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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO NILSON FONSECA MIRANDA TECNOLOGIAS DIGITAIS NO ENSINO DE QUÍMICA FORTALEZA 2007.

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEAR

    FACULDADE DE EDUCAO PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO

    NILSON FONSECA MIRANDA

    TECNOLOGIAS DIGITAIS NO ENSINO DE QUMICA

    FORTALEZA 2007.

  • NILSON FONSECA MIRANDA

    TECNOLOGIAS DIGITAIS NO ENSINO DE QUMICA Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educao da Faculdade de Educao da Universidade Federal do Cear, como requisito parcial obteno do ttulo de Doutor em Educao. rea de concentrao: Tecnologias Digitais. Orientador: Prof. Dr. Doutor Jos Aires de Castro Filho.

    FORTALEZA - CE 2007

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao Universidade Federal do Cear

    Biblioteca Universitria Gerada automaticamente pelo mdulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo autor.

    M644t Miranda, Nilson Fonseca.

    Tecnologias Digitais no Ensino de Qumica / Nilson Fonseca Miranda. 2007. 208 f. : il. color.

    Tese (doutorado) Universidade Federal do Cear, Faculdade de Educao, Programa de Ps-Graduao em Educao, Fortaleza, 2007. Orientao: Prof. Dr. Jos Aires de Castro Filho.

    1. Tecnologias Digitais. 2. Ensino de Qumica. 3. Softwares Educativos. I. Ttulo.

    CDD 370

  • NILSON FONSECA MIRANDA

    TECNOLOGIAS DIGITAIS NO ENSINO DE QUMICA

    Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educao da Faculdade de Educao da Universidade Federal do Cear, como requisito parcial obteno do ttulo de Doutor em Educao. rea de concentrao: Tecnologias Digitais. Orientador: Prof. Dr. Jos Aires de Castro Filho.

    Aprovada em: ___/___/______.

    BANCA EXAMINADORA

    ________________________________________ Prof. Dr. Doutor Jos Aires de Castro Filho(Orientador).

    Universidade Federal do Cear (UFC)

    _________________________________________ Prof. Prof. Dr. Joo Batista Carvalho Nunes

    Universidade Estadual do Cear (UECE)

    _________________________________________ Profa. Dra. Regina Clia Monteiro de Paula

    Universidade Federal do Cear (UFC)

    ________________________________________ Professora Dra Ana Karina Morais de Lira

    Universidade Federal do Cear (UFC)

    ______________________________ Professora Dra Selma Elaine Mazetto

    Universidade Federal do Cear (UFC)

  • Dedico este trabalho minha famlia: Renilde Fonseca (Me); Chico Miranda (Pai); aos meus filhos: Luis Eduardo e Maria Antonia e aos meus irmos: Nilton, Maria Neuma, Nilvon, Nielson e Nilfrnio, os quais me apoiaram integralmente para a realizao deste trabalho.

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeo aos colegas de curso, aos professores e funcionrios do programa

    de Ps-Graduao em Educao da UFC, pelo companheirismo convivido

    nessa temporalidade de realizao do Doutorado.

    Agradecimento especial ao meu orientador, Professor Dr. Jos Aires de Castro

    Filho, por dividir comigo a difcil tarefa de produzir conhecimento. Alm disso,

    pelas orientaes; leituras crticas do trabalho; pela liberdade e confiana

    depositada em mim; pela acolhida, pela calma e firmeza no acompanhamento,

    tornando possvel a realizao desse trabalho.

    A professora e amiga Dra. Rita sou muito grato, pelo incentivo e apoio,

    sobretudo, no incio dessa longa caminhada. Ao professor Dr. Luiz Botelho,

    pelas aulas e debates durante o curso. Agradeo as professoras Dra. Ana

    Karina e Dra. Selma Mazetto, pelas inmeras contribuies na qualificao do

    projeto.

    Aos colegas de trabalho da Universidade Federal do Piau UFPI que fizeram

    da ausncia um momento de solidariedade. Agradeo em particular aos

    professores e colegas de curso do ncleo Piau: Newton Freitas; Brbara;

    Gildsio Guedes; Armstrong; Lurdinha; Beatriz e Antnia Dalva.

    A Capes Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior,

    meu agradecimento pelo apoio financeiro por meio de bolsa de estudos, sendo

    vital para minha dedicao integral ao longo dessa jornada.

    Por fim, agradeo a Deus, por ter permitido a realizao deste trabalho.

  • Atualmente, no se questiona mais sobre a utilizao de tecnologia na escola, mas sim, sobre quais as tecnologias mais apropriadas e como as mesmas devem ser utilizadas. Boa parte do uso das tecnologias na escola ainda tem se restringido a usos pouco interativos com programas em que o aluno somente acompanha um contedo e posteriormente realiza testes e exerccios. Outros usos tm sido primordialmente no aspecto tcnico como planilhas eletrnicas ou pesquisa na Internet. Professores tm acessado a Internet e outras tecnologias digitais para enriquecer e apoiar suas aulas, mas nem sempre utilizam o real potencial que a tecnologia pode oferecer.

    Jos Ayres de Castro Filho

  • RESUMO Este trabalho analisa o discurso dos professores de qumica da Universidade

    Federal do Piau acerca do uso das tecnologias digitais, sites e softwares

    educativos, concebidas como ferramentas aplicadas ao ensino de qumica.

    Analisa tambm a forma de utilizao na sala de aula dos softwares: spartan;

    origin; qumica orgnica II e dos sites: nautilus; chemkeys; ucs; qmc.ufsc e

    quark. O objetivo fundamental verificar como o uso dessas ferramentas

    contribui pedagogicamente para o processo de ensino/aprendizagem na rea

    da qumica. O aporte terico utilizado sustenta que as tecnologias digitais por si

    s no estabelece, nem catalisa mudanas na prtica pedaggica, mas a

    forma como concebida pelo professor e utilizada no sistema de ensino,

    potencializa a ecloso de sucessivas inovaes e posterior mudana no

    paradigma educacional. Para o desenvolvimento desta pesquisa foi utilizada

    uma metodologia qualitativa a fim de possibilitar a busca do conhecimento

    qumico compreendendo que essa produo tambm se elabora na troca, na

    socializao, s vezes conflituosas, que os diferentes atores envolvidos

    promovem ao enfrentarem e representarem suas realidades, preenchendo-as

    de significaes diversas. Neste sentido, foram analisados: (a) o discurso dos

    professores obtido atravs de entrevista; (b) os dados sobre sites e softwares

    educativos utilizados no ensino de qumica obtidos atravs de uma grade de

    anlise produzida para esta finalidade. O resultado da anlise dos dados

    gerados aponta para algumas razes positivas que justificam a utilizao das

    tecnologias digitais no ensino de qumica: rapidez e eficincia na obteno de

    informaes; acesso a novos conhecimentos e maior agilidade no aprendizado.

    Alm disso, possibilita fazer simulao mediante experimentos virtuais,

    oportunizando professores e alunos a adquirirem informaes recentes e

    possibilidades de acesso a novos conhecimentos.

    Palavras-chave: 1.Tecnologias digitais; 2. Softwares educativos; 3. Educao

    qumica.

  • ABSTRACT

    This work analyzes the speech of the Chemistry professors of Universidade

    Federal do Piau about the use of digital technologies, educational sites and

    softwares, conceived as tools applied to the teaching of Chemistry. It also

    analyzes the usage of softwares in the classroom: Spartan; origin; organic

    Chemistry II and the sites: nautilus; chemkeys; ucs; qmc.ufsc and quark. The

    main goal is to verify how the use of such tools contribute pedagogically to the

    teaching/learning in the area of Chemistry. The theoretical contribution used

    supports that the digital technologies themselves dont stablish nor catalyze the

    changes on the pedagogical practice, but the way which it is conceived by the

    teacher and the way it is used at the teaching system, intensifies the

    development of successive innovations and later change in the posterior

    change in the educational paradigm. As for the development of this research a

    qualitative methodology was used in order to make the search of chemical

    knowledge possible bearing in mind that this production also comes from the

    exchange, the socialization, sometimes conflicting, that the different agents

    involved promote when theyre facing and representing their realities,

    completing them with various definitions. In this sense, (a) the speech of the

    teachers obtained through interviews, (b) the data about educational sites and

    softwares used on the chemistry teaching obtained through a grid of analysis

    produced for this purpose have been analyzed. The result of the collected data

    analysis aims at some positive reasons that justify the use of digital

    technologies on the Chemistry teaching: quickness and efficiency in the

    obtainment of information; access to new acquirements and higher agility at

    learning. Besides, it makes the simulation through virtual experiments possible,

    gives the opportunity to teachers and students to acquire modern information

    and possibilities of access to new acquirements. Keywords: 1. digital technologies; 2. Softwares educative; Chemistry Educacion

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1 - O relacionamento entre cincia, tecnologia, sociedade e o aluno.......... 40 Figura 2 - Molculas de surfactantes e micelas em cauda hidrofbica e cabea Hidrfila ....................................................................................................... 58 Figura 3 - Ao do nion tensoativo do sabo: fase de adeso ..................................... 59 Figura 4 - Ao do nion tensoativo do sabo: fase de desligamento ........................... 59

    Figura 5 - Ao do nion tensoativo do sabo: fase de emulso ................................... 60 Figura 6 - Barco de papel movido a surfactante: antes de colocar detergente sobre a gua .................................................................................................. 63 Figura 7 - Barco de papel movido a surfactante: aps colocar detergente sobre a gua .................................................................................................. 63 Figura 8 - Pesso de um gs em funo das variveis: T, V e n ................................... 66 Figura 9 - Presso de um gs em funo das variveis: reduo de volume e aumento na quantidade de molculas ........................................................ 66 Figura 10 - Presso de um gs em funo das variveis: aumento da temperatura e aumento na quantidade de molculas/ aumento da quantidade de molculas e reduo de volume ........................................... 67 Figura 11 - Presso de um gs em funo das variveis reduo de volume, aumento na quantidade de molculas e aumento da temperatura...............68 Figura 12 - Produo e uso de software educativo na prtica pedaggica de

    Qumica ....................................................................................................... 78

    Figura 13 - Software sobre Qumica Orgnica II Reaes Orgnicas ........................ 79

    Figura 14 - Molcula de propanona (acetona) ............................................................... 81

    Figura 15 - Molcula de propanona (acetona). Estrutura de ressonncia do

    grupo carbonlico ........................................................................................ 81

    Figura 16 - Site webelements ....................................................................................... 89

    Figura 17 - Interaes moleculares do plstico com a gua ......................................... 89

    Figura 18 - Site nautilus na pgina molecularium ........................................................ 91

    Figura 19 - Pgina da qmcweb, Revista Eletrnica de Qumica/ufsc .......................... 91

    Figura 20 - Ncleo de Apoio ao Ensino da Qumica: Textos Interativos .................... 92

  • Figura 21 - Site chemkeys ............................................................................................ 92

    Figura 22 - Site quark. qmc.ufsc .................................................................................. 93

    Figura 23 - Representao da nuvem eletrnica das molculas de Cl2 e HCl .......................................................................................................... 157 Figura 24 - Representao da nuvem eletrnica das molculas de cloro- benzeno e benzeno ................................................................................... 157 Figura 25 - Potencial eletrosttico para as molculas de benzeno e Piridina .................................................................................................... 158 Figura 26 - Mapa de potencial eletrosttico do benzeno e representao

    da interao .............................................................................................. 159

    Figura 27 - Mapa de potencial eletrosttico da gua e representao

    das interaes de suas molculas ............................................................ 159

    Figura 28 - Orbitais do tipo p na molcula de eteno .............................................. 160

    Figura 29 - Cargas do oxignio e hidrognio da ligao O H no cido

    etanoico, no cido 2-fluor-etanoico, no cido 2,2-difluor-etanico

    e no 2,2,2-trifluor-etanico, respectivamente, e a distancia

    entre tomos no ligados ....................................................................... 161

    Figura 30 - Carga dos carbonos orto, meta e para no nitrobenzeno e

    Tolueno .................................................................................................. 162

    Figura 31 - Tela do software qumica orgnica II - reaes orgnicas .................. 171

    Figura 32 - Clculos de concentrao de solues .................................................... 175

    Figura 33 - Tela tpica que representa o site ucs.br ................................................... 186

    Figura 34 - Tela tpica representando o site quark .................................................... 187

    Figura 35 - Tela tpica representando o site chemkeys ............................................ 187

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 - Aspectos enfatizados no ensino clssico de cincias e no ensino de

    CTS .............................................................................................. 41

    Tabela 2 - Ensino de cincia tradicional e ensino de CTS ............................ 42

    Tabela 3 - Nove aspectos da abordagem de CTS ........................................ 43 Tabela 4 - Sites utilizados pelos professores de Qumica da UFPI .............. .72

    Tabela 5 - Caractersticas de qualidade de um software educacional ........ 110

    Tabela 6 - Tipos de softwares educacionais na web ................................... 111

    Tabela 7 - Uso das tecnologias digitais como ferramenta pedaggica

    no processo de ensino/aprendizagem em qumica .................... 118

    Tabela 8 - Utilizao de ferramenta tecnolgica na prtica pedaggica de Qumica ...................................................................................... 119 Tabela 9 - Grau de uso da ferramenta na prtica pedaggica de Qumica . 120

    Tabela 10 - Sites especializados em Qumica utilizados na prtica

    Pedaggica ............................................................................... 123

    Tabela 11 - Softwares especializados em qumica utilizados em sala de aula..............................................................................................124 Tabela12 - Utilizao dos softwares na prtica pedaggica de Qumica ..... 125

    Tabela 13 - Categorizao versus freqncia mencionada pelo professor ... 132

    Tabela 14 - Freqncia dos critrios de seleo de software e sites especficos versus freqncia mencionada pelo professor ........ 138 Tabela 15 - Categorizaes resultantes do discurso dos professores relativos

    aos pontos positivos e negativos acerca do uso de softwares e sites

    especficos versus freqncia mencionada ................................. 145

    Tabela 16 - Categorizaes resultantes do discurso dos professores acerca

    da resistncia quanto ao uso das tecnologias digitais no ensino de

    Qumica ....................................................................................... 149

    Tabela 17 - Base pedaggica do software spartan ........................................ 163

    Tabela 18 - Dimenso tcnica do software spartan ....................................... 165

    Tabela 19 - Aspectos relativos categorizao na rea da Qumica

  • no software ................................................................................ 166

    Tabela 20 - Base pedaggica do software Qumica Orgnica II ................... 172

    Tabela 21 - Dimenso tcnica do software Qumica Orgnica II ................... 173

    Tabela 22 - Aspectos relativos categorizao do software na rea da

    Qumica ...................................................................................... 174

    Tabela 23 - Base pedaggica do site nautilus ............................................... 177

    Tabela 24 - Dimenso tcnica do site nautilus .............................................. 178

    Tabela 25 - Aspectos relativos categorizao do site nautilus na rea

    da Qumica ................................................................................. 179

    Tabela 26 - Base pedaggica do site qmc.ufsc.br ........................................ .181

    Tabela 27 - Dimenso tcnica do site qmc.ufsc.br ........................................ 184

    Tabela 28 - Categorizao do site qmc.ufsc.br, na rea da Qumica ............ 184

    Tabela 29 - Base pedaggica dos sites ucs, chemkeys e quark ................... 188

    Tabela 30 - Dimenso tcnica dos sites: ucs, chemkeys e quark ................. 189

    Tabela 31 - Categorizao dos sites ucs, chemkeys e quark, na rea

    da Qumica ................................................................................. 189

  • LISTA DE GRFICOS.

    Grfico 1 - Perfil dos professores do DQ da UFPI quanto titulao ............ 98

    Grfico 2 - Razes apontadas para o no uso das tecnologias digitais pelos professores respondentes .......................................................... 121 Grfico 3 - Razes positivas para justificar a utilizao das tecnologias digitais no ensino de qumica ...................................................... 122 Grfico 4 - Freqncia de uso, pelo professor, de software educativo como ferramenta da prtica pedaggica de qumic .............................. 125 Grfico 5 - Massa de quitosana utilizada para complexar cobre (Cu) e Cobalto (Co) em funo da varivel tempo ................................ 168

  • ANEXOS Anexo 1 - Breve histrico sobre o curso de qumica da UFPI ..................... 201 Anexo 2 - Grade de anlise de sites e softwares de qumica, com Check-list submetido ao professor de qumica para busca de dados ...........203

  • SUMRIO

    1 INTRODUO ...................................................................................... 16 2 ENSINO DE QUMICA ......................................................................... 27 2.1 Ensino de Qumica Tradicional ............................................................. 27

    2.2 Ensino de Qumica Moderno ................................................................ 30

    2.2.1 A Qumica no Cotidiano e Cidadania ................................................... 30 2.2.2 A Qumica como Cincia, Tecnologia e Sociedade CTS. .................. 39 3 BASE TERICA DA PESQUISA EM TECNOLOGIAS DIGITAIS .................................................................................. 45 3.1 Fundamentos Tericos sobre Tecnologias Digitais ................................ 45 3.2 O Ensino de Qumica com Tecnologias Digitais .................................... 55

    4 SITES E SOFTWARES EDUCATIVOS DE QUMICA ........................... 73 4.1 Fundamentos Tericos sobre Softwares Educativos ............................ 73

    4.1.1 O que um software educativo ............................................................. 80

    4.1.2 Por que avaliar um software educativo?................................................ 82

    4.2 Fundamentos Tericos sobre Sites Educativos na Internet .................. 83

    4.2.1 O que um site educativo? ................................................................... 88

    4.2.2 Por que avaliar um site educativo? ...................................................... 90 5 DIMENSO METODOLGICA DA PESQUISA 5.1 Introduo ........................................................................................... 94

    5.2 Procedimentos Metodolgicos ............................................................ 96

    5.3 Local de Realizao da Pesquisa ........................................................ 96

    5.4 sujeitos da Pesquisa............................................................................. 96

    5.4.1 Caracterizao do Campo de Pesquisa e dos Sujeitos Envolvidos.........97

    5.4.2 Caracterizao dos sujeitos envolvidos na pesquisa...............................98

    5.5 Percurso Metodolgico: Etapas Elaboradas na busca do

    Conhecimento........................................................................................98

    5.5.1 Fase Exploratria....................................................................................102

    5.5.2 Coleta de Dados.....................................................................................104

  • 5.5.3 Anlise Sistemtica de Dados................................................................107

    5.6 Avaliao de software e sites educativos..................................................112

    5.6.1 Base Pedaggica de um Software educativo........................................112

    5.6.2 Base Pedaggica: Concepo Terica de Aprendizagem....................112

    6 0 ENSINO DE QUMICA PERMEADO DE TECNOLOGIAS DIIGITAIS, COM

    BASE NOS DISCURSOS DOS PROFESSORES.....................................118

    6.1 Discusso dos dados obtidos do discurso dos Professores .............118 6.1.1 Significado para os Professores de Qumica acerca das Tecnologias Digitais ............................................................................................. 128 6.1.2 Contribuies das Tecnologias Digitais para o Ensino de Qumica. 128 6.2 Critrios para selecionar software e sites de Qumica..................... 133 6.2.1 A Utilizao de Sites e Softwares no Ensino de Qumica ................ 139 6.2.2. Estratgia Metodolgica para Trabalhar Sites e Software Educativo

    em Sala de Aula .............................................................................. 139

    7 AVALIAO DE SOFTWARES E SITES UTILIZADOS PELOS PROFESSORES DE QUMICA DA UFPI 7.1 Anlise de softwares educativos ...................................................... 155 7.1.1 Software Spartan ............................................................................... 155 7.1.2 Software Origin .................................................................................. 167 7.1.3 Software Qumica Orgnica II reaes orgnicas .......................... 170 7.2. Anlise de Sites Educativos................................................................176 7.2.1 Site nautilus........................................................................................176

    7.2.2 Site qmc.ufsc.br..................................................................................180

    7.2.3 Sites ucs.br; chemkeys e quark.........................................................186 CONSIDERAES FINAIS...............................................................191 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS..................................................194 ANEXOS............................................................................................201

  • 16

    1 INTRODUO

    As consideraes gerais e introdutrias deste trabalho tm como

    objetivo bsico situar o leitor acerca do uso das tecnologias digitais1 no ensino

    de Qumica, alm de focalizar ensaios e reflexes produzidas acerca da

    temtica em apreo, os quais procuram nortear as discusses para a dimenso

    que concebe essas tecnologias como ferramentas de ensino. Entend-las de

    acordo com Papert (1994), significa que o seu uso inteligente no espao

    escolar no se constitui exclusivamente um atributo inerente a estas. Elas

    esto vinculadas tambm forma como o professor desenvolve as tarefas

    educativas no ambiente da sala de aula. O desenvolvimento da informao e comunicao potencializa

    discusses sobre questes da temporalidade contempornea e possveis

    caminhos que a sociedade tende a trilhar no sculo XXI. A insero das

    tecnologias digitais, no campo da Educao, em especial na rea de Qumica,

    concebida como ferramenta pedaggica, possibilita ao aluno experimentar o

    ensino de forma mltipla e aberta, permitindo interpretaes e entendimentos

    diversos. Entendemos que o resultado desse ensino permeado de ferramenta

    tecnolgica depende da forma como o professor a utiliza no ambiente de

    aprendizagem.

    O objeto de estudo desta pesquisa investigar a utilizao das

    tecnologias digitais no ensino de qumica, a partir do discurso dos professores

    e da anlise de sites e softwares educativos de Qumica, compreendidos neste

    trabalho como ferramentas pedaggicas.

    Estas ferramentas potencializam o professor acerca da

    compreenso do conhecimento qumico. A premissa depende de trs pontos

    fundamentais: (a) da qualidade do produto tecnolgico disponibilizado em sala

    de aula; (b) contedo especfico de Qumica; (c) da forma como essas

    ferramentas so utilizadas na prtica educativa de Qumica. Assim, a temtica

    carece de pesquisas, avaliao e estudos analticos, cujos resultados

    estabeleam norte para tratar o objeto de ensino, em sala de aula, de modo

    1 Ressaltamos que, ao nos referir a tecnologia digital, ao longo do texto, ficar subentendido que tratamos sobre internet e software educativo.

  • 17

    fundamentado e seguro, do ponto de vista pedaggico, haja vista que a

    utilizao progressiva desse instrumental tecnolgico no espao escolar toma

    contorno irreversvel.

    Esta reflexo expressa, em tese, que esta pesquisa busca

    compreender o discurso de professores acerca da utilizao das tecnologias

    digitais na sala de aula, propondo subsdios para avaliar sites e softwares

    educativos de Qumica, mediante categorias de anlises condensadas numa

    ficha, produzida para a finalidade de avaliao da instrumentao tecnolgica.

    As razes positivas que justificam o porqu fazer esta pesquisa, sob ponto de

    vista pragmtico, passa necessariamente pelo entendimento de que existem

    recursos das tecnologias digitais disponveis e que alguns professores j

    utilizam essas ferramentas na prtica pedaggica.

    Sob ponto de vista acadmico, faltam pesquisas na rea referente

    insero das tecnologias digitais no ensino de qumica, em nvel superior; em

    particular, nos cursos de formao de professores. As pesquisas focalizam

    fundamentalmente a dimenso da educao bsica como, por exemplo, Eichler

    e Del Pino (2000), os quais fazem uma discusso sobre a modelagem e

    implementao de ambientes virtuais de aprendizagem em cincias. Nesse

    estudo, defendem um ensino que utilize metodologias ativas centradas no

    cotidiano do aluno. Temas como meio ambiente e produo de energia so

    iniciativas discutidas nesse estudo. O computador insere-se nesta proposta

    mediante tcnicas de simulao e resoluo de problemas. Focalizam tambm a descrio de ferramentas de ensino como a

    modelagem e simulao computacional que possibilitam aprendizagem e

    compreenso dos conceitos associados ao comportamento dos gases ideais e

    sua comparao com os gases reais. Alm disso, as pesquisas que concebem

    as tecnologias como suporte em EaD, por exemplo, os trabalhos de Giordan

    (2005) que buscam descrever e analisar o processo de introduo da internet

    em uma comunidade escolar, verificando como o domnio e a apropriao da

    ferramenta cultural e os propsitos da ao mediada condicionam esse

    processo. A partir da descrio e anlise, identificam-se os elementos

    condicionantes do domnio e da apropriao das ferramentas culturais, tendo

    como suporte o conceito de ambientes telemticos.

  • 18

    Ressaltamos que, aos poucos, essas tecnologias vo fazendo

    parte do cotidiano da sociedade contempornea, colocadas disposio do

    mercado, para otimizar processos de produo e/ou reproduo do

    conhecimento. Assim, a retroalimentao acontece em via dupla, constituindo-

    se, contnua e progressivamente, de modo que o homem alimenta

    intelectualmente a produo tecnolgica e, ao mesmo tempo, alimentado por

    essa mesma tecnologia para suprimento das necessidades e superao de

    desafios, tornando cada vez mais eficazes, pois apresentam linguagens que

    suscitam interatividade multimiditica, possibilitada por equipamentos cada vez

    mais rpidos, com maior confiabilidade e capacidade de processamento.

    Se pretendermos buscar a raiz do avano tecnolgico, dizemos

    que, num passado distante, as pinturas rupestres, provavelmente anteriores

    prpria fala, j retratavam cenas do cotidiano nmade dos primeiros grupos

    homindeos. Estas pinturas so talvez uma das primeiras manifestaes

    tecnolgicas utilizadas como substrato para registrar, informar e comunicar os

    eventos do cotidiano daquele tempo na histria. O fogo2, concebido neste

    trabalho como uma das descobertas mais significativas da Qumica, havia sido

    dominado h pouco e as atividades extrativas de subsistncia eram

    apreendidas por meio da simples observao e perpetuadas no imaginrio das

    pessoas daquele cotidiano, mediante representaes simblicas incrustadas

    nas cavernas. Desde ento, at a Era da comunicao via satlite, a

    humanidade tem transformado e interagido com o universo, diferenciando-se

    das demais espcies pela construo de legado cultural prprio, contnuo e

    progressivo (GIORDAN,1997).

    Historicamente, as mudanas ocorridas na sociedade, provocadas

    pelas contribuies epistemolgicas de autores como Bachelard (1971), Giroux

    (1999), Kuhn (1992), dentre outros, contriburam significativamente para o

    avano da cincia, concebida nesta reflexo como uma construo

    coletiva/humana. A tecnologia, em cada espao/tempo, possibilita a melhoria 2 As descobertas chamadas empricas ocorrem, geralmente, consoantes uma seqncia que envolve, grosso modo, observao, experimentao, aplicao. A descoberta do fogo no fugiu a essa regra. Os homindeos perceberam pela primeira vez o fogo h muitos milnios, em uma poca que no podemos precisar, mas h provas substanciais de que era j usado na Europa e na sia na Era do Paleoltico Posterior e na do Neoltico. Assim, cerca de 500.000 a.C., j o chamado Homem de Pequim (Pithecantropus pekinensis) utilizava o fogo, havendo disto evidncias encontradas em cavernas. uma reao que pode ser espontnea ou iniciada por um agente energtico natural ou intencional.

  • 19

    das condies da vida humana, seja no mbito de socializao entre as

    pessoas, na alimentao, na produo de medicamentos ou na produo de

    utenslio.

    Assim, a incorporao progressiva da produo tecnolgica, no

    cotidiano das pessoas, sobretudo, na rea da informao e comunicao, tem

    possibilitado ao sujeito, individual e coletivamente, compreender a realidade

    vivida, conhecendo-a e se apropriando culturalmente, de forma diversa,

    espao/temporalmente, em grande velocidade; a partir dos diversos

    dispositivos sob a forma de mdias: internet, programas computacionais, livros,

    jornais, dentre outros meios, que suscitam circulao, armazenamento de

    informaes e conhecimento no mundo para representao da realidade.

    O surgimento dessas tecnologias de comunicao produziu

    simultaneamente modificaes na estrutura do pensamento, no modus de

    apreenso do conhecimento e nas formas de interaes e organizaes

    sociais. No campo da cincia, em particular na rea de Qumica, sua eficcia

    ocorre em termos de velocidade, quantidade de informaes e dinamicidade

    que permitem interpretar a realidade observada e vivida.

    A observao bastante utilizada na pesquisa como instrumento

    de coleta de dados; na Economia, como diferenciadora de preos e tendncias;

    na Msica captando, dentre outras coisas, o diferencial no talento de cada

    sujeito. Na rea da Educao, a observao uma importante estratgia

    utilizada como atividade de ensino inserida na realidade escolar.

    A busca de abordagens que suscitam mudanas no processo de

    ensino/aprendizagem acompanha o homem desde os primrdios da sua

    existncia at o momento atual. Contemporaneamente, podemos inventariar

    algumas iniciativas, concebidas como ferramentas de ensino/aprendizagem, as

    quais auxiliam o professor em sua prtica pedaggica, dentre elas: a utilizao

    de software educativo e internet na sala de aula. A incorporao tecnolgica

    vida pessoal e social de parcela da populao global fato inconteste, o qual

    suscita mltiplos desafios e superaes.

    Desta forma, a busca de uma racionalidade que conceba a prtica

    educativa na rea da Qumica com a insero de tecnologias digitais se

    constitui gradativamente. Essa instrumentao tecnolgica auxilia o professor

    na produo do saber praticada na sala de aula e o pesquisador no

  • 20

    desvendamento dos fenmenos naturais, s vezes, imperceptveis ao senso

    comum, facilitando a pesquisa nas dimenses: social, econmica, cultural e

    tica.

    Para Bianchetti (2001), trata-se de aprender a conviver tanto com

    as tecnologias digitais como com os desafios e problemas que elas suscitam.

    Compreendemos que os avanos, nesta rea, em particular, internet e software

    educativo, contribuem para auxiliar o professor na sala de aula, sobretudo, na

    simulao virtual e modelagem de contedos da Qumica, suscitando

    facilitao na compreenso do fenmeno qumico, consequentemente, no

    aprendizado do aluno. Esse fato se concretiza impelido pela dinmica,

    interatividade e flexibilidade, possibilitadas pelo domnio e uso da internet e

    software educativo como ferramentas de ensino.

    Diante do exposto, ressaltamos a importncia de se estabelecer

    maior integrao entre a Educao e Informtica. Para Silva & Azevedo (2001),

    a Educao concebida como responsvel pela formao de um indivduo

    atuante numa sociedade cada vez mais informatizada e conectada. Essa

    parceria se constitui como catalisadora de mudana na forma de apresentao

    e na compreenso do objeto do conhecimento qumico.

    As modificaes tcnicas ocorridas no computador, sobretudo,

    concernente alta capacidade de resoluo e processamento numrico,

    tornando-o mais rpido, menor e mais barato possibilitaram sua utilizao na

    rea educacional como instrumental tecnolgico agregado prtica

    pedaggica. Este pensamento situa as tecnologias digitais, internet e software

    educativo, como um auxiliar extremamente favorvel s mudanas no

    ensino/aprendizagem na rea da Qumica, por exemplo, na modelagem de

    estruturas moleculares e na definio do potencial eletrosttico de uma

    substncia. As alteraes de espao/tempo, de comportamento do professor e

    de quantidade de informaes disponveis ao processo de ensino, impelidas

    pelas tecnologias digitais e pela relao professor/aluno instituda na sala de

    aula tm na velocidade da informao e do conhecimento; na aproximao

    fsico/temporal; na dinmica e na multiplicidade de acesso s fontes de busca

    de informaes a grande mudana na viso de mundo e de sociedade de cada

    sujeito envolvido no processo de busca do conhecimento. No basta, contudo,

  • 21

    ter acesso linear s tecnologias digitais para que tenhamos melhorias na

    qualidade do ensino. O sucesso da parceria dessas ferramentas com o ensino

    depende da forma como so utilizadas no ambiente do processo

    ensino/aprendizagem.

    Na compreenso de Kenski (2003),

    As alteraes sociais decorrentes do acesso e uso s tecnologias

    eletrnicas de comunicao e informao atingem as instituies e os

    espaos sociais. Na era da informao, comportamentos, prticas e

    saberes se alteram com extrema velocidade.

    Concordamos com a autora, quando trata das alteraes

    comportamentais, das prticas e saberes que se alteram mediante uso das

    tecnologias na sala de aula. Essas alteraes refletem sobre as tradicionais

    formas de pensar e fazer educao. Abrir-se para novas educaes

    resultantes de mudanas estruturais nas formas de ensinar e aprender

    possibilitadas pela atualidade tecnolgica o desafio a ser assumido por toda

    a sociedade.

    A busca de meios para tornar o ensino de Qumica sintonizado

    com a tecnologia do tempo presente torna-se legtima e necessria. Assim, as

    prprias instituies educacionais, usurias das ferramentas, internet e

    software educativo, podem contribuir teoricamente para o processo

    educacional nos aspectos didticos, disposio de contedos especficos

    imersos nos softwares de ensino e interface utilizada como meio para a busca

    de conhecimento.

    Existem trs formas diferentes para categorizar o conhecimento: a

    oral, a escrita e a digital. Embora essas se tenham originado em pocas

    diferentes, coexistem e esto presentes na sociedade atual. Elas nos

    encaminham, entretanto, para percepes diferentes e racionalidades mltiplas

    na forma de apreenso da realidade. A forma escrita de apreenso do

    conhecimento a que prevalece em nossas culturas letradas, mas a linguagem

    oral ainda a que predomina em todas as formas comunicativas vivenciais. Em

    meio a elas, o estilo digital de apreenso do conhecimento ainda incipiente,

    mas sua proliferao extremamente veloz.

  • 22

    fato irrefutvel que a velocidade de insero das tecnologias

    digitais no ambiente escolar, aumentou significativamente nas instituies

    pblicas de ensino, sobretudo, por meio do Programa Nacional de Informtica

    na Educao - PROINFO3. Assim, o estilo digital insere, obrigatoriamente, no

    apenas o uso de equipamentos diferenciados, mas tambm diferentes estilos

    de comportamentos na aprendizagem, cuja racionalidade pressupe

    interatividade e multiplicidade na busca de informaes e conhecimentos, alm

    de novos estmulos perceptivos aguados mediante programas computacionais

    de simulao virtual e modelagem. Seu rpido alastramento obriga-nos a no

    mais ignorar sua presena e importncia no ambiente escolar.

    Conceber essas tecnologias de forma crtica torna-se

    fundamental para no cairmos no modismo. No se trata, portanto, de adaptar

    as formas tradicionais de ensino aos equipamentos disponveis ou vice-versa.

    Tecnologias digitais e velhos hbitos no combinam. Para Umberto Eco (1996),

    precisamos de uma forma de competncia crtica e de uma arte ainda

    desconhecida de selecionar e decodificar a informao; em resumo, uma

    sabedoria nova. Esse posicionamento do autor acerca do ponto focalizado

    pressupe a busca do desenvolvimento de uma conscincia crtica que

    fortalea a identidade das pessoas e dos grupos. Esses so desafios atuais a

    serem enfrentados por todos ns, professores.

    Faz-se, no entanto, necessrio entender as limitaes

    pedaggicas, filosficas e sociolgicas que solues estritamente tecnolgicas

    podem causar ao ambiente escolar. Por isso, a insero das tecnologias

    digitais na sala de aula precisa estar configurada numa proposta pedaggica

    que tenha como substrato a busca do perfil do aluno que se quer formar, tendo

    como referncia as dimenses: social, poltica, cultural e tica.

    Assim, compreendemos que as tecnologias digitais inseridas no

    ambiente escolar no podem ser entendidas como capazes de solucionar os

    3 Programa Nacional de Informtica na Educao. um programa educacional criado pela Portaria N. 522/MEC, de 9 de abril de 1997, para promover o uso pedaggico da informtica na rede pblica de ensino fundamental e mdio. O Programa desenvolvido pela Secretaria de Educao Distncia (SEED), por meio do Departamento de Infra-estrutura Tecnolgica (DITEC), em parceria com as Secretarias de Educao Estaduais e Municipais.

  • 23

    problemas educacionais constitudos historicamente e discutidos luz do

    modelo tradicional de ensino. Ao contrrio, devem ser concebidas como

    ferramentas pedaggicas que podero auxiliar metodologicamente o professor

    com vistas melhoria na relao professor/aluno, sobretudo nos aspectos

    dinmicos de interatividade; na dimenso dos contedos, de modo que

    possibilite ao aluno compreender o que o contedo especfico; a sua

    importncia na vida cotidiana e suas implicaes na sociedade e na natureza,

    de maneira tal que favorea a explorao dos contedos pelos prprios alunos,

    em vez da mera exposio efetuada pelo professor. Vale ressaltar que essa

    forma de expor o contedo na sala de aula uma caracterstica fundamental

    do modelo tradicional de ensino.

    Outras particularidades deste modelo de ensino so: (1) a

    visualizao unilateral, na qual se admite como verdade absoluta a

    uniformizao no modo de pensar e agir sobre o conhecimento cientfico e (2) o

    contedo de Qumica discutido em sala de aula, privilegiando-se a descrio do

    fenmeno, com nfase exacerbada no aspecto abstrato.

    A contextualizao e a interatividade so elementos substantivos

    para o ensino/aprendizagem. Na Qumica, por exemplo, esse formato se

    manifesta numa vertente muito forte do ensino desta cincia voltada para a

    Qumica no cotidiano. Essa tendncia pedaggica com tecnologias digitais no

    ambiente escolar ser objeto de discusso mais ampla no captulo 2. Dentre os

    autores que partilham desse iderio esto: Chassot (1990; 1995), Maldaner &

    Piedade (1995), Maldaner (2000), Mortimer (1995), Lopes (1995; 1999),

    Giordan (1997).

    Ressaltamos que no final da dcada de 1980 e incio da dcada

    de 1990, muitas discusses foram estabelecidas na Qumica, sobre a

    necessidade de implementar um ensino especfico de forma contextualizada,

    em que o aluno perceba a Qumica no seu cotidiano. Desde a, surgiu o

    movimento a qumica no cotidiano (CHASSOT, 1990; 1995; LOPES, 1995).

    Da mesma forma, na dcada de 1990 e, mais fortemente, na atualidade, alguns

    autores, como Minatti (2000); Mortimer & Machado (2002) discutem sobre a

    importncia das tecnologias digitais, concebidas como ferramentas, a serem

    inseridas no ensino de Qumica. O uso do computador, da internet e software

    educativo no ensino de Qumica impulsionam discusses na academia.

  • 24

    A insero dessa tecnologia no ensino potencializa a busca de

    propostas alternativas para a prtica pedaggica de Qumica. Por exemplo, a

    produo de software de simulao e modelagem que concebe a cozinha do

    professor como laboratrio, verificando: (a) reaes qumicas, quando se

    coloca, na mesma panela, leo, alho, sal, gua e demais ingredientes,

    produzindo caractersticas diferentes das originais, como sabor, cheiro,

    consistncia e durabilidade; (b) solues, quando produzimos sucos de frutas;

    (c) diluies, quando adicionamos gua ao suco para torn-lo menos

    concentrado; (d) efetuao de clculos estequimtricos, quando se adiciona

    panela quantidades de ingredientes que caracterizam o alimento produzido, em

    termos de cheiro e sabor. Num lixo, podemos discutir dinmica e

    interativamente sobre diversos temas/contedos da Qumica: estudo da

    matria; metais; reaes qumicas; gases; combustveis; tabela peridica;

    contaminao; problemas ambientais.

    Outras temticas do cotidiano, como feromnio, geradoras de

    contedo qumico, podem ser discutidas. Por exemplo, na compreenso de

    Ferreira e Zarbin (1998) e Quadro (1998), o estudo sobre a temtica

    feromnio4 tambm nos possibilita compreender uma diversidade de funes

    orgnicas. Todo animal possui feromnio caracterstico, a saber: nas abelhas,

    os tipos de feromnios, so constitudos das funes lcool, cetona, cido

    carboxlico e ster; nas formigas, so constitudos das funes hidrocarboneto,

    cetona, aldedo, cido carboxlico e lcool; feromnio sexual do cupim, grande

    praga que ocorre na madeira, funo lcool; feromnio de defesa do gamb,

    constitudo de compostos de enxofre. Nessa reflexo, uma indagao

    imperiosamente se impe: qual a relao desses feromnios com as

    tecnologias digitais?

    Podemos estabelecer essa ponte, evidenciando, por simulao

    virtual, o extermnio de pragas de inseto. Por exemplo, um sotware de

    simulao com feromnio sexual5 em que o aluno possa manipular uma

    populao de insetos numa plantao de milho, de modo que sejam atrados e 4 So substncias qumicas secretadas por um indivduo que permite a comunicao com o outro indivduo da mesma espcie. Isto , uma substncia qumica com cheiro caracterstico, existente em toda e qualquer espcie animal, exalado para fins especficos: de ataque, defesa, conquista, orientao, formao de grupos, atrao sexual etc. 5 Substncia qumica de cheiro caracterstico que promove atrao sexual entre elementos da mesma espcie.

  • 25

    capturados numa armadilha com uma substncia de cheiro caracterstico,

    somente insetos machos, tendo como consequncia, a aniquilao da

    reproduo e posterior exterminao desses insetos. Este um tipo de controle

    de praga que se faz para exterminar alguns tipos de insetos. Todo esse

    processo de atrao, captura, controle e extermnio de pragas de determinados

    insetos um fenmeno que reflete o cotidiano de professores e alunos. A

    contribuio pedaggica dos softwares de simulao ocorre na dimenso do

    contedo de ensino, da avaliao da aprendizagem, do controle do impacto

    ambiental pesquisado.

    Para responder as perguntas desta pesquisa, o objetivo geral

    investigar o uso da internet e software educativo no ensino de Qumica, por

    meio do discurso dos professores de Qumica da UFPI, dos parmetros para

    anlise de sites e softwares educativos de Qumica e suas contribuies

    pedaggicas no ensino/aprendizagem. A busca dos dados que nutre essa

    investigao passa pelos seguintes pontos: (a) anlise da metodologia utilizada

    pelo professor para uso da internet e software educativo como instrumental

    pedaggico e (b) anlise dos parmetros de seleo de sites e softwares

    educativos. Essas ferramentas foram analisadas, observando a qualidade do

    produto tecnolgico disponibilizado em sala de aula, o contedo especfico de

    Qumica e a forma como essas ferramentas so utilizadas na prtica educativa.

    A fim de atender o objetivo geral deste trabalho delimitamos os

    seguintes objetivos especficos: (a) identificar, mediante questionrios e

    entrevistas, como os professores de Qumica compreendem e usam a internet

    e software educativo na prtica cotidiana; (b) desenvolver e aplicar em

    consonncia com a literatura de avaliao de software, parmetros gerais e

    especficos para anlises de softwares e sites educativos de Qumica; (c)

    verificar as contribuies das ferramentas internet e software educativo no

    ensino de Qumica, com ncora no discurso do professor e da analise dos

    softwares e sites. A seguir, trataremos sobre a estrutura da tese.

  • 26

    1.1 Estrutura da Tese.

    O presente trabalho possui a seguinte estrutura: No Captulo I

    institui-se a verbalizao acerca das Consideraes Gerais e Introdutrias da

    Tese. O captulo 2 constitudo de uma Fundamentao terica, em que

    apresenta: As Bases Tericas da Pesquisa e o Ensino de Qumica Tradicional

    e Moderno. O Captulo 3 constitui-se de Base Terica da Pesquisa em

    Tecnologias Digitais, colocando-se em relevo os fundamentos acerca das

    Tecnologias Digitais e o Ensino de Qumica com Tecnologias Digitais. No

    seguimento 4, discute-se os fundamentos que instrumentalizam a verbalizao

    sobre sites e softwares educativos no ensino de Qumica, em destaque, o por

    qu avaliar sites e softwares de qumica. No Captulo 5, trata-se sobre a

    Dimenso Metodolgica da Pesquisa, ressaltando os Sujeitos da Pesquisa,

    Local de realizao, Caracterizao do Campo de Pesquisa e as Fases da

    Pesquisa: Exploratria, Coleta e Anlise Sistemtica de Dados. No captulo 6,

    destaca-se a discusso sobre o Ensino de Qumica permeado de Tecnologias

    Digitais, com base no discurso dos professores, enaltecendo significado e

    contribuies das Tecnologias Digitais para o Ensino de Qumica; alm dos

    critrios e estratgias para selecionar e utilizar sites e softwares educativos em

    sala de aula. No Captulo 7, institui-se a avaliao de softwares e sites

    utilizados pelos professores de Qumica da UFPI, destacando a anlise dos

    softwares Spartan, Origin e Qumica Orgnica II e anlise dos sites educativos:

    nautilus, qmcweb, ucs, chemkeys e quark. O Captulo 8, apresenta as

    consideraes finais e recomendaes para trabalhos futuros, concernente

    temtica pesquisada.

  • 27

    2 ENSINO DE QUMICA Esta seo do trabalho visa estabelecer uma discusso

    fundamentada na literatura que versa sobre o ensino de qumica, evidenciando

    duas abordagens: tradicional e moderna. A discusso passa necessariamente

    pela literatura de base especfica de cada abordagem versada. A abordagem

    tradicional discute as caractersticas fundamentais que enfatizam o ensino de

    Qumica na perspectiva positivista. A abordagem moderna se configura em

    duas propostas pedaggicas: (a) a qumica no cotidiano e cidadania; (b) a

    qumica como cincia, tecnologia e sociedade CTS.

    2.1 Ensino de Qumica Tradicional

    A abordagem tradicional de qumica fundamenta uma prtica

    educativa que sustenta o repasse puro e simples dos contedos prontos e

    acabados, sem estabelecer relao com a realidade do aluno, concebendo a

    Cincia Qumica, como rea nobre, privilgio de poucos, decorrendo da sua

    associao aos aspectos do desenvolvimento intelectual, equivocadamente,

    ainda, supervalorizada no ambiente escolar, em que se destacam raciocnio,

    lgica, preciso e objetividade.

    Embora Carraher (1998) no discuta efetivamente o ensino de

    Qumica, sua concepo nos ajuda a entender alguns aspectos da viso

    tradicional, concebendo o ensino como transmisso e a aprendizagem como

    recepo de informaes. Na compreenso de Carraher (1998, p.12),

    O modelo tradicional de educao trata o conhecimento como

    um contedo, como informaes, como coisas e fatos a serem

    transmitidos ao aluno. O aluno, segundo esta viso, vai para a

    escola para receber uma educao. Dizer que ele aprender

    significa que saber dizer ou mostrar o que lhe foi ensinado.

    Segundo este modelo, o ensino a transmisso de

    informaes. A aprendizagem a recepo de informaes e

    seu armazenamento na memria.

  • 28

    Assim, fazendo uma transposio para a rea da Qumica, verifica-

    se que o excesso de esquematizao e transmisso de informaes,

    deslocadas da vivncia real do aluno, conduz a certo preconceito para com a

    Cincia Qumica, visto que esta rea do conhecimento transforma o ato de

    estudar num mecanismo de memorizao mecnica dessas informaes,

    contribuindo para o ofuscamento da imaginao e da capacidade de inventiva

    do aluno.

    Desse modo, fica patenteado que a caracterstica fundamental do

    ensino de Qumica se expressa, com nfase no repasse de informaes

    memorizveis, mediante uma coletnea de pr-definies, regras, smbolos e

    frmulas, versados de forma estanque e sem contextualizao, caracterizando

    o modelo positivista6; e, ainda, insipincia de atividades experimentais ou

    preocupao precpua em relacionar ou estabelecer interface com o cotidiano

    do aluno. Por sua vez, o discurso pedaggico trabalhado nessa perspectiva

    institui o ensino na forma de inculcao (Orlandi, 1987) e o dilogo como

    incutimento (Eichler, 2002).

    Diante do exposto, faz-se necessrio refletir e buscar a superao

    da coisificao7 no ensino, em particular, na rea de Qumica, visto que a

    reflexo, quando exercida para analisar um fenmeno, suscita uma

    aprendizagem mais consistente. como afirma Carraher (1998, p.15),

    referindo-se falsa conscincia:

    Estamos to acostumados a salientar os fatos e informaes

    consideradas importantes que esquecemos a importncia de estimular

    o raciocnio, o pensamento ativo, a reflexo e a descoberta pelo aluno.

    Os fatos e informaes so facilmente guardados quando os alunos

    apreendem as coisas. Quando apenas memoriza, o aluno esquece a

    maior parte das informaes com a mesma velocidade que aprendeu.

    Essas caractersticas esto afinadas com o modelo tradicional de

    ensino, cujo papel da escola consiste na preparao intelectual tambm moral

    6 a explicao dos fatos, reduzidos aos termos reais, sem mito nem metafsica. Isto , somente so reais os conhecimentos que repousam sobre fatos observados (Comte,1973,p.11) 7 Significa reduzir o ensino memorizao mecnica de fatos e fenmenos, estabelecida como a essncia do objeto de estudo. igual a reificar (de rei = coisa).

  • 29

    dos alunos para assumir sua posio na sociedade. Na concepo de Libneo

    (1990, p. 23), o modelo tradicional de ensino expresso da seguinte forma:

    O compromisso da escola com a cultura geral. Os problemas

    sociais pertencem sociedade. O caminho cultural em direo

    ao saber o mesmo para todos os alunos, desde que se

    esforcem. Assim, os menos capazes devem lutar para superar

    suas dificuldades e conquistar seu lugar junto aos mais

    capazes.

    Na abordagem tradicional, os contedos de ensino de Qumica ou

    de qualquer outra rea so os conhecimentos e valores sociais acumulados

    historicamente pelas geraes e repassadas ao aluno como verdade absoluta;

    isto , o mtodo de ensino baseia-se na exposio verbal da matria. A

    exposio verbal e anlise do contedo qumico so feitas pelo professor e

    observadas atentamente pelos alunos. Nessa abordagem, a relao

    professor/aluno vertical, prevalece autoridade do professor, que exige

    atitude receptiva dos alunos no decorrer da aula. O contedo, geralmente,

    trabalhado na perspectiva abstrata8, distante da realidade do aluno. Para

    Mizukami (1986, p.15), essa abordagem referida institui uma metodologia que

    se caracteriza por expressar o ensino, mediante transmisso do patrimnio

    cultural, pela confrontao com modelos e raciocnio elaborados, trabalhados

    atravs de aulas expositivas e demonstrativas do professor classe.

    Assim, reconhecendo a existncia de problemas fundamentais

    concernente abordagem de ensino tradicional, nas diversas reas do

    conhecimento, em particular, na rea de Qumica, buscaremos discutir para a

    temporalidade presente, alternativas modernas que atendam as demandas da

    comunidade acadmica professores e alunos, cuja direo esteja apontada

    para as abordagens do ensino de Qumica que superam o modelo tradicional

    de transmisso do saber em termos de estratgias metodolgicas para

    trabalhar o objeto do conhecimento nesta Cincia. 8 Para Marx abstrato o significado obtido pelo primeiro contato com o objeto do saber, um conhecimento marcado pelas determinaes da realidade, isto , as caractersticas fsicas. So os primeiros nexos internos ou categorias simples: as primeiras impresses. O abstrato, embora seja uma totalidade viva, uma viso catica do todo, confusa, sem nexos lgicos (Marx, 1983, p.218-219).

  • 30

    2.2 Ensino de Qumica Moderno.

    Estamos concebendo o ensino de Qumica moderno como a

    conjuno das abordagens que superam o modelo de ensino tradicional,

    referente ao tratamento do objeto do conhecimento no ambiente escolar, quais

    sejam: (1) a Qumica no cotidiano e cidadania; (2) a Qumica como cincia,

    tecnologia e sociedade CTS.

    2.2.1 A Qumica no Cotidiano e Cidadania

    Desde o incio da nossa vida acadmica, em particular, no plano

    fundamental e mdio, nos deparamos com o ensino de Qumica, expresso no

    ambiente escolar, caracterizado pela memorizao mecnica de frmulas e

    conceitos. Na contextura acadmica, h pouca mudana em relao a tal

    realidade. Ouvimos dos professores repetidamente a seqncia de contedo

    logicamente organizada que se repete na maioria dos livros didticos da

    Qumica.

    Para fundamentar essa afirmao concernente memorizao de

    frmulas e conceitos, pesquisamos em Lembo (2001); Ml et al (2004); Feltre

    (2000) e Russell (1994) sobre a forma como os contedos ligaes qumicas,

    por exemplo, eram abordados. Percebemos que essas fontes pesquisadas

    tratavam os teores numa perspectiva no contextualizada e compartimentada.

    Diante desta observao, justifica-se a busca de alternativas pedaggicas que

    sejam atraentes, dinmicas e desafiadoras, de modo a instigar a curiosidade e

    o interesse do aluno para aprender Qumica, nos diversos nveis de ensino.

    Para Maldaner (2000, p.165).

    possvel melhorar sensivelmente, o nvel de conhecimento qumico

    aprendido na escola. Para isso, os professores precisam superar a

    posio tradicional das propostas de ensino de qumica que colocam

    todo o esforo do trabalho escolar em torno dos contedos

    descontextualizados, em obedincia a uma lgica de conhecimento

    sistematizado, a qual poder se adequar, apenas, para quem j

    conhece qumica.

  • 31

    Esse posicionamento do autor suscita a busca de caminhos

    direcionados para uma prtica pedaggica de Qumica que seja instituda

    objetivando a superao da lgica tradicional de ensino. Assim, haveremos de

    experimentar opes pedaggicas que tenham como elemento substantivo a

    participao coletiva de professores e alunos de escolas e universidades de

    modo que trabalhem o programa de Qumica coletivamente, com atitude de

    pesquisa, com boa relao professor/aluno, visando a possibilitar ao

    ensino/aprendizagem situaes capazes de romper com as prticas

    tradicionais de conceber o conhecimento qumico. Um dos constituintes

    fundamentais dessa busca passa necessariamente pelo entendimento de que a

    preocupao central fornecer aos alunos ferramentas bsicas que lhes

    permitam preparao para o exerccio da cidadania.

    Destaca-se a participao como caracterstica bsica da

    cidadania, podendo-se dizer que cidado o homem participante

    (Canivez,1991; Demo, 1988). Acerca da participao Demo (1988, p.18)

    afirma:

    Dizemos que participao conquista para significar que

    processo, no sentido legtimo do termo: infindvel, em

    constante vir-a-ser, sempre se fazendo. Assim, participao ,

    em essncia, autopromoo e existe enquanto conquista

    processual.

    Concebendo dessa maneira, a participao do professor na

    relao com o aluno contribui para engendrar uma prtica pedaggica na

    direo da prtica social refletida, em que professor e aluno interagem numa

    construo coletiva e permanente.

    Ao se considerar a participao como processo de autopromoo,

    verifica-se que ela desenvolvida pelo indivduo, ou seja, conquistada e,

    logo, no pode ser transmitida, nem concebida. Assim, pode-se afirmar que

    cidadania tambm conquista.

    Do ponto de vista didtico-pedaggico, fato amplamente

    conhecido que os contedos de ensino de Qumica so trabalhados, ainda,

    muito fortemente, na perspectiva de repasse de forma pronta e acabada,

  • 32

    desconhecendo a importncia e validade da construo coletiva, a qual suscita

    participao, interao, cooperao etc., concebidas como princpios que

    demandam a busca da cidadania.

    Assim, a abordagem do ensino de Qumica na perspectiva da

    cidadania como princpio norteador da prtica pedaggica, estabelece, dentre

    outras, as seguintes recomendaes: (a) compreender o conhecimento qumico

    como um processo de construo coletiva, com o estabelecimento de relaes

    conceituais, em que os esquemas mentais so elaborados pelos alunos para

    compreender os novos conceitos introduzidos em sala de aula; (b) entender o

    papel do professor e dos recursos didticos como o de organizar os conceitos,

    estabelecendo desafios cognitivos em que os alunos sejam estimulados a

    novos esquemas explicativos para o mundo que os cerca; (c) adquirir o

    domnio de conceitos qumicos consubstanciados no cotidiano do aluno; (d)

    conceber a linguagem no ensino de Qumica como ferramenta cultural,

    constitutiva do prprio sujeito, que suscita dinmica interativa em sala de aula,

    na mediao da elaborao do conhecimento qumico; (e) compreender a

    proposta, tendo a cidadania como meta e a organizao do

    ensino/aprendizagem centrado no aluno, de modo que o conhecimento qumico

    seja mediado pela linguagem socialmente estabelecida, negociada entre os

    alunos.

    Assim, o movimento estabelecido para buscar opes

    pedaggicas na rea de ensino da Qumica tem como meta garantir princpios

    que instrumentalizem o aluno com as ferramentas culturais do conhecimento

    qumico, ao mesmo tempo, estabelea uma atitude de compromisso tico com

    a sociedade no seu contexto socioeconmico, poltico e tico.

    Para isso, adota-se uma orientao metodolgica sustentada em

    pressupostos de natureza construtivista. Essa concepo compreendida

    nesse trabalho, pelo entendimento de que:

    Nada, a rigor, est pronto, acabado, e de que, especificamente, o

    conhecimento no dado, em nenhuma instncia, como algo

    terminado. Ela se constitui pela interao do indivduo com o meio

    fsico e social, com o simbolismo humano, com o mundo das relaes

    sociais; e se constitui por fora de sua ao e no por qualquer

    dotao prvia, na bagagem hereditria ou no meio, de tal modo que

  • 33

    podemos afirmar que antes da ao no h psiquismo nem conscincia

    e, muito menos, pensamente (BECKER,1993, p.88-89).

    Assim, o construtivismo se institui como teoria do conhecimento

    que engloba numa s estrutura os dois plos, o sujeito histrico e o objeto

    cultural, em interao recproca, ultrapassando dialeticamente e sem cessar as

    construes j acabadas para satisfazer as lacunas ou necessidades.

    Na concepo de Matui (1995, p.18) o compromisso poltico do

    construtivismo scio-histrico com a formao do cidado. Qualquer escola,

    pblica ou particular, uma instituio social para prestao de ensino

    populao. A qualidade desse ensino se mede pela conscincia do cidado

    que cada escola forma.

    Ao refletir sobre essa posio de Matui acerca da acepo

    construtivista, inevitavelmente, nos impe um questionamento, qual seja: se a

    qualidade um termo relativo e se a formao cidad uma conjuno de

    fatores agregados expressos desde as primeiras instrues adquiridas pela

    criana no seio familiar at as histrias de vida de cada sujeito vivenciada

    individual e coletivamente ao longo de sua trajetria. Ento, como medir a

    qualidade do ensino de uma escola apegando-se somente ao aspecto

    pedaggico?

    Recorrendo s idias de Santos et al.(2004, p.12) acerca do

    pensamento construtivista observamos que:

    As propostas mais recentes de ensino de qumica tm como um dos

    pressupostos a necessidade do envolvimento ativo dos alunos nas

    aulas, em um processo interativo, em que os horizontes conceituais

    dos alunos sejam contemplados. Isso significa criar oportunidades

    para que eles expressem como vem o mundo, como pensam,

    como entendem os conceitos, quais so as suas dificuldades, etc.

    Vale ressaltar o fato de que, sendo a Cincia Qumica de natureza

    abstrata para o concreto, observada no estudo dos modelos atmicos, na

    estrutura molecular do tomo, nas transferncias de eltrons, faz-se necessrio

    compreender, conforme est em consonncia com os Parmetros Curriculares

    Nacionais - PCNs, que a busca do conhecimento qumico, ocorre na dimenso

  • 34

    da abordagem com ncora em vrios aspectos, em que se ressaltam as

    habilidades e competncias nas diversas dimenses: (1) representao e

    comunicao; (2) investigao e compreenso; (3) contextualizao scio-

    cultural.

    Entendemos que, na primeira dimenso, ressaltam-se os aspectos

    qualitativos, no que dizem respeito s interpretaes e discusses sobre os

    fenmenos qumicos, naturais e artificiais. As habilidades e competncias a se

    desenvolverem no ensino de Qumica, nessa dimenso, passam pela descrio

    das transformaes qumicas em linguagens discursivas; pela traduo da

    linguagem discursiva em linguagem simblica e vice-versa, mediante grficos,

    tabelas e representaes matemticas interpretadas quimicamente.

    Na segunda dimenso, destacamos os aspectos macroscpicos

    (lgico-emprica), no que dizem respeito ao fenmeno qumico visvel a olho nu

    como a separao fsica de misturas, o estudo da tabela peridica e a diluio

    de solues. Os aspectos quantitativos (raciocnio proporcional), como os

    dados estequiomtricos de reaes qumicas; e, finalmente, os aspectos

    microscpicos (lgico-formal), como as reaes nucleares, interaes

    intermoleculares, energias envolvidas nas ligaes qumicas, enfim, as foras

    imersas entre os tomos e molculas para formar substncias; alm disso, as

    habilidades e competncias para selecionar e utilizar idias e procedimentos

    cientficos (leis, teorias, modelos) na resoluo de problemas qualitativos e

    quantitativos em Qumica, identificando e acompanhando as variveis

    relevantes.

    Na terceira dimenso, destacamos as habilidades e competncias

    no sentido de desenvolver conexes hipottico-lgicas que possibilitem

    previses acerca das transformaes qumicas, reconhecer aspectos qumicos

    relevantes na interao individual e coletiva do ser humano com o meio

    ambiente e confirmar relaes entre o desenvolvimento cientfico e tecnolgico

    da qumica e aspectos sociopolticos e culturais.

    Diante do exposto, discutiremos a alternativa pedaggica que se

    refira ao objeto de ensino de Qumica numa viso diferente da tradicional. A

    abordagem a que nos referimos a Qumica no cotidiano & cidadania. Essa

    proposta discute e desmistifica a Qumica como coisificao, memorizao

    mecnica, vista na perspectiva de ensino tradicional ampliando a discusso da

  • 35

    Qumica para o exerccio da cidadania, de modo que o aluno discuta, participe

    ativamente e apreenda os conceitos dessa Cincia de forma refletida.

    Atualmente, essa proposta pedaggica se constitui como grande aceitao no

    ensino de Qumica. Partilham desse entendimento, vrios autores, como:

    Chassot (1990; 2000); Lutfi (1988;1992); Maldaner (1992; 2000); Maldaner &

    Zambiazi (1995) Ciscato & Beltran (1991); Mortimer (2000); Mortimer &

    Machado (2002); Ambrogi; Versolato & Lisboa (1987).

    Vale ressaltar que um dos principais desafios do educador

    brasileiro do momento atual canalizar esforos para desenvolver prticas

    pedaggicas viveis nutridas de eficcia e consistncia terica, as quais nos

    possibilitem compreender a essncia do objeto de ensino como uma

    construo coletiva e a aprendizagem como um fenmeno representativo para

    o aluno, de modo a expressar um significado qualitativo, acerca do objeto

    observvel, possibilitando, assim, o desvendamento da realidade concreta9, na

    qual o aluno est inserido.

    Essa busca decorre, em essncia, da prtica do debate e reflexes

    de experincias pessoais partilhadas entre os pares, pois, em geral, o processo

    inicial de formao dos professores deixa muito a desejar em virtude de

    incongruncia para pr em prtica concepes e modelos explicativos

    inovadores, bem como a incapacidade de uma parcela significativa dos

    professores, pertencentes aos cursos de formao, compreender o objeto de

    ensino na sua totalidade.

    As instituies de ensino superior ficam fechadas em si mesmas:

    ora por um academicismo excessivo, ora por um empirismo tradicional tosco.

    Esses desvios tornam-se perniciosos para o processo de formao inicial do

    aluno e posterior exerccio da prtica pedaggica destes. Desse modo, faz-se

    necessrio sair desse casulo ou desse imbrglio que se manifesta em estado

    de latncia na prtica pedaggica, visto que se torna imperativa a busca de

    reflexes acerca do ato de ensinar, instituindo o debate contextualizado, a

    interdisciplinaridade e a dimenso poltico-econmico-social e tica como

    elementos articulantes e propulsores de um novo paradigma de ensino.

    9 O concreto concreto por ser uma sntese de mltiplas determinaes. Logo, unidade da diversidade. por isso que ele para o pensamento um processo de sntese, um resultado e no um ponto de partida (MAX, 1983, p. 218-219).

  • 36

    Desse modo, compreendemos, em essncia, que um dos grandes

    e graves problemas imersos na prtica pedaggica das cincias aproximadas,

    em particular da Qumica, refere-se, substancialmente, em absoluta

    prevalncia da percepo acerca do objeto de ensino sob a forma

    fragmentada, enviesada e unilateral, manifestada pelo educador brasileiro.

    Nessa mesma direo, diz Maldaner (2000, p.23):

    A preocupao com a formao de educadores como pessoas que no

    aceitam separar, na educao, o pensar e o agir, tambm no

    prioridade nas grandes universidades pblicas brasileiras, sendo

    relegada, muitas vezes, a uma atividade perifrica e afastada das

    pesquisas e outras preocupaes dos departamentos e/ou institutos

    dentro delas.

    Esse posicionamento do autor concernente formao de

    educadores na atualidade procede na medida em que a busca de opes

    pedaggicas no ato educativo constitui-se como elemento substancial da

    prtica, a qual no separa o pensamento da ao. Para, no entanto, trabalhar o

    objeto de ensino da Qumica nessa perspectiva referida, necessria

    invariavelmente, uma formao pedaggica adequada. A pesquisa como

    atividade de ensino constitui a busca concreta da interface de contedos

    tericos e a articulao destes com a prtica refletida, portanto, faz-se

    necessrio estabelecer essa interao e dinmica na prtica pedaggica,

    objetivando facilitar a aprendizagem, tornando-a significativa para o aluno.

    Nessa perspectiva, Mol e Santos (1998, p.9) assinalam que a

    Qumica, como busca do conhecimento,

    uma cincia que est na vida de todo cidado, portanto, na

    atualidade, fundamental que as pessoas no s saibam lidar

    com a linguagem qumica e compreendam os princpios

    bsicos dessa cincia como possam interpretar os processos

    qumicos presentes em seu cotidiano, sendo capazes de tomar

    decises na busca da melhora da sua qualidade de vida.

    A reflexo dos autores consubstancia o discurso de professores

    que defendem uma prtica pedaggica de Qumica, cujos contedos

  • 37

    trabalhados em sala de aula sejam significativos para a vida concreta do aluno.

    Alm disso, que seja empreendedora de respeito aos preceitos coletivos,

    significando formar um cidado crtico. Assim, torna-se imperativo debatermos

    sobre alguns elementos constituintes da prtica pedaggica, os quais

    interferem diretamente no ato educativo, quais sejam: a formao do educador,

    a avaliao da aprendizagem, a seleo de contedos, no caso em apreo, os

    contedos de Qumica, bem como, os erros conceituais graves imersos no

    Ensino Mdio, por exemplo:

    a) so recorrentes, sobretudo nos livros didticos de Qumica do Ensino

    Mdio, as expresses que dizem a mistura de gua (H2O) e lcool etlico

    (C2H5OH) azeotrpica. Essa uma afirmao vlida somente para alguns

    casos, pois a relao entre gua e lcool abaixo de 96% no constitui

    caractersticas de misturas azeotrpicas10. Essas misturas apresentam

    caractersticas iguais mistura dos elementos ou de compostos qumicos

    em seus pontos de fuso (PF) e pontos de ebulio (PE).

    b) da mesma forma, sobretudo na Qumica do Ensino Mdio, uma parcela

    significativa de professores manifesta conceitos equivocados sobre as

    10 So misturas em que o ponto de ebulio no se altera, em temperatura constante, comportando-se como um composto qumico ou elemento. Esse tipo de mistura muito comum entre lquidos. Ex: lcool de cozinha est misturado gua numa proporo na qual impossvel separar pela ebulio, j que a temperatura se mantm constante. PE = 78,5C; PF = -177C e (densidade) d = 0,79g/cm3 do lcool.

    temperatura

    slido

    intervalo de fuso

    lquido

    Ebulio (cte) gasoso

    PE

    tempo

  • 38

    baterias de telefones celulares, ao afirmar que estas emitem ora radiao 11

    ora radioatividade 12,dando a entender que os dois fenmenos so a mesma

    coisa;

    c) na parte relativa s reaes qumicas, traduzem literalmente algumas

    incongruncias imersas nos livros didticos do ensino mdio, nos quais

    alguns equvocas de contedos expressam como verdades prontas erros

    conceituais graves, por exemplo, as reaes de dupla troca e reaes de

    deslocamento ou troca simples, em meio aquoso, em termos de

    classificao, esses tipos de reaes qumicas no existem. As reaes que

    ocorrem, de fato, so respectivamente de sntese e oxi-reduo.

    Logo, uma vez detectadas tais avarias, cabe tambm prtica de

    ensino, encaminhar o aluno em direo busca de solues conclusivas

    capazes de dirimir as dvidas sobre o fenmeno observado, inclusive sob a

    forma de pesquisa, pois assim se constitui como azimute epistemolgico

    retroalimentador do processo de ensino. Desconhecer isso atestar a

    incapacidade de compreender o fenmeno da Cincia Qumica como objeto da

    prtica pedaggica na sua totalidade.

    O acesso aos fundamentos da Cincia Qumica numa perspectiva

    direcionada para a formao do aluno, instigante e capaz de desenvolver sua

    capacidade de participar, de tomar decises criticamente e compreender os

    processos qumicos relacionados com a vida cotidiana uma necessidade para

    a prtica pedaggica na atualidade. Nesse sentido, Santos e Schnetzler (1997,

    p.29) compreendem, em essncia,

    11 a propagao da energia por meio de partculas ou ondas. As radiaes emitidas pelas substncias radioativas so principalmente partculas alfa, partculas beta e raios gama. 12 um fenmeno natural ou artificial, pelo qual algumas substncias ou elementos qumicos, chamados radioativos, so capazes de emitir radiaes, as quais tm a propriedade de impressionar placas fotogrficas, ionizar gases, produzir fluorescncia, atravessar corpos opacos luz ordinria etc.

  • 39

    [...] que h necessidade de o aluno adquirir um conhecimento

    mnimo de qumica para poder participar com maior

    fundamentao na sociedade atual. Assim, o objetivo bsico do

    ensino de qumica possibilitar ao aluno participao ativa na

    sociedade.

    A discusso sugerida pelos autores acerca de uma prtica

    pedaggica capaz de possibilitar ao aluno uma participao ativa na sociedade

    mais uma contribuio terica agregada tendncia que versa sobre a

    qumica no cotidiano e cidadania. Isso implica que o conhecimento qumico

    aparece no como um fim em si mesmo, mas tambm com o objetivo maior de

    desenvolver as habilidades bsicas que caracterizam o cidado: participao e

    julgamento. A elaborao do conhecimento qumico, porm, nessa direo

    espinhosa, delicada, trabalhosa, pois abre prenncios de rupturas e a

    possibilidade de uma nova forma de pensar a prtica pedaggica de Qumica.

    2.2.2 A Qumica como Cincia, Tecnologia e Sociedade CTS.

    Outra abordagem consubstanciada em Santos e Schnetzler (1997)

    expressa na perspectiva da Cincia, Tecnologia e Sociedade CTS, a qual,

    tambm, vincula a educao qumica preparao para o exerccio da

    cidadania. Para caracteriz-la, Hofstein et al. (1988, p.358) propem a

    representao da figura 1, a qual por eles assim explicada:

    CTS significa o ensino do contedo de cincia qumica no contexto

    autntico do seu meio tecnolgico e social. Os estudantes tendem a

    integrar a sua compreenso pessoal do mundo natural (contedo da

    cincia qumica) com o mundo construdo pelo homem (tecnolgico) e

    o seu mundo social do dia-a-dia (sociedade).

    Essas inter-relaes estabelecidas na dimenso da cincia-

    tecnologia e sociedade esto expressas na citada ilustrao, cujo entendimento

    situa o aluno fazendo uso lgico do contedo da cincia mediante as conexes

    feitas pelos materiais de ensino de Cincia Tecnologia e Sociedade - CTS que

    fornecem o contedo de Cincia Qumica neste contexto integrativo, mediante

    a dimenso artificialmente construda e dimenso social.

  • 40

    Figura 1 O relacionamento entre cincia, tecnologia, sociedade e o aluno.

    MEIO NATURAL

    ALUNO

    MEIO ARTIFICIALMENTE MEIO SOCIAL

    CONSTRUDO Fonte: extrada de Hofstein et al., 1988, p.358.

    Para Salomon (1988), as trs componentes de CTS significam

    separadamente que a cincia deve abordar o carter provisrio e incerto das

    teorias cientficas. Com tal compreenso, os alunos podero avaliar as

    aplicaes da cincia, levando em conta as opinies controvertidas dos

    especialistas. Ao contrrio, com uma viso de cincia verdadeira e acabada, os

    alunos tero dificuldade de aceitar a possibilidade de duas ou mais opes

    para o problema focalizado. A Tecnologia deve ser apresentada como

    aplicao das diferentes formas de conhecimento para atender s

    necessidades sociais. Dessa forma, o aluno compreender as presses das

    inovaes tecnolgicas na sociedade, caracterizando a tecnologia como uma

    produo social e reconhecendo a dependncia da sociedade para com os

    produtos tecnolgicos gerados. Finalmente, sobre sociedade, deve levar os

    alunos a perceberem o poder da influncia que eles tm como cidado. Assim,

    eles sero estimulados a participar democraticamente da sociedade por meio

    da expresso de suas opinies.

    Na compreenso de Holman (1988), o ensino de CTS no atende

    exclusivamente aos interesses de uma educao cientfica, mas deve existir

    uma nfase na cidadania, ao preparar estudantes para o seu papel em uma

    sociedade democrtica. Tal considerao vincula o ensino de CTS aos direitos

    CINCIA QUMICA

  • 41

    do cidado e sua participao na sociedade, vinculao essa tambm citada

    pela maioria dos autores adeptos de CTS revisado.

    Pode-se depreender o significado do ensino de CTS por meio da

    sua comparao com o ensino tradicional de cincias. Neste sentido, os

    quadros a seguir explicitam o significado do ensino em questo.

    Tabela 1 Aspectos enfatizados no ensino clssico de cincias e no

    ensino de CTS.

    Ensino Clssico de Cincias Ensino de CTS

    Organizao conceitual da matria a ser estudada Organizao da matria em temas

    (conceitos de fsica, qumica, biologia); tecnolgicos e sociais;

    ---------------------------------------------------------------------------------------------------------- Investigao, observao, experimentao, coleta Potencialidades e limitaes da tecnologia

    de dados e descoberta como mtodo cientfico; no que diz respeito ao bem comum;

    ------------------------------------------------------------------------------------------------------ Cincia, um conjunto de princpios, um modo de Explorao, uso e decises submetidos

    explicar o universo, com uma srie de conceitos a julgamento de valor;

    e esquemas conceituais interligados; ---------------------------------------------------------------------------------------------------------- nfase na teoria para articula-la com a prtica. nfase na prtica para chegar teoria.

    -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Lida com fenmenos isolados, sob ponto de vista Lida com problemas no seu contexto real

    disciplinar, anlise dos fatos, exata e imparcial; (abordagem interdisciplinar);

    Fonte: Tabela extrada de Zoller, 1974. Essa proposta foi pensada inferindo destaque a um forte trao da

    dimenso prtica, s vezes em detrimento da teoria. A extremidade da prtica

    foi perdendo fora desde a partir da dcada de 1980, quando a discusso

    sobre a importncia da valorizao do contexto em que est inserido o objeto

    de estudo e a realidade social se tornou evidente. Mckavanagh e Meher (1982)

    elaboram um quadro comparativo, que ressalta uma abordagem tradicional de

    cincias em relao unidade de metais e uma abordagem de CTS em relao

    unidade de metais. Veja a Tabela, a seguir:

  • 42

    Tabela 2 Ensino de cincia tradicional e ensino de CTS.

    Uma abordagem tradicional de cincias Uma abordagem de CTS em relao

    em relao unidade de metais. unidade de metais.

    Classificao e propriedades dos metais .Diversidade e funes de materiais metlicos

    E no-metais; de uso dirio (incluindo desperdcios e desuso).

    -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Desenvolver conceitos de maleabilidade, Produzir materiais referentes s propriedades e

    dureza, densidade, ductibilidade; aplicaes dos metais;

    ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Estudo das propriedades fsico- qumicas e Viso histrica da descoberta dos metais e

    Aplicaes de metais selecionados, ex: ligas metlicas, bem como dos efeitos sobre a

    chumbo, ferro, cobre tecnologia e a sociedade.

    ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

    Estrutura atmica e cristalina, propriedade Pesquisa sobre metais, ligas e processos, os

    E uso; quis tm estimulado o desenvolvimento de

    novas tecnologias;

    Fonte: Extrado de Mckavanagh e Meher (1982).

    Nas tabelas 1 e 2, podemos verificar a diferena fundamental entre

    CTS e o ensino clssico, sendo caracterizado o ensino de CTS pela

    organizao conceitual centrada em temas sociais, pelo desenvolvimento de

    atitudes de julgamento, por uma concepo de cincia voltada para o interesse

    social, visando a compreender as implicaes sociais do conhecimento

    cientfico. Por outro lado, o ensino clssico caracterizado pela organizao

    curricular, centrado no contedo especfico de cincias, com uma concepo

    de cincia universal, que possui valor por si mesmo, e no pelas suas

    aplicaes sociais.

    A abordagem consubstanciada em CTS apresenta os seus

    principais aspectos, quais sejam: o estudo da natureza da cincia, da

    tecnologia e da sociedade e de suas inter-relaes, de modo que o aluno

    compreenda a interdependncia de tais componentes, sob uma perspectiva

    social. Os aspectos mais significativos esto expressos n