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UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO BRUNO MAGALHÃES FERREIRA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DO CURSO DE DIREITO: RELATO DE EXPERIÊNCIA SÃO PAULO 2013

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UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO

PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO

BRUNO MAGALHÃES FERREIRA

COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DO CURSO DE DIREITO:

RELATO DE EXPERIÊNCIA

SÃO PAULO

2013

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BRUNO MAGALHÃES FERREIRA

COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DO CURSO DE DIREITO:

RELATO DE EXPERIÊNCIA

Dissertação apresentada para defesa, junto ao Programa de Mestrado em Educação, linha de pesquisa em Sujeitos, Formação e Aprendizagem, da Universidade Cidade de São Paulo, como requisito parcial exigido para obtenção do título de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Potiguara Acácio Pereira

SÃO PAULO

2013

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F383c

Ferreira, Bruno Magalhães. Coordenação pedagógica do curso de direito: relato de experiência. / Bruno Magalhães Ferreira. --- São Paulo, 2013. 109 p. Bibliografia Dissertação (Mestrado) – Universidade Cidade de São Paulo - Orientador: Prof. Dr. Potiguara Acácio Pereira. 1. Coordenação pedagógica. 2. Curso de direito. I. Pereira, Potiguara Acácio, orient. II. Título.

CDD 371.207

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BRUNO MAGALHÃES FERREIRA

COORDENAÇÃO PEAGÓGICA DO CURSO DE DIREITO:

RELATO DE EXPERIÊNCIA

Dissertação apresentada para defesa, junto ao Programa de

Mestrado em Educação, linha de pesquisa em Sujeitos, Formação e

Aprendizagem, da Universidade Cidade de São Paulo, como

requisito parcial exigido para obtenção do título de Mestre.

Data da defesa:

Resultado: ________________________

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Potiguara Acácio Pereira (Orientador) ___________________________ Universidade Cidade de São Paulo

Profa. Dra. May Berkenbrock-Rosito ______________________________ Universidade Cidade de São Paulo

Profa. Dra. Cláudia Celho Hardagh ______________________________ Centro Universitário São Camilo

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A Deus;

Aos meus familiares;

Aos meus professores;

Aos meus amigos;

À minha amada filha Lavínia.

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AGRADECIMENTOS

Ao Centro Universitário CESMAC, na pessoa do Magnífico Reitor Dr. João

Rodrigues Sampaio Filho e Vice-Reitor Dr. Douglas Apratto Tenório, cujo apoio e

incentivo foram fundamentais para a participação neste Programa de Mestrado.

Ao Prof. Dr. Potiguara Acácio Pereira, pela paciência, dedicação e preciosa

orientação deste trabalho.

Aos professores do Programa Mestrado em Educação, da Universidade

Cidade de São Paulo (UNICID): Profa. Dra. Ecleide Cunico Furlanetto, Profa.Dra.

Edileine Vieira M. da Silva, Profa. Dra. Célia Maria Haas, Prof. Dr. Júlio Gomes de

Almeida, Prof. Dr. Jair Militão da Silva, Prof. Dr. João Gualberto de C. Meneses,

Profa. Dra. May Berkenbrock-Rosito, Profa. Dra. Ângela Maria Martins, Profa. Dra.

Sandra Maria Zakia Lian Souza, pela competência, sensibilidade e seriedade com

que atuam no Programa.

A Profa. Dra. Cláudia Celho Hardagh pela importante contribuição com a

pesquisa.

A todos os colegas que estiveram comigo neste processo em sala de aula,

os professores, colaboradores e alunos, e aos externos ao Programa que apoiaram

e acompanharam este trabalho.

Ao amigo e parceiro Marcos Adilson Correia de Souza pela contribuição

acadêmica e pelos fraternos momentos de convívio e descontração.

A meus pais, Fernando Valadão Ferreira e Dulce Maria Magalhães Ferreira,

pelo incentivo, confiança e contribuição afetiva e financeira para realização de mais

um sonho.

Às minhas irmãs, Maria Valéria Magalhães Ferreira Cirquera e Fernanda

Maria Magalhães Ferreira, pelo apoio, afeto e incentivo.

Ao Dr. Fernando Sérgio Tenório de Amorim, professor-amigo e grande

inspiração acadêmica.

A Augusta Magda Costa Mendes por sua companhia, paciência e carinho.

À Profa. Dra. Lígia dos Santos Ferreira, pela correção gramatical e

formatação deste trabalho.

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RESUMO

A presente dissertação resulta de um processo científico-investigativo, cujo

procedimento metodológico foi o do Relato de Experiência, que retrata diferentes

momentos e acontecimentos decorridos na coordenação do curso de Direito, levada

a efeito no Centro Universitário CESMAC, em Maceió-AL, no período de dezembro

2009 a dezembro 2012. Com base principalmente nas dificuldades vividas, o relato

fundamentou-se teoricamente, para interpretação dos momentos e acontecimentos,

no paradigma experiencial de Antônio Nóvoa (1988, 1992) e Christine Josso (2002).

A pesquisa tem como objetivo compreender e desvelar os elementos constitutivos

de um distanciamento, de um hiato existente entre o acadêmico e o administrativo, a

partir da mudança de posição do profissional, enquanto professor, para a do

profissional que assume cargo de gestão. Espera-se, com este trabalho, contribuir

para importantes reflexões dos futuros profissionais do Direito que acabarão por

assumir cargos ou funções gestoras.

Palavras-chave: Educação. Coordenação pedagógica. Curso de Direito.

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ABSTRACT

This dissertation is the result of a scientific-investigative, whose methodological

procedure was the Experience Report, depicting different moments and in the

coordination of events after law school, carried out in the University Center Cesmac

in Maceió-AL, in the period December 2009 to December 2012. Based mainly on

difficulties, the report was based theory, interpretation of moments and events in the

paradigm of experiential Nóvoa Antonio (1988, 1992) and Christine Josso (2002).

The research aims to understand and unravel the constituent elements of a gap, a

gap between the academic and administrative, from the change in position of the

professional as a teacher for the professional who takes office management. It is

hoped this work, contribute to important reflections of future legal professionals who

will eventually assume management positions or functions.

Keywords: Education. Coordinating education. Law Course.

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LISTA DE SIGLAS

ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas

CAPES Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

CPC Conceito Preliminar de Curso

CESMAC Centro Universitário Cesmac

CFO Curso de Formação de Oficiais

ENADE Exame Nacional de Desempenho de Estudantes

FAA Faculdade Alagoana de Administração

FADIMA Faculdade de Direito de Maceió/CESMAC

FEJAL Fundação Educacional Jayme de Altavila

INEP Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

IES Instituição de Ensino Superior

JECC Juizado Especial Cível e Criminal da capital de São Paulo

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC Ministério da Educação e Cultura

MERCOSUL Mercado Comum do Sul

NEPE Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão

OAB Ordem dos Advogados do Brasil

OSPB Organização Social e Política do Brasil

PDI Plano de Desenvolvimento Institucional

PTCC Prática de Trabalho de Conclusão de Curso

PPC Projeto Pedagógico de Cursos

SINAES Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior

TCC Trabalho de Conclusão de Curso

TTI Técnico em Transações Imobiliárias

UMSA Universidad Del Museo Social Argentino

UniFMU Faculdades Metropolitanas Unidas

UFAL Universidade Federal de Alagoas

UFPE Universidade Federal de Pernambuco

UNICID Universidade Cidade de São Paulo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 9

2 OS PRIMEIROS PASSOS ..................................................................................... 12

3 UM ACADÊMICO DE DIREITO ............................................................................. 34

4 UM ADVOGADO E UM PROFESSOR .................................................................. 60

5 UM COORDENADOR DE CURSO ........................................................................ 89

6 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 105

REFERÊNCIAS ................................................................................................... 107

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1 INTRODUÇÃO

 

Esta pesquisa, que tem como procedimento metodológico o Relato de

Experiência, reflete momentos e acontecimentos de uma coordenação pedagógica

do curso de Direito, da Faculdade de Direito de Maceió (FADIMA), do Centro

Universitário Cesmac, no estado de Alagoas.

Trata-se de uma reflexão que se concretiza a partir de uma situação

tipicamente acadêmica, isto é, profissionais contratados por Instituições de Ensino

Superior como professores e que acabam por exercer cargos ou funções de gestão.

O suporte teórico, para tal reflexão, é constituído a partir das obras de

Antônio Nóvoa (1988, 1992) e Christine Josso (2002).

Esta compreensão do processo formativo perpassa o processo de narrar a

própria história e retirar dos fatos narrados a interpretação necessária à tomada de

consciência, na visão freiriana, que sob o aspecto da subjetividade constitui também

método de investigação que leva à autonomia pela apropriação do conhecimento.

A visão humanista e educativa na formação dos professores possibilita que

os sujeitos denunciem todo o tipo de relação injusta, desumana, que caminha em

sentido contrário da vida digna e ao que é bom ao sujeito em constante formação e

transformação.

A tomada de consciência crítica, decorrente do princípio da autonomia, torna

possível que o sujeito em formação tome decisões e seja responsável por elas.

Primeiramente, é necessário compreender o que se entende por Relato de

Experiência como procedimento metodológico. Depois, no desenvolvimento do

relato, evidencia-se que o sujeito da pesquisa é o autor e professor que narra,

porque participou dos momentos e acontecimentos, neste caso, da coordenação

pedagógica de um curso de Direito, talvez o mais importante, por ter sido quem

tomou as decisões. E mais, é ele mesmo quem analisa suas próprias atitudes.

Por intermédio do relato, fica claro que o sujeito em questão tem a

possibilidade de rever e dar sentido à sua própria trajetória profissional e, com isto,

contribuir para a formação de outros profissionais, porque compartilha situações e

tensões vividas.

Da análise e reflexão, levadas a efeito a partir do relato de experiência,

decorre uma tomada de consciência de si mesmo; um desvelar-se que conduz a um

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estado de consciência, no qual o sujeito é capaz de pensar e agir, de reconstruir

conceitos e dar novas configurações ao fazer pedagógico, não somente para a

construção do sujeito que narra a história, mas também para o grupo ao qual

pertence.

Nas Instituições de Ensino Superior (IES) que proporcionam a formação de

seus professores, observa-se que a consequência da qualificação de seus

membros, é o um deslocamento da atividade de ensino para o exercício de cargos

ou funções de gestão.

Em decorrência, instaura-se um distanciamento entre os colegas

professores e aquele que assume cargo ou função de gestão.

O objetivo da narrativa, aqui levada a efeito, é contribuir com todos aqueles

que exercem, ou exercerão, funções pedagógicas. Por isto, torna-se importante

expor todos os caminhos percorridos.

Para esse fim, esta dissertação foi estruturada da seguinte maneira:

Na segunda seção aborda-se os primeiros passos do autor e a narrativa de

suas experiências quando do surgimento pelo interesse em estudar Direito. As

noções de vestibular, grupo de pessoas e sociedade, evolução histórica e cultural do

homem. O conhecimento e reconhecimento do autor como parte integrante de

grupos sociais primários como a família, a escola e a igreja. O interesse do autor

pelas disciplinas escolares cujas questões envolvem ética, altruísmo, imagem de

pessoas que contribuem com a sociedade. Reconhecimento das oportunidades

oferecidas pelo curso de Direito às pessoas que defendem o ideário de sociedade

justa, fraterna e solidária.

Na terceira seção, destaca-se o relato do primeiro contato com o curso

decorrente de um discurso das autoridades acadêmicas sobre a estrutura do curso e

a atuação do profissional do Direito. O contato com as primeiras disciplinas, os

docentes, os colegas e a gestão do curso; com a dinâmica das aulas e sistemas de

avaliação. A percepção acerca do profissionalismo do trabalho docente. O lamento

por não haver no curso atividade acadêmica voltada à pesquisa; as dificuldades

encontradas pelo acadêmico em decorrência do então insipiente aparelhamento dos

recursos pedagógicos. A atuação do autor no estágio extracurricular e a carência do

curso em não ofertar o estágio curricular. Abordagem sobre a atividade vivenciada

na confecção do trabalho de conclusão de curso e sobre a preparação para

enfrentar o exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

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Na quarta seção, relata-se a condição de advogado devidamente inscrito na

OAB e a militância na advocacia, bem como o início da atividade docente. A

compreensão de que a atividade agora era profissional nos trouxe alegria e

inquietação em relação à práxis. Admitir que não se tratava de um profissional

acabado, pronto, foi um momento importante para impulsionar a busca por uma

qualificação em outro lugar, em um grande centro como é a cidade de São Paulo.

Há o relato de todas as principais dificuldades encontradas como advogado recém-

formado em busca de espaço em um mercado de trabalho tão competitivo. É

narrada a experiência vivida na condição de acadêmico de uma pós-graduação lato

sensu e aluno de cursinho preparatório para concursos. Nisso, situações de

inquietação e dúvida quanto ao futuro profissional são expostas. O retorno à Maceió

e o convite para atuar como professor itinerante apontam novas experiências. A

abertura de um escritório jurídico e as primeiras atuações após o retorno à cidade

natal. Atuação na Procuradoria Geral do Estado de Alagoas em cargo comissionado.

A construção da identidade profissional como advogado e docente. A experiência de

ter trabalhado no núcleo de ensino, pesquisa e extensão da IES CESMAC e a

passagem à condição de professor titular de uma disciplina. A participação em

seleção para ingresso em outra IES, aprovação e atuação. O envolvimento e

encantamento na atividade de professor e as primeiras decepções com a atividade

docente. A busca de qualificação profissional por meio de programas de doutorado

na Argentina – frustrado pelo não reconhecimento no Estado brasileiro dos títulos

obtidos em tal modelo de programas de pós-graduação stricto sensu.

Na quinta seção, relata-se os passos percorridos para a formação de

umaidentidade profissional na atuação em função pedagógica. Os grandes desafios

enfrentados e as atribuições do cargo.

Por fim, a sexta seção traz as conclusões deste longo percurso, que ora

começa a ser relatado.

 

 

 

 

 

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2 OS PRIMEIROS PASSOS  

Meu interesse pelo estudo do Direito teve início quando cursava o antigo

ginasial no Colégio Santíssimo Sacramento em Maceió, cidade onde nasci e vivo até

os dias atuais. Colégio que pertencia a uma Congregação de Religiosas Católicas.

Naquela escola, adquiri minhas primeiras lições fora do ambiente familiar.

Por conta da metodologia de ensino e da abordagem da educação sempre

voltada à religiosidade, no amor ao próximo, passei a receber orientação de que o

ser humano não pode e não deve esquecer que, muito mais do que precisar dos

outros para a consecução de seus fins e necessidades básicas, deveria acreditar

que respeitando aos ensinamentos bíblicos a comunidade alcançaria a almejada paz

social.

A sociedade teve seu nascimento da necessidade que os grupos de

pessoas, inicialmente formados pela família/parentesco, tinham de se reunir para

garantir sua sobrevivência. Reunião com o propósito de, por meio da união de

forças, talentos naturais e atividades cotidianas, tornar-se mais proveitosa às

necessidades do grupo.

Reconheço que desde a origem dos grupos sociais (primeiramente a família)

é feita uma divisão de atribuições conforme se descobre algum talento natural para

alguma atividade necessária ao grupo. Alguns desenvolvem habilidades para defesa

contra ofensas provenientes de animais selvagens, outros grupos ou dentro do

próprio grupo mantendo a ordem. Outras habilidades como a caça, a pesca, o

preparo dos alimentos, a confecção de vestuário são descobertas que nascem com

o convívio entre os pares.

Desta feita, não podemos prescindir da vida em sociedade. E como a família

é o primeiro grupo social que temos, recebemos ou herdamos dela também a

orientação religiosa inicial. Com a convivência, muitas vezes passamos a entender

a correção dos atos praticados pelos nossos pais e parentes. Na escola que estudei,

também recebi orientação religiosa dos docentes.

Para o cristianismo, o ser superior é Deus. Superior em vários aspectos: seja

porque esse ser é responsável pela nossa própria existência (criação do mundo que

nos cerca), seja porque a ideia de agir contrário às suas orientações desencadeará

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um descontentamento desse ser divino que pode tudo, inclusive castigar aqueles

que se insurgem aos seus ensinamentos.

No livro de Gêneses do antigo testamento, a Bíblia descreve a criação e o

pecado original em que o homem desobedece ao seu Criador, por conta disso e por

ter feito a escolha equivocada é castigado/penalizado. Em suma, o castigo por uma

escolha que não agradava a Deus.

Lembro-me muito bem das aulas de religião que nesse colégio eram

frequentes e ministradas tanto pelas Irmãs denominadas Sacramentinas (por serem

do colégio Santíssimo Sacramento) quanto por docentes. Muitos desses docentes

haviam obtido formação religiosa e filosófica no seminário de Maceió.

As aulas eram ministradas em sala de aula ou na Capela do Colégio. O

colégio Santíssimo Sacramento, instituição católica de ensino partícula, é dirigido

pelas freiras da congregação fundada pelo padre francês Pierre Vigne.

Com frequência, fui orientado de que devia seguir regras básicas para o bom

convívio dos homens. Uma das primeiras regras que tive conhecimento foi respeitar

a fila indiana. Trata-se de um colégio tradicional no estado e considerado rígido em

sua forma de exigir dos alunos um bom rendimento escolar. Ao tempo, os alunos

egressos tinham bom índice de aprovação nos vestibulares e concursos públicos por

conta da dinâmica que conduziam seus trabalhos.

Na atualidade, não mais possui um número elevado de alunos. Acredito que

fruto de uma nova perspectiva de ensino e aprendizagem que rompeu com alguns

modelos definidos como tradicionalistas. Fato é que, ao tempo em que estudava a 7ª

série, no turno matutino, a escola tinha até a turma “f” e funcionava em dois turnos.

Hoje, só existe em funcionamento o turno matutino.

É fato que as escolas tidas como religiosas perderam, no estado de Alagoas,

espaço para aquelas em que o foco é o resultado obtido no vestibular, fruto da

utilização de tecnologias, ferramentas que contribuem, quando bem utilizadas por

profissionais habilitados, para a assimilação e compreensão do conteúdo ministrado.

As escolas que não inovaram, não buscaram a utilização de novas técnicas

pedagógicas, ferramentas e estrutura física que permitissem que o aluno ficasse

mais tempo na escola, participando de atividades acadêmicas e desportistas, foram,

aos poucos, perdendo a preferência dos pais e dos alunos e, consequentemente,

espaço no mercado.

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Atualmente, percebo que os valores são outros. A presença dos pais na vida

educativa – formação de seus filhos – limita-se, muitas vezes, a encontros em finais

de semana. Hoje, a criança e o jovem de classe média estão sempre fazendo

alguma atividade além do horário que está em sala de aula. Cursos de línguas,

informática, esportes, aulas de reforço etc.

Por conta dessas atividades constantes, crianças e jovens não convivem e

muito menos dialogam com frequência com os pais. A cultura deixa de ser algo

presente na formação dos jovens. As informações surgem por vários veículos à

disposição, sem uma seletividade necessária a uma boa formação ética, moral e

religiosa.

Em minha formação inicial, fui orientado que se os dez mandamentos que

Deus deixou a Moisés fossem mais reconhecidos e respeitados pelos povos

teríamos a tão almejada pacificação social. O problema é que diante de tudo que

nos foi concedido por Deus, segundo o cristianismo, o livre arbítrio coloca nossas

atitudes numa balança. Balança que é um dos símbolos da Justiça.

Naquele momento tão importante para a minha formação como pessoa,

tanto em casa como na escola, deparava-me com o paradoxo entre o que desejava

fazer e o que era ético fazer. O que era bom, justo e o que era pecado. O que traria

frutos positivos e o que me levaria à ruína em todos os seus aspectos, ou seja, o

ponto de partida para uma formação proveitosa dependeria do meio em que eu vivia

e das minhas escolhas.

Meus pais tiveram grande participação nesse momento de minha vida

dizendo o que poderia, deveria ou não fazer. Quanto a isso jamais poderei me

queixar de seus ensinamentos. Sempre ouvi meu pai e mãe dizerem “não minta para

mim”, “não pegue o que é dos outros”, “respeite os mais velhos”, “obedeça a tia da

escola”, “seja um homem de bem” etc.

Na escola, percebi nas aulas ministradas de História (tanto História geral

quanto do Brasil) a razão de tanto desamor entre os homens, tantos conflitos,

riqueza e poder. As primeiras formas de convívio entre seres humanos, desde o

homem das cavernas, passando pela noção de grupos, sociedade, Estado, até a

formação das grandes civilizações, impérios, nações, lutas, batalhas, conquistas,

perdas, massacres, genocídios, injustiças, punições e os grandes personagens de

que a História tem registro.

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Conforme assimilava aquilo que os docentes no ensino fundamental e médio

ministravam compreendi melhor os fatos históricos. Dentre as disciplinas preferidas

estavam História geral, História do Brasil, Geografia, Literatura e OSPB.

O detalhamento feito no estudo do império romano por conta do tempo em

que Jesus conviveu com os homens, já que estudava em uma escola católica

(desde a busca pelos romanos com o propósito de ceifar sua vida, ainda recém-

nascido – momento em que várias crianças foram sacrificadas – somente por

nascerem no mesmo dia de Jesus) até a perseguição por sua pregação e

condenação e sacrifício, trazia-me uma curiosidade e inquietação atinente à

legislação existente. Como o Estado havia de não proteger alguém que não

cometera nenhum tipo de crime.

Como pode alguém concentrar tanto poder sobre os outros em nome de

suposta superioridade? Em muitos episódios da história desde a antiguidade, existia

a concentração de poder em uma pessoa em nome de uma superioridade oriunda

de uma dita divindade.

Não mais se detinha o poder pela força física ou capacidade de organizar

pessoas para empreender conquistas ou proteção quanto a invasores bárbaros, mas

por reconhecerem e concederem às autoridades constituídas uma ideia de

concentração de poder por conta da vontade política de uma classe elitizada.

No estudo da história, percebi que sempre esteve presente o domínio e a

supremacia de uma pessoa ou de um pequeno grupo sobre a grande parte da

coletividade. Essas pessoas mantinham uma estrutura política composta por sujeitos

que editavam as normas de convívio e aplicavam-na.

Faziam parte, ainda, dessa classe de elite ou casta, um ou alguns

representante(s) do que se intitulavam/entendiam por divino, bem como também

aqueles que detinham o capital e os ditos saberes.

O fato é que todas aquelas informações me aproximavam da ideia de justiça.

Do que era correto e justo. A aplicação e interpretação daquelas normas sociais em

favor dos menos favorecidos seria uma baliza na busca do equilíbrio social. Na

idade média, a Igreja teve papel importante na formação daquele modelo

econômico, os feudos, os senhores feudais, o modo de produção agrícola, as

corporações.

Posteriormente, com a criação das universidades para atender às

necessidades de formação intelectual de seus próprios membros e formação dos

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filhos daqueles que possuíam bens (como no caso dos comerciantes), a ciência e a

religião começaram a dividir o mesmo espaço, com as devidas proporções à época.

Nesse momento histórico da humanidade, relevante para mim fora o

conhecimento sobre a figura do mestre, companheiro, e do aprendiz. O mestre como

aquele que ensinava uma arte ou ofício e contribuía para a formação do futuro pai

de família mantenedor de um lar. Ofício exercido pelo resto da vida do aprendiz

quando da sua formação. Essa transmissão do conhecimento, na prática foi um

diferencial para mim, mesmo no alto da minha inicial formação e imaturidade.

Imaginava que devia aprender um ofício que trouxesse prazer em realizá-lo,

pois exerceria aquela função para o resto da vida. Comecei também a valorizar e

despertar meu interesse na atividade desenvolvida pelo professor percebendo sua

importância em uma sociedade politicamente organizada. Ator social presente e em

grande número dentre meus familiares. Mais adiante irei relatar sobre esse fato.

Este modo de pensar no futuro com um forte pragmatismo, teve profunda

intervenção de meu pai. Sempre colocava à mostra as possibilidades e modalidades

de trabalho a ser desenvolvidos pelo homem e como poderia chegar àquela

possibilidade/aptidão para a prática de tal ofício que, segundo sua orientação, traria

ou não vantagens ou respeitabilidade social. Fez questão de dizer que transmitia

toda aquela orientação por não ter tido dos familiares uma orientação mais precisa

quanto ao futuro dele.

Não posso deixar de considerar que obtive orientação de meus pais de que

deveria fazer aquilo que me trouxesse satisfação e realização pessoal. Não

obstante, sem deixar de lado que de nada adiantaria fazer o que se gosta, que traz

realização se a contraprestação – remuneração pela atividade desenvolvida –

estivesse aquém das necessidades básicas para uma vida digna.

Meu pai tornou-se militar à época, pois, segundo relato seu, via ali uma

possibilidade de se manter, viver dignamente, ter respeitabilidade social e uma

velhice tranquila, assim como ocorrera com meu avô e meus tios mais velhos que

ele.

A partir de então, passei a pensar no que eu poderia ser no futuro como

trabalhador. Todavia, conforme orientação de meu pai, a atividade a ser

desempenhada estaria intimamente ligada à remuneração percebida pelo sujeito

profissional. Ser militar seria um desdobramento considerado natural.

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Neto, sobrinho e filho de oficiais da PM, que tinham ali a principal fonte de

renda e atividade, poderia ser um fator importante para minha escolha. Ressalto que

na minha infância vivi cercado de colegas de meu pai também militares. Meus

colegas eram em sua maioria filhos de militares. Vizinho a casa de meu pai existia

um ginásio da Polícia Militar e estava a duas ruas de um quartel – batalhão da PM,

ou seja, tudo ao redor conspirava para aquela atividade.

Forte influência do militarismo em minha vida. Por sorte, o legado foi o que

de bom existia e existe no militarismo: respeito, companheirismo, postura tida

convencional e aceitável, dentre outras qualidades comuns aos bons militares.

A influência de meu pai para que eu escolhesse aquele caminho

(militarismo) era grande. Não foi o bastante, inclusive me trouxe certo desconforto.

Acredito que estava cansado daquele meio. Morava próximo ao quartel, ouvia o

toque de alvorada diariamente, vizinhos na sua maioria eram militares ou filhos de

militares.

No entanto confesso, não foi esse o motivo de não querer ser um militar.

Inclusive cheguei a fazer um concurso vestibular na Universidade Federal de

Alagoas (UFAL), em janeiro de 1997, para o Curso de Formação de Oficiais (CFO),

no qual obtive aprovação na primeira fase.

Contribuiu para minha escolha profissional o fato de acompanhar meu pai

nas solenidades em que ele participava, visto que chegou ao posto de comandante

geral. Deparei-me com a figura de autoridades não militares, a saber: políticos,

promotores de justiça, juízes, delegados.

Meu pai sempre explicou quais as atribuições desses sujeitos na sociedade.

Em decorrência de uma dessas solenidades fui apresentado a um delegado de

polícia. Como de costume, meu pai explicara “olhe meu filho esse cidadão prende

ladrões igual ao seu pai”. No mesmo instante questionei: “e qual o motivo dele não

usar farda?” A partir da informação prestada de que se tratava de um policial civil,

portanto, não militar, passei ainda mais a dar atenção a essas autoridades não

militares.

Por acompanhar meu pai sempre que podia nos eventos, estive em

algumas cidades no interior de Alagoas quando das eleições. Fui apresentado a

uma amiga de meu pai que era juíza eleitoral – profissional de uma respeitabilidade

naqueles lugares, atual colega docente da IES onde ministro aulas.

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Intrigante foi presenciar, mesmo no final dos anos 1980, uma mulher sendo

a autoridade local – era algo incomum ou não recorrente no nordeste do país. Que

uma mulher mandasse um policial, militar ou não, prender alguém ou conduzir os

trabalhos de fiscalização em uma eleição municipal era surreal para mim e para

muitos leigos naquele momento.

Certa vez, ainda na cidade de Flexeiras/AL, lugar onde minha mãe nasceu –

em visita a minha avó materna, que lá habita – assisti a um júri popular. O clamor

era grande por justiça. O clima era tenso na cidade. Dois amigos pertencentes a

famílias tradicionais da cidade haviam ingerido bebida alcoólica em demasia e

discutido em um bar. Resultado, um sacou uma arma e atirou no outro por conta de

uma partida de dominó.

Ao assistir ao júri, encantei-me com a atividade daqueles profissionais:

advogados, promotor, juiz e autoridades presentes. Era um misto de curiosidade e

admiração. Eu quis saber o que aqueles profissionais faziam e conheciam

tecnicamente; quais competências e habilidades possuíam. Para o exercício de

qualquer uma daquelas profissões tive o aval de meu pai, fator relevante e

importante para minha decisão.

Interessante ainda em minha escolha profissional foi o encanto pelas

ciências humanas e desencanto pelas ciências exatas e biológicas naquele

momento de minha vida. Contribuiu esse fator para a ratificação e opção posterior.

Tanto era verdade que encontrei uma dificuldade tremenda, não em aprender o

conteúdo dessas disciplinas, mas de encontrar um significado, uma razão para

estudar aquelas disciplinas.

Os estudos de Matemática e Química Orgânica para mim eram penosos.

Acredito que, assim como contribuiu positivamente a forma como os docentes das

disciplinas de humanas conduziam as aulas, negativamente interferiu em meu

aprendizado o modo que alguns docentes conduziam seus conteúdos.

A meu ver, tamanha interferência repercutiu em minha reprovação na 7ª e

8ª series. Com aulas particulares de matemática aprendi com muito mais facilidade

do que com os docentes do colégio, mas não havia mais tempo para estudar todo o

conteúdo, o tempo perdido resultou, por duas vezes, em reprovação.

Meus pais começaram a compreender, mesmo tardiamente, que o problema

não era somente meu, mas, sobretudo, no modo que os docentes lecionavam.

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Como resultado, tive um atraso de dois anos e posterior transferência para

outro colégio com mesmo nível de exigência, contudo, com uma nova pedagogia,

um novo modelo de conduzir o processo de ensino e aprendizagem que trouxe para

mim um melhora significativa no rendimento de todas as matérias, inclusive nas

disciplinas que possuía maior dificuldade em aprender seus conteúdos.

Creio que esses fatores negativos da escola em que estudei, ao longo do

tempo, podem ter contribuído para a perda de alunos para outras instituições de

ensino.

Lamentei muito por não ter tido a oportunidade de estudar (principalmente

Matemática, Química, Física) com professores que tentavam buscar a aprendizagem

do aluno. A reprovação era grande nessas matérias, pois concebiam a ideia de que

docentes mais experientes e rígidos possibilitariam um melhor resultado nos

vestibulares. A estratégia era exercer uma cobrança acentuada nos alunos em

relação ao aproveitamento de estudo, leia-se resultado considerado bom nas

avaliações.

Não posso asseverar que era por conta dessa forte pressão que os alunos

da escola tinham bom índice de aprovação nos vestibulares. Acredito que o fator

determinante era o fato de que muitos alunos, desde o início, tinham oportunidade

de ter acesso a aulas particulares. A aula particular, ou a também denominada aula

de reforço, era uma regra para quem podia pagar. No meu caso tive uma professora

particular em casa, mas não dessas matérias.

Nesse momento, abro um trecho para falar um pouco sobre isso. Minha mãe

era professora do ensino fundamental. Não só ela, minha avó materna, tios e tias

maternos e um tia e tio paternos eram e ainda são professores, nas mais diversas

áreas, em grande parte, professores da rede estadual de ensino. Fato esse que me

enche de orgulho.

Por vezes, acompanhei minha mãe em seu trabalho, fazendo minha tarefa

de casa nas carteiras da escola. Era uma turma de alfabetização de adultos.

Deparava-me com pessoas que não tiveram a oportunidade de estudar quando

criança, em razão de algum motivo, na maioria dos casos, por ter que trabalhar

quando criança devido à necessidade econômica.

A atenção e a preocupação de minha mãe com seus alunos, para que

pudessem crescer e render nos estudos, fizeram-me perceber que a aprendizagem

deve sim ter método e finalidade, contudo, sem deixar de lado a questão da

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humanização, percebendo que o aluno é um ser complexo e diferente uns dos

outros.

Quando na 8ª série, deparei com uma disciplina que tinha por nome

Educação moral e cívica – junto à História Geral e História do Brasil – dentre as

matérias que me despertavam interesse como Literatura e Geografia, essa era uma

das mais contundentes. Lá obtive as primeiras lições do que vinha a ser cidadania,

política, governo, povo, sociedade politicamente organizada, moral, ética dentre

outros temas que guardam similitude com os temas relacionados ao Direito.

Tive conhecimento do que aduz a Teoria do Contrato Social do suíço Jean-

Jacques Rousseau que revela o nascimento da sociedade e do Direito em uma

perspectiva moderna, pautada na ideia da necessidade de se implantar um conjunto

de regras (normas) reguladoras das relações sociais e de se conferir autoridade a

um governante ou grupo para impô-las.

Lembro-me ainda hoje das aulas do professor Cleber, pessoa culta, postura

elegante, formal e com uma eloquência digna de bons oradores. Em uma de suas

aulas na sala de vídeo, apresentou um filme sobre a Declaração Universal dos

Direitos Humanos (Assembleia Geral das Nações Unidas, de 10 de dezembro de

1948).

Marcou bastante saber que existira forte discriminação quanto ao credo, à

cor, classe social, às regiões no Brasil. Que nas relações laborais existia, e ainda

existe em pleno século XXI, trabalho escravo no Brasil, não somente no norte e

nordeste do país.

Mais tarde, no 2º ano científico, precisamente, comecei a ser indagado

quanto à minha pretensão de carreira. Agora em outro colégio, Santa Úrsula, foi

proposto um teste vocacional. Intrigante foi descobrir que dentre os resultados

obtidos, tendo em vista que fiz mais de um desses testes, estavam: bombeiro;

profissional que iria atuar no campo do direito; e, o mais interessante de tudo, a

possibilidade de ser professor.

Naquele momento, confesso que realmente importava, trazia deslumbre a

boa remuneração, notoriedade e respeitabilidade de juízes, promotores, advogados

e delegados. Ter um bom salário ainda jovem traria uma série de benefícios como

independência, aquisição de bens como carros, motocicletas, imóveis, boa

vestimenta, divertimento, viagens etc.

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Tenho lembrança, em 1995, aos 18 anos de idade, ainda no 2º ano

científico, ter sido apresentado por um colega a um amigo dele que, três anos mais

velho, costumava sair conosco nas noites de sábado, e com 21 anos de idade já

havia sido aprovado em concurso público para membro do Ministério Público

Estadual, como Promotor de Justiça, em Alagoas.

Aos vinte e dois 22 anos ele já havia sido nomeado. O meu colega disse “há

mais de dois anos esse amigo vem estudado muitas horas por dia”, por isso tão

rapidamente foi aprovado naquele concurso. Naquele momento, associei ao segredo

para o sucesso muito estudo e dedicação, e que aquela realidade poderia ser a

minha. Iria depender somente do meu esforço e dedicação.

No ano seguinte, em 1996, conheci um casal que foi muito importante para

que eu compreendesse com mais detalhes a atuação do delegado e do advogado.

Eram donos do cursinho preparatório vestibular que eu fazia. Além disso, em

momento posterior, passaram a ser os meus sogros – pais da namorada que tive por

quatro anos e meio – ele, delegado federal aposentado por invalidez precocemente

por conta de um acidente de carro em uma diligência, advogando na ceara criminal;

ela, advogada militante no campo do direito de família.

Passei, efetivamente, a conviver com profissionais dedicados, humanos,

muito competentes e com larga experiência. A atuação profissional ética na

advocacia e na gestão do cursinho trouxe resultados positivos em suas vidas,

traduzido por via de consequência em boa remuneração e condição de vida

condigna. O cursinho pré-vestibular era muito conceituado nos anos em que existiu.

Prestei vestibular para o ingresso na Faculdade de Direito de Maceió, a

então FADIMA, onde fui reprovado, mesmo obtendo oitenta por cento de

aproveitamento na prova.

A faculdade onde gostaria de estudar tinha política de ensino pautada no

ideário de seu fundador o Padre Teófanes Augusto de Araújo Barros (membro da

Academia Alagoana de Letras e do Instituto Histórico de Alagoas).

Pessoa que dedicou toda sua vida ao ideal, “educar para elevar”. Conferindo

oportunidade para as pessoas que trabalhavam durante o dia e não tinham como

estudar na Universidade Federal de Alagoas devido ao horário, fazer um curso

superior no turno da noite, contribuindo significativamente com a formação dos

alagoanos.

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Contudo, naquele momento a concorrência era grande. Era a única

faculdade particular que oferecia o curso de Direito no estado e o vestibular da

Universidade Federal de Alagoas era anual. À época foi uma decepção para mim e

para minha família não ter sido aprovado. Toda a preparação em cursos de matérias

isoladas (Português, História, Geografia, Inglês) não foi o suficiente.

A concorrência era enorme por vaga no curso de Direito, justificada pelo

imenso leque de possibilidades de atuação profissional que o curso ainda hoje

oferece. Ressalte-se que, na mesma época, prestei concurso vestibular (UFAL) para

o Curso de Formação de Oficiais (CFO) com uma concorrência enorme também (20

vagas somente) concorrência equivalente ao curso de Medicina. Fui aprovado na

primeira fase e reprovado na segunda. Neste caso, a decepção de meu pai foi ainda

maior.

No ano de 1997, continuei estudando no mesmo cursinho preparatório para

vestibular pertencente aos pais de minha namorada. Admirava a atuação daqueles

professores de cursinho como também seus gestores.

Interessante e diferente a forma que os docentes ministravam o conteúdo. A

equipe de docentes era, na sua maioria, composta pelos melhores docentes dos

colégios do estado de Alagoas. As aulas eram bem agradáveis.

A meu ver, os professores tinham maior preocupação de se fazerem

compreender. E, penso eu, mais motivados por terem uma melhor remuneração do

que a recebida nos colégios. Muitos eram considerados estrelas – festejados onde

passavam.

No intervalo, conversava com eles na sala dos professores, pois tinha livre

acesso. Muitos além da atuação como docente em cursinho eram professores

universitários, engenheiros, biólogos, historiadores, escritores, médicos. Observava

os bastidores; o que acontecia dentro e fora da sala de aula. A atividade dos

coordenadores pedagógicos sempre presentes. Os psicólogos contratados que

atuavam coletivamente através de palestras ou individualmente em uma sala

designada para esse fim.

A admiração também se fez presente em relação àqueles profissionais, por

serem pessoas simples, abertas e envolvidas com o trabalho. Presenciei o trabalho

desenvolvido na secretaria do curso, cumulando a função de tesouraria, entregando

os módulos. Coordenação pedagógica cuidando da organização dos horários,

ausência de docentes, remuneração, percebi como todo aquele trabalho era

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dinâmico. Tive interesse em poder também ser um dia um daqueles professores

qualificados e bem sucedidos.

No início do ano de 1998, por orientação de meus pais, prestei vestibular

para outro curso, escolhi o curso de Ciências Contábeis, influência de minha irmã

que é contadora, fui aprovado. Fiz um curso de Técnico em Transações Imobiliárias

(TTI), passei a trabalhar como corretor de imóveis e estudar no turno da noite.

Como imaginava, no início não me identifiquei com as disciplinas. Gostei do

ambiente acadêmico, mas não foi o suficiente para prosseguir com os estudos.

Cursei um semestre e tranquei minha matrícula desistindo em seguida da

corretagem de imóveis. Importante frisar que a experiência profissional como

corretor de imóveis me levou a conhecer todo procedimento formal para a alienação,

transmissão, permuta de bens em geral e não somente imóveis.

Naquele momento, senti que gostava daquele formalismo documental e

instrumental. Compreendi que um cartório não só serviria para eu abrir uma firma ou

reconhecer um documento. Também compreendi que uma simples proposta

formalizada por um interessado poderia trazer uma repercussão patrimonial

significativa, caso desistisse da aquisição imotivadamente, uma vez que já haveria

concordância do alienante. Trouxe-me curiosidade a informação de que o locatário

de imóvel tem preferência na aquisição do bem colocado à venda.

Dentre outras questões que suscitavam inquietações, pois não tinha comigo

o conhecimento técnico jurídico necessário, estavam: ações reivindicatórias de

imóveis, revisionais de alugueis, embargos de obras, ponto comercial, títulos de

crédito, inventário, divórcio etc.

Impressionante a quantidade de pessoas que atendi como corretor para a

alienação e posterior aquisição de bens móveis e imóveis por conta de separações

judiciais e divórcios. Certa vez, buscando tornar mais célere o procedimento,

coloquei-me à disposição para digitar o acervo de bens que existia em um

estabelecimento comercial (loja de artigos esportivos) pertencente a um casal que

estava naquele momento vendendo para aquisição de outros.

Não imaginava que naquele momento estava inventariando parte dos bens

pertencentes àquele casal em processo de ruptura da sociedade conjugal. Percebi

naquele instante a postura e importância dos advogados de ambas as partes quanto

à proteção dos interesses de seus respectivos clientes. A todo o momento intervindo

e discutindo não só o acervo de bens, mas, sobretudo, o modo como seria

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convertido todo aquele estoque, móveis, equipamentos em bens diversos. Liquidez

era a palavra de ordem.

Não sabia que tudo aquilo que me trazia satisfação em observar seria objeto

de estudo do Direito Civil, Direito Comercial.

Iniciei a atividade de vendedor de carros sem fazer qualquer cursinho

preparatório. Fui convidado por um amigo que trabalhava como corretor de imóveis

em uma equipe distinta da que trabalhava. Este acabou recebendo posteriormente

um convite para ser gerente de uma agência de veículos de alto padrão. Estava

montando uma equipe (pequena, porém dinâmica). Como corretor de imóveis

sempre busquei atender com muita atenção, dedicação e empenho aos clientes.

A clientela no ramo imobiliário é mais exigente e escassa. Isso é

compreensível já que estamos diante de pessoas que estão buscando um local para

viver e receber a família e amigos e pelo número elevado de corretores no mercado

imobiliário alagoano que, ao tempo, não era aquecido como hoje.

Trata-se, também, de que o imóvel é um bem com um valor econômico

significativo. Há quem trabalhe a vida inteira para juntar o valor suficiente para

adquirir tal bem ou ao menos o sinal para financiamento de um imóvel.

Como vendedor de carros (não populares) estive sempre em contato com

clientes de poder aquisitivo alto e autoridades locais. Dentre eles, comerciantes,

empresários, advogados de renome, desembargadores, delegados de polícia,

juízes, promotores de justiça. Não esquecendo, entretanto, das autoridades políticas

e religiosas.

Passei oito meses nessa agência de veículos a trabalhar de segunda a

sábado (eventualmente aos domingos), das 8:00h às 19:30h. Gostava muito de

atender às pessoas das mais variadas áreas de atuação no mercado de trabalho.

Interagir com pessoas sempre foi algo que me trouxe satisfação.

Principalmente sobre assuntos com os quais eu acreditava que tinha domínio e

interesse. Indagava frequentemente as autoridades (que trabalhavam com o direito)

em que local e setor trabalhavam, se gostavam do que faziam, por quanto tempo

desenvolviam aquele oficio.

Na maioria das vezes, os clientes eram muito solícitos e gostavam de me

incentivar em meu desiderato. Quando indagados por mim, na maioria dos casos, as

respostas advinham no sentido de que eram pessoas realizadas profissionalmente,

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que gostavam do que faziam. Acreditei que muitas respostas tinham em seu

contexto um ar de constância e consistência com a realidade.

A satisfação de poder ajudar as pessoas que buscavam orientação e apoio

era um fator importante na realização pessoal daqueles que eram interrogados.

Identificava-me, e ainda hoje me identifico, com esse propósito de ajudar ao

próximo. Sentir-se útil e potente diante das adversidades da vida é algo que acaricia

o ego e o coração. O ideário de justiça distributiva era outro ponto recorrente. “Dar a

cada um o que é seu”.

À época convivi com o preenchimento de cadastros para obtenção de linhas

de créditos nos bancos. Muitos financiavam os veículos para diversos fins. Para uso

particular ou para trabalho. Os contratos bancários ficavam sempre conosco para

que os clientes assinassem quando aprovado o crédito. Por vezes, lia os contratos.

Sentia um forte interesse por conhecer o conteúdo daquelas cláusulas,

principalmente, quando fazia a leitura das cláusulas “inadimplemento”, “busca e

apreensão do veículo”, “mora”.

Certo dia, na venda de uma caminhonete, preenchi o recibo do valor do

sinal. Existia um bloquinho de recibo timbrado que, dentre outras informações,

mencionava que aquele valor representava arras penitenciais. Até então não

conhecia tal figura legal.

Conheci na prática tal instituto. Poucos dias depois, o cliente retornara para

trazer o restante do valor para pagar o veículo, conforme acordado com o dono da

loja, disse-nos que não poderia mais ficar com o carro alegando se tratar não de

problema com o veículo, mas pessoal.

O dono da loja recebeu o carro de volta, mas informou de pronto que o valor

dado a título de arras penitenciais não seria devolvido. O adquirente perderia o valor

do sinal. Soube que quando as arras ou sinal são dados nessa modalidade, se quem

desistir da compra for o adquirente ele perderá o sinal dado. Se quem desistir for o

vendedor/alienante ele terá de restituir o valor recebido em dobro. O termo

penitencia significa sanção ajustada para recair sobre aquele que não cumprir o que

fora acordado.

Naquele instante percebi a indignação do cliente que ficou muito irritado.

Afinal de contas, ninguém deseja perder R$ 10.000,00 (dez mil reais) em poucos

dias. Ele aguardou o dono da loja chegar para discutir àquela sanção. Resultado,

não aceitando a explicação do proprietário, informou que iria ao PROCON.

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Lembrei-me do programa Aqui e Agora (década de 1990, exibido no canal

SBT), em que Celso Russomano, hoje político, era repórter e denunciava as

empresas que desrespeitavam o consumidor. Buscava também o citado repórter

resolver o problema conciliando os interesses conflitantes. Gostava muito de assistir

o programa. Tinha o seguinte bordão quando do término da matéria “se está bom

para ambas as partes, Celso Russomano aqui e agora”.

Comecei a me deparar com questões atinentes às relações de consumo.

Não raramente atendia aos clientes que procuravam a loja e diziam que o produto

adquirido apresentava algum defeito que tornava o uso do bem impossível ou

limitado. Discutiam-se muito sobre garantia, reparos etc. Sempre busquei interceder

em prol da resolução de problemas em que eu podia ajudar.

Ainda sobre relação de consumo, recebi na sala da loja em que trabalhava

um gerente de financiamento. Ele passava lá com frequência, dada a quantidade de

veículos que eram financiados, mas nunca havíamos conversado com calma. Com

o propósito de incentivar-me a oferecer financiamento de veículos, disse-me que as

tabelas que usávamos tinham conforme a taxa de juros uma escala de “retorno”.

Esse retorno traria uma comissão para nós vendedores. Ia de 0 a 10. Quanto maior

a tabela, 10, por exemplo, maior comissão receberíamos.

O detalhe é que a nossa comissão mais “gorda” dependia da exploração do

cliente. Explico: se usando a tabela 0 o valor da parcela fixa seria de 60 meses de

R$ 815,00 (oitocentos e quinze reais), na tabela 10 o valor passaria para 60 meses

de R$ 852,00 (oitocentos e cinquenta de dois reais), gerando um aumento de R$

37,00 (trinta e sete reais na parcela) e R$ 2.220,00 (dois mil duzentos e vinte reais)

de acréscimo. Ao lesar o consumidor mediante a utilização da tabela maior,

receberíamos, em decorrência disso, o valor de mais ou menos R$ 380,00

(trezentos e oitenta reais) a título de comissão.

Não me conformei com aquilo. Já não bastava o cliente pagar os juros altos,

ainda hoje aplicados, tinha que pagar a mais por conta de uma comissão concedida

ao vendedor! Infelizmente, hoje, essa é uma prática recorrente.

Preferia garantir a venda mostrando que aquele valor da parcela não tinha

“retorno” para mim. Muitos dos clientes desconheciam a prática e agradeciam por

terem recebido a informação e sentiam-se confortados por não estarem sendo

lesados na ocasião.

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Outro caso interessante para mim, foi quando vendi um carro de um cliente e

sua ex-cônjuge veio à nossa procura para saber a quem e por quanto havia sido

vendido o carro. A informação era para que ela pudesse levar o fato ao juiz no

processo de separação litigiosa em curso em uma das varas de família de Maceió.

Alegou à senhora que o carro tinha sido adquirido com recursos oriundos do

trabalho de ambos. E que não era justo ter trabalhado tanto para comprar e somente

por estar o bem registrado no nome do marido ela não tinha ficado com sua parte.

O marido dela à época buscou utilizar-se de um expediente ardiloso que foi

a simulação de venda do carro a um desconhecido que, na verdade, era um velho

amigo. Somente para afastar do rateio o bem adquirido a título oneroso na

constância da sociedade conjugal. A batalha daquela senhora foi grande segundo

relato seu. Disse-me que o marido tinha abandonado o lar em que residiam sem

arcar com o rateio das despesas. Ela, trabalhando em dois turnos e sem condições,

de pagar sozinha: condomínio, feira, escola, transporte, vestuário, lazer e plano de

saúde dos três filhos menores. Chegou a chorar diante de mim e dos colegas que

trabalhavam comigo na loja.

Fiquei bastante sensibilizado com aquela situação. Nem o apartamento em

que residiam estava pago. Existia um financiamento imobiliário que ela também não

tinha condições de honrar o pagamento. Aparentava ter uns quarenta e poucos

anos. Mas apresentava marcas de cansaço e decepção. Questionava os direitos

daquela senhora e seus filhos diante daquela situação.

Por quanto tempo se estenderia aquela situação enquanto o processo não

fosse julgado? O que aquela senhora poderia alegar em juízo e como provaria as

alegações no processo. Que ações poderiam o advogado dela tomar para, naquele

instante, dispor de meios para prover uma vida condigna para seus filhos?

Muitos eram os questionamentos. A curiosidade era enorme. O desejo em

ajudar era concreto. Em contrapartida, flagrante era a má-fé do cônjuge em suas

ações. Como morava com meus pais ao tempo, imaginava como seria meu destino

se aquilo ocorresse com minha família. O que eu poderia fazer materialmente e

psicologicamente para ajudar minha mãe e minhas irmãs?

No final do ano de 1998, voltei a sonhar com a possibilidade de aprovação

no processo seletivo vestibular em Direito e comecei a fazer uma revisão do que

havia estudado antes. Conversava com frequência com os pais de minha então

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namorada, obtendo deles grande incentivo. Acompanhei-os nas idas ao fórum,

presídios e ao escritório.

A ida ao presídio trouxe-me a convicção de que não gostaria de trabalhar

naquele meio, com direito penal. O local não me agradava por uma série de fatores.

A começar pelo odor do local. O mau cheiro era grande, ver pessoas aglutinadas em

uma cela era algo que não me fazia bem. As paredes sujas, a aparência daquelas

pessoas, na maioria pobre e negra, retratavam que algo no aspecto social estava

errado no Brasil. Estive também em um presídio feminino e a realidade também era

de desolação.

Presenciar mulheres, inclusive gestantes, com as mesmas características

dos homens, negros e pobres, cumprindo pena por tráfico de drogas e outros crimes

menos gravosos à sociedade como furto simples trazem ao visitante uma sensação

de impotência diante de questões sociais relevantes, na busca por uma sociedade

mais justa e igualitária.

Não me via empolgado em poder sob a perspectiva de advogado

criminalista retirar da prisão indivíduos potencialmente delinquentes, embora

reconhecesse que a todos deve ser conferido o direito de ser assistido por advogado

habilitado e compromissado.

Por diversas vezes, o casal de advogados citados anteriormente recebiam

clientes, em casa mesmo, com as mais diversificadas questões a serem analisadas

e posteriormente submetidas ao pronunciamento do poder Judiciário. Processos de

separação, divórcio, questão de guarda de filhos, pedido de pensão alimentícia,

exames de DNA, inventários, contratos das mais diversas espécies, habeas corpus,

pedido de liberdade provisória, responsabilidade civil, direito do consumidor, direito

do trabalho etc.

Vi-me muito envolvido com aquelas questões, principalmente por perceber

que pessoas procuravam e procuram a figura do advogado no intento de certificar

seus direitos. Se houver violação ao direito subjetivo e dessa violação acarretar

dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, o Estado de direito garante ou deve

garantir ao lesado o direito de buscar a tutela dos interesses individuais ou coletivos.

A própria Constituição Federal no título II capítulo I preceitua como direito e garantia

fundamental em seu Art. 5º, inciso XXXV, que a lei não excluirá da apreciação do

Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

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Percebi que o advogado atuava não só para tecnicamente representar seus

clientes em processo judicial, mas também como alguém que tem um papel muito

importante na sociedade através de seu órgão de classe (OAB). Por vezes, assistia

na TV, às entrevistas com o então presidente daquele órgão em Alagoas, hoje

ministro do Tribunal Superior de Justiça, Dr. Humberto Martins, sendo indagado e

falando sobre diversos temas como direitos humanos, prerrogativa dos advogados

etc.

A advogada parecia ser uma psicóloga. Para o enfrentamento das questões

jurídicas necessitava conhecer os fatos, o problema, para buscar uma solução

apaziguadora do conflito – a clientela desabafava – colocava para fora o que estava

sentindo – choravam muitas vezes. A militância nas varas de família e sucessões

era constante e desgastante muita vezes, tendo em vista que o advogado de certa

maneira convive e absorve o sofrimento dos clientes.

Não imaginava naquele momento que o custo da manutenção das despesas

de uma casa era tão significativo. Que se pagava imposto para a transmissão de

propriedade de uma casa recebida em processo de inventário. Que em uma família

existia discussão acerca de quem iria arcar com as despesas de um funeral.

É incrível como dentro de uma família possa ocorrer tanta desavença no

caso de morte de um ente querido, pelo fim da sociedade conjugal, na sua maioria

por apego a bens materiais (questões de natureza eminentemente patrimoniais). As

pessoas rompiam a relação com muito ou pouco tempo de casados. Disso, felizes

daqueles que podiam pagar um profissional para orientá-los, acompanhá-los, assisti-

los em uma lide.

E quem não dispunha de dinheiro para pagar, ou seja, não tinha meios para

ter um profissional habilitado? Onde buscar solução para suas questões?

Certamente já percebia que o Estado teria de dispor de um profissional para as

pessoas carentes de recursos.

As atribuições do defensor público estavam claras no meu entender. Mas

pairava em minha mente a ideia de que esse profissional agiria com mais presteza

se recebesse diretamente do cliente o valor justo de seu trabalho. À época aqui no

estado de Alagoas um defensor público tinha como remuneração um vencimento

baixo frente à quantidade de processos que tinha de atuar e da responsabilidade

social do cargo.

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Hoje, acredito ser duas ou mais vezes o valor que se tinha como

remuneração. Levando-se em conta que muitos dos concursos são objeto de desejo

por conta da remuneração de tais cargos e do regime de trabalho, o interesse em

prestar tão nobre serviço público era menor dentre aqueles que se preparavam para

participarem dos certames.

Reconheci que precisava dedicar mais o meu tempo aos estudos para poder

atingir meu objetivo. E assim eu fiz. Revisava as matérias no horário de trabalho

quando não estava atendendo clientes na loja. De certo, o estudo não era penoso,

mas a vontade era tanta em passar no vestibular que a expectativa gerava um mal

estar emocional repercutindo inclusive em minha forma de agir.

Cheguei a cogitar a possibilidade de prestar vestibular em Aracaju. Naquele

momento de escassez de vagas no estado de Alagoas, era uma saída para os que

não obtinham aprovação no vestibular tentar em outro estado e depois, se

aprovados fossem, cursavam um semestre e depois tentavam transferência para o

CESMAC em Maceió. Os aprovados moravam em repúblicas nas proximidades da

faculdade em Aracaju, ou alugavam apartamento e faziam o rateio dos custos.

Não fiz inscrição e desisti logo daquele expediente, pois não tinha condições

de me manter em outro estado e acredito, não teria apoio financeiro de meus pais

naquele momento para aquela manobra. Muitos conhecidos fizeram o que não fiz e

chegaram a obter aprovação e posterior transferência para o CESMAC.

Para eles, a manobra significou, conforme relatos que fizeram, a experiência

de viver em uma república e um avanço para seguir com os estudos. Agora em uma

faculdade de direito, não mais em um cursinho preparatório para o vestibular.

Perto do fim do ano, o noticiário da TV local ou nacional fazia e ainda faz o

relato da angústia dos estudantes. O estresse gerado pela pressão psicológica

desencadeava comportamentos e posturas distintas da forma normal de

enfrentamento de questões cotidianas.

Percebia e perceberam em mim uma conduta fora do que sempre tive como

postura. Irritava-me com frequência diante de questões simples. Não aceitava certas

brincadeiras vindas dos meus próximos. Brincadeiras comuns, que estavam

inseridas normalmente no contexto de jovens que se reuniam. De início não percebi

que estava passando por aquela alteração comportamental. Mas, com o tempo

percebi que se tratava de uma realidade. Era tido como uma pessoa estressada.

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A divulgação de técnicas para enfrentamento das questões com mais

tranquilidade eram normalmente dispostas em tais noticiários. Psicólogos e

Pedagogos apresentavam dicas tanto para os alunos como para os pais enfrentarem

e agirem diante daquele momento importante para ambos. Isso eu já havia

presenciado, conforme relato anterior, no cursinho pré-vestibular que estudei.

Confesso que achava bonito o texto e naquele momento anterior à decepção

acreditava e confiava que tudo iria dar certo. O fato é que comigo não funcionou.

Acredito que, por não ter tido a oportunidade de fazer uma terapia convencional, o

resultado não foi tão significativo no momento em que prestei a prova.

Senti bastante a iminência do processo vestibular, que era um instante

importante e crucial em minha vida. A possibilidade de reprovação me incomodava.

Nessa época, não estava matriculado em nenhum cursinho preparatório. Já havia

trancado a matrícula no curso de Contabilidade. Em casa, com meus pais, percebia

certo desdém quanto à seleção.

Naquele momento não sabia se se tratava de uma tática deles, deixar a

minha vida em relação a essa questão de lado para não gerar uma pressão ou

desconforto, ou por acreditarem que eu não teria competência para atingir aquele

objetivo. Relato isso por ter ouvido uma vez meu pai me dizer que eu não tinha

condições de “acompanhar” o curso de direito. “É um curso difícil, exige um Q.I que

você não tem”.

Ao tempo existia um fator que, a meu ver, poderia gerar esse desligamento

de mim. Ambos eram acadêmicos do CESMAC. O meu pai já havia feito vestibular

para o curso de direito e passado. Minha mãe cursava história. Para mim era uma

luta. Encontrar com meu pai fazendo as atividades de pesquisa do curso, estudando

para as provas, com colegas de minha idade era algo constrangedor.

Lembro-me que evitava ao máximo ir para casa. Almoçava no trabalho e à

noite quando saía do trabalho ia à casa da namorada.

Quando encontrava com meu pai, ele dizia: “olha você viu que saiu um edital

de tal concurso?”. Não acredito que era para me desmotivar, lembro que o nível

exigido para tais concursos estava aquém do que eu queria fazer em minha vida.

Não desmerecendo tais funções ou cargos públicos, mas eu sabia que tinha

condições de ter um futuro melhor.

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Acreditava que algum dia eu conseguiria passar. Acreditava na possibilidade

de aprovação apesar da angústia e da ameaça de não obter sucesso. Mas esse dia

precisava chegar o mais rápido possível.

Necessitava daquela conquista. Aguardava ansiosamente por sua chegada

para assim poder viver em paz comigo mesmo. Como disse antes, não havia dúvida

de que era o que eu queria fazer profissionalmente. Seria visto com bons olhos

pelos meus pais, família, amigos, namorada e sua família. O que me fez bem

naquele momento de minha vida foi estar com a mente ocupada com o trabalho.

Estava rodeado de pessoas que também tinham problemas, aspirações e

compromissos. Contudo, o bom-humor dos colegas de trabalho era constante. Como

a maioria dos brasileiros, fazia pouco caso dos próprios problemas.

Há poucos meses para terminar o ano, ouvi uma propaganda no rádio de um

cursinho preparatório – intensivo para vestibular dirigido para o edital do CESMAC.

Curso esse que meu pai havia frequentado por um ano. Os professores que ali

ministravam aula eram especialistas no edital para o vestibular CESMAC. Diferente

do cursinho que preparava para o vestibular da Universidade Federal de Alagoas em

que estudei.

Tratava-se de um corpo docente muito experiente e vitorioso em seus

trabalhos. A escola era reconhecida no seu mister. O curso teve início em novembro

de 1998 e terminou em janeiro de 1999. Nas vésperas do processo seletivo

vestibular.

Vi-me diante de uma situação intrigante. Quando ia ao curso assistir às

aulas ficava feliz em perceber que já havia estudado aqueles temas e casos triste

em saber que o fim não tinha sido atingido e poderia não o ser novamente. Mas

reconhecia que tinha necessidade de estar ali para agir conforme a adequada

orientação pedagógica do curso e que só assim eu atingiria o resultado almejado.

Outra concepção que tinha, quando frequentava as aulas, era que ficava

cada dia mais angustiado e nervoso. Caso eu não fosse à aula, meio que isolava

aquela sensação. O resultado foi que fiquei no meio termo. Havia dias em que sim

eu assistia às aulas, outros não. O turno da noite era outro fator que me afastava. O

cansaço era grande. Ver o conteúdo que já havia assistido anteriormente pelo meno

duas vezes, era penoso, porém necessário, conforme a orientação pedagógica do

curso. Ter o bom senso de reconhecer minhas limitações e o que estava em jogo e

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em minha volta era algo necessário. Daí a importância de não esmorecer, de lutar e

não me entregar.

O fato é que o dia da inscrição para o processo seletivo chegou e aumentou

a minha preocupação. Fiz a inscrição mais uma vez passando por uma fila que dava

a volta no quarteirão. A concorrência continuava grande. Procurei me inscrever para

o recém-aberto curso matutino. Mesmo sabendo que nesse turno a quantidade de

vagas ofertadas era a metade do turno da noite. Somente sessenta vagas.

O primeiro vestibular no turno matutino já havia sido realizado em julho de

1998. Também só foram oferecidas sessenta vagas. Não participei desse certame.

Em janeiro de 1999, participei do processo seletivo. Foram dois dias de prova. Um

sábado à tarde e um domingo pela manhã.

Como sempre, encontrava-me com as mãos molhadas de suor por conta da

ansiedade. Mas, finalmente, após alguns dias era chegada a hora de ouvir o

resultado do processo seletivo vestibular na rádio. Não quis ouvir o resultado na

frente do prédio do curso no trote oficial.

O tempo demorava a passar. O resultado sairia às 15:00h e eu fui para o

estacionamento da loja em que trabalhava às 14:00h. Nesse momento não queria

falar com ninguém. Saia do carro e andava de um lado para o outro, entrava na loja,

voltava para o carro, rezava muito. Minutos que duraram uma eternidade. Até que

chegou a hora e ouvi meu nome na lista dos aprovados. Um momento ímpar para

mim. A alegria era enorme. A retirada do peso da desconfiança e possibilidade de

concretização de um sonho trouxe-me a uma sensação de estar voando. Quando

entrei na loja fui recebido pelos colegas com tesouras para contar meus cabelos.

Estavam todos muito contentes com a minha aprovação.

Posteriormente, fui ao trote oficial ver amigos e, em seguida, fui à casa de

minha namorada à época. Lá recebi amigos mais próximos e minha família em um

churrasco feito no improviso, mas com muito carinho por todos. Foi uma das

melhores noites de minha vida.

Encontrava-me naquele momento como acadêmico do curso de Direito da

FADIMA/CESMAC. Aquela condição representava muito para mim. Estava com a

autoestima elevada. E, acima de tudo, feliz.

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3 UM ACADÊMICO DE DIREITO

Primeiramente, neste capítulo, faço uma breve passagem pela história do

ensino jurídico no Brasil e, em seguida, passarei a relatar minha experiência como

acadêmico de direito.

No Brasil, os cursos jurídicos foram criados com um propósito da formação

de quadros para a administração pública e para a atividade política de império no dia

11 de agosto de 1827, com sede em São Paulo/SP e Olinda/PE. Tratava-se de um

modelo de ensino conservador e elitista, com o objetivo de perpetuação das

estruturas de poderes vigentes.

Posteriormente, isso mudou quando começou o debate sobre o ensino livre

(1869) nos anos finais do império. O ensino livre tinha como bandeira a ideia de que

os alunos não necessitariam ir às aulas, prestando apenas os exames. Em 1900, no

Rio Grande do Sul foi fundada a Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre. O

embate maior de discussão do ensino jurídico estava voltado à questão entre teoria

e prática. De início, era puramente dogmático o ensino jurídico.

Para Oliveira (2004, p. 35), em 1891, o estágio supervisionado

caracterizava-se como prática do processo e passou a ser chamado de Prática

Forense, reunindo a teoria à prática. Mas nem por isso deixou de existir esse hiato.

Desse modo, é possível compreender que, já ao tempo, a associação

teoria/prática despontava como um recurso ao problema percebido do ensino

jurídico que as separava. Posteriormente, em 1930, o bacharel passou a perder

campo na burocracia estatal para outros profissionais. Perdera o jurista sua

identidade e deu-se início aquilo que foi apelidado de Crise do Ensino Jurídico.

Com a mudança de 1931, os cursos jurídicos passaram a ser divididos em

doutorado e bacharelado. O doutorado era teórico e voltava-se a uma formação

mais acadêmica. Já o bacharelado destinava-se à profissionalização.

Com a reforma, e, de forma mais acentuada em 1934, as celeumas sobre a

liberdade de ensinar tornam-se mais claras, com exceção dos períodos autoritários.

Portanto, até a década de 1950, apenas os juristas tinham valor social. Contudo,

com o conflito do Ensino Jurídico, começaram a perder espaço na burocracia

estatal. Ao tempo, San Tiago Dantas adotou um papel fundamental, ao indicar um

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novo modo de ensinar o Direito, partindo da distinção entre a didática tradicional e a

nova didática (OLIVEIRA, 2004).

Identificou-se que o ensino meramente transmissor de conteúdo, não

estimulava a crítica e a reflexão entre professores e alunos seria um problema

desencadeador de crise no ensino jurídico. Sofreu o ensino universitário, também,

com o autoritarismo de meados dos anos 1960. A falta de autonomia docente era

flagrante.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), ao

estabelecer entre os seus princípios a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e

divulgar a cultura, o pensamento, a arte, o saber e o pluralismo de ideias e

concepções pedagógicas, traduziu de forma mais límpida um antigo desejo dos que

lutam por uma educação pública brasileira de qualidade.

Entretanto, ainda estamos diante de um modelo, de uma política publica de

ensino jurídico voltado aos resultados (exame da OAB), sem pensar que o direito

serve à sociedade e não a sociedade serve ao direito. A mudança de paradigma se

faz necessária para uma concepção de ensino que vá além da produção de

bacharéis em grande escala. Não se sabe ao certo se o ENADE trouxe melhorias ao

ensino jurídico. Mais adiante volto a falar sobre o assunto.

Aprovado no vestibular do curso de Direito da FADIMA/CESMAC, muito feliz

comecei a reunir os documentos solicitados para a matrícula. Prestei a prova para o

turno matutino. Havia pouco tempo que fora autorizado o curso no turno matutino.

Foi o segundo vestibular para aquele turno, o primeiro naquele turno foi em junho de

1998. Foram ofertadas sessenta vagas somente – turma única. No turno da noite

eram oferecidas cento e vinte vagas. Minha turma era a segunda a oferecer também

sessenta vagas.

Reunida a documentação necessária, teria eu de passar conforme edital, por

uma entrevista com a direção do curso. Naquele tempo, o diretor era o hoje colega

Prof. Eduardo Tavares Mendes atual Procurador de Justiça do Estado de Alagoas) e

vice-diretor, o grande mestre e colega de trabalho Professor José Pereira Neto.

Quando da chegada na antessala, deparo-me com mães e filhos no aguardo

para a entrevista com a direção. Naquele momento, também estava acompanhado

da minha genitora. Ela e as demais mães presentes aparentavam estar cheias de

orgulho com a conquista dos seus filhos.

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Tenho a memória da imagem de um dos colegas do curso, que tinha feito há

poucos meses 17 anos. Minha mãe e eu ficamos admirados com o desempenho

dele. Conforme relatado anteriormente, a concorrência era enorme.

Finalmente, chegou a hora da entrevista. Fomos chamados ao gabinete do

diretor da faculdade e ao abrir-se a porta encontramos com as figuras do diretor

Professor Eduardo Tavares e com o vice-diretor Professor José Pereira Neto.

Confesso que senti certo frio na barriga naquele momento. Como era uma

entrevista que fazia parte do processo seletivo, mesmo confiante, diante de tão

imponentes autoridades senti-me receoso. Situação essa que logo passou dada a

boa receptividade e cordialidade de ambas as autoridades acadêmicas.

Fui de imediato cumprimentado, calorosamente, por ambos e indagado

sobre qual era a imagem que tínhamos do curso, qual a expectativa, qual escola

tinha estudado etc. Respondi aos questionamentos e, em seguida fui autorizado a

fazer a matrícula.

Hoje, compreendo o porquê daquela entrevista. Primeiro, para ser

apresentado às autoridades acadêmicas da faculdade. Segundo, para ser avaliado

psicologicamente. Em que pese não conter no edital exame psicotécnico servia a

entrevista para avaliar se o ingressante aparentemente encontrava-se saudável em

suas faculdades mentais. Mais adiante nesta dissertação falarei sobre o assunto

com acuidade.

Senti-me reconhecido e prestigiado por ser recebido individualmente no

gabinete da direção. Feita a matrícula logo após ter lido o contrato com minha mãe,

fomos embora para aguardar o início das aulas que estava próximo. Não me recordo

em que data teve início minha jornada acadêmica, mas sei que foi nos primeiros dias

do mês de fevereiro de 1999.

Pois bem, chegou o tão aguardado dia. Acordei cedo e fui um dos primeiros

alunos a chegar à faculdade. Havia fixado na entrada do prédio uma faixa dando-nos

boas vindas. O prédio ainda não tinha um movimento acentuado. Também, as aulas

tinham início às 08:10h da manhã e eu tinha chegado às 7:20h. Aos poucos foram

chegando os alunos e funcionários da faculdade e, consequentemente, a dinâmica

tomou conta do ambiente.

Procurei saber com um funcionário onde se localizava a sala do primeiro

período. Depois de informado pelo colaborador me dirigi à sala. Lá chegando,

encontrei com alguns poucos colegas, não recordo quantos. Apresentamo-nos e

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conforme o passar do tempo chegavam os demais colegas, as apresentações

continuavam.

Momento de descontração, alegria e contentamento. Chegada a hora da

aula, a direção da faculdade chegou à nossa sala de aula e nos convidou para

assistirmos no auditório a uma apresentação sobre o curso e sobre a Instituição de

Ensino Superior (CESMAC). Foi-nos feita à apresentação do então presidente da

fundação, hoje reitor Dr. João Rodrigues Sampaio Filho, e do então vice-presidente

Dr. Jayme Ferreira Lustosa de Altavila.

Recebemos uma pasta contendo as informações que estavam sendo dadas

através da fala dos presentes e do vídeo institucional. Ato contínuo, os calouros

foram agraciados com uma palestra proferida pelo diretor da faculdade que tinha

como tema a atuação do profissional do direito.

Dentre os mais diversos temas abordados como justiça, cidadania, Estado,

poderes constituídos, competências, pontualidade, dois dos vários tópicos me

chamaram a atenção. O primeiro tema que me despertou realmente atenção foi

sobre ética profissional e o segundo sobre altruísmo.

Em seu discurso o palestrante ressaltou a importância da ética profissional

em todas as áreas de atuação, principalmente do profissional que milita com a

ciência do direito. O agir corretamente, com lealdade, com probidade diante das

questões que lhes são apresentadas no cotidiano deve ser algo inerente ao

chamado operador do direito.

Na posição de advogado público ou privado no exercício das suas

atribuições, seja como magistrado, ali naquele ato representando a figura do estado

diante das questões postas para a uma solução, seja como membro do Ministério

Público, delegado, defensor público etc.

O outro tema que me chamou a atenção foi que o profissional do direito deve

sempre buscar a harmonia da sociedade pautada na ideia do bem comum. E essa

ideia de bem comum está fundada na coparticipação ativa da sociedade quando

presente a necessidade do próximo (seja de uma pessoa ou grupo de pessoas) e a

correspondente possibilidade do profissional em contribuir para a melhoria de vida

de um indivíduo ou de uma determinada comunidade.

Anteriormente, mencionei que um dos motivos do meu interesse em estudar

direito foi pela possibilidade de ajudar a quem necessitasse de um apoio. Essa

contribuição individual ou em grupo trazia e traz a mim uma satisfação pessoal

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imensurável e a fala do palestrante encaixava perfeitamente com minhas ideias,

convicções e propósitos.

Deixei a palestra com muito entusiasmo; entusiasmo por tudo. No segundo

dia, passamos a ter aulas regulares conforme a matriz curricular existente. Não

havia uma matéria sequer que eu não tivesse interesse em aprender.

Toda a temática concorria positivamente para a leitura do conteúdo

programático das disciplinas ofertadas. Todos os professores muito competentes,

tecnicamente falando, e compromissados com ato de disponibilizar, dividir seus

conhecimentos e práticas adquiridas ao longo de suas respectivas atuações

profissionais.

Dentre as disciplinas propedêuticas estavam Introdução ao estudo do direito

(IED), Direito Romano, Português Forense, Sociologia Jurídica, Economia. Todas

elas muito importantes para a formação inicial do acadêmico no estudo do direito.

Percebi que a leitura era indispensável para o bom andamento de meu curso e era

extensa. Com a leitura dirigida das obras recomendadas e adquiridas, aliadas à

participação nas aulas, percebi logo essa realidade. Cada obra tinha em média

quatrocentas páginas de leitura necessária.

Os docentes após as aulas nos remetiam à leitura constante na bibliografia

obrigatória e complementar. Para alguns colegas que não tinham o hábito de ler

diariamente, aquilo era extremamente penoso. Cada capítulo dos livros tinha em

média de trinta a quarenta laudas. O tema era apresentado e discutido em sala de

aula pelo docente e competia aos alunos a leitura em casa da doutrina e da

legislação respectiva.

Comecei a ler sobre os temas ministrados em sala de aula e percebi que

seria necessário ao menos umas duas horas diárias para acompanhar o conteúdo

ministrado pelos docentes. Se por alguma necessidade eu não pudesse ler em um

dia existia um acúmulo e perda de rendimento na próxima aula.

O conteúdo, para mim, era vasto, mas bastante agradável de ler. Muitos

colegas sentiam dificuldade em ler com regularidade e o aproveitamento de estudo

era deficitário. Seja por não terem o costume de ler, por não compreenderem o que

estava sendo discutido ou por deixarem acumular a leitura necessária. Busquei

organizar meu horário para poder estudar diariamente, de segunda a sexta, com

exceção do fim de semana.

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Constatei, que com a leitura diária, a assimilação do conteúdo ministrado em

sala de aula era maior. As matérias despertavam em mim uma curiosidade enorme

em compreender o conteúdo. À guisa de exemplo, menciono como uma disciplina

interessante que estudei, o Direito Romano.

Em seu conteúdo tive conhecimento do surgimento/origem de diversos

institutos jurídicos, tomei nota de grandes personagens históricos, grandes oradores

como Cícero; foram expostas as primeiras leis como a Lei das Doze Tábuas, os

primeiros códigos como o código de Manu e o de Justiniano, tribunais existentes etc.

Conteúdo indispensável ao estudo do direito e muito importante para conhecermos e

compreendermos sua dinâmica.

Tudo naquela disciplina ministrada com propriedade pelo professor José

Pereira Neto era agradável de ler. A leitura fluía e as horas passavam sem que eu

notasse. O professor, grande entusiasta, fazia com que viajássemos no tempo e

mergulhássemos na leitura.

Certo dia, ele lançou a proposta de, ao invés de juntarmos dinheiro para o

baile de formatura, deveríamos fazer uma viagem em grupo para Roma, na Itália.

Relatava com empolgação o que viu quando foi àquela cidade. Seus olhos brilhavam

ao relatar a viagem e a experiência que teve. Infelizmente, a proposta de viagem em

conjunto não foi acompanhada pela maioria dos formandos.

Falando em decisão por voto da maioria, logo no início das aulas tivemos a

necessidade de fazermos uma votação para eleição de um representante e vice-

representante de turma. O líder (representante) logo foi apontado pela turma. Foi

fácil a escolha, pois o colega de sala naturalmente se mostrou apto a representar

nossos interesses coletivos. O interessante foi que essa liderança surgiu pelo colega

ao se dispor, voluntariamente, a reunir os textos cedidos pelos docentes para

fotocopiá-los.

Resultado, votação da maioria e posterior alcunha dada pelos colegas de

“Xerox”. Até hoje o chamamos assim e a sua condição de representante de turma foi

até o final do curso.

Uma das primeiras tarefas deste representante foi organizar a nossa

inscrição em um curso de oratória realizado na Casa da Palavra, um espaço voltado

à cultura e aos intelectuais alagoanos. Tem como presidente um culto médico e

escritor alagoano. A receptividade dos colegas em fazer o curso foi muito boa.

Quase todos fizeram a inscrição.

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No intitulado curso de oratória, aprendi a me portar diante de uma platéia de

desconhecidos; a me dirigir usando da palavra falada a autoridades em eventos

formais. Muito enriquecedora a experiência. O curso teve duração de cinco dias,

com carga horária total de vinte horas.

Era realizado no turno vespertino. Lembro-me, que no primeiro dia o

palestrante que era o proprietário da casa, ele fez um discurso/aula muito rico sobre

cultura geral. Foi-nos concedido um passeio sobre a origem do homem, o

desenvolvimento deste na sociedade, na ciência, na política, nas artes.

Desde grandes pensadores como Sócrates, Platão, Pitágoras; escritores

famosos das mais diversas áreas nacionais e internacionais, como Eça de Queirós,

William Shakespeare, Aurélio Buarque de Holanda, Pontes de Miranda, Danti

Alighieri, Machado de Assis, Luis de Camões, Monteiro Lobato, passando por

pessoas mundialmente conhecidas e reconhecidas por seus feitos admiráveis como

Leonardo da Vinci, Einstein, Oscar Niemeyer, Mozart, Chopin, Tom Jobim, Santos

Dumont e como não poderia deixar de ser, pois era o propósito do curso, grandes

oradores da Humanidade, como Jesus Cristo, Cícero, Carlos Lacerda, Rui Barbosa

etc.

Nos dias seguintes fui apresentado a técnicas muito preciosas de oratória

para se chegar a um rendimento tido como satisfatório. Havia simulação inclusive

com filmagem de uma entrevista a ser dada a qualquer dos diversos veículos de

informação. Foram momentos de descontração, porém respeitosos, que todos os

participantes tiveram quando os colegas enfrentaram a tribuna.

O resultado é que quando tive de apresentar meus trabalhos em sala de

aula o rendimento foi considerado bom. Os professores ficavam muito satisfeitos

com minha postura e desenvolvimento dos trabalhos.

Passados alguns dias de aula na faculdade começa a formação de grupos

por diversos fatores, dentre eles semelhança de propósitos, interesses. Busquei

sempre ter em sala uma postura condizente com a de um acadêmico de direito.

Deparava-me com situações no dia-a-dia que não esperava num curso superior.

Alguns colegas agiam como se estivessem ainda no colégio, tanto em relação aos

pares como em relação aos docentes, curso etc.

Como era complicado o colega representante de turma dar um recado. Por

vezes era conturbado poder tratar de questões tão simples. Se o grau de maturidade

fosse maior entre os alunos seria mais fácil lidar com questões rotineiras. Quando o

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docente deixava para a turma decidir a data da avaliação eram constantes as

discussões.

Naquele ano, eu acabara de completar vinte e dois anos. Já havia tido uma

experiência em curso superior conforme dito antes e não vivenciara discussões tão

banais. Bom, com o tempo tudo foi melhorando.

Na proximidade das provas, recebi um convite de um colega para estudar

com ele em sua residência. À época ainda trabalhava na agência de carros que

anteriormente comentei. O proprietário não criou óbice algum por conta de minha

ausência no turno matutino, pois não gerava nenhum prejuízo a ele. O fato é que

trabalhava sem carteira assinada e o salário era o fruto exclusivo das comissões

relativas às vendas efetuadas.

Com isso, pude sair alguns dias no turno vespertino para estudar com o

colega que morava próximo. A experiência foi muito boa. Partíamos de uma leitura

prévia e, posteriormente, discutíamos o que foi lido anteriormente e o que foi

ministrado pelos docentes em sala de aula. Os apontamentos feitos nos cadernos

eram outra fonte de estudo.

O colega era muito disciplinado. Confesso que me via às vezes querendo ir

embora para minha casa dado o cansaço gerado pelo acúmulo de atividades.

Trabalhar e estudar exige muita força de vontade, perseverança, foco. A proposta do

colega em estudarmos juntos gerou frutos positivos tanto nas avaliações curriculares

a que éramos submetidos como na assimilação do que era transmitido pelos

docentes em sala de aula.

O estudo regular, o habito diário da leitura me trouxe uma realidade que não

existia em minha vida. Conseguia ter uma melhor concentração quando me

predispunha a estudar. Apreendi que, com o passar do tempo, a qualidade da leitura

estava nitidamente atrelada à prática diante das inúmeras condições e das

interferências externas que repercutem no bom andamento do trabalho.

Falo trabalho, pois entendo que estudar pressupõe dispêndio de energia,

tempo. Passei a ler nas horas em que não havia no pátio da loja clientes para

atender. Tratava-se de uma ocasião com pequenos espaços de tempo. No começo

era bastante complicado tendo em vista que dividia a sala com outros dois colegas

vendedores.

Esses ou conversavam entre si pessoalmente ou via telefone com clientes,

amigos, familiares, gerentes, tornando o ambiente não muito propício para alguém

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que gostaria e precisava ler. Essa interferência acarretada pela dinâmica da minha

atividade laboral fez com que, de início, eu encontrasse uma dificuldade em fazer

uma leitura que trouxesse bons resultados.

Entretanto, com o passar do tempo fui conseguindo abstrair o que se

passava ao redor criando uma espécie de competência para leitura em ambientes

não favoráveis à concentração. Por vezes, os colegas brincavam comigo e

chamavam-me a atenção por conta do bloqueio com o mundo externo gerado pela

minha concentração na leitura.

Às vezes, diziam que eu estava louco, pois do nada eu sorria ou entrava na

conversa deles atento sobre o assunto/tema com o que estavam falando. O ato de

fazer a leitura, perceber se estava entrando na loja algum cliente e aliado a isso

tudo, se era a minha vez de atender, criou em mim como disse antes uma

competência inexistente.

Em algumas aulas, os docentes, ainda no primeiro período, traziam algum

texto para leitura em sala de aula. Leitura na sua maioria feita após a divisão da sala

em grupos. Mais uma vez percebia que diante dos outros alunos tinha alcançado

com a prática diária uma condição de concentração na leitura que a maioria dos

pares não obtinha.

Por vezes, os colegas solicitavam ao orientador de classe a saída da sala de

aula para lerem o texto no pátio da faculdade, aduzindo que com o barulho gerado

pela conversa dos outros grupos eles não conseguiriam se concentrar e produzir.

Os que permaneciam em sala de aula, na maioria dos casos, não chegavam

a terminar a análise dos textos propostos para discussão posterior e ficavam a

conversar sobre outros assuntos que não guardavam correlação com o conteúdo da

disciplina.

No momento em que alguns dos docentes apresentavam essa modalidade

de aula pautada na discussão de textos, ouvia-se com frequência os alunos dizerem

que aquilo era um artifício do professor que não queria ministrar aula. Mal sabiam

que sem a leitura prévia não havia como existir discussão.

Muitos colegas não tinham o hábito de ler e estavam acostumados ao

modelo de aulas expositivas em que os docentes ministravam o conteúdo da matéria

sem indagar aos alunos o que eles entendiam sobre o assunto. Ao tempo, a visão

dos colegas era que professor bom ou matéria bacana eram as que tratavam sobre

o conteúdo das leis e casuística.

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Percebi uma grande rejeição nas matérias ditas propedêuticas. De certo

modo, também tive dificuldade com o estudo da filosofia. Ressalto que na época da

escola não tínhamos como disciplina o estudo da filosofia, antropologia, sociologia o

que me trouxe/desencadeou dificuldade na compreensão do assunto.

O nosso professor da disciplina Fundamentos das Ciências Sociais tinha

larga experiência docente, idade avançada, muito conhecimento teórico, contudo,

tinha a voz comprometida por anos de sala de aula. Resultado, o desinteresse em

tais conteúdos pela turma era enorme.

Como sempre sentei nas primeiras cadeiras ouvia seu discurso e

compreendia bem o que era ministrado. Era uma boa aula, a experiência de vida

daquele docente passava até pelo fato de ter sido torturado na época da ditadura

militar. Com riqueza de detalhes nos relatava os acontecimentos. Conhecia a

história política do Brasil com propriedade e saltava aos nossos olhos sua

competência no discurso.

Outro docente que contribuiu para nosso crescimento profissional e também

encontrava dificuldade na aceitação pelos alunos – gerada mais uma vez por

limitações físicas creio – era o professor da disciplina Teoria Econômica Aplicada ao

Direito, um paulista de uns sessenta e cinco anos de idade, que havia estudado

engenharia e obtido o título de mestre em uma Universidade, que por hora não

recordo o nome, situada no Estado de São Paulo. Fato interessante é que foi um

dos poucos docentes do curso que tinham uma titulação acadêmica strictu sensu.

Naquele momento de minha vida eu nem sabia a distinção acadêmica entre

mestre e doutor. O que chamava minha atenção era o ânimo daquele docente, bem

como o seu discurso rico em conteúdo. Disposição acima de tudo, pois o mesmo era

portador de glaucoma e tinha algum desvio na coluna. Por essa limitação física,

mesmo possuindo carro, ele utilizava-se do transporte público para ir à faculdade.

Presenciei o fato de ele estar no ponto de ônibus várias vezes. Ele morava

em um prédio vizinho ao que residia. Fiquei em vários momentos chateado com

alguns colegas que insistiam em dizer que ele não utilizava o carro para ir à

faculdade dada a sua condição voluntária de miserável no sentido de avareza.

Na visão deles, como era professor de economia, queria economizar

fazendo uso do transporte coletivo. Um colega meu da escola (científico) e vizinho

de porta desse professor, disse-me, certa vez, que ele era divorciado e vivia

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sozinho. Acredito que ele utilizava o transporte coletivo por não ter condições de

pagar um motorista particular.

Nem por isso chegava atrasado ou faltava às aulas. Sempre solícito às

indagações feitas por mim e pelos colegas, demonstrava satisfação ao discutir sobre

o assunto. Pena que já não mais ensina visto que a limitação física (glaucoma)

avançou para uma condição de quase cegueira. Tive o privilégio de ser aluno dele

por dois semestres consecutivos.

Quanto à pontualidade e à assiduidade dos professores, faço questão de

ressaltar o fato que foi constante durante o curso a problemática acerca desses dois

pontos (pontualidade e assiduidade). Mais adiante relatarei os acontecimentos

relevantes ligados ao tema.

Fato é que continuava feliz e disposto no fim do primeiro e segundo

semestres. Obtive aprovação em todas as disciplinas ditas propedêuticas. Continuei

a estudar com o colega, em casa e no trabalho. O que mudou foi o fato de ter saído

da loja que trabalhava.

Após ter passado dois meses sem receber minhas comissões (salário) sem

existir justificativa, sem ter recebido qualquer advertência decidi não mais continuar

laborando na empresa e ao final do expediente de uma tarde de sábado, recolhi meu

pertences e não voltei mais a loja. O relatado se deu na metade do segundo

semestre de 1999, creio que no final do mês de outubro. Estava cursando o segundo

período.

Na segunda-feira, comuniquei aos colegas de trabalho de que não retornaria

ao trabalho, eles ficaram chateados com o ocorrido e foram solidários. Após o fato,

não recebi nenhuma ligação do setor de gestão de pessoas da empresa, muito

menos do proprietário.

Relatei o fato aos advogados que conhecia e convivia e fui orientado pelos

mesmos à época, citados anteriormente, a buscar os serviços de um advogado

especialista para saber quais seriam os meus direitos trabalhistas.

Essa situação me fez pesquisar sobre o Direito do Trabalho, disciplina que

até então não havia sido objeto de estudo na faculdade. Só passaria a estudar tal

matéria a partir do quarto período conforme dispunha a matriz curricular em vigor.

O advogado fez uma abordagem objetiva de quais seriam esses direitos e

preparou uma procuração para eu assinar. Assinei e fiquei no aguardo do dia da

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primeira audiência em umas das Juntas de Conciliação e Julgamento na Justiça do

Trabalho, hoje denominadas Varas do Trabalho.

Gostei bastante da forma como fui atendido pelo advogado e de suas

explicações técnicas. Mais ainda por estar buscando a tutela estatal, meus direitos,

por meio do poder judiciário especializado. O que havia estudado até então sobre

normas sociais, direitos subjetivos, sanções, estava se materializando, saindo da

abstração para incidir sobre o caso concreto.

Designada a data e hora da audiência de conciliação (aproximadamente um

mês após o afastamento) fui ao fórum trabalhista. Chegando lá encontrei com o

advogado e disse que a nossa audiência estava próxima. Fiquei atento a todos os

detalhes.

Como era a sala de audiência (posição dos móveis, lugar em que ficavam e

sentavam as partes, advogados, os juízes – ao tempo existiam dois juízes na sala:

um juiz togado e um classista no final do seu mandato), quantas e que pessoas

trabalhavam, vi onde funcionava a secretaria da vara, como era o procedimento de

chamada para a audiência (pregão).

Percebi que naquele ambiente existiam pessoas de todas as classes sociais

aguardando a vez de serem convocadas à audiência: advogados, prepostos,

testemunhas, estagiários. Era intrigante a forma como os litigantes olhavam ou

deixavam de olhar uns para os outros. O nervosismo conforme disse meu advogado

era gerado por estarem diante de um juiz ou por conta da insatisfação de estarem

dividindo o mesmo ambiente. Alguns saiam das audiências tristes, outros sorrindo

dependendo do resultado.

A partir do momento que não entendia os procedimentos e funcionamento

da Justiça do Trabalho indagava ao advogado. Este foi bastante generoso e

respondia aos meus questionamentos. Percebi que chegou a preposta da empresa e

o advogado. Fomos chamados pelo sistema de som.

Nessa audiência inaugural, foi aberta pelo magistrado a proposta de

conciliação, sendo rejeitada pela empresa. A tese deles era a de negativa de

vínculo. Restando infrutífera a conciliação, foi designada a próxima audiência, essa

de instrução para menos de um mês após a primeira.

No dia, retornei ao fórum trabalhista na hora designada e fui recebido por

meu advogado. Este explicando quais os procedimentos de uma instrução

trabalhista falou das vantagens e desvantagens de fazer ou não um acordo. Tratava-

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se de um advogado experiente e acredito seria um bom professor caso resolvesse

enfrentar tal desafio. Ao menos aparentava, dada a sua paciência e gosto em

explicar os direitos e procedimentos legais no processo.

Na instrução esteve presente o advogado e o dono da empresa. Após o

chamado sentamos diante do juiz e do analista judiciário (escrivão). Novamente o

magistrado apresentou proposta de conciliação, informando ao reclamado

(empresário) que seria melhor inclusive para ele, pois a tese era de negativa de

vínculo. Este com ar irônico respondera positivamente, que tinha pensado em uma

proposta em pagar a quantia de R$ 800,00 (oitocentos reais) em duas parcelas.

Fui indagado pelo juiz se eu tinha interesse na proposta ou em fazer um

acordo e eu conforme conversa anterior com meu advogado disse que faria um

acordo desde que ele atendesse ao meu pedido. Meu advogado fez a

contraproposta de ser pago R$ 3.000,00 (três mil reais) visto que só de comissão em

dois meses eu faria jus ao valor de R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais).

O resultado foi que fizemos um acordo e neste constava que a empresa

deveria assinar minha carteira profissional. Após isso, “dar baixa” na carteira para

liberar as guias de seguro desemprego. Além disso, recebi a importância de R$

2.000,00 (dois mil reais) em duas parcelas; uma no ato do acordo e outra para ser

depositada e comprovada em trinta dias via depósito judicial.

Ficou acordado também que a empresa pagaria os honorários advocatícios

e que se a empresa não cumprisse na data acordada com o pagamento da segunda

parcela haveria a incidência de uma multa de 100% sobre o valor a ser pago.

Um mês após o acordo celebrado e homologado, diante do magistrado do

trabalho fui receber e a preposta da empresa chegou faltando cinco minutos para

acabar o prazo. Com a guia de seguro desemprego e a baixa na carteira de trabalho

(CTPS) dirigi-me à Caixa Econômica Federal para dar entrada na solicitação do

pagamento.

Tudo aquilo que vivi a assimilei trouxe uma contribuição positiva para minha

formação acadêmica e pessoal. Vivenciar, sentir na pele fez a diferença quando

retornei às aulas na faculdade. Nesse meio termo, recebi e aceitei convite para

trabalhar em outra loja de veículos, agora bem próxima a minha residência.

Continuei, portanto, estudando e trabalhando.

O trabalho já havia se tornado algo necessário para mim. Não por ter

necessidade de trabalhar para viver, mas para poder adquirir certa autonomia

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financeira, respeitabilidade social, sentir-me útil. Já não pedia dinheiro aos meus

pais para sair com a namorada, comprar uma roupa legal, presentear a quem eu

quisesse, trocar de carro etc.

Conforme já dito antes, a atuação profissional apresentava para mim um

mundo em constante mudança com uma dinâmica e abrangência incrível. Afinal de

contas estávamos vivenciando a virada do milênio. Passávamos a ter a ideia do que

era o mundo diante da globalização com o rompimento de fronteiras antes

limitadoras.

No terceiro período do curso, no ano 2000, começamos a estudar Direito

Penal, Direito Civil, Direito Constitucional, Ciências Políticas. O estudo dessas

disciplinas trouxe-me um novo e cada vez mais ascendente interesse pela leitura.

Digo isso, pois, apesar de gostar das matérias propedêuticas, o primeiro contato

com o Direito Penal, por exemplo, é algo que fascina o acadêmico de direito.

Estudar a figura do crime, do criminoso e o papel do Estado diante de tais

acontecimentos é bastante gratificante, pois a todo o momento estamos diante de

notícias que abordam a prática de condutas tipificadas pela norma jurídica. A

violência (lesão) às pessoas, ao patrimônio individual e coletivo é uma constante.

Não menos gratificante, interessante ou importante foi o estudo da Teoria

Geral da Constituição. Estudar os desígnios da Constituição da República

Federativa do Brasil, qual nossa forma de estado e de governo, torna-se condição

mínima para compreendermos qual o seu sentido e alcance.

Conhecer seus princípios fundamentais, os direitos e garantias

fundamentais, os direitos sociais, os direitos políticos, a organização do Estado, a

organização dos Poderes etc. deveria ser matéria obrigatória nas escolas. Ao menos

noções de Direito Constitucional.

Estudar Direito Civil, seus princípios, sua abrangência foi tarefa prazerosa.

Tão grande é a abrangência dessa disciplina na vida das pessoas em seus direitos

subjetivos que trata desde os direitos conferidos ao nascituro até os atos de

disposição de última vontade que devem ser respeitados após a morte do declarante

(testamento).

Para mim, as aulas eram impecáveis. Quanto aos docentes, mais uma vez

fomos, a meu ver, agraciados com a contribuição relevante de seus ensinamentos.

Tivemos como docentes, um promotor de justiça (Direito Penal), dois advogados

(Direito Civil e Direito Constitucional) e uma juíza (Ciências Políticas).

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Ressalto que a juíza foi a que me referi no primeiro capítulo (juíza eleitoral),

quando estava ainda adolescente descobrindo quais as atribuições dos profissionais

que militam com o direito. Foi uma surpresa e tanto. Ao tempo ela estava em um

programa de Mestrado em uma Universidade de Lisboa/Portugal. No momento se

encontra doutoranda em Direito na mesma Universidade.

Senti falta de uma biblioteca setorial atualizada e espaços reservados para

leitura. Existia uma biblioteca, contudo, não era no prédio em que estudávamos. Tão

pouco atendia a demanda. Naquele tempo (ano 2000), não era comum aqui no

estado de Alagoas as faculdades disponibilizarem computadores para aos alunos.

Muito menos com acesso a rede mundial (internet).

Estudei com os livros que adquiri ou solicitei aos colegas mais adiantados no

curso. Tive sorte de utilizar os livros que meu pai havia comprado, já que ele era

acadêmico de Direito da mesma IES, só que em turno diferente (noturno). Quanto

aos livros, não tiveram muito do que se queixar os colegas que estudavam na

Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Lá o acervo era maior. Alguns colegas da

faculdade tomavam emprestados livros da UFAL. Problema é que a UFAL ficava

muito distante da minha residência.

Sobre carência da nossa IES, não fui agraciado com a possibilidade de

conhecer sobre a pesquisa jurídica na graduação. O fato era que não tínhamos uma

cultura de professores pesquisadores na IES. Os docentes que ministravam aulas

não conheciam na sua maioria a pesquisa.

Não era hábito escreverem artigos, ensaios ou publicarem livros. As

atividades realizadas pelos docentes fora da aula consistiam em dar palestras e

visitar órgãos públicos.

Relato o fato não criticando a IES que estudei, mais informando que essa

era uma característica dos cursos de direito nas faculdades privadas do nordeste.

Basta dizer que não existia em Alagoas um Programa de Mestrado em Direito.

Passei o curso quase todo sem me dar conta do que era uma pesquisa. Do

que era um artigo científico, iniciação científica, nem mesmo monitoria. Certa vez, o

colega que estudava comigo falou que um amigo dele era monitor do professor

Marcos Bernardes de Melo, na UFAL.

Disse-me inclusive que o aluno monitor ganhava uma bolsa de estudos.

Perguntei do que se tratava, tamanho era o desconhecimento. Aquilo era uma

realidade nas Universidades, para nós não.

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Mais uma vez, obtive aprovação em todas as disciplinas e passara ao quarto

período. Deparei-me no quarto período com um docente chamado Fernando Sérgio

Tenório de Amorim, professor que tinha como forma de estímulo ao estudo da

matéria uma retomada da matéria dada na aula anterior através de

questionamentos.

Quando o docente fazia perguntas aos alunos individualmente ou ao grupo e

não obtinha as respostas desejadas ele não seguia com o conteúdo da aula do dia.

Ficou no início por vezes chateado com a turma quando não percebia nos alunos

que a leitura dirigida havia sido realizada. A matéria não era das mais fáceis de

compreender, por conta do conteúdo lógico, e abstrato. A disciplina era Direito Civil

(Teoria Geral das Obrigações).

Gostei da matéria e percebi que aquela postura do docente em cobrar dos

alunos a leitura era positiva. O docente com aquela atitude, a meu ver, mostrava

interesse no aprendizado da matéria. Falava que o resultado de um curso de Direito

não poderia ser positivo ou satisfatório sem leitura constante. Aluno que não levasse

a legislação necessária (Código Civil Brasileiro) para acompanhamento da aula por

vezes eram chamados a atenção.

Realmente, a matéria necessitava de um acompanhamento do disposto no

texto da lei. Sem ela, o discente ficava impossibilitado de analisar o conteúdo dos

artigos e, consequentemente, toda ou qualquer interpretação do que estava contido,

o sentido e o alcance da norma estava comprometido.

Com o transcorrer do curso, aquele método do professor foi bem

interpretado pelos discentes. Ele conseguiu transmitir aos alunos que havia uma

preocupação com o rendimento de cada um deles. E os frutos foram positivos. Tudo

correu bem, inclusive tive o privilégio de estudar no semestre seguinte com ele a

disciplina Direito Civil III (Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie).

Dentre as novas disciplinas neste período estavam: Direito do Trabalho e

Direito Processual Civil. Como esperado fiquei encantado com a primeira. A matéria

foi ministrada pelo então Juiz do Trabalho, hoje Desembargador Federal do Tribunal

Regional do trabalho da 19ª região Dr. Adrualdo Catão.

Fora o conteúdo ministrado com muita propriedade pelo docente, marcou-

me a visita que fizemos à Vara do Trabalho em que esse docente era titular. Todos

nós, alunos, fomos convidados a irmos presenciar o funcionamento da Vara do

Trabalho.

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Foi dividida a sala em dois grupos para a visitação. Não era possível receber

todos os 60 (sessenta) alunos de uma única vez. O professor recebeu por ordem de

chamada. Primeiro os 30 (trinta) alunos, depois os demais. No relatado, já havia

estado antes naquele mesmo fórum trabalhista, mas não entrado no gabinete do

juiz, na secretaria, na sala em que ficavam os analistas, técnicos judiciários e

estagiários.

Em dado momento, o professor magistrado apresentou, após os servidores

os estagiários (acadêmicos do curso de Direito que analisavam os processos e

auxiliavam o Juiz). De pronto, perguntei como poderia ser um estagiário. Ele

informou que era através de uma seleção aberta, via edital que era publicado ( como

eu no 4º período não sabia disso?). Foi decepcionante obter a informação de que só

poderia concorrer a uma vaga depois de terminar o 6º período.

A justificativa era de que eu não havia ainda estudado todo o Direito Material

do Trabalho nem ao menos iniciado o estudo do Processo do Trabalho. Só seria

possível contribuir, auxiliar o magistrado, após a conclusão do estudo do Direito e do

Processo do Trabalho, isto é, quando estivesse no 7º período no mínimo. Do

contrário só aprenderia a fazer os atos do cartório. Não que não fossem importantes

os atos cartorários, mas como a atividade do estágio consistia em fazer o que os

magistrados fazem, não seria a melhor oportunidade para estágio.

Saí de lá satisfeito com o que presenciei e aprendi, mas querendo trabalhar

no fórum. Com muita vontade de aprender, frequentar o ambiente em que em um

futuro próximo eu viveria. Relatei o fato ao meu pai e perguntei se seria bom naquele

momento largar o trabalho de vendedor de carro para poder estagiar em algum

órgão público. Como existe uma bolsa, no valor de um salário mínimo, na maioria

dos estágios, ele me incentivou a tentar uma vaga.

Naquele tempo, meu pai estava saindo de um estágio no Fórum da Justiça

Comum da Capital. Estagiava em uma Vara de Família. Conforme conversa que

tivemos, afirmou que aprendeu muito no estágio. Pensei, vou atrás do meu. Procurei

informações na faculdade de quando ocorriam as provas e a partir de quando eu

poderia concorrer.

Obtive resposta que estavam abertas as inscrições para a seleção de

estágio no Fórum da Capital. No edital, havia a informação que poderia ser

estagiário o aluno matriculado no segundo ano do curso sem ter perdido nenhuma

disciplina. Naquele instante preenchia os requisitos e fiz a inscrição. Não foi uma

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prova complicada. Abordava pontos mínimos, elementares (noções de Direito Civil,

Direito Constitucional e Direito penal).

Fui aprovado e deixei o trabalho na loja como vendedor de carros (também

denominado consultor de vendas). Em dois anos e meio naquela atividade, aprendi

como comprar e vender veículos. Tomei a decisão de vender o meu carro e passar a

comprar e vender carros com o capital obtido com a venda dele. O bom foi que eu

não precisava mais ficar na loja. Comprava e vendia meus carros através de

anúncios no jornal.

Quando fui me apresentar no fórum, soube que estava lotado na antiga 17ª

Vara da Fazenda Estadual. Eu nem imaginava qual era a competência tinha.

Cheguei lá e fui apresentado à escrivã, escrevente e estagiárias. Detalhe, o juiz

estava de licença remunerada por conta do Mestrado em direito que fazia na

Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Tive a informação de que havia um juiz substituto que não ficava na 17ª

vara. Era titular de outra vara no mesmo Fórum. Lembro-me que a vara era Cível de

Feitos Não Privativos. Resultado, quem iria me orientar no estágio? Eis a questão.

Outro detalhe, eu não tinha a menor noção do conteúdo dos processos a serem

analisados por aquela Vara Especializada.

Direito Administrativo, Tributário, Processual Civil (execução) só era visto no

final do curso (7º, 8º e 9º períodos). Eu estava saindo do quarto período e indo para

o quinto. As estagiárias estavam no 8º e 9º períodos. Eram alunas do magistrado

titular da vara, uma discente do CESMAC e outra da UFAL. Ele já havia passado as

instruções, orientado-as antes de sair. Elas eram muito dedicadas, mas não havia

tempo para parar e ensinar a mim a matéria.

Só me coube fazer tarefas de organizar processos. Ainda tentei ler e

compreender o conteúdo, sem sucesso. Percebi que eram raríssimas quaisquer

audiências de instrução. Tentei mudar para outra Vara que tratasse do conteúdo que

estava estudando, como Direito Penal e Direito Civil (contratos). Sem sucesso.

A solução foi aproveitar aqueles momentos ociosos para estudar as matérias

do período que estava cursando. Por um lado foi muito bom para mim, pois eu ficava

estudando de segunda a sexta-feira, no turno vespertino.Como resultado as minhas

notas melhoraram.

Assim, passei o 4º e o 5º períodos até completar um ano de estágio sem

conhecer pessoalmente o juiz titular. Até a presente data não fui buscar o

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documento que comprova que por lá passei um ano de estágio e foi feita uma

avaliação do meu desempenho pelo juiz.

Com o fim do estágio passei a ficar livre para estudar em casa no turno da

tarde e da noite. Passava o tempo dividido entre acompanhar os advogados pais de

minha namorada à época, estudando em casa e vendendo e comprando carros.

Nessa fase de 6º período comecei a estudar o Direito de Família, Processo

Penal e Processo do Trabalho. Período com um conteúdo grande e importante para

estudar. Caso o aluno não compreendesse bem as disciplinas, sentiria bastante

dificuldade no estudo das demais.

Basta dizer que após o término do 6º período, o acadêmico já conhecia o

conteúdo necessário para poder auxiliar um advogado trabalhista, Procurador do

Trabalho ou Magistrado do Trabalho. A única matéria que estava faltando estudar

em Direito do Trabalho era Prática Jurídica Trabalhista. Matéria essa ofertada

somente no 10º período do curso.

Encontrava-me apto naquele momento para submeter-me à seleção de

estagiários do Tribunal Regional do Trabalho. Fato que não aconteceu. Estava

envolvido com o Direito de Família e o Direito Penal. Tive muita facilidade na

assimilação dos conteúdos do Direito Civil (família), Direito Penal e do Processo

Penal. A leitura era frequente e o entusiasmo também.

Uma questão interessante era não existirem barreiras em áreas de

concentração diversas (direito privado e direito público), algo que fizesse dedicar

mais tempo, atenção a uma disciplina. Toda temática era muito atual e importante na

vida das pessoas, na sociedade. Tudo se interligava, Direito de Família, Direito da

Infância e da Juventude, Direito Penal.

Assim, certa vez deparei-me com uma questão familiar que desencadeou

um episódio de natureza penal. Por conta da dissolução da sociedade conjugal

(observado o direito potestativo da esposa em não mais querer conviver com o

cônjuge), existiu uma ameaça feita pelo cônjuge, aduzindo que se a encontrasse

com outro mataria os dois.

A cidadã não aguentou conviver acuada pelo marido e decidiu romper com a

relação, culminando com o pedido de divórcio litigioso. O ciúme era enorme e

patológico. O detalhe era que mesmo a relação tendo chegado ao fim a mais de um

ano as ameaças não cessavam.

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Os acessos de ciúmes chegaram ao ponto de, em público, o ex-marido

(comumente embriagado) fazer ameaças dizendo que se ela não voltasse para ele a

mataria, mataria a prole e, em seguida, cometeria suicídio.

A solução foi buscar o auxílio da força policial e judiciária para assegurar o

direito de ter a integridade física da mulher e da prole preservada. Igualmente, foi

necessário o pedido judicial de afastamento do genitor dos menores para preservá-

los, suspendendo o que foi regulamentado no processo de divórcio (direito de visita).

Era comum nas primeiras páginas ou páginas policiais de jornais de grande

circulação, televisão, sites, depararmo-nos com manchetes relatando situações

semelhantes que acabaram em tragédia (crimes passionais). Desse modo, o estudo

de tais disciplinas tornava-se esclarecedor.

Saber o que estava acontecendo, o que poderia acontecer, quais as

competências das autoridades, os direitos dos acusados de crimes, e acima de tudo

os direitos das vítimas, levava-me ao estudo dos casos divulgados nas mídias e que

eram levados ao escritório.

A discussão sobre esses acontecimentos em sala de aula era constante. Por

vezes, os docentes comentavam os casos em que existia uma interpretação

equivocada de outros profissionais. Argumentavam que a tese do advogado estava

equivocada. Que o Magistrado julgou correta ou equivocadamente. Que o volume de

provas não era o suficiente para a prisão de alguém, ou que a prova foi obtida de

forma contrária ao direito.

Não só em sala de aula, mas nos corredores da faculdade, em casa com os

familiares, nos momentos de lazer com os amigos, a discussão era muito

interessante. Tinha verdadeiro entusiasmo em explicar aos não estudantes de direito

o que estava acontecendo em processos famosos, com repercussão nacional e até

internacional.

Confesso que naquele momento já estava achando que entendia do

assunto. O interessante era que acreditava e concordava piamente nos argumentos

dos professores. Se o professor dissesse, quem iria contestar? Por vezes, ouvia

professores advogados dizendo que juízes não sabiam direito, que não foram felizes

em relação a alguma decisão. Que não julgavam conforme o direito. Fato que era

confirmado por alguns docentes promotores de justiça.

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Proporcionalmente era maior o número de professores promotores de justiça

e advogados. De certa maneira, isso fazia com que eu fosse influenciado em

analisar os fatos com olhos de advogado ou promotor de justiça.

Gostava de assistir programas policiais locais e nacionais. O fato de o

advogado criminalista que acompanhava o caso ter sido delegado federal me fazia

perceber as duas faces da moeda. De um lado, a experiência e a perspectiva de um

policial de alto gabarito na busca por retirar de circulação meliantes de alto poder

lesivo à sociedade e, de outro, a mesma pessoa agindo agora na posição de

advogado de defesa.

Foi nessa época que percebi que o advogado poderia agir como assistente

de acusação em um processo. Quando estava no 4º ano do curso, um professor que

era advogado criminalista contribuiu bastante com meus estudos do processo penal.

Tratava-se de um professor que iniciara sua atividade docente lecionando

matemática. Era reconhecido no estado como um bom professor de matemática,

mas havia se formado em direito e começou a atuar como advogado e professor de

direito e processo penal.

Aquele tinha o dom da oratória e uma eloquência admirável. Não era à toa

que sempre era requisitado e cotado para atuar no tribunal do júri. Seja na função de

advogado de defesa ou na de assistente de acusação. Falando em tribunal do júri,

ainda nesse ano, quando estava no 8º período, recebi na sala de aula a visita de um

juiz de direito fazendo o convite para que fôssemos fazer parte do conselho de

sentença do tribunal do júri. Estava ele em busca de voluntários acadêmicos de

direito.

Fez a apresentação em relação às vantagens de tal função pública e,

posteriormente, o convite. Já havia estudado a figura do tribunal do júri e conhecia

os benefícios, sem, contudo, ter pensado na possibilidade de ser um dos membros

do conselho de sentença. No dia pensei, será uma ótima oportunidade de conhecer

o que acontece por dentro, o que se passa na mente de um jurado. Então decidi

fazer a inscrição.

Quando menos espero, poucos meses depois, recebo uma convocação para

me apresentar diante do juiz para o sorteio do conselho de sentença em um

processo de competência daquele tribunal. Reconheço que veio logo em mente

certa insegurança, a reflexão acerca da minha competência para votar pela

condenação ou absolvição de um réu.

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Fui recomendado a assistir a um filme norte-americano que aborda o tema

do tribunal do júri: Doze homens e uma sentença. O filme relata o que se passa em

uma sala pequena e sem ventilação, em que o veredicto será pela condenação ou

absolvição do réu a cadeira elétrica. A discussão é acalorada e tensa em todos os

sentidos. Trouxe-me uma nova perspectiva em relação à função do jurado. Por

vezes, somos induzidos na dúvida a condenar alguém.

Na análise do fato de ter sido convocado, apresentei-me no dia e hora

designados e aguardei a hora do sorteio. Primeiro são colocados os nomes dos 21

convocados ao conselho de sentença, dos quais são sorteados sete jurados

presentes.

Resultado disso, fui sorteado para ser um dos membros do conselho de

sentença. O acusado era um soldado da polícia militar do Estado de Alagoas. A

vítima era um homossexual. O promotor de justiça havia sido o meu professor de

Direito Romano II.

A experiência foi bastante positiva e esclarecedora. As atuações dos

profissionais, advogado (defensor público), promotor e juiz foram bem

esclarecedoras a cada momento que se apresentavam. Todos se dirigiam aos

jurados explicando cada procedimento, cada etapa e o conteúdo do processo, visto

que não é necessária a formação jurídica para atuar como membro do conselho de

sentença.

Não era um caso que tinha causado um clamor público, uma comoção

social. Na platéia, estavam presentes alguns acadêmicos de direito, alguns poucos

familiares do acusado e da vítima. No caso em tela, o próprio membro do ministério

público pediu a absolvição do réu por falta robusta de indícios e provas de autoria. O

entendimento do conselho de sentença após os quesitos formulados pelo

magistrado foi pela absolvição do réu.

Em outros júris fui convocado, em alguns participei, em outros não fui

sorteado. Fiz parte do grupo (corpo de jurados) até concluir o curso. Naquele

instante do curso de direito estava bastante envolvido com o Direito Penal, mas

presenciei a dissolução da sociedade conjugal e profissional do casal de advogados

que convivia. Resultado disso, acabei por procurar um estágio na IES em que era

aluno.

Tive a informação de que já ocorrera um processo seletivo para estágio no

escritório modelo da IES e não havia mais vagas nem para voluntários. Até a

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seleção não foi divulgada em sala de aula. Alguns colegas de sala que souberam da

seleção sonegaram a informação.

A estrutura do escritório era muito carente. O estágio curricular fez falta para

minha formação acadêmica. Digo isso, pois, se ao tempo eu tivesse continuado com

a prática real (agora dentro da faculdade) teria um melhor aproveitamento no estudo

das disciplinas práticas.

Procurei estagiar em alguns escritórios jurídicos de grande e médio porte

mais não obtive sucesso uma vez que exigiam horário comercial. Como estudava no

turno matutino encontrei dificuldade inclusive em órgãos públicos. A solução foi me

dedicar exclusivamente aos estudos das disciplinas oferecidas na faculdade.

De certo modo, aquela situação foi positiva para mim. Algumas matérias

importantes como Direito Administrativo, Direito Tributário, Medicina Legal, Prática

de Trabalho de Conclusão de Curso, foram ministradas no último ano do curso.

Além disso, passamos a nos preocupar com o Trabalho de Conclusão de

Curso (TCC) e com a prova da OAB. Nos 9º e 10º períodos estudávamos as práticas

ditas simuladas, em que os docentes traziam casos fictícios para que pudéssemos

confeccionar as peças jurídicas aplicáveis.

Estava diante de uma nova realidade: a de fazer uma monografia. Como

disse anteriormente, a pesquisa na instituição era incipiente, para não dizer

inexistente. Como dito também, a carência era uma realidade nos cursos de direito

do estado de Alagoas.

Nossas aulas de Prática de Trabalho de Conclusão de Curso (PTCC) eram

resumidas em conhecer o conteúdo das Normas Técnicas da ABNT. O professor até

que se esforçava, mas a carga horária da disciplina não permitia um avanço naquele

universo desconhecido.

Fomos apresentados a um modelo de projeto, sem, contudo,

compreendermos o que poderíamos produzir em tormentosas 30 laudas. Esse era o

número mínimo exigido para a monografia. Para completar, lamentavelmente, no

transcorrer do 9º período, o professor de PTCC foi acometido por um estado

patológico de depressão e ficamos sem concluir o projeto. Iniciei o processo de

escolha do tema e fazer a leitura dirigida sobre o assunto.

No 10º período fui informado que poderia fazer a escolha de um orientador.

Procurei um professor penalista novato que até então desconhecia. Fui bem

recebido e conversamos sobre o assunto. Em poucos minutos, ele discutiu o

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conteúdo do sumário da monografia e o aprovou. Fui orientado a escrever e entregar

a ele o que havia produzido. Preocupado com o término do curso e a proximidade do

exame da OAB, em dois meses terminei a monografia e entreguei ao orientador.

Fiquei no aguardo de suas considerações, que para minha surpresa, limitou-

se a dizer que estava tudo bem e que eu deveria somente formatar o trabalho

conforme as Normas Técnicas da ABNT.

Após o depósito do trabalho, fiquei aguardando confiante o resultado do

trabalho. Iniciei a partir dali uma nova etapa de estudos. O foco era o exame da

OAB. No ano de 2003, o exame da OAB não era nacional. Cada Seccional tinha a

competência de elaborar as questões do exame.

Naquele segundo semestre, esquematizei um plano para buscar uma

qualificação profissional após a conclusão do curso, em São Paulo/SP. Por

coincidência minha noiva à época, hoje esposa, compartilhava do mesmo

entendimento de ir buscar um diferencial, algo que fizesse a diferença para mim.

Minha noiva era enfermeira recém-formada e queria fazer um curso de pós-

graduação em UTI.

Eu tinha em mente o propósito de fazer uma pós-graduação e/ou um

cursinho preparatório/destinado para concursos públicos. O mais conhecido

nacionalmente era o curso do Professor Damásio de Jesus. No momento eu já tinha

a intenção de advogar. Mas a dúvida era em que área. Trabalhista ou Penal?

Tratava-se de duas matérias que gostava de estudar. Pensava ter certo preparo

nessas duas áreas tendo como referência as notas obtidas e o gosto pela leitura de

ambas.

Ocorre que em pesquisa realizada na internet, tive conhecimento de que

estavam abertas as inscrições para seleção, objetivando vagas em cursos de pós-

graduação lato sensu oferecidos pelas Universidades Metropolitanas Unidas de São

Paulo/SP (UniFMU).

Cheguei a essa instituição por meio de busca dirigida, pois vi no livro do

professor Amauri Mascaro do Nascimento que ele tinha sido professor daquela

instituição. Era um dos livros que tinha adotado e adquirido para estudar Direito do

Trabalho. Não sendo o bastante, a IES oferecia pós-graduação nas duas áreas de

atuação que gostaria de me especializar (Direito do Trabalho ou Direito penal).

Também oferecia na área da minha noiva (Enfermagem – UTI).

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Não tivemos dúvida, partimos para São Paulo para fazer parte da seleção.

Ao tempo, eu tinha fobia de viajar de avião. A seleção constava de uma redação

sobre um tema ligado à área e, posteriormente, uma entrevista com o Coordenador

do Curso. Mas ainda existia em mim a dúvida quanto à escolha do curso.

Recorri ao meu pai e perguntei em qual das áreas eu deveria me

especializar. Ele como de costume, pragmático, disse-me que eu deveria fazer em

Direito do Trabalho, pois era a militância que mantinha normalmente as despesas

dos escritórios e o retorno, portanto, era mais imediato.

Aquela informação foi determinante para minha escolha. Com se já não

bastasse, assistindo à programação da TV JUSTIÇA, fiquei encantado com uma

palestra proferida pela Juíza do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª

Região, autora de livro e professora da UniFMU, Dra. Maria Inês Alves da Cunha.

Em São Paulo/SP, participei da seleção e fui aprovado. Minha noiva também

foi aprovada na seleção que participou. Resolvemos a questão do lugar onde

iríamos morar, em um apartamento alugado. Retornamos a Maceió com planos de

nossa vida em São Paulo, tendo em vista que nosso casamento estava próximo.

Marcamos a data para o dia 20 de dezembro de 2003. Minha noiva se ocupou dos

preparativos do casamento e eu da aprovação no exame da Ordem dos Advogados

do Brasil (OAB).

Comecei a preparação com provas passadas dos exames da ordem do

estado de São Paulo, pois, após o casamento em janeiro de 2004, submeter-me-ia à

avaliação. Na primeira tentativa, das 100 questões consegui acertar 46. Foi um

susto, visto que a nota mínima para se chegar à segunda fase era 5 (acerto de 50

questões – metade da prova).

O detalhe é que reduzi o tempo para simular o nervosismo da hora em que

fosse me submeter à prova. De quatro horas reduzi para três horas, inclusive

marcava as respostas no campo específico.

Minha noiva, no momento, disse-me algo interessante: “vou permitir que em

cinco minutos você altere as questões que marcou com dúvida”. Eu fiz as alterações

e para minha surpresa das 46 questões passei para 68 questões com acerto. Com

aquela nota eu estava aprovado para a segunda fase. Vi que o nervosismo atua de

forma contundente na hora de se submeter à prova longa e desgastante.

Criei o hábito de resolver as questões de vários estados todas às sextas-

feiras à tarde. Sempre com redução do tempo em uma hora e análise das questões

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que havia errado ou acertado por acaso. O interessante que resolvi em média uns

12 exames e em nenhum fiz menos que 50 acertos. Aquilo elevou a autoestima e

confiança na aprovação.

Após o retorno da lua de mel em Salvador/BA, arrumamos as coisas,

colocamos no carro e partimos felizes para a cidade que iria nos abrigar por um ano

(São Paulo/SP). Participei do primeiro exame OAB/SP, do ano de 2004, e fui

aprovado tendo como inscrição o nº 224.628. Naquele momento, era formalmente

um advogado habilitado a atender às demandas da clientela até então inexistente e

desejada.

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4 UM ADVOGADO E UM PROFESSOR

Essa fase como advogado recém-formado, recém-casado e estudante de

pós-graduação foi bastante rica e intensa para mim. Tudo era novo e envolvente.

Cheguei à São Paulo/SP, em janeiro de 2004, e as aulas do curso de pós-graduação

tiveram início no mês de março do mesmo ano.

Nos quase dois meses em que não havia iniciado o curso, procurei

acompanhar a atividade do escritório jurídico que minha cunhada tinha com uma

sócia. Minha cunhada (alagoana) já residia em São Paulo há uns quatro anos. Veio

antes com o propósito de estudar em curso preparatório para concursos nas

denominadas carreiras jurídicas. Acabou ficando, pois se casou com um alagoano

médico que residia em São Paulo.

O escritório funcionava no térreo de um sobrado no Bairro da Vila Mariana.

No piso superior do mesmo prédio residia sua sócia. A advocacia era voltada para a

área cível e trabalhista. Tratava-se de duas advogadas muito organizadas e com

muita vontade daquele escritório dar certo.

Nossa chegada (minha e de minha esposa) em São Paulo/SP despertou o

interesse de minha cunhada fazer também uma pós-graduação. Lembro-me que ela

ficou assustada ao saber que nós tínhamos ido inicialmente somente para estudar,

buscar uma qualificação profissional e ela há mais de ano naquela cidade, ainda não

tinha atentado para essa possibilidade.

Comecei a acompanhar minha cunhada em seu dia-a-dia para poder

conhecer os fóruns de São Paulo/SP e adaptar-me àquele mundo bastante diferente

do meu. De saber andar de metrô até divulgar seu escritório. Percebi que cliente não

cai do céu e que havia uma concorrência até desleal por alguns colegas advogados.

As duas passavam grande parte do tempo buscando uma forma de ter um

rendimento com aquela atividade.

Percebi que alguns fatores não concorriam para o crescimento do escritório.

Um deles era a localização. Muito embora a capital paulistana tenha uma população

numerosa, muitas indústrias, empresas de grande, médio e pequeno porte, um

comércio denso, grande também é o número de oferta de serviços advocatícios.

Desse modo, não oferecia os meios para alguém que não conhecesse seus serviços

chegasse à procura de um profissional. Ressalte-se que nem placa havia no local.

As sócias, por vezes, trabalhavam para escritórios maiores em regime de parceria.

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Relatei há pouco que a concorrência era desleal. Fui informado pelas

colegas advogadas que existia uma grande oferta de “agenciamento de clientes”

feito por pessoas que recebiam uma comissão de escritórios se levassem clientes

para lá. Eram e são os chamados agenciadores de “paqueiros”, derivando o termo

da palavra popular paquera.

Enquanto não iniciavam as aulas, por vezes, fiz companhia a minha cunhada

advogada a escritórios de parceiros de trabalho dela. Estava muito entusiasmado

com a possibilidade de poder atuar agora como advogado em um processo. Certa

vez, dirigimo-nos ao centro da cidade para irmos ao fórum João Mendes Junior

(Justiça do Trabalho) que ainda funcionava na época. O prédio ficava próximo à

Estação Sé.

Assim que saímos da Estação Sé deparamo-nos com uma imensa

quantidade de “paqueiros” distribuindo cartões de escritórios jurídicos. Senti certo

desconforto com aquele mercado de oferta de serviços. Serviço que já existira em

Maceió/AL, mas não tão exposto daquela maneira.

Eu só tive conhecimento da atuação dos agenciadores em Alagoas quando

voltei. Indaguei a colega advogada se não havia fiscalização da OAB/SP em relação

àquela prática ilegal. A resposta foi que dentro daquele universo era muito difícil

controlar a atuação dos “paqueiros” que faziam daquilo meio de vida.

Chamou-me a atenção, quando chegamos ao fórum, o fato de a colega

advogada receber a contestação das mãos de uma preposta da empresa. Ela não

sabia ainda do que se tratava e devia participar da audiência como advogada da

empresa. Ela relatou, naquele dia, que aquilo era constante.

Daí veio o questionamento de como poderia o advogado atuar com certo

grau de qualidade se não conhecia com propriedade dos fatos. A resposta da

advogada foi à altura indagando-me se eu pensava que os juízes conheciam

previamente do conteúdo dos processos em que eles figuram como presidentes nas

audiências de instrução. Daí a máxima extraída do brocardo latino: quod non est in

actis non est in mundo (o que não está nos autos não está no mundo).

Meu pensamento estava voltado para uma advocacia menos impessoal. Mas

interessada em atingir uma condição de segurança e busca pela satisfação dos

interesses subjetivos dos meus clientes. Contudo, não deixei de admirar a

participação da colega e de crer que um dia eu estaria apto, pronto para atuar

daquela forma.

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Dos poucos dias em que acompanhei a colega advogada em seu ofício, no

meu entender, foram momentos ricos de aprendizagem. Novos horizontes e

perspectivas foram-me apresentados. Comecei a pensar como poderia levar algo de

bom para meus futuros clientes em Maceió/AL. Fato novo foi o que soube via

telefone em conversa com meu pai.

Acabara de desfazer a sociedade que tinha com dois colegas, tendo em

vista que um deles havia passado em um concurso público (Polícia Rodoviária

Federal) que o impossibilitara a prática da advocacia e outro estava mais

interessado em prestar concursos na área jurídica.

Disse que eu seria seu novo sócio. Fiquei muito entusiasmado e contente.

Pediu que eu aproveitasse a oportunidade que estava tendo para levar o que fosse

de bom para nosso escritório. Disse, ainda, que estava à procura de uma sala

melhor, mais ampla para o nosso escritório. Firmei o compromisso de com o esforço

do meu estudo e dedicação dispensada em trabalho prático, mesmo não

remunerado, ganhar experiência para agregar na atuação do escritório.

Finalmente, chegou o dia da primeira aula da pós-graduação. Como de

costume, cheguei cedo e fiquei no aguardo do início do curso. Com a chegada dos

colegas fomos fazendo as devidas apresentações. A maioria estava acabando de

sair da jornada diária de trabalho, buscando naquele curso a qualificação técnica

para o mercado. Do grupo só não eram da capital e do estado de São Paulo eu e

uma colega de Belo Horizonte.

O espanto dos colegas era muito grande quando eu fazia a minha

apresentação e dizia que era de Maceió/AL e estava na capital de São Paulo por

conta do curso. Por coincidência, somente eu e a colega mineira éramos recém-

formados.

A maioria era composta de advogados com certa experiência prática e

alguns poucos com uma larga experiência. Era visto por alguns como alguém que

tinha muito dinheiro. Para eles, como podia alguém recém-casado e recém-formado

custear uma vida de valor tão elevado como era (e ainda o é) o de São Paulo.

Informei que tudo aquilo havia sido objeto de preparação prévia. Era a

realização de algo que foi planejado por mim, minha esposa e nossos pais. Expliquei

que se tratava de um investimento alto, mas acreditávamos que aquela aventura

valeria muito a pena profissional e pessoalmente. Indiscutivelmente, o Sudeste é um

grande polo educacional nas mais variadas áreas de conhecimento. O histórico de

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colegas que tinham tido a experiência que buscávamos e obtiveram sucesso

profissional era bastante positivo em nosso estado.

Recepcionado pelo coordenador do curso e o professor que iria ministrar

aula naquele dia, após as apresentações institucionais e de conteúdo da disciplina, o

docente tratou de buscar informações dos participantes do curso. Percebi que

estava acontecendo novamente o que ocorrera quando fui recebido na graduação.

Mesmo procedimento de recepção. Gostava daquilo, sempre acreditei ser

pertinente, conhecer como era a dinâmica do curso.

Como esperava, aparentemente, o curso tinha professores conhecedores

dos seus conteúdos e larga experiência prática em suas atuações profissionais,

incluindo a docente. À época, eram dois doutores, três mestres e dois especialistas,

dos quais um era mestrando. O curso acontecia de segunda às quintas-feiras, das

19:00h às 22:00h, com um intervalo de 20 minutos.

Notei logo a diferença no discurso dos docentes e a forma como a aula

acontecia. Existia um incentivo significativo de que os discentes participassem das

discussões e emitissem suas opiniões, dividissem suas experiências. Enfim, foi

sugerido que criássemos um grupo de trabalho em todas as disciplinas.

Alguns docentes exigiam que elaborássemos um paper da aula subsequente

para entregarmos ao fim de cada aula. Conheci naquele instante uma ferramenta

muito eficaz, ao menos para mim, de conhecermos o conteúdo a ser discutido ou

ministrado pelos docentes. Alguns colegas ficavam bastante chateados por conta do

tempo que aquelas atividades dispensavam. Como eu tinha boa parte do dia livre

para leitura era bastante proveitoso aquele exercício.

Com o tempo, senti a necessidade de preencher meu tempo fora da leitura

com a tão esperada atuação prática. Resolvi me dispor ao trabalho perante meus

colegas de sala. Contudo, encontrei uma barreira que foi a demora em sair minha

carteira da OAB/SP. Como existe um processo administrativo muito criterioso na

apreciação de documentos acostados, a OAB/SP oficiou a faculdade em que fiz a

graduação em Alagoas para saber da veracidade das informações constantes em

meu histórico escolar.

Tudo isso demandou uns três meses, ou seja, somente em meados de julho

fiz o juramento e recebi minha carteira. Para mim foi, em que pese eu estivesse

sozinho no momento, sem ninguém da minha família, um momento mágico, único,

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mais importante e significativo do que a colação de grau. Solenidade muito bonita de

juramento e posterior entrega das carteiras.

Mesmo assim não desisti e persisti perante os colegas até que um colega

que voltava conversando comigo no metrô e participava do grupo de trabalho em

sala de aula, após a aula, em uma quinta-feira, véspera de feriado, fez-me um

convite de irmos (eu e minha esposa) com sua família a uma casa de praia na

baixada santista.

Fiquei com receio por não conhecê-lo a ponto de passar um fim de semana

em sua casa. Mas, como havia passado mais de dois meses de curso, sempre

conversávamos sobre nossas famílias, conversei com minha esposa e resolvemos

acompanhá-los, mas em nosso carro. Qualquer desconforto voltaria à casa. Naquele

fim de semana prolongado, conversamos bastante sobre atuação profissional e

sobre o curso que estávamos participando.

No que se refere à atuação profissional, o colega me disse que era

advogado criminalista e atuava no campo da responsabilidade civil. Indaguei a razão

de polos tão distantes. Ele informou que gostava muito do Direito Penal, havia sido

inclusive policial militar no estado de São Paulo, e que a parte da responsabilidade

civil surgiu do trabalho que efetuava para o sindicato dos taxistas autônomos do

estado de São Paulo.

Era advogado desse sindicato e por conta disso sempre impetrava ações de

reparação por danos materiais e morais, na maioria das vezes, oriundas de sinistros

advindo do trânsito. Aduziu também que era grande o volume de ações envolvendo

taxistas seja como réu ou como vítima.

Naquele momento, perguntei se não existia, por conta do grande volume,

carência de advogados para atuar junto aos interesses da classe. A resposta foi

positiva e o colega disse que a solução encontrada pelo sindicato era a contratação

dos serviços de advogados freelancer.

Coloquei-me, naquele instante, à disposição para atuar como advogado,

mesmo sendo algo esporádico, e tive de resposta a informação de que ele me

levaria ao sindicato e me apresentaria aos colegas e ao presidente do sindicato, que

por coincidência era também alagoano. Ainda, no mesmo fim de semana,

conversamos também sobre o curso de pós-graduação que fazíamos. Disse ao

colega que estava muito contente, que era uma matéria que gostava bastante.

Enquanto ele, disse-me que estava fazendo a pós por conta do sindicato.

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Ele não conhecia bem o direito do trabalho e havia no sindicato a

necessidade de um advogado especialista na área, por isso resolveu fazer o curso.

Eu notava que na sala de aula ele não se mostrava interessado com o assunto

ministrado.

Dispus-me a ajudá-lo no que fosse necessário, tirando dúvidas,

emprestando alguns livros, a fim de que ele conseguisse compreender as matérias

no curso. O fim de semana prolongado foi muito rico em troca de experiências,

principalmente para mim que estava ali como o advogado recém-formado.

Com o retorno às aulas, recebi o convite esperado de conhecer o sindicato e

acompanhá-lo nas audiências no Juizado Especial Cível e Criminal da capital

(JECC). Fiquei impressionado com a organização do sindicato. Lá havia uma farta

oferta de serviços aos taxistas vinculados. Desde tratamento odontológico à terapia

com psicólogos.

Para mim, que até então só conhecia sindicato por meio dos livros e da

legislação aplicada, imaginei de certa forma o que era assistência. O sindicato tinha

tantos membros que até existiam stands com carros novos em suas dependências.

Em seguida, fomos ao fórum para que o colega participasse de uma audiência no

juizado. Conforme era esperado, tratava-se de ação de reparação por danos

oriundos de abalroamento de veículos, um deles sendo o carro de um taxista.

E, assim, acompanhei o colega por diversas audiências até que pouco

tempo depois fui convidado para fazer audiências caso não houvesse

disponibilidade dos advogados do sindicato. Aceitei prontamente e começaram a

surgir, semanalmente, uma ou duas audiências. Como havia acompanhado o colega

em audiências em vários fóruns, conhecia onde ficavam e a dinâmica daquela

atividade.

Em meio àquelas audiências pelo sindicato, surgiu um convite do colega

para atuar em um processo não vinculado ao sindicato, mas a ele como patrono da

causa. Tratava-se de uma reclamatória trabalhista. Aceitei prontamente e agradeci a

oportunidade e confiança depositada. Disse-me que como eu conhecia mais de

Direito Material e Processual do Trabalho seria uma oportunidade de participar da

minha primeira audiência trabalhista.

Aconteceu no fórum Rui Barbosa na Barra Funda. Tudo correu bem, apesar

do nervosismo que é natural em estreias. Logo após a audiência, fui assistir a outras

que aconteciam naquele imenso fórum, aguardando o momento de ir à aula da pós-

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graduação. Aleatoriamente, assisti a audiências dentre as noventa varas do trabalho

existentes naquele fórum.

Por coincidência, entrei em uma vara em que o juiz titular era o hoje

Desembargador Federal do Trabalho e ao tempo meu professor da disciplina Teoria

Geral do Direito do Trabalho na pós-graduação Dr. Adalberto Martins. Entrei na sala

de audiência e me sentei em um sofá.

Como em sala de aula, o professor conduzia muito bem as audiências, ficou

claro o que estava acontecendo, mesmo para um advogado recém-formado e recém

inserido nas audiências trabalhistas. Pessoa de fino trato e cortesia com os colegas

de trabalho, servidores, advogados e jurisdicionados. Longe da imagem de

arrogância e empáfia presentes em alguns daqueles membros do poder, objeto

inclusive da atenção de comediantes e contadores de história em todo o País.

Fiquei por quase toda a tarde presenciando as audiências. Até que em dado

momento o professor indagou se minha audiência era a próxima. Eu respondi que

não, que estava ali somente assistindo às audiências e continuei sentado. O

professor/magistrado deu continuidade aos trabalhos dentro da pauta do dia. Com o

fim da pauta de audiências, fui cumprimentar o professor e disse-lhe que era seu

aluno na pós em Direito do Trabalho nas Faculdades Metropolitanas Unidas

(UniFMU).

Noticiei ao orientador de classe que estava naquele momento a assistir às

audiências para conhecer melhor a atuação/atividade dos profissionais em

audiência. Disse-lhe, ainda, que havia participado como advogado da minha primeira

audiência naquela tarde e estava bastante empolgado com a novidade e com toda a

estrutura física e de pessoal voltadas para a população, advogados e jurisdicionados

no Fórum Rui Barbosa.

Naquele momento, ele contou que estava saindo para ir ministrar aula na

pós-graduação na UniFMU. Afirmei que já sabia disso e que nos encontraríamos lá

no curso à noite. Pelo meu sotaque fui indagado de onde eu era. Respondi que era

de Maceió e estava em São Paulo por conta do curso. Ele ficou surpreso com o que

disse e averiguou se eu estava de carro. Respondi que não sabia dirigir naquela

região em São Paulo e meu meio de transporte no momento era o Metrô.

Imediatamente, ele me ofereceu uma carona caso eu quisesse aguardar o

despacho em seu gabinete de uns poucos processos. Meio que surpreso e sem

jeito, aceitei e aguardei ele despachar os processos em seu gabinete. No caminho,

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fomos conversando sobre São Paulo, seu trânsito, as praias do nordeste, a cidade

de Maceió e sobre o curso. Disse a ele que estava gostando muito do curso, que

gostava da forma como ele ministrava suas aulas e que tinha muita vontade de não

parar minha qualificação profissional na pós-graduação lato sensu.

A conversa foi muito proveitosa. O professor havia feito mestrado e

doutorado com licença remunerada concedida pelo Tribunal Regional do Trabalho

da 19ª Região. Falou que o concurso público lhe trouxe estabilidade e perguntou se

eu tinha interesse em prestar algum concurso, investir no mundo acadêmico ou

advogar.

Respondi que meu propósito era buscar qualificação técnica necessária e

quando retornasse decidiria o que fazer. Falei que alguns conterrâneos haviam

investido nos estudos em São Paulo e o resultado, na maioria dos casos, era

bastante satisfatório.

Conforme orientação dele, deveria primeiro buscar clientela (como

advogado) ou a aprovação em um concurso público, depois, com mais folga e

tranquilidade, eu deveria pensar em seleção de programas de mestrado e

doutorado, se minha intenção fosse a de pesquisar ou ministrar aulas.

Confesso que naquele instante nem tinha ideia do que era pesquisa

acadêmica, muito menos em definir se eu gostaria de ser um professor universitário.

Mais remota ainda seria a ideia de ter a capacidade/competência de ser autor de

livros jurídicos como o professor.

Interessante foi o breve, porém, rico relato de sua história profissional.

Disse-me que sua primeira graduação foi em Matemática (licenciatura e

bacharelado), logo após obteve graduação em Pedagogia, em seguida Direito.

Pensei comigo mesmo como seria minha formação, minha história de vida

profissional. Por que caminho, ou quais os caminhos teria de percorrer para chegar

a uma situação confortável e realizadora como a do professor doutor/juiz/autor de

livros jurídicos.

Indaguei o motivo de o professor ensinar já que não necessitava do salário

de docente para viver. Ele prontamente me disse que ensinar era um prazer, que o

ensino lhe trazia contentamento e que sua formação inicial tinha sido de professor

de matemática. Confesso que me admirei com a forma como aquele docente me

deu orientação. Com a atenção dispensada.

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Relato porque fui tratado como alguém próximo, um colega de trabalho.

Jamais imaginei que poderia estar tendo uma atenção daquelas de um Professor

Doutor, autor de livros que havia lido na faculdade e além de tudo Juiz do Trabalho.

Faço a observação de, acima de tudo ter tido atenção de um Juiz, por conta da

cultura local de que juízes não são pessoas de fácil acesso, são mais reservados.

Fato é que foi muito proveitosa a conversa e extraí a ideia de compartilhar

minha vida profissional de advogado com o mundo acadêmico. Ideia incipiente

diante do rol de possibilidades de atuação profissional fora da docência.

No curso, tivemos uma disciplina denominada Metodologia da Pesquisa e do

Ensino Superior. Essa disciplina foi bastante importante para o cumprimento das

demais. Isso porque havia um seminário em cada uma das matérias. No seminário,

os grupos faziam apresentação do conteúdo definido pelos docentes.

Com as aulas, tivemos orientação sobre o trabalho docente na elaboração

de uma aula, na apresentação desse conteúdo em sala de aula e da necessidade de

se fazer compreendido pelos destinatários da informação. Fomos apresentados a

alguns textos sobre didática e instigados a discutir em grupo sobre o tema.

Interessante foi a ideia de cumprirmos essa disciplina junto com alunos da

pós-graduação em Direito Empresarial. Nós apresentávamos o conteúdo do nosso

trabalho, não para nossos colegas de sala, mas para desconhecidos e pessoas que

buscavam a especialização em outra matéria. Agora não como aluno da graduação

e sim de pós-graduação, pesava sobre meus ombros a responsabilidade de fazer

um bom trabalho, afastando ao máximo a ideia de erros na apresentação.

Não bastasse a pressão natural, ainda recaia sobre mim o fato de ser

nordestino com o dito sotaque carregado. Os colegas de sala estavam cientes e

acostumados, mas os demais alunos quando comecei a falar observaram com mais

atenção (alguns com ar de riso) ao que eu dizia. A solução foi me valer das técnicas

apresentadas no curso de oratória que fiz quando estava ainda no primeiro período

da graduação em direito.

Por fim, tudo correu bem. Cumprida nossa parte naquela atividade em

grupo. Gostei bastante da experiência e acima de tudo do desafio. Aquela atividade,

quando do seu término, trouxe-me certo ar de capacidade e possibilidade por

imaginar ter vencido umas das etapas inerentes à função de orientador de classe,

qual seja, a de falar a um público e ser presumidamente compreendido.

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Recebi o cumprimento de muitos colegas pelo meu desempenho. Depois

disso, busquei o aprimoramento da técnica de apresentação nos temas constituintes

dos objetos de estudo nas demais disciplinas.

Precisei, também, das orientações da professora da disciplina Metodologia

da Pesquisa para elaborar meu projeto e posterior realização do trabalho

monográfico junto ao meu orientador.

Como era complexa aquela atividade. Primeiramente na escolha do tema,

posteriormente na delimitação e reconhecimento do que seria o problema. Adquiri

uma obra sobre metodologia da pesquisa ainda na graduação. Obra essa que trazia

informações sobre metodologia da pesquisa e apontava as regras dispostas pela

Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) para a realização do trabalho

monográfico.

Chegou o momento de escolha do orientador e conversei com o professor

Dr. Adalberto Martins, mas ele me disse que tinha chegado ao limite máximo de

orientandos. Com sua costumeira cordial atenção trouxe valiosas ponderações e

dicas acerca de meu projeto de pesquisa.

Em seguida, procurei o professor especialista, e ao tempo mestrando, hoje

mestre, professor João Carlos da Silva por quem fui muito bem recebido. Discutimos

sobre o tema e ele se dispôs a me orientar.

Segui à risca as normas dispostas por ele, escrevia e entregava o resultado

para que ele fizesse suas considerações e sugestões. Passei um bom tempo lendo

as obras por ele indicadas, antes de escrever, fazendo o resumo e catalogando

aquilo que, mais tarde, seria ou poderia ser objeto de citações ou dados importantes

para o trabalho.

Em meio a essa fase do curso de pós-graduação, comecei a fazer o curso

preparatório para concursos nas carreiras jurídicas do Professor Dr. Damásio de

Jesus no turno matutino. Isso se deu após recebermos a visita de meus pais e eles

questionarem o que eu estava fazendo para aproveitar a estada em São Paulo e se

eu estava feliz com a vida que estava levando.

Antes, passava o turno da manhã e da tarde estudando em casa e algumas

vezes, quando solicitado, fazendo audiências, confesso que sentia falta de uma

rotina mais dinâmica. Passava quase o dia todo sozinho em um apartamento

pequeno lendo sobre os temas da pós-graduação.Com o passar do tempo, por

estar a maior parte do dia sozinho, comecei a perder o ritmo de estudos e a

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desenvolver uma fadiga despropositada, sonolência, desinteresse, falta de

concentração.

Foi aí que resolvi fazer o curso. Recebi o apoio moral e financeiro de meus

pais e fiz a matrícula no cursinho. Fiquei bastante instigado a estudar outras

disciplinas que não as constantes na pós. Comecei a pensar em fazer concursos,

mas estava diante de uma realidade que não a minha.

Conforme verifiquei, era muito difícil concorrer com pessoas que passavam a

vida estudando para determinado concurso. Fiquei impressionado com a dinâmica

das aulas. Eram cinco aulas de cinquenta minutos cada. O volume de informações

era imenso e denso.

Os alunos passavam a manhã no cursinho e o resto do dia estudando, ou na

biblioteca, ou em casa. Alguns colegas passavam o dia quase que inteiro estudando.

Vários alunos eram de outras cidades, de outras regiões do País. Só paravam de

estudar dez minutos em cada hora de leitura, na hora de ir ao banheiro ou para se

alimentar.

Minha realidade era a de dividir a atenção dos estudos do cursinho com a

pós e quando chegasse a hora do meu retorno à Maceió tinha que trabalhar no

escritório montado por meu pai, pois estava casado e deveria assumir as

responsabilidades decorrentes da minha escolha.

Mas, vivenciar aquele meio também foi uma experiência rica para minha

formação. Aprendi bastante com as aulas do cursinho. Os professores eram muito

bem preparados e intencionados. Alguns até famosos em todo o território nacional

por conta das aulas transmitidas por intermédio de satélites, com receptores nas

franquias existentes e espalhadas em vários estados da federação.

Eram tratados como “estrelas”, também por muitos deles possuírem

produção bibliográfica e estarem na condição de aprovados em concursos ou

advogados de sucesso reconhecidos local e nacionalmente.

Discurso sério e descontraído, ao mesmo tempo, era o da busca constante

pelo sucesso, da não desistência dos objetivos e sonhos. Alguns deles tiveram a

competência de esclarecer conteúdos que lutei na graduação para compreender

sem obter sucesso mesmo com a leitura de livros.

Gostava da forma como os responsáveis pela dinâmica do curso distribuíam

as aulas, levando-se em conta a complexidade do conteúdo e o talento de cada

docente. Isso não nos fora explicado em sala de aula, mas percebi que tudo era

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planejado e articulado para um bom aproveitamento do conteúdo ministrado pelos

docentes.

Isto é, percebi que a disciplina Direito Civil (Direitos Reais) era a última aula

da manhã, por conta da importância e da eloquência do docente. A aula tinha início

às 11:50h e término às 12:40h. Muito raro ver alunos irem embora apesar da hora do

almoço. Aulas com conteúdos mais simples aconteciam no início da manhã.

Isso funcionava em uma turma numerosa e presumidamente interessada na

assimilação de conteúdo, conteúdos estes que estavam na maioria dos editais de

concursos para provimento nos cargos das chamadas carreiras jurídicas.

Na reta final de minha estada em São Paulo, minhas atividades consistiam

no turno matutino: ir ao curso do professor Damásio de Jesus; no período da tarde:

participar de audiências, fazer a leitura necessária para a pós e curso preparatório e

escrever a monografia; no turno da noite: ir às aulas da pós.

Houve, portanto, o preenchimento e diversificação das atividades durante o

dia, representando ao final, acredito, um ganho real (otimização) da minha ida a São

Paulo, muito embora, ao custo de relevante desgaste físico e mental.

Chegado o momento do término das aulas em dezembro e o consequente

cumprimento das disciplinas da pós-graduação, voltamos à nossa cidade natal

cheios de esperança e confiantes de que poderíamos fazer um bom trabalho e quem

sabe, por via de consequência, colher bons frutos. Entretanto, não faltavam ideias,

possibilidades, inquietações, angústias em relação ao meu futuro profissional.

Antes de arrumar a mudança, recebi uma ligação do meu pai e relatou que

foi procurado por uma colega advogada que residia no mesmo prédio em que ele,

em razão de uma consulta sobre matéria trabalhista. A colega havia recebido uma

notificação judicial (reclamatória trabalhista) e indagou a ele se ele militava nessa

área. A resposta dele foi que não, mas que seu filho, referindo-se a mim, era

especialista em Direito do Trabalho e estava naquele mês voltando de São Paulo

por conta de uma pós-graduação que havia feito.

Prontamente, a colega disse que aguardaria meu retorno e demonstrou

interesse em saber se eu gostaria de participar de uma seleção para ministrar aula

na faculdade em que era professora e trabalhava na assessoria acadêmica da

coordenação do curso.

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Fiquei contente em saber que assim que chegasse havia uma cliente a

espera, mas não dei muita importância sobre a seleção para professor. Talvez por

estar ainda inseguro em relação à minha condição.

Arrumei as malas e os preparativos da mudança. Acreditei que estava

levando uma bagagem importante de conhecimentos no sentido amplo da palavra e

experiências vivenciadas que jamais poderiam deixar de intervir em minha

personalidade, meus sentidos e sentimentos. No entanto, não tinha definido

plenamente o que realmente iria fazer. O mais próximo e real era o escritório de

advocacia que iria montar com meu pai.

Quando cheguei à Maceió, após a recepção calorosa dos familiares,

passamos a por em prática aquilo que fora motivo de acerto na conversa com meu

pai em relação ao escritório jurídico. Procuramos uma sala comercial mais ampla do

que a anterior. Ao encontrarmos e ajustarmos o conteúdo do contrato (prazo, valores

etc.), pesquisamos valores de móveis e equipamentos de escritório.

Apesar de empolgado com a possibilidade de fazer daquele local, não só o

ganho do pão de cada dia, mas o centro de minhas atividades, novamente, e com

maior frequência, meu pai, mesmo com todo o investimento empregado na estrutura

do escritório, aconselhava-me a fazer um concurso público para as chamadas

carreiras jurídicas. Estava ele meio desmotivado com a prática da advocacia por

alguns fatores. Um deles era que ainda não tinha uma clientela que correspondesse

ao investimento feito.

A advocacia não só em Alagoas, mas na maioria dos casos para advogados

recém-formados, só produz frutos em um futuro longínquo devido a alguns fatores

como baixa renda dos clientes e demora na prestação jurisdicional. Aquele que

procura o advogado, faz-lo buscando socorro para seus direitos serem respeitados e

preservados.

Com exceção da advocacia criminal, para a qual o cliente, muita vezes,

encontra-se preso, clientes têm prioridades em seus gastos (alimentação, moradia,

transporte, vestuário, lazer etc.). Estando preso, o cliente prioriza a busca pela

liberdade. Faz-se rateio em família para pagar os honorários do advogado, vendem-

se bens ou, às vezes, o dinheiro está facilmente disponível por conta de ser produto

de ação criminosa. Mas há pagamento antecipado.

Na militância trabalhista e cível, áreas que pretendia atuar, a realidade era

outra. Advocacia nas varas de família, por exemplo, em sua maioria é feita por

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intermédio da Defensoria Pública Estadual. Não que estivesse fechado para os

demais campos de atuação, mas sentia mais segurança no que fazia nessas áreas.

Certo dia, conversando com um colega advogado criminalista em São Paulo,

ele me fez um relato de que certa vez foi procurado por uma mãe de um preso para

saber quanto custaria para ele solicitar a liberação do filho judicialmente.

Após explicar a acusação que recaia sobre o filho (tipificação penal), o

colega advogado lhe disse que o valor dos honorários era de R$ 2.000,00 (dois mil

reais). A mãe desesperada, com lágrima nos olhos, pediu que ele fizesse o serviço

por R$ 800,00 (oitocentos reais) porque não dispunha de tal quantia. Tratava-se de

pessoa humilde, esteio da família, que vivia com renda de um salário mínimo para

cuidar de três filhos.

Sensibilizado com a situação da mãe o colega resolveu aceitar. Fez o

trabalho e o preso foi solto. Um dia após a soltura recebeu uma visita inesperada. O

cliente solto perguntou se ele sabia quem ele era. Prontamente, o colega disse que

sabia, pois havia prestado um serviço para ele, liberando-o da prisão no dia anterior.

Naquele instante, o cliente disse que o motivo da visita devia-se ao fato de que ele

deveria devolver o dinheiro de sua mãe.

Imediatamente, o colega respondeu que a mãe dele pagou aquele valor em

razão dos honorários advocatícios. Não aceitando a resposta do profissional, em

tom de ameaça, disse-lhe que só sairia daquele escritório quando o dinheiro fosse

devolvido. O profissional informou que não tinha mais o valor em mãos, pois teria

feito compras em um supermercado com o numerário. Não satisfeito, o referido

cliente lhe apontou uma arma e levou um computador portátil do advogado, sob a

ameaça de que se ele o denunciasse seria um homem morto.

Disse-me o nobre colega advogado que a sensação foi horrível. De

impotência e indignação ao mesmo tempo. A informação passada pelo colega foi de

que a advocacia criminal mesmo tendo um retorno financeiro mais imediato, muitas

vezes restringe-se ao pagamento do sinal dado e a eventuais surpresas

desagradáveis. A atenção que se exige ao preso e à família a ser dispensada pelo

advogado criminalista é grande. A cobrança de saldo de honorários se torna uma

atividade muito desgastante e perigosa, em alguns casos.

Em um churrasco, na casa de meu sogro, encontro o professor que me

orientou na elaboração da monografia pois ele é casado com a prima de minha

esposa –, tive a liberdade de fazer alguns questionamentos e solicitar algumas

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orientações. Tivemos uma conversa muito proveitosa. Pedi orientação para minha

investidura na militância advocatícia como alguém que estava iniciando minha

carreira profissional e que gostaria de atuar, assim como ele atuava em sua

atividade principal. Ressalte-se que por essa atividade advocatícia havia o

reconhecimento e respeito da comunidade alagoana.

Das frases ditas que me chamaram a atenção foi a de que não há na

atualidade a possibilidade do advogado ser um generalista “clínico geral” devido à

enorme quantidade de áreas de atuação e vasta legislação. Disse-me “seja um

especialista em uma determinada área”.

A especialidade escolhida por ele é de advogado criminalista. É também

docente das disciplinas correlatas a sua atuação profissional (Direito Penal, Direito

Processual Penal e Criminologia). Informei que havia recebido um convite para

ministrar aulas na faculdade em que ele ensina e recebi dele uma palavra de

incentivo para participar do grupo de docentes da instituição.

Dentre os aspectos positivos apontados para o profissional militante ser

professor está a divulgação do seu trabalho como uma “vitrine”, constante

atualização de conteúdo e que há uma pequena, porém importante remuneração,

sobretudo para alguém que estava iniciando a carreira profissional. Foi o bastante

para que eu acolhesse de bom grado as orientações e fizesse a visita à colega na

IES respectiva.

Fui bem recebido pela colega e pelo então Diretor da Faculdade. Fui

indagado sobre minha estada em São Paulo no tocante aos cursos que fiz. Relatei

todos conforme o currículo e de imediato perguntaram se eu gostaria de contribuir

sendo um professor “coringa” (professor itinerante).

Justificaram o convite antes de explicar do que se tratava, informando que,

como alguns docentes haviam participado e obtido aprovação na seleção da

primeira turma de Mestrado em Direito Constitucional da Universidade Federal de

Alagoas, havia uma situação recorrente de ausência desses docentes nas aulas do

turno matutino.

Surgiu daí a necessidade de um docente que fosse para a sala de aula no

dia em que o orientador de classe não pudesse ir. Seja por conta das aulas do

mestrado ou qualquer outro motivo corriqueiro como audiências, problemas

relacionados à saúde, participação de bancas de conclusão de curso, congressos

etc.

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Informaram que o professor imbuído desta função substituiria a ausência do

docente trazendo algum conteúdo, uma palestra, dispondo e discutindo temas

relevantes e atuais de acordo com a possível compreensão e assimilação, tendo em

vista que esse docente “coringa” cumpriria com a correspondente atividade do 1º ao

3º ano do curso. Mais precisamente do 1º ao 5º períodos, no turno matutino.

Disse-me o diretor, também, que seria necessária a permanência à

disposição da faculdade em todas as manhãs de segunda a sexta-feira e que eu

teria como contraprestação o pagamento correspondente a 20 (vinte) horas aulas

semanais independentemente da entrada ou não em sala de aula.

Naquele momento, percebi uma oportunidade de mostrar meu trabalho e

receber um valor mensal que colaborava com as despesas básicas de uma casa,

aliado aos benefícios decorrentes de um contrato de trabalho, como férias, décimo

terceiro salário, FGTS, recolhimento previdenciário etc.

Recém chegado à Maceió foi uma oportunidade que não poderia perder. De

imediato aceitei o desafio, muito embora soubesse que seria a chance de ser bem

aceito pelos discentes ou rechaçado pelos alunos em razão do meu rendimento

como docente “coringa”. Estávamos em meados de abril de 2005.

Fui encaminhado para a Secretaria do Curso para conhecer quais os

documentos seriam necessários para o registro do contrato de trabalho e, em

seguida, fui comunicado de que seria marcada reunião acadêmica que teria como

pauta a apresentação da novidade perante o corpo docente.

Providenciei a documentação e aguardei até o dia em que fui notificado da

data, hora e local da reunião. Iniciei a partir daquele dia o trabalho de preparar aulas

especiais. Especiais no sentido de ser diferente das aulas convencionais que os

alunos assistem normalmente com os professores titulares ao conteúdo disposto na

matriz curricular.

Logo veio a ideia de tratar de temas polêmicos, discutidos em revistas

especializadas, e que entendia que podia despertar o interesse dos alunos. Como

tinha minha inscrição na OAB/SP recebia em casa mensalmente um jornal do

advogado distribuído gratuitamente com muitos assuntos jurídicos de interesse da

classe. Temas como eutanásia, guarda de menores, trabalho escravo,

argumentação jurídica, enfim, assuntos que poderiam ser discutidos, mesmo diante

de calouros no curso de direito da FADIMA.

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Após o preparo de um tema, imediatamente fiz a busca por outro e por

outros, sucessivamente, até que chegou o dia da reunião em que seria apresentado

pela direção do curso aos docentes. A reunião aconteceu em uma sala de aula, pois

o número de docentes do turno da manhã não permitia que ocorresse na direção da

faculdade.

Deparei-me com vários professores que foram meus mestres e alguns

poucos que não foram. Com a presença da maioria, no horário designado, o então

diretor fez uso da palavra explicando a novidade.

Logo se estabeleceu a discussão e/ou inquietação de alguns em relação à

atividade. Dúvidas surgiram como “o colega vai ministrar o assunto do professor

ausente?” “Ele terá caderneta, portanto, fará alguma atividade que atribua nota ou

frequência? Será uma espécie de monitor professor?

Retiradas as dúvidas pela direção, foi dito que o meu papel era de

colaborador em atividade acadêmica, com o único propósito de que os discentes

com a ausência do professor não ficasse no ócio, evitando, por conseguinte,

eventuais reclamações quando o assunto fosse assiduidade dos docentes.

Percebi alguns fazendo, a meu ver, pouco caso da proposta da atividade,

maculando-a, acreditavam não ser provavelmente bem sucedida em razão do pouco

interesse dos alunos nas aulas com professores que estão com a ferramenta

“caderneta” em mãos, imagine se não fossem fazer prova ou levar falta.

Percebi, portanto, de alguns docentes, certo descaso e desconfiança da

minha capacidade de despertar o interesse dos alunos em discutir sobre temas que

não os das matérias sujeitas às avaliações.

Apresentado como alguém que atrairia a atenção dos alunos e estava apto a

atender à demanda por conta dos cursos que fiz em São Paulo, existiu também

certo grau de insatisfação dos vaidosos por conta da atenção que recaia sobre mim

naquele momento. Como disse anteriormente, à época, poucas pessoas saiam do

estado de Alagoas para estudar em grandes centros de estudo como é o estado de

São Paulo.

Havia, ainda, professores que não tinham feito pós-graduação. Professores

que não sabiam definir o que era um projeto pedagógico de um curso, o que era

didática no ensino superior. Outros punham em xeque a remuneração que eu

receberia por estar à disposição. Achavam moleza o trabalho já que não havia

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provas para corrigir, dentre outros compromissos que o professor tem de cumprir

como plano de ensino e de aula.

Fato é que eles estavam ali como docentes da casa e não tinham

disponibilidade de estar à disposição em todas as manhãs. Não havia do que

estarem se queixando por prováveis benefícios que tive por conta de suas próprias

limitações temporais. Alguns advogados de escritórios próprios, outros juízes e

promotores em suas respectivas comarcas, que tinham a docência como atividade

secundária.

Realmente, com aquela atividade mesmo remunerada, havia um leque de

perdas de oportunidades na advocacia, por exemplo, audiências nos juizados

especiais que ocorrem no turno matutino, audiências trabalhistas no interior do

estado, atendimento aos clientes no turno da manhã etc.

Sem deixar de apontar o que eu estaria disposto a fazer e em circunstâncias

não muito favoráveis. Alguns poucos chegaram e ofereceram solidariedade,

palavras de conforto, dizendo que a direção do curso tinha tomado uma boa solução

para o problema pontual da assiduidade dos docentes mestrandos.

Em maio de 2005, fui apresentado aos alunos do 1º ao 5º períodos como o

professor “itinerante” e, logo na primeira semana, por três dias iniciei meu trabalho

em sala de aula. Jamais imaginei que seria tão frequente minha ida às salas de aula.

Tanto foi assim que tive de me debruçar nos horários livres para preparar mais e

mais aulas ditas especiais.

Relato como foi essa experiência, a meu ver, formadora. Logo no primeiro

dia, uma segunda-feira, o docente que passaria a manhã toda com a turma não

compareceu por conta de uma aula do mestrado. Como a disciplina tinha uma carga

horária de 100 (cem) horas-aulas, a coordenação do curso, à época, resolveu

concentrar quatro aulas em uma manhã inteira, em cada turma, e em outro dia

somente uma aula para cada, já que são duas turmas em cada período. Nesse caso,

o docente estaria por três manhãs na faculdade.

Fiz minha apresentação em sala e a da proposta de trabalho para aquela

manhã. Antes que eu terminasse a minha apresentação, percebi que alguns alunos

estavam ansiosos procurando se em meu material de trabalho havia a caderneta de

classe. Constatava-se, portanto, de certo modo, o que havia sido dito pelos colegas

professores em reunião.

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Informei de imediato que não haveria frequência a ser registrada, tampouco

atribuição de nota ou ponto pela atividade a ser desenvolvida naquela manhã

inaugural e mesmo assim permaneceram 70% da turma para assistir ao que eu iria

apresentar.

Os alunos eram do 3º período e naquela oportunidade “pagaram para ver”

se o que eu havia dito sobre o que iríamos fazer naquela manhã seria proveitoso

para eles. O resultado para mim foi proveitoso, pois consegui fazer o que tinha

planejado com sucesso.

O objetivo de minha ação era levar aos alunos a necessidade de consciência

da importância da leitura de textos não só jurídicos, mesmo não sendo objeto de

uma disciplina específica daquela matriz curricular. Como não queria ser cansativo

no discurso, resumi a fala em uma hora e vinte minutos, dispensando-os em seguida

após agradecer a atenção a mim dispensada, colocando-me em seguida à

disposição da turma. Como havia entrado em sala às 08:20h e iniciei o discurso às

08:30h, saímos de sala às 09:50h, conduzidos pelo toque para o intervalo.

Contente com a receptividade e desdobramento daquilo que havia sido

objeto de preparo em um plano de aula, fui logo em seguida para a sala dos

professores, onde, acredito, adquiri informações importantes para minha formação

como docente através da escuta dos relatos de experiências vividas pelos pares.

Impressionado, no início, como as opiniões são antagônicas em matéria

pedagógica, como cada um daqueles docentes se portava diante das questões

cotidianas apresentadas. Como eram felizes e, ao mesmo tempo, insatisfeitos em

estarem na condição de docentes. Como estava no início daquela experiência, ouvia

mais do que falava sobre os temas apresentados.

Em seguida, chegaram a segunda e demais vezes em que me dirigi às salas

de aula para cumprir o mister de ser “itinerante”. Após alguns meses, em agosto,

recebi um convite de um docente coordenador de outro curso de Direito, da

Faculdade Alagoana de Administração (FAA), em Maceió, para ministrar aulas de

Direito do Trabalho a uma turma descrita por ele como problemática.

O professor havia se desentendido com a turma por conta da conversa

constante nas aulas, atrapalhando o desenvolvimento regular das atividades. O

resultado foi que pediu à coordenação para se afastar das duas turmas do turno da

noite, no final do mês de agosto de 2005.

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O coordenador após a informação prestada indagou se eu gostaria de

enfrentar aquele desafio. De pronto, disse que estava à disposição tendo em vista

que era uma disciplina que havia me especializado e estava gostando de atuar como

docente, mesmo sendo “itinerante”. Enfim, após três meses do início da atividade

docente, estava recebendo proposta e assumindo compromisso de atuar na

condição de professor titular de uma disciplina em outra faculdade prestes a ter dois

empregos formais e um escritório para dar conta.

Fiquei a imaginar quanta coisa estava acontecendo em minha vida sem que

eu me desse ao luxo de planejar. Em minha mente existia uma confusão sem ser

incômoda. Qual seria meu futuro diante de tantas novidades? Ser professor seria

meu destino, assim como se deu com boa parte dos meus familiares? Quanta coisa

ainda tinha de aprender e desenvolver.

A conjunção de professor “itinerante” em uma faculdade à proposta aceita de

ser titular em outra, toda aquela vivência, despertou em mim certo entendimento de

que gostaria de viver naquele mundo. O mundo acadêmico. Além do prazer da

atividade, percebido quando atuava como “itinerante”, havia a expectativa e

esperança de sucesso como titular. Aliado a esses sentimentos, o sentido de

dignidade quando percebi que o meu trabalho estava sendo valorizado pela minha

família contribuiu bastante para continuar investido naquele caminho.

Naquela época, comecei a receber clientes no escritório, em grande parte,

por conta da atividade docente. Aquela exposição que pode ser negativa se o

resultado no acadêmico não for bom, torna-se bastante proveitosa em matéria de

divulgação do trabalho se tudo correr bem no acadêmico.

Com o passar do tempo como professor “itinerante” e a frequência em que

estava em sala sem ser o titular, criei com os alunos um vínculo de cooperação e

respeito mútuo. Por várias vezes fui procurado na época das provas para tirar

dúvidas em diversas matérias.

Essa condição de estar apto para fazer isso se deu por conta dos cursos que

fiz em São Paulo. No preparatório para concursos nas carreiras jurídicas fiz uma boa

revisão dos conteúdos e aprendi muitos temas não dispostos na matriz curricular da

minha graduação. Aliado a esse fator, contribuíram muito as leituras diárias em São

Paulo, já relatadas, das diversas matérias que são objeto de estudo dos alunos na

graduação.

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Ensinava um pouco de Direito Constitucional, Direito Penal, Direito Civil,

Processo Civil e, por conta de minha pós-graduação, Direito do Trabalho e Processo

do Trabalho. Todo aquele trabalho favoreceu bastante para minha atualização nas

diversas áreas de concentração (Direito Público ou Direito Privado).

A atividade como “itinerante” me fez também perceber, conhecer e ter

acesso, nos dias em que não estava em sala de aula, ao corpo diretivo da

faculdade. De boa parte do que ocorre fora de sala de aula fui sendo apresentado

pela coordenação e com a observação do que acontecia nos bastidores da

faculdade fui amadurecendo em minhas percepções e convicções.

Como titular na outra instituição vivenciei a atuação do docente que

trabalhava com o diário de classe. Em primeiro lugar, o coordenador do curso

apresentou o ementário da disciplina e solicitou que eu preenchesse um formulário

em que se teria com o seu resultado de preenchimento o plano de ensino.

Explicou acerca do sistema de avaliação da IES. Quantas avaliações, média

para aprovação, prova integrada e prova final.

Em seguida, solicitou que eu elaborasse um plano de aula para o semestre.

Novamente deparo-me com outro formulário que deveria preencher. Em que pese,

tenha dado certo trabalho para preparar, mesmo tendo elaborado esses documentos

nas aulas da pós-graduação.

Portanto, não era a primeira vez que cumpria tal atividade, muito embora

fosse a primeira vez que cumpria a atividade oficialmente como docente de uma

instituição de ensino superior.

Enfim, chegou o momento em que fui apresentado como professor pelo

coordenador do curso. Naquele dia, após a saída do coordenador, informei aos

alunos que estava ali em sala para contribuir com o aprendizado de todos e que não

gostaria que fosse feito qualquer comentário quanto ao ocorrido com o docente que

estava substituindo.

Resumi aquele primeiro contato à apresentação do plano de ensino e do

plano de aula. Ao sair da sala, o sentimento foi de que os alunos estavam dispostos

a trabalhar sem gerar mais problemas, como ocorrera no passado próximo deles.

Tudo aconteceu naturalmente no transcorrer do semestre, inclusive na atividade de

professor “itinerante”.

Cumpri com o calendário acadêmico à risca, aplicando as avaliações e

lançando as notas no tempo certo e concluí o conteúdo da disciplina. Em relação

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aos alunos, observei que existia uma limitação na assimilação do conteúdo

(deficiência, acredito, oriunda de uma precária formação no ensino médio) em

relação aos discentes do turno matutino. A dificuldade dos acadêmicos em escrever,

fazer um resumo de um texto, era significativa. A maioria estava estudando naquele

turno por conta do trabalho.

Entretanto, traziam consigo uma gama importante de informações extraídas

da vivencia laboral. Como ensinava a disciplina Direito do Trabalho, as discussões

sobre as relações de trabalho ganhavam corpo e consistência através dos relatos

dos presentes, o que faltava aos acadêmicos do curso matutino quando, mesmo

como “itinerante”, discutíamos sobre temas de Direito do Trabalho. É certo que

muitas das vezes a interpretação dos fatos pautava-se no senso comum. No mundo

do ser e não do dever ser.

Extrair o que eles tinham de melhor para poder tornar a aula bem produtiva

era um desafio constante. A apatia decorrente da falta de percepção do mundo

laboral e do pouco interesse pela matéria seriam obstáculos que deveriam ser

transpostos por minha atuação em sala de aula. Tinha consciência que deveria agir

diante de tais quadros.

Busquei elementos próximos para despertar interesse dos que não se viam

inseridos nas questões apresentadas. Falava sobre o trabalho do docente,

explicando que havia ali sim uma relação de emprego, espécie de relação de

trabalho; do trabalho doméstico – bastante comum na vida dos acadêmicos.

Ressaltava que em dado momento seriam eles empregados ou empregadores, daí a

importância de se dedicarem ao estudo da matéria.

Com o tempo tive a percepção de que o meu trabalho estava gerando frutos

quando recebi no final das aulas alguns alunos buscando extrair dúvidas acerca de

casos pessoais, fazer algum comentário e, por conta disso, às vezes ficava sem o

intervalo para descanso.

Frutos principalmente para mim, já que as situações apresentadas pelos

alunos, por vezes não vislumbrei, muito menos tinha resposta imediata para

oferecer. Alguns discentes já estavam buscando naquele curso o segundo ou

terceiro diploma. Eram contadores, administradores, médicos, dentistas,

engenheiros, em busca de conhecimentos e que, de certo modo, seriam importantes

para a vida de cada um deles.

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Essa preparação e formação em outras áreas do conhecimento, sem

sombra de dúvida, agregava e agrega bastante no rendimento da turma. A reunião

dos saberes, das experiências vividas por todos que pertencem àquele espaço,

contribuem significativamente com a formação de todos.

Quando por algum motivo não invocava a participação dos alunos na análise

de um fato jurídico (acontecimento relevante para o direito) ou até mesmo de uma

legislação, ou quando a turma insistia em se manter à margem da discussão

apresentada, o resultado do trabalho restava-se e resta-se comprometido. Por vezes

fiquei inquieto nas aulas em que estive presente quando imperava o monólogo.

Em razão disso, sempre busquei a inquietação dos alunos através da

instigação à discussão dos temas. A dogmática jurídica, quando não posta em

discussão, representa para mim uma estrada sem curvas, aclive ou declive. Remete

o estudante a ideia de que o que está posto é o correto, imutável e intangível.

Com a chegada do final daquele ano rico em novidades e experiências

(2005), chegou o momento do descanso. Férias necessárias à recomposição das

energias e para mim mais precisamente momento de estudar e me preparar para

enfrentar outro desafio.

Assim que chegou o final do ano, recebi do colega coordenador do curso

noturno o convite para assumir mais disciplinas. Até então era uma disciplina

somente e matéria com a qual eu entendia ter intimidade por haver recebido preparo

na pós-graduação (Direito do Trabalho).

Portanto, recebi o convite para assumir duas turmas em que o coordenador

ministrava aulas. Naquele tempo, ele encontrava certa dificuldade de estar em sala

de aula e atender às demandas apresentadas à coordenação do curso.

A disciplina era Direito Civil (teoria geral das obrigações). Matéria que

gostava inclusive, mas não havia aprofundado o estudo além dos poucos livros

sobre a disciplina que havia estudado na graduação.

O colega disse “você vai dar conta” e eu, mais uma vez, sem reserva aceitei

de imediato. O colega fez a doação de uns três títulos que tinha repetido (visto que

recebia oferta da editora) e se colocou à disposição para tirar dúvidas.

Trouxe a novidade a casa e recebi o costumeiro incentivo da esposa. Passei

as férias entre estudar e preparar aulas para poder ter segurança no que estava a

passar para os alunos. Conforme dito antes, o ensino traz ao advogado pontos

positivos se o resultado do trabalho em sala de aula for bom. Se o rendimento for de

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regular para baixo, a coletividade entende que a ação como advogado acompanha a

de docente e o reflexo é negativo.

Em fevereiro de 2006 voltamos às aulas, naquele momento exercendo ainda

a função de professor “itinerante” no turno matutino de segunda a sexta-feira, no

CESMAC, e na condição de titular de Direito do Trabalho por duas noites e Direito

Civil por mais duas noites. Em suma, sem muito planejamento estava com grande

parte de minha vida envolvida com o mundo acadêmico. Ressalte-se que isso

refletiu nos trabalhos do escritório. Por um lado, por estar na “vitrine” que é ministrar

aulas e, por outro, mais seletivo em relação aos clientes (diminuindo a quantidade

de causas como patrono).

Alguns contratos de prestação de serviços advocatícios exigem uma maior

disponibilidade do advogado. O cliente quer consultar o profissional e ter a atenção

(resposta) de imediato. Atenção essa que fica de certa forma prejudicada, uma vez

que o profissional professor encontra-se impossibilitado de atender ao telefonema

recebido de imediato ou de receber o cliente pessoalmente no escritório.

Fato é que tudo foi acontecendo naturalmente. Como sempre fui cumpridor

das minhas obrigações de docente, conforme avaliação dos alunos e da

coordenação de ambos os cursos, o resultado foi que me tornei o professor que é

advogado e não o advogado que é professor.

Tudo andando bem na atividade docente (inclusive na função de professor

“itinerante”), até que no meio do ano de 2006, recebi convite da então Direção da

FADIMA para substituir dois docentes titulares de Direito Civil (teoria geral das

obrigações) e (teoria geral do direito civil) no turno matutino. Comprometendo,

portanto, a função do professor “itinerante”. À época, o motivo que deu causa a

função de “itinerante” foi a constante falta dos docentes que estavam pagando os

créditos do mestrado. Com o pagamento dos créditos, esses colegas voltaram à

normalidade em relação à frequência.

Em seguida, receberam dois dos colegas professores, convite para serem

coordenadores de um curso de Direito em Maceió. Como resultado do afastamento,

assumi o lugar deles em sala de aula em um primeiro momento como “itinerante”,

posteriormente como professor regular.

Com todos os colegas que convivia nos cursos em que ministrava aulas

sempre mantive um bom relacionamento. Por vezes, esses colegas que estavam

cursando o mestrado recebiam propostas para ensinar e quando havia algum

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impedimento lembravam-se do meu nome e recomendavam às instituições de

ensino.

Incentivavam-me também para que fizesse um mestrado, mas eu estava

curtindo muito a condição de professor e, além disso, naquele momento, submeter-

me ao processo seletivo do programa demandaria tempo e perda de renda

necessária ao pagamento de minhas obrigações que aumentaram com a notícia de

que minha esposa estava grávida. Entretanto, não descartava a possibilidade de me

submeter em um futuro próximo à seleção para o programa de mestrado.

Mais um ano chegara ao seu termo e a minha relação com o ensino ficava

mais estreita. No início de 2007, mantive a carga horária de docente titular em

ambas as faculdades e recebi convite da Direção do curso de Direito da FADIMA

para trabalhar no Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão (NEPE), orientando

alunos nos trabalhos de conclusão de curso (TCC) em plantões.

Em razão desta disposição no núcleo passei a orientar alunos em trabalhos

de conclusão de curso. Fui orientado pela coordenadora do núcleo Professora

Mestra Sônia Albuquerque, a quem sou muito grato, a estudar um pouco mais de

metodologia da pesquisa jurídica através dos livros dispostos na biblioteca da

faculdade e aprendi bastante com suas orientações. Passei em razão disso a ter um

número acentuado de atendimentos distribuídos em dez horas semanais.

Com a função nova, fui lançado no rol dos docentes que participavam de

bancas de trabalho de conclusão de curso e, muitas vezes, convocado como

suplente no caso de ausência dos colegas avaliadores.

A atividade trouxe-me o desejo de participar de um programa de mestrado e

desenvolver pesquisa. Lá eu descobri que se podia fazer pesquisa na graduação.

Bolsas inclusive para alunos e docentes orientadores. Mas, para esse trabalho

faltava-me o atendimento do quesito pós-graduação stricto sensu.

Passei, no primeiro semestre de 2007, a atuar duas manhãs como docente

em sala de aula e por duas manhãs e meia atuava no núcleo. No turno da tarde,

continuava a ir ao escritório ou às audiências. No turno da noite, passava quatro

delas em sala de aula. Numa dessas noites, em sala de aula, recebi a ligação de

minha esposa para levá-la ao hospital, pois nossa filha nasceria naquela noite ainda

– a preocupação se deu porque estava laçada pelo pescoço com o cordão

umbilical).

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Interessante como a docência fazia parte de minha vida a ponto estar

ministrando aula naquele momento tão sublime de minha vida (momento em que

recebi a notícia de que minha filha nasceria com oito meses de gestação). Tudo

correu bem e as aulas que sucederam estavam cheias de um desgaste físico

enorme por conta das noites em claro.

No segundo semestre de 2007, recebi um convite para trabalhar na

assessoria do então Procurador Geral do Estado de Alagoas. Aceitei o convite tendo

em vista que tinha o interesse de conhecer como era a atuação do advogado na

advocacia pública.

Em um dos órgãos que atuei (procuradoria administrativa), tive a

oportunidade de conhecer a legislação estadual quando a matéria era educação. Era

constante a análise de solicitações de progressão de classe por tempo de serviço ou

qualificação técnica, solicitação de licença remunerada ou não para aprovados em

certames de programas de pós-graduação stricto sensu.

Questão interessante foi que sempre tive a curiosidade de ler um pouco de

cada projeto de pesquisa aprovado, mesmo a matéria sendo distinta ao programa de

mestrado em direito. Como professor identificava-me bastante com as questões

apresentadas que versavam sobre temas como avaliação, métodos de ensino,

gestão educacional, ensino fundamental e médio.

Por vezes, ficava indignado quando em alguns casos o pedido de licença era

indeferido por conta de carência de servidores docentes. Pensava, como pode a

educação básica, fundamental e média pública, em nosso país, passar por uma

melhoria se não existe respaldo estatal suficiente para uma qualificação permanente

de pessoal. Principalmente no pedido de licença sem remuneração, onde não havia

ônus para o erário.

A experiência foi proveitosa. Lá na Procuradoria conheci procuradores que

também lecionavam em cursos de Direito em Maceió. Certa vez, lendo um processo

de pedido de licença remunerada de um procurador que iria se afastar para fazer um

doutorado na Espanha, comecei a imaginar um plano para que eu pudesse me

submeter a uma seleção de programas de Mestrado. Plano, pois dependia de alguns

fatores que fugiam a minha esfera de competência e esforço.

Um dos pontos seria o impacto financeiro (custo do curso) e o segundo era

que teria, de certa maneira, de ter tempo para poder estudar e produzir no

programa, caso obtivesse aprovação.

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Por estar na procuradoria e não haver possibilidade de afastamento para

servidores de cargos comissionados, como já contava com o salário para

cumprimento das despesas novas (paternidade), descartei a possibilidade de fazer a

inscrição no programa de mestrado em Direito Constitucional da Universidade

Federal do Estado de Alagoas (UFAL).

Pesquisei sobre cursos de Mestrado na rede, deparei-me com a oferta de

cursos de pós-graduação stricto sensu nas férias escolares, nos meses de janeiro e

julho no Paraguai e na Argentina. Conversando com uma colega advogada que

trabalhava também na assessoria da procuradoria sobre o assunto, ela me deu a

informação que dois procuradores eram alunos de um programa de doutorado na

Argentina.

Quando encontrei com um dos procuradores perguntei o que ele estava

achando do curso. Respondeu que era bom e que recomendava, mas fez a ressalva

de que para a procuradoria o título (para progressão vertical) era aceito, mas quem

havia concluído o curso encontrava dificuldade para validar o título no Brasil. Falou

que existia um Decreto do então Presidente Luís Inácio Lula da Silva ratificando um

acordo de cooperação entre os países do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL)

para fins acadêmicos.

Com essas informações entrei em redes sociais, buscando comunidades no

Orkut que falavam sobre os cursos. Eram muitas as comunidades e nos fóruns tirei

muitas dúvidas decidindo por fim, arriscar.

Arriscar já que houve quem dissesse que o curso não era reconhecido. Que

seria jogar tempo e dinheiro fora. O que importava para mim, no momento, seria o

que o curso me ofereceria em termo de conhecimento.

Conversei com um colega docente e este se mostrou interessado. Em

seguida disse que outro colega também tinha interesse. Marcamos um almoço e

decidimos que faríamos a seleção do programa de Doutorado da Universidad Del

Museo Social Argentino (UMSA).

Seleção essa pautada na análise do nosso currículo. Juntamos a

documentação em conjunto e aguardamos o resultado. Dias após, recebemos a

notícia de que fomos aceitos no programa.

Em 2008, fiz uma reserva de dinheiro para custear as despesas com a

estada em Buenos Aires (15 dias em janeiro de 2009) para o primeiro dos quatro

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módulos. Chegando o momento, viajei e assisti às aulas por quinze dias no turno da

manhã e da tarde.

Para mim, tudo estava tranquilo. Boas aulas e organização do curso. O

corpo docente tinha vasta publicação e notoriedade naquele país. Apresentamos um

seminário na segunda semana sobre História do Direito e retornamos em seguida.

Em Maceió, no mês de abril de 2009, pesquisando sobre validação dos

cursos de Doutorado no Brasil obtive a informação de que a Universidade Federal

de Santa Catarina (UFSC) suspendera os processos de validação de títulos obtidos

no exterior. O que acontecera nas demais Universidades do Brasil que faziam o

mesmo procedimento.

Foi um balde de água fria sobre a minha cabeça. Não obstante eu tivesse a

vontade de buscar a qualificação profissional, o custo era alto e o retorno através do

reconhecimento seria algo necessário ao bom e fiel cumprimento de atividades de

pesquisador.

De nada adiantaria para os programas de bolsas o meu título obtido na

Argentina se não fosse validado por uma IES brasileira. Como não poderia orientar

os alunos em programas de iniciação científica desisti do curso muito frustrado com

o ocorrido. Assim também fizeram os demais colegas companheiros de viagem.

Passei o ano de 2009 exercendo as funções de docente em sala de aula e

no NEPE da FADIMA/CESMAC. Como também continuava a ensinar na FAA. Cada

dia que passava adquiria mais experiência no trato com os alunos e com os colegas

professores. Conforme dito anteriormente, o mundo acadêmico fazia parte da minha

vida e nele eu me sentia bem.

Em outubro de 2009, fui convocado pelo coordenador do Curso de Direito da

FADIMA para comparecer em sua sala. De pronto, o Professor/Coordenador

perguntou onde eu estava trabalhando no turno da tarde. Respondi que estava na

Procuradoria Geral do Estado com o cargo de assessor. Ele perguntou quais eram

as atribuições do assessor e respondi aos questionamentos.

Em seguida, o coordenador me disse que existia um novo turno (vespertino)

em andamento e que havia a necessidade de alguém para ajudá-lo no cumprimento

de suas funções de coordenador. Ressaltou que não havia possibilidade legal dele

estar fisicamente nos três turnos e precisaria de um assessor que fosse um

professor da casa.

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Disse-me qual seria a remuneração e atribuições do cargo e me fez o

convite. Aceitei prontamente, já que tinha grande admiração e confiança naquele

que havia sido meu professor.

Na mesma semana, pedi minha exoneração ao Procurador Geral explicando

as razões e agradecendo a oportunidade. Pedido aceito, seguido do desejo de

sucesso no novo trabalho, uma vez que iria atuar na gestão do curso em que ele

também ministrava aulas há anos.

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5 UM COORDENADOR DE CURSO  

Após a narração das experiências deste advogado-professor-pesquisador-

gestor, destacamos que o propósito da presente pesquisa é compreender e desvelar

os elementos constituintes de um distanciamento, de um hiato existente entre o

acadêmico e o administrativo, a partir da posição do profissional docente, para o

profissional que assume o cargo de gestão.

Nóvoa (1992, p. 25) se refere à formação dos professores, como sendo uma

arte a ser construída diariamente:

A formação não se constrói por acumulação (de recursos, de conhecimento ou de técnica), mas através de um trabalho de reflexividade sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso, é tão importante a pessoa intervir e dar um estatuto ao saber da experiência.

Em atividade na coordenação acadêmica, o professor que passa a condição

de gestor também pode, através da revisitação de suas experiências, construir uma

identidade pessoal. Não simplesmente através de cursos, como aduz o autor,

constrói-se uma identidade profissional.

De acordo com Berkenbrock-Rosito (2008), a formação de professores

através do resgate de suas histórias parte do pressuposto de que as fontes

formativas não se limitam à apropriação do conhecimento no espaço do ensino

universitário. Portanto, não deve ser considerado somente espaço de formação o

que se tem no ensino universitário em que pese sua importância.

Izquierdo (2004, p.31) afirma que memória é a aquisição, conservação e

evocação das informações, dos fatos vividos por cada indivíduo. Diz ainda que

“nada somos além daquilo que recordamos”.

Em consonância com esse entendimento, Brandão (2008, p. 10) assevera:

Nesse contexto amplo, consideramos a memória autobiográfica como uma promissora possibilidade metodológica de formação continuada e auto-formação, instrumento de resgate das trajetórias e projetos, por meio das narrativas num tempo-espaço da cultura e com uma função ressignificante, ponte entre o passado e o futuro, que incorpora todo o vivido, re-construído e aponta para a compreensão de um sentido-saber rearticulado, refeito, religado.

O desvelar dos sentidos e dos significados do texto narrativo se traduz como

espaço de formação para além do conhecimento bancário na visão freiriana. Para

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Paulo Freire (1973, p. 125), o despertar a consciência crítica é uma práxis

libertadora, tendo em vista que,

[p]ara que a alfabetização dos adultos não seja uma pura mecânica e um simples recurso à memória, é preciso dar-lhe os meios de se conscientizar para alfabetizar-se [...], pois, à medida que um método ativo ajuda o homem a tomar consciência da sua problemática, da sua condição de pessoa, e logo de sujeito, ele adquirirá os instrumentos que lhe permitirão fazer escolhas [...] Então, ele se politizará a si mesmo.

Na atual conjuntura, de hiato entre o acadêmico e o administrativo, a

construção e a identidade do gestor acadêmico e professor passa por uma

necessária análise da prática e da vivência. Desse modo, o método ativo, conforme

dito, de tomar consciência da problemática na condição de sujeito em formação

permite ao professor-coordenador se valer de instrumentos formadores e

libertadores.

Fazer uma análise dos fatos cotidianos em uma coordenação de curso

pressupõe, inicialmente, a descrição desses fatos pelo autor pesquisador. O resgate

da memória de experiência vivida é tarefa que o pesquisador em sua formação deve

proceder para a obtenção de resultado.

Josso (2004, p. 47) sugere uma abordagem de formação na visão do

paradigma experimental ao expor a concepção de que a experiência é única e

pessoal:

Falar das próprias experiências formadoras é, pois, de certa maneira, contar sobre si mesmo a própria história, as suas qualidades pessoais e socioculturais, o valor que se atribui ao que é “vivido” na continuidade temporal do nosso ser psicossomático. [...] é também um modo de dizermos que, neste continuam temporal, algumas vivências têm uma intensidade particular que se impõe à nossa consciência e delas extrairemos as informações úteis às nossas transações conosco próprios e/ou com o nosso ambiente humano e natural.

Assim, a compreensão de uma experiência formativa de coordenação

acadêmica, por meio do relato de experiência, possibilita ao autor do trabalho

construir e buscar o significado de sua práxis. O papel social da escola, mais

precisamente do curso de direito, tem sido hoje, também, objeto de discussões

acadêmicas. Temas como inclusão e equidade social interessavam bastante e foram

divisores de águas no momento de minha escolha profissional.

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Daí a importância da análise da linha do tempo como de formação do sujeito

professor. Estendendo essa reflexão para a formação do gestor que, a meu ver, não

perde a raiz do acadêmico por mais que haja circunstancialmente um hiato.

Passegui (2004, p. 74) afirma que:

As histórias de vida, nesse sentido, permitem a observação de como as experiências de transformação vão sendo geradas e compreendidas e se revelam como um material “perfeito” para apreender os segredos da historicidade do sujeito.

A mudança da condição de professor para professor gestor revela que essa

transformação é um marco importante na vida dos sujeitos, originando mudanças de

comportamento e postura, ou seja, na visão de Passeggi (2004) um material

“perfeito”.

Desse modo, através do relato de experiência (a família, a escola, a religião,

a advocacia, a docência e o acadêmico) proporcionaram para mim a possibilidade

de enxergar o mundo e de refletir sobre minhas ações e transformações.

Ao revisitar as experiências que permanecem na memória, em minha

biografia, busco a compreensão do sentido de minha prática. Desse modo, Souza

(2006, p. 17) faz as seguintes considerações acerca do objetivo do método

(auto)biográfico:

Os caminhos trilhados desde o início do século XX e os embates travados em diferentes campos do conhecimento têm permitido melhor compreender e a reafirmar as abordagens biográfica e a utilização da narrativa (auto)biográfica, como opção metodológica para a formação de professores, visto que a mesma possibilita inicialmente um movimento de investigação sobre o processo de formação e, por outro lado, possibilita, a partir das narrativas (auto)biográficas, entender os sentimentos e as representações dos atores sociais no seu processo de formação e autoformação.

Passo a narrar os acontecimentos quando da transformação da condição de

docente (de “itinerante” à titular) simplesmente para o professor que atua na gestão

acadêmica a fim de poder, através da pesquisa, desvelar e compreender

sentimentos e representações no contexto de distanciamento, hiato nesse processo

de formação e mudança.

Fui apresentado à reitoria como novo integrante da coordenação do curso e

recebi as boas vindas e os votos de sucesso em minha nova jornada. Em seguida,

apresentado aos alunos da tarde pelo coordenador do curso que, naquele instante,

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disse a eles que eu teria autonomia para resolver os problemas que surgissem.

Conforme a fala do coordenador acadêmico, “falando comigo, os alunos estariam

falando com ele”. e preocupação ao mesmo tempo. Conforto, pois percebi que foi

depositado confiança no meu trabalho e preocupação por conta da quantidade de

situações que iria enfrentar sem ter experiência e prática em gestão acadêmica,

inclusive conhecimento específico teórico.

O coordenador disse que era tranquilo e que eu facilmente estaria adaptado

à nova atribuição. Após a apresentação aos alunos fomos à sala da coordenação,

onde recebi as primeiras instruções de como despachar os processos e a quem

deveria remetê-los, caso não fosse da competência da coordenação a apreciação da

matéria.

Percebi que, na maioria dos casos, o que estava sendo requerido pelos

discentes eram análise quanto à frequência deles e dos docentes, notas, mudança

de turno, mudança de sala por conta da questão acessibilidade no prédio, postura

dos docentes e alunos.

Na sua essência, portanto, nada que eu de certa forma não tivesse

conhecimento. Fui formado por aquela instituição e já ministrava aulas há quatro

anos, ou seja, existia um histórico, uma experiência na casa tanto como aluno que

fui por cinco anos, como docente que estava naquele momento passando para um

novo momento de atuação.

Muitos dos requerentes tinham sido meus alunos e muitos dos docentes,

meus professores. De sorte que isso favoreceu na análise do que estava sendo

requerido. Na alegação dos fatos pelos alunos e também da narrativa dos docentes.

No primeiro dia, fiz solicitação ao coordenador de que informasse,

objetivamente, quais eram as minhas atribuições. Até onde eu poderia decidir sobre

questões que eram apresentadas.

Acredito que tal preocupação decorre da influência de meu pai na minha

infância, dado o rigor da minha formação inicial em relação aos limites quando o

tema era liberdade de agir conforme às minhas convicções. Com frequência,

costumava a dizer “todo pensar é torto”, assim que eu me equivocava e em razão

disso eu dizia: “eu pensei que”.

Percebi mais uma vez que o coordenador me deixou à vontade para tratar

de questões básicas do dia-a-dia e quando houvesse uma situação mais delicada eu

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poderia entrar em contato com ele por telefone ou e-mail. Autonomia que não estava

acostumado na tomada de decisões.

Ao compreender a nova estrutura hierárquica institucional, percebi que se

tratava de um corpo gestor formado por profissionais qualificados, habilitados e com

farta experiência acadêmica e em administração.

Fui bem recebido pelas instâncias superiores e obtive uma abertura para

sempre que houvesse necessidade ter acesso aos membros do corpo diretivo da

instituição. Essa acessibilidade, abertura, foi importante para que eu pudesse

enfrentar as questões.

Infelizmente, nem todas as instituições particulares de ensino superior têm

em seu corpo e forma de conduzir a gestão, pessoas preparadas e disponíveis.

No mesmo encontro, solicitei uma cópia do regimento geral da instituição.

De pronto, foi atendido pelo coordenador o meu pedido e solicitei a um colaborador

que providenciasse uma cópia. Assim que recebi, estudei o documento

minuciosamente. De certo, após a leitura, fiquei mais confiante em atender aos

alunos, fato que se tornou uma constante em minha vida.

Por turno vespertino, à época, atendia diariamente em média uns dez alunos

pessoalmente e despachava não me recordo o número preciso, mas acredito que

uns dez processos também em média. Atendia também às solicitações dos colegas

professores com os quais conversava constantemente.

Fator importante foi o de poder, também, ministrar aulas no turno vespertino.

Isso fez com que eu conhecesse e me aproximasse mais dos alunos. Percebi que

essa aproximação com os alunos tem de ser comedida, uma vez que notava, em

certos casos, um grau de liberdade que não agregava na relação da coordenação e

discentes.

Em sala de aula, agora como docente, percebia e refletia sobre a postura

dos alunos quando do desenvolvimento das atividades rotineiras e esporádicas.

Desse modo, sabia ao observar a postura deles, em muitos casos, se a alegação

dos fatos narrados na coordenação em desfavor dos docentes era procedente.

Identificava qual aluno não cumpria com suas obrigações; chegava atrasado;

qual aluno participava da aula positiva ou negativamente; quem tinha boa postura e

compromisso.

Quanto aos colegas, também tive a oportunidade e o interesse de conhecer

a forma como trabalham naquele turno. Assiduidade, pontualidade, interesse em

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colaborar com o bom andamento das atividades e, acima de tudo, o trato com os

alunos era ponto importante para que eu estivesse sempre, na medida do possível

conhecendo a alegação e repercussão dos fatos.

Nos intervalos, quando não atendia aos alunos e professores, procurava

estar presente para ouvir suas experiências, anseios e preocupações nas atividades

em sala de aula. A partir das informações colhidas, procurei, ainda naquele

momento inicial em gestão acadêmica, ter um discurso com meus pares de

aproximação e cooperação, em que pese ainda não saber, ao tempo, a distinção

entre trabalho em grupo e trabalho em equipe.

No atendimento aos alunos, o primeiro ponto que observei em comum em

relação à minha atividade como advogado era o de que não me procuravam com

soluções e sim com necessidades a serem atendidas.

Que neste caso particular (acadêmicos de direito) guardavam um ar de

necessidade de pronto atendimento superior à expectativa de alguém que buscava

uma solução em meu escritório. É recorrente na sala dos professores a fala dos

colegas orientadores de classe “o aluno do curso de direito é cheio de direito”.

Isto se dá, visto que em muitos casos, os alunos entendem que o serviço

prestado pela IES é puramente uma relação de consumo. O que para mim não

procede em sua integralidade. Porque assim como o negócio jurídico casamento é

um contrato sui generis, o ensino privado também é uma relação jurídica de

consumo sui generis.

Ressalte-se ainda que a atividade desenvolvida pela IES não deva ter como

primado a ideia de satisfação plena do cliente, por mais que se busque atender às

necessidades pontuais sempre que possível. Fato esse, muitas vezes,

lamentavelmente relatado por colegas docentes e gestores de outras instituições

privadas.

Por sorte, percebi que não seria e não é essa a política da IES onde trabalho

na gestão acadêmica. Recebi e recebo alunos exigindo, de pronto, providências

urgentes em matérias que não são urgentes. Desse modo, entendi que na gestão

acadêmica devemos ter um espírito de composição de interesses. Cada um que

recebo na coordenação traz consigo expectativas e desejos e, às vezes, não temos

como atender a essas demandas por não encontrarmos amparo regimental ou legal.

Todavia, sempre que pudermos ser úteis seja como docente ou gestor, deveremos

sê-lo com satisfação.

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Fiz constantemente o papel de intermediador, gestor de conflitos entre

alunos e docentes e alunos e instituição de ensino. Nem sempre fui compreendido

quando expliquei e fundamentei indeferimentos com base nos comandos legais e/ou

regimentais. Busquei sempre, desprovido de empáfia, dizer não quando necessário

fosse.

Vislumbro que trabalhar com sujeitos nessa relação tão direta e perspicaz

pressupõe um compromisso ético mesmo quando for para negar a uma solicitação

feita ou não ser omisso quando devo prontamente falar o que penso. Percebi o quão

amplo e complexo é o ser professor. De imediato identifiquei alguns docentes que

flagrantemente estavam insatisfeitos com o trabalho docente. Seja pela realidade

social de baixa remuneração do docente seja pela desmotivação gerada pelo

despreparo dos alunos ingressantes em um curso superior. Essa pauta é recorrente

no discurso dos docentes na sala dos professores.

Naquele momento, encontrei a primeira barreira que foi desconhecer a

legislação educacional. Não conhecia também a composição, órgãos e instâncias do

Ministério da Educação. Tudo para mim era novo e abrangente. Contudo, imbuído

da necessidade de conhecer a estrutura fui buscar no dia a dia suprir a carência por

meio da leitura e interação com os gestores do Centro Universitário.

Com a mudança na formatação da IES recentemente para Centro

Universitário fez com que eu tivesse a oportunidade de vivenciar muito desse

processo através de reuniões com o corpo diretivo; reuniões e palestras com

profissionais externos (consultorias).

Profissionais competentes, compromissados e dispostos a colaborar,

compartilhavam e compartilham ainda suas vivências e conhecimentos técnicos

advindos de longos anos de trabalho, alguns de Universidades Federais, outros de

instituições privadas e também de nossa instituição.

Portanto, não faço parte de instituição particular de ensino superior com

gestão fechada e excessivamente tradicional, não afeita a mudanças, fato recorrente

em algumas empresas familiares. Essa falta de abertura e forte centralismo refletem

em problema de gestão em instituições de ensino superior particulares. Vejamos:

O tema da gestão nas particulares é o que se pode considerar uma verdadeira “caixa preta”. Principalmente entre aquelas dirigidas por um padrão tradicional e familiar, a inovação organizacional, incluindo-se a implementação de adequados sistemas de informações gerenciais, de planejamento e avaliação, esbarra em grandes

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entraves, sobretudo decorrentes de um forte personalismo e centralismo, que impedem novas iniciativas ou as cerceiam, procurando ajustá-las ao desejo dos proprietários da instituição (TRIGUEIRO, 2002, p. 155).

Passei a entender que, sem desprezar o ideal de seu fundador, necessário

seria que a IES fosse adaptada à realidade econômica global. No final dos anos

1990, houve no Governo do então Presidente da República Federativa do Brasil uma

mudança no cenário educacional com a autorização e criação de diversos cursos de

Direito em todo o País. Alagoas não fugiu a essa realidade.

Pensar em concorrência não foi algo tão próximo à realidade como na

atualidade o é, principalmente quando essa se desdobra muitas vezes com

deslealdade das novas IES na busca por alunos de outras instituições concorrentes.

Avaliar e perceber ainda a importância de que na atualidade as exigências

do Ministério da Educação (MEC) quando o assunto é avaliação (SINAES) são muito

maiores nos cursos, foi um marco importante dentro do Plano de Desenvolvimento

Institucional (PDI) da IES. Pensar e participar da elaboração de um novo Projeto

Pedagógico atendendo aos ditames legais foi mais um desafio, já que ainda não

havia sequer sido apresentado ou lido algum desses documentos.

Aos poucos organizei as informações adquiridas nas constantes reuniões

com o novo corpo diretivo da IES, dentro da mudança necessária apresentada. Uma

das principais mudanças foi em relação à Gestão do então Centro Universitário

CESMAC.

Antes, a estrutura hierárquica era delineada da seguinte forma: Presidência,

vice-Presidência, Conselho, Direção dos Cursos (responsável pela gestão geral de

cada faculdade), Coordenação acadêmica (responsável pela gestão acadêmica) e

assessoria da coordenação acadêmica.

Como agora se trata de um Centro Universitário o modelo é outro. Temos

Reitoria, Vice-reitoria, Pró-reitorias acadêmica e adjunta, Coordenação de curso

(reunindo a gestão administrativa e acadêmica) e assessoria da coordenação. Essa

gestão coordenada por profissionais experientes e abertos às mudanças

necessárias trouxe melhoria ao curso.

Não pude esquecer que as atuais exigências advindas do Ministério da

Educação (já que houve a migração da jurisdição quando o assunto é avaliação dos

cursos), do Conselho Estadual de Educação para a competência do MEC, trouxeram

uma mudança de paradigma positiva e definitiva.

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Multiplicaram-se as atribuições do coordenador de curso. O envolvimento

deste gestor quando o assunto é a vida e sobrevivência do curso é muito maior. Não

cabe agora somente ao coordenador pensar em quadro de docentes (substituições,

contratações), horários e projeto pedagógico do curso. Dentre outras atividades

disciplinadas nos regimentos internos dos cursos, que extrapolam as atividades

cotidianas estão as seguintes: representar a IES perante autoridades e outras

instituições de ensino; decidir sobre pedidos de matrícula, cancelamento de

matrícula e transferência; convocar e presidir as reuniões de colegiado; compor e

presidir o NDE; elaborar o relatório anual das atividades da IES; zelar pela

manutenção da ordem e da disciplina no âmbito da IES, respondendo por abuso e

por omissão; propor à mantenedora contratação ou dispensa de pessoal docente;

promover as ações necessárias à autorização e reconhecimento de curso etc.

A atuação transpõe desde a qualificação através do conhecimento dos

ditames legais, estabelecidos pelo MEC, até o atendimento de questões básicas

como o atendimento direto, imediato e pessoal ao aluno e manutenção do prédio.

Em algumas faculdades (felizmente não a que atuamos na gestão), tive

conhecimento por meio de conversa com colegas coordenadores, de que dar conta

da captação de alunos é atribuição do coordenador. Chama-se coordenador gestor.

Em breve, não havendo equilíbrio, o coordenador de curso estará com uma meta de

captação de “clientes” a cumprir, sob pena de desligamento, o que espero que não

esteja acontecendo.

Com essa ampliação de atribuições do coordenador do curso, referindo-me

as pertinentes, há a necessidade de uma dedicação bem maior, inclusive com uma

maior carga horária à disposição a depender do curso, número de docentes,

colaboradores e número também de discentes.

Em nosso caso, como o curso funciona nos três turnos, o trabalho é intenso.

São quase 2.700 alunos e 85 docentes. Imaginemos agora que com essa migração

para o MEC há a necessidade de nos preocuparmos ainda com o Exame Nacional

de Desempenho de Estudantes (ENADE). Trata-se da questão de sobrevivência do

curso.

Compreender o Conceito Preliminar de Curso (CPC), e inserido nele o

ENADE, não é uma das tarefas mais fáceis. Na ocasião, assistimos às palestras

(workshops) sobre o tema. Como e por quem são elaboradas e contextualizadas as

questões? Quais os alunos serão submetidos ao exame, de que forma a

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coordenação deve agir para levar ao conhecimento de alunos e professores a

importância e o significado do exame para o desempenho de ambos. São

questionamentos que precisam de respostas céleres e consistentes da coordenação

do curso.

Por meio dessa necessidade tentarei demonstrar os maiores enfrentamentos

do gestor acadêmico quando o tema é esse exame. A falta de conhecimento dos

docentes e alunos sobre o ENADE é um dos fatores ou problemas mais sérios

quando o assunto é a sobrevivência do curso.

Um ponto relevante e fator imprescindível é a colaboração e cooperação de

todos os envolvidos. Por conta disso, é necessário que ambos os atores sociais

cativados (reitoria – coordenação – discentes – docentes) estejam engajados nessa

batalha; sejam copartícipes desse trabalho árduo, que se não for bem articulado

desencadeia sanções ao curso, como o corte de vagas.

Inicio a análise desses fatores na problemática em relação à coordenação

de curso e docentes. Por mais que imaginasse que seria simplista a questão, ou

seja, a coordenação dá as diretrizes, aponta o caminho a ser percorrido e os

docentes conhecedores do assunto se envolvem e colaboram para que alcancemos

os resultados almejados. Fato é que nem sempre há uma abertura dos docentes a

essa modalidade de avaliação.

Como o tema era avaliação, iniciei com a solicitação que fizemos de

padronização do modelo de questões. Intervir na autonomia do docente é tarefa que

demanda do gestor um bom jogo de cintura. Acesso e abertura para ouvir o discurso

de mudança é requisito essencial para que o trabalho seja realizado. A zona de

conforto nos remete, muitas vezes como docentes, a uma estagnação no processo

de evolução de um processo deveras dinâmico.

Procurei sempre conversar individualmente com os colegas professores,

demonstrando a necessidade de mudança para atender aos requisitos objetivos da

legislação, sem deixar de levar em consideração as particularidades. Ora somos

bem recebidos e a abertura para o diálogo é imediato. Ora temos de nos desdobrar

para tanto.

Por diversa vezes, na sala dos professores, disse que seria muito oportuno

que os colegas professores tivessem alguma experiência na gestão do curso. Com

certeza, a visão dos que hesitam em colaborar seria outra. O professor tem um

papel muito importante nesse momento de transição. Como formador de opinião que

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é, pode contribuir significativamente nesse processo de divulgação das novidades e

conscientização dos pares e alunos.

Nas conversas que tive, percebi que o espaço era propício para a discussão

do tema que, muitas vezes, é complexo e profundo, tendo em vista que, sem a

colaboração dos docentes o resultado provavelmente não seria satisfatório.

Compartilhar as experiências vividas na coordenação com os docentes era

uma forma de conhecerem os principais desafios enfrentados pelos gestores e

outros colegas professores, pois aprender exige humildade.

Entendi que a relação do profissional docente com o outro não é

individualizada, mas coletiva, desse modo, a perspectiva e a abordagem de trabalho

muda. Como o docente em diferentes espaços e momentos age conforme a sua

experiência, intuitivamente não pode o gestor acadêmico deixar de levar em conta

essas individualidades.

Muito embora se faça necessário o conhecimento dogmático, a intuição e

sensibilidade do gestor acadêmico refletem na postura do colega professor em

relação ao acadêmico. Cotidianamente, o conflito de opiniões, as inúmeras

informações previamente adquiridas pelos atores sociais, alunado e docentes, fazem

com que a procura do equilíbrio passe também pela necessidade de se manter a

ordem no desenvolvimento do trabalho.

Conforme aduz Ecleide Cunico Furlanetto (2008, p. 19):

Pensar em processos de formação docente requer pensar em como abrir espaços para que as matizes pedagógicas dos professores possam ser acolhidas, revisitadas, ampliadas e transformadas nos espaços de formação. Não existem receitas prontas, mas acreditamos que na medida que nos aprofundamos na compreensão dos processos de aprendizagem docente, vamos construindo referências que nos permitem fazer escolhas e definir caminhos mais adequados às formas de aprender dos professores.

Ponto importante, portanto, nesse processo de formação é que se deve

buscar a congregação de interesses no discurso, já que não existem modelos

prontos. O estar próximo e compartilhar os valores pessoais são indícios de um bom

caminho de aproximação.

A visão do homem interfere na vontade de colaborar, no compromisso que

nasce dessa vontade, criando-se uma identidade de grupo em constante formação e

transformação. A não concordância com determinado plano de governo (identidade

política) pode gerar uma apatia ou antipatia prejudicial ao avanço do trabalho. Se a

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visão de educação muda com a política (partidos políticos) que sempre trazem

novas políticas públicas de educação, muda-se inclusive o referencial teórico

aplicado em consequência.

Se o propósito do alunado é quase único: passar em concurso e/ou no

exame da OAB. O que deve fazer o coordenador para colaborar? Como despertar o

interesse dos alunos para as atividades extracurriculares e curriculares do curso

ainda não integralizado os créditos? Esse é um desafio que vivenciamos.

O coordenador de curso necessita conhecer o impacto que essa

necessidade precoce de aprovação impõe aos alunos e docentes. Frise-se que

antes do momento devido os discentes e docentes ficam tensos com o propenso

resultado.

Mesmo que tenha passado quando da primeira vez que prestei o exame,

percebi que errei questões por conta da ansiedade de desejar passar logo por

aquele obstáculo na vida. Diante disso, reflito como pode um gestor acadêmico

intervir para que esse tipo de problema emocional dos concluintes não possa refletir

em seu rendimento no exame. A resposta primária veio com a possibilidade de

acompanhamento psicológico oferecido pela IES.

Atender à demanda de mercado não deve ser a razão pura de um curso

superior. Imaginar que o ensino jurídico deve ser considerado um produto próprio

para consumo, pois está na prateleira com um selo de qualidade conferido pela

CAPES é no mínimo perturbador.

Sabe-se que o propósito de tais medidas do MEC é a busca pela

denominada e abrangente “qualidade”. Concordo que se não houver o controle

estatal será prejudicial à coletividade. Tentar extrair desses índices se está existindo

formação além da profissionalização no ensino jurídico é algo que merece atenção

dos responsáveis pela elaboração desses sistemas de avaliação. Formar indivíduos

em uma concepção ampla deve ser levado em consideração.

A análise de conteúdos como solidariedade, cidadania e busca pela justiça

social deve ser levada em consideração para a formação do sujeito que pretende

atuar nas ditas carreiras jurídicas. Esse foi, conforme dito anteriormente, um dos

motivos pelos quais tive a certeza de que estudaria Direito.

Ressalto que a IES em que trabalho na gestão tem tido uma importante

participação nessa minha contínua formação docente. As situações que são

apresentadas e vivenciadas, tanto na atividade docente, como na coordenação

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acadêmica, têm sido fundamentais nesse nosso processo de contínua formação e

transformação. Trata-se de reconstrução necessária e contínua em razão do

afastamento decorrente da posição de trabalho em função administrativa assumida.

Tornar evidente aos colegas a necessidade de mudança de comportamento

e concepção é uma das mais relevantes tarefas da gestão acadêmica do curso.

Identificar os colaboradores que estão ou não efetivamente contribuindo com o

desenvolvimento e adaptação da IES a esses ditames oriundos do Sistema

Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) é ponto crucial na atividade

de gerenciamento acadêmico estratégico.

A resistência a mudanças é uma questão a ser analisada e enfrentada com

cautela pela gestão acadêmica. Os hábitos deverão ser notados não só

individualmente e sim em pequenos grupos pelo gestor. Percebi a necessidade de o

acadêmico estar preparado para enfrentar esses desafios não só com boa vontade

e vivência, mas acima de tudo com o conhecimento teórico para tanto.

Esse é realmente um obstáculo que tenho, para tanto, busquei transpor

através de leitura e revisão de leitura dirigida quando o tema é trabalho com

docentes. Confesso que tenho compreendido melhor a atuação do professor-gestor

quando da leitura sobre prática pedagógica e formação através de relatos de

experiência.

Identificar e conhecer os conceitos de grupo, de organização e instituição é

imprescindível para que possamos seguir e intervir na busca por um trabalho eficaz,

que reflita positivamente em relação ao dia-a-dia do gestor acadêmico em relação

aos docentes, discentes e a própria IES.

Não pode, portanto, o gestor de um curso de direito ou mesmo os docentes,

desse modo, deixar de reconhecer a importância e a necessidade de adaptação às

novidades apresentadas pela dinâmica teórica e social da escola, levando-se em

consideração o subjetivismo decorrente da própria prática pedagógica vivenciada.

Muito embora esta pesquisa relate uma experiência em gestão educacional,

necessitei de uma bibliografia que me auxiliasse na compreensão de alguns

conceitos e aspectos de gestão de empresas.

Tornar-se-ia arriscado em gestão educacional haver um isolamento,

distanciamento, entre a realidade socioeconômica das organizações e instituições

particulares num contexto de Centros Universitários. A gestão acadêmica em

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Centros Universitários, portanto, na atualidade, passa também pela necessidade de

articulação de conceitos oriundos da Administração de Empresas.

O coordenador gestor atua também em atos de gestão, em tomada de

decisões que vão para além das questões puramente acadêmicas. Refletindo

sobremaneira em sua autonomia.

Busquei desse modo, inserir na pesquisa uma breve análise de estratégia e

liderança estratégica; fatores que possibilitam identificar a problemática que envolve

o distanciamento entre o acadêmico e o administrativo.

Com as mudanças impostas pelo modelo atual de avaliação de cursos e no

caso que nos afeta dos Centros Universitários, importante e indispensável ao

coordenador de curso fazer uma leitura sobre esses temas para poder através

desses ensinamentos encarar os problemas e situações que decorrem do modelo

estatal de avaliação de cursos na atualidade.

Tudo isso sem deixar de levar em consideração qual o propósito social do

curso de direito. Encontrei artigo de um pesquisador canadense, W. Glenn Rowe

(2002), publicado em revista intitulada Liderança estratégica e criação de valor. No

artigo, o autor traz além da definição de estratégia, os conceitos de liderança

estratégica, visionária e gerencial. Ao abordar a definição de liderança estratégica

aduz:

A definição de liderança estratégica pressupõe a habilidade de influenciar subordinados, pares e superiores. [...] Líderes estratégicos entendem esse processo e valem-se dele para garantir a viabilidade futura de suas organizações (ROWE, 2002, p. 10).

Perder de vista essa compreensão repercute no resultado esperado pelas

organizações escolares também. Diante das múltiplas atribuições confiadas ao

coordenador de curso em um Centro Universitário está compreender inclusive a

hierarquização estatal influenciando no acadêmico.

Como o Centro Universitário fica em uma zona intermediária entre

Faculdade (profissionalização) e Universidade (pesquisa), em seu propósito social e

em sua essência, a tarefa de resolver questões referentes ao quadro de docentes e

regime de trabalho também recai sobre o coordenador (gestor).

Com a liderança estratégica, o coordenador de curso pode, segundo o autor

do texto acima referindo-se a organizações, tornar viável a organização a qual

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pertence. Inclusive sobre o aspecto econômico. Tomando como exemplo a questão

do quadro de docentes e o regime de trabalho.

Equacionar a exigência legal de professores com pós-graduação (mestrado

e doutorado) para atender à exigência legal e institucional em relação aos custos da

organização implica na análise da viabilidade e existência da instituição. Em suma,

em organização particular de ensino não há como fechar os olhos para essa

realidade econômica.

O modelo tradicional da liderança gerencial (comedida e racional) sem

deixar de sonhar e a liderança visionária (riscos) encontram equilíbrio conforme o

autor na liderança estratégica.

Diante da análise dos demais tipos de liderança, o autor estabelece em

poucas, mas precisas palavras, distinção entre elas: “[...] Os estratégicos sonham e

tentam concretizar seus sonhos, sendo uma combinação do líder gerencial, que

nunca deixar de sonhar, e do visionário, que apenas sonha” (ROWE, 2002, p. 10).

Sonhar com uma instituição de ensino, com um curso de direito que tenha

autonomia na gestão, estando inserido em um Centro Universitário que também está

submetido a uma hierarquia estatal é desconhecer a realidade vivenciada pelo

coordenador.

Desse modo, o professor coordenador (gestor estratégico) deve assumir a

postura de estar imbuído do papel de agregar ao pensamento dos pares (superiores

ou inferiores, hierarquicamente falando), a construção de uma consciência crítica

coletiva para atingir seus objetivos.

Alguns lugares se apresentam como ambientes ricos para discutir as

questões vivenciadas: a sala dos professores, sala da coordenação e grupos criados

por professores em redes sociais, reuniões com a reitoria.

Não se deve esquecer que o professor coordenador é passível de erros,

equívocos e falhas, o que implica na existência de diálogo para poder o trabalho de

construção dos sujeitos envolvidos através da (re)análise das experiências surtir um

efeito que vá além da construção de um dos atores sociais envolvidos, mas de

crescimento da coletividade.

Colegas nesses ambientes declaram, além de discutir sobre os problemas

diários, a satisfação em ser professor, o envolvimento com o processo de ensino e

aprendizagem, o interesse em ser útil à IES e a busca por uma constante

qualificação profissional em que pese os problemas vivenciados.

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Percebi, quando da análise das situações cotidianas vivenciadas, no relato

de minha experiência que, em decorrência da revisitação desses momentos, existe

um distanciamento, hiato, resistência a mudanças nos colegas por comodismo ou

não concordância com políticas de gestão, que pode ser solucionado com o

compartilhamento do relato de experiências do professor coordenador. Daí a

importância desse tipo de pesquisa na construção de identidade coletiva e autônoma

dos sujeitos.

O professor que se torna coordenador passa por uma mudança de postura

em decorrência da necessidade de adaptação às atribuições assumidas e por conta

do constante e contínuo caminho que percorre em sua formação, convive com

conflitos em decorrência da tomada de decisões.

Desse modo, o hiato existente não decorre simplesmente da mudança de

acadêmico para administrativo, mas sim por conta da constante formação e

transformação do sujeito. A revisitação, o regate de memória tornam-se, conforme o

referencial teórico utilizado, instrumento de formação e constante transformação do

sujeito professor.

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6 CONCLUSÃO

No presente trabalho, refletiu-se sobre os possíveis contributos para a

construção e formação de um coordenador pedagógico do curso de Direito pautado

num relato de experiência.

Percebeu-se que, com o relato, os problemas que são cotidianamente

apresentados ao coordenador de curso, geram decisões. A partir delas foi possível

revisitar esses mesmos momentos.

Por meio do relato de experiência, a formação constitui instrumento de

reflexão, expressão e expansão de si, possibilitando, neste caso, ao sujeito

(professor, narrador, escritor e personagem), que atua em cargo pedagógico,

construir uma experiência e reconstruir sua identidade. Proporciona descobertas, o

que faz com que o autor tenha novas possibilidades de ser, estar e fazer docência. A

narrativa sobre si possibilita a reflexão sobre sua identidade, interpretação de si,

mesmo em processo de formação e reconstrução contínua.

No percurso realizado, percebeu-se que as experiências vividas pelo autor

contribuíram para o crescimento humano, tornando-o autor capaz de perceber em

que contexto está inserido quando o assunto é educação; no fazer pedagógico

cotidiano, dá novo significado às práticas diárias de coordenação.

Uma das pretensões do trabalho foi conhecer a importância do resgate, da

memória no processo formativo. A necessidade de construção de um ser mais

consciente e vidente para uma orientação na tomada de decisões futuras. O que

pode ajudar, inclusive, a pensar na formação do professor como processo que tem

seu início muito antes de o autor ter sua formação inicial. Conforme relatado no

trabalho, o caminho percorrido desde os primeiros passos ratifica a ideia de que

estamos em constante construção e reconstrução.

Passa pela família, escola, igreja e demais grupos sociais. Este caminho

pessoal do sujeito se envolve com o contexto social e político. Percebo que o relato

de experiência passa a tornar o autor relator em um contexto de interlocução e

mediação de sua própria formação e na dos seus pares. Sejam pertencentes ao

mesmo grau ou não de hierarquia funcional ou social.

A ação positiva, o agir ético com fundamento não somente no que é correto

e justo, mas também na transparência do pensamento; o semear a aproximação por

meio do pertencimento a um grupo e não distanciamento em razão da condição

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transitória de cargo é uma atividade que exige paciência, envolvimento e

persistência. Requisitos e habilidades que foram adquiridos durante toda a minha

formação como sujeito.

Exemplifico: a influência de meu pai quanto à rigidez de minhas ações,

opiniões e à organização; a formação religiosa na busca constante de ser útil ao

próximo e em busca da justiça; ou até mesmo pela influência da família materna em

razão da escolha em ser professor.

Identificar as angústias e anseios do grupo, inquietações e necessidades, ao

dialogar com os professores, dividir experiências e pontos de vista, torna o

coordenador de curso alguém que colabora com a formação do grupo; capacita e

torna possível a tomada de consciência para o enfrentamento das dificuldades, para

evitar, assim, o distanciamento maior que é negativo e previsível.

O método é o caminho que se percorre para se chegar a um fim. Nessa

pesquisa o trajeto/método – relato de experiência de vida profissional – conduziu-

me ao conhecimento e convencimento de que o ato de reanalisar a própria história

transporta o pesquisador da passagem da consciência ingênua para uma

consciência crítica na visão freiriana.

Conclui-se assim que, por mais que sejam apresentadas as dificuldades e

desafios cotidianos, com revisitação das experiências, com o pensar reflexivo sobre

os acontecimentos e tomada de decisões, pode o pesquisador autor contribuir

significativamente com a formação dos professores que compõe o quadro de

docentes da IES, compartilhando as experiências, a fim de tornar possível a

construção e a reconstrução, que vai além do limite de formação individual para a

tentativa de aproximação do acadêmico com o administrativo.

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REFERÊNCIAS

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