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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE MESTRADO ACADÊMICO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE ANA PAULA NEVES LOPES ENTRE OPORTUNIDADES, SONHOS E REALIDADE: EXPERIÊNCIAS DE JOVENS ESTUDANTES DE UMA ESCOLA PROFISSIONALIZANTE DE FORTALEZA FORTALEZA - CEARÁ 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE

MESTRADO ACADÊMICO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE

ANA PAULA NEVES LOPES

ENTRE OPORTUNIDADES, SONHOS E REALIDADE: EXPERIÊNCIAS DE

JOVENS ESTUDANTES DE UMA ESCOLA PROFISSIONALIZANTE DE

FORTALEZA

FORTALEZA - CEARÁ

2015

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ANA PAULA NEVES LOPES

ENTRE OPORTUNIDADES, SONHOS E REALIDADE: EXPERIÊNCIAS DE JOVENS

ESTUDANTES DE UMA ESCOLA PROFISSIONALIZANTE DE FORTALEZA

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado

Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade

do Programa de Pós-Graduação em Políticas

Públicas e Sociedade do Centro de Estudos

Sociais Aplicados da Universidade Estadual

do Ceará, como requisito parcial para à

obtenção do título de mestre em Políticas

Públicas e Sociedade.

Área de Concentração: Políticas Públicas e

Sociedade.

Orientador: Prof. Dr. João Bosco Feitosa dos

Santos.

FORTALEZA – CEARÁ

2015

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Aos jovens, interlocutores desta pesquisa, por

tornarem possível a realização deste trabalho.

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AGRADECIMENTOS

O percurso deste trabalho, trilhado com dúvidas, angústias, alegrias, afetos, aprendizados,

sonhos, não foi vivido de modo solitário, mas acompanhado, de perto ou de longe, em

presença ou pensamento, por muitas pessoas especiais que compartilharam comigo os

prazeres e desafios da arte da pesquisa e da própria vida. Sinto dizer que as palavras aqui

expostas não comportam todo o meu sentimento de gratidão reservado a elas e, por isso, os

meus agradecimentos vão além do que os olhos conseguem captar. Muito obrigada:

À Deus, por todas as oportunidades e conquistas proporcionadas em minha vida. Por me

estender sua mão quando eu humanamente não tinha mais forças para prosseguir.

Aos meus amados pais, Maria Alzenir e Manoel, pelo amor incondicional que nutre minha

existência. Obrigada pelo apoio, dedicação e atenção que sempre me dispuseram. Vocês são

meu porto seguro, minha alegria, meu viver!

Aos meus queridos irmãos: Marcos, pela companhia de todos os dias, por me inspirar sempre

e me encorajar na luta por meus objetivos. Obrigada por ouvir minhas vivências e escritas e

por todos os incentivos no decorrer desta pesquisa. Claudiene e Francisco, por todo o amor e

carinho que sempre demonstraram por mim, pelo incentivo e confiança e por todas as

vivências de aprendizados, alegrias e tristezas divididas. E Emanoel (in memoriam), por todos

os momentos que compartilhamos juntos, os quais são impossíveis lembrar sem as lágrimas

saltarem aos meus olhos e a saudade apertar meu coração, pelas lembranças do seu sorriso

tímido e do seu jeito meigo e manso de ser. Obrigada por continuar presente em minha vida,

mesmo em outra dimensão.

Aos meus sobrinhos queridos, Maria Clara e Lucas, e ao meu afilhado Rodrigo, por me

fazerem reviver a infância ao acompanhar suas brincadeiras ou participar delas. Obrigada

pelos carinhos e sorrisos que enchem meus dias de alegria e encanto.

A todos os meus familiares, tias e tios, primas e primos, avós e avôs, os quais tenho grande

consideração, carinho e respeito. Em especial à prima Daniely, pela amizade e incentivo de

sempre e pela colaboração na revisão do texto.

À minha amiga Deinair, pela companhia constante pessoalmente ou por telefone. Por saber

ouvir e compreender tão bem minhas angústias e por sempre me encorajar nos momentos de

aflição desta escrita. Agradeço ainda, pela leitura cuidadosa e sugestões que muito

contribuíram à elaboração deste trabalho.

À Lidiane, pela amizade construída desde a graduação e por ser alguém com quem sempre

posso contar. Obrigada pelo apoio, pela leitura e contribuições ao trabalho.

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À Jaiane, pela amizade, pelas conversas e parceria nos estudos e viagens acadêmicas, e pelos

sonhos e frustrações compartilhados.

À Sabrina, por ser sempre tão amável e prestativa. Obrigada pela amizade sincera e o apoio

constante nessa trajetória do Mestrado e na caminhada da vida.

Ao amigo Airton, por quem tenho enorme estima. Obrigada por estar sempre presente, por

suas palavras e gestos de carinho e, ainda, pela elaboração do abstract.

À amiga Danila e ao amigo Rafael, pela alegria dos encontros que tornam meus dias mais

leves e coloridos.

Ao professor João Bosco Feitosa dos Santos, por me acolher como orientanda e compartilhar

comigo seus ensinamentos. Obrigada pela confiança e amizade construída e por me

disponibilizar o tempo e o apoio necessários quando mais precisei.

À professora Celecina de Maria Veras Sales (Celé), pelos anos de amizade, aprendizados e

afeto. Obrigada por semear em mim o interesse pela pesquisa, principalmente na temática de

juventudes e, pelas valiosas contribuições ao trabalho.

À professora Francisca Rejane Bezerra Andrade, pela atenção e disponibilidade em participar

das bancas de qualificação e defesa com significativas colaborações ao trabalho.

À professora Rosemary de Oliveira Almeida, por ter me indicado e apresentado ao local da

pesquisa.

À Universidade Estadual do Ceará e ao Programa de Mestrado Acadêmico em Políticas

Públicas e Sociedade, pela estrutura física e humana e, aos colegas de mestrado da turma 13,

pelas conversas, amizades construídas e conhecimentos partilhados.

À escola pesquisada, em nome de toda a equipe escolar. Por se mostrarem sempre simpáticos

e dispostos a colaborar com esta pesquisa, mediante a disponibilidade de materiais,

informações, documentos e entrevistas.

Aos jovens, estudantes do 3º ano das turmas de Redes de Computadores e Estética, pela

enorme contribuição dada ao estudo, por dividirem comigo suas experiências, angústias,

sonhos e por me receberem sempre com calorosos sorrisos e afetos.

À CAPES, pelo auxílio financeiro à pesquisa.

A todos e todas, que de uma forma ou de outra colaboraram para a realização deste trabalho,

deixo aqui meus sinceros agradecimentos.

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“O sonho é que leva a gente para a frente. Se

a gente for seguir a razão fica aquietado,

acomodado”.

(Ariano Suassuna)

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RESUMO

Nesta pesquisa, tenho como objetivo analisar as repercussões do ensino médio integrado à

educação profissional nos projetos de futuro dos jovens estudantes de uma escola

profissionalizante de Fortaleza. A pesquisa foi realizada em uma Escola Estadual de Educação

Profissional em Fortaleza-CE, com jovens na faixa etária de 16 a 19 anos, do 3º ano dos

cursos de Redes de Computadores e Estética. A pesquisa, de natureza qualitativa, se

concretizou em dois momentos: primeiro, com os jovens enquanto estudantes e,

posteriormente, com esses mesmos sujeitos enquanto egressos. Utilizei como instrumentos

metodológicos a observação direta; acompanhamento dos sujeitos na rede social facebook;

cadernos-diário para as narrativas juvenis; entrevistas semiestruturadas e diário de campo. O

estudo mostrou que os jovens se inserem no ensino médio profissionalizante sem grandes

expectativas e afinidades com o curso técnico. Buscam melhores oportunidades de educação e

trabalho que a escola profissionalizante pode oferecer. Nesse sentido, a maioria dos jovens

concludentes não projeta seu futuro tendo como centralidade a formação profissional

adquirida. Desejam conquistar o diploma como estratégia de expandir as possibilidades diante

do futuro incerto que os espera. Percebi que, apesar da escola profissionalizante ter como foco

a preparação dos jovens para o mercado de trabalho, ela tem favorecido de modo mais

significativo a inserção desse contingente ao ensino superior. Embora os jovens tenham

avaliado a política do ensino médio integrado à educação profissional de modo positivo,

teceram críticas à adaptação feita pelo governo nas escolas já existentes por fragilizar os

resultados esperados. Aliado à infraestrutura precária do local estudado, outras lacunas

fragilizam a política, entre elas: ausência de docentes efetivos da base técnica; falta de

investimentos para atividades culturais; desvio de funções nos estágios. Observei que há

considerável flexibilidade da escola pesquisada em proporcionar espaços-tempos de expressão

das culturas juvenis, em especial, pelo incentivo aos projetos e grupos culturais na instituição.

Associado a isto, contempla em sua dinâmica um conjunto de elementos que contribuem para

a formação humana, fortalecem a socialização e a construção de projetos de futuro,

constituindo assim, um verdadeiro “ateliê de sonhos” para os jovens.

Palavras-chave: Jovens Estudantes. Escola Profissionalizante. Projetos de Futuro.

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ABSTRACT

In this research, my objective is to analyze the repercussions of high school teaching coupled

to professional education in future projects of young students at professionalizing school in

Fortaleza. The survey was conducted at Escola Estadual de Educação Profissional in

Fortaleza-CE, with young people aged 16-19 years on the 3rd year of Computer Network and

Esthetics courses. The qualitative research took place in two phases: first with young people

as students and later with those same subjects as graduates. I used as methodological tools

direct observation; monitoring of subjects in Facebook social network; notebooks diary for

youth narratives; semi-structured interviews and field diaries. The study showed that young

people enter in the professionalizing high school without great expectations or affinities with

the technical course. They seek better opportunities for education and work that the

professionalizing school can provide. Thus, the most part of the concluding young people do

not plan their future focusing on the professional training they learned. They want to get the

diploma as a strategy to expand the possibilities knowing that an uncertain future awaits them.

I realized that despite the professionalizing school have as aim to prepare young people for

the labor market it has helped more significantly the inclusion of that group on higher

education. Though young people have evaluated the high school policy integrated with

professionalizing education positively, have criticized the adjustment made by the

government on existing schools that weakened the expected results. Coupled with the poor

infrastructure of the studied place, other gaps weaken the policy, among them: lack of non-

temporary technical teachers; lack of investments for cultural activities; deviation of duties in

training jobs. I observed that the researched school offers considerable flexibility providing

several opportunities to youth culture expressions, specially encouraging projects and cultural

groups in the institution. Additionally includes in its dynamics a number of factors that

contribute to human development, strengthen the socialization and the construction of future

projects, constituting real "studio of dreams" for young people.

Keywords: Young students. Professionalizing school. Future projects.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Vista da entrada da escola (à frente) (A); Espaço do pátio (B)....................... 25

Figura 2 - Sala de aula (A); biblioteca (B); sala de leitura (C); quadra de esportes

(D)......................................................................................................................

27

Figura 3 - Laboratório de Informática I (A); laboratório de Informática II (B);

laboratório de Hardware (C); laboratório de Estética (D) e laboratório de

Ciências (E).....................................................................................................

28

Figura 4 - Jovens apresentando o TCC............................................................................. 35

Figura 5 - Cadernos-diário utilizados para as narrativas juvenis..................................... 39

Figura 6 - Imagem da página da “EEEP da Depressão” no facebook.............................. 64

Figura 7 - Grupos culturais em apresentação na instituição: Coral (A); Dança (B);

Instrumental (C).................................................................................................

67

Figura 8 - Jovens projetistas apresentando projeto em Santiago (Chile)........................... 70

Figura 9 - Jovens durante apresentação de projeto (A e B)............................................... 70

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANPAE Associação Nacional de Política e Administração da Educação

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CEFETs Centros Federais de Educação Tecnológica

CIOPS Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança

CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

CPU Unidade Central de Processamento

EAFI Escola Agrotécnica Federal de Iguatu

EEEPs Escolas Estaduais de Educação Profissional

ENEM Exame Nacional do Ensino Médio

EPI Equipamento de Proteção Individual

FAMETRO Faculdade Metropolitana da Grande Fortaleza

FANOR Faculdade Nordeste

FEBRACE Feira Brasileira de Ciência e Engenharia

FIES Programa de Financiamento Estudantil

FPC Formação para Cidadania

ICE Instituto de Co-Responsabilidade pela Educação

IFCE Instituto Federal do Ceará

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC Ministério da Educação

ONGs Organizações não Governamentais

PET Programa de Educação Tutorial

PIBID Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência

PLANFOR Plano Nacional de Formação Profissional

PROCENTRO Programa de Desenvolvimento dos Centros de Ensino Experimental

PROEP Programa de Expansão da Educação Profissional

PROUNI Programa Universidade para Todos

REUNI Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das

Universidades Federais

SEBRAE Serviço Nacional de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

SEDUC Secretaria da Educação do Ceará

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SEFOR Superintendência das Escolas Estaduais de Fortaleza

STDS Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social

SISU Sistema de Seleção Unificada

TCC Trabalho de Conclusão de Curso

TEO Tecnologia Empresarial Odebrecht

TESE Tecnologia Empresarial Socioeducacional

TPV Temáticas Práticas e Vivências

UAB Universidade Aberta do Brasil

UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

UNICHRISTUS Centro Universitário Christus

UECE Universidade Estadual do Ceará

UFC Universidade Federal do Ceará

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 16

2 PERCURSO METODOLÓGICO: OBSERVANDO, OUVINDO E EXPRESSANDO O

CAMPO ................................................................................................................................... 20

2.1 RELAÇÃO COM O OBJETO DE ESTUDO .................................................................... 21

2.2 INSERÇÃO NO CAMPO: ENCONTROS E DESENCONTROS .................................... 23

2.3 O LOCAL E OS SUJEITOS DA PESQUISA: ADENTRANDO O MUNDO DA ESCOLA

.................................................................................................................................................. 24

2.4 OBSERVAÇÃO: UMA AÇÃO DE MÃO DUPLA............................................................ 29

2.5 O ESTREITAR DOS LAÇOS NA REDE SOCIAL FACEBOOK .................................... 35

2.6 EM BUSCA DO “NÃO DITO”: O USO DE CADERNOS-DIÁRIO COMO

INSTRUMENTO METODOLÓGICO .................................................................................... 37

2.7 ENTREVISTAS: INTERAÇÕES FACE A FACE ............................................................. 41

2.8 ANÁLISE DOS DADOS ................................................................................................... 43

3 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, JUVENTUDES E POLÍTICAS PÚBLICAS:

ENCONTROS DA TEORIA COM A REALIDADE ........................................................... 45

3.1 BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL ... 45

3.2 AS ESCOLAS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO CEARÁ:

CARACTERÍSTICAS E AVANÇOS ....................................................................................... 53

3.2.1Os reflexos de uma escola profissionalizante adaptada .............................................. 57

3.2.2 Educação e cultura: quando a escola se torna palco das expressões culturais juvenis

.................................................................................................................................................. 65

3.3 JUVENTUDES E ESCOLA: CONEXÕES ENTRE OS SUJEITOS E O LOCAL DA

PESQUISA ............................................................................................................................... 73

4 DE JOVENS ESTUDANTES A JOVENS EGRESSOS: NARRATIVAS JUVENIS

SOBREA INSERÇÃO, A VIVÊNCIA E OS PROJETOS DE FUTURO EM UMA

ESCOLA PROFISSIONALIZANTE DE FORTALEZA .................................................... 84

4.1 AS RAZÕES DA ESCOLHA DE UM ENSINO MÉDIO PROFISSIONALIZANTE ..... 84

4.1.1 Dos percalços da trajetória escolar ............................................................................. 89

4.1.2 As expectativas e experiências dos jovens no estágio ................................................. 92

4.2 ESCOLA PROFISSIONALIZANTE: PASSAPORTE PARA O MERCADO DE

TRABALHO E/OU PARA O ENSINO SUPERIOR? ............................................................. 98

4.3 O PROGRAMA DAS ESCOLAS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NA

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ÓTICA DOS JOVENS ESTUDANTES................................................................................. 113

4.3.1 A escola profissionalizante como “ateliê de sonhos” ................................................. 115

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 124

REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 129

APÊNDICES ......................................................................................................................... 137

APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................. 138

ANEXOS................................................................................................................................ 140

ANEXO A – FOTOS DE APRESENTAÇÕES DO GRUPO PHYLOS PELA CIDADE DE

FORTALEZA ......................................................................................................................... 141

ANEXO B – JOVENS DA PESQUISA EM MOMENTOS DE SOCIALIZAÇÃO NA

ESCOLA ................................................................................................................................. 142

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1 INTRODUÇÃO

Surge em 2008, no Ceará, o ensino médio integrado à educação profissional com

o objetivo de promover a articulação do ensino médio com a formação para o mundo do

trabalho. Para o desenvolvimento dessa política, o Governo Estadual contou com os

incentivos do Governo Federal por meio do Programa Brasil Profissionalizado. Implantado

em 2007, o Programa visava fortalecer as redes estaduais de educação profissional e

tecnológica. Durante os seis anos de execução da Política de Educação Profissional no Ceará

já foram investidos mais de um bilhão de reais na implantação e desenvolvimento de Escolas

Estaduais de Educação Profissional (EEEPs), que até o início de 2015 somavam 111

unidades, distribuídas em 82 municípios, abrangendo escolas na capital e no interior do

Estado, e ofertando 53 cursos técnicos. Do total de alunos matriculados no ensino médio no

Ceará, 12% destes estão nas escolas profissionalizantes, o que equivale a 40.979 alunos

(SEDUC, 2015).

Observa-se um crescimento de investimentos governamentais, principalmente dos

Governos Federal e Estadual, para o desenvolvimento e ampliação de programas de educação

profissional no País. Os investimentos em educação profissional no Ceará vêm tendo

repercussão nacional, considerado como o Estado comprometido com a educação e que

inspira o Governo Federal na formulação de políticas educacionais para o País. Se nos

primórdios da nossa história a educação profissional assumia caráter secundário e pouco

valorizado, sendo oferecido aos marginalizados socialmente com o objetivo de ensinar um

ofício, assume hoje novas feições ao contemplar sujeitos diversos e ser usada no discurso

central dos governos como a garantia para o desenvolvimento e crescimento econômico do

País1.

Diante de uma sociedade globalizada, que vem, nos últimos anos, passando por

diversas e significativas transformações sociais, repercutidas nos diferentes espaços e setores,

a educação tem ocupado, cada vez mais, posição de destaque na vida das pessoas. Os sujeitos

revivem a valorização do poder da educação, seja por considerá-la como instrumento de

mobilidade social e/ou pela consciência das novas exigências do mundo do trabalho.

A partir desse contexto e instigada pelo crescimento do ensino médio integrado à

educação profissional no Ceará este estudo se apoia nas seguintes indagações: Quais as

1 Fala proferida pela Presidenta Dilma Rouself em seu discurso de inauguração de uma escola profissionalizante

no Ceará, em que destacou a importância da educação em tempo integral para o País crescer e se desenvolver.

Apresentou ainda, a proposta de difundir o ensino técnico em todo o País. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=0U5OO2_2chI>. Acesso em: 29 abr. 2015.

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repercussões do ensino médio integrado à educação profissional nos projetos de futuro dos

jovens? Que motivos levaram os jovens a ingressarem no ensino médio profissionalizante?

Como os jovens avaliam o Programa das Escolas Estaduais de Educação Profissional no

nosso Estado? Qual a interferência do ensino médio integrado à educação profissional na

inserção dos jovens no mercado de trabalho e no ensino superior?

Refletir sobre estas questões, que norteiam este trabalho, se mostra pertinente para

compreender os reflexos desse novo cenário da educação brasileira e cearense, principalmente

relacionadas ao ensino médio integrado à educação profissional, e analisar como estes vêm

atingindo as diferentes juventudes, seus processos formativos, bem como seus projetos de

futuro. Assim, nesta pesquisa tenho como objetivo analisar as repercussões do ensino médio

integrado à educação profissional nos projetos de futuro dos jovens estudantes de uma escola

profissionalizante de Fortaleza. Busco ainda, conhecer os motivos que levaram os jovens ao

ensino médio profissionalizante e investigar como os jovens avaliam o programa das EEEPs

no Ceará, como também, compreender a interferência do ensino médio integrado à educação

profissional na inserção dos jovens no mercado de trabalho e no ensino superior.

Uma vez que os jovens representam os sujeitos privilegiados da Política de

Educação Profissional, nada mais conveniente que refleti-la a partir da visão desses sujeitos

que vivenciam o cotidiano na escola profissionalizante e são, portanto, os mais indicados e

capazes de avaliar os serviços a eles destinados. Com esse propósito, neste estudo, os jovens

são os principais interlocutores do debate ao trazer suas experiências de formação e suas

análises sobre esse processo, apontando ainda críticas e sugestões de melhoria para o processo

educativo e para a instituição escolar.

Para atingir os objetivos propostos, tive como norteadores os pressupostos da

pesquisa qualitativa e instrumentos metodológicos que melhor apreendessem as vivências dos

jovens na realidade estudada, valorizando o olhar e a escuta dos sujeitos e reconhecendo-os

como diversos. A pesquisa foi realizada em uma Escola Estadual de Educação profissional de

Fortaleza-CE, com jovens na faixa etária de 16 a 19 anos, do 3º ano dos cursos de Redes de

Computadores e Estética. Para preservar a identidade do local e dos sujeitos estudados,

ressalto que o nome da escola pesquisada não será divulgado, bem como, os nomes dos

jovens entrevistados. Para estes últimos utilizarei nomes fictícios.

Com o intento de apresentar a trajetória realizada e os diálogos construídos a

partir desta pesquisa com os sujeitos e suas experiências em uma escola de educação

profissional, esta Dissertação está dividida em cinco seções. Nesta seção, a Introdução,

apresento de modo breve o objeto de estudo, os objetivos e a estrutura do trabalho.

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Na segunda seção “Percurso metodológico: observando, ouvindo e expressando o

campo” apresento minha relação com o objeto de estudo e descrevo como se deu a escolha do

local e dos sujeitos, a inserção em campo e a aproximação com os jovens, assim como a

definição e aplicação dos instrumentos metodológicos utilizados. São enfatizados os

encontros e desencontros ocorridos nesse processo, os obstáculos e as dificuldades, como

também as alegrias e os encantamentos proporcionados pela pesquisa.

Na terceira seção “Educação profissional, juventudes e políticas públicas:

encontros da teoria com a realidade”, abordo as categorias centrais desta pesquisa. Traço

inicialmente uma breve contextualização da educação profissional no Brasil, buscando dar

subsídios ao leitor para compreender o contexto do qual surgem as Escolas Estaduais de

Educação Profissional no Ceará, apresentando em seguida, suas características e avanços.

Tomo como referência a escola pesquisada, que é adaptada, para analisar a interferência da

estrutura escolar na formação dos jovens estudantes, bem como, analiso as experiências destes

nos projetos científicos e culturais. Destaco ainda, as conexões entre os sujeitos e o local da

pesquisa, em que enfatizo a discussão da juventude na sua multiplicidade e os dilemas vividos

pela escola, que se comporta ora flexível, ora disciplinadora. Por fim, apresento uma breve

discussão das políticas públicas para as juventudes com foco para as Políticas de Educação

Profissional.

Na quarta seção “De jovens estudantes a jovens egressos: narrativas juvenis sobre

a inserção, a vivência e os projetos de futuro em uma escola profissionalizante de Fortaleza”

apresento os resultados e discussões apreendidos dos objetivos propostos ao trabalho.

Primeiramente explicito os motivos que levaram os jovens pesquisados ao ensino médio

profissionalizante, apontando as principais dificuldades enfrentadas por eles durante a

formação e também discuto suas vivências no estágio supervisionado obrigatório. Discuto

ainda, de que modo a formação proporcionada pela escola profissionalizante, mediante o

ensino médio integrado à educação profissional, interfere na inserção dos jovens no mercado

de trabalho e no ensino superior, sendo a discussão intercalada com os depoimentos dos

sujeitos e suas vivências como egressos. Em seguida, os jovens apresentam suas concepções

acerca do Programa das Escolas Estaduais de Educação Profissional no Ceará a partir da

experiência vivenciada na escola pesquisada. Esse capítulo se encerra com a discussão de

como os jovens percebem as repercussões da formação obtida na escola profissionalizante na

construção dos seus projetos de futuro.

E por fim, a última seção consiste nas considerações finais do estudo, nas quais

apresento uma síntese dos principais aspectos abordados e dos resultados obtidos no trabalho.

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Nessa perspectiva, introduzo este trabalho convidando o leitor para embarcar comigo ao

encontro dos jovens pesquisados e suas experiências com a educação profissional em uma

escola profissionalizante de Fortaleza. Destaco aqui as expectativas, dificuldades e projetos de

futuro que acompanharam os sujeitos no ambiente escolar, e fora dele, quando passaram de

jovens estudantes a jovens egressos do ensino médio profissionalizante.

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2 PERCURSO METODOLÓGICO: OBSERVANDO, OUVINDO E EXPRESSANDO O

CAMPO

“Criar formas inventivas de pesquisar, maneiras de

fazer, é um desafio, principalmente quando nos

expomos através da escrita, pois escrever é uma forma

de se mostrar. Correndo todos os riscos, aventuramos-

nos a dizer que nossa escrita se coloca na ordem da

paixão pela pesquisa, pela vontade de abrir horizontes,

pela inquietação constante de questionar verdades e pelo

desejo de experimentar novos caminhos”.

(SALES, 2005, p. 83).

Inspirada em Sales (2005), a escrita do percurso metodológico expressa os

encantos e desafios trilhados na pesquisa, numa caminhada nem sempre fácil de ser

percorrida, carregada de dúvidas, incertezas, desencontros. Mas como disse Stecanela (2009,

p. 12) “o caminho não se faz sem conflitos, sem dúvidas e sem incertezas, pois as perguntas

servem para mobilizar em direção à construção de respostas, sempre parciais e provisórias

sobre a realidade que nos é dada a ler”. Percebi então, nessa trajetória investigativa, que os

anseios e as dúvidas fazem parte do processo de amadurecimento do pesquisador e que

quando este consegue driblá-los dá espaço a novas experiências, as que refletem a alegria e o

encantamento pela pesquisa.

A realização deste trabalho teve como suporte os pressupostos da pesquisa

qualitativa como modo de melhor apreender as vivências dos jovens em uma escola

profissionalizante. A abordagem qualitativa se mostrou a mais apropriada por envolver os

significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, e por constituir um espaço mais

profundo das relações, dos processos e dos fenômenos, “um lado não perceptível e não

captável em equações, médias e estatísticas” (MINAYO, 1994, p. 22). Utilizei como

instrumentos: observação direta, cadernos-diário confeccionados para as narrativas juvenis,

entrevistas semiestruturadas e acompanhamento na rede social facebook2. Na escolha das

ferramentas metodológicas busquei aquelas que deixassem os jovens mais à vontade para

compartilharem suas experiências, sonhos, angústias, os sentimentos mais ocultos,

privilegiando o olhar e a escuta dos sujeitos.

A pesquisa de campo teve início em setembro de 2013, período em que os jovens

cursavam o último semestre do curso, e se concretizou em dois momentos: o primeiro,

mediante observações e conversas informais nas duas turmas pesquisadas com os jovens

2 Rede social criada em 2004 representa hoje a mais acessada entre os internautas brasileiros.

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enquanto estudantes (de setembro a dezembro de 2013) e, o segundo momento, por meio de

acompanhamento na rede social facebook e da realização de entrevistas com esses mesmos

sujeitos enquanto egressos, sendo selecionados nove jovens para esta última etapa, que

ocorreu entre janeiro de 2014 a fevereiro de 2015.

2.1 RELAÇÃO COM O OBJETO DE ESTUDO

O pesquisador em seu percurso investigativo perpassa por diversos momentos

para conseguir construir, de fato, seu objeto de estudo. Na verdade, essa construção percorre

todo o trabalho de pesquisa, pois inicialmente, constitui uma ideia projetada de interesse, a

qual só será definida após várias leituras, orientações, reflexões, visitas ao campo. Nesse

processo, certo dia, em um desses momentos de reflexão, transportei-me ao passado

relembrando fatos marcantes da minha trajetória escolar e dos sonhos que eu carregava

quando criança. Percebi então, que havia entre mim e os sujeitos da pesquisa uma relação

muito próxima, mesmo se referindo a contextos e circunstâncias distintas.

Fazia parte das minhas lembranças, neste dia, a cena em que minha mãe me

levava à escola, pela primeira vez, aos 4 anos de idade. Não era uma escola com a estrutura

que conhecemos, era uma casa emprestada para este fim. Eu morava no interior do Estado, na

zona rural, e na época, por falta de escolas na região, normalmente as aulas aconteciam na

casa das próprias professoras. Lembro-me como eu estava feliz naquele dia e de como eu me

orgulhava ao dizer que havia iniciado os estudos com aquela idade, pois considerava que

havia iniciado muito cedo. Só mais tarde percebi que algumas crianças vão para o espaço

institucional educativo, até mesmo antes de um ano de vida e embora não estejam ainda

estudando, já estão recebendo estímulos importantes para o desenvolvimento da

aprendizagem e da formação humana.

A felicidade do primeiro dia de aula se transpôs aos anos escolares posteriores.

Sempre gostei muito de estudar e estabeleci ao longo dos anos uma relação muito próxima

com a escola, com os estudos, tendo desde criança os sonhos projetados nessa direção.

Recordo que nas redações escritas na escola a pedido das professoras, geralmente no início do

ano letivo, já apontava o interesse de cursar uma faculdade, fazer mestrado e doutorado, me

tornar independente financeiramente e ajudar os meus pais. Hoje quando me lembro disso

chego a rir, pois não sei como tomei conhecimento de mestrado e doutorado naquela época.

Cursei o ensino médio na Escola Agrotécnica Federal de Iguatu (EAFI/CE, hoje

Instituto Federal do Ceará – IFCE/Campus Iguatu), e ter estudado em uma escola técnica é

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algo que me aproxima muito dos sujeitos em estudo, pois estudei em tempo integral e obtive

além da formação básica do ensino médio, uma formação técnica. Fui estudar na escola

técnica por incentivo da família e por referência de dois irmãos que já haviam estudado lá.

Assim como alguns jovens da pesquisa, eu pensava mais na qualidade do ensino e na oferta de

oportunidades que a escola poderia me disponibilizar, do que na identificação com a área do

curso e da possibilidade de trabalhar logo após a conclusão. Embora sonhasse em cursar um

ensino superior, optei por uma escola técnica por ser naquele tempo e naquela região a que se

mostrava com maiores possibilidades de oferecer um melhor ensino.

A minha aproximação com as temáticas de estudo, juventudes e educação

profissional, se deu enquanto estudante do Curso de Economia Doméstica na Universidade

Federal do Ceará (UFC), em que fui bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET), cuja

tutora era a professa Dra. Celecina de Maria Veras Sales. Durante os três anos de participação

no PET, elaboramos e executamos três pesquisas anuais: a primeira, “Juventude e Internet: as

tecituras da cultura, comunicação e aprendizagem no viver tecnológico”, desenvolvida no

assentamento Todos os Santos no município de Canindé-CE e na EEEP Paulo Petrola,

localizada em Fortaleza-CE; a segunda, “Cultura Juvenil e Perspectivas de Futuro de Jovens

do Campo e da Cidade” realizada no assentamento José Lourenço no município de

Chorozinho-CE e na EEEP Joaquim Nogueira em Fortaleza-CE; a terceira, “Juventudes,

Grupalidades e Lazer”, desenvolvida no assentamento José Lourenço e na EEEP Paulo

Petrola, ambos locais já anteriormente trabalhados. No PET tive a oportunidade de adentrar

intensamente no campo do ensino, da pesquisa e da extensão sobre juventudes,

experimentando os prazeres e desafios da arte de pesquisar e ser pesquisadora.

A partir da experiência no PET, realizei meu trabalho de Graduação sobre

“Juventudes, Formação Profissional e Perspectivas de Futuro: experiência na Escola Estadual

de Educação Profissional Paulo Petrola”. Relacionando o contexto de avanço e repercussão

das escolas profissionalizantes e os discursos dos jovens em pesquisas anteriores - quando

destacavam a importância da escola profissionalizante para os seus projetos de futuro – foi

quando me senti instigada a iniciar os estudos sobre a temática da juventude e da educação

profissional. O trabalho de monografia foi desenvolvido na mesma escola e período em que o

PET estava realizando a pesquisa “Juventudes, Grupalidades e Lazer”, contando com a

colaboração do grupo, principalmente de duas bolsistas que também estavam realizando seus

trabalhos de conclusão de curso na referida escola.

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Assim, dar continuidade aos estudos de juventude e educação profissional no mestrado

se mostrou oportuno para fortalecer discussões anteriores e aprofundar minha compreensão

crítica na temática, o que também será uma contribuição para os estudos da área.

2.2 INSERÇÃO NO CAMPO: ENCONTROS E DESENCONTROS

“A vida é arte do encontro, embora haja tanto

desencontro pela vida”.

(Vinícius de Moraes)3.

Ansiedade, timidez, insegurança, medo. Adentrei o campo com as sensações de

uma pesquisadora de primeira viagem. Embora já tivesse experiência teórica e prática de

pesquisa, percebo a inserção em cada nova investigação como a subida ao palco ou a entrada

em cena, em que o início do espetáculo é sempre vivido com tensão e frio na barriga. Mesmo

os artistas mais experientes relatam sentir essas sensações, como se o fato de senti-las tornasse

a vivência do momento ainda mais prazeroso.

Para esta pesquisa tinha como proposta discutir juventude e educação profissional

a partir do Programa das Escolas Estaduais de Educação Profissional do Governo do Estado

do Ceará e sabia de antemão que a pesquisa seria desenvolvida com os jovens em uma das

escolas profissionalizantes de Fortaleza. O passo seguinte foi definir em qual escola, tendo em

vista que havia, na época, 19 unidades implantadas na capital. No final do primeiro semestre

do mestrado comecei a contactar com uma escola, por indicação de uma amiga, mas depois de

várias tentativas, por telefone e visita ao local sem conseguir conversar com a diretora,

percebi a inviabilidade daquele espaço e fui à busca de outro.

Essa decisão foi importante, pois a dificuldade de contato que antecedeu a

inserção em campo não foi algo positivo e continuar insistindo poderia não ser uma boa ideia.

Segundo Minayo (2010), os contatos, assim como os critérios lógicos, a interação e a

conveniência, fazem parte dos elementos que devem ser observados pelo pesquisador na

escolha do local da pesquisa. Fiquei desmotivada por não ter dado certo e preocupada por

precisar recomeçar. No entanto, essa experiência comprovou que nós pesquisadores

precisamos estar preparados para o inusitado, os obstáculos são muitos e nem tudo ocorre

perfeitamente bem da primeira vez. Persistência, paciência, determinação, são virtudes que

devem fazer parte da bagagem do pesquisador, pois a pesquisa se concretiza entre encontros e

desencontros, como o próprio desenrolar da vida, expresso no trecho da canção do poeta

3 Trecho da música “Samba da Benção”. Composição de Vinicius de Moraes e Baden Powell.

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Vinícius de Moraes no início desse tópico. O fato também mostrou a vantagem de ir para

campo o quanto antes, uma vez que, diante dos desencontros, o pesquisador tem mais tempo

para encontrar um novo caminho.

A segunda proposta de local surgiu por intermédio de uma professora do mestrado

do qual faço parte, a qual coordenava na época um grupo de estudantes pesquisadores do

Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) do curso de Ciências

Sociais da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e iria desenvolver no semestre seguinte

(2013.2), junto com o grupo, uma pesquisa em uma escola profissionalizante de Fortaleza-CE.

A minha primeira visita ao espaço foi em companhia do grupo para uma reunião com a

direção e coordenação escolar sobre o projeto a ser implantado em parceria com o grupo do

PIBID e a escola. Na ocasião fui apresentada pela professora aos integrantes da instituição e

tive a oportunidade de expor minha proposta de estudo, que recebeu consentimento para ser

realizada.

Minha inserção no campo foi facilitada pela parceria com o grupo do PIBID e

pela receptividade da equipe escolar: coordenadores, professores, alunos e demais

funcionários, que se mostraram dispostos, desde o primeiro momento, a colaborar com a

pesquisa. Encontrar essa receptividade pelos sujeitos foi o retorno que eu precisava para

acreditar que estava no lugar certo e sair da escola naquele dia com a expressão de alegria e

contentamento expressa no rosto, carregada por energias positivas. Além disso, estava ansiosa

para por em prática as ideias que surgiam em pensamento.

Percebi que a inserção prévia no campo foi algo muito favorável, pois

inicialmente estamos cheios de dúvidas ou muito confiantes da nossa proposta de estudo e a

vivência no local de pesquisa pode mostrar novidades inesperadas, pois “é no encontro com o

campo que o pesquisador se depara com as circunstâncias que o objeto de pesquisa lhe

apresenta” (JOCA, 2013, p. 48).

2.3 O LOCAL E OS SUJEITOS DA PESQUISA: ADENTRANDO O MUNDO DA

ESCOLA

A pesquisa foi realizada em uma Escola Estadual de Educação Profissional em

Fortaleza-CE. A instituição foi fundada em 14 de fevereiro de 1974 como escola de 1º grau e

a partir de 2009 passou a oferecer o ensino em tempo integral, articulando o ensino médio ao

profissional. Os sujeitos da pesquisa são jovens de 16 a 19 anos, concluintes do 3º ano dos

cursos de Redes de Computadores e Estética.

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Figura 1- Vista da entrada da escola (à frente) (A); Espaço do pátio (B)

(A)

(B)

Fonte: Arquivo pessoal.

A escola pesquisada é conhecida popularmente por fazer parte do bairro João

Arruda, mas este não aparece nos documentos referentes aos bairros de Fortaleza, sendo a

comunidade contemplada pelo bairro Dom Lustosa. O bairro faz parte da Secretaria Executiva

Regional III, composta por 16 bairros que juntos concentram 16,5% da população do

município e metade da população tem até 28 anos. Outro fator relevante é possuir o terceiro

menor índice de analfabetismo entre as regionais4. Nas proximidades do local de estudo se

encontra um campus da UFC, o Campus do Pici e um terminal de ônibus, o do Antônio

Bezerra.

O bairro caracteriza-se como uma área de risco com muitos problemas

relacionados à violência, drogas, e apresenta poucas oportunidades de trabalho. Diante da

ausência de políticas públicas para a juventude na comunidade em estudo, realidade que não

se diferencia muito de outros bairros pobres da cidade, fica evidente a necessidade de

articulação entre outros setores sociais como instituições de trabalho, de justiça, universidades

e órgãos comunitários5. A realidade do contexto da pesquisa pode ser pensada a partir da fala

de uma das jovens estudadas, quando interrogada sobre o que achava da estrutura da escola:

Em relação à estrutura, não é muito bom, não aqui, tem as escolas padrão MEC

[Ministério da Educação], mas essa aqui que foi adaptada, acho que não é nem tanto

por causa da estrutura, mas por causa do bairro, muitos alunos foram assaltados;

teve o vigia que levou um tiro [...] O pessoal aí [do bairro] tem mania de jogar

pedras nas salas; já jogaram bomba também no telhado [...] Eu pensando que era

4 Segundo o Relatório de Pesquisa: Cartografia da Criminalidade e da Violência na cidade de Fortaleza.

Fortaleza, 2010, p. 110. 5 Baseado no Projeto Político Pedagógico da escola pesquisada. Fortaleza, 2012.

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bomba, aí eu vi o pessoal correndo e quando eu vi tinha sido o vigia que tinha sido

baleado [...] Não morreu não, mas foi no pescoço. E na hora do almoço, o pessoal

jogando e já tentaram pular; os vagabundos tentaram pular. A segurança aqui é

quase zero (Beatriz, Redes de Computadores, 18 anos).

Lembrei-me da minha primeira visita à escola, quando ao sair uma das

coordenadoras alertou-me do risco de assalto na parada de ônibus, recomendando que ficasse

mais próxima ao portão da escola. O fato de a escola ficar próxima ao terminal Antônio

Bezerra facilita a passagem de ônibus com frequência. Ao ir à escola procurava não me expor

muito, andava sempre de jeans e camiseta, sem assessórios chamativos, apenas uma bolsa na

qual transportava os materiais utilizados na pesquisa de campo. Escolhia chegar e/ou sair da

escola em horários mais movimentados, como no início ou final da manhã ou da tarde,

quando os alunos chegavam ou saiam da escola e iam para o estágio. Em muitas dessas idas e

vindas à instituição deparei-me com os alunos da pesquisa nas paradas de ônibus, no terminal,

nos ônibus e aproveitava para aproximar-se deles e iniciar uma conversa. Costumava

perguntar onde moravam, se gostavam da escola, como estava sendo a experiência do estágio,

quais as expectativas para o ENEM6, o que pensavam fazer quando saíssem da escola.

Na escola profissionalizante 80% dos alunos que entram são oriundos da rede

pública de ensino e 20% da rede privada. Assim, os jovens que constituem a clientela da

escola estudada são majoritariamente provenientes de camadas populares e chegam à escola

com profundas lacunas em seu processo de escolarização. Essas lacunas, principalmente em

leitura e matemática, dificultam a apreensão de novos conhecimentos. Em virtude disso, os

jovens ao entrarem na escola passam por um curso de nivelamento, o qual tem o objetivo de

suprir as deficiências de aprendizagem no ensino fundamental. Outro objetivo da escola tem

sido buscar parceria com as universidades como forma de aumentar os índices de

aprendizagem7.

Como escola profissionalizante ofertou inicialmente dois cursos técnicos, Estética

e Informática. Depois este último mudou para Redes de Computadores e foram incorporados

outros três cursos, o de Meio Ambiente, o de Agroindústria e o de Finanças. Embora tenha

passado a oferecer cursos profissionalizantes a escola continuou com a estrutura antiga e

6 Exame Nacional do Ensino Médio. Foi criado em 1998 e tem o objetivo de avaliar o desempenho do estudante

ao fim da escolaridade básica. Podem participar do exame alunos que estão concluindo ou que já concluíram o

ensino médio em anos anteriores. Cerca de 500 universidades já usam o resultado do exame como critério de

seleção para o ingresso no ensino superior, seja complementando ou substituindo o vestibular. Disponível em:

<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=183&Itemid=414>. Acesso em: 17

fev. 2015. 7 Informações obtidas em reunião com a direção e coordenação da escola quando apresentaram as características

da mesma para mim e o grupo do PIBID. Foi minha primeira visita à escola, quando apresentei meu projeto e

recebi consentimento para realizá-lo.

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precária, o que dificulta a realização de atividades. Possui o aspecto de uma construção velha,

necessitando de reparos e pintura. Por ser adaptada não oferece espaço para expansão, com a

construção de laboratórios, por exemplo. Esse foi o principal motivo da mudança do curso de

Informática para Redes de Computadores e da inviabilidade de permanência dos cursos de

Meio Ambiente e Agroindústria, que tiveram suas últimas turmas concluídas no final de 2014.

A infraestrutura da escola compreende nove salas de aula, biblioteca com sala de

leitura, quadra de esportes, dois laboratórios de Informática, um laboratório de Hardware, um

laboratório de Estética, um laboratório de Ciências, sala dos professores, secretaria, diretoria,

banheiros, cozinha, pátio. Na escola não tem um auditório nem sala extra para a realização de

atividades extracurriculares.

Figura 2 – Sala de aula (A); biblioteca (B); sala de leitura (C); quadra de esportes(D)

(A)

(B)

(C) (D)

Fonte: Arquivo Pessoal.

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Figura 3 – Laboratório de Informática I (A); laboratório de Informática II(B);

laboratório de Hardware (C); laboratório de Estética (D) e laboratório de Ciências (E)

(A)

(B)

(C)

(D)

(E)

Fonte: Arquivo Pessoal.

O núcleo gestor é composto por um diretor, três coordenadores escolares, um

assessor financeiro, uma secretária, quatro auxiliares de serviços gerais e dois vigias. A escola

contava na época com 23 professores ao todo, sendo 15 da base comum e oito da base técnica.

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Por ser em tempo integral os alunos ficam na escola das 07h00min às 16h40min

horas e fazem três refeições por dia, sendo um almoço e dois lanches. Assistem nove aulas

diárias (cinco pela manhã e quatro à tarde) de conteúdos do ensino médio regular e do ensino

profissionalizante, mesclados entre os turnos manhã e tarde, com exceção dos alunos do 3º

ano, que só assistem aulas do ensino médio regular pela manhã e fazem estágio à tarde. Das

disciplinas que se diferenciavam do ensino médio regular eram: Formação para a Cidadania

(FPC); Técnico (específico para os três cursos); Projeto de vida; Mundo do Trabalho;

Temáticas Práticas e Vivências (TPV).

2.4 OBSERVAÇÃO: UMA AÇÃO DE MÃO DUPLA

Após a confirmação do local, iniciei as visitas à escola em setembro de 2013.

Estas foram realizadas com o objetivo de conhecer a estrutura da instituição, sua dinâmica de

funcionamento e como os jovens vivenciavam o espaço.

Apesar de ter apontado no projeto de pesquisa os métodos a serem utilizados,

busquei desde o início estar flexível ao que o campo me propusesse. Desse modo, privilegiei

as observações em visitas constantes à escola, buscando vivenciar ao máximo o ambiente.

Embora assumisse sempre a postura de pesquisadora, fazendo-me reconhecer como tal,

procurei familiarizar-me mais com os sujeitos para que estes estabelecessem maior confiança

comigo, pois sabia da importância do estreitamento dos laços para um maior acesso às

informações, principalmente as de âmbito pessoal, mais difíceis de serem compartilhadas. “A

investigação qualitativa requer, como atitudes fundamentais, a abertura, a flexibilidade, a

capacidade de observação e de interação com o grupo de investigadores e com os atores

sociais envolvidos” (MINAYO, 2010, p. 195).

As observações na escola tiveram duração de quatro meses, de setembro a

dezembro de 2013. Essas ocorreram em diferentes espaços e momentos, entre eles: salas de

aula, pátio, quadra de esportes, atividades livres dos alunos, reuniões de estágio,

apresentações de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), conselhos de classe, reunião com

pais e alguns eventos de socialização ocorridos. Esse período foi de extrema importância para

experimentar o cotidiano dos jovens na escola e estabelecer com eles os primeiros contatos.

Para conhecer os jovens era preciso estar junto a eles, vê-los, ouvi-los,

acompanhá-los no cotidiano escolar e para isso se fazia necessário “captar e interpretar o

sentido que os próprios atores sociais têm de sua realidade, aprender como eles vivem, como

pensam, como produzem suas concepções de mundo, desvelando, assim, sua mentalidade,

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suas direções e perspectivas” (DAMASCENO, 2005, p. 52). Transitar entre/com os jovens

exigia além dos sentidos apurados, a interação, e essa nem sempre foi uma tarefa fácil para

mim, uma vez que sou tímida e me aproximar dos jovens exigia mais espontaneidade para

iniciar uma conversa. Era necessário socializar, criar vínculos, estreitar laços.

Nas idas ao campo, sempre buscava me planejar na noite anterior, organizando o

material que utilizaria no dia seguinte. Costumava elaborar um roteiro, no qual descrevia o

que pretendia na visita. Para uma maior organização dos dados observados utilizava o diário

de campo, sempre registrando no início de cada nova observação, a data, o horário, o local e

os sujeitos observados, pois com o decorrer das observações formou-se um extenso material

de anotações, que se não estivessem organizadas teriam dificultado a análise posterior.

O diário de campo é um instrumento pessoal do pesquisador no qual ele pode se

expor livremente, sem embasamento teórico, a respeito de sua vivência no campo de pesquisa.

A descrição deve ser minuciosa, explorando com detalhes os ambientes observados, os

sujeitos, as falas, as expressões, as emoções vividas pelo pesquisador e observadas nos

pesquisados. Normalmente, os pesquisadores optam por anotar apenas o essencial, pequenos

registros durante as observações e conversas informais para aprofundar posteriormente, pois a

escrita pode gerar constrangimento ao despertar a curiosidade dos investigados. Ciente disso,

embora o diário de campo tenha sido meu companheiro inseparável nas idas ao campo,

costumava registrar informações breves como lembretes na presença dos sujeitos e só ao

chegar em casa descrevia-as detalhadamente, me reportando ao acontecido e refletindo sobre

o mesmo.

Lembro que no primeiro contato com os sujeitos da pesquisa, em que aproveitei o

momento para fazer uma sondagem inicial com informações relevantes ao estudo, entre elas

os motivos que os haviam levado ao ensino médio profissionalizante, as expectativas para o

ENEM e seus projetos de futuro, percebi que enquanto registrava de forma breve algumas

anotações no diário de campo os jovens ficaram a me observar, buscando decifrar o que eu

havia escrito. Isso me deixou bastante desconcertada e não consegui dar continuidade com

todos aqueles olhares voltados à minha escrita.

Ao registrar as observações no diário de campo, fiquei em alguns momentos sem

saber como expressar os reflexos do campo, como se as palavras não comportassem o

sentimento. Talvez essa sensação decorresse do receio de não ser fiel por escrito ao

observado, pois sempre foi uma preocupação minha apresentar a trajetória da pesquisa da

forma mais real possível ao leitor, ou como desejou Pais (2003, p. 91) dar uma “impressão

viva” ao trabalho, para que a descrição seja capaz de transportar o leitor ao espaço e tempo

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experimentados pelo pesquisador, assim como, fazê-lo sentir as sensações que acompanharam

o percurso. Nessa reflexão me reporto ao Brandão (1982, p. 11), em um de seus textos,

escritos em forma de carta e bem breve, no qual retrata características do diário de campo e

ressalta a dificuldade de registrar o observado: “eu não descobri como anotar aquilo, que me

tocava tanto, nas folhas dos diários de campo que carregava pra todo canto”. E a razão dessa

dificuldade ele mesmo explicou logo adiante: “os escritos do diário descrevem maneiras de

sentir pessoas, lugares, situações e objetos” (BRANDÃO, 1982, p. 13), e assim, faz-se

necessário, antes de escrever, compreender o que se sente.

O uso do diário de campo serviu tanto para o registro dos acontecimentos em

campo como para aprofundar questões do objeto de pesquisa. Ideias e pensamentos foram

anotados e posteriormente aproveitados, modificados, aprofundados, conforme crescia a

vivência no campo e a compreensão do estudo.

Realizei nas primeiras visitas à escola observações nas salas de aula das diferentes

turmas com o objetivo de me aproximar dos jovens e definir as turmas a serem trabalhadas.

Nas observações, ficava sempre no final da sala, em silêncio, apenas a observar, sem interferir

o andamento das atividades. Mesmo assim, era alvo de observações também por parte dos

sujeitos e isso foi constatado em uma das visitas quando a professora chamou a atenção da

turma, que estava bastante agitada, alertando-os da minha presença. Nesse momento um dos

alunos comentou baixinho, lá na frente, próximo à professora e ela reproduziu para mim:

“eles estão dizendo que enquanto você os observa, eles também te observam”.

Dessa forma, Marques e Villela (2005) demonstraram ter passado por uma

experiência similar: “além de não passarmos despercebidos, nos fizemos alvo de curiosidade,

senão de investigação, tanto quanto fazíamos de nossos vizinhos” (p. 49). Sales (2005)

também experimentou uma vivência parecida, quando ao iniciar uma entrevista individual e

pedir que um jovem falasse sobre seu cotidiano, ele disse que antes de responder gostaria de

saber informações sobre a vida da pesquisadora, demonstrando que “o pesquisador é

constantemente avaliado e, de certa forma, torna-se também um informante” (SALES, 2005,

p. 76). Isso demonstra que no campo a observação é uma ação de mão dupla, exercida tanto

pelo pesquisador quanto pelos sujeitos.

Decidi trabalhar com as duas turmas do 3º ano: Redes de Computadores e

Estética. A escolha dos cursos se deu por terem sido os primeiros criados na escola e os

únicos com turmas de 3º ano. Fator relevante, uma vez que, pretendia investigar as

perspectivas juvenis, as quais se tornam mais visíveis nesse período, quando os sujeitos já são

capazes de avaliar as experiências vivenciadas. Em virtude disso foquei as observações em

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sala de aula apenas nessas turmas e essas constituíram o foco de análise deste trabalho. As

observações em sala de aula ocorreram no período da manhã, pois à tarde os alunos se

dirigiam ao estágio. Nos dias de visita à escola me revezava entre as duas turmas, passando o

período antes do intervalo com uma turma e ao retornar com outra. As observações

possibilitaram-me conhecer melhor os sujeitos, interagir com eles, estabelecer laços de

amizade e confiança.

Com a turma de Redes de Computadores essa socialização aconteceu de forma

mais rápida e natural, pois consegui em pouco tempo estabelecer contato com quase todos os

alunos. Estes se mostraram mais acessíveis, sempre me cumprimentavam e muitas vezes se

aproximavam de mim para conversar.

Na turma de Estética, embora eu tenha sido também recebida com receptividade, a

relação não fluiu como na turma anterior. As alunas, que compreendiam a quase totalidade da

sala, eram mais fechadas, menos comunicativas, só comentavam algo quando eu perguntava.

Isso dificultou minha aproximação e posteriores tentativas de conversa.

As duas turmas observadas eram mistas. Na turma de Redes de Computadores

eram 37 alunos ao todo, destes 14 eram jovens do sexo feminino. Na turma de Estética eram

33 alunos, destes, apenas dois jovens do sexo masculino.

Com o decorrer das observações e com as conversas informais com os sujeitos,

me tornei uma presença conhecida pelos alunos, professores, núcleo gestor e demais

funcionários da escola, que me cumprimentavam ao passar, perguntavam pelo andamento da

pesquisa, se aproximavam para compartilhar alguma informação ou simplesmente dá um

abraço. Era muito gratificante quando essa interação partia deles também.

Esse andar pelo espaço delimitado no qual a pesquisa transcorre permite que o

etnógrafo se situe, isto é, adquira naquele contexto um lugar e uma identidade.

Trata-se de um percurso marcado pela interação. Ora, interagir pela participação nos

rituais, nos trabalhos, no lazer e pela interlocução nas entrevistas informais, nas

conversas suscitadas pela participação, nos bate-papos que até parecem escapar dos

desígnios do trabalho de campo, alimentados apenas pelas amizades ali contraídas

(SILVA, 2009, p. 178).

Embora eu fizesse visitas semanais, variava os dias e os horários de ida à escola e

de observação nas turmas, o que me possibilitou presenciar fatos inéditos e importantes para

compreender melhor as características da escola, como no dia do recital de poesias, o dia em

que fiquei sabendo que teria conselho de classe, e em outro momento que enquanto

conversava com uma das coordenadoras na secretaria iniciou uma reunião entre duas

professoras com o pai de um aluno.

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Era por volta de 09h20min da manhã. Eu estava na escola desde cedo, já havia

assistido uma apresentação de TCC da turma de Redes e quando chegou a hora do

intervalo todos os alunos saíram das salas e foram, a maioria, imediatamente para a

fila do lanche. Nesse momento, resolvi ir para o banco na entrada da escola.

Costumava ficar lá, às vezes, pois permitia uma visão de praticamente todo o pátio,

consistia um local privilegiado para as observações, principalmente em momentos

de intervalo, quando os alunos ficavam circulando por todo o espaço. Estava sentada

acompanhando com o olhar o movimento dos jovens, indo de um lado para o outro,

brincando, conversando. Mostrava-se uma cena normal aos dias já vivenciados,

quando de repente, passa uma aluna [que já me conhecia] e me convida para assistir

algo que na hora não entendi direito. Levantei-me rapidamente para acompanhá-la e

saber do que se tratava. Junto a ela iam outros alunos em direção à biblioteca.

Quando entrei na sala de leitura [da biblioteca] entendi o que viria a acontecer, pois

bem em frente à porta de acesso tinha um cartaz escrito “Recital de Poesias” [e

lembrei que eu já havia visto o cartaz de inscrições fixado na porta da biblioteca]. As

cadeiras estavam distribuídas em dois lados da sala, formando um corredor ao meio,

que serviria mais tarde para a apresentação dos jovens. Uma mesa posta ao lado de

entrada era o local específico para os jurados. Entrei e sentei na segunda fileira de

cadeiras do lado direito da sala, atrás da aluna que eu havia acompanhado. Ela era da

turma de Redes, assim como outros dois alunos [uma moça e um rapaz] que

chegaram em seguida e sentaram-se próximos a nós [com esses eu também já havia

estabelecido maior contato]. Fiquei sabendo que os três iriam competir no recital e

eu me sentia ansiosa para assisti-los. Os jovens mostravam-se ansiosos também. A

aluna que me fez o convite entregou seu celular e me pediu para tirar fotos enquanto

se apresentassem. Após alguns minutos todas as cadeiras estavam ocupadas e uma

funcionária da biblioteca [organizadora do evento] iniciou o momento, apresentou

os jurados, deu boas vindas a todos. Um dos jurados, professor da escola, abriu a

programação recitando um poema de sua autoria. Para acompanhar as apresentações

havia um jovem aluno tocando violão. Todas as apresentações foram muito boas,

fiquei no momento pensando: “que bom a aluna ter me convidado para assistir”; mas

ao mesmo tempo me questionei: Por que o evento não está acontecendo em um

horário livre, no pátio, para que os demais alunos possam contemplar seus colegas?

Pois naquele momento acontecia aula normalmente. Pelo que percebi, estavam

presentes, além dos alunos que recitavam, os colegas mais próximos que foram

torcer por eles e receberam liberação dos professores. Fiquei encantada com a

desenvoltura dos jovens. Foi emocionante a forma como dramatizaram com o uso de

objetos e gestos, e de como souberam repassar o sentimento proposto pelos versos;

alguns até recitaram poemas de sua autoria. Os ouvintes, inclusive eu, vibramos ao

final de cada apresentação. E como ressaltou a organizadora do evento: “é em

momentos simples como esse que descobrimos talentos”. A vencedora, que ganhou

um pen drive, a mesma que me fez o convite, ficou surpresa com a vitória e chorou

emocionada ao final (Diário de Campo, 12 de dezembro de 2013).

A movimentação inicial na escola, com conversas e alunos circulando é pausada

com a entrada dos professores em sala e retorna no horário do lanche e do almoço. A

interação no espaço nos horários livres é típica de escolas de jovens, muita agitação e barulho,

jovens circulando, conversando entre si, brincando uns com os outros, paquerando. As

demonstrações de afeto por meio de abraços e beijos no rosto eram frequentes entre os jovens

e destes com os professores.

Depois do almoço os jovens do 3º ano saiam rapidamente para o estágio e os

demais faziam atividades diferenciadas, dependendo do grupo de amigos, dos gostos, do dia.

Ficava uma boa concentração de jovens no espaço do pátio (usado como refeitório no horário

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das refeições), sentados nas mesas em grupo, conversando, estudando. Outros ficavam

sentados nos corredores das salas de aula, estudando, conversando, ouvindo música, usando o

celular, tocando violão e/ou cantando; alguns ficavam nas salas de aula, conversando,

dormindo, estudando, ou iam para a sala de leitura (na biblioteca) para estudar; outros usavam

a área livre entre o pátio para brincar de bola (futebol ou vôlei), enquanto outros brincavam na

quadra. Em dias de provas, embora houvesse jovens realizando todas essas atividades, se

destacavam os que ficavam estudando, individualmente ou em grupo, distribuídos nos

diferentes espaços da escola.

No período de observações, tive a oportunidade de assistir algumas reuniões de

acompanhamento do estágio, chamada de mediação. Estas aconteciam normalmente na última

quinta-feira do mês entre o professor orientador de estágio e os alunos.

Cada turma era dividida em dois grupos, ficando um professor orientador em cada

uma. Na turma de Redes de Computadores a mediação acontecia em dois ambientes

diferentes, sendo usados normalmente a sala de leitura da biblioteca ou os laboratórios de

Informática. A reunião acontecia com todos sentados em círculo compartilhando, um aluno de

cada vez, suas experiências no estágio. Já na turma de Estética, as mediações sempre

aconteciam no laboratório de Estética com as duas professoras juntas, que embora no mesmo

espaço, ficavam separadas, cada professora com seu grupo. A mediação acontecia

individualmente, em dupla ou trio, nunca o grupo todo ao mesmo tempo, pois segundo às

professoras a reunião com todos juntos não estava repercutindo em bons resultados.

Na mediação os alunos relatavam suas experiências no estágio: as atividades

desenvolvidas, as dificuldades enfrentadas, davam sugestões, expressavam também seus

desejos, dúvidas, insatisfações, alegrias. Era o momento em que os professores davam seu

feedback para os alunos, a partir da visita realizada na empresa e da conversa com o

supervisor. Quando algum aluno não estava se adaptando na empresa, o professor buscava a

transferência de local.

Acompanhei os jovens, também, nas apresentações de TCC. O trabalho era

elaborado a partir da experiência do estágio e de acordo com um modelo disponibilizado pela

Secretaria da Educação do Ceará (SEDUC)8. A elaboração e apresentação do TCC constituia

uma exigência para a conclusão do curso técnico. Essa experiência proporcionava aos jovens

os primeiros contatos com a escrita de um trabalho científico, algo significativo,

8 A estrutura exigida para o TCC consistia em: capa, folha de rosto, agradecimentos, sumário, introdução,

caracterização da empresa onde o jovem estagiou, atividades desenvolvidas no estágio, estudo de caso (no qual

os jovens deveriam escolher uma atividade ou produto desenvolvido com maior destaque durante o estágio),

considerações finais e referências.

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principalmente para aqueles que desejavam prosseguir os estudos na universidade. Apresentar

o TCC consistia em outro momento de aprendizagem, pela exigência da boa postura, da boa

comunicação e do domínio do conteúdo exposto.

Figura 4 – Jovens apresentando o TCC

(A)

(B)

Fonte: Arquivo pessoal.

Assistir as apresentações de TCC foi algo muito prazeroso, pois além de

presenciar o momento, que era significativo na vida dos jovens, na ocasião além de

abordarem a experiência no estágio, apresentaram uma síntese de suas trajetórias na escola,

destacando as dificuldades, os aprendizados e os sonhos construídos nesse percurso. Cada

apresentação foi única e diversa, como os próprios sujeitos em estudo. Era perceptível a

ansiedade, o nervosismo, a emoção que perpassava seus rostos. Lembro-me de um jovem que

ao final da apresentação não segurou a emoção e deixou as lágrimas transbordarem de seus

olhos. Todos os presentes, inclusive eu, nos emocionamos.

2.5 O ESTREITAR DOS LAÇOS NA REDE SOCIAL FACEBOOK

O facebook constitui, nos dias atuais, uma das redes sociais mais acessadas no

mundo com grande repercussão, principalmente entre os jovens. No espaço virtual, as

juventudes compartilham tudo, ou quase tudo sobre suas vidas por meio de publicações de

fotos, vídeos, comentários em tempo real em suas páginas, formando uma extensa teia de

sociabilidade que ultrapassa o contexto local. “Essa forma de sociabilidade das redes sociais

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faz parte da cultura juvenil contemporânea, uma vez que ela é um modo de expressão coletiva

das experiências sociais de comunicação, informação e relacionamento dos jovens” (SALES,

2010, p. 26). Assim sendo, embora não proponha realizar uma etnografia virtual9, utilizo o

facebook por compreendê-lo como importante instrumento para facilitar o conhecimento, a

comunicação e a interação com os sujeitos da pesquisa.

A ideia surgiu em campo durante as observações em sala de aula, quando ouvi

algumas vezes, os professores comentarem que iriam compartilhar determinado conteúdo no

grupo do facebook. Ao observar o destaque dessa rede social como instrumento de

comunicação/aprendizagem entre professores e alunos, e pela redução de tempo das turmas de

3º ano na escola, em decorrência do estágio, percebi que me comunicar com os jovens pelo

facebook seria algo favorável para estabelecer maior interação e contato. Pensando também

ser um espaço em que eles sentem-se mais à vontade para compartilhar as informações, onde

é viável estabelecer uma comunicação com vários sujeitos simultaneamente e um local

aparentemente atrativo para eles.

O uso de uma rede social como ferramenta metodológica consistia para mim em

um novo desafio de investigação. Os primeiros contatos foram de grande expectativa, eu

precisava não parecer pesquisadora naquele momento para conseguir a confiança deles. Ao

enviá-los o convite fiquei surpresa com a rapidez com que me adicionaram como amiga.

Muitos me confirmaram o aceite ainda na primeira noite. Alguns até chegaram a me

adicionar, pois como eu ainda não os conhecia muito bem, não havia enviado inicialmente

convite a todos.

Fui surpreendida algumas vezes pelos alunos falando comigo, pois embora tenha

buscado desde o início estabelecer uma relação amigável, que não parecesse da minha parte

apenas a intenção de usá-los como informantes, eu estava acostumada a procurá-los, iniciar

uma conversa, perguntar como estavam, demonstrar atenção. Então, quando me via

interpelada por eles querendo saber notícias minhas, desejando-me felicitações em uma data

especial, sendo atenciosos e carinhosos, sentia sempre uma sensação de alegria e satisfação,

por saber que estávamos vivenciando uma relação de troca e que eles me reconheciam como

pesquisadora e mais do que isso.

9 Para Marques (2010, p. 17), “a etnografia ou etnografia virtual são terminologias utilizadas para denominar o

estudo das trocas simbólicas e das práticas culturais e comunicacionais no âmbito da internet”. Durante a

pesquisa de campo acompanhei os jovens pelo facebook e estabeleci conversas via mensagens, mas não realizei

etnografia virtual, pois para isto eu teria que ter realizado, por exemplo, acompanhamentos sistemáticos,

entrevistas ou grupos de discussões pela internet.

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No facebook, foi uma oportunidade de conhecer melhor os sujeitos e também me

fazer mais conhecida, pois como amigos, visualizamos as publicações uns dos outros. Nessas

trocas virtuais, emocionei-me muitas vezes, como no período próximo a despedida deles da

escola. Ao participar dos comentários e compartilhar meus sinceros afetos e agradecimentos,

retribuíram-me com muitas palavras carinhosas. Momentos como esse são revigorantes e

recompensam todas as dificuldades enfrentadas em campo. “Essa interação implica

mutualidade. Nessa ação, o etnógrafo sofre e exerce influência dos/sobre os outros, afeta e é

afetado. Influência e afetação que incidem sobre identidade, condição e desenvolvimentos”

(SILVA, 2009, p. 179).

O uso do facebook foi muito importante, por estreitar os laços com os jovens e

possibilitar manter o contato com eles mesmo depois de egressos, mediante mensagens e

acompanhamento de suas publicações no espaço virtual. Foi também por meio do facebook

que contactei os sujeitos para as entrevistas.

2.6 EM BUSCA DO “NÃO DITO”: O USO DE CADERNOS-DIÁRIO COMO

INSTRUMENTO METODOLÓGICO

“Investigar é um labor científico e não apenas um

tecnicismo. A dialética entre técnica e criatividade é o

tempero da boa pesquisa”.

(MINAYO, 2010, p.199).

Como destaca Minayo (2010), pesquisar vai além de aplicar um conjunto de

métodos. Consiste em um trabalho árduo de investigação, análise, reflexão, que devem estar

associados à criatividade do pesquisador para encontrar os instrumentos mais adequados aos

sujeitos em estudo. Nessa perspectiva, como destacado anteriormente, busquei desde o início

estar flexível ao que o campo me propusesse e foi durante a pesquisa de campo que o uso do

facebook e dos cadernos-diário como métodos de investigação se mostraram oportunos. As

informações sobre o facebook foram traçadas no tópico anterior e sobre os cadernos-diário

passarei a descrever a partir de agora.

A ideia de trabalhar com cadernos para captar as narrativas juvenis veio durante a

pesquisa de Graduação, na qual tinha o objetivo de conhecer as perspectivas de futuro dos

jovens e pensei ser a escrita uma boa alternativa para os sujeitos sentirem-se mais à vontade

para falarem de si e dos seus sonhos. Na época, por consistir um instrumento metodológico

inovador, precisei amadurecer a ideia, compartilhar com a orientadora, pensar formas

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criativas de confeccioná-los, pois sabia que esses detalhes seriam importantes para despertar o

interesse da escrita, principalmente por se tratar de jovens.

Dos cadernos recebidos na pesquisa de Graduação, dois me chamaram mais

atenção pela forma como se apropriaram do instrumento expondo sentimentos pessoais,

gostos, dúvidas, angústias, sonhos. Outro destaque foi a decoração e a escrita detalhada. As

duas jovens que se destacaram fizeram ilustrações, escreveram poemas, músicas, colaram

adesivos ao longo de suas escritas como modo de expressar um pouco de suas personalidades.

Uma delas usou o caderno como um diário relatando as vivências na escola, assim como suas

dúvidas e angústias quanto ao futuro. Assim, além dos cadernos terem me proporcionado

conhecer melhor essas jovens, uma vez que compartilharam sentimentos íntimos, também

possibilitaram ter acesso a muitas informações valiosas para a discussão dos objetivos da

pesquisa, constituindo a técnica em que os jovens mais se expressaram, a qual rendeu mais

dados para discussão, até mais que nas entrevistas.

Dessa forma, por ter sido uma ferramenta metodológica já utilizada e que havia

sido muito satisfatória, e também por estar dando continuidade à investigação dos projetos de

futuro dos jovens, considerei o uso dos cadernos uma alternativa oportuna para a pesquisa do

mestrado. Decidi nomeá-los de cadernos-diário por observar a experiência anterior da

Graduação, em especial da jovem que utilizou o caderno como forma de diário. Como

também, porque penso ser a palavra “diário” a que mais se aproxima da proposta de estudo,

por reportar ao objeto diário, o qual é usado com o intuito de expressar os sentimentos mais

íntimos e difíceis de serem compartilhados. Por meio da escrita buscava dar voz aos jovens,

de modo que eles se sentissem livres e sozinhos para socializar opiniões, pensamentos,

frustrações, perspectivas, os principais acontecimentos e sensações que marcaram suas

experiências na escola, muitas vezes difíceis de serem ditas.

Para a escolha dos jovens, pedi ajuda aos professores orientadores de estágio para

me indicarem alunos que estivessem vivenciando experiências diferentes no estágio e que

possivelmente se comprometeriam em participar da atividade, pois eu ainda não os conhecia

bem e assim seria uma forma de contemplar melhor as características da turma. Pensei

inicialmente focar a experiência do estágio, mas decidi solicitar que descrevessem também

sobre a vivência na escola e as perspectivas de futuro. Inicialmente selecionei 10 alunos de

cada turma. Além das sugestões, conversei com os jovens escolhidos para explicar a atividade

e saber se aceitariam participar.

O modo de confecção dos cadernos foi similar ao realizado na Graduação, com

algumas modificações. A capa foi pensada por mim e criada por uma amiga, na qual aparece a

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imagem de um jovem e uma jovem com balões em branco sobre suas cabeças e por traz dessa

imagem um pano de fundo colorido, buscando criar uma ilustração atrativa que mais se

aproximasse dos sujeitos e pudesse despertá-los para a reflexão e possível posicionamento

sobre os balões em branco. Entreguei junto aos cadernos alguns apontamentos para nortear a

escrita.

No momento de entrega dos cadernos-diário ocorreu um fato interessante.

Entreguei primeiramente às alunas da Estética, expliquei a todas a proposta e depois perguntei

se aceitavam. Embora todas tenham aceitado, notei que algumas ficaram um pouco em dúvida

e uma até perguntou quando era para entregar, pois estava muito atarefada e não sabia se daria

conta. Já na turma de Redes de Computadores, fiquei surpresa, feliz e preocupada ao mesmo

tempo, pois quando comuniquei que distribuiria os cadernos, a maior parte da turma, os quais

eu já tinha maior contato, correram a minha procura, todos em minha volta querendo saber se

tinham sido selecionados e demonstrando com muito afinco quererem participar da atividade.

Demorei conseguir convencê-los que nem todos iriam participar. Posteriormente, analisando o

fato, decidi confeccionar mais 10 cadernos e distribuir com os que mostraram interesse.

Figura 5- Cadernos-diário utilizados para as narrativas juvenis

Fonte: Elaborados pela autora. Ilustração da capa elaborada por Sabrina Késia de Araújo Soares para este

trabalho.

Mesmo diante da explosão de interesse dos alunos de Redes de Computadores e

comprometimento deles em participar da atividade, dos 20 cadernos-diário entregues para a

turma apenas três foram devolvidos, todos de jovens do sexo feminino. Estes foram recebidos

no último dia de aula. Com as alunas da Estética combinei de receber na data de apresentação

do TCC, marcada para janeiro de 2014, e neste dia das dez alunas que haviam recebido os

cadernos-diário, três delas me devolveram. Enviei mensagens pelo facebook a todos que

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faltavam devolver, insisti mais de uma vez, cheguei a combinar a entrega com os que me

responderam, mas ninguém mais me devolveu. Percebi que continuar insistindo poderia

distanciá-los de mim e resolvi complementar a atividade dos cadernos-diário realizando as

entrevistas posteriormente. Observei que uma das circunstâncias que favoreceram a não

entrega foi o período conturbado que os jovens estavam vivenciando: final do 3º ano, tendo

que estudar para as provas finais; estágio e sua conclusão; elaboração e apresentação do TCC;

preparação para o ENEM/vestibular.

Dos cadernos-diário entregues, as seis jovens, em geral, não escreveram muito,

mas relataram a vivência na escola abordando fatos marcantes, os pontos positivos e

negativos que acompanharam a trajetória. Falaram também da experiência do estágio e das

expectativas futuras. A escrita das jovens se diferenciou no modo de abordagem: duas delas

fizeram uma síntese destacando os três anos na escola, os motivos pelos quais haviam se

inserido em uma escola profissionalizante, as dificuldades enfrentadas, os momentos bons,

mas se expressaram pouco, citando fatos sem aprofundá-los. Outras duas organizaram a

escrita em três fases, escola, estágio e futuro e relataram detalhadamente cada uma das fases.

Uma das jovens fez uma descrição direta, relatando como se deu a escolha pela escola

profissionalizante, como foi o processo de adaptação, a importância da escola no seu

desenvolvimento pessoal e profissional. Ao final, fez uma síntese do estágio, abordando o

processo seletivo de inserção na empresa e as atividades desenvolvidas durante o estágio.

A outra jovem fez um resumo dos cinco meses de estágio, contemplando não

apenas as ocorrências neste, mas também outros elementos que caracterizaram cada mês. Ela

foi a jovem que elaborou a escrita mais criativa, trazendo elementos novos, como um

prefácio, criando títulos que expressaram as vivências, algumas ilustrações e parte do texto

escrito de cabeça para baixo. Quando finalizou a descrição do estágio iniciou na página

seguinte de cabeça para baixo e continuou a escrita no sentido inverso. Lembro que no

momento que ela me devolveu o caderno-diário folheei e ao perceber, imaginei que havia sido

erro. No entanto, ela logo se explicou dizendo que tinha sido proposital. Só quando li

compreendi que aquela ação buscava expressar o momento de tensão, ansiedade que estava

vivendo, ela chegou a escrever: “Enfim, dezembro. Está todo mundo louco”. Destacou o final

do ensino médio e as difíceis decisões que estavam por vir, como qual faculdade cursar, se

iria trabalhar e com o quê. Relatou, ainda, as dificuldades encontradas para adaptar-se na

escola, os projetos culturais, as feiras científicas que participou, as premiações. Se apoiando

na justificativa do caderno-diário dessa “jovem criativa” percebi que aquele momento era de

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muito estresse e ansiedade para todos e escrever em um caderno não estava entre suas

prioridades, em meio a tantos eventos de final de ano.

Assim, embora apenas seis jovens dos trinta participantes da atividade tenham

devolvido os cadernos-diário, percebi que a atividade foi importante para agregar novas

informações ao estudo; para me aproximar mais dos sujeitos pelo ritual de entrega e contatos

para devolução; e por possibilitar conhecê-los melhor por meio das experiências na escola, no

estágio e em relação ao futuro.

2.7 ENTREVISTAS: INTERAÇÕES FACE A FACE

As entrevistas foram realizadas com o objetivo de compreender melhor algumas

características da escola profissionalizante e algumas questões surgidas em campo durante as

observações, como no caso dos projetos científicos e culturais que constituem um destaque na

escola, e para aprofundar os objetivos propostos no trabalho. Desse modo, realizei

inicialmente três entrevistas: com uma das coordenadoras da escola, com uma dupla de alunos

participantes de projetos e com um professor. Posteriormente, realizei entrevistas com nove

jovens, sendo seis da turma de Redes de Computadores e três da turma de Estética, destes

apenas um do sexo masculino.

Para contemplar os objetivos propostos na pesquisa, continuei acompanhando os

jovens pesquisados após a conclusão do curso por meio do facebook, no qual foi possível

saber as novidades pelas publicações ou comentários, como também pelas conversas que

estabeleci com eles. Dessa forma, a entrevista mostrou-se um instrumento satisfatório por

possibilitar reencontrar os jovens e conhecer/compreender os percursos trilhados por eles

como egressos, por meio de uma interação pessoal.

Quanto aos critérios utilizados para selecionar os jovens, busquei escolher entre

aqueles que já haviam participado das atividades anteriores, com os quais eu tinha maior

contato e também que estivessem vivenciando experiências distintas como egressos. Esse era

meu objetivo a princípio, mas conseguir contemplar todos esses elementos não foi uma tarefa

fácil, nem se mostrou viável em sua totalidade. Como já exposto anteriormente, o campo é

imprevisível, inconstante, por isso quando imersos nele, precisamos, muitas vezes, parar,

refletir e, se preciso for, mudar o rumo do percurso. Segundo Minayo (2010), na pesquisa

qualitativa os instrumentos utilizados costumam ser corrigidos e readaptados no decorrer do

trabalho de campo para melhor atender aos objetivos da investigação. Ciente que os

desencontros fazem parte da jornada era preciso continuar por outro caminho. Assim, das seis

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jovens que haviam entregado os cadernos, consegui contactar quatro para participar das

entrevistas. Buscando ainda contemplar os critérios propostos, selecionei mais alguns jovens

das duas turmas e deixei mensagens no facebook explicando o propósito da pesquisa e a

importância de participação deles. Da turma de Redes de Computadores, todos com os quais

contactei se dispuseram a participar da entrevista, no entanto, na turma de Estética, precisei

recorrer a muitos jovens, pois deixei várias mensagens que não foram respondidas. Essa

dificuldade em conseguir marcar as entrevistas com os alunos da turma de Estética foi reflexo

da difícil interação obtida no decorrer das observações. Já na turma de Redes de

Computadores, embora poucos tenham devolvido os cadernos-diário, não apresentaram

obstáculos para participarem das entrevistas.

Toda a aproximação construída com os jovens no período em que estudavam na

escola profissionalizante e os contatos pelo facebook , foram fundamentais para contactá-los

e, mais ainda, para estabelecer uma relação natural durante as entrevistas. Embora elas

tenham sido semiestruturadas, foram conduzidas em forma de conversa, procurando deixar os

jovens mais à vontade para compartilharem suas trajetórias e sonhos da forma mais

espontânea possível. Busquei assumir uma postura de valorização dos sujeitos, a partir da

escuta e da observação de seus discursos e expressões.

Antes das entrevistas, contactava com antecedência os sujeitos, acertando data,

horário e local que melhor lhes conviesse. Nas entrevistas, estava sempre equipada com diário

de campo, com roteiro de entrevista semiestruturado e com gravador de voz. No roteiro

elaborado busquei contemplar os objetivos da pesquisa, mas mesmo com ele, mostrei-me

flexível para abordar questões que surgissem na fala dos interlocutores. Antes da entrevista,

procurava me fixar em um local mais silencioso e menos movimentado para evitar barulhos

que pudessem atrapalhar e/ou intimidar a fala dos sujeitos e garantir a qualidade da gravação.

Já acomodados, mencionava o objetivo da pesquisa de forma breve, explicava o termo de

consentimento (ver apêndice A) e pedia-lhes a sua assinatura, buscando nesses passos iniciais

deixar o jovem mais espontâneo e criar um clima favorável para a entrevista.

As três primeiras entrevistas (com uma das coordenadoras; com dois jovens

projetistas; e com um professor) foram realizadas na escola durante o período de observações.

As demais foram realizadas em ambientes variados, devido ao fato dos jovens já serem

egressos. Na função de pesquisadora, estive disposta a ir ao encontro dos jovens onde eles

estivessem e isso significou entrevistá-los nas universidades, em suas casas, na escola, nas

praças da cidade.

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Na maior parte das entrevistas realizadas, obtive resultados satisfatórios, pois os

jovens se expressaram de modo natural e se empolgaram com a conversa, deixando seus

pensamentos fluírem. Ao realizar essas entrevistas, pude perceber claramente a importância

da interação face a face entre pesquisador e pesquisados: olhar nos olhos, observar os gestos e

expressões, compartilhar ideias, afetos e apoio, uma oportunidade de conhecer melhor o

outro. Todas essas sensações acontecem de modo mais expressivo e algumas só são possíveis

pela interação pessoal. “A inter-relação no ato da entrevista, que contempla o afetivo, o

existencial, o contexto do dia-a-dia, as experiências e a linguagem do senso comum é

condição sine qua non do êxito da pesquisa qualitativa” (MINAYO, 2010, p. 267). A

percepção que tive também foi de poder passar mais confiança aos sujeitos quanto à pesquisa,

e por meio da conversa a possibilidade de estabelecer uma relação de troca e, assim, não

parecer que estava apenas com a intenção de retirá-los informações.

As entrevistas foram realizadas com o auxílio de um gravador de voz e

posteriormente ouvidas e transcritas por mim. Embora tenha sido um trabalho exaustivo, optei

por assim proceder reconhecendo a vantagem das entrevistas serem transcritas pelo próprio

entrevistador. Sendo possível, no momento da transcrição, me reportar em pensamento ao

momento da entrevista e fazer as anotações não realizadas no dia, além de ser mais fácil

identificar trechos incompreensíveis na audição e reconhecer expressões próprias dos sujeitos.

Quanto às gravações, foi preferível às anotações, por facilitar o desenvolver da entrevista,

possibilitando-me maior atenção aos sujeitos, assim como maior interação, além de ficar mais

livre para registrar fatos inesperados.

2.8 ANÁLISE DOS DADOS

Após a fase exploratória e de coleta dos dados, deparei-me com a última etapa do

processo de investigação, momento que considero o mais difícil da pesquisa, o de analisar os

dados colhidos. Essa dificuldade, segundo Minayo (2010), surge principalmente por alguns

fatores: o de refletir além do que mostra a realidade, ultrapassando as incertezas do senso

comum; de apropriar-se das teorias abordadas com enriquecimento de leitura; de realizar

síntese das teorias abordadas e dos achados da pesquisa. O pesquisador deve conciliar teoria,

prática e os conhecimentos adquiridos de forma harmoniosa com o objeto de estudo e “esse

trabalho exige do pesquisador um esforço de apreensão, análise e síntese concernentes ao

objeto estudado” (DAMASCENO, 2005, p. 46).

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Nesse sentido, a escrita desse trabalho perpassa todo o processo de revivência no

campo de pesquisa; imersão na literatura que contempla as categorias de análise; leitura e

organização dos dados colhidos na pesquisa; abordagem dos dados contemplando os objetivos

propostos e os achados do campo; análise dos dados mediante o diálogo com os sujeitos, os

teóricos e os meus conhecimentos enquanto pesquisadora.

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3 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, JUVENTUDES E POLÍTICAS PÚBLICAS:

ENCONTROS DA TEORIA COM A REALIDADE

Proponho neste capítulo abordar as categorias Juventude e Educação Profissional

que se constituem centrais nesta pesquisa. Ao adentrar os estudos da Educação Profissional, é

possível perceber a dimensão e a complexidade do seu conteúdo, uma vez que perpassa

praticamente toda a nossa história, tendo enfrentado diversas reformas, com diferentes leis,

decretos, pareceres, resoluções. Nesse sentido, não realizarei um percurso histórico detalhado,

mas trarei elementos considerados fundamentais para a contextualização do objeto em estudo.

Quanto à categoria Juventude, a discussão traçada, mais do que teórica, se

constitui uma apresentação da categoria, em um elo com os sujeitos estudados e o local de

pesquisa. A escrita se fundamenta na multiplicidade juvenil, reconhecendo os jovens como

sujeitos conscientes e críticos, capazes de participar ativamente do diálogo de construção e

avaliação das políticas públicas, e no caso deste estudo, da política de ensino médio integrado

à educação profissional.

3.1 BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL

Diversas expressões têm sido utilizadas, no decorrer da história, para transmitir o

significado da educação profissional, entre elas: educação profissional e tecnológica,

educação profissional técnica, educação industrial, educação do trabalhador, ensino

profissional, formação profissional ou técnico profissional, qualificação profissional. De

acordo com as configurações sociais e do mercado de trabalho essas expressões ganham

complexidade e novos sentidos, podendo ainda aparecer ora como sinônimos, ora com caráter

distinto. Neste trabalho, utilizarei como expressão central a Educação Profissional por

considerá-la mais abrangente e adequada à discussão proposta.

Considero importante abordar inicialmente a compreensão do significado da

palavra educação, pois a educação profissional deve ser vista como categoria específica, a

qual deve contemplar em seus princípios os fundamentos básicos da educação, enquanto

formação geral. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB nº.

9.394, de 20 de dezembro de 1996) “a educação abrange os processos formativos que se

desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino

e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações

culturais” (BRASIL, 2010, p. 07). Assim, a educação deve ser compreendida como um

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processo dinâmico e histórico que envolve a formação geral dos sujeitos nos diversos

aspectos, sociais, políticos, econômicos, culturais, de modo a educar os sujeitos e possibilitá-

los exercer os valores apreendidos em sociedade.

No Brasil, a educação enquanto processo formativo de desenvolvimento da

aprendizagem implantada nos espaços institucionais próprios de ensino, em especial na

escola, foi desconhecida durante décadas pelos segmentos marginalizados da nossa sociedade,

que constituíam a maior parte da população, entre eles os pobres, as mulheres, os negros.

Apenas em 1988, com a Constituição do País, todos independente de cor, raça, religião, classe

social, são reconhecidos iguais perante a lei e sujeitos de direitos. No Capítulo III, art. 205 da

Constituição, a educação é reconhecida como direito de todos e dever do Estado, devendo a

sociedade colaborar para a sua promoção. O regulamento enfatiza que a educação deve

proporcionar o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho (BRASIL, 2012,

grifos nossos).

Embora, muitas vezes, seja mais uma igualdade legal do que real, tal conquista

representa um avanço inegável na nossa história. Desse modo, mesmo que vários obstáculos

ainda perdurem na educação brasileira, como a própria dualidade que discutirei a seguir, é

perceptível, conforme afirma Ribeiro (2011), que a população jovem de hoje é mais

escolarizada que a de antes, uma vez que houve uma extensão do acesso e das possibilidades

de conquistar níveis mais altos de ensino.

Embora a educação tenha sido constituída como um direito assegurado por lei, o

processo de democratização do ensino no país ocorreu de forma lenta. Dessa forma, a garantia

constitucional não foi suficiente para que todas as crianças e jovens passassem a frequentar a

escola, e em alguns casos o acesso se dá de modo deficiente. Dentre os vários fatores que

interferem no acesso e continuidade dos indivíduos à educação, posso citar as condições

econômicas das famílias, que impedem muitas crianças e jovens de se dedicarem inteiramente

a vida estudantil por precisarem contribuir com a renda familiar. Essa necessidade de

conciliar estudo e trabalho tem sido um dos fatores frequentes para explicar a evasão no

ensino médio, que como aponta Ribeiro (2011), tem superado os índices de reprovação.

Embora uma das coordenadoras entrevistadas tenha ressaltado que na escola pesquisada

praticamente não há casos de evasão, segundo ela é recorrente o caso de jovens transferidos

para escolas regulares pela necessidade de trabalhar e ajudar financeiramente as famílias:

“outro motivo da transferência às vezes é a situação social mesmo, necessidade de trabalhar,

de sustentar a família, acontece muito isso” (Coordenadora Escolar).

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Nesse contexto, diante das realidades sociais em que vivem muitas famílias,

marcadas pela exclusão e carências diversas, muitos jovens pertencentes a estas, não

usufruem o direito de escolha pela continuidade dos estudos, e o trabalho aparece como uma

necessidade básica desde muito cedo na vida desses jovens.

Podemos constatar que a vivência da juventude nas camadas populares é dura e

difícil: os jovens enfrentam desafios consideráveis. Ao lado da sua condição como

jovens, alia-se a da pobreza, numa dupla condição que interfere diretamente na

trajetória de vida e nas possibilidades e sentidos que assumem a vivência juvenil.

Um grande desafio cotidiano é a garantia da própria sobrevivência, numa tensão

constante entre a busca de gratificação imediata e um possível projeto de futuro

(DAYRELL, 2009, p. 18).

Logo, tendo em vista a marcante desigualdade socioeconômica existente no

Brasil, que leva inúmeros jovens da classe trabalhadora a buscarem inserção no mercado de

trabalho antes dos 18 anos para ajudar financeiramente as famílias, a educação profissional se

apresenta como importante formação para o trabalho e uma oportunidade de inserção na vida

profissional, uma vez que a pessoa adquire formação técnica, sem necessidade de cursar a

educação superior.

Vale ressaltar que não é meu interesse expor aqui juízos de valor, mas

proporcionar discussão crítica acerca da educação profissional, em especial do ensino médio

integrado à educação profissional. Isto posto, a abordagem aparecerá em alguns momentos

expositiva para situar o leitor contextualmente as categorias trabalhadas e em outros reflexiva,

ao trazer questões pertinentes à análise.

Para chegar à discussão do ensino médio integrado à educação profissional,

tomando como realidade uma escola profissionalizante de Fortaleza-CE, o leitor realizará uma

viagem ao passado para compreender como se deu a trajetória da educação profissional no

Brasil. Nessa viagem, haverá algumas paradas mais demoradas, as quais compreendem os

assuntos considerados fundamentais ao estudo proposto, entre eles a dualidade histórica da

educação brasileira, a 2ª LDB, o Decreto nº 5.154/2004.

A educação profissional possui uma relação histórica com o ensino médio.

Enquanto este último esteve tradicionalmente voltado às elites brasileiras por meio de um

ensino acadêmico e propedêutico, a educação profissional esteve voltada às classes

trabalhadoras com o objetivo de ensinar um ofício. Esta diferenciação histórica registra a

marca de dualidade na educação brasileira, com a perceptível distinção de uma educação para

os ricos e outra para os pobres.

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É necessário pensar o ensino profissional em sua correlação com o ensino médio, o

qual se relaciona, ao longo da história da educação brasileira. O ensino médio tem

oscilado quanto à sua definição e objetivos, mas tradicionalmente, vem se

constituindo como acadêmico, de caráter propedêutico, voltado para o ensino

superior e visando atender aos interesses das classes mais favorecidas. Por seu lado,

a educação profissional, quase sempre marginalizada, estigmatizada, destinada às

classes sociais mais carentes, assumindo tanto um sentido assistencialista e de

preparação para um ofício, quanto um caráter pragmático, de atendimento aos

interesses restritos do setor produtivo (SOUSA, LIMA, 2007, p. 159).

O desenvolvimento histórico do ensino médio no Brasil caracterizou-se pela

heterogeneidade em todos os aspectos, da finalidade à estrutura física. Quando somada essa

heterogeneidade às diferenças e desigualdades dos alunos e às características regionais,

observa-se a necessidade de oferta de programas específicos, que possam adequar-se à

realidade dos sujeitos (KUENZER, 2000). Nesse sentido, pensar na proposta levantada pela

autora é primordial, mesmo porque os sujeitos contemplados pelo ensino médio são de modo

singular, os jovens, que chegam à escola, carregados por uma série de características próprias,

como gênero, classe social, contexto social, gostos, e isso exige o reconhecimento destes em

sua diversidade.

A escolarização de nível médio no Brasil esteve tradicionalmente restrita aos

jovens de classes médias e superiores, o que dificultou intensamente a implantação do ensino

técnico no país (GOLDEMBERG, 1993). Como enfatiza Nascimento (2007), “o ensino médio

tem sido historicamente, seletivo e vulnerável à desigualdade social” (p. 02). Cursava o

ensino médio, no Brasil, aqueles pertencentes às famílias com melhores condições

econômicas. Aos pobres e demais marginalizados socialmente, lhes era negado esse direito.

“Na transição entre os séculos XIX e XX, começa um esforço público de

organização da formação profissional, mesclando ao viés assistencialista a preparação de

operários para o incipiente processo de industrialização e de modernização do país”

(VIAMONTE, 2011, p. 30). Portanto, comparada ao ensino médio, a educação profissional é

mais recente na história brasileira e seu avanço remete ao século XX com a chegada da

industrialização no País, quando surge a necessidade de qualificar mão de obra para suprir as

carências do mercado interno. Nesse período, permaneceu a dualidade na educação, pois

enquanto os ricos ocupavam as universidades, os pobres se dirigiam às fábricas.

Do mesmo modo que o ensino médio, o desenvolvimento do ensino técnico

profissional reflete as relações de poder e a luta de classes, como enfatiza Ramos (2012): “um

projeto de educação tecnológica como política de Estado é uma construção histórica

fortemente disputada pelas classes e suas frações” (p. 43).

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Em todas as épocas, os pensamentos dominantes são os pensamentos da classe

dominante, ou seja, a classe que é o poder material dominante da sociedade é, ao

mesmo tempo, o seu poder espiritual dominante [...]. Os indivíduos que formam a

classe dominante também têm, entre outras coisas, consciência, e como

consequência disto dominam como classe e determinam todo o conteúdo de uma

época histórica (MARX, ENGELS, 2002, p. 63).

Nesse contexto, as políticas educacionais no Brasil não diferem dessa lógica e se

estruturam a partir das relações de poder. Observa-se no decorrer da história que as reformas

educacionais implantadas estão sempre em consonância com as necessidades do mercado de

trabalho.

Segundo Ramos (2012), a reforma de ensino de 1971 que originou a lei nº 5.692

se apresenta como “o ponto de maior impacto na estruturação da educação brasileira e,

especificamente, do ensino técnico” (p. 31), uma vez que a profissionalização foi proposta

para todo o ensino médio.

A lei nº 5.692/71 passa a ser vista como a solução para uma série de problemas

que afetavam a força de trabalho e os estudantes. Além de expandir o número de profissionais

de nível médio que era restrito na época, possibilitaria aos estudantes adquirirem uma

formação profissional, sem que precisassem cursar o ensino superior para obtê-la (CUNHA,

1977). Nessa perspectiva, a função de conter a demanda de candidatos para o ensino superior

foi atribuída ao ensino de profissionalização universal e compulsório do 2º grau, a partir do

encaminhamento dos estudantes para um mercado de trabalho supostamente carente de

profissionais habilitados, mercado esse que se supunha capaz de absorver esse contingente

adicional de técnicos e auxiliares técnicos (CUNHA, 2001).

Apesar da generalização da profissionalização para todas as escolas de 2º grau, a

reforma do ensino médio não alcançou os resultados desejados pelo governo

(NASCIMENTO, 2007), e resultou em um grande fracasso (GOLDEMBERG, 1993), devido

uma série de fatores: não houve diminuição de demanda pelo curso superior; falta de recursos

nas escolas; aumento do custo por aluno; as escolas não atendiam às expectativas de

qualificação requeridas pela indústria moderna (XAVIER, RIBEIRO, NORONHA, 1994). Os

cursos eram inseridos na grade do ensino de 2º grau tendo pouco aprofundamento e sem

qualificar efetivamente os estudantes, uma vez que as escolas não atenderam as demandas

exigidas para as formações técnicas.

Ao tornar compulsória a profissionalização do 2º grau, a reforma, do ponto de vista

legal, eliminaria a dualidade entre educação geral e formação profissional.

Entretanto, ocorreu o contrário disso. Nas redes estaduais, a profissionalização não

se implantou completamente [...]. Ao invés de ampliar a duração do 2º grau para

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50

nele incluir os conteúdos da educação profissional de forma integrada à educação

geral, o que se fez foi reduzir os últimos em favor dos primeiros (MOURA, 2012, p.

50-51).

A obrigatoriedade do ensino profissionalizante resultou em uma desorganização

geral do ensino médio público (XAVIER, RIBEIRO, NORONHA, 1994). Em 1975, com o

Parecer 76 busca-se eliminar o equívoco de que toda escola de ensino médio deveria tornar-se

profissionalizante, quando não havia recursos materiais, financeiros e humanos para isto

(NASCIMENTO, 2007). Dessa forma, gradativamente o Ministério da Educação, foi

modificando o caráter da profissionalização, que através da lei nº 7.044/82 deixou de ser

obrigatória (XAVIER, RIBEIRO, NORONHA, 1994).

Com a 2ª LDB (Lei nº 9.394/96) o ensino médio é incluído no âmbito da educação

básica e passa a ser reconhecido como um “patamar básico de escolaridade que todos os

brasileiros deveriam ter” (CORTI, 2009, p. 13).

Na 2ª LDB (Art. 1º, §2º, p. 07) fica explícito que “a educação escolar deverá

vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social” (grifos nossos). Essa relação entre

educação e trabalho é percebida em outros trechos do regulamento, como no art. 35 que

aponta a finalidade do ensino médio: “a preparação básica para o trabalho e a cidadania do

educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade”

(p. 28-29, grifos nossos). Ou seja, o ensino médio deveria oferecer uma formação que

contemplasse preparação para a cidadania e para o trabalho, mas destaca no art. 36 § 2º, que

para preparar para o exercício de profissões técnicas o ensino médio deveria atender antes a

formação geral do educando (BRASIL, 2010).

A LDB 9.394/96, bem como toda a legislação específica repõe a histórica dualidade

do sistema educacional brasileiro, o seu duplo caráter formal e real, quando

prescreve para o ensino médio trajetórias, conteúdos e métodos distintos para a

escolarização propedêutica ao ensino superior e uma escolarização voltada para o

mercado de trabalho (SOUSA, LIMA, 2007, p. 161).

De acordo com a Lei nº 9.394/96, a educação profissional técnica de nível médio

poderá ser desenvolvida em estabelecimentos de ensino médio ou por instituições

especializadas em educação profissional, podendo ser realizada de forma articulada ao ensino

médio ou por quem já tenha concluído o mesmo (BRASIL, 2010).

A segunda LDB foi implantada no período de governo de Fernando Henrique

Cardoso - FHC (1995-2002). Em sua gestão, “uma medida fundamental foi a desorganização

do histórico ensino técnico de nível médio promovida pelo Decreto nº 2.208/97” (RAMOS,

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51

2012, p. 35). Na era FHC, se destacaram os programas de capacitação de massa, que teve

como programa exemplar o Plano Nacional de Formação Profissional (PLANFOR10

). Outra

característica foi a oferta de cursos técnicos concomitantes ou sequenciais a esses, ofertados

pelas escolas técnicas (RAMOS, 2012).

No governo de Luiz Inácio Lula da Silva, em seus dois mandados, buscou-se

reconstruir a política pública para a educação profissional e tecnológica, mediante duas ações

iniciais: a primeira delas foi a revogação do decreto nº 2.208/97 (através do decreto n.

5.154/2004), restabelecendo a possibilidade de integração curricular dos ensinos médio e

técnico; a segunda possibilitou o redirecionamento dos recursos do Programa de Expansão da

Educação Profissional (PROEP) para os segmentos públicos (RAMOS, 2012).

A partir da segunda metade do último governo Lula, políticas mais contundentes

direcionadas à educação tecnológica são tomadas em pelo menos dois sentidos. O

primeiro refere-se à implantação do ensino médio integrado [...]. O segundo sentido

das políticas se deu pela expansão da rede federal de educação tecnológica,

juntamente com a ampliação de suas funções para o ensino superior, integrado com

a pesquisa e o desenvolvimento científico-tecnológico. Tal ampliação se

institucionalizou por meio da criação dos Institutos Superiores de Educação, Ciência

e Tecnologia, no que vários Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefets) e

escolas técnica foram transformados (RAMOS, 2012, p. 39-40).

A proposta do ensino médio integrado à educação profissional vem sendo

implantada, desde 2005, na rede federal de educação profissional e em algumas redes

estaduais. Recebe a denominação de ensino médio integrado por envolver em sua elaboração

o eixo estruturante trabalho, ciência e tecnologia e cultura; e também por integrar o trabalho

como contexto, ao proporcionar formação profissional específica (MOURA, 2012).

O ensino médio integrado à educação profissional técnica de nível médio é uma

modalidade de ensino, no qual os planos de curso das instituições devem

contemplar, em um só currículo, os conteúdos da educação geral e da formação

profissional, de maneira que possam ser cumpridas as exigências dos perfis

profissionais relativos às habilitações técnicas oferecidas pelas escolas. Trata-se de

um projeto pedagógico único, uma só proposta curricular, uma só nomenclatura e

uma só matrícula (NÓBREGA FILHO, TASSIGNY, 2008, p. 12).

A possibilidade de integração entre ensino médio e educação profissional foi

prevista por meio do Decreto nº 5.154/2004, o qual “representa uma possibilidade de avanço

na direção de construir um ensino médio igualitário para todos [...]” (MOURA, 2012, p. 56).

Pois ele buscou “restabelecer os princípios norteadores de uma política de educação

10

O PLANFOR faz parte de um dos 42 projetos prioritários do Plano Brasil em Ação, do governo Fernando

Henrique Cardoso. Foi implementado a partir de 1995, mas só passa a ser amplamente executado em 1996.

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profissional articulada com a educação básica, tanto como um direito das pessoas quanto

como uma necessidade do país” (RAMOS, 2012, p. 38).

O Decreto nº 5.154/2004 (art. 4º, §1º) define que a articulação entre a educação

profissional técnica de nível médio e o ensino médio se dará de forma integrada, concomitante

e subsequente, conforme pode ser observado abaixo:

I-integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental,

sendo o curso planejado de modo a conduzir o aluno à habilitação profissional

técnica de nível médio na mesma instituição de ensino, contando com matrícula

única para cada aluno;

II- concomitante, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino

fundamental ou esteja cursando o ensino médio, na qual a complementaridade entre

a educação profissional técnica de nível médio e o ensino médio pressupõe a

existência de matrículas distintas para cada curso;

III- subsequente, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino médio

(Decreto nº 5.254/2004, incisos I, II e III do art. 4º, § 1).

O decreto instituiu ainda, que para a obtenção do diploma de técnico de nível

médio, o aluno deverá concluir tanto os estudos de educação profissional técnica de nível

médio como os do ensino médio (Decreto nº 5.154/2004, art. 7º). Nesse contexto, o Parecer nº

39/2004 destaca que “na adoção da forma integrada, o estabelecimento de ensino não estará

ofertando dois cursos à sua clientela. Trata-se de um único curso, com projeto pedagógico

único, com proposta curricular única e com matrícula única” (p. 08).

O ensino médio integrado à educação profissional foi viabilizado por meio de

investimentos do Governo Federal aplicados diretamente na construção de escolas ou

mediante o repasse de recursos aos governos estaduais. Entre os investimentos, dois

programas se destacaram: o Brasil Profissionalizado e o Ensino Médio Inovador (RAMOS,

2012). Destes destacarei o primeiro que possui relação direta com o estudo proposto.

Segundo exposto no portal do MEC11

, o Programa Brasil Profissionalizado, criado

em 2007, visa fortalecer as redes estaduais de educação profissional e tecnológica, mediante o

repasse de recursos do Governo Federal para os estados investirem em suas escolas técnicas,

possibilitando assim a modernização e a expansão das redes públicas de ensino médio

integradas à educação profissional.

Fazem parte dos objetivos do Programa Brasil Profissionalizado: a expansão do

atendimento e da melhoria da qualidade da educação brasileira e o desenvolvimento e

11

Disponível em:

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12325&Itemid=663. Acesso em: 11

mar. 2015.

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reestruturação do ensino médio, de forma a articular formação geral, científica e cultural com

a formação profissional dos educandos (Decreto nº 6.302/2007, art. 1º, incisos I e II).

Foi com o apoio do programa Brasil Profissionalizado que o Governo Estadual do

Ceará iniciou o Programa das Escolas Estaduais de Educação Profissional no Estado,

conforme será apresentado a seguir.

3.2 AS ESCOLAS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO CEARÁ:

CARACTERÍSTICAS E AVANÇOS

Em 19 de dezembro de 2008 o vigente governador do Ceará Cid Ferreira Gomes

sancionou a Lei nº 14.273 de criação das Escolas Estaduais de Educação Profissional (EEEPs)

no âmbito da Secretaria da Educação do Estado do Ceará (SEDUC). A referida Lei objetiva

articular a escola com o mundo do trabalho mediante a integração do ensino médio com a

educação profissional12

.

Esta tarefa, a de integrar o ensino médio à educação profissional, se coloca como

um novo desafio para a rede estadual de ensino médio no Ceará. Constitui-se de uma

estratégia para dar efetividade a necessidade e anseio dos jovens, a de vinculação entre a

educação escolar, o trabalho e as práticas sociais (MOTA, 2011).

Para a implantação das EEEPs, o Ceará tomou como referência o Programa de

Desenvolvimento dos Centros de Ensino Experimental (PROCENTRO), criado em 2002 pelo

governo de Pernambuco com o objetivo de enfrentar os desafios do ensino médio

(MAGALHÃES, 2008). Esses Centros de Ensino possuem como Tecnologia de Gestão a

Tecnologia Empresarial Socioeducacional (TESE), formulada a partir da Tecnologia

Empresarial Odebrecht (TEO)13

. Também foram agregadas à TESE, às quatro aprendizagens

fundamentais apresentadas pelo Relatório de Jacques Delors (2010), as quais são

denominadas de pilares do conhecimento: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a

viver juntos e aprender a ser.

A TESE é definida como a arte de coordenar e integrar tecnologias específicas e

educar pessoas por meio de procedimentos simples, que podem ser implantados facilmente na

rotina escolar. As atividades específicas são os diferentes saberes e áreas de conhecimento,

12

Disponível em:

<http://www.seduc.ce.gov.br/images/cogep/material_eeep/lei_14.273_criacao_eeep_doe_23_12_2008.pdf>.

Acesso em: 11 mar. 2015. 13

Segundo o Manual operacional do Instituto de Co-Responsabilidade pela Educação (ICE), “a TEO provê os

fundamentos éticos, morais e conceituais para a condução dos negócios e a atuação de todos os integrantes da

empresa Odebrecht Engenharia e Construção S.A” (p. 05).

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que na escola envolve as diversas disciplinas e atividades de apoio. A TESE objetiva formar

consciência empresarial humanística nos componentes da organização, alinhando-os à

filosofia do PROCENTRO, que busca garantir a excelência do ensino médio público14

.

Ao observar a expansão das EEEPs no Ceará é possível perceber que embora

tenha havido crescimento durante esses seis anos, o mesmo não ocorreu de modo crescente de

um ano para o outro. O projeto iniciou em 2008 com 25 escolas, ofertando os cursos de

Informática, Enfermagem, Guia de Turismo e Segurança do Trabalho, atendendo 20

municípios e 4.181 jovens. Em 2009 foram inauguradas mais 26 escolas e implantados nove

cursos: Edificações, Comércio, Finanças, Produção de Moda, Estética, Massoterapia, Meio

Ambiente, Aquicultura e Agroindústria, abrangendo mais 19 municípios com 11.279 jovens

atendidos. Em 2010 o número de escolas criadas foi bem menor que nos dois anos anteriores,

apenas oito, e contou com um número também menor de novos cursos implantados:

Administração, Secretariado, Contabilidade, Hospedagem e Modelagem do Vestuário, em três

novos municípios, totalizando assim, 17.342 jovens beneficiados. O número de escolas

implantadas variou nos anos seguintes também, sendo 18 em 2011, 15 em 2012, cinco em

2013 e nove em 2014. Até o início de 2015 haviam sido inauguradas mais cinco unidades,

correspondendo a um total de 111 escolas de educação profissional. Estas estão distribuídas

em 85 municípios, ofertando 53 cursos técnicos com mais de 40 mil jovens matriculados

(SEDUC, 2015).

Das vagas disponibilizadas nas EEEPs, 80% são destinadas aos alunos oriundos

da rede pública de ensino e 20% aos alunos oriundos da rede particular. Embora o ensino

médio integrado à educação profissional no Ceará tenha sido proposto apenas para alunos

oriundos da rede pública de ensino, alguns pais de alunos de escolas privadas reivindicaram

na justiça para garantir aos filhos o direito de acesso às EEEPs. Tal reivindicação resultou na

criação de uma cota que garante 20% das vagas serem destinadas para estes alunos. Vale

ressaltar que segundo uma das coordenadoras, da escola estudada, a procura dos alunos da

rede particular tem sido cada vez maior, chegando, muitas vezes, a superar a dos alunos da

rede pública. Nessa perspectiva, percebo que a educação profissional assume novos arranjos

na contemporaneidade, mediante as Escolas Estaduais de Educação Profissional no Ceará e

dos novos sujeitos que passa a contemplar.

14

De acordo com o Manual Operacional. Modelo de Gestão – Tecnologia Empresarial Socioeducacional

(TESE): uma nova escola para a juventude brasileira. Instituto de Co - Responsabilidade pela Educação.

Disponível em:

<http://www.ccv.ufc.br/newpage/conc/seduc2010/seduc_prof/download/Manual_ModeloGestao.pdf>. Acesso

em: 22 maio 2014.

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De acordo com a Portaria nº 1143/2014, a qual estabelece as normas para a

matrícula de alunos das escolas públicas estaduais para o ano de 2015, os requisitos

necessários para se inscrever ao ensino médio integrado à educação profissional são:

comprovar a conclusão do ensino fundamental; ter disponibilidade para o ensino integral; ter

idade mínima de 14 anos e estar ciente das normas do curso técnico escolhido. Para a

classificação dos alunos é considerada a maior média aritmética das notas relativas às

disciplinas cursadas do 6º ao 9º ano, sendo a seleção realizada em ordem decrescente,

obedecendo ao número de vagas existentes nas respectivas escolas e de acordo com o curso

pretendido.

Dentre os cursos pesquisados “o de Redes [de Computadores] é o mais concorrido

e o de Estética o menos concorrido [na escola]. Os melhores alunos de escola pública e

particular não querem ir pra Estética, nem que sobre vaga” (Coordenadora Escolar). Nesse

processo de seleção dos alunos à escola profissionalizante é possível observar que os

melhores alunos, aqueles com melhores rendimentos escolares (oriundos da rede pública e

privada de ensino do Estado) são os que conseguem se inserir nos cursos mais concorridos

das EEEPs, os reconhecidos como de maior prestígio social.

As EEEPs possuem currículo integrado, ofertando disciplinas da base comum do

ensino médio, disciplinas específicas dos cursos técnicos e conteúdos voltados para o

desenvolvimento pessoal e social com foco no Projeto de Vida de cada aluno, assim como,

conteúdos relacionados ao Mundo do Trabalho (Metodologia do Instituto Aliança), ao

Empreendedorismo, mediante a parceria com o Serviço Nacional de Apoio às Micro e

Pequenas Empresas (SEBRAE), Metodologia da Aprendizagem Cooperativa no horário de

estudo, Projetos, entre outros.

Durante o 3º ano os jovens realizam estágio curricular obrigatório e remunerado

pelo Governo do Estado que disponibiliza ao estagiário: bolsa-estágio, garantia de auxílio-

transporte, contratação de seguro contra acidentes pessoais e de Equipamentos de Proteção

Individual (EPI). O tempo de estágio se diferencia por área. No caso dos cursos estudados,

são exigidas 400 horas para o curso de Redes de Computadores e 600 horas para o curso de

Estética.

Outra característica das EEEPs é o Projeto Professor Diretor de Turma que foi

apresentado à SEDUC em 2008 por meio da Associação Nacional de Política e Administração

da Educação (ANPAE). Foi implantado como experiência piloto neste mesmo ano nas 25

EEEPs. Em 2010, a SEDUC observando os resultados satisfatórios atingidos nas escolas

profissionalizantes, estendeu o projeto para as escolas de ensino médio regular.

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Conforme o projeto, cada turma é acompanhada por um professor durante o

tempo de permanência deste na escola. A escolha dos professores para participarem do

projeto é feita pelo perfil, e dentre outras qualidades devem ser dinâmicos, interativos e

incentivadores. São funções do professor: acompanhar o desempenho da turma;

disponibilizar-se a atender os pais, alunos, professores e núcleo gestor da escola; mediar o

relacionamento entre seus alunos com os demais professores; elaborar e organizar o dossiê da

sua turma; lecionar a disciplina de Formação para Cidadania (FPC); organizar e presidir as

reuniões de conselhos de classe.

Na visão da coordenadora entrevistada, o Projeto Professor Diretor de Turma tem

favorecido muito o processo ensino-aprendizagem na escola. Dentre os pontos positivos do

projeto a aproximação entre professor e aluno é apontada pela coordenadora como exitosa,

uma vez que se dá de forma mais intensa que com os próprios pais:

É um projeto maravilhoso. Eu acho que muitas das conquistas do aluno concluir até

o 3º ano, o incentivo está muito na figura do diretor de turma, porque ele é um

professor que está muito próximo dos alunos; eles acabam conhecendo melhor esses

alunos, conhecendo a realidade, sabem das dificuldades, quando eles precisam de

um apoio o professor está lá presente. A gente tem exemplo aqui dentro da escola de

alunos que poderiam ter expectativas de futuro bem diferentes se não fosse a

contribuição do diretor de turma. Às vezes eles estabelecem relações mais próximas

do que até mesmo com a família e muitas vezes os pais vem pedir ajuda a esses

professores (Coordenadora Escolar).

Por meio da fala da coordenadora é possível observar que o projeto permite ao

professor conhecer melhor seus alunos, estabelecendo com eles e seus pais uma relação muito

próxima. Em muitos momentos o professor é mais que um profissional, ele expõe seu lado

afetivo,em que aconselha, incentiva, torce por seus alunos. Isso favorece o estreitamento dos

laços, a integração, os melhores rendimentos e expectativas de futuro dos jovens estudantes.

Segundo a coordenadora, a relação entre os pais e a escola ainda é uma relação

difícil, devido a pouca participação destes no ambiente escolar para reuniões ou quando

solicitados para resolver algum problema. E o projeto tem contribuído nessa relação, uma vez

que o contato com os pais é feito normalmente pelos diretores de turma.

No imaginário social escola profissionalizante é aquela que oferta cursos técnicos

e dispõe de estrutura adequada para a realização das atividades e formação discente. No

entanto, esta não é a realidade de todas as escolas profissionalizantes do Ceará, uma vez que o

programa é implantado não só em escolas construídas, mas também em escolas já existentes,

as quais são conhecidas como adaptadas. Este estudo não propõe fazer uma análise

comparativa entre os dois tipos, as que são padrão MEC e as adaptadas, pois a pesquisa

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consistiu no estudo de uma escola profissionalizante específica. Mesmo assim, traçarei uma

discussão acerca da interferência da estrutura escolar no processo de formação dos jovens

estudantes, tendo em vista a escola pesquisada ser uma profissionalizante adaptada e carente

de uma infraestrutura adequada.

3.2.1 Os reflexos de uma escola profissionalizante adaptada

As Escolas Estaduais de Educação Profissional no Ceará se apresentam de duas

formas distintas: as que são modelo MEC e as que são adaptadas. As primeiras são

construídas em modelo padrão e oferecem espaço amplo, confortável, com infraestrutura

adequada, munidas de laboratórios e equipamentos para a oferta dos cursos técnicos15

. Já as

últimas constituem escolas já existentes, nas quais o governo implanta o programa do ensino

médio integrado à educação profissional. Tomarei como referência a escola profissionalizante

estudada, que é adaptada, para discutir as interferências da estrutura escolar na formação

profissional dos jovens estudantes.

Um dos primeiros elementos que trago para análise é a extinção de dois cursos

técnicos na escola pesquisada, o de Meio Ambiente e o de Agroindústria. Estes tiveram as

últimas turmas concluídas no final de 2014, e segundo uma das coordenadoras, o principal

motivo da extinção dos cursos foi a falta de estrutura adequada na escola, pois ambos

necessitariam de laboratórios para aulas práticas, o que não foi possível devido a ausência de

espaço na instituição. Este fato é preocupante e mostra uma falha de planejamento por parte

do Governo Estadual para a implantação dos cursos técnicos, pois a constatação de que a

escola não possuía estrutura adequada para ofertar os cursos referidos, deveria ter sido

verificada antes da implantação dos mesmos. Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais

para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio (Resolução nº 6, de 20 de setembro de

2012), entre os critérios para o planejamento e a organização de cursos de Educação

Profissional Técnica de Nível Médio deve estar a capacidade da instituição de oferecer as

reais condições de viabilização da proposta pedagógica.

O curso de Informática também sofreu alterações, logo no segundo ano de

criação, sendo substituído pelo curso de Redes de Computadores. Isso foi algo que repercutiu

15

As EEEPs padrão MEC são unidades com 5,5 mil metros quadrados, 12 salas de aulas, auditório, bloco

administrativo, refeitório, biblioteca, ginásio esportivo, teatro de arena e laboratórios de Línguas, Informática,

Química, Física, Biologia e Matemática. Além dos laboratórios técnicos, que são equipados conforme a

especificidade de cada curso (SEDUC, 2015). Os equipamentos oferecidos por essas escolas podem ser

visualizados no vídeo disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=moLJIz5XOY0>. Acesso em: 01

mar. 2015.

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negativamente para os alunos, e inclusive apareceu nas falas de muitos deles, como um dos

elementos que os fizeram pensar em desistir do curso. Segundo a coordenadora entrevistada, a

mudança do curso se deu pelos motivos já mencionados de falta de infraestrutura adequada na

escola para comportar as exigências da área de Informática. Nesse caso houve uma maior

repercussão entre os alunos porque não se tratou de extinção, mas de mudança do curso e os

alunos já inseridos não tiveram participação decisória.

Assim, vale destacar que a implantação de políticas públicas, assim como

programas ou projetos de âmbito social, necessita de um planejamento prévio e de um

acompanhamento constante de avaliação para garantir os objetivos propostos. Todos os

elementos que compõe as políticas, os programas e os projetos precisam ser pensados de

forma articulada e com a participação dos sujeitos.

A escola estudada, embora profissionalizante, apresenta uma estrutura precária

dispondo de poucos recursos na formação dos jovens estudantes como pode ser observado nas

falas abaixo:

Realmente não tinha uma estrutura boa o colégio. As salas na questão de estrutura, a

quadra de esportes, de vez em quando faltava energia, a gente tinha muito caso de

faltar água, ou a gente passava o dia inteiro sem água ou então ia pra casa, perdia o

dia inteiro de aula por causa da falta d’água, falta de energia. Então, o que impedia

muito na escola que eu estudava era a questão da estrutura, de recursos que a gente,

pelo menos era o que nos falavam, que não passavam tantos recursos para que se

resolvessem os problemas da escola em relação a essas coisas pequenas, mas que

atrapalham bastante (Tamires, Estética, 18 anos).

Em termos de estrutura a escola era bem precária. Porque às vezes faltava água, às

vezes faltava luz. A cozinha não tinha higiene. E antes a estrutura era ainda pior, é

porque quando você [se referindo a mim] chegou, eles já tinham feito várias

melhorias, mas era pior antes (Sandra, Estética, 18 anos).

Eu acho que ficou muito a desejar na escola profissional, até porque a minha escola

ela é adaptada, não é padrão MEC. Aí como ela é uma escola assim, adaptada, ela

não tinha muitos recursos pra oferecer pra quem realmente vai exercer a profissão de

técnico. Deixou muito a desejar na área prática (Sophia, Redes de Computadores, 18

anos).

Os problemas como falta de água e energia aparece como algo que era recorrente

na escola. Embora, como enfatiza uma das jovens, sejam problemas simples, comprometem o

desenvolvimento das atividades escolares.

Um ensino de qualidade não depende apenas do trabalho docente com os alunos. O

espaço, as instalações e os recursos que a escola oferece a alunos, professores e

demais integrantes da comunidade escolar são suportes importantes ao processo de

ensino aprendizagem. Em primeiro lugar, porque uma escola ampla, organizada,

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equipada e limpa cria um ambiente favorável ao trabalho, motivando a equipe

escolar em suas atividades cotidianas. Segundo, porque um ambiente confortável

beneficia o aprendizado dos alunos, na medida que oferece os recursos e as

condições para que os jovens desenvolvam seu potencial (ABRAMOVAY,

CASTRO, 2003, p. 279).

Os problemas registrados na escola estudada, por conta da falta de infraestrutura,

me fizeram recordar o passado histórico da educação profissional no Brasil, quando foi

imposta a obrigatoriedade do ensino profissionalizante para todas as escolas que ofereciam

ensino médio. Na época, a proposta não teve continuidade, pois muitas escolas não tinham

estrutura para comportar os cursos oferecidos. Penso que isso vem, de certo modo,

acontecendo novamente no caso de alguns cursos técnicos oferecidos em escolas

profissionalizantes adaptadas, comprometendo a formação profissional dos jovens estudantes

ou levando a extinção dos cursos por falta de condições e/ou equipamentos adequados.

[...] pode-se afirmar que a expansão em si é um movimento importante e necessário,

que representa a presença do Estado brasileiro por meio de instituições reconhecidas

como de qualidade nas periferias das capitais e em regiões mais afastadas dos

grandes centros urbanos, ou seja, é a presença do Estado para mais além dos

territórios em que se concentra a maior parte do PIB nacional. Isso significa a

possibilidade de muitos brasileiros terem acesso a uma educação de qualidade

(MOURA, 2012, p. 62).

Tomando como referência a exposição de Moura (2012), é possível refletir na

perspectiva de que toda iniciativa de educação é bem vinda, e não se pode desconhecer as

vantagens da expansão das Escolas Estaduais de Educação Profissional no Ceará. No entanto,

não significa que a expansão em si seja suficiente, haja vista a necessidade de avaliar o

impacto dessa educação para os sujeitos contemplados. É importante aumentar o número de

escolas porque consequentemente isso irá ampliar o número de ofertas, possibilitando o

acesso de mais pessoas à educação, mas não se pode deixar de considerar a qualidade da

educação oferecida. Quando a expansão da educação estiver associada à qualidade da mesma

nos diversos aspectos que interferem a formação dos sujeitos, aí sim, é possível reconhecê-la

com mérito. Como destaca Andrade (2010), a oferta de escolas profissionalizantes é apenas o

primeiro passo, que deve estar acompanhado de outras ações, como os investimentos na

educação básica de qualidade, referendada por uma proposta pedagógica sólida, um quadro

docente qualificado e permanente e uma infraestrutura física e didática adequada.

Nesse sentido, diante da expansão da educação profissional integrada ao ensino

médio no Ceará, cabe questionar: como esse ensino vem sendo avaliado? É satisfatório ofertar

o ensino médio profissionalizante em escolas adaptadas? Essas questões se tornam ainda mais

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relevantes quando observado que há no Estado 52 escolas profissionalizantes adaptadas, o que

corresponde a um número significativo quando comparado à quantidade de escolas padrão

MEC inauguradas em funcionamento, as quais equivalem a 54 unidades (SEDUC, 2015). Ou

seja, as escolas adaptadas correspondem a quase metade das escolas profissionalizantes em

funcionamento no Ceará e refletir sobre os problemas que as permeiam se torna

preponderante para avaliar os impactos da Política de Educação Profissional no Estado.

Não há dúvidas de que a estrutura da escola interfere na qualidade do ensino, uma

vez que as aulas práticas são prejudicadas e, consequentemente, isso influencia na formação

profissional do aluno. Mesmo porque segundo o jovem Levi:

O diferencial da profissionalizante pra normal é o curso, é você sair dali tendo base

em alguma área no mercado de trabalho. E se você oferece o curso, mas não oferece

os instrumentos. A culpa às vezes não é nem do professor, porque o professor fica

ali limitado, vai ficar falando, falando. Certo que a gente extrai muita coisa, mas a

maioria das coisas que a gente aprende é na prática, você não tendo essa prática,

você acaba chegando no mercado de trabalho só com o nome do curso, não chega

sabendo do curso, sabendo o que você tem que fazer na empresa, então, eu acho que

isso é o que é falho no projeto (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

A respeito da limitação posta aos professores e da importância das aulas práticas,

a jovem Sophia complementa:

[...] Agora os professores, eles eram muito qualificados, ótimos professores, mas

eles não puderam passar tanto por causa que não tinha recursos na escola, entendeu?

Faltava um laboratório assim, bom mesmo, que desse pra praticar (Sophia, Redes de

Computadores, 18 anos).

É perceptível o reconhecimento dos alunos da importância da experiência prática

no processo de formação. Não que a teoria não seja importante, mas ela precisa estar atrelada

à prática. Os alunos ressaltaram ainda, que muitas vezes, os professores ficavam limitados,

sem condição de desenvolver as atividades devido a falta de recursos. O pensamento desses

estudantes reflete as exigências apontadas pelo mercado de trabalho, de buscar cada vez mais

profissionais preparados para atender as suas demandas. Mas não só isso, pois a própria

dinâmica da aula fica comprometida sem os recursos disponíveis, o que exige ainda mais

criatividade dos professores para tornarem suas aulas mais atrativas. Ouvi alunos comentarem

que alguns professores traziam equipamentos pessoais, como data show, para a escola, pela

pouca oferta disponibilizada pela instituição.

A estrutura precária interfere nas aulas práticas dos alunos, pois no caso dos

cursos extintos, não havia laboratórios e os estudantes só presenciavam aulas práticas por

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meio de visitas técnicas em instituições parceiras da escola. Na verdade, não constituíam aulas

realmente práticas, pois os alunos participavam da aula, na maioria das vezes, apenas como

ouvintes. Todavia, esse problema vai além da estrutura, pois mesmo nos casos dos cursos que

possuem laboratórios, por vezes o uso é comprometido devido a falta de equipamentos

necessários.

Foram poucas as aulas práticas. As aulas práticas que a gente fez, pra você ter ideia,

foi só um pouco da manutenção e foi só praticamente como tirar os equipamentos,

mostrando os equipamentos pra gente, entendeu? Ensinando a gente a montar a

CPU16

, gabinete né. Foram só essas. E outra, que foi no laboratório também, que foi

como configurar o servidor. Pronto. Essas foram as aulas práticas da gente. A gente

não teve muitas aulas práticas. Foi mais teoria (Sophia, Redes de Computadores, 18

anos).

Para o nosso curso não tinha os equipamentos necessários para oferecer um curso

bom, pra você chegar na empresa sabendo fazer mesmo e isso acabava refletindo na

gente. Tinha muita gente que tinha medo de chegar na empresa e não saber fazer

aquilo, sendo que você passou três anos (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

[...] Mesmo porque o laboratório era pequeno e os equipamentos eram todos velhos,

num dava pra usufruir muita coisa do laboratório de Informática. Pelo menos o de

Informática, que foi o curso que eu fiz, deixou muito a desejar (Sophia, Redes de

Computadores, 18 anos).

Indagado sobre a existência de aulas práticas o entrevistado respondeu:

Raras. O laboratório servia quando era manutenção, só que manutenção era da

Informática, como a gente era Redes, tipo, a gente precisava saber só o básico

daquilo. Aí bem dizer, o laboratório ficou jogado lá [...] e mesmo assim, se fosse

manutenção a fundo ainda estaria falho aquele laboratório. Não sei agora, mas os

professores estavam tentando melhorar (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

A infraestrutura deficiente, de certa forma, aparece como um dos responsáveis

pela falta de aulas práticas:

Pra te dizer a verdade, se a gente tiver ido pro laboratório de Hardware foi no

finalzinho e foi poucas vezes, porque o laboratório estava fechado porque o ar

condicionado estava quebrado; faltavam peças para praticar manutenção de

computadores. Agora está melhor depois que a gente saiu, os meninos do 2º ano

disseram que tá melhor agora. A gente não tinha computador novo, aí ano passado,

quase no finalzinho vieram computadores novos pra gente poder trabalhar, mas a

gente não tinha muita estrutura pra prática não (Flávia, Redes de Computadores, 18

anos).

16

É a sigla inglesa de “Central Processing Unit”, a qual, em Português, significa “Unidade Central de

Processamento”. A CPU é também conhecida como processador e corresponde ao cérebro do computador, onde

é feita a maior parte dos cálculos. Disponível em: <http://www.significados.com.br/cpu/>. Acesso em: 09 maio

2015.

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Acho que deveria ter mais apoio do governo, entendeu, porque às vezes não dá pra

trabalhar com o que a gente tem aqui, tipo, a área de Informática, às vezes a gente

precisava fazer alguma coisa, não tinha entendeu, não tinha como a gente ter a aula

porque não tinha certos materiais. Aí ficava difícil (Priscila, Redes de

Computadores, 18 anos).

Diante do exposto cabe questionar: essa ausência de materiais e infraestrutura

deficiente ocorre nas demais escolas profissionalizantes adaptadas? Ela se estende também

para as escolas padrão MEC? Qual a utilidade de um laboratório que não dispõe os materiais

necessários? Como um curso técnico pode oferecer a formação pretendida sem contar com a

estrutura e equipamentos requeridos?

Todos os alunos do curso de Redes de Computadores, como observado nos

depoimentos anteriores, demonstraram insatisfação com a formação prática oferecida pela

escola, pois segundo eles a escola não disponibilizava laboratórios e equipamentos adequados

para as aulas práticas. Já no curso de Estética as alunas relataram um discurso diferenciado

quando interrogadas se haviam tido aulas práticas:

Muitas aulas práticas. Eu acho que foram quase dois anos de aulas práticas.

Começou pela parte facial e depois só corporal, aí a gente se dividia em grupos.

Tinha as provas também práticas, que ajudaram muito. Eu não tenho nada a reclamar

da parte técnica, de aula prática nem teórica. Eu não tive nenhum problema de sair

pro mercado de trabalho pra área de Estética (Tamires, Estética, 18 anos).

Muitas [aulas práticas]. Tinha dias que a gente passava a manhã toda lá, a tarde

todinha. A gente fazia muito. Eu acho que disso eu não tenho muito a reclamar não.

Às vezes a gente ficava era cansada (Sandra, Estética, 18 anos).

De acordo com o portal do MEC (2015), o dinheiro repassado pelo Programa

Brasil Profissionalizado às escolas estaduais deve ser empregado em obras de infraestrutura,

desenvolvimento de gestão, práticas pedagógicas e formação de professores. É importante

saber como esses recursos são repassados às escolas profissionalizantes no Ceará. Segundo o

portal da SEDUC (2015), já foram aplicados mais de um bilhão de reais na implantação e

desenvolvimento das EEEPs no Ceará, incluindo os investimentos dos Governos Estadual e

Federal. Relacionando as escolas padrão MEC e as adaptadas, qual a quantidade de recursos

destinada a cada uma delas? Por que a escola adaptada faz parte do sistema das escolas

profissionalizantes, mas não recebe os investimentos comparáveis às escolas padrão MEC?

A nossa escola ela não era padrão MEC como eles mostram na televisão, não

mostram nenhuma adaptada, só mostram as que são padrão MEC. O curso precisava

de laboratórios, peças, e a gente não tinha. Estrutura para almoçar, tomar banho. A

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gente não tinha essa estrutura que todos os outros colégios que são padrão MEC

têm. [...] eles mostram as escolas que eles fizeram agora, que inauguraram, mas eles

não investem tanto nas escolas que começaram adaptadas. A minha escola tem

muito o que fazer pra estrutura ser adequada para uma escola profissionalizante. Mas

é nesse ambiente que a gente convive e eu acho que a gente não deixa de estudar.

Sai muita pessoa ali pra faculdade diretamente. Apesar de todos os defeitos

estruturais, a gente não deixa de estudar (Flávia, Redes, 18 anos).

[...] mesmo porque a estrutura ajuda a desenvolver atividades melhor. Apesar da

gente ainda ter uma estrutura precária, alguns objetivos a gente está conseguindo

alcançar, mas é lógico que a gente almeja mais. Aqui a gente não tem uma sala

sobrando pra fazer uma atividade extra com os alunos, não tem um auditório, então,

isso dificulta algumas atividades (Coordenadora Escolar).

A aluna ressaltou que mesmo diante das dificuldades em termos de estrutura, os

alunos na escola não deixam de estudar e muitos até conseguem se destacar com a inserção na

universidade. Da mesma forma, a coordenadora relatou que mesmo diante das limitações

existentes na escola já conseguiram atingir alguns objetivos e estão em busca de mais.

Moura (2012) destaca que apesar da maioria dos Estados terem recebido recursos

do Programa Brasil Profissionalizado, estes enfrentam inúmeras dificuldades, pois embora o

Governo Federal financie a infraestrutura física, como por exemplo, a construção e a

adequação de prédios, os equipamentos dos laboratórios e o acervo bibliográfico, os Estados

possuem algumas responsabilidades, sendo uma delas o quadro de professores. Com isso, a

maior parte dos Estados ainda não tem, nem estão constituindo o quadro de professores

efetivos, principalmente no que diz respeito às disciplinas específicas de formação

profissional (MOURA, 2012). No local da pesquisa, segundo a coordenadora entrevistada,

dos professores que compõe o quadro de docentes da escola, apenas cinco são efetivos e

nenhum faz parte da base técnica.

A insatisfação com a falta de estrutura adequada na escola é percebida também no

discurso dos jovens nas redes sociais, espaço em que expressam este descontentamento,

compartilhando a realidade deles com a de outros alunos.

Hoje, ao visitar o facebook, vi uma publicação da “EEEP da Depressão” que me

chamou atenção, era a imagem de uma escola com a legenda: “acreditem, essa é

uma EEEP”, e completava com o nome da escola. Percebi que já havia vários

comentários, então corri os olhos e visualizei o de uma aluna que conheço [da escola

pesquisada], ela disse: “ele quer saber de quantidade e não de qualidade. A minha

EEEP é adaptada e até hoje falta o básico [...] como ventiladores e cadeiras

adequadas. # revoltante”. Ao concluir a leitura dos demais comentários notei que

havia mais dois referindo-se à escola em estudo, provavelmente de alunos, mas não

os conhecia: “Essa está em perfeito estado, se for comparar com a [escola

pesquisada]”, dizia a aluna ao comparar sua escola com a da foto publicada. E o

outro aluno disse assim: “A [escola pesquisada] está mesmo merecendo uma

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reforma, falta de respeito com quem passa o dia inteiro lá cara” (Diário de Campo,

22/03/14, às 22h23min).

A página “EEEP da Depressão” no facebook, segundo descrição em que aparece

na mesma, é uma página humorística que tem o objetivo de agregar os alunos das escolas

profissionalizantes. Foi criada por um aluno de escola profissionalizante do Ceará e possui

membros de diferentes escolas. Eles usam o espaço virtual para compartilharem a vivência na

escola, muitas vezes de modo divertido e irônico. É perceptível que a problemática da escola

profissionalizante adaptada em nosso Estado não é uma realidade exclusiva do local em

estudo. É destaque também a revolta dos alunos, mesmo porque, segundo eles, falta a

estrutura básica onde estudam. Contrastando esse fato com as propagandas que circulam

constantemente nos meios de comunicação do Estado, nestas não aparecem escolas

profissionalizantes do tipo adaptadas, mas sim, padrão MEC, e a imagem que se transmite é a

de que todas as escolas implantadas possuem aquele modelo divulgado. Isso é preocupante,

pois mascara uma realidade e vários problemas, generalizando o programa das escolas

profissionalizantes, tendo em vista que essa questão deveria ser debatida de modo mais

crítico.

Figura 6 - Imagem da página da “EEEP da Depressão” no facebook

Fonte: Facebook.

Percebi que a página da “EEEP da Depressão” consiste em um local encontrado

pelos jovens para avaliarem a Política de Educação Profissional, embora não seja esse o

objetivo apresentado. A utilização de uma rede social como ponto de encontro consegue

contemplar um significativo número de alunos que estudam em escolas profissionalizantes, e

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ao mesmo tempo em que se unem para compartilhar experiências e informações de interesses

semelhantes, se apropriam do espaço virtual para expressar suas opiniões, críticas, sugestões.

Conforme destaca Sales (2010, p. 28), “ao acessar a internet, os indivíduos

descobrem novos espaços, onde desenvolvem teias de relações, redes de discussões, lugar

para compartilhar experiências, conhecimentos e sensações”. E, assim, ambientes como esse

são importantes instrumentos de participação e socialização juvenil, que poderiam ser

observados pelo Governo do Estado na avaliação do programa das EEEPs no Ceará, pois “as

manifestações culturais juvenis, notadamente as que se fazem notar pelas mídias eletrônicas,

podem e devem ser utilizadas como ferramentas que facilitem a interlocução e o diálogo entre

os jovens” (CARRANO, DAMASCENO, TAFAKGI, 2013, p. 04).

Vale ressaltar que as deficiências apontadas pelos alunos e coordenação, como

falta de auditório, salas extras, laboratórios adequados para aulas práticas, fazem parte de uma

realidade específica da escola estudada. Deste modo, a discussão não possibilita afirmar a

generalização dessas carências para as demais escolas profissionalizantes.

A seguir, abordarei sobre os projetos científicos e grupos culturais, os quais se

tornaram uma identidade da escola pesquisada. Por se apresentarem como algo específico e

significativo para a instituição e seus sujeitos, reconheço como uma discussão pertinente ao

estudo abordado.

3.2.2 Educação e Cultura: quando a escola se torna palco das expressões culturais

juvenis

A deficiência na infraestrutura da escola, como apresentado anteriormente, é

“compensada”, segundo os alunos, pelo acolhimento e incentivo recebido dos professores e

pelo destaque da escola nos projetos científicos e grupos culturais. Como pode ser percebido

na fala da jovem: “[escola pesquisada] não é escola padrão MEC, mas tem alunos padrão

MEC. Ou melhores [..].” (Beatriz, Redes de Computadores, 18 anos)17

.

Os projetos científicos e culturais se tornaram a identidade da escola pesquisada,

pois há alguns anos a instituição tem conseguido destaque no envio de projetos à

Superintendência das Escolas Estaduais de Fortaleza (SEFOR). Os jovens experimentam a

17

Escreveu à aluna em seu perfil na rede social facebook ao parabenizar o professor e os jovens do Grupo

Phylos, do Coral da escola, que estavam em Los Angeles concorrendo ao Intel ISEF, a maior Feira de Ciências

do mundo. Dois alunos da escola estudada fizeram parte do grupo de oito cearenses integrantes de dois projetos

selecionados no Estado para concorrer à feira. Foi a primeira escola profissionalizante a eleger alunos para o

evento, que ocorreu em maio de 2014.

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participação em projetos na escola por meio da Feira de Ciências, evento que ocorre

anualmente nas escolas profissionalizantes. Nesta, embora todos os alunos sejam incentivados

a participar há uma maior concentração dos alunos do 1º e 2º ano. Isso se justifica devido os

alunos do 3º ano estarem com seu tempo bastante comprometido devido conciliar com o

período de estágio e preparação para o ENEM/vestibular, e, portanto, sua participação é

facultativa. No caso dos alunos do 1º e 2º ano, normalmente as atividades são utilizadas pelos

professores com vistas a gerar notas para as avaliações bimestrais. Para concorrer, os alunos

devem escrever um projeto na área científica ou cultural, de forma individual ou em grupo. É

comum a formação de grupos com o auxílio de um professor orientador. Os melhores projetos

são encaminhados à SEFOR para concorrência estadual, podendo ainda participar a nível

nacional e internacional.

Quanto aos grupos culturais, estes surgiram na escola quando o atual professor de

Artes fez uma visita à instituição, em 2008, para ser jurado na semana cultural, evento em que

ocorre a Feira de Ciências. A partir desse contato ele ministrou uma aula que gerou interesse

de muitos alunos, levando a escola a contratá-lo por meio de uma cota arrecadada entre os

professores. Com o início dos trabalhos o professor teve a ideia de criar um grupo para

concorrer na Feira Estadual, a SEFOR, e foi a partir de então que surgiu o Phylos, o Coral da

escola. Em oito meses de trabalho o grupo fez a primeira apresentação e divulgou o

espetáculo em diversas escolas do Estado e também para a SEDUC. Em 2013 a escola

estudada reivindicou, junto à SEDUC, a contratação de um professor exclusivo para Artes, o

que consiste em um projeto extracurricular, que acontece fora do horário das aulas.

Nesse sentido, para o professor de Artes, conseguir a contratação constituiu um

desafio, mas significou para a escola o pioneirismo na conquista, e hoje, outras escolas do

Estado já são contempladas com um professor de Artes.

Porque como é uma escola profissional [...] ela é muito voltada para o mercado de

trabalho e a gente não tinha essa vertente para ser trabalhada. E a gente provou que

apesar de todos os afazeres e dessa vida tecnológica que eles têm, tem muito talento,

e tem os que querem trabalhar com isso (Professor Entrevistado).

Por que a escola precisou lutar por um professor de Artes? Por que a instituição

não recebe investimentos para a área cultural? Será que o fato de ser uma escola

profissionalizante, com foco para o mercado de trabalho, impossibilita a ela receber

investimentos em artes? Como os órgãos financiadores da educação profissional percebem a

influência do viés artístico e cultural para as expressões juvenis? Esses questionamentos se

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tornam pertinentes ao considerar que a escola profissionalizante está voltada à formação de

jovens estudantes e para estes a arte e a cultura oferecem possibilidades múltiplas de

expressão e participação, conforme ressalta Dayrell (2007, p.03) “o mundo da cultura aparece

como um espaço privilegiado de práticas, representações, símbolos e rituais, no qual os jovens

buscam demarcar uma identidade juvenil”.

Segundo o professor de Artes, o grupo Phylos foi pensado buscando construir,

através da música, um embasamento científico para elaborar trabalhos para as feiras e isso

tem mostrado resultados muito satisfatórios. Por meio do Coral outros três grupos foram

criados na escola: o Teatro, a Dança e o Instrumental, conforme pode ser observado na figura

a seguir:

Figura 7 – Grupos culturais em apresentação na instituição: Coral (A); Dança (B);

Instrumental (C)18

(A)

(B)

(C)

Fonte: Arquivo Pessoal.

18

Neste dia o grupo de Teatro não realizou nenhuma apresentação.

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Tendo em vista que a escola só possui financiamento para um professor de Artes,

este dá assessoria aos quatro grupos existentes, mas ele atua de modo mais específico com o

Coral. Para contemplar os demais grupos conta com a parceria de três professores de fora da

instituição, um para cada modalidade, o Teatro, a Dança e o Instrumental. Vale ressaltar que

estes outros professores não são contratados pela escola, a parceria funciona de modo

informal, em que eles ministram aulas dentro da carga horária do professor de Artes e este

repassa a eles o pagamento.

A gente conseguiu então grandes resultados nas feiras que a gente também

participou, mostrando que a música é capaz de interagir, de poder melhorar o

relacionamento intra e interpessoal, de poder então melhorar em atividades

acadêmicas, porque pra esse projeto coexistir precisa-se de notas, de um bom

relacionamento, não só nesse projeto, porque logo após a gente conseguiu então

fazer a divisão pra quatro vertentes: Teatro, que hoje nós temos na escola;

Instrumental, que também temos, com violão, flauta e percussão; Dança, que é

contemporânea, Balé Clássico, Jazz, Hip Hop; e Canto Coral, pra poder então

trabalhar. Então a gente é meio que um quarteto fantástico, trabalhando nessas

vertentes culturais e artísticas da escola. E cada vez mais tem crescido (Professor

Entrevistado).

Novamente a fragilidade da estrutura se apresenta, pois com a ausência de

auditório ou salas disponíveis o grupo tem sua atuação comprometida pela falta de um local

fixo e adequado para os ensaios e apresentações. Os ensaios normalmente acontecem no

laboratório de Ciências, podendo ocorrer também em salas de aula livres, no pátio ou na

quadra, o que aponta para uma ressignificação dos espaços escolares pelos jovens. Com

relação ao horário, normalmente ocorre no intervalo do almoço e em dias diferenciados para

possibilitar que um mesmo aluno possa participar de mais de um grupo.

Embora reconheça as dificuldades enfrentadas pelos grupos devido a falta de

infraestrutura na escola, o professor de Artes considera este um fator que propicia estímulo e

incentivo aos jovens, ao buscarem se diferenciar mesmo diante das adversidades:

[...] eu acho que a gente consegue desenvolver muitos bons trabalhos artísticos aqui

por conta da nossa não estrutura. Tu acredita? Eu acho que se a gente tivesse as

condições pra isso, talvez até esse grupo não existisse. Porque eles seriam bons em

outras áreas. Eles teriam estrutura para ser bons em outras áreas. Eu acho que essa

falta de estrutura, não é agradecendo a Deus pelas migalhas, mas é agradecendo pelo

que a gente já conquistou e agora que a gente já provou que pode ser fiel ao pouco a

gente quer o muito, pra poder ser fiel ao muito (Professor Entrevistado).

Embora a contratação de um professor de Artes tenha representado um passo

importante para o desenvolvimento das atividades, os grupos ainda enfrentam muitas

dificuldades, sobretudo com relação a disponibilização de recursos para viabilizar os

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espetáculos. Além dos recursos humanos, é necessário uma série de equipamentos que

contemplam instrumentos, roupas e acessórios para os ensaios e apresentações. No momento,

as apresentações do grupo de Coral têm sido remuneradas, o que representa algum recurso

para a compra de materiais. Todavia, da parte do governo, não ocorre nenhum investimento.

Quando indaguei ao professor entrevistado se havia investimentos governamentais, ele me

respondeu:

P: Nenhum, nada. O máximo que acontecia era a coordenação que poderia comprar,

por exemplo, quando tinha alguma apresentação muito importante pra SEDUC,

então a coordenação ia lá e patenteava comprando blusas pra deixar uma coisa mais

uniformizada, mas tirando isso, nada mais.

AP: Mas e agora?

P: Agora, pelas pautas remuneradas que foram poucas a gente conseguiu comprar

alguns instrumentos, como [...] um violão elétrico. Então foi com as pautas que a

gente conseguiu, até que enfim, comprar os nossos instrumentos pra ir pagando aos

poucos. A gente paga no cartão, faz rifa, faz bingo.

AP: Entre vocês mesmos?

P: Entre nós mesmos.

AP: E até o momento não tem nenhum investimento?

F: Não. Infelizmente não tem. Mas às vezes quando a gente pede alguma ajuda,

“olha, a gente precisa de tanto”, aí às vezes eles dão. Às vezes. Mas é muito raro.

Quase nunca.

AP: Por parte da SEDUC ou da escola?

P: Da escola. SEDUC não.

Vale ressaltar que para continuarem nos grupos culturais os alunos precisam ter

boas notas, frequência e bom comportamento. Embora com tempo restrito para dedicação aos

grupos, os jovens estudantes têm mostrado que é possível conciliar estudo com arte e cultura,

além de mostrar que a presença de grupos como estes na escola contribuem de modo

satisfatório no processo de aprendizagem, ao proporcionarem o incentivo e a disciplina aos

estudos.

Tive a oportunidade de conhecer de perto a trajetória de dois jovens projetistas. A

jornada de ambos iniciou em 2012 quando se apresentaram na Feira de Ciências da escola e

conseguiram ter o seu trabalho classificado para a SEFOR. A partir de então, os jovens

participaram de várias feiras e ganharam várias premiações. Na última delas conseguiram o 1º

lugar na área de Ciências Humanas e também a credencial para participarem do Fórum

Internacional de Ciência e Engenharia, realizado em agosto de 2014, em Santiago, no Chile,

mesmo já sendo egressos da escola. Conforme pode ser observado na foto a seguir:

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Figura 8 – Jovens projetistas apresentando projeto em Santiago (Chile)

Fonte: Cortesia dos jovens projetistas.

O projeto da dupla contava a história de Lampião e Maria Bonita e objetivava

divulgar a cultura nordestina por meio da valorização da cultura regional. Para concorrer,

além da escrita do projeto, eles construíam: plano de pesquisa, caderno de campo e relatório.

A exposição do projeto nos eventos se dava por meio de um banner confeccionado por eles e

pela apresentação de um recital de cordel de autoria própria, no qual ambos se caracterizavam

de Lampião e Maria Bonita.

Figura 9 – Jovens durante apresentação de projeto (A e B)

(A)

(B)

Fonte: Cortesia dos jovens projetistas.

Algo muito marcante na fala desses jovens foi a dificuldade de conseguir recursos

para realizar as viagens e apresentar o projeto. Ou seja, conseguir ser selecionado não

significava conseguir verba para viajar. Assim, a maior parte das viagens que conseguiram

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realizar só foi possível pela persistência que tiveram de buscar recursos, de acreditarem em

seu potencial e por substituírem a palavra desistir por insistir, conforme expressou o jovem

projetista:

[...] Aí depois, em dezembro, quando a gente já havia se inscrito na FEBRACE

[Feira Brasileira de Ciência e Engenharia], aí saiu o resultado no ano passado

[2012], em dezembro, acho que foi dia 16 ou dia 18, que a gente tinha passado. O

único projeto de Fortaleza que tinha passado na FEBRACE. A gente foi em março

[2013] pra São Paulo, foi muita luta pra gente conseguir verba. Fomos na

Assembleia Legislativa, fomos na SEDUC, fomos nas TVs, rádios, tudo. Só

recebemos porta na cara. A gente também fez uma entrevista pro Jangadeiro On-

line. Aí essa notícia que deixou a Secretaria de Educação meio assim. A partir do

momento que ela viu essa notícia ela ligou imediatamente pra escola pra tirar

satisfação. Disse que era pra gente desistir, que não ia dar certo e mesmo assim a

gente continuou acreditando até o último momento que a gente ia conseguir ir

apresentar o nosso trabalho. Aí, logo após, o diretor da nossa escola, vendo a nossa

motivação, aí ele retirou verba da escola e deu pra gente ir pra São Paulo (João

Paulo, 18 anos, Redes de Computadores).

Observo que a participação nos projetos é uma atividade significativa para os

jovens pesquisados. Embora estejam em uma escola profissionalizante, os sujeitos não se

contentam com a formação técnica adquirida e querem ser mais, ir além, buscam ser jovens

para além de alunos, mediante as vivências das expressões culturais no âmbito escolar. No

entanto, estas atividades culturais extracurriculares, mesmo sendo cultivadas pela escola não

recebem os investimentos necessários pelos órgãos financiadores da educação, demandando

por parte dos jovens, esforço próprio para aquisição dos recursos. O que causa maior surpresa

é perceber que a participação nos projetos é incentivada pela SEDUC por meio da realização

das competições na SEFOR, mas por outro lado, quando classificados para etapas posteriores,

os jovens não possuem recursos garantidos. O fato se mostra contraditório também, quando

ao analisar o propósito das EEEPs do Estado, aparece o objetivo de incentivar o protagonismo

juvenil, contudo, quando os jovens apresentam esse protagonismo não recebem estímulos

para desenvolvê-lo.

Assim, é preciso que haja políticas educacionais satisfatórias, capazes de garantir

não apenas o acesso aos estudos, mas também projetos de caráter multidisciplinar que

contemplem a arte e a cultura nas escolas, oportunizando aos jovens formação interdisciplinar

que envolva formação, conhecimento e expressividade juvenil.

É perceptível que a participação dos jovens nos projetos desenvolve neles o

interesse pelas atividades de pesquisa e possibilita o primeiro contato com um projeto

científico, desde a fase de elaboração escrita até a sua concretização final, constituindo assim,

uma iniciação à pesquisa. Os alunos aprendem a elaborar trabalhos científicos e isso contribui

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muito não só para os trabalhos da escola, mas para o crescimento intelectual e senso crítico

dos sujeitos.

A escola vem conseguindo se destacar e a gente nota a evolução deles, em termos de

pensar em temáticas para os trabalhos, em termos de pesquisa, das apresentações, o

crescimento deles é muito grande e acabam vivenciando coisas que nunca tinham

vivenciado. Meninos que nunca saíram nem do bairro e vão conhecendo outros

Estados. É uma oportunidade única (Coordenadora Escolar).

São múltiplos os aprendizados adquiridos pelos jovens na participação dos

projetos: superam limitações pessoais como timidez, comunicação e postura inadequadas;

aprendem a ser mais sociáveis; participam de atividades internacionais e fazem novas

amizades; amadurecem como pessoas e profissionais; aprendem valores como

responsabilidade, compromisso, dedicação, organização, disciplina. É perceptível que os

alunos participantes de projetos conseguem um desenvolvimento mais satisfatório em vários

aspectos. São experiências e aprendizados vivenciados que ultrapassam os muros da escola e

o tempo de curso.

A escola como um todo me deu uma ótima oportunidade, me fez crescer,

amadurecer, me permitiu fazer coisas que nunca consegui realizar, embora quisesse

fazer, por exemplo, o ingresso no Teatro, participações em seminários, dança,

criação de projetos que me deram destaque e conhecimento (Eliana, Estética, 17

anos, Trecho do Caderno-diário).

No discurso dos jovens ao relembrarem suas trajetórias na escola, a participação

nos projetos científicos e culturais apareceu como algo central, diante das experiências

vivenciadas de conhecimentos, sociabilidades, conquistas.

Diante de todas as contribuições, é possível afirmar que os projetos científicos e

culturais favorecem o fortalecimento do vínculo aluno/escola, facilitam o processo ensino-

aprendizagem e possibilitam aos jovens vislumbrarem novos horizontes. Com isso, cabe

afirmar que os investimentos nos projetos científicos e culturais nas escolas, sejam

profissionalizantes ou não, são um importante passo no reconhecimento das culturas juvenis

nas escolas, uma vez que as expressões culturais e a sociabilidade são importantes dimensões

da condição juvenil, pois segundo Dayrell (2009, p.20) “a sociabilidade para os jovens parece

responder às suas necessidades de comunicação, de solidariedade, de democracia, de

autonomia, de trocas afetivas e, principalmente, de identidade”.

No tópico a seguir adentrarei, mais especificamente, o ambiente da pesquisa e

realizarei uma análise das relações deste com os sujeitos estudados.

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3.3 JUVENTUDES E ESCOLA: CONEXÕES ENTRE OS SUJEITOS E O LOCAL DA

PESQUISA

“Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas

[...]. Escolas que são asas não amam pássaros

engaiolados. O que elas amam são pássaros em voo.

Existem para dar aos pássaros coragem para voar.

Ensinar o voo elas não podem fazer, porque o voo já

nasce dentro das pessoas. O voo não pode ser ensinado.

Só pode ser encorajado”.

(Rubem Alves)19

.

Inicio este tópico inspirada nas palavras de Rubem Alves e me utilizo delas para

relacionar a escola pesquisada com as “escolas que são asas”, sugeridas pelo poeta. Os

motivos pelos quais assim me refiro buscarei demonstrar no decorrer da discussão que traçarei

a partir de agora.

A escola constituiu o ambiente desta pesquisa. Um local que acolhe em seu

cotidiano muitos jovens, semelhantes, ao mesmo tempo em que diferentes entre si.

Semelhantes por estarem vivenciando a mesma fase da vida em que acompanha gostos e

transformações físicas similares. Mas por outro lado diferentes, uma vez que apresentam

características de gênero, raça, classe social, contextos sociais diferentes. Pois não podemos

dizer, por exemplo, que um jovem que sempre estudou em escola particular e morou toda sua

vida em um bairro considerado de classe média seja igual a um jovem oriundo de escola

pública e morador de um bairro periférico. A escola é uma só, mas envolve jovens diversos.

Discutir sobre os jovens estudantes, sujeitos dessa pesquisa, e como eles se

constroem no ambiente escolar remete à necessidade de discutir a categoria juventude,

embora não proponha trazer uma definição desta, pois como destaca Dayrell (2003), definir a

juventude não consiste tarefa fácil, visto que “os critérios que a constituem são históricos e

culturais” (p. 41). Nesse sentido, da mesma forma como o autor, busco traçar uma abordagem

que a reconhece enquanto categoria diversa.

Pais (2003) caracteriza a juventude a partir de dois olhares. O primeiro ao

considerá-la como um conjunto social constituído por indivíduos pertencentes a uma dada

fase da vida. Seria o mesmo que defini-la a partir da unidade, como grupo homogêneo. Essa

concepção deve estar associada ao segundo olhar, o qual visualiza a juventude como um

conjunto social composto por jovens que vivenciam situações sociais diferentes. Ou seja, “a

19

Trecho do Poema “Gaiolas e Asas” de Rubem Alves. Publicado no livro: Para uma educação romântica, da

editora Papirus, 7ª ed. 2008, p. 29-31.

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juventude se encontra socialmente dividida em função dos seus interesses, das suas origens

sociais, das suas perspectivas e aspirações” (p.42). Este último olhar seria o mesmo que

compreender a juventude na sua diversidade, como grupo heterogêneo.

Uma das limitações para o entendimento da juventude tem sido o fato de muitos

considerarem esta apenas como fase transitória para a vida adulta. É como se esse período não

fosse considerado em seu real significado, passando a ser visto como um momento de espera

e preparação para a fase adulta. O desemprego, o envolvimento na criminalidade e/ou nas

drogas, problemas na escola e na família são alguns dos problemas apontados socialmente

como pertencentes à juventude. Assim, a juventude apesar de ser múltipla e complexa passa a

ser vista numa falsa homogeneidade (CARRANO, MARTINS, 2007).

Carrano (2007) destaca que as idades não possuem um caráter universal e definir a

juventude tendo em vista apenas seu caráter etário seria a maneira mais simplista de uma

sociedade definir o que é ser jovem. Seria mais conveniente considerar a juventude como uma

complexidade variável que se caracteriza por suas múltiplas maneiras de existir nos diferentes

tempos e espaços sociais. A juventude assume, portanto, caráter dinâmico e cultural,

adquirindo características que se diferenciam no tempo e no espaço.

Nesse contexto, a definição de juventude aparece como complexa e um conceito

em aberto, pois remete à vivência particular de cada jovem, no seu tempo, na sua realidade,

com a sua personalidade e por diversos outros fatores. Os jovens constroem diferentes modos

de ser jovem, daí a necessidade de considerar a noção de juventudes, no plural, como forma

de melhor contemplar a diversidade juvenil.

Ao ter como sujeitos da pesquisa jovens estudantes, é preciso considerar que ao

irem à escola estes jovens carregam consigo um conjunto de experiências sociais

experimentadas nos distintos tempos e espaços em que vivem, as quais influenciam nas suas

relações escolares. Dessa forma, faz-se necessário que a escola reconheça os jovens nas suas

particularidades, para além de alunos, ou seja, é necessário “que a escola e seus profissionais

busquem conhecer os jovens com os quais atuam, dentro e fora da escola, descobrindo como

eles constroem um determinado modo de ser jovem” (DAYRELL, 2009, p 17).

Foi possível observar que enquanto inseridos na escola os jovens se revezam entre

dois papeis, assumindo em determinados momentos o papel de jovens, em outros, de alunos.

A primeira postura é percebida, por exemplo, quando os atores investigados se apropriam e

ressignificam o espaço escolar com brincadeiras, afetos e sociabilidades, assim como, quando

participam de projetos científicos e grupos culturais. A segunda postura foi mais perceptível,

por exemplo, quando os sujeitos se deixavam ser disciplinados pela instituição, seguindo suas

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normas e buscando atender suas expectativas, aquelas esperadas para um bom aluno:

comportado, educado, estudioso. Percebi que os atores estudados ao vivenciarem o cotidiano

escolar se construíam pela busca constante de contemplar estas duas dimensões.

Assim como os jovens que viviam o constante dilema entre ser jovem e ser aluno,

a escola se comportava ora flexível, ora disciplinadora. Em conversa com uma professora, que

é também diretora de turma, ela compartilhou algumas dificuldades enfrentadas no cotidiano

escolar, pois em seu trabalho precisa contemplar as exigências da escola, dos alunos e dos

pais, e nem sempre é fácil estabelecer um consenso entre todos. Quando são mais liberais,

como no caso de “aceitar” a homossexualidade dos alunos, os pais chegam à escola

reclamando de que esta apoia aquela prática, como se fosse papel da instituição determinar a

orientação sexual dos alunos. Ela citou o exemplo, também, de estudantes que chegam à

escola com características bem diferenciadas quanto ao modo de se vestirem, de como pintam

o cabelo, dos acessórios usados, e ressaltou o trabalho realizado pelos professores em prol

desses alunos adotarem novos hábitos, pois segundo ela, é uma exigência do mercado de

trabalho, e dependendo da caracterização que chegarem à empresa, eles serão ou não

recebidos.

Por se tratar de uma escola profissionalizante que tem como foco a preparação dos

jovens para o mercado de trabalho essa postura dos alunos é ainda mais exigida por parte dos

professores, mesmo porque, conforme enfatizado, eles passarão pela experiência do estágio.

“Vocês não são só jovens, são jovens profissionais e têm que tomar cuidado com a postura de

vocês, a maneira de se expressar, de comportamento. Tem que dar o exemplo” (Professora de

Redes de Computadores). Discursos como esse foram ouvidos com frequência pelos jovens

estudantes durante os três anos de formação, em especial no período de realização do estágio.

Com isso, observo que ao mesmo tempo em que a escola se mostra aberta, em alguns

aspectos, para acolher os interesses juvenis e proporcionar espaços-tempos para que os jovens

construam suas identidades, existe, de modo geral, um “tipo ideal” (WEBER, 1982) de aluno

desejado pelas escolas, aquele que seja educado, comportado, tire boas notas.

Observo que a escola, às vezes, até busca se posicionar diferente da lógica

implantada socialmente, mas quando isso acontece nem sempre é bem vista, nem pelos pais,

nem pela sociedade, a qual determina “o que” e “como” deve ser ensinado.

Reconheço a escola como um local contraditório, pois está imersa no conflito de

interesses, na esteira de possibilidades. Ela é a expressão de sínteses provisórias

decorrentes de arranjos e conflitos existentes no seu interior, mas também é

expressão de uma realidade mais ampla que muitas vezes professores, alunos, pais e

gestores não conseguem enxergar (OLIVEIRA, 2012, p. 96).

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Ao realizar as observações em sala de aula foi possível perceber tanto uma postura

disciplinar quanto flexível por parte da escola. Na primeira situação, por exemplo, pela

aplicação do mapeamento para organizar as cadeiras, sendo responsabilidade de o professor

definir o local que cada aluno deveria sentar. Na maior parte das turmas observadas o

mapeamento era estruturado por cadeiras dispostas em três filas duplas. Mesmo com essa

disposição definida, as salas não refletiam um aspecto organizado, ao contrário, apresentavam

aspecto desorganizado com livros e outros materiais espalhados no chão, principalmente no

final da sala; armários abertos com objetos jogados dentro e em cima sem nenhuma

organização; roupas estendidas em varais ou nas cadeiras. Observei também, em algumas

visitas, alunos sem farda ou com farda incompleta e não presenciei nenhum professor ou

coordenadores chamá-los a atenção.

Embora haja inúmeras pesquisas que comprovem o pouco interesse das escolas

pelos jovens e o não reconhecimento destes na sua condição juvenil, consistindo numa relação

conflituosa, na qual os jovens se inserem mais por obrigação do que por interesse, na escola

estudada observei uma dinâmica diferente, não na sua totalidade, pois são muitos os

elementos que interferem no processo, mas posso dizer que iniciativas têm sido realizadas por

parte de professores e demais funcionários para tornarem a escola mais aberta aos interesses

juvenis.

Algumas situações observadas durante a pesquisa de campo me deixaram curiosa

e me fizeram pensar que a escola não assume uma postura tão rígida e controladora com seus

alunos. Como no dia em que, depois do almoço, alguns alunos ocuparam o lado esquerdo do

pátio para jogar bola. Para isso usaram as cadeiras como traves e durante a partida chutaram a

bola inúmeras vezes para o lado oposto, passando entre alunos e professores que ainda se

concentravam nas cadeiras dispostas para o almoço. “Os jovens tendem a transformar os

espaços físicos em espaços sociais, pela produção de estruturas particulares de significados”

(DAYRELL, 2009, p. 21). Percebo que ressignificar os espaços constitui uma prática

marcadamente juvenil, mas nem sempre bem vista em ambientes como a escola,

principalmente quando representam escolas de “rígida estrutura burocrática”, pois nelas “o

espaço da escola é objeto de controle pelos variados mecanismos institucionais [...]; o uso de

equipamentos escolares (ainda que escassos), criteriosamente vigiado; o recreio em espaços

definidos” (PEREGRINO, CARRANO, 2003, p. 20). Assim, fiquei surpresa com a postura

dos professores e coordenadores ao não repreenderem a ação dos jovens. Talvez eu tenha

assim reagido por já ter uma experiência anterior de pesquisas em escolas

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profissionalizantes20

e nestas a rigidez me pareceu maior que na escola estudada, pela

vigilância constante e exigência de bom comportamento e de boas notas por parte dos jovens,

assumindo a postura de preparação dos alunos para futuros profissionais e desconhecendo,

muitas vezes, suas características juvenis. Na escola pesquisada, ao invés da pressão exercida

nos alunos, percebi que os professores se destacavam por incentivá-los, encorajá-los a novos

voos, como uma “escola de asas” proposta por Rubem Alves. Como pode ser observado nas

seguintes falas:

Os professores eram ótimos, eles realmente incentivavam a gente, disseram pra

gente nunca desistir, que mesmo quando a gente saísse, que a gente realmente

procurasse algo pra nossa vida (Priscila, Redes de Computadores, 18 anos).

O ponto positivo da [escola pesquisada], eu não sei as outras, é que os professores,

eles realmente se dedicavam muito pra dá aula, porque professor todo mundo sabe

que não ganha muito bem, aí tem uns que não tão nem aí. Mas os professores [da

escola pesquisada] eu acho que eles realmente gostavam do que estavam fazendo lá

(Sandra, Estética, 18 anos).

Eles [os professores] eram muito bons e eles animavam a gente pra correr atrás do

que a gente queria e davam apoio nos projetos escolares. Eles eram mais do que

professores, eles eram amigos, porque a gente convive mais com eles do que com a

própria família (Flávia, Redes de Computadores, 18 anos).

O forte apoio disponibilizado pela escola aos projetos científicos e grupos

culturais na instituição, conforme demonstrado no tópico anterior, já demonstra, por si só,

uma postura positiva e diferenciada da instituição. No entanto, é importante destacar que não

tenho o objetivo de supervalorizar a escola pesquisada, muito menos, afirmar que esta não

comete falhas em sua administração, mas reconheço que iniciativas importantes, embora não

contemplem sua totalidade, estão sendo desenvolvidas pela instituição, e isso tem

proporcionado um ambiente mais favorável à produção de conhecimentos e sociabilidades

entre professores, funcionários e sujeitos juvenis.

Inscrita nas engrenagens da modernidade, a escola está cada vez mais presente nos

quotidianos juvenis. Todavia, os jovens não vão simplesmente à escola: apropriam-

se dela, atribuem-lhe sentidos e são transformados por ela. Se parte deles sente o

processo de escolaridade como uma imposição, uma violência, a que se resiste ou

que se abandona, para outros esse espaço é um suporte fundamental na construção

do percurso de vida e do projeto identitário. Em qualquer dos casos, a escola

constitui hoje uma das instituições fundamentais em torno das quais os jovens

estruturam as suas práticas e discursos, os seus trajectos e projectos, as suas

identidades e culturas (ABRANTES, 2003, p.93).

20

Refiro-me ao período de 2009 a 2011, no qual realizei, enquanto bolsista do PET, três pesquisas que

contemplaram duas escolas profissionalizantes em Fortaleza.

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Para Oliveira (2012, p. 97), “a escola é muito mais que apenas um espaço de

socialização e de divulgação de saberes; ela é, antes de tudo, um espaço de reconstrução do

ser social”. Ainda segundo o mesmo autor, ela constitui um espaço fundamental para a

elaboração de uma identidade agregadora de várias dimensões, entre elas, políticas, afetivas,

físico-intelectuais ou econômicas. Por isso, não cabe pensar a escola ou a educação

profissional relacionadas apenas para uma dimensão da vida humana: o trabalho ou a

formação de um agente econômico.

Nesse contexto, percebo que a escola pesquisada têm buscado oferecer uma

educação integrada, dispondo formação básica e técnica, mas não restringindo-se a estas, uma

vez que agrega em seu currículo e prática educacional elementos de formação humana e de

preparação para a vida, os quais se sobrepõem aos conhecimentos teórico-práticos

apreendidos, conforme demonstram as jovens:

Eu esperava muito pela minha mãe, tipo, se tinha que fazer alguma coisa, eu, peraí,

que vou ligar pra minha mãe, e hoje em dia eu não sou mais assim, eu sei correr

atrás, sei conseguir as coisas que eu quero (Beatriz, Redes de Computadores, 18

anos).

Antes, antigamente, eu era uma menina, assim, muito envergonhada. Minha mãe ia

me deixar na escola, essas coisas. Quando eu fui pra escola profissionalizante eu fui

só. Eu nunca andei de ônibus só antigamente. Depois da escola muda, entendeu? Só

de passar o dia com aquelas meninas da sua idade [...] A gente ver como é a vida,

entendeu? Sai daquela bolha [...] (Antônia, Estética, 18 anos).

Pelo discurso das jovens observo que a escola profissionalizante proporcionou-

lhes independência, autonomia, liberdade, e a possibilidade de serem sujeitos de suas vidas e

não apenas expectadoras.

Outro elemento central na fala dos sujeitos foi o crescimento pessoal

proporcionado pela escola profissionalizante, pelo qual adquiriram maior maturidade.

Conforme pode ser observado nos trechos a seguir:

[...] eu acho que é mais a questão do amadurecimento, da pessoa tá lá numa escola

convivendo com várias pessoas diferentes, tendo que passar por várias situações

diferentes. Então eu acho que a pessoa vai quebrando a cabeça pra tentar resolver

algumas coisas até você chegar a um ponto de amadurecimento (Sandra, Estética, 18

anos).

Eu cresci muito, você chega aqui com uma mentalidade, aí você cresce muito

entendeu, porque você convive com outras pessoas com personalidades diferentes e

você ver que nem sempre as coisas são fáceis, que realmente a gente tem que lutar,

que a gente tem que batalhar por aquilo. E, tipo, me ajudou muito nessa parte de

perder a timidez, por causa dos trabalhos e tal, querendo ou não, você vai se

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soltando mais, entendeu e isso me ajudou muito porque, vamos dizer que eu vou

fazer uma entrevista, eu não sou mais tão tímida como eu era antes.

AP: Se fosse pra descrever a Priscila antes e depois da escola?

P: Uma Priscila mais madura (Priscila, Redes de Computadores, 18 anos).

Esse amadurecimento enfatizado pelas jovens se deu, principalmente, pelo

convívio com outros jovens da mesma idade, que eram diferentes, vieram de realidades

diversas e com opiniões divergentes. Apesar disso, essa convivência nem sempre foi uma

realidade fácil vivenciada pelos jovens na escola, como pode ser observado na fala abaixo:

Você estudar com 39 pessoas totalmente diferente de você, que tem um histórico de

vida diferente, isso era o mais complicado, eu acho até que para os professores, pois

era uma realidade totalmente diferente, tipo, tinha muito conflito de ideia e isso a

escola tentava padronizar, mas não dava, tinha muito conflito devido as pessoas

pensarem diferente, à flor da idade, todo mundo jovem, todo mundo querendo tá

certo (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

O jovem aponta em sua fala as tentativas da escola em padronizar as ideias

juvenis, pois como destaca Dayrell (2007) “institucionalmente, a escola é ordenada por um

conjunto de normas e regras que buscam unificar e delimitar a ação dos sujeitos” (p. 09). Esse

fato remete à discussão anterior e reforça o constante dilema da escola, o de ser tanto flexível

quanto disciplinadora.

Por outro lado, na visão dos jovens, os conflitos exercem papel positivo ao

proporcionarem amadurecimento, formação do senso crítico e aprendizado pelas experiências

com os demais colegas. Ao relatarem a vivência de suas juventudes na escola, os jovens

expressaram depoimentos como esses:

Foi complicado. Muitas meninas dentro de sala, personalidades diferentes e sempre

tem as panelinhas, os conflitos, tem aquela questão: “ah, eu não gosto de tal pessoa”;

“ah, eu gosto”. A questão de você estar lá dentro e aprender a conviver com pessoas

que vão praticamente virar sua família, porque a gente, principalmente no 1º ano que

não tinha estágio, a gente chegava lá 07h00min horas da manhã e saia 17h00min

horas da tarde, então só ia mesmo pra casa dormir. Então aprender a conviver dentro

de uma sala com muita gente totalmente diferente de você é bem complicado, mas

assim, depois de um tempo de convívio você amadurece, aprende a conviver com as

diferenças, com a opinião de cada pessoa. Vai ter conflito sempre? Vai. Mas a gente

aprende a conviver, a evitar, a ignorar, a gente realmente aprende a viver para a

sociedade, que não é tão diferente fora como dentro da sala (Tamires, Estética, 18

anos).

Eu acho que todo mundo que entrou lá de um jeito não saiu do mesmo jeito, porque

você convivendo com as outras pessoas você sabe, você se ver muito, “olha eu faço

isso”; você não aguenta nem a pessoa gritar “A” com você, aí você pensa: “eu faço

isso com a pessoa e a pessoa nem fala nada”[...] você convive, você aprende, você

sai uma pessoa totalmente diferente do que você entrou com certeza. Não tem como

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a pessoa entrar de um jeito e sair do mesmo jeito. Eu acho que é uma coisa quase

impossível (Flávia, Redes de Computadores, 18 anos).

Tentei tirar um pouco de experiência de cada colega que tive, tipo, você aprende a

observar melhor, a não agir por impulso com certas pessoas, você vai aprendendo

que tem pessoas que são diferentes, muito diferentes, e você vai aprendendo a ter um

convívio diferenciado com elas e isso é bom, pois você acaba tendo uma experiência

muito maior [...] pro seu senso crítico, porque não era aquela monotonia, as mesmas

pessoas pensando igual, gostar das mesmas coisas. Lá tinha muito conflito e isso era

até bom pra aprendizagem da própria pessoa por tentar pegar um pouco de cada um

e tomar pra si (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

Para Simmel (1983, p. 123), o conflito “contém algo de positivo”. Ele é

compreendido pelo autor como uma forma de sociação, visto que é exercido por mais de um

indivíduo e promove integração. Na fala do último jovem ele ressalta a importância do

conflito para a formação da personalidade do indivíduo enquanto sujeito. Nesse sentido,

Simmel (1983, p.123-124) afirma que “o indivíduo não alcança a unidade de sua

personalidade exclusivamente através de uma harmonização exaustiva [...]. A contradição e o

conflito, ao contrário, não só precedem esta unidade como operam em cada momento de sua

existência”.

Na escola em estudo por ser em tempo integral, os jovens estão mais suscetíveis a

vivenciarem momentos de sociabilidade. Observei que os laços construídos entre

alunos/alunos e/ou alunos/professores, núcleo gestor e demais funcionários são bastante

intensos, pelos gestos e palavras de afeição compartilhados entre eles. Associado ao tempo

integral, o Projeto Professor Diretor de Turma, já descrito anteriormente, é outro elemento

fundamental nesse processo, que faz a escola parecer ainda mais com a segunda família dos

jovens:

No começo é difícil, mas quando as amizades aparecem, parece que as coisas ficam

mais normais, já vira rotina levantar cedo, pegar ônibus lotado e ir passar o resto do

dia na escola. É claro que várias aulas por dia continua cansativo, mas nos intervalos

com os novos amigos parece que as coisas não nos “abala” como antes. Uns ajudam

os outros e a convivência torna uma nova família (Eliana, Estética, 17 anos, Trecho

do Caderno-diário).

O tempo integral aumenta a permanência dos jovens na escola e intensifica a

integração com os professores, o que favorece a estes últimos melhor conhecer seus alunos e a

maior possibilidade de intervir em seus processos de ensino-aprendizagem.

A interação entre professores e alunos não só fortalece os laços de amizade mas

também facilita o processo de ensino-aprendizagem. Ou seja, quando há interação

afetiva, os professores ensinam melhor e os alunos aprendem com mais facilidade.

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Todavia, cabe observar que os reflexos pedagógicos positivos da interação entre

professores e alunos são construídos com base no diálogo, na conversa, e que muitos

dos problemas que os alunos apresentam na sala de aula são decorrentes da falta de

diálogo com os pais. Cabe ao professor criar condições para que o aluno se sinta à

vontade para expor seus problemas (ABRAMOVAY, CASTRO, 2003, p. 424).

As relações de amizade são importantes para intensificar o sentimento de

pertencimento que cada aluno nutre em relação à escola e os laços construídos entre docentes

e discentes transcendem os muros da escola. Em muitos momentos, no decorrer da pesquisa,

presenciei fotos compartilhadas na rede social facebook pelos alunos e professores que saiam

juntos em momentos de lazer e sociabilidade.

Diante do exposto, vale ressaltar que a compreensão da juventude na sua

diversidade faz com que muitos autores adotem o uso de juventudes, no plural, buscando

melhor contemplar o universo juvenil. Portanto, esta deve ser não somente uma concepção

teórica, mas também, e principalmente, prática, vivenciada em ambientes como a escola e na

formulação e implantação de políticas públicas.

A política pública constitui uma contribuição para a busca do bem-estar coletivo e

está integrada no conjunto das políticas governamentais (SARAVIA, 2006). Souza (2006)

propõe compreender as políticas públicas como o campo do conhecimento que busca

simultaneamente por o governo em ação e/ou analisar essa ação e, quando necessário, sugerir

mudanças no curso dessas ações. Carrano (2011, p. 239) considera as políticas públicas como

“espaço-tempo de mediação da luta dos grupos sociais e políticos pelos recursos escassos do

Estado”.

No Brasil, nunca existiu uma tradição de políticas públicas específicas destinadas

aos jovens (ABRAMO, 2007), estas começaram a ser pensadas somente em meados dos anos

1990 (CLEMENTINO, 2009). Observa-se, embora recente, o consenso no país da necessidade

de implementação destas políticas (SPOSITO; CARRANO, 2003).

Isso ocorreu diante do contexto de globalização e de crescentes desigualdades

pelo mundo afora, em que os jovens aparecem como os mais atingidos, tanto pelo mercado de

trabalho restritivo e mutante, quanto pelas distintas formas de violência física e simbólica. O

diagnóstico dessas vulnerabilidades da condição juvenil tem feito a expressão “políticas

públicas de juventude” ganhar atenção e espaço nas demandas e conquistas sociais

(NOVAES, 2007). Assim sendo, “as políticas públicas de juventude emergem como uma

alternativa encontrada pelo Estado para conter as turbulências que atravessam a população

juvenil” (FREITAS, 2012, p. 194).

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Embora os avanços na criação de institucionalidades políticas direcionadas à

juventude, entre elas, secretarias, coordenações, assessorias e conselhos, “ainda perdura o

abismo entre concepções e práticas, entre as demandas por direitos manifestas pelos jovens e

as respostas na forma de políticas públicas efetivas” (CARRANO, 2011, p. 238). Conforme

enfatiza o mesmo autor, as políticas públicas de juventude, no Brasil, ainda não constituem

suportes suficientes para os jovens vivenciarem sua juventude com dignidade.

No processo de elaboração e implementação de políticas públicas para a juventude

é importante destacar a necessidade de reconhecimento dos jovens na sua multiplicidade e

que, por isso, devem receber tratamento específico de acordo com suas particularidades.

Outro elemento que merece destaque é a valorização do jovem enquanto sujeito, oferecendo

espaços de debates para que possam expressar suas reais necessidades.

As políticas públicas na última década têm-se destinado a oferecer aos jovens

aquilo que se preconiza ser suas necessidades, não sendo propostos espaços e tempos de

diálogos que possibilitem aos jovens falarem por eles próprios, apontando caminhos e

demandas (CARRANO, 2011).

A compreensão da diversidade juvenil e da condição de sujeito dos jovens é

fundamental para a elaboração das políticas de educação e qualificação profissional da

juventude, pois quase sempre as ações nesse setor são definidas apenas por critérios

econômicos, não havendo a devida consulta aos próprios jovens sobre suas disposições e

interesses. Isso gera políticas de controle social e de amoldamento da juventude aos interesses

do mercado de trabalho (SILVA, 2012).

Rodrigues (2012) propõe que as políticas de educação profissional e tecnológica

devem se voltar ao sujeito jovem, assim como devem ser construídas numa perspectiva de

visão integral destes sujeitos, considerando suas heterogeneidades, as distintas situações e

trajetórias das juventudes existentes. Reconhecendo assim, que “os direitos devem ser sim,

universais, entretanto as trajetórias são diferenciadas, trazendo necessidades desiguais, para

diversos modos de ser jovem” (RODRIGUES, 2012, p. 09).

Não se pode deixar de ressaltar a necessidade de integração das políticas públicas

de educação profissional com outras políticas de desenvolvimento, como as de geração de

emprego e renda. Implica investir também na universalização e melhoria da qualidade da

educação básica e no fortalecimento do ensino e pesquisa em nível superior.

Ao pensar na integração entre ensino médio e a educação profissional, tendo em sua

base unitária a integração entre trabalho, ciência e tecnologia e cultura, é necessário

fazê-lo também na perspectiva de sua contribuição para a consolidação das políticas

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de ciência e tecnologia, de geração de emprego e renda, de desenvolvimento agrário,

de saúde pública, de desenvolvimento da indústria e do comércio (MOURA, 2012,

p. 69).

Para que o ensino médio integrado se torne, efetivamente, política pública, é

preciso que haja o envolvimento das distintas esferas de governo, bem como maior

articulação com os movimentos sociais, as economias locais e a sociedade em geral

(MOURA, 2012).

Neste trabalho ouço os jovens do ensino médio integrado à educação profissional

de uma escola profissionalizante de Fortaleza para saber como avaliam o programa das

escolas profissionalizantes no nosso Estado a partir da experiência que vivenciaram,

apontando os pontos positivos, negativos e as sugestões. Pois reconheço que as políticas

destinadas às juventudes devem estar em constante diálogo com esta, para saber se satisfazem

seus anseios e em que aspectos precisam melhorar.

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4 DE JOVENS ESTUDANTES A JOVENS EGRESSOS: NARRATIVAS JUVENIS

SOBRE A INSERÇÃO, A VIVÊNCIA E OS PROJETOS DE FUTURO EM UMA

ESCOLA PROFISSIONALIZANTE DE FORTALEZA

Neste capítulo busco apresentar um pouco da vivência dos jovens estudantes,

sujeitos da pesquisa, pela escola profissionalizante, discutindo desde os motivos que os

levaram ao ensino médio profissionalizante até suas primeiras experiências como jovens

egressos. Enfatizo as expectativas, as dificuldades, os aprendizados, os receios, as críticas e os

sonhos dos jovens nesse processo, tendo-os como os principais interlocutores do debate que

se entrelaça aos teóricos das categorias abordadas e aos meus apontamentos como

pesquisadora.

4.1 AS RAZÕES DA ESCOLHA DE UM ENSINO MÉDIO PROFISSIONALIZANTE

Tendo em vista que o ensino médio hoje, no nosso Estado, é oferecido tanto por

escolas de ensino médio regular quanto por profissionalizantes, e sabendo que estas últimas

integram o ensino médio regular ao ensino técnico como proposta de preparar o jovem para o

mercado de trabalho, faz sentido pensar que os jovens os quais se inserem nas escolas

profissionalizantes buscam obter uma formação técnica que lhes possibilitem atuar no

mercado de trabalho e que, não constitui seu foco principal, o ingresso no ensino superior. No

entanto, a pesquisa de campo em uma escola profissionalizante demonstrou o inverso, uma

vez que o foco principal, da maioria dos alunos, foi a preparação para o acesso ao ensino

superior. Considerei curioso quando no primeiro contato com os sujeitos da pesquisa eles

informaram que praticamente todos os alunos da turma estavam realizando cursinhos

preparatórios para o ENEM/vestibular.

Em entrevista com os sujeitos, estes ao serem interrogados dos motivos que os

levaram ao ensino médio profissionalizante destacaram a indicação e incentivo de amigos e

familiares que estudavam ou conheciam pessoas que estudavam em escolas

profissionalizantes. Os jovens pesquisados foram para a instituição sem grandes expectativas,

pois para a maioria não fazia parte dos seus objetivos, como também, não possuíam

identificação com o curso escolhido. A escolha do curso foi feita praticamente por eliminação

associada ao curso que os jovens consideravam ter mais familiaridade, pois na época a escola

só oferecia dois cursos, o de Informática e o de Estética.

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Não estava nos meus planos estudar num colégio integral. Eu já ouvia falar do

programa, do projeto do governo, sempre passava na televisão. Aí meu primo

estudava numa escola profissionalizante e ele comentou com a minha mãe: “tia, fala

pra Flávia se inscrever e tal”. Aí ele me mandou na época uma cartinha de

recomendação, que informava quando era a matrícula, os documentos. Aí eu fui,

mas sem a esperança de passar, porque diziam que era um colégio competitivo e tal,

as melhores notas. Aí minha mãe foi ver e eu tinha passado. Aí eu disse: “Ah, se eu

passei, então vamos nessa”. Aí eu passei pra Informática porque na época só tinha

Informática e Estética, e Estética pra mim não dava (Flávia, Redes de

Computadores, 18 anos).

Mesmo não tendo sido, na maioria dos casos, uma ideia projetada pelos próprios

jovens, quando os interroguei sobre as expectativas que carregaram ao adentrarem à escola,

destacaram em suas falas o discurso de que a escola profissionalizante poderia oferecer

melhores oportunidades que aquelas de ensino médio regular. Como destaca Ribeiro (2011),

percebe-se que os jovens participam de iniciativas como a educação profissional “pela

perspectiva de buscar redes de oportunidades” (p. 34). Acreditavam que a formação técnica

lhes possibilitaria se destacar em comparação aos alunos que concluíssem o ensino médio

regular, pois o certificado de técnico seria um acréscimo para o currículo no qual acreditavam

ter melhores condições de competir no mercado de trabalho.

Quando questionada sobre as expectativas de estudar numa escola

profissionalizante, a jovem respondeu:

[Risos] Eu acho que eu não estava pensando em nada. Eu acho que eu pensei a

mesma coisa que todo mundo pensou né? quando sair de lá ter oportunidade de

arranjar um emprego mais fácil, pela parte de já terminar o ensino médio tendo um

curso técnico, aí isso já é bem legal. Mas só isso mesmo (Sandra, Estética, 18 anos).

Mesmo não se identificando com o curso técnico, a maioria dos jovens decide

concluir:

Porque ali, a escola integral, era uma oportunidade. Eu não ia perder, entendeu? Só

por ter entrado. Aí eu fiquei lá, fiz as provas. Eu gostei de Estética, só não quis

trabalhar [...] (Antônia, Estética, 18 anos).

Quanto às oportunidades nutridas pelos jovens em relação à formação técnica, a

jovem expressou que desejava:

Ter um diferencial no meio de tantos outros amigos, colegas, do antigo colégio, que

iriam continuar no colégio regular e eu poderia ter esse destaque de já tão cedo ser

uma profissional. De ter um destaque além deles, de ter um curso técnico e

futuramente uma formação na faculdade. Então querendo ou não vai ter um

diferencial entre mim e eles e de muitas outras pessoas. Eu pensei mais nisso

(Tamires, Estética, 18 anos).

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Independente de seguirem ou não a profissão adquirida ao saírem da escola, os

jovens pensavam mais em fazer o curso técnico para ter algo garantido no futuro, caso não

conseguissem adentrar imediatamente na universidade.

Mesmo não se identificando com o curso, muitos jovens entram e concluem

porque querem ter uma “garantia” ao saírem da escola. Embora a jovem deixe bem claro que

não gosta da área de Estética e só trabalharia por necessidade: “A Estética não é pra mim não

[risos]. Se eu for trabalhar com Estética vai ser por necessidade mesmo” (Antônia, Estética,

18 anos). Mas considera que é um diferencial em comparação aos alunos que concluem o

ensino regular:

Porque essas escolas normais [...], porque assim, a pessoa sai, termina os estudos, aí

tem muita amiga minha que terminou, tá só tentando o ENEM, mas não tem nenhum

emprego. Por exemplo, se eu não tivesse encontrado esse emprego [se referindo ao

emprego que ela estava no momento], pelo menos eu saí, mas tinha algum ensino

técnico. [...] Se eu tivesse em casa ainda eu ia atrás de algum emprego de Estética

(Antônia, Estética, 18 anos).

Como escola profissionalizante, que visa preparar para o mercado de trabalho, a

identificação dos jovens com o curso escolhido é de fundamental importância, haja vista que

irá interferir significativamente na atuação ou não desses nas suas áreas de formação. Essa

identificação dos jovens com o curso interfere também na permanência dos mesmos na

escola. Muitos por entrarem sem conhecer bem a formação veem mais adiante que não é sua

área de interesse, e por não terem mais oportunidade de trocar, mesmo porque, às vezes, não

há na escola a opção de um curso o qual se identifiquem, os alunos saem da instituição, isto é,

são transferidos para uma escola regular ou permanecem, mesmo sem interesse, até concluir.

A partir da fala de uma das coordenadoras é possível perceber também a forte interferência da

família, principalmente dos pais, para que os filhos permaneçam na escola:

[...] Nós temos casos de transferência, porque assim, esses meninos chegam, eles

chegam muito imaturos, às vezes é uma insistência da família pra estar nessa escola,

porque pra família, querendo ou não é uma acomodação grande, porque o aluno está

dentro da escola, você fica mais despreocupado. Então a família às vezes insiste

muito e muitas vezes a escola não é adequada pro aluno, ele não quer passar o dia

estudando, ele quer fazer outras atividades, então, há às vezes essa falta de

adaptação. Acontece mais no primeiro, mas também no segundo, porque a família

fica insistindo. Agora mesmo a gente tem um aluno do Meio Ambiente, que desde o

primeiro ano a gente conversa com os pais que não dá certo, mas os pais insistem, e

aí tá terminando o 2º ano e vai sair, porque ele não quer e os pais ficam insistindo. E

às vezes a escolha do curso também, eles são muito imaturos, às vezes, não

conhecem muito bem o que vai ser visto dentro do curso, e assim, como muitos

cursos não tem disciplinas técnicas no primeiro semestre, aí acaba que quando eles

se deparam com essas disciplinas eles percebem que não tem interesse pelo curso

(Coordenadora Escolar).

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É preciso levar em consideração, como destaca a coordenadora, a diversidade

juvenil e reconhecer que os jovens são diferentes e possuem gostos diferenciados, e assim,

nem todos se reconhecem na escola profissionalizante, uma vez que a mesma apresenta

características distintas como o tempo integral, o curso técnico, a sobrecarga de conteúdos.

Nesse processo, a compreensão da juventude enquanto categoria diversa por parte da escola

faz toda a diferença e ela passa a ser um importante apoio aos jovens por intermediar a relação

destes com suas famílias.

É perceptível na fala da coordenadora seu destaque para a imaturidade dos jovens

ao chegarem à escola: “chegam muito imaturos”, “eles são muito imaturos”. Interessante

destacar que os jovens também se posicionaram ao encontro com esse discurso, pois ao se

referirem às mudanças proporcionadas em suas vidas após a vivência na escola, o

amadurecimento apareceu como algo recorrente para muitos deles. Nesse sentido, no período

de inserção na escola profissionalizante os jovens ainda não possuem seus planos de futuro

bem traçados e isso explica a dificuldade apresentada por eles na escolha e identificação com

o curso técnico. Da mesma forma, percebo que a construção dos projetos de futuro dos jovens

é estimulada, principalmente, no período que concilia com o ensino médio, uma vez que se

aproxima uma nova etapa em suas vidas, na qual precisarão tomar decisões importantes, entre

elas: cursar ensino superior ou trabalhar? Ou conciliar estudo e trabalho? Qual a profissão que

mais se identificam?

Nesse processo, permeado de descobertas, emoções, ambivalências e conflitos, o

jovem se defronta com perguntas como: “quem sou eu?”, “para onde vou?”, “qual

rumo devo dar à minha vida?”. São questões cruciais que remetem ao projeto de

vida, uma dimensão decisiva no seu processo de amadurecimento. Contudo, para sua

elaboração, o jovem, principalmente aquele que frequenta o ensino médio, demanda

espaços e tempos de reflexão sobre seus desejos, suas habilidades, mas também

informações sobre o contexto social onde se insere, a realidade da universidade e do

mundo do trabalho, entre outros, de maneira que possa ter elementos para construir

um rumo para sua vida (LEÃO, DAYRELL, REIS, 2011, p. 02-03).

Algo central no depoimento da coordenadora é a insistência de muitos pais para

que os filhos estudem na escola profissionalizante, pois segundo ela essa “é uma acomodação

grande” para a família, haja vista a instituição funcionar em tempo integral. Percebi, no

decorrer da pesquisa, que a escola expressa, em geral, sensação de insatisfação com a relação

estabelecida com a maioria das famílias, pois estas mantém pouca participação na escola,

além da dificuldade de serem contactadas. Ouvi discurso semelhante de outra coordenadora

escolar, que enquanto conversávamos ela disse: “Percebo hoje uma apatia dos jovens. Eles

têm tudo nas mãos e não valorizam”. Achei curioso esse posicionamento e a questionei por

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qual motivo ela achava que isso acontecia, e ela me deu a seguinte resposta: “A família. A

família joga o aluno aqui porque sabe que é o dia todo, não vai lhe dar preocupação”. De

forma nítida as coordenadoras ressaltaram o pouco, ou nenhum envolvimento de algumas

famílias com a escola, delegando a esta última a responsabilidade total pela educação dos

filhos. As funcionárias demonstraram descontentamento e preocupação com a situação, pois

compreendem a importância do apoio familiar no processo ensino-aprendizagem.

Desse modo, os pais incentivam muito a ida dos jovens à escola

profissionalizante. Mesmo quando a ideia não parte deles, quando passam a conhecer o

projeto apoiam a permanência dos filhos na instituição. Um dos motivos é o estudo em tempo

integral que evita a ociosidade juvenil. Quando perguntei a um jovem se a família o apoiou na

escolha de estudar em uma escola profissionalizante, ele disse-me: “Muito. Devido a questão

de não ficar ocioso em casa, minha mãe gostou muito disso, ela apoiou bastante” (Levi, Redes

de Computadores, 17 anos).

Não restam dúvidas de que a escola é um importante espaço de aprendizagem e

socialização, e no caso da escola profissionalizante estudada, a vivência oportuniza aos jovens

formação humana e profissional, além de espaço para participação em projetos científicos e

grupos culturais. Dessa forma, ao passar o dia na escola o jovem encontra melhores

oportunidades do que ficando com tempo ocioso em casa ou na rua. Mesmo porque a maioria

dos jovens inseridos na escola profissionalizante é de baixa renda e estão imersos em um

contexto social vulnerável à violência, às drogas, ao desemprego e à falta de outras políticas

sociais. Assim, estar com tempo ocioso é estar vulnerável ao risco, ao perigo, à

criminalização, pois a rua se mostra como o espaço violento, de recrutamento do crime, da

venda de drogas. Nesse sentido, os pais veem a escola profissionalizante como uma referência

positiva, que atua em contraposição à ociosidade juvenil e ao mundo perigoso da rua, e por

isso insistem tanto para os filhos permanecerem nela.

A importância da escola profissionalizante para conter a ociosidade e oferecer

novas possibilidades e horizontes, principalmente para os jovens da periferia, foi central

também na fala dos sujeitos da pesquisa:

Eu acho muito interessante esse projeto. Muito útil também, principalmente lá [na

escola pesquisada], que é colocada lá no meio da comunidade. Aí no caso muita

gente que estuda lá pertence ao bairro Planalto Pici e eu acho que muita gente lá teve

oportunidade lá que não teria. Teve gente que ficou trabalhando no local do estágio e

na escola regular talvez não tivesse essa oportunidade. Eu acho muito importante

por isso. Não só na [escola pesquisada], como deve ocorrer em várias outras escolas

(Sandra, Estética, 18 anos).

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O colégio que eu me encontrava, que eu estudava, digamos que era em um ambiente

de periferia, atrás tinha uma favela, aos arredores também, então um colégio que

tomasse o tempo de vários adolescentes e os enchessem do que fazer, de estudar,

fazer pesquisa, de ganhar conhecimento, eu acho que é muito importante pra tirá-los

de um futuro assim, que a gente sabe que em condições precárias as pessoas

procuram qualquer forma de sobreviver, de viver mesmo né, a questão de tirar dos

outros ou de fazer o mal em geral às outras pessoas. Então eu acho que se

trabalhando a questão dos jovens, principalmente, que vão começar uma vida agora,

fazer essa questão de ocupar o tempo deles pra que eles ganhem conhecimento, de

saber o que é o certo ou o errado, o modo mais fácil deles ganharem uma vida boa

(Tamires, Estética, 18 anos).

Essa discussão da ociosidade juvenil e da importância da escola como espaço de

contraposição a esta, ganha ainda mais relevância se analisarmos a realidade de violência

instalada em Fortaleza, principalmente nos últimos anos, aparecendo nas estatísticas, em

2013, como a 7ª cidade mais violenta do mundo21

.

Nesse contexto, percebi que os jovens pesquisados buscam as escolas

profissionalizantes por considerarem estas as melhores em termos de qualidade de ensino e

por oferecer melhores oportunidades de educação e trabalho em comparação com as escolas

de ensino médio regular da rede pública do Estado.

No decorrer da trajetória escolar um momento crucial para os jovens estudantes

foi a vivência do 3º ano, em especial o último semestre do curso, por aglutinar uma série de

experiências importantes para estes e pelas dificuldades que precisaram contornar, conforme

será apresentado a seguir.

4.1.1 Dos percalços da trajetória escolar

Ressalto que os percalços trazidos ao título desse tópico e que serão abordados a

partir de agora não se esgotam nessa discussão, pois estes, assim como as demais experiências

dos jovens na escola estão difundidos no decorrer de todo o trabalho. Discuto aqui as

principais dificuldades apontadas pelos jovens estudantes em suas trajetórias pela escola

profissionalizante, com ênfase para o último período do curso.

Ao serem questionados sobre as principais dificuldades enfrentadas na trajetória

escolar, os jovens por unanimidade apontaram a dificuldade de adaptação e muitos afirmaram

terem pensado em desistir em algum momento do curso, por não estarem habituados com a

rotina em tempo integral, pelo cansaço e a sobrecarga de conteúdos para estudar:

21

De acordo com o estudo realizado pelo Conselho Cidadão para a Segurança Pública e Justiça Penal do México

no ano de 2013, a cidade de Fortaleza apresentava taxa de 72,81 homicídios por 100 mil habitantes. Disponível

em: <http://oglobo.globo.com/brasil/brasil-tem-16-cidades-no-grupo-das-50-mais-violentas-do-mundo-

11958108>. Acesso em: 20 maio 2015.

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Nesses três anos pensei em desistir várias vezes.

[...] Porque, tipo, tava cansativo. Eu não estava acostumada passar o dia na escola,

chegar em casa à noite e estudar mais ainda e isso pra mim tava sendo uma rotina

muito puxada, porque eu acordava muito cedo e chegava em casa muito tarde.

Estava muito cansativo pra mim e eu não tinha se acostumado ainda. Aí também, às

vezes, a sala brigava, entrava em discussão, aquele estresse todo de aluno com

aluno, aluno com professor, aluno com nota, aí chega uma hora que você: “não, dá

pra mim não, quero desistir”. Mas, consegui ir até o final (Flávia, Redes de

Computadores, 18 anos).

Embora a adaptação tenha sido uma fase difícil, não chegou a comparar-se às

dificuldades enfrentadas na conclusão do 3º ano. Eis abaixo o depoimento de uma jovem, se

referindo ao último período do curso:

[...] E o 3º ano foi muito ruim.

[...] Foi o melhor e o pior ano, porque foi puxado, a gente tinha que ir pra escola, ir

pro estágio, e eu fazia curso à noite. Eu comecei a fazer o curso aqui [UFC] à noite

com alguns alunos da minha sala. Todo dia e sábado também. Sábado de manhã eu

não vinha pra cá porque eu ia pro Alcance e domingo eu ia pra Academia ENEM.

Eu estudava de domingo a domingo.

AP: Quer dizer que você podia se matricular em mais de um cursinho ao mesmo

tempo?

L: Sim. Porque o Alcance e a Academia ENEM eram de graça e um da Prefeitura e

o outro do Estado. Um era sábado de manhã e o outro domingo à tarde. Muita gente

da minha sala fazia isso, a gente estudava de domingo a domingo, porque realmente

nesses três anos na nossa escola não dava base pra passar no curso que a gente

queria. Porque quando eu decidi que eu queria Computação, que eu decidi por causa

do estágio, eu estagiei e achei muito bom lá, o ambiente de trabalho, aí eu comecei a

tentar Computação, mas eu vi que a nota de corte era muito alta. No 2º ano eu fiz o

ENEM, eu tinha tirado 500 pontos e alguma coisa, eu tinha que subir minha nota em

mais de cem pontos pra eu poder passar no que eu queria. Aí a gente começou a

estudar de domingo a domingo.

AP: E como foi esse período?

L: Foi o período mais difícil. Tinha dias que eu chegava em casa desesperada,

chorando: “ai, eu não aguento mais”. Porque eu saia do curso aqui [UFC/Campus do

Pici] dez horas [da noite], ia pra casa e tinha que fazer as tarefas da escola e tinha

que estudar as tarefas do curso e tinha coisas pra estudar do estágio, porque eu

resolvi estagiar na área de programação e o curso não dava base pra programação.

Mesmo assim eu quis ir porque era a área que eu gostava (Laíz, Redes de

Computadores, 19 anos).

De tal modo, é possível perceber que foram muitos os malabarismos feitos pelos

jovens para contemplarem todas as atividades no final do 3º ano: conclusão do ensino médio,

preparação para o ENEM/vestibular, estágio, elaboração e apresentação do TCC, cursinhos

preparatórios22

. Dessa maneira, muitos jovens conciliavam uma quádrupla jornada diária,

estando um turno na escola, estudando disciplinas da base comum; outro turno no estágio; no

22

Praticamente todos os alunos do 3º ano realizaram cursinhos preparatórios para o ENEM/vestibular, os quais

eram oferecidos pelas seguintes instituições: UFC, UECE, Academia ENEM (oferecido pela Prefeitura de

Fortaleza), Projeto Alcance (oferecido pelo Governo do Estado do Ceará), e na própria escola, mediante aulões

nos dias de sábado pela manhã.

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início da noite no cursinho e no final da noite, em casa, estudavam para realizar as atividades

da escola, as provas, o estágio e o ENEM/vestibular. Exigência, responsabilidade, ansiedade,

eram sentimentos e cobranças vivenciados pelos jovens nesse período, havendo necessidade

ainda maior de apoio e acompanhamento dos gestores escolares, no sentido de compreendê-

los para além de alunos, ou seja, jovens na sua multiplicidade, pois muitas vezes a escola está

mais direcionada para o diploma e para os possíveis projetos de futuro dos jovens, e acaba

muitas vezes negando o presente por eles vivenciado, que perpassa questões existenciais bem

mais amplas que o futuro (DAYRELL, CARRANO, 2003).

Nesse sentido, fica perceptível que o 3º ano é um período sobrecarregado para os

jovens, e além de todas essas atividades muitos ainda estão indecisos quanto ao futuro, sem

saber qual rumo devem tomar para suas vidas, estando imersos em um clima de tensão e

expectativas que parte, tanto deles próprios, quanto dos pais e da escola.

No conselho de classe, que tive a oportunidade de acompanhar, os professores,

juntamente com a coordenação e direção, discutiram as dificuldades dos alunos do 3º ano para

conciliarem as disciplinas, a preparação para o ENEM/vestibular e o estágio, por ser um

período de muita correria e pressão, em que, segundo eles, até mesmo os alunos com

melhores notas têm um rendimento reduzido.

Acaba que o estágio acontece num período crucial para o aluno, que é o momento do

ENEM e fica muito pesado, é difícil. Nas disciplinas o rendimento cai com o início

do estágio. Eu vejo que essa é uma dificuldade, mas eu ainda não consigo visualizar

uma solução, se seria fazer o estágio antes, deixar o segundo semestre mais livre

para preparação pro ENEM (Coordenadora Escolar).

A preocupação com a vivência atribulada dos alunos, apresentada pela

coordenadora, demonstra o interesse da escola, mediante os professores e núcleo gestor, de

incentivar os alunos para a inserção na universidade, e sendo assim, a realização do estágio no

mesmo período de preparação para o ENEM/vestibular é apontado como uma dificuldade, um

empecilho. A escola percebe isso como crucial, mas como essa questão se dá? Sendo uma

escola profissionalizante com foco para o mercado de trabalho, existe interesse da SEDUC em

deixar o último semestre mais disponível para a preparação do ENEM/vestibular? A SEDUC

tem acompanhado essas dificuldades enfrentadas pelas escolas profissionalizantes e pelos

estudantes? Como tem sido feita a avaliação do plano de ensino nas escolas

profissionalizantes? A escola reconhece a necessidade de reformulação do plano de ensino e

de se repensar a didática da escola, no entanto, são mudanças que vão além das suas

competências.

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A realização do estágio no último semestre do curso torna a rotina dos estudantes

muito cansativa e impede que se dediquem inteiramente a ele, por estarem se preparando para

o ENEM/vestibular, para as provas de final de ano e elaborando o TCC:

O pior não foi ter que cumprir minhas 400 horas lá [no estágio], mas sim ter que

ficar lá por todos esses meses conciliando provas, cursinho à noite, acordar cedo e

ter que chegar todo dia na empresa com um sorriso e baixar a cabeça ao receber as

críticas “construtivas” do chefe (Beatriz, Redes de Computadores, 18 anos, Trecho

do Caderno-diário).

O ponto negativo do estágio é que é bem na época do vestibular, é muito ruim

conciliar as duas coisas, porque você tem que estudar para as duas coisas e focar nas

duas coisas. Você não pode deixar nem de estudar para o vestibular e nem de ir bem

no estágio, porque no final tem a nota, se você não for bem, você não recebe

certificado. Aí o pior de tudo é conciliar as duas coisas, o vestibular e o estágio

(Laíz, Redes de Computadores, 19 anos).

Conforme observado, o acúmulo de muitas atividades importantes em um mesmo

período impede aos jovens estudantes usufruírem de modo significativo de cada uma. Somado

a essas dificuldades expostas, outras se apresentam quando a experiência do estágio passa a

ser analisada de modo mais detalhado.

4.1.2 As expectativas e experiências dos jovens no estágio

Uma vez que se trata de uma escola profissionalizante a experiência do estágio é

aguardada com expectativa pelos jovens estudantes, pois consiste, para muitos, a primeira

experiência no mercado de trabalho. Nesse processo, os jovens carregaram consigo

sentimentos de ansiedade, receio, medo, dúvidas, que foram nutridas pelos comentários

frequentes dos professores sobre o assunto e conforme a vivência se aproximava. “Os alunos

iniciam o estágio curricular no terceiro ano do curso. Mas há um processo de preparação

permanente [...]” (SEDUC, 2015). Observei que essa “preparação permanente” consiste

também, e principalmente, no caso da escola estudada, das orientações repassadas pelos

professores durante as aulas, pois costumam abordar sobre o estágio, expondo recomendações

de como os jovens devem preparar-se, do comportamento, postura, ética, vocabulário que

devem ter.

O momento do estágio era o mais esperado por todos do 3º ano de Redes de

Computadores. Bom, o estágio não atendeu tanto talvez porque eu não estagiei na

minha respectiva área. O meu papel na empresa era recepcionista e administração da

empresa [...]. Toda experiência acrescenta algo na sua vida profissional, e o estágio

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deu-me uma visão do mercado de trabalho, no qual só tinha em pensamento (Flávia,

Redes de Computadores, 18 anos, Trecho do Caderno-diário).

O estágio supervisionado obrigatório ocorre no último semestre do curso técnico.

A escola já possui algumas empresas parceiras nas quais alocam os jovens, mas alguns alunos

precisam passar por entrevista, às vezes até mais de uma. Os jovens entrevistados para

adentrarem ao estágio, apontaram essa experiência como positiva, uma vez que consiste uma

etapa normalmente exigida na busca por emprego e eles sentem-se mais preparados para as

próximas.

Durante o estágio os alunos contam com a colaboração dos professores

orientadores, os quais são responsáveis por realizar visitas às concedentes do estágio e

mediação junto aos estudantes, assim como resolução de dificuldades e demandas que possam

surgir nesse período. O trabalho dos professores ocorre em parceria com um supervisor do

estágio nas empresas, com vistas a auxiliar os estagiários na realização das atividades e na

avaliação dos mesmos (SEDUC, 2015).

Observei que os alunos da turma de Redes de Computadores demonstraram mais

receio em irem ao estágio, pois como eles tiveram poucas aulas práticas na escola ficaram

com medo de não saberem fazer o que lhes fosse solicitado na empresa, conforme pode ser

observado abaixo:

Bom, quando a gente ia começar o estágio, antes da gente começar, a gente tinha um

certo medo, porque como a gente não teve aula prática, a gente tinha medo de chegar

lá na hora, até porque a gente só tinha visto teoria né. A gente, “meu Deus, o que a

gente vai fazer na empresa se a gente praticamente ainda não sabe?” [risos]. A gente

sabe a teoria, mas a prática nem tanto (Sophia, Redes de Computadores, 18 anos).

Durante as reuniões de estágio, ouvi em muitos momentos alguns alunos da turma

de Redes de Computadores desabafarem discursos como: “eu não estou aprendendo nada”. Os

professores, às vezes, respondiam da seguinte forma: “gente, não falta trabalho, é só vocês

saberem procurar”. Durante uma apresentação de TCC, em que uma jovem relatava sua

vivência no estágio, ela disse: “Dei graças a Deus por ter terminado [o estágio], acho que por

eu não fazer quase nada” (Flávia, Redes de computadores, 18 anos). Ouvir depoimentos como

esses, dos jovens, deixou-me desconfortável, pois além das palavras, que já dizem muita

coisa, suas expressões ao relatarem esses fatos demonstravam grande insatisfação e o desejo

de vivenciarem algo novo, diferente, significativo, mesmo porque muitos deles nutriram

expectativas positivas quanto ao estágio.

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Outro aspecto apontado por alguns jovens durante as reuniões foi o fato de não

poderem realizar, sozinhos, determinadas atividades do estágio, pois só eram autorizados a

executá-las na presença dos supervisores. Ouvi discurso semelhante durante uma apresentação

de TCC, em que um jovem da turma de Redes de Computadores relatou uma situação

desagradável a qual havia presenciado no estágio. Conforme expôs, ele foi atender a

solicitação de um setor da empresa, mas ao chegar ao local a funcionária que o recebeu, ao

constatar que se tratava de um estagiário, simplesmente respondeu: “não, eu não preciso

mais”. Segundo o jovem, se tratava da resolução de um simples problema, mas a funcionária

não mostrou credibilidade que ele fosse capaz de resolver, por ser tão jovem e “apenas” um

estagiário. Esses relatos repercutem na concepção social que tende a relacionar os jovens a

seres irresponsáveis, sendo comum a falta de confiança depositada aos mesmos, como se

precisassem sempre de um adulto por perto para vigiá-los e/ou dizê-los o que fazer e como

fazer.

Considerando que os jovens estagiaram em diferentes locais, é possível observar

que o perfil apresentado pelas empresas, no que se refere a possuir ou não a estrutura

demandada para a qualificação técnica do estudante, se mostra como elemento crucial nesse

processo:

Eu sempre brincava com o pessoal que meu estágio era bom porque lá a gente tinha

coisas pra fazer, tinha a paciência dos meninos de me ensinar e tinha o tempo, que

eu acho que a maioria dos alunos não teve, que era mais corrido, e lá não, eles

paravam mesmo, eu não sabia algo, eles paravam mesmo e me explicavam

direitinho, deixavam eu fazer (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

Conforme pode ser observado na fala do jovem Levi, para ele o estágio foi bom

porque teve a oportunidade de estagiar em uma empresa “que tinha coisas pra fazer”, tinha a

paciência dos supervisores para ensinar, assim como o tempo necessário para aprender antes

de executar. Além disso, ele tinha permissão para fazer, praticar: “deixavam eu fazer”. Esse

depoimento, de modo geral, apresenta o perfil de boa empresa considerado pelos jovens,

aquela que ofereça estrutura física e humana para possibilitar a qualificação esperada e na

qual o jovem tenha, realmente, a possibilidade de praticar os conhecimentos apreendidos

relacionados à sua área de formação.

Observei que para os jovens que estagiaram em boas empresas, mesmo não sendo,

para alguns, a área na qual se identificavam, conseguiram apreender muitos conhecimentos e

experiências válidas, e o estágio significou o diferencial do curso técnico. Principalmente para

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os alunos de Redes de Computadores que relataram ter presenciado poucas aulas práticas,

para eles o aprendizado maior foi proporcionado pelo estágio.

[...] Foi a melhor parte da escola profissional (Laíz, Redes de Computadores, 19

anos).

Eu achei bom meu estágio, pois foi mais de aprendizado, acho que 80% que eu não

aprendi no curso, eu aprendi lá, então pra mim foi muito válido o estágio, tirei o

máximo possível que eu pude, tive essa sorte [...]. Eu acho que o estágio foi o

diferencial do curso, pois realmente eu aprendi muita coisa lá, como se portar numa

empresa, como é o dia a dia de trabalho, as funções que eu fiz lá, realmente do

curso. Eu tirei muito aprendizado de lá, até mais do que os três anos que eu passei na

escola (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

O estágio praticamente foi a nossa prática, coisa que a gente não fez, na formação,

assim, dos três anos. A gente não fez mesmo e eu acho que o mais importante foi o

estágio, porque o que a gente sabe fazer hoje, não é nem o que a gente aprendeu na

escola, é o que a gente aprendeu no estágio.

[...]

Foi 100% [risos]. Até porque teoria você pode esquecer né, se você não colocar em

prática, já era. Assim, só a teoria não vai servir de nada. Então o estágio, digamos

que a teoria foi 20%, a escola foi 20% que contribuiu e o estágio foi 80%, foi a

maior parte mesmo, apesar de ter sido em tempo reduzido, porque o estágio foi em

seis meses né, e a escola foi em quase 3 anos (Sophia, Redes de Computadores, 18

anos).

Mas nem todos os alunos tiveram a oportunidade e o privilégio de serem

selecionados para boas empresas e de estagiarem nas suas respectivas áreas de formação, e

ainda na parte que mais se identificavam. Desse modo, buscaram desfrutar do que foi possível

no estágio, e no relato de todos a experiência se mostrou importante por possibilitá-los

conhecer o mercado de trabalho, aprenderem a se portar na empresa e a lidar com os clientes.

Abaixo apresento o depoimento de uma jovem que foi para a empresa do estágio

com outro colega do curso, sendo que ao chegar ao local o seu colega ficou na parte de Redes

de Computadores e ela no setor administrativo, porque além de não ter mais vaga na área do

curso, a empresa estava precisando de alguém na parte administrativa:

Eu tava em caso de experiência, porque o estágio é nosso primeiro emprego, com

certeza. Nossa primeira experiência no mercado de trabalho. Eu não exerci na

função de técnica de Redes de Computadores, quem exerceu foi o João. Eu fiquei na

parte administrativa da empresa. Era uma loja de autorizada de computadores. Eu

era dessa parte administrativa que lidava com os clientes em relação a receber

máquinas, equipamentos, eu que cuidava mais dessa parte de receber peças, o João

já era a parte mesmo de ajeitar o computador.

[...]

[Transferência do estágio] Pedi. É porque foi assim, no começo eu fui né. Aí passou

um mês, o professor estava resolvendo problemas de outros alunos. Quando eu fui

falar com ele já estava perto de terminar meu estágio porque eu fazia cinco horas por

dia e eram 400 horas. Então eu terminei em quatro meses, terminei em dezembro.

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Em novembro que eu fui falar com o professor e ele falou com meu supervisor, que

explicou por qual motivo eu não estava exercendo o cargo principal. Porque tinha o

João e mais duas meninas sendo técnica.

[...]

Era uma empresa pequena. Aí ele dizia que eu estava na parte administrativa porque

a empresa estava precisando de alguém na parte administrativa. Aí meu professor

acabou deixando eu lá mesmo, porque eu já tava perto de terminar meu estágio e ele

não ia arranjar outra empresa, já que só faltava 75 horas pra eu terminar meu estágio

(Flávia, Redes de Computadores, 18 anos).

Experiência similar foi vivenciada pela jovem Priscila (Redes de Computadores,

18 anos) que nutriu muitas expectativas em relação ao estágio, mas segundo ela, não foram

contempladas satisfatoriamente:

Mais ou menos. Tipo, eu pensava que eu ia fazer mais coisas, entendeu, mas não

tinha como eu fazer mais coisas, porque de Redes já tinha todo mundo entendeu [...].

Não tinha tantas coisas assim pra eu fazer, mas foi bom.

Nos dois depoimentos acima é possível observar que as jovens estagiaram em

empresas que lhes repassaram atividades que não correspondiam a sua área de formação, e

isso possibilita questionar: Por que as empresas receberam as estagiárias se não tinham vagas

condizentes à sua formação? Observei que fatos como esse foram recorrentes entre os alunos

de Redes de Computadores e são extremamente prejudiciais aos estagiários, porque estes vão

para empresas sem atuar diretamente nas suas áreas de formação, perdendo a oportunidade de

desfrutá-lo significativamente. E, portanto, tem sua formação comprometida, visto que a

atuação prática representa um diferencial na aprendizagem. Alguns jovens recorriam junto ao

professor orientador para serem transferidos de empresa, mas nem sempre era possível,

devido o professor está resolvendo outros problemas, e também, pela demora de encontrar

outra empresa. Percebi que isso acontecia, também, porque os alunos eram alocados em

empresas pequenas, que recebiam um grande número de estagiários e não tinham capacidade

de absorver todos nas suas respectivas áreas de formação, repercutindo aos jovens em tempo

ocioso no horário do estágio ou realização de atividades que não competiam à sua formação.

Nesse contexto, cabe refletir sobre os seguintes questionamentos: Qual o sentido

do governo destinar recursos para o estágio em empresas que não apresentam sua

contrapartida, que é a de oferecer aos jovens atuação profissional em suas respectivas áreas?

Como se dá a seleção dessas empresas que são beneficiadas com a política, mas não

correspondem as expectativas? Existe uma avaliação em torno dessa problemática?

A esse respeito Corrochano (2011, p. 66) chama a atenção para a:

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Associação do estágio a condições precárias de trabalho, sinalizando que tem

operado mais como um mecanismo pelo qual as empresas acessam uma parcela da

força de trabalho juvenil de relativa qualidade a baixos custos, até mesmo pelo

pouco acompanhamento da relação entre a atividade executada no estágio e o

conteúdo da formação realizada.

Entretanto, dentro da Política de Educação Profissional, o Governo do Estado é

responsável por financiar todos os custos de realização do estágio “não há ônus financeiro

para as empresas e instituições concedentes do estágio” (SEDUC, 2015). Percebe-se, então,

que o estágio é um benefício para as empresas, e estas em contrapartida, devem conferir aos

estudantes a possibilidade de se qualificarem em suas áreas. Ainda assim, o que fica

perceptível, em muitos depoimentos acerca dessa relação, é a utilização da mão de obra

juvenil em determinados setores de necessidade/interesse da empresa, que muitas vezes não

possui relação com a formação dos jovens.

Os custos do estágio para o Governo Estadual envolvem: concessão de bolsa

estágio no valor de R$ 311,00; seguro obrigatório contra acidentes; auxílio transporte e

aquisição de Equipamentos de Proteção Individual (EPI). No ano de 2014 foram gastos R$

23.699.202,20 na concessão de bolsas aos estudantes; R$ 1.091.291,67 na concessão de EPI e

R$ 188.255, 27 com apólice de seguro (SEDUC, 2015).

Como destacado por Ribeiro (2011), “o estágio, com direitos respeitados

conforme legislação vigente é importantíssimo para criar redes de sociabilidade laboral,

fundamental para inserção futura” (p. 34). E sem dúvidas isso é importante para os jovens,

que vislumbram serem contratados pelas empresas nas quais estagiaram, ou ao menos, que a

experiência lhes renda lucros futuramente, no caso daqueles que têm oportunidade de estagiar

em empresas renomadas. Como já abordado anteriormente as expectativas dos jovens com a

educação profissional é muito no sentido de se “prepararem” para o futuro, terem algo

“garantido”, pois têm consciência das exigências do mercado de trabalho e sabem que o fato

de terem estudado em uma escola vista como de qualidade, bem como ter cursado ensino

técnico é significativo para o currículo. Da mesma forma, o estágio quando realizado em boas

empresas, além de fundamental para a formação profissional, possibilita chances de

contratação futura.

Por meio do estágio os jovens tiveram a oportunidade de conhecer o

funcionamento do mercado de trabalho, de melhorar a postura, comunicação, disciplina,

responsabilidade, compromisso, independência, e também aprenderam a melhor se

relacionarem com as pessoas, além de ganharem mais confiança em si mesmos. Observo que

por esses e outros motivos o estágio compreende um momento significativo na formação dos

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jovens estudantes, e mesmo para aqueles que não o fizeram “bem feito”, ainda assim,

conseguem vê-lo como positivo. No entanto, apresenta algumas lacunas que devem ser

consideradas e melhor avaliadas com a participação dos sujeitos. Fica explícito que as

empresas devem ser melhor escolhidas e avaliadas para que os investimentos possam, de fato,

valer a pena.

4.2 ESCOLA PROFISSIONALIZANTE: PASSAPORTE PARA O MERCADO DE

TRABALHO E/OU PARA O ENSINO SUPERIOR?

Nesse tópico busco discutir como os jovens percebem a interferência da formação

obtida na escola profissionalizante na inserção no mercado de trabalho e na universidade. A

escola oferece formação condizente ao que é proposto? Os jovens concluintes sentem-se

preparados para ingressar no mercado de trabalho e no ensino superior? A discussão iniciará

com a abordagem desses questionamentos associados às reflexões em torno das experiências

dos jovens egressos entrevistados.

Mesmo diante das limitações da escola estudada em termos de infraestrutura, a

maioria dos jovens considera que a escola profissionalizante prepara mais para o mercado de

trabalho que para a universidade: “Eu acho que lá é mais para o mercado de trabalho. A

escola em si eu acho que puxa mais pro estágio. Porque naquelas aulas de preparação para o

estágio, devia ser aula pro ENEM, entendeu? Eu acho que puxava mais para o trabalho”

(Antônia, Estética, 18 anos); “Tá deixando muito a desejar. Não prepara muito pro vestibular,

é mais pro mercado de trabalho” (Laís, Redes de Computadores, 18 anos).

Na época do ENEM, do vestibular, a gente tá no estágio e também tá fazendo prova,

então não dá pra gente se dedicar. Muita gente foi prejudicada por causa disso,

porque tinha muita coisa pra fazer e não conseguiu conciliar, aí não se deu bem na

prova. Ou então trabalhou na sexta até tarde e quando foi no sábado estava super

cansada pra fazer a prova. Eu acho que nessa época que tá próximo, a escola deveria

se dedicar muito mais. Eu acho mesmo que deveria deixar o estágio de lado pra você

se dedicar mais à prova (Sandra, Estética, 18 anos).

É perceptível ao observar as falas que o interesse das jovens é divergente do

proposto pela Política de Educação Profissional, uma vez que destacam o desejo da escola

preparar mais para a inserção na universidade. Mas porque elas pensam dessa forma se a

escola é profissionalizante?

Um dos jovens ao avaliar a capacidade de preparação das escolas

profissionalizantes para o mercado de trabalho e para a universidade relacionou com as

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escolas profissionalizantes padrão MEC e ressaltou que estas “preparam, se não 100%, 90%

elas preparam você para o mercado de trabalho”. Mas por outro lado, segundo ele, a escola

padrão MEC:

Atrapalha muito no ensino comum, pois a gente que não tinha muitos recursos se

vislumbrava com o curso, imagina quem tem as ferramentas, quem aprende aquilo.

Acho que se você não tiver mesmo o foco de querer entrar na universidade, você vai

se contentar só com a profissionalizante, só com o curso técnico (Levi, Redes de

Computadores, 17 anos).

O pensamento desse jovem se assemelha com o do professor de Artes ao falar da

participação dos jovens nos grupos culturais: “eu acho que a gente consegue desenvolver

muitos bons trabalhos artísticos aqui por conta da nossa não estrutura [...] se a escola tivesse

uma estrutura muito boa os jovens iam se deslumbrar com os cursos técnicos”. No local

estudado os sujeitos pesquisados estabelecem uma relação entre a precária estrutura da escola

com o incentivo, como se encontrassem nas limitações motivações para se esforçarem mais,

para irem além e alcançarem destaque.

Quanto aos jovens sentirem-se preparados ou não para atuar no mercado de

trabalho após a conclusão do curso, as opiniões foram divergentes, enquanto alguns

afirmaram com toda convicção sentirem-se preparados, outros consideraram a formação

obtida uma base, na qual precisariam praticar e se atualizar sempre:

Sim. A qualquer momento. Eu acho que eu sei fazer tudo [...] não sei se é porque eu

tenho facilidade de decorar, mas se hoje eu fosse lá em uma aula e ela pedisse pra eu

fazer alguma coisa que ela havia ensinado há bastante tempo, eu acho que eu saberia

fazer (Sandra, Estética, 18 anos).

A gente sai com a base, tipo assim, o professor dá a base e a gente estuda, mas a

gente sempre tem que praticar [...]. A gente tinha a base, mas tipo, se eu não praticar

aquilo no meu dia a dia, pelo menos ajeitando o meu computador, verificando, eu

vou perder aquele hábito, porque é muito conhecimento e tecnologia você precisa

estar se atualizando o tempo todo. Então assim, a gente sai apto, mas também não

quer dizer que a gente não tenha que estudar para ter autoconhecimento (Flávia,

Redes de Computadores, 18 anos).

Para corroborar com essa discussão considero pertinente apresentar o caso da

jovem Antônia (Estética, 18 anos) que foi para a escola profissionalizante sem grandes

expectativas e no decorrer do curso percebeu que não se identificava com a área de Estética,

no entanto, quis concluir para ficar qualificada: “Mesmo não gostando do curso, mas você

tendo força de vontade termina e você fica qualificada”. Todavia, essa mesma jovem, após

concluir o curso afirmou não se sentir preparada para ingressar no mercado de trabalho na sua

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área de formação. É perceptível que a expressão “qualificada” usada pela jovem faz parte da

reprodução de um discurso utilizado pela mídia, pelo governo, pela escola, de que concluindo

o curso técnico os jovens estarão qualificados para o mercado de trabalho. Embora a jovem

não se sinta preparada para atuar profissionalmente, ela possui um curso técnico em seu

currículo, o qual a torna “qualificada” para o mercado. Isso possibilita afirmar que para

muitos jovens a escola profissionalizante funciona como importante passaporte para o

trabalho, por oferecer curso técnico e estágio, atividades extracurriculares que pesam no

currículo: “Eu acho que esse é um projeto muito importante, apesar de eu não querer seguir, é

uma coisa extracurricular, vai pesar mais no meu currículo, até porque meu estágio foi numa

empresa boa, então vai melhorar o currículo e tal [...]” (Sophia, Redes de Computadores, 18

anos).

Diante dessas falas, o que fica notório é a importância do diploma para o jovem.

Tendo em vista as incertezas pelas quais são marcadas as juventudes com relação à entrada na

universidade, a inserção no mercado de trabalho, dentre outras questões, os jovens, como

salienta Sales (2001), vivem em uma corda bamba, buscando desempenhar inúmeros papeis

para serem aceitos. Logo, mesmo sem objetivarem a formação técnica, seja pelas opções que

a escola dispõe que não contempla as suas aptidões, seja porque a preferência é a

universidade, conquistar um diploma representa expandir as possibilidades diante das

incertezas, mesmo quando a formação não representa conexão com a qualificação realizada.

Além disso,

No imaginário de muitos dos jovens cearenses e brasileiros habita a compreensão de

que a conclusão de uma qualificação profissional contribui para a inserção imediata

no mercado de trabalho. Porém se sabe que o processo não apresenta essa

linearidade, principalmente porque as políticas de educação profissional têm,

historicamente, pouca ou nenhuma articulação com as políticas de emprego e renda

no Brasil (ANDRADE, SANTOS, MACAMBIRA, 2013, 249-250).

Embora os alunos apontem as lacunas nos cursos com relação a qualificação para

o exercício profissional, estes afirmam que a preparação para o mercado de trabalho na escola

estudada vai além da capacitação técnica, oferecida nas disciplinas com aulas práticas e

teóricas, e pelo estágio, pois os alunos aprendem sobre comportamentos, postura, disciplina,

linguagem, indumentária, elementos constantemente abordados e cobrados pelos professores

durante os três anos de formação.

A gente teve aula de como se arrumar pra uma entrevista, de como falar na

entrevista; como se comportar; até uns vícios que os meninos tinham de falar, de

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andar, de corte de cabelo, de brinco, de cabelo colorido, nossos professores falavam

que o mercado de trabalho não aceitava isso e a gente foi se adaptando a esse

costume. Hoje os meninos não falam mais como falavam, em gírias, tipo: “ah mano,

num sei o quê cara”; Eles falavam isso, mas controlavam no estágio. No começo

nossos técnicos receberam reclamações devido às gírias e depois os professores

passaram a trabalhar mais esse assunto, de como falar e se comportar. Aí os meninos

mudaram e não tivemos mais nenhuma reclamação (Flávia, Redes de Computadores,

18 anos).

A realização do estágio supervisionado no mesmo período de preparação para o

ENEM/vestibular é uma das características das escolas profissionalizantes que dificulta a

preparação para a universidade. Pois enquanto nas escolas regulares a preparação nos três

anos de curso se concentra para o ENEM/vestibular, nas escolas profissionalizantes os alunos

se preparam para o estágio, uma vez que estão adquirindo uma formação técnica.

Embora reconheçam não haver boa preparação para a universidade, uma das

jovens ressaltou o fato das escolas profissionalizantes exigirem mais estudo dos alunos e isso

faz com que muitos se dediquem de modo mais intenso e consigam melhores rendimentos que

aqueles de escolas regulares: “Prepara mais para o mercado de trabalho, mas como aqui é

mais puxado, o pessoal acaba estudando mais e acaba tendo um nível de conhecimento maior

do que a dos alunos da regular, não todos, mas alguns” (Beatriz, Redes de Computadores, 18

anos).

Na visão dos jovens interlocutores, a preparação para a universidade na escola em

que estudaram se destacou pelo incentivo dos professores e núcleo gestor:

A gente tinha muito incentivo. A gente passou a ter aula nos sábados para quem

quisesse. Todos os materiais das aulas eram voltados para o ENEM. Os professores

elaboravam as provas de acordo com o ENEM, os textos, os assuntos, no mesmo

estilo. Se o aluno realmente quiser sair da escola e ir pra uma faculdade, é só ele se

dedicar, porque apesar de tudo, da estrutura, os professores sempre incentivavam e

iam atrás de artigos para que a gente pudesse estudar, mas tudo era direcionado ao

ENEM, principalmente no 3º ano. [...] os professores tiravam dúvidas e eles nunca

negavam tipo: “ah não, vamos fazer isso outro dia”. Não, se eles tivessem

almoçando só diziam: “deixem só eu terminar de almoçar que eu ajudo”. Eles

sempre foram assim (Flávia, Redes de Computadores, 18 anos).

O núcleo gestor da minha escola, graças a Deus, eles estimulavam a gente a entrar

na universidade, entendeu, até porque o objetivo da SEDUC é a gente sair de lá

técnico, entendeu, só técnico. Pra eles não importa se a gente entrar na universidade,

eles querem que a gente saia técnico de lá, até porque esse é o objetivo da escola

profissional né?! E no caso, o núcleo gestor, como a coordenadora, e os professores

também, eles incentivavam muito a gente a entrar na universidade. Quando era aula

do ensino básico, sem ser o técnico, poxa, eles falavam muito pra gente, que a gente

tinha que ter uma visão bem mais ampla, que a gente tinha que pensar no que

realmente queria fazer, eles estimulavam muito a gente a entrar na universidade [...]

eles contribuíram muito pra minha vida hoje, mas eu acho que nas outras escolas é

sair mais técnico do que você sair logo pra uma universidade (Sophia, Redes de

Computadores, 18 anos).

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Percebo que a escola estudada, mediante os professores e núcleo gestor, atuava na

contramão da política de educação profissional, uma vez que estimulava os jovens a

ingressarem na universidade. Ao verificar esse fato fiquei me perguntando: Essa é uma

realidade nas demais escolas profissionalizantes? Por que o incentivo maior não se volta para

a inserção dos jovens no mercado de trabalho? Por que o incentivo dos professores e núcleo

gestor não é uma realidade também nas demais escolas públicas de ensino médio regular?

Por sua vez os jovens estão inseridos em uma escola profissionalizante, mas

destacam como principal objetivo a preparação para o ENEM/vestibular e o ingresso na

universidade. Seria isso, uma estratégia dos jovens, que, reconhecendo as dificuldades que

permeiam o ensino médio nas escolas públicas regulares e a baixa qualidade do ensino e, por

alguns não terem condições financeiras para cursarem o ensino médio em uma escola

particular para obter melhor preparação, se utilizam da escola profissionalizante. Tendo em

vista que podem usufruir de uma escola pública que, como afirmou a jovem Beatriz, embora

prepare “mais para o mercado de trabalho” e não apresente as condições ideais de preparação

para o ENEM, mas por ser “mais puxado, o pessoal acaba estudando mais”, e, portanto,

“tendo um nível de conhecimento maior do que a dos alunos da regular”. O que se constitui

em uma diferencial na educação pública, coadunando com as perspectivas dos jovens, pelo

menos na escola pesquisada.

Embora reconheçam as falhas e limitações da escola em que estudaram, alguns

jovens entrevistados expressaram o discurso de que o sucesso depende do interesse e

dedicação de cada um, conforme pode ser observado nos depoimentos abaixo:

Você que faz acontecer, independente do professor, do ensino, se você estudar, não

se prender. O que diferencia é o aluno. Aí tinha gente que se baseava, ah, nossa

escola não oferece isso. Desestimula? Desestimula, mas você tem que correr atrás do

que você quer. Então você que tinha que fazer por onde acontecer e não ficar

esperando que do professor parta tudo e muita gente se contentava só com aquilo

que o professor falava [...] a pessoa espera que a escola melhore ela, que a escola

melhore, mas se você não melhorar, a escola não vai melhorar. É você que faz a

escola crescer, ter bons resultados (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

Eu acho que depende muito da pessoa entendeu, porque a gente pode ter o mesmo

ensino, mas vai depender muito do esforço de cada um, não é só porque eu estudei

numa escola profissionalizante que eu vou realmente ter capacidade de passar na

universidade entendeu, é porque é mais esforço. Se tu passar o dia aqui e não tentar

fazer nada, num tentar se esforçar, vai ser a mesma coisa futuramente, se você não

tentar também. Eu acho que é mais a questão do esforço de você conseguir passar na

universidade ou não (Priscila, Redes de Computadores, 18 anos).

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Eu sempre fui uma pessoa de pensar assim: quem faz a escola é o aluno. Se o aluno

se dedica, a escola é boa, se ele só ver os pontos negativos, ele não vai gostar da

escola (Flávia, Redes de Computadores, 18 anos).

Eu acho que a partir do momento que ele entra numa escola dessa é só a questão da

pessoa querer. Querer mudar de vida, querer um futuro melhor, pensar grande

(Tamires, Estética, 18 anos).

Para Abramovay e Castro (2003), há uma “tendência de o aluno assumir sozinho a

responsabilidade pelo seu desempenho, pelo seu sucesso ou fracasso na escola” (p. 527).

Sendo assim “a experiência escolar estaria sempre marcada pela possibilidade de produzir um

sentimento de desvalorização de si já que é o sujeito que “produz” o seu fracasso, não o

sistema, ou a sociedade” (BRENNER, CARRANO, 2014, p. 1229). O ideal seria não pensar

no papel isolado dos alunos ou da escola, mas sim, compreender o processo educativo como

uma construção conjunta, o qual deve ocorrer com a colaboração de ambos e não só estes,

pois é necessária também a participação da família, dos investimentos governamentais. Como

um jogo em que cada peça tem sua função, na escola cada sujeito tem seu papel e precisa

fazer sua parte para que a partida, de fato, aconteça. Isto posto, segundo Abramovay e Castro

(2003), delegar a responsabilidade aos jovens seria desconsiderar uma série de fatores que

interferem no processo ensino-aprendizagem e os problemas dele decorrentes.

O governo, embora não tenha o interesse central de preparar os jovens para a

universidade, acaba por se aproveitar desse resultado, que aparece para a sociedade como algo

positivo, e utiliza os resultados dos jovens oriundos de escolas profissionalizantes, inseridos

na universidade, como propagadores da Política de Educação Profissional do Estado. Os

dados expostos abaixo foram consultados no sítio eletrônico da SEDUC (2015), no qual

expõe como indicadores da política de educação profissional, o número de egressos inseridos

no mercado de trabalho e os aprovados na universidade:

Tabela 1 – Relação de egressos das EEEPs do Ceará, inseridos no mercado de trabalho e

na universidade, de 2011 a 2014

ANO NEC23

TAF24

QAIMT25

QAIU26

2011 77 6098 916 557

2012 92 6055 1729 1616

2013 97 9178 1550 2192

2014 106 11664 1891 3471

Fonte: Sítio eletrônico da SEDUC, 2015. Elaborada pela autora.

23

NEC: Número de escolas criadas. 24

TAF: Total de alunos formados. 25

QAIMT: Quantidade de alunos inseridos no mercado de trabalho. 26

QAIU: Quantidade de alunos inseridos na universidade.

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Observando a tabela apresentada e relacionando a quantidade de jovens inseridos

no mercado de trabalho com os aprovados na universidade se constata um maior número no

segundo, e isso é algo interessante, tendo em vista que o foco das escolas profissionalizantes

não é preparar os jovens para a universidade, e sim, para o mercado de trabalho. Dessa forma,

os jovens estão indo na contramão dos objetivos da Política de Educação Profissional, assim

como, a própria política, por favorecer o acesso desses jovens à universidade. Embora, pelos

dados disponibilizados no sítio eletrônico da SEDUC (2015), não seja possível fazer análises

mais detalhadas para saber, por exemplo, qual o percentual de jovens que estão

simultaneamente na universidade e no mercado de trabalho.

Considerando que as EEEPs contemplam em sua maioria 80% jovens oriundos de

escolas públicas, é possível afirmar que o ensino médio integrado à educação profissional no

Ceará tem interferido positivamente na inserção de jovens pobres ao ensino superior. E como

observado nas tabelas, esse número tem crescido significativamente desde 2011.

Os jovens pesquisados, em sua maior parte, demonstraram o desejo de dar

continuidade aos estudos por meio do ingresso no ensino superior. “Este fato em si já denota

uma novidade desta nova geração de jovens que, diante da expansão do ensino médio e do

ensino superior no Brasil, passam a vislumbrar esta perspectiva, o que não ocorria na geração

dos seus pais” (LEÃO, DAYRELL, REIS, 2011, p. 1076). Os resultados obtidos mostram que

os jovens, mesmo acreditando ter maiores possibilidades de inserção no mercado de trabalho

pela formação técnica, consideram o ensino superior necessário para obterem melhores

condições de trabalho. Ao mesmo tempo, demonstram compreensão do restrito e competitivo

mercado de trabalho e seu interesse em ingressá-lo de modo decente.

Segundo Leão (2014), as modificações no mercado de trabalho brasileiro têm

exigido um padrão maior de certificação educacional, principalmente no que se refere aos

postos de trabalho considerados melhores por disporem, por exemplo, de carteira assinada,

garantias sociais, entre outras. “Os jovens, por experiência própria ou de amigos e parentes,

ou mesmo pela divulgação de um discurso social em torno do valor da educação, têm

consciência dessas “novas” exigências” (p. 250).

Nessa ótica, percebo que “ainda se sobressai, no Brasil, o discurso da equivalência

do aumento da escolarização/qualificação profissional e emprego [...] mantendo ainda vivo o

fetiche do poder da educação” (OLIVEIRA, SOUSA, 2013, p. 102-103).

Durante o desenvolver desta pesquisa, à medida que ouvia o discurso, da maioria

dos jovens, do desejo de cursar o ensino superior e não dar continuidade à área de formação,

várias questões passaram a me inquietar: Até que ponto, compensa ao Estado, investir em

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escolas técnicas, sendo que, a maioria dos jovens, ao sair, não pretende exercer a formação?

Por que o Estado não investe, de igual modo, nas escolas de ensino médio regular? Por que os

professores, funcionários e alunos das escolas profissionalizantes parecem ser mais motivados

que os de escolas regulares? Essas questões se tornam ainda mais relevantes quando

analisadas em consonância com os gastos do Governo Estadual com a educação profissional.

Pois ofertar escolas profissionalizantes demanda ao Estado gastar mais recursos pelo perfil

diferenciado dessas escolas em comparação às regulares, visto que necessitam de laboratórios

e equipamentos especializados para os cursos técnicos ofertados, professores da base técnica,

bolsa estágio, alimentação dos educandos, entre outros. Mesmo havendo apoio financeiro do

Governo Federal e considerando que nem todas as escolas profissionalizantes são padrão

MEC - o que eleva ainda mais os gastos com construção, equipamentos, laboratórios, etc. –

ainda assim os gastos são significativos. Conforme apresentado pelo portal eletrônico da

SEDUC (2015), desde o início do programa das EEEPs no Ceará, já foram aplicados mais de

um bilhão de reais.

Ao considerarem as escolas profissionalizantes como as melhores entre as escolas

da rede pública do Estado, os jovens buscam usufruí-las e isso vai contra os interesses do

Estado, pois ao invés de buscarem formação para o mercado de trabalho, o interesse maior é a

inserção na universidade. É interessante refletir sobre isso porque quem está cursando o

ensino médio profissionalizante e não deseja exercer a formação técnica adquirida está

ocupando a vaga daqueles que desejam se habilitar profissionalmente.

Na tabela abaixo é possível observar a relação dos jovens entrevistados e as

atividades exercidas por eles enquanto egressos da escola profissionalizante, no que se refere

a inserção na universidade e/ou no mercado de trabalho.

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Tabela 2 – Relação dos jovens egressos com a inserção laboral e/ou em instituição de

ensino superior

Jovens

Entrevistados

Formação

Técnica

Cursando

Ensino

Superior

Instituição

Superior

Curso

Superior

Trabalhando

Tamires Estética Sim FANOR Gastronomia Não

Sandra Estética Sim UECE Filosofia Não

Antônia Estética Sim FAMETRO Psicologia Sim

Flávia Redes de

Computadores

Sim UECE Pedagogia Sim

Levi Redes de

Computadores

Sim UECE Geografia Não

Beatriz Redes de

Computadores

Sim UFC Publicidade/

Propaganda

Não

Laíz Redes de

Computadores

Sim UFC Ciências da

Computação

Não

Priscila27

Redes de

Computadores

Não Nenhuma Nenhum Sim

Sophia Redes de

Computadores

Não Nenhuma Nenhum Não

Fonte: Pesquisa de Campo.

Faculdade Nordeste (FANOR); Universidade Estadual do Ceará (UECE); Faculdade Metropolitana da Grande

Fortaleza (FAMETRO); Universidade Federal do Ceará (UFC).

Conforme se observa na tabela acima, dos nove jovens entrevistados, sete estão

cursando o ensino superior, e as duas jovens que ainda não se inseriram estão participando de

cursinhos preparatórios. Isso demonstra a importância do estudo para os jovens, os quais

delegam a ele o principal meio de mobilidade social e mediante o qual constroem seus

projetos de futuro. “O que se percebe é um grande interesse pela forma de mobilidade social

que se considera que a educação superior pode oferecer” (ABRAMOVAY, CASTRO, 2003,

p. 555). Outro dado interessante é que por meio da continuidade dos estudos esses jovens

estão postergando a entrada no mercado de trabalho.

Para Pochmann (2013), o adiamento da inserção no mercado de trabalho para

após a conclusão do ensino superior é uma característica da sociedade pós-industrial. Ao

realizar análise das juventudes e sua transição entre as sociedades destaca que, enquanto na

sociedade agrária o trabalho era exercido a partir dos 5 a 6 anos de idade e prolongava-se até a

morte, na sociedade industrial ele passou a ser postergado para os 14 a 16 anos de idade e

algumas garantias foram incorporadas ao trabalho, entre elas, descanso semanal, férias,

pensões e aposentadorias. Na sociedade pós-industrial, ainda em curso, o autor destaca que “a

inserção no mercado de trabalho encontra-se gradualmente sendo postergada ainda mais, com

27

As jovens, Priscila e Sophia (abaixo), até o final desta pesquisa, se encontravam realizando cursinhos

preparatórios para o ENEM/vestibular.

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107

o ingresso na atividade laboral somente após a conclusão do ensino superior, com idade acima

dos 24 anos” (p. 39-40).

Nessa acepção, Pochmann (2013, p. 47) ressalta ainda que “para o exercício do

trabalho de qualidade, a conclusão do ensino superior assume cada vez mais relevância, o que

exige ingressar mais tardiamente no mercado de trabalho. Dessa forma, a elevação da

escolaridade se aliaria à maior qualificação para o exercício do trabalho”. Pois,

[...] essas duas finalidades (viabilizar o acesso ao ensino superior e ao mercado de

trabalho) não se autoexcluem, pois o ingresso no mundo universitário é, também,

uma qualificação para o mundo do trabalho, especialmente quando se considera que

muitas oportunidades de empregos, que contam com reconhecimento social e

melhor remuneração, pedem formação universitária (ABRAMOVAY, CASTRO,

2003, p. 555).

Segundo o Censo da Educação Superior, divulgado em 2013 pelo Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), o percentual de

pessoas frequentando o ensino superior, em 2012, representava quase 30% da população

brasileira na faixa etária de 18 a 24 anos28

. Comparando com dados de anos anteriores, o

número de estudantes com idade entre 18 a 24 anos que cursavam o ensino superior

representava 5,8% em 1995 e 13,8% em 2008 (SANTOS, 2013). Portanto, se observa um

crescimento significativo de jovens inseridos no ensino superior com o decorrer dos anos, em

especial após 2008.

Para Santos (2013), esse crescimento pode ser justificado, pelo menos em parte,

pela mudança demográfica do país, como o envelhecimento populacional, associado à maior

demanda por cursos universitários em decorrência das maiores exigências do mercado de

trabalho. A autora considera ainda que, a propagação de faculdades privadas e os programas

de financiamento do Governo Federal influenciaram o acesso ao ensino superior, embora

ainda de modo desigual.

Ribeiro (2011), ao referir-se ao acesso e permanência à universidade, destaca que

embora se verifique uma ampliação do acesso, este ocorre, em sua grande maioria pelos

jovens mais favorecidos, pois para a população juvenil mais pobre esse acesso representa

apenas 12% e mais de 70% destes que concluem o ensino médio não ingressam nesse nível de

ensino.

28

Disponível em:

<http://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/apresentacao/2014/coletiva_censo_superior_20

13.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2015.

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No Brasil, cursar a educação superior entre os jovens das camadas populares é uma

perspectiva remota em comparação às pessoas oriundas de outros setores sociais

mais favorecidos. É inegável que o acesso à educação superior tem incorporado um

grande número de jovens pobres, mas tal incorporação tem se dado por meio da

expansão do ensino privado e em cursos de menor prestígio social (LEÃO, 2014, p.

236).

O Censo da Educação Superior (2013) mostra também que embora seja

expressiva a expansão da educação superior no Brasil, considerando as diferentes dimensões

de raça, renda, sexo e região demográfica, para que as políticas de inclusão, ora em curso no

país, possam garantir oportunidades igualitárias a todos os cidadãos é preciso que estas sejam

mantidas e ampliadas.

Entre os programas do Governo Federal que se destacam por ampliar as vagas de

acesso dos jovens ao ensino superior, no Brasil, estão: Programa Universidade para Todos

(PROUNI); Programa de Financiamento Estudantil (FIES)29

; Sistema de Seleção Unificada

(SISU); Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades

Federais (REUNI); Universidade Aberta do Brasil (UAB), e a expansão da Rede Federal de

Educação Profissional e Tecnológica30

.

Dos sujeitos pesquisados, aqueles que não ingressaram na universidade logo após

a conclusão do curso técnico, continuaram se preparando para tentar o ENEM/vestibular

novamente. Alguns chegaram a recusar emprego para se dedicarem melhor aos estudos e os

que escolheram trabalhar sem ainda terem ingressado na universidade, buscaram se inserir em

empregos de carga horária menor, buscando conciliar o trabalho com os cursinhos

preparatórios para o ENEM/vestibular.

No meu estágio ofereceram proposta de emprego como técnica, que ganha mais de

mil reais [...], mas como o meu objetivo não é trabalhar na área do técnico né, eu

penso bem mais entendeu, eu penso ir mais longe entende? Eu não quero me

conformar só como técnica. Mesmo porque a gente nem sabe se vai ser pra vida

toda. Então eu acho que eu não queria perder tempo trabalhando, sendo que eu quero

me formar cedo, eu não quero me formar depois de velha [risos]. Aproveitar o

tempo né, porque tempo é ouro praticamente. Pois é, aí eu não queria me acomodar,

mesmo porque eu me conheço, se eu fosse trabalhar eu iria me acomodar, eu não ia

mais querer estudar. Até porque [...] a minha família não me estimula a estudar

entendeu? Como eu já tô no pico dos estudos, se eu parar já era, não tem mais

estudo. Por isso que eu não quis o emprego, até porque eu teria que trabalhar oito

29

Segundo notícia divulgada no Jornal “O Povo” (no dia 04/05/2015) o “MEC está sem dinheiro para novos

contratos do FIES”. A informação foi repassada pelo secretário executivo do MEC, Luiz Cláudio Costa.

Segundo ele foi atingido o limite reservado ao programa, que era R$ 2,5 bilhões, e não será possível financiar

novos contratos neste semestre. Disponível em:

<http://www.opovo.com.br/app/maisnoticias/brasil/2015/05/04/noticiasbrasil,3432485/mec-esta-sem-dinheiro-

para-novos-contratos-do-fies.shtml>. Acesso em: 04 maio 2015. 30

A descrição de cada um dos programas pode ser consultada no sítio eletrônico do MEC. Disponível em:

<http://portal.mec.gov.br/. Acesso em: 16 abr. 2015.

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horas por dia. Qual tempo eu teria pra estudar? Eu nunca ia passar na universidade

[risos] com o tempo bem reduzido pra estudo. Então eu preferi estudar (Sophia,

Redes de Computadores, 18 anos).

Das instituições superiores cursadas pelos jovens entrevistados, destacam-se as

públicas, Estadual e Federal do Ceará, com um número de três jovens para a primeira e dois

para a segunda. Destes, quatro são concludentes do curso de Redes de Computadores e uma

concludente da Estética. As outras duas jovens concludentes da Estética, que estão cursando o

ensino superior, ingressaram em instituições privadas da capital cearense.

Duas jovens estão conciliando ensino superior e trabalho, o que demonstra ser o

trabalho um elemento importante na vida dos jovens. “Alguns estudos indicam que, apesar

das dificuldades, os jovens têm buscado elevar a escolaridade combinando-a com o exercício

de uma atividade laboral, o que aponta que no Brasil há muitos jovens que trabalham e

estudam simultaneamente” (SANTOS, 2013, p. 77). Isso possibilita pensar que essa dupla

jornada é enfrentada, principalmente, por jovens de classes populares, impossibilitados de se

dedicarem inteiramente a vida acadêmica por precisarem contribuir financeiramente no

sustento da família. Por essa razão, ressalta Ribeiro (2011, p. 35) ao referir-se ao acesso à

universidade: “o acesso é um importante avanço, mas é necessário, sobretudo, conquistar uma

permanência digna e compatível com a vida deles”. A oferta de bolsas nas universidades é um

importante instrumento para buscar manter a presença do jovem pobre, pois muitos por não

conseguirem se dedicar inteiramente aos estudos, conciliam estudo e trabalho, acarretando,

muitas vezes, no adiamento da conclusão do curso superior, por cursar um menor número de

disciplinas por semestre do que é sugerido e a própria falta de tempo para estudar, que leva a

reprovações e a necessidade de refazer disciplinas.

Ao questionar uma das entrevistadas, que havia conseguido um emprego e

simultaneamente passado no vestibular, se ela pretendia conciliar trabalho e universidade, eis

sua resposta: “Pretendo. Vai ser difícil. Todo mundo diz que é difícil, mas eu vou conciliar.

Como eu vou trabalhar como Jovem Aprendiz31

não vai ser tão puxado como outra empresa”

(Flávia, Redes de Computadores, 18 anos). Ao caracterizar o trabalho que iria adentrar, a

mesma jovem disse:

31

Consiste em uma das modalidades de inserção no mercado de trabalho oferecido pelo Projeto Primeiro Passo

da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS). Nesta modalidade os jovens são encaminhados

para empresas privadas, as quais são responsáveis pela remuneração. Conforme descrição apresentada pelo sítio

eletrônico da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS). Disponível em:

<http://www.stds.ce.gov.br/index.php/noticias/40%20-unidades-setoriais/117-projeto-primeiro-passo>. Acesso

em: 20 maio 2015.

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[...] O Jovem Aprendiz é na Floriano Peixoto, no Bradesco. Vai ser de segunda a

sexta, das 10: 00 às 16: 00 horas, mas um dia na semana eu vou fazer curso.

[...]

O curso é só de atendimento ao cliente. Porque quando você vai para o Jovem

Aprendiz tem que fazer um curso, segundo a lei do estágio do Jovem Aprendiz. Aí

vai ser R$ 598,00 mais vale transporte e vale alimentação.

[...]

Um contrato de dois anos, podendo ser renovado por mais dois anos.

Segundo Corrochano (2011), na busca pelo emprego algumas credenciais são

mais valorizadas pelos empregadores, entre elas escolaridade, experiência profissional,

certificação e acesso às informações. “Além dos anos de escolaridade, também é importante a

qualidade da educação recebida: não apenas que curso o jovem realizou, mas em qual

instituição e em que condições” (p. 54). Para os jovens concludentes das escolas

profissionalizantes, a certificação do curso técnico somada à experiência profissional

vivenciada no estágio, além da própria escola profissionalizante que possui certo status de

escola de boa qualidade em comparação às demais escolas públicas, são características que

constituem, sem dúvidas, importantes aos jovens no processo de busca por emprego. “Um

indivíduo mais escolarizado amplia o leque de oportunidades ocupacionais de que pode dispor

e, portanto, suas chances de conseguir um emprego” (MORETTO, REMY, 2013, p. 135) e

“não se pode negar que quando se tem uma boa formação profissional as condições de acesso

a um emprego melhoram significativamente, bem como os riscos do desemprego ficam

reduzidos” (MENEZES, UCHOA, 2013, p.129).

No entanto, não se pode desconsiderar que para o indivíduo jovem que almeja

ingressar no mercado de trabalho, as dificuldades são, possivelmente, maiores do que para

outras pessoas, em decorrência da falta de experiência e de uma política pública que atue

diretamente na transição dos jovens da escola ao mundo do trabalho (MORETTO, REMY,

2013).

Embora diante do discurso de garantia de emprego com a formação técnica, os

jovens que passaram pela experiência de buscar vaga no mercado de trabalho após concluírem

o curso técnico demonstraram que essa não foi uma tarefa fácil, como pode ser observado

abaixo:

Eu realmente procurei, eu procurei muito emprego entendeu. Tipo, na área, ou áreas

que fossem parecidas, que fossem mais leves pra mim, né, eu realmente tentei, mas é

difícil. Mandei currículo, mandei e-mail, currículo pelo e-mail, aí fiz um monte de

entrevista, mas não era na área que eu queria, eu não conseguia realmente na área de

Redes. Aí eu tentei, só que eu consegui de auxiliar administrativo, que é de Jovem

Aprendiz, aí eu fui, porque é uma coisa que não vai me atrapalhar tanto, entendeu,

porque eu tô fazendo o pré-vestibular, aí é uma coisa que eu quero ter tempo para os

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dois, entendeu. Que vai ser só 6 horas diárias, aí vai ser mais leve pra mim. De

segunda a sexta, sendo que eu faço o curso de auxiliar uma vez na semana.

[...]

O salário é R$ 510,00, seis horas diárias (Priscila, Redes de Computadores, 18

anos).

Conforme se observa, a jovem Priscila, mesmo com o diploma de técnica e com

todo o seu esforço empreendido na busca por emprego, não conseguiu se inserir no mercado

de trabalho na sua área de formação. Isso demonstra que o diploma, assim como o esforço

próprio dos sujeitos, embora favoreçam as chances de emprego, não constituem fatores

determinantes para este. Daí a necessidade de se investir em Políticas de Educação

Profissional em consonância com as políticas de emprego e renda, pois o que acontece, por

vezes, é os jovens concluírem o curso técnico e adentrarem outro programa de

profissionalização. Como destaca Andrade (2010, p. 05) “é imprescindível que as políticas de

educação profissional, ora em curso no Estado do Ceará, estejam interligadas a políticas de

emprego e renda para que possa viabilizar um quadro de mudanças a médio e longo prazo”.

Das três jovens que estavam trabalhando na época da pesquisa, duas delas

estavam em empregos de Jovem Aprendiz. Vale destacar que para o “empregador” é nítida a

vantagem em ter aprendiz, pelos custos baixos e geralmente com atribuições iguais a um

funcionário do quadro da empresa, cujo salário é maior. Ainda assim, significava para as

jovens, diante das ofertas de emprego disponíveis, uma das melhores opções, por ser de carga

horária reduzida e lhes permitir conciliar com os estudos.

Dentre as três jovens que estavam trabalhando, nenhuma atuava na sua área de

formação. Quando questionei o porquê de não estarem atuando como técnicas na formação

obtida, uma delas respondeu que não tinha afinidade com o curso de Estética, e, portanto, só

trabalharia na área por necessidade, pois segundo ela, nessa área “trabalha muito e ganha

pouco”. Ao perguntar a essa jovem se ela estava gostando do trabalho atual, ela me disse:

A: Sim. Porque é um emprego que se ganha bem, ganha o tíquete32

, vale transporte,

fica só sentada atendendo, fazendo a ocorrência; anota o endereço. Sabe como é né?

Roubo, que a pessoa liga de emergência, é esse, o CIOPS [Coordenadoria Integrada

de Operações de Segurança].

AP: Quanto você ganha?

A: R$ 804,00. Aí tem o tíquete alimentação de R$ 200,00 e pouco e o vale

transporte só de ida, porque voltamos no transporte da empresa.

[...]

AP: O trabalho é só à noite?

A: De 18h00min às 24h00min horas. É um ótimo emprego. Se fosse Estética eu ia

receber quase o mesmo preço; trabalha muito, sai suada (Antônia, Estética, 18 anos).

32

Bilhete que concede ou permite o uso de um serviço determinado. Neste caso se refere ao vale-refeição.

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Como observado, na visão da jovem o curso de Estética é pouco valorizado pelo

mercado de trabalho em Fortaleza, exigindo carga horária extensa e baixa remuneração, além

de considerável esforço físico. Nesse sentido, “as trajetórias ocupacionais dos jovens têm sido

marcadas pelo signo da incerteza: estes ocupam as ofertas de emprego que aparecem,

normalmente de curta duração e baixa remuneração” (CASTRO, ANDRADE, 2013, p. 160).

No caso das entrevistadas se observou que a procura e inserção em empregos de carga horária

menor se justifica pelo interesse das jovens em priorizar o estudo, pois duas estão cursando o

ensino superior e a outra se preparando para o ENEM/vestibular.

Tomando como referência a escola estudada, e observando a tabela anterior,

poucos jovens escolheram dar continuidade a área de formação seja por meio dos estudos ou

do trabalho. Quanto aos jovens entrevistados apenas uma jovem do curso de Redes de

Computadores optou pelo ensino superior relacionado ao curso técnico. Os demais

escolheram áreas totalmente distintas.

Diante do exposto, o ideal seria não pensar/oferecer uma escola dual, que prepare

o aluno focando no mercado de trabalho ou na educação superior, mas sim, uma escola que dê

condições ao aluno de ao final do ensino médio escolher o que mais lhe convier. Consiste em

reconhecer a multiplicidade juvenil e compreender que os jovens são diferentes e possuem

interesses diversos e, da mesma forma, é preciso oferecer oportunidades múltiplas, mas de

forma igualitária. Por conseguinte, há que serem feitas pesquisas de demanda, com vistas a

ofertar cursos que atendam a realidade demandada pelos jovens e pelo mercado. Por exemplo,

não se pode determinar a todos os jovens que se insiram na educação superior, mas é

fundamental que essa possibilidade seja ofertada a todos, pois “ainda que nem todos precisem

ir para a universidade, o horizonte de chegar é um direito de todos. Não podemos

institucionalizar a desigualdade” (CARRANO, 201433

).

33

Fala proferida por Paulo Carrano durante entrevista. Disponível em:

<http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/2014-01-06/nao-se-muda-a-realidade-da-escola-apenas-mexendo-no-

curriculo.html.> Acesso em: 21 fev. 2015.

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113

4.3 O PROGRAMA DAS ESCOLAS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NA

ÓTICA DOS JOVENS ESTUDANTES

Os jovens representam os sujeitos privilegiados da política de educação

profissional e são, portanto, os mais aptos a avaliarem a experiência vivenciada. Para o

programa das EEEPs em expansão no Ceará as discussões aqui construídas possibilitam

apontamentos para avaliação e futuras melhorias da política.

Os jovens entrevistados, em geral, avaliaram de modo positivo o programa das

escolas profissionalizantes:

É um projeto maravilhoso. Essa ideia de implantar escolas integrais e ainda

implantar um curso técnico é muito bom porque é uma formação hoje em dia muito

importante [...]. Então com o curso técnico a pessoa ganha vastas áreas do ambiente

que ele vive, pode conquistar vários outros cursos, ele pode fazer uma faculdade se

futuramente ele quiser e aliar o curso técnico dele. Então vai ser uma formação a

mais, de conhecimentos a mais. Eu acho que foi muito interessante essa questão, e

além de ajudar ele próprio ele pode ajudar a família, porque mesmo sendo um curso

técnico, mas o que a gente ganha dá pra viver, dá pra ajudar a família [...]. Então o

que o governo fez com essas escolas é só uma ponte para que as pessoas tenham

uma vida melhor, que elas alcancem essa vida melhor de uma maneira correta e mais

fácil, a partir do estudo (Tamires, Estética, 18 anos).

Mas como sujeitos ativos e participantes do programa teceram também críticas ao

apontarem as falhas que perduram.

Eu acho que entre as escolas públicas é um projeto muito bom e é uma das melhores

escolas públicas que tem, mas ainda não dá pra concorrer com as particulares com a

questão das olimpíadas e vestibular. Ainda falta muito investir nisso. Porque a

pessoa sai preparada pro mercado de trabalho, mas o curso técnico não vai fazer ela

sobreviver no mercado, ela precisa de uma graduação e se o estudante da escola

profissional não for atrás de um curso pra vestibular por fora ele não consegue,

muitas vezes, entrar na universidade, e na universidade federal, que é o que todo

mundo quer (Laíz, Redes de Computadores, 19 anos).

A jovem reconhece as escolas profissionalizantes como as melhores entre as

escolas públicas do Estado, mas ressalta a inviabilidade de compará-las com as escolas

particulares e reconhece a carência do programa por mais investimentos. Segundo ela, o

jovem sai preparado para o mercado de trabalho, mas essa formação não é suficiente para

sustentá-lo, haja vista as exigências de uma formação de nível superior. Diante disso, o jovem

precisa buscar cursinhos preparatórios para o ENEM/vestibular fora da escola caso queira

adentrar a universidade. Mais uma vez se percebe as contradições entre os interesses dos

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jovens com os oferecidos pela Política de Educação Profissional, sendo perceptível o desejo

deles da escola preparar melhor para o ingresso no ensino superior.

Foi destaque na avaliação dos jovens sobre as escolas profissionalizantes a

importância do programa, principalmente para os bairros periféricos, como era o caso da

escola em que estudavam, pois diante de um contexto de exclusão e vulnerabilidade social no

qual os jovens estão inseridos, a escola em tempo integral se apresenta como um importante

espaço para conter a ociosidade juvenil e oportunizá-los vislumbrarem novos horizontes,

possibilitando ressignificarem suas vidas.

Embora tenham elogiado as escolas profissionalizantes e reconhecido os pontos

positivos das mesmas, os depoimentos dos jovens se concentraram em críticas referentes ao

fato do governo implantar o programa em escolas adaptadas, pois segundo eles, essas escolas,

muitas vezes, não possuem o aparato necessário de estrutura, materiais e equipamentos para

oferecer cursos técnicos de qualidade e as aulas práticas, em especial, são comprometidas:

Olha, precisa melhorar mais, assim, na estrutura, eu acho que o governo deveria

investir mais entendeu, porque colocar uma escola ali, pegar uma escola e colocar o

nome profissional é fácil né, difícil é ter uma qualidade, uma boa qualidade mesmo

pra oferecer para as pessoas saírem realmente técnicas, entendeu? (Sophia, Redes de

Computadores, 18 anos).

A ideia e o projeto em si é muito bom, tipo, muito bom mesmo. Aí vem o lado

negativo. A ideia, a base do projeto é ótima, o problema é implantar isso nas escolas

já existentes no Estado do Ceará, mais especificamente em Fortaleza né, pois as

escolas que são criadas pra receber a profissionalizante, aí sim, você tem todo um

aparato técnico, equipamentos, foi criado pra aquele projeto. Então, agora a questão

é saber a adaptação das escolas que já existem, isso eu acho que ainda é falho, pois

eles só pegam a estrutura da escola, transformam em profissionalizante, mas a base

do curso técnico, que é a prática, você aprender ali mexendo no que você tá

estudando na teoria, isso é que tem que melhorar e muito, pois eu percebi que não é

só na nossa escola que isso é falho. Mas o projeto em si é muito bom e eu espero que

ele consiga espalhar por todo o Estado, pois a ideia é muito boa, mas também tem

que saber, tem que começar da base, não adianta nada trocar uma escola médio

regular por uma profissionalizante e não ter a estrutura que uma profissionalizante

merece, precisa (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

O projeto em teoria ele é muito bom. Se o governo souber investir também nas

escolas adaptadas. Porque eles dão mais atenção a construir escolas padrão MEC e

parece que eles esquecem das escolas que foram adaptadas. Eu acho que eles

poderiam investir mais para que as escolas adaptadas tivessem, pelo menos, uma

estrutura adequada, não no padrão MEC, porque para ser padrão MEC eu acho que

ela precisava ser derrubada e construída de novo. Mas pelo menos uma reforma,

aumentar a estrutura, o procedimento de equipamentos para a prática do técnico,

esse tipo de investimento que falta muito nas escolas adaptadas (Flávia, Redes de

Computadores, 18 anos).

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Os depoimentos apresentados pelos jovens demonstram sua capacidade de

reflexão e crítica acerca da experiência escolar vivenciada, e por assim se posicionarem

comprovam serem sujeitos conscientes e ativos. Entretanto, os jovens ainda aguardam espaço

para serem vistos e ouvidos, pois “o discurso dos jovens muitas vezes não é reconhecido

como um discurso verdadeiro, por ser considerado fora da ordem das leis e, por isso, sofre

rejeição e interdição” (SALES, 2001, p. 26). Assim, embora os jovens tenham elogiado o

programa das EEEPs, criticaram a adaptação feita pelo governo que fragiliza os resultados

esperados. Apesar disso, é importante o efeito propiciado pela escola, de autoestima e

esperança para os jovens, funcionando como verdadeiro “ateliê de sonhos” (LOBO, 2011).

4.3.1 A escola profissionalizante como “ateliê de sonhos”

“[...] A escola não é o ponto de chegada, mas é para

muitos o marco inicial de uma trajetória na qual existem

inúmeros obstáculos”.

(OLIVEIRA, 2012, p. 102).

Diante dos inúmeros obstáculos que aguardam os jovens fora da escola, estão os

de conseguirem se inserir na universidade e/ou no mercado de trabalho. Para os atores

estudados a escola não representa o ponto de chegada, uma vez que não pretendem contentar-

se com a formação adquirida, mas sim, o marco inicial de uma jornada em busca da

concretização dos seus sonhos. Dessa forma, reconhecem a escola como importante espaço de

vivência e construção de sonhos.

A capacidade de sonhar, embora inata em todo indivíduo, está muito relacionada à

vivência de cada sujeito, aos valores construídos em instituições sociais e comunitárias, como

família, escola, igreja, Organizações não Governamentais (ONGs) etc. Diz respeito também

às condições econômicas, sociais, culturais e às oportunidades vivenciadas, que podem

ampliar ou reduzir os horizontes de cada um. Conforme destaca Pais (2003, p. 236), “os

projectos de futuro (ou a ausência deles) têm muito a ver com as práticas quotidianas em que

os jovens se envolvem, com os múltiplos contextos de socialização a que se encontram os

sujeitos”.

Ancorada por Pais (2003) e inspirada em Lobo (2011), concordo que os sonhos

não se concretizam apenas pela vontade do indivíduo, esta é apenas o primeiro passo que deve

estar relacionado a outros elementos os quais interferem no processo, sendo eles de natureza

social, econômica, cultural, política, entre outras. Nesse contexto, a escola se reveste de um

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papel muito importante, o de contribuir para a construção de sonhos, mediante uma educação

de qualidade que busque contemplar todas as dimensões humanas, que ofereça um ambiente

estimulador da criatividade, com docentes e gestores comprometidos com o processo

educativo e que estejam abertos ao diálogo com os sujeitos.

Os jovens precisam sentir que estão tendo benefícios concretos com a escolarização,

tanto nos sentidos cognitivo e afetivo quanto, sobretudo, na dimensão da perspectiva

de futuro, encontrando significado nas experiências e trajetórias educacionais

(RIBEIRO, 2011, p. 41).

Nesse jogo de construção dos sonhos, a escola, inclusive a profissionalizante

aparece como elemento fundamental, pois por ser em tempo integral favorece os laços de

convivialidade entre os jovens e também possibilita a vivência de experiências únicas de

aprendizagem com a formação técnica, o estágio, a participação em projetos científicos e/ou

culturais. É possível considerar, então, que a escola profissionalizante estudada atua como um

“ateliê dos sonhos” (LOBO, 2011) para os jovens pesquisados, uma vez que, proporciona

experiências diversas de aprendizado e socialização que ultrapassam a aquisição teórica-

prática de conhecimentos, constituindo uma experiência formadora para a vida e de grande

importância na construção dos projetos de futuro dos jovens.

O projeto possui uma dinâmica própria, transformando-se na medida do

amadurecimento dos próprios jovens e/ou mudanças no seu campo de

possibilidades. Eles nascem e ganham consistência em relação às situações

presentes, mas implicando, de alguma forma, uma relação com o passado e o futuro.

Nesta formulação, falar em projeto é referir-se a uma determinada relação com o

tempo, em especial o futuro, e especificamente às formas como a juventude lida com

esta dimensão da realidade (LEÃO, DAYRELL, REIS, 2011, p. 1072).

Como destacado pelos autores acima, o projeto assume características próprias e

modifica-se conforme o amadurecimento e/ou mudanças vivenciadas pelos sujeitos.

Interessante ressaltar esse aspecto, pois o “amadurecimento” apareceu de modo recorrente nas

falas dos jovens ao expressarem as mudanças e contribuições adquiridas com a vivência na

escola profissionalizante. Isso porque o ambiente da pesquisa embora demonstre visível

estrutura precária ultrapassa essas limitações ao expressar um clima escolar positivo entre

docentes, discentes e demais funcionários, e ao oportunizar aos jovens experiências diversas

de educação, sociabilidade, cultura, lazer, tão importantes na construção das identidades

juvenis.

Para muitos jovens pesquisados, ter estudado em uma escola profissionalizante

interferiu em seus projetos de futuro, porque ao não se identificarem com o curso técnico

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adquirido, a experiência serviu como eliminação entre as possíveis áreas a tentar

ENEM/vestibular:

Influenciou que eu não vou querer Estética [risos]. (Sandra, Estética, 18 anos).

Influenciou muito porque eu eliminei algo que eu achava que me dava bem, que eu

achava que era algo que eu queria pra minha vida, que era alguma coisa com

Informática e devido ao curso e a experiência do estágio eu percebi que era algo que

eu quero passar bem longe [...] e foi bom por questão de eliminação, tipo, eu iria

ingressar em algo que logo eu iria perceber que eu não tenho afinidade e devido ao

curso eu consegui eliminar isso (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

Primeiro, que eu decidi que não queria seguir nessa área [Redes de Computadores]

[...] (Beatriz, Redes de Computadores, 18 anos).

Já outros jovens se “encontraram no curso” e decidiram seguir a área. Como no

caso da Laíz (Redes de Computadores, 19 anos), que ao entrar no ensino médio pensava em

cursar Engenharia Civil e por gostar do curso técnico, da área de programação, e pelo estágio

que realizou na área, decidiu cursar Ciências da Computação. Essa mesma jovem relatou o

quanto ter estudado em uma escola profissionalizante foi importante para o seu crescimento

pessoal, e principalmente para este, pois vivenciou experiências além dos conteúdos

estudados, as quais lhe oportunizaram aprender a conviver com as pessoas e a ser solidária,

ganhou independência, liberdade, responsabilidade. Por meio da participação em um projeto

científico adentrou o campo da pesquisa científica e conheceu lugares e experiências novos:

Foi muito, muito válida, não pelo lado de aprendizagem técnica, de conteúdos, mas

pelo lado pessoal. É muito válida porque você tem oportunidade de aprender coisas

que vão além da sala de aula, como o projeto que eu desenvolvi, que eu viajei pelo

projeto. Aprendi a fazer pesquisas grandes, o projeto mesmo que eu desenvolvi é

uma pesquisa bem grande que eu fiz e que eu aprendi tanto a fazer artigos, aprendi a

fazer pesquisa de campo. E tudo o que você quer, você tem que ir atrás, os

professores não ficam atrás de você pra você fazer coisas extracurriculares. Aprendi

também a conviver com as pessoas que eu não gosto, principalmente com

professores. [...] E no 3º ano você aprende que você é capaz de organizar o seu

horário e fazer mais coisas do que você achava que era capaz de fazer. Você estuda,

trabalha, estuda pro vestibular, tem trabalho de escola e faz tudo só. Antes eu não

tinha costume de andar de ônibus sozinha, aí minha mãe pegou e teve que desapegar

um pouco, deixar eu ir, deixar eu fazer minhas coisas, aí você ganha mais liberdade

e também mais responsabilidade. Ah, muito bom essa parte de você ganhar

independência, essas coisas (Laíz, Redes de Computadores, 19 anos).

O depoimento da Laíz apresenta vários elementos que refletem, de modo geral, as

repercussões da vivência na escola profissionalizante para ela e os demais estudantes. É

perceptível o enfoque dado pela jovem à formação humana obtida na escola, que segundo ela,

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foi mais significativa que a formação profissional: “Foi muito, muito válida, não pelo lado de

aprendizagem técnica, de conteúdos, mas pelo lado pessoal”.

Pensar a escola estudada como um espaço que contribui para a construção dos

sonhos juvenis surgiu desde as observações em campo, pelas peculiaridades que o local

apresentava, já descritas nesse trabalho. Associado às minhas percepções, ouvi nas

entrevistas, nos depoimentos de alguns jovens, a referência à escola como o ambiente

responsável por semear e cultivar os sonhos em suas vidas. Como relatado por uma das

jovens, foi a partir da escola que ela passou a pensar no futuro.

Eu acho que quando entrei eu não tinha tanta maturidade pra pensar no futuro pra

mim. Eu tinha meus desejos: “ah, futuramente eu quero fazer uma faculdade, me

formar, ganhar meu dinheiro, ter minha casa”. Mas assim, não passavam só de

pensamentos, não chegavam a ser nem planos, eram só mesmo pensamentos. Então

eu acho que além de me dar coragem pra que eu transformasse esses pensamentos

em planos pra uma vida, me deu também muita maturidade, porque quando você

estuda num colégio assim, você aprende a conviver com diversas pessoas,

principalmente começa a pensar no profissional. Então, eu não conhecia tanto o

mercado de trabalho assim, eu não sabia das dificuldades que eram e a gente vai

aprendendo no colégio, vai tomando maturidade tanto na questão da vida pessoal

como profissional, social. Então, tudo a gente aprende pra viver a vida, fora do

colégio, fora de casa, porque o mundo é completamente diferente daquilo que a

gente ver na TV, do que os nossos pais nos falam, e nada melhor do que uma

experiência de você próprio, a gente aprende a andar com as próprias pernas

(Tamires, Estética, 18 anos).

Eu acho que eu poderia simplificar em crescimento e transformação, porque eu

realmente, eu acho que a Flávia que eu sou hoje eu devo muito à escola

profissionalizante, tanto na pessoal como na profissional. Porque na escola eu

realmente soube me focar mais do que eu queria, porque eu tinha um foco, só que o

meu foco às vezes se desviava, eu me desviava do meu foco, e na escola

profissionalizante a minha transformação pessoal e profissional mudou muito. Eu

devo tudo isso à escola profissionalizante e às pessoas que me ajudaram, tanto os

professores como meus próprios amigos da sala. Eu entrei lá eu não tinha certeza do

que eu queria ser, eu acho que eu queria ser tudo (Flávia, Redes de Computadores,

18 anos).

Aqui [escola pesquisada] foi importante porque eu realizei muitos sonhos, consegui

apresentar trabalhos fora, ganhar premiação. Eu tenho quase certeza, se eu não

estivesse aqui, não teria realizado (Beatriz, Redes de Computadores, 18 anos).

A escola ajudou a projetar o futuro, a dar um norte. Como apontado nos

depoimentos acima, as jovens demonstraram que antes da escola tinham desejos, ideias do

que desejavam ser, mas foi a experiência escolar que possibilitou amadurecer suas

perspectivas de futuro, visualizá-las de modo mais concreto. O incentivo constante dos

professores estimulou o interesse pelos estudos e encorajou-os a lutar pelos seus sonhos.

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Expandiram os conhecimentos pelas vivências diversas que experimentaram. A escola os

preparou para a vida! Proporcionou-lhes “independência”, autonomia, maturidade, liberdade.

O modo como se constituirá a experiência escolar para os alunos dependerá da

construção de uma relação significativa entre a instituição e seus atores. A ação da

escola poderá ser potencialmente maior na medida em que seus alunos forem

considerados como sujeitos do processo e não apenas como expectadores (LEÃO,

2014, p. 254).

Entre os principais sonhos dos jovens pesquisados destacou-se o de ingressar na

universidade: “O meu foco maior agora é realmente passar, entendeu, passar no vestibular,

poder exercer a medicina, poder ajudar as pessoas” (Priscila, Redes de Computadores, 18

anos).

Eu penso em fazer tanta coisa que... [risos], eu tenho tantos sonhos que só Deus

[risos]. Eu penso em entrar logo na universidade, fazer Veterinária. Penso também

em fazer intercâmbio pra Inglaterra, mas o meu objetivo quando eu me formar,

terminar a graduação, eu quero fazer logo uma pós, um mestrado, entendeu? [...] eu

penso em ser professora da universidade, [...] aí eu acho que eu sendo professora,

por enquanto, vai dá pra eu me estabilizar um pouco pra depois sonhar com a minha

grande clínica. Aproveitar o que eu conquistei. Aí depois eu penso, sei lá, em fazer

Pediatria, eu sonho também ser Pediatra, não sei o porquê. Eu acho que eu vou viver

minha vida toda estudando [risos]. Eu acho que eu vou ficar velhinha estudando,

porque eu penso em fazer tanta coisa (Sophia, Redes de Computadores, 18 anos).

Os jovens que já estão cursando o ensino superior sonham em concluir a

graduação. Alguns querem dar continuidade aos estudos com uma Pós-Graduação, outros

ingressar logo no mercado de trabalho:

Quero terminar minha graduação, lecionar e se eu realmente gostar da área, fazer

mestrado e especialização (Levi, Redes de Computadores, 17 anos).

Eu pretendo terminar o curso [...]. Aí eu decidi que eu vou terminar a graduação e a

partir daí para o mercado de trabalho, ou como eu estou na empresa, tentar montar

minha própria empresa e seguir nessa área [...]. Do curso mesmo eu quero tentar o

Ciência sem Fronteiras, que eu já sei mais ou menos como funciona (Laíz, Redes de

Computadores, 19 anos).

Aqueles que entraram em um curso superior, mas almejavam outro, vislumbram a

possibilidade de transferência ou de passar no ENEM/vestibular para o curso desejado. Caso

não consigam, pensam em concluir o curso no qual estão e fazer Pós-Graduação na área de

interesse primário.

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Eu passei na UECE pra Pedagogia [...]. Assim, eu vou tentar transferir pra

Psicologia, eu sei que vai ser difícil, porque nada é fácil, mas caso eu não consiga,

eu faço Pedagogia com o maior orgulho, sem problemas e me especializo em

Psicologia Infantil ou algo do tipo que tem relacionado à área de Psicologia, mas eu

não quero deixar de seguir a área que eu sempre quis que é a Psicologia (Flávia,

Redes de Computadores, 18 anos).

Enquanto a jovem Flávia compartilhava comigo seus sonhos, ela disse: “eu acho

que a pessoa sempre sonha. Quem não sonha é uma pessoa que realmente não tem gosto à

vida” e isso me reportou ao Lobo (2011), pois o autor conceitua “sonhos como uma atividade

existencial, ontológica e epistemológica, que serve para dar sentido ao existir, não apenas para

viver” (p. 40). Dessa forma, sonhar aparece como uma necessidade existencial para dar

sentido à vida. É o que impulsiona o ser humano a querer mais e a buscar melhorias em sua

vida.

Eu sempre sonho em ter uma casa própria [...] pra minha mãe, eu quero dar pra ela;

eu pretendo estudar fora, fazer intercâmbio fora do país [...]. Os sonhos são: eu

estudar, passar num concurso, ter estabilidade financeira, ajudar minha mãe. Me

realizar profissionalmente e como pessoa (Flávia, Redes de Computadores, 18 anos).

Os sonhos apontados por Flávia expressam, de modo geral, os dos demais jovens

entrevistados, pois a maioria projeta seus sonhos tendo como foco os estudos, o desejo de

realizar um intercâmbio em outro País, a esperança de conseguir estabilidade financeira e

ajudar a família.

O futuro apareceu incerto para os sujeitos pesquisados, como pode ser percebido

nas falas a seguir:

O fim do ensino médio. Decisões difíceis estão por vir. Qual faculdade cursar?

Trabalhar? Com o quê? E eu pensando em muitas coisas (Beatriz, Redes de

Computadores, 18 anos, Trecho do Caderno-diário).

Futuro! Planos! São tantos planos, objetivos... Bom, pretendo cursar faculdade de

Psicologia e/ou Educação Física, trabalhar, prestar concursos, estudar fora (Flávia,

Redes de Computadores, 18 anos, Trecho do Caderno-diário).

[Planos para o futuro] Eu não sei, eu estou pensando ainda [risos] [...]. Tô confusa.

(Sandra, Estética, 18 anos).

Observei a indecisão quanto ao futuro como algo marcante para muitos jovens em

diversas etapas da pesquisa, nas conversas informais, nos relatos dos cadernos-diário, nas

entrevistas, nas conversas na rede social facebook. Até mesmo quando os jovens já

demonstravam alguns planos traçados, como o interesse em cursar o ensino superior, poucos

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eram aqueles que tinham certeza da escolha profissional, apontando um leque de

possibilidades entre os cursos pretendidos.

“Uma particularidade de muitos jovens contemporâneos é, por conseguinte, a de

viverem um tempo de instabilidade e de incertezas, de tensão entre presente e o futuro, de

laços persistentes de dependência e de anseios insistentes de independência” (PAIS, 2005,

p.11). Dayrell (2007) compartilha das ideias de Pais ao dizer que no Brasil, o cotidiano dos

jovens é marcado pelo princípio da incerteza, fazendo com que eles se deparem com

encruzilhadas de vida e transições ziguezagueantes que se caracterizam por serem sem rumo

fixo ou predeterminado.

As entrevistas foram realizadas entre o final do 1º semestre de 2014 e o início do

2º semestre do mesmo ano. Na fase de conclusão da pesquisa, em fevereiro de 2015, entrei em

contato novamente com os sujeitos, via rede social facebook para confirmar se os projetos

apontados pelos jovens estavam ocorrendo conforme planejados e em busca de saber as

últimas novidades na vida de cada um. Ao me deparar com as informações de retorno dos

jovens fiquei surpresa com a mudança radical dos planos de futuro de alguns deles. Mesmo

sabendo ser a incerteza uma característica juvenil, observar mudanças significativas em um

período tão curto, aproximadamente seis meses, não deixou de impressionar-me.

Entre os relatos juvenis, dois me chamaram mais atenção. Um deles foi o da

jovem Tamires (Estética, 18 anos), que na época da entrevista estava trabalhando em uma

clínica na área de Estética e sonhava ser Psicóloga. Já no depoimento apresentado no

facebook, ela disse:

Olha, muita coisa mudou, sabe. Saí da clínica que te contei que estava nos meus

planos ser efetiva [...]. Depois disso, tentei o ENEM pela 4º vez e por pouquíssimo

não entrei, talvez tenha sido falta de sorte mesmo, porque minha nota foi a melhor

em relação aos anos anteriores. Tentei o PROUNI e consegui bolsa 50% pra

Administração na FANOR, mas o que eu realmente queria era Gastronomia. Minha

ideia de ser Psicóloga deixei lá atrás junto com a clínica [risos]. Não consegui bolsa

pra Gastronomia infelizmente, mas meu pai está bancando a faculdade. E estou

bastante realizada, a cada dia amando mais o curso. Sempre tive influências

gastronômicas na família e por isso achei que seria uma boa escolha e está sendo!

No meio do ano, tento minha nota do ENEM de novo pro segundo semestre da UFC

e seja o que for melhor pra mim. Minha rotina tem sido essa: faculdade. Estou

completamente entregue a ela. Não estou trabalhando em nada, só estudos mesmo. E

meu futuro espero que seja esse, uma futura Chef de Cozinha, espero fazer uma pós

no Sul e Bacharelado na Le Cordon Bleu, faculdade símbolo de Gastronomia na

Inglaterra e então depois abrir meu próprio negócio. Minha realidade tá sendo

completamente outra, “fazer faculdade” é muito gostoso, cheio de descobertas... É

incrível! Minha área é linda! (Tamires, Estética, 18 anos, Facebook).

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Outro relato foi o da jovem Beatriz (Redes de Computadores, 18 anos), a qual

havia passado para Publicidade e Propaganda na UFC e no período da entrevista estava

aguardando o início do curso, que iniciaria no 2º semestre do ano (2014.2). Após concluir o

primeiro semestre da graduação ela decidiu cursar Relações Internacionais na Universidade

Federal do Rio de Janeiro (UFRJ):

Cheguei a ir pro Rio, porque tinha decidido não cursar mais Publicidade e

Propaganda e queria ir pra uma área que pudesse ajudar as pessoas e tal, aí escolhi

Relações Internacionais [risos], a Diplomacia. Porém, não consegui ficar lá, tava

com saudade do povo, nem tinha me despedido direito porque foi tudo em cima da

hora... aí eu voltei depois de um mês, nem cheguei a me matricular na UFRJ... aí eu

resolvi fazer Direito aqui e depois voltar pra lá pra fazer Relações Internacionais...

Enfim, uma loucura [risos] (Beatriz, Redes de Computadores, 18 anos, Facebook).

Ao acompanhar as publicações da jovem Beatriz pela rede social facebook,

observei certo dia, quando ela ainda se encontrava no Rio de Janeiro, a seguinte postagem em

seu perfil: “Você passa a vida inteira querendo uma coisa e quando consegue, muda o plano

de rota. Você sonha alto e consegue realizar tal sonho, mas não sabe se vale a pena tanto

assim” (postagem no dia 16/02/2015). Ela ainda colocou o símbolo de uma carinha em que os

olhos eram dois sinais de interrogação e escreveu: “se sentindo perdida”. Poucos dias depois

fiquei sabendo, pela mesma rede social, que ela já havia retornado à Fortaleza. Pelo último

contato realizado com a jovem a mesma estava decidida a trancar o curso de Publicidade e

Propaganda na UFC para fazer Direito no Centro Universitário Christus (UNICHRISTUS).

O exemplo da Beatriz, de indecisão quanto ao futuro, da incerteza em qual

profissão seguir, a faz tomar caminhos indefinidos e, por vezes, ver a necessidade de retornar

aos caminhos anteriormente tomados.

A retomada de caminhos outrora tomados é própria de estruturas labirínticas. O

dilema do labirinto traduz-se na incapacidade de decisão relativamente ao rumo a

tomar. Vou por aqui ou por ali? O ideal para muitos jovens é explorar

simultaneamente vários rumos possíveis que num labirinto surgem em simultâneo a

quem com eles se confronta (PAIS, 2005, p. 13-14).

Observando o modo como a maioria dos jovens lida com o tempo e seus projetos

de futuro é possível afirmar que a vida dos jovens é marcada pelo “princípio da

experimentação, através do qual testam suas potencialidades, improvisam, se defrontam com

seus próprios limites, lançando mão das possibilidades que lhes surgem” (LEÃO, DAYRELL,

REIS, 2011, p. 1080). Assim como a Beatriz, muitos jovens, permeados por incertezas e

diante das múltiplas possibilidades apresentadas pelo presente, transitam por “trajetórias ioiô”

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(PAIS, 2005), lançando mão da experimentação como a alternativa mais viável na busca pela

porta de saída no labirinto da vida.

Para Carrano (2007, p. 01), “os jovens compõem agregados sociais com

características continuamente flutuantes”. É fácil compreendermos se pensarmos que estamos

inseridos em uma sociedade dinâmica, em constantes transformações que interferem

diretamente no modo de pensar, de se comunicar, de se vestir, de se comportar. Isso faz com

que os sujeitos, inclusive os jovens, sejam influenciados pela sociedade. E da mesma forma

como esta, os jovens são dinâmicos, mudam de gostos, de sonhos e podem voltar a se

interessar por esses mesmos sonhos e gostos depois de um tempo. E assim, nesse vai e vem,

vão se reinventando nas tramas da vida.

Embora a incerteza seja uma característica marcante para os jovens quando

questionados sobre o futuro, no percurso do trabalho de campo cruzei também com jovens

que se mostraram seguros dos seus desejos e por essa razão afirmaram que irão insistir até

quando for preciso para concretizarem seus sonhos: “Se eu não conseguir realizar todos os

meus sonhos, pelo menos eu vou lutar por eles, vou correr e quando chegar lá no final se eu

não conseguir, pelo menos eu tentei, eu não vou me decepcionar comigo mesma” (Flávia,

Redes de Computadores, 18 anos). Percebi que estes jovens, em sua maioria, carregam sonhos

projetados ainda na infância, quando já pensavam no curso superior pretendido e/ou na

carreira profissional.

Diante do exposto, é possível afirmar que a escola pesquisada se apresenta como

uma instância significativa para a compreensão e construção dos projetos de futuro dos jovens

estudantes, pelo incentivo e as múltiplas oportunidades vivenciadas, disponibilizando aos

sujeitos novos horizontes. Por outro lado, a escola enfrenta muitos desafios, expressando,

pois, a necessidade de refletir a Política de Educação Profissional no Ceará, em especial, nas

escolas profissionalizantes adaptadas.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao chegar ao final dessa viagem, que foi o mestrado, convido o leitor para abrir as

malas comigo e reviver na lembrança a trajetória percorrida. Minha bagagem voltou mais

cheia e pesada, fruto das experiências que vivenciei. Todas elas, em maior ou menor

proporção, contribuíram para o meu crescimento pessoal e profissional, como jovem,

estudante, pesquisadora.

Bem como os sujeitos da pesquisa, que expressaram ao saírem da escola

profissionalizante, não serem mais os mesmos, eu também posso afirmar que já não sou mais

a mesma, pois muito apreendi: conhecimentos alcançados, amizades construídas, obstáculos

superados. Todos os momentos experimentados nessa caminhada foram importantes, até

mesmo aqueles de dificuldade, de medo, de ansiedade, de dúvidas, uma vez que me tornaram

mais forte e confiante ao conseguir ultrapassá-los. Portanto, passei por um processo de

mudança em que as roupas antigas se tornaram justas demais para abarcar todas as vivências.

À medida que adentrei o campo de pesquisa, deparei-me com novos

questionamentos além das questões outrora propostas, conforme crescia meu envolvimento

com a realidade investigada e os sujeitos pesquisados. Esses novos questionamentos, embora

interligados ao estudo, possuíam abrangência maior do que o contexto estudado. Nesse

sentido, tive o desafio de contemplar os aspectos mais relevantes, sem, contudo, perder de

vista os objetivos centrais desse estudo. Assim, considero o tempo de mestrado insuficiente

para abranger todas as questões surgidas em campo e de realizar análises mais aprofundadas,

e me contento, por hora, a trazê-las ao debate, como fiz no decorrer do trabalho, ainda sem

respostas tracejadas, por considerar importantes apontamentos para trabalhos futuros.

Não é novidade afirmar a importância da escola como instância formadora na vida

dos sujeitos, mas nesse estudo destaco a atuação positiva, em alguns aspectos, da instituição

pesquisada, por proporcionar uma dinâmica favorável ao processo ensino-aprendizagem que

busca contemplar as várias dimensões humanas com reconhecimento das expressões juvenis,

principalmente por se tratar de uma escola profissionalizante.

O conjunto de elementos que envolvem a dinâmica escolar - tempo integral de

estudo, Projeto Professor Diretor de Turma, participação em projetos e grupos culturais,

incentivo constante dos professores e núcleo gestor, laços afetivos construídos entre alunos e

funcionários – são de fundamental importância para as experiências dos jovens na escola,

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possibilitando-os vivências que fortalecem a socialização e a construção de projetos de futuro

e que se sobrepõem aos conhecimentos teórico-práticos apreendidos.

Entre os elementos apresentados acima o sistema de ensino em tempo integral se

destaca por favorecer a concretização dos demais, uma vez que aumenta a permanência dos

jovens na escola. A partir deste os jovens passam a reconhecer a escola como a segunda casa

e elegem os colegas e funcionários como família, pela intensificação de tempo e afetos

compartilhados naquele espaço.

O Projeto Professor Diretor de Turma, mediante a maior interação estabelecida

entre professor/alunos, permite ao professor conhecer mais seus alunos e melhor intervir em

seus processos de ensino-aprendizagem. Essa relação desencadeia outros dois elementos, o

fortalecimento dos laços entre professores e alunos e o incentivo dos professores para com

eles. Uma vez que o docente estabelece maior integração com seus alunos, aumenta a

probabilidade de desenvolver com eles relações de amizade e confiança, e consequentemente

melhorar os rendimentos e expectativas de futuro dos jovens estudantes.

Os jovens pesquisados foram unânimes ao reconhecerem a importância da

participação em projetos científicos e culturais na escola. Embora com tempo restrito, os

jovens têm demonstrado a possibilidade de conciliar estudo com arte e cultura, e que essa

parceria proporciona ganhos tanto para a escola como para os próprios jovens, por favorecer o

fortalecimento do vínculo aluno/escola, facilitar o processo ensino-aprendizagem e

possibilitar aos sujeitos vislumbrarem novos horizontes. Deste modo, observei que, mesmo

inseridos em uma escola profissionalizante, os jovens não se contentam com a formação

técnica adquirida e querem dar “voos” mais longos e altos. E a partir do momento em que a

escola oportuniza a participação dos jovens nos projetos e grupos culturais ela reconhece a

importância dessas vivências para as juventudes e possibilita formação que vai além da

preparação para o mundo do trabalho.

Outra experiência importante para os sujeitos foi a vivência do estágio, o qual

possibilitou-lhes, de modo geral, conhecer o funcionamento de uma empresa e as exigências

do mercado de trabalho.

Associado a essas experiências, entre outras, estudar em uma escola

profissionalizante para os sujeitos pesquisados significou também a aquisição de

independência, autonomia, liberdade, amadurecimento, fundamentais para a formação

humana.

Pensar as repercussões dessas experiências na vida dos jovens estudantes induz a

reflexão de que os processos formativos por eles vivenciados foram mais importantes para

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formação humana que profissional, auferindo-lhes capacidades de aprendizado de disciplina,

de socialização e de conhecimentos para além dos conteúdos previstos de preparação para o

trabalho.

Mas não foi só de experiências exitosas e positivas que viveram os sujeitos na

escola profissionalizante. A pesquisa mostrou a existência de lacunas na instituição escolar

que interferem significativamente na formação humana e profissional dos jovens estudantes.

Entre essas lacunas se destacou a infraestrutura precária da escola, pela ausência

de recursos, equipamentos, materiais, laboratórios, auditório, salas e espaços extras para a

realização de atividades. Isso tudo inviabilizou a continuidade de dois cursos técnicos na

instituição e têm comprometido a formação dos estudantes. Uma vez que os alunos não

vivenciam aulas práticas ou as têm de modo insatisfatório, isso repercute, por exemplo, na

sensação de insegurança ao realizarem o estágio e na aquisição deficiente de conhecimentos

práticos adquiridos ao longo do curso. Logo, diante do número expressivo de escolas

profissionalizantes adaptadas em funcionamento no Ceará e dos problemas observados na

instituição pesquisada, este trabalho aponta para a necessidade de avaliar o impacto do ensino

profissionalizante oferecido por essas escolas.

Ademais, observei a carência da escola pesquisada em professores efetivos, não

havendo a presença desses profissionais na composição da base técnica. Isso demonstra que

embora haja considerável avanço da Política de Educação Profissional no Estado, este não

tem caminhado em consonância com os investimentos adequados para a composição de um

quadro de docentes efetivos.

Outro aspecto relevante nos depoimentos dos jovens foi a dificuldade em conciliar

as diversas atividades as quais estão submetidos no final do 3º ano: conclusão do ensino

médio; realização do estágio; preparação para o ENEM/vestibular; elaboração e apresentação

do TCC; participação em cursinhos preparatórios para o ensino superior. Essa dificuldade

apontada pelos alunos foi reconhecida também pela direção e coordenação escolar. Juntos,

alunos e escola, buscam contornar esse entrave, embora tenham consciência que as mudanças

são de amplitude maior e vão além das suas competências.

As atividades culturais extracurriculares, embora sejam cultivadas pela escola e

contem com a oferta de um professor de Artes, não recebem por parte do governo os

investimentos necessários para a sua real concretização, demandando por parte dos jovens

esforço próprio para aquisição dos recursos, tanto para a apresentação de projetos científicos e

culturais fora do Estado, como para a manutenção dos grupos culturais da instituição.

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Os reflexos do estágio, embora vistos como experiência positiva pelos sujeitos,

apontam obstáculos a serem ultrapassados, dos quais se destaca a realização de atividades que

não competem à formação adquirida.

A pesquisa mostrou que os jovens pesquisados se inserem nas escolas

profissionalizantes sem grandes expectativas, influenciados por amigos e/ou familiares e

carregados com os anseios que perpassam o imaginário social, os de que as escolas

profissionalizantes oferecem melhores oportunidades, principalmente de inserção na

universidade e no mercado de trabalho. Os jovens visualizam o ensino médio integrado à

educação profissional como a possibilidade de se prepararem melhor para o futuro.

Os jovens, em sua maioria, não projetam dar continuidade a área de formação,

seja trabalhando ou estudando, e veem a formação profissional como um diferencial

importante quando saírem da escola. Esse diferencial toma como parâmetro as diferenças

entre os conhecimentos adquiridos na escola profissionalizante e os transmitidos no ensino

médio, na educação regular.

Mesmo diante das limitações da escola estudada em termos de infraestrutura, a

maior parte dos jovens considera que a escola profissionalizante prepara mais para o mercado

de trabalho que para a universidade. Mas consideram que devido a maior exigência de

disciplina com os estudos, e pelo incentivo dos professores, os alunos das escolas

profissionalizantes conseguem melhores índices de aprovação na universidade do que os

alunos de escolas regulares.

Os jovens, de modo geral, demonstraram o interesse de dar continuidade aos

estudos no ensino superior. A maior parcela dos entrevistados está cursando universidade e

duas jovens continuam em cursinhos preparatórios. Tendo em vista isso, o estudo apareceu

como central na vida dos sujeitos, como o principal meio de mobilidade social. Observei que

os jovens, mesmo acreditando ter maiores possibilidades de inserção no mercado de trabalho

pela formação técnica, consideram o ensino superior necessário para obterem melhores

condições de trabalho.

Quanto à avaliação dos jovens estudantes a respeito das Escolas Estaduais de

Educação profissional no Ceará, todos reconheceram a importância do programa para as

juventudes e avaliaram, em geral, de modo positivo. No entanto, se posicionaram também de

modo crítico, questionando a eficácia de implantar tal programa em escolas adaptadas, tendo

em vista as carências de estrutura, materiais e equipamentos apresentadas e que comprometem

a realização de aulas práticas, interferindo consequentemente na formação adquirida.

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A escola em tempo integral aparece como uma possibilidade de ultrapassar a

dualidade da educação, ao oferecer simultaneamente ensino médio regular com ensino

técnico. Contudo, não basta aumentar a carga horária de tempo do jovem na escola e mudar o

currículo. É preciso ouvir os sujeitos, alunos e professores, para que os mesmos participem

com seus anseios e necessidades, assim como, é necessário articular as Políticas de Educação

Profissional às políticas de emprego e renda no Ceará, para que os jovens encontrem

oportunidades reais e decentes de inserção no mercado de trabalho.

Nesse sentido, mais do que uma escola que prepare o aluno para o mercado de

trabalho ou para a educação superior, é preciso oferecer uma escola ampla, integrada, que

busque contemplar as várias dimensões humanas e dê condições ao aluno de ao final do

ensino médio escolher o caminho que se mostrar mais oportuno. Consiste em reconhecer a

multiplicidade juvenil e compreender que os jovens são diferentes e possuem interesses

diversos e, da mesma forma, é preciso oferecer oportunidades múltiplas, mas de modo

igualitário.

A pesquisa mostrou que a escola profissionalizante estudada atua como um “ateliê

de sonhos” para os jovens pesquisados, pois oportuniza experiências diversas de educação,

sociabilidade, cultura, lazer, tão importantes na construção das identidades juvenis e para a

construção de seus projetos de futuro. Foi por meio da escola profissionalizante que muitos

jovens passaram a pensar no futuro, amadureceram seus planos e visualizaram-os de modo

mais concreto.

Esse trabalho, tecido com o fio condutor das narrativas juvenis, expressa as

alegrias, conquistas, aprendizados, sonhos, dificuldades, indignações, revoltas, reivindicações,

que se ouvidas podem contribuir para possíveis avanços na área de educação, bem como de

implantação e avaliação de políticas públicas, em especial, da Política de Educação

Profissional do Ceará, visto que são expressões legítimas dos jovens estudantes que

vivenciaram o cotidiano escolar e são os mais capazes de avaliar esse processo e propor

melhorias.

Ao fim desta Dissertação carrego a certeza de ter contribuído com o debate das

juventudes e da educação profissional e espero ter despertado no leitor novas inquietações e

saberes. Como sementes lançadas ao solo, desejo que as contribuições e pistas aqui expostas

possam germinar com a esperança de futuros trabalhos para fortalecer o debate.

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137

APÊNDICES

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138

APÊNDICE A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS

MESTRADO ACADÊMICO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu,__________________________________________________________,

RG___________________________, declaro, por meio deste termo, que concordei em ser

entrevistado (a) na pesquisa referente ao projeto intitulado “Juventude e Educação

Profissional: entre os caminhos trilhados e os caminhos a construir”, desenvolvida pelo

Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Sociedade da Universidade Estadual do

Ceará. Fui informado (a), ainda, de que a pesquisa será realizada pela pesquisadora Ana Paula

Neves Lopes e orientada pelo professor João Bosco Feitosa dos Santos, a quem poderei

contatar a qualquer momento que julgar necessário, através do telefone número (85) 9732-

7307 ou pelo email [email protected] e pelo e-mail [email protected],

respectivamente.

Aceitei participar por minha própria vontade, sem receber qualquer incentivo

financeiro e com a finalidade exclusiva de colaborar para o sucesso da pesquisa. Fui

informado (a) do objetivo estritamente acadêmico do estudo, que, em linhas gerais é analisar

as repercussões da formação profissional nos projetos de futuro dos (as) jovens.

Fui também esclarecido (a) de que os usos das informações por mim oferecidas

estão submetidos às normas éticas destinadas à pesquisa envolvendo seres humanos, da

Comissão Ética de Pesquisa da Universidade Estadual do Ceará (CEP/UECE).

Minha colaboração se fará de forma anônima, por meio de entrevistas a serem

gravadas a partir da assinatura desta autorização. O acesso e a análise dos dados coletados se

farão apenas pela pesquisadora e pelo orientador.

Estou ciente também de que, caso eu tenha dúvida ou me sinta prejudicado (a),

poderei contatar a pesquisadora responsável ou o orientador ou ainda o Comitê de Ética em

Pesquisa CEP/UECE.

Page 140: UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE …uece.br/politicasuece/dmdocuments/Ana_Paula_Neves_Lopes.pdf · (Ariano Suassuna) RESUMO Nesta pesquisa, tenho como objetivo analisar as

139

A pesquisadora principal do estudo me ofertou uma cópia assinada deste Termo

de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme recomendações da Comissão de Ética em

Pesquisa.

Fui ainda informado (a) de que posso me retirar dessa pesquisa a qualquer

momento, sem nenhum prejuízo para mim e sem sofrer quaisquer sanções ou

constrangimentos.

Fortaleza, _____/______/________.

______________________________________________________________________

Assinatura do (a) participante

______________________________________________________________________

Assinatura da Pesquisadora

Page 141: UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE …uece.br/politicasuece/dmdocuments/Ana_Paula_Neves_Lopes.pdf · (Ariano Suassuna) RESUMO Nesta pesquisa, tenho como objetivo analisar as

140

ANEXOS

Page 142: UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE …uece.br/politicasuece/dmdocuments/Ana_Paula_Neves_Lopes.pdf · (Ariano Suassuna) RESUMO Nesta pesquisa, tenho como objetivo analisar as

141

ANEXO A – FOTOS DE APRESENTAÇÕES DO GRUPO PHYLOS PELA CIDADE DE

FORTALEZA

Grupo Phylos em apresentação no Centro Cultural Bom Jardim (CCBJ)

Fonte: Facebook.

Grupo Phylos em apresentação no Serviço Social do Comércio (SESC)

Fonte: Facebook.

Page 143: UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE …uece.br/politicasuece/dmdocuments/Ana_Paula_Neves_Lopes.pdf · (Ariano Suassuna) RESUMO Nesta pesquisa, tenho como objetivo analisar as

142

ANEXO B – JOVENS DA PESQUISA EM MOMENTOS DE SOCIALIZAÇÃO NA

ESCOLA

Jovens durante brincadeira no último dia de aula

Fonte: Arquivo Pessoal.

Jovens brincando na quadra de esportes

Fonte: Arquivo Pessoal.