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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
Júlia Inocenti Di Giovanni
A FERRAMENTA JORNADA DO USUÁRIO E AS FASES DO CICLO DE VIDA
DO SISTEMA PRODUTO-SERVIÇO
SÃO CARLOS
2018
Julia Inocenti Di Giovanni
A FERRAMENTA JORNADA DO USUÁRIO E AS FASES DO CICLO DE VIDA
DO SISTEMA PRODUTO-SERVIÇO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Engenharia de Produção, da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, como parte dos requisitos para obtenção do título de Engenheira de Produção
Orientadora: Profa. Dra. Janaina M. H. Costa Co-orientadora: Ms. Carina Campese
SÃO CARLOS, SP
2018
1
2
Agradecimentos
Primeiramente, agradeço à minha família por todo o apoio e confiança nessa
trajetória. Agradeço aos professores, funcionários e alunos da EESC e da
Engenharia de Produção, em especial a turma de 2013.
Agradeço também ao Enactus CAASO USP, minha família em São Carlos por
mais de três anos.
Por fim, à Prof. Janaína e à Carina por todo apoio, orientação e aprendizado nesta
reta final de graduação.
3
RESUMO
A importância de se entender os consumidores e melhorar suas experiências
durante todos os momentos de interação entre eles e uma empresa, seja por meio
de de marcas, produtos, serviços ou modelos PSS, tem se tornado cada vez
maior. Entretanto, ainda é um desafio compreender de fato o que os
consumidores esperam e desejam. Nesse sentido, algumas ferramentas podem
auxiliar na busca por esse entendimento, como por exemplo a Jornada do
Usuário. Assim, este trabalho tem como objetivo trazer os principais conceitos da
Jornada do Usuário e do PSS a fim de se buscar na literatura trabalhos, projetos
e modelos que relacionam essas duas áreas do desenvolvimento de produtos e
serviços. Portanto, este trabalho consistiu na realização de três revisões de
literatura: duas revisões buscaram os principais conceitos, aplicações, desafios e
benefícios do PSS e da jornada do usuário, e a terceira buscou, por meio de uma
revisão sistemática, as relações existentes entre PSS e jornada do usuário na
literatura acerca de abordagens, benefícios e oportunidades. Os resultados
encontrados indicam, por um lado, a existência na literatura de modelos de PSS
que se beneficiaram da aplicação e utilização da jornada do usuário, mas por
outro lado, a escassez de casos como esses, já que poucos artigos foram
retornados na pesquisa. Dessa forma, esse trabalho ainda ressalta a
oportunidade de se estudar e compreender os impactos que as características
específicas da ferramenta jornada do usuário tem na sua aplicabilidade e de se
pesquisar a utilização de outras ferramentas, que não foram abordadas nesse
trabalho, mas que possuem a mesma função da jornada do usuário no contexto
do desenvolvimento de modelos PSS.
PALAVRAS-CHAVE: PSS; Sistema Produto Serviço; Jornada do Consumidor,
Jornada do Usuário.
4
ABSTRACT
Understanding consumers and improving their experiences during all the moments
of interaction between them and a company, whether through brands, products,
services or PSS models, has become even more important. However, it is still a
challenge to read what consumers expect and want. In this sense, some tools may
help in the search for this understanding, such as the Consumer Journey (CJ).
Thus, this paper aims to bring the main concepts of Consumer Journey and PSS
in order to search for papers, projects and models in the academic literature that
relate these two areas of product and service development. Thus, this work
consisted of three literature reviews: two reviews focused on the main concepts,
applications, challenges and benefits of the PSS and CJ, and the third, through a
systematic review, the existing relations between PSS and CJ in the literature on
approaches, benefits and opportunities. The results indicate, on the one hand, the
existence in the literature of models of PSS that benefited from the application and
use of CJ, but on the other hand, the lack of cases like these, since few articles
were returned in the research. Thus, this work still highlights the opportunity to
study and understand the impacts that the specific characteristics of the CJ tool
has on its applicability and to investigate the use of other tools, which were not
addressed in this work, but may have the same function of the CJ in the context of
the development of PSS models.
KEY-WORDS: PSS; Product-Service System; Customer Journey.
5
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Modelo do ciclo de Vida do PSS 16
Figura 2: Modelos de alocação de recursos durante a experiência no serviço 22
Figura 3: Modelo 1 da Jornada do Usuário 23
Figura 4: Modelo 2 da Jornada do Usuário 24
Figura 5: Modelo 3 da Jornada do Usuário 25
Figura 6: Modelo circular da Jornada do Usuário 26
Figura 7: Modelo de desenvolvimento de PSS 29
Figura 8: Modelo CIM 31
6
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Resultado da pesquisa ("Product-Service System" 12
AND "Customer Journey")
Tabela 2: Resultado da pesquisa ("PSS" AND "Customer Journey") 12
Tabela 3: Artigos não selecionados 13
Tabela 4: Consolidação da discussão dos tópicos 32
7
LISTA DE SIGLAS
CJ - Customer Journey
BOL - Beginning of life
MOL - Middle of life
EOL - End of life
PSS - Product-Service System
CIM - Customer Intervention Mapping
CRM - Customer Relationship Management
8
SUMÁRIO
Resumo 4
Abstract 5
Lista de Figuras 6
Lista de Tabelas 7
Lista de Siglas 8
1. Introdução 10
1.1. Objetivos 11
1.2. Métodos 11
2. Revisão da Literatura 14
2.1. PSS: Product-Service System 14
2.1.1. Aplicações e benefícios 14
2.1.2. O PSS e as fases do ciclo de vida 15
2.1.3. Relação entre PSS e consumidores 17
2.2. Jornada do Usuário 18
2.2.1. Terminologias encontradas na teoria de CJ 19
2.2.2. As diferentes abordagens da CJ e suas particularidades 20
2.2.3. Benefícios e desafios 27
3. Resultados e discussões 28
3.1. Overview dos artigos selecionados 28
3.2. Discussão 32
3.2.1. Uso da CJ no PSS e sua similaridade com frameworks 33
da CJ propostos na literatura
3.2.2. Existência de semelhança na terminologia de PSS e de CJ 34
3.2.3. Fases da aplicação da Jornada do Usuário 34
3.2.4. Benefícios da utilização da CJ no PSS 35
4. Considerações finais 38
REFERÊNCIAS 40
9
1. INTRODUÇÃO
Atualmente, a preocupação com a sustentabilidade se torna cada vez maior. O
foco de se desenvolver produtos sustentáveis é acompanhado pela necessidade
de se satisfazer consumidores (MONT, 2002). Dessa forma, entregar valor de
maneira sustentável e, ao mesmo tempo, satisfazer as necessidades dos
consumidores é um grande desafio que pode ser impresso por meio da integração
entre produtos e serviços como uma única só oferta (PSS) (BAINES et al., 2007).
Nesse contexto, entender como esse sistema pode criar valor para os
consumidores é essencial para uma empresa que trabalha no sistema PSS
(WUEST, 2016). Mas como isso pode ser feito, visto que o entendimento das suas
necessidades e expectativas não seja algo trivial? É necessário que a empresa
seja pró-ativa na busca por informações à respeito dos seus consumidores
(MONT, 2002).
Muitas ferramentas podem auxiliar as empresas a buscarem esse entendimento.
Uma delas é a Jornada do Usuário (CJ - do inglês, customer journey), ferramenta
bastante utilizada para compreender e melhorar as experiências dos
consumidores (FøLSTAD et al., 2018). Essa ferramenta, por sua vez, apresenta
grande diversidade de aplicação, podendo ser desenhada conforme os objetivos
do projeto e seu escopo (MOON et al., 2016), e conforme as particularidades de
cada organização (RICHARDSON, 2010).
Dessa forma, essa pesquisa visa entender os principais conceitos acerca das
teorias de PSS e Jornada do Usuário, e como essas duas áreas de estudo podem
estar relacionadas na literatura. Para isso, são apresentadas primeiramente duas
revisões teóricas acerca do PSS e CJ (em termos de conceitualização,
abordagens, benefícios e desafios) e em seguida, uma revisão sistemática da
literatura é realizada a fim de se encontrar trabalhos que relacionam esses dois
assuntos de maneira explícita.
10
1.1 Objetivo
O objetivo principal deste trabalho é identificar trabalhos na literatura que
relacionam a ferramenta Jornada do Usuário e o desenvolvimento de Sistemas
Produto-Serviço (PSS).
Para que esse objetivo central seja alcançado, foram definidos os seguintes
objetivos específicos:
● Revisar a literatura sobre Product-Service Systems (PSS) e suas
aplicações;
● Revisar a literatura sobre Jornada do Usuário (Customer Journey) e suas
diferentes abordagens;
● Buscar na literatura artigos que tragam a Jornada do Usuário dentro do
contexto do PSS.
1.2 Método
Este trabalho foi realizado em duas etapas: a primeira etapa consistiu em uma
revisão bibliográfica não sistemática focada no conceitos de Product-Service
Systems (PSS) e Customer Journey (CJ). Nessa etapa, as buscas foram
realizadas nas bases Web of Science, Scopus e Google Scholar. Sobre PSS, os
tópicos pesquisados foram: conceito, definição, aplicabilidade, frameworks e
benefícios aos stakeholders envolvidos no PSS. Sobre CJ, os tópicos
pesquisados foram: definição, aplicabilidade, diferentes abordagens e frameworks
da ferramenta, vantagens e oportunidades.
A segunda etapa consistiu em uma revisão sistemática da literatura, com o
objetivo de se encontrar formalmente as relações existentes entre os dois temas
estudados na primeira etapa deste trabalho. Dessa forma, um processo de busca
na base de dados Scopus e Web of Science foi realizado, com as strings
(" Product-Service System" AND "Customer Journey") e ("PSS" AND "Customer
Journey"). Após o retorno dos artigos nas duas bases, foram aplicados três filtros
com o objetivo de se selecionar apenas os artigos que trazem tal relação entre os
11
dois tópicos. O primeiro filtro seleciona apenas artigos passíveis de download nas
suas respectivas bases. O segundo filtro exclui os artigos repetidos entre as duas
buscas. Por fim, o terceiro filtro seleciona apenas os artigos que possuem as
strings de busca encontradas no título, palavras-chave ou resumo.
Assim, foram encontrados 17 artigos nas bases Scopus e Web of Science. As
tabelas 1 e 2 mostram todos os filtros aplicados nesta pesquisa e os seus
respectivos resultados. Dessa forma, dois artigos foram selecionados com a
aplicação dos três filtros - 1) passível de download; 2) não repetidos; e 3)
possuem as strings no título, nas palavra chave ou no resumo.
Tabela 1: Resultado da pesquisa ("Product-Service System" AND "Customer Journey")
Fonte: Autor
Tabela 2: Resultado da pesquisa ("PSS" AND "Customer Journey")
Fonte: Autor
12
O primeiro artigo selecionado foi publicado em 2018 na "10th CIRP Conference on
Industrial Product-Service Systems". Já o segundo artigo selecionado foi
publicado na revista Sustainability no ano de 2018. Os artigos não selecionados
apresentam não atendimento aos critérios utilizados neste trabalho, conforme
mostra a tabela 3.
Tabela 3: Artigos não selecionados
Fonte: Autor
13
2. REVISÃO DA LITERATURA
2.1 PSS: Product-Service System
A preocupação quanto aos impactos ambientais gerados pelas atividades
econômicas é algo bastante discutido na literatura. Nessa direção, uma nova
lógica quanto à redução de materiais na produção e no consumo de bens tem
sido colocada em foco (MONT 2002). Entretanto, é bastante claro que o foco em
se desenvolver produtos de forma sustentável vem acompanhado da necessidade
de se atender as necessidades dos consumidores, sem que haja perda de
performance (MONT 2002). Essa nova forma de se entregar valor ao consumidor
pode ser considerada uma integração entre produtos e serviços como uma única
oferta, conhecida como PSS (BAINES et al., 2007), onde o maior desafio está no
desenvolvimento de soluções integradas na satisfação dos consumidores e na
geração de modelos de menores impactos ambientais do que os tradicionais
(MONT 2002).
Há autores que enfatizam o PSS como um modelo que busca atender as
necessidades e desejos dos consumidores (BAINES et al., 2007; MONT, 2002).
Enfatizando a entrega de valor aos consumidores, Baines et al. (2007) define o
PSS como uma oferta integrada entre produtos e serviços que entrega valor no
seu uso. O PSS, para Mont (2002), consiste em uma combinação de produtos
ecologicamente desenvolvidos, reforçado pelo desenvolvimento de serviços nas
diferentes fases do ciclo de vida do produto, envolvendo os consumidores finais e
outros autores da cadeia.
2.1.1 Aplicações e Benefícios
Muitos stakeholders são beneficiados pelo modelo PSS. De acordo com Mont
(2002), o entendimento do PSS pelas empresas, de modo geral, pode
beneficiá-las das seguintes maneiras:
14
- Melhorar o relacionamento com seus consumidores proveniente do maior
contato entre empresa e consumidor e do fluxo de informação referente às suas
preferências;
- Desenvolver estratégias de crescimento em inovação;
- Aumentar o valor do produto ao consumidor por meio do aumento de suas
funções, reuso e vida útil do produto;
- Antecipar-se a novas mudanças na legislação.
Para Baines et al. (2007), o PSS representa para as empresas uma alternativa de
se evitar o sistema de produção padronizado e em massa, além de possibilitar
redução de custos da utilização de menos recursos materiais para se entregar
um valor ainda maior ao consumidor.
Ao mesmo tempo que as empresas se beneficiam do PSS, os consumidores
também possuem vantagens em relação ao uso de PSS oferecidos pelas
companhias. Segundo Mont (2002), o PSS possibilita aos consumidores uma
maior variedade no mercado, além de serviços de manutenção e variedade nas
formas de pagamento. Mont (2002) pontua também:
- Diversidade do uso de produtos, sob a perspectiva da responsabilidade de
posse do mesmo, de acordo com as necessidades de uso do consumidor;
- Maior valor por meio da customização de ofertas de maior qualidade.
2.1.2 O PSS e as fases do ciclo de vida
Os autores Wiesner et al. (2015), entendendo a necessidade de se obter uma
base vasta de informações no desenvolvimento de produtos e serviços, propõem
um modelo que relaciona o PSS com as fases do ciclo de vida de produtos e
serviços, por meio da combinação entre PLM (Product Lifecycle Management) e
SLM (Service Lifecycle Management) de maneira sequencial (Figura 1). Esse
modelo (WIESNER et al., 2015) está dividido em três fases principais:
- PSS BOL: Beginning of Life (começo de vida):
A fase tem início na etapa de geração de ideias, seguida do levantamento de
requisitos do PSS e terminando na fase do design do sistema. O autor enfatiza a
15
necessidade de se olhar de forma holística para o PSS, evitando focar
separadamente no produto e/ou serviço - apesar de se existir a necessidade de
uma separação no desenvolvimento do produto e do serviço na etapa de design
(WIESNER et al., 2015).
- PSS MOL: Middle of Life (meio de vida):
A fase tem início com a realização do sistema - manufatura do produto e
implementação dos serviços desenvolvidos - de forma separada. Entretanto, o
autor enfatiza a necessidade de se testar de forma contínua a interação entre os
componentes serviço e produto de forma a garantir sua combinação e entrega ao
consumidor como um único sistema. MOL termina na etapa de prestação de
suporte, a fim de se assegurar as funcionalidades e os resultados do PSS
(WIESNER et al., 2015).
- PSS EOL: End of Life (fim de vida):
A última fase do ciclo de vida do PSS irá decidir se o sistema passará por
atualizações e adaptações ou se ele será inativado, conforme a decisão do
consumidor e/ou do fornecedor do PSS (WIESNER et al., 2015).
Figura 1: Modelo do ciclo de Vida do PSS
Fonte: Wiesner et al. (2015)
16
Em contrapartida à visão linear e sequencial de Wiesner et al. (2015), Wuest et al.
(2016) trazem um questionamento quanto ao modelo tradicional das três fases
BOL, MOL, EOL. Os autores argumentam que convencer e satisfazer os
consumidores apenas no momento único da venda não é mais suficiente, já que é
necessário entregar valor e satisfazer suas demandas de forma constante. Nesse
novo panorama em que o PSS se encontra, Wuest et al (2016) defendem que a
distinção entre as fases BOL, MOL e EOL no ciclo de vida de um PSS se torna
cada vez mais difícil e imprime a necessidade de se obter uma visão holística do
ciclo de vida do PSS por parte de seus desenvolvedores e designers.
Apesar de não haver uma recomendação definida quanto à utilização de um
determinado modelo de ciclo de vida no PSS, Wuest et al (2016) sugere a
discussão quanto à necessidade de se evoluir para uma visão holística quanto ao
ciclo de vida de um PSS, sem que haja distinções e barreiras entre fases do ciclo
de vida.
2.1.3 Relação entre PSS e consumidores
De acordo com Baines et al. (2007), muitos autores na literatura defendem que o
propósito do PSS está na proposição de uma vantagem competitiva, o que
acentua ainda mais a ligação entre o PSS e a necessidade de se buscar a
satisfação dos consumidores. Dessa forma, buscar entender como o PSS cria
valor para o consumidor é um fator chave para o sucesso de uma empresa que
oferece um PSS (WUEST 2016).
O relacionamento entre a empresa que oferece PSS e seus consumidores tem um
papel muito importante no desenvolvimento (MONT 2002) do PSS. Um PSS de
sucesso deve ser desenvolvido de forma sistêmica a partir da óptica do
consumidor e exige envolvimento entre ele e a empresa desde o início do
desenvolvimento (BAINES et al., 2007). Algumas empresas, consideradas
pró-ativas, têm buscado trabalhar de forma mais próxima com seus consumidores
a fim de se obter informações e insights quanto a suas preferências, hábitos e
desejos (MONT 2002). No PSS, a experiência do consumidor é parte
17
fundamental da oferta de valor (BOCKEN et al 2014). Nesse sentido, entender as
necessidades dos consumidores ao longo de todo o ciclo de vida se torna ainda
mais fundamental, já que o consumidor precisa enxergar o valor do PSS durante
todos os momentos (WUEST et al 2016).
2.2 Jornada do usuário
Toda empresa que interage com seus consumidores através do oferecimento de
um produto ou um serviço proporciona uma experiência a seus consumidores,
seja ela boa ou ruim (RICHARDSON 2010). Existem diversas formas de se avaliar
e melhorar essas experiências, incluindo o mapeamento da Jornada do Usuário
(CJ - do inglês, customer journey), uma ferramenta que aborda todos os seus
aspectos (MOON et al., 2016). De acordo com Følstad et al. (2018), a Jornada do
Usuário tem sido bastante utilizada como uma das formas existentes de se
compreender e melhorar as experiências dos consumidores. Dessa forma, a
Jornada do Usuário tem ganhado bastante importância sob a óptica de se
proporcionar uma vantagem competitiva às empresas e suas marcas (EDELMAN
et al., 2015).
Apesar do termo Jornada do Usuário ser bastante utilizado e aplicado em
diferentes cenários, a falta de padronização e maturidade quanto a terminologias
e abordagens referentes ao tema resultam na existência de diferentes
perspectivas (FøLSTAD et al., 2018). Dessa forma, muitas definições e
terminologias para a Jornada do Usuário são encontradas na literatura.
Rosembaum et al. (2017, p. 144) definem a Jornada do Usuário como "ferramenta
visual que traz a sequência de eventos pelos quais consumidores passam e
interagem com uma organização provedora de algum serviço, durante todo o
processo de compra". Já Richardson (2010, p. 1) define como "um diagrama que
ilustra as etapas que o consumidor passa ao engajar com uma empresa, seja por
um produto, uma experiência online ou física, por um serviço ou uma combinação
entre tudo isso". Já Følstad et al. (2018, p. 197), após estudar de forma
18
sistemática a teoria da Jornada do Usuário, definem como "métodos e práticas
onde o processo que envolve um serviço é analisado, modelado, gerenciado ou
redesenhado de acordo com a perspectiva da Jornada do Usuário". Apesar da
utilização de diferentes termos para definir Jornada do Usuário de acordo com
cada autor, Følstad et al. (2018) defendem que a Jornada do Usuário é,
geralmente, definida como uma série de etapas/touchpoints sob o ponto de vista
do consumidor.
Em termos de aplicabilidade em serviços e produtos, observa-se que alguns
autores retratam, de forma ampla, a CJ sob a ótica de serviços, marcas, ou
produtos no desenvolvimento de novos serviços ou na melhoria de serviços
existentes. Rosembaum et al. (2017) pontuam que a CJ é uma ferramenta
estratégica de gestão para inovação em serviços, que visa melhorar as interações
entre os consumidores e o serviço. Følstad et al. (2018) também pontua que a
Jornada do Usuário tem sua importância cada vez maior nas áreas de design e
gestão de serviços, sob a perspectiva de analisar, modelar, gerenciar ou desenhar
serviços.
Em contrapartida, Moon et al. (2016) pontua que a Jornada do Usuário é uma
ferramenta amplamente utilizada na melhoria de serviços existentes ou no
desenvolvimento de novos serviços, porém podendo ser aplicado também a
produtos. Lemon et al. (2016) traz a Jornada do Usuário em um contexto de
análise mas também desenvolvimento de novos serviços e experiências.
Richardson et al. (2010) pontua a Jornada do Usuários ob a perspectiva mais
ampla (produtos, experiências online ou física, serviços ou uma combinação de
tudo isso.
2.2.1 Terminologias encontradas na teoria de CJ
Alguns termos aparecem de forma bastante intensa. Touchpoints, que aparece
com maior frequência na maioria dos trabalhos revisados, são os pontos de
interação entre as empresas e seus consumidores (FøLSTAD et al., 2018; MOON
et al., 2016), dispostos de maneira horizontal em uma linha do tempo da Jornada
19
do Usuário (ROSEMBAUM et al., 2017). Os autores Lemon et al. (2016)
classificam ainda os touchpoints em quatro grupos:
- brand owned: são interações gerenciadas, desenvolvidos e sob controle da
empresa. Exemplos: propagandas, site na internet, programas de lealdade.
- partner owned: são interações gerenciadas, desenvolvidas e sob controle
de empresas parceiras à empresa fornecedora do serviço/produto. Exemplos:
agências de marketing.
- customer owned: interações cujo controle foge do domínio da empresa.
Exemplos: métodos de pagamento.
- external: interações externas à organização. Exemplos: interação com
concorrentes, outros consumidores.
Apesar de haver consenso quanto à definição de touchpoints, existem autores
que acreditam que alguns touchpoints são mais ou menos importantes do que
outros dentro da Jornada do Usuário (ROSEMBAUM et al., 2017) e que é
necessário identificar quais são os tipos de touchpoints presentes nas jornadas e
qual o poder de influência da empresa sobre cada um deles (LEMON et al., 2016),
de acordo com o produto ou serviço em questão.
Além de touchpoints, o termo encounters é utilizado no estudo das jornadas dos
consumidores. Sua definição, de acordo com os autores Voorhees et al., (2017),
consiste nas interações de caráter discreto entre consumidores e empresas que
fornecem um serviço, podendo ser através de telefone, catálogos, interações
online ou físicas. A partir da definição de encounters, os autores definem como
moment-of truth todas as interações críticas e de alto impacto para o consumidor,
e como experiência do consumidor o acúmulo dessas interações discretas
(encounters).
2.2.2 As diferentes abordagens da CJ e suas particularidades
Existem diferentes abordagens e modelos na literatura e muitos autores pontuam
essa diversidade ao caráter variável de cada projeto, empresa e objetivos. Moon
et al. (2016) defendem que o mapeamento da Jornada do Usuário deve ser
20
desenhado conforme os objetivos do projeto e seu escopo. Richardson (2010)
pontua que não existe uma única forma correta de se criar jornadas do
consumidor já que cada organização deve encontrar a melhor forma de
desenhá-la de acordo com suas particularidades. Følstad et al. (2018) defendem
que a Jornada do Usuário deve ser estruturada conforme o contexto em que ela
está inserida e não conforme um framework pré-definido. Por fim, Voorhees et al.
(2017) traz a necessidade de se estudar e de se desenvolver modelos que levem
em consideração as características dos consumidores e o nível de
competitividade das empresas a fim de se definir a alocação de esforços e
recursos nas diferentes interações da jornada do Usuário.
Os autores Rosembaum et al. (2017) propõem um modelo que cruzará dois tipos
de informação à respeito das interações entre cliente e empresa: em um primeiro
eixo, as principais interações são distribuídas em três fases distintas (antes,
durante e depois do serviço); em um segundo eixo, os recursos e stakeholders
envolvidos nessas interações, como por exemplo o suporte de funcionários dentro
do contexto de uma visita ao shopping center.
O trabalho Voorhees et al. (2017) não enfatiza um modelo de CJ em si, mas sim a
necessidade de se entender os diferentes níveis de importância que cada fase
(pré, durante e pós compra) deve apresentar ao consumidor. Dessa forma, os
autores sugerem diferentes formas de se enxergar as três fases da jornada,
conforme as necessidades dos consumidores e o business da empresa (Figura 2):
- Modelo 1 : Maior alocação de recursos na fase em que o serviço acontece.
Os autores acreditam que esse modelo retrata a maioria dos casos dos serviços.
- Modelo 2: Alocação de recursos igualmente distribuída entre as três fases.
Os autores acreditam que empresas situadas no mercado de luxo se encontram
nesse modelo.
- Modelo 3: Maior alocação de recursos nas fases pré e pós serviço. Os
autores acreditam que esse modelo se aplica a empresas que querem se
diferenciar da concorrência mas não possuem recursos suficientes para trazer
excelência nas três fases.
21
- Modelo 4: Maior alocação na fase pré serviço. Os autores pontuam que
esse modelo se aplica em empresas que apresentam e vinculação por meio de
contratos e traz elevados custos aos seus consumidores que quiserem migrar
para outra empresa (seguro, telecomunicação).
- Modelo 5: maior alocação na fase pós serviço. Os autores acreditam que
empresas cujo consumidores apresentam baixo custo para migrar para uma
concorrente (fast food, varejo).
Figura 2: Modelos de alocação de recursos durante a experiência no serviço
Fonte: Voorhees et al. (2017)
Lemon et al. (2016) também abordam a Jornada do Usuário em três fases
distintas (Figura 3): as interações que compõem a experiência do consumidor
estão alocadas em pré, durante e pós compra. Essas interações (touchpoints),
podem ser classificadas em quatro grupos, conforme explicado na seção anterior,
a fim de se trazer uma maior compreensão dos pontos principais que compõem a
22
experiência. Nessa direção, os autores sugerem que as empresas entendam
quais são os pontos específicos que levam o consumidor a continuar ou
descontinuar a jornada de compra na empresa.
Figura 3: Modelo da Jornada do Usuário
Fonte: Lemon et al. (2016)
Já a abordagem de Moon et al. (2016) consiste em uma ferramenta mais
detalhada, com quatro principais componentes: fases, objetivos, tarefas e rotinas.
As fases também retratam as interações durante e depois do serviço realizado,
sendo compostas por uma série de objetivos os quais terão, no mínimo, uma
atividade relacionada a eles. Por fim, essas atividades são impressas por meio de
rotinas dos consumidores, que são, de acordo com os autores, o menor
componente da CJ (Figura 4).
23
Figura 4: Modelo da Jornada do Usuário
Fonte: Moon et al. (2016)
A abordagem de Richardson (2010) propõe que a Jornada do Usuário (Figura 5)
tenha quatro etapas distintas (consciência, busca, compra e experiência
pós-compra) relacionadas à quatro variáveis (atividades, motivações, perguntas e
barreiras). O autor descreve essas variáveis através de perguntas a serem
respondidas pela empresa:
- Atividades: "O que o consumidor faz em cada etapa?"
- Motivações: "Porque o consumidor prossegue até a próxima etapa?"
- Perguntas: "Quais são as incertezas e problemas que impedem o
consumidor seguir até a próxima etapa?"
24
- Barreiras: "Quais barreiras estruturais, custos ou processos impedem a
próxima etapa?"
Apesar de sua abordagem apresentar etapas bem definidas, o autor traz o
conceito não-sequencial da ferramenta, já que defende que os consumidores
podem iniciar sua jornada a partir de diferentes etapas, e não necessariamente da
primeira.
Figura 5: Modelo da Jornada do Usuário
Fonte: Adaptado de Richardson (2010)
Por fim, Elzinga et al. (2009), por defenderem a necessidade de se desenvolver
uma abordagem mais sofisticada e menos linear à respeito da Jornada do Usuário
, propõem um modelo circular de Jornada do Usuário (Figura 6):
25
Figura 6: Modelo circular da Jornada do Usuário
Fonte: Elzinga et al. (2009)
Dessa forma, os autores, após consultar quase vinte mil consumidores durante o
processo de decisão de compra, chegam em uma abordagem que apresenta
quatro etapas distintas: considerações iniciais acerca das marcas disponíveis,
avaliação ativa do consumidor, compra e experiência pós compra. O que
diferencia esse modelo é a existência de um loop de lealdade, que, de acordo
com Edelman et al. (2015), irá reduzir ou eliminar a fase de avaliação do
consumidor e irá exigir que as empresas redesenhem suas operações de forma a
dar suporte a uma jornada totalmente integrada, e não dividida em touchpoints
individuais. Entretanto, os autores Edelman et al. (2015) defendem que esse
modelo exige das empresas uma nova estratégia e uma postura mais ativa quanto
26
ao desenvolvimento dessa jornada, por meio da criação de experiências
customizadas que engajam e beneficiam o consumidor em sua jornada.
Diferentes frameworks e modelos acerca da Jornada do Usuário podem ser
encontrados na literatura e nas abordagens práticas de empresas. Essa variedade
mostra, de certa forma, que a CJ é estruturada de acordo com o contexto
particular ao qual está inserida e não necessariamente sob um framework
pré-definido (Følstad et al., 2018) .
2.2.3 Benefícios e desafios
A Jornada do Usuário apresenta oportunidades de desenvolvimento quanto a
terminologia e abordagens (FøLSTAD et al., 2018). Apesar da Jornada do Usuário
ser uma ferramenta amplamente utilizada por provedores de serviços, agências
de design e empresas de consultoria (FøLSTAD et al., 2018), além de existir vasto
conteúdo acadêmico e prático quanto a ferramenta, ainda existe bastante
confusão e falta de instruções quanto ao uso da abordagem (ROSEMBAUM et al.,
2017). Entretanto, essa flexibilidade da sua terminologia pode ser, por um lado,
benéfica para a natureza versátil e para a sua utilização de maneira
interdisciplinar (FøLSTAD et al., 2018). Em termos de barreiras, alguns autores
pontuam ainda o elevado grau de complexidade da Jornada do Usuário em
termos de: (1) recursos demandados para sua realização (ROSEMBAUM et al.,
2017; EDELMAN et al., 2015); (2) elevado número de interações (touchpoints)
presentes na jornada (RICHARDSON, 2010; MAECHLER et al., 2016); e (3)
caráter não-linear da ferramenta advindo da diversidade de consumidores a
serem considerados (MOON et al., 2016).
Se por um lado a Jornada do Usuário apresenta barreiras, por outro existem
benefícios quanto a sua utilização em termos de: (1) melhoria da experiência do
consumidor (ROSEMBAUM et al., 2017; EDELMAN et al., 2015; MAECHLER et
al., 2016) ; (2) desenvolvimento de novos serviços (MOON et al., 2016); e (3)
visão holística quanto à experiência dos consumidores (MAECHLER et al., 2016).
27
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
De acordo com Baines et al. (2007), um PSS de sucesso deve ser desenvolvido
sob a ótica do consumidor e exige seu envolvimento com a empresa desde o
início deste desenvolvimento. Nessa direção, a Jornada do Usuário é uma
ferramenta bastante adequada para o entendimento dos consumidores, já que ela
consiste em métodos e práticas que buscam analisar, modelar, gerenciar e
desenvolver serviços sob a perspectiva do consumidor (FøLSTAD et al., 2018).
Dessa forma, a revisão realizada teve como objetivo entender como a ferramenta
Jornada do Usuário pode estar relacionada ou aplicada a modelos de PPS a partir
de trabalhos encontrados durante os processos de busca já descritos. Dessa
forma, busca-se compreender como a ferramenta foi abordada dentro do contexto
do PSS descrito, em qual fase do ciclo de vida deste PSS e quais foram os
benefícios dessa abordagem.
3.1 Overview dos artigos selecionados
Os dois artigos selecionados propõem e testam um modelo de desenvolvimento
de PSS. Olivotti et al. (2018) criam e validam um conceito de desenvolvimento de
um modelo de PSS específico (availability-oriented model) em uma indústria
manufatureira do setor de automação. De acordo com os autores, um
availability-oriented model consiste em um modelo de PSS que visa prever falhas
iminentes a fim de se criar serviços de forma antecedente a possíveis quebras de
máquinas nas indústrias de manufatura. Nesse contexto, os autores revisam as
literaturas de PSS e métodos de Design Thinking (incluindo nesse tópico a revisão
da Jornada do Usuário) para a criação desse conceito aplicado à
availability-oriented model, gerando então um modelo de cinco fases que
suportam o desenvolvimento do PSS (Figura 7).
28
Figura 7: Modelo de desenvolvimento de PSS
Fonte: Olivotti et al. (2018)
A Jornada do Usuário se encontra na quarta etapa do modelo proposto pelos
autores, aparecendo logo em seguida da fase de identificação de personas.
Nessa fase, os autores sugerem o mapeamento de todos os possíveis cenários
dentro do PSS que possam envolver algum desses personas identificados
anteriormente. Sob o contexto de um availability-oriented model, os autores
sugerem a criação de instruções direcionadas a cada persona anteriormente
identificado sob um cenário específico (um erro na máquina pode ser resolvido
por um operador; um erro na máquina não pode ser resolvido por um operador).
29
Em termos de benefícios da utilização da ferramenta dentro deste contexto, os
autores defendem que a utilização da Jornada do Usuário colabora para a
identificação das necessidades dos consumidores envolvidos nesse modelo e de
como eles podem ser suportados nas diferentes situações e problemas (possíveis
quebras e falhas de máquinas).
Em um contexto semelhante, os autores Sinclair et al. (2018) propõem e testam
um modelo de desenvolvimento de PSS circular, validado em workshops
envolvendo acadêmicos e profissionais da indústria. No artigo, os autores
pontuam conceitos relacionados às teorias de PSS, Economia Circular,
desenvolvimento de novos produtos, incluindo a Jornada do Usuário (e conceitos
importantes para sua definição, como por exemplo touchpoints e experiência),
Customer Relationship Management e outros temas relacionados. A partir desses
conceitos, os autores propõem um modelo chamado Customer Intervention
Mapping (CIM), cujo principal objetivo é identificar pontos, no ciclo de vida de um
produto, passíveis de interferência por parte de stakeholders envolvidos.
A CIM, de acordo com os autores, apresenta três grandes fases (pré-compra,
compra e pós-compra), sobre as quais são dispostas outras seis fases que
compõem o processo de desenvolvimento de produto até sua utilização. Sobre
esses dois níveis de fases encontra-se um terceiro nível, composto por dezoito
fases discretas identificados pelos autores na literatura. Ainda, os autores
propõem uma última variável que indica o grau de controle da organização sobre
as intervenções dos consumidores (Figura 8)
30
Figura 8: Modelo CIM
Fonte: Sinclair et al. (2018)
Sinclair et al. (2018), ao trazer uma breve comparação entre a CIM e a Jornada do
Usuário, em termos de nível de detalhamento, pontuam que a Jornada do Usuário
geralmente apresenta menos detalhes porque não considera touchpoints que
estão fora da cadeia de valor. Além disso, os autores pontuam que etapas como
pós-compra acabam recebendo pouca atenção.
Por fim, os autores pontuam que a ferramenta é capaz de trazer o entendimento
quanto a diferentes stakeholders do PSS que são capazes de interferir no seu
ciclo de vida, além de ser uma ferramenta efetiva na geração de diferentes
cenários que descrevem PSS existentes e novos conceitos que podem ser
adaptados à Economia Circular.
31
3.2 Discussão
Para melhor compreender as abordagens encontradas entre a ferramenta
Jornada do Usuário e o PSS na literatura, assim como o nível de alinhamento que
essa abordagem apresenta em relação às definições, conceitos e modelos
propostos na literatura e revisados neste trabalho, propõe-se analisar os dois
artigos sob a óptica do seu uso e similaridade com os frameworks e terminologias
já propostos, benefícios e fases de aplicação (Tabela 4). Esses critérios de
análise são importantes para se entender (1) as diferentes formas que a CJ pode
ser aplicada no PSS; (2) a existência de similaridade quanto à terminologia entre
os modelos propostos e a revisão da literatura de CJ, devido à falta de
padronização de termos e conceitos do tema; (3) as fases do desenvolvimento do
PSS em que a ferramenta é encontrada, a fim de se entender de que maneira a
CJ apoia no envolvimento de consumidores nos processos de design de PSS e
(4) os benefícios da aplicação da CJ no PSS.
Tabela 4: Consolidação da discussão dos tópicos
Fonte: Autor
32
3.2.1. Uso da CJ no PSS e sua similaridade com frameworks de CJ
propostos na literatura
A utilização da Jornada do Usuário aparece, nos dois casos, dentro de um
contexto de desenvolvimento de modelos de PSS. Entretanto, as formas como os
autores utilizam a ferramenta nesse desenvolvimento são diferentes entre si.
Enquanto os autores Olivotti et al. (2018) colocam a ferramenta como sendo uma
etapa específica do modelo proposto no desenvolvimento de PSS, de forma a
mapear possíveis cenários e situações que envolvem os diferentes stakeholders,
os autores Sinclair et al. (2018) propõem uma ferramenta própria que apresenta
certa similaridade com alguns modelos de Jornada do Usuário vistos na revisão
de literatura da CJ.
No que diz respeito a fases, o modelo de Olivotti et al. (2018) se assemelha aos
frameworks propostos por Lemon et al. (2016) e Voorhees et al. (2017), trazendo
as fase pré, durante e pós compra. Entretanto, a ferramenta proposta pelos
autores Sinclair et al. (2018) se apresenta mais completa, por trazer as fases
existentes em três níveis e granularidades diferentes, considerando não apenas
as fases de compra do produto/serviço, mas também as fases de
desenvolvimento e manufatura, e menos linear do que os frameworks vistos na
literatura, pois ela considera todas as etapas de maneira circular. Além disso, a
ferramenta proposta por Sinclair et al. (2018) consegue colocar de maneira visual
qual o nível de controle e influência da organização a respeito das fases,
característica que não foi vista em nenhum modelo proposto durante a revisão de
literatura de CJ de maneira tão explícita, mas que, de certa forma, pode ser
comparado com a classificação de touchpoints proposta por Lemon et al. (2016).
Uma oportunidade em relação ao modelo proposto por Sinclair et al. (2018) está
na identificação das etapas e interações mais importantes, conforme sugerem
Voorhees et al. (2017).
33
3.2.2 Existência de semelhança na terminologia de PSS e de CJ
Os termos BOL, MOL e EOL, correspondentes às fases do PSS (WIESEN et al.,
2015), não são encontrados para caracterizar as fases do PSS em nenhum dos
artigos analisados. Entretanto, os autores Sinclair et al. (2018) referenciam outros
autores defendendo que a etapa EOL de um produto, sob a perspectiva da
economia circular, deve enfatizar o reuso, reparo, remanufatura ou reciclagem
deste produto.
Em relação às terminologias encontradas na revisão da Jornada do Usuário, é
possível identificar pouca ou quase nenhuma similaridade no trabalho dos autores
Olivotti et al. (2018). Durante a descrição da etapa da Jornada do Usuário no
modelo proposto, não se encontra nenhuma terminologia em comum às
encontradas durante a revisão. Entretanto, essa ausência de padronização não é
surpreendente, já que Følstad et al. (2016) aponta em seu trabalho a existência
de divergências dentre termos chave da Jornada do Usuário.
Em contrapartida, os autores Sinclair et al. (2018) utilizam termos encontrados na
revisão de CJ, como touchpoints, pre-purchase, purchase, post-purchase e
customer experience. Esses termos são utilizados pelos autores para explicar os
conceitos da ferramenta Jornada do Usuário durante o desenvolvimento do seu
modelo.
3.2.3 Fases de aplicação da Jornada do Usuário
Os dois trabalhos analisados propõem e validam modelos que colaboram para o
desenvolvimento de PSS (circulares, para o caso de Sinclair et al., e
availability-oriented model, para o caso de Olivotti et al.). No modelo proposto por
Olivotti et al. (2018), a Jornada do Usuário possui o papel de validar as ideias
geradas nas primeiras fases do modelo, quanto às necessidades dos personas
identificados. Dessa forma, considerando as fases do ciclo de vida do PSS
propostas por Wiesner et al. (2015), a Jornada do Usuário, nesse contexto, se
encontraria dentro da fase BOL, onde se realiza a geração de ideias, seguida de
34
levantamento de requisitos e terminando na fase do design (WIESNER et al.,
2015).
O modelo proposto por Sinclair et al. (2018) apresenta por si só todo o ciclo de
vida do PSS, desde seu desenvolvimento até seu uso e descarte. As fases
descritas na ferramenta não possuem a mesma nomenclatura, disposição e
ordem que as fases propostas por Wiesner et al. (2015) no ciclo de vida do PSS.
Entretanto, existe uma relação de similaridade entre as fases dos dois modelos, já
que grande parte das fases descritas no modelo proposto por Sinclair et al. (2018)
estão cobertas no modelo de Wiesner et al (2015) e vice-versa. A circularidade
observada no modelo de Sinclair et al. (2018) pode ir na direção da necessidade
de se evoluir para uma visão menos linear e mais holística quanto ao ciclo de vida
de um PSS, proposto por Wuest et al (2016).
3.2.4 Benefícios da utilização da CJ no PSS
O uso da Jornada do Usuário no contexto do PSS observado nos dois casos
estudados traz benefícios na ótica de seus autores. Para Sinclair et al (2018), o
uso da CIM possibilita o entendimento quanto a diversos stakeholders envolvidos
no modelo, além da geração de novos cenários quanto ao PSS dentro do contexto
de Economia Circular. É possível observar que a ferramenta proposta consegue
trazer o mapeamento em detalhe das diversas fases que compõem o ciclo de vida
do produto/serviço, por conta do seu nível de detalhamento e profundidade quanto
à descrição de fases. Esse nível de detalhe, em termos de abrangência de fases,
não é visto em nenhum dos frameworks descritos na revisão da literatura de
Jornada do Usuário. Além disso, essa abrangência traz, por um lado,
oportunidades quanto ao mapeamento de fases que, muitas vezes, recebem
pouca atenção, como por exemplo etapas que envolvem reparo, revenda do
produto (SINCLAIR et al., 2018). Mas, por outro lado, pode trazer uma falta de
priorização quanto às interações mais relevantes, o que é visto no modelo de
Voorhees et al. (2017).
35
Já os autores Olivotti et al. (2018) acreditam que o benefício de se utilizar a CJ no
modelo proposto está na possibilidade de se identificar as necessidades dos
consumidores envolvidos nesse modelo e de como eles podem ser suportados
nas diferentes situações e problemas. Entretanto, essa visão se torna ainda mais
relevante quando os resultados da utilização da ferramenta são observados sob
uma visão holística a respeito do modelo de PSS em questão. De acordo com os
autores Olivotti et al. (2018), no caso de quebra de máquinas, alguns funcionários,
que não são especialistas técnicos, conseguem ser apoiados por instruções
passo-a-passo à respeito da falha, tendo acesso a informações acerca da
resolução desse problema. Com isso, eles conseguem realizar um melhor
planejamento da produção, evitando assim atividades de manutenção de forma
descoordenada, de acordo com os autores.
Apesar da aplicação da ferramenta CJ no contexto do desenvolvimento de PSS -
analisadas nestes dois trabalhos - ser clara e implícita quanto aos seus
propósitos, benefícios e fases de desenvolvimento do sistema, fica bastante clara
a ausência de uma relação mais consistente entre esses dois temas na literatura,
visto o baixo número de trabalhos retornados nas buscas realizadas.
Entende-se que o envolvimento de consumidores no desenvolvimento de serviços
ou produtos é um grande desafio e exige muitos recursos das empresas. Dentro
do contexto de um PSS, esse envolvimento se torna ainda mais desafiador, já que
o desenvolvimento de soluções, nesse sistema, entregue aos consumidores finais
é ainda mais complexo do que o desenvolvimento de produtos ou serviços de
forma isolada.
Apesar da relação pouco consistente e definida entre CJ e PSS, é perceptível a
existência de uma demanda específica no desenvolvimento e execução de PSS: o
relacionamento entre empresa e consumidor em termos de obtenção de
informações a respeito das preferências, demandas e necessidades dos
consumidores. Nesse sentido, a CJ pode apoiar como ferramenta na busca
dessas informações. Se por um lado, a ausência de frameworks e terminologias
padronizadas e pré definidas para a CJ atrapalha na sua consolidação como
36
ferramenta, por outro lado, essa ausência pode trazer maior flexibilidade na sua
utilização em sistemas mais complexos como o PSS.
Embora existam limitações quanto às buscas realizadas, principalmente quanto à
escolha das strings adequadas, visto à ampla utilização de terminologias para a
CJ, o retorno de apenas dois trabalhos apontam a necessidade de se entender
mais profundamente como os designers de PSS têm envolvido os consumidores
durante os processos de desenvolvimento desses sistemas: eles estão utilizando
outras ferramentas e métodos com os mesmo propósito da CJ ou não estão
considerando crucial esse envolvimento dos consumidores no desenvolvimento
de produtos/serviços? Ainda, essa possível falta de utilização pode estar atribuída
à alguma dificuldade prática para sua aplicação ou até mesmo ineficiência da
ferramenta para tal finalidade?
37
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse trabalho analisou artigos relacionados aos temas Product-Service System e
Customer Journey. Dessa forma, revisou-se separadamente a literatura dos dois
temas de forma não sistemática, a fim de se compreender o universo acerca
destas áreas quanto a suas definições, conceitos e abordagens. A revisão do
tema Jornada do Usuário mostra a sua natureza abrangente e flexível quanto à
existência de diferentes frameworks e termos conceituais, além do seu caráter
prático quanto à aplicação e utilização em diferentes tipos de produto, serviços,
negócios e empresas.
Já a revisão do tema PSS mostra a ascensão da importância desse modelo na
indústria e o quão relevante tem se tornado o atendimento e a satisfação dos
consumidores dentro do contexto do PSS, ao longo de todas as suas fases.
Após o entendimento dos principais conceitos de PSS e Jornada do Usuário,
buscou-se identificar e entender as relações existentes entre essas duas áreas na
literatura, por meio de pesquisas nos bancos de dados.
Os resultados apontam uma baixa relação entre a utilização de CJ e o
desenvolvimento de PSS, já que poucos artigos foram encontrados na pesquisa.
Apesar dos modelos PSS buscarem cada vez mais um desenvolvimento pautado
na satisfação e na geração de valor aos seus consumidores e, apesar dos
benefícios na aplicação da Jornada do Usuário nos dois modelos analisados ser
clara, o resultado da busca realizada neste trabalho mostra que a abordagem de
modelos PSS por meio da ferramenta CJ pode ser melhor explorada.
Apesar das limitações das pesquisas realizadas, oriunda principalmente da
existência de uma vasta terminologia referente à ferramenta CJ, o que de certa
forma pode impactar nos resultados das buscas e strings utilizadas, esse trabalho
aponta a necessidade de pesquisas futuras que possam investigar (1) o impacto
que a natureza flexível, abrangente e pouco definida da ferramenta CJ tem sobre
sua aplicabilidade em modelos PSS; (2) o estudo de outras ferramentas de
envolvimento de consumidores aplicadas a modelos PSS, com o objetivo de se
38
analisar a efetividade de outras ferramentas, que compartilham o mesmo
propósito que a CJ, neste mesmo modelo de negócio; e (3) a ausência de um
desenvolvimento centrado nos consumidores por parte dos desenvolvedores de
PSS, a ponto de não se utilizar ferramentas que possam apoiar no envolvimento
do consumidor/usuário e os impactos dessa ausência no sucesso do sistema.
39
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