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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE QUÍMICA
THALITA ANGÉLICA DESTEFANI
ESTABILIDADE COLOIDAL DE NANOPARTÍCULAS DE OXIHIDRÓXIDO DE
FERRO(III) EM SOLUÇÕES DE MICELAS GIGANTES
CAMPINAS
2017
THALITA ANGÉLICA DESTEFANI
ESTABILIDADE COLOIDAL DE NANOPARTÍCULAS DE OXIHIDRÓXIDO DE
FERRO(III) EM SOLUÇÕES DE MICELAS GIGANTES
Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto de
Química da Universidade Estadual de Campinas como
parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de
Mestra em Química na área de Físico-Química
Orientador: Prof. Dr. Edvaldo Sabadini
Coorientadora: Profa. Dra. Ana Maria Percebom
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA
PELA ALUNA THALITA ANGÉLICA DESTEFANI, E ORIENTADA PELO PROF. DR.
EDVALDO SABADINI
CAMPINAS
2017
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CAPES
Ficha catalográfica Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca do Instituto de Química Danielle Dantas de Sousa - CRB 8/6490
Destefani, Thalita Angélica, 1988- D473e DesEstabilidade coloidal de nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III) em soluções de micelas gigantes / Thalita Angélica Destefani. – Campinas, SP : [s.n.], 2017. DesOrientador: Edvaldo Sabadini. DesCoorientador: Ana Maria Percebom. DesDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Química. Des1. Estabilidade coloidal. 2. Micelas gigantes. 3. Nanopartículas. 4. Hidróxido de ferro(III). I. Sabadini, Edvaldo. II. Percebom, Ana Maria. III. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Química. IV. Título.
Informações para Biblioteca Digital Título em outro idioma: Colloidal stability of iron(III) oxyhydroxide nanoparticles in wormlike micelles solutions Palavras-chave em inglês: Colloidal stability Wormlike micelles Nanoparticles Iron(III) hydroxide Área de concentração: Físico-Química Titulação: Mestra em Química na área de Físico-Química Banca examinadora: Edvaldo Sabadini [Orientador] Miguel Jafelicci Junior Maria do Carmo Gonçalves Data de defesa: 21-02-2017 Programa de Pós-Graduação: Química
Powered by TC PDF ( www.tcpdf.org)
“O importante não é ver o que ninguém nunca viu, mas sim,
pensar o que ninguém nunca pensou sobre algo que todo
mundo vê”
Arthur Schopenhauer
Agradecimentos
À minha família, João, Íria e Thaís, pelo apoio incondicional, dedicação e
por sempre terem me proporcionado o melhor que puderam.
Aos meus orientadores, Edvaldo e Ana Maria, que, sempre com muita
paciência e carinho, me ajudaram a amadurecer e completar mais uma etapa da
minha vida.
Aos amigos da graduação Murilo, Denise e Fernanda, por todos os
momentos vividos juntos, pelas risadas e companhia, desde 2008.
À Família Reset, pelas risadas, loucuras e todos os eventos ao longo de
tantos anos.
Aos amigos do laboratório B-145, por todas as conversas, construtivas ou
não, que me fizeram ampliar os horizontes, ou apenas passar o tempo.
Ao Karl, que tanto me ajudou sempre que precisei, com muita calma e
paciência. E por todas as curiosidades.
Ao Gabriel, meu IC querido, que sempre foi muito prestativo, atencioso e
me ajudou com tantos detalhes desse projeto. E também pelas obleas!
Aos “BFFs” Eduardo, Antonio e Fernanda, pelas horas de café,
descontração, brincadeiras e por fazer meus dias mais leves.
Ao Thiago, por me acolher no laboratório e ter se tornado um amigo tão
querido. Nossas conversas, mesmo que à distância, sempre foram muito importantes
para mim.
Agradeço novamente ao Eduardo, por ser meu parceirinho, pelo carinho,
apoio, compreensão, puxões de orelha, por sempre me motivar e por estar presente
em tantos momentos da minha vida.
Agradeço à CAPES pelo auxílio financeiro, ao LNNano e ao LNLS pela
estrutura e em especial ao Alexandre e Marcelo, pela ajuda com as análises de
microscopia.
Obrigada a todos.
RESUMO
Micelas gigantes (MG) são estruturas que se assemelham à sistemas
poliméricos, essas são formadas pela auto associação de moléculas surfactantes em
determinadas condições. Neste projeto, as micelas gigantes foram produzidas pela
combinação do surfactante catiônico brometo de hexadeciltrimetilamônio (CTAB) com
salicilato de sódio (NaSal). A indução da formação das micelas alongadas ocorre pela
inserção do salicilato entre as cabeças polares do surfactante. Também é bastante
conhecido na literatura que íons salicilato podem complexar com íons Fe3+, formando,
em meio ácido, um complexo de coloração violeta. Na presença de CTAB e Fe3+,
estabelece-se uma competição pelos íons salicilato. Porém, ao se ajustar o pH para
7, ocorre a formação de nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III). Estas
nanopartículas permanecem estabilizadas na solução de micelas gigantes. O
presente trabalho tem como objetivo o entendimento da referida estabilidade coloidal
e da estrutura formada pelo sistema. Nos estudos foram utilizadas principalmente as
seguintes técnicas: espalhamento dinâmico de luz (DLS), espalhamento de raios X
em baixos ângulos (SAXS), microscopia eletrônica de transmissão (TEM),
microscopia eletrônica de transmissão em temperaturas criogênicas (Cryo-TEM) e
reologia. Os resultados mostraram que as nanopartículas formadas (de 3 a 5 nm de
diâmetro), por terem potencial zeta negativo, ligam-se eletrostaticamente à superfície
das micelas gigantes, que apresentam carga superficial positiva. Forma-se assim,
uma estrutura do tipo “colar de pérolas”, na qual as cadeias das micelas gigantes
evitam a coalescência das nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III). A formação
dessa estrutura é responsável pela elevada estabilidade coloidal do sistema.
ABSTRACT
Wormlike micelles (WLM) are polymeric-like structures, which are formed
by self-assembly of surfactant molecules under some specific conditions. In this
project, wormlike micelles were formed by combination of the cationic surfactant
hexadecyltrimethylammonium bromide (CTAB) and sodium salicylate (NaSal). The
wormlike micelle formation is driven by the insertion of salicylate between the
surfactant headgroups. It is also very known from the literature that salicylate ions
complex with Fe3+ ions forming a violet complex in acidic media. In the presence of
CTAB and Fe3+, a competition for salicylate ions is established. However, when pH is
adjusted to 7, the formation of iron(III) oxyhydroxide nanoparticles occurs. The
nanoparticles remain stably dispersed in the wormlike micelles solutions. The aim of
this project involves understanding the origin of such colloidal stability and determining
the system structure. The main techniques employed were: dynamic light scattering
(DLS), small angle X-ray scattering (SAXS), transmission electronic microscopy
(TEM), cryo-transmission electron microscopy (Cryo-TEM) and rheology. The results
revealed that the nanoparticles (diameter of 3 to 5 nm) having negative zeta potential,
can electrostatically bind to the positively charged surface of the wormlike micelles.
Therefore, a pearl necklace-like structure is formed, in which wormlike micelles chains
avoid the coalescence of iron(III) oxyhydroxide nanoparticles. The formation of such
structure is responsible for the high stability of such colloidal system.
Lista de Figuras
Figura 1. Representação de uma molécula de surfactante....................................... 19
Figura 2. Exemplos de surfactantes aniônicos, catiônicos, não iônicos e
zwitteriônicos............................................................................................................. 20
Figura 3. Mecanismo de redução da tensão superficial pelo surfactante (A e B) e
início da agregação das moléculas (C) ..................................................................... 21
Figura 4. Algumas estruturas que podem ser formadas a partir da agregação de
surfactantes............................................................................................................... 22
Figura 5. Parâmetros de empacotamento das moléculas de surfactante.................. 22
Figura 6. Áreas hidrofílicas e hidrofóbicas previstas pelo Parâmetro de
Empacotamento Crítico............................................................................................. 23
Figura 7. Representação da interação de moléculas de surfactante com as
moléculas de cossoluto (representadas pelos íons salicilato) na formação de
micelas gigantes........................................................................................................ 25
Figura 8. Representação dos modelos de associação dos íons com a superfície
de uma partícula: a) Modelo de Helmholtz e b) Modelo de Gouy-Chapman............... 30
Figura 9. Representação da dupla camada elétrica de Stern de uma superfície
carregada positivamente........................................................................................... 31
Figura 10. Representação esquemática da estabilização pelo efeito estérico de
macromoléculas adsorvidas na superfície da partícula............................................. 34
Figura 11. Diagrama representando as energias de atração e repulsão das
partículas em um sistema coloidal em função da distância........................................ 35
Figura 12. Foto das soluções dos complexos de ferro(III) e salicilato: [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)](𝑎𝑞)+
(roxo, à esquerda), [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)2](𝑎𝑞)− (vermelho, ao centro) e [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)3](𝑎𝑞)
3− (amarelo,
à direita). Na preparação das soluções as concentrações de Fe(III) e salicilato
foram mantidas fixas em 0,5 e 23 mmol L-1, respectivamente.................................... 37
Figura 13. Estruturas moleculares dos reagentes utilizados..................................... 40
Figura 14. Imagem do microscópio TEM JEOL-1400 PLUS (120 kV) utilizado no
presente projeto........................................................................................................ 42
Figura 15. Fotografias das amostras contendo 1 mmol L-1 de FeCl3, 3 mmol L-1 de
NaSal e variando-se a concentração de CTAB: 1) 0 mmol L-1; 2) 0,5 mmol L-1; 3) 1
mmol L-1; 4) 1,5 mmol L-1; 5) 2,0 mmol L-1; 6) 2,5 mmol L-1; 7) 3 mmol L-1; 8) 3,5
mmol L-1; 9) 4 mmol L-1; 10) 5 mmol L-1; 11) 6 mmol L-1; 12) 8 mmol L-1. A razão
[CTAB]/[NaSal] está indicada abaixo de cada frasco, na imagem..............................
44
Figura 16. Espectroscopia de infravermelho de FeOOH-NPs formadas a partir de
uma solução 3 mmol L-1 de NaSal, 3 mmol L-1 de CTAB e 1 mmol L-1 de cloreto de
ferro(III). O número de onda de algumas bandas estão indicadas no
espectro.................................................................................................................... 46
Figura 17. Espectroscopia Raman de amostra de FeOOH-NPs formadas a partir
de uma solução 1 mmol L-1 de NaSal, 1 mmol L-1 de CTAB e 1 mmol L-1 de cloreto
de ferro(III). As diferentes curvas (A-G) são análises de uma mesma amostra em
diferentes pontos da lâmina....................................................................................... 47
Figura 18. Imagem obtida da amostra de nanopartículas de oxihidróxido de
ferro(III) formadas a partir da diálise de uma solução 3 mmol L-1 de NaSal, 3 mmol
L-1 de CTAB e 1 mmol L-1 de cloreto de ferro(III) e posteriormente secada,
mostrando diferentes padrões de cores e heterogeneidade...................................... 48
Figura 19. Imagem obtida por TEM de uma amostra contendo 1 mmol L-1 de FeCl3
e razão [CTAB]/[NaSal] = 1. As setas vermelhas indicam as nanopartículas de
oxihidróxido de ferro(III)............................................................................................. 49
Figura 20. Gráficos de potencial zeta da amostra dialisada de nanopartículas de
oxihidróxido de ferro(III), como descrito na parte experimental. Os gráficos referem-
se a três diferentes medidas...................................................................................... 50
Figura 21. Potencial zeta de micelas gigantes formadas pela combinação de CTAB
com diferentes concentrações de salicilato............................................................... 51
Figura 22. Esquema de geometria de cela de espalhamento de luz.......................... 54
Figura 23. Esquema de um equipamento para obtenção do espalhamento de luz
dinâmico.................................................................................................................... 55
Figura 24. Sinal típico obtido em um experimento de DLS........................................ 56
Figura 25. Esquema apresentando a intensidade de espalhamento em função do
tempo de análise e a curva de perda de correlação, de acordo com o tamanho das
partículas espalhadoras............................................................................................ 57
Figura 26. Gráfico de perda de correlação em função do tempo de amostragem...... 58
Figura 27. Diferença de fase entre radiação incidida e radiação espalhada pela
amostra resulta no vetor de espalhamento 𝑞............................................................. 59
Figura 28. Imagem do goniômetro modelo CGS-3, marca ALV-GmbH..................... 60
Figura 29. Funções de autocorrelação (curvas pretas) e funções de distribuições
de tempo de decaimento ponderadas por intensidade (curvas azuis) de soluções
de MG sem NP (linhas cheias) e MG com NP (linhas pontilhadas). A razão
[CTAB]/[NaSal] é A) 1 e B) 1,5...................................................................................
61
Figura 30. Representação do modelo de como as MG e NPs interagem. As esferas
vermelhas representam as nanopartículas de oxihidróxido de Fe(III) adsorvidas na
cadeia da micela gigante........................................................................................... 64
Figura 31. Representação dos fractais de massa e de superfície com seus
respectivos valores de 𝛼, obtidos na região de Porod................................................ 69
Figura 32. Curvas de SAXS obtidas para amostras de MG e FeOOH-NPs
(símbolos pretos) com concentração fixa de NaSal e CTAB (3 mmol L-1 para
ambos) e FeCl3 = 1 mmol L- 1. A linha em vermelho é referente aos ajustes obtido
na região de Debye e Porod. A curva de SAXS para a solução de MG sem NPs
(símbolos azuis) também é apresentada, para comparação..................................... 70
Figura 33. Representação sugerida para a disposição das nanopartículas através
da técnica de SAXS, obtida pelo ajuste do modelo de colar de pérolas...................... 71
Figura 34. Curvas de SAXS obtidas para amostras com concentração fixa de
NaSal e CTAB (3 mmol L-1 para ambos) e concentração de FeCl3 = 3, 6, 8 e 9
mmol L-1 (símbolos). As linhas são referentes aos ajustes obtidos............................ 73
Figura 35: Esquema mostrando como ocorre a obtenção de nanobastões de óxido
de ferro, a partir da adsorção das nanopartículas de óxido de ferro(III) em MG e
seu movimento de reptação....................................................................................... 74
Figura 36. Esquema de preparação de amostras para Cryo-TEM. a) Amostra
líquida contendo as estruturas de interesse. b) A amostra é depositada na grade.
c) A grade é comprimida com papel de filtro para retirar o excesso de amostra
(blotting) e mergulhada no líquido criogênico. d) A amostra fica alojada dentro do
suporte de carbono e e) o feixe de elétrons atravessa a amostra para que a imagem
seja obtida................................................................................................................. 78
Figura 37. Sistema de vitrificação automatizada Vitrobot, da marca FEI................... 80
Figura 38. Imagem obtida por TEM de uma amostra contendo 3 mmol L-1 de CTAB
e NaSal ([CTAB]/[NaSal] = 1) e 1 mmol L-1 de FeCl3. As setas vermelhas indicam
nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III) e os círculos amarelos mostram
algumas regiões nas quais estas nanopartículas estão alinhadas............................. 81
Figura 39. Imagem obtida por Cryo-TEM de uma solução de micelas gigantes
composta de 3 mmol L-1 de CTAB e NaSal. As setas em vermelho e azul mostram
estruturas comuns às micelas gigantes..................................................................... 83
Figura 40. Imagens de Cryo-TEM para amostra de MG com nanopartículas de
oxihidróxido de Fe(III), formadas a partir de CTAB e NaSal (3 mmol L-1) e 1 mmol
L-1 de FeCl3. As setas amarelas indicam MG sem NPs e as setas vermelhas
indicam estruturas de MG de dimensões maiores, devido à presença de NPs..........
84
Figura 41. Imagens de Cryo-TEM para amostra de MG com razão [CTAB]/[NaSal]
= 3, na presença de FeOOH-NPs. As setas amarelas indicam MG e as setas
vermelhas indicam NPs próximas à MG. As setas azuis indicam estruturas
circulares possivelmente formadas pelas MG........................................................... 86
Figura 42. Ensaio no corpo de bombeiros de Nova York, no qual testa-se a
redução de atrito provocada por uma solução 30 ppm de poli (óxido de etileno) em
comparação com a água pura................................................................................... 89
Figura 43. Esquema representando a evolução dos vórtices grandes em vórtices
menores no regime turbulento (cascata de Kolmogorov) e a interferência de
cadeias alongadas nessa evolução........................................................................... 90
Figura 44. Esquema do equipamento usado para medida da redução de atrito
hidrodinâmico em um reômetro rotacional................................................................. 90
Figura 45. Curva de fluxo (torque em função da velocidade angular) para o
solvente puro (linha contínua) e para o solvente contendo um polímero redutor de
atrito (linha tracejada)................................................................................................ 91
Figura 46. Curva típica para a estabilidade térmica das micelas gigantes, em que
a rotação em regime turbulento é mantida constante................................................. 92
Figura 47. Imagens A) Reômetro RheoStress Haake RS1; B) Geometria de dupla
fenda: rotor (esquerda) e copo (direita)...................................................................... 93
Figura 48. Curvas de redução de atrito hidrodinâmico obtidas para amostras de
MG em diferentes razões de [CTAB]/[NaSal] (indicadas na legenda dos gráficos) e
A) ausência de FeOOH-NPs e B) presença de FeOOH-NPs. As curvas foram
deslocadas no eixo Y para facilitar a visualização das mesmas................................. 94
Figura 49. Temperatura de quebra das micelas gigantes na presença e ausência
de nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III)........................................................... 95
Lista de Tabelas
Tabela 1. Classificação dos coloides de acordo com a fase dispersa e meio de
dispersão................................................................................................................... 28
Tabela 2. Valores de pH de formação de cada complexo de Fe(III) e salicilato.......... 36
Tabela 3. Principais reações envolvidas e suas constantes de equilíbrio.................. 45
Tabela 4. Diferenças de valores de 𝛼 e dimensões fractais para fractais de massa
e superfície................................................................................................................ 68
Tabela 5. Valores de densidade eletrônica (ρ) para cada componente do sistema
estudado.................................................................................................................... 71
Tabela 6. Parâmetros estruturais do sistema obtidos pelo ajuste do modelo de
colar de pérolas......................................................................................................... 72
Tabela 7. Parâmetros para preparação de amostra utilizando o Vitrobot................... 80
Lista de Abreviaturas e Siglas
MG – Micela gigante
NP – Nanopartícula
CTAB – Brometo de hexadeciltrimetilamônio
NaSal – Salicilato de sódio
FeOOH-NPs – Nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III)
DLS – Espalhamento dinâmico de luz
SAXS – Espalhamento de raios X em baixos ângulos
TEM – Microscopia eletrônica de transmissão
Cryo-TEM – Microscopia eletrônica de transmissão em temperaturas criogênicas
HDR – Redução de atrito hidrodinâmico
CMC – Concentração micelar crítica
CPP – Parâmetro de empacotamento crítico
CEVS – Sistema de vitrificação em ambiente controlado
Lista de Símbolos
𝛾 – Tensão interfacial
𝐴 – Área superficial
𝐺 – Energia livre de Gibbs
𝑉 – Volume da cauda apolar do surfactante
𝑙𝑐 – Comprimento da cauda apolar do surfactante
𝑎0 – Área ocupada pela cabeça polar do surfactante no agregado
𝜇1 – Potencial químico do unímero
𝑔 – Número de moléculas de surfactante em um agregado
𝜇𝑔 – Potencial químico do agregado
𝑓 – Energia livre por molécula
𝑓𝑐 – Contribuição das caudas hidrofóbicas para 𝑓
𝑓ℎ - Contribuição das cabeças polares para 𝑓
𝑓𝑠 – Contribuição da tensão superficial para 𝑓
𝑓0 – Contribuição das forças opostas para 𝑓
𝑎 – Área da cabeça polar do surfactante
𝑔𝑐𝑎𝑝 – Número de moléculas de surfactante nas extremidades da micela gigante
𝜇𝑐𝑎𝑝0 – Potencial químico das moléculas de surfactante nas extremidades da micela
gigante
𝜇𝑐𝑦𝑙0 – Potencial químico das moléculas de surfactante no corpo cilíndrico da micela
gigante
κ-1 – Comprimento de Debye
ζ – Potencial Zeta
𝐴 – Constante de Hamaker
𝑅𝑔 – Raio de Giro
𝑉(ℎ) - Potencial total de interação entre partículas, em função da distância
𝑉𝐴(ℎ) - Potencial de atração entre partículas, em função da distância
𝑉𝑅(ℎ) - Potencial de repulsão entre partículas, em função da distância
𝐼𝑒 – Intensidade de luz espalhada
𝐼0 – Intensidade de luz incidida
𝜂 – Índice de refração relativo
𝑅 – Distância percorrida pela luz até incidir na partícula
𝑑 – Diâmetro da partícula
𝐼(𝑡) – Intensidade de luz espalhada em função do tempo
𝑔(2)(τ) – Função de autocorrelação
𝐷 – Coeficiente de difusão
𝑞 – Vetor espalhamento
𝜏 – Tempo de perda de correlação
𝑅ℎ - Raio hidrodinâmico
𝑃(𝑞) – Fator de forma
𝑆(𝑞) – Fator de estrutura
𝜌 – Densidade eletrônica
𝐷𝑚 – Dimensão fractal de massa
𝐷𝑠 – Dimensão fractal de superfície
Sumário
Capítulo 1: Introdução..............................................................................................19
1.1 Tensão interfacial, surfactantes e agregação.............................................19
1.2 Micelas gigantes........................................................................................23
1.3 Sistemas coloidais e sua estabilidade........................................................27
1.3.1 Repulsão eletrostática................................................................29
1.3.2 Interações de van der Waals.......................................................32
1.3.3 Repulsão estérica.......................................................................33
1.3.4 Teoria DLVO...............................................................................34
1.4 Desenvolvimento e inspiração...................................................................36
Capítulo 2: Objetivos................................................................................................39
Capítulo 3: Visão geral - Preparação e caracterização das nanopartículas de
oxihidróxido de Fe(III)...............................................................................................40
3.1 Parte experimental.....................................................................................40
3.2 Resultados e discussão..............................................................................43
Capítulo 4: Espalhamento dinâmico de luz (DLS)..................................................53
4.1 Fundamentos.............................................................................................53
4.2 Parte experimental.....................................................................................59
4.3 Resultados e discussão..............................................................................60
Capítulo 5: Espalhamento de raios X em baixos ângulos (SAXS)........................65
5.1 Fundamentos.............................................................................................65
5.2 Parte experimental.....................................................................................69
5.3 Resultados e discussão..............................................................................69
Capítulo 6: Microscopia eletrônica de transmissão e em temperaturas
criogênicas (TEM e Cryo-TEM)................................................................................76
6.1 Fundamentos.............................................................................................76
6.2 Parte experimental.....................................................................................79
6.3 Resultados e discussão..............................................................................81
Capítulo 7: Reologia – Redução de atrito hidrodinâmico (HDR)...........................88
7.1 Fundamentos.............................................................................................88
7.2 Parte experimental.....................................................................................92
7.3 Resultados e discussão..............................................................................93
Capítulo 8: Conclusões............................................................................................97
Referências bibliográficas.......................................................................................98
19
Capítulo 1
Introdução
1.1 Tensão interfacial, surfactantes e agregação
Diversas interações e reações químicas ocorrem na interface dos sistemas,
o que torna seu estudo de grande importância.1–3 As moléculas presentes na interface
realizam menor número de interações entre si quando comparada às moléculas no
interior da fase, tornando a interface uma região de maior energia.4 Como os sistemas
sempre tendem ao mínimo de energia, a tendência é diminuir a energia da interface.
Isso é possível reduzindo-se a área interfacial, uma vez que uma menor quantidade
de moléculas apresentará energia maior. Essa redução da área interfacial para
minimização da energia livre é o que dá o formato arredondado para gotas de água,
por exemplo.5
A tensão interfacial (𝛾) relaciona a área superficial (𝐴) com a energia livre
de Gibbs (𝐺), como mostrado na Equação 1. Esta mostra que para haver o aumento
da área interfacial deve haver um aumento da energia livre, se 𝛾 for mantida
constante6.
𝛾 = (𝜕𝐺
𝜕𝐴)𝑇,𝑃
(1)
Surfactantes são capazes de diminuir a tensão superficial porque são
moléculas anfifílicas, isto é, apresentam uma região apolar, devido à presença de uma
cadeia hidrofóbica, e uma região polar (Figura 1). Eles podem ser divididos em 4
classes: surfactantes aniônicos, catiônicos, zwitteriônicos e não iônicos.
Figura 1. Representação de uma molécula de surfactante.
20
Os surfactantes aniônicos são aqueles em que o grupo polar apresenta
carga negativa. São os mais utilizados industrialmente por serem de fácil obtenção e
apresentarem baixo custo de produção. Os grupos polares mais utilizados para esse
tipo de surfactante são os carboxilatos, sulfatos e fosfatos. Já os surfactantes
catiônicos são caracterizados por apresentarem carga positiva no grupo polar, sendo
os grupos catiônicos mais comuns as aminas e os sais de amônio quaternário. A
maioria das superfícies, tais como metais, minerais, plásticos, fibras e membranas
celulares, são negativamente carregadas e os surfactantes catiônicos são muito
utilizados pela tendência em adsorver em tais superfícies.6 Eles são extensivamente
usados como agentes dispersantes, condicionadores de cabelo e bactericidas, por
exemplo.6
Surfactantes zwitteriônicos são caracterizados pela presença de ambas as
cargas na parte polar (tanto a positiva quanto a negativa). Os grupos mais comumente
utilizados são amônio e carboxilato, tendo alta dependência com o pH e se
comportando como surfactantes não iônicos no ponto isoelétrico. São muito utilizados
em shampoos e produtos cosméticos devido a suas propriedades dermatológicas e
baixa irritação dos olhos. Por fim, os surfactantes não iônicos são aqueles que
apresentam grupos polares sem cargas, constituídos principalmente por cadeias
poliéter.6 Cada um dos tipos de surfactante citados acima estão exemplificados na
Figura 2.
Figura 2. Exemplos de surfactantes aniônicos, catiônicos, não iônicos e zwitteriônicos.
Para entender como a diminuição da tensão superficial ocorre, tomamos
como exemplo surfactantes em solução aquosa (o qual será estudado neste trabalho).
À medida que moléculas de surfactante são adicionadas à água, uma parte dessas
21
estarão em solução, como unímeros, enquanto outra parte irá se posicionar na
superfície, com o grupo hidrofóbico interagindo com o ar e o grupo hidrofílico
interagindo com a água (Figura 3A e B). Esse comportamento na interface ocorre
porque desidratação das cadeias hidrofóbicas do surfactante é energeticamente
favorável, pois libera moléculas de água que antes estavam solvatando a cadeia para
o interior da solução, adquirindo mais graus de liberdade. Essa liberação de moléculas
de água para o interior da solução é conhecido como efeito hidrofóbico e proporciona
um ganho entrópico ao sistema. Uma vez que a energia coesiva das moléculas de
água é maior que de cadeias de hidrocarbonetos, a adsorção de moléculas de
surfactantes na interface resultará em uma diminuição da tensão interfacial.6,4
Figura 3. Mecanismo de redução da tensão superficial pelo surfactante (A e B) e início
da agregação das moléculas (C).
Esse efeito de redução da tensão interfacial é observado até uma
determinada concentração de surfactante, chamada de concentração micelar crítica
(CMC), a partir da qual as moléculas de surfactante presentes no interior da solução
passarão a se associar formando agregados micelares6 (Figura 3C). A força motriz
para que ocorra essa agregação é novamente o efeito hidrofóbico, que leva à
formação de estruturas nas quais as cadeias de hidrocarbonetos ficarão na parte
interna da estrutura e o grupo polar na parte externa, em contato com o meio aquoso.
O ganho entrópico da liberação das moléculas de água supera a perda entrópica da
agregação das moléculas de surfactante e a associação é energeticamente
favorável.6
A agregação dos surfactantes pode resultar em estruturas de diferentes
geometrias, como mostrado na Figura 4.
22
Figura 4. Algumas estruturas que podem ser formadas a partir da agregação de
surfactantes. Adaptado de 6.
Um fator importante para a agregação de surfactantes é a geometria da
molécula. Esse fator pode ser dimensionado através do Parâmetro de
Empacotamento Crítico (CPP), dado pela Equação 2. Esse parâmetro relaciona a área
da parte hidrofóbica com a área da parte hidrofílica da molécula.
𝐶𝑃𝑃 =𝑉
𝑎0𝑙𝑐 (2)
Sendo 𝑉 e 𝑙𝑐 o volume e o comprimento da cauda apolar, respectivamente
e 𝑎0 é a área ocupada pela cabeça polar,7 como mostrado na Figura 5.
Figura 5. Parâmetros de empacotamento das moléculas de surfactante. Adaptado de
8.
23
Esse parâmetro é utilizado como um guia para prever as possíveis
geometrias dos agregados, levando em consideração características do surfactante
em questão. Para valores de CPP < ⅓, a geometria da molécula de surfactante se
assemelha a um cone, o que favorece a formação de agregados esféricos. Quando ⅓
< CPP < ½, obtemos a geometria de um cone truncado, resultando na formação de
micelas alongadas ou fase hexagonal. Por outro lado, quando o parâmetro de
empacotamento crítico é próximo de 1, temos as fases lamelares e bicontínuas.8,9 As
formas geométricas das moléculas de surfactante de acordo com cada valor de CPP
são mostradas na Figura 6.
Figura 6. Áreas hidrofílicas e hidrofóbicas previstas pelo Parâmetro de
Empacotamento Crítico. Adaptado de 8.
A área polar do surfactante pode ser modificada e pode-se induzir a
mudanças no CPP da molécula. Para surfactantes iônicos essa mudança ocorre a
partir de mudanças na força iônica do meio. Uma maior quantidade de contra íons
causa a blindagem das cargas das moléculas de surfactantes, causando uma redução
da área efetiva do grupo polar. Para surfactantes não iônicos, pode-se provocar tais
mudanças a partir de variações de temperatura da solução.8
1.2 Micelas Gigantes
Micelas gigantes são estruturas cilíndricas alongadas que apresentam raio
da secção transversal próximo ao raio de uma micela esférica e seu comprimento
pode chegar a ordem de micrômetros.9 As terminações de cada micela gigante são
compostas por hemisférios, ou seja, as pontas das micelas gigantes apresentam
estrutura de metade de uma micela esférica. É esperado que ocorra a formação da
24
micela gigante com ⅓ < CPP < ½, ou seja, as moléculas de surfactante devem ter
geometria aproximada de um cone truncado.10
O aumento da concentração de surfactante pode levar ao crescimento
unidimensional das micelas, formando as micelas gigantes, neste caso, devido ao
aumento da concentração de contraíons. Essas também podem ser obtidas em baixas
concentrações de surfactante, para isso, pode-se adicionar sais inorgânicos que
atuarão na superfície da micela: os íon de carga contrária à do surfactante irão
adsorver na superfície da micela, blindando as cargas dos grupos polares dos
surfactantes, diminuindo a repulsão eletrostática e diminuindo a área efetiva da parte
polar. Como consequência, há a alteração do CPP e a formação de micelas de
geometrias alongadas.9,11 Outro recurso muito utilizado é a adição de sais que
possuem anéis aromáticos. Além da carga do sal provocar o mesmo efeito de
blindagem de cargas, explicado anteriormente, o anel aromático, hidrofóbico, irá se
inserir entre as cadeias dos surfactantes, devido ao efeito hidrofóbico. No caso de
surfactantes contendo grupos amônios, a micela gigante também é estabilizada pela
interação do tipo ácido-base (interação cátion-π) entre a cabeça do surfactante e o
anel aromático. Esses sais aromáticos são comumente chamados de cossolutos.12
Na Figura 7 é mostrada uma representação de como as moléculas de
cossoluto e surfactante se arranjam na estrutura da micela gigante.
25
Figura 7. Representação da interação de moléculas de surfactante com as moléculas
de cossoluto (representadas pelos íons salicilato) na formação de micelas gigantes.
A formação das micelas gigantes também pode ser abordada do ponto de
vista termodinâmico. Em uma solução contendo moléculas de surfactante e água, sem
a adição de cossolutos, o potencial químico de um unímero 𝜇1 é o mesmo da molécula
do surfactante que esteja em um agregado contento 𝑔 moléculas de surfactante (𝜇𝑔),
como indicado na Equação 3.13
𝜇1 = 𝜇𝑔
𝑔 (3)
Em um agregado específico com 𝑔 moléculas de surfactante, a energia livre
por molécula será dada pela Equação 4.14
𝜇𝑔
𝑔= 𝑓 = 𝑓𝑐 + 𝑓ℎ + 𝑓𝑠 (4)
Sendo que 𝑓𝑐, 𝑓ℎ e 𝑓𝑠 estão associados com as contribuições hidrofóbicas
da cadeia do surfactante, com a repulsão das cabeças polares e com a tensão
superficial, respectivamente.
26
O modelo das forças opostas (forças que tendem a agregar formando
micelas e forças que tendem à desagregar a micela) separa as contribuições para a
energia livre, ignorando a contribuição do empacotamento das cadeias. Se
desconsiderarmos as contribuições hidrofóbicas da cadeia e considerarmos somente
a repulsão entre as cabeças polares e a tensão superficial, então a energia livre por
molécula passa a ser representada pela Equação 5.
𝑓0 = 𝑓ℎ + 𝑓𝑠 (5)
A partir da Equação 5, pode-se derivar a expressão mostrada na Equação
6.14
𝑓0 = 𝛾𝑎 (1 −𝑎0
𝑎)2
(6)
Sendo 𝛾 a tensão interfacial existente entre a camada hidrofóbica do
surfactante e a água, 𝑎 é a área da cabeça iônica e 𝑎0 a área da cabeça iônica quando
posicionada em um determinado agregado. Quando 𝑎0 = 𝑎, o valor de 𝑓0 é minimizado.
Porém, nas micelas gigantes, as moléculas nas extremidades hemisféricas não
conseguem adotar a conformação 𝑎0 = 𝑎, possuindo, então, maior energia.
As micelas gigantes podem ser divididas em duas partes: o corpo cilíndrico
e duas extremidades hemisféricas. Desta forma, o potencial químico da micela gigante
𝜇𝑔0 , com 𝑔 moléculas será dado pela Equação 7.13
𝜇𝑔0 = (𝑔 − 𝑔𝑐𝑎𝑝)𝜇𝑐𝑦𝑙
0 + 𝑔𝑐𝑎𝑝𝜇𝑐𝑎𝑝0 (7)
Onde 𝑔𝑐𝑎𝑝 é o número de moléculas de surfactante nas duas extremidades
hemisféricas, (𝑔 − 𝑔𝑐𝑎𝑝) o número de moléculas de surfactante no corpo cilíndrico da
micela gigante e, 𝜇𝑐𝑎𝑝0 e 𝜇𝑐𝑦𝑙
0 são os potenciais químicos das moléculas do surfactante
nas extremidades e no corpo cilíndrico da micela gigante, respectivamente.
A micela gigante irá crescer quando a contribuição de 𝑔𝑐𝑎𝑝𝜇𝑐𝑎𝑝0 exceder a
energia térmica (𝑘𝐵𝑇). Para micelas gigantes formadas por surfactantes não iônicos,
𝑔𝑐𝑎𝑝𝜇𝑐𝑎𝑝0 pode ser interpretado como a energia necessária para quebrar a micela em
27
duas partes, ou seja, a energia necessária para a criação de duas extremidades.
Surfactantes iônicos apresentam uma abordagem mais complexa, pois, embora a
energia das extremidades favoreça o crescimento micelar, a repulsão das cargas ao
longo da cadeia micelar favorece a quebra dessas micelas. Isto se deve ao fato de
que a repulsão é menor na região de maior curvatura da micela gigante, que no caso
são suas extermidades.13 Por esta razão, a adição de sais inorgânicos e determinados
cossolutos aromáticos leva ao crescimento micelar.
As micelas gigantes são extensivamente estudadas e apresentam diversas
aplicações: produtos de limpeza e cuidados pessoais, e no campo de exploração de
petróleo, por exemplo.10,15
1.3 Sistemas coloidais e sua estabilidade
Agregados micelares, devido às suas dimensões, podem ser classificados
como sistemas coloidais. Coloides são sistemas formados por macromoléculas ou
partículas dispersas em um meio, no qual pelo menos uma das dimensões da fase
dispersa esteja na dimensão nanométrica, ou seja, entre 1 e 1000 nm.16
O uso de coloides pelo homem remete a tempos remotos, tais como os
registros mais antigos que se tem da civilização, como por exemplo, pigmentos
estabilizados coloidalmente utilizados na pintura de cavernas na idade da pedra, ou
ainda em registros escritos de faraós. Em 1845, Francesco Selmi descreveu pela
primeira vez exemplos de partículas coloidais, utilizando soluções aquosas dispersas
de cloreto de prata e azul da Prússia. Em meados de 1850, Michael Faraday estudou
dispersões de ouro coloidais e notou que estas eram termodinamicamente instáveis,
porém, apresentavam estabilidade cinética, podendo permanecer estáveis por longos
períodos.17
Sistemas coloidais desempenham um papel fundamental na química. A
partir de suspensões coloidais de pólen, por exemplo, foi possível se observar o
movimento browniano, que é muito importante no desenvolvimento de outros
conceitos.17 Nos dias atuais, sistemas coloidais estão presentes em diversos produtos
e tecnologias utilizadas com bastante frequência. Na Tabela 1 são mostrados alguns
tipos de coloides e exemplos encontrados no dia a dia.16,18
28
Tabela 1. Classificação dos coloides de acordo com a fase dispersa e meio de
dispersão.16,18
Fase dispersa
Meio de dispersão
Tipo de coloide
Exemplos
Líquido Gás Aerossol líquido
Névoas, sprays líquidos
Sólido Gás Aerossol
sólido Fumaça, poeira
Gás Líquido Espuma Espumas em soluções de sabões, em
extintores de incêndio
Líquido Líquido Emulsão Leite, maionese
Sólido Líquido Sol,
suspensão coloidal
Tintas, pasta de dente
Gás Sólido Espuma sólida Poliestireno expandido
Líquido Sólido Emulsão
sólida Opala, pérola
Sólido Sólido Suspensão
sólida Plásticos e vidros pigmentados
Os sistemas coloidais podem ser divididos em três tipos: dispersões
coloidais, soluções verdadeiras de macromoléculas e coloides de associação.16
As dispersões coloidais são sistemas heterogêneos compostos por duas
fases ou mais, como mostrado na Tabela 1, e estes sistemas são
termodinamicamente instáveis, devido à sua alta energia livre superficial.16 Em uma
dispersão coloidal, a área interfacial da fase dispersa é muito grande, o que demanda
uma grande energia para mantê-la dispersa, como mostrado na equação 1. Na
tentativa de minimizar a energia livre da superfície, o sistema tende a minimizar a área,
a partir da agregação da fase dispersa.
As soluções verdadeiras de macromoléculas são sistemas coloidais
termodinamicamente estáveis, ou seja, não separará fase. Soluções poliméricas são
exemplos dessa classe de coloides.16
Por fim, os coloides de associação, que também são termodinamicamente
estáveis, são formados pela associação de moléculas de surfactantes, ou seja,
agregados micelares.16
Dependendo da afinidade entre as partículas de uma dispersão e o meio
em que estas estão dispersas, podemos classificar os coloides de duas maneiras:
coloides liofílicos e liofóbicos. Os coloides liofílicos são aqueles nos quais a superfície
das partículas apresentam afinidade com o solvente, mantendo a dispersão mais
29
estável e minimizando a agregação. Os coloides liofóbicos, por outro lado, são
aqueles em que as partículas tem maior interação entre si, o que acaba levando à um
rápido processo de agregação.16 A estabilidade de uma dispersão ou solução de
macromoléculas pode ser termodinâmica ou cinética e uma das maneiras de se
compreender a diferença entre elas é quanto ao tempo de estabilização do coloide.
Enquanto um coloide termodinamicamente estável permanecerá inalterado por um
tempo infinito (mantendo inalteradas propriedades como temperatura e concentração,
por exemplo), coloides cineticamente estáveis tendem a se agregar com o tempo,
mesmo mantendo-se todas as propriedades que podem afetar a estabilidade.
O estudo da química coloidal viabiliza alterar o tempo no qual o coloide é
estável cineticamente. As interações entre as partículas que compõe uma dispersão
e o meio dispersante são fundamentais para entender a estabilidade coloidal. Essas
interações incluem forças de repulsão eletrostática, van der Waals e repulsão estérica,
por exemplo.
1.3.1 Repulsão Eletrostática
Muitos compostos apresentam grupos carregados em sua superfície, que
lhes conferem uma carga superficial. A carga líquida na superfície desses compostos
atrai as espécies de carga oposta que estão próximas, formando uma dupla camada
elétrica.
Os primeiros estudos realizados a fim de compreender a formação da dupla
camada elétrica foram desenvolvidos por Helmholtz. Em sua teoria, Helmholtz dizia
que os íons da vizinhança formam uma camada compacta, que interage fortemente
com a superfície carregada do composto. Porém, a teoria não leva em consideração
a interação de íons em distâncias além da camada compacta.19
Posteriormente, Gouy e Chapman propuseram um modelo de dupla
camada elétrica que leva em consideração a mobilidade térmica dos íons. Os íons
dispersos nas proximidades da superfície carregada são atraídos, devido ao campo
elétrico formado, mas flutuações térmicas e efeitos entrópicos levam esses íons a
ficarem mais dispersos próximos à superfície carregada. Esses fatores são
responsáveis pela formação de uma camada difusa, a concentração dos íons diminui
gradativamente conforme se distancia da superfície. Na teoria de Gouy-Chapman não
30
é levado em consideração o tamanho dos íons, eles são tratados apenas como cargas
pontuais e, assim como a teoria de Helmholtz, a teoria Gouy-Chapman também
apresenta algumas falhas, como a não previsão da inversão de sinal do potencial.20 A
Figura 8 mostra uma representação das camadas iônicas formadas na Teoria de
Helmholtz (Figura 8a) e na Teoria de Gouy-Chapman (Figura 8b).
Figura 8. Representação dos modelos de associação dos íons com a superfície de
uma partícula: a) Modelo de Helmholtz e b) Modelo de Gouy-Chapman. Adaptado de
20.
Stern combinou as teorias de Helmholtz e Gouy-Chapman para propor a
teoria que é atualmente aceita. Nessa teoria, os íons do meio se distribuem em uma
camada compacta próxima à superfície da partícula (camada de Stern) e logo em
seguida em uma camada difusa. O modelo de Stern leva em consideração o tamanho
dos íons, uma vez que a quantidade de íons adsorvidos na superfície e a espessura
da camada formada dependem de fatores como a polarizabilidade dos íons. Quanto
mais polarizável esse íon, menor será a espessura da dupla camada. A espessura da
dupla camada elétrica é da ordem de κ-1, conhecido como comprimento de Debye.
Se a polarizabilidade dos íons e a interação com a superfície forem muito
grandes, pode ocorrer uma inversão do sinal do potencial medido no sistema. Essa
inversão não poderia ser explicada pelos modelos de Helmholtz e Gouy-Chapman.17,20
A Figura 9 mostra um esquema da dupla camada elétrica, segundo Stern.
31
Figura 9. Representação da dupla camada elétrica de Stern de uma superfície
carregada positivamente. Reproduzido de 16.
Quando a partícula se movimenta, os íons mais fortemente ligados irão se
movimentar junto à superfície. Isso irá provocar uma superfície de cisalhamento, e o
potencial medido nesse plano é chamado de potencial zeta (ζ). A superfície de
cisalhamento ocorre em uma região da camada difusa, como pode ser observado na
Figura 9.
A formação da camada difusa pode ser explicada em termos da entropia
de distribuição dos contraíons adsorvidos na superfície da partícula. A ligação dos
íons à superfície minimiza a energia, mas, por outro lado, deixar os íons dispersos
resulta em um aumento da entropia, que provoca a diminuição da energia livre. Seria
necessária muita energia para separar inteiramente os íons fortemente ligados à
superfície, e portanto, a camada de Stern é formada. A distribuição dos íons na dupla
camada elétrica resulta do melhor compromisso entre o efeito entálpico e entrópico.17
As interações eletrostáticas entre cargas de mesmo sinal ou entre uma
superfície carregada e outra neutra têm caráter repulsivo. Quando uma superfície
neutra se aproxima de outra carregada, os íons da dupla camada elétrica ficarão
confinados no espaço entre as superfícies, portanto a entropia desses íons irá
diminuir, evitando que as duas superfícies se aproximem mais. Quando duas
superfícies carregadas com o mesmo sinal se aproximam, ocorre um mecanismo
semelhante ao explicado anteriormente. Com a aproximação, as duplas camadas
32
elétricas de cada superfície se sobrepõem, a concentração de íons aumenta em um
mesmo espaço, portanto a entropia diminui, causando a repulsão.17
Por outro lado, a aproximação de partículas de cargas opostas é de
natureza atrativa. Uma superfície atua como um enorme contraíon para a outra
superfície e os contraíons originalmente ligados às superfícies serão liberados para o
interior da solução, proporcionando aumento da entropia.17
1.3.2 Interações de van der Waals
Interações de van der Waals compreendem interações não eletrostáticas.
Essas interações podem ser classificadas em 3 tipos: interações dipolo-dipolo
(Keeson), interações dipolo-dipolo induzido (Debye) e as interações dipolo induzido-
dipolo induzido (London):
Interações dipolo-dipolo (Keeson) ocorrem entre moléculas polares, na
qual o dipolo positivo de uma molécula interage com o dipolo negativo de outra
molécula.16
Interações dipolo-dipolo induzido (Debye) também necessitam a presença
de uma espécie polar. Essa espécie irá induzir uma polarização da nuvem eletrônica
da outra molécula (apolar), causando um dipolo induzido e provocando a atração entre
elas.16
Interações dipolo induzido-dipolo induzido (London), também conhecidas
como forças de dispersão, ocorrem devido às flutuações de distribuição de cargas nas
moléculas, provocando a formação de um dipolo, que irá interferir em outra molécula.
As interações de London são as que mais contribuem para a interação de van der
Waals, uma vez que não é necessário que as moléculas envolvidas sejam polares.
Portanto, todas as moléculas apresentam esse tipo de interação.16
As interações de London explicam as interações de van der Waals em
quase todas as situações, exceto naquelas em que as moléculas são muito polares.
Essas interações de London tem curto alcance (da ordem de 1 𝑑6⁄ , sendo 𝑑 a distância
entre as moléculas).21
Quando se trata de partícula, a abordagem das interações de van der
Waals é semelhante àquela entre moléculas: a energia das interações de van der
Waals é proveniente da integração do potencial de todas as moléculas que a
33
constitui.21 Essa aproximação foi proposta por Hamaker, e o potencial da força de
London pode ser estimado pela equação 8, considerando que as partículas estão
separadas por uma distância menor que seu raio. Com isso, as interações passam de
curto alcance para longo alcance (da ordem de 𝐷-1). 21,8
𝑉𝐴 = −𝐴𝑅
12𝐷 (8)
Sendo 𝑉𝐴 o potencial da força de London, 𝐴 a constante de Hamaker, 𝑅 o
raio da partícula e 𝐷 a distância entre as partículas, considerando-as esféricas.
As interações de van der Waals entre duas partículas serão sempre
atrativas se as partículas estudadas forem constituídas do mesmo material, não
importando o meio em que estão. Se as partículas têm natureza diferente, as
interações de van der Waals podem ser atrativas ou repulsivas.8,17 No estudo de
dispersões coloidais, o foco é, na sua grande maioria, a interação de partículas de
mesma natureza. Por isso consideraremos as interações de van der Waals como
interações atrativas.
1.3.3 Repulsão Estérica
Para aumentar a estabilidade de uma dispersão coloidal pode ser usado o
efeito estérico de macromoléculas, para impedir que as partículas agreguem. É
adicionado um estabilizante, um polímero, por exemplo, que irá adsorver na superfície
da partícula. As camadas hidrodinâmicas formadas por essas macromoléculas irão se
sobrepor conforme as partículas se aproximam, sendo que a distância de separação
entre elas é da ordem de 2𝑅𝑔, sendo 𝑅𝑔 o raio de giro das macromoléculas. Esta
distância, que pode ser da ordem de 10 a 100 nm, é muito grande e os efeitos das
forças de van der Waals e da dupla camada elétrica podem ser negligenciados.
Portanto, nesta condição, a força dominante entre as partículas envolve a
sobreposição entre os polímeros.17,22
Se a macromolécula adsorvida está em um bom solvente, suas cadeias se
expandem. Quando ela encontra uma cadeia proveniente de outra partícula, ocorre
uma restrição da conformação de ambas as cadeias no volume entre as duas
partículas, causando uma diminuição na entropia configuracional e,
34
consequentemente, um aumento da energia livre. Para minimizar esse efeito, as
cadeias das macromoléculas de repelem, provocando um efeito repulsivo entre as
partículas e impedindo a agregação.17 Na Figura 10 é mostrado uma representação
do efeito estérico provocado pela presença de macromoléculas adsorvidas na
superfície das partículas.
Figura 10. Representação esquemática da estabilização pelo efeito estérico de
macromoléculas adsorvidas na superfície da partícula. Reproduzido de 22.
1.3.4 Teoria DLVO
Na década de 1940, Boris Derjaguin e Lev Landau, na União Soviética, e
Evert Verwey e Theo Overbeek, na Holanda, deram uma contribuição importante para
a ciência dos coloides, eles divulgaram independentemente que as interações de
longo alcance entre partículas são as principais responsáveis pela estabilização
coloidal, ou seja, as interações de van der Waals e as interações eletrostáticas. Essa
teoria foi denominada teoria DLVO, em homenagem aos seus criadores.17,23
Através das forças atrativas e repulsivas, pode ser gerado um gráfico da
energia potencial de interação entre duas partículas em função da distância entre elas,
como pode ser observado na Figura 11. A curva correspondente à repulsão
eletrostática leva ao aumento da energia potencial, enquanto a curva de atração leva
à minimização da energia do sistema.
35
Figura 11. Diagrama representando as energias de atração e repulsão das partículas
em um sistema coloidal em função da distância. Adaptado de 23.
A energia potencial de interação total é dada pela somatória dos potenciais
de atração e repulsão, como mostrado na equação 9.
𝑉(ℎ) = 𝑉𝐴(ℎ) + 𝑉𝑅(ℎ) (9)
Sendo que 𝑉(ℎ) é o potencial total do sistema em função da distância, 𝑉𝐴(ℎ)
é o potencial de atração em função da distância e 𝑉𝑅(ℎ) é o potencial de repulsão em
função da distância.
As forças atrativas dominam o potencial de interação em distâncias muito
grandes ou muito pequenas. Conforme as partículas se aproximam pelo movimento
browniano, as interações atrativas de van der Waals atuam e as partículas ficam
aprisionadas em um mínimo secundário de energia, onde ocorre a floculação das
mesmas. A floculação é um processo reversível e as partículas podem ser
redispersas. Em distâncias intermediárias, as forças repulsivas atuam, formando uma
barreira energética para a aproximação das partículas. Se o sistema possuir energia
suficiente para ultrapassar essa barreira da repulsão eletrostática, as forças atrativas
de van der Waals predominam e as partículas se aproximam ainda mais, alcançando
o mínimo primário de energia, no qual ocorre a coagulação irreversível dessas
partículas.17,23
36
A altura da barreira energética, proveniente da repulsão eletrostática, pode
ser modificada a partir da espessura da dupla camada elétrica. Quanto maior a
concentração de íons em solução, a carga da partícula será mais blindada e a dupla
camada elétrica terá uma espessura menor. Isso permite que as partículas se
agreguem mais facilmente.17
1.4 Desenvolvimento e inspiração
O 2-hidróxi benzoato de sódio, também conhecido como salicilato de sódio
(NaSal), é muito utilizado como cossoluto do surfactante CTAB em meio aquoso,
formando um dos sistemas de micelas gigantes mais estudados.24–26
Também é conhecido na literatura que íons salicilato complexam com íons
Fe3+, formando os complexos descritos nas reações 1, 2 e 3.27,28
𝐹𝑒(𝐼𝐼𝐼)(𝑎𝑞) + 𝐻2𝑆𝑎𝑙(𝑎𝑞) ⇌ [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)]+(𝑎𝑞)
+ 2𝐻(𝑎𝑞)+ (1)
𝐹𝑒(𝐼𝐼𝐼)(𝑎𝑞) + 2𝐻2𝑆𝑎𝑙(𝑎𝑞) ⇌ [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)2]−(𝑎𝑞)
+ 4𝐻(𝑎𝑞)+ (2)
𝐹𝑒(𝐼𝐼𝐼)(𝑎𝑞) + 3𝐻2𝑆𝑎𝑙(𝑎𝑞) ⇌ [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)3]3−(𝑎𝑞)
+ 6𝐻(𝑎𝑞)+ (3)
Amirov e colaboradores28,27 mostraram que a obtenção desses complexos
depende do pH do meio, como mostrado na Tabela 2.
Tabela 2. Valores de pH de formação de cada complexo de Fe(III) e salicilato.
Complexos pH
[𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)]+ < 3
[𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)2]− 4 - 8
[𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)3]3− > 9
O NaSal atua como um quelante bidentado, sendo que em pH menor que
3, apenas 1 molécula de salicilato se liga ao ferro, formando um complexo roxo. Em
pH intermediário, o complexo é formando por 2 moléculas de NaSal ligadas ao metal,
formando um complexo de coloração vermelho-alaranjado e em pH maior que 9, há a
formação do complexo com 3 ligantes NaSal, que apresenta coloração amarela.28,27
Na Figura 12 é mostrado uma imagem com os complexos citados.
37
Figura 12. Foto das soluções dos complexos de ferro(III) e salicilato: [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)](𝑎𝑞)+
(roxo, à esquerda), [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)2](𝑎𝑞)− (vermelho, ao centro) e [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)3](𝑎𝑞)
3− (amarelo, à
direita). Na preparação das soluções as concentrações de Fe(III) e salicilato foram
mantidas fixas em 0,5 e 23 mmol L-1, respectivamente.
No cenário em que as espécies CTAB, salicilato e Fe(III) estão presentes,
pode-se supor que uma competição irá se estabelecer entre as micelas de CTAB e os
íons Fe(III) pelas moléculas de salicilato. Quando a concentração de NaSal não for
alta o suficiente para deslocar o equilíbrio dessa competição para a formação dos
complexos [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)2]− e [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)3]
3−, ao se elevar o pH até próximo de 7, espera-se
que ocorra a formação de partículas. O mecanismo proposto para a formação das
partículas de oxihidróxido de Fe(III), sendo chamadas neste trabalho por FeOOH-NPs,
a partir da adição de base em uma solução aquosa ácida de Fe3+ é mostrado na
reação 4.29
𝐹𝑒3+𝑂𝐻−
→ 𝐹𝑒(𝑂𝐻)2+ → [𝐹𝑒(𝑂𝐻)3−𝑥
𝑥+ ]𝑛𝑂𝐻−
→ 𝐹𝑒𝑂𝑥(𝑂𝐻)3−2𝑥𝑒𝑛𝑣𝑒𝑙ℎ𝑒𝑐𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜→ 𝛼 − 𝐹𝑒𝑂𝑂𝐻 (4)
Os oxihidróxidos de Fe(III), denominados FeOOH, incluem diversos
minerais, entre eles a lepidocrocita, goethita e a ferrihidrita, que é um oxihidróxido em
uma forma mais hidratada, entre outros polimorfos.30
Neste sistema também é possível observar a formação de MG, que são
responsáveis por garantir a estabilidade cinética das nanopartículas obtidas. A
presença de MG pode ser facilmente detectada pela agitação do frasco e observação
38
do movimento das bolhas formadas. Em algumas proporções de [CTAB]/[NaSal],
devido à viscoelasticidade característica das micelas gigantes, as bolhas se movem
no sentido do movimento e, quando o movimento cessa, as bolhas retornam o
movimento no sentido oposto, caracterizando em um movimento elástico.31
39
Capítulo 2
Objetivos
De maneira geral, o objetivo deste trabalho envolveu investigar o
mecanismo pelo qual ocorre a estabilização coloidal de nanopartículas de oxihidróxido
de Fe(III), formadas in situ, utilizando micelas gigantes como agente estabilizante.
Para viabilizar esse estudo, teve-se como objetivos específicos a caracterização das
nanopartículas obtidas (natureza, forma e tamanho). Também foi objetivo deste
trabalho o estudo comparativo de soluções de micelas gigantes com e sem
nanopartículas de oxihidróxido de Fe(III), a fim de avaliar sua interferência no
comportamento das micelas gigantes e propor um modelo no qual as micelas gigantes
e NPs se associam. Para tal, medidas de espalhamento de radiação (DLS e SAXS) e
microscopia eletrônica de transmissão (TEM e Cryo-TEM) foram as principais técnicas
utilizadas.
40
Capítulo 3
Visão geral - Preparação e caracterização das nanopartículas de oxihidróxido
de ferro(III)
Como mencionado no capítulo anterior, o ajuste do meio de ácido para
neutro/levemente básico em soluções contendo CTAB, salicilato e Fe(III) produz
nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III). Como será mostrado, as micelas gigantes
tem um papel central em manter essas nanopartículas dispersas. Neste capítulo serão
apresentados os procedimentos experimentais usados na preparação das
nanopartículas e alguns dos resultados relacionados com a caracterização das
mesmas.
3.1 Parte experimental
Reagentes e preparo de amostra
Para a síntese de todas as amostras estudadas no presente trabalho foram
utilizados os seguintes reagentes, como recebidos: brometo de
hexadeciltrimetilamônio (CTAB), >98%, Sigma Aldrich; 2-hidróxi-benzoato de sódio
(salicilato de sódio – NaSal), >99,5%, Sigma Aldrich; cloreto de ferro(III) hexahidratado
(FeCl3.6H2O), 98-102%, Sigma Aldrich, hidróxido de sódio, >98%, Sigma Aldrich;
ácido clorídrico, 37%, Sigma Aldrich. As estruturas do CTAB e NaSal estão mostradas
na Figura 13.
Figura 13. Estruturas moleculares dos reagentes utilizados.
Foram feitas soluções estoques de 100 mmol L-1 de CTAB, NaSal e FeCl3,
sem ajuste de pH. Estas soluções foram usadas para obter soluções contendo
41
3 mmol L-1 de salicilato de sódio, 1 mmol L-1 de FeCl3 e concentração de CTAB
variando de: 0; 0,5; 1; 1,5; 2; 2,5; 3; 3,5; 4; 5; 6 e 8 mmol L-1. As discussões serão
feitas utilizando a razão de [CTAB]/[NaSal], sendo que para as concentrações citadas
acima, tem-se as razões: 0; 0,16; 0,33; 0,5; 0,66; 0,83; 1; 1,16; 1,33; 1,66; 2 e 2,66,
respectivamente.
As amostras foram preparadas adicionando-se água, solução de FeCl3,
solução de NaSal e solução de CTAB e homogeneizadas com agitação manual ou
utilizando vórtex. Soluções de NaOH 5 mol L-1 e HCl 1 mol L-1 foram utilizadas para
ajustar o pH.
O FeCl3, quando em solução aquosa, sofre hidrólise, o que faz com que o
pH inicial das soluções seja ácido (em torno de 2,5). O pH das soluções foi ajustado
para um faixa entre 7 e 8.
As nanopartículas obtidas foram caracterizadas por espectroscopia Raman
e infravermelho e potencial zeta. Para estas análises foi utilizada uma dispersão
contendo 3 mmol L-1 de CTAB e NaSal e 1 mmol L-1 de FeCl3, pH entre 7 e 8. A
amostra foi dialisada durante 5 dias para retirada da micela gigante do meio, a fim de
evitar interferentes nas análises. Em seguida, a amostra foi secada em dessecador e
analisada. As FeOOH-NPs não dialisadas foram caracterizadas por microscopia
eletrônica de transmissão (TEM).
Descrição das técnicas
Espectroscopia Infravermelho
O espectro vibracional na região do infravermelho foi obtido com um
espectrofotômetro Cary 630, da Agilent, com 64 scans e resolução de 4 cm-1, na faixa
de 4000 a 400 cm- 1.
Espectroscopia Raman
Os espectros de espalhamento Raman foram obtidos em um equipamento
HORIBA Jobin Yvon T64000, com detector CCD resfriado com nitrogênio líquido e
acoplado à um microscópio ótico com resolução espacial de 1,0 μm e resolução
espectral de 1 cm-1. O equipamento utiliza laser de He-Ne (632,8 nm) e foi utilizada a
42
objetiva de 100x e coleta de dados com tempo de exposição de 60 segundos e 3
acumulações.
Potencial Zeta
As medidas de potencial zeta foram realizadas em um equipamento
Malvern Zetasizer nano – ZEN 3600, equipado com laser de He-Ne (λ = 632,8 nm) e
em 3 aquisições. A cubeta utilizada foi a DTS1070 e foi empregada a equação de
Smoluchowski para converter as mobilidades das nanopartículas obtidas em valores
de carga superficial.
Microscopia eletrônica de transmissão (TEM)
As imagens de microscopia eletrônica de transmissão, TEM, foram obtidas
no Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), no CNPEM. O microscópio
utilizado foi o TEM JEOL-1400 PLUS (120 kV), com filamento de Hexaboreto de
Lantânio (LaB6), equipado com câmera Gatan OneView com 4K x 4K pixel (Figura 14)
As amostras utilizadas em TEM apresentam 3 mmol L-1 de CTAB e NaSal (razão
[CTAB]/[NaSal] = 1) e 1 mmol L-1 de FeCl3.
Figura 14. Imagem do microscópio TEM JEOL-1400 PLUS (120 kV) utilizado no
presente projeto.
43
3.2 Resultados e discussão
As nanopartículas de oxihidróxidos ferro(III) utilizadas no presente trabalho
foram obtidas in situ, a partir da neutralização, com NaOH, de soluções aquosas de
cloreto de ferro(III) hexahidratado – FeCl3.6H2O, NaSal e CTAB. Antes do ajuste do
pH, todas as soluções apresentam a coloração roxa, característica da formação do
complexo [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)]+.
Ao ajustar o pH entre 7 e 8, ocorre a formação das FeOOH-NPs e as
soluções passam a apresentar o aspecto mostrado na Figura 15. No frasco 1 não há
formação de micela gigante devido à ausência de CTAB. Nos frascos de 2 a 6, a razão
[CTAB]/[NaSal] é menor que 1, ou seja, a concentração de NaSal é maior que de
CTAB. O frasco 7 apresenta [CTAB]/[NaSal] = 1 e a micela gigante é dita
estequiométrica. Por fim, nos frascos de 8 à 12, a razão [CTAB]/[NaSal] é maior que
1, portanto a concentração de CTAB é maior que de NaSal.
É facilmente observado que ocorre a formação de precipitado nos frascos
de 1 a 5. No frasco 1 não foi adicionado CTAB e a precipitação ocorre muito
rapidamente. Na parte posterior dos frascos foram colocados adesivos com as letras
WLM (wormlike micelle) com o objetivo de mostrar que as suspensões de 2 a 5 são
bastante turvas, as suspensões 6 e 7 são levemente turvas, enquanto as suspensões
de 8 a 12 são límpidas. Entretanto, imagens de microscopia evidenciaram a formação
de nanopartículas nestas suspensões, como será descrito detalhadamente no capítulo
6.
44
Figura 15. Fotografias das amostras contendo 1 mmol L-1 de FeCl3, 3 mmol L-1 de
NaSal e variando-se a concentração de CTAB: 1) 0 mmol L-1; 2) 0,5 mmol L-1; 3) 1
mmol L-1; 4) 1,5 mmol L-1; 5) 2,0 mmol L-1; 6) 2,5 mmol L-1; 7) 3 mmol L-1; 8) 3,5 mmol
L-1; 9) 4 mmol L-1; 10) 5 mmol L-1; 11) 6 mmol L-1; 12) 8 mmol L-1. A razão
[CTAB]/[NaSal] está indicada abaixo de cada frasco, na imagem.
O fato de terem sido formadas nanopartículas de oxihidróxidos de ferro(III)
após o ajuste do pH ao invés de complexos de Fe3+ com NaSal ([𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)2]− e
[𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)3]3−) pode ser explicado pela baixa estabilidade destes complexos. Para que
eles sejam obtidos, é necessário utilizar uma grande quantidade de NaSal (23 mmol
L-1), em comparação com Fe3+ (0,5 mmol L-1), para que o equilíbrio seja deslocado no
sentido de formação dos complexos. Em baixas concentrações de NaSal e em meio
com pH levemente ácido e alcalino, podem ser formados hidroxocomplexos, como
mostrado na Reação 5.27
[𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)]+ + 𝐻2𝑂 ⇌ [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)𝑂𝐻] + 𝐻+ (5)
45
Em um meio mais alcalino, o complexo formado na Reação 5 perde o
ligante Sal, como mostrado na Reação 6. Com o tempo, ocorre a precipitação de
hidróxido de ferro(III) - a partir dessas soluções.27
2[𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)𝑂𝐻] + 3𝐻2𝑂 ⇌ [𝐹𝑒2(𝑂𝐻)5]+ + 2𝐻𝑆𝑎𝑙− + 𝐻+ (6)
Pode-se entender porque a formação do Fe(OH)3 é favorecida em
detrimento da formação dos complexos de Fe-Sal a partir dos valores das constantes
de formação dos complexos e da constante do produto de solubilidade do Fe(OH)3,
indicados na Tabela 3.
Tabela 3. Principais reações envolvidas e suas constantes de equilíbrio.
Reação Constante Referência
𝐹𝑒(𝐼𝐼𝐼)(𝑎𝑞) + 𝐻2𝑆𝑎𝑙(𝑎𝑞) ⇌ [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)]+(𝑎𝑞)
+ 2𝐻(𝑎𝑞)+ K1 103 27
𝐹𝑒(𝐼𝐼𝐼)(𝑎𝑞) + 2𝐻2𝑆𝑎𝑙(𝑎𝑞) ⇌ [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)2]−(𝑎𝑞)
+ 4𝐻(𝑎𝑞)+ K2 10-2 27
𝐹𝑒(𝐼𝐼𝐼)(𝑎𝑞) + 3𝐻2𝑆𝑎𝑙(𝑎𝑞) ⇌ [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)3]3−(𝑎𝑞)
+ 6𝐻(𝑎𝑞)+ K3 10-5 27
𝐹𝑒(𝑂𝐻)3(𝑠) ⇌ 𝐹𝑒(𝐼𝐼𝐼)(𝑎𝑞) + 3 𝑂𝐻(𝑎𝑞)− Kps =2.10-39 32
A constante do produto de solubilidade do hidróxido de ferro(III) indica que
o precipitado é pouco solúvel em água. Este fato, aliado aos baixos valores de K2 e
K3, indicam que a formação do Fe(OH)3 é favorecida. O complexo [𝐹𝑒(𝑆𝑎𝑙)]+, por
outro lado, é facilmente obtido em pH baixo e isso é evidenciado pelo valor da sua
constante de formação em relação a dos outros complexos.
A adição de hidróxido de sódio em uma solução de cloreto de ferro(III) leva
à formação de Fe(OH)3, como mostrado na Equação da Tabela 3. Dada a observação
da formação de nanopartículas em meio aquoso e o mecanismo mostrado na Reação
4, pode-se inferir que essas sejam constituídas por uma mistura de hidróxido e
oxihidróxido de ferro(III).
As nanopartículas formadas podem variar em composição química e
estrutural, tamanho, morfologia, coloração e propriedades de superfície dependendo
de parâmetros como concentração dos íons Fe3+, pH, temperatura e natureza dos
46
ânions presentes.33 Por essa razão, a obtenção de FeOOH-NPs foi realizada com
concentração de FeCl3 fixa, à temperatura ambiente e com pH limitado a uma faixa
(entre 7 e 8).
Visando investigar a natureza química dessas nanopartículas, foram feitas
análises de espectroscopia infravermelho e Raman, com amostra de partículas
dialisadas e posteriormente secadas, como descrito no procedimento experimental.
Os espectros de infravermelho e Raman são mostrados na Figura 16 e 17,
respectivamente.
4000 3500 3000 2500 2000 1500 1000 500
20
30
40
50
60
70
80
90
Tra
nsm
itâ
ncia
(%
)
Número de onda (cm-1)
3309
1627
1639
1015
420
Figura 16. Espectroscopia de infravermelho de FeOOH-NPs formadas a partir de uma
solução 3 mmol L-1 de NaSal, 3 mmol L-1 de CTAB e 1 mmol L-1 de cloreto de ferro(III).
O número de onda de algumas bandas estão indicadas no espectro.
A banda larga em torno de 3300 cm-1 está associada ao estiramento do
grupo OH. Espectros de oxihidróxidos de ferro, como a Goethita, Lepidocrocita e
Ferrihidrita, por exemplo, apresentam bandas nessa região e são atribuídas ao
estiramento do grupo OH na superfície do material e no meio.34 A banda em torno de
1015 cm-1 é referente à deformação dos grupos OH no plano e o ombro observado
entre 800 – 900 cm-1 é atribuído à deformação dos grupos OH fora do plano.34 Toda
47
a região entre 600 e 400 cm-1 pode ser atribuída aos estiramentos simétricos e
assimétricos do grupo Fe-O.34
Na Figura 17 são mostrados espectros Raman das nanopartículas obtidas
dialisadas e secadas.
0 200 400 600 800 1000 1200
0
100
200
300
400
500
600
700
Inte
nsid
ad
e
Numero de onda (cm-1)
A
B
C
D
E
F
G
Figura 17. Espectroscopia Raman de amostra de FeOOH-NPs formadas a partir de
uma solução 3 mmol L-1 de NaSal, 3 mmol L-1 de CTAB e 1 mmol L-1 de cloreto de
ferro(III). As diferentes curvas (A-G) são análises de uma mesma amostra em
diferentes pontos da lâmina.
Os espectros apresentados na Figura 17 são referentes à análises da
mesma amostra em pontos diferentes da lâmina. Pode-se perceber que os espectros
apresentam bandas diferentes entre si, o que sugere que a amostra é uma mistura de
diferentes compostos. Dados da literatura indicam que para o mineral Lepidocrocita
(FeOOH), as bandas de maior intensidade são as de número de onda 252 e 379
cm- 1.34 Em quase todos os espectros obtidos foram observadas bandas mais intensas
nesses números de onda característicos. Os dados da literatura referentes à
ferrihidrita (Fe5HO8.4H2O) também podem ser associados aos dados obtidos
experimentalmente, uma vez que as bandas mais intensas estão nos números de
onda de 370 e 710 cm-1.34 A ferrihidrita é um oxihidróxido de Fe(III) de difícil
48
caracterização, uma vez que cada síntese pode resultar em produtos com pequenas
diferenças químicas e estruturais, também podendo formar estruturas pouco
cristalinas. Devido à isto, a determinação da sua composição é dificultada.30
Com as imagens obtidas durante a análise de Raman é possível afirmar
que a amostra é heterogênea, uma vez que há diversos padrões de cores. A imagem
da Figura 18, obtida na região relacionada ao espectro B da análise por Raman, ilustra
essa heterogeneidade.
Figura 18. Imagem obtida da amostra de FeOOH-NPs formadas a partir da diálise de
uma solução 3 mmol L-1 de NaSal, 3 mmol L-1 de CTAB e 1 mmol L-1 de cloreto de
ferro(III) e posteriormente secada, mostrando diferentes padrões de cores e
heterogeneidade.
Os resultados da espectroscopia infravermelho, aliados aos resultados de
espectroscopia Raman, indicam que o material que forma as nanopartículas do
sistema estudado é uma mistura de oxihidróxidos de ferro(III). Deve-se levar em
consideração que o material foi secado antes das análises e esse procedimento pode
ter levado à alterações químicas destas nanopartículas. Os resultados obtidos por
essas técnicas foram utilizados apenas como uma indicação da natureza das
nanopartículas.
Imagens de microscopia eletrônica de transmissão (TEM) foram obtidas a
fim de medir-se o tamanho médio das FeOOH-NPs presentes nas suspensões. Para
49
tal, utilizou-se a solução mostrada no frasco 7 da Figura 15, com concentrações de 3
mmol L-1 de NaSal, 3 mmol L-1 de CTAB e 1 mmol L-1 de cloreto de ferro(III). A partir
da análise em diversos pontos da grade, verificou-se que as FeOOH-NPs possuem
tamanhos em escala nanométrica, entre 3 e 5 nm. Na imagem da Figura 19, é possível
observar as nanopartículas formadas, algumas delas indicadas por setas vermelhas.
Uma discussão mais aprofundada sobre outros resultados obtidos por essa técnica
será feita no capítulo 6.
Figura 19. Imagem obtida por TEM de uma amostra contendo 1 mmol L-1 de FeCl3 e
razão [CTAB]/[NaSal] = 1. As setas vermelhas indicam as nanopartículas de
oxihidróxido de ferro(III).
Como as nanopartículas presentes na suspensão estão em um meio neutro
a levemente alcalino, é de se esperar que haja adsorção de grupos OH- na superfície
das mesmas, levando a uma carga superficial negativa. Para confirmar a carga na
superfície, foi utilizada a técnica de medida do potencial zeta. O gráfico obtido é
mostrado na Figura 20.
50
-50 -25 0 25
0.0
2.0x105
4.0x105
6.0x105
8.0x105
1.0x106
Co
nta
ge
m T
ota
l
Potencial Zeta Aparente (mV)
Figura 20. Gráficos de potencial zeta da amostra dialisada de nanopartículas de
oxihidróxido de ferro(III), como descrito na parte experimental. Os gráficos referem-se
a três diferentes medidas.
Na análise de potencial zeta foi utilizada a mesma amostra que nas
análises de Infravermelho e Raman, porém dispersas em meio aquoso. A diálise é
importante para evitar influências da carga do surfactante, cossoluto e excesso de
contra íons no resultado final. Porém, não se pode afirmar que todo CTAB, salicilato
e contra íons foram retirados do meio. A diálise garante que a MG é quebrada e isso
é observado pela precipitação das FeOOH-NPs presentes na suspensão.
Foi obtido um valor médio de carga superficial de -16±4 mV, mostrando que
a carga superficial da nanopartícula é negativa. Como não podemos garantir que todo
CTAB foi retirado do meio, é possível ocorrer adsorção do surfactante na superfície
das NPs35, podendo provocar mudanças no valor da carga superfícial36, portanto,
podemos dizer que o resultado de potencial zeta obtido é um resultado aparente. É
esperado que o valor real do potencial zeta das NPs seja negativa, porém não maior
que -30 mV. Sabe-se que cargas superficiais acima de ±30 mV (em módulo)
proporcionam a dispersão de partículas devido à repulsão da dupla camada
elétrica.17,37 Como foi observada a coagulação das nanopartículas formadas na
51
ausência de CTAB (Figura 15, frasco 1), assume-se que o potencial zeta das NPs é
negativo, com valor intermediário entre -30 e -16 mV.
Shukla e Rehage38 mediram o potencial zeta para micelas gigantes
formadas pela combinação de CTAB (15 mmol L-1) com diferentes concentrações de
salicilato. Os resultados são apresentados na Figura 21.
Figura 21. Potencial zeta de micelas gigantes formadas pela combinação de CTAB
com diferentes concentrações de salicilato. Adaptado de 38.
De acordo com os resultados dos autores, as micelas gigantes apresentam
potencial zeta positivo quando a razão [CTAB]/[NaSal] é superior a aproximadamente
15/70 = 0,2. Para razões menores, o potencial zeta fica levemente negativo pelo
excesso de salicilato. Assumindo-se que o potencial zeta mantém-se o mesmo para
soluções de MG mais diluídas que as estudadas por Shukla e Rehage, porém nas
mesmas razões de CTAB e NaSal, pode-se então estabelecer uma correlação entre
o potencial zeta e as suspensões da Figura 15. Apenas o frasco 2 apresenta MG com
potencial zeta negativo. De fato, observa-se uma grande precipitação de FeOOH-NPs
nesta amostra. Para razões [CTAB]/[NaSal] maiores que 0,2, a MG se torna
progressivamente mais positiva e a estabilidade da suspensão aumenta. Quando a
razão [CTAB]/[NaSal] 0,8, o potencial zeta da MG assume valores de +20 mV, o que
é próximo, em módulo, do valor de potencial zeta obtido para as NPs. A partir dessa
razão de CTAB e NaSal (Figura 15, frasco 6), observa-se uma alta estabilidade das
suspensões e as amostras se tornam límpidas. Assim, com base nestes resultados,
pode-se inferir que a suspensão das nanopartículas de oxihidróxidos de Fe(III), que
apresentam carga superficial negativa, forma suspensões estáveis em soluções de
micelas gigantes com excesso de carga positiva. Neste caso, este resultado leva-nos
52
a pensar que as FeOOH-NPs estejam ligadas às micelas gigantes por atração
eletrostática e que este processo assegura a estabilidade coloidal.
Também foram realizados experimentos de ressuspensão das
nanopartículas em solução de micelas gigantes. As partículas obtidas sem a presença
de MG (Figura 15 – frasco 1) e as nanopartículas dialisadas foram redispersas em
solução 3 mmol L-1 de CTAB e NaSal. Foi observada a suspensão dessas partículas,
sendo que rapidamente ocorreu a precipitação das mesmas. Isto pode ser atribuído a
um efeito do tamanho da partícula formada, ou seja, as FeOOH-NPs formadas na
ausência da micela gigante podem apresentar tamanho maior. Outra interpretação
plausível é que, na ausência de micelas gigantes, ocorre a agregação irreversível das
mesmas. Essa segunda hipótese também explica a precipitação das nanopartículas
dialisadas, uma vez que estas apresentam tamanho de partícula entre 3 e 5 nm, como
dito anteriormente.
53
Capítulo 4
Espalhamento dinâmico de luz (DLS)
Supondo que as nanopartículas de oxihidróxido de Fe(III) estão ligadas às
cadeias das micelas gigantes, então espera-se que a dinâmica das entidades
formadas seja diferente do que se as micelas ou as nanopartículas estivessem
isoladas. Uma forma de investigar esta questão é através do espalhamento dinâmico
de luz.
4.1 Fundamentos
Ao incidir um feixe de luz em uma suspensão coloidal, a luz pode sofrer
diversos fenômenos. Um comprimento de onda específico pode ser absorvido pela
partícula em suspensão, dando coloração ao coloide. Pode haver a transmissão da
luz, que ocorre quando não há interação com as partículas e, por fim, pode ocorrer
também o espalhamento desse feixe,16 o qual é um fenômeno útil para a
caracterização das partículas espalhadoras.
A luz é uma radiação eletromagnética que pode se propagar em diferentes
meios. O espalhamento elástico de luz é um resultado da interação do campo elétrico
da luz com a nuvem eletrônica das moléculas. O campo elétrico da onda causa um
deslocamento da nuvem eletrônica criando um dipolo, que oscila de acordo com a
frequência da onda. Devido à criação deste dipolo oscilante, a molécula passa a atuar
como uma fonte de radiação em todas as direções e com o mesmo comprimento de
onda da radiação incidida.39 Parâmetros como frequência, distribuição angular,
polarização e intensidade da luz espalhada estão relacionados com o tamanho, forma
e índice de refração do material das partículas espalhadoras.40 A equação de Rayleigh
(Equação 10), mostra essas relações.
𝐼𝑒 = 𝐼08𝜋4𝑑6
𝜆4𝑅2(𝜂2−1
𝜂2+2) (1 + 𝑐𝑜𝑠2𝜃) (10)
Sendo 𝐼𝑒 é a intensidade da luz espalhada, 𝐼0 é a intensidade da luz
incidida, 𝜆 é o comprimento de onda, 𝑅 é a distância percorrida até a partícula, 𝜃 é o
ângulo de detecção, 𝑑 é o diâmetro da partícula e 𝜂 é o seu índice de refração relativo.
54
A equação de Rayleigh também mostra que a intensidade de espalhamento varia com
1/𝜆4. Isso explica a cor azul do céu: quando a luz visível incide nas moléculas
presentes na atmosfera, estas espalham mais os comprimentos de onda mais curtos,
que correspondem à cor azul. Soluções de macromoléculas, como polímeros e
micelas gigantes, podem, algumas vezes, apresentar aspecto turvo, também devido
ao espalhamento de luz realizado por essas moléculas, uma vez que suas estruturas
podem ser da ordem de nanômetros.16
Quando observamos uma dispersão turva, é porque há um intenso
espalhamento da luz pelas partículas que a compõe. Até certo limite, quanto maior a
concentração de partículas, maior será a quantidade de luz espalhada, podendo até
ocorrer espalhamento múltiplo, que é quando a luz espalhada por uma partícula é
espalhada repetidas vezes por outras partículas presentes na dispersão.
Como mostrado pela Equação de Rayleigh (Equação 10), alguns fatores
podem influenciar na intensidade de espalhamento das partículas, como diferença de
contraste entre o objeto espalhador e o meio em que está disperso e o tamanho
desses objetos.
A diferença de contraste é proveniente da diferença de índice de refração
das partículas em suspensão com o meio. Sabe-se que todas as moléculas podem
espalhar a luz, inclusive as moléculas do solvente utilizado. Para se obter informações
sobre a dispersão estudada, é necessário que esta espalhe a luz de forma diferente
que o solvente, o que dependerá da polarizabilidade das moléculas e,
consequentemente, do índice de refração. Esta diferença resultará em uma
interferência construtiva dos diferentes feixes espalhados, de forma que este padrão
poderá ser detectado para a posterior análise das partículas. Se a partícula e o
solvente possuem o mesmo índice de refração, ocorre o fenômeno de continuidade
óptica, ou seja, não há contraste e nem interferência construtiva.16,39
O tamanho das partículas é um dos principais parâmetros de interesse nas
técnicas de espalhamento, inclusive na técnica de espalhamento dinâmico da luz
(DLS, do inglês, Dynamic Light Scattering). As partículas dispersas em um meio
apresentam um movimento aleatório, chamado de movimento Browniano, causado
pelas flutuações térmicas do solvente. Esse movimento é dependente do tamanho
das partículas, ou seja, quanto menores elas são, mais rapidamente elas se deslocam.
O movimento das partículas influencia as flutuações da intensidade da luz espalhada
55
ao longo do tempo e é nesse fenômeno que se apoia a técnica de DLS, através de
medições, em função do tempo, das flutuações da intensidade da luz espalhada pelas
partículas devido à mobilidade das mesmas.39
A intensidade de espalhamento 𝐼(𝑡) é registrada por um detector em um
ângulo θ específico. Nas Figuras 22 e 23, encontra-se um esquema característico da
geometria de uma cela de espalhamento, em que a intensidade da luz espalhada pela
amostra pode ser detectada, em ângulos definidos e um diagrama mostrando as
partes do equipamento relacionadas com as medidas de DLS, respectivamente.
Figura 22. Esquema de geometria de cela de espalhamento de luz. Adaptado de 41.
Figura 23. Esquema de um equipamento para obtenção do espalhamento de luz
dinâmico. Adaptado de 41.
A intensidade da luz espalhada por uma dispersão varia com o tempo e
essa flutuação na intensidade no sinal guarda uma correlação com as posições das
partículas. Uma partícula espalha a luz em determinado ângulo com determinada
56
intensidade. Com o tempo, as partículas sofrem difusão e ocupam outras posições
relativas e passam a espalhar a luz com outra intensidade. Se essa medida for
realizada em um tempo curto, a intensidade da luz espalhada nos dois eventos deve
ser próximas. No entanto, em um tempo mais longo, as intensidades não apresentam
grandes correlações entre si.39,41 Na Figura 24 é mostrado um sinal típico de
intensidade espalhada em função do tempo para um experimento de DLS.
Figura 24. Sinal típico obtido em um experimento de DLS. Adaptado de 41.
A intensidade da luz espalhada apresenta uma grande relação com o
tamanho das partículas da dispersão: partículas grandes difundem mais lentamente
e, portanto, espalhamentos de luz sucessivos são mais correlacionados que aqueles
que provêm do espalhamento de partículas pequenas. Na Figura 25 é apresentado
um esquema mostrando a diferença da intensidade de espalhamento para partículas
de diferentes tamanhos.
57
Figura 25. Esquema apresentando a intensidade de espalhamento em função do
tempo de análise e a curva de perda de correlação, de acordo com o tamanho das
partículas espalhadoras.
Sendo 𝐼(𝑡) a intensidade da luz espalhada em um instante de tempo 𝑡 e
𝐼(𝑡 + τ) a intensidade da luz espalhada em um instante seguinte, é calculada a função
de autocorrelação da intensidade da luz espalhada 𝑔(2)(τ), mostrada na Equação
11.41
𝑔(2)(τ) = ⟨𝐼(𝑡)𝐼(𝑡 + τ)⟩ (11)
A função de autocorrelação é calculada e acumulada por um tempo
definido. Se a correlação é grande, o produto das intensidades é alto. O gráfico de
⟨𝐼(𝑡)𝐼(𝑡 + τ)⟩ em função de τ, mostrado na Figura 26, tem um decaimento bem
comportado e mostra como a correlação decai à zero na medida que τ aumenta.41
Como observado na Figura 25, o tamanho da partícula também interfere na função de
autocorrelação. Partículas maiores tendem a difundir em uma velocidade menor,
portanto o tempo no qual ocorre a perda de correlação será maior quando comparado
com partículas menores.
58
Figura 26. Gráfico de perda de correlação em função do tempo de amostragem.
Adaptado de 41.
Amostras monodispersas apresentam apenas um decaimento exponencial
na função de correlação. A partir do decaimento exponencial observado, é possível
obter-se o tempo de decaimento da amostra, que é o tempo no qual o espalhamento
perde correlação.39
Como o tempo de decaimento está diretamente relacionado com o
movimento da partícula, a partir desse valor é possível se obter valores de coeficiente
de difusão das partículas analisadas, como mostrado na equação 12.
𝐷 =1
𝑞2𝜏 (12)
Sendo 𝐷 o coeficiente de difusão, 𝑞 o vetor espalhamento e 𝜏 o tempo de
perda de correlação.
O vetor espalhamento é a diferença de fase entre a radiação incidida na
amostra e a radiação espalhada pela amostra e que é detectada em um determinado
ângulo θ, conforme mostrado na Figura 27. Esse vetor é dependente não só do ângulo
de detecção, mas também do comprimento de onda da radiação (𝜆), como mostrado
na equação 13.21
59
Figura 27. Diferença de fase entre radiação incidida e radiação espalhada pela
amostra resulta no vetor de espalhamento 𝑞.
𝑞 =4𝜋
𝜆𝑠𝑒𝑛(𝜃) (13)
O coeficiente de difusão é inversamente proporcional ao tamanho das
partículas de acordo com a relação de Stokes-Einstein (Equação 14), que permite
calcular o raio hidrodinâmico das mesmas.
𝑅ℎ =𝑘𝐵𝑇
6𝜋𝜂𝐷 (14)
Sendo 𝑅ℎ o raio hidrodinâmico, 𝑘𝐵 a constante de Boltzmann, 𝑇 a
temperatura, 𝜂 o índice de refração relativo e 𝐷 o coeficiente de difusão.
É importante salientar que o raio obtido através da análise de DLS é o raio
hidrodinâmico, ou seja, o raio equivalente a uma partícula esférica rígida, mas que
possui uma camada de hidratação adsorvida em sua superfície que é arrastada
consigo durante a difusão.
O raio hidrodinâmico dos componentes de uma dispersão só pode ser
calculado em regime diluído, para evitar que interações entre as partículas influenciem
na mobilidade.39 Dadas as limitações consideradas, em muitos casos é mais
conveniente utilizar o termo raio hidrodinâmico aparente, para esclarecer que não se
tratam necessariamente de partículas esféricas em regime diluído.
4.2 Parte experimental
As amostras para análise de DLS foram feitas utilizando 1 mmol L-1 de
FeCl3 e NaSal, e variando-se a concentração de CTAB: 1 mmol L-1 (Figura 29A) e 1,5
60
mmol L-1 (Figura 29B). A escolha das amostras foi pensando-se em analisar apenas
amostras translúcidas. Também foram analisadas soluções de micelas gigantes nas
mesmas proporções de CTAB e NaSal, para comparação dos resultados.
Todo o material utilizado nas análises de DLS foi lavado com uma solução
1% v/v de Hellmanex (solução alcalina de mistura de surfactantes, utilizada para
limpeza de vidro e quartzo), a fim de eliminar interferentes, como poeiras.
Os experimentos de DLS foram conduzidos no goniômetro modelo CGS-3
da marca ALV-GmbH (Figura 28), com comprimento de onda de 632,8 nm e correlator
ALV-7004. O porta amostra contendo cis-decalina foi conectado a um banho
termostático para controle da temperatura a 25,0 ± 0,1 °C e o detector posicionado a
um ângulo de 90°.
O algoritmo CONTIN implementado no ALV-Correlator Software ALV-7004,
V.3.0.4.5 (ALV GmbH, Langen, Germany) foi utilizado como método de inversão
regularizada para realizar um ajuste linear de g(2)(τ)-1. Para esta análise de dados,
utiliza-se a configuração ALV-Regularized fit setup. O resultado desta inversão é uma
função de distribuição dos tempos de decaimento das partículas
Figura 28. Imagem do goniômetro modelo CGS-3, marca ALV-GmbH.
4.3 Resultados e Discussão
Na Figura 29 são mostradas as funções de correlação e as distribuições de
populações de amostras com razão [CTAB]/[NaSal] = 1 e 1,5 (A e B, respectivamente).
61
Para ser feito um comparativo entre os dados, foram realizadas análises sem o FeCl3,
ou seja, na ausência de nanopartículas de oxihidróxido de Fe(III).
10-4
10-3
10-2
10-1
100
101
102
103
104
105
106
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0g
(2)
Função de correlação com NP
Função de distribuição com NP
Função de correlação sem NP
Função de distribuição sem NP
Tempo de decaimento (ms)
A
10-4
10-3
10-2
10-1
100
101
102
103
104
105
106
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
B
Tempo de decaimento (ms)
g(2
)
Função de correlação com NP
Função de distribuição com NP
Função de correlação sem NP
Função de distribuição sem NP
Figura 29. Funções de autocorrelação (curvas pretas) e funções de distribuições de
tempo de decaimento ponderadas por intensidade (curvas azuis) de soluções de MG
sem NP (linhas cheias) e MG com NP (linhas pontilhadas). A razão [CTAB]/[NaSal] é
A) 1 e B) 1,5.
62
A micela gigante é constituída por moléculas de CTAB e NaSal, que
apresentam baixo contraste em meio aquoso. Esse baixo contraste foi verificado
através do baixo valor de intensidade espalhada, o que levou a um sinal ruidoso no
início da curva de função de correlação (Figura 29). A curva mostrada na Figura 29A
apresenta menos ruídos, comparando-se com a curva na Figura 29B e esse
comportamento tem relação com o tamanho da MG. Ito e colaboradores42 mostraram,
por calorimetria, que para os compostos TTAB (surfactante com 14 carbonos na
cadeia) e NaSal, a formação das micelas gigantes com o maior raio de giro se dá
próximo da razão [TTAB]/[NaSal] = 0,5. Para razões maiores e menores que esta, a
micela gigante formada apresenta raio de giro gradativamente menor. Como o CTAB
apresenta 2 carbonos a mais que o TTAB, o efeito hidrofóbico entre as cadeias é mais
pronunciado e a formação da micela gigante provavelmente ocorrerá em uma razão
menor que a encontrada para o TTAB. Levando-se isto em consideração, a formação
de micelas gigantes de CTAB e NaSal com maior raio de giro se dá em razões
[CTAB]/[NaSal] menores que 0,5. Nos dados obtidos por DLS no presente trabalho, a
amostra do conjunto de dados da Figura 29A apresenta razão [CTAB]/[NaSal] = 1,
mais próxima da razão ótima de formação, quando compara-se com a da Figura 29B,
que tem razão = 1,5. Portanto, quanto maior a razão [CTAB]/[NaSal], a micela gigante
torna-se cada vez menor, o que resulta em uma menor intensidade espalhada, de
acordo com a Equação de Rayleigh (Equação 10).
Os sistemas contendo FeOOH-NPs com MG, por sua vez, apresentam um
contraste muito grande em meio aquoso, o que levou à detecção de alto espalhamento
de luz. De certa forma isto pode ser explicado pelo fato de que as nanopartículas são
formadas por um metal com índice de refração muito diferente do valor da água.
Assim, na presença das nanopartículas, a curva da função de correlação mostra-se
bem-comportada, sem o sinal ruidoso no início, graças ao aumento de contraste do
objeto espalhador.
Comparando-se as funções de correlação das amostras de micelas
gigantes com e sem nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III), para uma mesma
razão [CTAB]/[NaSal], observa-se que o tempo de decaimento aumentou com a
presença de nanopartículas. Isso significa que o objeto espalhador está perdendo
correlação em um tempo maior e, portanto, está difundindo mais lentamente pela
presença de NPs. Esperar-se-ia que a difusão da micela gigante fosse menor se algo
63
a deixasse com maior massa, o que pode ser explicado pela adsorção das
nanopartículas ao longo da micela. Além disso, pode-se perceber que a diferença
entre os tempos de perda de correlação das amostras com e sem FeOOH-NPs
diferem quando a razão [CTAB]/[NaSal] muda. Na Figura 29A, tem-se uma diferença
dos tempos de perda de correlação menor que nas curvas da Figura 29B. Isso pode
ser explicado pela carga superficial da MG: quanto mais positiva a carga da micela
gigante, mais nanopartículas irão adsorver em sua superfície, uma vez que as
FeOOH-NPs apresentam carga negativa. Com isso, a difusão na MG é
proporcionalmente mais lenta.
O fato de ter sido observado apenas um decaimento exponencial na função
de correlação mostra que a amostra é monodispersa, ou seja, apresenta apenas um
tamanho de objeto espalhador. Se a MG e as NPs difundissem independentemente,
ver-se-ia um decaimento relacionado à perda de correlação da MG e outro decaimento
relacionado às NPs. A observação de apenas um decaimento mostra que todos os
objetos espalhadores do meio estão difundindo com velocidades similares.
A distribuição de população corrobora com os resultados até então obtidos.
Na Figura 29A, as curvas referentes à distribuição de população apresentam apenas
1 pico, tanto para a amostra contendo apenas micelas gigantes quanto para a que
contém MG e FeOOH-NPs, mostrando que a população das nanopartículas não é
independente da população de micela gigante. Na Figura 29B vê-se a presença de
outro pico de menor intensidade na curva referente à MG com FeOOH-NPs. Não se
pode descartar a possibilidade de que esse pico menos intenso seja atribuído a uma
possível população de nanopartículas. Porém, outra possibilidade mais provável é que
este pico de menor intensidade se origine da maior densidade de cargas positivas na
superfície da micela gigante de maior razão [CTAB]/[NaSal]. Como explicado
anteriormente, isso causa uma maior repulsão eletrostática dentro de uma mesma
micela gigante, fazendo com que esta fique mais esticada. Assim, essa estrutura
passa a apresentar duas componentes no tempo de decaimento: uma componente
rotacional e outra translacional, ou seja, tanto o pico de maior intensidade quanto o de
menor intensidade são atribuídos à micela gigante, mas são referentes a diferentes
tempos de decaimento da micela.
Considerando todas as interpretações feitas por espalhamento de luz,
pode-se sugerir um modelo para a interação entre micela gigante e nanopartículas de
64
oxihidróxido de Fe(III). Nesse modelo a adsorção das NPs se dá ao longo da micela
gigante, e é mantida através de interações eletrostáticas. Um esquema representando
esse modelo é mostrado na Figura 30.
Figura 30. Representação do modelo de como as MG e NPs interagem. As esferas
vermelhas representam as nanopartículas de oxihidróxido de Fe(III) adsorvidas na
cadeia da micela gigante.
65
Capítulo 5
Espalhamento de raios X em baixos ângulos (SAXS)
A adsorção das nanopartículas de Fe(III) na superfície das micelas gigantes
resulta em uma estrutura que podemos chamar de “colar de pérolas”, onde as
nanopartículas são as “pérolas” que ficam distribuídas ao longo da micela gigante que
é a “corrente do colar”. A partir de um modelo estabelecido para esta estrutura, foi
possível ajustar os dados de espalhamento de raios X em baixos ângulos para
determinar parâmetros geométricos do sistema formado.
5.1 Fundamentos
Assim como o DLS, o SAXS (do inglês, Small Angle X-Ray Scattering)
também baseia-se no espalhamento elástico da radiação em partículas ou moléculas
em um meio. Porém, como o próprio nome diz, a radiação utilizada é o raio X, que
apresenta um comprimento de onda menor que a luz visível utilizada nos
experimentos de DLS. Enquanto a luz visível apresenta comprimento de onda entre
390 e 700 nanômetros, a faixa de raios X é de 0,05 até 0,25 nm.43
O espalhamento elástico de raios X é conhecido como espalhamento
Thomson. Quando a radiação incide sobre a matéria, a oscilação provocada pelo fóton
em uma vizinhança de elétrons é sincronizada, provocando um espalhamento
coerente, apresentando uma relação de fase entre a radiação incidida e espalhada,
sendo capaz de dar informações sobre a estrutura, tamanho e formato médio das
partículas espalhadoras.43
O feixe espalhado tem pouca diferença angular do feixe incidido na amostra
e, por isso, a técnica é chamada de espalhamento em baixos ângulos, o que permite
garantir informações de partículas que possuem dimensões de até algumas dezenas
de nanômetros.
As análises por SAXS trazem duas importantes informações sobre o
sistema: o fator de forma (𝑃(𝑞)) e o fator de estrutura (𝑆(𝑞)) e eles se relacionam com
a intensidade da radiação espalhada pela Equação 15.
𝐼(𝑞) = 𝑛𝑃(𝑞)𝑆(𝑞) (15)
66
Sendo 𝐼(𝑞) a intensidade da radiação espalhada, 𝑛 é o número de
partículas espalhadoras, 𝑃(𝑞) é o fator de forma e 𝑆(𝑞) é o fator de estrutura.
O fator de forma traz informações do tamanho e formato de uma partícula
individualmente. Os elétrons dos átomos e moléculas constituintes da partícula
espalham a radiação incidida, produzindo um padrão de interferência característico.
Cada padrão de interferência está relacionado com um tipo específico de formato da
partícula. Isto se faz através de ajustes de modelos matemáticos conhecidos para
cada formato de partícula. Se a amostra for polidispersa, o padrão estará relacionado
a uma distribuição dos valores das dimensões.21
Experimentalmente, uma forma de facilitar o ajuste para se garantir que a
curva experimental seja dependente apenas do fator de forma, utiliza-se uma amostra
diluída o suficiente para evitar interação entre as partículas. Nesta situação, o valor
de 𝑆(𝑞) é 1 e tem-se que 𝐼(𝑞)~𝑃(𝑞).21
Se as partículas estão suficiente próximas, a interação com os raios X
produz um padrão referente à interferência entre os padrões de espalhamento das
partículas vizinhas. Este novo padrão é o chamado fator de estrutura, que pode
fornecer informações de como as partículas se organizam entre si.
Os raios X são espalhados pelos elétrons que constituem a partícula,
portanto, para que haja contraste e seja obtido um padrão de espalhamento, é
necessário que a amostra e o meio tenham densidades eletrônicas diferentes. Como
pode ser visto na equação 1643, a intensidade da radiação espalhada é diretamente
proporcional à diferença de densidade eletrônica.
∆𝐼1(𝑞) = 𝐼0(∆𝜌)2𝑉1
2𝑃(𝑞) (16)
Sendo ∆𝐼1(𝑞) a intensidade da radiação espalhada, 𝐼0 a intensidade da
radiação incidente, ∆𝜌 a diferença de densidade eletrônica entre partícula e o meio,
𝑉1 o volume da amostra iluminada pelo feixe e 𝑃(𝑞) o fator de forma.
Um desafio da técnica de SAXS é a interpretação dos dados obtidos.
Diversos modelos de forma e estrutura de objetos espalhadores são utilizados para
tal, ajustando-se os dados experimentais às equações fornecidas pelos modelos, de
forma a obter os parâmetros de dimensões desejados. Alguns sistemas podem ser
67
mais difíceis de se interpretar pela falta de modelos adequados ou pelo alto grau de
complexidade do modelo que pode levar a resultado sem significado físico.
Os resultados obtidos geralmente são interpretados a partir de um gráfico
de 𝐼(𝑞) em função de 𝑞 (vetor espalhamento). A relação do valor do vetor
espalhamento 𝑞 com as dimensões das estruturas advém do comprimento de onda
dos raios X e do ângulo no qual é feito a medida. A partir da equação do vetor
espalhamento (Equação 13) e da Lei de Bragg (Equação 17), obtém-se a equação
que relaciona 𝑞 com o tamanho das estruturas observadas (Equação 18) e indica que
dimensões maiores da partícula espalhadora são acessadas em regiões de menores
valores de 𝑞.
𝜆 = 2𝑑 𝑠𝑒𝑛(𝜃) (17)
𝑞 =2𝜋
𝑑 (18)
A faixa de baixos valores de 𝑞 é chamada de região de Guinier e pode
fornecer informações sobre o objeto espalhador como um todo, enquanto que uma
faixa de 𝑞 maiores, chamada região de Porod, fornece informações da fractalidade do
objeto. Por exemplo, para uma macromolécula, esta região pode indicar o seu grau
de enovelamento e sua dimensão fractal, conforme veremos adiante. Enquanto isso,
na faixa de baixos valores de 𝑞, pode se utilizar a aproximação de Guinier para
encontrar valores de raio de giração (𝑅𝑔)44, conforme mostra a equação 19.
𝐼(𝑞) = (∆𝜌)2exp (−𝑅𝑔
2𝑞2
3) (19 – válida para partículas isométricas)
Sendo 𝐼(𝑞) é a intensidade espalhada, ∆𝜌 a diferença de densidade
eletrônica, 𝑅𝑔 o raio de giração e 𝑞 o vetor espalhamento.
Na região de Guinier, a forma da partícula espalhadora tem pouca
influência e é possível obter valores de 𝑅𝑔 mesmo sem conhecer seu formato.
Em valores intermediários de 𝑞, encontra-se a região de Debye. Essa
região pode oferecer informações sobre o formato e a organização estrutural dos
objetos espalhadores, a partir de modelos aplicados aos dados experimentais.
68
Na região de valores altos de 𝑞 encontra-se a região de Porod, que exibe
um decaimento que segue a lei de potência apresentada na Equação 20.
𝐼(𝑞)~𝑞−𝛼 (20)
Sendo que o parâmetro 𝛼 está relacionado à fractalidade dos objetos
espalhadores.
A dimensão fractal, 𝐷, é um número que indica o grau de complexidade de
um padrão, ao se comparar como este padrão muda ao longo da escala na qual é
medido. Quanto mais compacta for uma partícula e mais próxima de um corpo globular
com superfícies bem definidas, maior será a sua dimensão fractal. A Lei de Porod é
capaz de prever este parâmetro por estar relacionada justamente aos detalhes da
partícula, e assim, pode fornecer informações de sua superfície.44,45 A relação entre o
parâmetro proveniente da lei de potência, 𝛼, e a dimensão fractal, 𝐷, é dada na Tabela
4.
Tabela 4. Diferenças de valores de 𝛼 e dimensões fractais para fractais de massa e
superfície.
Fractais de Massa Fractais de superfície
Se 1 < 𝛼 < 3 Se 3 < 𝛼 < 4
𝛼 = 𝐷𝑚 𝛼 = 6 - 𝐷𝑠 (desde que 2 < 𝐷𝑠 < 3)
Quando 𝛼 é igual a 4, indica que a superfície das partículas é perfeitamente
lisa. Valores de 𝛼 entre 3 e 4 indicam que o espalhamento da radiação é proveniente
de uma superfície rugosa. Ambos os casos são chamados de fractais de superfície.
Valores de 𝛼 menores que 3, indicam a formação de um fractal de massa, ou seja, o
espalhamento é proveniente de objetos com ramificações e superfícies menos
definidas, como, por exemplo, no caso de cadeias poliméricas.46 Quanto menor o valor
da dimensão fractal de massa, 𝐷𝑚, significa que a estrutura do objeto está mais longe
de ser um corpo globular definido.
Na Figura 31, é observado um esquema que exemplifica os fractais de
massa e de superfície.
69
Figura 31. Representação dos fractais de massa e de superfície com seus respectivos
valores de 𝛼, obtidos na região de Porod. Adaptado de 45.
5.2 Parte experimental
A amostra utilizada para análise de SAXS apresenta concentração 3 mmol
L-1 de CTAB, 3 mmol L-1 de NaSal e 1 mmol L-1 de FeCl3. Para comparação também
foram analisadas amostras nas mesmas condições, porém com variadas
concentrações de FeCl3: 0, 3, 6, 8 e 9 mmol L-1.
As medidas de SAXS foram realizadas no Laboratório Nacional de Luz
Síncrotron (LNLS), no CNPEM, na linha SAXS-2 com uma faixa de 𝑞 de 0,13 a 3,2
nm-1 e comprimento de onda de 1,548 Å. Foi utilizado porta amostra com janela de
mica e banho termostático com temperatura controlada em 25,0±0,5 °C e a distância
entre o porta-amostra e o detector foi de 902 mm. Foi utilizado um detector de raios X
de área (image-plate) CCD-MAR165. A integração e a subtração do branco (água)
foram feitas com o software Fit2D47.
5.3 Resultados e Discussão
Na Figura 32, são mostradas curvas obtidas por SAXS para as amostras
mais diluídas para observar apenas o fator de forma do sistema.
70
0,1 1
10-6
10-5
10-4
10-3
2.6
I (q
) / a
.u.
q / nm-1
[Fe3+
]:
1 mM
0 mM
Figura 32. Curvas de SAXS obtidas para amostras de MG e FeOOH-NPs (símbolos
pretos) com concentração fixa de NaSal e CTAB (3 mmol L-1 para ambos) e FeCl3 = 1
mmol L- 1. A linha em vermelho é referente aos ajustes obtido na região de Debye e
Porod. A curva de SAXS para a solução de MG sem NPs (símbolos azuis) também é
apresentada, para comparação.
Pela curva de SAXS obtida para a amostra contendo apenas micelas
gigantes, vê-se que a intensidade de espalhamento é muito baixa, devido ao seu baixo
contraste com a água. A presença de nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III) faz
com que o contraste da micela gigante seja aumentado, tornando possível a
realização dos ajustes. Analisando a curva de MG com NPs (símbolos pretos), pode-
se perceber que em baixos valores de 𝑞, ocorre o aumento da intensidade de
espalhamento, quando comparado com baixos valores de 𝑞. Essa característica indica
que há objetos espalhadores grandes, que são as micelas gigantes.
A fim de se obter o melhor ajuste aos dados obtidos, utilizando o software
SASView48, foram testados diversos modelos que poderiam descrever o sistema.
Entre eles, podemos citar, por exemplo: esferas para descrever as nanopartículas,
cilindros, micelas gigantes, etc. O único modelo que se ajustou bem às curvas
71
experimentais foi o modelo de “PearlNecklaceModel”48. Este modelo descreve um
sistema em que as pérolas (nanopartículas) estão dispostas de forma organizada ao
longo de uma estrutura parecida a uma corrente (micela gigante). A Figura 33 é uma
representação do modelo “PearlNecklaceModel”, mostrando apenas um segmento da
corrente, com algumas pérolas. Na faixa de valores de 𝑞 em que é feito o ajuste são
visualizados apenas segmentos da micela gigante, uma vez a detecção de toda a MG
só é possível em valores mais baixos de 𝑞 do que a faixa estudada.
Figura 33. Representação sugerida para a disposição das nanopartículas através da
técnica de SAXS, obtida pelo ajuste do modelo de colar de pérolas.
Para este ajuste, foram fixados os seguintes valores de densidade
eletrônica (ρ) para cada um dos componentes, como mostra na Tabela 5.
Tabela 5. Valores de densidade eletrônica (ρ) para cada componente do sistema
estudado.
Componentes Densidade eletrônica (ρ)
Solvente (água) 9,4.10-6 Å-2
Pérolas (nanopartículas) 28.10-6 Å-2
Corrente (MG de CTAB e NaSal) 7,8.10-6 Å-2
Também foi fixada a espessura da corrente em 4 nm, baseando-se no valor
esperado para o raio de uma micela de CTAB49. Por Cryo-TEM também é possível se
obter valores do diâmetro da micela gigante. Nas imagens obtidas, exemplificadas
pela Figura 38, encontrou-se um diâmetro para a MG entre 4 e 6 nm. Os valores
oscilaram devido à baixa definição do contraste entre a micela gigante e o filme de
72
carbono da grade. Como os valores obtidos por Cryo-TEM apresentam essa
oscilação, optou-se por utilizar o dado da literatura.
Através dos ajustes, foram obtidos os valores de raio da nanopartícula de
oxihidróxido de Fe(III), a distância média de separação entre elas e uma estimativa do
número de nanopartículas por segmento da micela gigante, conforme mostrados na
Tabela 6. A curva do ajustes da amostra de MG com 3 mmol L-1 de CTAB e NaSal e
1 mmol L-1 de FeCl3 está representada na Figura 32, em vermelho.
Tabela 6. Parâmetros estruturais do sistema obtidos pelo ajuste do modelo de colar
de pérolas.
[Fe3+] / mmol L-1 Distância de
separação / nm
Raio da
pérola / nm
Número de pérolas
por segmento
1 1,7 1,9 35
3 1,8 1,5 >60
6 2,1 1,6 >60
8 2,4 1,7 >60
9 2,3 1,7 >60
O raio encontrado para as FeOOH-NPs por SAXS é compatível com o valor
encontrado na técnica de TEM (entre 1,5 e 2,5 nm). O sucesso da aplicação deste
modelo reforça que as micelas gigantes estabilizam e interagem com as
nanopartículas, que ficam posicionadas ao longo do seu comprimento, conforme
sugerido anteriormente. Por esses resultados também pode-se verificar que o grau de
adsorção das NPs nas cadeias das MG é bastante elevado, uma vez que distâncias
médias da ordem de 1,9 nm separam uma nanopartícula de sua vizinha.
Fazendo-se a mesma análise para os dados obtidos a partir das amostras
com concentração maior de FeCl3, vemos que o padrão de espalhamento se repete e
o modelo “PearlNecklace” também se ajusta aos dados experimentais, como visto na
Figura 34. O raio encontrado para as nanopartículas formadas a partir de maiores
concentrações de precursor não difere do encontrado para a amostra com 1 mmol L- 1
de FeCl3. Porém, observa-se que não foi possível realizar um bom ajuste na região de
baixos valores de 𝑞. Este comportamento pode ser explicado pelo surgimento do fator
estrutura devido à interações entre os diferentes “colares de pérolas”. De fato, foi
73
verificada a formação de precipitado nestas amostras, proveniente da alta
concentração do precursor das NPs. Essa interação pode ter influenciado nos valores
de distância de separação entre as nanopartículas, no qual vemos que em maiores
concentrações de FeCl3, maior é a distância encontrada. Todavia, estes dados trazem
informações sobre a reprodutibilidade do sistema verificada na região de Debye e
Porod, mostrando a adsorção das nanopartículas de oxihidróxido de Fe(III) na MG e
a formação do colar de pérolas, mesmo em diferentes concentrações de FeCl3.
0,1 1
10-6
10-5
10-4
10-3
10-2
10-1
2.5
2.5
2.6
2.5
I (q
) / a
.u.
q / nm-1
[Fe3+
]:
9 mM
8 mM
6 mM
3 mM
Figura 34. Curvas de SAXS obtidas para amostras com concentração fixa de NaSal
e CTAB (3 mmol L-1 para ambos) e concentração de FeCl3 = 3, 6, 8 e 9 mmol L-1
(símbolos). As linhas são referentes aos ajustes obtidos.
Por fim, a região de altos valores de 𝑞, região de Porod, pode fornecer
informações sobre a fractalidade do sistema, como explicado anteriormente. Através
da lei de potência mostrada na Equação 11, obteve-se valor de 𝛼 para as
nanopartículas estudadas, que foi 2,6, indicando que o sistema estudado se trata de
um fractal de massa em uma região intermediária entre cadeias distribuídas de forma
gaussiana e uma rede emaranhada.46 Como dito anteriormente, a micela gigante
apresenta pouco contraste e o resultado obtido pela lei de potência representa a
74
disposição das FeOOH-NPs no sistema. Esse resultado segue a proposta do estudo,
uma vez que mostra que as nanopartículas estão formando uma rede ramificada,
comportamento esperado no caso de agregação na estrutura da micela gigante. Se
as nanopartículas estivessem isoladas, a lei de potência aplicada à região de Porod
deveria fornecer um valor de 𝛼 igual a 4, porque as NPs possuiriam uma interface
muito bem definida com o solvente.
Chhatre e colaboradores50 publicaram em 2015 um estudo que endorsa o
modelo proposto. Neste estudo, foram obtidos nanobastões de óxido de ferro com o
auxílio do movimento de reptação das micelas gigantes. Nanopartículas de óxido de
ferro foram obtidas em uma solução de micelas gigantes e essas ficaram adsorvidas
ao longo da micela. Quando é provocado o cisalhamento dessa suspensão, as
micelas gigantes sofrem o movimento de reptação, o que aproxima as nanopartículas
de óxido de ferro e elas se unem, formando nanobastões. Porém, Chhatre apenas
sugere que as nanopartículas ficam aderidas na micela gigante e seu estudo foca
apenas na parte reológica. Na Figura 35 é mostrado um esquema de como ocorre a
obtenção desses nanobastões.
Figura 35: Esquema mostrando como ocorre a obtenção de nanobastões
de óxido de ferro, a partir da adsorção das nanopartículas de óxido de ferro(III) em
MG e seu movimento de reptação. Adaptado de 50.
75
No presente trabalho não foi observada a formação de nanobastões porque
a solução de micelas gigantes utilizada está no regime diluído e não apresenta
movimentos de reptação.
76
Capítulo 6
Microscopia eletrônica de transmissão e em temperaturas criogênicas (TEM e
Cryo-TEM)
O modelo de colar de pérolas para o sistema está bem suportado pelo
dados experimentais obtidos até o momento, todavia, estes dados são indiretos e é
necessário um modelo para interpretá-los. Por outro lado, imagens de microscopia
fornecem um resultado direto e complementam as análises de espalhamento. A fim
de obter-se um conjunto de resultados mais completo, foram utilizadas as técnicas de
microscopia eletrônica de transmissão e microscopia eletrônica de transmissão em
temperaturas criogênicas (TEM e Cryo-TEM).
6.1 Fundamentos
Microscopia eletrônica de transmissão (TEM)
As técnicas de espalhamento de luz e espalhamento de raios X são de
extrema importância na caracterização de sistemas coloidais devido a seu resultado
representativo, ou seja, todo o volume da amostra fornece uma resposta ao detector.
Porém, o resultado obtido pela técnica resulta em um valor médio e, ainda, pode trazer
ambiguidades na interpretação. Além disso, técnicas de espalhamento são
dependentes de um modelo, o que pode dificultar a interpretação de estruturas
complexas ou com alta polidispersidade.13
Para complementar as técnicas de espalhamento de luz são muito
utilizadas técnicas de microscopia eletrônica. Esta técnica não apresenta uma
distribuição uniforme da amostra na grade e isso faz com que o resultado obtido por
uma imagem não seja uma resposta média, mas traz informações mais precisas sobre
tamanho e forma, bem como heterogeneidades do sistema.13
A microscopia eletrônica de transmissão (TEM, do inglês, Transmission
Electron Microscopy) é muito utilizada em sistemas coloidais pela sua alta resolução,
quando comparado à microscopia óptica, devido à utilização de um feixe de elétrons.
Como o comprimento de onda do elétron é pequeno, é possível se obter resolução de
ordem atômica. Na análise de TEM é obtida uma imagem que nada mais é que a
77
distribuição da intensidade do feixe de elétrons, resultante da interação do feixe com
a amostra (usualmente a amostra é depositada na forma de um filme fino sobre uma
grade de carbono). A parte do feixe que atravessa o material é focalizada e ampliada
com a ajuda de um conjunto de lentes e recebido pelo detector, que então irá formar
a imagem.
As micelas são formadas por moléculas de surfactantes que, em sua maior
parte, são constituídas por cadeias hidrocarbônicas. Quando as micelas são
colocadas na grade de carbono, o contraste entre a grade e a amostra é muito baixo
e sua visualização é dificultada. Além disso, sistemas supramoleculares sofrem
modificações quando são secados e, devido ao alto vácuo do microscópio, o solvente
evaporaria e comprometeria informações sobre a estrutura dos compostos na forma
hidratada.51,52 Para contornar essas dificuldades, a técnica de Cryo-TEM é de grande
importância para microscopia de sistemas auto-organizados.
Microscopia eletrônica de transmissão em temperaturas criogênicas (Cryo-TEM)
Cryo-TEM envolve a obtenção de imagens por microscopia eletrônica de
transmissão de amostras vitrificadas por abaixamento de temperatura. O processo de
preparação de amostra consiste no rápido congelamento da mesma a temperaturas
criogênicas, transformando o filme fino do solvente com a amostra em um filme
vítreo.51 Essa etapa promove a fixação térmica dos compostos reduzindo a mobilidade
de moléculas e possibilitando a visualização das estruturas auto-organizadas em sua
forma hidratada.52
A amostra para análise de cryo-TEM é obtida, primeiramente, formando um
filme fino sobre a grade de carbono através da retirada do excesso de amostra
depositado sobre a grade (blotting) e então mergulhando-se essa grade em um líquido
criogênico. O filme fino e o mergulho no líquido criogênico é realizado com a ajuda de
um controlador CEVS (do inglês, Controlled Environment Vitrification System). Um
esquema ilustrando o preparo da amostra é mostrado na Figura 36.
78
Figura 36. Esquema de preparação de amostras para Cryo-TEM. a) Amostra líquida
contendo as estruturas de interesse. b) A amostra é depositada na grade. c) A grade
é comprimida com papel de filtro para retirar o excesso de amostra (blotting) e
mergulhada no líquido criogênico. d) A amostra fica alojada dentro do suporte de
carbono e e) o feixe de elétrons atravessa a amostra para que a imagem seja obtida.
Adaptado de 52.
Para amostras aquosas, a taxa de resfriamento para que ocorra a
vitrificação da água é de 105 K s-1.13 Esse resfriamento deve ser rápido para evitar a
formação de gelo cristalino, que pode causar artefatos ópticos e redistribuição do
soluto, uma vez que ele é expulso do retículo cristalino do gelo em formação.13
O líquido criogênico ideal deve ter alta condutividade térmica para que seja
possível o rápido congelamento da amostra, e uma grande diferença entre o ponto de
fusão e ebulição, para minimizar a formação de um filme de gás em volta da amostra,
devido à ebulição do líquido criogênico. Esse efeito é conhecido como efeito
Leidenfrost e faz com que a vitrificação da amostra seja mais lenta, favorecendo a
formação de cristais.13,52 Nitrogênio líquido é pouco utilizado em Cryo-TEM devido a
estreita faixa entre seu ponto de fusão e ebulição.51 Em contrapartida, etano líquido
apresenta todos os requisitos para ser um excelente líquido criogênico e é largamente
utilizado no congelamento de amostras.
No caso de micelas gigantes outro artefato pode ocorrer, que é o
alinhamento das micelas. Para evitar esse efeito é necessário que haja um intervalo
79
entre a formação do filme fino e o mergulho da grade com a amostra no líquido
criogênico, para que as cadeias relaxem e voltem à sua conformação mais estável.13,51
Outra característica das micelas gigantes que pode afetar a análise de
Cryo-TEM é a viscosidade das mesmas. Quanto mais viscosa a amostra, mais difícil
será para se obter um filme fino na grade de carbono e isso interfere na transmissão
dos elétrons do feixe na amostra. Além disso, a viscosidade é diretamente relacionada
com a quantidade de micelas gigantes presentes. Então, se houver muito analito na
grade, a interpretação das imagens pode ser comprometida pela sobreposição de
micelas.
O gelo vitrificado e os compostos orgânicos são muito sensíveis ao efeito
do feixe de elétrons incidente. Para que não ocorram danos na amostra e não se perca
informações sobre os detalhes finos dos compostos é importante trabalhar com o feixe
em baixa dose, ou seja, a exposição da grade com a amostra é de apenas alguns
elétrons por Å2.13 Por outro lado, trabalhar com baixas doses pode acarretar em
problemas de contraste, uma vez que grande parte dos materiais nanoestruturados
são compostos de carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, o que faz com que não
haja muita diferença de contraste com o meio, geralmente aquoso, fazendo com que
a nanoestrutura fique praticamente invisível.51 A dosagem deve ser medida levando
em consideração o melhor compromisso entre contraste e integridade da amostra.
Técnicas de microscopia, tanto cryo-TEM quanto TEM convencional, não
podem ser consideradas técnicas estritamente quantitativas, uma vez que a imagem
obtida é dependente de fatores como a posição da área investigada no eixo óptico do
microscópio, desvios provenientes de condições de foco, por exemplo. Como dito
anteriormente, as técnicas de microscopia e espalhamento (de luz, raios X ou
nêutrons) são complementares e, sempre que possível, o resultado de uma técnica
deve reforçar o resultado da outra.13
6.2 Parte experimental
TEM
O procedimento experimental para se obter as imagens por microscopia
eletrônica de transmissão está descrito anteriormente, no capítulo 3. As amostras
utilizadas apresentam razão [CTAB]/[NaSal] = 1 (3 mmol L-1) e 1 mmol L-1 de FeCl3.
80
Cryo-TEM
Na análise de Cryo-TEM foram utilizadas amostras de MG com e sem NP.
A amostra de MG foi obtida utilizando 3 mmol L-1 de CTAB e NaSal ([CTAB]/[NaSal] =
1). As amostras com NP foram obtidas utilizando concentração fixa de CTAB e FeCl3
(3 e 1 mmol L-1, respectivamente) e variando-se a concentração de NaSal: 3 mmol L- 1
e 1 mmol L-1.
As análises de Cryo-TEM foram conduzidas no mesmo microscópio
eletrônico utilizado para análises de TEM, descrito anteriormente. Para a preparação
da grade com a amostra foi utilizado o sistema Vitrobot, da marca FEI (Figura 37),
com os parâmetros descritos da Tabela 7.
Tabela 7. Parâmetros para preparação de amostra utilizando o Vitrobot.
Tempo de espera
antes do blotting
Força do
blotting
Tempo do
blotting
Tempo de
drenagem
20 s +5 3 s 30 s
Figura 37. Sistema de vitrificação automatizada Vitrobot, da marca FEI.
81
6.3 Resultados e discussão
Na Figura 38 é mostrada uma imagem obtida por TEM da amostra descrita
na parte experimental.
.
Figura 38. Imagem obtida por TEM de uma amostra contendo 3 mmol L-1 de CTAB e
NaSal ([CTAB]/[NaSal] = 1) e 1 mmol L-1 de FeCl3. As setas vermelhas indicam
nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III) e os círculos amarelos mostram algumas
regiões nas quais estas nanopartículas estão alinhadas.
Devido à alta densidade eletrônica do ferro, as NPs estudadas apresentam
alto contraste e não foi necessário utilizar outro tipo de contraste, pela adição de
corantes. Os pontos escuros observados na Figura 38 se tratam das nanopartículas
de oxihidróxido de Fe(III). As setas vermelhas indicam algumas destas nanopartículas.
82
Observa-se também que as FeOOH-NPs não se apresentam em uma
disposição aleatória e são encontradas em aglomerados ou alinhadas, como mostrado
pelos círculos amarelos na Figura 38. Esse alinhamento ocorre devido à interação
com as micelas gigantes, que formam as estruturas de colar de pérolas. Quando a
grade contendo a amostra é secada, as estruturas das MG se desfazem e as
nanopartículas mantém parte da estrutura em que estavam quando em solução
aquosa. O feixe de elétrons do microscópio eletrônico volatiliza a matéria orgânica,
preservando apenas a disposição das nanopartículas de oxihidróxido de Fe(III).
Apesar das FeOOH-NPs serem facilmente observadas por TEM, utilizando
essa técnica perde-se informações sobre as estruturas das micelas gigantes. Para
complementar o estudo, foram realizadas imagens de Cryo-TEM de amostras com a
mesma concentração de MG ([CTAB]/[NaSal] = 1), na ausência e presença de
nanopartículas. Na Figura 39 é mostrada uma imagem de micelas gigantes na
ausência de FeOOH-NPs.
83
Figura 39. Imagem obtida por Cryo-TEM de uma solução de micelas gigantes
composta de 3 mmol L-1 de CTAB e NaSal. As setas em vermelho e azul mostram
estruturas comuns às micelas gigantes.
As setas na Figura 39 sinalizam estruturas comuns em imagens por Cryo-
TEM de micelas gigantes.51 As setas em azul mostram estruturas circulares fechadas.
Apesar de diminuir a entropia da cadeia, a formação dessas estruturas fechadas faz
com que não haja pontas na micela gigante, minimizando a energia livre do sistema,
uma vez que as pontas são mais energéticas que o corpo da MG. Nas setas em
vermelho são mostrados loopings, visualizados em diferentes ângulos e mostrando a
sobreposição das cadeias, aumentando o contraste, evidenciado pelos pontos mais
escuros.
A Figura 40 mostra imagens obtidas por Cryo-TEM de MG com razão
[CTAB]/[NaSal] = 1 (3 mmol L-1 de CTAB e NaSal) e NPs obtidas a partir de 1 mmol L- 1
de FeCl3.
84
Figura 40. Imagens de Cryo-TEM para amostra de MG com nanopartículas de
oxihidróxido de Fe(III), formadas a partir de CTAB e NaSal (3 mmol L-1) e 1 mmol L-1
de FeCl3. As setas amarelas indicam MG sem NPs e as setas vermelhas indicam
estruturas de MG de dimensões maiores, devido à presença de NPs.
85
Nas imagens da Figura 40 é possível ver as estruturas das micelas
gigantes, que se apresentam na forma de fios longos, finos e emaranhados, indicado
pelas setas amarelas. Pode-se também visualizar micelas gigantes de diâmetro maior
e com maior contraste (setas vermelhas), devido à presença de FeOOH-NPs ao longo
de sua estrutura.
Aumentando-se a razão [CTAB]/[NaSal] que irá formar a micela gigante,
aumenta-se também a carga positiva na superfície da mesma. Lembrando que a
nanopartícula de oxihidróxido de ferro(III) tem potencial zeta negativo, espera-se que
a concentração de NPs ao redor da micela gigante aumente. Na Figura 41 são
mostradas imagens de Cryo-TEM de MG com razão [CTAB]/[NaSal] = 3 na presença
das FeOOH-NPs.
86
Figura 41. Imagens de Cryo-TEM para amostra de MG com razão [CTAB]/[NaSal] =
3, na presença de FeOOH-NPs. As setas amarelas indicam MG e as setas vermelhas
indicam NPs próximas à MG. As setas azuis indicam estruturas circulares
possivelmente formadas pelas MG.
87
Como esperado, em MG com carga superficial mais positiva, a quantidade
de nanopartículas ao redor da MG aparentemente é maior. Isso concorda com os
dados obtidos por DLS, nos quais aumentando-se positivamente a carga superficial
da micela gigante é observado um aumento do tempo de perda de correlação (τ), uma
vez que mais nanopartículas estão adsorvidas na MG e a faz difundir mais lentamente.
As imagens da Figura 41 também corroboram com as distâncias médias obtidas pela
aplicação do modelo do colar de pérolas (Tabela 6), na qual observa-se que, em
média, a distância entre as nanopartículas é muito pequena.
Ainda na Figura 41 são observada estruturas circulares, indicadas pelas
setas azuis. Sabendo que as micelas gigantes podem formar estruturas circulares e
pelo alto contraste nas bordas dessa estrutura, uma explicação é que seja uma alta
concentração de NPs ao redor das estruturas circulares de micela gigante. Porém,
não há uma explicação definitiva e mais estudos devem ser realizados.
88
Capítulo 7
Reologia – Redução de atrito hidrodinâmico (HDR)
Foi mostrado nos experimentos de DLS e SAXS a adsorção das
nanopartículas nas cadeias das micelas gigantes. Procurou-se então outra evidência
deste arranjo. Com este objetivo, estudou-se a influência das nanopartículas de
oxihidróxido de Fe(III) sobre a estabilidade térmica das micelas gigantes. Sabe-se que
as micelas gigantes são eficientes agentes para reduzir o atrito hidrodinâmico em
soluções aquosas submetidas a regimes turbulentos. Uma vez que as micelas
gigantes são formadas por arranjos não covalentes, elas desagregam a partir de
determinada temperatura e perdem a capacidade de reduzir o atrito hidrodinâmico.
Assim, utilizou-se desta propriedade térmica para avaliar a influência das
nanopartículas sobre a estabilidade das micelas gigantes e concluir se, de fato, as
partículas estavam ligadas às cadeias micelares.
7.1 Fundamentos
A redução de atrito hidrodinâmico (HDR, do inglês Hydrodynamic Drag
Reduction) é um fenômeno conhecido desde 1948, quando foi descoberto pelo
químico B. A. Toms, quando ele observou que uma pequena quantidade de polímero
com alta massa molar, adicionado à uma solução, era capaz de diminuir a resistência
ao escoamento, quando comparado ao solvente puro.53
Um dos testes mais conhecidos de redução de atrito foi realizado no corpo
de bombeiros de Nova York, no qual foi colocada uma bomba para impulsionar água
em mangueiras de mesmo comprimento, na qual uma delas havia somente água e na
outra havia água e 30 ppm de poli(óxido de etileno). Nota-se claramente, pela Figura
42, que o jato da mangueira contendo poli(óxido de etileno) é lançado em distâncias
maiores que a mangueira contendo somente água.54
89
Figura 42. Ensaio no corpo de bombeiros de Nova York, no qual testa-se a redução
de atrito provocada por uma solução 30 ppm de poli (óxido de etileno) em comparação
com a água pura. Reproduzido de 54.
A redução de atrito é observada somente em regimes turbulentos. No
regime laminar, o fluido desliza em baixas velocidades por camadas paralelas durante
o escoamento, dissipando pouco a energia cinética do fluido. Conforme aumenta-se
a velocidade, as forças inerciais são maiores que as forças de viscosidade do fluido e
isso provoca a formação de vórtices, tornando o sistema caótico, com moléculas
descrevendo movimentos irregulares e aleatórios e aumentando a dissipação de
energia.53,55
No regime turbulento, os vórtices formados podem apresentar diversos
tamanhos. Vórtices grandes podem transportar o fluido sem grande perda de energia.
Porém, ao aumentar a taxa de cisalhamento do fluido, esses vórtices grandes evoluem
para vórtices cada vez menores e estes são capazes de dissipar a energia do meio.
Quando a dimensão dos vórtices é da mesma ordem da difusão molecular, a
dissipação de energia se torna muito elevada. Neste regime, diz-se que se inicia a
Cascata de Kolmogorov. A adição de uma pequena quantidade de polímero impede
que esses vórtices evoluam para vórtices menores através do efeito de alongamento
e relaxação das cadeias. O cisalhamento no fluido causa um alongamento das
cadeias e por efeito entrópico, elas retornam ao estado enovelado. Esse movimento
das cadeias poliméricas faz com que elas armazenem parte da energia que seria
dissipada, minimizando os efeitos da cascata de Kolmogorov.24 Na Figura 43 é
90
mostrado um esquema representando a progressão da cascata de Kolmogorov e a
atuação das cadeias alongadas.
Figura 43. Esquema representando a evolução dos vórtices grandes em vórtices
menores no regime turbulento (cascata de Kolmogorov) e a interferência de cadeias
alongadas nessa evolução. Reproduzido de 56.
Assim como os polímeros de alta massa molar com cadeias flexíveis, as
micelas gigantes também atuam como redutoras de atrito. Porém, ao contrário dos
sistemas poliméricos que quando expostos ao cisalhamento intenso sofrem
degradação irreversível pela quebra das ligações covalentes, as micelas gigantes têm
a capacidade de se reagregarem, mesmo depois de expostas a um cisalhamento,
dada a sua natureza supramolecular.13,24
Nakken e colaboradores57 apresentaram uma nova técnica para estudar a
redução de atrito hidrodinâmico usando um reômetro contendo sensores cilíndricos
concêntricos (Figura 44).
Figura 44. Esquema do equipamento usado para medida da redução de atrito
hidrodinâmico em um reômetro rotacional. Reproduzido de 53.
91
A amostra preenche o compartimento que fica entre os dois cilindros e o
torque aplicado é avaliado à medida que a velocidade angular Ω é aumentada. Um
diagrama típico é obtido quando se usa essa técnica, na qual se mede o torque
aplicado no cilindro rotatório, para mantê-lo rodando em determinada rotação
(tipicamente a rotação pode atingir até 1200 rpm). Este diagrama está apresentado
na Figura 45.
Figura 45. Curva de fluxo (torque em função da velocidade angular) para o solvente
puro (linha contínua) e para o solvente contendo um polímero redutor de atrito (linha
tracejada). Reproduzido de 53.
A grande sensibilidade dessa técnica permitiu estudos sobre a estabilidade
térmica das micelas gigantes.24,58,59 Nestes experimentos, o reômetro atua como um
torquímetro, em que é medido o torque que o equipamento deve fornecer à solução
de micela gigante para que a taxa de cisalhamento (ou velocidade angular)
permaneça constante, em função de uma rampa de temperatura. Observa-se que a
solução contendo micela gigante necessita de um torque menor para manter a mesma
taxa de cisalhamento em uma determinada temperatura, quando comparado com o
solvente puro, isso porque a dissipação de energia é menor e é menos energético
fazer a amostra fluir. Quando se alcança determinada temperatura, não há mais
diferença entre os torques aplicados na amostra com micelas gigantes e no solvente
puro. Isso mostra que naquela temperatura (temperatura crítica) a micela gigante não
é mais estável. A energia térmica supera a energia coesiva que mantinha o grande
agregado (micela gigante). Acima da temperatura crítica são formados agregados
menores que não apresentam capacidade de reduzir o atrito hidrodinâmico. Na Figura
92
46 é mostrada uma curva típica de redução de atrito hidrodinâmico usada para
avaliação da estabilidade térmica das micelas gigantes.
Figura 46. Curva típica para a estabilidade térmica das micelas gigantes, em que a
rotação em regime turbulento é mantida constante. Reproduzido de 53.
A destruição das micelas gigantes devido o aumento da temperatura resulta
na imediata perda da capacidade de redução de atrito hidrodinâmico e o nível de
turbulência retorna aos valores para a água sem o aditivo.
A temperatura de quebra das micelas gigantes é dependente da natureza
do surfactante e cossoluto utilizados, além da concentração de ambos.59,58 A redução
de atrito hidrodinâmico é uma boa técnica para avaliar se há estruturas alongadas no
sistema de estudo, ou ainda estudar interferentes da estabilidade das micelas
gigantes.
7.2 Parte experimental
As amostras estudadas por reologia apresentam mesma concentração das
amostras descritas na Figura 15. Também foram realizados testes com amostras sem
FeCl3, para efeito de comparação.
Os experimentos reológicos foram conduzidos no reômetro RheoStress
Haake RS1 (Figura 47A). A geometria utilizada foi a de dupla fenda (Figura 47B), na
qual são formadas 4 paredes de contato entre a amostra e a geometria, aumentando-
se a área superficial.
93
Na geometria dupla fenda são adicionados 10 mL de solução no copo e o
rotor se posiciona em uma altura de 5,1 mm da base do copo. Aplicou-se uma rotação
fixa de 1544 rpm (para se garantir o regime turbulento) e uma rampa de aquecimento
de 20 a 90°C com uma taxa de 0,018 °C s-1 e o torque aplicado para manter a rotação
é medido em função da temperatura.
Figura 47. Imagens A) Reômetro RheoStress Haake RS1; B) Geometria de dupla
fenda: rotor (esquerda) e copo (direita).
7.3 Resultados e Discussão
A fim de se avaliar se a presença das nanopartículas de oxihidróxido de
Fe(III) interferem na estabilidade térmica da micela gigante, foram realizados
experimentos de redução de atrito hidrodinâmico. Na Figura 48 são mostrados dois
gráficos com as curvas de redução de atrito obtidas para amostras de MG com e sem
as NPs.
94
Figura 48. Curvas de redução de atrito hidrodinâmico obtidas para amostras de MG
em diferentes razões de [CTAB]/[NaSal] (indicadas na legenda dos gráficos) e A)
ausência de FeOOH-NPs e B) presença de FeOOH-NPs. As curvas foram deslocadas
no eixo Y para facilitar a visualização das mesmas.
Algumas temperaturas críticas de quebra estão indicadas pelas setas
pretas nos gráficos. Nota-se que a amostra com razão [CTAB]/[NaSal] = 0,16 não
apresenta temperatura crítica de quebra, possivelmente porque não há agregados
95
grandes o suficiente para provocar o fenômeno da redução de atrito. As curvas para
essas amostras apresentam uma inclinação constante. Para todas as outras razões
foram observadas mudanças na inclinação e foram extraídas informações da
temperatura de quebra das MG. Um gráfico relacionando as temperaturas de quebra
das MG com e sem as nanopartículas está mostrado na Figura 49.
0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0
35
40
45
50
55
60
65
70
Sem nanopartículas
Com nanopartículas
Te
mp
era
tura
(°C
)
[CTAB]/[NaSal]
Figura 49. Temperatura de quebra das micelas gigantes na presença e ausência de
nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III).
A partir dos dados mostrados na Figura 49, observa-se que todas as
temperaturas de quebra das amostras contendo FeOOH-NPs estão abaixo daquelas
que contém apenas a MG. A diferença entre as temperaturas críticas de amostras
com e sem NPs é cerca de 3 a 5 °C. Esse resultado mostra que na presença das
nanopartículas de oxihidróxido de Fe(III), as micelas gigantes ficam mais frágeis
termicamente. De certa forma, o resultado indica uma influência direta das
nanopartículas nas propriedades reológicas das micelas gigantes. Se as NPs
estivessem soltas, ou seja, não ligadas nas MG, então, a princípio, poderia se esperar
que as diferenças nas temperaturas de quebra não fossem diferentes das micelas
gigantes sem as NPs de oxihidróxido de Fe(III). Com a adsorção de nanopartículas
96
ao longo da MG, ocorre a formação de pontos de enfraquecimento e, quando estas
estruturas são submetidas ao processo de aquecimento/cisalhamento se quebram
com mais facilidade. Esses pontos de enfraquecimento podem ser devidos à
neutralização da carga da MG pela nanopartícula naquele ponto. De qualquer forma,
este resultado corrobora os anteriores sobre a formação do colar de pérolas.
97
Capítulo 8
Conclusões
Este trabalho mostra que nanopartículas de oxihidróxido de ferro(III) são
formadas e estabilizadas a partir da mistura de FeCl3 com NaOH na presença de
micelas gigantes. As nanopartículas, formadas in situ, apresentam diâmetro de 3 a 5
nm. Este tamanho reduzido pode ser devido à nucleação das nanopartículas próximo
à estrutura das micelas gigantes, as quais evitam o crescimento das NPs.
O potencial zeta das estruturas estudadas guarda grande relação com a
estabilidade coloidal. O fato do potencial zeta das nanopartículas ser negativo e a
observação de que a estabilidade coloidal se dá em soluções que apresentam micelas
gigantes positivas nos leva à conclusão que essa estabilidade ocorre por interação
eletrostática entre as espécies.
Além disso, a forma como as micelas gigantes e nanopartículas se
arranjam pode ser determinada pelas análises de espalhamento de radiação. Com os
dados obtidos por DLS e SAXS sugeriu-se uma estruturação seguindo o modelo do
“colar de pérolas”, no qual as nanopartículas de oxihidróxido de Fe(III) estão
adsorvidas ao longo das micelas gigantes. Complementando esses resultados, as
imagens obtidas por TEM e Cryo-TEM corroboram com o modelo proposto: observa-
se uma maior concentração de nanopartículas ao redor das micelas gigantes e poucas
nanopartículas espalhadas aleatoriamente pela amostra.
Termodinamicamente, toda dispersão tende a coalescer, a fim de minimizar
a área. Todavia, dispersões com alta estabilidade cinética protelam essa
coalescência. O presente trabalho mostra que a presença de micelas gigantes, com
determinadas razões de [CTAB]/[NaSal], conferem às nanopartículas de oxihidróxidos
de ferro(III) estabilidade cinética elevada, uma vez que as amostras se mantiveram
estáveis por vários meses.
98
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