UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE...

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO MARCELO ALVES DANTAS O MISTICISMO JUDAICO E APOCALÍPTICO NO APOCALIPSE DE JOÃO CAPÍTULOS 4 E 5 ASCENSÃO E VIAGEM CELESTIAL NO CRISTIANISMO PRIMITIVO SÃO BERNARDO DO CAMPO 2014

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  • UNIVERSIDADE METODISTA DE SO PAULO

    FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO

    EM CINCIAS DA RELIGIO

    MARCELO ALVES DANTAS

    O MISTICISMO JUDAICO E APOCALPTICO NO APOCALIPSE

    DE JOO CAPTULOS 4 E 5 ASCENSO E VIAGEM

    CELESTIAL NO CRISTIANISMO PRIMITIVO

    SO BERNARDO DO CAMPO

    2014

  • MARCELO ALVES DANTAS

    O MISTICISMO JUDAICO E APOCALPTICO NO APOCALIPSE

    DE JOO CAPTULOS 4 E 5 ASCENSO E VIAGEM

    CELESTIAL NO CRISTIANISMO PRIMITIVO

    Dissertao de Mestrado em Cumprimento s

    Exigncias do Programa de Ps-Graduao em

    Cincias da Religio da Universidade

    Metodista de So Paulo, Faculdade de

    Humanidades e Direito, para Obteno do

    Grau de Mestre.

    rea de Concentrao: Literatura e Religio

    no Mundo Bblico.

    Orientador: Dr. Paulo Augusto de Souza

    Nogueira

    SO BERNARDO DO CAMPO

    2014

  • A dissertao de mestrado sob o ttulo O Misticismo Judaico e Apocalptico

    no Apocalipse de Joo Captulos 4 e 5 Asceno e Viagem Celestial no

    Cristianismo Primitivo elaborado por Marcelo Alves Dantas foi apresentada e

    aprovada em 04 de setembro de 2014, perante a banca examinadora composta

    por Dr. Paulo Augusto de Souza Nogueira (Presidente/UMESP), Dr. Paulo

    Roberto Garcia (Titular/UMESP) e Dr. Valtair Afonso Miranda (Titular/UFRJ).

    __________________________________________

    Prof/a. Dr/a. Paulo Augusto de Souza Nogueira

    Orientador/a e Presidente da Banca Examinadora

    __________________________________________

    Prof/a. Dr/a. Helmut Renders

    Coordenador/a do Programa de Ps-Graduao

    Programa: Ps-Graduao em Cincias da Religio rea de Concentrao: Literatura e Religio no Mundo Bblico

    Linha de Pesquisa: Apocalptica e Histria do Cristianismo Primitivo

  • Agradecimentos

    Em primeiro lugar minha gratido de maneira singular minha esposa Cacilda

    Miranda Dantas, por seu companheirismo e incentivo na vida acadmica, bem como, aos

    meus filhos Raphael e Juliana.

    Ao Dr. Paulo Augusto de Souza Nogueira, que incansavelmente e pacientemente

    exerceu a funo de Orientador desta pesquisa. Reconheo seu esforo para o implemento

    desta dissertao de Mestrado.

    Meu apreo ao Dr. Jos Ademar Kaefer pelo auxlo e contribuio com suas aulas e

    orientaes prticas para exegese e pesquisa.

    Deixo meu apreo ao grupo de pesquisas Oracula, que se dedica com esmero a

    busca pelo contexto histrico do cristianismo primitivo.

    Em segundo lugar, agradeo a CAPES - Coordenao de Aperfeioamento de

    Pessoal de Nvel Superior. Sem a qual no teria condies de assumir os compromissos

    financeiros para a realizao deste Mestrado.

    Agradeo ao Pastor da Igreja Ev. Assembleia de Deus em So Bernardo do Campo

    Francisco de Assis Pereira, amigo, companheiro e conselheiro, obrigado pelo apoio.

    Ao Pr. Cladio Aparecido Pinto amigo e companheiro na docncia de teologia e no

    trabalho junto coordenao pedaggica da FATEBENE - Faculdade Teolgica Bblica de

    Ensino Evanglico.

    Aos demais companheiros nos estudos acadmicos da Universidade Metodista, e a

    todos os amigos, meu apreo.

  • DANTAS, Marcelo Alves. O Misticismo Judaico e Apocalptico no

    Apocalipse de Joo Captulos 4 e 5 Ascenso e Viagem Celestial no

    Cristianismo Primitivo. Dissertao de Mestrado. So Bernardo do Campo,

    SP: Universidade Metodista de So Paulo, 2014.

    Resumo

    Esta dissertao tem por objeto analisar os textos do livro do Apocalipse captulos 4

    e 5. As fontes de pesquisa pertencem s tradies do Misticismo Judaico. Esta linha, hoje

    ecoa em estudos do misticismo apocalptico e do xtase visionrio relativo ao contexto do

    judasmo e cristianismo primitivos, em autores tais como: Christopher Rowland, Alan

    Segal, C. R. A. Morray-Jones e John Ashton, John Collins, Adella Collins, Jonas Machado,

    Paulo A. S. Nogueira, Carol Newsom, David E. Aune, Philip Alexander, Crispin H.T.

    Fletcher-Louis, Florentino Garca Martnez dentre outros; sendo que, estes autores se

    alinham aos resultados das pesquisas iniciais de Gershom Scholem sobre o Misticismo

    Judaico, e aos desenvolvimentos mais recentes neste mbito.

    Nogueira1 menciona que foi Scholem quem realmente usou este misticismo para

    produzir a chave das histrias de ascenso celestial presentes nos apocalipses dos ltimos

    dois sculos a.C. e dos primeiros dois sculos d.C. Foi Scholem, na verdade, quem iniciou

    a discusso acadmica dos msticos judaicos em seu livro Major Trends in Jewish

    Myticism - Principais Tendncias no Misticismo Judaico em 1941.

    Corroborando com a tradio destes estudos se encontram as descobertas dos

    manuscritos de Qumran, como a dos Cnticos do Sacrifcio Sabtico, uma composio de

    treze cnticos, tambm chamada de liturgia anglica, e que tem contribudo para o

    desenvolvimento das pesquisas, bem como sustentado os argumentos de Scholem.

    Dentre os manuscritos de Qumran h um fragmento de hinos denominado 4Q405,

    que trouxe ao conhecimento a terminologia Merkavh, em que anjos louvam a imagem do

    Trono da Carruagem citado no primeiro captulo do livro de Ezequiel. Identificou-se nestes

    o sincretismo da comunidade de Qumran acerca do canto dos anjos com outras ideias sobre

    os deveres dos mesmos, sendo uma caracterstica comum s tradies da Maasseh

    Merkavh - (Trabalhos do Divino Trono/Carruagem).

    1 NOGUEIRA, Sebastiana M. Silva. 2 Corntios 12 e o Misticismo Judaico (Os Quatro que Entraram no

    Pardes). Oracula, 2012 p.04.

  • Assim, a pesquisa segue os pressupostos de Rowland2, de que os textos do

    Apocalipse 4 e 5 possuem em sua narrativa uma semelhana bsica com a liturgia descrita

    nas tradies do misticismo apocalptico do judasmo no I sculo, bem como em textos de

    Qumran, principalmente no fragmento 4Q405.

    Conforme Nogueira3 Ezequiel captulo 1 considerado chave desta tradio mstica

    do judasmo, sendo, tambm um elemento central do Apocalipse de Joo, o principal

    visionrio do cristianismo.

    Assim, a pesquisa inclui a aproximao dos textos considerados fundantes, sendo:

    (Isaas 6; Ezequiel 1; Daniel 7; I Enoque 14), junto aos textos de Qumran, como o

    complexo dos 13 Cnticos Sbaticos relacionados ao culto no santurio celestial.

    A apocalptica pode ser assim compreendida como um tipo de literatura mstica,

    cujas imagens se conjecturam nos escritos que, por meio da ascenso do visionrio aos

    cus e a contemplao do trono de Deus, descortinam uma determinada tradio do

    judasmo antigo. Desta forma podemos tambm interpretar os captulos 4 e 5 do

    Apocalipse como texto mstico, de contedos similares aos dos textos apocalpticos

    judaicos, e talvez at com um tipo de experincia religiosa anloga.

    Palavras chave: Apocalptica, Ascenso, Misticismo, Cristianismo, Trono, xtase, Cntico.

    2 ROWLAND, C.; MORRAY. JONES, Christopher R. A. The Mystery of God. Early Jewish Mysticism and

    the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum, Volume 12). Leiden: Brill

    Academic, 2009 p.72,73. 3 NOGUEIRA, Paulo Augusto de S. (org.), Religio de Visionrios Apocalptica e Misticismo no

    Cristianismo Primitivo. So Paulo: Ed. Loyola, 2005 p.43.

  • DANTAS, Marcelo Alves. The Mysticism Jewish Apocalyptic and the

    Apocalypse of the John Chapter 4 and 5 Rise and Celestial Journey in Early

    Christianity. Masters Dissertation. So Bernardo do Campo, SP: So Paulo

    Methodist University, 2014.

    Abstract

    This dissertation has its purpose on the texts of the book of Revelation chapters 4

    and 5. Their source of research belongs to the Jewish Mysticism. This way of examination

    echoes today in studies of apocalyptic mysticism and the visionary ecstasy relating to the

    context of Judaism and primitive Christianity, on authors such as Christopher Rowland,

    Alan Segal, C.R.A. Morray - Jones and John Ashton, John Collins, Adella Collins, Jonas

    Machado, Paulo A.S. Nogueira, Carol Newsom, David E. Aune, Philip Alexander, Crispin

    H.T. Fletcher - Louis, Florentino Garca Martnez among others; but these authors align

    themselves to the Gershom Scholems initial research results on Jewish Mysticism, and

    also to the latest developments in this subject.

    Nogueira mentions that Scholem was who actually used this mysticism to produce

    the key for heavenly ascent stories present on apocalypses of the last two centuries b.C.

    and also to the first two centuries a.D. In fact, Scholem was who initiated the Jewish

    mysticism academic discussion in his book Major Trends in Jewish Myticism in 1941.

    Strengthening the tradition of these studies are the findings of the Qumran

    manuscript, such as the Songs of the Sabbath Sacrifice, a thirteen songs composition, also

    called angelic liturgy, that has contributed to the research development as well as

    supporting the Scholem arguments.

    Among the Qumran manuscripts a hymn fragment called 4Q405 brought to the

    acquaintance the terminology Merkavh, wherein angels praise the Chariot Throne image

    mentioned in the first chapter of the book of Ezekiel. It was identified on that the Qumran

    community syncretism regarding the song of angels with other ideas about their duties,

    being a common characteristic of Ma'asseh Merkavah traditions - (Divine Throne / Chariot

    tasks).

    Thus, the research follows the presupposed by Rowland that the texts of Revelation

    4 and 5 have in their narrative a basic similarity to the liturgy described in the traditions of

  • the first century Judaism apocalyptic mysticism, as well as on Qumran texts, mainly in

    4Q405 fragment.

    According to Nogueira Ezekiel chapter 1 is considered the key to the Judaism

    mysticism tradition, therefore also being a central element of the Johns Apocalypse, the

    main visionary of Christianity.

    The research includes the approach of texts considered the ones that established

    (Ezekiel 1, Isaiah 6, Daniel 7, I Enoch 14), the analysis of the Qumran texts, as the

    complex of 13 Sabbatical Songs related to worship in the celestial sanctuary.

    The apocalyptic is thus understood as a kind of mystical literature, whose images

    reflect the writings that, by means of the visionary ascent to heaven and the contemplation

    of God's Throne pull the curtain certain tradition of the 1st. century. Therefore, it can be

    also interpret the chapters 4 and 5 of Revelation as a mystical text, with similar content to

    the Jewish apocalyptic texts, and perhaps with a similar type of religious experience.

    Keywords: Apocalyptic, Ascension, Mysticism, Christianity, Throne, Ecstasy,

    Song.

  • Sumrio INTRODUO..................................................................................................................11

    1. Tema e os Parmetros da Dissertao..............................................................................12

    2. Distines na Literatura Apocalptica..............................................................................13

    3. O Estado da Questo.........................................................................................................18

    CAPTULO I TEORIAS SOBRE A COMPOSIO LITERRIA DO

    APOCALIPSE DE JOO..................................................................................................23

    1. Hipteses das Fontes................................................................................................23

    1.1 Teoria de Compilao.............................................................................................23

    1.2 Teoria de Reviso...................................................................................................24

    1.3 Teoria de Sntese e Fragmentos..............................................................................25

    2. A Crtica Diacrnica da Compilao........................................................................25

    a) A Primeira Etapa................................................................................................26

    b) A Segunda Etapa................................................................................................26

    c) A Terceira Etapa.................................................................................................27

    CONCLUSO....................................................................................................................28

    CAPTULO II - ANLISE EXEGTICA APOCALIPSE CAPTULO

    4..........................................................................................................................................29

    2.1 Introduo ao Texto Grego....................................................................................29

    2.2 Apocalipse (4.1-11)...............................................................................................30

    2.3 Traduo do Texto.................................................................................................30

    2.4 Introduo a Exegese Anlise do Aparato Crtico.............................................31

    a) v.3 ......................................................................................................................32

    b) vs. 8 ..................................................................................................................35

    c) vs. 9 ...................................................................................................................35

    d) vs.10 e 11 ...........................................................................................................36

    3. Coeso Estrutura e Delimitao do Texto......................................................38

    4. Diviso do Texto................................................................................................41

    5. Exegese Apocalipse (4.1 e 2)............................................................................43

    a) vs.1 e 2 - Viso / Transformao e Ascenso do Visionrio........................47

    b) v.2 - A Viso do Trono no Cu e do Assentado sobre ele............................49

    6. O Misticismo Judaico Anlise dos Textos fundantes.....................................56

    6.1 Isaas (6.1-7)..................................................................................................56

    6.2 Anlise Semntica (Isaas 6.1-7)...................................................................57

  • 7. Ezequiel (1.4-28)................................................................................................60

    7.1 Anlise Semntica (Ezequiel 1.4-28)...........................................................61

    8. I Enoque (14.8-21)................................................................................................65

    8.1 Anlise Semntica (I Enoque 14.8-21)........................................................66

    9. Daniel (7.9-14).....................................................................................................68

    9.1 Anlise Semntica (Daniel 7.9-14).............................................................69

    10. Esboo Comparativo da Anlise Semntica - Isaas, Ezequiel, I Enoque e

    Daniel ..................................................................................................................................71

    CONCLUSO....................................................................................................................72

    CAPTULO III - APOCALIPSE CAPTULO 4 LUZ DO MISTICISMO

    JUDAICO E APOCALPTICO DO PERODO DO SEGUNDO TEMPLO...............74

    3.1 A Viso da Glria do Trono - v.3 ...................................................................74

    3.2 A Viso da Corte Celestial - v.4 .....................................................................76

    3.3 Epifania diante do Trono - v.5 ........................................................................82

    3.4 O Pavimento do Trono v.6 .........................................................................82

    3.5 Os Seres Viventes no meio e ao redor do trono - v.6.....................................84

    3.6 Descrio dos Seres Viventes - vs.7 e 8.........................................................85

    3.7 Celebrao diante do Trono de Deus - O Sanctus por parte dos Seres

    Viventes - vs.8 e 9...............................................................................................................86

    3.8 A Adorao dos 24 Ancios vs.10 e 11........................................................95

    CONCLUSO....................................................................................................................97

    CAPTULO IV ANLISE EXEGTICA APOCALIPSE CAPTULO

    5..........................................................................................................................................98

    4.1 Apocalipse (5.1-14)..................................................................................................98

    4.2 Traduo do Texto....................................................................................................98

    4.3 Introduo a Exegese Anlise do Aparato Crtico................................................99

    a) v.1 ......................................................................................................................99

    b) v.2 e 3 ..............................................................................................................100

    c) 8-14 ..................................................................................................................101

    5. Coeso Estrutura e Delimitao do Texto.........................................................104

    6. Diviso do Texto...................................................................................................106

    7. Exegese (Apocalipse 5.1-14) Cristologia-Angelomrfica.................................107

    8. O Misticismo Judaico e Apocalptico em (Apocalipse 5.1-14)............................112

    a) v.1 Abertura da Cena (e vi...) - Viso do Trono e do Livro..........................112

  • b) v.2 e 3 A Dignidade do Cordeiro...................................................................114

    c) v.4 e 5 Desespero do Vidente / A Proclamao do Ancio O

    Reconhecimento da Dignidade do Cordeiro............................................115,116

    d) v.6 e 7 O Cordeiro recebe o livro A Vitria do Cordeiro...........................117

    e) v.8-14 Celebrao ao Cordeiro Sacerdcio e Realeza do Cordeiro - por

    parte dos seres Viventes e dos Ancios / por parte de uma voz de anjos / por

    parte da criao.................................................................................................117

    CONCLUSO..................................................................................................................122

    CONSIDERAES FINAIS ANLISE COMPARATIVA DE APOCALIPSE 4 E 5

    LUZ DOS RESULTADOS DA PESQUISA...............................................................123

    ANEXOS...........................................................................................................................130

    BIBLIOGRAFIA..............................................................................................................131

  • 11

    Introduo

    Segundo Nogueira4 o cristianismo primitivo nasceu como religio exttica. Os

    relatos como batismo e a transfigurao so considerados chaves para autoconscincia

    messinica, assim quanto, o relato visionrio procedente da experincia de converso de

    Paulo no caminho de Damasco. Nos evangelhos est claro que Jesus tambm teve vises e

    audies.

    Surge a pergunta sobre a situao cultural da poca e da produo dos textos.

    Diante do reconhecimento de que, vises, audies e revelaes no acontecem sem um

    quadro cultural de referncia, assim, partimos em busca de possveis contribuies para o

    estudo deste quadro cultural, tendo como finalidade contribuir para a compresso das

    experincias visionrias e apocalpticas, tanto quanto, da experincia religiosa dos

    primeiros cristos.

    Os textos do Apocalipse de Joo nos captulos 4 e 5 so considerados

    paradigmticos no estudo Novo Testamento, cuja descrio narrativa contm relatos de

    vises e audies em primeira pessoa, portanto, se constitui um tema relevante.

    Atualmente so considerados trs aspectos singulares no desenvolvimento da

    pesquisa do Apocalipse de Joo; (1) os aspectos literrios, (2) o contexto histrico-literrio,

    (3) e as novas ferramentas interpretativas para desvelar a sua linguagem complexa.

    A pesquisa apocalptica em suas mais recentes abordagens est sendo feita luz de

    releituras das tradies do Misticismo Judaico e Apocalptico e das descobertas dos

    Manuscritos de Qumran em 1947, cujos resultados seguem em diversas direes abrindo

    novos horizontes.

    Nas palavras de Nes5 o tema apocalptico tem ganhado uma acentuada discusso

    nas ltimas dcadas. Os temas e os debates recentes e seus desdobramentos tem procurado

    uma definio que responda as seguintes hipteses: O que se entende por apocalptica?

    Podemos construir a histria da apocalptica?

    Hanson6, pesquisador conceituado nesta rea tem contribudo atravs da trplice

    distino de entre gnero, cosmoviso e movimento social procurando explicar, a

    4 NOGUEIRA, Paulo Augusto de Souza. Experincia Religiosa e Critica Social no Cristianismo Primitivo.

    So Paulo Paulinas, 2004 p.17. 5 NEZ, Csar Carbullanca. Mesianismo y Mstica en Qumrn. Universidade Catlica del Maule, 2008 -

    p.16. 6 Apud. Martinus de Boer - Professor da Universidade Livre de Amsterdan. Traduo: Paulo Augusto de

    Souza Nogueira. HANSON, Paul D. The Dawn of Apocalyptic. The Historical and Sociological Roots of

  • 12

    influncia da apocalptica judaica sobre as origens crists e, consequentemente, sobre os

    documentos do Novo Testamento. Entendendo assim, que estas representam a

    documentao primria das origens crists.

    Na discusso das origens esto os pressupostos preliminares da possvel

    dependncia que o texto apresenta em relao ao campo imagtico do Misticismo da

    Mercavh.

    Necessrio se faz entender o significado de Mercavh, sendo este um termo

    hebraico ( que significa - Carruagem do Trono) e diz respeito s tradies de viagens

    e ascenso celestial rumo ao Trono de Deus, cujas razes esto situadas no perodo do

    Segundo Templo (200 a.C.) estendendo-se a (200 d.C.), tendo os textos de Isaas captulo

    6 e Ezequiel captulo1, como textos fundantes.

    Nosso objetivo demonstrar que os captulos 4 e 5 do livro bblico intitulado,

    Apocalipse de Joo, se manifesta de outra forma e se apresenta de maneira anloga s

    semelhanas com as tradies do Misticismo Judaico da Mercavh, e das encontradas em

    Qumran, as quais compreendem: (1) ascenso ao trono de Deus, (2) experincia visionria,

    (3) caractersticas litrgicas de culto com a presena dos anjos.

    No caso do Apocalipse captulo 4 a viso est restrita ao trono de Deus, j no

    captulo 5 se encontra em ambiente litrgico e cerimonial. A uma discusso em torno do

    tema da entronizao do Cordeiro e seu culto. Sendo, nesta viso de Jesus como o

    Cordeiro e Cristo ressuscitado, entronizado e cultuado, que se encontram honrarias e ttulos

    cristolgicos.

    1. Tema e os Parmetros da Dissertao

    As tradies do misticismo judaico, de viso, ascenso, e culto no cu so

    encontradas nos textos considerados fundantes, a saber: (Isaas 6, Ezequiel 1, Daniel 7),

    dentre outros.

    Textos como os que foram achados em Qumran evidenciaram a existncia de um

    movimento de misticismo judaico especfico onde a comunidade se sentia participante em

    culto celestial.

    Esta comunidade compreendida como possuidora dos 13 Cnticos Sbaticos

    relacionados ao culto no santurio celestial, cujos fragmentos receberam a sigla (4Q400-

    Jewish Apocalyptic Eschatology. Philadelphia, 1979 (2nd ed.), p. 432,440; cf. tambm Apocalypse, Genre

    and Apocalypsism ..., p. 30.

  • 13

    407), junto a oito cpias procedentes da caverna quatro, e um da caverna onze (11Q17);

    como tambm outros fragmentos, como o (4Q5307).

    Um texto chave o texto de I Enoque 14. Este apresenta uma experincia religiosa

    cujos aspectos evidenciam sua participao na tradio de Ezequiel.

    O fragmento achado nas runas de Masada de uma cpia de manuscrito, no qual os

    Cnticos Sabticos so notrios, nos permiti ver alm de Qumran a presena da tradio

    dos sacerdotes em culto celestial, e nos consente afirmar que, o uso dos Cnticos do

    Sacrifcio Sabtico no se limitava apenas a comunidade de Qumran.

    Diante das evidncias que temos a priori estabelecemos o tema desta dissertao:

    O Misticismo Judaico e Apocalptico no Apocalipse de Joo Captulos 4 e 5

    Ascenso e Viagem Celestial no Cristianismo Primitivo.

    O tema sugere e sustenta as possveis relaes que existem entre as tradies do

    misticismo judaico, Qumran e o Apocalipse captulos 4 e 5. Os testemunhos literrios nos

    permite o uso de diversas fontes, porquanto, encontramos uma ampla e bem fundamentada

    tradio, que compreende os textos bblico e extra-bblico, e que fazem referncia a uma

    tradio apocalptica de viso e viagens ao trono de Deus.

    2. Distines na Literatura Apocalptica

    O tipo de literatura com a qual estaremos trabalhando e comparando os dados desta

    pesquisa tem suas origens em contexto prprio. Para melhor entendermos de que contexto

    se trata, utilizo inicialmente a distino de quatro perodos da Apocalptica proposto por

    Sacchi8:

    a) A primeira fase apocalptica: com seu incio antes de 200 a.C.

    b) A segunda fase apocalptica: desde 200 a.C. a 100 a.C.

    c) A terceira fase apocalptica: desde 100 a.C. a 50 d.C.

    d) A quarta fase apocalptica: desde 50 d.C. a 120 d.C.

    Pela dimenso das fases da Apocalptica, temos muitos textos produzidos, o que

    impe a necessidade de comparao.

    7 (4QEnGants ar) - Um manuscrito copiado na primeira metade do sculo I a.C. Se constitiu de 8 grandes

    fragmentos com de trs colunas consecutivas e outros 9 de dimenses menores. 8 SACCHI, P. Jewish Apocalyptic and its History, Sheffield Academic Press, England, 1990 p. 110.

  • 14

    Segal9 cita um importante aspecto que levamos em considerao; a

    distino/similaridade em relao aos gneros literrios que envolvem a apocalptica e a

    mstica judaica; uma vez diferentes e facilmente distinguveis, mas que relatam

    experincias religiosas semelhantes.

    Collins10

    delimitou os estudos apocalpticos a partir da distino entre Apocalipses

    Histricos e os Apocalipses de Viagens. Para Collins um apocalipse uma estrutura

    geral, que incorpora outros gneros literrios (carta, testamento, parbola, hino, orao

    etc.).

    Por meio de um levantamento exaustivo dos textos que puderam ser classificados

    como Apocalipses e datados com qualquer plausibilidade no perodo de 250 a.C 250

    d.C.; procurou ver at onde podiam ser considerados como membros de um mesmo gnero.

    No entanto, o estudo da estrutura geral dos Apocalipses mostrou que o gnero pode

    ser definido de forma mais ampla, permanecendo distinto acerca de outros tipos de

    literatura de revelao. As caractersticas definidoras abraam tanto a maneira ou forma de

    revelao, como do contedo das coisas reveladas.

    Os elementos recorrentes significativos constituem um paradigma que mostra, no

    s as semelhanas persistentes que funcionam em todo o corpus, mas tambm, as variaes

    que distinguem os diferentes subgrupos e trabalhos individuais.

    As distines so definidas por meio de um paradigma-mestre que pode ser

    dividido em duas sees principais: (1) O enquadramento da revelao, e do seu contedo;

    (2) a estrutura, que por sua vez envolve tanto a forma em que a revelao como dos

    elementos finais.

    O contedo abrange eventos histricos e escatolgicos em um eixo temporal, seres

    de outro mundo, e lugares em um determinado eixo espacial.

    A exortao direta ao destinatrio no curso da revelao rara e desempenha um

    papel significativo apenas em poucas obras crists.

    O paradigma como se segue:

    (1) A Forma de Revelao - que apresenta o meio pelo qual a revelao

    comunicada, sendo:

    9 SEGAL, Alan F. Paul The Convert: The Apostolate and Apostasy of Saul The Pharisee. New

    Haven/London: Yale University Press, 1990. p. 38. Life After Death: A History of the Afterlife in the

    Religions of the West. New York: Doubledy, 2004 - p. 410. 10

    Artigo intitulado Apocalipses Judaicos - p. 1-8. COLLINS, John J. SEMEIA 14 Apocalypse: The

    Morphology of a Genre. The Society of Biblical Literature, 1979.

  • 15

    1.1 Revelao Visual - pode ser tanto na forma de Vises, onde o contedo da

    revelao visto, ou Epifanias, onde a apario do mediador descrita.

    1.2 Revelao Auditiva - geralmente esclarece o visual. Epifanias so sempre

    seguidos por revelao auditiva. Elas podem ser na forma de Discurso, ininterrupto pelo

    mediador, ou Dilogo, onde h conversa, entre o mediador e o destinatrio, muitas vezes

    em forma de pergunta e resposta.

    1.3 Jornadas Alm-Mundo - quando o visionrio percorre regies remotas, cu,

    inferno ou para alm do mundo normalmente acessvel. Revelao no decurso de uma

    viagem geralmente predominantemente visual.

    1.4 Escritas - quando a revelao est contida em um documento escrito,

    geralmente um livro celestial.

    (2) Um mediador de outro mundo comunica a revelao.

    Muitas vezes, a mediao consiste em interpretar a viso, mas tambm pode

    assumir a forma de discurso direto, ou simplesmente de orientar o destinatrio

    direcionando sua ateno para a revelao. O mediador o mais frequentemente um anjo,

    ou, em alguns textos cristos, o prprio Cristo.

    (3) O receptor humano

    3.1 Pseudonimato - O destinatrio geralmente identificado como uma figura

    venervel do passado. Alguns apocalipses cristos no so pseudnimos.

    3.2 A Disposio do Destinatrio - observa as circunstncias e estado emocional em

    que a revelao recebida.

    3.3 Instrues para o Destinatrio. Estes so distintas parnese e vm aps a

    revelao, como parte do quadro de concluso: por exemplo, eles dizem o destinatrio para

    esconder ou publicar a revelao.

    3.4 A Reao do Receptor - geralmente descreve o temor e / ou perplexidade do

    destinatrio confrontado com a revelao.

    3.5 Concluso Narrativa - descrever o despertar ou o retornar Terra do

    destinatrio, a partir do retorno do revelador se concentra nas consequentes aes dos

  • 16

    destinatrios. Em alguns textos gnsticos encontramos referncia perseguio dos

    destinatrios ao visionrio por causa da revelao.

    (4) Contedo: Eixo Temporal

    Protologia: Questes que lidam com o incio da histria ou pr-histria.

    Teogonia (em textos gnsticos, descrevendo a origem do Pleroma) e / ou Cosmogonia (a

    origem do mundo).

    4.1 Eventos Primordiais - que tm significado paradigmtico para o restante da

    histria (por exemplo, o pecado de Ado).

    4.1 Lembranas Explcitas do Passado - ou ex-evento profecia onde a histria

    passada disfarada como futuro e assim associado com as profecias escatolgicas.

    4.2 Salvao Atravs do Conhecimento do Presente - a principal forma de

    salvao em textos gnsticos e os distingue significativamente de outros apocalipses.

    4.3 Crise Escatolgica - pode assumir a forma de Perseguio e / ou outros

    transtornos escatolgicos que perturbam a ordem da natureza ou da histria.

    (5) Julgamento e / ou Destruio Escatolgica - esta provocada por uma

    interveno sobrenatural. Ele vem de cima.

    5.1 Os Pecadores - geralmente opressores; mas em textos gnsticos - o ignorante.

    5.2 O Mundo - ou seja, os elementos naturais.

    5.3 Seres de outro Mundo - por exemplo, as foras de Satans ou Belial ou outros

    poderes malignos.

    (6) A Salvao Escatolgica

    a contrapartida positiva do juzo escatolgico. Como o julgamento, sempre

    provocada por meios sobrenaturais. Pode envolver: transformao csmica, onde o mundo

    inteiro se renova; salvao pessoal, que pode ser parte da transformao csmica ou pode

    ser independente desta. Isto, por sua vez, pode tomar a forma de ressurreio, em forma

    corprea ou outras formas de vida aps a morte, por exemplo, exaltao para o cu com os

    anjos.

  • 17

    Os apocalipses combinam tambm uma srie de formas menores, sendo as mais

    importantes: 1) Panoramas da histria em forma de futuro - o interesse dos

    apocalpticos volta-se, em primeiro lugar, para os iminentes acontecimentos

    escatolgicos, para os horrores do tempo final e a glria do novo mundo. 2)

    Descrio do alm - outro interesse consiste em dar ao leitor uma viso do

    mundo do alm. Para isso se recorre a descries de arrebatamentos visionrios.

    Em um xtase, o visionrio passa por mudana de lugar e perambula por regies

    estranhas e misteriosas na terra e no cu (Ez. 8.3ss.). Elas oferecem a

    oportunidade de transmitir conhecimentos sobre a topografia do cu e do inferno,

    sobre hierarquia dos anjos, etc. 3) Vises da sala do trono - ponto alto dessas

    viagens, seu alvo, mas s vezes tambm seu desenlace, a viso da sala do trono

    de Deus. Sua descrio tem por objetivo mostrar sua inacessibilidade de Deus e

    documentar, simultaneamente, a competncia do visionrio que remonta

    diretamente a Deus, o qual recebe nessas audincias uma misso especial e ao

    qual se confere um status especial. (Atos 9. 10,11; 10.10,11; 26,19). As vises da

    sala do trono formam um elo intermedirio entre viso de convocao dos

    profetas (cf. Is. 6; Ez. 1ss.) e da posterior mstica merkaba (carruagem divina)

    judaica11

    .

    Vielhauer a semelhana de Collins fala da abrangncia e relevncia da literatura

    apocalptica; identifica nas vises da sala do trono a formao de um elo intermedirio

    entre a viso de convocao dos profetas e das tradies do misticismo da Mercavh, o que

    tambm atestado por Collins.

    Essas definies nos ajudam a delimitar o campo de pesquisa desta dissertao

    delineando os aspectos apocalpticos que se fazem presente nas literaturas, e que sustentam

    a relao com os textos do Apocalipse 4 e 5. Consolidando a pergunta pelas origens do

    campo imagtico nos textos do Apocalipse de Joo captulos 4 e 5.

    O texto de Apocalipse 4 apresenta uma narrativa cuja estrutura literria descreve

    um ambiente celestial, o trono de Deus, uma descrio de liturgia com caractersticas

    sacerdotais e o louvor que os seres celestiais oferecem diante do trono.

    De maneira similar Apocalipse 5 possui uma estrutura literria de liturgia num

    ambiente celestial diante do trono, porm desenvolve uma narrativa do Cordeiro exercendo

    funes de sacerdcio e vice-regncia, sendo digno de adorao pelos seres viventes, os 24

    ancios, anjos e toda criao.

    Estes argumentos sustentam a hiptese de que podemos encontrar nas literaturas

    anlogas citadas, o possvel campo semntico de contedos imagticos, e uma corrente de

    tradio mstica de fluxo contnuo, cujas evidncias so manifestadas no Apocalipse

    captulos 4 e 5.

    11

    VIELHAUER, Philipp. Literatura Crist Primitiva - Introduo ao Novo Testamento, aos Apcrifos e aos

    Pais Apostlicos. Ed. Academia Crist. So Paulo, 2005 - p. 517.

  • 18

    Sendo as estruturas literrias do Apocalipse captulos 4 e 5 compostas das seguintes

    imagens:

    Corte celeste,

    Trono / Carruagem?

    Liturgia - Culto / Hinos,

    Templo / Palcio?

    Cu,

    Sacerdotes / Ancios,

    Hayot Seres Viventes,

    Anjos, Serafins, Querubins,

    Visionrio - viso e ascenso,

    Raios, relmpagos, etc.

    A dissertao, assim pretende apresentar a linguagem e caractersticas das

    narrativas do Apocalipse nos captulos 4 e 5, bem como sua inteno na comunicao de

    sua mensagem aos leitores da poca. Analisar as estratgias cognitivas que o autor

    aparelhou para a decifrao de sentido por parte dos leitores.

    A nfase recai sobre a estrutura imagtica apocalptica que permitiu a mensagem

    atingir o efeito buscado pelo emissor.

    3. O Estado Da Questo12

    O estado da questo pode ser compreendido a priori em alguns pesquisadores de

    temticas da Apocalptica.

    Comeamos pela Dissertao de Mestrado do pesquisador Marcelo Eduardo Cunha

    Smargiasse, intitulada Os Cnticos do Sacrifcio Sabtico: Merkavh e Literatura

    Angelical em 4Q405. So Paulo UMESP, 2003.

    Seu objeto no foi contemplar um arcabouo amplo das tradies da apocalptica,

    embora cite alguns deles, mas se concentrou especificamente nos 13 Cnticos do Sacrifcio

    12

    Para uma melhor compreenso do Estado da Questo sobre o Apocalipse de Joo, (vide - PUC-RIO

    certificao digital N 0114204/CA - O Estado da Questo do Livro do Apocalipse de S. Joo).

  • 19

    Sabtico achados em Qumran, e sim objetivamente em torno do fragmento 4Q40513

    ,

    observando a possvel relao entre Apocalipse captulos 4 e 5 e o mesmo.

    Descreveu a possvel participao de Joo, bem como de seus ouvintes no culto no

    templo celestial. Para ele a comunidade joanina se sentia participante de uma liturgia

    celestial, acessvel apenas atravs de uma transformao angelomrfica.

    Os textos de Isaas captulo 6 e Ezequiel captulo 1, junto a textos considerados

    pseudoepgrafos como I Enoque 14 so vistos como textos fundantes de uma tradio

    ainda maior, apresentados como modelos, tanto para produo literria, como para as

    experincias extticas.

    Correlacionou os textos de Apocalipse captulos 4 e 5, aos textos considerados

    pertencentes s tradies do Misticismo Judaico e das tradies de Qumran. Elaborou um

    quadro cultural, pelo qual pde olhar os textos joaninos, e assim interpret-los.

    Dentro se sua proposta a pesquisa obteve xito mostrando a correlao que existe

    entre o fragmento de Qumran 4Q405 e o texto de Apocalipse captulos 4 e 5, porm de

    forma alguma esgotou o tema. De sorte que, a partir de suas concluses avanamos em

    nossa pesquisa.

    Um segundo trabalho apreciado em nossa leitura foi o livro14

    organizado pelo Dr.

    Paulo Augusto de Souza Nogueira, intitulado Religio de Visionrios Apocalptica e

    Misticismo no Cristianismo Primitivo. So Paulo: Ed. Loyola 2005.

    O texto resultado de um grupo de pesquisadores que passaram anos debruados

    sobre fontes antigas do judasmo e do cristianismo. Descreve estudos fascinantes de relatos

    de viagens astrais, visionrios que sobrevivem a perigosas passagens por portas celestes,

    anjos de diferentes ordens e a contemplao do mistrio mais fascinante dessas religies, o

    Trono de Deus.

    Sua contribuio especfica no que diz respeito ao visionrio na experincia

    religiosa do cristianismo primitivo, uma vez que, a abordagem sobre as origens do

    cristianismo a partir da experincia visionria perpassa por todos os captulos do livro.

    13

    4Q405 Se refere ao dcimo-segundo Cntico do Sacrifcio Sabtico, que faz parte de um conjunto de

    treze composies de teor litrgico que foram encontradas na caverna 4 de Qumran em 1954. Trata-se de

    instrues para a liturgia celestial, envolvendo o ritual do sacrifcio (olat) executado nos cus pela

    comunidade sacerdotal anglica. Nesse Cntico pode-se contemplar uma liturgia mstica a presena da

    Merkavh (trono-carruagem), que utiliza o mesmo complexo imagtico presente em Ezequiel 1 e 10.

    NOGUEIRA, Sebastiana S. As Vozes do xtase em 4Q405 - Um estudo nos Cnticos do Sacrifcio Sabtico.

    Oracula, 2009. 14

    Esta obra ser utilizada no dilogo com outras fontes. Sendo mencionada com certa constncia nesta

    dissertao, razo pela fizemos uso restrito no momento.

  • 20

    Considerou as principais fontes importantes para desenvolvimento de leituras

    contribuindo para o entendimento das experincias e prticas fundantes dos cristos

    primitivos.

    O captulo fundamental para contribuio desta pesquisa se encontra na pgina 33,

    neste h apontamentos imprescindveis da experincia de xtase e de viagem celestial no

    Apocalipse de Joo.

    Seguimos os passos de Nogueira que afirma: Estudar o cristianismo primitivo no

    primeiro e segundo sculos a partir da experincia visionria, tem se mostrado fecundo

    para lanar novas luzes para compreenso de seu desenvolvimento histrico.

    Outra fonte de pesquisa a Tese de Doutorado do pesquisador Jos Roberto Corra

    Cardoso, Cristologia Angelomrfica de Hebreus - Estudo Scio-Retrico e Histria das

    Religies Comparadas em Hebreus 1.1-14; 2.5-18; 7.1-10. So Paulo. UMESP, 2005.

    A tese percorre os principais acessos para formao do complexo ideolgico

    daquilo que se denomina angelomorfismo. Tema este que nos caro para entendermos as

    comunidades judaicas e crists primitivas, e suas experincias religiosas.

    Embora a pesquisa esteja situada na Epstola aos Hebreus, todavia seu eixo

    fundamental a cristologia-angelomrfica. A Tese lana luz no pano de fundo para

    compreendermos os textos apocalpticos e a experincia religiosa dos cristos primitivos.

    Outra fonte para a nossa pesquisa foi o trabalho de Csar Carbullanca Nez, sobre

    Messianismo y Mstica en Qumrn. Universidade Catlica del Maule, 2008.

    Consiste numa exegese de alguns textos de Qumran e a anlise de conceitos

    existentes na comunidade, como: Mistrio, Profecia, Mercavh, Luz, etc.

    Percorreu um breve resumo da teologia presente na comunidade de Qumran, de

    maneira particular em relao ao messianismo e a mstica essnia.

    O texto fez citaes e comparaes entre escritos de Qumran e o texto do

    Apocalipse captulos 4, sendo de grande contribuio para nossa pesquisa.

    Uma fonte de leitura que nos auxiliou no avano da anlise foi artigo da

    pesquisadora Dr. Sebastiana S. Nogueira, As Vozes do xtase em 4Q405 - Um estudo nos

    Cnticos do Sacrifcio Sabtico. Oracula, 2009.

    Trata-se de um artigo sobre o dcimo-segundo Cntico do Sacrifcio Sabtico,

    4Q405, que faz parte de um conjunto de treze composies de teor litrgico que foram

    encontradas na caverna 4 de Qumran em 1954.

    http://biblioteca.universia.net/autor/JOS%20ROBERTO%20CORRA%20CARDOSO.html

  • 21

    Une-se a leitura do texto que apresentamos acima do pesquisador Marcelo

    Smargiasse (2003) produzindo uma melhor compreenso da funo dos Cnticos Sabticos

    e de sua dimenso litrgica.

    O artigo pondera as instrues para a liturgia celestial, envolvendo o ritual do

    sacrifcio (olat) executado nos cus por uma comunidade sacerdotal angelomrfica.

    Nesse Cntico podemos contemplar uma liturgia mstica, a presena do (Trono-

    Carruagem/Mercavh), que utiliza o mesmo complexo imagtico presente em Ezequiel 1 e

    10.

    As linhas desse Cntico apontam para uma liturgia de culto em mbito celestial,

    demarcado por vrias expresses e frases que exigem uma anlise cuidadosa para revelar

    seu significado e compreenso.

    A anlise deixou de dar nfase a algumas dessas expresses representativas dos

    Cnticos, como o alegre tumulto de louvores pelas assembleias angelicais, ou a

    animada estrutura do templo celestial, para se concentrar nas expresses que falam do

    lugar do silncio da espiritualidade, expresses como o sussurro dos anjos, um cicio

    tranquilo e suave, a voz do silncio, a calma bno dos deuses.

    Porm, embora o foco de sua leitura seja especfico, no deixa de aprofundar uma

    viso do ambiente litrgico angelomrfico de culto nos cus, delimitando a experincia

    mstica da comunidade, o que contribui com nossa hiptese.

    Portanto, considerando as liturgias, o artigo buscou verificar a possibilidade de

    caracterizar esses sons do silncio, presentes na assembleia celestial, como um murmrio

    de inadequao da linguagem humana da comunidade adoradora de Qumran, diante da

    dimenso da adorao angelical da liturgia celestial.

    Dentre muitos que buscam compreender este universo visionrio tambm tivemos

    acesso ao artigo de Noam Mizrahi, intitulado The Songs of the Sabbath Sacrifice and

    Biblical Priestly Literature: A Linguistic Reconsideration - As Canes do Sacrifcio do

    Sbado e Literatura Sacerdotal Bblica: Uma Reconsiderao Lingustica. Hebrew

    University of Ierusalem, 2011.

    Noam Mizrahi pesquisador da Universidade Hebraica de Jerusalm, sua anlise

    tambm se situa nos Cnticos do Sacrifcio Sbatico, como j dito, uma composio de 13

    canes litrgicas nos fragmentos descobertos entre os Manuscritos de Qumran que

    descrevem o templo celestial e os anjos que servem nele como sacerdotes, e cujo principal

    ritual envolve o dever de louvar e glorificar a Deus.

  • 22

    Em sua pesquisa observou que esses fragmentos so tomados geralmente para

    indicar que as msicas foram compostas em crculos sacerdotais, derivando de tradies

    sacerdotais clssicas, e que refletem uma agenda sacerdotal e viso de mundo. Sua leitura

    concorda com as leituras de Johann Maier, que tambm entende a origem dos cnticos

    como sacerdotais.

    Segundo o artigo, o pesquisador Israel Knohl detectou uma continuao das

    tradies e concepes sacerdotais nas msicas. Sendo o proponente dessa viso Rachel

    Elior que apresentou uma sntese abrangente, segundo a qual, uma tradio direta e

    contnua foi levada da literatura sacerdotal bblica, atravs de escritos sectrios de Qumran

    e as msicas em especial, literatura Hehalot15

    .

    Em sua opinio, estes textos apresentam inmeras afinidades temticas, ideolgicas

    e terminolgicas que provam que eles so partes de um nico fluxo, bem definido de

    tradio, alimentado por crculos sacerdotais. Para ter certeza a este respeito, as msicas

    possuem uma forma excepcional, j que uma provenincia sacerdotal tem sido sugerida

    por outros textos do perodo do Segundo Templo, como o livro dos Jubileus e,

    especialmente, os textos sectrios de Qumran.

    No entanto, a partir destas consideraes Mizrahi identifica significativas

    implicaes para a histria cultural e religiosa da sociedade judaica durante o perodo

    greco-romano, e de suas possveis ligaes com preexlio de Israel, e como tal, deve ser

    analisada.

    O objetivo de seu trabalho foi revisar a evidncia lingstica e estilstica pertinente

    nas canes, concentrando-se no estudo de trs casos especficos. Examinou o uso e

    histria de trs expresses relativas a vrios aspectos do templo e o culto, e comparou a

    evidncia e significado das msicas para os textos sacerdotais agora incorporadas na Bblia

    hebraica.

    Portanto, seus resultados sero objeto de nossa apreciao permitindo a coerncia

    da leitura das tradies do judasmo e cristianismo primitivo.

    Dessa forma o estado da questo nos auxilia na compreenso das fontes, das criticas

    contemporneas e dos desafios atuais da exegese e interpretao bblica.

    15

    Hekhalot, um corpo literrio de textos msticos e escritos mgicos que datam entre o quinto e oitavo sculo

    da era crist cujos manuscritos foram copiados e editados na Idade Mdia [ORACULA 7.12 (2011) EDIO

    ESPECIAL ISSN: 1807-8222].

  • 23

    CAPTULO I

    TEORIAS SOBRE A COMPOSIO LITERRIA

    DO APOCALIPSE DE JOO

    O texto do Apocalipse de Joo considerado de difcil interpretao por conta do

    campo imagtico e sua variedade, dentre outras questes. Exige uma leitura que observe

    atentamente seus detalhes simblicos e suas alteraes constantes de figuras de linguagem.

    Portanto, neste captulo apreciamos algumas das teorias que auxiliam a exegese e

    interpretao da literatura apocalptica.

    1. Hipteses das Fontes

    Segundo David Aune16

    h trs teorias pelas quais podemos compreender a

    composio do livro do Apocalipse de Joo, (1) Teoria da Composio; (2) Teorias de

    Reviso; (3) e Teoria dos Fragmentos e Sntese. Essas teorias so resultados de vrios

    anos de estudos realizados no Apocalipse de Joo e viabilizam uma exegese mais coerente

    dos captulos 4 e 5 objetos desta pesquisa.

    Segue-se um resumo das teorias citadas:

    1.1 Teoria de Compilao

    A) Teoria de Compilao abrange e sustenta a seguinte hiptese: Dois ou mais

    apocalipses foram combinados para formar o Apocalipse de Joo. Para fundament-la cita

    alguns pesquisadores da apocalptica e suas opinies.

    a.1 - M. Boismard (1952) diz que o Apocalipse de Joo uma compilao de dois

    apocalipses, escritos em ocasies diferentes pelo mesmo autor cristo, que era tambm o

    compilador.

    16

    Apud - http://www.teologiaocidental.com/biblica/apocalipse-de-joao/fontes-do-apocalipse-de.pdf, acesso

    em 9/04/2014. Esta informao foi anexada por julg-la importante para o desenvolvimento de novas

    pesquisas.

    http://www.teologiaocidental.com/biblica/apocalipse-de-joao/fontes-do-apocalipse-de.pdf

  • 24

    a.2 - J. M. Ford (1965) sugere que o Apocalipse de Joo uma compilao de trs

    fontes. Duas so judaicas: uma revelao a Joo Batista e outra a um discpulo de Joo

    Batista. A terceira parte foi escrita por outro discpulo de Joo Batista que havia se tornado

    seguidor de Jesus.

    a.3 - F. Roussseau (1971) prope que a pr-histria do Apocalipse de Joo inclui

    cinco camadas redacionais, sendo as primeiras duas judaicas e as ltimas trs crists.

    a.4 - H. Stierlin (1972) dimensiona que provavelmente havia cinco escritos

    compostos separadamente e que foram juntados no incio do II sculo. Estas cinco fontes

    eram: (1) Apocalipse das Duas Testemunhas - Ap. 11, escrito por volta de 68-69 d.C.,

    (2) o Primeiro Apocalipse Sintico - cerca de 70 d.C., (3) o Segundo Apocalipse

    Sintico - 79 d.C., (4) o Terceiro Apocalipse Sintico - 88-96 d.C., e por ltimo (5) as

    Cartas s Sete Igrejas.

    Uma segunda teoria sustentada para a possvel redao do Apocalipse de Joo:

    1.2 Teoria de Reviso

    B) Teoria de Reviso sustenta que uma nica composio original foi submetida a

    uma reviso e expanso editorial posterior por um editor ou uma srie de editores.

    b.1 - R. H. Charles (1920) argumenta que o autor original do Apocalipse de Joo

    havia escrito praticamente tudo que compe o livro, mas morreu antes de public-lo como

    uma s obra. Apresenta a hiptese de que um discpulo do autor, que era fiel, mas no

    inteligente, juntou as partes, acrescentou 43 interpolaes e, ao deslocar muitos trechos,

    criou um caos autocontraditrio em Apocalipse 20.4 - 22.21.

    b.2 - H. Kraft (1974) compreende que a primeira verso do Apocalipse incluiu

    apenas a viso dos sete selos e posteriormente foi expandida pelo acrscimo das vises

    sobre as sete trombetas e as sete taas. Portanto, a primeira verso, com suas trs sries de

    sete pragas, destacou a soberania da ao divina no mundo. Todavia, faltava a ela vrios

    temas tradicionais da escatologia: (1) a preservao dos justos, (2) a vinda de profetas

    escatolgicos, (3) a esperada tribulao final, (4) a investida dos pagos contra os fiis, (5)

    e a congregao das tribos dispersas. Ento, o autor inseriu seu prprio material sobre estes

    assuntos em diversos lugares no texto, assim formando a segunda e, finalmente, a terceira

    verso do Apocalipse. Este trabalho comeou em 97 e foi completado por volta de 110 d.C.

  • 25

    1.3 Teoria de Sntese e de Fragmentos

    C) Teoria de Sntese de Fragmentos prope que o autor ou editor usou muitas

    fontes menores (fragmentos originalmente independentes uns dos outros) para formar uma

    s composio apocalptica.

    c.1 - W. Bousset (1906) para ele alguns dos trechos que mostram evidncia de

    terem sidos documentos j existentes antes da publicao do Apocalipse so: vs. 7.1-8;

    11.1-13 (um panfleto judaico do tempo do cerco de Jerusalm); vs. 12.1-17 (uma viso da

    Rainha do Cu, a Criana e o Drago, derivada da mitologia oriental); vs. 13.11-18 (trecho

    da mo do redator final do Apocalipse); e o captulo 17 (uma sntese de duas verses da

    lenda de Nero redivivus). O editor teria combinado todos os fragmentos j escritos numa s

    obra apocalptica.

    2. A Crtica Diacrnica da Composio

    Entretanto, diante das teorias e suas hipteses Aune sugeriu uma nova perspectiva

    que chamou de crtica diacrnica, cujo contedo combina: (1) a Teoria de Reviso e (2)

    a Teoria de Sntese de Fragmentos. Por meio da anlise e unio das duas prope que, uma

    nica composio original foi submetida a revises e expanses editoriais posteriores pelo

    autor ou editor, que tambm usou fragmentos originalmente independentes da composio

    em questo.

    Assim, segundo Aune h doze unidades textuais relativamente independentes, que

    tm pouco a ver com seus contextos ou com a macronarrativa do Apocalipse (1) vs. 7.1-17

    [o selamento dos 144,000], (2) vs. 10.1-11 [o anjo com o livrinho], (3) vs. 11.1-13 [as duas

    testemunhas], (4) vs. 12.1-18 [a mulher, a criana e o drago], (5) vs. 13.1-18 [as bestas do

    mar e da terra], (6) vs. 14.1-20 [um pasticho de vrias vises e audies]: o Cordeiro e os

    144,000 vs. 1-5, trs revelaes anglicas vs. 6-12, uma audio parentica v. 13, e a

    colheita anglica do trigo e vindima da terra vs. 14-20, (7) vs. 17.1-18 [a prostituta da

    Babilnia], (8) vs. 18.1-24 [a queda da Babilnia], (9) vs. 19.11-16 [o Cavaleiro montado

    no cavalo branco], (10) vs. 20.1-10 [a derrota final de Satans], (11) vs. 20.11-15 [o

    julgamento dos mortos], e (12) vs. 21.922.5 [a viso da nova Jerusalm].

    Estas unidades textuais manifestam caratersticas, que sugerem que elas foram

    compostas em situaes vivenciais (Sitze im Leben) diferentes: (a) H pouca continuidade

  • 26

    nos personagens dramticos encontrados nestes episdios. (b) H poucos vnculos

    literrios entre estas passagens. (c) O gnero e estilo literrio destes trechos exibem mais

    diversidade do que se poderia esperar de episdios escritos expressamente para ser

    includos no seu contexto literrio atual. (d) O carter fortemente judaico de vrios destes

    trechos conduziu crticos anteriores a classific-los como fragmentos de apocalipses

    judaicos que foram unidos por Joo para formar seu Apocalipse.

    A presena destas doze passagens no Apocalipse explicada da seguinte maneira

    por Aune. Durante um prazo de talvez vinte ou trinta anos, o autor redigiu vrios

    documentos apocalpticos independentes para propsitos diferentes e em situaes

    diferentes, dentro dos quais ele incorporou vrias outras tradies mais antigas.

    Eventualmente, o autor decidiu revisar todos estes pequenos documentos a fim de unific-

    los numa s obra literria, seu magnum opus, que hoje chamamos do Apocalipse de Joo.

    Sugere que o autor poderia ter comeado sua carreira longa como um

    apocalipticista judaico na Palestina. Isto explicaria seu conhecimento ntimo do Antigo

    Testamento e a enorme influncia lingustica do hebraico e aramaico na sua obra.

    Junto com outros cristos judaicos, o autor teria sido forado a deixar a Palestina

    logo depois da guerra entre os Judeus e os Romanos (66-73 d.C.). Aune acredita que foi

    assim que o autor chegou provncia romana de sia, onde se tornou aparentemente o

    lder de um grupo de profetas cristos, cuja autoridade foi reconhecida nas igrejas da

    regio. Seu envolvimento da revolta judaica contra a Roma explicaria porque alguns dos

    trechos no Apocalipse so datados por alguns estudiosos na dcada de 60/62, ao passo que

    outros devem ser datados na dcada de 90 d.C.

    Portanto, Aune conclui que a histria da composio do Apocalipse consiste de trs

    etapas, sendo:

    a) A Primeira Etapa - as doze unidades textuais independentes alistadas acima

    foram escritas, provavelmente, nas dcadas 50 e 60 d.C. A sugesto de Aune, portanto,

    parece assumir que Joo comps parte de sua literatura durante sua fase pr-crist como

    um apocalipticista judaico.

    b) A Segunda Etapa - a primeira edio do Apocalipse, que consistia

    aproximadamente de 1.7-12a e 4.122.5 foi compilada, editada e publicada por volta de 70

    d.C., assim refletindo os eventos imediatamente antes e depois da guerra judaica. Joo teria

    se tornado um profeta cristo e esta obra seria um apocalipse cristo, dentro do qual Joo

    teria inserido as unidades textuais independentes que ele redigiu na sua fase judaica. Esta

  • 27

    primeira edio no teve a moldura epistolar, nem a viso inicial de um como filho do

    homem, nem as mensagens s sete igrejas. Consistiu, afirma Aune, de praticamente apenas

    a viagem celestial do profeta.

    c) A Terceira Etapa - a segunda edio do Apocalipse foi completada na ltima

    dcada do sculo I. O que caracteriza esta edio so os acrscimos e a nova perspectiva

    cristolgica. A esta edio foram adicionados: o ttulo 1.1-3, a introduo epistolar e a

    doxologia 1.4-6, a viso do Cristo exaltado e as proclamaes s sete igrejas 1. 12b 3. 22,

    o eplogo e concluso epistolar 22.6-21. notvel que estes acrscimos contenham quase

    todo o material parentico ou tico que se encontra no Apocalipse. A novidade principal na

    rea cristolgica que ttulos e atributos normalmente reservados para Deus no judasmo

    agora so aplicados a Cristo. Agora, Cristo chamado o Alfa e o mega, o Primeiro e o

    ltimo, o Princpio e o Fim 22.13 e o Senhor 22. 20, 21. Tambm nesta edio final, o

    Cristo exaltado descrito com os atributos de Deus em Daniel 7 - vide Ap. 1. 12-20.

    Finalmente, vale a pena notar que Aune acha diferenas estilsticas entre a primeira e a

    segunda edio. Por exemplo, ele diz: Ao passo que 245 (ou 73.79%) das 337 sentenas

    no Apocalipse comeam com kai, e . . ., somente 9 (20,5%) das 44 sentenas em

    Apocalipse 2-3 comeam com kai. Ele acha que tais diferenas no estilo apontam para

    fases diferentes na composio do livro.

    No h comum acordo por parte da erudio apocalptica em torno do livro do

    Apocalipse de Joo. Entretanto, elas fazem parte dos crculos acadmicos e contribuem

    para uma anlise exegtica que faz jus a crtica literria hodierna.

    Como exemplo temos os argumentos de Marguerat17

    para ele a integridade literria

    do Apocalipse de Joo, como as cartas s Igrejas Ap. 2-3 no pertencem ao gnero literrio

    Apocalptico e possui inmeras duplicatas 13.1,3,8; com 17. 3,8; 14.8 com 18.2; 12.9,12

    com 20.2ss.. Estes indcios podem atestar que o Apocalipse o resultado de uma

    compilao de vrias obras, e que esteve sujeito a sucessivas reedies.

    Considerando as hipteses ser feita a leitura e exegese dos textos dos captulos 4 e

    5 do Apocalipse de Joo.

    17

    MARGUERAT, Daniel. Novo Testamento: Histria, Escritura e Teologia. 2 edio. Ed. Loyola, 2012 - p.

    497.

  • 28

    CONCLUSO

    O captulo I teve o objetivo de esclarecer a fragmentao das hipteses sobre a

    composio literria do Apocalipse de Joo. Sendo perceptvel a proposta de que no h

    unanimidade acerca da composio literria do mesmo, porm que notoriamente temos

    uma disposio clara que nos permite ver narrativas menores dentro de um corpo literrio

    composto, i.e os ditos fragmentos.

    Muitos so os caminhos e as metodologias aplicadas ao seu estudo. Deste modo

    somos levados validao da escolha e da exegese das narrativas desta dissertao.

    Podemos afirmar, portanto, que Apocalipse 4 e 5 so dois fragmentos textuais com

    composies diferentes, mas pertencentes a uma mesma tradio. Diante deste fato, nos

    reportamos pesquisa.

  • 29

    CAPTULO II

    ANLISE EXEGTICA - APOCALIPSE CAPTULO 4

    2.1 Introduo ao Texto Grego

    O texto e aparato crtico utilizado para exegese o da 28 edio do Novo

    Testamento Grego de Nestle Aland.

    Na questo de autoria do Livro do Apocalipse por parte de Joo ponderamos os

    pressupostos de uma crtica sutil encontrada de forma preliminar nos escritos de Dionsio

    de Alexandria18

    , que contestou a autoria do Apocalipse como sendo de Joo o apstolo,

    tido como autor do Evangelho. A base desta afirmao sustentada pelo seguinte

    argumento: a linguagem e as ideias do Apocalipse se distinguem do Evangelho e da

    Primeira epstola de Joo.

    Nesta mesma linha de pensamento Barbosa19

    comenta que o texto do Apocalipse

    para muitos um texto que contm muitos erros, sendo de m qualidade. Considera a

    abordagem de S.E. Porter que protesta contra a tese de S.Thompson, este ltimo apresenta

    o grego do Apocalipse como um dialeto grego judaizante. Porter acredita que a lngua do

    Apocalipse de Joo pode ser mais bem compreendida como sendo um dos testemunhos de

    uma lngua grega popular, em uso no primeiro sculo.

    Por outro lado D.D.Schimidt tenta mostrar que certas asperezas do grego do

    Apocalipse de Joo se do pela influncia do grego da Septuaginta usado pelo autor e

    menos pela influncia semtica.

    Barbosa pensa na hiptese de o Apocalipse ser uma traduo de uma verso

    hebraica, talvez uma traduo defeituosa de um original certo. No entanto, entende ser

    justificvel pelo fato de ter vivido em ambiente hebraico e grego; qualificando-o de inculto

    por ignorar a ortodoxia da gramtica grega. Para ele o grego do Apocalipse original e

    nico por iniciativa do prprio autor que assim quis devido o tema teolgico.

    Prope que algumas concluses relativas s caractersticas do grego do Apocalipse

    so: (a) Alternncia dos tempos verbais: presente, passado e futuro; (b) Relevncia

    expressiva e teolgica; (c) Liberao do determinismo do tempo; (d) A trplice linha

    teolgica cria dentro do Apocalipse sua prpria dimenso, a saber: h de um tempo

    18

    Mancionando tambm por - PRIGENT, Pierre. O Apocalipse. Traduo: Luiz Joo Barana. So Paulo

    Loyola, 2002 - p.15,16. 19

    LEITE, Jud Barbosa. A Cristologia e a Tradio Escatolgica Crist no mbito do Apocalipse de Joo.

    Dissertao de Mestrado, Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro, 2003 p. 21, 22.

  • 30

    metahistrico que supera o fatalismo e a contingncia Ap.1,4; 11,3-13; (e) O autor um

    mestre no difcil uso das preposies; (f) No uma escritura uniforme; (g) O contedo

    que precisa ser expresso impe ao autor sua forma.

    Percebemos se tratar de um texto de transmisso questionvel, porm ser analisado

    mediante as consideraes delimitadas no aparato crtico da 28 edio (Nestle-Aland), e

    mediante o uso de dicionrios e opinies justapostas de tericos da literatura apocalptica.

    2.2 Apocalipse 4. 1-11

    Texto Grego 28 edio Nestle-Aland

    1. , , ,

    2. ,

    , , 3.

    ,

    . 4. ,

    . 5.

    ,

    , , 6.

    .

    . 7.

    . 8. ,

    , ,

    , . 9.

    , 10.

    11.

    , ,

    , .

    2.3 Traduo do Texto

    1. Depois destas olhei, e eis porta se abrindo em o cu, e a voz a primeira que

    ouvi como trombeta falando comigo dizendo. Sobe aqui, e mostrarei a ti as que

    devem acontecer depois destas. 2. Imediatamente vim a estar em esprito, e eis

    trono havia ali em o cu e sobre o trono um assentado 3. E o assentado

    semelhante aspecto da viso pedra de jaspe e de sardnico, e listra de cor (arco

    ris) ao redor de o trono semelhante em aspecto a esmeralda. 4. E ao redor do

    trono, tronos vinte e quatro, e sobre os tronos vinte e quatro presbteros

    assentados tendo sido vestidos de vestes resplandecentes e sobre as cabeas deles

    coroas de ouro. 5. e de o trono saam relmpagos e vozes e rumores, e sete

    lmpadas de fogo brilhavam diante do trono, as quais so os sete espritos de

    Deus. 6. e diante do trono como mar de cristal com aspecto de uma crosta de

    gelo, e em meio do trono e ao redor de o trono quatro seres viventes estando

    cheios de olhos por diante e por detrs. 7. E o ser vivente o primeiro com aspecto

    de leo e o segundo ser vivente com aspecto de um novilho e o terceiro ser

    vivente tinha rosto de homem e o quarto vivente aspecto de uma guia voando.

  • 31

    8. E os quatro seres viventes um por um tendo cada um asas seis ao redor, e por

    dentro esto cheios de olhos. E descanso no tem dia e noite, dizendo: santo,

    santo, santo Senhor Deus o todo poderoso, o que era o que e o que vem. 9. E

    quando derem os seres viventes glria e honra e aes de graas ao que se

    assenta em o trono ao que vive para os sculos dos sculos. 10. Cairo prostrados

    os vinte e quatro ancios diante o que se assenta sobre o trono e adoraro ao que

    vive para o sculo dos sculos, e lanaro as coroas deles diante do trono,

    dizendo: 11. Digno s o Senhor e o Deus nosso, de receber a glria e a honra e o

    poder, porque tu criaste todas as coisas e por a vontade tua eram e foram criadas.

    2.4 Introduo a Exegese - Anlise do Aparato Crtico

    Introdutoriamente trataremos das variantes do texto do Apocalipse 4 que

    consideramos mais importantes. Sua funo esclarecer acerca da transmisso da narrativa

    e verificar a coeso do texto.

    Posteriormente verificaremos os resultados deste quadro preliminar e vamos

    ampli-lo luz das tradies do Misticismo Judaico e Apocalptico, dos textos de

    Qumran e demais fontes delimitadas de antemo como referncia, fazendo jus ao tema

    desta dissertao. Convm salientar o uso do aparato crtico anexo 28 edio de Nestle-

    Aland.

    Na pgina 66 na introduo se faz meno das Testemunhas constantemente citadas

    no Apocalipse e suas contribuies.

    Considera-se20

    que a tradio do manuscrito para o livro do Apocalipse muito

    diferente da dos outros escritos do Novo Testamento. Uma caracterstica peculiar a

    diviso do texto Majoritrio bizantino em duas tradies textuais distintas:

    21

    representa o grande nmero de manuscritos com o comentrio sobre o

    Apocalipse por Andreas de Cesrea.

    M Representa a tradio koin adequada

    M Representa o acordo de M e M

    Assim, temos os manuscritos que consistentemente so testemunhas do Apocalipse:

    ( 18) sculo III/IV - papiro do Novo Testamento que contm fragmentos do

    primeiro captulo do Apocalipse de Joo 1. 4-7.

    20

    Vide: ALAND. Kurt; ALAND, Barbara. O Texto do Novo Testamento Introduo s Edies Cientficas

    do Novo Testamento Grego, bem como, Teoria e Prtica da Moderna Crtica Textual. Trad. Vilson Scholz.

    Barueri, SP: Sociedade Bblica do Brasil, 2013 p. 248. 21

    M = Texto Majoritrio, incluindo o texto Koin Bizantino. Indica leituras apoiadas pela maioria de todos

    os manuscritos, i.e., sempre incluindo manuscritos do tipo Koin, em sentido restrito. , ento, representa o

    testemunho do tipo Koin, junto com o testemunho de todos os manuscritos consitentemente citados pela

    segunda ordem, o qual concorda com ele numa dada leitura. Aland. Kurt; Aland, Barbara. O Texto do Novo

    Testamento. So Paulo: Fonte Editorial, 2009 - p. 469.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Novo_Testamentohttp://pt.wiktionary.org/wiki/fragmentohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Cap%C3%ADtulos_e_vers%C3%ADculos_da_B%C3%ADbliahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Apocalipse

  • 32

    ( 24) sculo IV - papiro do Novo Testamento que contm fragmentos dos captulos

    cinco e seis do Apocalipse de Joo 5.5-8; 6.5-8.

    ( 43) sculo VI/VII - papiro do Novo Testamento que contm fragmentos dos

    captulos dois, quinze e dezesseis do Apocalipse de Joo 2.12-13; 15. 8-16.2.

    ( 47) sculo III - papiro do Novo Testamento que contm fragmentos dos captulos

    nove, onze, dezesseis e dezesete do Apocalipse de Joo (9.10-11.3; 11. 5-16.15; 16. 17-

    17.2).

    ( 98) sculo II? antigo papiro do Novo Testamento que contm fragmentos dos

    captulos um e dois do Apocalipse de Joo 1.13-2.1.

    ( 115) sculo III/IV - III? - antigo papiro do Novo Testamento que contm

    fragmentos dos captulos dois, trs, cinco, seis, oito e quinze do Apocalipse de Joo.

    Tambm so citados como testemunhas os Cdices e Fragmentos Unciais: Sinatico

    sculo IV; Alexandrino sculo V; Ephraemi Rescriptus sculo V; Porphyrianus sculo IX,

    046 sculo X, 051 sculo X, 0163 sculo V, 0169 sculo IV, 0207 sculo IV, 0229 sculo

    III;

    Os Cursivos: 1006 sculo XI, 1611 sculo XII, 1841 sculo IX/X, 1854 sculo XI,

    2030 sculo XII, 2050 sculo XII, 2053 sculo XIII, 2062 sculo XIII, 2329 sculo X,

    2344 sculo XI, 2351 sculo X e 2377 sculo XIV.

    Os manuscritos cursivos 2344 sculo XI e o 2377 do sculo XIV, muitas vezes no

    podem ser citados, devido ao seu mau estado de conservao, consequentemente, as

    testemunhas destes manuscritos no podem ser inferidas a partir do silncio.

    As consideraes preliminares desta dissertao seguem os apontamentos

    apresentados pelo aparato crtico, uma vez importante para a delimitao da exegese e

    interpretao dos textos em anlise.

    Seguem-se as divises da narrativa do nosso primeiro texto Apocalipse de Joo

    captulo 4.1-11. Tendo como inteno inserir o leitor nas dimenses textuais da narrativa.

    Uma variante que julgamos importante na leitura do texto de Apocalipse captulo 4

    est no verso 3.

    a) v.3

    3. ,

    .

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Novo_Testamentohttp://pt.wiktionary.org/wiki/fragmentohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Cap%C3%ADtulos_e_vers%C3%ADculos_da_B%C3%ADbliahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Apocalipsehttp://pt.wikipedia.org/wiki/Novo_Testamentohttp://pt.wiktionary.org/wiki/fragmentohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Cap%C3%ADtulos_e_vers%C3%ADculos_da_B%C3%ADbliahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Apocalipsehttp://pt.wikipedia.org/wiki/Novo_Testamentohttp://pt.wiktionary.org/wiki/fragmentohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Cap%C3%ADtulos_e_vers%C3%ADculos_da_B%C3%ADbliahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Apocalipsehttp://pt.wikipedia.org/wiki/Novo_Testamentohttp://pt.wiktionary.org/wiki/fragmentohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Cap%C3%ADtulos_e_vers%C3%ADculos_da_B%C3%ADbliahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Apocalipsehttp://pt.wikipedia.org/wiki/Novo_Testamentohttp://pt.wiktionary.org/wiki/fragmentohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Cap%C3%ADtulos_e_vers%C3%ADculos_da_B%C3%ADbliahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Apocalipse

  • 33

    3. E o assentado semelhante aspecto da viso pedra de jaspe e de sardnico, e

    listra de cor (arco ris) ao redor de o trono semelhante em aspecto a esmeralda.

    As palavras - e o assentado so omitidas na maior parte da

    tradio; na leitura original do manuscrito 1006 do sculo XI, 1841 sculo IX/X, 1854

    sculo XI, 2053 do sculo XIII e tambm 2344 do sculo XI, e no Texto Majoritrio.

    Possui leituras variantes, ou seja, diferem de outras leituras apresentadas s

    margens ou na seo de comentrios que acompanham o texto de um Pai da Igreja. Estas

    aparecem nos seguintes documentos: Cdex Sinatico sculo IV, Alexandrino sculo V,

    Porphyrianus sculo IX, 046 sculo X, 0169 sculo IV, 1611 sculo XII, 2050 sculo XII,

    2329 sculo X, 2351 sculo X, como tambm em toda tradio Latina, Siraca e Copta.

    O versculo 3 apresenta uma unidade de variao diferente no uncial 046 do sculo

    X, onde se escreve - e sardnico h uma insero de - e

    esmeralda.

    O termo substitudo por no Cdice Sinatico, como incio de uma

    diviso textual precoce (quando necessrio), tambm no Alexandrino sculo V e no 2329

    sculo X.

    Em parte da tradio h uma substituio de palavras propondo leituras alternativas

    da frase - semelhante em aspecto a esmeralda. No manuscrito

    046 do sculo X e 1006 sculo XI a frase substituda para: o o

    .

    O manuscrito 1841 do sculo IX/X indica uma leitura que no pode ser

    determinada com absoluta certeza, frequentemente verdadeiro quanto aos papiros e

    palimpsestos, quando a leitura original do manuscrito no mais claramente legvel.

    Os manuscritos 2329 e 2351 ambos do sculo X apresentam variaes menores,

    sendo que o 2351 possui a correo feita por um primeiro copista, ou por um copista

    posterior; em toda tradio do Koin propriamente dita; apresentado variaes menores

    cita-se a tradio Philoxeniana22

    . Possui uma leitura alternativa no manuscrito 1854 do

    sculo XI o o .

    Considera-se, entretanto, uma lista de testemunhas que apoiam o texto desta 28

    edio, sendo: Cdice Sinatico do sculo IV, Cdice Alexandrino sculo V, Porphyrianus

    22

    sy = Philoxeniana - Primeira verso Siraca Monofisista da Bblia, comissionada pelo Bispo Philoxenus, de Mabbug, entre os anos 507/508 A.D., no sobreviveu em sua totalidade. As Epstolas Catlicas mais

    breves (II Pd. 2,3; Jo. e Jd.) e o Apocalipse esto preservados num grupo de manuscritos. Aland. Kurt; Aland,

    Barbara. O Texto do Novo Testamento. So Paulo: Fonte Editorial, 2009 - p. 486.

  • 34

    sculo IX, o Cursivo 1611 do sculo XII. Apresentando variaes menores nos Cursivos

    2050 sculo XII e 2053 sculo XIII. Seguido do apoio do manuscrito 2344 sculo XI; da

    tradio Koin propriamente dita, com o apoio da Vulgata e uma parte da tradio Velha

    Latina; com variaes menores na verso Harklensis23

    . Tem apoio de dois ou mais

    manuscritos da tradio Sahdica24

    e Boharico.

    Concluimos que o verso 3 possui omisso, insero e variaes em sua leitura.

    Estas foram consideradas ao longo da transmisso do texto, e para elas busca-se uma

    leitura apropriada, visando manter a sua coeso por meio da considerao da narrativa

    como um todo.

    No entanto, a variante que exige ateno a do verso 3 onde temos a omisso da

    expresso - e o assentado que parece se dar, pela razo de

    aparentemente promover uma leitura contraditria.

    Se levada em conta subentender-se-, que o autor pretendia falar do aspecto da

    viso como um todo, e no se referiu particularmente e/ou unicamente ao personagem que

    estava assentado sobre o trono. Chegamos a essa concluso pelo fato de a leitura delimitar

    sua interpretao; percebemos que o acrscimo e o assentado parece destoar a frase

    quando lida em sua totalidade: - E o assentado

    semelhante aspecto da viso... que neste caso, tambm pode sugerir a leitura e o aspecto

    da viso do que estava assentado era o que coaduna a leitura do texto junto a viso de

    Ezequiel.

    Contudo, a omisso da expresso e o assentado delimita uma

    leitura e intrepretao tambm coerente, mas que orienta em outra direo, estabelecendo a

    fora do termo grego adjetivo nominativo masculino singular e

    substantivo dativo feminino singular que resguarda o aspecto da viso em si como um

    complexo maior, i.e., o autor nesse sentido parece falar do aspecto da viso como um

    todo, e no se detm apenas no que est assentado no trono.

    23

    sy = Harklensis - verso feita por Thomas de Harkel em 616 A.D., a nica verso Siraca que contm todo o Novo Testamento. Aland. Kurt; Aland, Barbara. O Texto do Novo Testamento. So Paulo: Fonte

    Editorial, 2009 - p. 486. 24

    O Novo Testamento completo existe nas verses Cpticas - Sahdico e Boharico. Feitas direta e

    independentemente do grego. Aland. Kurt; Aland, Barbara. O Texto do Novo Testamento. So Paulo: Fonte

    Editorial, 2009 - p. 488, 489.

  • 35

    Sendo assim, a melhor leitura feita sob o olhar da omisso pode ser:

    3. ,

    .

    3. E a semelhana da viso pedra de jaspe e de sardnico, e listra de cor (arco ris)

    ao redor de o trono semelhana da viso a esmeralda.

    Partindo deste ponto de vista a inteno do autor passa a dar nfase ao aspecto da

    viso, o que pode ser reforado pela duplicidade da expresso:

    aspecto/semelhana da viso no incio e no fim do verso, e que promove a coeso da

    leitura e da interpretao.

    Assim, ficamos com um ponto de interrogao quanto leitura original do mesmo.

    A leitura do verso 8 de grande importncia para nossa anlise, portanto

    observamos sua notoriedade no texto.

    b) v. 8

    8...

    , .

    8...e descanso no tem dia e noite, dizendo: santo, santo, santo Senhor Deus o todo

    poderoso, o que era o que e o que vem.

    25

    santo santo santo aparece 9 vezes no 046 sculo X e em

    toda tradio do Koin propriamente dita. Possuindo uma leitura alternativa para 8 vezes

    no Cdice Sinatico, sendo este ltimo considerado leitura original do manuscrito.

    c) vs. 9

    9.

    ,

    9. E quando derem os seres viventes glria e honra e aes de graas ao que se

    assenta em o trono ao que vive para os sculos dos sculos.

    25

    Cabe aqui a observao de que trataremos sobre o Cntico da Kedush e da variante em si, quando do

    estabelecimento das divises do texto, coeso interna e crtica textual.

  • 36

    derem verbo indicativo futuro na voz ativa, terceira pessoa do

    singular substituda por uma ou mais palavras em parte da tradio: no

    Cdice Sinatico sculo IV, 046 sculo X, 1854 sculo XI, 2351 sculo X e em toda

    tradio de manuscritos que representam os comentrios de Andreas de Cesrea.

    Com leitura alternativa nos manuscritos 1006 sculo XI, 1841 sculo IX/X

    e em toda tradio do Koin. no manuscrito 2053 sculo XIII.

    no 2329 sculo X e no comentrio de Primsio sobre o Apocalipse,

    com apoio das leituras de do Cdice Alexandrino sculo V, Porphyrianus sculo IX, no

    1611 sculo XII e no 2050 sculo XII.

    A expresso - o artigo definido dativo masculino singular e - trono

    substantivo nominativo dativo masculino singular substituda por

    passando de dativo para genitivo no Porphyrianus sculo IX, 046 sculo X, 1006 sculo

    XI, 1611 sculo XII, 1841 sculo IX/X, 2053 sculo XIII, 2329 sculo X, 2344 sculo XI,

    2351 sculo X e no texto Majoritrio incluindo o texto Koin Bizantino; tendo o apoio das

    leituras do Cdice Sinatico sculo IV, Alexandrino sculo V, 1854 sculo XI e no 2050

    sculo XII.

    d) vs.10 e 11

    10.

    11. , ,

    ,

    .

    10. Cairo prostrados os vinte e quatro ancios diante o que se assenta sobre o

    trono e adoraro ao que vive para o sculo dos sculos, e lanaro as coroas deles diante

    do trono, dizendo: 11. Digno s o Senhor e o Deus nosso, de receber a glria e a honra e o

    poder, porque tu criaste todas as coisas e por a vontade tua eram e foram criadas.

    Iniciamos est sesso do captulo 4 analisando os versos 10 e 11 em considerao a

    diviso proposta, uma vez se tratando da adorao dos 24 ancios.

    Observamos primariamente a insero da conjuno coordenativa no incio

    do verso 10 pelo Cdice Sinatico sculo IV, tendo o apoio da tradio Latina com

    pequenas variaes.

  • 37

    Aps a expresso sculo dos sculos encontramos uma

    unidade de variao diferente com a insero de passando a leitura para

    sculo dos sculos amm aparece no Cdice Sinatico sculo IV, no

    2329 sculo X, na tradio Latina e na verso Siraca Philoxeniana.

    O verbo no futuro do indicativo na voz ativa na terceira pessoa do plural

    lanaro substituda pela forma ; considerado uma leitura original do

    manuscrito no Cdice Sinatico sculo IV; 046 sculo X, 1854 sculo XI, 2050 sculo XII,

    2053 sculo XIII, 2329 sculo X, nos manuscritos com o comentrio sobre o Apocalipse de

    Andreas de Cesrea, tambm nos manuscritos individuais da Vulgata com leituras

    independentes.

    Tambm possui uma unidade de variao na forma no 1611 sculo X

    com leituras que diferem nos manuscritos da Vulgata.

    O verso apresenta inicialmente uma insero que modifica a leitura -

    o Senhor e para a forma que se inicia com uma exclamao

    Senhor! o Senhor e no Cdice Sinatico. Com a insero a leitura

    da frase se torna Digno s Senhor! o Senhor e o Deus nosso....

    A vogal omitida em parte da tradio: no Cdice Sinatico sculo IV; no 046

    sculo X se identifica uma correo da leitura original; sendo tambm omitida no 1006

    sculo XI, 1611 sculo X, 1841 sculo IX/X e o 2050 sculo XII.

    Em seguida apresenta a insero da expresso o santo aps a expresso

    Deus nosso passando a ser lido como: Deus nosso o

    santo; a insero encontra-se nos seguintes manuscritos: 046 sculo X, 1006 sculo XI,

    1841 sculo IX/X, 2351 sculo X, em toda tradio do Koin, e nas leituras do texto da

    Harkleana includas pelos sinais crticos e que no representam o exemplar do tradutor.

    A expresso - eram e foram criadas no final do verso 11

    apresenta insero, substituio e omisso em algumas tradies;

    O uncial 046 sculo X possui a insero da partcula negativa produzindo a

    leitura no eram e foram criadas

    Em diferentes partes das tradies encontramos a substituio de por

    - aparece no: Porphyrianus sculo IX, 1854 sculo XI, 2050 sculo XII; tambm

    nos manuscritos que representam os comentrios de Andreas de Cesrea e na verso Copta

    Sahdica. Com a leitura alternativa para no 2329 do sculo X.

  • 38

    Sendo que no Cdice Alexandrino sculo V omitida a expresso

    e foram criadas.

    3. Coeso Estrutura e Delimitao do Texto

    O objetivo da coeso tratar basicamente das articulaes gramaticais existentes

    entre as palavras, oraes e frases garantindo uma boa sequenciao e lgica dos eventos.

    Assim, iremos considerar o nmero de vezes que uma determinada palavra aparece no

    texto, funo de cada verso na narrativa, e a lgica dos eventos, procurando definir a

    coeso interna e a estrutura do texto.

    O verso 1 comea e termina com a expresso Depois destas () que uma

    preposio acusativa e () um adjetivo pronominal demonstrativo acusativo neutro

    plural. O que conforme Nogueira26

    indica uma mudana de nvel narrativo, mas que

    tambm transmite a ideia de uma continuidade do texto em relao a uma informao

    anterior, e que bem pode indicar a nfase que o autor pretendia produzir ao seu leitor,

    chamando-lhe a ateno para os fatos acontecidos, e para os que deveriam se suceder.

    No entanto, permanece distinta a viso de um cenrio totalmente diferente do

    anterior, pois neste, Joo inicia sua viagem celestial e tem a viso do trono.

    A coeso interna do texto bem delineada pela presena do termo trono -

    que aparece 14 vezes nos versos 2,4,5,6,9 e 10. Salientando a observao de que

    precedido 9 vezes pelo artigo definido genitivo masculino singular nos versos

    versos 3,4,5,6 e 10; uma vez precedido por artigo definido acusativo masculino

    singular verso 2; uma vez precedido por artigo definido acusativo masculino plural

    verso 4; e uma vez precedido por artigo definido dativo masculino singular. O uso do

    artigo junto ao substantivo indica a coeso temtica do texto (O Trono de Deus) como de

    sua estrutura narrativa.

    O termo esprito usado apenas duas vezes no texto versos 2 e 5, sendo

    que a primeira meno do termo substantivo dativo neutro singular usada

    para descrever o estado em que o visionrio se encontra logo aps receber o convite para

    ascender ao trono em esprito.

    26

    NOGUEIRA, Paulo Augusto de Souza. Experincia Religiosa e Critica Social no Cristianismo Primitivo.

    So Paulo. Ed. Paulinas, 2004 p. 18.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Coes%C3%A3o_(L%C3%ADngua_portuguesa)

  • 39

    A segunda meno do termo est no verso 5 substantivo nominativo

    neutro plural - faz referncia s sete lmpadas de fogo que so os sete espritos de Deus

    diante do trono.

    Considerando o verso 3 identificamos que o mesmo possui omisso, insero e

    variao em sua leitura; estas foram consideradas pelos copistas ao longo da transmisso

    do texto, e buscam delimitar uma leitura apropriada para o mesmo, bem como, contribuir

    para coesso da narrativa como um todo.

    Assim o termo assentado verbo particpio presente, voz mdia,

    nominativo masculino singular; so usados no texto cinco vezes 2,3,4,9 e 10 com exceo

    do verso 4 onde os que esto assentados so os ancios, os demais versos 2,3,9 e 10 fazem

    meno ao que est assentado no trono. Isto mantm a dinmica da narrativa de forma pr-

    estabelecida. O que tambm prope que aquele que se assenta no trono exerce o domnio

    absoluto, e correlaciona-se com o motivo litrgico da viso em si Deus Adorado como o

    Criador.

    Na anlise do aparato nos deparamos com a variante do verso 3 acerca da omisso

    da expresso - e o assentado que parece se dar, pela razo de

    aparentemente promover uma leitura contraditria.

    Sendo assim, propomos que uma razovel leitura feita sob o olhar da omisso deve

    ser:

    3. ,

    .

    3. E a semelhana da viso pedra de jaspe e de sardnico, e listra de cor (arco ris)

    ao redor de o trono semelhana da viso a esmeralda.