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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE EDUCAÇÃO DOUTORADO EM EDUCAÇÃO
SARA MARTHA DICK
AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ENSINO SECUNDÁRIO NA BAHIA
O LICEU PROVINCIAL
1860-1890
SALVADOR
2001
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SARA MARTHA DICK
AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ENSINO SECUNDÁRIO NA BAHIA
LICEU PROVINCIAL 1860 - 1890
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia , como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Educação.
ORIENTADOR : Prof. Dr. EDIVALDO MACHADO BOAVENTURA.
Salvador 2001
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Biblioteca Anísio Teixeira – Faculdade de Educação - UFBA D547 Dick, Sara Martha
As políticas públicas para o ensino secundário na Bahia: o Liceu Provincial : 1860-1890 / Sara Martha
Dick. Salvador: S.M.Dick, 2001. .... f.
Orientador: Edvaldo M. Boaventura Tese (doutorado) – Universidade Federal da Bahia 1. História da educação - Bahia. 2. Ensino secundário - 1860-1890. 3. Políticas públicas.4. Liceu Provincial da Bahia. I. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educação. II. Título. CDD – 370.981 CDU -
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COMPOSIÇÃO DA BANCA:
Prof.Dr. Edivaldo Machado Boaventura – Orientador
Prof.Dr. LUis Henrique Dias Tavares
Profª.Drª Marli Geralda Teixeira
Prof. Luis Felippe Perret Serpa
Profª Jacy Mesezes
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Pra as duas pessoas que mais amo.
Paulo, companheiro e amigo de todos momentos e Helena, filha querida, que ilumina e alegra nossas vidas. Em memória a meus pais, que lutaram para minha formação. A meus irmãos, sempre presentes, mesmo distantes no espaço.
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AGRADECIMENTOS
Este trabalho é produto de um conjunto de forças e estímulos para que as
barreiras encontradas no percurso fossem ultrapassadas e superadas até a
sua conclusão.
Em especial, meu agradecimento e admiração ao Professor Edivaldo
Machado Boaventura, orientador do trabalho , que com sua disponibilidade
no atendimento , incentivou, , acompanhou e apontou para os caminhos
possíveis a serem trilhados, não medindo esforços para a conclusão da
pesquisa.
Aos professores do Programa de Pós-graduação , particularmente no
desenvolvimento da atividade Projeto de Tese , que participaram auxiliando
nas discussões em diversos momentos da produção , contribuindo também
para o entendimento deste processo de conhecimento.
Para as estagiárias, à época alunas, Adriana Costa e Vera Lúcia
Genipapeiro da Silva, meu reconhecimento pela aplicação com que
ajudaram na coleta dos dados e nas discussões decorrentes de tais leituras.
Aos colegas do Departamento de Educação I da Faculdade de Educação da
Universidade Federal da Bahia , pela compreensão durante o período de
elaboração desta tese.
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Em especial a amizade da Professora Antonia Caló , compreendendo e
comentando os diversos momentos da elaboração do trabalho; a Professora
Dora Leal Rosa pelos esclarecimentos , sempre pertinentes , aos procedimentos
para a composição do texto ; a Professora Izabel Maria Villela Costa , que se
dispôs gentilmente a ler a primeira versão desta tese, com valiosas
contribuições.
Muitos foram os funcionários de Instituições que colaboraram decisivamente na
coleta dos dados . A todos do Arquivo Público do Estado da Bahia , que sempre
gentis cooperaram para que a coleta de dados fosse realizada . Particularmente
a todos do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, onde os mais raros e
valiosos documentos puderam ser localizados , sempre com presteza e
simpatia.
Por fim, mas não menos importante , a valiosa contribuição da Professora Dilza
Atta que desde o Mestrado contribuiu com doação de material importante para o
desenvolvimento do trabalho, além de efetuar a revisão do presente texto.
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“Só existirá democracia no Brasil no dia em que se montar no país
a máquina que prepara as democracias. Essa máquina é a escola pública.”
Anísio Teixeira
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SUMÁRIO I. Introdução 15 1. O Tema - problema 2. Justificativa 3. Objetivos 4. Organização do Trabalho II. Fundamentos Teóricos Metodológicos 30 1 - A Concepção de História 2 - A Análise Histórica 3 - Procedimentos Metodológicos
III. Tentativa de sistematização da Educação Baiana :
O Regulamento Orgânico 67 1. Condições Históricas do período
2. O ensino secundário em discussão e o Regulamento Orgânico 3. Críticas ao Regulamento e o ensino particular 4. Divergências na Condução das políticas e nova reforma
IV. A desagregação do Império e as conseqüências para o ensino secundário baiano 91 1. Reforma de 1870 – Críticas ao Regulamento Orgânico 2. Características da Reforma 3. A Reforma de 1870 e os Exames Preparatórios 4. A preparação e Reforma de 1873 5. O funcionamento de escolas particulares na Reforma de 1873 6. O caráter centralizador do Regulamento de 1875 7. Primeira Conferência Pedagógica Baiana 8. Principais temas para os mesmos problemas
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V. O final do Império e o ensino secundário baiano 158
1. Características gerais do período 2. Reforma Leôncio Carvalho - influências na província 3. Novo Regulamento do Ensino – 1881 4. Ensino público, gratuito e obrigatório e a fuga para o ensino
particular 5. O Liceu , o ensino profissional e o ensino feminino 6. A inconstância política , dificuldades financeiras e o ensino
secundário 7. Exames preparatórios na província 8. A legislação de 1888 e a Instrução pública
9. Reforma de 1890: entra em cena o Instituto Official de Ensino
Secundário
VI. Considerações Finais 229 Anexos 250 Fontes Impressas 267
Referências Bibliográficas 268
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RESUMO
Este trabalho visa estudar o desenvolvimento das políticas publicas para o
ensino secundário durante o século XIX , na Província Bahia, compreendendo
as três últimas décadas do Império , tendo como referencial as ações
empreendidas no Liceu Provincial da Bahia , que até o período Republicano ,
foi a única instituição para esta modalidade de ensino.
O marco inicial da pesquisa foi o Regulamento Orgânico de 1860 , disciplinado
em 1862, a primeira tentativa de organização do ensino secundário baiano. O
período é considerado como aquele em que o Estado brasileiro está em
processo de consolidação, o que explicaria as iniciativas em relação a
políticas publicas para o ensino secundário na província.
A partir da referência do Regulamento Orgânico de 1860/1862, passamos a
compreender o estudo em três momentos, sendo o primeiro relativo aos anos
60, que consideramos como período de tentativa de sistematização das
políticas públicas para o ensino secundário baiano. O segundo momento ,
relativo ao início do período considerado como de desagregação do Estado
Monárquico e, para o ensino secundário implicando em sucessivas reformas,
que antes mesmo de implantadas já eram substituídas, tendo em vista a
instabilidade política , provocando a mudança constante dos dirigentes da
província. O terceiro momento , diz respeito aos anos finais do império, com as
inquietações próprias do período como a abolição da escravatura, o ensino
público, gratuito, obrigatório e misto , que interferiram diretamente na
condução das políticas para o ensino na província.
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A análise partiu basicamente de fontes primárias, obtidas a partir das Falas
dos presidentes da província, dos Relatórios de Diretores do Liceu Provincial e
Diretor Geral de Estudos.
Analisando políticas públicas para o ensino secundário na Bahia do século
XIX , tendo como expressão de tais ações públicas o Liceu Provincial ,
consideramos como envolvendo a própria consolidação do Estado brasileiro
na segunda metade do século , sua política para a educação e as posições
assumidas pela Bahia, assim como o processo de desagregação da
Monarquia. Entretanto , ao buscar no Liceu Provincial, em Salvador, a
expressão destas políticas , não assumimos a postura de uma análise da
história daquele estabelecimento de ensino , mas sim, a compreensão de
como tais políticas se evidenciaram na prática , combinando a discussão de
caminhos metodológicos à concepção de História adotada como processual ,
dinâmica em constante movimento.
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ABSTRAT
This paper aims to present an extensive study on the public procedures
development of High Schools, during the 19th Century in the "Provincia da
Bahia" (Bahia's County). Our research will particularly focus on the "Liceu
Provincial da Bahia", covering the activities and measures of this institution
over the last three decades of the Empire, taking in account that this was the
first and only organization for that sort of teaching, that took place until the
Republican period.
This study grants special attention to the educational reform of 1860, (actually
taken in effect in 1862), as the first action to organize the teaching system for
High Schools in Bahia. We should bear in mind, that during this period, Brazil
was facing a consolidation process in several other internal political matters,
which were later responsible for the High Schools public procedures
improvements. Starting with the Educational Reform of 1860/1862, the
research was divided in three different periods of time: The first one being the
60's, that we consider as the one in which several actions were taken in order
to organize the teaching system in Bahia; the second relates to the "falling
apart" of the Monarchy regime, when several reforms were intended for the
teaching methods, but none were actually effected, due to the political
instability and the continuous changing of the authorities in the county, and
finally, the third as being the last years of the Empire involving all the changes
and typical issues that concerned that particular time, such as the slavery
abolition, the right to have a good and free educational system for all society,
the policies of mandatory class attendance in mixed schools (male and
female), that definitely had a great impact on how those teaching policies
were conducted.
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The research used basically primary sources of information, such as
speeches of the County's Presidents, reports from the Principals of the "Liceu
Provincial" and from the Education General Director.
Analyzing public policies for the high school system in the 19th century in
Bahia, mainly through the "Liceu Provincial" as our main source, we took into
consideration the consolidation process of the Brazilian State in the second
half of the century, its Educational policies, as well as, the "falling apart"
process of the Monarchy. Nevertheless, in choosing the "Liceu Provincial" in
Salvador as the expression of those educational policies, we were not
interested in the history of that particular institution, but in understanding how
those educational ideas were brought into reality, discussing methodological
ways along with the concept of History as a dynamic process in continuous
movement.
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I - INTRODUÇÃO Esta pesquisa busca o estudo das políticas públicas para o ensino
secundário na Bahia. O interesse pelo tema desenvolveu-se a partir do
estudo realizado durante a elaboração da Dissertação de Mestrado, que
analisou a origem dessas políticas formuladas no século XIX.
O tema passou a representar um desafio maior , ao constatarmos a imensa
lacuna existente , tanto na História da Educação brasileira como, em
particular, na História da Educação baiana , quanto aos estudos do século
XIX.
Para o ensino secundário, esse estudo é fundamental, pois foi no século XIX
que as políticas públicas tiveram origem e se desenvolveram.
Decidimos, assim, enfrentar o desafio para tentar deslindar as condições em
que tais políticas foram geradas.
Cabe destacar que a grande questão colocada durante todo o Império (e,
quiçá, contemporaneamente), era o que se pretendia com tal ensino:
profissionalizar ou preparar para o ensino superior?
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1 - O TEMA - PROBLEMA
A origem das políticas públicas para o ensino secundário na Bahia, já
trabalhadas em pesquisa anterior, está inserida em um processo conturbado
do ponto de vista político, econômico e social, durante o período regencial.
Assim, está imersa no processo de formação do Estado brasileiro, carregado
de características que se agravam com a crise econômica, as tensões
sociais e revoltas do período, sempre em um clima de instabilidade política e
econômica, fome, miséria e epidemias como a febre amarela e o cólera.
No curso desse processo de análise, de que resultou a elaboração da
Dissertação de Mestrado, podemos distinguir duas fases distintas, a seguir
caracterizadas.
A fase inicial corresponde à primeira metade do século XIX, sendo aquela
em que as tensões sociais são aguçadas, em decorrência da crise
econômica, além da agitação social própria do processo de formação do
Estado brasileiro.
Nesse primeiro momento, encontramos as elites dominantes divididas entre
brasileiros e portugueses. Por outro lado, estas mesmas elites opõem-se às
camadas dominadas. Durante todo esse período, em que , inclusive, nos
deparamos com a instalação do Liceu Provincial da Bahia em 1836, o
ensino secundário encontrava-se desorganizado, podendo ser considerada
essa fase como a da origem das políticas públicas para o ensino
secundário.
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O Liceu Provincial, que foi instituído para reunir as chamadas cadeiras
maiores, dispersas por toda a província, centralizando,assim, em uma
única instituição, o ensino secundário, não chegou a atingir esse objetivo.
Não só continuaram existindo as cadeiras isoladas, assim como o aluno
poderia matricular-se por disciplina, estando desobrigado de cursar as 13
cadeiras oferecidas.
O momento seguinte corresponde à parte da segunda metade do século,
mais precisamente entre os anos 50 e 60. Então, os problemas econômicos
não foram resolvidos, pelo contrário, até se agravaram, mas com uma
recomposição das camadas dominantes, que passaram a exercer uma
repressão maior contra os movimentos populares, ocasionando uma redução
das revoltas, sem que, no entanto, desaparecessem os conflitos.
Esse período expressa uma maior sistematização da política pública para o
ensino secundário – ou, pelo menos, uma tentativa de sistematização,
resultando no primeiro Regulamento Orgânico para o ensino, editado em
1860 , porém disciplinado em 1862.
No ensino secundário, a expressão de tal situação foi o esvaziamento do
Liceu com a fuga dos alunos para o ensino particular, que credenciava para
o ingresso às Academias, o que não ocorria com os estudos no Liceu.
Durante essa fase, as discussões presentes nas Falas presidenciais e
Relatórios sobre a instrução pública dão conta de preocupações como
centralizar ou descentralizar a administração do ensino, com vitória das idéias
centralizadoras e a criação do cargo de Diretor Geral de Estudos, que
substituiu o Conselho de Instrução Pública existente anteriormente; ensino
público gratuito ou ensino pago, para “selecionar mais o tipo de pessoas a
freqüentarem o Liceu”; ensino propedêutico ou um ensino “mais prático”
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como preparação para a vida e, até mesmo , idéias que já pregavam a
necessidade de nacionalização do ensino.
Em relação ao Liceu Provincial, podemos dizer que, segundo seus objetivos,
deveria conferir um ensino secundário, até certo ponto terminal, isto é,
habilitando as camadas intermediárias a ingressarem diretamente no
mercado de trabalho, na maioria das vezes, em funções públicas, Todavia,
acabava sendo um curso pretensamente preparatório para o ensino superior,
sem, no entanto, habilitar para o seu ingresso. Nessa contradição,
percebemos que o Liceu Provincial , procurando ter um curso para
profissionalizar, a fim de atender à formação de uma burocracia estatal, tem
um currículo propedêutico, não conseguindo ser nem uma coisa nem outra.
Daí o porquê da fuga de matrículas para o ensino particular, que era
claramente propedêutico e habilitava para o ingresso no ensino superior,
enquanto o Liceu sequer conseguia que seus poucos alunos fossem
absorvidos pelo mercado de trabalho.
Ao continuarmos nossa pesquisa, agora complementando e analisando os
dados referentes às décadas de 60 a 90, do século XIX, podemos distinguir
uma terceira fase para o estudo das políticas públicas para o ensino
secundário na Bahia.
Assim, passamos a considerar essa terceira fase correspondente às
décadas finais do Império , abrangendo os anos 60 a 90 – esse último já
republicano, persistindo os problemas políticos e agravando-se a crise
econômica no Nordeste. Do ponto de vista educacional, essa situação se
expressa nas diversas reformas educacionais e na proliferação das escolas
particulares.
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A partir do Regulamento Orgânico de 1860/62 até a Reforma de 1870 , as
discussões sobre o ensino secundário na Bahia continuam sendo em torno de
questões como : a evasão para o ensino particular, incrementada com a
criação e afirmação de escolas particulares de peso como o Ginásio Baiano -
dirigido pelo ex-Diretor Geral de Estudos Abílio César Borges; as possíveis
distorções da Reforma de 1860 e a necessidade de reformular o ensino na
Província; a permanência do não credenciamento dos alunos do Liceu ao
ingresso nas Academias e a importância de serem realizados e aceitos os
exames preparatórios na província baiana; e até a proposta de extinção do
Liceu Provincial da Bahia.
Os anos de 1860 a 1870 indicam, também, a derrocada do Império,
marcada por uma instabilidade política e econômica, sobretudo em relação
ao Nordeste, considerado por Kátia Mattoso como o período da
desagregação da Monarquia. Na educação baiana dos anos 60, há uma
tênue tentativa de sistematização, com o Regulamento Orgânico de 1860/62,
mas que não foi concretizada na prática.
Na década de 70, intensificou-se o deslocamento do eixo econômico do
Nordeste açucareiro decadente para o Centro-Sul cafeicultor, promissor com
certo surto industrial. Subjacentemente , estão os enfrentamentos à questão
da escravidão e à introdução da mão- de - obra imigrante na lavoura cafeeira
no Centro - Sul do país; as “novas” tendências políticas, com destaque para
o positivismo de Comte e as idéias republicanas, representadas pelo
movimento político de Itú.
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Durante esse período, afirmam-se as influências das idéias importadas
como o liberalismo , do qual o Manifesto Liberal de 1868 é uma expressão e
cuja crença básica residia no sentido de elevar o Brasil às transformações
que vinham ocorrendo, principalmente na Europa , no final do século XIX , ou
mesmo a criação do Partido Republicano em 1870. Tal postura implicou na
proposta de reformas das instituições existentes, em todos os sentidos,
sempre a partir de modelos importados e não com base na realidade
brasileira.
Essa ebulição política e econômica era expressa na educação brasileira,
através de uma série de reformas ocorridas fundamentalmente a partir da
Côrte (como a reforma de Leôncio Carvalho), com repercussão em todo o
país, indicando a nova face que ia assumindo, aos poucos, o Estado
brasileiro, com imensas disparidades regionais.
Para a educação baiana, especialmente no que diz respeito às políticas
públicas para o ensino secundário, tal situação se expressava nas propostas
de reforma do ensino que, efetivamente, passaram a ocorrer a partir de
1870, seguida de reformulações e regulamentações em 1873 , 1875 e
1881 , até a Reforma de 1890 , já no Brasil Republicano.
Podemos considerar esse período como uma terceira fase para a
compreensão das políticas públicas para o ensino secundário na Bahia do
século XIX que, a partir do advento da República. assumiu características
específicas.
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De tais características, uma, que deve ser destacada dos levantamentos
realizados , diz respeito ao fato de que, tanto a Reforma de 1860 quanto a de
1870 passaram a ser discutidas e criticadas mesmo antes que os seus
dispositivos fossem aplicados ou até mesmo regulamentados , sendo
superados no tempo. No entanto, apesar de incompletas na sua aplicação,
buscaram-se novas reformulações, implicando em uma instabilidade de
ações, dificultando qualquer análise sobre seus resultados.
Pretendemos, assim, através desta pesquisa, aprofundar os estudos
para melhor compreensão das políticas públicas para o ensino secundário
na Bahia, durante o Império, acrescentando às duas fases já analisadas
na dissertação de Mestrado, uma terceira fase que, acreditamos, compõe
a periodização da história da educação na Bahia, aprofundando a
concepção teórica de uma análise que possa contribuir para a composição
do quadro historiográfico - tão lacunar - da educação baiana do
período. Ao mesmo tempo, consideramos de fundamental importância
superar as visões que analisam a educação apenas com base na
história política do país, passando a construir e a adotar uma
periodização própria para a história da educação baiana.
Buscamos compreender as políticas públicas para o ensino secundário na
província baiana , durante o Império. Acreditamos que o período delimitado –
1860 a 1890 – compõe uma nova fase para o ensino secundário da Bahia,
que denominamos de terceira fase , uma vez que os períodos que a
precedem , já foram analisados em pesquisa anterior.
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Nossa proposta não visa discutir a história do Liceu Provincial , ou discutir
dentro de uma cronologia , os acontecimentos naquele estabelecimento de
ensino. Entretanto, foi o Liceu, desde a sua instalação , em 1836 , até as
primeiras décadas da República, a única instituição pública de ensino
secundário . Assim , qualquer ação dos poderes públicos em relação a essa
modalidade de ensino, teria que recair necessariamente sobre o Liceu
Provincial da Bahia , que passou a ser nosso referencial na busca da
compreensão de como os poderes públicos constituídos pretendiam conduzir
os estudos denominados secundários.
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2 JUSTIFICATIVA
Procurando dar continuidade a pesquisa já realizada anteriormente,
buscamos a análise das políticas públicas para o ensino secundário na Bahia,
na segunda metade do século XIX.
Na pesquisa já desenvolvida , estudamos o processo histórico que gerou e
desenvolveu o conjunto de ações públicas para a educação na Bahia, no
século XIX. Nosso objetivo, naquele momento , era a análise da origem das
políticas públicas para o ensino secundário na Bahia, sendo o Liceu
Provincial a instituição que expressava a concretização de tais políticas
públicas.
A política pública para o ensino secundário na Bahia, no século XIX, era
expressa no Liceu Provincial (que em 1890 passou a denominar-se Instituto
Oficial de Ensino Secundário; em 1895 , Ginásio da Bahia e, em 1942,
Colégio da Bahia), e que, por muito tempo, foi a única instituição oficial para o
ensino secundário na Bahia.
Para atingirmos nosso objetivo central na elaboração da dissertação de
mestrado , delimitamos o período da pesquisa entre o ano da criação do
Liceu Provincial - 1836 e o ano da edição do primeiro Regulamento Orgânico
para a educação na Bahia - 1860. As iniciativas públicas quanto à educação
no Brasil datam da mesma época, como é o caso do Colégio Pedro II no Rio
de Janeiro, vários Liceus no Nordeste, como o Liceu Provincial da Bahia, fruto
da pretensa descentralização proporcionada pelo Ato Adicional de 1834.
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No desenvolvimento da pesquisa, na realidade, partimos do processo de
emancipação política do Brasil, levando em conta as características de
formação do Estado brasileiro e sua expressão nas políticas públicas para a
educação, sobretudo no que diz respeito ao patrimonialismo, patriarcalismo e
às influências externas, como o liberalismo.
Para a compreensão do movimento histórico que gerou e desenvolveu as
políticas públicas para o ensino secundário na Bahia do século XIX,
procuramos traçar um quadro da economia da época, bem como delinear a
matriz social.
No processo de formação do Estado brasileiro, com a análise econômica e
social do período, discutimos a educação como expressão deste quadro, a
partir das Leis, Falas e Relatórios da época , como principais fontes.
Na análise realizada, compreendemos que o período delimitado - 1836 a
1860 - encerrava um momento específico para a origem das políticas
públicas para o ensino secundário na Bahia, assim como a sua afirmação
com o Regulamento Orgânico de 1860. A partir desse período, as políticas
para a educação na Bahia, como no Brasil, assumiram novas características.
A própria Reforma realizada na Bahia, com o Regulamento de 1860, teve
dificuldades na sua implantação e uma vida de dez anos, apenas, pois em
1870 uma nova Reforma veio substituí-la.
Dos anos 60 do século XIX até a Proclamação da República, muitas
mudanças aconteceram no país, com fortes interferências na vida do
Nordeste brasileiro, com a intensificação da lavoura de café no Sul e Sudeste
do país, ao mesmo tempo em que o Nordeste, já com problemas com a
lavoura de cana de açúcar, aprofunda uma crise econômica e social da qual
não consegue levantar-se impune.
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Assim , compreendemos que, para o estudo das políticas públicas para o
ensino secundário na Bahia do século XIX, é da maior importância a análise
do período entre 1860 e 1890, que estamos considerando como uma outra
fase para o ensino secundário na Bahia
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3 - OBJETIVOS
GERAL
Analisar o movimento histórico de desenvolvimento das políticas
públicas do ensino secundário na Bahia , durante o final da
Monarquia brasileira , a partir do Regulamento Orgânico de
1860 até a Reforma na Instrução Pública ocorrida em 1890.
ESPECÍFICOS
1 - Reconstituir a dinâmica das políticas públicas do ensino
secundário na Província da Bahia, a partir das fontes primárias
, constituídas fundamentalmente pelas Leis , Regulamentos e
Falas
2 - Caracterizar o processo social do período em estudo, em
especial os aspectos que dizem respeito ao Estado brasileiro em
afirmação, expressas nas políticas públicas do ensino secundário
na província baiana , a partir das fontes secundárias .
3 - Desenvolver uma análise teórica em relação à questão
do processo social (totalidade) e políticas públicas para a
educação na província (parte), a partir de um referencial teórico
cujas premissas fundamentais residem na não linearidade do
processo histórico mas na concepção da História como substrato para
o entendimento de todo o processo.
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4 - ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO Para o desenvolvimento do trabalho de pesquisa, buscamos as fontes
primárias que pudessem dar as indicações a respeito das políticas públicas
para o ensino secundário, desenvolvidas durante o período de 1860 a 1890 .
Tais fontes foram localizadas, fundamentalmente, no Arquivo Público do
Estado da Bahia e no Instituto Histórico e Geográfico da Bahia.
A primeira etapa foi de organização do material coletado – Falas, Leis e
Relatórios - e sua seleção; partirmos, então, para a análise, ao lado de
bibliografia que trata do tema.
A diretriz que norteou a pesquisa está explicitada no capítulo 2,
Fundamentação Teórica e Metodológica, onde discutimos a concepção de
História, a partir da qual elaboramos todo o trabalho , além de fazermos uma
exposição a respeito da análise histórica e suas varias faces. Nesse capítulo
também explicamos quais os procedimentos metodológicos utilizados na
pesquisa , concluindo com quadros explicativos desses procedimentos.
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O terceiro capítulo busca analisar as condições históricas do período
estudado na Bahia - 1860 a 1890, destacando a década de 60, quando
ocorreu uma certa tentativa de sistematização para o ensino público, com o
Regulamento Orgânico. Nesse capítulo, enfocamos não só o conteúdo do
Regulamento Orgânico de 1860, como também a legislação que definiu o seu
funcionamento, as diversas críticas , a reivindicação de um ensino mais
prático. Paralelamente, tratamos da proliferação do ensino particular em face
das deficiência do ensino público. E ainda nesse capítulo, abordamos toda a
discussão sobre o ensino secundário, destacando as diversas posições
quanto à condução das políticas públicas, inclusive sobre a preparação de
uma nova reforma.
No quarto capítulo, a discussão fica por conta das condições da província
baiana durante o período de desagregação do Império. São anos agitados
com as questões que abalaram esse momento histórico. Para a educação, a
expressão da instabilidade política é a instabilidade de ações , resultando
disso a ocorrência de três reformas, a de 1870 ,a de 1873 e a de 1875. No
final dos anos 70, vários foram os aspectos discutidos com relação à
educação, destacando-se a liberdade de ensino, o ensino obrigatório e o
ensino misto.
O quinto capítulo trata dos anos finais do Império , marcados por grandes
discussões, a exemplo da libertação dos escravos e da chegada ao país da
mão – de – obra imigrante, além do desenvolvimento, cada vez maior, da
região Sudeste, em detrimento do Nordeste. Os anos 80 do século XIX são
marcados, também, por questões como a gratuidade e a obrigatoriedade do
ensino , ao mesmo tempo em que avança cada vez mais a solidificação e
organização do ensino particular, para onde fogem os alunos que têm
condições de sustentar tal ensino. É no final desta década (1890) que o
Liceu é transformado em Instituto Oficial de Ensino Secundário da Bahia.
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Finalmente, no sexto capítulo, procuramos expressar nossas considerações
finais diante da documentação analisada sobre o desenvolvimento de
políticas públicas para o ensino secundário na Bahia, na segunda metade do
século XIX , bem como apontar para possíveis desdobramentos e
observações sob outros ângulos não abordados na presente pesquisa.
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II – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA METODOLÓGICA
1 - A Concepção de História e História da Educação
O desenvolvimento da pesquisa realizada parte de alguns pressupostos
teóricos básicos , no que diz respeito à concepção de História. Há
uma vasta discussão sobre conceitos de História que demandam
explicitação, indicando os caminhos seguidos na presente pesquisa.
As discussões em termos do significado da História têm um longo
percurso e podemos, ainda na atualidade, afirmar, concordando
com Jacques Le Goff, assim como com Ciro Flamarion, que a
História sendo um processo de mudança , em constante
transformação , poderia ser definida como uma ciência em
construção.
Em linhas gerais , o panorama de posições existentes até a
formulação de tal enunciado pode ser apresentado, a partir dos
significados que a palavra história adquire através dos tempos.
Para Hegel , o termo história implicaria em dois sentidos: de um
lado, história rerum gestarum , isto é, o lado subjetivo, a narração das
coisas feitas (fatos) e, de outro, o objetivo, res gestae., Isto é, as
coisas feitas . Esta posição implica em produções diferentes,
com concepções opostas na História, a saber, o positivismo e o
idealismo.
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Adam Schaff (1987), buscando a análise e o tratamento dado ao
fato histórico, nas diferentes concepções de História , tipifica três
modelos. Ao discutir tais modelos, analisa o primeiro no qual o
objeto do conhecimento - os fatos - atua sobre o sujeito , que é
passivo. Dentro dessa compreensão , os fatos históricos existiriam
como uma estrutura já dada. Nesse caso, falariam por si só,
sendo considerados como coisas feitas ( é a concepção da
História res gestae ). Assim, ao historiador somente caberia mostrar
os fatos efetivamente como sucederam, através da pura e simples
ordenação cronológica da documentação. Desse caso, como produto,
resulta a descrição histórica mecanicista, característica da postura
positivista.
Em um extremo oposto, Schaff apresenta um segundo modelo , no
qual o sujeito passa a ser preponderante sobre o objeto do
conhecimento - no caso, os fatos históricos . Dentro dessa
concepção, é o sujeito que praticamente determina o objeto , isto é , o
historiador determina, em uma postura subjetivista, os fatos históricos
que, nesse caso, são considerados a partir da narração das coisas
feitas - ( é a concepção da História rerum gestarum ). Assim , todo
peso é empreendido ao historiador que interpreta , seleciona e narra
os fatos. Como produto de tal posição, podemos observar uma
subjetividade na narração dos fatos , como na postura idealista, em
que o fato histórico somente ganha status a partir da interpretação
do historiador. Ainda dentro dessa visão , podemos exemplificar com a
posição de Carr , indicando que “ Os fatos falam apenas quando
o historiador os aborda: é ele quem decide quais os fatos que vem
à cena e em que ordem ou contexto.” (CARR,1982 :14).
32
Para esse autor, a existência objetiva dos fatos independente da
interpretação do historiador é uma falácia.
Rechaçando as duas concepções , Schaff inclui um terceiro
modelo, no qual há uma relação recíproca entre o sujeito
(historiador) e o objeto (fato). Nesse caso, o sujeito e o objeto estão
em interação , existindo tanto a atividade do sujeito, quanto a
influência do objeto, mantendo uma existência objetiva e real,
atuando um sobre o outro.
Caminhando nessa linha de análise e avançando nas discussões, Felipe
Serpa (1989) argumenta que essa relação recíproca entre o sujeito
e o objeto é possível, porque tanto o sujeito como o objeto estão
submersos na História, no espaço / tempo histórico, que se traduz
na sua historicidade.
Na discussão dos caminhos percorridos pelas diversas concepções da
História, desde a história linear dos fatos singulares até a história das
estruturas , Ciro Flamariom Cardoso indica que o eixo de preocupação
do historiador ,ou seja, o objeto da história, de acordo com a Escola dos
Annales - história nova, é o homem e sua atividade, entendendo-se por
homem não o personagem, que tanto ilustrou a história dos heróis , mas o
homem em seu grupo social , uma história da sociedade em movimento.
(CARDOSO.1979:349)
No que concerne ao estudo da Educação brasileira , interessa
questionarmos a grande quantidade de produções que, simplesmente,
ignoram o aspecto histórico de suas pesquisas. Até mesmo entre as
diversas tendências do pensamento educacional, constatamos a
característica de serem , em grande parte , ahistóricas.
33
Procurando discutir os aspectos dos problemas atuais da Educação
brasileira, Nagle (1984 :23) aponta para o fato de que o estudo da
Educação tem sido quase sempre escolar e , só recentemente, sob
uma perspectiva histórica. Para esse autor , isso ocorre, porque
no Brasil não há uma preocupação com a gênese ou com o
desenvolvimento das idéias . Nós acrescentaríamos a esse fato, que
é uma afirmação válida de forma geral, resultante do descaso
com a memória histórica do país.
No mesmo artigo, Nagle ainda afirma que tal postura leva a
“decretar-se assim a morte do passado , mesmo do passado mais
próximo” (NAGLE.1984:23) . Daí decorrem alguns problemas graves,
assim enumerados por ele:
• não há herança intelectual no campo dos estudos históricos,
o que implica, conseqüentemente , em que isso se
expresse também na Educação;
• especificamente com a Educação , ainda nos deparamos
com outras questões interligadas àquelas já discutidas ,
como:
a) dificuldade de localizar documentos históricos
b) pressa em elaborar interpretações sobre documentos
que, muitas vezes, provocam deficiências nas análises ou
trabalhos relativos à História da Educação
grande deficiência historiográfica.
34
No que diz respeito a esta última questão , Miriam Jorge Warde
(1990:3) , afirmando que enfrentar a História é uma tarefa
arriscada e, em relação à História da Educação , arriscadíssima,
realizando uma pesquisa sobre historiografia da educação
brasileira, constatou que pouquíssimos trabalhos em Educação
recorrem à História como método de análise.
Aqui caberia uma outra vertente na discussão, que é exatamente
sobre a historiografia e seu significado. Do ponto de vista
positivista, é um simples conjunto sistematizado de escritos de
História . Já as posturas opostas não consideram a historiografia
simplesmente como um reflexo , mas, sim , como a preocupação
em relação à natureza do que é escrito.
A pesquisa de Warde demonstra , também , que aqueles que se
dedicam à pesquisa histórica na educação , o fazem para
determinados períodos, através de marcos consagrados da política.
Assim, é comum que, para alguns períodos históricos, haja uma
grande produção, enquanto que para outros há quase um vazio
de investigações. É o que ocorre com o século XIX e a
Educação, sobretudo no que diz respeito à Bahia. A título de
exemplificação , Warde indica que, aproximadamente, 80% das
pesquisas em História da Educação dizem respeito à fase
republicana e, nesta, ao período de Vargas, sobretudo ao
Estado Novo.(WARDE.1990)
35
Ao mesmo tempo, a forte influência positivista na educação
brasileira tem produzido estudos que representam descrições de
tendências pedagógicas, em uma seqüência cronológica e de
acordo com os marcos a que nos referimos anteriormente.
Essa discussão é importante para destacarmos o fato de que as
pesquisas sobre Educação não podem estar desvinculadas de
uma concepção histórica, até porque a Educação é uma forte
expressão do processo histórico.
A História da Educação e da Pedagogia ( como teoria da
Educação ) deve ser encarada , do nosso ponto de vista,
a partir da concepção acima exposta. Mas, tal postura pode
ser considerada como uma tendência recente na historiografia
da História da Educação que, tanto do ponto de vista geral
como no que diz respeito à situação brasileira, não é das mais
ricas.
Partimos do pressuposto da História como ciência fundamental,
no sentido de que a compreendemos como substrato a toda
ciência, como bem discorre Pierre Vilar , que também considera
a História como ciência em construção, mas fundamental para
tudo pensar historicamente .
É, portanto, com a visão de que a História, como ciência
fundamental, estuda não o passado, mas a sociedade imersa
no espaço/tempo histórico e, por conseguinte, a partir da qual a
totalidade é cognoscível, que buscamos ter a base teórica
para a nossa pesquisa.
36
O que se pretende não é uma simples descrição ou exposição
de práticas pedagógicas ou sistemas escolares ao longo do tempo
e sim , práticas e sistemas entendidos como expressão de um
processo mais amplo econômico, social, político e ideológico, ou
seja, compreendidos se pensados historicamente.
Isso implica em uma preocupação não em contextualizar,
historicamente, no caso, o Liceu Provincial, mas trabalhá-lo a
partir da perspectiva da sua historicidade. Assim, os temas
educacionais são estudados como expressão da historicidade que
contêm. No caso do Liceu Provincial, por ser durante muito
tempo a única instituição pública para o ensino secundário na
Bahia, ele expressa, na sua prática, o conjunto de políticas
públicas estabelecidas pelos poderes constituídos para este ensino,
indicadas tanto na sua estrutura, como no desenvolvimento de seus
programas.
Compreendemos, dessa maneira, que a pesquisa de História da
Educação, dentro da concepção já discutida, é de grande importância
tanto no nível das relações entre o Estado e a Sociedade
como em relação à práxis pedagógica expressa pelas políticas
públicas. Pode vir a ser, ainda, relevante para uma contribuição
à historiografia da História da Educação baiana, tão lacunar no
período estudado, desenvolvendo a preocupação não de
contextualizar ou descrever a história do Liceu Provincial da
Bahia, mas entendê-lo como uma expressão da historicidade do
processo.
37
Para a concretização da pesquisa proposta , dentro da
concepção acima indicada, o ponto de partida foi a própria
legislação oficial, como Falas , Relatórios e Leis, além de
discursos da época, sendo basicamente de fontes primárias,
coletadas nos arquivos e bibliotecas públicas . Contamos, também,
com a Memória Histórica do Ensino Secundário Official na
Bahia , escrita pelos professores Gelásio Farias e Francisco
Conceição Menezes , por ocasião do centenário de fundação da
Instituição, repleta de fatos , que dão indicações para que
possamos compor uma análise para o período estudado.
Segundo os objetivos propostos , partimos dos resultados de
nossa Dissertação de Mestrado , com o Regulamento Orgânico
de 1860 , passando pela Reforma da Instrução pública de 1870
até a Reforma de 1890 que criou o Instituto Official do Ensino
Secundário da Bahia , no lugar do Liceu Provincial ,
representando o encerramento de um período e o início dos
anos republicanos , em que as características para a educação
baiana e brasileira já assumem novos aspectos.
A documentação - fontes primárias - , foi analisada conjuntamente
com as fontes secundárias que trabalham com a História do
país, durante o período proposto , sobretudo no que diz respeito
aos anos finais da Monarquia e as perspectivas republicanas.
Contamos também com a produção sobre a situação da Bahia no século XIX
38
A exemplo do que desenvolvemos na dissertação de Mestrado,
não poderíamos deixar de destacar as características marcantes
de formação e afirmação do Estado brasileiro , como o
patrimonialismo , presentes em todo processo , com fortes
repercussões sobre o desenvolvimento das políticas públicas
para a educação , principalmente durante o período estudado,
quando o ensino particular se afirma e se fortalece, percebendo-se
que os poderes públicos, de certa maneira, com isso compactuam
Nesse sentido, um exemplo que bem expressa a característica
patrimonialista do Estado brasileiro pode ser vislumbrado, quando se
analisa a composição e atuação dos governantes. Em artigo que
discute a questão do regionalismo e a Bahia no século XIX,
Consuelo Novais argumenta :
Durante o II Império foi principalmente a aristocracia
rural dos grandes proprietários de terras que constituiu
as elites governantes , nos níveis local e nacional ,
assegurando a defesa de seus interesses na esfera
política . (NOVAIS , 1977: 11).
39
2 – A ANÁLISE HISTÓRICA
A opção pelo estudo da educação baiana e, especificamente, do ensino
secundário, a partir de uma análise histórica, visa cumprir o objetivo de
buscar suprir o preenchimento das lacunas existentes na História da
Educação baiana. O século XIX , para tanto , torna-se um marco decisivo ,
visto que foi naquele momento que ocorreram algumas transformações na
educação brasileira e baiana, pelo menos no tocante às políticas públicas
empreendidas a partir do Ato Adicional de 1834 . Já havendo desenvolvido a
análise dessas políticas públicas para o ensino secundário na Bahia, na
primeira metade do século, nossos marcos históricos para a presente tese de
doutoramento passam a ser 1860 , com o Regulamento Orgânico para
educação e, 1890 com a reforma da educação baiana , já no período
republicano , dando início a uma nova etapa para o ensino secundário
baiano , agora no Instituto Oficial de Ensino Secundário.
O desenvolvimento de uma análise histórica da educação baiana , porém ,
parte de caminhos e descaminhos possíveis , diante da diversidade de
propostas que envolvem tal estudo. No capítulo em que desenvolvemos o
quadro de referências teóricas , buscamos indicar os pressupostos
metodológicos que envolvem a presente pesquisa . Entretanto , para essa
definição, torna-se necessário discutir, dentro do leque de propostas
apresentadas como análise histórica , a nossa opção , buscando a análise do
processo , no caso em tela , das políticas públicas para o ensino secundário
no século XIX , na Bahia .
40
Ao discutir a diversidade metodológica para a análise histórica , Virgínia
Fontes argumenta que é preciso ir além da compreensão do senso comum
sobre o que vem a ser o método , definindo - o como um instrumento de
trabalho que , orientado teoricamente , é capaz de estabelecer homologias
(construindo isomorfias) entre dados que , à primeira vista, são díspares ,
fazendo ressaltar o sistema que os ordena. (FONTES,1997: 355).
Ao longo da História podemos distinguir a diversidade metodológica
assumida por correntes de pensamento. Nesse sentido, a tradição positivista
considera o empírico como o dado concreto. Assim sendo , seu objetivo , no
caso da análise histórica , seria o de descrever a realidade em questão -
o fato - , utilizando-se, para tanto , de uma metodologia capaz de
quantificar os dados, a fim de abalizar a sua descrição. No extremo oposto ,
o idealismo , concebendo a História como pura subjetividade , considera os
documentos como o local onde esta subjetividade se concretiza , tanto no que
diz respeito aos seus autores , como com a interpretação feita pelos
historiadores.
Descartando-se as duas vertentes mencionadas , podemos dizer que, talvez
se possa encontrar o mais produtivo na análise histórica, considerando o
empírico , isto é , os dados coletados experimentalmente, não como um
resultado em si próprio , ou mesmo como decorrente da pura subjetividade
do pesquisador , mas sim como o resultado de uma construção , em que os
dados são selecionados pelo pesquisador , porém não sem serem lastreados
por pressupostos teóricos que permitam a elaboração da questão ,
orientando os dados a serem pesquisados.
41
No ir e vir - caminhos e descaminhos - da História , Ciro Flamarion Cardoso
(1997 : 2-23) , discute a polêmica atual na historiografia quanto ao método ,
que denominou de paradigmas rivais . De um lado estaria o paradigma por
ele denominado de “ Iluminista “ ou moderno e de outro o “pós-moderno” .
O paradigma “iluminista” é descrito por Cardoso como sendo aquele que
pretende uma análise histórica científica e racional. Segundo o mesmo autor,
o ponto de partida para tal análise histórica seria a produção de
conhecimento hipotético , como a história-problema dos Annales,
acreditando-se que:
(...) fora de tal atitude básica , o saber histórico não responderia às
demandas surgidas da práxis social humana no que tange à
existência e à experiência dos seres humanos no tempo , nem
seria adequado no enfoque da temporalidade histórica como
objeto. (CARDOSO,1997:4)
Para Cardoso , tal tendência filosófica, fundada nos séculos XVIII e XIX , é
reforçada, neste último, pelo emprego de modelos macro-históricos
teorizantes. Como exemplos para tal modelo, ele indica o evolucionismo , o
marxismo, o weberianismo e algumas vertentes do estruturalismo. No caso
do marxismo , argumenta que sua ambição seria a de reunir em um único
movimento de pensamento , os enfoques genético e estrutural das
sociedades , buscando uma visão, ao mesmo tempo, estrutural e dinâmica
das sociedades humanas. Ainda segundo este autor , trata-se de:
42
(...) uma história analítica , estrutural, (e mesmo
macroestrutural) , explicativa ( na prática, ainda em casos como
o de Weber que pretendia praticar uma “ciência da
compreensão “ , e não “da explicação’) ... (CARDOSO,1997:4)
Em um outro lado , estaria o paradigma “pós-moderno” , caracterizado pela
recusa de visões globais , apontando não para a História , mas sim para a
existência de histórias. Dentro dessa perspectiva não haveria lugar para a
macro história , devendo-se :
(...) abandonar o analítico , o estrutural, a macroanálise , a
explicação - ilusões cientificistas - em favor da hermenêutica , da
micro -história , da valorização das interações intencionalmente
dirigidas , da concepção da história como sendo narrativa e
literária. (CARDOSO , 1997: 17)
De acordo com tal explicação , o que se leva em consideração, do ponto de
vista social , são os indivíduos e os pequenos grupos com suas crenças,
valores e desejos ,o que é próprio dos estudos da denominada Nova História.
No entanto , as críticas feitas ao chamado “paradigma pós-moderno”
apontam para o perigo de que, em um afã anti-racionalista , esta análise
venha acompanhada de certo descaso teórico-metodológico . Assim
argumenta Ciro Flamarion:
43
O anti-racionalismo típico da corrente às vezes se acompanha
de certo desleixo teórico metodológico ... Os pós-modernos
costumam, com efeito, ser mais apodícticos e retóricos do que
argumentativos... (CARDOSO,1997:19)
Ao discutir o que denomina de “paradigmas rivais “ na contemporaneidade,
Cardoso argumenta ser plenamente possível que a análise histórica venha
mesclar aspectos positivos de cada paradigma , excluindo-se , porém, os
excessos unilaterais que, muitas vezes, estão mais configurados no âmbito
de lutas ideológicas ou modismos. O referido autor ainda acrescenta:
(...) não creio que estejamos obrigados a passar do rigor formal e
muitas vezes ilusório do cientificismo para algo tão limitado quanto
uma “busca interpretativa culturalmente contextuada”, uma
hermenêutica que se esgote em si mesma. As ciências sociais , entre
elas a história , não estão condenadas a escolher entre teorias
deterministas da estrutura e teorias voluntaristas da consciência , ...
nem a passar de uma ciência freqüentemente mal conduzida -
comprometida com teorias defeituosas de causação e da
determinação e com uma análise estrutural unilateral - às
evanecências da “desconstrução” e ao império exclusivo do relativismo
e da micro análise. (CARDOSO,1997:23)
44
Dentro desta análise , podemos perceber que é admitida a possibilidade de
compatibilização , ainda que com paradigmas rivais , entre abordagens
globalizantes e análises microscópicas na investigação histórica.
Para Ronaldo Vainfas , este não é um caminho fácil a ser perseguido , tendo
em vista que:
(...) embora combináveis , são paradigmas que geram opções
distintas, modos diferentes de conceber o objeto de investigação e
executar a pesquisa. (VAINFAS,1997: 447).
Ao analisarmos as políticas públicas para o ensino secundário na Bahia do
século XIX , tendo, como expressão de tais ações públicas , o Liceu
Provincial , podemos considerar tratar-se de um objeto macro-histórico ,
envolvendo a própria consolidação do Estado brasileiro, na segunda metade
do século , sua política para a educação e as posições assumidas pela
província baiana. Entretanto , ao buscar no Liceu Provincial , em Salvador, a
expressão destas políticas - micro- história - , não assumimos a postura de
uma análise microscópica daquele estabelecimento de ensino, mas sim, a
compreensão de como tais políticas se evidenciaram na prática, mostrando
a viabilidade de construção de uma História -síntese.
45
Combinando a discussão de caminhos metodológicos à concepção de
História adotada como processual , dinâmica em constante movimento, - já
discutida anteriormente - encontra-se nossa perspectiva de analisar a
política educacional para o ensino secundário da Bahia do século XIX.
Tal perspectiva não pode ser concretizada sem que se tenha sempre
presente , caminhando lado a lado, as condições políticas sociais e
econômicas do Império e da Província baiana.
Nesse sentido , podemos afirmar que, ao longo deste percurso , não foi
possível distinguir uma política educacional claramente estruturada que,
aliada à instabilidade política geral , reduz o processo educacional a uma
série sucessiva de reformas na Instrução Pública. Apesar da não
estruturação de uma política específica para a educação secundária , tal
ausência ou mesmo as incertezas quanto à forma e objetivos para tal
educação , nos indicam os caminhos adotados pelos órgãos oficiais ,
traduzidos em ações dos poderes públicos constituídos , aqui denominados
de políticas públicas para o ensino secundário.
Durante todo período estudado, a referida ausência de uma estrutura clara
para o ensino secundário baiano é acompanhada por discursos que, a todo
tempo, indicam uma desqualificação para o ensino secundário ministrado no
Liceu Provincial , a ponto de , por sucessivas vezes, chegar-se a ventilar a
possibilidade de extinção do Liceu e, conseqüentemente , do ensino
secundário público.
46
Entretanto , mesmo com a possibilidade de extinção , o ensino secundário
público não deixou de existir. Assim , cabe a pergunta: o que sustentava o
funcionamento do Liceu Provincial , ministrando o ensino secundário baiano,
se até mesmo presidentes da província e diretores de estudo chegaram a
prever o seu fim? Por que , mesmo com tantas críticas , o Liceu continuou
existindo? Que função ele estaria cumprindo?
Porém , parece que essas dúvidas e indefinições em relação ao ensino
secundário não são características específicas da província baiana ou do
Brasil , mas sim , fazem parte de uma intricada situação de crise de
identidade dessa modalidade de ensino, que atinge também outros países.
O ensino secundário brasileiro baseou-se muito no modelo das escolas
francesas. Mas o desenvolvimento do ensino secundário na França , no
século XIX , obedeceu a determinadas características específicas do país pós
- revolução. No entanto , transplantaram para o Brasil o modelo francês, sem
que fossem guardadas as características específicas de cada país.
No caso francês, o país discutia a necessidade da substituição dos colégios
latinos, representativos do Antigo Regime, por outra estrutura que ,
preservando a cultura da elite , representasse as mudanças que o regime
burguês imprimia à sociedade que, rapidamente, recebia novos contornos
com a industrialização.
47
A industrialização implicava em novas exigências para os trabalhadores e,
portanto, mudanças nas escolas. Entretanto , essas mudanças não ocorreram
facilmente. Questionamentos do tipo de quais conhecimentos científicos
seriam adequados ou que nível de discurso deveriam ser adotados nos
colégios, fazem parte das dúvidas para a implantação do ensino secundário
francês. As respostas às dúvidas existentes quanto ao tipo de escola mais
adequada oscilavam por vários caminhos que, de acordo com André Petitat,
eram definidos através da dimensão do poder e do jogo existente entre as
diferentes classes sociais.
Para as elites dirigentes francesas do século XIX, era necessária uma
redefinição cultural , que passava pela formação de uma estrutura escolar
onde ficava delimitado o que deveria estar ao lado da cultura clássica e o que
deveria ser rejeitado . No caso dos aspectos rejeitados , eles ficariam
restritos a um outro tipo de curso secundário , de segunda linha.
(PETITAT.1994:170)
De acordo com tal análise, fica evidente que , no caso francês, há uma nítida
bifurcação entre o ensino secundário destinado às elites , de caráter mais
geral , preparatório para o ensino superior e, por outro lado , um secundário
mais utilitário destinado às classes subalternas. Há, portanto, um projeto
claramente seletivo e classificatório. Ainda seguindo a análise de André
Petitat , concluímos que , apesar de a industrialização determinar
necessidade de programas subdivididos na escola, essa determinação seria
parcial , pois o determinante mesmo estaria nas relações de força e de
diferenciação das classes sociais. Em decorrência dessas questões é que
estaria fundamentada a estrutura dos programas escolares.
(PETITAT.1994:171)
48
Vale notar que, no desenvolvimento do ensino secundário da França no
século XIX, podemos perceber uma oscilação de posições definidoras do
ensino secundário , porém todas abrangendo posturas que implicam no
dualismo do ensino ministrado.
Um aspecto importante do referido dualismo encontra-se na forma de
diferenciar o ensino , o que não se faz por programas diferentes , mas sim
pela intensidade com que os assuntos são tratados , principalmente os de
conteúdo geral, cultural e científico-utilitário. Essa diferença, aliada às
distinções de classe, é que produziam ensinos distintos.
A distinção existente no ensino secundário francês era tratada claramente
nos discursos da aristocracia que temia que pudesse ocorrer o aumento de
estudantes no curso secundário, vindo a macular a sensibilidade aristocrática
a ponto de terem que preferir os colégios Jesuítas ao liceu existente
(PETITAT.1994:175)
Para a elite francesa, o dualismo presente no ensino secundário era encarado
com naturalidade, de forma que não se pensava em colocar em um mesmo
nível os distintos cursos, isto é , o ensino secundário especial não seria
equiparado ao clássico e científico dirigido às elites. Portanto, havia um
secundário mais utilitário, no qual a ciência teria o caráter vocacional, mais
profissional e, de outro lado , aquele preocupado com as ciências do espírito.
A barreira que se coloca como intransponível para as classes populares é o
ingresso ao ensino superior, pois o secundário, a elas destinado, não
conduzia a tais estudos.
49
Da organização do ensino secundário francês do século XIX , é interessante
notar a existência de várias semelhanças com o que ocorria com a mesma
modalidade de ensino na Bahia, no mesmo período, em que pesem as
diferenças econômicas , sociais e políticas, existentes entre os dois países.
A sociedade brasileira e, especialmente baiana , no século XIX, tinha
características bem próprias, aristocrática , latifundiária e escravista ,
diferenciando-se da situação européia. No entanto, foi esta sociedade que, se
apropriando , transversalmente, das idéias liberais , comandou os destinos
brasileiro e baiano.
Apesar das diferenças , mesmo sendo o Brasil um país dependente
economicamente, exportador de matéria primas e importador de produtos
industrializados, bem distante do processo de industrialização por que
passava a França; mesmo sendo politicamente organizado sob uma
Monarquia, com um discurso pretensamente liberal, de um liberalismo que
assume características bem diversas da européia, pois aparece na fala de
uma aristocracia latifundiária , escravista , aliada à Igreja da contra-reforma,
mesmo assim , transportaram-se os modelos educacionais aplicados na
França para o Brasil , sem que se pensasse em qualquer adaptação.
50
Devido à situação econômica de país dependente , não havia indústrias
como na França e, conseqüentemente , menos ainda operários. No entanto,
foram transplantadas as medidas adotadas na França , sem qualquer
questionamento, desde a denominação dos Liceus até o conteúdo
ministrado, bem como a sua estrutura – sendo que, nesse caso,
particularmente , adotamos a falta de estrutura, com a abolição de cursos
seriados seqüencialmente para substituí-los por disciplinas isoladas, cuja
matrícula dependia apenas e simplesmente da escolha do aluno , sem
qualquer orientação.
Um dos maiores problemas do ensino secundário baiano , ministrado no
Liceu Provincial, também aparecia nos estudos secundários franceses. Trata-
se do credenciamento , ou não , para o ingresso nas Faculdades.
No caso francês, a distinção era feita com bastante clareza, pois existiam os
dois tipos de escolas. Aquelas que preparavam para os estudos mais
utilitários, não credenciando ao ensino superior e, aquelas que, destinadas às
elites , preparavam para o ensino superior.
Novamente nos deparamos com questões semelhantes no Brasil e Bahia
especialmente , cujos estudos no Liceu Provincial , não habilitavam para que
se pudesse prestar os exames preparatórios, porta de entrada das
faculdades. Por outro lado , as escolas particulares , que proliferaram durante
o Império, possuíam seus cursos estruturados , credenciando seus alunos a
prestar os exames preparatórios para ingresso nas faculdades. Já para os
alunos do Colégio Pedro II , na Corte, sequer era necessário fazer tais
exames, pois estavam credenciados ao ingresso nas faculdades
automaticamente.
51
No transplante de modelos educacionais de outros países , muitas vezes é
enaltecida a iniciativa particular , para justificar que, em muitas nações
desenvolvidas , o ensino secundário estaria a cargo de particulares , sem que
o Estado tivesse que arcar com sua participação . É o caso das Falas do
Barão de São Lourenço , que explicitam a sua admiração por modelos
educacionais europeus , sobretudo aqueles mais privatizantes.
Curiosamente, durante a fase de governo Imperial , principalmente na sua
segunda metade , há uma grande proliferação das escolas secundárias
particulares. Seria talvez este um dos motivos de manutenção do ensino
secundário público, mesmo com tantos problemas para o seu
funcionamento? Existiria esse tipo de instituição apenas para justificar a
necessidade de proliferação das escolas particulares?
52
3 - PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Como já indicado anteriormente, as fontes básicas constitutivas da pesquisa
foram as Leis e Resoluções aprovadas pela Assembléia Provincial da Bahia
e sancionadas pelos respectivos Presidentes da Província Baiana , aliadas
aos Regulamentos editados em decorrência desses atos legais , referentes
ao ensino secundário, durante o período de 1860 a 1890.
Consideramos , para tanto , todas as Leis e Regulamentos que , no período
indicado , interferiram, direta ou indiretamente , no desenvolvimento do
ensino secundário na Bahia. Dessas fontes , puderam ser extraídos os
dados documentais essenciais ao estudo das políticas públicas para o
ensino secundário.
Complementando os dados contidos nas Leis ,Resoluções e Regulamentos,
outra fonte básica está expressa nos discursos oficiais das Falas dos
presidentes da Província baiana , proferidos durante o período estudado , a
cada abertura ou encerramento dos trabalhos da Assembléia Provincial . O
conteúdo de tais Falas abrange os mais diversos aspectos da vida da
Província , tornando-se uma espécie de relatório da situação em que ela se
encontrava , possibilitando uma visão ampla dos problemas e das ações
realizadas , com enfoque particular para aqueles relativos ao ensino
secundário.
53
Ao lado dos documentos mencionados , foram, também, usados como fonte
os Relatórios elaborados por órgãos oficiais encarregados de implementar ou
fiscalizar o cumprimento das normas legais , como o Conselho de Instrução
Pública , Diretoria Geral de Instrução Pública ou mesmo Direção do Liceu
Provincial , no período de 1860 a 1890. Os dados fornecidos por esses
documentos constituíram-se em suporte essencial para expressar a
implementação das políticas públicas para o ensino secundário na Bahia do
século XIX.
Essas fontes , por si , já podem dar conta do desenvolvimento do tema
proposto para esta pesquisa. No entanto , consideramos que seria
interessante , a título de complementação , uma incursão pelos discursos
proferidos na Assembléia Provincial , por ocasião das discussões das Leis e
Reformas para Instrução Pública . Essas fontes são mais restritas em
termos de período , vez que somente estão disponíveis a partir de 1874,
assim mesmo com muita dificuldade, pela forma de editoração com
seqüências de discursos que não tratam necessariamente sobre o mesmo
tema.
Todos esses dados, no entanto , não poderiam deixar de estar
acompanhados por uma visão da sociedade da época e , para tanto ,
recorremos à literatura disponível que caracteriza a sociedade baiana do
século XIX.
A partir do quadro de referência traçado , procuramos empreender
uma análise sobre o desenvolvimento das políticas públicas para
o ensino secundário na Bahia , no século XIX , para o período
de 1860 - 1890. Nesse sentido , adotamos os seguintes
procedimentos metodológicos:
54
1 - Levantamento das fontes primárias do período demarcado
entre o Regulamento Orgânico de 1860/62 e a Reforma de
1890;
2 - Elaboração de um quadro geral da legislação , a fim
de obter a compreensão das políticas públicas do Estado para
o período considerado , em relação ao ensino secundário da
Bahia ;
3 - Ampliação das fontes secundárias que caracterizem o
processo social do período onde se inserem as políticas
públicas para o ensino secundário , no período proposto para a
pesquisa;
4 - Estudo das fontes secundárias , com o objetivo de
analisar o movimento entre a caracterização das políticas
públicas em relação ao ensino secundário na Bahia e o
processo social no período considerado ;
5 - Análise do movimento do processo social ( totalidade ) e
das políticas públicas de educação do Estado para o período
proposto ( parte ) , tomando como referencial teórico as
análises e concepção de História , explicitadas no item anterior .
55
O desenvolvimento desses procedimentos metodológicos obedeceu
às seguintes etapas :
10. Localização e coleta de dados dos documentos oficiais - fontes primárias.
Com o objeto de pesquisa e período delimitado , partimos
para a coleta do material , integrado basicamente por fontes
primárias , a partir das Falas , Relatórios e Leis . Esses
documentos foram localizados no Arquivo Público do Estado da
Bahia e na Biblioteca do Instituto Histórico e Geográfico da
Bahia.
A coleta constou, basicamente, de localização e fichamento das
Falas dos Presidentes da Província baiana , no período proposto,
por ocasião da abertura ou encerramento dos trabalhos
legislativos , ou mesmo na passagem do cargo por motivo de
afastamento , momento em que tais Falas têm o caráter de
relatórios sobre todas as questões que envolvem a Província,
sendo ricas em dados . Por tratarem-se de documentos
gerais, além das questões que envolvem nosso objeto de estudo
- ensino secundário - , tivemos a oportunidade de coletar dados
amplos sobre a província , dentro da visão de seu presidente.
56
Foram , ainda , coletados e fichados os dados referentes ao
período de 1860 a 1890 , constantes dos Relatórios de
Instrução Pública , apresentados pela Diretoria Geral da Instrução
Pública da Bahia aos Presidentes da Província . Nesses
Relatórios, podemos apreciar as diversas análises sobre o
ensino secundário no período , assim como as concepções
variadas sobre os objetivos do ensino secundário e o ensino no
Liceu
Ao lado das Falas e Relatórios , foi realizado o levantamento de
toda legislação pertinente ao período, com destaque para aquelas
que afetaram diretamente o ensino secundário e o Liceu Provincial.
Tal legislação vem traduzir em ação , as discussões constantes
nas Falas e Relatórios.
Outro aspecto importante que deve ser considerado é a
discussão travada na Assembléia Provincial . Nas discussões
sobre questões e projetos relacionados à educação e ao ensino
na província, podemos verificar a possibilidade de um outro lado do
discurso oficial, com posições relacionadas ao pagamento ou
gratuidade do ensino , ou mesmo sobre a obrigatoriedade do
ensino , esta última debatida durante todo o período estudado.
A documentação relativa às fontes primárias foi coletada e
fichada, passando por um processo de seleção , análise e síntese , sendo
que, em relação aos debates da Assembléia Provincial , além de não
abranger todo o período estudado , houve grande dificuldade na sua
organização, com a finalidade de possibilitar a compreensão das
políticas públicas para o ensino secundário na Bahia do século
XIX.
57
20. - Elaboração de quadro geral da Legislação
A partir do levantamento das fontes primárias , elaboramos
um quadro geral da legislação . Assim, podemos visualizar
melhor a legislação para o período estudado. Esse quadro nos
permite , ainda , dar bases para uma análise do seu
conteúdo , bem como estabelecer relações com a sua
aplicação.
No que diz respeito à legislação referente à Instrução de forma
mais geral e ao ensino secundário, particularmente , no período
de 1860 a 1890 , selecionamos as seguintes que compõem
os quadros n.. 1,2,3 e 4 .
Esses quadros contribuíram para melhor compreensão da composição ,
elaboração e aplicação das políticas públicas para o ensino secundário na
Bahia , durante o período estudado.
Com o quadro 1 , procuramos listar as principais iniciativas de legislação
que afetaram diretamente o desenvolvimento do ensino secundário na
província baiana, durante o período estudado desde 1860 com o
Regulamento Orgânico , passando pela sua regulamentação em 1862 , assim
como as diversas reformas para a instrução pública do período , até a
reforma de 1890 , quando a denominação de Liceu Provincial é substituída
por Instituto Oficial de Ensino Secundário da Bahia, já no primeiro ano da
República
58
QUADRO 1
LEIS , RESOLUÇÕES , REGIMENTOS E REGULAMENTOS
LEGISLAÇÃO ANO CONTEÚDO ____________________________________________________________________ Regulamento Orgânico 1860 Organiza a Instrução Pública Lei n0. 844 1860 Reforma da Instrução Pública Lei n0. 868 1861 Altera Regulamento de 1860 Regimento 1861 Conselho de Instrução Pública Regulamento 1861 Plano de Estudos do Liceu Regulamento Orgânico 1862 Regulamentação da Lei de 1860 Regulamento 1862 Competências Dir. Geral Estudos Resolução 1864 Equiparação dos professores Resolução n0. 1039 1868 Disciplina atividade dos professores Decreto n0. 4431 1869 Instruções p/ exames preparatórios Ato 1870 Reforma do ensino no Liceu Resolução n0. 1116 1870 Reforma da Instrução Pública Regimento 1873 Cons. Sup. Inst. Pública Resolução n0. 1275 1873 Modifica artigo da Reforma de 1870 Lei n0. 1335 1873 Autorização da Ref. Da Inst. Pública Reforma 1873 Reforma da Instrução Pública Resolução n0. 1561 1875 Regulamenta Reforma de 1873 Reforma 1875 Secretaria da Instrução Pública Lei n0. 1686 1876 Altera Resolução n0. 1561 Resolução n0. 1623 1876 Contratação de prof. Particulares Lei n0. 2114 1880 Autoriza Reforma Instrução Pública Ato 1881 Regulamenta Instrução Pública Decreto 1886 Instrução sobre exame preparatório Decisão 1886 Exames preparatórios na Província Decisão 1888 Instruções- exames preparatórios Ato 1889 Estabelece um fundo escolar Ato 1889 Reforma a Instrução Pública Ato 1890 Cria departamentos escolares Ato 1890 Suspende a Reforma de 1889 Ato 1890 Reforma a Instrução Pública Ato 1890 Cria Inst. Oficial de Ens. Secundário
Fonte: Coleção de Leis , Resoluções e Regulamentos da Assembléia Legislativa Provincial
1860 – 1890
59
O quadro 2 destaca algumas questões importantes relativas às leis do
período em estudo , localizando a informação por conteúdo . Assim, para
cada legislação do período procuramos verificar sua interferência e
importância para a instituição - Liceu Provincial - a repercussão para os
professores, as determinações relativas aos estudantes e as mudanças ou
permanências para o curso secundário. Assim, a partir da legislação,
procuramos analisar os desdobramentos sobre cada um desses elementos.
Com o quadro pronto , temos uma visão geral da trajetória do ensino
secundário, durante o período de 1860 a 1890.
ANO 1860 1861 1862 1864 1868 1870ATOS
EASSUNToS
LEI 844REFORMA INST.PÚB.
REGULAMENTO ORGÂNICO PLANO DEESTUDOS30.03.1861
NORMATIZAÇÃO DOREG. ORGÂNICO DE1860
LEI 92230.04.1864
RESOLUÇÃO 103915.08.1864
ATO22.02.1870
L
I
C
E
U
. Gov. dará ao Liceuorganização maisapropriada
. Diretoria Geral deEstudos poderá serremovida para o Liceu
. suprime escolascom menos de 15alunos e com 20institui mestre
Concentra a educação secundáriano Liceu, na capital até a divisãoem circunscriçõesSuprima aulas com menos de 15alunosIncorpora o Museu de Hist. NaturalEnquanto não se converte em“misto”,continua a receber sóalunos externosDiários de classe deverão serarquivados a cada ano1 diretor, 1 censor, 2 mestresvigilantes, 1 capelão, mestresespeciais para repetição econferências, estipulando asgratificaçõesextingue o cargo de secretárioestatutos estipularão funções
Concentra educaçãosecundária no Liceu
Suprime todas ascadeiras avulsas
Estabelece puniçõespara professores ealunos
Restabelece a Congregaçãodo Liceu presidida peloDiretor Geral e compostapelos professores
P
R
O
F
E
S
S
O
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E
S
Dissolve o Conselhode Instrução einstitui o Conselhode Estudospresidido peloPresidente daProvíncia
.Professores de aulas avulsassão jubilados ou transferidospara o Liceu se desejarem eforem aptos pelo gov.,ouvido oDiretor Geral Estudos.Removidos para o Liceu os deaulas avulsas com mais de 15alunos.Capelão será um dosprofessores sacerdotes paraconferências de repetição moral.Professores passam a adjuntos.Gov. distribuirá entre osprofessores o ensino e outrasfunções. Um ano após o regulamento,nenhum professor poderá daraulas ou conferências, de modoa cooperar com o ensinosecundário particular.Pode haver acumulações de 2ensinos ou funções públicas.Institui o Diário de Classe
.Composição deBanca dosExames por 2 prof.da referidadivisão,mais um ccensor nomeadopelo governo
.1 ano após,regulaque nenhumprofessor poderá darlições ouconferênciasparticulares semlicença.Pode acumular aulaspúblicas com licença. Remove aulasavulsas e prof. para oLiceu.o gov. distribui oensino e outrasfunções conformehabilitação ou noção.lugar vago deprofessor não serápreenchido a menosque consideradoindispensável e porconcurso.Capelão= aula dereligião.Suprime o professorsubstituto
Equipara ascategorias dosprofessores doLiceu
.Estabelece osmesmossalários a todosos professoresdo Liceu
Proíbe expressamenteaos prof. públicoslecionarem emestabelecimentosparticulares sob pena desuspensão por 1 ano naprimeira vez e perda dacadeira por reincidência
.Diretor pode acumular comoprofessor.Permite lecionar particularmas não fazer parte de bancaexaminadora.Proíbe acumulação no Liceue Escola de Medicina.Congregação elabora listados mais competentes.Institui premiação do Gov..Só recebem vencimento apóscomprovação de freqüência.Salário de acordo com o nºde alunos.Nenhum discípulo= metade do vencimento.Restabelece Prof. substituto.Professor que acumularcomo substituto receberáacumulativo.conserva os atuaisprofessores
E
S
T
U
D
A
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T
E
S
. Pagamento de matrícula combase no preço médio dasescolas particulares a serestipulado
. aluno paga por conferência umpercentual a mais
. Os estudantes que desejaremcontinuar no Liceu a partir destemomento, passarão por examepara determinar a divisão deensino em que se enquadram
. Enquanto preparaestabelecimentomisto, só receberáalunos externos.Estabelece preço dematrícula. Para os atuaisestudantescontinuarem no Liceuserá feito exame.Permite que o alunoestabeleça ordem dasdisciplinas de acordocom preparatórios
. Estudante é livre paramatricular-se em qualqueraula,desde que habilitado
Estudante que perder anonão pode fazer exames
.O aluno indicado em listatríplice à Congregação queescolherá o que ganharáprêmio em dinheiro.Com 3distinções poderá serprofessor sem concurso
. Bacharéis = preferência paraempregos provinciais,principalmente os de ciências
C
U
R
S
O
S
. Aulas avulsasserão concentradasna Capital
. dividido em :-elementar preparatório com 2anos-superior dividido em duasseções com 3 anos
1. Cultura literária para estudosacadêmicos e professoradosecundário
2. preparação para profissõescomerciais e industriais paracertas escolas ou academiasespeciais de caráter científico-curso ministrado pela manhã etarde- suprime cadeiras deGrego,mecânica aplicada ecomércio-para disciplina de comércio serácriado curso especial, que nãofaz parte do Liceu.-disciplina o ensino particular,condicionando sua abertura aobediência do esquema dematérias das escolas públicas
.estabelece oconteúdo,metodologia elivros para cadacadeira de:.divisão elementar3 anos.Exame deGramática:conteúdo e banca.Divisão Superior:3 anos :a- Letrasb- Ciências
-Suprime cadeiras degrego e Comércio-Divisão elementar – 2anos-Divisão deGramática: 3 anos-Exame de Gramáticapara admissão naDivisão Superior-Divisão Superiorseparada em:.Letras (3 anos).Ciências (3 anos)
.Obrigatórias duaslínguas vivas
.Para Bacharelatomais um ano deLógica
.Para magistériosecundário,além deum ano delógica,curso deciência das escolas(prática)
- Altera divisões e sessõesestabelecendo as disciplinasa serem cursadas no Liceu(14 cadeiras)
-Tempo e duração das aulas aserem determinados pelaCongregação
-Disciplina a obtenção deBacharelato em Letras eCiências
- Para o futuro(?) todas ascadeiras serão providas porconcurso
1873 1874 1875 1876 1881 1886 1889 1890RESOLUÇÃO1275-24.04.1873
REFORMA27.09.1873
RESOLUÇÃO
144303.09.1874
RESOLUÇÃO 158128.08.1875
RESOLUÇÃO168608.08.1876
REGULAMENTODA INST. PÚBLICA1881
DECISÕES :EXAMESPREPARATÓRIOS
REFORMAINSTRUÇÃO PÚBLICA
REFORMAINSTRUÇÃO PÚBLICA
- Diretor do Liceumembro nato do ConselhoSuperior
-Liceu forma um Institutode Letras e Ciências
- Mantém Liceu coo Instituto deLetras e Ciências
-Ensino Públicosecundário = Liceu
- Instituto de Letrase Ciências
.Cria vários Institutospara o ensinosecundário que passoua ser chamado ENSINOMÉDIO.Instituto MédioPreparatório.Instituto Normal doprofessorado primário.Istituto Normal dedesenho.Istituto d ArtesLiberais. Instituto Comercial.Instituto de ArtesMecânicas e Ofícios.Instituto Industrial.Instituto Biologia eHigiene
.Cria o: INSTITUTOOFICIAL DE ENSINOSECUNDÁRIO
Ensino Secundáriocomposto por:Escolas NormaisO Liceu + InstitutoOficialInstituto Baiano deAgriculturaLiceu de Artes eOfíciosAcademia de BelasArtes
. Permiteacumulaçãode aulas dosprofessoresdo Liceu eEscola daMedicina
. Diretor não podeacumular como professor
.Prof. = vitalícioprovimento por concurso
.Estabelece vencimentos
.Jubilação com 25 anos deserviço
.Permite acumulações
.Estabelece competências
. Um contínuo controlará afreqüência dosprofessores
-Provimento porconcurso abacharéis do Liceuou Pedro II ouFaculdade doImpério.Trabalho para osque provaremconhecimentohumanístico.Prof. com 25 anosde trabalho podeser jubilado comtodosvencimentos, seprovar que se achaimpossibilitado decontinuar nomagistério. Quem continuarapós 25 anos terágratificação demais 4ª parte doseu ordenado. Jubilação após30 anos receberátrabalho adicional
. Provimento porconcurso.Estabelece formade concurso.Professoresvitalícios com asmesmas regaliasque os da EscolaNormal.Estabelece tabelasde vencimentos.Estabelecesubstituiçõesdesignadas peloDiretor.EstabelecePenalidades que vãoda advertêwncia àsuspensão doexercício evencimentos
.Matrículas livres noscursos de Letras, Ciênciasnas aulas avulsas.Qualquer aluno poderequerer exame parabacharel(mesmo s/ cursar).Pagamento da matrículaantes da inscrição.20 faltas não justificadasperde ano.Sair da sala sem licença=- falta.Se perturbar pó silêncioserá repreendido peloprofessor.Proíbe:-reunir grupos na porta doLiceu- entrar combengala,chibata ouarma,mesmo militar.Permanecer de chapéu ousentado quando o Diretorou professor passar.fazer caricaturas e andarem grupos nos corredores
. Matrícula dasaulas avulsaspoderá ser feitaem qualquer épocado ano letivo comlicença do governo
-Matrícula avulsa emqualquer época comlicença do governo
.Estabelecepagamento dematrícula
. Para obtenção dobacharelato o alunodeverá entregar 25cópias impressas daTese quer seráexaminada porbanca composta porexaminadores e oDiretor
.Altera as disciplinas doLiceu restabelecendoumas e suprimindo outras(1’3 cadeiras).Mantém o bacharelato emLetras e Ciências comdefesa de Tese.Congregaçãoestabelecerá as horas dasaulas.Estabelece critério deExames e Férias.Estabelece prêmios:-distinção ao talento-moralidade-aplicação nos estudos
.Elevaverba daInstruçãoPúblicaparaexecuçãoda Lei quecriouBibliotecasPopulares
. Mantém asdisciplinas deReforma de 1873
.Suprime umacadeira de Latim
.Restabelececadeirasuspensas desdeque tenha idofreqüênciasuperior a 20alunos
. 13 cadeiras + 2 deLatim = 15
. 2 seções: LetrasCiências
.Estabelece que ohorário das aulasdeverá serdiferenciado parapoderem serfreqüentados pelosmesmos alunos-para obtenção dobacharelato
.Estabelece osexamespreparatórios naProvíncia
. Instrução para arealização dosexames
.Instrução sobre adireção dos examespreparatórios
. Ensino livre
. Ensino Religiosofacultativo
.Criação do conselhosuperior de ensino quetambém era fiscalizador
. Ensino fica divididoem:
- primário-secundário-profissional outécnico
. Curso ministrado em6 anos
.Formando Bacharéisem Letras e Ciências
.Curso composto por27 disciplinas.
61
O quadro 3 indica as principais questões tratadas pela reforma para a
instrução pública de 1890 , apresentada no quadro anterior , que é marco
final para a presente pesquisa . Com um resumo dos aspectos da nova
reforma para o ensino secundário, apontamos as questões que a legislação
disciplina .
Em primeiro lugar, o caráter centralizador presente na organização do ensino
, sendo a direção de incumbência do Governador através do Diretor Geral .
Mas a lei também disciplina as demais instâncias encarregadas da
administração do ensino na província.
Em um segundo momento , a legislação indica como ficava dividido o ensino
público e, finalmente, mostra como ficou o conjunto de disciplinas
ministradas no Liceu , transformado, então, em um Instituto de Ciências e
Letras, com seu curso tendo a duração de 6(seis) anos, com possibilidade de
bacharelato em ciências e letras.
62
QUADRO 3 ____________________________________________________________ ATO - 18-08-1890 REFORMA DA INSTRUÇÃO PÚBLICA ____________________________________________________________
I - Disciplina a direção do ensino no Estado , sendo a direção suprema do governador , através do Diretor Geral da Instrução. Estabelece ainda:
• Inspeção da educação - Diretor Geral Conselho Superior de Ensino Diretor do Liceu Diretores das Escolas Normais Inspetores de Distrito Conselhos escolares Municipais e paroquiais.
• Conselho Superior - Diretor Geral Diretor do Liceu Diretores das Escolas Normais 1 Diretor estabelecimento particular 1 professor público (eleito) Intendente da Câmara Municipal da Capital Professor de Higiene da Faculdade de Medicina Engenheiro diretor de obras públicas Bibliotecário da Biblioteca Pública Diretor do Instituto Agrícola Presidente da diretoria do Liceu de Artes e Ofícios.
63
II - Divide o ensino público em:
Primário - compreendendo : escolas infantis primárias primárias superiores (13 aos 16 anos) Secundário - Escola Normal Liceu Provincial Profissional ou técnico - Escola Normal Instituto Baiano de Agricultura Liceu de Artes e Ofícios Academia de Belas Artes
O Liceu é transformado em Instituto de Letras e Ciências, com curso durando seis (6) anos
Matérias : Gramática filosófica Gramática latina Gramática francesa Gramática alemã Gramática italiana Grego Geografia Geral e Cosmografia Corografia e História do Brasil História Antiga,Média e Moderna Filosofia Aritmética e Álgebra Geometria e Trigonometria Retórica,Poética e Literatura Nacional Escrituração Mercantil e Contabilidade Noções de Direito Comercial Ciências Naturais : noções de Botânica e Zoologia noções de Anatomia e Fisiologia humana elementos de Química,Física e Mineralogia Bacharelato em letras e ciências - com defesa de tese preferência em empregos públicos
____________________________________________________________
Fonte: Coleção de Leis, Resoluções e Regulamentos da Assembléia Legislativa Provincial 1860 – 1890 .
64
Por fim , damos destaque, no quadro 4, ao Ato que, após a reforma, criou o
Instituto Oficial de Ensino Secundário na Província baiana , em substituição ao
antigo Liceu Provincial. Porém , cabe ressaltar que, até o ano de 1940 , foi o
Liceu, ainda que identificado por outro nome, a única instituição de ensino
secundário público na Bahia.
QUADRO 4 ___________________________________________________________
ATO 23.10.1890 CRIA O INSTITUTO OFICIAL DE ENSINO SECUNDÁRIO
____________________________________________________________ Criou o Instituto Oficial de Ensino Secundário no Estado da Bahia , acabando com o Liceu Provincial Estabeleceu os cursos: Bacharel em Ciências - 7 séries Bacharel em Letras - 7 séries Comercial - 4 séries Estabeleceu 23 cadeiras teóricas e práticas , além de Desenho Linear, Música, Ginástica e Contabilidade , tidas como exclusivamente práticas. ____________________________________________________________ Fonte: Coleção de Leis, Resoluções e Regulamentos da Assembléia Legislativa Provincial 1860 – 1890 .
65
Os quadros , além de possibilitarem melhor visualização da legislação da
época, também serviram de instrumento metodológico para que as análises
do período pudessem ser desenvolvidas.
30. - Ampliação das fontes secundárias.
O desenvolvimento desta etapa do projeto foi sendo realizado ao
longo de todo o processo. Cabe, aqui, ressaltar que, assim como
já comentado anteriormente , no que afeta em especial à
educação e ao ensino secundário , são pouquíssimos os estudos
existentes. Nosso trabalho constitui-se efetivamente em uma análise
de base , tendo em vista que a História da Educação para o
período é pouco pesquisada , principalmente no tocante à
educação baiana. Acresce a esse fato, a dificuldade de localização
de material , sem falar em seu mau estado de conservação.
Do ponto de vista da caracterização do processo social do
período , onde se inserem as políticas públicas para o ensino
secundário na Bahia de 1860 a 1890 , contamos com o
aprofundamento das leituras de obras de História do Brasil como
as de Emília Viotti da Costa , Carlos Guilherme Mota , Sérgio
Buarque de Holanda , entre outros, assim como particularmente
em relação à Bahia , com as pesquisa realizadas pelos professores
Kátia Mattoso , Consuelo Novais e Luís Henrique Dias Tavares.
66
Contamos também com a Memória Histórica do Ensino secundário
Official na Bahia , escrita pelos professores Gelásio Farias e
Francisco Conceição Menezes , repleta de fatos , que dão
indicações fundamentais para uma análise do período proposto.
40. Seleção e catalogação dos documentos.
Os dados coletados sofreram um processo de catalogação e seleção,
subsidiando a análise e redação de uma síntese do que consideramos
constituir o processo das políticas públicas para o ensino secundário na
Bahia do século XIX , tomando como referência o Liceu Provincial , tendo,
nos quadros de legislação e Resoluções , as ilustrações que contribuem
para a compreensão das ações assumidas pelos poderes públicos
constituídos, no período.
Nesse sentido , no decorrer do texto, nos utilizamos de trechos de falas,
relatórios ou mesmo da legislação , optando por transcrevê-los na ortografia
da época.
Com essa síntese , procuramos dar conta do movimento histórico entre os
discursos que expressam os propósitos do governo provincial no que tange
ao ensino secundário , para o período proposto , e as decisões efetivamente
levadas à prática , procurando desnudar o que, na nossa compreensão,
compõe as políticas públicas para o ensino secundário na Bahia do século
XIX, expressas no Liceu Provincial.
67
III . TENTATIVA DE SISTEMATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BAIANA NA DÉCADA DE 60: O REGULAMENTO ORGÂNICO
1. Condições Históricas do Período (1860 –1890)
A análise histórica das políticas públicas para o ensino secundário
na Bahia no século XIX, expressas no Liceu Provincial , parte dos
pressupostos teóricos que embasam a concepção de História já
discutida , dentro de uma visão em que a não linearidade da
História é o ponto principal , uma vez que ela é compreendida
em movimento e transformações constantes , o que nos afasta
de uma abordagem na qual o fato esteja isolado , para nos
aproximar de uma abordagem que possa ser indicativa desse
movimento da História.
Compreendemos , também , que o período estudado - 1860 a
1890 - representa uma fase de transição durante o segundo
Império, época em que a Bahia já havia perdido sua liderança
econômica , com a decadência do cultivo da cana-de-açúcar e a
concorrência estrangeira , isso acrescido do fato de ter-se
deslocado o eixo econômico brasileiro para o Centro - Sul do país
com o plantio do café.
68
Apesar dessa decadência econômica, politicamente a Bahia
permanecia bastante forte , com grande influência em todo o
Império. Esse fato pode ser atestado quando verificamos a
quantidade de Ministros baianos a comporem os Ministérios . De
acordo com Consuelo Novais , desde a criação do Conselho
de Ministros (1847) até 1889 , o Império teve 23 Primeiros
Ministros , sendo que a maioria foi de nordestinos e dentre eles
a Bahia forneceu o maior índice - 39% - com 9 nomes.
(NOVAIS.1977)
O período em estudo pode ser caracterizado , também , como
sendo o de afirmação do Estado brasileiro , sendo que o mesmo
não se pode dizer da Monarquia que, nos anos finais do período
estudado , em especial nas duas últimas décadas , entrou em
derrocada., com fortes sinais de enfraquecimento . As constantes
crises de ordem política - externa ou interna - a exemplo da
abolição da escravatura estavam freqüentemente ameaçando a
suposta estabilidade . As constantes mudanças nos gabinetes
ministeriais apontam para essas fragilidades.
Os anos 60 do século XIX podem ser considerados como os que integram a
consolidação do Estado Brasileiro . Segundo Kátia Mattoso , de 1822 a 1850,
temos a construção do Estado Brasileiro, de 1850 a 1870 a sua consolidação
e de 1870 a 1889 , o período de desagregação.
69
No entanto , em que pese esse processo político de consolidação do Estado
Brasileiro, a segunda metade da década , mais precisamente de 1864 a 1870
, é marcada por lutas freqüentes e intensas, incluindo a Guerra do Paraguai,
com todas as suas conseqüências e desastres , chegando, inclusive, a
favorecer o movimento republicano no país.
Para a educação baiana , o ano de 1860 é marcado pelo Regulamento
Orgânico para a Instrução Pública , no entanto , sua normatização pela
Assembléia Provincial levou mais dois anos , sendo editado em 1862.
Infelizmente , os registros quanto às discussões na Assembléia Provincial só
foram localizados a partir de 1874 , razão por que nos escapa o teor das
discussões ocorridas por ocasião da aprovação do referido Regulamento.
A manifestação no ensino secundário e no Liceu Provincial , da
instabilidade política e da crise econômica durante o período em
questão , é de inconstância dessas políticas públicas para
educação da província baiana . As Falas Presidenciais do início dos
anos 60 comprovam a grande rotatividade de nomes no poder, chegando a
mais de um Presidente em um mesmo ano.
As reformas e suas alterações se sucedem e, mesmo antes que tais
mudanças fossem colocadas em prática, já havia propostas para substituí-las.
Tal inconstância, que chega a afetar a consistência das reformas para a
instrução pública baiana , foi devida tanto à instabilidade política da província
, como também às mudanças ocorridas na educação da Corte. Essas
últimas, em sua maioria, não determinavam, necessariamente, a mesma
aplicação nas províncias. No entanto, mesmo assim, eram consideradas
como base na política de educação provincial, até como uma
demonstração de subserviência à Corte, procurando-se aplicar os
novos desígnios na província.
70
A mudança constante de presidentes na província é um dado bastante
significativo, quando nos deparamos com inúmeros problemas não
solucionados. Na Fala de abril de 1860, o então Presidente - Herculano
Ferreira Pena - abre sua exposição à Assembléia Provincial , com pedido de
desculpas por não ter agido de forma mais contundente , em virtude de
desconhecimento das necessidades da província. Dessa forma, argumenta
o Presidente:
Assim pois relevareis minhas faltas, que além de involuntárias,
serão amplamente suppridas pelos muitos esclarecimentos que se
encontrão nos diversos Relatórios de meus honrados
antecessores... (Fala-1860)
Tais afirmações dão a medida não só do desconhecimento , pela total
desvinculação com a província, como também do despreparo para enfrentar
os duros problemas vividos ali, que poderiam ser bem relatados e apreciados,
a partir de informes das autoridades em cada área de atuação . No caso da
Instrução Pública , os diversos Diretores das instituições como do Liceu ,
Escola Normal , por exemplo , ou mesmo o Diretor Geral , possuíam os dados
para que medidas fossem tomadas em relação ao ensino na província . A
inércia com que se deparavam as políticas públicas na província baiana
também apontava para a inexistência de quaisquer mudanças na instrução
pública naquele período
71
2. O ensino secundário em discussão e o Regulamento Orgânico
Os anos 60 foram marcados pelas discussões sobre a precariedade do
ensino e sobre a não aplicação do Regulamento e , ainda , sobre a
necessidade de nova reforma . Discutia-se, também, a validade de
utilização ou não de modelos europeus na educação brasileira e sobre o não
credenciamento dos alunos do Liceu ao ingresso nas faculdades , problema
não solucionado com o Regulamento Orgânico de 1860/62 , o que provocou
até a discussão sobre o fechamento do Liceu.
As discussões quanto à qualidade do ensino ministrado na escola secundária
e a situação da Instrução Pública estão presentes em praticamente todas as
falas da década de 60. Especificamente no que se refere ao ensino
secundário , as maiores questões levantadas repousam sobre a
obrigatoriedade do ensino , a proliferação do ensino particular , a
necessidade de uma vinculação mais prática do ensino. Tais questões já
compunham o pensamento do final da década de 50 , conforme Relatório
apresentado pelo então Diretor Geral de Estudos , João José Barbosa de
Oliveira.
No Relatório sobre Instrução Pública , anexo à Fala do Presidente de 1858, o
Diretor de Estudos enfatiza o ensino como uma obrigação do governo , que,
para ele, não consistia apenas em “pagar professores , mas também
oferecer condições para o funcionamento do ensino – escolas , compêndios ,
material escolar.” (Relatório do Diretor Geral-1858)
72
Com relação ao ensino secundário , o Diretor de Estudos João José Barbosa
de Oliveira acrescenta que se restringe a uma série de estudos gramaticais e
literários , distribuídos em aulas avulsas e no Liceu, sem base e sem fim
social. Opina , ainda, que a instrução deveria ser mais profissional que
erudita mais útil que literária. Segundo o Diretor de Estudos, o Liceu era um
conjunto discorde de várias disciplinas. Para ele, havia necessidade de um
ensino mais prático , defendendo a criação do internato como uma condição
para que isso acontecesse.
No que se refere à obrigatoriedade de ensino , o referido Diretor de Estudo
colocava-se contrário , por entender que conflitava com o direito natural que é
um princípio do regime representativo.
Em abril de 1860 , o então Presidente da Província, Herculano Ferreira Pena,
continuava dando conta da precariedade da situação do ensino na província
baiana . Quanto ao Liceu Provincial , opina na mesma linha de João Barbosa
de Oliveira, pela transformação do Liceu em internato, o que parece ser uma
tendência do pensamento da época. . (Fala-1860)
Admite, ainda , o presidente, na sua Fala de 1860 , que o ensino secundário
não tem uma organização ideal, se é que podemos considerar ideal qualquer
organização para o ensino secundário. Ele próprio afirma não ser ideal
porque além de não atender as exigências sociais, não possibilita ao ingresso
nas Academias. Para tanto, acredita ser o internato a solução. Todavia,
embora o tema fosse discutido à época, nenhuma medida concreta foi
tomada nesse sentido.
73
Nas Falas e Relatórios podemos perceber que se pretende deslocar os
problemas existentes na instrução pública , sobretudo na instrução
secundária, de uma ausência de política clara ou vontade política para
sanear suas mazelas, para o aumento de rigidez comportamental, com
internatos e disciplina severa, como se, dessa maneira, tais problemas
viessem a ser resolvidos.
Durante a década de 60 , as Falas e Relatórios dão conta da
precariedade do ensino público secundário ministrado no Liceu ,
mesmo após o Regulamento Orgânico de 1860 , que tinha como
proposta a organização do ensino na província e, que só foi
normalizado dois anos depois - 1862 , procurando concentrar a
educação secundária na capital e no Liceu .
Para tanto , suprimiu aulas avulsas , bem como aquelas com o número
inferior a 15 alunos e jubilou seus professores . As aulas com
mais de 15 alunos tiveram seus professores transferidos para o
Liceu , ficando esses proibidos de lecionarem em estabelecimentos
particulares , um ano após o Regulamento. O curso secundário
passou a ter 8 anos distribuídos em :
elementar preparatório - 2 anos
gramática - 3 anos (certificado especial)
superior (ciências ou letras) - 3 anos
No ano de 1861 continuaram as discussões sobre o Regulamento Orgânico e
foi sancionada uma resolução alterando alguns aspectos do Regulamento de
1860, Nesse mesmo ano, foi aprovado e sancionado pelo então Presidente
Antonio Costa Pinto , um Plano de Estudos para o Liceu Provincial. Aí, não só
74
estavam estipuladas as disciplinas a serem cursadas em cada ano , como
também o tipo de atividade a ser desenvolvida, incluindo os livros a serem
adotados.
Ao analisarmos o Plano de Estudos do Liceu , organizado por Divisões –
Elementar , Gramática e Superior - , com, respectivamente, 2, 3 e 3 anos de
duração (este último subdividido em Ciências e Letras, conferindo o grau de
Bacharel) pode-se pensar, à primeira vista, que a tão desejada organicidade
havia sido conquistada com o Regulamento Orgânico.
Entretanto , enganaram-se aqueles que assim pensaram, pois basta uma
análise nos mapas de freqüência para verificarmos que mesmo o
Regulamento Orgânico não havia conseguido sistematizar ou dar
organicidade ao ensino secundário. Em verdade, ele não podia ser
considerado um curso. Os alunos matriculavam-se e freqüentavam as
aulas sem qualquer requisito e de acordo com a sua própria vontade ou
disposição. Sendo assim, era comum que um aluno efetuasse sua matrícula
em uma aula e não em todas as que eram oferecidas.
Assim, constatamos que a aplicação do Regulamento não cumpriu
seus objetivos , principalmente no que diz respeito às aulas
avulsas , presentes no Liceu , como podemos verificar nos mapas
de alunos inscritos por disciplina , além da impossibilidade do
credenciamento para os exames preparatórios às Academias,
ocasionando uma fuga para o ensino particular , a ponto de ,
em 1862 , contar o Liceu com, apenas, 9 alunos. Em tais
circunstâncias,conforme afirmamos anteriormente, chegou-se a pensar
no fechamento daquela instituição de ensino.
75
Um ano após a edição do Regulamento Orgânico para a Instrução na
província baiana, o Diretor Geral de Estudos João José Barboza d’Oliveira ,
faz um longo Relatório sobre a situação do ensino na província , defendendo
a necessidade da reforma , ensejada a partir de tal Lei. Seu tom era de certa
lamentação pela situação da Instrução Pública , assim como pelas críticas
que logo começaram a brotar contra o regulamento , mesmo antes de ser ele
colocado em prática.
Em seu Relatório, afirmava o Diretor Geral ser a reforma da Instrução
clamada por todos , dirigentes e professores, durante toda a década de 50.
Comprovava sua argumentação com vários trechos de relatórios de seus
antecessores que reivindicavam reformas para a Instrução Pública.
Em relação, especificamente, ao ensino secundário, sua defesa do Liceu
Provincial da Bahia era veemente, combatendo as idéias de que aquele
estabelecimento deveria ser fechado. Admitia, no entanto, que, por muito
tempo, a situação não era boa naquela casa de ensino , principalmente do
ponto de vista da administração, mas que o então Diretor conseguira pôr
ordem na casa.
Na defesa do Liceu Provincial , afirma que seu fechamento implicaria em
entregar o ensino secundário completamente à iniciativa particular:
76
Decepar pela raiz o foco único de ensino publico secundário !
Supprimir o único elemento de competência entre a propagação
retribuída das humanidades e os collegios particulares das
mesmas lettras, isto é, entregar esse estudo, das mais melindrosas
esperanças de todos os paizes ,ás mãos sós da indústria
individual, embargando aos pobres , á intelligencia, ás asperações
da província, a possibilidade de vivificar esse estudo, manter o
nível delle, mediante a emulação, mediante a sua poderosa e
salutar concurrencia, na lucta , creando seus professores,
formando seus programa ! (Relatório do Diretor Geral de Estudos -
1861)
Continuando a sua indignação quanto à proposta de fechamento do Liceu
Provincial, O Diretor Geral argumenta que isso representaria total vandalismo,
o reino das trevas e o completo enfraquecimento do que denominava de
ensino secundário. Reforçando a sua argumentação , comentava as noções
de um dirigente francês, para definir o ensino secundário :
Os tres generos de instrução são todos igualmente necessarios e
indispensáveis, mas não é igualmente decisiva a ascendência
d’elles . Se a primaria salva o povo do estado de barbaria, em que
vegeta em grande porção na terra, se a superior prepara os
mancebos destinados às carreiras liberaes á pecorrel-as com
lustre, a instrucção secundaria, que em toda infância occupa o
homem,que lhe communica o complexo dos conhecimentos
humanos , forma aquellas que são denominadas as classes
illustradas de uma nação. (Relatório Diretor Geral –1861)
77
Com tal colocação , o Diretor Geral de Estudos tenta definir os estudos
secundários , que passam por uma crise de identidade. Apesar da definição
dada pelo Diretor , entenda-se que os poderes públicos constituídos , desde
a criação do Liceu Provincial da Bahia, não tinham clareza quanto aos
destinos que deveriam dar ao referido ensino, permeado de instabilidades de
ações e indefinições.
Ainda segundo o Diretor João José Barboza d’Oliveira, a nova reforma para
a Instrução Pública , através do Regulamento Orgânico , representava uma
ação decidida do poder político da província, no sentido de apontar para a
melhoria das condições do ensino baiano.
Na Fala do Presidente Joaquim Antão Fernandes Leão , em março de
1862 , além de lamentar o reduzido número de alunos matriculados no
Liceu Provincial , indica não poder fazer nenhum comentário sobre o
Regulamento Orgânico , uma vez que ele ainda não fora implantado. Em
setembro do mesmo ano, no entanto , comentava já estar havendo uma
certa recuperação nas matrículas do Liceu , que denominou de “lisongeiros
melhoramentos “ com a matrícula de 180 alunos.
O Regulamento Orgânico foi normalizado neste ano de 1862 , disciplinando o
funcionamento do Liceu Provincial e, consequentemente, o ensino secundário
em suas divisões Elementar, Gramática e Superior de Ciências e Letras. A
norma também indicava ser obrigatório mais um ano para o grau de bacharel
em Ciências e Letras e, ainda mais um ano de Lógica para aqueles que
pretendessem ser professores do Liceu.
78
A regulamentação da Lei chegava a detalhes de funcionamento do Liceu,
seus compêndios e metodologia. A aparência continuava sendo a de uma
organização para o ensino secundário. Entretanto , o artigo 81 , entre outros,
indicava a permissão para qualquer indivíduo estudar as matérias exigidas ,
como preparatórias, para qualquer das faculdades do Império, independente
de seguirem a ordem regular das divisões.
Essa lacuna deixada pela Lei não ocorreu por acaso, mas comprovou que a
sistematização era apenas aparente, pois, na prática, continuavam valendo
as aulas avulsas. Isso explicaria a fuga para as escolas particulares que
tinham seus estudos sistematizados, apesar de serem regulados pela mesma
norma.
3. Críticas ao Regulamento Orgânico e o ensino particular
Entretanto , as críticas ao Regulamento Orgânico não tardaram . Em 1863, o
Presidente Antonio Coelho de Sá e Albuquerque afirmou ser o referido
Regulamento “defeituoso“ mas , mesmo assim , deveria ser obedecido .
Considerou , também , que o Liceu havia melhorado , mantida, porém a
questão ensino prático ou preparatório acadêmico.
A melhora a que se referia o então presidente dizia respeito mais ao número
de alunos matriculados do que à qualidade do ensino ministrado , sua
seqüência , ou mesmo a possibilidade de habilitação para o ingresso nas
Academias.
79
Apesar da polêmica em tela, ensino propedêutico ou mais prático, o Liceu
Provincial da Bahia deixou de ministrar aulas de Contabilidade , que
passaram a ser oferecidas particularmente , por iniciativa e interesse da
Associação Comercial , conforme consta do Relatório do Diretor Geral de
Estudos João Antunes d’ Azevedo Chaves , datado de 1864 .
Dessas Falas e Relatórios , denota-se uma das contradições existentes entre
o discurso oficial neles presentes , que indica a necessidade de estudos mais
ligados à vida prática e a execução das políticas públicas efetivadas no
Liceu Provincial , suprimindo-se uma disciplina como Contabilidade que, de
tão necessária à atividade comercial , passou a ser oferecida
particularmente.
Ainda no mesmo Relatório de 1864 , podemos tomar conhecimento do fato de
que , após terem sido decorridos quatro anos da edição do Regulamento
Orgânico , que entre outras coisas proibiu a continuidade das aulas avulsas,
as matrículas no Liceu Provincial da Bahia continuavam sendo isoladas ,
com 371 alunos matriculados , distribuídos em 10 (dez) matérias isoladas,
não podendo ser considerado , ainda , como um curso, visto que não havia
qualquer interligação entre as aulas oferecidas. Na verdade, as próprias
referências existentes na documentação da época dizem respeito a aulas
secundárias , indicando a inexistência de um conjunto articulado de
disciplinas que pudesse ser considerado como curso secundário.
Na Fala de 1863, o presidente Antonio Coelho de Sá e Albuquerque lamenta
, mas afirma não existirem recursos suficientes para a instrução pública.
Desse modo , por entender ser apropriado o encaminhamento, a fim de que
fosse feita a propagação da instrução pública, solicitou auxílio aos cidadãos
beneméritos das diversas localidades, aos quais denominava de “homens
bons” , chamando a atenção para a necessidade da contribuição de
80
particulares, destacando a importância dos estudos secundários como base
para o ensino superior.
Com tal postura, o presidente descarta a possibilidade de a província
assumir integralmente as obrigações com a instrução , transferindo
responsabilidades para a iniciativa particular , tanto dando sustentação para
que a província promovesse o ensino, como possibilitando a abertura de
suas próprias escolas
Assim sendo , proliferaram as escolas particulares com seus cursos
sistematizados , possibilitando aos alunos prestarem os exames
preparatórios de ingresso nas faculdades . Na Fala e Relatório da
Instrução Publica de 1864, os mapas nos dão as indicações dessa situação .
Os números de matriculados no Liceu Provincial, além da demonstração da
baixa freqüência e da matrícula por aulas , apontando para a ausência de
qualquer estruturação de um curso secundário, indicam também, a
diferenciação quanto às escolas particulares. .
81
Mapa demonstrativo das aulas e alunos do Liceu Provincial em 1863
N0.alunos perderam ano retiraram-se observações Latim 64 12 1 Faleceu 1 estudante Francês 86 16 - e Inglês 48 8 1 um foi expulso Retórica 3 - 1 Filosofia 25 4 - Geometria/ Trigonometria 44 6 1 Aritmética e Álgebra 61 15 1 Geografia 14 5 - Desenho 25 6 - Divisão elem. 1 1 - TOTAL 371 73 6
Fonte: Relatório de 1864 do Diretor Geral de Estudos - João Antunes de Azevedo Chaves
O mapa das aulas do Liceu durante o referido ano continua indicando que
a desestruturação permanecia , o que é devidamente demonstrado pelas
matrículas por aulas, quando , por exemplo, constatamos 86 matriculas em
Francês para 44 em Trigonometria e Álgebra. Por esse motivo , mesmo o
pequeno número de matrículas indicado na totalização não expressa o real
, pois pode haver duplicidade de matrículas nas diversas aulas, isto é, caso
um mesmo aluno tivesse efetuado matricula em várias aulas , o total de
matriculados seria diferente.
82
Mesmo assim , enquanto o Relatório de 1864 indicava o número de
371 alunos no Liceu Provincial para o ano de 1863 , os colégios
particulares registravam um número de matriculados na ordem de
1336 alunos assim distribuídos:
Mapa demonstrativo dos alunos matriculados em escolas particulares 1863
Ginásio Baiano 498 Colégio 2 de Dezembro 286 Externato 2 de Julho 128 Colégio São João 386 Aula do Prof. Firmino P.D.Gameleira 29 Colégio 7 de Setembro 9 _______________________________________________________ Total 1336 Fonte: Relatório de 1864 do Diretor Geral de Estudos - João Antunes de Azevedo Chaves
Os dados expressos nos quadros são de grande significação , pois nos
fornecem elementos para a afirmação que fazemos ao longo de toda a
pesquisa de que a política pública para o ensino secundário , ao não
solucionar os principais problemas do ensino secundário público , acaba por
facilitar a proliferação - em número e importância - , das escolas particulares.
Nos dados acima apresentados é visível a procura por essas escolas que
possibilitavam o credenciamento para o ingresso no ensino superior. Assim,
nas escolas particulares que forneceram dados – pois nem todas enviavam
tais informações – o número de matriculados chega a ser quase quatro
vezes maior que o do Liceu Provincial , somente para o ano de 1864
83
Praticamente a mesma situação é constatada para os anos subseqüentes,
sendo que nem sempre, como ocorre na Fala de 1865, tem-se informação
clara sobre o ensino particular . Nesse ano de 1865, somente quatro colégios
particulares enviaram seus dados para a Direção Geral. Mesmo assim, o
número de matriculados supera , em muito ,o dos matriculados no Liceu.
Foram 337 alunos no Liceu para 860 naqueles colégios .
Os mapas demonstrativos constantes dos relatórios de Instrução do período
dão a indicação exata da fuga crescente para o ensino particular em
detrimento do ensino público que, apesar dos diversos protestos tanto de
diretores de estudo como dos próprios presidentes , não é alvo de vontade
política que indique modificação desse quadro. Ao contrário ,
encontramos , sim, posições de outras autoridades que advogam,
claramente, a substituição do ensino secundário público oficial , por
aquele oferecido pela iniciativa privada.
No Relatório de 1866 , novamente como Diretor Geral de Estudos , João
José Barboza d’Oliveira , além de apresentar mapas sobre a freqüência e
lamentar a situação em que se encontrava a Instrução pública , faz uma
longa análise sobre como o Estado deveria assumir a educação.
Discordava , como já o fizera no início da década, da posição que pleiteava o
fechamento do Liceu Provincial da Bahia , considerando que tal posição
entregaria a Instrução secundária à “ industria particular “.
Alguns ou instigados pelo desejo da economia , ou por notarem o
enfraquecimento do nosso estudo clássico , outros fundando-se
em mais fragil base , quando não admittem a intervenção publica
nesse ensino, unicamente por que a constituição so ordenou
gratuito o das primeiras lettras , quererião vêr suppresso o Lyceo,
e o estudo letterario entregue á industria particular”. (Relatório-
Diretor Geral - 1866)
84
Continuando sua argumentação, indica, entretanto, ser importante a
existência da concorrência entre o ensino público e particular. E comenta:
A mor parte dos estadistas e escriptores competentes
sensatamente observão que , sendo d'ahi que sahem os homens
publicos de todas as ordens , empregados , militares ,
magistrados , financeiros , ao estado ultamente convem mater,
.ter certo esse ensino , sem o qual definhara o serviço publico com
perda de todos, quer por que a industria particular não podesse
comportar as despezas que elle requer, quer por que , n’esse
mesmo alludido interesse commum , importa , pelos lyceos do
Estado , sustentando a concurrencia, aguçar a emulação ,
estimular o melhoramento, o progresso na sciencia ou nos
methodos. (Relatório Diretor Geral – 1866)
Mais adiante , no mesmo Relatório , afirma: “ A extinção do nosso Lyceo não
tera , pois , o meo humilde assenso”. No entanto , reconhece a necessidade
de investimentos tanto em relação a pessoal e salários , como no que diz
respeito a mobiliário e compêndios.
Porém , como já observamos anteriormente , o Diretor Geral de Estudos
demonstra indignação com o não cumprimento da legislação em vigor para
a Instrução, o Regulamento Orgânico.
85
Não me seduz o numero , que ora conta de alumnos , e que lhe
coube , desde que por uma reação que não pode ser legitimada ,
voltou-se ahí a tradicção antiga , continuando as matriculas , os
estudos sem nenhuma filiação logica , sem nenhum systema
pedagogico , sem o qual , cuido eu, não há exemplo de caza
publica ou particular , propondo-se seriamente a fornecer o
complexo dos estudos , que preparão as artes ou profissões
liberais. (Relatório- Diretor Geral - 1866)
Para concluir , relaciona a situação do Liceu Provincial da Bahia com as
escolas particulares e os exames preparatórios de ingresso às Academias,
levantando dúvidas quanto á possibilidade de acesso dos alunos do ensino
público às Academias. E acrescenta: caso tal situação venha a acontecer,
corre-se o risco de um enfraquecimento do ensino superior , por conta da
deficiência dos ensinamentos das aulas secundárias .
As preocupações levantadas nas análises feitas pelo Diretor Geral de
Estudos João José Barbosa de Oliveira não são elementos novos na
caracterização das condições da Instrução Pública, no século XIX . Na
segunda metade desse século , com a tentativa de sistematização do ensino
público a partir do Regulamento Orgânico , ainda presenciamos as mesmas
situações descritas anteriormente , indicando desorganização e dispersão , a
impedirem que os estudos secundários se transformem em cursos
propriamente ditos. Assim, o Regulamento Orgânico que, no início da década
de 60, buscou organizar o ensino , não conseguiu seu intento e, praticamente
transcorrida uma década , a transformação que aquela Lei se propunha a
fazer não conseguiu sair do papel para a prática do Liceu.
86
4. As divergências na condução das políticas e Nova Reforma
É preciso compreender que, à época, não havia um pensamento monolítico
em relação aos destinos da Instrução pública e à falta de cumprimento das
Leis que a regulavam. Rebatendo as análises efetuadas pelo Diretor de
Estudos João José Barbosa de Oliveira , estão as colocações do presidente
da Província, José Bonifacio Nascentes de Azambuja , em sua Fala, em
Junho de 1867 :
Abstrahindo da despeza com que elle (Liceu) se faz ,
que é questão secundaria , quando se trata de instruir o
povo , creio que a sua extincção não traria prejuizo á
instrucção secundaria, que é muito mais proveitosa nos
estabelecimentos particulares ( Fala-1867).
Ao final da década , o Presidente da Província , Barão de São Lourenço , ao
assumir o cargo pela segunda vez – posto que já havia sido Presidente da
Província Baiana dezessete anos antes - dá indicações no seu Relatório da
situação política em que se encontrava a Bahia. Apesar de considerar o
estado político como “tranquillisador “, comenta que :
... por toda parte uma opposição forte significava a quasi
impossibilidade de progredir o sistema administrativo d’aquella
epocha sem graves consequências. (Fala –1869).
87
A agitação política a que se referia o Barão de São Lourenço dizia respeito às
mazelas das repercussões da Guerra do Paraguai que já estava chegando ao
seu fim, assim como a dissolução da “antiga Camara” pelo poder Imperial. A
situação era tensa e as eleições foram bastante tumultuadas , havendo
incidentes como os da freguesia de Nazaré , onde compareceram “300
homens quasi todos armados “ , ou ainda ao fato que denominou de “eleições
clandestinas e falsas” em alguns locais. Atribuiu essa situação ao fato de
ainda não se achar “firmada a nova ordem política”.
Indica ,ainda , a Fala do Presidente que, na capital baiana , “ rica e populosa”
, sendo a Segunda do Império :
... a política adoptada pelo Governo achava-se isolada da
população , da opinião pública , e escassamente sustentada pelos
recursos officiaes ainda largamente prodigalisados. ... a Cidade da
Bahia , um dos mais consideraveis centros de civilização do
Império , tinha condemnado definitivamente aquella política” . (Fala
– 1869).
Admite ainda, o Presidente ter sido recebido com “rancor dos adversários”
por sua “moderação “, procurando conciliar os interesses. Mas, admite,
também, não simpatizar com uma “repentina transformação”. Tais
declarações são indícios de que as ações da “nova ordem política“ não
pretendiam alterações significativas na província.
Nesse sentido , argumenta, em sua Fala, o Presidente, que sua intenção era de
conciliação, a fim de “prover á conservação da ordem , á sustentação de seus
principios , e de combater o despeito e as hostilidades acintozas” .
88
O Relatório presidencial lamenta, ainda, o estado da Instrução pública em
que, segundo o presidente , houve uma queda na qualidade dos professores ,
pois deixaram de existir os concursos públicos que deram lugar às
“nomeações”, afirmando “... a mor parte por proteção , sem prévia consulta
aos interesses imprescindíveis da instrução “(Fala – 1869)
Ainda avaliando a situação da Instrução Pública da província baiana, afirma:
Permitti que seja franco : profundamente me penalisou o atraso em
que achei a instrucção pública. ... nenhumas são as vantagens que
se tem colhido n’estes 18 annos , intervallo entre a minha primeira
e Segunda administração. (Fala-1869)
Diante dos males da Instrução Pública , o Barão de São Lourenço indica a
necessidade de nova Reforma , desde que enérgica o suficiente para
“extinguir abusos ...”.É como se fosse esta a fórmula mágica para por fim aos
problemas existentes.
O Liceu Provincial, que foi fundado em 1836 , com o objetivo de reunir as
aulas maiores , concentradas em uma única instituição de ensino , sofreu,
então, por parte do Presidente da Província , severas críticas.
Argumentou ele que, ao concentrar as cadeiras no Liceu e extinguir as
existentes em outras comarcas ,ainda assim várias ficaram sem qualquer
direção. Propõe que a próxima Reforma reveja tal situação , ampliando o
ensino secundário na Província:
89
Entendo também que se deve ampliar mais a instrucção secundaria ,
convindo que sejão restituidas ás cidades e Villas que as tinhão as
cadeiras de Latim que forão suppressas com grande desvantagem
dos creditos litterarios d’esta Província. (Fala – 1869)
Para o Barão de São Lourenço , as causas da baixa freqüência das aulas
secundárias públicas , ministradas no Liceu Provincial , residiam exatamente
na sua concentração na capital . Assim , com esse raciocínio , julga que, ao
restabelecer as aulas , sobretudo as de Latim , no interior da província , esse
mal estaria sanado . No entanto , essa linha de pensamento deixa de
esclarecer os motivos por que as aulas particulares tinham o triplo de alunos
que as públicas , mesmo ocorrendo na capital . Portanto , apenas tal motivo
não justificaria a dispersão das aulas pela província. Em nenhum momento,
em sua Fala , ele discorre sobre a necessidade de uma maior sistematização
, ou mesmo seriação e integração entre as cadeiras ministradas como aulas
secundárias.
Outra grande crítica feita pelo Presidente Provincial em relação à Instrução, é
a ausência ou deficiência dos dados numéricos , tendo em vista que não
havia um recenseamento completo na Província. Entretanto , os dados a que
teve acesso davam conta de que :
No Lyceo , com 17 lentes , apesar désse grande numero para
ocupar dez cadeiras, e serem elles dos melhores da Provincia , as
matriculas nas diversas aulas apenas forão 380 , perdendo o anno
128 alumnos; e nos Collegios particulares da Capital , pelos
mappas recebidos, a frequencia foi de 1137 , o tríplo d’aquelles;
sendo o numero total 1517. (Fala – 1869)
90
No mesmo ano de 1869 , o Diretor Geral interino de Estudos , Cônego
Francisco Pereira de Souza , no Relatório apresentado ao Presidente da
província , não acrescentou muitas novidades à situação da instrução pública,
referindo-se sempre aos Relatórios anteriores. Porém, deu destaque ao
avanço do ensino particular, afirmando: “ Estranho ainda, de certo ponto , a
marcha particular do ensino na província... “ (Relatório – 1869)
O período que poderia ter sido considerado como aquele em que o ensino
secundário foi sistematizado, foi apenas um período de tentativa. O
Regulamento Orgânico deveria ter cumprido o papel estruturador do ensino,
porém antes de implantado plenamente já estava prestes a ser substituído.
Assim , as atenções voltaram-se para as discussões em torno de uma nova
reforma.
Por outro lado , enquanto prosseguiam os debates e o Regulamento não foi
implantado, permaneciam as mesmas condições de desorganização do
ensino secundário, sem um curso estruturado, com matrículas por aula no
Liceu, não credenciando para o ingresso nas Academias do Império. Assim
sendo , foi inevitável a fuga para o ensino particular e o esvaziamento do
Liceu Provincial , a ponto de pensar-se na sua extinção.
O Liceu Provincial da Bahia e o ensino público secundário sobreviveram a
essas discussões para enfrentar , ainda que cambaleante , várias outras
reformas.
91
IV . A DESAGREGAÇÃO DO IMPÉRIO E AS CONSEQUENCIAS PARA O
ENSINO SECUNDÁRIO BAIANO
Os anos que se iniciam a partir de 1870 são considerados por Kátia
Mattoso como os de desagregação do Império . São tempos de crise que ,
com o final da Guerra do Paraguai, adquirem características mais
permanentes , em especial para a região Nordeste do país que, cada vez
mais, tem seu desenvolvimento distanciado da região Centro-Sul . As novas
idéias e tendências políticas multiplicavam-se em torno da abolição da
escravatura , acirrando-se os conflitos com a Monarquia já desgastada e
atritada com a Igreja e o Exército.
Os ideais positivistas passaram a ter seus espaços políticos conquistados
entre civis e militares . O pensamento predominantemente católico recebia o
impacto do pensamento comtiano, com idéias evolucionistas do positivismo.
O pensamento republicano foi adquirindo contornos mais definidos.
Os últimos 20 anos do Império são de declínio e questionamento do próprio
regime. Questões como a religiosa, a militar, as reformas eleitorais, a
campanha abolicionista marcaram o final da Monarquia. Os anos 70
concretizaram , também, a discussão da mudança de regime, com a
fundação do Partido Republicano. Tal situação levou Raul Bitencourt a
observar que “os últimos vinte anos da monarquia são efervescentes de
imprevistos, renovação e contrastes ,” (1953 :50)
92
Na abertura dos trabalhos da Assembléia Provincial, em março de 1870 , o
então presidente da província baiana Barão de São Lourenço , admite que
as divergências políticas ocorridas em vários locais da província , fruto das
tensões da época - já comentadas na análise da década de 60 - prejudicaram
o seu período anterior de governo. , dizendo , ainda, ter consciência de “não
ter sido feliz” , na referida época. A pesar de todos os problemas políticos
enfrentados, o presidente declarou-se com “vívido interesse em promover o
engrandecimento da provincia” (Fala-1870).
Reconhece o Barão de São Lourenço , também em sua Fala , que o estado
da decadência administrativa teria sido responsável pelos problemas da
Instrução Pública da província . A esse respeito , ao analisar as reformas já
ocorridas na educação baiana , afirmou ser fruto dessa decadência :
... impraticabilidade das precedentes reformas, pelos vicios que
ellas originaram na educação da mocidade, que teve de ficar em
abandono ; percebendo muitos os vencimentos sem trabalho, e
outros fazendo do ensino jogo político. (Fala-1870)
Em vista da situação em que se encontrava a Instrução pública , já por ele
criticada no período de seu governo anterior , o Barão de São Lourenço
decidiu iniciar o processo para nova reforma, que de acordo com ele “ é
solicitada por todos os homens imparciais e entendidos na materia”. (Fala-
1870)
93
No relatório presidencial de 1870 , constatam-se os mesmos problemas em
relação ao ensino secundário. Nos mapas comparativos entre o ensino
particular e público , em que pesem a deficiência dos dados e o envio de
estatísticas por apenas 10 aulas particulares , constata-se a freqüência de
411 alunos em aulas particulares , para 262 matriculados no Liceu , dos quais
109 foram reprovados.
No mesmo período , 1870, o prédio em que funcionava o Liceu , na Palma ,
entrou em reforma devido às péssimas condições físicas , passando as aulas
a serem ministradas , provisoriamente , em um edifício alugado para esse fim
, prejudicando , ainda mais , os problemas de freqüência durante o período
de reforma.
1. A Reforma de 1870 – Críticas ao Regulamento Orgânico
Para a educação baiana , a década de 70 teve início com uma nova
Reforma da Instrução pública e , particularmente, do Liceu que permaneceu
com os mesmos problemas apontados desde sua fundação. No Relatório
que precedeu à Reforma propriamente dita , o Barão de São Lourenço
critica, duramente, as Reformas anteriores e , principalmente, o Regulamento
Orgânico no que se refere ao ensino secundário , dando indicações claras de
que, na verdade, ele não foi totalmente colocado em prática. Ainda na
apresentação que justifica a necessidade da Reforma , o Barão de São
Lourenço afirma ser o ensino secundário de “importância de primeira ordem
entre as nações cultas “ e, que a “... instrucção primaria é sem dúvida a
base...” , definindo , assim , o ensino secundário:
94
A instrucção secundaria porem forma a classe media das
intelligencias , o cidadão activo , industrioso , o burguez enfim do
seculo XIX , que se distinguirá no comercio , nas artes e na
agricultura ; ella abre tambem as portas da instrucção superior ,
que constitue a moderna aristocracia das grandes profissões , e
que preenche os mais importantes destinos sociaes. (Resolução
1116 - 1870)
Nesse mesmo Relatório em que o presidente da província baiana apresenta
a Reforma da Instrução pública , duas questões importantes , entre outras ,
foram colocadas em discussão. Uma delas dizia respeito ao ensino privado ,
que cada vez mais avançava, conquistando espaços no Império e , vista com
bons olhos pelos poderes constituídos , que se sentiam quase desobrigados
de assumir a educação , considerando que os “particulares “, como eram
tratados , poderiam se incumbir de tal obrigação, sem recorrerem aos cofres
públicos. A outra questão destacada referia-se ao conteúdo do ensino
ministrado nas aulas secundárias , reclamando a necessidade de tais
conteúdos serem mais científicos.
Dentro dessa visão, na continuidade de seu Relatório , em que apresentou a
Reforma da Instrução Pública , o presidente afirma:
O ensino secundário , pois, formando a principal força da
intelligencia nacional , não deve ser abandonado ao insticto
paterno somente , como por excepção tem sucedido em alguns
povos praticos... ( Resolução 1116-1870).
95
Nessa afirmação , o Barão referia-se à Inglaterra , aos Estados Unidos , à
Suíça e à Alemanha , onde , segundo ele , os particulares assumiram a
tarefa da educação, sem a interferência dos governos , em uma nítida
defesa ao ensino particular que desobrigasse o governo de assumir a
Instrução.
Continuando na mesma linha de raciocínio, afirmou que isso ocorreria “sem
maior inconvenientes , pela indole de certas raças que parecem
privilegiadas” . (Resolução 1116 – 1870).
Com um tom quase de lamentação, o presidente da província tece
comentários sobre o peso do ensino para os cofres públicos:
A Instucção tem estado a cargo exclusivo dos cofres publicos ,
somente com excepção da que distribuem os collegios e
escholas particulares, estabelecidas como um meio legitimo de
industria , as quaes fazem crecidos lucros á proporção do
descredito dos estabelecimentos publicos. (Resolução 1116-1870).
Para fortalecer a sua idéia de que a instrução poderia ser assumida pela
iniciativa particular , argumenta:
96
Na Inglaterra, a generosidade e o patriotismo dos particulares
crearam os maiores estabelecimentos deste ensino , que ainda
hoje subsistem sem auxilio do governo... e tem formado grandes
cidadãos para seu paiz , e sabios para o desenvolvimento da rasão
humana. (Resolução 1116 – 1870).
No que tange à discussão sobre os conteúdos mais científicos para o ensino
secundário , o presidente ilustra com o que se passa nos países citados:
As luzes do seculo porem conseguem realisar nesses mesmos
estabelecimentos modificações em favor das sciencias , e tem
creado tambem outras escholas menos rotineiras, ..., ainda devido
aos esforços particulares. (Resolução 1116- 1870).
Um longo trecho de seu Relatório foi dedicado a essas discussões sobre
ensino público e particular , além do ensino das ciências e letras, o que
demonstrava a grande preocupação que tais temas implicam. O que está em
jogo , além da idéia de retirar do Estado a responsabilidade pelo ensino, é o
tipo de sistema que poderia ser implantado , uma vez que não havia
nenhuma forma , ainda , sistematizada.
97
Buscando respostas nos países ditos mais avançados na época , a exemplo
da França e da Inglaterra , procurou saídas para a situação do ensino . Dessa
forma, exemplificou tanto com os “modelos“ mais estatizantes , como aqueles
mais ligados às iniciativas privadas, indicando, também , a possibilidade de
convivência dos dois sistemas.
A Alemanha do Norte se approxima mais da França tanto na
admissão das sciencias para a instrucção secundaria , como na
ingerencia do poder protetor . Assim por toda parte se multiplicam
os gymnasios e escholas reaes , sem exclusão de
estabelecimentos similhantes, devidos aos esforços particulares.
(Resolução 1116-1870).
Argumentando sobre a possibilidade de existência conjunta dos dois
sistemas, acrescenta:
A lucta portanto que se deu para a bifurcação dos estudos
secundarios , segundo a feliz expressão de um escriptor ,
separando as sciencias das letras, e promovendo-se educações
differentes , parece ter cessado, sendo hoje a questão discutida –
o justo acordo entre umas e outras. (Resolução 1116-1870).
Usando a Inglaterra , exemplifica:
98
Os inglezes , muito classicos nas suas escholas , muitos livres nos
methodos do ensino, independentes na organisação escholar ,
começam a receber a influencia das ideias francezas , marchando
todas as nações para um systema mais ou menos uniforme.
(Resolução 1116-1870)
Estando em pauta a discussão quanto ao ensino das ciências ou letras, e
mesmo a convivência de ambos, continua argumentando:
Si alguns entendem que as letras são indispensaveis para manter a
superioridade das altas classes da sociedade , idéa que influio
provavelmente na Inglaterra essencialmente aristocratica; outros
com rasão acreditam que os conhecimentos scientificos decidem
da supremacia industrial e commercial de uma nação, que é magna
questão do seculo; assim como que a cultura litteraria não dà a
precisão do raciocinio. As sciencias concorrem mais
poderosamente para a instrucção do que é util, as letras para a
educação do homem , para formar o espirito, pondo-o em
correspondencia com os grandes caracteres da antiguidade ;
formando-lhe o gosto pelo que é moral , e fazendo como uma
distincção do que é somente utilitário , que ensina exclusivamente
a aridez das sciencias naturais. (Relatório 1116-1870).
99
Nessa linha de pensamento, o presidente da província baiana se embasou
para a proposta na reforma do ensino , do retorno de duas seções, sendo
uma de ciências e outra de letras, não sem antes observar a situação em que
se encontravam ambas e tecer críticas:
Entre nos , como demonstro se quis a fraternidade dos dous
ensinos , mas tem-se recuado: acompanhando os habitos e
inclinações da população não se tem insistido em fazer-lhe
indispensaveis modificações. (Relatório 1116-1870).
A longa introdução feita pelo presidente Barão de São Lourenço ao
apresentar a proposta de Reforma para o ensino secundário à Assembléia
Provincial , trouxe , também , uma retrospectiva da legislação, desde antes
da criação do Liceu Provincial até a legislação em vigor na época , que era o
Regulamento Orgânico de 1860, modificado pelas normas de 1862.
Deplorando a situação em que se encontrava a instrução da província à
época , afirma:
Neste estado da instrcção secundaria foi publicado o Regulamento
Organico de 1860, e o foi com tanta precipitação que no anno
seguinte, em 6 de dezembro de 1861 , uma Resolução lhe mandou
fazer mais de cem emmendas , provavelmente no correr da
respectiva discussão; do que resultou a 2ª edição do dito
Regulamento Organico, datado de 22 de abril de 1862, que vigora.
(Resolução 1116-1870).
100
Continuando as censuras ao Regulamento Orgânico que, segundo o
presidente, nunca vigorou na realidade , faz severas críticas:
Desejando fallar á provincia com a franqueza propria de minha
idade , da posição que ocupo neste momento, e da gratidão que
consagro á meus comprovincianos, assevero que em tempo algum
se lhes fez maior mal : a instrucção, quer primaria quer secundaria,
pouco distou de sua completa anniquilação. Terrivel exemplo de
innovações irreflectidas , e de ensaios do que se lê sem o preciso
criterio e se apllica ainda sem o estudo do paiz”. (Resolução 1116-
1870).
Complementando sua censura ao Regulamento Orgânico, acrescenta que tal
legislação “não fez todo mal que prometeu” , uma vez que não colocou em
prática inúmeras atribuições para o funcionamento do ensino secundário.
Assim, segundo o presidente, a província não foi dividida em circunscrições
acadêmicas, da mesma forma como não foram criadas as divisões previstas
no Regulamento como elementar, gramática e superior que conferiria o grau
de bacharel nas divisões de ciências ou letras, as quais também não
funcionaram . Dessa forma, não houve nenhum caso em que se conferisse o
grau de bacharel, como estava previsto, ao cabo de 9 anos de implantado o
Regulamento , pois praticamente 10 anos após a regulamentação , grande
parte de seus artigos não havia sido efetivamente implantada.
101
De qualquer forma, a crítica do presidente provincial é procedente, no entanto
sua fala é como se fosse de alguém que estivesse completamente afastado
dos acontecimentos. Porém isso não era exatamente o que ocorria, pois,
como governante da província, caberia a ele , também , provocar os meios de
fiscalização a fim de que a legislação pertinente à educação viesse a ser
cumprida. De cada governante que se sucede, encontramos severas críticas
e novas propostas , que novamente não serão colocadas em prática.
Voltando às críticas que já fazia no seu governo anterior , o presidente
lamentou a concentração dos estudos secundários no Liceu e na capital ,
que, segundo ele, foi uma das poucas normas do Regulamento de 1860,
imediatamente colocada em prática.
A suppressão de todas as cadeiras do ensino secundario, fóra do
Lyceo, decretada pelo art.70, tornou-se logo effectiva, povoando-se
esta cidade dos respectivos professores sem que a instrucção no
Lyceo ganhasse , e perdendo a das localidades e sem alivio dos
cofres, que foram com tal providencia gravados , duplicando os
vencimentos ! (Resolução 1116 –1870)
Ainda na mesma Resolução , o Barão de São Lourenço , após uma longa e
minuciosa descrição da situação do Liceu Provincial feita por um de seus
professores , conclui serem as despesas muito elevadas para pouco
aproveitamento, argumentando:
102
... nenhum exame tendo lugar para demonstrar algum proveito de
tão grandes sacrificios ; decahindo o ensino quasi até anniquillação
, não obstante o pessoal de fiscalisação , como inspector especial ,
censor , etc. (Resolução 1116-1870)
Continuando o severo tom de crítica , avaliou que o aumento de matriculados
no Liceu , apesar do pouco aproveitamento , somente teria ocorrido em
virtude de incentivos do tipo da isenção para o recrutamento e para o serviço
da guarda nacional .
Uma das últimas questões discutidas pelo Presidente, na Resolução que
propôs a Reforma do ensino secundário, dizia respeito aos professores ,
suas atividades , acumulação com a Escola de Medicina, salários e
afastamentos.
Justifica que os professores, desestimulados com o pouco aproveitamento
dos alunos e a ausência dos exames comprobatórios de seu trabalho,
passaram a faltar ,a não cumprir horários ou a solicitar demasiadas licenças,
prejudicando a qualidade do ensino ministrado no Liceu.
103
Considerando a acumulação de aulas do Liceu com as da Escola de Medicina
como uma grave questão, e relacionando tal fato com os vencimentos
percebidos pelos professores , afirma:
Sem duvida um paiz onde não se paga bem os professores como
todos os funccionarios publicos , pela escassez de sua renda , e
necessidade de muitos empregos em rasão da dispersão da
população, não pode condemnar todas as accumulações , porque
nem sempre significam patronato, e ahi, como entre nos , todo
estímulo não é excessivo; porém no caso de que se trata a
incompatibilidade me parece saliente. (Resolução 1116-1870)
Para o Presidente, a acumulação das atividades dos professores do Liceu,
com as pertinentes à Escola de Medicina, prejudicariam a qualidade do
ensino, na medida em que os exames de final do ano teriam épocas
coincidentes .Nesse caso, o professor teria que faltar a um dos dois ,
concluindo que provavelmente a falta seria ao trabalho do Liceu . Além disso
, argumentou que a regularidade do serviço também seria prejudicada e o
conteúdo não sendo idêntico nas duas escolas , poderia vir a comprometer o
desempenho do professor , que iria tornar-se superficial. Por todos esses
motivos decidiu-se pela incompatibilidade dos dois serviços, propondo a
proibição da referida acumulação
No final de seu Relatório , contraditoriamente às idéias privatizantes
apresentadas no decorrer de sua explanação , antes de apresentar a
proposta de Reforma, lamenta que as escolas particulares estivessem
dominando o ensino secundário:
104
O Lyceo é actualmente um pesado encargo para a provincia; e
como nelle se concentra todo ensino publico secundario , os
collegios particulares sustentam só hoje esta tal ou qual instrucção
para a matricula dos dous curso geraes , direito e medicina;
disputando-se ahi quem mais depressa satisfaça aos desejos dos
pais de alunnos, que no interesse de sua fazenda, e na pressa de
um diploma para seus filhos, que lhes abra as portas a todas as
ambições , preferem o desejado desfeixo á solida instrucção que
habilitaria bachareis e doutores de outra força e de superior merito.
(RESOLUÇÃO 1116 –1870)
Diante da situação apresentada , pergunta quais os caminhos a seguir ,
chegando a questionar o fechamento do Liceu:
N’estas circunstancias cumpre ou supprimir o único
estabelecimento publico de ensino secundario que possue a
provincia , deixando a substituição aos esforços particulares , o que
seria retrogradar a Bahia , e perder a posição que tem ocupado; ou
realisar uma reforma efficaz , submetendo-a ao patriotismo e luzes
da Assembleia Provincial (Resolução 1116-1870)
Antes de encerrar a longa introdução de seu Relatório , o Barão de São
Lourenço propõe modificação nas disciplinas ministradas no ensino
secundário , retornando disciplinas mais ligadas ao campo das ciências, sem
as quais, segundo ele , não haveria condições de o país avançar para a
modernidade. Assim argumenta:
105
Desejava , verbi gratia , poder inspirar a meus comprovincianos a
convicção da necessidade das sciencias auxiliares das differentes
industrias , como as mathematicas , a chimica , a physica , e a
agricultura com todos os variados conhecimentos que lhe são hoje
indispensaveis; seria feliz si conseguisse , restabelecidas taes
cadeiras, que para ellas se dêsse frequencia , porque sem estes
estudos não poderemos acompanhar o progresso das outras
nações , e nos barbarisaremos com as questões de méra politica ,
que arma os braços fratricidas para disputarem a posse da fortuna
em diminuição. (Resolução 1116-1870).
2. Características da Reforma de 1870
Com a Reforma da Instrução de 1870, encaminhada pelo Barão de São
Lourenço, através da Resolução 1116, a direção do Liceu Provincial passou
para as mãos do Diretor Geral da Instrução , em uma visível tendência à
centralização das decisões , como tentativa de resolver os problemas .
Definiu, ainda , a reforma o restabelecimento da Congregação do Liceu ,
também sob a presidência do Diretor Geral de Estudos. Estipulou formar o
Liceu um curso com 14 matérias (cadeiras) com tempo de duração a ser
decidido pela Congregação. Essas 14 cadeiras são as seguintes:
106
- Grammatica e versão da lingua latina;
- Latinidades
- Grammatica e versão da lingua grega;
- Lingua franceza;
- Lingua ingleza;
- Grammatica philosofica, nas suas applicações á lingua
portugueza , compreendendo a historia da mesma lingua;
- Geographia e historia ,antiga e media;
- Geographia e historia moderna , com especialidade do Brasil;
- Rhetorica e poetica : literatura nacional;
- Philosofia racional e moral , comprehendendo noções geraes
da historia d’esta sciencia;
- Arithmetica e algebra
- Geometria e trigonometria
- Elementos de chimica e physica comprehendendo somente
os principios mais geres com applicação aos usos da vida.
Primeiras noções de geologia e mineralogia;
- Elementos de zoologia e botanica nas suas applicações mais
geraes , e particularmente á agricultura.
(Coleção de Leis e Regulamentos -Reforma 1870)
Para a obtenção do grau de Bacharel , o aluno poderia optar por bacharelato
em ciências ou letras . No primeiro caso, seria necessária a aprovação em
todo o curso ; para letras , ficava o aluno dispensado das aulas de Grego ,
Trigonometria , elementos de Química e Física , Zoologia e Botânica.
107
Essa Reforma não solucionou o problema das matrículas por disciplina, pois
o estudante continuou livre para matricular-se em qualquer das aulas , exceto
na de Grego, para a qual deveria mostrar-se habilitado em Latim e nas de
Geometria, Trigonometria, Química e Física, para as quais deveria ter sido
aprovado em Aritmética e em Álgebra. Ao mesmo tempo, qualquer pessoa
poderia requisitar à Congregação exames de algumas ou de todas as
matérias , com clara indicação de ausência de um sistema educacional.
A Reforma previa, para o preenchimento de professores das novas cadeiras
então criadas, concurso público realizado em palácio, sob a presidência do
Presidente da Província , com a presença do Diretor Geral. Tal medida , que
se estendia a todas as cadeiras , viria solucionar as indicações tão criticadas
pelo então Presidente da Província.
Disciplinando os salário dos professores, estabeleceu um recebimento
proporcional ao número de alunos. Por exemplo: caso não houvesse aluno
matriculado na aula, o professor somente receberia a metade do valor afeto
aos demais professores. Entretanto, permitia-se a substituição de professor
, acumulando-se os salários.
Alterando o que dispunha o Regulamento de 1860/62 , permitia-se ao
professor acumular suas aulas no Liceu e outras lecionadas particularmente,
vedando , entretanto , a acumulação das aulas do Liceu com as da Escola
de Medicina , sob pena de jubilamento.
108
A legislação de 1870 propôs, ainda, um sistema de premiação a professores
e alunos. No primeiro caso, deveriam ser indicados, a cada ano, três
professores que obtivessem o melhor desempenho, fosse em número de
aprovações ou na atividade de magistério. No caso de alunos , o mesmo
procedimento, com a indicação dos melhores três alunos por ano , recebendo
distinção especial que, repetida três vezes, resultaria em uma recompensa
em dinheiro. Além disso, o aluno também poderia , se assim o desejasse ,
ingressar como professor no próprio Liceu , ficando isento de concurso.
Nas Disposições Gerais , um fato novo. Foi proposta a criação de uma
Revista , sob fiscalização do Diretor Geral , de publicação quinzenal
destinada “exclusivamente ao desenvolvimento da instrução “ . Essa
recomendação refere-se à observação de que a Revista não deveria
veicular nenhuma questão política , mas sim os atos referentes à instrução,
como também relatórios , mapas , além de acontecimentos importantes na
instrução de outras províncias e na Corte. Completando os dados da Revista
, também deveriam ser publicados artigos estrangeiros que discutissem a
questão da instrução.
Essa Reforma teve curta duração , como tantas outras no período em
estudo, expressando a instabilidade política , sendo logo substituída por
outra em 1873 , estando a província sob a presidência de Antonio Candido
da Cruz Machado. Entretanto , dos anos de 1870 a 1873 , as discussões
contidas nas Falas e Relatórios expressavam a intenção de colocar em
andamento as modificações provocadas pela Reforma da Instrução Pública
de 1870.
109
No ano seguinte à Reforma ,que introduziu a Revista da Instrução Pública ,
foi elaborado um relatório pelo redator da referida revista , que não só
comentava o número de assinantes , como também o seu conteúdo .
Assim, o relatório deu conhecimento de que os temas mais tratados nos
artigos da Revista foram: a liberdade de ensino, a organização do ensino
com auxílio dos particulares, a intervenção da família na escola. São temas
próprios da inquietude da época , quanto à Instrução Pública.
A Fala de 1871 indica que, apesar das dificuldades, a Reforma da Instrução
estava sendo colocada em prática . As dificuldades a que o Barão de São
Lourenço se referia relacionavam-se com a instalação dos Conselhos
Municipais , instituídos com a Reforma de 1870. Nota-se que há uma grande
preocupação para que tais Conselhos sejam instalados e organizem a
instrução nos municípios , sem que precisem recorrer ao governo provincial .
Não há dúvida de que é uma forma de buscar a descentralização da
administração com a instrução , mas, ao mesmo tempo, uma contradição ,
tendo em vista que a Reforma de 1870 tinha características centralizadoras,
como é o caso de acumular-se a direção do Liceu com a direção da
Instrução . Diante dessa contradição , o que se pode concluir é que, na
verdade , ao invés de descentralizar , está-se desfazendo de
responsabilidades , transferindo-as do governo provincial para os diversos
municípios.
Uma outra questão foi também aí esclarecida , demonstrando que a
implantação da Reforma de 1870 não foi tão pacífica quanto se desejaria
deixar parecer . Isso diz respeito à situação de professores que deixaram de
receber salários em função da ausência de alunos matriculados em suas
cadeiras , conforme previa a lei. No entanto , não concordando com tal
medida, os professores pressionaram o governo com medidas judiciais.
110
Com o sucesso da ação de um professor, que recebeu por todo período que
ficara sem dar aulas , o presidente da província resolveu alterar o artigo que
disciplinava essa questão , para outro que garantia o pagamento aos
professores que não tivessem número suficiente de alunos, até que o
governo tomasse providências , colocasse o professor em disponibilidade ou
extinguisse a cadeira.
Apesar de estar a reforma em andamento , as Falas presidenciais dos anos
subseqüentes indicam não ter havido mudanças significativas na situação
do ensino secundário e do Liceu Provincial. As matrículas continuavam
diminutas frente às demandas, inscrevendo-se, durante o ano de 1871 , 225
alunos.
No ano de 1871 , o então Diretor Geral da Instrução Pública , Francisco José
Rocha , ao encaminhar ao presidente da província , seu relatório , informa
que se procurou, durante o ano , executar as mudanças impostas pela
Reforma de 1870.
Segundo o Diretor Geral , as matrículas continuaram sendo efetuadas por
“cadeiras” , em um total de 247 matriculados. Atribuiu essa pequena
matrícula – no ano anterior foram 380 - ao fato de ter sido extinto o
recrutamento para a Guarda Nacional , uma vez que muitos alunos
matriculavam-se no Liceu para evitar tal alistamento, em decorrência de
garantia conferida por Lei .
Em relação aos alunos matriculados tanto no Liceu quanto em escolas
particulares , os números são muito confusos , o que também ocorre nos
relatórios anteriores. Apesar de indicar em seu Relatório um total de 247
111
alunos, no mapa por disciplina somente constam 225 distribuídos nas
diversas cadeiras da seguinte forma:
Freqüência das diversas aulas do Liceu Provincial -1871 Latim ------------------------------------------------------------- 45 Latinidade ------------------------------------------------------- 8 Francez ---------------------------------------------------------- 70 Inglez ------------------------------------------------------------- 23 Grego-------------------------------------------------------------- 8 Philosofia -------------------------------------------------------- 15 Grammatica Philosofica-------------------------------------- 10 Geographia e Historia antiga ------------------------------- 2 Geographia e Historia Moderna --------------------------- 18 Arithmetica e Algebra ---------------------------------------- 16 Geometria ------------------------------------------------------- 6 Botanica --------------------------------------------------------- 4 Total 225 Fonte: Relatório do Diretor Geral - 1871
O quadro demonstrativo de aulas do Liceu para o período em tela , além de
indicar os mesmos problemas já comentados sobre as matrículas por aulas,
que não precisam o número de alunos, indica , também , a desestruturação
administrativa , ou pelo menos ausência de interesse na coleta de dados
reais para os acontecimentos relativos à instrução da província. Assim o
relatório registra um total de alunos na instituição pública que não existiam
na realidade.
Agravando mais a situação do desenvolvimento da política pública
estabelecida para a instrução no período, notamos na freqüência das
cadeiras , a ausência de algumas implantadas na Reforma de 1870 , sem
que sejam feitas quaisquer referências aos motivos de sua não inclusão.
112
Continuando seus comentários sobre a execução da Reforma de 1870 , o
Diretor Geral da Instrução Pública afirmou que foi diminuto o aproveitamento
dos alunos do Liceu durante o ano. Os motivos a que ele atribuía aquela
situação eram , em primeiro lugar , o abandono durante o ano , por aqueles
que somente efetivaram suas matrículas para fugir do alistamento na Guarda
Nacional,. Em segundo lugar , argumentou não haver autorização legal para
que os abusos fossem reprimidos . No entanto, não esclareceu a quais
“abusos” se referia , nem mesmo quais as medidas repressoras que pretendia
empreender.
Por outro lado , aqueles que almejavam ingressar nas Academias davam
preferência aos cursos particulares que, em poucos meses, preparavam os
alunos com as noções indispensáveis para os exames preparatórios. Como
já comentado anteriormente , os exames do Liceu não habilitavam para o
ingresso nas Academias.
3. A Reforma de 1870 e os Exames Preparatórios
Um dos grandes problemas – senão o maior deles – enfrentados pelo Liceu
Provincial da Bahia era a não habilitação para seus alunos prestarem os
chamados exames preparatórios , o que os impedia de ter acesso ao ensino
superior.
É preciso que seja esclarecido que os exames preparatórios eram provas que
aferiam conhecimentos considerados necessários para o ingresso aos cursos
superiores , que eram poucos e, portanto, concorridos. Assim sendo, o
acesso ao ensino superior era efetuado através de um processo de seleção,
113
de provas de conhecimentos, a todos os alunos do ensino secundário,
exceto àqueles que cursaram o Colégio Pedro II , na Corte , considerado
como padrão para todo o Império, que tinham acesso direto aos cursos
superiores..
A forma de implantação dos exames preparatórios limitava demasiadamente
o ingresso no ensino superior , criando situações de pressão para que o
acesso fosse ampliado.
Na primeira metade do século XIX , os exames eram feitos nas próprias
faculdades , com validade específica. Do início da segunda metade do
século até 1873 , os exames preparatórios passaram a ter validade nacional,
sendo realizados na Inspetoria do Ensino Público e no Colégio Pedro II , na
Corte. A partir desse ano , os exames passaram a ser feitos também nas
províncias, através de delegados da Inspetoria, não sendo , ainda , o caso da
província baiana . Assim, essa situação não resultou em melhoria para o
Liceu Provincial da Bahia, conforme discutiremos adiante.
No ano de 1879 , os exames preparatórios dos Liceus nas províncias
passaram a ser reconhecidos, desde que seguissem o mesmo programa dos
estudos efetuados no Colégio Pedro II. Ainda não foi a vez do Liceu
Provincial baiano , uma vez que não havia uma organicidade dos estudos
daquela instituição que fossem semelhantes ao ensino secundário ministrado
na Corte. Os exames preparatórios somente foram realizados na província
baiana, no ano de 1886 , de acordo com os registros nas Falas e Relatório do
Diretor Geral de 1887 , o que discutiremos no próximo capitulo .
Para a Reforma ocorrida em 1870, na Bahia, novamente repetiu-se um dos
principais problemas enfrentados pela instrução pública secundária , ou seja ,
114
a não aceitação dos exames realizados no Liceu , em nenhuma academia do
Império . Nesse sentido, argumentou o Diretor Geral :
Si os estabelecimentos de instrução secundária não forem
soccorridos em tempo pela acção combinada dos governos geral e
provincial , continuarão a decahir infallivelmente, e acabar-si-há por
extinguil-os , pois que nada justificará a continuação da despeza
provincial sem vantagens correspondentes. (Relatório Diretor
Geral, 1870).
O desestímulo era tamanho que, dos 225 alunos matriculados no ano de
1870 , 101 perderam o ano por faltas , indicando o abandono no decorrer dos
estudos , além daqueles que foram expulsos por mau comportamento.
Mesmo com todas essas questões , a Congregação do Liceu ofereceu
exames, segundo o Diretor Geral , mas não houve pretendentes para fazê-
los. Além de os exames não serem aceitos em todo o Império , na própria
Faculdade de Medicina da Bahia, por exemplo, somente eram válidos os
exames efetuados por ela .
Para enfatizar ainda mais a indignação com a situação do Liceu , argumenta
o Diretor Geral que os professores da banca na Faculdade de Medicina
eram, quase sempre , do Liceu , sendo habilitados , não justificando a
rejeição dos exames .
O Relatório do Diretor Geral traz , ainda , um outro dado que demonstra não
estarem sequer próximos a sanar os problemas da instrução pública
secundária. É em relação à freqüência de alunos nos estabelecimentos
particulares , que continuava crescendo . Para o ano em questão -1870/71,
115
pós reforma da instrução secundária, o número de matriculados foi de 1436 ,
contra 225 do Liceu (mais de seis vezes maior que as matrículas do Liceu).
Mesmo assim, reconhece que tal número não traduzia a realidade, que
poderia ser muito pior , tendo em vista que as escolas não costumam enviar
corretamente os dados para a Diretoria Geral.
Finalizando o Relatório, o Diretor Geral da Instrução Pública , Francisco José
da Rocha , destaca o que entendemos como o principal ponto para a
decadência da Instrução secundária: a necessidade de que os exames do
Liceu Provincial fossem aceitos nas Academias:
Serão infrutiferas todas as reformas n’este importante
estabelecimento público , único que a Provincia tem d’ instrução
secundaria , e um dos poucos que existem em todo Imperio, sendo
talvez o mais antigo , e que mais tem produzido , - si não houver
autorização para serem os seus exames acceitos em todas as
academias, ou – ao menos – na nossa Faculdade de Medicina.
(Relatório da Instrução – 1871)
Continuando dentro dessa mesma linha de pensamento , referindo-se aos
exames em cada faculdade ,conclui:
Não compreendo , pois, a razão de utilidade d’esse exclusivismo
d’exames para cada uma das faculdades do Imperio , tanto mais
quanto, como já em outro logar disse , os professores do Lyceo são
quasi sempre os examinadores dos preparatorios na Faculdade de
Medicina
116
Não vejo o inconveniente que pode resultar de estender-se aos
Lyceos provinciaes bem organisados o previlegio de que gosa
actualmente só o Imperial Collegiado de D. Pedro II. (Relatório da
Instrução – 1871)
No ano de 1872 , tanto as Falas como o Relatório da Direção Geral da
Instrução Pública são unânimes em elogiar a Reforma da Instrução de 1870
que, de acordo com relatos, teria elevado a freqüência nas aulas públicas ,
bem como melhorado o nível do professorado em maior número habilitado e
competente.
Considerando como causas para o melhoramento indicado , o Diretor Geral
Francisco José da Rocha enumera: os concursos para provimento das
cadeiras , exames para alunos das aulas primárias , relatórios de professores,
além das vantagens tanto para alunos como para os mestres com distinção ,
vantagens essas decorrentes da Reforma de 1870.
Se essas observações valiam para a Reforma de uma maneira geral , para o
ensino secundário , especificamente , a situação não era tão lisonjeira.
Novamente atribuía-se como causa dos problemas enfrentados no Liceu , a
sua não habilitação para as Academias. Questão sempre atacada e
destacada , não foi solucionada , apesar de não faltarem elogios ao Liceu:
O ensino secundário , que se limita no Lycêo, nunca , apezar da
proficiencia do professorado a quem esta incumbido , deu
resultados correspondentes aos sacrificios que faz a Provincia
para mantel-o . Não se encontrará o vicio na instituição; nenhum
predicado lhe falta para ser proveitosa. Tudo se deve a falta de
garantias para quem frequenta o curso do Lycêo, pois que as leis
geraes tiraram-lhe todas as regalias (Relatório da Instrução 1872)
117
Argumenta o Diretor da Instrução, não pela primeira vez , que bastaria a
aceitação nas Faculdades dos exames preparatórios realizados no Liceu ,
para que a instituição viesse a ficar no lugar considerado por ele como
merecido, caso contrário :
... em taes circunstancias o Lycêo pode se dizer condennado a
esperar ingloriamente um futuro , que depende de uma mais liberal
organização da instrução pública. (Relatório da Instrução – 1872)
As estatísticas que, sabemos, eram totalmente deficitárias , tendo em vista
que não havia um controle total de matrículas na província , indicavam para o
ano de 1872 dados que não são de forma alguma animadores quanto ao
ensino secundário público na província baiana . Apenas 229 alunos
matricularam-se no Liceu , para 520 matriculados somente em quatro
colégios que enviaram dados à Diretoria Geral – Collégio Alemão , Collégio
Santo Antonio , Collégio Athenêo e Collégio São Pedro.
Mesmo com todas as tentativas de elogios à Reforma de 1870 , apesar dos
grandes problemas enfrentados pelo ensino secundário oficial do Liceu
Provincial , outra Reforma ia sendo discutida e organizada .
118
4. A Gestão da nova Reforma
De acordo com a Fala do início do ano de 1873 , as condições do ensino
secundário continuavam não sendo dignas de elogios . Ao contrário , o
constatado era uma constante fuga de alunos do ensino público para o
privado , conforme quadro constante da Fala presidencial de 1873:
INSTRUCÇÃO SECUNDARIA
ESCHOLAS
ALUNNOS
MASCULINO FEMININO TOTAL
MASCULINO FEMININO TOTAL
PÚBLICO LYCÊO 1 _ 1 56 _ 56 PARTICULAR COLLEGIOS 4 1 5 610 74 684
Fonte: Fala -1873 Este quadro constante da Fala do presidente de 1873 é mais uma clara
evidência da fuga de alunos do ensino público para o particular , lembrando
que nem sempre os dados de escolas particulares eram confiáveis , pois
estas não enviavam à Diretoria Geral as devidas informações. De qualquer
forma, são dados alarmantes para o ensino público , ao se constatar que,
para 56 alunos do Liceu Provincial, existiam 684 no ensino particular.
Observa-se, aí, um outro dado importante que é a presença de 74 mulheres
cursando o ensino secundário.
119
O Relatório do Diretor Geral da Instrução Pública , João Vitor de Carvalho ,
no mesmo ano de 1873 , referindo-se aos dados do ano anterior , revela a
difícil situação por que passava o Liceu Provincial , mesmo após a recente
Reforma de 1870. Ficava evidente que um dos grandes problemas residia na
ausência de organicidade do curso secundário , manifesto nos índices por ele
indicados no seu Relatório. Segundo esse documento , no ano de 1872 ,
matricularam-se 137 alunos no Liceu , distribuídos nas diversas aulas , o que
deixa claro como eram isoladas , a saber :
... em Latim 9 , em Latinidade 1 , em Francez 17 , em Inglez 5 , em
Grammatica Philosophica 33 , em Rhetorica 1, em Arithmetica 14 ,
em Geometria 24 , em Chimica e Physica 1, em Historia Antiga 5 ,
em Historia moderna 5, em Philosophia 11 , em Desenho 8 , em
Musica 3. Vê-se , pois, que as aulas de Grego e de Botanica não
tiveram alunnos , que as de Latinidade , Rethorica e Phisica
apenas tiveram um alunno cada uma , a de Musica 3 , e as de
Inglez, de Historia antiga e moderna apenas 5 cada uma”
(Relatório – 1873)
Repete-se o desânimo em relação aos rumos do ensino secundário público
ministrado no Liceu Provincial , a ponto de, no mesmo Relatório , o Diretor
Geral , após comentar que o caminho do Liceu não é dos mais prósperos ,
questionar:
120
Converia extinguir o Lyceo em vista deste resultado? Converia que
esta quantia assim despendida quasi em pura perda do ensino
fosse applicada ao maior desenvolvimento da instrução primaria ,
que é a única que a Constituição politica do Imperio garantiu ao
povo no § 32 do artigo 179? São questões essas de magna
importancia , e que cumpre não resolver de chofre , mas com todo
o cuidado e estudo e depois de examinar profundamente as cauzas
do mal e empregar-se os meios precisos a ver se se consegue
algum resultado proficuo da despeza que se faz” (Relatório –
1873).
Dentro desse raciocínio , apesar de declinar todo o empenho no sentido de
retirar o Liceu Provincial da situação deplorável em que se encontrava , o
Diretor Geral afirma, também , que não hesitaria em aconselhar a sua
desativação, para que os recursos viessem a ser empregados no ensino
primário.
Como ocorre em quase a totalidade dos Relatórios e Falas , são muitos os
questionamentos feitos , para averiguar as verdadeiras causas da
decadência do ensino secundário público , na província baiana. Dentre esses,
estão pontos como a capacitação dos professores , que é inquestionável, e o
edifício do Liceu , na Palma, que fora, há pouco, reformado, não sendo,
portanto , causa da depreciação do estabelecimento de ensino. Sendo assim
, questiona o Diretor Geral :
121
...e qual é pois a cauza de semelhante mal? Se compararmos
ainda esse triste resultado com o que se vê nos Collegios
particulares , se vê , que estes estao repletos de alunnos, que os
Paes com prazer supportam as despezas que são precisas para
educação e instrucção aos filhos , vê-se bem , que não é a falta
dos Paes , que para isso concorre – mas outras differentes – para
que tendo elles ensino quasi gratuito e optimos Professores , se
por ventura o deixam para sujeitar-se aos onus pecuniarios de um
collegio de educação é por certo , por que ahi julgam encontrar
mais vantagens. (Relatório –1873)
Nas conclusões , o Diretor chega a admitir o que , em nosso entendimento,
seria o principal motivo para o afastamento dos alunos das salas do Liceu
Provincial :
A meu ver se os exames de preparatorios para as Academias
fossem no Lycêo , em vez de serem , como são actualmente feitos
na Faculdade de Medicina , se os exames feitos no Lycêo
podessem servir ,ou aproveitar para a matricula nas Academias do
Imperio , se o curso completo de humanidades no Lycêo desse
preferencia aos empregos publicos provinciaes, se ainda os
alunnos do Lycêo podessem gosar dos privilegios de que gosão os
do Collegio de Pedro 20. , na Côrte do Imperio , tudo isso
concorreria poderosamente para que o Lycêo se elevasse á altura
dos sacrificios que a Provincia faz para mantel-o . (Relatório –1873)
122
Sendo favorável a uma nova Reforma para a Instrução Pública , o Diretor
Geral faz algumas propostas que , efetivamente passaram a integrar o texto
da nova Lei. Entre as proposta do Diretor estão a descentralização dos
cargos com a instrução , desvinculando a Diretoria Geral da Diretoria do
Liceu, valorizando o órgão colegiado como o Conselho Superior, e a
reforma dos estatutos do Liceu.
Em 1873, foi apresentada pelo governo provincial uma nova Reforma ,- sem
que a Reforma de 1870 tivesse oportunidade de se implantar - efetivada pela
Lei n0.1335 de 30 de junho de 1873 . No seu artigo 30. , autoriza o governo a
colocar a reforma em execução para, posteriormente, submeter à aprovação
da Assembléia Provincial, o que, sem dúvida, parece estar de forma invertida
e dá indicações de que o processo pouca relação teve com preceitos
democráticos.
A partir dessa Reforma , ficou restabelecido o cargo de Diretor do Liceu
separadamente do Diretor Geral Da Instrução , assim como se promulgou o
Regimento do Conselho Superior da Instrução Pública , integrado pelo
Diretor Geral, pelo Diretor do Liceu, por Professores do Liceu e da Escola
Normal.
Com essa nova norma , não houve mais restrições quanto aos professores
lecionarem em escolas particulares, sendo que o ingresso passou a ser feito
por concurso público.
A primeira imagem que a Reforma da Instrução de 1873 deixa transparecer
é a de que, novamente, as idéias descentralizadoras são as que dominavam
naquela conjuntura. Ao contrário da centralização de poder que a Reforma
anterior continha , conferindo acumulação de cargos
123
de Diretor Geral e de Diretor do Liceu Provincial, a nova reforma permitia
que tais cargos fossem assumidos por distintas pessoas , sendo inclusive
proibida a acumulação, além de valorizar um órgão colegiado como o
Conselho Superior , composto não só pelos Diretores (Geral , do Liceu e da
Escola Normal) , como também por professores.
Outra questão relevante para o ensino secundário, diretamente ligada aos
exames preparatórios foi o fato de , a partir de 1873 , ser permitido que tais
exames fossem feitos diretamente nas províncias. Entretanto , o que poderia
passar a ser um elemento para a melhoria do ensino , resultou em uma
ênfase maior à única preparação para os devidos exames preparatórios, em
prejuízo da formação geral. Mesmo os exames preparatórios podendo
realizar-se na própria província , só poderiam ser feitos nas Academias ,
como, por exemplo, na Faculdade de Medicina baiana , pois os exames do
Liceu Provincial continuavam não sendo válidos para habilitação acadêmica.
Quanto ao curso no Liceu , retomou-se a idéia de divisão em duas sessões,
sendo uma de letras a outra de ciências , não ficando estipulada
a duração das aulas, o que deveria ser disciplinado pela congregação.
Manteve - se a matrícula por disciplina e a defesa de tese para o grau de
bacharel. Entretanto , podemos encontrar alguns elementos introduzidos por
essa reforma , que darão mais organicidade ao ensino secundário ministrado
no Liceu Provincial.
Em primeiro lugar, o Liceu Provincial passou a ser organizado como um
Instituto de Letras e Ciências , de acordo com a definição do artigo 94 da
Reforma . Em segundo lugar , outro elemento indicativo de maior
organicidade do curso de ensino secundário, no Liceu, foi a maneira pela
qual ficou estipulada a matrícula que, conforme artigo 119 do
Regulamento da mesma Lei, deveria ser feita :
124
1. No curso de Lettras
2. No curso de sciencias
3. Nas aulas avulsas
(Lei 1335 que reforma o ensino secundário -1873)
A importância de tal observação é a de que , embora ainda fosse permitida a
matrícula em aulas avulsas , tradição arraigada e de herança pombalina,
percebe-se claramente a idéia, ou tentativa , de um curso secundário
organizado em duas sessões – Letras e Ciências , com desenvolvimento
determinado por um plano de estudos a ser elaborado pela Congregação.
Os cursos de Letras e Ciências credenciavam os alunos que a eles
freqüentassem , a possibilidade de obter o grau de Bacharel em Ciências ou
Letras. Mesmo aqueles alunos que não tivessem freqüentado o Liceu, mas
quisessem obter o grau de Bacharel , poderiam prestar exames , desde que
fossem aprovados nas matérias pertinentes aos anos anteriores. Da mesma
forma , aqueles que somente freqüentaram aulas avulsas , desde que
prestassem exames do Liceu, poderiam ser aceitos para os cursos do
bacharelado .
Para a obtenção do grau de Bacharel , o estudante deveria ter sido aprovado
em todas as matérias dos cursos de Letras ou Ciências e , requerer à
Congregação a sua defesa de tese . Esta deveria constar de uma
dissertação sobre um ponto escolhido pelo candidato , além de três
proposições sobre as matérias de cada uma das cadeiras da seção (letras
ou ciências). É importante salientar que o grau de bacharel em ciências era
requisito básico para concurso de professor de ciências , somente sendo
aceitos aqueles que obtiveram tal grau no próprio Liceu , no Colégio Pedro II
, em faculdades do Império ou mesmo estrangeiras.
125
5. O funcionamento das escolas particulares na Reforma de 1873
A regulamentação da Reforma de 1873 traz , ainda , no Título V , toda uma
regulamentação para o funcionamento de escolas particulares primárias e
secundárias. Nela, estão estipuladas todas as formas de fiscalização do
poder público sobre as escolas particulares , desde a formação dos diretores
até o programa de estudos , o regulamento interno do estabelecimento, a
situação do prédio, a capacitação dos professores. Fica determinado ,
também que, no caso de escolas femininas , a direção somente poderia ser
exercida por senhoras.
Como o Regulamento da Lei 1335/73 estipulou a elaboração de novo estatuto
para o Liceu Provincial , no seu artigo 219 revogou os estatutos de 1841 , que
ainda estavam em vigência, assim como todos os atos do Regulamento
Orgânico de 1862, além de todas as ações pertinentes à Reforma de 1870 ,
ou quaisquer atos , regulamentos , leis sobre instrução primária e secundária
pública ou particular da província baiana.
No ano seguinte à Reforma de 1873 e sua Regulamentação , a Fala
Presidencial pouco tem a acrescentar sobre a vigência da Reforma. No
entanto , admite que ainda estariam faltando medidas complementares a fim
de que estivesse plenamente concluída. Nesse sentido , afirma que, de tais
medidas, somente teria sido possível concluir o Regulamento para o
Conselho Superior e o programa de distribuição de premiações a alunos e
mestres.
126
Na mesma Fala , o Presidente acaba por fazer um desabafo quanto a
quantidade de reformas e regulamentações de leis para a instrução pública:
De Leis e Regulamentos estão as nossas colleções cheias. As
Reformas se tem sucedido quasi que com pequenos intervalos, e
porque a instrucção publica não apresenta este aspecto tão
lisongeiro, em equilibrio com os sacrificios , que nos custa no
orçamento, e para o tempo que a temos organisado! (Fala-1874)
Para o presidente , a responsabilidade de tal situação estava na falta de
cumprimento das Leis. Para sanar esse problema , propôs que houvesse
uma ação mais enérgica da inspeção aos professores de toda província.
A medida proposta pelo presidente indicava que sua compreensão era de
responsabilizar os professores pelo não cumprimento da legislação pertinente
ao ensino secundário. Dessa maneira, procurava isentar as principais
autoridades da província em relação ao tipo de política a ser desenvolvida
para a instrução em geral e o ensino secundário , em particular.
Apesar de a reforma estar em andamento, o quadro de matrículas
apresentado pela Fala do Presidente da província baiana indicava que, dos
129 alunos matriculados , 50 perderam o ano , o que revelava um alto índice.
Porém o que causa maior estranheza é a listagem de matrículas por matéria ,
quando a Reforma propunha cursos distribuídos em duas divisões - Letras e
Ciências - sem que haja qualquer explicação para a continuidade das aulas
isoladas.
127
O texto da Reforma de 1873 e o de sua Regulamentação deixam claro um
embrião de organicidade , da qual o ensino secundário do século XIX era tão
carente . No entanto, os relatórios posteriores não deixam transparecer
qualquer indicação de uma continuidade de ações com vistas a um ensino
mais organizado. Pelo contrário , o que se encontra é a ausência de uma
sistematização , de uma estrutura para o ensino secundário , a ponto de o
Presidente afirmar que “em algumas aulas não há um so discipulo “ (Fala
–1874)
Em tais condições , restava ao presidente deplorar a pouca afluência de
alunos ao Liceu Provincial , em uma lamentação que já vinha se repetindo a
cada Relatório.
Destaca-se , novamente, como já era reivindicado de há muito , a
necessidade do reconhecimento dos exames do Liceu para habilitar ao
ingresso nas academias , conforme solicitação do Diretor Geral :
O Diretor indica como uma necessidade indeclinavel que se obtenha
do Governo Imperial a concessão de serem aceitos e validos em
todos os cursos superiores do Imperio os exames alli feitos das
materias preparatorias , e que tendo-se creado as comissões para
exames nas Provincias , onde não há Faculdades, parece , que não
haverá receio de que negue esse favor , visto como nenhum
Estabelecimento deste genero existe melhor organisado no Imperio
para o fim , de que se trata (Fala-1874)
128
Mesmo com repetidos apelos , ainda não foi esse o momento em que os
exames do Liceu Provincial da Bahia passaram a ser aceitos como
habilitação ao ingresso nas Academias , como ocorria com o Colégio Pedro II
do Rio de Janeiro.
Mais breve que a Reforma anterior , foi a vigência desta reformulação da
Instrução pública de 1873 , uma vez que foi regulamentada por outra Lei em
1875 , que pouco se diferenciará da anterior.
A Fala Presidencial , assim como o Relatório do Diretor Geral da Instrução
de 1875 , criticam algumas medidas tomadas pelo governo antecessor e,
mesmo com a vigência da Reforma de 1873, continuam lamentando a
situação do ensino secundário baiano.
O Presidente afirma que : “Entre nós , é doloroso confessar , este
importantissimo ramo da administração publica está longe de attingir o nosso
desideratum” (Fala-1875)
Em tom de crítica , afirma não entender a necessidade de duas pessoas
diferentes para assumirem os cargos de Diretor Geral da Instrução Pública e
Diretoria do Liceu Provincial . Acrescenta o Presidente que , até por uma
questão de economia , seria aconselhável a unificação dos cargos , chegando
, inclusive a considerar o cargo de Diretor do Liceu como “supérfluo” .
129
Na verdade, o que presenciamos é o embate entre duas posições já bastante
conhecidas da história da educação brasileira – centralizar ou descentralizar
a administração educacional. Como poderemos verificar também no discurso
do Diretor Geral , parece que a idéia centralizadora novamente vem à tona,
uma vez que, em seu Relatório, afirma ser plenamente compatível a
acumulação das funções de Diretor Geral e Diretor do Liceu.
No Relatório do Diretor Geral , há várias críticas ao presidente anterior que
efetuou algumas modificações no Regulamento da Reforma de 1873 , no que
diz respeito à inclusão de aula de música e manutenção do seu professor ,
na nomeação de inspetores paroquiais ao invés do inspetores da escola ,
considerando, enfim, que foi alterado o conteúdo , ou pensamento do
reformador.
O mesmo Relatório indica um aumento do número de alunos de 129 em
1873, para 212 em 1874 , lamentando , no entanto, que, somente dois (2)
prestaram exames no final do ano. As causas para tamanho desânimo
continuaram sendo as mesmas e de conhecimento de todos , conforme relato
do Diretor do Liceu Provincial :
O Diretor do Lyceu attribue o aspecto desanimador que apresenta
o estabelecimento a diversas causas , e entre ellas , a garantia que
offerecem os estabelecimentos particulares aos alunnos que
aspiram á matricula nas academias de medicina, e direito, pelo que
os procuram de preferencia, e tambem pela não validade dos
exames do Lyceu para as matriculas nas faculdades do Imperio ...
(Relatório Diretor Geral –1875)
130
Essas afirmações eram tão verdadeiras que , ao compararmos os 212 alunos
matriculados no Liceu , com o mapa de matriculados nas escolas particulares
, notamos a evidente diferença , sendo que o mapa refere-se somente
àquelas escolas que enviaram relatórios à Diretoria Geral
MAPA DOS ESTABELECIMENTOS SECUNDARIOS PARTICULARES DA PROVINCIA E DOS ALUNNOS QUE OS FREQUENTAM
COMARCA
LOCALIDADE
ESTABELECIMENTOS
MATRICULA
Capital
Sé Pedro II 141
Sé Paraense 176
Sé Independencia 21
S. Pedro S.Francisco 156
S. Pedro Sete de Setembro
190
Santo Antonio
Santo Antonio 85
Mares Athenêo Baiano 82
Total
851
Fonte: Relatório da Diretoria Geral da Instrução Pública - 1874
131
Mais uma vez ficou caracterizado como a política desenvolvida para o ensino
secundário na província baiana , apesar de todas as críticas de seus
dirigentes, culminava por favorecer fortemente o ensino particular que
continuava crescendo vertiginosamente. Para os dados apresentados no
mapa de estabelecimentos particulares de ensino – ressalvando que nem
todas as escolas particulares estavam incluídas no mapa – , a proporção de
alunos em relação ao Liceu Provincial continuava sendo de mais ou menos
quatro para um, isto é, nas escolas particulares contatamos matriculados
quatro vezes mais que aqueles matriculados no Liceu Provincial da Bahia.
6. Caráter centralizador da Reforma de 1875
Uma das questões presentes no decorrer de todo o período estudado reside
na característica de maior ou menor centralização na administração da
educação. Assim, como já noticiamos anteriormente, mais uma vez vem à
tona a indicação de uma fase de maior centralização, já apontada nos
discursos de críticas pronunciados pelo presidente da província.
Como resultado dessas críticas emitidas por todos - Presidente da Província ,
Diretor Geral da Instrução e Diretor do Liceu - uma nova Lei foi promulgada,
em meados do ano de 1875 , a de número 1561 , para regulamentar a
Reforma de 1873. A diferença significativa para a reforma anterior estava no
caráter centralizador , mais uma vez presente na regulamentação, ao
concentrar ou unificar os cargos de Diretor Geral da Instrução Pública com o
da Direção do Liceu Provincial.
132
Não tardaram as reações e, em pouco tempo, começaram a surgir pressões
em sentido contrário. A centralização dos cargos de Diretor do Liceu e Geral
da Instrução recebeu críticas do próprio Diretor Geral, assim como do
Presidente da Província em 1876 que, na sua Fala, indicou a necessidade
de um Diretor próprio para o Liceu, exigindo, para o seu funcionamento, uma
permanência constante , além de providências regularmente necessárias,
ao seu bom desempenho . Essa dedicação não poderia ser proporcionada
com a acumulação dos cargos..
Outra alteração que polarizou opiniões refere-se às autorizações para
funcionamento de estabelecimentos particulares primários ou secundários.
Segundo a Regulamentação 1561 /75 , qualquer pessoa , brasileiro ou não,
poderia abrir uma escola e “exercer o professorado particular sem
autorisação da Directoria ,sem dependencia de título ou prova de capacidade
profissional “ (art.190)
As ações da política desenvolvida para a educação e o ensino secundário da
província nos levam a confirmar nossa convicção de que, na mesma medida
em que não havia clareza para o ensino secundário público, havia um
favorecimento cada vez maior ao desenvolvimento e afirmação do ensino
particular, sob a pretensa forma de liberdade de ensino, chegando a ponto de
causar reações no seio do próprio poder.
Em relação ao funcionamento de escolas particulares , tanto o Presidente da
província em 1876 , quanto o Diretor Geral - José Eduardo Freire de
Carvalho , condenaram as alterações realizadas pela Assembléia Provincial.
133
O Diretor Geral refere-se a essas mudanças como tendo sido, certamente,
inspiradas pelo princípio de liberdade de ensino, porém afirma:
Não sou contrário ao ensino livre , mas entendo que essa liberdade
sem limitação alguma e sem a garantia da capacidade profissional ,
pode ser prejudicial á educação e instrucção popular , a que o
Estado não pode ser indifferente , porque tem necessidade de
intervir na direcção da educação geral e publica como condição de
ordem e grandeza moral do paiz (Relatório Direção Geral -1876)
Para justificar sua posição, contrária à abertura de escolas
indiscriminadamente sem qualquer tipo de controle do Estado, o Diretor Geral
argumenta, exemplificando com as experiências de outros países:
Em diversos paizes , como por exemplo na Allemanha e na Italia,
onde a instrucção tem tido grande desenvolvimento , não se
prescinde da intervenção do Estado , e ninguem pode exercer a
profissão de mestre publico ou particular sem licença da autoridade
que tem a inspecção das escholas , cumprindo ter em vista não só
a aptidão dos candidatos , mas tambem a sua moralidade (
Relatório Direção Geral – 1876).
134
Tanto a Fala Presidencial quanto o Relatório do Diretor Geral expressam
críticas a tal procedimento da Assembléia Provincial, que modificou o
Regulamento:
A illustrada Assembléa Provincial não previu o inconveniente de
semelhante disposição , contra a qual cumpre precaver-se ,
regulando-se essa liberdade de ensino , para que a instrucção
particular seja um verdadeiro e proveitoso auxiliar do governo na
importante missão de instruir o povo (Relatório Direção Geral –
1876)
Paralelamente, o caráter centralizador ultrapassou as questões puramente
administrativas, passando a existir o ensino público somente na capital da
província – Salvador e no Liceu Provincial , dificultando o acesso a tal
modalidade de ensino.
Além das questões levantadas em conjunto pela presidência e Direção Geral
, a Fala do presidente em 1876, dá destaque para a centralização das aulas
secundárias no Liceu Provincial , pois , segundo ele , as outras localidades
ficaram prejudicadas :
Em Vez de se alargar a esphera da instrucção na Provincia ,
estreitou-se ella com verdadeiro prejuiso dos povos. Hoje só pode
ter alguma instrucção , além da elementar , da Provincia , ainda
tão tenue entre nós , o menino cujos pais pódem fazer o sacrificio
das grandes despezas que demandão a viagem para esta Capital e
a forçada residencia n’ella durante annos.
Instituio-se d’est’arte um verdadeiro privilegio para os ricos e
abastados, que aliás infelizmente não abundão no nosso centro.
(Fala – 1876).
135
Permaneciam os lamentos quanto ao pequeno número de matriculados no
Liceu Provincial – 210 alunos – cuja causa era sobejamente conhecida: além
de não mais existirem aulas no interior da província , os exames não tinham
validade para habilitação e ingresso nas Academias . Comentava-se , ainda
, na Fala de 1876 , que talvez teria sido preferível substituir a aula de Grego
por Alemão “lingua que com rasão está sendo muito cultivada n’esta cidade;
que se explica pela extensão e desenvolvimento do respectivo commercio “
(Fala – 1876).
O ano de 1876 traz , também , alguns dados novos , como é o caso do
recenseamento escolar, indicando população alfabetizada ou não , assim
como o esclarecimento de informações duvidosas sobre o ensino particular,
conforme poderemos verificar dos quadros a seguir :
população livre escravos homens mulheres homens mulheres sabem lêr 161,937 87,135 49 15 e escrever: analfabetos 568,416 494,304 89,045 78,715 Fonte: Fala do Presidente da Província - 1876
136
Em uma estatística ainda incipiente , com dados bastante precários para a
situação da instrução na província , mas que apontam para os graves
problemas que a educação enfrentava , podemos comentar, de acordo com
os indicies do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) , em
relação ao recenseamento da população baiana no censo de 1872 , que,
dentre 1.379.616 habitantes, aproximadamente 80% da população livre
era analfabeta . Caso levemos em consideração também a população
escrava , este índice cresce ainda mais. A dimensão de tal dado é
importante , não só pela sua representação em si , de alto índice de
analfabetismo , como também em relação ao desdobramento do seu
significado quanto ao ensino secundário, que atingiria apenas uma parte de
pequena parcela da população.
Em relação ao número de estabelecimentos particulares , os documentos
sempre questionam os seus dados , pois os Diretores Gerais de Instrução
Pública queixam-se de que as escolas não enviavam os dados àquela
diretoria.
Difficil é á Directoria apresentar uma estatistica exacta dos
collegios e escholas particulares , pela reluctancia com que alguns
directores e professores, com expressa violação do Regulamento
da Instrução publica , se negão a remetter á repartição os
esclarecimentos e mappas de seos estabelecimentos. (Relatório
da Diretoria Geral –1876)
137
Dessa forma , o Relatório de 1876, emitido pela diretoria, indica apenas os
dados dos colégios para o sexo masculino e feminino que enviaram suas
informações à sua secretaria, não expressando , portanto, a real situação
dos colégios particulares , possivelmente com mais alunos do que o
registrado.
RELAÇÃO DOS COLLEGIOS DE INSTRUCÇÃO SECUNDARIA DA PROVINCIA , DE UM E OUTRO SEXO, QUE REMETTERAM MAPPAS E ESTA DIRECTORIA E DO NUMERO DE ALUNNOS QUE FREQUENTARAM NO ANNO DE 1875
SEXO N0. NOMES DOS COLLEGIOS N0.ALUNNOS M 1 Paraense 152 A 2 Independencia 38 S 3 Pedro 20. 141 C 4 S. Francisco 323 U 5 S.Vicente de Paula 74 L 6 Sete de Setembro 201 I 7 Santo Antonio 74 N 8 S. João 386 O 9 Atheneo Bahiano 236 10 Dr. Barbosa Nunes 70 11 Dr. Manoel José da Costa 9 Somma 1,954
Fonte: Relatório Diretoria Geral da Instrução Pública 1876
138
SEXO N0. NOMES DOS COLLEGIOS N0.ALUNNOS F 1 Coração de Maria 110 E 2 Piedade 129 M I N I N O Somma 239
Fonte: Relatório Diretoria Geral da Instrução Pública 1876
No mesmo Relatório, encontramos, também , a indicação da existência de
outras escolas particulares que não enviaram seus dados:
RELAÇÃO DOS ESTABELECIMENTOS DE INSTRUCÇÃO PARTICULAR DA PROVINCIA QUE CONSTA EXISTIR , E QUE NÃO REMETTERAM A ESTA DIRETORIA MAPPAS NUMERO NOME DOS COLLEGIOS 1 S. José 2 Bahia 3 Santo Antonio (Padre Pereira) 4 Conceição 5 Firmino Pereira de Souza Fonte : Relatório Diretoria Geral da Instrução Pública 1876
139
Conforme indicações dos dados dos mapas da Diretoria Geral , podemos
constatar que , no final da década de 70 - ano de 1876 - , permaneciam os
mesmos problemas quanto à matrícula e freqüência do Liceu Provincial , com
210 alunos , contra 2.193 alunos matriculados nas diversas escolas
particulares , isto é, mais que dez vezes o número de alunos que a instituição
pública . O número é bastante significativo , mesmo tendo conhecimento de
que esses dados não expressam , ainda, a realidade , na medida em que
diversas escolas particulares não enviaram dados à secretaria da Diretoria
Geral da Instrução Pública.
Além desse fato , os dados indicados pelo censo escolar constantes do
relatório de 1876 , nos levam a concluir que as escolas particulares
praticamente detêm quase a totalidade de alunos para o ensino secundário,
devido a sua estruturação que , diferentemente do ensino público do Liceu
Provincial , se assemelha ao ensino ministrado no Colégio Pedro II , na
Corte, o que permite habilitar os seus alunos à realização dos exames
preparatórios e conseqüente ingresso nas academias do Império.
Outra observação importante é que , mesmo com toda diferenciação entre o
ensino público secundário e o particular , o total de alunos nesta modalidade
de ensino, no ano de 1876 é de 2.403, para uma população de 1.379.616 .
Isso representa, aproximadamente, 0,2 % da população com acesso ao
ensino secundário.
140
Cabe , ainda , destacar que dos 2.193 alunos matriculados nas escolas
particulares, havia um número significativo de alunos do sexo feminino,
daquelas que enviaram seus dados ao censo escolar . Esse fato é
importante por indicar que já havia uma freqüência feminina no ensino
secundário , assim como aponta que o número dessas matrículas – 239 -- ,
era superior ao total de alunos que estavam matriculados no Liceu Provincial
– 210, reforçando nossa argumentação da debilidade do ensino público
secundário.
7. Primeira Conferência Pedagógica Baiana
Embora não seja um evento ligado diretamente ao ensino secundário , cabe
registrar o fato de que no final do ano de 1876 , no mês de dezembro,
realizou-se a primeira Conferência Pedagógica na província baiana.
Prevista desde a Reforma de 1873 , foi somente três anos depois que teve
sua realização concretizada, reunindo o Conselho Superior , Diretores e
professores , principalmente do ensino elementar , discutindo métodos e
conteúdos . Assim se refere ao evento o Diretor Geral:
Ninguem seriamente contestará a utilidade que conferem entre si
os professores sobre todos os pontos que interessem ao regimen
interno das escholas , methodos de ensino , e em uma palavra ,
sobre todas as questões praticas da educação e instrução popular .
Se é entre nós uma idéa nova , não o é entretanto nos paizes
cultos da Europa , nos Estados Unidos ; e no municipio da Corte do
Imperio o Regulamenbto de 1854 , confeccionado pelo illustrado
Conselheiro Euzebio de Queiroz Coutinho Mattoso Camara , de
saudosa memoria , consagrou-se uma de suas disposições.
(Relatório Diretoria Geral –1876)
141
Apesar da importância conferida ao evento, poucos foram os registros
posteriores sobre a realização de outras conferências. Até o final da década
de 70, somente encontramos o registro da realização de uma nova
Conferência Pedagógica no ano de 1878 , com a discussão de várias teses
sobre educação e ensino , teses estas que, infelizmente, não estão
detalhadas no relatório.
Os anos finais da década de 70 não apresentaram grandes alterações nas
condições de funcionamento da instrução pública baiana , sobretudo no que
se refere ao ensino secundário .
A referência que temos na Fala de 1877 é muito reduzida, referindo-se à
preocupação com os custos com a instrução pública , além de uma crítica
ao procedimento quanto às formas de qualificação do professorado e às
escolas mistas.
Nota-se a Repartição da Instrucção Publica , absorvendo a quarta
parte da receita , sem resultado correspondente , com um
regulamento que priva a mulher do ensino do sexo masculino , que
só tolera as escolas mixtas, quando o número das alunnas exceder
a 30 , e que finalmente torna a inscripção do candidato ao
professorado , dependente do parocho;... (Fala – 1877)
142
Fica bastante claro , também , que o presidente , por não ser baiano, não
tinha qualquer relação com a província; daí comentar não conhecer as
pessoas , os recursos e a forma como vem sendo conduzida , reafirmando
nossas observações em momentos anteriores, de que não só a troca
constante de presidentes provocava a instabilidade política , mas também a
existência de presidentes totalmente desvinculados da província , sem
sequer conhecerem a realidade local. Além desse fato , o cargo político era
de fidelidade ao Imperador e não à província.
Não tendo conhecimento bastante das pessoas e cousas da
provincia , ignorando os recursos , de que ella dispõe , para
dominar a crise , que nos ameaça , eu deixo de usar da iniciativa
que a lei concede , no tocante á indicação de providencias ....
(Fala – 1877)
O Relatório do Diretor Geral da Instrução Pública no mesmo ano de 1877,
também não retratava novidades quanto à instrução secundária.
Continuava-se reivindicando um diretor específico para o Liceu Provincial ,
verificava-se que as matrículas de aulas isoladas permaneciam e que o
número de alunos pouco aumentou , sabendo-se que a causa principal para
essa situação residia na não validade dos exames realizados no Liceu, para
o ingresso nas Faculdades. Mesmo assim , o Diretor comenta :
143
Todavia não se pode dizer que o ensino n’aquelle estabelecimento
não apresenta resultado satisfactorio; por quanto foram julgados
aptos pelos respectivos professores para prestarem exames 56
alunnos , dos quaes já o prestaram 11 na Faculdade de Medicina...
(Relatório Diretor Geral – 1877)
Quanto à aceitação dos exames do Liceu Provincial pelas Faculdades do
Império , o Diretor Geral reafirma :
Em quanto não fôr adotada a medida, há muito reclamada, e na
qual ainda insisto de serem validos nas Academias do Imperio os
exames feitos n’aquelle estabelecimento , maiores resultados não
se podem esperar d’elle , nem poderá entrar , com vantagem em
concurrencia com os estabelecimentos particulares . (Relatório
Diretor Geral –1877)
Nessa relação entre o ensino secundário público e particular , de acordo com
os mapas enviados no ano de 1877 , a desproporção continua muito grande,
pois para os 218 alunos do Liceu Provincial , nas escolas particulares – que
se tinha notícias – estudaram 1865 alunos , sendo 426 do sexo feminino e
1.449 do sexo masculino, de acordo com os dados do Relatório do Diretor
Geral da Instrução Pública de 1877.
144
Para o ano de 1878 , momento em que novamente nos deparamos com a
questão da instabilidade e troca constante de políticos , podemos verificar a
existência de pelo menos 3 (três ) presidentes na Província em um único ano
. Assim é que , ao assumir outro cargo no Império , como um lugar na
Assembléia da Corte , no caso do Barão Homem de Mello, ao passar a
administração da Província para o 20. Vice Presidente:
Seguindo para o Rio de Janeiro , na qualidade de deputado á
Assembléa Geral Legislativa , pela Provincia de S.Paulo , tenho a
honra de passar a V.Ex. a administração desta Provincia... (Fala-
1878)
Nota-se que o desligamento da província é tal que a representação que fará
na Assembléia Geral é pela Província de São Paulo , não havendo qualquer
espécie de ligação com a província baiana, o que comprova repetidas
afirmações anteriores , de que o cargo era de fidelidade ao Império , não
guardando qualquer preocupação com os problemas locais.
Sendo assim, por que seria diferente com a educação e o ensino secundário?
Novamente o que se lê são lamentos de que o ensino secundário da
província encontrava-se em estado lastimável , decrescendo o número de
matriculados no Liceu , discutindo as possíveis causas, que todos já sabiam ,
além de afirmarem a necessidade urgente de providências para problemas de
uma causa de “tamanha magnitude” . Entretanto , não foi movida sequer
uma peça fundamental. Do nosso ponto de vista, essa situação vinculava-se
diretamente à freqüente troca ou substituição de nomes no poder , sem que
aquelas pessoas tivessem qualquer vinculação direta com a província baiana.
145
8. principais temas para os mesmos problemas
Em fevereiro de 1878 , o então Presidente – Henrique Pereira de Lucena - ,
nomeou uma comissão para “rever o Regulamento vigente da mesma
instrucção , e indicar todas e quaesquer reformas que julgasse convenientes
....” (Fala - 1878 ). Segundo o mesmo documento , o trabalho realizado por
esta comissão estaria pronto e arquivado na secretaria do governo. No
entanto , não foi localizada a proposta de reforma a que se referia. Tão
pouco os demais presidentes do ano de 1878 referiram-se a esse projeto.
Pelo contrário , a Fala presidencial de 1879 comenta:
O Regulamento mandado executar pela Resolução 1561 de 28 de
junho de 1875 , e que está em vigor , resente-se de algumas faltas
, que convem remediar , para a melhor regularidade de tão
importante ramo do serviço publico. ( Fala - 1879)
O Relatório do Diretor Geral da Instrução Pública, neste mesmo ano de 1879,
inicia-se de forma irônica , ao comentar as iniciativas de seus antecessores ,
produzidas em gabinetes e que não tinham condições de execução , ou eram
executados de forma falha . Critica , ainda , o Diretor Geral , a importação de
métodos e teorias , com aplicação pura e simples , sem pensar nas
diferenças entre os povos , não só de localidade , como também de sua
formação social e cultural.
146
Por mais que se queira estatuir a homogeneidade ethographica da
especie humana , sempre será certo que a diversidade de
temperamentos, de preconceitos nacionaes, de condições
topographicas e que tantas outras circunstancias estabelecem
linhas divisorias entre os varios povos do globo , tão pronunciadas
e distinctas que, rejeita-las fôra o mesmo que fechar os olhos á
esmagadora evidencia dos factos , d’onde provém , muitas vezes ,
que aquillo que na Russia , é ,um meio vantajoso de evoluções
progressivas em ordem a qualquer ramo de publico serviço ,
applicado aos Estados Unidos do Norte , torna-se nocivo ou pelo
menos improficuo na pratica. (Relatório Diretor Geral –1879)
O Diretor Geral critica não só a inexequibilidade dos planos, como também
a importação de idéias sem qualquer avaliação ou adaptação .
Entretanto , ele não se coloca totalmente contrário às idéias provenientes de
outras nações , principalmente européias . O Diretor cobra dos legisladores
bom senso para adaptação de determinadas teorias ou métodos.
147
Mande-nos , em boa hora , a Europa seus methodos de ensino ,,
suas reformas , seus programas scientificos e litterarios , seus
systemas pedagogicos mais aperfeiçoados etc., que ao bom senso
brazileiro pertence separar a substancia do que é meramente
accidental, o fundo da fórma. Aquelle , podemos e devemos
acceitar, porque vem desbravar o campo da intelligencia,
ampliando os dominios do saber; esta , porém, exprime apenas
uma relatividade que só póde , em ultima analyse , convir a esta ou
áquella nação.
(Relatório Diretor Geral – 1879)
Continuando seu relato , lamenta o estado da Instrução Pública na província
baiana, indicando que não haveria outro caminho a não ser o de uma nova
Reforma do ensino primário e secundário.
É doloroso contemplar o actual estado da instrucção publica d’esta
provincia , onde aliás revelão-se as mais distinctas aptidões para
as lettras. ( Relatório do Diretor Geral - 1879 )
Esclarecendo suas idéias com relação às possíveis causas para tamanho
desastre na instrução pública , indica as freqüentes mudanças nos rumos da
educação da província baiana por motivos políticos :
148
Durante o curto espaço em que me acho á frente da instrucção
publica d’esta provincia , tenho chegado a compenetrar-me de uma
bem triste verdade , da qual , creio , hoje ninguem seriamente
poderá mais duvidar: - a acção deleteria da politica sobre os
destinos da instrucção publica. (Relatório Diretor Geral – 1879)
Ao tratar especificamente do Liceu Provincial , o Diretor Geral da Instrução
Pública , Cônego Emílio Lopes Freire Lobo , retoma a questão que sempre foi
discutida por todos os relatórios , desde a fundação do Liceu e que, naquele
momento , já no final da década de 70 , ainda constituía-se em um dos
maiores problemas para a instituição - a não habilitação dos exames
realizados no Liceu Provincial , para ingresso nas academias do Império ,
nem mesmo à própria Faculdade de Medicina da província baiana.
Para dar sustentação aos seus argumentos , quanto à necessidade de
modificação no sistema de exames preparatórios para o ingresso nas
faculdades, o Diretor Geral faz uma longa análise sobre a importância do
cumprimento dos objetivos , ou fins , de uma instituição , para que ela venha
a prosperar .
Nesse sentido , lembra os fins do Liceu Provincial :
149
O fim a que se destina o Lyceo da Bahia , de tão gloriosas
tradições e que ainda hoje recommenda-se á republica das lettras
pela preponderancia scientifica e litteraria de seu respeitavel corpo
docente , é preparar a mocidade no ensino das materias que
constituem o seu luminoso programma , incutindo-lhes o gosto
pelas sciencias , lettras e bellas artes , mediante uma filiação logica
de estudos. ( Relatório Diretor Geral- 1879)
O Diretor Geral da Instrução Pública não questiona a importância dos fins a
que se destinava o Liceu Provincial da Bahia , porém critica as formas que
foram utilizadas para atingir os objetivos propostos.
O emprego , porém , dos meios aptos ao conseguimento d’este fim
, na minha humilde opinião, não tem sido o melhor. (Relatório
Diretor Geral – 1879).
Para justificar a necessidade de os exames do Liceu serem reconhecidos , o
Diretor Geral remete-se aos comentários e sugestões feitos por Demetrio
Cyriaco Tourinho , por ocasião do Relatório e Regulamento Orgânico de 1860
, concluindo que:
150
Penso que , uma vez sanccionada a validade dos exames
prestados no Lyceo da Bahia , perante a Congregação dos
respectivos lentes , desde esse dia nova aurora de prosperidade
raiará para aquella casa de educação , que , d’est’arte reerguer-se-
há , como por encanto , do seu actual abatimento, repristinando
as saudosas éras de suas merecidas glorias. (Relatório Diretor
Geral - 1879)
Fruto dos temas mais discutidos naquele momento de final da década da 70,
o Diretor Geral termina seu detalhado Relatório com o levantamento de teses
sobre três questões : a liberdade de ensino ,o ensino obrigatório e o ensino misto, temas que também foram debatidos alguns anos depois por
Rui Barbosa , nos seus famosos pareceres sobre a instrução.
Em relação à liberdade de ensino tão discutida naquela conjuntura , a
posição do Diretor Geral era de certas restrições , que para ele deveria ser
limitada pela autoridade legal. Apesar de defender que todo cidadão tem o
direito de ensinar o que sabe, independente de autorização , afirma:
Não sei por que prisma os asseclas da opinião contrária encontrarão
a prosperidade social; menos feliz do que elles , talvez, pelo limitado
do meu alcance intellectual , não subscrevo á theoria da liberdade
absoluta de ensino. Quero que ao ensino livre presida uma
inspecção criteriosa que , sem coarctar os vôos da intelligencia ,
sem sopear os arrojados lances de genio nem impedir o luminoso
attrito das discussões scientificas , marque , entretanto , justas
balizas ás caprichosas aberrações da razão , não permittindo que o
contagioso virus das más doutrinas inficione e contamine , na espirito
da mocidade, a esperançosa seiva do futuro. ( Relatório Diretor
Geral – 1879)
151
Como podemos constatar da exposição do Diretor Geral da Instrução Pública
de 1879 , ele coloca-se na discussão da época , quanto a Liberdade de
Ensino , contrariamente, por entender que haveria liberdade demasiada no
ensino da época , pleiteando , para sanar a situação , de maior autoridade do
Estado a partir da fiscalização . Para ele , que dizia não se colocar contra a
liberdade de ensino , uma fiscalização mais dura era necessária , de certa
forma filtrando as idéias que deveriam ser veiculadas no ensino público.
Quanto ao ensino obrigatório , outra questão por ele discutida, coloca-se
absolutamente contrário , dedicando um longo trecho de seu Relatório para
discorrer sobre seus pontos de vista . Basicamente , coloca a questão como
de responsabilidade do pai , isentando o Estado do seu cumprimento e , para
justificar-se afirma:
Creio que todo pae ( á parte monstruosas excepções) deseja
ardentemente o bem de seu filho; aprender é um bem . Logo , se o
proletario não manda o filho para a eschola é porque necessidades
mais immediatas o constrangem a isso , não permittindo avanços
de recurssos. Obrigal-o ao impossível , é tão absurdo quão iniquo.
(Relatório Diretor Geral – 1879).
152
Nessa argumentação , o Diretor Geral , em nosso entendimento, inverteu a
discussão quanto a obrigatoriedade do ensino , colocando a responsabilidade
na família e em seus recursos . Assim , lamentou como sendo , em suas
palavras , “uma teoria bárbara e pagã”, que obrigaria a um pobre coitado
fazer sacrifícios financeiros para que seu filho estudasse. Na realidade , todos
sabemos que a discussão sobre a obrigatoriedade do ensino refere-se à
responsabilidade que o Estado deve ter com a educação , dotando de
condições para que as famílias possam manter seus filhos estudando. Ao
distorcer o problema , o Diretor Geral posicionou-se claramente em um ponto
de vista contrário às responsabilidades da educação pelo Estado.
Mais adiante acrescenta:
... penso que o ensino obrigatório é injusto a respeito da sociedade
, a quem investe de poderes exorbitantes e sobrecarrega de onus
abusivos; a respeito do pae a quem despoja de seus direitos e
dispensa de seus deveres; a respeito da criança , a quem gratifica
com favores artificiaes , privando-as de garantias naturaes; a
respeito do individuo, cuja liberdade viola; da familia , cujo laço
quebra ; da humanidade , cujo desenvolvimento perturba e para
com Deus, cuja providencia desconhece
A suprema sabedoria assentou o mundo sobre o eixo da
responsabilidade pessoal ou commum , logo , a intruzão da lei no
domínio da moral é a perversão da responsabilidade.
O dever da educação é , nos paes , de ordem puramente moral;
logo não póde dar logar a uma acção legal. (Relatório Diretor
Geral – 1879)
153
Essa argumentação contrária a que seja estabelecida em lei a
obrigatoriedade do ensino , depositando na família a responsabilidade
sobre o ensino, termina por ser contraditória com a argumentação do quesito
anterior, ou seja , da liberdade de ensino. Assim, ao mesmo tempo em que se
coloca contrário à liberdade de ensino , afirma que a obrigatoriedade do
ensino fere a liberdade da família em optar ou não pelo ensino dos seus
filhos. Ainda assim , a contradição continua presente , pois considerava ,
anteriormente , que qualquer pai gostaria de ver seus filhos estudando e, se
isso não ocorre, é por problemas econômicos. Mais um argumento para que
o ensino seja assumido pelo Estado.
Como última tese discutida em seu Relatório , o Diretor Geral posiciona-se
contrário ao ensino misto, pelo menos , aquele que não tenha restrições ,
dentro de limites que, segundo o Diretor deveriam ser estabelecidos, no caso
de pensar-se na sua implantação.
Uma vez por todas nos devemos capacitar de que vivemos no
Brasil , onde é muito deficiente a educação domestica , que tão
decidida influencia exerce sobre os destinos moraes do homem.
Acresce a isto as condições climaterias do nosso paiz , que, a ser
exceto o que attestão habilissimos investigadores da natureza ,
antecipão com lamentavel precocidade o exercicio de certas
funcções , que só podem convenientemente ser dirigidas pelo
dictam severo da razão ou pela providencial solicitude paterna –
salutar presidio e protectora égide dos primeiros annos da vida .
(Relatório Diretor Geral – 1879)
154
Com tal argumentação de que o ensino misto se tornaria prejudicial à
formação moral dos alunos , além de tomar uma posição preconceituosa ,
demonstra de que maneira era pensada a família brasileira , de forma
depreciativa.
Ao concluir o Relatório de 1879 , o Diretor Geral da Instrução Pública da
província baiana , retoma a questão dos exames preparatórios com a
seguinte proposição:
Enquanto o Governo Imperial não acceitar a idéa em outro logar
apontada para erguer este estabelecimento da depressão em que
se acha , convém que outra de menor alcance seja quanto antes
posta em pratica , isto é, restituindo-se aos seus professores a
faculdade de examinarem na Academia , da qual forão privados
pelo regulamento de 28 de junho de 1875 , com o que cessará a
preferencia que os estudantes dão aos collegios particulares ,
contando serem examinados pelos respectivos professores ,
acrescendo que o ensino há de apresentar outro resultado , visto
como professores do Lyceu por sua aptidão e independencia serão
as melhores garantias da verdade dos exames. ( Relatório Diretor
Geral – 1879 )
Com esta posição , o Diretor propõe uma solução parcial , para que, pelo
menos os professores do Liceu Provincial pudessem ser examinadores nas
Academias , até que os exames do próprio Liceu viessem a ser reconhecidos
como aptos a habilitar para o ingresso naquelas Academias.
155
Podemos afirmar que os anos 70 , em termos de políticas públicas para o
ensino secundário muito pouco avançou, as mesmas questões continuavam
em pauta , não foi solucionado o problema dos exames preparatórios e a fuga
para as escolas particulares permanecia.
Em termos mais gerais , a reforma Leôncio de Carvalho de 1879 talvez
tenha sido uma das mais importantes no Império , discutindo a liberdade do
ensino , a obrigatoriedade, eliminando a proibição de freqüência para os
escravos, tendo em vista o processo já desencadeado de sua abolição,
conferindo liberdade de crença, possibilitando a implantação de escolas de
várias crenças religiosas , bem como a criação de cursos superiores da
iniciativa particular, ainda que submetidos aos exames oficiais. Ao mesmo
tempo, passa a ter maior força a idéia de interferência mais direta do
governo geral na instrução e a necessidade de uma política nacional de
educação a ser executada em conjunto entre governo geral e as províncias.
A Lei de 1879 teve como desdobramento provocar a tomada de posição de
Rui Barbosa que, na década seguinte, elaborou uma série de Pareceres
sobre vários aspectos da educação brasileira que , se não tiveram
aplicabilidade imediata, serviram de base para as discussões que se
seguiram , apontando para a necessidade da modernidade na educação,
concretizada no início da república.
As questões que destacamos das falas e relatórios do final dos anos 70 - a
liberdade de ensino ,o ensino obrigatório e o ensino misto - foram , entre
outras ,conforme já aqui afirmado, objeto de discussão nos pareceres de Rui
Barbosa , com a finalidade de apontar para a necessidade da modernização
do ensino , acompanhando as transformações pelas quais passava o país.
156
Quanto à liberdade do ensino , Rui Barbosa posicionou-se favoravelmente ,
por entender que não deveria haver monopólios , quer do Estado quer da
Igreja. Nesse sentido , sua manifestação pela liberdade de ensino dirigia-se
basicamente contra a educação dada por religiosos. Mesmo assim , não
isentou o Estado de acompanhamento e fiscalização, ao contrário do que as
reformas , especialmente na Bahia, estavam propondo. Isto é , um total
desligamento do Estado , podendo qualquer pessoa , independente de aviso
ou autorização , abrir uma escola particular.
Da mesma forma , o parecerista colocou-se a favor da obrigatoriedade do
ensino , até por entender ser um desdobramento do artigo constitucional que
indicava como sendo o ensino primário público e gratuito.
Finalmente , em relação ao ensino misto o parecer de Rui Barbosa
apresentava uma ambigüidade . Ao mesmo tempo em que fazia uma
exposição de que em diversos países europeus havia um crescimento de
escolas com aulas para os dois sexos , dando a entender que estaria
concordando com o que denominou de co-educação dos sexos , acabava
por definir-se contrariamente ao desenvolvimento desse padrão ,
principalmente para o ensino secundário , admitindo-o com restrições ao
ensino primário . Segundo ele , para a mulher adolescente seria
fisiologicamente um mal de incalculável alcance e irremediáveis resultados
educa-la nos mesmos bancos , sob a mesma organização pedagógica,
debaixo do mesmo regime disciplinar que o homem. (BARBOSA.1947 Tomo
III:30)
Como as demais reformas de instrução do Império , a chamada reforma
Leôncio de Carvalho , de 1879 , ainda que restrita à Corte, acabou por
influenciar as ações nas províncias. É o que ocorreu na província baiana dos
anos 80, já nos estertores da Monarquia.
157
O período que analisamos, considerado como sendo o de desagregação da
Monarquia, indica que o desenvolvimento das políticas públicas para o ensino
secundário também foi bastante conturbado, passando da crítica ao
Regulamento Orgânico de 1860/62 , às sucessivas reformas.
Assim, a reforma de 1870 , sua regulamentação e praticamente outra reforma
em 1873 e a reforma de 1875 , apontaram para a desorganização do ensino,
acompanhada de ausência de sistematização, apesar de todas as
legislações. Ao mesmo tempo , se as matrículas no ensino público secundário
ministrado no Liceu Provincial permaneciam em franco declínio, o mesmo
não era válido para o ensino secundário particular que, com melhor
estruturação , possibilitava que seus alunos fossem aprovados nos exames
preparatórios, levando a um aumento constante de matriculados.
Por fim, mesmo com toda desestruturação que as reformas sucessivas
provocaram , o período termina indicando que a necessidade era de uma
nova reforma para o ensino, o que efetivamente ocorreu no início do período
subseqüente , acompanhando os acontecimentos que se desenrolavam na
Corte.
158
V. O FINAL DO IMPÉRIO E O ENSINO SECUNDÁRIO BAIANO
1. Características gerais do período
Apesar de todas as transformações ocorridas na sociedade imperial , é fato
que a composição da sociedade do século XIX vai tornando-se cada vez mais
complexa , não podendo ser mais reduzida simplesmente por senhores e
escravos, apesar de sua presença marcante. No entanto , no Nordeste, em
especial , as bases da sociedade ainda estavam assentadas na grande
propriedade territorial e na escravidão.
A partir dos anos 70, pós-proibição do tráfico negreiro e com a introdução de
mão de obra imigrante , sobretudo na região Centro-Sul do país, outras forças
passaram a ser observadas na sociedade brasileira.
Os dados obtidos pelo censo de 1872 dão conta de que as características da
sociedade brasileira apontavam sinais de diversificação, com indicação de
vários segmentos que, por suas profissões atestam essa diferenciação
urbana. Os números do censo indicam para a Corte e para Bahia :
159
Profissões Corte Bahia Profissionais liberais 14.426 10.417 Indústria e Comércio 24.303 28.494 Proprietários de terra 2.007 8.622 Lavradores 17.021 453.678 Criadores ______ 20.651 Militares 5.474 2.971 Marítimos 8.039 3.019 Operários 18.091 32.730 Pescadores 1.216 4.622 Costureiras 11.592 76.651 Criados e jornaleiros 25.686 40.727 Serviço doméstico 55.011 169.511 Sem profissão 92.106 527.523 TOTAL 274.972 1.379.616 Fonte: IBGE Recenseamento de 1872
Como afirmamos anteriormente , os dados acima nos apontam para as
mudanças ocorridas na sociedade brasileira em meados do século XIX. Na
Bahia, especificamente, em que pese o dado das profissões ligadas ao
campo, expressando a força que as grandes propriedades ainda possuíam ,
com forte presença da relação escravista, são também importantes as
mudanças que ocorreram nas cidades , indicadas pela diversidade de
profissões urbanas.
Podemos também argumentar que a concentração em atividades
consideradas liberais, ligadas às atividades comerciais e manufatureiras , nos
mostra que, nos últimos anos do Império, havia um segmento diferenciado
da sociedade que, ao mesmo tempo, era mais letrado e burocrático, com
possível influência na formação de opinião de uma sociedade em processo
de transformação , como a brasileira nesse período.
160
Do ponto de vista das mudanças ocorridas na sociedade brasileira no final do
século XIX, é importante destacar que o período em estudo para o ensino
secundário na Bahia (1860 a 1890) apresenta importantes transformações na
base da economia brasileira , principalmente no Centro Sul do país , com a
expansão da lavoura do café e desenvolvimento urbano industrial, resultando
em processo de crescimento das cidades e migrações internas.
Por outro lado , no Nordeste, a questão principal não se colocava tanto na
substituição da mão de obra escrava por livre, mas sim na própria
continuidade das atividades na lavoura e, no auxílio que o Império , por esse
motivo viesse a fornecer à região, a título de crédito agrícola ou mesmo sob
a forma de redução de impostos.
Tais medidas atingiram os setores dominantes da exportação , como no caso
da produção de açúcar. Essa situação , se já colocava a região em
diferenciação aos centros produtores do Centro- Sul do país , também é
demonstrativo de discriminação entre as próprias províncias nordestinas, pois
deixava de lado , ou mesmo excluía das reivindicações , economias
provinciais não dominantes como a pastoril, levando, até para a distribuição
de recursos , a uma diferenciação entre as províncias . Dessa forma , o
Nordeste , economicamente, se já estava longe das transformações que
ocorriam no Centro-Sul , cada vez mais vai se distanciando de uma
modernidade , além de separar, dentro da própria região, diferentes
“categorias” de províncias.
161
Os anos 80 do século XIX continuam tendo como característica principal a
desagregação da Monarquia . Conforme já comentamos , os últimos vinte
anos desse regime foram de declínio e de seu questionamento. As idéias
veiculadas pelo Manifesto Republicano na década de 70 abrem um debate
sobre as questões que envolviam o liberalismo , tão discutidas na sua
aplicação ao ensino , nos últimos vinte anos do século.
Mas, as mudanças desse final de Monarquia e de século ocorreram em
todos os sentidos da vida da sociedade da época. Além das idéias liberais , o
pensamento predominantemente católico recebe o impacto do pensamento
comtiano com idéias evolucionistas do positivismo , além de outras questões
como a religiosa , reformas eleitorais, campanhas abolicionistas e, enfim, a
questão militar. As questões que marcaram o período final do Império
fizeram com que existissem comentários do tipo: “... os últimos vinte anos
da Monarquia são efervescentes de imprevistos , renovação e contrastes “.
(BITTENCOUT.1953:50)
Se para a Monarquia os tempos eram difíceis , para a região nordestina ainda
mais , pois continua seu distanciamento , em termos de desenvolvimento com
as regiões Sul e Sudeste. Como afirma Kátia Mattoso, “pouco a pouco o
centro de gravidade econômica se deslocava do Nordeste para o Centro –
Sul , mas era imensa a disparidade entre as rendas regionais” (MATTOSO.
1992:236) . A autora ainda indica que as exportações do Centro - Sul e do
Sul do país passam a representar 65% , enquanto o Nordeste ficava cada
vez mais distanciado das inovações ocorridas no centro econômico do país.
162
Dessa forma , ficam evidenciados os elementos que irão compor o quadro de
distanciamento econômico da região Nordeste em relação às demais regiões
do país, em especial , as regiões Sudeste e Sul. Porém , ainda segundo
Kátia Mattoso , esta não era a situação das elites baianas , que sempre
tiveram um destaque especial na formação do “novo Estado “:
A Bahia teve uma participação decisiva nos setores econômico,
religioso e político. Ademais, a análise dos fracassos e dos êxitos
baianos torna possível compreender melhor o comportamento de
todas elites brasileiras nesse novo universo vigente entre 1822 e
1889. (MATTOSO.1992:237).
2. Reforma Leôncio de Carvalho – influências na província
No que concerne à educação e ao ensino , o período é de transformações,
pois a Reforma Leôncio de Carvalho (1879) foi bem mais ampla que as
anteriores , modificando não só o ensino primário e secundário da Corte ,
como também estabelecendo normas para o ensino secundário e superior em
todo o país . A partir dessa reforma, além do Inspetor Geral , instituído com a
Reforma Couto Ferraz de 1854 , e do Conselho Diretor, criou-se a função de
inspetor de distritos na Corte e delegados de municípios, nas Províncias onde
existissem estabelecimentos de ensino , criados ou subvencionados pelo
Governo Imperial , ou cujos exames fossem aceitos e reconhecidos por ele.
163
Foi durante esse período (1870-1880) que, na Corte, se organizou o ensino
técnico de nível superior , com escolas de engenharia , como D. João VI
havia feito com o ensino médico e artístico e, D. Pedro I com a formação
jurídica.
Com essa Reforma , permitiu-se o ensino secundário livre , como já era o
ensino primário , prevendo-se , inclusive, a possibilidade de estenderem as
prerrogativas existentes no Colégio Pedro II para os demais existentes nas
províncias . Esta era uma medida há muito reivindicada pela província baiana,
mas que não foi aplicada de imediato, pelo menos quanto ao Liceu Provincial
da Bahia.
A Reforma de 1879 proporcionou a oportunidade , maior ainda , de
proliferação de escolas particulares, religiosas ou não , em todo o Império ,
expressando as discussões sobre a liberdade de ensino que, na época,
empolgavam .
Na província baiana, a educação iniciou a década de 80 com as mesmas
mazelas dos anos anteriores , reclamando-se pela necessidade de mais uma
reforma para a Instrução Pública . Como podemos perceber , as políticas
pensadas para a educação e o ensino da província baiana traduziam-se por
uma sucessão de reformas e modificações que, no fundamental, não
alteravam as suas condições.
A Fala de 80 do presidente da província , apesar de iniciar-se com a
indicação de que a educação pública mereceria “especial atenção” por ser
“importantíssima parte do serviço público provincial” , também deixava
transparecer que a posição do presidente era a de considerar a educação
tratada com o mesmo cuidado que nos demais países civilizados.
164
Na mesma Fala, o presidente da província baiana registrou a existência de
516 escolas primárias , para uma população escolar de 20 mil alunos; duas
escolas normais para preparação de professores; um Liceu com “excelente
professorado”.
O próprio presidente, no entanto, advertia que os números não refletiam a
realidade. Mas, acreditava que a educação estava em toda a província.
Porém, afirmava colocar como meta de seu governo , cada vez mais , a
disseminação do ensino. Segundo o presidente, o que se deveria fazer para
a melhoria das condições de ensino era “aperfeiçoar os métodos” .
Considerava, ainda, necessária uma reforma , entretanto , acreditava que
esta deveria ser feita sem grande aumento de despesa.
Quanto ao Liceu Provincial, especificamente, neste documento, argumenta:
A manutenção deste estabelecimento é, como sabeis, uma
necessidade indeclinável ; mas cumpre dizer que, nas condições
em que se elle acha , por múltiplas razões, não produz os
desejados resultados . (Fala,1880)
O presidente refere-se à freqüência , que era limitada, sendo que em
algumas “aulas” , não havia alunos matriculados. Como causa para tal
decadência aponta:
165
... a prohibição imposta aos respectivos lentes, pelo regulamento de
28 de julho de 1875, de serem examinadores na Faculdade de
Medicina. (Fala,1880)
Na realidade, essa situação, de forma alguma seria uma causa nova, pois o
grande problema do ensino secundário público no século XIX, ministrado no
Liceu Provincial da Bahia , residia no fato da não habilitação para o ingresso
nas faculdades do Império , assim como a proibição para os professores do
Liceu serem examinadores nos exames de ingresso.
Esses temas faziam parte de um complexo de questões do mesmo problema,
pertinente à própria identidade do ensino secundário. As preocupações com os
rumos que essa modalidade de ensino apresentava durante o período
estudado, levaram, praticamente, todos os dirigentes do processo educacional
a se posicionarem com apreensão não só quanto à continuidade do Liceu
Provincial , como também quanto às causas que conduziam o ensino
secundário público à decadência . Apesar de serem as falhas do
conhecimento geral , sobretudo no que diz respeito ao ingresso nas faculdades
do Império, mesmo com todas as reformas do ensino no período , esta não era
uma questão atacada diretamente , a despeito do presidente dizer serem
esses temas merecedores de toda sua atenção.
O Relatório do Diretor da Instrução Pública , Cônego Dr. Emilio Lopes Freire Lobo
, datado do mesmo ano de 1880 para a situação do ensino no ano anterior, iniciou-
se com lamentações quanto a não tomada de providências para a situação da
instrução pública, inclusive destacando que:
166
Causas certamente estranhas á vontade da Administração
impedirão que fosse adotada grande parte das medidas por mim
apresentadas, quer em ordem a remover os inconvenientes, quer
em ordem a melhorar a condição atual da instrução primária.
(Relatório do Diretor Geral da Instrução – 1880).
Apesar das queixas, acrescenta sentir-se confortado , pois acredita que os
representantes da província souberam corresponder a mais santa de todas as
aspirações humanas – a educação popular (Relatório do Diretor Geral –
1880).
O Relatório do Diretor Geral continua , indicando a quantidade de alunos que
freqüentaram o Liceu Provincial durante o ano de 1879.
Matricularão-se no Lyceo 74 alumnos , representando 122
matriculas, das quaes perderão o anno 20 por excesso de faltas
(Relatório do Diretor Geral – 1880)
Como podemos notar do Relatório do Diretor, ao revelar que os 74 alunos
matriculados representam 122 matrículas , há uma indicação clara de que as
matrículas por disciplina permaneceram , apesar de todas as reformas já
efetuadas durante o século XIX. Isso significa que o ensino secundário ainda
não pode ser considerado como um curso , pois lhe falta a sistematização ,
seriação e inter-relação entre as disciplinas , denominadas de “aulas”. Essa
situação do ensino secundário, desprovido de uma organicidade, perdurará
até a eliminação dos chamados exames preparatórios, já no século XX.
167
Por outro lado , os colégios particulares continuavam com matrículas em
número crescente. Para o mesmo ano, enquanto a matrícula no Liceu foi de
74 alunos, as escolas particulares , que enviaram dados à diretoria, possuíam
562 alunos matriculados. Somente a Escola Sete de Setembro , em Salvador,
contava com 373 alunos.
O Diretor Geral da Instrução Pública, no Relatório de 1880, não procura fazer
análises profundas a respeito da educação baiana, argumentando acreditar
que as suas sugestões, apresentadas para modificação na educação da
Província, não teriam sido aceitas por motivos fortes , sem especificar quais
seriam. No entanto, deixa de fazer novas considerações, por entender que
suas repetidas proposições, expressas anteriormente, continuavam
oportunas.
Os Relatórios de 1881 , tanto do Presidente quanto do Diretor Geral ,
abordam os mesmos aspectos. O Diretor Cônego Romoaldo Maria de Seixas
Barroso chega a expressar a sua tristeza diante dos resultados apresentados
nos mapas que representam a instrução pública na província baiana.
Repetindo a Fala do Presidente, o Diretor comenta que : “ em um paiz como o
Brasil a grande questão deve ser a disseminação do ensino” (Fala , 1881)
Outro dado importante revelado pelo Relatório do Diretor Geral , este em
relação ao ensino primário, é de que para 1.500.000 habitantes e 574
cadeiras públicas de instrução primária , a inscrição foi de 21.626 alunos.
Segundo o Diretor , caso se abstraísse o número de matriculados nas escolas
particulares, seria encontrada a seguinte proporção: para 100 habitantes ,
apenas 1/5 teria instrução.
168
A partir desses dados , o Diretor passa a discutir o ensino obrigatório , que
era um dos focos dos grandes debates do final do século XIX. Afirma que tal
situação não ocorre somente por falta de escolas ,mas sim por outros fatores
, como :
... a pobreza de alguns Paes , que não podem dar aos filhos o
vestuário, com que appareçam decentemente na eschola ... além
da exploração das forças do menino, em prejuízo da sua educação.
(Relatório do Diretor Geral – 1881).
Para o Diretor Geral , a única maneira de buscar a solução dos problemas
para educação na província é a obrigatoriedade do ensino primário. Como
reforço de sua argumentação, afirma ser este um procedimento que teria
dado resultados positivos em quase todos os países europeus , em muitos
estados da América do Norte , além de na Argentina e no Chile. Também se
refere às afirmações de seus antecessores, a exemplo de Abílio César
Borges que, em 1856, já defendia o ensino obrigatório.
169
3. Novo Regulamento do Ensino - 1881
O ano de 1881 é marcado por um novo Regulamento para o ensino da
Província baiana. No que diz respeito ao ensino secundário , não há
alterações significativas. Quanto à organização do ensino e do Liceu,
permanece o ensino secundário sendo ministrado naquela instituição,
formando um Instituto de “Lettras e sciencias”( Regulamento – 1881) , com as
seguintes cadeiras:
I Grammatica e versão da língua latina;
II Latinidades
III Grammatica philosophica nas suas applicações á língua portugueza,
comprehendendo a historia da mesma língua;
IV Francez
V Inglez
VI Rhetorica, poética e litteratura nacional;
VII Geographia, cosmographia e historia do Brasil;
VIII Historia Antiga , da edade media e moderna;
IX Philosofia,comprehendendo as noções geraes da historia desta sciencia
X Arithmetica e álgebra;
XI Elementos de botânica e zoologia nas suas applicações mais geraes,
especialmente á agricultura;
XII Elementos de physica, chimica e mineralogia. (Fonte : Regulamento -1881)
170
Entretanto, previa-se a extinção de uma das duas cadeiras de Latim, a
primeira que vagasse.
Do ponto de vista do currículo , não houve alteração em relação aos anos
anteriores, demonstrando que não havia uma intenção concreta na
modificação do ensino secundário oficial , ministrado no Liceu Provincial.
Paralelamente, dividiu-se o curso ministrado no Liceu em duas “secções”,
sendo uma de “lettras e outra de sciencias, constituindo dous ensinos
distinctos” (Regulamento , 1881) . Essa já era uma determinação prevista
desde a Reforma de 1873.
Ao mesmo tempo, as matrículas continuaram a efetuar-se de forma avulsa,
da mesma maneira que eram realizadas desde a fundação do Liceu
Provincial; e os artigos do Regulamento em nada diferiam da Reforma de
1873.
Mesmo com as matriculas por “cadeiras” , isto é, de forma isolada, o
Regulamento de 1881 demonstrava uma preocupação para que os horários
de determinadas aulas não coincidissem , proporcionando a maior quantidade
de alunos matriculados . Nem por isso pode-se identificar uma maior
organicidade.
Continua-se presenciando um privilégio para as matérias ditas “humanistas”,
de tradição jesuítica, em detrimento àquelas chamadas mais científicas.
Assim, as cadeiras de línguas, principalmente a de Latim, tinham maior
duração - três horas -, enquanto as de ciências uma hora e meia de duração.
171
O Regulamento de 1881 não diferia em nada da Reforma de 1873 no que
concerne à realização de exames e à concessão do grau de Bacharel em
Letras ou Ciências .O documento de 81 também estabelecia o concurso para
professores , assim como todos os procedimentos necessários para o
ingresso no magistério do Liceu.
Na Bahia , a Reforma de 1881 trouxe pouca alteração em relação ao
ensino secundário , que continuou sendo ministrado só no Liceu , em duas
seções - Letras e Ciências. A alteração ocorreu , já por influência das
discussões realizadas por ocasião da Reforma Leôncio de Carvalho .
Quanto à liberdade de ensino que, na prática, apontava para um
favorecimento às instituições particulares , esse documento estabelece:
... qualquer cidadão brasileiro ou estrangeiro poderá abrir escola
ou outro estabelecimento de ensino primário ou secundário , e
exercer o magistério. (REFORMA 1881)
Na Fala em que o presidente Dr. Antonio Araújo de Aragão Bulcão transferiu
o governo para João Lustosa Cunha Paranaguá em 1881 , após elogiar a
ação do Diretor Geral da Instrução Pública , passa a comentar o
Regulamento por ele editado no mesmo ano – por esse motivo conhecido
como o Regulamento Bulcão - que, segundo o presidente, imprimia uma
nova organização à educação. Nessa Fala, considerava fundamental relatar
o estado do ensino provincial “ramo tão importante da administração”. (Fala,
1881). Com essa postura pretendia mostrar ao próximo governante:
172
... as medidas instantanhas , reclamadas que determinarão o meu
procedimento nos vários pontos da reforma de 5 de janeiro que
suscitarão apreciações menos justas. (Fala , 1881)
O presidente refere-se a explicações devido a críticas sofridas por ocasião da
publicação do Regulamento de 1881 que, na prática, pouco diferia do anterior
de 1873/75.
Para explicar suas atitudes frente à reforma realizada em 1881, o presidente
declara que quando assumiu o governo , já teria encontrado o pensamento
firmado quanto à necessidade de reorganização do ensino público provincial.
Argumenta que o regulamento que ditava o ensino até então , ainda era o de
1875, no entanto, com várias falhas, distorções e deficiências que, segundo
ele, não poderiam continuar. Assim, em 1878, através de Lei (1.780 de
27/06/78) , foi autorizada a reforma da Instrução Pública. A mudança de
governo impediu que ocorresse de imediato, vindo efetivar-se em 1881.
No curso da explicação do Presidente, fica evidenciado que do período da
autorização para a Reforma até a sua efetivação , além da sua própria gestão
, mais dois presidentes passaram pelo governo da província – o
desembargador Henrique Pereira Lucena , sucedido pelo Barão Homem de
Mello - sem que a Reforma se iniciasse. A Assembléia teve abertura sem
que a matéria entrasse em pauta, deixando a autorização para a Reforma da
Instrução Pública , “caducar”. A Assembléia Provincial teve encerramento e:
173
... o tempo da sessão não foi sufficiente para o exame, discussão,
adopção de uma lei sobre o ensino público. Assumptos outros de
interesse para a Província e de inadiável necessidade absorverão a
attenção do corpo legislativo. (Fala, 1881)
Somente no terceiro governo, isto é, no governo deste Presidente que
elabora o relatório, é que o assunto foi retomado.
Podemos perceber uma certa ironia nas palavras do Presidente, e um claro
descaso da Assembléia Provincial para com as necessidades e anseios
quanto ao ensino público da província. Mais uma vez fica evidenciado que o
tema ensino e educação pública não era concebido como prioridade para
os governantes da Província baiana, a ponto de , mesmo com a necessidade
evidente de Reforma e uma lei autorizando a sua realização, mesmo assim,
não é colocada a questão como prioridade das discussões e votações na
casa legislativa.
O Presidente afirma , ainda, em sua Fala de 1881, que por “concecutivas
sessões expoz na Assembléia Provincial a necessidade de organizar o
ensino.” Como argumentação para tal justificativa, explicava:
174
... que os concursos, as remoções , vencimentos e jubilações dos
professores, a hygiene das escholas, o conselho superior da
Instrução Pública, a adopção de livros para o ensino constituião
outros assumptos carecedores de reforma no sentido de mais
seguras garantias para os mestres, de mais proveito e utilidade
para os discipulos e mais verdade na instrucção publica da
província;
que o serviço da inspecção do ensino era ilusório e que preferível
aos inspectores litterarios parecia-me a creação de Conselhos
Parochiais de Instrução , nos quaes tivessem parte os Paes de
família;
Que o plano do Lyceu podia soffrer alguma restrição;
E que, finalmente, convinha acabar com a causa primordial da
decadência dáquelle estabelecimento, e que era geralmente
apontada – a prohibição imposta aos respectivos lentes de serem
examinadores na Faculdade de Medicina. (Fala , 1881)
Com tais explicações , o Presidente acaba por convencer a Assembléia
Provincial que votou nova autorização para que o ensino da província fosse
reformado.
A partir de então , segundo o Presidente, com suas idéias aliadas às
oferecidas por comissão formada para este fim, e com opiniões colhidas na
comunidade , organizou-se o plano da reforma , que resultou no Regulamento
de 1881.
175
Entretanto, por mais que o presidente possa justificar modificações ocorridas
no ensino público na província com o novo regulamento, também admite que:
“O regulamento de 28 de junho de 1875 não teve alteração sensível na parte
que se occupa do ensino secundário”. (Fala-1881)
Isso significa dizer que os principais problemas que afligiam diretamente ao
ensino secundário , como a questão da desestruturação de tal ensino ,
matrículas por disciplina e o não credenciamento para o ingresso nas
faculdades, continuavam sem solução . Portanto , permaneciam
apresentando as mesmas características de esvaziamento e fuga de
matrículas para o ensino particular.
A grande alteração que a Reforma de 1881 traz para o Liceu Provincial da
Bahia fica por conta da retirada da proibição de seus professores serem
examinadores na Faculdade de Medicina. Entretanto , o problema central - a
não habilitação para ingresso no ensino superior - não foi solucionado.
Ao concluir sua Fala , ele apela para que a Reforma seja executada ,
acrescentando: “A experiência provará se tive ou não as melhores rasões
para reorganisar como se acha o ensino provincial”. (Fala , 1881)
176
A Fala de Janeiro de 1882 indica que o Regulamento editado no ano anterior
estaria em pleno funcionamento, sendo que, no Liceu, estariam matriculados
140 alunos . Indica, também, que algumas disciplinas deixaram de ser
oferecidas por absoluta falta de alunos – “... rhetorica, poética e literatura
nacional.” (Fala , 1882). Tal constatação demonstrava claramente que, se
por um lado, apontavam para mudanças no conteúdo das preferências e
necessidades para o ensino secundário, com as transformações ocorridas na
sociedade baiana no final do século XIX, por outro , permaneciam as
matrículas por “aulas”, não havendo uma estrutura de curso secundário,
continuando esse ensino sem qualquer organicidade.
4. Ensino público, gratuito e obrigatório e a fuga para o ensino particular
O Presidente da província durante o ano de 1882, em sua Fala enaltece a
educação como sendo primordial para o desenvolvimento do país, embora
durante seu governo os problemas não tivessem sido resolvidos. Mesmo
assim , exalta , não só , a instrução pública, como também a importância de
sua obrigatoriedade e gratuidade.
Após um histórico sobre as reformas pelas quais a instrução pública passou
até o ano de 1882, o presidente define o que deveria ser o ensino secundário
como:
177
... deve ser organisado de modo a offerecer , de um lado – á classe
média dos cidadãos , a educação geral conveniente , de outro – a
servir de base para estudos superiores. (Fala 1882)
Sua visão não estava longe da idéia de sua época para esta modalidade de
ensino. Na França , como já discutimos anteriormente , as posições
oscilavam entre dois tipos de ensino secundário: um mais prático e terminal
para o trabalho e outro mais propedêutico , como base para o ensino
superior.
Entretanto , o Presidente reconhece que a situação não era das melhores,
chegando , inclusive, a comparar os custos despendidos com tal ensino e os
seus resultados, que não eram satisfatórios, não correspondendo os
primeiros com os últimos. A esse respeito lembra que tal situação já vinha
sendo reclamada desde a década de 40.
Nesse sentido , reafirmando o que já havia sido dito pelo Conselheiro Barão
Homem de Mello, em 1878 “a freqüência dos alumnos do Lyceu é tão
diminuta que fere logo a observação.” (Fala ,1882). Tal afirmação vem
acompanhada dos dados de matrícula do Liceu Provincial que naquele ano
teria tido 140 alunos matriculados , com 121 freqüentando, sendo que
somente 31 tiveram aproveitamento suficiente. Ao mesmo tempo,
considerava que a verba despendida para aquela instituição teria sido alta
argumentando: “É mister que a instrução ministrada pelo Lyceu não seja uma
utopia onerosa para a província” (Fala, 1882)
178
O Presidente também discute , diante dos resultados não muito positivos do
ensino ministrado no Liceu Provincial , a continuidade da instituição e o afluxo
de alunos para o ensino particular. E relembra que, por diversas vezes, ao
longo da história do Liceu e da instrução secundária na província, foi
proposta a supressão do Liceu , por ser uma instituição pouco produtiva.,
afirmando ainda que : “os partidários da suppressão não desapparecerão de
1846 para cá. Ainda há quem considere o Lyceu um instituto sem rasão de
ser”. (Fala ,1882)
No entanto, o pensamento do presidente a esse respeito era bastante claro,
quando discordava de afirmações de antecessores quanto à importância do
Liceu:
A instituição não é boa simplesmente - é necessária. Nem há
rasão para suppôr que a instrucção secundaria seja mais
proveitosa nos estabelecimentos particulares. A affluencia de
alumnos para os collegios por si só nada significa em desabono do
Lyceu, que tem na direção das suas aulas professores dos mais
habilitados da província” (Fala , 1882)
Continuando sua argumentação, retoma falas de seus antecessores ao
lembrarem ser o Liceu Provincial a única instituição oficial de ensino
secundário na província, enfatizando a importância desse ensino na formação
da “intelligencia nacional`”.
179
A fim de afirmar sua posição contrária a respeito da supressão da instituição
de ensino secundário, Liceu Provincial , o presidente assevera: O que
convém é estudar as causas que se oppõem ao desenvolvimento do Lyceu, e
fazel-as desapparecer . (Fala , 1882)
Tentando discutir as causas que implicariam na decadência do ensino
secundário oficial , ministrado no Liceu Provincial , o presidente da Província
baiana busca um histórico das causas já apontadas anteriormente. Assim ,
relembra que, ao longo do tempo, foram diversas as causas atribuídas
pelos vários presidentes aos problemas vividos pelo ensino secundário na
província . Com esses dados , elaboramos um quadro buscando indicar
como a questão da decadência do ensino secundária na província baiana
vinha sendo tratada:
180
As causas da decadência do Liceu segundo os presidentes
ANO PRESIDENTE ______ CAUSAS_______ 1858 Conselheiro Manoel Messias Leão ineficiência dos exames
preparatórios para admissão nas Faculdades
1860 Conselheiro Herculano F.Penna ausência de internato 1865 Antonio Coelho de Sá Albuquerque necessidade de escola especial de Belas artes 1867 Conselheiro Leitão da Cunha necessidade de melhorias físicas
transformando-o em colégio de artes com internato e externato
1871 Visconde de São Lourenço validade dos exames
preparatórios para as faculdades do Império
1880 Barão de São Francisco proibição dos professores serem
examinadores na Faculdade de Medicina e validade de seus exames para ingresso nos cursos superiores
Fonte: Quadro elaborado a partir dos dados presentes na Coleção de Leis , Falas
e Regulamentos – Arquivo Público da Bahia
181
Após fazer essa releitura das argumentações dos seus antecessores , o
presidente comenta que , naquele ano de 1882 , os professores já podem ser
examinadores da Faculdade de Medicina, uma vez que a permissão foi dada
na última reforma do ensino , em 1881. Entretanto , a freqüência do Liceu
continuava não sendo muito lisonjeira, indicando, portanto, não ser esta a
causa dos problemas do Liceu ou, pelo menos, não ser a única causa.
Apesar de toda análise efetuada sobre as condições de funcionamento do
ensino secundário no Liceu Provincial da Bahia, o presidente não aponta
possíveis soluções para os problemas do ensino. Pelo contrário, somente
enumera as causas do fracasso de tal modalidade de ensino, indicadas pelo
Diretor do Liceu ao Diretor Geral da Instrução.
Segundo o Diretor do Liceu , os motivos da decadência do ensino ministrado
no Liceu estão :
1a.Insufficiencia da instrucção primaria que das escholas publicas
ou particulares trazem os que se matriculão, de tal sorte que o
professor vê-se na alternativa – ou de deixal-os sem ensino, ou de
retardar o progresso dos que podem-n’o vantajosamente
aproveitar;
2a.Falta de bancas de estudos que supprão a inapplicação dos
alumnos em casa e a incapacidade ou negligencia dos Paes em
dirigir-lhes os estudos;
3a.Insufficiencia do ensino das línguas vivas, que é , como se sabe,
simplesmente theorico, quando aliás as múltiplas relações que dia
a dia nos digão aos paizes em que ellas se fallão estão exigindo
que o mesmo ensino seja essencialmente pratico;
182
4a.Falta, nos cursos de chimica e physica e de botânica e zoologia,
dos respectivos gabinetes, instrumentos reagentes e mais
pertences, o que de algum modo os inutilisa, apezar dos
respectivos professores;
5a.A que resulta do facto de nenhum valor terem nas escholas
superiores ou em outra parte os exames feitos no lyceu;
6a.A existência de grande numero de collegios particulares, para
onde affluem as classes mais ou menos abastadas;
7a.O efficaz empenho dos donos d’essas casas em obterem
alumnos dos amigos e conhecidos;
8a.A facilidade que fora do lyceu encontrão os alumnos em fazer de
carreira todos os seus estudos.
(Relatório Diretor do Liceu – 1882)
Como podemos constatar, não faltaram indicações sobre as possíveis
causas que levaram à situação lamentável em que se encontrava o ensino
secundário oficial, ministrado no Liceu Provincial da Bahia. Mesmo assim,
com todas as indicações feitas ao longo de quase quarenta anos, iniciativas
concretas não foram tomadas na busca de soluções. O ensino continuava
sendo ministrado desordenadamente, não havendo qualquer sistematização
ou organicidade.
Apontando para as mesmas preocupações que expressamos acima, o
Diretor do Liceu Provincial da Bahia , ainda no seu Relatório de 1882 , além
de procurar listar as causas da decadência do ensino , descarta a idéia de
supressão da entidade, assim como se coloca contrário à transformação do
Liceu em Internato ,recomendando as seguintes medidas urgentes:
183
10.- que, dividido o curso de estudos em três secções – uma de
línguas , que, além do desenho, do grego, do latim e das línguas
vivas alli existentes, comprehendesse o allemão e o italiano , -
outro de lettras propriamente ditas , abrangendo a geographia, a
história, a philosophia e a Rhetorica; e outra de sciencias,
comprehendendo as mathematicas e as sciencias – physico –
naturaes, se creassem para cada uma d’essas secções , antes e
depois das aulas, bancas de estudo sob a direção de professores
adjuntos ou aggregados – um para cada secção, nomeados
mediante concurso pelo presidente da província com ordenado
condigno e direito de entrar para o magistério sem dependência de
novas provas;
20.- que não fosse admittido á matricula do Lyceu alumno que não
mostrasse com documento ter sido approvado nas matérias da
instrução primaria ou se não sujeitasse ao exame d’ellas no
estabelecimento;
30.- Que se tornasse mais prático do que é actualmente o ensino
das línguas vivas, ao qual se adicionasse o da allemão e do
italiano, uma vez que, e só por isso, são hoje preparatórios para
cursos superiores;
40.- Que se dotassem as aulas de sciencias physicas e naturaes
dos indispensáveis instrumentos, reagentes, mappas, etc;
50.- Que se obtivesse dos poderes geraes que em todas as
escholas puperiores do Império fossem válidos os exames feitos no
Lyceu. N’este sentido a Congregação dos professores d’este
estabelecimento, e a Faculdade de Medicina d’esta cidade onde se
fazem exames preparatórios, tem por diversas vezes representado,
mas sempre debalde, sobre a conveniência d’essa medida , qie
aliás substituiria pela ordem e regularidade o atropelo com que se
fazem alli taes exames e traria ao Lyceu, entre outros proveitos
184
reaes, a suprema concurrencia que de direito lhe pertence.
(Relatório Diretor do Liceu – 1882)
De acordo com as preocupações do Diretor do Liceu , podemos afirmar que
as causas mais graves que afastavam os alunos do Liceu estavam presentes
nas recomendações do Diretor. No entanto, não ocorreu , de imediato ,
nenhuma ação pública no sentido de buscar as soluções. Por outro lado , nas
recomendações do Diretor do Liceu , estavam presentes os problemas de
falta de organicidade e sistematização para o ensino secundário , que ainda
não podia ser considerado como um curso secundário , propriamente dito.
Um primeiro passo para a organicidade estava indicado na segunda
recomendação , para que somente fossem matriculados alunos que
comprovassem a conclusão do curso primário. Tal medida implicaria em uma
certa continuidade nos cursos ministrados e maior sistematização, tendo em
vista que , até então , não era necessário que o aluno apresentasse qualquer
comprovação para cursar o ensino secundário que, com cuidado, não
estamos denominando de curso.
Em outra recomendação , o Diretor do Liceu demonstra a necessidade de ser
o ensino ali ministrado de caráter mais prático , mais adaptado às condições
reais da sociedade, sobretudo quanto ao ingresso às academias de ensino
superior.
Por fim , fica claro , em mais uma oportunidade, que o grande entrave para o
desenvolvimento do ensino ministrado no Liceu Provincial da Bahia é o não
credenciamento para realização de exames preparatórios para o ensino
superior. Assim , a recomendação , que já havia sido indicada inúmeras
vezes por outros dirigentes, é a da validação dos exames do Liceu para
ingresso nas Academias.
185
Diante de tais recomendações ,o comentário do Presidente Conselheiro
Pedro Luiz Pereira de Souza, foi de apenas observar que a situação não
poderia continuar a mesma , afirmando:
Do que fica exposto resulta que o Lyceu não deve continuar no pé
em que se acha, salvo se quizer-se o completo aniquilamento do
nosso único instituto de ensino secundario official (Fala-1882)
Para marcar sua posição quanto à situação precária do Liceu Provincial, o
Presidente propõe uma reforma do ensino , dentre tantas outras que já
haviam sido realizadas sem que os problemas fossem solucionados ,
inclusive uma no ano anterior. No entanto, o presidente argumenta:
O que o bem da província está indicando é uma reforma séria,
efficaz, em que se aproveitem , com intelligencia e patriotismo, os
excellentes materiaes que existem n’aquelle estabelecimento,
tornando-o em real proveito para o publico.
Em tal reforma dever-se-há attender para o ramo da instrucção
que interessa às artes, a que estão ligadas estreitamente toda vida
acadêmica e a prosperidade da província e do Estado – a
agricultura, o comercio , a industria. ( Fala-1882)
186
Ainda em 1882 uma nova Fala em março , no momento em que foi passado
o governo para novo Presidente da província , destaca a instrução popular
como “... questão vital para os interesses da província como para os
interesses do paiz...” (Fala,1882). Continuando a análise sobre a importância
da educação, o Presidente destaca:
...ensino popular, hoje a mais séria, a mais viva preoccupação dos
governos livres , por ser também a mais importante e urgente do nosso
tempo, ..
A mais importante e urgente, sem duvida, por que, como sabem V.Ex., é da
solução d’ella que depende a dos grandes problemas que se agitão na
sociedade moderna e que tanto perturbão-n’a. (Fala , 1882)
Apesar da argumentação utilizada pelo presidente baiano, no curso do estudo
das políticas públicas para o ensino secundário na Bahia do século XIX , nos
deparamos constantemente com a visível tendência dos poderes
constituídos – sob o pretexto de implantar a liberdade de ensino -
ao favorecimento da iniciativa particular na educação , fato que mereceu de
Fernando Azevedo o seguinte comentário : “ O Império foi a época do
esplendor dos colégios particulares no Brasil “ (AZEVEDO , 1943:349)
No caso particular da província baiana , podemos analisar que o fato de as
políticas públicas para o ensino secundário não atacarem, a ponto de
solucionar, os problemas relativos ao ingresso nas academias do Império,
assim como não resolverem o problema da atuação concomitante dos
professores do Liceu na Faculdade de Medicina baiana, acabou por
favorecer a fuga para o ensino secundário particular , sua proliferação e
fortalecimento.
187
Ao concluir os Relatórios para o ano de 1882 , tanto o presidente quanto o
Diretor Geral e do Liceu, indicam dados numéricos de matrícula dos colégios
particulares para aquele ano . Tais dados dão a noção do abismo existente
entre eles e os matriculados no Liceu Provincial que, naquele ano, teria
contado com 140 alunos matriculados , dos quais 121 freqüentavam e
somente 31 tiveram aproveitamento suficiente.
ESCOLA ALUNOS ____________________________________________________________ Colégio Sete de Setembro 119 Aulas Dr. José Barbosa Nunes Pereira 83 Aulas de Hermelindo Valeriano Ferreira 10 Collegio São Joaquim 135 Imperial Lyceu de Artes e Officios 139 Collegio Santo Amaro 46 TOTAL 532 (Relatório Diretor Geral –1882)
Cabe destacar que, deste quadro, não constam todas as escolas e aulas
particulares, assim como as que estão apontadas neste quadro não são as
mesmas apresentadas em relatórios anteriores, tendo em vista que o controle
era irregular e as escolas não enviavam os dados à Diretoria Geral. Mesmo
assim , nos deparamos com quase quatro vezes mais o número de alunos em
aulas particulares que no Liceu Provincial da Bahia.
188
Além de demonstrar que o número de matriculados nas escolas particulares é
maior que no Liceu Provincial, o Diretor Geral , ao encerrar seu Relatório ao
presidente, comenta o fato de nada mais poder ser feito pela instrução na
província , devido a falta de condições , inclusive financeira, tendo em vista
que o orçamento dedicado à instrução não era suficiente para solucionar os
problemas existentes.
Comenta , também , o Diretor que, embora a reforma estivesse em
andamento, muitas eram as críticas à Reforma de 1881, impedindo que os
resultados fossem efetivamente avaliados corretamente. Tal comentário
enquadra-se nas próprias afirmações do presidente que, ao encerrar sua
Fala, já advoga a idéia da necessidade de nova Reforma para a Instrução
pública da província.
Muito se fala , critica-se, porém , a situação do ensino secundário ministrado
no Liceu Provincial da Bahia ,continua vítima das mesmas mazelas
apontadas quase desde o início de seu funcionamento. Já às vésperas de
mudança de século , o ensino ministrado no Liceu continua sem grandes
alterações, com matrículas efetuadas, ainda, por matéria, não formando um
curso secundário estruturado, com organicidade e continuidade. A prova
desses dados está nas próprias Falas, como a de 1883 , que indica os
seguintes números para as matrículas no Liceu:
189
Latim 13 Inglez 9 Francez 11 Grammatica Philosophica 14 Philosophia 16 Geographia 9 Historia 15 Geometria 8 Arithmetica e álgebra 6 Botânica e zoologia(alumnos da Escola Normal) 17 Chimica e physica (alumnos da Escola Normal) 11 Rethorica 0 TOTAL 129 (Fala – 1883)
O Relatório de 1883 do Diretor Geral informa , como elemento novo , que foi
tentado no ano anterior , que os alunos homens da Escola Normal ,
freqüentassem as aulas no Liceu Provincial, o que justificaria a freqüência
desses alunos no quadro do Relatório. No entanto , argumenta o Diretor que
tal tentativa não teria dado resultados positivos - não sendo informado os
motivos - razão pela qual propõe que esse procedimento não tenha
continuidade.
Outro dado importante que este Relatório de 1883 deixa transparecer é a
mudança do prédio de funcionamento do Liceu , que passa a ser na Piedade,
segundo o próprio Diretor , sendo muito positivo para o Liceu , pois estaria
mais central e próximo dos poderes constituídos da época.
190
5. O LIceu , o ensino profissional e o ensino feminino
Dentre as questões em discussão nos últimos anos do Império , o
desenvolvimento dos centros urbanos aliado ao incipiente incremento de
atividades industriais levou ao debate das novas necessidades para a
educação e de um ensino técnico profissional.
Com essa visão de transformação da sociedade baiana e brasileira , é que o
presidente da província baiana passa a pregar uma nova reforma para a
instrução pública, de tal forma que o ensino fique mais próximo das
modificações por que vai passando o país. Nessa sociedade transformada,
não havia lugar mais somente para o ensino de tipo clássico :
As necessidades novas introduzidas na sociedade pelo immenso
desenvolvimento das sciencias physicas , chimicas e naturaes e o
numero crescente de suas applicações aos usos da vida fizerão
sentir a insufficiencia do ensino clássico. (Fala-1882)
O presidente da província baiana, em 1882, sugere, ainda, que o ensino
ministrado no Liceu Provincial , única casa oficial de ensino secundário da
província , seja também mais prático , ficando dessa forma , na mesma
instituição tanto o ensino dito clássico, como o profissional :
191
Na mesma casa, sob a mesma administração, com os mesmos
professores, auxiliados pelos mestres que fornecessem o ensino
primário e o das carreiras profissionaes, poderião reunir-se, sem
confundirem-se, os dous ensinos secundários – o classico, que
abre caminho para as carreiras liberaes e o profissional para as
carreiras da industria , do comercio e da agricultura. (Fala-1882)
Quanto ao ensino profissional, cabe destacar que se encontrava em
funcionamento , desde 1872 , o Liceu de Artes e Ofícios que:
... foi criado como instituição beneficente e educacional, destinada
a atender necessidades, profissionais e de sobrevivência, de
artistas e operários, que experimentavam dificuldades num período
em que as relações escravistas de produção se deterioravam, e a
maioria produtiva da cidade era constituída de trabalhadores livres.
(LEAL. 1996:115)
No entanto, a questão de o ensino ministrado no Liceu ser mais ou menos
profissional , fazia parte de uma discussão maior sobre a identidade , ou a
função que deve cumprir o ensino secundário. Na sua criação e instalação
do curso no Liceu Provincial , o objetivo primeiro era exatamente o de
preparar para o trabalho , para atividades burocráticas na máquina estatal ,
absorvendo , para tanto , jovens da camada intermediária da sociedade.
Porém , o que acabou acontecendo foi o oferecimento de um currículo
humanístico ,no melhor estilo de um curso clássico.
192
As preocupações para que o ensino secundário fosse mais profissional , não
eram , propriamente, novas na história do curso , visto que, mesmo na
França , de onde foram importados mais os modelos de escolas e cursos ,
todas as tentativas de profissionalização , durante o século XIX, fracassaram.
Nos pareceres emitidos por Rui Barbosa , no início da década de 80, do
século XIX, o objetivo de tornar o ensino secundário mais prático , mais
utilitário também aparece com freqüência , embora ele não descartasse a
continuidade dos cursos mais clássicos. Em suas avaliações , não descartava
que o ensino fosse literário , porém discordava que o secundário fosse
voltado unicamente como preparatório para o ingresso nas faculdades.
Dentro de seu pensamento, o momento era de difusão do ensino , de
ampliação do alcance da educação , que deveria ser ministrada para a
maioria das criaturas humanas , sendo que seu conteúdo deveria estar mais
voltado para os misteres práticos da vida, e não para a contemplação dela.
Nesse sentido apontava para o que denominava uma educação mais ligada a
existência cotidiana. (Barbosa.1942:157)
Como podemos comprovar , não há , por parte do parecer de Rui Barbosa ,
uma proposta concreta de um ensino profissionalizante. Mas há a indicação
de que, ao lado do ensino mais clássico , literário, que não seria ampliado a
toda população, deveria haver um ensino mais prático ,talvez utilitário , este
sim destinado a um maior número de estudantes ou a vasta maioria do povo ,
como ele próprio denominou.
193
As preocupações com as mudanças ocorridas neste final de século, também
estavam bastante explicitas na Fala presidencial . Deve-se ressaltar que,
diante das mudanças ocorridas no mundo do trabalho na província baiana,
principalmente em Salvador, a expressão de tais mudanças na educação já
havia dado seu tom, quando da criação do Liceu de Artes e Ofícios, dez anos
antes desta Fala , ou seja, em 1872.
Por fim , em sua Fala, o presidente deixa clara qual a função , que segundo
ele, o Liceu deveria ter:
D’est’arte o lyceu ficará o que deve ser: o logar onde se prepare o
individuo , pela cultura geral e desinteressada do espírito, para o
grande combate da vida – como também o logar , d’onde partão
todas as estradas que levão á consideração publica, ás honras, á
fortuna. (Fala-1882)
Apesar das transformações que vinham ocorrendo no país e na província
baiana no final do Império , o pensamento do presidente da província com
relação ao ensino que deveria ser ministrado no Liceu provincial , era de uma
formação humanística , que chamou de formação geral, não deixando espaço
para uma formação mais prática e de aplicação à vida cotidiana , como as
mudanças da época estavam apontando.
194
Em termos de transformação , pertinente ao período de final do século XIX,
salientava-se a questão da instrução feminina que passava a ganhar um
destaque especial , com a solicitação pelo Diretor Geral e aprovação pelo
presidente da província baiana , de um Curso de Letras e Ciências para o
sexo Feminino , conforme consta do Relatório deste mesmo Diretor, em
1883. A justificativa para a criação de tal curso estava assentada nos
seguintes argumentos:
A família é a base da sociedade, e a mulher a base da família. Tal
mulher, tal família; tal família, tal sociedade.
Procurar,pois, instruir o homem e deixar na ignorancia a mulher é
um crime e um erro, diz um notável publicista. (Relatório Diretor
Geral-1883)
O Diretor continua argumentando sobre a necessidade da instalação de um
curso secundário feminino, já que em termos de educação primária, as
mulheres já recebiam esse tipo de instrução.
A educação primaria é mais ou menos distribuída nas vinte e
quatro escholas , que para o sexo feminino temos na capital. Mas a
secundaria somente recebem-n’a as filhas dos que podem mantel-
as nos estabelecimentos particulares de instrucção (Relatório
Diretor Geral – 1883)
195
Para a implantação do Curso secundário feminino, o Diretor Geral ( Cônego
Dr. Romualdo Maria de Seixas Barroso) , solicitou auxílio às senhoras da
sociedade baiana, sendo que 12 aceitaram lecionar gratuitamente. O
funcionamento também foi possível , devido à permissão e franqueamento
para o uso de prédio situado no Largo da Piedade , destinado originalmente
ao externato normal de homens.
No estatuto que regula o funcionamento para o curso de Letras e Ciências
para o sexo feminino , consta que o mesmo era destinado a distribuir ás
senhoras a instrucção secundaria. (Relatório Diretor Geral – 1883)
O Curso secundário feminino passa, então, a estar integrado pelas seguintes
matérias:
Língua Nacional , comprehendendo noções de litteratura;
Língua franceza;
Língua italiana;
Língua ingleza;
Geographia e cosmographia;
Historia pátria e elementos de historia universal;
Arithmetica e geometria;
Elementos de physica,chimica,botânica e zoologia com applicação aos usos
da vida;
Higiene e noções de economia domestica;
Noções de direito usual nas relações com a família;
Desenho de imitação;
Musica;
Prendas domesticas.
(Estatutos anexos – Relatório Diretor Geral – 1883)
196
Embora com um programa de estudos diferenciado em relação ao estudo
secundário masculino, a criação e funcionamento do primeiro curso
secundário feminino oficial , isto é, na rede pública de ensino da província
baiana – uma vez que tal ensino já era ministrado nas escolas particulares ,
foi um avanço no conceito do ensino secundário público.
Segundo, ainda, o mesmo estatuto, o curso se iniciava em março e terminava
no mês de setembro, funcionando diariamente, das 17:00 às 21:00 horas,
tendo em vista que este horário era regulado pela conveniência das
professoras , que eram voluntárias, embora fossem de escolha e nomeadas
pelo Diretor. Mesmo sendo público , o curso secundário feminino exigia para
a matrícula o pagamento de taxa:
Enquanto o Curso não dispuzer de meios para fazer face ás
despezas de illuminação e gratificação á pessoa encarregada de
abrir e fechar o edifício etc., as allumnas pagarão mensalmente
uma jóia, sendo dispensadas as que absolutamente não puderem
pagar. (Estatuto do Curso secundário Feminino – Relatório do
Diretor Geral – 1883)
Mas o ano de 1883 ainda preparava mais transformações, como já
apontavam os relatórios dos anos anteriores , como a Fala de 1882, que
propunha dois tipos de instrução a serem ministradas no Liceu Provincial.
aquela que chamou de Clássica , para a formação propedêutica e a
profissional, que os novos tempos estavam a exigir.
197
Nesse sentido , o Relatório do Diretor de Estudos de 1883 apresenta um
programa de Instrução secundária e profissional que nos relatórios
posteriores deixa de ser mencionado, levando-nos a concluir que tal
pretensão não foi concretizada.
Ainda no ano de 1883, realizou-se mais um encontro da instrução da
província, denominado de Conferência Pedagógica, onde foram debatidos
temas relativos à instrução na província , como: vícios e lacunas do ensino
primário e profissional; organização do ensino secundário; organização das
escolas profissionais; métodos, programas e livros a serem adotados; entre
outras questões.
Para o ano de 1884, verificamos a existência de duas Falas , portanto , dois
Presidentes assumindo em um único ano, um no início e outro em meados do
mesmo ano. A primeira Fala , de abril , não revela grandes informações
quanto ao ensino secundário, com 103 alunos , representando 152 matrículas
, já que esta era feita por disciplina. Além desse dado , outro importante é o
da existência de 20 alunos do Externato Normal, que o Relatório do ano
anterior já havia condenado , como sendo uma medida que não teria
produzido resultados positivos.
A Fala de 1884 também dá conta da continuidade do curso secundário
feminino, que obteve durante aquele ano 39 alunas, com 12 professoras
voluntárias, lecionando gratuitamente, dentro do programa e estatutos já
aprovados no ano anterior.
198
6. Inconstância política, dificuldades financeiras e o ensino secundário
Entre as grandes questões que se colocam na análise das políticas públicas
para o ensino secundário durante o século XIX, nos deparamos com dois
problemas que muito dificultaram o desenvolvimento desta modalidade de
ensino.
O primeiro desses problemas é a inconstância política, muitas vezes ou na
maioria das vezes , relacionada à inconstância de pessoas no poder. Como já
analisamos anteriormente, os presidentes provinciais sucediam-se muito
rapidamente , sendo que era comum a existência de dois presidentes em um
único ano. Além desse fato , na sua maioria também não eram oriundos da
província , o que dificultava a criação de laços mais profundos com o local .
Tal inconstância provocava, na educação, mudanças mais rápidas que sua
implantação poderia suportar, resultando em sucessivas reformas de ensino
que não davam resultados positivos, até porque não chegavam a ser
implantadas totalmente.
Por outro lado , uma das queixas mais freqüentes em toda a documentação
, diz respeito às dificuldades financeiras. Ë bastante freqüente encontrarmos
nas Falas ou Relatórios , indicações de que não havia verbas suficientes para
determinadas mudanças , ou mesmo argumentações de que o ensino
secundário do Liceu Provincial estaria dando mais despesas que se poderia
esperar , não proporcionando uma contrapartida à altura , vez que o número
de alunos que chegavam ao final das aulas era pequeno.
199
A questão financeira e a inconstância política levam a uma morosidade no
próprio desenvolvimento do ensino secundário. É o que depreendemos da
segunda Fala do ano de 1884. Ela revela que , apesar de estar em
cumprimento a Lei que reformou a instrução pública em 1881, alguns
problemas não teriam sido resolvidos. A questão colocada diz respeito à
aprovação e regulamentação da Lei pela Assembléia Provincial que, segundo
o presidente, ainda não havia concluído seus trabalhos. Para o Presidente,
referindo-se ao Regulamento de 1881, ainda na Assembléia:
A demora de ser elle aprovado com as emendas que a experiência
tem mostrado de necessidade, a publicação das leis isoladas, (... )
tem trazido os maiores inconvenientes á instrucção publica. (
Fala – 1884)
Continuando sua análise, o Presidente condena a inconstância da legislação
que tantos problemas tem causado à instrução pública da província baiana.
Nessa segunda Fala presidencial, para o ano de 1884, diferiam um pouco os
dados numéricos quanto à matrícula no Liceu Provincial . Segundo o
Presidente , foram 109 alunos, em um total de 162 matriculados, com 23 do
Externato Normal.
O Presidente deixa claro na sua Fala que a situação financeira da província
não era boa , solicitando que a Assembléia Provincial analisasse mais
rapidamente o orçamento provincial.
200
Por outro lado , o Relatório do Diretor Geral coloca como urgente a reforma
do prédio onde funcionava o Liceu Provincial , afirmando:
Grande é a falta de aceio e ruína que de longa data se notão n’este
estabelecimento, não só em relação ao edifício mesmo, cujas
paredes , em muitos logares esburacadas, já não tem cor , e de
cujos telhados, em outro, cahe copiosamente a chuva, como a
respeito dos moveis e utensílios das aulas, da secretaria, etc.
É pois de urgente necessidade que seja todo o prédio novamente
retelhado, caiado e pintado, providas de vidros as janellas que os
não tem ou tem-n’os quebradas, e que a mobília e mais
perytences sejão por outras substituídas, ou reparadas as que de
reparo forem ainda susceptíveis (Relatório Diretor Geral – 1884)
Tais medidas foram tomadas em 1885 , segundo Fala do Presidente , que no
item de obras públicas , dedicou espaço para o provimento de verbas no
orçamento, a fim de que o Liceu Provincial tivesse sua estrutura física
restaurada. De acordo com a Fala presidencial , os consertos foram iniciados
ainda no ano anterior.
Para o ano de 1885 , apesar de o Liceu ter iniciado com 109 alunos , concluiu
o ano letivo com 78 estudantes, sendo que 31 teriam perdido o ano por
excesso de faltas . Segundo a Fala do Presidente, naquele ano, dos 78
estudantes que chegaram ao final , somente 64 tiveram aproveitamento
regular , sendo que 14 não receberam aprovação. Como podemos constatar,
as condições de desenvolvimento do ensino secundário no Liceu, não
sofreram alteração, em que pesem todas as discussões a respeito.
201
O Relatório do Diretor Geral , de 1885, avalia que, dos estudantes que
obtiveram aproveitamento naquele ano no Liceu Provincial, nenhum se
submeteu a exame preparatório “conseqüência natural do nenhum valor legal
que teem nas escholas superiores do Império os exames prestados n’este
estabelecimento” (Relatório Diretor Geral – 1885).
Outro dado interessante do referido Relatório é a indicação de que não
houve nenhum aluno para as aulas de Rhetorica durante aquele ano,
comprovando que estaria havendo uma mudança nas preferências dos
alunos, que vinham ao encontro das transformações por que passava a
Província, com uma necessidade maior de ensino profissionalizante, mais
voltado às atividades mais práticas da província.
O Relatório do Diretor de 1885 comenta ,como positivo, a transferência ,
ainda que temporária , para o Liceu Provincial , dos exames preparatórios da
Faculdade de Medicina, a pedido do então Diretor , em virtude de obras no
seu edifício. Lamenta o Diretor Geral que, quando o Diretor daquela
Faculdade partiu para a Corte, o seu substituto entendeu que os exames
deveriam retornar imediatamente para a Faculdade de Medicina.
Mesmo que por pouco tempo , o Diretor Geral entende que teria sido muito
positivo que o Liceu Provincial da Bahia realizasse os exames preparatórios:
202
Fôra, entretanto, um grande passo no caminho da regeneração dos
estudos secundarios, tão amesquinhados n’estes ultimos tempos,
que se removessem definitivamente da Faculdade taes exames ,
ou antes, como tantas vezez se tem pedido, que fossem validas
para a matricula, senão de todas as escholas superiores do
Império, ao menos da Faculdade de Medicina d’esta Cidade, as
approvações conferidas pelo Lyceu, que, seja dito para honra sua,
não promettendo nem dando esse ensino rápido e instantaneo hoje
tão procurado, não deixa passar nos exames os que a elles se
apresentam com leves tinturas, ou na ignorancia, absoluta das
matérias que estudão. ( Relatório Diretor Geral – 1885)
Para concluir seu Relatório , o Diretor Geral afirma que, apesar de todas as
imperfeições , ainda subsistia o Regulamento de 1881 para a instrução
baiana, reiterando ,ainda , que por diversas ocasiões, já teria dado sugestões
para a realização de uma nova reforma que, segundo ele, estaria em votação
na Assembléia Provincial , esperando que, o mais rápido possível,
aprovassem as novas medidas para a educação baiana.
Do final do ano de 1885 ao início de 1886 , três presidentes passaram pela
província baiana. Este era mais um , dos tantos problemas que a província
enfrentava – a descontinuidade política. Cabe lembrar que esses eram os
últimos anos da Monarquia, que já vinha em franca decadência ,
acompanhados de todos os problemas que envolviam tal situação de
mudança.
203
Compreendendo que a educação expressa o que é a sociedade, pode-se
concluir que a situação da instrução pública não era nada propícia ao seu
desenvolvimento. Pelo contrário , o que encontramos na documentação são
mudanças constantes , críticas variadas, mesmo antes que cada mudança
fosse sido colocada em prática. Assim, a Instrução Pública sofreu com a
descontinuidade política.
A sucessão de políticos no poder, levando a uma inconstância política e de
ações, nos indica que tais posturas levaram , também, a reformas constantes
na instrução pública , não permitindo que viessem a se concretizar. É
exatamente o que comenta o Presidente em 1886 – Conselheiro Theodoro
Machado Freire Pereira da Silva , em abril daquele ano:
Creado, e tendo existido o ensino publico n’esta Província sob o
regimem de reformas sucessivas, acha-se elle hoje sujeito aos
preceitos do Regulamento de 5 de janeiro de 1881, cujo complexo
de disposições , actuando em alguns casos para a má distribuição
actual do ensino, em outros é omisso em prover as necessidades
occurrentes em sua pratica. (Fala-1886)
Para o Liceu Provincial, a situação não foi alterada, pois continuaram as
matrículas por disciplina , como o mapa de matriculados pode nos
esclarecer, na medida em que eram 101 alunos , que representavam 148
matrículas, dependendo da disciplina em que se matriculassem.
204
A Fala indica , ainda, que havia alunos ouvintes, que também mantinham
matrículas por matéria. Além desses dados , outro importante diz respeito à
freqüência , pois dos matriculados apenas 81 freqüentaram as aulas, sendo
que nenhum prestou exames , uma vez que esses, realizados no Liceu , não
credenciavam para o ingresso nas faculdades , nem do Império, nem da
própria província.
Outra questão de relevância para o período de 1885/1886 diz respeito aos
problemas financeiros por que passava a Província baiana. Os Relatórios e
Falas comentavam sobre problemas em torno da lei de orçamento para o
referido período.
A Fala de outubro de 1885 indica que a Assembléia Provincial havia
terminado o período legislativo sem a aprovação de leis como do orçamento
provincial e da força policial.
Sendo assim , estava ameaçado qualquer tipo de despesa , bem como a
segurança pública. Em função disso, a instrução pública também teve
problemas, visto que afetava pagamentos , inclusive referentes à compra de
livros, o que, na Fala, ficou absolutamente expresso: deveria ser suspenso o
pedido dos livros que já haviam sido requisitados, determinando-se que
fossem devolvidos ao fabricante aqueles que já tivessem sido entregues.
A situação financeira da província neste final da Monarquia era realmente
lastimável, afetando não só a instrução e segurança pública , como também
a saúde , exatamente no momento em que surtos , antes já contidos , voltam
a atormentar a província, a exemplo da febre amarela e da varíola. Como o
Hospital de Mont Serrat havia sido fechado , devido as condições financeiras
da província , o então presidente afirma:
205
Tendo a varíola tomado certas proporções... entendi ser necessário
abrir um hospital...escolhi a fortaleza do Barbalho , onde já
funcionava uma enfermaria Militar...(Anexo à Fala - 1886)
A situação financeira da província baiana era de tamanha dificuldade que o
presidente criou uma comissão para indicar medidas que pudessem levar a
melhoria do estado financeiro. No ofício que a comissão enviou a presidência,
indicavam-se as enormes dificuldades para minimizar os problemas
financeiros:
A iniciativa que V.Ex. acaba de tomar, mostra o desejo que nutre a
Administração de evitar uma bancarrota, que será a conseqüência
se todos não concorrerem com uma quota de sacrifícios para
restaurar suas finanças.
Na creação de renda para o serviço da Província sentimo-nos
esbarrados ante uma muralha de difficuldades.
(Oficio da Comissão – Anexo a Fala 1886)
O ensino secundário público da província baiana agonizava durante as
últimas décadas do Império. Os presidentes bem como os Diretores da
Instrução ou mesmo do Liceu Provincial, protestavam e apontavam falhas. No
entanto, mesmo agonizando , o Liceu não foi fechado e, ao mesmo tempo ,
não se apresentam por parte dos poderes públicos constituídos , as soluções
necessárias.
206
Independente das questões específicas da província baiana, cujo ensino
secundário público sequer credenciava para prestar os exames preparatórios,
os problemas com esta modalidade de ensino são nacionais.
Rui Barbosa , no parecer emitido em 1882 sobre a reforma do ensino
secundário e do ensino superior, já argumentava sobre a importância da
educação para a sociedade, ao lamentar as parcas verbas destinadas ao
ensino público. Segundo ele, a educação deveria ser equiparada à defesa
nacional, em termos de gastos e prioridade. Entretanto , lamenta o fato de
não conhecer “país nenhum onde proporcionalmente se despenda tão pouco
com o ensino público como o Brasil” (BARBOSA.1942:17)
O posicionamento de Rui Barbosa , em seu parecer , quanto às verbas
destinadas ao ensino no Brasil, é bastante contundente , demonstrando que
pouca importância era atribuída ao processo educacional. Ao mesmo tempo
os Relatórios dos Diretores - tanto Geral como do Liceu - freqüentemente
reclamavam dos poucos recursos , enquanto os presidentes provinciais
sempre se queixavam de muita despesa com o ensino secundário.
Dessa situação concluímos por compreender que não havia uma devida
valorização do ensino público , sobretudo do secundário ,nosso objeto de
estudo, pois as falhas eram detectadas mas não eram corrigidas, nem
mesmo havia uma política clara que atacasse os principais problemas, como
é o caso da necessidade de verbas.
207
A Província baiana sofre as conseqüências da profunda crise econômica que
se abateu sobre ela nos últimos vinte anos de Império. A crise do açúcar
levou a província a assumir algumas atitudes em relação à lavoura
açucareira, sem contudo poder modernizar o suficiente a produção para fazer
frente as mudanças necessárias. Além desse fato, a transferência do eixo
econômico para o Centro-Sul do país , conforme já comentamos
anteriormente, afetou gravemente os segmentos produtivos do Nordeste,
agravando o desequilíbrio entre essas regiões.
A Fala de 1887 foi toda baseada na crise econômica da Província e as
possíveis medidas que poderiam ser adotadas para o melhoramento das
condições do ensino secundário na província baiana. Para tanto o presidente
afirma:
Nenhum ramo de administração existe que mais solicite um
interesse esclarecido e attento do que a difusão do ensino popular,
não sòmente sobre o modo de execução dada ás instituições em
vigor, para o fim de saber, si cumpridas em toda sua latitude ellas
deram os resultados presuppostos, como também sobre as
reformas preferíveis para prover a insufficiencia ou a inefficacia das
instituições, julgadas condennadas pela experiência. (Fala-1887)
208
O Presidente ainda comenta que tais mudanças ou reformas para a instrução
pública são complicadas e lentas:
A nenhum de nós são estranhos os embaraços que envolvem este
assumpto e elles por si explicam esta lentidão com que, em geral,
a educação popular vai alcançando desenvolver-se, a despeito da
solicitude e energia empregadas pelos governos dos paizes mais
cultos em promovel-a e aperfeiçoal-a . É que o progresso da
instrucção publica depende de um complexo de medidas, muitas
das quaes são subordinadas á acção lenta do tempo e ao
desenvolvimento material dos Estados.
(Fala – 1887).
Em mais uma oportunidade, constatamos que os lamentos quanto à situação
da província e da educação , particularmente o ensino secundário, apontam
para a necessidade de medidas concretas. Em contrapartida , estas não
aconteceram, ao contrário , lembrando as necessidades exigidas pela
instrução pública e a situação financeira da província, o presidente em
exercício no ano de 1887 - João Capistrano Bandeira de Mello - recomenda
moderação nas medidas a serem adotadas , porém , ao mesmo tempo
afirma:
Entendo , porém, que a instrucção popular como necessidade
indeclinável que é num paiz livre e progressivo, não passará de
uma formula vã e meramente depauperante, si as sommas
despendidas em seu nome forem insufficientes, para accudir as
suas necessidades reaes e immediatas. (Fala – 1887)
209
Apesar de a comissão instalada para propor medidas a fim de sanar os
problemas financeiros da Província, ter afirmado não ser possível instituir
mais qualquer outra taxa ou imposto , tendo em vista que os impostos já
estariam altos e que a província não comportaria mais um aumento de
impostos, o Presidente propõe a criação de uma nova taxa para ser aplicada
à instrução:
... creação de alguma taxa addicional aos impostos municipais,
com a apliccação exclusiva aos gastos da instrução primária de
cada município, si outro melhor alvitre não fôr suggerido pela
vossa experiência. (Fala1887).
Do ponto de vista do ensino secundário, a proposta do presidente para tentar
reduzir os gastos foi a de unificação com a Escola Normal. Segundo ele, as
duas instituições estariam enfraquecidas e a unificação poderia trazer , além
de redução nos gastos , melhoria no ensino:
Dentre as providencias que tenho por acertadas para alcançar, o
mais cedo possível, a uniformidade e sobretudo o melhoramento
desejável aos estabelecimentos do ensino normal e secundário,
indicar-vos-hei a fusão do Lyceu e do externato normal de homens.
(Fala – 1887).
210
Em sua Fala, o presidente continua defendendo a fusão do Liceu com a
Escola Normal masculina , demonstrando as vantagens em tal unificação
como prédio único, professores únicos, sem prejuízo para os mestres de
uma ou outra casa. A despeito de a fusão entre as duas instituições ser
defendida pelo então Presidente da província, não houve qualquer outra
manifestação nesse sentido e, além de algumas aulas em conjunto no início
da década de 80, nada mais apontou para essa direção.
Outro ponto importante destacado na Fala de 1887 é a indicação da
legislação de 1886, que determina e disciplina a realização de exames
preparatórios na província. Nesse sentido, comenta a necessidade da criação
de cadeiras no Liceu Provincial de acordo com as novas matérias exigidas
por leis gerais para a matrícula em cursos superiores.
A realização dos exames preparatórios na província deveria ser um elemento
positivo para o ensino secundário na Bahia, entretanto ainda não eram
aceitos os alunos do Liceu Provincial e, tampouco, foram implantados de
imediato.
Analisando , ainda , a situação do ensino secundário da província baiana , o
presidente reafirma a idéia discutida desde a criação do Liceu Provincial do
seu credenciamento para o ingresso no ensino superior. Indicando a
capacidade inegável de seus professores. O presidente afirma, também, que
daria um novo alento ao Liceu se, pelo menos, os professores daquela
instituição fizessem parte da banca examinadora dos exames preparatórios.
Para que o ensino secundário ministrado no Liceu Provincial voltasse a ter
um lugar de destaque na província, o presidente sugere que seja dada
prioridade para os empregos públicos àqueles que tenham formação naquele
estabelecimento de ensino.
211
Ao finalizar o seu relatório , o presidente conclui defendendo a idéia de que
não adianta criar várias escolas ou tornar o ensino obrigatório. Segundo ele,
tais medidas acabavam não sendo colocadas em prática por não serem
viáveis. Para ele , qualquer medida não seria completa se não fosse também
estimulada pela iniciativa particular:
Se não houver, como infelizmente tanto nos falta, o motor mais
poderoso do progresso dos povos – a iniciativa particular ou o
concurso das forças individuaes, tradusindo o interesse pela mais
grandiosa das causas – pequeno será o resultado dos esforços dos
poderes públicos e de todas as medidas que lhes suggerir o seu
patriotismo.
É que as idéias ou instituições, que pretendem viver somente na
estufa da direcção ou influxo official, não conseguem nunca medrar
completamente ou attingir ao seu Maximo desenvolvimento. (Fala-
1887).
212
7. Exames preparatórios na província
Embora já fosse permitida a realização dos exames preparatórios na
província desde 1873 , na Bahia essa situação somente foi concretizada treze
anos depois. A realização dos exames preparatórios , que permitiam o
ingresso nas faculdades do Império, era de importância para a província , que
não mais dependeria da saída de seus alunos para a realização de tais
exames fora. Ao mesmo tempo , conferia à província baiana um outro status
no que se referia a instrução pública secundária
Para o ano de 1887, o Relatório do Diretor Geral indicava 78 alunos para o
Liceu Provincial , perfazendo um total de 114 matrículas, sendo que, destes,
poucos tiveram aproveitamento e nenhum aluno do Liceu submeteu-se ao
exame preparatório .
O Relatório do Diretor Geral, em 1887, indica que logo ao ser colocado em
vigor o Decreto 9.647 de 02 de outubro de 1886 , permitindo que os exames
preparatórios fossem realizados na província , foi nomeado um Delegado
Especial para dar seguimento às inscrições e realização de tais exames na
província baiana. Foram 1.539 alunos inscritos, dando a clara indicação de
que os poucos alunos matriculados no Liceu Provincial não traduziam a real
situação do ensino secundário. Indicavam, também, uma demanda reprimida
pelo fato de não haver anteriormente a realização de tais exames na
província.
213
Segundo o Relatório do Diretor Geral , foi o seguinte o quadro de aprovações
nos exames realizados , na província, no dia 02 de novembro de 1886
QUADRO DO RESULTADO DOS EXAMES GERAES DE PREPARATORIOS MATERIAS numero dos Approvados Approvados Approvados Repprovados não não eliminados Alumnos com Inscriptos distincção plenamente simplesmente concluíram compareceram PORTUGUEZ 142 _______ 43 84 19 40 56 _____ LATIM 124 _______ 16 26 7 31 44 _____
FRANCEZ 212 2 56 37 2 41 74 _____
INGLEZ 128 3 14 33 1 36 41 _____
A RITMETICA 173 3 28 45 12 23 62 _____
GEOMETRIA 151 1 37 25 13 9 66 _____
ALGEBRA 107 _____ _____ 43 6 _____ 58 _____
TRIGONOME TRIA 15 1 1 2 _____ _____ 11 _____ GEOGRA PHIA 63 _____ 8 2 _____ 1 52 _____ HISTORIA 139 _____ 18 37 33 _____ 51 _____ PHILOSO PHIA 106 2 6 18 5 8 67 _____ HISTORIA NATURAL 13 _____ _____ 1 1 1 10 _____ PHYSICA E CHIMICA 15 _____ _____ 3 _____ _____ _____ 12 RHETORICA 51 2 7 11 3 _____ 28 _____
SOMMA 1.539 14 234 367 102 190 620 12
Fonte: Relatório do Diretor Geral - 1887
214
Este quadro nos dá algumas indicações merecedoras de comentários. Em
primeiro lugar , enquanto a matricula do Liceu não passava de 70 a 100
alunos por ano, o número de inscritos para os exames preparatórios foi de
1.539 alunos. Esse número dá a indicação clara de que os alunos aptos a
fazerem os exames preparatórios tiveram sua educação secundária realizada
em escolas particulares. Outro dado importante a ser destacado é o fato de
que até mesmo os exames preparatórios são feitos por matéria , segundo
dados da própria tabela divulgada pelo Diretor Geral na época.
Sem dúvida alguma , a realização dos exames preparatórios na província
baiana foi acontecimento digno de nota. No entanto , o ano de 1887 é marco
também de outras preocupações na província. Estamos falando da
proximidade da data de libertação dos escravos , com toda a legislação que
precedeu a tal fato, e suas repercussões na vida econômica baiana.
Diante de tal situação , grande parte das Falas de 1887 diz respeito a
questões ligadas com a produção agrícola, ao perigo de fortunas construídas
com base na produção agrícola escrava vir a se desmoronar. É com essa
preocupação que, na Fala de 1887, o presidente afirma:
Não é que desappareçam os homens, mudadas as condições de
existência , mas sim que se desmoronem as organizações
tradicionaes pela negação dos serviços, arrastando na queda
tantas fortunas construídas, que já representam immenso capital
accumulado, e por conseguinte parte da riqueza do paiz.
Seria desconhecer a natureza acreditar que a transformação
esperada não produzisse semelhante abalo na lavoura. (Fala -
1887).
215
Dentro deste raciocínio , o presidente da província baiana desenvolve todo
um pensamento da necessidade urgente de que fosse disciplinada a
imigração , para que o desenvolvimento tanto agrícola como industrial não
sofressem com a falta de pessoal ou de mão – de – obra . Assim sendo ,
sugere:
A solução, pois, deve preceder á extincção absoluta do elemento
servil , aproveitando- se a vitalidade que ainda resta para que
não surja uma quebra de continuidade na marcha ascendente da
produção ; quebra essa que seria uma verdadeira ruína moral para
a nação , e a miséria para a communhão de seus habitantes
desprecavidos. (Fala-1887).
Com tais preocupações , foi criada uma Comissão, dentro da já existente
Sociedade Bahiana de Imigração , Composta por ilustres figuras da província
como : Dr. José Luiz de Almeida Couto, Antonio Carneiro da Rocha – Barão
de São Francisco, Leovilgildo J. do Amorim Filgueiras, Franz Wagner e José
da Costa Pinto. Essa comissão tinha por finalidade levar, à Alteza Imperial ,
uma representação da província baiana, solicitando verbas no orçamento,
para que fosse encaminhada para a província a imigração estrangeira , a fim
de procurar solucionar problemas tanto de povoamento quanto de mão – de
– obra para a produção agrícola.
Realmente os últimos anos do Império foram bastante agitados , pois além
dos abalos que a libertação da mão – de – obra escrava viria a trazer para a
lavoura da província, as diferenças políticas pareciam ficar mais evidentes.
216
Em abril de 1888 , ao abrir os trabalhos da Assembléia Provincial , o
presidente baiano, em sua Fala, dedica especial interesse às divergências
políticas que estariam interferindo no desenvolvimento da Instrução Pública.
Uma idéa fatal tem desnaturado as instituições do ensino publico,
procurando fazel-as passar por instituições de ordem partidária.
Dirigindo-me a uma Assembléa illustrada, e que sobrepões os
interesses permanentes do desenvolvimento geral a cogitações
de qualquer outra natureza, eu não preciso dizer que , onde os
melhoramentos n’este assumpto encontram embaraços
systematicos sob o pretexto de discordancia em idéas políticas,
ahi está a primeira e mais danninha das causas de atrazo do paiz
em todas as direcções, sem que a seus agentes aprovite siquer a
attenuante d’aquelles que fazem o mal sem percebel- o.
A estreiteza do tempo não permittiu-me desenvolver, como
desejava, o meu pensamento com referencia aos detalhes de uma
útil reforma a fazer na instrução publica. (Fala – 1888) .
O Relatório do Diretor Geral , para o mesmo ano de 1888 , dá informação de
que foram matriculados no Liceu Provincial 114 alunos , com 9 da Escola
Normal , perfazendo um total de 205 matrículas. Desse total , 48 foram
perdidas por falta, 58 tiveram aproveitamento e, nenhum requereu exame
preparatório.
Com tais dados , podemos concluir que nada houve de alteração no
andamento da instrução pública secundária na província baiana. Continuam
as matrículas por matéria, não há curso estruturado, os alunos do Liceu
continuam não prestando exames preparatórios.
217
8. A legislação de 1888 e a Instrução Pública
A Fala de abril de 1889 é praticamente toda dedicada às mudanças ocorridas
com a Lei de 13 de Maio de 1888. Comenta os festejos que ocorreram na
província a partir da notícia da libertação dos escravos, inclusive com
algumas manifestações de oposição à nova legislação , mas sem que estas
tivessem grande repercussão na província baiana.
Por seo lado os recém – libertos pela Lei não praticaram actos
que determinassem a necessidade de intervenção da autoridade
e, mostrando-se d’est’arte dignos da condição de cidadãos a que
foram chamados.
Si , porem, não perturbaram a boa ordem social , e em geral
procuraram exercer sua actividade em outras localidades que não
aquellas em que tinham estado sob o regimem da escravidão , é
certo que , não só em muitos ainda não se firmou a convicção de
que é pelo trabalho que podem e devem cooperar para a
grandeza da Pátria e garantir o próprio bem estar mas
também que , pelo motivo exposto , deu-se em algumas
fazendas, por elles abandonadas, perturbação no trabalho . (Fala
– 1889).
218
A preocupação do presidente baiano era também com o tipo de instrução que
poderiam ou deveriam receber , agora pós-libertação, os negros. Assim,
convocou uma reunião com vários cidadãos da província , manifestando suas
idéias quanto à necessidade de que a iniciativa particular assumisse a
instrução dos libertos:
Parecendo-me de maxima conveniência recorrer á acção particular
para promover a instrucção dos libertos defendel-os quando
preciso, e dar-lhes collocação e trabalho, evitando-se os perigos
que a vagabundagem podessem resultar para a ordem publica,
convidei crescido numero de cidadãos para uma reunião em
Palácio; e effectuada ella no dia 16 de maio, expuz o fim a que me
propunha, indicando como meio a organização de uma siociedade
sob as bases que me pareceram mais convenientes, e mostrando
as vantagens que para os libertos e a Província adviriam d’ella.
(Fala –1889).
Sendo assim, aceita a idéia proposta pelo presidente baiano , foi fundada a
Sociedade Treze de Maio que, com os objetivos já delineados , passou a
atuar regularmente. Sua primeira ação foi a de criar a eschola nocturna, na
capital da província, para que os libertos viessem a estudar. No ato de
abertura da primeira aula noturna para libertos , no dia 28 de setembro de
1889, no prédio de número 84 da Rua São Francisco, antiga do Pão - de –
Lot , foi redigido o seguinte telegrama para sua Alteza a Princesa Imperial:
219
A Sociedade Bahiana Treze de Maio , inaugurando hoje sua primeira
eschola para instrucção dos libertos e seus descendentes, saúda a
Vossa Alteza, não só signatária das Leis de 28 de setembro de 1871
e 13 de maio de 1888, mas também pela sistincção que hoje
recebeu do Chefe do Catholicismo. (Fala – 1889) .
Do momento de sua abertura em setembro de 1889 até o momento em que o
presidente fazia o relatório em abril de 1890 , 197 alunos passaram pela
escola noturna . Segundo, ainda , a Fala do presidente baiano , vários
professores tanto públicos como particulares , passaram a oferecer aulas
noturnas , na capital e no interior , para que os libertos estudassem . O
mesmo procedimento ocorreu , também, no Liceu de Artes e Ofícios .
Após estes comentários sobre a libertação dos escravos e o ensino aos
libertos , o presidente volta a tocar no assunto , já desenvolvido em relatório
anterior e naquele momento mais concreto , que era a questão da imigração.
O presidente da província baiana torna a solicitar dos poderes centrais ,
orçamento dedicado a núcleos de colonização , a fim de que a lavoura
baiana não sentisse mais fortemente o desligamento do trabalho escravo.
Especificamente sobre a instrução pública, o presidente reclama a não
autorização para que ele realizasse uma nova reforma do ensino:
220
Na ausencia das medidas que , ao abrir a Assembléa Legislativa
Provincial , d’esta solicitei para dar ordem e incremento a este
ramo de serviço e mediante as quaes podesse conseguir melhor
distribuição das escholas, bom preparo dos professores , predios,
mobilias, livros e utencilios , e fiscalização local , que é actualmente
nulla, sou obrigado a dizer que a Instrucção definha e está muito
aquem das necessidades do cultivo intellectual dos habitantes
d’esta nobre Provincia, não passando de uma realidade puramente
orçamentaria. (Fala – 1889)
Com esse tipo de argumentação , o presidente procura se eximir de qualquer
culpa quanto ao estado precário em que se encontrava a Instrução Pública na
província baiana. Com relação à Reforma para a Instrução comenta:
A Reforma do ensino é necessidade que então fiz sentir á
Assembléa Legislativa Provincial, e que cada dia mostra- se- me
inadiavel.
Abstive-me , porem, de fazel-a , apezar da opinião de caber-me
essa competencia , por entender que solicitado autorização e não
me tendo dada , devia aguardar que a Assembléa m’a concedesse
em sua proxima reunião , nos termos e pela forma que
entendesse em sua sabedoria. (Fala – 1889).
221
Verificamos , assim , que nada foi feito para que ocorresse a tão necessária
reforma da instrução pública, ficando a mesma a mingua, com a desculpa de
que a Assembléia não havia autorizado. Portanto , não foi por
desconhecimento de quais deveriam ser as medidas a tomar , que a instrução
definhava. Sabia-se o que deveria ser feito e não se fez.
A própria Fala de 1889 é que nos mostra com clareza o que os poderes
constituídos na província pensavam sobre a legislação em vigor para o
ensino:
O actual Regulamento da Instrucção Publica , cujos effeitos não
correspondem nem poderão corresponder nunca aos reclamos ,
cada vez mais distantes, da instrucção popular, continua, a
despeito de estar condennado por uma serie de documentos
administrativos e parlamentares , a ter execução , sujeitando a
Administração a uma despeza quase infructifera , e obrigando – a
usar dos meios imperfeitos e inadequados que ella encerra ,
em desproveito do progresso intellectual da Província.. (Fala –
1889).
222
Como podemos concluir, apesar de todos os problemas conhecidos ,
deixando a instrução pública cada vez mais deficiente , a autoridade se
escorou na ausência de autorização da Assembléia para justificar não ter tido
atitude mais enérgica.
Do Relatório do Diretor Geral nos deparamos com os dados de 83 alunos do
Liceu Provincial , perfazendo 143 matrículas , das quais 42 tiveram
aproveitamento. Dos alunos do Liceu , nenhum requereu exame, entretanto, o
mapa mostra que 1.963 alunos efetuaram os exames preparatórios naquele
ano.
O final do ano de 1889 reservava muitas mudanças na estrutura do país . Do
ponto de vista da Instrução Pública , foi instituído o Fundo Escolar. Este fundo
teria a pretensão de buscar soluções para os problemas orçamentários para
a instrução. O Fundo seria composto por donativos e legados feitos ao
Estado para a Instrução; a décima parte da venda de terras devolutas, a terça
parte do produto das heranças vagas; produto de todos os emolumentos de
títulos de qualquer natureza; produto de impostos de profissões liberais e
mecânicas; entre outros.
Datado do último dia do ano de 1889 – 31 de dezembro – portanto após a
Proclamação da República , é o Ato que reforma a Instrução Pública baiana.
Essa reforma, que é a primeira do período já republicano , é integrada por 53
artigos. Como parte do pensamento do período em que foi editado tal Ato,
encontramos logo duas posições características. A primeira diz respeito ao
ensino “livre”, isto é, podendo ser ministrado pela iniciativa particular . A
segunda , relativa ao ensino religioso que passou a ser facultativo.
223
A reforma também criou um Conselho Superior de Ensino com várias
comissões : Comissão de estatística e recenseamento escolar; Comissão
pedagógica ou de Organização escolar; Comissão econômica; Comissão de
higiene; Comissão de fiscalização escolar; Comissão de legislação e
reformas; Comissão do ensino médio ou secundário.
Além dessas comissões , a reforma previa , ainda, a divisão do estado em
departamentos escolares, ficando o ensino, em cada um deles , sob a direção
e fiscalização de um delegado nomeado pelo governo. A fiscalização do
ensino seria ainda efetuada por dois Conselhos , o de Departamento e o dos
Municipais escolares.
Para a organização do ensino secundário ou médio , como passou a ser
chamado, a reforma previa a seguinte organização , caso ela tivesse sido
implantada : Instituto médio preparatório, Instituto de Ciências, conferindo
grau de bacharel; Instituto Normal do professorado primário; Instituto Normal
de Desenho; Instituto de Artes Liberais; Instituto Comercial; Instituto de Artes
Mecânicas e Ofícios; Instituto Industrial; Instituto de Biologia e Higiene
Elementares.
Por outro lado , a Reforma instituía como um outro ramo do ensino médio,
aquele destinado para as moças, composto de : Instituto Médio Preparatório;
Instituto Normal de Desenho; Instituto Normal de Música; Instituto Técnico de
Contabilidade; Escrituração Mercantil e Serviços Telegráficos; Instituto
Técnico de Trabalho doméstico; Instituto de Biologia e Higiene Elementares.
224
No início do ano de 1890 , outro Ato irá criar os Departamentos Escolares,
além de regulamentar a Reforma de 1889, e estabelecer que o Conselho
Superior deveria fiscalizar inclusive a alimentação e o número de horas de
sono dos alunos de internatos que, a partir deste Ato, somente poderiam
funcionar fora da cidade.
Em abril de 1890, foi suspensa a Reforma do ano anterior, bem como os atos
que a regulamentavam, de maneira que essa estrutura prevista para o ensino
secundário não chegou a ser concretizada. A responsabilidade pela
suspensão daquela reforma é assumida pelo Diretor Geral Dr. Sátiro de
Oliveira Dias, na exposição que faz ao governador marechal Hermes da
Fonseca , momento em que faz propostas para o ensino na Bahia.
Nessa exposição, o Diretor Sátiro de Oliveira Dias assume que a Reforma de
1889 era muito radical e, portanto , inexeqüível. Assim, reconhece que o
Regulamento de 1881 não era tão ruim e que, na realidade, não havia sido
aplicado integralmente. Propõe, então, algumas alterações no Regulamento
de 1881, ficando o ensino dividido em primário , secundário, profissional ou
técnico. O ensino primário ficaria dividido em infantil, primário e primário
superior, sendo gratuito , obrigatório e leigo. Para o ensino secundário,
ministrado no Liceu foram criadas cadeiras como as de Grego , Alemão e
Italiano , além de Escrituração Mercantil, Contabilidade e Direito Comercial.
Segundo a proposta do Diretor , a administração da Instrução ficaria a cargo
de um Diretor Geral , do Conselho Superior, do Diretor do Liceu, de dois
diretores das Escolas Normais, de doze inspetores de distrito e dos conselhos
escolares municipais e paroquiais.
225
9. A Reforma de 1890 – Entra em cena o Instituto Official de Ensino
Secundário
Finalmente, em agosto de 1890, ocorreu a primeira Reforma para a Instrução
Pública da República na Bahia. Nessa Reforma , as propostas do Diretor
Sátiro de Oliveira Dias foram incorporadas. Sendo assim, a direção da
instrução caberia ao Governador,através do Diretor Geral da Instrução. A
fiscalização ficava sob a responsabilidade do Diretor Geral, do Conselho
Superior ,do Diretor do Liceu, dos Diretores das Escolas Normais, dos
Inspetores de Distritos, dos Conselhos Escolares Municipais. A composição
do Conselho Superior era: o Diretor Geral, o Diretor do Liceu, os Diretores
das Escolas Normais, um diretor de estabelecimento particular, um professor
público, o Intendente da Câmara Municipal da Capital, o professor de
Higiene da Faculdade de Medicina, o Diretor de Obras Públicas, o
bibliotecário da Biblioteca Pública, o Diretor do Instituto Agrícola, o Diretor do
Liceu de Artes e Ofícios.
O ensino na Bahia ficava dividido em primário , secundário , profissional ou
técnico. O ensino secundário era integrado pelas Escolas Normais , o Liceu
,o Instituto Baiano de Agricultura, o Liceu de Artes e Ofícios e a Academia
de Belas Artes.
A Reforma , que procurava disciplinar o funcionamento do ensino na Bahia,
regulamentou, para o ensino secundário, a continuidade das Escolas
Normais - feminina e masculina - , como externatos, indicando as disciplinas
que deveriam ser ministradas durante os quatro anos de sua duração ,
prevendo diferenciação nos dois currículos.
226
As alterações introduzidas na Instrução Pública no ano de 1890 definiam o
Liceu como sendo um instituto de letras e ciências, constando das seguintes
matérias:
Gramática filosófica em suas aplicações à língua portuguesa ,
compreendendo a sua história; Gramática latina; Gramática Francesa;
Gramática alemã ; Gramática italiana – sendo que em todas haveria tradução
e versão - e Grego ; Geografia geral e Cosmografia; Corografia e História
do Brasil; História Antiga; Média e Moderna, Filosofia, compreendendo sua
história; Aritmética e Álgebra; Geometria e Trigonometria; Retórica, Poética e
Literatura Nacional ; Escrituração Mercantil e Contabilidade, Noções de
Direito Comercial; Ciências Naturais: elementos de Botânica, Zoologia,
noções de Anatomia e Fisiologia Humana; elementos de Química, Física e
Mineralogia.
Com a reforma da Instrução Pública, o ensino secundário ministrado no Liceu
do Estado da Bahia - uma vez que não era mais provincial - , passou a ser
efetuado em seis anos , formando bacharéis em Letras e Ciências. Esse título
de Bacharel pelo Liceu , concedido pela Congregação, depois de defesa de
tese, passou a ter preferência para o ingresso nos serviços públicos.
Com a Reforma de 1890 em implantação , uma nova modificação para o
ensino secundário veio a ocorrer no final do ano , quando , através de Ato ,
foi extinto o Liceu Provincial e criado o Instituto Oficial de Ensino Secundário
do Estado da Bahia.
227
A Direção Geral , após a saída do Sr. Sátiro de Oliveira Dias, ficou a cargo do
Dr. Ernesto Carneiro Ribeiro que, no ano de 1891, dava informações sobre a
Instrução pública do ano anterior. Referindo-se ao Liceu, observa:
Este importante ramo do serviço público está sendo regido pelo
Regulamento de 18 de Agosto de 1890 na parte relativa ao ensino
primário e ao secundário das Escholas Normaes de Homens e
senhoras; e pelo de 23 de outubro do mesmo anno o Instituto
Official do Ensino Secundário, na parte relativa ao ensino que outr’
ora se dava no Liceu. (Relatório – Diretor Geral – 1891)
Ao se referir ao antigo Liceu , o Diretor Geral comenta:
No Instituto Official, estabelecido, como se acha actualmente,
encontrarão os estudantes que o tenham de freqüentar maior
numero de disciplinas do que aquellas que se ensinavam no antigo
Lyceu.
Ahi encontra-se o ensino pratico e theorico não só para aquelles
que desejarem dedicar-se aos estudos superiores das faculdades
do paiz, como para os que se destinarem ao comercio, ás
industrias e ás artes. (Relatório Diretor Geral-1891)
228
As modificações introduzidas na Reforma de 1890 , aliadas aos comentários
dos Relatórios posteriores apresentados ao governador do estado baiano,
indicam que as preocupações com essa Reforma diziam respeito à busca de
soluções para os problemas que há muito afligiam os responsáveis pelo
ensino secundário da Bahia. Tais questões correspondiam a uma maior
organicidade, procurada na seriação do curso em seis anos; maior aceitação
pelos alunos, quando foram credenciados os concluintes do bacharelado ao
ingresso no serviço público com prioridade; formação voltada para o ensino
propedêutico mas, também, para a prática , para o cotidiano , tanto do ponto
de vista industrial como comercial.
Os anos finais do Império foram de tensões e transformações, o que também
terminou por implicar em mudanças no processo educacional na província
baiana que, durante esse período, passou por uma crise econômica , da
qual a instrução pública se ressentiu muito. Ao mesmo tempo, outra
característica marcante foi a grande sucessão de governantes, gerando
instabilidade política, com sérias repercussões sobre a educação
Essas mudanças ocorreram no ensino secundário, na Bahia, através de
várias reformas, como a de 1881 (Regulamento Bulcão). Entretanto, mesmo
com todas as modificações, permaneceram os mesmos problemas ,
principalmente o não credenciamento para o ingresso no ensino superior
229
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O ensino secundário brasileiro , que tem o seu desenvolvimento a partir do
Ato Adicional de 1834 , com a chamada “descentralização” da administração
da educação passando a ser atribuição da província, sofre também
interferência da situação política e econômica do momento de formação e
afirmação do Estado brasileiro. É a partir de tal situação que iniciamos nossa
discussão buscando vislumbrar os diversos momentos desta modalidade de
ensino no período entre o Regulamento Orgânico de 1860 e a reforma da
instrução de 1890 , na província baiana.
A primeira metade do século XIX foi por nós considerada , ao
desenvolvermos a dissertação de Mestrado , como sendo o período de origem
das políticas públicas para o ensino secundário . Durante esse período, a
província passava por momentos de tensão social, com diversas lutas que
afetaram o desenvolvimento da instrução pública. Do ponto de vista da política
nacional , também foi um momento de formação e afirmação do Estado
Brasileiro. Nesse período de origem das políticas públicas para o ensino
secundário ocorreu a criação do Liceu Provincial em 1836, que desenvolveu
tais políticas.
Como conclusão do período , compreendemos que o Liceu Provincial criado
para formar uma camada intermediária , capacitando-a para o trabalho na
administração do Estado, tinha um currículo propedêutico , que não habilitava
para o ingresso nas Academias do Império. Assim , o ensino secundário
público não atendia nem às necessidades de trabalho , nem àquelas referentes
à formação acadêmica, passando a ser até supérfluo , levando à
argumentação a favor de sua extinção, não servindo, portanto, aos dois
objetivos.
230
A segunda metade do século XIX teve, como ponto marcante para o
desenvolvimento de políticas públicas para a educação e para o ensino
secundário em particular , a discussão , elaboração e normalização do
Regulamento Orgânico para a educação da Bahia. Assim , os anos iniciais
deste período foram considerados por nós como de tentativa de sistematização
do ensino secundário.
O Regulamento Orgânico de 1860 foi fruto das discussões em relação às
condições por que passava a educação da baiana , sendo reivindicada, por
todos os responsáveis pela instrução , uma reforma que atendesse aos
anseios de maior organização para a educação .
O período de elaboração de uma nova legislação para educação baiana ,
ocorreu em um momento , considerado por historiadores como Kátia Mattoso ,
de consolidação do Estado brasileiro , agora mais fortalecido . Por outro lado ,
não podemos falar o mesmo sobre a Monarquia , que entrou em um estágio de
decadência. Na Bahia, embora as condições econômicas fossem de crise ,
com a perda de sua importância para a região Centro-Sul do país,
politicamente continuava forte em sua influência nos destinos da nação.
Neste contexto político é que o Regulamento Orgânico para instrução baiana
foi elaborado em 1860. Sua estrutura indicava ou aparentemente apresentava
todas as condições para que o ensino viesse a ser organizado na província.
Entretanto, a inconstância política interferiu diretamente no próprio andamento
da nova legislação para o ensino. Foram precisos mais dois anos para que a
lei fosse regulamentada, sendo editada somente em 1862.
231
A demora para a regulamentação da lei já poderia ser considerada como um
complicador da sua aplicação. Efetivamente, sua prática passou a ser
discutida por políticos que questionaram a sua eficácia . Várias foram as
argumentações nesse sentido, como : necessidade de os estudos secundários
serem efetuados em internatos e, dessa maneira, de forma mais rígida tanto
no conteúdo quanto no que diz respeito ao comportamento; necessidade de
não concentrar os estudos secundários na capital da província e no Liceu , já
que o Regulamento estaria criando dificuldades para que os alunos do interior
da província viessem a efetuar tal estudo.
Face a essas discussões, o que fica de concreto é que o Regulamento
Orgânico de 1860/62 , do qual se esperava brotar uma organicidade para o
ensino secundário baiano, não cumpriu essa atribuição . O ensino secundário
continuou desestruturado, com matrículas por aula, não compondo um curso
e não credenciando para os exames preparatórios , necessários para o
ingresso nas Academias do Império.
Durante todo o período subseqüente à edição do Regulamento Orgânico, as
críticas foram contundentes à sua eficiência. No entanto , não podemos falar
que houve uma aplicação de tal Lei. Na verdade, essa legislação sequer
chegou a ser implantada totalmente e já era criticada .
Ao mesmo tempo, enquanto era travado o embate sobre que política deveria
ser adotada , como ficou na prática o ensino secundário baiano ? A sua
característica mais marcante era de decadência do ensino público e de
proliferação de escolas particulares, chegando a ponto de o Liceu Provincial ter
em 1863 371 alunos, enquanto somente em seis escolas particulares o
número de matriculados era de 1336 , portanto , mais de três vezes maior.
232
Toda essa discussão tinha como centro uma outra questão , que estava
assentada no fato de o Estado assumir ou não a educação como sua
responsabilidade ou deixar que o ensino particular dominasse o ensino
secundário. É dentro dessa visão que podemos enquadrar a idéia defendida
por vários dirigentes da província ou mesmo da instrução pública, de fechar o
Liceu Provincial devido a seu funcionamento deficiente . Paralelamente ,
constata-se que diante da indefinição de uma política pública para o ensino
secundário, continuava constante a fuga de alunos para o ensino particular.
Com a idéia equivocada de que são as reformas políticas que levam às
mudanças imediatas para a educação , o Regulamento Orgânico , mesmo sem
ter sido aplicado na sua íntegra , acabou sendo substituído por uma nova
legislação, a Reforma de 1870 para a instrução pública.
O período , considerado como de desagregação do Império , reflete momentos
de crise para o país , com o questionamento da continuidade do regime, a
fundação do Partido Republicano, as campanhas abolicionistas, apontando
tudo isso para o ocaso da Monarquia. Para a região Nordeste ,
especialmente, a crise era mais aguda, na medida em que cada vez mais se
distanciava do crescimento empreendido pela região Centro-Sul.
A situação de conflitos e desagregação do Império implicou, para o
desenvolvimento de políticas para o ensino secundário na província baiana,
também um quadro conturbado. Sucessivos presidentes de província com
diversas propostas diferentes que substituíam as anteriores, transformavam as
políticas para o ensino secundário em um conjunto de reformas , muitas delas
sem sequer serem implantadas e já substituídas, impossibilitando que seus
resultados fossem avaliados.
233
Assim, em 1870, teve lugar uma nova reforma para instrução pública que, do
ponto de vista do ensino secundário, criticava as determinações do
Regulamento de 1860, quando era novamente constatada a crescente fuga de
matrículas para o ensino particular , bem como a não aplicação na íntegra das
disposições da antiga lei.
Com a reforma de 1870, algumas questões fundamentais para a compreensão
do desenvolvimento das políticas públicas para o ensino secundário na Bahia ,
ficaram explicitadas.
A primeira delas relaciona-se com a proliferação de matrículas em escolas
particulares. O ensino privado cada vez mais conquistava espaços no Império.
Na província baiana, não ocorria de forma diversa . Cada vez mais o Estado
deixava de assumir a educação como sua responsabilidade. Para tanto, as
argumentações se valem de exemplos de outras nações para justificar que o
Estado não poderia assumir totalmente a instrução , que deveria ficar a cargo
de particulares.
Uma outra característica presente na reforma de 1870 foi uma maior
preocupação com a necessidade de estudos com conteúdos mais científicos,
indicando a possibilidade de os estudos secundários conviverem tanto com
uma formação literária quanto científica.
Por outro lado , a característica mais marcante da referida reforma foi trazer à
tona uma questão presente constantemente na educação brasileira , ou seja,
centralizar ou descentralizar a administração como forma de resolução dos
problemas existentes. Dessa maneira, para a reforma de 1870, o aspecto
centralizador prevaleceu, chegando a ponto de concentrar em um único cargo
as atribuições do Diretor Geral , do Diretor do Liceu Provincial e da
Presidência da Congregação do Liceu.
234
Em que pesem todas as críticas à reforma anterior , a de 1870 também não
solucionou os graves problemas do ensino secundário público, continuando a
permitir matrículas por aulas, não formando um curso secundário e não
habilitando para ingresso nas Academias do Império.
Toda discussão que gerou e culminou por editar a reformulação do ensino,
em 1870, teve pouca duração. Três anos após a sua edição, uma nova
reforma foi colocada em vigor, em 1873 . Contrariando a anterior , essa
buscava na descentralização da administração os resultados positivos para o
ensino secundário, restabelecendo o cargo de Diretor do Liceu, bem como o
Conselho de Instrução Pública.
A nova reforma organizou o Liceu Provincial em duas sessões – de Ciência e
Letras, no entanto continuava permitindo as matrículas por aula. Por outro
lado, ao instituir a possibilidade de que os alunos obtivessem o grau de
Bacharel , condicionava que o aluno tivesse tido aprovação em todas as
matérias oferecidas para cada curso, além de ter que defender uma tese junto
à Congregação da instituição.
Aparentemente, a Reforma de 1873 deu demonstrações de que uma maior
organicidade para o ensino secundário já estaria em pleno andamento . Porém,
os mapas e relatórios posteriores demonstraram que não era exatamente esta
a realidade, permanecendo a matricula por matéria , sem estrutura de um
curso secundário , continuando a não habilitar para ingresso nas Academias.
235
Na realidade , a reforma de 1873 sequer chegou a ser colocada em prática ,
pois na sua regulamentação, em 1875, as reformulações foram tantas e de tal
profundidade que, praticamente, representou outra reforma. Novamente voltou
o caráter centralizador , concentrando em um único cargo as atribuições de
comandar o ensino secundário na província. Da mesma maneira, a
centralização era dirigida para a concentração do ensino secundário na capital,
a exemplo do que já disciplinava o Regulamento de 1860.
Tal postura era acompanhada pela posição de que a instrução não devia ser
uma tarefa unicamente do Estado . Para tanto , tornava-se cada vez mais
facilitada a abertura de instituições particulares de ensino, que poderiam ser
administradas por qualquer pessoa , podendo ser exercida a função de
professor sem autorização da Diretoria e sem comprovação de capacidade
profissional. (Regulamentação 1561/75 . artigo 190).
Instabilidade política e reformas constantes foram os elementos mais
marcantes do período, sem que os problemas principais do ensino secundário
fossem solucionados, como as matrículas por aulas (ou matérias), a ausência
de sistematização e o não credenciamento para ingresso nos cursos
superiores.
Os últimos anos de Império foram marcados para o ensino secundário por
questões que afligiam o pensamento da época , a liberdade de ensino, o
ensino obrigatório e o ensino misto. Em torno desses temas , passou-se a
discutir a necessidade de nova reforma para a instrução pública , sob
influência da Reforma Leôncio de Carvalho , ocorrida na Corte em 1879.
236
Dentro deste contexto entrou em cena a reforma de 1881, conhecida como
Regulamento Bulcão , que não alterava as condições de funcionamento do
ensino secundário público , ministrado no Liceu Provincial. Do ponto de vista
do currículo, continuava-se a privilegiar as matérias humanistas , permitindo
as matrículas isoladas por matéria. A fim de possibilitar a matrícula em várias
matérias , a legislação disciplinava os horários das aulas , para que não
coincidissem. Ainda assim, o que se ensinava no Liceu não podia ser
considerado como um curso.
O Regulamento Bulcão não diferiu muito da reforma de 1873, indicando as
formas para que fosse atingido o grau de Bacharel em letras ou ciências. Em
comum , também , com as legislações que o antecederam , a lei de 1881
reafirmava a facilidade de que fossem abertas escolas privadas para
ministrarem o ensino secundário.
Com todas as reformas, o ensino secundário público permanecia deficiente e
continuavam os discursos das autoridades responsáveis pelo ensino público
condenando o funcionamento do Liceu Provincial. Para apontar as causas da
decadência do ensino ministrado no Liceu , responsabilizavam ora os
problemas financeiros da província , ora a necessidade de aumentar a
participação particular, ou ainda, ao fato de os professores do Liceu não
poderem acumular suas funções como examinadores da Faculdade de
Medicina.
Algumas tentativas foram feitas no final do período no sentido de buscar uma
maior organicidade para o ensino secundário , a exemplo das recomendações
do diretor do Liceu, em 1882, ao propor que somente fossem matriculados na
instituição aqueles alunos que comprovassem a conclusão do curso primário.
Porém , o ensino secundário permanecia afastado da realidade , do conteúdo
mais prático e, ao mesmo tempo, sem credenciar para ingresso no ensino
superior.
237
Quanto a este último aspecto, a legislação do Império já permitia , desde 1873
, que os exames preparatórios fossem realizados nas províncias. No entanto ,
somente no final de 1886, passaram a ser oferecidos na província baiana,
indicando um número de 1539 inscritos, demonstrando uma alta demanda para
os exames. Mesmo assim , as indicações apontavam que esses alunos eram
oriundos do ensino secundário particular e não do Liceu Provincial , que não
chegava a ter sequer uma centena de alunos.
Os anos finais do império , caracterizados por tensões e crise econômica ,
foram também de transformações na sociedade brasileira e baiana, com o
desenvolvimento dos centros urbanos. Para essa sociedade, já não era mais
suficiente apenas o ensino clássico que vinha sendo ministrado no secundário.
Dessa forma, passou a desenvolver-se o ensino profissional , que já contava,
desde 1872, com o funcionamento do Liceu de Artes e Ofícios.
Mesmo com o reconhecimento da necessidade de um ensino mais profissional,
os dirigentes da época entendiam que uma vez já existindo um Liceu
profissionalizante como o de Artes e Ofícios , o Liceu Provincial deveria
permanecer mais “literário” ,como vinha sendo até então.
O acontecimento novo para o final do período estudado foi o destaque para o
ensino secundário feminino , considerado como importante à instalação de
um curso oficial. Todavia, para atender a tal necessidade, o Estado,
afastando-se mais uma vez de suas obrigações, recorreu ao auxílio , quase
que benemérito , de senhoras da sociedade. Essas colocaram em prática a
idéia de criação e funcionamento do primeiro curso secundário feminino da
rede pública da província baiana.
238
O marco final de nossos estudos reside na reforma ocorrida em 1890 ,
proposta por Sátiro de Oliveira Dias, mesmo antes de novembro de 1889, mas
vindo a ser concretizada já no período republicano.
Com a reforma de 1890, o ensino secundário ministrado no Liceu que passou
a ser do Estado da Bahia , era feito em seis anos , formando bacharéis em
Letras e Ciências. Posteriormente, a implantação da nova reforma , um Ato do
Governo do Estado, transformou a instituição em Instituto Oficial de Ensino
Secundário da Bahia. Essa reforma também deu indicações de maior
preocupação com a necessidade de imprimir ao ensino secundário uma
maior organicidade , bem como com sua aplicação social , com seus alunos
tendo prioridade para o ingresso no serviço público.
O estudo que realizamos sobre as políticas públicas para o ensino secundário
na Bahia, na segunda metade do século XIX , partiu , basicamente, de fontes
primárias . Ao analisarmos as Falas e Relatórios , assim como as leis do
período em tela para o ensino secundário, nossa preocupação não foi a da
descrição pura e simples, mas sim a de procurar compreender como tais ações
estavam expressando todo o processo econômico, social , político e ideológico
, pelo qual passava o Império de uma forma geral e, a província baiana em
particular.
A orientação metodológica levou-nos a selecionar determinados trechos das
Falas e Relatórios, significativos para indicar a situação do ensino secundário
na Bahia do século XIX. Nesse sentido, o Liceu Provincial da Bahia foi
considerado como referencial para a execução das políticas públicas no que
concerne a esse nível de ensino, tendo em vista que foi a única instituição
pública de ensino secundário por um largo período de tempo. Assim sendo,
não tivemos a pretensão de discutir a história do Liceu, mas entendê-lo como
elemento fundamental para a compreensão das políticas desenvolvidas para o
ensino secundário no século XIX.
239
Dentro desse quadro , a questão da periodização da História da Educação é
um relevante problema. Como analisamos no capítulo referente à abordagem
teórico-metodológica , há dificuldades para o estabelecimento de uma
periodização própria para a educação. Na maioria dos casos, são utilizados os
marcos políticos já consagrados, que não representavam as reais condições
da educação. O que realmente irá interferir nas possíveis mudanças na
educação é um conjunto de fatores , e não tão somente o político, mas
também a estrutura social, econômica, ideológica. Essa situação é facilmente
comprovada com exemplos como o da independência política do país e a
manutenção das condições sociais , levando a que a educação do Império não
sofresse alteração unicamente devido àquele fato político. Isto é,
compreendemos que a educação é uma expressão das características da
sociedade e, em relação à independência política, por exemplo, apesar do
desligamento de Portugal, mantidas as mesmas condições sócio-econômicas,
não houve alterações para a educação.
Com este estudo, estamos procurando indicar um outro caminho possível para
a periodização da educação secundária na Bahia do século XIX. Vislumbramos
três fases distintas a saber: uma restrita à primeira metade do século,
momento em que se originaram as políticas públicas para o ensino secundário
no Brasil e na Bahia. Uma segunda fase estaria presente entre os anos 50 e 60
do século XIX , representando um momento de tentativa de sistematização. O
Regulamento Orgânico é a expressão dessa tentativa. Porém , não podemos
afirmar que ela não conseguiu tal sistematização , porque não chegou a ser
aplicado plenamente, fazendo com que a idéia de tornar o ensino em um
sistema organizado não chegou a se concretizar. A terceira fase seria restrita
aos anos 70 e 80 do século XIX , que, indicando a desagregação do Império ,
implicam também em instabilidade política e na instrução pública , com
sucessivas reformas que não chegam a atingir o âmago dos problemas vividos
por essa modalidade de ensino.
240
A desagregação do ensino secundário público permaneceu, em que pesem
todas as reformas que ocorreram , pelo simples fato de que tais reformas ,
mesmo discutidas intensamente , não atingiram o elemento principal que
reside no fato de saber o que se pretendia com tal modalidade de ensino. Com
o currículo propedêutico que o Liceu Provincial possuía , afastado da vida
prática, não preparava para o mercado de trabalho. Portanto , deveria estar
dirigido para o ingresso nas Academias. Porém , sem estrutura, continuando
com matrículas por aulas isoladas , sem um curso propriamente organizado ,
não habilitava para os exames preparatórios, ficando tal função com o ensino
particular.
Tais questões indicam que o ensino secundário público permanecia carente
de planejamento e mesmo de organização didática e curricular , apesar de
todas as reformas educacionais do período. As causas para os problemas
enfrentados pelo ensino secundário eram do conhecimento dos dirigentes. Nos
diversos relatórios e falas presidenciais analisados, os motivos eram
freqüentemente apontados.
Assim sendo , por que motivos não se procurou atingir o cerne do problema?
Por que, desde a criação do Liceu Provincial da Bahia, em 1836 , até o período
abrangido pela presente pesquisa, com a Reforma de 1890 , já no período
republicano, a questão da habilitação para o ingresso nas academias não foi
solucionada? Não fosse esse o objetivo do ensino secundário baiano, por que
então não foi modificado o currículo para que tivesse maior praticidade e
portanto fosse dirigido para o mercado de trabalho? Consideramos que as
respostas para essas indagações podem ser obtidas a partir da análise de
algumas características da formação do Estado brasileiro.
241
Podemos dizer que, ao entendermos a educação como uma expressão da
sociedade , verificamos a interferência que a instabilidade política dos anos
finais do Império exerceram sobre a instrução pública , transformando-a em um
amontoado de reformas sucessivas , sem que se pudesse realmente avaliá-las
, pois nem mesmo chegavam a ser implantadas plenamente.
Do ponto de vista específico da instrução pública e do ensino secundário
baiano , todos os problemas eram bastante conhecidos e discutidos pelos
diversos presidentes de província , pelos Diretores Gerais de Estudos e pelos
Diretores do Liceu. Entretanto, não foram tomadas as medidas necessárias
para sanar tais questões.
Para uma aproximação das políticas da época , é ilustrativo o que ocorreu
com o porto de Salvador. Ao discutir a sua modernização , na segunda
metade do Império, sobretudo na década de 70 , Rita de Cássia Rosado ,
indica (p.46) que as dificuldades econômicas vividas na província , a partir dos
anos 70, com uma “grave crise econômico-financeira , crise que era camuflada
pela expansão e exportação do café no Sudeste e pelos empréstimos no
exterior” , poderiam justificar a negligência do Estado , como reflexo de sua
descapitalização. Mas, apesar da crise, argumenta que ela por si só não
poderia justificar as dificuldades enfrentadas na região. Para Rosado, houve
uma omissão do Estado em relação à modernização da província
Poderíamos dizer algo semelhante em relação à educação. Efetivamente a
província baiana passava por séria crise econômica a partir dos anos 70.
Entretanto , para a educação , os males sofridos eram do conhecimento de
todos . O que faltava era vontade política para a solução de problemas , como
é o caso do ensino secundário oficial , que foi fundado com objetivo de
formação de pessoal para atuar na burocracia do Estado , mas que no entanto,
durante todo o Império, sofre de uma crise de identidade , não sabendo
exatamente a que atender.
242
Por outro lado , o ensino particular ia muito bem . Com cursos estruturados,
habilitava seus estudantes ao ingresso nas Academias. Cumpria com seu
principal papel de formação das elites dominantes da província. Faltava , pois,
interesse real na resolução dos problemas por que passava o ensino
secundário oficial da Província baiana, concretizado no Liceu Provincial da
Bahia, caracterizando uma omissão por parte do Estado
Esses problemas podem ser atribuídos – como faz Rosado - à ambivalência
do Estado nos seus fundamentos político - ideológicos. A ambivalência a que
ela se refere , diz respeito à contradição existente entre o quadro teórico liberal
- próprio da política administrativa do Império e as formas com que esta
mesma política é colocada em prática – absolutamente autoritária. “Do poder
central irradiavam - se todas as decisões: outorgas de privilégios, concessões ,
fornecimentos; autorização de medidas de caráter administrativo, ...”
(ROSADO.1983:58)
A característica centralizadora estava longe de se identificar com os ditos
valores liberais , mas sim se direcionava para a defesa dos interesses dos
grandes proprietários de terras e escravos que , juntamente com a
consolidação do Estado Brasileiro, se fortalece a ponto de dominar os rumos
da política nacional. Assim , o Estado era controlado por esses grupos
políticos – filiados ao partido conservador ou liberal - que se alternavam no
poder , monopolizando posições na Câmara , no Senado , no Conselho de
Estado e nos ministérios. Portanto , como resultado , as políticas públicas
desenvolvidas visavam favorecer os seus próprios interesses.
Do ponto de vista da Educação , justificaria o desinteresse dos poderes
públicos constituídos na província baiana - assim como no Império - que,
apesar de reconhecer os problemas enfrentados pelo ensino público,
particularmente o ensino secundário, não empreenderam medidas
necessárias para a sua solução.
243
A contradição entre os fundamentos político-ideológicos liberais do Estado
brasileiro e sua prática centralizadora e autoritária, também poderia justificar a
postura assumida pelos dirigentes da província baiana quanto à continuidade
da existência do Liceu Provincial. Em diversos momentos, as falas e relatórios
chegam a indicar que não haveria solução para os
problemas vividos pelo ensino secundário e o Liceu Provincial da Bahia , a não
ser a sua extinção. Porém , ele continuou existindo, enfrentando as crises de
fuga dos alunos para o ensino particular e as sucessivas reformas, aliadas à
instabilidade das ações quanto ao seu funcionamento, muitas vezes ,
funcionando com poucos alunos, situação cuja evidência os mapas
demonstram.
A permanência do Liceu, mesmo com pequena quantidade de alunos – como
ocorreu na década de 60 com apenas 9 alunos - indica que haveria uma
necessidade de justificativa decorrente dos fundamentos liberais externados
pelo Estado brasileiro. Entretanto, na prática, não se encaminhavam as
necessárias soluções para os problemas enfrentados na estrutura e
funcionamento do ensino secundário oficial.
A continuidade da existência do Liceu Provincial, apesar de todas as
indicações contrárias , tanto por parte dos dirigentes da instrução pública ,
como por alguns presidentes da província, a nosso ver, expressava , por um
lado , a necessidade de justificar o funcionamento do ensino particular ,
favorecido por toda uma legislação facilitadora de sua proliferação. Por outro
lado, cumpria também a função de respaldar , externamente - do ponto de vista
de políticas públicas para a educação - a face pretensamente liberal do Estado
brasileiro .
244
Ao mesmo tempo , deixa clara a crise de identidade do ensino secundário.
Este é um problema que parece não ser específico do século XIX , nem da
província baiana. É uma questão que ainda prevalece para o ensino médio de
modo geral, assim como para o ensino secundário, durante o século XIX.
Na Europa , o ensino secundário se originou no século XVIII e afirmou-se no
século XIX, com a Revolução industrial e a ascensão da Burguesia ao poder
político , como forma de readaptar a escola e o ensino às novas necessidades
da sociedade moderna. Mas nem por esse motivo deixou de viver o conflito de
sua identidade, pois a França pós-revolucionária não sabia ao certo como
proceder com o ensino secundário para toda a população, chegando a instituir
dois tipos diferentes de ensino: para as elites, um curso mais propedêutico e
para as camadas populares, um ensino voltado para o ingresso no mercado de
trabalho.
No Brasil e na Bahia especificamente, a origem das políticas públicas que
levaram à instalação do ensino secundário, reside em outras causas. As
chamadas aulas maiores estavam dispersas pela província , desestruturadas e
avulsas como herança das chamadas reformas pombalinas. Tais aulas foram
reunidas em um único prédio na capital da província (Liceu Provincial), com
objetivo de formar , dentro da camada intermediária da sociedade, pessoal para
o trabalho burocrático na administração. Porém , como já apontado
anteriormente, fazendo parte integrante da conclusão deste trabalho , não
atingiu seu objetivo principal , na medida em que seu currículo era de tipo
humanista, propedêutico que, no entanto, não habilitava para o ingresso nas
academias.
Uma outra explicação para as dificuldades de elaboração de uma política
pública para o ensino secundário, poderia estar na inquietação que a
ampliação do acesso ao ensino superior provocava nas elites dirigentes , pois
245
poderia representar uma limitação na discriminação que o processo de seleção
representava ao assegurar às elites o acesso àquele ensino. Tal postura
pode justificar a facilitação que as camadas dirigentes empreenderam em
relação ao ensino privado. Ao não definir claramente uma política para o
ensino secundário público , os dirigentes reafirmavam uma posição que é
favorável à proliferação do ensino particular, por várias vezes enaltecido nas
falas presidenciais , chegando a explicitar que a educação não deveria ser uma
tarefa puramente do Estado, mas sim contar com a contribuição “dos
particulares” , como se referiam.
Assim, ao discutirmos determinadas Falas que afirmavam a precariedade do
ensino baiano, criticando ferozmente a situação da Instrução Pública ,
notamos que essas mesmas pessoas não propunham em troca uma política
pública que, claramente, viesse atacar tal problema. Ao contrário, o que se
desvenda de tais Falas é a facilitação , cada vez maior, da proliferação de
escolas particulares. Fica bastante explicitado que o comportamento daqueles
governantes era nitidamente facilitador da expansão do ensino privado por
uma opção ideológica, da qual não fazia parte a assunção, por parte dos
poderes público, da educação do povo.
Frente a tais questões ,cabe ainda indagar quais as políticas que os poderes
públicos constituídos à época desenvolveriam para a instrução pública de
forma geral e, para o ensino secundário de modo especial?
Diante de todas as informações coletadas na documentação podemos concluir
como dado importante que um dos maiores problemas , além da questão já
citada anteriormente , diz respeito à instabilidade política, levando fatalmente a
uma instabilidade de ações na educação.
246
Como os presidentes não desenvolviam uma ligação direta com a província ,
visto que eram indicados pela Corte , para servir aos seus interesses , as
questões da província ficavam relegadas . Esse fato chegou a levar a
Província baiana a ter até três presidentes em um mesmo ano , sem a menor
possibilidade de que houvesse continuidade de ações.
Assim, o que constatamos é uma sucessão de iniciativas desconectadas, fruto
da instabilidade política gerada pela substituição constante de dirigentes na
província baiana. Dessa forma, as políticas empreendidas na província
caminhavam no mesmo ritmo que a substituição de dirigentes .
Para a instrução pública, tal situação implicou em repetidas reformas , que
foram aprovadas, revogadas e criticadas com a mesma rapidez, mesmo antes
de serem implantadas. A situação chegou ao ponto de termos duas ou três
reformas em uma década. Ora, sabemos que quaisquer resultados para
mudanças implantadas na educação só são sentidos a longo prazo.
No caso de uma reforma geral para instrução que é aprovada e em pouco mais
de dois anos já é substituída por outra, e no mesmo tempo por mais uma,
como é o caso de 1870, 1873 e 1875, não há a menor possibilidade de obter-
se algum resultado positivo. Até mesmo uma avaliação sobre as deficiências
de determinada ação fica prejudicada por não haver tempo suficiente .
Presenciamos , portanto , uma ausência de coerência nos rumos a serem
adotados para o ensino secundário na província baiana no período analisado.
Entendemos , ainda , que tal postura de uma certa inércia , atendia a objetivos
não explícitos de defesa do ensino privado , com o entendimento que não
caberia ao Estado fornecer tal modalidade de ensino a toda a população.
247
A discussão de que o curso deveria ser dirigido para o ensino prático ,
profissionalizante ou mais propedêutico , não estava clara para o período
estudado , assim como continua sendo debatida na atualidade .
Diante dessas considerações ,concluímos que ,a partir da análise de toda a
documentação referida para o período proposto , houve uma ausência de
clareza quanto ao desenvolvimento de uma política pública para o ensino
secundário baiano. Tal fato decorre , dentro da nossa análise , por diversos
motivos que, embora já discutidos no texto , passaremos a elencar.
A ausência ou indefinição de uma política pública para o ensino secundário na
província baiana pode ser atribuída a uma omissão por parte do Estado ao
não assumir a educação como sua atribuição. Essa situação aliada à crise e
desagregação do regime monárquico ocorrida durante o período analisado,
implica em uma instabilidade de ações, tendo como produto uma sucessão de
reformas para a instrução pública , que não conseguiram atingir os principais
problemas do ensino secundário.
Sendo assim, encontramos como resultado de tal postura , um ensino
secundário público completamente desestruturado durante todo século XIX,
desde a sua implantação na primeira metade do século até o período que
compreende o presente estudo. As reformas constantes não foram suficientes
para sanar problemas tais como as matrículas isoladas por matéria , levando a
não estruturação de um curso organizado , com seriação e comprovação de
estudos anteriores, além da não habilitação para o ingresso nas Academias do
Império , apesar de um currículo propedêutico, afastando os alunos que
passaram a buscar nas escolas particulares a formação necessária para a
realização dos exames preparatórios.
Ainda como conclusão , compreendemos que as políticas públicas para o
ensino secundário , desenvolvidas da forma que analisamos anteriormente,
248
levaram a proliferação do ensino particular , que tem no Estado um facilitador
do seu fortalecimento.
Podemos também afirmar que a análise da documentação nos conduz a um
entendimento quanto a problematização da crise de identidade vivida pelo
ensino secundário, que não é nenhuma característica específica do caso
brasileiro ou baiano. Assim , sem clareza do que se pretende com essa
modalidade de ensino , aumentaram as dificuldades para seu
desenvolvimento , continuando a não preparar nem para o trabalho nem para
o ingresso no ensino superior.
A justificativa para a continuidade da existência do Liceu Provincial , apesar do
pensamento de sua extinção , na nossa compreensão reside na contradição
inerente à forma com que foi estabelecida a política dita liberal , mas com
ações centralizadoras e autoritárias , favorecendo aos grandes proprietários de
terras e escravos. O pretenso caráter liberal justificaria a sua manutenção,
como se o Estado estivesse assumindo a educação secundária para toda a
população. Entretanto , ao mesmo tempo, o caráter elitista deste Estado ,
não permitia a ampliação do oferecimento deste ensino, ao tempo em que as
escolas particulares eram favorecidas pelas ações públicas.
Dessa forma , o ensino secundário baiano , ministrado no Liceu Provincial ,
que posteriormente - 1890 -, passou a denominar-se Instituto Oficial de
Ensino Secundário , sobreviveu a todos estes problemas , chegando ao século
XX , quando veio a tornar-se uma das instituições de ensino mais importantes
da Bahia . Mas, fica a questão , ainda não respondida na nossa
sociedade sobre o que realmente se pretende com o chamado ensino
secundário público - ou será clássico e científico ; 20. grau ou mesmo ensino
médio? -, como uma problemática da atualidade.
249
Por fim, gostaríamos de ressaltar alguns aspectos que podem vir a ser
considerados como futuros desdobramentos do tema por nós estudado. Um
deles poderia ser a discussão dos elementos que movem os debates na
Assembléia Provincial no decorrer da aprovação ou não de novas leis para a
educação baiana. Em que pese a existência desses dados somente a partir de
1874, mereceria uma análise , que não nos foi possível proceder neste
momento.
Por outro lado, sabemos que, na Bahia, existiu apenas uma única instituição
de ensino secundário público , oriunda do Liceu Provincial – posteriormente
Instituto Oficial de Ensino Secundário , Ginásio Baiano e por fim Colégio da
Bahia - , até 1947 , quando então foram criados os ginásios nos bairros de
Salvador. Ao mesmo tempo, o ensino deficiente e desestruturado do Liceu
Provincial até a criação do Instituto Oficial de ensino Secundário em 1890, deu
lugar, no período republicano, a uma das instituições de maior importância no
estado, para aquela modalidade de ensino.
Dessa forma, pensamos que um estudo que venha a discutir como e porque
o ensino ministrado naquela instituição (ex-Liceu), conseguiu tal mudança de
‘status’ e estrutura, seria da maior importância para a compreensão do
desenvolvimento das políticas públicas para o ensino secundário público
baiano.
Compreendemos , também , que o ensino secundário público para o sexo
feminino , que iniciou sua trajetória no final do período de nosso estudo, pode
fornecer vários aspectos para maior discussão e aprofundamento, dando
origem a uma nova pesquisa.
250
ANEXOS
251
ANEXO I
RELAÇÃO DOS PRESIDENTES E VICES QUE ASSUMIRAM A
ADMINISTRAÇÃO DA PROVÍNCIA BAIANA 1860-1889
1. Herculano Ferreira Penna 08/1859 a 04/1860
2. Antônio da Costa Pinto 04/1860 a 06/1861
3. José Augusto Chaves (vice) 06/1861 a 12/1861
4. Joaquim Antão Fernandes Leão 12/1861 a 09/1862
5. Antonio coelho Sá de Albuquerque 09/1862 a 09/1863
6. Manoel Maria Amaral (Vice) 09/1863 a 03 1864
7. Antonio Joaquim da Silva Gomes 03/1864 a 11/1864
8. Luiz Antônio Barbosa de Almeida 11/1864 a 07/1865
9. Manoel Pinto de Souza Datas 07/1865 a 03/1866
10.Pedro Leão Veloso (Vice) 03/1866 a 10/1866
11.Francisco Liberato de Matos (Vice) 10/1866 a 11/1866
12.Ambrosio Leitão da Cunha 11/1866 a 06/1867
13.José Bomifácio Nascentes Azambuja 06/1867 a 07/1868
14.Barão de São Lourenço 08/1868 a 04/1869
15.Antônio Ladislau de Figueredo Rocha (Vice) 04/1869 a 10/1869
16.Barão de São Lourenço 10/1869 a 05/1870
17.João José de Almeida Couto (Vice) 05/1870 a
18.Barão de São Lourenço 03/1871 a 04/1871
19.Francisco José da Rocha (40. Vice) 04/1871 a 10/1871
20.João Jose de Almeida Couto (10.Vice) 10/1871 a 11/1871
21.João Antonio de Araújo Freitas Henriques 11/1871 a 06/1872
22.João José de Almeida Couto (Vice) 06/1872 a 07/1872
23.Joaquim Pires de Machado Portella 07/1872 a 11/1872
24.João José de Almeida Couto (Vice) 11/1872 a 1873
25.José Eduardo Freira de Carvalho (40. Vice) 1873
252
26.Antônio Cândido da Cruz Machado 10/1873 a 06/1874
27.Venâncio José de Oliveira Lisboa 06/1874 a 07/1875
28.Luiz Antônio da Silva Nunes 08/1875 a 02/1877
29. Henrique Pereira de Lucena 02/1877 a 02/1878
30. José Eduardo Freire de Carvalho(40.Vice) 02/1878 a 05/1878
31. Barão Homem de Melo 05/1878 a 12/1878
32. Antônio de Araújo de Aragão Bulcão 01/1879 a 03/1881
33. João Lustosa da Cunha Paranaguá 03/1881 a 01/1882
34. João dos Reis de Sousa Dantas (20.vice) 01/1882 a 03/1882
35. Pedro Luis Pereira de Sousa 03/1882 a 04/1884
36. João Rodrigues Chaves 04/1884 a 09/1884
37. Esperidião Eloy de Barros Pimentel 09/1884 a 12/1884
38. José Luiz de Almeida Couto 01/1885 a 10/1885
39.Theodoro Machado Freire Pereira da Silva 10/1885 a 07/1886
40. Aurélio Ferreira Espinheira 07/1886 a 10/1886
41.João Capistrano Bandeira de Melo 10/1886 a 02/1888
42.Manoel Nascimento Machado Portela 03/1888 a 04/1889
43.Aurélio Ferreira Espinheira (Vice) 04/1889 a 03/1889
44.Antonio Luis Affonso de Carvalho 03/1889 a 06/1889
45.José Luis de Almeida Couto 06/1889 a 11/1889
________________________________________________________________Fontes: Falas e Relatórios dos Presidentes de Província , TAVARES, Luís Henrique Dias . História da Bahia .8a.ed., São Paulo, Ática,1987 e BRASIL, MINISTÉRIO DA JUSTÇA . Organização e Normas Ministeriais.
253
Anexo II
REGULAMENTO ORGÂNICO 1860/1862 22/04/1862
(Aspectos do Ensino Secundário)
TITULO III DA INSTRUCÇÃO SECUNDÁRIA
CAPITULO I DO LYCÊU
Art.69 Em quanto se não subdivide a Provincia em duas ou tres circunscripções
acadêmicas, a instrucção secundária ficará concentrada n’esta Capital e
distribuida no Lycêu.
Art.70 Ficam supprimidas todas as cadeiras de instrucção secundaria, avulsas,
em que a frequencia de alumnos fôr menos de 15, sendo seus
Professores vitalícios jubilados, na forma da Lei vigente, se o quizerem;
ou empregados no Lycêu , se forem julgados aptos pelo Governo,
ouvido o Diretor Geral.
Na denominação de secundarias estão comprehendidas aqui todas as
que primarias não forem.
254
§ único. Os professores das outras avulsas destas normas de frequencia maior,
quer na Capital e quer nas Comarcas de fora, os quaes removidos ficam
para o Lycêu, menos o de musica em Santo Amaro, tem também direito á
aposentadoria, na forma e no caso d’este artigo.
art.71 O ensino secundário no Lycêu fica reorganisado assim:
§ 10. Haverá uma divisão denominada elementar, em que se prepararão os alumnos
para os estudos secundários, a qual será de dous annos, podendo ser
dispensado do primeiro aquelle que, em exame que reclamar das materias
respectivas, approvado for.
§ 20. A esta divisão preparatória, seguir-se-há, depois de exame, a divisão de
Grammatica, também commum a todos os discípulos, na qual por tres annos se
aprenderão:
10. As Grammaticas portugueza e latina
20. A Geographia e Historia do Brasil
30. Revisão do desenho linear á lápis e a penna
40. No terceiro anno, elementos de arithmetica e preliminares de Geometria
255
No fim do ultimo anno os discípulos passarão Poe exame, chamado de
grammatica , de que se lhes passará certificado especial indispensável para
admissão na divisão superior, e valido para todos os estabelecimentos públicos
provinciaes.
Este Certificado de aptidão será dado sem exame prévio aos alumnos que
reunirem certos requisitos que se estabelecerão depois.
§ 30. Divisão superior em que as lettras e as sciencias serão a base de dous ensinos
distinctos.
Esta divisão se subdivide em duas secção, tendo por objeto a 1a. a cultura
litteraria, e abrindo accesso a certos estudos acadêmicos e ao professorado
secundário; e a 2a. a preparação para profissões commerciaes e industriaes, e
para certas escholas ou academias especiaes de caráter scientifico.
A 1a. Secção litteraria comprehende o estudo aprofundado do latim e da lógica,
e as noções scientificas apropriadas ao caracter da secção.
O ensino particular da secção de sciencias comprehende a arithmetica, álgebra,
geometria e applicações, trigonometria rectilinea, cosmographia, physica,
mechanica, chymica, historia natural, elementos de lógica e desenho linear e de
imitação.
Cada uma d’estas secções durará tres annos , ministrada parallelamente, mas
em separado. Para ambas será obrigatoriomo ensino de duas lingoas vivas,
pelo menos, nos tres annos, alem de outros estudos communs que serão
indicados devidamente.
256
§ 40. Para aquelles de qualquer das duas secções que quizerem obter o grão de
Bacharel em lettras, ou sciencias, haverá mais um anno, dicto de lógica,
obrigatório, tendo por fim especial a exposição das operações de entendimento
e os princípios geraes da arte de pensar applicados ao estudo das sciencias e
das lettras. Porém aos que não se propõe ao grão, se dará, requerendo, o
ensino de lógica no 30.anno.
§ 50. Para aquelles que se propozerem ao magistério secundário, haverá o anno dicto
de lógica, um curso de sciencias das escholas ou pratica dos melhores
processos de ensino e disciplina escholar, em ordem a formal-os na arte de
ensinar.
Art.72 O Capellão que será um dos Professores Sacerdotes, escolhido pelo Governo,
sob proposta do Director Geral, fará conferencias sobre religião e a moral,
graduadas, segundo as divisões.
D’este ensino que faz parte necessária dos estudos, dará o programma o
Diocesano, ouvido o Conselho Superior de Estudos.
Art.73 O ensino do Lyceu será ministrado, mediante lecções distribuídas pela manhã
e pela tarde, e conferencias, repetições r sabatinas, que serão regularmente
praticadas.
Art.74 O ensino e as mais funcções do Lyceu serão desempenhados pelos seus
actuaes Professores e pelos demais avulsos, comprehendidos no art.70,
cabendo a todos estes últimos o titulo de Professores adjunctos.
257
Art.75 O Governo ouvida a Directoria Geral assim como o Conselho de Estudos, com
acquiescencia de cada um d’esses Professores, distribuirá por elles o ensino e
as outras funcções conforme as habilitações ou vocação de cada um, sem
embargo do diploma ou titulo especial.
Art.76.A cadeira de grego fica supprimida, comprehendido o seu Professor actual no
disposto nos artigos antecedentes.
§ 10. A de mechanica applicada, comprehendida no art. 70, também supprimida fica,
e seu Professor passará no Lyceu a se encarregar da parte do ensino, que se
lhe marcar.
§ 2 Fica, por ora, supresso na Provincia o ensino especial de Commercio, em
quanto se não fundam outras escholas especiais, as quaes, porém, de nenhum
modo, farão parte do Lyceu
§ 3 O musêu de historia natural fará parte das collecções do ensino scientifico ,
obrigado seu actual Director, a dar aos discipulos da divisão respectiva lecções
de historia natural, segundo o programma, mudado o seu titulo actual pelo de
Professor supplente de historia natural: ou em quanto estas não forem precisas
a desempenhar as funcções, que lhe tocarem pelo artigo antecedente.
Art.77 O actual Professor de desenho e pintura, continuando a fazer parte do Lycêu,
fica incumbido do ensino das duas especies de desenho, aqui estabelecidos, e
em geral de todos os trabalhos graphicos dáquelle estabellecimento; porém
professará a sua eschola de pintura em outro edifisio.
258
Art.78 O Lycêu, em quanto o Governo, ouvido o Conselho Superior de Estudos,
prepara os meios de o converter, quanto antes, n’um estabelecimento mixto
continuará somente a receber alumnos externos.
Art.79 Cada um alumno da divisão superior pagará, de matricula annual , em duas
inscripções adiantadas, a quantia de 40$000 rs., o da divisão de grammatica
30$000 rs., e o da elementar 20$000 rs.
Art.80 Os estudantes do Lyceu, que quizerem continuar n’elle, depois de posto em
execcução o presente Regulamento, serão todos examinados, segundo o modo
que se determinar, previamente,e, conforme os resultados, distribuir-se-hão
pelas trez divisões do ensino, aqui estatuidas; exceptuados porém os de que
trata o artigo seguinte:
Art.81 É permittido á qualquer individuo estudar as materias que forem exigidas, como
preparatorias para qualquer das faculdades do Imperio, independente de
seguirem a ordem regular das divisões ácima estabelecidas.
§ Único. N’este caso pagará o estudante a matricula de 10$000 rs. Por cada aula,
que tiver de frequentar.
Art.82 Um anno depois de posto em execução o presente Regulamento nenhum
Professor, adjunto ou não, do Lyceu, poderá dar lecções, conferencias,
repetições, ou de qualquer outro modo cooperar no ensino secundario particular
da materia á que referir-se o seu titulo, se não em virtude de licença do
Governo, mediante as informações que este julgar indispensaveis. Pode,
porém, accumular dois ensinos ou funcções em estabelecimentos de instrucção
259
publica na Província, que sejam compativeis, mediante licença do Governo,
ouvido o Director Geral.
Art.83 Todos os Professores serão obrigados a lançar succintamente n’um caderno
particular, de numero de paginas correspondentes ao de sua lecções n’um anno
sob o nome de – Diario - , no fim de cada uma d’ellas o seu resumo e o das
experiencias ou demonstrações que as acompanharam, pondo-lhe a data, o
qual todas as semanas será revisitado pelo Director ou Censor, que o terá em
seu poder.
No fim do anno lectivo serão estes Diarios colocados no archivo do Lyceu, e
cuidadosamente conservados.
Art.84 O Lyceu terá um Director, um censor, dous Mestres vigilantes, um Capellão,
Mestres especiais de conferencia e repetição, se forem precisos além dos
outros empregados actuaes, que são conservados e em quanto se não effectua
a conversão de que trata o art. 78, não serão providos dos novos empregos
senão aquelles que indispensaveis forem-se tornando a juizo do Governo, e sob
proposta ou informação do Director Geral, ouvido o Conselho.
§1 Todos estes podem ser Professores ao mesmo tempo, menos os empregados
conservados e metade dos Mestres vigilantes: n’esse caso, se accrescentará
ao vencimento do nomeado Director o que fôr preciso para leva-lo a dous
contos e quatrocentos; ao do Censor do mesmo modo at’’e prafazer o de um
conto e oitocentos; ao Professor Capellão se dará uma ggratificação
supplementar de tresentos e sessenta mil réis: aos que accumularem as
funcções de Mestres especiaes de conferencia e repetição, mais quatro centos
mil réis.
260
§2 Não sendo Professores, terá o Director dous contos e quatrocentos mil réis, o
Censor um conto e oitocentos Mil réis, os Mestres especiaes de conferencia um
conto de réis.
§3 Fica extincto o logar de Secretario, e o Amanuense encarregado de todo
expediente , sob s immediata direcção do Chefe do Estabelecimento, e do
Censor, á quem cabe a guade e zelo do archivo.
§4 Nos estatutos do Lycêu, que serão formulados pelo Conselho com a approvação
do Governo, se especificarão as funcções distinctas de todo o pessoal d’este
Estabelecimento.
Art.85 Todos os empregados á que se refere o artigo anterior, salva sempre a
qualidade de Professores são nomeados e demissiveis pelo Governo e só terão
titulo difinitivo nove annos depois do posto em execução o novo Plano dos
Estudos secundarios, conforme á este Regulamento, se então o overno,
mediante as necessarias informações julgar conveniente conferir-lh’o.
Art.86 Vagado por qualquer motivo algum logar de Professor, não se proverá de novo
senão sendo indispensavel, ouvida a Directoria Geral e o Conselho Superior de
Estudos, se o Governo o considerar indispensavel.
No caso de fazer falta essencial no magisterio , será o provimento interino,
mediante concurso, de programma especial, e pelo tempo estabelecido no final
do artigo antecedente.
261
Art.87 Dentro do mesmo praso, poderá o Governo, sob proposta ou informação do
Director Geral, e com audiencia do Conselho Superior de Estudos, mudar o
ensino commettido á qualquer Professor do Lyceu, a requerimento d’este ou por
acquiescencia sua, passando-o de uma materia,classe,divisão,ou secção para
outra, sem lhe alterar os vencimmmentos.
Art.88 Nove annos depois de executado no Lycêu o presente Regulamento poderá
haver logar na Provincia a collação do gráu de Bacharel em lettras e o de
sciencias.
§1 Em Regulamento particular se dará o programma do exame, cerimonias,
materias, provas e logar em que se conferirá o gráu.
Art.89 Da mesma epocha em diante, ninguem será Professor no Lycêu sem haver
sido substituto.
§1 O provimento dos substitutos será em virtude de concurso, cujas condições e
materiais se marcarão, a que serão admittidos somente os que tiverem 25
annos de idade, o gráu de Bacharel em lettras ou sciencias, havendo, demais
estudado o curso de methodologia, de que falla o § do art. 71, e ensinado
durante dous annos ao menos.
§2 A estes concursos terão direito de ser admittidos os professores interinos, de
que faz menção o art. 86, sendo dispendados da commissão, no caso de não
obterem a approvação.
262
O Art. 90 No estabelecimento se conservará a mais firme disciplina, lembrando-se os
Professores de que não são encarregados somente de cultivar o espirito dos
alumnos, mas tambem de preparar homens e cidadãos moralisados. Os
deveres dos alumnos, os premios, concursos de emulação e as penas
disciplinares serão designadas por menor nos Estatutos competentes.
Fonte:Colleção das Leis e Resoluções da Assembleia Legislativa e Regulamentos o Governo da Provincia da Bahia,sanccionadas e publicadas no anno de 1862.
263
ANEXO III
ESTATUTOS DO CURSO DE LETTRAS E SCIENCIAS PARA O SEXO FEMININO
CAPÍTULO I
Art.10. O curso de lettras e sciencias ,instituído n’esta cidade por iniciativa
particular, tem por fim distribuir ás senhoras a instrucção secundaria.
Art.20. Constará das seguintes matérias:
Língua nacional, compreendendo noções de litteratura ;
Língua franceza;
Língua italiana;
Língua ingleza;
Geografia e cosmographia
Historia patria e elementos de historia universal;
Arithimetica e geometria;
Elementos de physica,chimica,botânica e zoologia com applicação aos
usos da vida;
Hygiene e noções de economia domestica;
Noções de direito usual nas suas relações com a família;
Desenho de imitação;
Musica;
Prendas domesticas.
Art.30. Além das cadeiras designadas, outras poderão ser creadas , não trazendo
embaraço ao exercício das mencionadas no artigo antecedente.
Art.40. As cadeiras serão regidas por senhoras de nomeação do director do curso.
264
CAPITULO II
Art.50. As aulas começarão na segunda quinzena do mez de março e findarão
durante a segunda quinzena do mez de setembro , salvo força maior.
Art.60. As aulas funccionaráõ das 5 horas da tarde ás 9 da noite, devendo-se
conciliar o mais que fôr possível, as conveniências das professoras com os
interesses do ensino.
Art.70. Os paes, tutores, parentes, protectores que acompanharem suas filhas ,
tuteladas , parentes ou protegidas não terão ingresso no edifício sem
licença especial do director.
Art.80. A inspecção das aulas será exercida por uma das professoras para este fim
nomeadas pelo director.
Art.90. Logo que estiver constituído o corpo docente, este organisará o regimento
interno, que somente vigorará depois de approvados pelo director.
DISPOSIÇÃO TRANSITÓRIA
Art.100.Enquanto o curso não dispuzer de meios para fazer face ás despezas de
illuminação e gratificação á pessoa encarregada de abrir e fechar o edifício
etc., as allunnas pagarão mensalmente uma jóia, sendo dispensadas as
que absolutamente não puderem pagar.
265
Bahia, 10. de novembro, festa de Todos os Santos, de 1882
Cônego Dr. Romualdo Maria de Seixas Barroso
Diretor geral de Estudos
_______________________________________________________________
Fonte: Relatório do Diretor Geral de Estudos , anexo à Fala presidencial de 1883
266
ANEXO IV RELAÇÃO DE DIRETORES GERAIS
DA INSTRUÇÃO PÚBLICA
João José Barbosa de Oliveira 1858 a 1863 João Antunes d’Azevedo Chaves (interino) 1864 a 1865 João José Barbosa de Oliveira 1866 a 1868 Cônego Francisco Pereira de Souza 1869 a 1870 Francisco José da Rocha 1871 a 1872 João Vitor de Carvalho 1873 a 1874 José Eduardo Freire de Carvalho 1875 a 1877 Cônego Dr. Emílio Lopes Freire Lobo 1878 a 1880 Cônego Romualdo Maria de Seixas Barroso 1881 a 1885 Dr. Eduardo Pires Ramos 1886 José Olimpio Azevedo 1887 Dr. Antonio Franco da Costa Meirelles 1887 Dr. Eduardo Pires Ramos 1888 a 1889
Fonte: Falas dos Presidentes e Relatórios dos Diretores Gerais anexos às Falas
– 1860-1889
267
FONTES: IMPRESSAS : BAHIA. Annaes da Assembleia Legislativa Provincial: 1872 -1888. Tipografia Correio da Bahia.
BAHIA. Assembléia Legislativa. Coleção de leis e resoluções da Assembléia Legislativa e regulamentos do Governo da Província da Bahia, sancionados e publicados nos anos de 1860 a 1890.
BAHIA. Assembléia Legislativa. Relatórios de Diretores Gerais de Ensino - anexos às Falas dos Presidentes da Província - 1860 a 1889.
BAHIA. Assembléia Legislativa. Falas,Relatórios recitadas
pelos Presidentes da Província da Bahia : 1860 a 1889
268
REFERÊNCIAS ALMEIDA, José Ricardo Pires de. História da instrução pública no Brasil (1500 a 1889). Tradução de Antonio Chizzotti, [Brasília]: INEP; São Paulo: PUC, 1989.
ALMEIDA, Stela Borges de. Escola Parque: paradigma escolar: 1947 a 1951. 1989. 156 f. Dissertação (Mestrado) – Faculdade
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AQUINO, Rubim Santos Leão de. Sociedade brasileira: uma história através dos movimentos sociais. Rio de Janeiro:
Record,1999.
______. Sociedade brasileira: uma história através dos movimentos sociais: da crise do escravismo ao apogeu do neoliberalismo. Rio de Janeiro: Record, 2000.
AUGEL, Moema Parente. Visitantes estrangeiros na Bahia oitocentista. São Paulo: Cultrix; Brasília: INL, 1980.
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BAHIA. Secretaria de Planejamento. Fundação de Pesquisa -
CPE. A inserção da Bahia na evolução nacional: 1a. etapa
1850-1889. Salvador, 1978 . 5 v.
BARBOSA, Rui. Obras completas de Rui Barbosa. Rio de
Janeiro: Ministério da Educação e Saúde, 1942. v. 9, t.1; v.10,
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BARROS, Roque Spencer Maciel de. A ilustração brasileira e a idéia de universidade. São Paulo: Faculdade de Filosofia,
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BITTENCOURT, Raul. A educação brasileira no Império na
República. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Rio
de Janeiro: INEP, v. 19, n. 49, p. 41-76, 1953.
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______. A educação brasileira e o direito. Belo Horizonte:
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Nacional. Organização e programas ministeriais: regime parlamentar no império. 2. ed. Rio de Janeiro, 1962.
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de Janeiro: INEP, n. 47, p.13-20, jul./set. 1990.
CARDOSO, Ciro Flamarion. Ensaios racionalistas. Rio de
Janeiro: Campus, 1988.
______. Uma introdução à história. 7. ed. São Paulo:
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______; VAINFAS, Ronaldo. Domínios da história: ensaios de
teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997.
CARR, Edward Hallet. O que é história. 5. ed. Rio de
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