UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA - … · A doutrina materialista sobre a mudança das...

110
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA - UESB PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO - PPG PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO - PPGED JORSINAI DE ARGOLO SOUZA FORMAÇÃO CONTINUADA PARA PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ENTRE POLÍTICAS E VOZES NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE ITAPETINGA (BA) Vitória da Conquista/BA 2017

Transcript of UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA - … · A doutrina materialista sobre a mudança das...

  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA - UESB

    PR-REITORIA DE PESQUISA E PS-GRADUAO - PPG

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO - PPGED

    JORSINAI DE ARGOLO SOUZA

    FORMAO CONTINUADA PARA PROFESSORES DA

    EDUCAO INFANTIL: ENTRE POLTICAS E VOZES NA

    REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE ITAPETINGA (BA)

    Vitria da Conquista/BA

    2017

  • JORSINAI DE ARGOLO SOUZA

    FORMAO CONTINUADA PARA PROFESSORES DA

    EDUCAO INFANTIL: ENTRE POLTICAS E VOZES NA

    REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE ITAPETINGA (BA)

    Dissertao de mestrado apresentada ao

    Programa de Ps-Graduao em Educao da

    Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia,

    como requisito obrigatrio obteno do ttulo

    de Mestre em Educao.

    rea de concentrao: Polticas Pblicas

    Orientadora: Profa. Dra. Isabel Cristina de Jesus

    Brando

    Vitria da Conquista

    2017

  • FICHA CATALOGRFICA

  • JORSINAI DE ARGOLO SOUZA

    Formao continuada para professores da Educao Infantil: entre polticas e

    vozes na rede municipal de ensino de Itapetinga (BA)

    Dissertao de mestrado apresentada ao

    Programa de Ps-Graduao em Educao da

    Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia,

    como requisito obrigatrio obteno do ttulo

    de Mestre em Educao.

    rea de concentrao: Polticas Pblicas

    Orientadora: Profa. Dra. Isabel Cristina de Jesus

    Brando

    BANCA EXAMINADORA

    ____________________________________

    Profa. Dra. Isabel Cristina de Jesus Brando

    (Orientadora UESB)

    ____________________________________

    Profa. Dra. Sheila Cristina Furtado Sales

    (Titular Interno - UESB)

    ____________________________________

    Profa. Dra. Helena Maria Santos Felcio

    (Titular Externo - UNIFAL-MG)

    ____________________________________

    Profa. Dra. Leila Pio Moror

    (Suplente Interno - UESB)

    ____________________________________

    Profa. Dra. Dijnane Vedovatto Iza

    (Suplente Externo - UFSCar)

    Vitria da Conquista

    2017

  • Aos homens e mulheres da minha vida:

    Elpidio (In memoriam), Catarina,

    Jorgeney, Jorsinia, Jlio, Lo, Joo,

    Marcos Paulo, Lourdes, Sinara e Lorhan

    que me tornaram filha, irm, me, tia,

    sobrinha, cunhada e mulher.

    Aos meus alunos da Educao Bsica e

    do Ensino Superior que me tornaram

    professora.

  • AGRADECIMENTOS

    [...]. Os que com lgrimas semeiam com

    jbilo ceifaro. Quem sai andando e

    chorando, enquanto semeia, voltar com

    jbilo, trazendo os seus feixes. (SALMO,

    126).

    Caminhos do Corao

    1

    famlia Arglo Souza e famlia Datoli, em especial Clia, Roberto e Rhuama

    H muito tempo que eu sa de casa

    H muito tempo que eu ca na estrada

    H muito tempo que eu estou na vida

    Foi assim que eu quis, e assim eu sou feliz

    s amigas-irms de Ilhus, Tina, Carla, em especial: urea e Luclia; e a amiga de

    Itapetinga Simone Gualberto

    Principalmente por poder voltar

    A todos os lugares onde j cheguei

    Pois l deixei um prato de comida

    Um abrao amigo, um canto pr dormir e sonhar

    minha orientadora Profa. Dra. Isabel Cristina de J. Brando

    E aprendi que se depende sempre

    De tanta, muita, diferente gente

    Toda pessoa sempre as marcas

    Das lies dirias de outras tantas pessoas

    banca examinadora Profa. Dra. Scheila Furtado e Profa. Dra. Helena Felcio, aos

    professores e colegas do PPGED, em especial as companheiras: Milena, Geani e Eleny.

    Aos colegas da UESB (Itapetinga), em especial: Adenilson, Elson, nnia, Janana

    Freitas, Jos Valdir, Jussara Tnia, Reginaldo, Marta Loula e Wermerson; aos ex-

    colegas da UESB (Jequi), em especial: Conceio Sobral, Francislene, Jussara Midley,

    Lilian, Mateus, Marcos Antnio, Nandyara, Sirlndia e Ubirajara Lima

    E to bonito quando a gente entende

    Que a gente tanta gente onde quer que a gente v

    E to bonito quando a gente sente

    Que nunca est sozinho por mais que pense estar

    s professoras da rede municipal de Itapetinga, em especial a Fernanda S; as

    professoras das Escola Luza Ferraz e Laudiney Nascimento, em especial: Dbora e

    Raelma; as professoras da rede pblica e privada de Ilhus, em especial: Vernica

    Carine, Fabianne, Alessandra, Anglica, Soraia, Litza, Marlene, Ftima, Catarina,

    Carol, Gina, Alda, Nadja, Fabiana Valrio, Cida Dvila,Glria de Ftima, Dusthy,

    Vnia, Sebastio Maciel

    to bonito quando a gente pisa firme

    Nessas linhas que esto nas palmas de nossas mos

    to bonito quando a gente vai vida

    Nos caminhos onde bate, bem mais forte o corao

    1 Letra e msica do compositor e cantor Gonzaguinha.

  • A doutrina materialista sobre a mudana das

    contingncias e da educao se esquece de que tais

    contingncias so mudadas pelos homens e que o

    prprio educador deve ser educado. Deve por isso

    que separar a sociedade em duas partes uma das

    quais colocada acima da outra. A coincidncia da

    alterao das contingncias com a atividade humana

    e a mudana de si prprio s pode ser captada e

    entendida racionalmente como prxis revolucionria.

    (MARX, 3 Tese sobre Feuerbach, grifo nosso).

  • RESUMO

    O objeto de estudo desta pesquisa centra-se nos programas de formao continuada para

    professores da Educao Infantil do Municpio de Itapetinga-Bahia, desenvolvendo-se um

    estudo crtico sobre os impactos das reformas educacionais dos anos 90, atravs da poltica

    neoliberal, efetivadas a partir da lgica do capital e da produtividade, na definio de

    polticas de formao de professores e, consequentemente, no trabalho docente. Diante desse

    cenrio, levantou-se a seguinte questo: como os professores da Educao Infantil percebem

    a formao continuada adotada pela Secretaria Municipal de Educao de Itapetinga? Nesse

    sentido, com a finalidade de atingir o objetivo geral da pesquisa que foi: analisar o que

    dizem os professores da Educao Infantil acerca dos programas de formao continuada

    promovidos pela Secretaria Municipal de Educao, utilizou-se a tcnica do grupo focal com

    nove professores de duas escolas de Educao infantil da rede municipal de ensino e uma

    entrevista semi-estruturada com a representante da Secretaria de Educao, coordenadora da

    Educao Infantil. Os dados foram analisados, a partir de uma abordagem dialtica,

    embasando-se teoricamente nos estudos relacionadas poltica de formao continuada de

    professores e as concepes de formao continuada. A anlise dos dados da pesquisa nos

    faz afirmar que os programas de formao continuada, oferecidos pela Secretaria de

    Educao, apresentam as seguintes caractersticas: valorizao do conhecimento tcito e

    esvaziamento terico; privilgio da forma em relao ao contedo; no contemplam a

    formao humana, poltica, cultural e tica dos professores; no h consultas aos professores

    quanto s suas necessidades formativas e os professores no participam do planejamento de

    aes dos programas de formao continuada. Conclui-se, portanto, que a formao

    continuada no se constitui como prioridade na organizao das polticas educacionais do

    municpio e h interesses governamentais em preservar as situaes de desvalorizao do

    trabalho docente, pois corroboram para manter o funcionamento da lgica do sistema

    capitalista vigente no nosso pas. Prope-se a existncia de um Sistema Nacional de

    Educao, atravs da consolidao do movimento de educadores, que promova a

    participao da Unio na definio de uma poltica global de formao e de valorizao,

    capaz de contemplar formao inicial e continuada, condies de trabalho, piso salarial e

    carreira, qualificando pedaggica, metodolgica, cientfica e politicamente os professores.

    Palavras-chave: Educao Infantil; Formao Continuada de Professores; Poltica de

    Formao de Professores.

  • ABSTRACT

    The objective of this study is to focus on the continuous education programs for teachers of

    the Early Childhood Education of the Municipality of Itapetinga-Bahia, developing a critical

    study on the impacts of the educational reforms of the 1990s, wich were based on the logic

    of capital and Productivity, the definition of teacher training policies and, consequently, the

    teaching work. In view of this scenario, the following question arose: how do the teachers of

    Early Childhood Education perceive the continuous formation adopted by the Municipal

    Education Department of Itapetinga? In this sense, in order to achieve the general objective

    of the research, which was to analyze what the teachers of Early Childhood Education say

    about the continuous education programs promoted by the Municipal Education Department,

    the focus group technique was used with nine teachers from Two schools of pre-school

    education and a semi-structured interview with the representative of the Secretary of

    Education, coordinator of Early Childhood Education. The data were analyzed, based on a

    dialectical approach, based theoretically on studies related to the policy of continuous

    teacher education and conceptions of continuous education. The analysis of the data of the

    research makes us affirm that the programs of continuous training, offered by the Education

    Department, present the following characteristics: valorization of the tacit knowledge and

    theoretical emptying; Privilege of form in relation to content; Do not contemplate the human,

    political, cultural and ethical formation of teachers; There are no consultations with teachers

    regarding their training needs and teachers do not participate in the planning of actions of

    continuous education programs. It is concluded, therefore, that continuous education is not a

    priority in the organization of educational policies in the municipality and it is proposed to

    have a National Education System, through the consolidation of educators movement, to

    promote the participation of the Federal Union in Definition of a global policy of training

    and valorization, capable of contemplating initial and continuing training, working

    conditions, salary and career, qualifying pedagogical, methodological, scientific and

    technical teachers.

    Key words: Child Education; Continuous Teacher Training; Teacher Training Policy.

  • LISTA DE SIGLAS

    CAPES Centro de Aperfeioamento de Professores do Ensino Superior

    CEB Cmara da Educao Bsica

    CNE Conselho da Educao Bsica

    CONAE Conferncia Nacional de Educao

    ECA Estatuto da Criana e do Adolescente

    FUNDEB Fundo de Manuteno e Desenvolvimento da Educao Bsica

    IBICT Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e Tecnologia

    INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

    LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

    MEC Ministrio da Educao e Cultura

    PCN Parmetros Curriculares Nacionais

    PDE Plano de Desenvolvimento da Escola

    FUNDEB Fundo de Manuteno e Desenvolvimento da Educao Bsica

    PIBID Programa Institucional de Bolsa de Iniciao Docncia

    PARFOR Programa de Formao dos Professores da Educao Bsica

    Plataforma Freire

    PME Plano Municipal de Educao

    PNE Plano Nacional de Educao

    PROFA Programa de Formao de Professores Alfabetizadores

    PROINFNCIA Programa Nacional de Reestruturao e Aquisio de

    Equipamentos para rede e escola publica de Educao Infantil

    UESB Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

  • LISTA DE GRFICOS

    Grfico 1 - Teses e dissertaes 2010-2015 ..................................................................... 18

    Grfico 2 - Teses e dissertaes em Instituio Federal, Estadual e Privada: 2010-2015

    .......................................................................................................................................... 19

    Grfico 3 - Evoluo da matrcula na Educao Infantil em Itapetinga .......................... 30

    Grfico 4 - Evoluo da matrcula da Educao Infantil no Brasil ................................ 50

  • SUMRIO

    1. INTRODUO .................................................................................................................. 13

    2. PERCURSO METODOLGICO DA PESQUISA ......................................................... 22

    2.1Os nmeros da Educao Infantil do municpio de Itapetinga ............................................ 28

    2.2 Lcus e Sujeitos envolvidos na pesquisa ............................................................................ 34

    2.3 Procedimentos de pesquisa ................................................................................................. 35

    3. O CAMPO DE TENSO ENTRE POLTICAS PBLICAS E A FORMAO

    CONTINUADA DE PROFESSORES DA EDUCAO INFANTIL NO BRASIL ........ 38

    4. FORMAO CONTINUADA PARA PROFESSORES DA EDUCAO

    INFANTIL: ENTRE POLTICAS E VOZES NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO

    DE ITAPETINGA ................................................................................................................59

    4.1 Os programas de formao continuada oferecidos pela Secretaria Municipal de Educao

    ............................................................................................................................................... 59

    4.2 A relao entre as necessidades formativas das professoras e os programas de formao

    continuada que so promovidos pela Secretaria Municipal de Educao ................................ 79

    4.3 A contribuio dos programas no processo de formao humana, tica, poltica e cultural

    das professoras..........................................................................................................................86

    CONSIDERAES ............................................................................................................... 91

    REFERNCIAS ..................................................................................................................... 96

    APNDICES ......................................................................................................................... 104

  • 13

    1. INTRODUO

    Este trabalho de dissertao tem como objeto de pesquisa os programas de formao

    continuada de professoras2 da Educao Infantil desenvolvidos no Municpio de Itapetinga,

    na Bahia, na tentativa de responder a seguinte questo problema: como as professores da

    Educao Infantil percebem a formao continuada adotada pela Secretaria Municipal de

    Educao de Itapetinga?

    Nessa direo, almejando apreender o que pensam as professoras da Educao

    Infantil acerca das aes e atividades que compem um programa de formao continuada,

    definimos como objetivo geral: analisar o que dizem as professoras da Educao Infantil

    acerca dos programas de formao continuada promovidos pela Secretaria Municipal de

    Educao e os seguintes objetivos especficos: conhecer os programas de formao

    continuada adotados pela Secretaria Municipal de Educao de Itapetinga para as

    professoras da Educao Infantil; analisar a concepo de formao continuada presentes

    nos programas; identificar o grau de participao das professoras no planejamento das aes

    dos programas; analisar o que dizem as professoras da Educao Infantil sobre suas

    necessidades de formao continuada e analisar o que dizem acerca da contribuio dos

    programas no processo de formao humana, tica, poltica e cultural das professoras.

    Saliento que ao longo da minha3 trajetria profissional sempre estive envolvida em

    aes de formao continuada de professores da Educao Bsica assumindo, inclusive, a

    funo de formadora nos seguintes cursos de formao continuada: PCN (Parmetros

    Curriculares Nacionais em Ao), PROFA (Programa de Formao de Professores

    Alfabetizadores) e Fazeres da Educao Infantil. Paralelamente as experincias de

    formadora, assumi, tambm, na rede pblica municipal de ensino, durante vinte e quatro

    anos de servio, as seguintes funes: docncia, coordenao pedaggica, gerncia de gesto

    da educao infantil na secretaria de educao do municpio de Ilhus e professora. Confesso

    que durante a execuo das funes supracitadas, inclusive como formadora, no enxergava

    a valorizao excessiva da metodologia em detrimento dos fundamentos histricos,

    2Usaremos o termo professoras porque, at a data de realizao dessa pesquisa, no havia na rede municipal de

    ensino de Itapetinga nenhum homem atuando como regente de classe na Educao Infantil. Desse modo,

    empregaremos professoras quando formos tratar especificamente daquelas que so sujeitos da nossa

    pesquisa. Nas outras situaes, usaremos o termo professores. 3Todo o texto da dissertao foi escrito na primeira pessoa do plural. No entanto, no decorrer de trs pargrafos

    subsequentes no texto da introduo, usaremos a primeira pessoa do singular, pois estamos nos referindo a uma

    trajetria pessoal.

  • 14

    filosficos, sociolgicos e econmicos nos cursos de formao de professores. (DUARTE

    2010, p. 58).

    No entanto, no ano de 2014 ao assumir a funo de professora auxiliar da

    Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (campus de Itapetinga), na disciplina Estgio

    em Educao Infantil, bem como a coordenao do subprojeto de Pedagogia, linha de ao

    Educao Infantil, no Programa Institucional de Bolsa de Iniciao Docncia (PIBID) /

    Centro de Aperfeioamento de Professores do Ensino Superior (CAPES) no mesmo campus,

    o meu contato com discusses de fundamentos marxistas foi ampliado, a partir da obra do

    professor Saviani, na medida em que, enquanto professora de estgio, precisava aprofundar

    as relaes de indissociabilidade entre a teoria e a prtica.

    Consequentemente, as aproximaes com a rede municipal de ensino de Itapetinga,

    atravs do acompanhamento das aes do Estgio, gerou um desejo investigativo em analisar

    de forma crtica as condies de trabalho, a carreira e os processos de formao continuada

    dos professores da Educao Infantil, pois entendemos que a implementao da Lei de

    Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDBEN), promulgada em 1996, ampliou o debate

    em torno da formao de professores no Brasil, provocando, inclusive, a necessidade de

    formao dos professores para a Educao Infantil.

    Desse modo, importante registrar que, antes da dcada de 90, o professor de

    crianas de Educao Infantil apareceu no panorama da educao brasileira sem nenhuma

    exigncia de qualificao, pois acreditava-se que, para essa faixa etria, no era necessrio

    dominar contedos e nem saber preparar aula, bastava saber controlar e cuidar das crianas.

    Nesse sentido, para contrariar as concepes assistencialistas, higienistas e

    espontanestas, ainda presentes na formao e trabalho docente da Educao Infantil,

    recorremos ao conceito de trabalho educativo em Saviani (1996, p.146): o trabalho

    educativo o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivduo singular, a

    humanidade que produzida histrica e coletivamente pelo conjunto dos homens. O

    trabalho educativo desenvolvido pelo docente, uma atividade intencional, sistemtico, e

    est relacionado socializao do saber construdo socialmente.

    Considerando, portanto, a tamanha relevncia do trabalho docente para a sociedade,

    preciso estar atento em quais condies se processa a formao dos professores.

    Corroboramos com Martins (2010, p.14) que concebe a formao de professores, como

    uma trajetria de formao de indivduos, intencionalmente planejada, para a efetivao de

    determinada prtica social. vista disso, entendemos que a formao de professores s

    pode ser analisada a partir dos arranjos sociais contemporneos, considerando-se as estreitas

  • 15

    relaes que h entre a educao, sociedade e o trabalho docente. Salientamos, no entanto, a

    necessidade de analisar o trabalho docente e a sua insero na sociedade capitalista,

    buscando entend-lo no contexto do processo de produo e reproduo do capital.

    Nesse sentido, vivemos em uma poca marcada por reformas educacionais que

    interferem, de maneira intensa, nas polticas de formao de professores. Na dcada de 80,

    vivenciamos vrias lutas em prol da construo democrtica do Estado de direito com a

    defesa da escola pblica, universal, gratuita, laica e unitria.

    No entanto, a dcada de 90 foi marcada pela instaurao do projeto neoliberal, cuja

    finalidade a reduo dos gastos pblicos e a realizao de privatizaes com consequncias

    perversas para todas as reas sociais, inclusive a perda de direitos relacionados educao

    conquistados atravs da promulgao da Constituio Federal de 1988. Lombardi (2016)

    apresenta a gnese e as bases desse projeto que o autor considera mais ideolgico do que

    poltico e econmico:

    Friedrich August von Hayek4 e Milton Friedman foram os principais

    formuladores da doutrina neoliberal: criticaram o carter autoritrio do

    Estado, seus encargos sociais e sua atuao reguladora que impedia a plena

    realizao das liberdades individuais e o livre mercado, fundamentos da

    prosperidade econmica. Propuseram o afastamento do Estado das atividades

    econmicas, a realizao de inmeras reformas institucionais que

    possibilitassem o livre mercado e a livre circulao dos capitais, deixando

    como nica ao reguladora possvel a do mercado. Prescreveram a

    privatizao de todos os setores da economia nacional, a transferncia de

    servios pblicos ao setor privado, a desregulamentao do sistema

    financeiro, reduo dos encargos e direitos sociais que dificultavam o

    desenvolvimento econmico, reduo dos gastos governamentais, entre

    outras. (LOMBARDI, 2016, p. 82).

    No Brasil, segundo Previtali; Fagiani (2016, p. 88) foi no final dos anos 90 que

    comeam a ser sentidos o efeito do neoliberalismo medida que o pas foi sendo inserido no

    contexto da globalizao.

    [...] neoliberalismo comea no Brasil com a eleio de Collor de Melo em

    1989. Mas foi no governo de Fernando Henrique Cardoso entre 1994 e 2002,

    quando houve a implementao de um amplo programa de reforma do

    Estado, que as polticas neoliberais foram aprofundadas e sistematizadas.

    (PREVITALI; FAGIANI, 2016, p. 88).

    4A publicao do livro O Caminho da Servido, Friedrich August von Hayek21, em 1946, considerado o

    marco do nascimento do neoliberalismo, pela qual o autor divulgou posio contrria ao planejamento

    econmico e ao coletivismo predominantes em vrios pases como Alemanha, Itlia e Unio Sovitica - antes

    da Segunda Guerra Mundial (cf. ANDERSON, 1995). Depois da publicao dessa obra, em 1947, em Mont

    Saint Plrin, Sua, ocorreu um congresso reunindo economistas e intelectuais conservadores contrrios s

    polticas de bem-estar social e que, para eles, eram coletivistas e cerceadoras das liberdades individuais.

    (LOMBARDI, 2016, p. 83).

  • 16

    Nesse sentido, o iderio neoliberal impulsionou a reforma educacional dos anos 90

    baseada na viso de administrao gerencial numa preocupao com a perspectiva

    econmica produtivista que impactou e continua impactando os direcionamentos da poltica

    nacional de formao de professores no pas. Os organismos internacionais5 passaram a

    determinar as metas educacionais que os pases devem atingir, inclusive relacionadas s

    concepes da formao docente.

    No entanto, a partir dos anos de 2002, o governo de Lus Incio da Silva (Lula) do

    Partido dos Trabalhadores (PT) garantiu alguns avanos nas polticas de reduo da

    desigualdade social e da pobreza, bem como na expanso da poltica de expanso do ensino

    superior pblico. No entanto, no conseguiu promover mudanas econmicas e sociais

    estruturais que contribusse na mudana da relao do pas com capitais internacionais.

    Recentemente, em dezembro de 2016, presenciamos em nosso pas a efetivao de

    um golpe de estado voltado para atender aos interesses da classe dominante e contra os

    direitos da classe trabalhadora. Sendo assim, aps o golpe contra o Governo Dilma, que

    sucedeu Lula na presidncia da Repblica, o governo Michel Temer conseguiu a aprovao,

    no Senado Federal, da Proposta de Emenda Constituio (PEC 55) que prev o

    congelamento de novos investimentos em despesas pblicas relacionadas sade, educao,

    cultura, etc. Lombardi (2016) denuncia a perversidade do projeto burgus contra a classe

    trabalhadora:

    Qualquer avano social para os trabalhadores no Brasil, levado a cabo por

    governos politicamente desenvolvimentistas e nacionalistas, imediatamente

    so interpretados como um perigo para os interesses do capital. A arguta

    anlise de Florestan que o projeto burgus [] manter a ordem, salvar e

    fortalecer o capitalismo, impedir que a dominao burguesa e o controle

    burgus sobre o Estado nacional se deteriorem (FERNANDES, 1975,

    p.294). exatamente isso que faz com que o carter poltico do Golpe

    brasileiro seja antinacional, antipopular, antidemocrtico e pr-imperialista;

    com boa dose de violncia institucionalizada. (LOMBARDI, 2016, p. 69)

    inegvel que esse cenrio de tenso e reformas afeta o campo educacional e,

    consequentemente, a formao do professor. O contexto da sociedade capitalista que

    vivemos, marcada pela desigualdade social e pela hegemonia do pensamento da classe

    5Organizao dos Estados Americanos OEA; Banco Interamericano de Desenvolvimento BID; Banco

    Mundial BM;Comunidade Europia CE; Organizao de Cooperao e Desenvolvimento Econmico

    OCDE; Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento PNUD; Programa de Reformas Educacionais

    da Amrica Latina e Caribe Preal.

  • 17

    burguesa, corrobora para influenciar o trabalho docente pela lgica do capital e da

    produtividade. Consequentemente, em meio ao cenrio do lucro, da concorrncia e da

    individualidade, enquanto demandas hegemnicas da sociedade capitalista, complexo falar

    em luta contra a desigualdade e excluso, mas entendemos que preciso enfrentar essa

    lgica perversa, a fim de garantir as convices democrticas sobre o papel da educao e

    do professor na contribuio por uma sociedade mais humana e igualitria.

    Nesse sentido, avaliamos que a presente pesquisa possui relevncia cientfica em

    contribuir com a ampliao dos estudos e debates sobre a formao continuada de

    professores da educao infantil em uma perspectiva crtica e dialtica, pois identificamos

    atravs de um levantamento das dissertaes e teses defendidas em programas de ps-

    graduao em educao no Brasil, no perodo entre 2010 e 2015, no Instituto Brasileiro de

    Informao em Cincia e Tecnologia - IBICT, onde examinamos as teses e dissertaes, que

    h uma escassez de trabalhos que discutam as contradies e os conflitos que envolvem a

    formao dos professores no contexto brasileiro.

    Por conseguinte, consideramos vlido descrever o caminho traado de como

    obtivemos essas informaes acerca do que versam as produes escritas nessa rea, em

    documentos considerados cientificamente autnticos. Para tanto, definimos quatro

    descritores para localizar as pesquisas, a saber: formao continuada para professores da

    Educao Infantil; poltica de formao continuada para a Educao Infantil; professor da

    Educao Infantil e Educao Infantil.

    Na pgina do IBICT, selecionamos as pesquisas que versavam sobre a temtica

    atravs da leitura do resumo. Sendo assim, chegamos aos seguintes resultados de busca: no

    descritor formao continuada para professores da Educao Infantil foram encontrados 21

    pesquisas (17 dissertaes e 4 teses); no descritor Poltica de formao de professores da

    Educao Infantil, 12 pesquisas (3 teses e 9 dissertaes); no descritor professor da educao

    infantil foram encontradas 19 pesquisas (14 dissertaes e 5 teses) e, no descritor Educao

    Infantil, no foi encontrado nenhuma pesquisa diferente dos que j haviam sidos encontrados

    nos outros descritores, totalizando, inicialmente, 52 pesquisas para serem analisadas.

    No entanto, aps a leitura cuidadosa do resumo e, em alguns casos, da pesquisa como

    um todo selecionamos trinta e quatro pesquisas para fazer as anlises, pois as outras dezoito

    versavam prioritariamente sobre formao inicial, rotinas de professor da educao infantil,

    atuao do coordenador pedaggico, trazendo apenas consideraes superficiais sobre a

    formao continuada. Ressaltamos, contudo, que os estudos que se referiam formao

  • 18

    continuada com especificidades, como: msica, corpo, educao distncia, educao

    especial foram includos.

    Em seguida, realizamos a anlise dos dados encontrados, referentes a 34 produes,

    destacando: a quantidade de dissertaes e teses daquele ano; as palavraschave mais

    utilizadas; as instituies onde foram produzidas as pesquisas; os objetivos da pesquisa; os

    resultados e a metodologia mais usada. Logo depois, com essa mesma formatao, fizemos a

    anlise comparativa entre os anos.

    Evidenciamos, todavia, que para realizar a anlise acerca dos objetivos da pesquisa,

    definimos trs categorias: Curso de Formao Continuada; Poltica de Formao

    Continuada; Aes de Formao continuada na escola. Apresentaremos, a seguir, a anlise

    do conjunto da produo.

    Foi identificado que tanto o ano de 2013 quanto o de 2014 apresentou o maior

    nmero de teses e dissertaes (08 dissertaes e duas teses), havendo, no entanto, uma

    queda nesse quantitativo no ano de 2015 quatro trabalhos, conforme observamos no

    grfico abaixo:

    Grfico 1 Teses e dissertaes 2010-2015

    0

    1

    2

    3

    4

    5

    6

    7

    2010 2011 2012 2013 2014 2015

    DISSERTAES

    TESES

    Fonte: IBICT. Grfico produzido pela autora

    As produes vinculadas s universidades federais apresentam uma quantidade

    significativa vinte e trs produes, enquanto a rede estadual nove estaduais e quatro

    particulares (Grfico 2). Nesse total de produes, a palavra chave mais recorrente foi

    Educao Infantil, seguida por Formao continuada.

  • 19

    Grfico 2 Teses e dissertaes em Instituio Federal, Estadual e Privada 2010-2015

    0

    1

    2

    3

    4

    5

    6

    2010 2011 2012 2013 2014 2015

    Federal

    Estadual

    Privada

    Fonte: IBICT. Grfico produzido pela autora

    Todos os trabalhados analisados selecionaram a pesquisa qualitativa como

    abordagem metodolgica do trabalho. O questionrio e a entrevista se destacaram como os

    principais instrumentos para coletar os dados. Em relao aos objetivos, a maioria dos

    trabalhos indicou como objetivo central fazer a anlise das aes de formao continuada

    desenvolvida nas escolas.

    No que concerne aos resultados das pesquisas, um nmero significativo de produes

    sinalizaram que a formao continuada de fundamental importncia para o

    desenvolvimento profissional dos docentes, bem como a necessidade da prpria escola

    organizar as aes de formao.

    Desse modo, a definio dos descritores usados nessa pesquisa - formao

    continuada para professores da Educao Infantil; poltica de formao continuada para a

    Educao Infantil; professor da Educao Infantil e Educao Infantil possibilitou chegar a

    uma fonte de informaes acerca da importncia da formao continuada para os docentes.

    Ademais, julgamos necessrio fazermos algumas consideraes sobre o levantamento

    realizado, numa perspectiva de estabelecer um comparativo com o nossa pesquisa a fim de

    legitimar a nossa inteno de produzir um trabalho a partir de uma vertente crtica na rea de

    formao de professores.

    Quanto escolha metodolgica, entendemos que a nossa pesquisa avana em relao

    s pesquisas estudadas, pois acreditamos que a nossa escolha por uma abordagem dialtica

    amplia o campo de viso em relao ao objeto em estudo. Nessa mesma direo, avana na

    escolha da tcnica de coleta de dados na medida em que traz o grupo focal que possibilita

    uma rica e detalhada coleta de dados.

  • 20

    Tendo em vista esse levantamento das produes acadmicas sobre a temtica

    Formao Continuada de Professores, ampliamos nossas metas em relao pesquisa que

    realizamos, e pretendemos defender o trabalhador intelectual que revela suas necessidades

    formativas e participa dos processos de planejamento, execuo e avaliao dos programas

    de formao continuada, com a inteno de contribuir no seu aperfeioamento pedaggico,

    tico, poltico e cultural construindo sua identidade de educador de crianas de 0 a 05 anos.

    Para tanto, o presente texto consta de quatros captulos, alm das consideraes

    finais.

    No primeiro captulo, Introduo, apresenta-se o trabalho com a justificativa da

    escolha do tema, a problemtica de pesquisa, os objetivos e o levantamento feito das

    produes acadmicas no perodo de 2010 a 2015.

    No segundo captulo, Percurso Metodolgico da Pesquisa, apresenta-se a opo

    metodolgica, baseada em uma abordagem dialtica, seguido das tcnicas de coleta e

    categorizao dos dados; aspectos educacionais do municpio de Itapetinga; lcus, sujeitos e

    procedimentos da pesquisa.

    No terceiro captulo, O campo de tenso entre polticas pblicas e a formao

    continuada de professores de Educao Infantil no Brasil apresenta-se um estudo terico

    que retrata o cenrio da formao dos professores no pas em aspectos que perpassam pelo

    processo histrico, marcos legais, polticas pblicas, em um contexto de conflitos e

    contradies, evidenciando-se os desafios para a formao continuada de professores da

    Educao Infantil.

    No quarto captulo Formao Continuada para professoras da Educao Infantil:

    entre polticas e vozes na rede municipal de ensino de Itapetinga apresenta-se,

    inicialmente, o cenrio da educao infantil no municpio de Itapetinga no que tange a oferta

    de vagas, espao fsico, perfil e formao inicial dos profissionais. Posteriormente, o lcus da

    pesquisa com a caracterizao das escolas pesquisadas, seguido do perfil dos sujeitos da

    pesquisa e do percurso realizado para a coleta de dados e, finalmente, a apresentao dos

    dados obtidos, seguido das respectivas anlises realizadas a partir do referencial terico

    relacionado poltica de formao continuada de professores e as concepes de formao

    continuada apresentadas nas legislaes - Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

    (LDBEN 9394/96); o Plano Nacional de Educao (PNE 2014-2024) e as Diretrizes

    Curriculares Nacionais para a formao inicial e para a formao continuada (Projeto de

    Resoluo n 2, de 1 de julho de 2015), bem como dos estudos crticos de Marx (1989,

  • 21

    1996), Manacorda (2007), Saviani (1996, 2005, 2007, 2009, 2012, 2014), Gatti (2008, 2011),

    Duarte (2010) e Martins (2010).

    Nas Consideraes, retoma-se a problemtica e os objetivos da pesquisa, com a

    inteno de evidenciar os resultados e as concluses preliminares a respeito do nosso objeto

    de estudo, entendendo que a complexidade que o envolve sinaliza novas pesquisas na rea.

  • 22

    2. PERCURSO METODOLGICO DA PESQUISA

    Nesse captulo apresentaremos a nossa opo metodolgica para identificar como as

    professoras da Educao Infantil percebem a formao continuada adotada pela Secretaria

    Municipal de Educao de Itapetinga, seguido da apresentao das tcnicas de coleta e de

    categorizao dos dados. Alm disso, apresentaremos dados referentes a aspectos

    educacionais do municpio de Itapetinga, posteriormente o lcus e os sujeitos da pesquisa,

    atravs da caracterizao das escolas e do perfil das profissionais que atuam nessas escolas e,

    finalmente, os procedimentos de pesquisa.

    sabido que o mtodo um caminho para se atingir determinado fim e constitui-se

    um fator importante na aquisio de conhecimentos. Segundo Meksenas (2002, p. 105) os

    mtodos permitem um olhar diferente para a realidade e determinam como o pesquisador vai

    pensar essa realidade. So procedimentos lgicos, cognitivos, conceituais contidos em

    determinados estilo de pensamento.

    A opo por uma concepo metodolgica sempre uma escolha histrica,

    situacional, contextualizada e conduzem a diferentes resultados. Desse modo, esse trabalho

    trata-se de uma pesquisa de campo, cuja anlise dos dados da pesquisa est baseada na

    dialtica que, segundo Gil (1999, p. 32):

    fornece as bases para uma interpretao dinmica e totalizante da realidade,

    j que estabelece que os fatos sociais no podem ser entendidos quando

    considerados isoladamente, abstrados de suas influncias polticas,

    econmicas, culturais, etc. [...]. (GIL, 1999, p.32).

    importante registrar que a dialtica s se torna mtodo cientfico a partir de Marx,

    apesar de Hegel, grande expoente da Filosofia clssica alem, ter apresentado,

    primeiramente, estudos sobre o mtodo dialtico. Nas palavras de Marx:

    A mistificao que a dialtica sofre nas mos de Hegel no impede, de modo

    algum, que ele tenha sido o primeiro a expor as suas formas gerais de

    movimento, de maneira ampla e consciente. necessrio invert-la, para

    descobrir o cerne racional dentro do invlucro mstico. (MARX, 1996, p.

    140).

    Nessa direo, Marx, por sua vez, critica o idealismo da filosofia clssica alem e

    prope a dialtica materialista, ou seja, a utilizao do pensamento dialtico como mtodo de

    anlise da realidade, utilizando a prpria realidade como argumento. Apresenta, portanto, a

    sua posio:

  • 23

    Por sua fundamentao, meu mtodo dialtico no s difere do hegeliano,

    mas tambm a sua anttese direta. Para Hegel, o processo de pensamento,

    que ele, sob o nome de ideia, transforma num sujeito autnomo, o

    demiurgo do real, real que constitui apenas a sua manifestao externa. Para

    mim, pelo contrrio, o ideal no nada mais que o material, transposto e

    traduzido na cabea do homem. (Idem, p. 140).

    Destacando as bases materiais e racionais para entender a realidade, contrapondo-se,

    ao pensamento de Hegel, Marx acredita que a produo de ideias e de representaes est

    ligada atividade material dos homens, sendo assim a vida determina as ideias nas relaes

    que so estabelecidas ligadas principalmente luta pela sobrevivncia. Essas relaes sociais

    e polticas definem diferentes formas dos homens conhecerem. Considerando ainda o

    entendimento do conhecimento terico para Marx, Netto (2011) destaca:

    o conhecimento terico o conhecimento do objeto tal como ele em si

    mesmo, na sua existncia real e efetiva, independentemente dos desejos, das

    aspiraes e das representaes do pesquisador. A teoria , para Marx, a

    reproduo ideal do movimento real do objeto pelo sujeito que pesquisa: pela

    teoria, o sujeito reproduz em seu pensamento a estrutura e a dinmica do

    objeto que pesquisa. E esta reproduo (que constitui propriamente o

    conhecimento terico) ser tanto mais correta e verdadeira quanto mais fiel o

    sujeito for ao objeto. (NETTO, 2011, p. 20)

    Ainda, sobre o significado do conhecimento em Marx, Saviani afirma que:

    Marx delineou no item mtodo da economia poltica o caminho a ser

    percorrido no processo de produo do conhecimento pelo homem. O

    movimento global do conhecimento compreende dois momentos. Parte-se do

    emprico isto do objeto na forma como se apresenta observao imediata,

    tal como figurado na intuio. Nesse momento inicial, o objeto captado

    numa viso sincrtica, catica, isto , no se tem clareza do modo como ele

    est constitudo. Aparece, pois, sob a forma de um todo confuso, portanto,

    como um problema que precisa ser resolvido. Partindo dessa representao

    primeira do objeto, chega-se por meio da anlise aos conceitos, abstraes,

    determinaes mais simples. Uma vez atingido esse ponto, faz-se necessrio

    percorrer o caminho inverso (segundo momento) chegando, pela via da

    sntese, de novo ao objeto, agora entendido no mais como uma rica

    totalidade de determinaes e de relaes numerosas. (SAVIANI, 2012, p.

    61).

    Considerando-se, portanto, a viso defendida por Marx de que o conhecimento

    contm propostas polticas e tem historicidade no devendo, portanto, limitar-se a interpretar

    o mundo, mas transform-lo, ou seja, a pesquisa se faz pela e na histria nossa inteno foi

    investigar como as professoras da Educao Infantil percebem a formao continuada

  • 24

    adotada pela Secretaria Municipal de Educao de Itapetinga, identificando os conflitos e

    relacionando o prprio objeto de estudo formao continuada de professores com outros

    objetos, a exemplo: o poder (estado e poltica). A ideia foi compreender os processos que

    envolvem a formao continuada, a fim de apontar caminhos, e contribuir na transformao

    dessa realidade nos aspectos necessrios para garantir a qualidade da formao continuada.

    Desse modo, foi necessrio adotar, tambm, o pensamento de Marx sobre o sujeito

    que pesquisa, de acordo com Netto:

    o papel do sujeito essencialmente ativo: precisamente para apreender no a

    aparncia ou a forma dada do objeto, mas a sua essncia, a sua estrutura e a

    sua dinmica (mais exatamente para apreend-lo como um processo), o

    sujeito deve ser capaz de mobilizar um mximo de conhecimentos, critic-

    los, revis-los e deve ser dotado de criatividade e imaginao. O papel do

    sujeito fundamental no processo de pesquisa. Marx, alis, caracteriza de

    modo breve e conciso tal processo na investigao, o sujeito tem de

    apoderar-se da matria, em seus pormenores, de analisar suas diferentes

    formas de desenvolvimento e de perquirir a conexo que h entre elas

    (MARX apud NETTO, 2011, p. 25).

    Consequentemente, em nossa pesquisa, empregamos uma postura ativa e crtica com

    o intuito de adquirir uma viso geral dos aspectos que envolveram e envolvem a poltica de

    formao de professores no Brasil. Nesse sentido, concordamos com Martins (2005) e

    consideramos o alerta da autora:

    Portanto, se queremos descobrir a essncia oculta de um dado objeto [...]

    preciso caminhar das representaes primrias e das significaes

    consensuais em sua imediatez sensvel em direo descoberta das suas

    mltiplas determinaes ontolgicas do real. Assim sendo, no pode nos

    bastar apenas o que visvel aos olhos, pois o conhecimento da realidade, em

    sua objetividade, requer a visibilidade da mxima inteligncia dos homens.

    (MARTINS, 2005, p.10).

    importante, ainda, destacar que o objeto de estudo de Marx, em sua teoria social,

    a sociedade burguesa. Por consequncia, o objetivo da pesquisa marxista conhecer as

    categorias que constituem a articulao interna da sociedade burguesa.

    Essas categorias so definidas como formas de ser, modos de existncia do ser social.

    Totalidade, contradio e mediao so as trs categorias que definem a concepo terico-

    metodolgica de Marx. A totalidade significa estabelecer as mximas relaes possveis para

    o desenvolvimento do real. Marx define a sociedade como uma totalidade concreta que

    necessita das articulaes para que essa totalidade seja dinmica. As mediaes (internas e

    externas), por sua vez, tm o papel de articular as totalidades, ou seja, estabelecer as

    conexes entre os diferentes aspectos que caracterizam a realidade. E, sem as contradies,

  • 25

    as totalidades seriam inertes, mortas, pois ela que promove o movimento que permite a

    transformao dos fenmenos. A contradio seria a luta dos contrrios, a luta de classes

    como fora motriz da histria, no existiria histria sem a luta dos contrrios. (NETTO,

    2011).

    Nesse sentido, evidenciamos que a abordagem dialtica contribuiu para tornar visvel

    a realidade sobre os programas de formao continuada do municpio de Itapetinga,

    auxiliando na compreenso da poltica educacional de formao de professores, pois a

    poltica um complexo que faz parte de uma totalidade social, por isso importante o estudo

    da sua gnese, movimento e contradies. Isso significa que no se pode tratar da poltica

    educacional em seu aparente isolamento das outras manifestaes sociais. Consideramos

    ainda, que o processo de implantao e implementao das polticas marcado por interesses

    econmicos, polticos, ideolgicos, j que a poltica educacional no se define sem disputas,

    sem contradies.

    A fim de conhecer a realidade do nosso objeto de investigao - os programas de

    formao continuada para professoras da Educao Infantil do municpio de Itapetinga -

    definimos as seguintes tcnicas de coleta de dados: grupo focal (GATTI, 2005), o

    questionrio com questes diretas e a entrevista por pauta (GIL, 1999), cuja inteno foi nos

    beneficiar da comparao de dados paralelos atravs do uso das tcnicas citadas.

    Adotamos o grupo focal, uma tcnica que permite coletar dados atravs da interao

    grupal, pois apresenta vantagem em relao observao participante na medida em que

    consiste na oportunidade de observar uma quantidade muito maior de interao entre os

    participantes a respeito de um tpico, em um limitado intervalo de tempo, podendo o

    pesquisador direcionar e focalizar o tema da pesquisa.

    Nos estudos em que se adotam os grupos focais, estes demonstram serem espaos

    privilegiados de discusso e de trocas de experincias em torno de determinada temtica.

    Segundo Gatti (2005) o formato do grupo proporciona trocas e o debate entre os

    participantes, permitindo que os temas abordados sejam mais problematizados que numa

    situao de entrevista individual.

    A escolha da tcnica deve-se ao fato da deciso de ouvir as professoras da educao

    infantil e o grupo focal constitui-se uma tcnica importante para o conhecimento das

    representaes, percepes, experincias de um grupo, usada para examinar no somente o

    que as pessoas pensam, mas como elas pensam e por que pensam assim. Alm disso,

    desenvolve-se a partir de uma perspectiva dialtica, na qual o grupo possui objetivos comuns

    e seus participantes procuram abord-los trabalhando como uma equipe.

  • 26

    Realizamos a atividade com os professores que atuam em turmas de 04 e 05 anos de

    duas escolas de Educao Infantil6 da rede municipal, atravs de um roteiro definido

    previamente. As atividades para coleta dos dados, atravs da escuta voz dos docentes,

    foram realizadas em um perodo de dois meses.

    Quanto ao questionrio, segundo Gil, pode ser definido:

    como a tcnica de investigao composta por um nmero mais ou menos

    elevado de questes apresentadas por escrito s pessoas, tendo por objetivo o

    conhecimento de opinies, crenas, sentimentos, interesses, expectativas,

    situaes vivenciadas. (GIL, 1999, p.128).

    Nessa direo, destacamos que a tcnica foi utilizada como instrumento para

    identificar o perfil das professoras. Sendo assim, o contedo dessas questes est relacionado

    a fatos (GIL, 1999) que as professoras dominam: tempo de servio na rede municipal de

    ensino; tipo de vnculo empregatcio com a Prefeitura Municipal de Itapetinga; carga horria

    de trabalho; faixa etria; escolaridade, nome do curso, instituio formadora. Escolhemos,

    portanto, organizar o questionrio com questes fechadas, pois nesse tipo de questes

    apresenta-se ao respondente um conjunto de alternativas de resposta para que seja escolhida

    a que melhor representa sua situao ou ponto de vista. (Ibidem, p.129-130).

    Finalmente, lanamos mo da entrevista que, segundo Gil (1999, p. 117), definida

    como tcnica em que o investigador se apresenta frente ao investigado e lhe formula

    perguntas, como objetivo de obteno dos dados que interessam investigao.

    Evidenciamos, desse modo, que ao tentar obter dados precisos, a entrevista, devido sua

    flexibilidade, permite repetir perguntas e faz-las de outro modo, caso o entrevistado no

    interprete a questo de acordo com os objetivos da pesquisa.

    A entrevista, tambm, permite obter dados que no esto disponveis em outros

    registros. Como nossa inteno foi verificar o que diz e como diz a coordenadora da

    Educao Infantil, representante da Secretaria Municipal de Educao de Itapetinga, sobre

    questes que envolvem o processo de formao continuada dos professores da Educao

    Infantil do municpio de Itapetinga, estabelecemos uma interao com a entrevistada que

    permitiu observar e identificar expresses faciais, corporais e tom de voz semelhantes a que

    identificamos na tcnica do grupo focal que realizaremos com os professores.

    6 Essas duas escolas foram escolhidas como lcus da pesquisa, pois apresentam o maior nmero de professoras

    que atuam em classes de 04 e 05 anos de Educao Infantil do municpio.. Alm disso, so escolas onde so

    realizados os Estgios Supervisionados em Educao Infantil da UESB e a aplicao do Subprojeto de

    Pedagogia, linha de ao Educao Infantil, do PIBID. Essas escolas sero apresentadas, durante todo o texto,

    como Escola 1 e Escola 2.

  • 27

    Segundo Gil (1999) h diferentes tipos de entrevistas em funo da sua natureza e

    nvel de estruturao. Adotamos a entrevista semi-estruturada, cuja nomenclatura utilizada

    por Gil (1999) entrevista por pautas.

    A entrevista por pautas apresenta certo grau de estruturao, j que se guia

    por uma relao de pontos de interesse que o entrevistador vai explorando ao

    longo de seu curso. As pautas devem ser ordenadas e guardar certa relao

    entre si. O entrevistador faz poucas perguntas diretas e deixa o entrevistado

    falar livremente medida que se refere s pautas assinaladas. (GIL, 1999, p.

    120).

    Sendo assim, apesar de dispormos de uma lista prefixada de perguntas, permitimos

    que a entrevistada falasse do que pensa sobre os processos de formao continuada do

    municpio de Itapetinga, independente do roteiro.

    Para a realizao da tcnica da entrevista lanamos mo de um gravador para

    armazenamento das respostas que, posteriormente, foram transcritas e analisadas.

    No que diz respeito organizao e anlise de dados, inicialmente, retomamos os

    objetivos do estudo, seguido da organizao do material coletado tanto dos dados coletados

    no questionrio e na entrevista quanto das transcries das gravaes do grupo focal.

    Os dados oriundos do questionrio que foram aplicados aos docentes e esto

    relacionados s questes fechadas foram tabulados e interpretados em um enfoque

    quantitativo, traduzindo o que revelam os nmeros acerca dos seguintes elementos:

    a) Escolaridade dos professores

    b) Participao em cursos de formao Continuada

    Informamos que os dados obtidos serviram para traar um perfil aproximado dos

    docentes da educao infantil que participaram da pesquisa.

    As perguntas da entrevista, bem como do grupo focal foram categorizadas em trs

    blocos que foram definidos por meio do apoio nos objetivos da pesquisa. So eles: os

    programas de formao continuada oferecidos pela secretaria municipal de educao; a

    relao entre as necessidades formativas dos professores e os programas de formao

    continuada que so promovidos pela Secretaria de Educao; a contribuio dos programas no

    processo de formao humana, tica e poltica e cultural das professoras. As anlises das

    respostas obtidas atravs da entrevista e do grupo focal foram analisadas a tomando como

    base as discusses tericas relacionadas poltica de formao continuada de professores e as

    concepes de formao continuada apresentadas nas legislaes - Lei de Diretrizes e Bases

    da Educao Nacional - LDBEN 9394/96; o Plano Nacional de Educao- PNE 2014-2024 e

    as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formao inicial e para a formao continuada

  • 28

    (Projeto de Resoluo 25/03/2015), bem como dos estudos de Marx (1989, 1996), Manacorda

    (2007), Saviani (1996, 2005, 2007, 2009, 2012, 2014), Gatti (2008, 2011),Duarte (2010) e

    Martins (2010).

    2.1 OS NMEROS DA EDUCAO INFANTIL DO MUNICPIO DE ITAPETINGA

    Apresentaremos dados educacionais do municpio de Itapetinga, a fim de traar um

    perfil desse municpio no que diz respeito Educao Infantil, em aspectos relacionados a:

    matrcula das crianas; infraestrutura das escolas; perfil e condies de trabalho dos

    profissionais da Educao Infantil.

    De acordo com informaes do Plano Municipal de Educao (ITAPETINGA, 2015)

    a cidade de Itapetinga possui uma rea de 1.615,4 Km, fica localizada na regio Sudoeste da

    Bahia, mais precisamente a 151214 de latitude sul e 401210 de longitude oeste, sendo

    sua altitude mdia de 368 metros. O municpio faz divisa com as cidades de Itamb,

    Macarani, Itarantim, Potiragu, Itoror, Itaj do Colnia e Caatiba. Distancia 101 Km de

    Vitria da Conquista, 250 Km de Jequi, 500 Km de Feira de Santana, 140 Km de Itabuna,

    166 Km de Ilhus e 580 Km de Salvador.

    Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) Cidades a

    populao do municpio em 2015, era de 76.881 habitantes. Atualmente, Itapetinga possui

    aproximadamente 30 bairros, sendo os principais: Centro, Primavera, Camac, Clodoaldo

    Costa, Otvio Cames, Jardim Morumbi, Quintas do Morumbi, Quintas do Sul, Amrico

    Nogueira, Recanto da Colina, Vitria Rgia, URBIS, ECOSANE, Conjunto Habitacional

    Osvaldo Brito (Agarradinho), Nova Itapetinga (o mais populoso), Vila Isabel, Vila Rosa, Vila

    Snia, Vila Maria, Vila Susano, Vila Riacho, Clerolndia, So Francisco de Assis, 12 de

    dezembro, Vila rika, Moacir Moura, Jos Ivo, entre outros. Alm disso, o municpio tem um

    distrito: Bandeira do Colnia e um Povoado: Palmares.

    No que diz respeito aos aspectos educacionais7, o municpio atende a Educao

    Infantil na modalidade creche e pr-escola. Atualmente possui 06 creches (5 creches na sede

    7Os dados referentes Educao Infantil foram provenientes de entrevista realizada com a representante da

    Secretria de Educao, no ano de 2014, durante s aproximaes com a rede municipal, por conta da minha

    atuao como professora da disciplina Estagio Supervisionado na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

    (UESB) e Coordenadora da linha de ao Educao Infantil do Programa de Iniciao Docncia (PIBID). No

    entanto, esses dados foram confirmados e atualizados no decorrer dessa pesquisa, no ano de 2016.

    https://pt.wikipedia.org/wiki/2015

  • 29

    e 1 no Distrito de Bandeira do Colnia); a pr-escola composta por 11 escolas (9 escolas

    na sede, 1 no Distrito de Bandeira do Colnia e 1 no povoado de Palmares).

    importante registrar que, nos distritos, a pr-escola ofertada de forma

    multisseriada. Infelizmente essa realidade semelhante maioria dos municpios brasileiros,

    cuja justificativa dos gestores municipais est relacionada ao fato de no haver um nmero

    suficiente de crianas, em determinadas localidades, que justifique organizar, por exemplo,

    turmas especficas para as crianas de 04 e 05 anos. Sendo assim, essas crianas dividem a

    classe com crianas de 06, 07, 08 anos de idade, atendendo a perspectiva da multisseriao.

    Essa diferena entre o atendimento para as crianas do campo e da cidade, evidenciada por

    Campos:

    A expanso horizontal e vertical dos sistemas escolares reflete as

    caractersticas de desigualdade da sociedade: no e a mesma educao que

    chega a todos ou a quase todos e, tambm, no sempre que a educao

    oferecida corresponde as demandas e necessidades dos diversos grupos

    sociais, culturais e tnicos. (CAMPOS, 2013, p.25).

    Rosemberg, por sua vez, corrobora com o pensamento de Campos e acrescenta:

    A histria internacional tem mostrado que a educao infantil no tem

    escapado lgica de produo e reproduo da pobreza via polticas

    pblicas: as crianas mais pobres, de rea rural, mesmo em pases

    desenvolvidos, tendem, via de regra, a frequentar instituies de educao

    infantil de pior qualidade que as crianas no pobres e de rea urbana. Em

    pases com desigualdades sociais intensas, as desigualdades que atingem a

    educao infantil so ainda mais intensas. (ROSEMBERG, 2012, p.19).

    Ainda sobre o atendimento da Educao Infantil no campo, o PME do municpio na

    meta 01, estratgia 1.10, prev: Adequar espaos escolares j existentes na Educao

    Infantil do Campo no municpio para atender a demanda dos alunos em idade de creche

    tambm nas comunidades do campo. (ITAPETINGA, 2015, p.77).

    Em continuidade ao atendimento e acesso na Educao infantil nos ltimos anos,

    apresentaremos, a seguir, a evoluo da matrcula nos anos de 20102014, segundo

    informaes contidas no Plano Municipal de Educao de Itapetinga-Ba (Lei 1.275/2015):

  • 30

    Grfico 3 - Evoluo da matrcula da Educao Infantil em Itapetinga

    1.280

    1.300

    1.320

    1.340

    1.360

    1.380

    1.400

    1.420

    2010 2011 2012 2013 2014

    Linha 1

    Fonte: Plano Municipal de Educao de Itapetinga, 2015. Grfico produzido pela autora

    Conforme apresentado no grfico 3, podemos afirmar que os nmeros demonstram

    uma certa variao no que diz respeito as matrculas, ora com evoluo e ora com quedas.

    Houve um aumento de 9% nas matrculas na pr-escola no ano de 2011 em relao ao ano

    de 2010. No ano de 2012, comparado ao ano de 2011, o ndice caiu em 4,15%. Em 2013,

    em relao a 2012, houve um aumento de 4,7%. No entanto, no ano de 2014, houve uma

    queda de 6% nas matriculas em relao ao ano de 2013.

    Nos anos de 2015 e 2016, segundo informaes da representante da Secretaria de

    Educao, houve um avano significativo no nmero de matrculas: em 2015 foram 1.510

    crianas matriculadas e, no ano de 2016, esse nmero aumentou para 1.800 matrculas. Os

    nmeros comprovam, portanto, a expanso da matrcula no municpio de Itapetinga.

    No que se refere s instalaes fsicas, o tipo de imvel onde funcionam as escolas

    de pr-escolas so prdios prprios do municpio, mas so espaos fsicos inadequados no

    que diz respeito ventilao, iluminao e espao externo para atender as crianas. Acerca

    da infra-estrutura das instituies de Educao Infantil, o documento Parmetros de

    Qualidade para a Educao infantil (BRASIL, 2008) no item 15.1 destaca que:

    espaos, materiais e equipamentos das instituies de Educao Infantil

    destinam-se prioritariamente s crianas[...]so construdos e organizados

    para atender s necessidades de sade, alimentao, proteo, descanso,

    interao, conforto, higiene e aconchego das crianas matriculadas.

    (BRASIL, 2008, p. 42).

  • 31

    O documento no item 15.8 orienta, ainda, que o ambiente interno e externo das

    instituies de Educao Infantil seja mais bonito, instigante e aconchegante (Ibidem,

    p. 43).

    Nessa direo, vale salientar que as duas escolas, nas quais realizamos a pesquisa,

    tm espaos fsicos inadequados. Na Escola I, apesar do amplo espao externo, esse

    muito acidentado, necessitando de intervenes urgentes relacionadas a servios de

    terraplanagem para que as crianas possam usufruir o direito de aprender em outro espao,

    alm da sala de aula. Nessa mesma escola, as salas tambm so amplas, mas a ventilao e

    a iluminao so bastante comprometidas. Na escola II, por sua vez, o espao externo da

    escola, alm de ser muito pequeno, tambm apresenta perigo para s crianas, pois h

    escadas e terrenos em declive. As salas tambm so amplas, mas tambm no so

    ventiladas.

    Acerca da melhoria da rede fsica das escolas de Educao Infantil, o PME do

    municpio prev na estratgia 1.2 da meta 1:

    1.2) Manter e ampliar, em regime de colaborao com a Unio e respeitando as

    normas de acessibilidade, programa nacional de construo e reestruturao de

    escolas, bem como de aquisio de equipamentos, visando expanso e

    melhoria da rede fsica de escolas pblicas de Educao Infantil at o terceiro

    ano de vigncia do PME. (ITAPETINGA, 2015, p. 76).

    No que concerne ao nmero de crianas em cada turma, o municpio est distante da

    recomendao do parecer do Conselho Nacional de Educao (CNE) e do Conselho da

    Educao Bsica (CEB) 20/2009, que se refere reviso das Diretrizes Curriculares

    Nacionais para a Educao Infantil, aprovado em 11/11/2009 que , de aproximadamente,

    uma proporo de seis a oito crianas de zero a um ano por professor, de quinze crianas de

    dois a trs anos por professor e de vinte crianas de quatro e cinco anos por professor. No

    caso das turmas de 04 e 05 anos das escolas do municpio so matriculadas 25 crianas e h,

    apenas, uma professora regente para atender essas crianas e no se dispe de mais outra

    professora para realizao de um trabalho em conjunto na mesma turma. Somente nas turmas

    de 03 anos h a presena de um educador auxiliar (nomenclatura usada pela rede

    municipal), alm da professora regente para atender 25 crianas.

    As dificuldades enfrentadas pelo municpio nos faz retomar o debate relativo

    evoluo do acesso educao infantil e os desafios da qualidade para essa etapa a partir do

    que prev o Plano nacional de Educao (2011-2024), onde Campos, Esposito e Gimenes

    alertam que:

  • 32

    [...] corre-se, assim, o risco de repetir, na vigncia desse segundo plano, a

    sina de metas muito ambiciosas permanecerem restritas ao papel, enquanto a

    vida real segue seu curso. Comparativamente, a maioria das estratgias

    parece tmida frente a esses desafios, especialmente algumas que tocam em

    condies bsicas de qualidade, como, por exemplo, a formao inicial dos

    professores. Esse relativo desequilbrio pode sinalizar algo que a histria da

    educao brasileira mostra de forma eloquente: a expanso do atendimento

    realizada custa da perda de qualidade. (CAMPOS; ESPOSITO; GIMENES

    2014, p.349).

    importante destacar que a pesquisa est focada na pr-escolar, em turmas de 04 e

    05 anos, mas no podemos deixar de evidenciar que, apesar do municpio atender a

    demanda por vaga para as crianas de 04 e 05 anos, h lista de espera para as crianas de 0

    a 3 anos, segundo informaes da coordenadora da Educao Infantil. Como participa do

    programa Proinfncia, o municpio conta com a construo de duas creches para atender

    essa demanda de 0 a 3 anos. Acerca disso, o Plano Municipal de Educao do municpio -

    PME (Lei 1.275/2015) apresenta a seguinte diagnstico do atendimento em creche:

    [...] a procura pela matrcula grande principalmente nas creches, pelas

    razes bvias dos pais sarem para trabalhar e muitas vezes no terem onde

    deixar os seus filhos, e/ou, em outros casos, garantir a vaga na creche em

    razo da famlia ser carente e, nesse caso, ter a garantia dos cuidados

    essenciais, alm do mais importante, a alimentao. [...] (ITAPETINGA,

    2015, p. 18).

    A partir das informaes apresentadas pela coordenadora da Educao Infantil do

    municpio e da indicao do PME quanto procura de vagas para atender a demanda da

    creche, deduzimos que o municpio de Itapetinga prioriza a faixa etria de 04 e 05 anos, mais

    prxima do ensino fundamental, excluindo do sistema educacional a maior parte das crianas

    de 0 a 03 anos, negando o direito das crianas educao, assegurado na Constituio

    Federal de 1988.

    Concernente aos 59 profissionais que atuam na Educao Infantil, o municpio

    apresenta o seguinte quadro, quanto ao vnculo empregatcio, funo e carga horria semanal

    de trabalho:

    Quadro 1 Vnculo empregatcio dos professores da Educao Infantil

    Fonte: Secretaria de Educao de Itapetinga, 2014. Tabela produzida pela autora

    Efetivos Contratados

    38 21

  • 33

    Quadro 2 Funo dos professores da Educao Infantil

    Fonte: Secretaria de Educao de Itapetinga, 2014. Tabela produzida pela autora

    Quadro 3 - Carga horria semanal dos professores da Educao Infantil

    Fonte: Secretaria de Educao de Itapetinga, 2014. Tabela produzida pela autora

    Quanto a formao acadmica, 3 professores (6% do total) possuem formao em

    nvel de ensino mdio; 56 professores (94%) graduao em Pedagogia e 42 professores

    (72%) professoras possuem ps graduao lato sensu.

    Vale a pena destacar que Itapetinga avanou no quesito formao inicial de

    professores, pois apesar da LDBEN (BRASIL, 1996) ter sofrido alteraes a partir da

    Emenda Constitucional 59/2009 e continuar admitindo a formao em nvel mdio como a

    mnima exigida para o exerccio da docncia na primeira etapa da educao bsica, a maior

    parte dos professores que atuam na pr-escola j possui nvel superior.

    Contudo, em relao aos profissionais que atuam na creche, ainda h discrepncia em

    relao aos professores da pr-escola, quanto a formao dos professores. Acerca disso, o

    Plano Municipal de Educao informa:

    Convm ressaltar que a maioria dos docentes, dos servidores que atuam

    como auxiliares de sala, monitores que atuam com alunos em sala de aula da

    rede municipal que at ento s possuam o Ensino Mdio completo e outros

    incompleto (como era o caso de muitos auxiliares de sala), j esto em

    formao em nvel superior, no Programa Plataforma Freire, do Governo

    Federal em parceria com a Prefeitura Municipal/Secretaria Municipal de

    Educao e UESB Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, outros j

    concluram ou esto em fase final dos cursos de licenciaturas ou graduaes.

    (ITAPETINGA, 2015, p. 58).

    Em relao faixa etria, a mdia de idade dos professores da Educao Infantil de

    30 a 50 anos, incluindo os regentes da pr-escola e os auxiliares de classe da creche. No que

    Regente Auxiliar

    19 40

    20 h 40 h

    25 34

  • 34

    se refere ao nmero de escolas em que atuam, predomina o nmero de professores que

    trabalham em uma nica escola em uma mdia de 60% do nmero de professores nessa

    condio. Vale ressaltar que no h homens atuando nas escolas de Educao Infantil do

    municpio. Essa realidade, constatada pelos graduandos do curso de Pedagogia da

    Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia durante os estgios supervisionados e as

    monitorias didticas do Programa de Iniciao Docncia - PIBID tem favorecido o

    aumentado do nmero de pesquisas, em nvel de graduao, para essa realidade.

    Em suma, o perfil da Educao Infantil no municpio de Itapetinga, a partir dos dados

    apresentados, evidencia que houve expanso de matrculas nesse segmento de ensino. No

    entanto, paralelamente as lutas em prol da garantia do acesso, deslocamos nossa preocupao

    para a nfase na qualidade da Educao Infantil. A esse respeito, Casassus afirma ao

    substituir o discurso e as polticas de igualdade de oportunidades pelo discurso e polticas da

    qualidade dissociou-se a questo da qualidade de uma poltica de igualdade. (CASASSUS,

    apud CAMPOS, 2013, p.25).

    Sendo assim, algumas estratgias so urgentes para a garantia da qualidade do

    trabalho com as crianas da Educao Infantil no municpio de Itapetinga, a saber: definio

    de uma poltica de atendimento para as crianas da educao infantil do campo; aumento do

    nmero de vagas para o pblico de 0 a 03 anos; construo de novos espaos para pr-escola

    para reorganizar o nmero de crianas por turma; reforma e/ou ampliao das escolas de

    educao infantil para garantir espaos fsicos adequados para a aprendizagem das crianas

    e, principalmente, uma poltica de formao continuada que atenda as necessidades dos

    professores da Educao Infantil.

    2.2 LCUS E SUJEITOS ENVOLVIDOS NA PESQUISA

    Apresentaremos a seguir a caracterizao das escolas pesquisadas, seguido do

    perfil8dos profissionais que atuam em cada uma delas.

    As escolas foram identificadas como Escola I e Escola II. Os professores, por sua

    vez, foram identificados como professores A, B, C (escola I) e as professoras D, E, F, G, I, J

    (escola II).

    8Ver questionrio com o perfil dos docentes no apndice E

  • 35

    A escola I atende crianas de 03, 04 e 05 anos nos turnos matutino e vespertino. Essa

    escola parceira do Programa Institucional de Iniciao Docncia (PIBID) no Subprojeto

    de Pedagogia, linha de ao Educao Infantil e atende a sete bolsistas discentes do curso de

    Pedagogia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia- UESB, distribudos em quatro

    turmas da escola.

    Quanto ao perfil das profissionais, h trs professoras regente, efetivas na rede

    municipal de ensino que atuam entre 03 e 12 anos na Educao infantil e esto na faixa

    etria entre 40 e 50 anos de idade.

    Em relao formao das entrevistadas das 3 docentes da Escola I, apenas 1 no

    tem graduao. As outras duas possuem graduao e ps-graduao, sendo que uma delas

    cursou o Magistrio tambm.

    Sobre a participao das professoras em curso de formao apenas duas no

    participaram de nenhum curso de formao, enquanto que as outras realizaram cursos.

    Apenas a professora B participou de dois cursos de formao continuada, promovidos pela

    Secretaria Municipal de Educao, saber: em 2003 (palestra sobre as prticas de Educao

    Infantil) e em 2015 (palestra sobre reas dos saberes da Educao Infantil).

    A escola II atende crianas de 04 e 05 anos nos turnos matutino e vespertino, bem

    como crianas de 06 anos (primeiro ano do Ensino Fundamental). Essa escola, tambm,

    parceira do Programa Institucional de Iniciao Docncia PIBID no Subprojeto de

    Pedagogia, linha de ao Educao Infantil e atende a seis bolsistas discentes do curso de

    Pedagogia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia- UESB, distribudos em trs

    turmas da escola.

    No que se refere ao perfil das profissionais, a escola II tem seis professoras regentes,

    efetivas na rede municipal de ensino que atuam entre 08 e 24 anos na Educao infantil e

    esto na faixa etria entre 30 e 40 anos de idade. Quanto a escolaridade, todas as professoras

    da Escola II tem formao em Magistrio e so graduadas; apenas uma, no tem ps-

    graduao lato-sensu. Referente a participao em Cursos de Formao Continuada nos

    ltimos trs anos, todas participaram.

  • 36

    2.3 PROCEDIMENTOS DE PESQUISA

    Apresentaremos o percurso que realizamos para a coleta dos dados da presente

    pesquisa tanto da entrevista com representante da Secretaria de Educao quanto do grupo

    focal com as professoras.

    Inicialmente, no ano de 2016, fizemos um contato com a secretaria municipal de

    educao para assinatura do documento de autorizao para coleta de dados9 e agendamento

    da realizao da entrevista10

    com representante da prpria Secretaria de Educao11

    .

    Durante a entrevista, identificamos a disponibilidade e a seriedade da representante

    da secretaria em participar da pesquisa. Permitimos que a entrevistada escolhesse o horrio e

    o local a fim de garantir tranquilidade durante toda a entrevista.

    Em seguida, fizemos o contato com as diretoras de duas escolas da rede municipal

    para organizao da execuo da tcnica do Grupo Focal (data, horrio, local, contato com

    as professoras). A escolha das escolas est relacionada ao fato de que, essas escolas s

    atendem ao segmento da Educao Infantil e possuem um nmero maior de profissionais

    atuando. Finalmente, o contato com um colaborador para orientaes sobre os registros

    escritos, gravaes em udios durante a tcnica do grupo focal.

    Aps todos os encaminhamentos supracitados, executamos a tcnica do grupo focal

    com as professoras. No entanto, vale enfatizar que, de acordo com os estudos de Gomes

    (2005), que necessrio se faz, antes da apresentao da anlise das falas, fazer uma

    apreciao dos comportamentos e das reaes dos participantes durante a realizao da

    sesso do grupo, considerando os seguintes elementos:

    [...] o contexto da informao, concordncia das opinies, respostas de

    experincias pessoais, ideias principais, comportamentos dos participantes,

    gestos, reaes, sentimentos, entusiasmo, dificuldades de compreenso das

    perguntas feitas. (GOMES, 2005, p. 287).

    Ao chegarmos tanto na escola I quanto na escola II, realizamos, de imediato, o

    agradecimento a todos as professoras presentes e, posteriormente, informamos o objetivo da

    pesquisa seguido da leitura e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido12

    e

    9Ver Termo de autorizao para pesquisa no apndice B

    10Ver entrevista no apndice G

    11 Devido mudana de gesto do governo municipal da cidade, a coordenadora da Educao Infantil,

    esclareceu que estava muito atarefada com produo de relatrios, com o processo de transio para a nova

    gesto e informou que tinha disponibilidade para responder um questionrio. Sendo assim, aceitamos colher os

    dados atravs do questionrio e os apresentamos na etapa de qualificao da presente pesquisa. Aps a

    qualificao conseguimos agendar e realizar uma entrevista, no ano de 2017, com a ex-coordenadora da

    Educao Infantil da Secretaria Municipal de Educao. 12

    Ver o termo de Consentimento livre e esclarecido no apndice A

  • 37

    preenchimento, por cada professora, do questionrio com dados sobre o seu perfil

    profissional. Em seguida, fizemos uma pequena explanao sobre a tcnica do grupo focal e

    a leitura do roteiro13

    para o encontro, seguido da leitura das regras14

    para o funcionamento do

    grupo e das questes centrais15

    que norteariam a discusso.

    O grupo focal aconteceu no final do ano letivo de 2016 na Escola I. Durante toda a

    realizao da atividade, percebemos certa angstia das professoras em relao temtica

    debatida formao continuada de professores. Ainda demonstraram insatisfao em relao

    ao acompanhamento do trabalho realizado pela escola atravs da Secretaria de Educao. De

    modo geral, no houve discordncias em relao s opinies. No entanto, houve dificuldades

    no entendimento de algumas questes, sendo necessrios, desse modo, os devidos

    esclarecimentos. Durante o grupo focal, percebemos o quanto as professoras utilizam de

    experincias pessoais para expressar as opinies sobre as questes levantadas.

    Na escola II, efetuamos a tcnica do grupo focal no incio do ano letivo do ano de

    2017 durante programao da Jornada Pedaggica, na qual a diretora disponibilizou uma

    manh para a realizao da tcnica com as professoras. Houve uma intensa participao das

    professoras durante toda a tcnica e um sentimento de expectativa e entusiasmo em relao

    ao ano letivo de 2017, pois, alm dos novos colegas que agora compunham o quadro da

    escola, uma das professoras assumiu a direo. Tambm identificamos certa insatisfao

    acerca do acompanhamento da secretaria de educao na escola, bem como no houve

    discordncias sobre as opinies e as questes foram entendidas pelos participantes. Tambm

    foi identificado o uso das experincias pessoais para manifestar as posies sobre as

    questes do grupo focal.

    13

    Ver roteiro para o encontro do Grupo Focal no apndice C 14

    Ver as regras do grupo focal no apndice D 15

    Ver questes centrais para o grupo focal no apndice F

  • 38

    3. O CAMPO DE TENSO ENTRE POLTICAS PBLICAS E A FORMAO

    CONTINUADA DE PROFESSORES DA EDUCAO INFANTIL NO BRASIL

    Neste captulo apresentaremos pontos que retratam o cenrio da formao dos

    professores no pas em aspectos que perpassam pelo processo histrico, marcos legais,

    polticas pblicas, em um contexto de conflitos e contradies, evidenciando os desafios para

    a formao continuada de professores da educao Infantil.

    Indiscutivelmente Marx representa um marco a partir do qual no mais possvel

    pensar ou agir em poltica, histria ou qualquer cincia desconhecendo sua proposta. Buscou

    analisar a gnese das sociedades humanas, suas estruturas econmicas, sociais, polticas,

    ideolgicas e os vnculos que mantm entre si com suas contradies internas, evidenciando

    o seu compromisso com a transformao social e com a articulao entre o pensamento e a

    ao.

    Nesse sentido, a partir da sua obra O capital (MARX, 1986), o Estado

    compreendido como sociedade poltica que exerce uma violncia, de forma organizada,

    contra a sociedade civil, atravs das relaes econmicas e de produo. Sendo assim, as

    polticas pblicas, principalmente as de carter social, participam dessa correlao de foras

    e so mediatizadas por lutas, presses e conflitos.

    O termo poltica est relacionado ao poder do Estado com a inteno de legislar e

    executar as atividades humanas em um determinado territrio. As polticas educacionais, por

    sua vez, tambm expressam as contradies, pois, segundo Shiroma, Moraes e Evangelista

    (2011, p. 09) ao longo da histria, a educao [...] adapta-se aos modos de formao tcnica

    e comportamental adequado produo e reproduo das formas particulares de organizao

    do trabalho e da vida.

    Nessa direo, cumpre ressaltar que a profissionalizao docente no Brasil aconteceu

    em decorrncia das profundas transformaes econmicas e sociais por volta do sculo XIX,

    incio do sculo XX, com a criao das Escolas Normais. A partir da comeou-se a pensar

    em preparar algum para ensinar e as Escolas Normais que correspondiam, na poca, ao

    nvel secundrio e, posteriormente, a partir de meados do sculo XX, ao Ensino Mdio. Elas

    continuaram a fazer a formao dos professores para os primeiros anos do ensino

    fundamental e a educao infantil.

    Destacaremos as contribuies de Saviani (2009) no que se refere aos aspectos

    histricos na formao de professores no Brasil. O autor afirma que a questo do preparo de

    professores, no Brasil, emerge de forma explcita aps a Independncia, quando se cogita da

  • 39

    organizao da instruo popular. O autor ainda acrescenta que, ao examinar-se a questo

    pedaggica em articulao com as transformaes que se processaram na sociedade

    brasileira ao longo dos ltimos dois sculos, pode-se distinguir os seguintes perodos na

    histria da formao de professores no Brasil:

    1. Ensaios intermitentes de formao de professores (1827-1890). Esse

    perodo se inicia com o dispositivo da Lei das Escolas de Primeiras Letras,

    que obrigava os professores a se instruir no mtodo do ensino mtuo, s

    prprias expensas; estende-se at 1890, quando prevalece o modelo das

    Escolas Normais.

    2. Estabelecimento e expanso do padro das Escolas Normais (1890-1932),

    cujo marco inicial a reforma paulista da Escola Normal tendo como anexo a

    escola-modelo.

    3. Organizao dos Institutos de Educao (1932- 1939), cujos marcos so as

    reformas de Ansio Teixeira no Distrito Federal, em 1932, e de Fernando de

    Azevedo em So Paulo, em 1933.

    4. Organizao e implantao dos Cursos de Pedagogia e de Licenciatura e

    consolidao do modelo das Escolas Normais (1939-1971).

    5. Substituio da Escola Normal pela Habilitao Especfica de Magistrio

    (1971-1996).

    6. Advento dos Institutos Superiores de Educao, Escolas Normais

    Superiores e o novo perfil do Curso de Pedagogia (1996-2006). (SAVIANI,

    2009, p. 143).

    Destacamos, portanto, que as Escolas Normais (1827-1890) nortearam a preparao de

    professores para as escolas primrias, considerando-se orientaes pedaggico-didticas. No

    entanto, segundo Saviani (2009):

    contrariamente a essa expectativa, predominou nelas a preocupao como

    domnio dos conhecimentos a serem transmitidos nas escolas de primeiras

    letras. O currculo dessas escolas era constitudo pelas mesmas matrias

    ensinadas nas escolas de primeiras letras. Portanto, o que se pressupunha era

    que os professores deveriam ter o domnio daqueles contedos que lhes

    caberia transmitir s crianas, desconsiderando-se o preparo didtico-

    pedaggico. (IDEM, p. 144).

    Prosseguindo, aps a primeira dcada republicana (1890 1932), uma nova fase se

    abriu com o advento dos institutos de educao concebidos como espaos de cultivo da

    educao, encarada no apenas como objeto do ensino mas tambm da pesquisa. (Idem,

    145).

    Desse modo, no perodo de 1932 a 1971, os Institutos de Educao do Distrito

    Federal e de So Paulo foram tornando-se a base dos estudos superiores de educao - trs

    anos para o estudo das disciplinas especficas e um ano para a formao didtica. (Idem,

    146). No entanto, o golpe militar de 1964 provocou mudanas educacionais, de acordo com

    a lei n. 5.692/71(BRASIL, 1971) que ocasionou a extino das Escolas Normais. Em seu

  • 40

    lugar foi instituda a habilitao especfica de 2 grau para o exerccio do magistrio de 1

    grau.

    Posteriormente, em 1980, propagou-se um grande movimento pela reformulao dos

    cursos de Pedagogia e licenciatura, atribuindo, portanto, aos cursos de Pedagogia a formao

    de professores para a Educao Infantil e para as sries iniciais do Ensino Fundamental.

    Saviani (2009), porm, faz o seguinte alerta:

    Com efeito, por um lado, a elevao ao nvel superior permitiria esperar que,

    sobre a base da cultura geral de base clssica e cientfica obtida nos cursos de

    nvel mdio, os futuros professores poderiam adquirir, nos cursos formativos

    de nvel superior, um preparo profissional bem mais consistente, alicerado

    numa slida cultura pedaggica. Por outro lado, entretanto, manifesta-se o

    risco de que essa formao seja neutralizada pela fora do modelo dos

    contedos culturais-cognitivos, com o que as exigncias pedaggicas

    tenderiam a ser secundarizadas. Com isso, esses novos professores tero

    grande dificuldade de atender s necessidades especficas das crianas

    pequenas, tanto no nvel da chamada educao infantil como das primeiras

    sries do ensino fundamental. (SAVIANI, 2009, p. 150).

    Em 1996, mesmo diante da instaurao do projeto neoliberal dos anos 90, ocorre um

    amplo debate da sociedade, envolvendo, por exemplo, mobilizaes de educadores e

    movimentos sociais e promulga-se a Lei de Diretrizes e Bases da Educao (LDBEN

    9394/96). O texto da LDB 9394/96 prev no Ttulo VI dos profissionais da educao no

    artigo 62 que a formao inicial de professores da Educao Infantil, dar-se- no ensino

    superior, admitindo-se, no entanto, como formao mnima, o magistrio.

    Em continuidade, a LDBEN 9394/96 dedica no ttulo VI, em seus artigos 63 a 67 aos

    profissionais da educao, definindo mais outro campo de formao no mbito do

    magistrio, alm da formao inicial: a contnua, que deve ser oferecida aos profissionais da

    educao dos diversos nveis de ensino. Especificamente no artigo 67, estabelece que:

    os sistemas de ensino promovero a valorizao dos profissionais da

    educao, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos

    de carreira do magistrio pblico:

    [ ...]

    II aperfeioamento profissional continuado, inclusive com licenciamento

    peridico remunerado para esse fim;

    [...]. (BRASIL, 1996).

    Consequentemente, Gatti (2008) informa que nos ltimos anos do sculo XX,

    tornou-se forte, [...] a questo da imperiosidade de formao continuada como um requisito

    para o trabalho, [...]. A educao continuada foi colocada como aprofundamento e avano

  • 41

    nas formaes dos profissionais. importante destacar que Gatti (2011) afirma que as

    pesquisas acadmicas no colaboram na definio do conceito de formao continuada.

    Segundo a autora:

    Ora se restringe o significado da expresso aos limites de cursos estruturados

    e formalizados oferecidos aps a graduao, ou aps o ingresso no exerccio

    do magistrio, ora ele tomado de modo amplo e genrico, como

    compreendendo qualquer tipo de atividade que venha a contribuir para o

    desempenho profissional horas de trabalho coletivo na escola, reunies

    pedaggicas, trocas cotidianas com os pares, participao na gesto escolar,

    congressos, seminrios [...], enfim, tudo que possa oferecer ocasio de

    informao, reflexo, discusso e trocas que favoream o aprimoramento

    profissional, em qualquer de seus ngulos, em qualquer situao. Uma

    vastido de possibilidades dentro do rtulo de educao continuada. (GATTI, 2011, p. 185).

    Gomes, por sua vez, discorre sobre o conceito histrico de formao continuada:

    [...] originalmente tal conceito advm daquele de educao permanente,

    surgido na Europa com a necessidade dos pases de ps-guerra de superar os

    limites da educao formal. Entendida ainda como um processo ininterrupto

    de aprofundamento, diferentes nomenclaturas servem para design-la. De

    maneira geral, organiza-se na forma de cursos espordicos de curta durao,

    propostos, via de regra, por equipes tcnicas e de gesto administrativa e que

    se apresentam, muitas vezes, desvinculados das necessidades reais de

    formao dos agentes educacionais atuantes na escola. (GOMES, 2009, p. 68).

    O Plano Nacional de Educao, por sua vez, (Lei 13.005 de 25/06/2014) estabelece

    os rumos da educao brasileira para vigncia 2014-2024. O documento, na meta 16, trata

    especificamente da formao continuada:

    Meta 16: formar, em nvel de ps-graduao, 50% (cinquenta por cento) dos

    professores da educao bsica, at o ltimo ano de vigncia deste PNE, e

    garantir a todos (as) os (as) profissionais da educao bsica formao

    continuada em sua rea de atuao, considerando as necessidades, demandas

    e contextualizaes dos sistemas de ensino. (BRASIL, 2014).

    J as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formao inicial e para a formao

    continuada (Resoluo n 2, de 1 de julho de 2015), por sua vez, define a formao

    continuada como componente essencial da profissionalizao docente, devendo integrar-se

    ao cotidiano da instituio educativa e considerar os diferentes saberes e a experincia

    docente, bem como o Projeto Pedaggico da Instituio de Educao Bsic