Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy...

121
Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy” UNIGRANRIO Terezinha Fatima Martins Franco Brito Polifonia, (in) formação e (re) conhecimento de discursos críticos e interpretativos na sociedade contemporânea em uma análise de obra didática para o Ensino Fundamental II. Orientadora: Profª. Drª. Jacqueline de Cassia Pinheiro Lima UNIGRANRIO Duque de Caxias, RJ 2010 Dissertação apresentada à Universidade do Grande Rio “Prof. José de Souza Herdy”, Unigranrio, como parte dos requisitos para obtenção do grau de mestre em Letras e Ciências Humanas. Área de concentração: Discurso, Cultura e Formação Humana.

Transcript of Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy...

Page 1: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy”

UNIGRANRIO

Terezinha Fatima Martins Franco Brito

Polifonia, (in) formação e (re) conhecimento de discursos críticos e

interpretativos na sociedade contemporânea em uma análise de obra

didática para o Ensino Fundamental II.

Orientadora: Profª. Drª. Jacqueline de Cassia Pinheiro Lima

UNIGRANRIO

Duque de Caxias, RJ

2010

Dissertação apresentada à Universidade do Grande Rio

“Prof. José de Souza Herdy”, Unigranrio,

como parte dos requisitos para obtenção do grau

de mestre em Letras e Ciências Humanas.

Área de concentração:

Discurso, Cultura e Formação Humana.

Page 2: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

Livros Grátis

http://www.livrosgratis.com.br

Milhares de livros grátis para download.

Page 3: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

Terezinha Fatima Martins Franco Brito

Polifonia, (in) formação e (re) conhecimento de discursos críticos e

interpretativos na sociedade contemporânea em uma análise de obra

didática para o Ensino Fundamental II.

Duque de Caxias

2010

Dissertação apresentada à Universidade do Grande Rio

“Prof. José de Souza Herdy”,Unigranrio, como parte dos

requisitos para obtenção do grau de mestre em Letras e

Ciências Humanas.

Área de concentração:

Discurso, Cultura e Formação Humana

Orientadora:

Professora Doutora Jacqueline de Cassia Pinheiro Lima

Orientadora: Professora Doutora Jacqueline de Cassia

Pinheiro Lima.

Page 4: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos
Page 5: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

DEDICATÓRIAS:

Ao Senhor Deus, Criador da VIDA e de todos os tempos, Pai Nosso que estais no Céu,

Pai Nosso que estás aqui!

À minha mãe, uma Rosa em minha vida, que me gerou na flor da idade, suportou as

dores de um parto a fórceps e me abençoa a todo o momento. Cuidava de meus filhos para eu

poder estudar e lecionar e que ainda cuida de nós a todo instante de nosso dia-a-dia, com o

carinho de mãe, avó e bisavó!

Ao meu pai, que embora jamais o tenha conhecido, no único dia em que me pegou no

colo e eu estava com um mês de vida, ele disse: “Se fosse menino seria jogador de futebol,

mas já que é uma menina, será professora!”. “Você faz parte desse caminho que hoje eu sigo

em Paz!”

Ao meu tio Ernani Martins Franco (em memória), que foi meu pai, meu irmão, meu

maior amigo, quem me ensinou a ler e escrever e que me presenteava com livros, histórias em

quadrinhos, revistas, palavras cruzadas... Sempre um Anjo para mim!

À minha tia Nadir Martins Franco (em memória), mais que tia, uma grande amiga,

minha irmã, a minha “Leleguinha”, que um incêndio na empresa em que trabalhava a levou

ainda tão jovem para o Reino de Deus!

Ao meu padrasto, também em lembrança, José de Souza Ramos, que sempre me

chamou de “Senhorita Professora”!

A minha avó e madrinha, Filomena da Conceição Franco, que escolheu o meu

primeiro nome, me criou, me educou, me incentiva até hoje e alegra-se com minhas pequenas

vitórias! É mãe, avó, bisavó e tataravó! Uma bênção!

Aos meus três filhos, Rodrigo, Philippe e Fernanda, jóias preciosas, dádivas de Deus,

grandes presentes da minha vida, em todos os momentos!

À minha neta Eduarda, princesa linda da Vovó Tetê!

A todos os meus alunos e alunas. Eu sempre irei levá-los dentro do meu coração. Só

não façam muita bagunça porque eu tenho prolapso de válvula mitral.

A toda a minha ascendência da Família Ribeirinha, de Vale de Gouvinhas, Portugal.

Page 6: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

AGRADECIMENTOS

Mais uma vez e sempre a Deus. Ele tudo sabe, tudo vê e nos abençoa. Ainda bem! Em

Sua Divina Pedagogia, conduziu-nos por inúmeros percalços: doenças, privações,

provocações, demissões, assaltos, síndromes... Mas também muitas alegrias! Cá estamos nós,

uma turma de primeiro mestrado em uma universidade na Baixada Fluminense, defesa de

dissertação! Só Ele, Senhor do Tempo e Deus da vida em plenitude, sabe das dificuldades e

dons de cada um de nós.

À minha orientadora, (“a terceira foi aquela a quem Terezinha deu a mão”!)

Professora Doutora Jaqueline de Cássia Pinheiro Lima, que me acolheu nessa dissertação,

quase em trabalho de parto, numa triangulação: a dissertação, a orientadora e a pesquisadora.

Mas, destas, a orientadora está grávida de verdade, em inícios de uma nova e abençoada

gravidez!

Ao Professor Doutor Rogério Casanovas Tílio, que era o primeiro Orientador, mas

passou no Concurso para a UFRJ. Grata pelas preciosas orientações, por apresentar-me

Fairclough, Bronckart e Halliday, pelas excelentes indicações de leituras, companhia no

InPLA, no COLE, no Salínguas, na Unisinos, no Silid... Grata, também pela exigência, pela

(im) paciência com meus blablablás, meus chororôs, meus “tins e tens e tais”! Ao segundo

orientador, Professor Doutor Airto Ceolin Montagner, que passou no Concurso para a

UFRRJ. Agradeço a calma, a atenção, indicações de leituras, o livro que me emprestou, a

companhia no II Seminário Nacional de Gênero e Práticas Culturais - Culturas, Leituras,

Representações, em 2009, lá em João Pessoa!

A todos os professores doutores e professoras doutoras do Mestrado em Letras e

Ciências Humanas da UNIGRANRIO, pelo pioneirismo, pelos incentivos, pela aprendizagem

de vida. Aos professores participantes da Banca Examinadora e do Exame de Qualificação,

pelas sugestões feitas ao trabalho.

Ao meu companheiro Antonio Fernando, mais que amigo de todas as horas, sempre

presente, acompanhando-me em cada passo dessa caminhada, presente em minha vida, meu

confidente, meu incentivador; se não fosse a crença dele em afirmar, constantemente, que eu

seria capaz, eu nem teria me inscrito no mestrado.

Ao meu ex-marido e sempre amigo Nilson, pai de meus três filhos e avô de minha

neta.

Um brinde aos nove componentes da “Primeira Turma de Mestrado em Letras e

Ciências Humanas da UNIGRANRIO”. E quem disse que “noves fora é nada?”. Aliás, nada

de noves fora! Rumo ao doutorado!

Page 7: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

RESUMO

MARTINS FRANCO, Terezinha Fatima Brito. Polifonia, (in) formação e (re)

conhecimento de discursos críticos e interpretativos na sociedade contemporânea em

uma análise de obra didática para o Ensino Fundamental II.

A presente dissertação investiga as múltiplas vozes e o discurso presentes em alguns textos e

suas atividades interpretativas, em uma coleção didática de Língua Portuguesa destinada ao

Ensino Fundamental, séries finais. Analisamos a obra enquanto documento, com o intuito de

observar se esse documento atende a alguns aspectos das políticas públicas que veem, entre

outras necessidades da sociedade contemporânea, as obras didáticas como um espaço para

construção de cidadania e valores identitários e, a partir desses dados, verificar se a obra

didática analisada pode contribuir para a formação de cidadãos com desenvolvido pensamento

crítico e conscientes da multidiversidade do mundo. De acordo com alguns aspectos de

documentos oficiais, tais como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) no

9394/96, os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (PCN) e o Programa

Nacional do Livro Didático (PNLD), verificamos através de textos e suas atividades

interpretativas, como são apresentados os gêneros discursivos nesse recorte, aqui vistos como

inseridos numa perspectiva de gênero enquanto entidade sociodiscursiva e forma de ação

social e, também, como estão representadas, nessa perspectiva, questões relacionadas ao

mundo em que vivemos e os contextos culturais relacionados aos apelos presentes na

sociedade. Conduzimos esta pesquisa em bases qualitativas, inserida no âmbito da Linguística

Aplicada, através da contextualização proposta pelos textos e suas interpretações elaboradas

pelos autores da obra analisada. Pretendemos direcionar o foco deste trabalho na Análise

Crítica do Discurso (ACD), nas pesquisas de gêneros textuais, em alguns teóricos que

investigam as ideologias e questões socioculturais contemporâneas, numa perspectiva

sociointeracionista de ensino e aprendizagem. Este trabalho analisa uma coleção didática

formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos de número um, que

constam do primeiro capítulo em cada unidade temática, perfazendo um total de dezesseis

textos e respectivas atividades. A escolha destes capítulos e textos de número um se deveu ao

fato desses representarem o primeiro contato, dos leitores projetados, com o tema da unidade

onde aqueles estão inseridos e atenderem a vários tópicos estruturais da obra, entre estes o

gênero textual. Com base no mapeamento de textos e atividades de compreensão e

interpretação na obra didática analisada, elaboramos tabelas que registram a ocorrência de

categorias de análise que utilizamos neste trabalho. Foram identificadas as diversas visões de

mundo ressaltadas nos textos que formam o nosso corpus, evidenciando que a escolha dos

tópicos elaborados pelos autores, confrontados com as teorias, propiciam a formação de um

pensamento crítico da realidade em que estamos inseridos. Porém, alguns tópicos baseados

nos PCN e PNLD, em especial ao que concerne aos gêneros textuais, poderiam ter sido

melhor explorados, uma vez que ainda foram identificados alguns estereótipos, além da

predominância de alguns gêneros textuais sobre outros, importantes socialmente. O estudo da

obra também demonstrou que a multiplicidade de vozes (polifonia) explorada nos textos e

atividades selecionadas, possibilita a percepção das situações heterogêneas e

problematizadoras componentes do meio social em que vivemos.

Palavras-chave: Livro didático; Polifonia; Texto; PCN; PNLD, Identidades.

Page 8: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

ABSTRACT

MARTINS FRANCO, Terezinha Fatima Brito. Polyphony, (in) formation, recognition and

knowledge of critical and interpretative discourses in the contemporary society in a

textbook of Portuguese language analyses.

This dissertation investigates the multiple voices and the discourse which are present in some

texts and in its interpretative activities, in a collection of textbooks of Portuguese Language

destined for the final years of the Elementary Education. We analyzed the work as a

document, aiming to observe if it answers to some aspects of the public policy that, among

other needs of contemporary society, see the textbook as a room to the building of citizenship

and of identity values. By observing the data, we aim to verify if the analyzed work may

contribute to the formation of citizens with a developed critical thinking and aware of the

multi-diversity of the world. According to some official documents, as the LBD number

9394/96 (law that rules the National Education), the Brazilian Curricular Parameters of

Portuguese Language (PCN) and the National Program of the Textbooks (PNLD), we verified

through the texts and its interpretative activities how the different genres are presented, as

well as how issues related to the world we live in and the cultural contexts related to the

appeals present in society are represented under this perspective. They are seen here as

inserted in a genre perspective as a social-discursive entity and also as a means of social

action. We drove this research in qualitative basis, inserted in the Applied Linguistic field,

through the contextualization proposed by the texts and its interpretations, which were

prepared by the authors of the analyzed book. We intend to lead our focus to the Critical

Discourse Analysis (CDA), to the research of textual genres and to some theorists who

investigate the contemporary ideologies and socio-cultural issues, in a social interactionist

perspective of teaching and learning. This work analyzes a didactic collection consisted of

four books, and our outline consists of the texts “number one”, that are part of the first chapter

in each thematic unit, which make up a total of sixteen texts and its respective activities. The

chapters and texts of number one were chosen due to the fact that they represent the first

contact of the projected readers with the theme of the unity where the chapters and texts are

inserted in, and also due to the fact that they answer to many structural topics of the work –

among them, the textual genre. Based on the mapping of the texts and the activities of

interpretation and comprehension in the analyzed work, we prepared tables that register the

occurrence of categories of analyses that we use in this work. Varied worldviews were

identified in the texts that are part of our corpus, showing that the choice of the topics

prepared by the authors, confronted to the theories, provide the formation of a critical thinking

about the society we are inserted in. However, some topics based on PCN and PNLD,

specially the ones concerning to the textual genres, could have been better explored, once that

some stereotypes were identified, as well as the predominance of some textual genres over

others, which are socially important. The study of the textbooks also showed that the

multiplicity of voices (polyphony) explored in the selected texts and activities makes possible

the perception of the heterogeneous and problematizing situations that make part of the social

environment we live in.

Key-words: textbooks; polyphony; text; PCN; PNLD, identities

Page 9: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................12 1.1 Uns vislumbres da situação-problema............................................................................12 1.2 Os textos e seus múltiplos veículos pedagógicos............................................................17

1.3 Objetivos............................................................................................................................19 1.3.1 Objetivo Geral...............................................................................................................20 1.4 Questões de pesquisa........................................................................................................22 1.5 Organização de estudo.....................................................................................................23

2 ESTRUTURA METODOLÓGICA PARA ESSE ESTUDO..........................................25

2.1 Relevância do estudo........................................................................................................28

2.2 Delimitação do estudo......................................................................................................29

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA....................................................................................31

3.1 Discurso e sociointeracionismo........................................................................................37

3.1.1 Texto...............................................................................................................................44

3.2 Contemporaneidade e educação.....................................................................................47

3.2.1 Parâmetros Curriculares..............................................................................................53

3.3 O livro didático.................................................................................................................56

3.3.1 PNLD 2011 de Língua Portuguesa..............................................................................59

4 METODOLOGIA ................................................................................................................ 61 4.1 Teoria ................................................................................................................................. 62

4.2 Descrição do corpus .......................................................................................................... 64 4.3 Procedimentos de análise ................................................................................................. 66

5. ANÁLISE DE TEXTOS SELECIONADOS E INTERPRETAÇÃO ............................ 72 5.1 Visão de mundo e a polifonia no contexto cultural ....................................................... 73

5.1.1 O mundo visto através de tópicos e configurações tópicas ........................................ 76

5.1.2 A construção identitária na obra didática de Língua Portuguesa...........................103

6 REFLEXÕES CRÍTICAS E CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................... 105

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 108

ANEXOS ............................................................................................................................... 114

Page 10: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

Lista de abreviaturas e siglas:

ABRALE - Associação Brasileira dos Autores de Livros Educativos

ABRELIVROS - Associação Brasileira dos Editores de Livros

ACD – Análise Crítica do Discurso

DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente

ECT - Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos

FNDE - Fundo Nacional para o desenvolvimento da Educação

INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

INL - Instituto Nacional do Livro

ISD – Interacionismo sociodiscursivo

LD – Livro Didático

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LDP – Livro Didático de Língua Portuguesa

LP – Língua Portuguesa

LSF – Linguagem Sistêmico-Funcional

MEC - Ministério da Educação

PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais

PL – Português - Linguagens

PLIDEF - Programa do Livro Didático para o Ensino Fundamental

PNBE - Programa Nacional Biblioteca da Escola

PNLD - Programa Nacional do Livro Didático

Page 11: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

Lista de figuras

Figura 2.5a: O livro didático nas práticas sociais p. 26

Figura 2.5b - Fairclough (1992): concepção tridimensional de discurso p. 28

Figura 1 (Texto) p. 77

Figura 2 (Ilustração) p. 78

Figura 3 (Texto) p. 82

Figura 4 (Estudo de texto)

Figura 5 (Texto)

Figura 6 (Texto)

Figura 7 (Compreensão e interpretação)

Figura 8 (Texto)

Figura 9 (Texto)

Figura 10 (Texto)

Figura 11 (Boxe)

p. 83

p. 84

p. 87

p. 88

p. 91

p. 99

p. 99

p, 100

Page 12: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

Lista de quadros

Quadro 3.1 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 6º ano p. 41

Quadro 3.2 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 7º ano p. 42

Quadro 3.3 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 8º ano p. 42

Quadro 3.4 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 9º ano p. 43

Quadro 4.1 – Da análise quanto ao PNLD p. 68

Quadro 4.2 – Da análise quanto ao PNLD p. 69

Quadro 5.1 – Categoria de tópicos com base em Tílio (2006) p. 74

Quadro 5.1.1a – 6º ano e os resultados das análises p. 97

Quadro 5.1.1b – 7º ano e os resultados das análises p. 98

Quadro 5.1.1c – 8º ano e os resultados das análises p. 101

Quadro 5.1.1d – 9º ano e os resultados das análises

Quadro 5.2 – Unidades, capítulos e textos do 6º ano

Quadro 5.3 - Unidades, capítulos e textos do 7º ano

Quadro 5.4 - Unidades, capítulos e textos do 8º ano

Quadro 5.5 - Unidades, capítulos e textos do 9º ano

p. 102

p. 79

p. 90

p. 92

p. 95

Page 13: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

Lista de exemplos

Exemplo 1 trecho de questão p. 88

Exemplo 2 trecho de questão p. 91

Exemplo 3 trecho de questão: texto 1 p. 92

Exemplo 4 trecho unidade 2, cap. 1, texto 1 p. 93

Exemplo 5 trecho unidade 4, cap. 1, texto 1 p. 93

Exemplo 6 trecho de questão p. 93

Exemplo 7 trecho de questão p. 100

Page 14: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

12

1 – INTRODUÇÃO

O interdisciplinar, de que tanto se fala, não está em confrontar

disciplinas já constituídas das quais, na realidade, nenhum consente

em abandonar-se. Para se fazer interdisciplinaridade, não basta tomar

um “assunto” (um tema) e convocar em torno duas ou três ciências. A

interdisciplinaridade consiste em criar um objeto novo que não

pertença a ninguém. O texto é, creio, eu, um desses objetos.

(BARTHES, 1988, p. 99)

A proposta desta dissertação de mestrado é apresentar uma revisitação aos textos e

atividades interpretativas de uma obra didática de Língua Portuguesa, destinada para o sexto

ao nono ano do Ensino Fundamental, o que despertou a intenção da pesquisadora em

investigar mais detidamente o discurso neste recorte, porque sempre encontrou nos textos

(desde a primeira cartilha1) um caminho a ser percorrido a fim de descobrir novas

possibilidades de estudos e questionamentos, sobretudo quanto à compreensão e

interpretação, ou seja, buscava entender a aplicação desses textos à vida.

Considera-se que a pesquisa surgiu da preocupação com a função educativa e,

consequentemente, com os efeitos que poderiam ser extraídos a partir dos textos e as formas

em que esses são trabalhados, especialmente quando integram uma obra didática que chega às

mãos de educadores, alunos, familiares, à sociedade. Portanto, o que a leitura é capaz de

proporcionar à aprendizagem é algo que nos move à colheita de (in)formação.

Por isso, a pesquisa, a abordagem com textos, tornou-se instigante, sobretudo no que

diz respeito àqueles incluídos nas obras didáticas de Língua Portuguesa, doravante LP.

Identificar significados ocultos nas entrelinhas, mensagens contidas no significado das

palavras e o poder dos textos e enunciados em gerar novas realidades, descobrir novas

possibilidades, pode-se dizer, são os interesses que reafirmamos e que nos levaram ao

presente trabalho.

1.1 Uns vislumbres da situação-problema

Pretende-se que se descreva através de textos e atividades relacionadas a eles, com a

inquietude de investigação, o que se pode apreender e depreender em cada leitura e nas

atividades propostas com base nessas leituras. Ou seja, mesmo vistos em sua forma impressa,

1 Impossível não citar essa particularidade que é registro de memória, de história de vida: “A Princesinha do

ABC”, Cartilha de Alfabetização; autoria de Maria Guaraldo; ano de 1964; Editora Vozes Limitada.

Page 15: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

13

os textos, ao serem lidos, apresentam, por eles mesmos, possibilidades de inferir “como as

pessoas criam novas realidades de significação, relações e conhecimento, fazendo uso de

textos” (DIONÍSIO, 2009). Nesse aspecto educacional houve, a partir de documentos oficiais

tais como a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 20 de

dezembro de 1996, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), os Temas Transversais de

LP e o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) que organizam critérios, aqui no caso

de obra didática de LP, para maior articulação dos textos e as atividades propostas com eles,

sendo considerados, entre outros aspectos, espaços de aprendizagem, de construção do

conhecimento, de investigação, de pesquisas que permitem um leque de possibilidades,

embora tenhamos feito um recorte dentro das propostas desses documentos oficiais.

Para este trabalho, destacamos a obra de Língua Portuguesa intitulada “Português:

Linguagens”, doravante PL, de autoria de William Roberto Cereja e Thereza Cochar

Magalhães, composta por quatro livros no total, sendo um para cada série do Ensino

Fundamental II (6º ano até o 9º ano). Procura-se investigar se, através das leituras e das

análises dos textos selecionados para a pesquisa, conduz-se, ou não, à constatação de que o

material pedagógico, objeto de pesquisa, possibilita a instrumentação do professor na

formação de cidadãos conscientes de seu papel em um mundo pautado pela multidiversidade,

portadores de um pensamento crítico e autônomo. Serão vistos os vários aspectos

concernentes ao que cada leitura pode apresentar, pois a escolha dos textos que formam o LD

não pode ser vista como aleatória, eles têm um propósito a alcançar, conforme será verificado

no decorrer do trabalho.

Cada texto nos apresenta múltiplas informações, ou seja, pode traduzir uma grande

diversidade de facetas, de apelos ligados às questões da contemporaneidade, como por

exemplo, numa função de representação de identidades, dá voz a inúmeros atores e setores da

sociedade, daí surgindo oportunidades para o diálogo entre essas vozes.2 A partir de textos

dispostos numa obra, podem ser examinadas relações de poder que atravessam, como diz

Moita Lopes (2003, p.26), remetendo a Foucault ([1969], 2007), “as relações sociais

cotidianas de forma capilar no nível de micro-poderes do dia-a-dia”. Os textos apresentam,

através da multiplicidade de vozes, a oportunidade em obter-se informações de cultura,

especialmente de mundo. Portanto, a problemática deste trabalho intenciona, por meio da

2 Apelos existentes na sociedade contemporânea sejam eles de origem étnica, de gêneros, identidades, enfim, às

orientações contidas nos documentos oficiais tais como LDB 9394/96, PCN, PNLD e outras obras publicadas

com esse intuito de identificar essas vozes.

Page 16: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

14

Análise Crítica do discurso3, sem perder de vista as interações sociais (sociointeracionismo),

4

que se perceba nos textos da coleção didática em estudo, aqui vista enquanto documento, as

diversas práticas sociais nas quais se pode chegar ao outro (alteridade).

No dia-a-dia, convivemos, através da linguagem, com diversas estratégias de inclusão

e exclusão do outro. É uma preocupação das questões que envolvem a formação cidadã a

discussão e revisitação de temas específicos com a intenção de repensar essas práticas sociais

e destacar o papel da linguagem (aqui em particular da linguagem textual) na formação,

manutenção e/ou transformação da história, do comportamento e das relações humanas

quanto a, se de fato, existe uma concretização desse reconhecimento das diferenças, das

culturas, das condições de inclusão, do estudo dos gêneros, das identidades no discurso dos

textos apresentados na obra que analisamos.

Analisa-se, deste modo, a obra didática como um instrumento de produção que oferece

ferramentas para o processo de reconhecimento do outro através das ideias estabelecidas e

negociadas com o discurso e até que ponto este é portador de ideologias. “A esse conjunto de

ideias, a essas representações que servem para justificar e explicar a ordem social, as

condições de vida do homem e as relações que ele mantém com outros homens é o que

comumente se chama ideologia”, segundo afirma Fiorin (2007, p.28). Para ele “todo

conhecimento está comprometido com os interesses sociais” (2007, p.29) e, se os textos

utilizados numa obra didática promovem conhecimento, logo se supõe que eles estão

comprometidos com os interesses sociais, no sentido positivo, evidentemente. Queremos ver o

social no discurso desses textos. Pode-se entender que o discurso é o portador da ideologia

que lhe serve de suporte, que o sustenta e promove condições de aplicação à vida social.

Não se discute nesse momento da pesquisa a importância desse material para a

utilização de professores e alunos no espaço de sala de aula. A nossa investigação não

envolve o livro em uso, mas queremos visualizar essas perspectivas através do que está

proposto no material em análise. Há, atualmente, um crescente interesse pelo estudo do LD, e

os estudos sobre o tema se dão sob os mais variados recortes, e podemos dizer que o ponto

nevrálgico é a pesquisa dos processos de formação do pensamento social. Uma obra didática

não substitui, evidentemente, a formação continuada de profissionais especializados que a

3 Análise Crítica do Discurso: (ACD) – linha britânica de estudos sobre discurso, que assume papel de descrição

sociológica do trabalho científico por meio da investigação linguística, oferecendo atenção ao processo de

produção e interpretação textual caracterizados por tensões sociais.

4 Sociointeracionismo: em torno deste tema, a partir dos PCN de Língua Portuguesa , pretendemos refletir sobre

possibilidades discursivas quando da produção de documentos (os textos que analisamos) a respeito do que as

atividades interpretativas propõem na obra Português: Linguagens para a interação social.

Page 17: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

15

utilizam, isso é um outro assunto que não contemplamos aqui, mas queremos observar sim, se

os interesses comprometidos com a cidadania “falam” por eles mesmos, ou seja, podem ser

identificados nesse instrumento de (re)conhecimento e poder. Em relação ao conhecimento,

podemos verificar em Silva (2009): “O conhecimento não é aquilo que põe em xeque o poder:

o conhecimento é parte inerente do poder”. (SILVA, 2009, p.149).

Nas vozes que se apresentam no LD podemos verificar esse conhecimento como parte

que integra variados poderes, entre os quais, os dos autores dos textos, os autores da obra, a

editora, o currículo que determina os conteúdos, os gêneros textuais mais adequados para

determinadas séries... Sobre essa questão do currículo, Silva (2009) também nos orienta que

o currículo tem significados que vão muito além daqueles aos quais as

teorias tradicionais nos confinaram. O currículo é o lugar, espaço,

território. O currículo é relação de poder. O currículo é trajetória,

viagem, percurso. O currículo é autobiografia, nossa vida, curriculum

vitae: no currículo se forja nossa identidade. O currículo é texto,

discurso, documento. O currículo é documento de identidade.

Essa multiplicidade de mensagens encontradas no LD nos permite ouvir a diversidade

de interesses da e na sociedade e vai orientar para a produção de enunciados interpretativos

que apontam, através de diferentes formas de discurso, para a promoção de modos de pensar

mais críticos. A diversidade de interesses a que nos referimos pode ser entendida quanto, no

caso de textos, às possibilidades de pluri/multi/inter/trans/in/disciplinaridade, embora nosso

enfoque não vá esclarecer as diferenças entre esses prefixos. Utizamos em nossas abordagens

mais vezes o termo “interdisciplinaridade”, até porque é mais usual empregá-lo nos assuntos

sobre as práticas pedagógicas contemporâneas. Quanto a esse uso, destacamos uma

contribuição oportuna:

A falsa imagem de que está ocorrendo trabalho interdisciplinar no ensino

surge, assim, de idéias equivocadas, como por exemplo, a de que um

professor de um curso, ao dar aulas em outro curso, está estabelecendo uma

relação interdisciplinar. Isto pouco tem a ver com a definição de

interdisciplinaridade como um conceito orgânico, em comum, entre

disciplinas. O que costuma acontecer nestes casos é que o profissional que

dá aulas numa área que não é a sua mostra-se incapaz de adequar os

conteúdos de seu curso às necessidades da nova área. (COUTO, 1997 , p.03)

A epígrafe que introduz nosso trabalho vem ao encontro dessas palavras da autora e

atendem ao que concordamos em relação ao termo interdisciplinaridade para o que aqui

abordamos. Não adianta apenas dizer que se faz algo e, na prática, não percebermos esse

discurso. Em muitas abordagens pedagógicas se diz a respeito, mas pouco se faz

concretamente. Em resenhas de coleções didáticas, por exemplo, traz-se essa informação, que

Page 18: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

16

nem sempre é contemplada nas obras. Destacamos mais um comentário sobre esse assunto

que nos apresenta que

o conceito mais flexível de interdisciplinaridade reflete uma visão mais

aberta a inclusões, onde o desenvolvimento de trabalhos conjuntos implica

admitir uma ótica pluralista e dialógica. Corresponde a reconhecer que a

ordem da ação não está presidida por um só método, não é perfeita, mas

pode ser aperfeiçoada pela confrontação de pontos de vista, num diálogo

permanente, que pressupõe a presença de valores por vezes aparentemente

incompatíveis.(COUTO,1997 , p.13)

Muitos poderiam indagar o que poderiam os textos de LP relacionar-se a seus

conteúdos de outras disciplinas, mas se verificarmos que nos textos existe a polifonia a que

nos referimos neste trabalho, não seria difícil verificar pontos em comum. Se tudo é discurso e

com ele construímos nossa realidade e, consequentemente, nossa identidade, é possível

verificar e (re)conhecer, a interdisciplinaridade e sua atuação “como um processo contínuo e

interminável de elaboração do conhecimento, orientado por uma atitude crítica e aberta à

realidade”. (COUTO, 1997 , p.13)

É importante observar como o discurso tem sido construído na identidade nacional e,

se observamos esse discurso sendo analisado num material didático empregado com a

finalidade de promover questionamentos, é preciso verificar se esse documento possibilita

usarmos essa identidade nacional e, também, se usamos a linguagem de forma consciente e

reflexiva, pois segundo Moita Lopes

o discurso como uma construção social é percebido como uma forma de

ação no mundo. Investigar o discurso a partir dessa perspectiva é analisar

como os participantes envolvidos na construção do significado estão agindo

no mundo por meio da linguagem e estão, desse modo, construindo a sua

realidade e a si mesmos. (MOITA LOPES, 2002, p. 31).

As intenções que existem em cada discurso podem permitir que reflitamos mais sobre

a realidade e adotemos um posicionamento crítico diante dela. “Por isso, a cada formação

ideológica corresponde uma formação discursiva, que é um conjunto de temas e de figuras

que materializa uma dada visão de mundo” (FIORIN, 2007, p.32). É ainda importante

verificar se os textos que constituem a indicação de texto de número “um” e integrantes de

primeiro capítulo, em cada unidade estudada, fazem jus a iniciarem as discussões de uma

unidade que apresenta um tema central a ser contextualizado.

As escolhas dos contextos culturais apresentados pelos livros e as atividades

propostas pelos autores podem permitir, ou não, que determinadas

identidades sejam construídas, ou, pelo menos, manifestadas, em um

determinado momento. (TÍLIO, 2006, p. 19)

Page 19: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

17

Esses contextos podem referir-se a diferentes situações relacionadas às questões

culturais amplas, ou seja, os textos podem apresentar contextos étnicos, de gênero, de

sexualidade, de valores sociais, de política, de economia, etc., e que se manifestam através do

discurso e das formações ideológicas e de poder. “Por conseguinte, as formações ideológicas

só ganham existência nas formações discursivas”, de acordo Fiorin (2007, p. 32). Nesse

aspecto, o que nos preocupa de sobremaneira quando o assunto é uma obra didática, é se esta

poderá oferecer suporte à formação educacional pretendida para o desenvolvimento cultural

dos educandos.

Também perpassa pela preocupação pedagógica de que a obra projeta discursos de

múltiplas vozes oriundas dos textos que a compõem e que, nesse acervo, consequentemente,

ocorrerá (in) formação e (re) conhecimento quanto aos discursos críticos e interpretativos que

existem na sociedade em geral. Podemos verificar, segundo Tílio (2006) que “o livro didático,

enquanto forma de produção na modalidade escrita, pode ser considerado um documento

pedagógico, pois constitui parte integrante das práticas educacionais”.

Procuramos entender o processo de desenvolvimento das atividades de interpretação

dos textos selecionados na obra em estudo, a fim de verificar se esses textos são utilizados

como meros pretextos ou se promovem realmente uma dinâmica entre saberes, objetos e

práticas de ensino. Portanto, a relevância desse tema de pesquisa, em selecionar textos e

atividades interpretativas, reside no fato de que ao se refletir sobre a dinâmica da ação

polifônica desses elementos contribuir-se-á para com a importância social dos textos e

gêneros discursivos, visto que a leitura e interpretação são essenciais em situação de trabalho,

minimizando, muitas vezes, a dificuldade de compreensão de enunciados nas mais diferentes

abordagens e contextos transdisciplinares.

1.2 Os textos e seus múltiplos veículos pedagógicos

Além de vermos os textos como portadores de vozes, no sentido da polifonia,

ferramentas ou outra denominação que possa ser apropriada e que os representem na

qualidade de serem múltiplos veículos pedagógicos, pretendemos analisá-los não apenas

como atividades próprias de uma relação do universo escolar, mas, também, no processo de

construção de ações que promovam valores de vida e perspectivas cidadãs de acordo com as

necessidades da sociedade contemporânea, que precisa de conscientização crítica quanto às

situações concretas que dependem de tomada de decisões.

Ainda, é inegável a pluralidade cultural do contexto em que vivemos e que pode ser

observada nos mais variados espaços sociais, inclusive nas escolas e, especialmente, nas salas

Page 20: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

18

de aula. Mas, é nos espaços acadêmicos e noutros que possam promover essas discussões, que

vemos uma oportunidade de colocar-se em prática a interdisciplinaridade, há tempos

discutida. Se há documentos que discutem isso, falta abri-los, discuti-los e (re) descobrir as

(in) formações importantes a fim de dinamizarmos essas propostas de melhor compreensão da

realidade em que somos inseridos, pois

há muito se diz que o Brasil é um país rico em diversidade étnica e cultural

plural em sua identidade: é índio, afro-descendente, imigrante, é urbano,

sertanejo, caiçara, caipira... Contudo, ao longo de nossa história, têm existido

preconceitos, relações de discriminação e exclusão social que impedem

muitos brasileiros de ter uma vivência plena de sua cidadania. (BRASIL,

1998, PCN de Pluralidade Cultural, p.15)

Tanto o documento dos PCN quanto tantas outras obras importantes e que também são

documentos tratam dessas questões. Podemos conferir em Candeau que

as relações entre educação e cultura (s) nos provocam a situar-nos diante das

questões colocadas hoje pelo multiculturalismo no âmbito planetário e de

cada uma das realidades nacionais e locais em que vivemos. As

configurações desta problemática são distintas conforme o contexto em que

nos situemos e suscitam muitas discussões e polêmicas no momento atual.

(CANDEAU, 2008, p. 17)

Um livro que contenha textos que possam favorecer uma leitura dessa realidade que

nos cerca e que ofereçam atividades relacionadas, contextualizadas, que possibilitem que essa

mesma pluralidade, que frequentemente acarreta confrontos e conflitos, possa ser

compreendida, analisada, interpretada irá, sem dúvida, auxiliar no trabalho pedagógico, visto

que vêm se tornando cada vez mais contundentes os desafios a serem enfrentados pelos que

atuam em educação.

No entanto, se essa mesma pluralidade for apreciada através de leituras e atividades

coesas e coerentes, certamente poderá propiciar uma contribuição para o enriquecimento e a

renovação das possibilidades de atuação pedagógica. Antes, porém, de apresentarmos a

metodologia e analisarmos se os textos selecionados para o trabalho podem oportunizar uma

formação voltada para valores de cidadania, conforme um dos aspectos apresentados entre

nossos objetivos, examinaremos o que a obra tem a nos apresentar.

Nesse recorte sobre o qual nos debruçamos, deparamo-nos com essa inquietação

relacionada aos textos e exercícios sobre os mesmos enquanto espaços de pesquisa, ensino e

aprendizagem. Portanto, neste estudo, é pertinente a análise e reflexão sobre algumas questões

no sentido de identificar se existem condições de aprendizagem com esses elementos e como

é possível identificar esse processo de aprendizagem a partir da coleção didática, os textos e

atividades elaborados para serem trabalhados na obra. E, ainda, como essas atividades

Page 21: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

19

realizadas com base nos textos, ou a partir deles, contribuem, à luz das exigências da LDB,

dos PCN e PNLD, no processo de ensino e aprendizagem exigidos na contemporaneidade.

Num corpus formado por uma coleção didática com quatro volumes, um para cada

série do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental, e uma seleção total de dezesseis textos5,

sendo que, cada texto escolhido é o que representa o primeiro capítulo de cada uma das quatro

unidades, sobre os quais elaboramos quadros para melhor visualização do que explanamos e

que abordaremos mais adiante, pretendemos encontrar também resposta a essa questão.

Partimos do pressuposto de que o LD é fundamental para o processo de ensino-

aprendizagem, pois é um documento que porta vozes (sem hífen, mesmo) importantes de serem

ouvidas e com as quais os educadores fazem eco, esses mesmos educadores se apropriam de

informações e os alunos são introduzidos na e para a aprendizagem com base nessas informações

ou provocações para discursos. Vemos, então, a importância desse documento ser avaliado e

reavaliado. Um importante passo na direção dessa avaliação criteriosa do LD foi, sem dúvida, a

implementação do PNDL, visando coordenar a aquisição gratuita de livros didáticos aos alunos

das escolas públicas brasileiras. Isso é muito importante e sério! Precisamos nos debruçar nesse

exame no sentido de (re) conhecer que material é esse que chega a tantas mãos.

A obra que analisamos já se encontra pela quarta vez aprovada pelo PNLD e tem tido

atualizações ao longo desses anos, com objetivos claros de estar cada vez mais em

conformidade com as exigências dos documentos oficiais, pois nada é aleatório. Os volumes

que fazem parte da análise já estão editados quanto às novas orientações ortográficas.

Consideramos importante salientar que essa coleção didática é utilizada tanto nas escolas da

rede pública de ensino, através do já citado PNLD, quanto da rede particular; portanto, sua

abrangência é bem ampla. Objetivamos, entre outras possibilidades de pesquisa, verificar se a

obra didática PL corrobora para a contribuição do trabalho docente e o processo de formação

identitária do corpo discente. Ou seja, nossa investigação no documento visa também

“analisar como o discurso do livro didático, através da seleção e apresentação de tópicos e

contextos culturais e das atividades propostas, relaciona-se à construção de identidades sociais

dos alunos” (TÍLIO, 2006, p.20) às quais acrescentamos a dos professores.

1.3 Objetivos

5 Aqui enfatizamos, até utilizando propositamente diversas vezes a palavra “cada”, que nosso destaque são os primeiros

textos que pertencem ao primeiro capítulo de cada unidade apresentada em cada volume da obra e que cada volume possui

quatro unidades com temas específicos para cada uma delas. Queremos, além dessas considerações metodológicas, analisar o

que eles nos dizem (polifonia) e o que se extrai deles na obra didática.

Page 22: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

20

Entre nossos objetivos, pretende-se identificar se nos textos destacados na obra há

abordagens sobre a construção de formas de pensar críticas, assuntos da contemporaneidade e

educação; verificar se nos estudos interpretativos sobre esses textos, o Livro Didático de

Língua Portuguesa, doravante LDP, dialoga com propostas da LDB, os PCNs com os temas

transversais e o PNLD. Utilizaremos essas abordagens e estudos nos capítulos que são

apresentados e que serão desenvolvidos neste trabalho, que se insere no campo de estudo da

Linguística Aplicada por esta considerar “questões de uso da linguagem do mundo real, ou

seja, tem uma preocupação social”. (TÍLIO, 2006, p.21). São, portanto, objetivos gerais de

pesquisa, conforme explica Richardson (1989, p.23) aqueles que definem "o que se pretende

alcançar com a realização da pesquisa". Os objetivos específicos, por sua vez, aqueles que

"definem aspectos determinados que se pretendem estudar e que contribuem para alcançar o

objetivo geral" (idem). Com vistas a atender essas prerrogativas acreditamos poder alcançar o

objetivo geral deste trabalho. Eis nossos objetivos:

1.3.1 Objetivo Geral

Verificar se a obra didática analisada pode contribuir para a formação

de cidadãos com desenvolvido pensamento crítico e conscientes da multidiversidade

do mundo onde atuam.

1.3.2 Objetivos específicos

Investigar se os textos analisados mantêm a polifonia e adequação

interpretativa para o momento histórico-político-social em que são trabalhados.

Identificar situações de poder que possam estar inseridas nos textos

selecionados para análise, bem como em suas questões de interpretação textual.

Como já foi dito, mas é importante frisar, a obra didática com a qual trabalhamos

possui quatro unidades e cada unidade está dividida em três capítulos. Essa proposta de

trabalho considera os primeiros textos de cada primeiro capítulo, tendo em vista serem esses

textos os que significam o primeiro contato que o leitor terá com o tema proposto pela

unidade em que aquele primeiro texto se insere e por serem esses textos utilizados nas

unidades que apresentam mais tópicos propostos pelos autores. Mais adiante mostraremos

quadros onde podem ser constatados, em cada texto de número um, em cada início de um

novo capítulo, os tópicos passíveis de análise.

Page 23: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

21

Perfaz-se, portanto, o total de quatro textos por volume. Considerando-se que a obra é

composta por quatro volumes, (6º , 7º, 8º e 9º ano), o total de textos para análise corresponde

a dezesseis textos. Interessa-nos observar se o texto que inicia cada capítulo pode ser

considerado ponto de partida e traz referências presentes sobre algum dos aspectos das

temáticas propostas e se as atividades têm o objetivo de exercitar os conhecimentos prévios –

a bagagem – do/a leitor/a – em relação aos conceitos, conteúdos e principais abordagens do(s)

assunto(s) que se apresenta(m).

Destaca-se a importância de reconhecer se o texto é simples pretexto ou atende às

expectativas inscritas no processo histórico desse provável leitor, imbuído de memória e

cultura de seu meio. Essa indagação é válida para nossa análise por desejarmos verificar se

cada texto contribui para o desenvolvimento de conhecimentos prévios sobre o mundo, ou

seja, às questões exigidas pelo currículo. Para percebermos a relação entre esse currículo e as

construções sociais que estabelecemos ao nos depararmos com a linguagem de um

determinado texto, concordamos com uma perspectiva em que o currículo

pode ser visto como uma prática de significação. O currículo também pode

ser visto como um texto, uma trama de significados, pode ser analisado

como um discurso, pode ser visto como uma prática discursiva. E, como

prática de significação, o currículo, tal como a cultura é, sobretudo, uma

prática produtiva. (SILVA, 1997, p.13)

Objetiva-se contribuir, entre outras possibilidades oriundas do trabalho em pauta, com

aspectos importantes a serem observados em uma obra didática. É essencial que sejam feitas

algumas análises para verificar se a obra oferece temas pertinentes quanto às propostas dos

PCN. O enfoque na “análise do discurso deve ser idealmente um empreendimento

interdisciplinar.” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 276). Essa interdisciplinaridade pode destacar

questões sobre respeito a diferenças, lutas por igualdade, identidades e tantas outras já

mencionadas, além do multiculturalismo, por exemplo, que representa um importante

instrumento de luta política, pois ele remete a importantes questionamentos, entre eles o que

se considera como conhecimento oficial. Assim, essa visão de multiculturalismo também nos

lembra que “a igualdade não se obtém simplesmente através da igualdade de acesso ao

currículo hegemônico” (SILVA, 2009, p. 90), sendo preciso mudanças substanciais do

currículo existente. Percebe-se, através desse levantamento de questões, que a obra didática

perpassa por vários outros objetos de estudo.

Ao serem apresentados sob a forma de títulos nessa introdução, a simples menção

desses mesmos títulos faz pensar, levantar hipóteses, sobre as possibilidades de conteúdos

abordados nesses textos que virão a ser lidos e, posteriormente, analisados. Apresentam-se

diversas perspectivas, mas o foco que norteia e é objetivo principal deste trabalho é, portanto,

Page 24: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

22

verificar se a obra didática analisada pode contribuir para a formação de cidadãos com

desenvolvido pensamento crítico e conscientes da multidiversidade do mundo onde atuam. E,

nesse bojo se, realmente, através da seleção e apresentação de textos da obra, de tópicos e

contextos culturais propostos nos documentos oficiais, das atividades propostas pelos autores

da obra, contribui para a construção de identidades sociais dos alunos. Insistimos nessa

questão de formação identitária, pois pretendemos ver se esse enfoque pode ser percebido nos

textos e abordagens que os autores da obra utilizam, pois sabemos da importância de

partirmos da realidade social dos alunos e que, muitas vezes, a realidade social apresentada

num LD pode levá-los “a reprimir suas verdadeiras identidades, que podem não lhes parecer

legitimadas pelo livro”. (TÍLIO, 2006, p.19).

1.4 Questões de pesquisa

A presente dissertação visa, portanto, através da análise dos textos e atividades

interpretativas dessa coleção didática em análise, responder às seguintes perguntas de

pesquisa:

1) De que forma os tópicos dos textos selecionados contribuem para uma

formação cidadã?

2) Em que medida as atividades propostas com os textos permitem ao aluno agir

no mundo social, pensando criticamente e expressando diferentes vozes acerca do tópico?

3) Existe variedade de gêneros textuais compatíveis com a realidade social em

que o aluno se insere?

Para que as propostas desse trabalho possam ser alcançadas é importante verificarmos

temas que contribuam para atingirmos respostas aos nossos questionamentos, entre eles:

• o discurso e o socioconstrucionismo, a fim de problematizar às expectativas da

contemporaneidade e educação, com formação de valores de vida, pensamento crítico,

atitudes cidadãs;

• a interface com a interdisciplinaridade e os textos abordados a fim de observar de

que modo uma obra didática de língua materna dialoga com as demais disciplinas do

currículo, favorecendo esse diálogo interdisciplinar que tanto buscamos;

• e, ainda, se os possíveis discursos produzidos pela obra didática dialogam com

alguns documentos oficiais, inúmeras vezes mencionados nessa pesquisa.

Considerando-se que uma obra didática também é um documento e documentos

existem para serem usados a fim de comprovar algo a alguém ou em situações que se façam

Page 25: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

23

necessários, este trabalho insere-se no campo de estudo da Lingüística Aplicada e a

interpretação dos dados pretende inspirar-se em teorizações que respaldem acerca de apelos

constantes na sociedade em que vivemos, sejam em relação a questões culturais, identitárias,

de gênero, também de gêneros textuais, memória e aspectos de base sociológica à luz da

Análise Crítica do Discurso (ACD) (FAIRCLOUGH, 2001).

1.5 Organização de estudo

O capítulo 1 trata de nossa introdução que dividimos em alguns tópicos para explicar

alguns passos que tentamos desenvolver neste trabalho. Por termos divido a introdução nesses

tópicos, consideramo-na também na qualidade de capítulo, pois colabora com alguns

conceitos que gostaríamos de esclarecer.

No capítulo 2 apresenta-se a estrutura metodológica para esse estudo, com sua

relevância e delimitação e, no capítulo 3 desenvolve-se a fundamentação teórica deste

trabalho em que esboçamos algumas considerações sobre a teoria bakhtiniana com a oposição

entre a significação e o tema, onde verifica-se que para Bakhtin esses elementos seriam vistos

mais numa perspectiva histórica, social e concreta ao passo que para Halliday, o sentido de

tema abrange mais para a negociação dos signicados onde ele apresenta a oposição Tema e

Rema, sobre o que reportamo-nos a Tílio (2006) e utilizamos essa conceituação.

Também dialogamos com as teorias que se fundamentam na Linguística Aplicada

onde situam-se os estudos de linguagem vistos em sua contextualização o que nos remete às

teorizações acerca de cultura, identidade e contemporaneidade, lugares de onde procuramos

identificar questões de polifonia nos textos e atividades que estudamos, além de buscar

respostas às nossas questões também nos documentos oficiais. Assim, como vemos os textos

e as atividades que se depreendem um uso na sociedade, vemos na Análise Crítica do

Discurso de Fairclough(2001) uma teoria que nos dá embasamento, pois considera a

linguagem a partir de seu contexto de produção e busca revelar as ideologias veiculadas pelo

uso da linguagem, do discurso.

O capítulo 4 trata de nossa metodologia utilizada para essa pesquisa tendo como base a

obra didática que selecionamos para o trabalho em questão. Reafirma-se que o tão decantado

objeto de análise é a obra PL vista enquanto um documento, ou seja, o livro de acordo com a

proposta dos autores dessa coleção didática. Elaboramos a descrição do corpus, utilizamos

alguns quadros, tabelas, gráficos e exemplos para tentar, com essas ilustrações, elucidar um

pouco do que desejamos desenvolver na análise.

Page 26: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

24

Enfim, no capítulo 5 é feita a análise de alguns textos e atividades interpretativas

desse material didático que aqui abordamos. O estudo de cada um dos tópicos previstos

buscam respostas às nossas questões de pesquisa. Queremos visualizar o que apresentamos no

início desse capítulo introdutório quanto as metafunções às quais fizemos referência, pois elas

podem contribuir para identificarmos melhor um de nossos termos-chave: a polifonia.

O capítulo 6 apresenta as considerações finais dessa dissertação, com uma breve

apresentação de seus principais aspectos, se é que de fato conseguimos apresentá-los, e a

tentativa de trazer alguma contribuição desse trabalho para o desenvolvimento de capacidades

leitoras e interpretativas críticas, indispensáveis à vida e ao exercício pleno da cidadania.

Esperamos, também, levar para as expectativas do mestrado interdisciplinar em Letras e

Ciências Humanas um pouco dessas contribuições das linhas teóricas apontadas no trabalho

que se apresenta aqui.

Além de nossas considerações finais, esta dissertação inclui uma seção de Anexos, que

contém um CD-ROM, com arquivos em PDF, com todos os textos e atividades interpretativas

que foram utilizados para a análise desenvolvida nesta pesquisa. Os PCN de Língua Portuguesa

do 3º e 4º ciclos e o PNLD de Língua Portuguesa 2011 constam dos links que indicamos nas

referências.

Page 27: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

25

2 ESTRUTURA METODOLÓGICA PARA ESSE ESTUDO

Optamos por essa forma mais segmentada de apresentação a fim de que ficassem

claros os tópicos que propomos para nossa estrutura metodológica, a importância de

destacar aspectos da obra que lidam com questões de cidania, tendo em vista que essa

abordagem contribui com a efetivação de nosso objetivo geral. Pensamos na abordagem

textual e, comparando-a com as exigências de documentos oficiais, destacamos os pontos

que atendem às causas de diversidade cultural (CUCHE, 1999). Desenvolvemos uma

mostragem que nos apresenta um panorama em relação aos textos, as atividades

relacionadas a eles e, se nos tópicos que apontam, ocorrem ou não interações entre esses

temas e propostas abordados.

Os resultados obtidos, comparando os textos com as atividades, à medida em que,

com elas, se aproximam valores históricos, sociais, culturais, identitários através, também,

do uso dos gêneros discursivos, precisam partir de uma visão interacionista de acordo com

Cuche (1999), onde se reconhecem o caráter dinâmico da cultura com outra efetivando e

oferendo possibilidades de constante (in) formação, (re) conhecimento e (re) invenção, o

que também podemos verificar em Velho (2001) quando nos apresenta.

Com essa intenção, elaboramos um mapeamento de fragmentos dos textos e

atividades onde esses aspectos de gêneros discursivos, cultura, identidade, formação

cidadã, aparecem aplicados a um quadro com tópicos de TÍLIO (2006), sob a ótica da

LA, à luz da ACD, do ISD e da LSF confrontados de acordo com as propostas dos PCN e

PNLD. Nesse sentido, em relação aos documentos oficiais, Batista e Rojo (2005), Rangel

e outros são alguns exemplos que fundamentam essa abordagem. Elaboramos uma figura

na tentativa de representar o que aqui expusemos, de modo que, ao observarmos-la,

percebam-se os elementos que destacamos e o papel que estes exercem na dinâmica do

evento discursivo.

Figura2.5a: O livro didático nas práticas sociais

Page 28: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

26

Queremos frisar também, na figura 2.5a, que entendemos “o texto como um evento

comunicativo, com a análise da intencionalidade e, particularmente, da situacionalidade em

que ele acontece, ou seja, um texto é visto de acordo com o contexto em que ele se apresenta.

Deste modo, se temos um texto, mesmo que seja um clássico da literatura infanto-juvenil,

conto maravilhoso, fábula ou qualquer outro representativo de uma época passada, por

exemplo, vemos a partir daquela materialidade até como aquele evento é percebido no

momento atual, pois “vai-se do cotexto ao contexto” (MARCUSCHI, 2008, p. 83).

Um evento discursivo é considerado, portanto, nessa perspectiva, um texto, um

exemplo de prática social e um exemplo de prática discursiva – cf. concepção tridimensional

do discurso (FAIRCLOUGH, 1992), segundo a qual não se pode “analisar um texto sem

considerar as práticas discursivas e sociais que envolvem tal texto” (TILIO, 2006, p. 82).

Ainda seguindo essa visão de Marcuschi, podemos perceber o texto como algo observável e

que apresenta nele e em seu entorno todos os elementos que dão acesso a diferentes aspectos

que possam ser analisados e que, numa visão interdisciplinar, possam avançar para a

articulação entre as disciplinas.

A

D

C

A

C

D

I

S

D

PolifoniaA

AAAa

Gêneros

Atividades

LDB

Política

s

Pública

s

PCN PNLD

ECA

Page 29: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

27

Sob o olhar da Linguística Aplicada pretendemos observar nos textos, nos gêneros

textuais que esses representam, nas propostas extraídas na obra didática em análise, essa

interdisciplinaridade que problematiza, investiga, promove articulações com o mundo.

Podemos visualizar, portanto, na figura 2.5a, algumas representações do que abordamos e que

apresentam esse olhar da LA em diálogo com a ACD de forma que se envolvem no estudo do

texto, sua intencionalidade (cotexto) e situacionalidade (contexto), onde suas vozes

(polifonia) negociam com as atividades elaboradas pelos autores do livro didático em estudo

nesse trabalho.

As atividades propostas, por sua vez, precisam evidenciar e responder às propostas

das políticas públicas e promover práticas cidadãs num espaço social transdisciplinar,

revelando a análise intertextual como uma forma em que se articulam as análises textuais e

socioculturais em interação. São essas práticas de grande importância dentro de uma obra

didática.

Ao propormos uma análise de elementos textuais com os elementos do contexto de

acordo com a Análise Crítica do Discurso, estabelecemos possibilidades problematizadoras,

que vão confrontar situações de práticas sociais. Um documento, no caso a obra didática, que

não considere esses aspectos, não está de acordo com propostas importantes para a formação

cidadã tão proclamada. Não queremos discursos “ocos”, simplesmente ilustrativos, feitos

apenas para causar boa impressão. Queremos observar como se apresentam essas propostas

nos textos e se atendem a essas perspectivas sociais apontadas.

Na concepção tridimensional do discurso a que nos referimos antes, o discurso é visto

como composto por três elementos básicos: textual, discursivo e social. A figura 2.5b,

apresenta-nos essa concepção tridimensional do discurso, que nos mostra que não se analisa

textos fora dos contextos sociais e discursivos onde eles ocorrem. Para se fazer análise do

discurso verifica-se um texto e as práticas discursivas e sociais que envolvem o texto. A

inscrição do discurso e da atividade das múltiplas vozes passam por temporalidades, situações de

heterogeneidades e diversidade cultural dos indivíduos.

Figura 2.5b - Fairclough (1992): concepção tridimensional de discurso

Page 30: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

28

2.1 Relevância do estudo

A realização do estudo também se justifica por dois outros motivos, mutuamente

articulados: um de ordem acadêmica e outro social. Desde que assumimos que os livros

didáticos são documentos, socialmente situados e ideologicamente negociados através do

discurso dos autores em cada obra, procuramos identificar o quanto são necessárias diversas

análises e diferentes estudos teóricos para destacarem-se elementos importantes envolvidos

nos conteúdos dos textos que são (re)apresentados numa coleção didática.

Certamente, essa pesquisa que aqui se desenvolve não dará conta de esgotar todas

essas possibilidades de análise. Há toda uma grande pesquisa bibliográfica para que sejam

implementadas as propostas que passam a servir para estudos voltados às questões sociais

importantes e que trazem no bojo, também, toda uma discussão que se pretende observar se

são pertinentes à alteridade e situacionalidade, visto que “todo ato discursivo se dirige a

alguém e toda prática discursiva é situada no mundo sócio-histórico-cultural em que ocorre,

isto é, não ocorre em um vácuo social”. (MOITA LOPES, 2003, p. 22). Os textos, as

atividades numa obra didática, não estão ali presentes de forma ilustrativa, ou seja, não estão

num vácuo social.

Quanto a ordem social, pretende-se identificar a prática discursiva que os textos

apresentam fazendo uma análise dessa prática, “focalizando a intertextualidade e a

interdiscursividade das amostras do discurso.” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 282). Os textos

Prática Social

Prática discursiva

Texto

Page 31: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

29

selecionados na coleção didática devem fornecer indicadores que demonstrem estar coesos e

coerentes com a temática proposta nas unidades em estudo.

Ainda é importante observar se esses textos elencados e os trabalhos desenvolvidos

com os mesmos, na obra em análise, persistem em certos estereótipos ou buscam revelar

vozes críticas, visto ser importante que a prática intertextual seja recorrente nos

procedimentos de análise, bem como a atenta observação dos fatores socioculturais e

históricos, para destacar a consciência da riqueza desses assuntos. Também para Bentes

(2001) “um texto sempre será constituído de uma multiplicidade de significações, tudo

dependendo de diversos fatores, entre eles, a intenção de quem produz e, da parte do leitor ou

destinatário, a disponibilidade de aceitar aquilo que é dito” (BENTES, 2001, p. 273).

Nas aulas de Língua Portuguesa, tanto quanto nas demais disciplinas da Matriz

Curricular, pois a língua portuguesa perpassa por essas, a partir dos ideais interdisciplinares,

buscam-se, entre outros objetivos referentes à disciplina, promover reflexões sobre valores de

vida em sociedade. Podem-se dinamizar inúmeras possibilidades de debates, argumentações e

reflexões sobre o papel do discurso crítico e suas acepções exercidas no meio em que

vivemos; bem como as identidades que se (re)constróem através dos discursos proclamados,

com o devido cuidado em não torná-los panfletários.

Além disso, é fundamental despertar hábitos de leitura e reconsiderar a importância

da leitura de textos que garantam a formação identitária do indivíduo como agente de

transformações sociais e de novos textos que garantam sua identidade cultural, porém essas e

outras inegáveis contribuições não se esgotam numa pesquisa e isso é bom, pois justifica a

necessidade de que tais possibilidades tenham espaço de discussões posteriores.

2.2 Delimitação do estudo

Arriscamos alguns pequenos passos na perspectiva da Linguística Sistêmico-Funcional

porque é uma teoria de base sociossemiótica que, segundo Tílio (2006) “considera a

linguagem em contextos situacionais (imediatos) e culturais (abrangentes)”. É, portanto,

importante para esta pesquisa, que tem entre seus objetivos estudar os contextos construídos

nos textos e atividades interpretativas de uma obra didática, tanto esses contextos mais

imediatos, com observação de presença ou não de polifonia, os gêneros discursivos

trabalhados em situações sociais, ou não; quanto aos contextos culturais mais abrangentes que

possam inserir o aluno no mundo, em seu contexto cultural e identitário (cf. CANDEAU

2008, TRINDADE & SANTOS 2002, MOITA LOPES 2002, HALL 2006, SILVA 2009 e

outros).

Page 32: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

30

Elaboramos uma ilustração (cf. p. 26) que esperamos que possa contribuir para o

entendimento do que se traz à discussão e que pretende destacar o que propomos nesta

dissertação. E, considerando o nosso foco ser o discurso, especialmente em sua abordagem

crítica, o trabalho começa discutindo no capítulo 2 , que é a nossa fundamentação teórica, o

discurso e o socioconstrucionismo (cf. BRONCKART, 2003), com as passagens pelo texto e

por questões de poder (cf. FOUCAULT [1979] 2008) que possam estar veiculadas neles; as

questões inquietantes acerca da contemporaneidade e educação regida pelos documentos

oficiais (LDB/96, PCN, PNLD) que também representam poderes, uma vez que trazem

determinações a serem seguidas e de que modo o livro didático nos fala sobre isso. O capítulo

é encerrado com uma mostragem sobre o PNLD 2011.

Page 33: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

31

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Tropeçavas nos astros desastrada

Quase não tínhamos livros em casa

E a cidade não tinha livraria

Mas os livros que em nossa vida entraram

São como a radiação de um corpo negro

Apontando pra a expansão do Universo

Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso

(E, sem dúvida, sobretudo o verso)

É o que pode lançar mundos no mundo.

(Caetano Veloso)

Há aqui um compromisso com a investigação quanto a aspectos que possam ser

visualizados num LD. Nosso recorte se insere onde, numa seleção de textos e tópicos de

atividades interpretativas, embasados nesses textos, se pretende verificar a polifonia que

dialogue com temas relevantes e, efetivamente, pautados em assuntos significativos à

formação de valores essenciais para a vida em sociedade.

Aqui, ainda que se trate de uma análise do LD enquanto documento, cabe tecermos

considerações sobre o que podemos esperar de uma sociedade com uma formação cidadã

responsável, com valores identitários bem pontuados, com perspectivas de interação crítica

entre os indivíduos. Nesse sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, os Parâmetros

Curriculares Nacionais e o Programa Nacional do Livro Didático vêm sendo uma preciosa

contribuição e, pautado por estes instrumentos institucionais, o presente trabalho pretende

levar adiante o debate encontrado nos textos e atividades propostos numa obra didática. Para

respaldar o exposto, é importante analisarmos sobre o quanto se torna importante um texto e

os trabalhos que são desenvolvidos com ele, aqui no caso os trabalhos propostos na obra

didática em análise, a partir do momento em que cada um desses textos vai ser utilizado e

exposto à compreensão de outras pessoas que os leem, de acordo com o que nos informa o

fragmento:

Todo enunciado – da réplica sucinta (monovocal) do diálogo cotidiano ao

grande romance ou tratado científico – tem, por assim dizer, um princípio

absoluto e um fim absoluto: antes do seu início, os enunciados de outros;

depois do seu término, os enunciados responsivos de outros (ou ao menos

uma compreensão ativamente responsiva silenciosa do outro ou, por último,

uma ação responsiva baseada nessa compreensão). (BAKHTIN, [1979]

2003, p.275)

É claro que uma obra didática supõe critérios para sua organização que remetem à

cautela, a respaldos e estratégias cognitivas que levem a pressuposições adequadas a fim de

que possa ser legitimada. Podemos, assim, evocar o pensamento de Kock para enfatizar a

importância de uma análise fundamentada, a partir da necessidade de estudos para uma

Page 34: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

32

organização responsável e órgãos que analisem uma obra didática: “para que duas ou mais

pessoas possam compreender-se mutuamente, faz-se preciso que seus contextos

sociocognitivos sejam, pelo menos, parcialmente semelhantes” (KOCK, 2008, p. 06). Ainda,

para destacar a necessidade de uma compreensão de interação social, podemos ler em

Bronckart:

É, portanto, a adesão a uma psicologia interacionista-social que nos leva a

abordar o estudo da linguagem em suas dimensões discursivas e/ou textuais.

De um lado, os textos e/ou discursos são as únicas manifestações

empiricamente observáveis das ações de linguagem humanas (a língua é

apenas um construto; as frases e os morfemas são apenas “recortes

abstratos”) e, de outro lado, é no nível dessas unidades globais que se

manifestam, de forma mais nítida, as relações de interdependência entre as

produções de linguagem e seu contexto acional e social (BRONCKART,

[1997], 2003, p.14)

Segundo Jouve (2002, p. 23) “autor e leitor não têm espaço comum de referência.

Portanto, é fundamentando-se na estrutura do texto, isto é, no jogo de suas relações internas,

que o leitor vai reconstruir o contexto necessário à compreensão da obra”. Essa importância é

significativa, pois, a cada novo leitor, vão sendo incorporados novos conceitos, de acordo com

as experiências de um novo momento histórico e de diferentes processos de interação. De

acordo com Jouve, “enquanto no discurso oral a palavra morre logo após ser pronunciada, o

texto, ao contrário, resiste ao tempo e faz que, ainda hoje, se possa escutar Homero ou

Platão”. Por isso, o estudo de textos selecionados numa obra didática trazem essa polifonia

que pode permitir aos leitores verem além do projeto inicial de cada autor, especialmente se o

texto integra uma unidade que promova essa reflexão. Jouve também afirma que “o texto

alarga o horizonte do leitor abrindo-lhe um universo novo”.

Segundo Kleiman (2008, p. 65), “mediante a leitura, estabelece-se uma relação entre

leitor e autor que tem sido definida como de responsabilidade mútua, pois ambos têm a zelar

para que os pontos de contato sejam mantidos, apesar das divergências possíveis em opiniões

e objetivos”. Se consideramos a urgência da formação de cidadania responsável, de formação

identitária do indivíduo, se desejamos colocar em pauta questões e expectativas da

contemporaneidade e se pretendemos leitores críticos em nossa sociedade o nosso discurso

não pode cair no vácuo. É através de algum material didático que poderemos promover essas

construções cidadãs, identitárias, contemporâneas e de criticidade.

Assim, desejamos destacar que a leitura precisa ocupar um espaço privilegiado no

ensino de língua materna, estrangeira, nas ciências, na arte, na história, enfim, na

interdisciplinaridade. Numa abordagem de Orlandi (2008, p. 62), “estamos propondo nessa

reflexão pensar a produção do efeito-leitor a partir da materialidade mesma do texto em sua

Page 35: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

33

relação com a discursividade e os diferentes gestos de interpretação que aí se dão”. Ao que

Marcuschi (2008, p. 51) complementa “que o ensino de língua deva dar-se através de textos é

hoje um consenso tanto entre linguistas teóricos como aplicados”. Com a publicação dos

PCN, no final da década de 90, a discussão dessas questões sobre a importância de textos e

gêneros textuais tornou-se fundamental, especialmente tendo por base o contexto político,

cultural, social, étnico, ético, crítico, interativo.

Não podemos desconsiderar as orientações em Freitag (1989) que afirma que

a vertente populista do livro didático, defendendo um livro para as classes

oprimidas, que considere suas condições materiais de vida, sua linguagem e

sua “cultura de pobreza”(Lewis), não está prestando nenhum serviço à

criança carente. Sua marginalização e condição de classe não serão

superadas com esse procedimento, mas sim consolidadas.

Portanto, quando aqui dissemos sobre o conhecimento de mundo do aluno para o qual

reclamamos que as propostas do LD estejam voltadas não significa engessá-lo em condições

de subestima, muito pelo contrário. As oportunidades de conhecimento, de acesso aos livros,

à cultura, à formação crítica e identitária devem ser iguais para todos.

Nos aportes de Foucault (1969) sobre as formações discursivas, na contribuição de

Wittgenstein (1961) sobre linguagem como um produto de interação social e do uso, no jogo

das relações entre os usuários de uma língua natural, seguimos aqui em busca de

fundamentações teóricas que possam permitir o diálogo para enfrentar as lacunas que separam

textos de contextos e atividades que contribuam para que o texto possa ser lido,

compreendido, interpretado, analisado e que possa propor efetivamente o que os teóricos

chamam de interacionismo-sociodiscursivo, doravante ISD.

O ISD, em linhas gerais, postula que haja interação no intuito de se comunicar, por

meio de atividades que são desenvolvidas com base em textos e que, através desses textos e

atividades possam ser concretizadas as implicações sociais de diferentes gêneros, formadoras

de atitudes cidadãs. Para o trabalho proposto, foram escolhidos os textos que iniciam cada

capítulo, em cada unidade temática e, a partir deles, o confronto com os PCN, do Ministério

da Educação e Cultura, doravante MEC, e o Programa Nacional do Livro Didático, PNLD.

Os contextos socioculturais foram investigados para “identificar a visão de mundo

representada em cada livro (metafunção ideacional)” (TILIO, 2006, p.67), como uma forma

de orientações para o convívio social, cidadão, crítico e, portanto, questionador das formas de

poder e opressão. Lembramos a valiosa contribuição de Silva (2009) que nos diz que é

Preciso reconhecer que a chamada “virada linguística”pode nos ter levado a

negligenciar certos mecanismos de dominação e poder que tinham sido

detalhadamente analisados pela teoria crítica. Embora seja evidente que

somos cada vez mais governados por mecanismos sutis de poder tais como

os analisados por Foucault, é também evidente que continuamos sendo

Page 36: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

34

sempre governados, de forma talvez menos sutil, por relações e estruturas de

poder baseadas na propriedade de recursos econômicos e culturais. (SILVA,

2009, p.145).

É importante observar que tais sutilezas não dominem a educação com a imposição

dessas “estruturas de poder baseadas na propriedade de recursos econômicos e culturais”, pois

é mister que haja transparência, especialmente quando existem propostas sérias de levar às

classes menos favorecidas o LD que, muitas vezes, é o único livro que lhes chega às mãos.

Com base em pesquisas que têm sido feitas e nos estudos de grupos que se reúnem para as

avaliações das obras didáticas, os livros didáticos são submetidos por profissionais que atuam

nessas avaliações do MEC, a partir de critérios muito bem estruturados por esses grupos de

pesquisadores. Sendo assim, que os resultados daqui por diante, se não forem pelo LD ideal,

que seja ao menos pelo mais próximo do que se espera desse recurso pedagógico.

Numa obra didática de LP, que é o nosso enfoque, há uma coleção de textos que

apresenta-nos a importância de serem trabalhados com critérios definidos quanto às propostas

dos documentos oficiais. Para isso, que as vozes dos textos precisam ser ouvidas. A partir do

imaginário, da leitura atenta, o texto deve oferecer ao leitor o direito de voz. E, através desse

diálogo se dá o (re) conhecimento, o ensino e aprendizagem, a (in)formação cidadã. Podemos

ler no texto de Bakhtin essa polifonia, quando ele nos fala que

é também unicamente à imaginação do leitor que o escritor se dirige, quando

usa essas formas. O que ele procura, não é relatar um fato qualquer ou um

produto do seu pensamento, mas comunicar suas impressões, despertar na

alma do leitor imagens e representações vívidas. Ele não se dirige à razão,

mas à imaginação. (BAKHTIN, 2006, p.187)

Podemos perceber que em cada texto podem existir muitas vozes e diferentes

discursos. Um livro didático, aqui em pauta o livro de Língua Portuguesa, Português:

Linguagens, apresenta-nos os textos em unidades temáticas e trabalha o sentido da leitura nas

atidades interpretativas. É importante verificar até que ponto, através de cada texto, se

possibilita uma troca entre o que o leitor contempla na obra e o que experimenta em sua vida,

permitindo-lhe participar do diálogo com o material escrito e estabelecer uma relação de

interação entre esse e o que existe no contexto da realidade.

Para muitas famílias o livro didático é a única fonte de leitura a que elas têm acesso e,

a partir daí, se a obra oferece textos instigantes, essa é uma oportunidade de proporcionar-se

uma “experiência única com o texto literário” (ZILBERMAN, 1990, p. 18), que pode levar o

leitor a buscar outras fontes de leitura, adquirir novas vivências e a refletir sobre o seu

cotidiano. É importante verificar se existe uma coerência entre os interesses de uma sociedade

que se “reconfigura”, os assuntos motivadores típicos da identidade dos usuários, expectativas

criadas para os leitores alvo, os PCN, o PNLD e o que os textos da obra didática se propõem

Page 37: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

35

nesse diálogo. Ler textos é também uma relação de alteridade, de negociação de significados,

de sentidos entre o que se encontra na obra, o que o leitor pode apreender, os autores (re)

organizam e a sociedade transforma ou é transformada. Essa concepção é destacada

principalmente nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997, p.53)

“A leitura é um processo pelo qual o leitor realiza um trabalho ativo de

construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do seu

conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a

língua”.

Freitag (1993) ressalva que professores e alunos acabam tornando-se escravos do livro

didático ao invés de o utilizarem para o desenvolvimento da autonomia, do senso crítico e de

contraideologia tornando-o principal roteiro, ou exclusivo, do processo de ensino e

aprendizagem. Faz-se necessário dizer que um texto é “toda unidade de produção de

linguagem situada, acabada e auto-suficiente do ponto de vista da ação ou da comunicação”

(BRONCKART, 1999, p.75).

De acordo com a análise Crítica do Discurso, segundo Fairclough (2001) verifica-se

que esse enfoque tem muito a contribuir para a investigação sobre o cunho social de uma obra

didática, sobretudo quando se faz a investigação integrada em projetos interdisciplinares. Os

autores de cada texto, inserido numa coleção didática, – e, nesse caso, destacam-se os

selecionados para compor uma obra, de acordo com os critérios dos autores da mesma - não

podem prever o indivíduo que terá o produto em suas mãos. Há um leitor projetado na história

e um efetivamente real que o receberá e terá em relação a ele uma interpretação. Nesse

momento, a interdisciplinaridade torna-se elemento indispensável para a percepção e

entendimento de um texto, pois o leitor poderá escolher e organizar as informações contidas e

com elas representar novas propostas para o conteúdo apresentado.

Ainda ao darmos ênfase a este contexto, podemos observar a pertinência desses

estudos sobre o LD porque o que mais importa para a bagagem cultural do aluno é o que

poderá vir a ser promovido, com as leituras de textos e propostas de trabalho, para a formação

de valores de vida e não apenas ler textos e fazer exercícios de interpretação, mecanicamente,

e que “não tratam a cultura seriamente, ou seja, de forma a levar os alunos a pensar

criticamente” (TÍLIO, 2006, p.125). E, ao buscarmos eco a essas palavras, a fim de enfatizar o

que abordamos, ainda podemos observar que essa linha de raciocínio nos levaria a entender

que, parafraseando Coracini, se daria, então, na escola, instituição a quem é atribuída a

função de preparar o cidadão para a vida, a função de legitimar o livro didático, mas, ainda

seguindo a linha de pensamento da autora, “a escola não o faz sozinha: ao mesmo tempo que

constrói o imaginário discursivo da sociedade a seu respeito, vê também seus valores,

Page 38: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

36

interesses e necessidades de toda ordem sendo construídos e modificados por essa mesma

sociedade”. (CORACINI, 1999, p. 33).

Promover esse diálogo com os autores, com os textos, com as atividades previstas nos

ajuda no desenho que pretendemos esboçar em nossa análise. Temos o LD, os textos

selecionados, as atividades sobre esses textos, trabalhamos com a perspectiva desse objeto ser

um documento, mas não descartamos que esse documento possui significados que podem ser

negociados de acordo com as diferentes propostas elaboradas com ele. E, ainda, ele será

utilizado por alguém, para alguém, com propósitos, com propostas, com interesses

institucionais, com variados motivos para ser usado.

O LD não existe no vácuo; um documento não existe pelo simples fato de existir, há,

portanto, significados para que ele exista. De acordo com o que nos diz Bronckart (2003)

vemos a ratificação das considerações anteriores e podemos articular nosso pensamento no

sentido de que

convém sublinhar aqui que, sendo produtos da interação social (do uso),

assim como os textos nos quais se organizam, os signos continuam

perpetuamente sob a dependência desse uso e, portanto, os significados que

veiculam não podem ser considerados estáveis senão momentaneamente, em

um determinado estado sincrônico (artificialmente). Convém assinalar ainda

que, desde que é através desses textos e desses signos com significações

sempre moventes que se constroem os mundos representados definidores do

contexto das atividades humanas, esses mundos, por sua vez, também se

transformam permanentemente. (BRONCKART, 2003, p.35).

Nesse ponto parece-nos verificar uma consonância nos pontos de vista entre as

colocações de Bronckart e Bakhtin, pois este tem a nos orientar no sentido de que

O valor novo do signo, relativamente a um “tema” sempre novo, é a única

realidade para o locutor-ouvinte. Só a dialética pode resolver a contradição

aparente entre a unicidade e a pluralidade da significação. O objetivismo

abstrato favorece arbitrariamente a unicidade, a fim de poder “prender a

palavra em um dicionário”. O signo é, por natureza, vivo e móvel,

plurivalente; a classe dominante tem interesse em torná-lo monovalente.

(BAKHTIN, 2006, p.8).

Nosso trabalho não pretende esse alcance de análise que prevê escolhas ou o uso. Já

existem órgãos e profissionais competentes para essas abordagens, tal qual vemos em Rojo &

Batista (2003), que enumeram, percentuais de livros didáticos de língua portuguesa, que são

analisados sob os critérios de avaliação do PNLD quanto a capacidade de leitura, como

tratamento de gênero, propriedades estilísticas, e uma série de outros critérios e itens

avaliativos, apresentando que muitos desses textos não são trabalhados efetivamente nos

tópicos propostos nas diversas obras, que não veem a questão das variedades linguísticas e

estudo de textos de gêneros orais, entre outros. A abordagem de estrutura da maioria dos

Page 39: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

37

livros didáticos, especialmente de língua portuguesa, também é fortemente criticada pela

autora, assim como o descaso com a reflexão linguística nas diversas atividades propostas

desde a interpretação e compreensão, que interessa-nos particularmente também neste

trabalho, até a produção textual, segundo a autora destaca.

Podemos observar, portanto, nos textos selecionados, uma grande

diversidade temática (100%), que, no entanto, fica empobrecida por uma

menor diversidade na abordagem das atividades de leitura dos textos (69%),

que, muitas vezes, reduz ao enfoque ao que julga que pode ser compreendido

pelo leitor representado – criança ou pré-adolescente -, gerando uma leitura

plana das temáticas abordadas. Os textos apresentam-se também em gêneros

bastante diversificados (97%), embora nem sempre as características desses

gêneros sejam exploradas nas atividades de leitura e produção de textos.

(ROJO & BATISTA, 2003, p. 84).

As considerações elaboradas por esses autores confirmam o que vem sendo observado

nas atividades propostas com os textos no LD, embora já haja iniciativas mais dinâmicas

quanto aos trabalhos com textos, especialmente nos volumes de 8º e 9º ano que apresentam

temáticas que enfocam melhor as perspectivas das práticas discursivas sociais.

3.1 Discurso e socioconstrucionismo

O discurso inscrito através dos textos de uma obra didática é de certa maneira parte

integrante de uma discussão ideológica em grande escala: ele responde a alguma coisa, refuta,

confirma, antecipa as respostas e objeções potenciais, procura apoio, ouve as diferentes vozes

que podem ser percebidas nas leituras dos textos, forma imagens, etc. Estes pressupostos nos

fazem entender o estudo do texto na amplitude da análise do discurso, onde as formações

ideológicas são determinantes para o entendimento das práticas discursivas.

A leitura centrada em textos que permitem um diálogo com os mesmos encontra no

discurso do livro didático um elenco de possibilidades que podem promover respostas ativas

dos alunos e uma possível interpretação aplicável à vida. Hall (2006) vai dizer que as

sociedades modernas não têm um centro regulador que reja os sujeitos de forma unificada; o

que há é um conjunto disperso de referentes que transpassando os sujeitos torna-os usuários

de várias identidades. O autor ainda nos traz a pertinente reflexão sobre as palavras, os

significados e a identidade:

As palavras são multimoduladas. Elas sempre carregam ecos de outros

significados que elas colocam em movimento, apesar de nossos

melhores esforços para cerrar o significado (...). O significado é

inerentemente instável: ele procura o fechamento (a identidade), mas

ele é constantemente perturbado (pela diferença). Ele está

constantemente escapulindo de nós. Existem sempre significados

Page 40: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

38

suplementares sobre os quais não temos qualquer controle. (HALL,

2006, p.41)

Considerando, também, a flexibilidade das identidades, Santos (2000, p.135) apresenta

que “as identidades culturais não são regidas nem, muito menos, imutáveis. São resultados

sempre transitórios e fugazes de processos de identificação”. É importante que a reflexão

sobre a importância dos textos numa obra didática leve em conta o sujeito aluno, que de mero

objeto passivo, vai passar a agente autônomo de seu aprender.

Para Bakhtin ([1929]2006, p.126) tudo que envolve a língua está diretamente

relacionado ao social, ou seja, a língua é por natureza um fato social, e isso envolve tanto o

pensar lingüístico como a materialização do pensar por meio da enunciação e da criticidade

que a partir desta possa existir. Embora Bronckart apresente fundamentações em Volshinov,

não descartamos que as ideias atribuídas ao Círculo Bakhtiniano, com base no princípio da

dialogicidade de que geram-se inúmeros gêneros nas ações sociais e, se os textos são

pertencentes a determinados gêneros, é possível dizer que através das atividades promovidas

com eles podem ser observadas formas discursivas cada vez mais complexas capazes de

verbalizarem as vozes que existem nesses mesmos textos, apresentando-nos que as práticas

sociais podem ser repensadas através de discursos de textos pelo que conservam e acumulam,

ou não, de herança cultural e pela reelaboração de valores sociais que transmitem.

Pressupomos que no desenvolvimento deste estudo, a compreensão de que os textos se

apresentam no que é formulado e historicizado em sua essência, mas que também funcionam,

ao mesmo tempo, como possibilidades de transformação, de mudança. Dessa forma, nossa

pesquisa se circunscreve na perspectiva teórica do Círculo de estudos Bakhtinianos,

considerando-se também o conceito de gênero e princípios dialógicos dos discursos da

alteridade. Ao compararmos teorias e nas perspectivas que apontam podem vislumbrar-se o

diálogo com outros aportes teóricos que serão observados na medida em que se fizerem

necessários, especialmente no interior das análises.

Um documento não reclama para si a polifonia. Esta precisa ser oportunizada através

das propostas que permitam a observação dessas vozes. De conteúdo produzido pelos autores

dos textos às abordagens apresentadas pelos autores da obra didática e pautados na

conceituação bakhtiniana de que cada gênero se caracteriza pelo objeto do discurso, pelo

querer-dizer do locutor e pelas suas formas de interpretação nossa análise pretende identificar

as possíveis marcas dessa polifonia e os prováveis sentidos produzidos nas atividades de

interpretação recortadas para a análise.

Page 41: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

39

Considerando-se que o ISD defende que as interações assinalam um papel

preponderante para a aquisição da linguagem, queremos observar até que ponto ocorre essa

abordagem interativa que traduz as vozes que se encontram nas entrelinhas dos textos e que

contemplam as ideias dos autores daquilo que se pretende fazer ouvir. De acordo com

Bronckart (2006, p. 55), “é na própria construção do social que se situam as organizações

sociais”.

De acordo com Bakhtin (1997, p.123) “a verdadeira substância da língua é constituída

pelo fenômeno da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A

interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua”. Nesse aspecto, Foucault

([1969]2007, p. 123) diz que a análise do discurso “não toma o lugar de uma análise lógica

das proposições, de uma análise gramatical das frases, de uma análise psicológica ou

contextual das formulações.” O que podemos perceber, ao destacarmos essa perspectiva

foucaultiana de discurso é que os textos podem constituir sujeitos nas relações de poder, ou

seja, esses sujeitos não seriam exatamente pessoas, mas situações de interações que possam

ser promovidas através das vozes desses textos e que são apontadas nas perspectivas de que

podem articular-se e se unirem ou podem manter suas especificidades.

Os novos parâmetros que têm regido o ensino-aprendizagem de língua portuguesa

podem ser comparados ao que Foucault ([1969]2007, p. 133) chama de “Práticas

discursivas”[grifo nosso] que, parafraseando o que ele informa, focalizam um conjunto de

regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que podem definir,

em uma dada época e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou linguística,

as condições de exercício da função enunciativa, para qual cada texto, em seu contexto, pode

contribuir de maneira significativa. Que discurso se apresenta nas práticas discursivas dos

livros didáticos e do repertório da educação para a questão da heterogeneidade, da

diversidade, das diferenças étnicas, estéticas, dialéticas, culturais, políticas, de gênero,

gêneros do discurso entre tantas outras questões? Destacamos, então, para esses

questionamentos, o que Marcuschi nos apresenta quando afirma que

sem situacionalidade e inserção cultural, não há como interpretar o texto.

Parafraseando Kant, diria, numa expressão um tanto desajeitada, que a

língua sem contexto é vazia e o contexto sem a língua é cego. Mas isso nos

coloca diante de uma situação curiosa, pois em certo sentido todos os textos

são virtuais enquanto não se inserirem em algum contexto interpretativo. Só

que essa virtualidade diz respeito a um de seus aspectos, ou seja, sua

compreensão efetiva. Esta só se dá numa determinada situação, já que todo

sentido é sentido situado. (MARCUSCHI, 2008, p. 87)

Abordar sobre livros didáticos torna-se relevante, com base nesse estudo, pois na

prática não se leva em consideração toda a complexidade desse objeto cultural. Portanto, uma

Page 42: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

40

das considerações iniciais em destaque é a própria definição de Cultura e culturas e a

importância da obra didática nesse contexto. Pode-se observar na afirmação de Cuche:

O encontro das culturas não se produz somente entre sociedades globais,

mas também entre grupos sociais pertencentes a uma mesma sociedade

complexa. Como estes grupos são hierarquizados entre si, percebe-se que as

hierarquias sociais determinam as hierarquias culturais, o que não significa

que a cultura do grupo dominante determine o caráter das culturas dos

grupos socialmente dominados. As culturas das classes populares não são

desprovidas de autonomia nem de capacidade de resistência. (CUCHE,

2002, p. 14).

O que mais se discute, entre inúmeros teóricos que apresentam obras sobre livros

didáticos, se escuta, se lê e se repete é: cada aluno é um sujeito com suas particularidades de

aprendizagem; deve-se colocar o aluno em situações de aprendizagem onde ele possa ser

agente de transformação do seu aprendizado; a língua é um fato social que se manifesta

diferentemente em cada contexto, seja ele social, regional, político, econômico, de um grupo

para outro grupo, etc. Como se pode ler em Orlandi:

Uma das tarefas da Análise do Discurso é trabalhar a política da língua

(sujeita a equívoco) na textualidade ou, em outra perspectiva, aprender a

textualização do político, das políticas da língua que aí se constituem. E esse

jogo nos / sobre os (e não dos) sentidos é a marca dessa textualização. Logo,

é a materialização do político no dizer (e, por ele, temos a materialização da

ideologia, presença do equívoco na relação da língua com a história). É

dessa forma que podemos concluir que a leitura atesta os modos da

materialização do político. Ler é fazer um gesto de interpretação

configurando esse gesto na política da significação. Leituras diferentes não

são gratuitas nem brotam naturalmente. Elas atestam modos de subjetivação

distintos dos sujeitos pela sua relação com a materialidade da linguagem, ou

melhor, com o corpo do texto, que guarda em si os vestígios da simbolização

de relações de poder, na passagem do discurso a texto, em seus espaços

abertos de significação. (ORLANDI, 2008, p.66):

Todas essas práticas discursivas têm contribuído para reflexões importantes, e

felizmente, para práticas linguístico-crítico-discursivas no ensino da língua. Um exemplo

dessas práticas é o uso do texto como suporte fundamental para o ensino da leitura e da

escrita. A partir do exposto cabe-nos uma indagação sobre como se pode alicerçar uma prática

pedagógica multicultural em que não sejam reproduzidos padrões, estereótipos e nem as

situações de exclusão. Nesse caso, cabe-nos um olhar para os PCNs sobre Pluralidade

Cultural, p.121:

A temática da Pluralidade Cultural diz respeito ao conhecimento e à

valorização de características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais

que convivem no território nacional, às desigualdades socioeconômicas e à

crítica às relações sociais discriminatórias e excludentes que permeiam a

Page 43: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

41

sociedade brasileira, oferecendo ao aluno a possibilidade de conhecer o

Brasil como um país complexo, multifacetado e algumas vezes paradoxal.

Se iniciamos este capítulo sugerindo que o discurso inscrito através dos textos de uma

obra didática é de certa maneira parte integrante de uma discussão ideológica consideramos

importante visualizarmos de onde parte a nossa análise. Para isso, é necessário que façamos

inicialmente esse levantamento dos textos que foram selecionados para essa análise e

pensemos sobre o que encontraremos adiante, mais precisamente no capítulo 4 dessa

dissertação. Temos para a análise, portanto, nos volumes destinados do sexto ano ao nono

ano, a proposta que pode ser visualizada nos quadros a seguir:

Quadro 3.1 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 6º ano:

No volume destinado aos sétimos anos, pode-se verificar o seguinte quadro, onde

identificamos as unidades, títulos das unidades, a temática do capítulo e os textos:

Quadro 3.2 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 7º ano:

Page 44: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

42

Quadro 3.3 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 8º ano:

E, ainda quanto ao que foi examinado no livro destinado aos estudos do 9º ano:

Page 45: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

43

Quadro 3.4 representa o que se analisou no volume do PL destinado ao 9º ano

Com essa mostragem de nosso recorte para o trabalho que apresentamos, reafirmam

Na análise colocamos em evidência o LD avaliado em suas propostas nas questões de

interpretação, pois se trata de um documento utilizado em diferentes contextos institucionais,

educacionais, espaços de construções de cidadania, convívio, interações sociais, porque

interessa, especialmente com as leituras apresentadas, que o aluno possa tornar-se autor de sua

discursividade.

Ainda segundo o que nos apresenta Marcuschi quanto a leitura e compreensão de

textos como trabalho social e não atividade individual, podemos refletir sobre a seguinte

consideração:

Compreender bem um texto não é uma atividade natural nem uma herança

genética; nem uma ação individual isolada do meio e da sociedade em que se

vive. Compreender exige habilidade, interação e trabalho. Na realidade,

sempre que ouvimos alguém ou lemos um texto, entendemos algo, mas nem

sempre essa compreensão é bem sucedida. Compreender não é uma ação

apenas linguística ou cognitiva. É muito mais uma forma de inserção no

mundo e um modo de agir sobre o mundo na relação com o outro dentro de

uma cultura e uma sociedade. (MARCUSCHI, 2008, p.291)

Se tivermos uma obra didática que seleciona textos que oportunizam essas reflexões,

ou seja, que apresentam textos que revelam uma preocupação com o social, com as

diferenças, com os anseios e expectativas de uma sociedade plural, podemos constatar, com

base nas análises, que a compreensão poderá ser bem sucedida para a atuação desse leitor no

Page 46: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

44

mundo e as suas relações com o outro. Em função disso, concordamos cam Coracini quanto

ao fato de a obra didática possui um leitor projetado no contexto escolar.

É nesse contexto que se insere o uso do livro didático pelo professor que,

autorizado pela instituição escolar (já que é portador de um diploma

legalmente reconhecido), legitima o material comercializado, considerando-

o a base para seu trabalho em sala de aula. Assim, o livro didático funciona

como portador de verdades que devem ser assimiladas tanto por professores

quanto por alunos. (CORACINI, 1999, PP. 33 e 34).

3.1.1 Texto

“O texto é uma máquina preguiçosa, esperando que o leitor faça a sua parte”

(Eco, U, 1999, p.55).

Com esse estudo sobre textos de uma obra didática e atividades relacionadas a eles

propusemo-nos à identificação da polifonia, onde esse discurso oculto, pode revelar-nos

valores culturais, questões identitárias, características do socioconstrucionismo, marcas de

gêneros discursivos... Ou seja, o que desejamos dizer é que os autores constróem essa

máquina para que, segundo Eco, o leitor faça a sua parte, ou seja, faz essa máquina funcionar.

Com os discursos encontrados nos textos da obra os autores fizeram-na funcionar de acordo

com a perspectiva deles. Mas, nada impede que as atividades possam ser discutidas e se

possam chegar a respostas diferentes das oferecidas pelos autores no livro do professor. Eis o

que analisamos e o que pretendemos identificar na obra selecionada: possiilidades de dar

visibilidade á voz dos professorese alunos. De acordo com a análise crítica do discurso,

também devemos (re)considerar o texto em seu contexto e na questão de que ele é dirigido a

alguém, ou seja, supõe a existência de um interlocutor para quem esse texto se destina.

De acordo com estudos do Círculo bakhtiniano, a língua tem a propriedade de ser

dialógica, mesmo que essas relações dialógicas não se circunscrevam ao diálogo face a face.

Pode ser dar exatamente ao contrário, pois existe uma informação interna da palavra, que é

perpassada sempre pela palavra do outro. Isso significa dizer que qualquer pessoa, ao falar,

leva em conta a fala de outra pessoa, que está presente na sua. Ou seja, nossas posições de

sujeitos sociais, são pontos de vista acerca da realidade, são centros de valor de informações

de mundo que nós temos.

Segundo a teoria bakhtiniana o dialogismo revela-se na bivocalidade, na polifonia do

discurso. O contexto sociocultural em que esse discurso se constitui pode permitir que esse

texto dialogue com a realidade social, onde pretendemos visualizar através de que meios isso

Page 47: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

45

ocorre, ou seja, até que ponto o texto, trabalhado pelos autores, oportuniza a criticidade, a

visão de mundo e contribuições sociais. Segundo indagações de Soares, “será a leitura um ato

solitário, que afasta o mundo e do mundo? Só o leitor e o texto?” ela própria responde que não , mas

afirma que

“a leitura é vista com desconfiança, em certas culturas, às vezes utilizadas

como instrumento de opressão; perspectiva unilateral, porque os valores

atribuídos à leitura expressam a visão, numa sociedade de classes, dos

grupos que mantêm a posse e o controle dos modos de produção” (SOARES,

1995, p. 20).

O trabalho aqui apresentado não esgota as inúmeras possibilidades que estudos sobre

os textos e atividades interpretativas possam dinamizar. Há muito ainda para ser discutido,

especialmente quanto às contribuições desses estudos, com base em textos, que possam

contribuir para os estudos das ciências humanas, visto que aqui há diversos viéses

imbricados. E que ainda Soares prossegue afirmando que “o texto não preexiste à sua leitura, e

leitura não é aceitação passiva, mas é construção ativa; é no processo de interação desencadeado pela

leitura que o texto se constitui” (SOARES, 1995, p.26). Se aqui colocamos a importância do texto,

onde poderemos encontrar um acervo que nos apresente esse conteúdo social tão rico e pronto para

ser explorado? Como um importante recurso que auxilia o trabalho do educador, o livro didático

mostra-se, portanto, um material de utilidade inegável, “mas o desaparecimento do papel do livro

didático como fonte de informação tem efeitos mais profundos do que se pode imaginar à primeira

vista”. (PERINI, 1995, p.82).

Não basta o acesso ao documento em si, mas o que o documento permite realizar

através dele. Portanto, não nos basta munir educadores desses instrumentos didáticos e

pressupor-se que o trabalho esteja parcialmente pronto. O LD enquanto documento precisa

dar condições de acesso a saberes que permitam, a quem dele se aproprie, o desenvolvimento

da criticidade, das perspectivas cidadãs. Como afirma Orlandi “não se petrifiquem essas

leituras previstas, a fim de que possa acontecer a descoberta, a leitura nova, tanto quanto

possível” (ORLANDI, 2006, p. 45)

Ao pretendermos analisar o discurso encontrado nos textos e atividades de uma obra

didática, precisamos definir o que se entende por esse discurso nesse contexto social amplo

no qual nos inserimos e no qual os textos circulam . Nossa utilização para a análise de

discurso neste trabalho baseia-se Fairclough (1992), onde podemos ler que “O discurso é um

modo de agir, uma forma pela qual as pessoas agem em relação ao mundo e principalmente

em relação às outras pessoas” (FAIRCLOUGH, 1992, p. 63, apud TÍLIO, 2006, p.56). Ainda

segundo Fairclough (1992, p. 64), “existe uma relação dialética entre o discurso e a estrutura

Page 48: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

46

social, havendo portanto uma relação entre prática social e estrutura social, em que a segunda

é tanto uma condição para a primeira quanto um efeito dela”.

Vimos que para Fairclough há uma preocupação em verificar a forma como esse

discurso alcança a sociedade em geral, as práticas e eventos sociais em que nos inserimos.

Para nossa análise interessa, então, observar em que pontos os textos e as atividades

selecionadas articulam-se nas práticas sociais, “negociando significados e construindo o

mundo, ao mesmo tempo em que também são construídos por eles”.(TÍLIO, 2006, p.58).

Vemos aqui também a importância da linguagem desses textos, e embora não

venhamos a nos aprofundar, neste trabalho, num estudo mais detalhado sobre essa questão,

gostaríamos de registrar importância da Linguística Sistêmico-Funcional (LSF) de Michael

Halliday, como um enquadre teórico muito eficaz para o prosseguimento desses estudos

tendo em vista que a LSF preocupa-se com a explicação e interpretação dos usos concretos

que se faz da linguagem dentro dos contextos de situação e de cultura, até porque pontua suas

propostas nos alicerces de uma visão do mundo social como um mundo complexo e por isso

explora a relação dinâmica entre os significados e as formas pelas quais esses significados

são realizados e nos contextos que os ativam.

A dinâmica que os textos podem nos oferecer, junto com os tópicos previstos nas

atividades com esses textos, pode ativar “um recurso para que se possa engajar, com a

linguagem, na ação – para se intervir nos processos sociais e semióticos” (MATTHIESSEN,

2009, p. 12) e, ao mesmo tempo, “a construção de sentido nas interações sociais.”. (Bakhtin,

1929 [2002]). Portanto, o que sepretende é que nas discussões em torno dos textos, seja na

leitura com base no que o LD apresenta, nas atividades interpretativas previstas com base

nesses textos, discussão de obras extraclasse, seja na realização de pesquisas e seminários,

seja nas interações sociais em geral, que os textos possam oferecer a legítima expressão de

cidadania construída em/por seus leitores, de suas aspirações, de suas realidades pessoais.

Com base no exposto, ainda podemos confirmar que “o discurso não apenas reflete ou

representa as entidades e relações sociais, ele as constrói ou „constitui‟; diferentes discursos

constituem práticas sociais de formas diversas, posicionando os indivíduos de maneiras

diferentes como sujeitos sociais” (FAIRCLOUGH, 1992, p. 3-4).

Em síntese, “examinar o discurso desta perspectiva [sócio-construcionista] implica

analisar como os participantes envolvidos na construção do significado agem no mundo

através da linguagem e, portanto, como se constroem e como constroem sua realidade social”

(MOITA LOPES, 1996, p. 2).

Ao entendermos os textos como representantes discursivos de uma prática social,

também podemos verificar nesses textos relações de poder, que segundo Foucault (1979

Page 49: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

47

[2001, p. 12]), nos informa que essas mesmas relações de poder não necessariamente

reprimem, mas que possibilitam também produzir discurso, pois

cada sociedade tem seu regime de verdade, sua “política geral” de

verdade: isto é, os tipos de discurso que ela acolhe e faz funcionar

como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que permitem

distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como se

sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são

valorizados para a obtenção da verdade; o estatuto daqueles que têm o

encargo de dizer o que funciona como verdadeiro.

Considerando-se que o poder seja uma forma de prática social e discursiva, retomamos

as palavras de Umberto Eco que compara os textos a máquinas que funcionam à medida em

que as colocamos para funcionar e, ainda, podemos fundamentar-nos em Fairclough (1992, p.

65) que nos orienta no sentido de que as práticas discursivas “contribuem tanto para a

reprodução da sociedade como ela é quanto para a sua transformação”. E em Tílio podemos

encontrar que

“se todos os participantes do discurso têm o poder de agir na

construção do mundo social e das identidades sociais, o fato de algum

participante estar posicionado inferiormente na escala de poder não

tira necessariamente o seu direito à voz”. (TÍLIO, 2006, p.63)

Esses textos que recortamos para a análise e que vemos também numa perspectiva da

Análise Crítica do Discurso (ACD) podem ser analisados como uma forma que busca

estabelecer um elo entre esses textos e os contextos sociointeracionais nos quais eles oferecem

as possibilidades de mostrar mudanças sociais contínuas, mesmo que tais mudanças afetem

apenas contextos micros e locais (...). Por isso mesmo, a Análise Crítica do Discurso deve ser

entendida como interdisciplinar e interdiscursiva, estabelecendo um diálogo entre a

Lingüística e a Semiótica (...). Mais do que interdisciplinar, Fairclough (2001) advoga que a

Análise Crítica do Discurso assume um caráter transdisciplinar, em que ela não apenas se

utiliza de conhecimentos de outras áreas, mas também produz conhecimento a partir desta

interdisciplinaridade. A importância de tal interdisciplinaridade explica-se pelo espaço

ocupado pela linguagem na vida social contemporânea.

3.2 Contemporaneidade e educação

Ao esboçarmos os comentários em relação à contemporaneidade e educação torna-se

necessário frisar sobre as mais recentes determinações oficiais acerca desses assuntos, vistos

em conjunto. Uma dessas determinações que destacamos é o Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA), que foi criado em 13 de julho de 1990 e instituiu-se como Lei Federal n.º

Page 50: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

48

8.069 (obedecendo ao artigo 227 da Constituição Federal), cujo pressuposto básico afirma que

as crianças e os adolescentes devem ser vistos como pessoas em desenvolvimento, sujeitos de

direitos e destinatários de proteção integral, como podemos verificar:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e

ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à

alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à

dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,

além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,

exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).

Não é tão simples atender às necessidades básicas dessa faixa de desenvolvimento

humano a qual nos referimos e às suas particularidades quanto a material didático adequado

ao seu desenvolvimento intelectual, por exemplo. São muitas considerações que precisam ser

examinadas, pois são instâncias muito amplas que conceberam as determinações às quais

autores, editoras, educadores devem estar atentos, em minúcias. A concepção sustentadora do

Art. 227 é a Doutrina da Proteção Integral defendida pela ONU com base na Declaração

Universal dos Direitos da Criança. Esta doutrina afirma o valor intrínseco da criança e do

adolescente enquanto ser humano; a necessidade de especial respeito à sua condição de pessoa

em desenvolvimento; o valor prospectivo da infância e da juventude, como portadoras da

continuidade dos valores de seu povo e da sua própria espécie, (re) conhecer a importância do

saber sobre sua realidade, além do reconhecimento de sua vulnerabilidade, o que os torna

merecedores de contar com a proteção integral por parte da família, da escola, da sociedade

como um todo, percebendo-se integrados a esse todo.

O que se propõe é uma educação que passa pelos documentos oficiais, passa pelos

livros e outros veículos pedagógicos, para a formação do indivíduo, mas vai além deles. Na

percepção do professor Anísio Teixeira:

Não se trata, somente, de difundir conhecimentos. O livro também os

difunde. Não se trata, somente, de conservar a experiência humana. O livro

também a conserva. Não se trata, somente, de preparar práticos ou

profissionais, de ofícios ou artes. A aprendizagem direta os prepara, ou, em

último caso, escolas muito mais singelas do que as universidades. Trata-se

de manter uma atmosfera de saber pelo saber para se preparar o homem que

o serve e o desenvolve. Trata-se de conservar o saber vivo e não morto, nos

livros ou no empirismo das práticas não intelectualizadas.Trata-se de

formular intelectualmente a experiência humana, sempre renovada, para que

a mesma se torne consciente e progressiva [TEIXEIRA, 1998, p. 35].

O Estatuto ainda, em linhas gerais, visa à garantia dos direitos e deveres de cidadania a

crianças e adolescentes e determinando como responsáveis por essa garantia os setores que

compõem a sociedade, sejam estes a família, a escola, instituições em geral, o Estado. Há

Page 51: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

49

muito a ser estudado sobre o Estatuto, mas quanto ao que se refere à educação destacamos que

as escolas e seus educadores devem conhecer essa legislação e assegurar seu cumprimento.

Dessa forma, os educadores precisam ser orientados quanto a trabalhar para que os

pressupostos do ECA sejam cumpridos, proporcionando o pleno desenvolvimento da

cidadania de crianças e adolescentes. Portanto, consideramos importante destacar os tópicos

referentes ao Capítulo IV do Estatuto que orientam no sentido “Do Direito à Educação, à

Cultura, ao Esporte e ao Lazer”, do qual, para enfatizarmos sobre aspectos importantes que

não devem ser negligenciados numa obra didática, muito menos na educação em geral e, para

isso, apresentamos o que nos determinam os artigos a seguir:

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno

desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e

qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - direito de ser respeitado por seus educadores;

III - direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias

escolares superiores;

IV - direito de organização e participação em entidades estudantis;

V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.

Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo

pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.

Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente:

I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não

tiveram acesso na idade própria;

II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,

preferencialmente na rede regular de ensino;

IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de

idade;

V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação

artística, segundo a capacidade de cada um;

VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente

trabalhador;

VII - atendimento no ensino fundamental, através de programas

suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e

assistência à saúde.

§ 1.º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.

§ 2.º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua

oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente.

Entre todos os capítulos e artigos verifica-se a preocupação de oferecer às crianças e

adolescentes o melhor possível em termos de garantia de atendimentos específicos e amparo,

apresentando ainda um destaque nesse sentido no que se referem os Artigos 57, 58 e 59 onde

podemos ler que:

Art. 57. O poder público estimulará pesquisas, experiências e novas

propostas relativas a calendário, seriação, currículo, metodologia, didática e

avaliação, com vistas à inserção de crianças e adolescentes excluídos do

ensino fundamental obrigatório.

Page 52: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

50

Art. 58. No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais,

artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do

adolescente, garantindo-se a estes a liberdade da criação e o acesso às fontes

de cultura.

Art. 59. Os municípios, com apoio dos estados e da União, estimularão e

facilitarão a destinação de recursos e espaços para programações culturais,

esportivas e de lazer voltadas para a infância e a juventude.

Essas orientações e leis não surgiram num vácuo social. Elas existem para atender às

políticas públicas direcionadas ao desenvolvimento infantil e juvenil amplamente saudável.

Num contexto histórico, a década de 1960 foi mundialmente marcada pelo surgimento de

inúmeros movimentos sociais em defesa dos direitos da criança e do adolescente. O fato se

observa desde o final da Segunda Guerra Mundial, onde crianças e adolescentes passaram a

ser alvo de grande preocupação por passarem a ocupar uma posição de destaque no cenário da

violência, pois foi quando houve maior necessidade de mão-de-obra feminina na rotina de

trabalho fora do lar e que, em muitos casos, deixou as crianças em situação de abandono, as

quais, mais tarde, já adolescentes, constituíram-se como gangues marcadas por atitudes que

expressavam revolta, indignação e violência contra a sociedade. Essa é uma das causas entre

tantas que não nos cabe citar aqui, apenas queremos destacar possíveis motivos para que a

educação, e as formas que se oferecem para implementá-la, seja a mais efetiva possível

quanto às causas sociais onde ela pode oferecer suporte.

Para as ciências humanas, as ciências sociais e ciências jurídicas, esse processo caótico

resultou na necessidade de repensar a forma de (re) conhecer e compreender as reais

necessidades da infância e adolescência, que passaram a ser alvo de pesquisas e reflexões

teóricas, pois, nessas fases e suas manifestações típicas, há toda uma importância de

acompanhamento e atendimentos que passaram a ocupar um espaço definido no cotidiano, nas

instituições, na mídia e na sociedade em geral. Certamente uma obra didática não deve ficar

alheia a tudo isso, considerando-se ser um recurso no qual existe correlação com a relidade na

qual estamos inseridos.

Todas as instituições, pessoas e recursos pedagógicos, dentre eles o LD, realizam sua

função no sentido de (in) formar, educar, desenvolver o educando como ser cidadão. Não há

materiais didáticos ou métodos capazes de educar sozinhos. Com base nesta realidade

contemporânea, buscamos a educação que sabe ouvir todas essas vozes e visa, junto a todos

os recursos, uma formação que precisa promover o desenvolvimento social, igualitário e justo.

Há, sem dúvida, inúmeros conceitos e definições que buscam elucidar o que é a educação,

especialmente nessa contemporaneidade repleta de desafios, onde não apenas vozes, mas

luzes, precisam vislumbrar possibilidades que melhor instrumentalizem os agentes de

transformação social. Esse assunto é um tema que, para Sacristán (2003, pp.15 e 16),

Page 53: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

51

configura o “mundo da educação”, um “quebra-cabeça pedagógico” e um “amálgama

complexo de materiais muito diversos”.

Os contextos sociais também compartilham, na Escola Sistêmico-Funcional de

Sydney, representada por Halliday e Hasan estudos de grande contribuição para os aportes

teóricos, para os quais destacamos os contextos sociais. Por situarmos a ação de linguagem

analisada por meio de textos, também consideramos importante acrescentar a este arcabouço o

Interacionismo Sociodiscursivo , da chamada escola suíça, representada por autores como

Jean-Paul Bronckart, Bernard Schneuwly e Joaquim Dolz.

O modelo sociointeracionista se torna muito produtivo na contemporaneidade porque

para essa teoria os fatores de textualidade estão intimamente relacionados à discursividade.

Em termos gerais, essa perspectiva, entende o processo de produção textual como uma

atividade humana interacional (discursiva) e intencional (BAKHTIN, 1929). Um dos teóricos

igualmente preocupado com as formas de interação é Van Dijk, que, em sua proposta por um

modelo estratégico de compreensão textual, orienta-nos que:

A análise estratégica depende não somente das características textuais, como

também das características do usuário da língua, tais como seus objetivos ou

conhecimento de mundo. Isso pode significar que o leitor de um texto tentará

reconstruir não somente o significado intencionado do texto - como

sinalizado de diversas formas pelo autor, no texto e contexto - como também

um significado que diga mais respeito aos seus interesses e objetivos (van

Dijk, 2000, p. 23).

Pretende-se que esse arcabouço teórico possa dialogar com as propostas das políticas

públicas, como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), o PNLD e os textos trabalhados

sob a ótica dos autores da obra e pensamos inicialmente na Lei de Diretrizes e Bases para a

Educação Nacional (LDB) que foi promulgada, em 1996, e que apresenta diversos desafios

que não podem ser negligenciados.

Destacamos que nosso enfoque conta com a importância da inter e

transdisciplinaridade, visto que os PCN apresentam uma abordagem que notadamente

apresenta uma perspectiva social da linguagem muito importante de ser observada,

considerando-se que

além da memorização mecânica de regras gramaticais ou das características

de determinado movimento literário, o aluno deve ter meios para ampliar e

articular conhecimentos e competências que possam ser mobilizadas nas

inúmeras situações de uso da língua com que se depara, na família, entre

amigos, na escola, no mundo do trabalho. (BRASIL, 2002, p.55)

Podemos verificar, então, que os PCN revelam o quanto é necessária a formação

cidadã que, além do conhecimento conteudista, também se possibilite aplicar à vida

conhecimentos sobre questões sociais e problemas cotidianos do educando, especialmente

Page 54: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

52

quanto a sua identidade, como também podemos observar no documento quanto ao que diz

que:

Nas Ciências Humanas, a problemática da identidade, por exemplo, é objeto

de estudo da Psicologia, da Sociologia, da Filosofia e da História. A

identidade estará presente na afirmação e na auto-estima do jovem estudante,

no estudo antropológico das organizações familiares, das culturas

alimentares, musicais ou religiosas, nas questões de identidade nacional

diante da globalização cultural. Seu tratamento articulado, resultante de um

entendimento entre professores de uma mesma escola, poderia promover um

recíproco reforço no trabalho dessas e de outras disciplinas da área. A

identidade cultural em associação com o conceito de estética pode articular

ainda as disciplinas da área de Linguagens e Códigos. Por sua vizinhança e

caráter complementar, artes ou jogos, literatura ou teatro, dança ou esporte,

figura ou cena, música ou gesto podem ser apreendidos como integrantes de

um todo expressivo, não como mero mosaico de formas de representação.

(BRASIL, 2002, p.21-22)

O exposto assinala apenas exemplos encontrados no documento citado, mas já destaca

o quanto se torna essencial a articulação entre as diferentes disciplinas da matriz curricular.

Isto significa que é fundamental a interação e contextualização do conhecimento para que os

objetivos de educação sejam mais plenamente alcançados.

A Lei 9394 de 1996 é um marco para a educação em nosso país porque a partir dela o

Ensino Fundamental passa a ser obrigatório e gratuito, com progressiva extensão dessa

obrigatoriedade e gratuidade até o Ensino Médio. Com base na lei surgiram políticas públicas,

tais como os PCN e o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), “uma iniciativa do

Ministério de Educação e Cultura (MEC), (...) [cujos] objetivos básicos são a aquisição e a

distribuição, universal e gratuita, de livros didáticos para os alunos das escolas públicas do

ensino fundamental brasileiro” (BATISTA, 2003, p.25).

Por causa desses documentos, o livro didático passou a ser observado com mais rigor

quanto a aspectos sociais estritamente importantes para a tão falada “formação cidadã”, que

parecia uma proposta inalcançável, típica de falares de reuniões e que ilustravam

planejamentos, mas não saiam do papel. Haja vista o fraco desempenho de muitas escolas

recentemente divulgado pela mídia, os efeitos de uma nova proposta oferecida pelos PCN e

pelo PNLD ainda não foram efetivamente evidenciados.

Se pretendermos verificar se essas exigências dos contextos culturais e das interações

discursivas da realidade que vivenciamos na contemporaneidade são atendidas, é importante destacar

que contemporaneidade é essa, uma vez que vivemos num contexto “marcado pela afirmação da

diversidade e flexibilidade das formas de organização escolar, originadas pela necessidade de atender

aos diferentes interesses e expectativas gerados por fatores de ordem cultural, social e regional”

(BATISTA, 2003, p.49).

Page 55: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

53

Retomamos a inquietação quanto a reconhecer nessas falas a consonância com o que é

proposto na obra em análise, com seus textos e a polifonia dos mesmos, pois de acordo com o que

Rojo (2003, p.98) destaca, embora os procedimentos de avaliação do PNLD tenham contribuído para a

melhoria de qualidade em alguns aspectos do material didático distribuído em nossas escolas, o LD

ainda está a exigir um enorme montante de esforços, para o incremento de sua condução didático-

metodológica nos campos específicos do ensino de língua materna.

É importante ressaltar que, no presente estudo, consideramos o LD enquanto documento

(SILVA, 2000), com textos pertencentes a determinados gêneros e inerentemente dialógicos (talvez

polifônicos), numa perspectiva sócio-histório-político-cultural, do ponto de vista da Análise Crítica do

Discurso (ACD) e que se organiza considerando-se exigências de documentos oficiais baseados nas

necessidades estabelecidas pelas Políticas Públicas, mais especificamente o PNLD.

3.2.1 Parâmetros Curriculares Nacionais

Com esses diálogos pretendemos ainda esboçar algumas particularidades dos PCN de

Língua Portuguesa, pois entendemos a natureza desse diálogo como uma proposta que se

baseia na ACD e coerente com o socioconstrucionismo, pois o discurso crítico se constitui e

também é constituído nas relações sociais. Os PCN apresentam isso de forma clara, mas o que

pretendemos verificar é se essa clareza é percebida nos documentos que se baseiam neste

documento oficial, pois se espraiam nas relações sociais. (BRONCKART 1999;

FAIRCLOUGH, 1992; MOITA LOPES, 2002).

Para atender necessidades de políticas publicas e outras medidas pedagógicas

importantes para a melhoria do ensino e aprendizagem foi essencial a implementação de uma

reforma curricular em nosso país, prescrita pelas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) e,

entre medidas adotadas, aparecem os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), em 1996,

que passaram a balizar a avaliação do livro escolar comprado pelo governo no PNLD

(SOUZA, 2005).

Com orientações bastante detalhadas quanto a aspectos de cidadania, cultura, valores

sociais entre outros, esses manuais, específicos por disciplinas e graus, além dos temas

transversais de pluralidade cultural, sexualidade, etnia, inclusão, diversidade, enfim, temas

considerados ainda polêmicos nas escolas, assegurou-se com os PCN não somente a ausência

de erros grosseiros, conceituais, em textos e atividades e preconceitos em grande escala, como

também a difusão de uma reforma e a aglutinação do currículo nacional, visto o quanto tem

sido abordado e a centralidade desse manual na escola, para ser estudado, debatido e seguido.

Page 56: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

54

Os Parâmetros Curriculares de Língua Portuguesa, 3º e 4º ciclos, como vêm

especificados e que se referem do sexto ao nono ano do ensino fundamental, ou ainda, séries

finais do ensino fundamental, trazem contribuições muito importantes sobre os textos:

Vale considerar que a inclusão da heterogeneidade textual não pode ficar

refém de uma prática estrangulada na homogeneidade de tratamento

didático, que submete a um mesmo roteiro cristalizado de abordagem uma

notícia, um artigo de divulgação científica e um poema. A diversidade não

deve contemplar apenas a seleção dos textos; deve contemplar, também, a

diversidade que acompanha a recepção a que os diversos textos são

submetidos nas práticas sociais de leitura. (BRASIL, 1998, p. 26).

Enfatizando nossa proposta com os textos e atividades de compreensão e interpretação textual

trabalhados pelos autores da obra com as possibilidades que podem ser obtidas a partir desses tópicos

para o estudo interdisciplinar, destacamos mais uma passagem significativa extraída dos PCN de LP:

Ambiente, Saúde, Orientação Sexual, Trabalho e Consumo) demanda

participação efetiva e responsável dos cidadãos, tanto na capacidade de

análise crítica e reflexão sobre os valores e concepções veiculados quanto

nas possibilidades de participação e de transformação das questões

envolvidas.

Por tratarem de questões sociais contemporâneas, que tocam profundamente

o exercício de cidadania, os temas transversais oferecem inúmeras

possibilidades para o uso vivo da palavra, permitindo muitas articulações

com a área de Língua Portuguesa, como:

. a possibilidade de poder expressar-se autenticamente sobre questões

efetivas;

. a diversidade dos pontos de vista e as formas de enunciá-los;

. a convivência com outras posições ideológicas, permitindo o exercício

democrático;

. os domínios lexicais articulados às diversas temáticas.

Os temas transversais abrem a possibilidade de um trabalho integrado de

várias áreas.

Não é o caso de, como muitas vezes ocorre em projetos interdisciplinares,

atribuir à Língua Portuguesa o valor meramente instrumental de ler,

produzir, revisar e corrigir textos, enquanto outras áreas se ocupam do

tratamento dos conteúdos. Adotar tal concepção é postular a neutralidade da

linguagem, o que é incompatível com os princípios que norteiam

estes parâmetros. (BRASIL, p.40).

No que se refere ao nosso estudo, vemos as práticas de linguagem associadas aos

textos e o que com eles se trabalha com o sentido de evidenciar valores e atitudes que podem

ser construídos a partir dessas práticas. No documento dos PCN de LP, podemos conferir,

como nos mostra o fragmento extraído da p. 64:

VALORES E ATITUDES SUBJACENTES ÀS PRÁTICAS DE

LINGUAGEM

. Valorização das variedades lingüísticas que caracterizam a comunidade dos

falantes da Língua Portuguesa nas diferentes regiões do país.

Page 57: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

55

. Valorização das diferentes opiniões e informações veiculadas nos textos .

orais ou escritos . como possibilidades diferenciadas de compreensão do

mundo.

. Posicionamento crítico diante de textos, de modo a reconhecer a pertinência

dos argumentos utilizados, posições ideológicas subjacentes e possíveis

conteúdos discriminatórios neles veiculados.

. Interesse, iniciativa e autonomia para ler textos diversos adequados à

condição atual do aluno.

. Atitude receptiva diante de leituras desafiadoras e disponibilidade para a

ampliação do repertório a partir de experiências com material diversificado e

recomendações de terceiros.

. Interesse pela leitura e escrita como fontes de informação, aprendizagem,

lazer e arte.

. Interesse pela literatura, considerando-a forma de expressão da cultura de

um povo.

. Interesse por trocar impressões e informações com outros leitores,

posicionando-se a respeito dos textos lidos, fornecendo indicações de leitura

e considerando os novos dados recebidos.

. Interesse por freqüentar os espaços mediadores de leitura: bibliotecas,

livrarias, distribuidoras, editoras, bancas de revistas, lançamentos,

exposições, palestras, debates, depoimentos de autores ., sabendo orientar-se

dentro da especificidade desses espaços e sendo capaz de localizar um texto

desejado.

. Reconhecimento da necessidade de dominar os saberes envolvidos nas

práticas sociais mediadas pela linguagem como ferramenta para a

continuidade de aprendizagem fora da escola.

. Reconhecimento de que o domínio dos usos sociais da linguagem oral e

escrita pode possibilitar a participação política e cidadã do sujeito, bem

como transformar as condições dessa participação, conferindo-lhe melhor

qualidade.

. Reconhecimento de que o domínio da linguagem oral e escrita pode

oferecer ao sujeito melhores possibilidades de acesso ao trabalho.

. Reconhecimento da necessidade e importância da língua escrita

no processo de planejamento prévio de textos orais.

. Preocupação com a qualidade das produções escritas próprias, tanto no que

se refere aos aspectos formais . discursivos, textuais, gramaticais,

convencionais . quanto à apresentação estética.

. Valorização da linguagem escrita como instrumento que possibilita o

distanciamento do sujeito em relação a idéias e conhecimentos expressos,

permitindo formas de reflexão mais aprofundadas. (BRASIL, pp.64 e 65).

Vimos, portanto, que o livro didático, os recursos didáticos em geral, não existem sem

bases. Ao contrário. Esses documentos e materiais são essenciais ao ensino e aprendizagem.

Essas exigências sociais de legitimação encontram-se representadas principalmente, na nova

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB) e nas novas Diretrizes para o Ensino

Fundamental emanadas do Conselho Nacional de Educação (CNE). Da mesma forma, essas

demandas são contempladas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN/1998) propostos

pelo MEC para funcionarem como elemento catalisador de ações, na busca de uma melhoria

na qualidade da Educação Brasileira, o que podemos comprovar em Batista (2003, p.42).

Page 58: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

56

Pode-se dizer que, na década de 90, houve uma maior ebulição que favoreceu a

chamada “mudança de paradigma” e que vem refletindo, atualmente, uma nova configuração

do próprio ensino da Língua Portuguesa na qualidade de disciplina. Nessa nova configuração,

novos objetos de ensino e aprendizagem foram reivindicados, entre eles, o investimento na

melhoria de qualidade do LD.

3.3 O livro didático

O livro, isto é, o ato de fala impresso, constitui igualmente um elemento da

comunicação verbal. Ele é objeto de discussões ativas sob a forma de

diálogo e, além disso, é feito para ser apreendido de maneira ativa, para ser

estudado a fundo, comentado e criticado no quadro do discurso interior, sem

contar as reações impressas, institucionalizadas, que se encontram nas

diferentes esferas da comunicação verbal (críticas, resenhas, que exercem

influência sobre os trabalhos posteriores, etc.). Além disso, o ato de fala sob

a forma de livro é sempre orientado em função das intervenções anteriores

na mesma esfera de atividade, tanto as do próprio autor como as de outros

autores: ele decorre portanto da situação particular de um problema

científico ou de um estilo de produção literária. Assim, o discurso escrito é

de certa maneira parte integrante de uma discussão ideológica em grande

escala: ele responde a alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as respostas e

objeções potenciais, procura apoio, etc (BAKHTIN, 2006, p.126).

As questões referentes ao livro didático se inserem em um contexto mais amplo, que

perpassa o sistema educacional e envolve uma variedade de outras estruturas. Isto porque uma

obra didática para ser realizada depende de muitas vozes, como já pudemos observar quanto a

documentos oficiais e, também com elas, o que os autores e editoras propõem segundo esses

documentos e público alvo. Se a interlocução com as instituições que utilizarão o documento

ocorre dentro de critérios definidos por aqueles documentos oficiais e por atendimento ao

currículo, geralmente são adotadas obras de indiscutíveis condições de dialogar com o que se

pede para contribuir com a formação cidadã do aluno.

Caso o diálogo de adoção de um LD ocorra apenas por causa de coleções já

conhecidas pela mídia, esta apresenta editores e autores que têm prestígio suficiente para

obter respaldo nas instituições. De forma que se torna cada vez mais necessário que haja todo

um reconhecimento das vozes que perpassam por um LD, assim como a Associação Brasileira

de Editores de Livros (Abrelivros); a Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos

(Abrale), a Câmara Brasileira do Livro (CBL) e o Sindicato Nacional de Editores de Livros

(SNEL), entre outros, além, é claro, dos documentos oficiais nos quais um LD deve respaldar-

se.

Referir-se ao LD é geralmente polêmico, mas que, inegavelmente, é um assunto que

faz parte do universo dos professores, educadores em geral. Há tempos que o LD se destaca

Page 59: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

57

em ser uns dos instrumentos mais utilizados no campo educacional e sua visibilidade tem sido

maior, especialmente, a partir do momento em que esse material passou a ser submetido a

avaliações de profissionais pesquisadores e capacitados, de acordo com propostas de

documentos oficiais. Há muita informação social, cultural e de gêneros do discurso, entre

outras possibilidades, a serem exploradas, (re) conhecidas dentro de uma obra didática. Mas,

outra questão preocupante é como operacionalizar o atendimento a inúmeras especificidades

propostas para serem contempladas no LD, visto o fato de que esse material deve atender a

normas oficiais, ao universo multicultural.

Certamente o LD, enquanto documento, permite uma abordagem criativa por parte de

quem venha a usá-lo. As coleções aprovadas pelo Programa Nacional do Livro Didático

(PNLD) têm buscado essas possibilidades, sobretudo quanto ao uso de gêneros do discurso

que, se empregados com função social, indicam condições de atendimento à demanda

cultural. Mas, ainda “engatinha-se” nesse terreno e os gêneros estampam as unidades quase

que com a finalidade apenas ilustrativa, para deixar marcas que de que estão ali, mas que na

verdade não são explorados em suas possibilidades sociais. Fica, então, o gênero pelo gênero

e não como (re) conhecimento da importância de cada um para o emprego nas situações reais

de necessidade no espaço social.

O que temos visto é um investimento na qualidade, mas que ainda urge de “retoques”

essenciais para que os livros didáticos, quando produzidos em editoras compromissadas com

os documentos oficiais e valores de cidadania, possam ser recursos fundamentais para a

dinâmica do ensino e aprendizagem, obedecendo a padrões de qualidade. Segundo

Carmagnani, uma análise crítica do livro didático não poderia deixar de considerar sua

inserção no contexto geral do sistema educacional, o mercado o qual serve e, por fim, seus

usuários, professores e alunos (CARMAGNANI, 1999, p. 127).

Embora seja considerada, entre outras possibilidades, um documento, uma obra

didática não é estática, ensimesmada, fechada, engessada. Documentos não são assim.

Prestam-se a diversas possibilidades sociais. Por isso, vemos o LD enquanto objeto que

possui sua emancipação no cenário educacional, haja vista toda uma proposta nos PCN e no

PNLD, para citar dois, em outros exemplos, o que torna o objetivo suscetível a diferentes

explorações de análise.

O LD é um participante do universo escolar, pois é elaborado de forma a vir a ser um

auxiliar para atendendimento às necessidades de (re) conhecimento e (in) formações

educacionais importantes para a contribuição da criticidade e exercício de valores e práticas

cidadãs. Os conteúdos, entre eles os textos, em relação à realidade em que se insere, deve

permitir a formação de posicionamentos importantes na construção da sociedade.

Page 60: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

58

É importante também frisar que o LD contribui com aspectos que envolvem as

relações entre o que é proposto pelos autores e a cultura, através das atividades elaboradas

com as leituras e dentro da escola, com o que será realizado com tais propostas. Portanto, um

LD tem um discurso e, com base nesse pressuposto, podemos entender o LD como um espaço

onde podem ocorrer reflexões de práticas sociais: as formações identitárias, o dia-a-dia,

valores de vida em sociedade, o (re)conhecimento da diversidade e diferenças culturais, as

crenças, a indignaçãso diante de injustiças, as relações de poder e ideologias, as possibilidades

de transformação. Como nos apresenta Fairclough (2001):

O discurso contribui para construir todas as dimensões da estrutura

social que, direta ou indiretamente, o moldam e o restringem; as

próprias normas e convenções, como também relações, identidades e

instituiçoes que lhe são subjacentes. O discurso e uma pratica, não

apenas de representação do mundo, mas de significação do mundo,

constituindo e construindo o mundo em significados.

(FAIRCLOUGH, p. 91)

O LD pode ser visto ainda como um recurso contra o apagamento de tantos outros

discursos sociais. Atraves de estudos de textos podem ser inseridas questões importantes de

serem discutidas, tais como as questões de preconceitos sociais, as questões de gêneros

sociais, aspectos da realidade que muitas vezes se perdem porque ou os profissionais de

educação consideram esses temas irrelevantes ou porque as instituições não autorizam esse

tipo de discussão nas escolas, porque julgam que esses assuntos não levam a nada, pois o que

interessa para muitos são os alunos de boca fechada cumprindo tarefas.

Segundo a historiadora Circe Bittencourt, o livro didático é um objeto dos mais usados

instrumentos de trabalho integrantes da „tradição escolar‟ e de “múltiplas facetas”: ora é visto

como um produto cultural, ora “trata-se de um objeto cultural de difícil definição”, ora como

uma mercadoria ligada ao mercado editorial e, como tal, sujeito à lógica do sistema

capitalista; outras vezes é visto como suporte de conhecimentos e de métodos das várias

disciplinas curriculares e, sobretudo, como veículo de valores, ideológicos ou culturais.

A cada nova avaliação dos programas elaborados com a finalidade de avaliar e

contribuir, deste modo, para a melhoria do livro didático, vemos que essa produção está em

processo de mudanças que, esperamos, contribuam para atender ao que pedem os documentos

oficiais e às vozes da sociedade que busca por justiça e reconhecimento. Segundo lemos em

“um dos mais importantes pesquisadores de livros didáticos, o historidor francês Alain

Choppin, tem afirmado que os manuais estão, na atualidade, convertendo-se em uma

ferramenta „polifônica‟” (BITTENCOURT, 2009, p. 307)

Page 61: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

59

3.3.1 PNLD 2011 de Língua Portuguesa

Embora os LDP sejam oficialmente avaliados pelo PNLD, por equipes altamente

qualificadas para a tarefa e segundo critérios públicos e oficiais, com fundamentação teórica

pertinentes, embasamentos didático-pedagógicos e técnicas de análise bastante precisas apesar

de fortemente embasadas por todo esse aparato, a análise oficial do PNLD não só não invalida

como sugere e necessita de outras para que cada vez mais possam atingir os objetivos de

qualidade para um LD: pesquisas sobre os assuntos relacionados ao material didático e, e

especialmente, a análise das equipes docentes de cada unidade educacional.

Nessa trajetória do PNLD, que na verdade não é tão recente considerando-se que há

mais de duas décadas, “criado em 1985 e inserido numa política educacional do país

redemocratizado” (CASSIANO, 2007, p. 5), existe toda uma preocupação com a qualidade do

LD , esse suporte privilegiado para se recuperar conhecimentos, através de leituras,

atividades, conceitos e técnicas considerados essenciais para o ensino e aprendizagem de

alunos, para contribuir criticamente para uma sociedade que pretende ser justa, igualitária,

cidadã, mais humana.

Com vistas a isso, há todo um investimento e envolvimento em pesquisas de

especialistas nessa área do PNLD, de verbas que fomentam pesquisas, de pesquisadores que

também enveredam nessa área no sentido de (re) apresentar o LD como um dos recursos que

mais auxiliam ao trabalho docente e que, segundo nos afirma Choppin (2004) , durante muito

tempo as investigações históricas sobre o livro escolar foram negligenciadas, inclusive pelo

status secundário do manual no ramo dos livros. Entretanto, esse autor ainda observa que há

uns 20 anos esse tipo de pesquisa teve avanços significativos, sendo o livro didático

considerado como dispositivo de memória na educação. Por essa razão, tem sido mais

enfatizado o interesse quanto às pesquisas nessa área, onde o LD passou a ser um importante

objeto de estudos.

De acordo com o PNLD, as atividades de compreensão e interpretação do texto têm

como objetivo final a formação do leitor (inclusive a do leitor literário) e o desenvolvimento

da capacidade crítica. Neste trabalho, através das propostas elaboradas pelos autores no

recorte que fizemos vimos alguns aspectos que são relativos a esse enfoque no material

selecionado.

Ainda de acordo com o que podemos ler no documento elaborado pelo PNLD de LP

de 2011, o conjunto de textos que um LDP oferece para o ensino-aprendizagem de Língua

Portuguesa deve justificar-se pela qualidade da experiência de leitura que possa propiciar ao

Page 62: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

60

aluno, contribuindo para a sua formação como leitor proficiente, inclusive como leitor

literário. Segundo o documento, uma coletânea deve, portanto:

estar isenta tanto de fragmentos sem unidade de sentido quanto de

pseudotextos, redigidos com propósitos exclusivamente didáticos;

ser representativa da heterogeneidade própria da cultura da escrita –

inclusive no que diz respeito a autoria, a registros, estilos e variedades

(sociais e regionais) linguísticas do Português –, de forma a permitir ao

aluno a percepção de semelhanças e diferenças entre tipos de textos e

gêneros diversos, pertencentes a esferas socialmente mais significativas de

uso da linguagem;

ser adequada – do ponto de vista da extensão, da temática e da

complexidade linguística – ao nível de escolarização em jogo;

incluir, de forma significativa e equilibrada, em relação aos demais

textos da tradição literária de língua portuguesa (especialmente os da

literatura brasileira); e

incentivar professores e alunos a buscarem textos e informações fora

dos • limites do próprio livro didático.

Page 63: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

61

4 METODOLOGIA

Este ponto estrutura-se a partir de alguns eixos categoriais para a nossa análise, dando

conta de algumas mostragens que elaboramos em tabelas configuradoras de um perfil síntese

dos textos da obra didática. Por haver muitos pontos comuns na análise, fizemos os passos

desse percurso apenas utilizando alguns dos textos recortados, pois, se utilizássemos todos, o

trabalho ficaria deveras repetitivo.

A nossa investigação buscou tentar dar conta da pluralidade de vozes que pudessem

ser vistas nos textos e nas atividades, que, elaboradas pelos autores da obra, possibilitam ou

não a ação e estar em ação no mundo social e considerar que isso “envolve questões relativas

a poder, ideologia, história e subjetividade” (Moita Lopes, 1994, p. 331). A análise dessa

coleção didática para o ensino de LP proposta nesta dissertação de mestrado, mais uma vez

frisamos que

enquadra-se na modalidade de pesquisa qualitativa chamada de

análise documental (Lüdke & André, 1986). Conceituo o livro

didático como documento de fonte primária, pois se trata de material

impresso (documento) que analiso tal como concebido por seus

autores (fonte primária). Os livros didáticos são tratados aqui como

documentos, inseridos em um contexto sócio-histórico, e, assim como

qualquer documento, detêm um conteúdo passível de análise. (TÍLIO,

2006).

O discurso destes documentos que os livros didáticos de Língua Portuguesa

representam, com os textos e atividades de compreensão e interpretação são enfocados em

nosso trabalho com a perspectiva de seu papel social no contexto pedagógico, o que faz com

que esta pesquisa se caracterize por adotar uma perspectiva sociodiscursiva.

Esta dissertação apresenta uma análise textual, na medida em que observam-se

aspectos textuais e discursivos nos textos aqui previstos nos livros didáticos, e é uma pesquisa

social, pois o problema que enfoca caracteriza-se por ser de ordem social e a análise é feita

com base em uma teoria social de discurso que é a ADC . Adotamos uma postura crítica

prévia em relação aos aspectos ideológicos nos discursos, o que concorre para a ênfase de

perceber nos textos os fatos linguísticos que apontam às ideologias em sua produção e

levantamos hipóteses acerca de seu efeito nos receptores dos textos investigados. Para tanto,

lemos sobre as categorias de teorias da linguagem (por exemplo, em HALLIDAY apud

TÍLIO; MATTHIESSEN; FAIRCLOUGH, 2003; e van DIJK) para a identificação de

categorias linguísticas de análise e sua relação com o social e a cultura.

Sustentando o argumento de que a noção de “criticismo” nas Ciências Sociais e nas

Humanidades resulta de construções históricas do termo, percebemos na leitura de Fiorin

Page 64: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

62

esses mecanismos ideológicos na esteira de décadas. Pretendemos evitar, na análise, uma

supervalorização dos dados que destacamos a fim de não corrermos riscos de,

consequentemente, interpretá-los à luz de nossos próprios juízos de valor. Queremos com isso

emitir possibilidades de estudos e questionamentos e não engessar opiniões radicais.

Segundo Fairclough (1992, p. 67), “o discurso enquanto prática ideológica

constitui, naturaliza, sustenta e modifica significados do mundo a partir de suas

diferentes posições dentro de relações de poder”. É com esse enfoque que pretendemos

observar os recortes de textos que utilizamos nesta pesquisa, além de verificarmos as

condições de discurso que promovam interação no meio social. Para essas possibilidades,

contribuem de maneira significativa as contribuições da ACD e do ISD.

4.1 Teoria

Entre outros procedimentos, pretendemos verificar no material que nos propusemos a

analisar “ se o título está de acordo com as perguntas de pesquisa, se as perguntas estão de

acordo com os objetivos, se os objetivos estão de acordo com a justificativa e por último se a

conclusão é compatível com todos os itens anteriores” (BARROS, 2002, pp. 10 e 11).

O objetivo dessa análise documental é identificar no LD, documento primário,

informações que sirvam de subsídio para responder alguma questão de pesquisa. Por

representarem uma fonte natural de informação, documentos “não são apenas uma fonte de

informação contextualizada, mas surgem num determinado contexto e fornecem informações

sobre esse mesmo contexto” (Lüdke & André, 1986, p. 39, In TÍLIO, 2006).

O interesse nesse universo textual, com base nos teóricos que elencamos para

contribuição na pesquisa, objetiva também compreender a negociação de significados entre o

discurso dos textos e as propostas dos autores. A coleta de dados feita com esses textos e as

atividades propostas a partir deles ajudam na observação das relações sociais estabelecidas

por esses contextos em que os textos se inserem e são inseridos, pois é nessa troca de

informações entre esses universos que presenciamos a interação e o agir dessas vozes.

A análise documental deve ser adotada quando a linguagem utilizada

nos documentos constitui-se elemento fundamental para a

investigação. O livro didático, enquanto forma de produção na

modalidade escrita, pode ser considerado um documento pedagógico,

pois constitui parte integrante das práticas educacionais. Além disso,

ele está inserido em um contexto maior – a contemporaneidade – que

também é considerada na análise. (TÍLIO, 2006, p.130)

O material em análise, embora ainda não em mãos dos usuários projetados, supõe

esses usuários e já dialoga com eles em relação às propostas que se apresentam, pois tratam-se

Page 65: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

63

de temas importantes para a contemporaneidade, onde esses usuários projetados tem seu lugar

e seu direito de voz, pois, reportando-nos Tílio (2006) concordamos em que a relevância da

análise documental também se explica na medida em que a construção de identidades dos

alunos e a abordagem de questões socioculturais em livros didáticos são viabilizadas através

da linguagem. Este trabalho se preocupa com a análise do LD enquanto documento idealizado

por seus autores, mas tendo em vista a função pedagógica e os usuários previstos (projetados)

para o uso desse documento; são os textos selecionados na coletânea com o texto dos autores,

apresentados nas atividades de compreensão e interpretação textual, inseridos no contexto

contemporâneo , o objeto de estudo desta pesquisa.

Para desenvolver uma análise documental, Lüdke & André (1986) sugerem a

metodologia de análise de conteúdo, “uma categoria de procedimentos explícitos de análise

textual para fins de pesquisa social” (Bauer, 2002, p. 191). A análise de conteúdo “é uma

técnica para produzir inferências de um texto focal para seu contexto social de maneira

objetivada” (Bauer, 2002, p. 191, In: Tílio 2006), em que um texto é estudado tendo em vista

sua inserção em um contexto social mais amplo. Segundo Bakhtin,

o objeto verdadeiro da pesquisa deve ser justamente a interação dinâmica

dessas duas dimensões, o discurso a transmitir e aquele que serve para

transmiti-lo. Na verdade, eles só têm uma existência real, só se formam e

vivem através dessa interrelação, e não de maneira isolada. O discurso citado

e o contexto de transmissão são somente os termos de uma interrelação

dinâmica. Essa dinâmica, por sua vez, reflete a dinâmica da interrelação

social dos indivíduos na comunicação ideológica verbal. (Trata-se,

naturalmente, de tendências essenciais e constantes dessa comunicação) (BAKHTIN, 2006, pp.151-152).

Materiais textuais são trabalhados de forma sistemática, tentando evitar que a análise

seja confundida com uma interpretação subjetiva aleatória. Maneira objetivada refere-se aos

procedimentos sistemáticos, metodicamente explícitos e replicáveis: não sugere uma leitura

válida singular dos textos. Pelo contrário, a codificação singular de um texto o transforma, a

fim de criar nova informação desse texto.

O material selecionado nos textos e nas atividades que acessamos são os discursos,

identidades, a polifonia, os gêneros discursivos e as representações discursivas que podem ser

categorizadas com base nos dados desse material. Uma outra abordagem metodológica que

viabiliza a análise documental é a análise de discurso (Gill, 2002), o nome genérico utilizado

para uma forma de análise de textos que rejeita a neutralidade da linguagem e atribui ao

discurso centralidade na construção da vida social.

Reportando-nos a Tílio, que adapta Burr (1995), Gill (2002, p. 245) enumera quatro

características chave que norteiam uma análise de discurso: 1. A postura crítica com respeito

Page 66: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

64

ao conhecimento dado, aceito sem discussão e um ceticismo com respeito à visão de que

nossas observações do mundo nos revelam, sem problemas, sua natureza autêntica. 2. O

reconhecimento de que as maneiras como nós normalmente compreendemos o mundo são

histórica e culturalmente específicas e relativas. 3. A convicção de que o conhecimento é

socialmente construído, isto é, que nossas maneiras atuais de compreender o mundo são

determinadas não pela natureza do mundo em si mesmo, mas pelos processos sociais. 4. O

compromisso de explorar as maneiras como os conhecimentos – a construção social de

pessoas, fenômenos ou problemas – estão ligados à ações / práticas. A análise documental

aqui conduzida utiliza o aporte teórico-metodológico da análise crítica do discurso, além das

conceituações já discutidas em nossa fundamentação teórica e com os nomes de autores que

destacamos para nos dar suporte a essa fundamentação (cf. capítulo 3).

Reportando-nos a Resende (2009, p.12), uma característica fundamental dessas

abordagens críticas nos estudos da linguagem é a interdisciplinaridade. A autora ainda sugere

que pesquisas discursivas críticas estejam baseadas na identificação de problemas sociais que

possam ser investigados por meio da análise situada em textos. A forma de operacionalização

da análise encontra-se detalhada nos procedimentos de análise (cf. seção 4.3).

4.2 Descrição do corpus

Escolhemos a coleção didática Português: Linguagens, de autoria de William Roberto

Cereja e Thereza Cochar Magalhães, destinada às séries finais do Ensino Fundamental como

corpus que compõe essa pesquisa. Dentro dessa coleção, selecionamos os textos de número

um, sempre dos capítulos de número um, também, e as atividades de interpretação de texto

relacionadas a esses textos que recortamos. O motivo da escolha pelos textos de número um

deveu-se ao fato desses textos serem o primeiro contato do aluno com o título do capítulo nos

quais esses textos se inserem. Vemos esses títulos de capítulos como Tema, pois seguimos as

orientações de Tílio (2006) ao lidar com essa nomenclatura (cf. 4.3) nesta pesquisa.

Outro motivo de nossa escolha deveu-se ao fato da coleção em análise ter sido

aprovada pela quarta vez pelo PNLD e é a edição mais recente oferecida pelos autores e

editora. A edição define o público alvo, ou seja, alunos de 6º ano ao 9º ano do EF, bem como

possui local e data de publicação. São analisados dezessseis textos com a suas atividades

interpretativas. A escolha dessa faixa escolar, público alvo, justifica-se por alguns aspectos:

Primeiramente, espera-se que o aluno ingressante nesse segmento já tenha

cumprido satisfatoriamente uma primeira e decisiva etapa de seu processo de

letramento e alfabetização, tendo, inclusive, se apropriado de algumas

práticas mais complexas e menos cotidianas (relacionadas a esferas públicas

Page 67: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

65

de uso da linguagem), seja de leitura e escrita, seja de compreensão e

produção de textos orais. Essas práticas apresentam padrões linguísticos e

textuais que, por sua vez, demandam novos tipos de reflexão sobre o

funcionamento e as propriedades da linguagem em uso, assim como a

sistematização dos conhecimentos lingüísticos correlatos mais relevantes.

(BRASIL/ MEC, 2010, p. 21).

Destacamos que nessa faixa etária, entre os dez anos e quinze anos, aproximadamente,

é onde geralmente observa-se um comportamento mais inquiridor por parte dos alunos acerca

da realidade em que vivemos. É quando eles se percebem mais preocupados com as

transformações que acontecem no corpo e comportamento deles mesmos, pois é a fase da

pré-adolescência e inícios da adolescência onde se observa que

a trajetória desse aluno em direção à autonomia relativa nos estudos e ao

pleno exercício da cidadania pode ser considerada, por um lado, mais

delineada; e, por outro, ainda não satisfatoriamente consolidada. O que

deverá implicar, no processo de ensino-aprendizagem escolar desses anos,

um maior peso relativo para esses eixos de formação. (BRASIL/ MEC,

2010, p. 21).

É, sem dúvida, uma fase complexa, para eles, para os familiares que lidam mais

diretamente com eles, para os professores que dividem com eles um espaço de construção

cidadã, para os educadores em geral, para pesquisadores... Mais acentuadamente nessa fase,

esses alunos são expostos a um cotidiano mais conturbado, embora nosso trabalho não tenha

se aprofundado nessas particularidades sociais, comportamentais e psicológicas, mas é

importante para caracterizarmos a fase em que, certamente, a maioria do público alvo da

coleção em pauta se encontra, com bombardeios de informações que lhes chegam e eles ficam

sem saber como filtrá-las.

Finalmente, o destino do aluno, ao final desse período de escolarização

obrigatória, é bastante diversificado. E, muitas vezes, implica a interrupção

temporária ou mesmo definitiva de sua educação escolar, motivo pelo qual o

EF deve garantir a seus egressos um domínio da escrita e da oralidade

suficiente para as demandas básicas do mundo do trabalho e do pleno

exercício da cidadania, inclusive no que diz respeito à fruição da literatura

em língua portuguesa. Tais circunstâncias atribuem a esses anos do EF uma

responsabilidade ainda maior, no que diz respeito ao processo de formação

tanto do leitor e do produtor proficiente e crítico de textos quanto do locutor

capaz de uso adequado e eficiente da linguagem oral em situações privadas

ou públicas. (BRASIL/ MEC, 2010, p. 21).

Essa coleção também vem sendo há anos amplamente indicada nas escolas tanto das

redes particulares quanto públicas de ensino, sendo inclusive chamada por alguns professores

como coleção de grife. Os livros selecionados apresentam uma diversidade de temas (cf. 2.1,

quadros 2.1, 2.2, 2.3 e 2.4) que representam o que se analisou no volume do PL destinado

Page 68: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

66

aos anos aqui estudados), voltando a lembrar de que lugar referimo-nos ao citar a palavra

tema neste trabalho .

Verificamos que é preocupação tanto da editora quanto dos autores da obra a

adequação aos PCNs, pois “ um livro que não se adeque aos PCNs é considerado fora dos

padrões educacionais vigentes reconhecidos pelo MEC ” (TÍLIO, 2006, p. 13). Ainda é

importante salientar que o primeiro texto, correspondente ao livro de 6º ano e que faz parte do

capítulo de número um foi aquele no qual nos detivemos com as maiores pormenorizações de

análise, embora os demais textos também tenham sido vistos com o mesmo empenho, mas se

alongariam demais nossos comentários de análise aqui neste trabalho, tornando-os, inclusive,

repetitivos, caso nos detivéssemos a examinar pormenorizadamente cada um. Por isso,

optamos por elaborar quadros onde elencamos os tópicos com base em Tílio (2006), como

pode ser conferido no item 3.3 de nossos procedimentos de análise, alguns tópicos dos PCN

de Língua Portuguesa e outros tópicos referentes a textos que retiramos do documento do

PNLD, como pode ser conferido nos quadros: Quadro 4.1.1a, Quadro 4.1.1b, Quadro 4.1.1c

e Quadro 4.1.1d (6º, 7º, 8º e 9º anos, respectivamente, e os resultados das análises de acordo

com o tema dos capítulos, tópicos e documentos oficiais).

4.3 Procedimentos de análise

Para conduzir a análise documental aqui proposta, adaptamos os tópicos encontrados

em Tilio (2006) que versa sobre conceitos de Tema e Rema, alguns aspectos dos PCN (cf

anexo 2) de LP que consideramos mais representativos para o estudo de textos e atividades

interpretativas. Também utilizamos alguns itens do PNLD (cf. anexo 3) que consideramos

mais gerais para atendimento a nossa proposta de pesquisa e metologias voltadas à análise de

livros didáticos e a partir de alguns pressupostos teóricos da Lingüística Sistêmico-Funcional,

onde podemos ler que é importante,

através das metafunções ideacional, interpessoal e textual, identificar

como os livros didáticos representam o mundo (metafunção

ideacional) e abrem espaço para a construção de identidades, dão voz

aos participantes do processo de ensino e aprendizagem (metafunção

interpessoal) e organizam seu material (metafunção textual). A visão

de mundo e o espaço para a construção de identidades foram

observados nos livros didáticos através das experiências de mundo

que são apresentadas como representações da realidade. O estudo dos

tópicos abordados pelos livros foi feito visando caracterizar o mundo

que o livro pretende coconstruir com os alunos (metafunção

ideacional). (TILIO, 2006, p. 138)

Page 69: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

67

Os tópicos foram levantados a partir da análise dos textos um (os que abrem os

capítulos nas unidades temáticas), de todos os capítulos de número um nos volumes de sexto

ao nono ano e com base nas atividades de compreensão e interpretação desses textos. Os

contextos socioculturais foram analisados com intuito de verificar se, com as abordagem de

gêneros textuais utilizadas, os itens relacionados aos PCN e PNLD contribuem para “ auxiliar

na identificação dos mundos representados nos livros” (TILIO, 2006. p. 138).

Nossa utilização do que Tílio apresenta sobre considerar as categorizações de Tema e

Rema é porque concordamos com o que ele diz em sua tese:

Por se tratar de uma categorização preocupada com o significado da

mensagem, e não apenas com sua estrutura sintática, as mesmas

categorias de Tema e Rema podem ser utilizadas para estudar a

estruturação de livros didáticos. Embora o Tema seja o elemento que

ocupa a posição inicial em uma oração, adaptei este conceito para a

análise de livros didáticos, pois não analiso as orações presentes nos

livros. Ao invés de trabalhar com Tema e Rema das orações, trabalhei

com Temas e Remas das lições, unidades e do livro com um todo.

(TÍLIO, 2006, p.138)

Na organização do estudo, parafrasendo Tilio (idem), chamamos de Tema o que se

põe em destaque, ou seja, os títulos e subtítulos, o material que se encontra nas aberturas de

unidades (para nós todas correspondentes às unidades de número um), capítulos e títulos de

textos com fontes maiores, cores destacadas, as lições e atividades interpretativas e de Rema

tudo o que aparece ao redor deste(s) elementos(s) ou deixados mais para o final das unidades.

Portanto, o que nos interessa para o momento é o Tema, que nos apresenta esse corpo social

que o LD nos traz em forma de textos e atividades,

do ponto de vista do conteúdo, dos temas que aí se encontram atualizados

num dado momento do tempo; e, em segundo lugar, do ponto de vista dos

tipos e formas de discurso através dos quais estes temas tomam forma, são

comentados, se realizam, são experimentados, são pensados, etc

(BAKHTIN, 2006, p. 46)

Elaboramos, para a análise com utilização do quadro X, um código para os itens do

PNLD identificados como AIII8, AIV10, AIV11, AIV12 e AD24, (cf. quadro 3.1), que

explicamos a seguir:

AIII8 – “A”, referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf. doc. guia PNLD,

p.48) que trata da análise avaliativa quanto ao aspecto “III” , que apresenta tópicos sobre a

coletânea de textos usados para a leitura nos LD. E, finalmente o tópico 8 que apresenta as

seguintes questões:

8. A coletânea é representativa do que a cultura escrita oferece para o adolescente na faixa

escolar do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental?

a) Os gêneros selecionados pertencem a esferas socialmente relevantes?

Page 70: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

68

b) A coletânea inclui textos multimodais?

c) A produção cultural específica para os adolescentes (quadrinhos, almanaques, suplementos

de jornais) está representada?

d) Os textos literários selecionados são de autores representativos do cânone?

e) Há textos literários que se referem a diferentes épocas e regiões (aí incluídas traduções de

boa qualidade)?

Aqui, comprovamos com o fragmento extraído do documento do PNLD, exatamente

de onde surgiu o nosso quadro, e em que nos baseamos para um dos tópicos da análise:

Quadro 4.1 – Da análise quanto ao PNLD

AIII9 – “A”, referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf.doc. guia do PNLD,

p.48) que trata da análise avaliativa quanto ao aspecto “III” , que apresenta tópicos sobre a

coletânea de textos usados para a leitura nos LD. E, finalmente o tópico 9 que nos apresenta

os enuniados com os seguintes itens:

Page 71: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

69

Quadro 4.2 – Da análise quanto ao PNLD

Conforme as páginas aparecem indicadas e os podem ser conferidas nos documentos

a que nos referimos (cf. referências) Daqui por diante apresentaremos apenas as questões a

que nos referimos e não mais os quadros. Em sequência às explicações dos procedimentos de

análise, apresentamos os demais tópicos, ainda com base no PNLD:

AIV10 – Onde “A” é referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf. doc. Guia

do PNLD, p.49), sendo “IV” o tópico que trata especificamente sobre o tema “Leitura” onde

encontramos a questão 10 com os seguintes questionamentos:

10. As atividades de leitura colaboram efetivamente para a formação geral do leitor?

a) Definem objetivos plausíveis para a leitura proposta?

b) Resgatam o contexto de produção (esfera, suporte, função social, contexto histórico)?

c) Propõem apreciações estéticas, éticas, políticas, ideológicas?

d) Discutem questões relativas a diversidade sociocultural brasileira?

e) Situam as práticas de leitura em seu universo de uso social?

f) Respeitam as convenções e os modos de ler constitutivos de diferentes gêneros praticados

em diferentes esferas de letramento?

g) Incentivam os alunos a buscarem textos e informações fora dos limites do LD?

h) Tratam a leitura como processo de interlocução, promovendo o diálogo leitor–texto autor?

AIV11 - Onde “A” é referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf. doc. Guia

PNLD, p. 49), sendo “IV” o tópico que trata especificamente sobre o tema “Leitura” onde

encontramos a questão 11 com as seguintes perguntas:

Page 72: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

70

11. As atividades de leitura colaboram efetivamente para a formação do leitor literário?

a) Situam o autor e sua obra em relação à produção cultural e aos cânones literários?

b) Situam o fragmento selecionado em relação à obra de que faz parte?

c) Estimulam o aluno a conhecer a obra de que o texto faz parte ou outras

obras a ele relacionadas?

d) Levam o aluno a considerar a materialidade do texto na apreensão de efeitos de sentido?

e) Aproximam adequadamente o aluno do padrão linguístico do texto (vocabulário e recursos

sintáticos pouco usuais, variedades linguísticas etc.)?

de Livros Didáticos PNLD 201

AIV12- Onde “A” é referente à segunda parte do documento do PNLD 2011 (cf. doc. Guia

PNLD, p. 49), sendo “IV” o tópico que trata especificamente sobre o tema “Leitura” onde

encontramos a questão 12 com as questões:

12. As atividades de leitura colaboram efetivamente para o desenvolvimento da

proficiência do aluno?

a) Trabalham as diferentes estratégias cognitivas envolvidas no processo de leitura

(ativação de conhecimentos prévios, formulação e verificação de hipóteses)?

b) Desenvolvem capacidades de leitura para além da localização de informações?

c) Exploram aspectos discursivos [interdiscursividade, intertextualidade, marcas

enunciativas, efeitos de sentido, pressupostos e subentendidos, polifonia (vozes,

marcas da presença do discurso alheio), argumentatividade, etc.]?

d) Exploram os recursos linguístico-textuais específicos dos diferentes gêneros para

a produção de sentido (recursos de conexão, coesão verbal e nominal, recursos

sintáticos)?

e) Exploram a compreensão das relações que se estabelecem entre texto verbal e

imagem em textos multissemióticos?

D24 – Onde “D” (cf. doc. Guia PNLD , p. 53) diz respeito à legislação e observância

aos princípios éticos necessários à construção da cidadania e o item 24, que

destacamos, envolve as seguintes questões em relação a esse assunto:

D. RESPEITO À LEGISLAÇÃO E OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS ÉTICOS

NECESSÁRIOS À CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA

24. A obra em análise:

Page 73: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

71

a) obedece aos dispositivos legais pertinentes (Constituição Federal, Estatuto da Criança e do

Adolescente e outros)?

b) cumpre a exigência legal de não disseminar:

(i) preconceitos e estereótipos?

(ii) proselitismo político ou religioso?

(iii) publicidade (a não ser quando se trata de estudar textos dessa esfera)?

c) propõe a discussão de textos e imagens que apresentem atitudes preconceituosas ou

estereótipos?

d) contribui para a percepção das relações entre conhecimento e suas funções na sociedade e

na vida prática?

e) representa a diversidade étnica, regional, linguística e cultural e de gênero (masculino e

feminino) em textos e imagens?

Obs.: Utilizando-nos desses itens, fizemos a análise dos textos que selecionamos e

obtivemos um quadro mostragem onde cada tópico referente a itens presentes nesses textos

foi assinalado com um “X” para demarcar que verificamos totalmente ou parcialmente aquele

aspecto analisado; ou, caso o tópico não tenha sido identificado por nós, deixamos a célula

referente àquele item, sem qualquer marcação. Livros

Page 74: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

72

5 ANÁLISE DE TEXTOS SELECIONADOS E INTERPRETAÇÃO NOS VOLUMES

DIDÁTICOS

De modo geral, considera-se que um texto é polifônico, quando nele se

fazem ouvir várias vozes distintas, podendo tratar-se de várias vozes de

mesmo estatuto (diferentes vozes sociais ou diferentes vozes de

personagens) ou de combinação de vozes de estatuto diferente (voz do autor,

voz de um personagem, voz social, etc.). Portanto, podem existir múltiplas

formas de combinações polifônicas. Além disso, considerando a diferença

entre os modos de expressão direta e indireta, podemos distinguir uma

polifonia explícita (analisada principalmente por Ducrot, 1984) e uma

polifonia implícita (analisada particularmente por Bakhtin, 1984), sendo que,

em numerosos textos, a polifonia implícita e a explícita podem,

evidentemente coexistir. (BRONCKART, 2003, p. 329)

O livro didático de língua portuguesa apresenta-se, como documento interdisciplinar

que representa, no sentido de ser permeado por diversos outros discursos, não apenas vozes

relacionadas ao ambiente escolar, mas e sobretudo, discursos de mundo, provenientes também

da realidade sócio-histórico- cultural da sociedade vista como um todo. Aqui é o momento de

verificarmos até que ponto isso que dissemos pode ser confirmado na obra em análise,

sobretudo considerando-se que a mesma visa atender a uma série de exigências que contam

dos documentos oficiais.

O povo brasileiro com sua etnia, a convivência desse povo e seu relacionamento com a

globalização, a pluralidade cultural, as identidades que se constroem no cotidiano e nas

práticas sociais dessa interação, o papel social dos gêneros textuais que se apresentam no

interior da obra, até onde delimitamos seu estudo, são de crucial importância para essa

análise, de acordo com nossa proposta ao selecionarmos esse objeto de estudos.

Nesse recorte analisamos, não exaustivamente, alguns textos, já devidamente

recortados, com base nas propostas da teoria de linguagem de base sistêmico-funcional e uma

visão socioconstrucionista do discurso e sociointeracionista do ensino e aprendizagem, que

embasa os princípios dos Parâmetros Curriculares Nacionais de língua portuguesa (PCN de

LP), também as atividades interpretativas relacionadas a esses textos e os resultados

encontrados nesse estudo, que serão agora discutidos.

A análise desenvolvida buscou responder às seguintes questões de pesquisa:

1) De que forma os tópicos dos textos selecionados contribuem para uma formação cidadã?

2) Em que medida as atividades propostas com os textos permitem ao aluno agir no mundo

social, pensando criticamente e expressando diferentes vozes acerca do tópico?

3) Existe variedade de gêneros textuais compatíveis com a realidade social em que o aluno se

insere?

Page 75: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

73

Para que as propostas desse trabalho possam ser alcançadas é importante verificarmos

temas que contribuam para atingirmos respostas aos nossos questionamentos, entre eles:

• o discurso e o socioconstrucionismo, a fim de problematizar às expectativas da

contemporaneidade e educação, com formação de valores de vida, pensamento crítico,

atitudes cidadãs;

• a interface com a interdisciplinaridade e os textos abordados a fim de observar de

que modo uma obra didática de língua materna dialoga com as demais disciplinas do

currículo, favorecendo esse diálogo interdisciplinar que tanto buscamos;

• e, ainda, se os possíveis discursos produzidos pela obra didática dialogam com

alguns documentos oficiais, inúmeras vezes mencionados nessa pesquisa.

5.1 Visão de mundo e a polifonia no contexto cultural

Pelo que pudemos analisar, a visão de mundo (re) apresentada numa obra didática

pode exercer alguma influência na “ construção de identidades dos alunos que utilizam o

material”. Mas, voltamos a enfatizar aqui, que vemos esse material didático enquanto

documento,portanto esses efeitos não fazem parte da análise e, sim, o que depreendemos a

partir do documento que temos em mãos e as possibilidades apresentadas pelos autores da

obra.

A análise dos livros das quatro séries finais do ensino fundamental levou-nos a seguir

a sequência que foi elaborada pelos autores da obra com a identificação e classificação dos

tópicos presentes até a parte que delimitamos, que foram distribuídos em dezesseis partes, de

acordo com a quantidade total de textos que selecionamos. A função social desses textos, a

representação de mundo criada a partir deles e da forma em que eles foram “dissecados”pelos

autores nas questões de estudo do texto, no recorte de compreensão e interpretação, foi onde

nos atemos para esse trabalho.

Deste modo, através do estudo das categorias de tópicos presentes em cada volume

analisado foi feita a caracterização das especificidades retratadas em cada série, ou seja, as

abordagens textuais previstas, os gêneros mais presentes nesses textos e as questões

problematizadoras da realidade social que eles trabalham, a fim de que cheguem aos

educadores e alunos as propostas, tanto dos autores, quanto dos documentos oficiais aos quais

a obra deve atender.

De acordo com Tílio (2006), destacamos os mesmos tópicos utilizados por ele em sua

tese de doutorado e também ressalvamos que esse tópicos podem aparecer misturados. Não

significa que, pelo fato de termos elencado esse tópicos com uma marca de oposição ( o

Page 76: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

74

símbolo de versus), que eles apareçam separadamente. Ao contrário, eles podem aparecer

numa mesma perspectiva textual. Vejamos os tópicos nomeados como a seguir:

Quadro 5.1 – Categoria de tópicos Tílio (2006)

tópicos includentes X excludentes;

tópicos tradicionais X tópicos pós-modernos,

que aqui utilizo, de acordo com leituras e

preferência pessoal, o termo

contemporaneidade.

tópicos globalizados X tópicos localizados; tópicos contextualizados X tópicos

descontextualizados;

tópicos multiculturais X tópicos

etnocentristas;

tópicos conscientizadores X tópicos

alienantes;

tópicos estereotipadores X tópicos

legitimadores de identidades

tópicos legitimadores de identidades através

da difusão de identidades X tópicos que

permitem a construção de identidades de

projeto.

Aqui, esclarecemos um pouco mais sobre essa abordagem dos tópicos que citamos

anteriormente, ainda com base em Tílio (2006), e referimo-nos a alguns exemplos

encontrados na obra em análise:

• tópicos tradicionais, são os tópicos com assuntos atemporais (ex.: relacionamentos),

e tópicos pós-modernos, que tratam de assuntos da contemporaneidade (ex.: ternura) – cf.

Toada de Ternura;

• tópicos globalizados, preocupados com a integração de diferentes contextos globais (ex:

Carta ao Pleitosceno, que aborda sobre experiências científicas), e tópicos localizados,

preocupados apenas com questões setoriais que parecem não atingir o âmbito da globalização

(ex. comprar ou não comprar presentes para o dia das mães) – cf. 8º ano. Unidade 3:

Consumo – Capítulo: Ser ou ter? Eis a questão. Texto: Ser filho é padecer no purgatório.

Em meio a esses esclarecimentos sobre tópicos tradicionais, globalizados, localizados

e os demais que são lidos aqui, queremos apresentar, especialmente quanto a esses tópicos

globalizados, o que podemos ler em Santos (2002) que, para haver um processo de

globalização necessariamente tem que haver um de localização. Em suas palavras, a produção

de tópicos globalizados

“é o conjunto de trocas desiguais pelo qual um determinado produto,

condição, entidade ou identidade local estende a sua influência para além das

Page 77: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

75

fronteiras nacionais, desenvolvendo uma capacidade de designar como local

outro produto, condição, entidade ou identidade”. (SANTOS, 2002, p 63)

• tópicos descontextualizados, tratados de forma genérica, como se válidos para

qualquer situação (ex.: uma festa, como se todas as festas, em todos os lugares e de qualquer

tipo, fossem festejadas da mesma forma), e tópicos contextualizados, inseridos em contextos

culturais ou situacionais (ex: a noite de São Silvestre no país onde vive a menina dos fósforos)

– cf. anexos.

• tópicos etnocentristas, que induzem à idéia de que determinadas culturas sejam

superiores às demais (ex.ainda em “a menina dos fósforos” por apresentar conto maravilhoso

de origem europeia:), e tópicos multiculturais, que reconhecem a pluralidade cultural e suas

diferenças inerentes (ex.: diferenças culturais) – cf. o diálogo da patroa (branca) com a

empregada (negra) sobre desfilar na escola de samba;

• tópicos estereotipadores, que, na tentativa de reconhecer a diversidade, atribuem

identidades essencialistas a determinados grupos (ex.: alguns estereótipos relacionados a

cidades), e tópicos diferenciadores, que tratam de diferenças que coexistem, sem se

preocupar com a atribuição de identidades uniformes (ex.as diferentes profissões:) – cf. o

texto “A vocação de Geraldinho”;

• tópicos conscientizadores, com o intuito de educar o aluno e o cidadão, muitas

vezes com foco nos temas transversais apontados pelos PCNs (ex.consumismo:), e tópicos

alienantes, sem qualquer preocupação com a preparação do aluno para o mundo (não

identificados na análise).

• tópicos legitimadores de identidades através da difusão de identidades socialmente

aceitas (ex.o texto dos pais numa cerimônia de casamento:), e tópicos que permitem a

construção de identidades de projeto, através da resistência e sugestão de alternativas às

identidades legitimadoras (ex.: histórias de vida e experiências pessoais) – cf. “os meninos

morenos”, de Ziraldo.

As categorias descritas podem aparecer interrelacionadas, ou seja, num mesmo texto

podemos vê-las em conjunto e não necessariamente onde aparece uma não aparece a outra

que lhe serviu de par no quadro que apresentamos (cf. quadro 7.1, 7.2, 7.3 e 7.4) .

Pelo que pudemos analisar, a visão de mundo (re) apresentada numa obra didática

pode exercer alguma influência na “ construção de identidades dos alunos que utilizam o

material”. Mas, voltamos a enfatizar aqui, que vemos esse material didático enquanto

documento, portanto esses efeitos não fazem parte da análise e, sim, o que depreendemos a

partir do documento que temos em mãos e as possibilidades apresentadas pelos autores da

obra.

Page 78: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

76

A análise dos livros das quatro séries finais do ensino fundamental levou-nos a seguir

a sequência que foi elaborada pelos autores da obra com a identificação e classificação dos

tópicos presentes até a parte que delimitamos, distribuídas em dezesseis textos, de acordo com

os critérios de serem aqueles que são os textos de número um, conforma já explicamos. A

função social desses textos, a representação de mundo criada a partir deles e da forma em que

eles foram “dissecados” pelos autores nas questões de estudo do texto, no recorte de

compreensão e interpretação, foi onde nos atemos para esse trabalho.

Deste modo, através do estudo das categorias de tópicos presentes em cada volume

analisado foi feita a caracterização das especificidades retratadas em cada série, ou seja, as

abordagens textuais previstas, os gêneros mais presentes nesses textos e as questões

problematizadoras da realidade social que eles trabalham, a fim de que cheguem aos

educadores e alunos as propostas, tanto dos autores, quanto dos documentos oficiais aos quais

a obra deve atender.

5.1.1 O mundo visto através de tópicos e configurações tópicas

Com base nas categorias de tópicos e nas configurações tópicas que apresentam, cada

livro pode ser caracterizado, o que permite uma visão geral da natureza dos tópicos presentes

nestes livros e, conseqüentemente, a percepção do mundo que está sendo criado por cada um.

Por isso vemos que no livro de 6º ano os gêneros mais enfatizados, nas leituras dos

textos da unidades temáticas, são: conto maravilhoso, história em quadrinhos, página de

diário, relato. No livro de 7º ano podemos verificar que os gêneros mais abordados nos textos

são: mito, narrativa de aventura. Em relação ao 8º ano já vemos presentes os gêneros textuais:

crônica, poesia; e, finalmente, no livro indicado para o 9º ano, os gêneros elencados, nos

textos de nosso recorte, são: conto, crônica, poema

No entanto, cada um destes gêneros é mais evidente dentro da seção de texto e

interpretação de texto, mas não acontece da mesma forma considerando-se toda a obra. E,

mesmo dentro da seção de interpretação textual, nem sempre o gênero é nomeado, fazendo

com o que o aluno precise intuir qual o gênero do texto lido. O mesmo acontece com as

questões de tópicos que citamos, que nem sempre estão contextualizadas dentro da sessão em

análise. Para que visualizemos sobre o que falamos, torna-se importante examinar o que nos

apresenta, na unidade 1, capítulo 1, o texto 1, do livro destinado ao 6º ano:

Page 79: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

77

Figura 1 (Texto)

Logo na primeira leitura do capítulo há um texto distante da realidade do aluno de 6º

ano, por mais que saibamos que se trata de um clássico da literatura infanto-juvenil, que é de

gênero pertencente aos contos maravilhosos, mas com uma visão europeizada, considerando-

se os elementos distantes de nossa realidade, especialmente no início do ano escolar, quando

aqui no Brasil estamos em pleno verão e por estarmos próximos do carnaval, quando é

quando ocorre o início do nosso calendário escolar.

Apesar de ser um texto de conto “maravilhoso”, começar o ano escolar com um texto

onde há elementos que remetem ao último dia do ano, com aspectos descontextualizados em

relação à realidade brasileira, já pode contribuir para um certo afastamento do aluno para a

proposta de “gosto pela leitura” considerando ser essa uma das exigências dos PCN, que não

podemos esquecer que são levadas em questão. Nesse fragmento de texto abaixo também

vemos estereótipos, pois frisa uma menina loura ( cabelos cor de ouro), vemos sobre o que é

servido numa casa à ceia de final de ano, que é um ganso assado ( que não é tão típico de

nosso cardápio) e, reforçando o que dissemos, a data remete ao último dia do ano, que

depreendemos por causa de citar-se que “era dia de São Silvestre”, como pode ser

comprovado no fragmento de texto a seguir:

O exemplo contribui para enfatizarmos que, logo nesse primeiro texto, do livro de

sexto ano, quando os alunos ingressam na segunda fase do ensino fundamental, apresenta o

distanciamento de nossa relidade local e, ao mesmo tempo, não aproxima de uma realidade

Page 80: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

78

global, visto que não são todos os países que tem neve! Isso é o que se observa na superfície

do texto.

Porém, se considerarmos as vozes que se encontram na leitura textual mais atenta, ele

nos aproxima de realidade que precisa ser denunciada, em todas as mídias possíveis: a

exploração do trabalho infantil, os maus-tratos, mesmo no seio da família, que são abordados

no texto e são vozes que precisam de muitos ecos no que se refere à denúncias nesse sentido

e que, a nosso ver, caracterizam aspectos, entre outros, que são polifônicos nesse texto.

Vejamos que, na figura a seguir, há uma cena não típica de nossa realidade, mas se

observarmos a imagem e o que ela expressa do sofrimento da menina da história poderemos

compreender o que se pretende passar através da imagem e da leitura do texto.

Figura 2 (Ilustração)

De nada adianta elaborarmos apenas críticas que remeteam a uma inadequação da

presença do texto na obra, assim como também de nada adianta uma configuração tópica até

estar perfeitamente encadeada, se considerarmos apenas a questão de apresentar um clássico

para os alunos, apenas pelo fato de apresentar, para constar que foi apresentado, se o mundo

construído e refletido pelo livro didático apresentar significados (aqueles que concordamos

que precisam ser negociados) algumas vezes incompatíveis com o universo em que o aluno

Page 81: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

79

vive e conhece. Daí insistirmos no quanto é imprescindível que o trabalho que se faz com os

textos precisa de uma condução e, aqui em nosso trabalho, vemos a condução que é proposta

pelos autores da obra. “A compreensão amadurece apenas na resposta” (BAKHTIN, 1997, p.

90).

Considerando-se o contexto pedagógico, a forma como esse texto será trabalhado é

também uma maneira de comprovar que texto, além de ser discurso, é veículo pedagógico.

Para que haja construção de conhecimento, é preciso que sejam consideradas situações reais,

em que o aprendiz compartilhe os contextos comunicativos e socioculturais em que sua

aprendizagem está inserida.

Quadro 5.2 – Unidades, capítulos e textos do 6º ano

6 º

A

N

O

Unidade 1: No mundo da fantasia – Capítulo 1: Era uma vez

Texto: A menina dos fósforos

Tópicos Um país qualquer; neve; inverno; muito frio, noite escura;

miséria; fome; exploração do trabalho infantil; morte.

Configuração

tópica

Situação social de miséria; problemas de moradia; abandono e

maus-tratos; exploração da mão-de-obra infantil; criança em

perigo; injustiça social; morte como solução?

Unidade 2: Crianças – Capítulo 1: Quando eu crescer

Texto: A vocação do Geraldinho

Tópicos Inteligência; esperteza; preocupação com o futuro; diferenças;

profissões; vocação; teste vocacional.

Configuração

tópica

Dúvidas e inseguranças em relação ao futuro profissional.

Unidade 3: Descobrindo quem sou eu – Capítulo: Um mundo chamado

infância

Texto: Os meninos morenos

Tópicos Ascendência e descendência; lembranças da infância;

aconchego e segurança; momentos marcantes de vida;

observação da lua.

Configuração

tópica

Etnia; continentes; diferenças; patriarcalismo; miscigenação.

Unidade 4: Verde, adoro ver-te – Capítulo 1: Preservação animal

Texto: Da utilidade dos animais

Tópicos Diversidade da fauna; mensagens ecológicas; curiosidades

sobre os animais; direito dos animais à vida X utilidades dos

animais; contradições; ironia.

Configuração

tópica

Meio ambiente; comportamento dos seres humanos em

relação às demais espécies de vida; ironização.

Vimos que no volume destinado aos sextos anos há tópicos importantes para o

universo dos alunos situados nesta etapa de conhecimentos, embora o primeiro texto, um

conto maravilhoso, distancia a participação do aluno daquela realidade retratada, não pelo

gênero escolhido ou por representar um país qualquer onde neva no último dia do ano, mas

pela questão social abordada. As questões sociais ligadas ao abandono, sofrimento, maus-

Page 82: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

80

tratos, exploração do trabalho e morte infantil não acontecem apenas em contos maravilhosos

que apresentam crianças em perigo, num país distante e frio, onde cai neve numa noite escura

e onde as pessoas em suas casas saboreiam ganso assado recheado de maçãs e ameixas. A

questão final do conto maravilhoso fica mal resolvida na exploração das atividades propostas,

pois passa a ideia de que somente a morte seria a “solução” para a vida daquela menina

“vendedeira de fósforos”. Aqui vemos uma problematização que pode interferir na construção

de mundos e de crenças, pois o final do conto apresenta o reencontro da menina com a avó já

falecida.

Essas questões envolvem a importância da discussão relevante sobre assuntos

polêmicos e até de esfera psiquica, mas necessários à formação de pessoa humana. Segundo

nos aponta Bakhtin e é importante para a vida social refletir a esse respeito:

os próprios problemas do psiquismo permanecem insolúveis. Eles não

serão resolvidos enquanto não se resolva o problema da ideologia.

Estas duas questões estão indissoluvelmente ligadas. As histórias da

psicologia e das ciências ligadas à ideologia (a lógica, a teoria do

conhecimento, a estética, as ciências humanas,

etc...) são as de uma luta incessante, de uma delimitação recíproca de

fronteiras e de uma mútua absorção (BAKHTIN, 2006, p.54).

Essa construção tópica no conto “A menina dos fósforos”, para fazer mais sentido em

sua perspectiva enunciativa, representaria melhor o seu gênero, nas condições de aspecto

social se apresentasse, com mais ênfase em suas atividades de exploração de compreensão e

interpretação textual, as possibilidades de comparação da história à nossa realidade cultural,

onde há distanciamento e frieza em relação às causas e conseqüências do abandono e

exploração da infância, apesar de tantas leis, determinações e orientações. Segundo Bakhtin,

“se perdermos de vista os elementos da situação, estaremos tão pouco aptos a compreender a

enunciação como se perdêssemos suas palavras mais importantes” (BAKHTIN, 2006, p.132).

Na unidade dois, percebe-se uma preocupação em representar, através de uma história

em quadrinhos, as diferenças entre as personagens, crianças da turma do Pererê, envolvidas na

trama: o coelho Geraldinho, o saci Pererê, o jabuti Moacir, a onça Galileu, o macaco Alan, o

indiozinho Tininim. São essas personagens que aparecem na história “A vocação de

Geraldinho”, que convivem e dialogam, mesmo com suas diferenças de espécie.

A história atrai a curiosidade do leitor por ser uma HQ e colorida, por ter personagens

diferentes (pessoa, ser lendário e animais) e todos têm nome, atrai também por ser de autoria

de Ziraldo e por tantos outros aspectos, mas o coelho Moacir, no texto, para treinar sua

vocação que, num teste vocacional ele supõe que seja a medicina, machuca os colegas. Essa

perspectiva de que machucar alguém não é a melhor forma para “treinar” a vocação para a

Page 83: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

81

medicina, ou qualquer outra profissão, não é abordada pelas atividades previstas com o texto.

Segundo Tílio,

a visão de mundo de um livro didático pode influenciar diretamente a

construção de identidades dos alunos que utilizam o material. É através do

mundo retratado pelo livro que o aluno se reconhece, ou não, como parte

integrante desse mundo e vê-se capaz de agir, ou não, nele e sobre ele

(TÍLIO, 2006, p. 141).

Há muitas considerações que podem ser empregadas para as atividades de leitura e

interpretação textual. Entendemos que apenas as aulas de Língua Portuguesa e uma obra

didática não dão conta de uma série de particularidades importantes à formação do aluno,

como um todo, para atuar na sociedade com valores e práticas cidadãs. Por isso insistimos que

a interdisciplinaridade contribui para essa perspectiva

dos estudos sobre o conhecimento científico, a literatura, a religião, a

moral, etc. – [e] estão estreitamente ligadas aos problemas de

filosofia da linguagem. Um produto ideológico faz parte de uma

realidade (natural ou social) como todo corpo físico, instrumento de

produção ou produto de consumo; mas, ao contrário destes, ele

também reflete e refrata uma outra realidade, que lhe é exterior. Tudo

que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de

si mesmo (BAKHTIN, 2006, p. 29).

No texto da unidade três, um relato pessoal, conta-nos a história da infância do autor

que se confunde com a formação do povo brasileiro, pois o autor narra que ao chegar à nossa

terra o homem branco “encontrou meninos com a carinha igual à de todos os meninos que

viviam nas florestas úmidas da América ou das altas montanhas dos Andes, conforme

podemos ler no fragmento representado pela figura que se segue:

Esse texto nos traz vozes importantes relacionadas às questões de miscigenação e

desigualdades, o que propicia, sem dúvida, amplos debates. Por isso aqui destacamos que

há um debate sobre a constitucionalidade das políticas focalizadas e se estas

entram em conflito com as políticas universais. Não há contradição entre

políticas de alcance universal e políticas focalizadas: políticas universais são

e serão sempre indispensáveis. Tratar igualmente desiguais pode, no entanto,

agravar a desigualdade, em vez de reduzi-la. As políticas universais podem e

devem ser complementadas por programas que atendam a públicos

específicos, a fim de superar desvantagens e discriminações de natureza

Page 84: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

82

regional, racial, de gênero, de faixa etária, de nível de escolaridade ou outras

situações especiais de vulnerabilidade (PNUD Brasil, 2005, p.118).

O texto “Os meninos morenos” traz contribuições e possibilidades importantes para

abordar questões de etnia, da pobreza, desemprego – questões que se imbricam de tal forma

que permitem esse confronto, combinando tanto ações de cidadania quanto da participação

das políticas públicas que existem em prol dessas causas sociais. Na história o pai do menino

estava desempregado e eles precisaram mudar-se para outra cidade porque o avô do menino

conseguira um emprego para o genro. Ele relata como transcorreu essa viagem:

Figura 3 (Texto)

Muitos problemas paralelos são apresentados: uma viagem feita numa noite escura,

com relâmpagos e chuva, a família em caravana, com mudança, uma criança pequena

protegida pela capa do avô, montados a cavalo. É uma cena típica de muitos retirantes que

buscam melhores condições de vida nesse país. Vejamos as propostas elaboradas pelos

autores para o trabalho com o texto:

Figura 4 (Estudo de Texto)

Page 85: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

83

As demais questões do estudo do texto remetem à outras lembranças da infância do

autor, curiosidades que tinha a respeito da cor da lua, a conversa do escritor, já adulto, com

um astronauta sobre a verdadeira cor da lua e, ainda, a importância de conhecer o passado

para conhecer-se melhor no presente. Portanto, os autores perdem uma oportunidade

necessária de dinamizar questões que apontem para um debate mais amplo acerca das

questões sociais que envolvem vulnerabilidade.

E, completando as análises textuais dos textos dos sextos anos, temos a unidade quatro

com o texto “Da utilidade dos animais” em que uma professora se contradiz várias vezes ao

afirmar que devemos amar e proteger os animais, mas destaca todas as vezes o quanto eles são

úteis para a alimentação e que se pode aproveitar o pelo, o couro e os ossos para roupas,

acessórios, utensílios e decoração, em geral. Os alunos, no texto percebem a contradição e

ironizam o fato. É sem dúvida um texto interdisciplinar e faz-nos refletir, enquanto pessoas

humanas, estudantes, educadores, pesquisadores, profissionais de diferentes ramos do quanto

nosso discurso, em muitas situações, é contraditório. Vejamos o que nos apresenta o texto:

Figura 5 (Texto)

Page 86: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

84

Pelos textos elencados no livro de 6º ano, tópicos e configurações tópicas, podemos

notar que o conhecimento de mundo apresentado pelos autores aos alunos é um mundo

contemporâneo, mas que em alguns aspectos foge às questões essenciais de serem discutidas

nessa contemporaneidade, pois apresenta enfoques mais superficiais, mais planos nas

abordagens interpretativas que poderiam avançar mais nas causas de discussões sociais. No

exemplo do texto em que a professora orienta uma prática de amor aos animais e age no

sentido de que eles são importantes pelo que podemos usufruir deles, apresenta-nos uma

denúncia, uma crítica que poderia ser melhor explorada, nessa ironia, nas atividades sobre o

texto.

Em outras palavras, a ironia será considerada como estratégia de linguagem

que, participando da constituição do discurso como fato histórico e social,

mobiliza diferentes vozes, instaura a polifonia, ainda que essa polifonia não

signifique, necessariamente, a democratização dos valores veiculados ou

criados. (BRAIT, 2008, p. 16).

Reportando-nos a Tílio (2006), um discurso, que ainda tem sido repetido e se

transformado em lugar-comum na produção de livros didáticos, é o de que o livro iniciante

(e, no caso do volume em questão, estamos nos referindo ao livro que inicia a segunda fase do

ensino fundamental) não pode tratar de tópicos maduros, pois o aluno ainda não possui

competência linguística para se expressar, mas isso não justifica subestimar a capacidade

Page 87: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

85

crítica dos alunos dessa série. A capacidade cognitiva do aluno de 6º ano já permite a

discussão de tópicos mais maduros e pertinentes.

O que seriam esses temas mais maduros? Além dos gêneros textuais mais variados e

socialmente construídos e trabalhados os temas que afligem o professor, o aluno, os pais de

alunos, orientadores pedagógicos, as instituições, o pesquisador, os autores de livros

didáticos, as editoras, e por que não colocar aqui os detratores dos livros didáticos que o

utilizam para fundamentar críticas contra o sistema, são os que envolvem preconceitos em

geral, assuntos ligados à política, etnia, probreza, injustiças sociais, violência e, especialmente

os temas ligados à sexualidade.

Muitos temas aparecem em novelas, nos jornais, na mídia em geral e até nas casas dos

alunos, mas são considerados proibidos de serem comentados numa obra didática ou por

quem trabalha com ela. Existem passeatas de orgulho gay, apenas para citar um exemplo, nas

quais os próprios pais levam os filhos. Esse assunto e tantos outros são assuntos que

inegavelmente fazem parte da contemporaneidade, mas que ainda são tabus no universo

educacional. Mas, não estamos preparando nossos alunos para uma sociedade plural?

Sexualidade, violência, exploração, injustiças, questões de preconceitos sociais de vários

níveis e tantos outros temas polêmicos muitas vezes ficam de fora dos livros didáticos.

O discurso do LD tem a sua principal vantagem exatamente devido a uma escolha

criteriosa de textos. Estes devem ser atraentes ao seu público-alvo, que possibilite a vontade

de interagir, de criar novas possibilidades de ação. E esse poder somente é atingido quando o

aluno realmente se vê retratado e se identifica com os textos do seu material didático. Ali, no

texto, nas propostas de interpretação ele precisa se reconhecer, com todos os seus problemas,

com as suas qualidades, com o seu modo de ser, com a sua vivência, com o seu cotidiano.

Podemos ler em Albuquerque Junior (2009) o quanto se constrói, (re)constrói ou se

destrói com discursos, ou falta deles e que podemos reportar a essa nossa discussão que

também perpassa nos documentos oficiais e que deveriam ser problematizados em obras

didáticas, por exemplo.

[...]Angústia e pessimismo acompanham e acentuam a produção de sujeitos

que se refugiam, cada vez mais, no que seria o seu próprio interior. O

individualismo nascente resvala para o narcisismo e o egocentrismo, e as

impressões subjetivas se tornam o refúgio contra o mundo exterior, o mundo

do objeto, da matéria, da mercadoria. Diante de uma sociedade que requer

cada vez mais a disciplina, que investe na identificação e controle dos

corpos, se devaneia sobre corpos sem controle, sobre seres sem identidade,

seres que, como Frankenstein, vagam pelas ruas, pelas florestas, pelos mares,

em busca dos confins da civilização: nômades, fugitivos acossados pelo

julgamento e pelo controle de todos que fazem a

sociedade.(ALBUQUERQUE JR., 2009, p. 98).

Page 88: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

86

Até mesmo por (pré) julgarem que determinados assuntos não devem ser tratados nas

escolas e em textos que servem de veículos pedagógicos, as editoras, autores, instituições de

ensino, direções, pais de alunos e tantos mais que sejam, consideram que abordagens de

temática sexual, para citar um exemplo, no LD deve ser cuidadosa, o que sem dúvida

concordamos. Mas, não se podem ignorar assuntos que fazem parte da contemporaneidade, ou

sempre fizeram parte de tantas outras épocas, mas que ficam apagados nas obras didáticas e

em muitos discursos, em geral.

Entre outros aspectos, que não nos cabe abordar nesse trabalho, pois nossa proposta

são os textos e atividades interpretativas, mas sem esquecer a polifonia, nos exemplos dos

textos apresentados até aqui como fragmentos de análise, não vemos ainda a preocupação

com temas transversais e questões claras sobre interdisciplinaridade. Vemos, por exemplo,

que o texto um, da unidade um, primeiro capítulo, em seu papel de documento, liga-se a

contexto específico de países onde há neve em dia de São Silvestre.

Para a realidade do aluno também pode tornar-se chocante o fato de a menina dos

fósforos sair na última noite do ano para trabalhar, enquanto o pai da menina fica em casa e se

ela não vender os fósforos ela será espancada. Ainda, no final da história, a menina morre

congelada com o frio, para o qual ela não tem agasalho nem calçados adequados. Porém, se

nas abordagens de atividades interpretativas da obra houver uma ligação com o fato de que na

realidade há crianças sendo exploradas, sim, em todas as partes do mundo, e que muitas

passam fome e frio, mesmo no Brasil, onde não é tão comum haver neve, especialmente em

dia de São Silvestre, último dia do ano, poderá haver, neste caso, uma relação entre esses

contextos. Afinal, falta de calor humano também falta em qualquer parte do mundo. Vejamos

o final do texto:

Figura 6 (Texto)

Page 89: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

87

Constata-se, então, nesse documento textual que os tópicos não podem ser

considerados como localizados, nem tampouco globalizados. O mundo construído nesse

primeiro texto não se refere a um país específico, mas aí podemos dizer que se trata de um

conto maravilhoso e essa é uma das características desse gênero textual. As únicas referências

geográficas que percebemos são neve, frio, ganso como prato típico de final de ano e noite de

São Silvestre.

Embora as questões tenham sido baseadas em um conto maravilhoso, este que foi

selecionado, para um exame em mais detalhes, não é tão (re)conhecido nos clássicos da

literatura infanto-juvenil. Pelo menos nesse primeiro momento de atividades interpretativas,

que é o que analisamos, não se promove o confronto do texto com outros textos, apenas é

sugerido que se trabalhe com outros textos que, supostamente, pelo ponto de vista da 6ª

questão, deveriam ser conhecidos os textos mais famosos dos clássicos maravilhosos.

Page 90: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

88

A partir dessa problematização, vejamos como são abordadas as questões de

compreensão e interpretação textual:

Figura 7 (Compreensão e Interpretação)

Percebemos no boxe, (caixa de texto) ao lado das questões de interpretação, que há

preocupação dos autores em informar sobre nossos clássicos nacionais. Contudo, deixa como

sugestão, a critério dos leitores, educadores e/ou alunos, a busca por esses textos. Se essa

busca será feita ou não, é uma outra história. Continuemos na verificação das questões de

interpretação propostas com o texto em análise:

Exemplo 1 (trecho de questões)

Page 91: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

89

Verificamos nas questões 5, 6 e 7 uma tentativa de adentrar nas questões de injustiça

social, embora de forma bem superficial. É público e notório que o tempo previsto para as

aulas, mesmo de LP, que possuem na matriz curricular mais horas aulas que muitas outras

disciplinas, não contempla espaço/tempo para esses aprofundamentos de análise com as

turmas, até considerando-se o programa curricular da disciplina que deve envolver outros

conhecimentos importantes para a bagagem de conhecimentos do aluno. Aí a

interdisciplinaridade poderia ser contemplada, nas demais disciplinas, em conjunto com a LP,

no sentido de todas contemplarem assuntos desse e outros teores significativos para a a

construção identitária dos alunos.

As relações de alteridade precisam ser abordadas com mais profundidade, com a

possibilidade de promoção dos mais diversificados debates. Enfim, precisa ser dinamizada

como uma questão prioritária que, certamente, não podemos negar que seja. Para interagirmos

e sermos todos construtores de uma sociedade mais justa, são necessários amplos

entendimentos dessas questões e propiciarmos a fomentação do exercício desse entendimento,

se consideramo-nos, de fato, educadores.

Prosseguimos nossa análise considerando os demais textos com o olhar nesses

aspectos abordados, de acordo com os exemplos dos textos do 6º ano e de acordo com as

propostas temáticas em cada texto inserido nos demais capítulos e volumes estudados, isto é,

os livros de 7º, 8º e 9º ano.

Page 92: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

90

Quadro 5.3 – Unidades, capítulos e textos do 7º ano

Nos tópicos trabalhados no sétimo ano há uma abordagem maior em relação a

histórias que envolvem aventura, o desconhecido, as inquietações e o medo, retratando assim

a heroicização como pano de fundo para os textos que analisamos, embora aqui a figura do

herói não seja aquela romantizada, mas heróis que enfrentam realidades sem maiores

“poderes” de divindades. Verificamos que há tópicos recorrentes, tais como : amizade,

infância, aventura e heroísmo. Há aspectos contraditórios, como o medo, a covardia, a

agressão, a repugnância que expressam o multifacetamento das pessoas e da sociedade que

julga, isola e silencia.

Estamos diante de abortos da orientação social, incapazes de viver,

comparáveis a romances sem heróis ou a representações sem espectadores.

São privados de toda lógica ou unicidade. É extremamente difícil perceber

nesses farrapos ideológicos leis sociológicas (BAKHTIN, 2006, p.122).

7 º

A

N

O

Unidade 1: Heróis – Capítulo 1: O herói e a conquista do impossível

Texto: As asas de Ícaro

Tópicos Prisão no labirinto; fantasia, sonho, criatividade, invento;

trabalho; liberdade; juventude X maturidade; empolgação,

impaciência, euforia; medo; morte

Configuração

tópica

Mitos gregos; heróis; sonho de voar; limites.

Unidade 2: Viagem pela palavra – Capítulo 1: A palavra no reino da

ternura

Texto: Toada de ternura

Tópicos Amizade; companheirismo; reino; dia; noite; construção do

amanhã; sono; canção; estrela; ternura; infância

Configuração

tópica

Companheirismo; viagem; infância; mundo

Unidade 3: Eu e os outros – Capítulo 1: A descoberta do outro

Texto: A doida

Tópicos A doida; meninos curiosos; amizade; história de vida:

mocidade, casamento, abandono, isolamento; pedradas;

agressão; xingamentos e pragas; provocações; invasão; medo;

repugnância; solidariedade; maturidade.

Configuração

tópica

Loucura; desconhecimento; pré-julgamento; repúdio; culpa;

isolamento; guerrilha; desrespeito ao diferente e pessoa idosa;

heroicidade; alteridade; piedade; solidariedade; maturidade

Unidade 4: Medo, terror e aventura – Capítulo 1: Aventura no mar

Texto: A ilha do tesouro

Tópicos Velho marinheiro com baú; hospedagem; segredo; planos de

fuga; amizade; ameaça e morte; tesouro; cobrança;

honestidade X cobiça; covardia e heroísmo

Configuração

tópica

Aventura; medo; pirataria; fuga; heroísmo

Page 93: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

91

Conforme podemos verificar no texto da unidade 3, “A doida”:

Figura 8 (Texto)

Pelo texto, podemos verificar que a voz da senhora abandonada não foi ouvida pelo

menino. Mas, através dessa palavra curta, ininteligível, podem ser ouvidas muitas outras

vozes que um estudo das relações de grupos sociais, no caso do texto, o abandono do idoso,

apresenta-nos não apenas a situação imediata do texto em si, mas de um contexto social mais

amplo. Os autores apresentam, entre outras, as seguintes questões de trabalho com o texto, de

acordo com o que podemos verificar no exemplo:

Exemplo 2 (trecho de questões)

Page 94: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

92

Nos textos podemos notar também, que muitas vezes a sociedade tem noção do

abandono e da fragilização de muitos, mas não reage, não faz nada para minimizar aquela

situação. “A atitude blasé, analisada por Simmel em contexto metropolitano, com uma certa

indiferença e distanciamento em relação à multiplicidade de estímulos e situações é também

uma resposta possível às descontinuidades e fragmentação da sociedade moderna” (VELHO,

2003, p. 98). É importante que as obras didáticas não estejam alheias às vozes textuais.

Quadro 5.4 – Unidades, capítulos e textos do 8º ano

8 º

A

N

O

Unidade 1: Humor: entre o riso e a crítica – Capítulo 1: O povo, suas cores,

suas dores

Texto: Povo

Tópicos Diálogo entre patroa e empregada; relações de poder e

preconceito; argumentos para convencer e obter o que

pretende; mesquinhez

Configuração

tópica

Diferenças sociais e étnicas; preconceito; interesses

mesquinhos

Unidade 2: Adolescer – Capítulo 1: Corpo em (r) evolução

Texto: Eu, escultor de mim

Tópicos Transformações na adolescência; curiosidades; orientações;

Configuração

tópica

Mudanças físicas e psicológicas; construção identitária;

individualidade

Unidade 3: Consumo – Capítulo: Ser ou ter? Eis a questão

Texto: Ser filho é padecer no purgatório

Tópicos Abordagem de comerciante a cliente; argumentações para

convencer a comprar presentes; chantagem emocional

Configuração

tópica

Relacionamento comercial e clientela; mercadoria e lucro

Unidade 4: Ser diferente – Capítulo 1: O que faz a diferença

Texto: Socorro, sou fofo

Tópicos Autoestima X autocrítica; imagem construída pela sociedade;

autoaceitação

Configuração

tópica

Corporeidade

Ao observarmos os tópicos e as configurações tópicas referentes ao sétimo ano

podemos notar que há avanços significativos nas abordagens textuais. As atividades

propostas, em geral também permitem mais voz aos alunos, como podemos verificar nos

exemplos:

Exemplo 3 (questão texto 1)

Page 95: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

93

Exemplo 4 (unidade 2, cáp. 1, texto 1)

Exemplo 5 ( unidade 4, cáp. 1, texto 1)

Além desses exemplos recortados também aparecem junto aos textos e atividades

interpretativas que selecionamos alguns “boxes”. Os boxes, pequenos textos que aparecem

ladeando os textos principais ou as atividades propostas com os mesmos, algumas vezes

sugerem a voz dos alunos acerca do que apresentam,

não chegam a constituir uma seção, mas têm uma grande importância na

concepção da obra. São textos paralelos, que “dialogam” com o texto-base.

Seu papel é essencialmente, ampliar o assunto tratado e estabelecer relações

entre ele e a realidade do aluno. Assim, chamam a atenção para certas

curiosidades relacionadas ao assunto do texto estudado e certas obras da

literatura, do cinema, da música, etc. (CEREJA & MAGALHÃES, 2009).

No texto 1 da unidade 3, “Ser filho é padecer no purgatório”, os autores utilizam um

texto de Coelho Neto, no boxe junto às atividades de estudo do texto, para dialogar e

estabelecer comparações com o texto principal, como se pode verificar:

Exemplo 6 (Trecho de questão)

Page 96: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

94

Ainda quanto ao texto 1 “Socorro, sou fofo”, capítulo 1 da unidade 4, pode-se

verificar que este apresenta um importante exemplo para ser problematizado quanto a uma

temática necessária de se discutir nas escolas. As questões sobre obesidade e excessiva

magreza, que podem levar a sérias doenças, tais como, apenas para citar exemplos, problemas

cardíacos no primeiro caso e de anorexia e bulimia, no segundo, são relevantes e não podem

ser negligenciados para abordagens interdisciplinares. O que deve ser ensinado e

problematizado? No texto sobre conhecimento, poder e cultura no campo do currículo Soares

(2008) faz um questionamento:

Que critérios podem ser mobilizados para afirmar que alguns saberes valem

a pena ser ensinados em detrimentos de outros, após a formulação das

críticas pós-modernas e pós-estruturalistas? Entre esses critérios, ainda

teriam sentido aqueles que incidem em questões de objetividade,

subjetividade e verdade? Em que medida não podemos pensar em discursos

recontextualizados e hibridizados sobre essas questões produzidos no âmbito

da epistemologia social escolar? , (SOARES, 2008, p.231)

Temos, com o exemplo desse texto, uma contribuição interdisciplinar importantíssima.

Sem dúvida, esse documento, o texto, pode ser trabalhado, além da aula de LP. Ele pode ser

algo que instiga a pesquisas sobre obesidade e anorexia em Educação Física, Ciências,

questões de estatísticas matemáticas e tantas outras possibilidades que professores engajados

com uma educação inclusiva podem, em conjunto, articular.

O importante ao lermos um texto não é fazê-lo de forma mecânica, mas dinâmica no

sentido de buscar significados para o material que lemos. Problematizar, inquirir, arguir,

debater sobre o conteúdo nos leva a descobertas importantes para a formação identitária. As

reflexões permitem a construção de conhecimentos. Segundo Fairclough, “não existe análise

objetiva de textos, pois não é possível descrever simplesmente „o que está lá‟ sem a

participação da subjetividade do analista” (FAIRCLOUGH, 2003, p.14).

Com base no exposto e para não nos estendermos muito na subjetividade de nossa

análise, destacamos os tópicos referentes ao volume do nono ano que fazem parte desse nosso

recorte de estudos e, com o quadro a seguir, apresentamos os textos desse material:

Page 97: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

95

Quadro 5.5 – Unidades, capítulos e textos do 9º ano

9 º

A

N

O

Unidade 1: Valores – Capítulo 1: A dança das gerações

Texto: Pais

Tópicos Igreja; casamento; pais; cerimônia tradicional de casamento;

frustrações paternas.

Configuração

tópica

Ritual cerimonioso de casamento católico tradicional X

gerações contestadoras às formalidades do casamento

tradicional

Unidade 2: Amor – Capítulo 1: Amor além das fronteiras

Texto: Tentação

Tópicos Diferença e discriminação (ser ruivo X ser moreno); tédio;

desalento; objeto de estimação; paixão; sentimento de posse

Configuração

tópica

Diferenças e semelhanças étnicas; solidão; possessividade.

Unidade 3: Juventude – Capítulo 1: A permanente descoberta

Texto: Ser jovem

Tópicos Definições sobre juventude; juventude e possibilidades

sociais e emocionais.

Configuração

tópica

Reflexões e experiências estéticas sobre a juventude.

Unidade 4: Nosso tempo – Capítulo 1: De volta para o presente

Texto: Carta do Pleistoceno

Tópicos Clonagem; Projeto Genoma; DNA; Pleistoceno (época do

período Quaternário, há 3 milhões de anos); extinção animal;

caça;

Configuração

tópica

Curiosidade científica; Clonagem; Pesquisas científicas.

Em termos de escopo os textos presentes no volume de nono ano representam

categorias de interesse investigativo para a série a qual se destina. São assuntos que fazem

parte das práticas da vida social contemporânea, quando muitos valores são questionados,

como por exemplo a própria cerimônia oficial dos casamentos tradicionais. Apenas esse tema

da unidade 1 já possibilitaria uma ampla investigação, que não nos cabe nesse trabalho, mas a

simples referência a essas problematizações já acionam instâncias discursivas, passíveis de

estudos mais amplos e aprofundados.

O amor entre os diferentes no texto que inicia a unidade 2 é também outro aspecto

problematizador para análises minuciosas em relação aos elementos linguísticos no texto, pois

a “materialização discursiva de problemas sociais presentes em textos, além de apontarem

esses problemas, revelam suas vozes”( RESENDE, 2009, p. 13). Assim também pode ser

contatado no texto da unidade 3 que assinala um dos grandes desejos da humanidade em

manter-se com a vitalidade, a saúde, a beleza, a desenvoltura e tantas e ampls possibilidades

que o “ser jovem”pode oferecer em termos de descobertas e criatividade. Sem deixar de frisar

o quanto as pesquisas científicas investigam para a continuidade da vida através de

Page 98: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

96

experiências que envolvem clonagem, entre tantas outras formas de preservação, de cura, de

minimização de dores, mas que despertam outras discussões também muito mais amplas

porque envolvem questões religiosas, éticas e tantas outras mais, como nos aponta o texto da

unidade 4. Portanto, a abordagem de discurso que desenvolvemos neste trabalho

é aquela que vem sendo desenvolvida por Fairclough, que se baseia na

relação entre linguagem e sociedade: textos, como instanciações discursivas,

são resultantes da estruturação social da linguagem (nas ordens do discurso),

mas são também potencialmente transformadores dessa estruturação

(RESENDE, 2009, p.39).

Os textos que marcam esses tópicos levantados para essa análise despertam a

sensibilização às causas sociais, despertam vozes que podem colaborar para a “conduta

organizada para atingir finalidades específicas” (VELHO, 2003, p. 100). Desta forma, os

textos lidos numa obra didática junto com as propostas que são elaboradas para trabalhá-los

passam a ser fonte de memória, que tem um significado fundamental nesse processo de

construção de identidade cidadã. Isto porque os textos envolvem “valores, preconceitos,

emoções” (Idem, p. 101). Se os autores de obras didáticas dinamizam projetos que estimulem

à essa memória textual, “o projeto e a memória associam-se e articulam-se ao dar significado

à vida e às ações dos indivíduos, em outros termos, à própria identidade” (VELHO, 2003, p.

101). Portanto, para ilustrarmos o exposto, podemos visualizar, em seguida, os quadros onde

esquematizamos essas análises, de acordo com as categorias dos tópicos em Tílio (2006),

alguns tópicos dos PCN e de um breve recorte em análises do PNLD, conforme já

identificamos em nossa metodologia de pesquisa (cf. capítulo 3, item 3.3 procedimentos de

análise):

Page 99: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

97

Quadro 5.1.1a – 6º ano e os resultados das análises de acordo com o tema dos capítulos, tópicos e

documentos oficiais:

TEXTOS E ATIVIDADES INTERPRETATIVAS DO 6º ANO

Categorias

Itens observados

TEXTOS

PIC

OS

, S

EG

UN

DO

TÍL

IO (

20

06)

A menina

dos fósforos

A vocação

do

Geraldinho

Os meninos

morenos

Da utilidade

dos animais

Includentes x x x

Excludentes x x

Tradicionais x x

Contemporâneos x x x

Globalizados x x x

Localizados x x x

Descontextualizados

Contextualizados x x x x

Etnocentristas x

Multiculturais x x

Estereotipadores x

Diferenciadores x x x

Conscientizadores x x x

Alienantes x

Legitimadores de

identidades x x

Permitem a

construção de

identidades de

projetos

x x

P C

N

Quanto a aspectos da

apresentação da área

de LP nos PCN (cf.

anexo 2 pp. 17 a 21)

x x

Discurso e suas

condições de

produção, gênero e

texto/ A seleção de

textos. (cf. anexo 2

pp. 22 a 26)

x x

Conteúdos de Língua

Portuguesa e temas

transversais (cf. anexo

2)

x x x

Condições de

interdisciplinaridade

(cf. anexo 2)

x x x

PN

LD

AIII8 x x x x

AIV10 x x x x

AIV11 x x x x

AIV12 x x x x

D24 x x x x

Page 100: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

98

Quadro 5.1.1b – 7º ano e os resultados das análises de acordo com o tema dos capítulos, tópicos e

documentos oficiais:

TEXTOS E ATIVIDADES INTERPRETATIVAS DO 7º ANO

Categorias

Itens observados

TEXTOS

PIC

OS

, S

EG

UN

DO

TÍL

IO (

20

06)

As asas de

Ícaro

Toada de

Ternura A doida

A ilha do

tesouro

Includentes x

Excludentes x x x

Tradicionais x x

Contemporâneos x x x

Globalizados x x x x

Localizados x x x

Descontextualizados

Contextualizados x x x

Etnocentristas x

Multiculturais

Estereotipadores x x

Diferenciadores x

Conscientizadores x x x x

Alienantes

Legitimadores de

identidades x

Permitem a

construção de

identidades de

projetos

x x x

P C

N

Quanto a aspectos da

apresentação da área

de LP nos PCN (cf.

pp. 17 a 21)

x x x

Discurso e suas

condições de

produção, gênero e

texto/ A seleção de

textos. (cf. pp. 22 a

26)

x x x

Conteúdos de Língua

Portuguesa e temas

transversais (cf.doc.

PCN)

x x x x

Condições de

interdisciplinaridade

(cf. doc. PCN)

x x x x

PN

LD

AIII8 x x x x

AIV10 x x x x

AIV11 x x x x

AIV12 x x x x

D24 x x x x

Page 101: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

99

Ainda com a intenção de, com o clássico sobre heróis, levar em conta o nível de

interesse dos alunos, o texto sobre Ícaro nos apresenta o herói que busca vencer desafios.

Mas, nem sempre a vitória é obtida, de modo que o sonho de Ícaro em voar até o Sol não se

concretiza. Há aqui um preparo para a realidade onde nem sempre o que sonhamos é possível

de ser realizado. A abordagem feita na incursão pelo texto pode apresentar várias outras

comparações com o herói e a liberdade obtida com a capacidade de voar. Com base em Ícaro,

outros heróis podem ser lembrados com o que podem realizar através das condições que o ato

de voar lhes permitem. Essa interação pode ser estabelecida nas questões sociais porque

podem dialogar com vários outras possibilidades. O dialogismo “tem na polifonia sua forma

suprema” (BEZERRA, 2008, p. 193); isso representa que podemos estabelecer essas inserções

com outros heróis (personagens), pois cada personagem passa a ser dono de sua voz: “o autor

não fala sobre, mas com a personagem” (BAKHTIN, 2002, p.71).

Podemos confirmar o exposto através do que nos apresenta o fragmento de texto

abaixo, onde percebemos a voz do filho que percebe o perigo e clama pela ajuda paterna, que

não está ali presente para ajudá-lo. Quantos filhos vivem essa mesma situação diante do

perigo? Quantos alunos precisam de ajuda e encontram nos textos as suas próprias vozes?

“Cada enunciado do herói contém uma outra voz, que soa ao lado da palavra do autor”

(BAKHTIN, 2002, p. 5).

Figura 9 (Texto)

O pai previne o filho sobre o perigo, mas este, inebriado pela perspectiva da conquista

do Sol e de usufruir da liberdade, se afasta do pai e esquece seus conselhos. Uma forma de

orientar os alunos quanto a ouvir os conselhos e ensinamentos de pessoas mais velhas e

responsáveis, conscientes das situações de perigo é apresentada pelo texto, que mostra,

também, a dor do pai com a perda do filho.

Figura 10 (Texto)

Page 102: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

100

Pelas questões de estudo do texto, através da compreensão e interpretação, verifica-se

que os autores supõem um diálogo dessa história com outra história ligada a essa e que

envolve o labirinto e o Minotauro (monstro que tinha a cabeça de touro e o corpo de homem).

Se o aluno não conhece essa história anterior sobre o labirinto do Minotauro, as respostas aos

itens a, b e c da atividade “um” ficam comprometidas com o conhecimento dessa outra parte

da história, que um (re) conhecimento interdisciplinar poderia ter promovido.

Exemplo 7 (trecho de questão)

Quando os autores promovem a comparação do sonho de Ícaro em voar com salto do

homem na superfície da Lua eles estão apresentando um exemplo claro de polifonia. Vejamos

o boxe:

Figura 11 (boxe)

Outro exemplo de polifonia aparece no boxe onde compara a construção da asa feita

por Dédalo e o pioneirismo de Leonardo da Vinci como inventor da asa-delta.

A partir dessas interações sociais que podem ser promovidas através dos textos,

podemos verificar que essas possibilidades de compreensão e interpretação são apenas um

breve levantamento das propostas que os autores apresentam. “Trata-se evidentemente de um

levantamento não exaustivo” (SOBRAL, 2008, P. 125).

Page 103: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

101

Quadro 5.1.1c – 8º ano e os resultados das análises de acordo com o tema dos capítulos, tópicos e

documentos oficiais:

TEXTOS E ATIVIDADES INTERPRETATIVAS DO 8º ANO

Categorias

Itens observados

TEXTOS

PIC

OS

, S

EG

UN

DO

TÍL

IO (

20

06)

Povo

Eu, escultor

de mim

Ser filho é

padecer no

purgatório

Socorro, sou

fofo

Includentes x x

Excludentes x x

Tradicionais

Contemporâneos x x x x

Globalizados x x

Localizados x x

Descontextualizados

Contextualizados x x x x

Etnocentristas x x

Multiculturais x x x x

Estereotipadores x x

Diferenciadores x x x

Conscientizadores x x x

Alienantes

Legitimadores de

identidades x x

Permitem a

construção de

identidades de

projetos

x x x

P

C

N

Quanto a aspectos da

apresentação da área

de LP nos PCN (cf.

anexo 2 pp. 17 a 21)

x x x x

Discurso e suas

condições de

produção, gênero e

texto/ A seleção de

textos. (cf. anexo 2

pp. 22 a 26)

x x x x

Conteúdos de Língua

Portuguesa e temas

transversais (cf. anexo

2)

x x x x

Condições de

interdisciplinaridade

(cf. anexo 2)

x x x x

PN

LD

AIII8 x x x x

AIV10 x x x x

AIV11 x x x x

AIV12 x x x x

D24 x x x x

Page 104: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

102

Quadro 5.1.1d – 9º ano e os resultados das análises de acordo com o tema dos capítulos, tópicos e

documentos oficiais:

TEXTOS E ATIVIDADES INTERPRETATIVAS DO 9º ANO

Categorias

Itens observados

TEXTOS

PIC

OS

, S

EG

UN

DO

TÍL

IO (

20

06)

Pais Tentação Ser jovem

Carta de

Pleistoceno

Includentes x x x

Excludentes x x x

Tradicionais x x x

Contemporâneos x x x x

Globalizados x x

Localizados x x x x

Descontextualizados x

Contextualizados x x x

Etnocentristas x

Multiculturais x x x

Estereotipadores x x x

Diferenciadores x x x

Conscientizadores x x x

Alienantes

Legitimadores de

identidades x x x

Permitem a

construção de

identidades de

projetos

x x x

P

C

N

Quanto a aspectos da

apresentação da área

de LP nos PCN (cf.

anexo 2 pp. 17 a 21)

x x x x

Discurso e suas

condições de

produção, gênero e

texto/ A seleção de

textos. (cf. anexo 2

pp. 22 a 26)

x x x x

Conteúdos de Língua

Portuguesa e temas

transversais (cf. anexo

2)

x x x x

Condições de

interdisciplinaridade

(cf. anexo 2)

x x x x

PN

LD

AIII8 x x x x

AIV10 x x x x

AIV11 x x x x

AIV12 x x x x

D24 x x x x

Page 105: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

103

5.1.2 A construção identitária na obra didática de Língua Portuguesa

A partir dos resultados da análise da representação que os livros didáticos

fazem do mundo e do espaço dado ao aluno para que manifeste sua voz, é

possível discutir como estes livros didáticos contribuem para a construção de

identidades dos alunos. A representação do mundo e a inserção do aluno

neste mundo é o primeiro fator determinante de quais identidades serão

construídas por estes alunos, que podem se reconhecer ou não como parte

deste mundo, se têm lugar ou não neste mundo. Além disso, precisam de voz

para construir suas identidades, caso contrário são oprimidos pelas

identidades legitimadoras impostas pelos livros.(TÍLIO, 2006, p. 196)

Como contexto, constatamos a situação contemporânea, com suas crises das mais

variadas naturezas, sejam elas provocadas pelo desemprego, pela miséria, atribuídas à má

distribuição de renda, à falta de moradia, às condições precárias de saneamento básico e que

provocam doenças, ao salário mínimo irrisório, à falta de respeito pela identidade do outro,

incompatibilidades no seio familiar, exploração de crianças e jovens (além de uso indevido de

mão-de-obra para o trabalho, há também as questões de exploraçào sexual), os heróis

buscados e não mais encontrados, os choques culturais e as vozes dos excluídos, dos

marginalizados, há desesperança e, consequentemente a essas e outras causas, a violência se

alastra, a criminalidade não é combatida e povo permanece revoltado, denunciando inúmeras

injustiças que também não têm fim. São nessas interações sociais conflituosas que se

constróem as identidades e onde estas querem ser ouvidas em seus apelos, em meio a tanto

descaso e caos. Há muitas vozes abafadas. Segundo Rouanet(1993), “é a forma

contemporânea assumida pelo mal-estar na civilização” (ROUANET, 1993, p.96). E ainda

podemos relembrar Freud, citado por Rouanet, em que lemos que “a voz da inteligência é

baixa, mas não descansa enquanto não for ouvida” (ROUANET, 1993, p. 101).

Através do que se escreve nos textos, as marcas de tantas vozes ficam impressas.

Encontramos nos textos respaldo para que levantemos essas situações e permitamos que haja

as vozes críticas que possam elaborar o seu discurso com base em reflexões apontadas nos

enunciados das atividades de compreensão e interpretação textuais? Essa passagem da voz do

autor para o diálogo com os leitores, mesmo numa perspectiva de leitores projetados, “tem na

polifonia sua forma suprema, equivale à libertação do indivíduo, que de escravo mudo da

consciência do autor se torna sujeito de sua própria consciência” (BEZERRA, 2008, 193).

Podemos verificar na polifonia dos textos o que é, segundo Bakhtin (apud

BRANDÃO, 1995, p. 53),

um enunciado vivo, significativamente surgido em um momento histórico e

em um meio social determinados, que não pode deixar de tocar em milhares

Page 106: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

104

de fios dialógicos vivos, tecidos pela consciência socioideológica em torno

do objeto de tal enunciado e de participar ativamente do diálogo social.

Através do exposto, vemos que há “maleabilidade de um texto (falado ou escrito), sua

potencialidade de leitura múltipla e intertextualidade, questionando assim as interpretações

inívocas e unidimensionais oferecidas pelos textos didáticos” (FREITAG, , p. 82), mas que

aqui pudemos constatar que há esforço no sentido em que o discurso do livro didático, com

seus textos e atividades nos tópicos selecionados, através do material que recortamos para a

análise, nos apresenta possibilidades de relacionar-se com a construção de identidades sociais

dos alunos, “em que novas formas de exercício de cidadania e solidariedade tenham espaço”

(FREITAG, 2006, p. 177).

Page 107: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

105

6 REFLEXÕES CRÍTICAS E CONSIDERAÇÕES FINAIS

O livro didático de língua portuguesa analisado não apaga as possibilidades de

interação com as questões sociais citadas, embora não problematizadas em seu merecimento e

profundidade, pois não era nossa intenção, aqui neste trabalho. Através da polifonia e das

atividades interpretativas propostas pelos autores podemos observar que há no documento

reflexões sobre cultura, diversidade, diferenças, identidades e, a totalidade dos textos, como

pode ser observado ao visualizarem-se as tabelas elaboradas, atende aos aspectos que

recortamos nos PCN e PNLD, que nos ajudam a dialogar com esse recorte que elaboramos.

Portanto, podemos concluir que a polifonia é bastante explorada ao longo dos textos que

selecionamos, mas pelo eixo temático, não necessariamente pelo estudo de gêneros enquanto

função social, embora estes estejam presentes, não são análises de gêneros que possam

identificar a importância deles em suas funcções sociais.

Refletimos quanto a importância do LD, que segue orientações desses documentos

oficiais citados além do recorte teórico que elaboramos e observamos que o LD procura

conciliar, aqui nesse estudo, o papel dos textos com suas propostas de interpretação, ou seja,

a leitura e análise de textos. Porém, queremos salientar que todo um esforço de produção

textual, de autores, de editora, de leis, parâmetros, recomendações, programas, projetos se não

obtiverem ressonância no espaço onde devem ser aplicadas essas propostas, torna-se

impossível perceber-se o eco do que se espera em termos de perspectivas cidadãs. Pois, se o

corpo docente e todo a assessoria pedagógica de uma instituição privilegiar apenas enormes

listas de exercícios visando apenas aspectos gramaticais, propostas de produção textual para

serem feitas em casa com finalidade de serem corrigidas só para verificar ortografia, não se

estará satisfazendo às necessidades desse perfil de aluno que pressupomos agente de

transformação social, com pensamento crítico e sabendo expressar suas ideias num mundo

onde ele exerce a sua autonomia, a sua cidadania e inscreve a sua história como herói de si

mesmo.

O presente trabalho investigou o discurso de textos do livro didático Português-

Linguagem para o ensino de Língua Portuguesa do 6º ao 9º ano do EF, visando discutir como

estes textos, contidos no recorte para este trabalho, representam o mundo e permitem um

diálogo, através de propostas nas atividades interpretativas elaboradas pelos autores da obra,

de forma a representarem os contextos culturais, os tópicos que destacamos para análise,

algumas propostas dos PCN e PNLD e, em que medida esses tópicos contribuem para a

construção de identidades sociais e possiblitam dar voz aos alunos como contrutores de sua

aprendizagem, isto tendo em vista aulas dialógicas, onde não apenas a enunciação do

Page 108: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

106

professor e/ou do autor do livro didático são consideradas, respeitadas e tidas como verdades.

Como tornar alunos construtores de sua aprendizagem se muitos docentes e instituições ditam

que o aluno precisa estar de boca fechada, pois o contrário é falta de disciplina? Qualquer

esforço de elaboração de diretrizes, novos documentos oficiais, parâmetros, programas e

variedade de gêneros textuais, sobretudo os que visam a oralidade, caem por terra diante de tal

disparate.

Foram analisados quatro livros didáticos da coleção Português: Linguagem destinada

aos alunos de dez a quatorze anos. Constatamos que os livros das séries iniciais da segunda

fase do EF (6º e 7º anos) representam um mundo mais fantasioso, até mesmo quanto aos

gêneros estudados; e os volumes das séries de 8º ano e 9º ano apresentam mais situações do

mundo real.

Apesar da pesquisa restrita ao documento, vimos que há nas propostas da coletânea

analisada o interesse em que, nas atividades pedagógicas, possam se debater textos,

compartilhar e negociar a polifonia em seus sentidos mais amplos e, deste modo, a obra

exerce seu papel de colaborar para que o aluno assuma sua identidade social de cidadão

crítico e autônomo, que possa vencer suas próprias dificuldades.

Esperamos que esta pesquisa traga resultados que contribuam, de alguma forma, para

a prática pedagógica de professores que utilizam livros didáticos, levando-os a refletir sobre

estas breves questões aqui levantadas. Gostaríamos, também, que pudessem ser obtidas

algumas contribuições para um (re)conhecimento linguístico-discursivo do livro didático

enquanto um documento textual de grande importância no discurso interdisciplinar,

especialmente com temas que atendem aos interesses das letras e ciências humanas, que são

as propostas de nosso mestrado interdisciplinar.

Para que tenhamos hoje condições de verificar se a educação como um todo está em

condições de estimular o efetivo exercício da cidadania não basta verificar se uma obra

didática propicia essa condição. Há toda uma complexidade de elementos que dialogam para

essa construção cidadã. O LD é um dos suportes que pode configurar-se para promover

alguns enfoques que contribuam para a aprendizagem transformadora. São necessárias muitas

condições que permitam avaliar se o aluno está capacitado a agir no mundo social. Se ele é

apoiado pela família, pelos educadores, pelo estímulo à criatividade e autonomia, pela

instituição, pela sociedade e toda organização de outras instituições e sujeitos que atuam nas

mais variadas esferas da sociedade, a aprendizagem significativa e transformadora poderá

estar ao seu alcance.

Acreditamos que nossa perguntas de pesquisa tenham sido respondidas aqui, pois

quando indagamos de que forma os tópicos dos textos selecionados contribuem para uma

Page 109: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

107

formação cidadã? A classificação dos tópicos apresentada e comentada através das tabelas

que foram elaboradas e as citações, especialmente referentes aos PCN e temas tranversais,

colaboram para o que pretendemos responder.

Assim como quando indagamos em que medida as atividades propostas com os textos

permitem ao aluno agir no mundo social, pensando criticamente e expressando diferentes

vozes acerca do tópico, também acreditamos que as propostas apresentadas nas atividades do

LD contribuem para esse conhecimento que, através do trabalho que dependerá de como serão

tratadas pedagogicamente nos universos entre escola, família e sociedade, e com os tipos de

conhecimento sistêmico e de mundo que são desenvolvidos para contribuir para a formação

cidadã, junto com a operacionalização das propostas dos PCN poderão ser efetivadas.

E, finalmente, quanto a questão de se há existência de variedade de gêneros textuais

compatíveis com a realidade social em que o aluno se insere podemos responder que,

parcialmente, sim, embora esse ttratamento de variedade de gêneros ainda dependa de maior

exploração em sua contribuição social. Pois, como já dissemos anteriormente, não basta o

gênero pelo gênero, para servir de verniz, para constar no elenco da obra, para dizer que está

lá e foi usado numa ou noutra proposta de atividade interpretativa ou de produção textual.

Como nos apresenta Resende:

Textos como elementos de eventos sociais têm efeitos causais – ou seja,

acarretam mudanças em nosso conhecimento (aprendemos coisas por meio

deles). Em suma, textos têm efeitos causais sobre as pessoas (crenças,

atitudes), as ações, as relações sociais e o mundo material. Esses efeitos são

mediados pela construção de significado (RESENDE, 2009, p.23)

A partir dos resultados aqui obtidos, espera-se despertar em professores e

pesquisadores o interesse em dar continuidade ao desenvolvimento de pesquisas nesta área de

análise de obras didáticas e estudos de textos e atividades com base nestes, pois esse terreno

tem muitas possibilidades de investigação que nem sempre são observadas em sua totalidade

em relação a sua importância e que, certamente, não se esgotam em uma pesquisa.

A abordagem discursiva que desenvolvemos neste trabalho, a ACD, “provê meios

meios para investigar os modos como a linguagem figura na vida social” (RESENDE, 2009,

p.48). Através de objetivos éticos e políticos, concordamos que “a partir de uma análise

minuciosa de elementos linguísticos nos textos” (IDEM) que possam ser acrescentados cada

vez mais ao interesse investigativo acadêmico o aspecto discursivo, pois “a condição principal

para que um programa interdisciplinar possa se desenvolver é um interesse compartilhado por

problemas no mundo e o desejo de contribuir para sua solução” (BLOMMAERT, 2005, p. 19,

In: RESENDE, 2009, p. 48). É o que pretendemos com o presente trabalho.

Page 110: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

108

REFERÊNCIAS:

ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz de. A Bela ou a Fera: os corpos entre a identidade da

anomalia e a anomalia da identidade. In: Rago, Margareth; VEIGA-NETO, Alfredo (Orgs.).

Para uma vida não-fascista. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009. p. 95-115. 432p

BAKHTIN, M.[1929]. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 2006.

BAKHTIN, M.[1979]. Estética da criação verbal. São Paulo: Hucitec, 2003.

BAKHTIN, Mikhail. Problemas da poética de Dostoiévski. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense

Universitária, 2002.

BAKHTIN, Mikhail. Questões de Literatura e Estética. 3ª ed. Tradução de A. F.

Bernardini. São Paulo: UNESP, 1997.

BARTHES, O rumor da língua. Tradução Márcio Laranjeira. São Paulo: Brasiliense, 1988.

BATISTA, A; ROJO, R. Livros escolares no Brasil: a produção científica. In: Maria da Graça

Costa Val e Beth Marcuschi (Orgs.). Livros didáticos de língua portuguesa: letramento e

cidadania. Belo Horizonte: CEALE/Autêntica, 2005.

BENTES, A. C. Linguística textual. In: MUSSALIN, F. e BENTES, A. C. Introdução à

Linguística – domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001.

BEZERRA, Maria Auxiliadora. Textos: Seleção Variada e Atual. In: DIONÍSIO, Ângela

Paiva & BEZERRA, Maria Auxiliadora (org.). O Livro Didático de Português: múltiplos

olhares. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

BEZERRA, Paulo. Polifonia. In: BRAIT, Beth (org.). Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo:

Contexto, 2008.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. São

Paulo: Cortês, 2009.

BLOMMAERT, J. Discourse. A critical introduction. Cambridge University Press, 2005. In:

RESENDE, Viviane de Melo. Análise de discurso crítica e realismo crítico: implicações

interdisciplinares. Campinas, SP: Pontes Editores, 2009.

BORTONI-RICARDO, Stella Maris. O professor pesquisador: introdução à pesquisa

qualitativa. São Paulo: Parábola, 2008.

BRAIT, Beth (org.). Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2008.

BRAIT, Beth. Ironia em perspectiva polifônica. 2. ed. Campinas, SP: Editora da

UNICAMP, 2008.

BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à análise do discurso. 8ª ed. Campinas:

UNICAMP, 2001.

Page 111: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

109

BRASIL. Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da

educação nacional. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para assuntos jurídicos.

Brasília, 20 de dezembro de 1996; 175º da Independência e 108º da República.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:

terceiro e quarto ciclos: apresentação dos temas transversais. Brasília: MECSEF, 1998.

BRASIL. SEF. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino

fundamental: língua portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998

BRASIL, Ministério da Educação, Guia de livros didáticos PNLD 2011 : Língua

Portuguesa, Ministério da Educação. Brasília: MEC, 2010, 152 páginas.

BRONCKART, J. P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo

sócio-discursivo. São Paulo: EDUC, 1999.

CANDEAU, Vera Maria & MOREIRA, Antonio Flavio. Multiculturalismo - Diferenças

culturais e práticas pedagógicas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

CARMAGNANI, A. M. Ensino apostilado e a venda de novas ilusões. In: CORACINI, M. J.

(Org.). Interpretação, autoria e legitimação do livro didático. São Paulo: Pontes, 1999a. p.

45-55.

CASSIANO, Célia Cristina de Figuiredo. O mercado do livro didático no Brasil: da criação

do Programa N acional do Livro Didático (PN LD) à entrada do capital internacional espanhol

(1985-2007). Tese de Doutorado em Educação: História, Política, Sociedade. São Paulo:

PUC/SP, 2007.

CASTANHEIRA, Maria Lúcia. Aprendizagem contextualizada: discurso e inclusão na sala

de aula. - 2ª ed. – Belo Horizonte: Ceale; Autêntica, 2004.

CORACINI, Maria José Rodrigues Faria. (Org.) Interpretação, autoria e legitimação do

livro didático: língua materna e língua estrangeira. – 1ª ed. – Campinas, SP: Pontes, 1999.

CORACINI, M. J. Apresentação. In: CORACINI, M. J. (Org.). Interpretação, autoria e

legitimação do livro didático. São Paulo: Pontes, 1999a. p. 11-14.

CORACINI, M. J. O livro didático nos discursos da Lingüística Aplicada e da sala de aula. In:

CORACINI, M. J. (org.). Interpretação, autoria e legitimação do livro didático. São Paulo:

Pontes, 1999b. p. 17-26.

CORACINI, M. J. O processo de legitimação do livro didático na escola de ensino

fundamental e médio: uma questão de ética. In: CORACINI, M. J. (org.). Interpretação,

autoria e legitimação do livro didático. São Paulo: Pontes,1999c. p. 33-43.

CORACINI, M. J. A redação no livro didático e na sala de aula: criatividade e avaliação. In:

CORACINI, M. J. (org.). Interpretação, autoria e legitimação do livro didático. São Paulo:

Pontes, 1999d. p. 143-151.

CORACINI, M. J. (Org.). Identidade e discurso: (des)construindo subjetividades. Campinas:

Argo, Unicamp, 2003.

Page 112: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

110

COSTA VAL, Maria da Graça. Atividades de Produção de Textos Escritos em Livros

Didáticos de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental. In Livro Didático de Língua Portuguesa,

Letramento e Cultura da Escrita. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2003. p. 125-152.

COUTO, R.M.S. Movimento Interdisciplinar de Designers Brasileiros em Busca de

Educação Avançada. 280 p. Tese (Doutorado em Educação), PUC/Rio, 1997.

CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Tradução de Viviane Ribeiro.

Bauru: EDUSC, 2002.

DIJK, Teun A. van. Discurso e poder. São Paulo: Contexto, 2008.

DIONÍSIO, Ângela Paiva & BEZERRA, Maria Auxiliadora (org.). O Livro Didático de

Português: múltiplos olhares. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

DOLZ, Joaquim & SCHNEUWLY, Bernardo e colaboradores. Gêneros orais e escritos na

escola. Campinas, SP: Mercado das Letras. 2004 (Coleção as Faces da Linguística Aplicada).

DOLZ, Joaquim. Produção escrita e dificuldades de aprendizagem. Tradução de Fabrício

Decândio e Anna Rachel Machado. Campinas, São Paulo: Mercado das Letras, 2010.

FAIRCLOUGH, N. Discourse and social change. Cambridge: Polity Press, 1992. Apud

TILIO, R. C. O livro didático de inglês em uma abordagem sócio-discursiva: culturas,

identidades e pós-modernidade. Tese de doutorado. Rio de Janeiro: PUC-Rio, Departamento

de Letras, 2006.

FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Brasília: UnB, 2001.

FIORIN, José Luiz. Linguagem e ideologia. São Paulo: Ática, 2007.

FOUCAULT. Michel. [1969]. A Arqueologia do Saber. Tradução de Luiz Felipe Baeta

Neves. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.

FOUCAULT. Michel. [1970]. A ordem do discurso. Aula inaugural no Collège de France,

pronunciada em 2 de dezembro de 1970. Título original: L‟ordre Du discours. Leçon

inaugurale au Collège de France prononcée le 2 decémbre 1970. Tradução de Laura Fraga de

Almeida Sampaio. São Paulo: Loyola, [1996] 2009.

FOUCAULT. M. [1979]. Microfísica do Poder. Tradução de Roberto Machado. 25ª edição.

Rio de Janeiro: Graal, [1979] 2008.

FLORENTINO, Adilson. Fundamentos da Educação1 para Licenciaturas. V.1. Rio de

Janeiro : Fundação CECIERJ, 2008.

FREITAG, Bárbara et al. O Livro Didático em Questão. 2ª edição. São Paulo: Cortez, 1993

FREITAG, Bárbara. Teorias da Cidade. Campinas: Papirus, 2006.

GRIGOLETTO, Marisa. Leitura e Funcionamento Discursivo do Livro Didático. In

DIONÍSIO, Ângela Paiva & BEZERRA, Maria Auxiliadora (org.). O Livro Didático de

Português: múltiplos olhares. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

Page 113: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

111

GUIMARÃES, Elisa. A articulação do texto. São Paulo: Ática, 2006.

HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. Tomaz Tadeu da Silva,

Guaracira Lopes Louro. 11. ed. Rio de Janeiro: DPeA, 2006.

HALLIDAY, M. A. K.; MATTHIESSEN, C. M. I. M., Introducion To Functional

Grammar. London: Arnold, third edition, 2004. Apud SOUZA, M. Medianeira.

Transitividade e construção de sentido no gênero editorial. Tese de Doutorado. Recife: UFPE,

Pós-graduação em Letras, 2006.

HALLIDAY, M. A. K. Language as social semiotic: the social interpretation of language

and meaning. London: Edward Arnold, 1978. Apud TILIO, R. C. O livro didático de inglês

em uma abordagem sócio-discursiva: culturas, identidades e pós-modernidade. Tese de

doutorado. Rio de Janeiro: PUC-Rio, Departamento de Letras, 2006.

JOUVE, Vincent. A leitura. Tradução Brigitte Hervor. São Paulo: Editora UNESP, 2002.

KOCH, Ingedore Villaça & ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender: os sentidos do texto.

São Paulo: Contexto, 2008

KLEIMAN, Angela. Texto e Leitor: Aspectos cognitivos da leitura. Campinas, SP: Pontes,

2008.

OLIVEIRA, Maria Marly de. Como fazer pesquisa qualitativa. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

ORLANDI, Eni Pulcinelli. Discurso e Leitura. São Paulo: Cortez, 2006.

ORLANDI, Eni Pulcinelli. Discurso e Texto: formulação e circulação dos sentidos.

Campinas, SP: EDIÇÃO Pontes Editores, 2008

MAINGUENEAU, Dominique. Gênese dos discursos. Tradução de Sírio Possenti. São

Paulo: Parábola, 2008.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Compreensão de texto: algumas reflexões. In: DIONÍSIO,

Ângela Paiva & BEZERRA, Maria Auxiliadora (org.). O Livro Didático de Português:

múltiplos olhares. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São

Paulo: Parábola Editorial, 2008.

MOITA LOPES, L.P. Pesquisa interpretativista em Linguística Aplicada: a linguagem como

condição e solução. D.E.L.T.A, v.10, n. 2, pp. 329 a 338, 1994.

MOITA LOPES, Luís Paulo da. Identidades Fragmentadas: A construção discursiva de

raça, gênero e sexualidade na escola. Campinas: Mercado de Letras , 2002

MOITA LOPES, Luís Paulo da. Por uma linguística Aplicada Indisciplinar. Branca Fabrício...

(et al); organizador Luiz Paulo da Moita Lopes. – São Paulo: Parábola Editorial, 2006.

MONTEIRO, A. M.(org); ALBUQUERQUE, L.S.; LAGES, P.A.; ALMEIDA, W. M.

Educação para diversidade e cidadania. Recife: Ed. do Organizador, 2007.

Page 114: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

112

RANGEL, Egon de Oliveira. Livro Didático de Língua Portuguesa: o retorno do recalcado.

In: DIONÍSIO, Ângela Paiva & BEZERRA, Maria Auxiliadora (org.). O Livro Didático de

Português: múltiplos olhares. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

RAJAGOPALAN, Kanavillil. Por uma linguística crítica: linguagem, identidade e questão

ética. São Paulo: Parábola Editorial; 2003.

RESENDE, V. M. & V. RAMALHO. Análise de Discurso Crítica. São Paulo: Contexto,

2006.

RESENDE, Viviane de Melo. Análise de discurso crítica e realismo crítico: implicações

interdisciplinares. Campinas, São Paulo: Pontes, 2009.

RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa Social: métodos e técnicas. 2.ª ed. São Paulo:

Atlas, 1989.

ROUANET, Sérgio Paulo. Mal-Estar na Modernidade. São Paulo: Companhia das Letras,

1993.

SACRISTÁN, José Gimeno. Os “inventores” da educação. E como nós apreendemos. In:

SEBARROJA, Jaume Carbonell et al. (org.). Pedagogias do século XX. Porto alegre:

Artmed,2003.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Modernidade, identidade e a cultura de fronteira. In:

Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo : Cortez, 2000.

SANTOS FILHO, José Camilo dos & GAMBOA, Sílvio Sánchez (org.). Pesquisa

educacional: quantidade-qualidade. São Paulo: Cortez, 2007.

SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do

currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.

SOARES, Magda. Linguagem e Escola: Uma perspectiva social. São Paulo : Ática, 2008.

SOBRAL, Adail. Filosofias (e filosofia) em Bakhtin. In: BRAIT, Beth (org.). Bakhtin:

conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2008.

SOUZA, M. Medianeira. Transitividade e construção de sentido no gênero editorial. Tese

de Doutorado. Recife: UFPE, Pós-graduação em Letras, 2006.

TEIXEIRA, Anísio. Educação e universidade. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1998.

TILIO, R. C. O livro didático de inglês em uma abordagem sócio-discursiva: culturas,

identidades e pós-modernidade. Tese de doutorado. Rio de Janeiro: PUC-Rio, Departamento

de Letras, 2006.

TRINDADE, Azoilda Loreto da. & SANTOS, Rafael dos. (orgs.). Multiculturalismo: mil e

uma faces da escola. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

VELHO, Gilberto. Projeto e Metamorfose. Antropologia das Sociedades Complexas. Rio de

Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003.

Page 115: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

113

WITTGENSTEIN, Ludwig.[1921]. Tratado Lógico-Filosófico.. Jose Arthur Giannotti

[Trad.].Tractatus logico-philosophicus. Traduzido do original: LOGISCH-

PHILOSOPHISCHE ABHANDLUNG. São Paulo: Companhia N., 1968. 152 p.

http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/portugues.pdf . PCN de Língua Portuguesa – 3º e 4º

ciclo. Acessado aos 02 de fevereiro de 2010.

www.fnde.gov.br/index.php/pnld-guia-do-livro-didático. Sobre o PNLD, em geral, e PNLD

2011. Acessado aos 02 de agosto de 2010.

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=13455:decretoinsti

tucionaliza-os-programas-do-livro-do-mec&catid=318. Decreto institucionaliza os Programas

do Livro do MEC. Acessado aos 02 de agosto de 2010.

http://www.scribd.com/full/36974003?access_key=key-3cc387obntpy8sx4ezd. Tese de

Doutorado. COUTO, Rita Maria de Souza. Sobre Designers e Interdisplinaridade. Acessado

aos 10 de setembro de 2010.

Obra analisada: CEREJA, William Roberto & MAGALHÃES, Thereza Cochar.

Português: Linguagens. Vols. do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental II. (5ª edição

reformulada). São Paulo: Atual Editora, 2009.

Page 116: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

114

ANEXOS Devido a se tratarem de vários arquivos em PDF, que são todos os textos e atividades que

foram trabalhados nesta dissertação de mestrado, informamos que tais anexos constam de um

CD, devidamente identificado e anexado ao presente trabalho.

Obs.: Para título de exemplificação acerca dos arquivos mencionados acima, eis o primeiro

texto e atividades interpretativas, do capítulo um, do livro destinado ao sexto ano e que

também consta do CD-ROM:

Page 117: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

115

Page 118: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

116

Page 119: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

117

Page 120: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

Livros Grátis( http://www.livrosgratis.com.br )

Milhares de Livros para Download: Baixar livros de AdministraçãoBaixar livros de AgronomiaBaixar livros de ArquiteturaBaixar livros de ArtesBaixar livros de AstronomiaBaixar livros de Biologia GeralBaixar livros de Ciência da ComputaçãoBaixar livros de Ciência da InformaçãoBaixar livros de Ciência PolíticaBaixar livros de Ciências da SaúdeBaixar livros de ComunicaçãoBaixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNEBaixar livros de Defesa civilBaixar livros de DireitoBaixar livros de Direitos humanosBaixar livros de EconomiaBaixar livros de Economia DomésticaBaixar livros de EducaçãoBaixar livros de Educação - TrânsitoBaixar livros de Educação FísicaBaixar livros de Engenharia AeroespacialBaixar livros de FarmáciaBaixar livros de FilosofiaBaixar livros de FísicaBaixar livros de GeociênciasBaixar livros de GeografiaBaixar livros de HistóriaBaixar livros de Línguas

Page 121: Universidade do Grande Rio “Professor José de Souza Herdy ...livros01.livrosgratis.com.br/cp155017.pdf · formada por quatro volumes e o nosso recorte se faz em torno dos textos

Baixar livros de LiteraturaBaixar livros de Literatura de CordelBaixar livros de Literatura InfantilBaixar livros de MatemáticaBaixar livros de MedicinaBaixar livros de Medicina VeterináriaBaixar livros de Meio AmbienteBaixar livros de MeteorologiaBaixar Monografias e TCCBaixar livros MultidisciplinarBaixar livros de MúsicaBaixar livros de PsicologiaBaixar livros de QuímicaBaixar livros de Saúde ColetivaBaixar livros de Serviço SocialBaixar livros de SociologiaBaixar livros de TeologiaBaixar livros de TrabalhoBaixar livros de Turismo