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Universidade do Estado do Rio de Janeiro Centro Biomédico Faculdade de Enfermagem Guilherme de Moraes Nascimento Riscos no trabalho do Agente Comunitário de Saúde na perspectiva da saúde do trabalhador Rio de Janeiro 2009

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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Centro Biomédico

Faculdade de Enfermagem

Guilherme de Moraes Nascimento

Riscos no trabalho do Agente Comunitário de Saúde

na perspectiva da saúde do trabalhador

Rio de Janeiro

2009

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Guilherme de Moraes Nascimento

Riscos no trabalho do Agente Comunitário de Saúde

na perspectiva da saúde do trabalhador

Dissertação apresentada, como requisito parcial

para obtenção do título de Mestre, ao Programa

de Pós-Graduação em Enfermagem, da

Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Área de concentração: Enfermagem, Saúde e

Sociedade.

Orientadora: Profª. Drª. Helena Maria Scherlowski Leal David

Rio de Janeiro

2009

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CATALOGAÇÃO NA FONTE

UERJ/REDE SIRIUS/CBB

Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta

dissertação.

________________________________________ _________________________

Assinatura Data

N17 Nascimento, Guilherme de Moraes.

Riscos no trabalho do Agente Comunitário de Saúde na perspectiva da

saúde do trabalhador / Guilherme de Moraes Nascimento. - 2009.

104 f.

Orientadora: Helena Maria Scherlowski Leal David.

Dissertação (mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro,

Faculdade de Enfermagem.

1. Enfermagem em saúde comunitária. 2. Riscos ocupacionais. 3.

Cuidados primários de saúde. 4. Saúde e trabalho. I. David, Helena Maria

Scherlowski Leal. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Faculdade

de Enfermagem. III. Título.

CDU

614.253.5

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Guilherme de Moraes Nascimento

Riscos no trabalho do agente comunitário de saúde

na perspectiva da saúde do trabalhador

Dissertação apresentada, como requisito parcial para

obtenção do título de Mestre, ao Programa de Pós-

Graduação em Enfermagem, da Universidade do

Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração:

Enfermagem, Saúde e Sociedade.

Aprovada em 23 de março de 2009.

Banca Examinadora:

__________________________________________________

Prof.ª Drª. Helena Maria Scherlowski Leal David (Orientadora)

Faculdade de Enfermagem da UERJ

_________________________________________________

Prof. Dr. Regina Célia Gollner Zeitoune

Escola de Enfermagem Anna Nery / UFRJ

_________________________________________________

Prof. Dr. Maria Ivone Chaves Mauro

Faculdade de Enfermagem da UERJ

Rio de Janeiro

2009

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos Agentes Comunitários de Saúde, os verdadeiros agentes, que

possuem a grande missão de transformas a realidade de saúde da população brasileira.

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AGRADECIMENTOS

A minha mãe Enaura Maria de Moraes Nascimento (in memorian).

A Profª. Drª. Helena Maria Scherlowski Leal David, minha orientadora por sua

paciência e colaboração, fundamentais para a conclusão deste trabalho.

Aos Agentes Comunitários de Saúde, pela confiança em mim depositada, que resultou

neste trabalho.

A minha esposa Jaciara Rangel Crespo Nascimento, pelo amor e compreensão nos

longos períodos de ausência e confiança, que me fizeram acreditar que tudo ainda era

possível.

Ao meu pai Carlos Alberto, que sempre me ensinou a ser firme na busca pelos

objetivos.

Aos meus irmãos Carlos Leonardo e Elaine Cristina, pela preocupação, compreensão e

disponibilidade nas horas mais difíceis, sempre um ombro amigo quando mais precisava.

A minha “Segunda Mãezinha” Maria Izabel Gonçalves Saldanha, por sua confiança

que me fortaleceram e incentivaram em todos os momentos.

A bibliotecária Kalina, pela colaboração e paciência em me ajudar na fase de

formatação, mesmo em situação de doença.

A todos que direta ou indiretamente colaboraram para que eu pudesse completar mais

esta etapa da minha caminhada.

A todas as pedras que surgiram no caminho, pois sem elas não seria possível esta

construção.

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Mas por onde eu deveria começar? O mundo é tão vasto, começarei com o meu país,

que é o que conheço melhor. Meu país, porém é tão grande. Seria melhor começar com

minha cidade. Mas minha cidade também é grande. Seria melhor começar com a minha rua.

Não: minha casa. Não: minha família. Não importa, começarei comigo mesmo.

Elie Wiesel

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RESUMO

NASCIMENTO, Guilherme de Moraes. Riscos no trabalho do Agente Comunitário de

Saúde na perspectiva da saúde do trabalhador. 2009. 104f. Dissertação (Mestrado em

Enfermagem)-Faculdade de Enfermagem, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de

Janeiro, 2009.

Este estudo tem como objetivo identificar e discutir condições e riscos no trabalho dos

Agentes Comunitários de Saúde que atuam em uma Área Programática da cidade do Rio de

Janeiro. O referencial teórico foi o da saúde do trabalhador, e as normativas relativas à

formação do ACS e de seu processo de profissionalização. O estudo foi realizado em equipes

que atuam em duas comunidades, por meio de um estudo de observação sistemática, não-

participante, utilizando um roteiro prévio com conteúdo de riscos ocupacionais. Os dados

foram coletados a partir do acompanhamento de 23 ACS que realizaram 74 visitas domiciliares

nos meses de março a junho de 2008, e organizados sob a forma de um diário de campo

descritivo. A organização e análise basearam-se na abordagem qualitativa da análise de

conteúdo. Os resultados são apresentados e discutidos segundo a seguinte organização: i)

atividades realizadas pelos ACS; ii) comparação entre atividades prescritas e atividades reais e

iii) principais riscos identificados e suas possíveis repercussões na saúde do ACS. Nas

considerações finais, são discutidas as implicações para o SUS e para a enfermagem, que tem

supervisionado os ACS, e a importância de se aprofundar, por meio de estudos posteriores, as

situações e condições de trabalho desenvolvido na Atenção Básica.

Palavras-chave: Riscos no trabalho. Atenção primária à saúde. Enfermagem em saúde

comunitária.

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ABSTRACT

This study aims to identify and discuss occupational risks and word conditions on

Community Health Agents (CHA) that work in an area of Rio de Janeiro city. Theoretical

discussion was based on worker’s health field, and on educational and profesional legislation.

The research was carried on two communities, using systematic, non-participant observation,

and a previous guideline with occupational risks content. Data collection was developed by

observation of 23 CHA that made 74 domiciliary visits from March to July of 2008, and

organized in a descriptive diary. Organization and analysis were based on Content Analysis

technique. Results are presented and discussed as follows: i) activities developed by HCA; ii)

comparison between prescribed and real activities and iii) main occupational risks identified

and their possible repercussions on worker’s health. In final considerations, implications to

health care system and nurses that supervise the HCA are discussed, as also the necessity to

develop further studies to analyze work conditions and situation in Primary Health Care level.

Keywords: Occupational risks. Primary health care. Community health nursing.

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Riscos ocupacionais, segundo a classificação das Normas

Regulamentadoras...........................................................................................

30

Quadro 2 - Competências, habilidades e conhecimentos requeridos para o trabalho de

ACS – Departamento de Gestão e Educação na Saúde

(MS)................................................................................................................

36

Quadro 3 - Observação dos Riscos de Trabalho dos ACS................................................

49

Quando 4 - Trabalho Real – atividades observadas / informadas pelos ACS................... 53

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABV Alto da Boa Vista

ACS Agente comunitário de saúde

AP Área Programática

AVE Acidente vascular encefálico

CAP Coordenação de área programática

CO Monóxido de carbono

CO 2 Dióxido de carbono /gás carbônico

DORT Doenças osteoarticulares relacionadas ao trabalho

DT Difteria e tétano

ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

EPI Equipamento de proteção individual

FAPERJ Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro

FENF Faculdade de Enfermagem

FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz

GM Gabinete Ministerial

GAT Grupo de Apoio Técnico

INAMPS Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social

INSS Instituto Nacional de Seguro Social

LER Lesão por esforço repetitivo

MS Ministério da Saúde

MTE Ministério do Trabalho e Emprego

NR Norma Regulamentadora

OMS Organização Mundial de Saúde

ONG Organização não governamental

OS Ordem de serviço

PAB Piso de Atenção Básica

PACS Programa de Agentes Comunitários de Saúde

PCMSO Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional

PNACS Programa Nacional de Agentes Comunitários de Saúde

PPRA Programa de Prevenção de Riscos Ambientais

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Pq VI Parque Vila Isabel

PSF Programa de Saúde da Família

RN Recém nascido

SIAB Sistema de Informação da Atenção Básica

SMS Secretaria Municipal de Saúde

SSA Situação de Saúde da Área

SUDS Sistema Único Descentralizado de Saúde

SUS Sistema Único de Saúde

UBS Unidade Básica de Saúde

UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro

UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

VD Visita Domiciliar

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SUMÁRIO

1

1.1

1.2

1.3

1.4

2

2.1

2.2

2.3

2.4

2.5

3

3.1

3.2

3.2.1

3.2.2

3.2.3

3.3

4

INTRODUÇÃO..............................................................................................................

REFERENCIAL TEÓRICO........................................................................................

O Trabalho e o Trabalho na Saúde.............................................................................

O Trabalho e seus Impactos na Saúde dos Trabalhadores........................................

O Agente Comunitário de Saúde e seu Trabalho.......................................................

Trabalho Prescrito, Trabalho Real e Riscos no Trabalho do ACS...........................

METODOLOGIA..........................................................................................................

Abordagem Metodológica.............................................................................................

Sujeitos e Cenários da Pesquisa....................................................................................

Coleta de Dados..............................................................................................................

Organização e Análise dos Dados.................................................................................

Procedimentos Éticos.....................................................................................................

RESULTADOS E DISCUSSÃO...................................................................................

Atividades Desenvolvidas pelos ACS...........................................................................

Comparação entre o Trabalho Prescrito e o Trabalho Real dos ACS......................

Atividades Prescritas e Realizadas..................................................................................

Atividades Não Prescritas e Realizadas...........................................................................

Atividades Prescritas e Não Realizadas...........................................................................

Riscos Observados no Trabalho dos ACS...................................................................

CONCLUSÕES..............................................................................................................

REFERÊNCIAS.............................................................................................................

APENDICE A - Termo de consentimento livre e esclarecido.......................................

APÊNDICE B - Parecer do Comitê de Ética da SMS-RJ..............................................

ANEXO - Parecer prévio do Comitê de Ética da UERJ.................................................

13

21

21

25

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45

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51

52

52

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61

66

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INTRODUÇÃO

Este relatório de dissertação baseia-se em estudo que tem como objeto os riscos à

saúde no trabalho de Agentes Comunitários de Saúde, e insere-se, como subprojeto, no

Projeto de Pesquisa Abordagem Interdisciplinar das Novas Relações e Processos de Trabalho

em Saúde: o Caso dos Agentes Comunitários de Saúde, sob Coordenação da Profª Drª Helena

Maria Scherlowski Leal David. Este projeto é desenvolvido pelo grupo de pesquisa

Configurações do Mundo do Trabalho, Saúde dos Trabalhadores e Enfermagem do CNPq,

com apoio financeiro do Fundo de Amparo a Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro

(FAPERJ) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Ao longo da minha formação e da vida profissional, as oportunidades de trabalho e

afinidade voltavam-se para o cuidado e assistência ao cidadão hospitalizado, que já possui um

acometimento, que na maioria das vezes são conseqüência à evolução ou agravamento de

doenças crônicas como hipertensão arterial e diabetes. Mesmo atuando em nível terciário de

assistência, fui formado com a preocupação do bem-estar e da saúde da população,

consciente que para transformar a realidade de saúde é necessário investir intelectualmente e

materialmente na prevenção das doenças antes que elas ocorram ou de forma a evitar que elas

se agravem.

Para a transformação da prioridade assistencial preventiva de saúde é necessária a

criação de uma política preventiva e de estratégias eficiente para garantir o acesso da

população, sua participação ativa nesse processo de forma a possibilitar a implementação

plena das diretrizes e dos princípios do SUS, como a universalidade, equidade e participação.

No ano de 2007 fui eleito Conselheiro Distrital de Saúde pela Área Programática (AP) 3.3,

zona norte do Rio de Janeiro, participando de diversas discussões políticas sobre as

necessidades de saúde da região representando os trabalhadores do Hospital em que trabalho

no município. Através das discussões com os profissionais de saúde de diversas unidades

participantes, representantes populares (presidentes de associações de moradores, ONG,

representantes sindicais, entre outros) e gerentes de instituições e da Coordenação de Área

Programática (CAP), percebi que a estratégia da saúde da família, apesar das deficiências,

seria a melhor estratégia.

Ao longo dos anos de consolidação do Sistema Único de Saúde- SUS, foram

desenvolvidas algumas propostas para promover a saúde da população no ambiente onde

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reside, dessa forma possibilitando conhecer e atuar sobre a real necessidade daquele grupo na

busca de evitar o desenvolvimento de doenças em pessoas saudáveis e recuperar a saúde das

pessoas já doentes ou evitar seus agravos, nas situações de doenças crônicas. Bertussi e

Oliveira (2001) referenciam como novas práticas de atenção à saúde em substituição do

modelo vigente o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e o Programa de

Saúde da Família (PSF). Inicialmente funcionariam como programas e posteriormente sendo

assumidos como política pública estratégica de assistência à saúde da população, e estariam

sintonizadas com os princípios do SUS.

Para a implementação destas propostas político-assistenciais à saúde, fez-se

necessário a criação de uma nova categoria profissional: o Agente Comunitário de Saúde

(ACS), que cuja característica é ser membro da comunidade contemplada pelo serviço,

atuando como um responsável pela intermediação entre os profissionais de saúde e a

comunidade (MERCADANTE, 2002, p.264).

O trabalho do ACS tem sido objeto de análise que para David (2008) visam expressar

as contradições inerentes a uma prática social não consolidada como profissão, que nasce de

pressupostos de reorganização de serviços e sistemas de saúde baseados em políticas

internacionais desenvolvidas ainda nas décadas de 70 e 80. David (2001) descreve que no

Brasil, o ACS iniciou seu trabalho como um membro da comunidade em interlocução com os

serviços, geralmente vinculado a projetos comunitários de mobilização local. Já no âmbito da

consolidação do SUS e da expansão da proposta do PSF, o ACS foi incorporado a esta

proposta, por meio de uma política de profissionalização cheia de avanços e retrocessos, e

ainda em curso.

Bornstein (2007) aprofunda a discussão do ponto de vista da mediação do ACS,

quando disserta sobre o fato do ACS ser ao mesmo tempo, um membro da comunidade e um

trabalhador da saúde. Este fato pode ser um facilitador para a relação dos serviços com a

população, e por vezes pode incorporar uma postura baseada exclusivamente no saber

biomédico, se distanciando da comunidade e não conseguindo atingir o objetivo de

sensibilização e participação da população.

Os profissionais que atuam na estratégia de saúde da família (ESF), principalmente os

ACS, possuem o objetivo de realizar a busca ativa dos problemas referentes à população no

foco onde ele ocorre na casa das pessoas. Mesmo com as deficiências da estratégia, tenta dar

uma solução ou encaminhamento para a solução dos problemas e, conseqüentemente,

colaborando dignamente para o desafogamento dos ambulatórios e dos hospitais de

emergência com situações de saúde preveníveis.

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Refletindo sobre esta estratégia de saúde, compreendi que o profissional-chave para o

sucesso deste tipo de serviço de saúde é o agente comunitário de saúde. Além de ser um

membro da comunidade e, portanto, identificar-se com ela na cultura e na linguagem, pode

sensibilizar os moradores com sua atuação compromissada, tornando as informações mais

acessíveis e facilitando o processo de transformação. Além disso, como afirma Bornstein

(2007), trata-se de um mediador importante para que os serviços possam compreender a

lógica da produção da saúde da comunidade.

Sendo o ACS um trabalhador fundamental para a efetiva implementação das diretrizes

e princípios do SUS, e para a transformação da realidade, existe a necessidade em conhecer

melhor como se desenvolve o seu trabalho e quais são os riscos que o envolve. Independente

de seu processo de profissionalização, o ACS é um trabalhador, precarizado ou não, cujo

trabalho se dá em condições pouco estáveis e conhecidas, e que variam muito de acordo com

diversos fatores como geográficos, sócio-políticos e econômicos. No entanto, David (2008)

considera que se trata de um trabalho realizado por meio de atividades que podem expor o

ACS a riscos diversos, e deveriam ser classificados como riscos ocupacionais, já que estão

inseridos no seu ambiente, processo e condições de trabalho.

O risco no trabalho pode ser compreendido como a possibilidade de causar danos

físicos ao acidentado ou materiais para a empresa, mas com enfoque na saúde do trabalhador,

Marin (2000) considera o risco laboral como a possibilidade de perder a saúde devido às

condições que se desenvolvem o trabalho.

Brasil (1994) descreve uma definição normativa dos riscos a partir da exposição a

agentes físicos, químicos e biológicos capazes de causar danos à saúde do trabalhador, seja

pela natureza, concentração ou exposição. Além desses riscos de exposição, Vieira (1995)

complementa discutindo os riscos potenciais de causar danos ao trabalhador, como o trabalho

físico pesado, a monotonia, trabalho em turnos e noturno, atenção e responsabilidade,

treinamento inadequado e ritmo de trabalho.

Importante ressaltar que na condição de enfermeiro, possuo um cargo de liderança

frente à equipe de trabalho. Esta realidade não é diferente nas unidades de PSF, onde os

enfermeiros assumem a liderança e supervisão dos ACS e dos profissionais técnicos de

enfermagem, organizar e supervisionar o seu trabalho, preocupa-se com as condições em que

são realizados, inclusive os riscos, sofrimentos, desgastes e adoecimentos, sendo fundamental

para sua atuação.

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Com base nestes pressupostos, o presente estudo apresenta uma análise do trabalho do Agente

Comunitário de Saúde, na perspectiva da saúde do trabalhador e da enfermagem, com foco

nas atividades cotidianas e nos riscos existentes no seu trabalho.

O Agente Comunitário de Saúde é um trabalhador da saúde, e sua profissão,

regulamentada no âmbito exclusivo do Sistema Único de Saúde. Apesar dos avanços quanto

às políticas de profissionalização e regulação, sabe-se que seu processo de trabalho é

extremamente diversificado e amplo, com freqüência é contraditório e ambíguo, e tende a

extrapolar as atribuições definidas pelas normas.

Os problemas identificados no cotidiano de trabalho dos profissionais ACS incluem:

desde a precarização nas modalidades de contratação, forte influência política local, baixo

salário, falta de reconhecimento pela própria comunidade, dificuldades na relação com os

serviços de saúde fora de sua Unidade Básica de atuação (módulo); até as tensões entre as

demandas da comunidade e dos serviços, e exposição a riscos diversos de trabalho, como já

publicados nos trabalhos de David (2008) e Nascimento e David (2008).

Com toda a variabilidade do seu trabalho, o agente comunitário recebe da gerência

direta a responsabilidade de participar de ações na comunidade e assumir ações que muitas

vezes não são de sua competência de trabalho, havendo uma sobrecarga de demanda de

funções sobre o trabalho prescrito que não deveria assumir. Nesse sentido, atividade de

trabalho é composta pela tarefa prescrita, formalmente definida (formal), que neste caso é

composta pelo perfil de competências dos ACS. E pela tarefa real (efetivamente realizada),

que consiste nos instrumentos utilizados para realização da tarefa (recursos materiais e

equipamentos) e o posto de trabalho, que representa o ambiente ou local onde a tarefa é

realizada (ABRAHÃO, 2004, p.63).

Para um bom desempenho das atividades laborais, são necessárias condições e

ambiente de trabalho favorável. Sabendo-se que a função social do ACS é atuar como um

mediador entre os profissionais de saúde e a comunidade, pode-se inferir que diversos são os

problemas e dificuldades que precisa enfrentar, tais como: as precárias condições de

segurança, violência que marca os grandes centros urbanos do Brasil, dificuldade de

afirmação e legitimação como categoria profissional e problemas relativos à instabilidade nas

condições do ambiente onde trabalha junto à comunidade.

Este trabalhador tem sob sua responsabilidade uma quantidade de famílias que

deverão ser assistidas em todas as situações de saúde, desde o planejamento familiar, ao

acompanhamento da gestação, crescimento e desenvolvimento da criança e a velhice. Deverá

realizar cuidados na prevenção de doenças, acompanhamento do tratamento em situações

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onde a doença já está instalada, referencia aos profissionais, ao módulo do PSF /PACS de

atuação ou outras unidades de saúde.

Para atender a todas essas situações de saúde e doença das famílias, este trabalhador

lança-se em campo de trabalho, na comunidade, tornando-se exposto a riscos ocupacionais

como os citados por Trindade (2007) e Bornstein (2007): como longas caminhadas, carregar

peso, exposição à radiação solar, inalação de poeiras orgânicas e inorgânicas, rigidez

organizacional, amplitude de trabalho, entre outros.

Deve-se acrescentar ainda que o trabalho do ACS em áreas rurais difere do executado

em áreas urbanas, como é o caso da cidade do Rio de Janeiro. Esta diversidade de espaços e

locais de trabalho, aliada à variabilidade no trabalho do ACS impõe a necessidade de estudos

que busquem avaliar como se dão as atividades cotidianas, na perspectiva de sua saúde como

trabalhador.

Objeto e Problema do Estudo

Definiu-se como objeto do presente estudo a saúde do trabalhador ACS, a partir do

enfoque de riscos ocupacionais. Na busca de compreender melhor esta temática, emergiu a

seguinte questão norteadora: quais são os riscos presentes no trabalho do ACS?

Existem hoje no Brasil mais de 200 mil ACS, e a abordagem da saúde deste

trabalhador ainda é considerada por David (2008) e Trindade (2007) incipiente. As

contradições inerentes a uma profissão que existe apenas no âmbito do SUS, não consolidada

do ponto de vista social e jurídico-normativo evidenciam-se no seu processo de trabalho, que

é discutido, pela variabilidade e pela sobrecarga de funções e atividades.

Segundo os critérios utilizados por Freidson (1996) para definir profissão, e que

incluem o monopólio do mercado de trabalho, autonomia e autoridade sobre a atividade

realizada, não se pode considerar o ACS como um profissional. No entanto, as normativas

que regulamentam, até agora o trabalho do ACS, se referem a este trabalhador como

profissional (BRASIL, 2003, p.10), evidenciando uma contradição entre o nível jurídico-

normativo e a legitimação do trabalho como prática social.

Ainda assim há um investimento importante, em termos de políticas públicas, com

foco neste trabalhador. Atualmente, desenvolve-se uma política de formação que já incorpora

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as novas diretrizes curriculares para o nível médio, alocando no âmbito das Escolas Técnicas

do SUS de todos os Estados brasileiros a responsabilidade por sua formação (BRASIL, 2003.

p.05). Ou seja, por um lado, há um investimento governamental para sua formação e avanço

no processo de consolidação profissional, e por outro, verifica-se que existem muitas

contradições no seu trabalho, como encontrados no trabalho de Bornstein e Stotz (2007) e

que não são bem conhecidas as condições de trabalho e os riscos ocupacionais como a que

possam estar expostos, encontrado nos trabalhos de Trindade (2007) e Nascimento e David

(2008) .

Com base na questão norteadora, para a busca de melhor compreensão do objeto,

foram delimitados para este trabalho os seguintes objetivos:

Objetivos:

Objetivo Geral

Identificar e discutir, a partir das atividades de trabalho, os riscos a que estão expostos

os ACS de uma Área Programática da cidade do Rio de Janeiro, e suas possíveis implicações

na saúde deste trabalhador.

Objetivos Específicos:

Observar e descrever as atividades realizadas por um grupo de ACS de uma Área

Programática da cidade do Rio de Janeiro;

Comparar as atividades reais com as atividades prescritas para o ACS, a partir das

competências do seu referencial curricular;

Identificar, nas atividades realizadas, problemas e riscos presentes no trabalho do ACS;

Discutir as atividades prescritas, as atividades reais, os riscos identificados, e as

implicações para a saúde deste trabalhador.

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Justificativa:

A profissionalização do ACS é recente. Esta categoria profissional foi criada, no

âmbito do SUS, pelo Ministério da Saúde, para a implementação dos programas políticos de

assistência à saúde. Teve inicio em 1991, com a criação do Programa Nacional de Agentes

Comunitários de Saúde (PNACS), posteriormente denominado Programa de Agentes

Comunitários de Saúde (PACS) em 1992; e em 1994 inicia-se a implantação do Programa de

Saúde da Família, incorporando os ACS na sua equipe. Os mesmos atuam sob

responsabilidade e supervisão dos enfermeiros, sendo estes responsáveis pela organização e

planejamento das suas tarefas, contudo, ainda conhece-se muito pouco sobre os riscos que

estes profissionais estão expostos.

Importante ressaltar que segundo dados do Ministério da Saúde (2008), pelos dados

do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde - CNES, em dezembro de 2008, havia

230.244 ACS atuantes em PACS e PSF no Brasil, sendo de fundamental importância para a

consolidação e funcionamento das unidades que utilizam estes profissionais. Possuem a

missão social definida pelo Ministério da Saúde, são identificados com a comunidade por

aproximar-se dos mesmos valores, costumes e linguagem, desempenham um papel de

liderança para a melhoria das condições de vida através de ações políticas, educativas e

preventivas junto à comunidade. Segundo Souza (2001), apoiado pela ação governamental,

torna-se hoje um elemento indispensável para a consolidação do SUS.

O enfermeiro é o profissional que tem assumido a tarefa de organizar e supervisionar

o trabalho dos ACS. No entanto, no âmbito das atribuições profissionais do enfermeiro, o

ACS não é integrante da equipe de enfermagem, evidenciando outra contradição importante,

e que precisa ser enfrentada. Assim, este trabalho deverá trazer como contribuição a

identificação e discussão sobre as atividades de trabalho do ACS e as implicações para a

saúde do trabalhador, o que, indiretamente, afeta a enfermagem, como o principal apoiador,

na prática do trabalho do ACS.

Ainda que a questão da regulação profissional e da responsabilidade ético-jurídica do

enfermeiro não seja objeto do presente estudo, entendemos ser relevante para a enfermagem,

por ampliar a compreensão sobre o trabalho em saúde coletiva; e sobre os riscos a que estão

expostos os profissionais que trabalham dentro da comunidade, favorecendo o

desenvolvimento do trabalho seguro e saudável.

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Os achados deste trabalho poderão trazer como subsídios, elementos para a gestão do

trabalho de modo compreensivo, humanizado e preocupado efetivamente com a saúde dos

trabalhadores que poderão, de fato, transformar o modelo de assistência na atenção básica.

Esperamos, ainda, que a realização deste trabalho contribua para o enriquecimento de

conhecimentos na área da saúde do trabalhador da saúde em atenção básica, tendo em vista a

escassez de informações publicadas nesta área e a importância destes profissionais para a

implementação do SUS.

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1 REFERENCIAL TEÓRICO

1.1 O Trabalho e o Trabalho na Saúde

O trabalho existe na humanidade desde a existência do homem, quando buscava a

aquisição de alimentos e a construção de abrigos para a sobrevivência e proteção frente às

dificuldades impostas pela natureza, porém, segundo Haag (2007), as doenças permaneceram

ignoradas até o século XVIII.

No mundo moderno, as formas de exploração da mão-de-obra ocorreram

principalmente após a revolução industrial, através das grandes e extenuantes jornadas de

trabalho, adaptação do homem à máquina, em ambientes desfavoráveis, com a aglomeração

de trabalhadores, e entre eles mulheres e crianças, o que favorece a proliferação de doenças

infectocontagiosas (GOMES; COSTA, 1997).

Liedke (2002) destaca duas dimensões abstratas do trabalho, que significa

simplesmente o esforço realizado, como energia despendida pelos seres humanos, animais,

máquinas, em que o resultado é a transformação da natureza, produção, manutenção e

modificação de bens ou serviços necessários à sobrevivência. No trabalho exclusivamente

humano, adiciona-se o elemento mental que acompanha, permeia e colabora com o trabalho

em todas as suas etapas de realização produtiva. Seguindo este pensamento, o trabalho é

referido por Marx (1968) como sendo a atividade resultante do dispêndio de energia física e

mental que estaria direcionada direta ou indiretamente para a produção de bens e serviços,

contribuindo dessa forma para a reprodução da vida humana individual e social.

Entretanto, na sociedade capitalista o trabalho é compreendido como sendo uma

mercadoria passível de negociação e compra, adquirindo aspectos de mercadoria

propriamente dita, participando inclusive do processo de acumulação de riqueza através da

exploração para a aquisição da mais valia. Dessa forma, Liedke (2002) identifica que nesse

tipo de sociedade o trabalho possui um caráter duplo: concreto, quando o trabalho produz um

bem de utilidade para o mercado, adquirindo um valor “seco” sobre a utilização qualitativa do

trabalho; a utilidade pura e simples do trabalho e seu produto. E abstrato, que está relacionado

não simplesmente ao custo do material e da mão-de-obra agregada ao produto, mas

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corresponde ao valor de troca da mercadoria independente das variações e características

particulares do ofício.

Nesse contexto podemos, por exemplo, realizar uma comparação entre o trabalho de

dois profissionais, onde um possui um valor agregado e o outro apenas o valor de uso do seu

trabalho: o pintor. O pintor de paredes, ou de carros cobra sobre sua mão-de-obra

simplesmente pelo seu trabalho de pintura, mas “artista”, mais que um mero técnico da

pintura, possui subjetividade na valorização do seu trabalho, algo intelectual e magnífico que

o torna diferenciado. Nesse caso, a mercadoria do artista, mesmo não tendo aparentemente

uma utilidade real, possui um valor abstrato agregado que o torna especial.

Utilizando o imaginário e a subjetividade, o mercado faz os consumidores acreditarem

no valor abstrato também dos produtos, tornando-os mais valiosos que seu valor de utilidade

real e as pessoas pagam simplesmente na fantasia de manter um “status”, como citado no

texto de Marx (1968): “qualidade de trabalho humano”.

O trabalho foi incorporado pela ideologia burguesa, como sendo o responsável por

toda a vida social, não levando em consideração o contexto histórico da produção e troca de

valores, do seu uso, necessária a reprodução da vida social.

No período das grandes navegações, ocorreu o desenvolvimento do processo

capitalista, e Marin (2000) observa que a burguesia cria uma ruptura no entendimento entre

trabalho e não trabalho (relativo aos períodos de ócio e de lazer), levando a uma separação das

esferas relativas à vida doméstica, vida social e vida pública. A divisão social do trabalho

define funções para homens e mulheres e torna naturalmente aceito, onde o trabalho

remunerado adquire status de emprego e é ocupado primordialmente pelos homens e as

tarefas do lar permaneciam de natureza feminina.

O trabalho passa a ser associado ao emprego, como função na ou para a produção,

tornando-se significativamente importante para o desenvolvimento emocional, ético,

cognitivo, para o desenvolvimento social; por outro lado, a situação ou risco de desemprego

tornou-se fonte de tensão para o sujeito e para a sociedade.

Conjuntamente à evolução do trabalho, a mesma autora disserta que ocorreu uma

redução em termos de exigência de qualificação do trabalhador devido à substituição do

trabalho artesanal pelo compartimentalizado, que demandava o conhecimento de todo o

processo de produção, e substituindo o trabalho manual pela utilização das máquinas. Com

essa nova forma de trabalhar, surgiram novos conteúdos de trabalho e novas formas de

organização do trabalho, com a regulação da energia empregada no trabalho, aceleração no

ritmo visando à produção, elevação ou redução da complexidade da tarefa, entre outros.

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Liedke (2002) coloca que já no século XXI, com o avanço da tecnologia e da robótica,

são instituídas novas organizações do processo de trabalho orientadas por conceitos de

produção. O trabalho passa a assumir um contexto mais intelectual em nível de importância

social e sobre o trabalho manual, valorizando o trabalho imaterial. Com isso, contrapondo ao

conceito tradicional do trabalho, baseado na transformação da natureza. Nesse sentido, o autor

lança o questionamento se teríamos chegado a um momento de redefinição dos conceitos de

trabalho, emprego e identidade social.

Percebem-se assim a necessidade de criação de políticas públicas voltadas para as

atividades de mão de obra, e ao mesmo tempo defender a redução da jornada de trabalho.

Liedke (2002) põe ainda que os desafios são amplos e incertos, somado ainda às formas de

trabalhos precários (temporários, terceirizados, desregulamentados), longe de ser um trabalho

livre e criativo, passando à esfera da necessidade.

A reorganização do trabalho pelo sistema capitalista de produção tem como objetivo a

acumulação de riquezas e, para isso precisa de alta produtividade pelo menor custo o possível,

tornando seu produto competitivo no mercado. Neste sentido, Laurel e Noriega (1987)

descrevem que no berço da revolução industrial, para a otimização da produção, os

trabalhadores são distribuídos em funções compartimentalizadas, sob rígida organização e

supervisão que ditam o ritmo de trabalho, e esta forma de trabalhar tornou-se uma herança

que permanece até os dias de hoje.

Esses autores descrevem que somado a organização do trabalho, o ritmo do trabalho

também é ditado pelo tempo em que as maquinas levam para a realização e processamento de

determinado produto. Com isso, ocorre uma inversão de importância e de valores, pois há um

desajustamento entre o meio de produção e as condições humanas do trabalhador que executa

tal atividade. Afirmam que o esforço físico que o trabalhador necessita fazer e a postura

corporal que deve tomar para realizar determinadas tarefas leva a um desgaste físico, podendo

a médio ou longo prazo causar o adoecimento.

Franco e Druck (1998) também abordam este aspecto das cargas de trabalho,

discutindo que os novos regimes de trabalho são realizados em ritmos cada vez mais velozes e

predeterminados, e afirmam que estas condições de trabalho acabam potencializando os

fatores de adoecimento dos trabalhadores.

O trabalho da saúde é considerado como um trabalho de prestação de serviços que não

apresenta valorização direta de capital, o trabalho é consumido como o valor pelo seu uso, ou

sua representação para a vida das pessoas, como expõe Ramos (2007). Quando se compra o

trabalho como prestação de serviço e não para colocá-lo com o trabalho que gera um produto,

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no processo capitalista de produção, o primeiro tende a não ser considerado produtivo. Da

mesma forma, olhar o trabalhador assalariado do setor de serviços como produtivo implica em

reorganizar o processo de trabalho para dar visibilidade à sua produção, que não é material.

Na área da saúde, isto se dá, sobretudo pelo registro das atividades, decompostas em

procedimentos e ações.

A utilização do modelo taylorista, ou organização científica do trabalho na saúde, para

Ribeiro e Pires (2004), também força a criação de metas de atendimento médio diário e exige

do trabalhador da saúde que esta meta seja atingida a qualquer custo. Como forma de

controlarem esta produtividade, cobram inúmeros documentos que registram o número de

consultas, atendimentos, registros, cálculos de despesas de materiais e insumos, entre outros.

Para Dejours (1992) essa organização rígida pode levar o trabalhador a anular-se

intelectualmente, causando uma dissociação entre a produção e o acompanhamento crítico

intelectual. Na saúde este tipo de dissociação pode representar conseqüências gravíssimas já

que um diagnóstico, um atendimento ou um procedimento realizado baseado em casos

freqüentes podem resultar em situação de vida ou morte para quem está utilizando aquele

serviço.

Este modelo de organização não respeita a individualidade do profissional, as

dificuldades e limitações que pode estar passando em sua vida familiar ou fora do ambiente

do trabalho. Este desajuste e ritmo de trabalho são incompatíveis com as condições do

trabalhador, segundo Marin (2000), e podem representar fator de adoecimento a médio ou

longo prazo.

O ACS insere-se no contexto de trabalho em saúde e na organização do trabalho, e

deve atender a uma produtividade, que será exigida mensalmente. A organização do seu

trabalho responde às demandas impostas pelos modelos organizacionais, sendo que, na área

da saúde, ainda não se ultrapassou o modelo taylorista, como discutido por Ribeiro e Pires

(2004) com divisão entre o plano da formulação e planejamento e a execução, e a divisão de

tarefas, entre outras características. Pode-se, portanto, inferir, que os mesmos fatores que

podem afetar negativamente outros trabalhadores de saúde, podem também representar

impactos na saúde do trabalhador ACS.

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1.2 O Trabalho e seus Impactos na Saúde dos Trabalhadores

O ambiente de trabalho pode influenciar positiva ou negativamente na saúde do

indivíduo, e por sua vez, a alteração na condição de bem-estar físico e mental do trabalhador

pode influenciar na sua produtividade. Pode-se dizer que quando há uma sintonia entre

trabalho e trabalhador, quando o trabalho está bem adaptado ao trabalhador e este se torna

produtivo, esta boa relação entre esses dois elementos forma um fator potencializador da

saúde. Mas quando não há essa sintonia, o trabalho passa a apresentar riscos para a saúde do

trabalhador, que segundo Marin (2000) podem levar a doenças profissionais, contribuir para o

aparecimento de outras doenças, ou agravar um estado de saúde deficiente de origem não

profissional.

Dejours (1992) analisa a evolução da luta dos trabalhadores, identificando pontos-

chave relativos aos interesses dos trabalhadores, ao longo desse processo de luta pela

aquisição de melhoria nas condições de trabalho e de vida no trabalho. Relata que entre 1914

e 1918, período da primeira grande guerra, todo o movimento dos trabalhadores baseava-se no

fim do que se chamava de “miséria operária”, pois havia nessa época uma necessidade muito

grande de trabalhadores, porém, esta mão-de-obra encontrava-se escassa devido ao

recrutamento para os campos de batalha. Nesse período, as condições de trabalho eram

precárias, subumanas, com aglomeração inclusive de mulheres e crianças, o que tornava o

ambiente propício ao desenvolvimento de doenças infecto-contagiosas.

Em seguida, com a transformação da forma de ver o trabalho, com o desenvolvimento

da medicina do trabalho, da higiene ocupacional e a da segurança do trabalho, a luta passa a

ser pela sobrevivência, com a aquisição de benefícios, segurança e redução da jornada. Este

fato este que depois de instituído (jornada de trabalho que era de 18 a 20 horas) passa a oito

horas diárias e, ao contrário do que se esperava, aumenta a produtividade (DEJOURS, 1992,

p.20).

No período contemporâneo, a luta não busca somente a manutenção dos direitos

adquiridos até hoje pelos trabalhadores e que o mundo capitalista tenta retirá-los através de

diversas estratégias de precarização do trabalho e desqualificação da mão-de-obra. Objetiva

também a valorização pelos aspectos fisiológicos, psicossociais e ergonômicos dos

trabalhadores, adquirindo o significado de luta, pelo combate do sofrimento mental, que é

resultante da organização do trabalho.

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Neste contexto, Laurel e Noriega (1987) afirmam que para entender o processo de

trabalho e como repercute na saúde, não se deve analisar um elemento do processo

separadamente, mas também a interação entre eles.

Torna-se muito difícil no contexto de saúde e doença no trabalho, deixar de citar as condições

sociais em que se encontra a maioria dos operários. Dejours (1992) descreve que a maioria

encontrava-se subempregado, vivendo nos subúrbios, em condições precárias de saneamento,

moradia e nutricional, muitos possuem grande número de filhos. Interessantes esses dados,

pois, apesar de retratar a realidade da França por ocasião de seu trabalho, essa realidade

permanece ainda atual em muitos países do mundo inclusive o Brasil.

O comprometimento dos fatores relacionados à saúde e ao trabalho pode assim levar o

trabalhador ao adoecimento. Para compreender melhor como ocorre esta relação, é necessário

compreender que o processo saúde-doença é visto na sociedade de duas formas distintas:

um com enfoque individual e outro com enfoque social. Esta distinção é apresentada por

Minayo (1997), identificando que algumas vezes este processo é referenciado como a partir

do indivíduo e de causas endógenas ao seu organismo e psiquismo; e outras a partir da

sociedade, do ambiente, das condições de vida e de trabalho.

A visão do enfoque social da saúde relaciona o modo de vida com o

desenvolvimento da doença, e sendo assim, considera-se que a poluição atmosférica, a

violência, o estresse, o ritmo de trabalho e o desequilíbrio no ambiente familiar são

elementos prejudiciais à saúde (MINAYO, 1997).

Não por acaso, a Organização Mundial da Saúde (1995) define a saúde não sendo algo

que se possua como um bem, porém, uma forma de funcionar em harmonia com o seu meio

(trabalho, ócio, forma de vida em geral). Não significando apenas a ausência de dores e

doenças, mas também a liberdade para desenvolver e manter as suas capacidades funcionais.

A saúde se mantém por uma ação entre o genótipo e o meio total, e nesse caso, como o

ambiente de trabalho constitui uma parcela importante do meio ambiente total de convívio do

indivíduo por longo tempo (até sua aposentadoria), a saúde depende também em grande parte

das condições de trabalho.

A doença do trabalhador não pode ser avaliada apenas do ponto de vista físico,

biológico ou fisiológico, mas considerar outros fatores que participam da complexidade da

condição de saúde do trabalhador, como convívio social, as condições nutricionais, relação

com o ambiente de trabalho, como esse trabalho é vivenciado, entre outros. Para Dejours

(1992), a organização rígida do trabalho influenciado por este modelo organizacional, leva o

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trabalhador a anular-se intelectualmente, causando uma dissociação entre a produtividade

física e o acompanhamento crítico intelectual, levando ao adoecimento psíquico.

Dessa forma, pode-se afirmar que a individualização e compartimentalização da tarefa

(modelo conhecido como taylorismo), ocasionam diversos tipos de sofrimentos individuais,

tornando-se incompatível a luta pela defesa coletiva, pois o sofrimento decorrente da

organização do trabalho acarreta em respostas fortemente personalizadas. O autor afirma

ainda que a alienação causada por este modelo de organização do trabalho, onde o

comportamento e o tempo do trabalhador são de propriedade da empresa, leva a uma

verdadeira síndrome psicopatológica.

Com a aplicação da organização científica do trabalho (OCT) nos meios de produção e

de serviços, aumentou-se a cobrança para os resultados e na busca de se atingir as metas

estabelecidas pelas empresas. Com isso se faz necessário o aumento da cadência e aceleração

do tempo para realizar determinadas tarefas, ocorre exigência de desempenhos produtivos

crescentes, ocasionando aos processos de descompensação.

Ferreira (2000) também afirma que as formas de organização do trabalho também são

responsáveis pelos processos de adoecimento dos trabalhadores, por exigir grande ritmo no

trabalho, grandes responsabilidades, competências para a realização de tarefas cada vez mais

complexas. As conseqüências podem se traduzir em envelhecimento precoce, aumento no

índice de adoecimento, desenvolvimento ou agravamento de doenças crônico-degenerativas,

como hipertensão e diabetes, distúrbios osteomusculares relativos ao trabalho (DORT) e

sintomas de ordem psíquica como fadiga crônica, síndrome de burn out, entre outros,

podendo levar até a morte súbita.

Com o desenvolvimento dos estudos realizado por Marin (2000) sobre os elementos

que interferem nas condições de trabalho, tornou-se mais claro que para realizar um estudo

sobre a saúde do trabalhador é necessário interpretar a sua situação vivida, não somente para

conhecê-lo, mas também para intervir na melhora dessas condições. Dessa forma, devem-se

considerar todos os fatores que interferem no trabalho, que segundo o estudo citado, nos

possibilita organizar estes elementos da seguinte forma:

O tempo de trabalho - que significa a jornada de trabalho reconhecida por lei, os

horários flexíveis, as horas extras, o trabalho por turnos, as pausas e os descansos,

faltas e dispensa por doenças;

As formas de remuneração – o valor do salário, fixação do valor do salário,

remuneração por horas de trabalho, remuneração por produção, aquisição de

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benefícios e descontos, valorização de méritos, participação dos lucros e as formas de

proteção do salário;

A organização do conteúdo de trabalho – a divisão do trabalho, monotonia, altos

ritmos de produção, processos de trabalhos automáticos e fluxos contínuos,

desenvolvimento de novas formas de gestão e de tecnologias;

A higiene e segurança no trabalho – que inclui os riscos identificados no processo de

trabalho;

Os benefícios sociais e de bem-estar – referentes a alimentação, ao transporte, sestas

básicas, planos de saúde entre outros;

Os sistemas de relações de trabalho – que levam em conta o processo de participação,

o autoritarismo, o regime de prêmios e castigos, o desenvolvimento na carreira e a

oferta de capacitação;

Os fatores de dimensão do trabalhador – representam as condições sociais e culturais,

condições de saúde e nutricional, idade, sexo, qualificações pessoais, educação,

expectativas e necessidades;

As circunstâncias econômicas, políticas e sociais do país;

Situação prática e jurídica como empregado – diz respeito às formas de contratação;

Condições de vida.

Assim, as condições de trabalho estão representadas por todas as condições que

concorrem para o processo de trabalho e podem interferir na saúde do trabalhador direta ou

indiretamente. Esta relação entre as condições do trabalho e a saúde do trabalhador concorda

com o trabalho de Ferreira (2000), que discute que estas condições podem ou não ser

diretamente relacionadas ao trabalho e contribuir para a saúde ou adoecimento do trabalhador,

porém possuem um papel fundamental para que ocorra.

O ambiente de trabalho sendo considerado como uma parcela do meio ambiente

geral nos permite afirmar que há uma interação permanente entre o trabalhador e seu

ambiente de trabalho. Esta interação pode influenciar positiva e negativamente na saúde, e

por sua vez, no bem estar físico, mental e social com conseqüências na sua vida produtiva.

Considerando como ambiente de trabalho o local onde são executadas as atividades de

trabalho, Sluchak (1992) lista como fatores componentes do ambiente de trabalho os

dispositivos legais, regulamentos, considerações éticas, ruído, iluminação e a temperatura.

Fatores estes que podem representar riscos para os trabalhadores.

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O risco é compreendido como a possibilidade de causar danos físicos para o acidentado,

nesse sentido, Marin (2000, p.254) define como risco laboral: “Es la probabilidad de perder la

salud debido las condiciones en que se desarrolla el trabajo”.

Pela variedade e especificidade dos serviços prestados, a equipe de saúde e em especial

os ACS, tornam-se expostos a uma multiplicidade de riscos. Esses riscos são definidos pelo

Ministério da Saúde – MS (1995) como agentes físicos, químicos e biológicos que estão

presentes no ambiente de trabalho, capazes de causar danos à saúde.

Consideram agentes físicos as formas de energia presentes no trabalho, como a

vibração, ruído, temperaturas altas ou muito baixas, radiações ionizantes e não ionizantes e

ultra-som; agentes químicos as substâncias entram no organismo pelo sistema respiratório,

como poeiras orgânicas e inorgânicas, fumos, neblinas, névoas, gases ou vapores, ou ainda

que possa ser absorvida pela pele e sistema digestivo de acordo com a condição de exposição;

e os biológicos as bactérias, fungos, bacilos, protozoários, vírus, entre outros.

Bulhões (1998) e Marziale (1995) discutem que os riscos biológicos são os

responsáveis por infecções agudas e crônicas ocasionadas por vírus, fungos e bactérias; os

físicos são causados pelas radiações, iluminação e eletricidade; os químicos são gerados pela

manipulação de substâncias químicas e administração de medicamentos; os ergonômicos

ocorrem devido à postura irregular dos profissionais, em situações como movimentação,

flexões e rotação da coluna entre outros; e os causados por acidentes.

Alem dos riscos anteriormente definidos, é importante reforçar que o meio ambiente

também pode representar riscos à saúde, como foram encontrados na Norma

Regulamentadora (NR) 09, atualizada pela Portaria nº 25 de 29/12/1994 do Ministério do

Trabalho e Emprego –MTE, (1995). Vieira (1995) define como sendo agentes potenciais de

danos ao trabalhador os riscos ambientais e ergonômicos dentre outros: o trabalho físico

pesado, monotonia, trabalho em turnos e noturno, atenção e responsabilidade, posturas,

poeira, umidade, treinamento inadequado e ritmo excessivo.

Pela variedade e especificidade dos serviços prestados, a equipe de saúde torna-se

exposto a uma multiplicidade de riscos, sendo definidos por Brasil (1995) como agentes

físicos, químicos e biológicos presentes no ambiente de trabalho que podem causar danos à

saúde do trabalhador, devido sua natureza, concentração, intensidade e tempo de exposição.

Analisando o trabalho na saúde, os riscos biológicos são os responsáveis por infecções

agudas e crônicas ocasionadas por vírus, fungos e bactérias; os físicos são causados pelas

radiações, iluminação e eletricidade; os químicos são gerados pela manipulação de

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substâncias químicas e administração de medicamentos. Bulhões (1998) e Marziale (1995)

acrescentam os ergonômicos, que estão relacionados à postura irregular dos profissionais, em

situações como movimentação, flexões e rotação da coluna entre outros; e os causados por

acidentes.

O Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), em conjunto com a NR 17,

que dispõe sobre os riscos ergonômicos, elaborado pelo Ministério do Trabalho (MTE)

classifica os riscos segundo categorias, de acordo com seus determinantes. O Quadro 1

sintetiza este conteúdo:

Riscos físicos Riscos

químicos

Riscos

biológicos

Riscos ergonômicos Risco de

acidentes

-Calor -Frio

-Pressões anormais -Radiações ionizantes -Radiações não ionizantes -Ruídos -Umidade -Vibrações

-Fumo

-Gases -Névoa -Poeiras

-Substâncias compostos ou produtos químicos -Vapores

-Bacilos -Bactérias

-Fungos -Parasitas -Protozoários -Vírus

-Controle rígido de

produtividade -Esforço físico intenso -Uso de postura

inadequada -Ritmo excessivo de trabalho -Jornada de trabalho -Levantamento e transporte manual de peso -Trabalho em turno e

noturno

- Arranjo físico

inadequado - Armazenamento inadequado

- Animais peçonhentos - Eletricidade - Ferramentas inadequadas ou defeituosas - Iluminação inadequada

- Máquinas e equipamentos sem proteção - Outros

Quadro 1- Riscos ocupacionais, segundo as NR.

Fonte: Ministério do Trabalho (MTE) Normas Regulamentadoras: NR 9 – Riscos

ambientais, NR 17- Ergonomia.

Entretanto, devemos levar em consideração alguns fatores quando falamos de

condições ou situações de risco, pois sua identificação e enfrentamento também dependem

de complexas relações interpessoais, e da estrutura política e social. Neste sentido,

Meirelles (1997) relata que o viver implica em riscos, como por exemplo: o risco

econômico, o risco moral, social, risco de assalto, de adoecer e de morrer, aos quais

estamos sujeitos na vida cotidiana.

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Nas grandes cidades como o Rio de Janeiro, onde o índice de homicídios e

criminalidade é alta, estes riscos também influenciam no desenvolvimento do trabalho dos

profissionais de saúde. Nos anos 80, os acidentes de trânsito lideravam como a principal

causa de morte por causas externas, segundo Brasil, (2004). Na década de 90, os

homicídios passaram a liderar as mortes por causas violentas. É de se esperar que muitos

trabalhadores, no trajeto de casa para o trabalho e vice-versa, ou ainda no próprio

cumprimento de sua atividade profissional, tenham sido vitimizados por esta situação.

1.3 O Agente Comunitário de Saúde e seu Trabalho

Há anos são utilizados agentes comunitários no cenário de saúde mundial. Oliveira

(2003) afirma que este profissional surge em 1920 no Canadá, para auxiliar o movimento de

organização comunitária nas Américas. David (2001) relata ainda que há décadas, são

treinados por diversos grupos religiosos e por organizações não-governamentais (ONG). Na

América Latina, Solla (1996) relata que estes trabalhadores foram utilizados nos últimos

vinte anos como estratégia de extensão dos cuidados básicos em comunidade rurais e

periurbanas.

Em 1987 ocorreu a primeira experiência com agentes comunitários de saúde no

Brasil, como uma estratégia estruturada no Ceará, com o objetivo de criar emprego para as

mulheres na área da seca e, ao mesmo tempo, contribuir para a redução da mortalidade

infantil com priorização de ações na área da saúde da mulher e da criança, com bastante

êxito. Devido a este êxito, Tomaz (2002) afirma que esta estratégia, Programa de Agentes

Comunitários de Saúde (PACS), expandiu-se rapidamente em todo o estado do Ceará,

realizando cobertura em praticamente todos os municípios em três anos, sendo incorporado

pelo Ministério da Saúde (MS) praticamente nos mesmos moldes em 1991. Neste mesmo

ano, o Ministério da Saúde e a Fundação Nacional da Saúde instituíram a oficialização do

PACS, com o objetivo de atender as necessidades da população com qualidade,

universalidade, livre de preconceitos, de forma participativa e, para Souza (2001) sobre tudo,

livre de interferências político-partidárias.

O lançamento oficial do PACS ocorreu na Bahia em 1991, que segundo esse autor, foi

iniciada pela região Nordeste devido ao alto índice de doenças, de carências, pobreza e de

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miséria. Posteriormente foi estendido à região Norte e, em seguida, ainda em 1992, aos

demais estados da região Norte e para as principais capitais do país.

O PSF foi criado em 1994, com a missão de incorporar e reafirmar os princípios

básicos do SUS. Para Mercadante (2002), este projeto deve ser vinculado à rede de serviços

de forma a garantir a atenção integral aos indivíduos e famílias, com a garantia de

encaminhamentos para o atendimento das especialidades de tratamento que não contempladas

pelo programa sempre que se fizer necessário. Cada Unidade de Saúde da Família trabalha

em um território de abrangência definido, sendo responsável pelo cadastramento e assistência

da população adscrita a esta área, cuja também utiliza como força de trabalho o ACS, figura

principal deste programa.

Para Tomaz (2002), as estratégias de PACS e PSF não devem ser vistas como

simplesmente um programa, mas realmente como uma estratégia política de saúde, que tem

como proposta estruturar e reorganizar o sistema de saúde na atenção básica e não

simplesmente aumentar a cobertura de assistência à população. O mesmo autor avança ainda

nas suposições sobre as conseqüências dessa nova reestruturação do SUS, supondo que essa

reorganização da atenção básica deve pressionar os outros níveis de atenção na busca de

reestruturarem-se também, para atender com qualidade a demanda referenciada pela atenção

básica.

Atualmente, segundo dados do Ministério da Saúde (2000) o PSF realiza uma

cobertura assistencial de aproximadamente 50 milhões de pessoas pertencentes às camadas

mais carentes, em sua quase totalidade. A estratégia de saúde da família surge como forma de

reorganização do modelo de atenção à saúde, como substituição do modelo vigente. E para

Bertussi (2001) tem sido principal estratégia governamental para a reorientação do modelo

assistencial, e deve estar sintonizada com os princípios do SUS, com novas práticas de

atenção à saúde e firmando a indissociabilidade entre o atendimento clínico e a promoção da

saúde. Esta nova prática deve atender aos princípios de estabelecimento de vínculo,

compromisso e uma abordagem humanizada à população sob sua responsabilidade.

Desta forma, a proposta do PSF busca reafirmar os princípios básicos do SUS na

Unidade de Saúde da Família, atuando de forma integrada a uma rede de serviços, de forma a

garantir uma atenção integral aos indivíduos e às famílias.

Para apreender as necessidades reais, Bertussi (2001) propõe tais instrumentos para

obter conhecimento da comunidade atendida pelos programas:

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Cadastramento das famílias;

Oficinas de territorialização;

Visitas domiciliares;

Análise de indicadores de mortalidade e morbidade;

Obtenção de informações com informante chave da comunidade;

Análise de informações sobre a cobertura, produção, e produtividade sobre os

serviços realizados.

Para dar conta das diversas demandas, Brasil, (2000) afirma que é necessário não só a

inclusão de equipes multiprofissionais, mas também a interação com outros setores, como:

escolas, creches, asilos, presídios, companhias de habitação, de água e saneamento, luz,

coleta de lixo etc., para que se realize uma assistência integral, contínua e de qualidade, sendo

nesse contexto, o agente comunitário de saúde o principal intermediador dessa interação.

A profissão de ACS foi criada pela Lei n° 10.507, de 10 de julho de 2002, com o

exercício exclusivo no âmbito do Sistema único de Saúde e sob a responsabilidade das

formas de contrato definidas pelo gestor local em saúde, segundo MS (2002). Com a

definição das diretrizes curriculares, o Agente Comunitário de Saúde (ACS) passou a

integrar as equipes do PACS e PSF. Nesse contexto, assume a atribuição de realizar

atividades de prevenção de doenças e promoção da saúde, através de ações educativas em

saúde nos domicílios e coletividade, em conformidade com as diretrizes do SUS, e estende o

acesso às ações e serviços de informação e promoção social e de proteção da cidadania.

Segundo o mesmo autor, é previsto no artigo terceiro da mesma lei que cria a profissão

de agente comunitário de saúde, que para o exercício nessa profissão é necessário atender dois

requisitos básicos: residir e atuar na mesma área, possuir o ensino fundamental completo e ter

concluído com aproveitamento o curso de qualificação para a formação de Agente

Comunitário de Saúde. Ser membro da comunidade reforça o vínculo deste sujeito com a sua

comunidade, o coloca como referência para a atenção à saúde na área e facilita a atuação dos

profissionais da equipe técnica (médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem). O MS (1999)

determina o número de ACS de acordo com o número de famílias sob a responsabilidade da

equipe, numa porção de um agente para 400 a 750 pessoas a serem acompanhadas.

Os ACS atuam segundo suas competências determinadas pelo Ministério da Saúde,

identificando as situações mais comuns de risco em saúde, participando da orientação,

acompanhamento e educação popular individual e coletiva, estendendo as responsabilidades

das equipes locais de saúde. Para tanto, utiliza conhecimentos sobre a prevenção e solução de

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problemas em saúde através da utilização de práticas de promoção da vida em coletividade e

de desenvolvimento das interações sociais.

Nele é depositada a responsabilidade de mobilizar e articular conhecimentos,

habilidades, atitudes e valores requeridos pelas situações de trabalho. Entre suas ações, estão a

realização de orientação, acompanhamento e educação saúde, promoção da qualidade de vida

e desenvolvimento da autonomia diante da própria saúde, interagindo em equipe no ambiente

e nas situações de trabalho com os indivíduos, grupos e coletividades sociais.

O vínculo e a identidade com a comunidade facilitam a entrada da comunidade no

sistema público de saúde e, possibilita ao ACS apontar à equipe técnica quais são os pontos

fracos na promoção à saúde e onde estão as situações críticas, para que se possa atuar com

mais ênfase. Este papel de interligar a comunidade e o sistema de saúde caracteriza-se pela

mediação, como identificado por Bornstein (2007). O ACS atua como um mediador deste

processo, trabalhando na comunidade em que vive, e com isso possibilita a troca de saberes da

comunidade e o dito científico, da equipe técnica.

A troca de saberes pode constituir uma complementaridade à assistência daquela

comunidade, já que a saúde passa pelas dimensões física e religiosa, sendo necessária

aceitação da cultura popular do uso de métodos não convencionais que perpassa “desde a

utilização de plantas medicinais até rezas” (DAVID, 2001). Essa interação entre os saberes

instituídos, que fazem parte do conhecimento do senso comum da comunidade, e instuintes

que são os conhecimentos técnicos trazidos pelos profissionais da saúde, baseados nas

ciências médicas e da saúde, podem se complementar, respeitando as diferenças culturais e as

realidades individuais, e dessa forma contribuir para a melhoria das condições de vida e de

saúde deste grupo social.

Quando não ocorre esta complementaridade e o ACS assume como única verdade o

saber instituinte, passa a desconsiderar o saber da comunidade. Quando isto acontece,

identifica-se a ambigüidade e contradição no modelo, já que não permite a troca de saberes e

sua interação para a melhoria das condições de saúde da comunidade e podendo até dificultar

o acesso da comunidade ao sistema de saúde.

O Ministério da Saúde (2003), através da Portaria GM/MS n° 1.886, de 18 de

dezembro de 1997, define a vinculação dos agentes comunitários de saúde à esfera local de

gestão; e do Decreto Federal n° 3.189, de 04 de outubro de 1999, que determina as diretrizes

para o exercício profissional do ACS, cria um perfil profissional que objetiva as atividades

de promoção da saúde, a prevenção de doenças, estímulo à participação social. Estimulando

o desenvolvimento de atividades de promoção da vida, inserção à cidadania, orientação de

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indivíduos, grupos e populações através da educação popular em saúde, acompanhamento

de famílias e apoio sócio-educativo.

Toda essa estruturação legal vem definir e regulamentar as competências que se

espera para a realização de determinadas atividades num determinado contexto profissional

e sócio-cultural. Sendo assim:

...cada competência proposta para o ACS expressa uma dimensão da realidade de trabalho deste profissional e representa um eixo estruturante de sua prática, ou seja, uma formulação abrangente e generalizável, de

acordo com a perspectiva de construção da organização do processo de formação e de trabalho. (BRASIL, 2003, p. 14).

O Ministério da Saúde considera que a competência profissional incorpora quatro

dimensões do saber: “o saber-conhecer, o saber-ser, o saber-fazer e o saber-conviver”. Para

tanto, as competências profissionais estão expressas por Brasil (2003), no “saber-fazer”, que

representa as habilidades que o agente comunitário deve desenvolver para o trabalho; no

“saber-conhecer”, que são os conhecimentos necessários para a atuação junto à comunidade;

no “saber-ser”, que está relacionada às atitudes do ACS e pode sofrer interferência das

características pessoais e da personalidade; e no “saber-conviver”, representando a inter-

relação com os membros da comunidade que estará sobre sua responsabilidade e com os

profissionais que compõem a equipe.

Apresentando esta organização do conhecimento referente a cada competência, é

possível identificar aquilo que se busca na dimensão da atuação desse profissional, porém,

tais habilidades e conhecimentos não são apresentados de forma hierarquizada, cabendo às

instituições formadoras e de atuação identificar e organizar o trabalho, levando em

consideração inclusive suas diversidades.

O MS afirma que o “saber-ser” é considerado característica comum a todas as

competências e se expressa pela capacidade crítica, de reflexão e transformação de si e de

suas práticas. Para facilitar a compreensão, organizamos este conteúdo segundo

evidenciado no Quadro 2:

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Competências Habilidades Conhecimentos

Ações de integração entre equipe

e população -Atuar junto a equipe;

-Implementar práticas junto a

comunidade;

-Orientar quanto a utilização do

serviço de saúde;

-Programar e executar

acompanhamento domiciliar;

-Facilitar a interação entre a equipe e

a população;

-Agendar o atendimento;

-Registrar as suas condutas.

-Processo de trabalho de saúde;

-Trabalho em equipe;

-Conduta profissional;

-Princípios do SUS e política

publica de saúde;

-Estrutura, funcionamento e

responsabilidade do sistema de

saúde;

-Culturas e práticas populares;

-Eventos sociais e vitais.

Planejamento e avaliação de ações

de saúde em conjunto com a

equipe

- Cadastramento de famílias; - -

- Consolidar e analisar dados; ---

- Realizar mapeamento social e

demográfico da sua área;

-Priorizar problemas;

-Participar do plano de ação.

-Cadastramento de famílias e

territórios;

-Interpretação demográfica;

-Analisar situação sócio-econômica;

-Identificar traços culturais;

-Doenças mais comuns em grupos

etários;

-Conceitos de territorialização;

-Critérios de prioridade;

-Mapeamento sócio - político e

ambiental;

-Estratégias de avaliação em saúde;

-Indicadores epidemiológicos;

-Indicadores de produção de ações;

-Programar atividades domiciliares;

-Qualidade em saúde;

-Conceito de eficácia, eficiência e

efetividade em saúde coletiva.

Quadro 2- Competências, habilidades e conhecimentos requeridos para o trabalho do ACS,

segundo o Perfil de Competências Profissionais do Agente Comunitário de Saúde (ACS) –

versão preliminar (continua)

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Promoção em saúde / ações

educativas

-Reflexão sobre problemas de saúde;

-Relacionar problemas de saúde e

condições de vida; -

Propostas e processos de promoção

de saúde;

-Recursos adequados;

-Utilizar meios de planejamento,

acompanhar e avaliar as ações em

saúde;

-Orientar a inclusão de portadores

de necessidades especiais;

-Apoiar políticas de alfabetização;

-Participar de reuniões do conselho

de saúde.

-Processo saúde-doença,

determinantes e condicionantes;

-Promoção em saúde, conceito,

campo de atuação;

-Conceito de condição e qualidade

de vida;

-Parceria;

-Conceito de relação saúde,

alimentação, moradia;

-Conceito de informação, educação

e comunicação;

-Métodos educacionais;

-Cidadania e participação social;

-Conceito de organização;

-Liderança e cultura popular;

-Pessoas com necessidades especiais;

-Princípios organizacionais.

Ações preventivas e monitorização

de risco sanitário

-Identificação de condição de risco;

- Informar situações de risco;

- Orientar medidas de redução de

risco;

- Acompanhar indicadores de saúde.

-Conceito de ambiente e enfoque em

risco ambiental;

-Conceito de ambiente saudável;

-Conceito de poluente;

-Doenças prevalentes na microárea;

-Condições de risco social, como o

desemprego e infância desprotegida;

-Medidas de saneamento básico;

-Código de postura municipal.

Quadro 2- Competências, habilidades e conhecimentos requeridos para o trabalho do ACS,

segundo o Perfil de Competências Profissionais do Agente Comunitário de Saúde (ACS) –

versão preliminar (continuação)

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Ações preventivas e monitorização

para grupos específicos e à doenças

prevalentes segundo protocolos

- Comunicar os casos; -

Orientar convivência dos indivíduos

com necessidades especiais;

- Apoiar gravidez e puerpério;

-Apoiar planejamento familiar;

- Apoiar e estimular o aleitamento

materno;

-Acompanhar o crescimento,

desenvolvimento e situação vacinal;

- Apoiar e orientar cuidados com o

RN;

- Trabalhar hábitos saudáveis;

- Apoiar orientação de risco à saúde;

- Identificar indivíduos em situação

de risco e encaminhar à UBS;

- Estimular práticas saudáveis; -

Estimular práticas apropriadas para

grupos específicos, como idosos,

adolescentes, etc;

- Apoiar medidas de prevenção e

controle de doenças;

-Agendar casos nas UBS.

-Estrutura e funcionamento do

corpo, ciclo vital, reprodução

humana, sinais de gravidez;

-Cuidados gerais na gravidez, parto,

puerpério e RN;

-Planejamento familiar;

-Diferença de planejamento familiar

e controle de natalidade;

-Direito constitucional;

-Cartão da criança;

-Esquema vacinal;

-Aleitamento materno e desmame;

-Medidas de prevenção do tétano

neonatal;

-ECA;

-Saúde escolar;

-Saúde do adolescente e do idoso;

-Doenças crônico-degenerativas;

-Cadeia de transmissão de doenças;

-Conceito de resistência,

suscetibilidade e imunidade;

-Medidas preventivas individuais e

coletivas;

-Medidas de monitorização de

doenças;

-Preenchimento do SIAB

Quadro 2- Competências, habilidades e conhecimentos requeridos para o trabalho do ACS,

segundo o Perfil de Competências Profissionais do Agente Comunitário de Saúde (ACS) –

versão preliminar (conclusão).

A compreensão das competências dos ACS torna-se importante por possibilitar uma

reflexão sobre suas atividades laborais reais e prescritas e a realização destas atividades com

a sua saúde.

Analisando essas competências, sua atuação junto à comunidade (seu trabalho real),

podemos inferir que é necessário um treinamento sério e intenso para que sejam atendidas

todas as dimensões das competências que se aspira desse profissional, como: visão social e

transformação de mundo, o papel da escola em conjunto como transformador da realidade,

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realização de diversos grupos junto à comunidade como a importância da limpeza urbana,

estímulo à prática de atividade física, alimentação adequada, prevenção das doenças,

participação popular em conselhos de saúde, entre outros. Porém, Tomaz (2002) afirma que

essa discussão sobre as competências dos ACS é polêmica, pois ainda não se conseguiu

definir de forma clara essas competências e atribuições. Este autor refere que discutem um

novo perfil profissional, mas fala-se muito pouco do que, em termos de atribuições, este perfil

representa, e não se especifica exatamente qual o trabalho prescrito para o ACS.

As competências profissionais e da sua formação oferecem uma base mais clara do que

o ACS deve ser capaz de fazer. No entanto, dentro das equipes, sua identidade é reconstruída

cotidianamente, na relação com a comunidade e com a equipe, e nem sempre os demais

profissionais reconhecem seu trabalho. Além disso, a própria comunidade impõe demandas,

que segundo Bornstein (2007) seu papel como mediador tenta dar conta, e que representam

mudanças constantes no seu planejamento de trabalho.

O trabalho de Tomaz (2002) apresenta um alerta para o cuidado que se deve ter ao

afirmar que o ACS é a “mola propulsora” da implantação do SUS, pois isso depende de um

conjunto de fatores técnicos, políticos e sociais, e não é responsabilidade de um só

trabalhador. Por falta de uma clara delimitação de suas atribuições, acaba ficando

sobrecarregado no seu trabalho, pois qualquer ação que é desenvolvida na comunidade acaba

sendo atribuída ao ACS.

O aspecto importante da definição das atribuições dos ACS é justamente evitar que este

profissional absorva funções que não são de sua competência, tornando-se, além de

diversificado e amplo, inadequado do ponto de vista jurídico-normativo, fazendo do seu

trabalho real uma condição permeada por conflitos e problemas.

Como há falta de clareza na definição das atividades no âmbito da organização

cotidiana dentro das equipes, o ACS pode assumir atribuições para as quais não possuem

competências e respaldo técnico. Em outras situações, os próprios protocolos da atenção

básica, ao definirem atribuições do ACS, podem dar margem a interpretações diversas, pela

falta de clareza.

Podemos citar como exemplos o Caderno da Atenção Básica, volume 15 (2008, p.40)

voltado para o controle da Hipertensão Arterial, que lista, entre as atribuições do ACS,

“verificar a presença de sintomas de doença cardiovascular, neurovascular ou outras

complicações de hipertensão arterial, e encaminhar para consulta extra”. Trata-se, claramente,

de lançar sobre o ACS uma responsabilidade para a qual não está preparado, e que evidencia

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uma postura, por parte do serviço, de buscar controlar todas as variáveis relativas aos

problemas de saúde, numa lógica claramente medicalizante.

Também a idéia de que o ACS pode ser um elemento de controle sobre a comunidade é

reforçada por outras atribuições descritas, como por exemplo, no caso do controle da

tuberculose, quando se define como atribuição para o ACS “supervisionar a tomada da

medicação” (BRASIL, 2008, p. 165).

Por outro lado, devemos considerar que no âmbito de um sistema de saúde democrático

e participativo, é desejável que pessoas usuárias do SUS sejam capazes de assumir, de modo

autônomo, um papel protagonista, colaborando para a construção de projetos de ações

preventivas e terapêuticas inclusivas. Com isso, devem ser capazes de contemplar a

diversidade cultural e social descritas nos trabalhos de Stotz e Bornstein (2007) e David

(2008).

Nesta perspectiva, o ACS é um mediador que tem como perspectiva uma prática

transformadora, e não de reprodução de relações autoritárias. Como descrito por David

(2008), trata-se de uma contradição vivenciada pelos ACS, mais que por outros profissionais.

Como as atividades prescritas para os agentes comunitários de saúde não estão

explicitadas nos manuais ou normativas, nos baseamos no perfil de competências normatizado

pelo Ministério da Saúde e algumas literaturas publicadas para descrever algumas atividades

recomendadas para este trabalhador.

As atividades descritas como fazendo parte do conjunto de atribuições do ACS são, a

seguir, apresentadas. No âmbito das ações integradas com a equipe de saúde, participa do

acolhimento no módulo, ficando responsável por organizar a porta de entrada, separar os

prontuários e identificar e encaminhar as prioridades (pessoas com problemas de saúde,

gestantes, idosos, entre outros); realiza visita domiciliar acompanhada com os profissionais

enfermeiros, médicos e técnicos de enfermagem; participam de ações de orientação em saúde

em conjunto com a equipe multidisciplinar; realiza agendamento de consultas e exames no

módulo para os usuários (BRASIL, 2003, p.16).

No planejamento e avaliação das ações de saúde, realiza mapeamento da área e divisão

das microáreas principalmente no processo de implantação do serviço de PSF ou PACS,

cadastramento das famílias como processo constante devido a dinâmica da comunidade

(mudanças de endereços, abandonos de casas, aumento das famílias, entre outros). Na

promoção em saúde através, de ações educativas, preventivas e monitoramento de risco

sanitário, realiza ações individuais e coletivas de orientações sobre higiene, acondicionamento

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e descarte do lixo em locais adequados, os riscos do lixo para o desenvolvimento de vetores

de doenças (ratos e baratas) e a conseqüência para a saúde.

Ainda no campo da educação popular em saúde, realiza orientações sobre prevenção da

proliferação do mosquito transmissor da dengue e conduta em caso de suspeita da doença,

orientações sobre higiene, acondicionamento e preparo dos alimentos, que também são

descritos por David (2001) e Bornstein (2007).

Atua como educador em grupos específicos, enfocando as doenças prevalentes, orienta

sobre o planejamento familiar, cuidados na gestação, encaminha ao planejamento familiar,

orienta a importância do aleitamento materno exclusivo, acompanha o crescimento e

desenvolvimento das crianças, acompanha e encoraja a realização vacinação de crianças até

seis anos, conferindo se está atualizada.

Com os adolescentes, orienta a prevenção da gravidez, DST e AIDS, orienta e estimula

o uso de preservativo masculino como proteção em saúde, reforça os riscos e conseqüências

do uso e abuso das drogas e álcool e o risco de se envolver com atividades ilícitas e

marginalidade. Com os adultos e idosos, realiza orientação sobre doenças crônico-

degenerativas (hipertensão e diabetes), sobre os riscos de suas complicações (cegueira, AVC,

problema renal, etc), confere as medicações de uso e orienta a dosagem adequada, organiza e

realiza atividades de promoção da saúde, como caminhada com idosos e bailes da terceira

idade.

O ACS se responsabiliza também por um conjunto de registros, atividade que merece

uma discussão à parte. Todas as informações sobre as condições de saúde da área são

relatadas através de dados estatísticos, preenchidos em impressos próprios, junto com as

informações sobre os cadastros dos moradores e a produtividade. Esses dados são lançados no

Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB) através de sistema informatizado para gerar

os dados epidemiológicos em saúde da região. O ACS deve se responsabilizar pelo

preenchimento da Ficha A, por ocasião do cadastramento das famílias, com todas as

informações da família. Esta ficha é preenchida pela primeira vez em que a família é visitada,

geralmente por ocasião da implantação do PACS e/ou do PSF e subdivide-se em folha 01 e

folha 02.

A folha 01 contém informações sobre o domicílio da família atendida, o endereço, a

procedência (relativo a onde morava antes de morar naquela casa), tempo de moradia, se

recebe correspondência em casa, telefone para contato; nome do cidadão (moradores na

residência), a data de nascimento, raça /cor, situação familiar (casado, união estável, vive com

companheiro, entre outros); freqüenta a escola, escolaridade, natureza da escola (pública ou

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privada), qual a série; possui plano de saúde, fuma, se encontra presente durante a visita,

condição de saúde bucal, participa de grupos de saúde (hipertenso, diabético, pré-natal,

obesidade, entre outros), doenças ou condições referidas (Alcoolismo, câncer, AIDS, entre

outros); situação profissional e ocupação, as condições de moradia (destino do lixo, tipo de

domicílio, recebe água tratada, tem esgoto), renda familiar, meios de comunicação que meios

de transporte que utiliza, participa de grupos comunitários e, possui animais, domésticos.

Na folha 02 são coletadas informações documentais dos cidadãos que habitam a mesma

moradia, como nacionalidade e naturalidade, identidade com local, data e órgão emissor,

Cadastro de Pessoa Física (CPF), carteira de trabalho, nome dos pais.

A Ficha B serve para cadastramento de grupos específicos definidos pelo Ministério da

Saúde (2003), considerandos grupos de risco: gestantes, hipertensos, diabéticos, entre outros,

informando o tipo de tratamento, tempo de tratamento, consulta entre outros. A atualização é

anual. Também o ACS tem se responsabilizado por sua atualização, sob supervisão da

enfermeira de PSF.

Outros impressos utilizados pelos ACS incluem: o mapa diário de turnos trabalhados,

que visa o registro das visitas domiciliares realizadas no dia de trabalho (produtividade

diária), e o relatório da Situação de Saúde e Acompanhamento das Famílias na Área / Equipe

(SSA2), que serve como registro mensal da produtividade dos agentes comunitários de saúde

em visitas domiciliares.

No dia definido pela secretaria municipal de saúde, uma vez por mês, o sistema deverá

ser alimentado com estes dados. Tendo o ACS garantido o adequado e atualizado

preenchimento dos dados, entrega-os ao supervisor, geralmente um enfermeiro, que repassa as

informações para a estrutura municipal que irá inserir os dados no SIAB. No âmbito da

Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, este dia é usualmente denominado “o dia de

rodar o SIAB”.

Não está claramente definido se o ACS deve registrar dados nos prontuários familiares

ou individuais existentes nas unidades de saúde, e esta atividade varia em função da unidade e

do município. Sua prescrição, portanto, é variável.

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1.4 Trabalho Prescrito, Trabalho Real e Riscos no Trabalho do ACS

A inserção do ACS como mediador entre a comunidade e o serviço o torna um

trabalhador com diversas qualidades, com potencial visão das possibilidades de melhoria das

condições de vida da comunidade, pode estimular a participação dos moradores em defesa dos

interesses, como associação dos moradores e conselhos de saúde. Como trabalhador de

saúde, no entanto, a falta de legitimidade impõe dificuldades importantes para o seu trabalho

como liderança e agente mobilizador.

A atividade de trabalho é composta pela tarefa prescrita, que segundo Abrahão (2004),

se caracteriza pelas diretrizes e normas que regulam o quê, como e quando o trabalho será

realizado, que no caso dos agentes comunitários de saúde, é normatizado pelo perfil de

competências criado pelo Ministério da Saúde. O trabalho real, ou seja, o trabalho

efetivamente realizado, envolve os instrumentos utilizados para realização da tarefa que leva

o trabalhador a desenvolver estratégias técnicas e psíquicas para atingir o objetivo, e pelo

posto ou o local de trabalho, onde a tarefa será realizada, no caso dos ACS, pode ser a

unidade ou o módulo onde atua e a comunidade.

Em função de ser o ACS o trabalhador que realiza a mediação entre a comunidade e o

sistema de saúde, e ao mesmo tempo ser um morador da comunidade, fica exposto a situações

que podem ser desgastantes. Dentre estas situações, podemos citar caso do ACS estar em casa

de férias ou no período da noite fora do expediente normal de trabalho e ser abordado ou

solicitado por um morador para resolver alguma necessidade de saúde, ou marcação de

consulta, entre outros. Este trabalhador está exposto ao julgamento por parte de moradores e

vizinhos, pois, sendo ao mesmo tempo morador e profissional, e uma vez que os moradores

da comunidade os conhecem e recebem orientações de saúde, passam a também observar se o

ACS pratica as orientações que realiza.

Pode haver também a solicitação do ACS para atuar em situações de urgência e

emergência na comunidade, já que atua na unidade de saúde da família (USF) e interage com

médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem, e os moradores esperam que o ACS possa

realizar algum procedimento nestas situações. Todas estas situações poderão representar um

sofrimento para o ACS, gerando um desgaste e até podendo levar ao adoecimento,

necessitando ser mais bem compreendidas. Estas atividades, além de ferirem as bases ético-

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jurídicas das demais profissões de saúde, não fazem parte das atividades prescritas para os

ACS, mas se caracterizam como trabalho ou atividade real.

Uma atividade inerente ao trabalho do agente comunitário, que está prescrita e faz

parte efetivamente do trabalho real é o preenchimento das fichas e formulários de

cadastramento e produtividade diária e mensal. Estes impressos são documentos que

comprovam ter realizado seu trabalho, o que representa uma forma de controle da produção

pelo supervisor responsável.

Esta característica de trabalho controlado pode representar pressão sobre o trabalhador

para o aumento da produção. Essas formas de organização do trabalho são referidas por

Ferreira (2000) e Dejours (1992) como responsáveis pelos processos de adoecimento dos

trabalhadores, por exigir ritmo no trabalho acelerado, grande responsabilidade, competência

para a realização de tarefas cada vez mais complexas, os ritmos acelerados potencializam o

processo de adoecimento dos trabalhadores. Essas condições de trabalho podem então causar

o adoecimento devido sua organização, ritmo e cobrança pela produtividade.

Algumas literaturas identificam riscos no trabalho dos agentes comunitários de saúde,

como Bornstein (2007), quando afirma que este trabalho apresenta-se contraditório e amplo,

Tomaz (2002) discute esta vertente da amplitude do trabalho dos ACS, despertando para a

problemática de não se ter definido qual é de fato o papel dos ACS. Estas literaturas discutem

fatores de organização do trabalho, que podem potencializar ou ser causa de adoecimento

psíquico, como afirmado por Dejours (1992). No contexto do sofrimento, Theisen (2004)

encontra como resultados da sua pesquisa de dissertação, o sentimento de frustração,

fragilidade, baixa auto-estima, sofrimento mental e depressão no trabalho dos ACS, devido

não conseguir atingir o nível de efetividade que gostariam.

Quanto aos riscos encontrados no meio ambiente de trabalho dos ACS, Trindade

(2007) identifica na realidade gaúcha a exposição à radiação solar, chuvas, calor e frio,

carregar peso e a presença de animais soltos pelos trajetos, como: cachorros, cavalos, vacas,

entre outros. Estes riscos podem ser categorizados também como físicos, químicos e

ergonômicos pela referencia do Ministério da Saúde, mas para a realidade do Rio de Janeiro é

necessário explorar o trabalho para conhecer melhor.

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45

2 METODOLOGIA

2.1 Abordagem Metodológica

Para a realização deste trabalho, utilizamos o método qualitativo, pois este método

possibilita a compreensão de informações e apreensão de dados que não podem ser

levantados e analisados por outros métodos. A metodologia de pesquisa é entendida por

Minayo (1994) como o caminho, a trajetória que o pensamento deve percorrer em relação a

um fenômeno, e a prática que se deve exercer para realizar uma abordagem da realidade.

Desta forma, devemos identificar a metodologia que se adequa a abordagem do fenômeno

que será estudado, e na busca de apreender este fenômeno, atuar em campo com um

instrumento que possibilite esta apreensão sem desvincular ou perder sua adequação ao

método.

A metodologia utiliza concepções teóricas de abordagem, um conjunto de técnicas que

possibilitam a construção da realidade e o sopro divino do potencial criativo do investigador.

A pesquisa qualitativa se ocupa, nas ciências sociais, com os fenômenos que não podem ser

simplesmente quantificados, devido trabalhar com fenômenos que envolvem os significados

de símbolos, crenças, valores e atitudes humanas que não dependem de variáveis

quantificáveis.

A mesma autora afirma ainda que a pesquisa social trabalha com a subjetividade dos

significados e que dessa forma responde a um espaço mais profundo das relações, dos

processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos a operacionalização de variáveis ou

meramente quantificáveis.

Lazarsfelf (1969) avança ainda mais nessa discussão, e identifica três situações que

são relevantes em particular aos trabalhos qualitativos sobre os quantitativos: situações em

que a evidência qualitativa ou o significado possui mais relevância que a simples informação

estatística relacionada às épocas passadas; situações em que se faz necessário captar dados

psicológicos reprimidos e não facilmente articulado (atitudes, motivos, pressupostos, etc) e

situações em que as observações qualitativas são utilizadas para identificar o funcionamento

complexo das estruturas e organizações complexas que são difíceis de submeter à observação

direta.

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Entende-se ser este modelo de abordagem o que melhor delineia a trajetória

metodológica para o cumprimento dos objetivos propostos para este estudo.

Como estratégia para acompanhamento da realidade dos sujeitos da pesquisa, realizou-

se uma observação sistemática, não-participante, utilizando um roteiro prévio com conteúdo

de riscos ocupacionais, que será apresentado na descrição da coleta de dados. Durante a

observação, fatos, acontecimentos e as narrativas referentes ao cotidiano de trabalho dos ACS

foram registrados, e geraram um diário de campo, que serviu como a principal fonte dos

dados.

O roteiro contendo conteúdo sobre os riscos funcionou como forma a guiar o olhar

para riscos no trabalho que estivessem presentes durante o processo de observação das

atividades dos ACS. Assim, durante as visitas domiciliares, os deslocamentos pela

comunidade, nas reuniões no módulo e a partir falas dos ACS, que foram sendo registradas

todas as atividades realizadas pelos ACS, independente do fato de serem atividades

previamente planejadas, indicadas pela supervisão, ou espontaneamente desenvolvidas pelos

ACS. A idéia era apreender, no contexto do trabalho real, o que o ACS faz no seu cotidiano

de trabalho, e o que ele informa, por meio das narrativas, como sendo parte do seu trabalho.

O diário de campo, por sua vez, passou a se constituir também em uma outra

narrativa: a do observador. Transcritas as observações sob a forma de texto, foi possível dar

um tratamento organizativo e analítico com base em elementos da análise temática de

conteúdo de Bardin (2004), com a identificação de núcleos de sentidos comuns contidos nas

descrições das atividades.

2.2 Sujeitos e Cenários da Pesquisa

Os sujeitos da pesquisa foram 23 Agentes Comunitários de Saúde, sendo 13

trabalhadores do PACS do Alto da Boa Vista e 14 do PSF do Parque Vila Isabel. Destes, 06

eram homens, e 17, mulheres, demarcando a característica feminina do trabalho do ACS.

Ambas as áreas fazem parte da Área Programática (A.P.) 2.2 do Município do Rio de Janeiro.

Esta A.P. compreende os bairros de Tijuca, Vila Isabel, Maracanã, Andaraí, Grajaú e Alto da

Boa Vista.

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O Alto da Boa Vista é um bairro que também vem colaborando como campo de

estágio do internato da graduação da FENF/UERJ. Esta comunidade possui um PACS

implantado desde 1999, com um total de 13 ACS, sendo que alguns ACS trabalham desde

esta época. Apesar de estar dentro de uma AP fortemente urbanizada, trata-se de um bairro

atípico, pois algumas de suas comunidades se situam nos limites da área de preservação

ambiental do Maciço da Tijuca.

As comunidades são dispersas, sendo que as mais antigas e maiores possuem infra-

estrutura urbana melhor, e situam-se à beira da estrada entre os bairros da Usina e Barra da

Tijuca. Outras são menores, agrupando poucas dezenas de residências, e uma das microáreas

inclui residências que estão dentro do Parque Nacional da Floresta da Tijuca, com famílias

que lá já residiam há muitos anos. As características geográficas e do espaço são diversas,

prevalecendo as residências localizadas em ladeiras, sem acostamento ou asfaltamento,

algumas com pavimentação rudimentar. A água é oriunda da pequena estação de tratamento

que se abastece dos mananciais dentro da Floresta da Tijuca, mas nem todas as microáreas

possuem água encanada e tratada, tendo de se servir de borrachas, ligando diretamente os

mananciais às casas. Há iluminação elétrica em todas as microáreas, e ônibus circulando

apenas nas comunidades à beira da estrada.

O PACS realiza cobertura assistencial em 16 microáreas, porém no momento há 03

microáreas descobertas de visitas regulares dos ACS, devido à saída dos ACS. Estas

microáreas são atendidas por uma enfermeira, que também acompanha os demais ACS que

atuam próximo, e que colaboram na cobertura destas microáreas, no caso de algum agravo ou

necessidade identificada.

A outra equipe de ACS inserida no estudo atua na comunidade do Parque Vila Isabel,

bairro de Vila Isabel. Nesta comunidade funciona um PSF com 14 ACS atualmente. Uma

microárea encontrava-se descoberta à época do estudo. Esta comunidade possui

características de uma favela urbana, com áreas mais organizadas e com infra-estrutura

urbana, e outras mais precárias. A paisagem é marcada pelas subidas por meio de escadarias,

com vielas ligando as casas. Há rede elétrica sendo usual, sobretudo na parte mais alta, a

presença de ligações clandestinas, chamadas “gatos”. O abastecimento de água varia, sendo a

parte inferior da comunidade servida com água encanada, e na parte superior, por meio das

ligações individuais diretas entre manancial e residências.

A observação de campo se deu por meio do acompanhamento das caminhadas, visitas,

reuniões e outras atividades realizadas pelos ACS. Os encontros eram agendados previamente

com estes ou com a enfermeira, iniciando-se pela manhã, no módulo, a partir do qual os ACS

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partiam para as visitas. Esta atividade de observação realizou-se entre os meses de março a

junho de 2008, e foram acompanhadas 74 visitas domiciliares.

2.3 Coleta de Dados

Leopardi (2001) afirma que a observação pode ser considerada como técnica de coleta

de dados quando o pesquisador entra em contato com a realidade que se está estudando e

anota tudo o que considera pertinente para a pesquisa. Este contato com a realidade a ser

pesquisada, neste estudo, foi obtido por meio de minha presença diária no campo de trabalho

dos agentes comunitários de saúde, acompanhando-os durante 22 dias, observando e

registrando as atividades de trabalho, e, a partir destas, identificando de maneira preliminar os

riscos presentes neste trabalho.

Buscou-se apreender e registrar todas as situações, ambientes, atitudes e condições que

podem representar riscos para a saúde deste trabalhador. Polit (2004), afirma que os eventos

próprios para a observação podem ser características e condições dos indivíduos,

comunicação verbal e não verbal, as atividades realizadas, grau de destreza e comportamento,

características ambientais, entre outros.

A técnica de observação proporciona ao pesquisador obter a informação no momento

em que ele ocorre, podendo pessoalmente registrar o evento, porém, Leopardi (2001) ressalta

que para se utilizar a observação, devemos seguir algumas características, como: ser atento;

ser preciso, pois o registro deve conter detalhes do acontecimento como falas, gestos,

movimentos, relações entre pessoas, entre outros; exata e completa e ser sucessiva e metódica,

e para isso a autora sugere que seja utilizado um instrumento que colabore para a observação.

O instrumento, neste caso, foi o roteiro com conteúdo sobre riscos no trabalho, que colaborou

para guiar o olhar durante o acompanhamento dos ACS.

Este roteiro contém alguns elementos referentes aos riscos no trabalho, utilizando

como referencial as bases normativas do Ministério da Saúde e do Ministério do Trabalho e

Emprego: Manual de Doenças Relacionadas ao Trabalho do MS (2001), e as Normas

Regulamentadoras NR-7 (BRASIL, 1998), que dispõe sobre o programa de controle médico

de saúde ocupacional; a NR-9 (BRASIL, 1994), sobre a prevenção de riscos ambientais, a

NR-17 (BRASIL, 1990), que trata da ergonomia, e a NR- 32 (BRASIL, 2005),

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especificamente voltada para o trabalhador do setor saúde. Mesmo considerando-se que vários

dispositivos da NR 21 (BRASIL, 1978), que dispõem sobre os trabalhos a céu aberto foram

revogados pela NR-17, esta Norma também foi consultada (Quadro 3):

Tipos de Riscos Situações de Risco Riscos Observados

Risco físico Radiação solar, chuva,

umidade das casas,

barulho dos carros e

dos sons das casas,

Choque elétrico, odores

Risco químico Poeiras das ruas,

fumaça dos carros, cigarros,

contato com substâncias químicas

Risco biológico Pessoas com doenças

infecto-contagiosas,

presença de vetores de doenças

(ratos e baratas, etc),

fluidos corporais

Risco ergonômico Ritmo de trabalho acelerado,

organização do trabalho,

longas caminhadas,

carregar peso, postura,

esforço no trabalho

Risco de acidentes Ruas não pavimentadas,

Áreas de difícil acesso,

em morros, presença

de violência urbana,

choque elétrico,

ataque de animais

Quadro 3 - Roteiro preliminar de observação para a identificação de riscos no trabalho

dos ACS

As situações de trabalho e os riscos observados foram registrados no diário de campo,

que para Polit (2004) deve ser um registro dos eventos e conversas diárias. Nesse diário foram

registrados não somente as ações e atitudes realizadas pelos ACS, mas também seus relatos,

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suas aspirações, situações, e as condições relativas ao ambiente de trabalho, buscando-se

garantir ao máximo a riqueza de detalhes.

Neste sentido, vale lembrar que não se trata de uma observação neutra, uma vez que o

olhar do pesquisador dirige-se e focaliza determinados aspectos. Numa perspectiva da

pesquisa qualitativa crítica, Minayo (1999) chama a atenção para o fato de que a pesquisa é

um lugar onde a perspectiva do pesquisador está em contato com a dos sujeitos, embora com

esta não se confunda. Neste sentido, meu olhar como pesquisador dirigiu-se aos aspectos que,

na observação e na fala dos ACS, apontavam para situações capazes de afetar seu bem estar e

sua segurança como trabalhador.

2.4 Organização e Análise dos Dados

O diário de campo gerado, sistematizado sob a forma de narrativa, incluiu também as

narrativas trazidas pelos ACS durante o período de observação. Os riscos, identificados com o

apoio do roteiro de observação, também foram sendo registrados. Passou-se a um processo de

organização e análise com base na análise de conteúdo temática de proposta por Bardin

(2004).

Alvarez e Jurgenson (2007) pontuam que a análise de conteúdo segue sendo uma

maneira de analisar qualquer forma de comunicação humana, em especial a oriunda de meio

de comunicação de massa, e as falas de atores populares. Por permitir a apreensão,

organização e analise de aspectos objetivos e subjetivos, é considerada pelos autores como um

método híbrido, mas fortemente ancorada no paradigma qualitativo. Elementos observados

podem ser considerados como dados objetivos, enquanto elementos narrados, como

subjetivos. Este estudo agrega, portanto, um conjunto de dados que têm origem tanto na

realidade objetiva observada quanto nas impressões e explicações, narradas pelos ACS.

A parte descritiva do diário de campo foi transcrita, e, como procedimento preliminar,

foi feita uma leitura flutuante, para identificação de aspectos convergentes e mais relevantes

do contexto observado. Numa segunda leitura, foram identificadas unidades de significação,

que, no caso do presente estudo, não se referem apenas a narrativas ou falas dos sujeitos, mas

também às situações, às condições que envolviam seu trabalho, e à descrição do que faziam

como atividade.

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A diversidade e pluralidade de ações realizadas pelos ACS foram sendo agrupadas,

num processo de organização em que a opção foi a de categorizá-las em três categorias

temáticas, cujo eixo de definição foi o tempo e o espaço onde ocorreram.

A partir destas categorias, as atividades foram sintetizadas num quadro, para facilitar a

leitura e posteriormente descritas, para recuperação dos detalhes e das informações sobre os

contextos nas quais ocorriam.

No momento posterior, passou-se à comparação entre o que os ACS realizaram como

trabalho real, e as atividades prescritas, definidas a partir das competências profissionais, e

descritas no referencial teórico. Buscou-se, desta forma, evidenciar as convergências e

discrepâncias entre o trabalho prescrito e o real. Numa ultima etapa, agregou-se a esta

discussão os riscos identificados a partir do roteiro de observação e na análise dos dados

descritivos, discutindo-os à luz dos referenciais da saúde do trabalhador. A abordagem

qualitativa, assim, permitiu a apreensão de um conjunto amplo de elementos a serem

discutidos, já que os dados que geraram os resultados ultrapassaram o escopo proposto pelo

roteiro de riscos.

2.5 Procedimentos Éticos

Os objetivos, limites e alcances do estudo foram explicados a todos os sujeitos

envolvidos, que assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice A),

recebendo uma cópia assinada pelo pesquisador, de acordo com a resolução 196/96, que

normatiza a realização de pesquisas com seres humanos.

O projeto de pesquisa que deu origem a este estudo apresentado ao Comitê de Ética da

Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, sendo aprovado na data de 24 de março de

2008 por meio do Parecer 21 de 24 de março de 2008 (Apêndice B)

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3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Através das observações realizadas para a coleta de dados, foi possível identificar e

organizar as situações de trabalho real dos ACS expressos em atividades. Também as

informações e narrativas que os ACS faziam sobre seu trabalho geraram dados sobre estas

atividades.

Este capítulo apresenta primeiro as atividades reais desenvolvidas pelos ACS do

estudo, seguindo-se uma comparação entre o real e o prescrito, considerando as atividades

geradas a partir das competências curriculares e revisão bibliográfica. No terceiro tópico,

discutem-se os riscos identificados e seus potenciais impactos na saúde deste trabalhador.

3.1 Atividades Desenvolvidas pelos ACS

As observações e narrativas geraram um conjunto extenso de atividades que foram

sintetizadas, para fins de facilitação da compreensão e da análise, em: i) atividades que o ACS

desenvolve antes de ir para a comunidade e/ou no módulo/unidade de saúde; ii) atividades que

os ACS desenvolvem na comunidade e iii) atividades desenvolvidas fora do horário e local

formal de trabalho. O quadro 4 de atividades identificadas apresenta esta organização:

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Atividades realizadas no módulo / unidade

de saúde / antes de sair para VD

Atividades realizadas na comunidade Atividades realizadas fora do horário / local /

situação de trabalho

Definição de área de cobertura e

distribuição das microáreas;

Planejamento diário;

Recepção de pacientes no

acolhimento;

Organização de fichas de

atendimento de atendimento

Reunião com a equipe técnica e

coordenadores em nível central

Preenchimento de fichas de

estatística e produtividade,

Planejamento e preparo de ações

educativas coletivas

Auxilio e controle de materiais e

medicamentos

Marcação de consultas e exames

Mapeamento de área de cobertura

Realização de visita domiciliar às famílias

para orientações em saúde e resolução de

problemas diversos;

Cadastramento de famílias

Registro das situações encontradas durante as

visitas;

Solicitação da assinatura de uma pessoa da

família visitada como forma de comprovar a

atividade;

Acompanhamento do crescimento e

desenvolvimento e da situação vacinal através

da caderneta da criança;

Responder a chamado para avaliar

curativos cirúrgicos de moradores pós-

operados durante a troca de curativo no

fim de semana e/ou à noite;

Responder a pedido para socorrer

pessoas em situação de urgência /

emergência em finais de semana, noite,

madrugada e férias;

Acompanhamento na ambulância, em

lugar do familiar, de morador que teve

problema de saúde,

Atendimento a pessoas drogadas em

festas;

Quadro 4 – Trabalho Real – atividades observadas / informadas pelos ACS (continua)

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Convocação da comunidade para a

adesão às campanhas de vacinação,

controle de doenças crônico-

degenerativas como hipertensão e

diabetes;

Participação em atividades junto com

agentes de endemias como busca de

focos de proliferação de mosquito Aedes

aegypti;

Informa sobre inscrição e cadastramento

no bolsa família

Entrega de medicamentos do programa

Remédio em Casa;

Informação e acompanhamento de

pessoas a serviço de emergência,

urgência, retorno para reavaliação e

avaliação na unidade em caso de

necessidade;

Responde a chamado para avaliar

suturas, feridas e outros problemas;

Discussão e orientação com os garis comunitários

sobre o lixo;

Quadro 4 – Trabalho Real – atividades observadas / informadas pelos ACS (conclusão)

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Em relação às atividades realizadas exclusivamente no módulo, ou no momento que

antecedia a entrada na comunidade, as que mais envolveram os ACS, durante a observação

e a partir dos relatos são descritas a seguir.

Antes de saírem para realizar a visita domiciliar, se concentravam na sala de

reuniões do módulo e organizavam a pasta com prancheta, canetas, folha de produtividade

diária, cartões de vacinação, resultados de exames, marcações de consultas e exames.

Levavam também o aparelho de pressão, estetoscópio e glicosímetro, caso fossem realizar

visitas acompanhadas com profissional médico, enfermeiro ou técnico de enfermagem. À

observação, esta atividade de planejamento ocorria de modo tumultuado, com todos os

ACS querendo pegar seu material ao mesmo tempo. Apenas os impressos eram fornecidos

pelo serviço, canetas e lápis eram de propriedade do ACS.

No módulo de PSF era realizado atendimento aos moradores que precisassem de

consulta e não pudessem esperar até o dia do agendamento. Este atendimento era

denominado de acolhimento. Para esse acolhimento, havia uma escala de profissionais

técnicos (enfermeiros, médicos e técnicos de enfermagem) e de ACS. O atendimento

ocorria no período da manhã e dois ACS participavam do acolhimento, recepcionando os

moradores, separando as fichas, identificando as prioridades (idosos, portadores de

necessidades especiais, entre outros), separando o prontuário para a utilização da consulta.

Após identificar as prioridades, o ACS encaminhava para a consulta com o profissional

indicado. Durante esta atividade, não foi observado o uso, pelo ACS de nenhum protocolo

ou roteiro para guiar a decisão. Quando o ACS ficava em dúvida sobre alguma situação,

perguntava ao enfermeiro.

O período da coleta dos dados ocorreu em uma situação crítica, devido à epidemia

de dengue que afetou fortemente as áreas do estudo. Havia equipes desfalcadas e alguns

profissionais enfermeiros e médicos estavam solicitando a saída do Programa, por

insatisfação. Todo esse contexto levava a uma grande quantidade de atendimentos diários,

que devido à situação de epidemia de dengue, estava sendo realizado o dia inteiro. Foi

observado que o grande número de atendimento pela livre demanda e o desfalque no

número de profissionais causava grande tensão e angústia nos ACS, pois eram

constantemente cobrados pela comunidade quanto ao atendimento, mas dependiam dos

profissionais para atenderem a população.

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Outra situação que foi relatada pelos ACS como complicadora, foi o fato da

epidemia de dengue ser prioridade para o atendimento e as outras necessidades da

comunidade ficar em segundo plano. Essa priorização deixou os ACS em dificuldade com a

comunidade, já que solicitavam agendamento de consultas e marcação de exames e não

podiam fazê-las, pois as marcações estavam suspensas.

Este fato ocorreu durante a observação e evidenciou problemas de relacionamento

entre os ACS e alguns profissionais de saúde, em especial na equipe de PSF. Esta

dificuldade levava os ACS a terem de manter uma postura de “súplica” a fim de que outros

atendimentos fossem feitos, além dos casos de dengue.

No PACS não se evidenciou dificuldade de relação dos ACS com a enfermeira, mas

também havia problemas com relação ao agendamento e marcação de consultas e exames

para os moradores. Neste caso, o posto de saúde de referência muitas vezes limitava o

número de vagas para o PACS, o posto não possui todas as especialidades para o

atendimento à demanda (como cardiologista, endocrinologistas e oftalmologista) e o

usuário reclamava do atendimento.

Estas situações dificultavam o papel de mediador realizado pelos ACS, já que a

responsabilidade recaía sobre os seus ombros quando eram informados que o usuário não

havia conseguido realizar a consulta ou apresentavam alguma dificuldade. Ao retornar na

residência e buscar informações sobre o resultado da consulta, das informações sobre o

diagnostico ou como foi o resultado dos exames. Quando ocorriam estas situações, os ACS

relataram sentirem-se constrangidos e buscavam ou remarcar ou marcar agendamento

através da solicitação pelo GAT.

Realizavam o preenchimento de fichas de cadastramento das famílias, onde constam

diversas informações sobre o morador, como nome e idade, endereço, situação conjugal,

número de filhos, condições de moradia, emprego, entre outros. Após o preenchimento e

complementação dos dados, esses eram lançados no sistema de informação da prefeitura

para gerar dados das condições de saúde da área. Esta é uma atividade aparentemente

simples, mas que se refere a uma invasão, por parte do ACS, na intimidade da família. Nem

todas as pessoas estavam dispostas a prestar informações pessoais para o ACS, e isto

gerava uma certa tensão durante a visita.

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Para lançamento dos dados estatísticos no sistema informatizado da prefeitura, cada

dia da semana entre segunda e sexta-feira era escalado um ou dois ACS para ir ao GAT e

realizar pessoalmente a digitação destes dados no sistema. Foi observado que absorver esta

nova função trazia muito desconforto e sofrimento para os ACS, pois não possuíam

habilidade e familiaridade com o uso de computadores. Isto era mais freqüente com os ACS

com idade mais avançada, sendo que os mais jovens já apresentavam familiaridade maior

com o uso de computador, embora considerassem esta função como uma sobrecarga de

trabalho.

Na realização da visita domiciliar, os ACS saiam do módulo, geralmente vestindo

calça comprida, calçado fechado, camisa de malha com a identificação do Programa,

portavam uma pasta com alça para apoio apenas em um dos ombros. Em algumas situações

de muito calor, alguns ACS vestiam bermudas e sandálias abertas, pois relatavam ser mais

confortável para se deslocar na comunidade. Não havia uso de galochas ou sapatos para

andar na lama e na chuva, nem capas de chuva ou guarda-chuvas fornecidos pelo serviço, e

sim de posse pessoal pelo ACS.

Carregavam na pasta as fichas de cadastro de moradores, ficha de produtividade

diária, carteiras de vacinação, solicitações de agendamento de consultas e exames,

resultados de exames, garrafa de água de 600 ml, caderno para anotações, lápis, caneta,

borracha, fichário, agenda, telefone celular e pertences pessoais.

Para realizar efetivamente a visita, os ACS necessitavam se deslocar por

caminhadas de até 25 minutos sob o sol ou chuva, sendo este o tempo que levávamos do

módulo até a primeira casa a ser visitada na comunidade. A caminhada por vezes acontecia

na beira de estrada, sem proteção para o pedestre e com pequena faixa da calçada que deve

ser disputada com ciclistas.

No período da coleta de dados, foram freqüentes que as visitas se dessem sob

condições climáticas adversas, com dias de muito sol e calor. Algumas ACS do sexo

feminino usavam protetor solar antes de começar a caminhar sob o sol, manifestando

preocupação com a pele, mais no sentido estético do que de prevenção do câncer. Não foi

observado o uso dos bonés, apenas um dos ACS usava um chapéu de tecido. Já o uso de

repelentes tópicos era usual e freqüente, em função de se tratar de área de forte infestação

de mosquitos.

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Nos dias de chuva, e com a proximidade dos meses de inverno, as condições

climáticas variavam, e o ACS caminhava exposto à chuva e ao vento, e, em alguns dias, sob

temperaturas mais frias. O uso de capas de chuva e guarda-chuvas era de opção individual

pelo ACS, não sendo fornecidos pelo serviço. O ACS diminuía o numero de visitas em dias

de muita chuva, limitando-se a visitar as famílias mais necessitadas.

Ao chegar à comunidade, o ACS subia longas escadarias, altas, escorregadias,

algumas construídas de modo precário, com pedras de rio. Fazer visitas nas comunidades

mais distantes do Alto da Boa Vista, implicava em caminhar em vielas de barro

escorregadio, passar por ribanceiras, caminhar no meio de mato, por ruas sem

pavimentação, caminhar por becos e corredores entre as casas; no trajeto encontram-se

animais soltos, como cachorros, cavalos, vacas, e vetores como ratos e baratas. Nas visitas

às casas que ficavam dentro da Floresta da Tijuca, outros animais e insetos poderiam surgir,

segundo os ACS: cobras, abelhas, marimbondos, mutucas e borrachudos.

Nas áreas altas de difícil acesso, as pessoas não descem para jogar o lixo no local

adequado, depositando nas encostas dos morros, e após algum tempo queimam o lixo

acumulado, o que gera muita fumaça. Em algumas casas havia a criações irregular de

animais como galinhas, porcos, vacas, patos, gansos, pombos e cavalos, gerando mau odor

e presença de muitas fezes no caminho.

No Parque Vila Isabel, o ACS transitava próximo a fios elétricos distribuídos

irregularmente pela comunidade, dificultando a caminhada. No trajeto, encontrava pessoas

que estavam evidentemente sob efeito do uso de drogas e álcool. A violência urbana se

fazia presente quando caminhavam pela comunidade entre pessoas armadas, em locais nos

quais, há freqüentemente o conflito armado entre traficantes de facções rivais.

As visitas domiciliares podiam levar de 15 minutos até mais de meia hora,

dependendo da situação encontrada. Em relação aos ambientes das casas, foi observado que

o trabalho do ACS se dava em residências mal iluminadas, mal ventiladas, com umidade,

higiene precária, com a presença de pessoas fumando, com animais de estimação como

gatos, cachorros, pássaros, e com a infestação por mosquitos e moscas.

Durante a visita, após apresentar-se, o ACS costuma perguntar sobre a situação de

saúde da família, e se estava acontecendo algum problema. No caso de pessoas hipertensas

ou com diabetes, o ACS perguntava sobre sintomas e sobre o uso dos medicamentos,

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passando depois a prestar orientações sobre uso correto dos medicamentos. Em alguns

casos, os ACS conferiam e ajudavam na organização das medicações dos moradores.

Também foi feita, por ele, a entrega de medicamentos do Programa Remédio em Casa.

Ao identificar situações como a ocorrência de problemas dermatológicos, dermatite

de contato em bebês (assaduras), ou ambientes muito sujos e desorganizados, os ACS

convocavam as pessoas, em especial a mulher que estivesse presente, para a necessidade de

organizar e manter a higiene da casa e pessoal. Nas situações em que havia mulheres

jovens, com parceiros, ou adolescentes, prestava informações sobre planejamento familiar,

métodos contraceptivos e prevenção de DST/AIDS.

O desenvolvimento destas ações educativas era de caráter informativo e impositivo,

e o ACS não buscava problematizar as situações ou encaminhar um debate coletivo sobre

saúde. As respostas à sua fala eram variadas, algumas pessoas se mostravam curiosas e

desejosas de saber mais, a maioria se limitava a escutar, respeitosamente; alguns reagiam

com manifesta indiferença ou rejeição.

Quando o ACS identificava situações de doença, ou estas eram relatadas, o ACS

registrava os dados e dizia à pessoa que ia tentar um agendamento de consulta na unidade,

agindo aa mesma forma ao receber solicitações para marcação de consultas e exames.

Nestas situações, ficava clara uma postura de “profissional” por parte do ACS, que assumia

inteiramente a responsabilidade pelo agendamento, de forma natural.

Nas casas nas quais havia crianças, o ACS conferia a Caderneta da Criança,

verificando o estado vacinal, e de crescimento e desenvolvimento, apenas olhando os

gráficos de peso e altura, e se os espaços para o carimbo das vacinas estavam preenchidos.

Diante de situações nas quais não ficava clara a situação vacinal, o ACS se mostrava

inseguro e encaminhava a mãe da criança para procurar o enfermeiro da unidade.

Em relação ao programa Bolsa Família, trata-se de um programa de geração de

renda de implantação recente. Não se sabe a origem da determinação, mas o fato

observado foi que o ACS passou a assumir a prestação de orientações sobre o Programa

junto às famílias, verificando o cumprimento dos requisitos, tais como a manutenção da

criança na escola, caderneta de vacinação em dia e condição de renda.

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O ACS acompanha os agentes de endemias no combate ao mosquito da dengue,

entrega telas para caixas d’água, e tanto orienta quanto participa ativamente na busca e

eliminação de criadouros dos mosquitos.

De forma velada, utilizando a relação de amizade ou conhecimento com as pessoas,

fez alerta sobre os riscos do uso e abuso de drogas e álcool e do envolvimento com a

criminalidade, sobretudo dirigindo-se aos jovens que vai encontrando na comunidade

durante sua caminhada diária. Não é uma atividade educativa formal e sim informal e

espontânea.

Além das atividades realizadas no módulo e nas visitas domiciliares, os ACS

acabavam atuando em horários fora do seu expediente, à noite, nos finais de semana, nas

férias e fora do seu local de atuação. Os ACS, sob os pedidos insistentes das pessoas e das

famílias, visitavam as casas à noite, recebiam pedidos de agendamento no domingo,

durante seu passeio no shopping, no seu período de férias anual. As solicitações para que os

ACS voltassem à noite se davam em função da presença, somente neste horário, de outro

familiar que compreendesse melhor as orientações. Outra situação em que ocorreu este

pedido foi em caso de urgência no auxilio ao socorro de pessoas adoentadas ou que

houvessem piorado durante a noite; mais raramente, ocorreu de haver pedido de socorro a

moradores envolvidos com o trafico que foram baleados em conflito entre facções.

Outra situação que envolve o ACS fora do ambiente de trabalho são as situações de

intoxicação por uso excessivo de drogas e/ou álcool. Nos finais de semana, a comunidade

costuma organizar bailes e festas, eventos onde os usuários de drogas e álcool costumam se

exceder e algumas vezes acabam passando mal. Como o ACS trabalha com médicos e

enfermeiros nas unidades, os moradores lançam sobre ele a responsabilidade de colaborar

no socorro, como forma de facilitar-lhes o acesso ao atendimento por estes profissionais.

Atuavam também em campanhas de vacinação, que geralmente ocorre nos finais de

semana, colaborando em conjunto com os outros profissionais na organização dos materiais

utilizados, como seringas, agulhas, mesas, cadeiras, caixas de isopor com gelo para manter

a temperatura das vacinas. Organizavam os impressos, realizando registros dos

atendimentos na estatística, organizando as filas e convocando a comunidade para a

participação.

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Confirma-se o que outros autores como Tomaz (2002), Bornstein (2007), David

(2008) e Nascimento (2008) já haviam constatado: que o ACS desenvolve uma quantidade

excessiva de atividades, e que não há uma definição clara de suas atribuições.

O conjunto de atividades descrito conforma o trabalho real dos ACS das duas áreas

estudadas. Na comparação com as atividades prescritas, aprofunda-se a análise das

condições em que se dá o seu trabalho, e das suas contradições, problemas e

potencialidades.

3.2 Comparação ente o Trabalho Prescrito e o Trabalho Real dos ACS

Neste tópico, busca-se comparar e discutir o trabalho prescrito com o trabalho real

do ACS, a partir das atividades identificadas nas competências curriculares, e dos

resultados do estudo. Segue-se então a organização proposta para as competências, quais

sejam: ações de integração entre o ACS e a equipe e deste com e a população; planejamento

e avaliação das situações de saúde; promoção da saúde e ações educativas; ações

preventivas e monitorização de risco sanitário.

A discussão foi dividida em subtópicos, na seguinte seqüência: i) comparação das

atividades prescritas com as realizadas; ii) comparação das atividades que não estão

prescritas, mas foram observadas ou relatadas pelos sujeitos da pesquisa, e iii) comparação

das atividades estão prescritas, mas não foram observadas ou relatadas no estudo.

3.2.1 Atividades Prescritas e Realizadas

Nas ações de integração com a comunidade, a atividade tanto prescrita como real

que marca de modo mais significativo o trabalho do ACS é, sem dúvida, a visita domiciliar.

Nas atividades prescritas, a visita domiciliar possui a finalidade de realizar orientações para

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a promoção de saúde e prevenção de doenças e ações de monitoramento dirigidas a grupos

prioritários, como hipertensão, diabetes, dengue (BRASIL, 2003, p.12).

Estas ações, ao serem incluídas nas suas atribuições, dão a entender que estes

profissionais precisam ter competência técnica e conhecimento sobre o processo saúde-

doença e seus fatores condicionantes e determinantes. Alem disso, deve possuir

conhecimento e compreensão de conceitos sobre saúde, doença e qualidade de vida,

condições de sistematizar um trabalho educativo individual e coletivo aos diferentes

grupos, independente de idade, doença que possa ter desenvolvido ou risco a que está se

expondo (envolvimento com o tráfico, drogas, álcool, entre outros).

Quando comparamos estas atividades com o que foi realizado, a primeira

discrepância que se nota é, na descrição do trabalho real, a realização da visita e das

orientações pelo ACS parece ser uma atividade tranqüila e livre de tensões, o que não

acontece, segundo as observações. O ACS não realiza as visitas seguindo um planejamento,

já que a demanda da comunidade e do serviço se impõe, e ele acaba tendo que dar conta de

uma série de visitas não planejadas. Além disso, ao ser chamado para avaliar situações

sobre saúde, como feridas operatórias, problemas oculares, dentre outras situações

observadas, o ACS não é capaz de dar a resposta adequada, e pode ficar inseguro diante

destas situações. Mas, para legitimar-se perante a comunidade, o ACS tenta atender a todos

os pedidos, fato que foi observado por Bornstein (2007). Em decorrência, torna-se

sobrecarregado e manifesta desconforto e angustia para responder às tarefas demandadas.

O conhecimento que utiliza para avaliar estas situações é de base empírica: ao olhar

a ferida operatória, por exemplo, pode reconhecer sinais inflamatórios, se há saída de

secreção, pergunta sobre dor no local, usando assim um saber que para Von (2004), se

estrutura a partir da atividade de trabalho, e não do conhecimento teórico. Seria de se

esperar que os problemas em conseqüência de uma má avaliação destas situações pelo ACS

seriam freqüentes. No entanto, este trabalhador desenvolve uma sabedoria prudente que

visa justamente legitimá-lo como um mediador entre a comunidade e o serviço, e

importante para os dois. Isto quer dizer que o ACS avalia a partir de critérios empíricos,

mas não imprudentes. No entanto, não é uma situação discutida ou claramente definida

dentro da equipe, o que deixa o ACS em situação de permanente insegurança ao ser

chamado para atender estes casos.

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Um exemplo de ação conjunta em saúde que é prescrita é a realização de atividade

de orientação sanitária, como o acondicionamento adequado do lixo e solicitação da

atuação dos garis comunitários em determinada área da comunidade. Esta atitude

demonstra não somente a preocupação com a comunidade em que mora e trabalha, mas

também nos faz supor que há empatia com os problemas como sendo também seus.

Observamos que a interação não se limita aos garis comunitários, mas também há o

envolvimento da associação de moradores para garantir e fiscalizar que a solicitação seja

cumprida. Além da ação com os garis e com a associação de moradores, os ACS

participaram de atividade de escovação de pedras dos rios na tentativa de controle de

proliferação de mosquitos, em conjunto com outros mobilizadores comunitários

denominados guardiões dos rios. Sua participação se deu também pela convocação da

comunidade para participar, chamada constante pela rádio comunitária, para a convocação

às atividades coletivas e de prevenção de doenças, orientando sobre as formas de prevenir

dengue.

Estas atividades de interação e convocação da comunidade podem ser

compreendidas como ações de integração e cidadania, de participação da sociedade na luta

pelos seus direitos e interesses. Verificou-se que o ACS se consolida como liderança

comunitária relevante, e é capaz de desenvolver estratégias criativas para realizar estas

atividades coletivas. Concordando com Bornstein (2007), verifico que reside aí uma grande

potencialidade do ACS, que acaba pouco visível quando se compara com o papel de

controle sanitário que lhe é atribuído.

Importante ressaltar, que nas atividades de visita domiciliar com foco em doenças

ou problemas de saúde, seu papel é limitado, e isto gera ansiedade e sofrimento. Mas, nas

atividades comunitárias, revela-se sua capacidade de, efetivamente, levar adiante projetos

coletivos de mobilização para a promoção da saúde. O ACS cumpre, nestas atividades, um

papel que de fato pode ter destaque para a consolidação do SUS (SILVA E DALMASO,

2002, P.77)

Entre as estratégias utilizadas pelo ACS para garantir a realização da atividade na

comunidade, está a relação com os comerciantes locais, convencendo estes comerciantes da

necessidade de determinados materiais para a realização das ações e para lanche que é

oferecido aos participantes. Esta iniciativa representa um importante exemplo de liderança

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identificado por Bornstein (2007), e desvela assim a formação uma complexa rede de

relações que precisa realizar para garantir suas ações na comunidade. Esta situação também

foi observada por Valla (1999) demonstra que, no mesmo momento que os ACS mobilizam

membros com tempo disponível na comunidade, mobiliza também as pessoas que não

possuem tempo disponível para participar, mas possuem condições para colaborar.

Por outro lado, a necessidade de solicitação de doações deflagra uma deficiência do

sistema de saúde, pois deveriam ao promover e estimular a participação dos ACS para

atividades coletivas, prover as condições necessárias para que estas atividades

acontecessem plenamente, demonstrando assim uma dificuldade de organização e

planejamento das ações em saúde.

A parcela burocrática de trabalho apresenta uma realidade cotidiana, pois com

exceção do mapeamento da área para distribuição das microáreas e cadastramento das

famílias que só acontecem no momento de implantação do programa de PACS e PSF,

existem os impressos que são preenchidos diariamente e mensalmente.

Esses impressos são: o planejamento diário de atividade a ser realizada, a

produtividade diária que é separada por turnos, a atualização das fichas de cadastro das

famílias, o relatório de atividades e o fechamento da produtividade mensal (SSA2).

Esses impressos são impostos pelo nível central como forma de coletar dados de

saúde daquela comunidade com o objetivo de planejar ações locais e direcionadas de saúde

para a necessidade identificada. Em atividade de reunião com gerentes de saúde de nível

central, outra função de um dos impressos é servir como respaldo legal para o ACS e para a

unidade que a atividade proposta pelo programa de atendimento domiciliar acontece de

fato.

A comprovação legal da realização de visita domiciliar é a solicitação da assinatura

de um dos moradores na ficha de produtividade diária, em um espaço reservado para tal,

comprovando que o ACS compareceu na residência para realizar seu trabalho. Segundo

esta mesma gerente, já houve processos judiciais envolvendo a prefeitura do Rio de Janeiro,

onde o morador referia não estar sendo coberto pelo PSF, apesar de morar na área de

cobertura. A prefeitura foi absolvida, já que ficou comprovado através da assinatura que as

visitas domiciliares eram realizadas regularmente, pelo menos uma vez por mês.

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Outra utilidade identificada para esses impressos é possibilitar o controle do

trabalho e da produtividade dos ACS, já que este deve apresentar as fichas preenchidas para

comprovar ter atingido as metas de produtividade fixadas pelo nível central. Conclui-se que

esta é uma atividade prescrita que também é realizada, mas a sua lógica não é a de gerar

informações sobre saúde, e sim sobre a produtividade do ACS, numa perspectiva

fiscalizatória, em que, de modo velado, está presente permanente desconfiança sobre seu

trabalho.

A interação e integração entre o ACS e os profissionais, preconizada pelo perfil de

competências do MS, prevê a realização de reuniões regulares, a realização de visitas de

profissionais acompanhadas dos ACS e realização de atividades de promoção da saúde e

prevenção de doenças em conjunto. Destas atividades de “interação” entre o ACS e os

profissionais que atuam nos programas de PACS e PSF, a que mais chama atenção é a

reunião de equipe.

A reunião em equipe deveria acontecer, na lógica da atividade prescrita proposta

pelo MS (2003), para a discussão e planejamento das atividades a serem desenvolvidas na

comunidade, segundo a identificação das necessidades e prioridades de saúde da

comunidade. Entretanto, foram observados que as reuniões são em sua maioria

informativas, para treinamento de novas condutas e implantação de sistemas de informação

e de cobrança sobre os prazos de entrega das estatísticas e da produtividade. Trata-se de

uma pressão da organização do trabalho sobre o trabalhador, capaz de gerar riscos e danos à

sua saúde (DEJOUS, 1992, p.52).

As marcações de consulta ocorrem quando não há falta de médico ou enfermeiro na

unidade, ou quando outro médico de outra equipe aceita atender morador que não é coberto

pela sua microárea. Esta situação representa uma contradição, pois os profissionais que

atuam na assistência à saúde da família e da comunidade não deveriam criar dificuldade

para o atendimento. Por outro lado, ao perceber a resistência de atendimento pelo médico

ou enfermeiro, os ACS orientavam o morador a procurar o posto de saúde da área, pois sua

microárea está sem profissional e os profissionais que se encontravam no módulo somente

atendiam moradores de outras microáreas se houver caso de prioridade.

Neste caso, a interação entre os profissionais ocorre e o encaminhamento dos

usuários também ocorre, mas não é um fluxo pactuado. Acontece sob pressão da

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comunidade e do ACS, numa relação que às vezes o leva ao constrangimento quando

precisa marcar uma consulta e sua equipe está desfalcada, como relatado por uma ACS “eu

já nem peço mais pra médica atender, mando o morador logo para o posto pra não precisar

pedir. Que ela já vem cheia de grosseria... ”. Essa relação tensa não representa uma atuação

de equipe interdisciplinar, mas de uma equipe multidisciplinar que não atua em conjunto, e

o principal prejudicado acaba sendo o usuário morador. Revela ainda, forte hierarquização

no processo de trabalho em saúde, marca do sistema de organização rígida do trabalho

como o taylorismo e identificado nos trabalhos de David (2008) e Ribeiro (2004).

3.2.2 Atividades Não Prescritas e Realizadas

Das atividades realizadas pelo agente comunitário de saúde, pode-se identificar a

realização de atribuições que não seriam de sua responsabilidade, pois não está prescrito no

manual de competências ou em outros manuais do Ministério da Saúde. Durante o período

de coleta de dados, observamos que realizavam funções burocráticas e de secretaria, tais

como organização e acondicionamento de materiais de consumo no almoxarifado,

colaboração na organização e controle de farmácia local na unidade, organização, procura e

busca de prontuários para o atendimento de consulta dos profissionais médicos e

enfermeiros.

Foi observado que é realizada uma escala de ACS que acompanham os profissionais

em consulta e no atendimento de livre demanda, onde os ACS recebem os moradores que

chegam para coleta de exame e livre demanda, organizam os prontuários, identificam e

encaminham as prioridades de atendimento (recém-nascidos; idosos com pressão alta,

portadores de deficiências, entre outros).

Estas atividades de organização documental, de busca e organização de prontuários

deveriam ser realizadas por um profissional burocrático. O trabalho de burocracia,

organização de prontuário, separação para atendimento e organização de fila, deveria ser

realizado por uma secretária ou auxiliar de escritório responsável por esse controle e o ACS

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assumiria de fato seu papel de recepcionar e avaliar as prioridades para atendimento em

nível primário de atenção à saúde.

O ACS é, assim, um “faz-tudo”. As raízes desta condição, capaz de gerar riscos e

problemas à saúde deste trabalhador parecem residir na própria estrutura social brasileira,

na qual persiste a existência de uma população em condição que Souza (2006) descreve

como subcidadania. Vale ressaltar que o ACS é, dentro da equipe, o trabalhador menos

qualificado, mais recente, e, ainda por cima, oriundo das classes populares, e residente na

comunidade.

Durante a realização de visitas domiciliares, identificamos também algumas

atividades que são realizadas pelos agentes comunitários e que não são de sua competência

técnica. Em uma das visitas, uma adolescente que já havia iniciado tratamento de um

abscesso inguinal no posto de saúde solicitou a avaliação pelas ACS.

Nesta situação observo a realização de uma função que deveria ser realizada por um

enfermeiro ou médico, pois nesta avaliação poderia ser observado se o abscesso estava

regredindo, coloração, aspecto, presença de exsudação, entre outros. De acordo com a

atividade prescrita, o papel do agente comunitário deveria ser orientação em saúde, higiene

corporal, do lar e cuidados com as roupas, registrar a situação de saúde na estatística e

encaminhar à consulta para a avaliação do profissional competente para realizar a conduta

mais adequada se fosse necessário.

No entanto, em função dos pedidos da comunidade, e para legitimar seu papel

mediador referido por Bornstein (2007), o ACS acaba assumindo estas tarefas, para as

quais lança mão de uma sabedoria, que Von (2004) classifica como empírica prudente.

Isto não significa que ele considere estas situações adequadas. Pelo contrário, sente-

se pressionado e indignado diante das dificuldades de resposta pelo sistema de saúde, como

consta nos relatos dos ACS no trabalho de Silva (2001), quando uma ACS relada em tom

de desabafo que a comunidade cobra que realizem tarefas de enfermeiros.

Outras atribuições assumidas pelos agentes comunitários de saúde são a entrega das

medicações do programa Remédio em Casa e orientações sobre o programa Bolsa Família

do Governo Federal, por atuarem mais próximo da comunidade, conhecer bem seus

integrantes, e saberem identificar as localidades dentro da comunidade. Estes dois

programas de assistência à população, ao serem atribuídos aos ACS, acabam

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sobrecarregando seu trabalho. Desvela-se com isso uma visão utilitarista do trabalho do

ACS.

O programa Bolsa Família é um programa de inclusão social que oferece uma

quantia em dinheiro para famílias. Estas famílias devem ser enquadradas em alguns

critérios para terem direito ao benefício, como um limite de renda mensal, estar em dia com

a caderneta de vacinação das crianças, e estas devem estar matriculadas na escola e

freqüentando as aulas. Este programa realizou um recadastramento das famílias que

recebiam o benefício e os ACS, devido percorrer a comunidade com freqüência e conhece-

la, ficaram responsáveis por orientar a comunidade sobre o recadastramento.

Alguns ACS relataram que foram ameaçados por membros de uma família, caso

perdessem o benefício do programa Bolsa Família. O ACS possui definido nas

competências que deve participar de ações na comunidade, mas não deve assumir a

responsabilidade de realizar e orientar quanto aos critérios de inclusão e exclusão dos

programas.

Esta atividade deveria ser realizada por um profissional especializado em lidar com

os interesses sociais e financeiros da população, como o assistente social. Este profissional

ou um grupo de profissionais treinados por este profissional e sob sua supervisão, poderia,

por exemplo, montar um mutirão para atender a comunidade.

Como o ACS conhece a comunidade e possui um papel de liderança, a atuação

dentro de suas competências seria comunicar e convocar a comunidade para que fossem

realizar cadastramento, recadastramento ou procurar informações sobre formas de inclusão,

exclusão e prazos nos postos de atendimento para o programa. No entanto, mais uma vez

assume tarefas fora de sua governabilidade.

Também relacionado com o conhecimento e a proximidade dos ACS com a

comunidade, o programa Remédio em Casa, promovido pela Prefeitura do Rio de Janeiro,

acaba gerando mais uma atribuição aos ACS, devido à falta de clareza dos endereços das

comunidades, o que dificulta a localização das moradias pelos entregadores. Esta falta de

clareza decorre do desenvolvimento desordenado das comunidades e a identificação de

becos e escadarias como ruas elos moradores. Devido à dificuldade de localização dos

endereços, o entregador deixa as caixas de medicamentos no módulo ou unidade de saúde

onde atua o ACS, ou frequentemente na associação de moradores.

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Devido a essa condição, o ACS se encarrega de entregar as medicações que

deveriam ser entregues por pessoas que são pagas para tal, mas foram entregues à

associação de moradores ou à sua unidade. Este trabalhador realiza suas atividades, muitas

vezes precisam sair da sua organização de trabalho para realizar o trabalho gerado por outro

profissional.

Quando o ACS tem um planejamento de atuação próximo da casa dos pacientes

contemplados pelo programa, esta tarefa pode não parecer tão desgastante. Mas em

comunidade como a do Alto da Boa Vista, que um ACS realiza cobertura de áreas

distantes, esta tarefa representa um grande deslocamento e um peso ou volume extra para

carregar e realizar a atividade que seria de outro profissional.

Fato importante observado neste contexto, que quando a entrega deve ser realizada

em uma comunidade que cresce desordenadamente, como no Parque Vila Isabel, realmente

torna-se inviável ao trânsito de veículos e entrega dos medicamentos. A comunidade se

desenvolveu na subida do morro, possui apenas a via principal viável à circulação de

veículos, sendo prioritariamente composta por escadarias, vielas e becos, o que

impossibilita a localização das casas.

Na comunidade do Alto da Boa Vista, a comunidade se desenvolveu de forma que

tornou viável o transito de veículos na maioria de sua extensão territorial, porém, os

entregadores do programa Remédio em Casa também deixam as medicações dos moradores

de áreas cobertas para serem entregues pelos ACS. Esta é uma questão interessante por

supor que estes entregadores podem estar criando uma cultura de delegar aos ACS da área

coberta pelos programas PACS / PSF a distribuição destes medicamentos. Esta situação nos

faz refletir se estes entregadores, que ganham seu salário realizando esta tarefa, estariam se

aproveitando do fato dos ACS realizarem visitas domiciliares e se aproveitando disso e com

isso o sobrecarregando com mais esta tarefa.

Muitos moradores trabalham durante o dia e, segundo relatos dos ACS e durante

observação na comunidade, à noite muitas pessoas chamavam em sua casa para marcar

consultas e/ou exames quando apresentavam problemas de saúde. Relataram que tal

situação era muito desagradável, mas não poderia recusar já que o atenderia de qualquer

jeito. Alem de serem solicitados em casa, relataram também que nos finais de semana,

feriados e até nas férias os moradores os abordam nas ruas para realizar solicitações de

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agendamentos, marcações de exames e informações sobre consultas, programa Bolsa

Família, entre outros.

Esta situação de abordagem fora do horário ou das competências dos ACS tornou-se

presente quando durante a realização das visitas domiciliares os moradores na maioria das

situações eram idosos, com algum grau de deficiência visual ou auditiva solicitava que o

ACS retornasse mais tarde, pois sua filha ou filho estaria trabalhando e naquele momento,

mas logo chegaria em casa e poderia compreender melhor as orientações.

Outra situação que retrata a atuação do ACS fora do horário de trabalho e que

participa de sua competência, foi combinar durante a realização de visita domiciliar à

senhora que havia realizado uma cirurgia cerebral que drenava líquor, que voltaria mais

tarde quando a filha chegasse do trabalho, para acompanhar a troca do curativo e avaliação

da ferida operatória. Esta conduta gera dois problemas potenciais: o hábito de atendimento

a qualquer hora e a realização de uma tarefa de outro profissional.

A criação do hábito de atendimento fora do expediente pode representar a criação de

um compromisso que certamente será conhecido e divulgado pela comunidade, podendo

gerar uma responsabilidade, pois se atendeu a um morador, quando outro precisar também

se achará no direito de ser atendido. Outro problema possível de acontecer é a cobrança de

atendimento fora do horário pelos outros agentes de saúde. Pode ocorrer a cobrança de que

se o outro agente atende, este também deverá atender.

Estas situações de atendimento são relatadas pelos ACS como complicador, pois

compreendem que o usuário necessite do atendimento, mas não pode ficar abrindo mão da

sua folga, descanso e até das férias que é um direito de todos os trabalhadores. Mesmo

contra a vontade, alguns ACS relataram atender no seu momento de ócio, mas relatam que

na verdade seu desejo era poder viajar para conseguir realmente descansar e não ser

abordado por moradores em seu momento de descanso.

Fato relatado também pelos ACS é a sua solicitação pelos moradores para socorrer

pessoas não só que passam mal em casa, mas também pessoas drogadas que passam mal

por uso de drogas e álcool ou que são baleadas por conflito na comunidade entre facções

rivais. Esse papel de socorrista poderia ser realizado por qualquer pessoa devidamente

treinada, mas no perfil das competências do ACS não consta a atuação em situações de

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urgência e emergência. Segundo relato dos ACS, as pessoas acham que por que trabalham

com médicos e enfermeiros, devem saber atuar nessas situações.

A unidade básica de saúde não possui a função de atender pessoas em caráter de

urgência e emergência, não possui estrutura e equipamentos para realizar este tipo de

atendimento. Os ACS não são treinados e caso atue em caráter de urgência de forma

inadequada, pode representar ainda mais risco para o socorrido.

Além de o treinamento oferecer uma qualificação para a conduta com o doente,

oferece também uma orientação para evitar riscos para a saúde do socorrista, já que ao

socorrer a vítima, está se expondo ao risco de entrar em contato com fluidos corporais que

representam risco biológico. Principalmente quando se trata de uma comunidade dominada

pelo tráfico, e com freqüente conflito com facções rivais, é freqüente ocorrer ferimentos por

projéteis de arma de fogo com grande sangramento.

Nesta situação é necessária a avaliação médica e de enfermagem para a conduta

mais adequada, ainda envolve uma questão legal, pois necessita de registro policial, com

preenchimento de boletim de ocorrências. Para a preservação da integridade física e mental

dos profissionais, esta ocorrência não chega até os registros policiais, porém, seria

teoricamente obrigatório.

São situações que, alem de gerarem sobrecarga física e psíquica no trabalhador

ACS, evidenciam o quanto o SUS ainda se apresenta limitado no que se refere ao

cumprimento dos princípios de acesso universal e atendimento integral, como discute Stotz

(2008).

3.2.3 Atividades Prescritas e Não Realizadas

Existem atividades que são designadas como competência dos ACS e estes não

realizam. Entre essas atividades, a participação da análise dos dados epidemiológicos da

sua área e na elaboração das ações de saúde voltadas para a sua área. Em geral, os ACS

participam do levantamento das condições de saúde da sua área (diagnóstico da

comunidade), através do levantamento dos dados relativos aos grupos de risco, como:

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número de hipertensos, diabéticos, gestantes, crianças menores de 01 ano, tuberculosos,

entre outros, mas não participa da avaliação e planejamento das ações de saúde específicas

para esses grupos.

Em geral, as ações planejadas para a comunidade são discutidas e planejadas em

nível central e suas conclusões e condutas são definidas sem a participação do representante

local, que é o ACS, trabalhador e morador que poderia trazer alguma contribuição. Essas

ações chegam como determinações para serem realizadas e sofre o risco de não ser

adequada à realidade da comunidade.

As ações de saúde precisam ser discutidas e adequadas às necessidades e realidades

do local onde será implantada para atingir e ser compreendida pelo maior número possível

da população, nesse caso o melhor representante da comunidade, que se espera possuir a

linguagem, cultura e vivência da comunidade são os ACS.

Este fato leva à reflexão sobre o porquê de este representante da localidade onde

deve ser implantada a ação de saúde não participar de seu planejamento. Essa exclusão nos

faz imaginar que o papel de transformador da realidade não passa de demagogia, já que no

momento de personalizar a atuação de acordo com as características da comunidade, os

ACS não participam. Isto é reforçado pela fala de um ACS, ao avaliar suas condições de

trabalho: “Dizem que somos os olhos da comunidade, mas isto é uma mentira”.

Não acredito que seja devido à falta de formação escolar ou acadêmica a exclusão

do ACS nesse papel primordial, como trabalhador e membro da comunidade, que é

garantido pelo perfil de suas competências. Podemos supor que a idéia que originou esta

cartilha do perfil das competências dos ACS, teve intenção de desenvolver um tipo de

gerencia participativa, buscando romper a tradicional característica de gerencia autoritária,

que toma as decisões em nível central e enviam de cima para baixo, já chegando pronta aos

trabalhadores.

Certamente a tradição de gerência autoritária permanece em todos os níveis de

governo apesar dos esforços para mudar esta realidade, a organização taylorista no trabalho

em saúde como constata Ribeiro (2004). Dessa forma excluindo assim a possibilidade de

uma discussão aberta, democrática e participativa com os principais interessados que são os

integrantes do povo, como seus representantes.

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3.3 Riscos Observados no Trabalho dos ACS

A partir das visitas, atendimentos, observações das visitas, narrativas, e após a

análise dos dados, foram identificadas diversas situações e condições que podem gerar

riscos, tanto durante a realização do trabalho real quanto de trabalho prescrito para o ACS.

Neste tópico, retomamos uma seqüência de apresentação a partir do enfoque de riscos

ocupacionais.

Ainda que sua mensuração não tenha sido possível, devido ao escopo do presente

estudo ser outro, ao apontarmos alguns riscos identificados, buscamos ampliar a

caracterização sobre as condições de trabalho dos ACS.

Dentre os riscos físicos podemos destacar a exposição pela radiação solar, onde está

presentes o raio ultravioleta e infravermelho, extremamente nocivo e relacionado a doenças

da pele, como a queimadura solar de pele que ocorre após a exposição intensa a radiação

solar, pode causar também a dermatite solar, que segundo MS (2001) as principais causas a

exposição por raios ultravioleta e infravermelho. Desta forma, se relaciona também com o

desenvolvimento de câncer de pele, muito freqüente em trabalhadores cuja tarefa principal

obrigue a permanência na rua em céu aberto.

Pode ocorrer também o acometimento dos olhos como a catarata, que é a

opacificação do cristalino que pode ser parcial ou completa, em um ou ambos os olhos, e

geralmente ocorre em idade produtiva e a irradiação infravermelha é reconhecidamente a

causa mais importante. Pode ocasionar até a cegueira em seu estágio mais avançado. Fato

interessante que no manual do Ministério da Saúde não cita a exposição solar entre os

fatores de risco, mas relata casos de trabalhadores de soldas.

Há também exposição à umidade, especialmente nos períodos de chuva e na

realização de VD em locais úmidos. Este tipo de exposição não se restringe aos períodos de

chuva já que uma das comunidades encontra-se na Floresta da Tijuca, área de muitos rios,

cachoeiras, árvores e as casas localizam-se próximas e até inseridas nessas áreas. Essas

condições tornam o ambiente bastante úmido

O Parque Vila Isabel, apesar de não se localizar em área tão úmida e fechada pela

natureza, possui canos com vazamentos e esgotos a céu aberto, além das moradias serem

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extremamente próximas umas das outras, terem poucos cômodos em sua maioria e terem

ventilação precária. Toda esta condição torna o ambiente bastante úmido e mal ventilado

que se torna similar ao anterior. Estes riscos também foram identificados no trabalho de

Nascimento (2008) e Trindade (2007), e descritos como exposição ao calor, frio e umidade

conforme a mudança climática.

Estas condições do ambiente favorecem ao aparecimento de outra modalidade de

risco, o biológico, já que a umidade propicia a proliferação de fungos e bactérias, gerando a

possibilidade de uma doença respiratória e/ou um processo alérgico no trabalhador.

Pôde-se observar também que durante a realização do trabalho, o ACS encontra-se

exposto aos riscos químicos, como a poluição industrial, poeiras, fumaças dos automóveis

nas estradas, fumaça de cigarro em visitas à pacientes fumantes e de queimadas, sendo

todas relacionadas a doenças do sistema respiratório, rinites, alergias entre outros.

No trabalho de Franco e Druck (1998) essas condições são explicitadas quando

referem tratar-se das ações das sociedades contemporâneas, devido ao seu padrão de

consumo e produção. Afirmam que estas situações são capazes de interferir nos

mecanismos reguladores da biosfera, causando os principais problemas ambientais em

virtude da poluição química, emissão de gás carbônico e outros poluentes tóxicos,

destruindo a camada de ozônio e favorecendo o efeito estufa, situação que expõe toda a

população a risco de adoecimento.

Como descrito no manual do Ministério da Saúde (2001)sobre doenças relacionadas

ao trabalho, a poluição do ar nos ambientes de trabalho associa-se a uma gama de doenças

do sistema respiratório, que acomete desde o nariz até o espaço pleural. Os fatores de

exposição às propriedades tóxicas dos gases, fumaças, vapores e partículas aerossóis

(poeiras), são responsáveis por doenças como: faringite, bronquiolite, laringotraqueíte,

rinites alérgicas, pneumoconiose por poeira inorgânica, afecções inalatórias, podendo

chegar até a um edema agudo de pulmão.

Não muito raro de ocorrer, é a pneumonite por hipersensibilidade, que é resultante

de repetidas inalações e da hipersensibilização de poeiras orgânicas e substâncias químicas,

em que há a presença de antígenos fúngicos, bacterianos e protéicos que desencadeia a

doença. Fato este relevante, já que há a presença de criadouros irregulares de animais nas

comunidades observadas, causando um acúmulo de fezes, resíduos orgânicos e odores

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desagradáveis, além de causar o transtorno da poluição do ar e visual, favorecem ao

aparecimento de animais vetores de doenças como moscas e ratos.

No trabalho dos ACS, estes riscos se apresentaram concordando com o trabalho de

Trindade (2007), que destaca os odores provenientes de esgotos e valas e condições de

higiene ambiental e das famílias, como fumaça e poeiras orgânicas e inorgânicas. Nesse

contexto, Farias (2006) destaca que em ambiente rural, as poeiras têm sido associadas aos

problemas respiratórios e, a poeira orgânica aumenta ainda mais o risca, já que costuma

estar contaminada por esporos e fungos.

Observou-se a exposição aos riscos biológicos quando foram realizadas visitas aos

usuários portadores de doenças infecto-contagiosa de transmissão aérea, em especial a

tuberculose, com agravante de que um deles não aceitava o diagnóstico e não realizava o

tratamento. Sua abordagem foi realizada em um botequim, sem sucesso de sensibilização

quanto a importância da adesão ao tratamento, mas em geral seu atendimento é feito em sua

casa, mal iluminada e mal ventilada.

Sabemos que os agentes etiológicos estão disseminados no meio ambiente, não

sendo de natureza exclusivamente ocupacional, mas as condições ambientais de

saneamento e higiene são precárias, existe a prevalência de doenças infecto-contagiosas e

parasitárias nos moradores. Nesse sentido o MS (2001) descreve que as possíveis

conseqüências podem ser: quadros de infecções agudas ou crônicas, parasitoses, reações

alérgicas e tóxicas, podendo ser causadas por bactérias, vírus, fungos, entre outros. As

parasitoses estão normalmente associadas aos protozoários, helmintos e artrópodes,

causando geralmente infecções intestinais, doenças de pele, respiratórias e pediculose.

Dessa forma, a exposição aos riscos biológicos corrobora com o manual do MS

quando afirma que a ocorrência das doenças depende das condições e circunstâncias em

que o trabalho é executado e da exposição ocupacional que favorece o contato, contágio e

transmissão. Assim, os ACS atuam em local de endemia de dengue com total exposição aos

vetores. Esta situação faz emergir uma dificuldade em identificar seu nível de exposição

ocupacional.

O MS (2001) relata casos de acometimento de trabalhadores de zonas endêmicas,

em trabalho de saúde pública e laboratórios de pesquisa, onde a exposição pode ser

identificada. Em todo caso, persiste a questão a ser examinada em estudos posteriores, se o

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fato dos ACS trabalharem continuamente no ambiente da comunidade os expõe mais aos

vetores, que os moradores destas áreas.

A ingestão de água não tratada proveniente de nascentes que pode passar por

situações de contaminação, a água tratada também pode passar pelo de risco de

contaminação como, por exemplo, atravessar por dentro de um rio onde se despeja

esgotamento sanitário; realizam atendimento aos usuários com condições precárias de

higiene e, como conseqüência, portadores de escabiose, pediculose e micoses; são

solicitados com freqüência para avaliarem os curativos dos usuários, o que pode levar ao

contato com feridas limpas ou contaminadas, realizando uma conduta que não é de sua

competência, mas não vê como recusar frente aos pedidos do usuário, causando um

sofrimento psíquico indiretamente.

Os agentes comunitários de saúde trabalham caminhando na comunidade sob o sol e

o calor, muitos não levavam água para consumo e saíam à comunidade para a realização

das visitas. Em determinado momento do trabalho, o cansaço causado pelo desgaste das

caminhadas, subidas e descidas e longas conversas e orientações em saúde o fazia aceitar a

oferta de água realizada pelo morador. Esta situação expõe aos riscos biológicos não só de

contato, mas também de ingestão de água e alimentos contaminados, já que não ofereciam

apenas água, mas também frutas, bolos, pão, entre outros.

Também listado no manual, encontramos a leptospirose, zoonose relacionada aos

trabalhadores que realizam atividade de contato direto com água e locais contaminados com

os dejetos de animais que são reservatórios; pode ocorrer também o desenvolvimento de

hepatites tipo A e E, pois ocorrem através das mãos, águas e alimentos contaminados,

sendo inclusive conhecido como doença dos trabalhadores por águas usadas. Vale lembrar

que os ACS observados neste estudo participaram de atividades de limpeza de rios, o que

os expõe ao contato com água contaminada pelo esgoto ou por dejetos de outros vetores,

como o rato.

Identificam-se riscos para a infecção por doenças de pele, que compreendem as

alterações da pele, mucosas e anexos, causadas, mantidas ou agravadas direta ou

indiretamente pelo trabalho, e podem ser relacionadas ao trabalho já que as circunstâncias

ocupacionais podem ser consideradas como fator de risco. Segundo dados do MS (2001),

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este conjunto de doenças tem sido frequentemente responsável por desconforto, prurido,

ferimentos, alterações da estética e funcional que interferem na vida social e no trabalho.

Nas situações em que há o contato desse profissional com curativos limpos ou

contaminados (curativos cirúrgicos feridos por acidentes ou tiros), apresenta exposição

biológica que se restringe à contaminação por sangue e fluidos corporais, podendo se

contaminar pelo vírus da hepatite B e, até mesmo pelo vírus HIV (vírus da

imunodeficiência humana). Para o MS, esse fator de risco é relevante, já que as

circunstancias de exposição são acidentais ou ocorrem em condições específicas do

trabalho, contanto que sejam bem documentados e excluídos outros fatores de risco

(BRASIL, 2001).

O ACS não é um trabalhador de saúde que deveria estar exposto ao material

biológico, de acordo com o seu perfil de competências. No entanto, vimos que, em função

do seu trabalho real, isto acaba acontecendo com alguma freqüência.

Quando se fala em exposição aos fluidos corporais e ao sangue, estabelece-se uma

especificação no Manual de Doenças Relacionadas ao Trabalho, que envolve apenas

profissionais que trabalham em laboratórios, centros de hematologia e profissionais que

trabalham em hospitais e postos de saúde na área de vacinação e coleta de sangue. Essa

delimitação dos grupos considerados expostos aos fluidos corporais e ao sangue nos faz

pensar em outra questão interessante: no trabalho do Agente de Saúde, que atua na

comunidade em que reside, fora da segurança de paredes, dos outros profissionais e dos

seguranças que muitas vezes encontramos nas portarias das unidades de saúde, como

recusar uma solicitação de socorro?

Pela atuação na comunidade, e funcionando como pessoa de referência e mediação

entre o acesso ao serviço de saúde e a comunidade, muitas vezes o ACS não tem como

recusar uma assistência de emergência aos seus clientes assistidos. Considerando as

situações de riscos originados principalmente pela violência urbana, não raramente este

profissional se vê obrigado a se posicionar em situação de socorrista à pessoas baleadas,

feridas, agredidas ou acidentadas, com exposição a sangue e fluidos corporais e sem possuir

um treinamento, um equipamento de proteção individual (EPI), e sem ser respaldado

legalmente para esta atribuição.

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Estas situações de fato o expõem a situações de risco a doenças transmitidas pelo

sangue, como o HIV, riscos de contaminação por hepatite que, segundo o MS (2001), a

prevalência é de 02 a 04 vezes maior nos trabalhadores de saúde e a incidência é 05 a 10

vezes maior que na população em geral. Porém, como não contempla as atuações em

comunidades ou nas residências, cita que a via principal de transmissão é através de

procedimentos de transfusão sanguínea, injeções percutâneas com sangue e agulhas

contaminadas e através da relação sexual.

Os riscos ergonômicos estiveram claramente presentes durante as observações,

sendo identificado grande sofrimento psíquico nas situações relativas à cobrança da

supervisão direta e da gerência geral em relação à produtividade; delegação de

responsabilidade para a realização de atividades que não são de sua competência, como o

controle de peso e critérios para a inserção e manutenção no programa bolsa família,

atividade que deveria ser realizada por assistentes sociais. Todos estes fatores representam

um sofrimento psíquico, já que caso o benefício seja cancelado, esta pessoa culpabiliza o

ACS e muitas vezes até o ameaça (fato relatado pelos ACS).

Esta situação pode ser compreendida como o que Martinez (2004) identifica como

risco psicossocial, gerando uma carga psíquica para o ACS durante a realização do seu

trabalho. Nesse contexto, Vidal (2002) descreve que essa carga de trabalho está relacionada

às exigências sobre o indivíduo no decorrer das atividades de trabalho, e quando o

indivíduo não consegue gerenciar ou regular esta carga, se depara com uma situação de

constrangimento ou incômodo, que pode levar até ao adoecimento.

Há sobrecarga de tarefas com o acúmulo de funções, como a entrega de

medicamentos do programa do remédio em casa, já que muitas vezes o funcionário do

correio justifica não saber encontrar o endereço; e entrega na associação de moradores ou

mesmo no módulo do PACS ou PSF, e realizar entrega de lonas para vedação de caixas

d’água nas casas da comunidade, função que seria do agente de endemias.

Há desgaste frente aos usuários quando não consegue ser resolutivo ou quando

dependem de outro profissional e este não responde dentro do esperado; como em situações

em que o usuário precisa de uma consulta médica e o agente não consegue marcar devido

aos esforços estarem voltados para o atendimento de uma prioridade (como o caso do surto

de dengue); quando o profissional justifica já ter acabado o horário de atendimento de livre

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demanda, ou se recusa devido o usuário ser morador da microárea de outro profissional e

não atende.

Outra situação observada que também representa desgaste e sofrimento ocorre

quando há a necessidade de uma referência à um atendimento mais específico em outra

unidade fora da comunidade e não aceitam a referência ou não consegue o atendimento,

dessa forma gerando grande estresse e sofrimento. Este problema poderia ser resolvido com

uma organização para a cooperação dos serviços de referência e contra-referência, com as

especialidades necessárias à comunidade.

Muitas vezes os ACS não conseguem identificar os resultados de melhora na

conduta e na saúde do usuário, já que muitas vezes a origem do problema é de natureza

político-governamental, gerando a sensação de estarem sós, sem apoio e com a sensação de

“enxugar gelo”. A falta de visibilidade dos resultados é discutida por Dejours (1992), que

considera esta situação um fator determinante na saúde do trabalhador, dessa forma levar os

ACS a desenvolver o trabalho com monotonia.

Gera desgaste por serem solicitados fora do horário de expediente, em especial à

noite, no final de semana e durante as férias, situação muito comum encontrada nos relatos.

Essas situações podem gerar dificuldades no caso de recusa do atendimento, pois no dia

seguinte o ACS precisará “bater a sua porta”, e este poderá hostilizá-lo devido recusa.

Sofrimento gerado pela incerteza do emprego, já que sua forma de contratação é

considerada precária, o que representa uma contradição com o objetivo de sua criação pelo

Ministério da Saúde, onde este profissional foi criado para atuar apenas nos programas do

SUS. Porém, sua mão de obra é contratada por empresas terceirizadas, fato que expõe o

ACS de certa forma às decisões de sua gerência direta, não tendo a sua matriz criadora

(SUS) nenhum compromisso com este profissional. A partir daí, gerando incerteza quanto à

manutenção do emprego e o receio na realização de parcelamentos de bens com longo

prazo para pagamento, há relato de ameaça ao descredenciamento de uma microárea com a

dispensa do ACS no caso de haver tanta dificuldade para o acesso e baixos salários.

Todas estas situações, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, através da

análise do que rege a NR 17 (BRASIL, 1991), geram determinado grau de sofrimento e

podem gerar até transtornos mentais em situações mais graves. Nesse sentido, o MS

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(BRASIL, 2001) afirma que esses transtornos podem acometer cerca de 30% dos

trabalhadores, com 5 a 10% dos casos em situações mais graves.

Em nossa sociedade, o trabalho é mediador de integração social, seja pela

necessidade de subsistência ou pelo aspecto cultural, ganhando cada vez mais importância

em nossa sociedade. Dessa forma, as situações de trabalho podem ocasionar várias

alterações na saúde mental das pessoas, como pelos fatores organizacionais do trabalho,

divisão e parcelamento das tarefas, devido à política de gerenciamento dos recursos

humanos, e devido à estrutura hierárquica da organização.

Assim, resultam do contexto do trabalho e o aparato psíquico dos trabalhadores

pode desencadear processos psicopatológicos relacionadas às condições do trabalho. O

risco de perder o emprego gera sofrimento psíquico, pois ameaça a subsistência e a vida

material do trabalhador e de sua família, podendo gerar sentimento de desvalorização,

angústia, insegurança, desânimo, desespero, podendo levar à ansiedade e à depressão.

O MS também cita o processo de comunicação importante para a saúde mental do

trabalhador dentro do ambiente de trabalho, pois este ambiente favorece a comunicação

espontânea, a manifestação de insatisfações e a sugestão dos trabalhadores sobre a

organização do trabalho, sobre as condições para ser realizado o trabalho desempenhado. A

impossibilidade dessa troca de informações pode ser considerada como uma desvalorização

do trabalhador em relação ao seu trabalho e pode provocar tensão, sofrimento psíquico e

distúrbios mentais que podem se manifestar não somente pela doença, mas por elevados

índices de absenteísmo, conflitos no trabalho e fora dele.

O tempo e o ritmo de trabalho também são importantes na determinação de

sofrimento psíquico, pois as jornadas longas de trabalho, com poucas pausas para descanso,

refeições sendo realizados em períodos curtos de tempo, trabalhos em turnos alternados,

iniciando muito cedo pela manhã. Os ritmos intensos ou monótonos, pressão exacerbada

dos supervisores ou chefia por mais velocidade ou produtividade, entre outros, são descritos

pelo MS (2001) como causadores de ansiedade, fadiga crônica e distúrbios do sono, que

somados podem levar ao desenvolvimento de “Burnout”.

Há situações em que o trabalhador desenvolve o alcoolismo, que significa a ingestão

crônica de bebidas alcoólicas que levam a um descontrole e possível intoxicação. A

Sociedade Americana de Dependência– ADS (1990) considera o alcoolismo como uma

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doença crônica, com manifestação e desenvolvimento influenciados por fatores

genotípicos, fenotípicos, psicossociais e ambientais, sendo freqüentemente progressiva e

fatal. Nesse sentido o trabalho é considerado um dos fatores psicossociais de risco para o

alcoolismo crônico.

Os episódios depressivos são caracterizados por humor triste, desinteresse e perda

do prazer das atividades quotidianas. A relação com o trabalho pode ser sutil, causada por

decepções sucessivas e por trabalho frustrante, exigência excessiva de desempenho cada

vez maior, ameaça de posto de trabalho ou do próprio emprego (BRASIL, 2001).

Outra doença mental que pode acometer os trabalhadores é conhecida como fadiga

relacionada ao trabalho ou “neurastenia” (Síndrome da Fadiga Relacionada ao Trabalho),

que se desenvolve pela fadiga acumulada ao longo do tempo onde não há a possibilidade de

se obter o descanso necessário e suficiente. A fadiga é referida como constante, como

acordar cansado, além de cansaço físico e mental. Pode haver outras manifestações como:

sono irregular, insônia, irritabilidade, impaciência, desânimo.

Acrescentaria ainda a intolerância. A situação de impaciência pode muitas vezes não

ocorrer, porém, o profissional neste estágio de esgotamento pode ainda ter condições de

atender o usuário com respeito e paciência, mas pode apresentar total dificuldade de se

relacionar com os membros da equipe e da gerência direta ou indireta.

O último estágio nesse processo de sofrimento e desgaste psíquico onde ainda não

ocorreu o surto é o desenvolvimento do “Burnout”. Este é conhecido como o estágio de

esgotamento profissional, que é decorrente da resposta prolongada aos estressores

emocionais e interpessoais crônicos no trabalho, e pode ser resultante de uma vivência

profissional em um contexto de relações sociais complexas.

Quando atinge esta condição, o trabalhador perde o sentido de sua relação com o

trabalho, desinteressa-se deste e qualquer esforço lhe parece inútil. O MS (BRASIL, 2001)

afirma ainda que afeta principalmente os profissionais da área de saúde, cuidadores,

trabalhadores da educação, entre outros.

Os problemas emocionais e organizacionais têm sido descritos como fatores

predisponentes para o desenvolvimento de doenças do sistema circulatório e digestivo, fato

este de grande relevância já que têm se dado destaque à relação entre o infarto do

miocárdio, doença coronariana e a hipertensão arterial.

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O mesmo autor reforça a importância desses acometimentos à saúde do trabalhador,

já que as doenças cardiovasculares representam 1/3 de todas as doenças que levam à

incapacidade laboral total e permanente, com parcela importante da responsabilidade das

aposentadorias por invalidez.

Dente as doenças do sistema circulatório, podemos citar: doença renal hipertensiva,

angina pectoris, o infarto agudo do miocárdio, as taquiarritmias, a aterosclerose, e até a

parada cárdio-respiratória como complicação mais extrema. Todas podem estar

relacionadas às situações de estresse decorrentes do trabalho, da ansiedade gerada pela

preocupação com a manutenção do emprego ou pelo risco de perda desse emprego, situação

de exposição ao CO2. Essas condições podem ser potencializadas ou complicadas por

condições de predisposição genética e pelos hábitos e situações da vida quotidiana, como:

diabetes, obesidade, tabagismo, sedentarismo, hábito alimentar, entre outros.

Identificam-se também as doenças do sistema digestivo, que estão entre as causas

mais freqüentes de absenteísmo e limitação para as atividades sociais e ocupacionais; e

alguns dos mais importantes fatores para o desenvolvimento das doenças do aparelho

digestivo relacionados ao trabalho estão os fatores organizacionais do trabalho, como:

estresse, situações de conflito, tensão, o trabalho em turnos, fadiga, entre outros (BRASIL,

2001).

A carga de trabalho pode ainda estar relacionada com as doenças osteoarticulares,

principalmente sendo levado em consideração o cenário em que ele se realiza: há presença

de terrenos acidentados, grandes escadarias, longas caminhadas sem pausa para descanso

ou disponibilização de veículo pelo serviço para transportar o profissional às visitas

domiciliares. Estas estão classificadas dentro das doenças ortopédicas (DORT), que

também são conhecidas como lesões por esforço repetitivo (LER), são de consideradas de

grande e crescente importância médica-social em todo o mundo. Segundo o Ministério da

Saúde (BRASIL, 2001), a norma técnica do Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS:

OS/INSS nº 606/1998), conceitua a LER como uma síndrome clínica caracterizada por dor

crônica, acompanhada ou não de alterações objetivas que se manifestam principalmente no

pescoço, cintura escapular e membros inferiores devido ao trabalho, podendo afetar nervos

periféricos, músculos e tendões.

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Muitas vezes o ACS porta uma pasta ou bolsa que força apenas um ombro,

contendo papéis para anotações, fichas para cadastros das famílias, cadernetas de

vacinação, aparelho de pressão e estetoscópio. Algumas vezes contendo ainda uma garrafa

com água para consumo próprio entre outros materiais, o que leva sobrecarga e postura

forçada sobre a coluna. Toda esta carga de trabalho e carregamento de peso representa fator

de risco para o desenvolvimento de doenças osteoarticulares.

Entre essas doenças osteoarticulares, identificamos o risco para o desenvolvimento

de artrites, que são alterações progressivas das articulações, com o comprometimento das

articulações que sustentam o peso do corpo, como as do quadril e dos joelhos, da coluna

cervical e lombar. As osteoartroses ocorrem nas articulações sinoviais, sendo mais comum

nas pessoas com idade avançada, mas pode ocorrer como conseqüência de traumatismos

articulares contínuos, deixando seqüelas (BRASIL, 2001). Os grupos ocupacionais mais

expostos são as profissões em que é exigida a realização de movimentos e/ou exposição a

impactos repetitivos sobre determinadas articulações, daí podemos observar que a subida e

descida de escadarias ou a falta de um calçado adequado que absorva impacto durante

grandes caminhadas realizadas pelos ACS.

Podem ocorrer ainda, as doenças muito comuns em profissionais que trabalham em

posições forçadas e gestos repetitivos, as dorsalgias (lombalgias), que costumam ocorrer

nos trabalhadores, que tem como fatores de risco a idade, postura ergonômica inadequada e

fadiga no trabalho. As lombalgias crônicas costumam ocorrem em trabalhadores adultos em

torno dos 45 anos de idade e podem estar associados ao trabalho pesado, ao levantamento

de peso, falta de exercícios, problemas psicológicos, entre outros.

Importante ressaltar que quando buscado na literatura do Ministério da Saúde, este

se referia apenas aos trabalhadores das indústrias ou agrícolas que trabalhavam com o

transporte de cargas, mas não mencionava qualquer coisa para os trabalhadores das

comunidades, ou da área da saúde sobre esta exposição ou risco. Não há relato pelos órgãos

competentes dos riscos, também não há normas que contemplem especificamente estes

profissionais, no que diz respeito às precauções para prevenção do risco no seu trabalho.

Quanto aos riscos de acidentes, os cenários em que os ACS atuam são em si uma

armadilha. Para a realização do seu trabalho, realizam longas caminhadas na beira de

estrada com tráfego intenso de veículos e calçadas estreitas sem proteção; áreas em

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pavimentação, no meio do mato, com acesso acidentado, úmido e escorregadio, expondo a

quedas, lesões, cortes e torções de articulações como joelhos e tornozelos (há relato de

casos, inclusive causando absenteísmo), somado às escadarias construídas e destas, muitas

são fora dos padrões adequados e de forma que ofereçam segurança.

Quando as escadarias são construídas com pedras do rio, aumenta ainda mais o

risco, já que as pedras que compõem as escadas apresentam grande quantidade de limo e a

presença de esgotos em valas a céu aberto passando muitas vezes sobre a escadaria

apresenta um fator real de risco de acidentes. A presença de fios elétricos nas passagens

com risco de choque elétrico; grande quantidade de cães soltos nas ruas e outros animais

nas matas e florestas, com risco real de mordeduras por cães, cobras, ataques de macacos,

animais peçonhentos entre outros.

Há ainda em especial no Rio de Janeiro como nos grandes centros urbanos, o risco

de violência, com possibilidade de ser atingido por um projétil de arma de fogo, devido

conflitos entre traficantes e policiais e/ou entre traficantes de grupos rivais. Esta situação

impossível de ser prevista e pode ocorrer em momento de plena realização de VD durante o

deslocamento pela comunidade, já havendo inclusive vários relatos de ocorrência dessa

natureza e o ACS não encontrou local seguro para se abrigar, o que causou grande estresse.

Entre 1980 e 2000, Brasil (2004) apresenta dados estatísticos, onde mostra que as

mortes por agressões (homicídios) foram responsáveis por 584.457 mortes no país, sendo

deste total 401.090 óbitos ente 1990 e 2000 e 70% deles ocasionados por arma de fogo.

Nesta perspectiva, os profissionais que atuam em comunidades e favelas ocupadas por

marginais podem correr maior risco de sofrer ações relacionadas à violência, entre eles o

ACS, cuja atuação envolve visita domiciliar, expondo-se freqüentemente às situações de

risco.

As formas de contratação precária, sem garantias e estabilidade geram incertezas

para o trabalhador que acaba não conseguindo criar um vínculo com a instituição,

resultando em sentimentos de desmotivação, de descompromisso com o trabalho, sensação

de insubordinação e conseqüente queda da produtividade (CASTRO, VILAR,

FERNANDES, 2004). A queda da produtividade no trabalho do profissional da saúde

atinge a qualidade do atendimento aos usuários, que possuem necessidades em saúde a

serem atendidas, e acabam sofrendo as conseqüências.

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Outra questão relevante a ser discutida é se de fato este trabalhador da saúde se

caracteriza como um profissional, já que seu trabalho está regulamentado no âmbito do

Ministério da Saúde (Brasil, 2002), mas não possui características essenciais para se

caracterizar uma profissão.

Segundo Freidson (1996), para uma atividade ser considerada profissão, deve estar

relacionada a um tipo especifico de trabalho, que deve ser especializado e teoricamente

fundamentado. A partir desse conceito, entendemos que para uma atividade ser de fato

reconhecida como profissão, é necessário possuir um corpo de conhecimentos delimitado,

complexo e institucionalizado, o que não é o caso do trabalho dos ACS.

Podemos constatar que o trabalho dos ACS é muito diversificado, envolvendo

atividades e ações em saúde junto à comunidade, de planejamento e de responsabilidade

social. Além disso, suas competências não estão claramente definidas, fato este que abre

margem para a imposição de diversas outras atividades, tornando sua atividade, como

afirma Bornstein (2007), diversificada e ampla.

Outro aspecto que Freidson (1996) chama a atenção, pois deve constar em uma

atividade para que seja considerada uma profissão, é o fato de possuir autoridade,

autonomia e o monopólio de seus serviços no mercado de trabalho. A lei federal 10.507 de

2002 que regulamenta a profissão dos Agentes Comunitários de Saúde evidencia uma

contradição em relação à autonomia, quando delimita o campo de atuação do ACS

exclusivamente no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS. Esta afirmativa representa

uma vinculação institucional, excluindo qualquer movimento de autonomia no mercado de

trabalho. Outro elemento limitador desta ocupação é a o fato de que para ser admitido nesta

função, o candidato a ACS deve residir na área onde vai atuar, não permitindo uma

mobilidade de trabalhadores entre comunidades. Considerando-se os critérios de Freidson,

confirma-se que não há nesta ocupação as características fundamentais para que seja

regulamentada como profissão.

No entanto, quando se pensa nos princípios do SUS, estas mesmas características

impeditivas tornam-se relevantes, já que devolve o sentido de vinculação e

representatividade da comunidade. Trata-se, portanto, de um dilema, a ser enfrentado pelos

ACS, pelas instituições formadoras e pelo Estado, como legitimador jurídico-normativo das

profissões.

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Além dessas já discutidas, Freidson (1996) descreve que são necessários outros

fatores como a organização de seus interesses em associações profissionais que padronizam

a conduta de seus pares, deve haver um controle interno feito através da fiscalização das

condutas profissionais com dispositivos formais (código de ética) e deve ser reconhecida

como fundamental pelo estado e sociedade e possuir uma regulamentação legal. Esta é uma

questão que precisa ainda avançar no processo de profissionalização dos ACS.

Todos estes fatores apontam para o processo de tomada de decisão na implantação

dos Programas de Agentes Comunitários de Saúde e PSF (que hoje são estratégias) e na

criação e tentativa de profissionalização da ocupação, ficando este trabalhador em um

processo confuso e marcado por contradições e precarização do trabalho. Neste sentido,

pode-se afirmar que este processo de implantação buscou responder mais a critérios

políticos, e não atentou para as questões relativas ao trabalho do ACS.

A terceirização do vínculo empregatício representa uma forma de precarização do

trabalho, com conseqüências na prestação do serviço prestado pelo trabalhador ao cliente

(nesse caso o usuário) e é considerado irregular pelo Ministério Público do Trabalho - MPT

(2007). Para este órgão, com exceção ao cargo efetivo de agente comunitário de saúde e

emprego público de agente comunitário de saúde, todos os demais modos de contratação

desse profissional no serviço são considerados irregulares, o que legalmente gera a nulidade

do vínculo de trabalho e conseqüentemente, a necessidade do afastamento do trabalhador

ao serviço (MPT)

Todos os agentes comunitários de saúde que participaram da pesquisa possuíam

contrato de trabalho por empresas terceirizadas, apesar de terem carteira assinada. Mas,

ainda assim havia o sentimento de insegurança, pois se este trabalho é de fato irregular, já

que atua em serviço público sem ser concursado, está presente o risco de ter seu vínculo de

trabalho anulado. Dessa forma, o trabalhador torna-se duplamente penalizado, pois

independente de estar atuando na ocupação por dez meses ou dez anos, não possui a

garantia sequer de acrescentar no currículo que possui uma profissão, mas uma ocupação,

caso seja dispensado do trabalho por alguma razão. Isto aponta para a necessidade de que

os ACS se organizem politicamente e se reúnam com seus pares, buscando se fortalecer e

reivindicar seus direitos como trabalhador e profissional.

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Por fim, devemos ressaltar que os enfermeiros nas unidades de PACS e PSF que

atuam em todo o país, recebem a responsabilidade de gerenciar e supervisionar o trabalho

dos ACS. Porém, não existe nenhum dispositivo legal que ofereça respaldo para que o

enfermeiro assuma esta função. Este profissional tem sob sua responsabilidade legal

gerenciar e supervisionar o trabalho realizado pelos auxiliares de enfermagem, técnicos de

enfermagem e enfermeiros sob sua supervisão e chefia. O ACS, por não se constituir em

categoria da enfermagem, não pode ser incluído, do ponto de vista legal, como

responsabilidade do enfermeiro.

No entanto, a enfermagem tem, por suas características gerenciais e formação ético-

política, assumido esta função. É também pela importância da enfermagem para a

consolidação do SUS que se pode explicar seu vínculo histórico com os ACS, desde as

primeiras experiências no Brasil (DAVID, 2001). Também para a enfermagem o trabalho

do ACS se apresenta como um dilema a ser enfrentado, com vistas à definição jurídico-

normativa que não ameace os princípios e diretrizes de um sistema democrático e universal

de saúde. Neste sentido, o alerta é na direção de ampliar o debate dentro da profissão e

juntamente com os ACS, e demais profissional, e não de defender interesses meramente

corporativos.

Dessa forma é fundamental que os enfermeiros que trabalham nestes programas

tenham a clareza de que é preciso conquistar respaldo legal para esta função. O enfermeiro,

como ator social, deve buscar nas suas representações profissionais - sindicatos, conselhos

regional e federal, o apoio para fazer avançar este debate. E enquanto este processo avança,

o enfermeiro, mesmo assumindo na prática a função de gerente e supervisor também do

ACS, deve fazê-lo de forma compreensiva, consciente, científica e humanizada,

possibilitando uma assistência de qualidade para a população, desenvolvendo uma forma de

trabalhar que possibilite minimizar os riscos no trabalho dos agentes comunitários de saúde,

ampliando os espaços de interlocução com a comunidade, e colaborando para a

implementação dos princípios e diretrizes do SUS.

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4 CONCLUSÕES

Em relação aos objetivos da pesquisa, estudo realizado, ainda que pautado em

competências curriculares, avançou na definição de um conjunto de atividades que podem

ser consideradas como prescritas, mesmo não havendo esta classificação na literatura ou

nas normativas.

Ao descrever as atividades observadas (trabalho observado), identificou-se que o

ACS possui uma enorme quantidade de trabalho depositado sob sua responsabilidade,

devido à falta de definições claras sobre quais são de fato suas atividades.

Devido à empatia do ACS com a comunidade frente aos problemas sociais e de

saúde-doença vivenciados, este trabalhador busca desenvolver estratégias para solucioná-

las, ou pelo menos minimizá-las, mesmo que para isso seja necessário acompanhar

pessoalmente os moradores em hospitais, no encaminhamento às unidades e até mesmo ao

banco. Lança mão de estratégias criativas e linguagem compatível para a compreensão das

informações, concordando em atender mesmo em locais e horários fora do que é

regulamentado para o trabalhador. Discute-se que estas atividades realizadas que não

constam em seu âmbito de competências, mas que também funcionam como forma de

legitimação do trabalho dos ACS, com o objetivo de consolidar sua importância para a

comunidade e para o processo de implementação do SUS.

O fato de assimilar as atribuições legais determinadas para o ACS, acrescido das

competências e atividades que não lhe são inerentes, e a necessidade de colaborar para a

resolução dos problemas comunitários ocasiona uma sobrecarga de afazeres. Atuando como

uma liderança na comunidade e um representante do serviço de saúde, representa uma

abertura para serem solicitados e abordados a qualquer hora do dia ou da noite, dentro ou

fora da comunidade, em qualquer situação de demanda de saúde-doença pela comunidade.

Apesar de fazerem parte da equipe de saúde que atua na comunidade, percebeu-se

que em determinadas situações, os ACS desenvolvem sentimento de impotência, como nos

casos onde o problema social é determinante para a falta de condições básicas para uma

vida digna. Outra situação que causa este sentimento nos ACS é decorrente do contexto

histórico da hierarquia das profissões.

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Em função de não ter sua legitimação profissional, ser recente no cenário nacional e

ainda ser um membro da comunidade, estes trabalhadores se sentem subalternizados com

freqüência, o que interfere no desenvolvimento das relações de trabalho entre eles e os

outros profissionais, e resulta na dificuldade de resolução das demandas geradas pela

comunidade.

Na comparação entre o trabalho prescrito e o trabalho real, respondendo a um dos

objetivos deste estudo, conclui-se que o perfil de competências propostas para este

trabalhador pode ser utilizado como referencia para as suas atividades reais diárias, mas não

as define com clareza. Dessa forma sendo necessária uma reflexão político-pedagógica para

determinar de fato qual é o seu papel do ACS no sistema de saúde e quais devem ser suas

atribuições para a consolidação do SUS.

A observação do trabalho real revelou que apesar dos ACS desenvolverem um

roteiro para realização das visitas domiciliares antes de sair à comunidade, torna-se difícil

planejar as ações, pois as demandas se revelam no decorrer das visitas e no deslocamento

pela comunidade. Há uma serie de impressos a serem preenchidos que, além de tomar

tempo dos ACS, que poderia ser mais bem aproveitado na comunidade, causam grande

sofrimento, pois além de representar uma forma de cobrança de produtividade, é uma

maneira de controlar e fiscalizar seu trabalho, geradora de tensão.

Durante as visitas domiciliares, as demandas da comunidade emergiam e exigiam

do ACS um “desembaraço” e desenvoltura para dar conta e soluciona-lo de forma prudente,

e quando não conseguia resolver, encaminhava principalmente para o enfermeiro

solucionar.

As demandas da comunidade e os programas que são oferecidos pelo Governo

Federal geram diversas situações, que forçam o ACS a realizar atividades que não deveriam

ser assumidas por ele. Mesmo quando o ACS possui alguma formação teórica e pratica para

resolver, também nestes casos lança mão da prudência e tenta resolver da melhor maneira

possível, mesmo que signifique encaminhar para a avaliação do médico ou do enfermeiro

na unidade onde atua ou em outra unidade de referencia.

Por outro lado, evidenciou-se também que o ACS não realiza atividades de analise e

planejamento das ações em saúde que serão definidas para serem implementadas na

comunidade. Estas atividades estão preconizadas pelo seu perfil de competências do

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trabalho, mas quando ocorrem as reuniões de planejamento, este trabalhador não é

convidado a participar, o que reflete a presença marcante do modelo taylorista nos serviços

de saúde, onde os ACS são apenas operários que devem apresentar as atividades de

produção, e as cabeças pensantes que atuam em nível central de gerencia se encarregam de

analisar os dados e discutir quais seriam as ações mais adequadas para a soluço do

problema. Esta organização do trabalho gera uma contradição do papel dos ACS para a

implementação das diretrizes do SUS e da democracia, que asseguram a participação

popular nas tomadas de decisão em assuntos de seu interesse.

A não participação dos ACS no planejamento e analise dos dados, nos faz refletir

sobre o porquê este profissional não é convidado a participar desta atividade, que é

garantida pelo seu perfil de competências. Para compreender melhor esta situação, é

necessário se realizar uma abordagem mais cuidadosa e específica sobre estes fatores, que

não poderão ser abordados neste estudo.

O estudo constatou ainda, que estes trabalhadores estão constantemente expostos

aos riscos no trabalho. Dentre os riscos físicos, podemos identificar a exposição aos raios

solares, já que o trabalho essencial do ACS é a visita domiciliar, o que lança este

profissional na rua, em atendimento aos usuários, realizando muitas subidas e descidas de

escadarias e longas caminhadas a céu aberto. Uma cidade tropical como a do Rio de

Janeiro onde a temperatura costuma ser quente e a intensidade solar bem intensa; a

exposição à umidade devido ao período de chuvas e locais úmidos como nas florestas e

próximo aos rios, casas úmidas e mal ventiladas e até alagamentos das ruas também nos

períodos de chuva; altos ruídos dos tiros provenientes da violência urbana, altos sons das

casas e das estradas causada pela grande circulação de veículos e caminhada na beira de

estradas.

Nos riscos químicos, podemos identificar a exposição a poeira das ruas

pavimentadas e não pavimentadas que são freqüentemente inaladas pelos ACS, os gases

do lixo acumulado inadequadamente somado ao odor das criações de animais também

irregulares, como porcos, galinhas e cavalos, que são extremamente nocivos à saúde e ao

bem estar; inalação de fumaças provenientes dos automóveis, já que realizam caminhadas

em beira de estradas, fumaças de cigarro, como haviam fumantes ativos em todo o

período de algumas visitas, éramos obrigados a inalar, mesmo que contra a vontade de e

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orientando os malefícios do hábito do tabagismo. Já relacionado aos riscos biológicos,

foram identificadas vários situações, como as casas possuíam poucos cômodos, mal

iluminadas e mal ventiladas, as famílias eram numerosas, usuários portadores de

tuberculose e não tratados, mesmo quando orientados sobre a importância junto à saúde e

aos riscos aos próprios familiares; surto de dengue; utilização de água não tratada,

proveniente de nascentes; canos de distribuição de água que passam por dentro do rio

onde são despejados os esgotos sanitários; presença de lixões com infestação de insetos e

ratos que podem funcionar como vetores de transmissão de doenças; muitas casas em

condições precárias de higiene e pessoas com infestação por pediculose e micoses;

contato e avaliação de curativos limpos e contaminados pelos ACS.

Importante ressaltar que a pesar de não estarem capacitados para essa função, os

moradores os solicitam para que observassem a ferida e o curativo, de forma a responder

a demanda do usuário, aliviando sua angústia quando é identificada alguma melhora de

cicatrização por estes. Esta situação muitas vezes representa grande sofrimento para os

ACS já que não estão autorizados a realizar tal conduta, mas não conseguem recusar

atendimento aos usuários, e somado a isto, o fato destes atendimentos acontecerem fora

do horário do expediente ou local adequado.

Nos riscos ergonômicos, foram observadas situações em que havia grande carga

de sofrimento psíquico quanto à produtividade, devido à cobrança da chefia para a

realização das tarefas, na realização de condutas que não eram de sua responsabilidade,

na sobrecarga de tarefas de sua competência, no desgaste junto aos usuários quando não

conseguem ser resolutivos ou quando dependem de outros profissionais e esses não

estavam possibilitados a assistir tal demanda devido a ausência de profissionais, ou

devido ao surto de dengue, ou não haver vaga na agenda para aquele usuário.

Há ainda a sobrecarga de trabalho, o trabalho monótono e repetitivo; a falta de

reconhecimento do seu trabalho e o desânimo por não poder atuar de forma efetiva na

melhoria da qualidade de vida dos usuários, já que muitos dos problemas são de ordem

estrutural, dependendo de políticas econômicas e sociais para a sua resolução.

Muitos ACS verbalizaram o desgaste por serem solicitados fora do horário de

trabalho, à noite em casos que os usuários consideram como “urgência”, nos finais de

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semana e até mesmo nas férias, que segundo relatos dos ACS, havendo sentimento de

fuga para outros lugares para não serem solicitados pela população.

Referentes aos riscos de acidentes foram observadas e relatadas diversas situações,

como por exemplo: longas caminhadas em estradas com grande tráfego e com calçadas

estreitas e sem proteção; a construção de casas em locais de ribanceiras com riscos de

desabamentos; áreas com ausência de pavimentação, no meio do mato, úmidos e

escorregadios, que exponham a cortes e/ou quedas (já ocorrido com ACS levando ao

absenteísmo). Grande quantidade de escadarias, muitas com uma vala a céu aberto ao

lado ou feitas com pedras dor rios, também escorregadias com riscos de queda; presença

de fios nas passagens, com riscos de choque elétrico; presença de cães ferozes nas ruas e

comunidades, cobras, animais peçonhentos (abelhas, marimbondos, borrachudos entre

outros) podendo atacar os ACS

Há também a possibilidade de ser alvo de “bala perdida”, já que alguns atuam em

área de violência urbana e constante conflito entre policiais e traficantes. Os ACS

apresentaram vários relatos dos ACS de estarem trabalhando e de repente iniciar um

tiroteio e se virem no meio dele sem ter um local seguro para abrigar-se, podendo ser um

risco fatal à vida.

Quando se analisa o trabalho do ACS, torna-se difícil não se abordar questões

referentes às suas condições de trabalho, principalmente por ser um trabalhador em

processo de afirmação. Não possui efetivamente uma organização que possa colaborar com

a defesa e proteção de sua categoria e, como sua atuação é limitada ao âmbito de SUS,

torna-se frágil seu valor no mercado de trabalho fora do âmbito do SUS. Soma-se a isto a

precarização do seu trabalho, em função de haverem diversas formas de contratação, de

acordo com a os interesses e orientações políticas das autoridades gerenciais locais.

Apesar dos esforços do Governo Federal em institucionalizar a profissionalização

dos ACS, este trabalhador não pode efetivamente ser considerado um profissional, já que

seu trabalho não possui as características necessárias para esta efetivação. Somado a

dificuldade de se afirmar profissionalmente, este trabalhador possui um vínculo de trabalho

precário, onde há um intermediário no processo de contratação, entre o contratante e o

contratado, fato considerado ilegal, já que pela lei, qualquer pessoa deve ser concursada

para ser admitida no serviço publico de qualquer esfera.

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Vale ressaltar que a lei foi alterada devido à apelação dos estados e municípios, que

argumentaram ter limitação devido à lei de responsabilidade fiscal e orçamentária, que

delimita um percentual máximo da receita das esferas de governo (teto), para despesas com

funcionários. Segundo estas esferas de governo, não poderiam contratar os ACS como

servidores. Com a alteração da lei, foi permitida a contratação dos ACS através de seleção

pública, permitindo a manutenção das orientações do SUS, que um dos critérios para se

ACS é ser morador da área onde deverá atuar e dessa forma, favorecendo a precarização do

seu trabalho.

Nesse contexto, as implicações para a enfermagem tomam visibilidade, pois a

enfermagem assume o papel de supervisão e gestão do trabalho dos ACS e deve conhecer

os fatores de risco existentes no trabalho para que possa realizar uma gerencia segura,

humanizada e participativa.

Entretanto, os enfermeiros não estão legalmente respaldados para assumirem esta

atribuição. O enfermeiro é respaldado legalmente para gerenciar e supervisionar a equipe,

que consta enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, atribuição garantida pela sua

lei do exercício profissional. No caso de assumir a supervisão e gerencia dos ACS, não há

garantias na legislação e na lei do exercício profissional, sendo necessária uma discussão

ampla, com a participação de todos os interessados e envolvidos, para que se consiga

estabelecer uma definição, que não traga prejuízo aos trabalhadores e à implementação dos

princípios e diretrizes do SUS.

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100

APÊNDICE A – Termo de consentimento livre e esclarecido

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

CENTRO BIOMÉDICO

FACULDADE DE ENFERMAGEM

MESTRADO EM ENFERMAGEM

Comitê de Ética em Pesquisa da SMS-RJ

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Você está sendo convidado para participar da pesquisa: RISCOS NO TRABALHO DO

AGENTE COMUNITÁRIO: UMA PERSPECTIVA NA SAÚDE DO TRABALHADOR. Você

foi selecionado pela sua experiência no Programa de Agentes Comunitários de Saúde no Alto

da Boa Vista e sua participação não é obrigatória. A qualquer momento você pode desistir de

participar e retirar seu consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com

o pesquisador ou com a instituição na qual trabalha.

O objetivo geral deste estudo é Desenvolver um questionário para identificação e

dimensionamento das condições ambientais do trabalho do ACS. Sua participação nesta pesquisa

consistirá em realizar o trabalho normalmente pela comunidade para que se possa observar as

condições ambientais de seu trabalho; dar a sua opinião e responder a um questionário.

Não existem riscos relacionados com sua participação. Os possíveis benefícios

acarretados pela publicação dos resultados da pesquisa dizem respeito à melhoria das condições

de seu trabalho como ACS o que, por sua vez, poderá contribuir para a formulação de estratégias

e criação de meios que contribuam para a melhoria das condições de trabalho.

As informações obtidas através dessa pesquisa serão confidenciais e asseguramos o sigilo sobre

sua participação. Os dados não serão divulgados de forma a possibilitar sua identificação uma

vez que não constarão nomes, endereços nem Unidade de Saúde onde trabalham os

entrevistados.

Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço do

pesquisador, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer

momento.

Pesquisador: Guilherme de Moraes Nascimento

Endereço: Faculdade de Enfermagem

Avenida Boulevard 28 de Setembro 157, 7º andar,

CEP 20551-030 telefone: 2587 6335 - 2568-8175

Endereço: Comitê de Ética em Pesquisa da SMS-RJ

Rua Afonso Cavalcanti, nº 455 sala 701 – Cidade Nova - RJ

CEP 20211-901 telefone: 2503-2024 / 2503-2026

Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha participação na pesquisa e

concordo em participar.

Rio de Janeiro, _____ de ________________ de 2008.

Page 103: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp104214.pdf · Riscos no trabalho do Agente Comunitário de Saúde na perspectiva da saúde do trabalhador. 2009.

101

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

CENTRO BIOMÉDICO

FACULDADE DE ENFERMAGEM

MESTRADO EM ENFERMAGEM

Comitê de Ética em Pesquisa da SMS-RJ

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Você está sendo convidado para participar da pesquisa: RISCOS NO TRABALHO DO

AGENTE COMUNITÁRIO: UMA PERSPECTIVA NA SAÚDE DO TRABALHADOR Você

foi selecionado pela sua experiência na Estratégia de Saúde da Família do Parque Vila Isabel

e sua participação não é obrigatória. A qualquer momento você pode desistir de participar e

retirar seu consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o

pesquisador ou com a instituição na qual trabalha.

O objetivo geral deste estudo é Desenvolver um questionário para identificação e

dimensionamento das condições ambientais do trabalho do ACS. Sua participação nesta pesquisa

consistirá em realizar o trabalho normalmente pela comunidade para que se possa observar as

condições ambientais de seu trabalho; dar a sua opinião e responder a um questionário.

Não existem riscos relacionados com sua participação. Os possíveis benefícios

acarretados pela publicação dos resultados da pesquisa dizem respeito à melhoria das condições

de seu trabalho como ACS o que, por sua vez, poderá contribuir para a formulação de estratégias

e criação de meios que contribuam para a melhoria das condições de trabalho.

As informações obtidas através dessa pesquisa serão confidenciais e asseguramos o sigilo sobre

sua participação. Os dados não serão divulgados de forma a possibilitar sua identificação uma

vez que não constarão nomes, endereços nem Unidade de Saúde onde trabalham os

entrevistados.

Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço do

pesquisador, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer

momento.

Pesquisador: Guilherme de Moraes Nascimento

Endereço: Faculdade de Enfermagem

Avenida Boulevard 28 de Setembro 157, 7º andar,

CEP 20551-030 telefone: 2587-6335 / 2568-8175

Endereço: Comitê de Ética em Pesquisa da SMS-RJ

Rua Afonso Cavalcanti, nº 455 sala 701 – Cidade Nova - RJ

CEP 20211-901 telefone: 2503-2024 / 2503-2026

Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha participação na pesquisa e

concordo em participar.

Rio de Janeiro, _____ de ________________ de 2008.

Page 104: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp104214.pdf · Riscos no trabalho do Agente Comunitário de Saúde na perspectiva da saúde do trabalhador. 2009.

102

APÊDICE B – Parecer do Comitê de Ética da SMS-RJ

Page 105: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp104214.pdf · Riscos no trabalho do Agente Comunitário de Saúde na perspectiva da saúde do trabalhador. 2009.

103

ANEXO – Parecer prévio Comitê de Ética da UERJ

Universidade do Estado do Rio De Janeiro/Sr2

Comissão de Ética em Pesquisa – COEP Rua São Francisco Xavier, 524, bloco E, 3o. andar, sala 3020 - Maracanã

CEP 20550-900 – Rio de Janeiro, RJ e- mail: [email protected] – Telefone/Fax: (21) 2569-3490

PARECER COEP 001/2007

A Comissão de Ética em Pesquisa – COEP, em sua 1ª Reunião Ordinária realizada em 08 de

fevereiro de 2007, analisou a resposta ao parecer COEP 077/2006 referente ao protocolo de

pesquisa nº. 039.3.2006, segundo as normas éticas vigentes no país para pesquisa envolvendo

sujeitos humanos e emite seu parecer.

Projeto de pesquisa: “Avaliação das Condições de Trabalho dos Agentes Comunitários de

Saúde do Município do Rio de Janeiro ”

Pesquisadora Responsável: Helena Maria Scherlowski Leal David

Instituição responsável: Faculdade de Enfermagem/UERJ

CEP de origem: COEP-UERJ

Área do conhecimento: Enfermagem – cód. 4.04 Área Temática: Grupo III

Palavras-chave: Saúde do Trabalhador, Agente comunitário.

Considerações Iniciais: Trata-se de um projeto que pode contribuir para o gerenciamento da

saúde no Município do Rio de Janeiro. O campo da pesquisa será o Programa de Agentes

Comunitários de Saúde e Programa de Saúde da Família do Município do Rio de Janeiro,

desenvolvidos nas Áreas Programáticas 5.1, 2.2 e 2.1, incluindo um total de 138 ACS, podendo a

amostragem ser ampliada. Segundo a pesquisadora responsável, já foram feitos contatos com a

Coordenação de PACS/PSF da Secretária Municipal de saúde do Rio de Janeiro.

Sumário: As condições de trabalho de Agentes Comunitários de Saúde (ACS) são instáveis e

pouco definidas, como indicam alguns estudos, e também a análise preliminar de dados da

pesquisa “Condições de trabalho e saúde dos profissionais de saúde do SUS de Mesquita e Nova

Iguaçu”, realizada com 16 ACS de Mesquita. Os desdobramentos ou impactos das condições e

do processo de trabalho de ACS na sua saúde ainda não são conhecidos. O presente estudo

objetiva analisar, considerando o processo cotidiano de trabalho de ACS para identificar os

riscos reais ou potenciais à sua saúde. Os objetivos específicos incluem i) conhecer o perfil de

saúde ocupacional do ACS; ii) coletar e sistematizar dados para subsidiar a gestão de riscos no

trabalho de saúde desenvolvido na comunidade; iii) ampliar o conhecimento e estimular o

desenvolvimento da consciência crítica dos ACS envolvidos quanto às suas condições de

trabalho; iv) identificar elementos relevantes para o processo de educação permanente do ACS; e

v) dar visibilidade e valorizar este profissional no âmbito da Atenção Básica e do SUS. A

estratégia metodológica é constituída por uma abordagem qualitativa, e a realização de

entrevistas individuais com aplicação de questionários sobre a autopercepção de saúde e

condições de trabalho. A análise será baseada na perspectiva ergonômica e da psicodinâmica do

trabalho, identificando as situações de sofrimento, penosidade ou prazer no trabalho.

Page 106: Universidade do Estado do Rio de Janeirolivros01.livrosgratis.com.br/cp104214.pdf · Riscos no trabalho do Agente Comunitário de Saúde na perspectiva da saúde do trabalhador. 2009.

104

Objetivo geral: Avaliar, as condições de trabalho dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) do

Município do Rio de Janeiro e identificar riscos reais ou potenciais à saúde do trabalhador.

Objetivos específicos: Conhecer o perfil de saúde ocupacional do ACS; coletar e sistematizar

dados para subsidiar a gestão de riscos no trabalho de saúde desenvolvido na comunidade;

ampliar o conhecimento e estimular o desenvolvimento da consciência crítica de ACS quanto às

suas condições de trabalho; identificar elementos necessários para um processo de educação

permanente de ACS; dar visibilidade e valorizar o ACS como profissional no âmbito de Atenção

Básica e do SUS.

Considerações Finais: O projeto é de alta relevância social e pode contribuir para a melhoria

das condições de saúde pública do Município do Rio de Janeiro. A apresentação da proposta foi

considerada abrangente, mas adequada aos objetivos. A estratégia metodológica envolve o uso

de questionários validados e a realização de oficinas para sistematização de experiências, e

discussão de resultados por todos os envolvidos. A equipe é constituída por profissionais de

reconhecida competência.

A COEP analisou a resposta ao Parecer COEP 077/06, e considerou que as solicitações

foram atendidas. A COEP é favorável à execução do projeto, devendo ser utilizada, junto aos

sujeitos da pesquisa, a versão de 23 de janeiro de 2007 do Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido.

Faz-se necessário apresentar Relatório Anual - previsto para fevereiro de 2008, para

cumprir o disposto no item VII.13.d da RES. 196/96/CNS. Além disso, a COEP deverá ser

informada de fatos relevantes que alterem o curso normal do estudo, devendo o pesquisador

apresentar justificativa, caso o projeto venha a ser interrompido e/ou os resultados não sejam

publicados.

Situação: projeto aprovado

Rio de Janeiro, 14 de fevereiro de 2007.

Prof. Dr. Olinto Pegoraro

Coordenador da Comissão de Ética em Pesquisa – UERJ

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