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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE ALLEMÃO SANTOS A INDISPONIBILIDADE DE BENS NA AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: UMA ANÁLISE À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ NITERÓI 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

THIAGO FREIRE ALLEMÃO SANTOS

A INDISPONIBILIDADE DE BENS NA AÇÃO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA: UMA ANÁLISE À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ

NITERÓI

2017

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THIAGO FREIRE ALLEMÃO SANTOS

A INDISPONIBILIDADE DE BENS NA AÇÃO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA: UMA ANÁLISE À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado à Faculdade de Direito da

Universidade Federal Fluminense como

requisito parcial à obtenção do grau de

Bacharel em Direito.

Orientadora: Profa. Dra. Helena Elias Pinto

NITERÓI

2017

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Santos, Thiago Freire Allemão.

A indisponibilidade de bens na ação de improbidade administrativa: uma análise à luz da jurisprudência do STJ / Thiago Freire Allemão Santos. – Niterói, 2017.

75 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade Federal Fluminense, 2017.

1. Improbidade administrativa. 2. Indisponibilidade. 3.

Ilícito administrativo. 4. Medida cautelar. 5. Tribunal superior. I. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Direito, Instituição responsável. II. A indisponibilidade de bens na ação de improbidade administrativa: uma análise à luz da jurisprudência do STJ.

CDD 341.3

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THIAGO FREIRE ALLEMÃO SANTOS

A INDISPONIBILIDADE DE BENS NA AÇÃO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA: UMA ANÁLISE À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado à Faculdade de Direito da

Universidade Federal Fluminense como

requisito parcial à obtenção do grau de

Bacharel em Direito.

Aprovada em julho de 2017.

BANCA EXAMINADORA

Profa. Dra. Helena Elias Pinto – Orientadora

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Prof. Eduardo Faria Fernandes

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Prof. Juliano Oliveira Pinto

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

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Aliás, o desafio da jurisdição moderna – máxime em sede sancionadora – é

precisamente o de realizar as tarefas da repressão às ilicitudes sem descambar

para a inobservância das garantias processuais das pessoas processadas,

embora ceder a essa tentação seja uma ideia que ronda permanentemente,

como um fantasma, o exercício da jurisdição repressiva, inclusive (ou

sobretudo) no âmbito penal, onde as ilicitudes são mais agressivas e

ofendentes dos mais altos valores socialmente prezáveis.

Napoleão Nunes Maia Filho

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RESUMO

O presente trabalho visa, por meio do exame da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça,

realizar uma análise dos principais aspectos referentes à indisponibilidade de bens, medida

cautelar prevista no artigo 37, § 4º da Constituição Federal e no artigo 7º da Lei de Improbidade

Administrativa. A função de tal medida é assegurar a efetividade de futura decisão, ao final da

ação de improbidade, que venha a condenar o réu ao ressarcimento integral dos danos causados

ao patrimônio público ou ao perdimento de bens ilicitamente adquiridos. Assim, em primeiro

lugar, será realizada uma análise dos antecedentes legislativos à Lei de Improbidade

Administrativa, de modo a demonstrar a evolução da tutela da moralidade na legislação

brasileira até o momento atual. Em segundo lugar, serão abordadas as principais controvérsias

envolvendo a natureza jurídica, as hipóteses de cabimento, o momento adequado ao

requerimento da indisponibilidade dos acusados e os requisitos para concessão da medida. Por

fim, serão analisados os limites impostos à sua concessão de modo a verificar se as teses

adotadas pelo Superior Tribunal de Justiça tendem a acolher posições mais favoráveis ao

Estado, privilegiando assim o interesse público à recomposição dos danos causados pela

atuação do agente ímprobo, ou à proteção da parte acusada, privilegiando a presunção de

inocência constitucionalmente conferida pelo artigo 5º, inciso LVII.

Palavras-chave: Improbidade Administrativa; Indisponibilidade; Ilícito Administrativo;

Medida Cautelar; Superior Tribunal de Justiça.

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ABSTRACT

The present paper aims, through the examination of the jurisprudence of the Superior Court of

Justice, to conduct an analysis of the main aspects related to the unavailability of assets,

precautionary measure provided for in Article 37, Paragraph 4 of the Federal Constitution and

Article 7 of the Administrative Improbability Law. The function of such a measure is to ensure

the effectiveness of a future decision, at the end of the improbity action that can convict the

defendant to the full compensation of the damages caused to the public patrimony or to the loss

of illicitly acquired assets. Thus, in the first place, an analysis of the legislative antecedents will

be made to the Law of Administrative Improbity, in order to demonstrate the evolution of the

tutelage of morality in the Brazilian legislation up to the present moment. Secondly, the main

controversies involving the legal nature, the assumptions of appropriateness, the appropriate

time for requesting the unavailability of the accused and the requirements for granting the

measure will be addressed. Finally, the limits imposed on its concession will be analyzed in

order to verify if the theses adopted by the Superior Court of Justice tend to accept positions

more favorable to the State, thus favoring the public interest to the reimbursement of the

damages caused by the performance of the impotent agent, or To the protection of the accused

party, privileging the presumption of innocence constitutionally conferred by Article 5, LVII.

Keywords: Administrative Misconduct; Unavailability; Administrative Offense; Precautionary

Measure; Superior Court of Justice

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SUMÁRIO

Introdução 8

1. Tutela da Moralidade Administrativa no Brasil 11

1.1. Antecedentes Legislativos 11

1.2. Tipologia dos Atos de Improbidade na Lei nº 8.429/92 18

1.2.1. Dos Atos que Geram Enriquecimento Ilícito do Agente 19

1.2.2. Dos Atos que Causam Danos ao Erário 22

1.2.3. Dos Atos que Atentam Contra os Princípios da Administração Pública 26

2. Indisponibilidade de Bens 29

2.1. Natureza Jurídica 29

2.2. Cabimento 32

2.3. Momento Adequado do Pedido de Indisponibilidade 36

2.4. Requisitos 39

2.4.1. Probabilidade do Direito (Fumus boni iuris) 40

2.4.2. Perigo de Dano ou Risco ao Resultado Útil do Processo (Periculum in mora) 41

3. Extensão da Medida de Indisponibilidade 50

3.1. Quanto aos Bens 50

3.1.1. Momento de Aquisição do Bem 52

3.1.2. Bens Impenhoráveis 55

3.2. Quanto às partes 58

3.2.1. Pluralidade de Réus 58

3.2.2. Sucessor do Agente Ímprobo 62

Conclusão 64

Referências 68

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Introdução

O artigo 37, caput da Constituição Federal de 1988 traz a previsão de diversos

princípios que devem servir de orientação à atuação da Administração Pública. Dentre tais

princípios, destaca-se o da moralidade que impõe ao agente público no cumprimento de certos

deveres, a atuação honesta e proba, a fim de que a Administração Pública possa atuar sempre

voltada a consecução do interesse público.

Quando a atuação do agente público, no entanto, é realizada em desacordo com tais

deveres e fundada em desonestidade, como será visto, haverá a configuração do ato de

improbidade administrativa. Assim, a improbidade administrativa é a atuação do agente público

em desconformidade com o princípio da moralidade.

O § 4º do artigo 37 da Constituição, sem definir quais seriam os atos de improbidade,

função relegada à legislação infraconstitucional, determinou que aos praticantes de tais atos

seriam impostas a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos, a

indisponibilidade de bens e o ressarcimento ao erário.

Visando a regulamentação de tal dispositivo, foi editada a Lei 8.429/92 que trouxe a

previsão de quais seriam os atos de improbidade e as sanções que lhes seriam aplicadas. De

igual modo, a referida Lei previu ainda um conjunto de regras processuais específicas para o

processamento das ações de improbidade e de instrumentos processuais destinados a assegurar

a eficácia de futura sentença condenatória.

Dentre as diversas disposições da Lei de Improbidade Administrativa, foi escolhido

como objeto principal desse trabalho a análise da medida de indisponibilidade de bens, prevista

no artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa:

Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou

ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável

pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos

bens do indiciado.

Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo

recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre

o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.

A medida de indisponibilidade de bens é tema que tem dado azo à diversos

questionamentos e discussões, tanto na doutrina, como na jurisprudência. Isso se deve ao fato

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de que o artigo, como pode ser visto acima, possui redação deficiente, não trazendo a

regulamentação esperada para um instrumento tão importante1.

Devido à insuficiência do dispositivo para regulamentar a aplicação e os limites da

indisponibilidade, essa tarefa recaiu sobre a jurisprudência, em especial, do Superior Tribunal

de Justiça. Sendo assim, para se proceder ao estudo dos diversos aspectos concernentes à

indisponibilidade de bens, faz-se necessária a análise da jurisprudência do referido Tribunal

Superior.

Nesse sentido, por meio da ferramenta de busca de jurisprudência presente no sítio

eletrônico do Superior Tribunal de Justiça2, foi realizada a pesquisa utilizando-se os termos

“indisponibilidade e improbidade”. Com esse parâmetro de pesquisa foram apresentados 412

(quatrocentos e doze) resultados. A partir da análise de tais resultados, foram selecionados os

julgados que apontavam a predominância de determinado posicionamento na Corte com relação

a cada tema.

A relevância do tema está na necessidade da verificação dos limites impostos pela

jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça à concessão da medida, uma vez que, apesar de

ser importante instrumento à garantia da eficácia de futura condenação do agente por ato de

improbidade, é também medida gravosa imposta ao réu que ainda ostenta a presunção de

inocência imposta pelo artigo 5º, LVII da Constituição Federal.

Assim, questiona-se em que sentido caminha a jurisprudência da Corte Superior. Se

predomina nos seus julgados entendimentos no sentido de flexibilizar os limites da aplicação

da indisponibilidade, de modo a garantir maior eficácia à futura recomposição ao erário, ou se

evolui no sentido de assegurar as garantias dadas ao acusado, exigindo maior rigidez ao

cumprimento dos requisitos, bem como que a medida se sujeite a mais limites.

Nesse sentido, no primeiro capítulo será realizada uma análise das legislações que

antecederam a Lei 8.429/92, de modo a demonstrar a evolução do controle da moralidade no

Brasil e embasar a análise da tipologia dos atos de improbidade trazidos pela referida Lei.

No segundo capítulo, serão analisadas as principais questões referentes à natureza

jurídica da indisponibilidade de bens, as hipóteses de cabimento, o momento adequado à

realização do pedido e os requisitos necessários à sua concessão.

1 DIAS, Francisco Barros. A Tutela Cautelar na Ação de Improbidade. In: LUCON, P. H. dos S. (Coord.); COSTA,

E. J. da F. (Coord.); COSTA, G. R. (Coord.). Improbidade Administrativa: Aspectos processuais da Lei nº

8.429/92 – 2ª edição. São Paulo: Editora Atlas, 2015. P. 189. 2 http://www.stj.jus.br/SCON/

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Por fim, no terceiro capítulo serão tratados especificamente os limites impostos pela

jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça à indisponibilidade de bens. Assim, será

analisado quais bens podem ser tornados indisponíveis, os efeitos da pluralidade de réus na

medida, os limites impostos à responsabilização do sucessor do agente ímprobo e o cálculo do

valor a ser tornado indisponível para garantir hipotética sanção de multa que poderá ser imposta

ao fim do processo.

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1. Tutela da Moralidade Administrativa no Brasil

1.1. Antecedentes legislativos

A proteção da moralidade na Administração Pública é tema que está em voga, devido

ao aumento do número de condenações referentes à corrupção3 e a maior transparência dada a

tais casos4. Apesar de ser um debate que aparenta ser recente, devido aos diversos escândalos

de corrupção que inundam os noticiários, é uma preocupação que acompanha a história de

diversas nações. No Brasil, o temor do mau uso da res publica pelos agentes públicos pode ser

notado, ao longo de sua história, por meio dos diplomas legais editados, em especial, nas

Constituições.

O primeiro grande avanço da tutela da moralidade administrativa no Brasil ocorreu na

Constituição Imperial, outorgada em 1824. Como o regime de governo, à época, era o imperial,

não havia previsão de responsabilidade do governante, uma vez que ainda seguia-se a máxima

the king do no wrong5.

Apesar da ausência de responsabilidade do Imperador, é possível verificar que a

Constituição de 1824 trouxe regras com o intuito de reprimir condutas contrárias à moralidade

do Estado, especialmente ao tratar dos Ministros de Estado no artigo 1336. O referido

dispositivo prevê que tais agentes seriam responsabilizados “por peita, suborno ou concussão”

(inc. II), “por abuso de poder” (inciso III), “pela falta de observância da Lei” (inciso IV), assim

como “por qualquer dissipação dos bens públicos” (inciso VI).

3 GODOY, M.; BRAMATTI, D. Desde 2013, prisões por corrupção crescem 288%: Crime. Aprovada em resposta

às manifestações de rua há 4 anos, lei das delações fez aumentar detenções por desvio de recursos; número saltou

de 2,5 por semana para 10. O Estado de São Paulo, São Paulo, 25/06/2017. Disponível em:

<https://goo.gl/TPBb4m>. Acesso em: 09/07/2017.

4 DINIZ, F. Ministro diz que transparência aumentou sensação de corrupção: José Eduardo Cardozo, titular da

pasta da Justiça, disse que políticas de transparência fizeram a sociedade tomar conhecimento de irregularidades.

Terra, Porto Alegre, 31/07/2013. Disponível em: <https://goo.gl/WWCEiP>. Acesso em: 09/07/2017. 5 Cf: Morais, Márcio Eduardo Senra Nogueira Pedrosa. Breves Considerações Sobre A Responsabilidade Civil

Extracontratual Do Estado No Ordenamento Jurídico Brasileiro. SynThesis Revista Digital FAPAM, v. 6, p. 241-

251, 2015. 6 Art. 133. Os Ministros de Estado serão responsaveis

I. Por traição.

II. Por peita, suborno, ou concussão.

III. Por abuso do Poder.

IV. Pela falta de observancia da Lei.

V. Pelo que obrarem contra a Liberdade, segurança, ou propriedade dos Cidadãos.

VI. Por qualquer dissipação dos bens publicos.

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Dessa forma, ainda que não houvesse previsão expressa de tutela do princípio da

moralidade, pode-se apontar que a Constituição Imperial, ainda que de forma indireta, trazia

previsão contrária a atos considerados hoje como ímprobos7.

A Constituição de 18918, ao tratar de crimes de responsabilidade trouxe

expressamente, pela primeira vez no ordenamento jurídico brasileiro, a responsabilização do

Presidente por atos que atentassem contra a probidade da Administração Pública. Esse

dispositivo, desde então, esteve presente em todas as Constituições seguintes9.

As Constituições de 1934 e 1937 pouco alteram o que já havia sido previsto pela

Constituição de 1891. No entanto, cumpre ressaltar que, durante a vigência da Constituição de

1937, foi editado o Decreto 1.713, de 28 de Outubro de 193910, que instituiu o primeiro Estatuto

dos Funcionários Públicos Civis da União.

O artigo 227 do referido diploma legal trouxe a primeira previsão expressa da

responsabilização do servidor público por conduta dolosa lesiva ao erário. O referido

dispositivo, assim, versava sobre a primeira previsão legal de controle ético de todos os

funcionários públicos, não se restringindo apenas aos agentes políticos, uma vez que reconhecia

a possibilidade do agente, dolosamente, lesar o erário.

Ultrapassava-se, portanto, o entendimento de que o agente somente responderia pela

prestação ineficiente do serviço, e passou a prever também sanções diretas à prática dolosa de

atos voltados à lesão ao patrimônio público.

Obviamente, não se pretende argumentar que não havia previsão expressa de

responsabilização do agente público por sua atuação. Todas as Constituições brasileiras11

contiveram cláusula determinando a responsabilização do funcionário público, seja pelos

abusos cometidos, seja pela sua omissão.

7 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa – 6ª edição. Rio de Janeiro:

Editora Lumen Juris, 2011. P. 199. 8 Art 54 - São crimes de responsabilidade os atos do Presidente que atentarem contra:

(...)

6º) a probidade da administração; 9 Os dispositivos podem ser encontrados no artigo 57, alínea “f” da Constituição de 1934; no artigo 85, alínea “d”

da Constituição de 1937; no artigo 89, inciso V da Carta Magna de 1946; no artigo 84, inciso V da Constituição

de 1967; no artigo 82, inciso V da Emenda Constitucional nº 01 de 1969; e no artigo 85, inciso V da Constituição

de 1988. 10 Disponível em: <https://goo.gl/np3KmI>. Último acesso: 09/07/2017. 11 A previsão da cláusula de responsabilidade dos funcionários públicos pode ser encontrada: no artigo 179, inciso

XXIX, da Constituição de 1824; no artigo 82 da Constituição de 1891; no artigo 171 da Constituição de 1934; e

no artigo 158 da Constituição de 1937.

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No entanto, o texto normativo veiculava uma cláusula geral, cujo teor se circunscrevia

a hipótese de responsabilização do agente público. A conduta lesiva do funcionário público não

era examinada sob o âmbito do dolo ou da desonestidade do agente.

O Decreto 1.713/39 foi, portanto, o primeiro diploma legal por meio do qual o

legislador expressou a sua preocupação com a possibilidade de que o agente público pudesse

ter conduta desonesta, hoje denominada ímproba, atuando de forma dolosa em desfavor da

administração.

Nesse sentido, o referido diploma legal expandiu o espectro de análise da moralidade

administrativa para além da figura dos agentes públicos, vindo a incluir funcionários públicos,

o que denota uma crescente preocupação com a necessária coibição de condutas desonestas por

parte dos agentes públicos.

A Constituição de 1946, por sua vez, trouxe, em seu artigo 141, § 31:

Art 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes

no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a

segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)§ 31 - Não haverá pena de morte, de banimento, de confisco nem de caráter

perpétuo. São ressalvadas, quanto à pena de morte, as disposições da

legislação militar em tempo de guerra com país estrangeiro. A lei disporá

sobre o seqüestro e o perdimento de bens, no caso de enriquecimento

ilícito, por influência ou com abuso de cargo ou função pública, ou de

emprego em entidade autárquica. (grifo não presente no original)

A Constituição de 1946 foi o primeiro documento legal a prever expressamente os

casos de enriquecimento ilícito do agente público por meio do abuso de seu cargo. Ainda que

não utilizasse o termo “improbidade administrativa” para o enriquecimento ilícito, a

Constituição de 1946 impôs a criação de um sistema de controle da moralidade administrativa.

A fim de regulamentar o § 31 do artigo 141 da Constituição de 1946, foi editada, em

1957, a Lei 3.164/5712, também conhecida como Lei Pitombo-Godói Ilha. A Lei, buscando dar

maior efetividade à fiscalização da evolução patrimonial dos agentes públicos, instituiu, em seu

artigo 3º13, um registro público obrigatório dos bens e valores que constituem o patrimônio

privado de tais agentes.

12 Disponível em: <https://goo.gl/j3eYab>. Último acesso: 09/07/2017. 13Art. 3º É instituido o registro público obrigatório dos valores e bens pertencentes ao patrimônio privado de

quantos exerçam cargos ou funções públicas da União e entidades autárquicas, eletivas ou não.

§ 1º - O registro far-se-á no Serviço do Pessoal competente, mediante declaração do servidor público, incidindo

na pena de demissão do serviço público o que fizer falsa declaração.

§ 2º - O registro compreenderá, móveis, imóveis, semoventes, dinheiro, títulos e ações e qualquer outra espécie de

bens e valores patrimoniais, excluídos os objetos e utensílios de uso doméstico cuja soma não exceda de Cz$

100.000,00 (cem mil cruzeiros).

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Esse registro, que seria realizado bienalmente, se tornou obrigatório para todos os

agentes públicos federais e se faria constar todas as espécies de bens e valores patrimoniais dos

agentes públicos, tais como bens móveis, imóveis e semoventes, os títulos e ações, dentre

outras, sendo excetuados os objetos e utensílios domésticos cuja soma não excedesse Cz$

100.000,00 (cem mil cruzeiros).

A Lei previu também, em seu artigo 1º, § 2º, a legitimidade concorrente entre o

Ministério Público e qualquer cidadão para a promoção da ação que visasse o sequestro e o

perdimento de bens ilicitamente auferidos pelo agente público mediante o abuso de sua função,

de seu cargo ou de seu emprego.

A Lei, no entanto, não foi eficaz no combate ao enriquecimento ilícito. O referido

registro de bens acabou ficando relegado ao esquecimento, por conta da falta de

regulamentação. Contribuiu ainda, para a sua ineficácia, a dificuldade em se demonstrar o nexo

de causalidade entre a evolução patrimonial do agente e o abuso do cargo que ocupava.14

Em 1958, foi editada a Lei nº 3.50215, também conhecida como Lei Bilac Pinto, para

complementar a regulamentação do artigo 141, § 31 da Constituição de 1946. Diferentemente

da Lei Pitombo-Godói Ilha, que criou instrumentos práticos de fiscalização e definiu a

legitimidade para a propositura da ação, a Lei Bilac Pinto tinha por escopo a amplitude da

aplicação do dispositivo constitucional, delimitando as definições dos termos utilizados na

Constituição.

Nesse sentido, dispunha a Lei nº 3.502/58, em seu artigo 1º, § 1º, a definição do termo

“servidor público” como todas as pessoas que exercem na União, nos Estados, nos Territórios,

no Distrito Federal e nos municípios, quaisquer cargos, funções ou empregos, civis ou militares,

quer sejam eletivos que de nomeação ou contrato, nos órgãos dos Poderes Executivo,

Legislativo ou Judiciário.

No seu artigo 2º, no § único do artigo 4º, a referida Lei tratava as hipóteses em que see

configuram o enriquecimento ilícito do agente público. O rol previsto, no entanto, era exaustivo,

o que exigia, para a aplicação da lei que a conduta dos agentes se adequassem perfeitamente ao

previsto nos dispositivos para autorizar a sua aplicação.

§ 3º - A declaração será atualizada bienalmente, podendo a autoridade a que estiver subordinado o servidor exigir

a comprovação da legitimidade da procedência dos bens acrescidos ao patrimônio do servidor.

§ 4º - O registro prévio é condição indispensável à posse do servidor público e deverá ser obrigatòriamente

atualizado antes do seu afastamento do cargo ou função.

§ 5º - A declaração de que trata êste artigo compreende os bens do casal. 14 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 201. 15 Disponível em: <https://goo.gl/mdQYu6>. Acesso em: 09/07/2017.

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A Lei Bilac Pinto trazia ainda a previsão de que o próprio ente público lesado pelo uso

abusivo do cargo, do emprego ou da função pública, poderia ingressar com a ação e requisitar

o sequestro e o perdimento de bens.

A Lei nº 3.502/58, no entanto, assim como a Lei Pitombo-Godói, também não

conseguiu dar eficácia ao combate ao enriquecimento ilícito. Ainda que houvesse ocorrido um

aperfeiçoamento da legislação quanto à matéria, ainda persistia a dificuldade probatória para a

comprovação do enriquecimento ilícito. De igual modo, contribui para a ineficácia o fato de

que ambas as leis somente previam o perdimento de bens como sanção, sem ocorrer o

afastamento do agente.16

A Lei nº 4.717/65, editada ainda sob a vigência da Constituição de 1946, regulamentou

a Ação Popular, instituindo a forma específica por meio da qual todo cidadão pode requisitar a

anulação ou a declaração de nulidade de atos que sejam considerados lesivos ao patrimônio

público.

A Lei da Ação Popular, no entanto, assim como as normas anteriores, não estabeleceu

sanções diretas ao agente, exigindo deste tão somente o ressarcimento quanto ao dano causado

pelo ato lesivo. Logo, apesar de permitir a extensão aos cidadãos do controle dos atos da

Administração Pública, ainda não havia um sistema que permitisse sancionar o agente infrator,

sem recorrer ao Direito Penal.

Logo em seguida à Lei nº 4.717/65 adveio a Constituição Federal de 1967 que, em seu

artigo 150, § 11º, além do enriquecimento ilícito, passou a prever também a possibilidade da

aplicação da sanção de perdimento de bens aos agentes públicos por danos causados ao erário,

visando assim a recomposição deste. Esse dispositivo, no entanto, não chegou a ser

regulamentado por qualquer diploma legal infraconstitucional o que tornou praticamente

impossível a sua aplicação, uma vez que não havia a delimitação das condutas que causassem

dano ao erário e que pudessem ser abrangidas pela proteção conferida pelo dispositivo17.

A Emenda Constitucional nº 01/1969 não trouxe qualquer alteração ao regime já

previsto pela Constituição de 1967, trazendo, portanto, dentre os atos puníveis com o

perdimento de bens, o enriquecimento ilícito do agente público, conforme regulamentado pelas

Leis Pitombo-Godói Ilha e Bilac Pinto, e o dano ao erário, não regulamentado pela legislação

infraconstitucional.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, caput e § 4º, trouxe a seguinte

redação:

16 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 202. 17 Ibidem. P. 205.

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Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da

União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos

princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência

e, também, ao seguinte:

§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos

direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o

ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da

ação penal cabível.

Conforme se pode notar da transcrição do dispositivo legal, a Constituição Federal

quebrou com a redação tradicional das Constituições anteriores ao tratar dos atos de

improbidade como um gênero, sem elencar as condutas reprováveis e que ensejam a sanção.

Assim, acabou por relegar à legislação infraconstitucional a definição de quais seriam os atos

de improbidade.

A grande inovação da Constituição Federal de 1988, no entanto, se deu pela previsão

no caput do seu artigo 37 como princípios norteadores da Administração Pública a

impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência, em conjunto com o princípio da

legalidade. Dessa forma, a Constituição demonstrou que a mera adequação formal à lei, não

deve ser o único por meio do qual a atuação estatal deve se pautar.

A inclusão, na Constituição de 1988, de objetivos a serem perseguidos e de princípios

e normas que fornecessem balizas para a sua consecução, tornou inevitável o entendimento de

que o princípio da legalidade não poderia mais ser o único vetor mediante o qual se pudesse

aferir a legitimidade da atuação administrativa, bem como determinar suas limitações18.

Assim, a concepção de legitimidade mediante a adequação do ato à norma foi

substituída pelo princípio da juridicidade, entendido como a conformidade do ato “com uma

interpretação sistêmica do ordenamento jurídico pátrio”19. Ou seja, hoje, passou-se a se exigir

que a atuação administrativa considere a totalidade do ordenamento jurídico, sendo praticada

de forma harmônica com o universo normativo.20

Rogério Pacheco e Emerson Garcia ensinam:

Em que pese o fato de os princípios da legalidade (rectius:

constitucionalidade) e da moralidade serem os vetores básicos da probidade

administrativa, afigura-se evidente que tais princípios estão abrangidos por

uma epígrafe mais ampla, sob a qual se encontram aglutinados todos os

18 Ibidem. P. 58. 19 DE SOUZA, Júlia Mezzomo. A Crise da Lealidade Administrativa e a Aplicação do Princípio da Juridicidade a

Casos de Concessão de Gratificações de Desempenho a Servidores Públicos Federais. Trabalho de Conclusão de

Curso (Graduação em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de Brasília, Brasília, 2015. P. 27. Disponível

em: <https://goo.gl/dCiSKL>. Acesso em: 09/07/2017. 20 MOREIRA, Egon Bockmann. O Princípio da legalidade, a lei e o Direito. In: MARRARA, Thiago (Org.).

Princípios de Direito Administrativo: legalidade, segurança jurídica, impessoalidade, publicidade, motivação,

eficiência, moralidade, razoabilidade, interesse público. São Paulo: Editora Atlas, 2012. P. 58

Page 18: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE …

17

princípios regentes da atividade estatal, papel que é desempenhado pelo

princípio da juridicidade. A exigência de conformação da atividade

administrativa ao Direito também indica que o Poder Público não está

vinculado unicamente às normas que cria, sendo detectada uma esfera

subtraída à sua disponibilidade.21

Em atendimento à essa necessidade de um maior controle da Administração Pública,

adveio a Lei nº 8.429/92, que ao revogar as Leis nº 3.167/57 (Lei Pitombo-Godói Ilha) e nº

3.502/58 (Lei Bilac Pinto), se tornou o principal diploma legal a tutelar a moralidade da atuação

da administração pública.

A Lei de Improbidade Administrativa, em sentido diverso dos diplomas legais

anteriores, determinou sanções específicas, em seu artigo 12, para cada ato de improbidade, que

variam qualitativa e quantitativamente, conforme a lesividade da conduta ímproba.

As sanções trazidas pela Lei nº 8.429/92 são: (I) o ressarcimento integral ao erário dos

danos causados; (II) o perdimento dos bens ou valores ilicitamente adquiridos; (III) a multa

civil; (IV) a perda da função pública; (V) a suspensão dos direitos políticos por prazo

determinado; e (VI) a proibição de contratar com o Poder Público ou de receber benefícios ou

incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente por prazo determinado.

Tanto a doutrina majoritária22, como a jurisprudência23 têm o entendimento de que,

apesar de a Lei de Improbidade Administrativa prever diversas das sanções elencadas a cada

tipo de improbidade, caberá ao magistrado, no momento da dosimetria da pena, definir quais

serão aplicadas no caso concreto. Portanto, dentre as sanções elencadas, caberá ao magistrado

definir quais serão aplicadas, podendo inclusive serem todas, mas não há a exigência de que

todas sejam aplicadas em bloco.

A Lei 8.429/92 trouxe ainda, dentre suas normas, não somente a definição quanto aos

tipos de improbidade administrativa, mas também criou todo um conjunto de regras

processuais, definindo o procedimento específico por meio do qual se processariam os agentes

públicos sob os quais recaíssem suspeitas da prática de atos ímprobos.

De igual modo, a referida Lei previu ainda a existência de instrumentos processuais

destinados a assegurar a eficácia de futura sentença condenatória, a saber, a indisponibilidade

de bens (art. 7º) e o sequestro (art. 16), bem como a evitar que o acusado possa interferir na

21 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 59. 22 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de Improbidade Administrativa Comentada: Aspectos Constitucionais,

Administrativos, Civis, Criminais, Processuais e de Responsabilidade Fiscal – 6ª edição. São Paulo: Editora Atlas,

2015. P. 154. 23 AgRg no AREsp 173.860/MS, 2ª Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, DJ: 04/02/2016; AgRg no AREsp

239.300/BA, 2ª Turma, Min. Rel. Og Fernandes, DJ: 24/03/2015; REsp 1.416.406/CE, 2ª Turma, Min. Rel.

Humberto Martins, DJ: 14/10/2014.

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18

apuração judicial de tais atos, com a possibilidade de o magistrado determinar o seu afastamento

(artigo 20, § único).

A referida lei rompeu com a normatização existente até o momento, tipificando como

ato de improbidade não só o dano ao erário e o enriquecimento ilícito já previstos nos

documentos anteriores, mas também a inobservância quanto aos princípios da Administração,

consagrando assim o princípio da juridicidade no ordenamento e reforçando a normatividade

dos princípios, os quais serão vistos a seguir.

1.2. Tipologia dos Atos de Improbidade na Lei nº 8.429/92

A Lei 8.429/92, regulamentando o artigo 37, § 4º, divide, atualmente, os atos de

improbidade em quatro categorias considerando, para sua classificação, o bem jurídico afetado

pela conduta do agente ímprobo.

A referida lei, inicialmente, dividiu os atos de improbidade entre aqueles que causam

o enriquecimento ilícito do agente público (artigo 9º), aqueles que causam lesão ao erário (art.

10) e aqueles que atentam contra os princípios da Administração Pública (Art. 11).

Atualmente, além dos demais tipos, a Lei de Improbidade Administrativa prevê ainda

como ato de improbidade a concessão, a manutenção ou a aplicação de benefícios fiscais ou

tributários em desconformidade com o artigo, instituído pela inclusão do artigo 10-A, conforme

determinado pela Lei Complementar nº 157/16.

Deve-se destacar que a configuração da atuação do agente como ato de improbidade

ocorre a partir do cumprimento dos requisitos exigidos pelo caput dos artigos citados, não sendo

necessário que a conduta se amolde a uma das hipóteses elencadas nos incisos dos artigos 9º,

10 e 11 da LIA. Isso se deve, pois, segundo a corrente majoritária da doutrina24, o rol de

condutas previsto nos artigos é meramente exemplificativo, conforme se denota do uso da

expressão “notadamente” no caput dos referidos dispositivos.

Sendo assim, os artigos que contém a previsão dos tipos de atos de improbidade trazem

uma estrutura semelhante. Em seu caput, os referidos dispositivos trazem previsões genéricas,

as quais são utilizadas para definir a configuração ou não do ato de improbidade. Enquanto isso,

24NEVES, Daniel Amorim Assumpção; Oliveira, Rafael Carvalho Rezende. Manual de Improbidade

Administrativa: Direito Material e Processual – 4ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2016. P. 75-76.

GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 279-282; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito

Administrativo – 28ª Edição. São Paulo: Atlas, 2015. P. 1122-1123.

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19

os incisos trazem condutas específicas destinadas somente a exemplificar hipóteses de

configuração do ato.

1.2.1. Dos Atos que Geram Enriquecimento Ilícito do Agente

Os atos de improbidade que geram o enriquecimento ilícito do agente público,

previstos no artigo 9º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92), são aqueles por

meio dos quais o agente recebe qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do

exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no

artigo 1º da referida Lei. É o que se infere da redação do citado artigo:

Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito

auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de

cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1°

desta lei, e notadamente:

I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra

vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem,

gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser

atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente

público;

II - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição,

permuta ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas

entidades referidas no art. 1° por preço superior ao valor de mercado;

III - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação,

permuta ou locação de bem público ou o fornecimento de serviço por ente estatal por

preço inferior ao valor de mercado;

IV - utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou

material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das

entidades mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de servidores

públicos, empregados ou terceiros contratados por essas entidades;

V - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar

a exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de

contrabando, de usura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou aceitar promessa de

tal vantagem;

VI - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer

declaração falsa sobre medição ou avaliação em obras públicas ou qualquer outro

serviço, ou sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de

mercadorias ou bens fornecidos a qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta

lei;

VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou

função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução

do patrimônio ou à renda do agente público;

VIII - aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou

assessoramento para pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser

atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente

público, durante a atividade;

IX - perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba

pública de qualquer natureza;

X - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para

omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado;

XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores

integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei;

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20

XII - usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo

patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei.25

Para José dos Santos Carvalho Filho, “constitui objeto da tutela o enriquecimento

legítimo, justo e moral. (...) O que a lei proíbe é o enriquecimento ilícito, ou seja, aquele que

ofenda os princípios da moralidade e da probidade”.26

A doutrina, em sua grande maioria, entende que para a configuração desta espécie de

improbidade é necessária a presença de três requisitos: (I) o enriquecimento do agente público

por meio do recebimento de vantagem econômica indevida; (II) a prática de conduta (comissiva

ou omissiva) abusiva da função pública; (III) o nexo de causalidade entre a vantagem indevida

recebida e o exercício abusivo do cargo.27

No tocante ao primeiro requisito, importante ressaltar que o conceito de vantagem

patrimonial indevida deve ser amplo, de modo a abranger todas as prestações auferidas pelo

agente pública, sejam positivas (recebimento de vantagem, aquisição de bens por valor inferior

ao seu valor real) ou negativas (a utilização gratuita ou subsidiada por terceiro de serviços,

locação de imóveis ou móveis, transporte, hospedagem)28.

Ainda tratando do primeiro item, é de suma importância apontar que, para a

configuração do enriquecimento ilícito, não é exigível o dano ao erário. O artigo 9º estará

caracterizado sempre que o agente público aufira vantagem indevida, independentemente da

existência de danos ao erário.

É possível que da conduta improba praticada decorra o dano ao erário, conforme se

pode destacar, exemplificativamente, os incisos IV, X e XI do supracitado dispositivo29. No

entanto, a possibilidade da sua ocorrência não o torna indispensável para o reconhecimento da

improbidade administrativa.

O segundo item trata do elemento subjetivo da conduta. Assim, ainda que omisso o

artigo 9º, entende a doutrina majoritária30 que o enriquecimento ilícito somente pode ser

sancionado a partir de uma conduta dolosa do agente, abusando de seu cargo, seu emprego ou

sua função pública. Para sustentar esse entendimento, podem ser utilizados dois argumentos.

25 BRASIL. Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes políticos nos

casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública

direta, indireta ou fundacional e dá outras previdências. Disponível em: <https://goo.gl/JWCMf>. Acesso em:

09/07/2017. 26 CARVALHO FILHO. Op. Cit. P 1123., 27 NEVES. Op. Cit.P. 76-78. 28 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 290. 29 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Improbidade Administrativa: Doutrina, Legislação e Jurisprudência – 3ª edição.

São Paulo: Editora Atlas, 2015. P. 146-147. 30 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 79.

Page 22: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE …

21

O primeiro é o de que a culpa não se amolda ao ato de enriquecimento ilícito, uma vez

que deve haver o aceite do funcionário público para o recebimento da vantagem patrimonial

por forma que esteja em desacordo com a legislação, sendo inconcebível que algum servidor

receba vantagem indevida por imprudência, imperícia ou negligência31.

O segundo argumento seria a aplicação analógica do parágrafo único do artigo 18, II

do Código Penal32 que exige previsão legal expressa para a aplicação da sanção na modalidade

culposa. Dessa forma, devido à omissão legislativa quanto ao elemento volitivo do sujeito ativo

do ato de improbidade que gera o enriquecimento ilícito, não é possível a punição do agente a

título de culpa.

De igual modo, não havendo previsão expressa quanto à tentativa da prática do ato de

improbidade, o agente público somente poderá responder após a consumação do ato ímprobo,

ou seja, no caso do enriquecimento ilícito, somente será responsabilizado o agente após a

constatação do recebimento de vantagem indevida ou da aceitação de promessa de vantagem

futura indevida33.

O terceiro requisito é o liame entre o recebimento da vantagem indevida pelo agente e

o desempenho abusivo da função, do cargo ou do emprego público. Assim, uma parte da

doutrina34 traz o entendimento de que o agente público somente pode ser responsabilizado nos

termos do artigo 9º da Lei 8.429/92, caso a Administração Pública ou o Ministério Público

possam comprovar que o acréscimo ilícito do patrimônio decorreu diretamente do exercício

abusivo de seu cargo, emprego ou de sua função pública.

Cumpre ressaltar, no entanto, que, no caso do inciso VII do Artigo 9º da LIA, o

Superior Tribunal de Justiça já decidiu de modo diverso. No julgamento do Mandado de

Segurança 12.660/DF35, a 3ª Seção da Corte orientou que nas hipóteses de patrimônio a

descoberto, recai sobre a Administração Pública o dever de comprovar somente o acréscimo

patrimonial incompatível com a renda auferida, não sendo necessária a prova da conexão entre

a variação patrimonial e o exercício da função36.

31 CARVALHO FILHO. Op Cit. P. 1123. 32 Art. 18 - Diz-se o crime:

(...)

II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. 33 CARVALHO FILHO. Op. Cit. P. 1.123. 34 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de Improbidade Administrativa Comentada: Aspectos Constitucionais,

Administrativos, Civis, Criminais, Processuais e de Responsabilidade Fiscal – 6ª edição. São Paulo: Editora Atlas,

2015. P. 51-53. FAZZIO JUNIOR, Waldo. Op. Cit. P. 146. 35 MS 12.660/DF, Terceira Seção, Min. Rel. Marilza Maynard, DJ: 13/08/2014. 36 Em igual sentido os precedentes: MS 20.765/DF, 1ª Seção, Min. Rel. Benedito Gonçalves, DJ: 08/02/2017; MS

18.460/DF, 1ª Seção, Min. Rel. Napoleão Nunes Maia Filho (Voto vencido), Min. Rel. para o acórdão Ministro

Mauro Campbell, DJ: 28/08/2013.

Page 23: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE …

22

Ao agente público, conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, caberia

trazer à baila elementos mínimos comprobatórios da origem lícita do incremento patrimonial.

O STJ nessa hipótese, portanto, permitiu a criação da presunção de ilegitimidade da variação

patrimonial a descoberto, sendo dispensável a conexão entre a variação e o exercício da função,

exigindo-se somente o vínculo do agente com a Administração no período em que obteve o

acréscimo patrimonial.

1.2.2. Dos Atos que Causam Danos ao Erário

Os atos de improbidade que causam prejuízo ao erário estão previstos no artigo 10ª da

Lei de Improbidade Administrativa. O referido dispositivo enuncia que:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário

qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio,

apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades

referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio

particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes

do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;

II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens,

rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades

mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou

regulamentares aplicáveis à espécie;

III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de

fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de

qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das

formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie;

IV - permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do

patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta lei, ou ainda a prestação

de serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado;

V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço

superior ao de mercado;

VI - realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares

ou aceitar garantia insuficiente ou inidônea;

VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades

legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;

VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração

de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente;

IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou

regulamento;

X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz

respeito à conservação do patrimônio público;

XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir

de qualquer forma para a sua aplicação irregular;

XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;

XIII - permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas,

equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de

qualquer das entidades mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de

servidor público, empregados ou terceiros contratados por essas entidades.

XIV – celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de

serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades

previstas na lei

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23

XV – celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação

orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei;

XVI - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a incorporação, ao patrimônio

particular de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores públicos

transferidos pela administração pública a entidades privadas mediante celebração de

parcerias, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à

espécie;

XVII - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens,

rendas, verbas ou valores públicos transferidos pela administração pública a entidade

privada mediante celebração de parcerias, sem a observância das formalidades legais

ou regulamentares aplicáveis à espécie;

XVIII - celebrar parcerias da administração pública com entidades privadas sem a

observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;

XIX - agir negligentemente na celebração, fiscalização e análise das prestações de

contas de parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas;

XX - liberar recursos de parcerias firmadas pela administração pública com entidades

privadas sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma

para a sua aplicação irregular.

XXI - liberar recursos de parcerias firmadas pela administração pública com entidades

privadas sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma

para a sua aplicação irregular.37

Além da conduta genérica trazida pelo caput, conforme se pode notar do dispositivo

acima transcrito, os incisos I a XXI trazem ainda previsão de condutas específicas, em rol

exemplificativo. Assim, a adequação a qualquer uma das figuras específicas ou genérica

configuram o ato de improbidade na forma do artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa.

Nesse sentido, cumpre destacar que o dano ao erário é o principal requisito para a

configuração do ato de improbidade tipificado no artigo 10 da LIA sendo, portanto, necessária

a análise da extensão das expressões “erário” e “patrimônio público” para que se possa definir

a abrangência da proteção conferida pelo referido dispositivo legal.

Tradicionalmente, o erário é utilizado para designar a parcela do patrimônio público

de conteúdo econômico financeiro38. O termo patrimônio público39, no entanto, é mais

abrangente, englobando, não apenas os bens e interesses com valor econômico, mas também os

demais que não tenham conteúdo econômico40.

Com base na análise literal do disposto no caput do artigo 10 da Lei de Improbidade

Administrativa, parcela da doutrina41 entende que somente haverá a configuração do ato de

improbidade na medida em que o ato lesar o erário, ou seja, quando a conduta praticada gerar

37 BRASIL. Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes políticos nos

casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública

direta, indireta ou fundacional e dá outras previdências. Disponível em: <https://goo.gl/JWCMf>. Acesso em:

09/07/2017. 38 CARVALHO FILHO. Op. Cit. P. 1.124. 39 O artigo 1º, § 1º da Lei de Ação Popular (Lei 4717/65), considera como patrimônio público “os bens e direitos

de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico”, demonstrando assim a abrangência do termo. 40 NEVES, Daniel Amorim Assumpção; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Op. Cit. P. 84. 41 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Op. Cit.. P. 69; FAZZIO JUNIOR, Waldo. Op. Cit. P. 204-210; DECOMAIN,

Pedro Roberto. Improbidade Administrativa – 2ª edição. São Paulo: Editora Dialética, 2014. P. 121-123.

Page 25: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE …

24

dano financeiro mensurável aos cofres públicos. Nesse sentido, essa corrente afasta a

possibilidade de configuração do dano moral, uma vez que, em seu entendimento, o prejuízo

tratado no dispositivo citado é somente o referente ao patrimônio econômico-financeiro das

entidades previstas no artigo 1º da Lei 8.429/92.

Por outro lado, alguns doutrinadores42 defendem que, a partir de uma interpretação

sistemática da Lei de Improbidade Administrativa, a expressão erário, prevista no artigo 10 da

LIA, não foi utilizada em seu sentido estrito, para designar a parcela econômica do patrimônio

público. O termo, em realidade, teria sido utilizado em seu sentido subjetivo, visando

referenciar as pessoas jurídicas do artigo 1º. Assim, não caberia a limitação da incidência do

artigo 10 somente sobre o conteúdo econômico-financeiro do patrimônio público.

Para essa corrente, o dispositivo, ao apontar que o ato deve ensejar perda patrimonial,

determinou a sua aplicação à totalidade do patrimônio público, abrangendo todos os bens e

deveres das entidades previstas no artigo 1º, independentemente de seu conteúdo econômico.

A segunda corrente parece traduzir melhor a proteção instituída pela Lei 8.429/92, uma

vez que expande a proteção conferida de modo a coibir a prática de atos lesivos, ainda que estes

não tenham um impacto financeiro direto aos entes previstos no artigo 1º da Lei de Improbidade

Administrativa. Dessa forma, esse entendimento se aproxima mais à mens legis, ao permitir a

fiscalização da atuação administrativa, evitando-se possíveis abusos que possam ocorrer em

prejuízo dos demais aspectos que integram o patrimônio público.

Passada a discussão acerca da limitação semântica dos termos utilizados pela Lei

8.429/92, faz-se necessário o debate acerca dos requisitos para a configuração do ato de

improbidade. Nesse sentido, cumpre apontar que a existência de dano ao patrimônio público

não pode ser o único requisito para a configuração do ato ímprobo.

O dano ao erário pode ser causado tanto a partir de uma conduta ilícita, como por uma

atuação em total conformidade com as normas regentes da atividade estatal. A Lei de

Improbidade Administrativa não visa tutelar todos os danos ao patrimônio público, uma vez

que a possibilidade de insucesso de qualquer projeto é inerente à atuação de qualquer atividade.

Por maior que seja o zelo e a diligência do agente público, nem sempre é possível prever todas

as circunstâncias que influenciam o resultado. Não são raros os casos em que os obstáculos à

42 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 310-312; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. Cit. P. 1124.

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25

consecução do fim pretendido superam a esfera de previsibilidade dos agentes ou que fatores

externos influenciam o resultado final, causando danos ao erário43.

O pressuposto exigido, portanto, pela Lei nº 8.429/92 para a configuração do ato de

improbidade deve ser a ilicitude da conduta que gerou a lesão ao patrimônio público. Assim,

excluem-se do âmbito de aplicação da norma os atos praticados pelos agentes públicos que, em

estrita observância ao ordenamento jurídico, possam ter causado lesões ao patrimônio público,

conforme já apontado.

Nesse sentido, leciona Waldo Fazzio Júnior:

Em geral, o que se reprova no art. 10 não é a conduta legal, ainda que

prejudicial aos cofres públicos. Não se pretende punir a partir do resultado,

mas dos meios que o produziram. De sorte que, só se alvitra reprovar o

prejuízo administrativo, quando gerado por ilegalidade, ou seja, quando o

agente público, livre e conscientemente rompe com a lei; quando concebe e

admite o resultado danoso ao erário ou pelo menos negligência na adoção dos

meios legais para fazê-lo.44

Assim, a conduta lícita adequada aos fins buscados, ainda que traga prejuízo ao

patrimônio público, não deve ser objeto de aplicação do artigo 10 da Lei 8.429/92. Por outro

lado, a conduta ilícita, comissiva ou omissiva, dolosa ou culposa, que gere dano ao patrimônio

público será aquela que deverá ser determinada como ímproba e, portanto, sancionada com a

aplicação do referido dispositivo.

O elemento subjetivo no ato de improbidade que gera lesão ao erário é tema ainda

controverso na doutrina. O dissenso doutrinário ocorre por conta da previsão no caput do artigo

10 da Lei de Improbidade Administrativa da possibilidade de responsabilização a partir de uma

conduta culposa.

Para alguns autores45, essa previsão seria inconstitucional, uma vez que o artigo 10,

caput, da Lei 8.429/92 teria extrapolado os limites previstos no artigo 37, § 4º da Constituição,

ao pretender punir além do agente desonesto, também o inábil. Assim, segundo o entendimento

dessa corrente, se a Constituição não previu de forma expressa a modalidade culposa, não

caberia à Lei impô-la.

43 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de Improbidade Administrativa Comentada: Aspectos Constitucionais,

Administrativos, Civis, Criminais, Processuais e de Responsabilidade Fiscal – 6ª edição. São Paulo: Editora Atlas,

2015. P. 69. 44 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Improbidade Administrativa: Doutrina, Legislação e Jurispridência – 3ª edição.

São Paulo: Editora Atlas, 2015. P. 204-208. 45 COPOLA, Gina. A desnecessária indisponibilidade de bens em ação de improbidade administrativa. Revista

Fórum Administrativo, Belo Horizonte, ano 15, nº 169, mar. 2015. P. 35-37.

Page 27: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE …

26

Existe uma segunda corrente46 que, em sentido diverso, entende pela admissibilidade

da punição a título de culpa, uma vez que a Constituição não traz qualquer previsão em sentido

contrário, deixando ao arbítrio da legislação infraconstitucional a regulamentação.

Esse último entendimento é hoje o dominante na doutrina e parece ser o mais acertado.

O artigo 37, § 4º da Constituição Federal de 1988, ao tratar dos atos de improbidade, não trouxe

qualquer previsão de um salvo-conduto para aqueles que violem o dever de diligência inerente

aos cargos públicos.47 Pelo contrário, trouxe a previsão de que os atos de improbidade seriam

tratados na forma e gradação previstas na lei, o que legitima a previsão da modalidade culposa

no artigo 10 da Lei 8.429/92.

1.2.3. Dos Atos que Atentam Contra os Princípios da Administração Pública

O artigo 11 da Lei 8.429/92 delimita os atos de improbidade administrativa que

atentam contra os princípios da administração pública como:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios

da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de

honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele

previsto, na regra de competência;

II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;

III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que

deva permanecer em segredo;

IV - negar publicidade aos atos oficiais;

V - frustrar a licitude de concurso público;

VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;

VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva

divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de

mercadoria, bem ou serviço.

VIII - descumprir as normas relativas à celebração, fiscalização e aprovação de contas

de parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas.

IX - deixar de cumprir a exigência de requisitos de acessibilidade previstos na

legislação.

O referido dispositivo rompeu com a visão tradicional que existia sobre a improbidade

administrativa, uma vez que para sua configuração não há necessidade da ocorrência de dano

ao erário ou que o agente enriqueça ilicitamente, bastando que a conduta viole um dos princípios

norteadores da Administração Pública para a configuração do ato ímprobo48.

46 Cf: GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 305-309; PAZZAGLINI FILHO. Op. Cit. P. 71-73; NEVES; OLIVEIRA.

Op. Cit. P. 85-87; FAZZIO JUNIOR. Op. Cit. P. 137-139; DECOMAIN. Op. Cit. P. 121-123. 47 PAZZAGLINI FILHO. Op. Cit. P. 72. 48 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo – 28ª Edição. São Paulo: Atlas,

2015. P. 1126.

Page 28: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE …

27

Nesse sentido, Waldo Fazzio Junior49 denomina os atos de improbidade administrativa

que atentam contra princípios como atos de improbidade em sentido estrito, uma vez que

para a sua configuração é despicienda a existência de dano ao erário ou de enriquecimento

ilícito do agente. Defende, o autor, que o artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa

baseia-se na necessidade de prevenir a má-conduta administrativa, com a substituição do

interesse público, inerente à máquina estatal, pelos interesses privados de seus administradores.

O artigo 11, ao listar os diversos deveres dos servidores a serem observados, não

buscou limitar a sua aplicação somente aos deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade

e lealdade às instituições. Assim, como nos artigos 9º e 10 da Lei de Improbidade, o citado

dispositivo apresenta um rol meramente exemplificativo, o que pode ser comprovado pelo uso

da expressão “notadamente” ao fim do caput50.

Para Marino Pazzaglini Filho51, a redação do dispositivo poderia ter utilizado maior

rigor técnico, repetindo, ao menos, os princípios elencados no caput do artigo 37 da

Constituição. Cumpre, no entanto, destacar que dentre os deveres citados pelo caput do artigo

11 é possível perceber a sua relação com os referidos princípios.

Nessa perspectiva, o princípio da legalidade vem expresso no dever de legalidade, o

dever de honestidade e o de lealdade às instituições se relacionam com o princípio da

moralidade e o dever de imparcialidade corresponde ao princípio da impessoalidade. Por fim,

o princípio da publicidade, apesar de não estar referenciado no caput do dispositivo, pode ser

destacado no inciso IV do artigo 11, o qual prevê a negativa de publicidade aos atos oficiais5253.

Faz-se necessário apontar ainda que o artigo 4º da Lei de Improbidade Administrativa

já traz especificamente como imperativo aos agentes públicos a observância aos princípios da

moralidade, da publicidade, da legalidade e da impessoalidade, podendo ser aplicado de forma

subsidiária, o que tornaria despicienda outra repetição dos referidos princípios no artigo 11 da

LIA.

Cumpre mencionar que alguns doutrinadores54 trazem ainda o entendimento de que a

proteção conferida pelo artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa não abrange somente

49 Op. Cit. P. 301-302. 50 NEVES, Daniel Amorim Assumpção; Oliveira, Rafael Carvalho Rezende. Manual de Improbidade

Administrativa: Direito Material e Processual – 4ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2016. P. 88-90. 51 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Op. Cit. P. 114-115. 52 CARVALHO FILHO, José dos Santos. 53 Uma vez que o princípio da eficiência somente foi incluído na Constituição por meio da Emenda Constitucional

nº 19 de 1998, não há previsão específica na Lei de Improbidade Administrativa (1992) por esta ser anterior àquela. 54 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 89.

Page 29: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE …

28

os princípios constitucionais insculpidos no caput do artigo 37, mas também todos os demais

princípios implícitos ou expressos, constitucionais ou infraconstitucionais.

Nesse sentido, o referido dispositivo consagrou, no ordenamento jurídico brasileiro, o

princípio da juridicidade, ou seja, a necessidade de que a atuação do agente público esteja em

conformidade, não somente com a Lei, mas que se adeque ao ordenamento jurídico como um

todo, levando-se em consideração além das regras, todos os princípios reconhecidos pela

comunidade jurídica55.

Importante salientar, ainda, que apesar deste ato de improbidade, conforme o disposto

no artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa, se configurar a partir da inobservância dos

princípios norteadores da administração pública, não é toda e qualquer ação ou omissão, em

descumprimento aos princípios, que caracterizaria a conduta como ímproba. Entendimento

distinto, permitiria, por exemplo, que qualquer falta disciplinar dos servidores pudesse ser

tratada como ato de improbidade, uma vez que são sancionadas por conta de condutas

praticadas pelo agente público em violação aos deveres inerentes ao cargo.

A quase unanimidade da doutrina56 entende que para a configuração do tipo de

improbidade previsto no artigo 11 da LIA é imprescindível que a conduta atentatória aos

princípios da Administração Pública esteja marcada pela desonestidade do agente, ou seja, que

o ato seja praticado pelo agente com dolo.

Logo, igual visto anteriormente no enriquecimento ilícito, é imprescindível a

demonstração do dolo do agente público, não havendo a configuração do ato ímprobo a título

de culpa. Assim, a conduta derivada da má-interpretação de norma legal não pode ser

considerada ímproba, uma vez que não há dolo do agente público na sua prática.57

A doutrina58 entende ainda que, além do dolo, a conduta deve ter um potencial danoso

mínimo para que seja configurado o ato ímprobo. Logo, não é qualquer conduta que viole os

princípios da administração pública que é capaz de ensejar a aplicação do artigo 11. A gravidade

da conduta deve ser analisada caso a caso, uma vez que é impossível a tipificação de todas as

condutas violadoras de princípios da Administração Pública na Lei. Assim, o Juiz, munido dos

princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, deverá verificar se a conduta é grave o

suficiente para ensejar a aplicação do referido dispositivo.

55 Ibidem. P. 89. 56 PAZZAGLINI FILHO. Op. Cit. P. 114-115; FAZZIO JUNIOR. Op Cit. P. 303-304. CARVALHO FILHO. Op.

Cit. P. 1.127. 57 DECOMAIN, Pedro Roberto. Improbidade Administrativa – 2ª edição. São Paulo: Editora Dialética, 2014.

P. 164-165. 58 PAZZAGLINI FILHO. Op. Cit. P. 115.

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29

2. Indisponibilidade de Bens

No Capítulo 1 do presente trabalho, tratou-se da evolução histórica legislativa no

Brasil com relação à proteção da moralidade administrativa, demonstrando como a preocupação

com a probidade dos agentes públicos influenciou a produção legislativa, levando ao

desenvolvimento do sistema atual. Agora, pretende-se aprofundar a análise de um dos

instrumentos processuais previsto na Lei de Improbidade Administrativa que serve como forma

de garantir ao fim do processo a recomposição integral do patrimônio público.

Assim, serão abordados adiante os principais aspectos da medida de indisponibilidade

de bens tratados pela doutrina e pela jurisprudência, visando analisar as características do

referido instituto, de modo que sua aplicação seja efetiva e atenda ao interesse público, sem, no

entanto, conflitar com as garantias constitucionais e processuais conferidas aos acusados.

2.1. Natureza Jurídica

O artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa prevê, in verbis:

Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou

ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável

pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos

bens do indiciado.

Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo

recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre

o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.

Assim, a partir de uma interpretação literal do artigo 7º, acima transcrito, pode-se

inferir que a indisponibilidade de bens será cabível nas hipóteses em que, o agente público,

praticando ato de improbidade, cause dano ao erário ou aufira vantagem patrimonial em

desacordo com as normas legais.

A indisponibilidade é medida que, por meio do bloqueio dos bens do agente acusado

da prática de um ato de improbidade, visa assegurar execução futura, em caso de condenação.

Dessa forma, a indisponibilidade assume a natureza jurídica de uma medida cautelar, uma vez

que a sua função é a de impedir que o réu proceda à dilapidação do patrimônio que permanecerá

hígido até o fim da ação e possa arcar com o ressarcimento ao erário e/ou com o perdimento de

bens.

Page 31: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE …

30

A medida cautelar, segundo Daniel Neves59,

deve ser entendida como a proteção jurisdicional prestada pelo Estado para

afastar o perigo de ineficácia do resultado final da pretensão definitiva da

parte, funcionando como aspecto concreto da promessa constitucional de

inafastabilidade da tutela jurisdicional.

A doutrina entende que a Lei de Improbidade Administrativa prevê, expressamente,

três tipos de medidas cautelares: (I) a indisponibilidade de bens, objeto principal deste trabalho,

insculpida no artigo 7º da lei; (II) o sequestro de bens, previsto no artigo 16 da lei; e, por fim,

(III) o afastamento liminar do agente público de seu cargo, emprego ou função, enunciado no

parágrafo único do artigo 20, do referido diploma legal.

Quanto à indisponibilidade de bens, cumpre destacar que em decorrência da sua

imposição, os bens marcados pela decisão judicial se tornam inalienáveis, havendo, portanto, a

constrição do direito do réu de dispor da fração de seu patrimônio tornada indisponível. A

medida poderá recair sobre bens imóveis, móveis, contas bancárias, aplicações financeiras,

dentre outros que tenham repercussão econômica, visando a garantia de futura e eventual

execução.

Cumpre ressaltar que, na hipótese de recair sobre bens imóveis, a eficácia da

indisponibilidade perante terceiros estará sujeita à averbação da decisão na matrícula do imóvel

conforme previsto no artigo 247 da Lei 6.015/7360. Sendo realizado o registro, nada impede que

o agente acusado mantenha a posse do bem.

Na hipótese dos bens móveis que não se sujeitam a registro, o magistrado poderá

determinar que estes fiquem sob o poder de um terceiro, que será o depositário do bem até o

fim da ação, visando impedir que o acusado se desfaça dos bens ou que seu uso leve ao

perecimento ou ao consumo da coisa.

A alienação, tanto nos bens móveis, como nos imóveis, após ser dada a ciência da

decisão ao réu que decreta a indisponibilidade importará em fraude à execução e, por

conseguinte, na ineficácia da alienação em relação ao exequente, conforme previsão do artigo

792, § 1º do CPC61.

Apesar de configurar medida extrema e gravosa ao acusado na ação de improbidade,

considerando que impõe supressão temporária do direito de dispor, inerente ao direito de

59 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil – 8ª edição. Salvador: JusPodivm,

2016. P. 471. 60 Art. 247 - Averbar-se-á, também, na matrícula, a declaração de indisponibilidade de bens, na forma prevista na

Lei. 61 Art. 792. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução:

§ 1o A alienação em fraude à execução é ineficaz em relação ao exequente.

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31

propriedade previsto no artigo 5º, inciso XXII da Constituição Federal62, a indisponibilidade

não tem natureza antecipatória, uma vez que não há expropriação do bem ou sua reversão ao

autor da ação.

Nesse sentido aponta Aluízio Bezerra63 que “a indisponibilidade de bens não pode ser

vista como antecipação de pena, mas, como um procedimento cautelar visando a exequibilidade

futura de uma manifestação judiciosa procedente.”

Importante ressaltar que, levando em consideração a gravidade da medida, o

magistrado somente deverá concedê-la quando houver a presença de prova indiciária da prática

do ato ímprobo, demonstrando-se assim a plausibilidade do pedido (fumus boni iuris), e quando

o autor demonstrar ser a medida estritamente necessária para que o resultado útil do processo

seja assegurado (periculum in mora)64.

O magistrado deverá ainda, considerando ser a indisponibilidade de bens uma medida

extrema, se atentar ao valor a ser decretado indisponível. Segundo Rogério Pacheco e Emerson

Garcia65, a medida de indisponibilidade, uma vez que visa a recomposição integral do dano,

somente será efetiva quando abranger tantos bens quanto necessários ao restabelecimento do

status quo ante.

Assim, a indicação do valor estimado do dano (quantum debeatur) na inicial ganha

importância, uma vez que determina o valor sobre o qual, inicialmente, será decretada a

indisponibilidade66. Posteriormente, com a produção de provas, o valor da indisponibilidade

poderá ser alterado, caso seja comprovado a sua necessidade para se adequar ao real valor do

dano.

Não é necessário, por parte do autor, a individualização dos bens a serem bloqueados,

recaindo a medida sobre quantos forem necessários para assegurar a efetividade e a viabilidade

da decisão final. Assim, caberá ao magistrado definir quais bens serão tornados indisponíveis.

Neste diapasão, cumpre ainda destacar que a ausência da estimativa do dano na inicial

ou a impossibilidade de seu cálculo na fase inicial do processo não permitem a aplicação

indiscriminada da cautelar de indisponibilidade a todo o patrimônio do réu. Essa imposição,

62 ALVES, Francisco Glauber Pessoa. Tutelas Sumárias e Afastamento dos Agentes Públicos na Lei nº

8.429/92. In.: LUCON, P. H. dos S. (Coord.); COSTA, E. J. da F. (Coord.); COSTA, G. R. (Coord.). Improbidade

Administrativa: Aspectos processuais da Lei nº 8.429/92 – 2ª edição. São Paulo: Editora Atlas, 2015. P. 208. 63 BEZERRA FILHO, Aluízio. Atos de Improbidade Administrativa: Lei 8.429/92 anotada e comentada – 2ª

edição. Curitiba: Editora Juruá, 2014. P. 85 64 PAZZAGLINI FILHO. Op. Cit. P. 197-198. 65 Improbidade Administrativa – 6ª edição. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011. P. 918. 66 Ibidem P. 919.

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32

além de ser flagrante violação ao princípio da proporcionalidade, estabelece uma forma de

punição ao acusado que sofre ônus superior ao necessário para a garantia do ressarcimento67.

Nesse sentido, decidiu o Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1194045/SE:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE.

INDISPONIBILIDADE DOS BENS. POSSIBILIDADE DE DECRETAÇÃO

INAUDITA ALTERA PARS. REQUISITO. EXISTÊNCIA DE FORTES INDÍCIOS

DE DANO AO ERÁRIO. SÚMULA 7/STJ. NECESSIDADE DE DELIMITAÇÃO

DO ALCANCE PATRIMONIAL.

(...)

7. A mesma base indiciária que respalda a decretação de indisponibilidade dos bens

deve nortear a extensão do seu alcance. Com fundamento nos dados fornecidos na

petição inicial e em outros elementos que revelem a plausibilidade da

responsabilidade do recorrente, cabe ao julgador ordinário delimitar o montante sobre

o qual deve recair a indisponibilidade de seus bens - o que não significa

necessariamente que, ao final, tal medida não alcançará todo o seu patrimônio,

tampouco que será reduzida ao valor por ele apontado em seu apelo.68

Por fim, cumpre ainda ressaltar que os legitimados ativos para a requisição da cautelar

de indisponibilidade, serão os mesmos legitimados previstos no caput do artigo 17 da Lei nº

8.429/92 para a propositura da ação e, de igual modo, o juízo competente para decidir quanto

ao requerimento será o mesmo que for competente para julgar a ação principal.69

2.2. Cabimento

As hipóteses de cabimento da medida de indisponibilidade de bens podem ser extraídas

do caput do artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa que determina que à autoridade

administrativa caberá requisitar ao Ministério Público a indisponibilidade de bens do agente,

“quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento

ilícito”70.

A partir de uma interpretação literal do citado dispositivo, é possível inferir que não

são todos os atos ímprobos que autorizam a aplicação da indisponibilidade de bens. A norma

permite expressamente a decretação do bloqueio de bens do acusado nas hipóteses em que o

autor descreva na inicial a prática de um ato ímprobo que tenha causado lesão ao erário ou

gerado o enriquecimento ilícito do agente ímprobo71.

67 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 258-259. 68 REsp 1.194.045/SE, Segunda Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, DJ: 19/10/2010. 69 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 255-256. 70 BRASIL. Lei 8.429, de 02 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos

de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública direta, indireta ou

fundacional e dá outras providências. Disponível em: <https://goo.gl/JWCMf>. Acesso em: 04/07/2017. 71 AMBRIZZI, Tiago Ravizzi. Notas sobre a indisponibilidade de bens na Lei Geral de Improbidade

Administrativa. Revista de Processo, São Paulo, v. 229, mar. 2014. P. 309.

Page 34: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE THIAGO FREIRE …

33

Nesse sentido, a unanimidade da doutrina72 entende ser possível a decretação pelo

juízo da indisponibilidade quando o seu objetivo for garantir o ressarcimento do erário ou o

perdimento dos bens ilegalmente adquiridos pelo agente ímprobo. No entanto, a Lei de

Improbidade Administrativa, conforme já visto neste trabalho, além dos atos que causam

enriquecimento ilícito (art. 9º) e dos atos que geram o enriquecimento ilícito do agente ímprobo

(art. 10), também tipifica e sanciona os atos que atentam contra os princípios da Administração

Pública (art. 11), os quais não são mencionados no artigo 7º, trazendo à lúmen a questão: diante

da omissão legal, seria possível uma interpretação ampliativa para decretar a indisponibilidade

nos atos que atentam contra princípios?

Nesse ponto, a doutrina se divide.

Parte dos doutrinadores73 tem o entendimento de que, diante do silêncio da lei sobre o

tópico, não seria possível a ampliação do escopo da cautelar, até mesmo porque, na ausência de

dano ao erário ou de enriquecimento ilícito, a medida seria inócua e, até mesmo, contra legem.

Por outro lado, uma parcela dos doutrinadores74, entende pela possibilidade da

aplicação da indisponibilidade nos atos tipificados pelo art. 11 da Lei de Improbidade, ainda

que o ato ímprobo não configure lesão ao erário ou enriquecimento do agente. Para isso, essa

corrente defende a possibilidade de imposição da constrição com base em dois fundamentos.

O primeiro argumento defendido é o de que a indisponibilidade pode ser decretada,

pois, ainda que para a configuração do ato tipificado no artigo 11 da Lei 8.429/92 não seja

necessária a lesão ao erário, bastando a violação aos princípios da Administração Pública, a

conduta ainda pode gerar dano moral indenizável, que, segundo os autores dessa corrente,

poderá ser assegurado pela indisponibilidade de bens75.

Esse entendimento decorre da interpretação da expressão “ressarcimento integral do

dano, se houver”, prevista como sanção aplicável no artigo 12, inciso III da Lei 8.429/92 para

os atos que atentem contra princípios76.

O argumento acima traduzido, no entanto, se sustenta em um fundamento, no mínimo,

inadequado. O ato ímprobo ao causar lesão ao erário, ainda que o dano seja exclusivamente

72 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 256-257; FAZZIO JUNIOR. Op. Cit. P. 364-365. 73 Cf: SLHESSARENKO JUNIOR, Miguel. Indisponibilidade de Bens em ação civil pública de improbidade

administrativa. Disponível em: <https://goo.gl/AxKA02>. Acesso em: 12/06/2017. AMBRIZZI. Op. Cit. P. 315. 74 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa – 6ª edição. Rio de Janeiro:

Editora Lumen Juris, 2011. P. 923. 75 Cf.: CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo – 28ª edição revista, atualizada

e ampliada. São Paulo: Atlas, 2015. P. 1134; GARCIA, Emerson. Improbidade Administrativa: Configuração e

Reparação do Dano Moral. Revista da Emerj, v. 12, nº 48, p. 240-259. Rio de Janeiro: EMERJ, 2009; GARCIA;

ALVES. Op. Cit. P. 923. 76 AMBRIZZI, Tiago Ravizzi.Op. Cit. P. 310.

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34

moral, deverá ser configurado no artigo 10 da LIA, uma vez que o patrimônio tutelado pela Lei

de Improbidade não se restringe somente ao patrimônio econômico financeiro, admitindo uma

interpretação mais ampla, englobando o patrimônio em todas as suas vertentes (histórica,

cultural, ambiental, econômica, ...). 77

Dessa forma, o que permitiria a aplicação da cautelar de indisponibilidade, seria a

configuração de lesão ao erário, não a prática do ato ímprobo que atenta contra os princípios,

uma vez que esse tipo, por ser residual78, seria absorvido por aquele.

O segundo fundamento se baseia na possibilidade de decretação da constrição dos bens

do réu visando assegurar futura condenação ao pagamento de multa civil. Por ser sanção

pecuniária, cuja execução também poderia vir a ser frustrada, há o entendimento de que a multa

poderia ser computada no valor tornado indisponível, não somente nos atos que atentam contra

princípios, mas também no cálculo estimativo dos danos causados ao erário e do valor

ilicitamente auferido pelo agente ímprobo79.

Esse segundo fundamento é o adotado, hoje, pacificamente pela jurisprudência do

Superior Tribunal de Justiça (STJ)80, conforme pode-se notar da ementa do julgamento do

Agravo Regimental no Recurso Especial 1.311.013/RO81:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DOS

PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INDISPONIBILIDADE DE

BENS. POSSIBILIDADE. DILAPIDAÇÃO PATRIMONIAL. PERICULUM IN

MORA PRESUMIDO NO ART. 7º DA LEI N. 8.429/92. INDIVIDUALIZAÇÃO

DE BENS. DESNECESSIDADE.

1. O art. 7º da Lei n. 8.429/92 estabelece que “quando o ato de improbidade causar

lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade

administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a

indisponibilidade dos bens do indiciado. Parágrafo único. A indisponibilidade a que

se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral

ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do

enriquecimento ilícito”.

2. Uma interpretação literal deste dispositivo poderia induzir ao entendimento

de que não seria possível a decretação de indisponibilidade dos bens quando o

ato de improbidade administrativa decorresse de violação dos princípios da

administração pública.

3. Observa-se, contudo, que o art. 12, III, da Lei n. 8.429/92 estabelece, entre as

sanções para o ato de improbidade que viole os princípios da administração

pública, o ressarcimento integral do dano – caso exista -, e o pagamento de multa

civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente.

77 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 253. 78 PAZZAGLINI FILHO. Op. Cit. P. 114. 79 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 253-254. 80 Nesse sentido: REsp 1.023.182/SC. Min. Rel. Castro Meira, Segunda Turma, DJ: 23/09/2008; AgRg no REsp

1.042.800. Min. Rel. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJ: 05/02/2009; REsp 637.413. Min. Rel. Herman

Benjamin, Segunda Turma, DJ: 07/05/2009; AgRg no AREsp 25.133/MG. Min. Rel. Olindo Menezes

(Desembargador convocado do TRF 1ª Região), Primeira Turma, DJ: 03/12/2015; REsp 1.610.169/BA. Min. Rel.

Herman Benjamin, Segunda Turma, DJ: 02/05/2017; dentre outros. 81 AgRg no REsp 1.311.013/RO, Segunda Turma, Min. Rel. Humberto Martins, DJ: 04/12/2012.

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35

4. Esta Corte Superior tem entendimento pacífico no sentido de que a

indisponibilidade de bens deve recair sobre o patrimônio dos réus em ação de

improbidade administrativa, de modo suficiente a garantir o integral

ressarcimento de eventual prejuízo ao erário, levando-se em consideração, ainda,

o valor de possível multa civil como sanção autônoma.

5. Portanto, em que pese o silêncio do art. 7º da Lei n. 8.429/92, uma

interpretação sistemática que leva em consideração o poder geral de cautela do

magistrado induz a concluir que a medida cautelar de indisponibilidade dos bens

também pode ser aplicada aos atos de improbidade administrativa que

impliquem violação dos princípios da administração pública, mormente para

assegurar o integral ressarcimento de eventual prejuízo ao erário, se houver, e

ainda a multa civil prevista no art. 12, III, da Lei n. 8.429/92.

6. Em relação aos requisitos para a decretação da medida cautelar, é pacífico nesta

Corte Superior o entendimento segundo o qual o periculum in mora, em casos de

indisponibilidade patrimonial por imputação ato de improbidade administrativa, é

implícito ao comando normativo do art. 7º da Lei n. 8.429/92, ficando limitado o

deferimento desta medida acautelatória à verificação da verossimilhança das

alegações formuladas na inicial.

Agravo regimental improvido. (Grifo nosso)

Segundo os doutrinadores dessa corrente82, bem como a jurisprudência do STJ, o

magistrado, fundado no exercício do poder geral de cautela que, hoje, está previsto no artigo

301 do Código de Processo Civil, pode determinar a indisponibilidade dos bens do réu, no valor

necessário ao ressarcimento integral do dano ou do enriquecimento ilícito, levando-se em conta

a possível execução de multa civil.

Argumentam os seus defensores que a mens legis do artigo 7º da LIA seria assegurar

a execução de todos os valores aos quais sejam os réus condenados, não sendo lógico, na sua

concepção, a exclusão da multa, uma vez que, assim como os demais valores, também poderia

ter a sua execução frustrada, possibilitando assim a ineficácia parcial da sentença condenatória

por ato de improbidade administrativa.83

Esse parece ser o melhor entendimento, uma vez que dá interpretação ampliativa ao

artigo 7º da Lei 8.429/92, conferindo maior proteção ao patrimônio público e assegurando maior

efetividade às disposições da Lei de Improbidade Administrativa, uma vez que a efetividade

depende não somente da prestação jurisdicional definitiva, mas também que a sentença virá de

forma útil84.

82 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 923. 83 NEVES, Daniel Amorim Assumpção; Oliveira, Rafael Carvalho Rezende. Manual de Improbidade

Administrativa: Direito Material e Processual – 4ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2016.P. 257. 84 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 886.

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36

2.3. Momento Adequado do Pedido de Indisponibilidade

No que se refere ao momento adequado ao requerimento da indisponibilidade de bens

do acusado, o caput do artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa85 permite concluir que

o momento ideal para a requisição da indisponibilidade seria o processo cautelar antecedente,

ou seja, antes que seja intentada a ação principal de improbidade administrativa.

A doutrina, apesar do silêncio da norma, entende, de igual forma, que também é

possível a concessão da indisponibilidade de bens de forma incidental. Ora, se a medida tem a

função de assegurar futura execução, não teria sentido a aplicação de entendimento restritivo,

vedando a sua concessão de forma incidental, pelo simples fato de a ação principal já ter sido

proposta. 86

Nesse sentido, Pedro Decomain defende em sua obra que a “dita indisponibilidade

pode ser requerida tanto em caráter cautelar autônomo, como ação cautelar, preparatória ou

incidental, como incidentalmente na própria petição inicial da ação civil pública.”87

Logo, sem sombra de dúvidas, pode-se afirmar que a cautelar de indisponibilidade de

bens poderá ser concedida pelo magistrado tanto na fase do inquérito administrativo, no qual

será cautelar preparatória, como na fase judicial, dentre os pedidos da inicial ou em qualquer

momento posterior no qual se afigure necessária.

A grande celeuma na doutrina, no entanto, se resume ao momento da concessão da

medida de indisponibilidade de bens. Nesse ponto, os doutrinadores se dividem quanto a

possibilidade da concessão inaudita altera parte, ou seja, antes de ser dada ao réu a

oportunidade de se manifestar nos autos.

A primeira corrente, defende ser inconstitucional a concessão da indisponibilidade de

bens antes da realização do contraditório, inaudita altera parte, uma vez que, em sua visão, a

imposição de constrição ao patrimônio do réu antes do fim do processo, sem ao menos ser dada

chance ao réu de se manifestar sobre a acusação, incorreria em violação ao princípio do devido

processo legal insculpido no artigo 5º, inciso LIV da Constituição Federal de 1988 e aos

princípios do contraditório e da ampla defesa, estampados no inciso LV do referido dispositivo

constitucional.

85 Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito,

caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a

indisponibilidade dos bens do indiciado. 86 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 261. 87 DECOMAIN, Pedro Roberto. Improbidade Administrativa – 2ª edição. São Paulo: Editora Dialética, 2014.P.

340.

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37

Nesse sentido, Gina Copola aponta que :

Resta cristalino, portanto, que a indisponibilidade de bens do indiciado ou do

requerido em ação de improbidade não pode ocorrer sem que antes lhe seja

concedido o direito constitucional ao devido processo legal, sendo

assegurados o contraditório e a ampla defesa e, portanto, tal medida extrema

de constrição não pode ser decretada com fulcro em alegações de uma única

parte, sem robusta produção de provas e sem a necessária oitiva do acusado.

(...)

Tem-se, portanto, que a decretação da indisponibilidade de bens em ação de

improbidade administrativa deve ser precedida de contraditório e da ampla

defesa do acusado (...).88

Em igual sentido, Felipe Gussoli afirma que:

As cautelares são em sua essência mitigações do princípio do devido processo

legal (art. 5º, LIV da Constituição Federal), e quando deferidas inaudita altera

pars representam exceção ao contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV da

Constituição Federal).89

A concessão da liminar inaudita altera parte, no entanto, não impede o contraditório.

Segundo aponta Daniel Neves90, a estrutura tradicional do contraditório consiste no pedido do

autor, seguido pela manifestação da parte contrária, ao qual poderá ser oferecida resposta e, por

fim, haverá a decisão.

Na hipótese da concessão liminar da indisponibilidade, ainda segundo o referido autor,

assim como em qualquer outra cautelar, ocorre uma inversão da estrutura do contraditório.

Nesse sentido, o contraditório diferido, como é denominado pela doutrina, traz a antecipação

da decisão para o momento anterior à manifestação da parte contrária.

Apesar de ser medida excepcional a ser utilizada somente em situações de extrema

urgência, não há qualquer razão que impeça a sua aplicação à indisponibilidade de bens, uma

vez que o contraditório é efetivado após a decisão do magistrado, com a manifestação da parte

que poderá apresentar provas para impugnar a decisão proferida, demonstrando sua abusividade

ou ilegalidade.91

A concessão da medida liminar de indisponibilidade pelo juízo em ação de

improbidade, como já foi visto ao se tratar da natureza jurídica no tópico 2.1, não configura

88 COPOLA, Gina. A indisponibilidade de bens na Lei de Improbidade e o devido processo legal (Lei Federal n.

8.429/92, art. 7º). Fórum Administrativo, Belo Horizonte, v. 9, n. 96, fev. 2009. P. 58-59. 89Presunção do Periculum in mora na decretação de indisponibilidade de bens em ação de improbidade

administrativa: para o início de uma crítica à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Fórum

Administrativo, Belo Horizonte, v. 15, n. 176, out. 2015. P. 57. 90 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 261-263. 91 Ibidem. P. 262.

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38

supressão ou reversão do bem. O bloqueio visa somente assegurar a efetividade do

ressarcimento ao erário, em caso de prolação de sentença condenatória ao fim do processo.

Dessa forma, a cautelar deferida pelo juízo não priva o réu do bem sobre a qual recaiu, não

sendo possível, portanto, alegar a violação ao devido processo legal.

Por mais que haja o impedimento do réu quanto ao exercício do direito de dispor do

bem de sua propriedade, não há interferência quanto aos demais direitos decorrentes da

propriedade do bem. Assim, não há como se alegar violação ao devido processo legal, tendo

em vista que a constrição determinada não é permanente e pode ser revista a qualquer momento,

caso seja comprovada a sua abusividade ou a sua ilegalidade.

Em contraponto ao entendimento trazido, Marino Pazzaglini Filho92 ensina ser

possível a determinação pelo juízo da constrição sobre o patrimônio do réu. No entanto, o autor

exige que o tema deve ser tratado com extremo cuidado, uma vez que, por ser medida gravosa,

a sua concessão inaudita altera parte deverá ser medida excepcional:

Importante frisar que a concessão de medida cautelar sem prévio contraditório

só deve ocorrer em casos excepcionais, quando, realmente, a convocação do

interessado tenha o condão de prejudicar a eficácia da tutela pleiteada, pois

essa medida representa verdadeira surpresa para a parte contrária, que sequer

tem oportunidade de oferecer argumentos contestatórios, que poderiam

influenciar o convencimento do julgador.

Tiago Ravazzi Ambrizzi defende, de igual modo, a excepcionalidade da concessão

inaudita altera parte invocando o desequilíbrio de forças entre o Estado e o réu, ainda nem

mesmo notificado:

Não são raros os casos em que, proposta a ação anos após a prática do suposto ato de

improbidade, a indisponibilidade é decretada inaudita altera parte, sem se conceder ao

réu a oportunidade para o prévio contraditório. Ora, se o ente acusador levou anos

para proceder às investigações e para propor a ação no momento de sua conveniência,

nada justifica que a indisponibilidade seja decretada de afogadilho, à luz de um relato

unilateral e com o tolhimento do direito do réu – insista-se, sempre presumivelmente

inocente – de fornecer a sua versão.93

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça aponta no sentido da adoção do

segundo entendimento. Nesse diapasão, o STJ julgou por meio do Agravo Regimental no

Agravo em Recurso Especial nº 460.279/MS ser possível a concessão inaudita altera parte da

indisponibilidade, ainda que não houvesse ocorrido o contraditório prévio ao recebimento da

92 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de Improbidade Administrativa Comentada: Aspectos constitucionais,

administrativos, civis, criminais, processuais e de responsabilidade fiscal – 6ª edição. São Paulo: Atlas, 2015. P.

202. 93

AMBRIZZI, Tiago Ravazzi. Notas sobre a indisponibilidade de bens na Lei Geral de Improbidade

Administrativa. Revista de Processo, v. 229. São Paulo: Revista dos Tribunais, mar. 2014.pgs. 314.

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39

inicial estipulado nos parágrafos 7º e 8º do artigo 17 da LIA, conforme pode-se notar da ementa

abaixo:

PROCESSUAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE.

MEDIDA CAUTELAR. INDISPONIBILIDADE DE BENS ADQUIRIDOS

ANTERIORMENTE À PRÁTICA DO SUPOSTO ATO ÍMPROBO.

DEFERIMENTO ANTES DA DEFESA PRÉVIA. POSSIBILIDADE.

PERICULUM IN MORA PRESUMIDO. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA

DO STJ. REVISÃO DOS REQUISITOS. SÚMULA 7/STJ.

1. Cuida-se, na origem, de Agravo de Instrumento interposto contra decisão

que determinou a indisponibilidade de bens do ora agravante inaudita altera

pars. A Ação Civil Pública foi proposta com base em alegadas irregularidades

em compras efetuadas pela Prefeitura de Alcinópolis.

2. "O fato de a Lei 8.429/1992 prever contraditório prévio ao recebimento da

petição inicial (art. 17, §§ 7º e 8º) não restringe o cabimento de tais medidas,

que têm amparo em seus arts. 7º e 16 e no poder geral de cautela do

magistrado, passível de ser exercido mesmo inaudita altera pars (art. 804 do

CPC)" (EDcl no Ag 1.179.873/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda

Turma, DJe 12.3.2010). No mesmo sentido: REsp 880.427/MG, Rel. Ministro

Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 4.12.2008.

(...)94

2.4.Requisitos

Os requisitos necessários à concessão da medida cautelar, conforme previsão do artigo

300 do Código de Processo Civil são: (I) a probabilidade do direito, também denominado de

fumus boni iuris; e (II) o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, também

conhecido como periculum in mora.

No entanto, antes de adentrar ao estudo dos requisitos necessários à concessão da

medida de indisponibilidade de bens, cumpre destacar a importância que a Súmula 07 do

Superior Tribunal de Justiça tem no tema e como isso influencia a jurisprudência do referido

Tribunal.

A Súmula 07 do STJ enuncia que “a pretensão de simples reexame de prova não enseja

recurso especial”. Assim, a jurisprudência da Corte Superior entende que as demandas

direcionadas por meio de recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça não podem versar

sobre questões que necessitem o reexame do conjunto fático-probatório para sua solução.

Devido ao entendimento de que o revolvimento das provas é impossível na análise dos

recursos especiais julgados pela Corte, a apreciação dos requisitos sofre diversas limitações na

94 AgRg no AREsp 460.279/MS, 2ª Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, DJ: 07/10/2014.

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40

jurisprudência do STJ, uma vez que a sua presença ou ausência é avaliada caso a caso, a partir

das provas apresentadas.

Assim, o Superior Tribunal de Justiça, em respeito à interpretação dada à Súmula 07,

ao analisar os requisitos para a concessão da cautelar de indisponibilidade de bens, se limita a

verificar se o acórdão recorrido apontou de forma fundamentada o cumprimento dos requisitos

para a concessão da medida, uma vez que para divergir do decidido no tribunal a quo se exigiria

a revisão das provas.

2.4.1. Probabilidade do Direito (Fumus boni iuris)

A probabilidade do direito ou o fumus boni iuris, é a “probabilidade da existência do

direito para a concessão da medida, devendo também demonstrar a titularidade do direito

material”95.

No caso específico das ações de improbidade, o fumus boni iuris é cumprido com a

demonstração de indícios fundamentados e conectados que possam, em cognição sumária,

demonstrar ao magistrado a verossimilhança e a probabilidade da prática de ato ímprobo. Não

se exige do autor que aponte prova cabal da prática de ato tipificado pela Lei 8.429/92, uma vez

que, nessa fase inicial, geralmente é inexistente.

Quanto ao conceito e à essencialidade do requisito para a concessão da

indisponibilidade de bens não há grandes divergências. Nesse sentido, aponta Tiago Ambrizzi

que

a despeito de ser omissa a redação do art. 7º, a doutrina e a jurisprudência não

discutem: a indisponibilidade só tem lugar nos casos em que a causa petendi,

vale dizer, a acusação esteja amparada em elementos probantes idôneos, a

tornar plausível, ao menos naquele momento embrionário da relação

processual, a existência do ato de improbidade, mediante dano ao erário ou

enriquecimento ilícito do agente.96

Importante, no entanto, se faz a distinção entre o fumus boni iuris e o recebimento da

inicial. Apesar de haver o entendimento disseminado em alguns julgados de primeira e segunda

instância afirmando que a decisão que determina o recebimento da inicial poderia ser utilizada

como fundamento para o cumprimento do requisito, uma vez que, em ambos os casos, a base

para a decisão seria um juízo de verossimilhança, esse não é o melhor entendimento.

95 CASTILO, Elza Lucimara Albuquerque Del. As Ações Cautelares na Lei de Improbidade Administrativa.

Revista Âmbito Jurídico, Ano XVII, nº 131, dez. 2014. Disponível em: <https://goo.gl/PD9FHY>. Acesso em:

09/07/2017. 96 Op. Cit. P. 311.

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41

Insta destacar que, apesar de ambas as decisões terem fundamentos no juízo de

verossimilhança, a decisão do magistrado que recebe a inicial é baseada na aplicação do

princípio do in dubio pro societate, o que equivale dizer que para o recebimento da denúncia

basta somente meros indícios da prática de ato ímprobo.

Nesse sentido, para que o magistrado receba a denúncia, não é necessário que o

magistrado possa, em cognição sumária, determinar a existência ou ao menos indícios

contundentes da prática ato ímprobo. Em realidade, tendo em vista a aplicação do princípio do

in dubio pro societate, exige-se para o recebimento da inicial que a inicial traga indícios

mínimos de autoria e materialidade e que a resposta prévia do notificado, na forma do artigo

17, § 7º da Lei de Improbidade não consiga demonstrar de forma cabal a inocorrência do ato

ímprobo, a inadequação da via eleita ou a improcedência da ação97.

Para a configuração do fumus boni iuris, diferentemente da decisão que recebe a

inicial, são necessários fortes indícios da prática de ato de improbidade, não bastando a dúvida

com relação à sua ocorrência. Assim, a doutrina defende que a avaliação feita pelo magistrado

deverá ser criteriosa e séria, exigindo-se que os indícios sejam precisos e que demonstrem,

ainda que em cognição sumária, a plausibilidade do alegado pelo autor.98

Em igual sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Agravo

Interno nos Embargos de Declaração no Agravo em Recurso Especial nº 925.670/MG, no qual

a Relatora Ministra Assusete Magalhães deixou assentado em seu voto que:

Com efeito, o recebimento da inicial da ação e o deferimento do pedido de

indisponibilidade dos bens dos acusados são decisões que possuem

fundamentos diversos. Enquanto a primeira exige apenas a existência de

meros indícios de atos de improbidade, prevalecendo o princípio do in dubio

pro societate, a segundo demanda a demonstração do fumus boni iuris, ou

seja “a indisponibilidade de bens é cabível quando o julgador entender

presentes fortes indícios de responsabilidade na prática de ato de improbidade

que cause dano ao Erário”.99 (grifos presentes no original)

2.4.2. Perigo de Dano ou Risco ao Resultado útil do Processo (Periculum in mora)

O Perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora), como foi

denominado pelo artigo 300 do Código de Processo Civil, é o segundo requisito necessário à

97 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 862. 98 MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O Limite da Improbidade Administrativa: comentários à Lei 8.429/92

– 5ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010. P. 171 99 AgInt nos EDcl no AREsp 925.670. Segunda turma, Relator: Ministra Assusete Magalhães, DJ: 13/12/2016.

Voto da Relatora, P. 22. Disponível em: <https://goo.gl/C2Ccs6>. Acesso em: 05/07/2017.

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42

concessão da medida cautelar e consiste na “demonstração de que, sem a cautela, há o risco de

que a futura decisão, no processo principal, reste ineficaz”100.

A imprescindibilidade do cumprimento do presente requisito à concessão da cautelar

de indisponibilidade de bens é tema que cria profunda divergência na doutrina, conforme será

visto a seguir.

Para parte significativa da doutrina101, podendo ser concedida a alcunha de majoritária,

o mero temor do requerente de que o requerido venha a dilapidar o próprio patrimônio não é

suficiente para ensejar a aplicação da medida de indisponibilidade de bens. Para essa corrente,

o perigo de dano deve ser concreto e aferido caso a caso a partir das provas produzidas, sendo,

portanto, imperioso que o autor do pleito demonstre a necessidade da medida para que seja

assegurado o resultado final do processo.

Assim, os doutrinadores da presente corrente defendem que a indisponibilidade de

bens configuraria uma das hipóteses de tutela de urgência, uma vez que o provimento cautelar

a ser conferido dependerá da aferição de situação de perigo capa de pôr em risco o resultado

útil do provimento judicial final.

Nesse sentido, cumpre destacar, dentre os defensores dessa corrente, a lição de Calos

Velloso que destaca o periculum in mora como o requisito legitimador da indisponibilidade e

afirma que sema comprovação deste, a medida estará fadada a inconstitucionalidade:

Desse modo, a medida representa exceção ao princípio insculpido no art. 5º,

LIV e LV, da Constituição Federal, pois implica em privação de bens sem o

completo desenvolvimento do devido processo legal, antes da efetiva

instauração do contraditório e do pleno exercício do direito de defesa.

Se assim é, embora o art. 7º da Lei 8.429, de 1992, não cogite expressamente

da excepcionalidade da medida, a única maneira de salvar o preceito da pecha

de inconstitucionalidade é conferindo-lhe interpretação que atribua à

indisponibilidade esse caráter excepcional, só se legitimando quando voltada

a assegurar o resultado útil do processo.

É que, assegurando o resultado útil do processo, estará a medida, na verdade,

garantindo a efetividade de outros princípios constitucionais de idêntica

relevância, a saber: o primado da “universalidade da jurisdição do Poder

Judiciário, jurisdição que tem na sua função cautelar, mais que uma forma de

tutela das partes, um mecanismo de garantia de si mesma, da jurisdição, isto

é, da plenitude do exercício da função típica do Poder Judiciário”, e, ainda, o

princípio da função preventiva da jurisdição, insculpido no art. 5º, XXXV, da

Constituição Federal, onde se lê que “a lei não excluirá da apreciação do Poder

Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

100 FAZZIO JUNIOR. Op. Cit. P. 359. 101 Cf.: PAZZAGLINI FILHO. Op. Cit. P. 197-200; FAZZIO JUNIOR. Op. Cit. P. 368-370; NEVES; OLIVEIRA.

Op. Cit. P. 263-265; COPOLA, Gina. A Indisponibilidade de bens na Lei de Improbidade e o devido processo

legal (Lei Federal 8.429/92). P. 56-58. FERRAZ, Sérgio. Aspectos Processuais na Lei sobre Improbidade

Administrativa. In.: BUENO, Cássio Scarpinella (Org.); PORTO FILHO, Pedro Paulo de Rezende (Org.).

Improbidade Administrativa: Questões Polêmicas e Atuais – 2ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2003.

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43

Dessa forma, a indisponibilidade de bens só terá lugar quando presentes os

requisitos das cautelares – periculum in mora e fumus boni iuris -, pois

ausentes estes pressupostos, não se poderia falar em resultado útil do processo,

em garantia da jurisdição ou em função preventiva da função jurisdicional.102

A corrente minoritária na doutrina103, em sentido distinto, defende que o periculum in

mora para a concessão da medida de indisponibilidade de bens seria presumido, não sendo

necessário, portanto, ao autor fazer prova de que o réu pratica ou que tenha a intenção praticar

atos visando dilapidar o próprio patrimônio para fraudar futura execução.

Esses autores entendem que, não só o periculum in mora estaria implícito no artigo 7º

da Lei de Improbidade Administrativa, como também que a indisponibilidade seria medida

imposta diretamente pela Constituição que, em seu artigo 37, § 4º, determina que sobre a prática

de atos de improbidade importará, dentre outros, a indisponibilidade de bens do agente104.

Em complementação a esse entendimento, Marco Aurélio Adão105 aponta que

O periculum in mora é ínsito à natureza da medida, considerando o contexto

normativo que a legitima, pois identificado no caso concreto em face da só

existência de indícios relevantes de dano ao erário ou de enriquecimento

ilícito. Não é preciso, portanto, para o deferimento dessa tutela cautelar,

demonstrar que o requerido pretende dilapidar os seus bens ou demonstrar que

outro evento específico qualquer está a ameaçar o futuro ressarcimento ou a

sanção de perda patrimonial.

Acrescenta-se a este fundamento, a quase impossibilidade de produção da prova de

dilapidação em tempo hábil que permita um provimento jurisdicional. Em um mundo moderno,

no qual os atos de dilapidação podem ser cometidos de forma instantânea, como, por exemplo,

a transferência de ativos para o exterior, exigir que o requerente atue como vigia eterno do

patrimônio do requerido é condenar a cautelar de indisponibilidade à ineficácia absoluta106.

Nesse sentido, Rogério Pacheco e Emerson Garcia107 apontam que “de fato, exigir a

prova, mesmo que indiciária, da intenção do agente de furtar-se à efetividade da condenação

102 VELLOSO FILHO, Carlos Mário. A Indisponibilidade de Bens na Lei 8.429, de 1992. In.: BUENO, Cássio

Scarpinella (Org.); PORTO FILHO, Pedro Paulo de Rezende (Org.). Improbidade Administrativa: Questões

Polêmicas e Atuais – 2ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2003. P. 121-122. 103 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 919-920.; AMBRIZZI; Op. Cit. P. 312-313; BEDAQUE, José Roberto dos

Santos. Tutela Jurisdicional Cautelar e Atos de Improbidade Administrativa. In.: BUENO, Cássio Scarpinella

(Org.); PORTO FILHO, Pedro Paulo de Rezende (Org.). Improbidade Administrativa: Questões Polêmicas e

Atuais – 2ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2003. P. 303-305. 104ADÃO, Marco Aurélio Improbidade administrativa e indisponibilidade de bens. In.: DOBROWLSKI,

Samantha Chantal (Coord.) Questões práticas sobre improbidade administrativa. Brasília: ESMPU, 2011. P. 236. 105Ibidem. P. 235-236 106AMBRIZZI, Tiago Ravizzi. Notas sobre a indisponibilidade de bens na Lei Geral de Improbidade

Administrativa. Revista de Processo, São Paulo, v. 229, mar. 2014. P. 312. 107 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 920.

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44

representaria, do ponto de vista prático, o irremediável esvaziamento da indisponibilidade

perseguida em nível constitucional e legal”.

Por fim, os doutrinadores desta segunda corrente apontam ainda que a imposição

legislativa da presunção do periculum in mora não é novidade no ordenamento jurídico

brasileiro. Em realidade, diversas são as normas que criam essa presunção, dentre as quais

podem ser citadas: (I) o artigo 36, § 1º da Lei 6.024/74 que versa sobre a indisponibilidade de

bens de ex-administradores das instituições financeiras em liquidação; (II) o artigo 14, § 4º da

Lei 4.717/65, que determina a sujeição do réu condenado ao sequestro e à penhora, após a

prolação de sentença condenatória; dentre outras108.

A segunda corrente, portanto, defende que a indisponibilidade de bens, configuraria

uma espécie de tutela de evidência, sendo desnecessária a prova da urgência da medida. Assim,

para tais doutrinadores, a concessão da medida basear-se-ia tão somente no juízo de

verossimilhança realizado pelo requisito do fumus boni iuris.

Inicialmente, o Superior Tribunal de Justiça, conforme depreende-se do julgamento

unânime do REsp 469.366/PR109110, adotou a primeira corrente, exigindo para a concessão da

indisponibilidade de bens que a parte autora demonstrasse a existência de indícios de que o

requerido estaria onerando seu próprio patrimônio ou teria a intenção de fazê-lo, de modo a

frustrar futura execução proveniente de um provimento judicial final condenatório.

O julgamento teve origem em irresignação da parte ré com a concessão pelo Tribunal

Regional Federal da 4ª Região, em sede de agravo de instrumento, da medida de

indisponibilidade. Assim, os réus recorreram da decisão alegando: (I) a inadequação de

concessão da indisponibilidade de bens em meio à ação principal, sendo o meio cabível para tal

pedido a ação cautelar autônoma; e (II) a inexistência da configuração dos requisitos

necessários à concessão da tutela.

Após afastar o primeiro argumento dos recorrentes com base em precedente da 1ª

Turma do Superior Tribunal de Justiça, a Relatora Ministra Eliana Calmon, em seu relatório,

assentou:

Não resta dúvida de que os bens do indiciado podem se tornar indisponíveis

por decisão judicial, mas resta saber se além do fumus boni iuris, consistente

na existência de indícios de ato de improbidade administrativa, para se

justificar o cabimento da medida, deve haver o periculum in mora, este

108 Ibidem. P. 920-921. 109 REsp 469.366/PR, Segunda turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ: 13/03/2003. Disponível em:

<https://goo.gl/dMR7Nd>. Acesso em: 05/07/2017. 110 Todos os dados utilizados referentes ao caso foram retirados diretamente do voto da Relatora Ministra Eliana

Calmon que pode ser encontrado no link acima referenciado.

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45

traduzido na existência de fatos que levem à conclusão que o erário não será

ressarcido. Em outras palavras, se a medida preventiva a que se refere o art.

7º da Lei 8.429/92 sujeita-se aos requisitos do art. 798 do CPC.

(...)

A par da razoabilidade dos argumentos em sentido contrário, tenho pessoal

convicção de que a indisponibilidade dos bens do indiciado, conforme

requerido ad cautelam pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, encontra-se inserida

no poder geral de cautela do juiz, de que trata o art. 798 do CPC e, portanto,

deve submeter-se aos requisitos do fumus boni iuris (plausibilidade do direito

ao ressarcimento do erário) e periculum in mora (fundado receio de que o

indiciado pretende dispor do seu patrimônio, de modo a frustrar a futura

execução da sentença a ser proferida na ação civil pública).

(...)

Com estas considerações, conheço do recurso especial e dou-lhe parcial

provimento, para cassar a decisão que tornou indisponíveis os bens, porque

inexiste, na decisão, fundamentos que justifiquem a medida extrema.111 (grifo

presente no original)

Na referida decisão, a relatora, ao verificar o decisum recorrido, apontou a ausência de

fundamentação quanto ao periculum in mora. Dessa forma, acolheu em sua decisão, a primeira

corrente doutrinária, uma vez que entendeu como insuficiente para a concessão da medida a

fundamentação com base no longo período de tempo até um provimento judicial definitivo.

Esse posicionamento permaneceu como o majoritário no Superior Tribunal de Justiça,

apesar de haverem decisões adotando a segunda corrente – principalmente na 2ª Turma112 – até

o julgamento do Recurso Especial 1.319.515/ES113114. Nessa decisão, a Primeira Seção definiu,

por maioria, sendo vencidos o Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho e o Ministro César

Asfor Rocha, orientação para os julgados referentes ao tema.

A controvérsia trazida à Corte por meio do referido recurso especial se traduzia no fato

de o Tribunal a quo ter concedido a indisponibilidade de bens dos recorrentes, considerando

como preenchido o requisito do fumus boni iuris por conta da gravidade e da vultuosidade do

dano aferido pelo Ministério Público Federal, bem como no largo período de tempo necessário

à resolução da lide.

O Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, defende, em seu voto, a 1ª corrente

doutrinária, ou seja, a indispensabilidade da comprovação pelo autor da ação do requisito do

periculum in mora. O Ministro aduziu que, ao entender como presumido o referido requisito,

111 Ibidem. Voto da Relatora. P. 5-6. 112 AgRg no AREsp 1256287/MT, Min. Rel. Humberto Martins, DJ: 15/09/2011; MC 9675/RS, Min. Rel. Mauro

Campbell Marques, DJ: 28/06/2011; EDcl no REsp 1211986/MT, Min. Rel. Herman Benjamin, DJ: 24/05/2011. 113 REsp 1.319.515/ES, Primeira Seção, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho (Voto vencido), Rel. p/ Acórdão:

Min. Mauro Campbell Marques. DJ: 22/08/2012. Disponível em: <https://goo.gl/nQwb2K>. Acesso em:

05/07/2017. 114 Todos os dados utilizados referentes ao caso foram retirados dos votos do Ministro Relator e do voto vencedor

dissidente.

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abrir-se-ia espaço para que a indisponibilidade de bens fosse adotada de forma automática, uma

vez que o fumus boni iuris poderia ser suprido com base na decisão de recebimento da denúncia.

Todavia, como visto no tópico anterior, o argumento utilizado pelo Ministro Relator

não se sustenta, uma vez que há clara distinção entre o ato de recebimento da inicial na ação de

improbidade e o cumprimento do requisito da probabilidade do direito. Enquanto o primeiro

pode ser praticado com base em meras ilações, as quais não foram desconstituídas pelo réu em

sua manifestação prévia, o segundo necessita de fortes indícios para que seja dado como

demonstrado.

Em sentido oposto ao defendido pelo Ministro Relator, o Ministro Mauro Campbell

Marques abriu a divergência e acabou se sagrando vencedor. O referido Ministro, em seu voto,

trouxe o entendimento de que o periculum in mora na concessão da indisponibilidade de bens

é presumido, uma vez que o artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa não menciona a

sua necessidade e o artigo 37, § 4º da Constituição traz redação imperativa quanto a sua

aplicação aos atos de improbidade.

Segundo o Ministro, a presunção do periculum in mora foi prevista na legislação como

forma de dar efetividade à cautelar de indisponibilidade, em clara aproximação com o

entendimento defendido pela 2ª corrente doutrinária.

Acolhendo a segunda corrente, o Superior Tribunal de Justiça, hoje, tem sua

jurisprudência pacificada por meio do Recurso Especial 1.366.721/BA que foi julgado pela

Primeira Seção da referida Corte sob a sistemática dos recursos repetitivos prevista no artigo

543-C do Código de Processo Civil de 1973.

Nesse recurso, assim como no anterior, o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho foi o

relator designado, sendo novamente vencido. O seu voto, nesse caso, em muito se assemelha

ao que proferiu no REsp 1.319.515/ES acima analisado, não sendo, portanto, necessária nova

análise.

A divergência no Recurso Especial 1.366.721/BA foi aberta pelo Ministro Og

Fernandes, que com base nos precedentes da Corte Superior e nos entendimentos já

colacionados da segunda corrente doutrinária, apontou a implicitude do periculum in mora no

artigo 7º, sendo, portanto, desnecessária a sua demonstração pelos requerentes para a concessão

da medida de indisponibilidade.

O referido recurso, ao fim, restou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL

REPETITIVO. APLICAÇÃO DO PROCEDIMENTO PREVISTO NO ART. 543-C

DO CPC. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

CAUTELAR DE INDISPONIBILIDADE DOS BENS DO PROMOVIDO.

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47

DECRETAÇÃO. REQUISITOS. EXEGESE DO ART. 7º DA LEI N. 8.429/1992,

QUANTO AO PERICULUM IN MORA PRESUMIDO. MATÉRIA PACIFICADA

PELA COLENDA PRIMEIRA SEÇÃO.

1. Tratam os autos de ação civil pública promovida pelo Ministério Público Federal

contra o ora recorrido, em virtude de imputação de atos de improbidade administrativa

(Lei n. 8.429/1992).

2. Em questão está a exegese do art. 7º da Lei n. 8.429/1992 e a possibilidade de o

juízo decretar, cautelarmente, a indisponibilidade de bens do demandado quando

presentes fortes indícios de responsabilidade pela prática de ato ímprobo que cause

dano ao Erário.

3. A respeito do tema, a Colenda Primeira Seção deste Superior Tribunal de Justiça,

ao julgar o Recurso Especial 1.319.515/ES, de relatoria do em. Ministro Napoleão

Nunes Maia Filho, Relator para acórdão Ministro Mauro Campbell Marques (DJe

21/9/2012), reafirmou o entendimento consagrado em diversos precedentes (Recurso

Especial 1.256.232/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em

19/9/2013, DJe 26/9/2013; Recurso Especial 1.343.371/AM, Rel. Ministro Herman

Benjamin, Segunda Turma, julgado em 18/4/2013, DJe 10/5/2013; Agravo

Regimental no Agravo no Recurso Especial 197.901/DF, Rel. Ministro Teori Albino

Zavascki, Primeira Turma, julgado em 28/8/2012, DJe 6/9/2012; Agravo Regimental

no Agravo no Recurso Especial 20.853/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves,

Primeira Turma, julgado em 21/6/2012, DJe 29/6/2012; e Recurso Especial

1.190.846/PI, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 16/12/2010,

DJe 10/2/2011) de que, "(...) no comando do art. 7º da Lei 8.429/1992, verifica-se que

a indisponibilidade dos bens é cabível quando o julgador entender presentes fortes

indícios de responsabilidade na prática de ato de improbidade que cause dano ao

Erário, estando o periculum in mora implícito no referido dispositivo, atendendo

determinação contida no art. 37, § 4º, da Constituição, segundo a qual 'os atos de

improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da

função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e

gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível'. O periculum in mora,

em verdade, milita em favor da sociedade, representada pelo requerente da medida de

bloqueio de bens, porquanto esta Corte Superior já apontou pelo entendimento

segundo o qual, em casos de indisponibilidade patrimonial por imputação de conduta

ímproba lesiva ao erário, esse requisito é implícito ao comando normativo do art. 7º

da Lei n. 8.429/92.Assim, a Lei de Improbidade Administrativa, diante dos velozes

tráfegos, ocultamento ou dilapidação patrimoniais, possibilitados por instrumentos

tecnológicos de comunicação de dados que tornaria irreversível o ressarcimento ao

erário e devolução do produto do enriquecimento ilícito por prática de ato ímprobo,

buscou dar efetividade à norma afastando o requisito da demonstração do periculum

in mora (art. 823 do CPC), este, intrínseco a toda medida cautelar sumária (art. 789

do CPC), admitindo que tal requisito seja presumido à preambular garantia de

recuperação do patrimônio do público, da coletividade, bem assim do acréscimo

patrimonial ilegalmente auferido".

4. Note-se que a compreensão acima foi confirmada pela referida Seção, por ocasião

do julgamento do Agravo Regimental nos Embargos de Divergência no Recurso

Especial 1.315.092/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 7/6/2013.

5. Portanto, a medida cautelar em exame, própria das ações regidas pela Lei de

Improbidade Administrativa, não está condicionada à comprovação de que o réu

esteja dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, tendo em vista que o

periculum in mora encontra-se implícito no comando legal que rege, de forma

peculiar, o sistema de cautelaridade na ação de improbidade administrativa, sendo

possível ao juízo que preside a referida ação, fundamentadamente, decretar a

indisponibilidade de bens do demandado, quando presentes fortes indícios da prática

de atos de improbidade administrativa.

6. Recursos especiais providos, a que restabelecida a decisão de primeiro grau, que

determinou a indisponibilidade dos bens dos promovidos.

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7. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e do art. 8º da Resolução n.

8/2008/STJ.115

Considerando todo o exposto, é necessário se destacar que apesar de toda a

fundamentação demonstrada por ambas as correntes, a presunção do periculum in mora tem

como fundamento principal a morosidade do Poder Judiciário em julgar as causas que lhe são

encaminhadas.

Em decorrência da demora na prestação judicial, foi criado pela doutrina e aceito pela

jurisprudência, conforme acima demonstrado, a presunção da má-fé do acusado que teria anos

para onerar e elidir o próprio patrimônio, de modo a se evadir de futuro provimento judicial

desfavorável. Assim, a ineficiência do Poder Judiciário em trazer provimentos céleres, defeito

imputável tão somente ao Estado, é utilizado em seu favor para presumir possível e futura

atuação ilegal do réu, ainda protegido sob o manto do princípio da não-culpabilidade estatuído

no artigo 5º, LVII da Constituição Federal116.

Em sentido diverso do afirmado pela segunda corrente e adotado pelo Superior

Tribunal de Justiça, a demora na prestação judicial deveria militar em favor dos réus na ação

de improbidade. Não há como se defender que medida tão gravosa possa ser imposta aos

acusados, que devem ser presumidos inocentes até o julgamento final, por período indefinido

de tempo, pela simples presunção de má-fé, sem ao menos ser dada a possibilidade ao réu de

elidir tal presunção117.

Se o longo período de tempo até o provimento final fosse fundamento suficiente para

a presunção do requisito do periculum in mora, não seria necessária a existência do próprio

requisito. Tendo em vista que a demora no andamento dos processos é problema inerente ao

Poder Judiciário brasileiro, todos os processos nos quais se debatesse qualquer quantia a ser

paga ao erário, deveriam ter a mesma presunção, o que acabaria por transformar a exceção em

regra.

Nesse sentido, Daniel Neves e Rafael Oliveira118 apontam que

O argumento de que a defesa do Erário justificaria tal presunção pode parecer

simpática à população já esgotada diante de tanto mau trato da coisa pública,

mas não se sustenta juridicamente. Se assim fosse, não só a medida cautelar

de indisponibilidade de bens ora analisada se beneficiaria da presunção, mas

115 REsp 1.366.721/ES. Primeira Seção. Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho. Rel. p/ Acórdão: Min. Og

Fernandes. DJ: 26/02/2014. Disponível em: <https://goo.gl/sR7zjg>. Acesso em: 05/07/2017. 116 PEÑA, Eduardo Chemale Selistre. Os Pressupostos para o Deferimento da Medida de Indisponibilidade

de Bens na Ação de Improbidade Administrativa. Revista de Processo, v. 224, out. 2013. P. 335-337. 117 Ibidem. P. 336. 118 NEVES, Daniel Amorim Assumpção; OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Manual de Improbidade

Administrativa: Direito Material e Processual – 4ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2016. P. 265.

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todas as medidas cautelares que pudessem de alguma forma garantir uma

efetiva reparação ao erário. Não se tem notícia de outras cautelares nesses

termos gozando de tal prerrogativa.

De igual forma, não se sustenta a argumentação de que a prova de dilapidação ou do

intuito de fazê-lo ensejaria a ineficácia da medida. Esse argumento, assim como o anterior, se

utiliza da ineficácia do próprio Estado, em decorrência da dificuldade probatória, para embasar

a presunção do periculum in mora.

Nesse sentido, cumpre ressaltar que a decisão que confere ou indefere a medida

cautelar é proferida por meio de cognição sumária, sendo necessários somente indícios que o

acusado está praticando ou, ao menos, tem a intenção de praticar atos tendentes a dilapidar o

próprio patrimônio visando se evadir de futura execução. Assim, tendo em vista a dificuldade

de prova quanto a tais atos, seria possível ao magistrado amenizar o cumprimento do requisito,

sendo aceitável a mera possibilidade de dilapidação, desde que embasada em provas119.

Logo, a posição defendida no presente trabalho se assemelha mais à da primeira

corrente doutrinária, exigindo-se a comprovação de ambos os requisitos, periculum in mora e

fumus boni iuris, para a concessão da cautelar de indisponibilidade de bens.

119 Ibidem. P. 265.

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50

3. Extensão da Medida de Indisponibilidade

3.1. Quanto aos Bens

A extensão ou o alcance da cautelar de indisponibilidade de bens é tema

regulamentado pelo parágrafo único do artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa, in

verbis:

Art. 7° (...)

Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo

recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre

o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.

A norma, apesar de não trazer uma regulamentação extensiva, definindo as balizas

para a aplicação da indisponibilidade, traz em seu bojo ao menos duas garantias, uma conferida

ao Estado e a outra ao réu acusado da prática de um ato ímprobo.

Em favor do Estado, o referido dispositivo determinou que a indisponibilidade deverá

ser abrangente o suficiente para que possa assegurar o adimplemento de futura execução que

vise recompor integralmente o patrimônio público dos danos causados, bem como o perdimento

de todo o proveito econômico auferido ilicitamente.

Em contrapartida, a favor do agente acusado da prática do ato ímprobo, a norma sob

análise impõe a garantia de que somente serão tornados indisponíveis os bens estritamente

necessários ao ressarcimento ou que decorram do enriquecimento ilícito, não sendo possível,

portanto, a determinação de bloqueio indiscriminado de todos os bens do agente120.

A garantia conferida aos réus na ação de improbidade, entretanto, somente impede que

a totalidade dos bens do acusado seja tornada indisponível sem a utilização de parâmetros para

definir o valor total do dano ou do enriquecimento ilícito de modo a amparar tal bloqueio. Se o

valor do dano estimado for superior à totalidade dos bens do requerido, não haverá que se falar

em abusividade da medida, uma vez que se estará dentro do limite imposto pela norma, não

sendo configurado excesso de cautela121.

Nesse sentido, o Ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski ensina:

Em que pese à salutar advertência de Marcelo Figueiredo no sentido de que

“a norma autoriza – e a prudência aconselha – que o pedido de

indisponibilidade de bens seja amplo, devendo o requerente apresentar uma

120 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa – 6ª edição. Rio de Janeiro:

Editora Lumen Juris, 2011. P. 919 121 Ibidem. P. 919.

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estimativa sempre superdimensionada, a fim de garantir, ainda que

provisoriamente, futura recomposição”, cumpre ter em mente que a

decretação da medida pelo juiz deve ser precedida dos cuidados de praxe, por

envolver a constrição de direitos de pessoas em cujo favor milita ainda a

presunção constitucional de inocência.

Convém lembrar, por oportuno que o parágrafo único do artigo em comento

estabelece parâmetros de caráter quantitativo à constrição, ao consignar que a

indisponibilidade “recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento

do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento

ilícito”.

Isso significa que se, de um lado, o legislador pretendeu garantir que a

constrição fosse a mais abrangente possível para melhor atingir os fins

colimados no diploma legal sob exame, de ou, buscou evitar que a medida

extrema abrangesse mais bens do que aqueles estritamente necessários à

recomposição do erário lesado.

Em nenhum momento desejou o legislador o congelamento prévio e sumário

de todos os haveres dos envolvidos num inquérito administrativo ou processo

judicial para apurar atos de improbidade, como não raro tem ocorrido no

cotidiano forense122.

Assim, pode-se afirmar que a medida de indisponibilidade deve ser proporcional ao

dano causado ou ao proveito econômico ilicitamente auferido, de modo que permita a proteção

de futura execução em caso de condenação, sem, no entanto, impor constrição maior do que a

necessária ao acusado, que ainda tem a seu lado a presunção constitucional de inocência,

insculpida no seu artigo 5º, LVII123.

Considerando que, em sede de cognição sumária, o cálculo do valor da

indisponibilidade é de difícil realização, uma vez que ainda não foram produzidas as provas, a

indicação do valor da causa (quantum debeatur) pelo legitimado para propor a ação de

improbidade assume maior importância, devendo ser o valor utilizado pelo magistrado,

inicialmente, para determinar o valor total da indisponibilidade124.

Levando-se em consideração a provisoriedade inerente às medidas cautelares, o valor

inicialmente determinado não será necessariamente mantido bloqueado até a decisão final do

processo. Nada impede que, no curso do processo, o acusado apresente provas e demonstre a

abusividade, a ilegalidade ou o excesso do valor do bloqueio e, em consequência, que esse

venha a ser revisto, sendo aumentado, diminuído ou até que seja extinta a própria cautelar.

122 LEWANDOWSKI, Enrique Ricardo. Comentários acerca da Indisponibilidade Liminar de Bens Prevista na

Lei nº 8.429, de 1992. In: BUENO, Cássio Scarpinella (Org.); PORTO FILHO, Pedro Paulo de Rezende (Org.).

Improbidade Administrativa: Questões Polêmicas e Atuais – 2ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2003. P.

184-185. 123 Art. 5º (...)

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; 124 AMBRIZZI. Op. Cit. P. 315.

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52

Em realidade, é até louvável que isso ocorra. Havendo a modificação na estimativa do

quantum debeatur, deverá o magistrado alterar o valor da indisponibilidade, em respeito às

garantias conferidas ao legitimado ativo (Ministério Público ou o ente lesado) da ação de

improbidade e ao agente acusado pelo parágrafo único do artigo 7º da Lei de Improbidade

Administrativa.

3.1.1. Momento de aquisição do bem

Determinado o valor da indisponibilidade, importante passar à análise de quais bens

podem ser tornados indisponíveis. A doutrina se divide, nesse ponto, ao examinar o tema sob o

aspecto da retroatividade da lei de modo a incidir sobre bens adquiridos antes da prática do ato

ímprobo.

Para uma parcela dos doutrinadores125, a indisponibilidade pode ser imposta a todos

os bens, não havendo restrições relativas ao momento de sua aquisição. Essa corrente defende

que o momento da aquisição do bem não é importante para protegê-lo contra a aplicação da Lei

8.429/92, uma vez que o artigo 789 do Código de Processo Civil estatui que “o devedor

responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações,

salvo as restrições estabelecidas em lei”.

Uma parte dos tratadistas126, por outro lado, traz uma divisão entre os bens que podem

ser tornados indisponíveis com base na tipificação do ato ímprobo que se pretende, ao fim do

processo, sancionar. Para essa parcela da doutrina, há que se realizar a distinção entre a extensão

da medida de indisponibilidade de bens conferida em ação que vise a condenação pelo ato de

improbidade que cause lesão ao erário (art. 10 da LIA) e na que busque punir o enriquecimento

ilícito do agente (art. 9º da LIA).

Os defensores dessa corrente apontam que, no caso em que o agente esteja

respondendo por suposto ato de improbidade que tenha causado dano ao erário, não haverá

distinção entre os bens adquiridos antes ou após o ato ímprobo, respondendo o agente com a

totalidade de seu patrimônio.

Na hipótese em que o agente, no entanto, estiver submetido a processo no qual se

discuta ato de improbidade que tenha ensejado o seu enriquecimento ilícito, entendem os

125 GARCIA; ALVES. Op. Cit. .P. 917. 126 PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de Improbidade Administrativa Comentada: Aspectos Constitucionais,

Administrativos, Civis, Criminais, Processuais e de Responsabilidade Fiscal – 6ª edição. São Paulo: Editora Atlas,

2015. P. 201.

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53

doutrinadores dessa corrente que somente poderão ser tornados indisponíveis os bens

ilicitamente adquiridos, uma vez que a indisponibilidade de bens não “atinge os bens

preexistentes ao ato tido de improbidade, pois perde-se o que foi ganho de forma ilícita, ou seja,

o acréscimo patrimonial resultante de enriquecimento ilícito.”127

Isso decorre do entendimento de que “no caso do enriquecimento ilícito, o agente

público inescrupuloso que auferiu vantagem econômica indevida deve devolvê-la; não perde

nada que possuía; só devolve o que, por direito, jamais lhe pertenceu”.128

Essa segunda corrente, portanto, faz uma interpretação literal do caput do artigo 7º da

Lei de Improbidade Administrativa para embasar o seu entendimento. Assim, uma vez que a

norma estatui especificamente que o objeto da medida cautelar deverá ser o acréscimo

patrimonial decorrente do enriquecimento ilícito, defendem os doutrinadores que os bens

adquiridos antes do ato ímprobo não estariam sujeitos ao bloqueio, uma vez que, por ser anterior

à prática do ato ímprobo, haveria a presunção de sua licitude.

Ocorre que nem sempre é possível determinar qual bem, especificamente, foi

adquirido de forma ilícita. De igual modo, se o bem se deteriora, se consome ou se o

enriquecimento ilícito decorre da prestação de serviços gratuita ao agente público, não é

possível a designação de um bem específico para ser objeto da demanda.

Waldo Fazzio Junior ao tratar sobre o referido entendimento demonstra de forma

didática a sua insuficiência, senão vejamos:

Acréscimo, diz a lei, o que em princípio não abrange os bens que o agente

público já possuía antes da prática improba.

Essa leitura, se faz jus ao texto, em sua literalidade, não é tão fiel à intenção

da norma. Claro está que o acréscimo obtido ilicitamente pode ter sido

negociado, transferido, convertido em outros bens ou valores. Nessa

eventualidade, a indisponibilidade deverá recair sobre bens bastantes para

cobrir o valor do acréscimo.

Se o acréscimo pode ter se multiplicado, mediante aplicações financeiras bem

sucedidas, também pode, por outro lado, ter sido consumido em investimentos

ruinosos ou, até mesmo, em operações de risco, atividades criminosas etc.

Pode também ter sido utilizado para aquisições imobiliárias, estabelecimentos

empresariais e outras inversões.

É que as interpretações extremas não são isentas de aporias. De modo que,

quando predisposta a assegurar a perda de bens do agente que enriqueceu

ilicitamente, a cautelar deverá recair, em princípio, sobre o acréscimo (entre

os bens adquiridos no curso do seu exercício administrativo) se esses

estiverem presentes, e não sobre os possuía antes da assunção ao cargo. É que

127 Ibidem. P. 201 128 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Improbidade Administrativa: Doutrina, Legislação e Jurispridência – 3ª edição.

São Paulo: Editora Atlas, 2015. P. 364.

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estes normalmente estão distanciados do enriquecimento indevido, assente

que já regravam seu patrimônio pessoal, antes de exercer aquela função.

Contudo, evidenciado que o agente público, de qualquer forma, procedeu de

modo a impossibilitar a identificação do acréscimo ilícito, nada obsta que a

cautelar alcance outras partes de seu cabedal. Este é garante de suas dívidas

nascidas de obrigações legítimas ou de ilícitos que praticou.

Impedir peremptoriamente a extensão da cautela, nesses casos em que o

agente improbo, por qualquer forma, promoveu a confusão de seus bens ou

sua consumição, equivaleria a aceitar que, embora tendo se enriquecido

ilicitamente, não restituirá o indevidamente havido, porque não soube

administrar o proveito ilícito ou “não foi feliz nos negócios”!129

Conforme se extrai da lição acima transcrita, a segunda corrente, ao trazer a vedação

quanto a possibilidade de imposição da cautelar de indisponibilidade sobre a parcela do

patrimônio do acusado adquirida antes da prática do ato reputado ímprobo, impõe restrição

insustentável ao bloqueio de tais bens, uma vez que permite que o agente possa preservar seu

patrimônio intacto, desde que consiga omitir seus rendimentos ilícitos de forma eficaz.

Assim, cumpre apontar que faz-se necessária a modificação do referido entendimento,

como defendido pelo Professor Waldo Fazzio Júnior, adotando no lugar da vedação, uma ordem

de preferência. Logo, caso seja possível a individualização dos bens ilicitamente adquiridos, a

medida deverá recair sobre tais. No entanto, se não for possível determinar qual bem decorreu

do ato ímprobo ou não for possível a recuperação do bem, o alcance da medida de

indisponibilidade se estenderá sobre todos os bens constantes do patrimônio do acusado,

podendo incidir sobre qualquer um destes.

Esse entendimento modificado aparenta ser aquele mais compatível, tanto com os

direitos do acusado, que poderá ter seu patrimônio lícito preservado, ao ser aplicada a ordem

de preferência, bem como a necessidade de preservação do patrimônio público, assegurando

hipotética execução, independentemente do momento em que foi adquirido.

O Superior Tribunal de Justiça, ao tratar do tema sob análise, inicialmente adotou a

tese restritiva130, determinando que os bens adquiridos antes da prática do ato ímprobo não

poderiam ser tornados indisponíveis.

Atualmente, no entanto, o posicionamento adotado pela referida Corte131 é

predominante no sentido de que a indisponibilidade poderá recair sobre qualquer bem do

patrimônio, independentemente do momento de sua aquisição. Isso decorre do entendimento

129Ibidem. P. 370-371. 130 REsp 196.932/SP, Primeira Turma, Min. Rel. Garcia Vieira, DJ: 18/03/1999. Disponível em:

<https://goo.gl/yvNVsN>. Acesso em: 09/07/2017. 131 REsp 1.301.695/RS, Primeira Turma, Min. Rel. Olindo Menezes, DJ: 06/10/2015. Disponível em:

<https://goo.gl/xv38dx>. Acesso em: 09/07/2017.

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55

de que, para a concessão da cautelar de bloqueio dos bens, não se faz necessária a

individualização dos bens que serão afetados, bastando que incida sobre o número necessário à

garantia do valor total de futura execução.

3.1.2. Bens impenhoráveis

A cautelar de indisponibilidade de bens, como já visto, tem a função de assegurar

futura execução de provimento condenatório pecuniário. Nesse sentido, tema interessante diz

respeito à possibilidade de tal cautelar recair sobre os bens impenhoráveis.

Os bens, aos quais a lei conferiu a característica de serem impenhoráveis, ganham

proteção legal contra a busca sem limites dos credores pela satisfação da execução, que pode

gerar violação à dignidade da pessoa do devedor. Assim, os bens impenhoráveis são aqueles

que, em tese, permitem a manutenção de um grau mínimo de dignidade humana do

executado132.

Segundo Daniel Neves, a

impenhorabilidade de bens é a última das medidas no trajeto percorrido pela

‘humanização da execução’. A garantia de que alguns bens jamais sejam

objeto de expropriação judicial é a tentativa mais moderna do legislador de

preservar a pessoa do devedor, colocando-se nesses casos, sua dignidade

humana em patamar superior à satisfação do exequente.133

Os bens impenhoráveis estão delimitados em diversos instrumentos normativos134,

dentre os quais, os mais importantes são aqueles previstos no artigo 833 do Código de Processo

Civil e o denominado bem de família protegido pelo artigo 1º da Lei nº 8.009/90135.

Alguns doutrinadores136 defendem o entendimento de que, sendo a criação da

impenhorabilidade uma forma de proteger determinados bens, necessários à manutenção da

dignidade do executado, sobre tais bens não poderá recair a medida de indisponibilidade

132 NEVES. Manual de Direito Processual Civil – 8ª edição. Salvador: Editora JusPodivm, 2016. P. 201. 133 Ibidem. P. 134 Podem ser citados ainda: (I) o artigo 114 da Lei 8.213/91, que veda a penhora de benefícios pagos com base

nos planos da referida lei; (II) o artigo 69 do Decreto-Lei 167/67, que veda a penhora sobre bens objeto de penhor

ou de hipoteca constituídos pela cédula de crédito rural; dentre outros. 135 Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por

qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou

pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações,

as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que

guarnecem a casa, desde que quitados. 136 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa – 6ª edição. Rio de Janeiro:

Editora Lumen Juris, 2011.P. 919-920.

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56

prevista na Lei de Improbidade Administrativa. Esse posicionamento decorre do fato de que

por ser impenhorável, o bem não será capaz de assegurar o resultado final do processo, sendo,

portanto, a imposição da indisponibilidade ineficaz e gravosa ao réu, podendo levar ao

aniquilamento da dignidade da pessoa do devedor.137

Nesse sentido, leciona Aluízio Bezerra Filho que

a nosso ver, a decretação da indisponibilidade de bens de família, que no

futuro não poderão ser objeto de venda ou desapropriação do domínio do

agente, por estar protegido por norma especial, não tem resultado prático, pois

a fim de garantir o ressarcimento perquirido, estaria resguardando um

patrimônio que não servirá para fins de alienação ou apropriação do seu

produto pelo Poder Público. Seria, assim, uma medida inócua. Isso porque a

indisponibilidade objetiva resguardar o acervo patrimonial ou financeiro para

uma futura execução garantidora do prejuízo sofrido pelo erário; ora, se

procede o bloqueio do bem que não poderá ser objeto de penhora ou alienação

via leilão mais adiante, não se está garantindo a exequibilidade de uma ação

de reparação no futuro.138

O Superior Tribunal de Justiça, no entanto, incialmente139, trouxe o entendimento de

que a medida de indisponibilidade poderia ser implementada sobre os bens impenhoráveis, uma

vez que não configurava a expropriação do mesmo, mas sim a impossibilidade de alienação.

Em realidade, a referida Corte tem julgamentos140 nos quais inclusive foi afirmado que

a decretação da indisponibilidade de bens não criaria embaraços ao acusado, uma vez que

reforçaria a proteção da Lei 8.009/90 sobre o bem de família, ao determinar a proibição de sua

alienação ou que a proteção conferida não poderia fazer frente à indisponibilidade de bens

prevista no artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa.

Atualmente, no entanto, o entendimento que tem predominado no Superior Tribunal

de Justiça141 tem sido no sentido de que os bens impenhoráveis, por não poderem satisfazer o

provimento final condenatório, não se sujeitam à medida de indisponibilidade, uma vez que

inadequados ao fim colimado pela cautelar.

137 Ibidem. P. 921-922. 138 BEZERRA FILHO, Aluízio. Op. Cit. P. 84. 139 AgRg no REsp nº 956.039/PR, Primeira Turma, Min. Rel. Francisco Falcão, DJ: 03/06/2008; REsp 900.783/PR,

2ª Turma, Min. Rel. Eliana Calmon, DJ: 23/06/2009; REsp nº 806.301/PR, Primeira Turma, Min. Rel. Luiz Fux,

DJ: 11/12/2007. 140 REsp nº 840.930/PR, Segunda Turma, Min. Rel. Eliana Calmon, DJ: 16/09/2008; REsp 1204794/SP, Segunda

Turma, Min. Rel. Eliana Calmon, DJ: 16/05/2013. 141 REsp 1.610.169/BA, Segunda Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, DJ: 02/05/2017; REsp 1.637.831/SP,

Segunda Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, DJ: 15/12/2016; AgRg no REsp 1.460.621/BA, 2ª Turma, Min. Rel.

Herman Benjamin, DJ: 25/10/2016; AgRg no REsp 1.510.437/MG, Segunda Turma, Min. Rel. Herman Benjamin,

DJ: 17/12/2015; REsp nº 1164037/RS, Primeira Turma, Min. Rel. Sérgio Kukina, Rel. p/ acórdão Min. Napoleão

Nunes Maia Filho, DJ: 20/02/2014.

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57

Essa tese aparenta ser a que mais se aproxima dos fins pretendidos pelo legislador,

uma vez que respeita a proteção concedida legalmente ao patrimônio mínimo do devedor,

essencial à manutenção de sua dignidade. Esse entendimento adotado pelo Superior Tribunal

de Justiça permite, portanto, inferir que até mesmo o interesse público, nesse caso, representado

pela recuperação do patrimônio público lesado, pode ser afastado em prol da defesa da

dignidade da pessoa do acusado.

Por fim, torna-se imperioso ressaltar que a própria legislação pode determinar, em

algumas situações, a relativização da impenhorabilidade de determinado bem. Nessas situações,

taxativamente previstas na lei, será possível, portanto, a decretação da indisponibilidade de

bens, na ação de improbidade.

É o que ocorre, por exemplo, no artigo 3º, VI da Lei nº 8.009/90142. Sendo o bem de

família reconhecido por meio de sentença penal condenatória transitada em julgado como

produto decorrente de crime, não será possível a oposição da proteção do bem de família à

cautelar de indisponibilidade de bens prevista no artigo 7º da Lei de Improbidade

Administrativa143.

Nova hipótese de mitigação da impenhorabilidade adveio com o § 2º do artigo 833 do

Código de Processo Civil. O referido dispositivo, hoje, prevê a possibilidade da penhora de

salários, subsídios, vencimentos, soldos e todos os demais tipos de remuneração que

ultrapassem o valor mensal de 50 (cinquenta) salários mínimos, modificando a antiga previsão

do artigo 649 do Código de Processo Civil de 1973.

No antigo CPC, o artigo 649, em seu inciso IV144, trazia a previsão da

impenhorabilidade absoluta de todos os tipos de remuneração, sem no entanto estabelecer um

limite para a impenhorabilidade. Assim, independentemente do valor da remuneração, todos os

valores destinados à subsistência do executado eram considerados absolutamente

impenhoráveis, ainda que em valor astronômico.

142 Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária,

trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

(...)

VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento,

indenização ou perdimento de bens. 143 GARCIA; ALVES. Op. Cit. P. 921-922. 144 Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:

(...)

IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e

montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os

ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3o deste artigo

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58

Exatamente por conta da discrepância havida entre algumas remunerações e a proteção

conferida, o Superior Tribunal de Justiça começou a aplicar contra legem a mitigação da

indisponibilidade nessas hipóteses. Nesse sentido, confere-se:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO

EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE VALORES EM CONTA SALÁRIO.

EXCEPCIONAL POSSIBILIDADE. QUESTÃO A SER SOPESADA COM BASE

NA TEORIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE SE

EXCEPCIONAR A REGRA DO ARTIGO 649, IV, DO CPC/73, QUANDO O

MONTANTE DO BLOQUEIO SE REVELE RAZOÁVEL EM RELAÇÃO À

REMUNERAÇÃO PELO DEVEDOR PERCEBIDA O QUE, NÃO AFRONTA A

DIGNIDADE OU A SUBSISTÊNCIA DO DEVEDOR E DE SUA FAMÍLIA.

PRECEDENTE ESPECÍFICO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.145

O novo Código de Processo Civil veio, portanto, ao encontro da jurisprudência que se

firmava no Superior Tribunal de Justiça quanto à possibilidade da penhora dos valores

destinados à subsistência quando estes forem em muito superiores ao efetivamente necessário.

No entanto, o referido diploma legal trouxe a previsão de que somente seriam

penhoráveis os valores acima de 50 (cinquenta) salários mínimos, valor que ainda considerado

exorbitante para a realidade brasileira146. Assim, apesar do avanço permitido pelo novo Código

de Processo Civil, ainda é necessária a revisão do valor estipulado, de modo a adequar tal limite

à realidade brasileira.

3.2.Quanto as Partes

3.2.1. Pluralidade de Réus

Ainda acerca do alcance da medida de indisponibilidade de bens, interessante é a

questão referente à pluralidade de réus na ação de improbidade administrativa e os efeitos do

litisconsórcio na concessão da medida cautelar. Nesse sentido, questiona-se como deverá ser

decretada a indisponibilidade de bens. Deverá a medida ser concedida com base em uma fração

ideal destinada a cada um dos litisconsortes ou poderá ser reconhecida a solidariedade passiva,

podendo recair sobre os bens de qualquer um dos réus?

145 AgInt no REsp 1.582.475/MG, Terceira Turma, Min. Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, DJ: 07/03/2017. 146 Segundo o IBGE, no ano de 2016, a renda mensal domiciliar per capita da população residente no Brasil foi de

R$ 1.226,00 (mil duzentos e vinte e seis reais), o equivalente à 1,39 salário mínimo. Disponível em:

<https://goo.gl/PuJECj>. Acesso em: 09/07/2017.

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59

O Superior Tribunal de Justiça, ao tratar sobre a presente questão147, tem adotado o

segundo entendimento, determinando que, em cognição sumária, não é possível definir o grau

de participação de cada acusado na execução do ato ilícito.

Sendo assim, a referida Corte Superior tem adotado o entendimento que a

indisponibilidade de bens deverá recair sobre os bens que assegurem o valor necessário ao

integral ressarcimento do erário ou ao perdimento do proveito patrimonial ilicitamente auferido,

independentemente, nesse momento inicial, da separação quanto à parcela de responsabilidade

de cada um dos litisconsortes.

No julgamento da Reclamação nº 16.514/RJ148 pela Primeira Seção do Superior

Tribunal de Justiça, de relatoria do Ministro Sérgio Kukina, o posicionamento da referida Corte

pode ser melhor esclarecido. Antes de adentrar ao estudo do caso, no entanto, faz-se necessário

a sua contextualização.

O caso versava sobre ação civil pública por ato de improbidade proposta pelo

Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro em face de 34 réus. Posteriormente, no entanto,

visando a economia processual, a demanda foi desmembrada, restando somente a reclamante,

VP CONSULTORIA DE INFORMÁTICA E SERVIÇOS TERCEIRIZADOS LTDA, e o

Estado do Rio de Janeiro no polo passivo.

Na inicial, o Parquet imputava aos acusados dano ao erário consistente em R$

234.000.000,00 (duzentos e trinta e quatro milhões de reais), por meio do contrato nº 275/2005,

celebrado entre a Secretaria Estadual de Saúde e a Fundação PROCEFET, e requisitava o

bloqueio de todos os bens dos acusados, o que foi concedido pelo magistrado em primeira

instância e mantido em sede de agravo de instrumento na segunda instância.

Assim, foi interposto o Recurso Especial nº 1.368.192/RJ149 que, sob a relatoria do

Ministro Humberto Martins, determinou que a indisponibilidade deveria ser imposta atentando-

se ao dano estimado na inicial, não sendo possível que a constrição atingisse todos os bens dos

demandados, como determinado pela magistrada em primeira instância, uma vez que

configuraria a desproporcionalidade da medida, devido ao excesso de cautela e à inobservância

ao valor do dano.

Com base na referida decisão, uma vez que a inicial imputava à VP Consultoria dano

no valor de R$ 102.727,24 (cento e dois mil setecentos e vinte e sete reais e vinte e quatro

147 Neste sentido: REsp 1195828/MA, 2ª Turma, Min. Rel. Mauro Campbell Marques, DJ: 02/09/2010; REsp

1119458/RO, 1ª Turma, Min. Rel. Herman Benjamin, DJ: 13/04/2010; AgRg no AREsp 698259/CE, 1ª Turma,

Min. Rel. Benedito Gonçalves, DJ: 19/11/2015. 148 Rcl nº 16.514/RJ, Primeira Seção, Min. Rel. Sérgio Kukina, DJ: 28/05/2014. 149 REsp nº 1.368.192/RJ, Min. Humberto Martins, decisão monocrática, DJ: 26/04/2013.

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60

centavos), conforme informação fornecida pela própria reclamante, esta ofereceu um bem no

valor de R$ 2.634.155,24 (dois milhões seiscentos e trinta e quatro mil cento e cinquenta e cinco

reais e vinte e quatro centavos), requisitando o desbloqueio dos seus demais bens.

Após a negativa proferida pela magistrada de primeira instância quanto ao

requerimento de substituição dos bens bloqueados pelo bem oferecido, com o respectivo

desbloqueio daqueles, a empresa acusada ingressou com a reclamação sob estudo, alegando

violação ao decidido no REsp 1.368.192/RJ.

A reclamação tinha por base a tese de que, uma vez imputado pelo Ministério Público

o valor de R$ 102.727,24 (cento e dois mil setecentos e vinte e sete reais e vinte e quatro

centavos), os bens bloqueados deveriam bastar somente a cobrir esse montante. Sendo o valor

do bem oferecido cerca de 20 vezes maior que o dano imputado à ré, a reclamante exigia o

desbloqueio dos demais bens com a substituição destes pelo bem oferecido.

O relator Ministro Sérgio Kukina, ao analisar o caso, no entanto, manteve a decisão

impugnada, no que foi seguido pela unanimidade dos Ministros que compõem a Primeira Seção.

Segundo o relator, na fase em que se encontrava o processo, não seria possível determinar o

grau de participação de cada um dos acusados no dano de duzentos e trinta e quatro milhões de

reais imputado a estes.

Assim, determinou a Primeira Seção que deveriam permanecer bloqueados os bens

necessários ao adimplemento de todas as consequências financeiras virtualmente decorrentes

do ato de improbidade, uma vez que os corréus são solidariamente responsáveis, até o fim da

instrução probatória, pela totalidade do dano. Segue, in verbis, a ementa do referido julgado:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO. ART. 105, I,

f, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALEGADO DESRESPEITO À

AUTORIDADE DA DECISÃO PROFERIDA NO RECURSO ESPECIAL

Nº 1.368.192/RJ, A QUAL DETERMINOU QUE A INDISPONIBILIDADE

DECRETADA NO BOJO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA DEVERIA RECAIR SOBRE OS

BENS QUE ASSEGURASSEM O INTEGRAL RESSARCIMENTO DO

DANO OU SOBRE O ACRÉSCIMO PATRIMONIAL RESULTANTE DO

ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. ATO RECLAMADO QUE, LASTREADO

NA RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS RÉUS PELOS SUPOSTOS

ATOS ÍMPROBOS, MANTEVE A INDISPONIBILIDADE DE TODOS OS

BENS DA EMPRESA RECLAMANTE, INDEFERINDO SUA

SUBSTITUIÇÃO POR BEM IMÓVEL DE VALOR TIDO POR

INSUFICIENTE. ESTÁGIO DA INSTRUÇÃO DA SUBJACENTE AÇÃO

CIVIL PÚBLICA EM QUE AINDA NÃO É POSSÍVEL DELIMITAR A

QUOTA DE RESPONSABILIDADE DE CADA AGENTE.

IMPROCEDÊNCIA DA RECLAMAÇÃO.

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61

1 - Por meio da decisão cuja autoridade alegadamente está sendo

desrespeitada, o Ministro Humberto Martins, monocraticamente, deu parcial

provimento ao REsp nº 1.368.192/RJ, "apenas para determinar

que a indisponibilidade dos bens seja suficiente para assegurar o integral

ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do

enriquecimento ilícito".

2 - A empresa, com fundamento em tal decisão, requereu ao Juízo de origem

a substituição do patrimônio até então bloqueado por um bem imóvel ofertado

em garantia, avaliado em R$ 2.634.155,24 (dois milhões, seiscentos e trinta e

quatro mil, cento e cinquenta e cinco reais e vinte e quatro centavos). Assim

o fez por entender que "o valor que o MP/RJ alega ter sido supostamente

desviado pela ora Reclamante" é de " R$ 102.727,24 (cento e dois mil

setecentos e vinte e sete reais e vinte e quatro centavos)". Nesse contexto, no

entender da reclamante, ao indeferir o pedido de substituição, o Juízo de

origem teria afrontado a autoridade da decisão proferida no REsp nº

1.368.192/RJ.

3 - De acordo com a exordial da ação civil por ato de improbidade

administrativa, no entanto, o dano ao erário imputado à empresa reclamante e

aos corréus, solidariamente, perfaz o montante aproximado de R$

234.000.000,00 (duzentos e trinta e quatro milhões de reais), sem considerar

a incidência de juros e correção monetária e a eventual aplicação de multa

civil.

4 - Como até o presente estágio da instrução processual da ação civil pública

subjacente não é possível aferir o grau de participação dos réus nas condutas

ímprobas que lhes são imputadas, devem permanecer indisponíveis tantos

bens quantos forem suficientes para fazer frente à execução em caso de

procedência da ação. Precedentes.

5 - Reclamação julgada improcedente.150

Logo, o posicionamento definido pelo Superior Tribunal de Justiça com relação ao

tema é o de que, independentemente do fato do autor anotar na peça vestibular a

responsabilidade de cada réu separadamente, a indisponibilidade não poderá ser limitada ao

aduzido na petição inicial. Uma vez que ainda não seria possível ao juízo determinar a

participação de cada corréu, a indisponibilidade deverá sempre recair sobre os bens necessários

à garantia de hipotética execução.

Esse não parece, porém, ser o melhor entendimento. Ora, se o próprio autor delimitou

a responsabilidade de cada corréu, não é lógico determinar a indisponibilidade de bens sobre os

acusados ignorando o apontado na inicial. Essa cegueira deliberada autoimposta em nada

contribui para assegurar o resultado útil ao fim da ação, uma vez que ao determinar a

indisponibilidade a esmo, visando somente o valor total do dano, poderão ser concedidas

medidas cautelares abusivas em face de alguns réus, determinando a indisponibilidade em valor

superior ao imposto pelo autor, e ineficazes perante outros, concedidas abaixo da

responsabilidade imputada ao réu.

150 Rcl nº 16.514/RJ, Primeira Seção, Min. Rel. Sérgio Kukina, DJ: 28/05/2014.

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A solidariedade entre os réus deverá ser determinada tão somente nas hipóteses em

que não haja dados para aferir, em sede de cognição sumária, a participação de cada réu. Nos

casos em que o Ministério Público ou o ente lesado já delimita a responsabilidade de cada réu,

o magistrado, inicialmente, deverá conceder a indisponibilidade com base no fracionamento

realizado pelo autor, assim como ocorre com o valor global da causa (quantum debeatur).

3.2.2. Sucessor do Agente Ímprobo

Ocorrendo o falecimento do agente acusado da prática de ato de improbidade, o artigo

8º da Lei 8.429/92 prevê que “o sucessor daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se

enriquecer ilicitamente está sujeito às cominações desta lei até o limite do valor da herança.”

O dispositivo, portanto, traz uma limitação à responsabilidade patrimonial dos

sucessores do de cujus e, portanto, à cautelar de indisponibilidade. Ao se referir às cominações

da Lei de Improbidade, por certo, o artigo destina-se a tratar somente das sanções pecuniárias

referentes ao perdimento de bens ilicitamente auferidos e o ressarcimento ao erário151.

Exatamente por isso, o dispositivo legal finaliza prevendo que as sanções obedecerão ao limite

da herança.

O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o tema, entende que além do ressarcimento

ao erário e do perdimento de bens, também será transmissível a multa nas hipóteses em que o

de cujus estivesse sofrendo ação de improbidade com fundamento nos artigos 9º (atos que

geram o enriquecimento ilícito) e 10 (atos que causem lesão ao erário). Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO.

CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE SEM LICITAÇÃO.

ATO ÍMPROBO POR ATENTADO AOS PRINCÍPIOS DA

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CONDENAÇÃO CRIMINAL

TRANSITADA EM JULGADO. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES.

1. O Juízo de 1º grau julgou procedente o pedido deduzido em Ação Civil

Pública por entender que os réus, ao realizarem contratação de serviço de

transporte sem licitação, praticaram atos de improbidade tratados no art. 10 da

Lei 8.429/1992. No julgamento da Apelação, o Tribunal de origem afastou o

dano ao Erário por ter havido a prestação do serviço e alterou a capitulação

legal da conduta para o art. 11 da Lei 8.429/1992.

(...)

7. A multa civil é sanção pecuniária autônoma, aplicável com ou sem

ocorrência de prejuízo em caso de condenação fundada no art. 11 da Lei

8.429/92. Precedentes do STJ.

8. Consoante o art. 8º da Lei de Improbidade Administrativa, a multa

civil é transmissível aos herdeiros, "até o limite do valor da herança",

151 NEVES; OLIVEIRA. Op. Cit. P. 151.

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somente quando houver violação aos arts. 9° e 10° da referida lei (dano

ao patrimônio público ou enriquecimento ilícito), sendo inadmissível

quando a condenação se restringir ao art. 11.

9. Como os réus foram condenados somente com base no art. 11 da Lei

da Improbidade Administrativa, é ilegal a transmissão da multa para os

sucessores do de cujus, mesmo nos limites da herança, por violação ao art.

8º do mesmo estatuto.

10. Recurso Especial parcialmente provido para reduzir a sanção de proibição

de contratar e receber subsídios públicos e afastar a transmissão mortis causa

da multa civil. (Grifo nosso)

Essa, no entanto, não parece ser a melhor posição sobre o tema. O artigo 8º, ao

delimitar a responsabilidade do sucessor do de cujus acusado da prática de ato de improbidade

somente replica a previsão já expressa no artigo 5º, XLV da Constituição Federal. Este

determina que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar

o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores

e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido”.

Conforme pode ser notado, agora a nível constitucional, somente se transmite ao

sucessor as obrigações de ressarcimento do dano causado e a decretação do perdimento de bens,

não havendo qualquer menção à possibilidade da transmissão da multa. Não poderia ser

diferente. Se o dispositivo constitucional proíbe que as sanções passem da pessoa do

condenado, não há como se defender a possibilidade da multa ser transmitida, uma vez que

detém natureza jurídica de sanção disciplinar e corretiva.152

Assim, ao sucessor do de cujus somente poderão ser impostas as obrigações

indenizatórias, qual sejam a reparação dos danos causados e o perdimento dos bens ilicitamente

auferidos, até o valor da herança recebida ou a receber. Esse mesmo limite deverá ser respeitado

ao decretar a indisponibilidade de bens, uma vez que é o marco da responsabilidade patrimonial

do sucessor.

152 PAZZAGLINI FILHO. Op. Cit. P. 162; DECOMAIN. Op. Cit. P. 245.

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64

Conclusão

O presente trabalho versou sobre a indisponibilidade de bens na ação de improbidade

com o intuito de estudar quais os limites impostos pelo Superior Tribunal de Justiça para a sua

concessão, bem como se os referidos limites encontravam-se em conformidade com as garantias

concedidas ao réu, tais como a presunção de inocência, a impenhorabilidade de determinados

bens do acusado, dentre outras.

Para tal, no primeiro capítulo demonstrou-se que o legislador brasileiro, ao menos

desde a Constituição de 1824, já expressava a sua preocupação com o debate acerca da

moralidade na Administração Pública. Ainda que, inicialmente, a preocupação se resumisse

somente quanto à possibilidade do enriquecimento ilícito do agente com abuso de sua função

pública, ao longo do tempo os diplomas seguintes foram expandindo as formas de controle e os

meios pelos quais o controle pudesse ser efetivado, até se chegar ao sistema atual.

No segundo capítulo, discutiu-se as principais controvérsias quanto as características

da medida de indisponibilidade de bens, dentre as quais a natureza jurídica de medida cautelar

e a possibilidade de o legitimado ativo requisitar a medida a qualquer tempo, ainda que em

caráter antecedente ou em sede liminar, sem a oitiva do réu.

As hipóteses de cabimento da medida foram igualmente tratadas no segundo capítulo,

chegando-se a conclusão que a omissão do artigo 7º quanto à incidência da medida de

indisponibilidade na hipótese dos atos de improbidade que atentam contra princípios, não gera

qualquer restrição ao seu cabimento.

A medida nessas hipóteses se destinará a assegurar a hipotética execução da multa

civil, sanção que também poderá ser levada em consideração no cálculo do valor da

indisponibilidade de bens nas hipóteses dos atos de improbidade que causem dano ao erário ou

gerem o enriquecimento ilícito do agente.

Encerrando o segundo capítulo, foram discutidos ainda os requisitos para a concessão

da medida cautelar. Como foi visto, o Superior Tribunal de Justiça, por meio do Recurso

Especial 1.366.721, julgado sob o rito dos recursos repetitivos previsto no artigo 543-C do

Código de Processo Civil de 1973, estabilizou o entendimento de que o periculum in mora seria

presumido pelo artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa, não sendo, portanto necessária

a sua comprovação.

No entanto, ainda que a jurisprudência tenha fixado o referido entendimento, a corrente

majoritária na doutrina ainda defende tese diversa, no sentido da imprescindibilidade da

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65

comprovação da prova de ação ou intenção do agente de dilapidar seu próprio patrimônio, como

forma de cumprir o requisito do periculum in mora.

Foi demonstrado que o principal argumento favorável à presunção do periculum in

mora é a longa dilação temporal entre o início da ação e o provimento final, que permitiria ao

agente praticar atos que dilapidassem ou onerassem seu patrimônio de modo a frustrar futura

execução. Ocorre, no entanto, que, como foi exposto, o argumento da falta de celeridade no

julgamento das ações deve militar em favor do acusado, de quem não se pode ser exigido o

bloqueio por tempo indeterminado, por conta de uma presunção de sua má-fé.

A má-fé, no Direito, nunca é presumida, sendo sempre necessária a sua comprovação,

ainda que por meros indícios da prática de atos ou da intenção de dilapidar o patrimônio. Assim,

não é possível interpretar a omissão do artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa, quanto

à imprescindibilidade da demonstração do periculum in mora, como a permissão para a sua

presunção. Em realidade, quando o legislador pretende criar exceções às regras, o faz de modo

expresso, o que não ocorreu no presente caso.

No terceiro capítulo foram analisados os limites impostos à concessão de medida

cautelar, tais como quais bens podem ser tornados indisponíveis, quais os efeitos da pluralidade

de réus ou da sucessão processual do réu, e o cálculo do valor da multa civil a ser tornado

indisponível.

Com relação aos bens, destacou-se que o Superior Tribunal de Justiça tem o

entendimento de que podem sofrer a incidência da cautelar de indisponibilidade, todos os bens

constantes do patrimônio do réu, independentemente do momento de sua aquisição, ressalvados

aqueles considerados pela Lei como impenhoráveis.

O alcance da medida, conforme foi exposto, é limitado pelo valor estimado do dano

ao erário ou do proveito econômico ilícito auferido pelo agente, devendo ser levado ainda em

consideração o valor da possível condenação ao pagamento de multa civil. Assim, serão

tornados indisponíveis tantos bens quanto forem necessários a assegurar o integral

ressarcimento ao erário.

No que toca aos efeitos provocados por conta da pluralidade de agentes no polo passivo

da demanda, o Superior Tribunal de Justiça tem o entendimento de que, nessas hipóteses, sendo

impossível aferir o grau de participação de cada acusado, haverá a solidariedade entre os réus

na indisponibilidade, devendo ser decretada sobre tantos bens quanto necessários a assegurar

futura decisão final condenatória. Essa solidariedade permaneceria entre os acusados, no

máximo, até o fim da fase probatória, momento no qual seria possível determinar o

envolvimento e a responsabilidade de cada um dos agentes nos danos causados.

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Por fim, com relação ao sucessor processual do agente ímprobo, foi destacado que por

conta do disposto no artigo 8º da Lei de Improbidade Administrativa, a sua responsabilidade

patrimonial foi limitada ao valor da herança recebida. Essa limitação, de igual modo, incidirá

sobre a indisponibilidade de bens, uma vez que não seria lógico impor o bloqueio em valor

superior ao que poderia ser, ao fim executado.

Assim, em resumo, é possível dizer que a jurisprudência do Superior Tribunal de

Justiça tem caminhado no sentido de privilegiar o interesse público ao ressarcimento ao erário

sobre as garantias conferidas aos acusados. Esse entendimento pode ser extraído do tratamento

dado pela Corte à matéria, fixando a sua jurisprudência no sentido da presunção do periculum

in mora, e dando interpretação ampliativa do artigo 7º da Lei de Improbidade Administrativa

para permitir que a multa civil possa ser assegurada mediante a cautelar de indisponibilidade

de bens, ainda que o dispositivo seja omisso quanto ao tema.

A presunção do periculum in mora, como foi visto, carrega em si a suspeita de que o

acusado irá se desfazer do patrimônio para evitar futura decisão condenatória. Nesse sentido,

ocorre a presunção da má-fé do acusado perante o processo, em clara violação ao entendimento

de que todas as presunções militam a favor do agente, sendo sempre presumida a sua boa-fé e

honestidade. A má-fé, ao contrário deve ser sempre comprovada pela parte que a alega.

A possibilidade da aplicação da indisponibilidade de bens para garantir a futura

execução de multa civil, de igual modo, viola os direitos do acusado, uma vez que é realizada

com base na omissão legal quanto ao tema, permitindo assim que a indisponibilidade de bens

seja decretada em montante superior ao dano estimado pela parte autora.

Ainda que se entenda no presente trabalho ser possível tal interpretação ampliativa,

uma vez que entendimento diverso poderia gerar a inexecução parcial de futura condenação,

não há como se negar que tal posicionamento é desfavorável ao acusado, que será obrigado a

suportar o bloqueio de bens em valor superior ao dano incialmente estimado, havendo a

possibilidade de, ao fim da ação, não ser-lhe imposta a sanção de multa civil e ocorrer o excesso

de cautela.

Por fim, cumpre apontar ser louvável a evolução da jurisprudência do Superior

Tribunal de Justiça no sentido da impossibilidade da concessão de medida de indisponibilidade

sobre bens impenhoráveis. O avanço jurisprudencial no tocante ao tema, demonstrou que, até

mesmo o interesse público ao ressarcimento do erário, pode ser afastado em prol da dignidade

da pessoa humana e a proteção do mínimo necessário à sua manutenção.

Essa evolução quanto à impenhorabilidade, no entanto, não é suficiente para

demonstrar uma tendência do Superior Tribunal de Justiça na proteção da figura do acusado

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que deve ser presumido inocente até o fim da ação, em respeito ao previsto no art. 5º, LVII da

Constituição Federal. A vedação quanto à incidência da indisponibilidade sobre bens

impenhoráveis demonstra tão somente que a jurisprudência da referida Corte decidiu traçar um

limite para a medida, de modo a garantir o sustento do acusado até o fim do processo.

Assim, entende-se que o Superior Tribunal de Justiça tem adotado posicionamentos

mais favoráveis ao Estado, determinando assim a ampliação da aplicação da indisponibilidade

de bens, ainda que em violação às garantias conferidas ao acusado.

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Nunes Maia Filho (Voto Vencido). Rel. p/ Acórdão: Min. Og Fernandes. DJ: 26/02/2014.

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Martins, DJ: 14/10/2014.

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Benjamin, DJ: 02/05/2017.

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______. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.610.169/BA, Segunda Turma, Min. Rel. Herman

Benjamin, DJ: 02/05/2017.

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