UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARA PRÓ-REITORA DE … filemestrado profissional em planejamento e...

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARA PRÓ-REITORA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS MESTRADO PROFISSIONAL EM PLANEJAMENTO E POLÍTICAS PÚBLICAS SULAMITA TORRES DE OLIVEIRA ANÁLISE DA IMPLANTAÇÃO DA POLÍTICA DE ENSINO MÉDIO INTEGRADO À EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO ESTADO DO CEARÁ: AS EEEPS DE REDENÇÃO E ARACOIABA FORTALEZA - CEARÁ 2016

Transcript of UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARA PRÓ-REITORA DE … filemestrado profissional em planejamento e...

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARA

PR-REITORA DE PS-GRADUAO E PESQUISA CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS

MESTRADO PROFISSIONAL EM PLANEJAMENTO E POLTICAS PBLICAS

SULAMITA TORRES DE OLIVEIRA

ANLISE DA IMPLANTAO DA POLTICA DE ENSINO MDIO INTEGRADO EDUCAO PROFISSIONAL NO ESTADO DO CEAR: AS EEEPS DE

REDENO E ARACOIABA

FORTALEZA - CEAR 2016

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SULAMITA TORRES DE OLIVEIRA

ANLISE DA IMPLANTAO DA POLTICA DE ENSINO MDIO INTEGRADO EDUCAO PROFISSIONAL NO ESTADO DO CEAR: AS EEEPS DE

REDENO E ARACOIABA

Dissertao apresentada ao Curso de Mestrado Profissional em Planejamento e Polticas Pblicas do Programa de Ps-Graduao em Polticas Pblicas e Sociedade do Centro de Cincias Sociais Aplicadas, da Universidade Estadual do Cear, como requisito parcial obteno do ttulo de mestre em Polticas Pblicas e Sociedade. reas de concentrao: Polticas pblicas Orientador: Prof. Dr. Antnio Germano Junior.

FORTALEZA-CEAR

2016

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4

Dedico este trabalho ao meu velho

Juarez Garcia, pelo apoio e pela crena

depositados em mim. Que o meu lugar

seja sempre ao lado teu.

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AGRADECIMENTOS

Querido Deus, desta vez no quero pedir! Quero somente agradecer! Agradeo pela

vida, pela famlia e pelos amigos.

Agradeo de corao s mulheres guerreiras, corajosas, que so o sustentculo da

minha existncia neste planeta: Antnia da Silva Torres, minha me, e Nilza Garcia

da Silva, minha sogra. Obrigada pelo carinho, vocs so minha fortaleza.

Agradeo aos meus filhos, meu maior orgulho, minha vida, um pedao de mim, que

estiveram o tempo todo me incentivando, sempre cuidando de mim.

Agradeo s minhas noras, pelo carinho e pela compreenso, suas palavras de

motivao me encheram de energia para dar conta do que parecia impossvel.

Agradeo s minhas irms e aos meus irmos, pela amizade sincera e pelas

palavras de encorajamento.

Agradeo minha netinha Ana Beatriz, que muitas vezes, na sua inocncia, dizia:

estude, voinha, vou lhe fazer companhia. Obrigada, meu amor, voc muito me

motivou.

Agradeo ao meu orientador, Dr. Antonio Germano Magalhes Junior, por toda a

disponibilidade, pacincia, rigor, apoio e competncia nas orientaes.

Agradeo aos companheiros do mestrado, pelo incentivo e companheirismo, em

especial colega Ida Cabral, pela companhia de todos os dias no trajeto da UECE

ao terminal, encurtando minha longa estrada.

Agradeo s Coordenadoras da CREDE8, Jucineide Fernandes e Joyce Santana, e

aos Orientadores da CEDEA8, urea Martins e Clerto Alves, pela sensibilidade,

pelas palavras de incentivo e por me possibilitar a realizao do mestrado.

Agradeo aos meus colegas de trabalho, que sempre compreenderam a importncia

do mestrado para mim, em especial a Superintendente das EEEPs, Elodina Franco,

que sempre disponibilizou documentos para viabilizar minha pesquisa.

Agradeo comunidade educativa da EEEP Adolfo Ferreira de Sousa e da EEEP

Salomo Alves de Moura, por compartilhar comigo seus sonhos, seus desejos, suas

expectativas e seus desafios, o que muito me ajudou a entender essa poltica no

mbito da escola.

6

Agradeo aos professores Germano Junior, Rejane Bezerra, Horcio Frota, Helena

Frota, Alexandre Almeida, Josnio Parente, Hermano Machado, Lia Machado,

Liduina Farias, Paulo Cesar Batista, por todos os ensinamentos.

Agradeo ao secretrio do Curso de Mestrado, Cristi Gomes, por todas as vezes

em que me ajudou quando eu mais precisava.

Agradeo aos universitrios companheiros de viagens, que muitas vezes dividiam ou

at mesmo cediam um lugar no nibus, para que eu me acomodasse melhor durante

o percurso todas as noites. Meu sincero agradecimento pelo apoio.

7

RESUMO

O objeto de investigao deste trabalho a poltica pblica de ensino mdio

integrado educao profissional. A temporalidade estabelecida para este estudo

um recorte a partir da Lei de Diretrizes e Bases Nacional LDB n 9394/96 at o ano

de 2014. Nesse recorte, contextualizamos o Decreto n 2.208/97 lgica da

produo e o Decreto n 5.154/04 lgica da educao. O objetivo compreender

como se deu o processo de implantao e desenvolvimento dessa poltica em duas

escolas profissionais no Macio de Baturit. As fontes utilizadas so as entrevistas

realizadas com os gestores, a coordenadora de estgio, os alunos, o

superintendente, o orientador da CEDEA8 e o representante da COEDEP; todos

atuam no campo da educao profissional e concordaram em participar do presente

estudo. Utilizamos os documentos das instituies SEDUC e EEEP. Da SEDUC, o

relatrio de gesto O pensar e o fazer da educao profissional no Cear 2008 a

2014 e da EEEP o Currculo Escolar Integrao entre as disciplinas do ensino

mdio e dos cursos tcnicos e o Regimento Interno; todos possuem relao com

essa modalidade de ensino. Para essa anlise, o referencial terico-metodolgico se

compe dos estudos de Gaudncio Frigotto (2005), Maria Ciavatta (2005), Marise

Ramos (2005) e Accia Kuenzer (2003), com reconhecida contribuio no que se

refere trajetria da educao profissional no Brasil. Contudo, delineamos esta

pesquisa na perspectiva do direcionamento que essa poltica contribuiu e vem

contribuindo para que a juventude cearense seja inserida no mercado de trabalho ou

para dar prosseguimento aos seus estudos em nvel superior.

Palavras-chave: Educao. Ensino Mdio Integrado. Educao Profissional.

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ABSTRACT

The research object of this work is the public policy of integrated high school

vocational education. The temporality established for this study is an excerpt from the

Guidelines and National Framework Law - LDB n. 9394/96 by the year 2014. In that

contextualize cut Decree 2.208/97 will logic of production and Decree 5.154/04, will

logical education. The goal is to understand how was the process of implementation

and development of this policy in two vocational schools in the Massif Baturit. The

sources used are the interviews with managers, internship coordinator, students,

superintendent, supervisor of CEDEA8 and representative COEDEP, all work in the

field of education and agreed to participate in this study. We use the documents of

the institutions, and SEDUC EEEP. The SEDUC, the management "Thinking and

doing vocational education in Cear - 2008-2014" report and EEEP the School

Curriculum "Integration of high school courses and technical courses" and the Rules

of Procedure that are related to this type of education. For this analysis, the

theoretical framework is composed of studies Gaudncio Frigotto (2005), Maria

Ciavatta (2005), Marise Ramos (2005) and Acacia Kuenzer (2009) with recognized

contribution as regards the history of education in Brazil. However we outlined this

research in view of the direction that the policy has contributed and is contributing to

the Cear youth to be inserted in the labor market or to continue their studies at a

higher level.

Keywords: Education. Integrated High School. Professional Education.

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LISTA DE ILUSTRAES

Quadro 1 O desenvolvimento da educao profissional no cear, no decorrer dos anos de 2008 a 2014...........................................

53

Quadro 2 evoluo dos alunos da 1, 2 e 3 sries do ensino mdio das escolas regulares e das escolas estaduais de educao profissional em proficincia em portugus e matemtica..................................................................................

87

Quadro 3 Relao dos alunos que ingressaram na universidade e/ou inseridos no mercado de trabalho (2014 2014..........................................................................................

124

Tabela 1 Padres de desempenho/spaece......................................... 120

10

LISTA DE GRFICOS

Grfico 1 - Alunos com ciclo completo de formao profissional

integrada ao ensino mdio no Cear...................................

81

Grfico 2 - Nmero de egressos das escolas estaduais de educao

profissional inseridos no mercado de trabalho, no Cear, de

2011 a 2014..............................................................................

91

Grfico 3 - Nmero de egressos das escolas estaduais de educao

profissional aprovados na universidade, no Cear, de 2011 a

2014.......................................................................................

91

Grfico 4 - Comparao percentual entre a insero de egressos das

escolas estaduais de educao profissional no mercado de

trabalho e aprovao na universidade, no Cear, de 2011 a

2014.......................................................................................

93

Grfico 5 - Apresentao detalhada em percentual da insero no

mercado de trabalho, da aprovao de alunos em

universidades e de ambas as escolhas e representao

geral.........................................................................................

93

Grfico 6 - Percentual correspondente entre a rea tcnica cursada e a

atividade profissional desempenhada......................................

94

Grfico 7 - Percentuais comparativos de interiorizao da poltica de

educao profissional nos grupos de municpios de mdio e

pequeno porte.......................................................................

96

Grfico 8 - Aprovao na universidade de alunos das escolas estaduais

de educao profissional, por natureza jurdica dos

estabelecimentos de ensino, nos anos de 2013 e 2014, no

cear..................................................................................

96

Grfico 9 - Dados de rendimentos internos das 1s sries da AFS de

2008 a 2014.............................................................................

117

Grfico 10 - Dados de rendimentos internos das 2s sries da afs de 2008

a 2014.......................................................................................

118

Grfico 11 - Dados de rendimentos internos das 3s sries da afs de 2008

a 2014..................................................................................

119

11

Grfico 12 Dados de resultados externos (spaece) das 1s sries da afs

de 2008 a 2015................................................................

120

Grfico 13 - Dados de resultados internos (spaece) das 2s sries da afs

de 2009 a 2012. Vale destacar que em 2013 na 2 srie o

resultado foi amostral.........................................................

121

Grfico 14 - Dados de resultados internos (spaece) das 3s sries da afs

de 2009 a 2012, destaque para 2013, que na 3 srie o

resultado foi amostral.........................................................

121

Grfico 15 - Premiao com computadores (spaece+enem) aos alunos da

afs de 2008 a 2015........................................................

123

Grfico 16 - Resultados do enem, mdia geral com e sem a redao da

eeep (afs) de 2011 a 2014.................................................

123

Grfico 17 - Rendimentos internos da sam no ano de 2015 e matrcula do

ano de 2016............................................................................

126

Grfico 18 - Total de educandos que tiraram notas satisfatrias na

redao. Enem - 2015. 1 srie do ensino mdio na eeep

(sam).........................................................................................

127

Grfico 19 - Proficincia em lngua portuguesa 1 srie....................... 128

Grfico 20 - Proficincia em matemtica 1 srie.................................... 129

Grfico 21 - Resultado geral da escola proficincia em lngua portuguesa

e matemtica 1 srie ........................................................

129

12

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Fluxo de dilogo do(a) superintendente: um elo de

fortalecimento na gesto das eeeps no cear....................

75

Figura 2 - Rota de orientao de estgio 1........................................... 111

Figura 3 - Rota de orientao de estgio 2........................................... 111

Figura 4 - Rota de orientao de estgio 3........................................... 111

Figura 5 - Rota de orientao de estgio 4........................................... 112

Figura 6 - Rota de orientao de estgio 5........................................... 112

Figura 7 - Rota de orientao de estgio 6........................................... 112

Figura 8 - Rota de orientao de estgio 7........................................... 112

Figura 9 - Rota de orientao de estgio 8........................................... 112

Figura 10 - Rota de orientao de estgio 9......................................... 113

Figura 11 - Rota de orientao de estgio 10........................................ 113

Figura 12 - Rota de orientao de estgio 11....................................... 113

Figura 13 - Rota de orientao de estgio 12....................................... 114

Figura 14 - Rota de orientao de estgio 13....................................... 114

Figura 15 - Rota de orientao de estgio 14....................................... 114

Figura 16 - Rota de orientao de estgio 15....................................... 114

Figura 17 - Rota de orientao de estgio 16....................................... 114

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANAMATRA Associao Nacional de Magistrados Trabalhistas

AMATRA Associao dos Magistrados do Trabalho

AFS Adolfo Ferreira de Sousa

ANPAE Associao Nacional dos Profissionais de Administrao da

Educao

CAED Centro de Polticas Pblicas e Avaliao da Educao

CEB Conselho de Educao Bsica

SECITECE Secretaria da Cincia e Tecnologia Do Cear

CEDET Clula de Currculo e Desenvolvimento do Ensino Tcnico

CEE Conselho Estadual de Educao

CEEST clula de estgio

CEFET Centro Federal de Educao Tecnolgica

CPS Centro Paula Sousa

CEGEM Clula de Gesto de Material

CEJOVEM Centros educacionais para a juventude

CENTEC Instituto Centro de Ensino Tecnolgico

CNE Conselho Nacional de Educao

COEDP Coordenadoria de Educao Profissional

CF Constituio Federal

CREDE Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educao

EAF Escolas Agrotcnicas Federais

EEEP Escola Estadual de Educao Profissional

EJA Educao de Jovens E Adultos

ENEM Exame Nacional do Ensino Mdio

ESP Escola de Sade Pblica do Cear

ETF Escolas Tcnicas Federais

ETICE Empresa de Tecnologia Da Informao Do Cear

FIC Formao Inicial e Continuada

FHC Fernando Henrique Cardoso

FNDE Fundao Nacional de Desenvolvimento da Educao

IFCE - Instituto Federal de Educao, Cincias e Tecnologia

IFPR Instituto Federal do Cear

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ICE Instituto de Corresponsabilidade Pela Educao

INEP Instituto Nacional de Estudos E Pesquisas Educacionais Ansio

Teixeira

IPECE Instituto de Pesquisas Econmicas Do Cear

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

MEC Ministrio da Educao

MBTI Myers Briggs Test Identificacion

PDE Plano de Desenvolvimento da Escola

POP Procedimento Operacional Padro

PNE Plano Nacional de Educao

PPE Preparao para Estgio

PPP PROJETO POLTICO PEDAGGICO

PPPEPT Proposta de Polticas Pblicas Para A Educao Profissional

e Tecnolgica

PROCENTRO Programa de Desenvolvimento dos Centros de Ensino

Experimental

ProEMI Progragama Ensino Mdio Inovador

PROEP Programa de Expanso da Educao Profissional

PRONATEC Programa Nacional de Acesso ao Ensino Tcnico E Emprego

SAM Salomo Alves de Moura

SEBRAE Servio Brasileiro de Apoio s Micro E Pequenas Empresas

SECITECE Secretaria da Cincia, Tecnologia E Educao Superior.

SEDUC Secretaria da Educao do Estado do Cear

SEFOR Superintendncia das Escolas Estaduais de Fortaleza

SENAI Servio Nacional de Aprendizagem Industrial

SESI Servio Social da Indstria

SETEC Secretaria de Educao Profissional E Tecnolgica

SICE Sistema Informatizado Dde Captao De Estgios

SPAECE Sistema Permanente de Avaliao da Educao Bsica Do

Cear

TEO Tecnologia Empresarial Odebrecht

TESE Tecnologia Empresarial Socioeducacional

UNESCO Organizao Das Naes Unidas Para A Educao, Cincia E

Cultura

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UECE Universidade Estadual do Cear

UFC Universidade Federal do Cear

UNDIME Unio dos Dirigentes Municipais de Educao

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2.1

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3.1

3.1.1 3.1.2

3.2

3.3

3.3.1

3.3.2 3.3.3 3.3.4

SUMRIO

INTRODUO ................................................................................................A EDUCAO PROFISSIONAL SOB UMA PERSPECTIVA NACIONAL ................................................................................................

A LEGISLAO PARA A EDUCAO PROFISSIONAL NO BRASIL:

INSTRUMENTO QUE DESINTEGRA E INTEGRA ESSA

MODALIDADE DE ENSINO ......................................................................................

O BRASIL E A EXPANSO DA REDE FEDERAL DE EDUCAO:

UM PASSO LARGO ................................................................................................

POLTICA DE FINANCIAMENTO: PACTUAO QUE AGREGA

VALOR SOCIAL ................................................................................................

EDUCAO PROFISSIONAL E AS ORIENTAES NA

FORMAO DO SER: UMA PERSPECTIVA INTEGRAL E

INTEGRADA ................................................................................................

O CONTEXTO DA EDUCAO PROFISSIONAL NO CEAR: A DESCENTRALIZAO DA POLTICA DE 2008 A 2014. ................................

A IMPLANTAO DA REDE DE ESCOLAS ESTADUAIS DE

EDUCAO PROFISSIONAL NO CEAR: O COMPROMISSO .............................

Os nmeros do Cear na educao profissional: a garantia de 135

EEEP de 2008 a 2014 ..............................................................................................A educao profissional: outras conquistas asseguradas................................

INVESTIMENTOS REALIZADOS DE 2008 A 2014: POSSIBILIDADE

NA AMPLIAO DO ACESSO DE JOVENS AO ENSINO

PROFISSIONAL INTEGRADO NO CEAR..............................................................

A EXPERINCIA DO CEAR E AS PARTICULARIDADES

DETALHADAS DE 2008 A 2014 ................................................................

Em 2008: o propsito do Governo do Estado com o desenvolvimento integrado do ensino mdio com o ensino tcnico .....................................................................................................................

Em 2009: a estruturao organizacional...............................................................Em 2010: a produo da primeira verso dos referenciais para as escolas de educao profissional ................................................................Em 2011: EEEP padro MEC, potencializando a qualidade da

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3.3.5 3.3.6 3.3.7

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3.5.1 3.5.2

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formao profissional.............................................................................................

Em 2012: revisando e reformulando o currculo dos cursos implantados ................................................................................................Em 2013: a consolidao dos cursos ................................................................Em 2014: democratizando a informao, ferramenta de cidadania ...................

A PERSPECTIVA DE UM CURRCULO INTEGRADO NAS EEEPS

DO CEAR: DIALOGANDO SABERES ENTRE TEORIA E PRTICA ....................

POLTICA DE FORMAO NAS EEEPS: UMA NOVA VISO DE

GESTO ESCOLAR ................................................................................................

Formando gestores: contribuindo e qualificando para o uso das ferramentas gerenciais ...........................................................................................Formando professores tcnicos: capacitar docentes para promover viso abrangente ...................................................................................

AS EEEPS NO CEAR: REGISTRANDO SEU DESENVOLVIMENTO

E APONTANDO INDICATIVOS E TENDNCIAS EM CONSTRUO ....................

A EEEP no Cear e o SPAECE: avanando na proficincia em portugus e matemtica .........................................................................................

Alunos diplomados: sonhos realizados ...............................................................Na EEEP surgem as oportunidades: no mercado de trabalho e na universidade ................................................................................................

O CAMINHO PERCORRIDO E OS DESAFIOS PARA A

CONSOLIDAO DA POLTICA NO CEAR: REFAZENDO A

MEMRIA ................................................................................................

AS EEEPS NO MACIO DE BATURIT: OS DIFERENTES CONTEXTOS ................................................................................................

A EEEP NO MUNICPIO DE REDENO, PRDIO ADAPTADO:

COMPARTILHANDO EXPERINCIAS ................................................................

Trabalho integrado: foco na aprendizagem ........................................................

NO MUNICPIO DE ARACOIABA, ESCOLA PADRO MEC: UM

JEITO NOVO DE CAMINHAR ................................................................................

Resultados iniciais: perspectiva de crescimento ................................

AS EEEPS NO MACIO DE BATURIT: COMO PENSAM OS DOIS

GESTORES ................................................................................................

Dialogando com educandos, expectativas, sonhos e projetos de

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vida: o que pensa cada um ..................................................................................

CONSIDERAES FINAIS ....................................................................................REFERNCIAS ................................................................................................APNDICES...................................................................................

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1 INTRODUO

A presente dissertao destina-se a uma anlise do processo de

implantao e desenvolvimento da poltica de ensino mdio integrado educao

profissional no Cear. O trabalho tem por objetivo compreender a funcionalidade

desse processo em duas Escolas Estaduais de Educao Profissional no Macio de

Baturit, uma funcionando em um prdio adaptado desde sua implantao, em

2008, e a outra inaugurada em 2015, a chamada Escola Padro MEC.

O foco ser o estudo documental do currculo integral das duas escolas

estaduais de educao profissional no Macio de Baturit, a fim de, primeiramente,

compreender a oferta do ensino tcnico e outras formas de preparao para o

trabalho e para o ingresso no nvel superior na concluso do curso e, em seguida,

verificar se o projeto pedaggico nico, com proposta curricular e matrcula nica.

Inicialmente, apresento a poltica de Educao Profissional Nacional,

fazendo um recorte temporal a partir da Lei de Diretrizes e Bases Nacional LDB n

9.394/96, e descrevo a experincia do Cear a partir da criao dos Centros

Educacionais para a Juventude - CEJOVEM em agosto de 2008, at as mais

recentes Escolas Estaduais de Educao Profissional EEEP, implantadas em

2014. E, finalmente, verifico como se efetivou a implantao dessa poltica em duas

Escolas Estaduais de Educao Profissional no Macio de Baturit.

A delimitao adotada justifica-se pela importncia que tem sido dada

educao profissional no setor pblico, pela possibilidade em atender essa ltima

etapa da educao bsica, pela oportunidade em integrar ao mundo contemporneo

nas dimenses fundamentais de cidadania e do trabalho e pelo fato de estar lidando

com a juventude, essa categoria social, principalmente a classe trabalhadora, que ao

longo da histria percebe-se que esteve sempre na contramo desses dois direitos,

educao e ao trabalho.

As Escolas Estaduais de Educao Profissional no Cear tiveram um rito

de implantao sob a perspectiva de trs contextos distintos: O primeiro diz respeito

s 25 primeiras escolas implantadas em agosto de 2008, que, pelo perodo de sua

implantao, no incio do segundo semestre letivo, utilizaram-se de prdios

adaptados. O segundo contexto foi no ano seguinte, embora funcionando em

prdios adaptados, mas iniciando um novo ano letivo, houve toda uma seleo para

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a escolha dos gestores e professores e para a entrada de alunos nessas escolas. O

terceiro contexto foi em 2010; embora ainda permaneam em funcionamento as

escolas adaptadas, foi nesse ano que se iniciou a inaugurao das Escolas Padro

MEC, diferenciadas das demais, construdas especialmente para atender oferta da

Educao Profissional em tempo integral.

Percebe-se que essa poltica no Estado do Cear visa possibilitar aos

alunos dessa ltima etapa da educao bsica atender ao que est explicitado na

misso de cada EEEP Integrar a formao escolar de nvel mdio com uma

habilitao profissional tcnica atravs de educao acadmica de excelncia,

formao para o mundo do trabalho, prticas e vivncias em protagonismo juvenil

(CEAR, 2013, p. 2).

Examino os financiamentos que viabilizam e possibilitam a consolidao

da poltica, bem como os programas e projetos que do corpo ao currculo da escola

profissional, proporcionando aos educadores desenvolverem aes pedaggicas

que facilitem a aprendizagem.

E, finalmente, analiso o currculo da EEEP, os cursos ofertados, a

formao dos gestores e dos educadores, os avanos por meio de indicadores

internos e externos e o que agrega ano a ano (2008 2014) para a consolidao da

poltica.

O critrio utilizado para analisar as duas EEEPs foi a estrutura fsica, uma

escola adaptada e outra padro MEC. Com esse critrio, pde-se analisar os

resultados acadmicos dos estudantes, fazendo comparativo entre as duas escolas

dentro do contexto da poltica no estado do Cear.

Este estudo foi desenvolvido a partir de anlise documental. A anlise dos

dados, a pesquisa bibliogrfica e os depoimentos obtidos atravs de entrevistas

semiestruturadas, complementando as fontes documentais, que formaro o corpo

da dissertao.

A entrevista semiestruturada, segundo Ludke e Andr (1986), a que

mais se adapta aos estudos em ambientes educacionais e apresenta um esquema

mais livre. Constatei essa flexibilidade no momento de aplicar os questionrios aos

vrios segmentos dentro e fora da unidade escolar. Foram entrevistados, na EEEP

Adolfo Ferreira de Sousa, o Gestor, uma Coordenadora de Estgio e dez alunos que

esto cursando a 3 srie (ltima etapa da educao bsica), por estarem

concluindo um ciclo, bem como inseridos no campo de estgio. Na EEEP Salomo

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Alves de Moura, foi entrevistada a Gestora, que iniciou sua gesto na EEEP de

Redeno, em um prdio adaptado, e hoje est em Aracoiaba, em uma escola

Padro MEC, e pde dar sua opinio sobre os dois contextos, e dez alunos da 2

srie, por ser uma escola com apenas dois anos de atividades. Na CEDEA8,

entrevistei o Orientador da clula de Ensino e a Superintendente, que acompanha as

duas EEEPs na regio do Macio de Baturit.

Utilizamos das categorias educao, ensino mdio integral e educao

profissional, com foco na formao integral e integrada dos educandos, trazendo

para o campo da investigao a perspectiva quantitativa e qualitativa, esta ltima

para tornar compreensveis os critrios internos e externos no contexto da pesquisa.

Como bem explica Demo:

As caractersticas apresentada pela pesquisa qualitativa afirma que os critrios internos seriam a coerncia, a consistncia, a originalidade e a objetivao. Aponta como critrio externo de cientificidade, a intersubjetividade, significando a ingerncia da opinio dominante dos cientistas de determinada poca e lugar de demarcao cientfica. (DEMO, 1986, p. 17)

Para compor a pesquisa, foram consultados autores com reconhecida

contribuio no que se refere temtica a ser pesquisada, como Gaudncio Frigotto

(2005), Maria Ciavatta (2005), Marise Ramos (2005) e Accia Kuenzer (2003).

Organizei meu trabalho da forma que se segue. No primeiro captulo,

retomo a trajetria da educao profissional brasileira luz de suas marcas

originais: a caracterstica economicista, que se associa muito fortemente dinmica

do mercado de trabalho e, nessa perspectiva, aponta a educao profissional como

um meio de preparar as pessoas para esse mercado, e a caracterstica da

dualidade, que a situa como a educao que destinada classe trabalhadora.

Percebi que o ponto de partida, para a discusso que proponho, deveria situar-se

nessa perspectiva, levando-se em considerao o recorte histrico com o advento

da LDB n 9.394/96. A forma e a intensidade das discusses com o surgimento dos

Decretos Federais n 2.208/97 e n 5.154/04 levaram-me a essa deciso.

O Cear ganha destaque no desenvolvimento das polticas pblicas da

educao profissional. preciso situar nossa anlise e discusso na questo da

implantao e do desenvolvimento dessa poltica que vem sendo conduzida na rede

pblica estadual e, no caso particular que nos interessa, pela Secretaria de

Educao Bsica SEDUC. Destinei o segundo captulo para uma reflexo sobre

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esse momento da experincia do Cear a partir dos CEJOVENS, criados em agosto

de 2008, at as EEEPs, implantadas em 2014, com algumas particularidades que

sero abordadas no detalhamento dos ajustes realizados ano a ano.

Os fatos, as relaes que se manifestam no cotidiano das escolas

profissionais que vo nos permitir entender se as polticas ali implantadas do

conta em atingir o objetivo para as quais foram pensadas, desenhadas e

implantadas. Por isso, no terceiro captulo, dou a palavra aos protagonistas da

escola, sejam eles gestores, professores ou alunos. Dos que ouvi, procurei acolher

atentamente sua manifestao, sobre seu momento vivido em uma escola de tempo

integral profissional, seja em prdio adaptado ou em escola padro MEC.

Na concluso, revejo em sntese o caminho percorrido, tento extrair o que

mais significativo, levando em considerao a discusso proposta. Tendo esse

caminho traado, espero sinceramente que a comunidade educativa das Escolas

Estaduais de Educao Profissional do Estado do Cear para as quais as polticas

foram traadas, com o compromisso e empenho do Governo do Estado, por meio da

SEDUC, possa de fato dar a resposta a qual est explicitada em sua misso

Garantir educao bsica com equidade e foco no sucesso do aluno (SEDUC,

2013, p. 2). Por fim, apresento as consideraes finais decorrentes do trabalho.

23

2 A EDUCAO PROFISSIONAL SOB UMA PERSPECTIVA NACIONAL

Neste captulo, foi desenvolvida uma anlise da trajetria da educao

profissional brasileira luz de suas marcas originais: a primeira delas a

caracterstica economicista, que se associa muito fortemente dinmica do mercado

de trabalho e, nessa perspectiva, aponta a educao profissional como um meio de

preparar as pessoas para esse mercado; a segunda caracterstica a da dualidade,

que a situa como a educao que destinada classe trabalhadora e aos filhos da

classe trabalhadora.

Verificamos, ainda, no contexto da legislao brasileira, o percurso

histrico da educao profissional a partir da Constituio Federativa do Brasil

(1988), at o perodo compreendido entre 2011 a 2014, ora sendo reconhecida ou

no como modalidade de ensino, integrando o Ensino Mdio Educao

Profissional no Brasil.

A anlise foi pautada nas categorias: educao, ensino mdio e educao

profissional, a partir de leitura realizada que envolveu as relaes histricas,

abordando, principalmente, o impacto na qualificao profissional dos jovens e sua

ascenso social.

Contextualizar o momento histrico, antes, durante e aps a implantao

de uma poltica pblica e, neste caso especfico, o Ensino Mdio Integrado

Educao Profissional, requer um olhar crtico no sentido de entender como se

deram as discusses, os embates, as contribuies e quais atores figuram nesse

momento to importante para o desenvolvimento da Educao Profissional no Brasil.

Destacamos, dentro da legislao brasileira, no que tange s discusses

em torno da Educao Profissional: A Constituio Federal de 1988; a criao da Lei

n 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB); o Decreto n 2.208,

aprovado em 17 de abril de 1997 (no que se refere Educao Bsica, passa a

existir a dualidade entre Ensino Mdio e Educao Profissional, ou seja, separao

obrigatria contra a corrente progressista no perodo compreendido entre 1995-

2002); o Decreto n 5.154, de 7 de julho de 2004, que, alm de revogar o Decreto n

2.208/97, embora mantendo a oferta dos cursos tcnicos concomitante e

subsequente, trouxe de volta a possibilidade de integrar o Ensino Mdio Educao

Profissional Tcnica de nvel mdio, a partir de 2003.

24

Nesse contexto, interpretaremos a Lei n 11.741/08 que inclui na LDB, Lei

n 9.394/96, no Captulo II do Ttulo V, uma seo que denominada Da Educao

Profissional Tcnica de nvel mdio, e, finalmente, uma reflexo sobre o Programa

Nacional de Acesso ao Ensino Tcnico e Emprego (PRONATEC), criado pelo

Governo Federal, em 2011, com a Lei n 11.513/2011, com o objetivo de expandir,

interiorizar e democratizar a oferta de cursos de educao profissional e tecnolgica

no pas, alm de contribuir para a melhoria da qualidade do ensino mdio pblico.

Entretanto, a essas reflexes soma-se o resgate que se faz necessrio

Lei n 5.692/71, que, poca, reconheceu a integrao do Ensino Profissionalizante

ao sistema regular de ensino e estabeleceu a equivalncia entre os cursos

profissionalizante e o ensino propedutico, para fins de prosseguimento de estudos,

e tornou de maneira compulsria, tcnico-profissional, todo o currculo do segundo

grau, estabelecendo a um novo paradigma: formar tcnicos sob o regime de

urgncia. Nesse perodo, as Escolas Tcnicas Federais aumentam expressivamente

o nmero de matrculas, implantam novos cursos tcnicos e apontam a

predominncia do ensino especfico sobre o geral. Com isso, os estudantes do

ensino tcnico eram prejudicados em sua formao ampla, o que gerou insatisfao

na sociedade.

Tecendo um comentrio importante nesse contexto que a atual LDB n

9.394/96 possibilita ao estudante ter um ensino sem que a haja sobreposio da

base tcnica sobre a base comum. A forma de articulao integrada possibilita um

dilogo entre as bases e que o estudante no seja prejudicado no prosseguimento

dos estudos.

Alguns fatores foram responsveis pela obrigatoriedade da

profissionalizao no segundo grau, conforme Moura (2010):

Os fatores surgiram por fora do interesse da populao por uma escolaridade mais elevada e o governo com interesse em direcion-la por meio da oferta da profissionalizao, inseri-los no mercado de trabalho. Naquele perodo o mercado estava em expanso em funo dos elevados ndices de desenvolvimento. (MOURA, 2010, p. 67)

Essa a lgica da produo: cada perodo marcado por interesses do

capital e fortemente atingindo a classe popular.

A Lei n 5.692/71 parece trazer algumas vantagens: uma delas o

primeiro grau em oito anos obrigatrios, a outra a integrao entre ensino tcnico e

secundrio. O que poderia ser vantagens no passava de aparncias, s causou ao

25

pas grandes prejuzos educao. O ensino obrigatrio de oito anos no se

efetivou, pela escassez de recursos materiais, pela falta de financiamento e pela

falta de infraestrutura para atender aos cursos ofertados. Principalmente por causa

disso, a Lei n 5.692/71 foi perdendo gradativamente sua aplicabilidade. Sobre esse

assunto, Moura (2010) coloca:

A velha dicotomia entre educao bsica e educao profissional ressurge no mbito da legislao claramente reafirmando, mais uma vez, a oferta do ensino propedutico como via de acesso ao ensino superior e o ensino profissional como via de acesso ao mercado de trabalho. (MOURA, 2010, p. 67)

Percebe-se, portanto, que, naquele perodo, poucos estudantes tinham

acesso ao nvel superior, as escolas profissionalizantes subtraam deles um

conhecimento amplo, com isso retiravam-lhe esse direito. Diante disso, na

conjuntura atual da nova LDB, buscarei analisar se o Estado do Cear, ao implantar

a poltica pblica do ensino mdio integrado educao profissional, assume

caractersticas daquilo que foi delineado pelo ensino profissional nacional a partir da

Lei n 11.741/08, que a formao integral e integrada do sujeito, garantindo-lhe,

dessa forma, o acesso ao mundo do trabalho bem mais preparado, bem como se

assim desejar prosseguir com seus estudos.

Nesse contexto, percebemos a necessidade da universalizao dessa

poltica, que tem sua importncia pelos avanos alcanados, mas ainda no

garantia de atendimento a todos. Percebe-se que o no acesso a essa modalidade

de ensino tira do estudante o direito a uma educao vinculada melhoria das

condies de mo-de-obra, com acesso ao trabalho qualificado, em que haja

transformao social que atenda s necessidades do mundo do trabalho, sem

perder de vista o indivduo como centro do processo.

2.1 A LEGISLAO PARA A EDUCAO PROFISSIONAL NO BRASIL:

INSTRUMENTO QUE DESINTEGRA E INTEGRA ESSA MODALIDADE DE

ENSINO

A Constituio Federal de 1988, em seu artigo 2051, reconhece que a

educao um direito de todos e tem como objetivo o pleno desenvolvimento da

1 Art. 205. A educao, direito de todos e dever do Estado e da famlia, ser promovida e incentivada

com a colaborao da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho. (BRASIL, 1988)

26

pessoa, seu preparo para a cidadania e sua qualificao para o trabalho.

Dessa forma, entende-se que, na educao profissional, deveria ser

garantido o pleno desenvolvimento da pessoa, porm o que assistimos antes e

depois da promulgao da Constituio Federal de 1988 um conjunto de fatores

que no contribuem de forma efetiva para o exerccio da cidadania, quando o

trabalho assume carter exploratrio sem as condies necessrias de qualificao

na perspectiva da garantia de direitos.

A prescrio legal da Lei n 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educao

Nacional (LDB), mostra claramente a inteno em vincular a Educao Profissional

integrada s diferentes formas de educao, ao trabalho, cincia e tecnologia,

com o objetivo de conduzir o cidado a um permanente desenvolvimento de

aptides para a vida produtiva (art. 39) na sociedade do trabalho e do

conhecimento. Para isso, requer que a educao profissional seja desenvolvida no

s no espao escolar, mas que esteja articulada com o mercado de trabalho.

No Cear, Andrade (2010), em uma pesquisa denominada A Poltica de

Educao Profissional no Brasil e no Cear: O desafio da articulao do ensino

mdio com a educao profissional, analisa as implicaes das mudanas no

mundo do trabalho para a educao profissional no Brasil e a reforma efetivada no

ensino mdio e na educao profissional nos governos de FHC e Lula.

Direciona o olhar para os desafios que o Decreto n 5.154/04 promoveu

para as escolas e os sistemas pblicos estaduais, focalizando a atual proposta de

ensino mdio integrado com a educao profissional da rede estadual de ensino no

Estado do Cear. Andrade afirma que:

Como portador do saber, do conhecimento, da experincia e da qualificao, ele tem condies de intervir no processo produtivo, podendo trazer inovaes que favorecem a permanncia da empresa no mercado. (ANDRADE, 2010, p. 2)

Dito isso, compreende-se a formao do ser integral e integrada numa

perspectiva de mudana real como fator determinante de crescimento pessoal e

profissional do ser humano.

Para Tuppy (2007), na LDB, os caminhos legais da formao profissional

podero ocorrer de duas formas:

Incorporando organizao do ensino formal, particularmente no ensino mdio; outra tambm passvel de certificao, que desenvolvida nos

27

ambientes de trabalho, mas no exclusivamente nele. (TUPPY, 2007, p. 111)

Dito isso, a autora mostra as possibilidades que se tem em trabalhar a

formao profissional do indivduo no caso da integralidade, seja na educao

formal ou at mesmo no desenvolvimento da atividade, desde que essa formao

contribua para o crescimento integrado, gerando mudanas significativas na vida em

sociedade.

Na LDB, est explcito que, quando se trabalha com a educao

profissional, tem-se a necessidade de fazer a conexo da educao com o mundo

da produo material; a educao est dentro do trabalho e pelo trabalho, assim, a

educao retorna como aprendizado.

Nesse contexto, tanto a Constituio Federal de 1988 quanto a Lei n

9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB), apresentam a

Educao profissional na confluncia de dois direitos fundamentais do indivduo: o

direito educao e o direito ao trabalho (PARECER CNE/CEB N 39/04). Assim,

Tuppy, Zarco e Lima relacionam direito educao e direito ao trabalho a uma

liberdade que leva o indivduo a conquistar pelo conhecimento direitos que vo alm

do individualismo em uma sociedade democrtica.

Assim, a educao liberta na medida em que leva o indivduo a refletir e

dar novo significado ao que faz, pensando no bem coletivo e, sobretudo, na

apropriao dos conhecimentos que venham a intervir no meio em que vive.

Para Zarco (2006), a educao um direito humano, um bem pblico, e

a primeira responsabilidade do Estado garantir esse direito a todos. Tendo esse

direito garantido pelo Estado, Lima (2003) vai mais alm quando afirma que pela

educao que se pode compreender o direito fundamental de liberdade:

Direitos existem que guardam obviamente as mesmas caractersticas do direito liberdade, j que dele derivativos, valendo, entretanto, destacar a educao como um deles, pois, sem ela, sequer se ter a compreenso do significado do direito fundamental de liberdade. (LIMA, 2003)

Nesse sentido, a educao passa a ter papel relevante, quando sai da

tica da prestao de servios para desenvolver a formao humana na dimenso

social, fazendo com que o indivduo seja capaz de se perceber como cidado

autnomo, livre para participar, buscar compreender e garantir seus direitos, previsto

na Constituio Federal de 1988.

28

No Captulo II ,Dos Direitos Sociais, no Artigo 6 da CF/882, enfatiza-se

a educao como direito fundamental de natureza social, ou seja, trata-se de uma

dimenso para alm dos interesses individuais um bem comum que integra um

conjunto de direitos sociais.

No final dos anos 1980 e na primeira metade dos anos 1990, quando,

aps a promulgao da Constituio Federal de 1988, ocorre no Congresso

Nacional o processo que culmina com a entrada em vigor da Lei n 9.394/96, de

Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB)3, quase no h mais 2 grau

profissionalizante no pas, com exceo das escolas Tcnicas Federais (ETF), das

Escolas Agrotcnicas Federais (EAF) e de poucos sistemas estaduais de ensino.

Nos embates travados no processo de tramitao da CF de 1988, a lgica do

mercado prevaleceu, pois o setor privado conquistou a livre interferncia na

educao, confirmada posteriormente pela LDB n 9.394/96 (MOURA, 2010, p. 70).

Nesse momento, o pas estava saindo de um perodo ditatorial e tentando

reconstruir o estado de direito, em que os conflitos eram de grandes propores em

torno de projetos societrios distintos. Na esfera educacional, a principal polmica

era o conflito entre os que advogavam por uma educao pblica, gratuita, laica e de

qualidade para todos e os defensores da submisso dos direitos sociais em geral e,

particularmente, a educao lgica da prestao de servios (Documento Base,

MEC, 2007, p. 16).

Dito isso, percebe-se que a educao e, de modo particular, a profissional

esteve sempre na mira dos conservadores, de forma que a superao dessa

afirmativa vem ganhando fora na democracia, buscando desenvolver o

conhecimento que gera reflexo e, dentro do trabalho, oportuniza crescimento

individual e em grupo.

A Lei n 9.394/96 LDB ganha ainda mais notoriedade em relao

educao profissional, quando a ela, no Captulo II do Ttulo V, atravs da Lei n

2 Constituio Federal de 1988, Captulo II, Dos Direitos Sociais, no Artigo 6: So direitos sociais a

educao, a sade, a alimentao, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurana, a previdncia social, a proteo maternidade e infncia, a assistncia aos desamparados, na forma desta Constituio. (Redao dada pela Emenda Constitucional n 90, de 2015).

3 A LDB - Lei de Diretrizes e Bases n 9.394 foi promulgada em 20 de dezembro de 1996. Desde ento, ela vem abrangendo os mais diversos tipos de educao: educao infantil (agora sendo obrigatria para crianas a partir de quatro anos); ensino fundamental; ensino mdio (estendendo-se para os jovens at os 17 anos). Alm de outras modalidades do ensino, como a educao especial, indgena, no campo e ensino distncia.

29

11.741/084, includa uma seo que regulamenta a oferta da Educao

Profissional Tcnica de Nvel Mdio, desde ento passou a constituir-se modalidade

de ensino mdio, proporcionando a este grau de ensino a possibilidade de

preparao para o exerccio de profisses tcnicas. Nesse momento, a educao

profissional deixa de ser um apndice e passa, de fato, a incorporar a educao

bsica.

A Lei n 9394/96 - LDB objetiva superar o enfoque assistencialista e o

preconceito social apresentado nas primeiras legislaes de educao profissional

do Brasil, fazendo uma interveno social para tornar-se um dispositivo de

favorecimento incluso social.

A Lei n 9.394/96 - LDB, em seu artigo 22:

Reconhece o ensino mdio como uma etapa da escolarizao que tem por finalidade desenvolver o educando, assegurar-lhe a formao comum indispensvel para o exerccio da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores (artigo, 22, LDB, 9394/96).

E, ao mesmo tempo, a referida Lei, no seu artigo 35, coloca o Ensino

Mdio como etapa final da Educao Bsica, com durao mnima de trs anos, e

tem como finalidades:

I a consolidao e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino

fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;

II a preparao bsica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar

aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas

condies de ocupao ou aperfeioamento posteriores;

III o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formao

tica e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crtico;

4 Lei n 11.741/08: Altera dispositivos da Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as

diretrizes e bases da educao nacional, para redimensionar, institucionalizar e integrar as aes da educao profissional tcnica de nvel mdio, da educao de jovens e adultos e da educao profissional e tecnolgica. (Lei n 11.741, de 16 de julho de 2008). Lei n 11.741/08: inclui no captulo II do Ttulo V uma seo que regulamenta a oferta da Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio. Seo IV-A Da Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio. Nessa seo so acrescidos os Artigos 36-A, 36-B, 36-C e 36-D. Na mesma direo, o Captulo III do Ttulo V teve sua redao atualizada por fora da mesma Lei, denominado Da Educao Profissional e Tecnolgica. No Artigo 39 da Lei n 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educao Nacional LDB, a educao profissional e tecnolgica, no cumprimento dos objetivos da educao nacional, integra-se aos diferentes nveis e modalidades de educao e s dimenses do trabalho, da cincia e da tecnologia. (Redao dada pela Lei n 11.741, de 2008).

30

IV a compreenso dos fundamentos cientfico-tecnolgicos dos processos

produtivos, relacionando a teoria com a prtica, no ensino de cada disciplina.

A finalidade no inciso II do artigo 35 da LDB destaca a preparao para o

trabalho como condio do cidado de exercer sua cidadania, que, acima de

qualquer coisa, prima pelo seu aperfeioamento, dando-lhe condio de no ser um

mero executor de tarefas, mas, sobretudo, que valorize a fora do trabalho como

produto de uma aprendizagem significativa.

Para Pereira (2000), o Ensino Profissional na Lei n 9.394/96, de

Diretrizes e Bases da Educao Nacional, compreende as seguintes possibilidades:

[...] A Educao Profissional ser destinada no somente aos alunos matriculados ou egressos do Ensino Fundamental, Mdio e Superior, mas tambm, ao trabalhador em geral, jovem ou adulto, que optar por esta modalidade de ensino. Esta poder ser ministrada em instituies especializadas ou no prprio ambiente de trabalho, oferecendo certificados para prosseguimento ou concluso de estudos, avaliados atravs do conhecimento adquirido. Oferecer tambm, alm de seus cursos regulares, cursos abertos para a comunidade, aproveitando a capacidade profissional dos interessados e no somente o nvel de escolaridade. (PEREIRA, 2000, p. 22)

Nesse contexto, a educao profissional abrange de forma mais completa

a populao jovem e adulta, procura atend-la, valorizando o itinerrio formativo do

indivduo, aproveitando a capacidade de cada um independentemente do ambiente

e da escolarizao.

Em 17 de abril de 1997, surge o Decreto n 2.208/975, que dissociava a

Educao Profissional da Educao Bsica e Superior, sob a perspectiva de

preparar para o mercado de trabalho, e o Programa de Expanso da Educao

Profissional (PROEP), com funo de reestruturar a Rede Federal, sob a perspectiva

da oferta educacional, da gesto e das relaes empresariais e comunitrias, para

torn-la competitiva no chamado mercado educacional. Com esse projeto, as

instituies citadas anteriormente receberam recurso atravs do PROEP para se

reestruturarem e buscarem arrecadar, a partir dos servios prestados comunidade,

com o intuito de se autofinanciar. Dessa forma, o Estado aos poucos se eximiria da

sua funo, que era custear a manuteno.

5 O Decreto n 2.208/97 regulamenta o 2 do art. 36 e os artigos 39 a 42 da Lei n 9.394, de 20 de

dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educao nacional (BRASIL, 2007).

31

No mesmo sentido, a Portaria n 646/976 determinou a reduo da oferta

do ensino mdio no pas, com plena vigncia at 2003, at a revogao por meio da

Portaria n 2.736/03. Estudos apontam que a inteno dos promotores dessa

reforma era extinguir a vinculao das instituies federais de educao tecnolgica

com a educao bsica, da o fato de que a Rede Federal teve sua expanso

limitada.

Ainda sobre o Decreto n 2.208/97, Ramos (2010) afirma:

A educao profissional idealizada teria por objetivo formar o maior nmero possvel de mo-de-obra especializada em um menor nmero de tempo, seguindo assim, os preceitos liberais a partir dos quais o mercado em si o fator mais importante. (RAMOS, 2010)

Outra crtica feita pelos educadores a esse decreto aponta a separao

entre o ensino mdio e a educao profissional de nvel tcnico, observando que

essa separao pde acentuar de forma significativa a dualidade entre a educao

geral e a educao profissional.

Para Frigotto (2010):

O decreto n 2.208/97, reestabeleceu o dualismo entre educao geral e especfica, humanista e tcnica, destroando, de forma autoritria, o pouco ensino mdio integrado existente, mormente da rede Centro Federal de Educao Tecnolgica CEFET. Inviabilizou-se, justamente e no por acaso, os espaos, como sinaliza Saviani (2003), onde existiam as bases materiais de desenvolvimento da educao politcnica ou tecnolgica. Ou seja, aquela que oferece os fundamentos cientficos gerais de todos os processos de produo e das diferentes dimenses da vida humana. (FRIGOTTO, 2010, p. 32)

Assim, o autor coloca quo perversa foi a vigncia desse decreto para a

educao do nosso pas, visto que induziu veementemente a separao,

distanciando a classe popular cada vez mais da educao geral, levando o indivduo

mecanizao, sem possibilidades de mudanas.

O Decreto n 2.208/97 ope-se lgica da Lei n 5.692/71, no que diz

respeito obrigatoriedade da profissionalizao no ensino mdio. O mesmo decreto

forou o sistema de ensino a ofertar o ensino mdio de forma propedutica e

dificultou a profissionalizao nesse ensino mdio, sem, contudo, proibir a

manuteno de cursos na modalidade ensino mdio profissionalizante.

6 Portaria MEC n 646/97. Regulamenta a implantao do disposto nos artigos 39 a 42 da Lei Federal

n 9.394/96 e no Decreto Federal n 2.208/97 e d outras providncias (trata da rede federal de educao tecnolgica), de 14 de maio de 1997. (BRASIL, 1997)

32

Para Kuenzer (2003):

Se alguma unidade federada decidisse manter a verso integrada poderia faz-lo com o apoio da LDB; o preo dessa deciso, contudo, seria no receber recursos do convnio firmado pelo Banco Mundial. (KUENZER, 2003, p. 7)

A autora coloca a possibilidade de a educao e, no caso aqui especfico,

a educao profissional estar sempre refm do capital, para, assim, em segundo

plano, pensar no cidado de forma que esse servisse apenas e exclusivamente aos

interesses do desenvolvimento econmico do pas.

Para Frigotto (2005):

O Decreto n 2.208/97 e outros instrumentos legais como a portaria 646/97 vem no somente proibir a pretendida formao integrada, mas regulamentar formas fragmentadas e aligeiradas de educao profissional em funo das [...] necessidades do mercado. (FRIGOTTO; CIAVATA; RAMOS, 2005, p. 25)

Com isso, o autor nos coloca a lgica de mercado ou lgica da produo.

Esta ltima fortalece a primeira, sendo fortemente usada no perodo de vigncia

desse decreto. Alm do que o decreto separou definitivamente a base tcnica da

base comum.

Frigotto e Ciavatta (2003) ainda argumentam que a era FHC [...] foi um

retrocesso tanto no plano institucional e organizativo quanto, e particularmente, no

mbito pedaggico (FRIGOTO; CIAVATA, 2003, p. 93).

Com essa argumentao e referendado pelos instrumentos legais, dentre

eles o Decreto n 2.208/97, a referida era foi a que mais se aplicou lgica da

produo, haja vista a brusca separao do ensino propedutico e do tcnico,

promovendo a dualidade.

No plano institucional, foi a limitada expanso da Rede Federal, que,

segundo Cunha (2005), a Unio s poderia criar novas unidades para o ensino

tcnico mediante parcerias com os estados, municpios, setor produtivo ou

organizaes no governamentais, que seriam responsveis pela manuteno e

gesto dos novos estabelecimentos de ensino (CUNHA, 2005, p. 256). J no mbito

pedaggico, entende-se que houve proliferao, em uma expanso sem

precedentes, de cursos superiores de tecnologia na iniciativa privada, sem controle

muito eficiente sobre a qualidade desses cursos.

33

Sobre o assunto, Ramos analisa o panorama neoliberal da poltica

relacionada educao:

Somadas a essas reformas estruturais, a poltica curricular desenvolvida com a participao do Conselho Nacional de Educao esteve afinada aos preceitos da flexibilidade e do individualismo que tomaram espaos na sociedade ao final do sculo XX, sob a gide de neoliberalismo econmico e da cultura ps-moderna. Assim a identidade conferida ao ensino mdio, baseava-se na funo clara de desenvolver a pessoa humana por meio a preparao bsica para o trabalho e o exerccio da cidadania, remetendo o ensino tcnico sua antiga vertente profissionalizante a cursos isolados. A educao profissional foi regulamentada como modalidade prpria de ensino, independente dos nveis escolares, porm com eles articulados. (RAMOS, 2010, p. 46)

Na mesma linha, Frigotto, Ciavata e Ramos (2005) destacam que, no

perodo de 1995 a 2002, a educao bsica assumia o iderio pedaggico do

capital ou do mercado, representando, dessa forma, uma regresso, o que

restabelecia o dualismo entre educao e trabalho, ferindo os princpios da

politecnia (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 13).

A esse respeito, a pesquisadora Ca (2006) destaca:

Na prtica, o decreto serviu como mais um instrumento da poltica educacional do perodo que contribuiu para a institucionalizao de um sistema paralelo de formao profissional que, embora pudesse se articular com o sistema regular de ensino apenas concomitante ou seqencial, mas no de forma integrada, era dele imprescindvel. Tal desarticulao, presente na histria da educao h tempos, vinha ocorrendo de forma paralela e, at certo ponto, marginal ao sistema educacional pblico. A partir de 1997, essa dualidade passa a ser uma orientao legal e uma prescrio oficial, a ponto da educao profissional configurar-se, predominantemente, como um subsistema no interior do prprio sistema pblico de educao, voltado para a formao do trabalhador, sem a promoo da elevao dos nveis de escolaridade. Dessa forma, com o Decreto 2.208/97, o Estado brasileiro, como agente condutor da poltica educacional pblica, divide o protagonismo da conduo desse novo paralelismo com outros sujeitos polticos do setor privado. A opo da poltica educacional pblica entre as diversas possibilidades de organizao da educao profissional, especialmente nas redes estaduais, foi clara: prevaleceu a oferta de cursos bsicos independentes de escolaridade prvia e de cursos tcnicos, concomitantes e seqenciais, ocasionando a quase extino, em todo o pas, da oferta de cursos de ensino mdio de carter profissionalizante. (CA, 2006, p. 3)

Dentro dessa anlise, o referido decreto apresenta-se como um

instrumento da poltica educacional que colaborou para a institucionalizao de um

sistema paralelo de formao profissional, mesmo fazendo a articulao com o

sistema regular de ensino, seja na forma concomitante ou subsequente.

34

Nesse contexto Souza, Ramos e Deluiz (2007) colocam que o Decreto n

2.208/97 estabeleceu as seguintes funes da Educao Profissional no Brasil:

i) Qualificar, requalificar e reprofissionalizar trabalhadores em geral, independentemente do nvel de escolaridade que possuam no momento de seu acesso; ii) habilitar jovens e adultos para o exerccio de profisses de nvel mdio e de nvel superior; e iii) atualizar e aprofundar conhecimentos tecnolgicos voltados para o mundo do trabalho. Essas atribuies estariam condensadas, respectivamente, nos nveis bsicos, tcnico e tecnolgico da educao profissional, prevendo-se ainda, cursos de atualizao, aperfeioamento e especializao tcnica. (SOUZA; RAMOS; DELUIZ, 2007, p. 31)

O mesmo decreto, em seu artigo 5, ainda define que: A educao

profissional de nvel tcnico ter organizao curricular prpria e independente do

ensino mdio, podendo ser oferecida exclusivamente de forma concomitante ou

subsequente. No pargrafo nico do mesmo artigo, estabelece-se um limite de 25%

do total da carga horria mnima do ensino mdio para o aproveitamento no

currculo da habilitao profissional. Na prtica, esse limite constitua uma clara

herana da mentalidade ditada pela Lei n 5.692/71, ou seja, a predominncia do

ensino especfico sobre o geral. Com isso, os estudantes do ensino tcnico eram

prejudicados em sua formao ampla.

Finalmente, o Decreto n 2.208/97 desfrutava de um duplo sentido trazido

no 2 do artigo 367 Seo IV do Captulo II, e do artigo 408 do Captulo III,

relacionados educao profissional contidos na LDB. Esses dispositivos legais

evidenciam que quaisquer possibilidades de articulao entre o ensino mdio e a

educao profissional podem ser realizadas, assim como a completa desarticulao

entre eles. Esse era o objetivo do decreto, consolidar a separao entre ensino

mdio e educao profissional. Em todo esse contexto, no que se refere educao

bsica, o que ficou explcito legalmente com o Decreto n 2.208/97 foi a dualidade

entre o ensino mdio e a educao profissional, com todas as consequncias que

isso representou nesse recorte da historia da educao profissional no pas.

7 Art. 36-A. Sem prejuzo do disposto na Seo IV deste Captulo, o ensino mdio, atendida a

formao geral do educando, poder prepar-lo para o exerccio de profisses tcnicas. (Includo pela Lei n 11.741, de 2008).

8 Art. 40. A educao profissional ser desenvolvida em articulao com o ensino regular ou por diferentes estratgias de educao continuada, em instituies especializadas ou no ambiente de trabalho.

35

Durante o perodo que antecedeu a aprovao do Decreto n 5.154/049,

ao longo do ano de 2003 at meados de julho de 2004, houve grande efervescncia

nos debates relativos relao entre o ensino mdio e a educao profissional.

Esse processo resultou em uma significativa mobilizao dos setores educacionais

vinculados ao campo da educao profissional, principalmente no mbito dos

sindicatos e dos pesquisadores da rea de trabalho e educao, na perspectiva de

conferir ao ensino mdio uma identidade que possa contribuir para a formao

integral dos estudantes, voltada para a superao da dualidade histrica entre

cultura geral e cultura tcnica.

A Proposta de Polticas Pblicas para a Educao Profissional e

Tecnolgica (PPPEPT), apresentada no incio de 2003 pelo Governo Federal, trouxe

os princpios norteadores para o desenvolvimento da educao no Brasil. O

documento destaca o compromisso em reduzir as desigualdades sociais, o

desenvolvimento socioeconmico, a vinculao educao bsica e a uma escola

pblica de qualidade" (BRASIL, 2003, p. 6).

Alm do mais, esse documento estabelece que os princpios da educao

profissional no Brasil devero desenvolver-se sob os seguintes aspectos: Integrao

ao mundo do trabalho, interao com outras polticas pblicas, recuperao do

poder normativo da LDB, reestruturao do sistema pblico de ensino mdio tcnico

e compromisso com a formao e valorizao dos profissionais de educao

profissional e tecnolgica (BRASIL, 2003, p. 6).

A convergncia dos debates relativos educao profissional tem como

desfecho a revogao do Decreto n 2.208/97 e a aprovao do Decreto n

5.154/04, mantendo a oferta dos cursos tcnicos concomitantes e subsequentes,

trazidos pelo Decreto n 2.208/97, tendo o mrito de trazer de volta a possibilidade

de integrar o Ensino Mdio Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio.

Frigotto (2005) analisa o processo de criao do Decreto n 5.154/04 e

aponta os seguintes elementos:

No mbito da elaborao das polticas para o Ensino Mdio e para a Educao profissional, a revogao do Decreto n 2.208/97, tornou-se emblemtica da disputa e a expresso pontual de uma luta terica em termos de pertinncia poltico pedaggica do Ensino Mdio integrado Educao Profissional. Isto passou a exigir uma postura poltica: ou manter-

9 Decreto n 5.154, de 23 de julho de 2004. Regulamenta o 2 do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei n

9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educao nacional, e d outras providncias (BRASIL, 2004).

36

se afastado do processo, movimentando-se na crtica, buscando criar foras para um governo com opo e fora de corte revolucionrio. Ou entender que possvel trabalhar dentro das contradies do Governo que possam impulsionar um avano no sentido de mudanas estruturais que apontem, no mnimo, realisticamente, o efetivo compromisso com um projeto nacional popular de massa. Foi dentro da segunda postura, sem negar nossas posies tericas e compreendendo que estvamos num governo que se move no mbito de uma democracia restrita, que as sucessivas verses da minuta de decreto que recebeu o n 5.154/04 foram geradas, com uma complexa acumulao de foras, com a participao de entidades da sociedade civil e de intelectuais. (FRIGOTTO, 2005, p. 4)

Nesse contexto, destaca-se que a maior contribuio que o Decreto n

5.154/04 trouxe para a educao profissional foi a superao da dualidade estrutural

entre cultura geral e cultura tcnica, de maneira a propiciar aos jovens, segundo o

MEC (2007):

Uma formao de cidados capazes de compreender a realidade social, econmica, poltica, cultural e do mundo do trabalho para nela inserir-se e atuar de forma tica e competente, tcnica e politicamente, visando contribuir para a transformao da sociedade em funo dos interesses sociais e coletivos. (Documento Base, MEC, 2007, p. 24-25)

Sendo assim, destacamos que o Decreto n 2.208/97 trazia uma

abordagem que visava dissociar a formao intelectual da formao para o trabalho,

o que caracterizava o sistema dual. J o Decreto n 5.154/04 visa explicitamente a

formao para o trabalho e a formao intelectual, conjugando conhecimento e

prtica. O primeiro se pauta na lgica da produo, e o segundo na lgica da

educao.

Ainda sobre esse assunto, Ramos (2010) coloca:

O papel do ensino mdio deveria ser o de recuperar a relao entre conhecimento e a prtica do trabalho. Isso significa explicar como a cincia se converte em potncia material no processo de produo. Assim, seu horizonte deveria ser o de propiciar aos alunos o domnio dos fundamentos das tcnicas diversificadas utilizadas na produo e no o mero adestramento em tcnicas produtivas. No se deveria, ento, propor que o ensino mdio formasse tcnicos especializados, mas sim politcnicos. (RAMOS, 2010, p. 44)

Nesse contexto, a autora resgata o papel da educao, a possibilidade de

desenvolver nos indivduos a diversidade de habilidades para melhor interagir com o

desenvolvimento do trabalho, e no mais o fazer por fazer, sem promover mudanas

individuais, mas principalmente coletivas.

Ao regulamentar a oferta da educao profissional no pas, o Governo

Federal cria a poltica de financiamento, com o intuito de incentivar os estados a

37

investirem nessa modalidade de ensino, e ainda promove a ampliao e a

interiorizao da Rede Federal de ensino tcnico e tecnolgico, criando vrios

Institutos Federais espalhados por todo o pas.

2.2 O BRASIL E A EXPANSO DA REDE FEDERAL DE EDUCAO: UM PASSO

LARGO

Para exemplificar a expanso da Rede Federal de educao profissional,

seguem alguns dados comparativos: Entre 1909 e 2002, foram construdas 140

unidades, melhor configurando a Rede Federal de Educao Profissional e

Tecnolgica brasileira, compreendidos a 93 anos, quase um sculo.

Em 2005, com a publicao da Lei n 11.195/05, ocorre o lanamento da

primeira fase do Plano de Expanso da Rede Federal de Educao Profissional e

Tecnolgica, com a construo de 64 novas unidades de ensino. Tambm nesse

ano acontece a transformao do CEFET no estado do Paran em Universidade

Tecnolgica Federal do Paran, primeira Universidade especializada nessa

modalidade de ensino no Brasil.

Em 2006, lanado o Catlogo Nacional dos Cursos Superiores de

Tecnologia para disciplinar as denominaes dos cursos oferecidos por instituies

de ensino pblicas e privadas. No mesmo ano, a Secretaria de Educao

Profissional e Tecnolgica SETEC do Ministrio da Educao, em parceria com o

Frum Nacional de Gestores Estaduais de Educao Profissional, realizou

conferncias em 26 estados e no Distrito Federal, as quais culminaram, no perodo

de 05 a 08/11/06, na 1 Conferncia Nacional de Educao Profissional e

Tecnolgica, marco importante na educao brasileira, com a participao de 2.761

participantes. Foi a primeira conferncia que o Ministrio da Educao realizou em

toda a sua histria.

Em 2007, h o lanamento da segunda fase do Plano de Expanso da

Rede Federal de Educao Profissional e Tecnolgica, tendo como meta entregar

populao mais 150 novas unidades, perfazendo um total de 354 unidades, at o

final do ano de 2010, cobrindo todas as regies do pas, oferecendo cursos de

qualificao, de ensino tcnico, superior e de ps-graduao, sintonizados com as

necessidades de desenvolvimento local e regional. Em sntese: o cenrio at 2002

da Rede Federal de Educao Profissional e Tecnolgica foi de 140 instituies;

38

com o plano de expanso compreendido entre 2005 e 2010, so mais 214 novas

unidades; isso mostra um crescimento de 152% da Rede Federal em apenas 07

anos. (SEDUC, 2008, p. 9)10

Percebe-se que, na agenda do Governo Federal, a expanso da rede

federal de educao profissional a partir de 2003 esteve sempre em pauta, visto a

quantidade de prdios entregues s mais diversas regies do pas, oferecendo

populao brasileira condies de acesso educao profissional em locais nunca

antes imaginados. Muito embora o prdio fsico chegasse ao alcance da populao

brasileira, os equipamentos nele instalados no eram suficientes para dar o suporte

necessrio aos cursos, como, por exemplo, laboratrio para o desenvolvimento de

determinados cursos.

2.3 POLTICA DE FINANCIAMENTO: PACTUAO QUE AGREGA VALOR

SOCIAL

A poltica de financiamento articulada com a regulamentao da

educao profissional possibilitou que estados e municpios, ao fazerem a adeso,

possam capitanear recursos para desenvolver polticas pblicas, desde que estejam

alinhadas ao projeto nacional. Dentre os vrios programas, trazemos para essa

reflexo o Decreto n 6.302, de 12 de dezembro de 2007, que instituiu o Programa

Brasil Profissionalizado11,um programa de assistncia tcnica e financeira que

incentiva a ampliao da oferta do ensino mdio integrado educao profissional,

conforme o artigo 212 do mesmo Decreto.

A partir de 2003, comearam a repercutir no pas as mudanas

relacionadas aos rumos que estava tomando a educao profissional. Sobre isso,

Ramos (2010) analisa:

A nova maneira de compreender a educao profissional, qual seja, no como um sistema paralelo, mas organicamente relacionada com a

10 Informaes obtidas no Plano Integrado de Educao Profissional e Tecnolgica do Estado do

Cear. (SEDUC, 2008, p. 9) 11 Artigo 1. Fica institudo, no mbito do Ministrio da Educao, o Programa Brasil profissionalizado,

com vistas a estimular o Ensino Mdio integrado Educao Profissional, enfatizando a educao cientfica e humanstica, por meio da articulao entre formao geral e educao profissional no contexto dos arranjos produtivos e das vocaes locais e regionais. (Decreto n 6.302/07, p. 1)

12 Artigo 2. O Programa Brasil Profissionalizado prestar assistncia financeira a aes de desenvolvimento e estruturao do Ensino Mdio integrado Educao Profissional mediante seleo e aprovao de propostas, formalizada pela celebrao de convnio ou execuo direta, na forma da legislao aplicvel. (Decreto n 6.302/07, p. 1)

39

educao bsica, traz implicaes importantes quanto responsabilizao dos sistemas de ensino na sua oferta, em razo tanto da articulao da formao inicial e continuada com a EJA, quanto da integrao da formao tcnica com o ensino mdio na modalidade EJA, podem ou mesmo devem articul-los com a educao profissional, precisando dispor, ento, de estrutura fsica e de recursos financeiros para esse fim. Igualmente podendo oferecer o ensino mdio tcnico, no faz sentido que se financie somente a formao geral, mas tambm a formao especfica que assegura a educao profissional tcnica de nvel mdio. (RAMOS, 2010, p. 51)

J sinalizam, nesse momento, a importncia dessa poltica pblica que

deixa de ser um atendimento paralelo como j aconteceu anteriormente para ser

totalmente integrada articulando-se com a educao bsica inclusive na poltica de

financiamento garantindo dessa forma uma ao conjunta alinhada ao projeto

nacional.

O Programa Brasil Profissionalizado foi concebido para reestruturar as

redes pblicas estaduais de educao profissional integrada ao ensino mdio,

porm o que predomina nessa relao o termo articulao, como podemos ver nos

incisos III, V, VII, que versam sobre os objetivos do programa, expressando a defesa

de que a formao profissional seja, principalmente, articulada educao bsica.

O termo integrao, que deveria ser fortemente empregado, aparece apenas no

inciso IV, desvinculando-se do seu objetivo primordial, que integrar o

conhecimento do ensino mdio prtica.

O Decreto ainda aponta a necessidade de:

I - expandir o atendimento e melhorar a qualidade da educao brasileira; II desenvolver e reestruturar o ensino mdio, de forma a combinar formao geral, cientfica e cultural com a formao profissional dos educandos; VI - incentivar o retorno de jovens e adultos ao sistema escolar e proporcionar a elevao da escolaridade, a construo de novos itinerrios formativos e a melhoria da qualidade do ensino mdio, inclusive na modalidade de jovens e adultos; VIII fomentar a oferta ordenada de cursos tcnicos de nvel mdio. (BRASIL, 2007)

Em 2011, o Programa Brasil Profissionalizado foi direcionado para

compor a estrutura de um novo programa: O Programa Nacional de Acesso ao

Ensino Tcnico e Emprego (PRONATEC), que visa articular financiamento e

concepo de formao, envolvendo todos os programas e todas as aes do MEC

voltados para a educao profissional. Entretanto, esse novo Programa indica

40

elementos de financiamento para os Institutos Federais e a iniciativa privada,

priorizando a oferta de cursos subsequentes e de formao inicial bsica, o que

sinaliza elementos de mudana do Programa Brasil Profissionalizado inserido dentro

do PRONATEC. Isso no inviabiliza sua ao dentro do Ensino Mdio integrado

Educao Profissional Tcnica de nvel mdio.

O PRONATEC tem por objetivos:

I - expandir, interiorizar e democratizar a oferta de cursos de educao profissional tcnica de nvel mdio presencial e a distncia e de cursos e programas de formao inicial e continuada ou qualificao profissional; II - fomentar e apoiar a expanso da rede fsica de atendimento da educao profissional e tecnolgica; III - contribuir para a melhoria da qualidade do ensino mdio pblico, por meio da articulao com a educao profissional; IV - ampliar as oportunidades educacionais dos trabalhadores, por meio do incremento da formao e qualificao profissional; V - estimular a difuso de recursos pedaggicos para apoiar a oferta de cursos de educao profissional e tecnolgica; VI - estimular a articulao entre a poltica de educao profissional e tecnolgica e as polticas de gerao de trabalho, emprego e renda. (BRASIL, 2011)

Dentre os defensores do Brasil Profissionalizado, Colombo (2009) afirma:

Que este programa traz consigo novas concepes de educao profissional, alm da integrao de ensino, j contempladas na LDB e no Decreto 5.154/04, pois, o Programa apresenta uma perspectiva democrtica quando sugere que esta formao seja destinada a todos os cidados como forma de preparao para o mundo do trabalho. Coloca a permanente elevao da escolaridade como central na oferta da modalidade e prope a criao de itinerrios formativos para incentivar o retorno dos jovens e adultos escola. (Colombo 2009)

Dessa forma, o autor traz uma reflexo relativa contribuio que esse

programa agrega na preparao dos jovens para o moderno mundo do trabalho,

considerando a continuidade dos estudos, bem como oportunizando que outros

jovens voltem a sonhar com a possibilidade de voltar a aprender no s um ofcio,

mas se envolver com as diferentes formas de cultura.

Portanto, os programas de financiamento do Governo Federal citados

aqui, como Programa Brasil Profissionalizado e PRONATEC, visam firmar convnios

com os estados, garantem verbas para a construo de escolas profissionais de

nvel mdio, as chamadas Escolas Padro/MEC, e a construo de laboratrios

41

tcnicos para garantir o bom funcionamento dos cursos em escolas adaptadas, ou

seja, aquelas escolas que receberam a proposta inicialmente, antes da construo

das Escolas Padro/MEC.

A partir do Decreto n 5.154/04, a modalidade de educao profissional

vem ganhando espao, no sentido de aprimorar cada vez mais essa oferta,

utilizando-se de estratgias integradoras, buscando atingir os objetivos propostos.

2.4 EDUCAO PROFISSIONAL E AS ORIENTAES NA FORMAO DO SER:

UMA PERSPECTIVA INTEGRAL E INTEGRADA

Nesse contexto, o Projeto de Lei n 8.035/10, Plano Nacional de

Educao (PNE 2011 2020), em relao ao ensino mdio, determina a

universalizao do atendimento e a elevao da taxa de escolarizao lquida dos

jovens com idade entre 15 e 17 anos, de acordo com a Meta n 3:

Universalizar, at 2016, o atendimento escolar para toda a populao de quinze a dezessete anos e elevar, at 2020, a taxa lquida de matrculas no ensino mdio para oitenta e cinco por cento nesta faixa etria. (BRASIL, 2010)

Conhecendo que cada uma das metas vem acompanhada das

respectivas estratgias que buscam atingir os objetivos propostos, das 12

estratgias elencadas para o atingimento da Meta 3 (trs), citamos, aqui, a

estratgia de nmero 6 (seis), que, se bem trabalhada contempla a que se prope a

educao profissional.

Estimular a expanso do estgio para estudantes da educao profissional tcnica de nvel mdio e do ensino mdio regular, preservando-se seu carter pedaggico integrado ao itinerrio formativo do estudante, visando ao aprendizado de competncias prprias da atividade profissional, contextualizao curricular e ao desenvolvimento do estudante para a vida cidad e para o trabalho. (BRASIL, 2010)

O Documento Base lanado pelo Ministrio da Educao detalha como

se deu a revogao do Decreto n 2.208/97 pelo j citado Decreto n 5.154/04, em

meio grande efervescncia nos debates relativos relao entre o Ensino Mdio

e a Educao profissional. Sobre esse documento, Frigotto (2005) tece algumas

consideraes:

O documento fruto de um conjunto de disputas e, por isso mesmo, um documento hbrido, com contradies que, para expressar a luta dos

42

setores progressistas envolvidos, precisa ser compreendido nas disputas internas na sociedade, nos estados, nas escolas. Sabemos que a lei no a realidade, mas a expresso de uma correlao de foras no plano estrutural e conjuntural da sociedade. Ou interpretamos o Decreto como um ganho poltico e, tambm, como sinalizao de mudanas pelos que no querem se identificar com o status quo, ou ser apropriado pelo conservadorismo, pelos interesses definidos pelo mercado. O avano na educao mais completa, na formao humana que defendemos para jovens e adultos trabalhadores no se dar apenas pela contestao aos seus elementos de acomodao aos diferentes interesses que se enfrentaram durante sua elaborao e que continuam ativos na sua possvel implementao. H que se d historicidade ao debate e ao. A histria nos coloca num terreno contraditrio da dialtica de velho e do novo de lutarmos contra a ideologia e democracia burguesa, no espao restrito desta democracia burguesa em que vivemos. (FRIGOTTO, 2005, p. 4)

Esse um documento que indica o surgimento de um instrumento legal,

fruto de ideias progressistas e conservadoras, que marcam a histria da educao

profissional no pas, movida por foras contraditrias, trazendo de volta a

possibilidade de contribuir com uma educao emancipatria.

Para Santos (2007),

As reformas educacionais ocorridas durante os governos de Fernando Henrique Cardoso e de Lus Incio Lula da Silva pautaram a reformulao de polticas para o Ensino Mdio entre a formao geral e a formao tecnolgica. Durante a gesto de Fernando Henrique Cardoso, o ensino mdio centrou-se num ensino propedutico, de formao geral, discursado como ensino mdio para a vida, separando a educao profissional do ensino regular. Com o governo de Luiz Incio Lula da Silva, retomou-se a idia de formao integral, tecnolgica, buscando integrar a educao profissional com o ensino mdio. (SANTOS, 2007)

Percebe-se que esses dois momentos marcaram significativamente a

poltica de educao no pas, principalmente a educao profissional, cada governo

com seus ideais, o primeiro seguindo a lgica da produo, e o segundo, a lgica da

educao.

O Parecer do CNE/CEB n 39/04 deixa claro que tanto a Lei n 9.394/96

LDB, quanto o Decreto n 5.154/04, regulamentador da Educao Profissional, no

admitem mais essa dicotomia maniquesta que separa a teoria da prtica. Ele deixa

claro que, na adoo da forma integrada, o estabelecimento de ensino no estar

ofertando dois cursos sua clientela. Trata-se de um nico curso, com projeto

pedaggico nico, com proposta curricular nica e com matrcula nica, orientado

para o cumprimento simultneo das finalidades estabelecidas, tanto para a

Educao Profissional Tcnica de nvel mdio quanto para o Ensino Mdio, como

etapa de concluso da Educao Bsica.

43

Assim, Ramos (2005, p. 122) afirma que A integrao exige que a

relao entre conhecimentos gerais e especficos seja construda continuamente ao

longo da formao, sob os eixos do trabalho, da cincia e da cultura.

Desse modo, a interpretao dada como consequncia dessa

simultaneidade prevista pelo Decreto n 5.154/04, no se pode, portanto, organizar

esse curso integrado com duas partes distintas, a primeira concentrando a formao

do Ensino Mdio e a segunda, de um ano ou mais, como formao de tcnico. Um

curso assim seria, na realidade, a forma concomitante ou subsequente travestida de

integrada. Esse procedimento, alm de contrariar o Decreto n 5.154/04,

representaria um retrocesso pedaggico, reforando a indesejada dicotomia entre

conhecimentos e sua aplicao, ou seja, teoria e prtica.

Para Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005):

A modalidade de ensino Educao Profissional Tcnica de nvel mdio vista como uma soluo transitria e vivel: transitria porque fundamental que se avance numa direo em que deixe de ser um luxo o fato dos jovens das classes populares poderem optar por uma profisso aps os 18 anos de idade; e vivel porque o Ensino Mdio integrado ao Ensino Tcnico, sob uma base unitria de formao geral, uma condio necessria para se fazer a travessia para uma nova realidade. (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 43)

Nesse sentido, a Resoluo n 6/12, que define Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educao Profissional Tcnica de Nvel Mdio, no seu artigo 5,

apresenta sua finalidade tambm relacionada formao humana, quando afirma

que:

Os cursos de Educao Profissional Tcnica de nvel mdio tm por finalidade proporcionar ao estudante conhecimentos, saberes e competncias profissionais necessrios ao exerccio profissional e da cidadania, com base nos fundamentos cientfico-tecnolgicos, scio-histricos e culturais. (Resoluo n 6/12, p. 2)

Nesse contexto, ProEMI, Documento Orientador (2014):

Orientam que as aes propostas para o Ensino Mdio Integrado a Educao Profissional Tcnica de nvel mdio devero considerar o trabalho, a Cincia, a Cultura e a Tecnologia como dimenses indissociveis da formao humana e eixo articulador conforme estabelecem as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio. (ProEMI, Documento Orientador, 2014, p.8)

Assim, todas as orientaes que envolvem essa modalidade de ensino

tm uma direo na formao do ser integral e integrado. Integral porque, como j

44

dizia Aristteles, Educar a mente sem educar o corao no educao, e

integrada quando proporciona ao indivduo compreender e relacionar tudo o que

est sua volta.

Todas as abordagens apresentadas neste captulo tm a inteno de

buscar uma reflexo acerca de como se deu o processo histrico do fortalecimento e

tambm do retrocesso dessa modalidade de ensino, amparada na legislao

brasileira, que, por foras de correntes de pensadores e estudiosos em educao,

lanou um olhar para essa parcela da populao, contribuindo no sentido de que se

pensasse o ensino mdio integrado no mais como adestramento, mas

compreendendo, sobretudo, que a cincia e a tcnica esto presentes em todas as

profisses, devolvendo a esperana a todos aqueles que h dcadas vm lutando

por uma educao profissional pblica, gratuita, de qualidade, voltada ao

aprendizado significativo e emancipao dos sujeitos envolvidos nos processos

educativos.

Muito se tem ainda que pesquisar, aprofundar as discusses em relao a

essa modalidade de ensino, educao profissional, principalmente a articulao na

forma integrada.

Diante da apresentao desse recorte histrico da educao profissional

no contexto nacional, seguiremos fazendo uma anlise da poltica de educao

profissional no estado do Cear, observando se a poltica pblica no contexto

estadual assume caractersticas daquilo que foi delineado pelo Ensino Profissional

Nacional.

45

3 O CONTEXTO DA EDUCAO PROFISSIONAL NO CEAR: A DESCENTRALIZAO DA POLTICA DE 2008 A 2014.

No present