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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES - SCHLA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DECISO KAUÊ B. C. PESSOA GUIMARÃES OURINHOS, A TERRA CONTINUA ROXA PARA QUEM? A AGRICULTURA FAMILIAR FRENTE AO PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA CURITIBA 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES - SCHLA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS – DECISO

KAUÊ B. C. PESSOA GUIMARÃES

OURINHOS, A TERRA CONTINUA ROXA PARA QUEM? A AGRICULTURA

FAMILIAR FRENTE AO PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA

CURITIBA

2013

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KAUÊ B. C. PESSOA GUIMARÃES

OURINHOS, A TERRA CONTINUA ROXA PARA QUEM? A AGRICULTURA

FAMILIAR FRENTE AO PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA

Monografia apresentada no curso de Ciências

Sociais do Setor de Ciências Humanas, Letras

e Artes da Universidade Federal do Paraná,

como requisito parcial para obtenção do título

de bacharel em Ciências Sociais.

Orientação: Prof. Dr. José Luiz F. Cerveira Fº.

CURITIBA

2013

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A Roald Corrêa

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AGRADECIMENTOS

Há tantos nesse caminho, para agradecer, muitos nem sempre lembramos o porquê. Mas,

motivos sempre existiram. Entre todos, alguns possuem grandes motivos.

Meu avô Roald Corrêa, por tudo. Homem que nos ensinou que caráter não se compra se

conquista. Com sua jangada foi para o mar, buscar o peixe do qual Caymmi tanto falava.

Minha mãe Karina, por tudo e mais uns sonhos. De tudo, muito é seu apoio.

Meu pai Carlos, pelos ensinamentos e pelo Pessoa que carregamos.

Paulo Niederle, pelas oportunidades e dedicação que me concedeu. Sempre contribuindo para

a minha formação.

Zé Luiz Cerveira, por aceitar a tarefa de me orientar e fazê-la de forma dedicada.

Aos amigos, que dão graça a vida.

Rogério Melgaço e Vanda de Andrade, batalhadores. Por sempre me receberem bem.

Angélica, pelo carinho e paciência.

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Quem da solidão fez seu bem

Vai terminar seu refém

E a vida pára também

Não vai nem vem

Vira uma certa paz

Que não faz nem desfaz

Tornando as coisas banais

E o ser humano incapaz de prosseguir

Sem ter pra onde ir

Infelizmente eu nada fiz

Não fui feliz nem infeliz

Eu fui somente um aprendiz

Daquilo que eu não quis

Aprendiz de morrer

Mas pra aprender a morrer

Foi necessário viver

E eu vivi

Mas nunca descobri

Se essa vida existe

Ou essa gente é que insiste

Em dizer que é triste ou que é feliz

Vendo a vida passar

E essa vida é uma atriz

Que corta o bem na raiz

E faz do mal cicatriz

Vai ver até que essa vida é morte

E a morte é

A vida que se quer

(Baden Powell e Paulo César Pinheiro)

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RESUMO

Durante as últimas décadas a modernização agrícola tem sido responsável por modificar as

estruturas sociais e acentuar as diferenças socioeconômicas no campo. As pesquisas

científicas e o desenvolvimento de técnicas de produção tem influenciado a especialização das

atividades no meio rural. O resultado desse processo é o aumento da produtividade, definindo

o caráter capitalista e empresarial que a agricultura vem assumindo ao longo do tempo.

Portanto, o intuito deste trabalho é verificar o impacto da modernização agrícola sobre a

agricultura familiar, que originalmente possui tradições e intenções opostas aos interesses do

agronegócio, baseado numa lógica empresarial. Dessa forma, o intuito é contribuir para a

compreensão da agricultura familiar, e suas novas dinâmicas agrícolas que foram

estabelecidas no município de Ourinhos (SP).

Palavras-chave: modernização, agricultura, agronegócio, agricultura familiar, impactos.

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1. Cultura de café e a estrada de ferro no Vale do Paranapanema em 1910.............18

FIGURA 2. Área cultivada com café em 1937.........................................................................22

FIGURA 3. Município de Ourinhos (SP) em 2013..................................................................23

FIGURA 4. Produção de Cana-de-açúcar no município de Ourinhos (SP), safra de 2013......63

FIGURA 5. Multinacionais.......................................................................................................64

LISTA DE TABELAS

TABELA 1. Dados do município de Ourinhos (SP) em 1937..................................................21

TABELA 2. Evolução populacional do município de Ourinhos (SP)......................................57

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LISTA DE SIGLAS

APP – Área de Proteção Permanente

BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CATI - Coordenadoria de Assistência Técnica Integral

CENAL- Comissão Executiva Nacional do Álcool

CIMA - Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool

CNAL - Conselho Nacional do Álcool

CONFINS - Contribuição para Financiamento da Seguridade Social

EMATER - Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural

FEAP – Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

LUPA - Levantamento de Unidades de Produção Agropecuária do Estado de São Paulo

MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário

PAA - Programa de Aquisição de Alimentos

PIS/PASEP - Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor

Público

PMDRS - Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável

PNAE- Programa Nacional de Alimentação Escolar

PNPB - Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel

Proálcool - Programa Nacional do Álcool

PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

SAF – Secretaria da Agricultura Familiar

SP – São Paulo

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................................................10

1. ASPECTOS HISTÓRICO-SOCIAIS DO SERTÃO PAULISTA..................................13

1.1. A OCUPAÇÃO DO VALE DO PARANAPANEMA......................................................14

1.2. UM SERTÃO DE OPORTUNIDADES............................................................................16

1.3. OURINHOS, A CIDADE QUE CRESCE COMO O CAFÉ.............................................19

1.4. O OURO SE MODIFICA, MAS NÃO PERDE VALOR.................................................22

2. CONTRIBUIÇÃO PARA COMPREENDER UM TIPO SOCIAL E CULTURAL

ESPECÍFICO..........................................................................................................................25

2.1. O TRADICIONAL INDIVÍDUO DO CAMPO, PELO RETROVISOR..........................26

2.2. O TRADICIONAL INDIVÍDUO DO CAMPO, ANTES DA CURVA...........................35

3. O RURAL CONTEMPORÂNEO NO BRASIL..............................................................41

3.1. CARACTERÍSTICAS DO PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA..............42

3.2. PRINCIPAIS IMPACTOS DA MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA...................................48

3.3. O PAPEL DO ESTADO....................................................................................................51

4. O RURAL QUE PERMANECEU.....................................................................................56

4.1. A ESTRUTURA RURAL EM OURINHOS (SP).............................................................56

4.1.1. Características da teoria clássica que operam em Ourinhos (SP)............................59

4.1.2. Pluriatividade................................................................................................................60

4.1.3. A necessidade em definir as características do agricultor e produtor rural...........61

4.1.4. PNAE e PAA..................................................................................................................62

4.1.5. Características da cultura canavieira e da produção leiteira...................................63

4.1.5.1. Cana-de-Açúcar...........................................................................................................65

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4.1.5.2. Leite.............................................................................................................................66

4.1.6. Crédito rural.................................................................................................................67

4.1.7. Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI)..........................................67

CONSIDERAÇÕES FINAIS: AFINAL, A TERRA ROXA A QUEM BENEFICIA?....68

REFERÊNCIAS......................................................................................................................69

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INTRODUÇÃO

O avanço das pesquisas científicas e o desenvolvimento de técnicas de produção tem

resultado em novas tecnologias que também são empregadas nas etapas do trabalho agrícola

que buscam aperfeiçoar e especializar as atividades no campo. O resultando desse processo é

o aumento da produtividade, o que define o caráter capitalista e empresarial e que tem sido

denominado como agronegócio. O agronegócio também está presente no país como um todo,

o que inclui o município de Ourinhos (SP).

O objetivo deste trabalho é verificar o impacto da modernização agrícola, processo

que emerge no país baseado no ideal de progresso, sobre a agricultura familiar. Essa que

originalmente possui tradições e intenções opostas ao agronegócio, baseado numa lógica

empresarial, sofre diretamente os impactos da modernização. Graziano da Silva et al. (1983)

consideram que esse avanço é o grande responsável por afetar a agricultura familiar, tanto

interna como externamente. O tema é amplo e sugere inúmeras possibilidades para estreitá-lo.

Desse modo, o intuito é contribuir para o entendimento da agricultura familiar, e suas novas

dinâmicas agrícolas que foram estabelecidas, no município de Ourinhos (SP).

A finalidade de analisar essa questão se deve ao fato de que o processo modernizador

agrícola casou impactos e reestruturou as dinâmicas agrícolas. Os programas de incentivo à

modernização são as bases para o entendimento dessas, que são observadas com clareza no

município, principalmente, através da cultura da cana-de-açúcar, da soja e do milho. Tendo

grande destaque para a cultura canavieira e para o setor sucroalcooleiro, este como resultado

expressivo da modernização agrícola.

Frente a esse processo, a agricultura de pequena produtividade tem que se reestruturar

e „sobrevive‟ em meio a muitas dificuldades. Porém, é preciso compreender que esse processo

e seus resultados não são exclusivos de Ourinhos (SP) ou da região, mas sim intrínseco ao

Brasil, pelo modo que o processo foi articulado, visando o que consideravam como

desenvolvimento. Os resultados estão dados, resta neste momento, refletir sobre quais as

medidas necessárias para assegurar condições suficientes para o pequeno agricultor e produtor

rural permanecerem no campo e de maneira digna. Pois sabe-se que esses indivíduos não

querem deixar o campo, mas, as condições os levam a fazê-lo.

A definição desta pesquisa é dada quando há a proposta de analisar o processo de

modernização da agricultura e seus impactos socioeconômicos. A especificidade deste estudo

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é construída quando o interesse em estudar o impacto da modernização sobre a pequena

produção se reverte para o município de Ourinhos (SP). É importante considerar o papel do

Estado, o que será realizado neste trabalho, já que ele é o grande responsável pelo fomento da

modernização, esta consolidada de maneira desigual.

*

Este trabalho está dividido em quatro partes, consideradas como essenciais para a

compreensão do que está sendo proposto.

A primeira parte, intitulada „Aspectos histórico-sociais do sertão paulista‟ visa

resgatar o processo histórico do município, questão importante, pois situa o trabalho no

processo de desenvolvimento municipal, facilitando a compreensão dos pontos essenciais e

que assim, servirá de base para o maior entendimento dos rumos que foram dados ao

município nas ultimas décadas, principalmente ao que diz respeito à agricultura; isto é, a

necessidade de se entender a história municipal se dá pelo fato de que essa é responsável por

influenciar o meio rural, tanto na fundação da cidade como atualmente, através das dinâmicas

rurais.

A segunda parte, denominada „Contribuição para compreender um tipo social e

cultural especifico‟ tem como intenção analisar acerca do campesinato e da agricultura

familiar. As teorias clássicas relacionadas ao rural possuem inegável importância para a

formulação de teorias contemporâneas, são bases teóricas que influenciam, seja através de

críticas ou não, mas funcionam como pilar para novos paradigmas. Portanto, relembrá-las e

analisá-las fará parte do desenvolvimento deste trabalho através de três autores cujas obras

possuem notoriedade. Porém, também é preciso dispor atenção aos novos paradigmas para

compreender o universo rural contemporâneo, objetivo deste trabalho. Para isso, serão

analisados conceitos desenvolvidos e compreendidos como importantes por diferentes

autores, tanto estrangeiros como brasileiros. Esses conceitos, neste capítulo, intencionalmente

dirão respeito ao campesinato e à agricultura familiar.

A parte subsequente terá como objetivo demonstrar mais precisamente a questão da

modernização da agricultura no Brasil e seus impactos sobre a pequena exploração, ou seja, a

agricultura familiar. A modernização da agricultura é amplamente influenciada pelo Estado,

cabe a este trabalho, portanto, demonstrar o papel do Estado nesse processo, que resultou em

inúmeros impactos. Consequentemente poderemos entender de maneira pontual quais foram

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os impactos da modernização da agricultura fomentada pelo Estado, e quais os novos rumos

necessários para o futuro da agricultura familiar.

A última parte deste trabalho tem como intenção demonstrar a estrutura rural que foi

organizada no município de Ourinhos (SP), fortemente influenciada pelos processos

modernizantes da agricultura. Para tanto, serão apresentadas características que possam

esclarecer a nova dinâmica agrícola do município, para que seja possível concluir a respeito

do processo de modernização e sua influência sobre a pequena produtividade em Ourinhos

(SP).

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1. ASPECTOS HISTÓRICOS E SOCIAIS DO SERTÃO PAULISTA

Este capítulo tem por objetivo esclarecer os aspectos histórico-sociais do então Sertão

Paulista, área conhecida como Vale do Paranapanema. A intenção em demonstrar esses

aspectos se deve ao fato de situar o trabalho em termos históricos e sociológicos para facilitar

a compreensão das questões subsequentes.

O avanço dos pioneiros sobre áreas pouco exploradas e quando exploradas, realizada

por grupos indígenas, cujos objetivos são diferenciados das frentes pioneiras, dá início à

marcha para o Oeste com o objetivo de povoar o Sertão Paulista e, consequentemente, fazer

riqueza no século XIX.

A ocupação do Vale do Paranapanema pode ser sinteticamente compreendida,

primeiramente, através da já consolidada ocupação indígena na região, que com o avanço das

frentes consideradas pioneiras acabaram extinguindo grande parte da população indígena,

tanto por epidemias como por matanças. Nota-se a herança indígena na região,

principalmente, nos nomes das cidades do Vale do Paranapanema.

A ocupação compreendida através das frentes pioneiras é caracterizada, sobretudo,

pelos mineiros descendentes de portugueses, que exploravam a região de forma bandeirante.

Cândido (1977) expõe o caráter transitório da ocupação e destaca que o momento de fixação

nas terras se deve à sedentarizarão dos bandeirantes que, posteriormente, serão considerados

como caipiras1.

A terceira grande ocupação, no inicio do século XX, se deve aos imigrantes que se

estabeleceram na região à procura de oportunidades, visto que as fazendas, principalmente de

café, precisavam de mão de obra para a crescente produção, assim houve incentivo do

governo brasileiro para a migração, mesmo Mombeig (1984) expondo que os imigrantes na

época eram considerados mais como braços para lavoura, do que como parte integrante do

povoamento.

Portanto, entender esse contexto histórico-social abre espaço para compreender a

identidade regional e as heranças culturais definidas na região. Pode-se assim interpretar os

atores sociais envolvidos e os espaços socialmente construídos e então analisar tanto o poder

1 Cândido (1977) esclarece que o termo caipira foi incorporado recentemente de maneira jocosa, porém, esse

termo serve para designar o homem tradicional do campo.

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político como o econômico construídos no Centro Oeste Paulista, o que define um ponto

importante para o aprimoramento do objetivo deste estudo.

Para tanto, este capítulo será subdividido em quatro segmentos para auxiliar à

exposição do conteúdo. No primeiro momento será demonstrada a ocupação do Vale do

Paranapanema, levando em consideração as frentes pioneiras de ocupação. O segundo

momento tem como intenção demonstrar, principalmente, a ocupação enquanto oportunidade

na região que, essencialmente, foi responsável por garantir um desenvolvimento regional. Na

sequência, cabe analisar a evolução e o desenvolvimento do município de Ourinhos. Por fim,

o intuito é demonstrar alguns dados capazes de cooperar com a compreensão do município

hoje. O contexto histórico-social da região é amplo e diverso, por isso, não será possível

explorá-lo inteiramente nesse trabalho, mas a intenção é fornecer a maior clareza possível que

garanta a compreensão do objetivo dessa pesquisa.

1.1. A OCUPAÇÃO DO VALE DO PARANAPANEMA

O povoamento da região, já demonstrado anteriormente, foi realizado pelos indígenas.

Porém, por muito tempo houve a tentativa de ocupação da região. “A primeira tentativa de

ocupação do Vale do Paranapanema ocorreu no início do século XVII, com a fundação das

missões de jesuítas espanhóis com o intuito de reunir e catequizar os índios guaranis”

(BRAY, 1987, p.5), no entanto as missões não tiveram sucesso. É a partir da metade do

século XIX que a exploração da região é consolidada, principalmente pelos bandeirantes

mineiros.

Botucatu era a última vila da província de São Paulo e foi a partir dela que os novos

exploradores desbravarão o então sertão paulista (LEONIDIO, 2009). O extermínio das

populações indígenas era algo recorrente nos avanços rumo ao Oeste do Estado para que as

posses de terras no Vale do Paranapanema fossem realizadas, dessa forma não só índios como

a fauna e a flora eram considerados obstáculos à marcha rumo ao desconhecido, formavam-se

bandos de jagunços armados com objetivo de deixar o território livre (LEONIDIO, 2009).

Muitas vezes, esses bandeirantes são considerados como heróis e responsáveis pelo aumento

das extensões territoriais, o que de fato ocorreu, porém a que preço?

José Theodoro de Souza foi um pioneiro nas terras do Vale do Paranapanema o então

Sertão Paulista, que depois de desbravar a região além da ultima vila de Botucatu declara os

títulos de ocupação de terra em 1856, que abrangia uma área de 60 km de largura e 150 km de

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comprimento, mesmo com a Lei de Terras decretada em 1850, que proibia a obtenção de

terras se não fosse por meio da compra (BRAY, 1987). Pode-se notar, portanto, os indícios de

ilegalidade que compunha a região nesse período, ratificado nesse trecho:

A história da ocupação desta região do interior paulista, a partir de meados

do século XIX, é pautada por uma série de operações ilegais, invasões de

terras e falsificação de títulos de propriedade, envolvendo desde nomes

importantes da região [...], até pequenos posseiros pobres (LEONIDIO,

2009, p.38).

José Theodoro retorna a Minas Gerais, lugar de sua origem, para buscar os familiares e

ocupar as novas terras no Vale do Paranapanema, se estabelece com sua família numa área

que dará início ao povoado de São Pedro do Turvo (BRAY, 1987). Da mesma forma, Joaquim

Manoel de Andrade e Manoel Francisco Soares, também pioneiros nas explorações, são

responsáveis por fundar outro povoado, Santa Cruz do Rio Pardo, que logo se desenvolveria

chegando à condição de município, sendo esse, por muito tempo, a principal expressão

política e economia da região. (SELANI, 2005).

Mombeig (1984) ressalta sobre as condições ilimitadas que as áreas pioneiras

estimulam e, consequentemente, despertam esperanças. Porém, por mais virtuosa que a área

seja, se ainda não foi atingida pelo povoamento moderno, essa ainda é incapaz de beneficiar o

desbravador e assegurar condições econômicas. Ou seja, “as qualidades intrínsecas só existem

na medida em que correspondem aos apelos e às possibilidade humanas” (1984, p.98). Pode-

se notar, portanto, o caráter precursor desses indivíduos em ocupar a área que apresentava

inúmeras dificuldades.

A região considerada como o Sertão Paulista representava para muitos esperança.

Porém, as condições de vida da época na região eram bastante precárias, o que tornava a

ocupação mais dificultosa.

Durante a segunda metade do século XIX, o café que vinha fazendo a

fortuna de São Paulo, era praticamente inexistente no „Sertão do

Paranapanema‟, devido principalmente à precariedade dos transportes e a

distância do Porto de Santos. Mas, apesar do seu isolamento, o Vale do

Paranapanema povoa-se lentamente, mesmo com as contínuas lutas de

ocupação da terra contra os indígenas, e das dificuldades da vida na área

(BRAY, 1987, p.12).

Contudo, com a crescente ocupação e, consequentemente, a emergência de novos

povoados, houve uma atração cada vez maior de indivíduos para a região, que aos poucos

começaram a investir para garantirem melhores condições de vida e para a produção, desse

modo a situação começa a se reverter.

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Nos fins do século XIX e início do século XX, quando os plantadores de

café começaram a penetrar no Vale do Paranapanema, encontraram uma rede

urbana modesta organizando-se e alguns núcleos urbanos servindo de ponto

de apoio às plantações, caminhos abertos, a atividade criatória desenvolvida

pelos mineiros que forneciam alimentação e animais de trabalho, além de

posse de terra através das „aguadas‟ (BRAY, 1987, p.12).

Mesmo com as melhorias das condições, em vista ao que foi vivenciado no início do

desbravamento e das frentes de ocupação do até então considerado Sertão Paulista, ainda

havia grandes dificuldades para os ocupantes no início do século XX. Diversos depoimentos

confirmam os problemas encontrados na região nessa época, como os identificados no

povoado emergente da Fazenda Furnas, que será uma das áreas responsáveis por dar lugar à

cidade de Ourinhos.

[...] Cidade? Parecia uma fazenda. As casas plantadas uma aqui, outra ali,

quase não tinha alinhamento de ruas. Não havia luz, água e esgoto. Era água

de poço, levou muito tempo para chegar água na torneira2. (DEL RIOS,

1992, p.155).

Pode-se analisar através desse segmento o caráter pioneiro dos indivíduos,

principalmente, de origem mineira ao se aventurarem através do Sertão Paulista. Indivíduos

que para realizarem seus desejos não mediram esforços, fatos que deixaram marcas sobre os

grupos indígenas e sobre o meio ambiente. Porém, são considerados os responsáveis e

precursores da ocupação e desenvolvimento do Sertão Paulista.

1.2. UM SERTÃO DE OPORTUNIDADES

Com o passar do tempo, atraídos pela esperança de novas oportunidades e a falta de

mão de obra nas lavouras, imigrantes são atraídos para a região com o intuito de trabalharem

nas fazendas de café. Tem início o povoamento dos colonos, que para Mombeig (1984)

representava um proletariado desorganizado e explorado que apesar das péssimas condições

de vida e trabalho em beneficio dos fazendeiros, o colono participou ativamente da marcha

pioneira. Pode-se notar que as oportunidades eram voltadas mais para os fazendeiros do que

para os imigrantes, porém, Mombeig ressalta que “não era raro encontrar um fazendeiro que,

alguns anos atrás, ainda era um simples colono [...] chegaram a adquirir fazendas, grande

número de imigrantes” (1984, p. 163). Portanto, como não considerar os imigrantes como

participantes da ocupação do Sertão Paulista? É preciso ao menos considerá-los como

povoadores.

2 Depoimento da Dona Matilde, casada com Abuassali Abujamra, sobre a primeira impressão de Ourinhos em

1906.

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A independência do colonato em relação aos trabalhos precários das fazendas emerge

através de duas maneiras principais, pela difícil acumulação de capital por intermédio da

produção meeira3, que possibilitou para muitos adquirir um pedaço de terra, e através do

pequeno comércio realizado principalmente por imigrantes árabes.

A produção de café que apresentava grande expansão no Estado de São Paulo chegou

ao Sertão Paulista aos poucos e ganhou notoriedade, através daqueles que procuravam novas

terras para gerar riqueza, os fazendeiros. Com a grande produção de café nos principais

centros do Estado de São Paulo, a área recém ocupada no Vale do Paranapanema

proporcionava novas oportunidades para a expansão da produção cafeeira e,

consequentemente, indicava lucro financeiro.

Porém, apesar de evidentemente a região, e mais especificadamente os fazendeiros,

terem sido beneficiados economicamente com a produção cafeeira, a produção de café no

Vale do Paranapanema não ocorreu como esperado. Houve uma crise de superprodução no

início do século XX no Estado que fez com que as plantações diminuíssem. As produções

foram retomadas em longa escala apenas a partir do convênio de Taubaté em 1906, que visou

uma política de valorização dos preços do produto (RIBEIRO, 2011).

Nesse momento houve a ampliação das áreas plantadas para o Planalto Ocidental

paulista que se estendiam ao longo do Rio Paranapanema (BRAY, 1987), momento em que o

Vale do Paranapanema teve seu apogeu com a produção de café e com as crescentes

melhorias na infraestrutura, principalmente na construção de novas estradas de ferro.

A Estrada de Ferro Sorocabana é criada em 1870 com o intuito de escoar a produção

de café na região de Sorocaba, sendo uma das primeiras estradas de ferro a adentrar até o

interior ainda desconhecido do Estado de São Paulo (DEL RIOS, 1992). Mas, apenas em

1889 a Estrada de Ferro Sorocabana chegaria à vila de Botucatu e, posteriormente, deveria

seguir em direção ao Vale do Paranapanema.

Em 1906, os trilhos da Estrada de Ferro chegam até o município de Piraju4,

alcançando o Vale do Paranapanema. Dois anos mais tarde estende-se até Ourinhos5, um

3Diz-se do agricultor que trabalha em terras que pertencem a outra pessoa. O dono da terra fornece o terreno, a

casa e, às vezes, um pequeno lote para o cultivo particular do agricultor e de sua família. Fornece, ainda,

equipamento agrícola e animais para ajudar no trabalho. 4 Municípios desmembrados de Piraju por ordem; Fartura, Manduri, Timburi, Sarutaiá, Taguaí e Tejupá. Desse

modo, a E.F. Sorocabana passará pelo munícipio de Manduri. 5 Ourinhos ainda não era munícipio.

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importante tronco ferroviário para a época. Com a extensão da estrada de ferro para Oeste, “a

frente pioneira a acompanhava e povoava rapidamente as suas margens e assim, foram

surgindo da derrubada das matas, várias cidades e vilas que se sobrepunham às antigas vilas e

cidades fundadas pelos mineiros” (BRAY, 1987, p.16).

Santa Cruz do Rio Pardo6 foi um dos municípios que perdeu área com essa extensão

da Estrada de Ferro Sorocabana (SELENI, 2005). A Estrada que passava pelo Vale do

Paranapanema e que depois ficou conhecida como Média Sorocabana foi responsável por

garantir o escoamento da produção de café e o desenvolvimento da região. Mombeig (1984)

ressalta que o desenvolvimento das Estradas de Ferro não obedeciam a um plano sistemático,

mas sim, era conduzido pelos interesses dos administradores, comerciantes e produtores de

café.

FIGURA 1 – CULTURA DE CAFÉ E A ESTRADA DE FERRO NO VALE DO PARANAPANEMA EM 1910

FONTE: National Diet Library.

Desse modo pode-se compreender que o desenvolvimento do Vale do Paranapanema é

resultado da exploração, ocupação e povoamento da região denominada na época como Sertão

Paulista, principalmente por mineiros, fazendeiros e imigrantes.

Destacar-se-á nessa primeira parte as conquistas geográficas efetuadas pelos

pioneiros provenientes do Estado de Minas Gerais que povoaram as terras do

Sertão do Paranapanema e os núcleos que tiveram sua origem nesse processo

6 Munícipios desmembrados de Santa Cruz do Rio Pardo por ordem; São Pedro do Turvo, Salto Grande, Ipaussu,

Óleo, Chavantes, Bernardino de Campos, Espirito Santo do Turvo.

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de ocupação do território. Os demais núcleos populacionais são o resultado

do desmembramento desses extensos territórios municipais já instalados

(SELENI, 2005, p 23).

1.3. OURINHOS, A CIDADE QUE CRESCE COMO O CAFÉ

Ourinho ou Nova Alcântara era uma área que pertencia ao distrito policial de

Jacarezinho, este pertencente ao município de Tomazina, no Paraná. Jacarezinho e Ourinho

eram também os nomes de um rio e de um riacho, respectivamente, que passavam por essa

área.

Antônio José da Costa Junior, fazendeiro da região, possuía 104 alqueires de terras do

lado paulista do rio Paranapanema, cujo nome da fazenda era Ourinhos, onde algumas pessoas

acreditam que tenha importante influência para o nome da Cidade. Com a elevação do distrito

de Jacarezinho a comarca7, a área de Ourinho Paranaense deixou de existir, mas por tradição

oral o povoado que estava no caminho da Estrada de Ferro Sorocabana herdaria o nome,

sendo essa a hipótese mais viável para o nome da cidade de Ourinhos (DEL RIOS, 1992,

p.16). Há ainda no município contos de que o nome da cidade se deve ao fato das grandes

explorações de café no início do século XX, que para muitos representa o Ouro Verde.

O povoado de Ourinhos é elevado à condição de distrito da paz8 em 1915, pertencente

ao município de Salto Grande do Paranapanema, hoje Salto Grande. “Esse fato evidencia a

existência de uma vida política local com interesses específicos [...]” (DEL RIOS, 1992,

p.28). Três anos depois é elevado a condição de município9, sendo oficialmente instalado em

20 de março de 1919, como afirma Seleni (2005, p.31), porém, a data de assinatura da criação

do município data o dia 13 de dezembro de 1918 (DEL RIOS, 1992, p.31).

*

O início de Ourinhos tem relação com Jacintho Ferreira de Sá que aos 18 anos

convence dois de seus oito irmãos a procurarem oportunidades no interior paulista, vão até

Santa Cruz do Rio Pardo e fundam a Casa Três Irmãos, em 1886. Jacintho começa a

transportar mercadorias pelo caminho onde o trem da Sorocabana não passava e assim,

estabelece contatos com pessoas importantes da política na região como; João Baptista de

7 Lei Estadual nº 525, de 9 de março de 1904.

8 Lei Estadual n.º 1.484, de 13 de dezembro de 1915.

9 Lei Estadual n.º 1.618, de 13 de dezembro de 1918.

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20

Mello Peixoto e Ataliba Leonel10

, na cidade de Piraju. Ataliba ocupou os cargos de vereador,

prefeito, deputado estadual e federal, senador e só não foi governador anos depois, por culpa

da intervenção getulista, o que demonstra a força política concentrada na região (DEL RIOS,

1992, p.18).

Jacintho, anos depois, compra a fazenda das Furnas que pertencia a Dona Escolástica,

traçando o destino do município de Ourinhos, que posteriormente abrange outras duas

fazendas, a Lajeadinho e a Jacu.

A fazenda das Furnas não era toda a Ourinhos. A descrição de suas divisas

faz menções a duas outras fazendas de famílias pioneiras: a Lageadinho, de

Antônio de Almeida Leite [...]; e a fazenda do Jacu, também conhecida

como Ourinhos, da família Costa Junior (DEL RIOS, 1992, p.19).

Posteriormente, terão início os loteamentos das fazendas que constituirão os bairros,

dos quais muitos levam os nomes dos antigos proprietários das fazendas.

Jacintho Ferreira de Sá torna-se então o grande expoente da expansão e modernização

do que seria o município de Ourinhos. Com sua influência cria um terminal da Estrada de

Ferro Sorocabana nas suas terras, o que representa um grande passo para o desenvolvimento

do município que segundo Del Rios, “é fruto da aventura e do cálculo” (1992, p.21).

*

Com o desenvolvimento que a cidade estava assistindo, novos imigrantes, entre eles

30 Italianos, 41 Espanhóis, 25 Portugueses, 254 Brasileiros e 55 Japoneses, segundo dados da

Repartição de Estatística e Archivo do Estado chegaram ao município de Ourinhos em 1923 à

procura de novas oportunidades. Dessa forma, também são responsáveis por contribuírem

para o desenvolvimento da região e do município.

“Um milhão de pés de café, plantados em 1910, trariam para Ourinhos uma segunda

estrada de ferro [...]” (DEL RIOS, 1992, p.53). Antônio Barbosa Ferraz Junior, grande

proprietário de terras na região de Ribeirão Preto também vê na região do Vale do

Paranapanema oportunidade para aumentar os negócios e compra, entre Ourinhos e Cambará,

esta no Paraná, terras para cultivar café.

Porém, a E.F. Sorocabana só chegava até o município de Ourinhos na época. Então

para facilitar o escoamento da sua produção decide se unir com outros fazendeiros na região

10

Cf. “Ataliba Leonel - Panorama de uma época” (CÁCERES, 2008).

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21

para ligar as terras até Ourinhos e em 1923 tem início a construção da Estrada de Ferro

Noroeste do Paraná, que tempos depois altera o nome para Companhia Ferroviária São Paulo

– Paraná, que se estende por 29 km até Ourinhos (DEL RIOS, 1992, p. 53).

É a partir desse momento, que as novas fronteiras agrícolas ganhas força em direção

ao Norte Pioneiro do Paraná.

A E. F. Noroeste do Paraná foi aberta ao tráfego em 1925 ligando Ourinhos,

na linha-tronco da E. F. Sorocabana, em São Paulo, a Cambará, no Paraná.

Comprada pelos ingleses da Cia. de Terras do Norte do Paraná, teve seu

nome alterado para E. F. São Paulo - Paraná. Prolongada até Apucarana em

1942 e povoando a região, virgem até 1929, foi vendida ao Governo Federal

em 1944 e incorporada imediatamente à RVPSC. Foi prolongada, em

diversas fases, até atingir Cianorte, em 1972, onde parou. O tráfego de

passageiros, dividido entre os trechos Ourinhos-Maringá e Maringá-

Cianorte, parou em 1981 no primeiro trecho, onde rodava com trens de

passageiros que vinham de São Paulo, e um pouco antes no outro, onde

trafegava em trens mistos (GIESBRECHT, Estações Ferroviárias do Brasil).

Com o desenvolvimento, a população aumentava progressivamente, totalizando 8.427

habitantes no ano de 1937 (Tabela 1), sendo a produção de café a grande exploração do

município, que correspondia na época, uma imensa parte da área total do município destinado

à cultura cafeeira.

Comparando as quantidades atuais das principais produções do município, a produção

cafeeira na época era pequena, da mesma forma que a produção de café em Ourinhos não era

a maior do Estado, estando longe desse objetivo. O que cabe ressaltar na realidade é o espírito

pioneiro e empreendedor que atuou na cidade, assim como grandes benefícios que o

município obteve por sua localização privilegiada e pelos arranjos e rearranjos políticos que o

fizeram se destacar no cenário regional.

TABELA 1 – DADOS DO MUNICÍPIO DE OURINHOS EM 1937

Produção (Arrobas) Superfície em Km² População

Ourinhos ~15.000 222 8.427

FONTE: Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio do Estado de São Paulo.

Adaptado PESSOA, K.

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FIGURA 2 – ÁREA CULTIVADA COM CAFÉ EM 1937

FONTE: Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio do Estado de São Paulo.

Adaptado PESSOA, K.

1.4. O OURO SE MODIFICA, MAS NÃO PERDE VALOR

Pode-se considerar que o município de Ourinhos se desenvolveu a partir da ocupação

e povoamento da região do Vale do Paranapanema pelos pioneiros mineiros e,

posteriormente, pelos fazendeiros e imigrantes. É preciso ainda, considerar os benefícios

concedidos para o desenvolvimento através da construção da Estrada de Ferro Sorocabana,

com destaque para a produção agrícola.

Nos últimos anos, a agricultura representou aproximadamente 8 milhões de reais para

o município em 2000 e 30 milhões de reais em 2010, segundo a Fundação Seade. Grande

parte desse aumento numérico está relacionado à cultura canavieira desenvolvida no

município.

O município, segundo o censo de 2010 do IBGE, possui uma população de 103.035

mil habitantes, dos quais apenas 2.661 mil habitam a zona rural enquanto que 100.374 mil

vivem na zona urbana.

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O município atualmente totaliza uma área de 296.269 km², dos quais 268.951, km² são

considerados área rural (LUPA, 2007/2008) (Figura 3). A cultura cafeeira que foi uma das

pioneiras e de grande expressão elevou o desenvolvimento da cidade, mas começa a perder

espaço com o passar do tempo, e dá lugar a outras produções. A cultura canavieira ressurge

como a nova expressão do município na segunda metade do século XX, que perdura até hoje.

Em 2008, foram 11.646,8 hectares plantados, sendo essa hoje a maior cultura em extensão e

produção do município.

FIGURA 3 – MUNICÍPIO DE OURINHOS EM 2013

FONTE: Google Maps, 2013. Adaptado PESSOA, K.

A cultura canavieira e o setor sucroalcooleiro que vêm ganhando espaço desde a

década de 1950 trazem consigo inúmeros problemas, tanto de ordem socioeconômicas como

ambiental, da mesma forma que ocorreu na expansão da cultura cafeeira e das fazendas no

início do século XX no interior do Estado de São Paulo.

Os impactos ambientais são problemas frequentes da modernização agrícola e para

muitos, o preço do progresso. Basta analisar a cultura cafeeira no Vale do Paranapanema e em

outras regiões do Estado de São Paulo no final do século XIX e início do século XX. Como

resultado a prática da monocultura, caso explícito da cultura canavieira, o novo ouro agrícola

do Estado de São Paulo. “O oceano de café [...] assinalava, depois da destruição da paisagem

natural, um estágio que dificilmente poderia ser identificado como o de um front, esse sempre

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marcado pelas queimadas que abrem caminho para os fazendeiros” (MOMBEIG, 1984, p.

176).

Os impactos de ordem socioeconômicas também são muito frequentes nesse processo

de modernização agrícola e definem transformações rápidas e complexas nas estruturas

sociais. Cabe indagar, portanto, a quem realmente beneficia? Para Kageyama (1987) o

processo de modernização é dominante e desigual, por redirecionar o campo a novas

dinâmicas, cujos interesses são das elites rurais e empresariais, colocando à margem, os

pequenos grupos rurais que, segundo Cândido, “se caracterizam pela natureza das

necessidades de seus grupos, e os recursos de que dispõem para satisfazê-las” (1977, p.23).

Questão que abre espaço para a teoria de Chayanov, onde o equilíbrio depende do

ajustamento entre necessidades e satisfações. É importante ainda, considerar que:

Este modo de produção não deve ser considerado apenas com reprodução da

existência física dos indivíduos; ele já é uma espécie determinada da

atividade destes indivíduos, uma determinada maneira de manifestar a sua

vida, uma determinada maneira de viver destes indivíduos (MARX, Oeuvres

Philosophiques, vol. VI p.164 apud CÂNDIDO, 1977, p. 24).

Cândido (1977) reitera que desse modo essa questão traz um tema importante, onde do

ponto de vista do sociólogo é preciso colocar o fato social da organização na discussão dos

problemas de subsistência. Portanto, até que ponto a modernização agrícola determina novas

estruturas e organizações sociais que interferem na subsistência dos pequenos grupos rurais?

Durante esse capítulo houve a preocupação em analisar, mesmo de forma sintética,

algumas das principais características históricas e sociais do Vale do Paranapanema,

atualmente, definida também como Média Sorocabana. Essa preocupação se deve ao fato da

intenção de situar o trabalho tanto historicamente como sociologicamente, para então clarear o

objetivo dessa pesquisa, que é compreender a situação atual da agricultura familiar no

município de Ourinhos.

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2. CONTRIBUIÇÃO PARA COMPREENDER UM TIPO SOCIAL E CULTURAL

ESPECÍFICO

A busca pela compreensão do campesinato e seus significados atravessa um longo

período de análises, das quais inúmeras questões foram formuladas. Atualmente a discussão

sobre o meio rural tem ganhado cada vez mais espaço, questão evidente no Brasil por ser um

país de grande potencial agrícola. Com isso, o intuito deste capítulo é demonstrar os conceitos

e as noções que estão diretamente ligados ao ator social que está no campo, aquele que é

responsável por cultivar e produzir os bens primários.

Rural, segundo Cândido (1977) é a localização de um espaço que compreende um tipo

social e cultural específico, considerado como tradicionais aos homens e mulheres do campo,

da mesma forma que para Kayser, (1990, p.13 apud WANDERLEY, 2000, p.88), onde “o

rural é um modo particular de utilização do espaço e de vida social”. Wanderley ressalta que

este autor procura a

compreensão dos contornos, das especificidades e das representações deste espaço

rural, entendido, ao mesmo tempo, como espaço físico (referência à ocupação do

território e aos seus símbolos), lugar onde se vive (particularidades do modo de vida

e referência identitária) e lugar de onde se vê e se vive o mundo (a cidadania do

homem rural e sua inserção nas esferas mais amplas da sociedade) (2000, p. 88).

Em seu estudo sobre a população tradicional do meio rural na região de Bofete, no

interior de São Paulo, Cândido (1977) define o termo caipira como resultado da mistura entre

índios e portugueses, que denominará um tipo do tradicional indivíduo do campo, que muitos

consideram como camponeses. Por questões práticas, durante a maior parte deste trabalho,

esse tradicional indivíduo do campo será considerado como camponês, por ser um termo

utilizado por diferentes autores; mas é preciso considerar a diversidade em relação à

denominação desses atores, dependendo da região e da época, mas que na essência possuem

inúmeras semelhanças.

O cumprimento do objetivo deste capítulo, conceituar o tradicional indivíduo do

campo, aquele que possui tipos sociais e culturais específicos, se dará de duas principais

maneiras. Primeiramente, o intuito é expor três principais e importantes teorias, consideradas

clássicas sobre a temática dos estudos rurais. No segundo momento, a intenção é apresentar os

conceitos e as ideias desenvolvidas por autores contemporâneos, sobre o campesinato e sobre

a agricultura familiar. Desse modo, será possível compreender o que é o campesinato e a

agricultura familiar.

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26

A teoria clássica sobre o campesinato possui três importantes estudos cuja

apresentação é significativa, o que não sugere que outros estudos clássicos sejam descartáveis.

Os três estudos procuraram problematizar a questão agrária no final do século XIX e início do

século XX.

Vladimir Lênin, nascido em 1870 na Rússia, publica em 1899 o texto intitulado

“Desenvolvimento do Capitalismo na Rússia”, pautado principalmente pelas ideias da Social

Democracia russa. Karl Kautsky, nascido em 1854, publica também em 1899 o texto “A

Questão Agrária”, cuja discussão central diz respeito à subordinação da agricultura de

pequena exploração pela agricultura de grande exploração. Alexander Chayanov, nascido em

1888, também na Rússia, é considerado um autor clássico e de interesse para este trabalho,

onde representa as ideias da Escola de Organização e Produção, cujas crenças eram de que as

transformações no campo poderiam ocorrem sem o desaparecimento da comunidade

camponesa russa. Essa, portanto, sendo a questão de divergência entre os dois autores russos.

Adiante, em relação aos autores contemporâneos, inúmeras questões serão abordadas,

mas sempre com o intuito de esclarecer sobre o campesinato e a agricultura familiar.

Diferentes autores discutem sobre essa questão, dos quais muitos possuem aproximações

teóricas. Dessa forma, a intenção neste capítulo é caracterizar os principais conceitos e noções

referentes ao rural, conforme entendido por Cândido (1977) e exposto anteriormente.

A expectativa deste capítulo, portanto, é fornecer bases teóricas suficientes para

desenvolver análises concisas sobre os tradicionais atores sociais do campo, aqueles

considerados como portadores de culturas especificas e assim, posteriormente, tecer

considerações sobre o rural visto atualmente.

2.1. O TRADICIONAL INDIVÍDUO DO CAMPO, PELO RETROVISOR

No início do século XX era comum considerar os fenômenos econômicos através da

economia capitalista, baseado no trabalho assalariado e na maximização dos lucros, enquanto

que os outros modos não capitalistas não eram considerados importantes, pois estavam em via

de desaparecimento, como demonstra Alexander Chayanov (1924, p. 478). Questão que não

se diferencia do atual cenário mundial.

Para Chayanov (1924) a economia de produção familiar, em linhas gerais, é realizada

para garantir a subsistência e não como forma de acumular capital, o que iria contra a tese

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capitalista de trabalho assalariado e maximização dos lucros. Desse modo, para o russo, a

unidade econômica camponesa não pode ser considerada capitalista, questão que merece

atenção e dá início à discussão.

Chayanov (1924) acreditava que a família é o núcleo que garante os recursos para o

camponês e, a partir disso, determina esse ponto como seu grande interesse de investigação.

Abramovay confirma essa questão ao indicar que Chayanov “elaborou uma teoria do

funcionamento das unidades produtivas baseadas fundamentalmente no trabalho da família”

(1998, p.72). Ferreira e Alves acrescentam a explicação que “a força de trabalho da família é

o elemento mais importante no reconhecimento da unidade camponesa” (2009, p.152).

Compreender a importância da família como constituinte do campesinato e que o

modelo econômico camponês não é baseado no capitalismo, é fundamental para compreender

o pensamento de Chayanov. É ainda preciso considerar a premissa de Pontes (2005) onde,

uma vez que o camponês não possui salários nos moldes capitalistas e tem a família como

mantenedora dos recursos, há a importância em definir os integrantes da família capazes de

cooperar e os que não o são, para que seja possível garantir a subsistência do grupo familiar.

O valor em determinar esse ponto se dá pela necessidade de delimitar a auto-

exploração11

de cada indivíduo, para suprir as necessidades familiares, definindo a

necessidade de produção e de consumo, ou seja, “[...] o grau de auto-exploração é

determinado por um equilíbrio específico entre a satisfação da procura familiar e a fadiga

devido ao trabalho” (CHAYANOV, 1924, p. 482). Porém, ocasionalmente, ainda é necessário

à família empregar mão de obra em atividades não agrícolas para garantir a subsistência,

sendo essa uma característica histórica do campesinato, como aponta Carneiro (2009).

Através disso, é preciso entender que a auto-exploração é condicionada por certas variáveis,

entre elas a dimensão da família.

Enquanto a renda dependesse fundamentalmente do trabalho familiar haveria

um balanço entre a penosidade deste trabalho e as necessidades de consumo

da família: uma vez preenchidas as necessidades, cada unidade adicional de

trabalho passaria a ter, para a família, valor decrescente. Esta é a base teórica

que permitia a Chayanov contestar a validade da lei da diferenciação social

dos produtores, propondo em seu lugar uma espécie de diferenciação

demográfica (ABRAMOVAY, 1998, p. 72).

11

Cf. ABRAMOVAY, 1992, p.62.

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Até esse ponto podemos entender que, conforme Chayanov, a intenção camponesa não

é obter lucro da forma capitalista de acumulação de capital, mas sim, suprir as principais

carências da família, ou seja, garantir a subsistência e assim, a auto-exploração é delimitada

pelas reais necessidades, mantendo-se de certa forma na margem do sistema capitalista. “Em

economia natural, a atividade econômica humana é dominada pela satisfação das necessidades

de cada unidade de produção isolada - a qual é, ao mesmo tempo, uma unidade de consumo”

(CHAYANOV, 1924, p. 481), ou seja, “na economia camponesa, prevalece a produção de

valores de uso para o auto-consumo, diferentemente do modo de produção capitalista, que

produz valores de troca” (CARNEIRO, 2009, p. 55). Pode-se confirmar essa questão através

dos trechos ulteriores;

De tudo isto resulta que, em economia natural, a vida econômica, a distinção

entre o que é econômico e o que é lucrativo, as leis estranhas que regulam a

vida social, se apresentam de modo muito diferente das ideias e princípios

fundamentais da nossa economia, tal como são correntemente expostos nos

manuais (CHAYANOV, 1924, p. 481).

Numa exploração com base no trabalho familiar, a família, equipada de

meios de produção, utiliza a sua força de trabalho para cultivar o solo e

obtém, como resultado do trabalho de um ano, certa quantidade de bens.

Uma olhadela apenas para a estrutura interna desta exploração bastaria para

nos fazer perceber que, na ausência da categoria do salário, é impossível

situar nesta estrutura o lucro líquido, a renda e o juro do capital,

considerados como verdadeiras categorias econômicas no sentido capitalista

do termo (Ibid.).

Portanto, a unidade familiar camponesa, segundo o pensamento de Chayanov, não se

comporta como uma empresa que busca garantir lucros nas atividades exercidas, caso das

empresas capitalistas. “Embora a unidade de produção camponesa lide com trabalho, bens de

produção e terra, disso não decorre a presunção de que ela gera salário, lucro e renda da terra”

(1992, p.59). O camponês é diferente do trabalhador assalariado, pois, “é um sujeito criando

sua própria existência” (CHAYANOV, 1925/1986, p.118 apud ABRAMOVAY, 1992, p.59).

Dessa forma, “o que determina o comportamento camponês não é o interesse de cada

um dos indivíduos que compõem a família, mas sim as necessidades decorrentes da

reprodução do conjunto familiar” (ABRAMOVAY, 1992, p.62).

Há, portanto, a necessidade de compreender o campesinato incluindo categorias que

demonstrem sua forma de vida.

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O campesinato não é simplesmente uma forma ocasional, transitória, fadada

ao desaparecimento, mas, ao contrário, mais que um setor social, trata-se de

um sistema econômico, sobre cuja existência é possível encontrar as leis de

reprodução e desenvolvimento (ABRAMOVAY, 1992, p.59).

Adiante, conforme expõe Abramovay (1992), Chayanov acredita que a economia

camponesa é objeto de conhecimento racional e positivo, isto é, não há nada de ocasional no

campesinato e esse existe para responder uma necessidade social que se dá dentro do próprio

organismo camponês, sendo o balanço entre o trabalho e o consumo, questão exposta

anteriormente. Esse ponto marca uma divergência com Marx, que acreditava que a

necessidade é através da “relação com o outro e a superação de si próprio no quadro desta

relação” (ABRAMOVAY, 1992, p.52). Ou seja, para o autor alemão, uma vez o camponês

em relação com o exterior criaria novas necessidades e, portanto, trabalharia mais para supri-

las ou invés de balancear trabalho e consumo.

É importante entender a época em que Chayanov desenvolve esse pensamento,

momento em que surgia na Rússia o que era conhecido como Escola de Organização e

Produção, formada por economistas e agrônomos, da qual Chayanov fazia parte e que,

segundo Bartra (1976, p. 50) era uma “corriente de pensamiento que proponía la

transformación de la organización de la economia campesina com el fin de elevar la

producción agrícola”, teoria que, posteriormente, recebe inúmeras críticas. Abramovay (1992)

aponta que a Escola de Organização e Produção é consolidada por um caráter extensionista,

ou seja, possuía uma característica prática e, portanto;

Trata-se para eles, de tentar melhorar o desempenho econômico dos

camponeses e é como essa perspectiva que se colocam as questões que

determinam tanto um levantamento estatístico específico e original quanto à

orientação geral de seu trabalho. [...] a atividade cotidiana não consistia em

organizar um novo regime que viesse melhorar suas vidas e sim em aspectos

econômicos e técnicos. Nesse sentindo, independentemente do sistema

econômico no qual se inserissem os camponeses, a missão dos agrônomos

que junto a eles trabalhavam consistia em encontra formas organizacionais

que proporcionassem a cada unidade individual de produção – ainda que isso

envolvesse aspectos importantes de organização cooperativa – melhora de

renda, progresso técnico, etc. (1992, p.67).

A ênfase de Chayanov na motivação do camponês não pode ser explicada

simplesmente por sua sólida formação marginalista, mas por que era em

torno do comportamento econômico, técnico e organizacional dos

agricultores que se estruturava o trabalho prático ao qual sua teoria

procurava de certa forma responder. Em suma, sob a ótica de um

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extensionista seria impossível trabalhar apoiado em ideais cuja essência

jogasse por terra – e era o caso do marxismo dominante da social-

democracia de então – a possibilidade minimamente estabelecida de um

sentido em longo prazo para o seu trabalho (Ibid.).

Abramovay (1992) não descarta a importância teórica de Chayanov para o estudo do

campesinato, mas salienta que mesmo Chayanov tendo “consciência da importância da

caracterização do camponês como uma forma social estável, essa tende à transformação, no

limite a extinção” (1992, p.57), e segue, “[...] o campesinato, ao se manter no quadro da

modernização da agricultura soviética, tenderia fatalmente a perder seus atributos essenciais e,

assim, a negar-se como categoria social especifica” (1992, p.68). Portanto, com essa

penetração12

da modernização na agriculta o futuro do campesinato para Chayanov se daria

através do cooperativismo, pois, só assim seria possível aos camponeses manterem-se nessa

nova etapa.

*

Frente à contextualização em relação ao campesinato e o camponês de Chayanov,

Lênin tece duras críticas a esse e aos autores da Escola de Organização e Produção, pois os

considerava como populistas. Em termos gerais, Lênin considerou que o campesinato se

desintegraria como resultado do avanço capitalista, questão que se opõe ao pensamento

populista.

Lênin foi um social democrata, compartilhava das ideias marxistas, as quais o

influenciaram para considerar sobre a diferenciação social do campesinato, que seria

estabelecida a partir do trabalho assalariado. Desse modo, a economia capitalista para Lênin

(1985) é o processo final de transformação da economia mercantil, o que a torna nesse

estágio, capaz de obter um “domínio absoluto e uma extensão universal” (1985, p.13). A

divisão social do trabalho é um elemento importante dentro da economia mercantil e,

posteriormente, capitalista. Esta representa a separação das tarefas que dará início a novos

segmentos industriais especializando a produção cada vez mais, que evidentemente não

excluirá a agricultura.

Para Lênin (1985), portanto, o motivo do desenvolvimento da economia capitalista

está pautado na divisão social do trabalho, que segundo o próprio autor levaria o campesinato

a ruína, pois, transformaria o pequeno produtor em proletariado, o que consequentemente

12Cf. ABRAMOVAY, 1992, p. 68.

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aumentaria o consumo de mercado, pelo simples fato de que o pequeno produtor seria

obrigado a comprar produtos, quando antes produzia. A penetração do capitalismo no

campesinato é a questão mais importante na discussão de Lênin, pois é a partir desse ponto

que haverá a transformação do campesinato, essa é, portanto, a ideia central do pensamento

leninista sobre o campesinato.

Adiante, o que ocorre é a desintegração do campesinato, isto é, “a destruição radical

do antigo campesinato patriarcal e na criação de novos tipos de população rural” (LÊNIN,

1985, p. 113). Como vimos, o sucesso do capitalismo passa pela divisão social do trabalho e

desestrutura o campesinato, assim, para Lênin (1985), há um grande equívoco ao se afirmar

que a desintegração do campesinato é simplesmente fruto da desigualdade entre recursos, o

que ocorre com a destruição do campesinato é a emergência de outras categorias rurais

baseadas na economia capitalista.

Da desintegração do campesinato clássico, dois principais modelos emergem para

análise; por um lado o proletário rural, aquele indivíduo que possui poucas posses e se vê

obrigado a vender sua força de trabalho para garantir a sua subsistência; enquanto que, do

outro lado encontramos os pequenos burgueses rurais, que são independentes e se associam

cada vez mais ao mercado, não dando conta de produzirem apenas com o trabalho familiar,

como Lênin ressalta: “na maioria dos casos, as dimensões da exploração estão acima das

possibilidades da força de trabalho familiar; por isso, a formação de um contingente de

operários agrícolas [...] é indispensável da existência do campesinato rico” (1985, p.115), a

acentuação desses extremos é o que Lênin (1985) considera como „descamponização‟.

O pensamento de Lênin é fundamental para compreender a questão agrária, onde esse

autor acredita que com o desenvolvimento do capitalismo haverá um momento em que o

mesmo alcançará o campesinato, trançando a desestruturação do sistema clássico patriarcal.

Esse processo dará início a outras formas de organização agrícola; por um lado os proletários

e por outro, os pequenos burgueses. Adiante, é preciso ainda, também refletir sobre a época da

análise realizada por Lênin, o que não descarta a questão que devemos considerar: o

campesinato realmente desintegrou-se com o avanço do capitalismo?

*

Kautsky (1980) que assim como Lênin, pautou-se em conceitos marxistas, insere outra

discussão importante. Não em relação ao desaparecimento da pequena propriedade, como

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considerava Lênin, mas em relação às transformações que essa estaria submetida frente ao

processo capitalista. Abramovay (1992) destaca que Kautsky procura demonstrar a

supremacia da exploração capitalista sobre a propriedade familiar e a ineficácia de tentar

reverter a ação capitalista de expropriação camponesa.

O que Kautsky n‟A Questão Agrária procura, segundo Abramovay (1992) é verificar

teoricamente que o modo como os camponeses sobrevivem não é eficiente, mas sim, de

exploração, mantido pelo capitalismo que pode ser constatado através da superioridade

técnica e econômica que a grande exploração leva frente à pequena. Abramovay (1992) ainda

expõe que: Kautsky procura elucidar a questão referente à agricultura e a indústria, na noção

de industrialização da agricultura, ou seja, a dificuldade da pequena propriedade de adquirir

novas tecnologias que estão disponíveis para as grandes propriedades, que por sua vez, cria

uma distância entre o pequeno produtor e a indústria, ponto que se assemelha a Lênin.

O desenvolvimento do capitalismo é primeiro experimentado nas indústrias para

então, ao longo do tempo, modificar a produção rural, fato que podemos analisar através da

história. Anteriormente, os camponeses garantiam a própria subsistência através da terra e

dependiam da cidade apenas para aquilo que não era possível produzir, “essa sociedade

camponesa, que se bastava a si mesma, era indestrutível” (KAUTSKY, 1980, p.29);

O pior que poderia acontecer seria uma péssima colheita, um incêndio, a

invasão de um exército inimigo. Mas mesmo esses golpes do acaso só

constituíam um mal passageiro; não secavam as fontes da vida (KAUTSKY,

1980, p.29).

O camponês, desse modo, não vivia perante as leis e regras do mercado, mas sim da

natureza e da própria força de vontade. Kautsky (1980) acentua que o camponês levava uma

vida tranquila comparada às condições que lhe são impostas posteriormente pelo mercado,

pois esse cria dependência e dívidas e assim, não é apenas mais um mal passageiro,

transformando as condições iniciais do camponês que geralmente, para solucioná-las,

“arrancam o ganha pão – a sua terra – e finalmente separam-no inteiramente dela, para

transformá-lo num proletário” (1980, p. 33). Nota-se o efeito do desarranjo familiar que está

condicionado ao camponês pela sua inserção ao mercado, movido pela industrialização.

Uma vez inserido no mercado o camponês cria a necessidade de supri-lo e então,

começa a modificar sua produção inicial, antes realizada para a subsistência e portanto,

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diversificada, agora responde às necessidades do mercado, que são expressamente

diferentes;

O problema, para cada agricultor, se torna então, entre os produtos

procurados, a escolha daquele que segundo a natureza do solo e a localização

das suas terras, segundo as condições das comunicações, segundo a

importância de seu capital e a área de sua propriedade, etc., pudesse plantar

com proveito (KAUTSKY, 1980, p. 57).

Desse modo, podemos compreender que tem início a especialização da produção

agrícola por parte do camponês e a divisão do trabalho, que ao longo do tempo apenas se

acentua. Kautsky (1980) mostra ainda que os resultados levam ao aperfeiçoamento dos

operários, dos instrumentos e das ferramentas, das sementes e das raças animais, tornando a

agricultura dependente cada vez mais do sistema, onde os resultados são agravados quando

nota-se que:

[...] o camponês não produz mais para si mesmo [...]. Ele é obrigado a

comprar não apenas os instrumentos, e instrumentos mais caros que os de

outrora, mas ainda uma parte dos seus gêneros alimentícios, que a

exploração especializada não proporciona, ou não proporciona em

quantidade suficiente (KAUTSKY, 1980, p. 58).

Com a evolução do modo de produção agrária novas demandas são estabelecidas e

entre elas a necessidade de melhoramento contínuo das produções, onde cabe a ciência a

grande ação. A cultura de gerações ainda permanece resistindo, mas sabe-se da importância

do ensino agrícola para o futuro da agricultura e, portanto, tem início a crescente implantação

de cursos universitários que possam preencher as novas necessidades modernas. Nota-se

nesse processo a crescente diferenciação que está por vir na agricultura.

Aqueles que possuem maiores condições começam a se diferenciar daqueles com

menores, demonstrando assim o principio do que Kautsky (1980) denomina como sendo a

grande e a pequena exploração, onde “quanto mais o capitalismo progride na agricultura,

tanto mais acentua ele a diferença qualitativa entre a técnica da grande e da pequena

exploração” (1980, p. 112). Frente a essa nova ação, as cooperativas surgem para dar apoio

aos camponeses, sendo de grande importância; porém, não é algo que elimina as vantagens

que a grande exploração leva sobre a pequena, como exemplo, o pequeno perde tempo no

revezamento das máquinas, enquanto que o grande não tem necessidade, por possuí-la, como

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analisa Kautsky (1980). Desse modo, não restam dúvidas em relação à superioridade da

grande exploração frente a pequena em vários pontos.

Adiante, com a crescente submissão da agricultura ao capital, a dependência dos mais

vulneráveis se eleva e cada vez mais transforma a realidade, onde antes a produção era de

subsistência agora é para suprir as necessidades mercantis. O camponês que vende suas

mercadorias agrícolas mas não emprega mão de obra não é considerado um capitalista e sim

um criador de mercadorias, segundo Kautsky (1980), o que nos mostra o caráter de

proletarização do camponês que se endivida cada vez mais.

O resultado de tal processo, muitas vezes, é o êxodo rural, pois o camponês já não é

capaz de produzir o suficiente e há a necessidade cada vez maior de ganhos paralelos, assim

como o desenvolvimento tecnológico muitas vezes não é acompanhado por falta de recursos

ou conhecimento, então, as facilidades encontradas nas cidades são atrativas nesse momento,

criando a demanda de migração para aqueles que não conseguem mais manter-se no campo.

Portanto, as teorias expressas até o momento evidentemente tiveram grande efeito para

a discussão do campesinato. São teorias desenvolvidas numa época especifica, assim como as

condições geográficas e culturais são diferentes das atuais e das brasileiras; no entanto, deve-

se refletir a respeito. Até que ponto é possível considerar as ideias até aqui analisadas? Sem

dúvida há grande importância em ponderar o pensamento desses autores, visto que são

pensamentos que constituíram bases para novas discussões. O exercício que será

desenvolvido será o de compreender até que ponto pode-se avançar com esses estudos

clássicos no contexto atual.

Dessa forma, podemos concluir à respeito desses três autores que existem muitas

diferenças em relação à teorização do campesinato, porém, em determinados pontos há

semelhanças que não devem ser negadas. Desse modo sintético, pode-se considerar que, para

Lênin o campesinato não é imune a penetração do capitalismo, que por sua vez, irá

desintegrá-lo dando início a novas categorias rurais, o proletário rural e o pequeno burguês

rural; para Chayanov, o camponês vivia em uma economia de caráter familiar incompatível

com a lógica capitalista e que tinha como característica o equilíbrio entre penosidade e a

subsistência, sendo essa característica o principal ponto de debate para o autor. Kautsky por

sua vez, aproxima-se mais das ideias de Lênin do que de Chayanov, porém, pode-se perceber

semelhanças importantes entre eles; como a ideia das cooperativas como processos objetivos

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para o campesinato continuar reproduzindo-se. Mas é preciso salientar que a teoria central de

Kautsky refere-se à subordinação da pequena exploração pela grande exploração,

determinando inúmeras consequências para o rural.

2.2. O TRADICIONAL INDIVÍDUO DO CAMPO, ANTES DA CURVA

Cabe nesse momento trazer o debate para um viés mais atual e específico, que será

realizado através de autores que contribuem para essa proposta. A intenção agora se dá em

analisar outros conceitos referentes ao campesinato e os novos paradigmas desenvolvidos.

A primeira característica aqui atribuída ao camponês será feita a partir de Eric Wolf

(1970). O autor diferencia o camponês dos povos primitivos e para isso analisa a

complexidade dos sistemas, onde o campesinato é considerado como uma “sociedade mais

vasta e complexa do que as tribos e bandos primitivos” (1970, p.14). Cabe ressaltar que os

povos primitivos não possuem relações que caracterizem dependência de poder com o

exterior, ao contrário das sociedades camponesas, que precisam conservar a relação com o

exterior para manter o que Wolf caracteriza como fundo de manutenção, fundo cerimonial e

fundo de aluguel, gastos necessários em termos técnicos e culturais (1970, p.19). Wolf ainda

acredita que seja necessário que o camponês “contrabalanceie as exigências do mundo

exterior, em relação às necessidades que ele encontra no atendimento às necessidades de seus

familiares” (1970, p.31), sugerindo duas opções, incrementar a produção ou reduzir o

consumo.

Mediante a caracterização, Mendras (1978), que possui o mesmo título de Eric Wolf

(1970), em seu texto denominado Sociedades Camponesas, conclui que o camponês possui

determinadas características que os corroboram. Para Mendras (1978) o camponês é detentor

de autonomia; possui grande importância estrutural dentro do grupo doméstico; possui um

sistema econômico específico; é detentor de relações de interconhecimento e mediador entre a

sociedade local e o exterior. Esses pontos são importantes e abordados por outros autores. É

possível compreender que as “sociedades agrárias e sociedades camponesas caracterizam-se

pela organização que souberam estabelecer no quadro e nas condições que lhes oferecia a

natureza” (MENDRAS, 1978, p. 19). A conclusão que se pode chegar é a de que o camponês

é portador de estruturas específicas que os afirmam.

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A lógica econômica camponesa, o terceiro ponto expresso, é específico e cabe

ressaltá-lo, por ser uma questão muito debatida a respeito da temática. Os conceitos

empregados na economia industrial como: salário, capital e lucro, são inexistentes no

princípio da economia camponesa, uma vez que a importância está mais associada à

sobrevivência do que na acumulação de capital. “[...], com efeito, a economia camponesa, em

princípio, não dá lugar ao dinheiro, é uma economia não monetária” (MENDRAS, 1978, p.

49).

No decorrer do texto, novas características serão incorporadas para que se possa

compreender melhor o campesinato. Outros dois elementos são importantes para a definição

do campesinato e neste texto serão apontados por intermédio de Abramovay (1992); a cultura

tradicional e o modo de vida, observados com mais detalhe através do estudo realizado por

Antônio Cândido13

(1977) no interior do Estado de São Paulo à respeito de um agrupamento

de caipiras. O campesinato para Abramovay possui como traço básico a integração parcial a

mercados incompletos, ou seja, há “flexibilidade entre o consumo e a venda, em função de

circunstâncias ocasionais” (1992, p. 115), isto é, a intenção principal do camponês é alimentar

a família, caso o mercado não esteja vantajoso isso não o prejudica uma vez que seu objetivo

seja alcançado, questão semelhante à de Mendras e demonstrada anteriormente, fato que

afirma a especificidade da lógica econômica camponesa no tradicionalismo camponês.

As necessidades camponesas são representadas tanto no momento presente como

através das futuras gerações. No primeiro ponto Wanderley considera que seja garantida a

partir da “especificidade de seu sistema de produção”; enquanto que, no segundo seja para

garantir “a centralidade da constituição do patrimônio familiar” (1996, p. 3). A

especificidade do sistema de produção é vista através do sistema tradicional de produção,

construído através da policultura e pecuária, garantindo ao agricultor a sua subsistência

imediata, do mesmo modo que há importância em assegurar as relações familiares com vista

no futuro. Wanderley (1996) reitera duas características já expressadas por Mendras: o caráter

de interconhecimento, onde “o individuo convive com outras categorias sociais e assim,

desenvolve-se uma forma de sociabilidade específica, que ultrapassa os laços familiares e de

parentesco” e a autonomia, “a autarquia econômica corresponde, de certa forma, a autonomia

relativa da vida social” (1996, p. 4).

13Cf. CÂNDIDO, 1977.

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37

Em contraposição Wanderley (1996) não considera como essencial do campesinato a

dimensão da produção agrícola, essa não é a confirmação de que a torna camponesa ou não.

Para Abramovay (1992) deve-se antes analisar as relações internas e externas que são

praticadas, pois há no campesinato uma “natureza incompleta da racionalidade econômica”

(1992, p. 130). Ou seja, é preciso analisar os “laços comunitários locais, os vínculos de

natureza personalizada e o caráter extra comunitários das próprias relações de dependência

social, que explicam as particularidades do campesinato” (1992, p. 130); o camponês clássico

é orientado pelas suas tradições, regras e símbolos que não são especificadamente elementos

econômicos. Portanto, esse é um ponto fundamental para compreender o campesinato.

*

O fato das sociedades camponesas terem tradições não as impede de adaptarem-se as

inovações tecnológicas, mas, quanto mais o camponês se associa ao mercado e desse fica

subordinado, mais modificam-se as explorações familiares, que passam gradativamente a

depender do que Mendras denomina como inputs industriais, como petróleo, máquinas,

fertilizantes, alimentos dos gados, etc. (1978, p.57). Porém, “toda inovação põe em causa a

tradição” (MENDRAS, 1978, p.203). Nesse momento, pode-se afirmar que a lógica

camponesa já não é a mesma. Dando início a discussão entre a diferenciação do campesinato

e da agricultura familiar.

Wanderley (1996) contribui para a discussão e formula cinco hipóteses a respeito: a)

agricultura familiar é um termo genérico; b) o campesinato é uma forma encontrada na

agricultura familiar; c) a agricultura familiar encontrada nas sociedades modernas é

adaptada a certos contextos socioeconômicos específicos; d) o que, não demonstra uma

ruptura total com as formas anteriores; e) o caso brasileiro possui determinadas

particularidades comparadas ao conceito clássico de camponês. Wanderley (1996) busca

conceitualizar o termo através da ideia de que a agricultura familiar é ao mesmo tempo aquela

desenvolvida por indivíduos que possuem os meios de produção e são responsáveis pela força

de trabalho empregada na propriedade, o que não difere da ideia de campesinato; portanto,

onde reside a ruptura entre as duas categorias?

Até o momento, foi compreendido que a soma de algumas características denominam

o que é o campesinato, através de um modelo genérico, porém é preciso ressaltar até que

ponto pode-se considerar essa afirmação válida. Wanderley (1996) questiona até onde o

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modelo clássico de camponês pode ser generalizado a todas as sociedades e momentos. Três

pontos são elaborados para esse questionamento: a) o campesinato modificou-se e mesmo

tendo perdido os significados e a importância que possuía, continua a se reproduzir; “pode-se

identificar [...] setores mais ou menos expressivos, que funcionam e se reproduzem sobre a

base de uma tradição camponesa, tanto em sua forma de produzir, quanto em sua vida social”

(WANDERLEY, 1996, p.7); b) formas modernas de agricultura familiar não camponesa

“tentam adaptar-se a este novo contexto de reprodução, transformando-se interna e

externamente em um agente da agricultura moderna” (1996, p.7); c) “a presença dos

agricultores familiares modernos tem sido percebida por alguns estudiosos como o resultado

de uma ruptura profunda e definitiva em relação ao passado” (1996, p.7). O que pode-se

analisar são dois extremos; o campesinato que continua a se reproduzir com significados

distorcidos e uma nova forma que rompe com o campesinato clássico e, entre esses dois

extremos, observa-se uma transição entre os modelos.

Cabe questionar o ator social, para isso Wanderley (2004) supõe duas hipóteses: o ator

social é a reprodução do campesinato clássico com determinadas modificações ou a

emergência de um novo personagem? A análise que nos interessa é em relação às

continuidades e as modificações. Wanderley (2004) nos indica algumas modificações que

ocorreram: a) a suposição de que os camponeses se recusam a produzir além das suas

necessidades; b) rendimento indivisível, ou seja, a criação da necessidade de pagamentos pela

aquisição de equipamentos, juros bancários, insumos, etc.; c) mudança em relação ao tempo,

ou seja, “enquanto o camponês tradicional enfatiza o passado e suas tradições, a agricultura

moderna, ao introduzir a noção de progresso, transfere o primado ao futuro” (WANDERLEY,

2004, p.51).

Nota-se um processo de modificação no campesinato que sofre indefinições a seu

futuro. A agricultura familiar e o campesinato, compreendidos por serem aqueles

desenvolvidos por membros da família, possuidores dos meios de produção e da força de

trabalho, se rompem na definição quando se integram ao mercado, “o desenvolvimento do

capitalismo na agricultura tem por principal efeito a desagregação dos valores e das normas

de relações sociais tradicionais, sobre as quais se apoia a existência das sociedades

camponesas” (ABRAMOVAY, 1990, p.260), emergindo uma nova categoria definida como

agricultura familiar cuja interação com o mercado é intensa.

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Wanderley (2004) ressalta que o conceito de agricultura familiar possui duas

conotações; uma em relação ao que o Estado concebe e outra em relação aos agricultores

capazes de adaptarem-se as exigências modernas impostas, frente aos que não são aptos de

adaptação, ou seja, para Wanderley “a ideia central é a de que o agricultor familiar é um ator

social da agricultura moderna e, de certa forma, ele resulta da própria atuação do Estado”

(2004, p.44). Lamarche (1998) contribui para essa questão ao definir o agricultor familiar

como resultado de uma organização em torno do grau de integração com a economia de

mercado. Portanto, é preciso levar dois pontos em consideração, o nível familiar nos

comportamentos, isto é, a lógica familiar na produção e o grau de dependência do

estabelecimento com o sistema econômico.

Adiante, Lamarche (1998) analisa três temas, como denomina, para compreender o

grau de intensidade das lógicas familiares: a terra, o trabalho e a reprodução familiar. Da

mesma forma, analisa o grau de dependência do agricultor familiar perante a tecnologia,

financeiramente e em relação ao mercado. Segundo Lamarche (1998), a correspondência

dessas categorias define quatro tipos de relações, ou seja, quatro modelos de funcionamento: o

modelo empresa; o modelo empresa familiar; o modelo agricultura familiar e de subsistência

e; o modelo agricultura familiar moderna.

O primeiro modelo exposto caracteriza-se por relações de produção pouco ou não

familiares e são fortemente dependentes do sistema econômico. A diferença entre o modelo

empresa e o modelo empresa familiar diz respeito à lógica familiar encontrada no segundo

modelo e ausente no primeiro, porém, a dependência com o sistema econômico ainda é alta.

Em contrapartida, o modelo de agricultura familiar e de subsistência é o inverso dos

anteriores, por ser definido por uma lógica familiar alta e baixa dependência em relação ao

exterior, portanto, a intenção é satisfazer as necessidades familiares de subsistência. O ultimo

modelo representa um caráter diferenciado pela procura em diminuir a relação familiar na

lógica produtiva ao mesmo tempo em que busca uma maior autonomia, ou seja, uma

liberação das lógicas familiares enquanto que a dependência ligada ao sistema econômico

não é alta (LAMARCHE, 1998).

Cabe, portanto, refletir a respeito de prováveis rumos que o agricultor familiar está

sujeito. Se entendermos que os camponeses compõem uma categoria que vive para garantir a

subsistência, e que o agricultor familiar é fruto de uma transformação determinada pela

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inserção ao mercado, por intermédio do capitalismo, logo, esse terá que subordinar-se ao

mercado para manter-se diferentemente do camponês tradicional.

Houve, portanto, uma modificação na agricultura sob o que Mendras denomina como

forma de cultivos ou criações por contrato, transformando numa proletarização (1978, p. 61)

da família agrícola, que são destinos desenvolvidos dentro da modernização agrícola; de um

lado uma etapa do processo da indústria e de outro a dependência do que a indústria dispõe

para o consumo (MENDRAS, 1978, p. 61), assim, a terra garante a sobrevivência e estabelece

“um sistema de autoconsumo que supõe uma estreita correspondência, entre o que se produz e

o que é consumido, entre o sistema agrário e o regime alimentar” (MENDRAS, 1978, p. 45).

*

O primeiro ponto a concluir refere-se ao termo camponês. Esse termo não é exclusivo

do rural brasileiro, pelo contrário, o que houve foi uma incorporação. No caso brasileiro,

outros termos são encontrados; caipira, caboclo, caiçara etc. notado, principalmente, através

de Cândido (1977). Todavia, muitos autores procuraram definir o campesinato e ainda

continuam generalizando características que englobem em uma só porção diferentes

agricultores e produtores, mas, até que ponto isso é necessário? O tempo e espaço são

características importantes a serem consideradas e que determinam necessariamente as

propriedades. Portanto, a sequência desse trabalho busca caracterizar um determinado tipo de

agricultor encontrado no interior do estado de São Paulo, com intuito de entender, entre outras

coisas, qual ator social ele representa no tempo atual e espaço local.

Anteriormente, pudemos analisar que a discussão sobre o campesinato vem se arrastando por

um longo período e trás consigo novos paradigmas. Nesse capítulo, procurou-se analisar

algumas das principais teorias e conceitos sobre o assunto, questões que contribuíram para o

entendimento da discussão sobre o campesinato, para que seja possível compreender as novas

questões e dinâmicas colocadas no atual cenário da agricultura.

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3. O RURAL CONTEMPORÂNEO NO BRASIL

No capítulo anterior, a discussão sobre a noção de campesinato e agricultura familiar

foi o tema central. Nesse capítulo a intenção é acentuar a ideia de agricultura familiar e

compreender porque esta se encontra numa condição marginal em relação ao agronegócio.

Para analisar esse aspecto é necessário retornar ao processo de modernização agrícola que é

responsável pelo atual cenário agrícola no país.

Sabe-se que a modernização agrícola no Brasil possibilitou um avanço para o setor ao

mesmo tempo em que trouxe impactos socioeconômicos e ambientais que são, muitas vezes,

negados pelas elites empresariais e rurais. Segundo Brandenburg (1999) há duas formas de se

analisar a modernização agrícola; pela ótica da indústria e do processo tecnológico, onde a

baixa eficiência dos instrumentos tradicionais de produção precisa ser substituída; e pela ótica

do agricultor, que busca pertencer ao grupo daqueles não ficam no passado, o que sugere

inúmeras condições negativas.

Este texto busca analisar os aspectos que a modernização inseriu no contexto rural e

sua evolução ao longo do tempo. Compreender a herança da modernização agrícola é

necessário para que seja possível entender o novo ator social que se reproduziu na agricultura

de pequena exploração. Portanto, com a intenção de facilitar a compreensão da exposição,

este texto será dividido em três segmentos.

Primeiramente, o intuito é retomar a história e os conceitos sociológicos que se

referem ao processo de modernização, destacando as principais questões, como o interesse de

determinados segmentos da sociedade em constituí-la.

Na sequência, busca-se expor sobre os impactos socioeconômicos que são decorrentes

do processo de modernização agrícola, ponto de grande interesse a este trabalho. Os impactos

serão determinados e anunciados de modo a compreender os principais agravantes que

resultam do avanço agrícola, este como se verá, amplamente incentivado pelo Estado.

Por fim, o Estado será tema para o último segmento exposto nesse capítulo. O Estado

como fomentador da modernização é responsável por inúmeras questões que dizem respeito

aos rumos da agricultura no país. Será discutido, portanto, sobre a construção das

características de um novo ator social, aquele visto anteriormente e que se reestrutura através

da interação com o mercado. Surgem, dessa forma, novas questões a serem analisadas, entre

elas, maneiras do Estado garantir o beneficio da agricultura familiar, principalmente, através

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de políticas públicas capazes de assegurar melhores condições de produção e,

consequentemente, de vida para esses grupos marginalizados.

3.1. CARACTERISTICAS DO PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA

A agricultura está modernizada. Silva et al. (1983) consideram que a tecnologia é a

responsável por afetar a pequena agricultura, internamente e externamente. A tecnologia

transforma a dinâmica independentemente do sentido que esta assuma; destruir, manter ou

elevar. “Todos esses elementos se associam de uma forma ou de outra ao padrão tecnológico

adotado” (1983, p.21). A modernização por sua vez é um processo dominante e desigual, por

redirecionar o campo a novas dinâmicas (KAGEYAMA, 1987) cujos interesses são das elites

rurais e empresárias.

Graziano da Silva (2003) aborda sobre essa questão a partir da relação entre trabalho e

tempo, como ponto fundamental para o desenvolvimento social, econômico e cultural. Pois,

somente quando houve a „sobra‟ de tempo é que os indivíduos puderam se dedicar a outras

atividades, o que dará inicio à divisão social do trabalho. Portanto, para que isso seja possível,

a produtividade deve ser aumentada, restando duas formas: o aumento da carga horária, que a

certo ponto tornaria impossível ou o aumento do ritmo de trabalho, para produzir mais em

menos tempo.

Esse aumento poderia ser feito através de uma “especialização em determinadas

atividades através de uma adequada divisão de tarefas e pelo uso de ferramentas e máquinas

apropriadas” (2003, p.15), o que se denomina como tecnologia. Portanto, o que Graziano da

Silva (2003) considera é que para aumentar a capacidade produtiva é necessário introduzir

elementos tecnológicos capazes de suprir essa demanda.

O conhecimento disponível para reproduzir elementos capazes de darem suporte à

tecnologia é para Graziano da Silva (2003) um produto social e que “depende do nível de

desenvolvimento e das necessidades técnicas da sociedade” (2003, p.16), portanto, a

tecnologia tem um papel econômico, por aumentar a produtividade e, consequentemente,

funcionando como uma dominação social, visto que esta não está disponível para todos de

forma igual. Em outras palavras, a tecnologia atualmente tem servido para a reprodução do

capitalismo que tem como fundamento a acumulação do capital.

Dois fatores podem ser determinantes para a produtividade agrícola e,

consequentemente, para o seu aumento; fatores naturais e mecânicos. As condições naturais

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sempre foram primordiais para o avanço de qualquer produção agrícola o que a torna um

motivo de preocupações. Os ciclos biológicos não podem ser alterados, porém, podem e são

melhorados para desenvolver um melhor aproveitamento e qualidade, determinando uma

maior produtividade. Da mesma forma os maquinários agrícolas são desenvolvidos para

melhorar as condições de produtividade e assim, aumentar o capital final da produção. A

terra, principal responsável pela produção, pois é ela que garante o ciclo biológico, torna-se

um bem material capaz de ser apropriável privadamente e que dará início à propriedade

fundiária e, posteriormente, a conflitos pelo acesso à terra (GRAZIANO DA SILVA, 2003).

Uma vez dono de uma parcela de terra, o proprietário tem direitos sobre ela, e como se

sabe nem todos os solos possuem as mesmas qualidades físicas, químicas ou biológicas o que

agravará situações de diferenciação, pois aqueles que possuem maior quantidade de capital,

consequentemente, terão acesso às melhores terras, da mesma forma que às melhores

tecnologias disponíveis. Graziano da Silva (2003) ressalta que há duas maneiras de adquirir

terras: pela compra ou arrendamento de áreas já apropriadas privadamente ou então através

das novas fronteiras agrícolas que consistem em áreas ainda não apropriadas e que,

geralmente, são distantes dos centros econômicos.

Portanto, “a possibilidade de expandir a fronteira agrícola de um país funciona como

alternativa à intensificação da produção” (GRAZIANO DA SILVA, 2003, p.34). O resultado,

geralmente, é a concentração de terra por poucos indivíduos capitalizados, uma vez que as

tecnologias disponíveis já não são suficientes para aumentar a produtividade em determinada

área e, consequentemente, o crescente aumento dessa produtividade que exclui aqueles que

não são capazes de acompanhar a modernização, como os pequenos agricultores.

Dessa forma, as inovações tecnológicas na agricultura servem para dar suporte ao

processo capitalista de acumulação de capital, portanto, a tecnologia nada mais é do que uma

forma de reduzir tempo e melhorar qualidade. Graziano da Silva ressalta que:

O sistema capitalista desenvolveu as forças produtivas a um grau tal

que; a produção é um ato social por excelência e, todavia, a

apropriação dos meios de produção e dos resultados dessa produção

social são ainda privados (2003, p.55).

Os pequenos produtores que estão à margem do mercado são obrigados a

comercializarem fora do mercado principal, o que Graziano da Silva (2003) chamará de

“concorrência intercapitalista”, e muitos são obrigados a abandonar a produção agrícola,

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“confirmando assim, o caráter excludente da modernização capitalista no campo” (2003,

p.59).

As tecnologias alternativas são desenvolvidas com vista nessa questão de exclusão,

portanto, serve como uma forma de resistência à dominação capitalista, caso da

pluriatividade, porém, no momento em que o pequeno produtor já não mais consegue se

reproduzir como tal, inicia-se o caráter de proletarização e, geralmente, o êxodo rural.

Já foi analisado que há uma grande diferenciação entre as pequenas e grandes

explorações. Graziano da Silva (2003) analisa as diferenças entre as pequenas explorações,

onde há aquelas que possuem mais capitais investidos em tecnologia, considerada como uma

pequena empresa familiar, e aquelas em processo de proletarização e marginalização da

atividade agrícola. Segundo o autor a necessidade de compreender esses modelos se faz por

concluir quais as reais necessidades e reivindicações dessas categorias, para que seja possível

criar mecanismos, e projetos políticos e socioeconômicos.

*

Nos anos 1950, uma proposta de desenvolvimento influenciada pelo projeto

nacionalista de Getúlio Vargas somado a duas missões econômicas do governo norte

americano, desenvolveu-se no país a ideia de que a industrialização seria a solução para o

desenvolvimento econômico. A agricultura, que sofria um processo de estagnação, teria o

papel de fornecer a matéria prima para a indústria, tanto de bens materiais como de

alimentação, a fim de diminuir as importações e aumentar as exportações. Havia também o

intuito de ampliar o mercado consumidor interno, desenvolvido principalmente pela burguesia

industrial, que acreditava que o monopólio de terras exclui os pequenos agricultores de

produzirem e, consequentemente, consumir. (GRAZIANO DA SILVA, 2003).

Porém, é a partir dos anos 1960 que a modernização agrícola se consolida no país,

conforme analisa Martine (1990) que a divide em três principais fases.

A modernização conservadora tem início em 1965 e se estende até 1979, época em

que o país vive sob o regime de ditadura militar, e que ganha destaque através da

consolidação do parque industrial; da instauração do desenvolvimento visando à

modernização conservadora; da ascendência do ciclo econômico conhecido como milagre

econômico; da ampliação do crédito rural subsidiado e de incentivos a produção agrícola,

grande responsável pela consolidação da modernização agrícola; da internacionalização do

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pacote tecnológico da Revolução Verde; da melhoria dos preços internacionais para produtos

agrícolas, etc. (MARTINE, 1990).

Essa primeira fase tem um impacto muito forte sobre as técnicas e produções que eram

realizadas, pois ela é responsável por alterar significativamente as dinâmicas anteriores

consideradas menos eficientes. A modernização resultará diretamente numa diferenciação

produtiva e, consequentemente, socioeconômica. Os indivíduos com mais capital financeiro

poderão produzir em terras mais férteis e serão beneficiados com créditos e subsídios, pela

pesquisa, pela tecnologia e pela assistência técnica, com a finalidade de produzir para o

mercado externo e para a agroindústria. Os indivíduos com menos capital financeiro

produzirão em menores proporções e em áreas menores, solos menos férteis e através de

técnicas tradicionais para mercados marginais (MARTINE, 1990).

1980 a 1984 é compreendido como um período de crise decorrente da diminuição de

oferta de créditos subsidiados para a agricultura. O que houve na realidade, segundo Martine

(1990), foi à seletividade da oferta de crédito para determinados setores agrícolas, entre os

quais, a cultura canavieira. De 1985 a 1989, a terceira fase, é caracterizada como um período

de super-safras incentivadas pela exportação dos produtos, segundo Martine (1990).

Comprovadamente no sistema capitalista há vantagens a produções em maior escala,

acessíveis apenas para aqueles que possuem capital para investir, da mesma forma que “para

viabilizar a adoção de novas técnicas, é preciso ser mais informado, ter atitudes empresárias e

capacidade de endividamento” (MARTINE, 1990, p.19), fatores que, geralmente, não são

aptas aos agricultores familiares.

As vantagens redirecionadas à grande produção estão acobertadas pelo Estado e que

atualmente correm o risco de estagnação da produção agrícola, caso os estímulos através de

subsídios e políticas públicas sejam reduzidos (MARTINE, 1990), fato que não interessa às

elites.

A modernização trouxe o desenvolvimento do mercado interno, que por sua vez, traz a

divisão do trabalho, que com o tempo é acentuada por transformar a lógica de uma agricultura

de subsistência em uma agricultura de negócios, denominada posteriormente como

agronegócio. Sauer (2008) observa a popularização do termo agronegócio no Brasil a partir da

década de 1990, e ressalta que o termo procura caracterizar “as atividades agropecuárias que

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utilizam técnicas de produção intensiva e de escala, o que gera aumento de produção e da

produtividade” (2008, p.16).

Uma vez o mercado interno ampliado, cria-se a necessidade de consumo de outros

setores, como máquinas e insumos, e do próprio setor como sementes e reprodutores animais,

onde antes não eram comercializados e assim, dinamiza a economia nacional. Porém, cabe

ressaltar que o processo de modernização não é democrático, como analisado anteriormente e,

portanto, não é acessível a todos os agricultores de maneira igual, o que demonstra um caráter

elitizado que cada vez mais acentua os problemas socioeconômicos.

A modernização agrícola nacional só seria possível através de amplos incentivos e

caberia ao Estado tomar partido para executar esse processo, portanto, o governo brasileiro

estimulou e subsidiou intensamente a modernização agrícola. O meio rural passa a ser um

grande mercado consumidor para a indústria, principalmente, tendo o crédito rural como a

base da modernização (MARTINE; BESKOW 1987).

Silva et al. (1983) apontam pela formulação do crédito rural em 1965 e

operacionalizado dois anos mais tarde, sendo o maior responsável pela modernização que

aumenta e aperfeiçoa a produção agrícola, dando suporte para o avanço da modernização. O

seu sucesso está diretamente ligado a atores sociais, como a burguesia agrária, os bancos, as

empresas agrícolas, o Estado, etc. como sugerem Martine e Beskow (1987).

*

A produção de agro combustível pode ser considerada como herdeira do processo de

modernização agrícola. O agro combustível ganha notoriedade nas últimas décadas por ser

uma solução para os problemas climáticos, resultantes da queima de energias fósseis e pelo

futuro esgotamento dessas energias. Surge baseado num discurso de energia limpa e

renovável e pela preservação do meio ambiente, incorporando também a noção de progresso

que está vinculado ao agronegócio (ASSIS; ZUCARELLI, 2007). Porém, a realidade por trás

desse discurso é outra, o que realmente ocorre é a acentuação de problemas socioeconômicos

e ambientais, derivados do aumento da produção dos agro combustíveis no Brasil. Pois, como

sabe-se, não é a preservação do mundo o interesse principal do sistema capitalista.

O Programa Nacional do Álcool, Proálcool, inicia na década de 1970,

especificadamente em 1975 pelo decreto n° 76.593, com a intenção de incentivar a produção

de agro combustíveis frente ao crescente aumento dos preços do petróleo.

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De acordo com o decreto, a produção do álcool oriundo da cana-de-açúcar,

da mandioca ou de qualquer outro insumo deveria ser incentivada por meio

da expansão da oferta de matérias-primas, com especial ênfase no aumento

da produção agrícola, da modernização e ampliação das destilarias existentes

e da instalação de novas unidades produtoras, anexas a usinas ou autônomas,

e de unidades armazenadoras (BIODIESELBR ONLINE).

No inicio do programa, de 1975 a 1979, ocorreu a adição de álcool anidro à gasolina,

para diminuir a quantidade do combustível fóssil. Posteriormente, compreendida como fase de

afirmação, entre 1980 e 1986, o governo adota medidas ao Proálcool e são criados organismos

como o Conselho Nacional do Álcool - CNAL e a Comissão Executiva Nacional do Álcool -

CENAL para agilizar o programa (BIODIESEL ONLINE). De 1986 a 1995 houve a fase de

estagnação decorrente da baixa do preço do barril de petróleo. Em seguida há a redefinição do

programa com o intuito de direcionar políticas para o setor sucroalcooleiro. É criado em 1997,

o Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool – CIMA e assim, a produção de etanol tem

aumentado, com a ajuda da variação que o preço do petróleo tem sofrido no mercado

internacional somado à meta dos países desenvolvidos de adicionarem álcool à gasolina,

ampliando o mercado consumidor, bem como, com o desenvolvimento e aperfeiçoamento de

carros flex. (WILKINSON; HERRERA, 2008). Atualmente, o próprio setor considera que;

O Brasil vive agora uma nova expansão dos canaviais com o objetivo de

oferecer, em grande escala, o combustível alternativo. O plantio avança além

das áreas tradicionais, do interior paulista e do Nordeste, e espalha-se pelos

cerrados. A nova escalada não é um movimento comandado pelo governo,

como a ocorrida no final da década de 70, quando o Brasil encontrou no

álcool a solução para enfrentar o aumento abrupto dos preços do petróleo

que importava. A corrida para ampliar unidades e construir novas usinas é

movida por decisões da iniciativa privada, convicta de que o álcool terá, a

partir de agora, um papel cada vez mais importante como combustível, no

Brasil e no mundo. (BIODIESELBR ONLINE).

O Estado incentiva a produção de Biodiesel por agricultores familiares através do

Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) “que objetiva a implementação

de forma sustentável, tanto técnica, como econômica, da produção e uso do biodiesel, com

enfoque na inclusão social e no desenvolvimento regional, via geração de emprego e renda”.

O PNPB é um programa que surge com características diferentes das adotas pelo Proálcool

que resultou em problemas socioambientais, porém cria inúmeras dúvida a respeito da sua

atuação, o Selo Combustível Social pertencente ao programa funciona como um incentivo

para os produtores de Biodiesel adquirirem matéria prima proveniente da agricultura familiar

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através da diferenciação das taxas de PIS/Pasep e Cofins14

, conforme Abramovay e

Magalhães (2007) os estímulos do PNPB oferecem para os agricultores familiares condições

de inserção em mercados dinâmicos através de três aspectos: os incentivos para a formação de

um novo modelo organizacional; os estímulos à adoção de novos padrões técnicos e o

estímulo à adoção de modelos estratégicos de responsabilidade social por parte das empresas

e que, consequentemente, integra e subordina o agricultor familiar às estruturas das quais

ficará cada vez mais dependente.

Portanto, fica claro o interesse no avanço da modernização para a elite, pois esta

garante a esses atores sociais grandes benefícios. Resultado que coloca o agricultor familiar

cada vez mais à margem do sistema, porque evidentemente não possui as mesmas condições

das grandes explorações para se submeter a essas novas tecnologias e trará às pequenas

explorações novas necessidades que elas não são capazes de acompanhar.

Anteriormente foi analisado que a modernização não foi e continua não sendo um

processo democrático. Portanto, evidentemente, nem todos foram beneficiados e assim,

segundo Kageyama (1987) a pequena agricultura começa a perder espaço e é gradativamente

substituída por grandes produtores. Destino teorizado por Kautsky (1985), onde o autor

considerava que as pequenas explorações iriam subordinar-se às grandes explorações com o

avanço do capitalismo.

Pode-se considerar que a modernização agrícola eleva a agricultura de grandes

proporções a patamares maiores em produtividade, gerando capital financeiro, e exclui a

agricultura realizada em pequena escala. Cabe analisar quais são os resultados do processo da

modernização agrícola.

3.2. PRINCIPAIS IMPACTOS DA MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA

A modernização agrícola acentua as diferenças no campo que são delimitadas através

da proletarização, da concentração fundiária, do êxodo rural, da concentração de renda etc.,

não necessariamente nessa ordem. A modernização ainda intensifica os processos mecânicos

e de insumos químicos, o nível de circulação de mercadorias, de financiamento das atividades

agrícolas e de relações de emprego, e acreditar que a modernização traz empregos é um

equivoco. O que se estabelece é o desemprego visto que a proliferação de empregos é sazonal

como lembram Silva et al. (1983).

14

Id. Disponível em: http://www.mda.gov.br/portal/saf/programas/biodiesel/2286313

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Com resultados diversos, a proletarização dos pequenos agricultores é algo comum e

ocasionada pela incapacidade desses de acompanhar a modernização agrícola, mas que

segundo Graziano da Silva (2003) permanecem como parte daqueles que se mantém no

campo empregando a força de trabalho a terceiros. “É exatamente essa característica

fundamental que diferencia a pequena produção agrícola na órbita das economias capitalistas

periféricas” (GRAZIANO DA SILVA, 2003, p.103), ou seja, o pequeno agricultor se vê

obrigado a empregar força de trabalho a terceiros.

Graziano da Silva (2003) indica quatro características que confirmam a exploração dos

trabalhadores rurais decorrente da modernização agrícola: o trabalho acessório, de grande

expressão no meio rural e que visa à complementação da renda familiar; longas jornadas de

trabalho, a necessidade do indivíduo em trabalhar para um patrão e empregar força de

trabalho na sua propriedade, as baixas rendas e a baixa produtividade, considerada como

resultante das características anteriores. “O excesso de trabalho, combinado com a

insuficiência de renda e precariedade institucional das relações de trabalho, é uma

característica marcante [...]” (2003, p.123).

O padrão trabalhista desenvolvido através da modernização é responsável por

desorganizar os antigos sistemas tradicionais de relações de trabalho, contribuindo para o

trabalho temporário, e que redefine as remunerações e que segundo Hoffman e Kageyama

(1985) são responsáveis por reforçar o processo de acumulação de renda.

Desde o incentivo da modernização, a concentração latifundiária tem crescido e

caracteriza-se como uma estrutura que evoluiu num sentido concentrador e excludente

(GRAZIANO DA SILVA, 2003). A cana-de-açúcar no Estado de São Paulo, que inclui o

município de Ourinhos na análise, é um caso importante, visto que a expansão da produção,

beneficiada principalmente pelo Proálcool, aumenta a áreas monocultoras e assim, expulsa os

pequenos produtores que ficam entre as grandes produções (HOFFMAN; KAGEYAMA,

1985).

A concentração fundiária que irá se agravar com o processo de modernização tem

grande responsabilidade sobre o êxodo rural, processo que eleva as taxas de ocupações nas

cidades, inchando as periferias e desenvolvendo inúmeros agravantes socioeconômicos. A

modernização que historicamente beneficiou a participação das camadas mais ricas confirma

o caráter de acumulação de renda na agricultura, uma vez que esses são os responsáveis por

empregar o capital que se reverte em acumulação, posteriormente. Assim, conforme Hoffman

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e Kageyama (1985), a expansão da modernização significa a acentuação da concentração

fundiária e de renda.

O êxodo rural, portanto, torna-se a “expressão máxima de acumulação primitiva de

capital” (SAUER, 2008, p.60) e é resultado direto do processo de verticalização da

agricultura, decorrendo da modernização agrícola.

“As características da tecnologia, somadas às condições estruturais, institucionais e

políticas, redundavam num aumento da desigualdade de renda preexistente” (HOFFMAN;

KAGEYAMA, 1985, p.172). Assim, o pacote tecnológico reforçava a desigualdade, através

de benefícios, em favor dos maiores produtores que eram capazes de acumular capital

financeiro. (HOFFMAN; KAGEYAMA, 1985).

A diferenciação socioeconômica tem início na modernização, no momento em que a

necessidade de investimento é determinada, não sendo acessível a todos, da mesma forma que

a necessidade de garantias para o acesso a créditos, “assim, os maiores produtores são

beneficiados, reforçando sua capacidade inicial de acumulação de capital” (HOFFMAN;

KAGEYAMA, 1985, p.173), enquanto que a pequena exploração direciona-se para

tecnologias que necessitam de menores investimentos, como é o caso dos insumos químicos.

Portanto, Hoffman e Kageyama (1985) resumem que as características tecnológicas,

associadas às distribuições de recursos institucionais e produtivos, redistribuem a renda e

aumenta a desigualdade.

Desse modo, Hoffman e Kageyama (1985) acreditam que as características da

modernização agrícola brasileira, em especial as que influem no processo de produção, como

a mecanização, da mesma forma que as políticas ligadas aos créditos, são os maiores

responsáveis pela sustentação das desigualdades no campo.

Os dois autores lançam uma questão importante, que esse trabalho, tem como intenção

responder. “Se a modernização da agricultura tende a agravar as já agudas disparidades de

renda, deve-se então tentar abrandar seus efeitos freando o próprio processo? A solução é uma

agricultura tecnologicamente atrasada, porém socialmente mais justa?” (HOFFMAN;

KAGEYAMA, 1985, p.205).

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51

3.3. O PAPEL DO ESTADO

A tecnologia está ligada diretamente ao funcionamento da pequena propriedade

agrícola, uma vez que ela causa transformações tanto internamente como externamente. A

variável tecnologia é responsável por determinar os processos de produção e de trabalho e,

consequentemente, o grau de mercantilização. Portanto, “a política tecnológica para o setor de

pequenos produtores emerge como um elemento chave no contexto da transformação

dinâmica do setor, no sentido de destruir, manter ou elevar a economia” (GRAZIANO DA

SILVA, 2003, p.137). Os impactos sobre a agricultura familiar de pequena exploração são

agravados com a acentuação e crescimento do agronegócio, ponto anteriormente analisado.

Com a intenção de colaborar com o desenvolvimento do sistema agrícola no país, o

Estado cria duas empresas para tal finalidade; a Embrapa e a Emater, uma voltada a pesquisas

agropecuárias e outra a assistência técnica rural. Porém, Silva et al. (1983) demonstram que a

criação dessas estruturas não se fez em função do pequenos agricultores, mas sim para atender

às demandas dos setores industriais.

A questão colocada por Hoffman e Kageyama (1985) pode ser justificada, à medida

que criam-se condições que beneficiem a agricultura familiar, o que não sugere que haja um

rompimento com o progresso técnico já estabelecido, através da modernização que veio e

continua sendo assistindo no país, portanto, não é preciso frear o próprio processo e nem

condicionar o agronegócio ao atraso. A intenção, portanto, é criar medidas que valorizem a

pequena agricultura. Assim, quais são essas medidas e a quem cabem criá-las, para beneficiar

as pequenas explorações, que há muito tempo vêm sofrendo com o processo de

marginalização?

Há alternativas que possam colaborar e incentivar a agricultura familiar; tecnologias

adequadas às condições da pequena agricultura e adequação dessas condições às tecnologias

disponíveis, conforme Silva et al. (1983) que afirmam da necessidade de desenvolver

pesquisas e assistência técnica voltadas a condições particulares, da mesma forma que tornar

acessíveis políticas que garantem a incorporação das tecnologias já disponíveis para a

pequena exploração e então, incentivar instrumentos como política de preços, para garantir

um ganho real, considerando que a modernização é responsável por altos custos; créditos,

através de taxas diferençadas que garantam vantagens para a agricultura familiar arcar com as

novas tecnologias; comercialização, criando uma concorrência comercial para que o agricultor

familiar não fique subordinado a mercados monopolizados, e por fim o que Silva et al (1983)

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consideram como de suma importância: a necessidade do Estado intervir para que a pequena

agricultura não se submeta ao mercado monopolizado e assim fique refém desse.

Silva et al. (1983) indicam medidas que colaborariam com a melhoria da

produtividade desses pequenos agricultores: investimentos em pesquisa que garantem

qualidade a sementes e matrizes animais; investimento em máquinas de menor potência;

desenvolvimento de sistemas cooperativos de utilização de maquinário; financiamentos com

juros diferenciados. Muitas dessas medidas já estão em andamento, porém, será que

necessariamente têm beneficiado o pequeno agricultor?

O papel do Estado é imprescindível na elaboração de meios para beneficiar a

agricultura. Graziano da Silva (2003) cita duas políticas: agrária, que diz respeito às relações

de produção, às formas de organização, ao nível de renda, distribuição de propriedade de terra

etc. e agrícola, que diz respeito à produção e suas etapas, como necessárias para criar uma

nova dinâmica agrícola. Porém, é preciso considerar as categorias sociais envolvidas na

atividade rural para que seja possível conduzir as políticas agrárias e agrícolas, pois apenas

desse modo é possível atingi-las.

O crédito rural incentivado pelo governo através das políticas agrícolas foi um grande

responsável pela modernização e, consequentemente, pela diferenciação socioeconômica vista

atualmente. Mattei (2006) ressalta a questão ao identificar que durante o processo de

modernização, as políticas públicas agrícolas, privilegiaram os setores mais capitalizados e a

esfera produtiva do agronegócio, ponto que reafirma o que vem sendo discutido.

Para o setor da produção familiar, o resultado dessas políticas foi altamente

negativo, uma vez que grande parte desse segmento ficou à margem dos benefícios

oferecidos pela política agrícola, sobretudo nos itens relativos ao crédito rural, aos

preços mínimos e ao seguro da produção. De um modo geral, pode-se dizer que até

o início da década de 1990 não existia nenhum tipo de política pública, com

abrangência nacional, voltada ao atendimento das necessidades específicas do

segmento social de agricultores familiares, o qual era caracterizado de modo

meramente instrumental e bastante impreciso no âmbito da burocracia estatal

brasileira (MATTEI, 2006, p.13).

A criação do Pronaf, segundo Sauer (2008), está ligada à necessidade de políticas

públicas voltadas para a agricultura de baixa produtividade, como Silva et al. (1983) julgavam

necessárias. Em 1996 cria-se o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

(Pronaf), para a implantação de políticas de desenvolvimento rural específicas para as

pequenas explorações que sempre estiveram fragilizadas em termos de capacidade técnica e

de inserção nos mercados agropecuários (MATTEI, 2006).

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53

O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) financia

projetos individuais ou coletivos, que gerem renda aos agricultores familiares e

assentados da reforma agrária. O programa possui as mais baixas taxas de juros dos

financiamentos rurais, além das menores taxas de inadimplência entre os sistemas de

crédito do País. O acesso ao Pronaf inicia-se na discussão da família sobre a

necessidade do crédito, seja ele para o custeio da safra ou atividade agroindustrial,

seja para o investimento em máquinas, equipamentos ou infraestrutura de produção

e serviços agropecuários ou não agropecuários (MDA).

Do ponto de vista operacional, o Pronaf concentra-se em quatro grandes linhas de

atuação, a saber: a) financiamento da produção: o programa destina anualmente

recursos para custeio e investimento, financiando atividades produtivas rurais em

praticamente todos os municípios do país; b) financiamento de infraestrutura e

serviços municipais: apoio financeiro aos municípios de todas as regiões do país

para a realização de obras de infraestrutura e serviços básicos; c) capacitação e

profissionalização dos agricultores familiares: promoção de cursos e treinamentos

aos agricultores familiares, conselheiros municipais e equipes técnicas responsáveis

pela implementação de políticas de desenvolvimento rural; d) financiamento da

pesquisa e extensão rural: destinação de recursos financeiros para a geração e

transferência de tecnologias para os agricultores familiares (MATTEI, 2006, p.15).

O termo agricultura familiar emergia na década de 1990 num contexto político que

tinha os movimentos sociais ligados ao campo como centro da discussão. O termo agricultura

familiar surgiu para incorporar categorias sociais que não são mais identificadas como

camponesas e que, posteriormente, recebe legitimidade do Estado a partir da criação do

Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar em 1996 (SCHNEIDER,

2003), conforme foi analisado no capítulo anterior. “Assim, a criação do Pronaf representa a

legitimação, por parte do Estado, de uma nova categoria social – os agricultores familiares –

que até então era praticamente marginalizada em termos de acesso aos benefícios da política

agrícola” (MATTEI, 2006 p.14).

Ponto, anteriormente, demonstrado por Wanderley (2004, p.43) e exposto neste texto,

onde a autora ressalta que o conceito de agricultura familiar possui duas conotações; uma em

relação ao que o Estado concebe e outra em relação aos agricultores capazes de se adaptarem

às exigências modernas impostas frente aos que não são aptos de adaptação, ou seja, para

Wanderley “a ideia central é a de que o agricultor familiar é um ator social da agricultura

moderna e, de certa forma, ele resulta da própria atuação do Estado” (2004, p.44).

O Pronaf, deve-se lembrar, destina-se a promover o desenvolvimento sustentável do

meio rural, a partir do aumento da capacidade produtiva, geração de empregos,

elevação da renda e melhoria da qualidade de vida dos agricultores familiares. Para

isso, o crédito do PRONAF deve dar apoio financeiro às atividades agropecuárias e

não agropecuárias (turismo rural, produção artesanal, agronegócio familiar e

serviços no meio rural), que sejam compatíveis com a natureza da exploração rural e

com o melhor emprego da mão-de-obra familiar (MINISTÉRIO, 2002 apud

KAGEYAMA, 2003, p.2).

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Sauer (2008) ressalta uma discussão importante na qual Abramovay crítica Germer.

Este demonstra que a agricultura familiar no Brasil é uma união errônea entre a teoria de

Chayanov com o conceito de farmer americano. O que resultaria, segundo Germer, numa

falsa ideia de que todos os pequenos agricultores poderiam tornam-se prósperos farmers.

Abramovay em contrapartida esclarece que o acesso à terra e a criação de alternativas que

cooperem com o desenvolvimento da agricultura familiar estabelece bases para a prosperidade

dessa.

O Estado, dessa forma, constitui um agente de principal importância, cuja atuação se

orientou ora no sentido da exclusão econômica e social das parcelas importantes da

população camponesa, ora no sentido inverso, de inserção de outras parcelas, ora

ainda com objetivos clientelísticos, através de medidas assistencialistas, em muitos

casos meras reprodutoras da miséria rural e urbana (LAMARCHE (coord.), 1998, p.

30/31).

É preciso, portanto, criar mecanismos e políticas públicas capazes de suportar a

dicotomia que se estabeleceu no campo, visando o favorecimento da pequena agricultura, pelo

fato de historicamente ela estar marginalizada no sistema econômico.

*

Graziano da Silva (2003) diferencia três categorias de produtores rurais encontrados

no Brasil: a) os grandes proprietários e capitalistas agrários; b) os agricultores familiares e; c)

os produtores camponeses. Dois modelos foram, exclusivamente, discutidos a respeito do

produtor rural no capítulo anterior, voltados às pequenas explorações, aquele produtor de

subsistência, definido geralmente como camponês, e aquele produtor que possui uma

integração com o mercado maior e não deixa de ser uma criação contemporânea. Porém, um

terceiro modelo tem sido incluído nas discussões atuais, são os produtores considerados com

pluriatividade (GRAZIANO DA SILVA, 2003).

Ou seja, são produtores que diversificam suas fontes de renda, dividindo com a

família, para que seja possível completá-las com atividades agrícolas ou não agrícolas. Pode-

se entender que essa seja uma pratica atual decorrente das modificações que a modernização

agrícola sugeriu ao meio rural. Adiante, no próximo capítulo, será exposto acerca dessa nova

dinâmica e como ela se insere no contexto agrícola do município de Ourinhos (SP).

No decorrer deste capítulo foi analisada a supremacia que as grandes explorações

possuem no sistema econômico frente às outras categorias, que geralmente, situam-se à

margem desse sistema. Graziano da Silva (2003) considera as transformações impostas pela

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modernização, que por sua vez, decorre do processo capitalista, e ressalta desde as mudanças

técnicas e o endividamento, etc., até a especialização de uma região numa produção, caso da

cana-de-açúcar no município de Ourinhos (SP), responsáveis por pressionarem as pequenas

explorações obrigando-as a transformarem suas dinâmicas a fim de sobreviverem.

Estende um grande esforço, por conta desses produtores, para permanecerem no

campo, pois as modificações implicam na crescente submissão ao mercado e,

consequentemente, o endividamento, uma vez que esse precise de capital disponível para

investimento. A pluriatividade, portanto, segundo Graziano da Silva (2003), é decorrente das

mudanças estruturais e sugere elaborar novas dinâmicas e soluções para a agricultura de

pequena exploração, visto que não basta apenas reintegrar as categorias marginalizadas pela

modernização agrícola ao sistema econômico. É preciso criar estruturas e infraestruturas

capazes de elevar as condições socioeconômicas adaptadas às novas necessidades.

“Uma política de desenvolvimento rural precisa articular um amplo conjunto de outras

políticas não agrícolas que amparem os trabalhadores rurais mais desfavorecidos, de modo a

permitir que, eles mesmos, superem a condição de miséria em que se encontram”

(GRAZIANO DA SILVA, 2003, p.230).

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4. O RURAL QUE PERMANECEU

O objetivo desse capítulo é apresentar algumas características referentes ao rural do

município de Ourinhos (SP). Um universo que ao longo do tempo vem se modificando,

porém, sempre mantendo uma lógica semelhante ao início do século XX; isto é, a atividade

monocultora, que ganha cada vez mais espaço no município por conta dos investimentos e do

retorno financeiro que essa proporciona.

As principais características rurais do município possuem diversas semelhanças com

outras regiões do Estado de São Paulo e do Brasil, principalmente no que tange ao

agronegócio e a agricultura familiar, por serem fomentados por programas e projetos de

extensa abrangência.

Este capítulo será dividido em dois segmentos, onde o primeiro tem como intenção

demonstrar as características propriamente ditas, através dos principais pontos que atuam no

município; estes serão expostos de forma independente configurando subitens. O segundo

segmento tem como objetivo concluir a respeito do processo da modernização.

4.1. A ESTRUTURA RURAL EM OURINHOS (SP)

No município de Ourinhos (SP) a produção de cana de açúcar analisada a partir dos

dados do Estado de São Paulo, através do Lupa 1995/1996 e 2007/2008, constatam que o

aumento da produção nesse período foi de aproximadamente 14%. Em contrapartida, houve a

diminuição no total de unidades de produção de 73 para 65. Na última safra do ano de 2012,

segundo dados do CanaSat15

, o município de Ourinhos (SP) teve 13.116 (ha) de cana de

açúcar disponíveis para colheita. O gradativo aumento dessa produção traz consigo a

acentuação de problemas socioeconômicos e ambientais para o município, como pode ser

analisado anteriormente. Portanto, o discurso que é pautado na justificativa da preservação

climática é equivoco e pode ser comprovado empiricamente.

O setor sucroalcooleiro na região de Ourinhos (SP) tem início a partir do surgimento

dos alambiques que, posteriormente, deram lugar às destilarias e usinas. Assim como todas as

empresas desse setor, as empresas da região vêm modernizando-se ao longo do tempo para

continuar a concorrer no mercado (SELANI, 2005). A justificativa em demonstrar esses dados

15

CANASAT. Mapeamento da cana via imagens de satélite de observação da Terra. <Disponível em: http://www.dsr.inpe.br/laf/canasat/cultivo.html>

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se dá devido à cultura canavieira em Ourinhos (SP) ser a maior em área e produção do

município, como será demonstrado.

O cultivo de monocultura em grandes áreas é apontado como expoente das

desigualdades no campo e, portanto, uma barreira para a reprodução da agricultura familiar,

que sofre modificações nas suas estruturas socioeconômicas (ASSIS; ZUCARELLI, 2007). A

expansão em termos geográficos da monocultura traz impactos para a pequena produção por

ser esta pouco ordenada, tanto na questão social como juridicamente e, consequentemente,

aumenta a concentração da propriedade fundiária, o que prejudica a agricultura familiar que

acaba, muitas vezes, arrendando a área da propriedade para as produções majoritárias, o que

agrava o êxodo rural, modificando as estruturas originais, inchando as regiões urbanas e

aumentando os problemas socioeconômicos do município.

“O caboclo vai pra cidade e trabalha de serviço braçal, tá ganhando até mais que na

propriedade” (Produtor de Leite no Município de Ourinhos). A população rural, desde a Lei

Estadual n.º 1.618, de 13 de dezembro de 1918, que elevou Ourinhos à condição de

município, teve um aumento expressivo até a década de 1960 que, coincidentemente, foi a

mesma época de intensificação da modernização agrícola no país. A partir da década de 1970

a população rural decai, enquanto que a população urbana aumenta progressivamente. Dados

apresentados a seguir:

TABELA 2 – EVOLUÇÃO POPULACIONAL DO MUNICÍPIO DE OURINHOS (SP)

1918 1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010

Urbana 1,000 6,666 13,457 25,762 41,059 52,698 70,399 90,696 100,374

Rural 3,000 6,457 7,628 8,940 8,134 7,060 6,235 3,172 2,661

Total 4,000 13,123 21,085 34,702 49,193 59,758 76,634 93,868 103,035

Urb. % 25 50,80 63,82 74,24 83,47 88,19 91,86 96,62 97,42

Rur. % 75 49,20 36,18 25,76 16,53 11,81 8,14 3,38 2,58

T. % 100 100 100 100 100 100 100 100 100

FONTE: LEITE, A., 2012*

NOTA: o acesso a esses dados foram feitos em 2012 em vista de uma apresentação do XVII Encontro Nacional

de Geógrafos.

Brandenburg (1999) considera que os pequenos agricultores preservam certas

condições simbólicas intrínsecas ao meio rural e as reproduzem; o mundo da tradição, da

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sabedoria popular, das leis divinas, etc.. A Igreja torna-se um ponto central na referência

cultural da tradição ruralista, sendo responsável pela integração da comunidade, que pode ser

verificada através dos hábitos e das festas. Portanto, com o avanço da modernização as

estruturas são modificadas e inúmeras questões ficam a mercê, o que certamente causa uma

determinada dramaticidade para esses indivíduos tradicionais.

Wanderley (2000) confirma ao demonstrar que “as sociedades rurais tradicionais

sofreram um intenso processo de transformação: perderam a autonomia relativa que possuíam

e se integraram econômica, social e culturalmente à sociedade „englobante‟”. (JOLLIVET;

MENDRAS, 1971; JOLLIVET, 1974 apud 2000, p.93). Haverá, portanto, um processo que

mudará a lógica de produção, considerada tradicional ao campesinato, para uma lógica de

integração com os mercados que, transformará também as lógicas sociais e culturais.

O rural sente essa interferência externa, pois o universo rural é mais coeso e menos

heterogêneo, o rural é um espaço para a prática de solidariedade (CÂNDIDO 1977), e da

“noção de pertencimento local” (FRANCO, 1992 apud BRANDENBURG, 1999 p. 116).

Pode-se notar essa questão através desse trecho de um entrevistado; “O caboclo fica

“que jeito” (sic) na terra, com cana em volta da propriedade? Não tem vizinho, quer uma

agulha tem que ir pra cidade” (Produtor de Leite no Município de Ourinhos - SP). Esse

trecho só confirma a dramaticidade dos indivíduos, que não está ausente em Ourinhos (SP).

Em muitos casos a única opção é arrendar ou vender a propriedade e migrar para o

centro urbano. Porém, esses imigrantes rurais possuem tradições e símbolos característicos,

como já demonstrado, o que agrava a situação, visto que eles se encontram no meio urbano.

Além do fato do indivíduo passar da condição de produtor para a de consumidor (MARTINE,

1990).

“Há uma posição crítica sobre a agricultura convencional, sobre os efeitos perversos

que resultam muitas vezes na expropriação do agricultor e consequentemente na sua perda de

identidade” (BRANDENBURG, 1999 p. 266). Isto é, com a influência externa do meio

urbano o agricultor, que antes de tudo era reprodutor de técnicas e culturas específicas,

herdados dos seus antepassados, começa a incorporar, devido à modernização da agricultura,

técnicas que visam melhores produtividades. A princípio, para alguns, podem parecer

medidas apreciáveis, mas na realidade representam mudanças nos hábitos dos indivíduos.

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Ourinhos (SP), por possuir uma área municipal pequena e grande parte da área rural

ser destinada às grandes propriedades, conta apenas com 97 Unidades de Produção com áreas

de até 2.5 (ha) (LUPA, 2007/2008). Pode-se concluir desse modo que existem propriedades

com pequenas extensões, mas que não reproduzem necessariamente a lógica tradicional, o que

não significa que a pequena propriedade tenha que reproduzi-la. Porém, o que se pode

analisar no município é a modernização das grandes explorações pelo fato histórico do

processo de modernização, exclusivamente no Estado de São Paulo e, consequentemente, por

outro lado, a necessidade do rural tradicional ter que produzir perante uma lógica imposta que

é contrária aos seus modos habituais de sobrevivência, pois foram conduzidos a integrarem-se

ao mercado e nem sempre são capazes de acompanhar o avanço periódico.

Portanto, pode-se considerar algumas questões a respeito da pequena exploração; a

modernização reestrutura a lógica tradicional, onde duas alternativas são destinadas:

abandonar o espaço rural e migrar para a cidade ou adaptar-se às novas demandas da

agricultura. As duas alternativas sugerem um alto grau de dramaticidade.

4.1.1. Características da teoria clássica que operam em Ourinhos (SP)

No segundo capítulo desse trabalho, buscou-se demonstrar três importantes teorias

clássicas que abordam o campesinato. Nesse momento, cabe aproximar essas teorias aos

aspectos atuais encontrados no município de Ourinhos (SP).

Lênin, que concentra sua discussão acerca da desintegração do campesinato frente ao

avanço do capitalismo e Chayanov, que supôs a conservação do campesinato, teorizaram a

respeito de medidas que não corresponderam com a prática e que pode ser analisada

atualmente no município de Ourinhos (SP). Pois, conforme Brandenburg et al. (2004)

ressaltam, no Brasil ainda existe um rural que antecede a modernização intensiva,

denominado rural tradicional e que coexiste, muitas vezes, num mesmo espaço social e

geográfico da modernização, como relembram “a modernização da agricultura não levou a um

processo de homogeneização do rural no que tange aos seus aspectos, sociais, produtivos,

técnicos, biológicos, espaciais e cognitivos” (2004, p.120).

Desse modo, podemos compreender que a teoria kautskyana, que diz respeito à

subordinação da pequena à grande propriedade, é a mais provável a ser considerada como

resultante da modernização agrícola analisada em Ourinhos (SP). A partir dessa subordinação,

o campo é reestruturado e novas medidas precisam ser empregadas para a continuação da

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reprodução camponesa, se é que é possível. Desse modo, a pluriatividade surge como uma

forma de tentar garantir o pertencimento do espaço rural.

4.1.2. Pluriatividade

No Brasil, as pequenas explorações possuem características especificas e reunidas em

três grupos principais: a) subordinadas ao proprietário fundiário, caracterizado pela

necessidade de pagamento de renda, através de produção ou capital financeiro ao proprietário

fundiário e/ou pela obrigação de empregar força de trabalho em determinados serviços da

propriedade; b) subordinadas ao capital comercial, marcado pelo pagamento de taxas de juros

decorrente dos financiamentos e; c) subordinadas às agroindústrias e cooperativas capitalistas,

caracterizado pela necessidade de financiamento de insumos e assistência técnica, forçando a

adoção de novas tecnologias (SILVA et al.,1983). Nota-se que a pequena exploração

atualmente cria a necessidade de integração com o mercado e, consequentemente,

desenvolverá aspectos que a submeta ao sistema, cada vez mais.

Vistos os impactos que a modernização agrícola impõe à agricultura familiar através

das transformações estruturais, a pluriatividade emerge como forma de garantir a permanência

do individuo no campo. Schneider (2003) coloca em discussão a questão da pluriatividade

encontrada no campo a partir do avanço da modernização e, como consequência, há a

necessidade de integração ao mercado como forma de continuar garantindo a reprodução

social da pequena produção. Sacco dos Anjos (2003) também considera essa questão e

acredita que a agricultura em tempo parcial e a pluriatividade tornaram-se elementos

intrínsecos à agricultura familiar por garantirem a reprodução da lógica encontrada nesses

grupos. Kautsky (1980, p.105 apud SCHNEIDER, 2003) e Chayanov (1974, p.106 apud

SCHNEIDER, 2003), autores que formularam teorias sobre o campesinato baseados em

diferentes correntes de pensamentos, já consideravam sobre a necessidade do trabalho

acessório através de atividades agrícolas e não agrícolas.

Adiante, Schneider (2003) compreende que a pluriatividade encontrada na agricultura

familiar deve ser analisada a partir das transformações estruturais, ponto que vem sendo

debatido ao longo desse trabalho. Como ponto de partida, baseado na corrente de pensamento

denominada Sociologia da Agricultura, Schneider ressalta que a observação dos processos

produtivos é um importante ponto para compreender as transformações estruturais, ou seja,

perceber os processos produtivos é essencial para entender as modificações decorrentes e,

portanto, a pluriatividade. A pluriatividade generaliza-se nas áreas agrícolas onde a

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modernização diminui a demanda de trabalho e abre espaço para um processo contemporâneo

de revalorização do espaço rural.

Para melhor compreender essa questão é necessário considerar dois aspectos, um de

caráter externo, que também vem sendo debatido neste trabalho e outro através de relações

internas. Marsden, que é citado por Schneider, entende que as relações sociais são produzidas

através da dinâmica do processo de trabalho, pois crê que as unidades familiares são forçadas

a buscar novas fontes de renda uma vez que estão num ambiente competitivo e assim, os

ganhos com as atividades agrícolas já não são suficientes para sobreviver. (MARSDEN, 1990;

1991 apud SCHNEIDER, 2003). Portanto, a pluriatividade nada mais é do que formas de

obter rendas extras. Questão presente em Ourinhos (SP), onde se pôde analisar a necessidade

de obter renda extra, principalmente através das mulheres, que empregam a força de trabalho

em outras atividades, como ministrar aulas, por exemplo.

Portanto, deve-se levar em consideração três análises para compreender o processo de

pluriatividade desenvolvido nos espaços rurais, verificados por Schneider (2003): os

processos externos, os processos internos e compreender as transformações, ou seja, “quais

são os fatores regionais ou locais que exercem atração e estímulo e, em contrapartida, os

restritivos ou limitadores ao desenvolvimento da pluriatividade” (2003, p.111); “qual é a

abordagem da família como o núcleo das decisões para compreender as relações entre a

agricultura e a pluriatividade” (2003, p.112) e “interpretar a pluriatividade como uma

expressão da dinâmica das transformações socioeconômicas estruturais dos espaços rurais”

(2003, p.112). Sendo esse último processo de extrema relevância para a compreensão da

pluriatividade.

4.1.3. A necessidade de definir as características do agricultor e produtor rural

Conforme analisado nos capítulos anteriores, inúmeras características são responsáveis

por definir o que é e como é o campesinato, da mesma forma que a agricultura familiar, sendo

um aspecto de grande importância a relação com o mercado para definir a „passagem‟ de

camponês para agricultor familiar. Para tanto, Lamarche (1998) analisou as lógicas familiares

para compreender a dependência dessas com o mercado, ponto anteriormente analisado.

A importância em definir os agricultores e produtores rurais quanto as suas lógicas é

fundamental para que o Estado possa beneficiá-los através, principalmente, de políticas

públicas e incentivos para que essas categorias continuem a se reproduzir enquanto grupos

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tradicionais. O que se percebe no município de Ourinhos (SP) é a falta de conhecimento das

características desses grupos, o que dificulta a execução de projetos específicos. Durante a

pesquisa de campo, foi constatada a possível aplicação de projetos voltados a produções nada

tradicionais ao município como a aquicultura, desse modo, derivam questões a respeito desses

projetos. Visivelmente não há no município a tradição voltada à aquicultura, da mesma forma,

ponto que não cabe a este trabalho discutir, deve-se pensar a respeito das questões

geográficas, climáticas, etc., para a realização desse projeto, portanto, até que ponto um

projeto que visa essa magnitude realmente beneficiaria a população tradicional do campo,

visto que seus interesses podem ser outros. Ponto que ressalta a importância em definir as

lógicas e interesses desses grupos, pois só assim é possível determinar as reais necessidades.

4.1.4. PNAE e PAA

O Programa Nacional de Alimentação escolar (PNAE) foi criado pelo governo federal

na década de 1950 para garantir a alimentação dos alunos matriculados em escolas públicas.

O Art. 14 da LEI Nº 11.947, DE 16 DE JUNHO DE 2009 prevê que:

Do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, no âmbito do PNAE, no

mínimo 30% (trinta por cento) deverão ser utilizados na aquisição de gêneros

alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou

de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as

comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas (CONSTITUIÇÃO

FEDERAL, 1988).

Portanto, é lei destinar no mínimo 30% dos recursos financeiros para aquisição de

produtos alimentícios derivados da agricultura familiar. Ourinhos (SP) cumpre a lei e ainda

demanda quantidades maiores. Segundo funcionários da Prefeitura Municipal de Ourinhos, o

município adquire até 40% da agricultura familiar, o que torna o PNAE um grande canal de

comercialização para os agricultores e, portanto, os beneficiam conforme ressalta o agricultor

que está cadastrado no Programa em Ourinhos (SP);

Acertei o frete com o rapaz para levar minhas hortaliças pra CEASA de São Paulo.

Eu enchia as caixas e colocava no caminhão, na quarta viagem perguntei aonde tava

meu dinheiro, então o rapaz me entregou vinte e três reais. A gente nunca sabe do

preço na CEASA, eu tava pagando pra vender meus produtos em São Paulo. Agora

só entrego pro PNAE. (Agricultor no Município de Ourinhos)

O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) é mais recente que o PNAE, foi criado

em 2003 com o intuito de fortalecer a agricultura familiar através de mecanismos de

comercialização que “favorecem a aquisição direta de produtos de agricultores familiares ou

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de suas organizações, estimulando os processos de agregação de valor à produção” (MDA-

SAF, 2013). Programa que até o momento não opera no município de Ourinhos (SP) por

medidas burocráticas.

4.1.5. Características da cultura canavieira e da produção leiteira

Baseado em dados do Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (2010-

2013) a cana de açúcar é considerada uma cadeia produtiva da mesma forma que a produção

de leite. Com a finalidade de comparar duas produções, uma voltada para o agronegócio e

outra voltada para a agricultura familiar, é necessário compreender e reafirmar o caráter

majoritário da grande produção frente à pequena produção como processo da lógica

capitalista, atualmente. Como muito se sabe, a cultura canavieira é intensamente modernizada

e ocupa a primeira posição em área cultivada de todas as culturas do município.

FIGURA 4 – PRODUÇÃO DE CANA-DE-AÇUCAR NO MUNICÍPIO DE OURINHOS (SP), SAFRA 2013

FONTE: CanaSat, 2013. Adaptado PESSOA, K.

Com uma produção grande é preciso demandar fornecedores capazes de suprir as

necessidades. Entre esses fornecedores capazes, muitos são multinacionais, onde o

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investimento no município é pequeno, muitas vezes, reduzindo-se a escritórios; quando muito,

geram alguns postos de trabalho que funcionam mais como vias de comunicação. A figura a

seguir demonstra as principais multinacionais que atuam no mundo e seus rendimentos em

2007.

FIGURA 5 – MULTINACIONAIS

FONTE: ETC Group, 2013. Adaptado PESSOA, K.

A contratação de mão de obra para cultura canavieira e para o setor sucroalcooleiro

durante um longo período foi intensa, porém, com a crescente modernização e melhoramento

das tecnologias tem sido reduzida, o que cabe refletir sobre os reais benefícios para esses

trabalhadores. Grande parte deles são agricultores que precisam de uma pluriatividade para

obter renda extra, então se submetem a esses trabalhos. Pode-se afirmar através das

entrevistas concedidas: “Meu irmão mesmo, tá aí trabalhando nas fazendas de cana faz

tempo” (Agricultor do município de Ourinhos).

O município conta com 72 Unidades de Produção exclusivamente leiteiras, com um

total de 99116

cabeças. Os próprios relatórios do Plano Municipal de Desenvolvimento Rural

16

É preciso considerar a época dos dados, visto suas alterações atuais. Porém, questão que não interfere no

conceito.

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Sustentável (2010-2013) confirmam a supremacia de outras culturas sobre as pequenas

explorações que, segundo o relatório:

[...] estão perdendo sua importância devido a substituição das pastagens pelas

culturas de cana de açúcar, milho e soja que tem apresentado melhores resultados

econômicos nos últimos anos, considerando o alto valor atual das terras do

município (PMDRS, 2010-2013).

Adiante, o relatório ressalta a menor importância econômica da pecuária leiteira, assim como,

sua execução:

A pecuária de leite, apesar de representar menor importância econômica do que a de

corte, está presente em 72 UPAs, com uma lotação média de 13,6 cabeças/UPA,

explorada em sua maioria por pequenos e médios produtores (PMDRS, 2010-2013).

O próprio Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (2010-2013)

elabora e ressalta os principais pontos17

positivos e negativos que consideram. Para seguir o

que vem sendo exposto neste trabalho, cabe demonstrar os pontos apresentados a respeito do

cultivo e beneficiamento de Cana de Açúcar e da produção do Leite.

4.1.5.1. Cana de Açúcar

- Pontos Positivos:

Alta tecnologia de produção, alta produtividade, produtores organizados através da associação

dos fornecedores, geração de grande número de empregos diretos e indiretos, importante no

aspecto social e econômico para o município.

Aumento do consumo mundial de biocombustíveis, aumento da demanda de etanol no

mercado interno e externo, aumento do preço do açúcar no mercado internacional. Existência

de 03 agroindústrias canavieiras próximas.

- Pontos Negativos

Alto custo de produção causado pelos preços dos insumos e máquinas. Dificuldade em

adquirir máquinas ou contratar serviços de tratores e implementos adequados para a

mecanização da cultura, para o preparo do solo, plantio e tratos culturais. Áreas de APP sem

cobertura vegetal.

17

Pontos apresentados pelo Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (2010-2013), cujo este

trabalho apenas está exposto.

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Baixa concorrência de mercado devido ao monopólio das grandes usinas que estabelecem os

preços da cana, condições e prioridade na colheita da cana própria das usinas, não há

concorrência. Barreiras no mercado externo.

4.1.5.2. Leite

- Pontos Positivos

Condições de clima e solo favoráveis às pastagens; potencial de aumentar a produtividade e a

qualidade do leite.

Melhoria na qualidade e produtividade pela adequação do sistema de manejo; facilidade de

comercialização; boas vias de acesso. Possibilidade de venda para o Programa Aquisição de

alimentos - PAA/MDA.

- Pontos Negativos

Baixa qualidade do leite; manejo inadequado do pasto; vacas de baixa produtividade; baixa

produtividade geral do rebanho, individualismo.

Preços baixos; inadimplência dos laticínios; importação de leite; falta de organização dos

produtores.

É considerado como ponto positivo a alta tecnologia e produtividade, questão que

afirma o caráter capitalista desenvolvido na agricultura, onde as necessidades são expressas

através da acumulação de capital e confirma a temática deste trabalho. Outros pontos

considerados positivos dizem respeito ao aumento da demanda de etanol, beneficiado como

combustível para automóvel, questão que foi exposta anteriormente, onde cria-se a ideia de

que o aumento da demanda de etanol auxilia a preservação do meio ambiente e ao aumento de

empregos diretos e indiretos, que julgam possuírem importância social e econômica. A

questão que deve-se considerar é sobre as condições desses empregos. Em contrapartida, os

pontos negativos são aqueles que interferem no sistema capitalista, portanto, não parece haver

nenhuma preocupação com os aspectos socioeconômicos e ambientais decorrentes da alta

produtividade.

A produção leiteira através dos próprios dados do PMDRS (2010-2013) é considerada

executada por pequenos e médios produtores, ou seja, o caráter produtivista dessa cadeia está

mais relacionado ao processo voltado a agricultura familiar, questão já discutida, do que para

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a acumulação de capital. Portanto, os pontos positivos e negativos julgados pelo PMDRS

(2010-2013) são definidos de modo a sugerirem um melhor aproveitamento da produção,

porém, é preciso que haja incentivo e políticas públicas para que isso possa ocorrer, ponto

anteriormente abordado.

4.1.6. Crédito rural

O acesso ao crédito rural é algo que impulsiona a agricultura, visto que o investimento

é alto e o retorno não é imediato. Portanto, é fundamental o incentivo ao crédito agrícola. A

modernização só obteve progresso no país a partir desse fomento. Porém, sabe-se que a

pequena exploração não possui garantias suficientes para obter crédito, o que torna um

problema cíclico. Portanto, é preciso disponibilizar crédito agrícola a juros menores e prazos

maiores para beneficiar o pequeno agricultor e produtor rural. “Consegue crédito que jeito, o

Pronaf, você tem que tá (sic) um ano trabalhando, eu não to um ano na propriedade”

(Produtor de Leite no Município de Ourinhos).

Essa questão demonstra a dificuldade em obter crédito e leva o indivíduo a refletir

antes de resolver mudar-se para o campo para produzir. O que, consequentemente, diminui a

migração inversa, cidade-campo. O crédito rural no município, segundo dados do próprio

Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (2010-2013) é obtido por intermédio

dos agentes financeiros como: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Santander,

Bradesco e Copermota, através de recursos obrigatórios como: Pronaf, Feap, BNDES, Banco

do Povo, etc..

4.1.7. Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI)

A Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI) é um órgão da Secretaria de

Agricultura e Abastecimento do Governo do Estado de São Paulo, semelhante à EMATER no

Estado do Paraná. Esse órgão foi criado em 1967 para assessorar o produtor rural no Estado e

conta com um Escritório Regional no município de Ourinhos (SP), abrangendo 17 municípios

da região. Porém, há uma grande desconfiança por parte dos agricultores e produtores rurais

por conta desse órgão, pois acreditam que ele não cumpra devidamente o seu papel enquanto

fomentador de desenvolvimento rural. Nota-se no município inúmeras reclamações a respeito

da CATI e sua assistência técnica, reduzida e ineficiente, problemas que não são exclusivos

da região ou da CATI de Ourinhos (SP).

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Segundo dados do Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (2010-

2013), Ourinhos (SP) possui 1 Engenheiro Agrônomo e 1 Assistente Agropecuário I, para

atender aos agricultores e produtores rurais do município, isto é, 366 Unidades de Produção,

conforme dados da LUPA (2007-2008), o que realmente gera dúvida a respeito da suficiência.

Desse modo, as assistências técnicas para grandes produções são, geralmente, privadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: AFINAL, A TERRA ROXA A QUEM BENEFICIA?

Esses dados demonstram os rumos que a agricultura tomou no país e em Ourinhos

(SP). Wanderley (2004) acredita que a visão depreciativa decorrente da sociedade é reforçada

através da forma que essa trata o meio rural, como um vazio social, onde seus problemas são

solucionados com o êxodo para as cidades; “a redução da população é percebida como um

sinal de progresso, de que seriam exemplo as nações desenvolvidas” (2004, p.83).

Sabe-se que o desenvolvimento capitalista é considerado inerente às sociedades

modernas e que, por sua vez, está intrínseco aos processos de industrialização e urbanização.

O interesse pela agricultura se dá pela possibilidade de aplicação de capital, que adiante,

desestrutura o sistema tradicional, emergindo novas dinâmicas (WANDERLEY, 2000).

Pode-se perceber neste trabalho o caráter massivo do capitalismo e suas principais

consequências para a pequena exploração, que sobrevive hoje, interligada parcialmente a

mercados incompletos, conforme ressalta Abramovay (1992), ficando à margem dos sistemas

econômicos, porém, extremamente dependente desses.

Este trabalho foi pensado e desenvolvido para compreender uma questão que está em

debate durante algum tempo e que vem sendo abordada pelos principais teóricos da sociologia

rural. Isto é, o meio rural é passível de transformações e essas não operam de forma linear,

nem democrática, pois sempre houve o beneficio a uns mais do que a outros, e essa questão

continuará a acontecer. Cabe então, refletir sobre maneiras de garantir o favorecimento dessas

categorias, que historicamente sofrem o processo de exclusão. Portanto, a terra roxa que é

comum a todos, na realidade beneficia o capital, pois esse é capaz de investimento, seja no

agronegócio ou na agricultura familiar.

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REFERÊNCIAS

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