Video como ferramenta pedagógica (Estudo de Caso)

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A vídeo-reportagem como ferramenta pedagógica em Mossoró, RN: uma análise do Projeto Minha Escola na TV Publicado na Ata da Conferência Internacional Educação, Globalização e Cidadania: Novas Perspectivas da Sociologia da Educação, CD Room ISBN 978-85-7745-120. Regina Cunha [email protected] Resumo O objetivo deste trabalho é suscitar um debate entre educadores e comunicadores sobre o uso da vídeo-reportagem como ferramenta pedagógica (educacional). A TV é objeto de estudo permanente: abordam a presença da TV em nossas vidas; os modos como diferentes públicos se relacionam com as construções simbólicas da TV; a criação e elaboração dos produtos televisivos; as estratégias de linguagem da TV; mas, pouco se fala sobre a possibilidade de utilizar a câmera para gravar, por exemplo: uma pesquisa escolar feita por um grupo de alunos, um debate organizado por jovens e crianças sobre as eleições na escola, uma peça de teatro escrita e interpretada por adolescentes de uma comunidade rural; em seguida editar o material gravado, e, finalmente, veicular o “programa” através do canal local de uma TV a cabo. O projeto Minha Escola na TV (cinco programas produzidos e veiculados em 2006), desenvolvido no semi- árido nordestino, constitui o corpus deste trabalho. Palavras-chave: educação e televisão, comunicação, responsabilidade social, cidadania. Video-reportage as a pedagogical tool in Mossoró, RN: analysis of the proyect ‘Minha Escola na TV’ Abstract The main purpose of this analysis is to promote a debate between educators and communicators about the use of the video-reportage as pedagogical tool (educational). TV is object of permanent study, as example: the presence of the TV in our lives; the ways as different public managing with 1

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Resumo: O objetivo deste trabalho é suscitar um debate entre educadores e comunicadores sobre o uso da vídeo-reportagem como ferramenta pedagógica (educacional). A TV é objeto de estudo permanente: abordam a presença da TV em nossas vidas; os modos como diferentes públicos se relacionam com as construções simbólicas da TV; a criação e elaboração dos produtos televisivos; as estratégias de linguagem da TV; mas, pouco se fala sobre a possibilidade de utilizar a câmera para gravar, por exemplo: uma pesquisa escolar feita por um grupo de alunos, um debate organizado por jovens e crianças sobre as eleições na escola, uma peça de teatro escrita e interpretada por adolescentes de uma comunidade rural; em seguida editar o material gravado, e, finalmente, veicular o “programa” através do canal local de uma TV a cabo. O projeto Minha Escola na TV (cinco programas produzidos e veiculados em 2006), desenvolvido no semi-árido nordestino, constitui o corpus deste trabalho.

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A vídeo-reportagem como ferramenta pedagógica em Mossoró, RN: uma análise do Projeto Minha Escola na TV

Publicado na Ata da Conferência Internacional Educação, Globalização e Cidadania: Novas Perspectivas da Sociologia da Educação, CD Room ISBN 978-85-7745-120.

Regina [email protected]

ResumoO objetivo deste trabalho é suscitar um debate entre educadores e comunicadores sobre o uso da vídeo-reportagem como ferramenta pedagógica (educacional). A TV é objeto de estudo permanente: abordam a presença da TV em nossas vidas; os modos como diferentes públicos se relacionam com as construções simbólicas da TV; a criação e elaboração dos produtos televisivos; as estratégias de linguagem da TV; mas, pouco se fala sobre a possibilidade de utilizar a câmera para gravar, por exemplo: uma pesquisa escolar feita por um grupo de alunos, um debate organizado por jovens e crianças sobre as eleições na escola, uma peça de teatro escrita e interpretada por adolescentes de uma comunidade rural; em seguida editar o material gravado, e, finalmente, veicular o “programa” através do canal local de uma TV a cabo. O projeto Minha Escola na TV (cinco programas produzidos e veiculados em 2006), desenvolvido no semi-árido nordestino, constitui o corpus deste trabalho.

Palavras-chave: educação e televisão, comunicação, responsabilidade social, cidadania.

Video-reportage as a pedagogical tool in Mossoró, RN: analysis of the proyect ‘Minha Escola na TV’

Abstract

The main purpose of this analysis is to promote a debate between educators and communicators about the use of the video-reportage as pedagogical tool (educational). TV is object of permanent study, as example: the presence of the TV in our lives; the ways as different public managing with the symbolic constructions of the TV; the creation and elaboration of TV-productions; the strategies of TV-language; although not too much is explained about the possibility to use the camera to record, as example: researches made by pupils in a classroom; debate organized by youth about school’s elections; a play written and interpreted by adolescents in a rural area; and after that, prepare to edit the recorded ‘material’, and, finally, to broadcast the ‘program’ by local channel in a cable TV of the city. ‘Minha Escola na TV’ (five programs produced in 2006), a video-proyect developed in Brazil’s Northeastern, is the ‘corpus’ of this presentation.

Key-words: education and television, comunication, social responsibility, citizenship.

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Errar é humano, mas não culpem os professores

Procurar bodes expiatórios quando o resultado não dá certo é tão antigo

quanto a história da humanidade e pode assumir várias formas. As crianças

que vão à escola hoje nasceram no século 21. Estes pequenos estudantes

vivenciam um mundo completamente diferente de tudo o que foi vivido pelas

gerações anteriores. Esta geração do milênio já chega à escola “plugada” na

televisão, celular, videogame, Internet, enfim.

Para acomodar os novos conhecimentos os educadores adicionam

pequenas partículas de informação, no já “inchado e disforme” currículo

escolar, ao mesmo tempo em que aumenta a cada dia, a responsabilidade da

escola no sentido de ajudar a criança a entender o que significam os novos

termos como cidadania, sexualidade, relações humanas, vida ativa e saudável,

e ainda por cima, prepará-los para a carreira profissional. É fácil deduzir que

estas crianças não discutem na escola, o próprio ambiente em que vivem, o

qual hoje contém um dos mais ricos conteúdos para aprendizado, já que a

criança vive rodeada de novas tecnologias, além disso, é provável que estes

estudantes não estejam sendo preparados para a vida dos novos tempos. É

preciso inovar pedagogicamente através da criação de contextos que permitam

às crianças não somente adquirir conhecimentos que serão relevantes para

suas vidas, mas também, aguçar a curiosidade e a criatividade para que as

bases para toda a vida emocional e intelectual sejam estabelecidas.

Será que o caminho da produção de programas de televisão por

estudantes pode ajudar a melhorar o aprendizado tanto na sala de aula como

na vida fora da escola?

A utilização de novas tecnologias em sala de aula questionada por

Yelland (2007) é um alerta os educadores:

Será que entender o processo da produção jornalística pode

habilitar as crianças para desenvolver um aprendizado das

matérias “antigas” e novas que jamais sequer havia sido

pensado, antes da introdução das novas tecnologias, como

computador, câmera digital, software de edição de vídeo on-line,

entre outras inovações que estão disponíveis? (YELLAND, 2007,

tradução feita pela autora do trabalho).

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Inovação tecnológica Versus Inovação Pedagógica

Neste ponto é preciso recorrer a BELLONI (2003) para distinguir as

inovações:

A primeira (inovação tecnológica) ocorre no campo social e

econômico, quando uma nova técnica se impõe como objeto de

consumo, mudando hábitos, saberes e modos de fazer. A

inovação pedagógica é bem mais difícil de definir. Primeiro,

porque ela é relativa ao contexto (nesse sentido pode ser uma

espécie de “novo antigo”); em seguida, porque é resultado de

uma intencionalidade (sempre presente no ato de educar), um

desejo de mudar para melhorar, e, por último, porque, em geral,

a inovação pedagógica ocorre num processo pouco planejado.

Já a inovação educacional acontece quando a inovação

pedagógica é alçada a um nível de ação política de maior

amplitude no tempo e no espaço (abrangência), exigindo

planejamento e definição de projetos. (BELLONI, 2003, p.290).

Quando os primeiros carros a motor começaram a ser fabricados em

grandes quantidades, algumas pessoas acreditavam que apenas as pessoas

capazes de entender o funcionamento do motor de combustão interna estariam

aptas a dirigir. A prática mostrou que nem todo mundo precisou ser treinado

para ser mecânico de oficina.

O verdadeiro desafio da sociedade do chip de silicone não é entender o

que faz o hardware funcionar ou como produzir o software. É saber o que eles

podem fazer, o que pode ser feito com eles e como lidar com seu produto final,

produzido em massa: a informação. (LEWIS, 1987, p. 253).

E a televisão?

A tevê não pára nunca de produzir informações e o público não

pára nunca de ver. Do outro lado da telinha, sentado na sala de

casa ou na poltrona de um avião ou ônibus, está o telespectador.

Você pode chamá-lo de cidadão, ou de consumidor.

Normalmente ele é as duas coisas ao mesmo tempo. Nestas

condições, ele cada vez mais opina, influi e decide sobre o que

gosta e o que julga importante para sua vida. (BARBEIRO, 2002,

p. 18).

Você na Telinha

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A maioria dos manuais de “como fazer TV” apresenta fórmulas para

produção de um programa de televisão. O problema é que as fórmulas têm um

elemento intrínseco de fracasso. Elas podem se tornar cansativas, previsíveis e

chatas. Você sabe que isso acontece quando é capaz de prever mais de 50%

do programa, antes de assisti-lo.

Em seu livro Você na Telinha, Como usar a mídia a seu favor, o

professor Heródoto BARBEIRO (2002) ensina “como tratar as grandes estrelas

da tevê e como se postar em condições de igualdade”, e mais, diz que “a

missão do livro é treinar”, o leitor, “para dar boas entrevistas no estúdio ou em

reportagens na televisão”.

Aproveitando a idéia do livro, cujo objetivo do autor foi o de orientar o

empresário interessado em tornar-se fonte1, o projeto Minha Escola na TV tem

por objetivo treinar e dar oportunidade aos jovens e crianças mossoroenses de

divulgar através do canal da TV a Cabo do município de Mossoró, as

entrevistas, os debates, peças de teatro e outras produções feitas por eles,

gravadas e transformadas em programas de televisão.

O projeto Minha Escola na TV é uma atividade desenvolvida em sala de

aula que permite ao aluno exercitar a criatividade, ampliar os canais de

comunicação no próprio meio e desenvolver o sentido de equipe com

aprendizagem responsável.

Tendo-se por base que os jovens e crianças selecionados para participar

do projeto devem estar regularmente matriculados em uma escola, eles podem

atuar como na preparação de um trabalho escolar. Ou seja, os estudantes

pesquisam um tema (escolhido por eles) e devem se familiarizar com o

assunto, de tal maneira que o programa (depois de editado) seja

compreensível para todos que o vejam.

As reportagens também promovem a mobilização dos jovens em torno

de conteúdos relacionados à diversidade da cultura local, levando em

consideração a cidadania política, riqueza ambiental do semi-árido nordestino,

e principalmente, permite que utilizem a informação como elemento

transformador da realidade.

Permitir que o jovem investigue possibilidades, faça escolhas, encontre

soluções e respostas, tome decisões, seja o protagonista de seu processo

educativo. Aproveite as próprias experiências presentes para modificar o futuro

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para melhor. O prof. Francisco Gutiérrez, autor do livro Linguagem Total: uma

Pedagogia dos Meios de Comunicação, em uma entrevista à prof. Tania Porto

(1995) alerta para que a escola abrace os meios.

A sociedade atual criou diferentes linguagens para se comunicar:

cinema, TV, rádio, histórias em quadrinhos, revistas,

computadores, Internet, entre outros. Nós iniciamos com o termo

Linguagem Total, que significa introduzir na escola todas estas

linguagens que a sociedade usa, para que o aluno não encontre

tanta diferença entre a escola e a sociedade. Na atual estrutura,

a escola está isolada, mantendo-se, praticamente, apenas com a

linguagem falada e escrita. Ela não usa estas linguagens,

embora algumas instituições escolares creiam que as têm

introduzido, simplesmente porque têm e usam os recursos

citados. Isto nós consideramos apoio audiovisual. O importante

não é que tenham estes apoios, mas que o aluno possa

expressar-se através destas linguagens. Se há um vídeo na

escola, é importante que o aluno se expresse, não pela forma

rígida de um profissional, mas como um ser humano que se

utiliza de recursos para seu desenvolvimento pessoal. E tudo

isso requer uma pedagogia. A Pedagogia da Comunicação é a

elaboração de estratégias, instrumentos, atividades (por

exemplo: teatro, entrevistas, exposições, filmes, diálogos...) que

permitam ao estudante aprender. Estas linguagens permitem ao

estudante compreender o mundo e expressá-lo para conviver

melhor e poder, assim, escrever sua história. (PORTO, 1995)

Escrevendo a própria história

O primeiro programa da série Minha Escola na TV abordou o problema

da poluição do Rio Mossoró – Meio Ambiente (esta reportagem ganhou o primeiro

lugar em maio de 2007, no concurso Mão Amiga promovido pela DNA e UFERSA –

Universidade Federal Rural do Semi-Árido). Os alunos da Escola Municipal

Francisco de Assis Batista, do bairro Alto da Conceição, falam sobre a poluição

do Rio Mossoró e o lamentável estado em que se encontra o campinho de

futebol na margem do rio, transformado em lixão. O local da gravação

(histórico) é a Ponte onde Jararaca (cangaceiro de Lampião) caiu derrotado

pelo povo. Mais do que o descaso com a história da cidade, a matéria mostra o

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descaso com a vida das crianças que moram no bairro, que não têm um local

para lazer e socialização.

Data 13/05/2006Escola Municipal Francisco de Assis BatistaRua Eufrásio de Oliveira, s/n – Alto da ConceiçãoTelefone 84 3315-5087Alunos: Jucicléia, Elias, Thomas, Joamaia, André e José CarlosProfessora Coordenadora: Irenice

  O segundo programa tratou do jovem e da inclusão social (Participação

Social). Os alunos apresentaram uma peça de teatro (escrita e interpretada por

eles próprios) para os jovens da APAE – Associação dos Pais e Amigos dos

Excepcionais de Mossoró. A peça aborda a preservação da natureza, inclusão

social, respeito ao próximo, limpeza do Rio Mossoró e, principalmente,

incentiva a vitória do amor sobre o ódio. O roteiro foi escrito pelos jovens com

supervisão dos professores da escola. A proposta dos alunos foi mostrar na

tevê a integração de jovens e crianças de diferentes bairros mossoroenses e,

principalmente, o engajamento dos jovens para um projeto de responsabilidade

social e exercício da cidadania, independente de status social e necessidades

especiais de cada um.

Data: 17/05/2006Escola Municipal Professora Celina Guimarães VianaRua Tibério Burlamaqui, s/n – BarrocasTelefone 84 3315-5097Local da Gravação: APAE - MossoróAtores: Francisco (fogo), Sandbergson (ar), Neilson (amor), Adriano (terra), Fagner (água) e Jefferson.Professor: AlexandreDançarinos: Aline, Jéssica, Marina, Maria Thereza, Suelen, Maria, Jéssica, Suyane, Moniele, Priscila, Cleidiane e Karen.Professor Coordenador: Joscelito

O terceiro programa da série abordou o tema “jovem e educação”. Os

alunos questionam a participação dos pais, principalmente, no cotidiano

escolar. Eles pedem mais “liberdade” para discutir “temas contemporâneos” em

sala de aula. A reportagem mostra o trabalho voluntário de alguns profissionais

que moram no bairro e que executam atividades na escola em diversas áreas.

Um destes voluntários, durante a entrevista, afirma que o trabalho com as

crianças o ajuda, pois dessa maneira ele próprio não fica “na rua”, suscetível

aos contatos nocivos com drogados e traficantes. Os alunos também

entrevistam a prefeita, que compareceu à escola, junto com a secretária de

educação no dia da gravação.

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Data: 19/05/2006Escola Municipal Joaquim da Silveira BorgesAv. Alberto Maranhão, s/n - Centro

Local: Própria escola

Alunos: Bruna, Edson, Tatamura, Jefferson, Isa, Deilson.

A quarta abordou temas como respeito pelo meio ambiente,

passando pela reciclagem de lixo, até a interação da escola, com os pais e a

comunidade. Os alunos convidaram os pais e a comunidade para uma visita à

escola, num sábado pela manhã, denominando o evento como uma viagem de

Volta ao Mundo/Feira das Nações. Cada sala de aula escolheu como tema, um

País cuja seleção estivesse participando da Copa do Mundo de 2006. Os

alunos deviam pesquisar e apresentar aos visitantes um pouco do País

daquele time. A decoração dos países foi feita com material reciclado. Na

entrada da escola cada família recebeu um passaporte (feito de papel

reciclado). Em cada sala de aula, o visitante recebia um carimbo (figura ou

assinatura) do País visitado. O objetivo dos alunos era incentivar a vinda dos

pais para conhecer a escola e principalmente, provocar a participação deles na

vida escolar. (Uma das maiores reclamações dos alunos, em todas as escolas:

“meus pais brigam comigo para estudar, mas não vão até a escola para saber

se sou bom aluno, ou não!”).

Data: 20/05/2006Escola Municipal José BenjamimRua Bodoca, 211 - Inoocop - São ManoelAlunos: Marcos Paulo, Mara Raquel, Nadja, Inavan, GleicianeAnderson

O quinto programa foi gravado na zona rural, a 32 quilômetros de

Mossoró, RN, num lugar chamado Assentamento Hipólito. O grupo de alunos

foi um dos mais questionadores e dispostos a utilizar o espaço na telinha. A

coordenadora da escola, na primeira reunião, sugeriu o tema da Higiene, mas

os alunos mudaram tudo na hora da gravação, e decidiram escrever e

interpretar uma peça de teatro. Uma psicopedagoga foi chamada para orientar

o debate que se seguiu à apresentação e gravação da peça. O roteiro

apresentou a história de uma adolescente que morava em um assentamento, e

não podia ir até a cidade, porque a avó, com quem ela morava, tinha medo e

não permitia. No texto as crianças afirmam que são reprimidos pelos pais e que

não podem fazer nada (sair para festas ou reuniões na cidade, por exemplo).

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Afirmaram ainda, que os pais deles não estavam preparando-os para viver o

mundo de hoje, mas sim, para uma realidade subserviente de vida no campo,

já que eles não estavam aprendendo a tomar decisões e assumir

responsabilidades.

Data: 23/05/2006Escola Municipal Evilásio Leão (Assentamento Hipólito)Alunos: Jeová, Giovana, Raquel, EstelaProfessora Coordenadora: CarmemDiretora: Beônia

Vamos pescar? Reconhecer a própria capacidade e evoluir

Conhecer para conquistar. A reportagem veiculada pela tevê local

suscitou a vontade de outros jovens em muitas escolas. A possibilidade de um,

deu a certeza a outro. Para confirmar que o conhecimento da dinâmica da

produção televisiva pode ajudar professores e alunos, tanto dentro como fora

da sala de aula, recorro ao trabalho de SALGADO (2005) para explicar o vídeo,

pesquisa e intervenção:

Compartilhando da premissa marxista de que o conhecimento

dos modos de produção permite uma postura mais crítica na

relação com os bens materiais e culturais, construir imagens

com as crianças apresenta-se como possibilidade de inseri-las

na reflexão da própria produção cultural, suscitando-lhes outra

postura que não apenas a de espectador, visando a recuperar a

dimensão política da linguagem televisiva como um saber

representativo de uma época: a da reprodução técnica

(BENJAMIN, 1987). Assim, como cada época constrói suas

questões e as formas para respondê-las, entendemos que é

preciso formular nossas indagações – as nossas e as das

crianças – ante o tema da mídia e também construir um modo

próprio de abordagem: fazer uso da imagem e do som como

forma de compreender uma época que se constitui em torno das

tecnologias audiovisuais. Se a mídia televisiva obedece a uma

linguagem específica, há que a conhecer para poder intervir a

partir de um outro prisma. É certo que somente conhecer as

condições de produção não garante a tomada de uma postura

1 Para construir a reportagem o jornalista precisa de uma fonte. Sem fonte não há notícia. Por isso o jornalista precisa que você conte fatos, dê testemunhos e sua opinião para que as reportagens possam ser desenvolvidas e divulgadas para toda a sociedade. (BARBEIRO, 2002, p.13)

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crítica perante essa produção; se houvesse essa garantia, o

próprio campo da comunicação social seria necessariamente

autocrítico, uma vez que dispõe desses saberes. Em

contrapartida, o conhecimento do processo de produção pode

ajudar na construção de uma postura indagadora. (SALGADO, et

al, 2005, p.19)

Construir uma postura indagadora, promover a participação social e

política de adolescentes, incentivar a educação ambiental e cultura popular. O

projeto Minha Escola na TV acena com essa possibilidade positiva, através da

produção televisiva. Muito se fala que devemos ensinar a pescar, e não dar o

peixe. Mas, a realidade mostra que pouco está sendo feito nesse sentido. Os

trabalhos desenvolvidos na área de responsabilidade social, principalmente no

Nordeste continuam atuando como ‘arrecadador de doações’ para terceiros.

Como um dos focos do presente trabalho é o fortalecimento do vínculo

aluno/escola, através da produção para televisão, então será feito apenas um

registro sobre possibilidade de ‘geração de renda’ aventada por uma das

escolas participantes do projeto:

Uma das escolas comercializou ‘cópias’ da gravação original da

apresentação dos alunos. Em outro momento, a escola criou o ‘Dia de Ver TV

na Escola’ para exibir o ‘programa’ para alunos, pais e comunidade em geral,

pois nem todo estudante tem a assinatura da TV a cabo. (A documentação

dessa ação será desenvolvida, no segundo semestre de 2007, por uma

Assistente Social)

O mercado como ele é hoje

Com o surgimento dos serviços de TV paga no Brasil no final dos anos

80, o mercado de televisão no país passou a ser composto por três grandes

segmentos:

Redes abertas: que oferecem programação gratuita;

Programadoras: são as empresas que fornecem conteúdo para

TV paga, como Discovery Networks, HBO e Aol Time Warner;

Operadoras: captam os sinais dos canais pagos (como HBO,

Telecine, Sportv, TNT, CNN, ESPN International, Discovery, etc),

canais abertos (Globo, SBT, Bandeirantes, TVE, entre outros) e

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canais públicos obrigatórios (de utilização gratuita, como TV

Senado, TV da Câmara Federal etc) e transmitem aos assinantes.

Como o trabalho enfoca o projeto desenvolvido em uma TV a Cabo,

torna-se necessária a descrição deste segmento:

TV a cabo é o serviço de telecomunicações que consiste na

distribuição de sinais de vídeo e/ou áudio a assinantes, mediante

transporte por meios físicos. Segundo a NEO TV, associação

que congrega 59 operadoras de cabo no Brasil, atualmente

estas operadoras respondem por 185 operações. Das quais, 144

já estão em funcionamento, cobrindo cerca de 325 municípios

brasileiros.

A própria NEO TV reconhece que as operadoras de TV a Cabo devem

desenvolver um trabalho de responsabilidade social junto às comunidades em

que operam e para isso criou em 2006 o Prêmio Operador Cidadão:

O Prêmio Operador Cidadão tem por objetivo reconhecer todas as iniciativas que visam à melhoria das condições sociais e o desenvolvimento das comunidades onde as empresas associadas atuam. Neste primeiro concurso realizado em 2006, os projetos foram avaliados por uma comissão julgadora formada por programadores e jornalistas especializados em terceiro setor e TV por Assinatura. Os vencedores da primeira edição são:1º Lugar – Viacabo2º Lugar - TCM – MossoróA operadora recebeu uma homenagem especial pela criatividade do projeto voltado à educação Minha Escola na TV. Ele possibilita que jovens e crianças mossoroenses façam parte de todas as etapas do processo de produção de vídeo-reportagens sobre temas importantes a suas realidades. Além disso, vincula a sua participação ao fato de estarem matriculados em uma escola.2

3º Lugar – CTBC

Qualidade. O público quer ver programas bons e bem feitos

O projeto é desenvolvido por uma jornalista que, junto com um

coordenador da escola, explica aos alunos os caminhos da notícia até chegar

na telinha, estimula a iniciativa da colaboração, organização e coordenação e

incentiva a participação.

O processo leva, em média, quatro semanas: na primeira, a jornalista vai

a escola e explica a base teórica do processo da produção da reportagem para

os alunos; na segunda, os alunos vão até emissora de tevê e vivenciam o

2 O projeto Minha Escola na TV foi criado antes do lançamento do Prêmio Operador Cidadão.

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processo prático; na terceira semana é feita a gravação; e na quarta semana a

matéria é veiculada pelo canal local da TV a Cabo.

Um cinegrafista profissional opera a câmera da emissora (profissional)

para oferecer uma gravação de qualidade ao público telespectador. A gravação

com os jovens atuando como repórteres e apresentadores, leva em média,

duas horas; e depois da captação, as imagens são editadas em ilha não-linear,

já que a empresa TCM® trabalha com equipamentos digitais. A veiculação

acontece aos sábados, às três horas da tarde, com uma reprise durante a

semana.

Espelho, pauta e TP: o que é isso, professora?

A metodologia do projeto Minha Escola na TV baseou-se no

questionamento, e também utilizou o aprendizado cooperativo (ANTUNES,

2001) com o desenvolvimento de múltiplas inteligências:

Inteligência lingüística – desenvolve no aluno a habilidade para usar a linguagem para convencer, agradar, estimular ou transmitir idéias. Em crianças, esta habilidade se manifesta através da capacidade para contar histórias originais ou relatar experiências vividas. Na produção para televisão esta habilidade favorece o desenvolvimento da pauta (conteúdo) e a escrita do texto.

Inteligência lógico-matemática – É a habilidade para lidar com séries de raciocínios, para reconhecer problemas e resolvê-los. Na produção para televisão esta habilidade ajuda o aluno a desenvolver a produção técnica e edição.

Inteligência musical - Esta inteligência se manifesta na habilidade para perceber temas musicais, ritmos, produção e reprodução de músicas. Na produção televisiva esta habilidade ajuda o estudante na edição da trilha sonora e escola da música tema da reportagem.

Inteligência espacial – É a inteligência que ajuda entre outras habilidades a ter atenção aos detalhes visuais. Na produção para tevê o aluno desenvolve a habilidade para escolher os locais de gravação, desenvolvimento do conteúdo e apresentação.

Inteligência sinestésica (corporal) – A criança ou jovem especialmente dotada de inteligência sinestésica se move com graça e expressão a partir de estímulos musicais ou verbais demonstrando uma grande habilidade ou coordenação fina apurada. É fácil concluir que aqueles que possuem esta habilidade não encontram dificuldades para executar o trabalho da apresentação da reportagem (movimentação em frente à câmera).

Inteligência interpessoal – Esta inteligência pode ser descrita como habilidade para liderar outras crianças, uma vez que são extremamente sensíveis às necessidades e sentimentos dos outros. Na produção de tevê ajuda na direção e produção e uso do talento pessoal.

Inteligência intrapessoal – É o reconhecimento de habilidades, necessidades, inteligências e dos próprios desejos. Na produção para tevê ajuda no desenvolvimento do projeto, edição e preparo do texto.

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Um dos grandes desafios para o educador (MORAN, 2000, p.23) é

ajudar a tornar a informação significativa; a escolher as informações

verdadeiramente importantes entre tantas possibilidades; a compreendê-las de

forma cada vez mais abrangente e profunda; e a torná-las parte do nosso

referencial.

Os impactos efetivos ocorridos na vida dos participantes do projeto e da

comunidade mossoroense (232.196 pessoas em 2007, segundo dados do

IBGE) vão desde a melhora no desempenho escolar, passam pelo aumento do

número de alunos que participam de atividades extracurriculares, quando estas

atividades foram gravadas para veiculação pelo canal local da TCM®, até a

criação de novos programas na grade da emissora para atender à solicitação

da comunidade.

A cada programa professores, coordenadores e alunos aproveitam para

apresentar "avaliações informais" sobre o programa Minha Escola na TV. As

gravações não são utilizadas para computar avaliações, embora estejam

registradas em video, e futuramente, possam servir para estudo estatístico, ou

análise científica da prática.

Um dos pontos que demonstra a grande aceitação do público e que os

alunos compreendem a importância da utilização da video reportagem como

ferramenta pedagógica, é o aumento do número de pedidos para participar do

programa.

Telefonemas, cartas e e-mails com propostas para participar do Minha

Escola na TV triplicaram nos últimos meses do ano de 2007. Os alunos

entenderam que, organizados e com planejamento, conseguem fazer valer o

direito deles como cidadãos e estão procurando mostrar para a comunidade

que cuidar do meio ambiente, preservar a cultura regional entre outros temas

importantes, é dever de todos. E quando uma escola muda a comunidade a

sua volta, para melhor, é justo que outros também queiram tentá-lo e mostrar

ao público mossoroense que vão conseguir. Por exemplo: em 2006 (maio) os

alunos da Escola Municipal Francisco de Assis Batista prepararam uma

reportagem sobre a poluição do Rio Mossoró e o lixão ao lado da escola, local

que antes era um campinho de futebol. A reportagem ganhou o primeiro lugar

do Prêmio Meio Ambiente DNA/UFERSA em março de 2007, mas melhor do

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que isso, os alunos conseguiram plantar árvores no local e em menos de um

ano conseguiram recuperar a praça para esportes e lazer. A repercussão do

prêmo, da vitória dos alunos e da melhora da qualidade de vida, incentivou

outros alunos, do outro lado da periferia de Mossoró, também vizinhos de um

lixão, a pressionar a direção da escola (no caso estadual), mais conhecida

como CAIC CARNAUBAL, a iniciar um processo de limpeza, em todos os

sentidos. O dia da gravação do programa Minha Escola na TV, em dezembro

de 2007, foi preeenchido com torneio de futebol e troféu, vacinação,

apresentação de shows musicais, de grupos folclóricos e teatrais, palestras

sobre drogas e gravidez na adolescência, aulas de artesanato, corte de

cabelos para alunas e mães e o plantio de 30 árvores (após a limpeza geral da

área em volta da escola, que incluiu até a retirada de animais mortos). Cada

árvore ganhou um nome (o do aluno que ficou responsável pela sua

manutenção).

Em agosto de 2006, a TCM® recebeu o segundo lugar no Prêmio

Operador Cidadã da NEOTV – Associação de TV por Assinatura e a Menção

Honrosa em Criatividade pelo projeto Minha Escola na TV.

O município de Mossoró recebeu o selo UNICEF em abril de 2007, pois

entre os vários itens analisados pelo UNICEF estava o projeto de comunicação

voltado para jovens e crianças, Minha Escola na TV e Minha Escola no Rádio3.

Em março de 2007, o projeto recebeu o 1º lugar no Concurso DNA

UFERSA como projeto de responsabilidade social voltado para difusão da

preservação da natureza e do meio ambiente nas escolas mossoroenses.

Em julho de 2007, o projeto foi apresentado durante o IV Congresso

Brasileiro de Comunicação, realizado na Universidade Maurício de Nassau, em

Recife, Brasil.

Em agosto de 2007, a jornalista Regina Cunha, coordenadora do projeto

Minha Escola na TV apresentou uma palestra sobre a importância da

Responsabilidade Social (Minha Escola na TV, como exemplo) para os

participantes do Congresso Internacional da ABTA – Associação Brasileira de

TV por Assinatura.

3 O projeto Minha Escola no Rádio não foi incluído na pesquisa apresentada neste trabalho.

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Page 14: Video como ferramenta pedagógica (Estudo de Caso)

Em outubro de 2007, a jornalista Regina Cunha foi a única jornalista

brasileira a participar do Congresso da UNICEF sobre os Direitos da Criança e

do Adolescente no Chile.

Em novembro de 2007, o projeto Minha Escola na TV recebeu o 1º

prêmio de Melhor projeto de Responsabilidade Social da NEO TV, Associação

Brasileira de TV por Assinatura.

Em dezembro de 2007, o projeto Minha Escola na TV foi selecionado

entre mais de mil práticas de Responsabilidade Social, de todo o Brasil,

voltadas para difusão dos Objetivos do Milênio, e vai receber em janeiro de

2008, a visita de pesquisadores/avaliadores com referência ao Prêmio

Objetivos do Milênio, da Presidência da República.

A subjetividade e o sujeito

Em seu trabalho O dispositivo pedagógico da mídia: modos de educar

na (e pela) TV, Rosa Maria Bueno Fischer (2002) diz o seguinte:

No estudo da TV como dispositivo pedagógico – feito a partir de duas pesquisas recentes: O estatuto pedagógico da mídia4 e Subjetividade feminina e diferença no dispositivo pedagógico da mídia5 temos observado as mínimas estratégias de a televisão afirmar-se como um lugar especial de educar, de fazer justiça, de promover a "verdadeira" investigação dos fatos (relativos a violências, transgressões, crimes de todos os tipos) e ainda de concretamente "ensinar como fazer" determinadas tarefas cotidianas, determinadas operações com o próprio corpo, determinadas mudanças no cotidiano familiar e assim por diante.6

4 O corpus de análise da pesquisa "O estatuto pedagógico da mídia", desenvolvida de 1998 a 2000, com apoio do CNPq, constituiu-se de 66 produtos, entre documentários, seriados, comerciais, desenhos animados, telejornais, programas infantis, programas didático-instrucionais, novela, programa feminino, programa de auditório, talk show, programas humorísticos, veiculados na TV aberta e TV a cabo brasileiras, entre agosto de 1998 e julho de 2000. in FISCHER, R. Dispositivo Pedagógico da Mídia. SP: Ed.Pesq. v.28 n.1 Jan/jun 2002.5 Na pesquisa "Subjetividade feminina e diferença no dispositivo pedagógico da mídia", iniciada em agosto de 2000 (também com apoio do CNPq), estamos investigando de que forma se constrói um discurso sobre a mulher na televisão veiculada no Brasil; ou seja, perguntamo-nos sobre a mulher e os modos de constituí-la na cultura brasileira contemporânea. Para tanto, selecionamos um conjunto de programas e comerciais de TV, em que a mulher é figura proeminente, e os submetemos a uma rigorosa análise, cruzando elementos de linguagem televisiva e tópicos referentes a técnicas de subjetivação, presentes nesses materiais; ainda, apresentamos alguns desses materiais a um grupo de mulheres, de 18 a 45 anos, estudantes de pedagogia, em sessões de discussão sobre a presença feminina na TV. Esse conjunto de enunciações (os textos retirados da TV e os textos produzidos pelo grupo de mulheres) constitui o corpus de análise dessa pesquisa. in FISCHER, R. Dispositivo Pedagógico da Mídia. SP: Ed.Pesq. v.28 n.1 Jan/jun 2002.6 Conforme explicito no texto "Técnicas de si na TV: a mídia se faz pedagógica" (2000, p. 111-139). in FISCHER, R. Dispositivo Pedagógico da Mídia. SP: Ed.Pesq. v.28 n.1 Jan/jun 2002.

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Page 15: Video como ferramenta pedagógica (Estudo de Caso)

Durante as entrevistas com os alunos (antes das gravações) para saber

a opinião sobre a televisão, fica claro que antes mesmo de ir para a escola a

criança é educada pela mídia, principalmente pela televisão. Para a maioria

dos jovens e crianças a relação com a televisão não é obrigatória, ela aprende

a ver e ouvir a estória dos outros, num processo que não exige esforço. A

televisão traz novidades, todos os dias, a música é engraçada, os trejeitos são

fáceis de imitar e mexe com os sentimentos. Para analisar o processo de

tomada de consciência recorro a análise de SALGADO, et al (2005):

O uso do vídeo, como disparador de reflexões sobre as práticas sociais (...), pode ser entendido como facilitador de processos de aprendizagem e desenvolvimento, envolvendo a reflexão e a tomada de consciência, graças ao distanciamento que o vídeo permite, dessas práticas e representações, transformando-as. Nesse duplo processo de pesquisa e intervenção pedagógica, cabe ao pesquisador compreender o que as crianças compreendem, realizando, assim, o que Krippendorf (1997) denomina de compreensão de segunda ordem, aquela que permite ao pesquisador uma reflexão recorrente sobre o seu próprio papel na realidade investigada. Trata-se, segundo o autor, de um envolvimento comunicativo que abarca tanto o pesquisador quanto o outro-pesquisado, em que ambos se transformam, assim como os processos de comunicação que se pretende compreender. (SALGADO, et al, 2005).

Alguns professores admitem que a televisão “educa” enquanto mostra

programas de entretenimento. Para a maioria dos professores, a educação

escolar deve incorporar tecnologias mais avançadas; além disso, a escola deve

ser um ambiente democrático e participativo onde a criança e o jovem tenham

oportunidade de expressar o que pensam.

Apenas um professor reagiu negativamente à realização da oficina de

jornalismo com os alunos da escola, considerando que a emissora poderia

estar utilizando o trabalho como uma forma de promoção. O mesmo professor

criticou a programação de uma emissora aberta, mas não quis explicar porque

não gostava dos programas.

Os alunos de uma escola decidiram não utilizar o tempo para uma

reportagem, mas sim, para apresentar uma peça de teatro (escrita por eles) e

pediram que a apresentação fosse feita no teatro da APAE/Mossoró –

Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais, promovendo a inclusão social

de jovens com necessidades especiais.

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Page 16: Video como ferramenta pedagógica (Estudo de Caso)

Durante o período pré-eleições 2006, muitos jovens decidiram utilizar o

tempo do programa para promover campanhas para o voto consciente aos 16

anos, embora não obrigatório, nesta faixa etária. Mas a maioria dos jovens

questionou a importância do voto, sendo que um deles abordou a questão do

“pão e circo” relacionando os tempos atuais aos fatos ocorridos anteriormente

na história da humanidade.

A primeira reunião (teórica) realizada entre a jornalista e os alunos na

sala de aula (reunião de pauta) mostrou que, na maioria das vezes, eles estão

preparados para levantar problemas, comparar, distinguir e apresentar as

soluções. Algumas questões foram repetidas e discutidas por vários grupos de

alunos em diferentes escolas: meio-ambiente; lazer na escola e no bairro onde

vivem; e a participação dos pais na vida escolar. O ensino e a forma de ensinar

também foram temas de reportagens.

O resultado apresentado, ou seja, a reportagem exibida pelo Canal local,

feita pelos jovens e crianças motivou a comunidade a acreditar na televisão

como um meio de comunicação “verdadeiro”, na opinião deles, porque se antes

havia um sentimento de que a novela era uma “simulação” da vida real, e até

houve um comentário de que o telejornal de uma emissora nacional mostrava

uma realidade distante, como por exemplo, a guerra no Iraque, ou até mesmo

uma passeata de estudantes que parou o trânsito por dezenas de quilômetros

numa rodovia do sudeste; agora a imagem era outra, a televisão (pelo menos a

tevê a cabo local) permitiu à cidade, aos moradores, aos jovens e crianças, aos

professores, se enxergarem na telinha – e eles gostaram do que viram. O

exercício de auto-avaliação, ou seja, a experiência dentro da sala de aula,

analisando o mundo em que vive, ajuda o sujeito a observar-se e formar sua

subjetividade.

Cultura da Inovação – você é o que você faz

A maioria do conhecimento que os países em desenvolvimento têm,

ainda precisa de um empurrão na área da educação, para se tornar realmente

produtivo e agregar valor de mercado, tanto no setor de produção de

equipamentos de alta tecnologia quanto no setor de prestação de serviços. Isso

não é novidade nenhuma, porque os especialistas já descobriram isto há algum

tempo, o problema é que ninguém faz nada para modificar a situação. Muito se

fala em inclusão social, mas as crianças continuam excluídas do direito de

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Page 17: Video como ferramenta pedagógica (Estudo de Caso)

participar de decisões importantes, principalmente na escola. Quem escolhe os

livros que elas lêem? Quem decide a merenda escolar? Isto só para citar dois

pontos. E a inclusão digital? Tem escola que recebe um “presente de grego”,

primeiro vem o computador, depois que o equipamento já enferrujou de velho,

é que vem a capacitação do professor. O aluno que já sai de casa “plugado na

web”, porque atualmente, é relativamente fácil comprar um computador em

suaves prestações, ou quando não tem, dá para viajar pela internet na “lan

house” do bar da esquina. Este aluno curioso e atrevido, nascido no meio da

evolução tecnológica, mesmo que saiba, não pode tocar o objeto sagrado, que

fica empoeirando no meio da biblioteca ou da sala de vídeo, “ninguém mexe,

senão quebra!”.

Oferecer a este aluno a “ferramenta tecnológica” chamada vídeo

reportagem para incentivar a criatividade, a auto expressão, a iniciativa própria,

a possibilidade de buscar uma solução para um problema comum, e

principalmente, incorporar ao processo de aprendizado uma habilidade maior

de avançar no desenvolvimento das inteligências. Educar com a utilização da

vídeo reportagem é mais do que necessário, porque o fazer e aprender

fazendo, é mais do que aprender. É dar a possibilidade ao sujeito de analisar a

subjetividade daquilo que o sujeito fez e é, contribuindo para o entendimento da

realidade para poder transformar a sociedade. A televisão na escola tem o

poder e o dever de fazer com que professores e alunos se aproximem mais, e

falem a mesma linguagem, quebrando os paradigmas convencionais do ensino

atual. O desenvolvimento do conhecimento é um dos aspectos fundamentais

da escola e deve ser acompanhado do desenvolvimento de habilidades e de

atitudes, como a utilização de novas ferramentas pedagógicas, como a vídeo

reportagem.

A sala de aula tem que ser um lugar de produção do conhecimento

A utilização da televisão (de produtos produzidos, gravados e editados

por terceiros) já é bastante utilizada na educação. Vários autores confirmam as

suas potencialidades para tornar o ensino mais eficaz. O desenvolvimento

rápido das tecnologias da comunicação e da informação tem colocado à

disposição da televisão novas possibilidades, oferecendo-lhe mais

oportunidades do que propriamente ameaças. É o caso das redes de satélites,

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Page 18: Video como ferramenta pedagógica (Estudo de Caso)

por exemplo, e da tecnologia digital. Como conseqüência, a televisão tem se

tornado um meio bastante popular e de alcance ampliado através dos anos.

As linguagens da TV também são fáceis de serem interpretadas,

respondem à sensibilidade dos jovens e da maioria da população adulta. São

dinâmicas, dirigem-se antes à afetividade do que à razão. Entretanto, os

estudantes precisam desenvolver, mais conscientemente, o conhecimento e a

prática da imagem fixa, da imagem em movimento, da imagem sonora e fazer

isso como parte do aprendizado central, e não, marginal. Aprender a ver mais

completamente o que já estão acostumadas a ver, mas que não costumam

perceber com maior profundidade.

O desenvolvimento do conhecimento é um dos aspectos fundamentais

da escola e deve ser acompanhado do desenvolvimento de habilidades e de

atitudes, conforme foi dito no Curso de Extensão para Professores do Ensino

Fundamental e Médio da Rede Pública desenvolvido pelo Ministério da

Educação e Cultura:

Habilidades que levem o indivíduo a caminhar sozinho, a interpretar os fenômenos, a expressar-se melhor, a comunicar-se com facilidade, a dominar atitudes que o ajudem a ter auto-estima, a ter impulso para avançar, para querer aprender sempre, evitando isolar-se, e colaborando para chegar a uma sociedade mais justa. O poder de interação não está fundamentalmente nas tecnologias, mas nas nossas mentes.7

Educar com esta nova “velha ferramenta” será uma revolução, e quem

sabe a televisão na escola faça com que professores e alunos se aproximem

mais e falem a mesma linguagem, quebrando os paradigmas convencionais do

ensino atual.

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7 in TV na escola e os desafios de hoje: Curso de Extensão para Professores do Ensino Fundamental e Médio da Rede Pública. UniRede e Seed/MEC/Coordenação de Leda Maria Rangearo Fiorentini e Vânia Lúcia Quintão Carneiro. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2a Edição revisada, 2002.

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Notas Explicativas

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