UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO ......Em alguns momentos, ações de prevenção foram realizadas...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
UNIVERSIDADE ABERTA DO SUS
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM SAÚDE INDÍGENA
REGIÃO CERRADO – TURMA II
ESTRATÉGIAS EDUCATIVAS DE PREVENÇÃO DA CÁRIE DENTÁRIA ENTRE
CRIANÇAS GUARANI-KAIOWÁ DE 05 A 13 ANOS E SEUS RESPONSÁVEIS NA
ALDEIA INDÍGENA DE PANAMBI/LAGOA RICA (DOURADINA-MS)
NAYO HERNANDES DE MORAIS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao
Curso de Especialização em Saúde Indígena, da
Universidade Federal de São Paulo.
Orientador (a): Prof. (a) Luana Pinho de
Mesquita
SÃO PAULO
2017
ESTRATÉGIAS EDUCATIVAS DE PREVENÇÃO DA CÁRIE DENTÁRIA ENTRE
CRIANÇAS GUARANI-KAIOWÁ DE 05 A 13 ANOS E SEUS RESPONSÁVEIS NA
ALDEIA INDÍGENA DE PANAMBI/LAGOA RICA (DOURADINA-MS)
NAYO HERNANDES DE MORAIS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao
Curso de Especialização em Saúde Indígena, da
Universidade Federal de São Paulo.
Orientador (a): Prof. (a) Luana Pinho de
Mesquita
SÃO PAULO
2017
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus e a existência pоr tеr mе dado saúde е força pаrа superar аs
dificuldades.
Aos meus pais, irmão e avó pelo amor, incentivo е apoio incondicional.
A professora e tutora Juliana Nogueira de Souza Campos pоr tanto quе sе dedicou а
mim, nãо somente pоr ter mе ensinado, mаs por ter mе feito aprender.
A minha orientadora Luana Pinho de Mesquita pelas suas correções е incentivos e pelo
empenho dedicado à elaboração deste trabalho.
A todos quе direta оu indiretamente fizeram parte dа minha formação, о mеu muito
obrigado.
RESUMO
Este projeto de intervenção enfoca as estratégias educativas de prevenção à cárie
dentária, pois ela é considerada um problema de saúde pública por sua alta prevalência,
em especial em crianças. A intervenção se dará na aldeia indígena Lagoa Rica
(Panambi), localizado no município de Douradina, Mato Grosso do Sul, Brasil. O
objetivo geral é estimular hábitos de higiene bucal que possam minimizar a
problemática das doenças bucais em crianças de cinco a treze anos. Será utilizado como
estratégia de desenvolvimento da mesma, etapas de educação em saúde com as crianças
e responsáveis com a colaboração da equipe de saúde. O uso de recursos educativos que
despertem o interesse dos responsáveis tais como: manequins e cartazes. É importante
que a linguagem seja adequada a este, a fim de que os sensibilizemos sobre o valor da
saúde bucal. Com o desenvolvimento desse projeto esperamos alcançar resultados
como: reduzir a prevalência de cárie nas crianças da aldeia, desenvolver o conhecimento
da lesão de cárie como uma patologia, sensibilizar as pessoas envolvidas a participarem
dos processos educativos e desenvolver a co-responsabilidade do indivíduo pela bucal e
da criança sob seus cuidados. Assim como, quando associada a outros métodos de
prevenção pode ter resultados ainda mais positivos.
Palavras – chave: Saúde de Populações Indígenas; Saúde Bucal; Cárie Dentária;
Educação em Saúde.
LISTA DE SIGLAS
AIS: Agente Indígena de Saúde
ASB: Auxiliar em Saúde Bucal
DSEI-MS: Distrito Sanitário Especial Indígena do Mato Grosso do Sul
FUNAI: Fundação Nacional do Índio
FUNASA: Fundação Nacional de Saúde
MS: Mato Grosso do Sul
PSF: Programa de Saúde da Família
SESAI: Secretaria Especial de Saúde Indígena
SPI: Serviço de Proteção ao Índio
SUS: Sistema Único de Saúde
TSB: Técnico em Saúde Bucal
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – Apresentação da revisão de literatura- Artigos mais relevantes sobre o
tema, com descrição de autores, título, periódico, volume e número e principais
considerações sobre o tema.............................................................................................14
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Mapa com a localização da aldeia Panambi (Lagoa Rica)..............................9
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO..................................................................................................09
1.1 JUSTIFICATIVA........................................................................................12
1.2 REVISÃO DE LITERATURA...................................................................14
2. OBJETIVO GERAL E OBJETIVOS ESPECÍFICOS..................................18
3. MÉTODO...........................................................................................................19
4. RESULTADOS ESPERADOS.........................................................................21
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................23
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................24
9
1. INTRODUÇÃO
Os Guarani-Kaiowá estão presentes no território da aldeia de Lagoa Rica em
Douradina – Mato Grosso do Sul (MS). Eles vivem na região sul do Estado e no
passado eram milhares ocupando 40% do território que compreende Mato Grosso do
Sul. Pertencem ao tronco linguístico Tupi e é um dos únicos grupos indígenas que tem
noção de seu território. Durante a exploração da erva mate, as comunidades ficaram em
pequenas reservas, e até hoje seus territórios sagrados continuam a ser invadidos por
fazendeiros e agricultores. Em sua cultura, acreditam que foram os primeiros a serem
criados por Deus, vindo depois os Guarani, outros grupos indígenas e os brancos1.
Figura 1: Mapa de localização da aldeia Panambi (Lagoa Rica) - situada ao
norte da imagem em amarelo, caracterizada como aldeia demarcada. Fonte:
http://www.trilhasdeconhecimentos.etc.br/mato_grosso_do_sul/images/guarani_02.jpg
Desde a chegada dos colonizadores, os Kaiowá sempre foram confundidos com
os Guarani, por terem como base o mesmo idioma, apesar de suas culturas e aspectos
10
físicos serem diferentes e considerados únicos. Dentre seus costumes está o preparo da
chicha, bebida de milho cozido e fermentado, usado na alimentação, rituais e festas. Os
Kaiowá tem uma estatura mais alta e sempre viveram da caça e da pesca, plantando
somente o necessário para o sustento da família. Sua alimentação baseia-se no milho,
considerado alimento sagrado, na mandioca e, atualmente, no arroz. Eles se denominam
Kaáguygua. Os Guarani tem estatura mais baixa com hábitos alimentares baseados em
frutas e mel, além da caça e da pesca1.
Na década de 50, os Kaiowá moravam em casas grandes, que eles denominavam
gajekutu, reunindo até cem pessoas da mesma família. Atualmente elas cederam lugar a
casas geralmente pequenas, abrigando apenas a família nuclear, embora mantendo a
proximidade territorial com os demais membros da família extensa, pais, filhos e
genros, que são a base organizacional1.
No Mato Grosso do Sul, não obstante a prática de constrição em espaços
estabelecidos pelo Estado, inúmeros grupos macro familiares envidaram esforços para
permanecerem nas áreas de florestas – não raro nos fundos de fazendas que toleram sua
presença. O desmatamento dos anos 1970 levou os indígenas fora das reservas,
considerados pelo organismo indigenista oficial como “desaldeados”, a se deslocarem
continuamente, fugindo de áreas ecologicamente descaracterizadas e da hostilidade do
branco. Em fins dessa década, já com exíguas matas onde pudessem manter-se isolados,
não foi mais possível evitar conflitos frontais com os brancos que os queriam expulsar
para as áreas de Postos Indígenas, o que levou Ñandeva e Kaiowá a se organizarem e
reivindicar espaços territoriais perdidos. Isso tudo teria levado os Guarani do MS a uma
reflexão inexorável sobre as condições territoriais e se empenharem em elaborar
culturalmente as condições do presente no sentido de construir relações com o passado
através da organização da memória dos vários grupos macro-familiares e da percepção
dos espaços por estes ocupados no correr do tempo, reforçando o próprio sentimento de
autoctonia1.
Ainda hoje existem muitos conflitos na área de Lagoa Rica (Douradina-MS) pela
demarcação de terras tradicionais indígenas. A luta se intensifica não só com os
fazendeiros, mas também com a comunidade local já que a maior geração de renda local
é através da lavoura e é marcante o preconceito que permeia este processo2.
A atividade econômica desenvolvida por maior parte da comunidade é o trabalho
em serviços, como frigoríficos e limpeza urbana (garis), enquanto alguns têm ocupações
11
como professores, técnicos de enfermagem, agentes de saúde e artesãos. Também existe
uma minoria que são pequenos agricultores, porém pode-se dizer que grande parte
sobrevive de doações e também contam com benefícios sociais de programas do
governo como o bolsa família e cesta básica do governo do Estado do MS e da
Fundação Nacional do Índio (FUNAI).
Em relação à saúde e adoecimento na família, as práticas de autocuidado de
higiene bucal são realizadas habitualmente pelos mais jovens, poucos são aqueles que se
automedicam já que a maioria não possui televisores com propagandas de
medicamentos. O papel dos familiares nos cuidados de saúde é feito de forma
consciente e com zelo e medidas preventivas são realizadas com a equipe de saúde (ex:
exame preventivo nas mulheres). Em relação aos hábitos alimentares, a dieta é à base de
arroz, feijão, carne (eventualmente), e mandioca (que muitos plantam), e, há pouca
ingestão de produtos industrializados.
As ações preventivas iniciam-se na infância e prosseguem por toda a vida e, se
bem observadas, garantirão uma existência tranquila até a velhice. São práticas
transmitidas através das gerações, consagradas pela tradição e que se apoiam nas
qualidades curativas de plantas, em revelações e interpretações xamânicas e no
conhecimento registrado nas narrativas orais. Para entender o complexo conjunto de
concepções que as envolvem é preciso seguir até o universo imaginário que lhes dá
fundamento onde são muitos os fenômenos que se cruzam, sendo difícil estabelecer
domínios separados, limites claramente demarcados para manifestações da prática
social, de conhecimentos técnicos, de saberes espirituais e de procedimentos mágicos.
De um modo ou de outro, todos concorrem para explicar, justificar ou legitimar regras
do convívio social, desempenhos rituais e intervenções práticas3.
Os Serviços de Saúde disponíveis se localizam no centro das comunidades, em
unidades de saúde em que possui médico, enfermeira, dentista, técnicos de enfermagem
e agentes de saúde, a área possui acesso a saúde básica e caso necessário é encaminhado
para referencia no município de Dourados - MS.
Nesta região nota-se grande número de crianças com cárie dentária, pois com a
grande proximidade com a cidade (Douradina-MS) e a vinda de mascates aumenta a
incidência de carboidratos e açucares na população e principalmente com as crianças.
Mesmo com a realização a de palestras com educação em saúde bucal é observado ainda
12
as crianças se alimentando desses produtos e sem posterior higienização. Os pais,
responsáveis, anciões, agentes e agentes de saúde bucal são de extrema importância na
modificação e orientação para os mais novos seguirem esse modo de vida.
Um dos grandes problemas observado são as condições da saúde bucal em
crianças de 05 a 13 anos de idade decorrentes do mau hábito de higienização bucal e dos
maus hábitos alimentares, onde a base alimentar são os alimentos industrializados, pois
em boa parte da comunidade houve o abandono da agricultura de subsistência e a
dependência de programas governamentais de geração de renda oferecidos, como bolsa-
família e cestas básicas do governo estadual (MS).
A cárie dentária não deve ser considerada uma doença, mas simplesmente uma
lesão do esmalte de causa local, sem fatores etiológicos determinantes, porém
provocada pelo desequilíbrio de fatores considerados fisiológicos, pertencentes à
biodiversidade do ser humano e especificamente da cavidade bucal4. Podemos verificar
alterações nos hábitos e na biodiversidade da microbiota oral nesta comunidade, fatores
que podem contribuir para o aumento da prevalência de cárie nesta população.
1.1. JUSTIFICATIVA
A falta de assimilação por parte comunidade da importância de hábitos de
higiene oral é evidente. Em alguns momentos, ações de prevenção foram realizadas pelo
dentista do Pelotão do Exército, em campanha na comunidade, com aplicação de flúor e
palestras - em português, naturalmente, já que não tinha domínio da língua materna da
comunidade. Assim, a comunidade recebia isso em tom de humor, embora estivessem
pontualmente no local e hora marcados. Outras vezes, o próprio dentista da antiga
Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), também de passagem, fazia o mesmo, mas
após sua partida, tudo voltava ao normal, continuavam os hábitos de ingestão de açúcar,
balas, biscoitos e não havia hábitos de higiene regulares, assim, acometimentos bucais
como cárie eram recorrentes.
13
Dessa forma, é importante refletir: por que a população não correspondia ao
ensino enfático da importância dessa higienização cotidiana? Por que não valorizavam –
na ausência de produtos cedidos – produtos como cremes dentais e escovas em suas
trocas? Entende-se que a estratégia de educação em saúde adotada não atingiu seu
objetivo, o cerne, a vontade, a consciência simplesmente, e isso pelo fato de ser algo de
fora, alheio ao seu hábito e às suas perspectivas? Provavelmente sim. Vale considerar
que Moimaz et al5 que é importante a inter-relação entre conhecimento adquirido e a
mudança de atitudes já que muitas vezes há mesmo um abismo entre o saber e o fazer6.
Vale ressaltar que há uma influência da proximidade do contato com a cidade já
que Douradina fica a 7 km da aldeia, o que facilita o acesso a alimentos pouco
saudáveis, de baixa qualidade nutritiva, sem contar o grande problema do abandono da
prática da agricultura doméstica, que influencia muito na qualidade de vida da
população indígena Guarani Kaiowá, principalmente das crianças.
O DSEI Mato Grosso do Sul propõe ações de promoção de saúde de crianças de
05 a 13 anos com estratégias voltadas para melhoria das condições de saúde baseadas na
mudança dos padrões e modo de vida. No entanto, enfatiza-se a importância da análise
destes problemas de saúde bucal que prejudicam a qualidade de vida da população e a
necessidade de propostas que alcancem a sensibilização da comunidade para a
importância de hábitos de higiene rotineiros.
Dessa forma, acredita-se que um projeto de intervenção educativo voltado para
essas crianças e seus responsáveis é de grande importância já que a maioria delas é
proveniente de famílias com baixas condições socioeconômicas, e muitas não se
alimentam de forma tradicional, adotando alimentos industrializados, com poucas
informações relacionadas à importância da saúde bucal e de hábitos de vida saudáveis7.
Além disso, os cuidados em saúde bucal nesta faixa etária são de grande importância já
que há troca de dentição de decídua para permanente e a infância é um momento
propício para novas aprendizagens e adoção de novos hábitos saudáveis.
14
1.2 REVISÃO DE LITERATURA
A fim de buscar informações sobre a cárie dentária e a saúde bucal de crianças
indígenas em âmbito nacional, realizou-se uma revisão bibliográfica na biblioteca
eletrônica SciELO e na base de dados Lilacs. Os termos de descritores usados nos
idiomas português e inglês foram respectivamente: Índios Sul-Americanos, Indians
South American, Saúde Bucal, Oral Health, Cárie Dentária, Dental Caries.
Os artigos foram selecionados de acordo com a temática e relevância e esta
revisão deu subsídio à construção deste projeto de intervenção. As publicações foram
publicadas no período de 2008 a 2014 e aquelas consideradas mais relevantes sobre o
tema da Cárie Dentária em populações indígenas, e, no idioma português, encontram-se
descritas no Quadro 1.
QUADRO 1 – Artigos mais relevantes sobre o tema, com descrição de autores,
título, periódico, volume e número e principais considerações sobre o tema.
Autores (ano) Título Periódico, volume e número Principais considerações
sobre o tema
Carneiro et al (2008)
Cárie dentária e
necessidade de
tratamento
odontológico entre os
índios Baniwa do Alto
Rio Negro,
Amazonas.
Ciênc. saúde
coletiva vol.13 n.6.
Mudanças nos padrões de
dieta
Dumont et al (2008) Índice de necessidade
de tratamento
odontológico: o caso
dos índios Xakriabá
Ciênc. saúde coletiva vol.13 n.3
Aumento na prevalência
de cárie atribuído à
adoção de dieta mais rica
em carboidratos.
Alves Filho, Santos e
Vettore (2009)
Saúde bucal dos
índios Guaraní no
Estado do Rio de
Janeiro, Brasil.
Cad. Saúde Pública vol.25 n.1
Os estudos sobre saúde
bucal indígena ainda em
pequeno número no país
frente à sócio diversidade
existente.
15
Moura; Batista e
Moreira (2010)
População indígena:
uma reflexão sobre a
influência da
civilização urbana no
estado nutricional e na
saúde bucal.
Rev. Nutr., Campinas, v. 23, n.
3, p. 459-465.
Influência das transições
em relação saúde bucal da
população indígena
brasileira.
Arantes, Santos, Frazão
(2010)
Diferenciais de cárie
dentária entre os
índios Xavante de
Mato Grosso, Brasil.
Rev. bras.
epidemiol. vol.13 no.2.
O contato permanente
com a sociedade não-
indígena impôs
transformações nas formas
de subsistência.
Machado Jr, Reyes e
Dias (2012)
Odontologia na
aldeia: a saúde bucal
indígena numa
perspectiva
antropológica
Antropos. Ano 4 – Volume 5 –
2012.
O conhecimento adquirido
e a mudança de atitudes
são elos de uma corrente,
uma melhor informação
nem sempre leva à
modificação de
comportamento.
Maurício e Moreira
(2014)
Condições de saúde
bucal da etnia Xukuru
do Ororubá em
Pernambuco: análise
multinível.
Rev. bras.
epidemiol. vol.17 n.3.
Alguns grupos indígenas
possuem altos níveis de
cárie, outros possuem
baixos níveis de cárie,
configurando um quadro
epidemiológico diverso e
complexo.
As condições de saúde bucal dos povos indígenas no Brasil são muito pouco
conhecidas. Os estudos disponíveis têm evidenciado uma tendência de agravamento,
particularmente nas populações mais expostas a mudanças nos padrões de dieta,
incluindo a incorporação de itens industrializados, em particular do açúcar refinado8,
2008) mas de forma geral as produções indicam um quadro diverso e complexo com
transformações e mudanças nas diversas etnias e ao longo do tempo.
Do ponto de vista epidemiológico, a cárie dentária é possivelmente a doença
bucal de maior relevância. Em estudo realizado entre pares mãe-filho, Hirooka et al9
evidenciaram que o índice de cárie para dentição decídua (ceo-d) dos filhos apresentou
valor médio de 4,7 e que apenas 13,4% dos filhos estavam livres de cárie enquanto
16
79,7% necessitavam de tratamento. Há evidências de uma inter-relação entre
transformações nas estratégias de subsistência e na dieta ao longo da história humana e
as alterações na situação de saúde bucal. Segundo Dumont et al10
, há estudos que
demonstram que, em grupos caçadores-coletores, a frequência da doença é mínima. Já
nas economias mistas e, sobretudo, nas baseadas em agricultura, a ocorrência de lesões
de cárie é mais expressiva. Nestas investigações, o aumento na prevalência de cárie é
atribuído à adoção de dieta mais rica em carboidratos oriundos da agricultura. Além
disso, mudanças na forma de preparo dos alimentos, que passaram a ser consumidos
preferencialmente cozidos, tornando-os mais moles e adesivos, teriam facilitado o
acúmulo de placa, o que eleva o potencial cariogênico10
.
É importante ressaltar que vivem no Brasil mais de 200 etnias indígenas,
distribuídas em todo o território nacional e os estudos sobre saúde bucal indígena, ainda
são escassos no país frente à sócio diversidade existente, além de estarem concentrados
na região amazônica, apontam para uma grande heterogeneidade epidemiológica. Tal
como em outras populações, entre os povos indígenas, e no caso da cárie em particular,
os padrões da doença guardam uma estreita relação com determinantes culturais,
comportamentais e biológicos, por exemplo dieta, exposição ao flúor, entre outros11
.
Por se tratar de populações vulneráveis em relação às suas condições de saúde
bucal, é importante identificar a influência das transições em relação saúde bucal da
população indígena brasileira. Embora ainda existam sociedades indígenas que mantêm
um modo tradicional de viver, nas quais uma alimentação adequada em quantidade e
qualidade provém da caça e da prática de agricultura, a maioria dos índios vem sofrendo
um processo de aculturação oriundo do contato com a civilização urbana, pois eles não
mais dispõem de terra suficiente que garanta a subsistência. Desse modo, acabam
tornando-se dependentes do comércio local e consumindo alimentos industrializados
que podem ser prejudiciais à saúde bucal e ao estado nutricional12
.
É evidente que os riscos para desenvolvimento da cárie em povos indígenas
aumentaram à medida em que se intensificou essa interação e o contato permanente com
a sociedade não-indígena impôs transformações nas formas de subsistência, nos
sistemas socioculturais e nos estilos de vida desses povos, em geral com impactos
negativos para sua saúde13
.
17
Atualmente, alguns grupos indígenas possuem altos índices de cárie, enquanto
outros possuem um quadro epidemiológico diferente, o que configura a grande
diversidade e complexidade da doença em diferentes povos. Apesar da escassez de
estudos abordando a saúde bucal entre povos indígenas, o que inviabiliza o
delineamento de um perfil epidemiológico14
, é necessário envolver a comunidade no
planejamento das estratégias de prevenção e promoção da saúde, adaptados à realidade
local, para que eles possam ser realmente eficazes9.
18
2. OBJETIVOS
GERAL
Propor ações de educação em saúde bucal para sensibilização sobre a
importância da prevenção da cárie dentária entre crianças indígenas Guarani Kaiowá, na
faixa etária de 05 a 13 anos, e seus responsáveis, residentes na aldeia Lagoa Rica
(Panambi) em Douradina – Mato Grosso do Sul.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
- Identificar as formas de prevenção e instrumentos educacionais;
- Recomendar processos de abordagem aos responsáveis para a prevenção em saúde
bucal;
- Resgatar conhecimentos tradicionais;
- Realizar encontros na comunidade com crianças e responsáveis, incluindo auxiliares
de saúde bucal, agentes indígenas de saúde e líderes comunitários;
- Avaliar o processo ensino-aprendizagem das crianças realizando escovação
supervisionada e associando ao tema aprendido.
19
3. MÉTODO
Este projeto de intervenção prevê a realização de ações educativas em saúde para
trocar informações sobre a doença cárie com crianças de 05 a 13 anos e seus
responsáveis na comunidade de Lagoa Rica, Polo Base Dourados, DSEI Mato Grosso
do Sul.
As atividades serão realizadas no centro comunitário da aldeia e na escola da
comunidade de Lagoa Rica nas 4 áreas cobertas por diferentes agentes de saúde,
visando que os participantes possam se sentir à vontade. A intervenção caracteriza-se
por um processo de sensibilização sobre a importância da prevenção da cárie dentária na
faixa etária referida acima. Estas ações exigem envolvimento da comunidade, e o
público terá um papel ativo na troca de conhecimento e análise de aspectos importantes
sobre a Doença Cárie. Também irão participar da intervenção os seguintes profissionais
de saúde: auxiliares de saúde bucal, agentes indígenas de saúde e, líderes comunitários.
Para o desenvolvimento do projeto de intervenção foi realizado inicialmente um
Diagnóstico Situacional do território e consultou-se bibliografia sobre o tema.
As ações serão realizadas em 3 etapas:
Primeira etapa: Diagnóstica. A partir da revisão bibliográfica sobre a cárie
dentária nos povos indígenas, será proposta uma roda de conversa com os pais para a
identificação de possíveis dúvidas e seu conhecimento sobre a doença e como contribuir
para diminuir ou prevenir as mesmas.
Segunda etapa: Intervenções serão realizadas em atividades de educação em
saúde, por meio de palestras em grupo com temas específicos:
Tema 1: Cárie dentária, riscos e como prevenir;
Tema 2: Hábitos alimentares saudáveis: como evitar as cáries e como resgatar a
alimentação tradicional pode ser importante neste processo;
Tema 3: Hábitos de higiene: escovação, fio dental e flúor.
Estas atividades serão realizadas em forma de apresentação oral do tema
relacionando-os com os conhecimentos tradicionais. Durante a palestra a tradução será
20
simultânea na língua materna, realizada pela auxiliar de saúde bucal. O agente de saúde
indígena será responsável por organizar, convidar e acolher os participantes. As
lideranças e os anciões serão envolvidos para compartilhar o que sabem sobre o tema e
iniciar a roda de conversa para que haja a interação entre todos os participantes. Serão
um total de 4 atividades, 1 a cada semana, com duração de 1 hora cada uma. Cada etapa
estará centrada no conhecimento da doença cárie, unindo a interação direta dos
participantes, expondo suas formas de cuidado com as crianças, e possíveis tratamentos
administrados.
Nestas atividades serão utilizados os seguintes recursos e materiais: Cartolinas,
canetões, papel sulfite, canetas, macromodelo de boca e escova para demonstração, fio
dental, creme dental e escova dental.
O fazer pedagógico desta proposta é planejado de forma a combinar os
conteúdos e temas com a integração e a interação grupal através da espontaneidade e da
participação junto com a reflexão e a vivência de oficinas. Nossa opção metodológica
está baseada na participação real e na problematização, buscando a aprendizagem a
partir do confronto com situações reais no contexto de vida da comunidade. Levando
em consideração a busca do conhecimento de sua situação de vida e a discussão coletiva
visando ao encontro de soluções viáveis, os técnicos e a comunidade estarão
aprendendo e decidindo o encaminhamento das ações15
.
As atividades serão distribuídas nas diferentes micro áreas e no espaço escolar,
onde serão apresentados todos os temas seguido da atividade prática de escovação
supervisionada, como descrito a seguir:
Semana 1: Área do Agente de saúde indígena 1
Semana 2: Área do Agente de saúde indígena 2
Semana 3: Área do Agente de saúde indígena 3
Semana 4: Escola (Escola Municipal de Educação Indígena Joãozinho Carapé
Fernando)
Terceira etapa: Avaliativa - depois de cada atividade (etapa de intervenção
educativa) será avaliado o processo ensino-aprendizagem das crianças realizando-se
21
uma atividade prática de escovação supervisionada com o tema aprendido como
avaliação final em pequenos grupos na comunidade e escola.
22
4. RESULTADOS ESPERADOS
Atualmente atuo como Cirurgião-Dentista em uma aldeia no Sul do Mato Grosso
do Sul, pertencentes à mesma cidade, com aproximadamente 800 moradores. Porém
trabalho com saúde indígena há 5 (anos) anos e 6 (seis) meses. Além do atendimento no
consultório odontológico, desenvolvo atividades de educação (prevenção) para que
possamos atingir um número maior de pessoas, inclusive aquelas que não têm o hábito
de ir até a Unidade de Saúde e principalmente para tentar sensibilizar sobre a
importância de uma boa higiene oral, que também está diretamente ligada a outras
doenças sistêmicas. Com a realização de palestras educativas espero principalmente
demonstrar a importância da escovação dentária cotidiana em crianças escolares
indígenas e seus benefícios para a prevenção da cárie dentária, na aldeia Panambi
(Douradina-MS).
A escola como um local de ensino e aprendizagem, torna-se um local propício
para realização de palestras e desenvolvimento de atividades ligadas à saúde bucal.
Contribui para o sucesso deste projeto de intervenção, a inclusão da comunidade, pois
junto com a família e caciques poderá se reforçar a importância e o apoio destes diante
deste hábito. Outro ponto importante será a utilização de materiais ilustrativos, que
sempre colaboram no processo ensino-aprendizagem dos escolares, já que apenas o uso
de cartilhas não é capaz de despertar o interesse dos alunos, uma vez que este material
exige iniciativa individual na busca de informações.
Espera-se identificar as formas de prevenção e instrumentos educacionais já
utilizados pela comunidade (escolares, por exemplo); recomendar processos de
abordagem aos responsáveis para a prevenção em saúde bucal de seus filhos; resgatar
conhecimentos tradicionais junto à comunidade; e realizar encontros na comunidade
com apoio da equipe de saúde: auxiliares de saúde bucal, agentes indígenas de saúde e
líderes comunitários, pois este trabalho exige empenho coletivo com participação de
todos.
Em suma, espera-se a redução da doença cárie nas crianças de 05 a 13 anos e que
após a realização destas atividades educativas em saúde, as crianças e responsáveis
sejam sensibilizados para um novo hábito neles próprios e em pessoas ao seu redor. Por
23
outro lado, é esperado também que a comunidade compartilhe os conhecimentos
tradicionais relativos à saúde bucal e que eles sejam sensibilizados sobre a importância
da escovação diária, o uso do fio dental, a importância da aplicação de flúor e de hábitos
alimentares saudáveis. Ainda, espera-se que os profissionais se envolvam e deem
continuidade às atividades a partir da aprendizagem construída e que com o apoio de
todos multipliquem os conhecimentos, inclusive com o apoio das lideranças, pois
acredita-se que a confiança que a comunidade deposita nestes sujeitos pode influenciar
outros da comunidade, ampliando os impactos das atividades educativas.
24
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A importância da prevenção e promoção em saúde bucal através de trabalhos
preventivos e de educação em saúde bucal em crianças e seus responsáveis são eficazes
quando executados na comunidade ou/e principalmente em ambiente escolar.
Com isso, através das diversas atividades realizadas, é possível, despertar o
interesse das crianças relacionadas aos métodos corretos de higienização, permitindo
que o mesmo interaja e se familiarize de forma mais rápida e natural com esses
instrumentos de saúde bucal. Além disso, muitos repassam a informação para os
membros da comunidade, prática de educação em saúde pouco traz poucos significados,
assim, o uso de materiais educativos devem ser coerentes com a realidade.
É evidente, em muitos estudos, que ações de prevenção em saúde bucal
colaboram na redução do índice de cárie. De acordo com a revisão de literatura pode-se
perceber a relevância de uma a proposta de atividade educativa já que existem muitas
problemáticas como esta em outras aldeias e um projeto de intervenção como o
proposto na aldeia permite a sensibilização da comunidade para o tema. No entanto,
vale ressaltar que na atual situação vivida nas aldeias temos algumas dificuldades como
falta de viaturas, combustível e até materiais básicos para realizar os cartazes para este
tipo de intervenção.
Como resultado desse projeto de intervenção, esperamos que a ação interventiva,
após passado os doze meses propostos, promova uma melhor condição de saúde bucal
das crianças da Escola Municipal de Educação Indígena Joãozinho Carapé Fernando,
com a redução do número de dentes cariados destas e que contribua para a resolução da
problemática encontrada que é de cunho social bastante relevante. Espera-se também
uma maior aproximação e interação com os pais e responsáveis por essas crianças a fim
de fomentar a reflexão no sentido de que estes se tornem responsáveis pela saúde bucal
de seus filhos.
Considero que o presente projeto poderá também ajudar, colaborar e servir de
apoio para colegas que executem atividades educativas coletivas para prevenção e
também como um incentivo positivo para aqueles que desejam colocar em prática ações
de prevenção e promoção em saúde bucal.
25
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Instituto Socioambiental. Terras indígenas. Povos Indígenas do Brasil Guarani
Kaiowá. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/povo/guarani-
kaiowa/553. Acesso em 23 de maio de 2017.
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