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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS GEOGRÁFICAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA ANTONIO MARCOS DOS SANTOS VULNERABILIDADE HIDROLÓGICA DAS POPULAÇÕES RESIDENTES NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO UNA (PERNAMBUCO) FRENTE AOS CENÁRIOS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS Recife 2015

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

    CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

    DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS GEOGRÁFICAS

    PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

    ANTONIO MARCOS DOS SANTOS

    VULNERABILIDADE HIDROLÓGICA DAS POPULAÇÕES RESIDENTES NA

    BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO UNA (PERNAMBUCO) FRENTE AOS

    CENÁRIOS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS

    Recife

    2015

  • 1

    ANTONIO MARCOS DOS SANTOS

    VULNERABILIDADE HIDROLÓGICA DAS POPULAÇÕES RESIDENTES NA

    BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO UNA (PERNAMBUCO) FRENTE AOS

    CENÁRIOS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS

    Tese apresentada ao Programa de Pós-

    Graduação em Geografia da Universidade Federal de Pernambuco, para a obtenção

    de Título de Doutor em Geografia, na área de concentração “Regionalização e Análise Regional (Linha de Pesquisa:

    Ecossistemas e Impactos Ambientais)”.

    Orientadora: Profa. Dra. Josiclêda Domiciano Galvíncio

    Recife

    2015

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  • 3

    ANTONIO MARCOS DOS SANTOS

    VULNERABILIDADE HIDROLÓGICA DAS POPULAÇÕES RESIDENTES NA

    BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO UNA FRENTE AOS CENÁRIOS DE MUDANÇAS

    CLIMÁTICAS

    Tese apresentada ao Programa de Pós-

    Graduação em Geografia da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do título de

    Doutor em Geografia.

    Aprovada em: 13/03/2015.

    BANCA EXAMINADORA

    ________________________________________

    Profa. Dra. Josiclêda Domiciano Galvíncio (Orientadora)

    Universidade Federal de Pernambuco

    _________________________________________

    Profa. Dra. Maria do Socorro Bezerra de Araújo (1º Examinador Interno)

    Universidade Federal de Pernambuco

    _________________________________________

    Profa. Dra. Maria do Socorro Bezerra de Araújo (2º Examinador Interno) Universidade Federal de Pernambuco

    _________________________________________ Profa. Dra. Werônica Meira de Souza (1º Examinador Externo)

    Universidade Federal Rural de Pernambuco

    _________________________________________

    Profa. Dra. Érica Socorro Alves Graciano (1º Examinador Externo) Universidade Federal Rural de Pernambuco

  • 4

    A todos aqueles que incentivaram a

    construção deste trabalho.

    Inclui aí: amigos; colegas e familiares.

  • 5

    AGRADECIMENTOS

    À minha orientadora, Professora Dra. Josiclêda Domiciano Galvíncio, pela

    oportunidade de realizar esta pesquisa sob sua orientação, assim como, o

    aprendizado que obtive com ela durante esta jornada, o qual jamais será apagado e

    sim somado a outros e ofertados também. Em resumo muito obrigado.

    Ao Professor Dr. João Lima Sant'Anna Neto do Grupo de Pesquisa

    Climatologia Geográfica da UNESP de Presidente Prudente pelo fornecimento de

    materiais bibliográficos, documentais e cartográficos que ajudaram na realização da

    pesquisa.

    Aos Professores Alcindo José de Sá (UFPE), Hernani Loebler Campos

    (UFPE), André Dantas Estevam (UNEB), Janes Lavoratti (UFRB), Jânio Roque

    Castro de Barros (UNEB), Wendel Henrique (UFBA), Cláudia Sousa (UNEB),

    Jemisson Matos (UEFS), Cláudio Ubiratan Gonçalves (UFPE), José Alignoberto

    Fechine (UFAL), Lucas Cavalcanti pelos incentivos.

    Aos colegas do Programa de Pós-Graduação e da Graduação em Geografia

    da UFPE, Ailton Feitosa, Fernanda, Emilio Tales, Paulo Baqueiro, Bruno Halley,

    Lucas Cavalcanti, Robson Brasileiro, Saulo, Tiago Machado entre outros.

    À Odineide Soares pelo incentivo e compreensão nas horas difíceis.

    Aos colegas do SERGEO, Pedro Ferreira, Henrique Ferreira, Viviane Gomes,

    Ygor Cristiano, entre outros pelas discussões, trabalhos e mais trabalhos.

    Aos discentes do curso de geografia da UPE, Petrolina: Fredson, Diorgenes

    Lopes, Guilherme Theo, Francelita Castro, Marcio José Ramos, Gyslei Maria, entre

    outros.

    Aos meus pais que sempre incentivaram a realização deste trabalho e

    jornada.

    À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

    À todos e a todas que contribuíram diretamente ou indiretamente MUITO

    OBRIGADO.

  • 6

    RESUMO

    As preocupações frente aos atuais cenários e futuros sobre a disponibilidade hídrica

    incluindo aí as mudanças climáticas, crescimento populacional, uso não racional dos

    recursos hídricos, entre outras implicações vem crescendo nos mais variados

    ambientes, seja ele científico ou político. O desafio da ciência é desenvolver

    estudos que possam ampliar o leque de informações apuradas sobre as fragilidades

    dos ambientes hídricos as citadas mudanças de cunho natural e social. Nesta

    perspectiva, o presente trabalho tem como objetivo analisar a vulnerabilidade

    hidrológica das populações residentes na bacia hidrográfica do rio Una frente aos

    cenários de mudanças climáticas. Para o desenvolvimento do estudo foram

    empregadas técnicas de sensoriamento remoto para mapeamento do uso e

    ocupação das terras, montagem de um modelo hidrológico semi-distribuído simples,

    espacialização de dois cenários de mudanças climáticas, projeção e o cenário atual

    da disponibilidade hídrica na bacia e por último, aferida a vulnerabilidade hidrológica

    populacional. Os resultados indicam que com o aumento da temperatura média

    mensal, redução pluviométrica, padrão de uso atual das terras e o crescimento

    populacional ocasionará, para os próximos anos, redução da disponibilidade hídrica,

    assim como, colocar a maioria das populações dos munícipios em um Alto e/ou

    Muito alto grau de vulnerabilidade hidrológica. O citado problema requer atenção

    pública para que desenvolvam ações que visem em médio e longo prazo criarem

    alternativas de enfretamento das situações projetadas.

    Palavras chave: Modelagem ambiental. Disponibilidade hídrica. Cenários.

  • 7

    ABSTRACT

    The forward concerns to current and future scenarios on water availability there

    including climate change, population growth, not rational use of water resources,

    among other implications has been growing in many different environments be it

    scientific or political. The challenge of science is to develop studies to expand the

    range of information collected on the weaknesses of water environments the

    aforementioned changes in natural and social nature. In this perspective, this study

    aims to analyze the hydrological vulnerability of populations living in the catchment

    area of the watershed of river Una facing the climate change scenarios. To develop

    the study were used remote sensing techniques for mapping the use and occupation

    of land, installation of a simple semi-distributed hydrological model, spatial

    distribution of two climate change scenarios, projection and the current situation of

    water availability in the watershed and last, measured population hydrological

    vulnerability. The results indicate that with the increase in average monthly

    temperature rainfall reduction pattern of current land use and population growth will

    result, in the coming years, reducing water availability, as well as put most of the

    population of municipalities in a High and/or very high degree of hydrological

    vulnerability. The aforementioned problem requires public attention to now develop

    actions aimed at medium and long term create coping alternatives of projected

    situations.

    Keywords: Environmental modeling. Water availability. Scenarios.

  • 8

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 - Localização da bacia hidrográfica do rio Una .......................... 39

    Figura 2 - Média mensal dos totais pluviométricos sobre a bacia

    hidrográfica do rio Una .............................................................................

    40

    Figura 3 - Distribuição da temperatura média anual do ar sobre a bacia

    hidrográfica do rio Una .............................................................................

    41

    Figura 4 - Unidades geomorfológicas da bacia hidrográfica do rio Una ... 42

    Figura 5 - Distribuição dos solos sobre a bacia hidrográfica dor rio

    Una ..........................................................................................................

    43

    Figura 6 - Distribuição dos pontos aferidos em campo para validação do

    mapeamento de uso e ocupação das terras na bacia hidrográfica do rio

    Una ...........................................................................................................

    48

    Figura 7 - Distribuição dos postos pluviométricos empregados na

    calibração do MHSDS ..............................................................................

    52

    Figura 8 - NDVI para bacia hidrográfica do rio Una .................................. 64

    Figura 9 - NDII para bacia hidrográfica do rio Una ................................... 66

    Figura 10 - Mapeamento de uso da terra da bacia hidrográfica do rio

    Una ................................................................................................... ........

    67

    Figura 11 - Quantitativo de ocupação das classes de usos das terras na

    bacia hidrográfica do rio Una ....................................................................

    67

    Figura 12 - Plantio da cana-de-açúcar no município de Catende ............ 68

    Figura 13 - Plantio de mandioca no município de Xexeu voltado para

    agricultura familiar ....................................................................................

    71

    Figura 14 - Plantio de banana no município de Joaquim Nabuco voltado

    para agricultura familiar ............................................................................

    71

    Figura 15 - Estimativa da interceptação das chuvas pela estrutura de

    uso e cobertura das terras na bacia hidrográfica do rio Una ....................

    73

    Figura 16 - Matriz de confusão para o mapeamento de uso da terra e os

    dados de uso observados em campo .......................................................

    74

  • 9

    Figura 17 - Coeficiente de determinação linear de calibração do

    MHSDS .....................................................................................................

    76

    Figura 18 - comparação gráfica entre a vazão estimada pelo MHSDS e

    observada no posto fluviométrico de Palmares (calibração) ....................

    77

    Figura 19 - a baseline da precipitação pluviométrica total do modelo

    PRECIS para bacia hidrográfica do rio Una (19b) projeção da

    precipitação pluviométrica total do modelo PRECIS para citada bacia

    hidrográfica para o ano de 2030 e 19c projeção da precipitação

    pluviométrica total do modelo PRECIS para citada bacia hidrográfica

    para o ano de 2030 ...................................................................................

    82

    Figura 20 - Média mensal dos totais pluviométricos sobre a bacia

    hidrográfica do rio .....................................................................................

    83

    Figura 21 - (a) baseline da temperatura média mensal do ar para bacia

    hidrográfica do rio Una (modelo PRECIS, cenário de mudanças

    climáticas B2) e (b) projeção para o ano de 2030 referente ao modelo e

    cenário citado anteriormente ....................................................................

    86

    Figura 22 - Projeção para o ano de 2050 referente ao modelo PRECIS

    e cenário de mudanças climáticas B2 ......................................................

    87

    Figura 23 - (a) baseline da temperatura média mensal do ar para bacia

    hidrográfica do rio Una (modelo CCSM3, cenário de mudanças

    climáticas B1) e (b) projeção para o ano de 2030 referente ao modelo e

    cenário citado anteriormente ....................................................................

    88

    Figura 24 - projeção da temperatura média mensal do ar para bacia

    hidrográfica do rio Una (modelo CCSM3, cenário de mudanças

    climáticas B1 - 2050) ...............................................................................

    89

    Figura 25 - Projeção da vazão da bacia hidrográfica do rio Una (média

    histórica e projeção para os anos de 2030 e 2050 no cenário de

    mudanças climáticas B2 - modelo PRECIS) ............................................

    91

    Figura 26 - Projeção da vazão da bacia hidrográfica do rio Una (média

    histórica e projeção para os anos de 2030 e 2050 no cenário de

    mudanças climáticas B1 - modelo CCSM3) .............................................

    92

    Figura 27 - Disponibilidade hídrica sobre na bacia hidrográfica do rio

  • 10

    Una .......................................................................................................... 94

    Figura 28 - População atual e projetada na bacia hidrográfica do rio

    Una ...........................................................................................................

    96

    Figura 28 - Percentual de indivíduos com 5 ou mais anos de estudo nos

    municípios da bacia hidrográfica do rio Una .............................................

    97

    Figura 29 - Renda mensal média familiar nos municípios da bacia

    hidrográfica do rio Una .............................................................................

    99

    Figura 30 - Quantitativo de efluentes (esgoto) tratados nos municípios

    da bacia hidrográfica do rio Una ...............................................................

    101

    Figura 31 - Quantitativo de efluentes (esgoto) tratados nos municípios

    da bacia hidrográfica do rio Una ...............................................................

    103

    Figura 32 - Vulnerabilidade sociohidrológica das populações dos

    municípios da bacia hidrográfica do rio Una (cenário de mudanças

    climáticas B1 – 2010 e 2030 e B2 - 2010) ................................................

    106

    Figura 33 - Vulnerabilidade sociohidrológica das populações dos

    municípios da bacia hidrográfica do rio Una (cenário de mudanças

    climáticas B1 – 2050 e B2 – 2030 e 2050) ...............................................

    107

  • 11

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1- Classes de qualidade de mapeamento com base na estatística

    Kappa ..........................................................................................................

    48

    Tabela 2 - Valores finais dos parâmetros referentes à estrutura dos

    solos .. .........................................................................................................

    52

    Tabela 3 - Valores finais do parâmetro interceptação das chuvas pela

    cobertura vegetal ........................................................................................

    53

    Tabela 4 - Graus estatísticos utilizados para intepretação dos resultados

    de calibração e validação do MHSDS ........................................................

    55

    Tabela 5 - Notas para cada classe de vulnerabilidade empregada no

    estudo .........................................................................................................

    59

    Tabela 6 - Notas e graus de vulnerabilidade para a variável

    disponibilidade hídrica ................................................................................

    60

    Tabela 7 - Notas e graus de vulnerabilidade para a variável

    hidrogeologia ..............................................................................................

    60

    Tabela 8 - Notas e graus de vulnerabilidade para o atributo

    escolaridade ................................................................................................

    61

    Tabela 9 - Notas e graus de vulnerabilidade para o atributo renda média

    por família ..................................................................................................

    62

    Tabela 10 - Notas e graus de vulnerabilidade para o atributo tratamento

    de esgoto por município ..............................................................................

    63

    Tabela 11 - Valores médios obtidos no teste estatístico de Nash e

    Sutcliffe a cada 20 tentativas de calibração ................................................

    74

    Tabela 12 - valores médios obtidos no teste estatístico de Schaefli e

    Gupta (2007) a cada 20 tentativas de calibração .......................................

    75

    Tabela 13 - valores dos testes estatísticos na validação do MHSDS ......... 78

  • 12

    SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO ....................................................................................... 14

    2 OBJETIVO ............................................................................................. 17

    2.1 Objetivo geral .................................................................................... 17

    2.2 Objetivos específicos ...................................................................... 17

    3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ................................................................. 18

    3.1. Uso e ocupação das terras e escoamento superficial ................. 18

    3.2 Modelagem hidrológica ................................................................... 20

    3.2.1 Modelo hidrológico Semi-Distribuído Simples (MHSDS) ................. 24

    3.3 Mudanças climáticas ........................................................................ 25

    3.3.1 Cenários de mudanças climáticas (contextualização geral) ............ 26

    3.3.2 Modelos climáticos e escalas de abrangência ................................. 28

    3.3.3 Mudanças climáticas e os recursos hídricos globais ....................... 30

    3.4 Índices de disponibilidade hídrica .................................................. 33

    3.4.1 Mudanças climáticas e a disponibilidade hídrica ............................. 35

    3.5 Vulnerabilidade (conceitos e diretrizes) ......................................... 37

    3.5.1 Vulnerabilidade socioambiental ....................................................... 37

    4 MATERIAIS E MÉTODOS ..................................................................... 39

    4.1 Localização e caracterização da área de estudo ........................... 39

    4.2 Caracterização física ........................................................................ 40

    4.2.1 Tipologia climática ........................................................................... 40

    4.2.2 Geomorfologia, geologia e pedologia ............................................. 41

    4.3 Procedimentos metodológicos ....................................................... 45

    4.3.1 Mapeamento de uso da terra e interceptação das chuvas .............. 45

    4.3.2 Montagem do modelo hidrológico semi-distribuído simples ............ 49

    4.3.3 Calibração e validação do modelo hidrológico semi-distribuído

    simples ......................................................................................................

    50

  • 13

    4.3.4 Espacialização dos dados referentes às mudanças climáticas ....... 55

    4.3.5 Disponibilidade hídrica ..................................................................... 57

    4.3.6 Vulnerabilidade sociohidrológica ..................................................... 58

    5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................ 64

    5.1 Uso da terra e interceptação das chuvas ....................................... 64

    5.2 Avaliação da calibração e validação do MHSDS ........................... 74

    5.3 Mudanças climáticas e a precipitação pluviométrica ................... 78

    5.3.1 Modelo PRECIS (cenário de mudanças climáticas B2) ................... 78

    5.4 Mudanças climáticas e a temperatura média mensal do ar .......... 83

    5.4.1 Modelo PRECIS (cenário de mudanças climáticas B2) ................... 83

    5.4.2 Modelo CCSM3 (cenário de mudanças climáticas B1) .................... 87

    5.5 Projeção das vazões a partir do modelo climático PRECIS ......... 90

    5.6 Projeção das vazões a partir do modelo climático CSSM3 .......... 91

    5.7 Disponibilidade hídrica .................................................................... 93

    5.8 Vulnerabilidade sociohidrológica ................................................... 96

    6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................. 108

    REFERÊNCIAS ........................................................................................ 110

  • 14

    1 INTRODUÇÃO

    O acesso à água potável no mundo vem tornando-se um desafio para

    gestores públicos e cientistas dos mais variados ramos de estudos. Problema que

    tem como principais agravantes as desigualdades sociais e o precário manejo dos

    recursos hídricos, assim como, a falta de planejamento no gerenciamento das

    bacias hidrográficas. Estima-se que cerca de 1 bilhão de pessoas não têm acesso à

    água para consumo doméstico e que em 30 anos este número poderá crescer em

    500% (SETTI, et al., 2001; GANE & AMRANI, 2006; SÃO PAULO, 2012).

    Em vários países subdesenvolvidos e nos considerados em desenvolvimento

    a redução da disponibilidade de água para os usos consultivos1 e não-consultivos2

    vem comprometendo o dinamismo socioeconômico dos mesmos. No continente

    africano e asiático a redução das vazões de várias bacias hidrográficas vem

    proporcionando reduções na produtividade agrícola dos pequenos e médios

    produtores, adensamento populacional nas áreas urbanas devido à fuga do campo

    para cidades em países como Malavi, Tanzânia, Camarões, República Democrática

    do Congo, Congo, Uganda, China, Índia entre outros. As consequências assentam-

    se no agravamento da falta de alimentos, desempregos em massas e migrações.

    Acrescentam-se ainda, as disseminações de doenças de veiculação hídrica como a

    cólera, a Leshimaniose entre outras (MADULU, 2003; YONGJIAN, 2003; TINGEM,

    RIVINGTON, & COLLS, 2008; BAGUMA et al., 2012).

    O que foi apresentado anteriormente não se resume somente a alguns países

    da África e da Ásia. Nos Estados Unidos da América do Norte e norte do México

    estudos divulgados por Bates et. al., (2008) indicam que apesar de alguns rios

    registrarem vazões acima da média histórica, outros localizados em regiões com

    maior adensamento populacional apresentaram tímidas reduções em seus

    escoamentos. Diminuições que, em um futuro não tão distante, poderão apresentar

    sérios problemas de abastecimento de água nestas regiões.

    1 - Uso que retira a água de sua fonte natural reduzindo sua disponibilidade (irrigação; uso industrial; uso para

    fins domésticos; termoeletricidade; entre outros) (PEREIRA e PEDROSA, 2005). 2 - Uso que retira a água de sua fonte natural, porém, a mesma retorna para fonte (atividades recreativas;

    hidroelétrica; navegações; esportes aquáticos; depuração de efluente; entre outros) (PEREIRA e PEDROSA,

    2005).

  • 15

    O Brasil, apesar de possuir mais de 13% das águas disponíveis para

    consumo do mundo, a situação em algumas regiões apresenta-se de forma crítica

    (FERREIRA, SILVA & PINHEIRO, 2011). Na região Norte estão concentradas 80%

    das águas disponíveis no território nacional, restando 20% concentradas nas demais

    regiões, as quais possuem um maior contingente populacional. Aliam-se a este fator

    alguns agravantes como: contaminação dos mananciais principalmente aqueles que

    nascem ou cortam áreas urbanas; destruição de nascentes; assoreamentos dos

    canais fluviais; destruição da cobertura vegetal responsável pelo retardamento do

    escoamento superficial e consequentemente direcionamento das águas para o

    lençol freático; uso indiscriminado e insustentável da água para atividades de

    irrigação entre outros.

    As consequências referentes ao Brasil culminam em: políticas de

    racionamento em centros urbanos dos mais variados tamanhos, a exemplo das

    cidades de São Paulo, Fortaleza, Campina Grande-PB, Cariacica-ES, entre outras;

    consumo de água poluída por dejetos urbanos in natura e por águas poluídas nas

    regiões semiáridas aumentando, assim, os riscos de contaminação por doenças de

    veiculação hídrica; conflitos pelos usos múltiplos da água envolvendo,

    principalmente o setor agropecuário, industrial e a população urbana e rural; entre

    outras consequências (TOMAZONI; PINTO & SILVA, 2009; BRASIL, 2012).

    A situação tende a se agravar diante dos cenários nada otimistas, os quais

    apontam para o vertiginoso crescimento dos desmatamentos das áreas de

    cabeceiras e degradação (destruição) das áreas de nascentes, impulsionadas pelo

    crescente agronegócio no país. Problemas estes que mexe com os estado de

    relativa estabilidade dos sistemas físicos naturais reduzindo assim a oferta hídrica

    das bacias hidrográficas (BRASIL, 2011).

    Outro preocupante cenário refere-se às mudanças climáticas. Estudos

    publicados indicam que nos últimos anos várias bacias hidrográficas de grande

    porte, no âmbito nacional, apresentaram reduções em suas vazões, tendência que

    pode agravar diante dos possíveis cenários de mudanças climáticas divulgados

    pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) (MARENGO, 2009; IPCC,

    2007; 2007b; 2013).

    O Estado de Pernambuco não foge aos problemas socioambientais

    relacionados à disponibilidade hídrica. De acordo com Xavier (2005) o crescimento

  • 16

    populacional nesta unidade federativa aliado ao quantitativo de água escoada em

    cada bacia hidrográfica acende o sinal para o deficit hídrico estadual.

    Nos últimos anos houve uma quantidade considerável de estudos focando o

    atual estado de degradação dos recursos hídricos no estado de Pernambuco e o

    comportamento das vazões das bacias hidrográficas do referido estado atrelando

    aos cenários de mudanças climáticas e outros contextos ambientais. Entre estes

    trabalhos destacam-se os desenvolvidos por: Silva e Galvíncio (2010); Duarte

    (2009); Alburquerque e Galvíncio (2010); Santos (2010); Assis, Larcerda e Sobral

    (2012); Fechine (2012). Ambos apontam para reduções tímidas nas vazões de

    algumas bacias nos últimos anos e possíveis agravamentos nas próximas décadas.

    Apesar da grande contribuição que os citados estudos assinalam, tanto para o

    avanço científico, quanto para o campo da gestão e planejamentos dos recursos

    hídricos no âmbito das bacias hidrográficas, poucos são discutidos sobre a

    fragilidade das populações locais diante dos problemas correlacionados a redução

    da disponibilidade hídrica. Diante deste fato, aliado ás discussões apresentadas,

    costuram-se dois questionamentos, os quais serão as parábolas a serem

    perseguidas nesta proposta de tese. Como associar em um único estudo as

    discussões complexas e os resultados de uma modelagem hidrológica a

    estruturação de um modelo de cunho socioambiental? Qual o grau de

    vulnerabilidade socioambiental das populações que habitam os municípios inseridos

    na bacia hidrográfica do rio Una, porção localizada no Estado de Pernambuco,

    levando em consideração a dinâmica de funcionamento sistêmico da mesma,

    atualmente e no futuro médiante cenários climáticos e populacionais?

  • 17

    2 OBJETIVO

    2.1 Objetivo geral

    Analisar a vulnerabilidade hidrológica das populações residentes na bacia

    hidrográfica do rio Una frente aos cenários futuros de mudanças climáticas.

    2.2. Objetivos específicos

    - Mapear a estrutura de uso e ocupação das terras da bacia hidrográfica do rio Una

    com foco na interceptação das águas das chuvas;

    - Simular as vazões da bacia hidrográfica do rio Una a partir de um modelo

    hidrológico semi-distribuído simples;

    - Analisar a dinâmica de distribuição dos elementos climáticos para as variáveis

    (temperatura e precipitação pluviométrica) a partir dos cenários de mudanças

    climáticas sobre a área de estudo;

    - Projetar e analisar a vazão na bacia hidrográfica do rio Una a parir dos cenários de

    mudanças climáticas;

    - Diagnosticar os quadros de disponibilidade hídrica para população dos munícipio

    na bacia hidrográfica em estudo sobre os cenários de mudanças climáticas e

    populacionais;

    - Projeta e analisar a vulnerabilidade hidrológica das populações dos munícipios da

    área de estudo com ênfase nos cenários de mudanças climáticas, crescimento

    populacional e o quadro sóciosanitário atual.

  • 18

    3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

    3.1 Uso e ocupação das terras e escoamento superficial

    Enquadra-se como uso da terra qualquer utilização que o ser humano exerce

    sobre a superfície terrestre. Inclui, ainda, a presença da cobertura vegetal a qual não

    tem interferência direta humana (IBGE, 2010). Neste contexto, as construções

    residenciais urbanas e rurais, industriais, práticas agropecuárias, atividades

    extrativistas minerais e a vegetação sem fins agrícolas enquadram-se como uso e

    cobertura das terras.

    Para Robles et al., (2010) as mudanças no uso e cobertura das terras é a

    consequência da dinâmica das interações das atividades humanas com o meio

    natural. Dentro da referida dinâmica, nos últimos anos, houve um aumento

    considerado de estudos preocupados em compreender e analisar os efeitos do uso

    e cobertura das terras sobre problemas ambientais, como deslocamentos de

    massas, enchentes, alagamentos, degradação dos solos, contaminação de

    mananciais, propagação de doenças entre outros.

    Para análise do uso e cobertura das terras faz-se necessário à utilização de

    técnicas que permitam aferir através de representações cartográficas (mapas e

    cartas) os reflexos das configurações espaciais em determinados territórios. O

    sensoriamento remoto é uma das ferramentas cruciais aos estudos de uso da terra.

    Este instrumento firma-se como um recurso eficiente no monitoramento ambiental,

    incluindo neste leque o monitoramento do uso e cobertura das terras. Através dos

    produtos orbitais e/ou aéreos é possível produzir mapeamento que se transformam

    em verdadeiros retratos da realidade espacial de um determinado local que se quer

    investigar (FLORENZANO, 2002; BUNTINGA et. al., 2014).

    Na década de 1970, com o lançamento do primeiro satélite para uso civil por

    parte dos EUA, vários métodos de aquisição de dados foram desenvolvidos e

    aprimorados, posteriormente. Os resultados podem ser acessados nas dezenas de

    publicações anuais em periódicos e livros nacionais e internacionais. Dentre os

    produtos desenvolvidos, a partir do marco histórico pontuado anteriormente, podem-

    se destacar os índices de vegetação e de água, os quais podem identificar o padrão

  • 19

    da cobertura vegetal de determinada região, o uso da terra, stress da vegetação,

    nível de água da cobertura vegetal entre outras utilidades (FLORENZANO, 2002;

    ROSA, 2005; TILLACK et. al., 2014).

    A interferência do padrão de uso da terra é visível na dinâmica do

    escoamento superficial de uma determinada bacia hidrográfica. Bacelar (2005)

    destaca que vários estudos apontam que a estrutura da cobertura das terras, neste

    caso com ênfase nas florestas, pode controlar cheias e manter vazões nos períodos

    de estiagem.

    Do quantitativo de água precipitada nos eventos pluviométricos em uma

    determinada bacia hidrográfica apenas uma parte consegue atingir direta e

    indiretamente os solos. Outra parte é interceptada pela cobertura vegetal ativa ou

    pelos dejetos deixados pela mesma sobre a superfície. O quantitativo retiro pode ser

    evaporado e, consequentemente, não fará parte do escoamento superficial na bacia

    hidrográfica (CZIKOWSKY & FITZJARRALD, 2009).

    Foram nas duas primeiras décadas do século passado que iniciaram os

    estudos com objetivos de compreender o papel do uso e cobertura das terras no

    escoamento superficial nas bacias hidrográficas. Vale destacar, os comparativos

    entre bacias de dimensões geográficas e areas semelhantes, além das aplicações

    de vários métodos, atualmente aproveitados. Um dos estudos consagrados, e que

    atualmente contribui em dezenas de pesquisas hidrológicas, foi desenvolvido por

    Hilbert no ano de 1967. Com dados coletados e testados por mais de 20 anos este

    pesquisador foi o primeiro a concluir que a redução da cobertura florestal em

    detrimento de práticas agropecuárias, crescimento urbano entre outras finalidades

    contribui no aumento da vazão anual de uma bacia hidrográfica (BARCELLAR,

    2005).

    A resposta de Hilbert (1967) é explicada por Tucci (2001). Para este autor,

    quando é retirada a cobertura vegetal a tendência é a vazão anual aumentar. Isto,

    porque, será reduzido o quantitativo de água interceptada pela cobertura vegetal, a

    qual posteriormente será evaporada, além de reduzir o quantitativo de água infiltrada

    no solo, que é favorecida pelos impactos amortecido das gotas de chuvas.

    Bacellar (2005) destaca que parte dos estudos sobre o potencial da

    interceptação das águas das chuvas pela cobertura vegetal foram desenvolvidos em

    áreas sobre florestas úmidas tropicais. Neste tipo de cobertura mais de 13% das

  • 20

    chuvas podem ser interceptadas devido ao potencial de cobertura das folhas

    refletido no alto índice de área foliar, isto é claro dependendo do potencial das

    precipitações pluviométricas. Porém, há uma necessidade de informações sobre o

    potencial exercido por outras estruturas de cobertura vegetal.

    Aos poucos novos estudos vêm sendo desenvolvidos. No caso particular

    brasileiro, além das florestas de cunho tropical úmida há também composições

    florestais com estrutura de coberturas menores, como exemplo cita-se o cerrado e a

    caatinga. Em relação a esta última estrutura os estudos ainda são poucos, porém, já

    se pode inferir algumas informações relevantes (ALBUQUERQUE & COSTA, 2012).

    Medeiros et al., (2009) apontaram que o potencial de interceptação das

    chuvas pela vegetação de caatinga, segundo uma série de estudos, apontam para

    13 a 22%. Ao testar o potencial deste tipo de vegetação na estação ecológica de

    Aiuaba, Estado do Ceará, os autores conseguiram registar um índice de 13% de

    interceptação da chuva, valor dentro do apontado pelos estudos referido pela equipe

    de pesquisadores.

    3.2 Modelagem hidrológica

    A tentativa de representar os fenômenos da natureza não é nova no mundo

    científico. Desde os remotos períodos em que as ciências não eram sistematizadas

    milhares de tentativas foram feitas na busca de encontrar respostas para os

    fenômenos que ocorriam a todo momento na terra. Para Christofoletti (2004) partes

    destas tentativas eram auxiliadas pelas regras e poderio matemático, que ao longo

    do tempo foi ganhando força ao ponto de se tentar representar um dos maiores

    sistemas ambientais, o atmosférico.

    A ideia de modelagem ambiental remete a representação de um sistema

    físico-natural através de equações matemáticas que tentam reproduzir no papel ou

    no computador o comportamento de uma estrutura, um esquema funcional ou

    procedimento real que funciona através de uma entrada, causa ou estimulo de

    energia, e consequentemente uma saída (TUCCI, 2005; MARINHO FILHO, 2012).

  • 21

    Por mais eficiente que venha ser um modelo Berry (1996) destaca que o

    modelo não é a realidade em si que está representada, mais a visão do pesquisador

    ou pesquisadores e sua compreensão de determinada realidade.

    Os modelos ambientais podem ser divididos e classificados em diversos

    grupos, um deles está o grupo dos modelos matemáticos. Em sua classificação de

    modelos Petch (1986) apud Christofoletti (2004) definiu os modelos hidrológicos

    dentro da categoria dos arranjos matemáticos. Neste grupo estão os modelos

    determinísticos e os estocásticos. Segundo Christofoletti (2004) os primeiros são

    baseados em noções matemáticas clássicas de relações facilmente previsíveis. Já

    os estocásticos são estruturados em cima de variáveis, parâmetros e constantes

    matemáticas com um ou vários componentes de cunho aleatório com situação

    imprevisível.

    Com a propagação dos modelos hidrológicos nos mais diversificados ramos

    científicos as ações de planejamento e gerenciamento de bacias hidrográficas e de

    recursos hídricos tornaram-se mais dinâmicas e eficazes, tornando-se uma

    ferramenta de grande validade ao poder público, privado e científico. Nos últimos

    anos, com as discussões frente às mudanças ambientais globais as simulações

    hidrológicas cresceram ao associar as tais discutidas mudanças no comportamento

    dos sistemas hidrográficos, sejam eles rios, lagos, oceanos e principalmente bacia

    hidrográficas.

    A modelagem hidrológica pode ser definida como uma representação

    matemática do fluxo de água e seus constituintes levando em consideração os

    aspectos físicos-naturais do ambiente estudado, neste caso uma bacia hidrográfica.

    Neste contexto os modelos hidrológicos são ferramentas de fundamental

    importância no auxílio de estudos e tomadas de decisões por partes de engenheiros

    hidrólogos, geólogos, geógrafos, planejadores, entre outros (GALVINCIO, 2005;

    TUCCI, 2005).

    Christofoletti (2004) destaca que desde os primórdios da ciência inúmeras

    tentativas de modelagem de fluxo de quantidade de água sobre um sistema

    ambiental vem sendo desenvolvido, tendo como exemplo clássico o modelo

    conceitual do ciclo hidrológico proposto por Leonardo da Vinci por volta do ano

    de1500.

  • 22

    No citado modelo Leonardo da Vinci aponta que a água dos mares são

    carregadas para os topos das áreas de grandes altitudes através de veios

    (cavidades) presente na subsuperficie terrestre. Ao chegar nas áreas elevadas a

    água retorna aos mares através de fluxos superficiais (rios) nascidos nas

    montanhas. Há ainda outro processo neste modelo correspondente ao procedimento

    de evaporação das águas, as quais em seguidas precipitam sobre as terras e os

    mares (SENARATH, et al., 2000).

    Das ideias de Leonardo da Vinci, registradas a mais de 500 anos aos

    modelos existentes e desenvolvidos atualmente algumas concepções mudaram,

    assim como, o avançar científico contribuiu com incrementos de variados elementos

    que participam da dinâmica de circulação dos fluxos hídricos (águas) na superfície

    terrestre não adotados há cinco séculos atrás, a exemplo do fluxo subterrâneo,

    potencial de retenção da água por parte dos solos, entre outros.

    No inicio do século passado os mais diversificados ramos científicos se

    consolidam reforçando a sistematização das ciências dentro da perspectiva

    positivista. Consequentemente, os estudos voltados para representação do ciclo

    hidrológico deixam de ser empírico e passaram a se consolidar dentro das

    abordagens e representações quantitativas. Neste período, vale destacar os

    trabalhos de Sherman (1932) conceituando as bacias hidrográficas e Horton (1945)

    trabalhando com os fluxos de água na superfície.

    Dos pesquisadores citados anteriormente destaca-se Horton. Este

    investigador simulou o escoamento superficial nas vertentes de bacias hidrográficas

    no continente europeu além de trabalhar com o processo de hierarquização dos

    cursos hídricos de acordo com sua importância no transporte de água e sedimentos

    na escala da bacia hidrográfica (BRUNET, FERRAS, & THERY, 1998).

    A partir das contribuições de Horton vários modelos hidrológicos foram

    desenvolvidos e difundidos em escala mundial, entre eles podemos destacar: o

    TOPMODEL (Topography Model); o KINEROS (Kinematic Erosion); o SWAT (Soil

    and Water Assessment Tool); o CASC2D (Cascade Two-Dimensions); o Modelo

    Semi-Distribuído de dois Parâmetros, entre outros.

    O TOPMODEL é um sistema de modelagem integrado, com bases físicas e

    conceituais focalizando o balanço de água nos diversos horizontes estruturais do

    solo e da rocha matriz em escala temporal de no mínimo diária. Este modelo integra

  • 23

    dados do modelo digital do terreno a modelagem dos processos hidrológicos dentro

    dos sistemas de informações geográficas. Quanto à caracterização do modelo o

    mesmo é considerado como semi-distribuído, visto que, apenas os padrões

    topoFiguras são distribuídos pela bacia, enquanto que as demais variáveis de

    entrada no modelo são constantes (SILVA, 2010; SANTOS, 2010; VESTANA et. al.,

    2013).

    O KINEROS foi desenvolvido para ser trabalhado em pequenas bacias

    hidrográficas rurais e urbanas. Ele descreve processos de escoamentos baseando-

    se em informações da interceptação das chuvas, erosão do solo, infiltração das

    águas e escoamento superficial. É amplamente empregado nos estudos que

    envolvem fluxos de pesticidas, matéria orgânica e nutrientes em ambientes rurais,

    além do emprego em estudo de planejamento voltados para conservação dos

    ambientes superficiais aquáticos direcionados ao abastecimento humano

    (RODRIGUES & ADAMI, 2005; MARTINEZ, et. al., 2014).

    O SWAT (Soil and Water Assessment Tool) é outro modelo hidrológico cujo

    objetivo é predizer os efeitos dos diversificados usos do solo sobre o escoamento

    das águas, produção de sedimentos e qualidade dos componentes hídricos em

    bacia hidrográficas agrícolas. Foi desenvolvido pelo serviço de pesquisa agrícola

    dos Estados Unidos sendo uma ferramenta importante para o planejamento dos

    recursos hídricos, assim como, para a produtividade agrícola (ARNOLD et al., 2012).

    Nos últimos anos o SWAT ganhou interfaces acopladas aos Sistemas de

    Informações Geográficas (SIGs) a exemplo de sua interconexão com os softwares

    ArcGis (extensão ArcSWAT) e com o MapWindow GIS facilitando e difundindo seu

    uso nos mais diversificados ramos das geociências e área afins (ARNOLD et al.,

    2012; BETRIE, et al., 2013).

    Em relação ao CASC2D o processo de simulação do escoamento superficial

    da água ocorre a partir de um quantitativo de chuva estabelecido. Para isto, o

    modelo tem como dados de entrada o potencial da interceptação da chuva pela

    cobertura vegetal, seja ela natural ou artificial e o potencial de infiltração das águas

    na bacia hidrográfica em estudo levando em consideração a estrutura dos solos e do

    relevo (SENARATH, et al., 2000; DUBOS & BABIANO, 2002; MARSIK & WAYLEN,

    2006).

  • 24

    No Brasil, nos últimos anos, seguindo a tendência internacional do avanço

    científico no ramo da modelagem ambiental, houve um aumento no número de

    modelos voltados para modelagem hidrológica. Um dos modelos que vem sendo

    bastante utilizado é o MGB-IPH desenvolvido por Collischonn e Tucci (2001) para

    simulações hidrológicas em grandes bacias hidrográficas. Segundo Getirana et al.,

    (2011) partir dos estudos desenvolvidos com o uso deste modelo vem demostrando

    eficácia em simulações hidrológicas. Para os autores a modelagem em grandes

    bacias sempre foi um desafio devido à complexidade de informações ambientais a

    serem trabalhadas. Com isto, o MGB-IPH vem para contribuir com o referido desafio.

    3.2.1 Modelo hidrológico Semi-Distribuído Simples (MHSDS)

    Xiong e Guo (1999) apresentaram um modelo hidrológico semi-distribuído

    simples de dois parâmetros. A ideia exposta tinha como objetivo estudar os impactos

    dos cenários de mudanças climáticas sobre os recursos hídricos de várias bacias

    hidrográficas na China. O modelo foi estruturado tendo como variáveis de entrada a

    precipitação pluviométrica, a temperatura do ar e a evapotranspiração potencial e os

    dois parâmetros atrelados aos aspectos relacionados às características dos solos

    locais. Os resultados apontaram para o bom funcionamento do modelo

    principalmente nas bacias de áreas úmidas e subúmidas da China. Desde então

    vários estudos foram desenvolvidos utilizando a base do referido modelo.

    Vale destacar o estudo confeccionado por Guo et al., (2002) na bacia

    hidrográfica do rio Gangjiang e do rio Hanjiang na China. Os resultados apontaram

    para uma boa calibração do modelo e estimativa futura do escoamento superficial

    dentro dos padrões estimados por outros modelos hidrológicos mais antigos. Porém,

    nos mesmo estudo os autores detectaram problemas nas simulações com

    ocorrências de picos pluviométricos.

    Na Dinamarca, a base do citado modelo foi adaptado e incluso um terceiro

    parâmetro, isto no estudo desenvolvido por Muller-Wohlfeill, Xu e lversen (2003). Um

    dos objetivos da pesquisa foi simular vazões de rios não monitorados. Os resultados

    indicaram que o modelo apresentou boa eficácia, porém, alterações devem ser

    realizadas para adaptá-lo as condições físicas-climáticas da área de estudo. Visto

  • 25

    que, ao comparar os resultados alcançados nos estudos chineses com os

    desenvolvidos na Dinamarca há diferenças.

    No Brasil alguns estudos foram desenvolvidos com a base no modelo

    difundido por Xiong e Guo (1999). Lucas et al., (2009) aplicaram o referido modelo

    para simulação da vazão na bacia hidrográfica do rio Xingu. Neste estudo os autores

    compararam a eficiência na simulação do escoamento superficial do modelo com um

    modelo estocástico denominado de ARIMA. Os resultados foram satisfatórios,

    porém, os autores mostram o perigo em trabalhar com o modelo semi-distribuido em

    se tratando de eventos extremos com picos de vazão. Pontuação semelhante a

    realizada por Guo et al., (2002).

    Já Santos, Galvíncio e Moura (2013) desenvolveram a modelagem hidrológica

    para bacia hidrográfica do rio Goiana, Estado de Pernambuco. Neste estudo o

    MHSDS atingiu bons índices estatísticos nos testes de calibração e foi empregado

    na simulação das vazões diante de cenários de mudanças climáticas. Assim como,

    nos demais estudos, os problemas encontrados por Guo et al., (2002) na Ásia e por

    Lucas et al., (2009) na região hidrográfica do Xingu, América do Sul, também foram

    visíveis no trabalho desenvolvido na citada bacia hidrográfica.

    3.3 Modelagem - mudanças climáticas

    Modelos que representam sistemas ambientais podem ser considerados

    instrumentos capazes de simular, tentar representar, a realidade existente em um

    determinado ambiente, sendo que não pode ser confundido com o sistema

    representado em sua esfera real (CHRISTOFOLLETTI, 2004).

    Atualmente, centenas de estudos científicos faz uso de modelos ambientais

    para simular situações, as quais podem contribuir com a gestão pública,

    intervenções administrativas e científicas criações de produtos, reforçar

    determinados descobrimentos científicos, entre outras finalidades. Na ciência

    geográfica a modelagem ambiental teve seu auge na década de 1950 no seio da

    geografia quantitativa ou teorética. Semelhante à geografia, outras ciências, também

    enfatizaram o uso de modelos ambientais, tais como a meteorologia, hidrologia,

    ecologia, biologia entre outras (CHRISTOFOLETTI, 1993, 2004).

  • 26

    Os dados, muitas vezes numéricos, representados pelos modelos podem ser

    espacializados em uma determinada área de estudo, seja ela uma estrutura urbana,

    estados nacionais, unidades de paisagens, regiões fitogeográficas, bacias

    hidrográficas entre outras. Para isto, as técnicas de geoprocessamento são

    essenciais, visto que, além de fornecer uma visualização da espacialização dos

    dados gerados pelos modelos ambientais (dimensão geoespacial), proporciona uma

    série de análises estatísticas geoespaciais contribuindo com a relação dos dados

    gerados pelos modelos com determinados estudos, incluindo ai as abordagens

    climáticas como a distribuição da precipitação pluviométrica, temperatura média do

    ar, evaporação, umidade relativa do ar entre outras (SINGH, 1999; CAMARA &

    MEDEIROS, 2001; FERRERA et. al, 2013).

    3.3.1 Cenários de mudanças climáticas

    No ano de 1988 a Organização Meteorológica Mundial (OMM) e o Programa

    das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) se reuniram e criaram o Painel

    Intergovenamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). O objetivo era gerar e reunir

    informações de cunho científico referente aos impactos das mudanças climáticas

    sobre os condicionantes sociais e naturais da terra no intuito de fomentar soluções

    para tais efeitos. O painel foi divido em quatro grupos, cada um com determinada

    funcionalidade e formado por um grande número de cientistas. O primeiro grupo foi

    responsável pela divulgação dos estudos iniciais, os quais reuniram evidencias

    técnicas com argumentos teóricos fundada na relação entre o processo de produção

    e reprodução socioespacial e as mudanças climáticas (IPCC, 2001a; CAMPBELL, et

    al., 2000).

    O segundo grupo teve como incumbência relacionar os impactos das

    mudanças no clima sobre a saúde humana e, frente aos aspectos dos sistemas

    físicos naturais (sistemas: fitogeoFiguras; zoogeoFiguras; aquáticos; glaciais; entre

    outros). Já o grupo três teve a responsabilidade de, com base nos resultados

    apresentados pelos grupos anteriores, indicar possíveis soluções a serem tomadas

    por artes da comunidade política governamental (IPCC, 2001b; IPCC, 2007; IPCC,

    2013).

  • 27

    O grupo quatro teve como incumbência fechar as análises divulgadas pelos

    relatórios proferidos pelos grupos anteriores e, a partir daí, junto com o setor

    governamental no âmbito mundial, ajustarem às propostas as realidades de cada

    estado nação. Coube a este grupo construírem materiais esclarecedores que com

    linguagem acessível ao público não cientista pudessem trabalhar o desenvolvimento

    de políticas sustentável em pró a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.

    Acrescenta-se aos grupos apresentados o quinto conjunto de estudos (relatório

    cinco), o qual tem como finalidade apresentar uma visão clara do estado atual das

    práticas e levantamentos científicos referentes às mudanças climáticas (IPCC, 2012;

    IPCC, 2013).

    Os estudos e relatórios preparados pelos grupos explicitados anteriormente

    foram desenvolvidos com base nos cenários de mudanças climáticas. Estes

    panoramas são baseados em projeções sócio-econômicas, políticas, tecnológicas

    regionais e demográficas futuras, denominada de forças motrizes. Ou seja, com

    base em forças motoras são projetados lançamentos futuros de gases de efeito

    estufa. Estas projeções são baseadas em quatro espacializações geográfica

    (conjuntos de cenários), conhecidas como famílias (A1, A2, B1 e B2), as quais se

    subdividem em subfamílias, ou seja, outras ramificações (MARENGO, 2009; WALZ,

    et al., 2013).

    A historia de futuro do cenário A1 é montada em cima de um padrão global de

    crescimento em que a economia experimenta rápido crescimento no âmbito global.

    Neste aspecto, a população mundial cresce, porém, entre 2040 a 2060 ocorrerá uma

    queda no pico populacional. Incrementa-se a esta projeção o crescimento do

    desenvolvimento tecnológico acima da média atual. Diante do apresentado, tem-se

    como consequência o paralelo aumento do uso de energias. Para caracterizar os

    diferentes uso energéticos o cenário A1 se subdivide em três subcenários, o A1F1 o

    qual aponta para o uso intensivo de energias fosseis, o A1T com uso de energia não

    fosseis e o A1B representando o equilíbrio entre subcenários A1F1 e A1B da família

    (WALZ, et al., 2013).

    O cenário A2 projeta uma organização espacial heterogênea com forte

    preservação das tradições culturais locais, com aumento continuo da população

    global nos países mais atrasados tecnologicamente. Quanto à estrutura econômica,

    destacam-se o nível regional, sem muita interação econômica global.

  • 28

    Consequentemente, o crescimento tecnológico ocorre de forma fragmentada entre

    as regiões globais (LAURENT & PAREY, 2007; SLEETER et al, 2012).

    Em relação ao cenário B1, a estrutura organizacional no âmbito mundial

    apresentará convergência com as projeções desenvolvidas no cenário A1. Ou seja,

    ocorrerá um crescimento e, logo depois, uma queda na metade do século. O que

    difere do primeiro cenário apresentado é a intensificação de uma economia de

    serviços e informações. O crescimento no uso de tecnologias limpa é o destaque,

    porém, com ineficientes políticas climáticas (BASTOLA & SWEENEY, 2011).

    O cenário B2 projeta um mundo com forte ênfase em soluções locais voltados

    para sustentabilidade econômica, social e ligadas às temáticas ambientais. A

    população mundial apresenta um crescimento continuo, porém, com índices

    menores do que o A2 (LAURENT & PAREY, 2007; SANTOS, GALVINCIO &

    MOURA, 2013). Quanto à orientação tecnológica, neste cenário, o crescimento é

    menor do que o A1 e B1.

    3.3.2 Modelos climáticos e escalas de abrangência

    Os modelos climáticos podem ser conceitualizados como representações

    numéricas do sistema de circulação climática. Para isto, as propriedades físicas,

    químicas e biológicas de funcionamento do citado sistema são transformadas em

    equações em busca de se tentar representar, ou chegar ao mais próximo possível

    da realidade climática (CHRSITOFOLETTI, 2004; NOBREGA, 2010).

    Os modelos climáticos atuais, os quais são utilizados nas projeções climáticas

    pode ser divididos em duas categorias, isto obedecendo a escala de espacialização.

    Tem-se os modelos climáticos globais (Global Climate Models – GCMs) e os

    modelos climáticos de escala regional (Regional Climate Model - RCM). Os primeiros

    são representados em escalas maiores (resolução espacial menor), ou seja, a grade

    de pontos horizontal com os dados climáticos são gerados a partir de uma resolução

    espacial em média de 300km perfazendo, assim, no plano uma grade de pontos em

    média de 5000Km x 5000Km. Quanto aos modelos regionais a resolução espacial é

    maior. Em média esta resolução pode atingir 50km, e em alguns modelos a

    resolução atinge valores semelhante ou inferior a 25Km. Valores seis a 12 vezes

  • 29

    menores em comparação com a média de resolução dos modelos climáticos globais

    (ARRIETA, 2012).

    As diferenças em relação às resoluções geram discussões, isto, porque,

    podem mascarar e/ou limitar variáveis ambientais importantes a serem utilizadas nos

    modelos. Arzhanov et al., (2013) destacaram que ao utilizar um modelo climático

    global o pesquisador em seus estudos devem ficar atentos a uma série de fatores

    limitantes, um deles é a exclusão de elementos em escala regional que participam

    da dinâmica climática, exemplos das configurações do relevo, o papel da vegetação

    local, corpos hídricos em escala regional, entre outros. Com isto, a aplicação dos

    dados gerados por um modelo global deve ser trabalhada com as citadas ressalvas.

    Em relação aos modelos climáticos regionais os problemas apresentados nos

    globais são parcialmente resolvidos, visto que, em sua configuração espacial são

    incluídas as variáveis de escala local, oferecendo assim dados, que leve em

    considerações o papel dos sistemas físicos naturais regionais como subsistema

    climático. Porém, um modelo em escala regional apresenta alguns problemas de

    acoplagem de dados, a exemplo do componente marítimo costeiro, entre outros em

    macro escala (MARENGO, 2009; ARZHANOV et al., 2013).

    O IPCC utiliza em suas projeções uma gama variada de modelos climáticos

    globais. Estes produtos foram desenvolvidos por centros de pesquisas instalados em

    vários países do mundo. Entre os modelos mais utilizados estão o: HadCM3 (Hadley

    Center Coupled Model) produzido pelo centro de estudos com o mesmo nome,

    lotado na Inglaterra; o modelo CCSR/NIES (Centre for Climate System Research)

    desenvolvido pelo Centro de Pesquisas do Sistema Climático lotado no Japão; o

    modelo CCCMA desenvolvido pelo Canadian Centre for Climate Modelling and

    Analisys e o CCSM3 (Community Climate System Model 3) desenvolvido no Centro

    Nacional de Pesquisas Atmosféricas do Boulder, Estado do Colorado, Estados

    Unidos. Ambos bem empregados nos estudos referentes aos impactos das

    mudanças climáticas na produção agropecuária, no espaço urbano, na dinâmica

    biogeográfica, na ocorrência e projeções de tempestades e nos recursos hídricos

    (ABE-OUCHI, 1996; MARSHAL, BROOKS, KAROLYC, 2009; MEHROTRA, et. al.,

    2013).

    Quanto aos modelos em escala regional, a maioria são oriundos dos modelos

    de escala global como é o caso do modelo PRECIS (Providing Regional Climates for

  • 30

    Impacts Studies). Este modelo está entre os mais utilizados, visto que, seus dados

    são de fácil acesso, além, de uma série de adaptações realizadas por institutos de

    pesquisas em diversos países, os quais integram as realidades físicas-naturais

    locais na conFiguração do referido modelo (JONES, et al., 2004; DRUYAN et al.,

    2010; KUMAR & AGGARWA, 2013).

    3.3.3 Mudanças climáticas e os recursos hídricos globais

    O debate em torno da relação mudanças climáticas e recursos hídricos

    perpassa pela mesma dinâmica de discussão quanto as causas das mudanças

    climáticas globais. De um lado o grupo de pesquisadores que defendem que as

    constates taxas de aumento na temperatura do ar vem proporcionando reduções

    nas vazões de inúmeras bacias hidrográficas em escala mundial. Do outro lado o

    grupo de pesquisadores que defendem a baixa no alarmismo e, que as

    consequências das reduções das vazões são mais ligadas às dinâmicas de uso e

    coberturas das terras do que as mudanças climáticas (SANTOS, GALVÍNCIO &

    MOURA, 2010; USEPA, 2014).

    No contexto apresentado anteriormente a United States Environmental

    Protection Agency (USEPA, 2014) aponta que apesar de toda discussão em torno

    dos atuais usos dos recursos hídricos nos centros urbanos e rurais, assim como, as

    implicações voltadas para os usos das terras em torno dos mananciais hídricos não

    se pode negligenciar os impactos das mudanças climáticas sobre os recursos

    hídricos.

    Na escala global dezenas de estudos apontam para a participação das

    mudanças no clima nos últimos 100 anos na disponibilidade dos recursos hídricos.

    Na China, em levantamento realizado por Gao et al., (2012) precisamente na

    província de Anhui, os registros meteorológicos em uma série histórica superior a 50

    anos disponíveis em três estações de coleta indicaram aumento nas temperaturas

    do ar, assim como, aumento nas precipitações pluviométricas. Por outro lado, os

    autores destacam que há locais na China em que o processo ocorre de forma

    inversa, à temperatura tende a crescer e os quantitativos de chuvas diminuírem.

  • 31

    Em regiões opostas a desenvolvida no estudo de Gao et al., (2012) a situação

    é critica. No Leste Chinês informações fluviométricas registradas até o ano 2000

    apontaram para significativas reduções da disponibilidade hídrica superficial. Em

    vários reservatórios construídos para conter cheias, produções de energética e para

    reserva de água voltado ao consumo humano e industrial estão secando e tendo sua

    vazão artificial reduzida, a exemplo do Danjiangkou construído na bacia hidrográfica

    do rio Hanjiang. Na agricultura os reflexos são visíveis, partes dos agricultores

    chineses que são afetados pelas mudanças no clima apresentam dificuldades para

    futuras adaptações a esta nova realidade (CHEN, et al., 2007; LU, et al., 2013 &

    SJÖGERSTEN et al., 2013).

    No continente europeu a dinâmica é parecida. Nas bacias hidrográficas que

    desaguam no Mar Negro notam-se tímidos impactos referente à redução da

    precipitação na escala anual decorrentes dos impactos climáticos sobre as mesmas.

    A tendência é piorar diante dos cenários de mudanças climáticas com aumento da

    temperatura do ar e reduções das chuvas para os próximos anos ocasionando

    diminuições das vazões sobre o referido mar, reduzindo assim, a oferta hídrica

    destinada à agricultura irrigada. Na Espanha as projeções para os próximos 30 anos

    também requer alertas devido as possíveis reduções das vazões de suas bacias

    hidrográficas decorrente do aumento da temperatura e redução da precipitação a

    exemplo da bacia hidrográfica do rio Júcar (JAVIER FERRE, et al., 202).

    Nas regiões tropicais, incluída China discutida anteriomente, estudos com

    foco nas alterações climáticas apontam para reduções de vazões em várias bacias

    hidrográficas e aumentos em outras. Na bacia do Colorado, América do Norte

    (Estados Unidos e México), Dawadi e Ahmad (2012) analisaram a série história de

    1970 a 2000 e projetaram até 2035 com base em 16 modelos climáticos globais a

    vazão da referida área de estudo. Os resultados com base nas informações

    climáticas e fluviométricas observadas já indicavam redução das vazões provocadas

    por interferências humanos na dinâmica de uso das terras locais, assim como,

    impulsionado pelo aumento da evaporação e diminuição das chuvas. A tendência

    até 2035, nos cenários de mudanças climáticas B2, A1B e A2 é ampliar a diminuição

    da disponibilidade hídrica para as populações que dependem das águas desta

    bacia.

  • 32

    De acordo com Binder (2006) nas áreas que abrange as bacias hidrográficas

    do oeste da América do Norte, principalmente nos Estados Unidos, são visíveis os

    problemas de redução e aumento da precipitação pluviométrica nas últimas décadas

    de acordo com a sazonalidade das estações. Durante o inverno vem sendo

    registrados aumentos graduais dos totais de chuvas, por outro lado durante as

    primaveras o efeito ocorre de forma contrária, ou seja, redução pluviométrica. Para a

    bacia hidrográfica do rio Yazoo, no Mississipi, Estados Unidos, os problemas de

    redução das vazões atualmente estão correlacionadas ao uso das terras. Porém,

    levando em consideração apenas metade do que aponta o mais brando cenário de

    mudanças climáticas, nos próximos anos, com a redução das precipitações a

    situação pode se agravar ainda mais (KIM, PARAJULI & FILIP TO, 2013).

    Na América do Sul as observações feitas nos quantitativos das vazões das

    bacias hidrográficas são variáveis. Em bacias localizadas no sul do Brasil, a exemplo

    do rio Paraná nos últimos anos vem apresentando tendência de crescimento,

    auxiliado pelos aumentos das precipitações pluviométricas. Nas bacias de grandes

    dimensões como a do rio Amazonas e do rio São Francisco as tendências ainda não

    são tão significativas ao serem comparadas vazões com os totais pluviométricos e

    as médias das temperaturas do ar (MARENGO, 2009; SANTOS, GALVÍNCIO &

    MOURA, 2010).

    Na região Nordeste do Brasil, a qual possui grande parte de suas terras sobre

    o regime do clima semiárido e árido, levando em consideração a classificação

    climática de Thornthwaite e Mather (1955), a preocupação com o futuro da

    disponibilidade natural das águas nos reservatórios superficiais são notórias

    principalmente quando se discuti a dinâmica climática futura. Estudos apontam que

    em partes da citada região há evidentes tendências de aumento das precipitações

    pluviométricas devido ao deslocamento decadenal da Zona de Convergência

    Intertropical (ZCIT) além de outros fatores. Porém, as projeções climáticas para

    região não são otimistas, as quais indicam o aumento da aridez e

    consequentemente, reduções das vazões de várias bacias hidrográficas

    (MARENGO, 2009; MARENGO, TOMASSELI & NOBRE, 2010).

    Analisando isoladamente algumas bacias hidrográficas estudos desenvolvidos

    no Estado do Ceará e na bacia hidrográfica do Pajeú apontaram para redução das

    chuvas mensais nas últimas décadas, o que consequentemente, proporciona a

  • 33

    redução das vazões das áreas de estudos destacadas. Há também, trabalhos, os

    quais não foram possíveis observarem reduções ou aumento das vazões

    decorrentes das dinâmicas climáticas atuais, é o caso da bacia hidrográfica do rio

    Goiana no nordeste do Estado de Pernambuco (MONCUNILL, 2009; SANTOS;

    2010; FECHINE 2012).

    No continente africano as disponibilidades hídricas vêm cada vez mais

    chamando atenção dos poderes públicos locais. Nos países localizados no sul do

    citado continente as vazões vêm sendo reduzidas tendo como um dos fatores o

    aumento das temperaturas e abaixamentos das chuvas. Na República de Camarões

    regiões já sofrem com a ampliação dos racionamentos de água no centros urbanos

    e a produção agrícola, também, reflete a queda na disponibilidade de água para

    agricultura irrigada e semi-irrigada. Os impactos sociais nas áreas de saúde,

    gerenciamento urbano também são atrelados à saída das populações das áreas

    rurais em direção aos grandes centros (TINGEM et al., 2008; KUSANGAYA et al.,

    2014).

    Estudo desenvolvido por Tshimanga e Hughes (2012) em uma sub-bacia

    hidrográfica da bacia do Congo indica que as reduções das vazões detectadas nos

    últimos anos estão mais atreladas a outros fatores do que as mudanças climáticas.

    Porém, ao projetar para as próximas décadas a dinâmica mensal e anual das

    vazões na referida sub-bacia os tendem a preocupar. Mesmo com o aumento da

    precipitação pluviométrica indicada nos cenários de mudanças climáticas para a

    região não significará aumento nas vazões. Isto porque, a temperatura projetada

    tende a subir ampliando a evapotranspiração. Este diagnóstico não é particular a

    área de estudo. Segundo os pesquisadores outras áreas que vem registrando

    aumento na precipitação pluviométrica vem sofrendo com a ampliação da

    temperatura do ar.

    Diante do apresentado observa-se que existem áreas com redução das

    precipitações e outras com aumento ou estabilidade deste elemento climático.

    Porém, os estudos apontam acréscimos na temperatura do ar, o que já compromete,

    em alguns casos as vazões. Para as projeções futuras observa-se que a dinâmica

    permanece, porém, com estragos maiores.

    3.4 Índices de disponibilidade hídrica

  • 34

    Com o advento das discussões referentes às degradações dos recursos

    hídricos em meados do século passado foram desenvolvidos e/ou aperfeiçoados

    índices que apontam os graus da disponibilidade hídrica de determinada região.

    Para Maranhão (2007) os mais variados índices de disponibilidade hídrica podem

    ser uma importante ferramenta que atua como indicadores da realidade hídrica de

    determinadas regiões favorecendo intervenções políticas e científicas em favor de

    um uso racional e conversacional dos recursos hídricos.

    Os indicadores utilizados para aferir os graus de disponibilidade hídrica são

    essenciais para traçar um diagnóstico dos mais variados níveis relacionados à

    escassez e a abundância dos recursos hídricos tendo como principal variante as

    vazões dos rios atrelada à retirada de água para o consumo humano e demais

    utilidades. Atualmente, muitos estudos não se limitam aos cálculos relacionados à

    disponibilidade, acrescentando, também, parâmetros como: qualidade das águas;

    impactos ambientais no ambiente aquático, entre outros (LAWRENCE et al., 2002;

    PÉREZ-BRANCO & GÓMEZ, 2012).

    Um dos índices mais utilizados é o indicador de Falkenmark. Desenvolvido e

    difundido no ano de 1989, este índice trabalha diante do quantitativo de água

    disponível por indivíduo populacional de um determinado local. Ou seja, com base

    na vazão de uma bacia hidrográfica divide-se este quantitativo pelo número de

    habitantes da mesma ou de área administrativas menores que somadas

    representam toda bacia. A partir deste indicador outros foram sendo desenvolvidos

    levando em consideração as justificativas de seus formuladores (FALKENMARK,

    1989; BROWN & MATLOK, 2011).

    Aplicando o índice de Falkenmark (1989) uma região sem estresse hídrico

    apresenta valores menores que 1700m³ per capita. Valores entre 1700 a 1000m³ per

    capita classificam as áreas sobre estresse hídrico. O grau de escassez hídrico

    compreende os valores entre 1000 a 500m³ e as áreas com alto estresse hídrico

    apresentam valores inferiores a 500m³ per capita.

    As reflexões frente ao indicador de Falkenmark apontam os pontos

    preponderantes e que precisam de ajustes futuros da referida proposta. Como

    pontos positivos destacam-se a praticidade da aplicação matemática, a qual não

    requer expressivas quantidades de informações para modelação dos dados. Por

  • 35

    outro lado, devido a sua simplicidade, o uso das médias pluviométricas na escala

    anual mascara as analises sazonais das chuvas no decorrer de 12 meses. Outra

    crítica feita ao modelo de Falkenmark é o não uso de variáveis sociais. Porém, o

    indicador em sua base de formulação foi pensado para obter a distribuição per

    capita de água para grupos populacionais organizados em províncias, regiões,

    municípios, países entre outras organizações (RIJSBERMAN, 2005; VOROSMARTY

    et al., 2005; JUWANA, MUTTIL & PERERA, 2012).

    Atualmente, o índice de Falkenmark vem sendo adotado, com algumas

    adaptações, por várias agências governamentais incumbidas no planejamento e a

    gestão dos recursos hídricos. Um dos exemplos a serem citados corresponde a

    European Environment Agency (EEM, 2011), a qual publicou um mapeamento

    indicando os graus de estresses hídrico de toda Europa corresponde ao anos de

    1971 a 2000 e, projetou dentro do cenário de mudanças climáticas A2, o estresse

    hídrico para os próximos 60 anos.

    Outro indicador que deve ser destacado é o Índice de escassez de água de

    Gleick (1996). Este foi formulado visando obter os graus da disponibilidade de água

    para os usos básicos de grupos populacionais de determinadas regiões. Os usos

    básicos listados são: higiene humana; serviços de saneamentos; preparação de

    alimentos, entre outros. Para atingir o mínimo dos usos básicos, de acordo com a

    proposta do índice de Gleick são necessários no mínimo 50 litros de água por

    pessoa por dia. Este valor é aceito por várias organizações mundiais que discutem

    sobre os problemas socioambientais decorrentes da escassez de água planetária.

    Sua base é o índice de Falkenmark (GLEICK, 1996; GLEICK, 1998).

    Pensando em uma correlação social diante do quantitativo hídrico foi

    desenvolvido por Ohlsson (2000) o Índice Social de Estresses Hídrico. Este

    indicador tem sua base no índice de disponibilidade hídrica de Falkenmark (1989). O

    diferencial pensado por Ohlsson (2000) diante do índice de Falkenmark (1989) é o

    uso da capacidade dos grupos populacionais em lidarem com os indicadores

    negativos da disponibilidade hídrica. Para isto, usa-se o IDH (Índice de

    Desenvolvimento Humano) como medida ponderada.

    3.4.1 Mudanças climáticas e a disponibilidade hídrica

  • 36

    A disponibilidade hídrica para os mais variados fins torna-se tema de extrema

    preocupação para o planejamento e o gerenciamento dos recursos hídricos no

    âmbito internacional. Isto porque, a demanda pelo uso da água cresceu e tende a

    aumentar nas próximas décadas segundo a FAO (2013). Consequentemente, a

    ciência com auxílio dos setores de planejamento e gerenciamento dos recursos

    hídricos pensam e desenvolvem mecanismos técnicos para compreender o que vem

    ocasionando a crescente demanda, os conflitos pelos usos múltiplos da água e a

    elaboração de mecanismo que busquem facilitar a distribuição equitária dos

    recursos hídricos entre os setores usuários.

    Para Rocha et al., (2013) o desenvolvimento de métodos e técnicas que

    auxiliem na identificação de áreas prioritárias para atuações de conservação dos

    recursos hídricos torna-se importante dada situação crítica da disponibilidade de

    água no contexto atual mundial.

    Para conhecer o ambiente hídrico, atualmente, há no seio científico uma série

    de base estruturais, tanto do ponto de vista teórico, quanto metodológico. Uma delas

    está atrelada as mudanças climáticas globais, pauta de discursão, principalmente,

    quando se planeja executar o gerenciamento dos recursos hídricos.

    No Brasil, assim como, vários países da América Latina, o crescimento das

    cidades vem proporcionando conflitos pelos usos das águas. No México, Perú,

    Jamaica, Bolívia a crescente demanda ligada ao crescimento populacional e

    econômico proporcionaram aumentos dos conflitos nos últimos 20 anos entre os

    setores agrícolas, industrial e os usuários urbanos. Situação que tende a se agravar

    com os atuais cenários de mudanças climáticas (FAO, 2013).

    No Brasil, a circunstância não é diferente e se percebe a situação agravante

    quando ocorre um olhar apurado sobre a região Nordeste. Em cidades como Recife,

    Fortaleza já é visível às políticas de racionamento de água, as quais, segundo dados

    da Brasil (2013) atingem também cidades de médio e pequeno porte, tanto na região

    semiárida quanto na área de clima subúmido e úmido. Para Marengo (2009) os

    cenários de mudanças climáticas tende a ampliar a crise hídrica em várias regiões

    do Brasil, e desenvolver crises em regiões que ainda não experimentaram.

  • 37

    3.5 Vulnerabilidade (conceitos e diretrizes)

    3.5.1 Vulnerabilidade socioambiental

    O conceito de vulnerabilidade requer cuidados quando utilizado. Azevedo

    (2010) destaca que o perigo está no caráter multidimensional e polissêmico que o

    conceito possui. Polissemia que varia de acordo com as diferentes abordagens que

    ele é utilizado no campo científico. Almeida (2010) aponta que a dificuldade em se

    obter um conceito único deve-se ao caráter multidimensional e diferencial, ou seja, a

    vulnerabilidade varia através do espaço físico e entre e dentro de grupos sociais,

    depende também da escala espacial e temporal adotada nos estudos, assim como,

    a dinâmica envolvida com as características e forças motrizes da vulnerabilidade, as

    quais mudam a todo tempo.

    Ao propor uma conceituação multidisciplinar frente ao termo vulnerabilidade,

    Marandola Júnior e Hogan (2006) e Hogan e Maradola Junior (2007), destacaram

    que foi a partir da década de 1990 que o conceito de vulnerabilidade ganha

    destaque no seio científico. Esse marco acontece quando se verifica que os estudos

    que enfocavam os perigos naturais não abordavam os processos sociais envolvidos

    antes e depois dos eventos extremos (enchentes, deslizamentos de terras, furacões,

    entre outros), ou seja, os aspectos sociais e culturais das comunidades envolvidas

    não eram efetivamente mencionados nos estudos. Com o surgimento do conceito de

    vulnerabilidade os trabalhos envolvendo os perigos naturais passaram a abranger os

    aspectos sociais das populações, não se limitando as discussões das características

    físicas do ambiente e dos fenômenos.

    Anteriormente, as ideias reinantes nos estudos que envolviam impactos

    climáticos, hidrológicos, entre outros, eram o de risco ou perigo natural. Conforme

    destaca Azevedo (2010), a partir, da Segunda Guerra Mundial foram ampliados

    estudos sobre riscos naturais, com destaque para os riscos climáticos e hidrológicos.

    Nestes estudos o foco principal era identificar as regiões com maiores e menores

    riscos de ocorrência de determinados fenômenos. Trabalhos que contribuíram para

    ampliar o leque de conhecimentos que se tem atualmente sobre mudanças

    climáticas, impactos hídricos, movimentações de massas, entre outros. Porém, como

  • 38

    destacam Marandola Júnior e Hogan (2006) se há presença de riscos é porque há

    mecanismos internos (locais) que filtram os impactos e seus graus de atuação até

    que eles atinjam os indivíduos e famílias.

    O que os autores citados anteriormente apresentam é que os impactos de

    determinado risco natural vai refletir diferentemente entre as populações de um

    determinado local. A diferença estará no potencial que estes grupos terão para lidar

    com os problemas, assim como, o potencial de adaptação temporal ao mesmo. Ou

    seja, a ideia unicamente, de se trabalhar com os riscos naturais não debruça sobre

    as reais condições dos diferentes reflexos ocasionados pelos eventos extremos ou

    de mudança no comportamento físico-natural dos geoambientes. Daí, a importância

    de incluir os padrões e condicionantes sociais nos estudos de riscos, os quais

    passariam a ser classificados como estudos de vulnerabilidade socioambiental.

    Para reforçar o debate anterior Mendonça (2004) destaca que ao estudar a

    vulnerabilidade socioambiental não pode deixar de lado a importância das

    manifestações bruscas da natureza (natural hazards), porém, sozinhos elas não

    respondem quando se aborda um ambiente cada vez mais antropizado e cada dia

    mais dinâmico e marcado pelos conflitos sociais, sendo necessária a inclusão das

    análises socioeconômicas, culturais e políticas da população envolvida aos riscos

    estudados.

    Moser (1998) enfatiza que a vulnerabilidade pode ser conceituada e

    trabalhada sobre a luz de três fatores interligados entre si. Destaca-se a exposição

    que o grupo social está em relação ao risco ambiental, a incapacidade de reagir

    frente ao risco apresentado e, por último os entraves que o grupo possui para se

    adaptar a nova realidade apresenta pela concretização do risco.

    Neste contexto, a vulnerabilidade socioambiental pode ser entendida como a

    exposição física de um determinado grupo social a um perigo de ordem

    socioambiental e a capacidade deste grupo em se preparar e recuperar-se dos

    impactos negativos produzidos (CONFALONIERI, 2003; ALMEIDA, 2010). No caso

    do estudo aqui apresentado os grupos sociais correspondem às populações de cada

    município inserido na bacia hidrográfica. O perigo de ordem socioambiental, o qual

    neste estudo será denominado de perigo hidrológico, é a disponibilidade de água na

    bacia, enquanto que, os impactos negativos são todos aqueles decorrentes das

    reduções das vazões.

  • 39

    4 MATERIAIS E MÉTODOS

    4.1 Localização e caracterização da área de estudo

    A bacia hidrográfica do rio Una está localizada entre as coordenadas de

    36°42'10" e 35°7'59" de longitude oeste e a 8°17'13" e 8°53'56" de latitude sul

    (Figura 1). Mais de 80% de sua área está no território do estado de Pernambuco e o

    restante no estado de Alagoas. O contingente populacional que habita a bacia

    ultrapassa 250 mil habitantes segundo dados do IBGE (2010). Quanto ao total de

    municípios do estado de Pernambuco, os quais possuem seus territórios

    administrativos dentro do limite da bacia hidrográfica, somam 42.

    Figura 1: Localização da bacia hidrográfica do rio Una - Estado de Pernambuco - Brasil

    Fonte: Autor, 2015.

    Esta unidade ambiental faz parte de duas mesorregiões do estado de

    Pernambuco, são elas: as mesorregiões do Agreste e Mata Pernambucana. De

    acordo com Pernambuco (2014) a bacia hidrográfica do rio Una faz divisa com as

  • 40

    bacias dos rios Ipojuca e Ipanema na sua porção Oeste, rio Mandaú na porção sul,

    ao norte com as bacias dos rios Ipojuca e Sirinhaém.

    Sua nascente está localizada no município de Capoeiras tendo seu curso de

    escoamento no sentido oeste-leste desaguando no Oceano Atlântico e sendo

    caracterizada como uma bacia hidrográfica exorréica, ou seja, aquela que segundo

    Christofolleti (1993) desaguam nos mares e oceanos.

    4.2 Caracterização física

    4.2.1 Tipologia climática

    Quanto às características climáticas vale destacar que sobre a bacia

    hidrográfica do rio Una assentam-se quatro tipologias climáticas. O clima úmido na

    porção leste, região litorânea, e seguindo para o sentido oeste encontram-se os

    climas úmido-subúmido e seco subúmido no extremo oeste (LACERDA, FERREIRA

    & SOUZA, 2006).

    Quanto à distribuição da precipitação pluviométrica, os meses de março a

    agosto são os que concentram os maiores quantitativos de chuvas na bacia (Figura

    2). Em relação à temperatura média mensal do ar a distribuição obedece à direção

    geográfica da bacia. Temperatura médias maiores na sua porção leste sobre os

    climas úmidos e úmidos-subúmidos e menores na região oeste sobre os climas

    secos subúmidos (Figura 3).

    Figura 2: Média mensal dos totais pluviométricos sobre a bacia hidrográfica do rio

    Una, localizada no Estado de Pernambuco

  • 41

    Fonte: autor, 2015.

    Figura 3: Distribuição espacial da temperatura média anual do ar na bacia

    hidrográfica do rio Una, localizada no Estado de Pernambuco

    Fonte: autor, 2015 (base cartográfica: SRH, 2012).

    4.2.2. Geomorfologia, Geologia e Pedologia

    Quanto às características do modelado físico a bacia hidrográfica em estudo

    possui uma variada estrutura geomorfológica indo desde as áreas mais elevadas na

    sua região oeste às áreas de planície no litoral (Figura 4). As porções mais altas, as

    0

    20

    40

    60

    80

    100

    120

    140

    JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ

    Pre

    cip

    itaç

    ão P

    livio

    tica

    (m

    m)

    meses

  • 42

    quais chegam a 700m estão concentradas no Pediplano Central do Planalto da

    Borborema oeste da bacia, já a porção da bacia com altitudes em torno e menores

    que 100m correspondem aos Planaltos Rebaixados Litorâneos. Em relação à

    Encosta Oriental do Planalto da Borborema este apresentam altitudes transitórias

    entre 100 a 700 m (JATOBÁ, 2006).

    Figura 4: Distribuição espacial das Unidades geomorfológicas da bacia hidrográfica do rio

    Una, localizada no Estado de Pernambuco

    Fonte: Autor, 2015 (adaptado do ZAPE, 2006)

    Quanto às características geológicas, a bacia está assentada sobre rochas

    cristalinas datadas do Pré-Cambriano. Segundo a CONDEPE/FIDEM (2008) parte

    da área da bacia é composta pelo complexo Migmatitico-Granitoide com presença e

    quantidade semelhante de granitos e migmatitos.

    Em relação à pedologia, importante fator a ser empregado no modelamento

    hidrológico, a bacia hidrográfica do rio Una possui em sua unidade ambiental, 8

    classes de solos.

    A Figura 5 apresenta a distribuição das classes de solos na bacia