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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE ARTES LICENCIATURA EM DANÇA GUSTAVO BONIFÁCIO DOS SANTOS SILVA OS PÚBLICOS DA DANÇA CÊNICA: UMA ANÁLISE CONTRA A ENTIDADE O PÚBLICO NATAL/RN 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE ARTES

LICENCIATURA EM DANÇA

GUSTAVO BONIFÁCIO DOS SANTOS SILVA

OS PÚBLICOS DA DANÇA CÊNICA:

UMA ANÁLISE CONTRA A ENTIDADE O PÚBLICO

NATAL/RN

2013

GUSTAVO BONIFÁCIO DOS SANTOS SILVA

OS PÚBLICOS DA DANÇA CÊNICA:

UMA ANÁLISE CONTRA A ENTIDADE O PÚBLICO

Trabalho de Conclusão de Curso

(TCC) apresentado à Licenciatura em Dança

da Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, como requisito parcial à obtenção do

grau de Licenciado em Dança.

ORIENTADOR: Prof. Dr. Marcos Bragato.

NATAL/RN

2013

GUSTAVO BONIFÁCIO DOS SANTOS SILVA

OS PÚBLICOS DA DANÇA CÊNICA: UMA ANÁLISE CONTRA A ENTIDADE O

PÚBLICO

Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)

apresentado à Licenciatura em Dança da

Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, como requisito parcial à obtenção do

grau de Licenciado em Dança.

Aprovado em: ___/___/_____

__________________________________________________

Prof. Dr. MARCOS BRAGATO

LICENCIATURA EM DANÇA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

Orientador

__________________________________________________

Prof. Dra. MARIA DE LURDES BARROS DA PAIXÃO

LICENCIATURA EM DANÇA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

Examinadora Interna

_________________________________________________

Prof. Dr. ALEX BEIGUI

LICENCIATURA EM TEATRO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

Examinador Interno

DEDICATÓRIA

Dedico primeiramente a Deus, por iluminar esse meu caminho de muita luta dentro

da arte, aos meus pais pelo carinho e por ter contribuído em minha educação, a

meus irmãos que dos quais, às vezes, orgulho-me em outras, enchem-me de

preocupação, à capoeira que foi o pontapé inicial para que me tornasse o artista e o

professor que hoje sou. Aos meus queridos professores da Universidade Federal do

Rio Grande do Norte, que foram de grande importância para essa minha formação

acadêmica, à minha esposa por sempre caminhar ao meu lado, e acima de tudo à

DANÇA, dedico imensamente a essa arte maravilhosa, pois é ela que transpira

diariamente em meu corpo, sendo mais uma aliada nas dificuldades que

encontramos dia após dia dentro da sociedade.

AGRADECIMENTOS

Considerando este TCC como resultado de minha passagem pela UFRN, venho

agora agradecer a todos que fizeram parte dessa minha gloriosa conquista. Aos

amigos que conviveram comigo nesses frutíferos quatro anos de universidade, à

minha Mãe, Josefa dos Santos Silva e aos meus irmãos Gisele Bonifácio e

Guilherme Bonifácio. Agradeço, também, ao professor Marcos Bragato, pela

orientação que ajudou no caminhar e no desenvolver deste estudo, e a participação

da professora Maria de Lurdes Barros da Paixão e do professor Alex Beigui na

Banca deste TCC. Menciono também aqui toda a CDTAM (Cia de Dança do Teatro

Alberto Maranhão) que foi uma grande incentivadora da minha vida acadêmica, em

especial a Wanie Rosie Medeiros atual diretora da companhia. E, em especial, a

minha esposa Leila de Freitas Barretto Lins, por fazer parte da minha vida e ao meu

lado estar em minhas escolhas.

SUMÁRIO

1- Introdução .................................................................................................. 8

2- A Dança Teatral e o Conceito de Público .............................................. 10

3- O que é da diversão e o que é da especialidade. .................................. 16

4- Entreato .................................................................................................... 18

5- Os Públicos e o Paradoxo do Espectador ............................................. 19

6- O Deslocamento da Cena e a Cena do Deslocamento ......................... 20

7- Considerações Finais .............................................................................. 23

8- Referências .............................................................................................. 26

RESUMO

Há um público garantido para cada espetáculo ou cada tipo de espetáculo? Como

pode se dar um público ou o público se subdivide em públicos? Tais dúvidas se

fazem presentes nas mentes dos profissionais das artes cênicas e, em especial, os

da dança, quando tomam como parâmetro a abstrata e genérica entidade o Público.

Uma entidade que se molda com o surgimento no ocidente das companhias oficiais

de balé clássico, a partir do século 18, e pavimenta a noção popular de o Público.

Este estudo argui pela incompatibilidade da noção de Público com as iniciativas de

artistas do corpo no século 20. Intentamos analisar e questionar o conceito

tradicional da existência de “Um Público” e propor correlações com a realidade da

existência de Públicos, dada a natureza dos tipos de entendimentos de dança.

Discutimos questões sobre a noção tradicional de público e apresentamos a

hipótese da existência dos diversos públicos da mesma forma como são diversos os

seguimentos de dança para esse publico.

PALAVRAS-CHAVE: O Público, Os Públicos, Segmentação de Ideias de Dança.

ABSTRACT

There is a guaranteed audience for each spectacle or each type of spectacle? How

come an audience or the audience is divided into audiences? Such questions are on

the minds of professionals in the performing arts and, in particular, the professionals

in dance, when they take as a parameter the abstract and generic entity the

Audience. An entity framed with the emergence of the official classical ballet

companies in the West, from the 18th century, that paves the popular notion of the

audience. This study let us reason together by the incompatibility of the notion of

Audience with the body artists initiatives in the 20th century. We intend to analyze

and question the traditional concept of the existence of "an audience" and propose

correlations with the reality of the existence of Audiences, given the nature of the

understanding of the types of dance. We discuss issues about the traditional notion

of audience and present the hypothesis that there are various audiences just as there

are various segments of dance for this audience.

KEYWORDS: Audience, Audiences, Dance Ideas.

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1- Introdução

Desde cedo quando inicio-me na cena, como capoeirista e bailarino, em

shows, e, depois, em espetáculos com conteúdos diferenciados, um tema me toma

de assalto e me leva a algumas perguntas que não cessam de se fazer presente em

minha mente: Por que muitas vezes os públicos da dança mínguam-se? Há um

público garantido para cada espetáculo ou cada tipo de espetáculo? Como pode se

dar um público ou o “público” se subdivide em “públicos”? Tais dúvidas devem

assombrar igualmente as mentes dos profissionais das artes cênicas e, em especial,

os da dança. No entanto, tem-se a impressão de que são poucos os estudos

dedicados a um assunto candente, e que pode se desdobrar em diversos temas.

Os estudos sobre públicos e plateias são raros e diminutos dadas às

dificuldades de discernimento temático e das necessidades de pesquisas

quantitativas conduzidas em longos períodos sobre as questões que se quer arguir.

No entanto, na área da dança cênica profissional algumas iniciativas podem ser

apontadas especialmente entre os franceses graças ao fomento dirigido à área

datar-se dos anos 1980. Observar quem observa dança e seus produtos é tarefa

ardilosa dada à voluptuosidade das escolhas da assistência.

Os Programas de políticas públicas educacionais têm tentado atrair crianças e

jovens, potenciais espectadores para o tipo de dança praticado por quem o leva,

especialmente por conjuntos que se encaixam no modelo de companhia de

repertório moldado a partir das experiências na Corte de Luís 14 na França, no

século 17. No entanto, um desafio maior se impõe quando tratamos do que

comumente se tem chamado de “artista independente”. Quando ele mesmo assume

tarefas múltiplas como a da divulgação de seu trabalho, e não apenas o da criação e

execução.

Quando criança me sentia um pouco diferente dos meus colegas de classe,

pois sempre gostei de atividades voltadas às artes como música, dança, teatro e

cinema. Tinha especial atenção às aulas de educação artística da professora

Elimaura. Lembro-me das dificuldades da estrutura de uma escola pública, e da

resistência dos alunos com relação às aulas de artes.

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Quando me interesso a procurar por algo a preencher a rotina, deparo-me

com a oportunidade de praticar capoeira em um projeto comunitário gratuito; ao

saber, inscrevo-me e começo a praticar. Para minha surpresa, enquanto algumas

pessoas questionam a dança ou a religiosidade que supostamente a capoeira possa

ter, a professora de artes Elimaura é fiel incentivadora.

Ao a me dedicar a pratica da capoeira, não somente como um esporte, mas

sim como uma arte na qual pudesse sondar um primeiro contato com a dança, a

música, a luta e o teatro. Experimento, então, uma expressividade corporal, ao

participar de espetáculo de maculelê e capoeira. Nesse momento, passo a ter as

primeiras impressões com o público, e a notar diferenças em suas atitudes, e a me

questionar sobre o silêncio e atenção na hora em que me apresento num espetáculo

musical profissional, ao contrário de quando participo das apresentações na escola.

Essa mudança do espaço teatral para um espaço onde não trabalha esse tipo de

informação cultural educacional, às vezes, gera um pequeno desconforto ao artista,

principalmente se ele for um iniciante.

Ao ingressar na Cia. de Dança do Teatro Alberto Maranhão tenho

oportunidade de me apresentar em outras localidades no Brasil e no exterior, e

passo a notar as diferenças entre o público de uma companhia estatal e o público de

um festival, por exemplo. A partir de então, a curiosidade sobre tais diferenças ao

perceber o tipo de público da CDTAM, nas apresentações que se realizam, e dos

shows musicais diários, em casas noturnas e restaurantes, aguça em mim a questão

de que não se pode pensar no Público, genericamente, como única entidade

apreciadora de espetáculos porque não há correspondência com o que se observa

no entorno das manifestações cênicas das artes do corpo embebido por Públicos.

Portanto, Intentamos analisar e questionar o conceito tradicional da existência

de “Um Público” e propor correlações com a realidade da existência de Públicos,

dadas a natureza dos tipos de entendimentos de dança. Discutimos questões sobre

a noção tradicional de público e apresentamos a hipótese da existência dos diversos

públicos da mesma forma como são diversos os seguimentos de dança para esse

público.

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2- A Dança Teatral e o Conceito de Público: Dos Primórdios a Modernidade

A dança teatral, no formato que hoje está disposta, é produto de um

deslocamento e transformações pelas quais as artes experimentaram no mundo

ocidental. Sugere-se que uma origem da dança se localiza entre caçadores e

coletores no ambiente da savana africana, provavelmente há 80 mil anos atrás como

parte de uma coordenada atividade mágica de deciframento da natureza, por meio

de uma repetida gestualidade sonoro-corpórea.

As pinturas rupestres dispostas em cavernas francesas, datadas a partir de

40 mil anos atrás, oferecem a possibilidade de como tal deciframento pode se dar. A

dúvida crucial que afeta a esse conjuro mágico é se esse ritual é iniciativa individual

ou se há participação coletiva, dada a localização das pinturas em regiões lúgubres

das cavernas. De todo modo, a dança é parte da percepção do homem do

paleolítico frente a sua solidão em mundo povoado de animais diferentes. No

paleolítico, especificamente no período da Cultura Magdaleniana, numerosas figuras

zooantropomórficas são encontradas nas cavernas, como as do Feitiçeiro de Les

Trois-Fréres e O Homem de Gabillou.

Caverna de Gabillou (Dordogne, França) Homem-de-Boi.

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As ações do homem primitivo como gritar, pisar, agitar galhos e tochas contra

a manada de animais em movimentos sincronizados, inserem-se dentro de seus

rituais, e alguns desses rituais têm origens em reencarnações de duelos bem-

sucedidos com animais, quando aumenta coesão grupal e instrui os jovens sobre

como sobreviver. A dança é, portanto, parte de um coordenado ritual especialmente

relacionado à sobrevivência, é a dança que existe em função de sua fonte de

comida e de eventuais predadores.

O semicírculo de ossos de Dez mil anos atrás, chamado de Mas-d`Azil, em

Saint Germain, e também, uma roda de aproximadamente nove personagens na

gruta número dois de Addaura na Sicília (Itália), datada de oito mil anos atrás,

pertencente ao mesolítico, período que se situa entre o Paleolítico e o Neolítico, são

evidências de como os nossos ancestrais caçadores-coletores mobilizam ou

controlam seus movimentos corporais com a dança que se realiza em seus rituais

(BOURCIER, 1987).

A dança, uma forma de arte que utiliza movimentos corporais e gestos para

expressar imagens artísticas, tem o desenvolvimento inicial de sua gramática entre

os primeiros agricultores do Neolítico, que se espraiam com a formação de

assentamentos e a vida sedentária. Os públicos são os próprios participantes de

rituais relacionados à nova vida sazonal, da plantação à colheita.

No mundo antigo, entre egípcios e gregos, há uma nova conformação: a

dança tem seu uso crescente como parte de ritos religiosos e fúnebres, entre os

primeiros, e se acentua com os gregos, quando ela é um dos principais ingredientes

na formação e na sociabilidade do homem. Como produto desse incremento, temos

a fundação do teatro e o surgimento de um tipo de público, relativo sempre a uma

dada comemoração.

A dança na antiguidade passa a desenhar uma tradição, especialmente entre

as danças vistas como parte de cerimônias de reforçamento da panóplia mitológica

que pavimentam as sociedades antigas do Egito e da Grécia. Neste caso, há uma

expansão das práticas de dança como uma das atividades principais na vida das

cidades-estados gregas.

São diversas as danças da Grécia: como uma arte, simultaneamente,

comunal e de assistência, quando nasce o teatro; como celebração mútua entre os

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que realizam e observam, podendo participar; como plateia que reage e que pode

interferir na condução da encenação. Quando o teatro se populariza entre os gregos

antigos, alteram-se os arranjos entre artistas e plateias; nasce o theatron, o espaço

formal da encenação, e o theatra, os espaços dos assentos, quando se amplia as

fronteiras entre um e outro.

Os movimentos tornaram-se gradualmente estilizados ao longo da história, e

a arte da dança evolui como um dos primeiros exemplos de arte popular.

Inicialmente, ligada à fala e ao canto, como parte de eventos de um determinado

grupo social, em cerimônias civis e religiosas, a dança adquire gradualmente

importância como uma forma de arte independente.

Danças tradicionais têm se desenvolvido entre todos os povos do mundo

como as tradicionais e persistentes milenares indianas Kathak e kathakali, como

igualmente as danças camponesas a partir do medievo europeu que constituem a

base das danças de salão do ocidente, as danças nobres.

Na Europa ocidental, o percurso da dança está recheado de alterações e

deslocamentos. Com o século 12, o que é estritamente parte de um conjunto de

boas-maneiras e que se traduz em uma dança metrificada e geometrizada é produto

da separação das danças populares, que em seguida, aparecem no chamado

Quattrocento italiano instalando-se como uma atividade exclusiva no ambiente da

corte, uma dança erudita que requer, além da habilidade com a métrica, a retenção

de passos e de suas possíveis combinações (BOURCIER, 1987; SORELL, 1986).

The Art of Dancing Explained by Reading and Figures, Kellom Tomlinson (London, 1724/1735)

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A publicação dos primeiros manuais carrega as experiências dos primeiros

mestres-autores. Com eles não apenas a exposição dos passos e de suas

combinatórias, mas como fazer os passos. A consolidação da dança teatral com os

primeiros manuais, os primeiros livros, ou seja, as primeiras teorias são

desenvolvidas pelos práticos. Aqueles que ensinam são os que escrevem a teoria.

A dança teatral é uma das artes em que teoria e prática estão completamente

vinculadas na sua própria história. Os grandes manuais, desde o século 14, são

desses maîtres e professores não somente do passo, mas da etiqueta do passo.

Com a metrificação e geometrização dessas danças no ambiente dos salões da

corte, temos como substrato o nascimento de uma nova preocupação: a técnica da

exposição ao público que ali circula.

Os balés de corte, dentro do modelo de métrica e da geometrização, são

apresentados para serem apreciados do alto e por cima, pelos nobres. Os

dançarinos realizam evoluções numa parte da sala, todos no mesmo nível; na outra

parte eram montadas bancadas para os espectadores.

The Art of Dancing Explained by Reading and Figures, Kellom Tomlinson (London,

1724/1735)

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As aristocracias das cidades-estado italianas e a francesa se divertem,

festejam em casamentos e alianças políticas nas quais a dança é parte de uma

apresentação com poesia, canto e música. Portanto, é dada à partida a uma etapa

de configuração das danças de corte, e mais tarde nas monarquias francesas se

configuram como danças barrocas como fruto da organização e da ação de mestres

e publicações de estudiosos dessas danças.

Na etapa posterior, como parte das atividades artísticas da corte de Luís 14

(1638-1715), e trechos das óperas, temos o passo substancial à formatação dos

balés de corte, que diferem das danças de corte pelos modos e fins a que estão

destinados. O reinado de Luís 14 se torna a quintessência da cultura europeia.

Durante seu regime e sob seu entusiasmado comando nasce o balé com estrutura

similar a que hoje conhecemos.

O cenário se altera substancialmente a partir da França nos séculos 16 e 17,

e, posteriormente, dissemina-se pela Europa, como Rússia, Itália e Dinamarca. Com

a fundação da Academia Real de Dança, em 1661, embora ainda simbolicamente,

por iniciativa do rei Luís 14, o balé passa a ser tratado como espetáculo, quando ela

se instala nos primeiros palcos que a abriga e que requer as primeiras levas de

indivíduos treinados.

Nesse momento, moldam-se os primeiros grupos de profissionais da dança,

mestres/coreógrafos e bailarinos. Há uma crescente percepção “de expressão

estética do corpo humano e da utilidade das regras para explorá-lo” (BOURCIER,

1987: 64). O profissionalismo se refere aqui às novas exigências para uma

especialidade, antes parte de um grande consórcio religioso e político, e que

pressupõe novos formatos de treinamento.

“A mudança gradual do dançarino amador ao artista profissional teve sua

contraparte na composição da plateia” (SORELL, 1986: 126). A aristocracia possui

seus próprios teatros a partir do século 16, forçosamente de acesso restrito a outros

segmentos sociais. No entanto, com a sucessiva construção de teatros o final do

século 16, os teatros de corte se defrontam com a obrigação de abertura de suas

portas ao público pagante (Ibid.: 126). Simultanemente, no século 17, embora

mantenha suas produções restritas aos ambientes dos Palácios do Louvre e de

Versalles para seus cortesãos, Luís 14 possibilita o acesso por meio de dois teatros

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públicos às companhias atuantes, o Palais-Royal e o Petit-Bourbon com a

transferência das óperas-ballets de Jean-Batis Luly.

Temos, agora, uma disposição cênica semelhante ao teatro italiano – uma

frente e o palco elevado – com importantes consequências às definições estruturais

da linguagem e funcionamento do balé clássico e à formação do conceito de casa

oficial de espetáculos motivador, da noção da entidade o Público. Os espectadores

sentam-se lado a lado, e não mais no entorno, como ocorre nas apresentações nos

salões da corte, e o bailarino se posiciona de frente mesmo quando realiza mudança

de direções. O em dehors, a rotação da coxa-femural, instala-se como uma

obrigatoriedade.

O início da expansão do profissionalismo da dança teatral coincide com a

abertura dos teatros oficiais, como casas de espetáculos de companhias de balés, o

nascimento da figura do bailarino e da renovação do papel do coreógrafo com o balé

de ação de Jean-Georges Noverre (1727-1810). A abertura, em 1713, da Escola de

Balé da Ópera de Paris garante a formação permanente de bailarinos, o

desenvolvimento de companhias oficiais de balé e a sedimentação da entidade o

Público. Com o balé romântico, ao refinar o balé da ação, consolida a noção da

entidade o Público.

No entanto, os pioneiros da dança moderna americana como Isadora

Duncan (1877–1927), e seus construtores como Martha Graham (1894–1991), Doris

Humphrey (1895-1958) e os expressionistas alemães como a Mary Wigman (1866–

1973) no alvorecer do século 20, são algumas das evidências do conceito de que

políticas públicas são tantas quanto às mensagens de construtos artísticos em

dança. São deles os primeiros a pavimentarem o entendimento de que Público deve

comportar novas assistências para o que se constrói como dança para a cena.

Nasce a noção de Público como seguidores de um determinado contexto

artístico em dança. No entanto, com os chamados pós-modernistas americanos uma

nova realidade se impõe, a que descortina, não apenas a radicalização do

entendimento de Públicos, mas, também, as possibilidades de outras cenas de

dança: as paredes de prédios, dentro de carros em circulação, os halls dos teatros,

galerias, igrejas, a rua e a praça.

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Surge agora um novo desafio face ao cenário de criadores-intérpretes. Uma

alternativa ao modelo de criação de vínculo e manutenção dessa vinculação

proporcionada pelo Rei. Este modelo não desaparece: as companhias estatais. O

conceito de assistência como um conjunto de indivíduos observadores de um

determinado espetáculo, circunscrito frente a um palco italiano, aparentemente sem

poder ativar a constituir seu próprio entendimento, passa a ser questionado entre os

artistas da Judson Church Theater, a partir dos anos de 1960.

Neste estudo, como se pode constatar, alude-se a períodos chaves no

processo de estruturação da dança como uma linguagem conexa a outras ações,

como nos primórdios da dança, como uma linguagem que altera substancialmente

seus meios e fins no período das monarquias europeias, e, finalmente, com o inicio

do século 20 com os modernistas, e os pós-modernistas entre os anos 1960 e 1970,

por considerá-los o material fundamental e simultâneo da evolução histórica da

dança na formação dos públicos da dança cênica.

3- O que é da diversão e o que é da especialidade.

Se a dança para a cena é do domínio da especialidade então ela exige uma

iniciação para quem a observa? Esta é uma pergunta recorrente junto aos artistas

quando as artes da cena passam a sofrer a concorrência dos meios audiovisuais.

Com o advento e desenvolvimento de meios massivos de comunicação se

impõe novos desafios às artes da cena, em especial à dança. A ida ao teatro passa

a ter outros eventos concorrentes. Provavelmente, os artistas e pioneiros do

movimento da Judson Church Theater, nos anos de 1960, concentrados no galpão

de uma igreja protestante, em Nova York, podem ter percebido a necessidade de

alteração de estratégias, como a de se deslocar para a rua para capturar uma nova

geração de espectadores; porque para um novo entendimento de dança há que se

construir outra noção de espetáculo de dança e, consequentemente, outros jeitos de

entender o que até então é nomeado como produto artístico em dança (BANES,

1987).

Há que se pensar na inteireza do “pacote” porque a relação existente entre

palco e plateia pode não oferecer a solução à formação de públicos. Para outras

17

danças e outras plateias, em um mundo que se molda pela segmentação sócio-

econômica e pela concorrência com os chamados meios massivos de comunicação.

Nesse sentido, o modelo de plateia fundado a partir do ambiente das cortes

europeias e que se difunde entre o estamento médio da população, na metade do

século 20, pode não atender aos desafios da presença da televisão e do cinema.

O modelo de Público é pavimentado dentro do ambiente da corte e se

desdobra na representação oficial de sustentação estatal. Correlaciona-se ao

entendimento de única companhia para único teatro, o local a ser sede da produção

e apresentação do trabalho. Passa-se, então a constituir, a partir do século 19 o

entendimento senso comum do que é dança; e, aqui, dança é balé.

Hoje, quando encenamos carregamos obrigatoriamente a noção segmentada

de Públicos. Na pré-história, quando observamos uma pintura rupestre

representando o que imaginamos ser uma cena de dança, como, por exemplo, um

semicírculo que mostra pessoas voltadas para um ritual, pode-se imaginar que

indivíduos estavam ali a observar e, talvez, participar de um determinado ritual como

o ancestral do entendimento de plateia. No ambiente de qualquer civilização, nas

cortes do mundo antigo ou nas cortes modernas europeias, florescem danças como

divertimento e comunhão social ainda vivas entre nós.

Comumente, os autores creditam à televisão os males das dificuldades de

constituição de Públicos. Em uma das raras discussões sobre o papel do

espectador, em língua portuguesa, Desgranges acusa a televisão como o principal

responsável, grosso modo, pela existência dessas dificuldades pois ela “cria um

hábito mental fundado na ruptura e na segmentação, um hábito calcado na sedução

imediata, desencorajando, quando o flash deixa de ser fascinante”. (DESGRANGES,

2010: 39). Embora a televisão possa ter seu papel na criação de tais dificuldades, o

cerne do problema pode se encontrar justamente na crença do mito da existência do

Público.

A discussão sobre a fragmentação e da segmentação das informações pode

ser resolvida por outra explicação. Não é a televisão a causadora do hábito mental

de segmentação e ruptura. Há variáveis discerníveis nas transformações históricas

que são conformadas por diversos tipos de informação audiovisual e digital, e não

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podem ser imputadas a ela. A televisão é parte da conformação dos novos meios de

comunicação em operação.

Entendemos se tratar de um dilema antigo com nova roupagem: O que é da

diversão e o que é da especialidade. Similarmente às outras artes, a dança teatral

ocidental se altera de modo substancial no século 20 ao agregar ao modelo de

dança feita para o Público, diferentes modos de criar e de desenvolver estratégias

cênicas e de entendimento de quem as observa. Especialmente com os pós-

modernistas estadunidenses, esses modos se expandem substancialmente na

Europa continental nos anos de 1980 e parecem capturar o ambiente em que eles

(sobre)vivem.

Um dos aspectos importantes dessas alterações é o entendimento do lugar

em que a dança deve se realizar e o modelo, desde então, de espectador que

compõe o conjunto do Público como uma entidade passiva quanto à recepção

daquilo que vê.

4- Entreato

Ao procurarmos uma definição sobre a palavra público no dicionário Aurélio,

encontramos respostas tais como: adj. Que se refere ao povo em geral: interesse

público. / Manifesto, conhecido por todos: rumor público. / A que todas as pessoas

podem comparecer: reunião pública. No âmbito do significado da palavra, não há

coerência se considerarmos a Dança como uma entidade, já que não existe

somente um tipo de dança. Não podemos deixar de mencionar que existem danças

desconhecidas por muitos, e outras que ainda irão surgir, e na mesma proporção

temos segmentos de públicos como os que se formatam a partir de padrões de

entendimentos de dança.

Os públicos me inquietam desde quando praticante iniciante de capoeira, aos

12 anos de idade, embora sem uma consciência das questões concernentes à

temática. Na adolescência, tornava-me eufórico nos dias de roda. Mas quando era

diminuta a frequência, desanimava e me incomodava a não observância do coro

frente ao dialogo corporal da capoeira. E como cita-se anteriormente, a capoeira é o

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meu primeiro contato com as artes cênicas em geral e com as quais tenho minhas

primeiras impressões com o que possa ser o Público.

Uma roda de capoeira é uma espécie de microcosmo que reflete o

macrocosmo da vida que nos cerca. Diversos são os elementos que interagem em

nossas relações com o mundo, e no jogo da Capoeira esses elementos podem se

condensar de modo intenso: respeito, malícia, maldade, brincadeira,

responsabilidade, provocação, disputa, liberdade, se assim pudermos elencar. E se

realiza como um jogo executado no centro da roda por dois capoeiristas, uma

orquestra de instrumento dita a ritmicidade, e o coro, que além de bater palmas e

responder o coral, testemunha o jogo a sua frente.

As pessoas que estão em volta da roda de capoeira são o público que assiste

ao diálogo corporal do jogo que se realiza à sua frente. E cada participante que

observa essa cena consequentemente trava um diálogo com as duas pessoas que

jogam no centro. As que fazem parte do coro são participantes ativos, pois eles além

de observar, dialogam com a cena. O público que não faz parte da roda, aqueles

que estão apenas olhando do lado de fora, podemos pensar que são espectadores,

pois eles atuam como observadores do jogo que ali se instaura.

A relação que se estabelece entre o público de dança teatral e a percepção

que se extrai dos espetáculos e das rodas de capoeira fazem-se importante porque

se constitui como um dos norteadores essenciais no desenvolvimento desse artigo.

5- Os Públicos e o Paradoxo do Espectador

Um dos entendimentos propostos sobre a hipótese da existência dos públicos

pode se encontrar no debate movido pelo filósofo francês Jacques Ranciére. O alvo

da crítica de Ranciére é justamente a resistência de se manter o entendimento da

existência de única entidade, a do Público, como se ali estivesse concentrada toda a

força operativa da recepção às artes da cena. Desse modo, se há tão somente uma

entidade, outras forças podem não operar e, consequentemente, teremos a noção

do espectador como um ente em passividade.

20

Talvez o paradoxo do espectador possa ser equacionado como o tipo de

motivação que uma determinada dança produz em quem a vê. A crítica de Ranciére

se dá especialmente quando opera o debate entre olhar e agir:

Mas a condição do espectador é uma coisa ruim. Ser um espectador significa olhar para um espetáculo. E olhar é uma coisa ruim, por duas razões. Primeiro, olhar é considerado o oposto de conhecer. Olhar significa estar diante de uma aparência sem conhecer as condições que produziram aquela aparência ou a realidade que está por trás dela. Segundo, olhar é considerado o oposto de agir. Aquele que olha para o espetáculo permanece imóvel na sua cadeira, desprovido de qualquer poder de intervenção. Ser um espectador significa ser passivo. O espectador está separado da capacidade de conhecer, assim como ele está separado da possibilidade de agir (RANCIÉRE, 2010: 02,03).

O aspecto de que trata a crítica de Ranciére sobre a oposição entre o olhar e

o agir pode ser suscetível de revisão porque embora sentado, aparentemente

imóvel, enquanto se assiste a um espetáculo de dança, isso não corresponde à

inatividade de nosso equipamento biológico e a desvinculação dos processos

racionais de julgamento ao que se observa.

O interesse para quem vai assistir ao espetáculo é um fator importante, pois

ele faz diminuir certo distanciamento que existe entre o público e a cena, já o

desinteresse cria um abismo enorme entre o plano de ficção e o plano da realidade

do espectador; por não conseguir participar do jogo, o espectador se exclui, começa

a olhar no relógio, prestar atenção nos vizinhos, contar os minutos e pensar em

outras coisas, menos no espetáculo que está a sua frente. (CAMARGO, 2003).

Ao se debruçar sobre esse debate, pensa-se, também que as plateias não

são eternas, e a única garantia é a atualização do show ou do espetáculo em

quaisquer das circunstâncias. Na plateia sempre haverá pessoas diferentes, até

porque o público muda com frequência.

6- O Deslocamento da Cena e a Cena do Deslocamento

Quando música, pintura, escultura e literatura se hibridizam com a dança, de

um modo diferente até então reconhecido na história das artes ocidentais, os

produtos são o happening, a instalação que se cunha, posteriormente, como artes

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perfomativas. Não há mais privilégio da díade theatron- theatra, que converte no

olhar dos artistas o conceito do palco italiano. Há a procura de um espaço comum

no qual as artes se despregam de seus suportes habituais e se tocam nas galerias

de arte, hall dos teatros, nos muros, em telhados, em possíveis lugares de se moldar

um determinado ambiente da cena. Desse modo, irá requerer diferentes assistências

em diferentes modos participativos, os públicos.

O questionamento da noção da entidade Público é parte do pacote de radical

alteração do significado, conceito e função da dança, uma empresa que se

desenvolve entre os anos 1960 e 1970, entre artistas de dança estadunidense como

Steve Paxton, Simone Forti, Yvonne Rainner, Trisha Brown, David Gordon, Deborah

Hay e Lucinda Childs (BANNES, 1987). Não é apenas “suplantada” a danse de

l´école ou o chamado balé clássico de repertório, com seu estrito cânone de beleza,

graça e harmonia, justamente o responsável pelo fomento da entidade o Público,

como as linhagens da dança moderna que tentam formular outras regras de

composição coreográfica.

Tais artistas recebem a alcunha de pós-modernistas por pleitear alterações do

entendimento da cena e do espaço da cena, ao rejeitarem elementos como

atmosferas, caracterizações, psicologismos e a noção de treino entendido como o

molde para se encaixar a temática. Propõem-se o entendimento que o movimento

“não é pré-selecionado por suas características, mas produto de certas decisões,

metas, planos, esquemas ou problemas” (BANNES, 1987: XIV).

Os pós-modernistas, cujas ideias ecoam e se dissipam com uma nova leitura

pelos europeus nos anos 1990, postulam o processo em detrimento do produto, a

aproximação entre arte e vida e, especialmente, novas motivações e relações entre

artista e assistência, entre quem organiza a dança e quem a observa.

Presentifica-se especialmente como o que se chama instalação. Primeiro,

artistas plásticos, performers e dançarinos experimentam como uma arte da

configuração de um ambiente. Historicamente, em um segundo momento, instalação

ganha força como, além de se preocupar com a experiência imediata de apreensão

do trabalho artístico, a tentativa de motivar a conscientização dos que ali estão e do

que ali ocorre. Desenvolvem tipos de reciprocidades de criação entre a

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espacialidade, observadores e obra, em tempo real. Em um constante diálogo entre

linguagens artísticas.

TRISHA BROWN - GALERIA

Portanto, face ao deslocamento da cena, que se desgarra dos suportes

habituais – palco italiano, telas, esculturas fixas - dificilmente é aceitável as análises

que consideram a existência da entidade Público. Esse deslocamento se dá como

um pacote de alterações conceituais e artísticas, quando se inaugura tipos de cena

de deslocamento, os materiais com os quais se constrói dança em confluência com

outras artes, as tarefas de dança/task dances, o Contact Improvisation, a incidência

sobre as partes do corpo, e não somente sobre o todo, e assim por diante.

Trisha Brown, Man Walking Down the Side of a Building, SoHo, 1970 Photo ©Carol Goodden

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Os deslocamentos chegam com a tentativa de democratização de acesso aos

meios com o que se faz arte e aos meios de observá-la. Desanuviam a rígida

separação entre os que dançam e os que não dançam. Paradoxalmente, aprofunda

a especialidade, mas igualmente aprofunda e diversifica os que constroem essa

especialidade porque o artista não mais depende de um rei ou de uma linha de ação

da política estatal. O artista tem a possibilidade de desenvolver seu próprio material,

o que aumenta substancialmente a população de criadores da área.

Trisha Brown, Man Walking Down the Side of a Building, Walker Art Center, 2008 Photo: Gene Pittman

7- Considerações Finais

Tratamos em propor correlações com a realidade existente aos Públicos na

dança e sobre a importância de se pensar nessa pluralidade ao invés de

relacionarmos apenas como a entidade o Público, unificada na dança teatral no

século 19. Desde já, o que na mesma proporção há diversos tipos de públicos na

dança, também, há diversos tipos de segmentos de dança para esses públicos.

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Atentamos, também, para o fato das transformações históricas na dança e

na dança teatral da relação, feitura e apresentação com seus respectivos

observadores-partícipes para os da exclusiva assistência que se suplanta com o

aparecimento do criador-intérprete e da diversidade de ideias de dança no século

20.

A primeira bifurcação se dá no quattrocento renascentista italiano quando as

danças de salão da corte se instrumentalizam e se desgrudam das danças

populares. As danças dos salões da corte, que ainda se realizam no regime de

coparticipação, especializam em balés de corte quando experimentam seu auge na

monarquia de Luís 14, na França. Encontra-se aqui uma segunda bifurcação: surge

a preocupação com a técnica, agora codificada em sua estrutura geral, para a

exposição com o público, já que os balés de corte dentro de sua métrica são

apresentados para serem apreciados do alto e por cima, pelos nobres.

A entidade o Público, uma abstração fortemente arraigada no imaginário

senso comum, com a profusão do romantismo no balé, não corresponde à realidade

desde as primeiras iniciativas dos pioneiros da dança moderna ocidental e o

conceito inaugural de que são tantos os públicos quanto são tantas as mensagens

de construtos artísticos em dança. No entanto, com os chamados pós-modernistas

americanos uma nova realidade se impõe, a que descortina, não apenas a

radicalização do entendimento de Públicos, mas, também, as possibilidades de

outras cenas de dança: as paredes de prédios, dentro de carros em circulação, os

halls dos teatros, galerias, igrejas, a rua e a praça.

Por isso, nos leva a pensar e concluir que quaisquer iniciativas individuais e

políticas culturais voltadas à construção da assistência devem considerar a

existência da noção da fragmentação da informação, de certa “liberdade” criativa

presente entre os artistas de dança contemporânea, das diversas possibilidades de

relações entre quem faz e quem observa e da existência de um ambiente

multifacetado e hibridizado entre artes.

A leniência face aos prováveis desinteresses em conhecer a produção

artística de cada um dos profissionais pode advir não somente da existência da

abstração de senso comum da entidade o público, já que o mesmo muitas vezes

não se faz acostumado com a pluralidade inserida dentro da dança, e também do

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entendimento de que muitos dos profissionais alimentam uma única entidade de

assistência.

Como podemos exigir ou reclamar que não temos públicos se não

entendemos que somos parte dessa pluralidade! Quando o meu lugar não é o

palco, ele deve ser o da assistência; não sou somente o artista da dança; faço parte

também do público da dança e do público que dança.

Os limites deste estudo se encontram na ausência de uma pesquisa empírica

ou uma pesquisa de campo que possam corroborarem o entendimento da

pluralidade de Públicos e não o da entidade genérica O Público. No entanto, como

propusemos, este é um estudo cujo foco se centra na tentativa de alimentar a

discussão sobre o inadequado conceito de Público e motivar o entendimento das

pluralidades de assistências, cujos lugares ultrapassam os lugares tradicionais do

palco italiano, e a pluralidade de ideias de criação em dança. Por essa perspectiva,

o espaço no qual a dança se realiza não é neutro. A neutralidade é o sonho que se

acalenta na entidade O Público.

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8- Referências

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