URUGUAI - Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação … · implementação na América...

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V ENCONTRO INTERNACIONAL DO CONPEDI MONTEVIDÉU – URUGUAI SOCIOLOGIA, ANTROPOLOGIA E CULTURA JURÍDICAS RUBENS BEÇAK LUIS EDUARDO MORAS

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V ENCONTRO INTERNACIONAL DO CONPEDI MONTEVIDÉU – URUGUAI

SOCIOLOGIA, ANTROPOLOGIA E CULTURA JURÍDICAS

RUBENS BEÇAK

LUIS EDUARDO MORAS

Copyright © 2016 Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito

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S678Sociologia, antropologia e cultura jurídicas [Recurso eletrônico on-line] organização CONPEDI/UdelaR/Unisinos/URI/UFSM /Univali/UPF/FURG;

Coordenadores: Luis Eduardo Moras, Rubens Beçak – Florianópolis: CONPEDI, 2016.

Inclui bibliografia

ISBN: 978-85-5505-270-5Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações

Tema: Instituciones y desarrollo en la hora actual de América Latina.

CDU: 34

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Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em DireitoFlorianópolis – Santa Catarina – Brasil

www.conpedi.org.br

Comunicação – Prof. Dr. Matheus Felipe de Castro – UNOESC

Universidad de la RepúblicaMontevideo – Uruguay

www.fder.edu.uy

1. Direito – Estudo e ensino (Pós-graduação) – Encontros Interncionais. 2. Sociedade. 3. Conflito.4. Movimentos sociais. I. Encontro Internacional do CONPEDI (5. : 2016 : Montevidéu, URU).

V ENCONTRO INTERNACIONAL DO CONPEDI MONTEVIDÉU – URUGUAI

SOCIOLOGIA, ANTROPOLOGIA E CULTURA JURÍDICAS

Apresentação

O CONPEDI - Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Direito tem, na sua

sequência de realização de eventos, mormente os seus famosos Encontros e Congressos, a

apresentação de trabalhos em Grupos com temáticas específicas.

Esta parece, aliás, tradição já afirmada, com igual relevância àquela dedicada na discussão de

problemáticas inerentes à área, networking (numa era em que a ‘vaso’-comunicação é

enormemente valorizada) etc.

Este horizonte alargou-se bastante com a acertada decisão da realização também de

Encontros Internacionais, sendo a sua primeira aquela no ano de 2014, em Barcelona –

Espanha, sucedida pelos igualmente exitosos encontros de Baltimore - EUA e Madrid –

Espanha (2015) e Oñati – Espanha (2016), culminando com este agora, o de número V, em

Montevideu – Uruguai.

Se a importância da realização dos encontros internacionais é sobeja, a abertura para sua

implementação na América Latina é fundamental para o resgate da comunicação, no caso

acadêmico-científica, que o Brasil parece dever aos países da região.

De fato. Sem desconhecer a relevância das relações com o denominado primeiro mundo,

porta de excelência do que melhor se realiza na área, os países latino-americanos e, no caso

do Uruguai, país nosso parceiro do Mercosul-Mercosur, faz-nos lembrar que o

compartilhamento de determinadas injunções geográficas e geopolíticas é fronteira

inescapável de tudo que fazemos.

O GT com a incumbência da discussão dos trabalhos ligados à subárea dos estudos em

SOCIOLOGIA, ANTROPOLOGIA E CULTURA JURÍDICAS é um daqueles que, quer pela

expressão do número de trabalhos ali submetidos, como pela sua evidente qualidade,

demonstra a acerto da decisão pela internacionalização e sua aceitação.

Ademais, os debates ali vividos, em excelente ambiente de cooperação científica, fizeram

perceber este GT como um daqueles em que a qualidade investigativa bem se evidenciou.

Para além da discussão dos rumos da Pós-graduação em nosso país, a certeza de estarmos

contribuindo para a afirmação desta entidade científica nesta expressão internacional e

regional muito nos alegra.

Também, gize-se, a possibilidade da edição dos trabalhos apresentados e discutidos,

possibilita que todos aqueles interessados no tema aproveitem este material e possam, com a

leitura dos trabalhos aqui constantes, para além do necessário registro, acrescerem algo em

suas próprias indagações, estudos e pesquisas.

Prof. Dr. Rubens Beçak - USP

Prof. Dr. Luis Eduardo Morás - UDELAR

1 Mestre em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas.

2 Mestrando em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas.

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A POLÍTICA INDIGENISTA NA AMAZÔNIA: REFLEXÕES A PARTIR DA OBRA DE LORENZO CARRASCO E SILVIA PALACIOS

INDIGENOUS POLICY IN THE AMAZON: REFLECTIONS FROM THE WORK OF LORENZO CARRASCO AND SILVIA PALACIOS

Bruno Costa Marinho 1Almerio Augusto Cabral dos Anjos de Castro e Costa 2

Resumo

O presente trabalho tem por objetivo analisar a evolução da política indigenista brasileira sob

o enfoque das influências exercidas por grupos nacionais e estrangeiros, motivados por

interesses diversos, conforme a obra “Quem Manipula os povos indígenas contra o

desenvolvimento do Brasil: Um olhar nos porões do Conselho Mundial de Igrejas” dos

autores Lorenzo Carrasco e Silvia Palacios. Serão apresentados os argumentos formulados

pelos autores da obra analisada, juntamente com o entendimento de outros autores e

reportagens que tratam de problemas referentes à causa indigenista e demonstrados os riscos

decorrentes da segregação de povos indígenas em verdadeiros zoológicos de seres humanos.

Palavras-chave: Povos indígenas, Política indigenista, Integridade nacional

Abstract/Resumen/Résumé

The purpose of this paper is to analyze the evolution of Brazilian indigenous policy under the

approach of the influences exerted by national and foreign groups, motivated by different

interests, according to the book “Quem Manipula os povos indígenas contra o

desenvolvimento do Brasil: Um olhar nos porões do Conselho Mundial de Igrejas” by

Lorenzo Carrasco and Silvia Palacios. The arguments will be presented by the authors from

analyzed book, along with the opinion of other authors and reports that deal with issues

related to indigenous cause and demonstrated the risks of segregation of indigenous peoples

in real humans zoos.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Indian people, Indigenous policy, National integrity

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INTRODUÇÃO

A temática indígena é assunto ainda muito controverso dentro da sociedade

brasileira. O principal problema está na tentativa de identificar os indígenas brasileiros como

um grupo único e, principalmente, em colocá-los em papel antagônico em relação ao restante

da sociedade brasileira. Algumas pessoas chegam mesmo a pensar que soluções dadas a

questões indígenas em outros países teriam êxito no Brasil, pelo simples uso etimológico da

palavra “índio”, indistintamente, para todos os grupos ameríndios que existem em toda a

América.

Somente no Brasil, segundo a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), existem 305

etnias indígenas, falando 274 idiomas. Além desses já registrados, existem ainda 69

referências de grupos não contatados e outros grupos que buscam seu reconhecimento junto

ao órgão indigenista.

Como tratar um grupo tão heterogêneo como se fosse um só? Como atender os

anseios de 305 grupos, que, por muitas vezes, não falam sequer a mesma língua, tratando-os

como se fossem um grupo homogêneo? Essa é o primeiro questionamento a respeito da atual

política indigenista brasileira. Outra questão que deve ser debatida é, em qual medida as

riquezas minerais presentes nas extensas terras indígenas ao longo do Brasil exercem

influência sobre grupos nacionais e estrangeiros que interagem com alguns índios brasileiros.

Sob esse enfoque, os autores Lorenzo Carrasco e Silvia Palacios apresentam, em sua

obra intitulada “Quem Manipula os povos indígenas contra o desenvolvimento do Brasil: Um

olhar nos porões do Conselho Mundial de Igrejas”, uma visão nada romântica e politicamente

incorreta sobre a questão indigenista brasileira.

Lorenzo Carrasco é mexicano, nascido na Cidade do México, em 1950, jornalista,

editor-presidente da Capax Dei Editora, autor da obra “Una mirada al mundo y a los valores

que cimentan un nuevo ordem mundial”, organizador da obra “Máfia Verde: ambientalismo a

serviço do governo mundial”, e coautor de “O complô para aniquilar as Forças Armadas e as

Nações da Iberoamérica”, “Máfia Verde 2: ambientalismo, novo colonialismo” e “A hora das

hidrovias: estradas para o futuro do Brasil”.

Silvia Palacios também é mexicana, nascida na Cidade do México, em 1952,

jornalista e coautora de “O complô para aniquilar as Forças Armadas e as Nações da

Iberoamérica”, “Máfia Verde 2: ambientalismo, novo colonialismo”.

Trata-se de uma obra que apresenta uma série de argumentos acerca da manipulação

existente sobre os indígenas brasileiros, visando a reserva de recursos naturais para

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exploração de empresas estrangeiras. Essa manipulação é auxiliada por setores internos mal

intencionados ou ingênuos em relação às verdadeiras intenções por trás da defesa dos índios.

Apesar de os autores terem tratado da questão indígena em todo o Brasil, o presente

trabalho se limitará a analisar as afirmações referentes à região amazônica, bem como, não

ficará restrito às atitudes do Conselho Mundial de Igrejas (CMI). Nesse sentido, além da obra

de Carrasco e Palacios, serão apresentados autores, documentos e reportagens que corroboram

com a ideia dos mesmos.

1. A QUESTÃO INDÍGENA

O Brasil é um país que se destaca mundialmente pela diversidade racial e pela forma

como esses diversos grupos de pessoas convivem de forma harmônica, principalmente se for

realizada uma comparação com os conflitos étnicos e religiosos existentes no Oriente Médio,

onde Palestinos e Judeus não conseguem viver em paz e estão sempre sob o risco iminente de

uma guerra.

Segundo Andrade (2014, p. 13), “a formação da população brasileira é resultado de

cinco séculos de mistura entre populações de três diferentes continentes: colonizadores

europeus, escravos africanos e ameríndios.” Sendo assim, difícil é, depois de cinco séculos de

miscigenação, separar o país em etnias e dar tratamento diferenciado entre as mesmas.

Sob esse enfoque, Carrasco e Palacios (2013, p. 12) apresentam argumentos segundo

os quais essa miscigenação da população brasileira é confirmada pela presença de herança

genética indígena em mais de 50 milhões de brasileiros.

Na contramão de tudo o que foi dito, grupos nacionais e internacionais insistem em

segregar populações indígenas e deixá-los isolados em verdadeiros zoológicos humanos, sob a

bandeira da preservação da cultura, como se fosse necessário o isolamento de um grupo para

que sua cultura existisse. Sob esse argumento absurdo, pode-se chegar à falsa conclusão de

que somente os indígenas brasileiros e algumas outras sociedades isoladas pelo mundo

possuem cultura, o que não é verdade.

Criou-se uma situação fática onde o grande interesse é pela demarcação de terras

indígenas e isolamento de seus moradores, sem que haja qualquer preocupação com

populações não indígenas que habitam o local há gerações. Segundo Carrasco e Palacios

(2013, p.8):

Igualmente não são muitos os que, residindo fora das áreas diretamente afetadaspelos problemas, se dispõem a sequer examinar os argumentos das populações quetêm sido expulsas de terras ocupadas há décadas ou, em certos casos, há mais de umséculo, para a instalação de terras indígenas, como tem ocorrido em Roraima e MatoGrosso.

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Parece que mesmo a situação dos indígenas não é levada em conta quando o

interesse é demarcar terras, visto que, em diversas situações, as áreas são demarcadas e os

indígenas abandonados à própria sorte, como ocorreu em Roraima, após a controvertida

demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em que houve a demarcação de grandes

terras, com a expulsão de moradores não indígenas e o total abandono dos indígenas,

conforme pode ser verificado na reportagem de Militão:

Raposa Serra do Sol vive abandono após quatro anosBOA VISTA e PACARAIMA (RR) – Quatro anos depois de o Supremo TribunalFederal (STF) confirmar a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, emRoraima, e determinar a retirada dos arrozeiros que ocupavam a área, as antigasculturas estão abandonadas. O gado, que em muitos lugares substituiu as plantaçõesde arroz, morre de sede, as estradas, todas de terra, estão em mau estado deconservação, com muitas pontes sem condições de uso ou mesmo queimadas. Parafazer o transporte escolar dos índios, só com caminhonetes de cabine dupla, quetransportam no máximo quatro alunos.

Observou-se no caso de Roraima, da mesma forma que ocorre na maioria das terras

indígenas, que houve preocupação em demarcar grandes extensões de terras e de segregar os

indígenas, sem que existisse qualquer interesse no real desenvolvimento da comunidade local.

Essa demarcação trouxe prejuízos para não indígenas que viviam no local há décadas, bem

como para os indígenas que se viram abandonados em grandes extensões de terra, sem

alternativas para viver de forma digna.

1.1 Etnonacionalismo

O etnonacionalismo prega que os laços de ligação do cidadão devem ser fortalecidos

com o grupo que, entendendo ser de mesma origem ancestral, se designa por nação, em

detrimento à lealdade que deveria ter com o seu Estado. Pregam ainda a autonomia dessas

nações em relação aos Estados.

Os autores da obra analisada, Carrasco e Palacios (2013, p. 33), tratam do

etnonacionalismo da seguinte forma:

Segundo os cânones do etnonacionalismo, após a queda do regime socialista daURSS, começou a se modelar uma nova ordem mundial, com base emcaracterísticas étnicas, na qual a ideia do Estado nacional se caracteriza como mero“grupo de pessoas que creem ter uma ascendência em comum”, e cuja lealdade maisforte se encontra enraizada nos interesses de cada grupo determinado. Essasubjetividade radical, onde cada indivíduo ou grupo determina um relativismojurídico radical, justificaria a estruturação de “novas” nações dentro dos Estadosexistentes, o que, em última instância, os levaria à dissolução territorial decorrentedas discórdias interétnicas.

Para que seja verificado o grande perigo do etnonacionalismo, apenas para

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exemplificação, basta estudar um pouco os conflitos existentes no Oriente Médio, entre

Palestinos e Israelenses, ou entre Curdos e Iraquianos, o conflito nos Balcãs, que resultou na

divisão da Iugoslávia e o grave conflito ocorrido na África, em Ruanda, onde a divergência

entre etnias resultou na morte de centenas de milhares de pessoas.

Em relação aos conflitos étnicos no Oriente Médio, o que melhor pode demonstrar o

perigo do etnonacionalismo é o dos judeus, que começaram como vítimas dos nazistas, na

Europa, por motivos quase que exclusivamente étnicos e, com isso, acabaram ganhando a

simpatia da opinião pública mundial em relação à necessidade de uma pátria. Com isso,

conseguiram criar seu país na região onde já viviam árabes palestinos, que até hoje não

concordam com a criação do Estado de Israel e vivem em constante estado de guerra.

Conforme Camargo (2009, p. 431):

O principal motivo, que alinhou a opinião pública mundial ao lado da causa judaica,foi a revelação do maior genocídio da história, o extermínio de 6 milhões de judeusperpetrado pelo regime nazista, principalmente em campos da morte na EuropaOriental como Auchwitz-Birkenau, Chelmno, Majdanek, Treblinka e Sobibor. Ohorror do holocausto acabou acelerando a imigração ilegal de judeus para aPalestina, principalmente daqueles oriundos da Europa Central e Oriental.

Nota-se que um problema étnico, motivado pelo ódio aos judeus, acabou gerando

outro problema, pois devido à perseguição aos judeus na Europa, os mesmos conseguiram

criar um país no Oriente Médio, em local onde era ocupado por palestinos, que hoje são

privados de vários direitos em comparação com que é disponibilizado aos judeus, unicamente

por questões étnicas.

Na África, conflitos étnicos são comuns, onde ocorrem massacres de grupos, pelo

simples fato de pertencerem a grupo étnico diferente. O mais gritante caso de conflito étnico

ocorreu em Ruanda, onde mais de 800.000 (oitocentos mil) nativos da etnia Tutsi foram

mortos pela etnia Hutu, segundo Vezneyan ( 2009, p. 291), em apenas 100 dias, a partir de 6

de abril de 1994.

Importante ressaltar que a diferenciação entre etnias em Ruanda foi fomentada pela

Bélgica, que colonizou Ruanda. Segundo Miranda (2009, p. 34):

As etnias dividem o mesmo território, falam a mesma língua e compartilham osmesmos mitos e costumes. Com o passar dos séculos mesmo as diferenças físicasforam sendo diluídas devido aos frequentes casamentos entre membros de diferentesetnias.No entanto, o processo de assimilação deteve-se quando a região foi submetida àcolonização europeia. Importando as teorias racistas em voga na Europa, oscolonizadores belgas classificaram os tutsis como uma raça superior às demais,favorecendo-os com oportunidades de educação e acesso a empregos públicos,tornando-os uma casta economicamente privilegiada. Em 1931, o governo belgaintroduz em Ruanda a identificação étnica dos cidadãos nas carteiras de identidadedos ruandeses. Após as Segunda Guerra Mundial, a Bélgica, agindo sob o mandatodo Conselho de Tutela da ONU, inverte sua política, favorecendo os hutus e a eles

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transferindo o poder, quando da independência de Ruanda, em 1961. Estesestabelecem “cotas raciais” para a ocupação de cargos e funções públicas,diminuindo drasticamente a participação dos tutsis no processo político.

Desta forma fica claro entender o real interesse em fomentar divergências entre a

população de um Estado, pois é muito mais fácil dominar um povo, seja militar ou

economicamente, se o mesmo estiver dividido e enfrentando problemas de ordem interna.

A Bolívia, país vizinho ao Brasil optou por mudar a própria designação do país para

República Plurinacional da Bolívia, fazendo alusão às nações indígenas existentes naquele

Estado. No entanto, o termo plurinacional também causa preocupações, tendo em vista o risco

de secessão, conforme Iamamoto (2013, p. 105):

O debate sobre o caráter plurinacional da Bolívia também perspassa a maioria dascontribuições dos grupos da oposição. Somente dois grupos (MNR e MNR-FRI)definem o Estado boliviano como “multinacional”, graças à existência de naçõesoriginárias. Os demais partidos utilizam o termo “nação” ou “nacionalidade” sereferindo somente à nação boliviana. (...) A UN (tanto o documento de Lazartequanto o de Pol Achá) demonstra explícita preocupação com os termos “territórios”e “nações” indígenas, pois pressuporiam soberania e o direito à secessão. (grifonosso)

No Brasil, até pouco tempo existia o interesse de integrar toda a população em prol

do desenvolvimento do país. Porém, por questões que não visam o interesse nacional,

motivados por cunho financeiro e/ou político, está sendo fomentada a segregação entre grupos

nacionais, baseado em questões étnicas.

Atualmente, diversos grupos buscam receber algum tipo de vantagem em relação ao

restante da população brasileira, criando ou inventando novas etnias para tentar tirar vantagem

econômica disto. Segundo Silva Júnior e Souza (2008, p.52), “identidades coletivas

diferenciadas emergem no Brasil, revelando nas últimas décadas a existência de grupos

étnicos, organizados em movimentos sociais, que buscam garantir e reivindicar direitos, que

sempre lhes foram negados pelo Estado”.

Os autores concordam com a efetivação de direitos por vários grupos, que entendem

por etnias, conforme observa-se em seu magistério (2008, p. 57-58):

Em que pese favorável que Xetás, Guaranis, Kaiangs, Quilombolas, Faxinalenses,Caiçaras, Pescadores Artesanais, Cipozeiros e Ilhéus, tenham conquistado de formagradual reconhecimento jurídico-formal, por meio de suas mobilizações, aindaimpõe-se na esfera do Estado, limites burocráticos, jurídicos e políticos para a suaefetivação, além do que é notório que suas principais demandas – especialmente aterritorial – encontra-se engessada.

Verifica-se que Silva Júnior e Souza entendem que é necessário que sejam destinadas

mais terras para esses grupos. No entanto, no mesmo artigo, os autores (2008, p.53) afirmam

que as comunidades tradicionais são “estimadas em cerca de 4,5 milhões de pessoas

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pertencentes a distintos povos e comunidades tradicionais no Brasil, ocupando uma área

equivalente a 25% do território nacional.”

Basta fazer uma conta simples para verificar que não há nenhuma razoabilidade em

2% da população ocupar 25% do território brasileiro. Essa proteção a certos grupos étnicos

serve apenas para fomentar o ódio entre grupos de brasileiros.

Um excelente exemplo do que pode acontecer no Brasil caso seja fomentado este

ódio entre indígenas e não indígenas pôde ser observado, no final de 2013 e início de 2014, na

região de Humaitá, onde três cidadãos foram mortos por indígenas, apenas pela suspeita de

que um carro da mesma cor do que eles se encontravam teria sido o responsável pelo

atropelamento que resultou na morte de um cacique. Revoltados com a morte dos cidadãos, os

moradores de Humaitá, cansados também da cobrança de um pedágio ilegal por parte dos

índios, seguiram em carreata e queimaram as instalações do pedágio, conforme verifica-se no

portal eletrônico G1:

Moradores queimam prédios públicos em protesto no sul do AM

Um grupo de moradores da cidade de Humaitá, no sul do Amazonas, incendiouprédios públicos, carros e um barco, na noite de quarta-feira (25). Foi o auge de umclima de tensão que tem se agravado desde o início do mês. (…)Por causa do clima de tensão que tomou conta da cidade, os índios que estavamem Humaitá foram levados pro Batalhão do Exército pra garantir a integridade físicadeles. Já que, de acordo com a polícia, eles correm o risco de serem agredidos pelosmanifestantes.“A Funai acorreu ao batalhão e solicitou a ação do Exército para proteger aintegridade desses indígenas”, disse Márcio Antonio do Prado, Coronel do Exército.

O conflito se alastrou por semanas e só não teve um desfecho mais trágico ainda por

quê o Exército Brasileiro, a pedido dos próprios indígenas, os abrigou em um dos seus

batalhões e não permitiu que ocorresse uma verdadeira guerra entre indígenas e não

indígenas.

Ainda em relação à situação ocorrida em Humaitá, e corroborando com o

entendimento de que esta questão tome vultos de grande perigo para a manutenção da

integridade territorial brasileira, neste caso específico, segue abaixo a decisão liminar da

Justiça Federal em face da ação civil pública formulada pelo Ministério Público Federal:

Tendo em vista os patentes indícios de violação de direitos humanos – maisespecificamente de direitos tutelados por nação indígena de área conflituosa –violação esta que seria decorrente de possível omissão/inação de agentes do Estadobrasileiro, o que implicaria em vulneração de tratados e compromissosinternacionais assumidos junto à ONU e à OEA, DETERMINO que após o ingressoaos autos das peças de defesa, sejam extraídas cópias integrais deste feito eencaminhados à COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS,com vistas a que aquele Órgão Internacional tome ciência dos graves fatos

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reportados nesta ação e,com isso, possa aferir a conduta do Estado brasileiro e suacompatibilidade com os compromissos internacionais dos quais é signatário.(…)Manaus/AM, 28 de dezembro de 2013Marília Gurgel R. De Paiva e SalesJuíza Federal Plantonista

Verifica-se que uma Juíza Federal trata de direitos de uma suposta nação indígena e

procura tutela internacional para a mesma, sob a alegação de omissão do Estado, por supostas

violações a direitos humanos daquela “nação”. Como o Estado pode estar sendo omisso, se o

caso está sendo julgado pelo Poder Judiciário, constitucionalmente constituído?

Se o próprio Judiciário brasileiro, mesmo que em uma ação isolada, atesta o

reconhecimento de uma nação dentro do território brasileiro e pede a tutela de órgãos

internacionais, parece claro que é apenas uma questão de tempo para que esta nova “nação”

busque essa mesma tutela para se tornar independente do Brasil.

2. INGERÊNCIAS EXTERNAS

Não são poucas as ingerências externas que a causa indigenista sofre constantemente, por

motivações que não são difíceis de entender. Para tal, basta que seja verificada a quantidade de

riquezas naturais existentes na Amazônia brasileira.

Dentre esses agentes externos, segundo Carrasco e Palacios (2009, p. 45), entra o Conselho

Mundial de Igrejas, que diferente do que seu nome pode sugerir, não tem a intenção de evangelizar e

se utiliza de um “ falso ecumenismo”, para promover ideias e interesses econômicos e de poder

supranacionais contra o bem comum das nações soberanas, que seus fundadores prometeram

combater desde a fundação da entidade. Ainda segundo os mesmos autores (2009, p. 45-46):

(...) essas organizações “missionárias” promovem o que entendem como osinteresses dos povos indígenas – em essência, preservá-los em reservas que seassemelham a “zoológicos humanos”, separados do restante das sociedadesnacionais, como membros de uma humanidade abstrata, desprovida de princípiosuniversais e vivendo em condições institucionais que antecedem a existência dosEstados nacionais soberanos. Ou seja, uma causa perfeita para promover um“humanitarismo” hipócrita, pra favorecer o estabelecimento de estruturassupranacionais de governo mundial.

Segundo Carrasco e Palacios (2009, p. 65) o CMI condena a soberania e parte do

princípio de que o Estado soberano constitui a principal causa para que existam guerras e não

o capitalismo ou o socialismo.

Já se apresentam ações de grupos internacionais, contrários ao interesse nacional, que

se utilizam da manipulação indígena para se apropriarem de nossos recursos naturais. A seguir

será apresentado o caso de uma empresa irlandesa que realizou um contrato diretamente com

indígenas da etnia Munduruku, segundo o qual, sem o consentimento do Governo Brasileiro,

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a empresa teria o direito de realizar análises e estudos técnicos, com acesso, sem restrição a

toda a área, de 20 milhões de hectares localizada na Amazônia, e sendo vedado ainda aos

indígenas realizar quaisquer obras ou atividades na área que possam alterar a qualidade do

carbono captado. Segundo o contrato, todos os direitos relativos à biodiversidade da área

seriam de propriedade da empresa estrangeira.

Além da afirmação presente no livro analisado, segue parte da reportagem de Viana,

Mota e França, divulgada pelo portal eletrônico “A Pública”:

Por US$ 120 milhões, empresa irlandesa compra direitos sobre créditos de carbonodos índios Munduruku, no Pará; contrato valeria por 30 anos. (...)A Celestial Green atua em um novo setor que se fortalece nos recônditos daAmazônia brasileira: a venda créditos de carbono com base em desmatamentoevitado, focado nas florestas. Por estes créditos, a empresa tem procurado indígenasde diversas etnias e teria assinado contratos com os Parintintin, do Amazonas, eKaripuna do Amapá, segundo as suas páginas no twitter e facebook.(…) O contrato, no entanto, acabou sendo assinado naquele mesmo dia – tanto aempresa quanto os indígenas confirmam. De acordo com Izeldeti e Osmarino,porém, o contrato foi assinado contra a vontade da maioria da populaçãoMunduruku.Totalmente desconhecida no Brasil, a Celestial Green, sediada em Dublin, se declaraproprietária dos direitos aos créditos de carbono de 20 milhões de hectares naAmazônia brasileira – o que equivale aos territórios da Suíça e da Áustria somados.Juntos, os 17 projetos da empresa na região teriam potencial para gerar mais de 6bilhões de toneladas de créditos de carbono, segundo a própria empresa.

Diante de tais evidências, será que ainda existe alguma dúvida acerca da nocividade

dessa segregação entre etnias para o Brasil? Parece-nos límpida a certeza de que grupos

financeiros, visando única e exclusivamente angariar vantagens pecuniárias com os recursos

naturais do País se utilizam desse antagonismo criado entre indígenas e não indígenas a fim de

obter vantagens ilícitas.

Esse contrato, por intermédio do qual a empresa irlandesa se declara proprietária dos

direitos dos créditos de carbono de 20 milhões de hectares de terras da União está sendo

investigado pelo Ministério Público Federal, conforme notícia veiculada pelo site G1, em

2012:

O Ministério Público Federal abriu inquérito para investigar o contrato de US$ 90milhões firmado entre a empresa Celestial Green Ventures e a comunidade indígenamundurucu para uso de créditos de carbono. Segundo o órgão, falta clareza noacordo que permite à companhia irlandesa explorar por 30 anos uma área de 200 milquilômetros quadrados na floresta amazônica.

Em pesquisa no site do Ministério Público Federal (MPF) não existem menções à

investigação ao contrato firmado entre os índios Munduruku e a empresa irlandesa.

Fica muito claro o porquê de tanto interesse por parte de estrangeiros em questões

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indígenas no Brasil. Visto que as terras indígenas são demarcadas em áreas de grande riqueza

natural, fica muito mais fácil manipular os indígenas para retirarem esses recursos do País

quando os mesmos estão delimitados dentro de áreas ocupadas por indígenas, desamparados

pelo governo e em situação de desigualdade para negociar com grandes grupos financeiros

internacionais.

Até mesmo para a venda e exportação de artesanatos ocorrem casos de exploração de

indígenas brasileiros por parte de estrangeiros. Como exemplo, pode ser citado o caso da

Comunidade Beija-flor, localizada na Cidade de Rio Preto da Eva, localizada a pouco mais de

80 Km de Manaus, onde indígenas foram trazidos de várias regiões do Amazonas para

confeccionar artesanato e vender para um comerciante norte-americano, conforme verifica-se

na obra de Farias Júnior (2009, p. 24):

Foi nessa área de 81,20 ha que, na década de 1980, o Sr. Richard Melnyk decidiu“montar uma comunidade indígena”, passando a convidar indígenas de diferentesgrupos étnicos para ali residirem. Embora não haja indicações para tanto, pode-seadiantar que a heterogeneidade étnica dificultou inicialmente quaisquer laços maisprofundos de solidariedade entre os indígenas “convidados”, favorecendo adominação comercial das terras implementadas pelo Sr. Melnyk. O objetivo dessecomerciante era que os indígenas produzissem artesanato e os vendessemexclusivamente para ele. Que, por sua vez, os revendia em sua loja, na “Casa Beija-flor”, que se localizava na Rua Quintino Bocaiúva, Centro de Manaus. Assim comoos exportava para Inglaterra e Estados Unidos dentre outros países.

Verifica-se a criação de uma comunidade indígena composta pelas etnias sateré-

mawé, tukano, dessana, tuiuca, apurinã, baniwa, arara, marubo e maioruna, montada por um

estrangeiro, com a finalidade de explorar o fruto de seu trabalho. Para piorar a situação,

segundo Farias Júnior (2009, p.38), com a morte do Sr. Melnik, seu procurador teria passado

seus bens, incluindo a área da comunidade inventada, para sua própria esposa, o que fez com

que os índios residentes naquela área tivessem uma grande dificuldade em obter a propriedade

da área, o que somente aconteceu após a desapropriação das terras pela Prefeitura de Rio

Preto da Eva.

Mais uma vez ocorreu a manipulação dos indígenas com a finalidade de obtenção de

lucros financeiros por investidores estrangeiros, como ocorre na maioria dos casos em que

grupos de fora do País tentam realizar algum tipo de ingerência sobre as questões indígenas

brasileiras.

Outra situação que causa espanto é o grande interesse de governos estrangeiros em

etnias indígenas brasileiras, como é o caso da Noruega, que, segundo reportagem de Brasil,

noticiada na Folha de São Paulo, chega a promover visitas-surpresa de seu chefe de Estado, o

Rei Harald 5º, à Terra Ianomâmi, sem a anuência do Governo Brasileiro:

Rei da Noruega faz 'visita-surpresa' a terra indígena conflagrada.

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Apesar do agravamento da tensão na terra indígena ianomâmi, na Amazônia, o ReiHarald 5º da Noruega ignorou apelo das autoridades brasileiras e foi visitar a área.(…)Primeiro houve um pedido para que ele desistisse da empreitada. Diante da negativa,PF e Funai deslocaram servidores para acompanhar a estada, que começou nasegunda-feira passada e terminaria na madrugada de hoje.O rei, segundo a Funai, ficou na aldeia Demini, no Amazonas, a cerca de 150 km dolocal dos conflitos mais recentes em Roraima. Foi conhecer projetos financiadospela Noruega – um deles é para instalar rede de comunicação via rádio nas aldeias.(…)A associação fechou acordo com a Noruega em 2008 para o recebimento deR$300.000,00 para ações em saúde e educação na terra indígena.Nenhum órgão federal nem a associação souberam dizer quantas pessoasacompanharam o rei na visita.A Funai disse que autorizou a entrada da comitiva real na reserva atendendo ao umpedido dos índios.

Não é somente a Noruega que apoia diretamente a causa indígena no Brasil, mas

vários outros países, do chamado Primeiro Mundo, fazem investimentos nessa área, com a

total omissão do governo brasileiro. Nas palavras de Dewar (2008, p. 79-80):

O ocupante, um funcionário do Ministério de Assuntos Exteriores, estavadescarregando a sua mudança, de volta ao Canadá após um posto no exterior. (…)Como é de costume entre funcionários da chancelaria, ele somente havia concordadoem me receber se o seu nome não fosse mencionado.(…)Em sua sala de estar em Ottawa, ele explicou que a embaixada canadense emBrasília havia dado dinheiro a várias entidades beneficentes brasileiras, ou ONGs,como são chamadas. “Na embaixada, nós temos um fundo para patrocinar ONGs.Este ano são 250.000 dólares.” (Na verdade eram 500.000 dólares que podiam sergastos em dois anos).

Qual seria o real interesse em um governo financiar projetos em outro país?

Bondade? Espírito de cooperação? Ou seria a certeza de retornos financeiros oriundos da

riquezas naturais presentes nas grandes áreas demarcadas como terras indígenas? Onde está a

soberania brasileira, que não tinha a intenção de receber a visita de um chefe de Estado, mas

teve que aceitá-la mesmo contra a sua vontade? Onde está a soberania brasileira, que tem que

submeter à vontade de um chefe tribal e de um rei europeu? Esses questionamentos devem ser

respondidos de forma séria e racional e não baseados na ideia romântica que índios são seres

humanos puros e desprovidos de maldades e por isso conseguem a ajuda de governantes

estrangeiros.

3. INGERÊNCIAS INTERNAS

Em relação às ingerências internas, Carrasco e Palacios apresentam o Conselho

Missionário Indigenista (CIMI) como uma das entidades que manipula as questões indígenas,

contra o desenvolvimento do Brasil. Dentro do que já nos posicionamos, em relação aos

problemas existentes em outras regiões do mundo, motivados por divergências étnicas, da

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missão do CIMI, presente em seu sítio na rede mundial de computadores, podemos inferir que

o mesma realmente contribui para a não interação da população brasileira. Para tal, basta que

seja observada sua missão:

O objetivo da atuação do CIMI foi assim definido pela Assembleia Nacional de1995: “Impulsionados(as) por nossa fé no Evangelho da vida, justiça e solidariedade e frente às agressões do modelo neoliberal, decidimos intensificar apresença e apoio junto às comunidades, povos e organizações indígenas e intervirna sociedade brasileira como aliados (as) dos povos indígenas, fortalecendo oprocesso de autonomia desses povos na construção de um projeto alternativos,pluriétnico, popular e democrático.”Os princípios que fundamentam a ação do CIMI são:- o respeito a alteridade indígena em sua pluralidade étnico-cultural e histórica e avalorização dos conhecimentos tradicionais dos povos indígenas;- o protagonismo dos povos indígenas sendo o CIMI um aliado nas lutas pelagarantia dos direitos históricos;- a opção e o compromisso com a causa indígena dentro de uma perspectiva maisampla de uma sociedade democrática, justa, solidária, pluriétnica e pluricultural.E para esta nova sociedade, forjada na própria luta, o CIMI acredita que os povosindígenas são fontes de inspiração para a revisão dos sentidos, da história, dasorientações e práticas sociais, políticas e econômicas construídas até hoje.

Conforme pode ser verificado na missão institucional do CIMI, seu objetivo é um

processo de autonomia dos povos indígenas, e não a sua integração ao povo brasileiro, o que

pode trazer graves consequências para a soberania nacional. Nesse sentido, Carrasco e

Palacios apresentam a posição do CIMI durante a Assembleia Constituinte (2013, p. 125):

Durante os trabalhos da Assembleia, o CIMI apresentou a proposta de emendaPopular nº 8, com a qual se tentava introduzir na futura constituição o conceito de“plurinacionalidade”, pelo qual os indígenas brasileiros passariam a ter duplanacionalidade, a brasileira e a de seu povo. O primeiro artigo da emenda afirmavaque “o Brasil é uma República federativa e plurinacional”, E o segundo: “Osmembros das nações indígenas possuem nacionalidades próprias, distintas entre si eda nacionalidade brasileira, sem prejuízo de sua cidadania brasileira.”

Essa posição do CIMI demonstra que sua intenção é que os povos indígenas sejam

reconhecidos como nações, distintas da brasileira.

Além do cunho ideológico, existe interesse de grupos financeiros nacionais para que

os indígenas sejam segregados, pois assim se torna muito mais fácil explorar os recursos

naturais presentes em suas terras, conforme pode ser observado na reportagem do portal

eletrônico 24 Horas News:

Índios admitem vender madeira ilegal de área de reserva em MT Durante fiscalização do IBAMA a uma extração ilegal de madeira na reserva dosCintas Largas, região de Aripuanã, o cacique da aldeia confessou que osindígenas estariam vendendo madeiras, extraídas ilegalmente da área, amadeireiros da região. Consta que os agentes entraram na reserva e acabaramencontrando logo em seguida, um caminhão carregado com toras, umacampamento com trabalhadores responsáveis pela extração da madeira, além decentenas de árvores, já abatidas.

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No mesmo sentido, o portal Folha Política apresenta reportagem tratando do aluguel

de terras indígenas para a exploração de madeiras:

Índios 'alugam' terras para exploração ilegal de madeira.Índios da Amazônia têm loteado e “alugado” terras para madeireirosdesmatarem e retirarem madeira de forma ilegal – e a preços módicos.A Folha identificou casos em ao menos 15 áreas indígenas (no Amazonas, Pará,Maranhão, Mato Grosso e Rondônia), com base em investigações da PolíciaFederal, Ministério Público e servidores da Funai (Fundação Nacional do Índio).Nas transações, madeireiros pagam R$15,00 pelo m³ da madeira, depoisrevendida por preços na casa dos R$1.000,00, de acordo com a PF.Além de pagamento em dinheiro, os índios também aceitam aparelhoseletrônicos, bebidas ou até mesmo prostitutas, conforme relatos de funcionáriosda Funai.

Não fica difícil entender por quê muitos preferem que os índios permaneçam nas

mesmas condições que os portugueses encontraram os nativos quando aportaram em nosso

território. Como citado na reportagem, o escambo permanece sendo uma excelente forma de

roubar as riquezas naturais existentes no Brasil. Só que agora, além dos portugueses, grupos

nacionais também utilizam da inocência de uns e do mau caráter de outros para ganhar

dinheiro em “negociações” com indígenas.

4. DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS

A obra analisada, de Carrasco e Palacios, é finalizada com uma denúncia, formulada

pelo jurista Clovis Ramalhete, que foi juiz da Corte Permanente de Arbitragem de Haia,

Consultor-Geral da República e Ministro do Supremo Tribunal Federal, onde o mesmo faz

várias críticas acerca da política indigenista brasileira, principalmente sobre as demarcações

de grandes terras indígenas.

Segundo o relato de Clovis Ramalhete, citado por Carrasco e Palacios (2013, p. 185):

Ninguém, político ou jurista, por ter lido sobre os índios na Constituição de 88, jápasmou ao ver que eles agora se tornaram irremovíveis. E o são até mesmo no casode “interesse da soberania nacional” (só lendo para acreditar!). Enquanto com índioagora é assim, irremovível, o restante da população brasileira é deslocado por ordemjudicial, no caso de desapropriação. Arredam-se famílias para abrir nova rua. Atépopulações compactas são removidas, como no caso de hidrelétricas, necessárias, aserviço de áreas industriais e de desenvolvimento. Mas índio, não; índio está fincadoao solo pelo constituinte de 88. Ninguém já ficou surpreso, só porque não leu aConstituição, por ali saber esse fato espantoso: no Brasil, para apenas 240 mil índiosexistentes, estão destinados 793 mil quilômetros quadrados, isto é, 26 vezes maisque o território da Bélgica ou que a soma da França com a Inglaterra.

Parece-nos muito correta a visão do falecido jurista, quando o mesmo alerta para as

disparidades existentes entre índios e não índios. Estranho que setores esclarecidos da

sociedade não percebam o rumo perigoso que esta questão está tomando, principalmente para

a manutenção da integridade territorial do Brasil.

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Existe sim o risco de diminuição do território brasileiro, devido à demarcação de

grandes terras indígenas para pequenos grupos, principalmente na faixa de fronteira, como é o

caso da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, no Estado de Roraima, na tríplice fronteira

entre Brasil, Guiana e Venezuela.

Alguns autores alegam que o risco existe não pelo fato da demarcação de terras

indígenas, mas sim pela omissão do Estado, conforme os ensinamentos de Dantas e Silveira

(2008, p. 155):

As terras indígenas situadas nas faixas de fronteira são as que tem sido maisfrequentemente questionadas, sob o argumento de que vastas extensões territoriaisnessas áreas colocam em risco a segurança e a soberania nacional. Nesta mesmaperspectiva, afirma-se que essas áreas em faixas de fronteira estão suscetíveis àintervenção estrangeira. Esquece-se, entretanto, que nos casos de interferênciaestrangeira nesses locais, pressupõe-se a ausência, a omissão do Estado, e não aculpa dos povos indígenas, cujo conceito de território é distinto da lógica instituídapelo Estado Moderno.

O pensamento dos autores não está errado quando trata da omissão do Estado em

relação às fronteiras. No entanto, não é esse tipo de intervenção estrangeira que preocupa,

uma invasão militar, com uma guerra de anexação de territórios, mas sim a intervenção

baseada no etnonacionalismo, onde grupos de indígenas, possuidores de grandes áreas

repletas de recursos naturais, apoiados por potências estrangeiras, requeiram sua

independência do Brasil. E isso fica muito mais fácil quando as terras estão situadas em áreas

de fronteira.

Ainda sobre a denúncia formulada por Clovis Ramalhete, importante analisar a

situação do “direito originário” dos índios, que acabou se configurando em um direito

constitucional. Que direito originário? Estamos falando de brasileiros e não dos indígenas que

aqui viviam quando os portugueses colonizaram o país. No pensamento de Clovis Ramalhete,

apresentado na obra de Carrasco e Palacios (2013, p. 186):

De fato, diz a Constituição de 88, no capítulo sobre o índio (capítulo que ninguémleu): “São reconhecidos aos índios os direitos originários sobre as terras quetradicionalmente ocupam!”Vê-se logo que o constituinte errou. Ele admitiu aos índios, agora, a atualidade de“direitos originários” às terras que ocupam. Opôs tais “direitos” a tudo quanto ahistória já construiu politicamente em terra brasileira, desde a chegada de Cabral.Nesta verba constitucional, o constituinte de 88 declarou reconhecer “direitosoriginários” às terras. Contrariou então manifesto interesse brasileiro de que asoberania do Brasil seja íntegra; e recobriu os índios também, sujeitos à ordemjurídica nacional. Que é isso, agora, de “direitos originários”?(...)O constituinte de 88, ao garantir aos índios “direitos originários” às terras, faz tardiaobjeção ao Direito Internacional do século XVI, que, no tempo das navegações e“descobertas”, em definitivo concedeu a posse dos territórios achados à soberania dacoroa a que se sujeitasse o navegador, ainda que no território encontrado sedeparasse com civilizações como a dos incas e dos maias. A história já recobriutudo.

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Nas Américas, por efeito dessa ordem jurídica seiscentista, aqui se instalaramcolônias. O processo de séculos, que se seguiu, culminou constituindo Estadossoberanos, reconhecidos mundialmente.

Esse discurso relativo a direitos originários só trará uma consequência futura

possível, o desmembramento do território brasileiro em vários novos estados indígenas.

Chegar a soar estranho que isso ainda não tenha caído no conhecimento do povo brasileiro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho não teve a pretensão de esgotar o assunto e muito menos criticar

os indígenas brasileiros, que, em sua grande maioria, não tem qualquer interesse em atentar

contra a soberania nacional. Na verdade os indígenas também são vítimas de grandes grupos

financeiros nacionais e internacionais que fomentam esse clima de discórdia e separação para

auferir lucros com essa situação.

A questão indígena no Brasil está tomando vultos muito preocupantes para a

soberania do País, sem que este assunto esteja em discussão por todos os setores da sociedade

de forma séria e responsável. Fora os mal intencionados que visam angariar lucros financeiros

com a segregação dos índios e a demarcação de terras indígenas em áreas repletas de recursos

naturais, existem pessoas altamente esclarecidas tem uma visão romântica sobre o assunto e o

tratam sob uma visão maniqueísta de que os índios compõem o lado bom e o restante da

sociedade brasileira o lado mau da história.

Existe um pensamento absurdo de que os brasileiros não indígenas teriam uma dívida

histórica com os indígenas. Que dívida? Se o povo brasileiro é fruto de séculos de

miscigenação, como pode um descendente de indígenas ter dívidas consigo mesmo? Se há

alguma dívida, que seja cobrada dos colonizadores, que retiraram a riqueza do Brasil para o

exterior, mas não dos brasileiros, que lutam para o desenvolvimento deste País.

Não é sensato que se fomente a segregação de brasileiros pelo simples fato de

descenderem de uma ou outra etnia. São todos brasileiros, tanto os indígenas que não se

miscigenaram, como os brancos, negros, mulatos, mamelucos e cafuzos, que trabalham

diariamente para que exista um futuro melhor para a Nação Brasileira.

Nós não somos invasores das terras dos indígenas, os colonizadores sim, mas não o

povo brasileiro. Que se mande a conta da invasão das terras nativas para Portugal, que nos

colonizou! Mas cobrá-la de quem também foi explorado seria outro crime.

Por que um indígena deve ser obrigado a viver na “idade da pedra” se já existem

diversos aparatos tecnológicos que tornam a vida mais dinâmica e agradável? Não é certo que

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se imponha esse avanço tecnológico, mas chega a ser criminosa a postura que os relega à

posição de “homens da caverna”, fadados a viverem na floresta para serem observados, tal e

qual os animais em zoológicos espalhados pelo mundo.

REFERÊNCIAS

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