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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
O SUPERVISOR ESCOLAR E A CONSTRUÇÃO DA
LEITURA E DA ESCRITA NAS CLASSES INICIAIS DE
ALFABETIZAÇÃO DAS ESCOLAS PÚBLICAS
Por: Luciene Franco Ribeiro
Orientador
Prof. Vilson Sérgio Carvalho
Rio de janeiro
2007
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
O SUPERVISOR ESCOLAR E A CONSTRUÇÃO DA
LEITURA E DA ESCRITA NAS CLASSES INICIAIS DE
ALFABETIZAÇÃO DAS ESCOLAS PÚBLICAS
OBJETIVOS: Este trabalho focaliza a necessidade de reflexão
sobre a prática docente dos alfabetizadores e
as possíveis intervenções com vistas ao
aprimoramento e colaboração para a superação
do fracasso escolar nas séries iniciais de
escolarização.
Por: Luciene Franco Ribeiro
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, por ter me dado entendimento
e força até aqui. A meu esposo, pelo apoio, e à
minha filha, por sua compreensão. Aos alunos,
meus colegas de classe, e aos professores
que contribuíram para a realização deste
trabalho acadêmico.
4
EPÍGRAFE
“Educar é mais do que ensinar
a ver de uma certa forma.
É desejar que se veja de muitas
formas.”
Luís Carlos de Menezes Professor da Universidade de São Paulo
5
DEDICATÓRIA
Dedico essa monografia ao meu pai,
ao meu esposo e à minha filha
6
RESUMO
A escola brasileira tem percebido a necessidade de se aprimorar na tarefa de alfabetizar. Os índices alarmantes verificados, nos últimos anos, de fracasso escolar nas séries iniciais de alfabetização vêm fazendo com que a questão seja mais veementemente analisada. Principalmente porque parece atingir de forma perversa as classes populares. O exercício pleno da cidadania está atrelado à educação de qualidade, que instrumentaliza o aluno a lutar por sua libertação das mãos daqueles que dominam a sociedade. Educadores precisam se proporcionar criticamente ante a tarefa de educar, pois não há neutralidade na educação. Não há pretensão de solucionar problema tão complexo, mas de favorecer a reflexão sobre a prática pedagógica e sua contribuição para que a escola seja um espaço onde exista a verdadeira democracia. Isto será feito em uma ação conjunta de todos os envolvidos no processo pedagógico, mobilizando seus diferentes saberes, com o único objetivo de favorecer a aprendizagem do aluno sobre o conhecimento desvelador. Se a educação é a preparação para o exercício da cidadania, a mobilização para a existência de uma escola de qualidade é condição para que todos tenham verdadeira possibilidade de exercê-la.
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METODOLOGIA
A metodologia utilizada está baseada na pesquisa em livros, revistas
especializadas e artigos da internet que tratam da área pedagógica e cujo teor
é confiável. Portanto, a pesquisa apoiou-se em nomes de autores que possuem
competência comprovada pela prática docente, ou ligada à área educacional,
que embasa suas conclusões acerca do tema, favorecendo, assim, a reflexão
sobre a situação da prática alfabetizadora encontrada nas escolas brasileiras.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I – O processo de aquisição da linguagem 11
CAPÍTULO II – A importância social da leitura e da escrita 17
CAPÍTULO III – Dificuldades de aprendizagem – causas e considerações 24
CAPÍTULO IV - A participação efetiva do supervisor escolar e do professor-
alfabetizador no processo de alfabetização 30
CONCLUSÃO 37
BIBLIOGRAFIA 38
WEBGRAFIA 40
ÍNDICE 41
9
INTRODUÇÃO
No Brasil, há décadas, o interesse em torno da temática da alfabetização
inicial tem aumentado, entre outras razões, porque a aprendizagem tem estado
aquém das expectativas daqueles que lutam pela qualidade do ensino ou dos
que são responsáveis por financiá-la. Os índices de fracasso escolar têm se
tornado alarmantes e parecem atingir severamente as classes populares.
A qualidade de vida de qualquer pessoa passa pelo acesso ao
conhecimento, assim como em relação à alimentação, saúde, convívio social e
lazer. A escola tem uma função muito clara que é de promover a
aprendizagem do conhecimento acumulado historicamente. No entanto, não
tem alcançado o objetivo de sua missão, a partir mesmo do ensinar a ler e a
escrever.
A escola tem um grande poder em suas mãos: o de ensinar muito aos
alunos ou negar-lhes o direito de aprender. È na escola que as crianças
passam grande parte de seu tempo e isto se traduz em um enorme poder de
formação e informação. Se não consegue cumprir sua missão, acaba por
contribuir para a negação do exercício pleno da cidadania.
O objetivo do trabalho de pesquisa ora realizado não é o de propor
soluções para um problema que não é passível de resolução tão fácil; mas,
sim, de refletir sobre a prática escolar da alfabetização. No primeiro capítulo,
partiu-se dos fatos históricos que deram origem à alfabetização e cujo
conhecimento possibilite o entendimento sobre as influências que hoje
permeiam a ação educativa. Também, buscou-se compreender como o cérebro
humano processa novas informações e de que forma se torna um aprendizado
para toda a vida. E, especificamente, como ocorre o processo de
aprendizagem da leitura e da escrita.
10
No segundo capítulo, levou-se à reflexão sobre o papel social e político
da escola e a prática efetiva de sala de aula, onde o contexto é elemento de
fundamental importância. As dificuldades relacionadas à aprendizagem
mereceram destaque enquanto colaboradoras da não aprendizagem, no
terceiro capítulo, mas buscou-se deslocar o foco errôneo sobre os déficits
neurológicos para a própria ação exclusiva da escola. E, por último, no quarto
capítulo, o papel do especialista em Supervisão Escolar como contribuição na
superação do fracasso escolar na alfabetização, com destaque também para o
trabalho do professor-alfabetizador e as ações que podem ser desenvolvidas
em sala de aula.
O que se deseja de fato é que todas as reflexões provocadas resultem
em ações efetivas para a superação do problema da alfabetização. O acesso
real ao direito de aprender a ler e a escrever não é utopia, mas algo que exige
constante reavaliação da prática pedagógica, e que se converterá na
construção de uma escola verdadeiramente democrática e o exercício pleno da
cidadania.
11
CAPÍTULO I
O PROCESSO DE AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM
1.1 – Rápido retrospecto sobre a evolução da escrita e da
alfabetização
Segundo a historiadora Vera Lúcia Zacharias (2005), em suplemento
especial da revista “Viver: mente e cérebro”, dedicado ao tema “movimentos de
alfabetização”, a escrita é uma das aquisições que mais tempo levou para ser
adquirida, tendo surgido subsequentemente à fala, visto ser uma expressão
gráfica da mesma. Seu surgimento possibilitou ao homem ampliar sua
comunicação e contribuiu para o avanço da ciência, da literatura e da própria
história, por facilitar a transmissão do conhecimento.
A palavra “alfabetizar” surgiu na Antiguidade e já era utilizada na Grécia
relacionada ao ensino do alfabeto, tendo revolucionado as relações sociais e o
modo de o homem lidar com seus conhecimentos e acumulá-los, ao longo do
tempo.
A invenção da escrita, por volta de 3000 a.C., pelos sumérios (habitantes
da Mesopotâmia), marcou a passagem da pré-história para a história. Com o
passar do tempo, a escrita foi sendo aperfeiçoada, muito embora não tenha
sido linear e progressiva a sua evolução. Egípcios, hebreus e fenícios, entre
outros povos, contribuíram também nesse processo.
A escrita possibilitou ao homem registrar sua visão de mundo, sua cultura
e suas vivências, fazendo-se chegar a outras culturas e em outros tempos.
12
A escola tem sua origem registrada no período medieval, em mosteiros e
sedes episcopais. Era destinada a pouquíssimos alunos, cujo objetivo era o
preparo de sacerdotes para a Igreja ou a instrução de funcionários imperiais.
No final do século XII, a burguesia começou a exigir seu direito à leitura, visto
perceber o seu valor.
Nos séculos XV e XVI, ocorrem a invenção da imprensa, por Gutenberg,
e a Reforma Protestante, por Lutero. Esta última, produziu resultados a longo
prazo, como a extensão do ensino primário e o acesso aos livros.
Portugal e Espanha não foram atingidos pela Reforma, o que resultou na
tradição religiosa do ensino no Brasil, conseqüentemente. As revoluções
francesa e industrial trouxeram profundas transformações econômicas, sociais
e políticas e conseqüentes mudanças na educação, entre elas a necessidade
de alfabetizar o povo em geral, na maior parte do mundo. No Brasil, só na
década de 1900 é que um sistema nacional de ensino foi estruturado, com o
objetivo de integrar os trabalhadores e seus filhos ao desenvolvimento
industrial. Às elites eram destinados colégios, liceus, ginásios e outras escolas
diferenciadas.
1.2 – O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
A língua não é um código criado racionalmente. Por isso, não pode ser
ensinada por um método que considere a leitura e a escrita simples
mecanismos de decodificação e codificação de sinais gráficos. Segundo Emília
Ferreiro (2001), é possível alfabetizar uma criança apresentando a ela textos
diversos sem se utilizar de cartilha e metodologia específica. O professor,
porém, necessitará compreender como a criança aprende para, assim, definir o
que ensinar, como ensinar e como avaliar.
13
O conhecimento acerca do desenvolvimento cognitivo do ser humano
nos fornece informações que devem ser consideradas em nossa análise sobre
o processo de aprendizagem. A neurociência tem se ocupado em esclarecer o
que ocorre no cérebro humano desde a sua formação até o envelhecimento.
Para os educadores, saber como novas informações são processadas e como
permanecem em nossas mentes para sempre, auxiliam na escolha de
atividades mais pertinentes ao alcance desses objetivos.
1.2.1– O Desenvolvimento Cognitivo – aspectos neurológicos
Todo ser humano possui uma genética própria da espécie e que
obedece a fases para o amadurecimento, ficando corpo e cérebro prontos para
aprender determinada coisa. Assim sendo, bebês de quatro meses não estão
aptos a andar ou crianças de um ano de idade não podem ser alfabetizadas.
Todos têm um tempo para que cada capacidade seja adquirida. Esse
desenvolvimento do cérebro é mais rápido nos primeiros anos de vida,
tornando-se mais lento no decorrer da vida. Todos nós temos uma capacidade
inata de aprender a nos comunicar, falando ou gesticulando, evidentemente se
não houver a existência de alguma patologia ou má-formação cerebral. Dessa
forma, uma criança consegue armazenar e conectar diversas informações que
coleta no dia-a-dia, tudo isso ao mesmo tempo. É, nas palavras de Paulo
Freire, a “leitura de mundo” com a qual chegamos à escola (2005).
Até a entrada na escola, tudo o que aprendemos se relaciona ao nosso
cotidiano, ligado às emoções. O neurologista português Antônio Damásio, da
Universidade de Iowa, nos Estados Unidos (Nova Escola, Jan/Fev.2005),
explica que as emoções provocam alterações em todo o corpo porque ativam o
sistema límbico, parte do cérebro responsável pelas emoções, e
neurotransmissores são liberados, tornando os circuitos cerebrais mais rápidos,
14
facilitando o armazenamento de informações e resgatando outras já
guardadas.
Ao despertar a atenção da pessoa, geramos concentração. Sem
concentração não há armazenamento de informações. A atenção desencadeia
um processo em que a substância noradrenalina é liberada, auxiliando a deixar
os sentidos voltados para a atividade que está sendo realizada. Assim, ao
criarmos situações interessantes para ensinar, o indivíduo associa o
aprendizado ao prazer.
Os nossos sentidos (tato, olfato, paladar, visão e audição) são canais
para o aprendizado se soubermos explorá-los bem. Ao associarmos situações
de aprendizagem a informações ligadas aos sentidos, como o gosto de uma
comida, seu cheiro ou o som que emite, por exemplo, ativamos partes
diferentes do córtex cerebral que facilita lembrarmos depois e, a partir daí, criar
novas aprendizagens.
O medo, embora também seja uma emoção, desencadeia estresse e tem
ação não satisfatória para a aprendizagem por provocar a liberação de
substâncias que, atuando no hipocampo, impedem a formação de memórias
que guardam fatos, pessoas, lugares ou eventos. Além do que, a exposição
prolongada ao estresse pode provocar doenças, morte de neurônios e bloqueio
de atividades mentais.
1.2.2– Etapas do desenvolvimento da leitura e da escrita
O aprender a ler e a escrever tornou-se uma necessidade do homem
enquanto ser social, se desenvolvendo desde o período pré-histórico, através
de processos rudimentares de pintura até a elaboração mais precisa que
favorecesse a comunicação entre as pessoas.
15
A linguagem oral é uma capacidade inata ao ser humano e se
desenvolve naturalmente e espontaneamente se existir um ambiente
estimulador e se não existir nenhum fator físico e mental que o impeça de
ocorrer. Ao contrário da leitura e da escrita, que necessitam de intervenções
diversas para que aconteça por não ser natural, mas elaborada pelo homem no
decorrer da história.
A leitura requer que o indivíduo identifique símbolos (letras, palavras)
impressos e os relacione a sons que eles representam. È o processo de
decodificação. No entanto, este é inicial, pois para ler é necessário, além de
decodificá-los, compreendê-los. Assim, quando a criança lê PATO, deve
associar a palavra ao animal “pato”. Sem compreensão não se pode
considerar que a criança realmente lê.
A escrita é o inverso do que ocorre com a leitura. Se na leitura
estabelece-se a relação entre palavra impressa-som-significado, na escrita a
relação é som-significado-palavra impressa. Dessa forma, a leitura precede a
escrita para que tenha significado e relevância, visto que é através da leitura
que a palavra pode ser escrita de forma correta (MORAIS, s/d.)
Emília Ferreiro (2001), no entanto, busca uma nova forma de
compreender a escrita infantil quando, muitas vezes, as crianças produzem
escritas desviantes (diferentes de como uma palavra é corretamente escrita),
considerando que estas sejam fases, níveis ou períodos que de uma forma
crescente de complexidade, vão se aproximando da escrita convencional.
Assim, a palavra PATO é escrita por alguns alunos PO ou AO ou PT. Segundo
a psicopedagoga, a escrita produzida é fruto da aplicação de esquemas de
assimilação em relação ao objeto (escrita) ensinado. A ênfase de sua tese
está em que o sujeito já traz para a escola, em sua entrada nesta, um
conhecimento acumulado em sua ação como ser humano na resolução de
problemas e sobre a sua interação com o mundo em que está inserido.
Portanto, o sujeito já é detentor de uma grande competência lingüística que a
escola não considera. Fato este decorrente da errônea suposição de que a
16
aprendizagem da leitura e da escrita aconteça da mesma maneira que a
linguagem (fala), em virtude dos métodos equivocados utilizados na mesma,
baseados na memorização e repetição.
Na verdade, não há relação alguma entre a escrita e o objeto
representado, o que exige do aprendiz o estabelecimento de relações
simbólicas com as coisas. Além do que é necessário organizar essa escrita
sobre o papel. Em nossa prática diária percebemos que os métodos utilizados
pela escola não permitem a interpretação da produção escrita do aluno e as
fases que a envolvem, simplesmente descartando-as, desconsiderando-as
como relevantes. E, no entanto, isto se faz necessário visto a complexidade do
ato de ler e escrever.
Outro aspecto que envolve a escrita é o fato de que se deve escrever da
esquerda para a direita e de cima para baixo. Isto só pode ser assimilado pela
observação contínua sobre a ação de alguém que lê e que isto seja explicado a
quem está aprendendo. Nesse ponto, o indivíduo que aprende precisa ter
contato com atos de leitura onde lhe é mostrado como se deve proceder para
realizar a mesma.
17
CAPÍTULO II
A IMPORTÂNCIA SOCIAL DA LEITURA E DA ESCRITA
O processo de aquisição da leitura e da escrita tem sido objeto de
estudo e tema recorrente entre especialistas em seminários e congressos
sobre educação porque sempre foi o grande problema que desafia o Brasil. A
cada ano, os índices de analfabetismo vêm crescendo, não só entre as
crianças, mas também jovens e adultos que não conseguiram se alfabetizar
nos anos de obrigatoriedade escolar determinada pela Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (lei nº 9394/96, art. 32) (GARCIA, 2001). Isto parece
atingir de forma perversa os setores marginalizados da sociedade, com raras
exceções nas classes média e alta. Os índices são alarmantes e o fato já é
considerado um problema social ( AZENHA, 2003 ).
O analfabetismo se traduz em obstáculo à inserção do indivíduo no
mercado de trabalho e são muitas as conseqüências sociais, políticas e
econômicas que derivam do fato de não saber ler e escrever. A escolaridade
não é sinônimo de melhoria de vida ou ascensão social, mas para alguns, isto
pode contribuir de alguma forma. O mais importante, no entanto, é que
possibilita a conquista da cidadania ativa, ampliando a capacidade de
transformar a sociedade. O ato de ler e escrever, portanto, precisa ir além,
sendo entendido como instrumento de luta política.
18
2.1 – A função social e política da escola
A escola sempre teve uma função muito clara: transmitir o conhecimento
acumulado pelas gerações anteriores às novas gerações (GARCIA, 1986). Ela
é responsável por socializar o conhecimento.
Por estar inserida em uma sociedade de classes, a escola acaba por
reproduzir a contradição existente na mesma. Ao mesmo tempo, serve à
classe dominante e às classes populares porque, à medida em que promove a
inculcação ideológica para que a dominação permaneça da primeira sobre a
segunda, também favorece a apropriação do código cultural da burguesia pelas
classes subalternas, instrumentalizando-as para a luta contra essa dominação.
A escola precisa definir quais são os seus verdadeiros objetivos e
redirecionar suas ações. Assim sendo, a escola que se pretende consciente de
seu papel social e político tem por única finalidade fazer com que os alunos
aprendam, se apropriando do conhecimento historicamente acumulado, e
capacitando-os para compreender as relações de poder, tornando-os
potencialmente transformadores dessa sociedade. Para isso, há de se rever
todo o processo ensino-aprendizagem: a transmissão de conteúdos sem
significado real e sem avaliação crítica: a relação de poder existente na própria
escola, onde o professor é o detentor do saber e o aluno é mero receptor; a
superioridade de diretores e especialistas que reproduzem as relações de
poder da sociedade através de atitudes autoritárias.
Também, a questão da qualidade do ensino na escola é assunto
fundamental, haja vista serem os conteúdos insuficientes e incipientes. Assim
sendo, o conhecimento deve ser o que contribui para que o aluno desenvolva a
sua capacidade de pensar e também suas habilidades. A começar desde as
séries iniciais, com a leitura, onde o significado sobre o que se lê deve ser
trabalhado, e não mera decodificação de símbolos; o escrever, deve ser
traduzido em apropriação da língua, como instrumento de compreensão sobre
19
a realidade. E todos os demais saberes, matemáticos, geográficos, históricos,
e outros, todos colocados a serviço do aluno, para que ele se instrumentalize.
Antes de tudo isso, porém, é necessário que todos tenham direito de
acesso à escola e possibilidade de permanência nela até que conclua toda a
formação acadêmica necessária. E, a partir daí, desenvolver o processo de
alfabetização associado ao letramento.
2.2. O letramento e o ensinar a ler e a escrever
A noção sobre “letramento” surge no Brasil em meados da década de
80, no livro “No mundo da escrita: uma pesquisa psicogenética”, publicado pela
lingüista Mary Kato, como tradução do termo do inglês “literacy” (WEISZ,
revista viver: mente e cérebro, 2005). Mais de 20 anos depois, é um termo que
tem se consolidado quando há referência entre as múltiplas relações entre
oralidade e escrita. No entanto, alguns autores como Emília Ferreiro não
aceitam a sua utilização por completo, devido à forma como tem sido
empregado, onde o termo alfabetização foi posto de lado e erroneamente se
tornou sinônimo de decodificação, apenas. A autora prefere utilizar o termo
“cultura escrita” (revista “viver: mente e cérebro”, 2005).
Não obstante as diversas perspectivas (histórica, antropológica,
sociológica e outras) e divergências teóricas, o termo se define, de modo geral,
na relação entre a cultura da escrita e as práticas sociais em que a leitura e a
escrita se efetivam na sociedade, e a participação do indivíduo com a sua
utilização. Assim sendo, o letramento envolve o ler e o escrever nas
dimensões social e individual. A escola é, pois, uma das principais
responsáveis por tornar significativo o uso da leitura e da escrita nessas
dimensões. Mas, paradoxalmente, tem sido apontada como responsável por
formar sujeitos letrados não-leitores.
20
Segundo Magda Soares, em seu artigo “a reinvenção da alfabetização”
(2003), o acesso ao mundo da escrita, num sentido amplo, se dá de duas
formas: a primeira, através do aprendizado de uma técnica; a segunda, se
refere às práticas de uso dessa técnica. A escrita é uma técnica porque, para
que ocorra, envolve aspectos motores e relacionais (sons e letras, fonemas e
grafemas) para que seja possível decodificar ou codificar. No entanto, o
aprender a técnica não é suficiente se não soubermos utilizá-la. Portanto,
aprender a técnica e aprender a usá-la são processos que devem acontecer
simultaneamente, por serem interdependentes. Não há como dissociá-las. A
alfabetização deve ocorrer em um contexto onde práticas sociais de leitura, ou
atividades de letramento, estejam presentes , mas não há como fazer isto sem
a aprendizagem das relações entre fonemas e grafemas. Além disto, é preciso
despertar na criança o prazer pela leitura, para que ela mesma busque o
conhecimento, deseje o seu crescimento intelectual.
2.3–O aprender por prazer
Para muitas crianças, a escola tem se traduzido em sofrimento. Isto
porque, quando entram na escola, esperando encontrar um mundo mágico de
descobertas, encontram uma avalanche de informações que não condizem
com a realidade de suas vidas. E muitas, não conseguindo compreender o que
é ensinado no tempo estipulado como suficiente e satisfatório, são rotuladas de
“problemáticas”. Os professores quantificam sua aprendizagem, baseada em
respostas esperadas ao treinamento imposto para que se tornem “úteis” à
sociedade. Não sendo, estarão sempre à margem do convívio social. E aí, é
fácil se convencer que não são capazes, que não nasceram para aprender e
que só estão no mundo para servir aos mais capazes. Essas crianças se
tornam incapazes mesmo é de pensar criticamente sobre qualquer coisa, até
sobre a sua própria incapacidade.
21
Rubem Alves, em seu livro “A alegria de ensinar” (2000), reflete sobre o
papel de professor como sendo o de ensinar felicidade. Ele, professor, repleto
de saber, não pode mais contê-lo dentro de si e deseja transbordar todo o seu
conhecimento, que lhe traz tanto prazer, compartilhando com seus alunos a
sua maior alegria. Pois, se não é assim que sentem, não deveriam ensinar.
Mas a realidade é outra: os mestres não têm se dado conta de sua tarefa de
amor e, ao invés de seduzir seus alunos pela paixão que têm pelo
conhecimento, os têm tornado infelizes em relação ao aprender, ao estudar,
que passou a ser por obrigação. Ainda bem que muitos mestres não fazem
parte dessa norma porque sempre existiram alguns dentre os demais que são
lembrados por sua dedicação, pelo seu amor e desvelo pelo ato de ensinar. E
não por acaso, sempre foram os que obtiveram os melhores resultados ao final
dos períodos letivos.
Mas, então, qual é o papel do professor que ensina felicidade? Não deve
ensinar os conteúdos estabelecidos? A resposta é sim, deve, mas também
deve ir além, ensinando seus alunos a pensarem criticamente os conteúdos e a
elaborá-los segundo a sua maneira de pensar. Dessa forma, sua contribuição
será de um valor imensurável porque, além de instrumentalizar o seu aluno,
dará a ele a oportunidade de encontrar prazer em buscar e crescer cada vez
mais em seu conhecimento.
Cada pessoa na escola é responsável pela construção do aluno. Mas
ninguém exerce a influência tão diretamente como o professor sobre o seu
aluno. É ele, em sua sala de aula, seu domínio absoluto, que o ensino se
diferencia. Ali, sonhos são cultivados ou destruídos. Ali, ele faz o aluno crer
em seu potencial e a desenvolvê-lo; ou não. Nós somos o que os outros
pensam de nós: “Sou o intervalo entre o meu desejo e aquilo que os desejos
dos outros fizeram de mim” ( PESSOA, apud ALVES, R., p. 35,2000).
A educação tem um grande poder: o de fazer despertar do mais profundo
de nosso ser os nossos melhores sonhos; ou fazer morrer tudo de bom que
22
havia em nós na infância, tornando-nos apenas reprodutores de um ensino
sem sentido real.
Aquilo que aprendemos por meio do prazer, do querer aprender,
permanece para sempre em nossa memória. Os professores têm a tarefa de
fazer brotar nos alunos o desejo de aprender, o prazer de aprender, seduzindo-
os. Assim, saem ganhando aluno e professor. Aluno, por fazer o seu sonho e
potencialidades despertarem; professor, por sentir a alegria de ver seu aluno,
fruto de seu trabalho de amor, ir além das fronteiras do saber instituído.
2.4 – O ambiente alfabetizador como espaço de ação política
e social
O desempenho escolar inicial entre crianças oriundas de classes
populares e as de classe média tem merecido a atenção por parte dos
estudiosos da educação, visto que há uma diferença muito grande entre elas.
Os especialistas, entre eles Emília Ferreiro (2001) e Paulo Freire (2005),
defendem que não existem déficits a nível intelectual, lingüístico ou cultural.
Todas as crianças, em sua opinião, iniciam o processo de alfabetização muito
antes de sua entrada na escola. A diferença de desempenho entre elas deriva
do fato de que a criança da classe média já está mais adiantada no processo
de alfabetização quando inicia a escola, devido às oportunidades a que tem
acesso, onde a leitura e escrita fazem parte do cotidiano. Já a criança da
classe baixa possui menos ou nenhuma oportunidade envolvendo leitura e
escrita, e menor valorização das mesmas, o que contribui para tal
diferenciação.
As competências lingüísticas trazidas pelos alunos não podem ser
ignoradas pela escola. Antes, deve ser a partir delas que o processo precisa
continuar. E quando o acesso a práticas de leitura é restrito para algumas
crianças, a escola deve garantir esse ambiente alfabetizador (FERREIRO,
23
apud revista “viver: mente e cérebro”, 2005 ). O termo “ambiente alfabetizador”
se refere a um ambiente que propicia inúmeras interações com a língua escrita,
com a intervenção de adultos que saibam ler e escrever (WEISZ, apud Nova
Escola, mar.2006). É um espaço onde as crianças têm acesso à leitura de
histórias, materiais diversos (jornais, revistas e outros), exposição de seu
pensamento sobre a escrita, sempre tendo um adulto leitor fazendo a
mediação, capaz de dialogar com ele, analisando criticamente o que está
sendo produzido e trabalhado, e sempre cooperando para o desenvolvimento
pleno do aluno.
A garantia desse ambiente alfabetizador acaba por se tornar uma ação
política e social por possibilitar um acesso notoriamente restrito às classes
dominantes e por viabilizar o contato da escrita utilizada pela sociedade. A
preocupação primeira é, pois, trazer os textos utilizados no mundo para dentro
da escola e aproximar as práticas de leitura e escrita da mesma com as reais.
24
CAPÍTULO III
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM – CAUSAS E
CONSIDERAÇÕES
As razões que originam as dificuldades relacionadas à aprendizagem são
variadas. Quando se elabora um diagnóstico sobre a questão, diversos
aspectos devem ser levados em conta, que vão desde patologias a
oportunidades para que a criança possa desenvolver a sua capacidade leitora.
Muitos estudos não só na área da educação têm contribuído no auxílio desse
diagnóstico e tem possibilitado modificar condutas erradas utilizadas no
passado.
3.1 – A avaliação diagnóstica multidisciplinar
Nos anos 70 (FERREIRO, 2005), dos déficits de aprendizagem atribuídos
aos alunos que não se alfabetizavam, o mais aceito pela escola era o das
disfunções psiconeurológicas. Eles eram encaminhados ao médico, cujo
diagnóstico isolado, era aguardado ansiosamente pela família e pela escola,
confirmando ou não, sua normalidade. Em caso de confirmação, a criança era
encaminhada a classes ou escolas especiais que ofereciam um ensino
diferenciado, passando a fazer parte de um segmento social marginalizado,
onde as oportunidades de ampliação de suas potencialidades eram reduzidas.
Esse procedimento tem se modificado, há poucas décadas, em virtude
dos avanços nas pesquisas neurológicas que comprovam a plasticidade do
cérebro, com grande capacidade de reconstituição, em determinadas situações
25
e funcionamento satisfatório. Também, a Psicologia, em especial a
Psicanálise, que passou a considerar a criança como dotada de sentimentos
que influenciam seu comportamento desde a vida intra-uterina. De igual forma,
a Pedagogia colabora à medida em que, repensando a sua prática, aprofundou
a relação ensino-aprendizagem. A integração de todos esses profissionais
possibilitou o avanço sobre o assunto.
A Psicopedagogia tem se destacado por defender a tese de que todo
indivíduo, independente do comprometimento corporal, orgânico, cultural ou
psicológico, elabora aprendizagem porque se relaciona como ser social durante
a sua existência.
O fator orgânico é primordial na avaliação das dificuldades relacionadas à
aprendizagem. No entanto, não há como não considerar de igual forma os
aspectos cognitivos e afetivos quando da elaboração de um diagnóstico e
indicação de tratamento. Da mesma forma, os aspectos econômico e cultural
onde a criança está inserida são relevantes, tais como a escola freqüentada,
visto que há ligação direta com o desempenho escolar.
O diagnóstico sobre as dificuldades relacionadas à aprendizagem
necessita ser feito de forma multidisciplinar, envolvendo médicos, pedagogos,
psicopedagogos, psicólogos, professores e outros especialistas que porventura
de tornem necessários à avaliação (DI SANTO, 2006).
3.2 – A responsabilidade da escola
O fracasso escolar é uma realidade nas escolas brasileiras,
principalmente as públicas. E as causas para isto, muitas vezes, são atribuídas
a distúrbios orgânicos dos alunos. No entanto, especialistas no assunto têm
combatido tal argumentação e apontado para a escola como uma das grandes
responsáveis pela situação.
26
Em recente entrevista à revista Nova Escola (agosto, 2006), o
fonoaudiólogo Jaime Luiz Zorzi analisa os encaminhamentos que recebe em
seu consultório de crianças oriundas, principalmente, das classes populares,
com indicação de problemas de aprendizagem relacionadas a distúrbios
orgânicos. Na realidade, a minoria dos casos encaminhados se deve a
problemas como deficiências mentais, auditivas, motoras, visuais e múltiplas.
Em sua maioria, se deve à própria organização escolar, que acaba por
discriminar a criança “problemática”.
Zorzi (2006) especializou-se na área da educação em seus cursos de
mestrado, doutorado e pós-doutorado, em particular a alfabetização. Sua
experiência tem mostrado que a escola não sabe lidar com as suas próprias
limitações, que vão desde o despreparo do professor até a falta de
oportunidades culturais que os alunos apresentam. Assim sendo, acaba por
focar a atenção em metodologias, no aluno como responsável pelo seu próprio
fracasso, o professor desqualificado, o sistema escolar como um todo, as
condições sociais e as públicas. Como agravante da situação, está o fato de a
educação não ser entendida como um bem necessário pelas famílias, não
existindo estímulo suficiente para o desenvolvimento do aluno.
3.3 – Os métodos de ensino
Não há um método de ensino que seja infalível. Não há receita a ser
seguida que garanta resultados favoráveis quando se fala em alfabetização,
devido às nuances que influenciam o seu acontecimento. A cada surgimento
de uma proposta pedagógica inovadora, os professores esperam que, dessa
vez, todos os problemas enfrentados no cotidiano escolar sejam resolvidos.
Mas o que é necessário fazer sempre é uma avaliação constante da prática
docente, percebendo as singularidades que vão sendo reveladas, e procurando
27
novos caminhos através do aprofundamento dos conhecimentos sobre o
assunto.
Temos visto surgir, de tempos em tempos, propostas potencialmente
transformadoras da realidade educacional, jogando-se por terra o até então
utilizado. Historicamente, discutiu-se a eficácia dos processos (sintético,
analítico e analítico-sintético) e dos métodos (silábico, fônico, global) que
focalizavam a alfabetização. A importância de se conhecer cada um tem como
objetivo situar o professor nas discussões metodológicas e favorecer a
compreensão de como as mudanças de rumo no pensamento sobre
alfabetização alteraram os modos de alfabetizar (ZACHARIAS, 2005).
3.3.l – O método sintético
Dentre os métodos de ensino, o sintético é o mais antigo. O método se
caracteriza por partir do aprendizado do nome das letras, soletradas pelo
aluno, até ler toda a palavra. Baseava-se na memorização pela repetição. No
início do século XIX, o método foi aperfeiçoado, passando da ênfase no nome
da letra para a ênfase em seu som.
O método se divide em: alfabético, fonético ou fônico e silábico.
Atualmente, várias propostas pedagógicas ainda se baseiam nesses métodos.
Estes têm ênfase na decodificação, as relações entre fonemas (sons ou
unidades sonoras) e grafemas (letras ou grupos de letras) e na progressão de
unidades menores (letra, fonema, sílaba) para unidades mais complexas
(palavra, frase e texto).
As limitações desses métodos se encontram na descontextualização da
escrita, porque se baseiam no uso de atividades que privilegiam a
decodificação, na não exploração das relações existentes entre a fala e a
escrita, e por trabalhar partes isoladas e não o entendimento e percepção do
28
todo, em que palavras se estruturam em frases e se tornam significativas por
isto mesmo.
3.3.2 – Os métodos analíticos
No Brasil, os métodos analíticos começaram a ser utilizados no final do
século XIX, como opositores do método sintético. Sua característica é
conceber a leitura como um ato global e ideovisual, partindo de unidades
maiores para as menores. Dessa abordagem, derivam os métodos de
“palavração”, ideovisual, sentenciação e o conto.
a) Palavração ou de palavras normais: parte-se do todo , com palavras
concretas e significativas retiradas de histórias, conversa, desenho e
outras situações.
b) Ideovisual, ideográfico ou de palavras-tipo: apresenta a palavra
ligada a um desenho anteriormente apresentado.
c) Sentenciação: aprendizagem da leitura por meio da globalização.
d) Conto: utiliza materiais didáticos que trazem uma seqüência de contos,
com sentidos complementares, para ser trabalhados ao longo do ano
letivo. Os objetivos são o desenvolvimento no aluno da capacidade de
compreensão e antecipação de seqüências de idéias, facilitando a
relação entre elas e sua memorização.
Os métodos analíticos se traduzem em uma alfabetização mais
significativa, de forma geral, mas são criticados por se prenderem à utilização
de estratégias visuais e a etapas e procedimentos determinados a serem
aplicados.
29
3. 3.3 – O método analítico-sintético
Surge no Brasil em 1920, em meio a debates sobre os métodos analítico
e sintético, tendo havido uma tentativa de se impor o uso do método analítico,
mas que terminou por estabelecer a liberdade de escolha pelas escolas do
melhor método a ser adotado.
O método analítico-sintético une as orientações dos dois métodos por
utilizar análise e síntese: parte de um todo (analítico) mas segue os passos do
método sintético (som, sílaba, palavras, frases). A memorização e a
mecanização são características do método, e acabam por limitar a leitura e a
escrita, na opinião dos críticos (ZACHARIAS,2005).
30
CAPÍTULO IV
A PARTICIPAÇÃO EFETIVA DO SUPERVISOR
ESCOLAR E DO PROFESSOR ALFABETIZADOR NO
PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO
A função da escola sempre foi a de transmitir conhecimentos acumulados
historicamente (GARCIA,1986). Cumprindo bem a sua função, a escola acaba
por exercer uma ação política, mesmo sem se dar conta disso, podendo
perpetuar as relações de poder da sociedade, reproduzindo as contradições,
ou instrumentalizando os indivíduos de classes subalternas como o código
cultural da classe dominante, com vistas a formar uma consciência histórico-
política que os possibilitará lutar contra a dominação.
A educação, portanto, tem um poder extremo em relação à prática política
e individual do ser humano. Assim sendo, os educadores precisam se
posicionar frente à educação que ajudam a cultivar, visto que não existe
neutralidade na ação educativa.
4.1 – O supervisor escolar e sua participação efetiva na escola
A escola, como já citado, tem por finalidade maior ensinar aos alunos. O
educador que se pretende consciente, dentre eles, o supervisor, deve garantir
o acesso ao saber, fazer com que os alunos aprendam. Parece óbvia a
afirmação. No entanto, visto o contingente de crianças, jovens e adultos que
31
não conseguem se alfabetizar a cada ano, a afirmação se torna pertinente
diante do fracasso nas séries iniciais de escolarização.
A ação educativa de supervisores e demais elementos envolvidos nessa
nova forma de entender a educação precisa ser revista em diversos aspectos.
As próprias relações de poder dentro da escola necessitam ser reavaliadas,
não sendo possível mais que o saber seja oriundo de uma única fonte, o
professor, mas compreendendo que o aluno traz muito saber de seu cotidiano
e deve participar na decisão sobre o que quer aprender. E, por sua vez, os
próprios especialistas, orientadores e supervisores, também o diretor, não
podem mais impor seu “saber” sobre o professor, desenvolvendo uma relação
autoritária, reproduzindo a hierarquia existente na sociedade e produzindo
pessoas conformistas.
Assim sendo, a escola recupera a sua função social e política à medida
em que capacita o aluno para a participação na vida social, política, cultural e
profissional.
O papel do supervisor se torna imprescindível quando se propõe a
mobilizar os diferentes saberes dos profissionais que atuam na escola para
alcançar o objetivo comum de fazer com que o aluno aprenda. Sua atuação
não é isolada, e sim vinculada à do orientador educacional e administração
escolar. Embora cada um possua especificidades na área em que atua, todos,
e mais o professor, têm como espaço comum o fato pedagógico. Nesse, o
currículo deve ser entendido como também comum a todos, já que diz respeito,
num sentido amplo, a tudo o que afeta, direta e indiretamente, a transmissão e
apropriação do saber acumulado. É preciso conhecer o aluno, o seu mundo, o
que sabe e o que deseja saber e, também, o que se deseja alcançar com a
prática pedagógica. Tais fatores devem ser norteadores do currículo. Daí,
parte-se para a adequação de metodologias, materiais didáticos compatíveis
com os interesses do aluno e outros aspectos pertinentes ao ensino.
O aluno aprende num determinado contexto. A forma como este é
organizado e as relações que ocorrem nele influenciam tanto quanto o ensino
32
em sala de aula. O supervisor deve propiciar constantemente a ocorrência da
reflexão coletiva sobre a prática pedagógica de todos os que trabalham na
escola, desde serventes até o diretor, sem esquecer da família, que tem papel
primordial, e a comunidade. Nesse processo, o orientador educacional
coopera como especialista em relações; e o supervisor como especialista na
organização de todo o fazer pedagógico.
A ação integrada de especialistas, diretor, professor, serventes,
inspetores, famílias e comunidade define o que é fundamental para a escola: o
conhecimento que contribui para que o aluno se desenvolva na sua capacidade
crítica sobre a sociedade em que está inserido e, assim, seja capaz de
transformá-la.
Não basta que a lei garanta o direito à educação para todos; é preciso
garantir a permanência na escola e a apropriação do conhecimento para o
verdadeiro exercício da cidadania.
4.2 – O professor-alfabetizador
Segundo Emília Ferreiro (2005), o fato de a criança passar pelo menos
quatro horas durante 200 dias do ano na escola evidencia o enorme poder de
formação e informação que isto representa. A figura do professor se destaca
nessa situação pelo seu contato constante com o aluno, não desconsiderando
os demais envolvidos no processo ensino-aprendizagem, mas reconhecendo
sua importância vital. A ele cabe decidir ensinar muita coisa para o aluno ou
negar-lhe o direito de aprender. Tudo dependerá da crença que ele tem sobre
o aluno, sobre sua capacidade de aprender. A partir disto, é que a sua ação
acontecerá. Não é diferente com o professor-alfabetizador. Pelo contrário, seu
papel é de maior responsabilidade e dimensão que o dos professores das
séries seqüenciais, visto ser esse momento pré-requisito para o pleno
acontecimento dos demais. Pois, não basta somente saber decifrar e produzir
33
escrita tecnicamente. É preciso propiciar a autonomia sobre o que se lê e
escreve, possibilitando a compreensão e produção de novos saberes.
Um segundo aspecto fundamental para o professor-alfabetizador em
questão, é o entendimento de que a criança traz uma aprendizagem anterior à
sua entrada na escola e que não pode ser desconsiderada. Cabe ao professor
conhecer os processos de compreensão infantil que o possibilite melhor intervir
nas situações de aprendizagem que surjam. No entanto, a provocação de
situações de aprendizagem também são necessárias, visto que muitas crianças
não têm acesso a atos de leitura para que produzam o seu próprio pensamento
sobre isto. Assim sendo, o alfabetizador deve propiciar um ambiente de
valorização no uso da escrita no cotidiano escolar, através da leitura de textos
diversos e outros meios. O seu objetivo será sempre o de fornecer indicativos
da função social da escrita e tornar a leitura prazerosa.
Os alfabetizadores, eles mesmos, são fruto de uma escolarização
desvinculada com o prazer de ler. Não há como transmitir prazer em ler sem
que se tenha uma prática leitora. É necessário resgatar nos alfabetizadores tal
prazer através de programas de educação continuada que tenham um trabalho
sistemático nessa área (WEISZ, apud Nova Escola, mar. 2006).
O momento educacional atual tem exigido que o professor mude de lugar
e se torne aluno novamente, pois a atitude reflexiva sobre a prática tem feito
com que busque embasamento teórico que responda a seus questionamentos.
Não só o professor tem estado preocupado com isto, mas todos os envolvidos,
pelo menos diretamente, com o aluno como supervisores, orientadores e
diretores, que também sabem da necessidade de promover momentos de
estudo e reflexão em suas próprias escolas, tornando-se parceiros nessa
busca.
O que fica explícito é que não existe mudança possível a curto prazo e
nenhum saber que tenha se provado absoluto. Todas as possibilidades e
todas as novas idéias concebidas serão sempre provisórias, visto o dinamismo
34
das situações pedagógicas. O que é importante cultivar hoje e definitivamente
é a reflexão contínua sobre a prática docente.
4.3 – Sugestões de atividades práticas na sala de aula
Algumas ações no cotidiano escolar facilitam o alcance do objetivo de
alfabetizar, no sentido lato e no restrito. A seguir, sugestões de como
desenvolver atos de leitura em sala de aula, de forma simples e eficaz. No
entanto, é preciso ressaltar que não se trata de método de alfabetização, mas,
sim, ações que merecem reflexão e consideração, geradas a partir de
hipóteses de autoras como Emília Ferreiro, Ana Teberosky e outros,
elaboradas a partir de suas práticas, mesmo porque em educação não há
“receita de bolo” a ser seguida, mas bom senso de educadores que se
incomodam com a realidade educacional.
4.3.1 – O ambiente alfabetizador na prática da sala de aula
O primeiro ponto a ser destacado é o ambiente onde ocorre a
alfabetização. Como já dito, a criança que tem acesso a atos de leitura
constantes por meio de pais leitores ou contato de livros, revistas e outros
materiais que envolvem a escrita, apresentam maior facilidade de aprender a
língua escrita por já estar em um estágio mais avançado da alfabetização. Se
isto não ocorre, como é o caso de crianças cujos pais são analfabetos ou não
vivem em um ambiente cultural favorável, a escola é quem deve oferecer
ambiente propício. Assim, a sala deve ter livros, cartazes com listas, nomes e
textos elaborados pelos alunos (com o auxílio do professor) nas paredes e
35
recortes de jornais e revistas do interesse das crianças. No entanto, não é o
fato de pendurar coisas escritas nas paredes que produzirá um efeito
alfabetizador, mas, sim, as inúmeras interações com a língua escrita, mediadas
pelo alfabetizador.
4.3.2 – A utilização de textos diversos
A leitura a ser trabalhada não pode ser resumida a textos didáticos, mas
deve se estender a leituras do dia-a-dia. A leitura diária, ato imprescindível,
deve ser feito através da leitura de informações práticas diversas, curiosidades,
notícias e textos clássicos ou não. O uso de canções, poesias e parlendas
também são muito úteis devido à facilidade da criança em memorizá-las e,
posteriormente acompanhá-las na forma escrita de suas estrofes. Ao mostrar
vários gêneros, ampliamos as possibilidades de apreensão sobre a escrita.
Linguagens diversas, como pintura e cinema, também são pertinentes.
O ensino de letras também é necessário, mas pode ser feito na própria
leitura dos textos, citando seus nomes durante as conversas. A mistura da
literatura com atividades didáticas também é uma sugestão recomendada.
4.3.3 – A sala de leitura.
A organização de uma sala de leitura na escola, em muitos casos, é um
sonho, mas que tem sido possível devido ao incentivo do próprio governo
federal que tem fornecido livros paradidáticos e materiais como aparelhos de
DVD para as escolas públicas (Nova Escola-dez/2005). Muitas vezes, o
empecilho é o espaço físico que não comporta uma sala extra. No entanto,
mesmo que seja feito de forma precária, como por exemplo, levando o acervo
36
semanalmente às salas de aula, essa estratégia se torna uma grande aliada
na alfabetização.
Na possibilidade de implantação da sala de leitura, esta deve ser
organizada de forma a propiciar momentos de lazer, já que se torna uma
novidade por si só o sair da sala de aula. E este não deve ser um espaço
direcionado não só à leitura de livros e empréstimos, mas também para
encenações, dramatizações, oficinas envolvendo a leitura e tantas outras
possibilidades.
37
CONCLUSÃO
A escola brasileira não tem cumprido sua função de ensinar a ler e a
escrever satisfatoriamente. Em conseqüência disto, acaba por negar o acesso
ao aluno à diversidade de informações, só possível através da leitura, e a
ampliar seu conhecimento sobre o mundo físico e social, para transformá-lo e
transformar-se. Não há como ficar inerte a tal situação. Os educadores se
incomodam com ela e buscam por soluções.
A superação dessa situação é uma das principais tarefas da escola,
entendida como ação conjunta de todos os envolvidos no processo ensino-
aprendizagem. Cada um possui a sua parcela de responsabilidade e é
necessário mobilizar os saberes e ações de todos em favor do aluno. E não
basta ensinar a técnica do decifrar e produzir escrita; é preciso que se trabalhe
o entendimento sobre o que se lê, de forma contextualizada. Mas, isto só é
possível a partir da reflexão sobre a prática pedagógica.
Da reflexão coletiva pode surgir uma nova competência da escola,
compreendendo sua ação formadora, política e social, e ampliando sua visão
sobre o mundo em que está inserida, e a de seu aluno, capacitando-se e
capacitando-o a interferir sobre a realidade.
38
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41
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
EPÍGRAFE 4
DEDICATÓRIA 5
RESUMO 6
METODOLOGIA 7
SUMÁRIO 8
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I 11
O PROCESSO DE AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM 11
1.1 – Rápido retrospecto sobre a evolução da escrita e da alfabetização 11
1.2 – O processo ensino-aprendizagem 12
1.2.1 – O desenvolvimento cognitivo – aspectos neurológicos 13
1.2.2 – Etapas do desenvolvimento da leitura e da escrita 14
CAPÍTULO II 17
A IMPORTÂNCIA SOCIAL DA LEITURA E DA ESCRITA 17
2.1 – A função social e política da escola 18
2.2 – O letramento e o ensinar a ler e a escrever 19
2.3 – O aprender por prazer 20
2.4 – O ambiente alfabetizador como espaço de ação política e social 22
42
CAPÍTULO III 24
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM – CAUSAS E CONSIDERAÇÕES 24
3.1 – A avaliação diagnóstica multidisciplinar 24
3.2 – A responsabilidade da escola 26
3.3 – Os métodos de ensino 27
3.3.1 – O método sintético 27
3.3.2 – Os métodos analíticos 28
3.3.3 – O método analítico-sintético 29
CAPÍTULO IV 30
A PARTICIPAÇÃO EFETIVA DO SUPERVISOR ESCOLAR E DO PROFESSOR-ALFABETIZADOR NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO 30
4.1 – O supervisor escolar e sua participação efetiva na escola 30
4.2 – O professor-alfabetizador 32
4.3 – Sugestões de atividades práticas na sala de aula 34
4.3.1 – O ambiente alfabetizador na prática da sala de aula 34
4.3.2 – A utilização de textos diversos 35
4.3.3 – A sala de leitura 36
CONCLUSÃO 37
BIBLIOGRAFIA 38
WEBGRAFIA 40
ÍNDICE 41