UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FFCLRP DEPARTAMENTO … · conhecimento sobre o lidar com o paciente....
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UNIVERSIDADE DE SO PAULO
FFCLRP DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM PSICOLOGIA
Auxiliares de enfermagem de uma unidade de agudos de um hospital
especializado em psiquiatria: sua viso sobre a prtica profissional e a
clientela atendida
Fernanda de Sousa Vieira
Dissertao apresentada Faculdade de Filosofia,
Cincias e Letras de Ribeiro Preto da USP, como
parte das exigncias para a obteno do ttulo de
Mestre em Cincias, rea: Psicologia.
Ribeiro Preto-SP
2012
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Fernanda de Sousa Vieira
Auxiliares de enfermagem de uma unidade de agudos de um hospital
especializado em psiquiatria: sua viso sobre a prtica profissional e a
clientela atendida
Dissertao apresentada Faculdade de
Filosofia, Cincias e Letras
daUniversidade de So Paulo como parte
das exigncias para a obteno do ttulo
de Mestre em Cincias
rea de Concentrao: Psicologia
Orientadora: Prof. Dr. Regina Helena
Lima Caldana
RIBEIRO PRETO
2012
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Autorizo a reproduo e divulgao total ou parcial deste trabalho, por
qualquer meio convencional ou eletrnico, para fins de estudo e pesquisa,
desde que citada a fonte.
Vieira, Fernanda de Sousa Auxiliares de enfermagem de uma unidade de agudos de
um hospital especializado em psiquiatria: sua viso sobre a prtica profissional e a clientela atendida. Ribeiro Preto, 2012.
142 p. : il. ; 30 cm Dissertao de Mestrado, apresentada Faculdade de
Filosofia Cincias e Letras de Ribeiro Preto/USP. rea de concentrao: Psicologia.
Orientadora: Caldana, Regina Helena Lima. 1. Sade mental. 2. Profissionais de sade mental. 3. Auxiliares de enfermagem. 4. Psiquiatria.
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Nome: Vieira, Fernanda de Sousa Vieira
Ttulo: Auxiliares de enfermagem de uma unidade de agudos de um hospital especializado em psiquiatria: sua viso sobre a prtica profissional e a clientela atendida
Dissertao apresentada ao Departamento de Psicologia da Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Mestre em Cincias
Aprovado em: Banca Examinadora Prof. Dr. ____________________________________________________________
Instituio: ______________________________ Assinatua: ___________________
Prof. Dr. ____________________________________________________________
Instituio: ______________________________ Assinatua: ___________________
Prof. Dr. ____________________________________________________________
Instituio: ______________________________ Assinatua: ___________________
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Dedicatria
Aos meus pais, ao Diego. Aos profissionais que entrevistei.
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Agradecimentos
ProfDr Regina Helena Lima Caldana, pelos apoios e presenas nas horas certas, contribuindo para meu crescimento como pessoa e como profissional. Thas Tom Seni Oliveira Pereira e Cynthia Cassoni, pela companhia, pelos conselhos e pelas conversas to enriquecedoras para o meu estudo.
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RESUMO
VIEIRA, FS. Auxiliares de enfermagem de uma unidade de agudos de um hospital especializado em psiquiatria: sua viso sobre a prtica profissional e a clientela atendida 2012. Dissertao (Mestrado) Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras de Ribeiro Preto, Universidade de So Paulo, Ribeiro Preto, 2012. Na atualidade, entende-se que o campo do conhecimento da sade mental amplamente complexo e intersetorial, abrangendo muitos saberes. Muitos estudos sobre os cuidadores do sujeito com transtorno mental no Brasil, que revelam que apesar da mudana do paradigma no tratamento psiquitrico ocorrida na segunda metade do sculo XX ainda h violaes dos direitos dos pacientes internados, alm do sentimento, na equipe de ateno, de certo desamparo e falta de conhecimento sobre o lidar com o paciente. Este trabalho teve como objetivo buscar conhecera viso de auxiliares de enfermagem de um setor de agudos masculino e feminino de um hospital especializado em psiquiatria do interior do estado de so paulo a respeito de seu trabalho. mais especificamente, pretende-se conhecer, a partir de sua prpria perspectiva, a trajetria e formao profissional dessas pessoas, o contexto institucional e as prticas cotidianas envolvidas em seu trabalho e suas concepes a respeito da clientela atendida. Foram entrevistados atravs da histria de vida temtica onze auxiliares de enfermagem. Essas entrevistas foram gravadas e transcritas na ntegra, e analisadas qualitativamente. A anlise permitiu apontar os seguintes temas: suas trajetrias de vida, influncias recprocas entre a vida pessoal e do trabalho, a formao dos profissionais,o perfil do auxiliar, a rotina de trabalho e seus apoios a viso sobre o paciente psiquitrico, sua famlia. Os relatos convergiram para a apresentao da maneira como se configura o trabalho do auxiliar de enfermagem, quanto s suas vises e condies para o trabalho cotidiano Considera-se que importante promover a criao de espaos de reflexo, discusso e escuta entre os profissionais de sade mental, dentro dos setting de trabalho, integrando principalmente os que lidam diretamente com o paciente, de modo que nesses espaos se possa conversar sobre questes da prtica diria especficas, mas tambm transcender a elas; relacionando essa prtica com repercusses da vida pessoal no trabalho, promovendo apoio ao trabalhador. Palavras-chave: sade mental; profissionais de sade mental, auxiliares de enfermagem; psiquiatria
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ABSTRACT
VIEIRA, FS. Nursing personnel in na acute unit in a psychiatry specialized hospital: their concepts on practices and clients. 2012. Dissertation (Masters Degree) Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras de Ribeiro Preto, Universidade de So Paulo, Ribeiro Preto, 2012. It's well known that the mental health knowledge field is complex and inter sectorial. Many studies about the mental health patient, in Brazil, have revealed that although there was a change in the psychiatric treatment, still there is patients rights violations, and the feeling in the attention group is of certain hopelessness and lack of knowledge in dealing with the patient. This work aims to explore a masculine and feminine acute unit nursing personnel, in a psychiatry specialized hospital in the inner State of So Paulo, from the point of view of their work. More specifically, it's intended to know, from their own perspective their professional pathways and education, the institutional context and their everyday practices concerning work and clients. Eleven nursing professionals were interviewed through thematic life history interview. Those interviews were taped and integrally transcript and analyzed qualitatively. The analysis showed their life pathways, influences of their personal lives on work, professional education, work routine, support on psychiatric patients and the patients family concepts. It's considered that it's important to promote reflection, discussion and hearing spaces among mental health professionals, in the work setting, with those who deal directly with the patient and the whole team so its possible to discuss on every day practices, transcend to them relating to personal life repercussions, promoting support for work. Key words: mental health; mental health professional; nursing personnel, psychiatry
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Distribuio dos dados de caracterizao por participantes ..................... 56
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LISTA DE SIGLAS
SUS Sistema nico de Sade
COFEN Conselho Federal de Enfermagem
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SUMRIO
PRLOGO ................................................................................................................ 21
1. INTRODUO ...................................................................................................... 23
1.1. Aspectos Histricos......................................................................................... 23
1.2. Os Cuidadores ................................................................................................ 33
1.3. Profissionais da Equipe de Enfermagem ........................................................ 37
2. OBJETIVO ............................................................................................................ 49
3. MTODO ............................................................................................................... 51
3.1. Contexto do Estudo ........................................................................................ 53
3.2. Participantes ................................................................................................... 55
3.3. Instrumentos de Coleta de Dados .................................................................. 57
3.4. Procedimento de Anlise dos Dados .............................................................. 60
3.5. Cuidados ticos .............................................................................................. 61
4. RESULTADOS ...................................................................................................... 63
4.1. A trajetria at o trabalho no hospital .............................................................. 63
4.2. A Formao ..................................................................................................... 67
4.3. O contexto institucional de trabalho ................................................................ 71
4.4. A vida pessoal e o trabalho ............................................................................. 77
4.5. A reforma psiquitrica e o servio oferecido no hospital ................................. 85
4.6. O manejo do paciente na rotina do hospital .................................................... 88
4.7.A viso sobre o paciente e sua famlia ............................................................ 93
4.7.1. A famlia .................................................................................................... 99
5. DISCUSSO ....................................................................................................... 103
5.1. A configurao das prticas de trabalho ....................................................... 106
5.2. A viso sobre os pacientes psiquitricos atendidos ...................................... 113
6. CONSIDERAES FINAIS ................................................................................ 121
7. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ................................................................... 127
ANEXOS ................................................................................................................. 140
ANEXO A Termo de Consentimento Livre e Esclarecido .................................. 140
ANEXO B Instrumento de Coleta de Dados ..................................................... 141
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Prlogo| 21
PRLOGO
Ir a um hospital de psiquiatria sempre uma coisa difcil. Se vale o que vi ao
longo do meu contato com hospital especializado em psiquiatria, penso na minha
prpria experincia como um bom comeo de um primeiro relato de como o
contato com os pacientes psiquitricos, em meio a uma estrutura engessada. No
tive essa experincia, mas ouvi dos prprios entrevistados e de outras pessoas que
me disseram que passar dcadas no contato com os pacientes, deixa a pessoa que
com eles convive um pouco louco.
Apesar disso, tambm percebo que essa loucura no quer dizer
insensibilidade dor do outro. Na verdade, nunca achei isso. Loucura para mim o
contrrio: a exacerbao, num nvel que atrapalha a vida, da sensibilidade. Trabalhar
em meio a tanta loucura, parece tambm contagiar e ensinar a ter certos graus de
sensibilidades mais aguados do que aqueles de fora dos muros do hospital. Fico
pensando em como no se afetar com isso. No na tentativa de procurar um meio
de evitao do contato, mas a tentativa de viver com ele sem que isso o defina.
No contato que tive com a instituio, tive uma sensao contnua de no
querer entrar l pela manh, principalmente nas manhs frias de segunda-feira, mas
tambm, todas as vezes que ia embora, ficava pensando em como seria a prxima
vez que estaria l. s vezes adormecia no nibus, perdida nos pensamentos, mas
voltava sempre. Triste. O medo da loucura sempre em mim foi grande, o medo de
ficar l dentro, trancada, mas tambm isso me capacitou a estar l. Mostrou a mim
mesma que eu no precisava ter medo de quem estava l porque era igual a mim,
mas de um jeito diferente, embora eu ainda precisasse de um lembrete concreto: a
chave da porta de entrada e sada diria, horrio para ir e para voltar de l.
Diante dessas consideraes, fica a pergunta do meu mestrado. Na minha
experincia de contato com o hospital, eu sempre ia meio sem jeito perguntar para
os auxiliares de enfermagem como que era para eles, cheguei at a ser
repreendida por perguntar demais e isso, naquela poca, foi muito importante.
Claro que mudei meu jeito de continuar fazendo isso e acabei voltando para
colher as respostas que ficaram por l. Hoje acredito que, com o tempo vou aprendi
a acolher as respostas e a perguntar com mais ternura e mas compreenso.
Percebo que essa atitude importa tanto aos pacientes como tambm aos seus
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22| Prlogo
cuidadores e tornar isso conhecimento em sade mental, para mim me pareceu
importante num momento em que se repensa as repercusses da reforma
psiquitrica e de procura novas possibilidades de promoo de sade mental. A
minha contribuio para isso comea por aqui.
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Introduo| 23
1. INTRODUO
1.1. Aspectos Histricos
Pessotti (1999) diz que o conceito de loucura pouco se modificou desde a
Antiguidade at hoje: a loucura, para esse autor, seria a perda da autonomia
psicolgica, implicando perda da liberdade e do autogoverno. Assim, historicamente,
a questo do estudo da loucura e o contato com o louco se torna ao mesmo tempo
interessante e amedrontador. Durante o perodo da Grcia Antiga, a loucura,
segundo Silveira e Braga (2005) e Pessotti (1999) era entendida ambiguamente
como uma caracterstica quase divina, portadora de verdade, mas ao mesmo tempo
sofrimento e descontrole das paixes, pela tradio Hipocrtica; e o louco era visto
como um ser diferente dos outros, separado desses outros, mas integrado no
cotidiano da sociedade, no sendo entendido como doente.
Gradualmente, esse status da loucura muda e na Antiguidade clssica toma
direo contrria na Idade Mdia. O louco se torna cada vez mais o representante
daquilo que perigoso e desumano, possudo, endemoniado (PESSOTTI, 1999).
Por no ser adaptado ao meio e passa a ser retirado convvio social em instituies
religiosas e comunidades filantrpicas. H uma ciso cada vez mais profunda entre
a experincia mstica e a conscincia racional do mundo (SILVEIRA & BRAGA,
2005).
Na Renascena, h maior busca de racionalidade e objetividade conceitual. A
medicina toma conta desse campo do conhecimento e cunhado o terno alienao
mental (mentis alienatio) para falar do processo de enlouquecimento.
Paulatinamente, a psicopatologia evolui no sentido de busca cientfica de algum
substrato orgnico da loucura, cabendo ao mdico, observar as manifestaes e
sintomas para determinar as causas da psicopatologia, porm ainda carente de
bases fisiolgicas para fundamentar seus conhecimentos (PESSOTTI, 1999).
A psiquiatria moderna se configurou inicialmente no perodo seguinte, no
sculo XIX com o movimento Alienista, em que maiores presses sociais levavam a
restries dos alienados, em decorrncia do processo de urbanizao e da
consequente necessidade de manuteno da ordem das cidades em crescimento.
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24| Introduo
Nesse perodo o tratamento dado aos doentes passou por transformaes: o
hospital deixou de ser sede de abrigo, alimentao e assistncia caridosa, para
exercer papis de instituio social e poltica; se medicalizou com a pretenso de
anular os efeitos negativos da loucura e do louco (AMARANTE, 2007; SILVEIRA &
BRAGA 2005).
Nesse perodo o hospital se tornou espao de exame, tratamento e
reproduo do saber mdico, desprovendo o louco do saber sobre si mesmo e a
doena, isolada, se transformava em uma doena pela interveno mdica, dando
lugar ao saber do especialista. A consequncia disso foi a caraterizao do modelo
biomdico ocidental: predominantemente hospitalar, asilar e curativo (AMARANTE,
2007).
Para Pessotti (1996), em um momento em que a racionalidade que define a
identidade do Homem; no hospital psiquitrico mostra a desrazo a toda fora e pe
a nu a labilidade do homem (p.9). A ideologia vigente era a de que o louco deveria
no mais ficar acorrentado, mas submetido a um tratamento asilar (que, no entanto,
no significava perda da liberdade, mas restituio da mesma subtrada pela
alienao)1. A teraputica adotada nesse perodo era o tratamento moral, posto que
a loucura ou alienao era entendida, como escreve Amarante (2007), como um
distrbio no mbito das paixes que impossibilitaria ao indivduo perceber a
realidade, associando-se a essa perda o senso de periculosidade. Assim, era
necessrio domar essas paixes e, dessa maneira, moralizar o indivduo alienado
exercendo funo teraputica que pretendia instaurar organizao por meio de
regras, condutas, horrios, enclausuramento e o trabalho.
Nesse perodo, o manicmio se transforma de refgio ecolgico e educativo,
em meio de sujeio do louco a uma teraputica violenta destinada a agir sobre a
leso cerebral e no mais razo desarrazoada. Essa mudana no olhar sobre a
loucura evidencia o pensamento dos mdicos da poca, buscando explicaes
cientficas orgnicas para os fenmenos observados nos pacientes, desvalorizando
a concepo moral/passional da loucura. Dessa maneira, a atitude do mdico se
caraterizava pelo conflito entre a tentativa de controle do comportamento aberrante e
a conduta clnica. Adotava-se, desse modo, a teraputica disciplinatria, repressiva e
violenta como educao moral (PESSOTTI, 1996).
1Esse pensamento, segundo Amarante (2007), ainda subsiste at a atualidade na prtica em sade
mental.
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Introduo| 25
Os grandes representantes dessa poca foram Kraeplin, Durkheim e Freud,
que, embora pesquisando independentemente, segundo Turato (2003), deram certo
enquadre psiquiatria como uma disciplina da medicina: uma concepo que
remete vertente biopsicossocial2.
A concepo biolgica, derivada do movimento pineliano, na qual o
tratamento mental tinha a finalidade de restaurar o indivduo acometido a um padro
de normalidade previamente determinado, geralmente associado reduo dos
sintomas que o levaram internao, utilizando-se de mtodos diagnsticos e
teraputicos com aes geralmente prescritas pelo mdico e executadas pelos
outros profissionais da equipe, os quais eram coadjuvantes impossibilitados de
apropriarem-se da unidade concepo e execuo do tratamento, que fica em poder
do profissional mdico. Este o modelo hegemnico nas prticas assistenciais
psiquitricas no Brasil at os dias de hoje, como relata Campos e Barros (2008).
Segundo essas mesmas autoras, outra corrente que influenciou a prtica do
cuidado em psiquiatria foi a concepo da psiquiatria psicoterpica, que enfatizava a
importncia de compreender a pessoa enquanto situada nas relaes sociais e
sujeito de sua histria, sob influncia da psicanlise freudiana. Ouvir o paciente
passou a ser importante, buscando significados para alm do discurso manifesto
(CAMPOS; BARROS, 2008). Alm do fator teraputico da escuta, outro dessa
prtica foi produzir conhecimento acerca da doena mental. Assim, o hospital, alm
de ser um local de isolamento do louco era tambm local de produo de
conhecimento do saber mdico psiquitrico. Modelo esse que se relaciona ao
tratamento e produes acadmicas acerca no campo da sade mental.
Muitas crticas existiram acerca desse modelo segregacionista e na mesma
poca tambm outros modelos assistenciais foram criados, como as comunidades
de alienados cujo tratamento era feito por meio da submisso ao trabalho
teraputico, que, na prtica, mostraram-se tambm asilares (AMARANTE, 2007).
Um exemplo das crticas feitas a esse modelo apresenta-se Franco Basaglia (2005)
quanto ao pensamento do sculo XIX:
A doena mental identificada pela interveno mdica no emaranhado da desrazo e da culpa, transferida da esfera da
2Esse mesmo autor ainda pontua que o estudo da psiquiatria tem movimentos pendulares, pois, cem
anos anos depois, a psiquiatria retoma um modo minucioso de descrever as psicopatologias, francamente classificatrio, em que a abordagem epistemolgica compreensiva da psicologia profunda e da sociologia interpretativa ficam de fora (Turato, 2003, p. 97-98).
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26| Introduo
punio para a de um tratamento que continua a ser punio porque a misria que a constitui, e que determina o carter essencial da relao que se continua a manter com ela. (...) A doena passa a ser mediadora entre a nova racionalidade do poder e uma misria que deve ser organizada, subdividida, fracionada em tantos setores quantas forem as respostas tcnicas preparadas, a fim de que no se altere o equilbrio entre penria e abundncia e, sobretudo, sua distribuio. (p.269-270)
Com a ecloso das duas Guerras Mundiais, novamente houve um grande
perodo de mudanas que objetivaram repensar o modelo asilar e requeriam
reformas no tratamento da loucura. Amarante (2007) expe que as reflexes
geradas ento se tornaram to grandemente importantes que at hoje tm
repercusses. Nesse perodo, a crtica passou a ser sobre a forma de gesto da
instituio manicomial e dessa maneira, a soluo seria modificar a instituio. O
autor classifica os movimentos sociais de reforma psiquitrica como a seguir:
Os Movimentos das Comunidades Teraputicas (ComunityCare). Nesse
contexto, nascido no Reino Unido, surgiram experincias como as comunidades
teraputicas organizadas pelos funcionrios da instituio, usurios e familiares.
Esse movimento propunha uma nova relao entre o hospital psiquitrico e a
sociedade envolver todos os atores no processo teraputico, ou seja, tornar os
pacientes sujeitos nesta troca de experincias , demonstrando a possibilidade dos
doentes mentais virem a ser tratados fora do manicmio (GONDIM, 2001).
Seguindo esses passos, o movimento da Psicoterapia Institucional,
introduzido na Frana, era uma modalidade de tratamento centrada no
questionamento da instituio psiquitrica enquanto lugar de excluso e de
verticalidade das relaes mdico paciente. O objetivo, para Gondim (2001), era
criar meios para restabelecer o coletivo dos pacientes, possibilitando a abertura de
novos espaos para trocas e experincias. Outro modelo, semelhante a esse, a
Psiquiatria Social, buscava transformar o hospital em espao teraputico,
transformando as aes em produes que pudessem reabilitar o indivduo
internado para tornar-se produtivo. Faz-se uma crtica a esses dois modelos: apesar
de trazerem mudanas no enfoque do manejo com os pacientes, ainda vinculavam
instituio psiquitrica e ao mdico a centralizao do tratamento da doena mental.
Num enfoque mais aberto desinstitucionalizao dos pacientes, tambm na
Frana, surgiu a Psiquiatria de Setor na qual dividiam-se alas e servios de sade
em regies, facilitando o intercmbio de informaes entre os servios de
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Introduo| 27
acompanhamento pela mesma equipe multiprofissional (no mais somente mdicos)
e mesmo entre os pacientes e familiares (AMARANTE, 2007).
Nessa mesma ideologia, a Psiquiatria Preventiva ou Comunitria, surgida nos
Estados Unidos, considerava que o modelo asilar falido deveria ser substitudo por
servios assistenciais que modificariam o cuidado teraputico por meio de espaos
fora do mbito manicomial. O enfoque era o da preveno de maneira a evitar
internaes e reinternaes. As polticas de interveno passaram a ter carter
preventivo, procurando-se caraterizar precocemente a propenso de seu
desenvolvimento, promovendo a desospitalizao dos pacientes 3 (AMARANTE,
2007).
Na Inglaterra, surgia o movimento da Antipsiquiatria que propunha: todo o
modelo cientfico psiquitrico deveria ser colocado em xeque, juntamente com as
suas instituies. A proposta era uma mudana de paradigma: o discurso sobre o
louco seria uma denncia das tramas opressoras da famlia e da sociedade e teria
origem no no indivduo, mas nas relaes com ele estabelecidas. Amarante (2007)
relata que o tratamento, ento, no era mais tratamento para cura, mas relacionava-
se ideia de experincia de si e do sintoma como expresso da possibilidade de
reorganizao interior e a interveno viria no sentido de auxiliar, compreender,
acompanhar e proteger o paciente.
Outro vrtice, contemporneo ao da Antipsiquiatria, era a tentativa italiana de
reformulao do modelo psiquitrico vigente: a Psiquiatria Democrtica, uma
interveno que deveria ser multilateral e simultnea, visando eliminao do
manicmio e de todo o saber estigmatizante da loucura, dando um novo lugar social
a ela. Franco Basaglia (2005; p 270 a 272) em seu texto Loucura/Razo critica o
modelo vigente:
Entender os momentos desse processo, surpreender as passagens dessa mediao constituda pela doena e, ao mesmo tempo, o papel que a cincia exerceu na organizao separada dos fenmenos, o ponto crucial para a organizao daquilo que ser a loucura. (...) Sobre essa ambgua e gradativa fabricao de uma norma que responde s exigncias da racionalidade burguesa, a psiquiatria comea a erigir o labirinto das suas classificaes (...) j sem preocupar-se com o que a loucura e o que ela representa. Assim como comea a erigir suas instituies - com as respectivas prticas de punio, de controle, de tortura, agora avalizadas pela
3Para esse mesmo autor, em contrapartida, esse movimento levou a outro efeito: verdadeira caa ao
distrbio, buscando diagnsticos precoces, gerando estigmatizao do paciente
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28| Introduo
cincia - sem considerar o profundo nexo entre a ideologia da norma que a constitui, e que ela tutela com sua prtica e sua teoria, e uma organizao social estruturada sobre a diviso do trabalho, e das diversas disciplinas a fim de apropriar-se do indivduo que deve aderir-se quela norma.
Na viso de Gondim (2001) sobre a proposta basagliana props mudanas no
paradigma de compreenso da loucura, assim, faz uma crtica ao manicmio no
somente quanto ao aprisionamento que ele causa e sim a uma compreenso do
processo de violncia e excluso em que a experincia da loucura se inseria.
Tratava-se de analisar historicamente a forma com que a sociedade lidou com o
sofrimento mental ao longo do tempo (GONDIM, 2001).
A estratgia foi abrir o espao manicomial sociedade, inserindo-o ao cenrio
de atividades culturais, educativas da cidade, ampliando para todos as
possibilidades de convivncia e criao. Essa mudana no aconteceu somente no
mbito do espao fsico onde a loucura se inseria, mas tambm na produo de
saber sobre ela, na tcnica de abordagem e mesmo no sistema jurdico, dotando o
doente mental de plenos direitos sobre si. Outras estratgias alternativas ao modelo
vigente foram lanadas no sentido de incluso social foi a criao de Cooperativas
de Trabalho, seja pela construo de Residncias Teraputicas produzindo e
participando na sociedade.
No Brasil, os movimentos de reformas vem ocorrendo desde o final sculo
XIX. Gondim (2001) relata que nesse perodo a psiquiatria tinha como maior
representante o mdico Juliano Moreira, defensor das colnias agrcolas para
alienados nas quais o doente mental deveria ser tratado com auxlio do trabalho,
essa ideia foi ento disseminada em todo o pas. Nessa poca, os grandes
hospcios construdos foram reformados e ampliados, tornando-se o centro de toda a
poltica de estatizao da sade mental.
Entretanto, foi nos anos da ditadura militar, momento do ps-guerra, em que
intensas modificaes ocorreram em todo o sistema de assistncia sade. A
poltica de sade tomou novos rumos, expandindo a contratao de funcionrios e o
financiamento de clnicas privadas pela Previdncia Social. Essa medida levou,
segundo Gondim (2001), a um crescimento desordenado do setor, cristalizando o
modelo manicmio dependente, acompanhando o modelo sanitarista. Segundo essa
autora, o modelo privatizante foi considerado um dos fatores que provocaram a crise
institucional e financeira da Previdncia Social no incio dos anos de 1980.
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Introduo| 29
Entretanto, Silva e Fonseca (2005) relatam ocorrer na prtica a transferncia dos
pacientes de um estabelecimento a outros sem alterar a qualidade do cuidado com a
finalidade de racionalizar o uso de leitos estaduais pblicos e gerenciar uma
estrutura gigantesca, no administrvel. De maneira que o papel da equipe de
enfermagem se aproximava da prtica carcerria.
Goulart (2006) aponta que a rede de sade manicomial, nesse perodo, era
caracterizado por um modelo teraputico precrio, apoiado no uso indiscriminado de
medicaes, isolamento dos doentes em hospitais superlotados, resultando em
iatrogenias, cronificaes e altos ndices de segregao e mortalidade dos pacientes
institucionalizados.
Uma conjuno de movimentos sociais culminaram na criao do Sistema
nico de Sade, SUS, em 1986, invocando a universalidade, a integralidade e a
igualdade da assistncia. Particularmente quanto sade mental, o Movimento
Nacional da Luta Antimanicomial se construiu a partir de meados dos anos 70, em
uma conjuntura poltica, social e econmica de contestao em escala mundial e
vrios eventos, congressos, simpsios na rea de sade mental debatiam questes
relativas aos hospitais psiquitricos enquanto nica forma de ateno ao portador de
transtornos mentais (GRADELLA Jr, 2008).
Para Gondim (2001), o campo da sade mental encontrava-se aberto para
experincias inovadoras, com a participao de usurios e familiares nas polticas
de sade mental por intermdio da organizao de entidades que englobavam
trabalhadores de sade mental, bem como o surgimento de novos dispositivos de
cuidado para a doena mental.
No decorrer dos anos 1980, vrias experincias com modelos substitutivos ao
hospital psiquitrico foram realizadas em So Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do
Sul e Cear, durante o II Encontro Nacional de Trabalhadores em Sade Mental, que
defendia a urgncia de mudanas no atendimento a portadores de transtornos
mentais foi proposta a criao de servios como o Centro de Ateno Psicossocial
(CAPS) e o Ncleo de Apoio Psicossocial (NAPS), a criao de hospitais dia e
ambulatrios com equipes mnimas de Sade Mental (um psiquiatra, um psiclogo e
um assistente social) nas UBS, unidades de emergncia psiquitrica, leitos
psiquitricos em Hospitais Gerais, enfermaria psiquitrica em Hospitais Gerais e
centros de convivncia (AMARANTE, 2007).
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30| Introduo
Nessa conjuntura, com a I Conferncia Nacional de Sade Mental, houve o
desdobramento da 8 Conferncia Nacional de Sade e suas deliberaes
apontaram para a mudana radical do modelo psiquitrico vigente e o trmino da
construo de hospitais psiquitricos (GRADELLA Jr, 2008).
Goulart (2006) explica que as reformas feitas, nesse perodo, nos hospitais
pblicos se revelaram insuficientes e mesmo incuas quanto gravidade do
problema no incio do movimento, e as equipes de sade no conseguiram produzir
mudana efetiva num cenrio em que as prticas de segregao j estavam
consolidadas.
Nos anos 1990, houve certa estagnao quanto implementao de servios
de sade mental, embora com expressiva movimentao social a favor de
mudanas. Somente em 2001, com a aprovao da Lei n 10.216 (Projeto Paulo
Delgado de 1989), iniciou-se um movimento amplo por parte do Estado para a
implementao de um modelo de ateno com caractersticas antimanicomiais,
ainda que calcada em procedimentos tcnicos, deixando usurios e familiares como
sujeitos margem do processo de tratamento (GRADELLA Jr, 2008).
O novo panorama gerado aps a Reforma Psiquitrica no Brasil, apesar do
ideal motivador de sua criao; num ambiente de renovao poltica, teve
repercusses internacionais, considerada como sendo de grande originalidade, j
que possibilitou uma mudana de cultura, nos saberes e nas prticas sobre a sade
mental, levando criao de um equipamento diferenciado de cuidado, a mudanas
na legislao e na participao social (GONDIM, 2001).
Entretanto, essa nova ideologia em sade mental, atualmente tem encontrado
pouco respaldo nas polticas pblicas, sendo implantado de maneira parcial nos
servios de sade (AMARANTE, 2007; GRADELLA JR, 2008). A grande alterao no
sistema de sade mental do movimento antimanicomial, para Goulart (2006), foi a
implantao de servios extra-hospitalares, por se tratar de uma abordagem
oferecida como ateno bsica, como porta de entrada do usurio no servio de
sade, com muitas possibilidades para tambm assistir a sademental. Outra
estratgia so as prticas humanizadas da assistncia a estes usurios que por
muito tempo ficaram do lado de fora desta porta, muitas vezes excludos de
cuidados e servios bsicos. Alm disso, o tratamento de transtornos de sade
mental mais comuns passaram a ser tratados no contexto de cuidado primrio e a
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Introduo| 31
colaborao com servios de sade mental se torna necessria (YOUNES e cols.,
2005).
Barros (2008) e Andreoli e cols. (2007) afirmam que no incio da dcada de
1990, as internaes eram grande parte das despesas do Estado com internaes
hospitalares, assim, a partir de 1992, o Ministrio da Sade props mudanas no
perfil das internaes, aumentando servios extra-hospitalares. Nessa poca, o perfil
das internaes era da maior parte dos leitos disponveis, tempo de permanncia
elevado e grande nmero de reinternaes dos pacientes. Com a mudana na
gesto, houve reduo do nmero de leitos e ampliao de servios extra-
hospitalares de sade mental.
A partir de 2003, a internao integral passou por um momento de falta de
vagas, Barros (2008) refere que o aumento das internaes pode estar relacionado
a limitaes da rede de servios extra-hospitalares e que a melhoria desses servios
pode determinar melhorias na rede de atendimento psiquitrico. Andreoli et.al.
(2007) consideram que a poltica pblica de distribuio dos leitos no tem tido na
prtica investimentos que acompanhem essa necessidade de mudana, num
sistema que pretende diversificar as modalidades de atendimento aos usurios, bem
como acesso a medicaes, ficando o setor psiquitrico extra-hospitalar em
defasagem com relao a necessidade da populao. Esses dois autores relatam
que a reforma psiquitrica no uma estratgia pblica de reduo de custos, ou
pelo menos, no deveria ser, isso necessariamente s poder acontecer se houver
aumento de investimentos nesse campo.
Campos e Soares (2003) escrevem sobre a produo de servios de sade
mental, descrevendo as concepes de servios de sade mental de trabalhadores
de diferentes servios de sade mental: hospitalar, ambulatorial, unidades bsicas
de sade e centro de ateno psicossocial (CAPS), que fizeram o curso de
especializao em tecnologias em sade mental. Nos trs primeiros modelos, a
concepo de sade-doena multifatorial e centrada no indivduo; enquanto nos
CAPS, a concepo relacionava-se o usurio sua rede social. Essas autoras
consideraram que a produo de servios de sade mental enfrenta o desafio de
avanar no entendimento de um paradigma diferente sobre a concepo do
processo sade-doena e, consequente redefinio dos processos de trabalho,
pautados no mbito dos determinantes e no somente no dos resultados do
processo sade e doena.
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32| Introduo
Goulart (2006) tambm destaca desafios a serem vencidos no processo de
mudana na ateno sade mental: a necessidade de mobilizao e esforos
sistemticos na construo da poltica de sade mental afrontando os ainda
dominantes interesses de mercado de modo que haja reverso de um modelo
hospitalocntrico para estruturas assistenciais que efetivamente respondam s
situaes de crise, incrementando estratgias de reabilitao e reinsero social e
comunitria efetivos. Essa mesma autora aponta a necessidade de criao de meios
de avaliao qualitativa dos novos servios, promoo de integrao de aes entre
os servios pblicos assistenciais e a formao de profissionais capazes de
compreender a extenso do problema da sade mental e agir 'inventivamente' de
modo a responder s necessidades das pessoas atendidas articulando ateno e
esforo de emancipao dos envolvidos.
Wetzel e Kantorski (2004), discutem a avaliao de servios de sade mental,
atrelando-a a proposta de reformulao do modelo assistencial. As autoras avaliam
que fundamental a participao de todos os atores envolvidos no servio, de
maneira a considerar a integralidade dos servios de ateno em sade mental,
embora na prtica, as mudanas ocorridas nesse campo no se d de maneira
espontnea. Elas consideram que a avaliao de servios de sade mental devem,
alm de avaliar mudanas, tambm possibilitar o processo de construo dinmico
de servios e atendimentos em sade mental, negociando com todos os
interessados propostas, envolvendo-se nos grupos com o objetivo de buscar
questes mais pertinentes dentro do contexto do servio, com mais significado aos
interessados e aumento e aprimoramento da capacidade de ao desses grupos.
Kantorski (2007) complementa que, num contexto de reformulao da
ateno psiquitrica, a insuficincia de servios substitutivos, enquanto espaos de
ensino prtico, formas inovadoras precisam ser criadas e introduzidas.
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Introduo| 33
1.2. Os Cuidadores
Ao longo do tempo, acompanhando evoluo das ideias acerca do paciente4
com transtorno mental, as prticas dos profissionais que lidavam com esses
pacientes foi-se alterando, assim como as concepes do cuidador acerca desse
contato. Apesar de ainda desenvolver suas aes prioritariamente no modelo
hegemnico biomdico, h um movimento de humanizao da assistncia, tanto
dentro, quanto fora dele, no qual a enfermagem vem tambm desenvolvendo outras
prticas e revendo conceitos (CAMPOS e BARROS, 2008). Nesse sentido, essas
autoras colocam que este um momento de reviso do objeto de trabalho, da
prtica e da finalidade da assistncia da enfermagem no campo da psiquiatria.
Com o novo contexto delineado ps-reforma do sistema de assistncia em
sade mental, um novo olhar foi colocado nos cuidadores do paciente com
transtorno mental (PEREIRA & PEREIRA Jr, 2003; GOODWIN & HAPPELL, 2007).
Goodwin e Happell (2007) relatam que a participao dessas pessoas no tratamento
de usurios de servios de sade mental, mais que uma oportunidade, passou a ser
algo esperado.
Paralelamente, a viso sobre os cuidadores informais desses pacientes
tambm tem mudado dentro da sociedade, passando a serem considerados
pessoas com direitos, num movimento de incluso social e institucional e, nesse
sentido, passaram a ter visibilidade tornando-se grupo organizado advogando e
sendo reconhecidos quanto s causas dos indivduos com transtornos mentais
(GOODWIN & HAPPELL, 2007; PEGORARO & CALDANA, 2006).
Estudos atuais indicam que esses cuidadores tambm vivenciam sofrimento,
ainda que no manifestem transtornos categorizados nos manuais de Psiquiatria,
tornando-se deste modo, figuras indispensveis no planejamento das aes de
sade executadas pelas equipes de sade mental (PEGORARO & CALDANA, 2008;
DIAMANTINO, 2010).
Pegoraro e Caldana (2006) encontraram em seu estudo que os cuidadores
eram geralmente familiares, do sexo feminino - notadamente mes, mas que
4Neste estudo se faz a escolha de chamar o usurio do servio de sade mental como paciente por
sua condio de sofrimento, objeto de cuidado e pessoa que, com pacincia busca ativamente por ateno e cuidado, por meio da formao de sintomas, numa viso psicodinmica.
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34| Introduo
tambm podiam ser irms e esposas que ficavam a cargo de cuidados durante a
crise. Esses cuidados variavam desde a higiene pessoal, alimentao, tentativa de
preveno do suicdio e da fuga, bem como os encargos financeiros - muitas vezes
auxiliados pelo sistema de assistncia social do paciente do transtorno mental. A
responsabilidade pelo cuidado na crise psiquitrica pareceu, segundo essas autoras,
propiciar um ambiente de maior vulnerabilidade social, financeira e emocional.
Outro ponto importante a ser considerado foi a existncia de redes de apoio
tambm informais desses cuidadores como maridos, vizinhos, parentes e amigos,
pertencentes ao crculo social prximo e existente antes da irrupo das crises do
paciente com transtorno mental e que permitem que os cuidadores deleguem a eles
funes para que possam dedicar-se ao cuidado com o paciente. Indicando tambm
que os familiares deveriam ser alvo de interveno da equipe de sade mental,
posto que permitem tambm o cuidado indireto dos pacientes, no apenas por meio
de palestras e assembleias, apontando a necessidade de um trabalho contnuo com
essas pessoas (PEGORARO & CALDANA, 2006 e PEREIRA, 2003).
Corroborando com esse panorama, Diamantino (2010) e Gonalves e Sena
(2001) apresentam dados sobre uma repercusso importante da reforma psiquitrica
brasileira a problemtica da responsabilizao familiar do cuidado do paciente com
transtorno mental no processo de desinstitucionalizao. Apesar disso, os servios
substitutivos tomaram um significado importante na vida dos pacientes e de seus
cuidadores. Moreno e Alencastre (2004) relatam que hospitais dia funcionam para
eles como local de ensino-aprendizagem, ocupao do tempo e recebimento de
cuidados; j o atendimento ambulatorial permite ao paciente sua responsabilizao
sobre o tratamento embora relatem quanto ao atendimento emergencial, a primazia
do conhecimento mdico sintomatolgico em detrimento do conhecimento adquirido
pelos familiares como fatores importantes no diagnstico da crise.
Colvero, Ide e Rolim (2004), Pereira e Pereira Jr. (2003) e Souza, Scatena e
Pereira (2001) apontam para a importncia dos profissionais de sade mental
considerarem, em suas intervenes, o saber produzido pelos familiares, bem como
as dinmicas relacionais entre servio de sade, famlia e paciente psiquitrico.
Nesse contexto, Hird (2007) destaca que, a despeito do preconizado, envolvimento
com os usurios dos servios de sade mental so mais retricos que realistas; na
prtica o que parece acontecer que as equipes se envolvem com os pacientes
mais no sentido de tomar uma deciso quanto ao tratamento do que pelo benefcio
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Introduo| 35
direto do paciente na relao teraputica e isso aconteceria em detrimento do
prprio cuidado sobre a sade e sobre o uso que feito pelo usurio do servio de
sade.
Outra ponta da rede de apoio ao usurio de servios de sade mental a
equipe que o acompanha.
Ao mesmo tempo, os profissionais de sade tm um relacionamento especial,
dentro do processo de trabalho da equipe, o acolhimento e a acessibilidade
despontam como instrumental de organizao do servio e como tecnologia de
cuidado relacional com os pacientes e esto expostos a situaes que lhes permite
vivenciar o progresso do paciente, seu potencial e seguimento do tratamento
(NOISEUX & RICARD, 2008; PINHO, HERNNDEZ E KANTORSKI, 2009). Por isso,
segundo Noiseux&Ricard (2008) discutem que o foco no na doena e seu grande
potencial de destrutividade, mas na possibilidade de construo de mudanas do
panorama do paciente como um todo e das habilidades individuais deste; dessa
maneira, como membros de qualquer rea profissional, pesquisadores e
especialistas em sade tm uma responsabilidade especial por suas aes para
com os pacientes e esperado que contribuam para o desenvolvimento de um
conhecimento sobre as atividades de cuidado que podero facilitar a melhora dos
pacientes com transtornos mentais.
A literatura internacional tem apontado que os profissionais de sade tm sido
vistos (HIRD, 2007; NOISEUX & RICARD, 2008; SILVA e FONSECA, 2005) como os
maiores obstculos a implantao das novas propostas, especialmente no que se
refere s atitudes de enfermeiras, devido a sua formao segundo um modelo
assistencialista centrado na figura do tcnico de ensino superior como portador de
saberes. Entretanto h um esforo contemporneo de reviso das prticas de
assistncia no sentido de promover maior integrao de aes teraputicas
multiprofissionais.
Segundo a perspectiva retratada por Silva e Fonseca (2005), na prtica, no
regime asilar hospitalar da dcada de 80, a admisso para trabalhar no hospital
psiquitrico era associada a castigo, um lugar para onde poucos profissionais iam de
livre escolha e para onde o funcionrio problema era transferido, sendo que a
admisso para o quadro de funcionrios tinha a mesma conotao da admisso de
um paciente: absoluta falta de livre escolha. Era esse o campo do pleno exerccio da
psiquiatria clnica, mdica e biolgica e onde a equipe de enfermagem e demais
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36| Introduo
agentes de sade se acomodavam sob a impotncia e conivncia com o saber
tcnico, submetidos autoridade do saber cientfico, construdo e autorizado pelo
protocolo de pesquisa, nem sempre compartilhado com a pessoa sem crtica a
quem iria "ajudar".
Ainda que as iniciativas de mudana tenham emergido da reflexividade
instaurada pelo corpo tcnico e por gestores, Goulart (2006) questiona a origem da
criticidade que abalou a cultura profissional que orientava o campo de atuao: os
processos de mudana ainda que tivessem significado histrico, no foram
plenamente disponibilizados a todos e, mesmo que estivessem, no garantem a
deflagrao desses processos de mudana na atualidade. O processo de
transformao institucional, para essa autora um processo heterogneo e no
linear.
Com esse panorama, a Organizao Mundial de Sade elaborou, em 1991,
uma carta de direitos s pessoas com problemas mentais, enumerando vinte e cinco
princpios para a proteo e para a melhoria da assistncia sade mental,
promovendo iniciativas no mbito dos direitos humanos e das polticas sociais
(CAMPOS e BARROS, 2008).
Na atualidade, entende-se que o campo do conhecimento da sade mental
amplamente complexo e intersetorial, abrangendo muitos saberes, como coloca
Amarante (2007). E a Organizao Mundial de Sade (OMS) considera que sade
o estado de completo bem-estar fsico, mental e social, assim:
(...) sade mental seria um campo bastante polissmico e plural na medida em que diz respeito ao estado mental dos sujeitos e das coletividades que, do mesmo modo, so condies altamente complexas.(AMARANTE 2007; p. 19).
Por meio dos novos modelos substitutivos, buscou-se contemplar outras
maneiras de agir em psiquiatria comprometendo-se com as ideias da Reforma
Psiquitrica. Sob esse novo olhar, busca-se, para, a reconstruo do sujeito,
preservando sua subjetividade, sua histria de vida e suas relaes interpessoais,
buscando romper com mecanismos que podem perpetuar a marginalizao do
doente e no reconhec-lo como cidado (ZERBETTO e PEREIRA, 2005). Nesse
sentido, a discusso sobre o atendimento de sade mental, nos ltimos anos, trouxe
para a cena questionamentos sobre o viver com transtorno mental, bem como a
convivncia com sujeitos acometidos de transtornos mentais.
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Introduo| 37
1.3. Profissionais da Equipe de Enfermagem
Ao fazer uma retrospectiva sobre a maneira como os profissionais de
enfermagem agiam desde o incio da enfermagem psiquitrica, Rodrigues e
Schneider (1999) relatam que num primeiro momento, o trabalho estava vinculado a
instituies religiosas, num ambiente de maus tratos aos pacientes. Em um segundo
momento, influenciada pelo referencial das relaes humanas, o enfermeiro estaria
explorando seu estado profissional como instrumento de assistncia, numa postura
psicoteraputica. E em um terceiro, numa postura contrria a essa, outro enfoque do
contato foi dado ao trabalho de enfermagem: a interao efetiva entre enfermeiro e
paciente como parte do trabalho daquele, ainda que no realizada na prtica que,
segundo essas autoras tem a ver com a cronicidade da doena mental e seu
estigma de improdutividade.
Na atualidade, o contato do profissional de enfermagem com os pacientes
ainda conserva um carter disciplinador e mantenedor da ordem. Zerbetto e Pereira
(2005) tecem uma reflexo sobre o trabalho do auxiliar e do tcnico de enfermagem
nos novos dispositivos institucionais de ateno em sade mental a partir do
panorama criado aps a reforma psiquitrica no pas. Para eles, faz-se necessrio
reportar-se a dois pontos: o modelo psicossocial como tendncia nas polticas de
sade mental, substituto do modelo asilar e as novas aes de interveno na
assistncia. Sob influncia do modelo capitalista, as prticas carregam
caractersticas de um trabalho fragmentado, dividindo tarefas: a superviso,
administrao e ensino destinados a enfermeiros e os cuidados diretos (banho,
medicao, curativos, alimentao, etc.) a auxiliares e tcnicos de enfermagem.
Assim, dentro das atribuies das equipes de enfermagem (enfermeiros,
auxiliares de enfermagem e tcnicos de enfermagem), este grupo o que mais
proximamente trabalha com o sujeito com transtorno mental, por vezes fisicamente
mais prximo (CALGARO e SOUZA, 2008). Dessa maneira, as mudanas na
poltica de assistncia em sade mental trouxeram tambm para essa categoria
profissional, novas perspectivas.
Segundo o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) (1987) por meio do
Decreto n 94.406/87 , so membros da equipe de enfermagem e s ser permitido
ao profissional o exerccio legal da profisso se inscrito no Conselho Regional de
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38| Introduo
Enfermagem da respectiva regio quem for : Enfermeiro; Tcnico de Enfermagem;
Auxiliar de Enfermagem; Parteiro
Assim, so definidos como Enfermeiros: o titular do diploma de Enfermeiro
conferido por instituio de ensino, nos termos da lei; o titular do diploma ou
certificado de Obstetriz ou de Enfermeira Obsttrica, conferidos nos termos da lei; o
titular do diploma ou certificado de Enfermeira e a titular do diploma ou certificado de
Enfermeira Obsttrica ou de Obstetriz, ou equivalente, conferido por escola
estrangeira segundo as respectivas leis, registrado em virtude de acordo de
intercmbio cultural ou revalidado no Brasil como diploma de Enfermeiro, de
Enfermeira Obsttrica ou de Obstetriz; aqueles que, no abrangidos pelos incisos
anteriores, obtiveram ttulo de Enfermeira at 1961 (COFEN, 1961).
As atribuies regulamentadas para essa categoria so:
privativamente: direo do rgo de Enfermagem integrante da estrutura bsica da instituio de sade, pblica ou privada, e chefia de servio e de unidade de Enfermagem; organizao e direo dos servios de Enfermagem e de suas atividades tcnicas e auxiliares nas empresas prestadoras desses servios; planejamento, organizao, coordenao, execuo e avaliao dos servios da assistncia de Enfermagem; consultoria, auditoria e emisso de parecer sobre matria de Enfermagem; consulta de Enfermagem; prescrio da assistncia de Enfermagem; cuidados diretos de Enfermagem a pacientes graves com risco de vida; cuidados de Enfermagem de maior complexidade tcnica e que exijam conhecimentos cientficos adequados e capacidade de tomar decises imediatas. como membro da equipe de enfermagem: participao no planejamento, execuo e avaliao da programao de sade; participao na elaborao, execuo e avaliao dos planos assistenciais de sade; prescrio de medicamentos previamente estabelecidos em programas de sade pblica e em rotina aprovada pela instituio de sade; participao em projetos de construo ou reforma de unidades de internao; preveno e controle sistemtico da infeco hospitalar, inclusive como membro das respectivas comisses; participao na elaborao de medidas de preveno e controle sistemtico de danos que possam ser causados aos pacientes durante a assistncia de Enfermagem; participao na preveno e controle das doenas transmissveis em geral e nos programas de vigilncia epidemiolgica; prestao de assistncia de enfermagem gestante, parturiente, purpera e ao recm-nascido; participao nos programas e nas atividades de assistncia integral sade individual e de grupos especficos, particularmente daqueles prioritrios e de alto risco; acompanhamento da evoluo e do trabalho de parto; execuo e assistncia; obsttrica em situao de emergncia e execuo do parto sem distocia; participao em programas e atividades de educao sanitria, visando melhoria de sade do indivduo, da famlia e da populao em geral; participao
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Introduo| 39
nos programas de treinamento e aprimoramento de pessoal de sade, particularmente nos programas de educao continuada; participao nos programas de higiene e segurana do trabalho e de preveno de acidentes e de doenas profissionais e do trabalho; participao na elaborao e na operacionalizao do sistema de referncia e contra referncia do paciente nos diferentes nveis de ateno sade; participao no desenvolvimento de tecnologia apropriada assistncia de sade; participao em bancas examinadoras, em matrias especficas de Enfermagem, nos concursos para provimento de cargo ou contratao de Enfermeiro ou pessoal Tcnico e Auxiliar de Enfermagem.
Os papeis do enfermeiro, segundo a literatura cientfica so de ateno
sade, tomada de decises, comunicao, liderana, administrao e
gerenciamento (PERES & CIAMPONE, 2006; BRUSAMARELLO e cols, 2009),
atuando junto ao doente mental utilizando-se de artifcios mediados pelas relaes
tcnicas, interpessoais, interacionais e institucionais (MIRANDA, 2002). Esse
conjunto de atribuies parece ser mais centrado na assistncia de forma indireta,
tendo em vista a superviso, a administrao dos recursos e o controle das atitudes
dos doentes mentais, ainda muito ligado ao modelo asilar; pouco subsidiado por
uma formao acadmica que observasse as necessidades dos pacientes e
usurios do servio (OLIVEIRA & ALESSI, 2003; RIBEIRO & GONALVES, 2002;
VILLELA & SCATENA, 2004).
No que se refere aos cuidados concernentes aos tcnicos de enfermagem,
segundo a regulamentao do COFEN (1987): o titular do diploma ou do certificado
de tcnico de Enfermagem, expedido de acordo com a legislao e registrado no
rgo competente; o titular do diploma ou do certificado legalmente conferido por
escola ou curso estrangeiro, registrado em virtude de acordo de intercmbio cultural
ou revalidado no Brasil como diploma de tcnico de Enfermagem.
As atividades realizadas por essa categoria profissional so: assistir ao
Enfermeiro no planejamento, programao, orientao e superviso das atividades
de assistncia de Enfermagem, na prestao de cuidados diretos de Enfermagem a
pacientes em estado grave, na preveno e controle das doenas transmissveis em
geral em programas de vigilncia epidemiolgica, na preveno e controle
sistemtico da infeco hospitalar, na preveno e controle sistemtico de danos
fsicos que possam ser causados a pacientes durante a assistncia de sade;
executar atividades de assistncia de Enfermagem.
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40| Introduo
Os tcnicos em enfermagem so dotados, ao que se apresenta, de
conhecimentos de procedimentos tcnicos tanto para o cuidado como para a
administrao da equipe de enfermagem. Estando hierarquicamente, em nvel
intermedirio na equipe.
Para os auxiliares de enfermagem, so considerados como tal, segundo o
COFEN (1987): o titular do certificado de Auxiliar de Enfermagem conferido por
instituio de ensino, nos termos da Lei e registrado no rgo competente; o titular
do diploma regulamentado em 1956; o titular do diploma ou certificado
regulamentado em 1955 e expedido at 1961; o titular de certificado de Enfermeiro
Prtico ou Prtico de Enfermagem, expedido at 1964 pelo Servio Nacional de
Fiscalizao da Medicina e Farmcia, do Ministrio da Sade, ou por rgo
congnere da Secretaria de Sade nas Unidades da Federao de 1934, 1946 e
1959; o pessoal enquadrado como Auxiliar de Enfermagem a partir de 1967; o titular
do diploma ou certificado conferido por escola ou curso estrangeiro, segundo as leis
do pas, registrado em virtude de acordo de intercmbio cultural ou revalidado no
Brasil como certificado de Auxiliar de Enfermagem.
Suas atividades so descritas no COFEN (1987) como preparar o paciente
para consultas, exames e tratamentos; observar, reconhecer e descrever sinais e
sintomas, ao nvel de sua qualificao; executar tratamentos especificamente
prescritos, ou de rotina, alm de outras atividades de Enfermagem, tais como:
ministrar medicamentos por via oral e parenteral; realizar controle hdrico; fazer curativos; aplicaroxigenoterapia, nebulizao, enteroclisma, enema e calor ou frio; executar tarefas referentes conservao e aplicao de vacinas; efetuar o controle de pacientes e de comunicantes em doenas transmissveis; realizar testes e proceder sua leitura, para subsdio de diagnstico; colher material para exames laboratoriais; prestar cuidados de Enfermagem pr e ps-operatrios; circular em sala de cirurgia e, se necessrio, instrumentar; executar atividades de desinfeco e esterilizao; prestar cuidados de higiene e conforto ao paciente e zelar por sua segurana, inclusive: aliment-lo ou auxili-lo a alimentar-se; zelar pela limpeza e ordem do material, de equipamentos e de dependncia de unidades de sade; integrar a equipe de sade; participar de atividades de educao em sade, inclusive: orientar os pacientes na ps-consulta, quanto ao cumprimento das prescries de Enfermagem e mdicas; auxiliar o Enfermeiro e o
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Introduo| 41
Tcnico de Enfermagem na execuo dos programas de educao para a sade; executar os trabalhos de rotina vinculados alta de pacientes e participar dos procedimentos ps-morte.
Ou seja, as atividades profissionais dos auxiliares e tcnicos de enfermagem
so realizadas no cuidado corpo a corpo com os pacientes, no nvel hierrquico mais
baixo na equipe de enfermagem, sem que isso se traduza em menor nvel de
conhecimento, mas de natureza diferente, baseado na prtica cotidiana e na
aplicao de tcnicas.
Dessa maneira, muitos estudos atuais se voltam sobre seu papel e condio
de exerccio profissional da equipe de enfermagem e, para mapear os estudos
nesse campo, fez-se uma reviso bibliogrfica5. Esses trabalhos esto condensados
de acordo com os assuntos tratados e relacionados a seguir:
Desde a dcada de 1990, intensas mudanas no campo da sade mental tm
gerado uma reduo do nmero de hospitais especializado em psiquiatrias. O que
acarretou mudana poltica pblica em sade mental, resultando na diminuio das
internaes, mudana na formao em sade mental, (KENNY et.al.; 2009).
Tanto Nardi e Ramminger (2007) como Kenny et.al. (2009) relatam que em
teoria, desde essa poca, entre outras categorias profissionais, a enfermagem tende
a prtica compreensiva em psiquiatria e sade mental; entretanto, a preparao
para essa prtica apresenta-se abaixo do nvel de conhecimento e habilidades
necessrias para promover sade mental apropriada a demanda dos pacientes6.
Apesar do discurso da Reforma Psiquitrica introduzir a reflexo sobre a
prtica e influenciar os profissionais da rea da enfermagem, quanto
desinstitucionalizao dos usurios (quer seja por uma mudana de postura quanto
sade mental, quer seja pela facilitao das altas nas instituies), ainda se pode
perceber que esses profissionais continuam visualizando a hospitalizao como um
recurso pertinente no tratamento de transtornos mentais no momento de crise face a
realidade dos servios substitutivos extra-hospitalares, inchados tanto pela maior
5Utilizou-se as palavras-chave : mental health" and "psychiatric hospital" and nursingpersonnel,
sade mental" and "hospitais psiquitricos" and "enfermagem psiquitrica, sade mental" and "psychiatric hospital" and nursingpersonnel nas bases de dados Biblioteca Virtual em Sade (BVS), Lilacs, Psycnet e Pubmed no perodo entre 19/10/2010 a 30/10/2011, com 290 artigos no total e, desses artigos, foram selecionados aqueles que eram compatveis com os objetivos do estudo em termos de populao e assuntos tratados. 6 O estudo de Kenny et al. (2009) prope um curso de bacharelado em enfermagem com nfase em
enfermagem psiquitrica, com o intuito de promover as mudanas necessrias para o novo panorama de sade mental, juntando vrios setores como universidade, pacientes, governo, estudantes e indstrias da sade mental; bem como teoria e prtica tutorada ao longo do curso.
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42| Introduo
demanda de usurios sados do hospital, como pela falta de uma rede de recursos
que subsidiem os tratamentos, resultando no processo de cronificao dos usurios
e internaes mltiplas em curto espao de tempo (CALGARO, 2009; LIMA e
AMORIM, 2003). Entretanto, h na atualidade estudos que versam sobre a prtica
da enfermagem na ateno bsica (SILVA; FUREGATO; COSTA JNIOR, 2003;
BRDA et.al., 2005; BRDA; AUGUSTO, 2001; COIMBRA et.al., 2005) como uma
busca por alternativas para responder a demanda dos servios e de seus usurios.
Oliveira e Alessi (2003) dizem que a reforma psiquitrica pressupe um novo
desenho de objeto e instrumentos de trabalho, que so ainda pouco visveis na
prtica dos enfermeiros, diretamente relacionados conscincia do trabalhador de
enfermagem como tal.
Assim, ainda que os trabalhadores de enfermagem psiquitrica avaliem que o
modelo de cuidado diferente do modelo mdico, percebeu-se que na falta de um
modelo especfico de tratamento, a cultura predominante de cuidado com a doena
levaram a um modus operandi focado no cuidado e resoluo de problemas
(MCALLISTER & MOYLE; 2008).
Borges (2009) defende que exista um modelo interventivo dentro do hospital
especializado em psiquiatria que vise possibilitar trocas de saberes e experincias
entre a rede de relaes, permitindo tanto o crescimento pessoal e individual como
da prpria coletividade.
Assim, trs diferentes tipos de formas de subjetivao convivem entre si entre
trabalhadores do campo da sade mental: o discurso religioso no perodo do Brasil
Colonial e Imperial preocupando o cuidador em garantir sua prpria salvao
espiritual por meio do cuidado do louco, como caridade , o discurso mdico, do
sculo XIX, inaugurando o trabalho especializado de cuidado (o mdico psiquiatra e
o enfermeiro psiquitrico); e o discurso da reforma psiquitrica que propunha um
deslocamento do saber mdico psiquitrico para a interdisciplinaridade, mudando do
discurso mdico, para a discusso da cidadania (NARDI e RAMMINGER, 2007).
Tambm no Brasil, desde a dcada de 1970 at a atualidade, o papel social
da equipe de enfermagem tambm se modificou, como relata Calgaro (2009), os
prprios enfermeiros se percebem exercendo papel de maior complexidade,
migrando de um sistema fechado e enrijecido sobre o saber existente do modelo
tradicional biomdico para uma atitude de abertura maior para as novas
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Introduo| 43
problemticas e novas solues, implicando em diferentes experincias, saberes e
trocas entre as diversas profisses das equipes.
Ao mesmo tempo em que se tornou mais complexo, o papel do enfermeiro
tornou-se tambm indefinido, posto que as funes exercidas dentro dos servios
passaram a ser multidisciplinares, ficando indistinto pela competncia relativa e
especfica nos grupos de trabalho (CALGARO, 2009). So ento assinalados
algumas caractersticas do trabalhar em sade mental, ainda que as classificaes
de objeto de trabalho no se esgotem: trabalhar constantemente seu estado de
alerta, dificuldade em definio do objeto de trabalho, papel junto equipe
resultando e conflitos entre os profissionais e dificuldade de percepo das
especificidades de cada rea sentimento de falta de preparo para a atividade,
supremacia do modelo hospitalar e reconhecimento da necessidade de melhoria da
interao entre enfermeiro e pacientes (RODRIGUES e SCHNEIDER, 1999).
Zerbetto e Pereira (2005) relataram uma predominncia da viso biomdica
na prtica dos auxiliares e tcnicos de enfermagem no que concerne viso sobre
sade/doena dos pacientes, embora o foco do trabalho fosse o paciente como
indivduo. Assim, as caractersticas do cuidado dessa categoria eram de
acolhimento, valorizao da escuta do usurio e pelo usurio como ferramenta de
interveno, sem que haja respaldo da formao terico-prtica, mas no processo
de aprendizado no cotidiano.
Vere-Jones (2007) relata que grande parte dos enfermeiros dizem sofrer
algum tipo de efeito fsico ou mental relacionado ao estresse no trabalho, e para
Currid (2008), combinado a isso eles vivenciam falta de recursos de trabalho, alm
de pobre equilbrio entre trabalho e vida pessoal, parecendo no serem capazes de
chegar aos padres de cuidado que gostariam e, dessa maneira, atribuem pouco
valor ao seu trabalho.
Corrobora com isso, o trabalho de Arthur, Brende e Quiroz (2003) com
profissionais de sade mental sobre as ameaas segurana fsica e bem estar
psicolgico de profissionais de sade mental sofridas parecem apresentar srios
problemas segundo eles mesmos, segundo os resultados revelados Foram
encontrados respondentes vitimizados por atos psicolgicos ou fsicos violentos,
sendo que destes, muitos temiam por suas vidas pelo menos uma vez ao longo de
suas carreiras profissionais.
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44| Introduo
Estudos sobre burnout com enfermeiras hospitalares (ROS RISQUEZ et. al.,
2008; McELFATRICK et al., 2000; PIKO,2006; SHIMOMITSU, OHYA, ODAGIRI,
2003; LINDE, MARTNEZ, CERVANTES, 2005; IACOVIDES et al., 1997;
STATHOPOLOU et al, 2011; ASHTARI et al, 2009 entre outros) estimam a
prevalncia de um tero dos profissionais da rea dessa doena. Alm disso, faz-se
inter relaes entre a sndrome de burnout e sintomas psquicos ou fsicos de estafa
mental, resultando em uma significativa associao entre a estafa e o estado de
sade percebido, principalmente os sintomas de ansiedade, conflitos no trabalho,
satisfao no trabalho.
Com relao a satisfao profissional do enfermeiro psiquitrico, a literatura
apresenta a ocorrncia de alta prevalncia de transtornos psiquitricos menores, e a
existncia da contraposio entre satisfao do trabalho com os paciente e
insatisfao quanto s polticas institucionais, alm de poucas mudanas na rotina
laboral, provocando cansao emocional e certa frustrao (SAIDEL et al., 2007 e DE
MARCO et al., 2008).
Corrobora para isso o que Barkam. et al. (2004), Hiscott e Connop (1990)
relatam sobre os principais fatores para a precipitao de estresse ocupacional em
servios de internao em sade mental: eles seriam devidos a problemticas
organizacionais (caractersticas do trabalho e administrao) ou de variveis
psicolgicas como suporte social adequado a esses funcionrios.
Outro fator importante na satisfao no trabalho em sade mental a
participao em reunies de equipe. Assim, Vilas Boas (2004) relata que h maior
participao de profissionais mais experientes nas reunies de equipe em servio de
sade mental relacionando ao fato de coordenarem a maioria das atividades
teraputicas rotineiras , e essas reunies ofereceriam oportunidades para os
integrantes da equipe trocarem informaes sobre os comportamentos especficos
dos pacientes, possibilitando acompanhamentos continuados destes; alm disso,
favoreceria trocas de experincias entre os profissionais das diversas reas,
contribuindo para o processo de ensino/aprendizagem no hospital.
O fato de trabalharem em contato direto com os pacientes psiquitricos
parece levar os profissionais de sade mental a terem maior negatividade, se
comparados populao em geral com relao evoluo de transtornos mentais
em pacientes internados, porm esse negativismo pode afetar o trato com os
pacientes (JORM et al, 1999).
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Introduo| 45
Autores como Awa, Plaumann e Walter (2010) indicam que necessrio
construir um local de trabalho em que so privilegiados bons relacionamentos
interpessoais, nmero de pessoas trabalhando e quantidade de trabalho e realizar
intervenes com os profissionais de enfermagem de maneira que haja preveno
de problemas relacionados ao trabalho.
Ewers e cols., bem como Tavares (2006) salientam a importncia da
integrao entre servios pblicos de sade e estgios prticos nesses servios,
concluindo que a mudana na formao do enfermeiro est diretamente relacionada
s mudanas no mbito das relaes estabelecidas entre setores da universidade e
os servios de sade. Spadini e Souza (2010) complementa que na atualidade, o
enfermeiro se desenvolve para atuar de forma mais vivencial na rea de psiquiatria,
alguns fazem cursos extracurriculares e outros, leituras especficas. Todos esses
autores concordam que h a necessidade de maior investimento durante a
formao do enfermeiro durante a graduao.
Com relao aos cursos de enfermagem em nvel tcnico verifica-se a
inconstncia da disciplina de sade mental e/ou psiquiatria na grade curricular, alm
do distanciamento entre prtica e teoria de estgios, contedo voltado ao modelo
mdico e hospitalocntrico, certa introduo de princpios de reabilitao
psicossocial (CINTRO, 2005; MONTEIRO 2006; MONTEIRO; DONATO, 2008)
defendem que se faz necessrio o desenvolvimento de aprendizagens pertencentes
s dimenses conceitual, tcnica, tica e poltica, partindo-se da hiptese de que
existe uma nfase das aprendizagens da dimenso tcnica nos currculos de cursos
tcnicos de ensino mdio em detrimento das demais dimenses. Necessita-se,
assim, a melhoria da qualidade dos processos formativos e da oferta extensiva de
formao continuada aos trabalhadores j inseridos no trabalho, para fazer as
constantes mudanas no sistema de sade brasileiro (Gttems, Alves e Sena, 2007).
Calgaro (2009), Ribeiro & Gonalves (2002) e Villela &Scatena (2004) indicam
que os profissionais quando relatam sobre sua especializao tcnica na rea de
psiquiatria, poucos revelam ter cursado alguma especializao. Este dado torna-se
preocupante ao revelar a carncia de enfermeiros especialistas atuantes na rea,
sendo de fundamental importncia sua atualizao profissional, para que a
assistncia no fique pautada em velhos conceitos e reproduo de erros passados
(CALGARO, 2009).
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46| Introduo
Sobre o treinamento de equipes de profissionais de sade mental, se
encontra pouca literatura na rea de assistncia sistemtica no que se referia ao
treinamento dessas pessoas, pouca comunicao entre o processo de treinamento
bsico e especfico desses profissionais; a treinamento quando acontece muitas
vezes no suficiente para as necessidades dessa populao (BALCH, 1976;
NELSON e cols, 2008).
Com relao a especificidade do treinamento para cuidado de pacientes com
transtorno mental, Siegfried et.al. (1999); Oliveira, Kestenberg e Silva (2007) e
Dickens et al (2009) relatam que baixo o nmero de pessoas que haviam recebido
treinamento sobre lcool e outras drogas ou com relao a situaes de agresso,
grande parte havia tido experincia de trabalho, associando o conhecimento da rea
com contato regular com pacientes; considerando-se que o manejo desse grupo de
pacientes era difcil e geralmente inadequado. Aponta-se para a necessidade de
mais atividades de educao e treinamento em abordagens preventivas para o
manejo com os pacientes e realistas, de acordo com as possibilidades da equipe e
dos funcionrios treinados. Por isso, na atualidade, h um esforo pela criao de
cursos de nvel tcnico em enfermagem, com o intuito de preparar o enfermeiro para
a prtica em sade mental, bem como a formao continuada (DAL POZ et.al.,
1992; OLIVEIRA et.al., 2002; CINTRO, 2005; FERNANDES et.al., 2009;
ANDRADE; MEIRELLES; LANZONI, 2011).
A natureza do relacionamento entre usurio e equipe/servio, para Hird
(2007), pode ser vista como a maneira pela qual o poder utilizado nessa relao. O
que pode ser visto em algumas instituies um relacionamento profissional com
os pacientes distanciado, prprio da perspectiva predominante em relacionamentos
profissionais, que permitiria a percepo da problemtica sem o envolvimento
emocional.
Um exemplo disso a postura Fernandescom relao a vivncia da
sexualidade dos pacientes, como Miranda, Furegato e Azevedo (2008) relatam, em
que h uma tendncia dessa categoria profissional em estabelecer certa censura
silenciosa sobre a sexualidade do doente mental, estabelecendo-se uma poltica de
silenciamento. Para esses autores, esse posicionamento revela o cumprimento de
determinaes do estatuto profissional, negando a sexualidade do paciente,
circunscrevendo-a no rol dos desvios e transgresses e doena.
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Introduo| 47
Younes et.al.. (2005) realizaram um estudo com o objetivo de avaliar a opinio
dos profissionais de clinica geral sobre sua prtica cotidiana com os pacientes com
problemas de sade mental e seu relacionamento com os profissionais de sade
mental, identificando os fatores associados necessidade percebida de colaborao
destes com profissionais de sade mental e a atual colaborao recebida. Os
resultados apresentados por esses pesquisadores de que a maioria dos clnicos
relatou que seus pacientes pediam por: mais cuidado, mais tempo, mais consultas e
esses clnicos encontravam certa dificuldade em se tornarem pessoas referncia aos
pacientes com transtornos mentais do que seus outros pacientes. Embora a maioria
dos clnicos participantes do estudo tivesse uma relao satisfatria com os
psiquiatras particulares, com psiquiatras da rede pblica e assistentes sociais.
Younes e cols (2005) apontam para a necessidade de colaborao com
profissionais especialistas em sade mental era mais frequentemente sentida diante
de um tipo especfico de paciente: aquele com transtornos mentais que eram mais
jovens, desempregados, com problemas com durao de mais de um ano, histrico
de hospitalizao psiquitrica alm a dificuldade de adeso ao tratamento
psicolgicos. Onde as necessidades no foram supridas, os clnicos optavam por
procedimentos clssicos de referencia de sade mental a apenas um tero de seus
pacientes com transtornos mentais. Esses autores ressaltam a necessidade de
colaborao interprofissional no sentido de promover o manejo com os pacientes
com transtornos mentais.
Kenny et. al (2009), nesse sentido, advogam que a sade mental um
assunto importante e que apenas por meio de estratgias inovadoras, e alianas
efetivas entre setores pode-se promover servios de sade mental efetivos.
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48| Introduo
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Objetivo| 49
2. OBJETIVO
Se no contexto da sade, denominado por Turato (2005) como setting da
sade, conhecer as significaes dos fenmenos do processo sade-doena
considerado condio para melhorar a qualidade da relao profissional-paciente-
famlia-instituio e para promover adeso de pacientes e da populao frente a
tratamentos ministrados e de medidas implementadas, torna-se essencial entender
mais profundamente sentimentos, ideias e comportamentos dos participantes do
processo: usurios dos servios, seus familiares e a equipe de sade.
No que diz respeito equipe, dentro do panorama delineado quanto s
diferentes atribuies profissionais, considera-se que os auxiliares/tcnicos de
enfermagem esto em contato mais prximo com os pacientes em perodo de
internao psiquitrica; apesar disso, a reviso bibliogrfica apresentada demonstra
falta de estudos sobre esses profissionais na literatura cientfica, concentrado em
geral na rea de burnout: Os poucos relatos sobre essa temtica so antigos, dentro
dos encontrados: Alencastre (1979), Minzoni (1980), Hiscott e Connop (1990),
Aranha e Silva (2003).
Assim, foram definidos os seguintes objetivos para este trabalho: buscar
conhecer a viso de auxiliares de enfermagem de um setor de agudos masculino e
feminino de um hospital de internao especializado em psiquiatria do interior do
Estado de So Paulo a respeito de seu trabalho. Mais especificamente, pretende-se
conhecer, a partir de sua prpria perspectiva, a trajetria e formao profissional
dessas pessoas, o contexto institucional e as prticas cotidianas envolvidas em seu
trabalho e suas concepes a respeito da clientela atendida.
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50| Objetivo
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Mtodo| 51
3. MTODO
Para atingir os objetivos delineados, este trabalho opta por um quadro de
referncias metodolgicas em pesquisa qualitativa, que se adqua, segundo Paulilo
(1999), a busca por dados que se apresentam em mltiplos sentidos e esto
intimamente ligados s prticas, sendo analisados como indicadores e tendncias.
A pesquisa sob perspectiva qualitativa teve seu incio no final do sculo XIX,
quando do advento das Cincias Humanas, emergentes em contraposio s
Cincias da Natureza, num contexto epistemolgico baseado no empirismo. A
Sociologia, cincia nascida nesse perodo, cuja compreenso de Homem baseava-
se na ideia de que este no era organizado sob as mesmas leis regidas pela
Natureza e, dessa maneira, no podiam ser obtidos conhecimentos sobre ele da
mesma forma, buscando olhar para seu objeto de estudo por meio de mtodos que
no podem ser aplicados indiscriminadamente em um ou outro (Turato, 2003).
Turato (2003) contextualiza que a pesquisa qualitativa tem por base a contribuio
do Historicismo na Sociologia, disciplinas que buscam o conhecimento do mundo por
meio da histria social humana, tica sob a qual as cincias humanas passaram a ver os
fenmenos situados no tempo e contexto em que se inseriam os conhecimentos, pois
partia-se do pressuposto de que somente por essa via que os sentidos e significados
podiam ser construdos: a experincia humana vivida trazida da reflexo sobre a Cincia
Humana movimentando a prtica, situada na histria de um dado contexto, em que os
valores e significados so representados, reproduzidos e atualizados.
Os mtodos qualitativos, por sua vez, passaram a ter status de mtodos
cientfico de obteno de conhecimento por meio da Antropologia pela Etnografia
e da Psicanlise Freudiana, cujos mtodos de investigao pautam-se na escuta e
na observao apurada dos fenmenos, sob ateno flutuante sobre o contexto,
numa atitude d+e ir a campo e valorizar a experincia do sujeito (TURATO, 2003).
O conceito, portanto, de pesquisa qualitativa pode ser amplamente usado nas
mais diferentes reas do conhecimento, ora pensando na contraposio com a
metodologia de quantificao e mensurao dos dados, ora na descrio de qualidades
dos objetos estudados, alm de sua situao no ambiente em que se insere.
Numa contextualizao paradigmtica, a pesquisa qualitativa parece transitar
por referenciais distintos, seja assentado em ideias positivistas; nas ideias ps
positivistas, mas tambm em estudos culturais, feministas e fenomenolgicos;
embasado na interpretao em que diferentes teorizaes se sobrepem, se
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52| Mtodo
contrapem e complementam nas produes de conhecimento e a fase atual, em
que na ps-modernidade, a atitude de no privilegiar uma ou outra teoria como
mais legtima que a outra, mas dependente de seu objeto de estudo e da pergunta a
ser feita pelo pesquisador (IBAEZ, 2001; TURATO, 2003; GONZLEZ-REY, 2005).
Partiu-se, ento, nesse trabalho, de um paradigma epistemolgico qualitativo com
significado prprio dentro de modelos epistemo metodolgicos, nos quais os processos e
significados dos fenmenos so o interesse de pesquisa. Em seu desenvolvimento,
partiu-se de uma abordagem multivariada baseada em Turato (2000; 2003),
considerando o disposto por Bogdan e Biklen (1994) e Gonzlez-Rey (2000; 2005), o
que envolve uma abordagem interpretativa para seu assunto, caracterizando-se por:
carter descritivo da investigao qualitativa traduzido no interesse pelas significaes dos fenmenos, principalmente no campo da sade. Essa perspectiva subsidiaria pesquisas junto a indivduos ou grupos, buscando partir de seu prprio saber construir novos saberes e olhares sobre os processos envolvidos na construo do campo social da sade (ISHARA, 2007); fonte direta de dados no ambiente onde eles se inserem, ou seja, ambiente natural do sujeito como campo de pesquisa; valorizao de elementos como a escolha do tema/problema, desenvolvendo-se inicialmente no sentido de compreender relaes e funes desempenhados pelo objeto de pesquisa; desenvolvimento da investigao, a partir da subjetividade como categoria orientada para a construo dos processos subjetivos dos vrios mbitos da vida social os quais se relacionam com a importncia do contexto e das relaes com o sujeito. Parte-se do princpio de que a configurao histrica da experincia se d de forma subjetiva na personalidade dos sujeitos ao longo de suas histrias de vida; pesquisador como instrumento principal da coleta e anlise dos dados, como sujeito do pensamento, funcionando como bricoleur na composio de objetos novos a partir de fragmentos de outros; ateno a sentimentos existentes na situao de entrevista, sendo colocada em evidncia a importncia da capacidade de escuta e de interlocuo por parte do pesquisador. Em complemento a essa atitude, o pesquisador observaria o global da linguagem corporal/comportamental no sentido de complementar, confirmar ou confrontar o falado, entendidos como ferramentas para a coleta de dados, , sem deixar de ladoo carter interativo do processo de produo do conhecimento; interesse mais pelo processo do que pelo resultado, considerando a significao da singularidade como nvel legtimo da produo do conhecimento; forma indutiva de analisar os dados 7 ; considerando o conhecimento como produo construtivo interpretativa, que busca dar sentido a expresses do sujeito estudado.
7Com a ressalva feita por Trivios (1987) apud Turato (2000), de que os fenmenos podem ser
explicados num processo dialtico indutivo-dedutivo.
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Mtodo| 53
Com a composio desse panorama terico-metodolgico, para os propsitos
do presente trabalho, denomina-se como objeto de pesquisa qualitativa, a
significao atribuda ao contato com os pacientes atendidos por parte dos
auxiliares/tcnicos de enfermagem que o vivencia, partindo-se do pressuposto de
que o significado produzido na fala e nos comportamentos de quem observa e
observado, tm papel organizador nos seres humanos (Turato, 2003).
A pesquisa qualitativa aqui realizada pressupe que o conhecimento da
significao dentro da experincia humana e se relaciona com a observao dos
comportamentos e discursos existentes, as crenas e experincias dos sujeitos do
processo registrados por meio das entrevistas e registros em cadernos de campo.
Esses elementos so coligidos por meio do contato entre
pesquisador/entrevistador/observador e participantes do estudo, entendendo a
linguagem como um sistema de relaes em que se inserem ambos.
3.1. Contexto do Estudo
A pesquisa foi desenvolvida em um Hospital Especializado em Psiquiatria, dentro
da esfera administrativa do Estado de So Paulo, com gesto Estadual e administrao
direta da sade. A mantenedora a Secretaria do Estado de Sade de So Paulo. Essa
instituio de nvel de ateno hospitalar de mdia complexidade, realizando
atendimentos de internao, com demanda referenciada e convnio com o SUS.
Este subdividido em 2 unidades de atendimento: pacientes moradores e
pacientes agudos. Esta ltima, setor onde foi realizado o estudo, subdivide-se em
unidades de Agudos Geral (masculino e feminino), Primeira Internao, Ateno
Psicossocial e uma unidade de Dependentes Qumicos Masculina.
Os pacientes da unidade de agudos so, em geral, homens e mulheres em
surto psiquitrico com diferentes diagnsticos: transtornos do humor, depressivos,
alguns com transtornos psicticos, dependncia qumica em fase da abstinncia.
Outra caracterstica da unidade em estudo a unio dos setores masculino e
feminino. Essas unidades estiveram por um longo perodo separadas
geograficamente no hospital, passaram por um perodo curto de juno no mesmo
pavilho, com reduo do nmero de leitos e, aps um breve tempo, foram
separados por uma porta. Hoje em dia h juno dos gneros somente durante as
refeies e atividades. Essas mudanas acarretaram reduo do nmero de
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54| Mtodo
funcionrios e ocorreram por meio de transformaes da gesto do setor, em um
momento de transio de diretoria do hospital.
Este hospital se insere no contexto gerado pela portaria MS 251/2002,para
hospitais psiquitricos associados ao SUS com base na lei Paulo Delgado, que
busca consolidar a implantao do modelo de ateno comunitrio, com base no
sistema extra-hospitalar, articu