Universidade de São Paulo Escola Superior de Agricultura ... · Agradeço ao Programa de Ecologia...
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Universidade de So Paulo
Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz
Centro de Energia Nuclear na Agricultura
Educao Ambiental e polticas pblicas em Fernando de Noronha: a
participao na construo de escolas e sociedades sustentveis
Vivian Battaini
Tese apresentada para obteno do ttulo de Doutora em
Cincias. rea de concentrao: Ecologia Aplicada
Piracicaba
2017
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Vivian Battaini
Biloga
Educao Ambiental e polticas pblicas em Fernando de Noronha: a participao na
construo de escolas e sociedades sustentveis verso revisada de acordo com a resoluo CoPGr 6018 de 2011
Orientador:
Prof. Dr. MARCOS SORRENTINO
Tese apresentada para obteno do ttulo de Doutora em
Cincias. rea de concentrao: Ecologia Aplicada
Piracicaba
2017
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Dados Internacionais de Catalogao na Publicao
DIVISO DE BIBLIOTECA DIBD/ESALQ/USP
Battaini, Vivian
Educao Ambiental e polticas pblicas em Fernando de Noronha: a
participao na construo de escolas e sociedades sustentveis. / Vivian Battaini.
verso revisada de acordo com a resoluo CoPGr 6018 de 2011. - - Piracicaba, 2017.
271 p.
Tese (Doutorado) - - USP / Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz.
Centro de Energia Nuclear na Agricultura.
1. Educao Ambiental 2. Polticas Pblicas 3. Participao 4. Fernando de
Noronha I. Ttulo
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todos aqueles e aquelas que sonham e lutam para um mundo mais
justo, igualitrio, democrtico, solidrio, amoroso e feliz.
Tudo que posso fazer como uma pessoa que educa colocar-me ao seu
lado e dialogar com ela. Trocar vivncias, afetos e saberes. E, assim,
partilhar com ela a experincia dialgica, inclusiva, solidariamente
interativa, de partilhar a criao de saberes e a partir dos quais ela e eu,
cada um a seu modo, realiza o seu aprender.
Carlos Rodrigues Brando, 2012
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AGRADECIMENTOS
Agradeo CAPES, pelo financiamento de parte desta pesquisa, e Petrobrs, pelo
patrocnio ao Centro Golfinho Rotador, o recurso financeiro foi essencial para a realizao do
campo e minha dedicao para a pesquisa.
Agradeo ao Programa de Ecologia Aplicada por esses quatro, ou oito anos, de
processo ensino-aprendizagem. Em especial Secretaria Mara Casarin, sempre disposta a me
auxiliar na resoluo de dvidas e encaminhamentos burocrticos.
Ao Centro Golfinho Rotador pela oportunidade de trabalhar como educadora
ambiental na instituio, pelo apoio a realizao desta tese e pela oportunidade de viver um
ano em Fernando de Noronha. Com um carinho muito especial, agradeo ao incentivo e
oferecimento pelo Centro do Curso de Meditao Transcendental com a querida Cynthia
Gerling. O curso e a prtica transformaram a minha vida para melhor. Agradeo ao Jos
Martins pela parceria nesta pesquisa e no trabalho e por ter me colocado no foco deste
doutorado em 2014. O empurro foi necessrio para no abandonar a Ps-Graduao.
Agradecimento especial Cintia Gntzel-Rissato pela parceira profissional e
indicao para o trabalho no Centro Golfinho Rotador.
Administrao do Distrito Estadual de Fernando de Noronha, ao Conselho Distrital,
ao Instituto Chico Mendes de Conservao e Biodiversidade, ao Conselho Noronhense de
Educao e Escola de Referncia em Ensino Mdio Arquiplago Fernando de Noronha pelo
apoio e parceria no desenvolvimento desta pesquisa.
Agradeo toda a famlia Golfinho Rotador aqui representada pela Phi, todos os
amigos noronhenses, representados por Maria Paula, Neto, Lis e Amandinha.
todos aqueles que se dedicam ou se dedicaram para melhorar a qualidade
socioambiental de Fernando de Noronha, em especial aos que vivem na Ilha, s dez
instituies que trabalham com educao ambiental no Arquiplago, ao Marco Aurlio,
Mariana Maciel e Alice Watson Cleto.
Agradeo biodiversidade marinha do Arquiplago que trazem a paz necessria para
permanecer ilhada. Em especial, aos mergulhadores que me auxiliaram no mergulho ao
mundo subaqutico. Aos golfinhos por estarem presentes em nmero recorte no mar de
Fernando de Noronha no dia em que eu e um grupo de crianas estvamos a bordo em sada a
campo. As nadadeiras dorsais para todos os lados so imagens e sensaes inesquecveis.
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Agradeo aos estudantes da EREM AFN pelo carinho e envolvimento, em especial aos
estudantes da Comisso de Meio Ambiente e Qualidade de Vida. Esses estudantes me
motivaram a continuar na Ilha e enfrentar todos os desafios para contribuir com a Educao
no Arquiplago. Foram momentos intensos, de muito aprendizado, confiana, amizade e
praia.
Agradeo aos que apoiaram a criao e existncia da Com-vida, em especial a
Organizao de Permacultura e Arte. Destaco aqui a parceria que extrapola a Ilha com a
educadora Terena Zamariolli.
Agradeo todos que aceitaram ser entrevistados nesta pesquisa.
Agradeo Oca, seus pesquisadores e colaboradores, por existir e me abraar cada dia
mais forte. Agradeo ao grupo de Ps-Graduao e Prtica Profissionalizante da Oca e demais
amigos que contriburam com o aperfeioamento do texto, essencial, entre outros, para
enfrentar os momentos de travao.
Agradeo aos que me acolheram, me alimentaram e me divertiram e, assim, tornaram
possvel a permanncia em Piracicaba.
Agradeo todos os meus amigos que me incentivaram durante esses cinco anos.
Agradeo minha famlia por todo apoio emocional, afetivo e financeiro.
Por fim, agradeo ao Professor Marcos. A admirao cresce a cada dia, sua coerncia
na prxis inspira a continuar a aprender sempre. Sua generosidade, carinho, profundidade e
conhecimentos subsidiaram esses anos de ensino-aprendizagem.
Agradeo todos que conseguiram ler at o fim meus agradecimentos que parecem
sonhos nos quais as imagens vem e vo, tem cores, cheiros e sabores.
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SUMRIO
RESUMO .................................................................................................................................. 7 ABSTRACT .............................................................................................................................. 8 1. INTRODUO .................................................................................................................... 9
1.1. APRESENTAO ............................................................................................................................................ 9 1.2. TRAJETRIA DE VIDA DA PESQUISADORA .................................................................................................... 10 1.3. TRAJETRIA DA PESQUISA .......................................................................................................................... 16 1.4. JUSTIFICATIVA ............................................................................................................................................ 19 1.5. CARACTERIZAO DA REA DE ATUAO .................................................................................................. 20 1.6. HIPTESE E OBJETIVOS ............................................................................................................................... 23
1.6.1. Hiptese ............................................................................................................................................. 23 1.6.2. Objetivo Geral .................................................................................................................................... 23 1.6.3. Objetivos especficos .......................................................................................................................... 23
1.7 METODOLOGIA ......................................................................................................................................... 25 1.7. 1 Material e Tcnicas ............................................................................................................................ 28 1.7.2 Anlise dos dados ................................................................................................................................ 35
REFERNCIAS .................................................................................................................................................... 38 2. RESULTADOS................................................................................................................... 41
2.1 O DESAFIO DE PROCESSOS PARTICIPATIVOS NAS ATIVIDADES DE EDUCAO AMBIENTAL NO ARQUIPLAGO DE FERNANDO DE NORONHA PE BRASIL ............................ 41
Resumo ......................................................................................................................................................... 41 2.2 EDUCAO AMBIENTAL E ESCOLA: NARRATIVAS DE MORADORES DE FERNANDO DE NORONHA PE .............................................................................................................................................. 67
Resumo ......................................................................................................................................................... 67 2.3 PARTICIPAO EM ATIVIDADES DE EDUCAO AMBIENTAL: INDCIOS DE SUA QUALIFICAO A PARTIR DE UMA INVESTIGAO NO ARQUIPLAGO DE FERNANDO DE
NORONHA - PE. .............................................................................................................................................. 91 Resumo ......................................................................................................................................................... 91
2.4 O POTENCIAL DA EDUCAO AMBIENTAL PARA FOMENTAR O APRENDIZADO NAS UNIDADES ESCOLARES POR MEIO DO EXERCCIO DA PARTICIPAO ........................................ 121
Resumo ....................................................................................................................................................... 121 2.5 DESAFIOS DE POLTICAS PBLICAS ESTRUTURANTES DE EDUCAO AMBIENTAL EM FERNANDO DE NORONHA - PE ................................................................................................................ 145
Resumo ....................................................................................................................................................... 145 3 CONSIDERAOES FINAIS ...................................................................................... 169
REFERNCIAS ................................................................................................................... 177 APNDICES......................................................................................................................... 191
APNDICE 1 BAIRROS E ESCOLAS DO DISTRITO ESTADUAL DE FERNANDO DE NORONHA ............................ 191 APNDICE 2 ROTEIRO PARA ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA ...................................................................... 193 APNDICE 3 CARTA CONVITE DE APOIO PESQUISA ..................................................................................... 194 APNDICE 4 TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................................................................ 195 APNDICE 5 RETRATO DA EDUCAO AMBIENTAL NO DISTRITO ESTADUAL DE FERNANDO DE NORONHA
ANLISE DE DOCUMENTOS OFICIAIS DE FERNANDO DE NORONHA ................................................................. 197 APNDICE 7 - DESCRIO DAS INTERVENES EDUCADORAS AMBIENTALISTAS ............................................ 225 APNDICE 8 A COMISSO DE MEIO AMBIENTE E QUALIDADE DE VIDA DA ESCOLA DE REFERNCIA EM ENSINO
MDIO DO ARQUIPLAGO DE FERNANDO DE NORONHA .................................................................................. 245 APNDICE 9 PROJETO NORONHA ALM MAR: ENRAIZANDO A EDUCAO AMBIENTAL NA ESCOLA DE
REFERNCIA EM ENSINO MDIO ARQUIPLAGO DE FERNANDO DE NORONHA ................................................ 257
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RESUMO
Educao Ambiental e polticas pblicas em Fernando de Noronha: a participao na
construo de escolas e sociedades sustentveis
A construo de processos de transio para sociedades sustentveis envolve, dentre
outros, a criao e fortalecimento de democracias participativas. Tendo a Educao Ambiental
(EA) um compromisso com a transformao social, qual seu potencial na promoo e
fortalecimento de processos participativos? O recorte escolhido para o desenvolvimento desta
pesquisa envolveu a educao ambiental realizada no contexto escolar pelo seu potencial
educador e de articulao de indivduos e instituies de um territrio. O objetivo geral da
pesquisa foi contribuir com o aprimoramento de polticas pblicas de educao ambiental
comprometidas com o fortalecimento da participao na Escola e na construo de sociedades
sustentveis. Os objetivos especficos foram analisar contribuies das atividades de educao
ambiental para a qualificao da participao, para o aprendizado escolar dos indivduos e
para o fortalecimento da relao escola/comunidade. A rea de estudo, Fernando de Noronha
PE Brasil, peculiar por ser um Arquiplago, possuir duas unidades de conservao e
apresentar situaes de efetivo e potencial impacto socioambiental. A pesquisa, cuja
metodologia qualitativa, dialoga com a pesquisa-interveno e com a pesquisa etnogrfica.
As tcnicas de coleta de dados utilizadas foram: anlise de documentos, observao
participante, interveno educadora e entrevistas semiestruturadas. As anlises foram feitas a
partir da triangulao de tcnicas e sujeitos, dialogando com referenciais tericos sobre
educao ambiental, participao, educao escolar e polticas pblicas. Esta pesquisa
evidenciou a contribuio do desenvolvimento de processos participativos fomentados pelas
atividades de EA em Fernando de Noronha para a formao de pessoas comprometidas com a
melhoria das condies socioambientais de seu lugar e com a cidadania planetria.
Apresentou elementos que podem contribuir com os processos de qualificao da participao
e subsidiar aes, projetos, programas e polticas pblicas de EA comprometidas com a
transio para sociedades sustentveis. Em relao participao no contexto escolar
evidenciaram-se dois processos simultneos e complementares: o fortalecimento de espaos
institudos e o exerccio e estmulo da dimenso subjetiva da participao. Apontou que a
Educao Ambiental e, em especial, a participao, nos processos educadores ambientalistas
pode contribuir e fomentar a necessria transformao da comunidade escolar. Foram
sugeridos trs processos simultneos para fortalecer a EA na Ilha: a) formao continuada de
educadores ambientais locais, comunidade em geral e tomadores de deciso; b) enraizamento
da EA nas instituies; c) construo de polticas pblicas na rea e ambientalizao de outras
polticas. Por fim, foi proposta a criao de um Projeto Poltico Pedaggico (PPP) do Distrito
de Fernando de Noronha como estratgia para fortalecer, formular e implantar polticas
pblicas de EA comprometidas com um territrio educador e educado ambientalmente. A
continuidade desta pesquisa de doutorado poderia se dar por meio da construo e formulao
de polticas pblicas de Educao Ambiental (dentre as quais o PPP do Distrito) e na
ambientalizao de outras polticas em Fernando de Noronha. Em paralelo, analisar este
processo luz de suas contribuies para a transformao territorial no sentido da construo
de sociedades sustentveis. A pesquisa tambm fortalece a necessidade da continuidade das
pesquisas relacionadas s contribuies da Educao Ambiental para a comunidade escolar e
sobre polticas pblicas de Educao Ambiental.
Palavras chave: Educao Ambiental; Escola; Participao; Fernando de Noronha; Sociedades
Sustentveis; Polticas Pblicas
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ABSTRACT
Environmental Education and public policies in Fernando de Noronha: participation in
the construction of sustainable schools and societies
The construction of transition processes for sustainable societies involves, among others,
the creation and strengthening of participatory democracies. Environmental Education (EE)
has the commitment to social transformation; so, what would be the EE potential in
promoting and strengthening the participatory processes? The research focus of this work was
the environmental education in school context and its educational fostering of the people and
institutional articulation potential of the territory. The general objective of the research was to
contribute to the improvement of environmental education public policies committed to
strengthening the participation in the schools and construction of sustainable societies. The
specific objectives were to analyze contributions of environmental education activities to
improve participation, people school learning and to strengthen school/community
relationship. The peculiar research place of Fernando de Noronha - PE - Brazil, an
archipelago, has two conservation units and situations of effective and potential socio-
environmental impact. The qualitative research dialogues with intervention research and
ethnographic research. The techniques of data collection used were: document analysis,
participant observation, educational intervention and semi-structured interviews. The analyzes
were made from the triangulation of techniques and subjects, dialoguing with theoretical
references on environmental education, participation, school education and public policies.
The results evidenced the contribution of participatory processes promoted by the EE
activities in Fernando de Noronha to people formation committed to the improvement of the
socioenvironmental conditions of their territory and planetary citizenship. Some outlines
presented can contribute to the improvement of participatory processes and subsidize EE
actions, projects, programs and public policies committed to the transition to sustainable
societies. In relation to the participation in the school context, there were two simultaneous
and complementary processes: the strengthening of established spaces and the exercise and
stimulation of the subjective dimension of participation. It was pointed out that environmental
education and, in particular, participation in environmental education processes, can
contribute to foster the school community transformation. Three simultaneous processes to
strengthen EE in the island is suggested: a) continuous training of local environmental
educators, community in general and decision makers; B) rooting of EE in institutions; C)
construction of public policies in the area and the "environmentalization" of other policies.
Finally, it was proposed the creation of a Political Pedagogical Project (PPP) in the District of
Fernando de Noronha as a strategy to strengthen, formulate, and implement EE public policies
committed to the environmentally educated territory. The continuity of this doctoral research
could be done by means of the construction and formulation of public policies of
Environmental Education (among which the District's PPP) and the "environmentalization" of
other policies in Fernando de Noronha. At the same time, to analyze the contributions of this
process to territorial transformation towards construction of sustainable societies. The results
also strengthens the need for research continuity related to the contributions of Environmental
Education to the school community and to the EE public policies.
Keywords: Environmental Education; School; Participation; Fernando de Noronha;
Sustainable Societies; Public Policies
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1. INTRODUO
1.1. Apresentao
Em Fernando de Noronha h Educao Ambiental, por diversos processos e caminhos,
desde os primeiros anos da educao formal no Centro de Educao Infantil Bem-me-Quer
at o final do Ensino Mdio na Escola de Referncia em Ensino Mdio Arquiplago Fernando
de Noronha (EREM AFN). No mbito no formal diversas instituies atuam desde pelo
menos 1989. No entanto, o territrio tem emergncias de uma situao de degradao
socioambiental, de relaes humanas que esto na contra mo do que preconizado na
literatura de Educao Ambiental. Qual o motivo disso? No suficiente o que j feito? Por
qu?
Na busca de compreenso da situao citada foi realizada uma investigao aqui
relatada como uma tese de doutorado. O trabalho organiza-se com o presente captulo
introdutrio que abrange esta apresentao do trabalho, a trajetria da pesquisadora e da
pesquisa, a justificativa, os objetivos e a caracterizao da rea de estudo. A metodologia e as
tcnicas utilizadas na pesquisa tambm esto presentes nesta introduo e algumas
informaes so retomadas nos artigos que fazem parte do segundo captulo, nomeado como
Resultados.
Os resultados so apresentados no formato de cinco artigos, sendo construdos
sucessivamente, de modo que as reflexes dos primeiros contriburam para as dos demais. O
primeiro Os desafios de processos participativos nas atividades de Educao Ambiental no
Arquiplago de Fernando de Noronha/ PE traz dados relacionados anlise de documentos
oficiais e mapeamento das atividades de EA em Fernando de Noronha no ano de 2013.
O segundo artigo, intitulado Educao Ambiental e escola: narrativas de moradores
de Fernando de Noronha PE relata a perspectiva dos entrevistados sobre as temticas
centrais da pesquisa: escola, Educao Ambiental, relaes institucionais e a influncia da EA
no territrio. Pretende-se que o leitor tenha mais elementos para entender os entrevistados,
suas percepes e a realidade local.
O artigo Participao em polticas pblicas de Educao Ambiental: indcios de sua
qualificao a partir de investigao no Arquiplago Fernando de Noronha PE reflete sobre
caminhos para qualificao da participao nas aes de Educao Ambiental apoiados nos
dados da observao participante, intervenes educadoras ambientalistas e entrevistas
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semiestruturadas. Como estimular que as pessoas participem mais e melhor? Qual o papel da
EA nesse processo?
O quarto artigo, O potencial da Educao Ambiental para fomentar o aprendizado nas
unidades escolares por meio do exerccio da participao, discute contribuies da Educao
Ambiental para o aprendizado escolar e, em especial, o papel dos processos participativos.
O quinto artigo, Desafios de polticas pblicas estruturantes de Educao Ambiental
em Fernando de Noronha PE, mapeia condies institucionais, polticas e de contedo que
interferem em Polticas Pblicas de Educao Ambiental em Fernando de Noronha e
apresenta sugestes de aes, diretrizes e instrumentos de polticas pblicas de EA que
fortaleam o compromisso mtuo entre a escola e outras instituies de Fernando de Noronha.
O terceiro e ltimo captulo da tese, consideraes finais, relaciona os artigos entre si,
reflete sobre a hiptese do trabalho, prope caminhos para a continuidade da pesquisa e
apresenta desafios, angstias, felicidades e descobertas da pesquisadora durante os cinco anos
dedicados a esta pesquisa.
Ao final da presente tese esto os apndices, compostos por materiais descritivos e
analticos elaborados pela presente pesquisa e aqui apresentados para a melhor compreenso
das atividades desenvolvidas: roteiro das entrevistas semiestruturadas; carta convite
encaminhada aos sujeitos entrevistados; anlise de documentos oficiais de Fernando de
Noronha; mapeamento das atividades de EA do Distrito Estadual de Fernando de Noronha
(DEFN); descrio das intervenes educadoras ambientalistas realizadas pela pesquisadora:
Projeto Noronha Alm Mar; Comisso de Meio Ambiente e Qualidade de Vida; Projeto
Frias Ecolgicas; e artigos encaminhados para congressos (A comisso de meio ambiente e
qualidade de vida da EREM AFN; Projeto Noronha Alm Mar: enraizando a Educao
Ambiental na EREM AFN).
1.2. Trajetria de vida da pesquisadora
Nessa seo me apresento, tendo trs premissas: subjetividade da pesquisa cientfica,
influncia dos valores pessoais na escolha do objeto de estudo e a importncia de explicit-los
(GOLDENBERG, 1999). Sendo assim:
preciso reconhecer que na pesquisa sociolgica no possvel
ignorar a influncia da posio, da histria biogrfica, da educao,
interesses e preconceitos do pesquisador (MARTINS, 2004, p. 2).
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Sou paulistana, nascida em 1983 nos arredores da Avenida Paulista. Passei infncia e
adolescncia em playgrounds de prdios e clubes esportivos onde fui aprendendo a viver em
coletivo no encontro com o outro. Momentos esses marcados pela competio e a vontade de
superar os colegas. Sentimento reforado pela relao com o meu irmo mais velho: menino
com corao maior que o corpo, que me mostrava solidariedade, companheirismo e
cooperao, que s fui entender e exercitar anos mais tarde.
A vida conturbada da cidade era tranquilizada pelas frequentes viagens para hotel
fazenda, praia, stio e campo. Momentos de contato com a natureza e em famlia, composta
por Sylvia (me), Evaldo (pai), Nilce (av materna), Dennis (irmo) e Max (cachorro).
Minhas principais lembranas so: brincadeiras e andorinhas no hotel, mar e av postio na
praia, mangueira e casa na rvore no stio, cavalos, frio e paisagens em Campos do Jordo.
Lembro-me de ser uma menina tmida e medrosa, sempre contando com os cuidados
do meu irmo que no tinha medo de nada e vivia se quebrando (literalmente). Juntos fomos
educao infantil formal - Castelinho Mgico. O lugar era realmente mgico, com um
quintal, que na minha perspectiva de criana, era gigantesco. L tive minha primeira reao
alrgica por sentar em cima de um formigueiro e sem querer mais voltar escola, meu irmo
foi curto e grosso: s no sentar mais na casa das formigas.
Ao final dessa fase, fomos para a Escola bsica na qual passaria todos os meus anos
escolares Colgio Santa Clara. Nessa escola conheci freiras influenciadas pela Teoria da
Libertao e pelas ideologias de So Francisco de Assis. Apesar desse potencial de uma
formao mais a esquerda do espectro poltico, a escola de elite paulistana fortemente
influenciada pelas ideologias neoliberais. Foram anos contraditrios, de enfrentamento, com
poucos amigos de verdade com os quais podia compartilhar perspectivas de outro mundo
possvel. Porm, esse envolvimento poltico, social e ambiental no era forte na minha vida,
minhas energias eram direcionadas para os esportes. A vida nos esportes, em especial no
handebol, contribuiu com o desenvolvimento de disciplina e esprito de equipe.
J no Ensino Mdio fui fortemente influenciada por Lena, professora de Biologia, que
tinha amor por ensinar e paixo pela rea. Muitos professores utilizavam tcnicas de ensino-
aprendizagem que estimulavam reflexo crtica, criatividade, aprendizagem ativa, autonomia,
porm, Lena extrapolava todas essas possibilidades. Suas aulas eram todas a partir de
seminrios dos estudantes e a posio dela era de problematizar e questionar.
Eu era uma estudante com notas boas, porm nunca tive que fazer muito esforo.
Tinha uma grande amiga, Jlia, que era muito inteligente. Estudvamos juntas e ela me
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ajudava com as matrias de Humanas, que durante o ensino fundamental no me
interessavam. No Ensino Mdio comecei a ajudar alguns colegas que tinham dificuldades de
aprendizagem. Lembro-me bem de um em especial, adorava ajuda-lo, mas tinha pouca
pacincia. Sabia que gostava de ensinar, mas no tinha muita esperana na Humanidade.
Fui direcionada para o Curso de Cincias Biolgicas pela falta de crena nos seres
humanos, pela influncia da professora de Biologia e pelo bem-estar que sentia nos ambientes
naturais - o desejo de morar na praia e estudar os cetceos. Foram quatro anos na Unesp
(Universidade Estadual Paulista) de Rio Claro. Logo no primeiro ano, compreendi como eram
feitos os estudos de comportamento animal e desisti dos cetceos. Foi ento que meu amor
pela Educao no se escondeu mais.
No terceiro ano da faculdade comecei a me interessar pela Educao Ambiental e
iniciei um estgio na Prefeitura de Rio Claro. Mas, antes de entrar nas guas da EA, quero
registrar o aprendizado que tive ao sair da casa dos meus pais e ir morar em repblica. Clichs
parte, ganhei uma segunda famlia (Ana Gouvea Bocchini, Lia Chaer, Lia Salomo, Laura
Melo, Jlia Stuart e Carla Vilaronga), muitos amigos, mudei a minha alimentao e me perdi
em diversos caminhos e encruzilhadas.
No vou replicar o meu currculo profissional e sim destacar algumas contribuies
que as atividades trouxeram para a minha formao enquanto educadora. Durante a faculdade
trabalhei com Educao Ambiental no setor pblico (prefeitura, unidade de conservao e
rea verde urbana) e no terceiro setor (servio prestado associao de bairro).
Minhas experincias foram reforando sentimentos de equidade, solidariedade, justia
social, qualidade de vida, e conservao da biodiversidade. Cada uma delas me levava de
volta ao ambiente escolar, o qual acredito ser de extrema relevncia pelo fato de todos no
Brasil serem obrigados a frequentar e o Estado obrigado a ofertar. Porm, as discrepncias
entre essas unidades me motivam a trabalhar na perspectiva de um ensino pblico, gratuito e
de qualidade. Tambm sempre tive a impresso, que foi se transformando em conhecimento
da prxis, do potencial da Educao Ambiental para transformar as unidades escolares em
ambientes mais felizes, bonitos, democrticos, solidrios, libertrios e participativos.
As experincias isoladas e pontuais reforavam a vontade de trabalhar na escola, pois
a compreendia como um espao que possibilitava a continuidade do trabalho, mesmo ainda
no conhecendo a perspectiva de polticas pblicas.
Algumas vivncias foram nicas, como a de ter um deficiente auditivo e um transexual
integrando um grupo de adolescentes em atividades socioambientais vinculadas Prefeitura
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de Rio Claro SP. Em inmeras situaes no sabia como me portar diante de suas
necessidades. Os demais adolescentes me ensinaram que o amor, o respeito, a compaixo e a
solidariedade permitiam a comunicao e a convivncia harmoniosa.
Anos mais tarde tive que lidar com a dificuldade de me relacionar com crianas
violentas na Associao de Bairro em Rio Claro. Nesse projeto contei com a aprendizagem de
trabalhar numa equipe multidisciplinar que atuava em trs eixos: Linguagem, Sexualidade e
Meio Ambiente. Enfrentamos a situao a partir da compreenso do contexto socioambiental
de vida das crianas e do dilogo cotidiano com cada um e todos eles. No sei se foi o suporte
terico da graduao dos pedagogos ou a sensibilidade deles, Ana Gouva Bocchini e Silvio
Munari, que permitiram criar estratgias de ao.
Nessa mesma Associao de Bairro vivenciei momentos difceis de influncia
negativa da poltica partidria e de medo. Um candidato a vereador do bairro utilizou as
crianas para fazer propaganda poltica. Fomos questionar a situao, fundamentados em
nosso comprometimento com o trabalho e com os estudantes, na legislao e nas questes
ticas. Imaginem trs jovens de vinte e poucos anos, num bairro de periferia, questionando a
ao de um candidato a vereador que estava acordado com o gestor da Associao. Fomos
ameaados de morte, tivemos muito medo, mas tambm no aceitando a situao optamos por
abandonar o trabalho.
A universidade me proporcionou tambm conhecer a Amaznia, via projeto Rondon.
Ns questionvamos a viso assistencialista do Sul salvador do Norte, porm aproveitamos a
oportunidade mostrando outras formas possveis de se relacionar. O sentimento de ter
aprendido muito mais do que ensinado. Tive o desafio de estar sempre acompanhada por
militares, que estavam l, segundo eles, para garantir a nossa segurana. Que situao
constrangedora: o enfrentamento era dirio pelo fato de ter algum que estava acostumado a
dar ordens e queria que eu as seguisse. Outros pontos foram: oportunidade de conhecer o
Lula, que nos recepcionou em Braslia, conhecer a estrutura assustadora do exrcito brasileiro
e perder o show dos Rolling Stones em Copacabana.
Em Macap percebi que existem vrios Brasis no nosso Brasil. Tudo era to distinto.
Porm, o que me marcou foi ter ficado doente. Eu via as crianas todas correndo,
barrigudinhas, convivendo com vermes e/ou protozorios numa simbiose que no as
deixavam padecer. Mas eu, paulistana que nunca havia entrado em contato com alguns desses
minsculos seres, fui para o hospital, presso 3 X 5, quase morri. Percebi como criamos uma
relao com o ambiente que nos cerca e como isso essencial para a nossa sobrevivncia.
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A experincia de estgio no Parque Estadual da Ilha do Cardoso me levou para as
maravilhas cnicas das unidades de conservao, aproximou-me dos ciclos naturais, do dia a
dia na praia, porm evidenciou a fragilidade desses locais, a especulao imobiliria, a
influncia negativa do capital e a dificuldade de gesto.
Finalmente, o Trabalho de Concluso de curso numa rea verde urbana, em Registro
SP fez a conexo entre as unidades de conservao e as escolas. A possibilidade de utilizar
espaos pblicos como espaos educadores e integr-los s atividades escolares.
J formada fui trabalhar no setor de Meio Ambiente de um hotel em Prado Bahia.
Vivenciei a situao de ser o estranho no ninho: todas as minhas aes, posturas e falas
eram questionadas pelos meus colegas de trabalho, tudo precisava de explicao, nada fazia
sentido para eles. O sentimento era de um vazio interior, com saudades de encontrar no outro
algo de mim mesma. Outro fato marcante foi o descaso com as questes ambientais,
municpio que enterrava resduos slidos na restinga e considerava as multas por infraes
ambientais como custo operacional.
Aliado essas questes houve um conflito com a chefia que direcionou meus
trabalhos para a rea de turismo, enquanto o meu interesse era o de trabalhar com a
sustentabilidade interna. No nos entendemos e fui desligada do hotel e, de volta a So Paulo,
decidi voltar para a Academia para ter liberdade para atuar.
Cheguei Esalq procura de orientao com o Marcos Sorrentino, porm ele estava
no Ministrio do Meio Ambiente poca e me indicou a Profa. Laura Martirani. Na nossa
primeira reunio ficou evidente a nossa afinidade. Foram trs anos de muita aprendizagem
que ultrapassam muito o que consegui sistematizar na minha dissertao de mestrado. Voltei
a emergir no ambiente escolar com foco na educomunicao socioambiental, em busca de dar
voz aos indivduos e fortalecer as sadas a campo1.
Durante o mestrado, comecei a frequentar o Laboratrio de Educao e Poltica
Ambiental, Oca, e tive outras experincias de trabalho como educadora, como professora na
educao formal e atuando na formao de professores.
Na Oca vivenciei bons encontros com pessoas que compartilho utopias de um outro
mundo possvel. Local onde aprendi e exercito a autogesto e a busca continuada pela
coerncia entre o pensar e o agir.
1 BATTAINI, V. Educomunicao socioambiental no contexto escolar e conservao da bacia hidrogrfica do
rio Corumbata. Dissertao (Mestrado em Cincias). Ps Graduao em Ecologia Aplicada. Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queiroz. Centro de Energia Nuclear na Agricultura, 2011.
https://ocaesalq.files.wordpress.com/2013/07/vivian_battaini.pdfhttps://ocaesalq.files.wordpress.com/2013/07/vivian_battaini.pdf
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Como educadora atuei junto a uma agncia de estudos do Meio; e em parques da
cidade de So Paulo. Essas vivncias reforaram a importncia das sadas a campo e o contato
com reas verdes para a educao formal.
Minha atuao como professora na escola formal, disciplina de Cincias e Biologia, na
escola pblica e Qumica na privada, contriburam para valorizar o(a) professor(a) e a
compreender o funcionamento da escola, seus desafios, potencialidades e estrutura
organizacional. Quatro situaes me marcaram na escola pblica.
Eu dava duas aulas por perodo, s vezes atuava como professora substituta, porm
seis aulas numa tarde fazia com que eu me estressasse muito e tomasse atitudes que eu mesma
reprovava e posteriormente me culpava. A segunda o caso do estudante que era muito
agitado na sala de aula, no seguia os acordos de convivncia combinados e comprometia a
aprendizagem de todos os estudantes da classe. Conversei com o inspetor, pois gostaria de
conversar com os pais dele, foi quando fui contextualizada de sua situao de abandono pela
me que o deixou com o pai, que o deixou com a irm que j no estava mais aguentando
cuidar dele. Como poderia eu ser mais uma pessoa a abandon-lo? Como acolh-lo tendo
apenas duas aulas semanais de 50 minutos? Como no se sentir responsvel? Esse garoto me
ensinou a influncia de nossa histria de vida nas nossas atitudes e comportamentos, me fez
refletir sobre qual o papel da escola e do professor, e como a escola pode exercer sua funo
social se direitos bsicos so negligenciados?
Na escola privada, a coordenadora pedaggica era a dona da escola, tinha uma postura
extremamente autoritria que limitava a atuao em sala de aula e gerava questionamentos
sobre a coerncia entre fala e atitude. Como podemos dialogar sobre respeito com os
estudantes se eles e os professores so desrespeitados pela coordenadora?
A atuao com formao de estudantes, a provocao de minha orientadora de
mestrado sobre a necessidade de trabalhar com a formao de professores(as), o
amadurecimento profissional e as oportunidades de trabalho me levaram a atuar com
formao de professores.
Das experincias que tive nessa rea, ressalto que uma delas deu origem a um trabalho
de Concluso de Curso de Especializao em EA realizado na USP de So Carlos2.
2 BATTAINI, V. Formao continuada em educao ambiental: um estudo de caso com profissionais da
educao infantil em Torrinha/SP. Curso de Especializao em Educao Ambiental e Recursos Hdricos.
Universidade de So Paulo. Escola de Engenharia de So Carlos. Departamento de Hidrulica e Saneamento.
Centro de Recursos Hdricos e Ecologia Aplicada. 2010.
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Meu mestrado permitiu um maior contato com a realidade escolar e a aproximao
com a educomunicao socioambiental. Por meio de oficinas em diversas escolas pblicas da
Bacia do Rio Corumbata reforou-se a importncia das sadas a campo, do conhecimento do
socioambiente em que se est inserido e a essencialidade de reforar os laos afetivos entre e
com os estudantes.
Essas experincias profissionais e pessoais foram contribuindo para o meu
desenvolvimento pessoal e esta breve apresentao talvez contribua para a melhor
contextualizao e compreenso sobre a perspectiva pela qual so desenvolvidas as anlises
na presente pesquisa.
1.3. Trajetria da pesquisa
Nessa seo apresento a trajetria da pesquisa para auxiliar a compreenso dos leitores
a cerca de como essa tese se construiu. Em 2012 trabalhava no Instituto Paulo Freire junto a
Casa da Cidadania Planetria atuando na perspectiva de Municpio que Educa. Um dos
projetos que me marcou foi o Grupo de Articulao Local realizado em duas escolas pblicas
no municpio de Osasco SP. Essa experincia me fez refletir sobre o papel da Educao
Ambiental nas unidades escolares, tendo-as como articuladoras de um territrio nas
perspectivas de Municpio que Educa e Cidade Educadora. Essas inquietaes me levaram a
escrever um projeto de doutorado com essa temtica.
No ano de 2013 fui indicada para trabalhar no Centro Golfinho Rotador que uma
organizao no governamental sediada no Arquiplago de Fernando de Noronha com a
misso de desenvolver aes de pesquisa, Educao Ambiental e envolvimento comunitrio
em prol da conservao dos golfinhos rotadores de Fernando de Noronha e da biodiversidade
marinha.
Morar em Fernando de Noronha era um sonho de criana, e trabalhar com Educao
Ambiental no Arquiplago tornava a proposta irresistvel. Porm, tinha acabado de ingressar
no doutorado. No via outra sada que no fosse abandonar a ps-graduao. Aps dilogos
com o meu orientador com sua sabedoria e compreenso, fui estimulada a revisitar meu
projeto.
A vontade de ir Noronha, o estmulo do Marcos e dilogos com a Cintia Gntzel-
Rissato, educadora ambiental que havia trabalhado na Ilha e me indicou para o emprego,
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originaram o novo projeto intitulado Participao popular e enraizamento de polticas
pblicas: a interface entre o Coletivo Educador de Fernando de Noronha e a Educao
Ambiental escolar. Eu tinha a ambio de trabalhar na perspectiva de pesquisa- interveno e
criar o Coletivo Educador de Noronha na perspectiva de Municpios Educadores Sustentveis,
acreditando em seu potencial para articular e fortalecer aes de um territrio e contribuir
com a transio local em direo uma Noronha mais sustentvel.
Porm, minha funo na ONG era de educadora ambiental e minha atuao era
direcionada s atividades na Escola de Referncia em Ensino Mdio Arquiplago Fernando de
Noronha (EREM AFN). Meu trabalho era focado no Projeto Noronha Alm Mar,
posteriormente ampliado para atuar na Comisso de Meio Ambiente e Qualidade de Vida, no
Conselho Noronhense de Educao e nas Frias Ecolgicas.
Trs foram as principais dificuldades para a formao do coletivo educador: tempo
necessrio para fazer parte da comunidade e o meu de estadia na ilha; carga de trabalho que
tinha na ONG; e relaes interinstitucionais. Outras ideias foram aparecendo, uma delas era
direcionar a minha pesquisa nas intervenes educadoras que eu executava, muito motivada
pelo coordenador geral do Projeto Golfinho Rotador, Jos Martins. Por muito tempo, achei
que esse era o foco da pesquisa, pelo respeito aos conhecimentos do Z, a compreenso do
Arquiplago que ele possui e sua capacidade de compreender o que seria significativo para a
Educao Ambiental em Fernando de Noronha.
Porm, ainda no estava satisfeita e ento tambm coletei dados relacionados s outras
atividades de Educao Ambiental que aconteciam em Fernando de Noronha. Em fevereiro de
2014 me desliguei do Projeto Golfinho Rotador (PGR) para focar no meu doutorado e voltei
para Piracicaba - SP.
A imerso no Arquiplago me permitiu uma afinidade com o territrio, valorizando-o
enquanto significativo para a conservao da biodiversidade, especialmente marinha, mas
tambm humana. Encantei-me com o territrio, criei uma relao de respeito, cuidado e
compromisso com a Ilha e seus moradores, em especial com os estudantes. Esses ltimos me
estimularam e estimulam a refletir sobre a educao em Fernando de Noronha.
Noronha mexeu de uma forma curiosa comigo, foi um misto de amor e dio. De
querer estar ilhada e de ter a necessidade de sair. Contrastando riqueza da biodiversidade
socioambiental com o descaso do poder pblico; a beleza cnica com a situao de
degradao socioambiental local; a qualidade de vida com a restrio e o alto custo alimentar;
a possibilidade de ver e estar no mar diariamente com a sensao de estar sendo vigiada em
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todos os cantos; a liberdade de atuao na Educao Ambiental com os limites de um
territrio com inmeras relaes de poder institudas pelo controle, por exemplo, a
permanncia de no ilhus na Ilha de responsabilidade de seus patres, caso o contrato seja
rompido, a pessoa deve sair do Arquiplago imediatamente; a felicidade dos moradores
mesmo com as moradias precrias. Entre tantos outros que fizeram emergir em mim, mas
tambm em grande parte dos moradores, a euforonha, sentimento de bem-estar e euforia de
estar na Ilha, e a neuronha, sentimentos ruins, de desespero que impulsionam a sada de
Fernando de Noronha.
A entrada na comunidade foi favorecida pela credibilidade e reconhecimento do
Projeto Golfinho Rotador no Arquiplago. Ser educadora ambiental do PGR abriu as portas
na comunidade, e, gradativamente, por meio da minha atuao educadora fui ganhando
confiana dos moradores. Outro fator que favoreceu o contato e minha identificao junto aos
ilhus foi atuar na escola com todos os estudantes.
Dessa forma, a pesquisa foi crescendo dentro de mim medida que conhecia e
interagia com o territrio e seus moradores:
Uma das tradies analticas melhor formalizadas , sem dvida, aquela
que deriva da teorizao enraizada. Nessa tradio, a anlise produto de
uma interao entre sujeito e um objeto e ela se constri progressivamente,
durante a coleta de dados. Uma tal abordagem integra (ao menos idealmente)
as condies nas quais se desenvolvem os acontecimentos observados. O
princpio-chave desse procedimento o de que as hipteses so
constantemente revisitadas ao longo do processo de pesquisa at que o
fenmeno observado seja consistente (CORBIN & STRAUSS, 1990). Nesse
sentido, um movimento dialtico entre observaes feitas e anlises dos
dados constitui o procedimento prprio observao participante
(CHUACHAT, 1985: 116 apud JACCOUND & MAYER, 2008, p.276).
Na qualificao, achei que a tese estava sendo direcionada para a Educao Ambiental
na EREM AFN, porm crticas foram feitas em relao a no visualizao da escola no
relatrio do trabalho. Muitas e muitas indagaes apareceram, entre elas, se a preocupao a
escola, por que ela no aparece? Ser que o foco mesmo a escola?
As reflexes continuaram e aps inmeras idas e vindas identificamos, eu e meu
orientador, a linha condutora dessa pesquisa que a participao. O que participao? Qual
sua relao com a Educao? Como ocorre nas unidades escolares? Como a EA participativa
contribui para a sua concretizao? Como a EA contribui para o aprendizado nas unidades
escolares? Qual o seu papel na transformao territorial em direo sustentabilidade
socioambiental?
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Sendo assim, essa pesquisa foca na EA no Arquiplago como um todo, sendo as
minhas atuaes educadoras um suporte significativo para as reflexes apresentadas nessa
pesquisa sobre participao, Educao Ambiental, aprendizagem escolar e polticas pblicas
estruturantes no campo da sustentabilidade socioambiental.
1.4. Justificativa
O ponto de partida para a presente pesquisa so as minhas experincias relacionadas
Educao Ambiental escolar e os estudos que venho desenvolvendo sobre a questo
ambiental, educao, educao escolar, polticas pblicas, voltadas sustentabilidade
socioambiental, entre outros, que apontam para a importncia do fortalecimento das relaes
escola/comunidade para a melhoria da qualidade de vida local.
O fortalecimento dessa relao por meio da maior responsabilidade e envolvimento
das instituies de um territrio, tendo a escola como articuladora estratgica vislumbrando a
sua ambientalizao, possibilita identificar benefcios obtidos, dificuldades enfrentadas e
propor elementos para a construo de polticas pblicas que fortaleam o compromisso
mtuo entre a escola e outras instituies para a construo de sociedades sustentveis.
Tem-se como hiptese que a qualificao da participao contribui para a
aproximao e fortalecimento da relao escola-comunidade, e dessa forma, para a construo
de sociedades sustentveis. Para tanto, o trabalho procurou estimular e analisar uma Educao
Ambiental comprometida com a qualificao da participao dos atores envolvidos na
construo de uma escola e um territrio mais sustentvel.
A partir de uma busca nos bancos de dados acadmicos, como portal da Capes e
Scielo, foi possvel constatar que os trabalhos relacionados Educao Ambiental no
Arquiplago de Fernando de Noronha se restringem a compartilhar experincias realizadas.
No foi encontrado nenhum estudo que relaciona as experincias com as recomendaes e
proposies de documentos oficiais, como Plano de Manejo do Parque Nacional Marinho de
Fernando de Noronha (Parnamar) e da rea de Proteo Ambiental de Fernando de Noronha
Rocas So Pedro e So Paulo (APA), Noronha + 20, e o impacto dessas na realidade local.
Esse trabalho pretende elaborar o estado da arte da educao ambiental em Fernando de
Noronha em 2013 e sugerir caminhos para que a Educao Ambiental possa contribuir
positivamente para a construo de sociedades sustentveis no arquiplago.
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20
A produo cientfica no campo da Educao Ambiental no Brasil tem ampliado
significativamente (FRACALANZA, 2004; TOMAZELLO, 2005; REIGOTA, 2007;
LORENZETI & DELIZOICOV, 2006; CARVALHO et.al, 2009). No entanto, poucos estudos
se dedicam compreenso da relao entre Educao Ambiental e polticas pblicas,
necessria para analisar o que tem contribudo e o que tem limitado a implementao das
mesmas, alm da possibilidade de alcanarem o cotidiano das pessoas. As polticas pblicas
podem colaborar para o fortalecimento, a articulao e a continuidade das aes
desenvolvidas.
A necessidade de construo de novos modos de viver e atuar na realidade apontado
por diversos estudos, porm a relao entre distintas propostas de interveno com as polticas
pblicas que permitam subsidiar outros processos educadores ambientalistas e a formulao e
implantao de novas polticas pblicas foi pouco explorado.
Soma-se s justificativas supracitadas a particularidade da rea de estudo, o
Arquiplago de Fernando de Noronha, mundialmente reconhecido por suas belezas naturais e
pela sua biodiversidade. Entretanto, os estudos existentes sobre o impacto socioambiental
local apontam para um aumento significativo de prejuzos ambientais na Ilha e seu entorno, os
quais devem ser considerados no planejamento Distrital. Refletir sobre a possibilidade de
construo de sociedades sustentveis por meio de atividades de Educao Ambiental pode
tornar-se uma ferramenta importante para a conservao da biodiversidade local com
melhoria da qualidade de vida e com benefcios s relaes de ensino-aprendizagem no
cotidiano escolar.
1.5. Caracterizao da rea de atuao
Fernando de Noronha apresenta muitas peculiaridades, destacam-se trs: ser um
Arquiplago; ser o nico Distrito Estadual do pas; e formado por duas unidades de
conservao.
Fernando de Noronha um Arquiplago de 26 km (LINSKER, R., 2011) localizado
no Oceano Atlntico, 375 Km distante da costa de Natal - RN e 575 Km de Recife PE. Sua
localizao influenciou seu histrico de invases e ocupaes; e limita a entrada e sada de
pessoas, insumos e resduos. A entrada e sada tem um alto custo devido distncia a ser
percorrida de barco ou avio.
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A Constituio do Estado de Pernambuco em seu artigo 96 instituiu o Distrito
Estadual de Fernando de Noronha (DEFN), no qual o Administrador indicado pelo
governador de Pernambuco. A existncia de apenas um Distrito Estadual no pas dificulta a
regulao e funcionamento da Ilha e o fato de ter Administrador indicado limita o potencial
democrtico do territrio.
O Arquiplago constitudo por duas unidades de conservao. A rea de Proteo
Ambiental (APA) de Fernando de Noronha Rocas So Pedro e So Paulo (Decreto
Federal n 92.755 / 86) e o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha (Parnamar)
(Decreto Federal n 96.693 / 88), figura 1.
Figura 1 - Unidades de Conservao de Fernando de Noronha - PE
A populao da nica ilha habitada do Arquiplago (de mesmo nome Fernando de
Noronha) est entre 2.630 habitantes (IBGE, 2010) e 4.000 habitantes (dados extraoficiais da
administrao do Distrito Estadual de FN)3.
O Sistema Nacional de Unidades de Conservao (SNUC) regulamenta os usos das
unidades de conservao. Nas unidades de Proteo Integral, como o Parnamar, no
permitido habitao permanente e a visitao destinada para pesquisa e educao ambiental.
Na APA permitido residncia na zona urbana que delimitada no seu Plano de Manejo.
Dessa forma, os noronhenses vivem em nove bairros distribudos na zona urbana da APA,
figura 2 (mapa maior em apndice 1).
3 Dados obtidos junto ao Setor de Migrao da ADEFN em 2013. Oliveira, 2015, p.9, indica 5000 habitantes, de
acordo com informaes da ADEFN.
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Figura 2 - Bairros e Escolas do Arquiplago de Fernando de Noronha
No mapa tambm esto localizadas as duas unidades escolares de Fernando de
Noronha. O Centro Bem-me-Quer de Educao Infantil (CIEI Bem-me-Quer) e a Escola de
Referencia em Ensino Mdio Arquiplago Fernando de Noronha (EREM AFN). Na EREM
AFN funciona Ensino Fundamental, Mdio e EJA com aproximadamente 495 estudantes.
A gesto das unidades de conservao de responsabilidade do Instituto Chico
Mendes de Biodiversidade e Conservao (ICMBio). A sobreposio de gesto do territrio
(ADEFN e ICMBio) gera dificuldades e conflitos nas tomadas de deciso.
Auxiliam o processo de gerenciamento seis conselhos consultivos: Educao,
Turismo, Assistncia Social, APA, Parnamar e Sade. Existe tambm um Conselho Distrital
com funo central de fiscalizar a ADEFN.
Cada um dos artigos desta tese traz um pouco mais do histrico e do funcionamento
do territrio.
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1.6. Hiptese e Objetivos
1.6.1. Hiptese
As atividades de Educao Ambiental na escola contribuem para a qualificao da
participao, para o aprendizado escolar e para o fortalecimento da relao escola/
comunidade.
Os pressupostos desta hiptese so que uma EA pautada por uma perspectiva
progressista de Educao, em dilogo com a educao integral, que vise emancipar os
sujeitos, qualifica a participao e contribui para as pessoas participarem mais e melhor, ou
seja, estarem presentes em mais espaos institudos, fomentarem a construo de novos
espaos e ampliarem o seu potencial de participao. O sujeito participam com mais
qualidade ao se apoderar do processo, compreender sua funo e subir na escala de
participao proposta por Daz Bordenave em direo autogesto.
1.6.2. Objetivo Geral
Contribuir para o aprimoramento de polticas pblicas de Educao Ambiental
comprometidas com o fortalecimento da participao na Escola e na construo de sociedades
sustentveis.
1.6.3. Objetivos especficos
Identificar contribuies e limitaes das atividades de Educao Ambiental no
Distrito Estadual de Fernando de Noronha para a qualificao da participao dos atores
envolvidos.
Analisar as possveis contribuies das atividades de Educao Ambiental no
fortalecimento da relao escola/comunidade e no aprendizado escolar.
Mapear condies institucionais, polticas e de contedo que interferem em
Polticas Pblicas de Educao Ambiental em Fernando de Noronha.
Contribuir com sugestes de objetivos, princpios, aes e instrumentos de
polticas pblicas de EA que fortalea o compromisso mtuo entre a escola e outras
instituies de Fernando de Noronha, podendo subsidiar outros territrios.
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24
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1.7 Metodologia
De acordo com Batzn (1995), a metodologia qualitativa tanto processo como
produto da investigao. Como processo, estabelece uma relao no apenas de estudar um
determinado grupo em um trabalho de campo, mas de aprender com este. Explorou-se o
potencial educativo da pesquisa na qual todos os envolvidos aprenderam e ensinaram algo.
Como produto, constituiu-se no relatrio de todo o processo empreendido pelo pesquisador e
de seus achados.
O carter qualitativo ressalta a relao direta da pesquisadora com o territrio
(LUDKE & ANDR, 1986); seu carter subjetivo e no neutro (GOLDENBERG, 1999); e,
nesta investigao, o seu compromisso poltico com a melhoria e capilaridade da Educao
Ambiental no pas.
Ou dito de outra maneira, se no momento do nascimento das cincias
sociais no sculo XIX a maior parte da preocupao era, conforme o modelo
das cincias naturais, neutralizar o mais possvel os interesses polticos e
ticos do analista, para atingir mais facilmente a realidade objetiva ou a
verdade, o que esses autores preconizam que hoje o mais importante
produzir um conhecimento alm de til, explicitamente orientado por um
projeto tico visando a solidariedade, a harmonia e a criatividade (Pires,
1997 apud MARTINS, 2004, p.8).
Outra caracterstica alinhada com as vertentes qualitativas a relao "sujeito objeto"
interativa. Diferentemente da viso da natureza quantitativa de afastamento entre esses
sujeitos, fortalecendo o papel central do pesquisador na interpretao da realidade observada.
os papis do observador evoluram desde as primeiras prticas da
observao: ele foi, de incio, negado ou reduzido posio de simples
informante, para depois ser reconhecido, antes de deter, progressivamente,
um lugar enquanto varivel significativa (DELLA BERNARDINA,
1989:23, apud JACCOUND & MAYER, 2008, p. 263).
Apoia-se na compreenso de que uma, entre outras, explicaes possveis da
realidade [...] a provisoriedade, o dinamismo e a especificidade so caractersticas
fundamentais de qualquer questo social (MINAYO, 2002, p.13).
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26
Partindo do princpio de que o ato de compreender est ligado ao universo
existencial humano, as abordagens qualitativas no se preocupam em fixar leis
para se produzir generalizaes. Os dados da pesquisa qualitativa objetivam,
uma compreenso profunda de certos fenmenos sociais apoiados no
pressuposto da maior relevncia do aspecto subjetivo da ao social
(GOLDENBERG, 1999, p.49).
A definio das tcnicas e mtodos utilizados tiveram como pressupostos o carter
idiossincrtico (BECKER, 1999) das pesquisas do Laboratrio de Educao e Poltica
Ambiental, Oca (OCA, 2016); e a necessidade de flexibilidade e criatividade nas pesquisas
qualitativas. O carter idiossincrtico evidencia que cada pesquisador define o seu caminho,
optando pelas tcnicas necessrias para o trabalho que est sendo feito, soma-se a isso o fato
que:
Os dados qualitativos consistem em descries detalhadas de situaes com
o objetivo de compreender os indivduos e seus prprios termos. Esses dados
no so padronizveis como os dados quantitativos, obrigando o pesquisador
a ter flexibilidade e criatividade no momento de colet-los e analis-los
(GOLDENBERG, 1999, p. 53).
Dentre as pesquisas de natureza qualitativa, a pesquisa dialoga com a pesquisa-
interveno e a etnografia. Gajardo (1986) indica que na perspectiva da pesquisa social e
educacional, a produo de conhecimentos pode/deve acontecer a um s tempo, com a
comunicao dos conhecimentos produzidos e ressignificados, integrando
pesquisador/pesquisado e educador/educando, pesquisa/ao, em um processo de
aprendizagem coletiva, no qual crenas, ideologias, desejos e vises de mundo dos
participantes so considerados.
A pesquisa-interveno uma tipologia dentro das pesquisas participativas que:
surgem como um movimento frente s pesquisas cientificistas tradicionais,
trazendo pressupostos vinculados problematizao das relaes entre o
investigador e o que investigado, entre sujeito e objeto, teoria e prtica,
com a perspectiva do estabelecimento de condies para captao/
elaborao da informao no cotidiano das culturas, grupos e organizaes
populares. Isso significa que as prticas que constituem o social e os
referenciais que lhe do sentido vo se produzindo concomitantemente, uma
vez que o conhecimento e a ao sobre a realidade so constitudos no curso
da pesquisa de acordo com as anlises e decises coletivas, dando
comunidade participante uma presena ativa no processo. O conhecimento
se constri, assim, entre o saber j elaborado e incorporado nos pressupostos
do pesquisador e o fazer enquanto produo contnua que organiza a ao
investigativa (ROCHA, 2006, p.169).
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A pesquisa-interveno (ROCHA & AGUIAR, 2003) pressupe uma interveno na
realidade local por meio do dilogo entre as demandas do pesquisador, da comunidade local e
outras que surjam no decorrer da pesquisa (ROCHA, 2006, p. 170).
A pesquisa-interveno busca criar um campo de problematizao,
escavando outras dimenses do cotidiano e instaurando tenso entre
representao e expresso, com a perspectiva de dar consistncia a
novos modos de subjetivao (ROCHA, 2006, p.171).
A presente investigao influenciou-se pela perspectiva da pesquisa-interveno.
Foram propostos processos educadores com a comunidade de Fernando de Noronha que
subsidiaram aes e reflexes com todos os envolvidos. Soma-se a isso a essencialidade das
intervenes para as reflexes presentes nos resultados desta tese. Elas foram analisadas em
conjunto, associadas realidade local e as demais atividades de EA desenvolvidas no
territrio. As intervenes esto detalhadas nos apndices desta tese e sua centralidade no
trabalho evidenciada pela intencionalidade de contribuir com a transformao da realidade.
Inspira-se na pesquisa etnogrfica pela imerso realizada na comunidade com o
objetivo de conhec-la em profundidade. O ponto de partida desse mtodo a interao entre
o pesquisador e seus objetos de estudo (FONSECA, 1999, p. 58).
a etnografia uma forma especial de operar em que o pesquisador entra em
contato com o universo dos pesquisados e compartilha seu horizonte, no
para permanecer l ou mesmo para atestar a lgica de sua viso de mundo,
mas para, seguindo-os at onde seja possvel, numa verdadeira relao de
troca, comparar suas prprias teorias com as deles e assim tentar sair com
um modelo novo de entendimento ou, ao menos, com uma pista nova, no
prevista anteriormente (MAGNANI, 2009, p.135).
Buscou-se compreender a realidade local em sua complexidade e registrar no dirio de
campo tudo que fosse possvel, para posteriormente, selecionar os dados relacionados com o
objeto do estudo especfico.
A relao da etnografia com a Educao apoiou-se nos estudos de Marli Andr
(ANDR, 2012), O que temos feito pois uma adaptao da etnografia educao, o que
me leva a concluir que fazemos estudos do tipo etnogrfico e no etnografia no seu sentido
estrito (ANDR, 2012, p.28). A imerso na realidade escolar permitiu o olhar atento para
possibilidades e desafios de interferncia na realidade de Fernando de Noronha.
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28
A natureza qualitativa da investigao dialogando com pesquisa-interveno e
pesquisa etnogrfica possibilitaram a seleo de tcnicas para realizao da pesquisa.
1.7. 1 Material e Tcnicas
A escolha das tcnicas foi revista e atualizada aps o primeiro trabalho de campo
realizado por meio da imerso durante um ano na comunidade de estudo (2013). A vivncia
possibilitou a [....] formulao dos caminhos de pesquisa, atravs das descobertas de novas
pistas (NETO, 2002, p.62). Foi possvel compreender melhor o cotidiano e o funcionamento
do Distrito Estadual de Fernando de Noronha.
Para a coleta de dados foram utilizadas as tcnicas: anlise de documentos, observao
participante, interveno educadora ambientalista e entrevistas semiestruturadas.
1.7.1.1 Anlise de documentos de Fernando de Noronha
Essa tcnica foi utilizada na presente pesquisa para identificar de que forma a
Educao Ambiental est presente nos documentos de Fernando de Noronha. E tambm para
verificar se a participao citada e proposta. Sua utilizao justifica-se pelo fato de que
[...] uma fonte to repleta de informaes sobre a natureza do contexto nunca deve ser
ignorada, quaisquer que sejam os outros mtodos de investigao escolhidos (GUBA e
LINCON, 1981, apud LUDKE & ANDR, 1986, p. 39).
Os documentos analisados foram os Planos de Manejo da rea de Proteo Ambiental
(APA) e do Parque Nacional Marinho (Parnamar); o Noronha + 20; Orientaes Pedaggicas
para a Insero da Educao Ambiental no Ensino Bsico de Pernambuco; Projeto Poltico
Pedaggico da Escola de Referncia em Ensino Mdio Arquiplago Fernando de Noronha;
Lei Orgnica do Distrito Estadual de Fernando de Noronha; e Estatuto do Conselho
Noronhense de Educao.
1.7.1.2 Observao participante
A observao participante permite:
o acesso a informaes privilegiadas, incluindo aquela que ele recebe de
sua prpria experincia (CAPLOW, 1970), graas a uma compreenso mais
-
intensa do vivido dos participantes observados (LAPERRIRE, 1984 apud
JACCOUND & MAYER, 2008, p.264).
A tcnica foi selecionada e desenvolvida durante um ano (2013) de vivncia no
Arquiplago de Fernando de Noronha. Ocorreu em espaos formais, tais como, reunies dos
conselhos, participao nas intervenes educadoras, reunies sobre meio ambiente, e
tambm em dilogos informais do cotidiano da pesquisadora.
Os dados foram registrados em dirios de campo: nele diariamente podemos colocar
nossas percepes, angstias, questionamentos e informaes que no so obtidas atravs da
utilizao de outras tcnicas (NETO, 2002, p.63).
O tempo prolongado da observao participante, um ano, pode diminuir as bias (vis,
parcialidade, preconceito) (GOLDENBERG, 1999), porm trouxe dificuldades na
manuteno do dirio de campo, sendo que em alguns perodos o registo no foi realizado
com tanta assiduidade.
Para Tremblay (1985), as duas principais regras do trabalho de campo so a
imerso total e a anotao sistemtica completa (o total recording). Ele
reconhece, contudo, as exigncias contraditrias dessas regras: se a
participao for intensificada, no se ter mais condio de registrar a
totalidade das observaes, e vice-versa. Para resolver essa contradio, o
pesquisador deve tender a um equilbrio entre a anotao e a observao
(HAMMESLEY & ATKINSON, 1983 apud JACCOUND & MAYER,
2008, p. 273 274).
O equilbrio entre anotao e observao pode ter sido comprometido, tendo o caderno
de campo maiores detalhes nos perodos iniciais de imerso. Outro fator que contribuiu para
uma subestimao do caderno de campo foi a sobreposio de funes da pesquisadora que
atuava tambm como educadora ambiental. Possivelmente uma maior aproximao
geogrfica e pessoal com pesquisadores mais experientes, tais como, orientador e grupo de
pesquisa, poderia ter auxiliado a ter uma maior disciplina com o Caderno de Campo4.
Apesar de apontar esses problemas, o dirio de campo contribuiu significantemente
para as anlises nessa pesquisa.
4 A imerso em Fernando de Noronha PE distanciou a pesquisadora de seu laboratrio de pesquisa localizado
em Piracicaba SP.
-
30
1.7.1.3 Interveno educadora ambientalista
A pesquisadora trabalhou no Projeto Golfinho Rotador com a funo de construir,
articular, executar e analisar propostas de Educao Ambiental no Arquiplago. Os projetos
desenvolvidos foram nomeados nessa tese como interveno educadora ambientalista.
A interveno educacional pode ser concretizada em intervenes na
realidade socioambiental local, atravs de projetos pedaggicos em uma
perspectiva freireana. Neste sentido, o projeto uma oportunidade de se criar
um movimento no cotidiano de insero crtica dos atores. O projeto um
desafio que se coloca para, ao entender a realidade, procurarmos enfrentar os
problemas transformando a realidade e a ns, reciprocamente.
GUIMARES, M. 2005 p. 196).
proposta como um passo essencial do mtodo aqui proposto,
evidenciando o aprender pela prxis, podendo ter diferentes alcances, de
uma ao na prpria casa at um acordo internacional. O importante ser
uma ao que mobilize os sujeitos a planejar, executar e refletir sobre o
processo (OCA, 2016, p.85).
Nesse sentido foram desenvolvidos projetos de interveno educadora no territrio,
sendo seu carter ambientalista relacionado a utopia de contribuir com a transio de
Fernando de Noronha para uma sociedade mais sustentvel tendo nos conceitos de
comunidade, dilogo, identidade, potncia de ao e felicidade (ALVES, 2010) os princpios
que os qualificam.
As intervenes ocorreram por meio de trs projetos: Projeto Noronha Alm Mar na
Escola de Referncia em Ensino Mdio Arquiplago Fernando de Noronha (maro a
dezembro de 2013); Comisso de Meio Ambiente e Qualidade de Vida da Escola de
Referncia em Ensino Mdio Arquiplago Fernando de Noronha (de 2013 e em julho de
2014); e Projeto Frias Ecolgicas (janeiro de 2014).
Os dados foram documentados no caderno de campo e em relatrios sobre cada uma
das atividades. Esto tambm descritos nos apndices desta tese.
1.7.1.4 Entrevistas semiestruturadas
A partir da anlise dos dados coletados atravs das tcnicas citadas foram selecionados
sujeitos para a realizao de entrevistas. A entrevista uma das principais tcnicas de
trabalho em quase todos os tipos de pesquisa utilizados nas cincias sociais (LUDKE &
ANDR, 1986, p.33) que permite a captao imediata e corrente da informao desejada
(ibidem, p.34).
-
As entrevistas tiveram trs focos: contribuies das atividades de Educao Ambiental
para a qualificao da participao de seus pblicos, o aprendizado escolar e o fortalecimento
da relao escola/comunidade A partir destes focos foi construdo um roteiro de questes
(apndice 2), porm no aplicado rigidamente, permitindo que o entrevistador faa as
necessrias adaptaes (LUDKE & ANDR, 1986, p. 34), como recomendado na literatura
para a entrevista semiestruturada.
Quatro categorias foram criadas para a seleo dos sujeitos: proponentes de atividades
de Educao Ambiental em Fernando de Noronha, profissionais da Educao, estudantes da
EREM AFN e outros membros da comunidade (que inclui membros do Conselho Distrital de
Educao, do Conselho escolar e pais). As categorias foram subdivididas em trs modalidades
relacionadas ao envolvimento das pessoas com as atividades de EA na escola: a)
organizadores, propositores, realizadores, motivadores; b) participantes; c) no envolvidos ou
que pouco se envolveram nas atividades (figura 3).
Figura 3 - Esquema dos sujeitos entrevistados
-
32
Os entrevistados foram contatados anteriormente por e-mail ou pessoalmente.
Receberam uma carta convite (apndice 3) e agendaram a entrevista de acordo com a sua
disponibilidade e vontade.
A entrevista foi gravada e posteriormente transcrita. Foram criadas categorias para
anlise dos dados tendo como base os objetivos da pesquisa, o referencial terico,
conhecimento prvio do territrio e a sistematizao inicial dos dados j obtidos com outras
tcnicas. As falas dos entrevistados foram segmentadas e organizadas de acordo com as
categorias, sendo que novas categorias e subcategorias emergiram no processo de transcrio
e anlise.
Houve um perodo de afastamento entre a imerso na comunidade (de fevereiro de
2013 a maro de 2014) e a realizao de entrevistas (junho de 2016). Destaca-se a
importncia do distanciamento geogrfico e temporal da entrevistadora e dos entrevistados
para focar nas questes centrais da pesquisa no momento de interao (GOLDENBERG,
1999, p.59).
cabe assinalar as possveis consequncias de uma interao de longo prazo
com o objeto de estudo, em que difcil evitar sentimentos de amizade,
lealdade e obrigao, que podem provocar censuras nos resultados de
pesquisa (GOLDENBERG, 1999, p.51).
Tendo como pano de fundo a pesquisa qualitativa, em especial a etnogrfica, julga-se
necessrio a contextualizao histrica e social dos entrevistados. Essa foi realizada na
caracterizao da rea de estudo e no artigo sobre as narrativas dos entrevistados5. De acordo
com Fonseca:
...os informantes no foram escolhidos por serem estatisticamente
representativos de algum tipo ideal. Mas, para o pesquisador tirar qualquer
concluso de seu material, foi necessrio situar seus sujeitos em um contexto
histrico e social. s ao completar esse movimento interpretativo, indo do
particular ao geral, que o pesquisador cria um relato etnogrfico. Sem esta
contextualizao (um tipo de representatividade pos ipso facto), o
quantitativo no acrescenta grande coisa reflexo acadmica
(FONSECA, 1999, p. 60) .
5 Artigo intitulado Educao Ambiental e escola: narrativas de moradores de Fernando de Noronha PE,
presente nos resultados dessa tese. Presente nos resultados desta tese, item 2.2.
-
Sujeitos das entrevistas
Esta seo tem o objetivo de caracterizar os sujeitos entrevistados. Parte-se de
identificao de gnero, faixa etria e atuao profissional, em seguida estruturado um quadro
no qual cada sujeito apresentado individualmente.
Dos quarenta e cinco (45) entrevistados, dezesseis (16) so do sexo masculino e vinte
e nove (29) feminino (grfico 1); a faixa etria variada, sendo a maioria (15) estudantes
entre 12 e 15 anos, seguidos por pessoas entre 15-20 e 30-35 anos, sete de cada, e cinco (5)
entre 35-40 anos vide grfico 2.
Grfico 1 - Gnero dos entrevistados
Grfico 2 - Faixa etria dos entrevistados
Foi identificada a atuao profissional dos entrevistados, vinte e quatro (24) deles so
estudantes, oito (8) profissionais da educao, oito (8) proponentes de atividades de EA em
FN, e cinco (5) tem atuaes profissionais diferenciadas (professora de yoga, analista do
ICMBio, professora da Bem-me-Quer, Conselheiro distrital e presidente do Coned), vide
grfico.
16
29
Masculino
Feminino
15
7 7
5
2
2
5 1 1
12-15
15 - 20
30 -35
35 - 40
40-45
45 -50
50 -55
60 -65
NI
-
34
Grfico 3 - Profisso dos entrevistados
O quadro abaixo traz uma apresentao geral dos entrevistados que inclui categoria,
atuao, sexo, idade, tempo em Noronha e local de origem. Ressalta-se o longo tempo de
moradia em Fernando de Noronha dos adultos entrevistados que resultou num dilogo mais
aprofundado sobre o que a Ilha, as relaes de poder existentes e as atividades de Educao
Ambiental. A tabela permite ao leitor o retorno sempre que achar necessrio durante a leitura
desta tese.
DESCRIO GERAL DOS ENTREVISTADOS6
Identificao
Atuao
Sex
o
Idad
e
Tempo em
Noronha Local de Origem
Proponent
es de
atividades
de
Educao
Ambiental
em
Fernando
de
Noronha
Proponente ONG ONG Local M 53 27 Taquari RS
Proponente pblico Setor pblico M 51 51
Fernando de Noronha -
PE
Proponente ONG 2 ONG local M 34 6 Natal - RN
Proponente Coletivo Circo Caracas M 35 17 Tijucas - SC
Proponente pblico 2 Setor pblico F 52 30 Caruaru - PE
Proponente privado Empresa privada F 50 25 Recife - PE
Proponente pblico 3 Escola F 35 10 Vitria - PE
Proponente ONG 3 ONG local F 48 8 So Paulo - SP
Profissiona
is da
Educao
Professor Professor M 30 7 Recife - PE
Coordenador Coordenadora Escola F 37 12 Recife - PE
Professor 1 Professor F 37 5 Carpina - PE
Profissional da educao Psicopedagogo M 35 35
Fernando de Noronha -
PE
Diretor Diretor M 46 16 Olinda - PE
Professor 2 Professor F 51 3 Guaratingueta - SP
Professor 3 Professor M 34 4 Olinda - PE
Professor 4 Professor F 30 30
Fernando de Noronha -
PE
6 Os estudantes da mesma turma no foram individualizados porque as entrevistas foram realizadas em grupos e
suas falas foram transcritas no grupo e no individualmente.
8
8
24
5
Proponentes de atividades
de educao ambiental em
Fernando de Noronha
Profissionais da Educao
Estudantes
Outros
-
Estudantes
Estudante EJA EJA F 42 42
Fernando de Noronha -
PE
Estudante EJA 1 EJA F 44 44
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 9 Nono Ano
F 14 Fernando de Noronha - PE
Estudante 9 Nono Ano
F 14
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 9 Nono Ano
F 15 Fernando de Noronha - PE
Estudante 9 Nono Ano
M 14
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 9 Nono Ano
M 14 Fernando de Noronha - PE
Estudante 8 Oitavo Ano M 12
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 8 Oitavo Ano F 14
Fernando de Noronha - PE
Estudante 8 Oitavo Ano F 12
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 8 Oitavo Ano F 14
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 8 Oitavo Ano M 13
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 8 Oitavo Ano F 12
Fernando de Noronha - PE
Estudante 8 Oitavo Ano F 13
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 8 Oitavo Ano F 14
Fernando de Noronha - PE
Estudante 1 1 ano mdio F 16
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 1 1 ano mdio F 16
Fernando de Noronha - PE
Estudante 1 1 ano mdio F 14
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 1 1 ano mdio F 16
Fernando de Noronha - PE
Estudante 3 3 ano F 16
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 3 3 ano F 16
Fernando de Noronha -
PE
Estudante 3 3 ano M 16
Fernando de Noronha -
PE
Monitores FE M 14
Fernando de Noronha -
PE
Monitores FE M 14
Fernando de Noronha -
PE
Outros
membros
da
comunidad
e
Comunidade Yoga professora yoga
Professora de
Yoga F 37 15 So Paulo - SP
Comunidade me e analista do ICMBio Me F 37 4 Belm - PA
Comunidade me e professora da Bem-me
-quer Me F 35 17 Recife - PE
Comunidade conselheiro distrital Setor pblico M NI Fernando de Noronha - PE
Comunidade presidente do Coned Setor pblico F 61 61 Fernando de Noronha - PE
Quadro 1 - Descrio geral dos entrevistados
1.7.2 Anlise dos dados
De acordo com Trivios (1987 apud GOMES, 2002) o processo de anlise dos dados
inicia-se na coleta de dados, portanto, permeia todo o percurso metodolgico, anlise e
interpretao esto contidas no mesmo movimento: o olhar atentamente para os dados de
pesquisa (GOMES, 2002, p.68).
-
36
De acordo com Romeu Gomes so trs as finalidades da anlise de dados:
compreender os dados coletados; confirmar ou refutar questes e pressupostos da pesquisa; e
contribuir com conhecimentos sobre o tema de pesquisa (2002, p.69).
As anlises iniciais foram feitas por meio da triangulao de tcnicas. De acordo com
Paul (1996) e Jick (1984), citados em Cox e Hassard (2005), a triangulao permite um retrato
mais completo e holstico do fenmeno em estudo. De acordo com Denzin a triangulao de
dados significa coletar dados em diferentes perodos e de fontes distintas de modo a obter uma
descrio mais rica e detalhada dos fenmenos (1978, p.4).
Ao cruzar dados, comparar diferentes tipos de discurso, confrontar falas de
diferentes sujeitos sobre a mesma realidade, constri-se a tessitura da vida
social em que todo valor, emoo ou atitude est inscrita (FONSECA,
1999, p.64).
Foram cruzados os dados obtidos pelas tcnicas: anlise dos documentos, observao
participante e intervenes educadoras. O cruzamento permitiu mapear as atividades de
Educao Ambiental em Fernando de Noronha no ano de 2013, descrever as atividades de
interveno e identificar indcios sobre a forma como as atividades de EA contribuem com a
participao de seus pblicos, o aprendizado escolar e o fortalecimento escola/comunidade.
Esses dados compuseram o relatrio de qualificao dessa tese, na qual enfatizou-se
que:
Quando se trata de coleta de dados, e, portanto, de sua produo, as
reflexes e os conselhos metodolgicos se centram, sobretudo, na questo da
seleo dos dados de observao e na classificao das anotaes de campo
(JACCOUND & MAYER, 2008, p.273).
Alm disso, evidenciou a falta de reflexividade quanto relao entre coleta de dados
e a anlise, sendo as primeiras reflexes mais descritivas (FONSECA, 1999, p.273). Dessa
forma, parte das anlises geraram um artigo7 e as demais, incorporadas nos apndices (5, 6 e
7) deste trabalho, serviram de subsdios para novas reflexes. Ressaltando:
A imensa massa de dados obtida dificulta a organizao e anlise, fazendo
com que a eficcia do aproveitamento dependa, sobretudo, da capacidade do
pesquisador e da definio de caminhos para o melhor aproveitamento do
material coletado. De uma maneira geral, as crticas [ pesquisa qualitativa]
7 BATTAINI,V. M. SORENTINO, M. SILVA-JR, J. O desafio de processos participativos nas atividades de
educao ambiental no Arquiplago de Fernando de Noronha PE Brasil. Presente nos resultados desta tese,
item 2.1.
-
acentuam o carter descritivo e narrativo, alm de ilustrativo que a maioria
dos trabalhos apresenta, especialmente quando utilizam os mtodos da
histria de vida (MARTINS, 2004, p. 5).
Refora assim, que as anlises so um processo de funil (JACCOUND & MAYER,
2008, p. 273). Num segundo momento, avaliou-se a importncia de compreender os sujeitos
entrevistados e a perspectivas deles sobre as temticas centrais da pesquisa: escola, Educao
Ambiental, relaes institucionais e a influncia da EA no territrio. Pretende-se que o leitor
tenha mais elementos para entender os entrevistados, suas percepes e a realidade local.8
Sendo um discurso nem falso, nem verdadeiro, mas que representa apenas uma dimenso de
uma realidade social multifacetada (FONSECA, 1999, p.64)
Os subsdios das anlises anteriores somadas a triangulao de sujeitos entrevistados e
de tcnicas (observao participante, interveno educadora ambientalista e entrevista
semiestruturada) contriburam para as reflexes sobre caminhos para qualificao da
participao nas aes de Educao Ambiental9 e contribuies da Educao Ambiental para
o aprendizado escolar e, em especial, dos processos participativos10
.
Por fim, mapeiam-se condies institucionais, polticas e de contedo que interferem
em Polticas Pblicas de Educao Ambiental em Fernando de Noronha e apresentam-se
sugestes de objetivos, princpio, aes e instrumentos de polticas pblicas de EA que
fortalea o compromisso mtuo entre a escola e outras instituies de Fernando de Noronha,
podendo subsidiar outros territrios11
.
Nas consideraes finais relacionam-se as anlises anteriores, reflete-se sobre a
hiptese, prope caminhos para a continuidade da pesquisa e apresentando desafios,
angstias, felicidades e descobertas da pesquisadora durante os cinco anos dedicados a esta
pesquisa.
Destaca-se que:
Nunca podemos prever de antemo que o modelo que construmos seja a
chave da compreenso ou sequer relevante quando lidamos com casos
8 Educao Ambiental e escola: narrativas de moradores de Fernando de Noronha PE, presente nos
resultados desta tese item 2.2. 9 Participao em atividades de educao ambiental: indcios de sua qualificao a partir de uma investigao
no Arquiplago de Fernando de Noronha PE, presente nos resultados desta tese, item 2.3. 10
O potencial da educao ambiental para fomentar o aprendizado nas unidades escolares por meio do exerccio
da participao, presente nos resultados desta tese, item 2.4. 11
Desafios de polticas pblicas estruturantes de educao ambiental em Fernando de Noronha PE, presente
nos resultados desta tese, item 2.5.
-
38
especficos. Deve ser trabalhado como hiptese, a ser testada ao lado de
outras hipteses. Serve para oferecer uma alternativa, para abrir o leque de
interpretaes possveis, no para fechar os assuntos ou criar novas frmulas
dogmticas (FONSECA, 1999, p.76).
Referncias
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BATTAINI, Vivian. Educomunicao socioambiental no contexto escolar e conservao
da bacia hidrogrfica do rio Corumbata. Dissertao (Mestrado em Cincias). Ps
Graduao em Ecologia Aplicada. Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. Centro
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Engenharia de So Carlos. Departamento de Hidrulica e Saneamento. Centro de Recursos
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Territrio Federal de Fernando de Noronha, o Atol das Rocas e os Penedos de So
Pedro e So Paulo, e d outras providncias. Distrito Federal, 1986.
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