UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA DEPARTAMENTO DE JORNALISMO CURSO DE … · 2019-02-22 ·...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
DEPARTAMENTO DE JORNALISMO
CURSO DE JORNALISMO
MARIA VICTÓRIA FERREIRA SILVA
DIAS DE MARIA: MEMÓRIAS DO CRISTO REI
VILHENA
2018
2
MARIA VICTÓRIA FERREIRA SILVA
DIAS DE MARIA:
MEMÓRIAS DO CRISTO REI
Monografia apresentada no
curso de Jornalismo do
Departamento de Jornalismo
da Universidade Federal de
Rondônia, campus Vilhena ,
como requisito para a
obtencao do titulo de
Jornalista.
ORIENTADOR: ALLYSSON VIANA MARTINS
VILHENA
2018
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ATA DA DEFESA
MARIA VICTÓRIA FERREIRA SILVA
DIAS DE MARIA. MEMÓRIAS DO CRISTO REI
Monografia apresentada no
curso de Jornalismo do
Departamento de Jornalismo
da Universidade Federal de
Rondônia, campus Vilhena,
como requisito para a
obtencao do titulo de
Jornalista.
Orientação: Allysson Viana Martins
DATA:__________________________________________________________
RESULTADO:____________________________________________________
BANCA EXAMINADORA
Prof.___________________________________________________________
Assinatura:______________________________________________________
Prof.___________________________________________________________
Assinatura:______________________________________________________
Prof.___________________________________________________________
Assinatura:______________________________________________________
5
AGRADECIMENTOS
Tenho tanto a agradecer e a tantas pessoas, mas serei breve:
Agradeço a Deus pela vida.
Aos meus pais: Kátia Maria, por me ensinar, entre outras coisas, a ser sensível à
realidade; Ronaldo, por ser o herói da minha história, meu pai e amigo.
Aos meus familiares e amigos, por compreenderem minhas ausências quando passei
dias trancada no quarto, escrevendo, desenhando e faltando a compromissos.
Aos meus professores, em especial à Elenice Mendonça, onde quer que esteja sou grata
por ter visto em mim uma jornalista, quando eu mesma nem imaginava isso; Sandro
Colferai e Juliano Araújo, que dividiram comigo parte de seus saberes e me fizeram
querer ser algo além;
Ao meu orientador, Allysson Martins, pela paciência, amizade e sensibilidade.
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RESUMO
Este memorial faz parte do Projeto Experimental em Jornalismo, no qual foi
desenvolvido um livro de memórias, baseado em um livro-reportagem-retrato, que
apresenta as memórias sobre o bairro Cristo Rei em Vilhena, interior de Rondônia. Para
isso, foram selecionadas personagens marcantes para o bairro; empreendimentos
públicos e privados importantes para o desenvolvimento do local; e a violência e
estigmatização a partir da percepção de moradores do bairro. O livro registra memórias
ao tempo em que reflete sobre elas, a partir de um enfoque centrado em figuras do
bairro que de outra forma não receberiam espaço na agenda midiática local. Desse
modo, apresenta-se uma nova representação para o Cristo Rei. O livro conta com uma
percepção subjetiva e sob um viés artístico, a partir da autorreflexão da autora, cuja
história se cruza com a do próprio bairro. Sendo o trabalho produto dos aprendizados
colhidos durante todo o curso de Jornalismo, foi possível a utilização de técnicas
jornalísticas como seleção de fontes, escrita de perfil, princípios de reportagem,
entrevista, entre outros.
PALAVRAS-CHAVES: Jornalismo; Memórias; Cristo Rei; Livro-Reportagem;
Vilhena;
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Foto e ilustração de Adelina de Araújo dos Santos........................................26
Figura 2 – Exemplo de abertura de Capítulo...................................................................28
Figura 3 – Capa do livro..................................................................................................29
Figura 3 – Sumário com imagem em negativo................................................................30
Figura 5 – Ilustração de menina de bicicleta...................................................................30
Figura 6 – Página da História em Quadrinho..................................................................31
Figura 7 – Ilustração do cemitério em aquarela..............................................................32
Figura 8 – Perfil de Verônica Bolsoni com foto digitalizada..........................................32
Figura 9 – Rodapé do Capítulo 4 em negativo................................................................33
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...............................................................................................................9
1. JORNALISMO, MEMÓRIAS E CRISTO REI.....................................................11 1.1 GÊNEROS JORNALÍSTICOS.................................................................................11
1.1.1 Livro-reportagem.................................................................................................12 1.2 A FORMAÇÃO IDENTITÁRIA DE RONDÔNIA.................................................14
1.2.1 Vilhena...................................................................................................................15
1.3 MEMÓRIAS..............................................................................................................17
1.3.1 História e memórias..............................................................................................17
1.3.2 Memórias individuais e coletivas.........................................................................18
1.3.3 As lembranças, esquecimentos e silenciamentos................................................20
1.4 O CRISTO REI..........................................................................................................22
2. RELATÓRIO TÉCNICO DA PRODUÇÃO DO LIVRO DE MEMÓRIAS.......23
3. O LIVRO................................................................................................................... .26 3.3 PROJETO GRÁFICO E APRESENTAÇÃO DO LIVRO........................................26
REFERÊNCIAS.............................................................................................................32
ANEXO........................................................................................................................ ...33
1. LIVRO DE MEMÓRIAS: DIAS DE MARIA. MEMÓRIAS DO CRISTO
REI..................................................................................................................................33
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INTRODUÇÃO
Vilhena, município de Rondônia, fundado em 1977, teve, como as outras cidades
do estado, sua população formada a partir de diferentes fluxos migratórios. Foram dois
grandes ciclos, os responsáveis pela chegada dos imigrantes em Rondônia, um no final
do século XIX e no início do século XX, com predominância de nordestinos vindos para
trabalhar nos ciclos da borra, e o outro a partir da década de 1970, com as campanhas do
governo militar brasileiro que buscava ocupar a Amazônia, atraindo migrantes
principalmente do sul e sudeste do país (COLFERAI, 2010).
Atualmente, Vilhena ocupa o posto de quarto município mais populoso de
Rondônia, com uma população de cerca de 100 mil habitantes, segundo censo de 2017
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A cidade se localiza na entrada
da região Amazônica Ocidental, possui o segundo melhor IDH de Rondônia e encontra-
se em expansão nos setores de indústria, comércio e serviços, além de ser considerada
importante pólo agrícola da região. Como nas demais cidades do estado, a identidade da
população local é formada, principalmente, por dois grupos, representados por
ribeirinhos e colonos.
Com a promessa de criação de mil indústrias na cidade, o Cristo Rei nasceu em
meados de 1993. O fato não chegou a acontecer, mas foi o suficiente para que
rapidamente, a população começasse a crescer na região. Em 1995, aconteceu a
reintegração de posse na fazenda Santa Elina, que ficou conhecida como Massacre de
Corumbiara, e as pessoas oriundas do campo viram em Vilhena a oportunidade de
estabelecer residência. Na cidade, esses migrantes encontraram pouco apoio, mas foi
assim que começou a história do bairro. A ocupação, que se deu sem incentivo do
município, de forma desordenada e sem infraestrutura, contou apenas com a vontade
daqueles que precisavam das terras.
O espaço que o bairro ocupa hoje compreende a área geográfica que vai dos
fundos do cemitério municipal até a Avenida 1512, rodeado pelos bairros Moisés de
Freitas, Jardim Primavera, Marcos Freire e Bodanese. Entre os principais problemas
apontados pela população do bairro se destaca a falta de asfaltamento, a falta de
iluminação nas ruas, os constantes alagamentos na Avenida Melvin Jones, principal via
do bairro, além da falta de segurança.
Entre as características que aparentemente marcam a identidade do bairro, tem-
se a presença do único cemitério do município, homônimo, a grande quantidade de lojas
10
de roupas e móveis usados, uma das maiores feiras de rua da cidade, além do fluxo
constante de ciclistas e transeuntes na Avenida Melvin Jones. A história de alguns
empreendimentos públicos e privados se encontram com a do bairro, como a da igreja
católica Santa Lúcia Filippini, criada em 1996, localizada também na Melvin Jones; o
cemitério municipal, a primeira obra pública no bairro, em funcionamento desde 1969; a
Faculdade da Amazônia (FAMA), antiga escola agrícola; a Escola Municipal de Ensino
Fundamental Cristo Rei; além de algumas mercearias menores que ainda hoje
funcionam no bairro. Estigmatizado socialmente na cidade como violento, o livro aqui
apresentado buscou dar voz a outras histórias e facetas do bairro.
Com existência derivada da reportagem, que, como extensão da notícia, tem uma
abordagem mais profunda, trabalhando com origens, implicações, desdobramentos e
personagens envolvidos nos fatos, o livro-reportagem apresenta produções ainda mais
amplas, com maior ênfase no tratamento dos temas, podendo resultar da compilação de
reportagens já publicadas ou de trabalho feito especificamente para o livro. Distingue-se
de outros tipos de livro por conta de seu conteúdo – cujos temas são verossímeis e que
podem ser verificados –, tratamento – com linguagem jornalística equilibrada entre o
formal e o coloquial – e função – que busca informar e orientar em profundidade sobre
o tema abordado, oferecendo ao leitor um quadro capaz de situá-lo diante de suas
múltiplas realidades (PESSA, 2009).
O livro “Dias de Maira. Memórias do Cristo Rei”, de modo geral, conta
memórias do bairro, refletindo sobre elas e registrando os fatos que ainda não foram
abordados. Dessa forma, foi possível evitar os estigmas que formaram o imaginário da
população de Vilhena, apresentando uma nova representação para o Cristo Rei. O livro
aqui apresentado conta com uma percepção subjetiva e sob um viés artístico, a partir da
autorreflexão da autora, cuja história se cruza com a do próprio bairro.
11
1. JORNALISMO, MEMÓRIAS E CRISTO REI
1.1 GÊNEROS JORNALÍSTICOS
O fazer jornalístico ocorre por meio dos mais diferentes gêneros, como o
informativo, interpretativo, opinativo, investigativo e diversional (PESSA, 2009). A
produção de notícias segue a estrutura de construção que simplifica a narrativa de um
fato aos componentes do lead – o que, quem, quando, como, onde e por quê (LIMA,
1993). Trata-se do jornalismo informativo, cujo papel é “informar e orientar de maneira
rápida, clara, precisa, exata, objetiva. Em virtude disso, essa prática é muitas vezes
criticada como superficial, incompleta” (LIMA, 1993, p. 23). O jornalismo opinativo,
encarrega-se de possibilitar ao leitor uma leitura da realidade a partir da opinião daquele
que escreve, não limitando-se ao retratar dos assuntos. Já o jornalismo investigativo
busca desvendar mistérios, investigar e denunciar fatos que estão escondidos da
população. Tem-se ainda o jornalismo diversional que manifesta-se principalmente no
jornalismo literário.
Para ampliar os fatos, o jornalismo se vale de modalidades como a reportagem.
Essa amplitude é ainda maior quando se pratica a grande-reportagem, pois possibilita
um mergulho em profundidade nos fatos e contextos possibilitando ao jornalista maior
liberdade, não se atendo a fórmula convencional do lead (LIMA, 1993). A diferença
principal entre notícia e reportagem é que a primeira aborda um fato novo, já a segunda
trata de assuntos, suscitados ou não por um fato novo (LAGE, 2001). A reportagem
começa a se esboçar atrelada ao jornalismo interpretativo, categoria de informação
jornalística que busca preencher os vazios informativos. Pelo poder de ampliação da
narrativa jornalística, a reportagem possibilita o desdobramento das perguntas a que a
notícia busca responder e consegue expor uma humanização do relato, despertando o
interesse humano no acontecimento narrado, com texto de natureza impressionista e a
objetividade dos fatos narrados (SODRÉ; FERRARI, 1986).
Diretamente ligada à emotividade, a humanização se acentuará na medida em que o relato for feito por alguém que não só testemunha a
acao, mas também participa dos fatos. O repórter é aquele “que está
presente”, servindo de ponte (e, portanto, diminuindo a distância)
entre o leitor e o acontecimento (SODRÉ; FERRARI, 1986, p. 15).
12
No jornalismo, o anúncio de um fato está ligado a fatores objetivos e subjetivos
de seleção que indicam quais têm potencial para despertar o interesse do público
(SODRÉ; FERRARI, 1986). O discurso pode variar de acordo com a finalidade do texto
que pode ter funções de registrar, historiar, opinar e reclamar, por meio de detalhamento
e contextualização de fatos previamente anunciados. Nem sempre a reportagem se
constitui pela narração do retrato de um só personagem, o destaque pode ser dado aos
fatos, à ação ou ao levantamento de dados.
1.1.1 Livro-reportagem
Um desdobramento da reportagem, o livro-reportagem possibilita ampliar o
conhecimento por meio de dados, números, informações e detalhes relacionados, além
de apontar causas, consequências, efeitos, desdobramentos, repercussões e implicações
do assunto. Trata-se do veículo de comunicação impressa, que apresenta reportagens
mais amplas que os produtos rotineiros nos meios de comunicação, por não possuir
periodicidade definida (LIMA, 1993; PESSA, 2009).
O livro-reportagem pode ser composto pela compilação de reportagens
anteriormente publicadas ou ainda de uma reportagem feita especificamente para o
livro. Apesar de tratar-se de um trabalho feito para o livro, distingue-se dos demais tipos
de livro por três condições essenciais: conteúdo, tratamento e função (PESSA, 2009).
Com uma linguagem jornalística que busca equilibrar o registro formal com o coloquial,
possibilita maior liberdade autoral, podendo aproximar-se de uma escrita mais lúdica e
literária. Mesmo com essa aproximação, os conteúdos abordados devem ser providos de
veracidade, como uma ocorrência social capaz de situar o leitor sobre o mundo
contemporâneo.
A função particular do livro-reportagem é "informar e orientar em
profundidade sobre ocorrências sociais, episódios factuais,
acontecimentos duradouros, situações, ideias e figuras humanas, de modo que ofereça ao leitor um quadro da contemporaneidade capaz de
situá-lo diante de suas múltiplas realidades, de lhe mostrar o sentido, o
significado do mundo contemporâneo" (LIMA, 2004 apud PESSA, 2009, p. 2).
Para entender a sociedade contemporânea, o livro-reportagem aproxima-se da
história e da literatura, uma vez que o autor pode usar recursos literários para narrar,
porém, sem ser confundido com o ficcional (PESSA, 2009). Por oferecer essa visão
13
mais autoral, o livro-reportagem configura-se como uma forma de manifestação do
compromisso que o jornalista deve ter com o público, pois auxilia no debate e na defesa
de um discurso mais plural no jornalismo (MACIEL; HEITOR, 2016).
No livro-reportagem. “o jornalista (...) pode optar por se posicionar pela
reprodução da realidade social e/ou pela mudança social de acordo com a forma de
representar simbolicamente as questões de interesse público” (MACIEL; HEITOR,
2016 p. 1). Esse trabalho se dá por meio da aproximação com personagens,
contextualização de fatos históricos e de autorreflexões.
A fuga da visão naturalizada da sociedade, atenta aos pontos de confluência
entre o real visível e ao que está camuflado, possibilita ao jornalista-autor estimular a
reflexão crítica da comunidade a que se destina, demonstrando, dessa forma, o papel
social engajado que um livro-reportagem pode ter. Para tanto, faz-se necessária a
adocao da ideia de jornalismo como “dever público”, em que a ética de servico abre-se
para as críticas da sociedade, com narrativa plural e multiangular dos acontecimentos,
sempre tendo em mente as consequências que a prática jornalística tem na relação com
outros grupos sociais (MACIEL; HEITOR, 2016).
A construção de identidades articulada pela mídia noticiosa silencia o debate de
posicionamentos que se distanciem do consenso social. Nesse sentido, o livro-
reportagem apresenta a possibilidade de oposição aos instrumentos oficiais de produção
de sentido (MACIEL; HEITOR, 2016).
O livro-reportagem se apresenta como uma possibilidade de uma
“formatacao diferente do jornalismo capaz de explorar as
contradicões sociais”. Os jornalistas-autores se posicionariam,
assim, não só contra o jornalismo tradicional, mas, também, em
oposicao a “todos os demais instrumentos „oficiais‟ de producao
de sentido”. Buscam romper, portanto, segundo este autor, com
uma “censura” imposta por quem “pode determinar o que deve ou
nao ser publicado (ou veiculado de outras formas)” (p. 10)
O jornalismo define para a maior parte das pessoas quais fatos significativos
estão acontecendo, mas mais do que isso, oferece interpretações de como compreender
esses acontecimentos (MACIEL; HEITOR, 2016). Para alcançar a complexidade das
temáticas existem diversos tipos de livros-reportagens. Conforme Lima (1993), alguns
exemplos são: Livro-reportagem-perfil, em que se procura evidenciar o lado humano de
uma personalidade pública ou personagem anônima que se tornou relevante; Livro-
reportagem-depoimento, que reconstitui um acontecimento relevante a partir do relado
14
de um participante ou testemunha; Livro-reportagem-retrato, cujo papel exercido é
semelhante ao livro-reportagem-perfil, porém focaliza não uma figura humana, mas sim
uma região geográfica, um setor da sociedade. O livro-reportagem-retrato foi o estilo
utilizado para basearmos a composição do livro de memórias, que assume um caráter
mais subjetivo e artístico, uma vez que procuramos contar memórias do bairro Cristo
Rei através, até mesmo, das memórias da própria autora, dando conta de peculiaridades
e aspectos inerentes.
1.2 A FORMAÇÃO IDENTITÁRIA DE RONDÔNIA
O bairro Cristo Rei nasceu em um estado surgido de diferentes fluxos
migratórios. Rondônia, com formação populacional composta principalmente pelo ciclo
da borracha, no final do século XIX e início do século XX com predominância de
migrantes nordestinos, e a partir da década de 1970 com a ocupação da Amazônia no
governo militar, com imigrantes do centro-sul do país.
Formadas a partir dos Projetos Integrados de Colonização (PICs), as principais
cidades de Rondônia, tiveram atraídos imigrantes, principalmente do sul e sudeste do
país, que se tornaram a elite urbana que busca a cada ano fazer avançar a infraestrutura
urbana, com a instalação de crescentes redes de beneficiamento de recursos naturais e
agrícolas. Advindas de uma leva migratória incentivada pelo governo militar, aqueles
que migravam fugiam da escassez e de conflitos por terras no Sul e Sudeste do Brasil.
O estado de Rondônia apresenta-se como uma região em que diversos complexos
culturais se cruzaram e deixaram-se influenciar uns pelos outros. A convivência entre
colonos, seringueiros e homens da floresta alterou as práticas por conta da necessidade
de sobrevivência, pois tinham em comum o fato de estarem, em certa medida, à margem
das ações de instituições oficiais (COLFERAI, 2010).
Há solidariedades entre os dois grupos, mas não se deve perder de vista que se trata do contato de dois sistemas de representação
distintos e conflitantes. A noção da presença de tais conflitos e
disputas no campo da cultura é reforçada pela predominância de um desses discursos apenas, de somente um grupo de representações
atualmente tomado como legítimo, o que pode ser verificado a partir
dos discursos dos meios de comunicação social em Rondônia (COLFERAI, 2010, p. 4)
Nesse sentido um dos sistemas de representação cultural fixa-se no imaginário
social enquanto outro é deixado em um segundo plano, cuja posição dos colonos
15
imigrantes adéqua-se mais ao discurso desenvolvimentista, ainda hoje vigente em meios
de comunicacao locais, “ao mesmo tempo em que legitimam o papel do Estado, tendem
para o apagamento das populações tradicionais e fazem uma releitura do passado de
Rondônia” (COLFERAI, 2010, p. 16).
Constitui-se uma identidade preferencial em Rondônia que reflete nos
municípios e acaba por definir quais fatos merecem destaque e sob quais ângulos, e o
que deve ficar de fora dos debates, sendo que “no interior do estado parecem ser as
práticas culturais do complexo da colonização as referências para a busca de uma
identidade cultural” (COLFERAI, 2010, p. 14).
Os municípios de Rondônia, localizados ao longo da BR-364, sofreram
influência da abertura das Linhas Telegráficas Estratégicas de Mato Grosso ao
Amazonas, coordenada pelo oficial do Corpo de Engenharia do Exército, Cândido
Mariano da Silva Rondon. Das cidades do estado, três tiveram origem e fundação do
vilarejo ligada à Comissão Rondon, sendo Vilhena uma dessas (FIORI, 2012).
1.2.1 Vilhena
A história de Vilhena, cujo nome faz referência a Álvaro Coutinho de Melo
Vilhena, amigo de Marechal Rondon e diretor-geral dos Telégrafos, começa
oficialmente em 11 de outubro de 1977, com o artigo 47º da lei nº 6.448, assinado pelo
então presidente da República, Ernesto Geisel. Tendo como primeiro prefeito Renato
Coutinho dos Santos, que administrou o município até março de 1980. Entre os vários
motivos que tornam a cidade um local privilegiado, pode-se destacar sua proximidade
de cerca de 700 quilômetros da capital de Rondônia, Porto Velho, e da capital mato-
grossense, Cuiabá.
Como as demais cidades do estado, Vilhena foi fruto das estratégias militares de
ocupação da Amazônia, entretanto apresentou peculiaridades determinadas pelo clima e
o solo, mas também pela localização entre Cuiabá e Porto Velho, aproximadamente a
700 km de cada uma. Vilhena foi transformada em base de apoio para a construção da
BR-364 e assim começou a crescer o número de trabalhadores na região. Com as obras
da rodovia, foi construída uma pista de pouso para aviões, visando apoiar a abertura da
BR-364, o que deu a Vilhena certa vantagem em termos de desenvolvimento em relação
as outras cidades do estado (FIORI, 2012).
16
Entre os anos de 1964 e 1966, foram instalados na pequena vila que se tornaria
Vilhena, o 5º Batalhão de Engenharia e Construção, um destacamento da Força Aérea
Brasileira e um pequeno hospital militar, além da primeira serraria e o início das obras
da Embratel. Em 1968, a primeira delegacia de polícia, a Companhia de Água e Esgoto
de Rondônia (Caerd) e as Centrais Elétricas de Rondônia (Ceron) são instaladas no
vilarejo (FIORI, 2012).
Como nas demais cidades do interior de Rondônia, a colonização agrícola de
Vilhena começou em 1960 e se consolidou em 1980. Vilhena se tornou distrito de Porto
Velho em 1969, pelo Decreto nº 565. Em março de 1973, foi nomeado o primeiro
administrador distrital de Vilhena, Gilberto Barbosa, época em que o local contava com
aproximadamente 800 habitantes.
A população crescia sem que houvesse condições de receber tantas pessoas, o
que aumentava as tensões sociais principalmente em Ariquemes, Ji-Paraná, Cacoal e
Vilhena, esta última tido um modelo de ocupação diferente. Por sua terra arenosa,
Vilhena não era adequada para as propostas de reforma agrária que norteavam a ação do
INCRA em Rondônia, pois o solo não era favorável a pequena agricultura e agricultura
familiar. Dessa forma as terras era destinadas a partir de licitações públicas nacionais,
atraindo para a região produtores rurais capitalizados e financeiramente capazes de
investir em empreendimentos agrícolas. Assim definiu-se o perfil do homem que
ocupou Vilhena, diferente daqueles que se direcionaram as demais cidades do estado
(FIORI, 2012).
Com quase 1,6 milhão de hectares distribuídos entre cerca de 1.100 licitantes, a
região recebeu um público diferente, o empresário rural, com dinheiro e capacidade de
realizar investimentos no agronegócio, o que diferenciou o perfil de Vilhena em relação
às outras cidades do estado. Esses fatores, somados ao intenso fluxo migratório – que
garantia a mão de obra barata –, o clima ameno, as riquezas vegetais e o acesso pela
BR9-364, fizeram com que Vilhena desse um salto nos seus indicadores de
desenvolvimento ainda na década de 1990 (FIORI, 2012).
Em 1995 uma promessa política de que em Vilhena existiriam mil indústrias, fez
com que a população, vinda principalmente da área rural de cidades do Cone Sul de
Rondônia, se agrupasse e aumentasse a ocupação do espaço onde hoje se situa o bairro
Cristo Rei. No mesmo ano, aconteceu o conflito agrário na fazenda Santa Elina, que
ficou conhecida como Massacre de Corumbiara. Os migrantes, sem terra nos campos da
região, viram em Vilhena a oportunidade de estabelecer residência.
17
Em 2018, Vilhena se apresenta como uma cidade prestadora de serviços e de
logística, contando com três avenidas comerciais principais (Major Amarantes, Melvin
Jones e Paraná). Desde o início de sua ocupação a cidade já aparentava aptidão para a
logística e prestação de serviços. Pela posição privilegiada e pela terra arenosa e, em um
primeiro momento, pouco produtiva, o município se tornou um grande fornecedor para
as propriedades rurais e cidades que iam se formando no Cone Sul de Rondônia (FIORI,
2012). O Cristo Rei consolidou-se como bairro, embora sua regularização fundiária
ainda não esteja completa, e apresenta-se como fundamental para a manutenção da mão-
de-obra em Vilhena.
1.3 MEMÓRIAS
1.3.1 História e memórias
A identidade individual e coletiva tem como elementos essenciais a história e a
memória de sociedades e indivíduos. Segundo Le Goff (2013), o termo história pode
referir-se a dois aspectos: a ciência histórica e os acontecimentos passados.
1) “procura das acões realizadas pelos homens” (Heródoto) que
se esforça por se constituir em ciência, a ciência histórica; 2) o
objeto de procura é o que os homens realizaram. [...] a história é
quer uma série de acontecimentos, quer a narração desta série de
acontecimentos. Mas a história pode ter ainda um terceiro
sentido, o de narração (LE GOFF, 2013, p. 13).
A história pode ser compreendida como uma compilação de fatos que tiveram
maior repercussão na memória dos homens, isto é, aqueles foram mais lidos, ensinados
e tiveram grande penetração nas diversas instâncias sociais. A história busca conhecer
as ações realizadas pela humanidade e lança seus esforços para se estabelecer como
ciência histórica. Como registro da história nacional, elabora, através de uma
periodização, o resumo dos acontecimentos mais importantes da vida de uma nação e se
difere das histórias locais, uma vez que apresenta apenas os fatos que interessam a todos
os membros do país ou grupo (HALBWACHS, 1990).
Para registrar as ações humanas, a história se vale de documentos, além de
depoimentos, para comprovar como se deu o acontecimento estudado. Como todo texto,
os documentos carregam em si subjetividades próprias daquele que o produz, isto é,
nenhum documento é isento de ideologias e concepções de mundo. Além disso, não
apenas os documentos produzidos, registrados e conservados, os silêncios na história
18
também dizem muito, pois são lacunas que devem ser estudadas a fim de compreender
por que aquele espaço está em branco, quais as questões que foram esquecidas e
silenciadas naquela história e por quais motivos. Assim, a história se faz tanto pela
presença quanto pela ausência de documentos e arquivos. A história do bairro Cristo
Rei não possui muitos documentos que permitam conhecer mais a fundo e por outro
ângulo como se deu o início da ocupação do espaço. Essa lacuna na história da cidade
reflete a realidade de tantas outras lacunas que ainda não foram preenchidas. As falas
daqueles que chegaram primeiro ao bairro tornam-se, nesse caso, a principal fonte pela
qual foi possível contar parte da história do local.
As memórias surgem como elementos componentes da história, embora não
existam somente em função dela, e na vida humana se manifestam como possibilidade
de acesso a impressões de coisas que já aconteceram. “A memória, como propriedade
de conservar certas informações, remete-nos em primeiro lugar a um conjunto de
funções psíquicas, graças às quais o homem pode atualizar impressões ou informações
passadas, ou que ele representa como passadas” (LE GOFF, 2013, p. 366). Feita de
lembranças e de esquecimentos, trata-se de um fenômeno sempre atual, por natureza
múltipla, plural e coletiva. Enquanto a história é a reconstrução incompleta do que não
existe mais, uma representação do passado que se liga às continuidades temporais,
excluindo as ambiguidades, a memória, apesar de ter o aspecto coletivo, é
individualizada, embora seja um individual que se insere em um contexto social e
coletivo (NORA, 1993). A memória também aparece como uma das formas de
consolidação da identidade coletiva e comunitária e as cidades se tornam arquivos
urbanos cheios de histórias com as quais convivemos e de onde tiramos memórias
individuais e coletivas.
1.3.2 Memórias individuais e coletivas
Essa importância na consolidação da identidade individual e coletiva da
memória se estabelece porque, como destaca Halbwachs (1990), mesmo um indivíduo
sozinho é apanhado por forças sociais que atuam sobre ele e fazem com que nunca
esteja, de fato, só. As suas lembranças são apoiadas nas de outros e nos grupos sociais
nos quais está inserido, como família, escola, igreja, entre outros. Desta maneira, as
memórias também se organizam de duas formas ao se considerar suas individualidades
e coletividades, podendo “ora se agrupar em torno de uma pessoa definida, que as
19
considere de seu ponto de vista, ora distribuir-se no interior de uma sociedade grande ou
pequena, de que elas sao outras tantas imagens parciais (HALBWACHS, 1990, p. 53)”.
As memórias do bairro Cristo Rei consolidam-se como memória coletiva enquanto é
possível perceber, através das falas dos moradores, pontos em comum que fazem com
que essas memórias se apóiem umas nas outras.
Para Santo Agostinho, a memória tinha um caráter essencialmente privado, pois
representa o passado de impressões que cabem apenas ao indivíduo que vivenciou o
momento e denota a capacidade de remontar-se no tempo. Deste modo, a memória
individual representa a experiência passada dos indivíduos em determinado espaço e
tempo. As memórias individuais são pontos de vista sobre as memórias coletivas, que
podem mudar de acordo com o engajamento e lugar que o membro ocupa no grupo. A
memória coletiva envolve as memórias individuais, porém não se confunde com elas
(HALBWACHS, 1990). É possível perceber, mesmo nas memórias que parecem mais
individuais, traços sociais, como a data de nascimento, que embora o próprio indivíduo
nem mesmo se lembre do dia, é comemorado ano após ano e incrementado com
lembranças de outros que se recordam pelo aniversariante.
Já Husserl considera a memória coletiva como um conjunto de rastros causados
por fatos que afetaram a história de um grupo em relação à consciência e à memória
individuais. A memória pode ser atribuída a grupos, composta a partir de seus membros,
cujas lembranças se apóiam umas nas outras, mas, ainda que coletivas, são formadas
também pelas memórias individuais de cada integrante, ou de uma parte deles. Dessa
forma, memórias individuais e coletivas estão intimamente relacionadas
(HALBWACHS, 1990).
Pensar em uma época em que qualquer indivíduo não seja membro de nenhum
grupo é uma tarefa difícil, para não dizer impossível. Estaríamos falando de um
momento em que as sensações não estivessem relacionadas com nenhum pensamento
ou imagem que o identificasse como participante de um grupo qualquer , ou mesmo que
o seu nascimento nao se cercasse de diversas instituicoes sociais . Isto acontece porque,
como destaca Halbwachs (1990), uma “corrente de pensamento” social é tao invisivel
quanto o ar que respiramos, e cuja presença só pode ser enfatizada na sua ausência.
É possível criar um engajamento e manter vivas as lembranças relacionadas
àquele grupo principalmente quando permanece a identificação. Para que a memória
possa usar a de outros como auxílio, é necessário que as memórias que ali circulam não
tenham deixado de ter vários pontos de contato entre as memórias individuais dos
20
integrantes, porque desta forma as lembranças podem ser reconstruídas sobre um
fundamento comum. A harmonia, nesse sentido, é essencial para que as oposições
individuais se silenciem em prol do grupo, criando uma memória mais unificada, com
maiores identificações entre as diversas perspectivas. E mesmo essa memória pode
mudar com o tempo, pois, desde que se conserve uma parte limitada de lembrança, ela
pode em algum momento fazer parte da consciência de um grupo.
A coesão dos grupos é mantida pela referência ao passado, que é continuamente
deformado e interpretado pelo presente, muitas vezes com lembranças proibidas,
indizíveis ou vergonhosas que são guardadas e passadas adiante informalmente,
despercebidas da sociedade em geral (POLLAK, 1989). Nesses casos, ao contrário de
levar ao esquecimento, o tempo contribui para reforçar o ressentimento dos subjugados,
que esperam o momento de se expressar e quebrar o silêncio. O livro “Dias de Maria.
Memórias do Cristo Rei” articula memórias individuais e coletivas, através de
memórias individuais da autora e entrevistados que, juntas, representam e compõem a
memória coletiva dos moradores do bairro. As individualidades dos personagens
apresentados no produto são sempre atravessadas pelos fatores sociais que a região onde
moram suscita nos demais moradores da cidade de Vilhena, por isso, diversas vezes
prefere-se o silêncio à exposição, sendo o livro uma forma de se expressar.
1.3.3 As lembranças, esquecimentos e silenciamentos
A memória, em âmbito individual e coletivo, constitui-se por lembranças e
esquecimentos. Para Halbwachs (1990), lembrar é, em certa medida, reconstruir o
passado por meio de dados emprestados do presente e da apropriação de relatos e
depoimentos de outros. Por isso, muitas vezes acreditamos ter uma lembrança guardada
fielmente em nossa memória, quando na verdade ela foi criada sobre as lembranças de
outros, como acontece com muitas recordações de infância e de grandes acontecimentos
sociais. Desta forma, as lembranças de um se juntam a de outros e podem confirmar ou
mesmo mudar uma recordação que antes parecia formada e conformada. Mesmo quando
vividas por apenas uma pessoa, as lembranças possuem um caráter coletivo, já que o
social alcança o homem, englobando-o em grupos e fazendo com que as lembranças de
outros se juntem e componham o quadro do que aconteceu.
Com o passar do tempo, a lembrança relaciona-se com uma imagem, porém,
imaginar não pode ser considerado lembrar, já que a imaginação volta-se para o fictício,
21
e o esforço em busca da memória é o que chamamos recordação. Mesmo quando
inserimos imagens em nossas lembranças a fim de preencher as lacunas, elas não
deixam de ser calcadas em acontecimentos experienciados por nós ou por outros.
Lembranças reais e fictícias podem se juntar e as imagens de pessoas, lugares e
acontecimentos não param de mudar, uma vez que, com o passar do tempo, algumas
impressões se sobressaem enquanto outras se apagam, isso não transforma, contudo, as
recordações em ficções, isto é, em imaginações (HALBWACHS, 1990). Impedidas,
esquecidas, silenciadas ou apagadas, o fato é que as lembranças do passado se alteram
ou saem de cena conforme o tempo avança.
Ao privilegiar as memórias oficiais, a história nacional muitas vezes deixa as
memórias das minorias às margens, criando memórias subterrâneas, ocasionando em
destruição, homogeneização e silenciamentos. Em oposição à recordação, manifestam-
se, além do esquecimento, os silenciamentos, as zonas de “nao-ditos”. Os silêncios
podem ser moldados pelo medo de punição ou de exposição por aquilo que se diz ou
pela impossibilidade de encontrar “escuta” para aquilo que se quer expor (POLLAK,
1989). O livro de memórias produzido apresenta-se como uma escuta para as memórias
dos entrevistados, que nunca antes tiveram a oportunidade de contar essas partes de suas
vidas, já que os veículos de comunicação locais limitam-se a representar o bairro apenas
como um local violento.
“Memória oficial”, no caso a memória nacional. (...) acentua o caráter
destruidor, uniformizador e opressor da memória coletiva nacional. Por outro lado, essas memórias subterrâneas que prosseguem seu
trabalho de subversão no silêncio e de maneira quase imperceptível
afloram em momentos de crise em sobressaltos bruscos e exacerbados. A memória entra em disputa (POLLAK, 1989, p. 4)
As zonas de sombra, por assim dizer, não são definitivas e estão em contínuo
deslocamento. Às razões políticas do silêncio somam-se motivos pessoais, como o
desejo de esquecer memórias traumáticas ou constrangedoras para retornar a vida
normal, que fazem com que as lembranças tidas como comprometedoras sejam
guardadas em silêncio durante anos. A motivação pode ser ainda a impossibilidade de
se fazer compreender e ser aceito em determinado grupo social, pois “o silêncio sobre si
próprio – diferente do esquecimento – pode mesmo ser uma condição necessária (...)
para a manutenção da comunicação com o meio-ambiente” (POLLAK, 1989, p. 13).
Esses silenciamentos perduram até que existam “escutas” na sociedade, passando de
geração em geração, desenvolvendo essas memórias transgeracionais, até que possam
22
emergir. A partir das entrevistas, feitas para o livro, com minha avó e meu pai, tive
acesso a memórias de momentos que eu conhecia, mas não tinha detalhes de como
haviam acontecido. Descobri novas nuances nas histórias das vidas deles, de situações
difíceis e decisivas pelas quais passaram. Provavelmente se o livro não estivesse sendo
escrito essas memórias permaneceriam guardadas até que eles encontrassem o momento
de passá-las adiante.
Essas lembranças durante tanto tempo confinadas ao silêncio e transmitidas de uma geração a outra oralmente, e não através de
publicações, permanecem vivas. O longo silêncio sobre o passado,
longe de conduzir ao esquecimento, é a resistência que uma sociedade civil impotente opõe ao excesso de discursos oficiais. Ao mesmo
tempo, ela transmite cuidadosamente as lembranças dissidentes nas
redes familiares e de amizades, esperando a hora da verdade
(POLLAK, 1989, p. 5)
1.4 O CRISTO REI
O livro de memórias aqui apresentado tem sua importância justificada uma vez
que conta a história de um dos bairros de Vilhena, o Cristo Rei, buscando preencher
uma lacuna ainda existente em relação à história da própria cidade, cuja fundação se deu
há quarenta anos, e que ainda não possui materiais do tipo produzidos localmente. O
trabalho traz uma reflexão sobre o bairro, alcançando fatores que a imprensa local não
pôde, ou não quis, abordar, possibilitando a apresentação de uma diversidade ainda não
creditada à Vilhena, a partir da sua história política, econômica e cultura, ao enfatizar
personagens, e ao possibilitar uma percepção subjetiva e artística, resultados da
autorreflexão da autora, cuja história se cruza com a do bairro.
O registro também se mostra inovador devido à falta de matérias e reportagens
mais completas sobre o bairro, tendo os veículos de comunicação locais se limitado a
produzir conteúdos factuais que, quase em sua totalidade, apenas alcançam a editoria de
polícia dos jornais, não chegando a trabalhar com outros tipos de formatos jornalísticos.
Desta maneira, a produção aqui apresentada busca, por meio do aprofundamento
próprio de um livro-reportagem, demonstrar outras representações do bairro, contando
uma história que, de outra forma, talvez nunca chegasse a ser conhecida por aqueles que
não são moradores do bairro. Trata-se, por fim, de memórias que precisam ser contadas
para ampliar os olhares a respeito do Cristo Rei e da própria Vilhena, mostrando outras
faces do bairro e da cidade, alcançando sua complexidade e buscando evitar o estigma
que há tempos se formou sobre ele e sobre a cidade.
23
2. RELATÓRIO TÉCNICO DA PRODUÇÃO DO LIVRO DE MEMÓRIAS
Os conceitos teóricos apresentados no primeiro capítulo construíram as bases
sobre as quais o livro se moldou. Entender o significado das memórias individuais e
coletivas que envolvem o bairro Cristo Rei foi fundamental para lançar um olhar
humanizado e aguçar os ouvidos para ouvir o que aquelas pessoas tinham a dizer.
Compreender os conceitos jornalísticos, critérios e técnicas permitiu cortar excessos,
priorizar informações e construir um tom mais sensível ao texto, de forma a atrair a
atenção de quem se debruça sobre essa história.
A partir do referencial teórico citado, foi produzido o livro, um produto que
difere do fazer jornalístico cotidiano e que apresenta a informação ao leitor dando
espaço para a subjetividade, percepção e interpretação da autora acerca dos fatos sobre
os quais escreve. Optou-se por personagens como fontes de informação, também pela
falta de documentos históricos sobre o bairro, mas principalmente porque a proposta do
produto era alcançar e dar voz a essas pessoas, sobretudo aquelas relacionadas às
memórias da autora.
A introdução do livro foi a primeira parte a ser escrita, ditando o tom que o texto
seguiu. O foco foi apresentar ao leitor os assuntos que seriam abordados e informações
sobre a infância da autora, que a tornam apta a narrar uma história sobre o bairro Cristo
Rei como moradora, definindo-a também como participante da história em diversos
momentos, como nos capítulos 1,2 e 3.
Para contextualizar o leitor sobre o bairro, optamos por iniciar com um capítulo
sobre a história do Cristo Rei. A proposta inicial era entrevistar uma moradora antiga do
bairro, Maria Helena da Silva, minha avó, e duas figuras políticas: Ademar Marcol
Alfredo Suckel, prefeito de Vilhena entre 1993 à 1996, e Melkisedek Donadon, que
havia assumido a prefeitura em 1997, quando o número de moradores começava a
crescer no bairro. Conforme as entrevistas com os moradores do bairro foram iniciadas,
tornou-se clara a possibilidade de transformar o livro, que até então buscava enquadrar-
se nos termos de um livro-reportagem, em um livro de memórias dos moradores. Assim
o planejamento do capítulo 1 parecia não se encaixar tão adequadamente na proposta.
Optamos então por transformar o capítulo em um breve histórico de contextualização do
bairro, em forma de história em quadrinho, com as informações obtidas com todos os
entrevistados dos capítulos posteriores. Portanto, foi o último a ser produzido.
24
O processo de apuração dos dados para o livro começou no início do mês de
agosto. O principal critério para a seleção das fontes do capítulo 3, que trata sobre
personagens do bairro, foi a quantidade de tempo que o entrevistado vive nele e a sua
inserção com a comunidade. Inicialmente, foram elencados 5 possíveis perfilados:
Adelina de Araújo dos Santos; Verônica Bolsoni; Ronaldo Ferreira Silva; Sampaio
Velasco; e Vilma Silva Pessoa. As entrevistas foram abertas e versavam sobre quando
os entrevistados chegaram ao bairro, como conseguiram a moradia no local, os motivos
pelos quais escolheram se mudar e continuar no bairro, além de suas opiniões sobre as
mudanças pelas quais o Cristo Rei passou ao longo dos anos.
Após investigação inicial e pré-entrevistas com os selecionados, 2 dos
escolhidos não alcançaram o grau de aprofundamento necessário e por isso optou-se por
mesclar as informações obtidas em outros capítulos do livro, restando apenas 3
perfilados: Adelina de Araújo dos Santos, Verônica Bolsoni e Ronaldo Ferreira Silva. A
última personagem escolhida para compor os perfis foi minha avó, Maria Helena da
Silva. Inicialmente, ela faria parte do primeiro capítulo, sobre a recapitulação histórica
do bairro, mas, após as mudanças no capítulo 1, optamos por incluí-la como perfilada.
Aos personagens dos perfis foram solicitadas fotografias antigas que pudessem ser
utilizadas na narrativa.
Os empreendimentos escolhidos para serem apresentados no capítulo 2 do livro
também tiveram como principal critério de seleção o tempo em que foi construído e seu
atrelamento ao bairro, mas foi levado em consideração também como o lugar faz parte
da vida do bairro, ajudando a compor as formas de identificação com o local.
Inicialmente, foram elencados 7 empreendimentos que comporiam o capítulo, porém
após iniciar as buscas por documentos, imagens e fontes sobre os locais, optamos por
reduzir o capítulo para 4 lugares: Cemitério Municipal Cristo Rei, Faculdade da
Amazônia, Mercearia da Maria e Comunidade Santa Lúcia Filippini; sendo os outros
empreendimentos apenas mesclados ao texto. O capítulo 2 contou com entrevistas de
funcionários do Cemitério Municipal, da proprietária do mercado, dos primeiros
participantes da igreja e informações sobre a faculdade. As perguntas feitas a esses
entrevistados tinham a ver com o início dos empreendimentos, quando começaram a
funcionar, por quais motivos chegaram ao bairro, quais as principais dificuldades
encontradas no início e como o bairro era na época. As entrevistas de todos os capítulos
do livro foram realizadas tendo como critério o diálogo com as pessoas e gravadas para
posterior transcrição.
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A ideia do último capítulo do livro surgiu em uma disciplina realizada
anteriormente, de Comunicação Comunitária, em que realizamos um podcast com
moradores para falarem a percepção deles sobre a estigmatização de que o bairro é
vítima. No podcast, foi realizado um debate com 7 moradores, em que foram lançados
apenas temas, como polícia, educação, política e emprego, a partir dos quais os
convidados podiam expor suas opiniões sobre como esses assuntos são refletidos no
bairro. Parte do material pôde ser aproveitado, sendo realizada apenas mais uma tarde
de enquete na feira de rua do Cristo Rei, seguindo a mesma estrutura do podcast, para
compor a miscelânea de comentários dos moradores. Após a transcrição de falas, foram
selecionadas aquelas que representaram visões mais vezes citadas por todos os
entrevistados, evitando assim que o texto se tornasse repetitivo, ou as falas que mais
poderiam chamar a atenção do leitor, pelo acontecimento narrado.
O estilo do texto permitiu o aprofundamento no jornalismo literário
possibilitando uma liberdade maior da escrita. Procurou-se criar certa proximidade com
o leitor, visto que o livro apresenta memórias de pessoas que ainda hoje vivem no
bairro, além das memórias de infância e adolescência da própria escritora. O processo
de escrita exigiu o equilíbrio entre o coloquial e o formal, a partir de técnicas de escrita
apreendidas em disciplinas anteriores, como Língua Portuguesa I e II, Ciências da
Linguagem, Jornalismo Impresso e Laboratório de Jornalismo Impresso. Ainda que
houvesse contato da autora com o estilo de escrita literária, o tom do texto por vezes
dificultou o andamento do processo, visto que diversas revisões e correções precisaram
ser feitas até chegar ao resultado considerado satisfatório.
Durante as entrevistas para os capítulos 2 e I3, foram solicitadas aos
entrevistados fotografias antigas que pudessem ilustrar a história, recordar os momentos
pelos quais os personagens passaram, além de dados em que pudessem ser baseados os
desenhos feitos posteriormente, como a imagem no perfil de dona Adelina (ver Figura
1). As fotografias escolhidas foram aquelas que melhor retratavam o assunto tratado no
texto e, em segundo lugar, que possuíam melhor enquadramento, iluminação e aspectos
técnicos que facilitassem a compreensão do leitor.
26
Figura 1 - Foto e ilustração de Adelina de Araújo dos Santos.
Fonte: Maria Vitória Ferreira Silva
Optou-se pela utilização de fotos atuais apenas ao final de cada um dos perfis
para que o leitor pudesse visualizar as pessoas que contam a história como estão
atualmente. Nos outros momentos, priorizamos fotos de arquivo e ilustrações que
ajudassem a representar o momento narrado. As ilustrações foram feitas ao longo do
processo de escrita, após as entrevistas. As imagens antigas cedidas pelos entrevistados
serviram para basear as ilustrações, porém a maior parte dos desenhos foi feita apenas
com as informações verbais passadas pelos entrevistados, com a autora possuindo
liberdade criativa e de imaginação. Parte dos desenhos foi feita em preto e branco, ou
em negativo, e a parte colorida foi feita em aquarela. Foram utilizados diversos estilos
de desenho diferentes, como técnicas de história em quadrinho, Mangá e desenho
realista, com cores variadas para compor o que parecia se encaixar melhor em cada
parte do texto.
O processo de ilustração foi o mais complicado e demorado do livro. A falta de
experiência na área fez com que fosse necessário realizar inúmeras pesquisas, tutoriais e
informações que pudessem auxiliar e melhorar os desenhos. A maior parte das
ilustrações foi feita em duas etapas, primeiro com a realização de esboços e em seguida
a parte de pintura com aquarela ou contorno com caneta preta. Três ilustrações
precisaram ser refeitas, porque o resultado final não foi considerado satisfatório, e três
ilustrações, de um total de 20 realizadas pela autora, fora as 6 páginas que compõem o
capítulo 1 do livro, não entraram na diagramação final por não serem consideradas
essenciais para a leitura do texto. Todas as ilustrações foram feitas à mão e em seguida
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escaneadas, tendo edições, pelo programa Paint, apenas em quatro imagens em que se
optou pelo efeito em negativo e na imagem que compõe a capa do livro, editada no
aplicativo de celular LightX.
A falta de tempo para dedicação exclusiva à realização do produto, por questões
pessoais e profissionais, fez com que fosse necessário encontrar atalhos nos processos
de escrita, ilustração e diagramação do livro, como a utilização de ferramentas mais
simples, como o Paint e o Adobe Indesign 2015, e a supressão de fontes em alguns
capítulos.
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3. O LIVRO
3.3 PROJETO GRÁFICO E APRESENTAÇÃO DO LIVRO
O livro de memórias “Dias de Maria. Memórias do Cristo Rei” foi orientado
pelo professor Dr. Allysson Viana Martins, tendo este acompanhado todo o processo de
produção, captação e edição do livro. Baseado no livro-reportagem-retrato, o produto
buscou a liberdade narrativa e o aprofundamento ao tratar das memórias do bairro
Cristo Rei e da própria autora, entrelaçando memória individual e coletiva, sob uma
perspectiva subjetiva e artística.
O livro foi concluído e apresentado em PDF no formato 14 x 21 cm, com 101
páginas. A diagramação foi feita no software de edição de livros, Adobe Indesign2015,
pela própria autora. As fontes, tamanhos e cores buscaram compor uma estética
agradável, porém dando prioridade à fluidez da leitura. No corpo do texto, utilizou-se a
fonte Georgia, tamanho 12; nos intertítulos, citações e identificação dos entrevistados,
foi utilizada a fonte Antonio, tamanho 14, variando apenas as tonalidades de preto, entre
100, 75 e 50%. Nas primeiras páginas de cada capítulo e introdução, foi usada a fonte
Chiller, tamanho 36 na cor branca sobre fundo preto (ver Figura 2).
Figura 2 – Exemplo de abertura de Capítulo.
Fonte: Maria Vitória Ferreira Silva
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Na capa, foi utilizada uma ilustração da autora, e a fonte Chiller, que simula uma
letra escrita a mão, para destacar o caráter artístico e subjetivo do livro (ver Figura 3).
Representando uma menina negra chegando ao bairro, passando pelo cemitério e por
uma casa com panelas e remédios a mostra. A personagem da capa caminha por uma
avenida e avista ao longe a feira e uma igreja. O desenho tem como objetivo mostrar ao
leitor a necessidade de se percorrer um caminho para de fato conhecer o bairro, em suas
nuances e faces ainda escondidas do público em geral.
Figura 3 – Capa do livro.
Fonte: Maria Vitória Ferreira Silva
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Entre as ilustrações que compõem o livro, quatro foram colocadas em negativo,
para acentuar alguns de seus traços, dar um tom mais dramático ao desenho e ficar mais
harmônico com o texto. Como a imagem utilizada no sumário do livro (ver Figura 4).
Figura 4 – Sumário com imagem em negativo.
Fonte: Maria Vitória Ferreira Silva
Todas as páginas possuem o nome do capítulo nas páginas ímpares, junto ao
número da página. Na introdução, são apresentadas ao leitor informações sobre a
infância e adolescência da autora, além dos assuntos abordados no livro, definindo
também a narradora como participante da história em diversos momentos que se
seguem. Ao final da introdução, pode-se ver uma ilustração da autora andando de
bicicleta e crianças brincando ao fundo (ver Figura 5).
Figura 5 – Ilustração de menina de bicicleta.
Fonte: Maria Vitória Ferreira Silva
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O primeiro capítulo apresenta uma breve retrospectiva sobre o início do bairro,
por meio de uma história em quadrinhos. O capítulo é todo em preto e branco, apenas
com os desenhos, numeração da página e nome do capítulo no rodapé (ver Figura 6). A
história em quadrinho apresenta informações cronológicas sobre o bairro, iniciando pela
fundação da cidade de Vilhena, em 1977, seguindo com o grande fluxo migratório
ocorrido antes, em 1960, causado pela inauguração da BR-364. O quadrinho faz um
salto para 1995, quando uma nova onda migratória ocorreu, após um conflito agrário em
Corumbiara, que fez com que camponeses migrassem e aumentassem a ocupação no
Cristo Rei. No capítulo é possível vermos um pouco de como era a vida dos migrantes
quando chegaram ao local. Fatos da vida da autora também são incluídos ao quadrinho,
na quarta página, com desenhos de sua infância no bairro, correndo na rua, levando
panelas para conserto, pegando remédios, indo ao mercado e pintando a casa em que
vive. Ao final apresenta-se o Cristo Rei em 2018.
Figura 6 – Página da História em Quadrinho
Fonte: Maria Victória Ferreira Silva
No segundo capítulo, são apresentados locais conhecidos do bairro, escolhidos
por sua relevância nas memórias da autora, seja pela quantidade de tempo que passou
neles, pela época em que foram criados, ou pelo que representam para a identidade do
bairr, como: Comunidade Santa Lúcia Filippini; Mercearia da Maria; Faculdade da
Amazônia; e Cemitério Municipal Cristo Rei. Os locais são apresentados em ordem
32
cronológica, do mais antigo para o mais novo no bairro, As ilustrações que compõem
essa parte do livro são coloridas, pintadas em aquarela, com tons predominantes de azul,
preto e roxo (ver Figura 7), a exceção de uma das ilustrações que tem predominância da
tonalidade laranja.
Figura 7 – Ilustração do cemitério em aquarela.
Fonte: Maria Victória Ferreira Silva
O terceiro capítulo traz perfis de personagens importantes do bairro, seja por
suas peculiaridades ou por terem chegado ao local no início da formação do Cristo Rei,
todos com contato em algum momento com a autora, como: Adelina de Araújo dos
Santos; Verônica Bolsoni; Maria Helena da Silva; e Ronaldo Ferreira Silva. Os
capítulos 2 e 3 contaram com fotos digitalizadas, do acervo pessoal dos perfilados (ver
Figura 8), mas mescladas com os desenhos da autora.
Figura 8 – Perfil de Verônica Bolsoni com foto digitalizada.
Fonte: Maria Victória Ferreira Silva
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Já o último capítulo apresenta a perspectiva daqueles que moram no bairro sobre
variados temas, são eles: estigmatização; polícia; educação; emprego; finalizando com a
esperança que o morador do Cristo Rei do futuro. As citações foram apresentadas em
discurso direto, seguidas de nome, idade e tempo no bairro. Foram incluídas ilustrações
ao capítulo, entre elas uma imagem em negativo da feira (ver Figura 9). O desenho
apresenta várias pessoas na rua, representando a intenção do capítulo de dar voz ao
povo, deixando claro em sua formatação, com citações diretas, que estão sendo
apresentados depoimentos dos moradores do Cristo Rei.
Figura 9 – Rodapé do Capítulo 4 em negativo.
Figura 7 – Rodapé do Capítulo IV em negativo
Fonte: Maria Victória Ferreira Silva
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CONCLUSÃO
O livro apresentado teve como proposta registrar memórias do bairro Cristo Rei,
em Vilhena. Buscando refletir sobre o estigma por trás do bairro, o livro teve como
enfoque as personagens que não se enquadram nas representações midiáticas locais
sobre os moradores do Cristo Rei.
A partir de percepção subjetiva, com viés artístico e autorreflexões da autora, foi
possível apresentar a miscelânea de memórias individuais que formam a memória
coletiva do bairro e criam a identidade de quem mora no local. Para a realização do
trabalho foram utilizados os aprendizados de todo o curso de Jornalismo, como as
técnicas jornalísticas de seleção de fontes, escrita de perfil, princípios de reportagem,
entrevista, entre outros.
Com os conceitos teóricos de memória e os fluxos migratórios que compõem a
cidade de Vilhena, foi possível realizar o proposto ao livro. Já que, ao entender a
importância das memórias individuais e coletivas que envolvem o bairro Cristo Rei, e
de onde vieram os primeiros migrantes, foi possível lançar um olhar livre de
preconceitos e pronto a captar o que quer que os moradores tivessem a oferecer. Os
conceitos jornalísticos, critérios e técnicas auxiliaram nos processos de captação,
produção e edição, evitando excessos, priorizando informações e construindo o tom do
texto.
Ao final, foi produzido um livro que atende a intenção inicial, com estética livre
das fórmulas prontas do jornalismo cotidiano e espaço para as perspectivas dos
personagens. O produto final difere das produções jornalísticas da cidade sobre o bairro,
uma vez que permitiu aos próprios moradores contarem suas histórias.
35
REFERÊNCIAS
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identidade preferencial no interior de Rondônia. In: Anais da Biblioteca On-line de
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Compromisso Público e Autonomia Jornalística. In: XVIII Congresso de Ciências da
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PESSA, Bruno. Livro-reportagem: o que é, para quê, como se faz?. 2009
POLLAK, Michael. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos Históricos, Rio de
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SODRÉ, Muniz; FERRARI, Maria. Técnica de reportagem:notas sobre a narrativa
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