UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO ...Os contos de fadas estão cada vez mais fora de moda...

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU AVM FACULDADE INTEGRADA CONTOS DE FADAS E SUA COLABORAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL Por: Ana Paula Vilela Rodrigues Orientadora: Prof.ª. Fabiane Muniz São Paulo 2014

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  • UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

    PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

    AVM FACULDADE INTEGRADA

    CONTOS DE FADAS E SUA COLABORAÇÃO

    PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL

    Por: Ana Paula Vilela Rodrigues

    Orientadora: Prof.ª. Fabiane Muniz

    São Paulo

    2014

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    UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

    PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

    AVM FACULDADE INTEGRADA

    CONTOS DE FADAS E SUA COLABORAÇÃO

    PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL

    Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do

    Mestre – Universidade Candido Mendes como

    requisito parcial para obtenção do grau de

    especialista em Psicopedagogia Institucional.

    Por: Ana Paula Vilela Rodrigues

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    AGRADECIMENTOS

    A Deus, por dar-me força para alcançar mais esta conquista.

    Aos meus filhos, Cindy e Davi, e meu marido Everson, que estiveram ao meu

    lado sempre.

    À orientadora, tutora Narcisa Castilho Melo, pelas orientações transmitidas.

    À orientadora, professora Fabiane Muniz, por sua contribuição.

    A todos que, de alguma forma, contribuíram para o meu êxito profissional.

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    DEDICATÓRIA

    A todas as pessoas que estiveram envolvidas, direta ou indiretamente.

    Aos meus lindos filhos, Cindy e Davi.

    Ao meu marido Everson.

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    RESUMO

    O presente trabalho trata da discussão acerca da importância dos

    Contos de Fadas para o desenvolvimento do imaginário infantil. Tal assunto foi

    escolhido por conta da familiaridade da pesquisadora com a leitura e escrita e

    sua preocupação com a pouca importância que as pessoas dão para a leitura.

    Justifico, aqui, a existência dos capítulos iniciais sobre aprendizagem e

    leitura. O primeiro capítulo descreve como a aprendizagem acontece através

    de grandes pesquisadores, como Piaget, Vygotsky e Wallon e neurocientistas,

    uma área nova de pesquisa que tem muito a ajudar. O segundo capítulo é,

    voltado para a importância da leitura e do ato de ler, sendo este um ato político,

    capaz de modificar o modo de pensar de uma sociedade. Através de Paulo

    Freire, Caio Riter e Geraldo Peçanha de Almeida, há um paralelo entre leitura

    da palavra e leitura de mundo e a importância de se formar bons leitores, a

    origem da literatura infantil e os Contos de Fadas.

    Enfim, no terceiro capítulo o assunto principal é realmente os Contos de

    Fadas, sua importância para o desenvolvimento infantil e o que se pode ser

    trabalhado enquanto psicopedagogo para um melhor desempenho de seu

    paciente, juntamente com Bruno Bettelheim e Teresa Colomer.

    Este trabalho foi uma forma de demonstrar o quanto a leitura é

    importante, não só para mim, mas para toda a sociedade e que quanto mais

    nós crescemos e amadurecemos, mais difícil fica para introduzi-la na rotina das

    pessoas. Sendo assim, na educação infantil é o melhor momento para ser

    introduzida a literatura para que essa seja uma atitude duradoura, como os

    “felizes para sempre” dos nossos eternos Contos de Fadas.

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    METODOLOGIA

    Considerando a proposta do trabalho a ser realizado, a metodologia foi

    reduzida fundamentalmente à pesquisa bibliográfica e webgráfica, uma vez que

    há uma bibiografia considerável sobre o assunto, mas poucas discussões

    acerca de sua importância em sala de aula, principalmente na educação

    infantil.

    O principal autor estudado foi Bruno Bettelheim, através de sua obra

    Psicanálise dos contos de fadas, um manual indispensável para quem lida com

    o desenvolvimento infantil. E não há como discutir leitura sem Paulo Freire.

    Educador por vocação, sua obra também foi de grande valia para o estudo em

    questão. Ademais, grande parte do material disponível está em artigos mais

    atuais e não em livros.

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    (...) hoje se pode reconhecer que o processo

    de aprendizagem de cada pessoa está associado

    à construção de pontes entre a objetividade e a

    subjetividade, entre o ser que observa e o ser

    observado, e vice-versa, entre o saber e o não

    saber, entre os seres que coexistem e juntos,

    se humanizam e trocam saberes.

    Essa é a relação e a reação dos sentimentos

    e das emoções vividas em sala de aula,

    sob os olhares dos professores e estudantes

    que fazem parte destas relações que

    pulsam dentro de cada um de nós,

    que é a busca do conhecimento

    e de um novo saber.” (Relvas 2012).

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    SUMÁRIO

    INTRODUÇÃO ................................................................................................. 09

    CAPÍTULO I – O desenvolvimento infantil e a aprendizagem ......................... 11

    1.1 - Jean Piaget ........................................................................................... 11

    1.2 - Lev Semenovitch Vygotsky ................................................................... 13

    1.3 - Henri Wallon .......................................................................................... 15

    1.4 - Neurociência, aprendizagem e educação ............................................. 17

    CAPÍTULO II - A leitura, a literatura infantil e a escola .................................... 20

    2.1 - A leitura e a importância de ato de ler ................................................... 20

    2.2 - A origem da literatura infantil ................................................................. 22

    2.3 - A literatura e a escola ............................................................................ 23

    CAPÍTULO III – A Psicopedagogia e os contos de fadas ................................ 28

    3.1 – O imaginário infantil ................................................................................ 28

    3.2 – Os contos de fadas ................................................................................. 30

    3.3 – A atuação psicopedagógica através dos contos ..................................... 32

    CONCLUSÃO .................................................................................................. 37

    BIBLIOGRAFIA ................................................................................................ 39

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    INTRODUÇÃO

    Atualmente, fala-se muito da questão do lúdico no ambiente escolar e

    que a brincadeira em sala de aula é coisa séria. Aqui mesmo no curso, tem-se

    um módulo exclusivo sobre o assunto. Porém, não deixa claro o quanto as

    crianças ainda precisam da leitura dos contos de fadas para explorar o campo

    do desenvolvimento infantil tanto quanto os jogos e as brincadeiras.

    Desde o nascimento, as crianças têm necessidade de pessoas que

    leiam para elas, para que possam se familiarizar com a linguagem. Os livros

    proporcionam muitos estímulos para seu desenvolvimento: as personagens, as

    emoções da história, as ilustrações, o ritmo de quem lê. Isso faz com que os

    horizontes da criança sejam ampliados, o que aumenta sua capacidade de

    compreender o mundo. Ler histórias é um gesto simples que pode transformar

    a maneira de ver o mundo das crianças.

    Os contos de fadas estão cada vez mais fora de moda por conta das

    novas tecnologias que invadiram as casas das famílias modernas e as escolas,

    mas, para alguns estudiosos, ainda são de grande valia para a formação da

    personalidade do ser humano e seu desenvolvimento social. Com isso, tornam-

    se crescentes as propostas de trabalho e discussões sobre a importância e a

    influência dos contos de fadas para o desenvolvimento infantil.

    É importante ressaltar que as crianças entendem a linguagem utilizada

    nos contos de fadas, se divertem e se distraem no seu dia a dia brincando de

    faz de conta, dividindo-se entre imaginação e realidade. Elas se interessam

    mais pelos contos de fadas do que por outras leituras porque estes apresentam

    soluções para seus medos, dúvidas ou angústias e as personagens as ajudam

    a resolver esses conflitos.

    Contar e ouvir histórias são parte fundamental no desenvolvimento da

    identidade infantil, quando, através delas, a criança tem a possibilidade de se

    colocar no lugar das personagens, entrando na história e produzindo opiniões,

    sentimentos, ideias; assim, adapta-se a situações reais que ela só

    experimentaria quando adulta e é capaz de aprender sobre seus processos

    interiores.

  • 10

    O objetivo do trabalho foi analisar se os contos de fadas podem

    realmente colaborar para o desenvolvimento das crianças na educação infantil

    e discutir a sua importância para o desenvolvimento cognitivo, social e

    emocional da criança. Por isso, no primeiro capítulo, foram estudados dados a

    respeito do desenvolvimento infantil e aprendizagem oriundos de grandes

    teóricos, sendo eles Piaget, Vygotsky e seu discípulo Luria, Wallon e a

    professora Marta Relvas, neurobióloga, autora de diversos livros que mostram

    o quanto é importante entender o cérebro para entender como a aprendizagem

    acontece.

    O segundo capítulo, a partir de Paulo Freire e Caio Riter, apresenta a

    questão da importância da leitura e do ato de ler em nossa sociedade atual,

    mostrando o quanto a leitura é um ato político e social, capaz de mudar todo

    um povo; além de trazer ao leitor a origem da literatura infantil, a trajetória dos

    contos de fadas, suas origens e alterações ao logo da história e a questão dos

    contos de fadas e a escola, as aplicações propostas pelo governo federal

    através de projetos e cursos para professores pensando no desenvolvimento

    do educando.

    O terceiro capítulo apresenta o desenvolvimento do imaginário infantil

    através dos contos de fadas - o contar histórias - descrevendo suas as

    finalidades e benefícios a fim de ajudar a criança a construir sua identidade e o

    trabalho do Psicopedagogo com os contos de fadas para a melhora no

    desempenho dos alunos atendidos, com exemplos de histórias infantis que

    podem ser úteis ao seu tratamento e desenvolvimento.

    Fica a sugestão para que, também no curso de Psicopedagogia,

    tenhamos módulos referentes ao tipo de leitura a ser aplicada a cada turma em

    sala de aula, uma vez que uma criança leitora será, no futuro, um adulto muito

    mais reflexivo, capaz de exercer conscientemente seu direito à cidadania.

  • 11

    CAPÍTULO I

    O DESENVOLVIMENTO INFANTIL E A APRENDIZAGEM

    Para um maior aprofundamento sobre o assunto a ser tratado, segue

    uma apresentação acerca de alguns dos principais teóricos relacionados à

    Teoria da Aprendizagem. Afinal, para chegar a conclusões a respeito do quanto

    os contos de fadas são importantes para o desenvolvimento infantil, é

    necessário saber como o aprendizado acontece. As considerações são sobre

    os trabalhos de Jean Piaget, Lev Semenovitch Vygotsky e seu discípulo

    Alexander Luria e Henri Wallon, além de destacar trabalhos de neurobiólogos,

    como a professora Marta Relvas, que podem nos mostrar a importância de

    estudar o cérebro e suas ramificações para entender onde e como acontece o

    aprendizado.

    1.1 – Jean Piaget (1896 – 1980)

    Formado em Biologia, se interessou em pesquisar sobre o

    desenvolvimento do conhecimento em seres humanos.

    Nasceu em 09 de agosto de 1986 em Neuchâtel, Suíça. Já adolescente,

    chamou a atenção internacional por conta de vários trabalhos escritos a

    respeito de moluscos. Formou-se em Biologia na Universidade de Neuchâtel

    em 1915; completou o doutorado em Ciências Naturais na mesma instituição

    em 1918. Mudou-se para Zurich e se tornou biólogo experimental.

    Em 1919 começou a trabalhar com Alfred Binet, pedagogo e psicólogo

    francês criador dos primeiros testes de QI, e ficou responsável por aprimorar e

    tornar estes testes de QI perfeitos. Foi então que surgiram seus primeiros

    estudos sobre o desenvolvimento da aprendizagem infantil. Mais tarde,

    acompanhou metodicamente a evolução mental de suas três filhas,

    desenvolvendo, assim, a sua teoria construtivista.

    Segundo Piaget, a origem do conhecimento é própria do sujeito,

    biológica, e constituída na interação homem-objeto. Seus estudos deram

    origem à teoria psicogenética, que mostra o quanto a interação é necessária ao

  • 12

    ser humano; e à epistemologia genética, teoria do conhecimento focada no

    desenvolvimento natural da criança, o estudo dos mecanismos de formação do

    conhecimento lógico, as noções de tempo, espaço, objeto e da evolução do

    conhecimento. Explica que o aprendizado acontece a partir de seu nascimento,

    através da sucção do leite materno, do pegar, do por na boca, do jogar e nunca

    acaba.

    Em Piaget (2014) para o estudioso, existem quatro fases do

    desenvolvimento cognitivo, onde ocorrem transformações que diferenciam uma

    fase da outra, com características específicas em cada uma delas, descritas

    através dos seguintes estágios: Sensório-motor, Pré-operatório, Operatório

    concreto e Operatório formal.

    O estágio Sensório-motor, que se dá do nascimento até os dois anos de

    idade, é um período no qual a atividade intelectual é de natureza sensorial e

    motora, através dos deslocamentos do próprio corpo. É uma inteligência

    prática, onde o bebê percebe o ambiente e age sobre ele, toma consciência do

    próprio corpo e o difere do restante do mundo físico.

    O segundo estágio, chamado de Pré-operatório, acontece entre os dois

    e sete anos de idade, aproximadamente. É o período da aprendizagem intuitiva

    e instrumental básica. O pensamento da criança não está limitado a seu

    ambiente sensorial imediato, em virtude do desenvolvimento da capacidade

    simbólica. Aqui surge a função semiótica, que permite o desenvolvimento da

    linguagem, do desenho, da imitação. É o período da fantasia, do faz de contas,

    do animismo, do egocentrismo, entre outras características.

    O terceiro estágio é chamado de Operatório concreto e se enquadra na

    faixa dos sete aos onze anos. Neste período, as operações mentais da criança

    ocorrem em resposta a objetos e situações reais, quando ela consolida a

    construção das operações resultantes de ações mentais interiorizadas e

    reversíveis e a formação de novas estruturas. Os principais aspectos em

    relação ao desenvolvimento afetivo são a conservação dos sentimentos, a

    formação da vontade e o início do pensamento e sentimentos autônomos.

    E por último está o estágio chamado Operatório formal, que abrange os

    doze aos dezesseis anos, aproximadamente, onde as estruturas cognitivas

    tornam-se qualitativamente prontas. É o ápice do desenvolvimento da

  • 13

    inteligência e da capacidade de transformar o pensamento simbólico e intuitivo

    em pensamento operatório. Inicia-se a formação da personalidade para a

    adaptação ao mundo adulto.

    Ainda de acordo com seus estudos, o pensamento se organiza mediante

    a construção de esquemas que se formam através do processo de adaptação,

    um processo dinâmico e contínuo no qual a estrutura hereditária do organismo

    interage com o meio externo de modo a reconstituir-se. É o equilíbrio contínuo

    entre a assimilação - processo de integração de novos conhecimentos em

    estruturas já existentes - e a acomodação - reformulação das estruturas em

    relação aos novos conteúdos que se incorporam - dos esquemas de novos

    elementos, isto é, a cada nível de desenvolvimento cognitivo, os anteriores são

    sempre incorporados e integrados. Então, a inteligência se dá através da

    adaptação a situações novas, em etapas ou estágios sucessivos, com

    complexidades crescentes, encadeadas umas às outras; do conhecer o objeto

    que está a sua volta e interagir com ele.

    Sendo assim, se a criança interage com a história e a moral nela

    existente, através de uma música ou de contos de fadas contados pelos

    adultos, em família, ou pelos educadores, nas escolas de Educação Infantil,

    muito cedo vai utilizar o que aprendeu em sala de aula e no seu mundo.

    Principalmente na Educação Infantil, que abrange o estágio Pré-operatório,

    responsável pelo período da fantasia e do faz de contas. É esse aprendizado

    que será lapidado durante todos os anos na escola e que levará a criança ao

    seu desenvolvimento intelectual, físico e moral.

    1.2 – Lev Semenovitch Vygotsky (1896 – 1934)

    Nasceu em 17 de novembro de 1896 em Orcha, Bielorrússia. Em 1914,

    ingressou na Universidade de Moscovo, onde começou o curso de Medicina,

    mas acabou formando-se em Direito. Ensinou literatura, estética, história da

    arte e psicologia, graças à sua infância mergulhada em livros. Em pouco tempo

    de vida escreveu mais de 200 artigos e publicou A Psicologia da Arte, sua tese

    de mestrado sobre Hamlet, obra de William Shakespeare.

  • 14

    Grande parte de suas obras foi publicada apenas após sua morte

    precoce, em 1934, por conta de uma tuberculose.

    Teve como discípulo, Alexander Luria, quem conheceu no Segundo

    Congresso Pan-Russo de Psiconeurologia, em Leningrado, quando Vygotsky

    apresentou seu artigo sobre o Método de Investigação Reflexológica e

    Psicológica e foi convidado por Luria, então secretário científico do Instituto de

    Psicologia da Universidade de Moscovo, a participar da reconstituição do

    Instituto.

    Vygotsky e Piaget não chegaram a se conhecer, por conta do

    falecimento de Vygotsky, mas apesar de discordarem em pontos consideráveis,

    Piaget lamentou a falta de tempo para que pudessem discuti-los.

    Para Vygotsky, o conhecimento é mediado através de relações entre

    sujeito, objeto e o meio onde se vive; então, o professor é o mediador que atua

    auxiliando na aprendizagem, é o ser que estimula os esquemas mentais já

    existentes para a construção do conhecimento e é a interseção do que a

    criança já sabe com aquilo que ela pode vir a saber, através da imitação do

    outro. Isso interfere na zona de desenvolvimento proximal dessa criança e

    provoca avanços que não aconteceriam espontaneamente.

    Segundo Bastos (2014), para Vygotsky, a criança nasce apenas com

    funções psicológicas elementares e é com o aprendizado cultural que ela

    adquire funções superiores. Um dos fatores mais levados em consideração é a

    linguagem: a principal função social e comunicativa, que difere muito de uma

    região para outra, influenciando na aprendizagem. Aprender é garantir que o

    desenvolvimento da cultura e da espécie será perpetuado pelos que ainda

    virão e se relacionarão com eles. Pode-se dizer que o meio em que o indivíduo

    vive é responsável pelo que o indivíduo aprenderá até um determinado período

    de sua vida; desde o modo de se vestir, as palavras utilizadas ou até mesmo

    pequenos costumes são herdados desta relação com o meio.

    Em seus estudos, destaca que a aprendizagem está em função da

    comunicação e do desenvolvimento do indivíduo como resultado de um

    processo sócio histórico, e enfatiza o papel da linguagem. Ela interage com o

    desenvolvimento produzindo uma abertura na zona de desenvolvimento

    proximal - que é a distância entre aquilo que a criança é capaz de fazer por si

  • 15

    própria e o que ela é capaz de fazer com a intervenção de um adulto -. Essa

    intervenção se dá a partir da mediação, um processo de interferência do adulto

    na construção do conhecimento do outro, interferência de um ser que sabe um

    pouco mais, no aprendizado daquele que sabe um pouco menos para que este

    desenvolva suas capacidades mentais. Sendo assim, os dois, ensinante e

    aprendente, devem estar inseridos num contexto, a partir do seu ambiente

    social e cultural. Por isso, a aprendizagem constrói-se em processos de troca,

    chamados, por ele, de mediação. Enquanto isso, a linguagem fornece os

    conceitos, as formas de organização do real, a mediação entre o sujeito e o

    objeto do conhecimento. É por meio dela que as funções mentais superiores

    são formadas e culturalmente transmitidas.

    Um trabalho bem desenvolvido na escola, desde a alfabetização, leva o

    educando a um maior desenvolvimento das funções cognitivas e culturais. Uma

    boa mediação, através da escolha de bons contos é fundamental pra o futuro

    da criança. Se um bom projeto de leitura for montado, com uma estrutura

    capaz de alcançar a zona de desenvolvimento proximal dos alunos,

    futuramente sua aprendizagem ocorrerá naturalmente e só serão alcançados

    bons resultados.

    De acordo com Alexander Luria (Apud. em Pereira e Galuch, 2012), na

    criança em desenvolvimento, as primeiras relações sociais e as primeiras

    exposições a um sistema linguístico (de significado especial) determinam as

    formas de sua atividade mental. Neste ponto, o sistema linguístico dos contos

    de fadas é de grande valia para a aprendizagem por conter uma estrutura fixa,

    um roteiro de introdução, desenvolvimento, clímax e conclusão e por ter

    personagens que podem interagir com o público ao seu redor.

    1.3 – Henri Wallon (1879 – 1962)

    Nasceu e morreu em Paris, França. Em 1902, formou-se em Filosofia

    pela Escola Normal Superior. Deu aulas no ensino secundário, discordando

    dos métodos autoritários utilizados para controlar a disciplina nas salas de

    aulas e começou a se preocupar com as causas sociais.

  • 16

    Em sua época não existia um curso específico de Psicologia, então, em

    1908, formou-se em Medicina. Atuou como médico em instituições psiquiátricas

    se dedicando ao atendimento de crianças com deficiências neurológicas e com

    distúrbios de comportamento, se interessando ainda mais pela psicologia da

    criança.

    Em 1925, fundou um laboratório que se destinava a pesquisas e ao

    atendimento a crianças tidas como anormais, junto a uma escola na periferia

    de Paris para que, além de ajudar e estudar essas crianças, ele pudesse ter

    acesso a elas inseridas em seu próprio meio. Publicou, então, A Criança

    Turbulenta, sua tese de doutorado; depois dela, diversos outros textos voltados

    para a psicologia da criança.

    Em Galvão (2012), para Wallon, o estudo da criança não era um mero

    instrumento para a compreensão do psiquismo humano, mas também, uma

    maneira de contribuir para a educação. Enfatizava, sempre, a importância de

    que esse estudo fosse feito através da criança contextualizada, buscando

    entender as interações que aconteciam entre sujeito e ambiente.

    Wallon, como Piaget, também se utilizou de estágios para circundar o

    desenvolvimento infantil, porém, era muito mais flexível em relação ao tempo

    que eles durariam, pois, segundo ele, o fator biológico, determinante no

    nascimento, vai dando lugar ao social e este pode transformar todos os efeitos

    do fator biológico, quando há interações sociais através de circunstâncias

    sociais capazes de modificar essa evolução. Por isso, não há condições de

    definir um limite para o desenvolvimento da inteligência nem da pessoa em si,

    pois dependem intimamente das apropriações que o sujeito faz do que foi

    oferecido a ele.

    Segundo Galvão (2012), as etapas de desenvolvimento definidas por

    Wallon são Estágio Impulsivo-emocional, Estágio Sensório-motor e projetivo,

    Estágio do Personalismo, Estágio Categorial e Predominância Funcional.

    O Estágio Impulsivo-emocional se dá no primeiro ano de vida e é

    caracterizado pelas reações do bebê frente aos outros e pela interação da

    criança com o meio.

    Já o Estágio Sensório-motor e projetivo acontece do segundo até o

    terceiro ano de vida e se caracteriza pelas relações cognitivas com o meio. A

  • 17

    aquisição da marcha e preensão dão autonomia para a manipulação de objetos

    e na busca de espaços, além do desenvolvimento da função simbólica e da

    linguagem.

    O terceiro estágio, chamado de Estágio do Personalismo, abrange a

    faixa dos três aos seis anos e é responsável pela formação da personalidade e

    da construção da consciência, que acontece através das relações sociais e

    afetivas.

    Aos seis anos, inicia-se o Estágio Categorial que é responsável pelos

    avanços da inteligência, onde a criança passa a ter interesse para as coisas, o

    conhecimento e o mundo exterior.

    Por último, denominado Predominância Funcional, acontece perto da

    adolescência e ocorre nova definição dos contornos de personalidade, onde as

    discussões de questões éticas, morais e existenciais emergem. Com isso, há

    momentos de afetividade e outros de agressividade, de acúmulo de energia ou

    de liberação desta.

    Para o autor, o meio influencia diretamente no desenvolvimento do

    sujeito, seja ele psíquico ou motor. Médico, psicólogo e filósofo francês mostrou

    que as crianças têm também corpo e emoções (e não apenas cabeça) na sala

    de aula.

    1.4 - Neurociência, aprendizagem e educação

    Neurociências, em Relvas (2012), é um campo de estudo entre

    Anatomia, Biologia, Farmacologia, Fisiologia, Genética, Patologia, Neurologia,

    Psicologia, Psiquiatria, Química, Radiologia e os vislumbrados estudos

    inerentes à educação humana no ensino e na aprendizagem. Ao estudar

    Neurociências, o profissional adquire um amplo leque de informações que

    podem ser capazes de instrui-lo para um melhor aproveitamento escolar de

    todos seus alunos.

    Sabe-se, por exemplo, que o cérebro dos homens é um pouco diferente

    do cérebro das mulheres. Homens têm melhor desempenho e precisão em

    testes de raciocínio matemático, de navegação em rota, ou de habilidades

    motoras com alvo. Mulheres tendem a ser melhores em trabalhos manuais, na

  • 18

    memorização de referências e em trabalhos que envolvem memória verbal e

    fluência verbal. Essas informações são relevantes para a realização de

    algumas atividades, como a leitura em voz alta em sala de aula.

    Já a aprendizagem, para Relvas (2010), é um fenômeno extremamente

    complexo, envolvendo aspectos cognitivos, emocionais, orgânicos,

    psicológicos, sociais e culturais. É uma modificação biológica na comunicação

    entre os neurônios e resulta no crescimento ou nas alterações das células.

    A aprendizagem acontece na interação, na troca de conhecimentos e

    provoca uma transformação na estrutura mental do indivíduo. Ter vontade de

    aprender é característica do ser humano e o professor tem papel fundamental

    para que essa vontade cresça ainda mais.

    Em estudos atuais, principalmente aqueles voltados à Neurociência e à

    Psicologia, a emoção é fator primordial para que a aprendizagem aconteça e a

    afetividade impera como fator importantíssimo na aquisição de todo e qualquer

    conhecimento, uma vez que, se a criança se sente confortável e feliz ao lado

    daquele que a ensina, ela tem prazer em aprender e, com isso, os objetivos do

    educador podem ser alcançados de uma maneira mais rápida e satisfatória.

    Nas palavras de Leahy-Dios (2000 - Apud. Almeida, 2010):

    "Os valores adquiridos na formação dos professores reforçam a

    ideia de que a literatura é enriquecedora, traz autossatisfação e

    alta cultura. Entretanto, há graves lacunas entre determinados

    conhecimentos teóricos específicos e a prática docente. Tais

    lacunas acabam por comprometer o enriquecimento individual

    e a autossatisfação através da leitura literária. Alguns

    professores reconhecem o esvaziamento teórico de seu

    treinamento, centrado em conceitos e estratégias didáticas

    inadequados. O papel original de leitura como "modelo e

    prazer" que os influenciou a se tornarem professores de leitura

    não é vivenciado por seus alunos, indicando que algo mudou

    mais que a distância socioeconômica entre as gerações."

  • 19

    Por isso, o prazer e a motivação devem ser transmitidos pelo professor

    da Educação Infantil. E ele só consegue isso a partir de seu conhecimento.

    Entender a importância dos contos de fadas para o desenvolvimento da criança

    através de cursos ou leituras, através de um aprofundamento do assunto, fará

    com que seus objetivos sejam atingidos e que, no futuro, esses alunos possam

    ser leitores efetivos e capazes de resolver seus problemas de formas mais

    objetivas e, porque não dizer, fáceis, enfim, capazes de serem adultos bem

    resolvidos consigo mesmos e conscientes de suas ações.

    Atualmente, existem muitos adolescentes alienados, se preocupando

    apenas com a internet e os amigos virtuais. Poucos deles têm amigos reais. E

    leem pouco, ou não leem nada. Por isso, não conseguem se expressar sobre

    qualquer assunto, seja ele o mais banal. Ao fazer uma anamnese sobre eles, o

    que se descobre é que não adquiriram o hábito de ler quando crianças e não o

    conseguem fazer agora. Como os pais estão geralmente muito ocupados, cabe

    à escola inserir na criança esse “vírus” e que ela não seja capaz de se livrar

    dele.

  • 20

    CAPÍTULO II

    A LEITURA, A LITERATURA INFANTIL E A ESCOLA

    Nesse capítulo há uma explanação sobre a leitura e a importância do ato

    de ler através de um paralelo entre gerações. São destacados apontamentos

    de Paulo Freire, grande educador e conferencista de sua geração, Geraldo

    Peçanha de Almeida, professor e conferencista e Caio Riter, autor de livros

    sobre literatura que, com sua experiência de professor, aluno e pai, mostra

    uma paixão pelas letras. Em seu segundo momento, há, então, a origem da

    literatura infantil, uma vez que, nem sempre, crianças foram vistas como tal, a

    importância da leitura e literatura em sala de aula e em seu terceiro momento,

    as diretrizes federais que envolvem a leitura e os projetos propostos.

    2.1 – A leitura e a importância do ato de ler

    Para Freire (2011) ler é muito mais do que decodificar algumas letras e

    formar palavra. A leitura tem caráter social e político. Não é mera memorização

    mecânica de um objeto, mas sim, o conhecimento de tal objeto. A leitura

    implica na compreensão do que está escrito através do conhecimento interno

    do sujeito, de sua maturidade e do seu conhecimento do mundo. São vários

    fatores os responsáveis por essa total compreensão do que está escrito. Não

    sendo possível essa combinação de fatores, há o chamado analfabeto

    funcional, que é aquele que lê, mas não entende o que foi lido.

    É importante ressaltar que a leitura de palavras acontece após a leitura

    do mundo. A partir do momento em que o sujeito nasce, passa a conviver com

    pessoas, animais, plantas, lugares. Por isso, aprende a se comunicar e a se

    entender, independente da leitura da palavra escrita. Então, pode-se dizer que

    a leitura da palavra escrita e a leitura do mundo estão intimamente ligadas, e

    assim, que leitura e escrita estão ligadas a palavras e significados pertencentes

    ao mundo da criança. Um sujeito nascido no nordeste do Brasil tem

    significantes diferentes do sujeito nascido no sul do país, colonizado por

    culturas diferentes. Segundo Freire (2011):

  • 21

    "O comando da leitura e da escrita se dá a partir de palavras e

    temas significativos para os sujeitos e não palavras, temas,

    contos/histórias que estão ligadas e são representativos para o

    professor. Não é uma leitura mecânica, memorizada, para

    prestar conta na hora da aula da leitura."

    O ato de ler tem sentido tão amplo que não é possível defini-lo. Ler

    significa interagir com um mundo novo cheio de descobertas e novas

    situações, é viajar sem sair do lugar, é atribuir sentido a alguma coisa que foi

    escrita.

    Tendo caráter social e político, é certo dizer que a leitura, desencadeada

    pelas leituras de mundo, é fator importante para a construção da cidadania. É a

    leitura que permite a criança participar e modificar a realidade que existe a sua

    volta, seja ela formada a partir de experiências boas ou ruins. Ou seja, permite

    não apenas decodificar os signos, mas lhes prover significados mais amplos.

    Ler é fazer com que a pessoa seja capaz de se maravilhar com um verso, rima,

    a beleza das palavras. É poder rir com as situações vividas pelas personagens

    e com os contos, instituindo novos ares, novos universos, suscitando o

    imaginário, a curiosidade, a possibilidade para solucionar questões e entender

    o mundo. É atribuir sentido a alguma coisa escrita.

    Portanto, em Almeida (2010):

    "Ler é um processo diário de construção em que o leitor é

    colocado em frente aos espaços em branco deixados pelos

    textos diante das mais variadas intrigas e das mais complexas

    situações e, perante qualquer um desses fatos, o texto lhe

    cobrará uma atitude."

    A leitura faz com que o leitor tenha uma participação efetiva do texto

    lido. Ela não é pacífica, muito menos passiva. À medida que diferentes textos e

    diferentes assuntos são apresentados aos alunos, maior será a construção da

    sua cidadania. Para as crianças, deixa um hábito muito difícil de livrar.

  • 22

    A escola que tem por objetivo formar novos leitores e se esforça para tal

    com ações e projetos interessantes tende a lançar na sociedade crianças,

    jovens e adultos dispostos a refletir sobre todos os temas e serem capazes de,

    através de suas ações, modificar seu ambiente, diferentemente dos

    adolescentes atuais que, ao serem abordados por situações complexas ou

    desafiadoras são apenas capazes de dizer que não têm opinião formada sobre

    aquilo.

    De acordo com Patrícia Lacerda e Volnei Canônica, em artigo publicado

    no Jornal O Globo em 26/10/2012:

    "O prazer pela leitura não se ensina como uma lição

    convencional. É necessário um conjunto de políticas

    continuadas que garantam ao professor o acompanhamento na

    sua trajetória de leitor, tempo para a leitura, acesso ao livro, e

    que ele seja sensibilizado para o papel que desempenha de

    transmissor do gosto pela leitura."

    2.2 – A origem da literatura infantil

    Consta apenas que a literatura infantil começou seu majestoso caminho,

    a passos muito lentos, no início do século XVIII, juntamente com as primeiras

    citações sobre o fato de a criança deixar de ser um mini-adulto e passar a ser

    vista como criança, a ter direitos, o que antes não havia. O que se sabe é que,

    por durante muito tempo, não houve qualquer diferença no manejo com criança

    e jovens que os diferenciasse dos adultos.

    As pessoas menos abastadas da sociedade viviam em casas muito

    grandes, sem divisões de cômodos, e, nesses casarões vivia a família inteira,

    geralmente muito numerosa - por conta da inexistência de métodos de

    contracepção. Esposa e o marido dormiam no mesmo cômodo que os filhos e

    todas as pessoas da casa tinham que trabalhar. Quando havia relação sexual,

    era ali mesmo, no quarto, com todos os outros moradores por perto, sem

    distinção de idade ou grau de parentesco. Se a mulher engravidava,

    geralmente a gestação era considerada um acidente de trabalho, uma vez que

  • 23

    ela deveria dispensar uma parte de seu tempo nos cuidados básicos da

    criança, não estando disponível para seus demais afazeres. Segundo Motta

    (2011), era comum que essas crianças, geralmente os meninos, fossem

    levadas por outras famílias para aprenderem algumas profissões. Estes eram

    devolvidos apenas no início da adolescência, nem conhecendo direito seus

    parentes e não tendo mais nenhum vínculo afetivo com a família por conta da

    distância em que tinham vivido. As meninas geralmente ficavam com a mãe

    aprendendo as tarefas do lar. Em Motta (2011, Apud Aries, 1981):

    “Até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a

    infância ou não tentava representa-la; é difícil acreditar que

    essa ausência se devesse à falta de habilidade ou de

    competência. Parece mais provável que a infância não tivesse

    lugar naquele mundo”.

    Apenas no início do século XVIII essa situação começa a mudar e os

    adultos percebem que as crianças possuem um tempo próprio para que

    aconteça seu desenvolvimento, chamado de etapas, e que essas etapas

    devem ser respeitadas. Nesse momento, as famílias já não mandam seus

    filhos para outros lares, seu grupo familiar é menor e, então, começam a

    aparecer traços de afetividade entre seus entes e o surgimento da emoção. A

    literatura é, a partir do final do século XVIII, adaptada para essa nova faixa

    etária, começam as modificações e estruturações nos movimentos literários

    para serem aproximadamente como são atualmente e surgem os contos de

    fadas.

    2.3 – A literatura e a escola

    Vive-se em uma democracia, onde todas as pessoas têm direitos sociais

    e individuais e deveres a serem cumpridos. Em relação às escolas, esses

    deveres são dispostos em leis, resoluções e referencias que regem a educação

    no país. Para o planejamento da rotina em sala de aula, há referenciais que

    regulamentam os trabalhos.

  • 24

    As legislações estudadas foram a Constituição da República Federativa

    do Brasil de 1988, com constantes emendas, a Lei de Diretrizes e Bases, nº

    9.394, de 20 de dezembro de 1996, também com constantes emendas, as

    Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica e o Referencial

    curricular nacional para a educação infantil, sendo as duas primeiras

    sancionadas pela subchefia para assuntos jurídicos da Casa Civil da

    Presidência da República e as duas últimas pelo MEC – Ministério da

    Educação e Cultura.

    Considerando o assunto do trabalho a Educação Infantil e os contos de

    fadas, seguem as descrições do que se diz nos referenciais norteadores dos

    educadores.

    A Constituição da República, em seu capítulo 3º, da Educação, da

    Cultura e do Desporto, na Seção I – da Educação, dispõe que a educação,

    direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada

    com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa,

    seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

    O texto da Constituição já adianta para um ensino que vise o pleno

    desenvolvimento do aluno e o exercício da cidadania. Como já citado

    anteriormente, com os contos de fadas, as crianças são submetidas a

    momentos de reflexão sobre a vida e o comportamento, individual e social,

    fazendo com que esses objetivos sejam atingidos.

    Já a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), já restrita apenas aos assuntos

    voltados a educação cita, como cópia da Constituição, no artigo 2º que a

    educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e

    nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno

    desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e

    sua qualificação para o trabalho. Em seu artigo 29º dispõe que a finalidade da

    educação básica é o desenvolvimento integral da criança de até cinco anos em

    seus aspectos físico, psicológico intelectual e social.

    Também na LDB, como na Constituição, o objetivo da educação infantil

    é o pleno desenvolvimento do educando que se dá através de boas práticas

    em sala de aula, de bons projetos que possam realmente modificar a vida das

    crianças.

  • 25

    Os textos das leis acima mostram os objetivos da educação básica,

    porém não mostram como fazê-lo. Para tal, o Ministério da Educação e Cultura,

    dentro da Secretaria de Educação, criou referenciais, ou manuais práticos, com

    sugestões de atividades e planejamentos para que os professores pudessem

    ter um material norteador de seus trabalhos. Nasceram, então, o Referencial

    Curricular Nacional para a Educação Infantil e as Diretrizes Curriculares

    Nacionais Gerais da Educação Básica. Também foram lançados livros de

    estudo do PROINFANTIL1 elaborados tendo como base os Guias de Estudo do

    Programa de Formação de Professores em Exercício - PROFORMAÇÃO2.

    Lançado em 1998, o Referencial Curricular Nacional para a Educação

    Infantil é uma coleção de três volumes que pretende contribuir para o

    planejamento das práticas educativas, sendo um guia de orientação para

    projetos educativos que têm como objetivo a formação pessoal e social, a partir

    da construção da identidade e autonomia das crianças e o conhecimento de

    mundo.

    No documento Introdução – Volume 1 – Fundamenta as concepções

    sobre creches e pré-escola, além de definir os objetivos da educação infantil,

    sendo um deles o desenvolvimento de uma imagem positiva de si, atuando de

    forma cada vez mais independente, com confiança em suas capacidades e

    percepção de suas limitações; além de haver uma descrição sobre conteúdos,

    como organizar, selecionar, integrar esses conteúdos sabendo que não há

    aprendizagem sem ele, além de orientações didáticas para organização do

    tempo. Há uma descrição sobre as atividades que devem ser permanentes, a

    serem realizadas com frequência regular, diária ou semanal. Em MEC/SEF

    (1998): brincadeiras no espaço interno e externo, roda de história, roda de

    conversas, ateliês ou oficinas de desenho, pintura, modelagem e música. Nos

    volumes 2 e 3, relativos, respectivamente, ao âmbito de experiência e formação

    pessoal e social e experiência de conhecimento de mundo, descrevem a

    1 Proinfantil – O Programa de Formação Inicial dos Professores em Exercício na Educação Infantil é dirigido aos 37 mil professores de creches e pré-escolas que não têm a formação mínima exigida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) - nível médio em magistério. 2 O Programa de Formação de Professores em Exercício é voltado para professores de escolas públicas nas séries iniciais do ensino fundamental, em classes de alfabetização ou na educação de jovens e adultos que não tenham formação em magistério nível médio, na modalidade Normal. O curso combina educação à distância com encontros presenciais e tem duração de dois anos, estruturados em quatro módulos.

  • 26

    importância do faz-de-contas para enriquecer sua identidade, por poder

    experimentar outras formas de pensar e desenvolver um sentido próprio de

    moral e justiça. Através de orientações, as páginas seguintes dos referenciais

    descrevem a importância dos jogos e brincadeiras, da organização do

    ambiente e do tempo, entre outros, orientações didáticas para prática de leitura

    e afins. Um bom material para a capacitação dos professores na busca efetiva

    de melhorar as condições de ensino/aprendizagem no Brasil.

    Mais atuais que os referenciais, os livros de estudo da Coleção

    PROINFANTIL, lançados em 2006 pelo MEC/SEB, trazem o papel da literatura

    infantil no desenvolvimento do leitor através de textos e exemplos de como

    aplicá-los na prática pedagógica.

    As Diretrizes Curriculares da Educação Básica, fixadas como Resolução

    nº 5, de 17 de dezembro de 2009 e lançadas pelo MEC/SEB em 2013, como

    livro, evidenciam as direções a serem tomadas tanto pelos diretores e

    responsáveis pela escola, o espaço existente e a limpeza das salas de aula,

    como para os professores em relação ao que deve ter em sala de aula e como

    aplicar.

    Para os responsáveis, as Diretrizes Curriculares da Educação Básica

    determinam que deva haver espaços para que as crianças interajam entre si e

    favoreçam o contato com diversos produtos que possam adquirir e construir

    cultura através dos livros de literatura, brinquedos, objetos e outros materiais

    de manifestações artísticas e com elementos da natureza.

    Aos professores, os eixos norteadores de seu trabalho constam no artigo

    9º, inciso III como interações e brincadeiras que possibilitem às crianças

    experiências de narrativas, de apreciação e interação com a linguagem oral e

    escrita, e convívio com diferentes suportes e gêneros textuais orais e escritos.

    Uma vez que a Educação Infantil tem função sociopolítica, da mesma

    forma que a leitura, o desenvolvimento integral da criança acontece quando,

    sabendo de sua responsabilidade, o professor utilize do material disponível

    pelo governo3, e de tantos outros lançados todos os dias por profissionais

    competentes, para a adequação de seus projetos em sala de aula na busca

    3 Todo o material de apoio, bem como as leis e resoluções, está disponível no site http://portal.mec.gov.br/. Não é necessário ser professor da rede pública para ter acesso a eles.

    http://portal.mec.gov.br/

  • 27

    desse desenvolvimento. Um bom conteúdo seriam os contos de fadas, que em

    Bettelheim (2012):

    “O conto de fadas procede de um modo conforme àquele

    segundo o qual uma criança pensa e experimenta o mundo; é

    por isso que ele é tão convincente para ela. A criança pode

    obter um conforto muito maior de um conto de fadas do que de

    um esforço para confortá-la baseado em raciocínios e pontos

    de vista adultos. Uma criança confia no que o conto de fadas

    diz porque a visão de mundo aí apresentada está de acordo

    com a sua.”

    Ao compreender que a escola de Educação Infantil seja um lugar

    direcionado para a escolarização das crianças ao garantir seu desenvolvimento

    intelectual, social e afetivo, é importante dizer que a leitura literária está em

    consonância com esses propósitos, pois direciona essas crianças para sua

    formação integral ao provocar a valorização dos sentimentos e emoções,

    próprios da condição humana.

  • 28

    CAPÍTULO III

    A PSICOPEDAGOGIA E OS CONTOS DE FADAS

    O mundo encantado dos contos de fadas ajuda as crianças a lidar com

    os temores do mundo real, pois elas projetam seus receios e desejos nos

    personagens e incidentes das histórias. É o que defende Bruno Bettelheim em

    seu livro A Psicanálise dos Contos de Fadas. A partir dele e de Teresa

    Colomer, o que se pretende neste capítulo, é induzir o leitor da importância dos

    contos de fadas para as crianças.

    Para entender um pouco melhor sobre como ajudar os alunos no seu

    desenvolvimento através dos contos de fadas e para melhorar o atendimento

    individual do educando, esse capítulo se dará através da explanação sobre

    imaginário infantil, o seu desenvolvimento e o papel do psicopedagogo nesse

    processo. Com isso, o objetivo do trabalho deverá ser alcançado: o de mostrar

    como o trabalho com contos de fadas em sala de aula e em atividades

    complementares pode melhorar o desempenho dos alunos e fazer deles

    pessoas capazes de resolver seus problemas, buscar soluções e serem

    adultos reflexivos.

    3.1 – O imaginário infantil

    A narração é a forma mais agradável para a leitura infanto-juvenil,

    auxiliando o processo educacional. Os narradores preocupam-se em criar a

    movimentação que mexe com o espírito infantil. Fazer perguntas, supor

    respostas, são técnicas interessantes para a criança: faz com que elas

    explorem os fatos, analisem e tirem significados. Pode-se dizer que o

    imaginário infantil é algo que precisa ser aguçado. Está no cérebro de todos,

    mas só irá realmente interferir em seu desenvolvimento quando este for

    trabalhado. A mente da criança pequena contém impressões mal ordenadas,

    alguns aspectos da realidade e elementos dominados pela fantasia, por isso,

    imaginação da criança deve ser estimulada a inventar. Conforme Bettelheim,

    através do jogo simbólico, ela vai compreendendo seu inconsciente para poder

  • 29

    dominar seus problemas psicológicos de desenvolvimento, superar suas

    decepções narcisistas, dilemas edípicos, ser capaz de abandonar

    dependências infantis, obtendo um sentimento de individualidade e

    valorizando-se.

    Como concluiu Piaget, o pensamento infantil atravessa um estado

    animista até a puberdade. Isso significa que, mesmo pais e professores

    dizendo o contrário, para as crianças, todos os seres inanimados têm vida,

    como o rio que está vivo, pois a água está correndo ou uma pedra quando

    desce uma ladeira rodando. E se para a criança não há uma linha separando

    pessoas de objetos, não há diferença entre os humanos e os animais, portanto

    os animais e seres vivos também podem falar e têm semelhanças e vida

    parecida com os humanos. Segundo Bettelheim (2012), para a criança que

    tenta entender o mundo, parece razoável esperar respostas daqueles objetos

    que despertam a sua curiosidade.

    É por isso que os contos de fadas têm muito a dizer, como os

    Porquinhos, o Lobo Mau, os passarinhos, o relógio da casa da Fera e mesmo a

    Fera. São situações comuns para as crianças. Os adultos podem explicar com

    situações científicas, lhes dizendo coisas que elas não conseguem sentir, com

    ensinamentos racionais, mas as crianças não estão preparadas para

    determinadas situações e apenas absorvem o que os adultos disseram. Os

    contos ajudam-nas exatamente a entender as situações reais, porém, com a

    maturidade que lhes é necessária.

    Para Bettelheim (2012), numa criança, contudo, sempre que seu

    inconsciente vem à tona, ele imediatamente domina sua personalidade total.

    Isso porque ela ainda não controla seu ego, recebendo apenas um conteúdo

    caótico desse inconsciente. Algumas brincadeiras como bonecas ou animais,

    têm como objetivo ajudar a controlar esse inconsciente. Algumas pressões das

    crianças podem ser tratadas assim, mas apenas os contos de fadas podem

    exteriorizar tudo aquilo que a criança está sentindo e ajudar a livrá-la dos

    medos. Um dos motivos é o fato de que grande parte das histórias é

    representada por crianças, o que faz com que elas se familiarizem com a

    história de uma forma mais verdadeira, mesmo sabendo que a história não

    aconteceu no tempo dela, nem na cidade dela.

  • 30

    3.2 – Os Contos de Fadas

    Não há uma certeza de onde os contos de fadas possam ter sido

    contados pela primeira vez. Há uma ideia de que tenham surgido como

    poemas de amores eternos, estranhos ou fatais existentes na civilização Celta.

    Segundo Couto e Campos (2009), o que se sabe é que os contos de fadas são

    narrativas de conteúdo simbólico existentes desde o início da humanidade.

    Essas histórias, que eram transmitidas pela tradição oral, em geral, nas classes

    mais baixas, têm sua primeira adaptação realizada pelo francês Charles

    Perrault (1628 - 1703) para que se adequassem aos nobres pertencentes à

    corte do Rei Luiz XIV (1638 - 1715), sendo retiradas as passagens obscenas,

    incestuosas ou de canibalismo, por exemplo, e manter apenas seu apelo

    literário junto aos parisienses mais abastados, ou seja, os contos nada mais

    eram que passagens relatadas da vida dos camponeses, cheias de

    pornografias e aventuras, pouco indicados para as crianças. Nessa época

    ainda não existia a designação Contos de Fadas, por conta de seu conteúdo

    violento e impróprio. Anos mais tarde, com a instituição da Fada como

    idealização da mulher perfeita e com poderes sobrenaturais, esses contos

    começam a ser adaptados para o universo infantil e voltados à educação, uma

    vez que a fantasia neles contida ajudava a formar a personalidade dos

    menores.

    O que sempre chamou a atenção e chama até hoje é que a história dos

    contos de fadas serve de exemplo para atitudes das crianças de uma maneira

    geral. Sempre houve, nessas histórias, a intenção da transmissão de

    determinados valores ou padrões sociais que eram respeitados por uma

    determinada sociedade, ao mesmo tempo em que há uma noção de

    pertencimento social que é a capacidade de participar da história como se ela

    acontecesse no nosso mundo, no mesmo tempo e espaço em que vivemos.

    Em Bruno Bettelheim (2012) pode-se afirmar:

    "Enquanto diverte a criança, o conto de fadas a esclarece

    sobre si mesma, e favorece o desenvolvimento de sua

    personalidade. Oferece significado em tantos níveis diferentes,

  • 31

    e enriquece a existência da criança de tantos modos que

    nenhum livro pode fazer justiça à multidão e diversidade de

    contribuições que esses contos dão à vida da criança."

    No Brasil, as adaptações que chegavam da Europa eram utilizadas em

    salas de aula e aconselhavam o patriotismo, amor, respeito à família e aos

    mais velhos, fazendo valer seu projeto ideológico e educativo.

    Os contos de fadas, diferente das histórias modernas, conduzem a

    criança a um significado mais profundo da vida. Além de serem interessantes e

    prender a atenção dos pequenos, expõem problemas interiores e suas

    soluções que, durante a vida, a criança enfrentará. Do ponto de vista

    intelectual, segundo Bettelheim (2012), estimulam a imaginação, desenvolvem

    a inteligência a ajudam a tornar claras suas emoções, reconhecem as

    dificuldades e sugerem soluções para os problemas. Representam uma série

    de valores que ultrapassam a barreira dos tempos e existem até hoje. Têm

    como características a simplicidade das situações descritas, a clara distinção

    entre o bem e mal, a facilidade de identificação do leitor com o herói positivo e

    o desenlace feliz de história, Colomer (2003).

    Do ponto de vista adulto ou científico, pode-se dizer que as respostas

    dos contos não sendo reais, são fantásticas, o que pareceria incorreto para

    muitos adultos. O que eles não entendem é que a criança precisa desse mundo

    fantástico para organizar seus pensamentos. Todas as explicações realistas

    são geralmente incompreensíveis para as crianças porque lhes falta o

    entendimento abstrato necessário para que aja sentido. A criança só tem

    segurança naquilo que ela entende perfeitamente.

    O ato de contar ou ler um conto de fadas tem efeito calmante, onde as

    crianças não estão expostas ao obstáculo de estimulantes visuais e acústicos e

    podem desfrutar a proximidade de um adulto em que confiam. A história dá

    margem para o desdobramento de conteúdos e conceitos. Através dela, a

    criança pode lidar com seus medos, angústias, raiva: pode significar e

    ressignificar experiências. É, também, elemento de aculturação, em Colomer

    (2003) citando a teoria vigotskiana de aprendizagem. Representa uma crença

  • 32

    necessária ao desenvolvimento pessoal da criança que algum dia ela sairá

    vitoriosa, crescendo e trabalhando arduamente.

    Em princípio, contos de fadas com finais felizes são os que mais

    confortam as crianças, porque aliviam a tensão, lavram-nas de temores, o que

    é bom para fortalecê-las. Teresa Colomer, em entrevista à Revista Escola

    (Ago-14), destaca que a literatura não é luxo, mas a base para a construção de

    si mesmo.

    Bettelheim (2012) ainda cita que a criança não está consciente de seus

    processos íntimos, exteriorizados nos contos de fadas e simbolicamente

    representados por ações que substituem as lutas interiores e exteriores. O

    crescimento pessoal necessita de profunda concentração. E ainda explica:

    “Os contos de fadas, como todas as verdadeiras obras de

    arte, possuem uma riqueza e profundidade multifárias que

    transcendem de longe aquilo que mesmo o mais cuidadoso dos

    exames digressivos pode extrair deles.”

    3.3 – A atuação psicopedagógica através dos contos

    As histórias dos contos de fadas oferecem inúmeras contribuições às

    crianças em desenvolvimento tamanha riqueza simbólica existente, o que

    auxilia a formação da personalidade e organização do pensamento infantil,

    além de despertar seu imaginário. Seu talento especial, de falar diretamente às

    crianças, faz com que elas encantem ao mesmo tempo em que instruam, é um

    gênero literário que favorece a projeção das fantasias inconscientes, que trata

    da realização de desejos e se relaciona às angústias.

    Como a mente da criança da educação infantil ainda não está totalmente

    desenvolvida, histórias verdadeiras, que parecem ter saído do mundo real,

    podem não fazer tanto sentido. Já os contos trabalham o subconsciente,

    atraindo muito mais a atenção dos pequenos. Ao psicopedagogo e seu

    paciente oferecem uma troca de informações a fim de que possam compartilhar

    seus sentimentos, emoções, fantasia. Ao surgirem dilemas como constituição

    do ego, complexo de Édipo, a castração, o psicopedagogo pode, então, intervir

  • 33

    e ajudar, uma vez que o objetivo do tratamento psicopedagógico é a

    desaparição do sintoma e a possibilidade para o sujeito de aprender

    normalmente ou, ao menos, no nível mais alto que as suas condições

    orgânicas, constitucionais e pessoais lhe permitam, Pain (1985). E, para esses

    casos, Bettelheim (2012) cita:

    “Para que o conto de fadas produza efeitos de exteriorização

    benéficos, a criança deve permanecer ignorante das pressões

    inconscientes a que está respondendo ao tornar suas as

    soluções de contos de fadas.”

    É importante que a criança entenda o que dizem os contos por conta

    própria. Ao adulto, cabe apenas o ato de contá-las. E só ouvindo repetidamente

    um mesmo conto que a criança é capaz de aproveitar a história e tirar um

    significado mais pessoal dele. Para que o encantamento aconteça é preciso

    dar à criança a necessidade de sentir a história. Segundo Bettelheim, a faixa de

    idade que as crianças mais compreendem os contos é aos cinco anos. Mas

    isso não quer dizer que eles não possam ser lidos antes ou não ajudem depois.

    O ideal é que se contem histórias desde o nascimento para que a criança se

    acostume com o momento e isso lhe possa ser agradável.

    O inconsciente é a fonte de matéria-prima e a base sobre a qual o ego

    erige o edifício de nossa personalidade. Prosseguindo na comparação, nossas

    fantasias são os recursos naturais que fornecem e moldam essa matéria-prima,

    Bettelheim (2012). A infância é a época em que essas fantasias devem ser

    estimuladas. E isso é feito quando se pede à criança para desenhar o que

    quiserem ou inventarem histórias. E todas as histórias inventadas são reflexo

    de seu inconsciente. E quando ouvem histórias, o conto fornece aquilo que é

    necessário para seu alimento e a forma contada faz com que ela compreenda o

    que é preciso. A criança gosta dos contos de fadas porque apesar de tudo de

    ruim que pode acontecer, há sempre um final feliz.

    Há muitos contos de fadas que podem e devem ser lidos para crianças

    bem pequenas, como a história dos Três Porquinhos, que abarca uma

    mensagem de coragem que inspira confiança e fortalece a autoestima do leitor.

  • 34

    Adverte, ao mesmo tempo, aquelas que gostam de contar vantagens e que

    pensam que são donas do mundo. Essas crianças aprendem que quem se

    superestima ou é cansado demais para construir uma casa resistente corre o

    risco de ser devorado - ou é de fato devorado - como na versão original da

    história e a moral está clara: mesmo sendo apenas um porquinho, você

    consegue fugir do Lobo Mau se for rápido e esperto. Isso dá coragem, inspira a

    confiança e fortalece a autoestima. Além disso, mostra as vantagens de

    amadurecer, pois o mais sábio deles é o maior e mais velho, em Bettelheim

    (2012).

    Chapeuzinho Vermelho é um conto para crianças inocentes demais e

    sem confiança, pois a história previne contra o descuido e ensina a

    determinação e independência. No princípio, a heroína promete obedecer às

    recomendações da mãe, mas, assim que se afasta da casa, faz exatamente o

    contrário: fala com ousadia ao lobo, desvia-se do caminho e, por fim, quer

    saber absolutamente tudo e acaba tendo uma surpresa desagradável. Nem um

    fio de cabelo da heroína é tocado. Ela sobrevive e comemora alegremente a

    morte do lobo junto de sua avó e do caçador. Ela nada sofre, mas sai da

    aventura mais experiente. As crianças que se identificam com a personagem e

    vivem o que ela viveu ganham maior determinação e independência.

    Chapeuzinho Vermelho é tentada, confia nas boas intenções dos outros e isso

    pode causar armadilhas, mas como adverte Bettelheim (2012), se não

    houvesse algo em nós que aprecia o grande lobo mau, ele não teria poder

    sobre nós. É importante entender sua natureza, mas ainda mais importante é

    saber o que o torna atraente para nós.

    Em Cinderela, a menina é relegada pela madrasta à função de criada,

    atormentada pelas meias-irmãs, vivendo no meio das cinzas, junto à lareira, e

    imposta a realizar tarefas impossíveis. É o conto da rivalidade e do ciúme

    fraternos e de como se pode vencê-los, Bettelheim (2012) e quaisquer que

    sejam as condições externas, a criança vivencia um período íntimo de

    sofrimento. É um grande conforto identificar-se com alguém em situação pior

    que a nossa. A Cinderela entre as cinzas mostra que ninguém pode escapar

    disso. O consolo fortalece. A criança alcança, com a heroína, a glória maior -

  • 35

    que é a conquista do príncipe - além de dar às filhas da madrasta, o que elas

    merecem.

    A Bela Adormecida é caracterizada por um processo de individualização

    após ter encontrado forças na solidão, encoraja a criança a não temer os

    perigos da passividade. Mostra que após um longo repouso, se pode alcançar

    a glória. É um conto que pode ser comparado à fase adolescente onde existe o

    período de passividade (juntamente com o fato de deixar de ser criança e ainda

    não ser um adulto). A mensagem final é bem parecida com a Branca de Neve:

    após um período de passividade idêntico à morte, no final da infância, é apenas

    um tempo de crescimento tranquilo e de preparação, do qual a pessoa

    despertará madura, pronta para a união sexual, Bettelheim (2012).

    Como constatado, na grande maioria dos contos há um confronto entre o

    bem e o mal, belos e feios, fortes e fracos, que remete críticas à corte da

    época. Existe sempre a bruxa, que é a mensageira do mal, com poderes

    mágicos e a princesa, sempre relacionada ao cuidado da casa e da família,

    geralmente somente o pai, já que na época em que foram escritos, era comum

    que a mãe morresse no parto e a criança fosse criada apenas pelo pai, era

    bondosa e prestativa e, como prêmio, sempre ficava com o príncipe, no final. A

    madrasta má, referência à segunda mulher do pai, que não fazia questão de

    tratar a primogênita bem, uma vez que as leis vigentes deixavam toda a

    herança ao primogênito e os prováveis meios-irmãos não teriam direito a nada.

    O sapo vira príncipe, os gênios intercalam entre bons e maus, que significam a

    fantasia do poder e os relacionamentos interpessoais.

    A sabedoria é a consequência de experiências significativas que

    enriqueceram a vida, reflexo de uma personalidade rica e bem integrada. Os

    primeiros passos rumo à aquisição dessa personalidade são quando a criança

    começa a lutar contra suas ligações profundas e ambivalentes com seus pais.

    Os contos dão ideias e coragem para lutar contra essas dificuldades e

    fortalecem as esperanças de sua resolução bem-sucedida, Bettelheim (2012).

    Em alguns artigos também há a intenção dos contos de melhorar a

    leitura e a escrita do aluno. Uma vez que a grande maioria das crianças não

    tem esse hábito, o trabalho com os contos pode induzi-las a gostar um pouco

  • 36

    da leitura e a quere praticá-la, ao tentar escrever um novo final para a história,

    por exemplo.

    “Seja qual for a verdade de fato, a criança que ouve contos

    de fadas passa a imaginar e acreditar que, por amor a ela, o

    genitor está disposto a arriscar a vida para lhe trazer o

    presente que mais deseja. Por sua vez, uma tal criança

    acredita ser merecedora de tal devoção, já que estaria disposta

    a sacrificar sua vida por amor a seu genitor. Desse modo, ela

    crescerá para trazer paz e felicidade até mesmo para aqueles

    que estão dolorosamente aflitos que parecem feras. Ao fazê-lo,

    uma pessoa obterá felicidade para si própria e para seu

    parceiro para a vida e, com ela, igualmente para seus pais.

    Estará em paz para consigo mesma e com o mundo.

    Essa é uma das múltiplas verdades reveladas pelos contos

    de fadas que podem orientar nossas vidas; é uma verdade tão

    válida hoje em dia quanto quando era uma vez.” Bettelheim

    (2012).

  • 37

    CONCLUSÃO

    Ao iniciar o trabalho, como professora de português, tinha em mente

    apenas uma coisa: tentar mostrar aos professores que leitura em sala de aula é

    importante para todas as crianças, independente da faixa etária ou da sua

    classe social. Os contos de fadas foram escolhidos por conta da proximidade

    com o autor do livro A Psicanálise dos Contos de Fadas, de Bruno Bettelheim.

    Mas trabalhar apenas a importância dos contos de fadas sem identificar

    alguma coisa de como a aprendizagem acontece parecia algo inconsistente.

    Falar da importância da leitura também, se não o trabalho não faria sentido.

    Hoje, depois de tudo pronto, vejo o quão importante foram meus

    escritos, e mais, minha experiência de vida.

    Quando comecei a escrever sobre a aprendizagem, gostaria de enfocar

    o quanto o estímulo e a convivência são importantes para o desenvolvimento

    infantil. Ao colocar meu bebê (que hoje tem um ano e três meses) na escolinha,

    percebi o quão fundamental é o papel dos pais no seu desenvolvimento. Sim,

    como estudado pelos nossos grandes pensadores Vygotsky, Wallon, com os

    neurocientistas, é o meio que desenvolve a criança. Ela precisa de estímulos

    para o que seja que ela fazer. E a escola ainda não entende isso. Não, da

    forma que deveria entender. A escola ainda não está preparada para as

    crianças estimuladas que possam vir a frequentá-la.

    Analisando mais um pouco o trabalho, tinha que falar de leitura. E leitura

    de mundo. E leitura da vida. Vi em minha outra filha (de 15 anos) a falta que o

    estímulo à leitura faz e como tudo o que eu queria provar aqui era verdadeiro:

    Ela não teve quem contasse os contos para ela – apesar de ter todos os

    clássicos em casa. Não adiantou. Ela não os conhece e nem sabe que sua

    opinião pode fazer a diferença! Em um dever de redação apenas me disse que

    não tinha opinião sobre o assunto e por isso, não saberia escrever. O estímulo

    à leitura desde a educação infantil pode ajudar a criança e se tornar um adulto

    com interesse em informação, que seja capaz de discutir qualquer assunto.

    A partir desses dois exemplos vejo meus objetivos alcançados. Os

    contos de fadas produzem maravilhas na mente de quem lê ou de quem ouve.

  • 38

    Sim, os professores podem e devem ler para seus alunos. Manter uma rotina e,

    se possível, uma biblioteca em sala de aula e que os psicopedagogos, através

    dos contos, ajudem as crianças tidas como diferentes a alcançarem seu lugar

    ao sol através de uma bela história, lida com muita emoção. Os contos são

    capazes de intervir no ego da criança que, nela, ainda está caótico. Como eles

    falam a linguagem da própria criança, fica mais fácil dela resolver os problemas

    que possam vir a aparecer na vida adulta. Além disso, eles encantam e deixam

    a vida mais bonita. Os contos de fadas têm em si, uma riqueza intelectual

    impossível de se precisar. É necessário, apenas, contar.

  • 39

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