UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA IGHOR POSSAMAI …

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA IGHOR POSSAMAI NICOLETI REPRODUÇÃO ASSISTIDA POST MORTEM: A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO LIMITE TEMPORAL DE 2(DOIS) ANOS, PREVISTO NO ART. 1.800, § 4º DO CÓDIGO CIVIL Araranguá 2021

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA

IGHOR POSSAMAI NICOLETI

REPRODUÇÃO ASSISTIDA POST MORTEM:

A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO LIMITE TEMPORAL DE 2(DOIS) ANOS,

PREVISTO NO ART. 1.800, § 4º DO CÓDIGO CIVIL

Araranguá

2021

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IGHOR POSSAMAI NICOLETI

REPRODUÇÃO ASSISTIDA POST MORTEM:

A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO LIMITE TEMPORAL DE 2(DOIS) ANOS,

PREVISTO NO ART. 1.800, § 4º DO CÓDIGO CIVIL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

ao Curso de Graduação em Direito da

Universidade do Sul de Santa Catarina, como

requisito parcial à obtenção do título de

Bacharel em Direito.

Orientadora: Prof. Fátima Hassan Caldeira, Drª

Araranguá

2021

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IGHOR POSSAMAI NICOLETI

REPRODUÇÃO ASSISTIDA POST MORTEM:

A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO LIMITE TEMPORAL DE 2(DOIS) ANOS,

PREVISTO NO ART. 1.800, §4º DO CÓDIGO CIVIL

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi

julgado adequado à obtenção do título de

Bacharel em Direito, aprovado em sua forma

final pelo Curso de Graduação em Direito da

Universidade do Sul de Santa Catarina.

Araranguá, 06 de julho de 2021.

______________________________________________________

Professora e orientadora Fátima Hassan Caldeira, Doutora.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________

Professor Arnildo Steckert Junior, Especialista.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________

Professora Nádila da Silva Hassan, Especialista.

Universidade do Sul de Santa Catarina

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Dedico a presente monografia aos amigos e

colegas do curso, em especial à minha família.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos familiares por suportar o mau humor em tempos difíceis de home

office. Ao meu cão, um “filho” que constantemente invadia a casa em busca de afeto ou,

quando ao furtar algum objeto, saia em fuga para me perturbar, ou melhor, me animar.

Agradeço também à orientadora Fátima Hassan Caldeira, a qual me ajudou a

reescrever os termos xucros. E à minha supervisora de estágio no TJSC, Solange Martins Jose

Bez Batti, que com paciência ensinou-me a essência do Judiciário em uma perspectiva única.

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RESUMO

A presente monografia visa examinar a (in)constitucionalidade do limite da temporalidade,

previsto no art. 1.800, § 4º do Código Civil, ou seja, do direito sucessório de 2 (dois) anos, do

filho não nascido. O tema, ora discutido, é oriundo principalmente da doutrina, em razão de

ser uma realidade difícil de presenciar, porém não muito distante, haja vista, o crescente

número de embriões criopreservados no banco de dados nacional, o que dá origem à

discussão, diante da omissão do legislador acerca da reprodução assistida no campo

sucessório, frente aos princípios de igualdade, principalmente à luz da filiação. Como

metodologia, utilizou-se a pesquisa bibliográfica e documental. Diante da análise realizada,

concluiu-se que é injusto o filho concebido posteriormente ao lapso temporal de dois anos ser

excluído da herança. Assim, é mister que o Direito evolua, principalmente na seara sucessória,

para que se criem leis que possam dirimir esses conflitos de tal modo que ele possa garantir os

direitos daqueles que o buscam.

Palavras-chave: Direito sucessório. Reprodução assistida. Post mortem.

(In)constitucionalidade.

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ABSTRACT

This monograph aims to examine the (un)constitutionality of the temporal limit, provided for

in art. 1.800, § 4 of the Civil Code, that is, the right of succession of 2 (two) years, of the

unborn child. The theme, discussed here, comes mainly from the doctrine, as it is a difficult

reality to witness, but not too far away, given the growing number of cryopreserved embryos

in the national database, which gives rise to the discussion, given the omission of the

legislator about assisted reproduction in the field of succession, in view of the principles of

equality, especially in light of affiliation. As a methodology, bibliographic and documentary

research was used. Based on the analysis carried out, it was concluded that it is unfair for a

child conceived after the two-year period to be excluded from inheritance. Thus, it is essential

that the Law evolve, especially in the succession area, so that laws can be created that can

settle these conflicts in such a way that it can guarantee the rights of those who seek it.

Keywords: Inheritance law. Assisted reproduction. Post mortem. (Un)constitutionality.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 8

2 DA FILIAÇÃO ................................................................................................................... 13

2.1 CONCEITUAÇÃO .......................................................................................................... 13

2.2 CRITÉRIOS DE ORIGEM DA FILIAÇÃO ANTES DA CONSTITUIÇÃO DE 1988 . 14

2.3 DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE DA FILIAÇÃO ..................................................... 16

2.4 PRINCIPAIS DIREITOS DECORRENTES DA FILIAÇÃO ........................................ 18

3 DA REPRODUÇÃO ASSISTIDA ..................................................................................... 20

3.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS ........................................................................................ 20

3.2 DA FALTA DE PRINCÍPIOS REGENTES ................................................................... 21

3.3 FERTILIZAÇÃO IN VITRO ............................................................................................ 24

3.4 INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL ...................................................................................... 29

3.5 REPRODUÇÃO HOMÓLOGA ...................................................................................... 30

3.6 REPRODUÇÃO HETERÓLOGA ................................................................................... 30

4 DIREITO A HERANÇA APÓS O LIMITE TEMPORAL DE DOIS ANOS ................... 32

4.1 ESPÉCIES DE SUCESSÃO HEREDITÁRIA ................................................................ 32

4.1.1 Sucessão hereditária legítima ........................................................................................ 32

4.1.2 A sucessão hereditária testamentária............................................................................. 33

4.2 A ORDEM DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA ................................................................ 34

4.3 CAPACIDADE SUCESSÓRIA ...................................................................................... 35

4.4 A PROLE EVENTUAL ................................................................................................... 36

4.4.1 A prole eventual na sucessão legítima .......................................................................... 36

4.4.2 A prole eventual na sucessão testamentária .................................................................. 37

4.4.3 O embrião excedentário ................................................................................................ 38

4.5 O PRAZO DE DOIS ANOS DO ART. 1.800, § 4º COMO LIMITADOR DA

EFICÁCIA DOS DIREITOS DECORRENTES DA FILIAÇÃO ........................................... 40

5 CONCLUSÃO .................................................................................................................... 45

REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 48

8

1 INTRODUÇÃO

A presente monografia propõe um exame sobre o art. 1.800, § 4º, do Código Civil,

no que diz respeito à sua (in)constitucionalidade, referindo-se ao limite temporal de dois anos

para se reclamarem direitos sucessórios daquele que foi alvo de reprodução assistida post

mortem, sob o enfoque dos princípios constitucionais, especialmente do princípio à vedação

ao tratamento desigual entre os filhos (BRASIL, CC, 2021).

O tema em discussão é a reprodução assistida post mortem, haja vista que o

legislador fora omisso em relação ao tema ao redigir o capítulo da sucessão em geral,

deixando margem para uma relevante discussão por parte da doutrina.

Diante disso e, antes de adentrarmos na questão atinente ao prazo acerca da

reprodução assistida post mortem para reclamar o recebimento de herança, se faz necessário

entender, onde o não concebido se enquadra na moldura legislativa acerca da sucessão.

A primeira referência, acerca do não concebido, encontra-se no artigo 1.798 do

CC, que afirma serem pessoas legítimas a suceder as nascidas, ou já concebidas, no momento

da abertura da sucessão (BRASIL, CC, 2021).

Todavia, o mesmo Código Civil, no artigo 1.597, em seu inciso III, trata da

fecundação artificial do marido falecido, considerando que a referida prole é concebida na

constância do casamento (BRASIL, CC, 2021).

No entanto, a Constituição Federal trata todos os filhos, sejam eles biológicos ou

socioafetivos, tidos na constância do casamento ou fora dela, como filhos legítimos à

sucessão. Logo, não poderia haver qualquer discriminação ao filho concebido por

inseminação artificial, autorizada após a morte do de cujus.

Já a legislação cível no campo da sucessão testamentária, prevê, ainda, a

possibilidade de o testador indicar filho ainda não concebido.

Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:

I - os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que

vivas estas ao abrir-se a sucessão (BRASIL, CC, 2021).

Nota-se no texto, que o legislador não atentou-se à evolução e às novas

possibilidades advindas da tecnologia na atualidade.

Como já exposto e, com base na letra da lei, temos a prole ainda não concebida

como possível herdeira. Contudo, o artigo subsequente, em seu parágrafo 4º, nos revela outro

elemento, onde o ainda não concebido terá direito à herança no prazo de dois anos do

falecimento do autor da mesma. Contudo, caso tal direito não seja exercido, os bens factíveis

de herança, dispor-se-ão aos legítimos herdeiros em espera.

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Art. 1.800. No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão

confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz.

[...]

§ 4º Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o

herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador,

caberão aos herdeiros legítimos (BRASIL, CC, 2021).

Percebe-se então, à controvérsia que guia esta pesquisa. Nota-se, pela leitura do

capítulo de sucessões, que o prazo visa dar segurança aos outros herdeiros legítimos.

Contudo, é o prazo suficiente e razoável a favor da prole ainda não concebida? O

tempo aprazado seria constitucional? Qual prazo seria possível para resolver a questão? Seria

possível a dilação do prazo? Far-se-ia justiça ao filho concebido posteriormente aos dois anos,

ser excluído da herança?

Mediante o até aqui exposto, seria pertinente perquirir esse dispositivo legal

acerca de sua (in)constitucionalidade, notadamente parco, no que se refere ao tempo para à

tutela da prole concebida posteriormente a esse biênio.

Frise-se que a situação dos ainda não nascidos passou por uma ampla discussão já

no século XX. Observa-se que os mesmos tiveram reconhecidos seus direitos, após árduo

conflito no âmbito do direito sucessório brasileiro no ano de 2002, através do art. 1.798 e do

próprio art. 2º, ambos do CC (BRASIL, CC, 2021).

Porém, aqueles não concebidos por inseminação post mortem posteriormente ao

lapso temporal, já abrigado pela lei cível, foram esquecidos pelo legislador e tal abstração,

gera dúvidas doutrinárias, o que abre lacunas à insegurança jurídica.

De acordo com Dias (2015, p. 131), em se tratando de técnicas de reprodução

assistida no direito sucessório, “[...] o legislador ao formular a regra contida no art. 1798 do

CC, não atentou para os avanços científicos na área da reprodução humana, ao se referir

somente as pessoas já concebidas. Mais Um cochilo que traz muitas incertezas”.

Consequentemente, percebe-se na atualidade, haver um crescente uso das vias da

inseminação artificial. Pois de acordo com o relatório da SisEmbrio, órgão da Anvisa,

competente nesse tema, de 2012 a 2018 o uso de embriões congelados quase triplicou, como

mostra o gráfico a seguir:

Gráfico 1- índice de elevação dos números de embriões congelados

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Fonte: ANVISA (2019, p. 4).

Assim, cada vez mais se perquire acerca das consequências jurídicas advindas

dessa realidade.

Uma dessas celeumas cerca a questão atinente à herança no que diz respeito à

reprodução assistida post mortem.

Com efeito, a relevância jurídica sobre o tema está presente na clara perspectiva

de um maior uso, pelos interessados, até mesmo pela sociedade como um todo, a alternativa

da reprodução artificial. Mediante a relevância do tema, o presente trabalho considera a

discussão do elemento constitucional fundamental, pois o que está em jogo é o direito à

igualdade, e, notadamente, aqui, a igualdade entre os filhos.

Diante do que se expõe, se faz necessário retroceder de modo a visualizar esse

campo e discorrer sobre os direitos já garantidos, sobrevindo assim, uma nova visão sobre o

tema estudado. Há, contudo, uma certa resistência doutrinária acerca do objeto de estudo, uma

vez que este pode gerar posições discriminatórias, pois, ao trata-se de uma área obscura para o

Judiciário, quando este vier a ser provocado, pode não ter embasamento, ou até mesmo optar

por escolhas duvidosas.

Assim, vista a pouca fundamentação jurídica sobre o embate, observa-se que a

discussão gera insegurança, e o direito, que exatamente tem como princípio a proteção contra

a desigualdade, pode gerar situações de tratamentos injustos e violadores da igualdade de

filiação preconizada pela Constituição Federal.

Portanto, acredita-se, na urgência do debate sobre o tema e ponderar sobre tal

evolução. A inseminação post mortem é cada vez mais presente em nossa realidade, logo,

evidencia-se a urgente necessidade de referenciais jurídicos, seguros e estáveis para lidar com

os direitos dos ainda não concebidos.

Para tanto, se faz necessário examinar o art. 1800, § 4º, especialmente acerca da

sua (in)constitucionalidade no que diz respeito ao limite temporal, que hoje é de dois anos

para se reclamarem os direitos sucessórios daquele que fora concebido a partir da reprodução

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assistida post mortem, sob o enfoque dos princípios constitucionais, em especial do princípio

à vedação ao tratamento desigual entre os filhos (BRASIL, CC, 2021).

Contudo, há que se verificar as possibilidades que ocasione a

inconstitucionalidade do prazo de 02 anos, previsto no art. 1.800, § 4º do Código Civil e

analisar sob a ótica da lei, qual prazo seria o mais adequado à garantir o direito do ainda não

concebido, ou, ainda, verificar a viabilidade constitucional de qualquer limitação temporal

nesse sentido.

Dias (2015, p. 133) defende o herdeiro ainda não concebido como legítimo e

necessário. Assim, o mesmo estaria abrigado pelo princípio da igualdade, com respaldo em

nossa Constituição Federal, a qual não traz qualquer exceção. In verbis:

Art. 227 [...]

§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os

mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias

relativas à filiação (BRASIL, CFRB, 2021).

Diante do que se expõe, este estudo aferirá a necessidade de uma garantia

uniforme em face de todos os herdeiros legítimos, independente do contexto pelo qual se

originou a filiação.

Uma situação que ilustra a realidade fática do quanto o nosso alvo de estudos trata

acerca de vidas e de famílias, trata-se da situação exposta por Saraiva (2020, p. 1):

Figura 1 – Foto que ilustra o texto de Saraiva

Fonte: Saraiva (2020, p. 1).

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Trata-se de um caso real onde,

Samille Ladim, de 33 anos, não deixou os desafios da vida abalarem seus sonhos de

aumentar a família. A empresário de Volta Redonda, no Rio de Janeiro, perdeu o

marido, Cleberson Landim, para um tumor cerebral, em 2010. Na época, o casal fez

fertilização in vitro para ter o primeiro filho: Pietro Cássio. Com os embriões

estavam guardados desde então, Samille resolveu que era hora de engravidar

novamente do marido. Hoje, ela espera pelo bebê que deve nascer em fevereiro de

2021 (SARAIVA, 2020, p. 1).

Segundo a autora, o próprio marido de Samille deixou um último pedido: “busque

os nossos bebês”. Os embriões haviam ficado guardados em uma clínica de fertilização, o que

garantira a tutela aos mesmos até o final de 2020. Cabe aqui mencionar que o marido de

Samille não deixou autorização impressa para a inseminação post mortem, porém sua esposa

acionou a justiça, o que lhe deu o direito à liberação dos embriões por meio do acordo

judicial.

A situação ilustra o fato de estarmos discutindo sobre um ser que não pediu para

nascer, mas que veio em decorrência da vontade dos pais. A imagem da matéria de Saraiva

tem o condão de lembrar-nos de que a inseminação artificial é uma realidade que está entre

nós, assim, acredita-se ser questão de tempo até que as implicações sucessórias dos

procedimentos post mortem cheguem ao Judiciário.

A presente monografia estrutura-se em três capítulos. No primeiro, evidencia-se o

conceito de filiação, critérios de origem, a própria norma de proteção, bem como os direitos

decorrentes dela. No segundo capítulo, busca-se elucidar as técnicas de reprodução assistida.

No terceiro e último capítulo, atenta-se ao cerne do objetivo da pesquisa, ou seja, a

reprodução assistida dentro do campo sucessório e a análise do limite temporal para reclamar-

se a mesma.

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2 DA FILIAÇÃO

Dividiu-se esse capítulo em quatro subtítulos: o primeiro traz a conceituação de

filiação; o segundo apresenta os critérios de origem da filiação anteriores à Constituição de

1988; o terceiro analisa o princípio da igualdade da filiação e, por fim, o quarto expõe os

principais direitos decorrentes da filiação.

2.1 CONCEITUAÇÃO

Antes de adentrarmos em aspectos mais específicos da filiação, necessita-se

conceituá-la, pois é dela que discorrerá o cerne da presente discussão. Sendo assim, a filiação

trata-se da relação de parentesco entre pais e filhos. Para Gonçalves, “Filiação é a relação de

parentesco consanguíneo, em primeiro grau e em linha reta, que liga uma pessoa àquelas que

a geraram, ou a receberam como se a tivessem gerado” (2020, p. 402).

Percebe-se que o autor faz referência a duas formas de filiação: a “de sangue” ou

consanguínea, a qual obrigatoriamente envolve DNA; e aquela cuja família a recebe como se

houvessem gerado, ou seja, a chamada filiação socioafetiva, seja por adoção ou situações

afins.

Azevedo, por sua vez, especifica a filiação distinguindo a paternidade da

maternidade, quando afirma que

Filiação é a relação jurídica que se estabelece entre o filho e seus pais; inversamente,

a relação entre pai e filho é chamada de paternidade, e entre mãe e filho, conhecida

por maternidade. São pessoas que descendem umas das outras ou ligadas pelo

vínculo da adoção (2019, p. 367).

Ao adentrar no campo da sucessão e ao abordar o laço familiar, Dias (2015, p. 41)

afirma que se trata da “[...] escolha dos parentes que irão suceder”, pressupondo-se “que o

desejo das pessoas é contemplar os mais chegados”, ou seja, trata-se da escolha de qual

parente herdará o trabalho de uma vida.

Pensando-se acerca da prole, é comum que tal escolha seja repleta de afeto e de

carinho, pois para os pais, trata-se intrinsecamente de uma parte sua, um vínculo imensurável.

Por outra ótica, não é diferente a um filho, no curso normal de sua vida, afirmar que seus pais

são tudo, um porto seguro, quem lhes dá a vida e o motivo da mesma, alguém em quem nos

espelhamos e de quem nos orgulhamos.

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Já conceituado o termo filiação, bem como demonstrada sua principal

característica dentro da sucessão, na próxima seção, apresentar-se-ão os critérios de origem da

filiação antes da Constituição de 1988.

2.2 CRITÉRIOS DE ORIGEM DA FILIAÇÃO ANTES DA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Antes da análise da legislação anterior à Carta Magna, necessita-se refletir sobre a

família “antiga”, erigida sob tradições culturais e religiosas, as quais não estão muito distantes

dos dias atuais.

A entidade familiar compunha-se de um provedor, o chefe da família, o qual

necessariamente era o homem, acompanhado de sua mulher, em geral dona de casa, cujos

afazeres resumiam-se à lida doméstica e aos cuidados com os filhos.

Constatava-se uma rotina em que a filha deixava o poder do pai para passar ao

poder do marido. Segundo Nader (2016, p. 46), “ao se casar, a mulher [...] desligava-se de sua

família original, para integrar a do marido, e os antepassados dele eram seus antepassados”,

algo que só começou a sofrer alteração na época da revolução industrial.

Este quadro não resistiu à revolução industrial, que fez aumentar a necessidade de

mão de obra, principalmente para desempenhar atividades terciárias. Foi assim que a

mulher ingressou no mercado de trabalho, deixando o homem de ser a única fonte de

subsistência da família. A estrutura da família se alterou. Tornou-se nuclear, restrita

ao casal e a sua prole (DIAS, 2016, p. 48).

Alterada a estrutura familiar em decorrência de mudanças sociais e econômicas,

faz-se necessário identificar os princípios que norteiam a filiação. Para tanto, observa-se a

necessidade de rever a legislação do século passado, uma vez que a compreensão das leis

ajuda-nos a captar a evolução da sociedade, e, ainda, pode ser capaz de demonstrar que a

norma, que hoje é aceitável, poderá ser descabida em um futuro próximo.

Começamos pelo Código Civil de 1916, em relação ao qual Azevedo considera

odiosa a comparação entre as espécies de filiações. Afirma o autor que

Filhos legítimos eram os nascidos dos pais, durante seu casamento. Os filhos

legitimados eram os concebidos por pessoa não casadas, que se casavam

posteriormente (legimatio per subsequens matrimonium). Filhos ilegítimos eram os

de pessoas não casadas, considerados naturais quando não havia impedimentos

matrimoniais entre os pais; ou espúrios por já estar casado um dos pais (filhos

adulterinos) ou por existir entre estes relação de impedimentos que obstavam seu

casamento (filhos incestuosos), por parentesco próximo (AZEVEDO, 2019, p. 367).

A própria leitura das nomenclaturas dadas a cada origem de filiação, na

atualidade, causa um certo estranhamento. Vejamos o que traz a legislação em comento, pois

a mesma norteava a doutrina na época de sua vigência. Assim, o art. 358 afirmava que: “Os

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filhos incestuosos e os adulterinos não podem ser reconhecidos” (BRASIL, CC, 1916). Como

se percebe é algo que não se coaduna com a visão atual de filiação.

Madaleno também não destoa, fazendo menção à legislação, afirma que

[...] o odioso artigo 358 do Código Civil de 1916, que vedava o reconhecimento dos

filhos incestuosos e adulterinos, negando-lhes identidade, personalidade e dignidade,

como se eles fossem responsáveis pelas escolhas afetivas e procriadoras de seus pais

(2018, p. 146).

Em relação à essa mesma situação, Dias afirma que

Até o advento da Constituição Federal, que proibiu designações discriminatórias

relativas à filiação, filho era exclusivamente o ser nascido 180 dias após o

casamento de um homem e uma mulher, ou 300 dias depois do fim do

relacionamento. Essas presunções buscavam prestigiar a família, único reduto em

que era aceita a procriação (2016, p. 653).

Nos dias atuais, perguntar-nos-íamos: como uma legislação não reconhecia a

filiação de alguém pelo simples fato de seu nascimento ter derivado de uma relação

extraconjugal ou de uma situação incestuosa, levando, inclusive, à impossibilidade de que

houvesse a investigação da paternidade?

Pois bem, com a Lei nº 883/49, embora ainda tímida, passou a ter uma nova visão

sobre o fato. In verbis:

Art. 1º Dissolvida a sociedade conjugal, será permitido a qualquer dos cônjuges o

reconhecimento do filho havido fora do matrimônio e, ao filho a ação para que se

lhe declare a filiação.

Art. 2º O filho reconhecido na forma desta Lei, para efeitos econômicos, terá o

direito, a título de amparo social, à metade da herança que vier a receber o filho

legítimo ou legitimado. (BRASIL, Lei nº 883, 1949).

Observa-se, na letra da lei, que o preconceito ainda persistia, uma vez que só

possibilitava a alteração do estado da filiação após a dissolução da sociedade conjugal. Além

disso, o art. 2º traz a possibilidade de ser destinada apenas a metade da herança de um filho

legítimo ou legitimado, àquele que fosse considerado ilegítimo.

Ou seja, os pais cometiam “erros”, os quais, vale relembrar, eram considerados

crimes à época, e o filho, o qual não tinha culpa nenhuma, carregava sua desonra.

Dias vai além, traz-nos uma explicação acerca dessas rotulações, resumindo o

problema ao controle do patrimônio.

A necessidade de preservação do núcleo familiar - leia-se, preservação do

patrimônio da família - autorizava que os filhos fossem catalogados de forma

absolutamente cruel.

[...]

E negar reconhecimento ao filho é excluir-lhe direitos, é punir quem não tem culpa,

é brindar quem infringiu os ditames legais. O nascimento de filho fora do casamento

colocava-o em uma situação marginalizada para garantir a paz social do lar formado

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pelo casamento do pai. Prevaleciam os interesses da instituição matrimônio (DIAS,

2016, p. 654).

Contudo, parte dessa situação, fora “reparada” na Lei do Divórcio, Lei nº

6.515/77, mais especificamente em seu art. 51, o qual reconheceu o direito à igualdade dos

filhos em relação à herança, fazendo com que o art. 2º, já discutido anteriormente, passasse a

ter uma nova redação: “Art. 2º Qualquer que seja a natureza da filiação, o direito à herança

será reconhecido em igualdade de condições” (BRASIL, CC, 2021).

Da mesma forma, a Lei nº 7.250/84 trouxe alterações ao art.1º, que passou a ser

alvo de novas controvérsias. In verbis:

Art. 1º Dissolvida a sociedade conjugal, será permitido a qualquer dos cônjuges o

reconhecimento do filho havido fora do matrimônio e, ao filho a ação para que se

lhe declare a filiação.

§ 1º - Ainda na vigência do casamento qualquer dos cônjuges poderá reconhecer o

filho havido fora do matrimônio, em testamento cerrado, aprovado antes ou depois

do nascimento do filho, e, nessa parte, irrevogável.

§ 2º - Mediante sentença transitada em julgado, o filho havido fora do matrimônio

poderá ser reconhecido pelo cônjuge separado de fato há mais de 5 (cinco) anos

contínuos (BRASIL, Lei nº 7.250, 1984).

Para tanto, o reconhecimento da filiação seria possível, somente após a dissolução

da sociedade conjugal, ou, se na manutenção do vínculo do casal, só poderia haver o

reconhecimento através de testamento cerrado. Novamente algo que causa estranheza nos dias

atuais.

Ora, percebe-se nitidamente as pequenas evoluções em relação à filiação e à

relação sucessória em um curto período de evolução legislativa. Porém é a Constituição

cidadã, em 1988, que encerrará as controvérsias acerca da igualdade da filiação, não

importando sua origem. É sobre o que discorreremos no próximo tópico.

2.3 DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE DA FILIAÇÃO

No que tange à igualdade da filiação, a mesma, de fato, começou a evoluir após o

advento da Carta Magna brasileira de 1988. Nesse sentido, afirma Nader que

A Constituição Republicana de 1988 é um grande marco na evolução do Direito de

Família, tanto na definição das entidades familiares quanto na fixação do princípio

da isonomia entre a prole. Anteriormente, os filhos havidos fora do casamento, além

de acoimados, pejorativamente, de ilegítimos, não possuíam iguais direitos aos

concebidos no casamento, então chamados legítimos. As discriminações existentes

foram eliminadas pelo texto constitucional (2016, p. 454).

Madaleno, por sua vez, mostra-nos um sentimento de repulsa ao citar do que a

Constituição Federal de 1988 livrou-nos.

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O artigo 227, § 6º, da Constituição Federal veio para terminar com o odioso período

de completa discriminação da filiação no Direito brasileiro, sob cuja epidemia viveu

toda a sociedade brasileira, e sua história legislativa construiu patamares

discriminando os filhos pela união legítima ou ilegítima dos pais, conforme a prole

fosse constituída pelo casamento ou fora dele (MADALENO, 2018, p. 657).

Quando mencionamos o princípio da igualdade, principalmente entre filhos,

surgem diferentes consequências no Direito. Começaremos a discorrer à luz da Constituição

Federal.

Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao

adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à

alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao

respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a

salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade

e opressão.

[...]

§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os

mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias

relativas à filiação (BRASIL, CFRB, 2021).

Percebe-se que o § 6º é claro, não restando qualquer dúvida acerca da não

permissão a qualquer distinção em relação aos filhos, quaisquer que sejam as origens de sua

filiação.

Nesse diapasão, Nader afirma que

O Direito contemporâneo não distingue os filhos nascidos do casamento dos

concebidos fora deste. Igual ação é notada entre os filhos biológicos e os adotivos.

Atualmente, a socioafetividade tem o poder de instituir o parentesco. A igualdade de

direitos entre os filhos está garantida pelo art. 227, § 6º, da Constituição Federal.

Funda-se, também, no princípio da dignidade da pessoa humana, constante no art.

1º, inciso III, da Lei Maior (2016, p. 447).

À luz do Código Civil, não é diferente.

Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão

os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações

discriminatórias relativas à filiação.

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

[...]

III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários,

decorrentes de concepção artificial homóloga;

V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia

autorização do marido (BRASIL, CC, 2021, grifo nosso).

Além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), que veio

para garantir maior proteção às nossas crianças, replica as mesmas palavras em seu texto:

Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os

mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias

relativas à filiação (BRASIL, ECA, 2021).

18

Já nossos doutrinadores não mensuram suas palavras quanto às discriminações

que existiam anteriormente à vigência da nossa atual Constituição. Madaleno (2018, p. 657),

por exemplo, entende que, com a vinda da igualdade constitucional da filiação, a legislação

brasileira deveria sumir com os conceitos espúrios das diferentes nomenclaturas já citadas no

tópico anterior, quando o destino do filho dependia da “honra” de seus pais, o que dá real

significado ao princípio da dignidade da pessoa humana, pois o mero ato de chegar a citá-los

ou de tentar diferenciá-los nos dias atuais é estar em contramão em matéria que já foi vencida.

Conclui-se então, que, o marco constitucional de 1988, que determinou que

nenhum filho será descriminado em razão de sua filiação, foi quem garantiu a igualdade entre

eles.

2.4 PRINCIPAIS DIREITOS DECORRENTES DA FILIAÇÃO

No presente tópico, versaremos acerca dos direitos decorrentes da filiação e,

principalmente, acerca das obrigações dos pais, decorrentes do Estatuto da Criança e do

Adolescente.

Inicialmente, é importante lembrar que a filiação encontra-se dentro do campo das

relações de parentesco, embora, como se sabe, nem todo parentesco seja decorrente da

filiação. Assim, segundo Nader,

Os efeitos do parentesco se espalham pelos diversos ramos do ordenamento jurídico,

a começar pelo Direito de Família (impedimentos matrimoniais, poder familiar,

guarda de filhos, alimentos, entre outros); Direito das Sucessões (herança); Direito

Constitucional, Administrativo, Penal, entre outros (2016, p. 433).

Pode-se afirmar que foi principalmente a partir da criação do Estatuto da Criança

e do Adolescente (ECA) que a proteção do Estado aos direitos dos filhos tornou-se algo

valorizado.

Segundo o Estatuto,

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais

inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei,

assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e

facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual

e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e

adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo,

raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de

desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e

local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a

comunidade em que vivem (BRASIL, ECA, 2021, grifo nosso).

19

O art. 15 do ECA, por sua vez, clarifica ainda mais esta relação entre esses

direitos e à proteção constitucional e legal a eles. In verbis:

Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade

como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de

direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis (BRASIL,

ECA, 2021, grifo nosso).

Em decorrência dos princípios apresentados anteriormente e, baseando-se na

dignidade da pessoa humana, percebe-se que a criança ou o adolescente não podem ser alvo

de discriminação. Por isso, o Estatuto prevê ainda a não discriminação relativa à filiação. In

verbis:

Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os

mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias

relativas à filiação (BRASIL, ECA, 2021).

Haja vista que dessa não discriminação vêm as obrigações dos pais em relação aos

filhos, cabe a estes assegurar todos os direitos da legislação pertinente, qualquer que seja a

origem de sua filiação. In verbis:

Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos

menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer

cumprir as determinações judiciais (BRASIL, ECA, 2021).

Ou seja, entre os deveres dos pais, pode-se afirmar que eles são obrigados, por lei,

a sustentar os filhos e a dar-lhes educação e sua guarda.

Quanto ao reconhecimento do status de filho, afirma o Estatuto:

Art. 27. O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo,

indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus

herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça (BRASIL, ECA,

2021).

Diante desse dispositivo legal, percebe-se que a filiação é um marco tão

importante na vida de um ser humano que se torna um direito personalíssimo, ou seja, um

direito intrínseco, próprio, um direito instransponível, que não se pode perder ou recusar.

Além disso, é um direito imprescritível, o qual pode ser questionado ou buscado em qualquer

momento da vida, podendo ser exercido contra os pais ou seus herdeiros.

Oportuno salientar que, como o objetivo da presente pesquisa é discutir o direito à

herança daquele que foi concebido por reprodução assistida post mortem, é mister que

conheçamos as técnicas que possibilitam essa reprodução. Tema do próximo capítulo.

20

3 DA REPRODUÇÃO ASSISTIDA

Esse capítulo foi dividido em seis seções: a primeira apresenta noções

introdutórias; a segunda mostra os princípios que regem a reprodução assistida; a terceira

descreve a criação do embrião em laboratório; a quarta aborda a inseminação artificial; já a

quinta e a sexta seções analisam espécies de técnicas de reprodução assistida.

3.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

A reprodução assistida nada mais é que um processo reprodutivo, assistido ou

ajudado pela medicina, como é elucidado no art. 1.597, incisos III, IV, e V, do Código Civil.

Mas como há mais de uma espécie desses procedimentos para gerar um filho, necessitamos

conhecê-las melhor.

Para Dias, a reprodução assistida é tema de saúde pública. In verbis:

O tema da inseminação artificial e da engenharia genética encontra embasamento

nesse preceito. Todas as pessoas têm direito fundamental à saúde sexual e

reprodutiva. Assim, distúrbios da função procriativa constituem problema de saúde

pública, devendo o Estado garantir acesso a tratamento de esterilidade e reprodução

(2016, p. 660).

Para conceituar o tema, o faremos nas próprias palavras de Azevedo, o qual

argumenta que:

Afirme-se que a reprodução humana assistida, como visto, é a fecundação, com

artificialidade médica, informada e consentida por escrito, por meio de inseminação

de gametas humanos, com probabilidade de sucesso e sem risco grave de vida ou de

saúde para a paciente e para seu futuro filho (2019, p. 374).

Havendo mais de uma forma de reprodução assistida e ocorrendo divergências

doutrinárias acerca de cada uma delas, é necessário que conheçamos as mais preponderantes.

O Código Civil, como já comentamos alhures, reconhece alguns tipos derivados

da reprodução assistida. In verbis:

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

[...]

III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários,

decorrentes de concepção artificial homóloga;

V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia

autorização do marido (BRASIL, CC, 2021, grifo nosso).

Em decorrência das diversas técnicas de reprodução assistida, é necessário que

compreendamos os princípios que as norteiam, bem como afirmarmos a personalidade do

embrião ali criado.

21

3.2 DA FALTA DE PRINCÍPIOS REGENTES

Ao citarmos técnicas de reprodução assistida, a reação é de notória complexidade,

pois o legislador incorporou-as ao título acerca da filiação na legislação cível sem dar maiores

explicações. Para Azevedo (2019, p. 371), o legislador simplesmente inseriu algo complexo,

para o qual se deveria criar um estatuto próprio, uma vez que, a nós, enquanto operadores do

Direito, falta-nos embasamento acerca de teses que envolvam a ciência médica.

Portanto, o comportamento do legislador em relação ao tema tem sido

permanentemente destacado em críticas em obras de diversos doutrinadores.

Dias (2016, p. 669) lembra-nos que “até o século passado a paternidade era linear,

natural, tinha origem em um ato sexual, seguido da concepção e posterior nascimento. Tudo

mudou, mas a legislação ainda reproduz este modelo”.

A mesma autora ainda faz menção à ruina que se deu nos sistemas de paternidade,

maternidade e filiação, a partir dos avanços da biotecnologia. In verbis:

A enorme evolução - verdadeira revolução - ocorrida no campo da biotecnologia

acabou produzindo reflexos nas estruturas familiares, especialmente em face do

surgimento de variadas técnicas de reprodução medicamente assistidas. Os avanços

tecnológicos na área da reprodução humana emprestaram significativo relevo à

vontade, fazendo ruir todo o sistema de presunções da paternidade, da maternidade e

da filiação (DIAS, 2016, p. 669).

Madaleno, por sua vez, afirma a necessidade de leis especiais, tanto para

regulamentar, quanto para evoluir junto com o campo da engenharia, as quais, se

regulamentadas, podem trazer estabilidade ao longo dessa evolução, uma vez que

a abordagem acerca da reprodução assistida no Código Civil é superficial, só sendo

referida por decorrência da filiação conjugal presumida, e a normatização da matéria

deve ser estabelecida por leis especiais, porque são constantes e dinâmicas as

mudanças nessa seara de infindas descobertas no campo da engenharia genética, não

comportando sejam reguladas em códigos, cuja maior característica é justamente a

estabilidade das leis (2018, p. 702).

Em verdade, é por isso que o presente tópico versa mais sobre a falta de princípios

do que do auxílio dos mesmos, pois estes inexistem. Assim, só podemos discorrer acerca das

teses oriundas dos nossos doutrinadores, os quais ficaram com a difícil tarefa de debater em

lugar do legislador.

No contexto apresentado, temos, também, a influência da Igreja Católica, a qual

repudia algumas técnicas, entre elas a da inseminação in vitro e a própria doação de gametas.

Segundo Madaleno,

A Igreja Católica não aceita a evolução tecnológica da reprodução assistida e

condena frontalmente todos os meios de fecundação antinaturais, inclusive exorta a

22

comunidade política a não legalizar a doação de gametas, em respeito à unidade do

matrimônio e à fidelidade conjugal (2018, p. 702).

Diante dessa situação, o principal regulamento de orientação acerca do assunto

tem sido o Código de Ética da Medicina. Porém, Azevedo (2019, p. 374) adverte que “não

havendo força de lei, o seu descumprimento implica sanções de caráter administrativo”. E

ainda completa,

A reprodução humana assistida vem ocorrendo no Brasil, por seu turno, por técnicas

médicas, segundo regramento do Conselho Federal de Medicina, pela atual

Resolução n. 1.957, de 2010, publicada no Diário Oficial da União402, em 6 de

janeiro de 2011, com normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução

assistida, sem uma legislação própria, que necessita existir, para que se evitem

abusos (AZEVEDO, 2019, p. 374).

Todavia, sendo a única orientação vigente, para que andemos mais próximos dos

possíveis princípios, é necessário que a analisemos e, para tanto, utilizaremos a Resolução nº

2.168, de 21 de setembro de 2017, do Conselho Federal de Medicina, que é a mais atualizada.

I - PRINCÍPIOS GERAIS

1. As técnicas de reprodução assistida (RA) têm o papel de auxiliar na resolução dos

problemas de reprodução humana, facilitando o processo de procriação.

2. As técnicas de RA podem ser utilizadas na preservação social e/ou oncológica de

gametas, embriões e tecidos germinativos.

3. As técnicas de RA podem ser utilizadas desde que exista probabilidade de sucesso

e não se incorra em risco grave de saúde para o(a) paciente ou o possível

descendente.

6. É proibida a fecundação de oócitos humanos com qualquer outra finalidade que

não a procriação humana (CFM, Resolução nº 2.168, 2021).

Percebe-se, então, que as técnicas de reprodução assistida, ou RA, como consta da

Resolução, têm a finalidade de auxiliar/ajudar a reprodução de maneira segura, versando

sobre diversos usos e finalidades, sendo que as principais são aquelas que permitem somente a

reprodução assistida, evitando abusos técnicos por parte dos profissionais da medicina em

usos distintos. Outro ponto relevante que a resolução apresenta, são as quantidades

embrionárias utilizadas, a fim de evitar que seja usado um número de embriões que possa

trazer riscos à gravidez.

Mas vamos ao tema central.

V- CRIOPRESERVAÇÃO DE GAMETAS OU EMBRIÕES

2. O número total de embriões gerados em laboratório será comunicado aos

pacientes para que decidam quantos embriões serão transferidos a fresco, conforme

determina esta Resolução. Os excedentes, viáveis, devem ser criopreservados.

3. No momento da criopreservação, os pacientes devem manifestar sua vontade, por

escrito, quanto ao destino a ser dado aos embriões criopreservados em caso de

divórcio ou dissolução de união estável, doenças graves ou falecimento de um deles

ou de ambos, e quando desejam doá-los.

4. Os embriões criopreservados com três anos ou mais poderão ser descartados se

esta for a vontade expressa dos pacientes.

23

5. Os embriões criopreservados e abandonados por três anos ou mais poderão ser

descartados.

Parágrafo único: Embrião abandonado é aquele em que os responsáveis

descumpriram o contrato pré-estabelecido e não foram localizados pela clínica

(CFM, Resolução nº 2.168, 2017).

Observando o capítulo V da resolução, percebe-se, que o paciente deverá ser

comunicado especificamente acerca do procedimento que será adotado, tanto em relação aos

embriões que serão transferidos a fresco, como de embriões excedentes, que serão

criopreservados para usos futuros.

Outro ponto muito importante para o debate no presente trabalho é o destino

desses embriões, cuja previsão encontra-se no item 3, e em que se exige, dos pacientes, a

manifestação de sua vontade, por escrito, acerca da destinação dos embriões criopreservados,

se houver divórcio ou dissolução de união estável, ou se ocorrerem doenças graves ou

falecimento de um deles ou de ambos, e, também se eles quiserem doá-los.

Importante mencionar, também, o parágrafo único do item 5, que prevê o

descarte, em 3 anos, dos embriões que forem abandonados pelos seus responsáveis, seguindo,

assim, a mesma linha de raciocínio do art. 5º da Lei nº 11.105 de 2005, que versa sobre os

organismos geneticamente modificados. In verbis:

Art. 5º É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco

embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não

utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta

Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3

(três) anos, contados a partir da data de congelamento.

§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.

§ 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia

com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à

apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.

§ 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e

sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de

1997 (BRASIL, Lei nº 11.105, 2021).

A Lei de Biossegurança é citada em algumas doutrinas, contudo, ela pouco nos

ajuda, ao contrário, tão somente traz conteúdo para acalorar a discussão acerca da vida dos

embriões excedentários, devido à sua destinação nesse contexto, interferindo no seu possível

direito pós nascimento, conteúdo que será abordado no decorrer da presente monografia.

Vejamos as disposições finais da resolução citada anteriormente. In verbis:

VIII - REPRODUÇÃO ASSISTIDA POST-MORTEM

É permitida a reprodução assistida post-mortem desde que haja autorização prévia

específica do(a) falecido(a) para o uso do material biológico criopreservado, de

acordo com a legislação vigente.

IX- DISPOSIÇÃO FINAL

24

Casos de exceção, não previstos nesta resolução, dependerão da autorização do

Conselho Regional de Medicina da jurisdição e, em grau recursal, ao Conselho

Federal de Medicina (CFC, Resolução nº 2.168, 2017).

Nota-se, que a resolução preocupou-se em repetir parte do item 3, anteriormente

comentado, porém, agora, referindo-se de forma específica aos casos de post mortem,

exigindo-se autorização por escrito do cônjuge falecido.

Para Dias,

sem autorização expressa, os embriões devem ser eliminados, pois não se pode

presumir que alguém queira ser pai depois de morto. É necessário respeitar o

princípio da autonomia da vontade. Resolução do Conselho Federal de Medicina

exige a autorização prévia específica do falecido. A viúva não pode exigir que a

clínica lhe entregue o material genético que se encontra armazenado para que seja

nela inseminado, por não se tratar de bem objeto de herança (2016, p. 671-672).

Entretanto, acerca das exceções, estas não foram regulamentadas, assim, quando

houver, dependerão de autorização dos Conselhos Regional e Federal de Medicina.

3.3 FERTILIZAÇÃO IN VITRO

A fertilização in vitro de origem laboratorial representa a produção de um embrião

em laboratório. De acordo com Gonçalves,

A fertilização in vitro, na qual o óvulo e o espermatozoide são unidos numa proveta,

ocorrendo a fecundação fora do corpo da mulher [...]. O embrião é excedentário

quando é fecundado fora do corpo (in vitro) e não é introduzido prontamente na

mulher, sendo armazenado por técnicas especiais (2018, p 157).

Logo, ter-se-á um embrião a ser realocado no útero da mãe por meio de uma das

técnicas que melhor se adapte ao procedimento e que serão aprofundadas ao final do presente

capítulo. O principal e único embate acerca do tema refere-se à sua aceitabilidade diante do

olhar da sociedade.

Azevedo compartilha dos ditames de parte da nossa sociedade com relação ao

procedimento em comento, repugnando, contudo, o fato de a mão humana dar origem a um

ser em laboratório. Segundo o autor,

É como se, permitam-me dizer, o direito humano estivesse a intrometer-se no direito

divino, fazendo, por artifício humano, o que compete à Divina Natureza. Se esta,

que é obra de Deus, negou ao homem seu filho, não há que admitir -se a reprodução

in vitro (AZEVEDO, 2019, p. 375).

É nítido o pensamento do autor, e sabemos que o mesmo não é o único a pensar

assim, contudo, seria pertinente alguns questionamentos em torno do tema ora estudado,

25

como, por exemplo: se realmente tivéssemos uma forte legislação sobre o assunto, será que tal

pensamento não sofreria alterações?

Azevedo demonstra respeito comedido ao embrião, quando diz: “Lembre-se de

que, ainda que seja homóloga a fecundação, permite a lei que existam embriões

“excedentários”, o que implica a ideia de permitir vidas humanas em risco, de embriões que

podem não ser inseminados e terminem por serem destruídos” (2019, p. 376).

É importante salientar que, para um embrião ser excedentário, é necessário que o

mesmo esteja em laboratório para sobreviver, pois o único procedimento possível à sua

fertilização é a fertilização in vitro.

Já nas palavras de Gonçalves (2018, p. 157), “fecundação indica a fase de

reprodução assistida consistente na fertilização do óvulo pelo espermatozoide”.

Apresentamos aqui, uma curiosidade interessante, perceptível em nossos estudos,

que é o fato da fertilização in vitro ser o único procedimento a trazer uma certa segurança

acerca da quantidade de bebês a que se pode dar origem, pois é a única técnica em que o

embrião é formado fora do útero. Assim, o paciente é que escolherá a possibilidade de uma

gestação com um ou mais filhos, de acordo com a quantidade de embriões que serão

introduzidos no útero.

Portanto, ao falarmos acerca da fertilização in vitro, faz-se necessário e prudente,

adentrarmos no embate acerca da personalidade do embrião.

Personalidade do embrião

Vejamos algumas concepções sobre o tema na visão de alguns autores.

Para Madaleno (2018, p. 702), a fertilização in vitro ainda é muito discriminada,

não em relação à eventual criança a ser gerada, mas sim quanto aos embriões excedentários,

pois, segundo ele, “a Igreja Católica também condena a manipulação de embriões e seu

descarte, cuja prática equipara ao aborto, e, portanto, também atenta contra a vida dos seres

humanos”.

Para Dias, em se tratando de embriões excedentários, o tema continua complexo e

muito polêmico. Segundo a autora,

De modo geral, no procedimento de fertilização são gerados vários embriões, e

levadas a efeito diversas tentativas de concepção. Os embriões descartados e não

utilizados permanecem armazenados na clínica que realiza o procedimento. As

questões referentes aos embriões excedentários podem gerar delicados problemas

sobre direito de personalidade, havendo o risco de serem reconhecidos como

26

nascituros e sujeitos de direitos. Persiste acirrada a polêmica no âmbito da bioética e

do biodireito (DIAS, 2016, p. 670-671).

Igualmente, percebe-se que há permissão da legislação quanto à utilização de

embriões excedentários, desde que haja o consentimento dos genitores, para fins de avanço

em pesquisas e terapias. In verbis:

Art. 5º É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco

embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não

utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta

Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3

(três) anos, contados a partir da data de congelamento.

§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores (BRASIL, Lei nº

11.105, 2021).

No entanto, diante da questão relativa ao aborto, os embriões excedentários

ganharam debate junto ao STF, pois os mesmos têm sido usados pela ciência, uma vez que

foram admitidos em pesquisas científicas a partir da ADIn nº 3.510. In verbis:

CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI

DE BIOSSEGURANÇA. IMPUGNAÇÃO EM BLOCO DO ART. 5º DA LEI Nº

11.105, DE 24 DE MARÇO DE 2005 (LEI DE BIOSSEGURANÇA). PESQUISAS

COM CÉLULASTRONCO EMBRIONÁRIAS. INEXISTÊNCIA DE

VIOLAÇÃO DO DIREITO À VIDA. CONSTITUCIONALIDADE DO USO DE

CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS EM PESQUISAS CIENTÍFICAS PARA

FINS TERAPÊUTICOS. DESCARACTERIZAÇÃO DO ABORTO. NORMAS

CONSTITUCIONAIS CONFORMADORAS DO DIREITO FUNDAMENTAL A

UMA VIDA DIGNA, QUE PASSA PELO DIREITO À SAÚDE E AO

PLANEJAMENTO FAMILIAR. DESCABIMENTO DE UTILIZAÇÃO DA

TÉCNICA DE INTERPRETAÇÃO CONFORME PARA ADITAR À LEI DE

BIOSSEGURANÇA CONTROLES DESNECESSÁRIOS QUE IMPLICAM

RESTRIÇÕES ÀS PESQUISAS E TERAPIAS POR ELA VISADAS.

IMPROCEDÊNCIA TOTAL DA AÇÃO (BRASIL, STF nº 3.510, 2008, grifo

nosso).

Conveniente lembrar, que tal ADIn, contribuiu também para o entendimento

acerca da própria personalidade do embrião, debatida nas teorias natalista e conceptualista,

conhecidas pelos operadores do direito e presentes, principalmente, no Código Civil, que

afirma: “Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei

põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro” (BRASIL, CC, 2021).

Segundo a ADIn em comento,

O Magno Texto Federal não dispõe sobre o início da vida humana ou o preciso

instante em que ela começa. Não faz de todo e qualquer estádio da vida humana um

autonomizado bem jurídico, mas da vida que já é própria de uma concreta pessoa,

porque nativiva (teoria "natalista", em contraposição às teorias "concepcionista" ou

da "personalidade condicional"). E quando se reporta a "direitos da pessoa humana"

e até dos "direitos e garantias individuais" como cláusula pétrea está falando de

direitos e garantias do indivíduo-pessoa, que se faz destinatário dos direitos

fundamentais "à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade" (...), o

27

embrião é o embrião, o feto é o feto e a pessoa humana é a pessoa humana. Donde

não existir pessoa humana embrionária, mas embrião de pessoa humana

(BRASIL, STF nº 3.510, 2008, grifo nosso).

Para uma melhor compreensão da celeuma, vejamos as diferentes teorias acerca

da personalidade do nascituro.

Teoria Natalista: Segundo Madaleno, “no Brasil prevalece a teoria natalista,

segundo a qual, durante toda a duração da gestação, o nascituro não tem personalidade

jurídica e, portanto, não goza de direitos próprios, que ficam condicionados ao seu nascimento

com vida”. Vale ressaltar, que a mesma prevalece somente em sede doutrinária (2018, p. 706).

Para Dias (2015, p.130), a teoria invoca a parte inicial do artigo em comento,

sendo razoável tal entendimento, por ser atribuída expectativa de direito, condicionada a uma

expectativa de vida, que se consuma com o nascimento.

Teoria conceptualista: Para Madaleno, na “teoria concepcionista, a

personalidade inicia com a própria concepção, e por isso mesmo a lei assegura os direitos

desde a concepção e, portanto, o nascituro como sujeito de direitos deve ser considerado

como pessoa” (2018, p. 707).

Segundo Dias (2015, p. 130), a teoria invoca a parte final do artigo mencionado, o

que concede plena personalidade ao nascituro. Tal teoria prevalece em sede jurisprudencial.

Teoria da personalidade condicional: Conforme Madaleno, “[...] a teoria da

personalidade condicional, admite que o nascituro adquira personalidade desde a sua

concepção, mas condiciona esses direitos ao seu nascimento com vida” (2018, p. 707).

Muitas são as discussões geradas no âmbito do direito sucessório. Havia, assim,

decisões que condicionavam o recebimento da herança ao nascimento com vida, ainda que a

criança falecesse poucos minutos depois. Por exemplo:

AÇÃO DE COBRANÇA DO SEGURO OBRIGATÓRIO DPVAT. ACIDENTE DE

TRÂNSITO. VÍTIMA QUE ESTAVA GRÁVIDA. ÓBITO DO FETO.

DISCUSSÃO SOBRE A NATUREZA JURÍDICA DO NASCITURO. EXEGESE

DO ARTIGO 3º, INCISO I, DA LEI N. 6.194/1974. TITULARIDADE DE

DIREITOS DA PERSONALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO

DE DIREITOS PATRIMONIAIS. CONDIÇÃO. NASCIMENTO COM VIDA.

APELO CONHECIDO E PROVIDO. Não faz jus à indenização decorrente do

seguro obrigatório DPVAT a grávida que, em razão de evento de trânsito, vem a

sofrer aborto. Isso porque o ordenamento jurídico brasileiro, notadamente o artigo 2º

do Código Civil de 2002, adota a teoria condicionalista, reconhecendo ao nascituro a

titularidade de direitos personalíssimos - vida, nome, proteção pré-natal, etc. -

condicionando os direitos patrimoniais ao nascimento com vida, sobre eles havendo

apenas mera expectativa de direito (SANTA CATARINA, TJSC, 2013, grifo nosso).

Porém, em 2015, a jurisprudência acabou tomando outro caminho:

APELAÇÃO CÍVEL. COBRANÇA. SEGURO DPVAT. SENTENÇA DE

IMPROCEDÊNCIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO ENVOLVENDO GESTANTE.

28

MORTE DO NASCITURO. ART. 2º DO CÓDIGO CIVIL/2002.

PERSONALIDADE JURÍDICA QUE NASCE COM A CONCEPÇÃO.

INDENIZAÇÃO DEVIDA EM RAZÃO DO ÓBITO DO FETO. ART. 3º DA LEI

6.194/74. PRECEDENTES. DECISUM REFORMADO. RECURSO PROVIDO.

[...] A despeito da literalidade do art. 2º do Código Civil - que condiciona a

aquisição de personalidade jurídica ao nascimento -, o ordenamento jurídico pátrio

aponta sinais de que não há essa indissolúvel vinculação entre o nascimento com

vida e o conceito de pessoa, de personalidade jurídica e de titularização de direitos,

como pode aparentar a leitura mais simplificada da lei. [...] 3. As teorias mais

restritivas dos direitos do nascituro - natalista e da personalidade condicional -

fincam raízes na ordem jurídica superada pela Constituição Federal de 1988 e

pelo Código Civil de 2002. O paradigma no qual foram edificadas transitava,

essencialmente, dentro da órbita dos direitos patrimoniais. Porém, atualmente isso

não mais se sustenta. Reconhecem-se, corriqueiramente, amplos catálogos de

direitos não patrimoniais ou de bens imateriais da pessoa - como a honra, o

nome, imagem, integridade moral e psíquica, entre outros. 4. Ademais, hoje,

mesmo que se adote qualquer das outras duas teorias restritivas, há de se reconhecer

a titularidade de direitos da personalidade ao nascituro, dos quais o direito à vida é o

mais importante. Garantir ao nascituro expectativas de direitos, ou mesmo direitos

condicionados ao nascimento, só faz sentido se lhe for garantido também o direito

de nascer, o direito à vida, que é direito pressuposto a todos os demais. [...] (Resp.

1415727/SC, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 4.9.2014). (SANTA CATARINA,

TJSC, 2015, grifo nosso).

Essa última decisão, baseou-se na fundamentação do Recurso Especial

1415727/SC, o qual foi discutido no final de 2014 pelo Superior Tribunal de Justiça. Nesse

recurso, o STJ decidiu:

DIREITO CIVIL. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. ABORTO. AÇÃO DE

COBRANÇA. SEGURO OBRIGATÓRIO. DPVAT. PROCEDÊNCIA DO

PEDIDO. ENQUADRAMENTO JURÍDICO DO NASCITURO. ART. 2º DO

CÓDIGO CIVIL DE 2002. EXEGESE SISTEMÁTICA. ORDENAMENTO

JURÍDICO QUE ACENTUA A CONDIÇÃO DE PESSOA DO NASCITURO.

VIDA INTRAUTERINA. PERECIMENTO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. ART. 3º,

INCISO I, DA LEI N. 6.194/1974. INCIDÊNCIA.

[...]

2. Entre outros, registram-se como indicativos de que o direito brasileiro confere ao

nascituro a condição de pessoa, titular de direitos: exegese sistemática dos arts. 1º,

2º, 6º e 45, caput, do Código Civil; direito do nascituro de receber doação, herança e

de ser curatelado (arts. 542, 1.779 e 1.798 do Código Civil); a especial proteção

conferida à gestante, assegurando-se-lhe atendimento pré-natal (art. 8º do ECA, o

qual, ao fim e ao cabo, visa a garantir o direito à vida e à saúde do nascituro);

alimentos gravídicos, cuja titularidade é, na verdade, do nascituro e não da mãe (Lei

n. 11.804/2008); no direito penal a condição de pessoa viva do nascituro – embora

não nascida – é afirmada sem a menor cerimônia, pois o crime de aborto (arts. 124 a

127 do CP) sempre esteve alocado no título referente a "crimes contra a pessoa" e

especificamente no capítulo "dos crimes contra a vida" – tutela da vida humana em

formação, a chamada vida intrauterina (MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de

direito penal, volume II. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 62-63; NUCCI,

Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 8 ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2012, p. 658) (BRASIL, STJ, 2014).

Tais decisões deixam o tema, aqui discutido, ainda mais interessante, pois, se a

personalidade limitava-se ao nascimento com vida, após a legislação civil de 2002, mais

precisamente com base em seu art. 2º, hoje não mais. Podemos ver que, na última década, a

discussão voltou a dar esperanças aos nascituros, inclusive concordando com a posição de

29

Dias, referenciando, no cenário jurisprudencial, como prevalecente, a teoria conceptualista, e

indo de encontro, portanto, à doutrina que, por longos anos, adotou a teoria natalista, como

bem nos lembrou Madaleno.

Tartuce, ao mudar sua opinião, apresentou suas motivações. In verbis:

No passado, este autor filiava-se aos ensinamentos da Professora Titular da PUCSP.

Ressalvava, assim, que o nascituro é pessoa humana, tendo a personalidade jurídica

formal, relativa aos direitos da personalidade [...]. Faltar-lhe-ia, porém, a

personalidade jurídica material, relacionada aos direitos patrimoniais, caso do direito

à herança.

Todavia, o autor desta obra mudou sua posição. Isso porque, a partir da leitura dos

trabalhos de Diogo Leite de Campos e Silmara Chinellato, estamos inclinados a

entender que ao nascituro devem ser reconhecidos direitos sucessórios desde a

concepção, o que representa a atribuição de uma personalidade civil plena a tal

sujeito de direito [...].

De fato, pensar o contrário parece representar um resquício da teoria natalista, que

nega personalidade ao nascituro. De qualquer modo, pontue-se que o entendimento

majoritário continua sendo no sentido de que o nascituro somente terá direitos

sucessórios se nascer com vida, pendendo uma condição para tal reconhecimento

(2020, p. 2.193).

Observa-se que, na última década, a própria doutrina tem sofrido uma

metamorfose, pois doutrinadores que acreditavam na teoria natalista estão mudando de

opinião, passando a concordar com a teoria conceptualista e vice-versa,

No próximo capítulo, adentraremos no tema do embrião excedentário no direito

sucessório.

3.4 INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL

A inseminação artificial consiste na união do material genético no próprio

organismo feminino. De acordo com Gonçalves (2018, p. 157), a inseminação artificial

consiste “[...] na introdução de gameta masculino, por meio artificial, no corpo da mulher,

esperando-se que a própria natureza faça a fecundação”.

Trata-se de procedimento considerado o mais simples no que diz respeito ao tema.

Discorre Madaleno que

A inseminação ou a introdução do sêmen no útero feminino em procedimento

laboratorial não garante a fecundação, porque o óvulo e o espermatozoide podem

não se fundir. É dos procedimentos mais simples, com poucos recursos tecnológicos,

onde os espermatozoides do marido (inseminação homóloga) ou de um banco de

esperma (inseminação heteróloga) são coletados, selecionados, preparados e

transferidos para o colo do útero (2018, p. 703).

De modo mais simples e enfático, o embrião ainda não existe, vindo a constituir-

se de forma natural após a técnica.

30

3.5 REPRODUÇÃO HOMÓLOGA

A reprodução homóloga é compreendida como a reprodução na qual se extrai o

espermatozóide masculino e introduz-se no óvulo feminino. Nas palavras de Gagliano e

Pamplona Filho (2017, p. 732), “entenda-se por concepção artificial homóloga, aquela

realizada com material genético de ambos os cônjuges”, enfatizando-se que se trata de um

procedimento que envolve apenas a genética do casal.

Acresce-se ao contexto as palavras de Madaleno,

A inseminação artificial homóloga utiliza o sêmen do próprio marido e o óvulo da

mulher, à margem da relação sexual, mas com a ajuda instrumental. É a técnica

pacificamente aceita pela sociedade, pois proporciona à união conjugal a alegria da

procriação que não seria alcançada sem a intervenção médica (2018, p. 2018).

Já Azevedo trata tal reprodução principalmente como caminho para casais férteis

que possuem dificuldades físicas ou psíquicas, os quais não conseguem praticar o coito,

afirmando que “a homóloga ocorre quando o embrião é constituído do espermatozoide do

marido ou do companheiro, aplicado no óvulo da esposa ou da companheira, no próprio corpo

desta” (2019, p. 371).

Podemos considerar, então, ser esta uma técnica mais complexa, envolvendo

alterações laboratoriais e procedimentos, auxiliando a criação de um embrião in vitro.

3.6 REPRODUÇÃO HETERÓLOGA

A reprodução heteróloga trata-se de técnica em que se usa produto de terceiros,

seja do homem ou da mulher ou ainda de ambos, onde o embrião é gerado fora do corpo (in

vitro) e depois implantado no interior do corpo da mulher.

De acordo com Gagliano e Pamplona Filho (2017, p. 732), a inseminação artificial

heteróloga é "[...] aquela realizada com material genético de terceiro, ou seja, alguém alheio à

relação conjugal”.

Já Azevedo afirma que

A inseminação heteróloga é, desse modo, a que se realiza com a coleta de material,

próprio ou alheio (sêmen e óvulo próprios ou alheios, sêmen próprio e óvulo alheio

ou vice-versa), com a resultante de embriões, para implantação em útero alheio, ou,

ainda, em útero próprio, com material alheio (sêmen e óvulo; sêmen ou óvulo)

(2019, p. 371).

Como resultado desta concepção, surge a possibilidade da famosa “barriga de

aluguel”, a qual não fará parte desta pesquisa, pois, para os objetivos desse trabalho, não se

31

discute a forma de origem, mas tão somente, a metodologia utilizada, até mesmo porque

entraríamos em outra discussão, uma vez que nossa Constituição veda tal prática, consoante o

art. 199. In verbis:

Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.

[...]

§ 4º A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de

órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e

tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus

derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização (BRASIL, CFRB, 2021,

grifo nosso).

Para concluir esse tópico, segue o conceito de Madaleno:

É heteróloga a inseminação artificial quando utiliza o sêmen de um doador que não

o marido ou o companheiro, sendo imprescindível o expresso consentimento do

parceiro. Entretanto, e para que não pairem dúvidas, a cessão de material genético

tanto pode implicar produto biológico do homem (espermatozoide), como da mulher

(óvulos), mas o Código Civil dispõe exclusivamente acerca da presunção da

paternidade na utilização de técnica de fecundação artificial heteróloga (2018, p.

709).

Podemos dizer que a presente técnica, ora conceitualizada, é a que envolve o

maior número de procedimentos, e, como Madaleno afirma, o material biológico a ser colhido

do doador pode advir tanto do homem quanto da mulher, embora a legislação cível, conforme

alerta o autor, atenha-se mais às questões relativas à presunção de paternidade em relação à

reprodução heteróloga.

32

4 DIREITO A HERANÇA APÓS O LIMITE TEMPORAL DE DOIS ANOS

O presente capítulo divide-se em cinco subtítulos: o primeiro apresenta as

espécies de sucessão; o segundo aborda a ordem da vocação hereditária; o terceiro trata da

capacidade sucessória; o quarto examina a prole eventual; e, por fim, o quinto trata do prazo

de dois anos previsto no Código Civil como limitador da eficácia dos direitos decorrentes da

filiação.

4.1 ESPÉCIES DE SUCESSÃO HEREDITÁRIA

Ao adentrarmos nas espécies de sucessões hereditárias, vemos que as mesmas

dividem-se em duas: a) sucessão hereditária legítima, disciplinada nos artigos 1.829 a 1.856

do CC; e b) a sucessão hereditária testamentária, prevista nos art. 1.857 a 1.890 do CC.

As espécies de sucessões disciplinam a legitimidade para suceder, as quais

acontecem no momento da morte, ocorrendo o princípio de saisine. Nas palavras de Lobo,

São legitimados a suceder os sujeitos de direito que podem ser qualificados como

herdeiros, de acordo com a lei, ou como legatários, designados em testamento. A

legitimação para a sucessão não se confunde com a capacidade civil, pois esta é

atributo das pessoas físicas (seres humanos nascido com vida) ou de pessoas

jurídicas. A legitimação para a sucessão hereditária é mais ampla que a capacidade

civil, pois alcança outros sujeitos de direito, que não são pessoas (2016, p. 62).

Veremos cada uma delas de forma detalhada nas próximas seções.

4.1.1 Sucessão hereditária legítima

A sucessão legítima ou sucessão legal é aquela que, na falta de testamento, servirá

como regra geral. Importante mencionar que, mesmo sendo escolhida a sucessão

testamentária, a legítima será acionada para regrar a metade dos bens na proporção dos

herdeiros necessários, proporcionando, ao autor da herança, somente identificar os bens que

deverão integrar o quinhão do herdeiro favorecido, com fulcro no art. 2.014, (BRASIL, CC,

2021).

Conforme já havíamos mencionado, ainda no tópico acerca da filiação, vamos

relembrar as palavras de Lobo,

A sucessão legítima expressa a evolução por que passam todos os povos [...]. No

início, os bens eram tidos em comunhão coletiva, o que reduzia a importância da

sucessão hereditária [...]. Depois surge a copropriedade familial ou do clã, com a

sucessão hereditária do chefe atribuída ao grupo; quando morria o pai, um filho ou

outro membro do grupo o substituía.

33

Após o surgimento da propriedade privada, e, concomitantemente, quando e

enquanto a família foi tida como célula nuclear da sociedade e do Estado, a sucessão

legítima expressou a preocupação com a continuidade do patrimônio e os riscos de

sua fragmentação, o que refletiria no equilíbrio dos poderes. Daí que houvesse o

privilégio do primogênito, a preferência pelo regime dotal, a exclusão dos filhos

extramatrimoniais, as limitações sucessórias em relação à mulher (2016, p. 70-71).

Após as evoluções apresentadas, percebe-se que a sucessão legítima, na

atualidade, configura uma forma mais democrática, já que ressalta a igualdade entre os filhos,

operando por força de lei, como veremos a seguir. Gonçalves afirma que,

a sucessão legítima, também denominada ab intestato, a que opera por força de lei e

que ocorre em caso de inexistência, invalidade ou caducidade de testamento e,

também, em relação aos bens nele não compreendidos. Nesses casos a lei defere a

herança a pessoas da família do de cujus e, na falta destas, ao Poder Público (2019,

p. 188).

Dias (2016, p. 120) afirma que a sucessão legítima poderia também ser chamada

de testamento tácito, pois o de cujus, ao não deixar regras para a disposição dos seus bens,

concorda com as pessoas enumeradas pela lei.

Na sucessão legítima, sucedem as pessoas contidas no art. 1.829 do Código Civil,

ou seja, descendentes, cônjuges, ascendentes e colaterais (BRASIL, CC, 2021).

Adiante abordaremos mais profundamente essa ordem hereditária. Por hora,

trataremos da outra espécie de sucessão.

4.1.2 A sucessão hereditária testamentária

A sucessão testamentária resume-se a uma transação jurídica, na qual o testador,

respeitando as normas vigentes acerca dos herdeiros necessários, tem a liberdade de escolher

os seus próprios sucessores, podendo também delimitar o quinhão de cada um deles.

Logo, podemos afirmar que a sucessão testamentária dá-se pela exceção, na qual,

pagos os impostos, é garantida a legítima dos herdeiros necessários, seu quinhão será

disponibilizado de acordo com a vontade do de cujus.

Nas palavras de Gagliano e Pamplona Filho (2017, p. 55), “a sucessão

testamentária [...] é aquela em que a transmissibilidade da herança é disciplinada por um ato

jurídico negocial, especial e solene, denominado testamento”.

Os mesmos autores afirmam ainda que,

Soa irônico o fato de a sucessão testamentária ser regulada de forma tão abrangente

e exaustiva no Código Civil, consagrando inclusive várias espécies de testamento, a

despeito da sua menor aplicação prática.

Até mesmo porque, em geral, o brasileiro não tem tanto patrimônio com que se

preocupar...

34

Quando morre, em regra, o que deixa não é propriamente uma herança, mas sim, na

melhor das hipóteses, um saldo remanescente [...] um simples procedimento de

alvará judicial para levantamento de tais valores, dispensando-se o inventário

(GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 56).

Diante do que se expõe, pode-se afirmar que o campo de sucessão testamentária é

bem regulamentado, embora seja pouco utilizado.

4.2 A ORDEM DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA

A ordem da vocação hereditária, por mais sucinta que seja, é de grande

importância para o trabalho, sendo necessário elencar onde a prole se encaixa na ordem dos

herdeiros.

Nader (2016, p. 90) trata a ordem de vocação hereditária como um chamamento

de pessoas aptas ou legítimas a suceder o patrimônio deixado pelo de cujus, fazendo

referência à palavra vocação, a qual, segundo o autor, significa chamar/convocar.

Vejamos a previsão legal. In verbis:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado

este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação

obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão

parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais (BRASIL, CC, 2021).

Note-se que a primeira classe diz respeito aos descendentes, sendo esses os filhos,

os netos, os bisnetos, etc., sendo que, com base no art. 1.833 do Código Civil, o mais próximo

sempre excluirá o mais remoto (BRASIL, CC, 2021)

Percebe-se, então, que a prole pertence à classe de descendentes e constituem os

filhos do de cujus. Vê-se que a mesma é tratada como primeira subordinada, ou seja, é o

principal sucessor na herança, pertencendo à classe dos herdeiros necessários, os quais estão

abarcados nos incisos I, II e III do artigo de lei em comento.

Somente na situação em que não houver herdeiros necessários, serão chamados os

herdeiros facultativos, embora ambos integrem a sucessão legítima.

Dias menciona que,

Caso o falecido não disponha de herdeiros necessários e não eleja ninguém como

herdeiro testamentário, seus bens serão transmitidos aos herdeiros legítimos. Assim

são chamados o companheiro da união estável e os parentes colaterais até o quarto

grau[...]. Se nem herdeiro facultativos houver, a herança é declarada vacante e fica

para o ente público (2015, p. 119).

35

Voltando ao caso da prole, de acordo com Lôbo (2016, p.74), são herdeiros

potenciais ou em estado de expectativa, uma vez que o herdeiro real só vem a ser

caracterizado herdeiro se o sucessor vier a falecer. Sendo assim, impõe-se o seguinte

questionamento: será que o não nascido, ou melhor, o não concebido (prole eventual) pode

tornar-se herdeiro?

4.3 CAPACIDADE SUCESSÓRIA

Antes de adentrarmos no tema, necessitamos diferenciar capacidade de

legitimidade. Assim, de acordo com Dias,

A falta de capacidade decorre da proibição imposta pela lei para determinada

pessoa intervir em qualquer relação jurídica. Já a ausência de legitimidade se

caracteriza pela inaptidão para a prática de determinado ato ou negócio jurídico,

devido a condição que lhe é peculiar (2015, p. 127, grifo do autor).

A mesma autora ressalta ainda haver diferença entre capacidade sucessória e

capacidade civil. Segundo Dias,

Capacidade sucessória não se confunde com capacidade civil. Alguém pode ser

incapaz para os atos da vida civil, o que não lhe subtrai capacidade para suceder, e

vice versa: quem não pode ser herdeiro pode gozar de plena capacidade civil (2015,

p. 127, grifo do autor).

Porém, conforme Tartuce, no campo sucessório, a legitimidade é a própria

capacidade de suceder (2020, p. 2.192). Quanto a isso, Nader corrobora, afirmando e

acrescentando que

No âmbito das sucessões, legitimidade significa capacidade para herdar, a qual se

define com a vocação hereditária. Assim, a capacidade de fato não induz a de

herdar; indispensável que não haja qualquer obstáculo de ordem legal, que se

verifica, por exemplo, quando a pessoa capaz de fato tenha sido declarada indigna

(2016, p. 91).

A capacidade sucessória é definida no art. 1.798 do Código Civil, que afirma que

“legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas, no momento da abertura da

sucessão” (BRASIL, CC, 2021).

Dias afirma que todas as pessoas físicas possuem capacidade para suceder, e as

pessoas jurídicas ou não nascidas somente podem ser beneficiárias por testamento (2015, p.

128). Menciona ainda a autora, que os embriões concebidos in vitro e os nascituros com vida

intrauterina têm capacidade sucessória, promovida pelo princípio da coexistência (DIAS,

2015).

36

Com base nas teorias já referendadas, pode-se, então, dar uma resposta à pergunta

colocada ao fim do tópico anterior. Conclui-se que o não concebido pode tornar-se herdeiro,

mas, no entanto, tal possibilidade só encontra guarida, na atualidade, na legitimidade

testamentária.

Há que se destacar, porém, que a legislação apresenta limites à concepção da

eventual prole, configurando-se no principal ponto de discussões da pesquisa, e que, apesar do

que foi aqui apresentado, acredita-se ainda ser possível discutir tal situação na sucessão

legítima. Além disso, crê-se que, por essa interpretação, ser o embrião excedentário capaz de

herdar, visto que é existente.

4.4 A PROLE EVENTUAL

No sentido de esclarecer, ou até mesmo conceituar, o termo prole eventual, faz-se

necessário afirmar que este, nada mais é, que o filho ainda não concebido, ou seja, o gameta

masculino e feminino, antes de sua concepção. Cabe-nos, ainda, levar à discussão, nas

diferentes formas de sucessão, onde ela melhor se amolda.

4.4.1 A prole eventual na sucessão legítima

Sabemos que é direito do casal fazer o seu planejamento familiar, mesmo quando

direcionado a técnicas de reprodução assistida. Entretanto, diante da celeuma levantada por

esse trabalho, pergunta-se: e se o casal concordou com elas em vida, até onde vai a vontade do

de cujus, ou melhor o seu direito de deixar herdeiros?

De acordo com Dias (2015, p. 132), a tendência que se consolidou em sede

doutrinária é a de afastar a prole quando vier a ser implantada após a abertura da sucessão,

contrariando princípios já apresentados neste trabalho.

Porém, para a autora,

É difícil dar mais valor a uma ficção jurídica do que ao principio constitucional da

igualdade assegurada a filiação (CF 227 § 6.º). Determinando a lei a transmissão da

herança aos herdeiros (CC1.784), mesmo que não nascidas (CC 1.798), e até as

pessoas ainda não concebidas (CC 1.799 I e 1.952), nada justifica excluir o direito

sucessório do herdeiro por ter sido concebido post mortem. É necessário dar ao

dispositivo interpretação constitucional, pois o filho nascido de concepção póstuma

ocupa a classe dos herdeiros necessários. A normatização ocupa não apenas a classe

de pessoas vivas e concebidas no momento da abertura da sucessão, mas também os

filhos concebidos por técnicas de reprodução humana assistida post mortem. Sob

qualquer ângulo que se enfoque a questão, é descabido afastar da sucessão de quem

foi filho e foi concebido pelo desejo do genitor (DIAS, 2015, p. 133).

37

Diversas monografias têm explorado a não previsibilidade do legislador e as

tendências doutrinárias e jurisprudenciais acerca do tema. Assim, para Corrêa,

[...] a doutrina majoritária entende pela não aplicação dos direitos à herança à prole

concebida por meio da técnica post mortem, com base no artigo 1.798 do Código

Civil, onde se dispõe que somente “são legitimados a suceder aqueles já nascidos ou

concebidos ao tempo da abertura da sucessão”, mas com uma única exceção, que

trata da possibilidade de estender os efeitos sucessórios, se caso o falecido venha

deixar em testamento que este futuro ser terá direitos, com base no artigo 1.799, do

mesmo diploma legal. Assim, muito embora não goze de capacidade aquele que

ainda não foi concebido, pode a prole eventual ser beneficiada pelo testador,

tratando de questão meramente testamentária (2012, p. 66).

Percebe-se um estreitamento do tema, resumindo-se ao princípio de saisine e ao

próprio artigo 1.798 do CC. Porém, nos dois próximos tópicos é mister que apresentemos

outras possibilidades de discussão.

4.4.2 A prole eventual na sucessão testamentária

A eventual prole na sucessão testamentária encontra previsão no seu artigo 1.799,

inciso I, do Código Civil, como já visto anteriormente, logo a mesma poderá participar da

sucessão.

Gagliano e Pamplona Filho (2017, p. 144), assim como Gonçalves (2019, p. 83),

argumentam que a prole eventual poderá ter especial legitimidade sucessória, se, por meio de

testamento, o autor da herança indicá-la como beneficiária. E, havendo previsão legal, seu

quinhão será confiado a um curador nomeado judicialmente:

1.800. No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão

confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz.

§ 1º Salvo disposição testamentária em contrário, a curatela caberá à pessoa cujo

filho o testador esperava ter por herdeiro, e, sucessivamente, às pessoas indicadas no

art. 1.775 (BRASIL, CC, 2021).

Por lógica, consequentemente, a curatela estender-se-á até o incapaz atingir plena

capacidade civil. Para assegurar maior segurança jurídica a outros herdeiros, no próprio art.

1.800, estipulou-se o prazo de dois anos para que o mesmo seja concebido:

Art. 1.800 [...]

§ 4º Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o

herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador,

caberão aos herdeiros legítimos.

Quanto ao reconhecimento da possibilidade de sucessão, relacionado ao período

de dois anos do não concebido, Gagliano e Pamplona Filho destacam que

Não temos dúvida de que, neste caso, o embrião concebido em laboratório e

posteriormente implantado no útero materno (como nascituro), adquirirá o direito

38

sucessório correspondente. Claro que há um inconveniente manifesto decorrente da

exigência legal do referido prazo de dois anos.

Por outro lado, se a concepção ocorrer após o prazo de dois anos,

indiscutivelmente a criança será considerada “filha do falecido” (que autorizou

previamente a fecundação), mas não poderá ser considerada “herdeira”, pois a

concepção se deu fora do biênio (2017, p. 151, grifo nosso).

No sentido de ampliar as discussões, no próximo tópico, abordaremos um pouco

mais acerca do embrião excedentário.

4.4.3 O embrião excedentário

Compreendemos ser o embrião um ser já concebido, inclusive, que o mesmo pode

ser criopreservado para ser usado posteriormente, logo, por analogia, poderia ser equiparado a

um herdeiro legítimo e/ou testamentário, capaz de poder adentrar em uma das duas espécies

de sucessão, portanto, até porque a resposta da doutrina à prole eventual, na sucessão

legítima, baseia-se no princípio de saisine e no art. 1.798 do CC, que condicionam a

existência.

Gonçalves explica a situação do nascituro no contexto de herdeiro legítimo,

explicando que

A regra geral segundo a qual só têm legitimação para suceder as pessoas nascidas

por ocasião da abertura da sucessão encontra exceção no caso do nascituro. De

acordo com o sistema adotado pelo Código Civil acerca do começo da personalidade

natural (art. 2º), tem-se o nascimento com vida como o marco inicial da

personalidade. Respeitam-se, porém, os direitos do nascituro, desde a concepção,

pois desde esse momento já começa a formação do novo ser (2019, p. 80).

Logo, podemos dizer que o embrião poderia ser comparado ao nascituro.

Lembramos, também, que, conforme já estudamos no capítulo acerca da filiação, o embrião

excedentário é tratado de forma igualitária, proibindo-se qualquer discriminação, sendo

considerado, inclusive, como concebido na constância do casamento.

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

[...]

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários,

decorrentes de concepção artificial homóloga; (BRASIL, CC 2021).

Diante disso, chegamos há um embate entre a legislação e a doutrina.

Segundo a visão de Lôbo,

[..] o embrião que foi fecundado in vitro (fora do organismo feminino) não é

considerado legalmente concebido, para fins de sucessão legítima. Assim é porque

embriões que o Código Civil considera excedentários, ainda que tenham sido

fecundados in vitro antes da morte do de cujus, podem jamais ser transferidos para o

útero da mulher, ou ser transferidos sem haver gravidez, ou ser considerados

39

inviáveis, ou haver divergência quanto a sua utilização devido a separação ou

divórcio do casal (2016, p. 108).

Percebe-se que autor se vale do princípio da coexistência, afirmando que o

herdeiro deve estar vivo ou ao menos concebido no momento do falecimento do seu

ascendente. Contudo a lacuna ainda continua, pois, cientificamente, o embrião excedentário

foi concebido. Assim, perguntamos: será que o princípio da coexistência poderia não ser

atribuído ao embrião excedentário?

Dias (2015, p. 129) utiliza-se do mesmo princípio, porém acredita existir a

capacidade sucessória por equiparação ao nascituro. Vale-se também a autora de decisões em

que os sucessores do nascituro fazem jus ao recebimento do seguro DPVAT.

Dias também encontra guarida na própria legislação, a qual, segundo ela, abrange

a concepção do embrião, não distinguindo o seu lugar e muito menos o momento da sua

implantação. E finaliza com sua indignação, afirmando que

Não se pode admitir que apenas com a existência de testamento, estaria assegurado

ao filho concebido após a morte do pai, o direito sucessório. Os filhos devem ter

tratamento isonômico. Todos pertencem a classe dos herdeiros legítimos e

necessários (DIAS, 2015, p. 133).

A letra da legislação nós já conhecemos, contudo, há o enunciado 267 do

CFJ/STJ, da III Jornada de Direito Civil. In verbis:

A regra do art. 1.798 do Código Civil deve ser estendida aos embriões formados

mediante o uso de técnicas de reprodução assistida, abrangendo, assim, a vocação

hereditária da pessoa humana a nascer cujos efeitos patrimoniais se submetem às

regras previstas para a petição da herança (BRASIL, 2003).

Porém, de acordo com Tartuce,

O enunciado doutrinário não conta com o apoio de vários juristas, que entendem que

o embrião está em situação jurídica diferente em relação ao nascituro, não

merecendo tratamento equânime. Essa é a opinião, por exemplo, de Francisco José

Cahali,12 Jones Figueirêdo Alves e Mário Luiz Delgado (2020, p. 2.194).

Inclusive, ressalta o autor, que também concordava com opinião diversa do

enunciado, assim como a maioria dos doutrinadores. Porém, em sua última obra, do ano de

2020, Tartuce apresenta uma mudança de opinião, a qual vem acompanhada também pelas

palestras de Veloso, esclarecendo, contudo, que o mesmo ainda está em estudo (2020, p.

1.194).

Venosa (2017, p. 81), em sua última obra acerca de sucessões, afirma que não

pode o nascituro, ser identificado como embrião, porém argumenta ser necessário ainda,

estudo a parte, fazendo poucas menções a reproduções assistidas, e, quando o faz, não são

pertinentes ao nosso tema.

40

Ou seja, é um tema que surgiu há cerca de 19 anos em nossa legislação, mas que

está em constante mudança e, diga-se de passagem, longe de ser resolvido.

Em realidade, como já mencionamos, não há previsão legal no ordenamento

jurídico pátrio que se preocupe com o tema dessa pesquisa, como já foi tratado no tópico

acerca da falta de princípios regentes. Aliás, todos os doutrinadores com os quais tomamos

contato mencionam justamente a falta de previsão no ordenamento jurídico.

Em casos específicos no Judiciário evidenciamos somente jurisprudências para o

uso do material genético, tema o qual já foi exposto no presente trabalho, faltando assim a

consequência da reprodução assistida no campo sucessório.

4.5 O PRAZO DE DOIS ANOS DO ART. 1.800, § 4º COMO LIMITADOR DA

EFICÁCIA DOS DIREITOS DECORRENTES DA FILIAÇÃO

Chegamos, então, ao ponto culminante e fundamental em nossa pesquisa: Os dois

anos de prazo que podem funcionar como um limitador à eficácia dos direitos decorrentes da

filiação no caso de sucessão post mortem na reprodução assistida após a morte do de cujus.

Nas palavras de Gagliano e Pamplona Filho,

Trata-se de um prazo, à primeira vista, bastante razoável, considerando o período de

uma gestação [...].

Todavia, ampliando os horizontes, talvez tal prazo não seja tão elástico assim, uma

vez que não contemplaria, por exemplo, situações de destinação testamentária de

bens para filhos de pessoas ainda longe da idade de ter condições para procriar

(2017, p. 145)

Note-se que o prazo já pode entrar em discussão sem nem mesmo tocarmos no

tema de reprodução assistida, como evidencia o exemplo mencionado pelos doutrinadores, o

qual abrange filhos de terceiros, e, de fato, o legislador expressou em sua redação, filhos não

concebidos de pessoas indicadas pelo testador, logo, poderia tal direito, caber aos mesmos.

Outro ponto relevante trazido pelos doutrinadores refere-se ao prazo destinado à

simples situação gestacional, o qual, pela letra da lei, seria de se conceber em até 2 (dois)

anos, mas apontando o fato de o sucessor da prole eventual ainda nem ter idade para praticar

tais atos.

Podemos perceber que o referido prazo não foi devidamente debatido pelos

legisladores diante da vontade do de cujus.

Relembramos:

Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:

41

I - os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que

vivas estas ao abrir-se a sucessão;

[...]

Art. 1.800. No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão

confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz.

[...]

§ 4º Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o

herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador,

caberão aos herdeiros legítimos (BRASIL, CC, 2021, grifo nosso)

Acerca da limitação de tal prazo, vamos aos detalhes da doutrina.

Nader concorda com o referido prazo por segurança jurídica, pois

A tendência é de se interpretar extensivamente o art. 2º do Código Civil, a fim de se

admitir igualmente, onde consta o termo nascituro, a figura do embrião. Todavia,

como bem adverte Eduardo de Oliveira Leite, deve-se estabelecer um prazo para a

habilitação no procedimento de inventário, a exemplo do estipulado no § 4º do art.

1.800 (2016, p. 447).

Esse pensamento é também compartilhado por Gagliano e Pamplona Filho,

quando afirmam que

Em nosso sentir, ao menos enquanto não houver uma regulamentação legal

específica, que leve em conta os avanços da tecnologia, a segurança jurídica

recomenda que, nos limites da Sucessão Testamentária, o embrião somente poderá

figurar como beneficiário se a implantação no útero materno ocorrer dentro do prazo

de dois anos, na linha do § 4.º do art. 1.800 do Código Civil.

Após esse prazo, não deixará de ser considerado filho do falecido, mas não terá

direito sucessório (2017, p. 154).

É nítido que a opinião de ambos baseia-se na segurança jurídica, pois destacam

que é fundamental termos um prazo e, assim, enquanto a legislação não regulamentar a

situação da reprodução assistida, é primordial seguir a lei.

Para Lôbo (2016, p. 109), no entanto, o termo concebido não se aplica à sucessão

post mortem. O autor sustenta ser controverso concordar com tal posicionamento, inclusive

referindo-se à petição de herança, já que o suposto futuro filho não poderia usá-la, uma vez

que ela deve ser subordinada ao tempo, o que não faz jus ao que vier após o falecimento do de

cujus.

Interessante observar o entendimento do autor em comento, o mesmo rebate o que

fora trazido em decisões sobre os seguros DPVAT, alvo de estudo no capítulo anterior. Lôbo

afirma que:

Admitiu a Terceira Turma do STJ, por maioria (REsp 1120676), o direito à sucessão

aos pais do nascituro para receberem a indenização por danos pessoais, prevista na

legislação regulamentadora do seguro DPVAT, em face da morte do feto. A minoria

entendeu que o nascituro não detém capacidade sucessória, possuindo apenas

expectativa de direitos, equivocadamente, pois há direito expectativo, como

sustentamos. Mas há equívoco também na decisão da maioria, uma vez que o

nascituro não chegou a adquirir o direito, não podendo transmitir por sucessão

hereditária a seus pais, pois não se converteu em pessoa e seu direito permaneceu

42

expectativo. A decisão reflete confusão entre direito constituído, direito expectativo

e expectativa de direito, que ainda persiste na doutrina e na jurisprudência dos

tribunais (2016, p.109).

O autor finaliza o pensamento afirmando que esse viés é o mesmo do herdeiro

pré-morto, o qual não pode herdar, haja vista que também se fundamenta na segurança

jurídica dos outros herdeiros e dos credores do próprio inventário. Como apresentado no

trecho colacionado acima, isso gera bastante confusão.

Ou seja, a falta de regulamentação legislativa é de enorme proporção, capaz de

devastar direitos em diversas ações diferentes, possibilitando resultados aleatórios.

Gagliano e Pamplona Filho encerram o tema com o seguinte comentário:

Sem dúvida, não se afigura como a melhor solução, mas, em nosso atual sistema, é a

mais adequada, mormente em se considerando que a indefinição de um prazo para a

implantação geraria o grave inconveniente de prejudicar por meses ou anos o

desfecho do procedimento de inventário ou arrolamento, em detrimento do direito

dos demais herdeiros legítimos ou testamentários (2017, p. 154).

Tal medida, para alguns doutrinadores, é a única solução viável, pois o que mais

se preza na legislação é a segurança jurídica.

Embora, a doutrina assim se posicione, cremos que a segurança jurídica deveria

servir a todos, não somente ao procedimento do inventário, assim, obstruções não deveriam

existir, pois ambas as partes deveriam ter resguardados seus direitos.

Como podemos cogitar a hipótese de segurança jurídica para um filho, com um

simples prazo testamentário, diante de tantas normas conflitantes?

Gonçalves (2019, p. 87) refere-se ao prazo de espera como solução adotada para

suprir a condição de espera permanente, para com a legislação antiga, a qual esperava um

“sucessor legítimo”, não deixando espaço para os filhos adotivos, situação esta que foi

abordada em nosso primeiro capítulo, sendo que o prazo jamais poderá ser atribuído à prole

eventual. Argumenta o autor, que a legislação não pode ser usada de modo distinto,

finalizando que,

A doutrina brasileira se inclina no sentido de negar legitimação para suceder aos

filhos havidos por métodos de reprodução assistida, quer na hipótese de a morte do

ascendente preceder à concepção, quer na de implantação de embriões depois de

aberta a sucessão. Solução favorável à criança ocorreria se houvesse disposição

legislativa favorecendo o fruto de inseminação post mortem (GONÇALVES, 2019,

p. 88)

Ou seja, o autor trata o referido artigo como uma tentativa de solução para as

injustiças do passado, não como aplicação para inseminação artificial assistida post mortem.

Um dos argumentos do autor para findar a discussão quanto aos princípios de

igualdades emanados pela Constituição, é que o mesmo não deveria ser discutido,

43

referenciando o prazo de espera testamentário. Mas, segundo o autor o que se deveria discutir

seria a própria sucessão legal, acerca da qual já demonstramos a incompatibilidade em um dos

tópicos anteriores (a prole eventual na sucessão legítima), a qual raramente é discutida pela

doutrina, apresentando-se, em parte, como tema vencido.

Ou seja, observa-se que, na opinião do autor em comento, tudo está errado, a prole

eventual entra como legítima, não se podendo discuti-la no presente artigo, pois o mesmo não

foi criado com tal finalidade.

Para Dias,

Esta limitação não tem qualquer justificativa. Não se pode discriminar o filho havido

post mortem concebido com sêmen do pai pré-morto depois do prazo de dois anos.

A tentativa de emprestar segurança aos demais herdeiro não deve prevalecer sobre o

direito hereditário do filho que veio a nascer, ainda que depois de alguns anos. Basta

lembrar que não há limite para o reconhecimento de filiação por meio de

investigação de paternidade, e somente o direito de pleitear a herança que prescreve

no prazo de 10 anos (CC 2015) (2015, p.134).

A autora reluta diante de tamanha discriminação, pois qualquer um que considere

estar no direito, pode pleitear o reconhecimento de filiação a qualquer tempo, prescrevendo-se

tão somente a reclamatória dos bens em 10 anos. Assim, questiona-se: seria possível admitir

que um prazo limitasse o direito de um herdeiro legítimo e necessário?

Cabe mencionar, então, que seria injusto julgarmos o referido prazo, sabendo que

o mesmo poderia usar essa segunda via, a petição de herança, pois ela não pode pesar na

análise da (in)constitucionalidade do nosso tema. Além do mais, como citado anteriormente

por Lôbo, talvez a prole eventual ou o embrião excedentário não se amoldem a casos

específicos para reclamar através da referida petição. Eis outro viés a ser questionado.

Logo, não sabemos ser válido o prazo, pois tal situação não se vivencia. Contudo,

analisado pelo olhar constitucional, seria coerente afirmar que o mesmo limita os direitos

decorrentes da filiação.

E só para relembramos, não pode haver discriminação alguma, entre filhos,

inclusive em relação àqueles advindos de reprodução assistida.

Outro viés fundamental trata-se do fato de que a reprodução é tida como ocorrida

na constância do casamento, ou seja, dentro do prazo legal.

Como lecionou Dias, é incoerente emprestar segurança aos demais herdeiros,

frente à igualdade do ainda não concebido.

Pois bem, vistas as posições doutrinárias sobre o assunto, necessitamos relembrar

alguns princípios, entre eles, destaca-se o princípio da igualdade, resguardado em nossa

Constituição. In verbis:

44

Art. 227 [...]

§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os

mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias

relativas à filiação (BRASIL, CFRB, 2021).

Tal princípio é aplicado e ampliado pelo Código Civil. In verbis:

Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão

os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias

relativas à filiação.

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários,

decorrentes de concepção artificial homóloga;

V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia

autorização do marido (BRASIL, CC, 2021).

Podemos afirmar então, haver contradição entre a legislação ora debatida e os

princípios aqui elencados. Diante de tal conflito, devemos optar por um olhar um pouco mais

jurídico, sendo este o que prevê a pirâmide de Kelsen.

Figura 2 – Pirâmide de Kelsen

Fonte: Dutra (2017, p. 31).

Ou seja, diante da pirâmide de Kelsen, poder-se-ia resolver o conflito legal, haja

vista estarmos diante do fato de uma norma menor ferir uma outra maior. Por esse norte,

constata-se que devemos dar uma interpretação constitucional à legislação, a qual pode

concluir que o § 4º, do artigo 1.800 do Código Civil é um limitador dos direitos decorrentes

da filiação, principalmente no que toca ao princípio da igualdade entre os filhos.

45

5 CONCLUSÃO

A presente pesquisa buscou uma análise acerca da (in)constitucionalidade do

limite temporal de 2 (dois) anos previsto no art. 1.800, § 4º do Código Civil. In verbis:

Art. 1800 [...]

§ 4º Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o

herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do testador,

caberão aos herdeiros legítimos (BRASIL, CC, 2021).

Contudo as reproduções assistidas estão cada vez mais corriqueiras, uma vez que,

na última década, triplicou o congelamento de embriões.

Outro ponto a ser evocado é que há quase duas décadas estamos discutindo um

tema que o Legislativo não demonstra interesse em regulamentar, dificultando a vida dos

operadores do Direito, tanto é que há relatos de doutrinadores que até o ano passado retiraram

sua ideia inicial sobre o assunto, alertando que será tema de mais estudos.

Porém, acredita-se não haver muito tempo para que o presente tema chegue ao

Judiciário, pois o uso de tal técnica está cada vez mais presente e rotineiro. Convém lembrar,

após tantas teorias, que o tema em debate advém de uma esperança familiar, o que nos remete

a lembrança do rosto das pessoas na imagem inserida na introdução do presente trabalho,

onde transparece a felicidade de uma família, dando-se esperança ao seu planejamento

familiar.

O capítulo acerca da filiação esclareceu o momento em que se encontra nossa

sociedade no que diz respeito ao tema de nossa pesquisa. No que se refere aos princípios,

cremos que estamos evoluindo bem, dado que chegamos ao ponto em que se admite a

igualdade em relação à filiação, indiferente à sua origem, se laboratorial ou por adoção.

A nossa legislação traz um tratamento isonômico, em que se destaca que a letra

imposta na legislação não carece de dúvidas. In verbis:

Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao

adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à

alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao

respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a

salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade

e opressão.

[...]

§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os

mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias

relativas à filiação (BRASIL, CFRB, 2021).

46

Observou-se que a própria legislação dedicou-se muito para que a proteção da

filiação seja incontestável. Isso está presente em nossa Constituição Federal, no Código Civil,

no Estatuto da Criança e do Adolescente, e em diversos outros dispositivos que a utilizam

como base.

Contudo, cabe enfatizar que o Estado e a sociedade têm uma responsabilidade

muito grande nessa defesa, o que evidenciamos no decorrer do capítulo da filiação. Tanto que,

com as mudanças sociais e a reprodução assistida, já inserida em nosso meio, o Código Civil

foi readaptado em 2002, usando como norte a própria Constituição Federal, ou seja, o

legislador sentiu a necessidade de preservar o direito da filiação a qualquer custo. In verbis:

Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão

os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações

discriminatórias relativas à filiação.

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

[...]

III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários,

decorrentes de concepção artificial homóloga;

V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia

autorização do marido (BRASIL, CC, 2021, grifo nosso).

Contudo, quando abordou-se a questão do processo de reprodução assistida,

percebeu-se a falta de legislação sobre ela, a qual tem, como o único norte, a orientação do

Código de Ética da Medicina, que, conforme evidenciamos, é regido por princípios e não tem

força de lei.

No mesmo capítulo, apresentou-se o debate de uma ADIn do ano de 2005 sobre o

uso de embriões excedentários que seriam descartados, a qual resultou em uma sentença

positiva ao uso dos mesmos em pesquisas. Embora a decisão do processo não responda à

nossa pergunta, ela acrescenta conteúdo acerca da teoria natalista. Tal teoria que, como vimos,

na última década, não condiz mais com a nossa realidade, uma vez que sofreu grandes

mudanças, principalmente após o debate acerca do seguro DPVAT. Ou seja, a jurisprudência

apontou uma nova direção, e diferente da doutrina, o que também poderia ter tomado novos

caminhos se fosse discutida na ADIn citada anteriormente, pois se o nascituro adquiriu

direitos, nada impediria que também se aplique o mesmo ao embrião excedentário.

Evidenciamos uma evolução doutrinária no que diz respeito ao tema das teorias

natalistas, conceptualistas e da personalidade constitucional, acerca do qual houve mudanças

de concepções, bem como a retirada de opiniões que visavam novos estudos.

Ao depararmo-nos com o campo sucessório, destacou-se a confusão doutrinária,

uma vez que o campo sucessório não evoluiu na mesma velocidade que o o restante dos

47

direitos decorrentes da filiação, forçando várias teorias de discriminação, as quais foram

elencadas em subtópicos, da prole eventual na sucessão legítima e testamentária, bem como

do embrião excedentário, o qual, querendo ou não, fisicamente, encontra-se em posição

diferente da prole eventual.

Foram elaboradas essas três distinções, citadas anteriormente, antes do nosso

tópico final, com a intenção de evidenciarmos a divergência de pensamentos. Quando

confrontamos a reprodução assistida com o campo sucessório, verificou-se que a biogenética

e os princípios da filiação caminham em direções opostas à legislação sucessória, haja vista

que a legislação não proporciona essa união.

Por fim, ao adentrarmos em nosso último tópico, o qual possuía o condão de

esclarecer-nos se o art. 1.800, § 4º do Código Civil limitava a eficácia dos direitos decorrentes

da filiação ou não, subjugando o mesmo à (in)constitucionalidade, constatou-se que a presente

monografia corrobora com a inconstitucionalidade do referido artigo, uma vez que o mesmo

vai contra todos os princípios de igualdade aqui trazidos. Como vimos, o principal argumento

dos doutrinadores, que são a maioria, tem sido o da segurança jurídica, porém, parece-nos

inviável optar pela mesma.

Levando-se em conta o que se analisou nesta pesquisa, acredita-se que não há

razão para prevalecer um meio termo baseado na “simples” falta de legislação. Assim, restou-

nos evidente que algumas escolhas de posições doutrinárias somente seguiram um caminho

baseado na segurança jurídica diante de um descaso do legislador que, por inatividade, tem

criado ainda mais dificuldades aos juristas, obrigando doutrinadores a tomarem uma posição

(ou a questioná-las) diante das leis existentes.

Logo, parece-nos injusto o filho concebido posteriormente ao lapso temporal de

dois anos ser excluído da herança. Assim, seria inconsistente chegar ao final da presente

pesquisa e tentar solucionar o problema atribuindo-se um novo prazo, isto porque, segundo

nossa visão, o embrião ou a prole eventual deveriam ser considerados como legítimos.

Inclusive, cremos que se deva levantar dúvidas acerca da constitucionalidade do art. 1.798 do

CC, sendo que a única desavença deveria ser quanto à destinação dos bens até o possível

nascimento. Porém deve-se achar uma solução constitucional.

Diante do exposto, conclui-se, como única saída, que o direito deve evoluir

juntamente com os seus próprios princípios, principalmente na seara sucessória, obrigando o

legislador a fazer o seu papel principal, o de legislar, criando leis menos conflitantes, para que

toda discussão no campo jurídico cumpra com a finalidade de garantia dos direitos daqueles

que o buscam.

48

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Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de

Biossegurança – PNB, revoga a Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória

nº 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10 e 16 da Lei nº 10.814, de 15

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49

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Adota as normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução assistida – sempre em

defesa do aperfeiçoamento das práticas e da observância aos princípios éticos e bioéticos que

ajudam a trazer maior segurança e eficácia a tratamentos e procedimentos médicos -,

tornando-se o dispositivo deontológico a ser seguido pelos médicos brasileiros e revogando a

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