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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO NÚCLEO DE TECNOLOGIAS EDUCACIONAIS EM SAÚDE – NUTES ELISETE CASOTTI ODONTOLOGIA NO BRASIL: uma (breve) história do pensamento sobre o ensino. RIO DE JANEIRO 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO NÚCLEO DE TECNOLOGIAS EDUCACIONAIS EM SAÚDE – NUTES

ELISETE CASOTTI

ODONTOLOGIA NO BRASIL:uma (breve) história do pensamento sobre o ensino.

RIO DE JANEIRO 2009

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ELISETE CASOTTI

ODONTOLOGIA NO BRASIL:uma (breve) história do pensamento sobre o ensino.

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Saúde, Núcleo de Tecnologias Educacionais em Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito para obtenção do título de Doutor.

Orientadora: Victoria Maria Brant Ribeiro

Rio de Janeiro 2009

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Casotti, Elisete. Odontologia no Brasil: uma (breve) história do pensamento sobre o ensino / Elisete Casotti. – Rio de Janeiro: UFRJ / NUTES, 2009.

x, 98 f.: il. ; 31 cm. Orientador: Victoria Maria Brant Ribeiro

Tese (doutorado) -- UFRJ, NUTES, Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências e Saúde, 2009.

Referências bibliográficas: f. 100-108 1. Educação em Odontologia - história. 2. Educação em

Odontologia – tendências. 3. Formação de recursos humanos. 4. Currículo e Ensino - Tese. I. Ribeiro, Victoria Maria Brant. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, NUTES, Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências e Saúde. III. Título.

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ELISETE CASOTTI

ODONTOLOGIA NO BRASIL:uma (breve) história do pensamento sobre o ensino.

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Saúde, Núcleo de Tecnologias Educacionais em Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito para obtenção do título de Doutor.

Aprovada em:

________________________________________________ Profa. Victoria Maria Brant Ribeiro, Doutora em Educação,

NUTES/Universidade Federal do Rio de Janeiro

________________________________________________ Profa. Vera Helena Ferraz de Siqueira, Doutora em Educação,

NUTES/Universidade Federal do Rio de Janeiro

_______________________________________________ Prof. Cresus Vinicius Depes de Gouvêa, Doutor em Prótese Dentária,

Universidade Federal Fluminense

_______________________________________________ Profa. Adriana Mohr, Doutora em Educação,

Universidade Federal de Santa Catarina

______________________________________________ Profa. Sylvia Helena Batista, Doutora em Educação,

Universidade Federal de São Paulo

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AGRADECIMENTOS

À minha orientadora, Victoria, pelos múltiplos e cotidianos aprendizados.

Aos colegas de doutorado pelo bom humor, por garantirem momentos de alegria em

momentos difíceis.

Aos docentes do NUTES, pela generosidade no estabelecimento de diálogos

interdisciplinares.

À equipe de apoio, pelo trabalho cuidadoso e amigo.

A todos aqueles de conviveram com as ausências, especialmente Laura, pelos

finais de semana que passou em casa.

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RESUMO

CASOTTI, Elisete. Odontologia no Brasil: uma (breve) história do pensamento sobre o ensino. Rio de Janeiro, 2009. Tese (Doutorado Educação em Ciências e Saúde) – Núcleo de Tecnologias Educacionais em Saúde – NUTES, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009.

Trabalho de revisão documental sobre o ensino da odontologia no

Brasil, tomando como referencial os conceitos de historiografia e inovação.

Contrapõe-se ao argumento de que a discussão sobre a formação em saúde é nova

no interior dos cursos de odontologia e sustenta que um pensamento inovador,

organizado e partilhado sobre o ensino odontológico já fez parte da pauta das

instituições na década de sessenta. Aponta para um deslocamento temático e de

lócus de produção nas décadas de 80 e 90, gerando um vazio institucional, sendo

retomado com a proposição das Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de

Odontologia. Conclui que houve um pensamento inovador sobre a formação, que

este não foi hegemônico ao longo do tempo, mas que nos períodos mais críticos

trabalhou estrategicamente acumulando experiências e propostas para recolocar o

ensino da odontologia na pauta das políticas públicas.

Palavras-chave: ENSINO. ODONTOLOGIA. INOVAÇÃO. (Brasil)

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ABSTRACT

CASOTTI, Elisete. Odontologia no Brasil: uma (breve) história do pensamento sobre o ensino. Rio de Janeiro, 2009. Tese (Doutorado Educação em Ciências e Saúde) – Núcleo de Tecnologias Educacionais em Saúde – NUTES, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009.

This work is a documental survey on dentistry education in Brazil, with reference to

the concepts of historiography and innovation. Opposing the argument that the

discussion on health education is new within dentistry courses, it considers that an

innovative, systematic and democratically shared approach on dentistry education

has been part of the syllabuses of academic institutions since the 60`s. It refers to

changes in themes and the different ambiances of scientific production in the 80`s

and 90`s, causing institutional void, only fulfilled after the proposition of the National

Curriculum Guidelines for the Dentistry Courses. It points to the actual existence of

an innovative approach on education, that has not always been hegemonic, but that,

in critical years, developed its own strategies, accumulating experiences and

proposals to guarantee a place for dentistry education within the priorities of public

policies.

Keywords: EDUCATION. DENTISTRY. INNOVATION. (Brazil)

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1. Inovação Educativa, de acordo com o enfoque conservador e progressista.

18

9Assunto Pós-Graduação no temário das reuniões da ABENO/ 1973-1980

59

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LISTA DAS SIGLAS

ABEM Associação Brasileira de Educação Médica

ABENO Associação Brasileira de Ensino

ABO Associação Brasileira de Odontologia

ADA American Dental Association

ALAFO Associação Latino-Americana de Ensino Odontológico

CAPES Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CNPq Conselho Nacional de Pesquisa

CNRHS Conferências Nacionais de Recursos Humanos para a Saúde

CNS Conferências Nacionais de Saúde

DCN Diretrizes Curriculares Nacionais

DEGES Departamento de Gestão da Educação em Saúde

DEsu Diretoria de Ensino Superior

ECEO Encontro Científico de Estudantes de Odontologia

ENATESPO Encontro Nacional de Técnicos de Saúde Pública Odontológica

FAPESP Fundação de Apoio a Pesquisa do Estado de São Paulo

ForGRAD Fórum de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras

FSESP Fundação de Serviço de Saúde Pública

ICA International Cooperation Administration

IDA Integração Docência Assistência

IES Instituição de Ensino Superior

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas

LBD Lei de Diretrizes e Bases

MBRO Movimento Brasileiro de Renovação Odontológica

MEC Ministério da Educação e Cultura

MPAS Ministério da Previdência e Assistência Social

MS Ministério da Saúde

OMS Organização Mundial de Saúde

OPAS Organização Pan-Americana de Saúde

OPS Organização Pan-Americana de Saúde

PET-SAÚDE Programa de Educação para o Trabalho pela Saúde

PPC Projeto Pedagógico do Curso

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PPREPS Programa de Preparação Estratégica de Pessoal para Saúde

PROMED Programa de Incentivo a Mudanças Curriculares nos Cursos de

Medicina

PRÓ-SAÚDE Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em

Saúde

PUC Pontifícia Universidade Católica

SESP Serviço Especial de Saúde Pública

SGTES Secretaria de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde

SINAES Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior

SUS Sistema Único de Saúde

UERJ Universidade Estadual do Rio de Janeiro

UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UNI União com a Comunidade

UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

USP Universidade de São Paulo

VerSUS Vivência-estágio na realidade do SUS

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 11 2 QUADRO TEÓRICO-METODOLÓGICO .......................................................................................... 13

2.1 HISTÓRIA, PASSADO E DOCUMENTOS .................................................................................. 14 2.2 INOVAÇÕES EDUCACIONAIS: FUNDAMENTOS CONCEITUAIS ........................................... 16

3 O CONTEXTO DA PROPOSTA DE REORIENTAÇÃO DA FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DE SAÚDE .................................................................................................................................................. 22

3.1 DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E DE EDUCAÇÃO ........................................................................ 22 4 ENSINO DA ODONTOLOGIA NA AMÉRICA LATINA .................................................................... 30

4.1 OS SEMINÁRIOS LATINO-AMERICANOS DE ENSINO DA ODONTOLOGIA .......................... 32 4.2 PROGRAMA LATINO-AMERICANO DE INOVAÇÕES EM EDUCAÇÃO ODONTOLÓGICA .... 42

5 O ENSINO DA ODONTOLOGIA NO BRASIL ................................................................................. 46 5.1 DÉCADAS DE 50-60 E 70 ........................................................................................................... 49

5.1.1 DA INTERFACE DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE ODONTOLOGIA COM A PAUTA DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO ........................................................................................................ 49 5.1.2 DA ATUAÇÃO DA ABENO .................................................................................................. 55 5.1.2 PROJETO PILOTO DE ENSINO INTEGRADO DE DIAMANTINA ..................................... 61

5.2 DÉCADAS DE 80-90 ................................................................................................................... 65 5.2.1 PROGRAMA ida E UNI ....................................................................................................... 65 5.2.2 ENSINO DA ODONTOLOGIA E o MOVIMENTO DE REFORMA SANITÁRIA .................. 68

5.3 ANOS 2000-09 ............................................................................................................................ 72 5.3.1 DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS ..................................................................... 72 5.3.3 PRÓ-SAÚDE ....................................................................................................................... 76

6 ANÁLISE E DISCUSSÃO ................................................................................................................. 78 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................. 96 REFERÊNCIAS ................................................................................................................................... 100

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1 INTRODUÇÃO

Aqui está o produto de um processo que envolveu muitas dúvidas, becos sem

saídas, idéias abandonadas, pistas perseguidas e decisões sobre os caminhos a

seguir – nem sempre tão lineares.

Inicialmente, o desenho previa trabalhar somente com uma amostra de

conveniência dos projetos aprovados no âmbito do Programa de Reorientação da

Formação de Profissionais de Saúde – PRÓ-SAÚDE 2005 e acompanhar as

mudanças implantadas durante a vigência do processo. Fez-se um diagnóstico

preliminar da auto-avaliação dos cursos, a partir do que as escolas informaram no

corpo do projeto (n=15 de 24), e vimos que as escolas, unanimemente, avaliaram

muito mal seu desempenho, tanto na “integração básico-clínico” como na “mudança

metodológica” – e nos perguntamos: quais as razões para que especialmente esses

vetores, que têm gestão predominantemente acadêmica, estejam em estágio tão

conservador/tradicional?1

Investigamos, então, a produção sobre ensino na odontologia tomando por

base as publicações de teses e dissertações, armazenadas no Banco de Teses da

CAPES, abrangendo um período de 11 anos, e que confirmou a fragilidade da

produção strictu sensu sobre o ensino da odontologia no período2. O número de

trabalhos cresceu após a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais, mas, em

números absolutos e relativos, ainda é proporcionalmente insignificante em relação

ao total da produção - não ultrapassando 3% e 4% do total da produção de

dissertações e teses em odontologia, respectivamente.

Face a esse cenário, e caminhando então para a definição de qual seria o

argumento principal desse estudo, definiram-se alguns blocos de questões que

nortearam os levantamentos bibliográficos, as leituras e as reflexões. É comum nos

perguntarmos: a questão da educação em odontologia se configurou como uma

agenda relevante na trajetória de consolidação da profissão? Em que momentos? 1 O Documento de Referência do Pró-Saúde propõe três grandes eixos de mudança (orientação teórica, cenários de prática e orientação pedagógica), cada um detalhado em três vetores, os quais podem ser avaliados de acordo com os seguintes estágios de desenvolvimento: conservador/tradicional; intermediário ou imagem-objetivo. (BRASIL, MS. PRÓ-SAÚDE: Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde. Ministério da Saúde, Ministério da Educação. Brasília: Ministério da Saúde. 80p. 2005.) 2 Submetido para publicação na Revista História, Ciência e Saúde Manguinhos, em jul.2008.

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Quem os protagonizou? Com que pauta? Se houve mudanças, poderiam ser

inscritas como inovações? No momento: qual é o contexto atual de mudanças?

Quais os nortes de mudança pré-estabelecidos?

Nessa jornada, especialmente no estudo de documentos históricos, alguns

achados foram suficientemente instigantes para produzir uma mudança de rota,

deslocando de uma perspectiva avaliativa das ações desencadeadas pelos cursos

envolvidos com o PRÓ-SAÚDE, para uma reflexão histórica sobre o pensamento na

educação em odontologia. Se, de um olhar menos atento, afirma-se de forma

aligeirada que a odontologia está “atrasada” em relação a essa discussão e que

“essa idéia é nova” no interior das instituições formadoras, sob uma análise mais

cuidadosa parece que há elementos que não corroboram essas afirmativas.

Então, aqui a intenção é sustentar uma interpretação diversa: parte-se da

afirmativa de que um pensamento inovador, organizado e partilhado sobre o ensino

odontológico não é recente; ao contrário, já fez parte de uma pauta que envolvia as

instituições formadoras especialmente na década de sessenta, mas que sofreu um

deslocamento temático e de lócus de produção nas décadas de 80 e 90, gerando

um vazio institucional, sendo retomado com a proposição das Diretrizes Curriculares

Nacionais para os Cursos de Odontologia.

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2 QUADRO TEÓRICO-METODOLÓGICO

Construímos, pois, uma trama e uma narrativa do passado a partir das fontes existentes, dos recursos metodológicos escolhidos e de um olhar dentre vários outros possíveis, marcado por nossa atualidade, vale dizer, por nossa inserção cultural e social enfim, por nossa própria subjetividade. (RGO, 2007, p. 12)

Este trabalho, na forma como foi sendo elaborado, se aproxima muito de uma

historiografia do ensino da odontologia no Brasil, pois a investigação está centrada

em uma revisão documental e se propõe utilizá-la à luz dos processos de mudanças

em andamento, como matéria prima na constituição de uma leitura desse campo.

Utilizou-se a técnica de documentação indireta, envolvendo a identificação e a

coleta de dados em locais diversos: arquivos oficiais e particulares, livros, periódicos,

revistas, teses, relatórios e folhetos. Não se faz aqui, tomando as reflexões de

Jenkins (2007, p.82), distinção entre fontes primárias e secundárias por duas razões

principais: em estudo dessa natureza a diferença não existe a priori – especialmente

quanto às fontes secundárias, pois alguns textos secundários contêm dados que são

utilizados com a mesma força daqueles que se convencionou chamar de primários.

A segunda e mais importante diz respeito ao entendimento que o uso dessa

terminologia pode sugerir, ou seja, de que ao acessar uma fonte primária/original

estaria o pesquisador mais próximo do acontecido ou do “conhecimento verdadeiro”,

raciocínio que para as fontes secundárias seria sinônimo de material de menor valor

ou menos profundo – o que esse estudo não compartilha, em nenhum dos casos.

Aqui, a priori, todos os documentos coletados foram tratados como vestígios

do passado, sendo que muitos deles ao serem utilizados para dar suporte à

argumentação a que se propõe esse estudo, passaram então, da categoria de

vestígio para a de “prova”, não como prova do passado, mas dessa construção

teórica.

A busca foi orientada pelos grandes temas delimitados previamente como de

interesse da investigação: proposições atuais no campo das políticas de saúde e

educação; pensamento, movimento e atores na história do ensino da odontologia na

América Latina e no Brasil e inovações educacionais.

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Importante colaboração para que parte do objeto ganhasse corpo, foi a

possibilidade de acesso ao arquivo pessoal do Professor Paulino Guimarães Junior3,

figura de relevância ímpar nos processos de mudança no ensino da odontologia

entre as décadas de cinquenta e setenta do século passado: primeiro presidente da

Associação Brasileira de Ensino Odontológico (ABENO), cargo que ocupou por

vários mandatos, presidente da Associação Latino-Americana de Ensino

Odontológico (ALAFO), mentor e coordenador do Projeto Piloto de Ensino Integrado

de Diamantina e participante ativo das formulações e atividades ligadas ao ensino,

até sua morte em 1971.

Pelo zelo com que registrava e guardava os documentos (revistas, papers,

relatórios, discursos e outros materiais que circularam na época), ele reuniu um

acervo particular muito expressivo, o que permitiu, mais de meio século depois,

coletar dados que foram de inestimável valor para esse trabalho.

A recuperação histórica das iniciativas e atores que colocaram na agenda a

questão do ensino de odontologia teve por objetivo reconhecer a pauta de discussão

e identificar, sob a luz do referencial da inovação educacional, o quão inovadoras ou

conservadoras foram estas, ao longo de um pouco mais de meio século.

Esse resgate, ao mesmo tempo em que se apóia na idéia de que a história é

sempre menor que o passado, também auxilia a entender o presente, e que é pelo

seu objeto, o passado, que se cria em parte a identidade.

Desta forma, alguns pressupostos do campo da história, especialmente

localizados na produção de Jenkins (2007), Le Goff (1994) e Bloch (2001), são

adotados e aqui merecerão uma breve exposição.

2.1 HISTÓRIA, PASSADO E DOCUMENTOS

Para Jenkins (2007, p.40) a “história é um termo e um discurso em litígio, com

diferentes significados para diferentes grupos”. Em outras palavras, cada grupo

produz leituras e discursos possíveis sobre o presente e o passado, de posse de

3 Acesso concedido gentilmente por Luiz Guimarães, que reside na Cidade da Campanha/MG, e tem sob seus cuidados um vasto acervo documental das atividades da ABENO e da produção intelectual do seu pai, Professor Paulino Guimarães Jr.

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diferentes materiais e, principalmente, de diferentes referenciais conceituais e

metodológicos.

Então, a primeira questão está relacionada ao entendimento de que toda a

produção está submetida ao tempo em que se vive, ou seja, produz-se a partir da

atualidade, dos recursos disponíveis e de um lugar epistemológico. Assim, o fato

histórico não é objeto dado, mas uma construção de quem trabalha nele. (LE GOFF,

1994)

Outra questão é a de que o passado e a história “estão muito distantes entre

si no tempo e no espaço”, ou seja, ainda que a história seja um discurso sobre o

passado, ela não corresponde, de acordo com a visão romântica, a uma

“ressurreição integral do passado”, nem “aquilo que realmente aconteceu” como

defende a visão positivista. (LE GOFF, 1994, p. 13) Não há possibilidade do resgate

completo dos acontecimentos do passado; eles são infinitos, “a maior parte das

informações sobre o passado nunca foi registrada, e a maior parte do que

permaneceu é fugaz”. (JENKINS, 2007, p. 31)

Para Bloch (2001, p. 75) o “passado é, por definição, um dado que nada mais

modificará. Mas o conhecimento do passado é uma coisa em progresso, que

incessantemente se transforma e aperfeiçoa”. É o passado a serviço de um

entendimento do presente, mas é o passado atingido a partir do presente. (LE

GOFF, 1994, p. 13)

Documentos são fragmentos do passado e recursos que o presente dispõe

para evidenciar o que foi esquecido, ou mesmo constituir coisas que antes nunca

estiveram constituídas como tal, ou seja, podem ajudar a tornar visível algo que não

existia – não porque estivesse oculto, mas que ao ser olhado com ferramentas

atuais possibilita ver o que não estava sendo visto ou mesmo, produzir um novo

visível.

Entretanto, documentos não podem ser vistos como “material bruto, objetivo e

inocente”, mas “como o poder da sociedade do passado sobre a memória e o

futuro”. Os documentos que persistem e atravessam o tempo são resultados de

escolhas quer seja das “forças que operam no desenvolvimento do mundo e da

humanidade, quer pelos que se dedicam à ciência do passado e do tempo que

passa, os historiadores” (LE GOFF,1994,p.535), ou mesmo, como o caso de parte

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do material aqui utilizado, mantidos até o presente pelo valor afetivo e de

reconhecimento familiar da importância dos fatos protagonizados no passado.

Para Le Goff (1994, p. 541), o estatuto do documento na pesquisa está “em

relação com a série que os precede e os segue, é o seu valor relativo que se torna

objetivo e não sua relação com a inapreensível substância real”. O autor também

destaca que a documentação precisa ser questionada “sobre as lacunas, interrogar-

se sobre os esquecimentos, os hiatos, os espaços brancos da história. Devemos

fazer o inventário dos arquivos do silêncio, e fazer a história a partir dos documentos

e das ausências de documentos”.

Bloch (2001, p. 79) também chama a atenção para o fato de que os

documentos não constituem respostas por si mesmo, pois mesmo aqueles mais

objetivos e claros “não falam senão quando sabemos interrogá-los”.

Por último, vale destacar que todo esforço de interrogação e da busca de

leitura de uma situação sempre será destinado a alguém, feito desde um lugar

epistemológico, metodológico e ideológico. Nesse caso, a interrogação se faz, como

já delineado anteriormente, sobre o ensino da odontologia no Brasil e, por querer

saber sobre a existência de um pensamento inovador no interior do processo de

consolidação do atual modelo de ensino, segue um referencial sobre a natureza das

inovações que estão sendo investigadas.

2.2 INOVAÇÕES EDUCACIONAIS: FUNDAMENTOS CONCEITUAIS

Reformulações, modernizações, mudanças, transformações, revoluções,

reformas e inovações... Há movimentos constantes e permanentes que modificam a

ordem das coisas, as relações estabelecidas e os valores predominantes –

expressos objetiva ou subjetivamente – no que chamamos de constituição da

realidade.

Em se tratando da educação, pensada como produto de múltiplas e

complexas inter-relações entre os atores envolvidos e o conjunto de valores

construídos socialmente, temos, então, no mínimo, um cenário em várias camadas.

Aqui nesse trabalho, que tem o foco de análise direcionado para o ensino da

odontologia e o pensamento advindo dessa tarefa, propõe-se uma reflexão sobre a

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dimensão que este pode assumir nesse processo e, para tal, conceitos de inovação educacional, mudança e reforma serão utilizados como referencial para balizá-lo.

Inovação educacional, segundo Mitrulis (2002), é um conceito que ao longo

das últimas quatro décadas tem variado seu significado – sendo expressão direta

dos movimentos que dele se apropriaram. Para a autora: Nos anos 60, a inovação foi sinônimo de mudança planejada e sistêmica definida por peritos, atuando em esferas distantes do fazer escolar, associada à idéia de modernização e desenvolvimento social e econômico. [...] Nos últimos anos da década de 70 e na seguinte, as inovações adquirem caráter de contestação. [...] Nesses anos de acentuada crítica social, as inovações foram expressão da militância política conduzida por aqueles que pretendiam mudar a situação vigente. Nos anos 90, tal tendência perde seu caráter “revolucionário” e adquire outros contornos diante do imperativo econômico da competitividade internacional e das complexidades sociais decorrentes do desenvolvimento tecnológico. [...] A inovação passa a ser valorizada como estratégia política no quadro das transformações do Estado. Hoje é o sistema que exige das escolas e seus profissionais, contínuo empenho inovador, sob total responsabilidade dos atores locais. (p. 229)

Conceitualmente, há um consenso entre vários autores de que a aquisição e

a incorporação de tecnologias, ou a adoção de determinados protocolos de ensino

pelas instituições, não estão relacionadas com a inovação educacional, mas sim a

processos de modernização de espaços e de seu modus operandi, que não

modificam de fato as concepções de ensino-aprendizagem. (SEBARROJA, 2001;

BELTRÁN, 1976; AGUERRONDO, 1991)

Para Sebarroja (2001, p. 16): Existe uma definição bastante aceitável e aceita que entende o termo inovação como sendo uma série de intervenções, decisões e processos, com algum grau de intencionalidade e sistematização, que tentam modificar atitudes, ideias, culturas, conteúdos, modelos e práticas pedagógicas e, por sua vez, introduzir, seguindo uma linha inovadora, novos projectos e programas, materiais curriculares, estratégias de ensino e aprendizagem, modelos didácticos e uma outra forma de organizar e gerir o currículo, a escola e a dinâmica da aula.

Mas é o mesmo autor que chama atenção para o fato de que como um

conceito, inovação também está sujeita às formas de entendimento e significação

moduladas pela ideologia, pelo contexto sócio-cultural, relações de poder instituídas

nos espaços institucionais e sociais, e pelas relações estabelecidas entre os atores

do processo.

Identifica dois modelos de inovação educativa, conforme quadro abaixo,

apontando diferenças entre o enfoque conservador e o enfoque progressista – com

ressalvas sobre a natural limitação das formas esquemáticas e ao fato de as

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diferenças, na prática, não se apresentarem em “estado puro”, mas estarem

fortemente imbricadas. (SEBARROJA, 2002, p. 13, tradução nossa)

Quadro 1. Inovação Educativa, de acordo com o enfoque conservador e progressista.

Enfoques da Inovação Educativa Conservador Progressista

Produto Competitividade

HomogeneizaçãoÊnfase na privatização

Cultura essencialistaEscola empresa

Simplificação Autocomplacência

DesigualdadeEspecialização

Processo Colaboração Diversidade Ênfase no público Cultura crítica e questionadora Escola-comunidade Complexidade Utopia Igualdade Globalização

Sobre a associação feita entre inovação educativa e os processos de

mudanças e de melhorias, duas contribuições são importantes para organizar essa

discussão: a primeira de Messina (2001, p.227) ao perguntar, a priori, pelo sentido

da inovação e, complementarmente a de Sebarroja (2001, p. 16) que aclara a

relação entre melhoria e mudança, qual seja, a de que toda a melhoria pressupõe

um movimento de mudança, mas que nem toda mudança pressupõe melhorias.

Indagar-se sobre o sentido do afã na incorporação de novidades, seja do

mercado tecnológico ou da cartela de soluções didático-pedagógicas difundidas no

campo educacional, e da adoção de projetos baseados em novas racionalidades

burocráticas, recoloca a educação na centralidade da discussão sobre inovação e

tensiona os processos em curso – situando o lugar e o destino das mudanças.

Contrapondo o conceito de inovação com o de reforma, Sebarroja (2001, p.

16) a diferencia a partir da magnitude que cada uma assume: enquanto a inovação

localiza-se nas escolas e nas aulas, ou seja, é de caráter micro, a reforma afeta o

conjunto do sistema educacional, no seu âmbito macro. Sendo assim, nem toda a

inovação está associada a processos de reforma e estes, “no siempre estimulan la

innovación sino que muchas veces incluso la ignoran, la paraliza, la dificultan o la

torpedean”. (SEBARROJA, 2002, p. 12)

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Dois são os componentes, segundo Messina (2001, p.226), que distinguem a

inovação“: a) alteração de sentido a respeito da prática corrente e b) o caráter

intencional, sistemático e planejado, em oposição às mudanças espontâneas”.

Aguerrondo (1991), de forma complementar e avançando no campo das

definições do objeto das inovações, defende que inovar é produzir transformações

estruturais, ou seja, mexer nos elementos que têm função estruturante no sistema

educacional, como “a definição do papel da educação na sua relação com a

sociedade, a concepção de ciência e conhecimento, as concepções de ensino e de

aprendizagem, a idéia sobre as características psicológicas do ser que aprende,

entre outras”. Desta forma, toda a mudança que não envolva esses aspectos apenas

significa ajustes, melhorias ou aperfeiçoamento do sistema em vigência. Importante,

como alerta a própria autora, é perceber que os aspectos estruturantes, ainda que

alguns se materializem no âmbito macro, a maioria deles está inscrita no ambiente

escolar e expressa no cotidiano das práticas e decisões de cada escola e sala de

aula.

Para Jorge (1996, p. 54), o conceito de inovação compreende: [...] uma série de mecanismos e processos mais ou menos deliberados e sistemáticos, por meio dos quais se tenta produzir e promover mudanças nas práticas educativas vigentes, e parece oferecer uma alternativa real de mudanças, em um contexto em que ‘a história mostra não ter havido nunca uma ruptura radical entre o novo e o velho’.

Mitrulis (2002, p. 231) acrescenta uma formulação que incorpora o

protagonismo dos atores envolvidos e assim define: [...] Inovar é um processo de tradução, de decodificação da novidade pura em novidade aceitável, passível de ser aplicada, com o objetivo de melhorar aquilo que existe, de introduzir em dado contexto um aperfeiçoamento, um melhor saber, um melhor fazer e um melhor ser. Diferente da descoberta, da invenção e da criação, que são produções que não têm outra finalidade que elas próprias, a inovação traz embutida a idéia de estratégia de ação e é regida por objetivos práticos. A ação inovadora é da ordem da aplicação, entendida esta não como resultado de uma ação determinada, mas de um processo. Ela supõe uma intenção de mudança dentro de um projeto acalentado pelos atores envolvidos, uma intenção expressa em uma visão antecipadora, sob forma de objetivos definidos, ou uma intenção que se manifesta em uma reação de protesto contra uma situação dada.

A autora também destaca que as inovações são resultantes de trocas e de

acordos tácitos entre as múltiplas visões que compõem o coletivo envolvido no

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processo e, citando os estudos realizados por Françoise Cros (1997)4 a situa como

resultante de: [...] efeitos sucessivos de tradução entre diferentes atores, diante de um mesmo objeto. A tradução seria esse modo de se exprimir sobre um mesmo objeto, que tem repercussões nas preocupações e representações dos diferentes atores, e atende a uma espécie de bem comum provisório desses diferentes atores. Nesse caso, não haveria, de um lado, um objeto e, de outro, uma apropriação desse objeto, essas duas operações estariam consubstancialmente ligadas no processo de inovação. (2002, p. 232)

Em um esforço teórico de posicionamento do conceito de inovação no interior

da Filosofia da Educação, Saviani (1980) o situa dentro das quatro concepções

fundamentais: humanista tradicional, humanista moderna, analítica e dialética.

Argumenta que na primeira, por conceber o homem como uma essência imutável e

toda a mudança como um evento acidental, não há espaço para a idéia de inovação

– ao contrário, se ela aparecer é, por natureza, uma oposição a essa concepção;

para a humanista moderna, que entende a natureza humana como mutável e

determinada pela existência, ou seja, “a existência precede a essência”, o que é

inovador está inscrito na valorização do educando, da vida e da atividade – fazendo

oposição à linha tradicional -; a concepção analítica, diferente das anteriores, não se

remete a uma visão de homem, mas à análise da linguagem educacional, na qual

seu significado é encontrado no contexto lingüístico em que utilizado, logo, não há

critério pré-determinado e isso vale também para compreender o conceito de

inovação; e, por último, a concepção dialética que como a analítica não pressupõe

uma visão a priori do homem, mas “interessa-lhe o homem concreto, isto é, o

homem como ‘síntese de múltiplas determinações’”, entende que os problemas

educacionais devem ser explicitados e entendidos à luz do contexto histórico no qual

estão inscritos e que “inovar significa mudar as raízes, as bases”.

Nesse estudo, será assumido o conceito de inovação como processo

conduzido de forma intencional, com objetivo de provocar mudança nas questões

estruturais do ensino, contando com a participação dos sujeitos envolvidos nas

ações/cenário.

Entende-se ainda que o conceito de inovação pede uma inserção em um

referencial mais amplo que qualifique as características que estão sendo

consideradas como inovadoras no ensino da odontologia. Com base no quadro

4 Cros, F. L’Inovvation em éducation et em formation. Revue Française de Pédagogie, n. 118, p. 127-156, jan. mar. 1997.

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proposto por Pinotti&Arouca&Arouca (1974), modificado para este fim, o trabalho

investiga a existência de interrogações, formulações e experiências nos seguintes

aspectos, assim qualificados quanto:

1. à função social da profissão – definição do perfil do egresso que atenda o

perfil sócio-epidemiológico da população;

2. ao ensino – organização curricular com integração de conteúdos e não

numa visão disciplinar clássica; formação em cenários diversificados de

aprendizagem como a rede de serviços públicos e de espaços sociais;

3. à assistência – integração das instituições formadoras às políticas públicas

de saúde, tendo a prestação de serviço como objeto de estudo para criação de

modelos reprodutíveis;

4. à pesquisa - preocupação de responder aos principais problemas de saúde,

envolvendo os serviços e as escolas.

Considerando essa proposta e as demais referências do campo de inovações

o processo de análise se dará segundo uma divisão temporal em três grandes

cortes: décadas de 1950 a 70; década de 1980-90 e anos 2000. Esses recortes

temporais foram definidos com base na afinidade temática e na dinâmica das

discussões sobre ensino que prevaleceram em cada um desses períodos.

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3 O CONTEXTO DA PROPOSTA DE REORIENTAÇÃO DA FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DE SAÚDE

3.1 DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E DE EDUCAÇÃO

Algumas áreas do conhecimento gozam de permanente renovação de idéias,

pois envolvem diretamente as questões da vida humana e suas múltiplas

perspectivas de estar no mundo. A educação e a saúde estão entre elas,

funcionando no seu duplo papel: o de gerar conhecimento e desdobrar-se em prática

social, o que faz com que ao longo da história, muito se tenha pensando e escrito

sobre o lugar que ocupam no interior das sociedades - e a consequente relação com

os estados nacionais.

De acordo com Freitag (1978, p.9) em estudo de revisão de posições teóricas

sobre educação, publicado com o título Escola, estado e sociedade, há pelo menos

dois pontos de concordância conceitual entre os diversos autores: 1) a educação sempre expressa uma doutrina pedagógica, a qual implícita ou explicitamente se baseia em uma filosofia de vida, concepção de homem e sociedade; 2) numa realidade concreta, o processo educacional se dá através de instituições específicas [...] que se tornam porta-vozes de uma determinada doutrina pedagógica.

No campo da saúde também é aceito que a representação da saúde e da

doença é temporal, circunstanciada e disputada por diferentes idéias de mundo e

mediada pelos modelos tecnoassistenciais5. Estes, em última análise, traduzem

para a realidade a sua premissa conceitual de origem e, retroalimentam as idéias

hegemônicas sobre o processo em questão – sendo por isso arena permanente de

disputa.

No Brasil, desde 1988, saúde é um direito constitucionalmente garantido que

deve ser provido pelo Estado, estando, portanto, fora da lógica exclusiva do

mercado. Aparentemente, essa prerrogativa significa que tanto o setor público como

o privado estaria alinhado com os interesses da sociedade, ou seja, disponibilizados

e orientados para o conjunto de necessidades da população. Entretanto, o que se vê

5 Utiliza-se “tecnoassistencial” ao invés de “técnico-assistencial”, pois se trata de uma combinação de recursos tecnológicos e modalidades assistenciais, “ordenados como estratégia institucional para a atenção à saúde das pessoas e das populações e para a gestão das ações, serviços e sistemas de saúde.” (BRASIL/MS, 2005)

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é a tensão permanente entre a visão da saúde como direito, representada pela

materialidade do Sistema Único de Saúde e a amplitude das ações propostas,

especialmente aquelas dirigidas a redução de riscos e; a visão de mercado que

tendo a doença como centralidade da sua prática, desdobra-se em inúmeras

especialidades, induz o consumo crescente de atos médicos, de procedimentos de

apoio diagnóstico e de medicamentos.

No caso da saúde, os princípios do direito universal e do financiamento

estatal são resultados de uma mobilização onde a população brasileira sustentou –

na contramão da minimização do estado de bem-estar - uma discussão conceitual

do valor dos seres humanos na sociedade e do papel do Estado na garantia dos

direitos de cidadania, fazendo oposição à histórica realidade de acesso restrito e da

dependência do mercado biomédico privado – generosamente fortalecido pelas

políticas públicas das décadas de sessenta e setenta.

Como toda conquista é resultado de uma disputa entre diferentes, nesse

caso, a sua implantação e consolidação são um contínuo da mesma luta que no dia-

a-dia exige que todos aqueles identificados com esse ideário, criem estratégias e

articulações para a manutenção e melhoria do está garantido constitucionalmente.

A mudança conceitual impressa legalmente, por si só, não representou

modificações na maneira como se formam os profissionais de saúde, como se

constrói e reforça o imaginário do consumo de atos médicos, ou como parte da

sociedade, contrária a essa decisão, pensa em solucionar os problemas que afetam

a saúde. No centro desse imbróglio está, por um lado, a vida humana e, por outro, o

lucro de todas as formas privadas de organização e prestação de serviços que se

concentram na doença ou em formas de proteção específica.

Disputam-se, palmo-a-palmo, conceitos, tecnologias e formas de organização

de serviços. O Programa de Agentes Comunitários, criado em 1991, e a Estratégia

de Saúde da Família em 1994, são modelos adotados com o objetivo de fazer valer

os princípios doutrinários e organizativos do Sistema Único de Saúde – num cenário

onde as bases legais do sistema, a expansão da rede própria e o crescimento das

contratações não foram suficientes para criar um contraponto à racionalidade

biomédica individual e curativa predominante nos serviços.

De acordo com Luz (1988), discutindo os fundamentos da racionalidade

médica, o “deslocamento epistemológico – e clínico – da medicina moderna, de uma

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arte de curar indivíduos doentes para uma disciplina das doenças, supõe uma

passagem histórica de vários séculos, que se inicia no Renascimento, no final do

século XV ao início do século XVI”. Essa construção histórica, modernamente

sofisticada pelo acesso às tecnologias de diagnóstico, de intervenção e do

desenvolvimento de fármacos se constitui num maciço hegemônico que orienta a

formação e atravessa o ordenamento da prestação de cuidados, tanto público como

privado. Isso não significa minimizar a importância dos avanços científicos e a

necessidade de dispô-los para a assistência aos doentes – o que se discute é o

modus operandi das disciplinas médicas no manejo dos principais problemas que

acometem a coletividade.

Particularmente no Brasil, o movimento sanitário sintonizado com as

discussões internacionais sobre as condições de saúde e as formas de organização

do cuidado, expressas na Conferência de Alma Ata em 1978 e na Carta de Otawa

de 1986, construiu uma definição legal de que a saúde é resultante das condições

de vida, e que é parte das tarefas do Estado identificar e minimizar os riscos por

meio das políticas públicas – incluindo as de saúde, mas não excetuando-se as

demais. Dessa perspectiva, o foco principal do cuidado desloca-se da doença e

incorpora a análise e estratégias de ação sobre os de determinantes e

condicionantes do processo saúde-doença.

Odesdobramento dessa visão ampliada da saúde foi, então, mediatizada pela

implantação da estratégia da saúde da família que, com suas características de

trabalho em equipe, territorialização e cuidado longitudinal, permite desenhar linhas

de cuidado, de acordo com os problemas locais encontrados, extrapolando a

abordagem biológica e potencializando ações que envolvem outros atores sociais.

Essa construção, que se deu no interior do serviço público, não tem similar no

exercício liberal da profissão e não é uma experiência que possa ser vivenciada e

apreendida com o somatório de práticas de formação intra-muros, ao longo de um

curso de graduação em saúde.

Aqui reside um problema com dupla face: de um lado o serviço avançando a

duras penas e apontando os limites da formação dos profissionais como um dos

problemas para sua operacionalização e, por outro as instituições em estado de

letargia ou de conflitos internos frente à demanda por respostas de mudança na

formação dos profissionais de saúde.

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Merhy & Aciole (s.d) apontam duas grandes tensões presentes nesse

processo: uma localizada no campo do trabalho em saúde, identificando-a como a

“tensão existente entre a lógica de produção de atos de saúde como procedimentos

e a da produção de atos de saúde como cuidado” e a outra pertencente às

instituições formadoras, que se “origina da sua dupla vinculação: ao campo da

saúde e ao campo da educação. No primeiro, há as tensões definidas nos processos

específicos da atenção/intervenção no processo saúde/doença; no segundo, há as

tensões vinculadas aos processos institucionais de ensino/aprendizagem,

específicos no que tange à formação de profissionais médicos.”

Não são tensões desvinculadas entre si, como também não constituem

problemas diferentes – têm núcleos conceituais comuns e se auto modulam de

acordo com as bases conceituais com as quais são construídos. Com a mudança

epistemológica da racionalidade médica, que se dá no século XV, e a influência

decisiva das idéias reordenadoras do ensino médico propostas por Flexner (1910)6,

no início do século vinte, estabeleceu-se um modelo de ensino baseado na

fragmentação do conhecimento e na supervalorização das especialidades – que

diretamente influenciou a organização dos serviços.

De acordo com Merhy & Aciole (s.d) as escolas médicas atualmente são

organizadas segundo uma “lógica adocrática”, definidas pelos autores como: [...] lugares extremamente atravessados pelo domínio de saberes e práticas, particularizados, segmentados e especializados, e que negociam tais domínios em torno dos processos pedagógicos e da capacitação profissional dos médicos, no caso, também docentes [...]. Numa situação como esta tais núcleos de especialistas ou individualmente vão exercendo enorme autonomização ao passo que igualmente subordinando e tornando secundários os espaços coletivos que podem ordenar um sentido para o agir coletivo da organização.

Com as instituições e o ensino na área da saúde funcionando nessa lógica,

há que se entender a fraca identidade e o profundo desconhecimento, por parte dos

docentes, da organização de serviços e redes, destinados a coletivos, que

incorporam ações de promoção da saúde e de prevenção de doenças – sejam eles

pertencentes ao sistema público de saúde ou a gestão das próprias unidades de

ensino-serviço ligadas às escolas.

6 http://www.carnegiefoudation.org/publications/pub.asp?key=43&subkey+705 Acesso em 15 jul. de 2008.

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A despeito do acúmulo de evidências sobre a necessidade, pertinência e

urgência de conduzir modelos de intervenção fora dos ambientes clínico-hospitalares

– seja com atividades em grupos, seja conhecendo o território de onde emergem as

necessidades de saúde para planejar as ações – os avanços no processo de

formação dos profissionais de saúde ainda são muito tímidos.

Olhar a realidade de saúde-doença de seu entorno (comunidade local, cidade

ou país) e constituí-la como farol para a formação de trabalhadores da saúde é, do

ponto de vista de uma produção científica socialmente comprometida, uma missão

clara e desejável. No entanto, essa não tem sido a preocupação do dia-a-dia das

escolas. Se, no mundo do trabalho, a realidade na sua totalidade pede práticas de

saúde que se dão fora dos limites disciplinares, integrando os aspectos biológicos e

médicos com os ambientais, sociais, políticos, econômicos dentre outros, no ensino

essas dimensões não estão, a priori, presentes na formação.

Assim posto, temos um problema circular de difícil manejo que é de como

romper as múltiplas e inter-relacionadas fragmentações do ensino e do serviço. Se

para o ensino, ao fazer um movimento em direção aos espaços assistenciais - na

busca de aproximação com a gestão dos serviços e a realidade epidemiológica -,

encontra reproduzido os seus próprios limites, para os serviços a tarefa é dupla:

construir estratégias de educação permanente para aqueles que já estão operando

e, ao mesmo tempo, sediar parte da formação de novos profissionais.

Essa tarefa é de difícil execução, pois envolve duas instituições

historicamente distantes e por isso com muitas contratualizações por fazer. Pesa

para o serviço, nessa aproximação, a necessária clareza de seu papel de prestador

de serviço e a flexibilidade para discutir os limites da inserção acadêmica, não

replicando em seu espaço a lógica da instituição formadora; e para a universidade,

que entra no serviço, a disposição de negociar e colaborar para que possa afiançá-lo

como um cenário de ensino-aprendizagem e, ao mesmo tempo, compartilhar

estratégias de fomento para mudanças recíprocas.

Ainda que conturbada, essa convivência é talvez a única maneira de se

garantir que a lógica cotidiana do trabalho - múltipla, permeada de imprevisibilidade,

decisões e conflitos sobre a organização das ações - seja incluída na formação do

egresso e reflita na qualificação da rede de cuidados.

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Essa perspectiva não é nova no cenário das discussões sobre formação

profissional e gestão de serviços; ao contrário, desde 1950 há “oferta de idéias” –

conforme caracterizado por Mattos (2001) ao avaliar o papel das agências externas -

e financiamentos que estimulam processos inovadores dessa ordem na formação de

pessoal na América Latina.

A Organização Pan-americana de Saúde e a Fundação W. K. Kellog se

destacaram como indutoras de mudanças na área da saúde. Entre outras ações

estão: o patrocínio para a realização de seminários temáticos; o apoio financeiro

para projetos centrados na inovação do ensino e em assistência de qualidade; o

financiamento de publicações na área de saúde pública e a sua distribuição entre os

países latino-americanos; a criação de órgãos de apoio às instituições de ensino,

como o Centro Latinoamericano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde

(BIREME) e o Centro Latinoamericano de Tecnologia Educacional para a Saúde

(CLATES) - hoje Núcleo de Tecnologias Educacionais em Saúde (NUTES), e a

concessão de bolsas de estudos para profissionais da saúde. (CHAVES &

CUTHBERT, 2003)

Projetos como o Integração Docência Assistência (IDA), na década de 70, e o

Uma Nova Iniciativa na Educação dos Profissionais de Saúde: União com a

Comunidade (UNI) dos anos 90 são exemplos importantes de antecedentes que

levaram para o interior de alguns cursos da área da saúde - mais especificamente

medicina, enfermagem e residualmente para a odontologia - um ideário de mudança

na formação dos profissionais. (FEUERWERKER, ALMEIDA & LLANOS, 1999)

O grande diferencial das propostas de reorientação da formação, como o

PROMED (BRASIL, 2002) e o PRO-SAÚDE (BRASIL, 2005), apresentado mais

recentemente, é sua amplitude e seu caráter de política estatal. O primeiro

relacionado com a extensão da indução – números de escolas e alunos envolvidos

nos processos de mudança - e o segundo - expresso concretamente na sustentação

interministerial da proposta (educação e saúde) e na existência de uma secretaria,

no organograma do Ministério da Saúde - que chama para si a operacionalização da

diretriz constitucional do ordenamento da formação de pessoal da saúde para o

sistema público instituído no país. (BRASIL, 1988) Pode-se afirmar que a

conformação dessa situação, num primeiro plano, é resultante tanto da análise do

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próprio Ministério da Saúde, quanto dos espaços consultivos da sociedade

brasileira7, de que o perfil dos profissionais de saúde formados nas universidades

representa um limite concreto para a consolidação e o processo de qualificação do

SUS. De outro plano, conta positivamente o acúmulo de iniciativas de mudanças em

curso e do alinhamento político conseguido com as Diretrizes Curriculares

Nacionais, conjuntura que criou um ambiente favorável para capilarizar e

experimentar projetos de mudança mais ousados – em que as Instituições de Ensino

Superior são chamadas a participar do mundo que acontece fora de seus muros.

O “Aprender SUS” foi apresentado, pela Secretaria de Gestão do Trabalho e

Educação na Saúde/Departamento de Gestão da Educação em Saúde

(SGTES/DEGES), como um conjunto de estratégias a serem desenvolvidas em

parceria com as instituições de educação superior e destinadas a produzir “mudança

na formação dos profissionais de saúde no âmbito do ensino de graduação”.

(BRASIL, s.d; BRASIL, 2004) Segundo o documento orientador a “formação para a

área da saúde deveria ter como objetivos a transformação das práticas profissionais

e da própria organização do trabalho e estruturar-se a partir da problematização do

processo de trabalho e sua capacidade de dar acolhimento e cuidado às várias

dimensões e necessidades em saúde das pessoas, dos coletivos e das populações.”

(BRASIL, 2004)

A integralidade do cuidado foi definida como eixo central no “Aprender SUS”,

e algumas das propostas executadas foram: curso de educação à distância para a

formação de ativadores de processos de mudança na graduação, destinados a

docentes e preceptores do serviço; trabalho articulado com Ministério da Educação

na implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais e o financiamento dos Pólos

de Educação Permanente, que agregam usuários, gestores, profissionais de saúde

e as universidades em torno de projetos de qualificação da atenção à saúde.

Outra iniciativa foi o “VerSUS – Vivência-estágio na realidade do SUS”,

projeto proposto para acadêmicos de graduação dos cursos da saúde com objetivo

de oportunizar uma inserção não assistencial no interior do sistema público de

saúde. Partiu do diagnóstico de que “há um despreparo dos recém formados para

7 Conferência Nacional de Saúde (CNS) e Conferência Nacional de Recursos Humanos para a Saúde (CNRHS)

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atuarem na complexidade inerente ao sistema de saúde, compreender sua gestão e

compreender a ação de controle social sobre o setor [...]”.(BRASIL, s.d)

Importante destacar que todos os projetos/programas criados para dar

direcionalidade à mudança - VerSUS, AprenderSUS, especialização em Ativação de

Processos de Mudança, Pólos de Educação Permanente, PROMED e o PRO-

SAÚDE - são iniciativas que estão simultaneamente relacionadas com o processo de

reordenamento, tanto no âmbito das políticas de saúde como de educação, e que

fundamentalmente mobilizaram diferentes atores da sociedade brasileira para a

discussão, proposição e acompanhamento dos resultados.

Especificamente no setor da educação, a mudança na Lei de Diretrizes e

Bases (LDB), com o consequente processo de elaboração e implantação das

Diretrizes Curriculares Nacionais – DCN para o sistema de educação superior do

país, reabriu uma importante interlocução entre as demandas do setor da saúde de

natureza coletiva com aquelas da formação dos profissionais.

O texto aprovado nas DCN para os cursos de odontologia (BRASIL, 2001)

trouxe, do ponto de visa de um arcabouço legal, o resgate dos pilares das

discussões do ensino da odontologia na década de sessenta, e da atualidade dos

princípios do Sistema Único de Saúde, quais sejam: da integração curricular e da

integralidade da atenção.

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4 ENSINO DA ODONTOLOGIA NA AMÉRICA LATINA

Ainda que a profissão de cirurgião dentista tenha sido assimilada pelas

instituições de ensino superior na segunda metade do século dezenove, é a partir da

década de 50 do século vinte, que a discussão sobre o ensino da odontologia,

extrapola a questão legal da institucionalização do que antes era um ofício e assume

um lugar onde se diversificam os temas e os atores envolvidos, ganhando expressão

nos cenários, nacional e latino-americano. Esse movimento não é deslocado das

outras áreas da saúde, mas responde a um movimento que se estabeleceu

originalmente no campo da medicina e que teve a Organização Pan-americana de

Saúde, apoiada pela Fundação Kellogg, como a principal catalisadora.

Vários pesquisadores identificam que as principais diretrizes de mudança na

formação de profissionais da saúde começaram a ser discutidas no início dos anos

50, após a realização, em 1949, do encontro entre os Estados Unidos e os países da

América Latina, no qual foi acordado termo de cooperação técnica para algumas

áreas estratégicas, entre as quais a da saúde. Esse encontro, chamado Ponto IV,

tinha como pano de fundo a intenção de aglutinar e estreitar laços dos países latino-

americanos com os EUA, demarcando politicamente espaço em relação à

aproximação de Cuba ao bloco socialista.

O Seminário de Viña del Mar (Chile), em 1955, e o de Tehuacán (México), em

1956, foram desdobramentos do acordo e iniciaram a discussão sobre ensino da

medicina preventiva, influenciando a formação de uma geração de sanitaristas que

“assumiram papel importante na criação e no desenvolvimento dos departamentos

de medicina preventiva, comunitária e social em escolas de medicina, enfermagem e

odontologia.” (CHAVES & KISIL, 1999. p.4) Los seminários latinoamericanos organizados por la OPS em Viña del Mar em 1955 y em Tehuacán em 1956 registraron el pensamiento docente sobre o social. [...] Em el Seminário de Viña del Mar se destaca la importância de la enseñanza de la medicina preventiva Y se señala com o preocupación fundamental “entender al hombre como unidad biológica integrada em uma familia y esta, por su vez, em una sociedad. Un año más tarde, el Seminario de Tehuacán, México, define el tipo de conocimiento que debe proporcionarse al estudiante así: a) del individuo como unidad

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biológica, para lo cual incluirá la enseñanza de la biología, genética y psicobiología; b) del hombre, como unidad social, sea físico químico, biológico, psicológico o social.” Esto comprenderá aspectos de sociología general, ecología y antropología social, saneamiento, epidemiología y bosestadística. (VILLARREAL & RODRIGUEZ, 1986, p. 429)

De acordo com Rodriguez & Villarreal (1986), foram nesses seminários que se

incorporaram a noção de práticas de ensino fora dos muros da universidade e a

possibilidade de desenvolvimento de estudos com base em comunidades – ainda

que pese, para a década, os insuficientes avanços na análise dos problemas de

saúde no contexto social.

Em 1961, foi realizada no Uruguai uma Reunião Extraordinária do Conselho

Interamericano Econômico e Social, que ficou mais conhecida como Conferência de

Punta del Leste, e de onde saiu a definição do “Plan Decenal de Salud Publica de la

Alianza para el Progresso, baseado em grande parte nos documentos apresentados

pela OPAS, entre eles ´Hechos sobre Problemas de Salud: la salud em relación

com el progresso social y el desarrollo económico de las América´ que

afirmava a centralidade da saúde como condição para o desenvolvimento e a

necessidade de criar meios adequados para abordá-lo”. (PIRES-ALVES, 2008 p.

901 - grifo do autor)

O Plano, segundo Paiva (s.d., p.2): [...] parece ter lançado as bases de todo um movimento de vanguarda no campo da saúde pública no Brasil e na América Latina, especialmente no que se refere à discussão acerca do planejamento em saúde, do aumento de cobertura dos serviços e da reforma dos currículos médicos nacionais no continente. Assim, no cerne dessas discussões creio que há um importante debate acerca de uma nova estruturação no campo dos recursos humanos em saúde.

Na primeira Reunião dos Ministros de Saúde das Américas, convocada em

1963, foi discutida a operacionalização do Plano, e a pauta da formação de recursos

humanos ganha destaque. Consolida-se, nessa década, o discurso

desenvolvimentista da saúde, construído e disseminado pela OPAS, e que serviu de

argumento para a promoção das iniciativas de mudanças – desde a ampliação dos

serviços de saúde pública até a criação de condições para formar e qualificar

pessoal para a saúde. (PIRES-ALVES et al, 2008, p. 825)

Para Andrade (1973. p 253), é em 1958, com a publicação pela OPS do

Resumen de los informes quadrienales sobre las condiciones sanitárias en las

Américas – no qual são apresentadas informações sobre as necessidades globais

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de profissionais de saúde em cada país - que surge, em documento oficial, a

primeira referência explícita sobre o planejamento de recursos humanos em nível

regional. Conclui o documento: Esta información es esencial para la planificación sanitária, pues precisa tomar en consideración los recursos de personal disponibles, y, en caso de que sean insuficientes, desarrollar los medios de educación y adiestramiento con el fin de satisfacer la necessidad de nuevos trabajadores sanitários para la ampliación de los programas de salud pública. (OPS, 1958)

Na odontologia, a realização de três seminários regionais sobre “La

enseñanza de la odontología”, programados pela OPAS com colaboração da

Fundação Kellogg e da Associação Latino-americana de Faculdades de Odontologia

(ALAFO), correspondeu ao mesmo tempo ao alinhamento e ao posicionamento

setorial no movimento que vinha se estabelecendo na área da formação de pessoal

para a saúde e, simultaneamente, propiciou um diagnóstico mais detalhado da

realidade das faculdades de odontologia da América Latina.

4.1 OS SEMINÁRIOS LATINO-AMERICANOS DE ENSINO DA ODONTOLOGIA

Os três Seminários sobre o Ensino da Odontologia, realizados em 1962, 1964

e 1966, pela importância que assumiram no posicionamento da odontologia no

movimento latino-americano de discussão sobre a formação de profissionais de

saúde, serão aqui tratados de forma a captar, nos principais temas abordados, o que

é considerado central em cada um, e o que, com a diferença temporal e histórica, foi

se modificando - seja pelo destaque, seja pela perda da centralidade.

O primeiro Seminário aconteceu em outubro de 1962, sediado em Bogotá,

envolveu 18 faculdades de odontologia dos seguintes países: Colômbia, Bolívia,

Chile, Equador, Peru e Venezuela. Além desses, outros participaram como

observadores, estando o Brasil representado pelo então presidente da ABENO e por

docente da Faculdade de Farmácia e Odontologia de Piracicaba e da Faculdade de

Higiene e Saúde Pública da USP, tendo como Coordenador do Seminário o

brasileiro professor Mário M. Chaves.

O texto de abertura do primeiro seminário destaca: La enseñanza de la odontología en la América Latina se resiente, lo mismo que la otras carreras universitarias, de falta de la influencia benéfica de los conocimientos y técnicas de la pedagogía moderna. Por un lado, los

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pedagogos han concentrado su atención en la enseñanza primaria e en la secundaria; por outro, entre los que se han dedicado a enseñar odontología, há prevalecido la convicción de que para enseñar las asignaturas de esta carrera basta conocerlas bien. La llamada experiencia docente suele medirse, em general, por el número de años de enseñanza, sin que haya, salvo raras excepciones, una verdadera formación pedagógica del professorado, ni siquiera um rudimentario programa de adiestramiento durante o servicio [...]. (PRIMER..., 1963. p.281)

Na seqüência, o documento chama a atenção para o crescimento

populacional, a pressão social por níveis crescentes de acesso a serviços públicos

de qualidade, a existência de cursos de odontologia inadequados para as realidades

locais e a escassez de dentistas nas áreas rurais e afastadas – o que manteria o

exercício ilegal da profissão e todas as conseqüências advindas do fato. Foram

essas deficiências, na opinião da OPAS, que deram relevância e apontaram a

necessidade de um fórum “donde se haga un análisis de los problemas pedagógico-

odontológicos del momento.” (PRIMER, 1963. p.281)

Os objetivos do Primeiro Seminário foram: 1. Proporcionar aos professores de odontologia a oportunidade de estabelecer contatos pessoais e trocar pareceres sobre o ensino da odontologia; 2. Fomentar a publicação e distribuição de trabalhos sobre o ensino da odontologia, estimulando os professores a divulgar suas experiências, traduzindo trabalhos escolhidos e publicados em outros idiomas e reproduzindo outros pouco conhecidos, já publicados em espanhol ou português; 3. Promover a experimentação de novas idéias e métodos sobre o ensino da odontologia, a avaliação do trabalho docente atual e a preparação dos currículos, a longo prazo, para aperfeiçoá-los. 4. Reunir informação básica sobre o ensino atual da odontologia para proceder sua análise com a maior objetividade possível; 5. Preparar informes e recomendações sobre o ensino, de acordo com a opinião predominante de conhecedores da matéria, que sirvam de apoio para os diretores e professores interessados em renovar os currículos vigentes. (PRIMER..., 1963. p.282 - tradução nossa)

Como fase preparatória, todas as escolas dos países citados receberam um

roteiro de entrevista, preenchido e entregue aos consultores que visitaram as

faculdades meses antes da data do evento. Os resultados do diagnóstico foram

apresentados no Seminário e incluíram uma extensa lista de itens, entre eles: o

número de dentistas, de faculdades e de docentes; informações sobre as condições

gerais de infra-estrutura das instituições, do perfil dos docentes e sua carga horária

média, tempo de duração dos cursos, número de vagas e características das grades

curriculares.

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A programação do seminário previu trabalho em grupos com oferta de roteiro

de questões sobre os seguintes temas: “objetivos do ensino da odontologia,

organização e administração de uma faculdade de odontologia, planos de estudo,

preparação de pessoal docente e seleção de estudantes” (PRIMER..., 1963. p.282).

Das conclusões contidas no Informe Final, o tema que teve roteiro mais extenso e,

portanto, concentrou o maior volume de informações, foi sobre o que se discutiu a

respeito da organização curricular dos cursos.

Nesse tema, destacou-se a diversidade entre as definições de duração do

curso entre as escolas e o fato de que os tempos estabelecidos nem sempre eram

dedicados ao ensino. Sobre esse último fato, os presentes associaram-no a quatro

fatores: tipo de docente (preparação insuficiente, deficiência quantitativa,

instabilidade e outras); dificuldade econômica (problemas com a infra-estrutura das

escolas); da condição social dos pacientes (absenteísmo nas clínicas) e; problemas

circunstanciais (a indisciplina de docentes e discentes). (PRIMER..., 1963, p. 310)

O tema do estudo das ciências básicas e sua relação com a clínica foi

extensamente explorado, expressão da incorporação nas décadas anteriores dos

conteúdos das ciências básicas na formação dos profissionais de saúde, e as

conseqüentes incongruências do seu isolamento nas grades curriculares. Confirma

que a maioria dos cursos, tradicionalmente, tem dividido a formação entre um ciclo

básico e outro clínico e, a guisa de recomendação, pontua que:

[...] vem se observando certa tendência para a maior integração dos ciclos, mediante ajustes que permitam ao estudante adquirir precocemente uma experiência com pacientes. [...] Os participantes reconheceram que, ainda que não possuam suficiente experiência para emitir uma opinião categórica, é conveniente, de acordo com as atuais tendências docentes, que o estudante entre em contato, o mais cedo possível, com a realidade da prática odontológica. Esse conceito moderno parece ser de grande ajuda para conseguir uma melhor correlação entre as ciências básicas e as clínicas. (PRIMER..., 1963. p. 310, tradução nossa)

Sugere, também, que: sejam formados “professores ponte”, os quais

ensinariam tanto as ciências básicas como as clínicas; haja alguma forma de

“serviço hospitalar obrigatório” para os estudantes dos últimos períodos; se inclua

mais teoria nos últimos períodos para equilibrar a composição prático-teórico; se

melhore a qualidade e a quantidade do material disponível para o ensino; o aluno

faça, pelo menos, um tratamento completo com grau de complexidade maior, e para

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tal se aconselha a criação de “clínica integral atendida por professores das

diferentes especialidades.” (PRIMER..., 1963, p.311)

Esse Informe, escrito com detalhamento cuidadoso do que foi o trabalho dos

grupos, aponta os consensos e expõe alguns dissensos preservando, assim, a

riqueza do que ocorreu nos dois dias de trabalho. Sobre a discussão do ensino das

disciplinas, alerta que na impossibilidade de discutir cada uma, fosse solicitado aos

grupos que opinassem somente sobre quatro delas: operatória dental (dentística),

periodontia, diagnóstico oral e plano de tratamento e odontologia preventiva.

Sobre as conclusões, de forma sucinta, destaca-se (PRIMER..., 1963, p. 312):

a) indicação da necessidade de melhoria da qualidade do ensino da

dentística, incluindo a revisão da correlação entre o pré-clínico e o clínico,

aumentando o primeiro, a valorização da qualidade em detrimento da quantidade e a

“indispensável” redução de sua carga horária, para atender outras áreas de

conhecimentos;

b) inclusão da periodontia, do diagnóstico oral e da odontologia preventiva

como disciplinas nos currículos - a primeira abrangendo aspectos preventivos e

curativos, e o ensino da odontologia preventiva como possibilidade de criar uma

“verdadeira consciência preventiva” nos professores do curso.

Afirma que as faculdades latino-americanas de odontologia não dão suficiente

importância aos aspectos sócio-econômicos e de saúde pública, e ainda sustenta

que seja intensificado o ensino da “saúde pública, bioestatística, psicologia aplicada

à odontologia, odontologia preventiva e odontologia legal e legislação odontológica”.

Sobre o desenvolvimento de currículos diversificados, avalia que não cabe um

padrão para todas as faculdades, mas recomenda um currículo mínimo para que

todas, então, possam adequar a sua realidade. Quanto à experimentação de

diferentes currículos, “se considero que ello no solo es conveniente, sino también

necesario para el progresso de la enseñanza odontológica.” (PRIMER..., 1963. p.

312)

Ainda nesse item, destaca a necessidade de que se estruturem bibliotecas

com um acervo de livros e revistas atuais, como demonstração do progresso das

faculdades de odontologia.

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Sobre os docentes, conclui que tanto os métodos de seleção como aqueles

empregados para a sua preparação são insatisfatórios. Identifica que são

necessários esforços no sentido de melhorar a qualidade dos docentes quanto à

atualização dos conteúdos ministrados, à preparação prática em serviço – tanto em

ciências básicas como na clínica -, e o aperfeiçoamento sobre metodologia de

ensino.

Ainda em 1962, a Organização Mundial de Saúde publicou um número da

Série de Informes Técnicos com o produto da elaboração de um comitê de

especialistas sobre o tema “La Enseñanza de la Odontologia”. Nesse documento, há

uma orientação para que os países façam diagnóstico das suas necessidades e que

os resultados sirvam de base para definições de quantidade de pessoal, número de

escolas e principalmente dos objetivos do ensino da odontologia – que para o comitê

deve ajustar-se à realidade e às necessidades de cada país ou região. Alerta

também para que os países com déficit de pessoal para o ensino e a assistência não

realizem investimentos prematuros em centros de pesquisa odontológica, sob pena

de descuidar da responsabilidade primeira que é responder aos problemas

existentes. (OMS, 1962)

Ainda que os sistemas públicos de atenção em saúde bucal, nessa época,

fossem fragilizados ou inexistentes na maior parte dos países latino-americanos, o

Comitê apontava que com sua criação haveria necessidade de dentistas com

formação diferenciada para assumir tanto a coordenação como a própria assistência

– referindo-se à administração central e local, ao uso da epidemiologia, à educação

em saúde bucal e à odontologia preventiva – conhecimentos estes que deveriam ser

incluídos nos atuais planos de estudo.

Identifica que o “crescimento dos departamentos principais de cirurgia bucal,

prótese e dentística nem sempre favorece o estabelecimento de novos

departamentos” e, destaca positivamente a iniciativa de algumas escolas de criar um

departamento de odontologia social e preventiva que assumiria o ensino de

disciplinas mais amplas como ética, questões jurídicas e econômicas relacionadas à

odontologia, além de bioestatística e da odontologia preventiva e de saúde pública.

(OMS, 1962. p. 12)

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O segundo Seminário aconteceu dois anos depois na Cidade do México, em

1964, e envolveu os seguintes países: Costa Rica, Cuba, El Salvador, Guatemala,

Haiti, Honduras, México, Nicarágua, Porto Rico e Republica Dominicana. Mantendo

o mesmo protocolo de organização do primeiro encontro, vários países participaram

na condição de observadores, dentre eles o Brasil.

O Programa do Seminário, com algumas alterações nos temas, apresentados

como complementares ao anterior, ficou assim definido: I – Educação Universitária Pré-profissional II – Condições Físicas de uma Escola ou Faculdade de Odontologia III – Organização da Faculdade ou Escola de Odontologia IV – Correlação entre as Ciências Básicas e as Clínicas V – Aspectos Preventivos e Sociais da Odontologia. (SEGUNDO..., 1965, p.5 – tradução nossa)

O relatório informa que além dos grupos de trabalho foram realizadas as

seguintes conferências: “Experimentación en la Enseñanza” com professor da

Universidade de Chicago e Consultor da Fundação W. Kellogg; “Papel de la

Odontología en los Planes de Salud de América Latina” e “Las Responsabilidades

del Professor de la Faculdad de Odontología” com professores da Escola de

Odontologia da Universidade de Michigan; “Las Actividades de la Odontología em la

Oficina Sanitaria Panamericana” com Assessor Regional da OPAS e “Disección

Filosófica de uma Professión y su Programa Educativo com professor da

Universidade de Pittsburgh. (SEGUNDO..., 1965)

Diferente do primeiro Seminário, no qual o tema com mais destaque foi

aquele relativo aos objetivos do ensino da odontologia, no segundo, o foco recaiu

sobre as condições físicas e a organização necessária para o funcionamento das

escolas. Detalhamento das dependências e das opções arquitetônicas das clínicas

odontológicas somou-se às definições de organogramas, atribuições e

recomendações sobre carga horária, e garantias trabalhistas para os docentes.

Particularmente, sobre a organização das escolas, há alguns pontos consensuais:

de que a divisão em departamentos é um método desejável pois agrupa material de

ensino e controle administrativo, que os professores precisavam incorporar a

investigação como tarefa docente, e que a dedicação desses deveria ser integral ou,

no mínimo, a metade do tempo.

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O tema do ensino das ciências básicas retorna como o quarto tema, não mais

diluído no grande tema do ensino da odontologia, mas com destaque e com uma

definição prévia do que o seminário estava chamando de correlação entre as

ciências básicas e as clínicas:

[...]correlación es la relación formal, recíproca y sistematizada entre uno o más temas en la enseñanza de dos o más disciplinas. Aplicada a las ciencias básicas y clínicas, es la relación significativa que debe existir entre lo que es básico y lo clínico para uma finalidad determinada. En otras palabras, es dar los medios y conocimientos básicos al estudiante para poderlos aplicar a la parte clínica.” (SEGUNDO, 1965, p. 11)

Apresenta os seguintes níveis de correlação, propostos por um grupo de

trabalho: - Relação simples: tem caráter informal, no qual o professor de um curso faz alusão aos aspectos pertinentes de outra ou outras disciplinas; - Cooperação: é uma relação informal que se estabelece entre dois ou mais professores para o desenvolvimento de um ou mais temas de suas respectivas disciplinas; - Integração: é o nível mais elevado da relação formal entre duas ou mais disciplinas. Implica selecionar temas relacionados entre si, de duas ou mais disciplinas, e formar com eles uma unidade de ensino chamada unidade de integração. (SEGUNDO..., 1965, p. 11, tradução nossa)

Não há dúvida de que o ensino das ciências básicas e sua relação com a

clínica era uma das questões candentes do momento, justificada pelo diagnóstico de

que uma das fragilidades da odontologia era a formação dos dentistas nessa área.

Discutiu-se a responsabilidade na condução do ensino - se pela própria faculdade de

odontologia ou não; a importância de ter dentistas especialistas em ciências básicas,

fazendo o papel de um “professor-ponte”, o que facilitaria a correlação entre os

núcleos citados; a necessidade de oferecer oportunidades para discussão sobre a

correlação entre as disciplinas, formar professores em serviço e fomentar atitude

favorável em relação a essa aproximação; e a necessidade da direção do curso

acompanhar esse processo.

Um último tema tratou dos “Aspectos preventivos e sociais da odontologia”,

reafirmando a posição do Informe de 1962, com a qual se recomendou que seus

conteúdos fossem abrigados em uma disciplina ou departamento, no último caso,

com um diretor que tivesse formação acadêmica adequada, experiência em

administração de saúde púbica e no ensino e pesquisa. Ponderou-se sobre o

crescimento populacional vivido pela América Latina e a incapacidade da

odontologia de responder aos problemas de saúde bucal somente com

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procedimentos curativos, dando então a essa disciplina ou departamento a

atribuição de melhorar a formação dos estudantes nos aspectos sociais e de saúde

pública.

Conforme as atribuições definidas, fica explícito que caberia a essa disciplina

ou departamento serem porta-vozes e conduzirem uma mudança profunda, tanto no

perfil dos egressos como em outros departamentos, convertendo a “prevención en

una verdadera filosofía de la profesión”, bem como demonstrar que a escola ou

faculdade de odontologia poderiam assumir responsabilidades com a comunidade e

colaborar eficientemente com os serviços de saúde – facilitando meios para

capacitação de dentistas e pessoal auxiliar. (SEGUNDO..., 1965, p. 13)

Quanto ao tempo a ser ocupado no programa de cada curso, um grupo

opinou que só se poderia definir depois de fazer um “estudo exaustivo da magnitude

do problema bucal em cada país ou área correspondente”, enquanto outro indicou

um percentual de cinco por cento. Aos métodos de ensino, além dos convencionais,

citou-se a prática extra-muro, com ênfase nas ações educativas com o público, a

prática em serviços de saúde e o planejamento, a realização e a avaliação de

projetos de saúde bucal para a comunidade. Argumentou-se que não é possível

ensinar aspectos preventivos e sociais da odontologia sem estreita colaboração com

outras instituições de saúde e associações profissionais. O documento conclui que é

objetivo central da faculdade de odontologia o serviço para a comunidade e, para

tanto, deve-se tomar iniciativas de aproximação com outras instituições e outras

faculdades. (SEGUNDO..., 1965, p. 14-15)

O terceiro e último Seminário, programado de forma regional, destinado a

discutir o ensino de odontologia, foi realizado em Petrópolis, Brasil, em 1966 e

contou, além do país sede, com Argentina, Paraguai e Uruguai, mais os

observadores dos países latino-americanos, congregando em torno de 200 pessoas.

Os quatro temas que orientaram os trabalhos em grupo foram: I - Desenvolvimento das bibliotecas e o aumento do uso da literatura odontológica; II - Formação de pessoal auxiliar nas faculdades de odontologia; III - Educação depois da graduação e; IV - Papel da investigação nas faculdades de odontologia. (TERCER, 1968, tradução nossa)

Esse terceiro seminário, à semelhança do segundo, teve grande parte da sua

preocupação direcionada a questões de ordem prática, ou seja, como organizar

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bibliotecas, estimular a produção científica, divulgar os artigos científicos, o quê

investigar, de quem é a responsabilidade da pesquisa, a definição das necessidades

da pós-graduação e o modelo de pós-graduação que deveria ser incentivado. O

tema da formação de pessoal auxiliar - diferente dos outros três que de alguma

forma sempre permearam as discussões do ensino odontológico - aparece aqui pela

primeira vez e o principal argumento é o “da necessidade de se obter melhores

resultados das potencialidades desenvolvidas pelos dentistas nos seus cursos de

formação”. (TERCER..., 1968, p. 26 – tradução nossa) As discussões não fecharam

consensos e o informe apresenta os posicionamentos divergentes sobre a

necessidade de formação e sobre as competências desse novo profissional.

No mesmo local, no último dia de atividade, foi realizado o III Congresso da

Associação Latino-americana de Faculdades de Odontologia – ALAFO, que teve

como pauta a análise dos currículos odontológicos da América Latina. O informe

final foi apresentado na forma de perguntas e respostas e teve três grandes

preocupações: definir conceitualmente as questões discutidas, realizar um

diagnóstico geral da situação vigente nas escolas e apresentar a posição do

Currículo Básico Mínimo proposto pela ALAFO. (TERCER ... 1968, p. 34-37)

Analisando o informe final, a ALAFO retoma os temas, principalmente, do

primeiro seminário, como “disciplinas básicas” e “disciplinas clínicas”, estágios e

experiências em espaços fora das faculdades (hospitais e comunidade),

experiências com estudo e aprendizagem independente, investigação, disciplinas

optativas e, por último, a importância das disciplinas de saúde pública e prevenção.

(TERCER..., 1968, p. 34-37)

Sobre as “disciplinas básicas” e em que ano e em que volume são ensinadas,

a recomendação da Associação é de que elas ocupem mais da metade do total de

anos do currículo, sem descuidar da sua articulação com as “disciplinas clínicas”.

Estas últimas, segundo diagnóstico da época, por estarem localizadas mais para o

final do curso, têm como desvantagem a falta de correlação com as básicas e a

consequente falta de motivação do aluno para estudá-las, resultando na

recomendação que as disciplinas clínicas fossem inseridas precocemente no

currículo para incentivar o aluno e estabelecer as relações necessárias entre as

duas. Quanto às experiências de ensino-aprendizagem fora da faculdade, destacou-

se o hospital como uma oportunidade de vivenciar tanto os problemas da

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coletividade como o “conceito mais amplo de trabalho em equipe, adquirindo as

atitudes ou os hábitos próprios de um profissional de saúde” (TERCER..., 1968, p.

33), e a experiência denominada de campo que, ao ser desenvolvida, na

comunidade, aproximaria o estudante da realidade social e reforçaria sua

responsabilidade social. Para essa última modalidade foi recomendado que

houvesse coordenação entre o currículo, os serviços e as instituições existentes na

comunidade, e que as experiências fossem efetuadas o mais cedo possível no

curso.

Em relação ao ensino de saúde pública e prevenção, a avaliação mostra-se

insatisfatória e se recomenda mais ênfase nos conteúdos preventivos, e que os

departamentos de odontologia social incluam disciplinas como bioestatística e

ciências sociais junto às disciplinas básicas. Afirmaram-se as vantagens de um

ensino que valorizasse o estímulo ao estudo independente, com consultas à

biblioteca e uso de bibliografias, e da aprendizagem dos passos da investigação

científica.

Não há dúvidas que a realização, propriamente juntos, do terceiro seminário e

o terceiro congresso da ALAFO significou a amplificação das discussões que já

vinham se acumulando desde o primeiro seminário, somando abrangência temática

e consolidando posições importantes que determinaram a estruturação dos cursos

de odontologia no Brasil e na América Latina.

Em uma avaliação mais geral, ainda que os três seminários tenham sido

realizados de forma regionalizada, a participação de observadores de diversos

países em todas as ocasiões e a divulgação dos relatórios finais para todas as

faculdades permitiu circular as informações e criar uma massa crítica em torno do

tema.

O que chama atenção, quase cinqüenta anos depois da realização desses

seminários, é que parte dos temas da época se mantém como preocupações atuais,

e que as muitas análises e recomendações contidas nos informes finais ainda são

pertinentes em relação à pauta - presente e conduzida - na área do ensino de

odontologia.

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4.2 PROGRAMA LATINO-AMERICANO DE INOVAÇÕES EM EDUCAÇÃO ODONTOLÓGICA

Em publicação sobre as Tendencias innovadoras em odontología:

antecedentes, bases y perspectivas, escrito em 1978 pelo chefe da Seção de Saúde

Bucal e pelo coordenador do Programa de Inovações no Ensino e Serviço

Odontológicos, ambos da OPS/OMS, os autores fazem um balanço dos

investimentos feitos na década anterior e apontam que os três Seminários foram

responsáveis por impulsionar importantes mudanças nas escolas de odontologia da

América Latina, com crescimento do interesse pelo assunto de ensino –

concretizado por inúmeros seminários locais, pela edição de duas revistas em

espanhol sobre educação odontológica e o aumento do número de artigos em

publicações de outras especialidades. (GILLESPIE & BELTRAN, 1978)

Entretanto, analisam também que o aumento do número de faculdades, e

todo o avanço que pode ter sido incorporado pelas antigas ou novas escolas, seja

na adoção de esquemas inovadores, na mudança curricular ou nos planejamentos

pedagógicos, não conseguiram ampliar significativamente o número de pessoas com

boa condição de saúde bucal, nem incorporar o enfoque preventivo – o que na

avaliação dos autores era imprescindível para o enfrentamento do problema.

(GILLESPIE & BELTRAN, 1978)

Com base nesse diagnóstico, foram conduzidos, sob responsabilidade da

OPS/OMS, três encontros que discutiram, respectivamente: a função das

universidades em relação ao Plano Decenal de Saúde para as Américas, 1970-80;

as tecnologias educacionais e uma rede colaborativa para preparar, traduzir e

acessar materiais de auto-aprendizagem; discussão e produção de material para

capacitação de pessoal para novas formas de ação que permitiriam ampliar a

cobertura aos grupos excluídos de cuidados odontológicos.

Em 1976, foi realizada na Faculdade de Odontologia da Universidade

Estadual de Campinas (UNICAMP) a Primeira Reunião do Programa Latino-

americano de Inovações em Educação Odontológica, congregando autoridades e

professores de faculdades de odontologia interessadas em introduzir mudanças no

ensino da odontologia. A programação incluiu a apresentação de uma “Revisão dos

projetos em execução ou em elaboração – aspectos inovativos”, em que o Brasil

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contribuiu com três experiências: Faculdade de Odontologia da Universidade Federal

do Rio Grande do Sul; Departamento de Odontologia da Universidade Católica de

Minas Gerais e Faculdade de Odontologia de Piracicaba - UNICAMP. (UNICAMP,

1976)

De acordo com o relatório:

O objetivo desse encontro foi, em primeiro lugar, fazer um retrospecto e uma análise dos programas atualmente em andamento. A segunda etapa constituiu no estabelecimento de uma linha filosófica que representasse o consenso do grupo, que serviu de base para a terceira etapa da reunião, que apresentou como produto final um programa de ação coordenadora (sic) para os projetos atuais e futuros. (UNICAMP, 1976, p.1)

Além das apresentações das experiências, a reunião se deteve na discussão

em grupos e elaboração de relatórios dos seguintes temas: Inovação curricular –

aspectos filosóficos; Inovação curricular – aspectos tecnológicos; Organização e

operação de clínicas integradas na faculdade; Organização e operação de

programas extra-murais; Abordagens para o problema de formação de pessoal

auxiliar; Formulação de projetos e Elaboração do programa conjunto. (UNICAMP,

1976)

Destaco aqui a centralidade de discussões conceituais como a que envolveu

a concepção de inovação. Beltrán (1976, p.59) inicia sua explanação distinguindo o

conceito de modernização ao de inovação, identificando o primeiro como sinônimo

de “mudanças de forma” e o segundo como “mudanças de fundo”. Ao refletir sobre

inovação curricular, afirma que esta implica em mudanças de valores, envolvendo

juízo sobre três fontes que alimentam o currículo: sua intencionalidade, os conteúdos

e a metodologia de aprendizagem.

Lobo (1976, p.71) abordou, na sua exposição sobre inovações, as definições

de tecnologia, tecnologia educacional, currículo e plano de estudos. Apresentou

características de diferentes etapas da organização curricular – de um modelo

tradicional ao inovado – segundo variáveis como relação ensino/saúde, forma de

currículo e organização do ensino.

As experiências brasileiras reunidas estavam relacionadas com: reforço de

biblioteca, serviço de triagem e tecnologia educacional no caso da faculdade de

odontologia da UFRGS; a apresentação de desenho de um modelo inovado de

ensino odontológico com propostas no âmbito do ensino, serviço e pesquisa pela

Universidade Católica de Minas Gerais e um projeto de inovação de ensino da

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UNICAMP, que no momento da Reunião tinha avançado somente no primeiro dos

três objetivos definidos (reestruturação curricular, tecnologia de ensino, modelos de

prestação de serviços). (UNICAMP, 1976)

A partir dessa reunião, a Seção de Saúde Bucal da OPS preparou uma

proposta para obtenção de recursos, que foi viabilizada junto à Fundação Kellogg e

cobriu o período de 1977-1979. O Programa assumiu a característica de programa

regional destinado a estimular, apoiar, trocar e avaliar projetos inovadores de ensino

e serviço odontológicos na América Latina.

A definição de inovação, no campo da educação e do serviço, adotada pelo

projeto, traduz a centralidade da sua missão:

[...] tem o propósito de introduzir mecanismos que permitam modificar qualitativamente a formação de recursos humanos de modo que estes possam criar ou adaptar e utilizar formas de alta eficácia e baixo custo na atenção em saúde bucal. Constitui sua finalidade última estender a cobertura dos serviços fazendo-os acessíveis a toda a população e proporcionando ao mesmo tempo ao trabalhador da saúde um alto grau de satisfação e realização humana. (GILLESPIE & BELTRÁN, 1978. p. 518, tradução nossa, grifo nosso)

Não há dúvida que, do ponto de vista conceitual, tanto a leitura diagnóstica

como os argumentos que dão suporte aos projetos da OPS nessa década

incorporam, de forma mais incisiva, a necessidade de as escolas darem respostas

aos problemas epidemiológicos de saúde bucal, e incluem os serviços e a

comunidade como atores desse processo – o que não aparecia tão claramente na

década anterior – caracterizando a adoção da estratégia da integração docente-

assistencial. Esse quadro está consoante com o movimento de discussão

internacional sobre as opções de organização dos cuidados de saúde para a

população – que culminou na Conferência de Alma Ata em 1978 – e a contribuição

do movimento da medicina e da epidemiologia social, em plena construção na

América Latina, que vocalizam a concepção da determinação social das doenças.

O marco conceitual do Programa de Inovação no Ensino e Serviço Odontológicos se fundamenta na concepção científica da saúde segundo a qual esta se encontra condicionada pela situação socioeconômica de um país num determinado momento histórico. Se reconhece que as mudanças nos níveis de saúde bucal derivam de modificações estruturais nos fatores determinantes. Sem dúvida, se concebe que a interação das variáveis do contexto socioeconômico e político geral possibilitam uma margem de trabalho que permite o ensaio e a aplicação de planos curriculares e de serviço capazes de produzir mudanças qualitativas e quantitativas nos setores saúde educação, contribuindo para seu aperfeiçoamento, renovação ou mudança.

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Em consonância com isto, o processo de ensino-aprendizagem em odontologia, considerado como um conjunto complexo de relações sociais entre docentes, alunos e comunidade, é suscetível de modificação com o propósito de estabelecer a integração necessária entre as instituições formadoras, a comunidade e os serviços. Desta maneira, a formação de recursos incorporará na sua prática a participação conjunta da comunidade na tomada de decisões e execução de ações para a atenção aos problemas de saúde bucal. ( OPS/OMS, 1977 apud GILLESPIE & BELTRÁN, 1978. p. 524, tradução nossa)

Os autores, refletindo sobre o alcance e as perspectivas do Programa,

analisam com muita clareza o contexto, e problematizam a reciprocidade existente

entre a prática e o ensino de odontologia, sendo o prestígio da primeira determinado

pelos fatores econômicos - predominantemente ligados à venda de procedimentos –

e pelo fator social e que, de acordo com a complexidade tecnológica, exerce forte

influência no enfoque curricular e confere peso às disciplinas das grades

curriculares.

[...] A maioria dos professores se apresenta aos olhos dos alunos como especialistas de prestígio em seus respectivos campos, e a imagem de base científico-tecnológica se agrega ao do êxito econômico pessoal. Em resumo, se observa certa coerência entre o substrato socioeconômico do exercício profissional e a ideologia que hoje impera no ensino da odontologia.[...] (GILLESPIE & BELTRÁN, 1978. p. 530; tradução nossa)

Assinalam ainda que os professores que têm seu trabalho associado a

inovações, invariavelmente são tidos como idealistas, distantes do fazer clínico,

diferentes dos outros docentes, e que uma das ações que podem modificar

positivamente essa situação é a criação e o desenvolvimento de novas formas de

prestação de serviço que incorporem o processo de ensino-aprendizagem.

Sendo assim, o Programa reconhece a determinação social da situação

epidemiológica de cada local para cada tempo histórico, mas reconhece também

que “existe a possibilidade de uma margem de trabalho que permite o ensaio e a

aplicação de planos curriculares e de serviços capazes de produzir mudanças

quantitativas e qualitativas no setor educacional e no dos serviços”. (GILLESPIE &

BELTRÁN, 1978. p. 530, tradução nossa)

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5 O ENSINO DA ODONTOLOGIA NO BRASIL

A institucionalização da odontologia no país iniciou-se pela oficialização do

curso por meio do Decreto Imperial nº. 9.311, de 25 de outubro de 1884. Entretanto,

já em 1882, começou a funcionar o curso na Faculdade de Medicina do Rio de

Janeiro; em 1891, iniciou o Curso de Cirurgia Dentária da Faculdade de Medicina e

Farmácia da Bahia; em 1898, criou-se a Escola de Odontologia de Porto Alegre; em

1901, a de Farmácia, Odontologia e Obstetrícia na Faculdade de Medicina de São

Paulo; e em 1905, a Faculdade de Farmácia e Odontologia de Juiz de Fora. Até o

ano de 1917, foram fundados mais 14 cursos de odontologia. (QUEIROZ, 2006)

A preocupação com o exercício da odontologia e, portanto, em alguma

medida, com a formação recebida pelos alunos, pode ser identificada desde sua

vinculação e reconhecimento como uma área de conhecimento pertencente às

instituições de ensino superior. Inicialmente, essa preocupação estava concentrada

na definição de requisitos mínimos para o funcionamento dos cursos, tais como:

definição de disciplinas, tempo mínimo para integralização do curso e características

do perfil de aluno a ser selecionado. Esses foram os primeiros passos de uma longa

transição entre o “ofício” aprendido na relação mestre-aprendiz, para uma fase

“escolar” de formação, imprimindo a autonomia da odontologia em relação às

faculdades de medicina8. (QUEIROZ, 2006)

Mas, é entre as décadas de quarenta e cinquenta do século passado que a

discussão da formação dos profissionais da área da saúde começa a receber maior

atenção – agora articulada com as demandas socioepidemiológicas e as demandas

dos governos em responder por questões como ampliação de cobertura e

resolubilidade dos sistemas públicos embrionários. Não há dúvida que é com a

medicina que se inaugura essa temática – tanto pela dimensão da sua intervenção

sobre os corpos como pelo tempo de existência como escola e profissão. Trabalhos

de Feuerwerker et al. (1999), Lampert (2002), Feuerwerker (2002), Paiva (2004),

Pires-Alves et al (2008) e Paiva (2008), entre outros, relatam essa trajetória,

8 “A partir de 1905, as faculdades ou escolas de odontologia em funcionamento passaram a ser equiparadas às escolas oficiais, por determinação do decreto n° 1.731 de 28 de agosto.” (Queiroz, 2006, p. 79)

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mapeando as preocupações e as estratégias conduzidas no Brasil – em conjunto ou

não com outros países latino-americanos – para a área médica.

Entretanto, a odontologia brasileira muito cedo se alinhou às discussões

correntes sobre a formação de pessoal. Guardadas algumas especificidades, a

odontologia passa, ao longo de quase toda a história de mudança da educação do

século passado, a gerar respostas setoriais para mobilizações que não pertenceram

exclusivamente a sua área – mas foram movimentos ampliados de reforma da

formação de pessoal para a saúde, com múltiplas e variadas intencionalidades.

Para Rodriguez & Villarreal (1986), boa parte dos esforços de reforma no

ensino da saúde, na década de cinqüenta do século passado, foi orientada pelos

eixos principais do modelo proposto pelo Informe Flexner de 19109, o que, na

prática, significou “a oportunidade para a incorporação, a organização e a

modernização das ciências básicas pré-clínicas, [...] e a formação de docentes

especializados, para o desenvolvimento de uma infra-estrutura biomédica [...]”,

configurando a consolidação de uma medicina científica que “não favoreceu uma

visão integral do homem” e negou as relações entre as doenças e o contexto social.

A proposta de Flexner, ao portar um modelo estruturante para o ensino e a

produção de conhecimento da área médica, foi acolhida como uma proposição

inovadora e iniciou a sedimentação do atual modelo biomédico. Ainda que suas

premissas conceituais, atualmente, sejam criticadas pela limitada capacidade de

explicar o processo saúde-doença das populações e promover uma prática integral

na área da saúde, ele foi na ocasião absorvido sem oposição.

Essa visão pode corroborar o que Cunha, apud Queiroz (2006, p. 128),

defende em relação à reforma universitária de 1968, ou seja, o autor afirma que as

idéias de Flexner, incorporadas oficialmente no projeto de modernização do ensino

superior em saúde, não eram mais exógenas ao pensamento do corpo docente e

discente das instituições – mas correspondiam, em grande medida, aos próprios

anseios de mudança.

Pode-se afirmar que o esforço inicial, de pautar o tema ensino odontológico,

envolveu a Organização Pan-americana de Saúde – que, segundo Pires-Alves

(2008), teve sua agenda de trabalho ampliada no período pós 1947, constituindo-se

9 http://www.carnegiefoudation.org/publications/pub.asp?key=43&subkey+705 Acesso em 15 jul. de 2008.

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“como ator-chave em torno de novos temas, entre estes o planejamento e a

educação profissional em saúde” - e a Fundação Kellogg. Esta última, de acordo a

informação que disponibiliza no site10 com a denominação de “Resumo do Legado”,

caracteriza o período entre os anos de 1941 e 1959 como de investimentos na

formação dos profissionais de saúde e na melhoria da infraestrutura das

universidades, portanto, em convergência de interesses com a OPAS.

No início da década de 50, na condição de consultor de “Educación Dental de

la OPS”, e financiado pela Fundação Kellogg, o Dr. Mário Chaves fez o primeiro

diagnóstico da situação do ensino da odontologia nos países da América Latina. O

relatório mostrou uma área carente de profissionais, fragilizada do ponto de vista

técnico-científico e desarticulada como serviço. Puede decirse que prácticamente no existem planes dentales nacionales” [...] Los dentistas y los administradores nacionales de salud estaban em desacuerdo. [...] Las faculdades que observó parecían ofrecer escaso potencial para cambiar la situación: “Em muchos casos, el estudiante aprende procedimientos operativos mediante ensayo e error com sus primeros pacientes. (CHAVES & CUTHBERT, 2003, p. 31)

Com base nesse relatório, a OPAS adotou um plano de quatro pontos de

intervenção: - Um centro regional de capacitação em odontologia de saúde pública - Ênfase na prevenção e saúde pública dentro da educação dental - Uma melhor capacitação para as enfermeiras dentais, e pessoal auxiliar - Programas nacionais de saúde oral mais contundentes, incluindo medidas de prevenção de cáries, como a fluoretação. (CHAVES & CUTHBERT, 2003, p. 32, tradução nossa)

Esse relatório foi de grande importância, pois serviu para afirmar a

necessidade de manter a odontologia como área de investimento pelas agências

externas. Para o Brasil, além de significar a formação dos poucos dentistas em

saúde pública existentes até meados dos anos de 1950, com bolsas de estudos na

Faculdade de Saúde Pública da Universidade de Michigan, oportunizou sediar, em

1958, um “Curso de Especialização em Saúde Pública para Dentistas”, na

Universidade de São Paulo – servindo como Centro Regional de Formação. Ali se

formaram centenas de profissionais, brasileiros e latino-americanos, que ocuparam

lugar na sucessão de eventos que discutiram tanto a educação dos novos dentistas

como a organização dos serviços de saúde.

10 http://wkkf.org/default.aspx?tabid=65&CID=145&NID=51&LanguageID=2. Acesso em 15 jul. de 2008.

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A repercussão da existência do Centro no país não pode ser minimizada, pois

foi fundamental, tanto para a consolidação do campo da odontologia na saúde

pública - com produção de conhecimento e publicações11 que marcaram época -,

como de experiências na área do ensino da saúde pública e da gestão dos serviços

públicos. (CHAVES & CUTHBERT, 2003)

Sem dúvida, a criação do Centro vai ajudar a entender as condições que

permitiram que a odontologia ocupasse espaço e protagonismo no Movimento da

Reforma Sanitária na década de oitenta - a partir de um núcleo que se fortaleceu

dentro dos departamentos de saúde pública ou odontologia social e preventiva –

mobilizando e produzindo um conhecimento desde o locus dos serviços, pensando

no perfil do egresso frente aos desafios da organização dos sistemas públicos de

saúde bucal.

5.1 DÉCADAS DE 50-60 E 70

5.1.1 DA INTERFACE DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE ODONTOLOGIA COM A PAUTA DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO

A idéia de uma odontologia de saúde pública no Brasil data do início da

década de 50, com a inclusão do setor no organograma do então Serviço Especial

de Saúde Pública (SESP), criado em 1942, como agência bilateral brasileira-

americana, com estatuto jurídico especial que lhe garantia autonomia dentro do

Ministério da Educação e Saúde. Tinha como atribuição inserir a saúde pública em

áreas sem cobertura assistencial e que, em muitos casos, eram estratégicas no

fornecimento de produtos de interesse internacional – como a borracha e os

minérios. (PINTO, 1977)

A Secção de Odontologia - criada em 1951, no interior do SESP e mantida

após a transformação, em 1960, para Fundação de Serviço de Saúde Pública

11 Livros como Manual de Odontologia Preventiva de Alfredo Reis Viegas e o Manual de Odontologia (2 vol.) de Mário Chaves foram publicados em português, traduzidos para o espanhol pela OPAS e impressos pela Fundação – sendo copias distribuídas na América Latina.(Chaves & Cuthbert, 2003. p.33)

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(FSESP) - desenhou uma trajetória singular de organização de serviços e ações

para aquele contexto sócio-histórico. A coordenação consistia de um dentista

brasileiro (Prof. Mário Chaves) e um americano, tendo seu plano de intervenção

baseado nos moldes da Odontologia Sanitária, com algumas linhas prioritárias:

utilização de métodos preventivos coletivos – com destaque para os estudos

pioneiros de fluoretação da água; a formação em serviço e a utilização de pessoal

auxiliar e a programação de serviços para atender escolares, denominado aqui no

Brasil de Programa Incremental. (PINTO, 1977, p.91)

A qualidade da condução dessas experiências, sem dúvida, colaborou para

que, em 1958, a Universidade de São Paulo fosse escolhida como Centro Regional

de Formação, sediando o “Curso de Especialização em Saúde Pública para

Dentistas”, sob a coordenação de Mário Chaves. Em 1960, Mário Chaves publicou o

“Manual de Odontologia Sanitária”, com sua versão para língua espanhola, em 1962,

financiada pela OPS e inserida nas estratégias de melhoria do ensino de

odontologia, em discussão pela agência e cursos de odontologia da América Latina.

(CHAVES & CUTHBERT, 2003, NARVAI, 1994)

Ao mesmo tempo em que esse conjunto de experiências teve caráter de

vanguarda, elas não alcançaram suficiente abrangência e força para disputar e se

constituir, nas décadas seguintes, uma opção de política de Estado12. Com a

instauração da ditadura militar, a opção foi pelo financiamento de um modelo

previdenciário de assistência, com forte componente individual-curativo-mutilatório.

Concentrou-se o financiamento na compra de procedimentos de terceiros, num

modelo de odontologia liberal sem programação, e relegou-se a lógica sespiana a

um modelo de cobertura residual. Essa opção, na prática, impediu o crescimento de

experiências e críticas nessa área, paralisando as possibilidades de avanços no

campo da saúde bucal coletiva.

Esse modelo hegemônico, que se fortaleceu na segunda metade da década

de sessenta, só teve suas bases questionadas já no final dos anos setenta – face ao

agravamento do quadro epidemiológico e a precariedade e os custos da rede de

atenção - tendo na Conferência Internacional sobre Atenção Primária da Saúde de

Alma-Ata (OMS,1978) o referencial para a organização de experiências alternativas

12 Sobre a assistência odontológica ver ZANETTI (1993).

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de cuidado e o amadurecimento político do que veio a constituir o Movimento pela

Reforma Sanitária.

Metaforicamente, a odontologia social da época pode ser comparada a um

estrategista sem exército. Enquanto se estruturava, a passos largos, como campo de

conhecimento, faltava-lhe território institucional de aplicação – parte imprescindível

da sua existência, ou seja, a da prática social.

Com relação aos processos de formação, nesse momento, a disciplina vai

compor o currículo com uma proposta de odontologia que ainda não tem existência,

que precisa ser antes constituída, para então poder dialogar com os conteúdos e as

ferramentas pertencentes ao campo. São tempos exclusivos de odontologia de

mercado, ou de um modelo público fortemente nele baseado.

Vários nomes contribuíram nessa época para a constituição do ideário da

odontologia sanitária, como Paulo Frenkel, Paulo da Silva Freire e Alfredo Reis

Viegas, mas é Mário Chaves que ocupa, simultaneamente, os espaços de discussão

dos serviços e do ensino. Segundo Narvai (1994, p. 29-30), a versão para língua

espanhola do livro “fez a influência de Chaves espalhar-se inicialmente pela América

Latina e Caribe e, depois, para todo o mundo”, desdobrando-se em convites para

participar de várias comissões técnicas e de assessoria da OPS/OMS e a

designação para chefiar a Unidade de Saúde Dental da Organização Mundial de

Saúde (OMS).

Antes de 1960, ele publica três artigos, dois sobre o ensino de odontologia:

“La ensenanza de la odontologia em la America Latina” e “Las tendencias de la

enseñanza de odontologia em el hemisfério occidental” e um analisando a relação

da responsabilidade profissional e institucional na garantia de resposta às demandas

de saúde bucal da população, intitulado “Necesidad de uma conciencia sanitaria y

peventiva em el profisional” (CHAVES, 1957; 1959; 1960). O primeiro, na condição

de Assessor de Odontologia da OPS, é resultado de um amplo diagnóstico, feito

com base em visitas a oitenta por cento das 69 escolas de odontologia da América

Latina, no qual conclui por um quadro heterogêneo de desenvolvimento do ensino:

desde a falta de docentes para as escolas mais novas, até outras que já tinham

superado essa fase e estavam vivendo o processo de especialização – com a

conseqüência, em alguns casos, da tendência de separação dos aspectos biológicos

e técnicos da formação. Destaca o predomínio de cursos em que nos dois primeiros

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anos só se ministram matérias das ciências médicas básicas, ficando as práticas

específicas da profissão a partir do terceiro ano – ocorrendo uma perda preciosa de

tempo no desenvolvimento da habilidade manual dos alunos. Registra, também,

experiências que tentam encontrar saídas para o tecnicismo e a especialização

exagerada e, por entender a importância desse movimento, sugere que seria

“provechoso el intercambio de ideias en este campo a fin de que la experiencia que

condujo a la reorientación de los estúdios em certas escuelas sea compartida por

cuantos se interesan em la enseñanza de la odontología em América Latina.”

(CHAVES, 1957, p.16)

O segundo artigo é uma análise das tendências de transformação que se

observam nos currículos do tipo experimentais, limitando-se aos aspectos teóricos

sobre os planos de estudo e a metodologia de ensino, conforme define o autor. Inicia

escrevendo que:

Não é demais a afirmação de que um sistema de ensino não funciona no vazio. As escolas de odontologia formam dentistas procedentes de um determinado meio para nele exercerem sua profissão. Quanto mais se ajuste o ensino às verdadeiras necessidades do dentista em suas atividades futuras, tanto mais objetiva e realista resultará. Pelo contrário, quanto mais ignore as necessidades da coletividade e se anquilose, convertendo-se num fim em si e não como meio, tanto mais subjetiva e idealista será. (CHAVES, 1959, p. 11, tradução nossa)

Ao apontar os fatores que influenciam o ensino da odontologia, classifica-os

como de ordem interna e externa à profissão. Os primeiros, ele os identifica como: o

crescimento constante de conhecimentos técnico-científicos, seja por justaposição a

outras áreas ou pelo desenvolvimento dentro da própria área, e o desejo das

escolas de oferecer a mais completa formação – em que cada professor, no

exercício da docência, é movido por metas altruístas e egoístas – ou seja, ao mesmo

tempo que se trabalha para que os alunos desenvolvam competências que

signifiquem avanços para a odontologia, os docentes também estão interessados no

“prestigio profissional y las vantajas materiales y morales que este prestigio

representa.” (CHAVES, 1959, p. 11)

Para Chaves (1959) as influências externas são determinadas:

a) pelo desenvolvimento no campo educacional em geral e particularmente com

o ensino da medicina, que por ser mais antiga já possui um “cuerpo doctrinal mucho

más amplo y de um número mucho maior de educadores profesionales

especializados”. Destaca que é um campo de onde se pode obter muitas idéias e

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relaciona que alguns dos avanços já registrados no ensino de odontologia

respondem, em linhas gerais, às mudanças recentes do ensino médico;

b) pelo desenvolvimento político e econômico do lugar onde o futuro dentista

exercerá a profissão, ponderando que normalmente as escolas estão em locais de

melhor poder aquisitivo e preparam os alunos para atender exclusivamente essa

demanda – o que se configura num problema quando se tem áreas economicamente

heterogêneas, pois se produz uma má distribuição de dentistas. Segundo o autor,

quando cobertas as necessidades do local de maior poder aquisitivo, normalmente

por àqueles com maior preparação, parte do excedente de profissionais se desloca

para áreas menos prósperas até um limite econômico-social crítico, abaixo do qual

se nota o êxodo dos dentistas para outras profissões e o vazio assistencial.

Conclui que do conflito entre a influência interna de uma formação completa do

profissional e a pressão da sociedade por respostas para os grupos socialmente

excluídos, têm havido propostas de “[...] un sistema docente flexible y equilibrado,

que atiende al mismo tiempo los deseos de la profesión de tener oportunidad para

um desarollo constante, y la población de disponer de buenos servivios dentales [...]”

(CHAVES, 1959, p. 11)

Na seqüência, faz uma análise retrospectiva do ensino de odontologia,

apresentando sua evolução de acordo com os seguintes períodos: artesania ou

vocacional; o acadêmico e o humanístico. A maioria das escolas latino-americanas

foi identificada como no Período Acadêmico, com predomínio das cátedras e suas

características: fragmentação do ensino em matérias sob a responsabilidade

exclusiva de um catedrático e a centralidade do ensino nas técnicas e nas doenças.

Identifica como principais inconvenientes desse período:

a) excessiva especialização que separou a escola da comunidade/coletividade: [...] ya está llegando al límite de sus posibilidades como sistema de enseñanza de verdadera utilidad. Em primer lugar, el sistema aparto a la escuela de la coletividad. Hubo profesores que afirmaron que los problemas que afectan a la coletividad desde el punto de vista odontológico – incumben a la salud pública, y no les interesan como educadores. Su problema es de formar dentistas muy bien preparados desde el punto de vista técnico, y cpaces de colocar la professión al mismo nível de la medicina. Esta actitud de convertir la escuela em uma torre de marfil, ajena a los problemas de la sociedad a la que debe servir, es uma consecuencia del academicismo exagerado, del saber como fín o como médio. (CHAVES, 1959, p. 15)

b) a separação do paciente - supervalorização das ciências básicas sem que

sejam adequadamente utilizadas no ensino da clínica, estando concentradas de

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forma exclusiva nos primeiros anos do curso, ficando o ano intermediário para o

pré-clínico e somente o final do curso reservado para as cátedras clínicas e o

contato com o paciente;

c) o distanciamento entre os professores, gerando um ensino dissociado e

disperso – falta de correlação entre as matérias, incluindo as pré-clínicas e as

clínicas, observando-se muitas vezes a falta de continuidade entre as cátedras de

técnica e de clínica.

Conclui que, de acordo com os ensaios e reformas atuais, há uma tendência

para a humanização do ensino, mediante: 1. Um plano de estudos unitário, que contenha, em ordem de sucessão lógica, os conhecimentos que o ‘dentista clínico’ deve adquirir para exercer a profissão; este plano implica uma ampla correlação entre as matérias, uma aproximação dos docentes, coordenação de esforços e eliminação de atividades repetidas. 2. Um ensino clínico orientado para o paciente e para o dentista de família, que retome os instrutores de clínica geral ou preceptores e dê um matiz humano às relações entre professor e aluno. 3. Uma maior atenção à formação humanista como complemento necessário da formação técnico-científica. 4. Uma aproximação entre a escola e a coletividade a que deve servir, criando no estudante uma consciência das obrigações que a formação universitária impõe ao dentista como tal e como cidadão.” (CHAVES, 1959, p. 30 – tradução nossa)

No artigo em que aborda a consciência preventiva e sanitária do profissional,

Mário Chaves define a primeira como a boa prática profissional no âmbito individual,

e sua extensão para a coletividade como a consciência sanitária. Argumenta que, na

medida em que a sociedade deu o monopólio para a profissão controlar a formação

e exercer a prática odontológica, a responsabilidade de garantir serviços de

qualidade recaiu sobre três instituições: as escolas, que atuam no processo de

formação; os serviços, que atendem as necessidades da coletividade; e as

associações responsáveis pela regulação interna. Sobre o papel das instituições

formadoras afirma que a maioria das escolas da América Latina tem uma orientação

curativa e não pretende criar uma atitude preventiva sanitária nos alunos, gerando

uma postura distorcida nos serviços com a reprodução da postura individualista e

curativa dos consultórios particulares.

Esses três artigos mapeiam o ideário da OPS, que foi, em maior ou menor

intensidade, apropriado por técnicos brasileiros tanto na programação das ações do

SESP como permearam as discussões sobre a formação nessas décadas –

trazendo para os serviços, ainda incipientes, propostas gerenciais diferenciadas e,

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para a pauta do ensino uma reflexão sobre os limites da formatação biomédica

hegemônica.

5.1.2 DA ATUAÇÃO DA ABENO

A Associação Brasileira de Ensino Odontológico - ABENO, criada em caráter

experimental em 1956, decorrente de uma reunião articulada entre os

representantes da Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior – CAPES, Serviço Especial de Saúde Pública - SESO e da International

Cooperation Administration – ICA (Ponto IV) - contou com a participação de 28

faculdades das 32 existentes no país. (MENEZES & LORETO, 2006. p. 41)

Vale destacar que a oficialização da ABENO, ocorrida em 1958, antecedeu à

criação da Associação Brasileira de Educação Médica (ABEM), que teve origem em

1962 com o nome de Associação Brasileiras de Escolas Médicas, passando

somente em 1975 a receber a denominação de ABEM. (LAMPERT, 2002, p. 51)

Os temas definidos para essa primeira reunião envolveram aperfeiçoamento,

seleção e preparo de pessoal docente, melhoramento de técnicas e material de

ensino, intercâmbio de escolas e problemas no ensino das matérias básicas e

clínicas. Foram discutidos em grupos, e os relatórios assumidos como resoluções

finais do encontro. (LAMPERT, 2002, p. 44)

Como parte dos desdobramentos da reunião, mesmo antes da aprovação da

primeira diretoria, iniciou-se um programa de concessão de bolsas docentes, em

convênio com a CAPES e a ICA. A CAPES financiou oito bolsas nacionais e a ICA

três bolsas nos Estados Unidos, como parte do Acordo de Cooperação Internacional,

selado em 1949, entre o governo brasileiro e o norte-americano, conhecido como

Ponto IV – que tinha como objetivo dar assistência técnica para as áreas

subdesenvolvidas. De acordo com Queiroz (2006, p. 35), tanto a criação da ABENO

como o programa de oferta de bolsas de estudo se integraram ao que Cunha (apud

Queiroz, 2006) chamou de modernização do ensino superior, culminando na

Reforma Universitária de 1968.

A segunda reunião oficializou a existência da ABENO e discutiu três temas:

concurso de habilitação, treinamento de pessoal de magistério e programas de

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ensino. Na visão do presidente à época, prof. Paulino Guimarães Jr., esses eram

anos nos quais a

Tecla muito batida era a que falava das matérias básicas, frequentemente relegadas a segundo plano, para a formação do odontológo. Foi a fase das “correlações”. Discutiram-se as correlações horizontais e verticais, em diferentes níveis e em diferentes matérias. Procurava-se um caminho para fugir à inconveniência de compartimentagem estanque separando matérias básicas, clínicas e pré-clínicas. (Guimarães Jr., 1970)

Foi nesse contexto que a ABENO, com a chancela da CAPES, realizou um

amplo diagnóstico das condições das Faculdades de Odontologia do país e

apresentou os resultados em 1960, na quarta reunião da Associação. Esse estudo

abriu, além da possibilidade de garantir investimentos em algumas escolas, na

avaliação de Guimarães Jr. (1970), uma nova pauta de discussão do ensino da

odontologia, em que:

[...] passou-se a falar sobre a necessidade de melhor conceituação de currículo, não tanto em termos de alterações no elenco das matérias lecionadas, mas muito mais de uma filosofia de abordagem das atividades essenciais ao aprendizado. (Guimarães Jr., 1970, p.30)

Contando com reconhecimento do Ministério da Educação e sua recém criada

Campanha de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-CAPES, a

Associação, desde sua origem, adotou como estratégia de qualificação dos

docentes o estabelecimento de convênios conjuntos para a oferta de bolsas de

estudo e a vinda de professores americanos para desenvolverem cursos no Brasil.

Em um balanço, envolvendo o período entre 1956 e 1962, contabilizaram-se “78

bolsas para cursos de longo prazo, 74 para cursos de atualizações e 20 para cursos

no Exterior”, concedidas por meio da CAPES, SESP, ICA, e CNPq. Um novo

convênio, com bolsas da CAPES, CNPq, FAPESP, OPS e W.K. Foundation, foi

celebrado em 1973 com a Universidade de Illinois-USA, e ofertou mais 76 bolsas

para docentes em cursos latino-americanos de Odontopediatria Social e Periodontia

Social, naquela instituição. (MENEZES & LORETTO, 2006)

Essa proximidade com os EUA, inserida no mapa dos acordos e estratégias da

macro política, foi setorialmente mediatizada pela presença de agências como a

OPAS e a Fundação Kellogg, o que certamente contribuiu para consolidar um perfil

de escola mais parecido com o modelo americano, com a constituição e a

centralidade das especialidades no ensino da odontologia. Essa é uma das muitas

situações, no mínimo, paradoxais: ao mesmo tempo em que o ideário dessas

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agências, na década de sessenta, se apoiava numa perspectiva de formação de

pessoal para responder às necessidades da população, o que houve foi a formação

de um corpo de especialistas, mestres e doutores que acabaram delineando e

consolidando escolas com currículos baseados na dissociação do básico com o

clínico, e no ensino das especialidades por meio das múltiplas disciplinas –

incluindo a odontologia preventiva e social.

Num plano mais ampliado de análise, há uma demanda real e pactuada entre os

ministros dos países da América Latina13 pela ampliação da oferta de ações e

serviços públicos de saúde. O papel assumido por essas agências foi, então, de

financiar, em acordo com estruturas do Estado e em parceria com a ABENO, os

processos de qualificação docente e de melhoria das estruturas físicas das escolas.

Para Queiroz (2006, p.124 ): A OPAS e a Fundação Kellogg desempenharam o papel de formuladoras e financiadoras das propostas de inovação na área da saúde na América Latina, portanto, de produtoras do discurso da necessidade de mudança no ensino na área da saúde, e, neste caso, no da odontologia.

Sob a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1971, e com o

Conselho Federal de Educação legislando sobre a estrutura curricular dos cursos

superiores, a odontologia faz a primeira revisão do currículo aprovado em 1931,

currículo este com suas bases fortemente alicerçadas no modelo flexneriano, na

presença da figura do catedrático e em um currículo único para todas as escolas.

Para Chaves & Kisil (1999), o modelo flexneriano - caracterizado pelo entendimento

da doença apartada da realidade social, com ênfase nos aspectos biológicos, na

unicausalidade e na supremacia das intervenções curativas - ganha muita influência

nos cursos da área da saúde a partir da década de cinquenta na América Latina.

Se, por um lado, já existia e difundia-se um ideário de inovação contrapondo-se

ao modelo flexneriano, recomendado desde o Seminário de Viña del Mar

(SEGUNDO...,1955), o novo currículo, aprovado em 1962, não abarcou grandes

mudanças. Na avaliação de Guimarães Jr. (1961a), com base no diagnóstico feito

pela ABENO, em 1959, a situação da rede de ensino da odontologia era complexa:

as escolas tinham promovido modificações e alterações isoladas a partir do

currículo-padrão mínimo determinado em 1931, apresentavam grave problema com

as instalações materiais “traduzido por deficiências que variavam de 65,2% a 87,5%

13 Plan Decenal de Salud Publica de la Alianza para el Progreso, anexo a Carta de Punta del Este, 1961.

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para as cadeiras básicas e 39% a 69,5% para as cadeiras de aplicação” (p.33) e o

quadro docente era insuficiente e com problemas de qualificação.

O documento “Estudo para a reestruturação do currículo das faculdades de

odontologia no Brasil”, contendo as sugestões de professores que participaram de

“Encontros Regionais de Educadores Brasileiros”, e sistematizadas por uma equipe

de docentes em reunião promovida pela ABENO, em parceria com a CAPES, em

1961, foi a contribuição da Associação para o processo de revisão curricular. Nesse

documento há uma defesa do “currículo-mínimo” e da definição de “duração

obrigatória”, como meio de garantir padrões médios de formação para um país de

base territorial como o Brasil – o que, na opinião do grupo, não impediria sua

ampliação no caso dos cursos mais desenvolvidos. Identifica que as falhas estão

localizadas na conceituação das diversas matérias (conjugação de matérias de

ensino diferentes; desdobramento de matéria única e designações obsoletas) e na

atrofia de outras. Propõe novo rol de disciplinas, com uma disposição em que há

matérias pré-clínicas, logo no início do curso, no final um complemento obrigatório

de “estágio em policlínica” – como recurso à integração de diversas disciplinas - e

locação da disciplina de odontologia social em três das quatro séries do currículo.

O que de fato constituiu-se foi um novo currículo mínimo dividido em ciclo básico

e profissional – muito diferente das recomendações da OPAS, materializadas no

relatório do Comitê de Expertos em Higiene Dental e da ABENO, que

recomendavam uma organização curricular na qual o ensino do pré-clínico e do

clínico já estariam contemplados nas séries iniciais, funcionando como um

dispositivo facilitador para as correlações entre as matérias – até então estanques.

(OMS, 1962; Guimarães Jr., 1962a)

Para Queiroz (2006, p. 199), o currículo aprovado ficou muito distante de uma

proposta de “integração dos conteúdos curriculares que não se restringia à

dimensão técnica da profissão, incluindo as dimensões biológica e social na

formação profissional”.

A ABENO, ao longo da sua existência manteve estreita ligação tanto com a

OPAS como com outras agências de fomento para a oferta de cursos e eventos na

área do ensino como, por exemplo, o convênio com a ADA – American Dental

Association - em 1979, que trouxe um professor americano para ministrar o curso

“Alguns problemas do Ensino Odontológico”, na reunião anual da entidade, que tinha

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como objetivo apresentar os problemas e apontar as soluções encontradas naquele

país. (MENEZES & LORETTO, 2003)

Nos primeiros anos da década de 70, quando escassearam os recursos das

agências internacionais, o país já tinha consolidado seu sistema de ensino superior

em odontologia e formado um número de profissionais suficientes para atender à

demanda de docentes para rede de universidades existentes e começava, então, a

fundar as bases da pós-graduação na área. Nas reuniões da ABENO, essa pauta

ganha centralidade a partir de 1973 e torna-se frequente até o ano de 1980,

excetuando-se os anos de 1977-79. (QUEIROZ, 2006)

Quadro 2. Assunto Pós-Graduação no temário das reuniões da ABENO/ 1973-1980*.

N. Ano TemaX 1973 Pós-graduação no Brasil na área de odontologia XI 1974 Cursos de Especialização

- Organização dos serviços de triagem, - Formação de pessoal auxiliar

XII 1975 Política Geral do Ensino Superior, - 1° Plano Nacional de Pós-graduação - Problemas do Ensino Superior

XIII 1976 Atual estágio no ensino de Materiais Dentários, Dentística, Odontopediatria, Odontologia Preventiva e Social e Diagnóstico Oral. - Pesquisa nos Cursos de Pós-graduação em Odontologia no Brasil

XIV XV XVI

1977 1978 1979

- Não se aplica

XVII 1980 Pós-Graduação *Adaptado de Queiroz (2006)

Esse fato sugere que houve um deslocamento da discussão da graduação para

a pós-graduação, com o claro privilégio da segunda e, como consequência, o

fortalecimento de identidades docentes no campo das especialidades e, portanto,

segmentadas e distantes do ideário da formação profissional imbricada com a

realidade social do país, ou mesmo da possibilidade de construir um ensino

integrado – como experimentado na década de sessenta com Diamantina.

Desdobramento da iniciativa do Programa Latino-americano de Inovações em

Educação Odontológica, em 1979 desenvolveu-se um projeto denominado

“Odontologia: Docência e Serviços”, envolvendo a CAPES, ABENO e Fundação

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Kellogg, que selecionou, entre as 29 escolas de odontologia que apresentaram

propostas (de um total de 32), 16 que receberam financiamento durante 4 anos para

promover inovações curriculares, mudanças na metodologia de ensino e estruturar

clínicas extra-murais. O objetivo do Programa era “formar um cirurgião dentista

clínico geral voltado para os problemas de saúde bucal, com filosofia preventiva e

social, estimulando o aumento da cobertura do atendimento odontológico às

populações de baixo índice socioeconômico.” (MEDEIROS, 1991, p. 129)

As experiências relatadas por Medeiros (1991), que incluem seis cursos de

odontologia (PUC-Campinas, Universidades Federais do Espírito Santo, do

Maranhão, de Minas Gerais, da Bahia e Universidade Estadual do Rio de

Janeiro/UERJ), mostram que o principal vetor de mudança foi a criação de clínicas

extramurais que, na sua maioria, destinava-se ao atendimento a escolares – e no

caso específico da UERJ, reproduzindo o Modelo Incremental, proposto pelo SESP

na década de 50. Experiências com a simplificação de equipamentos e incorporação

de pessoal auxiliar na prática odontológica, ainda que importantes, foram pontuais.

Não há relato de aproximação/integração com a rede de serviços de saúde.

Essa iniciativa, de fomento à aproximação da formação com os serviços de

saúde, está inserida num contexto em que a questão de pessoal continuava a ser

um problema quanti-qualitativo: reconheciam-se avanços na formação de

profissionais em várias categorias, mas ainda insuficientes para responder às

necessidades sociais. Desde 1975, estava em andamento o Programa de

Preparação Estratégica de Pessoal para a Saúde (PPREPS) – “uma iniciativa de

cooperação entre o governo brasileiro e a Organização Pan-Americana de Saúde”

que envolveu os Ministérios da Educação e Cultura, da Saúde e da Previdência e

Assistência Social – tendo originalmente como eixos de trabalho o aumento

quantitativo do pessoal de saúde de nível médio e a melhoria da qualidade da

formação em todos os níveis – pauta que foi sendo ampliada e, na virada dos anos

70 para 80, incorporou também as “temáticas mais ligadas à organização e à gestão

do sistema de saúde.” (PIRES-ALVES et al, 2008) Algumas iniciativas como a da

regionalização docente-assitencial foram discutidas e experimentadas,

especialmente no nordeste do país.

Para Chaves (1977), os processos de inovação vividos pela educação médica,

de enfermagem e de odontologia, passaram desde a fase das discussões

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burocráticas sobre criação e ordenamento de disciplinas até a adesão aos múltiplos

recursos tecnológicos, numa perspectiva behaviorista ou skineriana do processo de

ensino-aprendizagem. Entretanto, esses processos não produziram mudanças de

fundo na educação dos profissionais da saúde. Aponta, nesse sentido, que:

A regionalização docente-assistencial parece ser o grande marco de referência para a harmonização das duas abordagens educacionais: o microensino e as técnicas de auto-aprendizagem e a instrução programada servirão para a modernização do processo; o macroensino e a integração ensino-trabalho contribuirão para a humanização do produto. (CHAVES, 1977, p.76)

A aposta na integração do ensino com o serviço vai ser a tônica dos projetos

financiados por agências externas nas décadas de 80 e 90 e, mais recentemente,

assumido pelos Ministérios da Educação e da Saúde como eixo principal de

reorientação a ser seguido pelas escolas da área da saúde.

Se o fomento para o desenvolvimento de iniciativas com essas características

ocorreu a partir dos anos oitenta do século vinte, a odontologia por meio da ABENO

e da figura do presidente Prof. Paulino Guimarães, antecipadamente deu origem a

uma experiência que aqui merece ser destacada desse conjunto, pela radicalidade e

pioneirismo no Brasil.

Uma experiência singular de ensino da odontologia, situada na década de

sessenta, que merece ser resgatada e analisada em separado, é o Plano Piloto de

Ensino Integrado, desenvolvido em Diamantina/MG entre os anos de 1966-69 e

financiada pelo Ministério da Educação. Essa iniciativa foi gestada durante os

primeiros anos da ABENO, numa época caracterizada, segundo o coordenador do

projeto e então presidente da Associação “por uma infusão de entusiasmo nos

meios da Odontologia” (MEC, 1970, p. 3).

5.1.2 PROJETO PILOTO DE ENSINO INTEGRADO DE DIAMANTINA

O diagnóstico das faculdades de odontologia no Brasil, realizado em 1959, e a

apresentação dos resultados na IV Reunião da ABENO, parecem ter sido decisivos

na abertura das discussões sobre a organização dos cursos: “desde então passou-

se a falar sobre a necessidade de melhor conceituação do currículo, não tanto em

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termos de alterações no elenco de matérias selecionadas, mas, muito mais, de uma

filosofia de abordagem das atividades essenciais ao aprendizado” (MEC, 1970, p.4).

Sintonizado com os movimentos que se faziam na área médica, especialmente

aquele relacionado com o ensino integrado – baseado na experiência do Curso de

Medicina na Universidade de Western Reserve – a ABENO iniciou o processo de

elaboração do projeto de uma “Escola Experimental de Odontologia”, apresentado

no Primeiro Seminário Latino-americano de Odontologia/Bogotá, em 1962.

Com a criação da “Comissão de Planejamento de Formação de Odontólogos”,

na Diretoria de Ensino Superior do Ministério de Educação e Cultura, em 1964, foi

dada a atribuição ao prof. Paulino Guimarães Junior a tarefa de elaborar um estudo

de viabilidade da proposta. No ano seguinte celebrou-se o Convênio que dava vida

ao “Plano Piloto de Ensino Integrado”, com sede na Faculdade de Odontologia de

Diamantina, que tinha como meta: [...] colocar o ensino da Odontologia dentro de um quadro humano, compatível com a realidade social vigente, permitindo ao profissional realizar-se dentro da comunidade, prestando a esta a assistência a que te direito recebendo dela, em troca, a consideração que se traduz por condições de bem estar psíquico e moral. (GUIMARÃES JR., 1965)

O currículo integrado, mola mestra do Plano, apresentado como uma proposta

distinta da “instrução integrada de informações múltiplas”, constituindo-se, então,

como uma unidade orgânica apoiada em conhecimentos, habilidades e atitudes,

contemplava, nas atividades curriculares, três níveis de integração: - integração no ensino; - integração do estudante nas metas profissionais; - integração do estudante, futuro profissional, na coletividade a cujo serviço se destina. (MEC, 1970, p.4)

A organização do ensino foi planejada com base no conceito de núcleos

abrangentes, nos quais são agregados os conhecimentos das diferentes disciplinas

em torno de um tema, oferecendo os conteúdos necessários para que sejam

asseguradas uma compreensão ampliada e uma visão “analítica-sintética” do

assunto. Na prática, a operacionalização se dava por meio da unidade curricular,

cada uma fruto de um projeto que, ao definir o objetivo-núcleo, agregava as várias

disciplinas, ou seja, “na unidade curricular encontram-se todas as disciplinas

porventura capazes de ter algo a ver com aquilo de que ela trata” (MEC, 1970, p. 10)

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É uma concepção de desenvolvimento em espiral, tendo como seu ponto de

origem o núcleo de integração, e sua amplitude decorrente do tratamento que é

dado a cada assunto. O relatório destaca que esse sistema “escapa à antiga

concepção de integração vertical em que, sempre, havia barreiras e divisões para

representar a idéia de conjuntos homogêneos reciprocamente integrados [...]”, e que

a atuação cooperativa da equipe docente é peça fundamental para dar sentido ao

conceito imanente de ensino integrado. (MEC, 1970, p. 10)

O Piloto também insere os seminários, como substitutos da preleção e forma de

modificar a atitude do aluno “que de mero espectador passa a atuar ativamente no

processo ensino-aprendizagem” (PLANO PILOTO..., s.d., p. 7)

A avaliação do projeto, além dos relatórios anuais (GUIMARÃES JR., 1965;

1966; 1968), concentra-se em dois documentos principais: o relatório do “Encontros

de professores-visitantes do Plano Piloto” (MEC, 1967) e o documento final do Plano

Piloto (MEC, 1970). O último inclui síntese do Inquérito entre os Estudantes e dos

dois Encontros de Professores. De acordo com esse documento, o trabalho avaliou

a integração: I – das matérias básicas entre si; II - das básicas pré-clínicas com as

clínicas; III – do estudante com a comunidade; IV – da Odontologia Preventiva e

Social no Ciclo Profissional e V – das disciplinas constituintes do Ciclo Profissional.

Os resultados apresentados apontaram para alguns ajustes na elaboração das

unidades curriculares, mas a idéia de um currículo assim organizado foi aceita,

ponderando-se sobre a “necessidade de uma transição gradativa dos métodos

tradicionais” (MEC, 1967, p.19). A discussão que aparece no segundo encontro de

professores, em 1967, é a preocupação com o andamento da Reforma Universitária

– realizada no ano seguinte – que deslocaria as disciplinas básicas para dentro dos

Institutos dessa natureza.

Ainda que cuidadosamente conduzido e avaliado, com a formação de duas

turmas de graduandos, no Relatório Anual de 1968 aparece a explicitação da crise

financeira vivida pelo Plano – que se estendia desde o final de 1967 e que agravou-

se nesse ano, quando o então Diretor do Departamento “deixou de incluir no Plano

de Aplicação da DESu o orçamento-programa do Plano.” (GUIMARÃES JR., 1968,

p.12)

Encerra-se, assim, em 1969, essa experiência singular que mobilizou

professores, na condição de visitantes, de universidades públicas do Brasil inteiro e

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que trazia no seu escopo um conjunto de idéias inovadoras para uma realidade de

formação homogeneamente conservadora.

Tudo faz crer que houve um descompasso entre a proposta e o seu tempo, com

todas as limitações que possam ter ocorrido no desenvolvimento prático da idéia do

ensino integrado; o Piloto foi arauto de princípios que simplesmente não

encontraram eco no âmbito das instituições formadoras e muito menos na política de

reforma universitária que estava em processo.

De acordo com Saviani (2008, p. 304) a reforma que estava em andamento,

destituiu, em 1968, a idéia de que o curso era a unidade básica da universidade e

promoveu a estrutura departamental para esse lugar. Desta forma, o docente passa

a ter sua vinculação primeira com um – e apenas um – departamento,e o aluno com

as disciplinas, bastando estar matriculado em uma para estar em situação regular na

instituição. Na prática, a dependência da coordenação de curso em relação ao departamento, esvaziado este de preocupações pedagógicas, significou, em termos da estrutura do ensino, a subordinação dos fins aos meios. Tal conseqüência – é bom lembrar – está em perfeita consonância com a concepção que orientou a reforma universitária, guiada pelos princípios da racionalidade, eficiência e produtividade. (SAVIANI, 2008, p. 305)

Nesse cenário, olhando retrospectivamente, o destino de idéias inovadoras

como as do Plano Piloto era previsível: ao não se articular com o processo de

reforma proposto para a educação superior brasileira estava fadado ao

esvaziamento e ao esquecimento.

Então, olhando para essas três décadas, há vestígios suficientes que indicam

ter havido uma movimentação importante sobre o ensino da odontologia no Brasil: a

criação e a atuação da ABENO, os esforços de qualificar os docentes, o diagnóstico

das condições das escolas do país, a participação nos seminários latino-americanos

e a implantação do Plano Piloto constituem iniciativas que envolveram dirigentes e

professores na temática da formação. Sob a orientação da OPS, há um

direcionamento claro da importância de que o processo de expansão da odontologia

assumisse um duplo compromisso: de formar profissionais capazes de dar respostas

aos problemas considerados de saúde pública e de criar uma expertise na área de

odontologia social e preventiva para dar suporte aos programas de natureza pública.

De outro modo, ao tirar o foco das iniciativas para concentrar-se no momento

histórico social, nos deparamos com a falta de infraestrutura das escolas, a carência

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de docentes qualificados, estruturas arcaicas de organização curricular, um

momento político pós-64 que impõe graves restrições à participação e,

principalmente, o desmonte do modelo de saúde pública incipiente em benefício de

um baseado no acesso parcial da população e na assistência individual e curativa.

Esse cenário interno, de fato, não pode ser caracterizado como facilitador ou

promotor de idéias inovadoras. Entretanto, o papel desempenhado tanto pela OPS

como pela Fundação W.K. Kellogg, no fomento de experiências e debates na área

da saúde, criou espaços até então inexistentes que oportunizaram a realização de

atividades e projetos que refletiram positivamente na história atual das profissões da

saúde.

5.2 DÉCADAS DE 80-90

5.2.1 PROGRAMA IDA E UNI

No rastro do ideário de regionalização docente-assistencial foi criado, em 1981,

o Programa de Integração Docente-assistencial (IDA), que teve como base o Acordo

OPS/MS/MEC/MPAS (MEC, 1981). Nesse documento, a avaliação das ações

anteriores é de que:

Os Programas comunitários, ditos de integração docente-assistencial, conduzidos em algumas universidades brasileiras, embora tenham se constituído em importante elemento questionador e formador de recursos humanos, jamais poderiam ter assumido a ingênua pretensão de atuarem como agentes transformadores da realidade. Seriam melhor classificados como programas de extensão do ensino em ambiente extra-mural da escola. (MEC, 1981)

No projeto IDA, participaram nove cursos de odontologia, quantitativamente

menor que medicina e enfermagem. Ainda que o Programa tenha tido como

pressupostos a participação social; a integração institucional e o modelo de

desenvolvimento baseado no eixo da prestação de serviços; o conjunto dos projetos,

na avaliação de Chaves, foram de caráter uniprofissional com a participação

comunitária tratada como um apêndice e a comunidade, muitas vezes, considerada

como “objeto de intervenção”.(grifo do autor). Para Kisil (apud MARSIGLIA, 1995),

o projeto parece não ter alcançado seus objetivos:

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Eu acho que a maioria das universidades teve sua experiência de Integração Docente Assistencial e de alguma maneira elas foram rejeitadas. Não conseguiram se afirmar. Houve uma concessão de deixar aquele pedacinho ali, mas sem significância para a instituição e para o currículo como um todo. (KISIL apud MARSIGLIA, 1995)

Uma outra proposta, de formação de pessoal em saúde, tem origem com o

Programa UNI - Uma nova iniciativa na Educação dos Profissionais de Saúde: União

com a Comunidade - desenvolvido a partir de 1992 com financiamento da Fundação

Kellogg e envolvendo oito países da América Latina. O Programa tinha como

objetivo induzir e apoiar processos de mudança que envolvessem, simultânea e

sincronicamente, os componentes: ensino, sistemas locais de saúde e ação

comunitária – “possibilitando a formação de profissionais melhor preparados para

prestar cuidados de saúde com qualidade e, também de novas lideranças para

desenvolver, institucionalizar e difundir tais métodos.” (CHIANCA & NARVAI, 2000)

Para Feuerwerker e Sena (1999), o UNI foi lançado no momento em que a

maioria dos países latino-americanos tinham saído de regimes autoritários e

predominava, na área de serviços de saúde, a idéia de Sistemas Locais de Saúde e

a valorização da Atenção Primária à Saúde – estando o Programa alinhado com os

princípios de universalidade, equidade e qualidade da atenção.

No Brasil, dos 15 projetos, 12 contam com a participação do curso de

odontologia. De acordo com a Coordenação para a América Latina e Caribe14:

Odontologia é a terceira carreira mais freqüente no programa (segue-se a medicina e a enfermagem, que eram um pré-requisito para a participação). Apesar disso, somente uma reunião, ao princípio do programa, havia sido organizada com um olhar dirigida para essa área.

Nesse caso, o acompanhamento dispensado para as ações desenvolvidas pelos

cursos de odontologia, se comparado àquele destinado aos demais cursos, foi

tardiamente programado. Segundo o diagnóstico da própria Coordenação,

inicialmente foi necessária uma abordagem de reconhecimento “pois a maior parte

dos instrumentos de avaliação era genérica ou mais voltada para captar informações

de medicina e enfermagem. [...]”. O que se procedeu foram visitas de consultores

especializados e, em 1998, organizado um Seminário com o objetivo de promover

intercâmbio de experiências e sistematização do debate específico da área –

realizado em Rionegro, Colômbia. 14 Laura Feuerwerker e Francisco Tancredi, em análise exposta no texto de apresentação da Edição Especial da Revista Brasileira de Odontologia em Saúde Coletiva, julho 2000.

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Do relato reflexivo das quatro experiências da odontologia brasileiras no projeto

UNI - Universidade Estadual de Londrina, Universidade de Brasília, Universidade

Federal da Bahia e Universidade Federal do Rio Grande do Norte – constantes da

edição especial da Revista Brasileira de Odontologia em Saúde Coletiva, em linhas

gerais pode-se afirmar: não foi regra o desenvolvimento das ações conjuntas com os

outros cursos, houve dificuldade generalizada em qualificar a interlocução com a

comunidade, a aproximação com os serviços aconteceu mas com diferentes graus

de interação e, para o componente acadêmico de formação, só um relato sugere

que o processo de mudança foi capilarizado de forma a envolver o curso como um

todo na perspectiva de impactar no perfil do egresso.

Feuerwerker & Sena (2002), sistematizando e avaliando as experiências

desenvolvidas pelo Programa UNI, não especificamente da odontologia, tomaram

três categorias analíticas para dimensionar as mudanças promovidas pelos projetos:

aqueles que realizaram intervenções pontuais; os que estabeleceram processos de

constituição de sujeitos pela construção de espaços coletivos, e os que produziram

mudanças na correlação de forças entre os diversos sujeitos e grupos dentro e entre

as instituições. Concluíram que “em todas as esferas predominaram os processos de

primeiro e segundo planos” (p.39) e que “[...] somente em período mais recente

houve a percepção de que inovações e mudanças nos processos e nas relações são

importantes, mas não bastam para chegar onde se pretendia. (p.40).

Destacaram, também, que na prática as mudanças foram moduladas por

variáveis como o tipo de inserção do projeto na instituição – tanto pior quanto mais

distante do poder instituído; a concepção de como conseguir desencadear e

conduzir o processo de mudança – tanto melhor quanto maior a participação dos

atores; e o acúmulo prévio em outras iniciativas semelhantes. (FEUERWERKER &

SENA, 2002)

Sobre o papel que o Programa teve nas instituições participantes variou de

acordo com o momento em que cada uma estava vivendo: para aquelas em

processo de mudança, o projeto foi um reforço; para as tradicionais estáveis variou

desde um estímulo para desencadear um processo de mudança, o desenvolvimento

de iniciativas pontuais ou a situação de não entendimento da proposta; e, por último

para aquelas em crise foi um orientador, constituindo-se numa alternativa. Desta

forma, as mudanças mais amplas aconteceram onde “havia uma longa história de

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acúmulo de reflexão e de tentativas de inovação na área acadêmica ou então em

lugares em que existia uma crise tão grave que a mudança radical surgiu como

alternativa de sobrevivência.” (FEUERWERKER & SENA, 2002. p.46)

Para a odontologia, ainda que uma minoria de cursos tenha conseguido fazer

parte de projetos mais amplos e integrados – com os outros cursos da instituição e

com os componentes serviço e comunidade – não há dúvida que essas experiências

também foram fundamentais na formação de uma expertise que contribuiu no

processo de discussão e revisão da legislação educacional, especialmente das

Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL, 2002).

5.2.2 ENSINO DA ODONTOLOGIA E O MOVIMENTO DE REFORMA SANITÁRIA

Para a odontologia, o início da década de oitenta foi sinônimo da emergência de

novas pautas e de uma nova geração de atores – mobilizados tanto pela

possibilidade política da redemocratização como da luta da inserção da saúde bucal

na discussão da saúde como direito de cidadania e dever do Estado.

Nascia um movimento contra-hegemônico à odontologia de mercado, que

discursava sobre a temida “socialização” da atenção com perda de clientela e do

status de profissão liberal (RGO, 1977, p. 24) e na prática pressionava por convênios

(NAPOLITANO, 1977), para fazer uma odontologia barata (leia-se mutilatória), de

faturamento fácil e de baixa cobertura. (CASOTTI, 1995)

Ganharam espaço, acompanhando a “abertura lenta e gradual” do regime

ditatorial, críticas sobre a velada imparcialidade da produção de conhecimento e da

formação de profissionais em relação aos projetos políticos de sociedade, e

apareceram experiências marginais que se desenvolveram em meio ao incipiente

movimento pela reforma sanitária da década de setenta, mas que até então se

limitavam ao interior dos departamentos de odontologia social das universidades

brasileiras e de alguns projetos isolados.

As principais inovações trazidas por esses projetos, foram principalmente

centradas em alternativas técnico-gerenciais. O uso de equipamentos simplificados,

a adoção e normalização de pessoal auxiliar e a incorporação de procedimentos

preventivos na rotina dos serviços formaram o conhecido tripé do novo modelo de

prática: simplificação, desmonopolização e prevenção.

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No relatório do Sub-tema Saúde Bucal da VII Conferência Nacional de Saúde,

em 1980, o grupo decidiu deixar registrado o fato de que era a primeira vez, na

história das Conferências Nacionais de Saúde, que o tema ganhava destaque, e

justificou: “tem–se atribuído um cunho ou caráter de especialidade dentro das

ciências médicas e que isto automaticamente e desavisadamente tem induzido a se

crer que é muito difícil, quando não impeditiva, sua participação nos programas de

saúde pública”. Apontou, como problemas do modelo de prática e assistência, a

ineficácia, a ineficiência, a descoordenação, a má distribuição, a baixa cobertura, o

enfoque curativo, o caráter mercantilista e a inadequação no preparo dos recursos

humanos: “formados de maneira desvinculada das reais necessidades do País,

precocemente direcionados para as especialidades e totalmente dissociados das

características dos serviços onde deverão atuar [...]”. (BRASIL, 1980, p. 175-176)

A década de oitenta foi marcada por uma nova geração de técnicos que, para

Zanetti (1993, p. 220), diferente da geração anterior muito preocupada com soluções

gerenciais pragmáticas, “esta foi mais discursiva e problematizadora, centrando-se

nas dimensões da busca de redemocratização e rearticulação da categoria

odontológica no contexto geral da redemocratização brasileira [...]”.

São marcos importantes da época: a criação do Movimento Brasileiro de

Renovação Odontológica (MBRO), congregando dentistas vinculados aos serviços

públicos, estudantes universitários e docentes da área de saúde pública

preocupados com as questões macro-políticas do país, mas também com o lugar

setorial na construção de um novo sistema de saúde; os Encontros Nacionais de

Técnicos de Saúde Pública Odontológica (ENATESPO), que ampliaram e

qualificaram a discussão da necessidade da odontologia gerar respostas para o

conjunto da sociedade, incluindo ferramentas de trabalho como a epidemiologia, o

uso de métodos preventivos e a oferta de ações de odontologia integral; e a

realização dos Encontros Científicos de Estudantes de Odontologia (ECEO),

capilalizando de forma contra-hegemônica um discurso da responsabilidade social

das escolas de odontologia e da necessidade de mudança da rota do modelo

curativo-especializado.

O trabalho de Mendes e Marcos (1985), ao publicar “Odontologia Integral –

Bases teóricas e suas implicações no ensino, serviço e na pesquisa odontológicas”,

relatando uma experiência do Departamento de Odontologia da Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais, e o artigo de Mendes (1986) são importantes

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(mas solitárias) reflexões produzidas do interior da universidade sobre o ensino da

odontologia nessa década.

A realização da I Conferência Nacional de Saúde Bucal (BRASIL, 1986),

imediatamente após a histórica VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986, foi o

resultado da ocupação sistemática de espaços que a saúde bucal coletiva veio

conduzindo desde o final da década de setenta, e principalmente nessa primeira

metade dos anos oitenta. Um conjunto de publicações (PINTO & VIANNA, 1981;

Botazzo, 1986; Córdon, 1986; Souza, 1986; Schneider Filho, 1986; Botazzo et al,

1988; CEPEC, 1986; Narvai, 1992; Garrafa,1993) sustentou uma nova abordagem

do papel da odontologia, colocando-a eixo das discussões da democracia, do direito

e do acesso como conquista.

O artigo Saúde Bucal e Cidadania, de Garrafa (1993), ao afirmar que a

odontologia brasileira era “tecnicamente elogiável mas socialmente caótica”, torna-

se emblemático da intensidade dos posicionamentos e da implicação dos vários

atores no processo de garantir que a área estivesse alinhada às discussões da

saúde coletiva e que, de fato, alavancasse um movimento de constituição de uma

rede pública de atenção à saúde bucal.

Década de noventa é a década da implantação das redes públicas municipais

de atenção à saúde no país e também, por conseqüência, da estruturação dos

serviços e das ações de odontologia – antes escassas e precárias. Então, é possível

entender o porquê que a geração de dentistas, que esteve envolvida com a

aprovação do Sistema Único de Saúde, permaneceu ocupada e investindo energias

para a estruturação e funcionamento do Sistema, independente se de sua ligação

institucional - serviços ou universidades -, somada a outros milhares de dentistas

anônimos.

A realização do primeiro levantamento epidemiológico das condições de saúde

bucal da população brasileira, em 1986; a aprovação inédita de uma Política

Nacional de Saúde Bucal no âmbito do Ministério da Saúde (BRASIL, 1988); a

produção de alguns ajustes burocráticos no início da década de noventa, revendo

valores de procedimentos da tabela SUS, e favorecendo a expansão dos

procedimentos preventivos na clínica; o desenvolvimento de múltiplas e ricas

experiências de (re)organização de serviços de saúde bucal nos municípios, da

presença crescente da oferta de cuidados odontológicos nas unidades de saúde –

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saindo da fase escolar -, do crescimento das ações coletivas; da incorporação da

epidemiologia como uma ferramenta de uso local até a inclusão da odontologia na

estratégia da saúde da família (BRASIL, 2000), são avanços que mobilizaram tanto

os gestores setoriais como os profissionais da rede assistencial e, em boa medida,

os docentes e pesquisadores da área de saúde coletiva ligados aos cursos de

odontologia.

Não é exagero afirmar, para as décadas de oitenta e noventa, que a energia

produtiva daqueles preocupados com o acesso e o direito à saúde bucal –

independente do locus de origem – somou esforços teóricos e práticos para

(re)desenhar o mapa da odontologia no sistema público de saúde. O epicentro,

portanto, das análises e proposições setoriais se deu na esfera dos serviços, de

onde passou-se, inclusive, a tensionar o modelo formativo.

Ainda que os primeiros esforços de aglutinação de idéias, em prol da reforma do

componente de saúde bucal no sistema público brasileiro, tenham emergido de

alguns departamentos dos cursos de odontologia e, particularmente, envolvido

docentes ligados a esses, a constituição de um campo de investigação e produção

acadêmica de conhecimento sobre o ensino da odontologia ficou relegado a um

plano secundário. 15

Entretanto, passada a fase inicial de aprovação e da criação do arcabouço legal

do sistema, os problemas ligados ao perfil do profissional formado ganharam

destaque na agenda política governamental, mobilizando novamente as instituições

de ensino e os serviços na discussão do perfil desejável do egresso da área da

saúde, ou seja, uma retomada de questão do ensino, agora por dentro das próprias

instituições formadoras.

Na prática, isso só acontece no final da década de noventa, quando o

Ministério da Saúde e o Ministério da Educação desencadeiam uma série de

iniciativas conjuntas, com a intenção de produzir mudanças no perfil do egresso

saído dos cursos da área da saúde; uma delas é a discussão e aprovação das

Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de Odontologia.

15 Casotti, E.; Brant, V.M; Gouvea, M. Educação em odontologia no Brasil: produção de conhecimento no período de 1995 – 2006. (no prelo; Rer. História, Ciência e Saúde de Manguinhos)

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5.3 ANOS 2000-09

5.3.1 DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS

A vigência, a partir de 1996, da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação

(BRASIL, 1996) estimulou, ao extinguir os currículos mínimos para os cursos de

graduação, um movimento importante que discutiu um novo balizamento na

formação de pessoal de nível superior. Por meio do Edital n. 4 de 4 de dezembro de

1997, foi aberta uma convocatória às IES para que “realizassem ampla discussão

com a sociedade científica, ordens e associações profissionais, associações de

classe, setor produtivo e outros setores envolvidos, e encaminhassem propostas

para a elaboração das Diretrizes Curriculares dos Cursos de Graduação, a serem

sistematizadas pelas Comissões de Especialistas de Ensino de cada área.” (Brasil,

1997)

Em documento síntese do Fórum de Pró-Reitores de Graduação das

Universidades Brasileiras (FORGRAD), a avaliação do processo de construção das

Diretrizes Curriculares é de que apesar das dificuldades apresentadas, tem

“proporcionado a reflexão, a análise e a crítica ao modelo de ensino superior,

gerando a concepção de propostas inovadoras e criativas por parte dos educadores”

(FORGRAD, 2000, p.3)

Numa análise geral, pesam prós e contras a esse novo desenho de

organização do ensino superior no país. É consenso a avaliação de que foi

importante destituir a lógica burocrática dos currículos mínimos estabelecidos pela

LDB de 1971. Entretanto, as críticas que pesam sobre essa política de flexibilização

questionam principalmente a intencionalidade das mudanças, considerando-a

resposta às pressões do mundo do trabalho pela adaptação da formação à lógica

produtiva, favorecendo assim o alargamento da educação privada mercantil. O risco

de “naturalização do espaço universitário como campo de formação profissional em

detrimento de processos mais amplos, reduzindo, sobretudo, o papel das

universidades” é uma preocupação a ser considerada. (CATANI et al, 2001)

Na área da saúde, diferente de outras áreas, o processo de elaboração das

DCN foi fundamental para a explicitação da responsabilidade das instituições, sejam

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públicas ou privadas, com a formação de pessoal adequado para a

operacionalização do sistema público de saúde do Brasil. Essa conquista, ainda que

não tenha agradado a todos, representa um avanço importante no acúmulo de

políticas alinhadas com o direito à saúde expresso na Constituição. É um documento

legal do Ministério da Educação que reconhece o que no setor saúde vem sendo

discutido desde os meados da década de 70 – ou seja, a necessidade de um

processo de formação adequado às necessidades sócio-epidemiológicas, e dotado

de suficiente abertura para promover mudanças na forma de conduzir o processo de

formação.

Essa idéia, de acordo com posição de Feuerwerker e Ceccim (2004, p.1402),

expressa a concepção de que: [...] A universidade exerce um mandato público, socialmente outorgado, e não uma soberania acadêmica como se a formação profissional superior, a produção de conhecimento, a produção científica e tecnológica ou a promoção da informação, da arte e da cultura pudessem ser independentes dos interesses da sociedade ou da sua relevância pública.

Feuerwerker (2004, p. 24), analisando problemas e desafios da educação dos

profissionais de saúde face às novas diretrizes curriculares, reafirma, na condição de

porta-voz do Ministério da Saúde, que “é indispensável que produção de

conhecimento, formação profissional e prestação de serviços sejam tomados como

elementos indissociáveis de uma nova prática” - condição que exigirá mudanças de

concepções e prática, mas também de relações de poder no cotidiano de cada

instituição.

O texto resultante, precisa ser entendido como um importante ganho na arena

das disputas políticas entre os interesses públicos e aqueles de natureza particular,

não foi consensual, mas a aproximação institucional do Ministério da Saúde com o

da Educação, apoiado na definição legal da competência do Sistema Único de

Saúde, prevista no artigo 200 da Constituição, de “ordenar a formação de recursos

humanos na área de saúde”, criou a viabilidade histórica dessa inflexão. (Brasil,

1988)

Essa aproximação interministerial precisa ser lida também como a

participação de grupos e pessoas, que de dentro do espaço acadêmico e do serviço,

vocalizaram por meio de suas representações essa intencionalidade – que vinham

sendo pontuadas sistematicamente, em diferentes frentes de trabalho, a pelo menos

duas décadas.

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O texto final incorpora, na definição das competências e habilidade gerais

comuns a todos os cursos da área da saúde, elementos importantes na perspectiva

tanto de um novo fazer pedagógico, como de um novo perfil de profissional a ser

formado. Ao incluir no campo das competências o trabalho com indivíduos e

coletivos em todos os níveis de atenção; da habilidade de tomar decisões no

contexto de sistema de saúde, do desenvolvimento de qualidades associadas à

comunicação, à liderança e à gestão de processos de trabalhos, as DCN expressam

concordância com um perfil de egresso mais ativo, autônomo em relação ao seu

processo de aprendizagem e de trabalho. (BRASIL, 2001)

Para Zilbovicius (2007, p.75), as DCN: [...] parecem indicar uma mudança no eixo de formação do profissional, na medida em que apontam para conceitos de cunho sócio-pedagógico aliados à fundamentação técnica. De forma claramente explícita, as DCN delineiam competências que dizem respeito à inserção do futuro trabalhador da saúde em uma sociedade complexa e multifacetada - na qual os processos de diagnóstico e tratamento são permeados por determinados contextos sócio-econômicos - e, para tal, faz-se necessária uma abordagem pedagógica que contemple essas necessidades.

É verdade que com isso não está tudo resolvido; ao contrário: a despeito da

existência temporal de um limite para que os cursos se ajustassem às diretrizes,

estamos hoje ainda muito distantes do que se imagina razoável. Estudo que avaliou

a adesão dos cursos de odontologia às DCN, envolvendo 97 projetos pedagógicos

depositados no sistema INEP, nos anos de 2002 a 2006, concluiu que é ainda

parcial essa adesão e identifica as seguintes características sinalizadoras: Currículo tradicional, constituído de disciplinas isoladas: quase sempre fundamentado no currículo mínimo; Ciclos básicos, pré-clínicos e clínicos, Ausência de integração com a rede de serviços, Projeto Pedagógico do Curso (PPC) redigido de forma a reproduzir parte das DCN, mas sem correspondência com a realidade observada pelo avaliador” (HADDAD et al., 2006)

Como aponta Abranches (1987, p.7) “a política e a tecnologia da política

social têm natureza complexa”, o seu núcleo é o da dinâmica das necessidades e

interesses humanos e seu desdobramento envolve escolhas, campo de forças onde

pesam valores arbitrários e propostas técnicas diversas.

Nesse caso, é a visão de saúde como direito, expressa tanto no modo de

ensinar e como de operar o sistema público de saúde, contrapondo-se a uma linha

de pensamento e ação neo-liberal, que vê a saúde e o setor uma perspectiva

mercadológica. (LAMPERT, 2002)

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Ao que tudo indica, com a aprovação das DCNs, algum grau de tensão se

produziu no interior daS universidades. Ao serem interrogadas sobre o perfil do

egresso, e indiretamente sobre a quem interessa determinado tipo de profissional e

a quem tem beneficiado historicamente seu modelo de formação, alguns

posicionamentos ficaram mais claros. Explico: pela primeira vez a orientação legal

alinhou-se com uma visão francamente defensora do interesse público, o que

descortinou as adesões e também as resistências e contraposições.

Para acompanhar a fase da implementação das DCN nos cursos de

odontologia, a Associação Brasileira de Ensino de Odontologia – ABENO, a partir

de 2005, por meio de uma parceria entre Ministério da Saúde e Organização

Panamericana de Saúde, realizou uma série de 63 oficinas, distribuídas em IES

públicas e particulares, com a participação de um total de 3.506 participantes -

docentes e discentes. (MORITA et al., 2007, p.56)

Para aos autores, as oficinas sobre as DCN pretenderam: Se constituir como espaço privilegiado para informar, analisar e discutir com os dirigentes, coordenadores, docentes e discentes dos cursos de Odontologia a sistemática de implantação das Diretrizes Curriculares Nacionais de Odontologia, bem como estabelecer um diálogo interno nas IES visando às modificações necessárias de sua estrutura curricular e desenvolvimento didático-pedagógico.(p. 29)

Zilbovicus (2007, p.155), com base nos relatórios finais dessas oficinas,

chamou atenção para dois diagnósticos: a do desconhecimento, por parte do

conjunto de docentes e discentes, das DCNs aprovadas a pelo menos 3 anos antes

da realização das oficinas e; do incipiente desenvolvimento das mudanças

produzidas no período. Para essa etapa, foram analisados os resultados obtidos

pelo instrumento que avaliou as mudanças segundo três eixos: orientação teórica,

abordagem pedagógica e cenários de prática - cada um com 3 vetores, classificados

de acordo com o estágio de implementação.

Com o mesmo objeto de análise, os resultados do Projeto de Cooperação

Técnica ABENO/OPAS/MS, apresentados por Morita (2007, p.80), concluem que a

inovação está preponderantemente no estágio “incipiente”, o que: [...] apontaria para um processo lento de mudanças nas IES de odontologia porém apontando para um distanciamento sério com relação ao corpo ideológico claramente exposto nas DCN que, de forma clara, determina uma aproximação mais eficaz e contundente com o SUS no processo pedagógico de formação.

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Essa situação é reflexo, tanto da dificuldade de operar mudanças num

sistema educacional que ficou propriamente quase três décadas refém das

definições de grade curricular com detalhamentos excessivos de conteúdos e cargas

horárias, como da resistência ideológica da área da saúde em aderir a propostas

que revisam a racionalidade médica hegemônica, qual seja, a da doença e da

produção de procedimentos e não da produção do cuidado na acepção mais ampla

do conceito de saúde.

5.3.3 PRÓ-SAÚDE

Outras iniciativas convergentes, na forma de políticas ministeriais ou

interministeriais no âmbito da Saúde e da Educação, também têm colaborado no

aquecimento das discussões. São exemplos: a criação dos Pólos de Saúde da

Família que foram os embriões dos Pólos de Educação Permanente e que hoje são

operacionalizados por meio dos Colegiados Regionais e das Comissões de

Integração Ensino-Serviço, estas com a participação das “instituições de ensino com

cursos na área da saúde, por meio de seus distintos segmentos” (BRASIL, 2007); o

Programa de Incentivo a Mudanças Curriculares nos Cursos de Medicina/PROMED

(BRASIL, 2002) que resultou posteriormente em dois editais de seleção de projetos

para o Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em

Saúde/PRÓ-SAÚDE (BRASIL, 2005 e 2008), a criação do Programa de Educação

para o Trabalho pela Saúde/PET-SAÚDE (BRASIL, 2008) e a vigência, desde 2004,

de um Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) com três

componentes: avaliação das instituições, dos cursos e do desempenho dos

estudantes.

Aqui, será dada atenção particular ao PRÓ-SAÚDE, por reunir características

diretamente associadas ao objeto desse estudo. No seu primeiro edital, incluiu os

cursos de medicina, odontologia e enfermagem, ampliando o escopo do antecessor

PROMED, que foi destinado somente às escolas médicas. Já o segundo edital,

abriu para todos os cursos da área da saúde e ao desenho do projeto foram

agregadas estratégias institucionais comuns de mudança – não só por curso, como

foi no primeiro.

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Os cursos de odontologia selecionados no primeiro edital (n=25), em 2005,

estão nesse momento com um cronograma de atividades defasado em dois anos, ou

seja, aguardam a aprovação do projeto de financiamento do segundo ano, quando o

prazo inicial previsto pelo projeto já expirou. Ocorre, então, que avaliações

conclusivas sobre o impacto do Programa na formação dos profissionais de saúde

não foram publicadas. Mas, artigos e relatos de experiência envolvendo os eixos de

mudança, especialmente “cenários de prática” e “orientação pedagógica”, têm sido

publicados ou apresentados nos congressos com temáticas afins.

A concepção do projeto carrega de forma explícita que se trata de um esforço

de articulação entre as instituições formadoras e o serviço, com a finalidade de

provocar mudanças nas graduações da área da saúde e, portanto, garantir a

qualidade de pessoal necessária ao funcionamento do sistema de saúde. (BRASIL,

2005) Desse modo, os processos formativos devem considerar o acelerado ritmo de evolução do conhecimento, as mudanças do processo de trabalho em saúde, as transformações nos aspectos demográficos e epidemiológicos, tendo em perspectiva o equilíbrio entre excelência técnica e relevância social. Espera-se formar cidadãos-profissionais críticos e reflexivos, com conhecimentos, habilidades e atitudes que os tornem aptos a atuarem em um sistema de saúde qualificado e integrado. (p.5)

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6 ANÁLISE E DISCUSSÃO

Esse estudo foi resultado, em parte, da surpresa frente a alguns achados

referentes às idéias e ações que constituíram a trajetória do ensino de odontologia

no país, mas que, ao ficarem reféns do tempo em que aconteceram, perderam a

potência de servirem como fundação do movimento que, ao longo de um pouco mais

de meio século, tem, em maior ou menor intensidade, conduzido às discussões

sobre a educação em odontologia.

Pode-se afirmar que o pensamento sobre o ensino da odontologia no Brasil não

foi apartado do movimento que aconteceu na América Latina, especialmente aquele

da área médica. Entretanto, por apresentar algumas singularidades, penso que a

análise possa ser feita a partir de três momentos datados e que se diferenciaram

tanto pela centralidade que a produção do pensamento sobre o ensino da

odontologia mereceu, quanto pelo lócus de sua produção. São eles:

a) a do movimento engendrado pela ABENO, o que significou a participação ativa da

odontologia brasileira nos fóruns latino-americanos e no fomento de um diagnóstico

e de discussões sobre o ensino no país, nas décadas de 50 e 60;

b) a de docentes ligados à saúde bucal coletiva que, alinhados com o movimento

sanitário das décadas de 80 e 90, constituíram um pensamento sobre o lugar da

saúde bucal na política pública de saúde e, dessa perspectiva, contribuíram com

críticas ao modelo de ensino hegemônico;

c) e uma terceira, abrangendo a última década, ainda em construção, que se

organiza por dentro da academia e é constituída principalmente por docentes que

têm envolvimento com os processos de mudança curriculares, desencadeados no

âmbito das políticas interministeriais da educação e da saúde – retomando a

questão da educação como objeto de reflexão.

Nesse primeiro período, que vai da origem/criação da ABENO, em 1956, ao

encerramento do Plano Piloto de Ensino Integrado em Diamantina, em 1969, foram

anos que abrigaram intenso movimento de discussão sobre o ensino da odontologia,

tanto na América Latina como no Brasil. A presença de uma Associação como a

ABENO criou e catalisou, dentro da academia (pelo menos junto aos coordenadores

dos cursos), um espaço até então inexistente, qual seja: o de gestar idéias e

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propostas que fossem capazes de afirmar uma identidade do ensino da odontologia

no país.

Era um cenário com um total de trinta e dois cursos de odontologia, cinquenta

por cento deles com corpo docente próprio, mas ligados administrativamente a

cursos de farmácia (GUIMARÃES JR., 1961a), orientados por um currículo mínimo

vigente há pelo menos 30 anos: disciplinas básicas e clínicas desarticuladas; forte

ênfase na “prótese” e “operatória dental”; carga horária prevista insuficiente e

escolas com graves problemas em relação à infra-estrutura (laboratórios e

bibliotecas) e ao pessoal docente; prática profissional (quase) exclusivamente

privada liberal, com base na oferta de procedimentos cirúrgicos e reabilitadores para

uma parcela muito restrita da população.

Tempos de parcos avanços científicos relativos às principais patologias

bucais, de estranhamento com os conteúdos básicos e suas possíveis correlações

com a clínica e suas técnicas; tempos de muitas intervenções cirúrgicas-mutilatórias

e de reabilitações totais destinadas a poucos; entretanto, com um mercado de

trabalho interno favorável e em processo de valorização pela própria trajetória de

institucionalização da profissão.

É nesse universo que foram semeadas as idéias de mudança, parte delas

derivadas do alinhamento com o ideário da OPAS, mas, ao que parece, também

com originalidade e determinação própria. A presença do professor Mário Chaves,

há pelo menos uma década transitando entre a organização de um embrião de

saúde bucal pública no Brasil – no Serviço Especial de Saúde Pública – e o

escritório da Organização Pan-Americana de Saúde, como assessor para a Saúde

Bucal, possivelmente tenha sido determinante nos contornos da discussão no Brasil.

É após a segunda guerra mundial que as agências internacionais, e aqui

especialmente a OPAS, recolocaram a questão da saúde fora dos limites do modelo

higienista, predominante até então, e passaram a tratá-la como uma questão

estratégica no processo de desenvolvimento dos países latino-americanos. Daí o

novo papel assumido pela OPAS na formação de profissionais de saúde e sua

orientação para as questões de saúde pública.

Se um marco importante para a educação médica pode ser localizado em

1955, com a realização do Seminário de Medicina Preventiva em Viña del Mar, que

indiretamente influenciou toda a área da saúde, na odontologia o diagnóstico das

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escolas latino-americanas - empreendido por Mário Chaves em 1955 – que apontou

as inúmeras fragilidades e precariedades dos cursos; a criação no Brasil da ABENO

em 1956, que vocalizou a necessidade de mudança dos nossos cursos de

graduação; e a abertura, em 1958, do Curso de Especialização em Saúde Pública

para Dentistas na Universidade de São Paulo foram, sem dúvida, desdobramentos

internos muito importantes no conjunto de iniciativas de formação de pessoal na

área odontológica.

A movimentação iniciada no final da década de cinquenta vai ser fortalecida

pela participação do país nos três Seminários Latino-Americanos de Ensino de

Odontologia, quando muitas idéias já vinham sendo discutidas internamente, e

possivelmente reforçadas por esse contato. A necessidade de qualificação de

pessoal para o exercício docente, a identificação das deficiências do ensino

localizadas na tendência ao excessivo tecnicismo, a limitada preparação biológica e

médica do dentista, a falta de cultura humanística e de uma visão social da profissão

são algumas das conclusões contidas nos Informes dos Seminários.

Como a tarefa aqui colocada é pensar sobre o caráter inovador das idéias que

povoaram os diferentes tempos históricos, vale destacar que nesse período toda a

reflexão sobre o ensino da odontologia no Brasil está ligada à existência da ABENO,

que obviamente tinha no cenário latino-americano seu espelho. Não foi difícil

identificar a dupla de autores que mais escreveram sobre o assunto na época: Mário

Chaves, via OPAS, protagonizando a análise do conjunto das faculdades dos países

da América Latina, e Paulino Guimarães Jr., com a chancela da ABENO, fertilizando

esse novo campo de idéias no país, sendo, portanto, o (farto) material assinado por

este último o principal objeto de análise.

Interessante observar - resgatando a concepção de que a história não é o que

aconteceu, mas aquilo que ainda podemos saber do que aconteceu e, portanto,

escrita a partir de vestígios e estes, guardados ou remanescentes não por desígnios

mas por intencionalidades várias - que a disponibilidade dos documentos desse

período corrobora a idéia de que há um abandono histórico de parte dos fatos e

significações pertencentes a essas décadas. Ainda é possível localizar documentos

relativos a eventos coordenados pela OPAS, pois foram absorvidos em suas

publicações institucionais, mas aqueles referentes à trajetória inscrita pela ABENO,

como instituição, ou por seus pares, nunca mereceram atenção. A manutenção de

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documentos é resultado de um propósito familiar que, reconhecendo a importância

dos inúmeros eventos da época, os mantém sob guarda.

São esses documentos que permitiram recuperar uma lacuna no pensamento

da odontologia e, de alguma forma, inscrever nessa história o esforço de homens

que construíram experiências importantes e inovadoras para a época.

Para análise das principais idéias sobre ensino da odontologia,

preliminarmente, os seguintes documentos são considerados: “Alguns aspectos do

ensino odontológico no Brasil” composto de dois textos: “As escolas de odontologia;

sua missão” e “Significação do ensino integrado na formação profissional”

(GUIMARÃES JR., 1960), ambos contendo reflexões sobre o papel das escolas na

formação dos profissionais; “O Ensino Odontológico no Brasil”, referente aos

resultados do levantamento das condições de organização e funcionamento das

faculdades e cursos de odontologia (GUIMARÃES JR., 1961a); “A experiência

brasileira no aperfeiçoamento de pessoal docente das faculdades de odontologia”

(GUIMARÃES JR., 1962c), documento apresentado no Primeiro Seminário Latino-

americano sobre o Ensino da Odontologia que traça, historicamente, os avanços do

ensino da odontologia no Brasil, e apresenta as ideias do ensino integrado – que

mais tarde constituirá a base do Projeto Piloto de Ensino Experimental.

Mas, que idéias estão ali expressas?

Um grupo de idéias, mais gerais, sobre a mudança necessária para o período,

podem ser relacionadas com o esforço de chamar a gestão dos cursos para

processos de qualificação, apontando o desmembramento, já ocorrido, da

odontologia do ensino médico e a contingência de imprimir alterações na forma de

organizar o ensino e responder às demandas quali-quantitativas da sociedade – que

crescia em ritmo acelerado e pedia respostas restauradoras e reabilitadoras para o

conjunto de problemas odontológicos acumulado.

Os principais argumentos estão referidos à necessidade de planejar a

distribuição dos cursos de forma mais equitativa no território nacional, melhorar as

condições de funcionamento das escolas, acelerar a formação de novos docentes e

de estabelecer estratégias de aprimoramento daqueles em atividade (Guimarães Jr.,

1960 & 1961b).

De acordo com Guimarães Jr. (1960, p.7):

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Não se improvisam professores. A carreira de magistério implica no desenvolvimento paulatino de diferentes aptidões que não são só aquelas exigidas de um profissional comum.

O outro grupo de idéias está referido a um detalhamento complementar e

imprescindível ao estágio anterior, aproveitando o raciocínio do mesmo autor:

Estabelecido que a sociedade espera que as escolas de odontologia formem em número suficiente, profissionais aptos, capazes de atender a suas solicitações no sector específico, devemos nós, professores de odontologia, entendermo-nos a respeito de como pode a escola, melhor atingir a sua meta. (p.12)

Para esse aspecto, há uma resposta categórica: ensino integrado. Apóia-se

na análise de Mário Chaves sobre o predomínio de uma estruturação curricular

rígida - composta de compartimentos estanques entre si e, por conseqüência,

impermeável às influências do meio – e apresenta a concepção do ensino integrado,

simbolizado como uma diagonal:

[...] A linha diagonal representa a intromissão das cadeiras pré-clínicas e clínicas nos ciclos de estudos fundamentais; a intromissão nessa concepção, deverá ser progressiva de forma que, com seu avanço, os ensinamentos das cadeiras básicas vão diminuindo de freqüência e intensidade. (GUIMARÃES JR., 1960, p.16)

Utiliza para exemplificar seu entendimento de ensino integrado uma metáfora

simples, mas muito precisa: a de um enorme e moderno edifício, onde só se

concebe a existência de vários andares por que há múltiplas formas de

intercomunicação entre eles (escadas, elevadores, depósito comum de lixo, poços

de luz etc.) e, porque há um planejamento de fachada para atender a fatores como

clima e tempo – próprios de cada país.

Ao voltar o olhar para o currículo de odontologia vigente na época, diz ser

uma heresia e o compara a um edifício de três pavimentos, cada um com inúmeras

unidades isoladas e autônomas. O primeiro correspondente ao ensino das cadeiras

básicas, ocupando um terço do volume total da construção, o segundo menos

volumoso representando as disciplinas pré-clínicas, e o último composto pela clínica

– e conclui:

O edifício, no conjunto, não tem harmonia; não dá, senão superficialmente, impressão de unidade, impressão que não resiste a exame mais acurado; não apresenta, também, janelas de vão adequado, nem escadas de incêndio [...] De que valem fundações sólidas se as máquinas, caldeiras de aquecimento central, compressores de ar, enfim, outros recursos [...] estão encerrados – de modo seguro, é certo, mas de forma isolada – dentro de

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compartimentos autônomos? [...] Cadeiras de aplicação, não beneficiadas pela bagagem das cadeiras básicas, são apartamentos sem luz elétrica, sem aquecimento central, sem elevadores e sem sistema de água. Quanto mais alto colocados, mais se agravam esses inconvenientes; quanto mais luxuosos na aparência, tanto mais lamentáveis como um todo. (p. 13-14)

Olhando essas idéias, de quase meio século atrás, o que primeiro sobressai é

a atualidade dos temas; não seria estranho apresentar um fragmento de texto como

o escrito acima para discutir a situação dos cursos de odontologia nesse século - a

integração básico-clínico e a formação docente, por exemplo - pois continuam sendo

um calcanhar de Aquiles, segundo a própria auto-avaliação das escolas que se

propuseram a investir em mudanças na formação (CASOTTI et al, 2007)

Somando a esse raciocínio a perspectiva do referencial de inovação adotado

por Messina (2001), para quem todo o processo inovador deve provocar a alteração

de sentido a respeito da prática corrente e ter caráter intencional, sistemático e

planejado, em oposição às mudanças espontâneas, estamos então diante de idéias

inovadoras, que disputaram processos concretos de mudança (reforma curricular e

plano piloto de ensino integrado) e que, por razões a serem melhor compreendidas,

se tornaram secundárias na consolidação do modelo atual de ensino da odontologia.

Com a proposta de mudança curricular em 1962, após trinta anos de vigência

do mesmo currículo, aprovado em 1931, a ABENO, com apoio da CAPES, reuniu,

em 1961, professores de odontologia de várias regiões do país para sugerir os

princípios que deveriam nortear um processo de mudança. Esse encontro, que

durou três dias, teve como produto o documento “Estudo para a Reestruturação do

Currículo das Faculdades de Odontologia no Brasil” (GUIMARÃES JR., 1962a),

adotado como ponto de vista da ABENO sobre a mudança curricular. Para análise

desse componente, foi utilizado, além do documento citado, o “Ante-projeto para a

modificação do currículo odontológico” (GUIMARÃES JR., 1961b), que

possivelmente alimentou as discussões iniciais sobre o tema.

Ambos os documentos têm como lastro o mesmo diagnóstico: de que as

falhas na organização curricular existiam, que as tentativas introduzidas sem

planejamento não tinham tido êxito e que esse assunto precisava ser enfrentado de

forma mais consistente – mesmo entendendo ser somente parte do problema

existente, este já conhecido desde o levantamento das condições de ensino das

escolas de odontologia, realizado em 1959.

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No âmbito do currículo, destacaram-se como problemas principais a

conceituação das diversas “matérias de ensino” (grifo do autor) - relativa à

conjugação de matérias diferentes, duplicação de cadeiras e a designação obsoleta

de algumas - acrescida da atrofia de alguns setores importantes na composição

existente. (GUIMARÃES JR., 1962a)

As questões com algum caráter inovador podem ser identificadas como: a)

criação de 350 horas de “estágio em policlínica” (grifo do autor) – entendido como

“um período probatório da capacidade profissional adquirida durante os anos

escolares” e uma resposta concreta à sociedade, pois o ambulatório seria concebido

como uma forma de “assistência social”, localizado no interior ou não da faculdade;

b) a inclusão dos conhecimentos de Odontologia Social em três períodos do curso,

incluindo conhecimentos de bioestatística e outros de interesse para a saúde

pública; c) a quebra dos monoblocos independentes (ciclo básico e clínico) até então

vigentes, com a previsão de entrada de disciplinas pré-clínicas e clínicas logo no

início do curso. (GUIMARÃES JR., 1961b; GUIMARÃES JR., 1962a)

Com exceção da carga horária clínica, que foi absorvida na forma disciplinar

de Clínica Integrada, as demais questões guardam atualidade e são objetos de

intensa discussão nos processos contemporâneos de mudança do perfil dos

profissionais da saúde e, consequentemente da reformulação das matrizes

curriculares dos cursos de odontologia. Em muitos casos, a discussão ainda está no

mesmo estado da arte dos anos de 1960, ou seja, da discute-se a pertinência

dessas propostas e não as experiências e as possibilidades de qualificação delas.

O documento também destaca a importância de definir carga horária prática e

conceituá-la, a fim de minimizar o diagnóstico de que está “comprovado que

numerosas faculdades padecem dos males de um teorismo excessivo, resto das

tradições do magister dixit [...]”. (grifo do autor) Defende que aulas práticas são

aquelas em que há “o exercício prático individual do aluno e não a demonstração

prática´, feita pelo docente.” (GUIMARÃES JR., 1962a, p.12)

Importante atentar que as propostas de reformulação do currículo, assumidas

pela ABENO, estão construídas sobre o levantamento realizado da situação das

escolas e, ainda que disputassem uma visão mais integrada de ensino, com uma

previsão de carga horária para a formação em saúde pública (odontologia social) e

uma clínica integrada assentada no atendimento da comunidade, ao que parece não

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traduzia toda a potência das idéias em circulação na época. Guimarães Jr. (1961a,

p.44), ao concluir o documento que apresentou os dados do levantamento e propôs

ações necessárias para a melhoria dos cursos (muitas contidas na proposta de

reforma curricular), afirma:

Pode parecer a muitos que as sugestões ora apresentadas carecem de ambição. No entanto, a análise dos dados do “levantamento”, traduzindo o panorama real do ensino odontológico no Brasil, não é de molde a permitir planos inexeqüíveis por demasiadamente pomposos. Estamos certos de que se nos próximos dez anos estiverem sido concretizadas integralmente as medidas ora propostas, será então possível, com base segura, traçar novos programas, empreender novas tarefas, se não de maior alcance, pelo menos de mais bela aparência.

Nesse caso, recupero o conceito de Jorge (1996, p. 54) que situa inovação

como mecanismos e processos, sistemáticos, que têm o objetivo de oferecer

alternativas reais de mudanças “[...] em um contexto em que ‘a história mostra não

ter havido nunca uma ruptura radical entre o novo e o velho’”.

Se as primeiras idéias de novo modelo de ensino começaram a ser

veiculadas no início dos anos 1960 (GUIMARÃES JR., 1960; 1961a; 1961b; 1962b;

1962c), em resposta ao diagnóstico dos limites da organização curricular

predominante na época, a possibilidade de materializá-las é oportunizada em 1964 –

quando da criação da “Comissão de Planejamento da Formação de Odontólogos” no

interior da Diretoria de Ensino Superior (DESu) no Ministério da Educação e Cultura,

que tinha como objetivo apresentar projetos de melhoria do ensino odontológico no

país.

É no interior dessa Comissão que se aprova o Plano Piloto de Ensino

Integrado, desenvolvido na faculdade de odontologia de Diamantina-MG, entre os

anos de 1965-69. De acordo com o documento: “Procurava-se um caminho para

fugir à inconveniência de compartimentagem estanque separando matérias básicas,

clínicas e pré-clínicas”. (MEC, 1970)

Para fins de análise, aqui é utilizada parte do documento “Uma Experiência

Educacional: Plano Piloto de Ensino Integrado” (MEC, 1970), estando nele contido o

projeto inicial com os antecedentes históricos e as bases teóricas do projeto –

ficando as demais seções, como a da avaliação do desenvolvimento do Plano - para

uma análise posterior, e “As iniciativas para a melhoria do ensino odontológico no

Brasil” (GUIMARÃES JR., 1962b) – encaminhado pela ABENO à Associação

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Brasileira de Odontologia (ABO) que, após apreciação e análise pelo Conselho

Executivo, emitiu resposta favorável ao proposto pelo estudo. (ABO,1962)

O detalhamento das bases teóricas do Projeto foi apresentado sob dois

aspectos: dos objetivos curriculares e da concepção do currículo integrado. Para

definir os objetivos curriculares, de acordo com o autor, foram adotadas duas

questões: “qual a qualificação que desejo no profissional específico?” e “qual a

viabilidade do aproveitamento desse profissional à sociedade peculiar a que se

destina?”. (MEC, 1970. p. 7-8) Com base nessa reflexão, definiram-se os objetivos

do Plano: [...] conseguir a formação de um profissional capacitado a atender às exigências mais frequentes da comunidade brasileira – no tocante a seus serviços especializados, possuidor de uma sólida bagagem de conhecimentos fundamentais, capaz de perceber e acompanhar a evolução de seu setor de atividade – e cônscio da necessidade de permanente atualização científico-técnica ao lado de constante informação de cunho cultural.

O currículo integrado, estratégia operacional escolhida para cumprir o Plano

Piloto, foi descrito como “aquele em que todos os objetivos se entrosam dando

origem a uma unidade orgânica”, destacando que há:

[...] diferentes ‘níveis de integração’, que transcendem da simples noção de instrução integrada – transmissão, globalizada, de informações múltiplas. Efetivamente, se os objetivos curriculares se traduzem por vivência especial – soma de experiências que levam à atuação diferenciada e específica, dita ‘profissional’ – apoiada em conhecimentos, habilidades e atitudes, as atividades curriculares devem ser interligadas nesses três níveis, a saber: a) integração no ensino; integração do estudante nas metas profissionais; integração do estudante, futuro profissional, na coletividade a cujo serviço se destina.” (grifo nosso) (MEC, 1970, p. 9)

Propõe para a organização do ensino integrado um núcleo abrangente

chamado unidade curricular – onde se encontram “todas as disciplinas porventura

capazes de ter algo a ver com aquilo de que ela trata” (MEC, 1970, p.10) –

escapando da idéia tradicional de integração do tipo vertical. Nesse sentido: O desenvolvimento da unidade curricular assume, pois, o aspecto de uma espiral. O espaço cônico delimitado pelo traçado da espiral pode alargar-se indefinidamente, numa perspectiva de horizonte cada vez mais amplo, sem solução de continuidade. (MEC, 1970. p.10)

Chama a atenção que é no planejamento integrado, realizado pelo grupo de

docentes participantes de uma unidade curricular, que se discutem os conteúdos e a

ordem de inserção dos mesmos – potencializando as relações mútuas e, por

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conseqüência, o sucesso do processo de ensino-aprendizagem. Destaca a vital

importância do comportamento docente: Conceituada dêsse (sic) modo a unidade curricular, é preciso afirmar que ela só tem vida real se o corpo docente nela interessado se comporta como as figuras de uma orquestra, atuando em perfeita sincronia. (MEC, 1970. p.10)

A integração do estudante, segundo item do ensino integrado, é abordada em

duas vertentes, às vezes concomitantes, que é o da formação profissional, para o

qual colaboram todos os esforços didáticos de ensino-aprendizagem organizados

pela escola, e o do lugar que este ocupará na comunidade, com a escola

propiciando a inserção do estudante-profissional precocemente no meio, e

estimulando-o ao hábito da interrogação – que o levará ao estudo e a ampliação

contínua dos horizontes na vida profissional.

Historicamente, esse projeto, levado a termo na forma de um plano

experimental envolvendo duas turmas de graduandos, tem um duplo valor: o

simbólico, que é representado tanto pelos conceitos inovadores que permeavam a

proposta, como pelo prestígio alcançado pela ABENO e seus atores na

institucionalização dessa experiência, e o valor concreto que foi o de executar o

Plano quando ainda predominava o ensino convencional e as grandes discussões

ainda giravam em torno de macro questões como a melhoria de infra-estrutura, a

formação e a qualificação de pessoal docente para as escolas em funcionamento.

Guimarães Jr. (1962b, p. 16) argumentando sobre a proposta de melhoria do

ensino de odontologia no país, mais especificamente preparando a apresentação da

idéia da escola experimental - o que para o autor responderia também pela formação

de novos quadros docentes tanto pela intencionalidade do ensino conduzido com os

alunos, como pela exposição de docentes já em exercício com uma nova forma de

ensinar - afirma:

As experiências parciais já realizadas como tentativas de modificar radicalmente as atitudes tradicionais, têm demonstrado que as modificações de métodos pedagógicos e da filosofia do ensino, mesmo nas escolas de melhor padrão, processam-se de forma de tal modo lenta que conduz ao risco de que seja introduzida uma modificação, - válida no passado – quando já se encontra ultrapassada.

O Plano Piloto foi factível, pois teve a adesão de um grupo que participou

diretamente na execução do projeto. Seu mentor - Prof. Paulino Guimarães Jr. -

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mudou-se para Diamantina e a maior parte dos docentes – de várias universidades

do país - deslocava-se de suas cidades para permanecer lá durante o tempo

necessário para desenvolver a tarefa na qual estavam implicados. Nesse regime de

trabalho, que foi minuciosamente acompanhado e avaliado nas mais diferentes

vertentes de mudança, está patente que houve a adesão de um grupo e, ao que

parece, na condição de autores permanentes do processo.

Essa experiência representa, no período analisado, a radicalidade prática das

idéias inovadoras que vinham sendo gestadas desde o final dos anos cinquenta do

século passado. Olhando-a pelo conceito de inovação proposto por Mitrulis (2002),

parece que é um exemplo muito bem acabado de intencionalidade e visão

antecipadora: [...] inovar é um processo de tradução, de decodificação da novidade pura em novidade aceitável, passível de ser aplicada, com o objetivo de melhorar aquilo que existe, de introduzir em dado contexto um aperfeiçoamento, um melhor saber, um melhor fazer e um melhor ser. [...] A ação inovadora é da ordem da aplicação, entendida esta não como resultado de uma ação determinada, mas de um processo. Ela supõe uma intenção de mudança dentro de um projeto acalentado pelos atores envolvidos, uma intenção expressa em uma visão antecipadora, sob forma de objetivos definidos, ou uma intenção que se manifesta em uma reação de protesto contra uma situação dada.” (p. 231)

O Plano Piloto carregava e acalentava perspectivas de dar a conhecer novas

possibilidades de ensino para o conjunto da sociedade, de cumprir objetivos de

formar melhores profissionais e criar oportunidade para capacitar, na prática,

docentes já em exercício - de onde se pode depreender que para aquele contexto

histórico, quiçá para os dias de hoje, o projeto inscreve-se numa perspectiva

inovadora.

Olhando retrospectivamente, o que se vê, então,são duas décadas de intensa

mobilização da odontologia, movimento de amplitude maior que o cenário brasileiro,

mas que aqui dentro produziu efeito: seja na condução de uma avaliação da

qualidade de todos os cursos em funcionamento, na contribuição para a reforma do

curricular, nos esforços de formação docente, na presença de uma pauta

permanente sobre a função social do curso de odontologia, na criação de curso de

pós-graduação em saúde coletiva, até a ousada proposta de um curso piloto

baseado em princípios de integração curricular e interface com a comunidade.

De acordo com a análise proposta, de lançar um olhar para a história do

ensino da odontologia segundo uma periodização, não linear, mas sugestiva de

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conter características singulares, pode-se encerrar com a clareza que a afirmação

de que a odontologia não tem história e acúmulo sobre o objeto em estudo não

condiz com os vestígios apresentados.

A pergunta que deriva, imediatamente, ao contato com essa interpretação do

período é: por que essa memória ficou refém no tempo? Quais os motivos que

podem ajudar a entender o abandono das idéias inovadoras? Para onde se deslocou

à produção do pensamento sobre o ensino da odontologia?

Uma tentativa de delinear um entendimento é avançar para o próximo período

sem perder de vista alguns fatos oriundos desse mesmo. No plano macro, na

década de setenta, como descrito, houve franca desaceleração de investimentos da

OPAS na área de formação de profissionais de saúde – retomando seu foco para os

sistemas locais de saúde. Especificamente, no interior do campo acadêmico da

odontologia, uma conjunção de fatores pode ter convergido para uma desaceleração

das discussões sobre o ensino.

Um dos fatores que pode ter contribuído foi à natureza do investimento na

formação de docentes, que a despeito do discurso de integração curricular, estava

centrado na valorização e estruturação das especialidades – lugar histórico de

compartimentação dos saberes e de fraca articulação disciplinar. Conforme balanço

do professor Paulino Guimarães Jr., para os quinze anos de existência da ABENO,

foram feitas “tentativas iniciais de entusiasmar os integrantes do corpo docente das

Escolas e Faculdades de Odontologia brasileiras, por um programa de melhoria

individual dos padrões científico-técnicos, admitindo que estes reflitam na qualidade

do ensino ministrado” e acrescenta que essa iniciativa estava alinhada com a

“[...]doutrina aceita de que professor que não se mantém atualizado em sua

especialidade é elemento nocivo ao ensino em cujas fileiras milita” (GUIMARÃES

JR. apud MENEZES & LORETTO, 2008, p.62-63) . É de fato complexo, senão

contraditório: ao mesmo tempo em que se fazia necessário ampliar a capacidade

técnica dos docentes em exercício, a saída encontrada, com a oferta de bolsas de

estudos no exterior, ofereceu um aprendizado na lógica das especialidades, num

sistema de ensino diverso daquele que a ABENO acalentava, via ideário da OPAS,

qual seja, de um ensino ajustado às necessidades do país, retardando o máximo a

formação de especialistas (OMS, 1962).

Outro componente que merece reflexão foi a aposta de que a especialidade

“odontologia preventiva e social” teria potencial disseminador de idéias de uma

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prática odontológica socialmente mais comprometida e, portanto, de um ensino que

integrasse as disciplinas em torno desse objetivo. Nos três seminários latino-

americanos há destaque para esse tema; particularmente, no segundo seminário, há

a defesa da criação de unidades ou departamentos de odontologia preventiva e

social, que teriam entre os vários objetivos listados o de “inculcar nos futuros

odontológos uma firme atitude preventiva mediante o esforço coordenado de todos

os Departamentos de Faculdade ou Escola, com o fim de converter a prevenção em

uma verdadeira filosofia da profissão.” (SEGUNDO..., 1965, p.13). Como a

prevenção até então estava circunscrita à especialidade, depreende-se que o

esforço de coordenação seria, então, resultado de um trabalho dos futuros

departamentos, ou seja: seriam eles o motor da mudança nos cursos de odontologia.

Mas, na sua construção, a especialidade assumiu aqui no Brasil, um duplo

objeto: o do ensino e o da contribuição com a estruturação de um sistema público de

saúde bucal. Dos dois, foi no desenvolvimento do segundo que a especialidade

alcançou, desde muito cedo, o reconhecimento pela qualidade das investigações e

das proposições políticas para o setor, ocupando um lugar de destaque na

construção tecnocientífica do campo.

A despeito de ter ocorrido a introdução da disciplina de Odontologia Social e

Preventiva nos cursos de odontologia, a influência da especialidade nas mudanças

do ensino não foi expressiva, estando longe de ter conseguido dar conta da

dimensão do papel que lhe foi atribuído. O primeiro equívoco foi pensar que uma

disciplina poderia promover sozinha um processo de mudança curricular dessa

envergadura, ou coordenar outras disciplinas nesse sentido. Imaginemos o cenário:

presença de antigas e tradicionais especialidades cirúrgicas e reabilitadoras,

marcadamente com maior prestígio que a recém constituída “odontologia social e

preventiva”, ausência de uma rede de assistência pública em saúde bucal que

justificasse qualquer mudança, um número limitado de profissionais formados para

uma população urbana que crescia, e o exercício liberal da profissão como garantia

de todo egresso. Metaforicamente, pode-se afirmar que o cenário era árido e

pedregoso.

Outro fato que impactou nas discussões foi a perda, em 1971, do Prof.

Paulino Guimarães Jr., que um mês depois de sua morte iniciaria um novo mandato

como presidente da ABENO, e no discurso de posse, que já tinha redigido, acenava

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para a inserção da Associação nas discussões, não mais só da odontologia, mas

naquelas referentes à política de ensino superior no país.

Já há alguns anos, como Consultor para Assuntos de Educação de Nível

Universitário do Centro Nacional de Recursos Humanos do Instituto de Pesquisas

Econômicas Aplicadas/IPEA – Ministério do Planejamento, vinha alimentando a idéia

partilhada com Prof. Dr. Mário Chaves, da necessidade da criação de uma

Universidade capaz de integrar a educação médica com as outras profissões da

saúde – configurando uma Universidade da Saúde.

Essa idéia, não é estranha na recente pauta das inovações do ensino superior

no Brasil, guardadas as devidas proporções, pode-se compará-la a proposta da

Universidade Nova, defendida pelo atual reitor da Universidade Federal da Bahia,

que tem como a principal proposta “a implantação de bacharelados

interdisciplinares, mediante uma pré-graduação em cultura universitária geral antes

da carreira profissional de graduação e a formação científica ou artística da pós-

graduação”16

Na Conferência Pan-Americana de Educação Médica, Guimarães Jr. (1969)

defendeu que só dessa forma o “conjunto dos profissionais estará apto para servir

como uma equipe, atendendo as múltiplas exigências das coletividades, no tocante

a saúde dos indivíduos e do grupo” (p.3). Imaginava e defendia que a Universidade

poderia prover uma sólida formação inicial comum e garantir, posteriormente, uma

escolha adequada do caminho a seguir, algumas fases da formação comuns ou

complementares – reforçando “a consciência de que pertencem a um grupo único

em que conhecimentos e habilidade se devem completar sob o signo da ética

profissional comum e impecável” (p.4).

O desaparecimento do Prof. Paulino Guimarães - por sua defesa de um

sistema de educação superior socialmente comprometido, pela capacidade ímpar de

aliar idéias inovadoras a uma permanente disposição de dar-lhes materialidade -

influenciou tanto os rumos da ABENO como o rumo das discussões mais ampliadas

da formação em saúde no Brasil.

Setorialmente, como mostra o Quadro 2 , a ABENO retrocedeu e passou a

concentrar-se na temática das pós-graduações e, portanto, das especialidades e da

16 http://www.eagora.org.br/arquivo/Universidade-nova-nem-Harvard-nem-Bolonha/ Acesso em jul., 2009.

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pesquisa, exatamente numa década em que o mundo estava voltando-se para o

desafio de formar e organizar os serviços na lógica da Atenção Primária em Saúde.

Esse conjunto de fatores imprimiu à década de setenta uma desaceleração

das pautas sobre a finalidade e a qualidade do ensino de graduação em odontologia.

A tentativa de retomar essa questão, em 1976, com o lançamento do Programa

Latino-americano de Inovações em Educação Odontológica, financiado pela

Fundação W. K. Kellog, não representou avanços.

Houve incorporação do aspecto tecnológico como uma variável da inovação

curricular, e parte dos projetos apresentados gravitou em torno de novos “métodos

instrucionais”, havendo orientação aos cursos para “aumentar a produção e

utilização de multimeios e desenvolvidos centros de recursos audiovisuais”. (LOBO,

1976, p.74) Com essa “novidade”, parece que as discussões da academia sobre as

respostas necessárias da odontologia à realidade brasileira sofreram mais um recuo

importante. Ademais que o tema “integração ensino-serviço” tenha tido espaço,

Chaves (1976, p. 51-55) chamava a atenção para o fato de a odontologia estar fora

do processo de “regionalização docente-assistencial” em curso no país, perdendo a

possibilidade de experimentar a integração multiprofissional.

A década de oitenta, já entrando no segundo período de análise, começa a

materializar os anseios de mudança – da abertura democrática do regime ditatorial

às reivindicações do movimento sanitário - que vieram se fortalecendo desde o final

da década anterior. A proposta de um sistema de saúde universalista e as

discussões sobre os orientadores dos modelos tecnoassistenciais vindouros

aglutinaram aqueles que se identificavam politicamente com a redemocratização e

compreendiam a importância estratégica daquele momento para o desenho de um

novo sistema de saúde no Brasil.

Na odontologia, a vocalização mais orgânica foi feita pelo Movimento

Brasileiro de Renovação Odontológica/MBRO, que reuniu tanto docentes das

universidades como trabalhadores dos serviços públicos. É um movimento que, ao

mesmo tempo é representado por professores, especialmente da área de saúde

coletiva, não tem a universidade como seu lócus de referência – mas produz e faz

circular a crítica ao ensino do lugar ocupado pelo movimento sanitário: conferências

de saúde, encontros de estudantes e fóruns próprio do serviço.

De fato, as escolas de odontologia e a maioria do seu corpo docente não

estavam preocupadas com a ampliação do acesso aos serviços ou com o

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fortalecimento de políticas públicas na área, pelo contrário, muitos tinham sido

beneficiados com o pagamento direto por prestação de serviços ao Estado. Desde a

metade dos anos setenta, a situação ficou cada vez mais generosa para prática

liberal: crescimento das pós-graduações, serviços públicos residuais que obrigavam

o consumo de serviços particulares, número de egressos compatível com o mercado

e a alta prevalência das principais doenças bucais foram fatos que blindaram a

odontologia de qualquer perspectiva de mudança.

Assim, não fica difícil entender o porquê da lacuna, no interior das instituições

de ensino, de um pensamento sobre a formação face às necessidades sociais e

epidemiológicas da realidade brasileira. A lógica das especialidades clínicas é

hegemônica, há supremacia dos procedimentos em detrimento do cuidado e do

individual sobre o coletivo.

A saúde coletiva, que ficou na berlinda da formação, foi ocupando espaços

estratégicos fora da academia, tece interlocuções e formula possibilidades de um

novo cenário de ensino e serviço. As posições expressas na VII Conferência

Nacional de Saúde dão mostras da articulação que a área conseguiu estabelecer, a

despeito dos rumos assumidos pela academia.

Entretanto algumas questões permanecem:

- onde ficaram aqueles docentes que na década de 60 participavam das discussões

sobre um ensino comprometido com a realidade brasileira, num modelo integrado e

com propósito de formar profissionais para trabalhar em equipe? era um grupo

inexpressivo que foi amalgamado por aquele que ocupou, de forma conservadora, o

interior da academia nos anos 70?

- de onde vinha a força das idéias inovadoras? resumia-se a uma questão pautada

pelas agências externas? foi uma proposta personalizada, que nunca foi partilhada

pelo coletivo?

- as mudanças de rumo, com a melhoria das condições de infra-estrutura dos cursos

e os investimentos na pós-graduação, foram suficientes para desfazer os interesses

de pensar a contribuição da odontologia para a saúde coletiva do país?

Enfim, nesse segundo período de análise, descontados eventos pontuais, o

discurso da necessidade de reorientar a formação vem a partir de espaços e grupos

que estão articulados na construção de uma rede de serviços pública e universal. O

foco, portanto, da produção científica ficou concentrado nos modelos

tecnoassistenciais e na gestão da rede que se iniciava.

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A avaliação crítica sobre a formação dos profissionais - e a co-

responsabilidade das IES nessa questão - esteve sempre presente mas, por ser

oriunda dos movimentos ligados ao serviço e, portanto, feita de fora da academia,

tornou-se na prática uma pauta secundária.

Os motivos do não envolvimento da academia nessa discussão são na

essência os mesmos que obstaculizam a implantação das DCN para os cursos de

odontologia. Ou seja: a disputa entre a lógica pública e a de mercado. A primeira

que reconhece a saúde bucal como direito e fortalece a formação de profissionais

generalistas para garantir a estruturação da política pública de saúde bucal no país;

e a segunda que direciona os projetos político pedagógicos para as especialidades,

reforça o exercício privado da profissão e aponta o setor público só como uma

alternativa de rendimentos fixos pelo profissional.

Como a odontologia só entrou pontualmente nos projetos de Integração

Docência Assistência e do Programa UNI - Uma Nova Iniciativa na Educação dos

Profissionais de Saúde: União com a Comunidade, retardou também a incorporação

de uma discussão mais consistente e atual sobre os temas da educação: exercício

da docência, diversificação de cenários e metodologias ativas de ensino-

aprendizagem.

Com a criação do SUS e a abertura de novos espaços de inserção, a saúde

coletiva cresceu enquanto especialidade e uma nova geração de técnicos foi

formada, somando-se à existente, ocupando lugares institucionais importantes na

defesa de uma odontologia pública, ao mesmo tempo que respondia as exigências

acadêmicas de pesquisa na especialidade. Essa característica é marcadamente

atual e fez com que o trânsito da especialidade entre o serviço e o ensino

aumentasse.

Entretanto, mais centrada no campo da própria especialidade, não se

constituiu num grupo de referência para as questões da educação – diferentemente

da medicina, que ao longo dessas década criou suas próprias referências para o

pensamento na educação médica estrito senso.

Nesse vazio, a ABENO vem trabalhando para resgatar a condução da

temática do ensino da odontologia. Sua participação nas discussões preliminares

das DCN, a sistemática de reuniões com os coordenadores dos cursos, a

manutenção de uma revista e a iniciativa das Oficinas de acompanhamento da

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implantação das DCN têm dado mostras dos esforços feitos para reocupar um lugar

que foi, político-ideologicamente, abandonado nas últimas décadas.

Essa retomada é de certa forma confortável, pois passa apenas a assumir o

papel de interlocutora de uma carteira oficial de orientações de mudança, redigida

no âmbito das políticas públicas e, portanto, com força legal.

Mas, é o conjunto de iniciativas de reorientação da formação oriundas da

esfera federal, já anteriormente mencionadas, que devolveram para os cursos da

saúde, e, nesse caso, para os cursos de odontologia, a tarefa de pensar um novo

perfil do egresso. Particularmente, os projetos de reorientação, com uma bula de

mudanças, são laboratórios financiados de experiências – que inegavelmente

mobilizam a academia e oportunizam o aparecimento e o acúmulo de estratégias na

área da educação.

É cedo para medir o impacto dessas iniciativas, como também é cedo para

dimensionar a adesão das instituições nos processos de mudança requeridos e

inscritos nas Diretrizes, mas no caso da odontologia não há dúvida que a questão da

formação voltou para dentro das escolas, e hoje mobiliza novos atores, que muito

proximamente devem se aglutinar e constituir uma referência no fazer e no pensar o

ensino da odontologia.

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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não poucas vezes me perguntei sobre o motivo pelo qual buscava um

acontecido datado a mais de meio século, por que não ater-me ao passado

imediato, quase presente? Não que tivesse vivido algum desconforto com minha

opção, mas porque entendo que sempre há de haver uma razão, que seja

suficientemente clara, para que empreendimentos dessa natureza tenham validade

e sentido para os pares e para que possam contribuir com determinado campo de

conhecimento.

A intenção exposta inicialmente foi a de desenvolver um trabalho que

trouxesse elementos para sustentar, em relação à existência de um pensamento

sobre o ensino da odontologia, uma interpretação diversa daquela corrente. Ou seja,

de que um pensamento inovador, organizado e partilhado sobre o ensino

odontológico não é um advento novo ou recente; ao contrário, há vestígios que essa

já foi pauta das instituições formadoras há, pelo menos, cinco décadas passadas. De

outro modo, ao sustentar essa afirmativa, o trabalho também foi implicado na busca

de uma resposta que explicasse a lacuna entre o período referido e o atual – quando

acontece uma retomada desse tema por parte das instituições de ensino.

Resgatando a idéia de Jenkins (2007, p. 42) de que “a história é a maneira

pela qual as pessoas criam, em parte, suas identidades”, penso que uma

contribuição desse trabalho, junto com outros de mesma natureza, pode ser lida

como uma tentativa de dar corpo a uma “biografia” do pensamento sobre o ensino

da odontologia no Brasil. Não há dúvida que essa é só uma visão entre outras

possíveis, mas são os fragmentos e os vestígios compondo um argumento que tem

a intenção de disputar um lugar com aquele que subtrai da odontologia esse

passado - colocando-a sempre numa condição de atraso histórico, de incipiência na

abordagem da temática e, por isso, num lugar diferente e em desvantagem a outras

áreas.

É de alguma maneira um estudo provocativo, que não se propôs a aprofundar

todas as situações e nem responder a todas as lacunas, mas sim resgatar alguns

acontecimentos e projetar um olhar retrospectivo reflexivo, em suas características

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mais marcantes, sobre o lugar e os atores, do pensamento sobre o ensino da

odontologia.

A análise, de acordo com a periodização proposta, evidenciou o quanto esses

momentos foram distintos, não só do ponto de vista do desenvolvimento da área, o

que era esperado, mas da dinâmica que se estabeleceu no interior das instituições

formadoras em relação à discussão e à escolha do modelo de ensino desejado.

Tomando novamente as palavras do Prof. Paulino Guimarães, nos anos 60

houve uma relação de entusiasmo com essa temática, que veio sendo constituída

desde a metade dos anos 50 e que transpareceu tanto interna como regionalmente.

Ou seja, tanto ocorreu um movimento interno de diagnóstico das escolas, discussão

de modelo de ensino e criação de um centro de pós-graduação de referência na

área de saúde pública para dentistas, como houve uma agenda e uma interlocução

intensa com os países vizinhos da América Latina e Central.

Contando que a movimentação estava inscrita na lógica das agências

externas, os desdobramentos poderiam ter sido de natureza conservadora,

priorizando os ajustes de infra-estrutura e grade curricular dos cursos. Entretanto,

olhando o conteúdo dos artigos, dos relatórios e mesmo a radicalidade dos

pressupostos do Plano Piloto, pode-se afirmar que nessa época inscreveram-se

conceitos inovadores, que de acordo com o referencial assumido, estavam

imbricadas com um perfil de egresso comprometido socialmente, o entendimento da

necessidade de um ensino com integração de conteúdos e disciplinas e da

necessidade de aproximação do ensino com os serviços públicos de saúde.

As discussões que envolveram a formatação e a inclusão da “odontologia

social e preventiva” como componente curricular e o investimento na criação de um

“Curso de Saúde Pública para Dentistas”, em 1958, podem ser analisados como

ganho partilhado tanto do movimento que pensava o ensino da odontologia, quanto

daquele ligado ao serviço de saúde bucal, particularmente fundado no Serviço

Especial de Saúde Pública.

Essa afirmativa alinhava um passado entre a área da educação e a

conformação da especialidade – que entre os anos de 50 e 60, por ser considerada

estratégica nos processos de mudança na formação, foi incluída com destaque nas

pautas do ensino, o que sugere ter sido decisivo para sua existência e fortalecimento

nas décadas seguintes.

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Entretanto, a despeito de sua constituição como campo de conhecimento, não

chegou a imprimir direcionalidade no ideário da formação dos dentistas, perdendo

força no interior da academia nas décadas seguintes, quando floresceu a lógica das

pós-graduações clínicas, sustentadas por uma promissora odontologia de mercado.

Essa situação, já pontuada anteriormente, é resultado tanto da inflexão do

pensamento sobre o ensino da odontologia, particularmente na década de setenta,

quanto pelo modelo assistencial adotado pelo Estado – que gerou grandes

distorções ao aumentar a oferta de procedimentos odontológicos via indireta, por

credenciamentos com a rede privada, e propriamente liquidar as iniciativas de saúde

coletiva.

Na década de oitenta, os espaços possíveis de mudança na graduação das

profissões de saúde se concentraram nos projetos de integração docente-

assistencial, nos quais a odontologia participou de forma residual. O que agregou e

ampliou a discussão da formação foram os espaços ocupados pelo movimento

sanitário, que com a lenta abertura democrática, iniciava um novo desenho para a

política pública de saúde. E é nessa década que o grupo identificado com a saúde

bucal coletiva ocupa um espaço externo à academia e produz a crítica ao modelo de

ensino hegemônico, incongruente com a realidade social e epidemiológica do país.

Essa crítica, devido sua externalidade, não se constitui num movimento de reflexão

partilhado pelos cursos, como também não se constitui em uma pauta propositiva de

mudança das e pelas escolas.

A retomada dessa pauta é recente e se deve às políticas de educação e

saúde - que recolocam as instituições no centro do processo de mudança. E a

pauta, ao retornar para a academia, vem atualizar em grande parte as discussões

que já figuraram no cenário das décadas de 50 e 60, com uma grande diferença:

agora a saúde bucal está inscrita como uma política pública de saúde e, com isso,

criam-se condições para que o ensino seja rediscutido em outras bases.

Assim, ao finalizar esse trabalho não há como não considerar que a

odontologia tem na sua trajetória, como curso de graduação, uma história que inclui

um pensamento inovador sobre a formação, que este não foi hegemônico ao longo

do tempo, mas que nos períodos mais críticos trabalhou estrategicamente

acumulando experiências e propostas para recolocar o ensino da odontologia na

pauta das políticas públicas. E por ser esse um momento em que o Sistema Único

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de Saúde assume, em conjunto com o Ministério da Educação, o reordenamento da

formação de profissionais de saúde é necessário ter a noção exata do quanto se

avançou no país nos últimos cinqüenta anos.

Encerra-se assim um objeto de estudo, que ao ser datado e recortado da

complexa teia que são os acontecimentos, como qualquer outro, deve ser visto como

só mais uma leitura possível.

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