VARIAÇÕES C1RCADIANAS DIÁRIAS NOS ÓBITOS DE UM … · o ritmo circadiano ocorre em muitos...

6
VARIAÇÕES C1RCADIANAS DIÁRIAS NOS ÓBITOS DE UM HOSPITAL GERAL 1 DAILY CIRCADIAN ARIATIONÇ OF DEATHÇ AT A GENERAL HOÇPITAL Cesar Emanuel Rodrigues 2 Javier Lazo 3 Marcus Aurelho Lima 4 RESUMO: Objetivo - Determinar a existência de variações circad ianas diórias nos óbitos de um hospital geral. Método - Foram analisados a hora da morte e o período do dia em que ocarreram 502 mortes naturais em hospital geral. Empregaram-se testes estatísticos para determinar as d iferenças entre proporções e médias. Resultados - Não se observou relação entre mortalidade e a hora ou período de ocorrência no d ia, apesar do aumento no nLJmero de óbito no período das 12 às 18 horas. Conclusão - Os resultados observados sugerem que a morte natural não tem padrão circadiano, apesar da ma ior freqüênc ia no período vespertino. UNITERMOS: Variação circadiana - Hospital geral - Morte natural. ABSTRACT: This work a ims at determining the incidence of circadian daily variations of natural death at a general hospital. Methods: We have analyzed time of death in 502 ind ividua is with natural death. Statistical analyses have been applied to determine the difference significance between proportions and averages. As a result, we have found out that the occurrence of natural death was similar in different periods of the day. However, values indicate an excess of lethality at 6 a.m . and from noon to 6 p.m.. We have concluded that the obser ved results suggested that the natural death does no t have a circadian pattern, despite the vespertine peak. KEYWORDS: Circadian variations - General hospita l - Natural death. 1 Trabalho apresentado na 4ª Jornada Cient if ica de Enfermagem da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro (F MTM), em 1995. 2 Acadêmico de Enfermagem e Técnico de Anatomia e Necropsia do Hos p ital- Escola da FMTM. 3 Médico, Aluno do Curso de Pós-Graduação em nível de Doutorado em Patol ogia Humana da FMTM. 4 Médico Patolog ista, Professor Adjunto de Patolog ia Espec ial da FMTM. R. Bras. Enfe., Brasília , v. 50, n. 3, p. 339-344, jul. lset. , 19 97 3 39

Transcript of VARIAÇÕES C1RCADIANAS DIÁRIAS NOS ÓBITOS DE UM … · o ritmo circadiano ocorre em muitos...

VARIAÇÕES C1RCADIANAS D IÁRIAS NOS ÓBITOS DE UM HOSPITAL GERAL 1 DAILY CIRCADIAN \JARIATIONÇ OF DEATHÇ AT A GENERAL HOÇPITAL

Cesar Emanuel Rodrigues 2 Javier Lazo 3 Marcus Aurelho Lima 4

R ES U M O : Objetivo - Determinar a existência de variações circadianas diórias nos

óbitos de um hospital gera l . Método - Fora m a n a l isados a hora da morte e o

período do dia em q u e ocarrera m 502 mortes naturais em hospita l gera l .

Em pregara m-se testes estatísticos para determinar as diferenças entre proporções

e médias. Resu l tados - Não se observou relação e ntre morta l idade e a hora ou

período de ocorrência n o d ia , a pesar do a u m ento n o n LJmero d e óbito n o período

das 1 2 às 1 8 hora s . Conc l u são - Os resu l tados observados sugerem que a morte

natural não tem padrão circadiano, a pesar da m a ior freqüência no período

vespertin o .

U N IT E R M O S : Variação circadiana - Hospita l g era l - Morte natura l .

A BSTRACT: This work a ims at determin ing t h e incidence o f circadian dai ly variat ions

of natura l death a t a genera l hospita l . Methods: We have a nalyzed t ime of death

in 502 i nd ividua i s with natura l death . Statist ica l a n a lyses have been appl ied to

determine the d ifference s ig n ifica nce between proport ions a n d averages. As a

resu l t , we have fou n d out that the occurrence of n atura l death was s imi lar i n

different periods of the day. However, va l ues i n d icate a n excess of lethal ity at 6

a.m . a n d from noon to 6 p .m . . We have conc l uded that the observed resu l ts

suggested that the natural death does n o t have a circadian pattern , despite the

vespertine pea k .

K EYWO R DS : Circadian variations - General h ospita l - N atural death .

1 Trabalho apresentado na 4ª Jornada C ientifica de Enfermagem da Faculdade de Medic ina do Triângulo Mineiro (FMTM) , em 1995.

2 Acadêmico de Enfermagem e Técn ico de Anatomia e Necropsia do Hosp ita l- Escola da FMTM . 3 Médico, Aluno do Curso de Pós-Graduação em n ível de Doutorado em Patologia Humana da

FMTM . 4 Médico Patologista , Professor Adjunto de Patologia Especia l da FMTM .

R. Bras. Enferm. , Brasí l ia , v. 50, n. 3 , p. 339-344 , j u l . lset . , 1 997 339

I� O D R rGlIES, Cl'�ar EI 1 lGl l l l l'i cf alii

INTRODUÇÃO E OBJETIVO

o ritmo ci rcad iano ocorre em m u itos fenômenos b iológ icos, i ncl u i ndo

secreção de hormôn ios e atividades do s istema nervoso a utônomo e ,

recentemente , tem s ido tam bém notado ocorrer nas i ncidências de certas

doenças card íacas e cerebrovascu lares 3 . 8 . O reconhecimento de variações

ci rcad ianas (VC) no estudo das doenças é de ut i l idade pela contribu ição que

pode trazer ao melhor con h ecimento da patogênese , fis iopato log ia , profi laxia e

terapêutica das enferm idades . Desse modo , baseando-se em p icos de maior

freqüência de óbitos em determ inados horários do d ia , os profiss ionais de saúde .

podem ter parâmetros e uma maior , v ig i lância na implementação de cu idados a

determinados pacientes. Em vista d isso , procu ramos observar a poss ib i l idade

de tendências nas VC d iárias das mortes natu ra is súb itas e não súb itas de um

Hospita l Gera l .

MATERIAL E MÉTODOS

Foram estudados 502 óbitos por mortes natu ra is ocorridas no Hospita l­

Escola da Faculdade de Medic ina do Triângu lo M ine i ro , U beraba , MG, d u rante o

ano de 1 994 . A hora do óbito fo i obtida através do reg istro de entrada no Setor

de Necropsia do Serviço de Pato log ia C i rúrg ica deste Hospita l . Os casos foram

d istribu ídos seg u ndo a hora e o período do d ia em que o óbito ocorreu . Para

esta d istribu ição , as 24 horas foram d iv id idas em horas e em 4 períodos ig ua is .

Não foram estabelecidas restrições em re lação á i dade ou ao sexo .

ParÇ! aná l ise estatística , fo i u t i l izado o teste do q u i quadrado para determinar

o s ig n ificado das d iferenças entre proporções de ób itos em cada periodo .

Consideram-se sig n ificativas d iferenças ao n ível de 5%.

RESULTADOS

As VC d iár ias em que ocorreram as mortes nos 502 casos estão ind icadas

nas F ig u ras I e 2 . O estudo estatístico não mostrou relação entre morta l idade e

hora ou período de ocorrência no d ia , apesar da elevação no período das 1 2 às

1 8 horas (F ig u ra I ) . Os 502 casos estão d istribu ídos d u rante o d ia , conforme se

observa na F ig u ra 2, evidenciando maior n úmero de óbitos às 6 horas da manhã .

340 R. Bras. Enferm. , Brasí l iá , v . 5Ó , n. 3, p. 339-344 , ju l . /set . , 1 997

V a r i ll ç ii l' S C i r C ll d i t l l l tl S D i á r i a s I I O S Ó h i t o s . . .

FIGURA 1 - PERíODO DO DIA EM QUE OCORRERAM OS ÓBITOS, DE 6 EM 6 HORAS.

N. de mortes (%) 2 7 , 7 0 28 0 00 0 1 -06:00

27 IH 06 0 1 - 1 2 00

11 1 2 0 1 - 1 8 00

26 13 1 8 : 0 1 -24 00

25 n = 5 0 2

2 3 , 90 24

2 3

2 2 Período do

2 1 d i a (Horas)

FIGURA 2 - VARIAÇÕES CIRCADIANAS DIÁRIAS DAS MORTES NATURAIS SÚBITAS E NÃO-SÚBITAS.

n = 5 0 2

5.98 N . DE 6 , 0 0

CASOS (% :

5 .SR

5 , 50 5 . 38 5 . 1 8 5 . ' g

4 ,98 4.98 5 , 00

4 . 50 4.1S .� . 1 8

1 . 38 3.9'8 4 ,00 3 . -S 3 . :'8

3 , 50 1 , 39 3 . 39

3 , 0 0

2 , 50

2 , 00 H 2.59

I 2 3 4 5 6 7 8 9 1 0 1 1 1 2 1 3 14 1 5 16 1 7 1 8 1 9 20 2 1 22 23 24

R Bras. Enferm. , Brasília, v. 50 , n . 3, p. 339-344 , j u l . lset . , 1 997

HORA DA MORTE

34 1

RODRIGUES, Cesar Emanuel et alii

DISCUSSÃO

Apesar dos dados da l iteratu ra mostrarem p icos diários de mortes por

episódios cardiovasculares agudos e também uma tendência circadiana em

mortes por doenças cerebrovascu lares6 e na morte súb ita da doença de

Chagas 3 , os nossos resu ltados não mostram qualquer VC estatisticamente

s ign ificativa em relação a períodos do d ia em que ocorreu o óbito nos 502 casos

anal isados de morte natura l súbita e não súbita . Estes resu ltado$ podem ser

explicados pela d i l u ição, entre os óbitos de um modo gera l , de doenças que

possuem mortal idade relacionada com o ciclo circad iano. Uma destas doenças,

o infarto agudo do m iocárdio , tem o período da manhã (7 às 9 horas) com maior

incidência de episódios1 ,2,4, 5,9 , Esta i ncidência decorre , ao que parece , da

elevação da atividade s impática pelo acréscimo dos n íveis de

cateco laminas 4,7,9, 1 0 e cortisol (pico às 6 horas) , aumento do débito card íaco e

pela d im inu ição da atividade fibr inol ítica nesse período do d ia6 , além do que a

pressão sangü ínea4, 7,9 , o tônus coronarian04,7 e a agregação plaquetária

encontrarem-se mais acentuados também nesse períod04,6 O segundo p ico

d iá rio por morte súbita isquêmica , entre 1 8 e 24 horas, eng loba menor n úmero

de pacientes que o pico matutino e é formado por mu lheres fumantes , maiores

que 70 anos e com insuficiência card íaca 1 ,2 ,

O n úmero de óbitos por nós anal isados nestes dois períodos , 6 às 1 2 e 1 8 às

24 horas , não foi mu ito d iferente dos demais. Houve , entretanto , d iscreta

elevação, apesar de não ser estatisticamente sign ificativa , no período das 1 2 às

1 8 horas. A elevação neste período coi ncide com o excesso de letal idade

estatisticamente s ign ificativo verificado no estudo sobre morte súbita da doença

de Chagas real izado na nossa regiã03 Esse trabalh03 ut i l iza óbitos por morte

natu ra l não-sú bita como controle e não observa qualquer tendência circadiana no horário destas mortes.

CONCLUSÃO

Os resu ltados sugerem que as mortes naturais , de um modo gera l , tendem a

ocorrer de modo u n iforme durante o d ia , com maior freqüência no período

vespert ino, sem caracterizar um padrão circadiano.

342 R. Bras. Enferm. , Brasí l ia , v. 50, n. 3, p. 339-344 , ju l . /set. , 1 997

V a r i a ç õ e s C i r c a d i a n a s D i á r i a s n o s Ó b i t o s . . .

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 . G I LP I N , E .A. ; H IALMARSON , A . - , ROSS J r, J . S u bg roups of patients with

atipical ci rcad ian pattems of symptom onset in acute myocard ia l

i nfarctio n . Am. j Cardiol. , v . 66 , p . 7G- 1 1 G , 1 990.

2 . HJALMARSON , A. ; G I LP I N , E .A. ; N ICOD, P . et a I . D iffer ing circad ian

pattems of symptom onset i n subgroups of patients with myocard ia l

infarct ion . Circula tion, v. 80 , p .267-275 , 1 989.

3 . LOPES, E . R . ; C U N HA, L . F . L . R ; SANTOS , T .A. M . et a I . Variações

ci rcad ianas d iárias e semanais na morte súb ita da doença de C hagas.

A rq. Bras. Cardiol. , v. 6 1 , p . 345-348 , 1 993 .

4 . M U LCAHY, D . ; P U RC E LL, H . ; FOX, K. Shou ld we get u p i n the morning?

Obeservations on c i rcadian variation i n card iac events . Br. Heart j,

v. 65 , p. 299-30 1 , 1 99 1 .

5 . M Ü LLER, J . E . ; LUDMER, P . L . ; WI LLl C H , S . N . et a I . C i rcad ian variation i n

t he frequency of sudden card iac death . Circula tion, v. 75 , p . 1 3 1 - 1 38 ,

1 987.

6 . M Ü LLER, J . E . ; STO N E , P . H . ; TU R I , Z. G. et a l . -C i rcad ian variation i n the

frequency of onset of acute myocard ia l inffarction . N. Engl. ). Med. ,

v . 87 , p . 1 3 1 5- 1 322 , 1 985 .

7 . MÜ LLER, J . E . ; TOFLER, G . H . C i rcadian variat ion on card iovascular

d isease . N. Engl. ) . Med. , v . 325 , p . 1 038 - 1 039 , 1 99 1 .

8 . Q UYYUM I , A.A. C i rcad ian rhythms i n card iovascu lar d isease . Am. Heart.

j, v. 1 20 , p . 726-733, 1 990 .

R . Bras. Enferm. , Brasí l ia , v . 50 , n . 3 , p . 339-344 , ju l . lset. , 1 997 343

R O D R IG U E S, Cesar Emallucl et alií

9 . ROCCO, M . B . ; BARRY, J . ; CAMPBELL, S . et a I . C i rcadian variation of

transient myocard ia l ischemia in patients with coronary artery d isease

Circulation; v .75 , p. 395-400, 1 987.

1 0 . WILL lCH , S . N . ; LEVY, D . ; ROCCO, M. B . et a I . C i rcadian variation i n the

inc idence of sudden card iac death in the F ramingham Heart Study

Popu lation . Am. j. Cardiol, v.60 , p .801 -806 , 1 987.

344 R. Bras. Enferm. , Brasí l ia , v. 50, n . 3, p. 339-344 , ju l . lset. , 1 997