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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE ESCOLA DE MÚSICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA FERNANDO FERREIRA BATISTA REMEMÓRIAS OPUS 79 PARA VIOLÃO SOLO DE MARLOS NOBRE: um processo criativo. NATAL-RN 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

ESCOLA DE MÚSICA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA

FERNANDO FERREIRA BATISTA

REMEMÓRIAS OPUS 79 PARA VIOLÃO SOLO DE MARLOS NOBRE:

um processo criativo.

NATAL-RN

2017

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FERNANDO FERREIRA BATISTA

REMEMÓRIAS OPUS 79 PARA VIOLÃO SOLO DE MARLOS NOBRE:

um processo criativo.

Artigo apresentado ao Programa de Pós-

Graduação em Música da Universidade Federal

do Rio Grande do Norte, na linha de pesquisa

Processos e Dimensões da Produção Artística,

como requisito parcial para a obtenção do título

de Mestre em Música.

Orientador: Prof. Dr. Ezequias Oliveira Lira

NATAL-RN

2017

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Catalogação da Publicação na Fonte

Biblioteca Setorial da Escola de Música

B333r Batista, Fernando Ferreira. Rememórias opus 79 para violão solo de Marlos Nobre: um

processo criativo / Fernando Ferreira Batista. – Natal, 2017. 67 f.: il.; 30 cm.

Orientador: Ezequias Oliveira Lira.

Artigo (mestrado) – Escola de Música, Universidade Federal

do Rio Grande do Norte, 2017.

1. Música para violão – Artigo. 2. Música – Interpretação –

Artigo. 3. Criatividade (Música) – Artigo. I. Lira, Ezequias Oliveira.

II. Título. RN/BS/EMUFRN CDU 787.61

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FERNANDO FERREIRA BATISTA

REMEMÓRIAS OPUS 79 PARA VIOLÃO SOLO DE MARLOS NOBRE:

um processo criativo.

Artigo apresentado ao Programa de Pós-

Graduação em Música da Universidade Federal

do Rio Grande do Norte, na linha de pesquisa

Processos e Dimensões da Produção Artística,

como requisito parcial para a obtenção do título

de Mestre em Música.

Aprovado em: ___/___/___

BANCA EXAMINADORA:

_________________________________________________________

PROF. DR. EZEQUIAS OLIVEIRA LIRA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

ORIENTADOR

_________________________________________________________

PROF. DR. RADEGUNDIS ARANHA TAVARES FEITOSA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

MEMBRO DA BANCA

_________________________________________________________

PROF. DR. LUCIANO CHAGAS LIMA

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PARANÁ

MEMBRO DA BANCA

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Dedico este trabalho à minha mãe Dona

Damiana e a todos meus familiares pelo apoio

incondicional em meus estudos.

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AGRADECIMENTOS

À Deus por me permitir o dom da vida.

Ao professor Ezequias, orientador, mestre e amigo na realização deste trabalho.

Aos professores do PPGMUS/UFRN, pelas orientações enriquecedoras.

Ao maestro Marlos Nobre, pela disposição em colaborar com a pesquisa e pelo presente

que nos enviou a Guitar Sonata Opus 115.

À Fundação de Apoio a Pesquisas do RN (FAPERN), pelo auxílio parcial de

importantíssimo valor que proporcionou dedicação integral à pesquisa.

À PROAE e PPg UFRN pela bolsa residência.

Aos colegas e amigos da Residência da Pós-Graduação.

À professora Heather Dea Jennings, pelo o auxílio na tradução do resumo deste trabalho.

Ao maestro Edson Porto, pela ajuda na edição dos exemplos musicais.

À todos os colegas de curso, pelas amizades aqui firmadas e a construção coletiva do

conhecimento.

À Comunidade Indígena do Amarelão, juntamente com a Associação Comunitária

(ACA), pela realização de nossos projetos musicais.

À Irmã Terezinha Galles e à Congregação das Irmãs do Imaculado Coração de Maria,

por proporcionar que a música chagasse até a mim e a outros jovens carentes da comunidade

do Amarelão.

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RESUMO

O presente trabalho aborda o processo criativo do autor na interpretação da suíte Rememórias

Opus 79 para violão solo do compositor Marlos Nobre (1939-). Na referente pesquisa, o

intérprete descreve seu processo criativo partindo de sua experiência empírica na interpretação

da referida obra. As ideias interpretativas foram fundamentadas em uma entrevista realizada

com o compositor e nas influências da música tradicional nordestina presentes na peça. Autores

como, Andrade (1972, 1989), Alvarenga (1982), Corquer-Nobre (1994), Barancoski (1997),

Azevedo (2000), Ferraz (2007), Silva (2007), Cavini (2009), Anjos (2013), nortearam nosso

referencial teórico. Foram elaborados exemplos musicais de trechos editados da partitura,

exemplos audiovisuais e uma gravação audiovisual completa da peça.

Palavras-chave: Rememórias Opus 79. Violão. Marlos Nobre. Caboclinhos.

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ABSTRACT

The present work deals with the creative process of the author in the interpretation of the

Rememórias Opus 79 suite for solo guitar by brasilian composer Marlos Nobre (1939-). In this

research, the interpreter describes his creative process based on his empirical experience in

interpreting the work. In order to provide a foundation for his interpretative ideas, the author

made use of an interview with the composer and of the influences of traditional Northeastern

music present in the piece. Authors like Andrade (1972, 1989), Alvarenga (1982), Corquer-

Nobre (1994), Barancoski (1997), Azevedo (2000), Ferraz (2007), Silva (2007), Cavini (2009)

and Anjos (2013), guided our theoretical reference. Musical examples of edited pieces of the

score were developed, and use was made of audiovisual examples and a complete audiovisual

recording of the piece.

Keywords: Rememórias Opus 79. Guitar. Marlos Nobre. Caboclinhos.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Trecho inicial do Prelúdio BWV 996 de J. S. Bach ............................................... 22

Figura 2 – Trecho inicial da Embolada ................................................................................... 22

Figura 3 - Primeiros compassos do Prelúdio BWV 1007 de Bach .......................................... 23

Figura 4 – Compassos 62-64 da Embolada ............................................................................. 23

Figura 7 – Agógica no compasso 51 ....................................................................................... 24

Exemplo audiovisual 1 – O uso do cotovelo nos compassos 58-62 ....................................... 25

Exemplo audiovisual 2 – Abafamento com a parte interna do polegar .................................. 25

Exemplo audiovisual 3 - Abafamento com a parte lateral do polegar .................................... 26

Exemplo audiovisual 4 – Trecho inicial da Embolada ........................................................... 26

Figura 8 – Digitação na quinta posição nos compassos 5 e 6 ................................................. 27

Figura 9 – Digitação nos compassos 25 e 26 .......................................................................... 27

Figura 10 – Exemplo de dedilhado nos compassos 4 e 5 ........................................................ 28

Figura 11 - Ângulo perpendicular X ângulo frontal ................................................................ 29

Figura 12 – Colorido sonoro nos compassos 75 ao 82 ............................................................ 29

Figura 13 – Articulação nos trechos que fazem associação ao Prelúdio BWV 1007 de Bach 30

Figura 14 - Fraseado separado pelas pausas de semicolcheia ................................................. 30

Figura 15 - Fraseado em “subfrases” fragmentado ................................................................. 31

Figura 16 - Letra e melodia da canção “É Lamp, é Lamp, é Lampa” ..................................... 32

Figura 17 – Trecho inicial de Cantilena .................................................................................. 33

Figura 28 - Padrões rítmicos dos Caboclinhos ........................................................................ 39

Figura 29 – Compassos 19-27 de Caboclinhos ....................................................................... 40

Figura 30 – Melodia do refrão de “Juazeiro” de Luiz Gonzaga .............................................. 40

Figura 31 - Variações do ostinato no Caboclinhos ................................................................. 41

Figura 32 – Exemplos de dedilhado como exercício técnico .................................................. 41

Figura 33 - Digitação escolhida para melodia (notas com hastes para cima) e ostinato (com

hastes para baixo) ..................................................................................................................... 42

Figura 34 - Dedilhado nos compassos 28 e 29 ........................................................................ 42

Figura 35 – Dedilhado com Ré3 na quinta corda .................................................................... 42

Figura 36 – Acordes rasgueados utilizando o dedo médio ..................................................... 43

Figura 37 – Variação timbrística nos compassos 19-27 .......................................................... 43

Figura 38 – Mudança de ligado por ser em cordas diferentes ................................................. 44

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LISTA DE TABELA

Tabela 1 – Obras para violão solo de Marlos Nobre ............................................................ 18

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SUMÁRIO

1.INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 12

2.MARLOS NOBRE E SUA ESCRITA VIOLONÍSTICA ................................................ 15

3.A SUÍTE REMEMÓRIAS E O PROCESSO CRIATIVO .............................................. 19

3.1 Embolada ............................................................................................................................ 20

3.2 Cantilena ............................................................................................................................. 31

3.3 Caboclinhos ........................................................................................................................ 38

4.CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 45

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 46

APÊNDICE A – Entrevista aplicada via e-mail a Marlos Nobre ............................................. 49

ANEXO A – Partitura de Rememórias Opus 79 ...................................................................... 55

ANEXO B – Links com a gravação audiovisual de Rememórias Opus 79 ............................. 63

ANEXO C - Apresentação da suíte Rememórias opus 79 em masterclass.............................. 64

ANEXO D – Print do comentário de Marlos Nobre acerca de minha interpretação. .............. 68

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1. INTRODUÇÃO

Meu contato com a Rememórias Opus 79, do compositor Marlos Nobre, teve início na

graduação quando fui bolsista de iniciação científica,1 cuja orientação foi ministrada pelo

professor doutor Ezequias Oliveira Lira no ano de 2013. Na ocasião, a peça me foi apresentada

como sugestão para estudo de uma obra brasileira envolvendo os ritmos nordestinos, a fim de

estudá-la e apresentá-la em nosso recital final. Nosso processo de criação pretendia associar

empiricamente elementos musicais característicos da música tradicional nordestina – quanto à

presença e à influência desses – à linguagem formal e sua respectiva interação, alcançando uma

proposta interpretativa e resoluções aos problemas técnicos encontrados na obra.

Em conformidade com a revisão bibliográfica em anais de eventos e periódicos da área

da performance musical, nota-se que Rememórias Opus 79 para violão solo é uma obra ainda

pouco explorada no âmbito das pesquisas acadêmicas no campo supracitado. Não há registro

em CD da obra completa,2 estando disponíveis três gravações audiovisuais no canal do You

Tube do compositor, uma delas é uma versão do autor deste trabalho.

Desse modo, o principal objetivo do estudo a ser apresentado é fornecer elementos

técnicos e interpretativos que podem auxiliar futuros violonista consiste em descrever o

processo criativo do autor com a obra, de maneira a tornar este relato um guia para futuros

violonistas debruçarem-se no estudo desta obra. Faremos apontamentos e sugestões tanto no

aspecto técnico quanto no interpretativo, andamento, digitação, articulação, timbre e dinâmica,

além de explicitarmos a maneira como nós resolvemos as dificuldades técnicas nela encontrada.

Conseguintemente, procuramos conceituar as manifestações que influenciaram o compositor

na escrita da peça, seu processo de escrita para o violão e a atualização de seus períodos

criativos.

É importante mencionar que quando nos referimos ao processo criativo neste trabalho,

nos remetemos os autores, Eyng e Damiani (2014) que discutem o modelo clássico da atividade

criativa proposto em 1926 pelo psicólogo inglês Graham Wallas (1858-1932), que divide o

processo criativo em quatro etapas: preparação, incubação, iluminação e verificação. Desse

modo, entende-se que para a visão clássica, na preparação, o processo tem a ver com a

formulação do problema; já a incubação tratará do trabalho inconsciente; enquanto a iluminação

1 Projeto de pesquisa PVH10114-2013 – A influência das manifestações folclóricas nordestinas no processo

criativo do violonista na obra Rememorias Op. 79 de compositor Marlos Nobre (1939). Cota PIBIC 2013-2014. 2 O violonista Fabio Shiro Monteiro gravou o segundo movimento Cantilena no album Recital Brasileiro (2001).

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se relacionará ao aparecimento de ideia consciente (insight); e, por último, a verificação se

constituirá no desenvolvimento da ideia de avaliação (EYNG e DAMIANI, 2014, p. 3).

Todavia, segundo Eyng e Damiani (2014), o conceito clássico aparenta não ser

suficiente para a compreensão do processo criativo na música. Eles propõem que levemos em

consideração uma análise pautada no entrecruzamento dos conhecimentos interiores e

exteriores do músico, ou seja o processo criativo nos direciona a “dialogar” o saber interno

individual, no que diz respeito as técnicas e conhecimentos adquiridos pelo músico, ao saber

prático, como a exteriorização desses saberes. Portanto, optaremos por utilizar, em nosso

trabalho, o termo processo criativo, para designar como ocorreu o nosso processo de

aprendizado, construção e interpretação da obra, sem nos atermos diretamente ao conceito

clássico de processo criativo.

Inicialmente, abordaremos de forma sucinta não só os dados sobre o compositor, suas

influências e seu processo de escrita para violão, mas também destacaremos as obras escritas

para violão solo compostas em seu catálogo. Em seguida, trataremos sobre a escrita da suíte

Rememórias, contextualizada a partir das manifestações culturais que a inspiraram e

apresentada em seus aspectos intertextuais presentes na obra, descrevendo a forma pela qual se

deu nosso processo criativo. Por fim, apresentaremos nossas considerações finais, anexando a

entrevista realizada com o compositor e anotações de orientações dadas por professores sobre

nossa performance em masterclass.

A abordagem metodológica deu-se através de pesquisa bibliográfica nos bancos de teses

e dissertações, periódicos, anais de eventos e plataformas internacionais, tais quais JSTOR,

Academia.edu, periódicos da CAPES, trabalhos relacionados ao compositor da obra estudada

ou trabalhos referentes ao campo da performance musical voltados para o violão. Isto posto, os

principais autores aos quais nos referenciamos destacam-se Andrade (1972, 1989), Alvarenga

(1982), Corquer-Nobre (1994), Barancoski (1997), Ferraz (2007), Silva (2007), Cavini (2009),

Sánchez (2010) e Anjos (2013). Em paralelo às leituras e pesquisas bibliográficas,

estabelecemos seções de trabalho de experimentação com nosso orientador, procurando

documentar o processo criativo elaborando nosso guia para interpretação e performance de

Rememórias.

Concernente à coleta de dados, utilizamos algumas ferramentas essenciais para

realização desta pesquisa: gravação audiovisual da obra com o intuito de levantar dados

qualitativos; entrevista com o compositor para elucidar aspectos formais de sua escrita

violonística e de Rememórias; anotações das observações de nossa performance nas

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marterclass das quais participamos durante nossa trajetória de intérprete e pesquisador, que

estão anexadas ao final deste trabalho.3

3 Recolhemos dados qualitativos de grande importância para o presente trabalho com violonistas nacionais e

internacionais. Dentre eles, cito Mario Ulloa (UFBA), Thomas Patterson (USA), Eduardo Meirinhos (UFG),

Daniel Göritz (ALE) e Erik Pronk (UFPB) e nosso orientador professor Dr. Ezequias Lira (UFRN) na busca por

soluções aos problemas encontrados.

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2. MARLOS NOBRE E SUA ESCRITA VIOLONÍSTICA

Natural de Recife/PE, Marlos Nobre (1939) é, destacadamente, um dos compositores

brasileiros de maior representatividade da atualidade nos cenários nacional e internacional.

Nobre tem dedicado parte de sua obra para o repertório violonístico. Hoje, aos 78 anos de idade,

sua obra tem relevância para o repertório do violão brasileiro de concerto; sua poética musical

funde elementos da música tradicional nordestina com aspectos da música de concerto, criando

um estilo próprio de compor. Conforme afirma Cavini (2009),

[...] os estudos dos musicólogos brasileiros Mariz (2000) e Neves (1981)

concluem que Nobre pertence à chamada geração independente da música

brasileira, geração que fez sua música sem preocupar-se em seguir ou não uma

corrente estético-filosófica determinada. Entretanto, as manifestações

folclóricas do nordeste do Brasil tiveram uma significação muito especial na

formação musical deste compositor, assim como também o influenciaram

alguns dos compositores e artistas do meio cultural brasileiro e estrangeiro

(CAVINI, 2009, p. 52).

A importância da obra, trajetória, premiações e períodos composicionais já foram

explicitados em trabalhos acadêmicos, como os desenvolvidos por Corquer-Nobre (1994),

Barancoski (1997), Ferraz (2007), Silva (2007), Cavini (2009) e Sánchez (2010). Com base

nesses, destacamos os diferentes períodos criativos do compositor, divididos em cinco fases

composicionais que apresentam características distintas, porém interligadas. A primeira, (de

1959 a 1963), compreende obras como o Concertino Op. 1 até o Divertimentos Op. 14, na qual

o compositor explora o tonalismo, modalismo, politonalidade e atonalidade;4 na segunda (1963

a 1968), que vai desde as Variações Rítmicas Op. 15 à peça Dia da graça Op. 32, explora o

método dodecafônico (dodecafonismo, serialismo);5 a terceira (1969 a 1977) integra do

Concerto Breve Op. 33 a Homenagem a Villa-Lobos Op. 46, caracterizada pela inserção dos

processos anteriores;6 na quarta (1980 a 1989), as obras vão de Yanomani Op. 47 ao Op.73 com

liberdade e maturidade da linguagem musical;7 a quinta, a partir de 1989, com o Concertantes

do Imaginário Opus 74, distingue-se por linhas melódicas e grandes estruturas formais8

(BARANCOSKI, 1997, p, 50-56).

Em nossa entrevista, arguindo o compositor sobre a existência de uma sexta fase no seu

estilo composicional, ele nos responde:

4 Tradução nossa. “Tonality, modality, polytonality, and atonality”. 5 Tradução nossa. “Twelve-tone methods”. 6 Tradução nossa. “The integration of processes”. 7 Tradução nossa. “Maturity and freedom of musical language”. 8 Tradução nossa. “Melodic lines and larger formal structures”.

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[...] depois de 1989, muita coisa aconteceu e mudou no meu estilo de compor,

mas sempre mantive basicamente os mesmos princípios que nortearam a

minha criação musical como compositor, a vida toda. Entre estes princípios

básicos e que pertencem ao meu estilo atual está o desenvolvimento e

depuração de minha convicção de que ainda há muito o que explorar no

trabalho criativo como o cromatismo. Minha concepção, a partir de 1990 até

o presente, tem sido de uma depuração e trabalho cada vez mais entusiasmado

com a minha técnica pessoal de exploração do total cromático. Já não se trata

aqui de séries, nem de moldes pré-estabelecidos, mas de uma imersão criativa

no total cromático. Isto em linhas gerais porque é impossível em pouco espaço

descrever em detalhes esta minha técnica pessoal. Somente informo que as

minhas obras mais recentes vêm depurando e usando extensamente o

cromatismo como base de minha criação (NOBRE, 2017).9

De acordo com Corker-Nobre (1994) e Sánchez (2010), na visão do compositor existem

duas grandes vertentes composicionais na evolução da música: uma de origem germânica e

outra latina. Para ele,

(...) a germânica caracteriza-se pelo sentido evolutivo-histórico que vem na

música contemporânea desde os últimos quartetos de Beethoven, passando

pelo Tristão de Wagner, por Mahler, Bruckner e depois Schoenberg, Berg e

Webern, originando as consequências seriais e multi-seriais do grupo pós-

weberniano, sobretudo Stockhausen, Boulez, Pousseur, Nono. A outra

vertente, a latina, embora sem desconhecer nenhum desses aportes e

conquistas técnicas citadas anteriormente, incorporava de maneira mais direta

as técnicas e estéticas de Scriabin, Debussy, Ravel, Stravinsky, Varèse,

Messiaen, Lutoslawski e Penderecki (CORKER-NOBRE, 1994, p. 235-6).

Amplamente influenciada pela cultura nordestina, sobretudo no aspecto rítmico da

música carnavalesca de Recife, é comum encontrar na obra de Marlos Nobre elementos da

cultura popular – aliados ao seu estilo complexo e refinado de composição –, ao relatar um

pouco de sua infância em entrevista que o compositor concedeu a este autor:

A influência da cultura nordestina, musical, principalmente do Recife onde

nasci em 1939 e onde passei minha infância e adolescência, foi marcada pela

música, ritmos e magia das manifestações do Carnaval do Recife, sobretudo

os Maracatus, Frevos, Caboclinhos, Cirandas. Minha obra toda vem daí,

naturalmente como base, mas tudo isso, toda esta influência foi transformando

através dos tempos de minha criação. As influências de fora, primeiro do

Brasil total e depois as experiências internacionais ampliaram e de certa

maneira internacionalizaram a minha criação. Hoje sou um compositor do

Mundo mas com as raízes profundas no Brasil (NOBRE, 2017)10.

Um fato que chama atenção na obra de Nobre é o uso da intertextualidade, caracterizada

pelo processo no qual um autor recorre a um texto e, partindo deste, faz os mais variados tipos

de transformação. Em música, a intertextualidade dá-se de diversas formas, como a citação,

alusão, arranjo, redução, paródia, paráfrase e dentre outras (SOUZA, 2006, p. 30). Entretanto,

9 Documento online não paginado. 10 Idem, documento online não paginado.

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Nobre rechaça qualquer comparação em identificar temas ou ritmos em sua obra e esclarece

que o uso de tal procedimento não é feito de forma deliberada.

Eu nunca fiz “pesquisa de campo” eu simplesmente VIVI realmente estas

manifestações folclóricas. Portanto eu as incorporo ao meu estilo quando

quero e quando assim o desejo. E isso acontece também de forma involuntária

e de forma não consciente, até mesmo que partes de obras de outros

compositores que de forma inconsciente eu incorporo à minha obra e as

transformo tornado-as portanto, minha própria criação (NOBRE, 2017)11.

Marlos Nobre tem sido um compositor bastante prolífico para o violão, tanto no campo

do violão solista quanto do uso camerístico do instrumento: duo de violões, violão e flauta,

violão e coro, violão e orquestra, conjunto de violões. Sua obra mais recente para violão solo

foi escrita em 2011 e trata-se da Sonata para Violão (Guitar Sonata), Opus 115. Dedicada ao

violonista Odair Assad, é composta de três movimentos: “Impetuoso”, “Cantabile”, e “Toccata

Brasilis”. Com duração de 16 minutos, a Guitar Sonata foi comissionada pela GHA Records

Belgium, tendo a sua estreia realizada pelo violonista germânico-venezuelano Sef Albertz em

9 de novembro de 2016, em Leipzig, na Alemanha (NOBRE, 2011, p. 27).

Sua obra para violão é assinalada pelo virtuosístico, com uso percussivo, acentos

deslocados, cromatismos, fortes rasgueados,12 textura polifônica e ostinato.13 Apesar de não

ser violonista, Nobre (2017) conhece a técnica do instrumento e tudo que escreve experimenta

neste. Contudo, o compositor nos descreve como se dá seu processo criativo para violão:

Meu processo é mais o menos como segue: eu imagino mentalmente a obra

que vou escrever para violão, anoto todos os detalhes desde a linguagem, a

técnica, o espírito, a forma da obra e depois testo no violão (tenho dois

excelentes instrumentos) a escritura das obras. É interessante e fundamental

dizer que não sou violonista, não toco nada no violão, mas conheço

profundamente a técnica e as possibilidades sonoras do instrumento. Desta

forma, como sempre aconteceu, eu escrevo diretamente na partitura branca a

obra toda e posteriormente os violonistas a tocam. Raramente é necessário

mudar qualquer coisa (NOBRE, 2017)14.

Ao ser questionado sobre sua complexa escrita violonista, o autor relembra uma obra

escrita para o violonista Marcelo Kayath, que relatou a dificuldade em tocá-la: trata-se da obra

Prólogo e Toccata Opus 65 (1984). Para provocá-lo, Nobre escreveu uma versão mais simples

e entregou-a ao violonista. Porém, tempos depois de ter provado, Kayath disse preferir a versão

original – mais complexa – a facilitada, porquanto a última tirava todo impacto da obra

11 Idem, Documento online não paginado. 12 Técnica violonística oriunda do estilo flamenco. 13 Ostinatos são repetições sucessivas de padrões na partitura, podem ser rítmicos, harmônicos e melódicos.

(DOURADO, 2004, p. 239). 14 Documento online não paginado.

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(NOBRE, 2017)15. Diante isso, Nobre se orgulha de suas obras contribuírem para o

desenvolvimento técnico do instrumento. Nas palavras do compositor,

(...) o “difícil” na minha escritura violonística nunca é uma dificuldade em si

mesma, mas sempre é o resultado de um pensamento violonístico mais

avançado. Por isso, talvez, os compositores-violonistas escrevem sempre com

os “clichês” próprios do violão mas não fazem avançar sua técnica. Eu me

orgulho de ter feito avançar as possibilidades técnicas e sonoras do violão com

minhas obras (NOBRE, 2017)16.

Destacamos, até o presente momento, um conjunto de 19 obras para violão solo, fato

que o coloca como um compositor de bastante representatividade no repertório violonístico e

comprova que o instrumento está presente em seus ciclos composicionais:

Tabela 1 – Obras para violão solo de Marlos Nobre

NOME DA OBRA ANO

Momentos I Op. 41 n. 1 1974

Momentos II Op. 41 n. 2 1975

Momentos III Op. 41 n. 3 1976

Homenagem a Villa-Lobos Op. 46 1977

Momentos IV Op. 54 1982

Momentos V Op. 55 1984

Momentos VI Op. 62 1984

Momentos VII Op. 63 1984

Prólogo e Toccata Opus 65 1984

Entrada e Tango Op. 67 1985

Reminiscências Op. 78 1991

Relembrando Op. 78ª 1993

Rememórias Op. 79 1993

Momentos VIII Op. 102 2004

Momentos IX Op. 103 2004

Momentos X Op. 104 2005

Momentos XI Op. 105 2005

Momentos XII Op. 106 2005

Sonata para Violão Opus 115 2011 Fonte: O autor (2017).

15 Documento online não paginado. 16 Documento online não paginado.

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19

3. A SUÍTE REMEMÓRIAS E O PROCESSO CRIATIVO

Consoante à revisão bibliográfica em anais de eventos e periódicos da área da

performance musical, Rememórias Opus 79 para violão solo, do compositor Marlos Nobre, é

ainda pouco explorada no âmbito das pesquisas acadêmicas no supradito campo. Não há, até o

momento, registro de gravação em CD da obra completa17. Composta em 1993, a obra é uma

homenagem a duas figuras ilustres do cenário violonístico: Michele Pittaluga (1918-1995) e a

violonista suíça Suzanne Mebes. Nas palavras do compositor:

[...] esta peça REMEMÓRIAS Opus 79 foi escrita em memória de Michele

Pittaluga, criador do importante Concurso Internacional de Violão na Itália

“Città di Alessandria,” na Itália. Esta portanto é uma homenagem a este grande

homem entusiasmado pelo violão e passou este entusiasmo a seus dois filhos

que continuam sua obra. Ao mesmo tempo é dedicada à violonista suíça

Susanne Mebes, que fundou uma excelente companhia de discos, editando em

Cds quase que exclusivamente obras para violão. Foi esta editora de disco

LÉMAN que editou um CD Lemán LC 44601 onde o excelente violonista

Joaquim Freire, gravou pela primeira vez a minha obra REMINISCENCIAS

Op. 83 para violão. Minha obra REMEMÓRIAS não foi ainda lançada em

disco, até onde estou informado, mas existem excelentes interpretações desta

minha peça, completa, no meu próprio canal no YOUTUBE (...) (NOBRE,

2017)18.

Referente às interpretações disponíveis que Nobre menciona, ressaltamos que

encontramos – até o momento – três gravações no canal do YouTube do compositor, sendo que

uma delas é uma versão do autor desta pesquisa, gravada em 25 de junho de 2015.19

Concernente ao Concorso Internazionale di Chitarra Classica Città di Alessandria à qual

Nobre se refere, é uma importante competição de violão da Itália, completando sua

quinquagésima edição neste ano de 2017, sob direção do violonista austríaco Marco Tamayo.

Rememórias foi publicada pela Editions Henry Lemoine na coleção Roberto Aussel em

1998, constituída de três movimentos: “Embolada”, “Cantilena” e “Caboclinhos” e tem duração

aproximada de 8 minutos. A obra é inspirada em recordações de obras para violão que o

compositor ouvira na infância, como o próprio relata:

Quando comecei a escrever Rememórias, o próprio título indica o que me

inspirou na composição desta obra, ou seja, lembranças de obras para violão,

sobretudo que me marcaram. Entre elas estão o Prelúdio BWV 996 de Bach,

assim como o da Suite nº 1 para Cello. (...) Assim, de forma natural, estas

17 O violonista Fabio Shiro Monteiro gravou o segundo movimento Cantilena no álbum Recital Brasileiro (2001). 18 Documento online não paginado. 19 Nossa versão de 25 de junho de 2015, disponível em: https://youtu.be/p_rJ5oImSAE; versão do violonista

Mikael Mannberg disponível em: https://youtu.be/lB54ldwfXxw; e versão do violonista César Farías Huenuqueo

disponível em: https://youtu.be/R31YsyLi27Y, ambos acessos em 31/10/2017.

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obras de Bach, este manancial de toda a música de todos os tempos, me levou

instintivamente a fazer o mesmo em Rememórias; a alusão a um “sujeito” de

uma fuga também são na realidade coisas instintivas, não pensadas

deliberadamente, pois há citações nesta obra de diversas fontes, inclusive da

música popular do Recife (NOBRE, 2017)20.

É importante observar as citações mencionadas por Nobre serem feitas de forma

inconsciente e natural: “Só um dia depois de escrevê-la, soube que era a tal suíte de Bach.

Portanto, é um caso típico de rememória de algo ouvido antes, mas surgido em estado meio

nebuloso” (SILVA, 2007, p. 36).

Para Silva (2007), Rememórias segue o mesmo espírito de outra obra escrita

anteriormente, a Reminiscências Opus 78, evocando lembranças da infância do compositor e

integra a quinta fase composicional do compositor, tipificadas por estruturas tonais, formas

cada vez mais amplas, maior presença de melodia e fusão de elementos tradicionais e

contemporâneos em sua linguagem (BARANCOSKI, 1997).

3.1 Embolada

A Embolada, como manifestação, é uma expressão de cultura típica do nordeste

brasileiro, tendo sua forma mais clássica nas duplas de cantores ─ denominados emboladores

que, acompanhados de pandeiro ─ criam versos improvisados de forma rápida e com caráter

humorístico. Foi popularizada pelos cantores de rádio a partir dos anos 1950. Ademais, daquela

época destaca-se a figura do embolador Manezinho de Araújo.21

Engendrada a partir da improvisação dos versos em melodias declamatórias,

apresentadas em valores rápidos e intervalos curtos, texto estruturado em versos de cinco ou

sete sílabas e estrofes construídas por quadras ou oitavas, a embolada pode ser de caráter

cômico, satírico ou descritivo ou ainda com palavras que tenham valor sonoro como

onomatopéias (ALVARENGA, 1982, p. 322).

Sem distingui-la do “coco de embolada”, Azevêdo (2000) apresenta-nos uma importante

definição desta:

O coco de embolada, ou apenas embolada, como mais frequentemente é

chamado pelos emboladores, é um sistema literário popular complexo e rico.

É cantado em duplas, sendo o acompanhamento feito com pandeiro ou mais

raramente com ganzá. Apresentam-se os emboladores quase sempre em feiras,

praças, ruas, parques, ou mesmo nos congressos de cantadores de viola. Nesse

20 Documento online não paginado. 21 Do website do Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira: “(...) recentemente destacam-se as duplas

de emboladores Cajú e Castanha, e Terezinha e Lindalva” (disponível em:

<http://dicionariompb.com.br/embolada/dados-artisticos>. Acesso em: 20/04/2017).

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21

caso, apenas como modalidade de exibição, fora de disputa. (AZEVÊDO,

2000, p. 84).

A disputa à qual o autor citado anteriormente se refere trata-se dos “desafios de

embolada”, quando os dois cantadores travam longas disputas entre si.

Nessa perspectiva, ainda de acordo com Azevêdo (2000, p. 86), existem diferenças da

Embolada improvisada (das ruas, da feira) para a Embolada escrita (do rádio ou de folheto).

Enquanto a primeira se caracteriza pela ridicularização de ambos os emboladores, na segunda

não há o achincalhamento, pois corporificada na escrita, perde um pouco o caráter malcriado

das emboladas improvisadas. Com isso, caracteriza-se mais como uma forma de composição

poética, podendo ser usada no âmbito do cordel, por exemplo.

Partindo da ótica descrita no Dicionário Musical Brasileiro, do musicólogo Mario de

Andrade (1989), a Embolada é vista como um processo rítmico-melódico de criar estrofes pelos

cantadores ou emboladores nordestinos: “A embolada não é uma forma musical, é apenas o

nome das estrofes solistas nas canções nordestinas de origem coreográfica. É um processo de

tirar o solo nessas cantigas e não compreende pois o refrão” (ANDRADE, 1989, p. 199).

O musicólogo ainda lembra que a palavra Embolada deriva de bola, cuja terminologia

é bastante confusa entre os cantadores nordestinos, podendo relacionar-se ao jeito poético-

musical de cantar, como aponta os de versos de embolada estruturada em quadra, forma mais

utilizada pelos emboladores: “Rebola a bola/ Você diz que dá, que dá/ Você diz que dá na bola/

Na bola você não dá!”22

Quanto à Embolada de Nobre, mais precisamente no primeiro movimento da obra, o

compositor rememora obras de Johann Sebastian Bach (1685-1750) com temas do Prelúdio da

Suíte em Mi menor BWV 996 e do Prelúdio da Suíte para Violoncelo em Sol maior BWV 1007,

dispostos em comparativo a partir das figuras abaixo.

22 Idem, ibidem, p.199.

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22

Figura 1 – Trecho inicial do Prelúdio BWV 996 de J. S. Bach

Fonte: Zigante (2001, p. 40).

Figura 2 – Trecho inicial da Embolada

Fonte: Nobre (1998, p. 1).

Observa-se, no quarto compasso da Embolada (Fig. 2), a forte semelhança do material

melódico com o trecho inicial de Preludio de Bach (Fig. 1), com pequenas modificações

intervalares.

Outra reminiscência do compositor ─ o Prelúdio da Suíte nº1 para Cello BWV 1007,

originalmente escrito em Sol maior ─ pode ser associado a dois momentos deste primeiro

movimento: dos compassos 42 ao 49 e do 62 ao 74. Vejamos, nas figuras 3 e 4, uma comparação

entre um trecho do Prelúdio com um trecho da Embolada:

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23

Figura 3 - Primeiros compassos do Prelúdio BWV 1007 de Bach 23

Fonte: Yates (1998, p. 11).

Figura 4 – Compassos 62-64 da Embolada

Fonte: Nobre (1998b, p. 3).

Percebe-se ainda, nos compassos 62 ao 64, a menção ao nome de Bach, pois o

compositor escreve na partitura as letras “B”, “A”, “C” e “H” (Fig. 4) sobre cada um desses,

respectivamente. Tal alusão, segundo o próprio Nobre, é uma constante na sua escrita (Sib, Lá,

Dó e Si), sendo perceptível depois de concebida e faz-se presente no Trio Op. 4 (1º movimento),

no Divertimento Op. 14 (2º. movimento), no Quarteto Op. 26, no Quinteto de Sopro Op. 28,

nas Convergências Op. 29, na Biosfera Op. 35 e na Homenagem a Villa-Lobos Op. 46

(GOULART, 1985, p. 51).

Ao escrever uma embolada com rememórias de Bach, o compositor utiliza a célula

rítmica característica da embolada nordestina: os acentos sincopados do pandeiro e dos versos

declamatórios dos cantadores. No entanto, quando extraímos os acentos da peça, notamos – em

sua maior parte – acentuação quarta semicolcheia do primeiro tempo e na segunda do segundo

tempo (ver Fig. 5), distinguindo-se um pouco da célula rítmica mais comum executada pelos

emboladores,24 acentuada na primeira e quarta do grupo de oito semicolcheias (ver Fig. 6).

Figura 5 – Célula rítmica extraída do primeiro movimento Embolada

Fonte: O autor, 2017.

Figura 6 – Célula rítmica extraída do pandeiro do Embolador

Fonte: O autor (2017).

23 Transcrição para violão de Stanley Yates. 24 Padrão rítmico encontrado nas seguintes duplas de emboladores: Bem-Te-Ví & Estrela da Poesia, disponível em

https://youtu.be/cNGSPCTBegw; Cajú & Castanha, disponível em https://youtu.be/3uqEoZsKQsQ; Terezinha &

Lindalva, disponível em https://youtu.be/7jrEEV7JaLA. Acesso em 21/11/2017.

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24

Sobre o procedimento baseado em improvisações, brincadeiras com música ou temas

de outros compositores, Nobre – em depoimento ao programa de rádio Violão com Fábio Zanon

–, recorda ser uma prática típica dos músicos de feira de Recife (ZANON, 2008)25.

Sendo a peça escrita em compasso binário, característica da embolada de coco,

curiosamente o compositor escreveu-a em ternário em três momentos: compassos 13, 51 e 56.

Por conseguinte, interpretamos um leve ralentando no segundo tempo de ambos os compassos,

voltando a tempo no terceiro, retornando à fórmula de compasso original da embolada.

Figura 7 – Agógica no compasso 51

Fonte: Nobre (1998b, p. 2).

Para o andamento, a indicação do compositor é de Poco Vivo com semínima a 80

batimentos por minuto (bpm). Há trechos em que foram encontradas dificuldades técnicas para

sua execução, tendo a necessidade de elaborar um mapeamento e praticá-los lentamente com

auxílio do metrônomo com semínima a 50 bpm, com aumento gradativo da velocidade. Dentre

esses, elegemos três trechos da peça classificados como de complexa execução: compassos 25

a 26, compasso 33 a 37 e no trecho em fugato dos compassos 58 a 62.

Para esses, além do estudo lento, utilizamos o gesto consciente do cotovelo26 esquerdo,

fazendo movimentos com o objetivo de auxiliar na execução destas passagens. Destarte, o gesto

passou a ter função na técnica de mão esquerda deste autor, com movimentos de cotovelo alto

(distante do corpo), cotovelo baixo (próximo do corpo), cotovelo para frente (embaixo do braço

do violão). Percebemos, em nossos experimentos, que o movimento consciente desse é bastante

usado entre concertistas e violonistas experientes, porém esta técnica tende a passar

despercebida entre os violonistas principiantes.

O exemplo abaixo mostra a maneira como utilizamos o cotovelo para auxiliar nas

dificuldades técnicas do trecho em fugato.

25 Documento online não paginado. 26 Na falta de um conceito mais específico, criamos estes termos provisórios com a intenção de auxiliar na

explanação de nossa ideia.

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25

Exemplo audiovisual 1 – O uso do cotovelo nos compassos 58-62.

Fonte: Batista (2017a)27.

Vale ressaltar que, apesar de bastante utilizado, o uso consciente do cotovelo não foi

mencionado em nenhuma masterclass relatada anteriormente neste trabalho. Nosso despertar

para o uso desta técnica surgiu de observações do nosso orientador. Sendo assim, partindo de

sua experimentação, vimos a necessidade de introduzi-la de forma mais aprofundada no estudo

prático do violão, visando o gesto e a consciência corporal como componentes auxiliares na

interpretação.

Com relação ao ostinato rítmico da sexta corda que percorre por toda a peça, podemos

associá-lo com o toque do pandeiro dos emboladores. Notamo-lo sua formação a partir da

colcheia pontuada, semicolcheia com acento e staccato, além de pausa de semínima

(BATISTA; LIRA, 2016). Esse desenho rítmico desenvolve-se praticamente em toda peça,

exceto nas partes contrastantes (compassos 43-52 e 63-83). A fim de realizá-lo, encontramos

duas opções: na primeira, o autor experimentou abafar a semicolcheia pontuada com acento e

staccato, com o dedo polegar tocando e voltando rapidamente para a sexta corda para “apagar”

a nota Mi2 e, assim, tocar o silêncio da pausa de semínima.

Exemplo audiovisual 2 – Abafamento com a parte interna do polegar

Fonte: Batista (2017b)28.

27 Disponível em https://youtu.be/kL0LrJcvKHs. 28 Disponível em https://youtu.be/psBZgtGZ0_Q.

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26

Já na segunda, abafamos a mesma semicolcheia com a parte lateral do polegar, tocando-

a e posicionando a pólice ligeiramente na quinta corda, com um breve movimento de virar

punho, o polegar “apaga” o Mi2.

Exemplo audiovisual 3 - Abafamento com a parte lateral do polegar

Fonte: Batista (2017c)29.

Para a realização do ostinato, escolhemos a técnica de abafamento exposta nas linhas

anteriores, porquanto a semicolcheia é acentuada e em staccato, indicando uma duração mais

curta que o normal. Vimos, portanto, o abafamento com a borda lateral de o polegar ser

eficiente.

Exemplo audiovisual 4 – Trecho inicial da Embolada

Fonte: Batista (2017d)30.

Para digitação, foi utilizado praticamente toda a indicação exposta pela edição Henry

Lemoine, porém com algumas mudanças ou substituições de dedo na mesma posição da mão,

como apresentaremos nos exemplos musicais com trechos da partitura. Desta, escolhemos dois

trechos que decidimos mencionar com o intuito de demonstrar como exemplo desta solução

alternativa.

De modo que a mão esquerda esteja em posição fixa – elidindo mudança de posição

desnecessária – digitamos os compassos 5 e 6 na quinta posição ao invés da quinta e primeira,

conforme o indicado na partitura, com o intuito de digitar a mão esquerda numa posição fixa,

29 Disponível em https://youtu.be/ctgOrL25kjQ. 30 Disponível em https://youtu.be/GeI53FD1bp0.

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eliminando as mudanças de posição desnecessárias. Na figura 8, apresenta-se uma comparação

entre a solução encontrada (Fig. 8a) e o trecho original (Fig. 8b).

Figura 8 – Digitação na quinta posição nos compassos 5 e 6

(8a)

(8b)

Fonte: Nobre (1998b, p. 1).

Outro exemplo de mudança de digitação está nos compassos 25 e 26. Aproveitamos as

notas Mi2 e Mi4 em cordas soltas (sexta e primeira) para fazer a mudança de posição da I para

a VI e em seguida para a X (ver Fig. 9a) – diminuindo um salto mais brusco da posição I para

a X (ver Fig. 9b), já que o elemento melódico se encaminha para o Fá5 e Mi5.

Figura 9 – Digitação nos compassos 25 e 26

(9a)

(9b)

Fonte: Nobre (1998b, p. 2).

Quanto ao dedilhado de mão direita, não encontramos dificuldade técnica, porquanto a

maior parte da peça desenvolve-se com uma única linha melódica, sendo acompanhada pelo

ostinato do baixo. Sendo assim, procuramos o dedilhado mais natural possível, guardando o

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conceito de alternar os dedos indicador e médio (letras “i” e “m” na figura abaixo). Em trechos

que percebemos o cruzamento de dedos, utilizamos o anelar (letra “a”) para eliminar o

problema. Vejamos o exemplo dos compassos 4 e 5.

Figura 10 – Exemplo de dedilhado nos compassos 4 e 5

Fonte: Nobre (1998b, p. 1).

Aqui, vale ressaltar dois problemas técnicos peculiares ao violão. Trata-se dos sons com

ruídos nas cordas graves do instrumento (sexta, quinta e quarta) devido à sua construção e são

ocasionados pelos seguintes fatores: o primeiro é a mão esquerda, em consequência do arraste

dos dígitos sobre as cordas, ocorrendo em razão do fio de aço – que enrola a corda – estar em

sentido vertical e as linhas que os formam, em sentido horizontal; o segundo é a mão direita,

pois o ruído dá-se pelo atrito das unhas nas cordas, basicamente pelo mesmo conceito de ambos

estarem em sentidos diferentes. Nesse caso, o ruído torna-se mais acentuado caso o ângulo da

mão direita for perpendicular em relação às cordas.

Isso, relacionado à peça Embolada, pode estar presente visto como há partes da peça em

que a melodia se apresenta na região média e/ou grave do instrumento. Com isso, para diminuir

os ruídos criados pela mão esquerda, estudamos paulatinamente o levantar dos dedos nas

mudanças de posições das cordas graves e aproveitando as lisas para deslizá-los com o auxílio

do “dedo guia”.31 Objetivando minimizar os ruídos de unha da mão direita, experimentamos

girar levemente o ângulo da mão à proporção das cordas,32 na medida em que o dedilhado “i”,

“m” e “a” segue em direção às cordas graves, tocando quase de frente, conforme mostra a

imagem abaixo.

31 Técnica que se utiliza de um dedo da mão esquerda deslizando sob a corda para auxiliar no traslado. 32 Sugestão do professor Dr. Mario Ulloa (UFBA) em masterclass no dia 09/10/2013.

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Figura 11 - Ângulo perpendicular X ângulo frontal

(11a) (11b)

Fonte: O autor (2017).

Observa-se a postura da mão, quando posicionada nas cordas primas (Fig. 11a), ser

perpendicular às cordas do instrumento, enquanto que na mão – posicionada nas cordas graves

(Fig. 11b) – há uma mudança no ângulo da mão, fazendo com que os atritos das unhas nas

cordas sejam em sentido frontal.

Concernente ao timbre, notou-se que o compositor praticamente não coloca indicações

na partitura. Algumas, a nosso ver, estão presentes mais pelo caráter que pelo colorido sonoro.

Baseando-se nessas, procuramos associar o que, para nós, representa um timbre para

determinados trechos, possibilitando assim criar variações na peça. Desse modo, as maiores

variações estão nos compassos 37 ao 41 (impetuoso), nos quais escolhemos uma sonoridade

metálica; nas sessões contrastantes dos compassos 42 ao 51, 62 ao 82, em que buscamos pelo

caráter misterioso, sonoridade escura, doce e, sobretudo nos quatro compassos finais, o

compositor repete o compasso 75 quatro vezes. A fim de exemplificar, vejamos o trecho dos

compassos finais:

Figura 12 – Colorido sonoro nos compassos 75 ao 82

Fonte: Nobre (1998b, p. 3).

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Observa-se que o compositor é bastante enfático em suas indicações, quanto à

articulação, com uso dos ligados, acentos, staccato e tenuto. Porém, com relação aos trechos

anteriormente citados, cuja alusão faz-se ao motivo inicial da Cello Suíte nº 1 de J. S. Bach,

experimentamos três maneiras para interpretá-los:

1. A articulação indicada na partitura, com o emprego do tenuto na segunda semicolcheia

de cada compasso;

2. Articulação associada à suíte de Bach, sem o tenuto e com ligado entre a terceira e quarta

semicolcheias de cada compasso;

3. Articulação associada à rítmica da embolada, sem o tenuto e sem ligado, mantendo as

acentuações supracitadas no trecho musical – características da embolada nordestina.

Desse modo, notamos que todas as opções de articular o trecho são válidas. Não

obstante, decidimos pela segunda opção, porquanto o trecho faz referência ao motivo da Cello

Suíte nº 1 de Bach, a qual se utiliza dos ligados entre a terceira e quarta semicolcheias do

primeiro tempo do compasso.

Figura 13 – Articulação nos trechos que fazem associação ao Prelúdio BWV 1007 de Bach

Fonte: Nobre (1998b, p. 3).

Ainda com relação à articulação, ressaltamos a mudança das acentuações na linha

melódica dos compassos 21 ao 25. Nesse trecho, o acento recai sobre a segunda semicolcheia

de cada tempo do compasso.

Em referência ao fraseado no primeiro movimento, verificamos o compositor não

colocar nenhuma ligadura de frase, bem como nenhuma indicação de respiração. Entretanto,

para as sessões A da peça, há algumas pausas de semicolcheia que indicam a separação de

materiais melódicos semelhantes. Por isso, podemos interpretá-los como final e início de uma

nova frase.

Figura 14 - Fraseado separado pelas pausas de semicolcheia

Fonte: Nobre (1998b, p. 1).

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Outra forma de executar é dar ênfase ao que poderíamos chamar de “subfrases”, isto é,

destacar – dentro da frase maior – outras pequenas que surgem do motivo inicial da peça:

característica da música do período barroco. Esses motivos, por sua vez, estão presentes a cada

oito semicolcheias. Vejamos, assim, o exemplo abaixo com o mesmo trecho musical anterior:

Figura 15 - Fraseado em “subfrases” fragmentado

Fonte: Nobre (1998b, p. 1).

3.2 Cantilena

Segundo o dicionário Groove (versão online), Cantilena é um termo latino cujas origens

são provenientes da música da Idade Média. O termo significa “canção” ou “melodia”, ao longo

da história, serviu para designar uma variedade de forma de música vocal. Inicialmente, para

cantos diferentes da salmodia, a partir do século IX foi frequentemente associado à monofonia

não-eclesiástica. Por volta do século XIII, passou a ser aplicado a canções polifônicas não

baseadas no cantus firmus33.

Já em Dourado (2004), encontramos a seguinte definição para Cantilena: “lat.

Cantillare, lit.: cantar em murmúrio. 1. Canção repetitiva lenta e monótona. 2. Durante o século

XIII um tipo de polifonia simples” (DOURADO, 2004, p. 68).

No segundo movimento de Rememórias, encontramos essas descrições anteriores, pois

Cantilena é uma peça de curta duração com textura polifônica e escrita em compasso

quaternário. A melodia principal é simples, porém com tratamento harmônico refinado,

aparecendo repetidas vezes ao longo da peça, fruto de mais uma das reminiscências de Nobre,

doravante uma canção nordestina chamada a “A Muié de Lampião”, como o compositor relata

a Silva (2007).

A 2ª. peça “Cantilena” é uma rememória de uma canção do Nordeste, “A muié

de Lampião”, que sempre me pareceu belíssima e que eu utilizo no meu “Ciclo

de Lampião” para coro misto e capella. A escrita é muito trabalhada e muito

polifônica, com aquele caráter tipicamente nostálgico do Nordeste... (NOBRE

Apud SILVA, 2007, p. 162).

33 Disponível em:

<http://www.oxfordmusiconline.com/subscriber/article/grove/music/04773?q=cantilena&search=quick&pos=1&

_start=1#firsthit>. Acesso em: 13 fev. 2017.

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Além de utilizá-la no segundo movimento da Rememorias Op. 79, no Ciclo de Lampião

Op. 52,34 no Quarto Ciclo para Piano Op. 43, Marlos Nobre também a usou em Cantilena I,

primeira peça da série Três Cantilenas escrita em 2009 para violoncelo e piano. Com relação

à letra, consta na partitura do Cancioneiro de Lampião Op. 52 o seguinte texto:

II. É Lamp, é Lamp, é Lampa

A muié de Lampião não anda de pé no chão

Anda de meia e sapato lenço de seda na mão

Anda de meia e sapato lenço de seda na mão

É Lamp, é Lamp, é Lampa, é Lamp, é Lampião

O meu nome é Virgulino o apelido é Lampião

Minha mãe me dê dinheiro pra comprar um cinturão

Pra encher de cartucheira pra brigar mais Lampião

Que a mió vida do mundo é andar mais Lampião

É Lamp, é Lamp, é Lampa, é Lamp, é Lampião

O meu nome é Virgulino o apelido é lampião35

Encontramos, ainda, essa melodia com pequenas variações rítmicas e texto semelhante

ao Ensaio sobre a Música Brasileira do musicólogo Mario de Andrade (1972). Neste, conforme

os exemplos a seguir, a canção está escrita em compasso binário (Fig.16) e, na seguinte, em

quaternário.

Figura 16 - Letra e melodia da canção “É Lamp, é Lamp, é Lampa”

Fonte: Andrade (1972, p. 115).

34 Apesar de Marlos Nobre ter mencionado a peça como “Ciclo de Lampião”, consta no catálogo online disponível

no site oficial do próprio compositor como o título original “Cancioneiro de Lampião” op. 52. Escrita para coro

em 1980, a obra é estruturada em três movimentos: 1. Muié Rendera, 2. É Lamp, é Lamp, é Lampa, 3. Cantigas

de Lampião. 35 Letra extraída na partitura da obra Cancioneiro de Lampião Op. 52 (1980) de Marlos Nobre. Disponível em:

<https://pt.scribd.com/document/239586258/Marlos-Nobre-Cancioneiro-de-Lampiao-pdf>. Acesso em: 15 mar.

2017.

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33

Figura 17 – Trecho inicial de Cantilena

Fonte: Nobre (1998a, p. 4).

No que concerne à técnica e à interpretação da peça, percebemos um caráter de lamento

nordestino, ou o canto das lavadeiras que, segundo o compositor, são vagas lembranças da

época quando morava em Recife, do cantar em murmúrio das senhoras daquela era (ZANON,

2008).36 Sobre uma simples e melancólica melodia, Nobre desenvolve uma textura

contrapontística criando uma densa e refinada harmonia. Neste movimento, é evidente o

tratamento cromático do compositor no contexto harmônico. Como pode ser observado as notas

em destaque na linha do baixo nesse último exemplo (Fig. 17).

Em nosso processo de aprendizagem, encontramos desafios que levaram ao estudo

aprofundado da técnica. Os aspectos mais trabalhados foram o legato, da condução das vozes

e nas mudanças de posições da mão esquerda,37 aberturas de mão esquerda, destaque de uma

linha melódica dentro de acordes, e a formação de acordes com notas em harmônicos. Assim,

buscamos, na digitação, alternativas mais naturais e musicais para a realização de trechos

musicais os quais classificamos como problemáticos na peça, além de poder auxiliar ou

diminuir determinadas dificuldades técnicas, dependendo da proposta interpretativa.

Em relação às dificuldades técnicas citadas, fomos pesquisar na literatura exercícios

isolados que auxiliaram na resolução dessas. Evidentemente, a escolha dos exercícios teve a

orientação do nosso professor de violão. Partindo deste estudo, obtivemos uma melhora

bastante significativa no processo com a obra.

Um dos exercícios trabalhados que surtirão efeitos positivos no legato da condução de

vozes e nas mudanças de posição foi retirado do método Pumpin Nylon, do violonista americano

Scott Tennant. O exercício é uma polifonia a duas vozes que consiste em executar as notas em

intervalos de 2ª e 3ª menor, ambos em cordas alternadas. O objetivo é manter os dedos

pressionando as notas com a duração indicada, fazendo com que não aconteça interrupção

antecipada do som.

36 Documento online não paginado. 37Aspectos trabalhados depois da masterclass com o violonista e professor Dr. Thomas Patterson, da Universidade

do Arizona (USA).

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34

Figura 18 – Odair’s Favorite Drill

Fonte: Tenannt (2005, p. 21).

Para o andamento, o compositor sugere “lento expressivo” com semínima a 60 bpm.

Baseados em nossa performance, notamos que a peça fica bastante arrastada, sobretudo nos

trechos de “poco meno” (trechos com andamento inferior), podendo resultar numa música

cansativa para o ouvinte. Assim, procuramos um andamento pouco mais rápido que melhor

expressasse nossas ideias musicais. Experimentamos, então, a semínima a 66 bpm e para os

trechos de andamento inferior, a semínima a 56 bpm.

Concernente à digitação, vemos como boas as escolhas que constam na partitura, mas

procuramos outras alternativas de maneira a contribuir na minimização das dificuldades

técnicas, objetivando sempre valorizar um pouco mais a melodia principal. Conforme o

exemplo (Fig.19), nossa escolha nas primeiras frases da peça foi deixar a melodia principal com

uma sonoridade mais clara, brilhante. Diferentemente da digitação indicada pela edição Henry

Lemoine, que inicia na terceira corda, digitamos na segunda as duas primeiras frases.

Figura 19 – Digitação da melodia principal na segunda corda

Fonte: Nobre (1998b, p. 4)

Essa escolha deu-se pelo fato de a segunda corda normalmente ter um timbre mais claro

que a terceira, podendo embaraçar a comunicação da obra. Devem, também, ser consideradas

as particularidades do violão quanto à construção e tipo de cordas, influenciando no aspecto

timbrístico do instrumento.

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35

Curiosamente, há três passagens na peça que notamos complexidade na escrita para

digitação do trecho musical. Na primeira, presente no compasso 21, o compositor escreve o

acorde de Si menor com a sétima (Lá) em harmônico. Da maneira como se apresenta na escrita,

fica inviável a realização do harmônico com a digitação sugerida, como mostra a figura abaixo,

em destaque o círculo vermelho.

Figura 20 – Digitação complexa no compasso 21

Fonte: Nobre (1998a, p. 4)

Sendo assim, encontramos duas formas para resolver-se a problemática: a primeira é

tocar a nota Lá em som real na quarta corda (eliminando o harmônico) consegue se mantiver a

digitação proposta na partitura; a segunda, as notas Ré, Fá#, Si com a meia pestana do dedo 1

(dedo indicador) e a nota Lá em harmônico com o dedo 4 (dedo mínimo) no XII traste da quinta

corda (conserva o harmônico, mas altera a digitação).

Figura 21 –Digitação no compasso 21

Fonte: Nobre (1998b, p. 4).

Salientamos, na segunda passagem problemática, uma dificuldade relacionada à

anatomia da mão deste autor.

No compasso 23, Nobre escreve novamente um acorde que podemos interpretar como

Mi maior com sétima, tendo as notas Sol#, Mi e Ré em som real e a nota Mi em harmônico do

XII traste da sexta corda. Constatamos, ao experimentar a digitação indicada com o dedo 2 na

primeira corda e o 4 na sexta, ser impossível para nós a execução do trecho da maneira como

está escrito. Recorremos, então, a recursos da técnica de jogar o cotovelo para frente (próximo

do corpo do instrumento), tirar o apoio do polegar de traz do braço do violão (deixando a mão

mais livre para a realização do movimento), mas não obtivemos resultado satisfatório. Com

isso, a forma que encontramos para resolver o problema foi oitavar as notas Sol# e Sol natural

e tocar o Mi em som real na quinta corda.

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36

Vejamos uma comparação entre o trecho original (Fig. 22a) com a nossa solução

encontrada (Fig. 22b).

Figura 22 – Compasso 23 de Cantilena

(22a)

(22b)

Fonte: Nobre (1998b, p. 5)

Já na terceira passagem, no compasso 40, o problema é a abertura pouco usual da mão

esquerda condicionada pela distância entre a nota Si4 da primeira corda e Fá2 da sexta. Ou seja,

uma abertura entre a I e a VII posição do braço do violão. Aqui, experimentamos duas formas

de executá-la: na opção primeira, oitavamos a nota Fá2, transferindo-o para a quinta corda –

nessa opção, sustenta-se a melodia, contudo a linha do baixo permanece prejudicada; na

segunda, elegemos por tocar as notas da melodia Si-Lá-Si em harmônico com a mão direta,

assim mantém-se a melodia e a linha do baixo como escrito na partitura. Acresce-se que essa

forma de tocar reforça a indicação de “dolcissimo” proposta para o trecho em questão.

Figura 23 – Compassos 40-41 da Cantilena

Fonte: Nobre (1998b, p. 5).

Em relação ao timbre, há apenas três indicações na peça: duas delas estão nos trechos

de mudança de andamento “poco meno” (compassos 13-20 e 32-36) que sugerem uma

sonoridade “dolce” e a terceira é de “dolcissimo”, nos compassos 40 ao 44. Diante disso, nos

trechos não colocados por Nobre quanto à indicação de timbre, tomamos liberdade para buscar

maior colorido sonoro e mais contrastes. Assim, nossa sugestão é para os compassos que vão

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de 20 ao 24 com a volta do “Tempo I” com timbre pouco metálico (Fig. 24) e do 36 ao 40 com

o “a Tempo”, caracterizada pela suavidade sonora e metálica (Fig. 25). O resultado é uma maior

variedade de timbres, proporcionando maior interesse no ouvinte.

Figura 24 – Compassos 20-24 da Cantilena

Fonte: Nobre (1998b, p. 5).

Figura 25 – Compassos 36-40 da Cantilena

Fonte: Nobre (1998b, p. 5).

Voltada à articulação, a proposta é tocar sempre com legato, podendo ocasionalmente tocar em

stacatto, melodias secundárias que funcionam como ponte ou ligação entre o final e início das frases.

O exemplo abaixo apresenta nossa sugestão para o compasso 8, entre o desfecho da quarta e começo

da quinta frase.

Figura 26 – Compasso 8 da Cantilena

Fonte: Nobre (1998b, p. 4).

Em referência ao fraseado, o compositor delimita-o claramente com as ligaduras de frases,

embora estas não se presentifiquem nos trechos em que não as há e nos compassos indicados

de “poco meno”, é nítida – pelo movimento melódico – a estrutura das frases. Recorremos,

ainda, à letra da canção “A muié de lampião” para compreender o fraseado nestes trechos da

peça.

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Figura 27 – Compassos 12-16 da Cantilena

Fonte: Nobre (1998b, p. 4).

3.3 Caboclinhos

Caboclinhos (ou Cabocolinhos) são grupos de índios ou de descendência indígena –

compostos por pessoas de diversas faixas etárias – que se apresentam em eventos, seja o

carnaval, seja em rituais de sua comunidade, através da dança e da música.

A dança é construída por coreografias bem sincronizadas e ensaiadas pelos

participantes, acompanhada de ritmos acelerados dos tambores, cujos efeitos percussivos

representam do ataque do arco e flecha, caracaxás e apito. Acresce-se a esta descrição a gaita,38

instrumento responsável por repetidas melodias, repassadas pela tradição oral.

Ademais, têm como característica o uso de indumentárias com acessórios indígenas tais

quais os cocares, cordões, as pulseiras, o arco e a flecha confeccionados artesanalmente,

podendo ainda ser confeccionados pelos próprios integrantes do grupo.

Os Caboclinhos mais conhecidos são os do Recife, famosos por saírem às ruas em

desfiles carnavalescos. Já no Rio Grande do Norte, o grupo mais conhecido é o dos

“Caboclinhos de Ceará-Mirim”39, apresentando-se regularmente em eventos diversos a convite

de autoridades ou organizadores. Suas características diferem dos caboclinhos pernambucanos,

haja vista a exposição de um auto que se refere ao período da Guerra dos Bárbaros, contendo

personagens militares. Concernente aos cantos, os perrés e baianos solados são entoados e

acompanhados pela flauta de taquara – de quatro furos40.

Destarte, no plano musical, podemos afirmar que não existe o elemento da harmonia,

tendo o compasso geralmente binário. Além disso, a base desta música consiste em uma linha

melódica executada pela gaita e acompanhada por instrumentos de percussão como caracaxás,

ganzás e tambores (ANJOS, 2012).

38 Tipo de flauta artesanal, tendo quatro ou cinco furos e mede entre 34 e 39 centímetros. Pode ser construída de

taboca, alumínio ou cano PVC. 39 O grupo funciona desde 1929, atualmente sobre a organização do mestre Severino Araújo. 40 Informação verbal. Obtida em apresentação pública dos Caboclinhos de Ceará-Mirim, na Cidade da Criança em

Natal, pelo pesquisador e folclorista Alcides Sales em 24 abr. 2017.

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39

Ritmicamente, a música dos Caboclinhos pode ser classificada em três tipos – guerra,

perré e baião, podendo ter ainda suas respectivas variações que são chamados pelos

participantes de “toque” ou “batida” e variam de 108 a 160 bpm (ANJOS, 2013). Observa-se

na figura abaixo os três ritmos diferentes de toques de Caboclinhos.

Figura 28 - Padrões rítmicos dos Caboclinhos

Fonte: Anjos (2013, p. 36).

Consoante Alvarenga (1982), os Caboclinhos são denominados como “Danças

Dramáticas de Inspiração Ameríndia” e, além das melodias executadas pelo pife ou gaita, como

também é conhecido, é acrescido o canto, de acordo com a citação abaixo:

Os Cabocolinhos possuem manifestações das quais o canto participa e outras

de que a música é apenas instrumental, executadas geralmente por pifes e

zabumbas, aos quais se juntam por vezes tarô e caracaxá. A participação da

palavra falada é rara (...). O departamento da cultura de São Paulo registrou

em disco uma pequena parte falada dos Cabocolinhos “Índios Africanos” de

João Pessoa (Paraíba) e dos cabocolinhos de Itabaiana, tendo colhido em

Areia, no mesmo Estado, um texto escrito que prova ter a parte falada existido

por lá no fim do século passado (ALVARENGA, 1982, p. 92).

No Dicionário do Folclore Brasileiro de Câmara Cascudo (1954), a definição dada é

esses grupos serem predominantes em cidades do Nordeste, participando de desfiles no

carnaval, sem o elemento do enredo:

Grupos fantasiados de indígenas, com pequenas flautas e pífanos percorrem

as ruas nos dias de carnaval nas cidades do nordeste do Brasil. Executam um

bailado primário, ritmado nos arcos, fingindo ataques e defesa, em série de

saltos e simples troca-pés. Não há enredo nem fio temático nesse bailado...

(CASCUDO, 1954, p. 211).

Com intuito de colher nuances interpretativas da música dos Caboclinhos, buscamos

ouvir e ver de perto apresentações desses grupos. Notamos em nossas pesquisas auditivas em

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40

CDs como o Som dos Caboclinhos 2003,41 CD anexo da Tese de doutorado de Alexandre

Jonhson dos Anjos e ainda apresentação ao vivo do grupo Caboclinhos de Ceará-Mirim, nos

quais tanto o elemento rítmico e o melódico têm a mesma importância. Ou seja, ambos são

executados em mesma intensidade, sem diferir, pois a melodia costuma estar em um plano

principal e o ritmo em plano secundário, como é de praxe na música instrumental. Portanto,

nossa primeira sugestão para interpretar o Caboclinhos é tocar tudo em um mesmo plano de

dinâmica, podendo em determinados momentos da peça variar de acordo com a dinâmica

sugerida.

O terceiro movimento da Rememórias é inspirado na música dos grupos de Caboclinhos

do Recife. Para Silva (2007, p. 37), a peça é constituída de lembranças de melodias nordestinas,

dentre elas trechos da música “Juazeiro” de Luiz Gonzaga, que são desenvolvidas sob ostinatos

rítmicos da nota Ré da sexta e quarta cordas. Vejamos uma comparação com o trecho de

Caboclinhos dos compassos 19 ao 27 (ver Fig. 29) com a melodia original cantada por Luiz

Gonzaga (ver Fig. 30).

Figura 29 – Compassos 19-27 de Caboclinhos

Fonte: Nobre (1998b, p. 6).

Figura 30 – Melodia do refrão de “Juazeiro” de Luiz Gonzaga

Fonte: Batista; Lira (2016, p. 6).

A sonoridade de Caboclinhos remete-nos à música armorial, uma vez que a peça está

composta baseada na chamada “escala nordestina” com a presença dos modos lídio/mixolídio,

(lídio b7) ou seja, escala maior com a 4ª aumentada e 7ª menor (BATISTA; LIRA, 2016, p. 6).

Ritmicamente, os ostinatos apresentados no desenrolar da peça fazem menção à execução

rítmica dos tambores dos Caboclinhos. A realização desses foi nosso maior desafio na peça,

41 Disponível em: https://youtu.be/HIkiTh_hIb4. Acesso em: 15 abr. 2017.

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41

pois tivemos de experimentar técnicas e dedilhados diferentes para alcançarmos um resultado

satisfatório.

As características que podemos citar na peça são o uso recorrente dos ligados, o

compasso binário, o andamento rápido e as mudanças dos ostinatos rítmicos, relacionadas aos

vários tipos de toques dos tambores. Se a observarmos, a célula rítmica do ostinato varia cinco

vezes na linha do baixo. Entretanto, acreditamos que são variantes da primeira célula

apresentada pelo compositor, caracterizado pelo acento da última semicolcheia do primeiro

tempo de cada compasso, como mostra a figura abaixo.

Figura 31 - Variações do ostinato no Caboclinhos

Fonte: O autor (2017).

Para conseguir fazer os ostinatos soarem de forma rítmica, associando com o toque dos

tambores dos Caboclinhos, foi necessário empregar – no primeiro momento – a técnica de

abafamento com a parte lateral do polegar. Para tanto, foi extraída a digitação da mão direita

através de muita prática, de modo a tornar o gesto do palmo mais natural, fazendo-nos a ter a

percepção do método. O exemplo abaixo mostra como extraímos o dedilhado da peça e o

tornamos um exercício técnico.

Figura 32 – Exemplos de dedilhado como exercício técnico

Fonte: O autor (2017).

No tocante à digitação, encontramos dificuldades na indicação da partitura como, por

exemplo, muitas mudanças de posição da mão esquerda, ocasionando traslados que muitas

vezes podem ser executados facilmente em uma posição fixa. Por isso, procuramos – na medida

do possível, escolher uma digitação que deixasse a mão mais estabilizada possível.

Quanto ao dedilhado da mão direita, escolhemos a combinação polegar e indicador (p,

i) a fim de realizar os ostinatos da peça, sendo o “p” para a sexta corda e o “i” para a quarta.

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Além disso, experimentamos tocar a última colcheia do ostinato com o “p”, mas não obtivemos

um bom resultado. Relacionado à melodia, utilizamos os dedos médio e anelar (m, a).

Figura 33 - Digitação escolhida para melodia (notas com hastes para cima) e ostinato (com

hastes para baixo)

Fonte: Nobre (1998b, p. 6).

Com a mudança do ostinato dos compassos 28 ao 45, a melodia que se apresenta em

quartas sobrepostas, passa a ser realizada pelos dedos indicador e médio (i, m) e o ostinato

apenas com o polegar (p).

Figura 34 - Dedilhado nos compassos 28 e 29

Fonte: Nobre (1998b, p. 6).

A partir do compasso 51, volta-se basicamente ao mesmo dedilhado. No entanto, nos

compassos 62 ao 69, onde identificamos o tema de “Juazeiro” de Luiz Gonzaga, é acrescentado

uma melodia intermediária (Fá3), sendo possível a realização do ostinato com Ré3, sendo

tocada na quinta corda, conforme mostra a figura abaixo.

Figura 35 – Dedilhado com Ré3 na quinta corda

Fonte: Nobre (1998b, p. 7).

O mesmo acontece na terceira vez em que Nobre utiliza o tema supracitado de Gonzaga,

mais especificamente nos compassos 87, 91 e 94.

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Já nos quatro compassos finais (Fig. 36), cuja funcionalidade é de uma codeta,

sugerimos tocar os acordes em rasgueados com o dedo médio, pulsando as três notas

simultaneamente do acorde em destaque.42

Figura 36 – Acordes rasgueados utilizando o dedo médio

Fonte: Nobre (1998b, p. 8).

Em referência ao andamento, a indicação da partitura é de caráter vivo e semínima a 116

bpm. Naturalmente, nas primeiras apresentações públicas da Rememórias, tocamos em

andamento inferior ao sugerido pelo compositor. Porém, recentemente temos experimentado o

andamento mais rápido como a semínima igual a 120 bpm. Com isso, notamos que a peça toma

um caráter mais dançante e vibrante, aproximando-a ainda mais à música dos Caboclinhos, a

qual, em certas ocasiões, chega até 160 bpm.

Para o colorido sonoro, nossas escolhas visam obter maior contraste em trechos

repetidos ou que funcionam semelhantemente a pergunta e resposta. Desse modo, os contrastes

mais acentuados estão nos momentos os quais aparecem as citações de “Juazeiro”, composta

por Gonzaga. Para a primeira citação (compassos 19-27), buscamos o timbre poco metálico,

obtido próximo do cavalete, ou mudando o ângulo da mão em relação às cordas (técnica que

depende do formato da unha do violonista) para a frase que funciona como “pergunta”

(compassos 19-22). Para a “resposta” (compassos 23-27), executamos com um timbre doce ou

escuro, utilizado para a segunda vez em que aparece a citação (compassos 62-70).

Figura 37 – Variação timbrística nos compassos 19-27

Fonte: Nobre (1998b, p. 6).

42 Sugestão baseada na observação do professor Erik Pronk (UFPB) em masterclass. Na ocasião, o professor

sugeriu tocar os acordes com o dedo anelar (a) fazendo movimento para dentro da mão.

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Já para a última citação recomendamos o inverso: para a pergunta (compassos 86-89)

utilizamos a sonoridade escura e para a resposta (compassos 89-93), a sonoridade metálica,

visto que a dinâmica está se encaminhando a fortíssimo, em acordes acentuados, necessitando

assim uma maior tensão das cordas do instrumento, sendo o toque próximo do cavalete uma

opção.

Quanto à articulação, observa-se o uso recorrente de ligados na partitura, encontramos

essa indicação praticamente em todos os compassos da peça. Ligados, trinados e mordentes são

características interpretativas da música dos Caboclinhos. Assim, os ligados são

imprescindíveis para a interpretação, porém em alguns trechos o compositor escreve-os

voltados à digitação em cordas diferentes. No trecho que segue, sugerimos uma digitação em

posição fixa (no caso, na VII). Diferente da edição, transferimos os ligados das notas Lá-Si para

Si-Dó no terceiro compasso de “Caboclinhos”.

Figura 38 – Mudança de ligado por ser em cordas diferentes

Fonte: Nobre (1998b, p. 6).

Ainda neste último exemplo, nota-se o motivo inicial como elemento de unidade na

peça. Se considerarmos a nota Si4 como uma nota de passagem, teremos Ré-Lá-Dó, os mesmos

intervalos do motivo inicial de Embolada (Si-Fá#-Lá) transpostos uma 3ª acima.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho, apresentou-se uma proposta interpretativa da suíte Rememórias Opus 79

do compositor brasileiro Marlos Nobre. A partir da entrevista realizada com o compositor, das

masterclass em que foram apresentadas a obra e da experiência musical do autor, foi possível

construir uma proposta interpretativa relacionada à aspectos da música tradicional nordestina,

assim como a tentativa de solucionar e/ou propor sugestões aos problemas técnicos encontrados

no estudo realizado.

Mostrou-se também que Marlos Nobre é um dos compositores não violonistas que tem

sua própria forma de pensar a escrita para violão, sem preocupar-se com os típicos clichês do

instrumento. Suas obras contribuem com a evolução da técnica violonística. As influências da

cultura nordestina, que advêm de sua infância na cidade de Recife, são características marcantes

em sua obra, sobretudo em Rememórias. A partir dos anos 1990, o cromatismo tem sido cada

vez mais explorado em sua estética, como foi relatado para esta pesquisa, dando ares de uma

nova fase composicional.

As sugestões no âmbito da dinâmica, do andamento, da articulação, do fraseado, do

colorido sonoro e da digitação, sobretudo, visaram minimizar as dificuldades técnicas

encontradas na peça e servir como um guia inicial para uma interpretação satisfatória da obra.

Nossa intenção não foi revelar que nossas escolhas são as mais corretas ou as únicas para a

peça; consistiu em apontar um caminho a resolver os problemas técnicos de digitação, traslados

e ruídos nas cordas graves.

Como produto final deste trabalho, foi realizado uma nova gravação audiovisual de

nossa performance da obra a qual culminou com os resultados apontados aqui. Não obstante,

ressaltamos o comentário do compositor acerca de nossa interpretação da obra mencionada em

seu canal do YouTube e em sua página pessoal no Facebook: “Excelente interpretação de minha

peça REMEMÓRIAS (Embonda [sic], Cantilena e Caboclinhos) para violão, pelo violonista

Fernando Batista, bravo”.43

Portanto, enxergamos neste trabalho uma contribuição para a área da performance, aos

outros violonistas interessados na obra violonística do compositor Marlos Nobre e,

especificamente, a Rememórias Opus 79. Além disso, os aspectos técnicos trabalhados na peça

podem ser assimilados e incorporados a outras obras para violão.

43 Disponível em: <https://www.facebook.com/marlos.nobre.1/posts/1507526615932280>. Acesso em: 12 abr.

2017.

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REFERÊNCIAS

ALVARENGA, Oneyda. Música Popular Brasileira. São Paulo: Duas Cidades, 1982.

ANDRADE, Mário de. Dicionário Musical Brasileiro. Brasília: Ministério da Cultura, 1989.

ANDRADE, Mário de. Ensaio sobre a Música Brasileira. São Paulo: Martins, Brasília:

INL, 1972.

ANJOS, Alexandre Johnson dos. Aspectos Rítmicos e Melódicos da Peça “A Inúbia do

Cabocolinho” de César Guerra-Peixe. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE PÓS-

GRADUANDO EM MÚSICA, 2.2012, Rio de Janeiro. Anais do SIMPOM... Rio de Janeiro:

UNIRIO, 2012. v. 2, n. 2, p. 1383-1389. Disponível em:

<http://www.seer.unirio.br/index.php/simpom/article/view/2565/1894>. Acesso em: 27 jun.

2017.

ANJOS, Alexandre Johnson dos. A gaita dos caboclinhos e seus reflexos nas obras de

compositores brasileiros. 2013. 238f. Tese (Doutorado em Música – DINTER / UFRN) –

Programa de Pós-Graduação em Música, Centro de Letras e Artes, Universidade Federal do

Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

AZEVÊDO, Jimmy Vasconcelos. O pandeiro e o folheto: a embolada enquanto manifestação

oral e escrita. In: AYALA, Maria Ignez Novais; AYALA, Marcos (orgs.). Cocos: alegria e

devoção. Natal: Editora da UFRN, 2000.

BARANCOSKI, Ingrid. The Interacion of Brazilian Identity and contemporay Musical

Language: the Stylistic Development in Select Piano Works by Marlos Nobre. 1997. 161 f.

Tese (Doutorado em Música) – Programa de Pós-Graduação em Música, Dança e

Performance, Universidade do Arizona.

BATISTA, Fernando Ferreira; LIRA, Ezequias Oliveira. Reflexos da música tradicional

nordestina na suíte Rememórias Opus 79 para violão solo de Marlos Nobre. In:

CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM

MÚSICA, 26. 2016, Belo Horizonte. Anais da ANPPOM. Belo Horizonte: Associação

Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música, 2016. Disponível em:

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Acesso em: 16 mai. 2017.

BATISTA, Fernando Ferreira. Exemplo audiovisual 1. 2017a. 1 vídeo. Disponível em:

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___________. Exemplo audiovisual 2. 2017b. 1 vídeo. Disponível em:

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___________. Exemplo audiovisual 3. 2017c. 1 vídeo. Disponível em:

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APÊNDICE A – Entrevista aplicada via e-mail a Marlos Nobre

Recebido em 09/04/2017.

Das fases composicionais.

FB:44 Encontramos em vários trabalhos, referências sobre suas fases composicionais. Nestes

trabalhos o senhor delimita especificamente cinco fases ao todo, sendo que a última data de

1989. Levando em consideração um intervalo de quase três décadas, é possível identificar

outros elementos, novas influências, novas técnicas composicionais atualmente? Existe uma

nova fase no seu estilo de compor?

MN:45 Naturalmente depois de 1989 muita coisa aconteceu e mudou no meu estilo de compor,

mas sempre mantive basicamente os mesmos princípios que nortearam a minha criação musical

como compositor, a vida toda. Entre estes princípios básicos e que pertencem ao meu estilo

atual, está o desenvolvimento e depuração de minha convicção de que ainda há muito o que

explorar no trabalho criativo como o CROMATISMO. Minha concepção a partir de 1990 até o

presente, tem sido de uma depuração e trabalho cada vez mais entusiasmado com a minha

técnica pessoal de exploração do total cromático. Já não se trata aqui de séries, nem de moldes

pré-estabelecidos, mas de uma imersão criativa no total cromático. Isto em linhas gerais porque

é impossível em pouco espaço descrever em detalhes esta minha técnica pessoal. Somente

informo que as minhas obras mais recentes vêm depurando e usando extensamente o

cromatismo como base de minha criação.

Da escrita violonística.

FB: O senhor poderia descrever como se dá o seu processo criativo? E da escrita para violão, o

senhor utiliza o instrumento?

MN: Todo processo criativo é mutante, jamais é cristalizado, uniforme, único. No caso de todas

minhas obras, orquestrais, pianisticas, cameristas, etc, eu obviamente tenho de criar

mentalmente, você não tem (com exceção do piano) o instrumento para ir testando nem

provando. No caso do violão é um pouco diferente. Meu processo é mais o menos como segue:

eu imagino mentalmente a obra que vou escrever para violão, anoto todos os detalhes desde a

44 Fernando Batista. 45 Marlos Nobre.

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linguagem, a técnica, o espírito, a forma da obra e depois testo no violão (tenho dois excelentes

instrumentos) a escritura das obras. É interessante e fundamental dizer que não sou violonista,

não toco nada no violão, mas conheço profundamente a técnica e as possibilidades sonoras do

instrumento. Desta forma, como sempre aconteceu, eu escrevo diretamente na partitura branca

a obra toda e posteriormente os violonistas a tocam. Raramente é necessário mudar qualquer

coisa. Violonistas como Marcelo Kayath, por exemplo, para quem escrevi obras importantes e

difíceis com o Prólogo e Toccata, olhando minha partitura me disse que seria muito difícil tocá-

la. Para “provocá-lo” eu fiz uma versão mais simples, menos difícil da obra. Marcelo a recebeu

e provou e tempos depois me disse: “Prefiro a versão original, a mais difícil, eu estava com

preguiça de estudar. A versão “facilitada”, escrita por você, tira todo o impacto da obra”.

Dificuldade em conseguir partituras de suas obras para violão

FB: Maestro Marlos Nobre, tenho buscado em várias lojas virtuais partituras suas

(especificamente o Desafio para Flauta e Violão) e não obtenho respostas. Diante disto gostaria

de saber onde e como comprar, como conseguir suas partituras?

MN: Todas minhas obras para violão, assim como todas as minhas demais obras para qualquer

formação instrumental, sinfônica, de câmera, etc., podem ser adquiridas facilmente em minha

própria editora “Marlos Nobre Edition” no email: [email protected] é só

escrever e minhas secretárias atenderão os pedidos.

A influência das manifestações culturais?

FB: Podemos notar influências das manifestações culturais nordestinas nesta obra. Descreva

como se dá este processo, o porquê da utilização destes materiais.

MN: A influência da cultura nordestina, musical, principalmente do Recife onde nasci em 1939

e onde passei minha infância e adolescência, foi marcada pela música, ritmos e magia das

manifestações do Carnaval do Recife, sobretudo os Maracatus, Frevos, Caboclinhos, Cirandas.

Minha obra toda vem daí, naturalmente como base, mas tudo isso, toda esta influência foi se

transformando através dos tempos de minha criação. As influências de fora, primeiro do Brasil

total e depois as experiências internacionais ampliaram e de certa maneira internacionalizaram

a minha criação. Hoje sou um compositor do Mundo mas com as raízes profundas no Brasil

Da Rememórias.

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FB: A Rememórias opus 79 é marcada por forte influência de manifestações culturais

nordestinas, sobretudo no caráter rítmico. Quais procedimentos o senhor sugeriria ao um

violonista para uma boa interpretação de sua Rememórias?

FB: O violonista Fabio Shiro Monteiro em disco Brazilian Solo Guitar, gravou apenas o

segundo movimento da Rememórias. O senhor tem conhecimento de algum violonista ter

gravado a obra completa?

FB: Em alguns trabalhos acadêmicos o senhor falou que escreve com o instrumento ao lado e

as vezes explora possibilidades diretamente no violão. No processo de escrita da Rememórias

opus 79 o senhor se utilizou deste recurso?

Sabemos que a Rememórias opus 79 foi escrita em 1993, dedicada à violonista alemã Susanne

Mebes e em memória a Michele Pittaluga que foi o fundador do Concorso Internazionale di

Chitarra Classica “Città di Alessandria”. A obra foi comissionada para este concurso? Quanto

à primeira audição, onde foi o local da estreia e qual violonista a estreou?

MN: Esta peça REMEMÓRIAS Opus 79 foi escrita em memória de Michele Pittaluga, criador

do importante Concurso Internacional de Violão na Itália “Città di Alessandria,” na Italia. Esta

portanto é uma homenagem a este grande homem entusiasmado pelo violão e passou este

entusiasmo a seus dois filhos que continuam sua obra. Ao mesmo tempo é dedicada à violonista

suíça Susanne Mebes, que fundou uma excelente companhia de discos, editando em Cds quase

que exclusivamente obras para violão. Foi esta editora de disco LÉMAN que editou um CD

Lemán LC 44601 onde o excelente violonista Joaquim Freire, gravou pela primeira vez a minha

obra REMINISCENCIAS Op. 83 para violão. Minha obra REMEMÓRIAS não foi ainda

lançada em disco, até onde estou informado, mas existem excelentes interpretações desta minha

peça, completa, no meu próprio canal no YOUTUBE, onde, aliás, praticamente é possível

encontrar todas as gravações de todas minhas obras para violão por excelentes intérpretes em

memoráveis gravações.

FB: Na dissertação de mestrado de João Raone Tavares da Silva, encontramos um depoimento

seu (Marlos Nobre) esclarecendo que sempre prefere colocar sua própria digitação. Porém no

caso da obra Reminiscência op. 78 a digitação foi do Marcelo Kayath. Na obra Rememórias

op.79, a digitação da obra foi pensada pelo senhor ou pela editora?

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MN: Em geral em todas minhas obras para violão, eu indico basicamente uma digitação básica,

que cordas eu escolho para cada nota, indicando de forma muito precisa todos os aspectos

técnicos assim como a dinâmica precisa que desejo.

Embolada

FB: No primeiro movimento da Rememórias encontramos alusão ao motivo inicial do Preludio

BWV 996 de J. S. Bach no início e ao final também. Porém nas seções contrastantes dos

compassos 43-50 e 63-83 é possível encontrar fragmentos melódicos que lembram o preludio

da Suíte nº 1 para Cello. É possível afirmar que este fato seria outra rememória da Suíte de

Bach?

FB: Ainda nos compassos 63 ao 66 temos as letras B, A, C, e H acima de cada compasso

respectivamente, Isto seria uma assinatura do nome de J. S. Bach?

FB: Dos compassos 57 ao 63, o senhor apresenta o material melódico de origem da peça cinco

vezes em seguida e alternando-os na região média e grave do violão. Este seria um

procedimento pensado como se fosse a apresentação do sujeito de uma fuga?

MN: Quando comecei a escrever Rememórias, o próprio título indica o que me inspirou na

composição desta obra, ou seja LEMBRANÇAS de obras para violão, sobretudo que me

marcaram. Entre elas estão o Prelúdio BWV 996 de Bach assim como o da Suite nº 1 para cello.

Como talvez você deve saber, eu escrevi também posteriormente duas obras para violoncelo

solo, as quais foram baseadas em motivos das Suítes para cello solo de Bach. Foi uma

encomenda do Antonio Meneses que a estreou mundialmente (a gravação também está no meu

canal do Youtube). Depois fiz outra obra também para cello solo baseada em outra suite de

Bach. Assim, de forma natural, estas obras de Bach, este manancial de toda a música de todos

os tempos, me levou instintivamente a fazer o mesmo em Rememórias; A alusão a um “sujeito”

de uma fuga, também são na realidade coisas instintivas, não pensadas deliberadamente, pois

há citações nesta obra de diversas fontes, incluisive da música popular do Recife.

Cantilena

FB: A melodia do segundo movimento já fora usada em outras obras suas como no Cancioneiro

de Lampião para Coro e Capella e no segundo movimento do Quarto Ciclo Nordestino Para

Piano. A letra desta melodia presente no Cancioneiro de Lampião é original da canção

folclórica “A muié de lampião”?

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Ainda na Cantilena, em vários momentos encontramos passagens que de certa forma são de

difíceis execução ao violão. Por exemplo o legato na condução de vozes em momentos de

aberturas/saltos de mão esquerda. O senhor está de acordo que em certas passagens, tendo em

vistas as limitações do instrumento, algumas notas podem ser cortadas para se manter a voz

principal em evidência e não perder o sentido das frases?

MN: Realmente esta melodia original da canção folclórica “A Muié de Lampião” me fascinou

sempre, e sempre se “intrometia” apesar de mim mesmo, em algumas obras minhas, como o

mencionado e mais direto peça coral CANCIONEIRO DE LAMPIÃO nesta Cantilena. Eu sei

que a escritura violonística não é muito “cômoda” nesta peça para violão, de difícil execução,

mas tem muitos violonistas e muitas gravações que provam que muitos conseguem. Certo?

Assim que, quem não puder, paciência...Muitos violoncelistas achavam impossíveis as suítes

de Bach e hoje qualquer aluno avançado as tocam. O mesmo para tantos outros instrumentos....!

O compositor tem a obrigação de criar novos desafios, fora do “rotineiro e certo” senão a própria

técnica do instrumento não evoluciona.

Caboclinhos

FB: Sabemos que na música dos Caboclinhos existem variantes em relação ao ritmo (o toque

como é chamado pelos integrantes), por exemplo: o toque de Perré, Baião e de Guerra. Quanto

ao ostinado rítmico do terceiro movimento, o senhor se preocupou em associá-los a alguns

desses citados anteriormente?

FB: O terceiro movimento é composto de colagens de melodias nordestina como afirma, João

Raone Tavares, podemos identificar facilmente em três momentos da peça a melodia da música

Juazeiro de Luiz Gonzaga. Quanto aos outros materiais melódicos utilizados, o senhor saberia

dizer sua origem ou é fruto de sua inspiração?

MN: Veja bem, eu não me baseio jamais em “pesquisas de campo” ou em estudos acadêmicos

sobre ritmos de agremiações populares, sejam elas de Frevo, Caboclinhos, Maracatus,

Candomblés, etc, etc. Eu VIVI estes ritmos desde minha infância, eu dançava nas ruas do Recife

desde meus 6 anos de idade, eu os incorporei à minha própria rítmica. Eu tenho aglomerado em

meu baú de recordações, ritmos, melodias, harmonias, passos de dança de tantas e tantas

agremiações de Frevos, Maracatus, Caboclinhos, Cirandas, Candomblés que tudo isso formou

uma espécie de BAÚ de reminiscências, de recordações, e quando eu componho, muitas vezes,

surgem estas reminiscências e eu jamais as rechaço, ao contrário eu as incorporo à minha

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maneira, na minha criação, sem consultar fontes, sem ver que tipos de toques os folcloristas as

nomeiam, isso não me interessou jamais. Eu nunca fiz “pesquisa de campo” eu simplesmente

VIVI realmente estas manifestações folclóricas. Portanto eu as incorporo ao meu estilo quando

quero e quando assim o desejo. E isso acontece também de forma involuntárias e de forma não

consciente, até mesmo que partes de obras de outros compositores que de forma inconsciente

eu incorporo à minha obra e as transformo tornado-as portanto, minha própria criação.

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ANEXO A – Partitura de Rememórias Opus 79

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Uso exclusivo para a pesquisa!

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Anexo B – Links com a gravação audiovisual de Rememórias Opus 79

1ª gravação:

Gravado ao vivo 25 de junho de 2015 no Auditório Oriano de Almeida da Escola de

Música da UFRN.

Rememorias Opus 79: https://youtu.be/p_rJ5oImSAE.

2ª gravação:

Gravado ao vivo em 10 de novembro de 2017 no Estúdio da Escola de Música da UFRN.

I. Embolada: https://youtu.be/Ia39mtSdbkI

II. Cantilena: https://youtu.be/VgSBFKv-kY8

III. Caboclinhos: https://youtu.be/orZ30nVL-lc

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ANEXO C - Apresentação da suíte Rememórias Opus 79 em masterclass

Masterclass com Mario Ulloa (UFBA)

A primeira apresentação da peça foi em 9 de outubro de 2013 na Escola de Música da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (EMUFRN). Na ocasião, apresentei a Embolada

para o professor e violonista Dr. Mario Ulloa.46 Dentre as várias observações do professor

Ulloa, destaco três que considero relevantes:

1. Como melhorar o aproveitamento das seções de estudo, o professor Ulloa sugeriu na

masterclass que quando me deparar com repetidos erros na execução, perguntar onde, como e

o porquê que este problema está ocorrendo. A partir de então, começamos a refletir melhor

acerca de nossa prática instrumental. Observamos que muitas vezes o fato de repetir

exaustivamente determinado trecho musical pode inclusive acarretar problemas de saúde.

2. Estudar cada indicação de dinâmica fora da música. Deveria estudar e conseguir obter

contrastes entre o pianíssimo e o piano, forte e fortíssimo, e assim executar cada dinâmica

proposta pelo compositor. Neste aspecto de dinâmica é importante observar também que o

violão é um instrumento que mesmo com as inovações no campo da luteria, apresenta pouco

grau de intensidade se o compararmos a outros instrumentos como Piano ou Trompete. Deve-

se também levar em consideração a qualidade do instrumento de um estudante de música, pois

como se sabe, um bom violão atualmente está em um patamar de preço muito acima para a

realidade de um estudante de violão. Para isso, elaboramos uma espécie tabela com todas as

indicações de dinâmica da peça, e as praticamos no intuito de obter diferenças entre uma e

outra.

3. Eliminar os chiados nas cordas graves do instrumento, tanto da mão direita pelos dedos

Indicador e Médio (i, m), quanto pela mão esquerda pelo arraste dos dedos sobre as cordas

graves. O professor sugeriu mudar um pouco o ângulo da mão direita a medida em a mesma

sobe em direção as cordas graves do instrumento.

Masterclass com Thomas Patterson (USA)

46 Violonista costa-riquenho, doutor em Música, professor de violão da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

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A segunda apresentação foi no dia 21 de novembro de 2013 também na EMUFRN. Desta vez,

a masterclass foi com o professor Thomas Patterson (USA),47 onde executei o segundo

movimento Cantilena. As observações dele foram voltadas para a parte da técnica da mão

esquerda. O professor nos chamou atenção para obter maior legato nas mudanças de posição e

na condução de vozes (aspecto já trabalhado antes com nosso professor de violão mas

intensificado depois). Para isso, fomos buscar na literatura exemplos que melhorassem essa

dificuldade técnica. Assim, utilizamos os exercícios de independência de dedos da página 21

do método Pumping Nylon do violonista americano Scott Tennant. O professor também

orientou a encontrar digitação alternativa e resolver os compassos problemáticos da peça. A

dica seria aproveitar as cordas soltas do instrumento para facilitar determinadas passagens.

Masterclass com Eduardo Meirinhos (UFG)

A terceira masterclass foi com o professor Dr. Eduardo Meirinhos48 no dia 30 de abril de 2014

na EMUFRN. Na ocasião apresentei novamente a Embolada. As observações do Professor

Meirinhos foram desde questões extra musicais como a maneira correta de sentar na cadeira e

a postura do violão em relação ao corpo. O professor sugeriu uma postura deixando o violão

levemente inclinado para fora para conseguir melhor projeção sonora e melhor visualização do

braço do instrumento. E direcionamentos na leitura das grafias indicadas na partitura. Meirinhos

chamou atenção para a diferença entre acento e tenuto, ralentando e ritardando.

Masterclass com Daniel Göritz (ALE)

A quarta masterclass foi com o violonista alemão Dr. Daniel Göritz49 em Porto Alegre/RS na

VI Mostra de Violão da UFRGS no dia 23 de setembro de 2014. Na oportunidade toquei a

Embolada mais uma vez. As observações do professor Daniel foram as seguintes:

1. Reconhecer o clímax da obra, o professor me orientou a criar uma espécie de gráfico das

dinâmicas aplicadas na peça. Assim, seria capaz de entender os pontos de maior tensão.

47 Professor de violão da Universidade do Arizona desde 1980, Estados Unidos. 48 Professor de violão, literatura do instrumento e música de câmara na Universidade Federal de Goiás (UFG). 49 Professor de violão da Hanns Eisler School of Music Berlin, Alemanha.

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2. Resolver problemas técnicos da mão esquerda como a independência de dedos (citados

anteriormente pelo professor Thomas Patterson).

3. Correção de erros de leitura, o professor argumentou que normalmente na música

contemporânea o uso de acidentes (bemol, sustenido) dentro de um compasso somente valem

para notas na mesma oitava.

Masterclass com Erik Pronk (UFPB)

A última masterclass foi com o violonista Erik Pronk50 na EMUFRN no dia 17 de dezembro

de 2015. Na ocasião apresentei o Caboclinhos, terceiro movimento. As observações do

professor foram mais voltadas para a parte interpretativa do que técnica.

1. Sugeriu outras possibilidades de colorido sonoro, maior exagero nos contrastes de dinâmica

nos trechos repetitivos.

2. Acordes com o dedo anelar: nos quatro últimos compassos (sucessão de acordes em plaque

alternados pelo ostinato da quarta e sexta corda), sugeriu o toque dos acordes com o dedo anelar

ferindo as cordas primas de forma simultânea.

3. Dinâmica nos trechos de ligação: revisar trechos da peça que servem de ponte entre um

material e outro, esses compassos teriam funções secundárias em relação aos temas principais.

50 Violonista paraibano, professor de violão da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

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ANEXO D – Print do comentário de Marlos Nobre acerca de minha interpretação.

Fanpage do Facebook de Marlos Nobre em 12/04/2017.