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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA O SANEAMENTO BÁSICO COMO CARACTERIZADOR DO MÍNIMO EXISTENCIAL SOCIOAMBIENTAL E A OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL INSUFICIENTE – UMA QUESTÃO DE JUSTIÇA Por: Bárbara Cristina Ondeza Motta Vianna Orientador Prof. Francisco Carrera Rio de Janeiro 2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O SANEAMENTO BÁSICO COMO CARACTERIZADOR DO

MÍNIMO EXISTENCIAL SOCIOAMBIENTAL E A OFENSA AO

PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL

INSUFICIENTE – UMA QUESTÃO DE JUSTIÇA

Por: Bárbara Cristina Ondeza Motta Vianna

Orientador

Prof. Francisco Carrera

Rio de Janeiro

2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O SANEAMENTO BÁSICO COMO CARACTERIZADOR DO

MÍNIMO EXISTENCIAL SOCIOAMBIENTAL E A OFENSA AO

PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL

INSUFICIENTE – UMA QUESTÃO DE JUSTIÇA

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito Ambiental.

Por: . Bárbara Cristina Ondeza Motta Vianna.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, por permitir mais este passo

profissional e aos meus mentores

espirituais por me conduzirem. À minha

mãe por ter acreditado e investido em

mim com o pouco que tinha. Ao meu

marido, pelas palavras de apoio e

dedicação.

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DEDICATÓRIA

Aos filhos de Deus que povoam a Terra e

dela precisam dela para evoluir.

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RESUMO

O presente trabalho versa sobre o saneamento básico, velho conhecido

dos direitos sociais, agora, na perspectiva ambiental. Através de considerações

históricas, dados estatísticos e apontamentos jurídicos, a realidade acerca do

desenvolvimento do sistema de saneamento no país é retratada de maneira

objetiva, porém, aprofundada com o escopo de fazer entender os remendos

que, ao longo do tempo, perfizeram entraves ao progresso desse serviço.

Aborda-se o funcionamento jurídico e prático, bem como seus resultados

realçados em pesquisas reveladoras da carência no atendimento básico de

saneamento. Este, que simultaneamente, constitui um direito, um serviço

essencial, um dever do Estado na dimensão socioambiental, enfim, uma

condição indispensável para a saúde humana e não humana, imprescindível

para viver digna e sustentavelmente sobre o planeta Terra.

Cuida-se de discutir a responsabilidade do Estado na proteção ambiental

suficiente, como exigir dele o mínimo existencial sem onerar ainda mais a

sociedade; de difundir os deveres fundamentais de todos; de conscientizar as

pessoas através da educação ambiental na busca conjunta e imprescindível

por Equilíbrio e Justiça.

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METODOLOGIA

O presente trabalho foi desenvolvido sob o enfoque teórico pelo método

indutivo, tomando por base uma leitura preliminar a respeito da temática em

fontes de pesquisa documental, dados estatísticos e artigos técnicos e jurídicos

na internet, bem como na legislação nacional correlata e em publicações

doutrinárias como livros, revistas e jornais.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - SANEAMENTO AMBIENTAL 10

CAPÍTULO II - PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL INSUFICIENTE 37

CAPÍTULO III – MÍNIMO EXISTENCIAL E JUSTIÇA AMBIENTAL 47

CONCLUSÃO 58

BIBLIOGRAFIA 62

ÍNDICE 67

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INTRODUÇÃO

O saneamento básico é um exemplo emblemático para caracterização

do mínimo existencial na busca por Justiça socioambiental à medida que o

sistema brasileiro nasceu com entraves físicos, jurídicos, administrativos e

financeiros ao seu desenvolvimento.

Não obstante, as ações de saneamento são fundamentais para a

garantia da saúde humana e do equilíbrio do meio ambiente que,

simultaneamente, constituem direitos fundamentais e condições indispensáveis

para existência da vida no planeta.

A monografia se alicerça em três eixos que dialogam entre si, numa

relação de pertinência temática. A feição preventiva do saneamento básico o

torna prioridade para que o Estado cumpra seus deveres constitucionais, de

maneira próativa e com eficiência, inclusive financeira, de garantir saúde e de

proteção ambiental suficiente atingindo, dessa forma, a Justiça Universal que

permeia a Carta Constitucional vigente.

O primeiro capítulo tem a finalidade de retratar o histórico do

saneamento básico como atividade antiquíssima e essencial à convivência

saudável de agrupamentos humanos, bem como busca descrever o

desenvolvimento do setor no país com exemplos ilustrativos, porém reais.

Ainda neste capítulo, são tratados tópicos de relevância jurídica e de

ordem prática. A nomenclatura básica, empresta o significado de essencial ao

saneamento, enquanto a ambiental o amplia no sentido da sustentabilidade.

Através de dados estatísticos, a realidade é sintetizada sem torná-la

menos contundente. É a funcionalidade prática da herança na estrutura do

sistema de saneamento frente às cobranças jurídico-constitucionais e legais,

bem como às demandas socioambientais contemporâneas.

No segundo capítulo, mais afeito ao princípio da proibição da proteção

ambiental insuficiente, cuidou-se de relacioná-lo aos imperativos do

neoconstitucionalismo e seus efeitos na delimitação da responsabilidade civil.

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Nesse ponto, ressalte-se a importância do cabimento ou não da

responsabilidade civil objetiva por omissão do Estado, elemento central do

segundo eixo argumentativo da proteção ambiental adequada. Discussão

antiga, trazida à baila em razão dos reclames ambientais e a inércia do Estado.

O terceiro e último capítulo, embora menor, revela-se dotado de

conteúdo social-progressista. Em que pese discutir sobre a garantia básica do

mínimo existencial que possui mais de sessenta anos de idade, tem o propósito

de não falar mais do mesmo.

Assim, segue a linha mestra do saneamento como concretizador da

salubridade habitacional e urbana que repercute não somente na saúde e no

meio ambiente, mas na dignidade das pessoas na sua dimensão ecológica,

fundamento do Estado de Direito Socioambiental.

No caminho para Justiça existe uma montanha chamada

conscientização, esta é tratada no item sobre direitos e deveres fundamentais.

Por óbvio, a palavra de ordem é equilíbrio, não se pretende uma atrofia de

deveres em detrimento de uma hipertrofia de direitos. O Estado tem seus

deveres a cumprir e as pessoas também. Cuida-se de caminhar na direção do

progresso através da educação ambiental para conscientizar cidadãos de todas

as idades, em todos os níveis de ensino, em todas as classes sociais.

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CAPÍTULO I

SANEAMENTO AMBIENTAL

1.1 – Considerações Históricas

A questão do destino dos efluentes remonta à antiguidade. À época

dos agrupamentos nômades, a própria natureza se encarregava de reciclar os

detritos deixados quando se deslocavam em busca de locais mais fartos. Com

o desenvolvimento das técnicas agrícolas e pastoris, iniciou-se o processo de

sedentarismo, tendo espaço a fixação dos grupos humanos sempre próximos

aos cursos d’água, também utilizados para dissipar a quantidade de lixo

produzido.

Com a expansão das cidades a quantidade de lixo gerada era superior

à capacidade da natureza em decompor satisfatoriamente. Inevitável, portanto,

foi o aumento do lixo acumulado, a proliferação doenças e a poluição das

fontes de abastecimento.

Em Nipur na Babilônia, desde 3.750 a.C, já existiam coletores de esgoto.

O aqueduto de Jerwan, primeiro sistema público de abastecimento de água, foi

construído na Assíria em 691 A.C.

Ainda na Idade antiga até o século V d.C, na Grécia, enterravam as

fezes ou as afastavam para longe das residências. Em Roma, o povo em geral

acessava água em fontes públicas e utilizava latrinas comunitárias para as

necessidades fisiológicas, como a Toalete de Ephesus do século 1 d.C. Sob os

assentos havia água corrente para levar os dejetos e para que o usuário

lavasse a mão esquerda, utilizada na limpeza corporal. Ruas com

encanamentos serviam as fontes públicas e os lares de cidadãos ricos que

pagavam pelo privilégio.

A Idade Média foi um período de 10 séculos sem avanços sanitários. A

população jogava o lixo nas vias públicas e ali se acumulava, disseminando

doenças e graves problemas de saúde pública. A proliferação de ratos gerou

uma epidemia em meados do século XIV conhecida como peste bubônica ou

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peste negra, que dizimou cerca de um terço da população europeia. Na mesma

época, cólera, lepra e tifo infectaram metade da população da Europa e na

Índia milhares morreram, vítimas nas péssimas condições de salubridade.

A Revolução Industrial, responsável pelo aumento da população das

cidades, ao término do século XVIII, contribuiu para o agravamento do acúmulo

de lixo nas ruas. Os rios passaram a sofrer os efeitos da poluição, com prejuízo

do ecossistema, mortandade de peixes, e transmissão de doenças sobretudo,

a cólera.

Na Inglaterra surgiram as primeiras tentativas de medir e caracterizar a

poluição, os primeiros regulamentos de proteção aos cursos d’água e os

primeiros processos de tratamento de águas residuais. A primeira Estação de

Tratamento de Água foi construída em Londres em 1829 e tinha a função de

coar a água do rio Tâmisa em filtros de areia. No mesmo ano, na França, o

combate à poluição das águas previa punição com multa ou prisão para quem

atirasse nas águas produtos que provocassem o envenenamento ou destruição

dos peixes. Em 1842 Edwin Chadwick divulga estudos sobre saneamento,

saúde e prevenção. A ideia de tratar o esgoto antes do despejo no meio

ambiente foi testada apenas em 1874 na cidade de Windsor, Inglaterra. A

primeira construção de sistemas de esgotos subterrâneos ocorreu em 1843 em

Hamburgo, na Alemanha.

1.1.1 Histórico no Brasil

No período colonial o abastecimento de água era feito por meio de

bicas e fontes nos povoados que se formavam. Com a chegada da família real

no Brasil, implantou-se uma infraestrutura mínima. O Rio de Janeiro foi pioneiro

na coleta de águas pluviais, obviamente, na área ocupada pela aristocracia.

Os arcos da Lapa foi o primeiro aqueduto construído no Brasil, em 1723.

Até meados da década de 30 do século XIX já existiam os chafarizes

que abasteciam a corte real e os moradores habitantes da vila real, bem como

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os pipeiros, que coletavam a água nas bicas e fontes e revendiam aos

habitantes.

Vale registrar a antiga coleta colonial de esgoto feita pelo escravos

conhecidos como “tigres”, responsáveis por coletar os baldes de desjetos e

despejá-los nas praias ou riachos mais próximos1. Obsceno, na realidade, é

tentar esquecer que fezes existem e supor que o mar se constitui em uma

espécie de sumidouro universal - problema ainda muito atual nos dias de hoje.

A partir da segunda metade do século XIX o crescimento das cidades e

dos fluxos imigratórios aumentou, acarretando o agravamento dos problemas

de saneamento, com a reprodução cíclica de epidemias. Nesta fase, ocorreram

as concessões iniciais de serviços públicos de saneamento. Primeiramente na

cidade de Campinas – São Paulo, em 1875.

Na cidade do Rio de Janeiro era comum a infestação de ratos e

epidemias. Entre 1830 e 1840, foram registradas epidemias de cólera e tifo.

Em 1903, o então Diretor-Geral de Saúde Pública do Governo Federal,

Oswaldo Cruz, travou verdadeira batalha para erradicar doenças provenientes

da crônica insalubridade.

Até a década de 30 do século XX, aproximadamente, os serviços foram

prestados por empresas estrangeiras concessionárias e organizações

nacionais. Vários contratos foram objeto de cancelamento por absoluta falta de

capacidade de investimento, sendo as companhias encampadas pelo governo.

Em 1940, o governo federal criou o Departamento Nacional de Obras de

Saneamento – DNOS sob um modelo de planejamento centralizador da União,

com cooperação dos entes federativos, através do Fundo Nacional de Obras

de Saneamento.

O Serviço Especial de Saúde Pública – SESP, criado em 1942 com o

apoio do governo norte-americano, apesar do nome, teve como principal

objetivo atuar nas regiões dos rios Amazonas e Doce, produtoras de matérias-

primas como borracha, quartzo e mica, estratégicas para a época. Dez anos

depois, o SESP passou a apoiar os municípios e foi transformado em

Fundação no ano de 1960. 1 A história do tratamento de esgoto no Rio de Janeiro. Disponível em:

http://www.cedae.com.br/raiz/002002004.asp <acesso em 02/12/2011>

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Com o fim do Estado Novo, houve necessidade de reorganização DNOS

em 1946, porém, no curto período democrático de 1946 a 1964, infelizmente, o

setor não recebeu a atenção requerida. Ainda no ano do Golpe Militar, 1964,

cria-se o Banco Nacional da Habitação – BNH, gestor dos recursos do Fundo

de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, principal fonte financiadora do setor

sanitário. Em 1965 o Brasil assina acordo com o Governo dos Estados Unidos,

criando o Fundo Nacional de Financiamento para Abastecimento de Água e

Grupo Executivo de Financiamento, que atendeu vinte e uma cidades no país

entre 1965 e 1967 com obras de abastecimento de água. Nesta década, o

Brasil ocupava o último lugar no ranking dos indicadores de saneamento básico

na América Latina, com abastecimento de água acessível a menos de 50% da

população urbana. (SAKER, 2007, p.24)

Em 1968 foi criado o Sistema Financeiro do Saneamento – SFS, sob

gerência do BNH. Em 1969, foi instituído pela União através do Decreto-Lei no

949, então detentora do planejamento e controle da política nacional de

saneamento básico, o Plano Nacional de Saneamento – PLANASA, executado

pelo BNH a partir de 1971 com recursos externos a baixo custo e,

principalmente, do FGTS. Tratava-se de um modelo misto desenvolvido pelas

esferas municipal e estadual, com a finalidade abastecer, no mínimo, 80% da

população urbana com água potável e 50% com os serviços de coleta e

tratamento de esgoto até 1980.

De acordo com o modelo, os Estados teriam maior capacidade

financeira que os municípios e a operação, por uma só organização viabilizaria

o investimento. Assim, foram criadas vinte e sete Companhias Estaduais de

Saneamento Básico – CESB, que executavam os serviços através de contratos

de concessão válidos de 20 a 25 anos com os municípios. Todavia, as cidades

que possuíam uma infraestrutura melhor, mantiveram gestão própria de seus

sistemas de saneamento por meio de autarquias ou empresas municipais e

não aderiram ao programa, restando à grande parte dos municípios brasileiros,

que não tinham recursos para investir, a concessão da prestação dos serviços

às CESBs. De fato, a adesão municipal era condição para o acesso aos

recursos do SFS, porém, significava ceder, em parte, a autonomia municipal.

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Embora o acesso à água potável nos domicílios urbanos tenha crescido

de 60% para 91% e a coleta de esgoto de 20% para 49% entre 1970 e 1985,

houve crise do sistema de financiamento do setor nos anos de 1986 e de 1989

a 1992, sendo o PLANASA extinto em julho deste ano. A partir de 1994

retomou-se o ciclo de investimentos em âmbito nacional, ainda com base nos

recursos do FGTS. Os principais programas foram Programa de Modernização

do Setor de Saneamento – PMSS, o Pró-Saneamento, o Programa de Apoio à

Gestão de Sistemas de Coleta e Disposição Final de Resíduos Sólidos –

PROGEST, o Programa Emergencial de Geração de Empregos em Obras de

Saneamento – PROSEGE, o Programa de Ação Social em Saneamento –

PASS, PAT PROSANEAR. (OLIVEIRA, 2004, p.16)

O PMSS de 1994, como principal instrumento para implementação da

Política Nacional de Saneamento, criou as bases para o setor de saneamento.

Em 1995, o Pró-Saneamento tinha por escopo melhorar as condições de

saúde, bem como da qualidade de vida da população e do meio ambiente

empregando além do abastecimento de água e do esgotamento sanitário, a

coleta de resíduos sólidos e a drenagem urbana. O PROGEST, basicamente,

definiu diretrizes e estratégias para manejo dos resíduos sólidos e de fomento

ao desenvolvimento tecnológico. O PROSEGE visou o incremento dos serviços

de esgotamento sanitário voltado a comunidades com rendimentos familiares

de até sete salários mínimos. O PASS, mais direcionado à política social a

exemplo do PROSEGE, objetivava expandir a cobertura das ações de

saneamento2 para as localidades urbanas mais pobres, principalmente, para os

municípios de pequeno e médio portes dotados de receita reduzida. O PAT

PROSANEAR, novamente, destinou-se ao apoio técnico-financeiro dos

municípios brasileiros com mais de 75.000 habitantes, porém, foram inclusos

projetos sustentáveis para aglomerados urbanos vulneráveis, conhecidos como

favelas e áreas de baixa renda, em geral.

Vale ressaltar ainda o Programa de Assistência Técnica à Parceria

Público-Privada em Saneamento - PROPAR, incentivador dos concessionários

privados no setor. O PROPAR, de setembro de 1997, era voltado ao apoio dos

2 abastecimento de água, esgotamento sanitário e destinação final de resíduos sólidos

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municípios e Estados, em especial, para o definição do modelo de gestão de

parceria público-privada mais adequado, bem como do planejamento

econômico-financeiro através de consultoria especializada financiada pela

Caixa Econômica Federal e pelo BNDES.

De fato, segundo Marta Arretche, para o governo federal o FGTS não

suportaria a universalização dos serviços de saneamento, exclusivamente, com

base em recursos públicos, sendo necessário atrair recursos privados, abrindo

as empresas estatais de saneamento para terceirização e privatização dos

serviços. (apud SAKER, 2007, p.26)

Destarte, diante do quadro, através Emenda Constitucional n.º 19 de

1998, modificou-se a redação do artigo 241 da Constituição da República, com

o intuito de garantir a universalização do serviço de saneamento através da

prestação por consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os

entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos

O dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei n.º 11.107/2005,

que criou mecanismos de gestão associada entre os entes federados como

consórcios públicos e convênios de cooperação, tido como ponto fundamental,

para viabilizar a implantação efetiva da privatização do setor de saneamento

básico para Alaôr Caffé Alves.

Para Ricardo Araújo, após um período de tempo marcado, sobretudo,

por iniciativas de privatização nas áreas de energia elétrica e telecomunicações

e discussões acerca da parcela do mercado de combustíveis destinada à

PETROBRÁS, as atenções do governo e das empresas investidoras voltaram-

se, também, para os serviços públicos de saneamento básico, mormente,

abastecimento de água e esgotamento sanitário.

O autor aponta, minimamente, duas explicações bastante razoáveis,

para essa diferença de cronograma em relações a esses setores do

desenvolvimento. Em primeiro lugar, o setor de saneamento era passível de ser

incluso entre as funções clássicas de Estado, particularmente por sua relação

estreita com a saúde pública. Assim, demorou-se a cogitar com afinco sobre a

viabilidade de transferência das responsabilidades diretas da prestação de

seus serviços a empresas privadas.

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Em segundo lugar, a organização institucional, bastante diferente dos

setores públicos de telecomunicações, energia elétrica, petróleo e gás, acarreta

restrições mais complexas tanto para uma participação abrangente de capital

privado em sua administração e operação, quanto para uma eventual

reestruturação do modelo ainda predominantemente estatal de financiamento e

gerenciamento, característicos do PLANASA.

Na opinião de Ana Cristina Augusto de Souza, na raiz da crise vivida

pelo saneamento ambiental nos dias de hoje está a proposição neoliberal de

transformar sua natureza de serviço público de caráter social para atividade

econômica que visasse o lucro; de direito social e coletivo para a de

mercadoria, que se adquire ou não segundo a lógica do mercado.

A tentativa de implementação de um modelo neoliberal à época do

governo de Fernando Henrique Cardoso, provocou a paralisação dos

investimentos do setor público pela dificuldade de acesso aos financiamentos,

postergando assim o atendimento à população socialmente mais

excluída.(SOUZA, 2005, p.12)

Entrementes, o marco regulatório do setor, a Lei nº11.455 de 2007,

oriunda do Projeto de Lei nº 5.296/2005 - Saneamento para Todos, foi

encaminhado à Câmara dos Deputados, onde recebeu pelo menos oitocentas

emendas pela Casa Civil da Presidência da República. Posteriormente, houve

a fusão deste com o projeto de lei sob o n.º 155/05 que já tramitava no Senado

Federal versando sobre a matéria, surgindo o projeto consolidado nº 219/06,

aprovado no Senado Federal e encaminhado à Câmara dos Deputados, em

julho de 2006, sob a identificação P.L. n.º 7.361/06, aprovado em 12 de

dezembro de 2006 e sancionado pelo então Presidente da República Luís

Inácio Lula da Silva. Em 2010, o regulamento desta lei foi promulgado através

do Decreto no 7.217 de 2010.

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1.2 – Relevância jurídica e fática do saneamento

1.2.1– Nomenclatura

Por tradição histórica, o saneamento é adjetivado como básico, uma vez

que corresponde à salubridade pública visando tornar um local livre de doenças

e em boas condições de higiene e habitabilidade favorecendo a existência do

homem, dos animais e das coisas (DE PLÁCIDO E SILVA, 2002, p.733).

O Estatuto das cidades de 2001, a lei no 10.257/01, inovou qualificando

o termo saneamento como ambiental, um adjetivo mais moderno e adequado

às preocupações ambientais em voga, porque abrange aspectos além da

saúde pública, ampliando a tutela do setor para seus outros efeitos reais como

a poluição do meio ambiente, sobretudo, a hídrica, bem como os danos ao

patrimônio público.:

“ Art 2o. A política urbana tem por objetivo ordenar o

pleno desenvolvimento das funções sociais da

cidade e da propriedade urbana, mediante as

seguintes diretrizes gerais:

I – garantia do direito a cidades sustentáveis,

entendido como o direito à terra urbana, à moradia,

ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana,

ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e

ao lazer, para as presentes e futuras gerações;”

O Estatuto da Cidade, segundo Nelson Saule Júnior e Carlos Ari

Sudfeld (apud PRIETO, 2006, p.2) é uma diretriz geral do desenvolvimento

urbano com status de norma geral, que retira seu fundamento de validade da

Constituição da República, mas precisamente do princípio da função social

ambiental da cidade, ínsito no art 182:

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“Art. 182. A política de desenvolvimento urbano,

executada pelo Poder Público municipal, conforme

diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo

ordenar o pleno desenvolvimento das funções

sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus

habitantes.” (grifei)

Sendo competência constitucional da União, conforme art. 21, inciso XX,

instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação,

saneamento básico e transportes urbanos, o princípio da função social

ambiental da cidade, é resultado da competência constitucional da União para

instituir diretrizes gerais para o desenvolvimento urbano, sendo essa política

executada pelos Municípios nos termos das diretrizes traçadas no Estatuto da

Cidade.

A questão ambiental constitui um dos eixos principais da política de

desenvolvimento urbano, vez que deve garantir o bem estar dos habitantes das

cidades o que está em plena consonância com o direito fundamental das

presentes e futuras gerações ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 3

Todavia, por opção do legislador, o marco regulatório do setor de

saneamento, a lei no 11.445 de 2007, não seguiu a orientação do Estatuto da

Cidade e homenageou a tradição histórica da nomenclatura – saneamento

básico, a exemplo da Constituição de 88.

Vale dizer, que a lei mais nova e mais específica, não menciona o termo

saneamento ambiental, antes porém, pontua a salubridade ambiental como

objetivo da política de saneamento no país:

3 Lei Federal n.º 10.257/01: Art. 1º. (...) Parágrafo Único. Para todos os efeitos, esta Lei, denominada Estatuto da Cidade,

estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.

Art. 2o. (…) I - garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;

IV - planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;

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Art. 49. São objetivos da Política Federal de

Saneamento Básico:

III - proporcionar condições adequadas de

salubridade ambiental aos povos indígenas e outras

populações tradicionais, com soluções compatíveis

com suas características socioculturais;

IV - proporcionar condições adequadas de

salubridade ambiental às populações rurais e de

pequenos núcleos urbanos isolados;

V - assegurar que a aplicação dos recursos

financeiros administrados pelo poder público dê-se

segundo critérios de promoção da salubridade

ambiental, de maximização da relação benefício-

custo e de maior retorno social.(grifei)

Para Ana Cristina Augusto de Sousa, a categoria Saneamento Básico

surgiu para restringir o conceito do Manual de Saneamento de 1972 sobre o

conjunto de ações, obras e serviços considerados prioritários em programas de

saúde pública, tais como: abastecimento de água, esgotamento sanitário,

drenagem urbana, resíduos e controle de vetores e roedores.

De acordo com a conceituação clássica inscrita no Manual, saneamento

é “o conjunto de medidas que visam a modificação das condições do meio

ambiente com a finalidade de promover a saúde e prevenir as doenças”.

Segundo a autora esta concepção desenvolveu uma nova definição de

saneamento que é traduzida no moderno conceito de Saneamento Ambiental,

conceituado por Roque (apud SOUZA, 2005, p.2) como o conjunto de ações

técnicas e socioeconômicas, entendidas fundamentalmente como de saúde

pública, tendo por objetivo alcançar níveis crescentes de salubridade

ambiental, compreendendo o abastecimento de água em condições

adequadas; a coleta, o tratamento e a disposição adequada dos esgotos,

resíduos sólidos e emissões gasosas; prevenção e controle do excesso de

ruídos; a drenagem urbana das águas pluviais e o controle ambiental de

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vetores e reservatórios de doenças, com a finalidade de promover e melhorar

as condições de vida urbana e rural.

Pelo exposto, o saneamento é o meio para se atingir a salubridade

ambiental, que a seu turno, conforme o conceito supra é mais abrangente que

o próprio conceito legal de saneamento básico analisado no tópico a seguir.

A amplitude do vocábulo ambiental relaciona-se com a

transdisciplinariedade do bem “ambiente”, que não é um lugar, pura e

simplesmente. É um conjunto de condições, leis científicas, influências e

interações.

A política nacional do meio ambiente positivada na lei no 6938/8, ao

definir legalmente meio ambiente no inciso primeiro do artigo terceiro, qualifica

as influências e interações como de ordem física, química e biológica.

Assim, sob a prespectiva física inclui-se, por exemplo, a consistência do

solo, a temperatura, a qualidade do ar e a sua umidade relativa, os ruídos,

radioatividade, dentre outros. Na matriz química, encontra-se a composição

química do ar, do solo, da água e os poluentes. Biologicamente, trata-se das

cadeias ecológicas nos mais variados ecossistemas, dos agentes infecciosos

provenientes do lixo e encontrados em ambientes hospitalares, etc

(FIGUEIREDO, 2011, p. 53). Vale ainda aduzir o elemento cultural, também

pilar para o desenvolvimento do ambiente e da qualidade de vida.

Ora, sanear na sua acepção mais simples é consertar. Fazer correções

ambientais acarreta uma série de serviços e exige profissionais de várias áreas

do conhecimento para desenvolvê-los e executá-los, tornando o saneamento

extenso em suas bases e até ilimitado, tendo em vista os riscos e efeitos do

progresso industrial e socioeconômico.

De fato, a opção legislativa de nomenclatura não revoga ou torna

menores os efeitos práticos do saneamento, uma vez que as ações e omissões

de saneamento, respercutem sobre a saúde e sobre o meio ambiente

independente do seu adjetivo.

Com efeito, o termo saneamento ambiental não exclui as demandas

sanitárias, pelo contrário, as reforça enquanto ação prioritária na garantia de

salubridade ambiental, porém não se limitando a estes objetivos. Destarte,

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21

constitui uma evolução do termo, sobretudo nos aspectos conceituais

referentes à natureza transdisciplinar do bem jurídico tutelado

constitucionalmente, o meio ambiente.

1.2.2 – Conceito e Finalidade

Para os efeitos da Lei no 11.445/07, conforme dispõe o art. 3o, considera-

se saneamento básico: o conjunto de serviços, infraestruturas e instalações

operacionais de abastecimento de água potável, esgotamento sanitário,

limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos constituído pelas atividades e

drenagem e manejo das águas pluviais urbanas.

O abastecimento de água potável é constituído pelas infraestruturas e

instalações necessárias ao abastecimento público de água potável, desde a

captação até as ligações prediais e respectivos instrumentos de medição.

Por esgotamento sanitário entende-se as atividades, infraestruturas e

instalações operacionais de coleta, transporte, tratamento e disposição final

adequados dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até o seu

lançamento final no meio ambiente.

Limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos traduz-se pelo conjunto

de atividades, infraestruturas e instalações operacionais de coleta, transporte,

transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixo originário da

varrição e limpeza de logradouros e vias públicas.

Drenagem e manejo das águas pluviais urbanas é o conjunto de

atividades, infraestruturas e instalações operacionais de drenagem urbana de

águas pluviais, de transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de

vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas

nas áreas urbanas.

Depreende-se portanto, a finalidade de atender a uma necessidade de

interesse geral.

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22

1.2.3 – Natureza Jurídica e abrangência fática

Maria Luiza Machado Granziera define a natureza jurídica do

saneamento básico como serviço público essencial. Não alcança tal natureza a

ação de saneamento executada individualmente ou ações e serviços de

saneamento básico de responsabilidade privada, incluindo o manejo de

resíduos sólidos de responsabilidade do gerador. (Cf. Lei no 11.445/07, art 5o)

A universalização dos serviços públicos essenciais constitui um querer

constitucional. No que concerne ao saneamento básico, a carência de

investimentos no setor, que por sua vez, além de ofender o princípio da

universalização, tem efeitos práticos devastadores.

Os efeitos da não prestação, da má prestação, ou ainda da prestação

insuficiente podem ser danos ao patrimônio, à saúde das pessoas e ao meio

ambiente. (GRANZIERA, 2011, p. 642)

Segundo a Pesquisa Saneamento, Educação, Trabalho e Turismo

realizada pelo Instituto Trata Brasil em parceria com a FGV no ano de 2008, se

os investimentos em saneamento continuarem no mesmo ritmo, apenas em

2122 todos os brasileiros teriam acesso a esse serviço básico.

Em relação ao patrimônio do cidadão brasileiro, estima-se que a

universalização do acesso a rede de esgoto pode proporcionar uma

valorização média de até 18% no valor dos imóveis. A valorização dos imóveis

pode alcançar R$ 74 bilhões, valor 49% maior que o custo das obras de

saneamento avaliado em R$ 49,8 bilhões, considerando apenas novas

ligações. Isto implica diretamente na arrecadação do IPTU e ITBI, pois, a longo

prazo, o acesso à rede de esgoto implicaria um aumento na arrecadação do

Imposto Predial e Territorial Urbano na mesma proporção do valor médio dos

imóveis, um ganho estimado de R$ 385 milhões ao ano. A despeito do Imposto

Sobre Transferência de Bens de Imóveis o crescimento esperado é superior a

R$ 80 milhões por ano, conforme a Pesquisa Benefícios Econômicos da

Expansão do Saneamento Brasileiro desenvolvida pelo Instituto Trata Brasil

juntamente com a FGV em 2010.

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No que concerne ao meio ambiente, a Pesquisa Saneamento,

Educação, Trabalho e Turismo realizada pelo Instituto Trata Brasil em parceria

com a FGV no ano de 2008, aponta que as 81 maiores cidades do país, com

mais de 300 mil habitantes, despejam, diariamente, 5,9 bilhões de litros de

esgoto sem tratamento algum, contaminando solos, rios, mananciais e praias

do país, com impactos diretos a saúde da população.

No que tange à saúde, vale destacar que o saneamento básico é um

dos fatores mais importantes para a saúde, de forma que o abastecimento de

água simultâneo com o destino adequado de dejetos, é capaz de influir

poderosamente contra as mais frequentes endemias como esquistossomose,

verminose, amebíase, shigueloses e febre tifoide. (MENEZES,1993, p.17)

As doenças oriundas da falta de saneamento básico são decorrentes

tanto da quantidade como da qualidade das águas de abastecimento, do

afastamento e destinação adequada dos esgotos sanitários, do afastamento e

destinação adequada dos resíduos sólidos, da ausência de uma drenagem

adequada para as água pluviais e principalmente pela falta de uma educação

sanitária.

Nesse sentido Barcellos e Bastos indicam a distância da população a

fontes de poluição como um fator controlador dos riscos associados à

exposição, mas não o único. A faixa etária, ocupação e condições de habitação

também, condicionam, de forma seletiva, grupos populacionais submetidos a

maior risco. (BARCELLOS, BASTOS, 1996, p. 10)

O Censo 2000 do IBGE indicam um total de 46,5 milhões de domicílios

particulares permanentes no País. Desse universo, 22,17% ainda não possuem

cobertura de abastecimento de água adequada, ou seja, água encanada

disponível em pelo menos um cômodo, proveniente de rede geral; 33,25% não

possuem esgotamento sanitário adequado, isto é, rede de coleta ou fossa

séptica e 16,79% não possuem coleta de lixo adequada quer direta ou indireta.

No ano de 2009, apenas 44,5% da população brasileira estava conectada a

uma rede de esgotos, e do volume coletado somente cerca de 37,9% era

tratado. (SNIS, 2009) A participação dos domicílios atendidos pelo serviço de

rede coletora ou por fossa séptica à rede coletora foi de 59,1%, tendo o Norte e

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o Nordeste do país as menores parcelas de domicílios atendidos por este

serviço, com 13,5% e 33,8%, respectivamente. (IBGE, 2010)

Nesse diapasão, cabe dispor sobre o elenco das doenças infecciosas

relacionadas à água, ao esgoto, ao lixo e à habitação. No binômio água e

saúde influenciam tanto a qualidade quanto a quantidade da água para seus

diversos usos, principalmente, ingestão, higiene corporal e do ambiente e

preparo dos alimentos. Agentes microbianos e químicos podem infectar a água

para consumo e causar, dentre outras doenças, cólera, febre tifóide, disenteria

bacilar e hepatite infecciosa, esquistossomose, esta por água poluída com

excretas com caramujos aquáticos que infectam a pele.

A escassez de água para a higiene pessoal e doméstica propicia

diarreias, responsáveis por grande parte da mortalidade infantil, infecções de

pele por sarna e fungos e tracoma nos olhos. Insetos, chamados vetores, que

se reproduzem na água ou vivem próximos a reservatórios como mananciais,

águas paradas ou córregos, são transmissores de malária, febre amarela e

dengue. A mosca glossino longipennis, conhecida por “tsetse” transmite a

doença do sono ou sono mortal e, a mosca simulium causa cegueira,

tecnicamente oncocercose.

As doenças relacionadas aos esgotos são causadas por patogênicos,

quais sejam, vírus, bactérias, protozoários e helmintos existentes em excretas

humanas, sobretudo nas fezes. As mais comuns são poliomielite, hepatite A,

giardiases, desinterias, diarreias, salmonelose por ingestão de alimento ou

água contaminada com fezes; áscaris lumbricoides e ancislotomíase –

amarelão, através da sola dos pés em solo contaminado; taeníase, pela

ingestão de carne de boi ou porco contaminada; e filariose, por meio de

picadas de mosquitos do gênero Culex que se reproduzem em águas poluídas

pela falta de sistemas de drenagem.

Os resíduos sólidos ou lixo, acarretam a proliferação de moscas,

responsáveis pela transmissão de amebíase, salmonelose. O lixo hospeda

ainda os ratos, transmissores da peste bubônica; leptospirose, transmitidas

pela urina de rato e febres pela mordida do rato.

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Cumpre enfatizar que habitações precárias favorecem a contaminação

humana, assim, devem distar de depósitos de lixo, águas estagnadas e

esgotos abertos. É indispensável que instalações hidro sanitárias existam e

funcionem, para o suprimento de água e afastamento dos esgotos

adequadamente. Igualmente imprescindível é a ventilação satisfatória, vez que

garantindo-se temperatura e umidade razoáveis, evitam-se doenças

disseminadas pelo ar, a saber, meningite, sarampo, difteria e doenças

respiratórias. Habitações de taipa mal conservadas hospedam o inseto

barbeiro, transmissor da doença de chagas, comum em populações rurais de

baixa renda.

Por ano, 217 mil trabalhadores precisam se afastar de suas atividades

devido a problemas gastrointestinais ligados a falta de saneamento. A cada

afastamento perdem-se 17 horas de trabalho. Considerando o valor médio da

hora de trabalho no País de R$ 5,70 e apenas os afastamentos provocados

apenas pela falta de saneamento básico, os custos chegam a R$ 238 milhões

por ano em horas-pagas e não trabalhadas. (Trata Brasil/FGV, 2010)

Em 2009, dos 462 mil pacientes internados por infecções

gastrointestinais, 2.101 faleceram no hospital. Cada internação custa, em

média R$ 350,00. Com o acesso universal ao saneamento, haveria uma

redução de 25% no número de internações e de 65% na mortalidade, ou seja,

1.277 vidas seriam salvas (Trata Brasil/FGV, 2010), por isso, é fundamental

ressaltar que a cada R$ 1,00 investido em saneamento gera economia de R$

4,00 na área de saúde, conforme dados de 2004 da Organização Mundial da

Saúde – OMS.

Todavia, o Brasil parece caminhar na contramão. A princípio, os

investimentos no setor deveriam ser na ordem de 0,63% do PIB, entretanto,

são investidos apenas 0,22%, efetivamente. Pouco investimento torna a

universalização ainda mais distante e promove mais gastos com saúde.

O governo federal lançou em 2007 o Programa de Aceleração do

Crescimento – PAC Saneamento, porém, segundo o Ministério das Cidades,

menos de 30% das obras do foram concluídas até 2010.

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1.3 Funcionamento do Sistema

A exemplo da Constituição de 1934, influenciada pelo federalismo de

cooperação norte-americano, a Constituição de 1988 repetiu tal linha,

observável nas competências comuns, porém, ainda sob um modelo fiscal que

privilegia a União como detentora dos recursos da Federação.

O setor de saneamento básico, parte integrante da política de saúde

pública, está inserido no modelo cooperativo. O texto constitucional dispõem

sobre o saneamento básico de forma a compor um sistema de repartição de

tarefas com base no princípio da cooperação, e consequentemente, não define

expressamente a titularidade do serviço.

À União cabe instituir, privativamente, diretrizes para o

desenvolvimento de saneamento básico (CR, art. 21, XX), além de promover a

melhoria das condições de saneamento básico e proteger o meio ambiente e

combater a poluição em qualquer de suas formas, em conjunto com Estados,

Distrito Federal e Municípios.(CR, art 23, VI e IX e art 3o, III e IV da lei no

10.257/01).

Visto que os efeitos do serviço de saneamento ambiental repercutem

na saúde humana e no meio ambiente, é válido mencionar a a atribuição

constitucional dada ao Sistema Único de Saúde em participar da formulação da

política e da execução de ações de saneamento básico (CR, art 200, IV), bem

como a fixação de competência legislativa concorrente da União sobre

recursos naturais, controle da poluição, proteção do Meio Ambiente, do

patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico e dano ao

consumidor(CR art. 24, VI e VII), em normas gerais, o que não exclui a

competência suplementar legiferante dos Estados-membros (CR art. 24 §§ 1o e

2o)

Os Estados federados possuem as competências não vedadas pela

Constituição (CR, art. 24 §§ 1o e 2o), podendo ainda, mediante lei

complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e

microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para

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integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de

interesse comum.(CR, art 25 § 3o)

A competência legislativa dos Municípios refere-se aos assuntos de

interesse local e suplementar da legislação federal e da estadual no que couber

(CR, art 30, I e II). Administrativamente, cabe organizar e prestar, diretamente

ou sob regime de concessão ou permissão (CR, art. 175), os serviços públicos

de interesse local e promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local,

além das atribuições supracitadas (CR, art 30, V e IX).

A nova regra regulamentadora do setor – Lei no 11.445/07, não definiu,

igualmente, a titularidade do serviço. O primeiro dispositivo do capítulo II – Do

exercício da Titularidade, o art 8o, por exemplo, capitula: “Os titulares dos

serviços públicos de saneamento básico poderão delegar (...)”. Todavia, no

capítulo III regulou a prestação regionalizada do serviço público de saneamento

básico caracterizada por um único prestador do serviço para vários Municípios,

contíguos ou não; pela uniformidade de fiscalização e regulação dos serviços,

inclusive de sua remuneração e, pela compatibilidade de planejamento.(Lei no

11.445/07, art 14, I, II e III)

A prestação regionalizada de serviços públicos de saneamento básico

poderá ser realizada por órgão, autarquia, fundação de direito público,

consórcio público, empresa pública ou sociedade de economia mista estadual,

do Distrito Federal, ou municipal, na forma da legislação; ou, empresa privada

a que se tenham concedido os serviços. (Lei no 11.445/07, art 16, I e II)

Vale ressaltar a vedação legal para os instrumentos de delegação

precários trazida no art. 10 para os serviços públicos de saneamento básico

prestados por entidade que não integre a administração do titular, que

dependerão da celebração de contrato, sendo vedados convênios, termos de

parceria ou outros instrumentos de natureza precária.

Excetuam-se os convênios e outros atos de delegação celebrados até

o dia 6 de abril de 2005 e, os serviços públicos de saneamento básico cuja

prestação o poder público, nos termos de lei, autorizar para usuários

organizados em cooperativas ou associações, desde que se limitem a

determinado condomínio ou, localidade de pequeno porte, predominantemente

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ocupada por população de baixa renda, onde outras formas de prestação

apresentem custos de operação e manutenção incompatíveis com a

capacidade de pagamento dos usuários.

1.3.1 Funcionalidade na prática

Face à opção do constituinte originário pelo federalismo de cooperação

no que tange ao saneamento básico, não existiria hierarquia entre os entes

federados para o planejamento, regulação e execução dos serviços de

saneamento básico, vez que este foi inserido no rol de competência comum,

cabendo, indiferentemente, às entidades estatais solucionar as matérias que

estejam em suas atribuições institucionais.(SLAWINSKI,2006, p.225)

Mediante interpretação literal da letra constitucional, o funcionamento

do sistema criado rege-se pelas diretrizes (CR, art. 21, XX), planos de

desenvolvimento (CR, art. 21, IX) e normas gerais sobre meio ambiente,

proteção ao consumidor usuário (art. 24, VI, §1º) e do sistema único de saúde

(art. 200, IV), editadas pela União. Salvo as normas de integração do sistema

único de saúde ao saneamento, as demais podem sofrer suplementação pelos

Estados(art. 24, VI e §2º e art. 24, V) e Municípios(art. 30, II e art. 30, V, c/c

art. 21, XX), conforme interesse regional ou local.

Às cidades compete legislar sobre a forma de prestação dos serviços

de sua atribuição, isto é, se diretamente ou através de concessão ou

permissão. Linearmente, portanto, sendo o saneamento um serviço público de

interesse local, caberia, originariamente, aos municípios a titularidade da

prestação, muito embora a Constituição não faça menção expressa.

Nesse sentido, Ricardo Araújo aduz, por tradição histórica e política,

tais atividades foram enquadradas no texto constitucional atual como de

responsabilidade local, sendo razoável deduzi-la a partir dos termos do inciso V

do artigo 30, conforme segue:

“Artigo 30 - Compete aos Municípios:

(...)

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29

V - Organizar e prestar, diretamente ou sob regime

de concessão ou permissão, os serviços públicos de

interesse local, incluído o de transporte coletivo, que

tem caráter essencial”

Luís Roberto Barroso observa ser o dispositivo supra uma cláusula

genérica que procura realizar o princípio da subsidiariedade, pelo qual todos os

serviços de interesse tipicamente local, ou seja, que possam ser prestados

adequadamente pelo Município e se relacionem com sua realidade, estejam no

âmbito de competência deste. (BARROSO, 2006, p. 227)

Nesse ínterim, cabe ressaltar que sendo possível a instituição de

regiões metropolitanas pelos Estados para organizar os serviços de interesse

comum (CR, art. 25, §3º), pode-se concluir, ao menos, pela possibilidade de

prestação do saneamento básico pelo Estado instituidor da região

metropolitana, vez que este serviço constituiria interesse comum. Nesses

casos, o abastecimento de água é viabilizado, frequentemente, mediante

sistemas produtores cuja finalidade é o atendimento a dois ou mais municípios,

caracterizando uma função de interesse mais claramente comum. (ARAÚJO, p.

13) Outrossim, uma lei que institui região metropolitana pressupõe um

fenômeno econômico, fático, social e urbanístico, que é a conurbação, onde os

interesses estão interpenetrados, não se percebe mais onde termina um

município e começa o outro, e aí não se pode falar mais em interesse

predominantemente local, o interesse pasa a ser regional. (JURUENA, 2006, p.

217)

Porto Neto, entretanto, entende que o fato do Município integrar região

metropolitana, aglomeração urbana, microrregião ou região interligada de

desenvolvimento não altera sua competência em relação à execução dos

serviços. Mas, a cidade fica subordinada à regulamentação, ao planejamento

regional e às normas de organização compartilhadas. (apud SAKER, 2007,

p.25)

Pedro Gonçalves da Rocha Slawinski afirma não ser conflitante o

conceito de interesse local com o conceito de interesse comum. A maior parte

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da doutrina aponta o critério da predominância do interesse para dirimir o

conflito aparente.

Eros Grau (SLAWINSKI, 2006, p.227) aprofunda a temática

esclarecendo que a noção de interesse municipal não implica que seja

considerado exclusivo do município, aliás, tudo quanto seja de interesse

municipal se reflete, em última instância, como de interesse estadual ou

federal, distinguindo-se pela circunstância predominantemente local, uma

noção elástica que permite a adoção de critérios variáveis para determinação

de um mesmo problema, ora de interesse local, ora regional. Se determinada

matéria predomina o interesse do Município em relação ao Estado e à União,

tal competência é do município, assim, segundo Hely Lopes Meirelles, a

aferição da competência municipal há de ser feita no caso concreto com base

no critério da predominância do interesse e não o da exclusividade.

Na hipótese do serviço publico não ser de competência político-

administrativa expressa e possa ser enquadrado como como de predominante

interesse local, será de competência do município. Contudo, se for considerado

de interesse comum, metropolitano ou regional, será de competência dos

Estados. Esse critério é firmado pode ser firmado pela lei complementar que

institui a região metropolitana, basta ser incluso no rol de serviços comuns aos

Municípios

Luís Roberto Barroso ao lado de Alaôr Caffé Alves, Diogo de

Figueiredo e Sérgio Ferraz, enfatiza que uma vez editada a lei instituidora da

região metropolitana, a associação é compulsória para os Municípios, porque o

elemento local não pode prejudicar o interesse comum. Eros Grau afirma que o

segundo dos serviços reputados como de interesse metropolitano é o

saneamento básico (SLAWINSKI, 2006, p.231). Caio Tácito arremata a questão

dispondo que nos municípios incluídos na região metropolitana, os serviços de

saneamento básico são, em sua totalidade, de competência estadual plena,

conforme regulado em legislação específica. (SLAWINSKI, 2006, p.235). E,

boa parte das leis complementares que criaram regiões metropolitanas no país

incluíram o saneamento básico como serviço comum, a saber, as de São

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Paulo, Belo Horizonte, Fortaleza, Recife, Salvador, Curitiba, Belém e Porto

Alegre, que, aliás, é um caso a parte.

Destarte, em tese, os serviços de saneamento em cidades localizadas

em regiões metropolitanas seriam de titularidade estadual e a avocação

estadual de matéria ordinariamente municipal não violaria a autonomia do

município vez que o fundamento de validade é a própria Constituição, de forma

que ela mesma afirma – art 30, V e limita a autonomia municipal – art 25 § 3o.

Todavia, muitos municípios localizados em regiões metropolitanas vem

prestando saneamento básico há décadas, como Porto Alegre no Rio Grande

do Sul e Betim em Belo Horizonte, e tal situação não se alterou com o advento

da Constituição da República e tampouco com as leis complementares

instituidoras de regiões metropolitanas.

A título de exemplo cita-se a lei complementar estadual 87/97 do Rio de

Janeiro:

“Art. 1o. Fica instituída a Região Metropolitana do

Rio de Janeiro (?) com vistas à organização, ao

planejamento e à execução de funções públicas e

serviços de interesse metropolitano ou comum.

(?)

Art. 3o. Consideram-se interesse metropolitano ou

comum as funções públicas e os serviços que

atendam a mais de um município, assim como os

que, restritos ao território de um deles, sejam de

algum modo dependentes, concorrentes confluentes

ou integrados de funções públicas, bem como os

serviços supramunicipais, notadamente:

(?)

II – saneamento básico (...)”

A norma supra é objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI

no 1842 – 5/RJ de 09 de junho de 1998, de mérito ainda não julgado.

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O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro4, de São Paulo5 e do Espírito

Santo6 compartilham do entendimento de que a titularidade é do Estado em

Região Metropolitana, vez que o interesse local resta descaracterizado diante

da necessidade comum de outras municipalidades.

Com efeito, as necessidades metropolitanas demandam funções

públicas que exigem coordenação entre vários centros de competência político-

administrativos do mesmo ente federativo ou não e, para a consecução dos

serviços, podem esses firmar contrato entre si nos moldes da lei no 11.107/05

ou com o setor privado conforme a lei no 8.987/95.

Segundo Ricardo Araújo, no início dos anos 90, quando parecia haver

a iminência de uma onda de municipalização de serviços concedidos às

empresas públicas estaduais foi elaborado um projeto de lei federal, o PL no

199/93, que trazia em seu bojo a definição de competências na prestação do

serviço de saneamento básico. Tal projeto foi aprovado pelo Congresso, mas

integralmente vetado pelo atual governo federal:

“Art. 3o – Compete aos Municípios e ao Distrito

Federal organizar e prestar diretamente, ou

mediante regime de concessão ou permissão, os

serviços públicos de saneamento de interesse local.

Art. 4o – Os Estados e o Distrito Federal, em

cooperação com os Municípios, deverão promover a

organização,

o planejamento e a execução das funções públicas e

saneamento de interesse comum, nas regiões

metropolitanas, aglomerações urbanas, ou outras

regiões constituídas por municípios limítrofes

agrupados, onde a ação supra-local se fizer

necessária”.

4 Apelação em mandado de segurança 2002.004.01949 e RE 419832 5 RI 1096000300 TJ/SP 6 Ação de Inconstitucionalidade 10000001481-9 e 10099001127-0 TJ/ES

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Outro projeto de lei federal, o PL no 266/96, do então senador José

Serra, estabeleceu:

“Art. 4o – O poder concedente dos serviços públicos

de saneamento básico, observadas as normas

legais supletivas ou complementares dos Estados,

do Distrito Federal e dos Municípios, será exercido:

I – pelos Municípios, quando se tratar da prestação

de serviços de interesse local, entendidos como tais

aqueles serviços de saneamento básico em cuja

execução as instalações operacionais não sejam

compartilhadas com outras localidades, bem como

não afetem os interesses de outros Municípios;

(...)

III – pelos Estados, quando abranger a prestação de

serviços que atendam interesses comuns a dois ou

mais municípios integrantes de regiões

metropolitanas, aglomerações urbanas e

microrregiões, instituídas como tal mediante lei

complementar estadual, nos termos do parágrafo 3o

do artigo 25 da Constituição Federal.

§ 1o – Lei Complementar Estadual definirá os

serviços públicos de saneamento básico de

interesse comum e a forma de cooperação entre

Estado e Municípios para o planejamento, a

organização e a prestação desses serviços nas

regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e

microrregiões.”

De fato, a tentativa de esclarecer e definir o que a Constituição da

República deixava subentendido não poderia ser efetivado por uma norma

infraconstitucional, vez que a letra daquela pulverizava a titularidade, enquanto

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esta a delimitava e, neste ponto, eram colidentes, não havendo fundamento de

validade para o projeto de lei. Solução mais adequada seria a reforma por

emenda à Constituição, substituindo neste ponto o federalismo por cooperação.

A discussão sobre a titularidade dos serviços de saneamento básico em

uma região metropolitana assumiu importância estratégica. De um lado, o

esforço por preservar o mercado das companhias estaduais, prestadoras do

serviço há décadas. De outro lado, a divisão de titularidades entre estado e

municípios, pelo critério de serviço comum e serviço local, revela questões

contraproducentes, pois, na prática, podem repercutir na funcionalidade do

sistema de prestação de serviços, quais sejam, a coordenação política para

operacionalização do serviço, que depende de sintonia e cooperação entre

centros políticos de decisão que podem possuir interesses divergentes, aliás

presente em outras áreas de interesse público comum como transporte, uso e

ocupação do solo, por exemplo; as políticas de combate às perdas físicas e

financeiras do sistema, isto é, volumes d'água que se perdem nas várias fases

de produção e distribuição e volumes efetivamente entregues aos usuários,

mas não faturados; a conservação de água; e, os débitos contraídos por alguns

municípios ao longo de vários anos pelo não-pagamento ou pagamento parcial

às CESBs.

Flávia Bahia aponta uma singularidade na federação republicana do

Brasil – os municípios. As demais federações apresentam um modelo dual de

União e Estados, enquanto a brasileira é tricotômica, sendo o município

reconhecido como ente federativo. De acordo com a Constituição os municípios

são pessoas jurídicas de direito público, possuem auto-organização, que lhes

perite a elaboração de sua própria lei orgânica, possui governo identificado

pelo Executivo e Legislativo, mas não dispõe de Judiciário.

José Afonso critica a qualificação de ente federativo dos municípios,

argumentando que não existe federação de municípios e sim de estados, que

são essenciais ao conceito de federação. “Não é porque uma entidade

territorial tenha autonomia político-constitucional que necessariamente integre

o conceito de entidade federativa”(SILVA, 2003, p.473).

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Não obstante não serem reconhecidos em outros países como entes

federativos, a Constituição de 88 outorgou incluiu os municípios no rol de entes

federativos e lhes deu autonomia político-administrativa. Ademais, é

reconhecida a competência originária dos municípios para o serviço de

saneamento.

Não seria compatível com o princípio da Federação e com o da

autonomia dos entes que a integram sustentar que o Estado, por decisão

própria e exclusiva, possa absorver competências que a Constituição Federal

confere aos Municípios.

Outra discussão válida trata da delimitação do espaço destinado à

iniciativa privada no setor de saneamento. Não obstante a natureza de serviço

público por disposição constitucional, doutrina e jurisprudência discutem até

onde se estende a atuação estatal. Segundo Alaôr Caffé Alves, é plenamente

possível a outorga do serviço de saneamento básico aos entes privados, desde

que estes se responsabilizem tão-somente pela gestão deste serviço, sendo

irrenunciável a tarefa de atender à regulação, controle e fiscalização da prestação

do serviço público outorgado. (ALVES, 1998, p.22)

A Constituição da República, no art 241, autoriza os consórcios públicos

e os convênios de cooperação entre os entes federados e a gestão associada

de serviços públicos.

A Lei no 11.445/07 afirma não constituir serviço público a ação de

saneamento executada por meio de soluções individuais, desde que o usuário

não dependa de terceiros para operar os serviços, bem como as ações e

serviços de saneamento básico de responsabilidade privada, incluindo o

manejo de resíduos de responsabilidade do gerador, conforme o art 5o. No art.

16, II, autoriza a prestação regionalizada de serviços públicos de saneamento

básico por empresa a que se tenham concedido os serviços. (grifei)

O decreto no 7.217/10 permite ao titular prestar os serviços de

saneamento básico diretamente, por meio de órgão de sua administração

direta ou por autarquia, empresa pública ou sociedade de economia mista que

integre a sua administração indireta, facultado que contrate terceiros, no regime

da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, para determinadas atividades; ou de

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de forma contratada, indiretamente, mediante concessão ou permissão,

sempre precedida de licitação na modalidade concorrência pública, no regime

da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995.

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37

CAPÍTULO II

PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL INSUFICIENTE

2.1 Neoconstitucionalismo e a eficácia da norma-

princípio

Uma das grandes mudanças de paradigma ocorridas ao longo do

século XX foi a atribuição à norma constitucional do status de norma jurídica,

superando-se o modelo que vigorou na Europa até meados do século passado,

no qual a Constituição era vista como um documento essencialmente político,

um convite à atuação dos poderes públicos. Assim, concretização das

propostas restava condicionada à liberdade de conformação legislativa ou à

discricionariedade do administrador.

Com a reconstitucionalização após a Segunda Guerra Mundial,

passou a ser premissa do estudo da Constituição o reconhecimento da sua

força normativa, do caráter vinculativo e obrigatório de suas disposições.

“As normas constitucionais são dotadas de imperatividade, que é

atributo de todas as normas jurídicas, e sua inobservância há de deflagrar os

mecanismos próprios de coação, de cumprimento forçado.” (BARROSO, 2006,

p.137)

A Carta Magna da República de 1988 constitucionalizou a proteção

ambiental em capítulo próprio no título da Ordem Social no art 225 dispondo

que todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e impôs ao

Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e

futuras gerações. Da leitura combinada com o art 5o, § 2o da CR/88, inserto no

título II dos Direitos e Garantias Fundamentais, doutrina e jurisprudência,

amplamente, entendem que à proteção ambiental foi atribuído o status de

direito fundamental do indivíduo e da coletividade, além de consagrar a

proteção ambiental como um dos objetivos ou tarefas fundamentais do Estado

Socioambiental de Direito (SARLET, 2011, p.91).

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Destarte, a proteção ambiental é caracterizada por uma dupla

funcionalidade no ordenamento jurídico, qual seja, de direito fundamental e de

objetivo e tarefa estatal. Assim, cabe ao Estado adotar medidas legislativas e

administrativas para prover a tutela ecológica adequadamente. Nesse ínterim,

destaca Ferreira Mendes, o dever de proteção do Estado assume a forma de

dever de evitar riscos, autorizando os entes estatais a atuarem em defesa do

cidadão e da coletividade em geral, mediante a adoção de medidas de

proteção ou prevenção. (grifei)

Segundo Luiz Fux, não há discricionariedade do administrador frente

aos direitos consagrados constitucionalmente, sobretudo, na sociedade

tecnológica, onde o Estado deve ajustar-se e remodelar-se para controlar e,

antes porém, evitar os riscos. É um dever estatal de garantia de segurança ou

de prevenção de riscos, característico do Präventionsstaat. (apud SARLET,

2011, p. 98 e120)

Não é demais mencionar Nelson de Freitas Porfirio Júnior ao

lecionar sobre medidas preventivas ao risco e ao dano ambiental:

“Os sempre escassos recursos econômicos do

Poder Público podem ser muito melhor empregados

dessa maneira do que se usados na tentativa de

reparar ou indenizar os danos que já tenham

acontecido. Além disso, não há como se reparar o

esgotamento de recursos naturais.” (PORFÍRIO

JÚNIOR, 2002, p.88)

Para Maria da Glória Garcia, a consagração constitucional da

proteção ambiental como tarefa estatal traduz a imposição de deveres de

proteção que retiram do Estado a sua capacidade de decidir sobre o momento

de agir, obrigando-o a uma adequação permanente às situações carentes.

Herman Benjamim, no mesmo sentido, aponta a redução da discricionariedade

da Administração Pública como benefício da constitucionalização da tutela

ambiental, uma vez que normas constitucionais vinculam a atuação

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administrativa para um permanente dever de levar em conta o meio ambiente e

de, direta e positivamente, protegê-lo, de maneira que não há margem para o

Estado não atuar.

O texto constitucional é cristalino ao versar sobre o meio ambiente

ecologicamente equilibrado como bem de uso comum do povo e essencial à

sadia qualidade de vida, de modo que existe um patamar mínimo de qualidade

ambiental para concretização digna da vida humana. E, como bem de uso

comum do povo, ensina Paulo Afonso Leme Machado, o poder público passa a

figurar, não como proprietário de bens ambientais, mas como gestor, que

administra bens alheios.

Como gestor, o Estado está vinculado aos princípios da

Administração Pública trazidos pela Carta Republicana de 88 em seu artigo

37, com destaque neste ponto, para o princípio da eficiência, que apareceu no

ordenamento jurídico desde o Decreto-lei 200/67, que dispõe sobre a

organização da Administração Federal e estabeleceu diretrizes para a Reforma

Administrativa, o qual submeteu toda atividade pública ao controle de resultado

(arts. 13 e 25, V), fortaleceu o sistema de mérito (art. 25, VII), sujeitou a

Administração indireta a supervisão ministerial quanto à eficiência

administrativa (art. 26, III) e recomendou a demissão ou dispensa do servidor

comprovadamente ineficiente ou desidioso (art. 100).

Acrescentado à Constituição de 88 pela emenda constitucional no

19/98, seu conteúdo impõe à Administração a persecução do bem comum, por

meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra,

transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da

qualidade, primando pela adoção de critérios legais e morais necessários para

a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar

desperdícios e garantir maior rentabilidade social. (MORAES, 2006, p.307) É o

princípio basilar do Estado-Gerencial.

Ora, o Estado no dever de proteção ambiental precisa executá-lo de

forma suficiente a garantir padrões mínimos de qualidade de vida. Na lição de

Ingo Sarlet, o ente estatal está incumbido de adotar medidas positivas com o

escopo de assegurar a tutela do ambiente. Esta, por seu turno, se situa no

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âmbito da dupla face do princípio da proporcionalidade, isto é, entre a proibição

de excesso de intervenção e a proibição de insuficiência de proteção.

A proibição da insuficiência de proteção é um subprincípio ou uma

face do princípio da proporcionalidade e, na perspectiva do Estado

Socioambiental de Direito, seu alcance cresce para abarcar a tutela ambiental e

os deveres constitucionais públicos que dela decorrem.

Assim, correlato ao dever de proteção estatal é o princípio da

proibição da insuficiência de proteção ambiental, que veda tanto a omissão

quanto a ação insuficiente da proteção e promoção ambiental. A omissão fere a

imposição jurídico-constitucional de agir e o princípio da proporcionalidade na

dimensão necessidade; a ação deficiente ofende a proporcionalidade na

dimensão adequação. Tais condutas concretizadas em medidas legislativas ou

administrativas ou pela ausência delas, podem ensejar responsabilidade estatal

para reparação os danos.(SARLET, 2011, p.189)

Vieira de Andrade apud Sarlet, aprofunda ainda mais ao esclarecer

sobre o princípio da proibição do déficit, que obriga o Estado a assegurar um

nível mínimo adequado de proteção dos direitos fundamentais, sendo

responsável pelas omissões legislativas.

Destarte, diante da insuficiência de proteção aos direitos

fundamentais ambientais há violação do dever de tutela estatal e, está

caracterizada a inconstitucionalidade da medida (SARLET, 2011, p.190), seja

de cunho omissivo ou comissivo pela inadequação, sendo passível de controle

judicial.

2.2 Da Responsabilidade Civil por dano ambiental

A responsabilidade civil do poluidor, na ação, é objetiva com fundamento

na teoria do risco integral. Nesse sentido, aquele empreendedor que aufere

bônus deve, por conseguinte, suportar o ônus, independente de culpa. Assim, o

poluidor responde pelos danos causados, bastando a comprovação do evento

danoso e do nexo causal e tal responsabilidade não pode ser afastada pela

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invocação das excludentes, quais sejam, culpa exclusiva da vítima, fato de

terceiro, caso fortuito ou força maior.

Assim dispõe o art 14 § 1o da lei no 6938/81:

Art. 14. caput

§ 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades

previstas neste artigo, é o poluidor obrigado,

independentemente da existência de culpa, a

indenizar ou reparar os danos causados ao meio

ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O

Ministério Público da União e dos Estados terá

legitimidade para propor ação de responsabilidade

civil e criminal, por danos causados ao meio

ambiente. (grifei)

Annelise Monteiro Steigleder (apud FIGUEIREDO, 2011, p.147)

assevera que na sociedade contemporânea, pós industrial, marcada pela

proliferação de riscos, a responsabilidade exerce a função de prevenir

comportamentos antissociais, principalmente aqueles que implicam geração de

riscos.

No que concerne à responsabilidade do Estado, este é responsável

pelos danos que causar, diretamente ou através do seus delegados, nas

condutas comissivas, conforme dispõe a Constituição da República:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de

qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do

Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos

princípios de legalidade, impessoalidade,

moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao

seguinte:

(...)

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§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de

direito privado prestadoras de serviços públicos

responderão pelos danos que seus agentes, nessa

qualidade, causarem a terceiros, assegurado o

direito de regresso contra o responsável nos casos

de dolo ou culpa.

Indubitavelmente, o Estado, gestor e administrador dos bens ambientais,

que constituem um “patrimônio” que deve ser resguardado não só às

presentes, mas, igualmente, às futuras gerações, é responsável por

implementar a proteção ambiental, assegurando a efetividade do direito de

todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, direito humano

fundamental, essencial para a garantia do direito fundamental à vida, e da

dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da República Federativa

do Brasil, conforme art. 5º, caput, e art. 1º, III, da Constituição da república de

1988, respectivamente.

A atuação do Poder Público em tema ambiental também está

disciplinada na Constituição no art. 225, caput e §1º, na Lei de Política

Nacional do Meio Ambiente – PNMA, a Lei no 6.938/817. Extrai-se daí, bem

como Declaração de Estocolmo de 1972, o denominado Princípio da

obrigatoriedade da intervenção estatal, que exprime o dever de intervir do

Poder Público na tutela ambiental e está em consonância com os Princípios da

Precaução e da Prevenção, alicerces do direito ambiental na busca da

efetividade na proteção ambiental. Ademais, o princípio constitucional da

eficiência, contido no art. 37, caput, da Constituição Republicana de 88, não

pode o Poder Público permanecer inerte e omisso na defesa e preservação do

meio ambiente. De forma que, na hipótese de degradação ambiental, verificada

a sua omissão, conclui-se que o Estado concorreu para o evento danoso.

7 artigos 2º (incisos I, III, IV, V e IX), 4º (incisos I, III, V e VI) e 9º (incisos III, IV, VI e IX).

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2.2.1 Da Responsabilidade Civil por omissão do Estado

Segundo Nelson de Freitas Porfirio Júnior, a responsabilidade do Estado

em relação à tutela do meio ambiente exige que ele assuma uma postura mais

ativa e de atuação preventiva, no sentido de evitar a ocorrência do dano

ambiental.

No art. 225, §3º, o constituinte de 1988, instituiu a tríplice

responsabilidade ambiental, isto é, administrativa, civil e penal, dispondo sobre

as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente que serão

sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e

administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos

causados.

A Declaração de Estocolmo de 1972 assim se refere ao princípio da

responsabilidade ambiental:

“Os Estados devem cooperar para continuar

desenvolvendo o direito internacional, no que se

refere à responsabilidade e à indenização das

vítimas da poluição e outros danos ambientais, que

as atividades realizadas dentro da jurisdição ou sob

controle de tais Estados, causem às zonas situadas

fora de sua jurisdição.”

Nesse sentido, também Conferência das Nações Unidas sobre Meio

Ambiente e Desenvolvimento, conhecida como ECO 92 realizada no Rio de

Janeiro que, dentre outros, definiu o princípio da responsabilidade ambiental de

nº 13: “os Estados devem desenvolver legislação nacional relativa à

responsabilidade e indenização das vítimas de poluição e outros danos

ambientais.”

O artigo 3º, inciso IV, da PNMA conceitua poluidor, como a pessoa física

ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente,

por atividade causadora de degradação ambiental. O art 4o, inciso VII, primeira

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parte, impõe ao poluidor e ao predador, a obrigação de recuperar e/ou

indenizar os danos causados. O art. 14, parágrafo 1º, fixa a responsabilidade

objetiva independente de culpa.(grifei)

Em que pese restar legalmente fundamentado a responsabilidade civil

por omissão do Estado dano ambiental, há posicionamento contrário. O

Ministro João Otávio De Noronha do STJ no RESP 647493 / SC julgado em

22/05/2007 sobre poluição ambiental por empresas mineradoras afirmou que a

responsabilidade civil do Estado por omissão é subjetiva, mesmo em se

tratando de responsabilidade por dano ao meio ambiente, uma vez que a

ilicitude no comportamento omissivo é aferida sob a perspectiva de que deveria

o Estado ter agido conforme estabelece a lei. Segundo o magistrado,

condenando o Estado à reparação de danos ambientais, a sociedade

mediatamente estará arcando com os custos de tal reparação, como se fora

autoindenização.

Importa destacar o pensamento de José dos Santos Carvalho Filho

acerca da conduta estatal omissiva. Segundo o autor, será preciso distinguir se

a omissão constitui, ou não, fato gerador da responsabilidade civil do Estado,

pois nem toda conduta omissiva retrata um desleixo do Estado em cumprir um

dever legal: “somente quando o Estado for se omitir diante de um dever legal

de impedir a ocorrência do dano é que será responsável civilmente e obrigado

a reparar os prejuízos” (CARVALHO FILHO, 2008, p.531). Bandeira de Mello

assim se manifesta: “não bastará, então, para configurar-se responsabilidade

estatal, a simples relação entre ausência do serviço e o dano sofrido”

(MELLO,1993, p.447)

A teoria subjetiva é sustentada, entre outros, por Celso Antônio Bandeira

de Mello, Toshio Mukai e Paulo Antônio da Silveira. Argumentam que estaria

instituído o princípio da coletividade-pagadora, se o Estado fosse

responsabilizado sempre em suas omissões.

É cediço, que noutras hipóteses, a responsabilidade civil por omissão do

Estado é subjetiva, porém, no que tange ao dano ambiental, o poder público,

independente de culpa, é o responsável pelo dano ecológico seja o nexo

causal direto ou indireto.

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Em consequência, surge a questão, igualmente polêmica, a respeito da

teoria aplicável quando prevalecer a responsabilidade objetiva estatal. A teoria

do risco administrativo admite invocar as excludentes do nexo de causalidade –

culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito e força maior; enquanto

a teoria do risco integral não as admite.

Predomina na doutrina e na jurisprudência a teoria do risco

administrativo, vez que implica uma responsabilização mais justa, moderada e

harmônica com a tradição do ordenamento jurídico brasileiro, permitindo uma

distribuição de custos mais equilibrada.

Contudo, a adesão à teoria do risco integral vem crescendo com Rodolfo

de Camargo Mancuso e Nélson Nery Júnior, por exemplo. Aduzem que a

austeridade do risco integral decorre da teoria do risco-proveito - ubi

emolumentum, ibi onus, ou seja, quem obtém lucros deve arcar com o custo

dos danos ambientais com o fito de afastar a socialização dos prejuízos. Isto

funciona bem para o particular poluidor, no entanto, para o Estado, embora,

não lucre, em regra, com a omissão nos serviços públicos, o poder público, em

atenção ao princípio da eficiência, deve adequar os gastos do erário às

necessidades coletivas, sobretudo as relativas aos direitos fundamentais ao

ambiente e à saúde, não sendo permitido deixar de investir em prioridades que

afetam a vida das pessoas como o serviço de saneamento básico.

Na questão processual acerca da legitimidade passiva, o Estado, em

regra, enquadra-se como poluidor indireto, evitando-se assim de

responsabilizar o poluidor principal. Todavia, na questão do saneamento

ambiental, tendo em vista a estrutura física e as regras legislativas do setor no

país, não poderia o Estado ter outra posição que não de poluidor direto.

Muito embora, não haja previsão específica na lei de saneamento

básico, tampouco na PNMA, vale citar a responsabilidade solidária objetiva

decorrente de omissão da Administração quanto aos danos nucleares, instituto

que possui 37 anos de idade, contido na lei no 6453/77 que dispõe sobre a

responsabilidade civil por danos nucleares e a responsabilidade criminal por

atos relacionados com atividades nucleares.

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Ainda assim cabe a responsabilização solidária do Estado no setor de

saneamento básico, vez que a lei no 11.445/07 permite a prestação do serviço

via entidades de direito público ou privado, sendo fundamentada no código

civil.

Cumpre ressaltar, entretanto, que diante do princípio da vedação da

proteção ambiental insuficiente, as condutas omissivas ganham destaque,

tendo como agravante opções políticas, sobretudo acerca do saneamento

básico, incluso em um sistema dependente da integração e cooperação de

entes políticos diferentes.

Isto posto, a mera integração formal é estéril na medida que não faz

avançar o sistema, apenas fazendo funcionar o já existia, e com reservas.

Portanto, urge rever o entendimento dominante sob pena de, juridicamente, a

Justiça Socioambiental ser ofendida, e pior, de fato, a saúde e a qualidade de

vida de pessoas ser atacada por negligência.

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CAPÍTULO III

MÍNIMO EXISTENCIAL E JUSTIÇA AMBIENTAL

O processo de afirmação dos direitos fundamentais, historicamente,

projetam seu reflexo no modelo estatal, assim designam-se Estado Liberal com

ênfase na tutela das liberdades ou direitos civis; o Estado Social, protetor dos

direitos sociais alicerçados nos pilares ou valores da dignidade da pessoa

humana, mínimo existencial, justiça social e proibição do retrocesso; e o

Estado Pós-Social (apud SARLET, 2011, p.42) ou Estado Socioambiental, no

dizer de Ingo Sarlet, onde o direito intergeneracional ao meio ambiente

equilibrado lança suas premissas sobre as atividades humanas e decisões

cobrando sustentabilidade na busca por qualidade de vida.

Tal concepção ambiental ou ecológica não abandona os pilares sociais

supra, mas lhes agrega valor. Ingo Sarlet refere-se à dimensão ecológica do

princípio da dignidade da pessoa humana e à dimensão ecológica do direito-

garantia ao mínimo existencial, hoje, mais adequadamente, mínimo existencial

socioambiental.(SARLET, 2011, p.108) Canotilho cunhou o termo Estado de

Justiça Ambiental, relacionando o compromisso estatal de garantir uma

existência digna com acesso aos bens sociais básicos com a proibição de

práticas discriminatórias que onerem ambientalmente grupos ou minorias mais

vulneráveis.

3.1 Mínimo existencial e saneamento básico

O mínimo existencial nasceu da necessidade de garantir que o indivíduo

pudesse sobreviver dos seus ganhos com dignidade, de forma a excluir ou

quantificar a tributação de acordo com a capacidade contributiva do

cidadão.(TORRES, 2008, p. 41) Na sociedade atual aprofunda-se a reflexão

sobre o mínimo existencial à luz dos direitos humanos e do constitucionalismo.

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Ricardo Lobo Torres o conceitua como um direito às condições mínimas

de existência humana digna que não pode ser objeto de intervenção do Estado

e que ainda exige prestações estatais positivas.

Constitui um direito pré-constitucional, não positivado na Carta Magna,

mas implícito no art 3º, III, como sendo um dos objetivos da República

Federativa do Brasil. A Declaração Universal dos Direitos do Homem – DUDH

em seu art 25 refere-se ao mínimo existencial como um nível de vida suficiente

para assegurar a sua saúde, o seu bem-estar e o de sua família, especialmente

para a alimentação, o vestuário, a moradia, a assistência médica e para os

serviços sociais necessários.

O saneamento básico, indispensável à garantia de saúde pela via

preventiva e de um meio ambiente equilibrado, de um lado liga-se aos direitos

sociais dada sua repercussão na saúde. De outro lado, desponta seu estreito

laço com os direitos de solidariedade no que diz respeito aos efeitos ambientais

dele advindos.

Ingo Sarlet adjetiva o saneamento básico como um exemplo

emblemático do mínimo existencial, tendo em vista a controvérsia acerca dos

elementos que o constituem, sejam estes direitos ou serviços.

O direitos sociais surgidos com o Welfare State são doutrinariamente

reconhecidos como direitos de segunda dimensão ou geração, enquanto os

direitos de solidariedade constituem direitos de terceira gestação como

denomina Guilherme Peña de Morais. As dimensões de direitos fundamentais

entrelaçam-se com a bandeira da Revolução Francesa - Liberdade, Igualdade

e Fraternidade, posto que a partir deste momento histórico a reforma e

evolução do Estado desenvolveram-se com ênfase na proteção de direitos do

homem.

No Estado Liberal, as liberdades ou direitos civis como direitos de

primeira geração constituem os chamados direitos negativos ou direitos de

defesa, verdadeira contenção à ação estatal visando conter o Leviatã exigindo

sua abstenção no agir ante o direito de liberdade individual. No Estado Social

ou de Bem Estar Social, os direitos tidos como sociais são positivos e exigem

do Estado prestações efetivas para concretização do seu conteúdo. Os direitos

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de fraternidade, essencialmente os difusos e coletivos, em especial o direito ao

ambiente. Em que pese existir a divisão em quatro e também em cinco

gerações, opta-se pela mais clássica, visto que capta a essência diferenciadora

requerida para esta análise.

Os direitos fundamentais estão espalhados pela Carta Constitucional de

1988, não constituindo o art 5o um rol taxativo. As normas constitucionais que

os definem, sejam eles de primeira, segunda ou terceira geração são

classificadas, segundo sua eficácia jurídica, em normas de eficácia plena,

normas de eficácia contida e normas de eficácia limitada, na liça de José

Afonso da Silva. As normas de eficácia limitada subdividem-se em de princípio

institutivo e de princípio programático. O autor situa as normas que

estabelecem direitos econômicos e sociais como normas programáticas,

todavia, faz uma ressalva imprescindível, pois não inclui nestas o direito à

saúde e à educação, embora sejam, formal e materialmente, direitos sociais.

Conforme José Afonso, não se trata de programaticidade, e o não atendimento

é descumprimento da norma. (SILVA, 2003, p. 105)

Noutra classificação, Luís Roberto Barroso, identifica os direitos

econômicos e sociais fixados em normas definidoras de direitos e em normas

programáticas. E, em consonância com José Afonso, considera os direitos à

saúde, dentre outros, normas constitucionais definidoras de direitos.

A programaticidade consiste no delineamento pelo constituinte de

princípios a serem cumpridos pelos órgãos legislativos, executivos,

jurisdicionais e administrativos, por meio de programas, objetivando a

realização dos fins sociais do Estado. Destarte, não sendo o direito à saúde

dotado de programaticidade, enseja a exigibilidade de prestações positivas.

A garantia do mínimo existencial extraída do princípio da dignidade da

pessoa humana na Alemanha, tem a finalidade de prover uma parcela mínima

garantidora da existência digna do cidadão e de seu desenvolvimento. Os

direitos sociais, balizados pelo mínimo existencial, são concretizados através

dos serviços públicos. O saneamento como serviço público essencial é uma

atividade próativa na garantia da saúde humana e do meio ambiente que, como

primorosamente detalha Chagas Pinto, opera simultaneamente no combate da

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pobreza e da degradação do ambiente, de modo que sua efetividade integra o

direito à saúde, à direito à habitação decente, o direito ao ambiente, o direito

emergente à água, e nos casos mais extremos, o direito à vida.

No Estado Socioambiental de Direito, Ingo Sarlet identifica o

saneamento básico como direito e dever fundamental do indivíduo e da

coletividade, além de dever do Estado enquanto serviço público essencial,

conforme configuração jurídico-constitucional e aponta a interdependência da

tutela dos direitos sociais – saúde, água potável e moradia, e dos direitos

ecológicos sob o formato do direito fundamental ao mínimo existencial

socioambiental. (SARLET, P. 117)

Nesse sentido, Ana Paula de Barcellos (BARCELLOS, 2008, p.313)

confirma a prestação de saneamento básico como desmembramento do direito

à saúde e dessa forma, integra a garantia do mínimo existencial, o núcleo

mínimo de prestações estatais sociais a serem exigidas do Estado para

assegurar o desfrute de uma vida digna.

Em que pese a formatação constitucional do saneamento apontar para

programaticidade aduzida por gestão integrada entre as esfera de poder

político, não é demais reforçar que, como desmembramento da saúde e sendo

esta definida por norma não programática, o serviço de saneamento como

direito-dever meio para se atingir um fim – a saúde, da mesma forma, também

não poderia depender exclusivamente da discricionariedade de programas

estatais, sobretudo quando a gestão deve ser integrada diante de uma

titularidade indefinida para sua consecução. Por isso, vale o destaque para as

palavras do Ministro Luiz Fux, em ser necessário que os direitos fundamentais

sejam transportados do plano das promessas constitucionais para o mundo da

vida.

À luz do direito ao ambiente, o núcleo de direitos sociais são ampliados

de forma atender as novas exigências por uma vida digna. Em que pese a

reconhecimento controverso a respeito dos integrantes do mínimo existencial,

Dias infere por direitos básicos, aqueles que no decorrer do tempo, puderem

ser reconhecidos como parte da concepção de vida digna. Assim, além de

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educação, formação profissional, trabalho, saúde, alimentação, moradia, hoje,

insere-se o direito ao ambiente saudável.

Tal direito toca a questão da segurança, aludida também no art 5o caput

da CR de 88, agora sob a ótica ambiental, agrega-se valor, sendo mais correto

o termo segurança ambiental.

O direito fundamental ao mínimo existencial socioambiental apresenta-

se como o conjunto de medidas mínimas, tanto de natureza defensiva quanto

prestacional, em termos de qualidade ambiental, indispensáveis ao desfrute de

uma vida humana digna e saudável.

3.2 Justiça Ambiental como fim e saneamento ambiental como

meio

Todas as leis e atos estatais relacionados à implementação de políticas

no interesse público têm efeitos distributivos, vale dizer, implicam na

transferência de benefícios e custos entre diferentes grupos sociais. No

entanto, os efeitos distributivos de normas e de políticas públicas ambientais

não se limitam aos aspectos financeiros, podendo implicar a submissão de

determinados grupos a condições ambientalmente desfavoráveis ou premiar

outros em prejuízo dos demais. Na distribuição desses ônus e benefícios, há

uma tendência a que aqueles grupos mais vulneráveis em termos econômicos,

sociais e políticos arquem com maiores custos ambientais e usufruam de

menores benefícios.

Embora na década de 70, o governo dos Estados Unidos tenha editado

as leis de proteção ambiental, como o Clean Air Act e o Clean Water Act, foi

neste país que surgiu o movimento conhecido como Justiça Ambiental, na

década de 80 do século XX. Inicialmente foi identificado com a bandeira de

racismo ambiental pela repercussão da instalação de um aterro químico no

condado predominantemente negro de Afton, em Warry County, na Carolina do

Norte, que geraram mais de quinhentas prisões e protestos contra o sistema de

proteção legal que desfavorecia as classes sociais mais baixas e as minorias

raciais. (MACHADO, 2008, p. 2)

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Após pesquisas, sobretudo do relatório científico divulgado pelo Comitê

para a Justiça Racial da Igreja Unida de Cristo de 1987, foi concluído que a

alocação dos depósitos de resíduos perigosos e lixeiras tóxicas se

encontravam predominantemente em comunidades de negros, hispânicos e

asiáticos, apesar de estas constituírem menos de um quinto da população.

No município de Duque de Caxias no estado do Rio de Janeiro, o local

conhecido por Cidade dos Meninos, é um caso de contaminação ambiental e

humana. Uma área de aproximadamente 20 hectares, de propriedade da

União, que em 1946 passou a abrigar as instalações de um complexo de

assistência social e educacional para crianças e adolescentes, a Fundação

Abrigo do Cristo Redentor – FACR. Em 1950, parte das edificações ali

existentes foram cedidas para abrigar o Instituto de Malariologia ligado, à

época, ao Ministério da Educação e Saúde. O espaço foi adaptado para a

instalação, na Cidade dos Meninos, de uma Fábrica de Inseticidas

organoclorados que funcionou até 1960. Quando cessaram as atividades desta

fábrica, ficaram no local cerca de 350 toneladas de resíduos tóxicos,

abandonadas a céu aberto. Atualmente, habita na mesma área, uma população

de cerca de 2000 indivíduos, distribuídos em aproximadamente 400 famílias

(OLIVEIRA, 2008).

No Brasil, o termo justiça ambiental, segundo Henri Acselrad, exprime

um movimento de ressignificação da questão ambiental, vez que condensa a

temática do meio ambiente com as dinâmicas sociopolíticas tradicionalmente

envolvidas com a construção da justiça social. (ACSELRAD, 2010, p.6)

A Constituição da República Brasileira já em seu preâmbulo traz como

valores supremos do Estado Democrático e da sociedade fraterna fundada na

harmonia social, dentre outros, o bem-estar, a igualdade e a justiça, sendo

objetivos desta República construir uma sociedade livre, justa e solidária. A

Justiça, portanto, constitui um valor e um objetivo a ser alcançado com

cidadania e dignidade.

Os romanos atribuíam à Justiça o valor de virtude e a conceituavam

como a vontade constante e perpétua de dar a cada um o que é seu (DE

PLÁCIDO E SILVA, 2002, p. 471). Todavia, nos tempos atuais, os riscos e os

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danos ambientais possuem uma distributividade desproporcional e

discriminatória.

Nesse sentido, Murphy (apud ACSELRAD, 2010, p.8) sugere que as

sociedades estão se estruturando crescentemente em classes ambientais –

umas que ganham com a degradação e outras que pagam os custos

ambientais.

Segundo Beck, sociólogo alemão, na sociedade de risco, este se

acumula abaixo enquanto as riquezas se acumulam acima. Em que pese existir

uma certa parcela democrática da degradação ou poluição ambiental, como a

poluição atmosférica, as classes menos privilegiadas não conseguem evitar

certos riscos como residir longe de recursos hídricos contaminados, áreas

industriais, áreas sem saneamento básico, que são zonas habitacionais mais

baratas. Claramente, a equação distributiva nessa hipótese distoa do ideal de

justiça, pois os custos socioambientais do desenvolvimento oneram

desproporcionalmente a população mais carente.

Diante da importância que os direitos fundamentais socioambientais

adquirem no Estado Socioambiental de Direito, Canotilho sugere a idéia de um

Estado de Justiça Ambiental onde ganha importância o princípio do acesso

equitativo aos recursos naturais que, em linhas gerais, veda a distribuição não

equitativa dos benefícios e malefícios da extração e do aproveitamento dos

recursos naturais.

Vale o destaque para a a Rede Brasileira de Justiça Ambiental criada em

2001, que em sua declaração designa a justiça ambiental como:

“O conjunto de princípios e práticas que:

a – asseguram que nenhum grupo social, seja ele

étnico, racial ou de classe, suporte uma parcela

desproporcional das consequências ambientais

negativas de operações econômicas, de decisões de

políticas e de programas federais, estaduais, locais,

assim como da ausência ou omissão de tais

políticas;

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b – asseguram acesso justo e equitativo, direto e

indireto, aos recursos ambientais do país;

c – asseguram amplo acesso às informações

relevantes sobre o uso dos recursos ambientais e a

destinação de rejeitos e localização de fontes de

riscos ambientais, bem como processos

democráticos e participativos na definição de

políticas, planos, programas e projetos que lhes

dizem respeito;

d – favorecem a constituição de sujeitos coletivos de

direitos, movimentos sociais e organizações

populares para serem protagonistas na construção

de modelos alternativos de desenvolvimento, que

assegurem a democratização do acesso aos

recursos ambientais e a sustentabilidade do seu

uso”. (ACSELRAD, 2010, p.10)

Assim, Justiça ambiental, na definição de Henri Acselrad, é uma noção

emergente que integra o processo histórico de construção subjetiva da cultura

dos direitos, surgida da criatividade estratégica dos movimentos sociais que

alteraram a configuração de forças sociais envolvidas nas lutas ambientais e,

em determinadas circunstâncias, produziram mudanças no aparelho estatal e

regulatório responsável pela proteção ambiental. (2010, p.9)

No conceito de Alexandre Kiss a justiça ambiental tem como fundamento

a igualdade e a equidade dentro de um tríplice significado: a justiça para com

as pessoas que vivem no presente, a justiça para com a humanidade futura e a

justiça entre as espécies vivas. Inicialmente, enfoca-se a ideia de justiça social

dentro de uma perspectiva de partilhamento equitativo dos recursos naturais,

seguida do aprimoramento tomando por base as gerações futuras e, por fim, é

apregoada uma nova ética na relação entre os seres vivos.

Resta clara a coexistência dos direitos sociais com as demandas

ambientais fundamentais, isto porque, no Estado Socioambiental de Direito, a

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justiça social tem seus contornos ampliados, vez que a noção de dignidade é

dilata, incluindo-se novos conceitos como equilíbrio do ambiente e qualidade de

vida, igualmente ligados à redução das desigualdades e ao tratamento

isonômico, agora na dimensão socioambiental sustentável.

De fato, a questão do saneamento básico afeta sobremaneira a

população mais carente. No Brasil, 22,17% não tem acesso à água potável

encanada e segundo dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico –

PNSB/2000 a intermitência no abastecimento de água afeta 20% dos distritos

abastecidos. A maioria dos cerca de 18 milhões de pessoas que não tem

acesso à água encanada nas áreas urbanas moram em habitações precárias

em favelas, invasões, loteamentos clandestinos e bairros populares das

periferias dos grandes centros, ou em pequenos municípios particularmente do

semiárido.

O estudo do IBGE mostrou que, em 2000, foram registrados mais de

800 mil casos de seis doenças - dengue, malária, hepatite A, leptospirose, tifo e

febre amarela - que estão diretamente ligadas à má qualidade da água, às

enchentes, à falta de tratamento adequado do esgoto e do lixo. Naquele ano,

mais de 3 mil crianças com menos de cinco anos morreram de diarreia.

Em 2000, havia 116 municípios brasileiros sem serviço de

abastecimento de água por rede geral, a maior parte dos quais situada nas

regiões Norte e Nordeste e, utilizam como alternativa, chafarizes e fontes,

poços particulares e abastecimento por caminhões-pipas, bem como uso direto

de cursos d´água. Informações que pasmam, tendo vista que o abastecimento

de água por fontes e chafarizes, no país data do início do século XIX, e ainda é

utilizado no ano de 2012.

Mais de 50% da população não está conectada a uma rede de esgotos,

realizando alternativas para o afastamento dos dejetos.

O Brasil produz 125.281 toneladas de lixo diariamente. Segundo o Atlas

do Saneamento do IBGE a coleta de lixo é amplamente difundida, porém a

maioria dos municípios, cerca de 63,3% deposita seus resíduos em lixões a

céu aberto e sem nenhum tratamento. Os aterros sanitários estão presentes

em apenas 13,8% dos municípios brasileiros, e apenas 8% deles afirmam ter

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coleta seletiva. Em relação às unidades de disposição final de resíduos

utilizadas há predominância da prática de disposição a céu aberto – lixões, com

59%, seguida do aterramento controlado, com 16,8%, os aterros sanitários

representam 12,6% e os aterros de resíduos especiais 2,6%. As usinas de

reciclagem totalizam 2,8%, as usinas de compostagem, 3,9% e as de

incineração, 1,8% das unidades de destinação final de resíduos utilizados pelos

municípios no País.

Em regra, a miséria e a pobreza caminham juntas com a degradação e

poluição ambiental, expondo a vida das populações de baixa renda e violando,

por duas vias distintas, a sua dignidade. Buscar justiça, é continuamente

garantir acesso equitativo aos bens socioambientais, de forma que ultrapassa a

noção do mínimo existencial socioambiental, sendo este apenas a primeira

etapa. Há necessidade de avanço para outra fase, sob pena de se extrapolar o

conceito do mínimo tornando o que já é controverso numa utopia na sociedade

de risco contemporânea.

3.2.1. Direitos versus Deveres fundamentais socioambientais

Não obstante tal distributividade desequilibrada de riscos e resultados

socioambientais, o fato dos mais pobres terem direitos e carecer do seu

atendimento não exclui os deveres dessas pessoas, que não se confundem

com os deveres de proteção e promoção socioambiental do Estado.

O pacto democrático pela sustentabilidade ambiental gera deveres e

responsabilidade para todos os intervenientes e conviventes da sociedade,

Estado e cidadãos indistintamente. Assim, o cidadão é simultaneamente credor

e devedor da tutela ambiental, isto porque, segundo Nabais, os direitos

ecológicos tem efeito boomerang. São deveres conexos ou correlatos aos

direitos ambientais que não são numerus clausus, mas abertos e verificáveis

no caso concreto, conforme explicação de Ingo Sarlet.

Destarte, não há que se falar em hipertrofia de direitos e atrofia de

deveres. Pelo contrário, há um desenvolvimento histórico de deveres

fundamentais sequenciais e não excludentes, a saber, os deveres liberais,

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sociais e ecológicos correspondentes às dimensões de direitos fundamentais.

Tais direitos e deveres encontram-se igualmente protegidos contra reformas

que materialmente esvaziem seu conteúdo pela cláusula pétrea do art 60 § 4o

da CR/88. (SARLET, 2011, p.148)

Cuida-se de difundir as informações pertinentes para conscientizar a

população do que deve ser feito e do que deve ser evitado. Trata-se, portanto,

de educar ambientalmente para progredir enquanto comunidade rumo à uma

sociedade livre, justa e fraterna. A conscientização é imprescindível à medida

que a omissão ambiental de um repercute no direito do outro e até do próprio. A

título de exemplo, cita-se condutas comuns, como jogar lixo em córregos, rios,

e ruas, entupindo as redes pluviais e de esgoto, que causam enchentes e

degradam o meio ambiente; bem assim, deixar água acumulada, gerando

criadouros de mosquitos responsáveis pela disseminação de doenças tropicais,

como a dengue e febre amarela.

Ampliar a mentalidade humana para entender os princípios ético-

ecológicos correlatos aos deveres fundamentais de proteção ambiental

(SARLET, 2011, p.154), a justiça intrageneracional com o princípio-dever da

solidariedade com as pessoas da mesma geração; a justiça interespécies com

o respeito humano pelo ambiente não humano; e a justiça intergeneracional

com a responsabilidade perante as futuras gerações.

A política nacional do meio ambiente descrita na lei no 6.938 de 1981 e

alinhada com a importância de educar para a questão ecológica, dispõe no art

2o, X, como dever do Estado a educação ambiental em todos os níveis de

ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para

participação ativa na defesa do meio ambiente.

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CONCLUSÃO

A necessidade de afastar e tratar os dejetos humanos é tão antiga

quanto a existência do próprio homem. Na babilônia, quase quatro mil anos de

Cristo, já existiam coletores de esgoto em Nipur, todavia, apenas no século XIX

concretizaram a proteção das águas na França e Inglaterra, bem como a

construção de esgoto subterrâneo na Alemanha.

Historicamente, os melhores serviços de coleta de esgoto e distribuição

de água eram privilégios da aristocracia, a exemplo de Roma. A maioria da

população tinha acesso à agua em fontes públicas e utilizavam latrinas

comunitárias. Os efeitos da insalubridade na história da humanidade alcançou

seu ápice na Europa do século XIV com a peste bubônica e no século XVIII

com aumento de lixo nas ruas e poluição de rios.

No Brasil, sobretudo no século XIX, epidemias cíclicas de cólera e tifo

eram comuns. Os primeiros serviços de saneamento foram prestados por

empresas estrangeiras e somente em 1940 o governo federal se ocupou de

planejar um sistema de saneamento a nível nacional. Mas, apenas em 1968,

em plena ditadura militar, que a execução de um sistema estruturado de forma

centralizadora, com recursos do FGTS e do governo norte-americano ganhou

impulso para desocupar o último lugar no ranking do saneamento básico na

América Latina através do Sistema Financeiro do Saneamento – SFS e do

Banco Nacional da Habitação – BNH.

O Plano Nacional de Saneamento – PLANASA, executado a partir de

1971 criou vinte e sete Companhias Estaduais de Saneamento Básico – CESB

que executavam os serviços de saneamento mediante concessão municipal de

25 anos em média. Por óbvio, os municípios detentores de infraestrutura

mantiveram gestão própria.

Dezenas de programas foram criados no país para atender às

crescentes demandas pelo serviço face ao aumento populacional,

principalmente, o urbano. Os pontos comuns, velhos conhecidos, continuaram

marcando presença, incapacidade municipal, contratos de concessão

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monopolizados pelas companhias estaduais, má prestação de serviços,

financiamento com recursos de FGTS, federalismo de cooperação, ausência de

lei específica e titularização indefinida.

O resultado direto é estarrecedor, pois dos 46,5 milhões de domicílios

particulares permanentes no país, 22,17% ainda não possuem cobertura de

abastecimento de água adequada, segundo dados do Censo/IBGE de 2000 e

apenas 44,5% da população brasileira estava conectada a uma rede de

esgotos, e do volume coletado somente cerca de 37,9% era tratado, conforme

dados do SNIS/2009.

O marco regulatório do setor data de 2007 – lei no 11.445 e sua norma

regulamentadora, o decreto federal no 7.217 de 2010 continuaram

homenageando os velhos e inconvenientes conhecidos, mas a base de custeio

aumentou com os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT. O

acesso a esses recursos se dá mediante critérios de planejamento e eficácia

do serviço.

Com efeito, houve progresso no que tange à regulamentação desta

área de desenvolvimento, com definições importantes sobre o serviço e sua

abrangência, as formas de execução permitidas, os princípios regentes, dentre

os quais destaco a universalização.

A construção jurídico-legal demonstra atenção aos reclames

ambientais modernos, mas a preocupação é sobre a eficiência na execução,

porque o saneamento não constitui, tão somente, um serviço público em si.

Constitucionalmente se reconhece sua repercussão na saúde e no equilíbrio do

meio ambiente, direitos fundamentais do indivíduo e da coletividade, fixados

por normas constitucionais não-programáticas.

Em que pese incluir-se a saúde nos direitos sociais limitados pela

reserva do possível, o investimento em ações proativas no sentido de se evitar

doenças para não precisar tratá-las, é economicamente mais rentável, vez que,

a cada um real investido em saneamento, quatro reais são poupados na saúde.

Cuida-se, aqui, de otimizar o pensamento político-administrativo visando

valorizar a prevenção, rompendo esse ciclo vicioso de tratar as demandas a

posteriori, além de contraproducente, favorece práticas escusas na compra de

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remédios, nas contratações de profissionais, nas obras em hospitais, na

compra de material médico.

Hoje, avançamos para o Estado Socioambiental de Direito, onde as

demandas sociais não desapareceram, mas lhes foram agregados os valores

ambientais da sustentabilidade. Definitivamente, o saneamento básico é

integrante do mínimo existencial, em razão da sua ausência ofender a

dignidade da pessoa humana, na dimensão social, como desmembramento do

direito à saúde e, ecológica. O adjetivo ambiental empresta uma amplitude

muito maior tendo em vista a transdiciplinariedade do bem tutelado, qual seja, o

ambiente, demandando uma estruturação que dista do mínimo. O Estatuto da

Cidade ao positivar o saneamento ambiental inovou com uma cláusula

dirigente e progressista que reforça a necessidade de se observar o ambiente

saudável como elemento indispensável à vida em todas as suas perspectivas.

Os Conceitos ampliados junto à hermenêutica neoconstitucionalista

determinam a atuação do Estado, não existem mais convites constitucionais ao

sabor do discricionarismo do Administrador e de conformação legislativa. As

normas que tratam de direitos socioambientais são imperativas, não dotadas de

programaticidade. Assim, se a finalidade do serviço é atingir um direito fixado

por normas de princípio institutivo, o saneamento em si não pode ser

interpretado como disciplina programática, seria um contrassenso, algo criado

para não funcionar.

A opção constitucional pelo federalismo de cooperação e a não

identificação da titularidade do serviço, simetricamente reproduzida no marco

regulatório do setor, favoreceu a fixação da gestão compartilhada, capaz de

obstar o fluxo prestacional que depende da convergência de interesses dos

centros de decisão político-administrativos.

A questão ambiental correlata ao saneamento afeta a justiça

intrageneracional, a justiça interespécies e a justiça intergeneracional. Destarte,

a tutela protetiva do ambiente é chancelada constitucionalmente como princípio

e dever do Estado, vedando tanto a inércia quanto as ações deficientes, vez

que a proteção ambiental deve ser adequada, segundo o princípio da proibição

da insuficiência de proteção ambiental.

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Ao Estado cabe evitar riscos, agir preventivamente, em suma sanear,

pois os danos advindos do seu desleixo, das suas condutas inadequadas são,

não obstante as controvérsias, passíveis de responsabilização objetiva pela

omissão com base na teoria do risco integral, onde não se invocam

excludentes. Ao argumento de onerar duplamente a sociedade, cabe ressaltar

que tal inconveniente foi criado com a positivação do instituto da

responsabilidade objetiva do Estado e, não se trata de torná-lo um segurador

universal, até porque existem critérios aferíveis no caso concreto, mas há

hipóteses em que o Estado também necessita ser repreendido, mediante

condenações de efeito didático e moralizador.

A Justiça enquanto valor do Estado Democrático Brasileiro requer a

conscientização de todos os atores intervenientes na sociedade – do Estado na

sua função de proteger suficiente e decentemente e dos cidadãos na

reivindicação de direitos e no cumprimento dos seus deveres fundamentais

anexos que, a seu turno, demandam difusão urgente.

É imperativo conscientizar pessoas e entidades de direito público e

privado através da educação ambiental, mesmo por meio de condenações

judiciais, se for o caso, pois os recursos naturais, enquanto matéria, são

limitados e os prejuízos serão socializados. Justiça significa acesso aos bens

da vida digna de forma igualitária e decente.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 02

AGRADECIMENTO 03

DEDICATÓRIA 04

RESUMO 05

METODOLOGIA 06

SUMÁRIO 07

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

SANEAMENTO AMBIENTAL 10

1.1 - Considerações Históricas 10

1.1.1 - Histórico no Brasil 11

1.2 - Relevância jurídica e fática do saneamento 17

1.2.1– Nomenclatura : básico e ambiental 17

1.2.2 – Conceito e Finalidade 21

1.2.3 – Natureza Jurídica e abrangência fática 22

1.3 - Funcionamento do Sistema 26

1.3.1- A Funcionalidade na prática 28

CAPÍTULO II

PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL INSUFICIENTE 37

2.1 - Neoconstitucionalismo e a eficácia da norma-princípio 37

2.2 - Da Responsabilidade Civil por dano ambiental 40

2.2.1. Da Responsabilidade Civil por omissão do Estado 43

CAPÍTULO III

MÍNIMO EXISTENCIAL E JUSTIÇA AMBIENTAL 47

3.1 - Mínimo existencial e saneamento básico 47

3.2 - Justiça Ambiental como fim e saneamento ambiental como meio 51

3.2.1. Direitos versus Deveres fundamentais socioambientais 56

CONCLUSÃO 58

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BIBLIOGRAFIA 62

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