Web viewembate de modernismo e pós-modernismo. O conflito direto entre os conceitos a...

7
A USP hoje e daqui a 20 anos: problemas estruturais e a manuntenção de problemas sociais Luiz Alberto Perin Filho Introdução A Universidade de São Paulo (USP) é uma das três Universidades públicas mantidas pelo governo estadual do Estado de São Paulo. Hoje e já há muito tempo é considerada a melhor Universidade do Brasil, seja por rankings ou pela crença pública. É uma das maiores e melhores instituições de Ensino Superior da América Latina e está envolvida no ensino, pesquisa e extensão universitária em todas as áreas do conhecimento humano. Diversos problemas podem ser apontados na USP ns dias de hoje. Há desde questões estruturais físicas que sofrem com a precarização em todos os seus 8 campus, até problemáticas estruturais nas escolas e institutos no ensino e na extensão como, por exemplo, grades horárias antiquadas e pouco (ou nenhum) fomento à extensão universitária. Todos esses problemas são de conhecimento principalmente da comunidade universitária, composta por professores, alunos e funcionários, ou seja, aqueles que estão diretamente em contato e sofrem os efeitos destes ditos problemas.

Transcript of Web viewembate de modernismo e pós-modernismo. O conflito direto entre os conceitos a...

Page 1: Web viewembate de modernismo e pós-modernismo. O conflito direto entre os conceitos a sociedade deve ser melhorada e de que a sociedade deve ser transformada

A USP hoje e daqui a 20 anos: problemas estruturais e a manuntenção de problemas sociais

Luiz Alberto Perin Filho

Introdução

A Universidade de São Paulo (USP) é uma das três Universidades públicas mantidas pelo governo estadual do Estado de São Paulo. Hoje e já há muito tempo é considerada a melhor Universidade do Brasil, seja por rankings ou pela crença pública. É uma das maiores e melhores instituições de Ensino Superior da América Latina e está envolvida no ensino, pesquisa e extensão universitária em todas as áreas do conhecimento humano.

Diversos problemas podem ser apontados na USP ns dias de hoje. Há desde questões estruturais físicas que sofrem com a precarização em todos os seus 8 campus, até problemáticas estruturais nas escolas e institutos no ensino e na extensão como, por exemplo, grades horárias antiquadas e pouco (ou nenhum) fomento à extensão universitária. Todos esses problemas são de conhecimento principalmente da comunidade universitária, composta por professores, alunos e funcionários, ou seja, aqueles que estão diretamente em contato e sofrem os efeitos destes ditos problemas.

O conflito com a temática das problemáticas estruturais na Universidade está diretamente relacionado à sua admnistração. Não só pela estrutura, mas também pela falta de continuidade e critério que essas administrações acabando tendo.

É interessante ressaltar como funciona a estrutura de administração universitária na USP. A estrutura administrativa da USP tem na

Page 2: Web viewembate de modernismo e pós-modernismo. O conflito direto entre os conceitos a sociedade deve ser melhorada e de que a sociedade deve ser transformada

Reitoria o seu órgão central, assim como no Reitor a figura principal da Universidade. Subordinadas à Reitoria estão as quatro Pró-Reitorias, órgãos especializados em cada um dos campos de atuação da universidade: Pró-Reitoria de Graduação (PRG), Pró-Reitoria de Pós-Graduação (PRPG), Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP) e Pró-Reitoria de Cultura e Extensão (PRC).

O reitorado é decidido pelo Governador do Estado de São Paulo, após a comunidade universitária, via Conselho Universitário, decide por três nomes mais votados compondo uma lista tríplice, que vai para o Governador. Apesar de ser considerada por muitos a raíz dos problemas da USP, é importante analisar mais de perto os meandros dessa discussão.

A USP e a Sociedade

A USP é uma Universidade Pública, ou seja, é bancada pelos impostos da sociedade do Estado de São Paulo. Isso significa que ela deve estar em conssonância com o que a sociedade precisa e quer.

Nao é simples pensar que, justamente o lugar onde se discute, cria e transforma conhecimento tem de atender aos anseios da sociedade. Pode-se pensar que, eventualmente, os anseios daqueles que estão na parte de fora do campus podem muitas vezes serem cegos de determinada maneira, denotando uma espécie de iluminação ou arrogância daqueles que estão como detentores do conhecimento. É possível dizer também que é justamente o que se espera daqueles que estão fora da Universidade: que os beneficiados justamente devam ter a capacidade de ajudar a população do Estado e do Brasil a melhorar e se transformar cada vez mais.

Porém, há um gravíssimo choque de noções dentro da própria USP e que, na verdade, reflete justamente o mundo externo. O resumo

Page 3: Web viewembate de modernismo e pós-modernismo. O conflito direto entre os conceitos a sociedade deve ser melhorada e de que a sociedade deve ser transformada

desse embate (que é um embate de discussão generalizado não só na Universidade, mas no mundo) é o reconhecimento do que é, de como está e de como poderia estar a sociedade. É possível encaixar, daí, a noção do embate de modernismo e pós-modernismo. O conflito direto entre os conceitos a sociedade deve ser melhorada e de que a sociedade deve ser transformada. Ressaltar que os conceitos de melhora e inovação não são necessariamente contrários à ideia de transformação trazida pelos pós-modernos. Mas há sim um confronto direto entre aqueles que acreditam que o que basta é inovar e aqueles que acham que inovar não é o bastante se não houver transformação. Há, aí, um claro embate político, econômico e social: pode-se pensar que inovar é apenas manter a estrutura para aqueles que são beneficiados na sociedade, enquanto o transformar significa justamente a quebra dessa estrutura dada pelo diagnóstico de que apenas inovar causa um congelamento estrutural quando o problema da desigualde na sociedade está justamente na problemática da capacidade emancipação de qualquer indíviduo dentro da sociedade. É, portanto, essencialmente um debate entre espectros políticos opostos.

Dessa forma, aqueles que pagam impostos para bancar a Universidade também se veem confrontados pelo mesmo paradigma.

O que acontece ou deixa de acontecer dentro da USP também deveria ser de interesse da sociedade. Porém não é. Existe uma noção extremamente problemática de simples prestação de serviços, de clientelismo por parte da sociedade que acredita que a USP deve trabalhar para melhorias sobretudo econômicas do espectro brasileiro, formar cegamente indivíduos capacitados para entrarem no mercado de trabalho e, justamente, inovar para empresas, bancos e indústrias. Portanto, a sociedade não se interessa diretamente pelo que acontece dentro da USP, identificando-a meramente como uma fábrica de diplomas de elite que garante empregos hiperqualificados

Page 4: Web viewembate de modernismo e pós-modernismo. O conflito direto entre os conceitos a sociedade deve ser melhorada e de que a sociedade deve ser transformada

para aqueles que tem o benefício de entrar nela. É uma noção aproximada daquela que a maioria do mercado de universidades privadas promove a manuntenção. De que para poder sobreviver ao mundo, o indivíduo deva ter um diploma. O estudo mais aprofundado das questões da sociedade, portanto, acaba não interessando justamente àquela que deveria ser beneficiada. E esse raciocínio cada vez mais invade os muros da USP.

A USP daqui a 20 anos: como mudar?

É importante diagnosticar a raiz do problema na Universidade. Como já dito, não é na escolha do reitor pelo governador do Estado. O grande problema da universidade hoje, o cerne de todos os outros problemas estruturais presentes está justamente na estrutura administrativa interna, passando por departamentos, faculaddes, institutos, pró-reitorias, conselho universitário e reitoria.

O problema da representação nos conselhos deliberativos, há muito discutido na comunidade, é que detém a raiz do problema para aqueles que buscam basicamente transformar a sociedade.

Independente da fórmula, é de extrema importância dar mais voz à comunidade universitária. Deixá-la fadada à mão de praticamente 10% do corpo significa a manuntenção de todos os problemas que a universidade enfrenta há anos.

Para tanto, é necessária que a noção de autoritarismo e superioridade de grande parte do corpo docente seja amenizada. Problema identificado inclusive dentro de salas de aula, onde professores com métodos e didática ultrapassados continuam a dar aulas vendo o crescente desinteresse do corpo discente, cada vez mais diferente e sensível à questões de autoritarismos e reafirmações de superioridade. Esse corpo docente, que é parte dominante do

Page 5: Web viewembate de modernismo e pós-modernismo. O conflito direto entre os conceitos a sociedade deve ser melhorada e de que a sociedade deve ser transformada

conselho universitário, deve agir com mais humildade e estar mais sensível às mudanças da comunidade, de funcionários e alunos. Afinal, apesar de ser legítimo o fato de que professores e pesquisadores tem carreira por muitos anos e devem ser os principais responsáveis pelos rumos da universidade, podemos questionar essa possível maior sensibilidade às necessidades justamente naqueles que acabam se acostumando mais à forma como ela acontece. Os alunos, por exemplo, tem muito a dizer. É absolutamente egoísta ignorar as articulações conseguidas pelas bases dentro dos Centros Acadêmicos, dado que aqueles indivíduos gastaram muito tempo em aprofundadas discussões de conjuntura e situação da universidade.

A maior inserção da comunidade nas tomadas de decisão da USP é a chave para conseguir alterar todos os problemas estruturais dentro dela. Passando pelo acesso limitado à uma clara elite econômica e branca, pelo sucateamento de prédios enquanto se dá a construção de outros, pelo maior aprofundamento das trocas entre a sociedade e universidade.

Daqui a 20 anos, a USP deverá representar mais a sociedade brasileira através daqueles que são o corpo docente e discente com a adoção de diferentes políticas de inserção social. Deverá gerir e gastar seu dinheiro de maneira responsável, de maneira absolutamente sensível às necessidades de sua enorme comunidade. Espera-se que também, em 20 anos, alunos não saiam no 5º ano da faculdade sem terem noção alguma do significado de extensão universitária, para que então essas trocas sejam factualmente mútuas entre sociedade e universidade e ditos projetos de extensão não sirvam apenas como cabide de experiência para alunos que queiram ingressar no mercado de trabalho. É sensível o problema da extensão na USP, vendo que são raros os projetos de extensão universitária que visam de fato levar conhecimento ao mundo exterior e produzir conhecimento se baseando nessa troca.

Page 6: Web viewembate de modernismo e pós-modernismo. O conflito direto entre os conceitos a sociedade deve ser melhorada e de que a sociedade deve ser transformada

Espera-se que, também, mais pessoas consigam ter acesso ao ensino superior e que este deixe de ser em duas décadas apenas um acessório para a manuntenção de uma classe econômica e social no mercado de trabalho.