UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ-UVA CENTRO … · SOBRAL-CE 2016 . Aos meus pais, Raimundo e...

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Flávio Araújo Prado ACOLHIMENTO COM AVALIAÇÃO/CLASSIFICAÇÃO DE RISCO E VULNERABILIDADE NA ATENÇÃO PRIMÁRIA EM SAÚDE: uma proposta analítica sob a perspectiva da melhoria do acesso e da qualidade SOBRAL -CE 2016 UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ-UVA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE MESTRADO PROFISSIONAL EM SAÚDE DA FAMÍLIA

Transcript of UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ-UVA CENTRO … · SOBRAL-CE 2016 . Aos meus pais, Raimundo e...

  • Flvio Arajo Prado

    ACOLHIMENTO COM AVALIAO/CLASSIFICAO DE RISCO E

    VULNERABILIDADE NA ATENO PRIMRIA EM SADE: uma proposta

    analtica sob a perspectiva da melhoria do acesso e da qualidade

    SOBRAL -CE

    2016

    UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARA-UVA

    CENTRO DE CINCIAS DA SADE

    MESTRADO PROFISSIONAL EM SADE DA FAMLIA

  • Flvio Arajo Prado

    ACOLHIMENTO COM AVALIAO/CLASSIFICAO DE RISCO E

    VULNERABILIDADE NA ATENO PRIMRIA EM SADE: uma proposta analtica

    sob a perspectiva da melhoria do acesso e da qualidade

    Dissertao apresentada ao Mestrado Profissional em Sade da Famlia da Rede Nordeste em Sade da Famlia, Nucleadora Universidade Estadual Vale do Acara, como requisito parcial obteno do ttulo de Mestre em Sade da Famlia, modalidade Profissional.

    Orientadora: Prof. Dr. Eliany Nazar Oliveira.

    SOBRAL-CE

    2016

  • Aos meus pais, Raimundo e Maria das

    Graas. Esses que, com todo amor, foram

    os primeiros a me acolherem, dedico.

  • Ao meu pai,

    Responsvel, dedicado e justo,

    Amou sua famlia at seus ltimos momentos.

    Inigualvel, tinha sempre um ombro amigo nesse

    Mundo para nos acolher no amor paternal.

    Unico, respeitvel como um nobre, era

    Nosso porto seguro. Sempre nos orgulhou com sua

    Dignidade. Inspirava-nos confiana,

    Orgulho e exemplo.

    Xeque de nossa famlia, sua

    Ida nos entristeceu,

    Mas Deus, de onde tudo deriva

    E para onde todo retorna, invocou-te para junto dEle.

    No estamos ainda habituados com a ausncia fsica, porm

    Esto em ns a sua calma, a sua fora nas decises, a sua

    Simplicidade e a sua segurana do prprio valor e humildade.

    Dedicou sua vida ao servio e disposio familiares e deixou

    O melhor para ns: o exemplo de amor e bondade pelo que foi.

    Presena indispensvel em nossas vidas.

    Real e forte homem trabalhador, ensinou-nos a vida, o valor do

    Amor, a serenidade nas mudanas e a sabedoria nas diferenas.

    Deus lhe guarde, proteja e ilumine na plenitude da vida.

    Onde quer que voc esteja, estaremos sempre te amando.

    In memorian.

  • minha me,

    Me, de todo amor que eu tenho,

    A maior parte foi voc que me deu. Ao fitar sua angelical face, percebi que as

    Razes do seu sorriso e as enrgicas luzes da beleza do seu olhar,

    Igual verdade, serenidade, doura e amor, no havia.

    A essncia da verdade, do caminho espiritual, instigou-nos a sempre pensar.

    De tudo que estimula a filosofia, numa fluidez de modernidade,

    A certeza de que a vida um fazer, desfazer e refazer constantes,

    Senso no mais puro sentir, na simplicidade de ser humano e limpidez da alma.

    Gratido por doar-me e ensinar-me a plenitude do amor bem como a certa e

    Rica maneira de amar. E atravs do limite entre o sonho e a realidade,

    Acertadamente, ensinou-me a interseco da subjetividade e da objetividade,

    Com a unio mais ntima, mais pessoal e, precisamente, mais social.

    Acalantou-me nas descobertas onde a vida foi menos biolgica, de forma mais

    Serena, menos seletiva, menos competitiva, mais metafrica e mais potica.

    A mim, no acode qualidade capaz de definir, sem desvio dos valores, o que

    Representa o dom da maternidade. Acredito que a benevolncia divina

    A mim presenteou a gerao em seu ventre.

    Uniu-nos com a sensatez e com a singeleza do significado da felicidade e,

    Juntamente com a formao de nosso seio parental, educou-nos com

    Os valores, os juzos, os conceitos da aliana, do cuidado e do zelo familiares.

    Primordialmente esclareceu que o produto patrimonial dos fartos saberes e das

    Retricas aprendizagens no residem apenas na memria, pois

    As respostas que darei na prova da vida, a nica prova que interessa, no vm

    Da ponta do lpis, elas vm do corao aliadas ao equilbrio da razo.

    Obrigado minha mestre em sensibilidade e doutora em amor, pela faculdade

    da Vida!

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus, por me amparar em todos os momentos, dando-me fora interior

    para superar as dificuldades, mostrar os caminho nas horas incertas e me suprir em

    todas as necessidades e por me permitir ir ao Seu encontro, com tudo o que sou e

    tudo o que no sou, e permanecer me amando infinitamente.

    A meus pais, de forma muito especial, Raimundo (in memorian) e Maria,

    pelo amor que compartilhamos e pelo efeito da presena eficaz, efetiva e afetiva de

    ambos em meu viver, como patamares de meu mundo, partes integrantes de mim,

    por me concederem o direito vida e dela fazerem parte de forma to autntica,

    presente e real, meu infinito agradecimento. Isso s me fortaleceu e me fez tentar a

    fazer o melhor de mim. Ainda no aprendi algo que seja o suficiente e possa

    substituir o simples: Muito obrigado pelo amor incondicional!.

    minha famlia, a qual amo muito, pelo carinho, pacincia e incentivo, por

    compartilhar comigo sonhos e vitrias.

    minha orientadora, Professora Doutora Eliany Nazar Oliveira, pela sua

    valiosa orientao, na grandiosidade de partilhar as experincias desde a

    graduao, com veredas pelo projeto de extenso da UVA, especializao e, agora,

    o mestrado. Gratido pela ateno, pelo apoio, pela generosidade e pela confiana

    depositada em mim no desenvolver da pesquisa; por acreditar em mim, mostrando o

    caminho da cincia e por ser exemplo de profissional e de mulher a qual sempre far

    parte da minha vida e da minha caminhada.

    Professora Doutora Maristela Ins Osawa Vasconcelos por sua ajuda,

    igualmente desde os primeiros passos na graduao at o caminhar do mestrado,

    nos momentos de luz na qualificao, contribuindo com o desenho do estudo, por

    acreditar no futuro deste projeto e contribuir para o meu crescimento profissional e

    por ser tambm um exemplo a ser seguido. Sua participao foi fundamental para a

    realizao deste trabalho.

    Professora Doutora Roberta Cavalcante Muniz Lira, pela gentileza em

    participar como examinadora da banca e pela prestimosa contribuio no estudo,

    meus sinceros agradecimentos.

    A todos os professores do Mestrado Profissional em Sade da Famlia,

    pela construo do saber nesse perodo de formao, bem como s secretrias do

    MPSF, pela disponibilidade, zelo e carinho.

  • Aos colegas do MPSF, por todos os momentos vivenciados juntos e pelo

    aprendizado que cada um trouxe para partilhar durante esse perodo.

    Rede Nordeste de Formao em Sade da Famlia e Universidade

    Estadual Vale do Acara, pela oportunidade da formao atravs desse mestrado,

    por abrirem as portas para que pudssemos realizar esse sonho, proporcionaram-

    nos mais que a busca de conhecimento tcnico e cientfico, mas uma lio para a

    vida.

    Aos amigos, essa famlia extrassangunea e afetiva, que fizeram parte

    desses momentos sempre me ajudando e incentivando, dando fora e apoio.

    Aos meus colegas de trabalho e Secretaria de Sade de Forquilha, pela

    ajuda em todos os momentos.

  • Todas as propostas devem ter como

    objetivo principal a melhoria das

    condies de sade da populao

    brasileira, a garantia dos direitos do

    cidado, o respeito aos pacientes e a

    humanizao da prestao de servios.

    (Carta de Braslia apresentada no VIII

    Simpsio sobre Poltica Nacional de

    Sade em junho de 2005).

  • RESUMO

    O acolhimento visto, concomitantemente, como tecnologia do encontro, criando

    redes de conversaes para resgatar um enfoque centrado no usurio, e como ao

    tcnico-assistencial para reorganizar os processos de trabalho. Objetivou-se analisar

    o processo de Acolhimento na Ateno Primria Sade no municpio de Forquilha,

    Cear, tendo como base os dados da Avaliao Externa dos Ciclos I e II do

    Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Ateno Bsica (PMAQ-AB).

    Tratou-se de um estudo analtico e exploratrio, de abordagem quantitativa a partir

    de um recorte no instrumento de avaliao externa do Programa de Melhoria do

    Acesso e da Qualidade da Ateno Bsica do Ministrio da Sade apenas com as

    quesitaes referentes ao Acolhimento na Ateno Primria em Sade, tanto do

    Mdulo dos Profissionais de Sade quanto do Mdulo dos Usurios do Servio,

    tendo como referncia espacial o municpio de Forquilha, Cear. Os dados foram

    compilados em planilhas do software Excel e analisados com apoio do software R

    verso 3.2. Os dados esto descritos por frequncias absolutas e percentuais. O

    teste exato de Fisher foi aplicado para comparar variveis similares obtidos nos dois

    ciclos do PMAQ tanto para profissionais quanto para usurios dos servios de

    sade. Quando as variveis apresentavam mais de duas categorias a comparao

    foi feita utilizando o teste de Fisher Freeman Halton. Para a anlise inferencial,

    adotou-se um nvel de significncia de 5%.Os resultados foram apresentados em

    tabelas, considerando a proporo do evento encontrado para o municpio de

    Forquilha, Cear, procedendo-se s anlises descritivas, com a devida verificao

    da distribuio de cada varivel e avaliando sua amplitude e consistncia. Como

    resultados foi encontrado que o Acolhimento est implantado na APS do municpio,

    ocorrendo todos os dias, h a avaliao de risco e vulnerabilidade no Acolhimento

    aos usurios, atravs de profissionais com capacitao para o Acolhimento. O

    protocolo considera queixas frequentes, problemas por ciclo de vida e captao

    precoce de gestantes. H agendamento de consultas que no so possveis de ser

    realizadas no dia e que no caracterizem uma urgncia. Os usurios sentem-se

    satisfeitos com o acolhimento, conseguem ser atendidos na prpria UBS quando h

    queixa urgente. As gestantes usurias reconhecem o servio como local para

    recebimento das queixas em urgncia.

    Palavras-Chave: Acolhimento. Humanizao. Ateno Primria Sade.

  • ABSTRACT

    The host is seen concurrently as technology of the meeting, creating conversations

    networks to rescue a focus centered on the user, and as a technical-assistance

    action to reorganize work processes. This study aimed to analyze the reception of

    process in primary health care in the city of Forquilha, Cear, based on data from the

    External Evaluation of Cycles I and II of the Access Improvement Programme and

    Quality of Primary Care (PMAQ-AB) . This was an analytical and exploratory study

    with a quantitative approach from a cut in the external evaluation of the instrument

    Access Improvement Programme and the Ministry of Health Primary Care Quality

    only with questions for the Home in Primary Care in health, both module of health

    professionals as module of the Service Users, with the spatial reference of the

    municipality Forquilha, Cear. The data were compiled in Excel spreadsheet

    software and analyzed with the support of R version 3.2 software. The date are

    described by absolute and percentage frequencies. The Fisher exact test was used

    to compare similar variables obtained in the two cycles of PMAQ both professionals

    and users of health services. When the variables, more than two categories

    comparison was performed using the Fisher test - Freeman - Halton. For the

    inferential analysis, we adopted a significance level of 5% .The results were

    presented in tables, considering the ratio of the event found for the city of Forquilha,

    Cear, proceeding to the descriptive analysis, with due verification of distribution of

    each variable and evaluating its breadth and consistency. The results found that the

    Home is deployed in the municipality of APS, taking place every day, there is the risk

    assessment and vulnerability in Home users through professionals with training for

    Reception. The protocol considers frequent complaints, problems life cycle and early

    identification of pregnant women. There scheduling appointments which are not

    possible to be held on and does not characterize an emergency. The users feel

    satisfied with the host, they can be seen at UBS itself when there is an urgent

    complaint. The pregnant women who recognize the service as a location for receipt

    of the urgency of complaints.

    Keywords: Home. Humanization. Primary Health Care.

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1 Caracterizao da PNH .......................................................................... 29

    Figura 2 Componentes da RUE e suas interfaces ................................................ 36

    Figura 3 Fluxograma para a organizao do processo de trabalho das equipes de

    ateno primria para o atendimento da demanda espontnea ............ 40

    Figura 4 Fases da avaliao do programa nacional de melhoria do acesso e qua

    lidade da ateno bsica (PMAQ). Brasil. ............................................. 45

    Figura 5 Localizao do municpio de Forquilha em relao ao Brasil e ao Cear 51

    Grfico 1 Capacitao de profissionais que fazem o acolhimento para avaliao

    e classificao de risco e vulnerabilidade dos usurios, para os ciclos I

    e II do PMAQ no Municpio de Forquilha, Cear ................................... 63

    Grfico 2 Percentual de participao de profissionais no acolhimento no Munic

    pio de Forquilha, Cear, conforme, ciclo I do PMAQ ............................ 79

    Grfico 3 Percentual de aes desencadeadas a partir do acolhimento realizado

    conforme profissionais de sade, no ciclo I do PMAQ no municpio de

    Forquilha, Cear ................................................................................... 81

    Grfico 4 Percentual de profissionais que realizam escuta ao usurio no munic

    pio de Forquilha, Cear no ciclo I do PMAQ ........................................ 96

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Comparao dos dados dos profissionais de sade relativos institucio

    nalizao do acolhimento nas UBS nos ciclos I e II do PMAQ no munic

    pio de Forquilha, Cear ......................................................................... 58

    Tabela 2 Comparao dos dados dos profissionais de sade relativos dinmica

    da equipe da AB frente ao acolhimento nos ciclos I e II do PMAQ do mu

    nicpio de Forquilha, Cear .................................................................... 67

    Tabela 3 Comparao dos dados dos profissionais de sade relativos ao fator tem

    po para resoluo de demandas no acolhimento nos ciclos I e II do

    PMAQ do municpio de Forquilha, Cear .............................................. 71

    Tabela 4 Dados dos profissionais de sade relativos ao procedimento do acolhi

    mento no ciclo I do PMAQ do municpio de Forquilha, Cear ................ 74

    Tabela 5 Dados dos profissionais de sade relativos ao acolhimento no ciclo II do

    PMAQ do municpio de Forquilha, Cear .............................................. 82

    Tabela 6 Dados dos profissionais de sade relativos queixa, ao tipo de atendi

    mento e ao procedimento do agendamento no ciclo II do PMAQ do muni

    cpio de Forquilha, Cear ...................................................................... 84

    Tabela 7 Satisfao dos usurios do servio de sade e tempo de espera para

    Primeira escuta relativos aos ciclos I e II do PMAQ do municpio de For

    quilha, Cear, 2011-2014 ...................................................................... 88

    Tabela 8 Dados dos usurios do servio de sade relativos ao acolhimento no ci

    clo I do PMAQ do municpio de Forquilha, Cear, 2011-2012 ............... 88

    Tabela 9 Dados dos usurios do servio de sade relativos ao acolhimento no

    ciclo I do PMAQ do municpio de Forquilha, Cear, 2013-2014 ............. 98

    Tabela 10 Dados dos usurios do servio de sade relativos ao acolhimento

    gestante no ciclo II do PMAQ do municpio de Forquilha, Cear,

    2013-2014 ........................................................................................... 99

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    AB Ateno Bsica

    AMAQ Autoavaliao para Melhora do Acesso e da Qualidade

    AMQ Avaliao para Melhoria da Qualidade

    AP Ateno Primria

    APS Ateno Primria Sade

    CEP Comit de tica em Pesquisa

    CNS Conselho Nacional de Sade

    CNES Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Sade

    CS Centro de Sade

    DAB Departamento de Ateno Bsica

    EAB Equipes de Ateno Bsica

    eSF Equipe de Sade da Famlia

    ESF Estratgia de Sade da Famlia

    GM Gabinete Ministerial

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    MPSF Mestrado Profissional Sade Famlia

    MS Ministrio da Sade

    NASF Ncleo de Apoio Sade da Famlia

    OMS Organizao Mundial de Sade

    PA Pronto Atendimento

    PACS Programa de Agentes Comunitrios de Sade

    PMAQ Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade

    PMAQ-AB Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade na Ateno

    Bsica

    PNAB Poltica Nacional da Ateno Bsica

    PNH Poltica Nacional de Humanizao

    PSF Programa Sade da Famlia

    RENASF Rede Nordeste de Formao em Sade da Famlia

    RAS Rede de Ateno Sade

    RUE Rede de Urgncia e Emergncia

    SUS Sistema nico de Sade

  • UBS Unidade Bsica de Sade

    UVA Universidade Estadual Vale do Acara

  • SUMRIO

    1 INTRODUO ........................................................................................... 17

    1.1 Aproximao com o objeto de pesquisa: o encontro ............................ 17

    1.2 Contextualizando o objeto de estudo ..................................................... 21

    1.3 Justificativa e relevncia da pesquisa .................................................... 22

    2 OBJETIVOS ............................................................................................... 25

    2.1 Objetivo geral ........................................................................................... 25

    2.2 Objetivos especficos ............................................................................... 25

    3 REVISO DE LITERATURA ...................................................................... 26

    3.1 Princpios da humanizao do atendimento .......................................... 27

    3.2 O acolhimento como princpio da PNH ................................................... 31

    3.3 O acolhimento como prtica multiprofissional de organizao do aces

    so e da melhora da qualidade na ateno bsica a sade .................... 35

    3.4 O programa de melhoria do acesso e da qualidade na ateno bsica

    (PMAQ) ...................................................................................................... 43

    4 TRAJETRIA METODOLGICA .............................................................. 49

    4.1 Tipo de estudo .......................................................................................... 49

    4.2 Local do estudo ........................................................................................ 50

    4.2.1 Localizao ................................................................................................ 51

    4.2.2 Ateno primria sade em Forquilha ..................................................... 51

    4.3 Mtodo de processamento e anlise de dados ...................................... 53

    4.4 Consideraes e aspectos ticos do estudo ......................................... 55

    5 RESULTADOS E DISCUSSES ............................................................... 57

    5.1 Dados relativos aos profissionais da ateno primria nos dois ciclos

    do PMAQ ................................................................................................... 58

    5.2 Dados relativos aos usurios da ateno primria nos dois ciclos do

    PMAQ ........................................................................................................ 87

    6 CONCLUSES ........................................................................................ 104

    REFERNCIAS ........................................................................................ 109

    APNDICE A TERMO DE CONFIDENCIALIDADE .............................. 125

    APNDICE B- PLANEJAMENTO DE VARIVEIS PARA CRUZAMENTO

    DE DADOS CONFORME COMUNICABILIDADE ENTRE CICLO I E CICLO

    II ............................................................................................................... 126

  • ANEXO A TERMO DE AUTORIZAO PARA PESQUISA ................ 131

    ANEXO B INSTRUMENTO DE AVALIAO EXTERNA DO RPOGRA

    MA NACIONAL DE MELHORIA DO ACESSO E DA QUALIDADE

    DA ATENO BSICA (PMAQ)/2012 CICLO MDULO II

    ETREVISTA COM PROFISSIONAL DA EQUIPE DE ATENO BSI

    CA E VERIFICAO DE DOCUMENTOS NA UNIDADE DE SA

    DE (QUESTES UTILIZADAS NA PESQUISA ....................................... 132

    ANEXO C- INSTRUMENTO DE AVALIAO EXTERNA DO PROGRA

    MA NACIONAL DE MELHORIA DO ACESSO E DA QUALIDADE

    DA ATENO BSICA (PMAQ)/2012 CICLO I MDULO III ENTRE

    VISTA NA UNIDADE DE SADE COM USURIO .................................. 135

    ANEXO D INSTRUMENTO DE AVALIAO EXTERNA DO PROGRA

    MA NACIONAL DE MELHORIA DO ACESSO E DA QUALIDADE DA

    ATENO BSICA (PMAQ)/2013 CICLO II MDULO II

    ENTREVISTA COM PROFISSIONAL DA EQUIPE DE ATENO BSICA

    E VERIFICAO DE DOCUMENTOS NA UNIDADE DE SA

    DE (QUESTES UTILIZADAS NA PESQUISA) ...................................... 138

    ANEXO E- INSTRUMENTOS DE AVALIAO EXTERNA DO PROGRA

    MA NACIONAL DE MELHORIA DO ACESSO E DA QUALIDADE DA

    ATENO BSICA (PMAQ)/2012 CICLO II MDULO III

    ENTREVISTA NA UNIDADE DE SADE COM USURIO ...................... 142

    ANEXO F- PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP .......................... 145

    ANEXO G - DECLARAO DE CORREO ORTOGRFICA

    E GRAMATICAL ...................................................................................... 147

    ANEXO H DECLARO DE FORMATAO CONFORME NOR

    MAS ABNT .............................................................................................. 148

  • 17

    1 INTRODUO

    1.1 Aproximao com o objeto de pesquisa: o encontro

    Estar no mundo, viver, conviver, reviver, construir nossa histria com um

    arcabouo de lembranas instigantes de reflexes, de experincias motivadoras

    para receber o outro com um olhar para o cuidado, do contato com sensibilidade no

    desenvolvimento das habilidades da arte e da essncia do cuidar, do acolher em

    suas mltiplas nuances, e, especialmente, no desvelar dos processos na sade,

    estimularam-me a trabalhar a questo do acolhimento, visto que ele fundamental

    no incio da comunicao, das relaes interpessoais, nos projetos teraputicos,

    como tambm ele um forte elemento para o incio ou continuidade de uma relao

    de vnculo e de cuidado.

    Uma das diretrizes norteadoras do setor sade de que a assistncia

    sade um direito de todo cidado brasileiro e dever do Estado de assegur-lo,

    identificando e priorizando aes bsicas comprovadamente eficazes no controle

    dos mais relevantes problemas. Assim, como fazemos parte, construmos e vivemos,

    conforme a Carta Magna de 88, em um Estado Democrtico de Direito em que tem,

    como um dos princpios basilares, a Soberania Popular, instiga-me, como cidado,

    usurio e profissional do SUS, o compromisso de estar constantemente empenhado

    no protagonismo dos processos de produo da sade.

    Meu interesse em trabalhar com processo de acolhimento me acompanha

    desde minha tenra formao e educao familiar, onde meus pais sempre nos

    educaram a receber os outros, os vizinhos, os parentes, os amigos, da mesma forma

    que gostaramos de ser recebidos, despertando j a possibilidade reflexiva de se

    colocar no lugar do outro, de dar as boas-vindas, de tentar acomod-los dentro de

    nossas possibilidades, porm da melhor forma e conforto que poderamos oferecer

    nossa ateno.

    Em complemento formao educacional familiar estava a construo da

    formao religiosa, espiritual e crist, com uma grande contribuio da Parquia So

    Francisco de Assis do municpio de Forquilha, Cear, bem como o zelo de repassar

    o exemplo de Francisco de Assis na doao para com o outro.

    Assim, engajei-me no grupo da igreja assumindo um papel social dentro

    do espao catlico e cristo, passando por um grupo paroquial chamado de aclitos.

  • 18

    A palavra aclito vem do verbo acolitar, que significa acolher, acompanhar no

    caminho. Dado que se pode acompanhar algum indo frente, ao lado ou atrs de

    outras pessoas, aclito aquele ou aquela que, precede, vao lado ou segue outras

    pessoas, para servi-las e ajud-las. Nesse sentido, cabia a ns, aclitos, acolher a

    comunidade de fiis para alm dos momentos das celebraes eucarsticas, atend-

    los em suas necessidades de orientaes das atividades e procedimentos dentro

    das aes paroquiais.

    Destarte, trabalhar diretamente com pessoas tem me acompanhado

    desde cedo onde iniciei minhas atividades laborais no servio pblico municipal de

    educao aos quatorze anos de idade em uma sala grande com oitenta e cinco

    alunos, alguns com idade superior a minha. Minha preocupao sempre culminava

    na forma de como abordar e acolher cada discente a fim de que se sentissem

    acomodados e confortveis no processo de ensino-aprendizagem e um grande

    desafio era acolher a todos, nas suas individualidades, onde eu tambm fazia parte

    do processo do ser acolhido na escola, na educao e na profisso. Essa etapa foi

    de grande valia para a compreenso das coparticipaes nos processos coletivos,

    de ensino-aprendizagem e de trabalho coletivo.

    Emps, no incio de minhas atividades como enfermeiro da ESF do

    municpio de Forquilha, atuando em uma equipe de zona rural, com vrias barreiras

    geogrficas, caracterizava-nos como uma equipe que realizava muitos

    deslocamentos para atender s comunidades e, s vezes, fixava ponto de apoio nas

    salas e nas varandas cedidas nas residncias dos usurios ou nas escolas das

    comunidades. Fatos repetidos que me chamavam a ateno eram as formas em que

    as pessoas, culturalmente, garantiam o atendimento. Em vez de pessoas

    presentes para acolhida, estavam enfileirados registros de identidades, pedras,

    chinelos, todos representativos de seus proprietrios, ficavam marcando seus

    lugares para o atendimento conforme a ordem de chegada no local, j existindo

    uma forma de norma social entre eles como uma prioridade incontestvel de acesso

    ao servio. Pouco mais afastados, depois dos objetos representativos, estavam

    alguns usurios obedientes que, apesar de acordarem cedo para a consulta, no

    conseguiram chegar a tempo hbil em relao aos demais, mantendo-se a norma

    social daquele micro-espao e, na maioria das vezes, eram pessoas com prioridades

    por risco e vulnerabilidades que apresentavam.

  • 19

    A viso da fragilidade do acolhimento no SUS me surpreendeu quando

    sa da perspectiva de profissional de sade para usurio do sistema. Enquanto

    acompanhante do meu pai, meu exemplo de vida, meu modelo de honra e inteireza

    de carter, meu porto seguro e minha fonte de estabilidade, equilbrio e segurana.

    Foi quando, literalmente, estava no lugar do outro, do ser que estava necessitando

    de cuidados, usurio do servio que eu estava totalmente inserido: o servio pblico

    de sade.

    Acompanhei meu pai, no como o profissional de sade, mas como um

    filho inundado de esperanas que procurava apoio nas redes de sade pblica do

    municpio de Forquilha, do municpio polo de referncia na regio, que Sobral e do

    estado do Cear, com possibilidades at de transpor os limites do municpio, do

    estado, do pas, se fosse necessrio, para encontrar a integralidade da assistncia

    sade to merecida a qualquer cidado. Sentimos, em conjunto, a nsia do forar

    pele, nervos, msculos para mover todos os recursos do cuidar.

    Em um dos acompanhamentos ambulatoriais no SUS, o profissional do

    acolhimento nem sequer interrogou pelo nome, pelo que necessitava, pelo possvel

    diagnstico. Assim, de forma mecnica e fria, tratou de afastar meu pai,

    grosseiramente, da proximidade dos demais usurios do ambulatrio, apenas

    considerando um sinal diferente dos demais que ali estavam, mal sabia que no se

    tratava de doena contagiosa. Igualmente sem saber que minha irm estava ali

    presente como acompanhante, ainda justificou que estava passando ele na frente,

    pois estava muito magrinho e amarelinho, para no correr o risco de infect-la.

    A lgrima que percorria o rosto era igual lgrima de muitos usurios dos

    servios que no encontram uma resposta, ou at mesmo, o respeito por suas

    necessidades. Lamentavelmente, esquecendo o profissional, que essa instituio

    familiar adoecia juntamente com o patriarca. Desse modo, a viso holstica do cuidar

    e a compreenso da ateno integral sade bem como o conceito mais amplo de

    famlia e de sade da famlia estavam comprometidos com uma atitude profissional

    aparentemente pontual, mas com reflexo no conjunto de rotinas, de normas, de

    direitos, de deveres, de conceitos e pr-conceitos, de juzos e pr-juzos, da

    universalidade, da equidade, da autonomia, da segurana, da gesto do cuidado, da

    longitudinalidade, do vnculo, da humanizao e do acolhimento.

    Destarte, acode-me o ser que procura a assistncia, o ser que

    disponibiliza a assistncia e a fuso de ambos em um ser que sente, que previne,

  • 20

    que promove, que busca, que tenta e que experimenta e que acolhe. Assim, no h

    como se distanciar da condio existencialista do ser numa perspectiva no

    puramente filosfica, mas em um expectador dos fatos cotidianos que tem a

    oportunidade de observar, de ler, de estudar um conjunto de doutrinas segundo as

    quais se tem como objetivo a anlise e a descrio da existncia concreta,

    considerada como ato, como atitude, como dinamismo e como uma liberdade que se

    constitui afirmando-se e que tem unicamente como gnese ou fundamento esta

    afirmao de si.

    No se trata de uma nica doutrina, de uma nica cincia ou de uma

    nica necessidade. Entretanto, existe algo em comum entre eles, que a

    preocupao em compreender e explicar a existncia humana bem como os fatores

    importantes na expresso da convico de que a realidade ltima somente pode ser

    encontrada na existncia individual e concreta, seja profissional, seja familiar.

    Costuma-se acentuar a importncia da necessidade como um fator que compele o

    indivduo na procura do objeto que satisfaa uma carncia biolgica ou motive sua

    realizao psquica e existencial. Mas o homem no meramente movido por

    carncias e desejos; um ser aberto ao mundo, aberto ao apelo e s possibilidades.

    Por estar aberto, no est inteiramente determinado e j feito de uma vez. Toda

    motivao, todo desejo, todo projeto, emana ou se sustenta no cuidado.

    O fato que vivemos uma realidade como um feixe de possibilidades

    diante das quais o ser, com sua liberdade de escolha, pode optar pelas que mais lhe

    convm. Estes caminhos podem ser englobados em opes primordiais que

    podero ser decisivas diante da efemeridade da vida: o ser tico, o ser esttico e o

    ser religioso. Portanto, no possvel alcanar o porqu de tudo que ocorre na

    esfera em que vivemos, pois no se pode racionalizar o mundo como ns o

    percebemos. Esta viso d margem a uma angstia existencial diante do que no se

    pode compreender e conceder um sentido. Resta a liberdade humana, caracterstica

    bsica do existencialismo, a qual no se pode negar. E em uma liberdade de

    pensamento heideggeriano, concluo que o homem um ser-no-mundo. Ele no

    existe com um eu ou um sujeito em relao a um mundo externo; no tampouco

    uma coisa ou um objeto, ou um corpo interagindo com as outras coisas que fazem

    no mundo. O homem tem sua existncia por ser-no-mundo e o mundo tem sua

    existncia porque h um Ser para revel-lo.

  • 21

    A partir dessa fase de produo, o texto ser escrito em primeira pessoa

    do plural por considerar a participao da orientadora no processo de trabalho bem

    como dos sujeitos da pesquisa como construtores em conjunto e vivncias coletivas

    que foram somadas para a produo da pesquisa.

    1.2 Contextualizando o objeto de estudo

    As polticas pblicas adotadas pelo Sistema nico de Sade (SUS) tm

    passado por contnuas transformaes, buscando reafirmar a sade como direito

    universal. O acolhimento, entendido como uma diretriz operacional da Poltica

    Nacional de Humanizao da Ateno e Gesto do SUS, vem ganhando significados

    prprios e importncia na Ateno Primria Sade para garantir acesso

    humanizado e resolubilidade s demandas de sade dos usurios e das

    comunidades (BRASIL, 2013).

    No contexto da sade, o Acolhimento entendido como uma ao

    tcnico-assistencial que pressupe uma mudana na relao entre o usurio e o

    profissional, colocando o primeiro como participante ativo, um protagonista, no

    processo de produo de sade (BRASIL, 2004). Alm disso, foi identificado como o

    mecanismo que poderia funcionar para viabilizar uma anlise crtica do fluxo de

    entrada na ESF (porta de entrada), revelar seu processo de trabalho e, ao mesmo

    tempo, servir para a mudana de postura (STARFIELD, 2002; FRANCO & MERHY,

    2003).

    Como diretriz operacional, o Acolhimento consiste em uma estratgia

    para inverter a lgica de organizao e funcionamento do servio de sade, tendo

    como princpios: garantir acessibilidade e atendimento a todos; reorganizar o

    processo de trabalho para a equipe multiprofissional que se responsabilize em

    escutar o usurio com o compromisso de resolver seu problema de sade; qualificar

    a relao trabalhador/usurio por parmetros humanitrios, solidrios e de cidadania

    (ANDRADE et al., 2007).

    No mesmo sentido, o Acolhimento, em razo da afetividade que essa

    tecnologia proporciona, consiste em uma ferramenta potente para humanizar o

    cuidado (ROSSI & LIMA, 2005). Assim sendo, o acolhimento aponta para as

    potencialidades do uso como ferramenta transdisciplinar em Ateno Primria

    Sade. Neste sentido, o SUS se mostra como uma obra aberta em que os seus

  • 22

    eixos basilares determinados pela Carta Magna de 1988 e o arcabouo legal que o

    constituiu funcionam como pilares mestres de uma obra cujo formato final ser

    configurado em torno dessa estrutura, sem previso, de um acabamento em

    pequeno lapso temporal (SAES, RAYS & GATTI, 2011).

    Destarte, o Acolhimento deve abranger os problemas de recepo da

    demanda fazendo somatrio s diretrizes de clnica ampliada, co-gesto, ambincia

    e valorizao do trabalho em sade, processos integrantes do HumanizaSUS, para

    a mudana nos processos de trabalho e gesto de servios (BRASIL, 2009). Por

    conseguinte, deve influir positivamente no padro de utilizao dos servios por

    parte dos indivduos, e tambm consiga influenciar em questes scio-

    organizacionais do servio.

    Como bem refere Freitas e Mand (2010), a promoo da sade poltica

    e prtica que envolve aes do governo, do setor sade, de outros setores sociais e

    produtivos, e aes de indivduos, famlias e comunidades, direcionadas ao

    desenvolvimento de melhores condies de vida e sade. Dessa forma, a promoo

    da sade envolve uma multiplicidade de aes e de nveis de atuao que, de

    maneira coordenada, promovero uma melhoria da condio de qualidade de vida

    dos cidados, com reduo de agravos e doenas.

    Diante de tais assertivas, torna-se importante a identificao das

    caractersticas que compem o acolhimento e se essas esto presentes nas

    unidades de Ateno Primria Sade. Nesse sentido, surgem as seguintes

    hipteses: o acolhimento est efetivamente institucionalizado nas UBS de Forquilha;

    Os profissionais esto realizando o acolhimento no cotidiano das equipes de

    Ateno Bsica; O usurio percebe esse acolhimento; O Acolhimento tem reflexo no

    acesso e na qualidade da ateno sade.

    1.3 Justificativa e relevncia da pesquisa

    A importncia de se trabalhar com Acolhimento no apenas para uma

    possvel satisfao enquanto pesquisador ou como usurio do sistema de sade

    local onde essa pesquisa se ambientou, mas pela sua funo social e pelo seu

    potencial de auxiliar gestores, profissionais ou usurios de servios de sade bem

    como de vrias outras organizaes a tomarem decises mais acertadas em suas

    instituies e nos modelos de assistncia prestada. As possibilidades de

  • 23

    transformaes em benefcio de uma coletividade sero melhores abordadas a partir

    do momento em que se estuda, de maneira sistematizada, o objeto despertador da

    inquietude.

    Nesse sentido, pode-se encontrar indcios de comportamento regular e

    previsvel, porm algo que, categoricamente, no se pode afirmar seno com a

    aplicabilidade dos procedimentos abordados em estudos dessa natureza a fim de

    que se consiga chegar a concluses devidamente fundamentadas, a fim de que se

    produza modificaes significativas na dinmica da sade. Para tanto, toma-se o

    Acolhimento na perspectiva de melhoria do acesso e da qualidade na Ateno

    Bsica em Sade. Assim, imprescindvel que se reconhea os limites e as

    possibilidades encontradas nos servios, atravs do potencial cognitivo de

    desenvolver transformaes a partir da interao com o meio scio cultural ao qual

    est inserido. Pois, este trabalho parte do pressuposto sociocultural em que o ser

    humano construtor e construdo pelas suas interaes sociais e culturais.

    No Ministrio da Sade, a Secretaria de Ateno Sade destaca como

    objetivos fundamentais da atual gesto a ampliao do acesso e a melhoria da

    qualidade da ateno sade no SUS, tendo a implantao das Redes Temticas

    prioritrias como estratgia nuclear para o alcance desses objetivos. Dentre as

    Redes Temticas prioritrias, a Rede de Ateno s Urgncias e Emergncias se

    sobressai, tendo em vista a questo salutar e necessria das situaes clnicas

    envolvidas (BRASIL, 2013). Ressalta-se que o acolhimento demanda espontnea

    e o atendimento s urgncias em uma UBS diferencia-se do atendimento em uma

    unidade de pronto-socorro ou pronto-atendimento, pois a Ateno Bsica trabalha

    em equipe, tem conhecimento prvio da populao, possui, na maior parte das

    vezes, registro em pronturio anterior queixa aguda, possibilita o retorno com a

    mesma equipe de sade, o acompanhamento do quadro e o estabelecimento de

    vnculo, o que caracteriza a continuidade do cuidado, e no somente um

    atendimento pontual.

    Conforme Pereira (2006), uma estratgia importante de garantia de

    acesso com equidade a adoo da avaliao/estratificao de risco e de

    vulnerabilidades como ferramenta, possibilitando identificar as diferentes gradaes

    de risco, as situaes de maior urgncia e, com isso, realizar as devidas

    priorizaes. Tem sido cada vez mais comum, principalmente nos servios de

    urgncia-emergncia, a adoo de protocolos de estratificao de risco. A utilizao

  • 24

    de tais protocolos, e de suas respectivas escalas, tem impacto importante na

    qualidade do acesso destes servios.

    Por outro lado, alguns problemas persistem: a ausncia de articulao em

    redes integradas, o excesso de demanda, o modelo biomdico hegemnico, a

    ausncia de capacitao e de espaos democrticos e reflexivos para reorganizar o

    processo de trabalho em sade tm colocado em questo, de modo cada vez mais

    incisivo, a potencialidade desta diretriz na operacionalizao e qualificao do SUS

    (MITRE et al., 2012).

    Mendes (2008) afirma que, apesar dos esforos das polticas pblicas de

    sade em tentar absorver a demanda na Ateno Primria, a falta de estrutura das

    unidades de sade e a reduzida oferta de servios (muitas vezes de simples

    resoluo) refletem no aumento da demanda aos servios de urgncia e

    emergncia.

    Assim sendo, destaco que o objeto de estudo o Acolhimento a partir dos

    dois Ciclos do instrumento de Avaliao Externa do Programa de Melhoria do

    Acesso e da Qualidade da Ateno Bsica em Sade, do Ministrio da Sade do

    Brasil, realizado no municpio de Forquilha, Cear.

    Apesar de o Acolhimento ser um atributo de todas as prticas de ateno

    e gesto em sade, elegemos os servios de urgncia, em especial a

    avaliao/classificao de risco e vulnerabilidade na Ateno Primria em Sade

    como foco para a pesquisa, por apresentarem alguns desafios a serem superados

    no atendimento em sade: superlotao, processo de trabalho fragmentado,

    conflitos e assimetrias de poder, excluso dos usurios na porta de entrada,

    desrespeito aos direitos desses usurios, pouca articulao com o restante da rede

    de servios, entre outros.

    preciso, portanto, repensar e criar novas formas de agir em sade que

    levem a uma ateno resolutiva, humanizada e acolhedora a partir da compreenso

    da insero dos servios de sade na rede local. Acolher o incio de um projeto

    teraputico, mas tambm o incio (ou continuidade) de uma relao de vnculo.

  • 25

    2 OBJETIVOS

    2.1 Objetivo geral

    Analisar o processo de Acolhimento na Ateno Primria Sade no

    municpio de Forquilha, Cear, tendo como base os dados da Avaliao Externa dos

    Ciclos I e II do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Ateno Bsica

    (PMAQ-AB).

    2.2 Objetivos especficos

    Identificar o processo do acolhimento demanda espontnea na

    perspectiva dos profissionais de sade e dos usurios;

    Caracterizar o Acolhimento na Ateno Bsica sob a tica dos

    profissionais de sade e dos usurios dos servios, com base na dinmica do

    PMAQ-AB;

    Averiguar como acontece o Acolhimento especifico gestante;

    Verificar o reflexo do Acolhimento no Acesso e na Qualidade da

    Ateno em Sade.

  • 26

    3 REVISO DE LITERATURA

    Na perspectiva da construo do modelo tcnico-assistencial nos

    processos sade-doena-cuidado, considerando a trade gesto/profissionais de

    sade/comunidade nesse contexto de coparticipantes e construtores do quadro de

    sade, bem como no planejamento, execuo e avaliao do sistema de sade, a

    humanizao desses servios se tornou uma necessidade presente em todo o

    processo, dentro de uma pluralidade de necessidades que o setor sade precisa

    responder. Considerando uma possibilidade consequente da insatisfao da

    populao por conta do tempo de espera nas filas, pouco acesso ao atendimento em

    sade, demandas por intervenes tecnolgicas, ausncia de atendimento

    acolhedor e resolutivo baseado em critrios de risco, garantindo os direitos dos

    usurios e valorizando o trabalho na sade.

    Segundo Martins (2001), a humanizao um processo amplo, demorado

    e complexo, ao qual se oferecem resistncias, pois envolve mudanas de

    comportamento, que sempre despertam insegurana.

    De acordo com a Poltica Humaniza SUS, o SUS deve ser contagiado por

    esta atitude humanizadora, articulando-se atravs deste eixo. Trata-se, sobretudo,

    de destacar o aspecto subjetivo presente em qualquer ao humana, em qualquer

    prtica de sade (BRASIL, 2005).

    Conforme Brasil (2004) as diretrizes especficas no nvel da Ateno

    Bsica so:

    1. Elaborar projetos de sade individuais e coletivos para usurios e sua

    rede social, considerando as polticas intersetoriais e as necessidades

    de sade;

    2. Incentivar prticas promocionais de sade;

    3. Estabelecer formas de acolhimento e incluso do usurio que

    promovam a otimizao dos servios, o fim das filas, a hierarquizao

    de riscos e o acesso aos demais nveis do sistema;

    4. Comprometer-se com o trabalho em equipe, de modo a aumentar o

    grau de corresponsabilidade, e com a rede de apoio profissional,

    visando a maior eficcia na ateno em sade.

  • 27

    Para tanto, faz-se necessrio, principalmente, um atendimento eficaz e

    resolutivo. Brasil (2013) traz uma orientao muito importante quanto ao primeiro

    contato e/ou primeira avaliao em demanda espontnea.

    No primeiro contato e na primeira avaliao, os pacientes devem ser informados a respeito do processo de trabalho da equipe e do fluxo do cuidado do usurio na demanda espontnea. O profissional deve esclarecer a possibilidade de diferentes tempos de espera e de manejo de cada caso, considerando o processo de avaliao de risco e vulnerabilidades. Faz parte do processo de trabalho da equipe na primeira escuta do usurio:

    Avaliar a necessidade de cuidados imediatos;

    Prestar ou facilitar os primeiros cuidados;

    Identificar as vulnerabilidades individuais ou coletivas;

    Classificar o risco para definir as prioridades de cuidado;

    Organizar a disposio dos pacientes no servio, de modo a acomodar os que necessitam de observao, ou administrao de medicao, ou que estejam esperando remoo para outro servio, ou que sejam suspeitos de portar doenas infectocontagiosas de transmisso area (meningite, por exemplo);

    Encaminhar o usurio para o cuidado de acordo com sua classificao.

    Assim sendo, tornam-se palpveis os princpios do SUS: a

    Universalidade, a Equidade e a Integralidade da Ateno Sade da populao

    brasileira.

    3.1 Princpios da humanizao do atendimento

    A partir de 2000, atravs da IX Conferncia Nacional de Sade (CNS),

    intensificam-se os debates em torno da importncia do acolhimento na perspectiva

    de humanizao da sade. Nova crise no sistema se instaura, visto que de um lado

    encontravam-se os usurios que buscavam ateno com acolhimento e de outro, os

    profissionais que reivindicavam melhores condies de trabalho (BENEVIDES;

    PASSOS, 2005).

    Em 2003, foi ento realizada a XII Conferencia Nacional de Sade, que

    retorna o debate em torno da Universidade, Acesso, Acolhimento aos usurios e

    valorizao dos trabalhadores (BRASIL, 2004). Assim segundo Santos Filho, Barros

    e Gomes (2009) foi lanada nesse mesmo ano a Poltica Nacional de Humanizao

    (PNH), a qual veio afirmar a indissociabilidade entre ateno e gesto dos processos

    de produo de sade, assegurando a incluso dos usurios, trabalhadores e

    gesto nos servios de sade, impulsionando aes para disparar processos no

  • 28

    plano das polticas pblicas, visando transformao nos modelos de ateno e

    gesto da sade vigentes.

    Conforme Brasil (2006) a Poltica Nacional de Humanizao (PNH),

    denominada de Humaniza-SUS foi desenvolvida de modo a qualificar o SUS e

    estabelecer suas diretrizes. Essa poltica foi em resposta s evidncias do

    despreparo dos profissionais de sade para lidar com a dimenso subjetiva do

    cuidado, juntamente com a persistncia dos modelos centralizados e verticais, que

    desapropriam o trabalhador de seu processo de trabalho.

    Os princpios norteadores da PNH so apontados em Brasil (2000) como

    sendo:

    Valorizao da dimenso subjetiva e social em todas as prticas de

    ateno e gesto do SUS, fortalecendo os compromissos com os direitos

    dos cidados, destacando-se o respeito com relao raa, gnero,

    etnia, orientao sexual e populaes especificas;

    Fortalecimento do trabalho em equipe multiprofissional, instigando a

    transversalidade e a grupalidade, qualificando a comunicao no sistema;

    Apoio construo de redes cooperativas, solidrias e comprometidas

    com a produo de sade e sujeitos;

    Construo da autonomia e protagonismo dos sujeitos e coletivos da

    rede SUS;

    Corresponsabilidade dos sujeitos nos processos de gesto e ateno

    sade;

    Fortalecimento do controle social com carter participativo nas

    instncias do SUS;

    Compromisso com a democratizao das relaes de trabalho e

    valorizao de profissional de sade, com estmulo aos processos de

    educao permanente;

    Heckert, Passos e Barros (2009) definem humanizao como tratar com

    respeito, carinho, amor, educao, empatia; capacidade de se colocar no lugar do

    outro e aceit-lo; acolhimento; dilogo; tolerncia; aceitar as diferenas, em suma,

    resgatar a dimenso humana nas prticas de sade.

  • 29

    Faiman et al. (2003) apontam que o processo de humanizao implica em uma

    transformao da cultura assistencial, a fim de que sejam valorizados os aspectos

    subjetivos, histricos e culturais no s dos usurios, como tambm dos

    profissionais visando melhoras nas condies de trabalho e qualidade do

    atendimento.

    A humanizao representa melhoria da capacidade dialgica entre os

    sujeitos, acolhimento resolutivo, participao no SUS, corresponsabilidade,

    cogesto, incluso, tica, oposio violncia, seja ela de qualquer natureza, no

    discriminao, qualidade como aliana entre o uso de altas tecnologias, o cuidado e

    bom relacionamento na assistncia e oferecimento de melhores condies de

    trabalho (DESLANDE, 2004).

    Figura 1 - Caractersticas da PNH

    Fonte: PACHECO, Marcos Antnio Barbosa Pacheco (Org.). Redes de ateno sade: rede de urgncia e emergncia RUE. Universidade Federal do Maranho. UNA-SUS/UFMA - So Lus, 2015.

  • 30

    De acordo com Pasche (2010) humanizar trata-se de uma poltica com

    princpios, com diretrizes e com dispositivos acionados por um mtodo caracterizado

    por uma trplice incluso: pessoas, movimentos sociais e pela perturbao e tenso

    que estas incluses produzem nas relaes entre sujeitos nos processos de gesto

    e ateno, sendo que essa perturbao que permite a produo de mudanas nos

    modos de gerir e nos processos de formao.

    Forte; Martins (2000) compara humanizao com reconhecimento, ou

    seja, reconhecer o usurio que busca os servios de sade, como sujeito de direitos,

    observando-o em sua individualidade, especificao, ampliando assim as

    possibilidades para que possa exercer sua autonomia.

    Humanizar os servios de sade implica em transformar o prprio modo

    como se concede o usurio, ou seja, de objetivo passivo a sujeito; de necessitado de

    atos de caridade quele que exerce o direito de ser usurio de um servio de sade

    que garanta aes tcnicas, polticas e eticamente segura, prestadas por

    trabalhadores responsveis. O enfoque sade apresenta-se numa dimenso

    ampliada, relacionadas s condies de vida inseridas em um contexto sociopoltico

    e econmico (MARQUES; SOUZA, 2010).

    Para a construo de uma poltica de qualificao do SUS, Pereira et al

    (2010) destacam que a humanizao deve ser vista como uma das dimenses

    fundamentais, no podendo ser entendida como apenas mais um programa a ser

    aplicado nos diversos setores da sade, mas como uma poltica que opere

    transversalmente em toda rede SUS.

    Com a implementao do atendimento humanizado, pretende-se,

    segundo Brasil (2004) consolidar alguns pontos especficos:

    Reduo das filas e tempo de espera, ampliando o acesso e o

    acolhimento resolutivo, baseando em critrios de risco;

    Os usurios tero cincias de quem so os profissionais que cuidem de

    sua sade;

    Os servios de sade responsabilizar-se-o pelo territrio de

    referncia;

    As informaes aos usurios sero garantidas pelas unidades de

    sade;

  • 31

    As unidades de sade garantiro gesto participativa dos trabalhadores

    e usurios, bem como educao permanente dos trabalhadores;

    3.2 O Acolhimento como princpio da PNH

    Passos (2006) indaga que a PNH se propes a fomentar princpios e

    modos de operar no conjunto das relaes entre profissionais e usurios, entre os

    diferentes profissionais, entre as diversas unidades e servios de sade e entre as

    instncias que constituem o SUS. Um dos dispositivos dessa poltica o

    Acolhimento, que compreende desde a recepo do usurio no sistema de sade e

    a responsabilizao integral de suas necessidades, at a ateno resolutiva de seus

    problemas.

    O Acolhimento ganha discurso oficial do Ministrio de Sade,

    configurando-se como uma das diretrizes de maior relevncia da PNH para

    operacionalizao do SUS; que prope o protagonismo de todos os sujeitos

    envolvidos no processo de produo da sade; a reorganizao dos servios a partir

    da problematizao dos processos de trabalho; alm de mudanas estruturais na

    forma de gesto para ampliar os espaos democrticos de discusso, escuta e

    decises coletivas (BRASIL, 2006).

    A PNH prope o acolhimento como processo constitudo das prticas de

    produo e promoo da sade, preocupando-se em incluir a sade do trabalhador

    em sade como parte das metas do SUS e de seus parmetros de avaliao

    (SCHOLZE; DUARTE JUNIOR; SILVA, 2009). O acolhimento implica em

    responsabilizao do profissional pelo usurio, ouvindo-o, considerando suas

    preocupaes e angstias, fazendo uso de uma escuta qualificada, que permita

    analisar sua demanda, impondo os limites necessrios, garantindo ateno integral

    e resolutiva, por meio de articulao de redes internas e externas (BRASIL, 2004).

    O Acolhimento envolve um interesse, uma postura tica e de cuidado,

    uma abertura humana emptica e respeitosa ao usurio e concomitantemente

    identificar riscos e vulnerabilidade, eleger prioridades, perceber necessidades

    clnico-biolgicas, epidemiolgicas e psicossociais. Isso possibilita hierarquizar

    necessidades quanto ao tempo de cuidado, ou seja, diferenciar necessidades mais

    prementes e menos prementes; distinguir entre necessidades desigualdades e trat-

    las conforme suas caractersticas (STARFIELD, 2002). Nesse sentido, vislumbra-se

  • 32

    uma forte potencialidade de se observar essas fragilidades e fraquezas do

    atendimento, da assistncia e do cuidado com consequente eleio das aes

    priorizadas para serem otimizadas com o tempo oportuno.

    Para Ramos e Lima (2003) o acolhimento trata-se de um instrumento que

    humaniza a assistncia, facilita o acesso efetivamente e permite priorizar casos de

    risco ou grupos especficos que devem ser atendidos por determinadas programas,

    permitindo alterar o modelo exclusivo de pronto atendimento.

    A proposta de acolhimento no Brasil sugere formas de ateno

    demanda espontnea, que no impliquem simplesmente em aumentar o acesso a

    consultas mdicas, mas prope-se a servir de elo entre as necessidades dos

    usurios e as vrias possibilidades do cuidado, incluindo, assim, vrios profissionais

    (GUARDINI, 2002). As ideias so retirar do mdico o papel de nico protagonista do

    cuidado, ampliar a clnica realizada pelos outros profissionais e incluir outras

    abordagens e explicaes possveis, que no somente as biomdicas, para o

    processo de adoecimento e demanda (TESSER; POLI NETO; CAMPOS, 2010).

    Assim, fortelecem-se as aes da clnica ampliada, alm das prticas de promoo,

    de preveno, do ordenamento e da gesto do cuidado em sade, dentro do

    territrio adscrito.

    Franco et al. (1999) discutem o acolhimento como uma diretriz

    operacional pautada nos princpios do SUS partindo das seguintes diretrizes:

    Atender todas as pessoas que procuram os servios, com garantia

    universalidade do acesso; dessa forma o servio assume sua forma e sua

    funo precpua de acesso e acolhimento;

    Buscar a reorganizao do processo de trabalho, deslocando o eixo

    central, centrado na prtica mdica, para uma equipe multiprofissional,

    capaz de produzir escuta qualificada, responsvel, resolutiva e com

    formao de vnculo; assim a consulta mdica justifica-se para os casos

    em que realmente h necessidades;

    Qualificar as relaes de trabalho entre profissionais e usurios, sob os

    parmetros de humanizao, solidariedade e cidadania. Essa a

    argamassa capaz de unir trabalhadores e usurios em prol de um

    interesse comum: um servio de sade de qualidade.

  • 33

    O Acolhimento significa a humanizao do atendimento, pressupondo

    garantia de acesso universal dos usurios nos servios de sade. Diz respeito a

    uma escuta qualificada dos seus problemas, visando respostas e

    corresponsabilizando pela resoluo dos mesmos. mais que uma triagem

    qualificada ou escuta interessada. Pressupe um conjunto formado pela escuta,

    identificao dos problemas e intervenes resolutivas para seu enfretamento,

    ampliando a capacidade da equipe de sade responder demanda dos usurios,

    reduzindo a centralidade em torno das consultas mdicas e ampliando o potencial

    dos demais profissionais (SOLLA, 2005).

    Da, portanto, apega-se com uma valorosa ferramenta para o cuidado em

    sade que a comunicao, pois uma tecnologia fundamental para a prtica dos

    profissionais de sade quando se relaciona ao processo de humanizao da

    assistncia, tanto no contexto direcionado ao paciente quanto equipe de sade. A

    comunicao, alm de aproximar, tambm promove a interao entre cuidador e

    cuidado, entre usurio, profissional e gesto, permitindo que eles se expressem, que

    exponham seus sentimentos, suas nsias, seus desejos, suas sugestes e suas

    opinies, realizem seus contatos e possam relacionar-se com o outro de forma a

    compartilhar conhecimentos. A eficcia da interao entre a gesto, o profissional de

    sade e o usurio depende de um meio de comunicao qualificado, o que exige

    uma linguagem clara, exigindo o desenvolvimento de novas habilidades para a

    transmisso das ideias. Nesta perspectiva, podem ser adotadas diferentes

    metodologias e recursos educativos em sade pblica que facilitem a transmisso

    da mensagem proposta.

    Matumoto (1998) afirma que o Acolhimento trata-se de um processo uma

    vez que deve ser realizado por todos os setores e trabalhadores dos servios de

    sade; no se limita a um discurso verbal, mas sim de uma sequncia de atos que

    se culmina em um processo de trabalho concretizado em aes que respondam s

    necessidades da populao.

    Silva Junior e Mascarenhas (2004) identificam quatros dimenses do

    Acolhimento: acesso-geogrfico e organizacional; postura-escuta, atitude

    profissional/usurio e interao entre a equipe; a tcnica, o trabalho em equipe,

    capacitao de profissionais e aquisio de tecnologias, saberes e prticas; projeto

    institucional-superviso e processos de trabalho.

  • 34

    Para esses autores, Acolhimento como postura pressupe uma atitude de

    equipe de sade que permita receber bem os usurios, escutando de forma

    adequada e humanizada suas demandas. Dessa maneira, torna-se possvel a

    construo de confiana e apoio entre trabalhadores e usurios. Nessa dimenso,

    se situam as relaes no interior da prpria equipe e entre os nveis de hierarquia na

    gesto.

    Franco et al. (1999) corroboram que o acolhimento deve alcanar a

    dimenso da gesto do processo de trabalho, pois sua implantao s ser possvel

    se houver uma gesto participativa, baseada em princpios democrticos e equipe

    interativa. Esses autores tambm mencionam que o Acolhimento est baseado em

    um direito constitucional dos usurios: o acesso. Portanto, a Ateno Primria

    Sade, como porta de entrada da rede de sade, deve elaborar estratgias, que

    garantam esse fcil acesso, o qual um dos motivos que garantem a efetividade e o

    sucesso da Ateno Primria.

    Malta & Merphy (2002) mencionam que o Acolhimento enquanto tcnica

    implica na construo de ferramentas que contribuam para uma escuta e anlise,

    identificando solues possveis s demandas apresentadas. A composio da

    equipe traduziria a incorporao de novos agentes e alteraes nos processos de

    trabalho, relativas s mudanas de como os servios so organizados.

    Conforme Brasil (2004) o Acolhimento uma maneira de operar os

    processos de trabalho em sade, de forma a atender os usurios que procuram os

    servios de sade, ouvir seus pedidos, e pactuar respostas conforme as

    necessidades identificadas. Considera-se uma tecnologia leve a ser aplicada em

    todos os nveis de complexidade dos servios de sade, para dar continuidade a

    sua assistncia, estabelecendo articulaes para garantir a eficcia desses

    encaminhamentos. Trata-se de uma ao tcnica-assistencial, que pressupe a

    mudana da relao profissional/usurio, passando a reconhecer esse ltimo como

    sujeito ativo no processo de produo de sade;

    O Acolhimento diz respeito valorizao da singularizaro e dignidade

    humana, indo alm do cuidado tcnico e prescritivo. Este envolve compromisso com

    o ser humano como um todo, sem distino de raa, cor, etnia, favorecendo, assim,

    um vnculo entre o ser cuidador e o ser cuidado. Trata-se de um atendimento

    diferenciado, focando a dignidade das pessoas em situaes de cuidado e ateno,

    propondo aes que valorizam e qualificam os servios de sade (WALDOW, 1998).

  • 35

    Segundo Lina et al. (2007) o Acolhimento permite alm do

    empoderamento do usurio pela produo de sua sade, a responsabilizao do

    profissional pelo estado de sade do usurio, despertando neste, um sentimento de

    confiana naquele que lhe presta a assistncia.

    De acordo com Brasil (2004) o Acolhimento na Ateno Sade,

    constitui-se de um dispositivo na organizao dos processos de trabalho, dos

    servios de sade, portanto deve estar relacionado como parte do processo de

    produo de sade, como algo que qualifica a relao e que, portanto passvel de

    ser apreendido em diferentes dimenses (relacionais, tcnico, clnica, cidadania) e

    trabalhado em todo e qualquer encontro entre profissionais/usurio, profissional,

    equipe de sade/gesto e usurio e sua rede social.

    O Acolhimento no se restringe a um espao ou local, mas uma postura

    humana. No pressupe horrio e profissional especfico, implica em compartilhar

    saberes, necessidades, possibilidades, angstias e intervenes. Diferencia-se da

    triagem, por no constituir uma do processo, mas como ao que deve ocorrer em

    todos os locais e momentos dos servios de sade (BRASIL, 2004).

    3.3 O Acolhimento como prtica multiprofissional de organizao do acesso e

    da melhoria da qualidade na ateno bsica sade

    Em julho de 2011, foi aprovada a Portaria n 1600 (BRASIL, 2011), que

    reformula a Poltica Nacional de Ateno s Urgncias e institui a Rede de Ateno

    s Urgncias (atualmente denominada Rede de Urgncia e Emergncia RUE) no

    Sistema nico de Sade (SUS), em conformidade com os caminhos apontados pela

    Portaria n 4279 (Brasil, 2010). A finalidade descrita para a RUE articular e integrar

    todos os equipamentos de sade, de maneira que se alcance a ampliao e

    qualificao do acesso aos usurios em situao de urgncia e emergncia nos

    servios de sade, garantindo agilidade do atendimento.

    Os componentes que constituem a RUE so: Promoo, Preveno e

    Vigilncia Sade; Ateno Bsica em Sade; Servio de Atendimento Mvel de

    Urgncia (SAMU 192) e suas Centrais de Regulao Mdica das Urgncias; Sala de

    Estabilizao; Fora Nacional de Sade do SUS; Unidades de Pronto Atendimento

    (UPA 24h) e o conjunto de servios de urgncia 24 horas; Hospitalar e Ateno

    Domiciliar (PACHECO, 2015).

  • 36

    A RUE, como rede complexa e que atende a diferentes condies

    (clnicas, cirrgicas, traumatolgicas, em sade mental etc.), composta por

    diferentes pontos de ateno, de forma a dar conta das diversas aes necessrias

    ao atendimento s situaes de urgncia. Desse modo, necessrio que seus

    componentes atuem de forma integrada, articulada e sinrgica. Alm disso, de forma

    transversal a todos os componentes, devem estar presentes o acolhimento, a

    qualificao profissional, a informao e a regulao de acesso (PACHECO, 2015).

    Assim, com o objetivo principal de reordenar a ateno sade em situaes de

    urgncia e emergncia de forma coordenada pela ateno bsica, necessrio

    muito mais do que a ampliao da rede de servio: necessrio, de forma

    qualificada e resolutiva, o desenvolvimento de aes de promoo da sade e

    preveno de doenas e agravos, de diagnstico, tratamento, reabilitao e

    cuidados paliativos.

    Figura 2 - Componentes da RUE e suas interfaces

    Fonte: PACHECO, Marcos Antnio Barbosa Pacheco (Org.). Redes de ateno sade: rede de urgncia e emergncia RUE. Universidade Federal do Maranho. UNA-SUS/UFMA - So Lus, 2015.

    O objetivo atribudo AB na rede a ampliao do acesso, fortalecimento

    do vnculo e responsabilizao, bem como o primeiro cuidado s urgncias e

    emergncias, em ambiente adequado, at a transferncia ou encaminhamento a

  • 37

    outros pontos de ateno, se necessrio. Faz-se ressalva sobre a necessidade de

    implantao do acolhimento com avaliao de risco vulnerabilidades (Brasil, 2013).

    A Ateno Bsica em Sade tem como objetivos a ampliao do acesso,

    o fortalecimento do vnculo, a responsabilizao e o primeiro atendimento s

    urgncias e emergncias, em ambiente adequado, at a transferncia ou

    encaminhamento dos pacientes a outros pontos de ateno, quando necessrio,

    mediante implantao de acolhimento com avaliao de riscos e vulnerabilidades.

    Caracteriza-se por um conjunto de aes de sade, no mbito individual e coletivo,

    que abrange a promoo e a proteo da sade, a preveno de agravos, o

    diagnstico, o tratamento, a reabilitao, a reduo de danos e a manuteno da

    sade com o objetivo de desenvolver uma ateno integral que impacte na situao

    de sade e autonomia das pessoas e nos determinantes e condicionantes de sade

    das coletividades (Portaria MS/GM n 2.488/2011).

    Neste sentido, Pacheco (2015) aponta que a Ateno Bsica deve

    cumprir algumas funes para contribuir com o funcionamento das Redes de

    Ateno Sade. So elas:

    Ser base: ser a modalidade de ateno e de servio de sade com o

    mais elevado grau de descentralizao e capilaridade, cuja participao

    no cuidado se faz sempre necessria;

    Ser resolutiva: identificar riscos, necessidades e demandas de sade,

    utilizando e articulando diferentes tecnologias de cuidado individual e

    coletivo, por meio de uma clnica ampliada capaz de construir vnculos

    positivos e intervenes clnicas e sanitariamente efetivas, na perspectiva

    de ampliao dos graus de autonomia dos indivduos e grupos sociais;

    Coordenar o cuidado: elaborar, acompanhar e gerir projetos

    teraputicos singulares, bem como acompanhar e organizar o fluxo dos

    usurios entre os pontos de ateno das RAS. Deve atuar como o centro

    de comunicao entre os diversos pontos de ateno, responsabilizando-

    se pelo cuidado dos usurios em qualquer destes pontos por intermdio

    de uma relao horizontal, contnua e integrada, com o objetivo de

    produzir a gesto compartilhada da ateno integral. Deve articular

    tambm as outras estruturas das redes de sade e intersetoriais,

    pblicas, comunitrias e sociais; e

  • 38

    Ordenar as redes: reconhecer as necessidades de sade da

    populao sob sua responsabilidade, organizando as necessidades

    desta populao em relao aos outros pontos de ateno sade,

    contribuindo para que a programao dos servios de sade parta das

    necessidades de sade dos usurios.

    Destaca-se o carter estruturante e estratgico que a Ateno Bsica

    pode e deve ter na constituio da RAS, na medida em que se caracteriza pela

    grande proximidade com o cotidiano da vida das pessoas e dos coletivos em seus

    territrios.

    As equipes da Ateno Bsica tm a possibilidade de se vincular,

    responsabilizar-se e atuar na realizao de aes coletivas de promoo e

    preveno no territrio, no cuidado individual e familiar, assim como na cogesto dos

    projetos teraputicos singulares dos usurios, que, por vezes, requerem percursos,

    trajetrias e linhas de cuidado que perpassam outras modalidades de servios para

    atender as necessidades de sade de modo integral (BRASIL, 2013).

    Dourado (2013) afirma que no que se refere ao processo de trabalho das

    equipes com foco na urgncia/emergncia, os profissionais devem realizar o

    acolhimento com escuta qualificada, classificao de risco, avaliao de

    necessidade de sade e anlise de vulnerabilidades, tendo em vista a

    responsabilidade da assistncia resolutiva demanda espontnea e ao primeiro

    atendimento s urgncias e emergncias.

    Antes mesmo da publicao da PNAB (2011) outros documentos j

    anunciavam maiores nuances de articulao da ateno bsica para o atendimento

    s urgncias. Pode-se apontar como parte desse processo o Programa de Melhoria

    do Acesso e Qualidade (PMAQ), lanado com aprovao da Portaria n 1654

    (BRASIL, 2013). Trata-se de uma iniciativa federal para instituir processos

    avaliativos da AB, com o objetivo de induzir a ampliao do acesso e a melhoria da

    qualidade dos servios prestados, de maneira que permita a criao de um padro

    de qualidade comparvel nos mbitos nacional, regional e local.

    O fluxograma a seguir (figura 3) busca representar um padro de fluxo

    dos usurios nas UBS, partindo do pressuposto de que a recepo o primeiro

    contato da equipe com o usurio. Para tanto, qualquer profissional da UBS pode

    estar fazendo o primeiro contato ou a primeira escuta ao usurio. Nas situaes em

  • 39

    que avaliao e definio de oferta(s) de cuidado no sejam possveis na recepo,

    deve haver um espao para escuta, anlise, definio de oferta de cuidado com

    base na necessidade de sade, seja esta oferta um agendamento, uma orientao

    ou uma interveno (BRASIL, 2013). Em parte dos servios, h um espao fsico

    especificamente para essa escuta a sala de acolhimento. Porm, como

    acolhimento um espao-momento de encontro para o reconhecimento de

    necessidades, ele acontece com ou sem sala especfica, em vrios lugares e

    tempos (BRASIL, 2013).

    Assim sendo, o ambiente propcio para o acolhimento aquele onde o

    profissional da sade e o usurio do servio se sintam vontade para realizar a

    conversa, o dilogo sobre a necessidade do usurio e a oferta do profissional que

    est acolhendo.

    Em sntese, este fluxograma deve ser tomado como uma oferta, um ponto

    de partida possvel, uma estratgia de visualizao e de organizao do trabalho

    coletivo na UBS, devendo, sempre que necessrio, ser adaptado, enriquecido,

    testado e ajustado, considerando a singularidade de cada lugar, de modo a facilitar o

    acesso, a escuta qualificada e o atendimento s necessidades de sade com

    equidade, assumindo a perspectiva usurio-centrada como um posicionamento

    tico-poltico que tem implicaes organizativas e no processo de trabalho das

    equipes (BRASIL, 2013).

    Assim, apresenta-se como uma ferramenta de orientao, uma sugesto

    de fluxo, nada impedindo que cada unidade de sade crie o fluxo de demanda da

    realidade local da rea adscrita de atuao. O importante manter a organizao do

    servio e da demanda ofertando ao usurio uma postura aberta e acolhedora dentro

    da Estratgia Sade da Famlia ou de qualquer outro servio de sade que faa

    parte da Rede de Ateno Sade.

    Desse modo, o fluxograma da Figura 3 uma sugesto do Ministrio da

    Sade no qual ele apresenta o fluxo da chegada do usurio unidade de sade e

    segue, conforme necessidade, o caminho do atendimento adequado aps o

    acolhimento por meio de uma escuta qualificada, avaliao do risco ou

    vulnerabilidade com consequente encaminhamento conforme oferta de cuidado para

    a necessidade apresentada.

  • 40

    Figura 3 - Fluxograma para a organizao do processo de trabalho das equipes de ateno primria para o atendimento da demanda espontnea

    Fonte: BRASIL. Caderno de Ateno Bsica. Acolhimento Demanda Espontnea. n. 28, Volume

    I. MS. Braslia: 2013.

    Franco, Bueno e Merhy (1999) enfatizam que em todo local onde ocorre

    um encontro entre trabalhador de sade e usurio, seja um profissional mdico ou o

    porteiro do servio, deve-se desenvolver a prtica do Acolhimento, a qual segundo

    os autores trata-se de uma prtica clnica, que deve ser realizada por quaisquer que

    sejam os trabalhadores, visando, assim, a produo de relaes de escutas e

  • 41

    responsabilizaes, as quais se articulam com as constituies de vnculos e em

    compromissos de projetos de interveno.

    Entendendo que o acolhimento constitui-se uma prtica da Estratgia de

    Sade da Famlia, torna-se relevante que todos os profissionais o realizem, pois

    acolher, mesmo com aqueles que no lidam cotidianamente com o saber clnico,

    podem realizar o Acolhimento, ainda que para essa atuao, sejam necessrias

    discusses com os demais integrantes da equipe a fim de ser definida a melhor

    conduta para o usurio (FRACOLLI; ZOBOLI, 2004).

    Campos (2003) menciona a importncia do Acolhimento que se realiza

    por todos os profissionais de sade, uma vez que o trabalho em equipe favorece a

    contribuio dos diferentes saberes, o que no deve eliminar o carter particular de

    cada profissional, ou de cada profisso, de modo a assegurar prticas de sade

    populao e realizao pessoal dos trabalhadores.

    Nenhum profissional detm de todas as ferramentas necessrias para

    exercer o cuidado; faz-se necessrio o trabalho em equipe, afirmam Cavalcante

    Filho et al.(2009). Ceccim (2006) acrescenta que todo profissional, pela sua

    condio de terapeuta, deve ter com apropriao ou com proximidade entre o valor

    experimental e o valor verdadeiro, recursos e instrumento de interveno clnica ou

    teraputica, entretanto, estas s podem ser desenvolvidas a perspectivas de

    compartilhamento de saberes, conhecimentos e apoio matricial.

    O Acolhimento resolutivo no se limita apenas na clnica, uma vez que

    aes de consultas mdicas, de enfermagem, de curativos, de orientaes, dentre

    outros baseados na clnica, no so por si s, suficientes para dar todas as

    respostas s vrias dimenses que compem os problemas e as necessidades de

    sade das pessoas, sendo essencial o trabalho envolvendo aes coletivas, que

    evoquem a intersetorialidade e uma rede de referncia e contra referncia eficiente

    (FRACOLLI; ZOBOLI, 2004).

    Silva e Alves (2008) abordam que o acolhimento colabora para a garantia

    de um atendimento de qualidade e humanizado, facilita a promoo da assistncia

    integral, de forma que cada profissional possua um a viso holstica do ser humano

    a ser assistido. Essa colaborao somente poder existir se o acolhimento for

    entendido como um processo de corresponsabilidade de todos os profissionais pela

    sade dos usurios, por meio do trabalho de uma equipe multiprofissional,

  • 42

    qualificada e capacitada para tal, da postura acolhedora de todos e da liberdade

    para que se estabelea o vnculo dos usurios com o servio.

    Nos recursos humanos est uma possvel soluo das maiores questes

    de sade. So eles que, sendo capazes de interferir positivamente na modificao

    das condies de vida e sade da populao e na expectativa de uma sociedade

    saudvel, influiro diretamente na ateno sade e na teraputica prestados no

    indivduo e na coletividade. A sade exige profissionais ticos e responsveis, na

    medida em que este passe a reconhecer no usurio um ser repleto de necessidades

    complexas e nem sempre objetivadas em uma doena (CAMELO et al., 2000).

    Brasil (2004) indaga que a aproximao entre usurio e profissional de

    sade promove um encontro, um e outro sujeitos dotados de intenes,

    interpretaes, necessidades, razes e sentimentos, mas em situao de

    desequilbrio, de expectativas diferentes, em que um, o usurio, busca assistncia

    em estado fsico e emocional fragilizado, junto ao outro, um profissional que deve

    estar capacitado para atender e cuidar da causa da sua fragilidade. Assim, cria-se

    um vnculo gerando afetiva e eticamente entre ambos, numa convivncia de ajuda e

    respeito mtuos.

    Teixeira (2003) sistematiza que o acolhimento e vnculo entre usurios e

    trabalhadores tm contribudo para desvelar e problematizar e desumanizao do

    atendimento, determinada principalmente pela tecnificao do cuidado sade.

    Com isso, o foco no cliente e a incorporao de alteraes substantivas nos

    processos de trabalho nos servios de sade podem questionar aspectos crticos do

    modelo hegemnico, como a relao mdico/paciente ou mesmo os limites dos

    conhecimentos e tecnologias utilizadas to intensamente nesse modelo medico

    cntrico.

    Atravs do respeito singularidade humana e dilogo, promovidos pelo

    acolhimento, os usurios sentem-se seguros no ambiente onde esto inseridos,

    aceitando com mais facilidades as orientaes dos profissionais (BACKES;

    LUNARDI FILHO; LUNARDI, 2005). Com isso, afirma S et al.(2007) h uma maior

    adeso ao tratamento, seja clnico ou no, devido criao do vnculo.

    Oliveira (2008) tambm admite a importncia da inteno entre

    profissionais de sade e usurios, para alm da atuao tcnica, associando aquela

    criao e manuteno de vnculos, adeso aos planos de cuidados e

    satisfao dos usurios.

  • 43

    Lima et al. (2007) referem que a responsabilizao do profissional para

    com o usurio constitui em um dos elementos que torna o acolhimento efetivo,

    despertando no usurio um sentimento de confiana em relao ao profissional que

    lhe acolheu. Esse bom relacionamento, baseado na escuta do usurio acaba por

    otimizar o processo de assistncia, proporcionando aos profissionais conhecerem os

    seus clientes e as prioridades de cada um, facilitando-lhes o acesso.

    O acolhimento mesmo de difcil execuo ajuda na organizao do

    processo de trabalho e do acesso dos usurios. Produz na equipe uma

    compreenso mais ampla das necessidades de sade dos usurios que vo alm da

    identificao e da classificao das doenas e dos agravos e carncias

    correlacionadas, muitas vezes, imperceptveis, numa abordagem fria, restrita a sinais

    e sintomas. Esses, passveis de serem aliviados por gestos de ateno e respeito,

    exigem aes que se estendem alm dos limites dos servios de sade (SOUZA et

    al., 2008).

    Coelho e Jorge (2009) mencionam a importncia do estabelecimento de

    um dilogo entre o trabalhador e o usurio, pois se pode encontrar a soluo para

    muitos problemas de sade, j que na confiana, no encontro e no desabafo, muitas

    vezes so encontradas respostas para determinadas dificuldades enfrentadas pelo

    ser cuidado. Concomitantemente, trabalha-se com o conhecimento popular, o qual

    nunca deve ser desprezado pelo profissional, mas sim trabalhado junto ao seu saber

    acadmico.

    3.4 O Programa de melhoria do acesso e da qualidade na ateno bsica

    (PMAQ-AB)

    O Ministrio da Sade tem priorizado a execuo da gesto pblica com

    base em aes de monitoramento e avaliao de processos e resultados. O

    conjunto de aes e atividades desenvolvidas no mbito do Sade Mais Perto de

    Voc, no qual se insere o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade

    da Ateno Bsica (PMAQ), apresenta-se como uma das principais estratgias

    indutoras da qualidade no Ministrio da Sade. Entre os objetivos do programa,

    destacam-se a institucionalizao da cultura de avaliao da Ateno Bsica (AB)

    no Sistema nico de Sade (BRASIL, 2013).

  • 44

    A Portaria n 1.654, do Ministrio da Sade criou o PMAQ-AB e instituiu,

    na nova PNAB, amplo processo de mobilizao de trabalhadores, gestores das

    trs esferas de governo e usurios para a implantao de mudanas no processo

    de trabalho com impacto no acesso e na qualidade dos servios, articulado a uma

    avaliao e certificao que vincula repasses de recursos conforme o desempenho

    alcanado na implantao e no desenvolvimento dos elementos avaliados pelo

    programa (BRASIL, 2013).

    O instrumento de Avaliao Externa da PMAQ-AB guarda similaridade

    com o Instrumento de Autoavaliao para a Melhoria do Acesso e da Qualidade da

    Ateno Bsica (AMAQ), utilizado nos processos de autoavaliao, visando

    assegurar coerncia das informaes, uma vez que os resultados foram

    acompanhados ao longo da implementao de novos ciclos do PMAQ. Esto

    contemplados, ao longo do instrumento, aspectos importantes das prioridades da

    Poltica Nacional de Ateno Bsica, tais como: sade da mulher, sade da criana,

    sade bucal, sade mental, ateno s doenas crnicas, Programa Sade na

    Escola, ateno domiciliar, prticas integrativas e complementares e ateno s

    doenas negligenciadas.

    O Sade Mais Perto de Voc Acesso e Qualidade procura induzir

    processos que ampliem a capacidade das gestes federal, estaduais, municipais e

    das Equipes de Ateno Bsica em ofertarem servios que assegurem acesso e

    qualidade, de acordo com as necessidades concretas da populao. A iniciativa

    objetiva a ampliao do acesso e a melhoria da qualidade da ateno bsica, com

    garantia de um padro de qualidade comparvel nacional, regional e localmente de

    maneira a permitir maior transparncia e efetividade das aes governamentais

    direcionadas Ateno Bsica em Sade (BRASIL, 2013).

    O PMAQ passou a ser um importante elemento, qualitativo e quantitativo, da

    nova proposta de financiamento da AB e um revelador da nova PNAB (PINTO; KOERNER;

    SILVA, 2012; PINTO; SOUSA; FERLA, 2014), possui, portanto, a capacidade de induzir um

    movimento de mudana por meio de padres de qualidade (PINTO; SOUZA; FLORNCIO,

    2012).

    Possui como um de seus principais aspectos, o carter voluntrio de

    adeso, associado ideia de que a qualificao do servio e mudana das prticas

    s ser possvel quando trabalhadores, gestores e usurios sintam-se motivados e

    se percebam como protagonistas para o seu xito (PINTO, 2014).

  • 45

    O PMAQ est organizado em quatro fases que se complementam e que

    conformam um ciclo contnuo de melhoria do acesso e da qualidade da Ateno

    Bsica (Adeso e Contratualizao, Desenvolvimento, Avaliao Externa e

    Recontratualizao).

    Figura 4 - Fases da Avaliao do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e Qualidade da Ateno Bsica (PMAQ). Brasil

    Fonte: Ministrio da Sade do Brasil, 2012.

    A primeira fase do PMAQ consiste na etapa formal de adeso ao

    Programa, mediante a contratualizao de compromissos e indicadores a serem

    firmados entre as Equipes de Ateno Bsica (EAB) com os gestores municipais, e

    desses com o Ministrio da Sade num processo que envolve pactuao local,

    regional e estadual e a participao do controle social (BRASIL, 2012).

    A segunda fase consiste na etapa de desenvolvimento do conjunto de

    aes que sero realizadas pelas equipes de Ateno Bsica, pelas gestes

    municipais e estaduais e pelo Ministrio da Sade, com o intuito de promover

    movimentos de mudana da gesto, do cuidado e da gesto do cuidado que

    produziro a melhoria do acesso e da qualidade da Ateno Bsica. Essa fase est

    organizada em quatro dimenses (Autoavaliao, Monitoramento, Educao

    Permanente e Apoio Institucional) que devero ser estruturadas de forma contnua e

    sistemtica (BRASIL, 2012).

  • 46

    A terceira fase consiste na avaliao externa, momento em que ser

    realizado um conjunto de aes para averiguar as condies de acesso e de

    qualidade dos municpios e das equipes de Ateno Bsica participantes do PMAQ.

    Esta fase realizada pelas Instituies de Ensino e Pesquisa (BRASIL, 2012).

    A quarta fase constituda por um processo de repactuao das equipes

    de Ateno Bsica e dos gestores com o incremento de novos padres e

    indicadores de qualidade, estimulando a institucionalizao de um processo cclico e

    sistemtico a partir dos resultados alcanados pelos participantes do programa

    (BRASIL, 2012).

    Espera-se que a autoavaliao funcione como um dispositivo que

    provoque o coletivo a questionar o institudo e a colocar em anlise seu processo,

    suas relaes e suas condies de trabalho, de modo que consiga negociar e

    planejar maneiras de superar problemas e alcanar objetivos desejados e pactuados

    (COUTINHO, 2015).

    A avaliao externa consiste no levantamento de informaes para

    anlise das condies de acesso e de qualidade das Equipes da Ateno Bsica

    participantes do programa. Busca reconhecer e valorizar os esforos e resultados

    das eAB e dos gestores municipais de sade na qualificao da Ateno Bsica.

    Segundo o Departamento da Ateno Bsica do Ministrio da Sade

    (BRASIL, 2013), o processo de avaliao externa, tambm, possibilita:

    Reforar prticas de cuidado, gesto e educao que contribuam para

    a melhoria permanente da ateno bsica sade ofertada ao cidado;

    Fortalecer aes e estratgias das gestes do SUS que qualifiquem as

    condies e relaes de trabalho e que busquem apoiar tanto o

    desenvolvimento do processo de trabalho das equipes quanto dos

    prprios trabalhadores;

    Subsidiar a recontratualizao das equipes de forma singularizada,

    respeitando suas potencialidades e dificuldades;

    Considerar a avaliao dos usurios e fortalecer sua participao no

    esforo de qualificao permanente do SUS;

    Conhecer em escala e profundidade, indita, as realidades e

    singularidades da ateno bsica no Brasil, registrando as fragilidades e

  • 47

    potencialidades de cada lugar contribuindo para planejamento e

    construes de aes de melhoria em todos os nveis;

    Elaborar estratgias adequadas s diferenas dos territrios,

    promovendo maior equidade nos