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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
Mrcia Regina Bll
ARTISTAS PRIMITIVOS, INGNUOS (NAFS), POPULARES, CONTEMPORNEOS, AFRO - BRASILEIROS.
FAMLIA SILVA: UM ESTUDO SOBRE RESISTNCIA CULTURAL
So Paulo 2007
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Mrcia Regina Bll
ARTISTAS PRIMITIVOS, INGNUOS (NAFS), POPULARES, CONTEMPORNEOS, AFRO - BRASILEIROS.
FAMLIA SILVA: UM ESTUDO SOBRE RESISTNCIA CULTURAL
Dissertao apresentada ao Programa de Pos Graduao em Educao Arte e Histria da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie ,como requisito parcial obteno do titulo de mestre em Educao ,Arte e Histria da Cultura.
Orientador: Prof. Dr. Marcos Rizolli
So Paulo 2007
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B935f Bll, Mrcia ReginaArtistas Primitivos, Ingnuos, (nafs), populares, contemporneos
afro-brasileiros. Famlia Silva: um estudo de resistncia cultural /Mrcia Regina Bull. - So Paulo, 2007.
451 p. : il. ; 30 cm Dissertao (Mestrado em Educao, Arte e Histria da Cultura. ) Universidade Presbiteriana Mackenzie, So Paulo,2007. Bibliografia: p.: 384 - 404 . Orientao: Prof Dr Marcos Rizolli 1. Arte naf. 2. Cultura afro-brasileira. 3. Polticas pblicas culturais. I.Ttulo.
CDD: 301
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Mrcia Regina Bll
ARTISTAS PRIMITIVOS, INGNUOS (NAFS), POPULARES, CONTEMPORNEOS, AFRO - BRASILEIROS.
FAMLIA SILVA: UM ESTUDO SOBRE RESISTNCIA CULTURAL
Dissertao apresentada ao Programa de Ps Graduao em Educao Arte e Histria da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial obteno do ttulo de mestre em Educao, Arte e Histria da Cultura.
Aprovada em
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________Prof. Dr. Marcos Rizolli Orientador
Universidade Presbiteriana Mackenzie
______________________________________________________Prof. Dr. Marcos Tarcisio Mazetto
Universidade Presbiteriana Mackenzie
______________________________________________________Prof. Dr. Jorge Anthonio e Silva
UNISO - Universidade de Sorocaba
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Aos nafs do mundo inteiro
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Agradecimentos
Aos Silva que nos propiciaram grande aprendizado.
Ao Professor Doutor Marcos Mazetto pela oportunidade de freqentar o Curso de
Educao Arte e Histria da Cultura onde se ampliaram meus horizontes.
Ao Professor Doutor Marcos Rizolli pela paciente e motivadora orientao.
Ao Professor Doutor Jorge Anthonio e Silva pela profunda viso esttica.
Ao Professor Rodrigo Augusto Prando pelos livros e incentivo.
Dra. Denise Cssia Garcia pelas informaes de Campo Belo e calorosa recepo.
Dra. Antonia Cezerillo Quinto pelo incondicional apoio e amizade nas horas mais
complicadas.
Ao Jacques Ardies pela confiana e generosidade ao emprestar sua biblioteca naf.
Ao amigo e colega Jos Maria Valente pelo nimo e alegria.
Vilma Haidar Eid pela conversa e pelas imagens de Auxiliadora.
Ao Emanoel Arajo pela disponibilizaro de tempo para atender a esta pesquisa.
A Werner Arnhold, pela disponibilizaro de arquivos privados.
Ao Dr. Walter Rocha, Secretrio de Turismo de Embu das Artes
Aos artistas Enrique Aravena, Ivonaldo Veloso de Melo, Joel Cmara, Raquel Trindade
a Kambinda, Tnia Felix e Waldomiro de Deus, pelos longos e alegres dilogos.
Ao Andr Pedro Jos Soejtoery-Kiss, pelas longas madrugadas de trabalho com
imagens
Mariana Rodrigues, Eleonora Vachi, Cinthia, Rubia e Lucia Cristina, pelo apoio.
Aos funcionrios da Biblioteca da Cmara Municipal de So Paulo e da Biblioteca do
Museu de Arte de So Paulo (MASP)
Diretoria do Museu Internacional de Arte Naf - Mian (Rio de Janeiro)
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IN MEMORIAM
Conceio Cahu, nossa querida amiga artista, que realizou o
sonho de conhecer a Frana, antes de sua ltima viagem.
Deixou saudades infinitas. Mas voc tambm faz parte desta
histria.
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Se o Brasil tivesse um sobrenome, o mais digno seria Silva, pelo que tem de ancestral, de simples e de humano como a Famlia Silva, a Famlia Brasil.
Jorge Anthonio e Silva Curador da mostra
Ars Brasilis: A famlia Silva (2006)
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RESUMO
Estudo interdisciplinar, em Arte e Histria da Cultura, que aborda a
resistncia cultural de artistas primitivos, ingnuos (nafs), populares,
contemporneos, afro brasileiros representados pela Famlia Silva.
Mediante histria de vida de seus membros, coleta de documentao de
arquivos pblicos, e privados, bibliografia, e iconografia, registra a
diversidade de sua cultura, produo artstica, e resistncia cultural:esta
em face das adversidades prprias do grupo tnico-racial, em processo
migratrio, bem como em face das polticas pblicas da cidade de So
Paulo (de 1960 a 2007), relativas s mostras de arte e cultura na Praa
da Repblica. Conclui pela necessidade de formao de grupos
interdisciplinares para seleo dos expositores de arte e artesanato para
que se possa preservar o plo artstico-cultural naquele local.
Palavras Chave: 1. Arte naf. 2. Cultura afro-brasileira. 3. Polticas
pblicas culturais.
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ABSTRACT
Interdisciplinary Study on Arts and History of Culture regarding cultural
resistance of primitive, naf, popular, contemporary, and Afro-Brazilian
artists represented by the Silvas Family. Throughout the life-history of
its members, collection of public and private document files, bibliography
and iconography, the research registers the Silvas cultural diversity,
artistic production, and cultural resistence: when facing its own ethnic
and racial adversities, in its migratory process, as well as when facing the
City of So Paulos public policies (from 1960 up to 2007), related to
Republicas Square Art and Culture Fair. It concludes defining the need of
interdisciplinary groups for the selection of art and handcrafts expositors
in order to preserve the artistic pole in that site.
Key-Words:1. Naf Art. 2. Afro-Brazilian Culture. 3. Cultural Public Policies.
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SUMRIO
1 INTRODUO ........................................................................... 13
1.1 ESCOLHA E ADOO DA METODOLOGIA DE TRABALHO ................. 14
1.2 QUESTES TICAS ................................................................... 19
1.3 NOSSOS ARTISTAS................................................................... 20
1.4 NOSSOS INTERLOCUTORES ...................................................... 22
1.4.1 Interlocutores Agentes do Sistema da Arte......................... 22
1.4.2 Interlocutores de Instituies do Poder Pblico ................. 22
1.4.3 Interlocutores Artistas ...................................................... 23
1.4.3.1 ENRIQUE ARAVENA ............................................................. 23
1.4.3.2 IVONALDO VELOSO DE MELO ............................................... 24
1.4.3.3 JOEL CMARA..................................................................... 24
1.4.3.4 RAQUEL TRINDADE ............................................................. 25
1.4.3.5 TNIA FLIX....................................................................... 25
1.4.3.6 WALDOMIRO DE DEUS........................................................ 26
1.4.3.7 CARLOS ALBERTO CAETANO (Carlo) ................................. 26
2 PONTO DE PARTIDA: PRAA DA REPBLICA ............................. 27
2.1 VISITA CASA E ATELIER DOS SILVA AOS 13 DE MAIO DE 2006.... 30
2.1.1 O Esprito de Dna. Maria de Almeida - A Histria do
Boi............................................................................................. 33
2.1.2 As msicas que Dna. Maria de Almeida cantava .................. 34
2.1.3 Joo Cndido e O Samba Contando Histrias ................... 35
3 SILVA: UM NOME CHEIO DE SIGNIFICADO ............................... 39
4 OS SILVA E SUAS RAZES ......................................................... 42
4.1 GENEALOGIA ........................................................................... 44
5 A VIDA EM CAMPO BELO ........................................................... 55
5.1 TUDO ERA MOTIVO PARA DAR FESTA .......................................... 61
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5.1.1 Como funcionava o Moambique? ....................................... 61
5.2 O PLANEJAMENTO DA VIAGEM DE MUDANA DEFINITIVA DA
FAMLIA SILVA PARA SO PAULO ..................................................... 69
6 A MUDANA DE CAMPO BELO PARA SO PAULO ....................... 71
7 POR QUE NIF? ........................................................................ 79
7.1 ARTE ..................................................................................... 84
7.2 ARTE POPULAR ........................................................................ 86
7.3 CULTURA POPULAR .................................................................. 88
7.4 ARTESANATO........................................................................... 90
7.5 ARTES LIMINARES ................................................................... 91
7.6 ARTE NAF............................................................................... 91
7.6.1 Douanier Rousseau............................................................. 93
7.6.2 Finkelstein (2001) esclarece que Naf difere de Primitivo ... 94
8 CONCEIO SILVA (1938)........................................................ 96
9 EFIGNIA ROSRIA (1937) .................................................... 136
10 GINA DA SILVA (1947)......................................................... 148
11 ILZA JACOB DA SILVA (1939)............................................... 166
12 JOO CNDIDO DA SILVA (1933) ......................................... 177
12.1 O FILHOTE ........................................................................ 178
12.2 NAS HORAS VAGAS JOO ESCULPIA E PINTAVA.EMBU DAS
ARTES E PRAA DA REPBLICA...................................................... 180
12.3 JOO CNDIDO: UM ARTISTA MOTORISTA, OU UM MOTORISTA
ARTISTA?.................................................................................... 183
12.4 EXPOSIO AFRO BRASILEIRA DE ARTES PLSTICAS NO MASP -
MUSEU DE ARTES DE SO PAULO .................................................. 186
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13 MARIA AUXILIADORA (1938-1974) ...................................... 246
13.1 IVONALDO ........................................................................... 248
13.2 WERNER ARNHOLD ............................................................... 254
13.3 VILMA HAIDAR EID ............................................................... 259
13.4 MARIA AUXILIADORA .......................................................... 263
13.4.1 EMBU DAS ARTES ........................................................... 264
13.4.2 AS COLAGENS DE CABELO E RELEVOS ............................ 269
14 MARIA DE ALMEIDA (1909 -1991) ....................................... 294
15 SEBASTIO CNDIDO (1929) ............................................. 310
15.1 SEBASTIO CNDIDO DA SILVA dados biogrficos................... 312
15.1.1 Como Sebastio Cndido comeou a pintar ..................... 314
15.1.2 OS PRIMEIROS TRABALHOS............................................ 315
16 VICENTE PAULO DA SILVA (1929-1980)....................................................334
17 SAGA DA REPBLICA: AS LEGISLATURAS DA CIDADE DE
SO PAULO DOS ANOS 60 A 2007 SOBRE AS MOSTRAS NA
PRAA DA REPBLICA............................................................... 349
18 ALGUMAS CONSIDERAES ................................................ 381
BIBLIOGRAFIA .......................................................................... 384
GLOSSRIO ............................................................................... 405
APNDICES ............................................................................... 417
ANEXOS .................................................................................... 443
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ARTISTAS PRIMITIVOS, INGNUOS (NAFS), POPULARES, CONTEMPORNEOS, AFRO BRASILEIROS.
FAMLIA SILVA: UM ESTUDO SOBRE RESISTNCIA
CULTURAL
Um dos maiores dilemas do pensamento brasileiro, no presente, compreender o homem comum 1
So os simples que nos libertam dos simplismos, que nos pedem a explicao cientfica mais consistente, a melhor e mais profunda compreenso da totalidade concreta que reveste de sentido o visvel e o invisvel. 2
1 IANNI, Octvio. Sociologia e Sociedade no Brasil. So Paulo: Alfa-Omega, 1975.p.87. 2 MARTINS, Jos de Souza. A Sociabilidade Do Homem Simples: Cotidiano e Histria Na Modernidade Anmala. So Paulo: Hucitec, 2000.
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1 INTRODUO
A Famlia SILVA 3, constituda por artistas plsticos e artesos,
representativos da cultura popular afro-brasileira, expositores na Praa
da Repblica em So Paulo, foi o objeto de estudo interdisciplinar, em
Arte e Histria da Cultura, desta dissertao.
Entretanto no pudemos deixar de incluir tambm o Direito, que
permeia os fatos aqui narrados e retrata as polticas pblicas (culturais?)
do perodo compreendido entre o final dos anos 50 e a atualidade
(2007), na metrpole de So Paulo.
Pelos caminhos da Histria da Cultura e da Arte tivemos por objetivo
adentrar as razes africanas que remanescem nas obras dos Silva, hoje
em sua terceira gerao4; registrar o percurso de suas vidas, em
biografias e cronologias, fundadas em fontes primrias e secundrias; e
proceder ao levantamento iconogrfico de suas obras, junto aos acervos
familiares, de colecionadores e de museus.
Procuramos, tambm, identificar as diferentes interfaces existentes
entre esses artistas e o denominado sistema da arte.
Essa expresso, sistema da arte, utilizado por Cauquelin (2005) 5 ,
no se refere pura e simplesmente ao aspecto econmico, da lei da oferta
e da procura, de forma que o mercado seria o fator determinante sobre as
obras. A autora esclarece que o referido mecanismo compreende o lugar e
o papel dos diversos agentes ativos no sistema: o produtor, o comprador-
3 SILVA. Silv ou Sylv - Do Latim: floresta. Tradues: Para Quenya: TAURO ou TAURON (taur floresta). Dicionrio Latino Portugus. F.R. dos Santos Saraiva; Belo Horizonte: Garnier, 10aEd., 1993. 4 Os Silva, componentes do grupo estudado, so netos de escravos. 5 CAUQUELIN, Anne. Arte Contempornea, uma introduo. So Paulo: Martins, 2005, pg.14
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colecionador ou aficionado - passando pelos crticos, publicitrios,
curadores, conservadores, as instituies, os museus (...) dentre outros.
Por essa razo, nos propusemos, mediante entrevistas, abordar
alguns dos mencionados agentes ativos do sistema da arte para maior
aprofundamento da pesquisa. Relativamente a este objetivo tivemos a
grata satisfao de encontrar crticos, marchands e colecionadores,
verdadeiras autoridades em seu segmento, que conhecem os Silva h
mais de 30 anos, e que se dispuseram a colaborar com o presente
trabalho. Tais pessoas nos proporcionaram momentos inesquecveis de
aprendizado que procuramos transcrever nestas linhas.
1.1 ESCOLHA E ADOO DA METODOLOGIA DE TRABALHO
A mincia do olhar remete para a descrio etnogrfica, mas, sobretudo, para o que Geertz chama de descrio densa afirmando-a microscpica, interpretativa e capaz de resgatar o dito do decurso da precariedade da ocasio efmera. No apenas o dito mas o observado. O Olhar. O Olhar Distanciado sobretudo um olhar activo, e criativo ( distanciamento criativo), do trabalho de reflexo do espectador - actor (...)(RIBEIRO,2004-13).
Adotamos mtodos e tcnicas de investigao em Antropologia e
Antropologia Visual. Isto porque ao identificarmos as diferentes
problemticas contidas naquele espao de investigao, a Praa da
Repblica (terreno de pesquisa), verificamos ser necessrio obter dados
pormenorizados dos artistas objeto de nosso estudo. Isto somente seria
possvel mediante o conhecimento de suas histrias de vida6. Como
6 RIBEIRO (2003 :318) menciona que a partir dos anos 70, intensificaram-se as pesquisas baseadas em histrias de vida. D destaque a algumas reas temticas, e exemplifica : os artesos e a mobilidade social (destacamos o trabalho de Bertaux e Bertaux Wiame (1980) sobre um grupo scio profissional ameaado pela industrializao - os padeiros artesanais. Para esse estudo da evoluo da padaria
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inexistem escritos sobre a maioria desses artistas populares7, e
entendemos que deveriam existir, partimos para a coleta de dados com a
finalidade no s de escrever suas biografias, mas de levantar dados
quanto s origens das mostras naquele espao pblico, relativos aos
diferentes perodos polticos vivenciados por aquele grupo, as razes do
estar ali todos os domingos com suas obras, os temas de seus trabalhos,
suas crenas, suas origens, seus anseios, suas lutas.
Evidente que os mtodos de investigao da antropologia se
prestam aos nossos objetivos e constituem ferramenta til para a
recuperao e registro de dados importantes para a Arte, para a Histria
da Cidade de So Paulo, Histria da arte, Histria da Cultura e, ao mesmo
tempo, para as Cincias Polticas, tendo em vista que o contexto da
denominada Feira de Arte, Artesanato, Antiguidades, Gastronomia,
Cultura e Lazer da Praa da Repblica8 constitui seara das polticas
pblicas do Estado, em sentido lato, e do Municpio em sentido estrito.
Entendemos ser relevante a presente investigao porque os
registros, quer oficiais, quer no oficiais, sobre diversos fatos importantes
vivenciados por esses artistas e artesos ou inexistiam, ou encontravam-
se dispersos.
artesanal em Frana, estes investigadores procuraram responder questo: Como que as pessoas se tornam padeiros ? O trabalho biogrfico orientou-se para a anlise das prticas e processos sociais. Para alm das entrevistas biogrficas de padeiros (independentes e assalariados) , recorreram tambm entrevista a um comerciante de fundos de comercio, que lhes forneceu algumas das mais importantes informaes sobre padeiros; a dados estatsticos e a estudos histricos sobre esta profisso. 7 Desde a Grcia Antiga at o sculo XIX, as autobiografias, e outros tipos de documentos pessoais, eram um privilgio das classes dominantes; Os indivduos das camadas populares, em contraposio, praticamente no tinham a oportunidade de ter suas vidas contadas por escrito, fosse por eles mesmos, fosse por outra pessoa, e muito menos v-las publicadas. Assim, o discurso sobre a sua vida fica contido na memria do seu grupo (a vila, o campo), e raramente ultrapassa esse circulo. RIBEIRO (2003:306) 8 Denominao atual da Mostra que ocorre aos sbados e domingos na Praa da Repblica.
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No se sabe ao certo, se a escassez de registros, sobre as mostras
de arte e artesanato na Praa da Repblica, Embu das Artes, e em outros
locais, aonde esteve a famlia Silva, deve-se ao preconceito dos
intelectuais , das ditas elites culturais, da cultura erudita, ou omisso
do Poder Pblico da Cidade de So Paulo, ou a ambos.
Na prtica o que existe uma grande lacuna documental, histrica,
de pesquisa, acerca das mostras nesses espaos pblicos da cidade,
acerca dos artistas e artesos que ali expem seus trabalhos, acerca do
pblico que por ali transita.
Especificamente quanto famlia Silva h tambm o fato desta ser
constituda por afro-brasileiros. Importante ressaltar que apesar dos
reconhecidos esforos de indivduos como Emanoel Arajo, ex-secretrio
de Cultura, hoje Diretor do Museu Afro Brasileiro de So Paulo, h ainda,
poucos registros sobre a produo artstica, cultural e cientfica da raa
negra. Em casos como esse, verifica-se que o recurso da Histria oral /
Historia de Vida, recuperar muitos dados que se encontram dispersos nas
diferentes memrias individuais, que podero revelar inmeras
informaes originais, pesquisa de dados primrios.
Alm do j exposto, os artistas pesquisados so pintores nafs, que,
por serem em sua grande maioria autodidatas, no-eruditos e com temas
populares, deixam de ser aceitos por muitos. Na realidade, como observou
Carl Jung, ...representam os ltimos ecos da alma coletiva em vias de
desaparecimento9.
Assim, acreditamos que a Histria oral ser a alavanca10, a
ferramenta mestra, por assim dizer, para a coleta de dados sobre a
9 FINKELSTEIN,Lucien. Brasil Naf. Arte Naf Testemunho e Patrimnio da Humanidade. Rio de Janeiro : Novas Direes,1981. 10 Nesse sentido, muitos creditam histria oral o papel de produtora de documentos em casos em que a censura, polticas governamentais ou o desligamento cultural no
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Histria de Vida desse grupo de artistas, sua trajetria de vida, desde as
origens africanas, at se radicarem em So Paulo, passando pela Bahia, e
pelas diversas cidades de Minas Gerais.
Alm do caderno de campo e do recurso da fotografia, utilizamos os
registros em udio e vdeo, para que os ambientes da pesquisa ficassem
documentados. Conforme o dito popular, acreditamos que uma imagem
vale mais que mil palavras e, por essa razo, alm dos textos, a pesquisa
constituiu-se, tambm, de coleta de imagens para que pudssemos deixar
registradas visualmente as diferentes fisionomias, os diferentes lugares, a
vasta produo artstica, e at mesmo as manchetes de jornais que nos
reportam os momentos polticos vividos.
Elaboramos um roteiro apenas com questes orientativas (vide
Apndice I), bem como ficha dos informantes (Apndice II) e partimos ao
terreno de pesquisa, no intuito de ver nossos artistas em seu local de
trabalho, de conversar com eles e com o seu pblico, de obter as
informaes necessrias ao cumprimento dos objetivos aos quais nos
propusemos.
Indispensvel foi o referencial terico de autores nacionais e
estrangeiros, entretecido aos dados de campo. O referencial terico foi a
base de onde extramos os conceitos e os dados histricos iniciais que
precisvamos para edificar a pesquisa. E durante a prpria investigao
de campo, cada informao verbal foi buscada e confirmada em
bibliografia, arquivos histricos, publicaes de jornais, filmes, msicas,
outros informantes, o que por si s, evitar que seja colocada em cheque
a validade da investigao baseada em histrias de vida, uma vez que
essa metodologia tem provocado diferentes tomadas de posio por parte
dos investigadores (RIBEIRO,2003:317).
promoveram registros (...) ou quando no se leva em considerao experincias grupais populares (MEIHY, 2005), que entendemos ser o nosso caso.
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Quanto ao campo do Direito, nos concentramos em um breve estudo
de legislao especfica: relativa s exposies (feiras), em particular da
Praa da Repblica em So Paulo, local que foi o ponto de partida da
pesquisa. Isto porque nos interessamos em verificar quais as polticas
pblicas existentes relativamente s mostras a cu aberto, em especifico
naquela Praa.
Seria impossvel falar dos Silva sem falar do cenrio e contexto em
que os conhecemos: na luta pelo espao de exposio na Praa da
Repblica, no ano de 1999, luta que envolvia a todos os expositores,
como veremos mais tarde.
Apesar de restrita s mostras em Praas Pblicas o que, em um
primeiro momento nos parecia simples, a pesquisa de legislao foi
bastante dificultada. Isto devido falta de organizao dos arquivos
pblicos, pois que inexistem bancos de dados virtuais para consulta do
perodo anterior aos anos 80, o que muito nos interessava.
Nos arquivos fsicos das diferentes bibliotecas, a indexao
tambm se encontra muito inadequada: no h conformidade de
palavras-chave, tanto na prpria redao das normas, como na forma de
catalogar os arquivos dos Dirios Oficiais do Municpio e da Cmara
Municipal de So Paulo, o que impediu o acesso s informaes.
Assim, os dados que necessitvamos foram coletados em arquivos
os mais diversos11, e podero ser de utilidade futura a outros
pesquisadores que eventualmente se interessem pela matria. Esses
podero partir de uma base de dados j sistematizada e simplificada, na
forma de cronologia legislativa.
11 Nos arquivos fsicos do DPH - Departamento do Patrimnio Histrico do Municpio de So Paulo; da Cmara Municipal de So Paulo; da AASP - Associao dos Advogados de So Paulo; da Prefeitura do Municpio de So Paulo; e nos arquivos virtuais da Municipalidade de So Paulo, disponvel em Acesso em 15 de maio de 2007.
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1.2 QUESTES TICAS
Como salienta RIBEIRO (2003:314), no mbito das cincias sociais,
nomeadamente pela utilizao das histrias de vida no processo de
investigao, o outro se tornou audvel e visvel. E prossegue o mesmo
autor12:
Conta-se, rememora pedaos do seu vivido, (re) constri a sua identidade atravs de uma interaco social com o investigador, o seu interlocutor situa-se no presente, exprime os seus receios e expectativas relativamente ao futuro.
As suas palavras so inscritas nos textos cientficos aps um trabalho de adaptao, de passagem da produo oral produo escrita ou de imagens. Daqui decorrem implicaes ticas, metodolgicas, epistemolgicas.
Quanto s implicaes ticas, faz-se necessrio mencionar que nos
municiamos de autorizaes para a publicao, para fins
didtico/acadmicos, dos contedos aqui reproduzidos que, por questes
de privacidade, poderiam enfrentar bices. Isso ocorreu junto ao MASP -
Museu de Arte de So Paulo, aonde nos comprometemos a apenas
utilizar imagens (de Pierre Verger) e textos l obtidos, para fins desta
dissertao; bem como junto a Werner Arnhold, crtico, colecionador de
arte e marchand, relativamente a excertos de correspondncias enviadas
a Pietro Maria Bardi, sobre a artista Maria Auxiliadora da Silva.
Importante tambm mencionar a verdadeira co-autoria dos
artistas da Famlia Silva, na elaborao de grande parte da presente
pesquisa. Isso porque ficamos at na dvida de como proceder, quanto
aos relatos que simplesmente transcrevemos bem como textos que os
prprios Silva produziram: suas autobiografias. Isto sem falar na
12 RIBEIRO, Jos da Silva. Mtodos e Tcnicas de Investigao em Antropologia. Lisboa: Universidade Aberta, 2003.
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grande parceria na busca de imagens e endereos de pessoas, para que
pudssemos reconstituir histrias e concretizar o trabalho idealizado.
Como a pesquisa acadmica tem a autoria da ora mestranda,
buscamos solucionar o impasse mediante a referncia direta, aos nomes
dos diferentes co-autores nos diversos textos, bem como a incluso das
autobiografias no referencial terico e na bibliografia.
Convm esclarecer que a nossa relao com os artistas da Famlia
Silva ultrapassa a relao pesquisadora/pesquisados. Constitui
colaborao, confiana e, sobretudo, grande amizade. Passamos muitos
dias, e muitas noites, contando e ouvindo histrias, examinando e
organizando inmeros documentos. Organizamos, em conjunto, muitas
exposies (1999 a 2007); os visitamos inmeras vezes na Praa da
Repblica, na Avenida Paulista Calada do Parque Trianon
(1999/2000), na Avenida Ipiranga (1999), na Praa dos Omagus, e em
suas casas. Viajamos em grupo ao interior da Frana (Chartres, Orlans,
Poitiers, Bordeaux), e a Paris (2004), e tambm a Campo Belo (Minas
Gerais-2006), Mairipor (2006), Embu das Artes (2007). Choramos com
grande pesar a perda de uma artista amiga em comum, e gargalhamos
comendo pizzas e contando histrias em finais de noites de trabalho.
1.3 NOSSOS ARTISTAS
Joo Cndido, auxiliado por sua mulher, Ilza Jacob, foi um dos
principais interlocutores para a realizao desta pesquisa. Da famlia,
detinha a maior quantidade de documentos e artigos de jornais que, aps
classificados, possibilitaram a obteno das informaes necessrias
construo histrica e biogrfica realizada13.
13 Muito entusiasmado com a pesquisa sobre si e sua famlia, a cada semana coletou mais e mais informaes: fotografias, recortes de jornais e revistas antigos, alguns j rasurados, sem o nome da matria, o nome do jornal, ou com datas ilegveis, mas que auxiliaram a memria para reportar os principais momentos dos Silva.
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Foi tambm o lder, por assim dizer, pois conseguiu convocar os
irmos para que estes tambm reunissem o maior nmero de dados para
o trabalho ora apresentado, bem como para empreender viagem e visitas
a locais (O Velho, na serra da Cantareira, Mairipor, SP; Campo Belo
(MG), dentre outros) que fizeram e fazem parte da histria dos Silva.
Por esta razo, em muitos dos textos constam mais frases de Joo
Cndido, do que dos seus irmos, pois agiu como um verdadeiro contador
de estrias e histrias.
Efignia Rosria, por sua vez, contribuiu sobremaneira na fase
final, complementando as informaes e rebuscando os velhos alfarrbios
para localizar uma pea aqui e outra ali: datas, imagens, nomes. No foi
tarefa fcil! Conseguiu tambm trazer a irm, a conhecida GINA,
carregada de bonecos, com os quais conversa e conta histrias e estrias.
Conceio Silva reuniu os seus materiais em uma pasta e tambm
escreveu uma pequena autobiografia. Pequena em tamanho, mas rica em
contedo, com parte de sua vida. Alm de documentos de mostras,
centenas de fotografias artsticas revelaram a sua beleza que conquistou
as objetivas de fotgrafos nacionais e estrangeiros. Estes at postais
comercializaram, com o seu lindo rosto.
Sebastio Cndido, o mais velho dos irmos Silva, chegou quase
no final da pesquisa, mas nem por isso sua colaborao foi menor.
Conseguiu obter com o filho, arquivos que o mesmo mantm a sete
chaves, onde, alm de sua carreira artstica, constavam informaes que
complementaram todas as narrativas. Trouxe a soluo para muitas
dvidas, o que possibilitou o preenchimento das lacunas que nos pareciam
infindveis.
Natlia Natalice foi a ltima que conseguimos entrevistar. Poetisa
e cronista, Natlia complementou informaes de todo o grupo, e nos
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trouxe poemas dedicados aos seus falecidos genitores, aos quais atribui
as qualidades artsticas da famlia.
De fato, cada qual trouxe a sua histria, a sua viso do todo, com
colorido prprio. Assim, pouco a pouco, os fatos narrados pelos diversos
personagens e interlocutores, como em um enorme quebra-cabea,
encaixaram-se, e surgiu a histria de uma original famlia de artistas
populares brasileiros: a Famlia Silva.
1.4 NOSSOS INTERLOCUTORES
1.4.1 Interlocutores Agentes do Sistema da Arte
Emanoel Arajo.Diretor do Museu Afro-Brasileiro de So Paulo. Artista Plstico ex-secretrio da Cultura de So Paulo. Ex-Diretor da Pinacoteca de So Paulo. Parque do Ibirapuera, So Paulo, SP. Tel. (11) 55 79 0593. Jacques Ardies. Galerista especializado em artistas nifs.Escritor e editor de obras sobres artistas nafs. Galeria Jacques Ardies. Rua Morgado de Matheus, 579, Vila Mariana.So Paulo, SP. Tel. (11) 5539 7500 Vilma Haidar Eid. Galerista especializada em arte popular brasileira. Presidente do Instituto do Imaginrio do Povo Brasileiro e Presidente do Conselho da Associao Museu Afrobrasil. Rua Ferreira de Arajo, 625, Pinheiros. Galeria Estao So Paulo, SP. Tel. (11) 3813 7253
Werner Arnhold. Marchand e colecionador. Foi responsvel por grande parte da divulgao do trabalho de Maria Auxiliadora no exterior.
1.4.2 Interlocutores de Instituies do Poder Pblico
SECRETARIA DA CULTURA DO MUNICPIO DE SO PAULO.Ilmo Sr. Carlos Augusto Machado Calil, Secretrio da Cultura do Municpio de So Paulo. Ex - Diretor do Centro Cultural Vergueiro. Avenida So Joo, n 473, 11 andar. Centro, So Paulo, Capital.
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SECRETARIA DE TURISMO DO MUNICPIO DE EMBU DAS ARTES. Ilmo.sr. Walter Rocha, Secretrio de Turismo do Municpio de Embu. Rua Andronico dos Prazeres Gonalves,114 Embu das Artes,So Paulo.
CASA DA CULTURA DE CAMPO BELO (MG) Dra. Denise Cssia Garcia, Ex-Diretora da Casa da Cultura de Campo Belo, Minas Gerais. Cadeira n.37 da Academia Campo-Belense de Letras. Rua Juca Escrivo, 120, Campo Belo, Minas Gerais. Tel. (035) 3831 17 34.
CMARA MUNICIPAL DE SO PAULO. Martha Campos, Assessora Parlamentar da Vereadora Myryan Athie.Palcio Anchieta, Viaduto Jacare, n 100, So Paulo, Capital. Tel. (11) 33 96 45 66
1.4.3 Interlocutores Artistas
1.4.3.1 ENRIQUE ARAVENA. Artista Plstico chileno, expositor da
Praa da Repblica.
Ilustrao 1.1.Enrique Aravena.Foto tirada por ocasio do evento em comemorao ao Ano do Brasil na Frana. BMA - Biblioteca Mrio de Andrade. So Paulo, 2005. Foto MRB.
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1.4.3.2 IVONALDO VELOSO DE MELO. Artista plstico, ex-expositor na Praa da Repblica, contemporneo e amigo de Solano Trindade (Embu) e amigo de Maria Auxiliadora da Silva.
Ilustrao 1. 2. Ivonaldo. Foto tirada na Sala Pretrito Perfeito. So Paulo, SP. 2007. Foto MRB.
1.4.3.3 JOEL CMARA. Artista Plstico h 40 anos e expositor na Praa da Repblica e Embu das Artes.
Ilustrao 1.3. Joel Cmara. Foto tirada por ocasio do evento em comemorao ao Ano do Brasil na Frana. BMA - Biblioteca Mrio de Andrade. So Paulo, 2005. Foto MRB.
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1.4.3.4.RAQUEL TRINDADE. Artista Plstica. Filha de Solano Trindade, viva de Vicente de Paula Silva.
Ilustrao 1.4.Raquel Trindade.kambinda.Foto tirada por ocasio do Centenrio de Solano Trindade.Embu das Artes,SP.Julho de 2007.Foto MRB.
1.4.3.5 TNIA FLIX. Artista plstica, amiga da falecida artista Maria Trindade Almeida da Silva.
Ilustrao 1.5. Tnia Felix. Foto tirada por ocasio do evento em comemorao ao Ano do Brasil na Frana. BMA - Biblioteca Mrio de Andrade. So Paulo, 2005. Foto MRB.
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1.4.3.6. WALDOMIRO DE DEUS. Artista Plstico co-fundador das mostras na Praa da Repblica: Participou de mostras no MASP juntamente com Maria Auxiliadora da Silva, Maria de Almeida, Joo Cndido da Silva
Ilustrao 1.6. Waldomiro de Deus. Foto extrada da Obra de Oscar DAmbrsio.Os Pincis de Deus. Vida e Obra do Pintor Naf Waldomiro de Deus.
1.4.3.7. CARLOS ALBERTO CAETANO ( Carlo). Co-fundador da Escola de Samba Unidos do Peruche, juntamente com Vicente Paulo da Silva e Joo Candido da Silva
Ilustrao 1. 7. Carlos Alberto Caetano ao lado de Joo Cndido. Entrevista especialmente elaborada para esta pesquisa, por ocasio do Centenrio de Solano Trindade. Embu das Artes, SP. Julho de 2007.
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2 PONTO DE PARTIDA: PRAA DA REPBLICA.
Ilustrao 2.1 Praa da Repblica: 30.000 m2 de rea no Centro de So Paulo. Foto de MARCOS ROSA (2000) So Paulo Vista do Cu14.
Da observao da vista area da Praa da Repblica v-se do lado
esquerdo a atual sede da Secretaria de Estado da Educao, antiga Escola
Normal Caetano de Campos e, do lado direito, o espao onde ocorre a
atualmente a denominada Feira de Arte, Artesanato, Antiguidades,
Gastronomia, Cultura e Lazer da Praa da Repblica.
A presena fsica daquela Secretaria, no entanto, no significa que
haja dilogo 15 entre o sistema da Educao e o fenmeno artstico-
cultural, representado pela referida feira, que ocorre naquela grande
14 ROSA, Marcos. So Paulo Vista do Cu. So Paulo: Caras. 2000 15 Esse fato foi observado pelo Professor Doutor Marcos Tarciso Mazetto, quando da apresentao do Projeto desta pesquisa para a qualificao.
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rea, h mais de meio sculoi, como examinaremos no decorrer desta
pesquisa.
Perguntamo-nos se deveramos trazer o "primitivo" para o nosso convvio, em pessoa e produo, ou, ao invs, reunirmo-nos a ele, na medida do possvel, em seu meio ambiente. Pois o sbito transplante desse tipo de artista de suas roas, pequenas cidades, subrbios, favelas ou pequenas reparties pblicas significa uma radical guinada, que muda o seu modo de viver e de se representar a vida. Isto, somado presso exercida pelo mercado de arte, induz sua rpida descaracterizao. (FROTA, 1975)
Centro de So Paulo, selva de pedra, poluio, marginalidade,
obras inacabadas, buracos, camels, trnsito congestionado, turistas
curiosos, e ali esto os nossos artistas reunidos na Praa da Repblica,
com sua exposio de domingo pela manh. Alguns desenham e pintam,
outros somente mostram em seus cavaletes, e em apoios junto ao cho,
algumas das obras que j produziram.
Quando ainda nem pensvamos em realizar esta pesquisa sobre os
artistas da Praa da Repblica, j refletamos acerca da importncia das
mostras que ali se realizavam sob os aspectos de arte-cultura e
educao. Mas, foi somente quando ficaram tensas, as relaes dos
expositores com o Poder Pblico, momento bastante difcil, sobretudo
para os artistas plsticos, foi que passamos a nos interessar pelo destino
da mostra e pelas histrias de vida desse grupo e seu futuro. Isso
ocorreu no ano de 1999. poca em que o ento Prefeito Celso Pitta16
16 Celso Roberto Pitta do Nascimento. Bacharel em Cincias Econmicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, com Mestrado em Economia dos Transportes pela Universidade de Leeds (UK), e graduado em Administrao avanada pela HawardBusiness School nos Estados Unidos. Eleito, em 1996, com a expressiva votao de 3.178.300 votos, ou seja, 62.28% dos votos vlidos (...) primeiro prefeito negro eleito na histria desta metrpole. evidente que uma boa administrao de Celso Pitta h de ser um bnus a mais creditado a favor dos afro-descendentes..(Oliveira, 1998)
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ordenou o esvaziamento da praa, mediante o uso de fora da cavalaria
da Policia Militar e de jatos dgua. Esse foi o dilogo.
Evidentemente, diante desse quadro, verificamos que o tratamento
ministrado aos artistas, e s suas obras, no se apresentava
minimamente adequado e conveniente ao plo artstico-cultural que foi
mantido, a duras penas (verdadeira resistncia), ao longo de quase meio
sculo, no centro histrico da cidade de So Paulo.
Entretanto, apesar de termos defendido os interesses dos artistas17,
bem como os de preservao do patrimnio artstico e cultural, que as
mostras da referida praa representam, a idia de pesquisar e documentar
a histria de vida, e a produo artstica e artesanal, especificamente da
famlia Silva, nasceu bem mais tarde.
Surgiu a partir do fato de termos verificado que poucos autores
dedicam-se ao denominado homem comum, ao homem simples, aos
Silva, observao e registro da histria das mentalidades que se
desenvolve margem das idias dominantes. No campo artstico, como
observa Lelia Frota18
, h uma resistncia quando se trata de relacionar e
exibir essas criaes ao pblico, que muitas vezes congela as artes
populares como pertencentes ao passado, enquanto qualifica a arte alta
das elites como contempornea e/ou projetada para o futuro.
Em especfico a Famlia Silva, alm de se tratar de um grupo de
artistas que expe na rua (na Praa), suas artes encontram-se dentro
de uma categoria denominada pela maioria dos estudiosos de arte nif
(ingnua), ou at mesmo de primitiva. Tal arte, por incompreenso e
desconhecimento de muitos, marginalizada dos circuitos das culturas
dominantes ou eruditas, sobre as quais discorreremos oportunamente,
com base nos estudos de Teixeira Coelho (2004).
17 Pelo fato de atuar como advogada. 18 FROTA, Lelia Coelho. Op. Cit,2005.
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A esse respeito nos reportamos mais uma vez, s ricas
observaes de FROTA (2005) que menciona na parte introdutria de
seu Dicionrio da Arte do Povo Brasileiro sculo XX que (...) as culturas
do povo so historicamente desconhecidas. Muitas de suas criaes so
at denominadas por ns de primitivas, como se fossem de grupos
tribais distantes, no espao e no tempo, das sociedades complexas,
urbanas. E a autora enfatiza: Precisamos, portanto, estudar com mais
regularidade e tornar conhecido um corpus de informaes sobre as
criaes do povo.
Como, desde h muito, j havamos identificado a Famlia Silva
dentre os vrios expositores da Praa da Repblica, de quando em
quando por ali passvamos e trocvamos algumas idias sobre as
exposies, os novos trabalhos, os sucessos e as dificuldades.
Quando finalmente decidimos elaborar a presente pesquisa e
perguntamos se os Silva estariam dispostos a participar, logo surgiu um
convite para almoo: - Vamos almoar l em casa ? Vamos fazer um
prato que minha especialidade. Disse Ilza Jacob, mulher de Joo
Cndido.
O convite era irrecusvel, tanto que foi imediatamente aceito e na
data combinada fomos casa dos Silva.
2.1 VISITA CASA E ATELIER DOS SILVA AOS 13 DE MAIO DE 2006.
Chegamos ao bairro da Casa Verde Alta, na casa dos Silva, por volta
das 13 h. Fomos recebidos, na calada, pelo artista Joo Cndido. Na
entrada a cadeira de barbeiro/ cabeleireiro, funo exercida por uma de
suas filhas. Nas paredes os anncios e imagens de tranas
(dredes19)...Ao fundo, o seu atelier com vista para a bela serra da
19 Dredes- Tranas finas.
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Cantareira, aonde ainda existe um pouco de verde permeando o casario
que resiste verticalizao da cidade.
Do outro lado da rua, bem na direo da casa dos Silva, h uma
placa: Escola Municipal de Educao Infantil Vicente Paulo da
Silva.
Joo Cndido informou (e mais tarde nos mostrou e cedeu os
documentos para a pesquisa), que a nova denominao atribuda Escola
Municipal de Educao Infantil, do Conjunto Habitacional Nossa Senhora
da Penha, localizada na ento Administrao Regional da Freguesia do ,
foi uma homenagem prestada ao seu irmo, escultor, concedida mediante
a proposta e pedido do Vereador Eurpides Sales20 . Com os documentos
em mos verificamos que foi aprovada e outorgada mediante Decreto
Municipal firmado pelo Prefeito Jnio da Silva Quadros, aos 29 de junho
de 1988, publicado no DOM de 30 de junho de 1988.
Homenagear Vicente Paulo da Silva com o nome de escola foi a feliz idia dos que crem no homem comum como construtor da Histria do seu pas.(BUENO, 1995)21 (grifamos)
No atelier dos Silva, encontramos esculturas em madeira de
demolio, em concreto, pinturas em tela, pinturas em madeira. Muitas obras
em andamento, algumas encomendadas, outras para expor na Praa da
Repblica aos domingos, e outras ainda, para atender a exposies futuras
(Parque da gua Branca, Salo Naf de Piracicaba...).
Muitos temas do dia a dia: o homem do biju, a capoeira, a festa
de reis, a gafieira , as peladas, a venda do amendoim...
20 Oficio OF.ES-584/88 Dirigido ao Secretario Municipal da Educao , Doutor Paulo Zingg aos 14 de junho de 1988. 21 BUENO, Joel Evangelista (Diretor Escolar). Biografia do Patrono da EMEI Vicente Paulo da Silva. Documento cedido pela Famlia Silva aos 13 de Maio de 2006.
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Alm das suas prprias obras, Joo nos mostrou, com orgulho,
trabalhos em madeira de seu falecido irmo, Vicente Paulo da Silva, e de sua
me, Maria Almeida Trindade da Silva.
Aps a visita ao atelier, descemos para a casa. Exalavam os temperos
da comida apetitosa... Entramos na cozinha.
Um papagaio curioso dependurado do lado de fora de uma grande
gaiola no canto da porta, ora dormia, ora circulava de um lado para o
outro, e observava, l de cima, as conversas e o movimento da cozinha.
Na grande panela, Dobradinha com feijo branco, especialidade de
Ilza Jacob Silva (mulher de Joo), acompanhamentos: salada e arroz.
No quarto ao lado da cozinha dormia uma beb, uma das netas de
Joo e Ilza. Enquanto a me trabalha a beb fica com os avs.
Durante o almoo, o resto da famlia foi chegando. A filha que
trabalha com costura, a irm Efignia, e logo aps Conceio Silva.
De conversa em conversa, foram surgindo as histrias. Histrias
preciosas da famlia, da arte, da formao da prpria cultura brasileira,
com suas razes afro-brasileiras. Sobremesa: melancia cortada do jeito da
Dna Efignia Rosria da Silva. O corte foi no meio da melancia repartindo-
a em duas partes. Uma das metades foi colocada em um prato como um
bolo. Da foram cortadas as fatias, uma a uma, como Dna Efignia fazia
quando trabalhava na Prefeitura (Escola Municipal de Educao Infantil-
EMEI), s que l, as fatias eram mais finas para poder atender a todas as
crianas.
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Ilustrao 2. 2 A cozinha dos Silva. Dobradinha com feijo branco e a melancia cortada moda de Efignia Rosaria.
Ali na cozinha, as conversas trouxeram lembranas importantes da
infncia daquela famlia. Uma delas foi a que denominamos de o esprito
de Dna. Maria de Almeida, a histria do boi, e a outras referem-se s
msicas que a me cantava e histria da Escola de Samba da qual Joo
foi fundador.
2.1.1 O Esprito de Dna. Maria de Almeida - A Histria do Boi .
Minha me era mulher que parecia homem... subia em rvore, fazia fora... Joo Cndido.
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L perto de casa, alm da estrada de ferro, tinha uma estrada
paralela, uma estrada de terra. Ali andava carro e tambm carro de boi e
boiada.
Um dia, um vaqueiro avisou que um boi, ou uma vaca (no sei...)
tinha tomado gua no ribeiro e caiu morta... Ento quem quisesse
arriscar... Podia aproveitar a carne.
A me foi l, 1 km de distncia da nossa casa, mais ou menos,
sangrou a vaca e voltou com uma bacia de carne.
Foi logo salgando e pendurando nos varais.
Meu pai depois de ver aquilo, depois de algum tempo, resolveu
ajudar e acabou carregando umas bacias tambm..!
Os vizinhos ficaram s observando, olhando, dia aps dia, pra ver se
a famlia ia morrer...
Depois de uns quatro dias, mais ou menos, como viram que
ningum morreu, comearam a aparecer com pratinhos na nossa porta -
podiam dar , para ns, um pedao daquela carne ?
2.1.2 As msicas que Dna. Maria de Almeida cantava
CONCEIO SILVA - Nossa me cantava muito. E fazia as crianas,
(ns) cantarmos tambm.
A vizinha conta seus patos pra ver se falta algum, L em casa tem muita pena, mas pato, no tem nenhum. Descendo a rua abaixo, Quando vi um pato encostado, Logo me deu vontade, de comer pato ensopado.
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2.1.3 Joo Cndido e O Samba Contando Histrias
Joo Cndido - Eu tocava surdo. A gente tinha o costume de tocar, de fazer seresta, trs ou quatro ficvamos tocando a noite toda. (tempo pensando...)
No Peruche22 tinha o batuque que acompanhava o futebol. Mas depois formou uma turma que tocava, e outra que cantava, as mulheres vinham tambm e algumas pessoas ficavam assistindo nas ruas, nos bares...
Da resolvemos formar um bloco. s vezes aconteciam certas rivalidades entre as turmas. Coisa de cime, competio. Depois formamos o cordo. Foi idia do Carlo, aquele que depois ganhou o titulo de Cidado do Samba.
Formamos o cordo do Bico Doce (bico doce linguagem da malandragem).23
Muitos negros participavam e apenas dois brancos: O Procpio e o Zibu.
Era meio cmico, mas tinha nego que nunca tinha ido cidade... Que no conhecia a cidade. S ficava no bairro. Quando o Bico Doce entrou na cidade a primeira vez, assustou um pouco.
Tinha gente que se assustava com as fantasias... Tinham outros que queriam pegar as mscaras e enfeites pra eles e dava muita confuso.
Uma vez a polcia invadiu o desfile, porque estavam fazendo desordem. Mas no tinha mulher pelada nos desfiles... Isso no tinha no.
22 Bairro de So Paulo situado na zona norte da cidade de So Paulo. 23 Bico-Doce [De bico + doce.] Substantivo masculino; 1 Bras. Arte de seduzir ou convencer, astcia, manha. FERREIRA, Aurlio Buarque de Holanda. Novo Dicionrio Aurlio da Lngua Portuguesa. 3. Edio. Curitiba: Positivo, 2004. 1 CD-ROM.
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Conceio Silva - Naquele tempo o desfile era na Avenida So Joo, na Brigadeiro Luiz Antonio, depois foi tambm para a Praa do Correio (1950 mais ou menos). (tempo pensando para se lembrar)
O pessoal ia l em casa, enchia uma bacia de gua, para molhar o cabelo, alisava o cabelo e passava uma pasta chamada...; GUMEX (!) e fazia um topete (s que os nossos eram de dois andares ! [risos] para ficar parecido com o Nat King Cole24.
Ilustrao 2.3 Fotografia Nat King Cole25
Joo Cndido - A Prefeitura dava uma verba para o desfile26. Alguns pagavam pela prpria fantasia. Eu gostava de ganhar a fantasia e no de pagar. Eu sempre fiz parte dos batuqueiros.
Conceio Silva - Eu danava no Som de Cristal, no Garito na Barra Funda e... Tambm no 28.
Joo Cndido - Naquele tempo no tinha samba - enredo. Tinha samba, tinha o Cartola, marido da Dna. Zica, o Jamelo, que est a at hoje. O Carlo teve a idia do samba - enredo: o samba contando histrias... Mas ningum quis seguir a idia do Carlo... Da, depois de um tempo, comearam a fazer isso no Rio de Janeiro, e ficou deles a idia!
i Na primeira metade do sculo XIX, o espao hoje ocupado pela Praa da Repblica era uma vasta rea, distante do ento centro da cidade, utilizada exclusivamente para exerccios militares e conhecida como Praa da Legio. Mais tarde, recebeu as denominaes Praa dos Milicianos, Praa dos Curros e Largo 7 de Abril.
Com a Proclamao da Repblica em 1889, diversos locais da cidade tiveram seus nomes alterados: o largo tornou-se Praa da Repblica. O expressivo processo de crescimento industrial e comercial da cidade de So Paulo provocou sua expanso em diversas direes. A construo do Viaduto do Ch, em 1892, facilitou a ocupao da. rea em direo Praa da Repblica, consolidando a existncia do "centro novo".
Essas transformaes urbanas marcaram a ltima dcada do sculo passado, tendo como destaque no quadro das reformas republicanas do ensino a construo da Escola Normal Caetano
24 Nathaniel Adams Coles, (Montegomery, 17 de maro de 1919 Santa Mnica, 15 de fevereiro de 1965) foi um cantor e msico de jazz norte-americano. 25Nathaniel Adams Coles. Disponvel em: < http://www.imusica.com.br/artista.aspx?id=4880.> Acesso em 20 de julho de 2006.26 Tal fato, mais tarde, verificamos tratar-se da Prefeitura de Faria Lima, na qual ficaram legalizados os desfiles carnavalescos em So Paulo, bem como institudos os concursos das Escolas de Samba. Vide item relativo ao Prefeito Faria Lima, no capitulo Saga da Repblica .
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de Campos, seguida de perto pelo seu pioneiro Jardim da Infncia.
Construda como smbolo e exemplo de qualidade de ensino e formadora de cidados conscientes, alguns de seus ex-alunos desempenharam importante papel na luta para preservar sua presena na praa, integrada ao quadro do progresso urbano.
A partir dos anos 40, alteraes urbanas ocorreram no entorno da Praa da Repblica: a implantao do projeto das grandes avenidas do prefeito Prestes Maia, a construo do 'Edifcio Esther, de caractersticas modernistas, a construo do Edifcio Itlia, ainda hoje o mais alto da cidade, e a construo da Estao Repblica do Metr.
"No incio do sculo XIX, j se fazia referncia a uma praa situada entre a chcara do Ch, de Joaquim Jos dos Santos, mais tarde Baro de Itapetininga, _ a chcara do general Arouche. Por ser um local amplo e se encontrar afastado do centro da cidade era utilizado para exerccios militares, sendo conhecido como Praa da Legio, posteriormente denominada Praa dos Milicianos. Sua transformao em rea de recreao pblica ocorreu em 1817, orientada pelo engenheiro militar Daniel Pedro Muller, com a construo de anfiteaatro de madeira para realizao de touradas, cavalhadas e circo de cavalinhos. Nesse perodo, tornou-se conhecida como Praa dos Curros.
PERODO: 1860-1904
Com a deteriorao do anfiteatro de madeira e o fim das touradas e cavalhadas, a praa passa a ser o espao de treinamento de cocheiros e de animais destinados trao de veculos. Sua denominao alterada para Largo 7 de Abril em 1865. Com o advento do governo republicano, vrios locais da cidade tiveram seus nomes alterados: o largo passou a denominar-se Praa da Repblica. A ocupao da regio alterou-se rapidamente com a formao do "centro novo", consolidado com a inaugurao do Viaduto do Ch. Em 1894, o marco arquitetnico Escola Normal de So Paulo, mais tarde Escola Normal Caetano de Campos, foi inaugurado. Posteriormente, foi construdo anexo a ele o Jardim da Infncia. PERODO: 1905-1940 A rea verde da praa remodelada em 1905, na gesto do prefeito Antnio Prado, com a construo de canteiros, tanques, pontes e caladas. A cidade ganha um novo ponto de encontro para as famlias dos bairros circundantes e para os estudantes das escolas da regio, principalmente os da Faculdade de Direito, que faziam cantorias e recitativos diante da herma de lvares de Azevedo. Em 1912, inaugura-se o coreto do jardim. No final da dcada de 30, o prefeito Prestes Maia implanta o projeto das grandes avenidas, alterando o espao da praa e seu entorno. Inicia-se, assim, a construo do primeiro arranha-cu modernista, o Edifcio Esther, e o Jardim da Infncia so demolidos para o prolongamento da Avenida So Lus.
O Cine Repblica foi inaugurado em 1921, com uma apresentao do cmico Grock. Depois de quase 15 anos de funcionamento, o cinema foi desativado e, em seu lugar, instalada a Recebedoria Federal. Quando esta repartio mudou-se para a Rua Florncio de Abreu, o local foi alternadamente ocupado para a promoo de bailes de carnaval e outros usos como o de rinque de patinao. O Cine Repblica foi reinaugurado em 1952, com a projeo do filme "O Manto Sagrado", pioneiro do processo cinemascope no Brasil e do uso da tela panormica, considerada a maior do mundo em 1955. Sua demolio ocorreu em 1978, em virtude das obras do Metr.
No final da dcada de 40, desenvolveu-se um comrcio informal de colecionismo, com troca e venda de selos, moedas e medalhas.Vinte anos mais tarde, pintores e artesos descontentes com o trabalho das galerias de arte da cidade, que os distanciavam do pblico, elegem a praa como local para exposio dos seus trabalhos. Em 1967 somente ficaram legalizadas as mostras que espontaneamente ali se realizavam , quando a Prefeitura criou a feira de arte e artesanato aos domingos, conhecida como "feira hippie", como veremos em capitulo prprio.
PERODO: 1941-1994
A Avenida Ipiranga inaugurada em 1941, reduzindo a rea verde da Praa da Repblica. Aos domingos, colecionadores passam a ocupar o local com a feira de filatelia e numismtica. No final da dcada de 60,artistas plsticos e artesos, pintores em sua maioria, elegem a praa para
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expor e vender seus trabalhos diretamente ao pblico, na "feira hippie", distante do circuito das galerias de arte. tambm dessa poca a inaugurao do Edifcio Itlia, ainda hoje o mais alto da cidade. Poucas alteraes ocorreram at 1978, quando se iniciou a construo da Estao Repblica do Metr. Alguns prdios foram demolidos, rvores transplantadas, integrando o trecho da Rua 7 de Abril ao atual desenho da praa.
Manifestaes na Praa da Repblica
A Proclamao da Repblica ocasionou a primeira manifestao poltica: o senador Souza Queiroz, residente onde hoje est o Edifcio Esther, reuniu amigos armados, na expectativa de um ataque que acabou no acontecendo. J em 23 de maio de 1932, na esquina da praa com a Rua Baro de Itapetininga, uma multido avanou contra a sede da Legio Revolucionria, sendo recebida bala. Essa manifestao culminou na morte dos estudantes Martins, Miragaia, Drusio e Camargo, homenageados posteriormente com a sigla MMDC, dada ao movimento lder da Revoluo Constitucionalista eclodida em 9 de julho. Em 1964, a praa foi o ponto de partida da Marcha da Famlia, em direo Praa da S, e, em 1968, transformou-se no palco das manifestaes estudantis contrrias ao regime militar. Foi palco das reivindicaes pelas eleies diretas no decorrer de 1984.
Estao Repblica do Metr Ao se projetar o Metr, a situao urbana central da praa proporcionou a implantao da Estao Repblica, conexo das linhas sudeste - sudoeste e leste-oeste, esta j em operao. O projeto e a construo dessa estao foram condicionados necessidade de preservar a rea verde da praa com seus monumentos e conservar os edifcios pblicos e privados de grande representatividade. Assim, foi localizada na rea correspondente ao ltimo quarteiro da Rua 7 de Abril e sua superfcie integrou-se como calado ao novo desenho da praa. A estao foi edificada em quatro nveis: um nvel de acesso geral, um intermedirio entre as duas linhas e finalmente os dois nveis das plataformas de acesso s duas linhas. Praa da Repblica - Cadernos da Cidade de So Paulo- n13. Sao Paulo: ICI, 1995.
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3 SILVA: UM NOME CHEIO DE SIGNIFICADO.
SILVA. Do Latim Silva. Floresta. S.f. 1. Bot. Designao comum de diversas plantas medicinais da famlia das rosceas (gnero Rubens); Silveira, sara. 2. Ant. Selva (1) 3. Composio potica onde versos de 10 slabas alteram com versos de seis.Miscelnea literria ou cientifica. 5. Cilcio de arame. 6. Ornato da gola, do peito ou do canho das fardas, inspirado na forma das folhas e das flores. 7. Mancha de forma alongada ao lado das ventas do cavalo. 1
SILVA 2 [do antr. Silva] El. S.f. Us na loc. Da Silva. Da Silva. Brs. Fam. Loc. (precedida, em geral de um adjetivo diminutivo) com a qual se procura dar nfase ao que se afirma: o homem esta rico, riquinho da silva. que o sujeito est doido para ser governo. Doidinho da silva..
SILVA tambm a terceira pessoa do presente do verbo SILVAR.SILVAR. [do latim sibilare, por uma f. metattica silbare]1. produzir com a boca, ou com instrumento,
assoprando, som agudo e prolongado. 2. Assobiar, sibilar: o vento silvava anunciando o furaco. A locomotiva silva2
Ao buscarmos em dicionrios etimolgicos e enciclopdias verificamos
que Silva possivelmente constitua o mais difundido apelido3 de famlia nos
pases de lngua portuguesa. Sua origem claramente toponmica, sendo
1 FERREIRA, Aurlio Buarque de Holanda. Novo Dicionrio Aurlio da Lngua Portuguesa. 3. Edio. Curitiba: Positivo, 2004. Pg. 1846. 2 VIEIRA, Jos. Sol de Portugal, Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 1918. Pg.144. Apud FERREIRA, Aurlio Buarque de Holanda..op.cit.Pg. 1846.
3 Apelido: (...) 1. Nome de Famlia. (sobrenome). Dicionrio de Lngua Portuguesa Contempornea. Academia das Cincias de Lisboa, Fundao Calouste Gulbenkian.Lisboa: Academia de Cincias e Editorial Verbo, 2001. Vol.1.
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derivado diretamente da palavra latina silva que significa selva, floresta ou
mata.4
A motivao para a denominao Silva controversa e de difcil
verificao, todavia a maioria dos estudiosos da onomstica convergem em
apontar que o apelido (sobrenome) surgiu para designar pessoas que viviam
afastadas de centros urbanos. possvel, porm, verificar que a popularidade
deste sobrenome remonta ao sculo XVII em Portugal, e tambm no Brasil.
Acredita-se que tenha se tornado o sobrenome mais difundido no Brasil
por um srie de fatores, como a adoo por escravos e crianas filhas de pais
incgnitos.Tambm foi largamente adotado por pessoas que, chegadas ao
Brasil, queriam comear uma nova vida, apagando vnculos com o passado
na Europa, aproveitando-se do relativo anonimato que o sobrenome
proporcionava (e ainda proporciona).
No nosso caso, o sobrenome de nossos pesquisados, componentes da
famlia SILVA, por si prprio, constitui um sinal marcante do qual emana o
naf , o simples, o homem comum, do povo, ao mesmo tempo o natural, o
nato, algo de raiz. Pode-se dizer que Silva aquele que se encontra em seu
estado natural, em estado de liberdade.
Nesse sentido, os Silva so independentes, sem os grilhes dos
intelectualizados. Trazem, de dentro de si, de seus sentimentos, seu
imaginrio e memria, figuras de mltiplas cores. Roger Thilmany, crtico de
arte belga, mencionado por ARDIES (2005)5 ao falar dos artistas modernos,
menciona a asfixia da repetio, da banalidade, e da cerebralizao secante,
por demais presentes nos dias de hoje. Da a aspirao por um ar fresco, a
volta s origens, para poder escapar desse estado de coisas, encontrada na
arte naf.
4 Ibdem, VOL. II. 5 ARDIES, Jacques. Arte Naf. (Coletnea de textos). Encontros Estticos. Organizador: Jorge Anthonio e Silva. So Paulo: Conjunto Cultural da Caixa, 2005.
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H perfeita harmonia entre os integrantes da famlia Silva, a sua arte e
seu nome: coerncia do ser com a representao esttica de cada qual.
Nome to comum em pessoas genunas, originais, ingnuas que realizam
uma arte que tambm poderamos chamar de silva.
Trata-se de sobrenome popular, em artistas dedicados arte popular,
(ingnua). A famlia Silva defende, talvez mesmo sem talvez saber, um
mundo livre de saberes inatos, intuitivos, instintivos, espontneos. Kant dizia
que a ingenuidade a expresso da originria sinceridade natural da
humanidade contra a arte de fingir, que se tornou uma segunda natureza
(Crit. Do Juzo 54). 6 A ingenuidade no deve ser confundida com a
simplicidade franca, que no dissimula a natureza s porque no compreende
o que a arte de viver em sociedade. antes uma natureza que se faz
presente ou se revela na prpria arte (ibid 54) 7.
Os Silva trazem para o mundo material signos de sua natureza, de
liberdade e autonomia. No buscam assemelhar-se aos modismos, s
tendncias estticas deste ou daquele momento. Os Silva representam a
ancestralidade que percorre os tempos, a natureza em sua essncia, os
deuses impetuosos de mltiplas origens, o extravasar do contido em suas
almas. Na liberdade de seus seres transferem matria seus sentimentos,
sem a preocupao do rigor tcnico em suas criaes8. Inventam a sua
linguagem com os seus prprios meios. Os Silvas nos transmitem vibrao,
talvez do silvar de seus coraes e mentes, energia, poesia, e um certo
perfume de inocncia encantador e contagioso9.
6 ABBAGNANO, Nicola. Dicionrio de Filosofia. So Paulo: Martins Fontes. 2003 7 Ibdem. 8 FOURNY, Max. lbum Mondial de la peinture Naive. Paris: Herva, 1990. 9 ARDIES, Jacques. Arte Naf. (Coletnea de textos) in:Encontros Estticos.Organizador: Jorge Anthonio e Silva. So Paulo: Conjunto Cultural da Caixa, 2005.
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4 OS SILVA E SUAS RAZES.
A Famlia Silva possui as razes africanas de seus ancestrais,
homens e mulheres de raa negra, que, no Brasil, trabalharam como
escravos, a servio dos senhores de engenho na Bahia. Parte deles
migrou para o interior de Minas Gerais (Campo Belo, Divinpolis) para o
trabalho na roa, na cultura do caf, nos canaviais, com o gado, e,
posteriormente, na estrada de ferro... 1
Os Silva, aps algumas dcadas, mudaram-se para a Capital e
para o interior do Estado de So Paulo, na busca de realizar sonhos. Os
sonhos da cidade grande, como muitos outros o fizeram.
Das pitorescas histrias de vida dos Silva verifica-se a sofrida luta
pela sobrevivncia, as crenas nos santos catlicos mescladas s crenas
nos Orixs e demais divindades do Candombl, as curas pelas ervas e
pelas bnos dos santos, a transformao dos materiais pela
criatividade da mente instrumentalizada pelas mos2, a ginga, a
sensualidade, a musicalidade.
O dia a dia dos membros da Famlia Silva foi sempre alimentado
pelas artes: o entalhe na madeira das carroas de boi, j executados
pelo av (Jos de Almeida) em Sorocaba; as msicas tocadas no
acordeom, de sete baixos, do pai; as esculturas em dormentes das
estradas de ferro em Campo Belo; as modelagens de peas em cermica,
feitas s escondidas, nos intervalos de trabalho nas olarias de Itapecerica
da Serra; as capoeiras em ferro-cimento; as bonecas de retalhos
1 Rede Mineira de Viao (Campo Belo-MG). 2Para Leonardo da Vinci la pittura e cosa mentale . a mente que cria e gera a obra de arte. A Arte a expresso da representao mental. No caso especifico da arte, denominada popular, muitos artistas trabalham com materiais que esto no seu entorno. Criam a arte a partir dos materiais disponveis. A cultura material vai permitir a construo dos signos. O domnio da matria flagrante. O popular detm o signo e busca a materialidade.O fazer vai instruir o pensamento e este cria e transforma os materiais em arte.
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coloridos e os bordados da me preta, Maria de Almeida; os desenhos
a carvo nas paredes e nos papis; os "nifs"3 pintados em telas; a
poesia... as danas do folclore afro-brasileiro, as cantigas, sem falar
nas engraadas e comoventes histrias e estrias transmitidas de
gerao em gerao.
Na realidade, as diferentes expresses artsticas da famlia Silva
renem um verdadeiro complexo de elementos simples, retratam gente
simples, e transformam o simples em sonhos, em magia de formas e
cores.
No foi sem razo, que muitas das exposies, em que
participaram os Silva e outros artistas nafs, idealizadas por Pietro Maria
Bardi4 e seus contemporneos, chamaram-se Festa de Cores56, Mito
e Magia das Cores78, Arraial das Cores9 ....
Histrias e experincias de vida, boas e ruins, so transformadas
pelos Silva e representadas no campo esttico.
Cada um deles possui arte prpria, mas, ao mesmo tempo,
relaciona-se com o todo, em harmnica unidade com o seu cl. A seu
4 Pietro Maria Bardi, jornalista e critico de arte italiano, casado com a arquiteta Lina Bo, que em conjunto com Assis Chateaubriand, montaram juntos um museu h muito tempo idealizado:O MASP - Museu de Arte de So Paulo. De 1947 a 1996 Bardi cria e comanda o Museu de Arte de So Paulo, MASP. Paralelamente, mantm sua atividade de ensasta, crtico, historiador, pesquisador, galerista e marchand. 5 Festa de Cores foi o nome dado mostra organizada por Pietro Maria Bardi, em 1975 no MASP - Museu de Artes de So Paulo, com artistas nifs. Coletiva com a participao de diversos membros da famlia Silva bem como Raquel Trindade (filha de Solano Trindade). So Paulo, SP. 6Festa das Cores. Mostra de Maria Auxiliadora da Silva no Museu de Arte de Goinia. Goinia, Gois. 1984. (Pstuma) 7 Mito e Magia del Colore. Nome do catalogo e da mostra itinerante iniciada em Npoles e finda no Brasil, organizada por Werner Arnhold em conjunto com Pietro Maria Bardi, e Emanuel von Lauenstein Massarani 8Mito e Magia del Colore, Salo Nobre do Palcio Joo Ramalho. Paco Municipal da Prefeitura Municipal de So Bernardo do Campo Coletiva de nifs brasileiros. Itlia maio-julho (em Npoles), e no Brasil em Dezembro de 09 a 16 de 1982. Organizao de Walter Jos Demarchi e outros. So Bernardo do Campo, SP. Mostra Coletiva8 9 Arraial das Cores.Galeria de Arte Convivncia.Campinas, SP. Mostra a qual participou Gina da Silva (vide cronolgico da artista).
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modo protegem-se mutuamente, e, de forma herica, resistem aos
embates da existncia escudados por suas ingnuas artes.
4.1 GENEALOGIA
Ilustrao 4.1. rvore Genealgica da Famlia Silva. Bisavs: Maximiniano Felipe Florentino e Francisca Maria da Conceio (ambos de famlias de escravos comercializados no Estado da Bahia e no Estado de Minas Gerais) Desenho executado por Joo Cndido da Silva, aos 13 de Maio de 2006, por ocasio de visita que realizamos sua casa no Bairro da Casa Verde - Cantareira, para explicar a formao da famlia e enumerar os seus 21 irmos. Todos filhos de Jos Cndido da Silva que j era pai de 3 filhos e com Maria Trindade de Almeida Silva teve mais18 filhos.
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Pertencem famlia Silva a reconhecida pintora Maria Auxiliadora
da Silva (1935 - 1974), cuja biografia foi escrita por BARDI10. O escultor
Vicente Paulo da Silva (1930-1980) marido de Raquel Trindade a
kambinda - filha de Solano Trindade (1920-1974), o poeta que criou o
Teatro Experimental do Negro em Embu das Artes; Benedito da Silva,
arteso e pintor (1953-1998) , Sebastio Cndido da Silva (1928),
desenhista, e tambm pintor; o conhecido pintor e escultor Joo
Cndido da Silva (1933) e sua mulher, a pintora Ilza Jacob da Silva
(1946) ; a pintora admirada na Frana, Conceio Aparecida Silva
(1938); Natlia Natalice da Silva (1948) poetisa;Georgina Penha da
Silva (1947), conhecida no mundo artstico por Gina (1949 ),pintora e
fada das agulhas, que transforma os fatos da vida em bonecos e
Efignia Rosrio da Silva (1937), a contadora de histrias, com suas
ricas e coloridas imagens da memria e do imaginrio da famlia.
Verificamos que parte dos afro-descendentes, que deram origem ao
grupo atual, vieram da Bahia (bisavs), do Rio de Janeiro (av) e parte de
Minas Gerais ( vide rvore genealgica e seu descritivo) no final do sculo
XVIII, o que coincide com os dados histricos constantes na obra
referenciada de Emanoel Arajo (1994)11 :
O ltimo perodo (final do sculo XVIII - de 1791 at
1888) foi marcado pela expanso da economia cafeeira, pelos processos graduais de abolio do trafico escravo e, finalmente, pela abolio da escravido (Brasil e Cuba foram os ltimos paises das Amricas a manter essa instituio).
Nesse terceiro perodo, algumas provncias do sudeste (Rio de Janeiro, So Paulo e Minas Gerais) receberam importantes contingentes de escravos africanos (CARDOSO, 1982:20-2 apud ARAUJO,1994).
Emanoel Arajo, na mesma obra, ressalta que:
10 BARDI, Pietro Maria. Maria Auxiliadora da Silva. Torino: Giulio Bolaffi Editore. 1977.
11 ARAUJO, Emanoel;MARCONDES DE MOURA,Carlos Eugnio . Arte e Religiosidade Afro-Brasileira. So Paulo: Cmara Brasileira do Livro,1944 (Brasiliana de Frankfurt) Exposio na 46 Feira do Livro de Frankfurt 1994.
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a escravido a todos procurava dessocializar, despersonalizar; de todos intentava destruir a identidade, as funes e os papis sociais, reduzindo cada individuo a um denominador comum. Ele se tornava simplesmente escravo. A empreendedora comerciante que vendia seus produtos nos mercados africanos, acompanhada de suas pequenas filhas, que a auxiliavam, com ela aprendiam e a sucederiam um dia; o arteso do ferro, que forjava armas, implementos agrcolas e peas de arte sacra; o ourives, de cuja oficina saiam objetos de adorno de ouro, marfim, coral, bzios, couro, ferro e bronze; os escultores, cuja produo, de altssimo valor esttico, o Ocidente s soube reconhecer e valorizar depois que os artistas cubistas por ela se interessaram; sacerdotisas e sacerdotes, detentores do saber e das praticas religiosas, entre elas a da adivinhao e a da manipulao das ervas, com fins profilticos ou iniciaticos (no casa dos sacerdotes), de fundamental importncia para a estruturao pessoal e coletiva; o campons, que dominava as tcnicas do trato da terra e do plantio; o caador, que conhecia os segredos da mata e indicava quais os lugares mais apropriados para a implantao de uma nova aldeia; o griot, cronista dotado de excepcional memria, em culturas que se apoiavam na oralidade para a transmisso da histria e da identidade; (...)
Como veremos no decorrer deste trabalho, a potica, a mstica, o
prprio modo de pensar, e o fazer, da Famlia Silva esto intimamente
ligados sua ancestralidade, s suas razes, e as diferentes culturas
pelas quais foram influenciados. Desde a cultura do homem e mulher
escravos que trabalharam nas sedes das fazendas; at aqueles que, aps
libertos, migraram de um Estado a outro, principalmente no sentido
norte-sul, e trouxeram, para o Estado de So Paulo, e, sobretudo
Capital, um pouco de tudo, um pouco da sua africanidade, da sua
nordestinidade, e mineiridade...
Os mesmos nomes, de santos e santas (de raa negra em sua
maioria), originalmente atribudos aos africanos12 que eram traficados ao
territrio brasileiro, encontramos em nossos artistas e artesos da
Famlia Silva, tais como: Santa Efignia, virgem etope, So
Benedito, profeta e taumaturgo nascido na Siclia, Nossa Senhora do
12 Arajo,op.cit, pg.38.
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Rosrio (padroeira de Confrarias e Irmandades - de propagao da f e
de ajuda mtua), Nossa Senhora da Conceio, Nossa Senhora
Aparecida. Nomes de santos catlicos, crenas nos orixs. Sincretismo
que se verifica em muitas de suas obras.
Ilustrao 4.2 Conceio Aparecida da Silva. Festa de Nossa Senhora Aparecida. leo sobre Tela. (2005). [na mesma cena: Atabaques e Mes de Santo do Candombl, Igreja e Nossa Senhora Aparecida do culto catlico].
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Tambm as cenas de folclore, como a Folia de Reis13, Festa de
So Joo14, Bumba meu Boi15, tradies praticadas pelos africanos em
territrio brasileiro, so, constantemente, objeto das obras dos Silva.
Ilustrao 4.3 Festa do Divino na casa de Tia Jandira irm de Maria Almeida da
Silva. Divinpolis. MG. Fotografia do Acervo da Famlia Silva. ( Anos 30).
Pelas pesquisas iniciadas, todos herdaram a musicalidade do pai,
Jos Cndido da Silva16 e, sobretudo, a tenacidade e a criatividade da
me, a escultora, pintora e poetisa Maria Trindade de Almeida Silva
(1909-1991). Esta, durante toda a sua vida, foi o elemento catalisador
da unidade familiar, fato que refletiu nas atividades artsticas da famlia
13 Festejos em que eram escolhidos os Reis e Rainhas do ano, sob o patrocnio das confrarias e irmandades, importadas de Portugal, onde os africanos podiam conservar suas diferenas culturais e conservar sua identidade tnica. (Arajo, 1994. op.cit. pg. 38)Vide Glossrio. 14 Vide Glossrio.15 Vide Glossrio. 16 Segundo depoimento de Gina da Silva tocava um acordeom de sete baixos.
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Silva. Exemplo de resistncia e luta pela preservao das razes
culturais africanas e reconhecimento do valor do seu trabalho.
Dentro do aspecto afro-brasileiro, no pudemos esquecer a forte
participao dos Silva no grupo de Solano Trindade17: nas
apresentaes teatrais, nas artes plsticas, nas mostras na cidade de
Embu das Artes.
Ilustrao 4.4 Apresentao de Navio Negreiro no teatro de Solano Trindade, Embu das Artes. Fotografia do Acervo da Famlia Silva.
Os Silva mantm relaes com os artistas e famlia do grupo de
Solano at os dias de hoje, tanto pelos laos de afinidade (uma vez que
Raquel Trindade, filha de Solano, foi casada com Vicente Paulo da
Silva) , como pelos vrios elos de afro - brasilidade que entre eles
remanesce (sesses de candombl, apresentaes de dana, teatro,
17 Teatro Popular Folclrico Brasileiro, formado por Solano Trindade em 1950. TRINDADE, Solano. O Poeta do Povo. 1 ed. So Paulo: Cantos e Prantos Editora, 1999
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homenagens a Solano Trindade, dentre outras).
Joo Cndido, por exemplo, exibe com felicidade, a obra pstuma
que reuniu vrios poemas de Solano que lhe foi presenteada por Raquel
em 1999. Abre o livro e recita, com paixo, a Balada Molenga De Uma
Negra Dengosa, um de seus poemas prediletos18:
BALADA MOLENGA A UMA NEGRA DENGOSA19
Solano Trindade
Sou Molengo Molengo Cheio de dengo
Gosto de beijo Gosto de amor
Sou Molengo Molengo Cheio de dengo
Choro por um carinho Que venha de tuas mos
,Sou Molengo Molengo Cheio de dengo
Gosto de cafun Gosto bem do lero lero Que venha da tua boca
MolengoSou Molengo Cheio de dengo
Gosto tambm do teu dengo Gosto cafunar teu quengo
Sou Molengo Molengo Cheio de dengo
18 Poema apresentado por Joo Candido na Mdiathque de Poitiers-Frana, por ocasio dos Debates sobre Arte e Globalizao , no ano de 2004.19 Poema de Solano Trindade (op.cit)
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Ilustrao 4.5 - Dedicatria de Raquel Trindade, A Kambinda, filha de Solano Trindade, aposta no livro O Poeta do Povo editadopos mortem em sua homenagem.
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Ilustrao 4.6. Maria Almeida da Silva esculpindo na Praa da Repblica. Anos 60. Foto do Acervo da Famlia Silva.
Muitos curadores reconheceram os esforos da me, Maria
Almeida da Silva e a unio com seus filhos, dentre os quais o curador Jos
Luyten (1981) 20, que ressalta: Acreditamos que Maria Almeida Silva e
seus filhos representam melhor do que nenhuma outra famlia afro-
brasileira, o esforo do homem negro de, em nossa sociedade, conseguir o
reconhecimento de seu trabalho artstico e a aceitao de seus valores.
Tambm a me de Maria Almeida, Sra. Marcelina Carlota de
Almeida, teria vocao artstica, pois "era sambista e fazia croch muito
bem", j prenunciando com seu artesanato o dom plstico das geraes
20 Professor da ECA USP e membro da APCA, Jos LUYTEN foi curador da mostra e autor do catlogo da Exposio Os Silvas na Cultura Negra , realizada pela Prefeitura do Municpio de So Bernardo do Campo.SP.maio/junho 1981.Vide Cronologias.
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subseqentes conforme depoimento de Maria Auxiliadora.(FROTA, 1975)21.
O pai falava que tinha outros irmos homens, e uma mulher.
Somente conheceram um tio. Tio Marinho que ia visitar a famlia em
Campo Belo. Era rezador e curandeiro de bicheiros de animais e gostava
de amanhecer cantando hinos de igreja catlica. Tinha uma voz muito
linda.
Mas ele no parava de andar de cidade em cidade. Era andarilho. Meu pai, Jos Cndido ( nascido aos 29 de agosto de 1897) contava que ele e os irmos deixaram a famlia muito cedo porque o seu pai ( meu av) era muito bravo, nervozinho. Meu pai deixou a casa aos 14 anos de idade e foi ser ajudante de padeiro em So Joo Del Rei, em Minas Gerais mesmo. Somente era acolhido, quando estava em algum apuro, pela irm, que morava em Rio dos Montes. Ele dizia que possua parentes em So Joo Del Rei muito bem de vida. Herdeiros de fazendas, de garimpos... Deixa pra l... Quando j homem feito passou a trabalhar no campo, nas lavouras. Casou-se, em primeiras npcias, com Maria Jlia C. Silva e tiveram trs filhos, todos nascidos na cidade de Oliveira, em Minas Gerais: Benedicta Paulina da Silva ( 1925-1987), Jos Silva ( ?) e Glria Silva (?).
Ficou vivo, e cuidava dos filhos sozinho.22
A me, Maria Trindade de Almeida (Silva, depois que se casou),
nasceu em Sorocaba (SP) aos 06 de janeiro de 1909 (Era filha de Jos de
Almeida, natural do Rio de Janeiro, e de Marcelina Carlota de Almeida,
baiana, filha de pais africanos, que na poca, trabalhavam nas fazendas
em Minas Gerais).Contava com a assistncia de uma irm que morava na
cidade de Divinpolis (MG), a tia Jandira.
21 Declarao de Maria Auxiliadora da Silva, em depoimento Llia Frota no ano de 1972. (FROTA, 1975:70) 22 SILVA, Joo Cndido da. Autobiografia. So Paulo, SP. 2007
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Maria Trindade de Almeida foi criada em Sorocaba at a idade de 10
anos aproximadamente. Sua me era empregada domstica, sofreu um
acidente que a deixou paraltica de um brao. A famlia resolveu, ento,
entreg-la aos cuidados de parentes, em Minas Gerais, os Nogueira.Na
realidade foi entregue aos Nogueira definitivamente, como se fosse
filha. Marcelina Carlota, a visitava nos primeiros meses, mas, depois
desapareceu. Era assim que minha me descrevia a sua infncia, informou
Joo Cndido.
Tornou-se moa, e foi criada apenas para o trabalho caseiro e
artesanal, sem escola.
Depois de algum tempo a famlia Nogueira resolveu cas-la e para isso o pretendente bastava ser um homem trabalhador, com T maisculo. E, o escolhido foi o vivo, Jos Cndido da Silva, doze anos mais velho do que ela, j com trs filhos. O casamento ocorreu na cidade de Bom Sucesso, aos 14 de julho de 1928 (o pai com 31 anos e a me com 19).23
A famlia Silva cresceu bastante. O casal Jos Cndido e Maria de
Almeida teve 18 filhos24, alm dos filhos do primeiro casamento do vivo
Jos.
Aps o casamento, em Bom Sucesso, e nascimento do filho mais
velho, Sebastio Cndido (1929), os pais comearam a se deslocar,
mudando de moradia, de acordo com a necessidade de trabalho nas
lavouras da regio. O primeiro itinerrio, ao que parece, foi Santana do
Jacar (MG),onde nasceu Vicente Paulo e depois Campo Belo (MG), onde
nasceram Maria Auxiliadora, Joo Cndido, Conceio e Efignia.
23 SILVA, Joo Cndido da. Autobiografia. So Paulo,SP. 2007 24 Benedicta Paulina da Silva (1925-1987); Jos Silva (?) Glria Silva (?); Sebastio Cndido da Silva; Bom Sucesso (MG)1929; Vicente Paulo da Silva, Santana de Jacar (MG)1930-1980; Joo Evangelista da Silva (?); Joo Cndido da Silva, Campo Belo (MG),1933;Maria Auxiliadora Silva,Campo Belo (MG)1935-1974;Efignia Rosria da Silva, Campo Belo, 1937; Conceio Silva, Campo Belo (MG), 1938; Georgina P. Silva,So Paulo 1947 (05.03.1947); Natlia Natalice Silva, So Paulo, 1948 (Dezembro); Benedicto Evangelista da Silva, So Paulo, 1953-1998; Jos Nicodemus da Silva, So Paulo (?) Mauro Mauricio da Silva, So Paulo (?).