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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ SIMONE CRISTINA BILL A NATUREZA JURÍDICA DO DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO CURITIBA 2012

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

SIMONE CRISTINA BILL

A NATUREZA JURÍDICA DO DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO

CURITIBA 2012

SIMONE CRISTINA BILL

A NATUREZA JURÍDICA DO DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO

Monografia de Conclusão de Curso, apresentada como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito pela Universidade Tuiuti do Paraná – UTP

Orientador: Profº Friedman Wendpap

CURITIBA 2012

TERMO DE APROVAÇÃO

SIMONE CRISTINA BILL

A NATUREZA JURÍDICA DO DIREITO INTERNACIONAL

HUMANITÁRIO

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná

Curitiba________ de __________________ de 2012

__________________________________________________

Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite Coordenação do Núcleo de Monografia

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: ______________________________________________________

Prof. Friedman Wendpap Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito

Supervisor: ______________________________________________________

Prof. Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito

Supervisor: ______________________________________________________

Prof. Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais, meus maiores incentivadores, pela força,

compreensão e apoio incondicional em todos os momentos.

AGRADECIMENTOS

Agradeço, em primeiro lugar, a Deus, pela presença constante em minha

vida, por sempre me guiar e me dar forças para superar todas as barreiras.

Agradeço também, a todos os professores pelos ensinamentos e incentivos

ao longo do curso, em especial ao meu orientador Prof. Friedmann Anderson

Wendpap, pela proposta do tema inovador e de tamanha relevância, bem como pela

paciência e dedicação dispensada durante todo o período de elaboração do

presente trabalho.

Aos amigos acadêmicos, que muito me apoiaram e contribuíram para o meu

desenvolvimento pessoal e profissional e a todos que contribuíram direta ou

indiretamente para a realização deste trabalho.

RESUMO

Trata-se de um tema pouco discutido no meio acadêmico brasileiro, o Direito

Internacional Humanitário ou, conforme é conhecido no meio militar, Direito

Internacional dos Conflitos Armados. É sistema internacional autônomo com

princípios e bases jurídicas próprias com o grande desafio de tentar conciliar as

necessidades militares das partes em conflito, tendo em vista a proteção da pessoa

humana. O principal órgão aplicador e divulgador do Direito Internacional

Humanitário é o Comitê Internacional da Cruz Vermelha que baseia-se nos

princípios humanitários, destinado a proteger e das assistência às vítimas de

conflitos armados e outras situações de violência

Palavras chave: Conflitos Armados. Combatente. Humanitário. Proteção. População

Civil

LISTA DE SIGLAS

CICV Comitê Internacional da Cruz Vermelha

DIDH Direito Internacional dos Direitos Humanos

DICA Direito Internacional dos Conflitos Armados

DIH Direito Internacional Humanitário

DIP Direito Internacional Público

ONU Organização das Nações Unidas

PG Prisioneiros de Guerra

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.............................................................................................. 08 2. DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO.............................................. 10

2.1 HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO................................................................. 10

2.2 ÂMBITO DE APLICAÇÃO............................................................................. 17

2.2.1 Âmbito Material.......................................................................................... 17

2.2.2 Âmbito Pessoal.......................................................................................... 18

2.2.3 Âmbito Temporal........................................................................................ 18

3. DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO X DIREITOS HUMANOS..... 27

3.1 DIREITOS HUMANOS.................................................................................. 27

3.2 ELEMENTOS DIVERGENTES E CARÁTER COMPLEMENTAR................ 28

3.2.1 Teoria Integracionista................................................................................. 28

3.2.2 Teoria Separatista...................................................................................... 30

3.2.3 Teoria Complementarista........................................................................... 30

3.3 SEMELHANÇAS ENTRE DIREITOS HUMANOS E DIREITO

INTERNACIONAL HUMANITÁRIO............................................................... 31

3.4 DIFERENÇAS ENTRE DIREITOS HUMANOS E DIREITO

INTERNACIONAL HUMANITÁRIO............................................................... 33

4. COMITÊ INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA (CICV)....................... 36

4.1 ORIGEM DO CICV....................................................................................... 36

4.1 ATUAÇÃO DO CICV .................................................................................... 40

4.2 NATUREZA JURÍDICA E FUNÇÕES DO CICV........................................... 42

5. CONCLUSÃO............................................................................................... 44

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................. 46

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1. INTRODUÇÃO

Apesar de pouco discutido no meio acadêmico brasileiro, o Direito

Internacional Humanitário ou, como é conhecido no meio militar, Direito Internacional

dos Conflitos Armados (DICA), é antigo, porém, ganhou relevância no contexto

mundial apenas recentemente.

A evolução do Direito Internacional Público deu-se através dos numerosos

conflitos internacionais ocorridos ao longo da história. E, devido ao fato de suas

regras terem sido constantemente violadas, houve a necessidade de se criar um

novo direito que regulasse essas relações, restringido o uso da força, antes

empregada de maneira ilimitada, com a finalidade de atenuar os efeitos dos conflitos

armados. Assim, surge o Direito Internacional Humanitário.

Mesmo sendo ramo do Direito Internacional Público, o Direito Internacional

Humanitário é sistema internacional autônomo, com princípios e bases jurídicas

próprias. Sendo composto por normas consuetudinárias e convencionais, como as

previstas nas Convenções de Genebra e seus Protocolos Adicionais, e na

Convenção de Haia. Tais normas visam a proteção da pessoa humana em situação

de conflito armado e regem a conduta dos combatentes, restringindo os meios e

métodos utilizados por estes nas hostilidades. Reduzindo-se assim, os impactos

causados às vítimas e aos seus bens.

Assim sendo, o grande desafio enfrentado pelo Direito Internacional

Humanitário é a tentativa de conciliação das necessidades militares das partes em

conflito, tendo em vista a proteção da pessoa humana, respeitando-se os princípios

de humanidade. Logo, as partes beligerantes devem, através de métodos certos,

atingir um objetivo esperado, minimizando os danos causados pelos conflitos.

O presente trabalho também busca fazer a distinção entre o Direito

Internacional Humanitário e o Direito Internacional dos Direitos Humanos.

Destacando suas diferenças e similitudes. Caráter complementário este que resulta

no objetivo primordial de ambos os sistemas: a proteção da pessoa humana.

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Outrossim, não há como falar em Direito Internacional Humanitário sem

ressaltar o trabalho realizado pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV),

principal órgão aplicador e divulgador do Direito Internacional Humanitário. Atuando

de maneira imparcial e, baseado nos princípios humanitários, destinado a proteger e

dar assistência às vítimas de conflitos armados e outras situações de violência.

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2. DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO

2.1 HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO

Desde a origem da civilização, a guerra sempre acompanhou o indivíduo ao

longo de sua evolução. Razão pela qual, ela está diretamente ligada à gênese e ao

desenvolvimento do próprio direito internacional, instituído para regulamentar as

relações entre as diferentes comunidades1.

Na antiguidade, devido à ausência de regulamentação da guerra, as partes

tinham total liberdade de recorrer ao uso da força para resolver os seus litígios.

Assim sendo, ao longo da história existiram situações de absoluta barbárie, não

havendo espaço a pensamentos éticos ou humanitários para com o inimigo. Com o

desenvolvimento da sociedade, crescia a preocupação por parte de algumas

civilizações no sentido de proteger as vítimas da guerra, evitando-se assim, que

populações fossem escravizadas ou dizimadas. Limitando o uso abusivo e

descontrolado da força entre os combatentes, buscando-se a preservação dos

exércitos, e ainda, com o intuito de evitar represálias, surgiu a necessidade de

submeter o conflito bélico ao domínio das leis.

A necessidade desta regulamentação da guerra já se mostrava presente em

codificações muito antigas, criando assim limitações à guerra, como se observa:

Normas sobre a guerra e os meios de se conduzir hostilidades existem desde os primórdios da civilização.Todas as culturas2 possuem tais regras, que foram repercutidas, em maior ou menor escala, em grandes obras literárias ou religiosas. (BORGES, 2006. p. 8 e 9).

1 Segundo Borges (2006, p.1): “A guerra sempre acompanhou o homem em seu processo evolutivo, dos primórdios até a época atual”.

2 Como exemplo o Código de Manu, datado provavelmente do século I d.C., que possuía normas de proibição de uso de armas pérfidas, como flechas envenenadas ou em chamas.

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Também, não é demais lembrar, as regras descritas no Código de

Hammurabi, conforme ensina Cinelli (2011, p. 31): “Na Babilônia, o Rei Hammurabi

estabeleceu o “Código Hammurabi”, que previa a proteção dos fracos contra a

opressão dos fortes e ordenava a libertação de reféns mediante o pagamento de

resgates.”

Apesar de existirem desde os tempos mais remotos acordos bilaterais

contendo regras humanitárias, somente a partir do século XIX (até então não existia

um corpo organizado e bem-estabelecido de assistência médica para os feridos em

confrontos, tampouco instituições seguras e protegidas para acomodar pessoas

feridas) estas normas encontraram-se presentes em acordos de caráter universal,

sendo aplicáveis a qualquer tempo. O que não ocorria nos acordos bilaterais, já que

nestes, as normas tinham validade determinada.

O conceito de guerra justa nasce devido à necessidade de justificativa por

parte dos Estados, da utilização da guerra como meio de resolução de suas

controvérsias.

Francisco Suarez aplica, em pleno século XVI, alguns pensamentos de São Tomás de Aquino, elaborados há três séculos de então [sic], como a visão da admissibilidade da guerra justa – ius belli – sendo um direito subjetivo do Estado soberano, limitado pelo direito das gentes (...). (KRIEGER, 2006. p. 214)

Wendpap esclarece acerca do assunto:

A disseminação do debate sobre a justeza da guerra é relativamente recente. Na antiguidade, a guerra – terribilis dea – era considerada parte da rotina dos povos e apenas a ocasional lhaneza de trato entre dirigentes das partes adversas mitigava a atrocidade. Não se cogitava a possibilidade de uma guerra, no mérito, ser injusta. A carência de debate filosófico sobre a justiça da guerra afunila as referências conhecidas a opinião de Santo Agostinho, resumível ao seguinte (Mattos, 1957, p. 330): [sic]

a) a guerra é um ato de violência, sendo geralmente um mal;

b) a guerra se torna justa quando só é possível reprimir o mal pelo uso da própria guerra;

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c) um soberano que lança mão da guerra, mesmo para defender uma causa justa, podendo defendê-la honestamente por meios pacíficos estaria participando de um ato religiosamente reprovável;

d) Deus permite a guerra por motivo de misericórdia, e como castigo algumas vezes de pecados cometidos pelos povos, e outras vezes como meio indireto de santificação. (WENDPAP, 2007. p. 232)

Ressaltando que na atualidade, o Preâmbulo do Protocolo Adicional I às

Convenções de Genebra de 1949, dispõe:

As Altas Partes Contratantes,

Proclamando seu ardente desejo de ver reinar a paz entre os povos,

Lembrando que todo o Estado tem o dever, de acordo com a Carta das Nações Unidas, de se abster, nas relações internacionais, de recorrer a ameaças ou ao emprego da força contra a soberania, a integridade territorial ou a independência política de qualquer Estado, ou de qualquer outra forma incompatível com os objetivos das Nações Unidas,

Julgando, no entanto, necessário reafirmar e desenvolver as disposições que protegem as vítimas dos conflitos armados e suplementar as medidas adequadas ao reforço de sua aplicação,

Exprimindo sua convicção de que nenhuma disposição do presente Protocolo ou das Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949 poderá ser interpretada como legitimando ou autorizando qualquer ato de agressão ou qualquer emprego da força, incompatível com a Carta das Nações Unidas (…)

A Relação internacional bélica está relacionada a dois conceitos, o Jus ad

Bellum (direito à guerra) e o Jus in Bello (direito na guerra). Segundo ensina Mônica

Teresa Costa Souza:

O jus ad bellum (Direito à Guerra) nem sempre foi um direito assegurado apenas aos Estados; ao contrário, era defendido e utilizado por particulares, que acreditavam poder declarar guerra (guerras privadas) uns contra os outros (...) e reforçado o jus ad bellum como prerrogativa exclusiva daquele que detém soberania, apenas os Estados poderiam declarar guerra e teriam assegurado esse direito. Atualmente os Estados não são mais titulares desse direito em caráter absoluto (...) a guerra passa a ser permitida apenas em caso de legítima defesa. O jus in bello (Direito de Guerra) é a regulamentação da guerra em si mesma; se condensa nas normas que determinam e limitam as condutas dos Estados em conflito. (SOUSA, 2008. p. 33 e 34)

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O autor Fabio Konder Comparato, continua:

Foi justamente para tentar uma solução normativa permanente para o problema da guerra, que se criou o direito internacional. A sua primeira sistematização deveu-se a Hugo Grotius, em sua obra De iure belli ac pacis [Das leis da guerra e paz] publicada em 1625 (...) Sua sistematização fundou-se, toda ela, no fato bélico, e comportou duas partes: o direito preventivo da guerra (jus ad bellum) e a regulamentação jurídica da situação ou estado de guerra (jus in bello). (CINELLI apud COMPARATO, 2011. p. 40)

Destarte, as experiências advindas tanto da I quanto da II Grande Guerra

Mundial serviram para mostrar que se fazia necessário superar, de forma definitiva,

a antiga sistematização de Hugo Grotius. Objetivando-se tornar o recurso à guerra

um ato ilícito para sempre, nulificando-o como um recurso para a solução de

conflitos. Ainda, observa Cinelli apud Comparato (2011. p. 44) deve-se: “estabelecer

um sistema mundial de respeito dos direitos humanos”.

Atualmente o jus ad bellum é limitado pela Carta das Nações Unidas, sendo

visto como um ilícito internacional, havendo a possibilidade de se recorrer ao uso da

força apenas em situações excepcionais. Conforme observa Borges:

(…) E mesmo no que se refere ao jus ad bellum, em casos excepcionais há a possibilidade de se recorrer ao uso da força de maneira legítima. Dessa forma, a Carta de São Francisco permite a guerra em caso de legítima defesa individual ou coletiva ou quando o Conselho de Segurança assim o considerar, tendo em vista a manutenção ou o restabelecimento da paz e segurança internacionais. Do mesmo modo, um povo que luta pelo seu direito à autodeterminação – guerras de libertação nacional – pode recorrer à força contra o Estado opressor. (BORGES, 2006. p.4)

A antiga denominação “Direito Internacional da Guerra”, dá lugar ao Direito

Internacional Humanitário, trazendo em seu bojo tanto normas convencionais, como

normas consuetudinárias daquele antigo instituto, que apesar de não codificadas,

são universalmente aceitas perante a comunidade internacional.

No que tange ao costume como fonte do DIH, leciona Mello:

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O D. Humanitário tem origem no costume internacional e é assim obrigatório para todos os estados. Em tempo de conflito armado ele cria obrigações para todos os indivíduos. (MELLO, 2004. p. 1508)

O doutrinador internacionalista Christophe Swinarski conceitua de maneira

ampla o Direito Internacional Humanitário:

(…) o “Direito Internacional Humanitário” é um conjunto de normas internacionais, que se originam em convenções ou em costumes, especificamente destinadas a serem aplicadas em conflitos armados, internacionais ou não-internacionais, que limitam, por razões humanitárias, o direito das partes em conflito a escolher livremente os métodos e os meios utilizados no combate (Direito de Haia) e que protegem as pessoas e os bens afetados (Direito de Genebra). (SWINARSKI, 1991. p. 11)

O nascimento do DIH não está atrelado ao surgimento do CICV, tendo sua

origem no costume internacional. Conforme enuncia Mônica Teresa Costa Sousa:

As primeiras leis de guerra foram conhecidas muito antes da Idade Contemporânea (quando nasce o CICV), e ainda que fundamentadas basicamente no costume, as contribuições das antigas sociedades humanas em muito colaboraram para o desencadeamento do Direito Internacional Humanitário tal qual hoje é conhecido. (SOUSA, 2008. p. 44)

Já a origem do moderno Direito Internacional Humanitário está diretamente

ligada a dois sujeitos que contribuíram de forma expressiva para as regras

humanitárias desse instituto: Francis Lieber e Henry Dunant, que com árduas e

traumáticas experiências em conflitos conceberam o conteúdo do direito

internacional humanitário.

Lieber, um professor de ciência política da Universidade de Columbia,

preparou, a pedido do Presidente Lincoln, um manual baseado na lei internacional (o

Código de Lieber3), código este que foi posto em prática pela primeira vez em 1863, 3 O Código Lieber, criado em 1863, trata-se de um documento interno concernente à condução das hostilidades, contendo normas que buscam impedir sofrimentos desnecessários e limitar a quantidade de vítimas em conflito. Acabou servindo como fonte para normativas internacionais que surgiram posteriormente.

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durante a Guerra Civil americana e deu origem àquele que viria a ser conhecido

como a lei dos conflitos armados, ou seja o “Direito de Haia”, que foi escrita sob o

ponto de vista do soldado, uma vez que tem o formato de uma declaração de

direitos e deveres do militar em um conflito. Este código foi a primeira tentativa de

estabelecer as leis e os costumes da guerra.

No ano de 1859, Henry Dunant, um empresário suíço, natural de Genebra,

seria o responsável pela criação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV).

A idéia da Cruz Vermelha nasceu no campo de batalha, com Henry Dunant, em 1859. Os horrores da guerra foram observados (...) por ele, que estava em viagem de negócios no norte da Itália (...). Dunant ficou impressionado com o sofrimento dos soldados das forças armadas francesas [, italianas] e austríacas que lutavam na Batalha de Solferino (…). O cidadão suíço improvisou, juntamente com alguns voluntários, atendimento médico para os feridos. Sensibilizado com aquela situação, escreveu o livro “Uma Recordação de Solferino”, onde sugeriu a criação de sociedades nacionais que atenderiam os feridos sem nenhuma distinção quanto à nacionalidade ou à religião. Idealizou também a criação de um tratado que possibilitasse que os governos reconhecessem o elevado fim destas instituições. (CINELLI apud PIERROTTI JR, 2007. p. 43 e 44)

A falta de esforço sistemático por parte dos exércitos, no que tange ao

atendimento aos feridos, deixados em campo de batalha a sua própria sorte, muitas

vezes saqueados, assassinados pelos habitantes locais, foi o que chocou Dunant,

que descreve as atrocidades presenciadas durante o conflito e o importante trabalho

voluntário realizado por ele e pelos habitantes daquele local no tratamento aos

enfermos, indicando iniciativas que deveriam ser tomadas a fim de evitar que

aquelas situações se repetissem. Medidas estas que foram colocadas em prática

posteriormente e que deram origem às presentes normativas humanitárias.

Krieger apresenta três iniciativas descritas por Henry Dunant, contempladas

pelo Direito Internacional Humanitário, conforme observa-se:

Havia que fundar em cada país, sociedades nacionais de socorro, equipá-las e formá-las para que assistissem aos feridos de guerra, com o objetivo de apoiar os serviços médicos com frequência insuficientes, inclusive inexistente, dos exércitos.

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As pessoas postas fora de combate por ferimentos, assim como o pessoal e os equipamentos médicos de assistência, deviam ser considerados como “neutros” e serem protegidos por um signo distintivo, que seria mais tarde o emblema da Cruz Vermelha.

Havia que propor um tratado internacional que desse força de lei às propostas acima mencionadas, e que garantisse a proteção dos feridos e do pessoal médico que os assistisse. (KRIEGER apud PEYTRIGET, 2006. p. 102)

Devido à ampla repercussão de seu relato, suas propostas influenciaram

nomes importantes da época, que juntamente com Dunant, resolvem criar um

comitê; denominado “Comitê dos Cinco”, fundado em 9 de fevereiro de 1963, como

uma comissão de investigação da sociedade de Genebra, para o bem estar público,

que objetivava examinar as idéias de Dunant e organizar uma conferência

internacional sobre sua possível implementação. Dunant era um dos cinco

integrantes do comitê. Um ano depois a conferência adotou a primeira convenção de

Genebra, composta por 10 artigos, que estabeleciam regras legais garantindo a

neutralidade e o amparo aos feridos em combate, sendo considerado a gênese do

Comitê Internacional da Cruz Vermelha, principal órgão difusor e aplicador do Direito

Internacional Humanitário, fundada apenas no ano de 1880.

Surgiu assim, o moderno Direito Internacional Humanitário (DIH), que

embora não muito divulgado no meio acadêmico, é de singular importância para a

sociedade internacional.

A criação do CICV, ocorreu em 1863 e a primeira Convenção de Genebra,

foi assinada em 1964. E desde então, muitos tratados foram firmados sob a égide do

CICV, que tem a existência enredada com a contínua evolução do DIH.

(...) o nascimento do moderno Direito Humanitário, vinculado ao CICV, modifica a situação anterior: normas bilaterais pactuadas pelos Estados tinham validade determinada: a partir da primeira Convenção de Genebra de 1864, os Estados respeitariam um acordo universal, aplicável em qualquer tempo. (CINELLI apud BORY, 2011. p. 44)

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2.2 ÂMBITO DE APLICAÇÃO

O Direito Internacional Humanitário representa normativa internacional

autônoma, em grande parte codificado, tendo como finalidade precípua a proteção

da pessoa humana, possuindo princípios, bases jurídicas e esfera de aplicabilidade

próprios. Não obstante, possua caráter complementário de todo o sistema das

normas internacionais de proteção da pessoa humana.

No que tange a aplicabilidade, convém destacar seu âmbito de aplicação,

que são: âmbito material, temporal e pessoal.

2.2.1 Âmbito Material

Este âmbito se desenvolveu devido às novas formas de batalhas que foram

surgindo ao longo dos tempos.

O DIH aplica-se somente4 nos casos de conflito armado internacional e

conflito armado não internacional, conforme leciona Borges (2006, p. 45): (…) o

Protocolo II determina que o DIH “não se aplica às situações de tensão e

perturbação internas, tais como motins, atos de violência isolados e esporádicos e

outros atos análogos (…)”.

Em relação aos distúrbios interiores e tensões internas, Swinarski afirma:

Nas duas primeiras (conflito armado internacional e não internacional), as regras do Direito Internacional Humanitário são diretamente aplicáveis e invocáveis, enquanto que nas duas últimas (distúrbios interiores e tensões internas) são invocadas ou aplicadas de maneira indireta e/ou por analogia. (SWINARSKI, 1990. p.41)

4 No caso de tensões internas e distúrbios interiores não se aplica o DIH. Contudo, o CICV tende a aplicar as normas humanitárias em tais situações.

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2.2.2 Âmbito Pessoal

Os Estados aparecem como destinatários quase que absolutos das regras

do Direito Internacional Humanitário, dividindo sua titularidade de direitos e deveres,

em relação às normas humanitárias, com o CICV. Já os indivíduos, são

considerados beneficiários desse sistema de proteção internacional da pessoa

humana, eis que não podem atuar em favor da sua própria proteção.

Importa ressaltar, no que tange ao desenvolvimento do âmbito de

aplicabilidade pessoal do DIH, houve considerável progresso, conforme afirma

Borges (2006. p. 131): (...) “o avanço obtido no âmbito pessoal é enorme, pois as

regras se aplicam a qualquer pessoa afetada por um conflito armado, sem qualquer

distinção de caráter desfavorável, incluindo disposições precisas acerca da proteção

conferida à população civil”.

2.2.3 Âmbito Temporal

Esse sistema de proteção da pessoa humana destaca-se por seu elemento

temporal, visto que não visa a proteção da vítima em qualquer tempo, mas sim em

tempo de conflito. Segundo Borges (2006, p. 47): “As normas de DIH, via de regra,

não tem caráter de continuidade temporal, isto é, elas são aplicáveis apenas a partir

da existência de um conflito armado, afastando-se sua exigência tão logo essa

situação tenha fim.”

A necessidade de se adotar a expressão conflitos armados em substituição

ao termo guerra5, surgiu após a Segunda Guerra Mundial, devido à recusa por parte

dos Estados em reconhecer o estado de guerra na maior parte dos conflitos

ocorridos na época. Deste modo, a terminologia utilizada teve como finalidade

contemplar as novas formas de conflito que surgiram, tanto internacionais como não-

5 O conceito de guerra como sendo um conflito entre dois ou mais Estados, obviamente não compreenderia todas as situações bélicas que sucederam à Segunda Guerra Mundial.

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internacionais, permitindo que um número maior de situações fossem amparadas

pelo Direito Humanitário.

O Direito Internacional Humanitário é ramo do Direito Internacional Público

que se aplica em conflitos armados internacionais ou não-internacionais, tendo como

seus componentes o Direito de Haia e o Direito de Genebra, conforme esclarece

Swinarski:

Esta definição do DIH, ou, para ser mais técnico, do direito internacional aplicável nas situações dos conflitos armados, menciona os seus dois componentes que são o direito de Haia e o direito de Genebra. Os métodos e os meios de combate configuram o conteúdo do primeiro componente e a proteção das vítimas dos conflitos armados representa a matéria do segundo. (SWINARSKI, 1991. p. 25)

Convém destacar, a opinião da doutrinadora Mônica Teresa Costa Sousa

acerca dos institutos que compõem o DIH, conforme observa-se:

(…) O Direito de Haia trataria das regras estabelecidas entre os Estados para limitar e regulamentar o uso da força; já o Direito de Genebra trataria da proteção que deveria ser dispensada às pessoas quando os Estados usassem da força como forma de resolução de controvérsias. O primeiro dá a idéia de relação Estado a Estado; o segundo, do Estado para com os indivíduos. De acordo com esse entendimento, pode-se afirmar que o Direito humanitário propriamente dito é na verdade o Direito de Genebra; já o que se denomina de Direito de Haia passa a ser visto como o Direito de Guerra, próprio para determinar as regras que conduziam a conduta dos Estados uns com os outros, em situação de conflito armado. (…) ( SOUSA, 2008. p. 33)

Apesar de possuírem finalidades distintas, por óbvio, que o Direito de Haia

ao limitar os meios e métodos de combate, indiretamente, confere proteção aos

combatentes e às pessoas atingidas pelos efeitos das hostilidades.

O Direito de Genebra é constituído pelas quatro Convenções de Genebra de

1949 e seus dois Protocolos Adicionais de 1977. Suas normas protegem certas

categorias de pessoas, que não participam das hostilidades ou que não participam

mais das hostilidades, como os prisioneiros de guerra, feridos e doentes.

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Cada Convenção refere-se à uma categoria distinta de vítimas dos conflitos

bélicos:

(…) o que resultou na celebração das quatro famosas Convenções de Genebra: a primeira, relativa à proteção dos feridos e enfermos; a segunda, quanto aos náufragos, feridos e enfermos no mar; a terceira, relativa aos prisioneiros de guerra; e a quarta, consagrando proteção aos civis em tempo de guerra. (BORGES, 2006. p. 28)

O mesmo autor citando Bugnion destaca ainda:

(...) quer se trate de militares feridos ou enfermos, de náufragos, de prisioneiros de guerra ou de civis, as vítimas sempre estão no coração deste ramo do direito, que amplamente procedeu por extensão dos mesmos princípios a um número cada vez maior de vítimas. Como todas as etapas significativas de desenvolvimento desde direito ocorreram em Genebra, costumou-se designá-lo sob o nome de direito de Genebra. (BORGES apud BUGNION, 2006. p. 29)

Importa ressaltar que, além dos indivíduos, os bens afetados ou que possam

ser afetados durante um conflito armado, ou seja, aqueles bens que não sejam

objetivos militares, também são tutelados pelo Direito de Genebra.

(…) o sistema de Genebra também protege os bens afetados (ou que possam ser afetados) pelo conflito. O propósito desta proteção não se baseia na vontade dos autores dos tratados de Genebra de constituir uma proteção a determinadas categorias de bens (...) pelo contrário, esta proteção baseia-se na convicção de que é necessário salvar dos efeitos das hostilidades determinados bens indispensáveis para a sobrevivência das pessoas protegidas (...) por essa razão protegem-se as unidades sanitárias (…) (SWINARSKI, 1990. p. 52)

Entre os bens protegidos pelo sistema de Genebra estão as unidades

sanitárias, tais como hospitais, veículos sanitários, galpões com material sanitário,

etc., ou seja, são resguardados os bens imprescindíveis para a sobrevivência das

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vítimas, bem como para a atuação daqueles que buscam dar assistência aos

enfermos.

Também é atribuída uma proteção especial aos bens que integram o meio

ambiente. Estes não deveriam sofrer danos durante os ataques, eis que são

considerados indispensáveis para a sobrevivência dos civis.

Dentre os artigos presentes nas Convenções de Genebra pode-se citar o

artigo 1° como de fundamental relevância, o qual impõe aos Estados a obrigação de

garantir que as disposições dos tratados humanitários sejam respeitadas por todos.

O referido dispositivo prescreve: “As Altas Partes Contratantes comprometem-se a

respeitar e a fazer respeitar a presente Convenção em todas as circunstâncias”.

Indubitavelmente as Quatro Convenções de Genebra6 contribuíram de

maneira significativa para o moderno Direito Internacional Humanitário. Todavia, ao

longo dos tempos, foram surgindo uma série de conflitos armados não abarcados

por àqueles institutos. Deste modo, surgiu a necessidade de se criarem regras que

regulamentassem tais situações, servindo de complemento para as normas já

existentes. Nasciam então os Protocolos Adicionais de 1977, contribuindo para a

ampliação das normas de proteção das vítimas dos conflitos armados.

Sobre os Protocolos Adicionais de 1977, enuncia Swinarski:

O Protocolo Adicional I completa e desenvolve as disposições das Convenções de Genebra aplicáveis em situações de conflito armado internacional. (…) também são desenvolvidas e complementadas por ele algumas regras do Direito Humanitário referentes aos métodos e os meios da conduta no combate (“Direito de Haia”).

O Protocolo Adicional II desenvolve e complementa, por sua vez, a normativa do artigo 3, comum às Convenções de Genebra, aplicável na situação de conflito armado não-internacional, estendendo os seus efeitos, mas salvaguardando expressamente o direito dos governos de manter ou de restabelecer a ordem pública com todos os meios de direito. (SWINARSKI, 1990. p. 38 e 39)

6 Atualmente são 165 os Estados integrantes das Convenções de Genebra, contra apenas 99 Estados que ratificaram o Protocolo Adicional I e o 89 Estados que aderiram ao Protocolo II.

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Tendo o Direito Internacional Humanitário como objetivo a proteção da

pessoa humana sem qualquer discriminação, faz-se necessário que os Protocolos

Adicionais atinjam uma universalidade semelhante à das Convenções de Genebra, a

fim de proporcionar a máxima tutela ao indivíduo em tempo de guerra.

Os Protocolos Adicionais também contribuíram de modo significativo para

casos não contemplados pelo Direito de Haia, sobretudo no que diz respeito aos

meios e métodos de combate empregados que causam danos ao meio ambiente.

Tomando por base episódios marcantes como a Guerra do Vietnã, onde a finalidade

era atacar diretamente o meio ambiente, houve a preocupação em limitar tais

métodos, visando impedir, ou pelo menos minimizar, os efeitos danosos ao meio

ambiente.

O Direito de Haia relativo às regras concernentes entre os Estados, que tem

como finalidade regulamentar os meios e métodos utilizados nos combates, foi

influenciado pelo Código Lieber, conforme enuncia Borges:

O ramo do DIH conhecido como direito de Haia, cujas disposições têm a finalidade de regulamentar a condução das hostilidades entre os beligerantes, recebe tal nome pelo fato de suas normas jurídicas essenciais terem sido originadas nessa cidade, notadamente nas duas Conferências realizadas em 1899 e 1907. Entretanto, essa corrente foi inicialmente influenciada por duas normas anteriores, criadas em outros locais: o Código Lieber e a Declaração de São Petersburgo de 1868. (BORGES, 2006. p. 23 e 24)

O Direito Internacional Humanitário destaca-se principalmente por seu

caráter protetivo, visto que sua finalidade primordial é o amparo às pessoas

humanas. Nas palavras de Swinarski:

É essencialmente esta última a que permite ao Direito Internacional Humanitário pretender ser o primeiro corpo de normas internacionais especificamente destinado a proteger a pessoa humana, na cronologia do desenvolvimento de todo o Direito Internacional Público. (SWINARSKI, 1990, p. 28)

23

Dentre as inúmeras medidas preventivas impostas pelo Direito de Genebra,

a mais essencial é o dever de divulgação das normas humanitárias pelos Estados,

tanto em tempos de paz como de guerra. Esse dever de difusão do teor das

Convenções e de seus Protocolos Adicionais, importa no conhecimento mais amplo

possível por parte dos destinatários e de todos aqueles que serão beneficiados por

esse direito. Destacando a obrigação particular de conhecimento pelas autoridades

militares, devendo incluir as regras humanitárias nos programas de instrução militar,

visando a capacitação dos membros das Forças Armadas, preparando devidamente

todos aqueles que deverão aplicar o Direito Humanitário.

Swinarski trata da importância desse dever de divulgação das normas de

Direito Internacional Humanitário:

(...) consequentemente, sem um ensino e divulgação adequados não podemos visar a meta desejada de alcançar a sua eficiência (a do DIH), ou seja, a sua validade sociológica, que importa o maduro conhecimento em uma sociedade, do dever e necessidade de respeitar suas normas, conhecimento que não é logrado facilmente se aceitamos que o Direito Internacional Humanitário é um direito de emergência que deve ser aplicado em situações excepcionais, às vezes em situações limite, cujos protagonistas são seres humanos submetidos à paixão própria do combate (...) (SWINARSKI apud CERDÁ 1991. p. 56)

A implementação nacional do Direito Internacional Humanitário é outra

barreira a ser vencida para o ideal funcionamento deste sistema de proteção aos

afetados pelos enfrentamentos bélicos. Conforme observa Swinarski (1991. p. 92):

“Para surtir realmente os seus efeitos, as regras internacionais precisam espalhar-se

na normativa interna do Estado”.

Ainda, complementa Mello (2004, p. 1508): “A melhor maneira de incorporar

o direito humanitário no direito interno é nos manuais militares”.

Importa salientar que as normas humanitárias também servem como

complemento internacional diante das falhas do direito interno dos Estados:

Bem assim, cumpre destacar outra característica deste direito, que é a de servir de complemento internacional às insuficiências, às carências e às

24

falhas do direito interno do próprio Estado, que surgem na raiz da existência de um conflito bélico em seu território. (SWINARSKI, 1990. p. 27)

O grande desafio do Direito Internacional Humanitário está na tentativa de

conciliação entre as denominadas “necessidades militares” e as exigências

humanitárias, duas finalidades contraditórias.

O resultado da conjugação entre a necessidade militar e os objetivos humanitários deve ser uma regulamentação que imponha limites efetivos ao poder bélico dos Estados sem, contudo, tornar impossível o exercício legítimo desse poder. (BORGES, 2006. p. 16)

E reitera Swinarski (1991, p. 21): “(...) a busca de uma conciliação entre as

‘necessidades da guerra’ e as exigências da humanidade, em que aquelas devem

ceder a estas.”

Dentre os princípios norteadores do DIH, pode-se destacar o princípio da

proporcionalidade, relacionado diretamente com a proteção dos civis e seus bens, e

o meio ambiente, uma vez que impõe limitações na condução das hostilidades entre

os combatentes. As partes durante o conflito, devem ter a consciência de que a

vantagem militar deverá ser maior que os danos causados por um ataque. Ou seja,

o combatente que pretende atingir um determinado alvo, deverá levar em

consideração os prejuízos decorrentes de sua ação. Caso estes sejam

desproporcionais aos ganhos militares almejados, sua investida deverá ser cessada.

Assim, preconiza o artigo 55 do Protocolo Adicional I às Quatro Convenções

de Genebra:

1. A guerra será conduzida de forma a proteger o ambiente natural contra danos extensos, duráveis e graves. Essa proteção inclui a proibição de utilizar métodos ou meios de guerra concebidos para causar, ou que possam vir a causar, tais danos ao ambiente natural, comprometendo, por esse fato, a saúde ou a sobrevivência da população.

2. São proibidos os ataques contra o meio ambiente natural a título de represália.

25

Ainda que exista por parte dos combatentes respeito pelas regras

humanitárias, a distinção entre aquilo que é alvo militar e civil, em meio a névoa da

guerra torna-se um dificuldade, devido aos artifícios de que se valem os beligerantes

para ludibriar seus inimigos.

Outro princípio humanitário que deve se destacar é o princípio da não-

discriminação, presente nas Convenções de Genebra e em seus Protocolos

Adicionais. As normas humanitárias tem por escopo proteger as vítimas de um

conflito, independentemente de raça, cor, idade, religião ou nacionalidade. A título

de exemplo, pode-se destacar:

A regra fundamental da I Convenção dispõe que, em qualquer tempo e lugar, os feridos e enfermos deverão ser respeitados e protegidos pela parte em poder da qual se encontrem, sendo-lhes concedido tratamento humano sem qualquer discriminação. (BORGES, 2006. p. 79)

Por fim, cabe destacar o caráter paradoxal do DIH. De um lado, este surge

como instituto lícito e em consonância com as normas de direito internacional. De

outro, regulamenta situações de flagrante ilegalidade.

No que tange às críticas de alguns doutrinadores concernentes ao assunto,

insta salientar:

Em um primeiro momento, pode parecer contraditório o fato de um combatente possuir normas que o protejam em caso de guerra, já que é ele o responsável direto pela condução das hostilidades.De fato, é o direito de participarem diretamente das hostilidades, sem receberem punição posterior por isso, que os diferencia dos demais indivíduos envolvidos em um conflito. Entretanto, quando esse mesmo combatente se fere ou se torna um prisioneiro de guerra, é imperativo considerar que possui alguns direitos que o protegem dos ataques das forças armadas adversárias.(BORGES, 2006. p. 69)

Juán Bautista Alberdi complementa:

(…) o direito internacional da guerra como assim o da paz não é… o direito dos beligerantes, mas sim o direito comum e geral do mundo não-

26

beligerante a respeito desta desordem que se chama guerra (…) (SWINARSKI apud ALBERDI, 1990. p. 40)

Borges ainda ressalta:

(…) não deve o DIH se preocupar com o fato de o conflito ser ou não lícito, pois sua finalidade primordial é “tentar fazer ouvir a voz da razão em situações em que as armas obscurecem a consciência dos homens e lembrar-lhes de que um ser humano, inclusive inimigo, continua sendo uma pessoa digna de respeito e de compaixão”. (BORGES apud SWINARSKI, 2006. p. 41)

27

3. DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO X DIREITOS HUMANOS

3.1 DIREITOS HUMANOS

Os direitos humanos surgem como forma de reivindicação moral, através de

lutas sociais, que tinham por objetivo a dignidade humana. Sendo inicialmente

baseados no direito natural e posteriormente inaugurados em instrumentos legais de

caráter universal, conforme esclarece Norberto Bobbio:

Os direitos humanos nascem como direitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos positivos particulares (quando cada Constituição incorpora Declarações de Direitos) para finalmente encontrar a plena realização como direitos positivos universais. (PIOVESAN apud BOBBIO, 2006. p. 108).

A internacionalização, bem como a universalização dos direitos humanos

aconteceu somente após a Segunda Guerra Mundial, com a criação da Carta da

ONU de 1945 e da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, como

resposta às barbáries ocorridas no regime nazista. Revelando o Estado como

verdadeiro transgressor deste direito, tendo em vista que o respeito pelos direitos

humanos é seu dever e sua violação enseja a responsabilidade internacional por

parte dos mesmos.

O maior infrator dos direitos humanos é o Estado; surge assim a necessidade de internacionalizá-los não apenas para proteger o homem de seu próprio estado, bem como para universalizá-los, conforme o ideal do iluminismo. O processo de internacionalização é lento e ainda se encontra em desenvolvimento, mas é a característica mais marcante deste tema no século XX, e com ela se desenvolve meios de proteção ao ser humano que é superior ao Estado. (MELLO, 1997. p. 28)

Destarte, a segunda guerra representa marco de retrocesso e evolução dos

direitos humanos. Durante a sua ocorrência houve total violação desses direitos e,

após o seu término, devido à inquietação por parte da comunidade internacional

diante da necessidade de observância dessas normas, o indivíduo surge como

personagem central no cenário internacional. Não configurando mais o Estado como

28

o único sujeito de Direito Internacional. Impondo-se limites à soberania estatal,

intervindo no âmbito nacional, de modo a resguardar tais direitos.

Louis Henkin, destacando a dificuldade de conceituação dos direitos

humanos, devido a complexidade do tema, apresenta o seu conceito:

Direitos humanos constituem um termo de uso comum, mas não categoricamente definido. Esses direitos são concebidos de forma a incluir aquelas “reivindicações morais e políticas, que, no consenso contemporâneo, todo ser humano tem ou deve ter perante sua sociedade ou governo”, reivindicações estas reconhecidas como “de direito” e não apenas por amor, graça ou caridade”. (MELLO apud HENKIN, 1997. p. 6)

3.2 ELEMENTOS DIVERGENTES E CARÁTER COMPLEMENTAR

Há divergência até os dias de hoje, no que tange à localização do DIH.

Alguns autores defendem que a disciplina é autônoma, outros entendem que a

disciplina integra o Direito Internacional dos Direitos Humanos.

O que se pode concluir é que o Direito Humanitário e os Direitos Humanos,

não se confundem, restando notórias diferenças entre eles. Entretanto, existem três

teorias que relacionam esses dois ramos do Direito.

3.2.1 Teoria Integracionista

Esta teoria sustenta que o DIH é uma subdivisão dos Direitos Humanos e

este sustenta aquele. Para o entendimento integracionista os Direitos Humanos são

a origem para o entendimento das idéias de proteção à pessoa e traduzem-se na

fusão destas normas jurídicas.

Mello é partidário dessa tese:

(...) a máxima finalidade dos Direitos Humanos e do Direito Humanitário é a proteção da pessoa humana, propõe ser o Direito Internacional dos Direitos

29

Humanos um direito único, e a separação do mesmo em ramos distintos acabará por enfraquecê-lo.(SOUSA apud MELLO, 2008. p. 103 e 104).

Entretanto, Swinarski apresenta outra concepção acerca dessa tese,

conforme observa-se:

Swinarski apresenta idéias desta escola de maneira diferenciada, embora também a denomine integracionista. Para este autor, escola integracionista Considerava que os Direitos Humanos eram parte do Direito Internacional Humanitário como primeira forma conhecida de se proteger a pessoa humana; desta maneira, os Direitos Humanos se baseavam em última instância no DIH . A escola integracionista conclui ainda que Direito Humanitário e Direitos Humanos são institutos vinculados entre si. (SOUSA apud SWINARSKI, 2008. p. 103).

E continua Swinarski:

O direito internacional humanitário é um direito de exceção, de urgência, que intervém em caso de ruptura da ordem jurídica internacional, enquanto que os direitos humanos aplicam-se, principalmente, em tempos de paz, embora alguns deles sejam inderrogáveis em qualquer para circunstância.

No direito internacional humanitário (“lex specialis”), existem regras mais pormenorizadas do que nos direitos humanos para a proteção das pessoas em situações de conflitos armados, como, por exemplo, as normas pelas quais é regida a conclusão da guerra marítima.

Ao contrário, nos direitos humanos existem certas disposições que, na prática, são difíceis de aplicar durante um conflito armado, com, por exemplo, a liberdade de reunião e de associação, assim como certos direitos econômicos, sociais ou culturais. (MELLO apud SWINARSKI, 1997, p. 140)

A crítica desta teoria, reside no fato de que ao analisar-se algumas regras

inerentes a ambos, observa-se diferenças significativas. Conforme cita Leonardo

Estrela Borges:

(...) todo o sistema normativo conhecido como direito de Haia, que rege os métodos de se conduzir as hostilidades, e que não encontra qualquer referência nas disposições de direitos humanos. Ademais, tanto um quanto outro possuem princípios e regras próprios, até mesmo pelo fato de terem surgido em contextos históricos diferentes. (BORGES, 2006. p. 36)

30

3.2.2 Teoria Separatista

Esta corrente fundamenta-se na completa distinção entre os Direitos

Humanos e Direito Humanitário, enquanto o primeiro advém das consequências da

guerra, o segundo funda-se na normatização da paz.

(…) a escola separatista ainda esclarece que a tentativa de reunião destes diferentes ordenamentos pode mesmo ser prejudicial à proteção dos indivíduos, eis que têm naturezas diversas e são absolutamente incompatíveis. (SOUSA, 2008. p. 104)

Os defensores desta corrente entendem que:

(...) as normas de direitos humanos se pautam pela defesa do indivíduo contra o próprio Estado, ou seja, contra as arbitrariedades da própria ordem jurídica interna, ao contrário do DIH, que surge e se desenvolve com a finalidade de salvaguardar o indivíduo em situações em que a própria ordem interna já não pode protegê-lo de maneira eficaz, isto é, em uma situação de conflito armado. (BORGES, 2006. p. 36 e 37)

3.2.3 Teoria Complementarista

Já a tese complementarista, adotada por Swinarski e pela doutrina

majoritária, não diferencia os Direitos Humanos do Direito Humanitário, ao contrário,

estes sistemas se complementam, apesar de serem distintos; uma vez que ambos

primam pela proteção da pessoa humana.

Enquanto o DIH regulamenta as relações entre o Estado e os indivíduos do Estado inimigo, os Direitos Humanos se voltam para a relação entre o Estado e seus próprios súditos. Isso faz que os sistemas sejam distintos, porém complementares em razão de objetivos e princípios comuns, como o princípio da inalienabilidade e o princípio da não-discriminação em função de cor, religião, sexo, etc. O que se conclui é que escola complementarista vê os dois ordenamentos de forma complementar, não excludente nem unificadora estando lado a lado na tarefa de proporcionar instrumentos específicos à proteção da pessoa humana. (SOUSA, 2008. p. 104 e 105)

31

Ou seja, estas teorias apesar de terem pontos de vista distintos, possuem o

mesmo foco, a mesma essência, ou seja, visam a proteção da vida, saúde e

dignidade das pessoas, proibindo a tortura e outros tratamentos cruéis; logo, o

objeto dos sistemas convergem para o mesmo fim.

3.3 SEMELHANÇAS ENTRE DIREITOS HUMANOS E DIREITO INTERNACIONAL

HUMANITÁRIO

Conforme se observou acima, trata-se de sistemas normativos diferentes,

entretanto, estes sistemas possuem muitos pontos em comum, o primeiro e mais

importante deles é o fato de buscar a proteção da pessoa humana, foco de suas

preocupações. Acerca do tema, comenta Cançado Trindade:

(…) Outra etapa importante no processo de aproximação ou convergência no plano normativo entre o Direito Humanitário e os Direitos Humanos é marcada pela consagração de determinadas garantias fundamentais nos dois Protocolos de 1977 adicionais às Convenções de 1949. O artigo 75 do Protocolo Adicional I às Convenções de Genebra Relativo à Proteção das Vítimas dos Conflitos Armados Internacionais enuncia, em detalhes, garantias fundamentais mínimas de que gozam todas as pessoas afetadas por tais conflitos, protegendo direitos individuais destas pessoas oponíveis a seu próprio Estado. (TRINDADE, 1997. p. 279)

Cançado Trindade destaca o afamado artigo 3 comum às quatro

Convenções de Genebra de 1949 como normativa de grande valia para a

convergência entre o DIH e o DIDH:

A adoção do artigo 3 comum às quatro Convenções de Genebra de 1949, contendo padrões mínimos de proteção em caso de conflito armado não-internacional, também contribuiu para a aproximação entre o Direito Internacional Humanitário e o Direito Internacional dos Direitos Humanos em razão de seu amplo âmbito acarretando a aplicação das normas humanitárias igualmente nas relações entre o Estado e as pessoas sob sua jurisdição (como ocorre no campo próprio dos direitos humanos); ora, é justamente nos conflitos armados não-internacionais, e nas situações de distúrbios e tensões internos [sic], pondo em relevo precisamente as relações entre o Estado e as pessoas sob sua jurisdição, que a

32

convergência entre o Direito Humanitário e os Direitos Humanos se torna ainda mais claramente manifesta. (TRINDADE, 1997. p. 278 e 279)

Existem também princípios que se revestem das mesmas características em

ambos sistemas.

(…) O princípio da inviolabilidade, por exemplo, representa o direito que cada indivíduo possui de ter a sua integralidade física e moral respeitada, seja em uma situação de paz ou de beligerância, seja vis-à-vis do seu próprio Estado ou de um Estado invasor ou ocupante.

O princípio da segurança, determina, igualmente a proibição a represálias, a penas coletivas ou à tomada de reféns.

Finalmente, o princípio da não-discriminação obriga à aplicação das normas de DIH e de direitos humanos sem distinção fundada em raça, sexo, cor, idade, nacionalidade ou escolha religiosa. (BORGES, 2006. p. 37 e 38) [grifo meu]

Insta salientar que as semelhanças entre os sistemas fizeram com que as

ONU ressaltasse seu interesse sobre o tema.

(…) na ocasião da Conferência de Teerã sobre os Direitos Humanos de 1968, a ONU, pela primeira vez, percebe a necessidade de convergência entre esses dois sistemas para melhor proteger a pessoa humana, passando a invocar frequentemente o DIH para o apoio de suas resoluções7. (BORGES, 2006. p. 38)

Ressalta Mello apud Meron (1997. p. 142): “ a idéia de humanidade tornou-

se o denominador comum do Direito dos Direitos Humanos e do Direito

Humanitário”.

7 Como exemplo Resolução 688 do Conselho de Segurança, de 5 de abril de 1991, sobre a necessidade de aplicar o DIH no Iraque, bem como a Resolução AG 1904 (XXXII-O/02) intitulada “Promoção e Respeito ao Direito Internacional Humanitário”.

33

3.4 DIFERENÇAS ENTRE DIREITOS HUMANOS E DIREITO INTERNACIONAL

HUMANITÁRIO

No que tange à origem, os Direitos Humanos e o Direito Internacional

Humanitário não se correspondem, sendo este um de seus elementos de

divergência.

As diferenças começam pelas suas origens históricas. O DIH é um direito relativamente antigo, enquanto as normas internacionais de direitos humanos são recentes, pois sempre foram consideradas assunto de jurisdição interna. É somente após a Segunda Guerra Mundial que tais normas se internacionalizaram criando a necessidade imediata de sua diferenciação. (BORGES, 2006. p.38)

Os Direitos Humanos são aplicados em qualquer tempo e local, sem

qualquer espécie de distinção entre os sujeitos possuidores desses direitos, já o DIH

é aplicado em categorias diferenciadas, em tempos específicos:

Enquanto os Direitos Humanos se aplicam sem qualquer espécie de distinção quanto aos sujeitos desses direitos, o DIH incide sobre categorias diferenciadas, o que não significa dizer que pauta sua aplicabilidade pelo caráter discriminatório. Ao contrário, um dos elementos de convergência entre Direitos Humanos e Direito Humanitário é justamente a não-discriminação. (SOUSA, 2008. p. 107)

E ainda salienta:

Raúl Emilio Vinuesa esclarece que para as situações não classificadas como conflito armado interno propriamente dito podem ser aplicadas as normas humanitárias, até mesmo porque situações como comoções internas, levantes de baixa intensidade, alteração da ordem em razão de conflitos étnicos, religiosos, ou raciais e outras formas de insurgência muitas vezes fazem que as autoridades estatais suspendam algumas garantias individuais e coletivas, e desta forma o Direito Humanitário poderia ser aplicado não para resguardar direitos individuais, mas principalmente para garantir a integridade dos cidadãos em possíveis situações de violência. (SOUSA apud VINUESA, 2008. p. 107)

34

Algumas garantias constantes nos Direitos Humanos podem ser suspensas

nos termos de algumas situações, esta é outra distinção entre as normas.

Os direitos humanos podem ser restringidos ou suspensos. A suspensão dos direitos humanos está autorizada por acordos regionais e internacionais em casos de comoções internas, situações de guerra ou em casos de violência interna. Existem certos direitos que são definidos e reconhecidos como não sujeitos à suspensão. Sem embargo, o Estado, ao declarar e suspensão de certos direitos durante estados de emergência interna não necessariamente tem levado em consideração os parâmetros estabelecidos para a efetiva observância dos direitos que não podem ser suspensos.

Ao contrário, as normas de DIH por definição, não admitem restrições nem suspensões, portanto, sequer autorizam o Estado a intentar uma interpretação unilateral com respeito a uma eventual suspensão ou restrição. (SOUSA apud VINUESA, 2008. p. 108)

Destarte, ressalta-se a importância das garantias conferidas aos indivíduos

pelos Direitos Humanos, no que tange aos exageros advindos do Estado. Já o

Direito Humanitário, por se tratar de um direito de exceção, não pode sofrer

restrições8.

(...) o DIH se aplica a situações e em tempo de conflitos armados, nas localidades onde se desenvolvem as hostilidades. As normas de direitos humanos, ao contrário, são aplicáveis em qualquer tempo e local. Contudo, algumas disposições destas normas, pela dificuldade prática de sua aplicação em uma situação belicosa, podem ser suspensas, como as liberdades de locomoção, reunião ou associação. Já as normas de DIH não admitem qualquer tipo de derrogação.[grifo meu] (BORGES, 2006. p. 39)

Até mesmo as instituições que primam pelo crescimento e difusão destes

institutos são distintas. Os direitos humanos advém de uma institucionalização,

mundial e regional, enquanto o DIH tem como principal instituição de

desenvolvimento o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV).

8 Direitos que não podem ser restringidos ou suspensos pela autoridade do Estado: o direito à vida, a proibição da tortura, os castigos e o tratamento desumano, a escravidão e a servidão, o princípio da legalidade e da irretroatividade

35

E finalmente, nota-se que a maneira de implementação e controle dos

Direitos Humanos e dos Direitos Humanitários são muito diferentes:

(…) Enquanto o DIH exige um controle espontâneo, permanente, preventivo e corretivo na prática, os direitos humanos possuem um controle a posteriori, mediante uma demanda, em um processo judicial ou quase- judicial. Entretanto, dentro da idéia de direitos complementares, é cada vez maior a convergência de aplicação de ambos, ora o DIH utilizando-se de mecanismos dos direitos humanos para sua implementação, ora os direitos humanos utilizando as instituições de DIH para sua promoção. (BORGES, 2006. p.40)

Atualmente, percebe-se a tendência dos órgãos que fazem uso dos Direitos

Humanos admitirem a probabilidade de usar o Direito Humanitário. E isso reflete na

sociedade civil, fazendo com que esta reconheça as disposições humanitárias.

36

4. COMITÊ INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA (CICV)

O CICV se empenha em diminuir o sofrimento em situações de guerra, e

promove o fortalecimento do Direito Humanitário bem como dos princípios

humanitários universais, e ainda dirige e coordena atividades internacionais de

distribuição de ajuda humanitária em situações de conflito. No entanto, ensina

Mônica Teresa Costa Sousa:

Essa visão um tanto romanceada não é a única idéia que se deve ter de uma organização que existe desde o final do século XIX, quando começou não apenas um trabalho de “solidariedade universal” mas também quando começou a codificação mais expressiva do Direito Internacional Humanitário. (SOUSA, 2008. p. 127).

4.1 ORIGEM DO CICV

Antes do final do século XIX, não havia ramo do Direito que estabelecesse

leis de guerra. Tampouco uma organização que atendesse as vítimas de guerra. O

que haviam eram organizações locais que visavam auxiliar as vitimas e os

problemas sociais decorrentes dessa. (fome, moradia, emprego, etc). Porém, Sousa

(2008. p. 128) esclarece que: “Essas organizações eram eminentemente locais,

muitas vezes formadas por mulheres que viam essas atividades exclusivamente

como caráter beneficente.”

No ano de 1859, Henry Dunant, cidadão suíço, foi responsável pela criação

do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, concomitantemente, nascia o moderno

Direito Internacional Humanitário.

Dunant, chocado com a carnificina que vira nos campos de batalha de

Solferino, onde os feridos não tinham qualquer assistência médica e ali

permaneciam os corpos expostos aos abutres, mobilizou as comunidades ao redor

para prestar esta necessária assistência aos feridos:

37

(...) cada casa havia se convertido em uma enfermaria e enquanto cada família tivesse bastante o que fazer assistindo aos oficiais que havia acolhido, consegui, já no domingo pela manhã, reunir certo numero de mulheres do povo, que realizaram o melhor que puderam, os esforços para socorrer os feridos; pois não se trata de amputações ou nenhuma outra operação, mas sim era necessário dar de comer e, sobretudo de beber a pessoas que morrerem, literalmente de fome e de sede.(KRIEGER apud DUNANT, 2006. p. 101)

E Henry Dunant continua:

(...) ademais é necessário vendar as feridas, ou lavar os corpos ensanguentados, cobertos de barro e de parasitas, devendo-se fazer tudo isso num meio de fétidas e nauseabundas emanações, entre lamentos e alaridos de dor, em uma atmosfera rescaldada e corrompida. Se formou, bem cedo, um núcleo de voluntários, e as mulheres lombardas correm até os que mais forte gritam, apesar que nem sempre sejam mais dignos de lástima (...). (KRIEGER apud DUNANT, 2006. p. 101 e 102)

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) criado em 1863, deu

origem ao Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.

Trata-se o CICV de uma organização imparcial, neutra e independente cujo objetivo

é exclusivamente humanitário. Presta assistencia às vítimas de guerra e da

violência interna, busca a proteção da vida e da dignidade destas pessoas.

Dunant, uniu-se a quatro cidadãos e formou o Comitê dos cinco, que visava

a promoção do socorro e de tratamento aos feridos em batalha. Este Comitê,

presidido por Dunant, analisou e viabilizou uma Conferencia Internacional em

Genebra, e juntou representantes dos governos de países europeus, e ainda outras

personalidades de destaque da época. Sousa (2008. p. 130): “Esse caráter misto,

(...) se mantém até hoje nas Conferências Internacionais da Cruz Vermelha e do

Crescente Vermelho”.

O comitê decide também preparar uma conferência diplomática com o objetivo de fazer que os Estados adotassem as resoluções de 1893, como normas com força de lei. (...) Em 22/08/1864, é assinada a Convenção para melhorar a sorte dos militares feridos em batalhas, surgindo desta forma o atual Direito Internacional Humanitário. (SOUSA. 2008. p. 130)

38

Como a iniciativa deste Comitê partiu da Suíça, restou justo e razoável que a

organização tivesse como símbolo, algo que marcasse esse fato. Então, optou-se

por inverter a bandeira daquele país, adotando-o como emblema da nova

organização, a inconfundível cruz vermelha com fundo branco. E para que não fosse

confundida a bandeira com o símbolo cristão, a pedido dos países islâmicos,

também adotou-se como símbolo a meia lua vermelha, sobre o fundo branco,

denominado o ‘Crescente Vermelho’. Conforme dispõe o artigo 38 da I Convenção

de Genebra de 1949:

Em homenagem à Suíça, o sinal heráldico da cruz vermelha em fundo branco, formado pela inversão das cores federais, é mantido como emblema e sinal distintivo do Serviço sanitário dos exércitos.

Contudo, para os países que já empregam como sinal distintivo, em vez da cruz vermelha, o crescente vermelho ou o leão e o sol vermelhos sobre fundo branco, tais emblemas são igualmente reconhecidos no sentido da presente Convenção.

E assim surgiu o Comitê Internacional da Cruz Vermelha/Crescente

Vermelho, cujo nome permanece até a atualidade. Desde então organizou-se nos

mais variados países as Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha. Sousa (2008. p.

131): ”Atualmente o Movimento Internacional da Cruz Vermelha é formado pelo

CICV, pelas Sociedades Nacionais da Cruz e do Crescente Vermelho e pela

Federação Internacional das Sociedades da Cruz e do Crescente Vermelho”.

Apesar de muitas sociedades atualmente se dedicarem à causa humanitária,

é notório o papel desempenhado pelo Comitê, Internacional da Cruz

Vermelha/Crescente Vermelho, como o precursor do serviço Humanitário, bem como

sendo a mais importante instituição do Direito Internacional Humanitário.

Não foi somente a Convenção de 1864 que se destacou desde a criação do

CICV, houveram outros diplomas internacionais, diplomas estes que se pode

observar no quadro abaixo:

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Quadro 1 – Principais Tratados Internacionais sobre o DIH

Tratado (Data)

Objeto ou assunto

Decl. de São Petersburgo (1868)

Projéteis explosivos e inflamáveis com peso < 400g

Convenção (II) de Haia (1899)

Munições que inflamam ou se alastram facilmente no corpo

Convenção (IV) de Haia (1907)

Leis e costumes da guerra (1ª norma sobre PG)

Convenção (V) de Haia (1907)

Direitos e deveres dos Estados e pessoas neutras (G Ter)

Declaração (XIV) de Haia (1907)

Lançamento de projéteis e explosivos a partir de balões

Protocolo de Genebra (1925)

Uso de gases asfixiantes, tóxicos e biológicos

Convenção de Genebra (1929)

Tratamento de prisioneiros de Guerra

Pacto de Washington (1935)

Prot. De instituições artísticas, científicas e monumentos

Convenção de Haia (1954)

Proteção de bens culturais em caso de conflito armado

Convenção de Genebra (1949)

Guerra Terrestre (I); Guerra no Mar (II); PG (III); Civis (IV)

Protocolos adicionais I e II (1977) às

Convenções de 1949

Conflitos Internacionais (I); Conflitos não internacionais (II)

Convenção de Genebra (1980)

Uso de armas convencionais excessivamente lesivas

Protocolos Adicionais (1980)

Fragmentos não detectáveis por raios X (I); Minas Armadas (II); Armas

incendiárias (III); Armas cegantes a laser (iv)

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Tratado (Data)

Objeto ou assunto

Convenção de Ottawa (1997)

Uso, estocagem e transferência de minas terrestres antipessoal e sua

destruição

Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (1998)

Julgamento dos crimes de genocídio,

crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crime de agressão

Protocolo Adicional III (2005) às

Convenções de 1949

Uso do cristal vermelho

Fonte: CICV - 2008

4.1 ATUAÇÃO DO CICV

Enquanto durou o período de conflito o CICV, encontrava-se à disposição

dos militares feridos bem como da população civil, notadamente aquelas que

estavam em territórios ocupados pelos inimigos.

Durante a I Guerra Mundial o CICV, promoveu ações diferenciadas, sendo a primeira organização a se preocupar com a situação dos prisioneiros de guerra, criando uma entidade especializada, a Agência Internacional dos Prisioneiros de Guerra. (SOUSA. 2008. p. 132)

Foi de grande relevância o trabalho desenvolvido pelo CICV na II Guerra

Mundial, entretanto foi grandemente criticado por sua mínima ação ante os civis

detidos em campos de concentração da Alemanha nazista.

Em 1939, o CICV criou a Agência Central de Prisioneiros de Guerra, que

desempenhava as funções:

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Centralizar toda a informação sobre os prisioneiros de guerra (anúncios de captura, traslados, etc);

Comunicar dita informação aos países de origem dos prisioneiros de guerra;

Manter a comunicação entre os prisioneiros e suas famílias (transmissão de mensagens aos familiares). (SOUSA, 2008. p. 133)

Até os dias de hoje o CICV, recebe críticas no que tange sua atuação na II

Guerra Mundial. Apesar das críticas o CICV visitava com frequência os campos onde

estavam os prisioneiros e procurava mesmo que minimamente melhorar as

condições de detenção.

Um dos fracassos amargados pelo CICV, foi a impossibilidade de visitar os

prisioneiros alemães, reclusos na então União Soviética, por formal negativa de

Moscou. Outro fracasso do CICV, no que tange à II Guerra Mundial, foi o fato de que

a população civil não possuía base jurídica que justificasse sua proteção, a solução

encontrada pelo CICV, foi a de estender à população civil a proteção que possuíam

os prisioneiros de guerra, como observa o próprio comitê:

Desde o começo das hostilidades, os beligerantes prendem a maioria dos civis inimigos que se encontram em seus respectivos territórios; o CICV consegue então que esses estrangeiros detidos unicamente em razão de sua nacionalidade sejam tratados como prisioneiros de guerra. Desta maneira, cerca de 170.000 pessoas se beneficiam desta proteção. Como estes detentos são comparados aos prisioneiros de guerra, o CICV pode desenvolver em seu favor a mesma atividade de proteção e assistência que desenvolve em favor dos prisioneiros de guerra. (SOUSA, 2008. p. 134)

A independência, a neutralidade e a imparcialidade são pré requisitos para o

desenvolvimento do trabalho do CICV. Pode-se inclusive afirmar, que tais princípios

justificam a impotência, muitas vezes confundida com indiferença. No entanto insta

salientar que:

(…) Longe de tentar qualquer ação que tivesse caráter de intervenção, o Comitê necessitava, como até hoje acontece, da expressa anuência dos Estados interessados em seu trabalho para que pudesse exercê-lo; afinal,

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é justamente o consentimento dos Estados que diferencia as ações reais de assistência humanitária das intervenções. (SOUSA, 2008. p. 137)

De maneira geral, o CICV, reconhece suas falhas nesse período.

4.2 NATUREZA JURÍDICA E FUNÇÕES DO CICV

O CICV é pessoa jurídica de direito suíço, exercendo atividades

internacionais, tendo acordos assinados com diversos Estados que lhe outorgam

certas imunidades.

A natureza jurídica do CICV:

(...) é derivada das quatro Convenções de Genebra de 1949 e dos Protocolos Adicionais de 8 de junho de 1977, que lhe conferem credenciamento com fins de laborar de forma neutra em conflitos armados internos ou internacionais. (KRIEGER, 2006. p. 104)

As funções do CICV encontram-se detalhadas no artigo 5º, incisos II e III,

dos Estatutos do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente

Vermelho.

As funções específicas do Comitê Internacional da Cruz Vermelha são: a) visita e entrevista com testemunhas a prisioneiros de guerra e civis protegidos, em particular quando estão internados ou sob custódia (art 126 da III CG e art 143° da IV CG) b) prestar auxílio a civis protegidos, prisioneiros de guerra e a população de territórios ocupados (arts 73º e 125º da III CG, arts 59°, 61° e 142° da IV CG e art. 33º do PA I); e c) proceder à busca de pessoas desaparecidas e rastreio de prisioneiros de guerra e civis e entregar-lhes correspondência familiar (art 123° da III CG, art 140º da IV CG e art 33º do PA I) (KRIEGER, 2006. p. 106)

Observa-se que através de suas funções o CICV, realiza muitas atividades

como exemplo: assistência médica às vítimas de conflitos; ajuda alimentar em

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situações de conflitos; visitas a campos de prisioneiros de guerra e locais em que se

encontram detidos civis protegidos; visita e ajuda material a pessoas detidas por

medida de segurança; trabalho de pesquisa de desaparecidos; assistência a

pessoas desabrigadas em razão de conflitos; a disseminação de regras do Direito

Internacional Humanitário, bem como o desenvolvimento e interpretação desse ramo

do Direito.

A Federação Internacional de Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente

Vermelho é a maior organização humanitária do mundo. É formada por mais de 180

Sociedades Nacionais e conta com o apoio de 100 milhões de voluntários e

membros em escala mundial. As atividades da Federação Internacional e das

Sociedades Nacionais que a formam se orientam no sentido de reduzir o impacto de

tragédias e de doenças por meio de atividades de socorro e de desenvolvimento.

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5. CONCLUSÃO

O Direito por ser fonte regulatória da vida em sociedade traz como maior

fundamento a harmonização do convívio inter social. Com base nisso, revela-se a

importância do direito internacional humanitário, o qual tem como objetivo regular a

conduta dos países em tempo de conflito armado, de modo a proteger tanto os

combatentes, como aqueles indivíduos que não participam das hostilidades. Desta

feita, pode-se concluir que as normas humanitárias jamais poderão servir de amparo

para interesses escusos ou para afetar um povo.

Percebe-se com o desenvolvimento do moderno direito internacional

humanitário, que ampliaram-se as categorias de vítimas resguardadas por esse

sistema. De uma proteção destinada apenas aos militares feridos em combate, seu

objetivo inicial, conquistada através dos esforços de um cidadão suíço atônito diante

da ausência de assistência aos enfermos e de respeito pelos princípios humanitários

durante os combates, à proteção dos civis, atualmente as maiores vítimas dos

conflitos armados.

A evolução desse instituto está atrelada ao surgimento do principal

organismo responsável pela aplicabilidade de suas normas, o Comitê Internacional

da Cruz Vermelha, que desde sua criação contribui de maneira expressiva para a

difusão do Direito Internacional Humanitário em todo o mundo.

Embora sendo o direito internacional humanitário ramo do direito

internacional com maior número de tratados e convenções, este instituto ainda é

muito criticado. Para alguns doutrinadores ele se revela até mesmo contraditório, eis

que busca regulamentar uma situação atualmente considerada ilícita.

Contudo, importa ressaltar que o Direito Internacional Humanitário não se

relaciona com o Jus ad Bellum. Esse direito não visa proibir o uso da força, nem se

atém às razões do conflito. Seu objetivo primordial é a proteção da pessoa humana,

seja ela vítima de um conflito considerado ou não lícito.

Ainda, esse sistema não anseia tornar um conflito bélico mais justo. Na

verdade, o direito humanitário contém mecanismos que visam minimizar o

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sofrimento humano ocasionado por essa circunstância. Dessa forma, ele se revela

extremamente importante ao regular a conduta dos beligerantes durante um conflito,

impedindo que estes ajam de maneira desumana, ao mesmo tempo em que confere

a devida proteção aos que dele necessitem. Sem esse direito, a mais violenta das

manifestações humanas seria ainda mais devastadora.

Ao versar sobre os objetivos dos Direitos Humanos ou do Direito

Internacional Humanitário, o principal é a proteção da pessoa humana. Destarte, é

de suma importância que as normas humanitárias sejam respeitadas para que esta

proteção seja assegurada. Para que isso ocorra, se faz necessária a sua

implementação nos ordenamentos jurídicos internos dos Estados, bem como sua

ampla divulgação não apenas no meio militar, mas também no meio acadêmico, e na

sociedade como um todo, tanto em tempo de paz como de guerra.

Deste modo, o respeito pelo estado de direito, conforme estipulado pelos

direitos humanos e princípios humanitários, não é um ornamento do direito

internacional, mas suas próprias fundações.

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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BORGES, Leonardo Estrela. Para Entender o Direito Internacional Humanitário: A Proteção do indivíduo em Tempo de Guerra. 1ª Edição. Belo Horizonte: Del Rey, 2006.

CICV, Compilação de Convenções da Haia e de Alguns Outros Instrumentos Jurídicos, 1996

CICV, Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949, 1992

CICV, Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949, 1996

CINELLI, Carlos Frederico. Direito Internacional Humanitário: ética e legitimidade na aplicação da força em conflitos armados. 1ª Edição. Curitiba: Juruá, 2011.

KRIEGER, César Amorim. Direito Internacional Humanitário. 1ª Edição. Curitiba: Juruá, 2006.

MELLO, Celso de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público, Vol. 2, 15ª Edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

MELLO, Celso de Albuquerque. Direitos Humanos e Conflitos Armados, Rio de Janeiro: Renovar, 1997.

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 7ª Edição, revista, ampliada e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2006.

SOUSA, Monica Teresa Costa. Direito Internacional Humanitário. 2ª Edição. Curitiba: Juruá, 2008.

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SWINARSKI, Christophe. A Norma e a Guerra, Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris

Editor, 1991.

SWINARSKI, Christophe. Direito Internacional Humanitário, São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1990.

TRINDADE, Antonio Augusto Cançado. Tratado de Direito Internacional dos Direitos

Humanos, Vol. 1, Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1997.

UTP, Universidade Tuiuti do Paraná. Normas Técnicas, Curitiba: UTP, 2012.

WENDPAP, ROSANE, Rosane Wendpap e Friedman Wendpap. Direito

Internacional, Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.