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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL SUZANA DA CUNHA JOFFER AS RELAÇÕES DE GÊNERO NO TRABALHO: UMA ANÁLISE DA INSERÇÃO DAS MULHERES E HOMENS NA REDE DE FAST FOOD. Natal-RN 2008

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL

SUZANA DA CUNHA JOFFER

AS RELAÇÕES DE GÊNERO NO TRABALHO:

UMA ANÁLISE DA INSERÇÃO DAS MULHERES E HOMENS NA REDE DE FAST

FOOD.

Natal-RN 2008

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SUZANA DA CUNHA JOFFER

AS RELAÇÕES DE GÊNERO NO TRABALHO:

UMA ANÁLISE DA INSERÇÃO DAS MULHERES E HOMENS NA REDE DE FAST

FOOD.

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Serviço Social.

Orientadora: Profª Drª Rita de Lourdes de Lima

Natal-RN 2008

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Catalogação da Publicação na Fonte. UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA Divisão de Serviços Técnicos

Joffer, Suzana da Cunha. As relações de gênero no trabalho: uma análise da inserção das mulheres e homens na rede de fast food / Suzana da Cunha Joffer. - Natal, 2008. 170 f.

Orientadora: Profª. Drª. Rita de Lourdes de Lima. Dissertação (Mestrado em Serviço Social) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Programa de Pós-Graduação em Serviço Social.

1. Serviço Social - Dissertação. 2. Trabalho - Dissertação. 3. Reestruturação produtiva - Dissertação. 4. Gênero – Dissertação. I. Lima, Rita de Lourdes de. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/BS/CCSA CDU 36.058.97 (043.3)

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HAS RELA<;OES DE GENERO NO TRABALHO: lima amllise da

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Oisscrta(,'ao apresentada it. P<ls-Gradmu;ao

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BANCA EXAMINADORA

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pror' D,C1 Tclma ;l"-gcl da Silva - UFRN

I(Membra Titular Externo)

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Às luzes que iluminam e dão razão a

minha vida: meus pais e irmãos, pelo

apoio e incentivo constantes, em

especial à minha mãe, por me

ensinar a lutar pelos meus sonhos e

pelo apoio de uma vida.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, nosso pai, por iluminar os meus caminhos e me dar forças para

seguir sempre adiante.

Aos meus pais e irmãos por todo o apoio e incentivo ao longo da minha vida

acadêmica e na trajetória da pós-graduação.

Às minhas amigas e amigos, pela torcida sempre constante e pelo apoio

encontrado durante o processo de elaboração deste trabalho, em especial à

Candice, Thalyta, Adriana, Luciana, ao casal Isabele e Kleber, Lylian, Rodrigo,

Dênis, Débora, Luana, Katiane, Aluízia, entre outros que me apoiaram nos

momentos difíceis.

Em especial à Candice pelo apoio na escolha do local para realização da

pesquisa, à Adriana pela correção bibliográfica, à Verônica pelo auxílio em relação

as normas exigidas pela ABNT, e à Rodrigo por resolver os problemas do meu

computador. À minha amiga Thalyta, amizade construída na pós-graduação, mas

que se estendeu pela vida, à ela agradeço pelos trabalhos realizados juntas, pela

cumplicidade e pelo exemplo de responsabilidade, mas principalmente pelo apoio

nos momentos difíceis enfrentados durante o ano de 2007.

Ao meu namorado, Gustavo, com todo o meu amor e admiração, pelo

incansável apoio, por muitas vezes abrir mão da sua vida pessoal em meu beneficio,

por todo o amor a mim dedicado, pela companhia constante, pelo apoio e respeito,

por ter me levantado nos momentos em que desacreditei que chegaria ao fim, mas,

principalmente, por ter tido paciência e compreendido a importância deste trabalho

para a minha vida.

A professora Doutora, Neuza de Farias, pelo despertar do meu olhar para as

questões de gênero, pelos trabalhos partilhados, pelo apoio constante durante a

minha graduação, pela amizade e partilhar de discussões durante os anos em que

fui bolsista de Iniciação Científica.

Com toda a minha admiração e gratidão, à professora Doutora, Rita de

Lourdes, minha orientadora, pela minuciosa correção deste trabalho, pelo partilhar

de conhecimentos, pela paciência e apoio aos obstáculos enfrentados no transcurso

de minha pesquisa.

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Às professoras examinadoras Eliana Guerra e Silvana Mara, pelas valiosas

contribuições dadas no momento da minha qualificação. Em especial, a Eliana

Guerra pelo apoio bibliográfico, pela amabilidade e cordialidade constantes sempre

que procurada.

A todos os funcionários e professores da pós-graduação em Serviço Social

da Universidade Federal do Rio Grande do Norte pelos ensinamentos e incentivo

constantes, que das mais diversas maneiras participaram das atividades da minha

vida acadêmica e contribuíram para o meu curso e pesquisa de mestrado. Em

especial a Lúcia, pela amizade e cordialidade dedicadas a nós alunos da pós-

graduação, se tornando uma das amizades mais especiais construídas durante o

mestrado.

As colegas da turma 2005.1 do Programa de Pós-Graduação em Serviço

Social, pelo saudável convívio e as essenciais discussões realizadas em nossos

encontros.

Aos/as funcionários/as do Restfood, pela confiança e total disponibilidade em

que se colocaram para a realização da pesquisa.

A todas as mulheres que lutam pela igualdade de gênero no mercado de

trabalho e a todos os trabalhadores/as, que sonham e lutam pelo cumprimento dos

direitos trabalhistas.

Enfim, a todas as pessoas queridas presentes em minha vida, que me

engrandecem como mulher e contribuem para que eu me torne um ser humano

melhor.

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"Todos os meus escritos ficaram inacabados; sempre novos pensamentos se interpunham, associações de idéias extraordinárias e inexcluíveis, de término infinito ... O Caráter da minha mente é tal que odeio os começos e os fins das coisas, porque são pontos definidos."

(Fernando Pessoa)

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Resumo

Procurou-se com esse estudo, investigar a divisão sexual do trabalho numa cadeia

de fast food em Natal/RN. Esses aspectos foram analisados juntamente com as

formas de organização do trabalho, sendo realizado um estudo de caso. O principal

objetivo dessa pesquisa consistiu em analisar a influência das relações de gênero na

inserção de homens e mulheres no mercado de trabalho e analisar a questão da

submissão feminina no mundo do trabalho. Buscou-se estudar tais questões,

considerando o atual estágio do capitalismo mundial, a partir das características do

processo de flexibilização produtiva e do crescimento do setor de serviços. A

pesquisa foi realizada com um grupo de trabalhadores e trabalhadoras lotados/as

nos setores da produção, atendimento, gerência e recursos humanos na loja de fast

food Restfood, sendo entrevistados/as 6 (seis) trabalhadores/as. Através de nossa

pesquisa, pode-se constatar a permanência da divisão sexual do trabalho no interior

dos processos produtivos do Restfood, que coloca a mulher em condição subalterna

em relação ao homem. Esse resultado se confirma se considerarmos que as

mulheres, na referida cadeia de alimentos, ocupam, prioritariamente, a função de

garçonete e nesta, não há progressão funcional, enquanto seus colegas homens,

por ocuparem outras funções, podem progredir dentro da empresa. Constatou-se

também que, em um contexto de mundialização do capital,

desregulamentamentação e desrespeito dos direitos trabalhista, o capital age sem

nenhum respeito aos/as trabalhadores/as. Foi o que se observou e se ouviu nas

falas dos/as entrevistados/as: a precarização das condições de trabalho e o

constante desrespeito dos direitos trabalhistas. Dessa forma, pudemos constatar

que a precarização das condições do trabalho atinge homens e mulheres, mas tem

uma face mais cruel no que se refere às mulheres e esta se reproduz

cotidianamente no processo de reprodução social, através da vida familiar, da

inserção no mundo do trabalho, da informação e educação recebida socialmente.

Enfim, o capital explora a todos/as, mas as relações de gênero criam, para o capital,

a possibilidade de um grau diferenciado de exploração, tornando, assim, as

mulheres, suas principais vítimas.

Palavras-chave: Trabalho; reestruturação produtiva; relações de gênero.

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Abstract

The purpose of this study was investigate the sexual division of the work in a chain of

fast food, in Natal, RN. These aspects were analyzed with the ways of organization

of the work, being made a case study. The main objective of this survey was to

analyze the influence of gender relations in the insertion of men and women in the

job market and to analyze the question of feminine submission in the professional

world. These questions were analyzed considering the current period of the world-

wide capitalism, from the characteristics of productive process and the growth of the

service sectors. The research was made with a group of workers on the production

sectors; attendance, management and human resources at restfood store, where six

clerks were interviewed. Through our research, it is possible to perceive the

permanence of the sexual division at the job in the interior of the productive

processes at Restfood, that puts the woman in a subordinate position in relation to

the man. This result can be confirmed if we considerate that the women, on this

chain of food, occupy in first place the function of waitress and on this, trere’s no

functional progression, while her workmates (the men) for occupying other functions

can progress inside the company. It was also evidenced that in a context of

globalization of the capital, deregulation and disrespect of labor laws, the capital acts

without any respect to workers. That was what we observed at the interviewer

speech; the scarcity of the conditions of work and the constant disrespect of the labor

laws. This way, we could evidence that the scarcity of work conditions hit men and

women, but it has a crueler face with the women, and this one reproduces itself, day

by day in the process of social reproduction, through family life, insertion in the world

of the work, information and received social education. So, the capital explores all of

them, but the gender relations create to the capital, the possibility of a different

degree of exploration, becoming this way, the women main victims herself.

Key words: work, productive reorganization, gender relations

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Caracterização dos funcionários/as Restfood quanto ao sexo.............116

Gráfico 2 – Caracterização dos funcionários/as Restfood quanto ao número de

filhos.........................................................................................................................116

Gráfico 3 – Caracterização dos funcionários/as Restfood quanto a faixa

salarial......................................................................................................................117

Gráfico 4 – Caracterização dos funcionários/as Restfood quanto ao número de

pessoas que moram na residência..........................................................................122

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Perfil Pessoal dos entrevistados/as.......................................................117 Tabela 2 – Caracterização dos entrevistados quanto à escolaridade.....................119

Tabela 3 – Ordem de importância da família, trabalho, participação política,

casamento e estudo na vida do funcionário/a Restfood..........................................121

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO........................................................................................................14 2. TRABALHO E CONSUMO NAS SOCIEDADES CAPITALISTAS........................27

2.1. O TRABALHO NO MODO DE PRODUÇÃO CAPITALISTA: UMA

PERSPECTIVA HISTÓRICA......................................................................................27

2.2. CONFIGURAÇÕES DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: DO FORDISMO ÀS

NOVAS FORMAS FLEXIBILIZADAS E PRECARIZADAS DE TRABALHO..............38

2.3. AS MÚLTIPLAS FACETAS DO TRABALHO NAS SOCIEDADES

CAPITALISTAS..........................................................................................................47

2.3.1 O capitalismo mundial e as especificidades brasileiras....................................47

2.3.2 O trabalho no setor serviços: rupturas e continuidades..................................55

2.3.3 Sociedade de consumo: contradição em processo entre consumo de massa e

especialização............................................................................................................63

3. A CONDIÇÃO FEMININA NO MUNDO DO TRABALHO.....................................76

3.1. QUESTÃO DE GÊNERO NAS SOCIEDADES CAPITALISTAS.........................76

3.2. A DIVISÃO SEXUAL DO TRABALHO E A MULHER TRABALHADORA NAS

SOCIEDADES MODERNAS......................................................................................95

3.3. MULHER E TRABALHO NO BRASIL...............................................................102

4. REPRODUÇÃO LOCAL DO SISTEMA FAST FOOD E O TRABALHO

FEMININO................................................................................................................106

4.1. CONFIGURAÇÕES DA REDE DE FAST FOOD NO ÂMBITO LOCAL............106

4.2. A PESQUISA E AS FALAS DOS SUJEITOS SOBRE SUAS CONDIÇÕES DE

VIDA E TRABALHO.................................................................................................114

4.3 - POR TRÁS DA MARCA: RELAÇÕES DE DISCRIMINAÇÃO E DE

EXPLORAÇÃO DO TRABALHO DA MULHER........................................................138

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................... ........147

REFERÊNCIAS.................................................................................................. 152

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APÊNDICES....................................................................................................... 165

APÊNDICE A...................................................................................................... 166

ANEXOS ............................................................................................................ 167

ANEXO A............................................................................................................ 168

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INTRODUÇÃO

Diversos estudos sobre o trabalho feminino têm chamado a atenção para a

crescente incorporação das mulheres ao mercado de trabalho e para as

características dessa inserção. Um olhar atento às estatísticas sobre o tema revela

que, não obstante o aumento da taxa de desemprego feminino nos últimos anos, as

mulheres ampliaram sua participação no mercado de trabalho. Embora sua inserção

ainda se dê, predominantemente, nos segmentos menos valorizados do mercado de

trabalho, – este é o caso da importante presença feminina no emprego doméstico e

no setor informal1 – as mulheres também passaram a ocupar postos em novos

grupos ocupacionais. Observa-se, por exemplo, maior participação feminina no

grupo de gerentes financeiras, comerciais e de publicidade, postos de trabalho

historicamente destinados aos homens2. Embora ainda perceba-se que, a maior

escolaridade das mulheres – que já são maioria no ensino superior3 – não tem

repercutido em igualdade salarial com os homens, mesmo quando exercem a

mesma função, elas chegam a receber 65% (sessenta e cinco por cento) do salário

masculino (SEADE, 2007).

Em relação ao setor formal da economia – objeto dessa dissertação -,

observa-se que, através de dados do IBGE, a partir de 1990, a parcela de mulheres

assalariadas aumentou, aumento este associado à expansão dos empregos no setor

de serviços, em paralelo à retração do emprego masculino, em especial no setor

industrial.

1 - Alguns estudos questionam a utilização da denominação “setor informal e formal”, assinalando que ambos se encontram imbricados e fazem parte da lógica capitalista (Cf. Tavares, 2007). Concordamos com estes questionamentos, mas mantemos a denominação, para assinalar as diferenças entre ambos, uma vez que as mulheres se inserem, predominantemente “no setor informal” da economia. 2 - Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE que fazem parte de um recorte da Pesquisa Nacional por amostra de domicílio - PNAD de 2005, mostram que o percentual de mulheres em ocupações de dirigentes em geral no RN é o maior do Nordeste e o 7º melhor do Brasil, ou seja, 4,8% (quatro vírgula oito por cento) dos cargos de decisão são ocupados por mulheres no Estado, mas ainda é evidente que os homens predominam nos cargos de liderança com 95,2% (noventa e cinco vírgula dois por cento).3 - Segundo dados da PNAD (2005), as mulheres representam 56% (cinqüenta e seis por cento) das pessoas com 15 anos ou mais de estudo, ou seja, os homens representam 44% (quarenta e quatro por cento). No Rio grande do Norte, cerca de 57,2% (cinqüenta e sete vírgula dois por cento) de mulheres, possuem 12 ou mais anos de estudo, sendo este o menor índice do nordeste. O Estado com maior percentual de 12 anos ou mais de estudo no nordeste, é o Maranhão com 65,1% (sessenta e cinco vírgula um por cento) das mulheres.

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Segundo pesquisa do SEADE (Fundação Sistema Estadual de Análise de

Dados) ainda na década de 1990, no estado de São Paulo, ocorreu uma ampliação

de empregos nos grupos ocupacionais de trabalhadoras dos serviços de limpeza e

de serviços administrativos, sendo que este passou a ser, em 2000, ocupado

majoritariamente por mulheres. Esses dois grandes grupos ocupacionais – que se

caracterizam por reunir as ocupações tradicionalmente desempenhadas por

mulheres – respondiam por cerca da metade do contingente de mulheres

assalariadas. Não obstante o enxugamento das ocupações industriais ter ocorrido,

em termos absolutos, com maior intensidade para os homens, o referido estudo

também registrou a diminuição de postos de trabalho entre as mulheres desse setor

(SEADE 2002).

Assim, é possível verificar que o movimento de inserção da mulher no

mercado de trabalho mantém a trajetória de crescimento do emprego formal,

verificada nos anos de 1990, o que contribui para abrandar a tendência, revelada em

estudos anteriores, de entrada das mulheres em inserções mais vulneráveis,

desprotegidas e sem perspectiva de continuidade, que comprometem o futuro de

suas carreiras e o acesso à previdência social.

Em termos regionais, a despeito do emprego feminino no Estado do Rio

Grande do Norte ter se elevado de forma mais intensa, permanece a concentração

acentuada de assalariadas nas áreas de maior expressão populacional, como a

região da grande Natal, segundo dados do IBGE (2005). Confirma-se também, o

predomínio feminino nos empregos com maior nível de escolaridade, bem como, a

manutenção da desigualdade salarial. Em todas as regiões, verificou-se que o nível

de remuneração das mulheres é inferior ao dos homens. As proporções, porém, são

bem distintas e indicam que, quanto mais complexa a estrutura ocupacional, maior é

a tendência de diferenciação salarial em favor dos homens. A distribuição percentual

das mulheres por ocupação revela que, no Brasil, 6,2% (seis vírgula dois por cento)

delas estavam ocupadas como profissionais das ciências e das artes; 8,9% (oito

vírgula nove por cento) como técnicas de nível médio; 9,3% (nove vírgula três por

cento) como trabalhadoras de serviços administrativos; 30,5% (trinta vírgula cinco

por cento) como trabalhadoras do setor de serviços; 15,3% (quinze vírgula três por

cento) como vendedoras e prestadoras de serviços do comércio; 16,2% (dezesseis

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vírgula dois por cento) como trabalhadoras agrícolas e 8,7% (oito vírgula sete por

cento) como trabalhadoras da produção de bens e serviços industriais e da

reparação e manutenção.

Estas considerações visam mostrar o nítido recorte de gênero presente ao

longo da história, na divisão social do trabalho e introduzir a nossa preocupação

acerca do emprego da mão-de-obra feminina no setor de alimentos. Nosso objeto de

estudo é a situação do emprego feminino e masculino na rede de fast food4 em uma

empresa sediada em Natal, a Rede Restfood5, que emprega mão-de-obra feminina,

principalmente como garçonetes, possuindo, portanto, uma nítida divisão sexual do

trabalho. Neste sentido, este estudo propõe-se a discutir a desigualdade de gênero

nesse mercado.

O nosso interesse pessoal pelo tema se deu através da nossa experiência

como bolsista de iniciação científica do CNPq. Na época, tínhamos como objeto de

pesquisa as Mulheres Chefes de Família6 e percebemos nas mulheres que

entrevistamos um forte discurso de submissão feminina. Segundo elas, esta

submissão justificava-se pela sua inserção precária no mercado de trabalho e isto

nos despertou especial interesse, uma vez que tal discurso se contrapunha a sua

posição de chefes de família, de provedoras do lar. Lar que, em muitos casos, não

possuía sequer uma figura masculina, mas todos os males, por ventura encontrados,

eram atribuídos a essa ausência e quando havia a figura masculina, mesmo que

esta não contribuísse significativamente para a renda familiar, ainda assim era o

membro mais importante, aquele que tomava as decisões da família, da vida

financeira etc.

4 - Termo utilizado na língua inglesa com o significado de “comida rápida”. O emprego do termo passou a designar qualquer estabelecimento que oferece serviço de lanches rápidos. Sua inserção no Brasil se deu no Rio de Janeiro, na década de 1950, com o americano Robert Falkernburg que vendia sorvetes de baunilha com máquinas e receitas trazidas dos Estados Unidos. Em 1952 abriu as portas da sua primeira loja, o Bob’s no Rio de Janeiro, lançando no Brasil o cachorro quente, o hamburguer, o milkshake e o sundae. Somente em 1979 foi aberta a primeira loja do McDonald’s no Brasil. Esta é hoje a maior representante no setor de fast food no mundo e o Brasil é o 8° maior mercado da empresa (Revista FATOR BRASIL, 2007). 5 - O nome da rede de lojas foi modificado para preservar o anonimato, garantido aos seus proprietários no início da pesquisa.6 - A pesquisa em questão, sob a orientação da prof.dra. Neuza Farias de Araújo, foi desenvolvida no período de 2002 a 2003 e teve como título “A Dimensão Econômica das Mulheres Chefes de Família”.

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A escolha do nosso objeto se deu através da análise de dados do IBGE. Tal

órgão registrou que, em 2003, mais da metade das empresas de serviços em

atividade, no estado do Rio Grande do Norte, pertencia ao grupo de serviços

prestados às famílias (alojamento, alimentação, serviços pessoais, recreativos e

culturais etc.), empregando 21.174 (vinte e uma mil, cento e setenta e quatro)

pessoas, sendo, portanto, o primeiro em ocupação de mão de obra. Outro elemento

que nos levou a esta escolha foi o pequeno número de pesquisas nesta área, sendo

maior o número de pesquisas acerca do setor informal.

A seleção do fast food em questão, se deu pelo fato de ser a única rede de

fast food com origem na cidade do Natal e por possuir um número representativo de

lojas para que se possa fazer uma amostra representativa de funcionários. Não

obstante esses elementos, a rede Restfood foi ainda o primeiro nome mais lembrado

pelo público, no segmento de fast food/lanchonete, na última pesquisa "Top of Mind",

publicada pela revista FOCO7, tendo, portanto, representação para a sociedade local

e conseqüentemente, exercendo influência sobre o público que faz uso de seus

serviços. Mas a principal razão está na nossa observação que constatou a presença

de mulheres somente na atividade de garçonete e caixa, e nunca nos serviços de

produção dos alimentos e entrega em domicílio, no qual se encontram somente

homens. Uma justificativa inicial para esse fato veio da gerência, afirmando que tais

atividades (garçonete e caixa) são serviços mais adequados às mulheres, uma vez

que estas saberiam lidar melhor com o público e o trabalho da cozinha se

configuraria em um trabalho muito pesado. Percebeu-se, assim, uma forte divisão

sexual do trabalho despertando nosso interesse enquanto pesquisadora.

Neste sentido, o principal objetivo dessa pesquisa consistiu em analisar a

influência das relações de gênero na inserção de homens e mulheres no mercado

de trabalho formal, e nesse caso, especificamente, na cadeia de fast food Restfood

situada na cidade do Natal/RN, visando verificar a reprodução da submissão

feminina no mundo do trabalho.

Desta forma, delimitamos como questões norteadoras da nossa pesquisa:

Como se dão as relações de gênero na cadeia de fast food Restfood? Quais as

atividades desempenhadas por mulheres e homens nesse espaço? Qual o perfil 7 FOCO a revista do RN – é uma publicação quinzenal da Editora FOCO que traz informações sobre o setor de serviços do Estado do Rio Grande do Norte.

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socioeconômico destes homens e mulheres? Quais os meios que estas mulheres e

homens se utilizaram para se inserir no mercado de trabalho? Qual a visão de

mulheres e homens inseridos na cadeia de alimentos Restfood acerca das relações

de gênero e da divisão sexual do trabalho?

Autoras que tratam da divisão sexual do trabalho, como Helena Hirata (2002),

afirmam que, apesar de todas as conquistas sociais, as mulheres ainda

permanecem em estado de submissão no mundo do trabalho, e ainda sofrem as

conseqüências da dominação masculina.

Atualmente, em algumas ocupações, as mulheres chegam, a ganhar cerca da

metade do salário masculino desempenhando a mesma função e sofrendo inúmeras

discriminações, todavia, a atuação no mercado de trabalho garante sua

sobrevivência e representa sua libertação de papel restrito à esfera privada.

Movidas pela necessidade de contribuir para a manutenção da família, ou

mesmo pelo desejo de obter realização profissional, as mulheres estão, ao longo

das últimas décadas, cada vez mais presentes no mercado de trabalho. Apesar dos

homens ainda terem uma participação bem mais expressiva que as mulheres, entre

1989 e 1996, a taxa de participação feminina cresceu 8,9% (oito vírgula nove por

cento), enquanto a masculina caiu 3,6% (três vírgula seis por cento) (IBGE, 2005).

A análise da incorporação da mulher no mundo do trabalho tornou-se uma

questão importante. Inicialmente como elemento fundamental na luta pela

emancipação feminina e pela igualdade entre os sexos. Posteriormente, pela

evolução do peso feminino no mercado de trabalho. Um fator importante para a

incorporação das mulheres ao mercado de trabalho foram novas configurações do

trabalho que, segundo alguns estudiosos na área, estão mais adequadas às

características e especificidades femininas. Segundo estes estudos, as mulheres

são mais flexíveis e adaptáveis aos novos processos de trabalho “flexibilizados”,

pois sua trajetória histórica faz com que sejam mais permissivas e mais suscetíveis

a aceitar empregos parciais, precários e sem garantias sociais, pela necessidade de

conciliar o trabalho com a vida doméstica. Dessa forma, o capital passa a utilizar as

especificidades tidas como femininas para obter lucro (HECKERT, 1991).

Em relação à inserção das mulheres no mercado de trabalho, observa-se que,

tal inserção não tem alterado a configuração das relações de gênero no ambiente de

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trabalho, que persistem discriminações de sexo em relação à mulher, fator que tem

afetado negativamente sua carreira profissional. Neste sentido, apesar do aumento

da presença das mulheres do setor de serviços, os cargos mais elevados na

hierarquia profissional continuam sendo ocupados, na sua grande maioria, por

homens, estando concentrada neles, a tomada de grandes decisões.

Pode-se observar que a reestruturação produtiva teve implicações

diferenciadas para homens e mulheres. Dentro do contexto global, os “novos”

modelos de produção e organização empresarial têm ocasionado mudanças nas

formas de produção e gestão com implicações e efeitos diferenciados para

trabalhadores homens e mulheres. As mudanças têm afetado a vida dos

trabalhadores e trabalhadoras, sobretudo, na exigência de novas competências

(técnicas, capacidade de trabalhar em grupo, por exemplo). Todavia, grande parte

do trabalho feminino, principalmente no ramo de fast food, tende a permanecer

organizado a partir do modelo taylorista, com atividades desenvolvidas de forma

repetitiva, monótona e intensiva.

A permanência da subalternidade da mulher no mercado de trabalho, em

função da desigualdade de rendimentos em diversas áreas faz piorar as já precárias

condições de vida, principalmente naquelas famílias chefiadas por mulheres.

Dificilmente, as mulheres são vistas como mantenedoras do lar. As diferenças de

rendimentos se mostram como uma das faces mais perversas da desigualdade entre

homens e mulheres no mercado de trabalho. Segundo Denise Carreira (2001), entre

os países do Mercosul, o Brasil é um dos que apresenta uma maior desigualdade de

salários: as mulheres ganham em média 65% (sessenta e cinco por cento) menos

do que os homens e ainda vivenciam o agravante da discriminação racial: as negras

recebem metade dos rendimentos das brancas, situação que se perpetua pela forte

concentração de trabalho feminino em ocupações de baixo rendimento. Análises

longitudinais, nesse momento, mostraram o quanto este fenômeno se encontrava

em expansão e era associado à pobreza, alertando os formuladores de políticas

sociais (BARROSO, 1978 apud BRUSCHINI, 1996).

Desta forma, a temática da inserção feminina no mundo do trabalho torna-se

significativa, na medida em que abre espaço para discussão da igualdade de

oportunidades para homens e mulheres em relação à ocupação de cargos dentro de

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uma empresa. Ademais, a possível existência de estilos “masculinos” ou “femininos”

de exercer determinadas atividades. Embora o movimento feminista tenha se

destacado no cenário político nos mais diversos espaços e eventos nacionais e

internacionais, a presença das mulheres ainda é restrita em espaços estratégicos no

mundo do trabalho, como por exemplo, nos sindicatos de trabalhadores e do

patronato. As mulheres estão sub-representadas nessas organizações, pois ainda

permanece a resistência por parte dos dirigentes em relação às pautas

comprometidas com a equidade de gênero, consideradas de menor importância.

Nos parlamentos, nos governos e nas empresas, a participação feminina ainda é

limitada, sendo maior em cargos de pouco poder. Na última eleição ocorrida no

Brasil, em 2006, 2.498 (duas mil quatrocentas e noventa e oito) mulheres disputaram

mandato, 2 (duas) à Presidência, 26 (vinte e seis) aos governos estaduais e

municipais, 35 (trinta e cinco) ao Senado, 652 (seiscentas e cinqüenta e duas) à

Câmara Federal e 1783 (um mil setecentas e oitenta e três) às Assembléias e

Câmara Legislativas. Foram eleitas 176 (cento e setenta e seis) mulheres: 3 (três)

governadoras, 4 (quatro) senadoras, 46 (quarenta e seis) deputadas federais e 123

(cento e vinte e três) deputadas estaduais/distritais. O número de mulheres eleitas

para a Câmara Federal não se ampliou de forma expressiva em relação às eleições

de 2002; passando de 8,19% (oito vírgula dezenove por cento) para 8,97% (oito

vírgula noventa e sete por cento) das cadeiras dessa Casa, de 42 para 46 mulheres.

Nas Assembléias e Câmara Legislativas, o número de mulheres eleitas caiu de

12,56% (doze vírgula cinqüenta e seis por cento) para 11,61% (onze vírgula

sessenta e um por cento). As mulheres perderam dez cadeiras nos parlamentos

estaduais. Dos 5.560 municípios brasileiros, apenas 418 são governados por

mulheres (SEMIRA, 2007).

A participação feminina na política está muito aquém do que as mulheres

representam na sociedade. No Brasil, esta participação encontra-se abaixo dos

padrões internacionais médios. Enquanto a representatividade das mulheres nas

instâncias de poder político do Brasil gira em torno de 10% (dez por cento), os

países nórdicos já têm quase metade das vagas parlamentares ocupadas por

mulheres. Uma das explicações para a limitada participação da mulher nas esferas

de poder está ligada a questões econômico-sociais. Quanto melhor o Índice de

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Desenvolvimento Humano (IDH) de um país, mais equilibrada é a participação das

mulheres nos espaços de poder. A lentidão do avanço das mulheres no campo

político também está relacionada com a propriedade da riqueza, uma vez que

apenas 4% (quatro por cento) da riqueza do mundo está nas mãos de mulheres.

Não é por acaso que a participação das mulheres no mundo político só teve início

após a Revolução Industrial, com a entrada das mulheres no mercado de trabalho

(CFEMEA, 2006). Paradoxalmente, a exploração possibilita a emancipação, mas

nos limites da sociedade capitalista.

Neste sentido, buscamos fazer uma análise da situação de homens e

mulheres inseridos na cadeia de fast food Restfood, visando contribuir com a nossa

pesquisa, para o enriquecimento dos estudos nessa área.

O método de análise da realidade escolhido foi a perspectiva crítico –

dialética. A sua luz, buscamos apreender os fenômenos a partir das categorias

contradição, historicidade e totalidade. A revisão da literatura existente na área se

fez imprescindível nesse processo, para a melhor compreensão do objeto de estudo.

Para nortear nosso estudo, escolhemos como categorias centrais: as relações de

Gênero e Trabalho, nos detendo, particularmente, nas discussões acerca da Divisão

Sexual do Trabalho. Para isto, nos aproximamos de autores (as) que discutem, tais

questões, entre eles/as: Saffioti (1976), Scott (1990), Beauvoir (1949), Whitaker

(1989), Hirata (2002). Para nos orientar acerca da conjuntura atual buscamos

autores como Antunes (2006), Mészaros (2006), Alves (2006), Chesnais (1996) e

Santos (1994).

Para alcançar os objetivos propostos, se fez uso de técnicas e instrumentos

(entrevista semi-estruturada, revisão bibliográfica, roteiro de observação) visando

conhecer os processos, dinâmicas e problemáticas das desigualdades de gênero no

mundo do trabalho.

Para a coleta dos dados foi realizada pesquisa qualitativa com a aplicação de

entrevistas semi – estruturada que combinaram questões abertas e fechadas, dando

a possibilidade ao informante de discorrer sobre o assunto. Seguimos um roteiro de

entrevista8 composto de duas partes: na primeira, foram realizadas perguntas com o

intuito de conhecer como se efetivam as relações de trabalho dos/as

8 Ver anexo A – Roteiro de entrevista baseado na pesquisa de Nogueira (2006).

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entrevistados/as na esfera produtiva. Na segunda parte, pretendíamos conhecer de

que forma as atividades desenvolvidas na esfera reprodutiva expressam dimensões,

também fortemente marcadas pela divisão sexual do trabalho.

A observação assistemática foi outro instrumento utilizado com a finalidade de

identificar aspectos acerca dos quais, às vezes, os indivíduos não têm consciência,

mas que orientam seu comportamento (LAKATOS, 1996).

A escolha da observação se deu pela possibilidade de entrar em contato com

a realidade em estudo, não somente através da análise das falas dos/as

entrevistados/as, mas também porque tal método permite analisar a realidade em

momentos diversos do seu cotidiano de forma assistemática. Assim, através da

observação buscamos analisar como se colocam as mulheres e os homens tanto na

esfera da produção quanto da reprodução, observando como se davam as relações

dentro da empresa no momento das decisões e como se expressavam os/as

funcionários/as diante dos acontecimentos rotineiros do estabelecimento.

Como guia para orientar a observação assistemática utilizamos roteiro de

observação9 elaborado previamente para este fim. As entrevistas e o diário de

campo complementaram a observação.

O local selecionado para a pesquisa - Restfood - possui 6 (seis) lojas na

cidade de Natal10, que se localizam nas principais avenidas da cidade,

supermercados e shopping centers.

Optamos por escolher para nossa amostra somente a loja Matriz, que possui

um total de 178 funcionários/as, dos quais 69,1% são homens e 30,9% são

mulheres, deste total fizemos, inicialmente, a escolha de realizar 17 entrevistas.

Após a qualificação do projeto, a banca sugeriu que nosso universo de

pesquisa inicial fosse alterado, devido a ausência de tempo hábil para a realização

do número de entrevistas proposto inicialmente. Dessa forma sugeriu-se a

realização de 6 (seis) entrevistas, distribuídas entre funcionários/as da gerência, do

atendimento, da produção de alimentos e do setor de recursos humanos.

A coleta de dados foi realizada no período de julho a agosto de 2007 e todas

as entrevistas foram realizadas de forma individual e em ambiente reservado nas

9 Ver apêndice A 10 Além das 6 lojas, funcionam 2 pontos facultativos – numa importante casa de shows e nas principais praias durante o período de carnaval.

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instalações da empresa estudada. Inicialmente, todas foram gravadas, mas após a

realização de 5 (cinco) entrevistas, nossa presença passou a incomodar a

administração que acreditava, tratar-se de algum tipo de fiscalização. A partir desse

momento, as entrevistas foram proibidas de serem gravadas e alguns funcionários

recuaram, com medo de possíveis demissões.

Em cada uma delas, explicava-se a natureza e os objetivos da pesquisa;

firmava-se um compromisso ético de garantir o anonimato do entrevistado e da

empresa; confirmava-se a disposição do entrevistado em participar da pesquisa;

solicitava-se autorização para gravar depoimentos, buscando com essa gravação

fidedignidade no processo de transcrição das respostas dadas.

Apesar das dificuldades encontradas para a realização da pesquisa, como a

proibição das gravações das entrevistas seguintes, buscou-se o esforço, no sentido

da maior apreensão possível para o desvelamento do nosso objeto de estudo.

Para apresentar este caminho percorrido, a dissertação está dividida em 3

(três) capítulos, além da introdução e das considerações finais. No primeiro fazemos

um resgate histórico do mundo do trabalho, apresentando uma reflexão das

mudanças nos processos de trabalho no modo de produção capitalista, a partir das

tendências de reconversão para um novo padrão de acumulação, inicialmente de

base taylorista – fordista para o paradigma toyotista ou de acumulação flexível. O

estudo a que nos propomos desenvolver neste capítulo, acerca do processo de

reestruturação produtiva, tem como principal objetivo contextualizar as

características dos processos de trabalho, que determinam as novas relações de

trabalho impostas pelo atual estágio do capitalismo.

No capítulo 2 (dois) analisamos a entrada das mulheres no mercado de

trabalho, mais especificamente no setor de serviços e seus desdobramentos na

esfera reprodutiva, bem como sua atual situação no mundo produtivo. Buscou-se

também analisar os efeitos do processo de produção nas relações de gênero bem

como os efeitos das relações de gênero no processo produtivo. Este capítulo teve

como eixo central a discussão das relações de gênero e da divisão sexual do

trabalho.

No terceiro e último capítulo, apresentamos os resultados da pesquisa

realizada na rede de fast food Restfood, bem como a caracterização do grupo de

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trabalhadores/as entrevistados/as, sujeitos da nossa pesquisa. Apresentamos os

resultados e a análise dos dados, enfocando os novos processos de trabalho, bem

como a permanência e a mescla de novos e antigos processos de trabalho nas

redes de fast food. Discutimos ainda as relações de gênero existentes no local

pesquisado e a situação do emprego feminino nesse setor da economia.

Podemos afirmar, após a realização desse estudo, que os processos de

trabalho na atualidade, apontam para a continuidade do processo de segregação

(horizontal e vertical), precarização e desvalorização do trabalho feminino.

Observamos que as mulheres e homens no setor de fast food da empresa estudada,

permanecem concentrados/as em postos de trabalho taylorizados. Com relação ao

trabalho feminino, verificou-se que as mulheres estão submetidas à organização e

condições de trabalho que contribuem para o desencadeamento de um número

elevado de doenças ocupacionais, principalmente de casos de lesões por esforços

repetitivos. Vale destacar que, no mercado de trabalho brasileiro, há uma

permanente reprodução das desigualdades salariais que favorecem os homens.

Observou-se também que há uma continuidade da divisão sexual do trabalho,

pela qual as mulheres permanecem concentradas em ocupações tradicionalmente

femininas. Todavia, verificamos também uma tendência de alteração dessa divisão,

pois percebemos a ampliação do número de mulheres em cargos hierarquicamente

superiores, a inserção feminina em atividades consideradas masculinas e a

ampliação do número de homens em ocupações consideradas femininas.

O que se pode destacar de novo é a ocorrência da construção de diferenças

entre trabalhadores/as do mesmo sexo (qualificados/as e não qualificados/as).

Nesse sentido, destacamos a construção das diferenças entre as mulheres,

denominada por Hirata (2002) de bipolarização do trabalho feminino, no qual há um

pólo composto por mulheres qualificadas, bem remuneradas e com prestigio social

e, outro, formado por mulheres com baixa qualificação, mal remuneradas, sem

prestigio social e, em grande medida, alocadas em trabalhos precários.

A contribuição desse estudo, portanto, se dá na perspectiva de apreender o

processo de divisão sexual do trabalho e as relações de gênero que se passam

nesse universo e visa contribuir para futuros estudos na área e novas pesquisas,

assim como chamar a atenção para uma problemática que direta ou indiretamente

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afeta a todos nós. Neste sentido, esperamos que este estudo possa contribuir com

reflexões que nos auxiliem na busca do enfrentamento das desigualdades existentes

entre homens e mulheres.

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2. TRABALHO E CONSUMO NAS SOCIEDADES CAPITALISTAS

Um homem se humilha

se castram seus sonhos

Seu sonho é sua vida

e vida é trabalho

E sem o seu trabalho

o homem não tem honra

E sem a sua honra

se morre, se mata

Não dá pra ser feliz,

não dá pra ser feliz...(Gonzaguinha Jr.)

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2. Trabalho e Consumo nas sociedades capitalistas

2.1 O trabalho no modo de produção capitalista: uma perspectiva histórica

Na longa história da atividade humana, em sua incessante luta pela

sobrevivência, pela conquista da dignidade, da humanidade e da felicidade social, o

trabalho tem sido vital. Foi por meio do trabalho que os indivíduos, homens e

mulheres, distinguiram-se dos animais. A marca do trabalho tornou a história

humana uma realização monumental, rica e cheia de caminhos e descaminhos, de

alternativas e desafios, de avanços e recuos. Sem o trabalho, a vida cotidiana não

se reproduz. Contudo, quando a vida humana se resume exclusivamente ao

trabalho, ela se converte em um esforço penoso, aprisionando os indivíduos e

unilateralizando-os. Se, por um lado, necessitamos do trabalho e de seu potencial

emancipador, devemos também recusar o trabalho que explora, aliena e infelicita o

ser social. Essa dupla dimensão presente no processo de trabalho – que cria, mas

também subordina, emancipa e aliena, humaniza e degrada, libera e escraviza –

converte o estudo do trabalho em uma questão crucial de nosso mundo, de nossas

vidas, neste conturbado século XXI, cujo desafio maior é dar sentido ao trabalho e

tornar nossa vida fora do trabalho também dotada de sentido.

De todas as categorias conceituais que concretizam a definição do ente-

espécie humana como animal político, o trabalho é a mais abrangente e

compreensiva de todas. Em outras palavras, a categoria trabalho, uma vez

compreendida na sua historicidade material e dialética, permite alcançar uma

definição de homem como aquele ente que, para ser, necessita produzir os seus

próprios meios de subsistência material e simbólica.

Entendemos trabalho segundo as idéias de Marx, para quem o homem1 é o

primeiro ser que conquistou certa liberdade de movimentos em face da natureza.

Através dos instintos e das forças naturais, em geral, a natureza dita aos animais o

1 Nesse trabalho, referimo-nos a “Homem” no seu sentido genérico - universal, compreendendo o sexo masculino e feminino. A maioria dos autores clássicos que utilizamos, entre eles o próprio Marx, ao falar de ser humano e de sua relação com a natureza, utiliza somente o termo homem. Assim, para nos mantermos fiéis aos textos originais, utilizaremos somente este termo. Ao adentrarmos na discussão mais específica das relações de gênero, voltaremos a utilizar os termos homem/mulher, homens/mulheres.

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comportamento que eles devem ter para sobreviver. O homem, entretanto, graças

ao seu trabalho, conseguiu dominar em parte, as forças da natureza, colocando-as a

seu serviço. Segundo o próprio Marx:

Como criador de valores de uso, como trabalho útil, é o trabalho, por isso, uma condição de existência do homem, independente de todas as formas de sociedade, eterna necessidade natural de mediação do metabolismo entre homem e natureza e, portanto, da vida humana (MARX, 1970, p. 17).

O que caracteriza o ser humano como traço de sua identidade geral é o

trabalho como expressão da sua condição ontológica inalienável. O trabalho, assim,

é um conceito que requer uma analítica densa para poder se mostrar como foco

intencional de uma sociologia das relações de poder instituídas e instituintes.

Nessa perspectiva, vejamos como Marx compreende o trabalho,

conseqüentemente, desvelando a relação homem—natureza:

Antes de tudo, o trabalho é um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano com sua própria ação impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza. [...] Atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica a sua própria natureza. [...] Não se trata aqui das formas instintivas, animais, de trabalho. Quando o trabalhador chega ao mercado para vender sua força de trabalho, é imensa a distância histórica que medeia a sua condição e a do homem primitivo com sua forma ainda instintiva de trabalho. Pressupomos o trabalho sob a forma que o caracteriza como exclusivamente humano. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha supera mais de um arquiteto ao construir sua colméia. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor das abelhas é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em realidade. No fim do processo de trabalho, aparece um resultado que já existia antes idealmente na imaginação do trabalhador. [...] Além do esforço dos órgãos que trabalham, é mister a vontade adequada que se manifesta através da atenção durante todo o curso do trabalho (MARX, 1987b, p. 202).

Neste sentido, os animais também “produzem”, dispendem energia, porém

somente para atender as exigências práticas imediatas, exigências materiais diretas

dos mesmos ou de seus filhotes, pois a atividade dos mesmos é determinada

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unicamente pelo instinto. O que ocorre com o homem é diferente. Anterior a

realização de seu trabalho, o homem é capaz de projetá-lo, ou seja, no homem há a

capacidade de definir meios diversos que possibilitam o alcance de seu objetivo,

possuindo a livre escolha das alternativas que melhor se adeqüem aos seus

objetivos.

Assim, através do trabalho o homem modifica a natureza de acordo com suas

possibilidades. O que Marx observa na História é a evolução gradativa do trabalho,

naquilo que corresponde à evolução do homem e a necessidade de suprir suas

necessidades frente ao meio.

Para aumentar o seu poder sobre a natureza, o homem passa a utilizar

instrumentos, acrescenta meios artificiais de ação aos meios naturais de seu

organismo, multiplicando enormemente a capacidade do trabalho humano. Dessa

forma, a relação homem – natureza com o desenvolvimento da sociedade, passa a

ser cada vez mais mediatizada pelos meios, instrumentos de trabalho.

O desenvolvimento do trabalho criador aparece, assim, aos olhos de Marx,

como uma condição necessária para que o homem seja cada vez mais livre, mais

dono de si próprio. Contudo, ele verifica que, em sua contemporaneidade, o trabalho

assumiu características diferentes das anteriormente pensadas: os homens que

produzem os bens materiais, alguns indispensáveis a sua própria existência, não se

realizam como seres humanos em suas atividades. Se, no trabalho, encontramos o

sentido de transformação dos bens necessários à espécie e é o trabalho o

fomentador de seu progresso, como pode transformar-se em grilhão? Para

conseguirmos compreender este antagonismo, devemos nos ater ao caráter do

trabalho em nossa sociedade, que se exterioriza sob a forma da mercadoria.”A

riqueza de uma sociedade em que domina o modo de produção capitalista aparece

como uma ‘imensa coleção de mercadorias’, e a mercadoria individual como sua

forma elementar” (MARX, 1970, p. 200).

Sendo o exercício do trabalho, em qualquer regime econômico sucedido ao

longo da História, um dispêndio físico de energia, encontramos na força de trabalho

humana, a particularidade de ser fonte de valor. O valor é um fenômeno puramente

social; o valor de um produto é, portanto, uma função social e não função natural.

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O pensamento econômico evoluiu no sentido de buscar desvendar as formas

sociais de trabalho abstraindo as formas concretas de trabalho. O trabalho abstrato

não está compreendido na materialidade, pois sua forma é puramente uma

construção social da economia Mercantil Capitalista (PINTO, 2006).

Como o trabalho abstrato é o responsável pela criação de valor na sociedade

capitalista, o mesmo fica dependente da expansão e consumação do modo

capitalista de produção. Esta necessidade de universalização colocou-se na base do

processo histórico que engendra o trabalho abstrato como aquele que cria valor.

Sob este aspecto, e na caracterização do trabalho abstrato como uma

espécie de trabalho socialmente igualado, não há, no mercado mundial, nenhuma

outra "mercadoria" capaz de regular o conjunto das diversas economias, a não ser o

próprio trabalho e é, através de Marx, que conseguimos chegar a esta compreensão.

No sistema atual, o trabalhador produz bens que não lhe pertencem e cujo

destino, depois de prontos, escapa ao seu controle. O trabalhador, assim, não pode

se reconhecer no produto de seu trabalho; não há a percepção daquilo que ele criou

como fruto de suas capacidades físicas e mentais.

A criação (o produto) se apresenta diante do mesmo como algo estranho e,

por vezes, hostil e não como o resultado normal de sua atividade e do seu poder de

modificar a natureza.

Assim sendo, se o produto do trabalho não pertence ao trabalhador e de certa

forma, se defronta com o mesmo de uma forma estranha, isso somente ocorre

porque tal produto pertence a outro homem que não o trabalhador. Portanto, quem

se apropria de parte do fruto do trabalho e do próprio trabalho operário? Marx

responde: o capitalista; o proprietário dos meios de produção.

O homem sempre se expressou através de sua atividade vital, visando à

satisfação de suas necessidades. Contudo, o sistema mercantil vai reduzir e aviltar

essa atividade. O capital universalizará essa forma de exploração, vinculando-a ao

salário. Atualmente, essa é a única possibilidade de sobrevivência para um grande

número de pessoas.

A palavra "trabalho", que designa uma forma muito particular de atividade

humana, soa, hoje, aos ouvidos de todos/as, como sinônimo de "atividade", visto

que, para a maioria dos homens, o trabalho chegou a ser a totalidade de suas

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atividades. Logo, atuar significa "trabalhar" e ser ativo entende-se como ser

"trabalhador". Assim, a palavra trabalho denomina uma forma determinada de

atividade humana, intrinsecamente ligada ao sistema mercantil. É preciso entender

que no sistema capitalista, o trabalho como atividade humana torna-se estranho ao

homem, à manifestação de sua vida e à consciência que ele tem dela. “O trabalho é

o ato de alienação da atividade humana prática” (MARX, 1970, p. 25).

Desta forma, o trabalho na Sociedade Capitalista, é a expressão alienada da

atividade humana; a manifestação da vida como estranhamento e perda da vida. E o

caráter alienado do trabalho aparece de diferentes maneiras. Em primeiro lugar,

através do objeto produzido. Este, de fato, não pertence ao proletário. Obrigado a

vender a única mercadoria que lhe pertence, sua força de trabalho, e a alienar sua

atividade na mercadoria que produz, o proletário constata que sua vida não lhe

pertence mais. O estranhamento de si no e através do trabalho decorre, pois, da

necessidade, para o proletário, de vender sua força de trabalho para produzir uma

mercadoria que lhe é totalmente estranha.

Ao mesmo tempo, o trabalhador não encontra qualquer satisfação no

resultado do seu trabalho. Mesmo quando o objeto criado é de seu interesse

imediato, o trabalhador, por vezes, não pode adquiri-lo, comprá-lo. O proletário não

se aliena somente no produto de sua atividade, mas em sua própria atividade. Sua

atividade produtiva já não lhe pertence. De fato, o trabalho é exterior ao trabalhador,

mas sendo esta a única atividade que lhe permite obter seus meios de sobrevivência

no sistema capitalista, ele se vê obrigado a exercê-la. O trabalho é, pois, a atividade

não-livre no seu mais alto grau. Escravidão assalariada, o trabalho só pode ser

constrangido e forçado.

No trabalho, o indivíduo não se afirma, se nega. Da mesma maneira que

investe a sua vida no objeto, o proletário abandona sua existência à atividade de

produção desse objeto.

Se o produto do trabalho é a alienação, o próprio trabalho deve ser alienação em ato. A alienação do objeto do trabalho não é mais que o resumo da alienação, o estranhamento de si, dentro da própria atividade do trabalho (MARX, 1974, p. 32).

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O trabalho, atividade produtiva submetida ao capital, torna-se, para o

proletário, atividade passiva, força impotente. Perda de si e do objeto, o trabalho

acarreta ainda a perda do outro. O trabalho torna o homem estranho ao próprio

homem, separa a vida individual da vida da espécie humana.

O que é verdade, a respeito da relação do homem com o seu trabalho, o produto de seu trabalho e a si próprio, é verdade também a respeito da relação do homem com o outro homem, assim como ao trabalho e ao objeto do trabalho do outro homem (MARX, 1970, p. 34).

Assim, sob o domínio do capital, a consciência do gênero humano, a

consciência da espécie, isto é, de si e do outro, é aniquilada. Quando ocorrem, as

manifestações de solidariedade proletária, nada mais são do que um vestígio da

consciência genérica do homem compreendendo que os seus próprios interesses

coincidem com os interesses da comunidade humana; consciência de um ser

humano genérico, que somente pode entender a livre satisfação de suas

necessidades e desejos como desfrute coletivo.

O ser humano, alienado pelo trabalho, não se pertence mais. Se a atividade

humana tornou-se um tormento para o operário, é necessariamente em proveito de

outro. Através do trabalho, o proletário não só produz uma relação estranha com o

seu produto, mas também a dominação dos que não produzem, dominação que se

exerce sobre o produto, sobre a atividade produtiva e sobre o próprio produtor. O

proveito que a burguesia tira de sua dominação, impede-lhe de ver mais além de

seus próprios interesses de classe.

Neste sentido, o processo de produção capitalista é essencialmente

contraditório, pois se baseia na constante contradição capital-trabalho. O processo

de produção é cada vez mais coletivo, socializado, mas ao mesmo tempo, a

apropriação do fruto do trabalho é cada vez mais privada. Desta forma, ao mesmo

tempo em que cresce a riqueza social, cresce, na mesma proporção, à miséria e a

fome no mundo. Por ser essencialmente contraditório, o sistema capitalista passa

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por crises cíclicas constantes2. Foi assim na crise de 1929 e na crise que antecedeu

a 2º guerra mundial e que possibilitou a reestruturação do capitalismo, através da

adoção do modelo de Welfare State, a partir de 1945, por toda a Europa e aos

poucos no restante do mundo ocidental.

Assim, após a adoção do Welfare State e da produção taylorista/fordista, o

sistema capitalista experimentou um período de relativa tranqüilidade e crescimento

que durou cerca de três décadas – os chamados anos dourados.

Contudo, a partir de 1975, nova crise se instala e frente a ela, novas

estratégias são necessárias. A partir da crítica do Welfare State e ao modelo

taylorista/fordista entra-se em uma nova fase do capitalismo.

Dessa forma, acentua-se, a partir de 1983, as chamadas “políticas de ajustes”

determinadas pelos países credores aos países devedores, através do FMI e BIRD3

levando os paises devedores a um empobrecimento ainda maior. Esse período,

como mostra Santos (1994), foi marcado por enormes “desequilíbrios” que, no plano

social, se refletiram na estagnação econômica e, conseqüentemente no aumento

das desigualdades sociais e da miséria.

2 Marx aponta também como geradores das crises cíclicas do capitalismo a tendência à queda da taxa de lucro, a anarquia da produção e o subconsumo das massas trabalhadoras. Para uma discussão introdutória no assunto, ver Netto e Braz (2006) especialmente, os capítulos 6 e 7. 3 O Acordo de Bretton Woods, assinado no dia 22 de julho de 1944, tratava de três assuntos: sistema monetário internacional, regras comerciais e planos de reconstrução para as economias destruídas pela guerra. Hoje, não existe mais o mundo desenhado naquele Acordo. Mas continuam existindo duas instituições criadas pela Conferência de Bretton Woods: o Fundo Monetário Internacional (FMI), que começou a funcionar em 1º de março de 1947, e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD, mais conhecido como Banco Mundial), que instalou-se em 27 de dezembro de 1945. Supostamente, o BIRD foi criado para financiar projetos de recuperação e construção dainfra-estrutura necessária ao desenvolvimento econômico. Já o FMI teria a função básica de fornecer recursos financeiros, tal como um banqueiro de última instância, para aqueles países que apresentassem déficits nas contas externas, decorrentes de conjunturas internacionais adversas. Na prática, tanto o FMI como o Banco Mundial ganharam importância com a crise da dívida externa, nos anos 1980, quando emprestaram ou autorizaram empréstimos apenas para os países que se dispuseram a adotar programas de ajuste de corte neoliberal. Tanto o FMI quanto o Banco Mundial são dirigidos por um "Comitê de Governadores". Cada país é representado por um governador. Teoricamente, os governadores elegem o presidente do Banco Mundial, porém, na prática, o presidente do Bird é sempre um cidadão dos Estados Unidos, escolhido pelo governo norte-americano. Já o diretor-presidente do FMI é tradicionalmente um europeu. No dia-a-dia, o Banco Mundial e o FMI são conduzidos pelos diretores-executivos. O recursos financeiros do FMI vêm dos 182 países-membros, entre os quais o Brasil. Evidentemente, manda no Fundo quem tem mais recurso financeiro investido: no caso, os Estados Unidos e os outros grandes países capitalistas. O Brasil e os demais países hiperpopulosos pesam muito pouco: no FMI, prevalece a democracia do dólar (CEFET/SP, 2007).

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Nos últimos anos, com a promessa de crescimento econômico, ocorreram

rearranjos políticos e, segundo Almeida e Alencar (1995), nos anos de 1990, sob a

imposição do FMI/Banco Mundial, os governos latino-americanos vêm executando

sistematicamente o receituário neoliberal4. As conseqüências deste processo podem

ser comprovadas no aumento da pobreza e miséria, evidenciadas na massa de

excluídos5 que se adensa frente a uma política que conjuga uma perversa

distribuição de renda, a redução do salário real e deterioração dos serviços sociais.

Observamos segundo Santos (1994), uma nova etapa histórica marcada pela

substituição do trabalho diretamente produtivo e da divisão natural do trabalho pelas

máquinas, usinas, complexos industriais e sistemas de produção mais complexos.

Neste sentido, a concentração e a centralização da produção que caracterizam a

revolução industrial assumem formas globais, originando complexos produtivos com

caráter internacional e transnacional. O surgimento do trabalho excedente, não

diretamente produtivo e do maior tempo “livre” na sociedade6 acarreta o

desenvolvimento da educação e dos serviços de lazer e cultura. A explosão da

educação universitária é conseqüência dessas mudanças e com elas há uma

expansão dos serviços ligados à saúde, educação e habitação à essa nova massa

de trabalhadores urbanos.

Desta forma, com o incremento tecnológico, o mesmo trabalho passa a ser

realizado em menos tempo, ocorrendo uma substituição crescente do trabalho vivo

por trabalho morto, através da aquisição e do aperfeiçoamento de máquinas. Frente

a essas modificações e complexificação da sociedade há um aumento das

necessidades subjetivas do homem contemporâneo7, e a produção se sofistica para

atender a essa subjetividade e individualidade cada vez mais exacerbada. Essa

4 O neoliberalismo defende a liberdade dos mercados contra qualquer interferência política, porque acredita que os detentores dos capitais – principalmente os administradores de grandes blocos de riqueza financeira, como os fundos de pensão e as reservas técnicas das seguradoras – têm racionalidade e dispõem de todas as informações necessárias para investir os capitais de modo a maximizar o bem-estar social global (SINGER, 1998). 5 Apesar de estarmos utilizando o termo “excluído”, concordamos com Martins (1997), quando afirma que o processo de exclusão no capitalismo, também se configura como uma inclusão perversa, discriminatória, “marginal”. 6 O aumento do tempo livre na sociedade capitalista, em função do desenvolvimento tecnológico, beneficia os trabalhadores mais bem remunerados e os próprios capitalistas. Contudo, isto significou um aumento da discussão e valorização do lazer, cultura e das artes. 7 A discussão acerca das necessidades subjetivas na contemporaneidade se encontra inserida na discussão/proposta pós-moderna que enfatiza o pontual, o micro, o fenomênico e a individualidade. (Ver a este respeito Harvey, 1992).

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divisão do trabalho isola e submete os países com menor desenvolvimento,

mostrando o caráter desigual dessas transformações, que acentua as distâncias

econômicas e culturais entre os paises desenvolvidos e subdesenvolvidos.

Os mercados locais e nacionais entram em crise, devido a enorme

competitividade internacional, tornando-se necessária à criação de um processo de

gestão planetária, de onde se originam novas formas de competição. A regulação

dos mercados exige formas de controle supranacionais, baseados em acordos,

estratégias e planos de ação conjunta de Estados, empresas e instituições de

pesquisa. Inicia-se assim, o denominado processo de “globalização”. A chamada

"globalização" da sociedade capitalista foi vista como uma nova etapa e trouxe

muitas esperanças para alguns, pois sugeria o aparecimento de novos postos de

trabalho e uma integração mundial.

Neste sentido, argumentava-se que a nova fase do capitalismo mundial abriria

múltiplas perspectivas de desenvolvimento econômico, social, cultural e político para

a humanidade. Contudo, segundo Corsi e Alaves (2002), tal processo foi analisado

de maneira exageradamente simplificada. Concebiam-na como a abertura das

fronteiras nacionais, o que levaria a uma sociedade mundial regulada e integrada

pelo mercado. A queda de barreiras comerciais, a livre circulação de capitais, as

inovações tecnológicas, a rapidez da circulação das informações etc, culminariam

em um capitalismo sem fronteiras, auto-regulado pelos mercados, no qual os

Estados nacionais teriam seu papel diminuído e tenderiam e se restringiriam à

administração de problemas e interesses locais.

As inovações tecnológicas e organizativas do processo de produção, sob a

égide da Revolução Tecnológica e do toyotismo, libertariam os trabalhadores do

trabalho alienado, recuperando sua criatividade, imaginação e iniciativa, abrindo

espaço para a auto-realização e para o ócio. As políticas neoliberais, com

estabilidade monetária e liberdade na circulação de mercadorias e capitais e

redução do Estado no campo social, eram a forma ideal desse novo estágio da

economia mundial e o que garantiria a prosperidade geral. Aos países, restava se

adaptar a essas transformações e arcar com os custos sociais necessários.

Na verdade, a globalização, segundo Chesnais (1996), é um termo de cunho

ideológico utilizado para designar esse conjunto de transformações, mas

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correspondendo, em um sentido mais preciso, à etapa da mundialização do capital.

Trata-se de uma nova fase do processo de internacionalização do capital, sob a

hegemonia do capital financeiro e que tende a abarcar as regiões do mundo, que

apresentam abundância de recursos, desenvolvimento prévio, amplos mercados,

políticas voltadas ao favorecimento de investidores externos etc, ao mesmo tempo

em que, tende a excluir outras regiões do mundo. Isto significa que a globalização,

como mundialização do capital, incorpora a lógica do capital, seletiva, desigual e

excludente. Assim a mundialização do capital trouxe uma nova divisão internacional

do trabalho baseada na relativa desconcentração industrial. Tais processos são

concomitantes as inovações tecnológicas, concentradas na biotecnologia e na

informática.

Esses processos são, de um lado, frutos da antiga tendência à

internacionalização do capitalismo e, de outro, da crise do capital, aberta no final dos

anos 1960, marcada por intensa luta de classes. A resposta que o capital encontrou

frente ao avanço do socialismo, à crítica da cultura burguesa, à redução das taxas

de lucro, à crise da hegemonia norte-americana e ao avanço das forças de esquerda

no centro e na periferia do sistema, geraram as condições para um complexo de

reestruturações em várias dimensões — produtiva, econômico-financeira, política e,

inclusive, cultural —, que desembocaram na mundialização do capital (CHESNAIS,

1996).

De fato, na última década, assistimos a mudanças profundas e contraditórias.

Ao mesmo tempo em que muitos processos se "globalizaram", outros reforçaram

sua dimensão local: veja-se, por exemplo, o ressurgimento das tradições regionais,

dos nacionalismos e dos fundamentalismos religiosos.

A esperada prosperidade e integração mundial parecem cada vez mais

distantes. Observa-se, hoje, uma profunda desigualdade entre as várias regiões do

planeta, sendo que muitas se encontram à margem da chamada “globalização”. A

miséria, o desemprego, a precarização dos salários e a falta de perspectiva

encontram-se como problemas maiores gerados por este processo, estando também

nos países desenvolvidos, mas em proporções menores, sem contar os diversos

problemas ecológicos causados por este processo de desenvolvimento. Na atual

fase do capitalismo mundial, o baixo crescimento econômico e a instabilidade

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permanente atingem o sistema mundial, não apenas em sua dimensão econômico-

financeira, mas em seus aspectos geopolítico-militares.

Segundo Mota (1998), a chamada “reestruturação produtiva” é uma nova

forma de produção industrial que, através da introdução de novas tecnologias,

trouxe uma grande redução de custos relativos à produção, transformando também

o mundo do trabalho, das estratégias empresariais e da competitividade,

aumentando a internacionalização. Os processos de trabalho sofreram mudanças,

com a substituição e/ou a mescla dos modelos taylorista/fordista pelo Toyotista -

modelo japonês que sobrepõe à fragmentação do trabalho, típicas do modelo

taylorista e fordista, pela multifuncionalidade do trabalhador, exigindo deste uma

maior qualificação, uma maior capacidade de desenvolver diversas funções, estando

adequado às novas exigências da produção de mercadorias. A aproximação das

chefias aos trabalhadores se dá de forma que esse passe a se sentir parte da

empresa, responsável pelo seu funcionamento e pessoa importante para o processo

de produção. Através dessa nova cultura implantada pelas empresas, a exploração

do trabalhador se dá de forma conscienciosa, com o consentimento deste.

As estratégias utilizadas pelo grande capital, para redefinir socialmente o processo de produção de mercadorias, a rigor, evidenciam as reais necessidades do processo de reestruturação produtiva: a integração passiva dos trabalhadores à nova ordem do capital, isto é, a adesão e o consentimento do trabalhador às exigências da produção capitalista (MOTA, 1998, p. 12).

Segundo Santos (1994), as transformações no mundo do trabalho tem uma

forma bastante peculiar nos chamados países de Terceiro Mundo, onde coexistem

formas de trabalho “arcaicas” e “modernas” baseadas em um sistema de

superexploração da força de trabalho. Vê-se uma canalização da mão-de-obra rural

para a economia urbana e industrial, o que gera um grande número de

desempregados, que só encontram como estratégia de sobrevivência, a economia

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informal8. Na América Latina, a questão social9 aponta para o surgimento de

problemas “novos” gerados por aqueles que estão incluídos precariamente no

sistema e lutam para sobreviver nessa sociedade, incapaz de absorvê-los.

2.2 Configurações das relações de trabalho: do fordismo às formas

flexibilizadas e precarizadas de trabalho

O fordismo como forma de organização do trabalho surgiu em 1913, quando

Henry Ford, à frente da sua empresa, que já existia há 10 (dez), anos cria uma nova

forma de produzir e de organizar o trabalho. Tendo como produto o automóvel,

estabelece uma forma de venda em massa e com preços relativamente baixos.

A fabricação de veículos, até então, se dava através de mecânicos altamente

especializados, que fabricavam o automóvel praticamente por inteiro e de forma

artesanal. A produção era lenta, o que demandava muito tempo e desperdício de

capital.

Ford, através do método taylorista10 – pautado na organização científica do

trabalho, no planejamento e no controle dos tempos e movimentos do trabalho -,

organiza a produção através da padronização e da produção em série como

condição para a redução de custos e elevação de lucros. O trabalho deveria ser

8 [...] o trabalho informal cumpre a mesma função do formalmente assalariado, que desenvolve sua ocupação na indústria, nos ramos comerciais e/ou financeiros, sob uma explícita relação empregado-empregador (TAVARES, 2004. p.19).9 “A questão social não é senão as expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção mais além da caridade e repressão” (IAMAMOTO; CARVALHO, 1983, p. 77).10 Tal método consiste na dissociação do processo de trabalho das especialidades dos trabalhadores, ou seja, o processo de trabalho deve ser independente do ofício, da tradição e do conhecimento dos trabalhadores, mas inteiramente dependente das políticas gerenciais. Taylor separa a concepção (cérebro, patrão) da execução (mãos, operário). Nega ao trabalhador qualquer manifestação criativa ou participação. A introdução das idéias tayloristas também foi adaptada ao campo do trabalho doméstico e da medicina. Vinculava-se a necessidade das donas de casa e dos médicos otimizarem suas tarefas. Neste contexto, a organização das atividades deveria ser bem planejada a fim de que tudo fosse realizado com eficiência e rapidez. É o chamado controle de tempos e movimentos. Para tudo isso, é fundamental a hierarquia e a disciplina. Isto foi o que predominou na grande indústria capitalista, ao longo do século XX e é um modelo que ainda está bem vivo em algumas organizações, a despeito de todas as inovações. A crise deste modelo surgiu em grande parte pela resistência crescente dos trabalhadores ao sistema de trabalho em cadeia, à monotonia e à alienação do trabalho fragmentado. (GOUNET, 1999).

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realizado na linha de produção de forma intensa, padronizada e fragmentada,

proporcionando ganhos de produtividade (GOUNET, 1999).

Assim, para elevar os lucros, Ford partiu para a produção em massa,

racionalizando ao extremo as operações efetuadas pelos operários e combatendo os

desperdícios. A principal racionalização é a execução parcial das tarefas, cada

operário é responsável pela fabricação de uma peça do veículo, através de

movimentos repetidos. Assim, é criada a linha de montagem com base na esteira

rolante e as peças são padronizadas através da compra a firmas que as fabricam –

integração vertical. Tal modelo permitiu a fabricação do carro em uma velocidade 8

(oito) vezes maior.

O trabalho é parcelar e fragmentado em suas funções. A elaboração e a

execução são separadas no processo de trabalho. As unidades fabris são

verticalizadas e consolida-se o operário-massa, o trabalhador coletivo fabril. A mais-

valia é extraída no prolongamento da jornada de trabalho, a subsunção do trabalho

ao capital, própria da fase da maquinaria estava consolidada.

O fordismo, junto ao taylorismo, consistiuem o processo de trabalho que

predominava na grande indústria capitalista. Segundo Harvey (1992), o núcleo

essencial do fordismo manteve-se firme até 1973, pois o padrão de vida da

população trabalhadora dos países capitalistas centrais manteve relativa

estabilidade, assim como os lucros advindos dos monopólios.

Contudo, esse novo modo de organização do trabalho desqualifica os

trabalhadores, poda a criatividade e estabelece a separação entre concepção e

execução. Desta forma, para atrair o operariado, ele duplica o valor do salário de

mercado, mas impõe restrições – o trabalhador não deve ser do sexo feminino, não

deve beber, fumar e deve destinar o seu dinheiro para a família. A empresa cria um

serviço social para controlar a vida pessoal dos seus funcionários, passando a tentar

controlar também a subjetividade do trabalhador (Gounet, 1999)

O aumento do salário acirra a competição no mercado de veículos e apesar

disto, o preço dos veículos se reduz, porque o lucro estava baseado na venda

massificada.

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Com o sucesso do modelo, o sistema fordista se espalhou por outras regiões

do mundo e foi incorporado por outras montadoras, como a General Motors, Nissan,

Mazda, Honda, Mitsubish Motors, dentre outras.

Percebemos, nesse ciclo de transformações, que as empresas mudam

radicalmente para atender a demanda, assumem a liderança da indústria. As

mudanças no nível organizacional precedem a introdução de novas tecnologias.

Mas, a empresa que busca o sucesso deve garantir a adesão do trabalhador, pelo

menos pelo tempo necessário para generalização do sistema.

A pressão concorrencial faz com que cessem os investimentos na melhoria

das condições de trabalho. As grandes empresas da Europa, na década de 1960,

trazem trabalhadores imigrantes para reduzir os custos. Esses operários são

submetidos a condições de trabalho cada vez piores.

É dentro desse contexto que surgem os fast foods. Essa nova geração que

tinha o acesso fácil aos automóveis desenvolveu também um novo estilo de se

alimentar, que exigia uma maior permanência dentro dos automóveis. Isto fez com

que os irmãos Mcdonald’s adentrassem no promissor ramo do drive in11, e

passassem a incorporar a sua lanchonete essa nova forma de se alimentar, que

fosse rápida e não exigisse que o consumidor entrasse na loja. “já que as pessoas

com carro são tão preguiçosas que não querem sair de seus automóveis para se

alimentar” (FONTENELLE, p. 51. 2002). Dessa forma, criaram um espaço onde os

carros poderiam transitar e o cliente faria seu pedido, pagaria e o receberia dentro

de seu automóvel, tudo no menor tempo possível. (FONTENELLE, 2002). A forma

de “produzir” comida no fast food também se baseia no modelo fordista/taylorista.

Cada trabalhador faz uma parte do trabalho, dentro de um rígido controle de tempo e

movimentos. Desta forma, o setor de fast food, à semelhança das demais empresas

e indústrias, cresceu e se expandiu por todo o mundo durante os anos “dourados” do

capitalismo (décadas de 1950 a 1970).

Esse modo de produção foi à forma mais racionalizada de processo de

trabalho que o capitalismo já teve e só começou a dar sinais de esgotamento no final

de década de 1970.

11 Estilo de cinema surgido nos EUA, no qual as pessoas assistiam aos filmes dentro de seus automóveis.

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Essa fase foi caracterizada pelo “compromisso” fator, importante que

delimitava o campo da luta de classes. Através do welfare state12, implementavam -

se ganhos e políticas sociais. Esse mecanismo se tornou um forte instrumento em

favor do capital.

Mas a partir da década de 1970, os operários passam a querer romper com

este “compromisso”. Essas condições podiam ser suportáveis para a primeira

geração de operários, para os quais as vantagens do fordismo, compensavam o

preço de seu acesso, mas não para a segunda geração. Assiste-se ao boicote e a

resistência ao trabalho despótico, através do absenteísmo, fuga do trabalho, greves

parciais, operação de zelo (que diminui o tempo de trabalho). As lutas no final dessa

década, solapavam as bases do domínio do capital e afloravam a possibilidade de

uma contra-hegemonia vinda do mundo do trabalho.

O que estava no centro da ação operária era a possibilidade efetiva do

controle social dos trabalhadores, dos meios materiais dos processos produtivos.

Mas “a contestação do poder do capital sobre o trabalho não se estendeu ao poder

fora do trabalho” (ANTUNES, 2003, p. 20) e não conseguindo se articular com os

diversos movimentos sociais, se tornou incapaz de criar mecanismos capazes de lhe

dar longevidade. Por não conseguir superar suas limitações, a luta dos

trabalhadores enfraqueceu não sendo capaz de se contrapor a sociabilidade do

capital. Contudo, sua capacidade de organização perturbou o capitalismo e foi um

dos elementos que fez surgir à crise dos anos 1970. Os trabalhadores foram

capazes de controlar não só o movimento reivindicatório, mas o funcionamento das

empresas e mostraram a sua inteligência e capacidade organizacional e os

capitalistas perceberam que podiam explorá-los intelectualmente, também. Assim,

com a derrota da luta operaria pelo controle social da produção criaram-se bases

sociais para a retomada do processo de reestruturação do capital em um patamar

diferente do fordismo/taylorismo (ANTUNES, 2003).

12 Esta expressão origina-se na Inglaterra, na década de 1940, e em seu sentido amplo, designa a generalização das ações do Estado “para modificar as condições do mercado e proteger os indivíduos das suas conseqüências econômicas e sociais e, nesses termos, seria possível afirmar que ações públicas nessa direção, ainda que ‘rudimentares’, são originárias do século XIX e se ampliaram no século XX”, após a Segunda Guerra Mundial (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 96). Contudo, a conceituação, origem e abrangência do Welfare State são polêmicas e suas configurações adquiriram feições diversas, a partir das conjunturas históricas, políticas, sociais e econômicas dos diversos países.

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Assim, para os países de regime capitalista, a década de 1980 se configura

como uma década de profundas transformações no mundo do trabalho. A classe-

que-vive-do-trabalho passa pela crise que, segundo Antunes (2003), atinge não só a

sua materialidade, mas traz repercussões na sua subjetividade.

Essa década, como já assinalamos, foi marcada por um grande salto

tecnológico, a automação, a robótica e a microeletrônica que invadiram o universo

da fábrica, provocando transformações nas relações de trabalho e na produção do

capital.

O fordismo e o taylorismo deixam de ser as únicas formas de organização do

trabalho, e passou-se a mesclar estes, com novos processos produtivos. O

cronômetro e a produção em série e de massa são substituídos pela flexibilização da

produção, pela especialização flexível e por novos padrões de adequação da

produção à lógica de mercado (ANTUNES, 2003). Este novo modelo, apóia-se na

flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e

padrões de consumo (HARVEY, 1992).

Assiste-se a desconcentração industrial e a novos padrões de gestão da força

de trabalho, entre estes, os círculos de controle de qualidade (CCQs), a gestão

participativa, a busca da qualidade total, expressões do mundo japonês, que se

desenvolvem em vários países do capitalismo avançado e também chegam ao

terceiro mundo industrializado.

O denominado toyotismo surge então, como necessidade das empresas em

responder a crise financeira, e a necessidade de atender a um mercado interno que

solicita produtos diferenciados e demandas menores. Dessa forma, mescla-se ou

em alguns casos substitui-se o modelo fordista dominante em várias partes do

capitalismo, pelo toyotismo13.

Os direitos conquistados na área do trabalho passam a ser flexibilizados,

desregulamentados, para que o capital possa adequar-se a essa nova fase. As

conquistas e direitos históricos dos trabalhadores são substituídos e até mesmo

eliminados do mundo da produção.

13 O nome “Toyotismo” é utilizado como referência a fábrica de carros japonesa “Toyota”, primeira a utilizar este novo modelo de organização da produção (ANTUNES, 2006).

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Surgem setores inteiramente novos de produção, novos modos de

fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e novas taxas de

intensificação comercial, tecnológica e organizacional.

O toyotismo ou especialização flexível, segundo Antunes (2003), é a

expressão de uma processualidade que teve sua experiência concreta na “Terceira

Itália” e que possibilitou o advento de uma nova forma produtiva que articulou o

enorme desenvolvimento tecnológico e a desconcentração produtiva baseada em

médias e pequenas empresas artesanais.

Pode-se dizer que, a acumulação flexível trouxe rápidas mudanças nos

padrões de desenvolvimento desigual, tanto entre os setores quanto nas regiões

geográficas, resultando, por exemplo, em uma enorme ampliação do emprego no

setor de serviços, assim como conjuntos industriais inteiramente novos em regiões

subdesenvolvidas.

Algumas empresas com bases fordistas adotaram as novas tecnologias e os

emergentes processos de trabalho, o que se chamou de “neofordismo”, devido a

grande pressão competitiva que levou a integração do fordismo à rede de

subcontratação para aderir à onda de flexibilidade.

Segundo Harvey (1992) a acumulação flexível, como uma forma própria do

capitalismo, mantém as características essenciais desse modo de produção: a) está

voltada para o crescimento e; b) este crescimento se apóia na exploração do

trabalho vivo no universo da produção.

No tocante à segunda característica, fica claro que, esse processo de

transição para a acumulação flexível solapou o trabalho organizado, gerou o

desemprego estrutural, trazendo excedentes da força de trabalho, fazendo retornar

estratégias absolutas de extração de mais-valia, assim como, o crescimento do

emprego no setor informal da economia por todo o mundo capitalista avançado,

revelando o lado obscuro da história apresentada como progressista.

Dentro desse modelo de acumulação, sistemas de trabalho alternativos

podem coexistir, permitindo a “livre” escolha dos empreendedores capitalistas.

Segundo o exemplo de Antunes (idem), o mesmo molde de camisa em grande

escala pode ser produzido na Índia, pelo sistema cooperativo da “Terceira Itália”, em

Nova York, ou pelo trabalho familiar em Hong Kong.

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Desta forma, o toyotismo surgiu a partir de quatro fases: a) a introdução na

indústria automobilística japonesa, da experiência do ramo têxtil, devido à

necessidade do trabalhador manusear várias máquinas ao mesmo tempo; b) a

necessidade da empresa fornecer respostas à crise financeira, elevando a produção,

sem aumentar o número de trabalhadores; c) a importação de técnicas de

supermercados dos EUA que originaram o sistema Kanban14; d) a expansão do

método Kanban para as empresas subcontratadas e fornecedoras (CORIAT apud

ANTUNES, 2003).

Um traço também marcante do toyotismo consiste no necessidade de atender

a um mercado interno que solicita produtos diferenciados e pedidos pequenos,

devido às condições do Japão no pós-guerra. O Ohnismo15 nasce assim, a partir da

necessidade de satisfação de pedidos pequenos e variados.

Naquele momento era necessário enfrentar o combativo sindicalismo japonês,

marcado por grandes greves que se colocava como entrave à expansão toyotista.

Em 1950, durante uma greve dos metalúrgicos, a Toyota conseguiu derrotar, pela

primeira vez o sindicalismo japonês, o que desencadeou lutas em várias empresas,

contra a racionalização do trabalho e por aumentos salariais. Todavia, os

trabalhadores foram, novamente derrotados. Após as derrotas, as empresas se

aproveitaram da fraqueza sindical e criaram o chamado sindicalismo de empresa, o

sindicato-casa atado ao ideário patronal, diminuindo a combatividade dos

trabalhadores e manipulando a sua subjetividade.

O sucesso da Toyota deveu-se também a essa incorporação, combinando

repressão e cooptação. O sindicalismo teve como resposta a obtenção do emprego

vitalício para cerca de 30% (trinta por cento) dos trabalhadores da Toyota, como

também ganhos salariais vinculados à produtividade. A manutenção permanente no

emprego se dava através da condição em que, os funcionários só poderiam

ascender a funções de responsabilidade dentro da empresa, se tivessem passado

pelo sindicato “Proteger nossa empresa, para defender a vida (...)” (CORIAT apud

ANTUNES, 2003. p 33).

14 O sistema Kanban consiste na reposição dos produtos somente após sua venda.

15 O termo “Ohnismo’ remete-se a Ohno, um dos principais mentores e fundadores do modelo japonês de organização do trabalho (WOLFF, 1998, p.105).

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É dentro desse contexto que se desenvolve o toyotismo, através da

manipulação subjetiva do trabalhador. Assim, a produção passa a ser baseada em

um estoque mínimo e no melhor aproveitamento do tempo, o que inclui o transporte,

o controle de qualidade e do estoque, que está garantido pelo just in time16.

Ao mesmo tempo, busca-se e incentiva-se o trabalhador polivalente, capaz de

executar várias operações, com maior qualificação. É a chamada desespecialização

decorrente da criação dos trabalhadores multifuncionais, que diminuiu o poder do

trabalhador sobre o processo de produção e aumentou a intensidade do trabalho,

constituindo-se ainda, em um ataque à profissão e à qualificação bem como ao

poder de negociação. O trabalho passou a ser realizado em equipe devendo o

trabalhador ser capaz de exercer várias funções. Ao mesmo tempo, estende - se

seus métodos e procedimentos as chamadas subcontratadas ou terceirizadas.

O sistema toyotista através do Kanban, just in time, da flexibilização,

terceirização, subcontratação, CCQ, controle de qualidade total, eliminação do

desperdício, “gerência participativa”, sindicalismo de empresa etc, supõe uma

intensificação da exploração do trabalho, através da, os funcionários devem exercer

várias funções operando com várias máquinas simultaneamente, ou através do

sistema de luzes17 - gerenciamento by stress (por tensão).

O toyotismo traria também a flexibilização das relações de trabalho e dos

direitos sociais:

O capital, com o objetivo de ampliar os níveis de lucro por via da redução/eliminação de gastos atrelados ao salário e ao aumento da extração de mais-valia, cria novos mecanismos de controle da força de trabalho, entre eles a flexibilização dos contratos de trabalho. Certas operações que antes se realizavam no interior das fábricas, resguardadas pela formalização dos contratos de trabalho, agora são exteriorizadas, passando a ser realizada por trabalhadores

16 O Just in Time surgiu no Japão, no princípio dos anos 1950, sendo o seu desenvolvimento creditado à Toyota Motor Company, a qual procurava um sistema de gestão que pudesse coordenar a produção com a procura específica de diferentes modelos de veículos com o mínimo atraso. Para a filosofia Just in Time, em cada etapa do processo produzem-se somente os produtos necessários para a fase posterior, na quantidade e no momento exato. Está baseado na eliminação do estoque e no maior aproveitamento do tempo (GOUNET, 1999).

17 No sistema de luzes ao se acender a luz verde o ritmo de funcionamento deve ser normal; laranja significa intensidade máxima; e vermelha significa que há problemas, deve-se reter a produção (ANTUNES, 2003).

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contratados por terceiros. Uma empresa contrata outra empresa e não um trabalhador (ALVES; AMARAL, 2007, p. 2 e 3).

Para os trabalhadores que se encontram na situação de “terceirizados”, cria-

se a esperança de estar empregado, mesmo que sem vínculos formais de trabalho,

já que o desemprego é estrutural. Nesse mundo, sem garantias trabalhistas, sem

empregos estáveis, ao trabalhador restam os “objetos de desejo”, pois dentro da

sociedade de consumo, os objetos são uma forma de materializar sonhos de

consumo. Os objetos tornam-se mercadorias e podem ser adquiridos principalmente

nos shopping centers.

A incorporação e manipulação subjetiva dos trabalhadores, através do

“espírito Toyota”, “família Toyota”, “Nissan a fábrica da nova era” e do “sindicato-

casa” – sugerem a busca de uma saída à atual crise do capitalismo, uma nova forma

de organização do trabalho, um novo ordenamento social pactuado entre capital,

trabalho e Estado. Supõe a aceitação da política concorrencial e de mercado, a

exclusão de alternativas para além do capital, não levando em conta o desemprego

estrutural em dimensões continentais, como resultado das transformações no

processo produtivo. Dessa forma, a ocidentalização do toyotismo comportaria a

aquisição do capital contra o trabalho (ANTUNES, 2003).

Portanto, o toyotismo não deve ser entendido como um novo modo de

organização societária, e nem mesmo como um avanço em relação ao fordismo e

taylorismo. Deve se ter a clareza de que este foi uma resposta a mais uma dentre as

várias crises, enfrentadas pelo capitalismo, e como uma forma de sobrevivência do

sistema produtor de mercadorias.

Apesar da redução do despotismo fabril, pela ampliação da participação do

trabalhador na concepção do processo produtivo, ainda se perpetua a desidentidade

entre indivíduo e gênero humano, pois a lógica dessa organização da produção é

mais envolvente, consensual e participativa, em suma, é uma lógica manipulatória.

O capital passa a se apropriar do ser e fazer do trabalho, o trabalhador deve pensar

e agir para o capital, acreditando-se na diminuição do fosso existente entre

elaboração e execução (ANTUNES, 2003).

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A crise que afeta o ser do trabalho atinge o universo da consciência, da

subjetividade e da representação. Desestrutura o sindicalismo que deixa de ser

combativo no sentido de buscar uma nova ordem para além do capital, questionando

somente pequenas melhorias dentro da ordem social vigente, operando uma

aceitação acrítica da social-democratização ou mesmo do ideário neoliberal.

Desta forma, o toyotismo como sistema de acumulação provoca uma

diferenciação social ainda mais elevada, surgindo como um processo crescente de

exclusão/inclusão precária e de exploração da força de trabalho e de acumulação do

capital.

2.3. As múltiplas facetas do trabalho nas sociedades capitalistas

2.3.1 O capitalismo mundial e as especificidades brasileiras

O capitalismo, no Brasil, se deu de forma tardia e, ao longo do século XX,

vivenciando, a partir de Getúlio Vargas, um processo de crescimento e acumulação

industrial.

A industrialização deu seu primeiro salto somente a partir de 1930, possuindo

um cunho nacionalista. Seu segundo salto ocorreu em 1950, no governo de Jucelino

Kubitschek. E seu terceiro salto ocorreu após o golpe de 1964, juntamente com a

forte internacionalização do capital.

A industrialização do país, a partir de 1964, se dava de 2 (duas) formas: a

partir da produção de bens de consumo duráveis, que tinham como foco o mercado

interno restrito e seletivo; e a partir da produção para exportação de produtos

primários, como também de produtos industrializados.

Dentro do padrão de acumulação de capital

Pela vigência de um processo de superexploração da força de trabalho, dado pela articulação entre baixos salários, jornada de trabalho prolongada e fortíssima intensidade em seus ritmos, em um patamar industrial significativo para um país que, apesar de sua inserção subordinada, chegou a alinhar-se, em dado momento, entre as oito grandes potências industriais (ANTUNES, 2006. p. 17).

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Com o fim da ditadura militar, na década de 1980, já na “Nova República” e

durante o governo de José Sarney, o padrão de acumulação vigente, sustentado no

tripé estado, capital nacional e internacional passou por transformações. Mesmo que

alguns traços tenham sido conservados, inicia-se um processo de mutações

organizacionais e tecnológicas, no interior do processo produtivo, como no setor de

serviços, embora, no Brasil, esse processo tenha se dado de forma mais lenta do

que nos países centrais.

A nova divisão internacional do trabalho já apontava no final do governo

Sarney, que a singularidade do Brasil começava a ser afetada com os novos traços

universais do sistema global do capital que se instaurava, modificando

posteriormente muitos de seus traços essenciais (ANTUNES, 2006).

A partir dessas mudanças as empresas passam a adotar novos padrões

organizacionais e tecnológicos, assim como novas formas de organização social do

trabalho.

Nesse momento, dá-se início à introdução de formas Toyotistas de produção

no país baseadas no just in time que trouxe a flexibilização das empresas, produção

somente dos produtos necessários e com qualidade, dentro do menor tempo

possível, redução dos estoques e dos custos, investimento no atendimento ao

cliente, e principalmente criação de mecanismos de controle da subjetividade

através do envolvimento dos empregados (moral, satisfação, desenvolvimento e

autocontrole). A produção é baseada no team work – (sistema de produção em que

as equipes de trabalhado são constituídas por 04 (quatro) ou 08 (oito) trabalhadores

polivalentes), assim como programas de qualidade total e ampliação da difusão da

microeletrônica.

As empresas brasileiras passam a se preparar para a competitividade

internacional. Agora as empresas necessitam responder ao novo sindicalismo e as

formas de conflito adotadas pelos trabalhadores, para evitar greves como as

ocorridas no ABC paulista e em São Paulo. Esse período foi marcado pela redução

do número de trabalhadores, principalmente nos setores automobilísticos e de

autopeças, assim como nos ramos têxtil e bancário. Observa-se, no setor

automobilístico, a coexistência de linhas novas e antigas de montagem,

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expressando a heterogeneidade da reestruturação produtiva no Brasil (ANTUNES,

2003).

Nesse momento de reorganização da produção, surge a necessidade de

aumento da produção, a jornada de trabalho é ampliada, surgem os CCQ’s (círculos

de controle de qualidade), assim como a adoção dos sistemas Kanban e just- in-

time.

O fordismo existente no Brasil passa a incorporar formas toyotistas de

organização do trabalho, e assim, a economia brasileira começa a se recuperar em

meados de 1980, através das inovações tecnológicas, a automação e a

microeletrônica.

Mas foi na década de 1990, que a reestruturação produtiva teve seu auge no

Brasil. Através do modelo de acumulação flexível novas formas de trabalho são

incorporadas, como a subcontratação e terceirização da força de trabalho

imperantes em meio aos sistemas de Qualidade Total, just-in-time e kanban.

A produção industrial passa a se descentralizar, fazendo uso de justificativas

como a concorrência internacional que escondiam o real interesse – a busca pela

mão-de-obra de baixa remuneração e incentivos fiscais do Estado.

Portanto, pode-se dizer que, a década de 1990, foi marcada pela

reestruturação produtiva, que trouxe profundas transformações no interior do

processo produtivo do Brasil e que combinou novas e antigas formas de organização

do trabalho (ANTUNES, 2006).

No estágio em curso do capitalismo no Brasil, o enxugamento elevado da

força de trabalho vem se combinando a mudança de ordem sóciotécnica do

processo produtivo e de organização das formas de trabalho.

Os direitos sociais têm sido desregulamentados e flexibilizados, as novas

formas terceirizadas de contrato de trabalho coexistem com formas fordistas, que se

preservam em diversos ramos produtivos e de serviços. Segundo Antunes:

Mas quando se olha o conjunto da estrutura produtiva, pode-se também constatar que o fordismo periférico e subordinado, que foi aqui estruturado, cada vez mais se mescla fortemente com novos processos produtivos, próprios, oriundos da acumulação flexível e das práticas toyotistas que foram e estão sendo assimiladas com vigor pelo setor produtivo brasileiro (ANTUNES, 2006. p. 19).

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A baixa remuneração encontrada em países como o Brasil, tanto pode ser um

atrativo para o capital estrangeiro, como pode se colocar como obstáculo ao nosso

desenvolvimento tecnológico. A mescla de padrões produtivos mais avançados com

a mão-de-obra qualificada representa um aumento da exploração da força de

trabalho, traço característico da implantação do capitalismo no Brasil. Para o grande

capital, é interessante que se combine mão-de-obra qualificada, polivalente,

multifuncional e que possua direitos flexibilizados e baixa remuneração.

A partir da década de 1990, as montadoras como Volkswagem, Honda e

Mercedez-Benz no Brasil também intensificaram, o processo de reestruturação

produtiva, visando não só a adequação aos novos imperativos do capital, como

também o ”envolvimento” da força de trabalho. O manual de integração que a

Toyota concedia aos funcionários da empresa era um exemplo claro do

envolvimento manipulatório do trabalhador.

Apesar da crise que se instaurou durante o governo Collor (1990 a 1992), a

reestruturação produtiva continuou a se desenvolver e teve mais um pico durante o

governo de Fernando Henrique Cardoso, a partir de 1994. Se na década de 1980 a

reestruturação se dava de forma ainda seletiva, na década de 1990 ela encontra

espaço para se desenvolver plenamente.

Os programas de qualidade total, just-in-time, Kanban, o enxugamento da

mão-de-obra, os benefícios salariais, a PRL (programa de participação nos lucros e

resultados), foram medidas que adequaram o país aos moldes flexíveis.

Percebemos que esses programas recriaram estratégias de dominação do trabalho

que tentam mostrar a possibilidade de relação harmoniosa e lucrativa entre capital e

trabalho.

Um exemplo claro desse processo é a cadeia de fast food Mcdonald’s que

possui uma taxa de rotatividade dos funcionários que são contratados

temporariamente e seu vinculou ao estabelecimento depende da sua produtividade,

agilidade e incorporação da filosofia Mcdonald’s.

Na cadeia do fast food Restfood, os funcionários gozam de uma relativa

estabilidade, os cargos mais altos como gerência, administração são

preferencialmente ocupados por antigos funcionários. Mostraremos adiante nos

resultados da nossa pesquisa que, em geral, no Restfood, somente os homens

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ascendem dentro da empresa. Mas o vínculo empregatício, também está atrelado a

sua produtividade e adequação às exigências como rapidez, agilidade, polivalência e

disponibilidade, em muitos casos integral, de horário para o trabalho.

Como conseqüência do emprego da mão-de-obra flexível, como os chamados

terceirizados, subcontratados, contratação por tarefa, a introdução do call center,

assistiu-se à precarização do emprego, à redução da remuneração, confortados pela

desregulamentação do trabalho e redução dos direitos sociais.

Segundo Antunes (2003), um caso bastante evidente é o do Banco do Brasil

que através do seu processo de liofilização organizacional18 teve uma redução no

seu número de funcionários de 800 mil (oitocentos mil), em 1980, para 400 mil

(quatrocentos mil), em 2005.

Essas pode-se dizer, são adequações à reestruturação produtiva e seu

processo de tecnificação e racionalização do trabalho que ocorreu no Brasil, a partir

da década de 1980.

Segundo Meszáros (2006) em algumas línguas o "trabalho temporário" é

chamado de "precarização", embora seu sentido seja confundido com "emprego

flexível". A questão, segundo Mészaros, não está no fato do desemprego ou do

"trabalho temporário" ameaçarem o trabalho, mas sim, no fato deste se dá de forma

precarizada.

[...] Uma solução possível aos problemas que enfrentamos é mudar das trocas socioeconômicas reguladas pela submissão à tirania do "tempo necessário" e à emancipação por meio do "tempo disponível", como uma alternativa ao modo de reprodução sociometabólica do capital (MEZSÁROS, 2006. p. 28).

Socialistas de países europeus e das Américas Sul e Norte adentraram na

luta pela redução do tempo de trabalho para 35 horas semanais, visando combater o

perverso sistema que submete e miserabiliza a população. Percebemos que, em

países como a Itália, citando o exemplo do Partido da Refundação Comunista, há

preocupação não somente com a criação de novos postos de emprego e melhoria

18 “Liofilizar é enxugar. Muita gente vai perguntar qual o problema de uma planta reduzir de 40 mil para 20 mil postos, se ela produz três vezes mais. Acho ótimo, desde que você saiba o que fazer com os 20 mil que perderam o emprego” (ANTUNES, 2004).

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das condições de vida, mas também com a importância de se transformar a

realidade social.

O alcance desse objetivo - a diminuição da jornada de trabalho - só se esgota

no momento em que, além do seu alcance, se consiga realizar a crescente

transformação da ordem social estabelecida, a qual imporá sempre barreiras aos

que tentem resistir ao seu domínio. Embora existam ainda aqueles que crêem, que a

ordem social advinda do modelo norte-americano, seria a solução para os males

como o desemprego, entre tantos outros males sociais (MÉSZAROS, 2006).

A taxa de exploração dos trabalhadores é tão alta na América do Norte que

cerca de 1% (um por cento) do rendimento da população mais rica equivale a 40%

(quarenta por cento) dos rendimentos da população de classe mais baixa. Em

países como a Grã-bretanha a carga horária de 16 horas/diárias é computada como

trabalho de tempo integral, revelando que o medo do desemprego, tem feito com

que os trabalhadores se submetam a jornadas de trabalho exaustivas e a máxima

exploração do seu trabalho por salários irrisórios (MEZSÁROS, 2006).

Meszáros (2006) assinala ainda que, mesmo os países de "capitalismo

avançado" como o Japão, escondem taxas elevadas de desemprego. Esse

problema afeta tanto os trabalhadores não-qualificados, como os de qualificação alta

que passam a disputar as vagas de emprego disponíveis, com o estoque anterior de

desempregados, ou seja, a totalidade da força de trabalho da sociedade, vem

sofrendo as conseqüências desse processo.

Em países como a Índia, que são referências pelo baixo desenvolvimento

existem cerca de 336 milhões de desempregados. Nos países industrialmente

desenvolvidos existe um número de 40 milhões de desempregados e dentro desse

número, a Europa colabora com cerca de 20 milhões de desempregados e a

Alemanha ultrapassa os 5 (cinco) milhões (MEZSÁROS, 2006).

Na atual fase do capitalismo, o desemprego é uma característica dominante,

e nessa sua nova configuração se tornou inviável encontrar paliativos ao

desemprego. A esse respeito, as soluções parciais não serão capazes de prestar

sequer a mais superficial atenção aos sofrimentos humanos, até porque é a primeira

vez na história que a dinâmica - e, em suas implicações finais, dinamicamente

destrutivas - do controle social metabólico auto-expansivo do sistema expele,

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brutalmente, se necessário, uma maioria esmagadora de seres humanos do

processo de trabalho. Esse é o sentido profundamente perturbador da "globalização"

(MEZSÁROS, 2006. p. 32).

O que se percebe é que mesmo com a conquista da redução da jornada de

trabalho para 35 horas semanais em alguns países, isso representa uma exploração

diferenciada - aumento das horas extras, diminuição dos salários e dos direitos dos

trabalhadores. O que existe de real são os movimentos em direção a flexibilização e

a desregulamentação (MEZSÁROS, 2006).

A flexibilização das práticas de trabalho, que é facilitada por meio da

desregulamentação leva em direção a precarização das condições de trabalho. A

preocupação é combater o mercado rígido de trabalho, e promover a flexibilidade

sob o pretexto de dar empregos a um maior número de pessoas.

Segundo Meszáros (2006), um documento do FMI traz informações de que a

população européia desloca-se menos em busca de trabalho do que os americanos,

portanto, culpados pelo seu desemprego já que se fixam mais ao seu local de

origem. Esse documento ainda coloca que se o governo cortasse o auxílio

desemprego incentivaria ainda mais a população a buscar postos de trabalho, e, um

grande contingente de pessoas, em busca do emprego levaria a redução do preço

pago pela mão-de-obra, e salários mais baixos resultariam em um maior estímulo ao

crescimento do emprego. Em outras palavras, essa é uma tentativa de transferir

para o individuo a culpa do seu desemprego, já que a redução dos direitos

trabalhistas resultaria em um maior número de empregados que, por sua vez, devido

à falta de alternativas, se sujeitariam às péssimas condições de trabalho e de

salário, sem questionar.

Na realidade, o sistema continua a expulsar os trabalhadores do mercado de

trabalho, além de prolongar a sua jornada de trabalho. No Japão, por exemplo, um

projeto de lei eleva a jornada de trabalho de 9 para 10 horas diárias e a jornada

semanal de 48 para 52 horas, o que permite que a empresa exija que o trabalhador

execute a sua função, enquanto houver trabalho a se fazer, desde que o limite anual

não seja ultrapassado. Esse mesmo projeto permite que a empresa pague somente

8 horas trabalhadas por dia, mesmo que essa jornada seja ultrapassada.

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O efeito dessa brutalidade se expressa até mesmo em casos de morte de

trabalhadores no Japão: um jovem que desenvolvia um sistema de software para

bancos, no mês anterior a sua morte, chegou a trabalhar 300 horas e, em outro

caso, o trabalhador, nas duas semanas anteriores a sua morte, trabalhou cerca de

16 horas e 19 minutos diários (ibid).

Diante da crise estrutural do capital, mesmo esse alto nível de exploração não

é suficiente. Ele se prolongará até enquanto o movimento do trabalho seja capaz de

suportar.

As taxas de exploração diferenciais que afetam os países de capitalismo

avançado é uma circunstância necessária à existência da globalização nas relações

de produção. As antigas relações de trabalho perdem espaço, e sua presença não

se justifica nem mesmo para amenizar os impactos negativos da presente crise

estrutural.

O trabalho que não confere garantias aos trabalhadores e é extremamente

mal remunerado, se alastra de tal forma que, mesmo o trabalho mais estável sofre

pressão em direção à submissão de horários diversificados de trabalho.

E qual seria a saída para o embate capital x trabalho? Do ponto de vista do

capital não há uma alternativa ao trabalho fragmentado. A promessa de resolução

das contradições entre capital e trabalho se dão no sentido dos benefícios do

expansivo "livre-comércio", em que se acredita que as condições dos trabalhadores

terão expressivas melhoras, em todo o mundo, graças ao retorno da economia em

expansão crescente. Mas a atualidade mostra o oposto. As mercadorias produzidas

com mão-de-obra barata acentua, ainda mais, a má distribuição de renda, o

aumento da competição internacional e leva a uma variação constante na procura

por trabalho.

O trabalho se encontra cada vez mais vulnerável às flutuações do mercado,

perdendo o poder de barganha diante do capital, ou seja, o "livre-comércio" não

amplia a riqueza, mas sim a redistribui a um nível acima (ibid), concentrando-se nos

setores mais ricos da sociedade, tanto nos países de capitalismo avançado como

nos emergentes e em desenvolvimento.

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No cenário atual o capital já não possui condições de fazer quaisquer

concessões ao trabalho. A luta pela redução da jornada semanal de trabalho,

consiste em uma importante luta por melhores condições de trabalho,

[...] esta é uma exigência estratégica central para o trabalho, porque ela é "não negociável", isto é, não pode ser integrada às pseudoconcessões manipuladas pela ordem existente, pois isso se refere diretamente à questão do controle - um sistema alternativo de controle social metabólico - ao qual o capital se opõe de modo hostil e adverso (MEZSÁROS, 2006, p. 42).

O capital é absolutamente incapaz de respeitar os seres humanos. Ele

conhece apenas uma maneira de administrar o tempo de trabalho: maximizando a

exploração do "tempo de trabalho necessário" da força de trabalho empregada e

ignorando totalmente o "tempo disponível" na sociedade de forma geral, pois deste

não pode extrair lucro (MEZSÁROS, 2006, p. 43).

2.3.2 O trabalho no setor serviços: rupturas e continuidades

Nas últimas décadas o Brasil se tornou um país, no qual, o setor de serviços19

representa quase dois terços do emprego urbano metropolitano e corresponde a

metade do PIB, trajetória semelhante à de países desenvolvidos (IPEA, 1998). No

âmbito da economia mundial, a expansão das atividades de serviços constituiu uma

das mais importantes mudanças introduzidas no cotidiano humano do século XX.

O Brasil e a Argentina representam participação no PIB muito próximas a de

países como Alemanha e Japão. Esse fato sugere que a participação dos serviços

na geração de renda e emprego não é, por si só, um indicador do grau de

desenvolvimento de um país. Na realidade, a presença de um setor de serviços

19 A partir da década de 1930, os Serviços passam a ser objeto de discussão na análise econômica, inicialmente sob uma definição genérica de “Terciário”. Teve como seu principal autor Fisher. Para quem, as atividades econômicas se classificariam em primárias, secundárias e terciárias. E para este autor o setor de serviços se caracterizaria pela produção de bens imateriais. Neste trabalho, setor de serviços equivale às idéias de Clark que entende o setor de serviços também pela existência da divisão da produção econômica em três setores, mas acrescenta a expressão “Serviços” por ser mais adequada para expressar a gama de atividades nele incluídas (IPEA, 1998).

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quantitativamente relevante, no que se refere a geração de renda e do emprego,

pode estar associada tanto a uma economia de serviços moderna, própria a

economias em estágio avançado de desenvolvimento, como pode ser o resultado de

uma economia de um setor de serviços composto, em maioria, por atividades

tradicionais, portadoras de baixos níveis de produtividade e refúgio para mão-de-

obra de baixa qualificação. Em suma, ter um setor de serviços quantitativamente

representativo não expressa, modernidade econômica (IPEA, 1998).

Assim, as economias subdesenvolvidas podem apresentar um setor terciário

inflacionado, devido a elementos estruturais como a concentração da propriedade

fundiária e a incapacidade do desenvolvimento industrial de absorver camadas da

população que foram expulsas do campo. Dentro dessa perspectiva podemos

assinalar que, grande parte dos setores tradicionais de serviços seria a única

possibilidade de ocupação de amplas camadas da população brasileira, portadores

de baixa qualificação, significando, conseqüentemente, subemprego e exclusão

social.

No Brasil, essa realidade não foi diversa. A mudança estrutural operada em

nível internacional teve trajetória similar em nosso país. A evolução das atividades

no setor de serviços se deu, sobretudo na década de 1970 com a industrialização e

o seu corolário, que acarretaram um sensível crescimento do setor de serviços,

alterando significativamente a estrutura econômica nacional. Pode-se dizer que foi

uma evolução positiva, tanto do ponto de vista do emprego, tanto quanto da renda,

ainda que essa expansão tenha se dado de forma diferente do avanço da

terceirização em outras economias, nos aspectos de ocupação da mão-de-obra,

produtividade e preços (IPEA, 1998).

A tendência geral de expansão desse setor, visível para a totalidade das

economias nacionais e acelerada a partir da década de 1960 acompanhou um

fenômeno, que se tornou importante nas análises do setor de serviços: a elevação

dos preços relativos. Tal fato é explicado, pela constatação de que, por se tratar de

atividades intensivas de trabalho e encontrar dificuldades para a sua substituição, a

produção de serviços encontra fortes barreiras no tocante ao avanço de

produtividade. Dentro desse cenário, a uniformização dos salários reais na

economia, acompanhada de uma relativa inelasticidade-preço dos produtos de

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serviços, implicaria no crescimento dos seus preços. Essa elevação dos preços no

setor de serviços carrega implicações para a mudança estrutural do setor, que se

expressam à substituição de inúmeros serviços pessoais pelos chamados auto-

serviços (self services) ou por bens, muito embora, alguns setores não sejam

passíveis de substituição pelas máquinas ou auto-serviços. Em alguns países esses

serviços são prestados pelo Estado, e a elevação de seus custos, muitas vezes tem

sido utilizada como explicação para a crise do Welfare State nas economias da

Europa Ocidental.

No tocante a situação do emprego no setor de serviços, verifica-se, segundo

dados do IPEA (1998), que o crescimento desse setor da economia foi a principal

mudança estrutural ocorrida a nível mundial, nas últimas décadas. Em todos os

países ocidentais, o emprego no setor de serviços expandiu-se extraordinariamente.

Nos Estados Unidos, por exemplo, a participação cresceu em 10% (dez por cento),

no Japão 13,5% (treze e meio por cento) e na Alemanha aumentou 14% (quatorze

por cento). No caso do Japão, esse crescimento se deu em detrimento do setor

agropecuário, enquanto nos casos alemão e norte-americano, o crescimento se deu

pela retração do setor industrial (IPEA, 1998).

No Brasil, a expansão desse setor também é um fato, desde o avanço do

processo de industrialização por substituição de importados, nos anos de 1940. A

industrialização, segundo Almeida e Silva (1993), trouxe um crescimento da força de

trabalho nas atividades do setor de serviços, principalmente, naquelas em que há

menos exigência quanto à qualificação, caracterizando esse setor como importante

absorvedor de mão-de-obra pouco qualificada. A importância desse setor, no século

atual, é explicado por dois processos: 1) no desenvolvimento brasileiro, a expansão

agropecuária e industrial exigiu aumento das atividades de distribuição de

mercadorias e serviços financeiros, ramos intimamente ligados à produção de bens.

A expansão desses serviços se configuraria em uma resposta às necessidades de

construção dos segmentos modernos; 2) a urbanização de países periféricos,

acompanhou, de modo geral, o aumento da força de trabalho no setor de serviços e

na construção civil, devido à expulsão da mão-de-obra, como resultante da

substituição de antigas por novas técnicas nos setores arcaicos e a incapacidade de

geração de postos de trabalho pela indústria de transformação. Dessa forma, a

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entrada de imigrantes, com baixo grau de qualificação, se deu nas atividades mais

tradicionais do comércio e na prestação de serviços pessoais.

O crescimento do setor de serviços, junto com a expansão de novos modelos

de gestão do trabalho resultam em novas formas de controle que incidem,

diretamente, no perfil dos trabalhadores exigido pelas empresas, bem como no

maior controle da subjetividade e emoções dos mesmos.

Assim, o surgimento de um novo perfil do trabalhador associa-se a uma

estrutura nova de controle da força de trabalho. O trabalho se subordina ao capital

no contexto da produção flexível e se diferenciava sua quase totalidade, das formas

adotadas durante os regimes tayloristas-fordistas.

As novas tendências advindas da nova organização do trabalho na década de

1990, apesar de suas especificidades setoriais, mostram que existem inúmeras

convergências entre os setores. Principalmente, no que se refere à redefinição da

divisão do trabalho que deu origem ao trabalho polivalente em distintas formas, e à

emergência de novas exigências quanto à formação – com a introdução de

treinamento técnicos mais formais, em face da antiga formação adquirida na prática

(INVERNIZZE, 2000).

Pesquisas realizadas nos diversos setores conferem relevância ao que os

empresários denominam como “atitudes pessoais” e formais de comportamento em

relação ao trabalho, a exemplo: da responsabilidade, do nível de envolvimento com

a empresa, cooperação, disponibilidade, confiabilidade, iniciativa e facilidade de

adaptação ao trabalho em grupo. Tais habilidades têm se tornado tão importantes

quanto a qualificação técnica no momento da contratação e manutenção do

emprego.

Esse novo perfil do trabalhador tem se redefinido junto ao perfil técnico.

Observa-se, por exemplo, que a onda de demissões que afetou a indústria, foi

extremamente seletiva, tanto técnica quanto politicamente. Trabalhadores com

menor nível de escolaridade, maior envolvimento em sindicatos e menor adaptação

às “novas filosofias” de produção foram os mais atingidos pela onda de demissões

(INVERNIZZE, 2000). A sofisticação dos processos de admissão de novos

funcionários inclui não apenas o antigo psicoteste, mas também testes psicológicos

que avaliam atitudes comportamentais desejadas pela empresa, assim como

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pesquisas sobre o passado do candidato. Outro aspecto observado é a transmissão

de valores, dada através de palestras e treinamentos comportamentais: o

surgimento de novas funções como “líderes” e “facilitadores” que ocuparam o lugar

dos supervisores. Esses processos visam padronizar o “comportamento” dos

trabalhadores. Não se adotam mais formas coercitivas, já que o líder, ao repassar a

“filosofia” da empresa, será o mesmo funcionário a avaliar o candidato

individualmente, tanto no seu perfil comportamental, quanto na sua performance

produtiva. Existe ainda o benefício da participação nos resultados que são ganhos

que visam melhorar a qualidade de vida do trabalhador e da sua família, mas que

estão atrelados ao cumprimento de metas, a serem cumpridas pelo trabalhador ou

por sua equipe e que, em geral, usam do envolvimento da sua família. A busca de

mão-de-obra dócil em outras regiões tem se caracterizado como uma tendência à

descentralização industrial, ou seja, as empresas passam a buscar em outras

regiões, fora do ABC paulista, por exemplo, uma força de trabalho vazia de

participação do ramo industrial e da participação sindical e, principalmente, esteja

ávida pela inserção no mercado de trabalho, o que facilitará a adesão as novas

formas produtivas (INVERNIZZE, 2000).

As diversas formas de controle dos trabalhadores vêm trazendo, ao longo dos

anos, sérias conseqüências para o bem-estar e a saúde do trabalhador. Queixas

freqüentes de cansaço e esgotamento mental, tristeza e sentimentos de impotência,

face às exigências da organização do trabalho são enfáticos, e explicitam a

associação com os componentes da atividade, evidenciando o peso da organização

do trabalho no desencadeamento dos sintomas.

As formas de organização do trabalho estabelecem uma íntima relação com o

indivíduo. Se essa organização afasta o trabalhador do poder de decisão, prejudica

ou impede que ele desenvolva estratégias para adaptar o trabalho à sua realidade,

são gerados sentimentos de insatisfação e inutilidade, interferindo na motivação e

nos desejos, reduzindo o desempenho do indivíduo. A rigidez das organizações

pode gerar perturbações na relação do trabalhador com a sua tarefa, bloquear o uso

pleno de suas capacidades e "automatizar" o pensamento. Estudos como os de

Vilela (2004) mostram, casos freqüentes de sintomas depressivos e sensação de

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fadiga no interior de setores como o de teleatendimento, com efeitos na vida

extratrabalho.

Segundo pesquisa de Vilela (ibidem), no setor de teleatendimento, para atingir

a determinação da ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações) de garantir

que 95% (noventa e cinco por cento) das chamadas sejam atendidas em menos de

dez segundos, ao invés de adequar em numericamente o efetivo de trabalhadores, a

empresa estipula que, pelo menos 90% (noventa por cento) dos atendentes, não

deixem o usuário esperar mais de dez segundos. Os mecanismos de controle

implementados para garantir a meta citada são: (a) cálculo em situação real do

tempo de atendimento, que servirá para outro cálculo: o Tempo Médio de

Atendimento (TMA), utilizado para a avaliação individual do teleatendente; (b)

cálculo diário e mensal da porcentagem do efetivo que não deixa o cliente esperar

mais de dez segundos na linha.

Apenas no mês de janeiro, o conjunto de teleoperadores não conseguiu, pela

média estabelecida, atingir a meta de TMA de 25 segundos no setor de auxílio à

lista. Do ponto de vista da saúde, alcançar essa meta torna-se preocupante,

considerando que as demandas são variadas e as condições materiais de trabalho

inadequadas (ruído, mobiliário, espaço físico). Ou seja, alcançar a meta, significa

responder às exigências de qualidade em um quadro temporal incompatível. O que

indica o esforço empreendido pelo coletivo dos trabalhadores para garantir as metas

e pode estar associado às queixas de cansaço e doenças relatadas.

Se o trabalhador não ultrapassa o limite do TMA, recebe dez pontos na

avaliação. Até dez segundos além do prescrito resultam na perda de dois pontos,

até vinte segundos penalizam o atendente em cinco pontos. Além dos vinte

segundos, ocorre uma punição de nove pontos na avaliação de desempenho do

atendente.

Entre as formas de controle da subjetividade dos trabalhadores, no caso das

empresas de teleatendimento, segundo Vilela (2004), independentemente das

palavras agressivas do cliente, o teleoperador deverá seguir um padrão de frase e

manter uma entonação de voz pré-determinada pela hierarquia, não diretamente

envolvida na execução da atividade.

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A empresa não controla apenas a forma como o atendente deve se

pronunciar em relação a cada serviço, mas também a entonação de voz, com o

objetivo de impedir manifestações emocionais por parte do operador, tentando tornar

a linguagem um simples instrumento de trabalho e moldando o afeto do indivíduo

para ser gentil, sem permitir o prolongamento do diálogo.

A resposta pré-formulada, cuja utilização correta é rigidamente avaliada nos

formulários da monitoria de qualidade, estabelece a frase a ser pronunciada no início

e a frase a ser pronunciada no final da ligação. A justificativa dos gestores está no

beneficio da homogeneização dos atendimentos. E a pontuação para a avaliação

dos trabalhadores, se referem à fraseologia, cordialidade, objetividade e

fornecimento de informações exatas.

Existem frases pré-formuladas para dar resposta a qualquer possível motivo

que o cliente apresente para solicitar o cancelamento. Em situação real, não há

como ser permanentemente fiel a ele, pois as situações variam. Certas solicitações

nunca foram apresentadas e não estão previstas. Por prestar serviços para

diferentes cidades e estados, o teleatendente tem de lidar com diferenças de

linguagem, sotaques, endereços desconhecidos e uma série de diferenças culturais

regionais, mantendo a fraseologia padrão.

Mesmo o comportamento e a disciplina são controlados, atribuindo-se pontos

a eventuais atrasos no início da jornada ou ausências ao trabalho. A qualquer atraso

são perdidos dois pontos, mas a qualquer ausência são perdidos todos os seis

pontos referentes ao critério de avaliação da assiduidade.

A livre movimentação no setor de teleatendimento é restringida pela

necessidade de se manter ligado ao posto de trabalho com pequenas interrupções

ao longo da jornada: não é permitido ficar em pé em sua “célula”20, mesmo que o

organismo do atendente não esteja mais suportando a posição sentada por horas

consecutivas.

Assim, percebemos que estamos assistindo a um processo de readequação

da estrutura de controle da força de trabalho, com o objetivo de garantir a

manutenção da extração do trabalho excedente, dentro de um novo contexto de

20 Nome dado ao espaço de trabalho de cada atendente.

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acumulação. Essa nova estrutura não se baseia somente nos aspectos já

mencionados, como também encontra-se intrínseca na organização do trabalho.

A automação, que substituiu a mecanização, se tornou um importante

mecanismo de controle, já que as máquinas são capazes de registrar o número de

intervenções feitas pelos trabalhadores, assim como a “qualidade” do trabalho feito.

Estes mecanismos garantem a “autonomia” do trabalhador, tornando-o

“responsável”, sempre direcionado para o bom funcionamento da empresa.

Os novos modelos inspirados no Japão como os PQTS – programas de

qualidade total (redução a zero dos desperdícios materiais e humanos) transferem

ao trabalhador, o controle dos outros membros da equipe para a obtenção das

metas de produção, que atingem os salários. O controle não se dá mais de forma

direta e coercitiva como no taylorismo, ele se dá via organização do trabalho,

fundado no autocontrole e no controle intertrabalhadores.

O Estado desempenha seu papel no apoio as novas formas de utilização da

força de trabalho, bem como no seu barateamento e desorganização coletiva. O

Estado garante a flexibilização das leis trabalhistas, as práticas de subcontratação e

contratação temporária, minimizando sua participação na reprodução da força de

trabalho dentro da saúde, educação, segurança, entre outros. Assume uma posição

ofensiva em relação aos sindicatos, limitando os direitos trabalhistas, e, ao mesmo

tempo, exercendo sua função ideológica, através do discurso da empregabilidade,

no qual, o emprego e a qualificação são atribuídos como responsabilidade individual

do trabalhador.

O papel do mercado também é forte nesse processo, no momento em que o

desemprego e as formas precárias de contratação exercem um forte controle sobre

os trabalhadores que, na ânsia de manter seu emprego, se comprometem a fazer

horas extra, a controlar a si e aos outros funcionários, o que acarreta na

desorganização coletiva dos trabalhadores.

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2.3.3 Sociedade de consumo: contradição em processo entre consumo de

massa e especialização

Todas essas modificações no mundo do trabalho geram modificações

também na vida das pessoas. Os homens e as mulheres do século XX, do mundo

“globalizado” e urbano são pessoas com costumes e hábitos diferentes dos homens

e mulheres de 50 (cinqüenta) anos atrás. Assim, tal ritmo trouxe novas formas de se

deslocar, vestir, comer, consumir. O ritmo de vida acelerado impõe a necessidade de

se optar por comodidade e rapidez em todas as dimensões da vida.

O mundo atual gira em torno do consumo. As pessoas buscam satisfazer

suas necessidades básicas de alimentação, vestuário, moradia, medicamentos de

forma eficiente e rápida. Precisa-se de produtos que são consumidos por uma razão

de sobrevivência. Ao mesmo tempo, existem as necessidades complementares,

mais ou menos intensas, de serviços, de educação, de saúde, de justiça, de lazer,

de transporte, de saneamento, de segurança.

Portanto, há também a necessidade de serviços que tornem a sobrevivência

mais longa e confortável. Mais existe ainda o desejo e o interesse ilimitados, de

produtos e serviços, úteis ou supérfluos, que faz com que na sociedade atual os

indivíduos tornem-se consumidores com intensidade e velocidade proporcionais ao

crescimento da população mundial e das riquezas que esta consegue gerar. O

consumo crescente faz com que essa nova sociedade seja denominada “sociedade

de consumo21”.

O "ter" vai se tornando progressivamente mais importante do que o "ser", os

valores expressam a contradição que está na base da sociedade e estes tornam-se

cada vez mais contraditórios.

As empresas dos ramos de alimento e vestuários, dentro dessa nova

sociedade de consumo, contam com as empresas de prestação de serviços, como

por exemplo, os veículos de massa (jornais, revistas, redes de tv e rádio) para a

imposição de novos hábitos e costumes. Através das propagandas, assiste-se a

criação da necessidade do uso de novos produtos.

21 Também aqui se dá uma contradição da sociedade capitalista. Pois ao mesmo tempo que cresce a capacidade de consumo de alguns, cresce também, na mesma proporção, a impossibilidade de consumo da maioria da população, uma vez que aumenta a concentração da riqueza.

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A associação entre esse modelo de produção em série, adotado peIas

indústrias, e as empresas de prestação de serviços caracteriza esta nova sociedade

de consumo. Esse termo designa a atual sociedade moderna, urbana e industrial,

dedicada à produção e aquisição crescentes de bens de consumo cada vez mais

diversificados (ARANHA, 1993).

Para a sobrevivência da lucratividade dessa sociedade é essencial que sejam

criadas necessidades de uso de novos produtos, pois, logo que um produto aparece

no mercado, ele deve ser consumido intensamente e, em seguida, substituído por

outro.

A questão central está na criação da necessidade de tal produto. A formação

da opinião pública se realiza através dos meios de comunicação, que ditam o que a

sociedade vai escolher, possuir e usar – incutindo nas mentes a necessidade do uso

de novos produtos. Fica claro que não é a tecnologia que se adequa às novas

necessidades, mas sim as necessidades que são criadas para atender à crescente

produção e à produção cada vez mais diversificada dos bens de consumo.

O processo de formação de opinião transforma a opinião pessoal através da

influência dos meios de comunicação de massa. Então, em que a produção de bens

de consumo difere da produção artesanal? As diferenças não ficam somente nas

mudanças dentro da fábrica, nas mudanças do artesão para o operário, nas

mudanças do poder de decisão do artesão para o proprietário da indústria. Há

também uma mudança no usuário final do produto, ou seja, no consumidor. Ao

adquirir um bem produzido em série, o consumidor nada sabe sobre quem o criou e

não tem com ele vínculo cultural ou afetivo, como ocorria, por exemplo, com um

objeto de arte (ARANHA, 1993).

Os indivíduos buscam a felicidade e a satisfação de suas necessidades e as

empresas, o lucro. Dessa forma, as empresas entram no mercado para vender essa

“felicidade” e satisfação. Nos reportando, aos fast foods, veremos que em ambientes

como aqueles das lanchonetes McDonald's as pessoas afirmam se sentirem em

outro lugar, esquecem do mundo lá fora, vivendo uma espécie de “felicidade”, em

um ambiente, limpo, padronizado, colorido, climatizado.

Em uma sociedade de consumo, ter dinheiro significa poder consumir e é

sinônimo de busca de felicidade e status. O produto passa a identificar o individuo

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socialmente. Os produtos adquiridos pelas classes mais altas, não são os mesmos

adquiridos pelas camadas populares. A compra de um produto tido como importante

pelo grupo social ao qual o consumidor pertence produz uma imediata sensação de

prazer e realização e, geralmente, confere status e reconhecimento a seu

proprietário. Quando o novo vai-se desgastando, o vazio ameaça retornar. E para

evitar isso, a solução padrão do consumidor é se concentrar em uma próxima

compra promissora, na esperança de que a satisfação seja mais duradoura e mais

significativa (ARANHA, 1993).

A sensação de vazio que se apossa do consumidor é um dos aspectos do

individualismo e isolamento, que o caracteriza. Contrapondo-se ao vazio interior,

está a aparência de segurança e de realização.

Esse mundo fantástico de satisfação das necessidades de aceitação social,

de realização pessoal e mesmo de conforto físico, mediante o consumo constante, é

elaborado pelos meios de comunicação de massa e pela indústria de propaganda.

Assim, um indicador claro do sucesso do consumismo é a propaganda.

Como em uma sociedade de consumo sempre haverá, por mais que

consumamos um novo produto, ou uma nova tecnologia a ser lançada, algo melhor

do que o que acabamos de consumir, somos obrigados a conseguir mais dinheiro

para satisfazer nossas novas “necessidades". É essa a engrenagem principal que

faz a economia girar e que torna ilusória a busca da felicidade por meio do consumo.

Isso tudo nos faz questionar: de quem é verdadeiramente a necessidade que

estamos atendendo enquanto consumidores?

À primeira vista, a sociedade de consumo parece ser a sobreposição de duas

realidades bem distintas e desiguais. De um lado, encontram-se os produtos ligados

à boa qualidade de vida, ao acesso à saúde de qualidade, ao saneamento, aos

ambientes climatizados de acordo com as necessidades regionais. De outro lado,

vê-se a poluição, principalmente nas regiões mais industrializadas, a mão-de-obra

barata nos países de terceiro mundo como o Brasil, onde a maior parte da

população trabalha desde a infância até a morte, sem higiene, saúde, abrigo e

alimentação adequados à dignidade do ser humano.

Nesta sociedade do consumo o tempo se tornou um recurso escasso, as

famílias já não possuem tempo para reunirem-se na hora do jantar, nem mesmo na

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hora do almoço. O trabalhador já não consegue sequer descansar no horário do

almoço, com o cotidiano cada vez mais corrido. Vemos gestarem-se novas formas

de se relacionar, novos hábitos e costumes e temos nos fast foods o seu maior

expoente.

O surgimento dos fast foods no Brasil data da década de 1950, no Rio de

Janeiro, com o americano Robert Falkenburg, ex-campeão de tênis que vendia

exclusivamente sorvete de baunilha, com máquinas e receitas trazidas dos Estados

Unidos. Mas, o maior representante da rede de fast food no Brasil é o Mcdonalds

que surge no país, em 197922. Para se entender a proporção do crescimento do

mercado desde então, a rede americana sozinha (em dados de 2005) emprega

cerca de 34.000 (trinta e quatro mil) funcionários e possui em operação 1.146 (um

mil cento e quarenta e seis) pontos de venda, sendo 544 (quinhentos e quarenta e

quatro) restaurantes, 602 (seiscentos e dois) quiosques e 49 (quarenta e nove)

unidades de McCafé. Atualmente, o Brasil é o 8º (oitavo) maior mercado da

empresa.

Segundo o discurso empresarial as principais vantagens do sistema de

franquias são: expansão, velocidade, popularização, rapidez, dinamismo, solidez,

sucesso. Esse sistema pode propiciar ao detentor da "marca" uma maior velocidade

espaço-tempo, isto é, em um menor tempo ganham mais espaço (através da

abertura de vários pontos de venda). Por tudo isso, esse sistema vem apresentando

elevado índice de crescimento e aceitabilidade pelas empresas, afinal, atualmente, a

busca pela expansão (extração da mais-valia), torna-se prioritária, norteando todo o

mundo dos negócios.

A “mundialização” tem sido um forte aliado dessa nova forma de consumo,

como por exemplo, o uso das telecomunicações e da informatização que são de

fundamental importância nesse processo, pois articulam as redes de franquias,

diminuindo as distâncias e promovendo uma nova regionalização do espaço,

conforme o interesse capitalista, já que as lojas estão alocadas em áreas

estrategicamente selecionadas.

O atual modelo de reprodução do mundo capitalista tem nos levado a uma

nova perspectiva do tempo e do espaço, governada pelo tempo produtivista. Os

22O Mcdonalds surge nos EUA em 1930. A este respeito (CF. FONTENELLE, 2002).

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objetos são reduzidos a signos, criando modelos para manipular pessoas e

consciências e o tempo também passa a ser severamente gerenciado. A

normatização dos gostos passa a ser fundamental, para que esse modelo de

produção continue a se reproduzir.

No fast food a produção e a troca, o administrável e o tecnológico passam a

fazer parte de um mesmo processo; essas transformações no processo produtivo

conduzem o mercado, o gosto, a necessidade e passam a requerer um novo tempo

e um novo espaço. Assim, todas as mudanças ocorridas no âmbito da produção e

do consumo acabaram reprogramando o cotidiano das pessoas.

A distância-tempo necessária para se ir e vir da casa ao trabalho tem

aumentado, principalmente nas grandes metrópoles, o que leva algumas pessoas a

se adaptarem ao que o ambiente próximo lhes oferece. Neste sentido, as

lanchonetes se mostram como alternativas a esse processo, oferecendo refeições

rápidas. Esse novo estilo de comer passa a ser uma opção imposta pelo próprio

modo de vida, pela sua adequação e comodidade. Isto se torna evidente se

observarmos o cotidiano das pessoas que, devido às mudanças no mundo do

trabalho, não têm mais tempo a perder. As novas formas de trabalho, baseadas na

produtividade, não permitem horários extensos para as refeições, que passaram a

entrar em sintonia com as novas exigências da sociedade. A padronização tornou-se

condição para a crescente aceleração do movimento dentro das cidades e nossa

paisagem foi modificada, pois os produtos mundializados, com seus símbolos e

"marcas" ocuparam o espaço nacional, tornando-o mundial.

O setor de alimentação fast food passou assim, a caracterizar a modernidade,

pois o ato de comer ganhou, a partir dele, funcionalidade e mobilidade, não se

identificando mais com o território, mas se adaptando às circunstâncias que a

mundialidade impõe.

Neste sentido, o fast food carrega consigo, além de uma "marca" forte, um

"produto" que tem um "uso" pré-determinado: ele vem pronto e acabado, é igual em

todos os pontos de vendas e, no local em que se instala, ele dita as regras: quem vai

consumir, como vai consumir.

Atualmente, assiste-se a uma intensificação das relações sociais em escala

global. A tecnologia propicia novas relações espaço-tempo, o local e o global se

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confundem, inibindo o nacional, e fica-nos cada vez mais difícil identificá-los. No fast

food essas relações mundiais são nítidas, já que a homogeneização dos gostos está

sendo concretizada a largos passos e as ligações íntimas com o nacional estão

sendo abolidas.

A estratégia tecnológica é de grande peso no fast food. É nela que se

concentra a capacidade de desenvolverem novos produtos e serviços de modo

contínuo, aperfeiçoando os procedimentos. Ela é a própria garantia para que a

empresa se torne competitiva, pois o sucesso dessa estratégia resulta no sucesso

da própria empresa, sendo ela que instrumentaliza todas as demais. Nesse sentido,

a generalizada aplicação da gerência científica propicia a revolução técnica, não só

na indústria como no comércio. As transformações geradas pelo gerenciamento são

fundamentais para a estruturação, funcionamento e controle das redes de franquias.

Ortigoza (1997), em pesquisas, nos coloca que as empresas de fast food

possuem grande capacidade de gerar o novo, isso é um processo inerente ao

capitalismo, e é desse modo que a escolha do sujeito, vai se esvaziando: o que

existe é uma criação industrial da necessidade.

A gerência científica (característica do taylorismo), planejada e articulada,

penetra nesse sistema e a manipulação e a padronização do gosto passam a ser as

expressões dessa dinâmica. Tal gerenciamento reduz o caráter autônomo da

demanda, e é nesse sentido que a busca do controle do mercado pelas empresas

faz com que, não só os consumidores sejam induzidos, como também o próprio

território se torne dominado. A partir do sistema de franquias, a produção planejada

passa a estar presente como nunca nas formas urbanas, através da padronização

das fachadas. Com essa formatação das redes desenvolvem-se condições materiais

capazes de permitir que a racionalidade da mercadoria, através do produto-marca,

se estabeleça e o valor de troca sobressaia (ORTIGOZA, 1997).

A mão-de-obra no fast food é especializada, porém, é o treinamento e o

formato do negócio que a torna assim. Nela, o funcionário é "moldado" segundo as

características e objetivos da empresa. Nesse sentido, aproveita-se geralmente a

mão-de-obra local, locomovendo-a para outra unidade em funcionamento, durante

um período de estágio, para que não se perca a "identidade" do serviço oferecido.

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Pelo peso da padronização, os funcionários das lojas devem abandonar sua

subjetividade, pois tudo lhes é imposto: cada gesto e cada minuto seguem um

padrão, toda operação de trabalho é de antemão, concebida pela gerência,

projetada, medida, ajustada com adestramento e padrões de desempenho. Os

resultados são pré-calculados antes que o sistema seja posto em movimento. Cada

trabalhador, assim, como as máquinas, é um dos seus membros e por isso precisa

ser bem controlado. O trabalho se torna rico em mesmice e pobre em criatividade.

Através desse sistema operacional rígido, altamente disciplinado, assegura-se

o padrão de qualidade. Os equipamentos são sob medida para agilizar o serviço, o

cardápio é limitado, as técnicas de produção são refinadas, divididas em

procedimentos detalhados, com o objetivo de poupar tempo. A máquina substitui o

principal obstáculo ao serviço "idêntico" do fast food - o elemento humano. Afinal,

acabaram descobrindo como atender à principal característica e exigência do fast

food: a velocidade.

Esse ritmo combina muito bem com a sociedade atual e com as necessidades

que lhe são impostas pelo modo de produção. A cozinha deixa de ser considerada

uma arte pessoal e se especializa, tornando-se industrial e comercial, perdendo a

criatividade e a identidade. Com todo esse formato moderno, o fast food torna-se um

lugar impessoal. Desta forma, nos fast foods mesclam-se formas de gestão do

trabalho antigas e novas, mesclam-se o mais cruel taylorismo com elementos do,

moderno e não menos cruel toyotismo.

Perceber o taylorismo e o toyotismo mesclados parece-nos uma perspectiva

bastante oportuna para o que estamos pensando no momento sobre o fast food: um

espaço que é símbolo da modernidade.

O mundo atual tem como característica mais evidente a chamada vida urbana

e, portanto a vida comercial tem chamado à atenção devido ao surgimento das

novas formas comerciais para atingir a população crescente das cidades. A indústria

foi produzindo uma gama diferenciada de objetos que fez necessária, uma nova

articulação de espaço - tempo para que a produção, distribuição e o consumo se

realizassem (ORTIGOZA, 1997).

Não obstante, as empresas de fast food estão sempre localizadas de forma

estratégica, sua localização passa por uma seleção rigorosa e a escolha do seu

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ponto comercial é de muita importância para essas redes. Tomemos como exemplo

o Mcdonalds. Pode-se dizer que ele possui uma espécie de monopólio

administrativo, os seus pontos de venda elevam a renda fundiária propiciando lucros

acima dos padrões. Dessa forma, o ponto comercial passa a ser não só uma

atividade comercial, mas um empreendimento imobiliário e a localização ganha

maior importância, sendo uma estratégia que propicia valor, gerando lucro.

O Mcdonalds domina o ponto, as normas de funcionamento, a produção e a

marca, ficando a autonomia do franquiado praticamente nula. Esse controle da

padronização comercial faz com que a empresa alcance o verdadeiro processo de

racionalização produtiva do espaço.

Dessa forma, as cadeias de fast food se localizam em pontos de grande

rotação de pessoas, principalmente em locais onde se busca a velocidade, o

movimento incessante de pessoas que não têm tempo para pensar, para descansar,

elas apenas “comem” e “bebem” algo que lhes dê a oportunidade de não sair do seu

ritmo. Por isso, a resposta das pessoas é sempre positiva ao serem indagadas sobre

qual a sensação de estar nesses estabelecimentos, pois criou-se a necessidade, a

necessidade gera o desejo, formando um par dialético (ORTIGOZA, 1997).

Assim, casam-se os interesses do fast food (vender rápido) e do cliente

(comer rápido). Além disso, esses lugares possuem um forte poder de concentração

e seleção da clientela. Segundo Pintaud (apud ORTIGOZA 1997, p. 18):

O ambiente artificial criado nesses locais leva o consumidor a pensar que os problemas sociais são externos. Ali, o luxo e o aconchego prevalecem e isso propicia bem estar, gerando prazer ao público que freqüenta esses locais.

Parece evidente, que o espaço produzido por esse sistema é condição para

que ele continue se desenvolvendo, ou seja, é a partir da multiplicação desses

espaços no território “nacional” que ele produz o “mundial”, característica forte do

sistema de franquias que, por estar presente em todas as fases do processo de

produção, detêm maior poder sobre os seus objetivos, afinal seu know how é

produtivo, administrativo e comercial, padronizado e homogeneizante.

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Segundo Ortigoza (1997), com toda essa padronização e normatização

presentes no sistema de franquias, o espaço torna-se também produto. Os

elementos como a padronização, normatização, homogeneização e velocidade

(características do taylorismo) criam “espaços-símbolos”, ou seja, imagens que

operam no sentido de reproduzir o lugar, segundo a ideologia desse sistema.

Provocando rápidos processos de adesão a novos costumes, idéias, mitos e

desejos, provoca também a cristalização de novas formas urbanas e vice-versa

criando novos processos sociais. Mesmo tendo nos referido, a todo momento, à

globalização dos gostos, gostaríamos de complementar dizendo que a globalização

se realiza também através da diferenciação, pois a globalização é, ao mesmo

tempo, a fragmentação, a padronização e a diferença; o local e o global não se

contrapõem. Ao contrário, são faces de um mesmo processo.

Assim, as alterações nos processos de trabalho não são feitas de forma

brusca. Elas se dão de forma gradual e sutil. Somente após atingir certo grau de

amadurecimento é que as relações permitem mudanças, como se deu no caso das

franquias no Brasil.

A franquia pode ser vista também como um estágio do capitalismo atual, que

controla as informações e a mídia, o ritmo frenético de inovação das idéias, se

constituindo em uma poderosa estratégia de dominação. Hoje, o fast food é

responsável pelas maiores alterações nos valores e comportamentos da sociedade

brasileira de consumo atual (Ortigoza, 1997). É o segmento mais globalizante, pois

introduziu hábitos em sintonia com o tempo produtivista exigido pelo nível de

reprodução do capitalismo mundial. Há algumas décadas abandonar a comida de

casa, com a família, comer em pé, eram hábitos inconcebíveis para os brasileiros.

Hoje, assiste-se a um novo tempo urbano e o fast food tornou-se uma

necessidade das grandes cidades. É um sistema de massa que atinge um mercado

maior, ultrapassa costumes e tradições e visa atender à necessidade atual da

velocidade. Permitiu a passagem da cozinha tradicional para a cozinha industrial

diversificando, em um primeiro momento, os produtos nacionais, para depois

padronizá-los e homogeneizá-los em nível mundial. Essa forma de alimentação, traz

consigo o modo americano de viver, está impregnado da ideologia, dos costumes e

do modo de vida americano. Esse país é responsável por costumes que se

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difundiram pelo mundo, alterando comportamentos: estar em um fast food é estar

em um lugar que representa o centro do mundo. É pelo lugar que o “mundial” é

empiricamente reconhecido.

Assim, o sistema de fast food introduz uma nova forma de produzir, no qual a

empresa é a detentora e controladora absoluta de todas as fases do processo de

produção, desde a sua fabricação, distribuição e comercialização. Algumas

empresas de franquias repassam a fase de industrialização dos produtos às

chamadas terceirizadas, mas no caso do nosso objeto de estudo o Restfood ainda

não expandiu sua franquia para além da cidade do Natal, mas esse já é um objetivo

da empresa. E como toda empresa, possui seu caráter massificador, afinal, seu

produto passa por rigorosas exigências e testes de qualidade, pois é sua “marca”

que está em jogo (BENEVIDES, 2006).

A marca é um signo de identificação e construção simbólica, que serve para

inscrever, representar e diferenciar produtos e serviços dentro do mercado.

Sua trajetória genealógica está apoiada na prática medieval da cultura

heráldica, cujo nascimento se dá com o aparecimento das armas e dos brasões no

século XII, na Idade Média. A heráldica fixou as bases de uma “civilização da

marca”, que designa um balizamento estratégico, uma estrutura ordenada, uma

forma de classificar, hierarquizar, valorizar e destacar. Ou seja, como o brasão, a

marca serve para diferenciar aquilo que é uniforme e idêntico, tal qual a armadura

dos cavaleiros e os próprios cavaleiros na Idade Média. Hoje, por exemplo, as

roupas dos indivíduos e os próprios indivíduos desvelam e representam o papel da

marca, na contemporaneidade: inscrever uma diferença de ser e aparecer.

A palavra brand, que em português quer dizer marca, é de origem anglo-

saxônica, e vem de brandon, que é o instrumento empregado para marcar o gado a

ferro quente. Sem nenhum exagero metafórico, podemos dizer que o marketing se

utiliza do conceito da marca para revelar pertencimento e propriedade, com intuito

de fixar no imaginário do mercado, a marca como um sujeito singular na mente dos

consumidores, que são vistos e tratados como objetos a serem marcados pela sua

produção emblemática (BENEVIDES, 2006).

Neste caso, a idéia de emblema expressa um sentido de manipulação

psicossociológica do consumidor, podendo ser representada sob as mais variadas

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manifestações (brasões, insígnias, nomes, slogans e logotipos), imprimindo a marca

como um elemento de essência, de interioridade, vetor tradicional da adesão e da

incorporação, que atribui valor e sentido a algo / alguém através de um efeito de

submissão.

Investigando-se a etimologia da palavra emblema, observa-se que esta vem

do termo grego emballô, que significa literalmente “lançar no interior”. Isto é, remete

a ritualidade, ao vínculo com a referência, o preenchimento de uma identidade. As

marcas se apresentam em uma relação de poder (força) que “colam” o “sujeito”

(consumidor) à identidades temporárias, (des)construindo sua legitimidade e

existencialidade através de um incessante processo de desfiliação simbólica.

A máxima moderna é uma só: pagando bem, que mal tem? A sociedade consumidora, a que tem dinheiro, a que produz, não pensa em mais nada além da imagem, imagem, imagem. Imagem, estética, medidas, beleza.Nada mais importa. Não importam os sentimentos, não importa a cultura, a sabedoria, o relacionamento, a amizade, a ajuda, nada mais importa. Não importa o outro, o coletivo. Jovens não tem mais fé, nem idealismo, nem posição política. Adultos perdem o senso em busca da juventude fabricada. Ok, eu também quero me sentir bem, quero caber nas roupas, quero ficar legal, quero caminhar correr, viver muito,ter uma aparência legal, mas... Uma sociedade de adolescentes anoréxicas e bulímicas, de jovens lipoaspirados, turbinados, aos vinte anos não é natural. Não é, não pode ser. Que as pessoas discutam o assunto. Que alguém acorde. Que o mundo mude. Que eu me acalme. Que o amor sobreviva [...] (HERMAN, 2006, p. 1)

Na sociedade consumida pelas marcas, o consumidor não é mais sujeito, pois

lhe é negado o estatuto da singularidade. O que lhe resta é portar uma identidade

transitória, líquida, revogável e coletiva, a busca frenética pelo consumo, sendo

gravada na sua mente a idéia de que para “ser” é preciso ter; uma servidão

voluntária consumista, que sublima a marca à condição de senha virtualmente

onipotente. (BENEVIDES, 2006).

Esta sociedade de marcas e do consumo é também a nossa “velha”

sociedade capitalista, que encontra formas de se atualizar, de permanecer e de

explorar. Contudo, frequentemente, a atualização/modernização se dá mesclando

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novos hábitos com velhos e arraigados preconceitos, bem como com antigas

práticas.

No que concerne à divisão sexual do trabalho, por exemplo

À medida que se desenvolviam os processos de automatização e flexibilização do trabalho, presenciou-se um movimento de feminização da categoria que, entretanto, não foi seguido por uma equalização da carreira e do salário entre homens e mulheres. Uma série de mecanismos sociais de discriminação – reproduzidos e intensificados nos ambientes de trabalho – estruturou relações de dominação e de exploração mais duras sobre o trabalho feminino, que se traduziram em desigualdades e segmentações entre gêneros (ANTUNES, 2006. p. 21).

Sobre a permanência da dominação-exploração de gênero na sociedade de

“marcas e do consumo”, falaremos a seguir.

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3. A CONDIÇÃO FEMININA NO MUNDO DO TRABALHO

Flor infinita, Em que nascedouro se cria esta magia?

Pródiga menina tornaste mulher. Desejo um verso ameno,

Tácito, doce e, ao mesmo tempo, pungente.

Quero uma estrofe moderna e sem rima Para poder falar de amor e dor,

Submissão e liberdade Na delícia e abdicação de ser mulher.

Mulher do lar imaculado e santo, Que renuncia a vida pelos filhos,

Não sei se tem prazer e descanso. Faço esta ode assimétrica

Pela tua coragem de entrega.

Mulheres das revoluções: Anita, Pagú, Maria Quitéria, Olga Benário, Leila Diniz,

Nizia Floresta... Mulheres anônimas que lutam Dia-a-dia contra as injustiças,

Que reivindicam a abolição dos preconceitos, Para que caiam as mordaças que calam.

É preciso por um fim na brutalidade de mãos Que batem e se acostumam com o vício da impunidade.

Que esta poesia se transforme em apelo – Desatem os nós das gargantas!

Afrouxem a favela do medo!

Uma homenagem às sem-terras E às que tombaram na terra,

As trabalhadoras rurais que cedo levantam pra lida,Antes do galo entoar seu canto.

Canta, encanta, assobia o teu acalanto mulher. Pois teu nome é trabalho e fé.

É o suor que respinga no rosto, A lágrima que encharca a relva,

É o vôo solene e mais alto da liberdade.

(Andréa Lima)

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3. A condição feminina no mundo do trabalho

3.1. Questão de Gênero nas sociedades capitalistas

Nos estudos sobre as condições de trabalho e de produção, que até então

haviam privilegiado particularmente as relações e conflitos entre capital e trabalho, a

grande contribuição dos estudos acadêmicos realizados a partir da especificidade da

problemática feminina, foi demonstrar que a classe operária tem dois sexos, levando

à superação da concepção da classe como um coletivo assexuado, no qual homens

e mulheres são, indistintamente, oprimidos e explorados pelo capital22 (BARBIERI,

1993).

Neste sentido, a abordagem das relações de classe para a reconstrução

interpretativa dos mecanismos de reprodução da submissão do trabalho ao capital

foi enriquecida pela abordagem a partir das relações gênero, que possibilita ampliar

a visibilidade das estratégias de controle e exploração do capital, diversamente

operacionalizadas para cada categoria de trabalhadores, no caso que aqui nos

interessa, as mulheres.

É oportuno fazer uma digressão para lembrar que a consideração da classe

trabalhadora, não como um todo homogêneo, mas como um coletivo segmentado

por diversos atributos que a diferenciam internamente - como etnia, cultura,

nacionalidade, condição legal - tem sido decisiva para desnudar as inumeráveis

estratégias do capital para explorar o trabalho. A abordagem da classe trabalhadora

como portadora de atributos sexuais distintos permitiu revelar a articulação

capitalismo/patriarcado, que assegura, simultaneamente, a superexploração da

mulher pelo capital e sua subordinação ao poder masculino, reproduzido na família e

na sociedade.

A incorporação maciça das mulheres ao mercado de trabalho remunerado fez

com que o trabalho, a família e o mercado de trabalho passassem por profundas

transformações neste último quarto do século XX. Segundo dados do IBGE, em 22 Com esta afirmação não estamos negando a exploração operada pelo capital, através de extração da mais valia, na classe operária e trabalhadora em geral, estamos apenas assinalando que a exploração e opressão têm matizes diferenciadas no que se refere às especificidades de sexo, raça/etnia.

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1990, haviam 854 (oitocentos e cinqüenta e quatro) milhões de mulheres

economicamente ativas no mundo inteiro, respondendo por 32,1% (trinta e dois

vírgula um por cento) da força de trabalho em termos globais. As mulheres

potiguares ocupam o sétimo lugar no Brasil e o primeiro do nordeste com 4,8%

(quatro vírgula oito por cento) (IBGE, 2005).

A entrada maciça das mulheres na força de trabalho remunerada deve-se, de

um lado, à informatização, integração em rede e “globalização” da economia e, de

outro, à segmentação do mercado de trabalho por gênero, que se aproveita de

condições sociais específicas da mulher para aumentar a produtividade, o controle

gerencial e, conseqüentemente, os lucros.

Ademais, o processo de incorporação total das mulheres no mercado de

trabalho remunerado gera conseqüências muito importantes na família. A primeira é

quase sempre a contribuição financeira das mulheres é decisiva para o orçamento

doméstico.

Além disso, o trabalho remunerado era visto, como uma forma de

emancipação da dona de casa e de seu papel subjugado na família, uma vez que, a

idéia da subordinação da mulher estava ligada a sua exclusão do mundo produtivo.

Isto é, a crescente participação feminina no mercado de trabalho, tornou o trabalho

feminino um problema teórico e, desta forma, os estudos de gênero chegam às

universidades por volta de 1960.

Naquele momento, inicialmente, somente dois autores foram levados em

consideração, Friedrick Engels e Simone de Beauvoir, porque segundo Barbieri

(1993), foram objetivos e se colocaram ao lado das mulheres. O desafio era enorme,

mas era necessário construir teoricamente as mulheres no mundo.

O determinismo biológico não respondeu às questões, se percebeu que a

variação dos comportamentos sociais ultrapassava as diferenças biológicas.

Baseado em Max Weber, tomando sua categoria patriarcado, surge uma das

primeiras propostas que identificava a subordinação feminina como produto da

ordem patriarcal como diz Millet (1975). Ou seja, a organização social atual teria se

transformado apenas em aparência e não em essência, pois permanecia a ordem

existente nas sociedades bíblicas arcaicas. Os homens atuais pouco diferiam dos

antigos, que dispunham da morte e vida dos filhos, escravos e rebanhos. Essa

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construção social deveria ser destruída para libertar as mulheres, e esta ordem

representaria para as mulheres o que o capitalismo representava para a classe

operária (BARBIERI, 1993).

Inicialmente duas posturas acompanharam a investigação sobre as mulheres:

a que centralizava o objeto de estudo nas mulheres, suas condições de vida e

trabalho e a cultura produzida por elas, outra que privilegiava a sociedade como

geradora da subordinação das mulheres. Esta segunda postura é a defendida por

Barbieri.

Segundo a autora (ibidem), parte-se da premissa de que: a) a subordinação

das mulheres é produto de determinadas formas de organização e funcionamento

das sociedades. Há, portanto que se estudar a sociedade ou as sociedades

concretas; b) não se avançará estudando apenas as mulheres; o objeto é mais

amplo. Requer uma análise das relações mulher-homem, mulher-mulher e homem-

homem em todos os níveis, âmbitos e tempos.

Nesse contexto, se expande o conceito de gênero, entendido “como categoria

que no social correspondente ao sexo anatômico e fisiológico das ciências

biológicas. O gênero é o sexo socialmente construído” (BARBIERI, 1993, p. 5).

Assim, para Rubin (1975, p. 101) gênero é: “O conjunto de disposições pelo qual

uma sociedade transforma a sexualidade biológica em produtos da atividade

humana e no qual se satisfazem essas necessidades humanas transformadas”.

Isso quer dizer que os sistemas de gênero são conjuntos de práticas,

símbolos, representações, normas e valores sociais que as sociedades definem a

partir da diferença sexual anatômico-fisiológica e que doam sentido a satisfação dos

impulsos sexuais, a reprodução da espécie humana e, em geral, ao relacionamento

entre as pessoas. Então, segundo Barbieri (1993, p. 04) “Os sistemas de

sexo/gênero são, portanto, o objeto de estudo mais amplo que permite compreender

e explicar o duo subordinação feminina-dominação masculina”.

Gênero, segundo Rubin (1975), é uma categoria mais adequada do que o

patriarcado, pois segundo Rubin é um conceito de maior generalidade e

compreensão já que deixa aberta a possibilidade de existirem formas distintas de

relação entre mulheres e homens: dominação masculina patriarcal e outras

possíveis não necessariamente patriarcais, dominação feminina ou relações

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igualitárias e permite pensar que formas distintas de organização levariam a

liberação das mulheres. É o reconhecimento segundo Barbieri (1993, p. 04) “[...] de

uma dimensão da desigualdade social até então não trabalhada, subsumida na

dimensão econômica, seja nas teorias das classes ou nas teorias da estratificação

social”.

Assim, a categoria gênero foi criada no final da década de 1970 por um grupo

de pesquisadoras feministas da Inglaterra, e pode-se dizer que ela é revolucionária

porque evidenciou a discriminação vivida pelas mulheres não mais como um

problema exclusivo das mulheres ou advindo de sua “incapacidade natural”, mas

como o resultado das relações sociais entre os sexos que foi construída ao longo da

história.

Essa categoria também revela aquilo que é cultural e pode ser modificado na

sociedade, porque questiona a naturalização da desigualdade social entre os sexos.

E no momento em que evidencia a dimensão social da desigualdade e suas

repercussões na divisão sexual do trabalho, abre as portas para a ação política e

uma possível transformação da realidade dando caminhos para organizações e

movimentos engajados nessa causa.

O emprego do conceito de gênero nos anos de 1990 é feito por diversos/as

autores/as de forma distinta. Vê-se frequentemente à substituição da palavra sexo

por gênero, nos estudos macrossociais, na demografia, nos estudos sobre o

mercado de trabalho, educação, comportamento político, entre outros. Gênero é

utilizado também como a desagregação por sexo, mas não se dá sentido a

categoria, não se leva em conta a construção social além da diferença anatômica.

O mesmo acontece com a substituição da categoria gênero por mulheres, que

nada mais são do que estudos sobre a história das mulheres. Não que esses

estudos não tenham significativa contribuição, mas o estudo da categoria gênero

abrange o sentido do comportamento dos homens e mulheres como seres

socialmente sexuados. Desta forma, é fundamental partir do conjunto das relações

sociais:

Relação significa contradição, antagonismo, luta pelo poder, recusa a considerar que os sistemas dominantes (capitalismo, patriarcado) são totalmente determinantes e que as práticas sociais apenas

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refletem essas determinações. Em resumo o que é importante na noção de relação social – definida pelo antagonismo entre grupos sociais – é a dinâmica que ela reintroduz, visto que isso implica introduzir a contradição, o antagonismo entre os grupos sociais no centro da análise. Trata-se, efetivamente, de uma contradição viva, perpetuamente em vias de modificação, de recriação (KERGOAT 1996, p. 22).

Neste sentido, mesmo usando autores/as feministas diversos, nos

basearemos na perspectiva que incorpora as categorias ontológicas fundamentais:

contradição, historicidade, classe social e totalidade. Contudo, sempre percebendo

que o gênero e a raça/etnia estabelecem matizes diferenciadas para a análise e

compreensão da sociedade.

Desta forma, nos perguntamos por que cabe às mulheres, na divisão social

do trabalho, os papéis secundários? Porque aceitar a naturalidade dos papéis

femininos? Porque as meninas são treinadas para dar continuidade ao papel de

reprodutoras biológicas das relações de dependência e subordinação?

Para desvelarmos isto, é preciso perceber de que formas são moldados

meninos e meninas para que aceitem e exerçam a desigualdade e a hierarquia em

função do gênero, desde a distinção de cores em roupinhas rosas e azuis para os

bebês até os ritos, aprendizados e ensinamentos formais e informais, práticas e

símbolos com os quais se festeja, convive-se e se reprime nas diferentes culturas

(BARBIERI, 1993).

Assim, pensar e compreender a sociedade a partir de uma ótica de gênero

exige analisar informações a partir da variável sexo, e também contextualizar para

que se possa dar conta do estado dos gêneros. Faz-se necessário também estudar

os âmbitos sociais nos quais os sujeitos interagem em função dos gêneros distintos.

Um ponto importante a ser lembrado: o sistema de poder é baseado em

relações instáveis e inseguras, como afirmou Foucault (1984): “O poder se exerce,

não se possui. Não se guarda numa caixinha”. Assim, não existem suficientes

regras, normas e castigo. Aos dominados existe sempre a possibilidade de

readequação, de obediência aparente, mas também de desobediência real,

resistência, manipulação da subordinação. Por isso, os espaços de controle sobre

as mulheres, na esfera privada são espaços de poder: o reprodutivo, o acesso ao

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corpo e a sedução, a organização da vida doméstica, são espaços contraditórios e

inseguros. A mulher pode se negar a ter filhos, alegar esterilidade, engravidar

quando quiser, se relacionar sexualmente com outros ou outras, seduzir com

diferentes objetivos, se negar a trabalhar impedindo a sobrevivência dos integrantes

daquela família, incluindo os recém-nascidos, entre outros.

Por isso, o sistema de dominação é tão forte, precisa estar preparado para

qualquer manifestação de revolta. Esses comportamentos citados não são

socialmente aceitos nem mesmo pelas próprias mulheres. Esse sistema se mantém

pela negociação permanente, que assegura a paz. Assim, gênero pode ser

entendido como uma forma de desigualdade social, que possui dinâmica própria,

mas está intimamente ligado a outros tipos de desigualdade, das distâncias e

hierarquias sociais.

E para que possamos entender a forma como se desenvolve essa

desigualdade, se faz necessário o despertar para a luta em favor da igualdade entre

homens e mulheres. Entendemos igualdade segundo as idéias de Santos (2007. p.

01):

A igualdade de oportunidade constitui-se num principio que, segundo seus ideólogos, tem como objetivo possibilitar, a determinados segmentos que se encontram em situação de vulnerabilidade sócio-cultural, condições equivalentes àqueles que, supostamente, já transitam como sujeitos de direitos.

Pode-se dizer que o principio da igualdade de oportunidades é de difícil

aplicação objetiva, devido às barreiras ideológicas e culturais consolidadas através

dos anos, bem como à própria lógica da sociedade capitalista que cria

continuamente desigualdades.

Em termos políticos e operacionais a igualdade de oportunidades esta

diretamente ligada a iniciativas que circundam as ações afirmativas, reparando

danos sócio-culturais por ventura ocasionados em virtude da diferença e diversidade

existente entre os indivíduos. A intenção é tornar os indivíduos “iguais” para o

acesso às instituições e pleno exercício a cidadania, o que levaria a competição

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“igualitária” por condições e oportunidades, antes acessadas somente pelos

segmentos legitimados socialmente.

Os instrumentos jurídicos que asseguram a “igualdade” de condições aos

indivíduos, só podem ser pensados dentro do sistema capitalista, dentro da

sociedade burguesa, pois, somente uma sociedade desigual necessita de um

instrumento jurídico para garantir o abrandamento dos seus conflitos, gerados por

atitudes preconceituosas e discriminatórias (SANTOS, 2007).

A igualdade entre homens e mulheres constitui um dos princípios

fundamentais. Os objetivos da União Européia (UE), em matéria de igualdade entre

as mulheres e os homens, consistem em assegurar a igualdade de oportunidades e

tratamento entre os dois sexos, por um lado, e em lutar contra toda a discriminação

fundada no sexo, por outro. Este tema apresenta, igualmente, uma forte dimensão

internacional em matéria de luta contra a pobreza, de acesso à educação e aos

serviços de saúde, de participação na economia, no processo decisório e de direitos

das mulheres enquanto direitos humanos.

A União Européia propõe que de 2006 a 2010 sejam efetivadas ações para a

promoção da igualdade entre homens e mulheres. Ações voltadas para a

independência econômica de homens e mulheres, devido à constatação de que o

risco de pobreza é maior para as mulheres que para os homens, já que elas tendem

a ter carreiras profissionais com interrupções, adquirindo, por conseguinte, menos

direitos. Visa também, o combate a diferenças de remuneração ocasionadas devido

à diferença de sexo e o combate a discriminação.

Ademais, as ações se voltam também para as questões de conciliação da

vida privada e profissional. O fato de serem mais mulheres do que homens a

recorrer à possibilidade de flexibilidade no trabalho, leva a uma repercussão

negativa na sua posição no local de trabalho e na sua independência econômica.

No tocante a representação igual na tomada de decisões, as ações propostas

pela União Européia se dão no sentido de encontrar saídas para a persistente sub-

representação feminina na sociedade civil, na vida política e nos cargos superiores

da administração pública, pois esta se constitui em um déficit democrático. Uma

participação equilibrada pode contribuir para uma cultura do trabalho mais produtiva

e inovadora.

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Atingir o objetivo fixado pelos Estados-Membros, de 25% de mulheres em

cargos de liderança na investigação do setor público pode contribuir para aumentar

a inovação, a qualidade e a competitividade da investigação. Ao mesmo tempo,

melhores estruturas de guarda de crianças permitirão encontrar um novo equilíbrio

entre trabalho e vida privada, uma vez que, poucos são os homens que exercem o

direito à licença parental ou que trabalham em tempo parcial. Neste sentido, as

ações se voltam para a tomada de medidas que os incitassem a assumir

responsabilidades familiares.

No mercado de trabalho, as mulheres continuam a ter de enfrentar uma

segregação ao mesmo tempo horizontal e vertical, perpetuando a presença

majoritária do emprego feminino em setores menos valorizados e a ocupar escalões

inferiores na hierarquia (Roteiro para igualdade entre homens e mulheres 2006 –

2010).

Neste sentido, a articulação entre gênero-classe social tem sido de

inquestionável importância para estudos feitos na América Latina. A forte entrada

das mulheres no mercado de trabalho tem explicações que vão além da acreditada

emancipação conquistada por elas e “concedida” pelos homens. Para o capital

nacional e internacional as mulheres subordinadas, em razão do gênero, se

constituem numa mão-de-obra mais barata e explorável no mercado, porque apesar

da capacidade de trabalho, elas possuem características psicológicas e treinamento

desde a infância, o que permite a intensificação da exploração, pois são socialmente

mais submissas que os homens frente à autoridade e disciplina, têm mais paciência

para trabalhos tediosos e são mais disponíveis para o aumento da jornada.

A necessidade de assumir as despesas, quando os homens não podem fazê-

lo, ou em função do achatamento salarial, a necessidade de dividir as despesas com

os homens no sustento da família, faz com que elas se sujeitem ao aumento das

taxas de exploração, a mais-valia e a acumulação do capital. Dessa forma, a

realidade é muito mais complexa, ela envolve questões de classe, gênero, etnia e

geração que se cruzam e se articulam.

No caso da América Latina, segundo Barbieri (1993) as respostas para essas

questões são cruciais para que se entenda a estruturação e a dinâmica de nossas

sociedades. A dominação capitalista é cada vez maior e excludente, o machismo é

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devastador, a discriminação racial a grupos e pessoas de cor negra, fica evidente e,

apesar dos direitos formais, estes não chegam a constituir-se como cidadãos e

cidadãs.

Essa construção histórica é fruto do chamado patriarcado e todas as

sociedades contemporâneas têm como base o patriarcado. Ele caracteriza-se pela

autoridade, imposta institucionalmente, pelo homem sobre mulher e filhos no âmbito

familiar. Para que essa autoridade possa ser exercida, é necessário que o

patriarcado permeie toda a organização da sociedade, da produção e do consumo à

política, à legislação e à cultura. Os relacionamentos interpessoais, e

consequentemente, a personalidade, também são marcados pela dominação e

violência que têm origem na cultura e instituições do patriarcado. É essencial,

porém, não esquecer o enraizamento do patriarcado na estrutura familiar e na

reprodução sócio-biológica da espécie, contextualizados histórica e culturalmente.

Não fosse a família patriarcal, o patriarcado ficaria exposto como dominação pura e

acabaria esmagado pela revolta da "outra metade do paraíso", historicamente

mantida em submissão (BARBIERI, 1993).

O enfraquecimento do modelo familiar baseado na autoridade/dominação

contínua exercida pelo homem, como cabeça do casal, sobre toda a família é

chamado de crise da família patriarcal. A partir da década de 1970 e 1980,

encontramos indicadores desta crise em quase todas as sociedades, principalmente

nos países mais desenvolvidos. A dissolução dos lares, por meio do divórcio ou

separação dos casais, constitui o primeiro indicador de insatisfação com um modelo

familiar baseado no comprometimento duradouro de seus membros. Em segundo

lugar, a crescente freqüência com que as crises matrimoniais se sucedem, assim

como a dificuldade em compatibilizar casamento, trabalho e vida pessoal, associa-se

a outras tendências importantes: o adiamento da formação de casais e a formação

de relacionamentos sem casamento, relações estáveis e duradouras sem filhos por

opção, relações homossexuais etc.

O resultado dessas diferentes tendências, associadas a fatores demográficos,

como envelhecimento da população e diferença da taxa de mortalidade entre os

sexos faz surgir uma variedade de estruturas domésticas, diluindo assim o

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predomínio do modelo familiar clássico. Os lares de solteiros e os habitados por

apenas um dos pais proliferam.

Na verdade, o modelo familiar onde o homem é o mantenedor da família,

exercendo o trabalho fora de casa e a mulher somente na esfera doméstica nunca

foi uma realidade, já que, historicamente, somente uma pequena parte das mulheres

viviam assim. As negras sempre trabalharam como escravas, depois prestando

serviços domésticos ou sendo vendedoras ambulantes; as camponesas trabalhavam

na roça, produziam artesanato, cultivavam hortas e criavam animais contribuindo

para o sustento da família, assim como, hoje, muitas trabalham fora e ajudam no

sustento da família. A idéia de uma mulher que se dedica somente à esfera

doméstica existe devido à “naturalização” desses papéis repassados pela ideologia

dominante (BARBIERI, 1993).

Ao longo da história e principalmente nos últimos trinta anos vimos essa

construção histórica se modificar, quando tanto movimentos feministas de cunho

liberal, quanto socialistas, passaram a lutar pela igualdade/emancipação das

mulheres.

Segundo Miguel (2007) se pode afirmar que o feminismo sempre existiu em

seu sentido mais amplo. As mulheres individual ou coletivamente ao longo da

história, se indignaram frente às imposições postas pelo patriarcado, e sempre

almejaram a igualdade de direitos na sociedade. Contudo, ao longo dos séculos ele

foi assumindo configurações e perspectivas diversas a partir das influências

ideológicas de classe e posteriormente de raça/etnia e orientação sexual.

Podemos situar o feminismo na história, a partir do chamado feminismo pré-

moderno. Este movimento surge então, pela luta por formas sociais mais justas e

libertadoras que pudessem libertar as mulheres das teias da religião, da ciência, do

discurso e da prática que afirmaram a inferioridade feminina. Discurso que dividia o

mundo em sexos e, junto com eles, em dois corpos, duas leis, duas morais e duas

razões.

O Renascimento trouxe consigo o paradigma da autonomia, que não se

estendeu às mulheres. O movimento da reforma protestante trouxe um importante

debate entre o Estado e a polêmica feminina, instaurando uma nova relação

hierárquica entre o individuo e Deus, abrindo espaço para que as mulheres

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questionassem: E porque nós não? Muito embora, contraditoriamente, o

protestantismo reforçou a ideologia patriarcal substituindo a autoridade já debilitada

do sacerdote e do rei.

Era uma nova forma de interpretação das Escrituras, mas que ainda

subordinavam as mulheres. A própria lógica dessas teses fez surgir grupos

feministas mais radicais, principalmente na Inglaterra. Foi possível o encontro nesse

período de um terreno favorável ao despertar da individualidade feminina, mas por

esse motivo elas foram acusadas de bruxaria, de ir contra as leis de Deus e algumas

foram acusadas de pactuar com o demônio. (MIGUEL, 2007)

No século XVII na França, encontra-se abertura para novas formas de

organização e novos valores sociais, as mulheres passam a ganhar presença

notável na literatura, conferindo um caráter mais romântico, dentro de um universo

em que raramente puderam opinar. A partir deste momento passa-se a discutir a

igualdade entre os sexos. O centro da discussão deixa de ser a comparação entre

homens e mulheres, e passa a ter seu enfoque, na igualdade colocando o feminismo

como um coletivo capaz de fazer valer suas reivindicações, se tornando um sujeito

revolucionário coletivo, podendo articular-se em torno de premissas como as de que

todos os homens nascem livres e iguais, portanto possuidores dos mesmos direitos.

Desta forma, durante a Revolução Francesa, atuantes na luta armada, as

mulheres se viram orgulhosas de exercer outra função além das de mãe e esposa.

Em 1791, a tomada de consciência feminina fica explicita com a publicação de

“Declaración de los derechos de la mujer y la ciudadana”, por Gouges.

Em 1894 quando os Jacobinos proibiram os clubes de mulheres e o exercício

de atividade política. Aquelas que fossem encontradas nesses casos teriam dois

destinos: o exílio ou a guilhotina.

A imprensa da época publicava que as mulheres estavam infringindo as leis

da natureza, e deixando de cumprir seu destino de mães e esposas, almejando ser

homens de Estado. O novo código napoleônico se encarregaria de estabelecer e

colocar em exercício as chamadas “leis naturais”.

No século XIX surge o feminismo Decimônico, como um movimento de

caráter internacional e com autonomia técnica e organizativa, ocupando um

importante lugar no cenário dos movimentos sociais, diferentemente dos outros

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movimentos existentes na época, denominados socialismo e anarquismo, que

surgiram como tentativa de solucionar os problemas advindos da revolução industrial

e do socialismo.

Já o movimento sufragista partia do princípio de que a entrada das mulheres

no mercado de trabalho alterou as relações entre os sexos. As mulheres

principalmente da burguesia começaram a se indignar com a sua situação de

submissão ao homem e o destino de pobreza que condenava aquelas que não

contraíssem o matrimônio. Mesmo com a predominância burguesa este movimento

se caracterizou pelo seu caráter interclassista. Portanto, iniciaram uma luta pelo

direito ao sufrágio, justificando a denominação de seu movimento. Mas esta não foi

a sua única reivindicação, a busca pela igualdade e universalização dos valores

democráticos e liberais, partiam da premissa de que se conseguissem fazer parte do

parlamento poderiam opinar e votar a respeito de leis que favorecessem as

mulheres.

O feminismo socialista foi uma corrente de pensamento socialista que focava

sua preocupação com as mulheres e com a necessidade de analisar a sociedade

com vistas a propor um projeto futuro mais igualitário. Essa afirmação não visa

afirmar que o socialismo é necessariamente feminista, mas sim busca colocar que

após o século XIX a preocupação com a igualdade não poderia se resumir à metade

da humanidade. Os socialistas utópicos foram os primeiros a “pensar” sobre as

mulheres, propondo a volta das pequenas comunidades em que havia certa

autogestão baseados na premissa de que a forma dessas comunidades baseadas

na cooperação humana trazia a igualdade entre os sexos. O socialismo marxista

surge em meados do século XIX, denominado de socialismo “cientifico”. O marxismo

articulou a questão feminina à sua teoria geral da história criando uma ponte entre

explicação da origem da opressão feminina, articulada a nova estratégia para sua

emancipação. Engels desmentiu a crença de que a inferioridade feminina estaria

ligada a razões naturais – a causas biológicas – mas sim estaria ligada diretamente

a aparição da propriedade privada e a exclusão das mulheres do mundo produtivo.

Portanto a emancipação feminina estaria ligada à volta das mulheres ao mundo

produtivo. Contudo, o feminismo socialista, ao contrario do movimento sufragista,

considerava que a opressão feminina se distinguia de acordo com a classe social a

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qual ela estava inserida e por isso havia certa desunião entre estes dois

movimentos. Portanto o socialismo acreditava que a emancipação feminina não

poderia acontecer dentro do modo de produção capitalista.

Surge posteriormente o Neofeminismo (1960 - 1970) em um momento de

relativa paz no campo das lutas feministas, no qual o voto feminino havia sido

conquistado e pareciam não haver novas reivindicações a serem feitas, já que as

demandas postas pelas diversas correntes femininas haviam sido satisfeitas. Nesse

momento o grande expoente foi a obra – “O Segundo Sexo” de Simone de Beauvoir

(1949), inserida no contexto de um momento de “igualdade legal” trouxe ao debate a

opressão velada sofrida pelas mulheres. Outro estudo importante foi – A mística

Feminina (1963) – de Betty Friedan, que trouxe a tona assuntos como a pressão

psicológica sofrida pelas mulheres através da culpa que lhes era incutida quando

esta não se realizava somente como mãe e esposa, e os diversos males

decorrentes dessa insatisfação consigo mesma, como a ansiedade, depressão e o

alcoolismo.

Surge então o feminismo liberal no qual Friedan (1963) foi a responsável pela

criação de um dos feminismos mais poderosos dos EUA a Organização Nacional

para as Mulheres (NOW). O feminismo liberal pautava-se na premissa de que a

situação das mulheres na sociedade da época era uma questão de desigualdade e

não de opressão e exploração. Buscavam a inclusão das mulheres no mercado de

trabalho.

Deu-se em seguida o surgimento do Feminismo Radical, movimento radical

da década de 1960 que não buscava reformas dentro do sistema vigente, mas o

surgimento de um novo sistema que pudesse suprir uma ordem mais igualitária. As

mulheres aderem a esse movimento lutando por novas formas de inserção, por

novas formas mais ativas de participação política. Nesse momento o movimento se

divide em dois blocos – as “políticas” e as “feministas”.

As “políticas” eram a maioria, até 1968 quando passaram a ser minoria, mas

estas definiam a opressão feminina como advinda do capitalismo e eram

consideradas de esquerda. As “feministas” se manifestavam contra a subordinação,

mas não buscavam um movimento revolucionário. As feministas se esforçavam na

busca de fazer com que as “políticas” entendessem que a opressão das mulheres

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não é somente uma conseqüência do sistema capitalista, mas sim por um sistema

especifico que submete à mulher ao homem. As “políticas” guardavam o receio de

serem vistas como revolucionárias e liberais por isso rejeitavam a denominação de

feministas devido a associação deste nome ao movimento sufragista que julgavam

como burguês e reformista.

Já o Feminismo Radical – teve como uma de suas principais expoentes Kate

Millet (1960) que pautadas da teoria marxista, da psicanálise e do anticolonialismo

formularam questões sobre o patriarcado, gênero e a divisão sexual.

O Manifesto Redstockings de 1969, berço do movimento em Nova York dizia:

Identificamos nos homens os agentes de nossa opressão. A supremacia masculina é a mais antiga e básica forma de dominação. Todas as outras formas de exploração e opressão (racismo, capitalismo, imperialismo etc.) são prolongamentos da supremacia masculina; os homens dominam as mulheres, alguns homens dominam os demais.

A partir da década de 1970, o movimento radical e liberal foi tomando

uma forma mais unificada o que permitiu conquistas mais significativas. Uma das

mais importantes ações do movimento radical foi a organização de grupos de

autoconsciência, no qual as mulheres colocavam de que forma experimentavam e

sentia a opressão. Este grupo também permitiu a valorização da palavra, do

discurso e da troca de idéias de um grupo até então inferiorizado, desvalorizado pela

sociedade. Surge então uma nova aliança entre o feminismo e o socialismo.

Assim, podemos entender o feminismo como a luta pelo fim do patriarcado

como forma de opressão das mulheres, e o socialismo como a luta pelo fim do

sistema capitalista. Numerosos estudos da década de 1970 sinalizavam para a

complementaridade desses dois movimentos. Feministas como Juliet Michell

reconheceram que as categorias marxistas eram cegas para a questão feminina,

mas também consideravam que o feminismo é cego para as questões das mulheres

trabalhadoras emigrantes e não brancas. Portanto a aliança entre feminismo e

socialismo busca, hoje, a união das análises de gênero, raça e classe.

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Além das organizações principais, hoje existem numerosas organizações

locais de mulheres: clínicas alternativas de saúde da mulher, cooperativas de

crédito, centros de treinamento, livrarias, restaurantes, creches, centros de

prevenção da violência contra a mulher e de tratamento de suas conseqüências,

grupos de teatro, grupos musicais, clubes de escritoras e uma extensa gama de

expressões culturais passaram por altos e baixos.

Um outro aspecto importante para caracterizar o movimento feminista são os

conflitos ideológicos entre as diferentes gerações. Assim, torna-se doloroso para as

feministas de longa data verem as recém-chegadas ao movimento rejeitarem suas

crenças mais arraigadas ou mudarem as organizações que tanto lutaram para

formar. As principais diferenças dizem respeito ao lesbianismo e a discussão sexual,

já que as veteranas eram, às vezes, mais conservadoras. Outro ponto de

divergência é a união de feministas recém-chegadas a movimentos como os gays.

Outras tensões internas surgem na medida em que o movimento se espalha por

todo o país e por todas as classes sociais.

No caso da Europa Ocidental, Canadá e Austrália nota-se um movimento

feminista bastante espalhado, distinto e multifacetado, ativo e expandindo-se nos

anos de 1990, embora com intensidade e características diferentes. Em todos os

países da Europa, o feminismo está infiltrado nas instituições sociais e em uma

infinidade de grupos, organizações e iniciativas que se alimentam reciprocamente,

confrontam-se e provocam um fluxo inesgotável de exigências, pressões e idéias

sobre as condições, questões e cultura da mulher (BARBIERI, 1993).

Já nos ex-países socialistas, o Estado criou oportunidade de mulher exercer

papéis nas áreas da educação, saúde, dentre outros, de forma que apesar das

organizações feministas estarem sempre presentes em todos os segmentos da

sociedade elas estavam sob o controle do Estado. Assim, toda uma geração de

mulheres cresceu sabendo de seus potenciais, mas sem poder colocá-los em

prática. A partir dos anos de 1990, na Rússia, porém, mulheres tem tido cada vez

mais importância, inclusive, na política (Ibidem). Já na Ásia industrializada, o

patriarcado reina praticamente sem contestação como são os casos do Japão,

China e Corea.

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Nos países em desenvolvimento a situação é complexa e até mesmo

contraditória. Mas o que chama mesmo a atenção é a crescente participação das

mulheres desses países no enfrentamento da questão social, em movimentos de

base popular, na grande maioria criada e dirigida por mulheres.

Neste sentido, Castells (1999) ressalta que o movimento feminista apresenta

formas e orientações muito diferentes, dependendo dos contextos culturais,

institucionais e políticos dos locais onde estão inseridos. Este é caso da Grã-

bretanha, Espanha e Itália onde o feminismo esteve ligado, intimamente, à política,

mais particularmente, aos sindicatos na Grã-Bretanha e a esquerda na Itália.

Assim, os contextos em que o feminismo se desenvolve moldam o movimento

em uma série de formatos e discursos. Desta forma, um núcleo essencial de valores

e metas que constituem a identidade do movimento difunde-se por toda a polifonia

cultural do feminismo. Destarte, podemos destacar na atualidade diversas

correntes/expressões, entre elas:

Defesa dos direitos da mulher – para este grupo, as mulheres devem ser tratadas

como seres humanos e exigem direitos iguais inclusive o direito de terem filhos ou

não. Nesta, o estado patriarcal é o principal adversário;

Feminismo cultural – caracteriza-se pela luta da comunidade feminista e luta

contra instituições e valores patriarcais e a favor de sua autonomia cultural;

Feminismo lesbiano - luta contra a heterossexualidade patriarcal;

Identidades femininas - luta contra a dominação cultural e a favor do

multiculturalismo sem segregação por sexo;

Feminismo pragmático - Constituído por donas de casa, mulheres exploradas, e

agredidas. Lutam pela sua sobrevivência e dignidade e, de uma maneira geral,

contra o capitalismo patriarcal (BARBIERI, 1993).

As múltiplas identidades femininas redefinem modos de ser com base nas

experiências vividas ou fantasiadas das mulheres. Além disso, suas lutas pela

sobrevivência e pela dignidade capacitam-nas, subvertendo desse modo a mulher

patriarcalizada, que recebeu esta definição precisamente por causa da sua

submissão. O feminismo diluiu a dicotomia patriarcal homem/mulher na maneira

como se manifesta, de formas diferentes e por caminhos diversos, nas instituições e

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práticas sociais. Agindo assim, o feminismo constrói não uma, mas muitas

identidades, e cada uma delas, em suas existências autônomas, apodera-se de

micropoderes na teia universal tecida pelas experiências adquiridas no decorrer da

vida (BARBIERI, 1993).

Para Castells (1999) existe, porém uma essência comum subjacente à

diversidade do feminismo: o esforço histórico, individual ou coletivo, formal ou

informal, no sentido de redefinir o gênero feminino em oposição direta ao

patriarcado. Castells analisa as conseqüências deste processo de transição de um

patriarcado enraizado para uma sociedade mais liberal.

Assim sendo, segundo este autor, as principais vítimas dessa transição

cultural são os filhos, que às vezes são negligenciados nas atuais condições da crise

familiar. Sua situação poderá piorar, seja porque as mulheres ficam com seus filhos

em condições materiais precárias, seja porque elas, em busca de autonomia e

sobrevivência pessoal, começam a negligenciá-los da mesma forma que os homens.

Considerando que o auxílio do Estado, em função do modelo neoliberal, vem

minguando, homens e mulheres têm de resolver, eles próprios, o problema dos

filhos, ao mesmo tempo em que perdem o controle sobre suas vidas.

O crescimento dramático no número de casos de crianças e adolescentes

molestados observado em numerosas sociedades, principalmente nos EUA, pode

bem ser uma expressão do estado de confusão e perplexidade de pessoas com

relação as suas vidas familiares. Ao fazer esta afirmação, não procuramos culpar a

liberação ou o feminismo, pelo drama dos filhos. Estamos simplesmente destacando

uma questão vital em nossa sociedade, que precisa ser abordada sem preconceitos

ideológicos: os filhos estão sendo extremamente negligenciados, conforme

constatado e bem documentado por cientistas sociais e jornalistas. A solução não

está na volta, impossível, da família patriarcal obsoleta e opressiva, mas na

reconstrução da família com homens e mulheres em condições de igualdade e

responsabilidade no cuidado doméstico e no cuidado com os filhos. É necessário

também a responsabilidade do Estado e das instituições públicas, assegurando

apoio material e psicológico para as crianças. São medidas cabíveis para alterar o

curso, que hoje conduz a destruição em massa da psiquê humana, implícita na vida

instável de milhões de crianças.

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Mas vemos, através da história, a incansável luta das mulheres para modificar

essa realidade tão dura. O movimento feminista mostra claramente como surge essa

luta através dos anos.

A luta das mulheres nunca prometeu a felicidade eterna e nem fez da conquista do poder o seu objetivo central. Ao longo da história, mulheres se propuseram a fazer uma transformação, subvertendo a separação sexista do mundo, mudando imaginários, removendo (in) consciências, resgatando individualidade, lutando por melhores condições de vida e de trabalho e revolucionando, sobretudo nelas, a maneira de estar no mundo. Luta irrenunciável e intransferível, assumida como uma contribuição coletiva para um futuro diferente da humanidade. Esta herança exige agora uma postura nova, diferente de quem a recebe, para que se possa seguir avançando (HIRATA, 2005, p. 07).

O feminismo enquanto movimento social propiciou vários questionamentos

em torno da condição feminina na nossa sociedade. Assim, a perspectiva de gênero

envolve como já assinalamos, a análise das relações sociais e, portanto, a análise

da problemática das mulheres deve ser realizada em conjunto com a dos homens,

pois uma está intimamente implicado com a do outro. Em outras palavras, os

gêneros são construídos através de processos de interação social e sua análise

possui um caráter relacional e interdependente.

Estudos como o de Whitaker (1989) em seu livro Mulher & Homem, O Mito da

Desigualdade - afirma que gênero é uma construção social que tem seu início na

educação familiar e se estende a educação formal. Através de um resgate na

história da situação feminina na esfera privada e pública, percebemos que através

da educação se criam padrões femininos e masculinos, que constroem o que se

convencionou chamar de masculinidade e feminilidade e influenciam na inserção

diferenciada de homens e mulheres no mundo do trabalho.

Numa sociedade como a nossa, cuja formação complexa criou subculturas

heterogêneas, pensar em ser menina ou mulher, segundo Whitaker, nos coloca mais

questões do que respostas. Quando se levam em conta questões teóricas já

enfrentadas pelos estudiosos das relações de gênero, conclui-se com facilidade que

a mulher e a menina estão sempre excluídas dos espaços masculinos. Na mesma

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linha de raciocínio, os estudos de Faria e Nobre (1997) mostram que a desigualdade

de gênero tem início na educação diferenciada que se dá para meninos e meninas,

na qual são exigidas diferentes formas de vestir, brincar, de se comportar, entre

outros. Assim são criados padrões femininos e masculinos, diferenças construídas

socialmente e não determinadas pelo sexo.

Essa cultura gerada ainda na infância, formará o futuro marido, pai que não

verá o trabalho doméstico como sendo próprio dos homens, mas no máximo quando

o faz dentro de sua própria casa, é com um caráter de ajuda, nunca como um

membro que utiliza e compartilha da mesma residência. Desta forma, a criação das

meninas acaba formando, em maior ou menor grau, em cada uma de nós um

processo de baixa estima sofrido/vivenciado pelas mulheres, que exige esforço para

ser superado.

Ao longo da vida, as meninas sofrem um processo de socialização que as

prepara para a desvantagem, com menores expectativas de escolarização e

profissionalização do que os meninos. Neste sentido, Whitaker (ibidem) descreve a

complexidade sociológica do processo, cuja base reside justamente nas

ambigüidades do trabalho doméstico, a forçosa criação para a docilidade, vista como

característica natural do sexo feminino, obtida através da repressão dos impulsos,

do instinto natural, da agressividade e a negação da liberdade de comportamento,

de expressão, de escolha das mulheres, o que não ocorre na criação do menino,

muito pelo contrário, nele são estimuladas tais características e até mesmo são

vistas como boas.

O que se nota de mais forte é que o trabalho doméstico é um referencial

importante na socialização das meninas, pelo menos durante muito tempo. Vemos

que, no mundo atual, pelo menos para algumas classes sociais, essa preocupação

não se faz tão presente no cotidiano das famílias23, mas nas camadas mais pobres

da população, ainda é muito forte. Essa é a educação informal, mas a autora mostra

também o papel da educação formal, adquirida de forma sistemática na escola, que

influencia poderosamente o indivíduo. Vemos nas escolas que o comportamento

feminino é geralmente aquele mais disciplinado, obediente, que se enquadra melhor

23 Dependendo da classe social da qual a mulher faça parte, pode-se “optar” por pagar empregada doméstica e babás. Contudo a responsabilidade com as “instruções domésticas” à empregada e à babá permanecem quase sempre como responsabilidade somente da mulher.

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nas regras impostas pela escola, o que lhes rende melhores notas, já que são vistas

com bons olhos pelo conjunto dos professores. Contudo, no momento do vestibular

e na luta pelo mercado de trabalho, são outras características julgadas como

importantes, já não há a relação de afetividade professor/a - aluno/a e o caráter

competitivo exige mais agressividade e para isso os homens foram mais bem

preparados.

Ainda, segundo a autora (ibidem), essa socialização “feminina” impede esses

padrões que geram autonomia e independência pessoal, gerando conseqüências na

vida pessoal e profissional das mulheres.

3.2. A divisão sexual do trabalho e a mulher trabalhadora nas sociedades

modernas

Os elementos analisados anteriormente influenciam em todos os âmbitos

sociais. Contudo, nossa análise se deterá na divisão sexual do trabalho e na

inserção diferenciada de homens e mulheres no mercado de trabalho.

Neste sentido, é inegável o crescimento da taxa de atividade feminina, nas

últimas décadas que, por sua vez, tem impulsionado o processo de feminização do

trabalho. Mas estes fenômenos não estão diretamente ligados a melhores condições

de trabalho e, muito menos concorreram a curto e médio prazo, para mudanças

significativas na segregação ocupacional de gênero (DIAS, 2006).

A inserção feminina no mercado de trabalho possui diferenças não só no

tocante a sua relação com os homens, mas também demonstra situações

diferenciadas ao longo de sua vida laborativa. As mulheres passam da inatividade

para a atividade, do desemprego para a ocupação, quase sempre, como assalariada

sem carteira assinada, doméstica ou autônoma. Ou seja, elas se inserem no

mercado de trabalho mesmo que seja num mercado precarizado ou em ocupações,

nas quais serão subutilizadas. Por isto, de uma forma geral, nos últimos anos, as

mulheres têm ocupado as atividades em que predominam descontinuidades

freqüentes, vulnerabilidades ao desemprego, formas de contrato sem garantias

legais, redução dos níveis salariais e a informalidade.

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No que se refere à educação e ao trabalho, as mulheres são sempre

socializadas a aceitar as tarefas domésticas como suas, o que faz com que,

qualquer que seja o caminho escolhido, como dona de casa ou profissional, ela, por

vezes, é considerada culpada quando ocorrem problemas. Assim, se está remetida

somente a esfera privada, permanecendo no ambiente familiar, no cuidado dos filhos

e da casa, é acusada de não contribuir para o sustento da casa e da família, de ter

fracassado como profissional. Do contrário, se está dedicada a uma carreira e

obteve sucesso através dela, é acusada do abandono do lar, dos filhos e qualquer

problema familiar, lhe será atribuída responsabilidade no fato, e será aceito, por

vezes, por ela como tal. Para muitas mulheres não é fácil trocar o ambiente do lar

pelo ambiente do trabalho externo, pois é naquele que ela possui hegemonia e

segurança. Fica evidente que o poder da mulher está no seu afeto, na esfera

emocional, no trato com os filhos, com o marido, no cuidado que exige a produção

da comida, no trato do ambiente privado. A educação dada às mulheres, voltada

para as tarefas domésticas influencia o mundo do trabalho24 e percebe-se entre as

profissões ditas “femininas”, atividades que não rompem com a padronização. Nelas,

as mulheres continuam a exercer o “papel feminino” categorizado como inferior, de

pouco valor social, reproduzindo no seu interior, a situação de opressão, repetindo o

modelo discriminador da condição de classe e da condição de gênero, preservando,

portanto, os padrões burgueses e a continuidade e a manutenção dos papéis

sexistas na divisão social do trabalho.

Desta forma, os mecanismos do capitalismo e do patriarcado favorecem a

subordinação da mulher e alimentam uma ideologia da privatização25 feminina -

concepção conservadora e discriminatória, que determina a forma que a mulher

deve se inserir no mundo do trabalho, ou melhor, que não a vê como indivíduo a ser

incluído no mercado de trabalho, afirmando que se a mulher não puder evitar o

trabalho deve ao menos trabalhar em ocupações femininas – sendo esta a ideologia

24 É polêmica a discussão sobre a influencia entre as “esferas” produtivas e reprodutivas. A nossa posição é que o ser social é uma totalidade complexa e imbricada no qual todas as “esferas” se influenciam mutuamente. 25Termo utilizado por Ferreti (1994) que se refere às discriminações sofridas pelas mulheres no mundo do trabalho que, segundo a concepção conservadora a mulher, não deve trabalhar, se puder evitá-lo.

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da discriminação sexual das tarefas. Essas posturas afetam a liberdade de escolha

profissional das mulheres.

A sociedade brasileira, historicamente autoritária e excludente é um campo

fértil para essa ideologia. Na sua história de luta, está claro que existiu e existe uma

forte dinâmica que exclui e submete as mulheres.

As relações de poder entre os sexos se assentaram, ao longo dos tempos, numa hierarquia de status e expressaram a diferença entre o homem e a mulher em termos de direitos legais e costumes estabelecidos (HECKERT, 1991, p. 59).

Assim, a constituição da identidade feminina se deu distante da vida pública e

sua inserção no mercado de trabalho remunerado e na vida política, quando ela se

volta para tal, traz as implicações de uma identidade que historicamente foi

direcionada somente para o mundo privado. A entrada das mulheres num espaço,

que era majoritariamente masculino se deu sob a influência da ideologia da

discriminação sexual das tarefas. Por isso, no conjunto de ocupações produtivas,

existem aquelas destinadas à homens e outras à mulheres.

As profissões, nas quais, se encontram o maior número de mulheres, são

aquelas que possuem as ditas características “femininas”, que reproduzem o espaço

doméstico. As possibilidades de acesso à profissões mais técnicas é menor entre as

mulheres, devido a carga de preconceitos e estereótipos que a estigmatizam.

Nessas profissões, são privilegiados os homens por terem mais acesso a escolas

técnicas e cargos técnicos, como a engenharia e a toda uma série de profissões na

área de exatas, de ensino superior, nas quais, as mulheres têm menor

representatividade, devido a sua educação não ser voltada para esse tipo de

atividade cientifico - técnica. A questão não está no fato das mulheres não terem

chances de concorrer a um curso na área tecnológica - mesmo porque assiste-se ao

crescimento da entrada de mulheres, ainda que em minoria -, mas o que se constata

é que as mulheres não foram educadas para escolher esse tipo de profissão, como

se não lhes coubessem exercer esse tipo de atividade, ditas como de perfil

“masculino”.

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Dentro das universidades as mulheres se concentram em profissões como a

enfermagem, a assistência social, nutrição, psicologia – papéis de cuidado com o

outro – assim como lhes fora atribuído na família e na sociedade. A esse respeito,

Heckert (1991, p. 60) citando Eva Blay, assinala:

As mulheres se dirigem para aqueles (cursos) socialmente indicados para o sexo feminino (...) é que o mercado de trabalho e a escolarização são dois ângulos de um mesmo processo; aquele reforça os valores sociais e induzem as eventuais pretendentes a carreiras próprias ao sexo feminino.

Outro ponto que determina a carreira feminina, ainda segundo Heckert, é o

fato das escolhas profissionais se darem em função da vocação ou da possibilidade

de conciliação com a vida doméstica, que não dificultem o casamento, profissões

que possuam vantagens simbólicas, como a solidariedade humana, a realização

pessoal, a oportunidade de realizar uma vocação, inspirada em motivações

religiosas ou políticas, enfim profissões que incorporem a mística do servir, da ajuda,

guiada por valores nobres e altruístas26. Dessa forma, as dificuldades compensariam

as desvantagens como a baixa remuneração e o exercício de carreiras, cujo

prestígio social não é muito elevado. Essas são as duas conseqüências da

concentração feminina em determinadas carreiras – o desprestígio social e a baixa

remuneração.

As influências sociais, os valores próprios da cultura que estão fortemente

presentes no processo de socialização das mulheres, as conduzem a essas

escolhas, como também as determinações sócio-históricas, de um determinado

momento da organização da sociedade, interferem diretamente na escolha

profissional. O desconhecimento desses fatores levam a crença sobre as possíveis

“vocações” tidas como “naturais” ao sexo feminino para certos tipos de trabalho,

como aqueles que envolvem o contato humano, o auxílio ao outros etc.

Bourdieu (1999) discute a questão do status social que as profissões

femininas adquirem quando são realizadas pelos homens. Ele compara a

26 Neste sentido, a autora assinala que a predominância feminina no Serviço Social, ainda é fruto desta tendência das mulheres de buscarem profissões com valores altruístas.

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masculinidade à nobreza, porque os homens não podem rebaixarem-se a executar

tarefas designadas socialmente como inferiores. Assim, algumas tarefas podem ser

vistas como nobres e difíceis quando executadas por um homem, ou insignificantes

e imperceptíveis quando executadas por mulheres. A este respeito, assinala:

[...] a diferença entre um cozinheiro e uma cozinheira, entre o costureiro e a costureira; basta que os homens assumam tarefas reputadas femininas e as realizem fora da esfera privada para que elas se vejam com isso enobrecidas e transfiguradas (BOURDIEU, 1999, p. 74).

As diferenças entre os sexos compreendidas como construções sociais e não

como “destinos biológicos” indicam que a sociedade instaura patamares de poder e

dominação. Assim, estabelece segregações e valorações que acabam por

determinar um valor para o trabalho masculino diferente do feminino, não só no que

concerne á remuneração, mas também quanto ao reconhecimento social da tarefa e

da profissão.

As profissões ditas qualificadas cabem aos homens [...] porque em parte toda profissão, seja ela qual for, vê - se de certo modo qualificada pelo fato de ser realizada por homens (que, sob esse ponto de vista, são todas, por definição, de qualidade (Ibidem, p. 74).

Segundo Silveira e Almeida (1991, p. 34) a opressão feminina se dá assim,

pela:

[...] categoria sexo ser historicamente marcada pela discriminação, submissão, via de regra ocupando papéis secundários na divisão social do trabalho. Uma espécie singular carregada de mitos e fantasias que reforçam a posição de dependência e submissão.

Assim, apesar da conquista do mercado de trabalho, as mulheres se

encontram em condições subalternas, ganhando menos e sem reconhecimento, o

que mostra que o crescimento econômico não foi igual para todos.

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100

A participação política da mulher avançou, em todo o mundo e, no Brasil,

particularmente, tivemos muitas conquistas como a constituição de 1988 que

garantiu, entre outras conquistas, a licença maternidade de 120 (cento e vinte) dias,

ao invés de 90 (noventa), criou a licença-paternidade e estendeu o direito de creche

para os filhos de trabalhadores independentemente do sexo. Ainda na década de

1990 foram criadas as lavanderias coletivas e os programas de geração de renda.

Mas, mesmo após essas conquistas, as mulheres continuam enfrentando

muitos problemas na área do trabalho. Como já assinalamos, se requer maior

dedicação das mulheres do que do homem no cuidado dos filhos Elas, em geral, têm

que abandonar o emprego, quando resolvem tê-los, fazendo cair o número de

trabalhadoras entre 24 (vinte e quatro) e 30 (trinta) anos. Elas também abrem mão

de empregos formais com horários rígidos em função das crianças, obrigando-as a

se vincularem a trabalhos informais ou a jornadas parciais, pela possibilidade de

conciliar o trabalho com os filhos e o trabalho doméstico. Todos esses elementos

trazem prejuízos para as mulheres na medida em que, impossibilitam seu

crescimento profissional, impedindo-as de assumirem cargos de chefia, por exigirem

um maior tempo de dedicação.

A reestruturação produtiva trouxe consigo novos desdobramentos para a

questão de gênero. As mulheres sofreram ainda mais com esse novo modelo de

exigência, na medida em que devido a sua dupla jornada (que é vista como natural),

se torna muito difícil que ela alcance o nível de qualificação desejável, obrigando-a a

se submeter a trabalhos que exijam menor qualificação profissional e tempo

disponível, estando atrelada, muitas vezes, ao mercado informal, sem a garantia de

direitos trabalhistas. A este respeito, Antunes (1995, p. 46) assinala que uma crítica

conseqüente ao capital, enquanto relação social deve, necessariamente, apreender

a dimensão de gênero:

A presença feminina no mundo do trabalho nos permite acrescentar que, se a consciência de classe é uma articulação complexa, comportando identidades e heterogeneidades, entre singularidades que vivem uma situação particular no processo produtivo e na vida social, na esfera da materialidade e da subjetividade, tanto a contradição entre o individuo e sua classe, quanto àquela que advém da relação entre classe e gênero, tornaram-se ainda mais agudas na era contemporânea. A classe-que-vive-do-trabalho é

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tanto masculina quanto feminina. É, portanto, também por isso, mais diversa, heterogênea e complexificada. Desse modo, uma critica do capital, enquanto relação social, deve necessariamente apreender a dimensão de exploração presente nas relações capital/trabalho e também aquelas opressivas presentes na relação homem/mulher, de modo que a luta pela constituição do gênero-para-si-mesmo possibilite também a emancipação do gênero mulher.

Percebe-se, nitidamente, que ocorreram mudanças como a desproletarização

relativa do trabalho industrial, a incorporação do trabalho feminino, subproletarização

(trabalhos temporários e parciais) e um crescimento do setor de serviços, que está

evidente no crescimento absoluto do setor terciário. Uma outra conseqüência, de

grande importância, é a mudança na forma do trabalho que, de um lado, se dá pela

exigência cada vez maior de qualificação e, de outro, na crescente desqualificação

de grandes contingentes de trabalhadores. Neste sentido, não houve uma

eliminação do trabalho, mas sim uma intelectualização de uma parcela da classe

trabalhadora e a exclusão crescente dos trabalhadores não qualificados,

aumentando o número de desempregados.

Como já foi citado, as mulheres estão dentre os mais prejudicados com essa

nova exigência do mercado já que sua dupla jornada, na esfera privada e na pública,

as impossibilita, muitas vezes, de alcançar uma maior qualificação, fazendo com que

se submetam a trabalhos parciais e temporários.

Em relação às mulheres, o mercado de trabalho as exclui/inclui de diversas

formas. Segundo Helena Hirata (2005), de um lado, existem certas discriminações,

como a questão da idade, na qual as pessoas mais jovens estão sempre em

vantagem, porque, as com menor idade são tidas como mais dispostas, mais hábeis.

Ademais, existem também as discriminações em relação ao estado civil, as

mulheres casadas ou com filhos pequenos não são bem vistas, porque podem

aumentar o absenteísmo no trabalho. Percebemos então obstáculos do próprio

mercado de trabalho que limita o ingresso da mulher. Mas existem outros obstáculos

como em relação à família, o espaço familiar, onde, por exemplo, aquelas que

possuem filhos pequenos têm dificuldade para trabalhar no ritmo desejável pelas

empresas, com horários regulares, entre outras exigências. Muitas vezes, essas

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empresas não possuem creche ou porque a “conciliação” entre o trabalho

profissional e a família é exigida somente para as mulheres e não para os homens.

Fica evidente que esses desafios e obstáculos estão ligados ao fato de que o

cuidado da casa e da família, dos filhos, das crianças é visto como obrigação da

mulher, cabendo a ela o destino e o cuidado com a família. E tudo isso entra em

concorrência com a possibilidade de ter uma atividade profissional.

3.3. Mulher e trabalho no Brasil

As contradições do sistema capitalista geram um processo de desigualdade

social e econômica que, no caso brasileiro, se caracteriza por uma divisão estrutural

e desumana. No Brasil, nos anos de 1970, grande parte da força de trabalho

feminina foi absorvida pelo comércio, na indústria e prestação de serviços27. O

avanço da industrialização transformou a estrutura produtiva, a continuidade do

processo de urbanização e a queda das taxas de fecundidade, proporcionou um

aumento das possibilidades das mulheres encontrarem postos de trabalho na

sociedade. O trabalho remunerado era visto então, como forma de emancipação da

dona de casa e de seu papel subjugado na família, uma vez que a idéia da

subordinação da mulher estava ligada a sua exclusão do mundo produtivo. Este era

então o fundamento das idéias feministas.

No tocante ao mundo do trabalho, Antunes coloca que se observa uma

diminuição da classe operária industrial tradicional e, paralelamente, houve uma

expansão do assalariamento no setor de serviços, como também uma

heterogeneização do trabalho expressa, fortemente, na entrada da mão-de-obra

feminina no mundo operário. Observa-se também uma subproletarização com a

expansão do trabalho parcial, temporário, precário, subcontratado, terceirizado que

marca a sociedade dual no capitalismo avançado (ANTUNES, 1995). Esse trabalho

vinculado à economia “informal” coloca os/as trabalhadores/as em situação de

27 O Brasil, neste período, vivendo na Ditadura Militar, entra na fase do “milagre econômico”, o que proporcionou a entrada maciça das mulheres no mercado de trabalho.

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precariedade no emprego e na remuneração, desregulamentação das condições de

trabalho, e como conseqüência, a redução dos direitos sociais e a ausência de

proteção sindical.

Na verdade, o desemprego estrutural atinge a população em escala mundial.

Dessa forma, o trabalho precário e assalariado no setor de serviços inclui as

mulheres e exclui os jovens e os velhos, tornando a classe trabalhadora

heterogênea, fragmentada e complexa.

Assim, um enorme contingente de mulheres é encontrado não só no setor

têxtil, mas em novos ramos como na indústria microeletrônica e no setor de serviços.

A mudança na estrutura produtiva e no mercado de trabalho aumentou a exploração

das mulheres em ocupações de tempo parcial, nos trabalhos domésticos. Na

França, mais de 80% (oitenta por cento) dos postos de trabalho em tempo parcial

foram, entre 1982 e 1986, ocupados por mulheres e verifica-se que a presença

feminina representa mais de 40% (quarenta por cento) da força de trabalho total, em

vários países de capitalismo avançado (Antunes 1991). Os dados sobre trabalho e

rendimento do ano de 2004 nos mostram que 51,6% (cinqüenta e um vírgula seis

por cento) das mulheres no Brasil estavam empregadas, contra 73,2% (setenta e

três vírgula dois por cento) de homens. No Rio Grande do Norte, para o mesmo

período, a porcentagem era de 43,6% (quarenta e três vírgula seis por cento) das

mulheres contra 24% (vinte e quatro por cento) de homens.

No Rio Grande do Norte ¼ (um quarto) da população trabalha por conta

própria, 21,4% (vinte e um vírgula quatro por cento) sem carteira e 19,5% (dezenove

vírgula cinco por cento) com carteira, isso significa que 65,3% (sessenta e cinco

vírgula três por cento) da população deixou de contribuir para a previdência (IBGE,

2004).

Com relação às famílias chefiadas por mulheres, ou seja, nas quais a renda

principal advêm do membro feminino, no Brasil, elas representavam 90,4% (noventa

vírgula quatro por cento) de mulheres que não possuíam cônjuge. Esse número

mostra que, apesar de ainda existir a crença na sociedade de que a função social da

mulher é o casamento e os filhos, essa não é mais uma realidade (IBGE, 2004).

Em relação à renda per capita, 28,1% (vinte e oito vírgula um por cento) dos

arranjos familiares tem uma renda mensal de até ½ (meio) salário mínimo e 40,2%

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(quarenta vírgula dois por cento) até 1 (um) salário, no Rio Grande do Norte e, no

Brasil, respectivamente 26% (vinte e seis por cento) e 23,6% (vinte e três vírgula

seis por cento). O que demonstra que a faixa de pobreza é enorme principalmente

aqui no Estado, denunciando a situação de inúmeras mulheres chefiando suas

famílias com uma renda abaixo da linha de pobreza (IBGE, 2005).

Desta forma, cresceu cada vez mais a inserção das mulheres no mercado de

trabalho formal ou informal, como já assinalamos. Contudo, a reestruturação

produtiva trouxe novos desafios, principalmente no que se refere a divisão sexual do

trabalho.

Assim, a inserção feminina no mercado de trabalho, a inserção das mulheres

no setor de serviços e mais, especificamente, no setor de alimentação remete a

divisão sexual do trabalho, que destina as mulheres o ato de servir e nutrir. Neste

sentido, a inserção das mulheres no setor de fast food também remete,

necessariamente, a discussão da divisão sexual do trabalho, pois a inserção

crescente das mulheres no mundo do trabalho também contribui para a modificação

na forma de se alimentar. Neste sentido, os fast foods lanchonetes se mostram

como alternativas a esse processo, oferecendo refeições rápidas, e se tornando uma

opção para este novo estilo de vida, de consumo e de alimentação. Veremos como

este estilo de vida tem afetado a vida de homens e mulheres em Natal na rede de

alimentos Restfood.

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4. REPRODUÇÃO LOCAL DO SISTEMA FAST FOOD E O TRABALHO

FEMININO.

Criamos a época da velocidade,

mas nos sentimos enclausurados dentro dela.

(Charlie Chaplin)

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4. Reprodução local do sistema fast food e o trabalho feminino

4.1. Configurações da rede de fast food no âmbito local

Diante das fortes pressões exercidas pelo capital na direção da apropriação

dos saberes e fazeres dos trabalhadores, pela via da introdução do trabalho

participativo, da flexibilização dos trabalhadores, nos propusemos a traçar linhas

gerais sobre as relações de trabalho na cadeia de fast food Restfood e os impactos

que as mesmas vêm causando nas vivências e experiências dos/as

trabalhadores/as que deles participam. Para tanto entram em discussão a divisão

sexual do trabalho nessa área do setor de serviços que mescla práticas fordistas e

toyotistas de organização do trabalho.

Durante praticamente toda a história o ser humano vem procurando exercer

um domínio sobre a natureza, no sentido de transformá-la em algo consumível que

atenda às suas necessidades de sobrevivência. O processo histórico demonstra

haver uma complexificação constante no modo como vem se dando este controle.

Para os efeitos do interesse deste estudo vamos partir dos primórdios da forma de

organização do modo de produção capitalista. Marx (1987) identificou três formas

básicas que caracterizam o desenvolvimento do controle capitalista sobre a força de

trabalho, associado à intensificação do processo de acumulação do capital. Trata-se

das seguintes formas: 1) cooperação simples; 2) divisão manufatureira do trabalho;

3) a maquinaria e a grande indústria.

As características centrais de cada uma destas formas varia de acordo com

uma forma específica de organização do processo de trabalho associada a um modo

particular de divisão do trabalho que, por sua vez, se encontra orientada segundo os

elementos da base técnica que estruturam o processo produtivo. Em linhas gerais

percebemos que este movimento de complexificação do modo de produção

capitalista pode ser caracterizado por dois movimentos. O primeiro expressa a busca

do controle do trabalho através da subtração do seu conteúdo subjetivo. Este

movimento representa uma transferência clara dos saberes e fazeres do trabalhador

em prol da acumulação capitalista. À medida que o trabalho vai se transformando o

capital passa a incorporar os conhecimentos absorvidos dos trabalhadores em

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elementos mecânicos, através das máquinas. É exatamente na base técnica que

encontramos o segundo movimento de controle do trabalho. Com o desenvolvimento

tecnológico, as máquinas acabaram por sintetizar, de modo mecânico, um dado

conjunto de tarefas anteriormente realizadas pelos trabalhadores. Assim, os

trabalhadores passaram a se ajustar às características das máquinas. Isto implicou

na redução dos graus de liberdade e na perda relativa da autonomia, que o

trabalhador possuía para organizar, não só o modo de fazer uma tarefa segundo as

suas características fisiológicas, como também os arranjos mentais, produto da sua

subjetividade enquanto ser socialmente constituído. Com o controle objetivo do

processo de trabalho o trabalhador perde a condição de sujeito, transformando-se

em objeto neste processo (Ruas, 1985, p. 27).

De acordo com Marglin (1996), o avanço no processo de acumulação está

diretamente relacionado ao crescimento do controle sobre o processo produtivo

exercido pelo capital. Em outras palavras, a intensificação da acumulação depende

do grau de domínio que o capital exerce sobre o trabalho.

Considerando a passagem da corporação dos artesãos ao capitalismo

industrial, encontramos um sucessivo processo de divisão técnica e social do

trabalho, até o momento em que este se torna tão simples que pode ser realizado

por qualquer trabalhador indistintamente. Há uma disputa de poder que caracteriza a

passagem de um modo de produção e organização social a outro. Nesta luta pelo

poder, foi instituído o putting-out system como forma de reduzir o controle exercido

pelas corporações e desvincular as figuras do produtor e do comerciante (Marglin,

1996 p. 75).

O putting-out system é uma forma de produção que realiza uma das primeiras

divisões técnicas do trabalho ao provocar uma fragmentação da produção entre os

artesãos. Assim, cada um se especializava na sua parte do produto, gerando um

aumento de produtividade. Contudo, o domínio do capital sobre o trabalho ainda era

muito frágil, o que comprometia a completa previsibilidade da produção. O putting-

out system não só realizou a primeira quebra de resistência ao desenvolvimento do

capitalismo industrial, como também criou as bases do livre mercado de trabalho e

de mercadorias (Marglin, 1996 p. 75).

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O processo de contradições internas do putting-out system levaram ao factory

system. Essas contradições estão ligadas à necessidade de controle sobre o

trabalhador que o capital requer para obter a máxima exploração do trabalho. Ao

capital não bastava o domínio sobre o produto (a mercadoria), ele necessitava,

também, o controle e domínio do processo de produção, o que corresponde ao

exercício do poder sobre os trabalhadores, sobretudo no que se refere ao controle

do ritmo do trabalho. Com o surgimento das fábricas o capital passa gradativamente

a aumentar o seu domínio e controle sobre o trabalho, podendo explorá-lo, cada vez

mais para a ampliação da acumulação (MARGLIN, 1996 p. 58).

Ao retirar o conteúdo subjetivo do trabalho, tornando-o cada vez mais

concreto, objetivo e controlável, o capital começa a reunir a possibilidade de

desenvolver o planejamento que favorece o encontro da previsibilidade necessária

ao processo de ampliação da acumulação capitalista. Ao que parece, este seria o

melhor dos mundos para o desenvolvimento do capitalismo, se não fosse o conjunto

de resistências que os trabalhadores exercem no cotidiano fabril.

Como forma de conter as manifestações de rebeldia dos trabalhadores surge

outro elemento de controle e de exercício do poder do capital no interior das

fábricas. Trata-se do código de conduta e disciplina fabril. Uma cartilha contendo,

sobretudo, as obrigações dos trabalhadores e o conjunto das punições para as

transgressões realizadas. As manifestações de emprego da subjetividade dos

trabalhadores tornam-se mais inibidas com o emprego dos princípios tayloristas que

procuravam controlar os tempos e movimentos despendidos na realização dos

trabalhos (MAGLIN, 1996).

No que tange aos interesses deste estudo gostaríamos de ressaltar a

importância do controle sobre a subjetividade do trabalhador no exercício do seu

trabalho. Como vimos, desde os primórdios do modo de produção capitalista, o

capital vem procurando, a todo custo, exercer um controle cada vez maior, sobre a

força de trabalho, no sentido de sufocar toda e qualquer manifestação da

subjetividade dos trabalhadores, como se esta representasse um risco ao processo

de acumulação. No entanto, na década de 1950, encontramos um movimento no

sentido oposto por parte das empresas norte americanas e européias, quando um

conjunto de experiências procuraram resgatar o universo das subjetividades dos

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trabalhadores, através da adoção de princípios participativos no processo de

trabalho.

Diante de um trabalho excessivamente controlado, desinteressante, pouco

criativo e nada desafiador, parte dos trabalhadores americanos e europeus não

tinham estímulo para procurar trabalho, ao mesmo tempo em que aqueles que se

encontravam empregados praticavam as mais variadas formas de recusa e

resistência, dentre as quais estavam as faltas, sabotagens, pedidos de demissões

intempestivas. Estas reações não só prejudicavam as ações de planejamento e

previsibilidade do capital, como também demonstravam que o processo de trabalho

taylorizado acabava por retirar toda a inventividade e a criatividade dos

trabalhadores. De um certo modo, a ampliação da acumulação capitalista dependia

em parte da criatividade e inventividade dos trabalhadores. Sem esta criatividade e

inventividade a fábrica não funcionaria, pois seguir a risca os padrões de produção

significava uma redução concreta do volume da produção. Eis que surge, assim, a

idéia do resgate da subjetividade dos trabalhadores e da adoção de princípios

participativos no processo de trabalho (ANTUNES, 2006).

Ao que tudo indica, o capitalismo está realizando um retorno, uma retomada

de alguns princípios presentes nos seus primórdios, cuja base é o resgate de parte

da subjetividade dos trabalhadores que o capital tanto insistiu em eliminar do

cotidiano fabril. Segundo percebemos, há um movimento claro e explícito do capital

em resgatar a contribuição de cada trabalhador, enquanto expressão da sua

subjetividade, como forma de alavancar o processo de aumento da produção. É

através do processo de participação que esse movimento vem se dando ao longo

das últimas décadas.

Muito embora o Brasil tenha assistido a introdução dos princípios do processo

de participação no ambiente fabril no final dos anos 1970 e durante os anos 1980,

sobretudo na forma dos Círculos de Controle de Qualidade (CCQ) aplicados na

indústria japonesa desde os anos 1960, é no final dos anos 1980 e durante os anos

1990 que o capitalismo brasileiro começa a introduzir com mais vigor os princípios

dos processos participativos, como forma de atender as demandas de mercado. Ou

seja, o capitalismo começou a perceber a importância do resgate da subjetividade e

da vivência dos/as trabalhadores/as no cotidiano do trabalho.

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Seguindo esta linha de raciocínio, nasceu a rede Restfood. Segundo seus

fundadores, a filosofia Restfood esta baseada no desenvolvimento sustentável, na

integração das pessoas, e na valorização do meio ambiente na busca do lucro. Para

a incorporação dessa filosofia o Restfood conta com a qualificação técnica do seus

funcionários - chamados “colaboradores”, no nível comercial e comportamental, que

se realiza no “Centro de Excelência”, no qual funcionários, corpo técnico e

administrativo participam de treinamentos.

A rede Restfood iniciou suas atividades voltadas ao segmento de Fast Food,

em 1984, a partir da iniciativa de um jovem e do seu primo. A primeira marca, muito

colorida como a maioria das marcas da época, apresentava como ícone dois

coqueiros com um sol nascendo por trás, seguindo o estilo jovem-surfista-radical.

O Restfood começou como uma pequena lanchonete que vendia apenas

sanduíches e refrigerantes em um antigo shopping da cidade de Natal. Com o

crescimento da demanda criou-se a necessidade de oferecer um espaço mais

confortável e com um cardápio variado. Surge, então, o terceiro e definitivo

endereço, embora não o único. Hoje, a matriz, objeto de análise de nosso estudo,

fica localizada em uma das principais avenidas de Natal e, em pouco tempo se

tornou a lanchonete preferida da cidade.

Outras filiais surgiram nos principais shoppings da cidade e nas praias de

maior movimento durante o verão.

Vinte anos após a sua inauguração, o Restfood continua sendo uma

referência no segmento de lanchonetes, para os jovens da cidade do Natal. O

Restfood recebeu o prêmio "Qualidade Brasil" como a melhor sanduicheria da região

nordeste e, por dois anos consecutivos, foi destaque na pesquisa de preferência e

simpatia do público, da EMBRAPES.

Como já nos referimos anteriormente a marca Restfood teve o seu nome

como o primeiro mais lembrado pelo público, no segmento de fast food/lanchonete,

na última pesquisa "Top of Mind", publicada pela revista FOCO, e o número do seu

call center foi o número mais solicitado pelo público junto à TELEPESQUISA e

MULTIPESQUISA, empresas prestadoras de informações telefônicas em Natal/RN.

Após vários contatos com os administradores da loja matriz, tomamos

conhecimento que as 6 (seis) lojas estão sob a responsabilidade de 2 (duas)

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pessoas diferentes e, percebemos que nossa pesquisa seria melhor aceita nas 4

(quatro) lojas que estavam sob a mesma administração do responsável pela loja

matriz.

Inicialmente, trabalharíamos com um universo de 271 funcionários,

correspondendo a 4 (quatro) lojas, assim distribuídas:

• Matriz – localizada numa das principais avenidas da cidade;

• Filial 1 – localizada no shopping da zona sul de Natal;

• Filial 2 – localizada num dos bairros de maior fluxo turístico;

• Filial 3 – localizada num importante supermercado da cidade;

Distribuição MATRIZ FILIAL 1 FILIAL 2 FILIAL 3

Funcionários

por sexo H M H M H M H M

*Gerência 02 - - - - - - -

Supervisor - - 01 - 01 - 01 -

*Cozinha 43 - 21 - 10 - 12 -

*Atendente

de loja 02 29 01 16 - 01 - 05

Atendente

delivery03 06 - - - - - -

*A.S.G 07 03 - 02 - - - -

*Caixas 06 04 01 03 - 02 - 02

Motoqueiros 39 - 06 - - - - -

*Produção 11 04 - - - - - -

Estoque 05 - - - - - - -

*Escritório 02 06 - - - - - -

*Recreadores

(parque) 03 03 - 01 - - - -

Fiscal - - 02 - - - - -

Líder - - 02 - - - 01 -

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Expedidor - - 01 01 - - 01 01

TOTAL 123 55 34 22 11 03 15 08

% 69,1% 30,9% 60,7% 39,3% 78,6% 21,4% 65,2% 34,8%

Total geral

por loja 178 56 14 23

A partir do quadro, percebeu-se predominância masculina na cozinha e na

produção dos alimentos que tradicionalmente são atividades femininas. Em funções

como a entrega de mercadorias e estoque, a predominância masculina é justificada

pela necessidade do uso da força física. Percebe-se também que, em cargos como

supervisão e administração existem somente mulheres. Enquanto cargos como a

gerência e a fiscalização das lojas são desempenhadas somente por homens.

Nestas 4 (quatro) lojas, os/as funcionários/as estão assim distribuídos: 271

(duzentos e setenta e um) ao todo, dos quais 183 (cento e oitenta e três) - 67,5%

(sessenta e sete vírgula cinco por cento) são homens e 88 (oitenta e oito) - 32,5%

(trinta e dois vírgula cinco por cento) são mulheres.

Os números a que tivemos acesso foram os seguintes:

Lojas Homens Mulheres Total

Matriz 123 69,1% 55 30,9% 178

Filial 1 11 78,6% 03 21,4% 14

Filial 2 34 60,7% 22 39,3% 56

Filial 3 15 65,2% 08 34,8% 23

Total 183 67,5% 88 32,5% 271

Ao compararmos o quantitativo dos funcionários nas 4 (quatro) lojas sob a

mesma administração, percebemos que poderíamos realizar a pesquisa somente na

loja matriz, e que isto não representaria nenhum prejuízo para a pesquisa, pois esta

loja é a que reúne o maior número de funcionários (178 funcionários/as)

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representando, quantitativamente, 65% (sessenta e cinco por cento) dos

funcionários em relação a todas as 4 (quatro) lojas (271 funcionários/as ao todo).

MATRIZ

Cargos

Ocupados

Homens Mulheres Total

Gerência 02 100% - 0% 02

Cozinha 43 100% - 0% 43

A.S.G 07 70% 03 30% 10

Atendentes

de loja

02 6,5% 29 93,5% 31

Atendentes

delivery

03 33,4% 06 66,6% 09

Caixa 06 60% 04 40% 10

Parque 03 50% 03 50% 06

Motoqueiros 39 100% - 0% 39

Produção 11 73,3% 04 26,7% 15

Estoque 05 100% - 0% 05

Escritório 02 25% 06 75% 08

Total Geral 123 69,1% 55 30,9% 178

De posse do quadro acima, inicialmente, fizemos a escolha de realizar 17

entrevistas assim distribuídas:

Cargos ocupados Homens Mulheres Total

Gerência 01 - 01

Cozinha 02 - 02

A.S.G 02 01 03

Atendentes de

loja 01 02 03

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Atendentes

delivery - - -

Caixa 01 01 02

Parque

(recreadores) - - -

Motoqueiros - - -

Produção 02 01 03

Estoque 01 - 01

Escritório 01 01 02

TOTAL GERAL 11 06 17

Na escolha quantitativa apresentada no quadro anterior, foram considerados

os cargos ocupados e a proporção de homens e mulheres por cargo. Foram

excluídos/as das entrevistas os motoqueiros (profissão ocupada somente por

homens), os/as recreadores/as (profissão relativamente equitativa do ponto de vista

da proporção entre homens e mulheres) e os atendentes delivery (já contemplados

nas entrevistas com os/as atendentes de loja).

Após a qualificação do projeto, segundo sugestões da banca nosso universo

de pesquisa foi alterado, devido a ausência de tempo hábil para a realização do

número de entrevistas proposto inicialmente. Dessa forma, foram realizadas 6 (seis)

entrevistas, distribuídas entre funcionários/as da gerência, do atendimento, da

produção de alimentos e do setor de recursos humanos.

4.2. A pesquisa e as falas dos sujeitos sobre suas condições de vida e trabalho

Realizamos pesquisa qualitativa com trabalhadores da gerência, do setor de

Recursos Humanos, atendimento ao cliente e do setor de produção dos alimentos.

Para analisar e desvendar o nosso objeto de pesquisa, nos utilizamos de entrevista

semi-estruturada com a combinação de perguntas abertas e fechadas. Além das

entrevistas realizadas, para maior aproximação ao nosso objeto, se fez uso da

observação assistemática.

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Os entrevistados foram selecionados de acordo com os setores em que

haviam uma nítida divisão sexual do trabalho. Um olhar mais atento as cadeias de

fast food, denunciaram uma realidade de precarização do trabalho feminino. Em

estabelecimentos como o Restfood, as cozinhas são compostas exclusivamente por

homens, e o mesmo se dá em cadeias como o McDonald’s, e outras grandes

empresas do setor de fast food. Como já foi dito em capítulos anteriores o trabalho

feminino antes considerado como trabalho unicamente doméstico e restrito a vida

privada, passa a ganhar status de profissão, mas quando assumido por homens. O

que essas cadeias de fast food pretendem demonstrar é que seu alimento é feito de

forma profissional, portanto não é um sanduíche comum, como o que se costuma

comer em casa, feito pelas mães ou empregadas. Mas sim, um sanduíche feito por

um profissional e, portanto, um homem. No “Restfood “ a realidade obedece a essa

mesma lógica.

Voltando ao relato da pesquisa, as dificuldades foram inúmeras. Por se tratar

de uma empresa privada, as limitações foram logo postas. Inicialmente, a empresa

se recusou a permitir a realização da pesquisa e conseqüentemente das entrevistas.

Após muita insistência nos foi permitido fazê-las, desde que todo e qualquer material

a ser publicado, passasse primeiramente pelo aval do setor de marketing da

Restfood.

Começamos os primeiros contatos ainda no mês de agosto de 2005, e as

entrevistas foram realizadas de julho a agosto de 2007. Inicialmente, todas foram

gravadas, mas após realizarmos 5, nossa presença passou a incomodar a

administração que acreditava, tratar-se de algum tipo de fiscalização. A partir desse

momento, as entrevistas foram proibidas de serem gravadas e alguns funcionários

recuaram, com medo de possíveis demissões.

Apesar das inúmeras dificuldades encontradas na fase empírica de nossa

pesquisa, nosso esforço nos levou no sentido da maior apreensão possível para o

desvelamento do nosso objeto de estudo.

Se fizeram prioritárias nesse estudo, as questões relacionadas ao regime de

exploração ao qual são submetidos homens e mulheres trabalhadores/as desse tipo

de serviço, bem como as relações entre eles e a divisão sexual existente nesse

ramo de produção.

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Nesse sentido, as questões do roteiro de entrevista nos orientaram para a

obtenção de resultados acerca da negação de direitos trabalhistas, da consciência

da exploração vivenciada, das formas de controle, da saúde do trabalhador e da

precarização do trabalho feminino.

A seguir, apresentamos os dados coletados na primeira parte das entrevistas,

que corresponde ao perfil de todos/as os trabalhadores/as entrevistados/as.

- Perfil dos entrevistados/as:

Os gráficos a seguir, apresentados, foram constituídos em relação ao número

dos entrevistados/as, ou seja, 6 (seis) pessoas).

Gráfico 1 - Caracterização dos funcionários/as Restfood quanto ao sexo

3

3

0 0,5 1 1,5 2 2,5 3

SEXO

Sexo

HOMENS MULHERES

Gráfico 2 – Caracterização dos funcionários/as Restfood quanto ao

número de filhos

3

2

1

0 0,5 1 1,5 2 2,5 3

NÚMERO DEFILHOS

Número de filhos

Não possui 1 Filho 3 Filhos

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Gráfico 3 – Caracterização dos funcionários/as Restfood quanto a faixa

salarial

1

3

2

FAIXA SALARIAL

Faixa Salarial

Até 1 salário mínimo De 1 a 3 salários De 3 a 6 salários

Como mostram os gráficos anteriormente apresentados, dos/as 6 (seis)

entrevistados/as, 3 (três) não tem filhos e os/as demais variam entre 1 (um) e 3 (três)

filhos. Quanto a faixa salarial 4 (quatro) entrevistados/as ganham até 3 (três) salários

mínimos, enquanto 2 (dois) recebem entre 3 (três) a 6 (seis) salários mínimos.

Tabela 1 – Perfil Pessoal dos entrevistados/as

NOME FICTÍCIO30 FAIXA ETÁRIA ESTADO CIVIL

Cravo Entre 21 e 30 anos Casado

Petúnia Entre 21 e 30 anos Separado

Angélica Entre 21 e 30 anos Separada

Antúrio Entre 21 e 30 anos Solteiro

Lírio Entre 31 a 40 anos Solteiro

Verbena Entre 41 a 50 anos Solteira

30 Todos os nomes relatados são fictícios e algumas informações que poderiam permitir a identificação dos/as trabalhadores/as foram suprimidas.

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Os entrevistados estão na faixa entre 21 (vinte e um) e 50 (cinqüenta) anos, e

percebemos que na empresa não existem pessoas com mais de 50 (cinqüenta) anos

de idade, exceto o dono do fast food. Como se percebe na tabela, a maioria dos

entrevistados se encontram na faixa etária entre 21 e 30 anos (4 pessoas) não

possuem uma união estável com parceiro (3 solteiros, 2 separados e somente 1

casado), o que pode indicar que o ritmo intenso de trabalho que não permite tempo

disponível para as relações pessoais. Como coloca Petúnia:

Eu era casada e quando trabalhei na madrugada me separei. [...] Porque eu passava as noites todas aqui. Eu passava até sete dias sem ver o meu marido. Porque ele trabalhava de dia e eu trabalhava a noite. Quando eu saia, ele ainda não tinha chegado. Quando eu chegava de oito horas da manhã ele já tinha saído. De domingo a domingo. Porque assim, eu saia daqui de seis horas da manhã, ia pra parada, chegava em casa de sete e meia e ele saia de casa seis horas da manhã. Quando eu tava saindo daqui ele já tava saindo de casa. Quando eu saia pra vir para cá, ele ainda não tinha chegado [...] A gente vive mais aqui do que na nossa própria casa. É, eu vivo mais aqui do que em casa (Petúnia).

Durante a semana eu chego em casa, tomo um banho, janto e vou dormir. Nem tempo pra namorar tem (Antúrio).

Percebe-se claramente que o trabalho não deixou de ser central na vida do

ser humano, muito pelo contrário, a cada dia, as pessoas estão mais dependentes e

focadas para o seu trabalho.

[...] a busca de uma vida cheia de sentido, dotada de autenticidade, encontra no trabalho seu lócus primeiro de realização. A própria busca de uma vida cheia de sentido é socialmente empreendida pelos seres sociais para a sua auto-realização e coletiva. É uma categoria genuinamente humana, que não se apresenta na natureza. [...]. dizer que uma vida cheia de sentido encontra na esfera do trabalho seu primeiro momento de realização é totalmente diferente de dizer que uma vida cheia de sentidos é exclusivamente trabalho, o que seria um completo absurdo (ANTUNES, 1999. p. 143).

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Segundo Nogueira (2006), a busca de uma vida cheia de sentido dentro da

esfera do trabalho é central porque, por meio dele, temos um processo que não se

resume a transformação da natureza, mas sim possibilita a transformação do

trabalhador, ou seja, através do ato laborativo a própria natureza humana se

metamorfoseia.

Em relação à Escolaridade, temos o seguinte quadro:

Tabela 2 – Caracterização dos entrevistados/as quanto à escolaridade

NOME ESCOLARIDADE

Angélica Superior Completo

Verbena Superior Completo

Cravo Superior Incompleto

Petúnia Ensino Médio

Antúrio Ensino Médio

Lírio Médio Incompleto

Como se percebe, os funcionários do Restfood possuem, no mínimo, o nível

médio, com exceção das mulheres que trabalham no corte das verduras, no setor de

produção, que não são alfabetizadas.

Quando questionados sobre o desejo de dar continuidade aos estudos, os/as

entrevistados/as responderam, em sua maioria (5 funcionários/as) que desejariam,

mas a esmagadora maioria não dispõe de tempo e aquele que tem tempo (1

funcionário/a), mesmo que mínimo, prefere ficar em casa, com a família ou até

mesmo descansar. A rotina estressante impede os funcionários de buscar formação

em um curso superior. O único investimento se dá em cursos que permitam a

reprodução da vivencia do fast food e do aprimoramento das atividades já

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desenvolvidas dentro da cadeia. Atualmente, em parceria com o SENAC/RN estão

sendo oferecidos cursos de atendimento ao cliente: “Boas práticas” para os antigos

funcionários. Aqueles que pretendem se candidatar a uma vaga devem também ter

concluído esse curso.

É, porque aqui agora vai exigindo, então se a gente vai, agora, então tem que fazer esse curso. Então, justamente como a gente ta aqui o dono pagou, quem for entrar agora tem que fazer o curso por fora pagando do próprio bolso pra entrar aqui (Antúrio).

Em relação aos cursos oferecidos:

Pronto, esses quinze provavelmente funcionários, eles já recebem um certo tipo de pressão, pra ele já entrar no ritmo dos outros. Você percebe quando é um novato, você bota um novato pra fazer uma atividade já sente a diferença. Não pela agilidade, não pela forma que ele vai fazer, por todos fazem igual, mas pela rapidez que o outro faz (Cravo).

O ritmo frenético impõe ao trabalhador novos comportamentos, adaptações

que são levadas para a vida pessoal. É o controle da subjetividade do trabalhador,

explorado tanto física quanto psicologicamente.

Desde a sua origem, o modo capitalista de produção pressupõe um envolvimento operário, ou seja, formas de captura da subjetividade operária pelo capital, ou, mais precisamente, da sua subsunção à lógica do capital (observando que o termo “subsunção” não é meramente “submissão ou “subordinação”, uma vez que possui um conteúdo dialético – mas é algo que precisa ser reiteradamente afirmado). O que muda é a forma de implicação do elemento subjetivo na produção do capital, que, sob o taylorismo/fordismo, ainda era meramente formal e com o toyotismo tende a ser real, com o capital buscando capturar a subjetividade operária de modo integral (Antunes; Alves, 2004. p. 1)

Nas entrevistas realizadas, perguntamos aos/as funcionários/as a importância

em suas vidas do casamento, família, trabalho, estudo e participação política. A

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partir das respostas dadas, agrupamos os itens de acordo com a ordem de

importância que foi atribuída pelos/as entrevistados/as, Nela, o número 1 significa o

mais importante e o número 5 o de menor importância.

Tabela 3 – Ordem de importância da família, trabalho, participação política,

casamento e estudo na vida dos funcionários/as Restfood

ORDEM DE IMPORTÂNCIA

NOME FAMÍLIA TRABALHO CASAMENTO ESTUDO PART. POLÍTICA

Cravo 1 2 3 4 5

Petúnia 1 2 3 4 -

Lírio 1 2 4 3 5

Angélica 1 2 4 3 5

Antúrio 1 2 4 3 5

Verbena 1 3 2 4 -

Na tabela fica explícito que para a totalidade deles, a família está em primeiro

lugar, embora na vida cotidiana ela esteja renegada em função do trabalho. Mesmo

porque é em nome da sobrevivência da família que os indivíduos se submetem aos

mais diversos tipos de exploração. Neste sentido, em relação ao número de pessoas

que moram com os/as entrevistados/as temos o seguinte quadro:

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Gráfico 4 – Caracterização dos funcionários/as Restfood quanto ao

número de pessoas que moram na residência

2

1

2

1

0 1 2

Número depessoas

naresidência

Número de pessoas que moram na residência

De 5 a 7 pessoas

De 2 a 4 pessoas

1 pessoa

Com companheiro

Assim, o trabalho está no segundo lugar na lista de prioridades, ficando

abaixo somente da família, espaço de reprodução de homens e mulheres. Mais uma

vez evidencia-se a centralidade do trabalho na vida do homem, principalmente para

a classe trabalhadora para quem sua sobrevivência e da sua família, depende da

venda de sua força de trabalho. Observa-se também a modificação do valor

atribuído ao trabalho no universo feminino. Hoje, o trabalho para as mulheres é tão

importante quanto para os homens. Em seguida, vem o estudo, o casamento e por

último a participação política. Alguns desconsideraram a importância da participação

política, e os que a consideraram a colocaram em último lugar porque só a

conseguiam entender como a vinculação ou a troca de favores com políticos. Aqui,

percebe-se uma deformação e/ou redução do conceito de participação política,

entendida neste estudo como participação na decisão dos processos que dizem

respeito à coletividade.

- O ritmo e as condições de trabalho no Restfood

Quando indagado sobre a atuação do sindicato:

Então, o sindicato nunca fez uma reunião, ainda não apareceu nada pra fazer. Mas pro ano que vem pretendemos fazer algumas coisas.

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Só que não serei mais eu, não pode ser o mesmo funcionário dois anos seguidos (Lírio).

Aqui o sindicato, corresponde ao sindicato – empresa, no qual é presidente o

funcionário que melhor trabalha, que melhor se adequa às exigências do capital.

Neste sentido, a razão de ser do sindicato – lutar por melhores condições de

trabalho no constante conflito capital/trabalho – perdeu o sentido para esta visão de

mundo, engendrada pelo capital: o sindicato deve ser organizado para ajudar na

produção e organização do trabalho, no qual todos são “colaboradores”, em uma

harmoniosa relação capital – trabalho.

Já o trabalho da cozinha é visto pelos funcionários como aquele submetido ao

maior regime de exploração, fato que gera uma rivalidade entre funcionários do

atendimento e da cozinha. Deixando espaço para o desrespeito e críticas de uns

para com os outros, o que enfraquece a solidariedade de classe:

[...] pela profissão mesmo também e pela condição de ser mulher que é muito assim não aceitam assim porque a gente garçonete ganha até melhor do que eles da cozinha (Petúnia).

A principal característica das empresas do ramo de fast food, incluindo o

Restfood, é o atendimento realizado no menor tempo possível. Esse serviço abrange

entre os seus objetivos se destacar na prestação de um serviço considerado de alta

qualidade, limpeza e rapidez no atendimento.

Para tanto, os trabalhadores inseridos nesse ramo da prestação de serviços

são extremamente exigidos em relação ao controle do tempo e dos movimentos

para a execução das suas atividades.

Segundo a experiência de um funcionário/a em relação às exigências de

tempo mínimo para o preparo da comida:

[...] depende do produto. Por exemplo, pizza, petisco demoram mais um pouquinho, mas sanduíche a gente prima pela qualidade e rapidez né, principalmente porque a gente faz a parte da loja pra viagem. Então o delivery é um pouco mais complicado porque tem que ser mais rápido né. Então saiu ali um sanduíche de mesa e do delivery, então a gente da prioridade a mesa, mais do que o do

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delivery, porque você chega aqui de manhã e a loja tá vazia. Então senta, mas o viagem tá funcionando, muitos pedidos, mas o cliente que tá aqui não quer saber se lá tão fazendo os de entrega, quer saber que: “pô, não tem ninguém aqui na loja e o lanche demorando”. Então não justifica esse lanche demorar [...] É a gente fala alguns, que atolou [...] Essas coisas assim. atolou é porque a gente tem muita coisa pra fazer. Ai o cara lá atrás, atolou, atolou, ai pronto, já puxa dois, três, leva pra lá e tal. muita coisa pra fazer e não ta dando conta. Então a gente tem essa linguagem, a gente usa aqui, mais o líder né. Tem umas coisas ai, mas como a gente não fica direto na cozinha a gente não fala (Cravo).

No que diz respeito a suas atividades cotidianas:

A gente trabalha em fast food, então você vê que é um negócio rápido, você não pode ir exercer uma atividade e demorar muito. Então se tá demorando um pouquinho, o líder chega e diz: “bora, bora!” então [...] (Cravo)

E acrescenta:

É aquela pressão cotidiana. Então o homem já fica naquela, se você vai fazer uma atividade já é tão cobrado que não precisa cobrar mais. Já sai daqui, às vezes você chega em casa, vai fazer um negócio e pensa que ta aqui e já faz mais rápido. Vai no banco, você já não tem paciência mais de ficar em uma fila, esses casos assim um pouco mais. Então seu metabolismo (se acostuma) [...] (Cravo).

Os funcionários que estão na Restfood em sua maioria foram contratados

através da indicação de um conhecido.

O trabalho dentro da cadeia de fast food Restfood segundo as falas dos

entrevistados tem se configurado em um trabalho exaustivo, exploratório, que não

respeita a carga horária estabelecida pela lei trabalhista.

É a gente trabalha quatro dias, a gente trabalha seis horas corridas e dois dias a gente trabalha onze horas (Petúnia).

As chamadas “dobras” são os dois dias que geralmente são sábados e

domingos em que as garçonetes, atendentes e o pessoal da cozinha tem que

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trabalhar onze horas com uma hora para descanso. Na verdade, o trabalho no

Restfood é de segunda a segunda, com a folga semanal (1 dia). Os/as trabalhadores

têm direito a uma folga, no domingo, somente após 6 domingos de trabalho.

A folga da gente é corrida. Pronto, se eu folgar, eu folgo amanhã que é sexta aí na próxima semana eu vou folgar na quinta. A gente trabalha seis domingos para folgar um. Ai quando chega domingo[...] (Petúnia).

As garçonetes chegam a trabalhar seis domingos para conseguir uma folga

em outro domingo, pode-se observar que o trabalho se tornou onipresente na vida

desses trabalhadores, suas vidas se resumem ao trabalho.

Isso, ai folga um (domingo) porque vai chegar um domingo que vai ser minha folga, vai vir alternando, ai chegou o dia que cai em um domingo (Petúnia).

Durante a semana a carga horária de trabalho das garçonetes é de seis horas

corridas, com quinze minutos de intervalo que não são respeitados. Já os

trabalhadores da produção trabalham oito horas diárias com uma hora de descanso.

Observamos que muitas vezes eles nem chegam a se alimentar, pois se utilizam

desse horário para resolver questões pessoais, como ir ao banco, levar um filho ao

médico. Contudo, a saída da loja não é bem vista pela administração, e só se torna

possível se feito às escondidas.

Não, durante a semana são seis horas corridas sem direito a hora de descanso (Petúnia).

Tem uma hora que é o horário de almoço. A carga horária só fica pesada por causa dessas dobras que é de onze horas por dia. E as duas dobras é uma seguida da outra (Ibidem).

No escritório, a carga horária é de 44 (quarenta e quatro) horas semanais

com uma hora de intervalo e quinze minutos de descanso durante à tarde. Os

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gerentes de loja e o pessoal da produção também possuem uma hora para o

almoço, embora esse horário nunca seja respeitado.

Quando questionada sobre possuir direitos trabalhistas, uma entrevistada

mostrou que o ritmo de trabalho se alterou nos últimos cinco anos e

conseqüentemente os níveis de exploração:

Tem. Tem décimo, décimo terceiro. Só não tem o direito trabalhista que quando eu entrei a gente trabalhava três domingos e folgava um por mês. Ai foi cortado e foi colocada a escala fixa, ou, a escala corrida. Ai a gente perdeu. A gente trabalha seis, dois meses para folgar um ai fica um pouco puxado (Petúnia).

A empresa não contrata funcionários temporários, todos os funcionários do

Restfood são efetivos e têm em média cinco anos de empresa. Chegaram a rede

Restfood através de algum parente ou amigo em geral. A relativa estabilidade

oferecida pelo emprego no Restfood em uma conjuntura de crescente desemprego,

termina fazendo os/as trabalhadores/as que estão na produção e no atendimento, a

se submeterem a exploração, já que a realidade da administração é bem diversa.

Na gerência da loja o horário é bem variado, depende do turno. Os gerentes

diurnos têm sua carga horária de sete horas diárias, enquanto o gerente da

madrugada tem sua carga horária de quatro horas diárias (da meia noite às cinco da

manhã) com o salário equivalente e em alguns casos possui gratificações. Ele é

conhecido como “turista” pela equipe, por possuir maiores benefícios.

Ele é bem mais gratificado que a gente em horário e tal, e o dono deixa bem claro né, se tiver achando ruim vá pro horário dele (Cravo).

Os gerentes têm maior possibilidade de conseguir concessões para a

resolução de problemas pessoais, devido à existência dos folguistas:

É, aqui a gente, pela minha parte é fácil. Tem gente também que é beneficiada que tem os folguistas. Os folguistas tira, quando eu tô de folga ele fica no horário. Então quando eu preciso resolver um

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problema, ai a gente troca, ele vem no meu horário, eu venho no dele e tal. E a gente não teve nenhum problema desse tipo de trocar horário. Pronto, se eu tenho um problema de manhã, ai o gerente da noite pode vir de manhã e eu vir na parte do horário dele, resolvo meu problema [...] (Cravo).

Cravo afirma ser bastante exigido em sua função, mas possui alguns

benefícios em relação aos outros trabalhadores:

Muito exigido, mas assim, é tranqüilo. Tem o apoio, que já se falou, descansa, assiste (televisão) um pouquinho...(Ibidem).

A cobrança se dá no sentido do ritmo do seu trabalho:

A cobrança na verdade existe, principalmente do horário porque eu tenho que deixar tudo pronto. Eu não posso trabalhar em cima de noventa e nove por cento, tenho que trabalhar em cima de cem por cento, não pode falhar nada. Assim, até essa parte pessoal, às vezes a gente tem um horário privilegiado que é durante o dia e tal, e muitas pessoas pensam que a gente não tem o que fazer. Assim, mais da parte pessoal. Por exemplo, eu trabalho de dia e você a noite, ai você chega a noite com um certo tipo de problema pra resolver, ai pensam, eu pelo menos penso assim:” poxa, o cara passa o dia aqui e não resolveu isso” . Então assim, meu psicológico é preparado pra isso, pra ninguém chegar aqui e falar nada (Cravo).

Já na cozinha o trabalho se configura como um dos mais exaustivos.

Percebe-se nitidamente que coexistem formas taylorizadas mescladas com práticas

toyotistas.

Observamos que os trabalhadores do setor da produção e atendimento

entrevistados percebem o ritmo de exploração ao qual estão submetidos e muitas

vezes sentem na nossa presença durante a observação um conforto, uma forma de

denúncia. Ao nos depararmos com uma das garçonetes no banheiro da loja:

Olha, eu estou aqui, mas escondida, nós não temos o direito a usar esse banheiro, lá em cima (no prédio atrás da loja) existe um banheiro para nós, mas eu não tenho autorização para sair da loja. E eu só vim porque não agüento mais, tem uma amiga ali no lado de fora, me encobrir qualquer coisa.

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Sobre os quinze minutos de descanso:

É para comer, ir no banheiro e voltar [...] às vezes a gente vem , ta doente, naqueles dias, ai às vezes fica doente custa um pouquinho porque a gente entra demora, ai outro vai e fica, mas se for pego é punido (Petúnia).

Muitas vezes nossa presença em campo passou a ser um conforto, enfim

alguém que as/os escutava. Usavam a nossa presença em campo para tentar

denunciar práticas no que se refere à forma como o trabalho é realizado.

Na produção e na cozinha existe uma grande fragmentação do processo de

trabalho, mas essa divisão se rompe no caso da falta ou ausência de algum dos/as

funcionários/as. Todos/as os funcionários/as são capacitados/as para atuar em

todas as funções. O Restfood, seguindo o modelo do McDonald’s que possui uma

universidade para a formação de seus funcionários, possui igualmente em seu

prédio salas de aula em que são ministrados cursos para a prática e adesão ao

estilo de vida dos fast foods. Esse curso surgiu nos últimos cinco anos. Antes os

funcionários aprendiam na prática.

Para postos como o de garçonete não existe formação teórica, elas são

colocadas direto na prática e após sete dias são definidas como aptas ou não ao

trabalho. Os trabalhadores da cozinha passam pelo treinamento teórico e em

seguida o prático em todas as funções da cozinha. Sua contratação dependerá de

seu desempenho nessa fase do processo. A função para a qual será designado

dependerá da área em que melhor se desenvolveu.

Os líderes definem, no início do dia, o posto que o trabalhador irá ocupar no

caso de falta ou de necessidade de intensificação da produção em períodos como

dezembro que é um mês de aumento de demanda e ainda inclui, na nossa cidade, o

carnatal31.

O cotidiano do trabalho é tomado pela realização de tarefas repetitivas,

rotineiras de ciclo curto. O ritmo acelerado somado à monotonia das tarefas

realizadas levam a um desgaste físico e mental muito grande. A jornada de trabalho

31 O carnatal é o carnaval fora de época da cidade de Natal. Normalmente realizado na primeira semana de dezembro.

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demora a passar, as horas parecem não percorrer o ritmo normal, cada hora dura

uma eternidade. Os trabalhadores não têm o direito de opinar sobre a melhor forma

de fazer o seu trabalho. As regras e os procedimentos são fortemente controlados

pela estrutura de comando da produção -, os chamados líderes. Os trabalhadores

devem cumprir as ordens e os métodos de trabalho definidos pela empresa sem

contestação.

Eu subi de cargo né, eu era peão como os outros. Fazia o serviço braçal mesmo na produção, mas hoje eu sou o líder. Só que eu continuo recebendo o mesmo salário, isso que eu não entendi. [...] eu, perguntar o porquê? Deus me livre...eu volto a ser peão na mesma hora (Antúrio).

Quando indagado sobre quais atividades desenvolvia na produção:

Eu faço tudo, na verdade faço a mesma coisa de antes porque começam os comentários “agora que subiu tá se achando não quer mais ajudar”. Então eu faço tudo o que eu fazia e ainda faço mais, eu lidero, eu mando neles. Pelo menos agora eu é que dito o que deve ser feito, todos têm que me obedecer. E eu me sinto muito feliz por isso (ibidem).

Observamos que as formas de manipulação da subjetividade dos

trabalhadores são muito fortes:

Eu era motoboy só que vivia sendo assaltado, era muito perigoso. Ai surgiu essa vaga no atendimento, falei com o diretor e ele liberou. Gosto muito mais daqui, já ganhei até uma placa com a foto do funcionário do mês quando ainda tinha disso aqui. Todos me elogiam, sou até presidente do sindicato (Lírio).

- Relação entre funcionários: competição e solidão

Os/as trabalhadores/as percebem que o trabalho taylorizado acaba

arrastando-os para a solidão. Esta imagem é muito forte, pois ela traduz o quanto

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o/a trabalhador/a fica isolado/a em um posto de trabalho fazendo tarefas repetitivas,

restringindo-se a um solitário no meio da multidão, ou seja, ele/a não é nada mais

que um/a trabalhador/a dentre vários/as, cuja ação é desprovida de muito sentido,

cujo colorido, particularidade e singularidade não é reconhecida e substantivada pela

forma com que o trabalho está organizado. Estar no trabalho repetitivo, rotineiro é

estar sozinho/a, é mergulhar no labirinto dos sons existentes na cozinha, pela

fumaça que ela exala, pelo calor que ela provoca. Os momentos de interação

intersubjetiva são muito raros. O/a trabalhador/a acaba se entorpecendo de uma

rotina que só diz respeito à lógica da produção, esquecendo de si mesmo enquanto

um ser social que interage com o outro. De certo modo o outro e o próprio indivíduo

trabalhador aqui encontra-se esfacelado e diluído em um mundo rotineiro e

repetitivo, que parece não assumir o diferente e o outro como forma de gerar um

mínimo de conflito e de reflexão. Esta solidão, no entanto não vem só, pois está

acompanhada do princípio da competição, que de certo modo o trabalho em grupo

começa a tornar mais ameno (MARTINS, 1999).

A competição, como constatou Martins (ibid), parece ser algo que está muito

presente nessa forma de trabalho. Fato este que além de contribuir para a solidão

do/a trabalhador/a, acaba por gerar uma tensão entre os/as vários/as

trabalhadores/as, no sentido de uma certa competição entre os mesmos, seguida de

um apego ao próprio posto de trabalho como se a sua defesa significasse a

possibilidade de continuar empregado, o que não deixa de fazer muito sentido, em

um contexto de crescente desemprego e exclusão/inclusão social.

O trabalho tanto do atendimento da loja, quanto o da produção e da cozinha é

realizado de modo mais individual, cada um cuida da sua parte e não está muito

preocupado com o trabalho do/a colega que está ao lado. O principio de

solidariedade e cooperação só existe com os/as colegas que exercem a mesma

função, os/as demais são vistos quase como inimigos – os superiores por serem

superiores e menosprezarem os que estão abaixo e os iguais (não considerados

inferiores, mas exercendo funções diferentes) também não são considerados

amigos, porque ou almejam estar em uma função superior ou menosprezam o outro

tipo de trabalho.

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Cada trabalhador/a é avaliado/a individualmente. Há uma enorme

preocupação com a forma de organização do trabalho e a relação estabelecida entre

os diversos setores, esta é uma característica do modo toyotista de organização do

trabalho. Ainda são fortes as práticas fordistas de trabalho fragmentado e o controle

dos tempos e movimentos do taylorismo em especial nos setores da produção e

cozinha.

Essa mescla das formas de organização do trabalho é uma realidade após a

década de 1970. A partir desse momento, as formas de controle são substituídas.

Com a instituição dos/as líderes, os/as trabalhadores/as passam a ser qualificados

para trabalhar em vários postos de trabalho diferentes e realizar rodízios entre os

postos de trabalho com uma periodicidade definida pelos membros do grupo.

Eles/as definem também a escala de folgas e férias. Estas decisões são tomadas

em conjunto pelos membros do grupo em conversas rápidas no início da jornada de

trabalho, como destaca Antunes (1999, p. 36):

Tratava-se, para o capital, de reorganizar o ciclo reprodutivo preservando seus fundamentos essenciais.

O toyotismo traria a promessa de um trabalho diversificado, que acabaria

deixando de ser visto como um castigo, aquela “maldição” que condenaria o/a

trabalhador/a a repetir diariamente a mesma coisa, a ponto de ficar estressado na

espera no dia que se segue. Os imprevistos e a falta de previsibilidade do que vai

ser realmente feito no dia, considerando um leque de possibilidades, que diga-se de

passagem, também não é muito vasto, parecem estimular a mente dos/as

trabalhadores/as e tornar o trabalho de certa forma mais prazeroso, reduzindo com

isto a noção de castigo e enjoamento que o trabalho carrega consigo.

Mas, infelizmente, essa não é uma realidade dentro do sistema fast food, os

trabalhadores são submetidos a exaustivas jornadas de trabalho e a trabalhos

repetitivos e em uma velocidade cada vez maior gerando um alto nível de stress

entre os/as trabalhadores/as desse tipo de serviço.

A imagem do trabalho como um castigo não é nova na vida de muitos

trabalhadores, uma vez que o castigo está relacionado com o sofrimento do

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trabalho, um sofrimento que se abate pelo corpo, provocando uma dor física, como

forma fenomênica da expressão da exploração de classe.

Quando indagadas sobre o desconforto acarretado pelo trabalho a resposta é:

O desconforto é porque a gente passa muito tempo em pé, a gente só pode ficar em pé [...] É só pode ficar em pé. Dores nas pernas, todas nós temos bastantes varizes. As pernas são muito... principalmente as pernas. E também o cansaço físico, às vezes muito puxado, é muito puxada a carga horária, e por a gente passar muito tempo em pé, ai a gente sente muito, o corpo sente muito (Petúnia).

Eu tenho tendinite nas mãos. Eu já me afastei umas três vezes (ibidem).

Quanto às questões relacionadas a faltas ao trabalho:

Não. A gente assim, [...] eu só coloco atestado mesmo, mas assim, eu sinto que por botar atestado não é muito agradável e pode acontecer a qualquer tempo de eu ser demitida por isso, por eu colocar atestado. Já aconteceu de eu derrubar uma bandeja com cinco milk-shakes porque deu a dor e eu não consegui chegar lá na mesa. Ai eu não sinto a mão e eu sinto, elas tremem muito quando tá na crise. Elas tremem muito (Ibidem).

As garçonetes que possuem mais de um ano de trabalho apresentam, em sua

maioria, varizes. Quase todas já passaram por algum método cirúrgico, além de

adquirirem tendinite causada pelo peso das bandejas.

Em relação às medidas tomadas pela empresa nos casos de afastamento

devido às crises de tendinite:

Até agora não (nunca pediu licença devido a tendinite). Já aconteceu de, teve gente inclusive que se afastou já, ficou afastada pela doença e volta, mas quando volta tem só um ano de estabilidade, a qualquer momento pode sair (Petúnia).

Por esse ano se você não tiver outra crise (eles não demitem), eu não entrei ainda não, não cheguei a me afastar ainda não. Só quando dá a crise eu faço pulsão que é colocar um líquido em volta e depois dou o atestado, mas teve outras meninas já que se afastaram (Ibidem).

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O local onde, em geral, elas desenvolvem a tendinite é nos pés e mãos,

devido ao contínuo caminhar dentro da loja, o transporte das bandejas e a

impossibilidade de sentar ou mudar de posição. Cada garçonete tem seu lugar de

trabalho, duas dentro do espaço fechado que fica sob o ar condicionado e as

restantes espalhadas pela loja. A conversa entre elas não é permitida, devem

manter-se atentas aos clientes que entram e saem. Qualquer problema com o

cliente a culpa lhes será atribuída, e só consultam o gerente se o caso for muito

grave, como por exemplo, se um cliente não quiser pagar pelo serviço, porque se

sentem intimidadas com as indiretas que receberão de outros funcionários e mesmo

da gerência por não conseguirem resolver o problema sozinhas.

Não pode. Oh, se o produto vem da cozinha pequena, que nem a cartola, se vem pouca, o cliente diz: “por que tá pouca?” só que é padrão, vem tudo de lá. A gente, às vezes tem cliente que o sanduíche vem errado,quer sem molho, a gente, o menino do pão passou o molho dentro só que fora a gente tá vendo que tá sem molho ai quando o cliente morde o cliente chama a gente e pergunta: ”por que o sanduíche tá com molho?” mas a gente não ta sabendo que ta, quem leva o desaforo é a gente. Ai a gente às vezes vem com tanta raiva da mesa que desconta neles lá na cozinha. A gente desconta o que a gente passou pra eles. Às vezes, rola estresse, rola discussão, mas hoje em dia tá bem mais...(Petúnia).

No caso da devolução do sanduíche, quem arca com a despesa é a

garçonete:

Oh, se for assim um sanduíche, se você pedir um sanduíche e eu garçonete digitei errado e eu levar pra mesa, o cliente mordeu, eu que vou pagar, mas o cliente acha que a gente não paga. Se for uma mesa embora, o cliente lanchou e a gente não viu o cliente indo embora,a gente paga. Tudo os cliente acha que nada, os clientes acha que a gente todo dia tem lanche de graça, mas não tem (ibidem).

A alimentação dos funcionários é diferenciada, os funcionários têm direito a

alguns tipos de sanduíche pré-determinadas, mas devido ao grande tempo em que

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trabalham na empresa, já não querem comer o produto fabricado lá. Então podem

optar por uma quentinha.

Os funcionários/as da produção recebem a comida da empresa, porque

segundo eles/as mesmos, possuem carga horária maior (garçonetes trabalham

6hs/d diárias e pessoal da produção 8 h/d).

De dia tem direito, a gente escolhe ou um sanduíche ou uma quentinha, mas a noite é só sanduíche da casa mesmo (Petúnia).

A empresa oferece três tipos de sanduíche por dia para os funcionários,

obviamente os mais simples, que contêm apenas hambúrguer e salada. Se for do

desejo do funcionário comer algum outro sanduíche que não consta no cardápio dos

funcionários do dia (que nunca varia) eles devem comprá-lo a preço normal, sem

nenhum desconto.

É, porque as dobras não são os mesmos dias, então se eu dobro toda sexta, toda sexta é o mesmo sanduíche, todo sábado é o mesmo sanduíche. Muito difícil a gente comer, a gente não consegue mais comer (Petúnia). Não como. Às vezes a gente trás comida de casa ou então compra quentinha (Ibidem).

É carne de frango e carne hambúrguer (o sanduíche a que eles tem direito). Ai aqui a gente é assim, nós temos o nosso crachá e tem esse em umerozinho aqui, aí a gente tem um crédito de cento e cinqüenta reais. [...] é, se a gente quiser comer, compra e é descontado no nosso salário. Tem gente que come e não tem nada para receber no final do mês porque tem o desconto, é descontado o lanche (ibidem).

Eu tenho uma hora de almoço. Como aqui mesmo uma quentinha que a gente recebe, sempre foi assim. Se eu pago por ela eu não sei, mas nunca ninguém disse que era descontado, mas eu penso que é porque nada nessa vida é de graça (Antúrio). [grifos nossos].

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Observa-se que o incessante ritmo da produção, a estressante rotina de

trabalho gera uma forte competição entre os trabalhadores e o controle de faltas e

atrasos é feito por eles mesmos.

Não é permitido e às vezes quando a gente, se faltar por motivo de doença de um familiar se não trouxer atestado, declaração, é falta (Petúnia).

É descontada em dinheiro (a falta) e pode acarretar uma suspensão. Não é fácil, aqui não é fácil. [...] Se faltar sem justificativa é falta mesmo e dependendo muito do funcionário se, às vezes eles analisam, se for um funcionário que é acostumado a faltar eles dão só suspensão e até chegar um certo ponto. E às vezes também mesmo que você falte e tiver doente eles desacreditam, eles ficam soltando piada: “será que ta doente?, será que não é mentira?” Sempre assim, a gente sempre escuta isso (ibidem).

Percebe-se um forte discurso contraditório em todos/as os funcionários/as, ao

mesmo tempo em que afirmam estarem sendo explorados pelo ritmo incessante da

produção, afirmam:

Da parte, da minha parte é o horário, sou beneficiado pelo horário, e assim, eu tenho um bom relacionamento com os proprietários. Assim não puxa saco, desse tipo, mas assim, eu tenho livre arbítrio de chegar lá, sentar, conversar, debater problemas, eu já aprendi com eles. Deixo bem claro que como ele já tá há muito tempo a frente da empresa, assim, tem conhecimento e tal, então assim, eu passo pra ele que eu tenho muito pra aprender com ele. Então, às vezes ele tem tempo disponível, que é pouco, a gente bate um papo, ele dá uns toques e tal, então eu sou beneficiado por lidar com pessoas assim, vencedoras né, pessoas que venceram e tal, cresceram. Então assim, a gente aprende muita coisa com eles. Sou beneficiado por isso e os outros gerentes não têm essa oportunidade, porque eles assim trabalham no mesmo horário né, por tanto tempo né, só passa pela porta dele e tal (Cravo).

Eu acho que meu trabalho é reconhecido porque teve uma empresa que o Restfood contratou pra fazer uma pesquisa com os funcionários pra avaliar os funcionários, as condições de trabalho, vários aspectos. Eu tive uma boa colocação e em troca disso a empresa me ofereceu uma gratificação, ai eu achei que eles reconheceram e reconhecem o meu trabalho (Lírio).

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Eu sinto, assim eu me sinto, agora se eles da empresa se sentem assim nunca chegaram pra mim e falaram, agora eu gosto de trabalhar aqui. Em termos financeiros, não porque era pra ‘mim’ ganhar mais e não ganho. Mas assim, em termos de amizade, eu me dou bem com o dono, me dou bem com os filhos dele, isso pra mim é demais. Ele confia em mim, na nutricionista no meu trabalho, que nem agora no carnatal, pediram um monte de sanduíches e tudo saiu da produção. Toda responsabilidade em mim, que pra mim acho valeu um voto de confiança que tive, dele confiar no meu trabalho (Antúrio).

Mesmo sem ascender a cargos ou não sendo financeiramente

recompensados por isso, os funcionários se sentem valorizados por ter a “chance”

de ter proximidade com o dono da rede, já que esse é um “privilégio” para poucos.

A recompensa financeira pelas boas respostas fornecidas por Lírio à uma empresa

contratada para verificar o nível de adesão dos funcionários ao sistema “Restfood”

se configura como uma forma de controle e suborno, a forma de controle da

subjetividade própria do toyotismo.

Pode-se dizer que o trabalho realizado na forma de grupos cooperativos

diminui a competição individual e aumenta o espírito de equipe, a favor do capital, ao

mesmo tempo que aumenta também a pressão de uns sobre os outros. Realimenta

as esperanças dos trabalhadores em direção a possibilidade de realizar seus

desejos de ter a sua voz e suas idéias reconhecidas e valorizadas. Dotar o trabalho

de uma roupagem onde o trabalhador possa ter o mínimo de reconhecimento no

produto gerado pelo seu trabalho, parece ser o grande papel exercido pelos

processos participativos em geral.

Constituí-se, assim, uma nova forma de controle e domínio sobre o

trabalhador, que podemos definir como sendo autocontrole, o próprio trabalhador

introjeta um conjunto de valores e de responsabilidades intimamente ligadas às

necessidades do capital. Trabalhos em equipes cooperativas, em particular e os

processo participativos em geral, amenizam uma dor, muitas vezes, insuportável,

porém não a elimina, ou seja, os processos participativos contribuíram para a

amenização da dor provocada pela ausência do sentido e do significado do trabalho.

Os processos participativos recolocam algum sentido e significado no trabalho

efetivo e concreto, através do qual o trabalhador pode encontrar elementos básicos

de reconhecimento e de sentido naquilo que está realizando (MARTINS, 1999).

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A dor, provocada pela falta de sentido e significado do trabalho, parece ser

insuperável, porém ela é acalentada por um outro universo poderoso que invade os

sonhos dos homens. Um dos funcionários entrevistados afirmou que necessita do

trabalho para viver, independente da forma que esse trabalho assume, ele se torna

aceitável pela fase em que se encontra o capitalismo, a dura realidade de

desemprego que afeta a todos. O trabalho é o meio de realização dos sonhos,

porém de que sonhos estamos falando? Estamos falando dos sonhos vinculados a

realizações de cunho eminentemente material: um carro, uma casa própria, uma

casa na praia e assim sucessivamente. Tratam-se do sonho de consumo de algo

concreto, de um bem.

Trata-se da sede de consumo. Luta-se, portanto, para que os sonhos

materiais sejam realizados. Em nome dos bens materiais a serem conquistados, os

trabalhadores se submetem à opressão e subjugação enfrentada no cotidiano de

trabalho. Trata-se das esperanças de se poder conseguir aquilo que se deseja. O

trabalho em geral parece alimentar pouco o espírito, a subjetividade e a

solidariedade. A única coisa que ele pode atender então, em raros casos, é a

satisfação de determinadas necessidades de consumo. Isto leva alguém a comprar

um tênis, ou sapato que custa, três vezes, o seu salário. Se a possibilidade de

realização da satisfação dos desejos materiais, se tornou tão rara, as contradições e

as fissuras do modo de produção capitalista ficam cada vez mais expostas e

explícitas suas contradições, suas inconsistências, marcadas sobretudo, pela

acumulação excludente que move as forças do capital no mundo contemporâneo. O

mesmo se pode falar da dor pela ausência de um trabalho completamente sem

significado (MARTINS, 1999).

Estes sonhos representam um projeto de coisas a serem realizadas e

conquistadas, traduzem-se em elementos materiais que acabam por conferir sentido

ao que não possui. No entanto, quanto se trata de sonhos, e do desejo de satisfazê-

los tem-se em mente que o outro lado da moeda mostra que os “pesadelos” dos/as

trabalhadores/as submetidos a lógica do capital estão submetidos a dores e

incômodos que, via de regra, são relegados ao esquecimento. O conteúdo destes

sonhos representam, em geral, o universo de contradições e conflitos vividos no

ambiente de trabalho. Quando este/a trabalhador/a fala das formas de controle

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exercidas pela empresa no seu dia-dia, na imposição de novos hábitos e costumes,

ele/a fala do conjunto de tensões e angústias experimentadas no dia-a-dia para

poder consumir aquilo que seus “sonhos” desejam. Os sonhos de consumo são

aqueles eleitos para atribuir um sentido e um significado para a ação e para que se

possa suportar o sofrimento do trabalho.

O sonho produto do inconsciente é aquele que desarruma, que traz

questionamento, que perturba, que incomoda, pois ele expressa o preço alto que se

paga para realizar os sonhos materiais. Seu mal estar é produto da ação da

contradição que ele revela e de que é portador, é o acordar na noite de sobressalto,

como se a “maldição” do trabalho não desse sossego um só instante.

4.3 - Por trás da marca: relações de discriminação e de exploração do trabalho

da mulher

Abordamos neste item a divisão sexual do trabalho no espaço reprodutivo da

mulher trabalhadora do segmento de fast food.

Anteriormente, vimos que homens e mulheres estão submetidos as mais

diversas formas de exploração e controle da força de trabalho, mas em nossa

pesquisa constatamos que o trabalho feminino sofre uma dupla exploração devido

sua condição de mulher.

Não queremos com isso somente reconhecer que a divisão sexual do trabalho

no Brasil é totalmente favorável ao sexo masculino e desfavorável a mulher, mas

mostrar que existe uma forte inter-relação entre a precarização da força de trabalho

feminina e a opressão masculina na família patriarcal.

O discurso dos/as trabalhadores/as é ambíguo. As mulheres buscam a

igualdade na obrigação com as tarefas domésticas, mas também demonstram ainda

valores que admitem a divisão sexual tradicional do trabalho.

Apesar do número de pessoas na família, muitas vezes, ser grande, as

responsabilidades com as tarefas domésticas costumam se resumir à mulher.

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É, na verdade, é dividida né, divide as tarefas. Como minha esposa trabalha, então nesse período de quatro meses, ela tá cuidando mais da parte do filhinho e da casa. Eu cuido mais da parte financeira. Então a gente divide tarefas. Eu faço um pouco de tudo, então a gente divide (Cravo).

Eu, eu em casa praticamente não faço quase nada porque trabalho, eu saio. É minha mãe que faz, minha irmã, mas se eu tivesse em casa eu faria né, mas no momento eu não faço. Tarefa de casa é quem fica em casa (Petúnia).

Hoje, tá sendo de minha responsabilidade porque minha mulher trabalha durante o dia e eu trabalho a noite então fico com os filhos em casa. Sou o dono de casa (Lírio).

Segundo dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do

IBGE) de 2006, a participação dos homens nos afazeres domésticos vem

crescendo. Em 2001, 42,6% (quarenta e dois vírgula seis por cento dos homens)

ajudavam com as tarefas domésticas e em 2005 esse número cresceu para 51,1%

(cinqüenta e um vírgula um por cento). Apesar desses números, a PNAD mostra

que, no Brasil, 90,6% (noventa vírgula seis por cento) das mulheres cuidam das

tarefas no âmbito privado.

A título de curiosidade, as duas profissões que menos contribuem nos

afazeres domésticos são os militares e os empregadores (empresários) – fato

justificado talvez pelo poder simbólico atrelado a esses homens. Dados do IBGE

mostram ainda que os homens nordestinos são os considerados mais machistas

participando menos dos afazeres domésticos do que os homens nascidos no sul do

país.

Lírio afirma não colaborar com as tarefas domésticas, que apesar da família

ser grande, todo o serviço doméstico depende de sua mãe, mas quando

questionado se pudesse alterar a distribuição das tarefas:

Primeiro eu ia tentar ajudar quando chegasse, fazer alguma coisa, e ia exigir do meu pai que ele ajudasse mais, porque ele não trabalha e não ajuda em nada, minha mãe que fica responsável por tudo. Que nem minha irmã, ontem eu liguei pra ela pagar um negócio pra mim que ontem não tive tempo de nada. Porque, ontem, justamente foi um dia que a gente saiu daqui de seis horas. Ai não ia pegar a lotérica aberta, ai liguei pra ela e ela não teve tempo porque tava

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ajudando em casa. E ela também não trabalha, aí ela tem que tentar fazer alguma coisa pra ajudar em casa (Lírio).

:

Mudaria sim, com certeza e deixaria a responsabilidade todinha pra mulher e cuidaria do meu jardim, tenho umas plantinhas que eu gosto de cuidar e toma muito meu tempo, mas hoje eu faço tudo. Mas com certeza eu deixaria pra ela (Antúrio).

Na verdade assim, quando eu era solteiro, eu não tenho irmã, né. Então sempre quem cuidou de casa era mais a gente, eu tenho dois irmãos, então a gente sempre soube fazer tudo, cozinhar, limpar e tal. Então não tenho nenhum receio de dividir tarefa com ela. Agora só lavar roupa que é um pouco mais complicado, eu acho né, mas nas outras atividades eu não tenho nenhuma dificuldade, não (Cravo).

Ficou claro que o entrevistado divide as tarefas de casa, mas só o fazia

porque não havia uma filha mulher em sua residência se não, a tarefa,

provavelmente seria obrigação dela.

Quando questionado se dependia da esposa material ou emocionalmente:

Não, na verdade não dependo dela pra nada. Assim, fora a parte afetiva, não, não dependo dela pra nada não. Sempre fui autônomo nas minhas atitudes, tudo que eu faço eu só penso em mim. Hoje em dia não, que eu tenho meu filhinho e tal, agora tudo que eu for fazer eu penso neles dois, mudou um pouquinho, mas eu sempre fui eu, não pensava em outras pessoas, sempre fui responsável (Cravo).

Uma relação de igualdade no espaço reprodutivo, como no espaço produtivo,

não é do interesse e, nem faz parte da lógica do capitalismo que, no seu estágio

atual de desenvolvimento, no máximo, “permite” uma relação de igualdade formal

(NOGUEIRA, 2006).

O que fica claro, é que a lógica capitalista se coloca em oposição ao processo

de emancipação da mulher, visto que ele necessita, para a preservação do seu

sistema de dominação, tanto no espaço produtivo como no reprodutivo, dos

mecanismos estruturais que geram a subordinação da mulher.

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Se faz necessário colocar que a unidade entre a produção e a reprodução se

dá baseada na lógica da divisão sexual do trabalho que perpassa tanto mundo

assalariado como a família patriarcal. Portanto, a importante categoria da divisão

sexual do trabalho presente na esfera produtiva e reprodutiva possibilita a

articulação das duas dimensões que definem essa relação, o trabalho e a

reprodução.

É. Hoje em dia eu moro com a minha mãe, mas dificilmente me vêem em casa porque eu acordo quase na hora de vir. Acordo dez horas, levanto, tomo banho e já venho. Chego em casa oito horas da noite. As vezes tem engarrafamento porque eu moro na zona norte, ai chego em casa de oito horas. Só faço jantar, me tranco, vou dormir, pronto. No dia de uma folga é só pra fazer as coisas em casa mesmo. A gente perde praticamente nossa vida pessoal. Assim, vive mais profissionalmente. Pronto, tem uma amiga da gente, uma menina de 32 anos que ela pegou uma depressão forte (Petúnia).

O setor de serviços na atualidade é aquele que mais absorve a força de

trabalho feminina. Setor esse que permite evidenciar que freqüentemente a força de

trabalho feminina tem como característica a atribuição de tarefas monótonas,

repetitivas e estressantes.

É evidente que as atividades em maiores condições de precariedade são

destinadas às mulheres no mundo do trabalho, porque se encontram diretamente

articuladas às relações de poder presentes na histórica afirmação que o trabalho

feminino tem menos valor que o masculino, devido a naturalização de características

ditas “femininas” como os papéis de mãe e esposa.

Observa-se também que esta realidade possui diversas contradições e

antagonismos, aliás, como ocorre sempre que os interesses do capital impõem sua

lógica. A carga da responsabilidade imposta às mulheres para que se mantenha a

família nuclear é enorme, tornando sua situação no mundo produtivo extremamente

injusta. Ao invés de se verem aliviadas como pretenderia a retórica da oportunidade

de direitos iguais para as mulheres e da eliminação de qualquer discriminação de

gênero, o que elas presenciam de fato é uma acentuada precarização da sua força

de trabalho (MÉSZÁROS APUD NOGUEIRA, 2006).

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Portanto, é importante destacar que, na luta por uma divisão sexual do

trabalho com mais igualdade, devemos priorizar o combate da opressão masculina

sobre a feminina, assim como, o objetivo da superação da relação capital/trabalho.

O espaço da produção em nome da lógica capitalista deve despertar a

atenção da luta feminina, pois ele não pode e nem deve se dar sem discutir a

eliminação do processo de desigualdade, em todos os sentidos.

Segundo Mezsáros apud Nogueira (2006, p.1): “Não apenas porque as

mulheres têm de aceitar uma parcela desproporcional das ocupações mais

inseguras, mais mal pagas” que existem no mundo do trabalho e, por isso,

representarem 70% dos pobres do mundo, mas em virtude de seu papel decisivo na

família patriarcal.

Dessa forma, quanto maior o fosso criado por essas desigualdades, maior

será o peso e as exigências impostas às mulheres como eixo dessa família. Quanto

mais acentuada for essa carga, além da sua exploração do trabalho no espaço

produtivo, mais intensa fica a condição de opressão feminina no espaço reprodutivo.

Não obstante, a crítica da sociedade capitalista não pode limitar-se à análise da exploração existente no espaço produtivo, por mais importante que ela seja. A crítica deve abranger também todos os profundos e multifacetados aspectos negativos dessa lógica, tal como a compreensão da opressão que se encontra presente no espaço reprodutivo, aqui representado pela estrutura da família patriarcal que impõe uma desigual divisão do trabalho para a mulher (NOGUEIRA, 2006, p.1).

Portanto, pode-se afirmar que a articulação entre as categorias trabalho e

reprodução permite-nos salientar o aspecto dialético da positividade e negatividade

que se encontra nessa dinâmica contraditória. A feminização no mundo do trabalho

apesar de precária é um ponto positivo para a emancipação das mulheres. Todavia,

o mais preocupante é que sua jornada ainda que parcial não ameniza a sua dupla

jornada, faz o movimento inverso, intensifica essa realidade.

O que ainda é evidente no mercado de trabalho atual é a permanência dessa

situação que, se traduz em uma acentuada exploração feminina no mundo do

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trabalho e uma profunda opressão masculina sobre a mulher no espaço da

reprodução.

Em suma, uma nova divisão sexual do trabalho, tanto no espaço produtivo como no reprodutivo é profundamente necessária. Mas, não é do interesse do capital uma metamorfose nesta divisão principalmente se esta transformação for direcionada a uma igualdade substantiva e, muito menos, se tiver o intuito de uma alteração hierárquica da família, que permita atingir a igualdade de gênero e conseqüentemente extinguir a opressão masculina que presenciamos no cerne da família patriarcal (NOGUEIRA, 2006. p. 1).

No universo da nossa pesquisa o processo de exploração é muito claro. A

divisão sexual do trabalho é muito forte e arraigada. Um olhar mais atento as

cadeias de fast food evidenciará essa realidade. As cozinhas abertas aos olhos do

público exibem trabalhadores masculinos na produção do alimento devido a

valorização do trabalho masculino. É o que Bourdieu assinalou como o status que as

profissões ditas femininas adquirem com a entrada masculina. Uma atividade que

antes era considerada como trabalho doméstico passa a ganhar status de profissão

reconhecida socialmente quando exercida por um homem.

É a mais completa desvalorização de um trabalho tradicionalmente feminino.

Quando indagados dos motivos pelos quais o trabalho da cozinha é realizado

somente por homens:

Nem eu sei falar, sei dizer. Acho que sei lá, pelo trabalho ser um serviço mais pesado eu acho. Apesar de aqui fora ser muito mais pesado. É muito homem porque assim, trabalhar aqui fora eu acho muito mais pesado porque já entraram vários homens pra ser garçom e eles não se adaptaram [...] ao movimento, ao ritmo de tudo, não sei. E dentro da cozinha é só homem, eu acho que é por ponto de vista do dono mesmo, só homem na cozinha, mulher só fora (Petúnia).

Quando indagada pelo motivo pelo qual homens não são contratados para trabalhar

no atendimento:

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É, aqui tem só um rapaz, teve outros, mas não se adaptaram e saíram. Eu acho assim, é aqui é conhecido também pelo atendimento ser só mulheres, não entendo. Eu acho que ele acha que mulher é mais confiável, dá assim um ar de, um aspecto de mais esperta (ibidem).

Na verdade, a maioria das profissões que exigem contato ou relações com os outros

adquire feições femininas (recepcionistas, atendentes, professoras, assistentes sociais). É a

divisão sexual do trabalho impondo a sua lógica.

Quanto a ascensão a cargos percebemos que no fast food em questão as

mulheres que estão no atendimento não têm possibilidade de crescimento dentro da

empresa:

Mesma função. Pelo menos assim, as garçonetes não crescem. Eu acho que eles não dão oportunidade pra outro tipo de... pra gente crescer. Tem garçonete aqui de dezoito anos e exerce a mesma função (Petúnia).

Na verdade eu cheguei como atendente de telemarketing, trabalhar e tal, e ao longo do tempo fui me destacando por tomar decisões e tomar frente, ter idéias. Então com ajuda também do meu supervisor que até hoje é gerente do delivery, fui promovido para encarregado como líder dessa minha turma que era, que trabalhava durante o dia. Então no caso durante o dia não tem o gerente de delivery. Então o líder que toma conta do delivery. Então de antemão fui desenvolvendo meus conhecimentos, estudando e tal. E chegou o tempo do gerente da loja não resolver os problemas e eu acabar resolvendo os problemas. Então com a saída do gerente eu fui promovido a gerente sem nenhum problema porque eu já tava tomando as providências, tomando decisões e tal. Aconteceu de ter quatro gerentes e eu tá tomando decisões. Então resolveram...(Cravo).

[...] Ai trabalhei dois meses, fui crescendo na empresa e agora tô tomando conta do hambúrguer. Acho que foi uns cinco meses. Assim, pra mim subir de profissão. Aí pra mim ir pro encarregado foram uns dois anos. é só encarregado. Ai eu passei dois anos fazendo esse serviço e já tô a três no cargo de encarregado. (Antúrio).

Percebe-se que os homens facilmente sobem de cargos, enquanto as

mulheres têm enorme dificuldade de ascender dentro da empresa. Com a exceção

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do escritório que exige maior qualificação e é onde predominam as mulheres, os

cargos que exigem menor qualificação como no atendimento ao cliente, preferem as

mulheres, mas estas não almejam um cargo de gerência, líder ou quaisquer outra

função, porque afirmam ser impossível que uma delas consiga ocupar esse cargo.

Enquanto Petúnia afirma que existem garçonetes há dezoito anos na mesma função,

vemos que na produção, Antúrio levou dois meses para ascender de cargo e com

cinco meses passou a ser líder da produção.

Elas se sentem desvalorizadas. Com relação à discriminação:

Não, porque assim o fato da gente ganhar vai do cliente porque o cliente paga os dez por cento. Só que o dono da empresa não tira dinheiro do bolso dele para pagar as garçonetes por que calculamos e quatro por cento paga o nosso salário e os seis por cento é a nossa comissão. Ai assim a gente não se acha muito valorizada não. Porque aqui é assim, a gente garçonete, a gente todo dia faz cem por cento, vamos supor, no dia que você faz noventa e nove você é criticada porque você é burra. Tem muito gerente assim que eu já cheguei a vê e tudo que se a garçonete erra um produto ai a gente vai pedir para cancelar, “Cancela esse produto porque é tal produto” ai ele coloca na comanda “ a garçonete errou porque é burra” (Petúnia).

Mas segundo Petúnia esse tipo de tratamento se dá pelo fato dos homens da

cozinha ganharem menos do que as garçonetes, gerando a insatisfação:

Não, é assim também por raiva, por alguma coisa. Porque o estresse aqui, principalmente no “Restfood” é muito grande. A gente lida muito com o cliente também, a gente lida com o público ai é muito difícil. Vem gente de todo tipo aqui que a gente atende, tem gente muito boa de atender, mas tem gente que às vezes se, pede o lanche e tá demorando, ele grita, ele xinga aí é muito estressante. Só fica mesmo quem gosta da profissão e precisa também né (Petúnia).

Quanto às doenças que adquiriu com o trabalho no fast food:

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Eu me sinto prejudicada porque eu não tinha isso. Eu não consigo lavar roupa, não consigo pegar peso. [...] É, eu não consigo varrer a casa, evito movimento muito brusco porque dói. No frio dói muito, muito, muito. Faz um mês que tava, fiquei afastada dez dias por motivo de dor. Ai melhora um pouquinho, mas quando começa de novo. Eu trabalhava a noite, eu vim pro dia porque o movimento é menor, o peso é menor [...]

Assim, as mulheres trabalhadoras, juntamente com os trabalhadores, estão a

mercê dos extenuantes mecanismos de exploração e opressão que pertencem ao

funcionamento do capitalismo. A intensa produtividade do setor de fast food, a

rigidez disciplinar, as cansativas e longas jornadas de trabalho no espaço produtivo

e os baixos salários (características do taylorismo/fordismo) atingem a todos/as

os/as trabalhadores/as, mas no caso da força de trabalho feminina, que é

historicamente pouco valorizada, e mais explorada no mundo do trabalho – os

trabalhos repetitivos e monótonos sempre são destinados às mulheres - ainda

somam-se a isso as intermináveis tarefas do espaço reprodutivo, ou seja, após o

trabalho, quase sempre, cabe à elas, o cuidado com a casa, com os/as filhos/as ou

pais/mães etc. Dessa forma, a divisão sexual do trabalho persiste como uma dura

realidade que atinge as mulheres, pois, além de precarizar a força de trabalho

feminina, ainda lhe reserva as tarefas do espaço reprodutivo (Nogueira, 2006), como

se o cuidado com a vida familiar fosse responsabilidade somente das mulheres.

É preciso mais do que nunca, construir relações novas, nas quais homens e

mulheres inteiros assumam integralmente suas vidas sendo pais, mães, filhos e

filhas, irmãos e irmãs, profissionais, donos e donas de casa, enfim, dividindo

igualmente as responsabilidades.

Neste sentido, cabe também a ciência contribuir, através da reflexão e

desvelamento da realidade, com a construção de novas relações sociais,

desnaturalizando o instituído, “em uma época em que reina a confusão, em que a

humanidade se desumaniza”. Cabe-nos, portanto, concordar com Bertold Bretch:

“Nunca digam: isto é natural. A fim de que nada possa ser imutável”.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através desse estudo, buscou-se analisar a divisão sexual do trabalho,

partindo de um esforço teórico, no sentido de desvendar os aspectos que marcam a

mescla de novas e antigas formas de organização do trabalho e como se dá no seu

interior o desenvolvimento do trabalho feminino.

Tendo como suporte a literatura que aborda as questões de gênero e do

trabalho, em autores como Marx, Hirata, Beauvoir, Antunes entre outros, buscamos

uma apreensão crítica do nosso objeto, respaldadas numa perspectiva de totalidade.

Ou seja, no âmbito da realidade concreta do modo de produção capitalista e das

contradições de classe que o movem - o que implica em considerar o aspecto

intraclasse e interclasse – buscamos analisar a inserção de homens e mulheres no

mercado de trabalho, considerando as particularidades da divisão sexual do

trabalho. Analisar o seu aspecto intraclasse significa dizer que a classe trabalhadora

- ou o seu oposto, a classe burguesa - não se constitui em blocos monolíticos do

ponto de vista de gênero, ou seja, homens e mulheres trabalhadores/as pertencem a

mesma classe, porém as relações que se dão entre eles, possuem suas

especificidades que não podem ser entendidas somente, a partir de sua condição de

classe, podendo-se incorrer, se assim age-se, numa redução sociológica. Assim,

buscou-se abordar o gênero no âmbito da natureza das contradições de classes e

isto se constituiu entre uns dos principais esforços teóricos no desenvolvimento

desse trabalho.

Partindo desta postura teórico-metodológica, nossa pesquisa, mediada pelo

campo dos estudos de gênero e do trabalho, ao ser realizada, empiricamente, em

uma rede de fast food, na cidade de Natal – o Restfood - buscou um avanço no nível

da compreensão da realidade dos processos de trabalho, em geral, e da situação do

emprego feminino dentro do âmbito dos fast food.

A esse respeito, o estudo demonstrou que as novas formas de organização

da produção, implicando tanto no uso de novas tecnologias físicas e

organizacionais, quanto nas conquistas femininas na inserção do mercado de

trabalho, estão longe de garantir, no Restfood, melhores condições de trabalho, seja

para homens ou mulheres. Contudo, apesar de constatação de exploração

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constante e condições de trabalho precárias para ambos os sexos, constatou-se

que, especificamente para as mulheres, restringe-se a ascensão funcional

mantendo-as em funções subalternas na hierarquia da produção, em relação aos

homens.

Essa situação de inferioridade da mulher trabalhadora da rede de fast food

Restfood nas funções estabelecidas pela empresa foi relatada no discurso dos

segmentos entrevistados na nossa pesquisa.

A ausência de mulheres em setores como a cozinha e a produção de

alimentos - existem 2 mulheres na produção, mas seu trabalho se restringe ao corte

das verduras - são atribuídas a “ausência de força física”, a não adaptabilidade das

mulheres ao calor existente na cozinha e a falta de agilidade para esse tipo de

trabalho. O cuidado com os filhos e os afazeres domésticos, têm sido partilhados, no

caso dos trabalhadores que possuem união estável, mas quando questionados se

essa divisão seria modificada em função de seu desejo, eles – os homens -

afirmaram que gostariam que sua esposa se encarregasse dessas funções, que são

“femininas”. A cônjuge, nos dois casos, abandonou o trabalho após o nascimento

dos filhos, devido as responsabilidades que assumem na divisão sexual do trabalho.

Confirmou-se, portanto, nesse estudo o que a literatura especializada já dizia

a respeito, ou seja, além da ainda persistente situação de precarização do trabalho

para a classe trabalhadora em geral, no bojo do paradigma flexível de acumulação

de capital, há, de forma específica, a precarização, exploração e dominação das

mulheres, através da sua inserção em funções diferenciadas no mercado de

trabalho, na permanência em funções subalternas e na continuação da dominação

no âmbito doméstico, através da dupla (ou tripla) jornada de trabalho. Os

trabalhadores homens, em sua maioria, afirmam que as mulheres poderiam, sem

grandes dificuldades, desenvolver funções na cozinha e que a divisão sexual do

trabalho existente no Restfood é estabelecida pela administração da empresa. Pode-

se inferir que esse fator tem sua origem na cultura patriarcal e nas relações de poder

e de controle da produção pelo capital que dita como se dá a divisão sexual do

trabalho, segundo sua lógica de acumulação.

Dessa forma, com base na literatura utilizada como referência para o nosso

estudo, constatamos que o trabalho feminino têm se mantido na situação de

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subalternidade, caracterizado pelos crescentes índices de desemprego e/ou

subemprego, registrando um acentuado grau de precarização nas condições da

inserção e permanência da mulher no mercado de trabalho.

Neste sentido, esta pesquisa possibilitou-nos aprofundar estudos na área de

gênero, trabalho e fast food. Apontamos no sentido de que gênero deve ser

compreendido enquanto categoria social, fora da perspectiva essencialista, não

atrelada a seu sentido biológico, restrita a divisão do feminino/masculino, mas sim,

compreender gênero na sua dimensão relacional mediado pelas condições de sexo,

raça/etnia, idade, classe, assim como considerando suas dimensões econômicas,

políticas e culturais.

Durante o transcurso de nossa pesquisa, alguns desafios foram colocados

tanto no campo teórico quanto em sua fase empírica.

No que diz respeito as bases teóricas e no que se refere ao estudo da

categoria gênero, percebeu-se que os estudos existentes dentro dessa temática

concentram seu foco, de forma mais acentuada no sujeito, com recortes mais

culturalistas e menos centrados na dialética e totalidade, a qual os sujeitos estão

remetidos. Há, portanto, que se buscar a compreensão interrelacional, através de

estudos como o de HIRATA (2002), SAFFIOTI (1976), KERGOAT (2003), CASTRO

(1997), MORAES (1990) e ARAÚJO (2007), WHITAKER (1989), BARBIERI, (1993) e

BEAUVOIR (1949). Mesmo que algumas destas autoras não assumam a

perspectiva crítica-dialética, foi-nos possível, partir de suas considerações e

contribuições e construir inferências acerca das relações de gênero numa

perspectiva de totalidade.

Ainda no campo teórico, constituiu-se um desafio construir as bases

conceituais para o desenvolvimento deste estudo no campo dos fast foods – área

pouco estudada no âmbito do Serviço Social. Assim, serviu-nos fundamentalmente

de base, os estudos de FONTENELLE (2002) e ORTIGOZA (1997).

O segundo desafio posto a nossa pesquisa, foi em relação a pesquisa de

campo. Esse desafio diz respeito à conjuntura no âmbito do Restfood. Já que se

trata de uma empresa privada, qualquer informação relacionada a seu

funcionamento e relações de trabalho que se desenvolvem dentro da empresa,

podem comprometer, segundo informações de seus responsáveis, a “imagem” da

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rede. Foi um longo caminho a ser percorrido até a realização das entrevistas, que

por fim foram colhidas. Apesar da concordância com as entrevistas por parte dos/as

responsáveis na rede, ao iniciarmos a coleta, surgiram desconfianças e temores e

os funcionários/as que concordaram em colaborar com as entrevistas tiveram receio

de perder seus empregos. A nossa observação foi motivo de enorme apreensão por

parte da empresa por acreditarem se tratar de algum tipo de fiscalização. Contudo,

ao concluirmos a coleta, nenhum deles/as foi demitido/as por causa das informações

prestadas, até porque asseguramos o anonimato tanto dos/as funcionários/as como

da empresa na qual se deu a pesquisa.

Devemos destacar que através da nossa pesquisa pode-se concluir que os

trabalhadores e trabalhadoras do ramo de fast food estão submetidos a exaustivos

horários de trabalho, que não respeitam as leis trabalhistas e que ainda

permanecem formas “compensatórias” para os funcionários/as que melhor se

adaptarem a exploração. Pode-se constatar também, que existe no âmbito do

Restfood a presença ainda muito forte da divisão sexual do trabalho que subjuga as

mulheres, em funções consideradas inferiores. Permanece ainda, a separação de

papéis “femininos” e “masculinos” construídos pela sociedade, que leva as mulheres

a serem consideradas mais eficientes para trabalhos que exijam trato com os outros,

carisma e simpatia como no caso do atendimento e na administração, como forma

de perpetuar papéis desenvolvidos historicamente na esfera reprodutiva, como

administradoras do lar.

Os homens são considerados mais aptos a trabalhos como na gerência, na

produção de alimentos e na cozinha – estes últimos, embora tenha sido

historicamente definido como feminino, passou a ganhar status social com a entrada

dos homens nesse mercado, adquirindo status de trabalho profissional.

A impossibilidade de ascensão a cargos superiores – fato que só aflige as

mulheres dentro do Restfood - se caracterizou como um dos pontos mais graves no

que se refere a subjugação feminina. Existem garçonetes há 9 (nove) anos

desenvolvendo a mesma função, enquanto alguns homens em média, levam de 4

(quatro) a 8 (oito) meses para ascender de função, mesmo que isso em muitos

casos, não tenha se refletido em aumento de salário. Fica claro, que a inserção

feminina no Restfood, ou se dá em cargos que exigem maior escolaridade, como no

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caso, do marketing e administração ou se inserem no setor de atendimento ao

cliente, como garçonetes e caixas, nos quais não existe a possibilidade de

ascensão.

Por fim, há que se desatar a permanência da exploração de trabalhadores e

trabalhadoras do ramo de fast food, mas também se faz preciso analisar a dimensão

de gênero, relacionando-a com a natureza da contradição de classe postas pelo

capitalismo contemporâneo, nas quais o gênero está inserido.

Por fim, este estudo, apesar das dificuldades encontradas, nos instigou e nos

despertou para a necessidade de novos estudos sobre outras redes de fast food, a

fim de constatar as condições em que se dá a inserção de homens e mulheres

dentro de um âmbito mais abrangente, pesquisa que pode ter um caráter

comparativo, com novos sujeitos sociais, dentro de um segmento de

trabalhadores/as compreendidos não dentro de uma só empresa, mas no interior do

ramo de serviços, mais especificamente, nas grandes redes de fast food

encontradas no Brasil. Acreditamos que um estudo mais abrangente possa nos

revelar as duras condições de vida e trabalho de homens e mulheres inseridos na

engrenagem de produzir alimentos rápidos, bem como nos fará conhecer melhor a

divisão sexual do trabalho persistente no mundo capitalista contemporâneo.

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APÊNDICE

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ROTEIRO PARA OBSERVAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL – PPGSS

Aluna: Suzana da Cunha Joffer Orientadora: Profa. Dra. Rita de Lourdes de Lima

� Como se dão as relações dentro da empresa no momento das decisões e

como se colocam os funcionários diante dos acontecimentos rotineiros do

estabelecimento: as mulheres têm poder de decisão?

� Como se comporta a chefia em relação a homens e mulheres?

� Em que cargos as mulheres são mais respeitadas?

� Existem diferenças de hierarquia em relação ao gênero?

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ANEXO

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL – PPGSS

Aluna: Suzana da Cunha Joffer

Orientadora: Profa. Dra. Rita de Lourdes de Lima

Entrevista n° ____

I – Perfil profissional e pessoal

1. Sexo:

( ) M ( ) F

2. Estado civil:

( ) solteiro ( ) casado ( ) separado, divorciado ( )união estável ( ) viúvo ( ) outros

3. Escolaridade:

( ) Fundamental incompleto

( ) Fundamental completo

( ) Ensino Médio incompleto

( ) Ensino Médio completo

( ) Superior incompleto

( ) Superior completo

4. Caso você desejasse, conseguiria estudar mais hoje? Você tem tempo para

estudar mais?

5. Faixa etária:

( ) até 20 anos

( ) de 21 anos a 30 anos

( ) de 31 anos a 40 anos

( ) de 41 anos a 50 anos

( ) acima de 50 anos

6. Faixa Salarial:

( ) até 1 salário mínimo

( ) de 1 salário mínimo a 3 salários mínimos

( ) de 3 salários mínimos a 6 salários mínimos

( ) de 6 salários mínimos a 10 salários mínimos

( ) acima de 10 salários mínimos

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7. Em que ordem de importância você classificaria os seguintes itens na sua

vida:

( ) Casamento

( ) Trabalho

( ) Estudo

( ) Participação Política

( ) Família

( ) Outro – Qual? ___________________________________________

8. Quantas pessoas moram com você?

( ) moro sozinho/a

( ) eu e meu companheiro/a

( ) entre 2 a 4 pessoas

( ) entre 5 e 7 pessoas

( ) 8 ou mais pessoas

9. Você tem filhos? ( ) sim ( ) não

10. Se sim, quantos __________________

II – Condições de trabalho

11. Que cargo que ocupa na empresa? E que atividades desenvolve?

12. Como conseguiu essa vaga na empresa?

13. Gosta do que faz?

14. Há quanto tempo está na empresa?

15. Você sempre esteve nessa função?

16. Você fez algum curso ou treinamento para ocupar a sua função atual ou mesmo

a antiga?

17. Qual é o seu contrato de trabalho?

18. Qual é a sua jornada de trabalho?

19. Qual é o seu turno de trabalho?

20. Como são os seus intervalos? Almoço, descanso?

21. Vocês têm todos os direitos trabalhistas assegurados?(férias, décimo terceiro,

FGTS etc)

22. Existe trabalho temporário na empresa? Se sim, em que funções?

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23. Existe algum programa de busca de qualidade dentro da empresa?

24. O seu trabalho acarreta algum tipo de desconforto físico?

25. Você considera fácil retirar licença para resolução de problemas pessoais

(saúde, familiares)?

26. Quais são as atitudes tomadas empresa em caso de absenteísmo? E atraso? O

que é uma justificativa “aceitável” que evitaria as penalidades?

27. Você é sindicalizado (a)?

28. Em que aspectos você se sente valorizado pela empresa?

29. Seu salário e cargo são compatíveis com a sua função na empresa?

( ) Sim ( ) Não Por quê?

30. Você vê perspectiva de crescimento profissional e ascensão nesta empresa?

Como?

31. Descreva para mim, um dia de trabalho seu, desde a saída de sua casa.

III - Divisão Sexual do Trabalho

32. O seu salário é fundamental para manter as despesas da casa?

33. O cuidado com os filhos e com as tarefas de casa é responsabilidade de quem?

34. Caso você pudesse alterar a distribuição das tarefas domésticas, como você

organizaria?

35. O que você faz com seu tempo livre?

36. Você depende de seu companheiro (a)?

37. Por que, em sua opinião, na cozinha só trabalham homens?

38. Por que, em sua opinião, no setor de atendimento da loja, predomina mulheres?

39. Porque em sua opinião, em algumas funções estão concentrados somente

homens?