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Justiça Social no Domínio da Saúde * João Pereira ** * Versões preliminares deste ar- tigo foram apresentadas nas VIII Jornadas de Economia de la Salud, em Los Palmas de Gran Canaria, e num encontro do Health Economist's Study Group na Universidade de Bru- nei. Agradeço os comentários que vários participantes nestas reuniões fizeram ao trabalho; e em particular as apreciações de- talhadas de Gavin Mooney, Alan Maynard, Julian Le Grand e Tony Culyer. Os argumentos principais e erros que possam subsistir são, todavia, da minha inteira responsabilidade. ** Professor da Disciplina de Economia da Saúde - Escola Nacional de Saúde Pública Portugal No debate europeu sobre eqüidade na saúde uma questão fundamental tem recebido fraca atenção por parte dos investigadores. Trata-se da especificação dos objetivos de determinado sistema de saúde e da forma como podem ser interpretados para permitir a monitorização de políticas. Este artigo passa em revista atuais e potenciais contribuições para esta área de estudo. Adota como perspectiva que o significado de eqüidade na saúde depende, de forma crucial, da maneira como se define o conceito de justiça social, e que este, por sua vez, depende de juízos de valor ou pontos de vista da sociedade, tal como articulados por indivíduos, grupos ou governos. Esta abordagem permite-nos escolher racionalmente as regras de distribuição que melhor se adaptam ao conjunto de valores duma sociedade e, subseqüentemente, aplicá-las como escala de medição para avaliar o sucesso da política de saúde. Apôs uma exposição sumária da abordagem, a parte principal do artigo discute três teorias concorrentes da sociedade a Libertária, a Liberal e a Socialista-Democrática bem como as principais regras de distribuição delas decorrentes. Estas últimas, propostas na literatura econômica e filosófica, são analisadas criticamente. A parte final do artigo avança com algumas conclusões e caminhos para investigação futura. INTRODUÇÃO Nos países europeus, o problema das desigual- dades sociais na saúde gerou, durante a década de 80, um enorme esforço de investigação no sentido de medir e explicar tais assimetrias e, eventualmente, de promover maior eqüidade no setor. Ao tentar estabelecer um programa de investiga- ção sobre o tema, Julian Le Grand (1986) argumentava que uma questão básica a ser respondida dizia respeito aos objetivos da política do setor, e fazia notar com certo desânimo que o debate não chegou ainda a ser

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Justiça Social no Domínio da Saúde *

João Pereira **

* Versões preliminares deste ar-tigo foram apresentadas nasVIII Jornadas de Economia dela Salud, em Los Palmas deGran Canaria, e num encontrodo Health Economist's StudyGroup na Universidade de Bru-nei. Agradeço os comentáriosque vários participantes nestasreuniões fizeram ao trabalho; eem particular as apreciações de-talhadas de Gavin Mooney,Alan Maynard, Julian Le Grande Tony Culyer. Os argumentosprincipais e erros que possamsubsistir são, todavia, da minhainteira responsabilidade.

** Professor da Disciplina deEconomia da Saúde - EscolaNacional de Saúde Pública —Portugal

No debate europeu sobre eqüidade na saúde umaquestão fundamental tem recebido fraca atenção porparte dos investigadores. Trata-se da especificaçãodos objetivos de determinado sistema de saúde e daforma como podem ser interpretados para permitir amonitorização de políticas.Este artigo passa em revista atuais e potenciaiscontribuições para esta área de estudo. Adota comoperspectiva que o significado de eqüidade na saúdedepende, de forma crucial, da maneira como se defineo conceito de justiça social, e que este, por sua vez,depende de juízos de valor ou pontos de vista dasociedade, tal como articulados por indivíduos, gruposou governos. Esta abordagem permite-nos escolherracionalmente as regras de distribuição que melhorse adaptam ao conjunto de valores duma sociedadee, subseqüentemente, aplicá-las como escala demedição para avaliar o sucesso da política de saúde.Apôs uma exposição sumária da abordagem, a parteprincipal do artigo discute três teorias concorrentesda sociedade — a Libertária, a Liberal e aSocialista-Democrática — bem como as principaisregras de distribuição delas decorrentes. Estasúltimas, propostas na literatura econômica e filosófica,são analisadas criticamente. A parte final do artigoavança com algumas conclusões e caminhos parainvestigação futura.

INTRODUÇÃO

Nos países europeus, o problema das desigual-dades sociais na saúde gerou, durante a década de80, um enorme esforço de investigação no sentidode medir e explicar tais assimetrias e, eventualmente,de promover maior eqüidade no setor.

Ao tentar estabelecer um programa de investiga-ção sobre o tema, Julian Le Grand (1986) argumentavaque uma questão básica a ser respondida dizia respeitoaos objetivos da política do setor, e fazia notar comcerto desânimo que o debate não chegou ainda a ser

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enquadrado nas discussões filosóficas da sociedadeem geral. Vários autores dedicaram-se recentementea corrigir esta lacuna da literatura (1), mas todoseles, sem exceção, apresentam apenas uma explicaçãoparcial que deixa em aberto muitas questões de inte-resse.

O presente trabalho tem como objetivo aperfei-çoar a compreensão do debate ao adotar uma aborda-gem alternativa cuja finalidade é encontrar o elo emfalta na análise da especificação dos objetivos de umsistema de saúde. Simultaneamente passa em revista,de forma crítica, as reais e potenciais contribuiçõespara uma definição do conceito de eqüidade na saúde,evidenciando as suas vantagens, desvantagens e ade-quabilidade para aplicação.

ABORDAGEM

Este artigo adota como perspectiva que o signifi-cado de eqüidade em saúde e em cuidados de saúdedepende, de forma crucial, da maneira como se defineo conceito de justiça social, e que este, por sua vez,depende de juízos de valores, ou seja, dos pontosde vista da sociedade tal como articulados por indiví-duos, grupos ou governos. Em vez de remeter esterelacionamento para formulações de base disciplinária— como outros autores têm feito — tentou-se retratara forma como os objetivos de eqüidade na políticade saúde, assim como pontos de vista mais geraissobre justiça social, estão dependentes da opinião geralda sociedade. Esta abordagem permite-nos escolheras regras de distribuição que melhor se adaptem aoconjunto de valores duma sociedade e, subseqüente-mente, pô-las em prática como escala de medição paraavaliar do sucesso dessa política.

A idéia geral pode ser ilustrada através da FiguraI. Há três níveis fundamentais na especificação dosobjetivos de eqüidade no campo da saúde. Para come-çar temos indivíduos ou grupos perfilhando opiniõeslargamente diferenciadas sobre organização sócio-eco-nômica (teorias de sociedade); estas, por seu turno,implicam pontos de vista diferentes sobre justiça social(princípios de distribuição); e, por fim, estes princípiossão aplicados ao campo da saúde e constituem o padrãode medição dos efeitos das decisões coletivas (objeti-vos de eqüidade em política de saúde). Deste modo,estes últimos só podem ser devidamente compreen-didos se considerados à luz dos dois primeiros níveis.

O motivo da opção por esta abordagem apareceem toda a sua dimensão quando da determinação doscritérios de avaliação a utilizar na escolha entre osdiferentes princípios de distribuição. Três linhas mes-tras sugeridas na literatura são, primeiro, que um prin-

(1) Ver, por exemplo, Lê Grand(1987), Mooney (1987), e Cu-lyer (1987).

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cípio deverá possuir reduzidos requisitos de informa-ção; segundo, que deve ser facilmente compreensível;e terceiro, que deveria ser possível obter uma distribui-ção de recursos que seja simultaneamente equitativae Pareto-eficiente (ver Rawls, 1971; Sen, 1977; Paznere Schmeidler, 1978).

Le Grand (1984) sugere, contudo, que o critériomais importante, ou seja, aquele perante o qual estesoutros ficam reduzidos a posição perfeitamente secun-dária, é o da sua aceitabilidade intuitiva... (isto é,um critério que) ... conduza ao consenso geral. Masisto mais não faz que trazer-nos de volta à questãocrucial dos juízos de valor. Um critério de eqüidadeaceitável para Le Grand pode ou não sê-lo para outroscidadãos. Se o conceito, de fato, 'reunir o consensogeral' entre todos eles, então é, com certeza, porquesão mais ou menos idênticos não só nos seus valoresbásicos de organização da sociedade, como tambémna importância que atribuem à questão da eqüidade.Eis pois o motivo que me leva a tomar em consideraçãoas teorias da sociedade e a sua relação com as regrasde distribuição. Isto não quer dizer que a escolha deprincípios de distribuição ficará reduzida à identifi-cação daquele que melhor se coadunar com o conjuntode valores de uma sociedade — pois podemos argumen-tar que a sua especificidade e o seu potencial de aplica-ção empírica são igualmente importantes — mas tere-mos progredido no sentido da clarificação de dúvidasquanto à sua aceitabilidade num determinado contexto.

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Se assentarmos nas teorias de sociedade comoponto de partida, como convirá então ordená-las? Cu-lyer et al (1981) fornecem-nos uma hipótese de ordena-ção que permite uma perfeita distinção entre duas baseséticas de política de saúde: uma abordagem profunda-mente 'individualista', que considera o acesso aos cui-dados de saúde em termos praticamente iguais aosdo acesso a quaisquer outros bens de consumo disponí-veis no mercado, ou seja, como uma parte do sistemaretributivo da sociedade; e uma abordagem franca-mente 'coletivista' que considera o acesso aos cuidadosde saúde como um direito do cidadão, de modo algumdependente da distribuição da riqueza ou dos rendi-mentos. Embora estes autores tenham demonstrado queesta dicotomia de pontos de vista se revelara extrema-mente útil na compreensão dos objetivos e da 'perfor-mance' de certos sistemas de saúde, o caso é quenão se apresenta suficientemente discriminatória paraenglobar toda a variedade de princípios de distribuiçãopropostos pela literatura como potencialmente aplicá-veis ao debate sobre desigualdade na saúde.

Barr (1987) apresenta-nos uma ordenação quemais se aproxima dos nossos requisitos. Começa porestabelecer uma distinção entre três teorias: a Libertá-ria, a Liberal e a Coletivista; e salienta simultanea-mente, em relação a esta última ideologia, as diferen-ças entre os pontos de vista Fabiano (Socialista Demo-crático) e Marxista. Esta abordagem assemelha-se àque foi adotada por George e Wilding (1985) e Telfer(1976).

Neste artigo limitar-me-ei à análise dos três pri-meiros pontos de vista, que apelidarei de: Conserva-dor/Libertário; Liberal e Socialista Democrático. Noseu conjunto, refletem um largo espectro das idéiasdas sociedades modernas (2). Sob cada um destes títu-los serão analisados tanto os princípios de distribuiçãoclássicos como os mais recentemente propostos pelaliteratura econômica e filosófica; e isto porque elesrepresentam os valores básicos inerentes às respectivasteorias de organização sócio-econômica. As regras dedistribuição são igualmente avaliadas à luz dos crité-rios atrás sugeridos, em particular o seu potencial deaplicação ao caso português.

CONSERVADORES/LIBERTÁRIOS

Os Conservadores/Libertários são os atuais her-deiros do 'liberalismo' do século XIX. Os seus valoresfundamentais são a liberdade, o individualismo, e, pos-sivelmente, a desigualdade. Só através da aceitaçãode que a liberdade (definida como a ausência de coa-ção) tem precedência sobre todos os outros valoresé que se conseguirá chegar ao âmago da posição Con-

(2) A exclusão das análises Mar-xistas sobre justiça não tem gran-de importância já que, algo para-doxalmente, uma das caracterís-ticas dessa literatura é o seu rela-tivo sub-desenvolvimento no quetoca a conceitos de distribuiçãoequitativa. De fato, os que têmsido sugeridos não são substan-cialmente diferentes dos discuti-dos sob o ponto de vista Socialis-ta-Democrático (p. ex., Igualda-de e Capacidades Básicas). Oleitor interessado deverá consul-tar Wood (1986), Roemer(1986) e Sen (1987).

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(3) A precedência da liberdadesobre os outros valores conduzà vulgarização do termo 'Liber-tário'. Na análise que se segue,utilizá-lo-ei alternadamente com'Conservador'.

servadora sobre eqüidade (3). É sempre um meio neces-sário e suficiente para atingir outros tantos fins desejá-veis, incluindo uma maior igualdade:

Uma sociedade que coloca a liberdade em primei-ro plano acabará por atingir — como se de umfeliz sub-produto se tratasse — não só maior li-berdade, como também maior igualdade... (Essasociedade)... garante aos desfavorecidos de hojea oportunidade de se tornarem nos privilegiadosde amanhã, e, no decurso dessa evolução, permi-tirá a quase todos, de alto a baixo, gozar umavida mais cheia e mais rica.

(Friedman e Friedman, 1982)

Para os Conservadores, individualismo é tambémcomplemento de liberdade. Quanto menos restringidoum indivíduo for nas suas escolhas, maior será o bem-estar social. Neste encadeamento, aquilo que os outrosapelidam de problemas sociais, para os Conservadoresnão constitui mais do que problemas resultantes decausas individuais e que requerem, inevitavelmente,ação individual para a sua resolução. A desigualdadeem saúde não é, assim, um problema da política gover-namental, mas antes da responsabilidade e da escolhade cada um.

Em face de tais pontos de vista, a própria noçãode eqüidade aparece destituída de sentido para os Con-servadores/Libertários. Segundo Hayek (1960), qual-quer distribuição só poderá ser classificada de justaou injusta se tiver sido causada pela ação, ou inação,do indivíduo. Além disso, a prossecução de políticasigualitárias por um governo e incompatível com a no-ção de liberdade, pois acabará indubitavelmente porconduzir à coerção e a efeitos prejudiciais sobre oindividualismo, pondo em risco a harmonia social.

Nozick (1974) apresenta o clássico argumento Li-bertário de eqüidade na sua teoria de distribuição emfunção da titularidade. O seu princípio básico é quecada um é titular daquilo que possui desde que otenha adquirido de forma justa, ou seja: como proventodo seu trabalho, através de herança, ou pela via daredistribuição pelo Estado de títulos adquiridos ilegal-mente. Uma distribuição específica para ser ou nãoconsiderada equitativa apenas dependerá da via utiliza-da para a atingir. As suas implicações para a eqüidadena saúde são bastante diretas. Nenhum cidadão temdireito a cuidados de saúde, a não ser que os tenhaadquirido pela via do mercado. Qualquer.tentativa deredistribuição de recursos seria, por si só, consideradauma injustiça, mesmo que a sua finalidade fosse ade criar incentivos para aqueles que utilizem de formamenos eficaz os serviços de saúde (p. ex., os menos

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instruídos e os pobres). A teoria também não atribuiqualquer importância aos desafortunados, já que consi-dera ser uma mera questão de destino que uns nasçamsaudáveis enquanto que outros são atormentados porproblemas crônicos de saúde; como também não reco-nhece sentimentos de compaixão ou generosidade dossaudáveis para com os enfermos, que freqüentementese traduzem, na prática, pela contribuição de subsídiospara os serviços de saúde (Culyer, 1980). Por fim,omite reconhecer o papel desempenhado pelos haveresrecebidos a título de bens sociais (por exemplo, forma-ção médica) assim como pela ignorância do consumidorno mercado dos cuidados de saúde, e os efeitos exter-nos do seu consumo.

Considerando as conseqüências extremas da teoriade Nozick em termos de política social e de saúde,alguns Libertários sugeriram a criação de uma espéciede grelha de segurança, ou seja, um nível abaixo doqual nenhum indivíduo poderia descer.(4) Tal aborda-gem — freqüentemente designada como o mínimo de-cente — é, portanto, uma possível regra de distribuiçãode cuidados de saúde sob a égide do Libertarismo.No entanto, a chave da sua operacionalidade está emque exige um juízo de valor quanto ao que constituio tal mínimo decente ou social, e os seus proponentestêm-se mostrado relutantes em defini-lo com exatidão.No domínio da saúde, só Enthoven (1980), atravésda sua proposta de um Plano de Saúde por Escolhado Consumidor, se aproxima de uma tal definição.Em vez de critérios, propõe uma lista de "serviçosbásicos de saúde" cuja prestação caberia à HMO —Health Maintenance Organization. Mas isto está longede nos garantir que, no fim, ficaremos com uma idéiaclara daquilo que constitui o mínimo decente, vistoque ele não nos apresenta nenhuma justificação concre-ta sobre a colocação, ou não, na tal lista, de certostipos de cuidados. Em última análise, a distinção quefaz entre planos de opção elevada ou baixa sugereque se poderá escolher o 'mínimo decente' por referen-ciação aos custos médios das categorias atuariais. Oraisto parece-nos um princípio algo injusto para a distri-buição de cuidados de saúde.

Em suma, o discurso Conservador/Libertário so-bre eqüidade revela pouca utilidade para o debate dadesigualdade na saúde. A adesão dogmática à teoriade que não é injustiça a atual distribuição coloca osLibertários à margem da preocupação generalizada como problema. As suas opiniões sobre justiça social tam-bém não refletem, manifestamente, as preocupaçõesigualitárias expressas em documentos legais dos maisdiversos países no que se refere ao acesso aos cuidadosde saúde. Temos por fim que, sempre que propuseramprincípios de distribuição para a proteção das necessi-

(4) Ver, por exemplo, Flew(1987).

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dades extremas de alguns indivíduos, esses princípiosse revelaram claramente falhos da especificidade, daclareza e da operación alidade que se procura.

LIBERAIS

Os valores Liberais assemelham-se, em muitosaspectos, aos dos Libertários, sendo a principal dife-rença que os primeiros os não subscrevem de formaabsolutista. Barr (1987) sintetiza as principais caracte-rísticas do discurso Liberal como a análise da socie-dade em termos de indivíduos; a propriedade privadacomo contingente do atingimento dos objetivos da po-lítica mais do que como um elemento essencial dasua doutrina; e a comunhão de opiniões sobre justiçasocial que, por vezes, possuem implicações igualitá-rias. Poder-se-ia ainda argumentar que o seu pragma-tismo é pontuado por uma forte vertente humanista.

As noções Liberais sobre liberdade e individua-lismo explicam-se melhor como sendo a tentativa demoderar, na prática, os excessos dos conceitos Conser-vadores/Libertários. Isto transparece claramente do ar-gumento de Beveridge (1945) segundo o qual liberdadeé mais do que estar-se livre do jugo do poder arbitráriodos governos; é estar-se livre da servidão econômicaresultante da Indigência, da Miséria Abjecta e de ou-tros males sociais. Ou, segundo o ponto de vista deKeynes (1946), o individualismo, se puder ser expurga-do dos seus efeitos e abusos, é a melhor salvaguardada liberdade pessoal no sentido de que ... permitealargar sobremaneira o exercício da escolha pessoal.Não é portanto surpreendente descobrir que os Liberaisacreditam que as desigualdades devem e podem seratenuadas. Convém, contudo, sublinhar que a sua vi-são de eqüidade não é propriamente igualitária, massim uma visão que pretende melhorar as condiçõesdos mais desfavorecidos, quer se trate dos pobres,dos sem-instrução, ou dos doentes crônicos.

Têm sido sugeridos vários princípios de distribui-ção na literatura que supostamente refletem os valoresLiberais. Segundo Barr (1987), as duas mais influentesteorias de justiça social — o Utilitarismo e o 'Maximin'Rawlsiano — pertencem, sem sombra de dúvida, à tra-dição Liberal. A primeira, na sua interpretação clássi-ca, considera equitativa uma distribuição em que seencontre maximizado o somatório das utilidades indivi-duais. É todavia difícil de entender por que é quealguns autores vêem o utilitarismo como uma teoriade distribuição equitativa. Por um lado, é ponto perfei-tamente assente que uma distribuição igualitária sópode resultar sob a égide dos princípios clássicos doutilitarismo se houver preferências idênticas (Culyer,1980). Há no entanto um argumento mais forte, apre-

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sentado no conhecido comentário de Sen (1973), se-gundo o qual a maximização do somatório de utilidadesindividuais é soberanamente indiferente à distribuiçãointerpessoal daquele somatório. As atividades ou pes-soas as quais são atribuídos recursos dependem, purae simplesmente, das comparações de utilidade. Assim,se um indivíduo rico responde melhor a um determina-do tipo de tratamento do que um pobre, a regra dedecisão utilitária impõe que é àquele primeiro que de-vem ser atribuídos maiores recursos. Poderá dizer-seque é eficiente a distribuição dali resultante, mas épouco provável que ela se identifique com o conceitode eqüidade da maioria das pessoas. Há, ainda, váriosproblemas técnicos associados ao utilitarismo, todoseles inevitavelmente relacionados com a impossibili-dade de estabelecer comparações interpessoais de utili-dade. Com efeito, a identificação de uma justa distri-buição utilitária depende de uma tão vasta gama defatores empíricos — tão difíceis de obter — que serevela improducente tentar aplicá-la à saúde e aos cui-dados de saúde. Além do mais, estes fatores não sãodiretamente deduzíveis do próprio princípio, o queainda mais vem complicar a tarefa.

A teoria do 'Maximin' de John Rawls (1971) temmerecido grande atenção da parte dos economistas.Esta teoria faz da justiça um objetivo inflexível, aopropor que a política social deve procurar maximizara posição dos menos favorecidos. Rawls refere umconjunto de bens cuja produção e distribuição, sugereele, não deveriam ser deixadas ao critério dos própriosindivíduos. Estes "bens sociais primários" incluem asliberdades básicas: liberdade de movimentação e deescolha da ocupação num cenário de oportunidadesjustas; poder e regalias da função; rendimentos e rique-za; e as bases sociais do respeito próprio. Rawls imagi-na então um hipotético 'ponto de partida' em quecada indivíduo agisse sob um 'véu de ignorância'. Numtal contexto, o indivíduo racional mostrar-se-ia adver-so ao risco e escolheria como esquema de preferênciauma situação em que fosse maximizada a posição dosmais desfavorecidos. O que o impele para tal opçãonão é tanto a compaixão para com os menos favoreci-dos, mas antes o medo de que ele próprio possa vira tornar-se num desses elementos mais desfavorecidosda sociedade, uma vez levantado o véu da ignorância.

Segundo Le Grand (1987), a aplicação do 'Maxi-min' Rawlsiano ao campo da saúde determina que asdesigualdades (tanto na saúde como nos cuidados desaúde) só se justificam quando resultem a favor dosmenos favorecidos. Le Grand critica a consagraçãode semelhante regra como linha mestra da políticade saúde por dois motivos. Primeiro porque levantaum sem-número de dificuldades de ordem teórica e

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(5) Com efeito, incluir tanto asaúde como os cuidados de saúdeimplicaria trocas compensatóriascom outros bens sociais primáriostais como rendimentos e riquezae, inevitavelmente, comparaçõesde utilidade que Rawls decidida-mente pretende evitar (Arrow,1974).

(6) O próprio Daniels admitefrancamente que o seu trabalhonão pressupõe a aceitabilidadeda teoria de Rawls (Daniels,1981).

prática; por exemplo, deveremos definir os menos fa-vorecidos em termos do seu consumo global de bensprimários, ou em termos de saúde ou cuidados de saú-de? Além disso, estaremos a ser realistas ao suporque será fácil estabelecer a distinção entre as desigual-dades que beneficiam os menos favorecidos e as queo não fazem? Poder-se-ia acrescentar que o princípiosugere implicitamente que uma distribuição equitativaseria aquela em que todos os indivíduos baixariamà situação de saúde da pessoa mais doente. A segundacrítica contém uns certos laivos de libertarismo: é queo 'Maximin' conduziria à redistribuição em favor da-queles cujo pior estado de saúde, ou cujo inadequadoconsumo de cuidados de saúde, ou cuja própria indi-gência seriam o resultado das suas próprias decisões.Teoricamente, no entanto, a aplicação direta (por LeGrand) do princípio Rawlsiano ao campo da saúdeé demasiadamente ambiciosa, já que nem a saúde nemos cuidados de saúde foram classificados pelo próprioRawls como bens sociais primários (5). Daniels (1981)sugere que a estratégia mais promissora de alargamentoda teoria 'Maximin' ao campo da saúde é a de incluirnum mesmo enquadramento os serviços de saúde eas instituições apostadas em proporcionar uma justaigualdade de oportunidades. Tal abordagem, contudo,apenas terá como efeito o de reduzir a definição deeqüidade a igualdade na oportunidade de acesso a cui-dados de saúde (6). Assim, embora esta interpretaçãopareça estar em perfeita sintonia com as preocupaçõesda política de saúde de países europeus como Portugalou o Reino Unido, o caso é que produz o infelizefeito de tornar redundante a sua estrutura teórica.Ficamos reduzidos a uma simples interpretação deeqüidade que é problemática, e nenhuma idéia de comose poderá aplicar o conceito a uma análise concreta.

Uma engenhosa e recente tentativa de aplicaçãodo utilitarismo à saúde é a fórmula da maximizaçãoda saúde. Esta fórmula apreende a essência das preocu-pações Liberais com a eqüidade e, embora ainda numafase embrionária de desenvolvimento, merece contudoa atenção dos investigadores da desigualdade. As suasraízes podem-se encontrar em trabalhos que procuramexaminar a externalidade de preocupação (caring ex-ternality) no campo da saúde (Culyer, 1971). Emboraesta investigação tenha sido inicialmente concebidacomo uma explicação do alargado apoio em favor dofinanciamento público de cuidados de saúde, indireta-mente ela tem implicações sobre o tipo de eqüidadepor que deve nortear-se a política do setor. Culyer(1971) parte do princípio que é a quantidade de sofri-mento, mais do que a sua distribuição, que constituia base da relação da externalidade. Isto sugere quea preferência por um maior consumo de cuidados deve-

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ria constituir argumento nas funções de utilidade dosmais favorecidos, em vez de igualdade de consumode cuidados (Lindsay, 1969), pois é o próprio subcon-sumo pelos indigentes (implicitamente associado amaior sofrimento) que impõe uma 'desutilidade' exter-na aos outros.

Parece ter-se desenvolvido uma certa confusãona literatura quanto à verdadeira definição de eqüidadeque se deve extrair da abordagem da 'externalidadede preocupação'. Mooney (1987) opina que é 'igual-dade de utilização para igual necessidade'. O próprioCulyer (1976) sugere que ela pende para uma noçãoigualitária de 'cuidados igualmente disponíveis paraindivíduos em idênticas situações de doença', ou seja,o 'comunismo na doença'. Nenhum destes conceitosabrange de forma satisfatória aquilo que é talvez ocritério mais importante da análise de Culyer (1971):a situação de saúde dos 'indigentes' como causa dainquietação. As pessoas preocupam-se com os outrosnão por estes serem pobres ou desprovidos de recursos,mas por serem ou estarem doentes. Embora na práticasejam normalmente os ricos a demonstrarem caridadepara com os pobres, o caso é que nada impede intrinse-camente que haja compaixão, e portanto também gene-rosidade, para com a pessoa rica e doente. Isto incitaa que seja a situação de saúde o foco da políticade distribuição, e não os rendimentos, o bem-estar,as comodidades, ou os bens sociais primários. A saúdenão é, contudo, um bem transacionável; nestas condi-ções, como se conseguirá desenvolver uma consistentedefinição de eqüidade? Aparentemente só existem duasvias logicamente defensáveis. Por um lado, considerarequitativa uma distribuição quando haja um consumootimizado de bens que favoreçam a saúde; por outro,considerar inerentemente equitativa toda e qualqueração que maximize a saúde da comunidade. Em ambosos casos, o realce é posto na maximização/otimizaçãomais do que na distribuição; na plenitude mais doque na relatividade.

Só a segunda versão parece ter suscitado interes-se, embora se encontre obviamente num estádio inicialde desenvolvimento. Alguns economistas da Univer-sidade de York, no Reino Unido, argumentaram recen-temente que a maximização da saúde, quando medidaatravés dos anos de vida ajustados pela qualidade (QA-LY's = Quality Adjusted Life Years), ou outro padrãosemelhante, poderá incorporar as preocupações distri-butivas da política de saúde e, por encadeamento,ser considerada como princípio de eqüidade (Culyer,1987; Williams, 1988). Pode entender-se que a maxi-mização da saúde deriva logicamente da abordagemda 'externalidade de preocupação', visto englobar osseus principais aspectos: a situação de saúde como

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o foco das preocupações; um ponto de vista mais abso-lutista do que relativista; e um papel para a compen-sação exógena. No entanto, a maximização dos QA-LY's continua a ser um tópico controverso entre osprofissionais de saúde (Smith, 1987) e até entre oseconomistas (West, 1988). Argumenta-se, particular-mente, que a regra da maximização ignora as preocupa-ções distributivas de sistemas públicos tais como oSNS. Parafraseando Sen (1973) em relação ao utilita-rismo, poder-se-ia afirmar que a maximização do soma-tório dos estados de saúde individuais é soberanamenteindiferente à distribuição interpessoal desse somatório.Os apologistas da abordagem QALY poderiam, comcerta justeza, contrapor que isto é uma crítica escusadae vã, uma vez que não é possível redistribuir saúdeentre as pessoas. Tal argumento ignora, no entanto,uma questão fundamental. Consideremos o caso dedois indivíduos: 'A' relativamente rico, instruído, ebem alimentado; e 'B', pobre e relativamente ignorantedos métodos duma produção de saúde eficaz. Ambossofrem da mesma doença e foram sujeitos ao mesmotratamento. Mas, por causa das suas característicaspessoais e ambientais, 'A' consegue reagir melhor aotratamento e ganhar assim um maior número de QA-LY's. Deverá então a política de saúde redistribuirrecursos a pessoas como a 'A'? E evidente que muitopoucos concordariam com semelhante princípio.

De momento, a tese da maximização continuaa ser prejudicada pela relutância dos seus proponentesde a defenderem ativamente e de desenvolverem assuas implicações. O aperfeiçoamento teórico de umprincípio de eqüidade QALY requer muito mais doque simplesmente remeter para os políticos a sua defi-nição precisa. Em termos genéricos, é preciso demons-trar que uma maximização QALY adequadamente pon-derada deverá produzir resultados em harmonia comas preocupações de eqüidade, e também que resultadosdesagradáveis não constituem característica significa-tiva. Mas, mesmo que isso seja conseguido, remanes-cerão dúvidas quanto à adequabilidade da teoria. Espe-cialmente porque o volume de informação necessáriopoderia vir a revelar-se inconciliável com o óbvio crité-rio de que um princípio deve conter reduzidos requisi-tos de informação. Como também não deveríamos su-bestimar as reais limitações do próprio padrão QALY;por exemplo, problemas de medição ou a forma comotrata a questão do risco e incerteza (7). Além disso,embora teoricamente não se apresentem problemas,é muito provável que, na prática, a maximização dosQALY pudesse traduzir-se numa excessiva concentra-ção nos efeitos dos procedimentos médicos, em detri-mento de outras atividades promotoras de saúde. Have-ria a tendência de descurar desigualdades geradas fora

(7) Ver West (1986) para umaanálise deste tipo de problemas.

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do sistema de cuidados de saúde, a menos que existis-sem dentro dele oportunidades de compensação. Final-mente, poderíamos também rejeitar a própria idéia demaximização da saúde como principal objetivo dossistemas de saúde. É claro que seria preciso um ousadoexercício de imaginação para crer que ela não deveriaconstituir um objetivo, ou mesmo que, tecnicamente,não será o melhor caminho a seguir. No entanto, ossistemas de saúde revelam constantemente a supremaimportância de outros objetivos: a demonstração decompaixão ou a não-exclusão de certo tipo de usuários,por exemplo. A não-discriminação é claramente umaimportante característica dos objetivos da política desaúde de diversos países. (8) Pode ser que o objetivoglobal dos cuidados médicos seja de fato a maximi-zação da saúde, mas também que uma organizaçãoespecífica encarregue da sua implementação (como,por exemplo, um Serviço Nacional de Saúde) tenhaobjetivos adjacentes (tais como garantir igual acessopara igual necessidade) que tomem precedência numaeventual troca compensatória.

O discurso Liberal sobre eqüidade constitui umpotencial e significativo contributo para a compreensãodas questões levantadas pelo debate da desigualdadeem saúde. É hoje geralmente aceite que as formulaçõesclássicas do Utilitarismo e do 'Maximin' Rawlsianotêm que ser ultrapassadas se se pretende atingir umaformulação adequada das preocupações com a eqüidadeno campo da saúde. As concepções mais recentes pro-postas pelos economistas revelam contudo um certopotencial como linha de orientação para a formulaçãoe monitorização de uma política concisa. Resta noentanto bastante caminho a percorrer no que respeitaà operacionalidade de tais princípios e, efetivamente,permanecem dúvidas quanto à sua capacidade de refle-tir as preocupações de sistemas de saúde tipo SNSque pretendem promover a eqüidade em saúde.

SOCIALISTAS-DEMOCRÁTICOS

O Socialismo é geralmente diferenciado das filo-sofias Liberais e Conservadoras/Libertárias pela suaadesão ao coletivismo. Isto pode revelar-se enganosona medida em que alguns escritores socialistas realçamcada vez mais a importância dos mercados competi-tivos. Além do mais, o coletivismo é melhor interpreta-do como um meio de atingir um objetivo do que comocomponente de um conjunto de valores sociais. Comoacontece com as outras teorias, através de reflexãosobre os referidos valores sociais poderemos obter umacompreensão mais aprofundada de como a eqüidadedeve ser definida. Embora existam várias correntesno socialismo, gostaria de aqui me debruçar sobre uma

(8) Ver Pereira (1990) para umadiscussão de objetivos de eqüida-de na política de saúde portu-guesa.

Page 13: Versões preliminares deste ar- Justiça Social no Domínio ... · implicam pontos de vista diferentes sobre justiça social (princípios de distribuição); e, por fim, estes princípios

das formas que se tem revelado especialmente influenteem debates sobre desigualdade e saúde — e sobretudoporque a criação de sistemas públicos de cuidadosde saúde, com expresso empenhamento no acesso uni-versal, tem sido freqüentemente associada aos seusobjetivos. No Reino Unido, este ponto de vista épor vezes designado como o socialismo Fabiano. Utili-zarei o termo de Socialismo-Democrático para englobaraquela mais vasta área de raciocínio que deriva darevisão do Marxismo levada a cabo por Eduard Berns-tein no virar do século, e que hoje em dia encontraexpressão política em partidos da Internacional So-cialista.

Segundo George e Wilding (1985), há três valorescentrais na base ética do Socialismo Democrático —liberdade, camaradagem e igualdade. A concepção deliberdade é mais extensa que as dos dois grupos ante-riormente analisados. Para além do mero exercício daescolha individual, ela estende-se até ao requisito deque toda e qualquer pessoa tenha segurança econômi-ca. Assim, se houver uma grande desigualdade de re-cursos ou de poder econômico, alguns indivíduos en-contrar-se-ão em verdadeira posição de sujeição a ou-tros e, como tal, não pode existir liberdade. Por muitoimportante que isto possa ser, a maioria dos escritoressalienta que é a noção de camaradagem que mais apelapara o coração da mensagem Socialista-Democrática.Camaradagem é um termo maldefinido, mas que nor-malmente evoca preferências por cooperação, altruís-mo e participação, mais do que por competição ouinteresse pessoal. A camaradagem também põe a tônicanos deveres e no bem da comunidade, acima dos direi-tos ou exigências individuais.

O elemento crucial parece ser, no entanto, a igual-dade, uma vez que os outros valores lhe estão invaria-velmente associados. Definir precisamente o que elasignifica tem-se contudo revelado um óbice constante.O campo da saúde constitui exemplo flagrante. Emboraos objetivos da política igualitária do tipo evidenciadoem países com Serviços Nacionais de Saúde estejamfreqüentemente associados com o ponto de vista Socia-lista-Democrático, a literatura apresenta grande escas-sez de princípios de distribuição bem-definidos e ope-racionais. A maior parte das vezes as discussões sãoapresentadas num vazio teórico. Esta falta de clarezae de desenvolvimento tem sido dolorosamente sentidapelos Socialistas-Democráticos defensores dos siste-mas tipo SNS no debate sobre desigualdade na saúde.

Uma argumentação relativamente grosseira sus-tenta que o critério mais apropriado para a distribuiçãode recursos é em função da necessidade. Aparente-mente, bastaria que as necessidades fossem empirica-mente identificadas para que os objetivos da saúde

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e de outros serviços sociais fossem perfeitamente de-terminados e especificados. Se pusermos de parte estasugestão, não tanto por as necessidades serem moral-mente relativas (ao fim e ao cabo já foram executadostrabalhos válidos sobre a definição objetiva e a medi-ção de necessidades de saúde — p. ex. Culyer, 1983),mas essencialmente por elas se revelarem instrumentaispara um objetivo superior, então uma grande partedo debate no campo socialista gira à volta da escolhaentre igualdade de recursos e igualdade de bem-estarcomo regras de distribuição.

A clássica noção de justiça do Socialismo Demo-crático é freqüentemente designada por igualitarismo.Isto é, às vezes, interpretado como sendo a equalizaçãodos benefícios líquidos individuais (p. ex., estado desaúde) ou, uma vez que se parta do princípio de quealguns atributos não podem ser materialmente distri-buídos, a equalização de oportunidades individuaiscom vista aos mesmos benefícios. Uma das caracte-rísticas dos recentes contributos para a literatura sobresaúde e política social têm sido as longas discussõessobre as possíveis distinções dentro desta abordageme os objetivos paralelos de política que as mesmasimplicam (9). A questão de relacionar definições igua-litárias de política com a sua base econômica ou filosó-fica tem no entanto sido praticamente ignorada. Emeconomia, tem havido contributos importantes paraa especificação de objetivos igualitários (ver, porexemplo, Atkinson, 1982; Klappholz, 1972; Roemer,1986); mas não podemos deixar de sentir que a faltade análises rigorosas e consistentes relacionadas coma saúde se deve ao fato de se manter demasiado elusivoo conceito de igualitarismo como princípio de distribui-ção. Na literatura filosófica há também uma longatradição de conceitualização do igualitarismo. Numaimportante análise, Dworkin (1981) estabeleceu umadistinção entre as duas noções-chave de igualdade debem-estar e igualdade de recursos, defendendo quetodo e qualquer igualitarismo eticamente defensávelexige a equalização dos recursos postos à disposiçãodo público, e não o seu bem-estar ou utilidade. Igual-dade de bem-estar implica que:

um esquema de distribuição trata os indivíduoscomo iguais quando distribui ou transfere recur-sos entre eles até ao ponto em que mais nenhumatransferência os poderia colocar em maior igual-dade de bem-estar.

Em contrapartida, a igualdade de recursos:

trata-os como iguais quando distribui ou trans-fere por forma a que mais nenhuma transferência

(9) Ver em O'Higgins (1987)uma interessante análise.

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poderia deixar a sua quota-parte dos recursostotais em maior situação de igualdade.

(Dworkin, 1981, pp. 185-186)

No entanto estas distinções apenas levantam no-vas questões. A igualdade de bem-estar no campo dasaúde exigirá uma igualdade de saúde, ou o atingi-mento de níveis iguais de utilidade? A igualdade derecursos exigirá simplesmente igualdade de acesso (oude oportunidade de acesso), ou exigirá a utilizaçãode recursos em iguais quantidades? Deverão as defini-ções ser aplicadas em relação aos cuidados de saúdefornecidos pelo Estado ou em relação a todos os recur-sos, públicos e privados?

Parece inútil prolongar a procura duma base con-ceitua para uma política de saúde equitativa adentrodo igualitarismo. Argumentei num trabalho recente(Pereira, 1988) que no conceito de Capacidades Bási-cas de Sen (1980) existe uma formulação mais promis-sora das preocupações Socialistas-Democráticas. Esteconceito fornece uma clarificação para o debate sobrese a equalização de recursos, ou de bem-estar, deveriaser objeto de política ao analisar o processo de trans-missão de bens (recursos) para resultados finais (bem--estar), defendendo que o que importa é a capacidadedas pessoas de transformar os bens em funções huma-nas (como a capacidade de trabalhar). Além do mais,esta abordagem é uma nova forma de especificar objeti-vos de eqüidade de saúde; de como deveremos agirpara os atingir; de como o processo deve ser monitori-zado; e, ao mesmo tempo, aborda alguns temas comunsàs linhas principais da economia da saúde. Mereceassim uma atenção muito mais marcante por parte dosinvestigadores interessados no debate da desigualdadeem saúde.

O argumento das Capacidades Básicas pode serexemplificado através da Figura II. Do lado esquerdoestá o mundo dos bens de consumo, que tem sidoo ponto de focagem tradicional da ciência econômicaao analisar os problemas da distribuição. Estes benssão transformados em produtos intermédios mais fun-damentais apelidados de 'características' segundo aabordagem de Lancaster (1966). Uma focalização nascaracterísticas conduzir-nos-ia a interpretar a procurade cuidados de saúde como uma procura de fatorestais como a eficácia clínica, a assistência pelo Médicode Família, e assim por diante. Passando para o mundodas pessoas, a maneira como os indivíduos utilizamas características dos bens para produzir atividadeshumanas é descrita por Sen como 'funções' (p. ex.,ganhar a sua vida, procurar formas de lazer, gozarde boa saúde etc). Tipicamente a maioria dos econo-mistas não consideraria problemática a ligação das fun-

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ções à utilidade. Sen discorda, afirmando que, emboraníveis mais elevados de utilidade estejam associadosa melhores funções, a ligação não é de modo nenhumdireta. Por exemplo, suponhamos que, uma vez mais,nos defrontássemos com o problema de distribuir recur-sos entre dois indivíduos: o 'A' que, apesar de fisica-mente incapacitado, apresenta um moral invariavel-mente otimista, e o 'B' que não sofre de nenhumadoença em particular, e tem uma elevada utilidademarginal de rendimento, mas que por ser, no fundo,essencialmente pessimista, se encontra na realidadeem pior situação do que o 'A' em termos de utilidadetotal. Basearmo-nos na utilidade conduziria a uma dis-tribuição preferencial a favor do 'B' o que não parecemuito justo. Isto porque não aparece em parte nenhumada analise aquilo que a maioria consideraria como asnecessidades maiores de 'A'. Se, por outro lado, nosbasearmos nas funções, a interpretação da necessidadetorna-se fundamental e permite incorporá-la como in-formação extra-utilidade. Encontramos aqui ecos dasjá velhas advertências dos economistas da saúde deque as necessidades devem ser vistas como instru-mentais para a realização do desejado estado-final (noexemplo acima, ser capaz de se mover de um ladopara o outro) e que o sucesso de uma política desaúde deve ser avaliado em termos das mudanças nosatributos individuais (Culyer, 1980).

Sen afirma ainda que, em termos de equidade,o fato de uma pessoa estar a funcionar de uma certamaneira nos interessa menos do que o fato de esseindivíduo ter ou não a capacidade de assim fazer.Donde que a igualdade de capacidades básicas sejao princípio de eqüidade primordial. Esse argumentoaparece refletido nas preocupações de eqüidade emsaúde em que os objetivos políticos são geralmente

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definidos em termos do acesso de um indivíduo a cuida-dos de saúde, mais do que da sua utilização. O basear-mo-nos nas funções poderia implicar que uma pessoadevesse usar continuamente os serviços médicos, aopasso que a idéia crucial é a de que as pessoas deveriampoder fazê-lo quando assim decidissem. Este elementoda escolha é geralmente considerado importante, em-bora francamente menos no universo das capacidadesbásicas em que Sen inclui aspectos como a capacidadede as pessoas satisfazerem as suas necessidades nutri-cionais, de vestuário, de habitação e, fundamental-mente, no aspecto que nos interessa, de gozarem deboa saúde.

A proposta de Sen de tratar as questões da distri-buição em termos das capacidades básicas das pessoastem vantagens óbvias. Em primeiro lugar, é defensa-velmente a mais coerente e operacional formulaçãodos valores Socialistas-Democráticos encontrada na li-teratura. No entanto é interessante notar que, emboracamaradagem e igualdade estejam presentes, o princí-pio de capacidades básicas se apoia muito mais nanoção de liberdade: isto é, que as pessoas deveriampossuir segurança econômica e social. Em termos analí-ticos isto sugere que a dimensão do conjunto de opor-tunidades das pessoas é mais importante do que oponto específico nesse conjunto que acaba por serescolhido.

A importância da abordagem de Sen na análisedo problema da eqüidade em saúde pode ser depreen-dida através da Figura III, que apresenta um esquemade produção da função 'boa saúde'. O estado de saúdeatingível depende, neste esquema, das capacidades defuncionar que as pessoas têm à suas disposição. Estascapacidades são, por seu turno, determinadas pelosbens (p. ex., cuidados de saúde, educação, alimenta-ção) ou, mais diretamente, pelas características dosbens (eficácia clínica, conhecimentos e sabedoria ecomposição protéica e calorífica). De uma forma im-portante, as características dos bens estão relacionadascom fatores ambientais (disponibilidade de cuidadosmédicos, de boa educação, de alimentação nutritiva)e características pessoais (p. ex., idade, nível sócio-e-conômico, dimensão da família etc). Assim, se umindivíduo é ou não capaz de atingir um estado saudáveldependerá do seu acesso a bens produtores de saúde,e da sua titularidade de funções produtivas de saúde,em si próprios determinados, em parte, pelo acessoaos bens de consumo. Em suma, no que diz respeitoà eqüidade, igualdade de capacidades implica igualacesso aos benefícios da saúde.

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Há também implicações importantes para a análiseeconômica na abordagem de Sen, dado que tem muitoem comum com modelos de produção familiar (tambémapelidados de capital humano) que se baseiam no estu-do pioneiro de Becker (1965). Esta linha de investiga-

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cão tem considerado a importância de imputs tais comotempo e restrições monetárias na produção de bensfundamentais geradores de utilidade. No modelo deprocura da saúde de Grossman (1972), os indivíduosproduzem um certo capital de saúde durável, que podeser acumulado, e que ao mesmo tempo pode exigirmanutenção através de investimento em característicashumanas não-genéticas e em características dos bens.Os bens domésticos fundamentais — capacidade detrabalhar, de gozar a vida etc — coincidem em todosos pontos com as funções de Sen. O que as distingueé que os escritores tradicionalmente interessados pelocapital humano não consideram normalmente proble-mática a ligação entre funções e utilidade. Sen, poroutro lado, sublinha que quaisquer dois indivíduos,ou até o mesmo indivíduo em épocas diferentes, podemfazer escolhas idênticas quando confrontados com omesmo conjunto de capacidades, e no entanto vir aencontrar níveis de utilidade bastante diferentes. Lo-go, a nossa atenção deveria centrar-se no conjuntode capacidades. Muellbauer (1987) afirma que numaanálise empírica este problema não é insuperável: Oque é importante é que as relações que determinamo conjunto de capacidades são relativamente univer-sais, e que as variáveis determinantes e as funçõesescolhidas são relativamente perceptíveis. Na sua ré-plica a Muellbauer, Sen referiu-se a um outro pontode discórdia em relação à abordagem do capital huma-no: que as funções são 'produzidas' tanto fora comodentro do ambiente doméstico (Sen, 1987). Mas, maisuma vez, este problema poderia ser resolvido atravésda generalização do modelo de procura de saúde demodo a considerar os efeitos das alterações exógenassobre as atividades domésticas (como em Birch, 1987,por exemplo).

O debate Socialista-Democrático sobre eqüidadedesde há muito que se revela fonte de grande confusãona procura de princípios orientadores que sejam simul-taneamente específicos, claros e operacionais, apesarde existirem poucas dúvidas quanto à importância da-quele ponto de vista ideológico na criação de institui-ções que procuram assegurar a existência de justasoportunidades para todos os cidadãos. Nos últimosanos, no entanto, têm-se realizado importantes traba-lhos sobre a explicação das preocupações societáriascom as questões da distribuição e sobre a própria defi-nição do conceito de eqüidade. Estes trabalhos mere-cem uma atenção mais pormenorizada do que a quelhes tem sido atribuída até agora. Sobretudo, eles pare-cem conter concepções que os economistas poderiamcontinuar a desenvolver na análise da desigualdadeem saúde.

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COMENTÁRIOS FINAIS

Este artigo passou em revista aspectos normativosdo debate sobre desigualdade em saúde que só muitorecentemente começaram a ser abordados por econo-mistas e outros cientistas da área social. Existe hojeum largo consenso no sentido de que apreender asimplicações éticas dos diversos princípios de distribui-ção constitui pré-requisito para compreender por queé que as pessoas se preocupam com a desigualdade,como é que ela deve ser medida, o que é que a provoca,e como devem as políticas equitativas ser formuladase monitorizadas. O atual estudo deverá servir comosuporte conceitual a futuras análises empíricas queprocurem um melhor entendimento do problema dadesigualdade em saúde bem como das estratégias alter-nativas para combatê-la. Já demasiada investigaçãosobre o tema tem posto o carro à frente dos boisao identificar distribuições desiguais sem tomar emconsideração se elas são ou não, simultaneamente, ine-quitativas. Seria interessante e encorajador encontrarfuturos trabalhos empíricos rigorosamente enquadradosem abordagens que reflitam os objetivos, explícitosou implícitos, de políticas de saúde nacionais.

In the European debate on equity in health and healthcare a crucial question has received scantconsideration. It concerns the precise specification ofa health system's objectives and the manner by whichthey can be suitably interpreted to permit monitoringof implemented policies.This article is an attempt to review actual and potentialcontributions to this area of study. It adopts the viewthat the meaning of equity in the health domain dependscrucially on how social justice is defined and thatthis in turn depends on value judgements or the viewsof society held by individuals, groups or governments.Such an approach allows one to choose principlesof distribution which are in agreement with a society'svalue set and subsequently to apply them as the correctyardstick for measuring the success of policy.Following an initial exposition of the approach, themain body of the article discusses the question ofcompeting theories of society — Libertarian, Liberaland Democratic Socialist — and appraises the variousdistribution principles, to be found in the economicand philosophical literature, which they imply. Thefinal section offers some brief conclusions and avenuesfor further research.

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