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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS- GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE PSICOGÊNESE E PSICOPEDAGOGIA: Semeando uma parceria Por: Denise Alves de Aguiar Bernardo Orientador Prof. Ms. Vilson Sérgio de Carvalho Rio de Janeiro 2006

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

PSICOGÊNESE E PSICOPEDAGOGIA:

Semeando uma parceria

Por: Denise Alves de Aguiar Bernardo

Orientador Prof. Ms. Vilson Sérgio de Carvalho

Rio de Janeiro 2006

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

PSICOGÊNESE E PSICOPEDAGOGIA:

Semeando uma parceria

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como condição prévia para a

conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu”

em Psicopedagogia.

Por:. Denise Alves de Aguiar Bernardo.

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AGRADECIMENTOS

À Deus por ter iluminado o meu caminho

e meus pensamentos.

Ao meu marido, ao meu filho e a minha mãe.

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DEDICATÓRIA

À minha família que me apóia

integralmente.

À todas as crianças.

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RESUMO

Este estudo objetivou compreender como o psicopedagogo atuando de

maneira preventiva pode orientar as professoras alfabetizadoras, com o

objetivo de prevenir ou intervir nas dificuldades de aprendizagem das crianças

na classe de alfabetização. Utilizando como base as pesquisas de Emilia

Ferreiro e Ana Teberosky que originaram o livro “Psicogênese da Língua

Escrita”, onde as autoras fizeram uso da teoria psicogenética de Piaget e dos

conceitos da psicolingüística contemporânea na busca de uma maior

compreensão dos processos vividos pela criança rumo a conquista da base

alfabética da escrita, fiz uma releitura de minha monografia de graduação,

procurando manter um diálogo constante com as práticas pedagógicas das

professoras alfabetizadoras de uma escola municipal, situada na zona norte do

Rio de Janeiro. Dentro da perspectiva de Ferreiro e Teberosky as crianças são

construtoras de conhecimentos e precisam estar testando suas hipóteses como

meio de apreender e compreender as informações contidas no ambiente social.

Nesse sentido, a escrita não é vista como um objeto estritamente escolar, mas

como um objeto social que requer sentido. O professor não é mais aquele que

traz os conhecimentos prontos, mas o que atua como o interlocutor da criança,

que a desafia através das atividades, levando-a ao conflito cognitivo, um

desequilíbrio que possibilita a modificação de suas estruturas intelectuais frente

ao novo conhecimento permitindo que avancem conceitualmente.

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METODOLOGIA

A metodologia utilizada no presente trabalho foi a pesquisa bibliográfica

em diversas fontes: livros, revistas especializadas, internet e a releitura de

minha pesquisa monográfica de graduação realizada em 2004.

A referida pesquisa, quanto ao método de abordagem geral, tratou-se de

uma pesquisa exploratória onde se pretendeu uma maior exploração

(familiarização) dos aspectos inerentes ao tema. Quanto aos procedimentos a

pesquisa teve como proposta o estudo de caso, com o objetivo de investigar

profundamente uma escola da rede municipal de ensino, observando turmas de

1º e 2º ano do ciclo e contou também com a pesquisa bibliográfica, onde foi

feito um levantamento das literaturas disponíveis sobre tema em questão,

estabelecendo relações entre as teorias e algumas práticas de ensino. As

técnicas utilizadas compreenderam: entrevistas semi-estruturadas, fotos,

entrevistas, observação/registro e a análise de conteúdos.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - Contextualizando a Alfabetização 11

1.1 - As abordagens teóricas e as práticas de alfabetização 18

1.2 - Alfabetização uma questão de método!?. 22

1.3 - O uso das cartilhas na alfabetização 24

CAPÍTULO II - Conhecendo a Psicogênese da Língua Escrita 28

2.1 - A Psicogênese e a criança 31

2.2 - A Psicogênese e o professor 42

CAPÍTULO III - A Psicopedagogia 48

3.1 - Um breve histórico da Psicopedagogia 50

3.2 - Campo de atuação da Psicopedagogia Preventiva 55

CAPÍTULO IV - Psicogênese e Psicopedagogia uma parceria 63

4.1 - As práticas cotidianas: um olhar psicopedagógico 64

4.2 - Revisitando e dialogando com as práticas cotidianas 78

CONCLUSÃO 92

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 96

ANEXOS 100

ÍNDICE 109

FOLHA DE AVALIAÇÃO 110

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INTRODUÇÃO

O tema de minha pesquisa surgiu devido às observações feitas nos

estágios que realizei em diferentes instituições de ensino e na minha prática

enquanto professora. Foi percebida uma grande preocupação dos educadores

com relação à alfabetização, várias crianças apresentavam dificuldades de

aprendizagem e os professores tinham dificuldades em lidar com a

heterogeneidade de suas salas, onde umas crianças liam razoavelmente bem,

enquanto outras mal sabiam atribuir “valores sonoros às formas gráficas”.

No cenário educacional, inúmeros avanços vêm contribuindo para a

quebra de alguns paradigmas, principalmente, no campo da alfabetização.

Muitos autores voltaram seu olhar para este foco, dentre eles estão Emília

Ferreiro e Ana Teberosky que nos anos 80 fizeram inúmeras pesquisas neste

campo, passando a considerar o professor como um mediador do processo de

aquisição da leitura e da escrita nas séries iniciais e a criança nesta

perspectiva é vista como sujeito cognoscente (sujeito que busca adquirir

conhecimentos através de suas próprias ações e questionamentos).

Devido a esta perspectiva, muitos professores começaram buscar novas

maneiras de tornar o aprendizado mais significativo para seus alunos. Mas,

ainda assim, vemos a manutenção de práticas pedagógicas tradicionais, isto é,

que desconsideram os conhecimentos prévios que os alunos trazem para a

sala de aula, continuando a considerá-los como recipientes vazios, nos quais o

professor derrama todo o conteúdo do currículo de forma descontextualizada,

não cabendo espaços para o questionamento.

Apesar dos avanços e da mudança de postura pedagógica de alguns

professores, nossas salas de aulas ainda permanecem com resquícios de um

ensino mecânico/automatizado. A alfabetização inicial, ainda é vista, em muitos

casos como uma técnica, onde as cartilhas, os treinos e as cópias sem

significados são a base das práticas pedagógicas. Neste sentido, torna-se

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importante entender que o caminho percorrido pela criança na construção de

conhecimentos acerca da leitura e da escrita não deve ser visto como uma

técnica (treino, cópia, etc.) e sim, como uma construção cognitiva (natureza

conceitual) feita por um sujeito cognoscente, através de desequilíbrios/conflitos

cognitivos e de suas hipóteses. As escolas e as professoras que delas fazem

parte precisam integrar à sua ação pedagógica a busca constante de uma

maior entendimento sobre os sistemas de representação que a criança constrói

para a compreensão da lectoescrita, e sua metodologia deve considerar os

caminhos que a criança percorre nesse processo de apropriação e

compreensão.

Assim, a partir do meu olhar psicopedagógico, do diálogo mantido com a

teoria e trazendo como interlocutoras Emilia Ferreiro, Ana Teberosky e outras

que entendem que a leitura e a escrita não devem estar restritas ao cotidiano

escolar, busquei entender, sem julgar, como as práticas pedagógicas das

professoras alfabetizadoras de uma escola da zona norte do Rio de Janeiro

podem auxiliar ou impedir a conquista da base alfabética da escrita pela

criança. Optei por uma releitura de minha pesquisa de campo, que realizei

durante a graduação, para poder estabelecer um contato direto com o objeto

de estudo.

No Primeiro Capítulo faço uma breve contextualização da alfabetização

no Brasil, trago as abordagens que circundam as práticas de alfabetização,

além de alguns métodos de ensino tradicionais, que têm as cartilhas como

suas representantes diretas.

O Segundo Capítulo tem como tema principal as pesquisas de Emília

Ferreiro e Ana Teberosky, ou seja, a Psicogênese da Língua Escrita e as suas

implicações no que se refere ao professor e a criança.

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No Terceiro Capítulo traço um sucinto perfil da psicopedagogia no

Brasil, apoiada no livro intitulado “A psicopedagogia no Brasil”, de Nádia A.

Bossa e abordo a Psicopedagogia Escolar ou Preventiva, foco desta pesquisa.

No Quarto Capítulo faço uma releitura da minha pesquisa iniciada no

ano de 2004, pautada em um enfoque psicopedagógico, procurando traçar um

elo/uma parceria entre a Psicopedagogia e a Psicogênese.

E com o olhar inquieto de uma pesquisadora termino trazendo minhas

Conclusões, não finais, pois ainda tenho muito a pesquisar, muito a perguntar

e muito a compreender.

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CAPÍTULO I

CONTEXTUALIZANDO A ALFABETIZAÇÃO

Antes de dar início à discussão acerca de como o psicopedagogo e o

professor podem estar atuando juntos, de modo preventivo, como mediadores

entre a criança e a construção do conhecimento da leitura e da escrita no

ambiente escolar, tendo como base os estudos de Emília Ferreiro, faz-se

necessário abordar historicamente a Educação no Brasil.

Algumas décadas depois do descobrimento do Brasil, desembarcaram

em nossas terras os padres jesuítas:

“Que vinham com uma tarefa oficialmente definida nos

Regimentos Portugueses para a colônia – catequizar e

instruir os nativos, assim como a população que para cá

se transferira ou fora transferida, nas quatro décadas que

já se haviam passado desde o Descobrimento” (XAVIER,

1998, p. 41).

Os jesuítas inicialmente tinham como objetivo fazer o reconhecimento

das terras da nova colônia portuguesa e converter os nativos vistos como

“selvagens”. Alguns séculos depois, os seminários instalados desde o início da

colônia foram se expandindo e transformaram-se em instituições de ensino

(XAVIER, 1998).

As características do ensino jesuítico eram basicamente o ensino

propedêutico1, enciclopédico, a memorização, a disciplina e a rigidez. “(...), o

Plano de Estudos dos jesuítas, reinava absoluto, e o faria por séculos, mesmo

1 Ensino propedêutico - É sempre um ensino de caráter preparatório, ou seja, a educação infantil prepara para o ensino fundamental que, por sua vez, prepara para o ensino médio e, este prepara para a universidade.

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após a expulsão de seus criadores (1759) e o desmantelamento do sistema

colonial” (id., p. 48).

Com a reforma pombalina os jesuítas são expulsos do Brasil e o ensino

brasileiro desmantela-se. Os extintos colégios foram substituídos por aulas

régias: “Eram aulas avulsas, sustentadas por um novo imposto colonial, o

‘subsídio literário’ [criado em 1772]...” (XAVIER, 1998).

Cabe ressaltar a falta de interesse governamental de estar oferecendo

uma educação para todos, ficando assim, o acesso restrito a uma pequena

camada da população, ou seja, neste momento a maioria da população fica

privada da educação escolar, já que os componentes da elite poderiam

complementar os estudos na Europa. Com isso durante muitos anos o Brasil

ficou à margem no que se refere a educação, pois não possuía um plano

educacional e os colégios eram escassos.

O Decreto de 15 de outubro de 1827, “transformaria a instrução pública

elementar em simples Escolas de Primeiras Letras e nada dispunha sobre as

condições materiais de sua implementação” (id., p. 62).

O método de ensino adotado seria o Lancasteriano, trazido da Inglaterra,

que consistia na monitoria, ou seja, os alunos mais avançados estariam

passando para os demais o que aprenderam com um professor. A adoção

desse método trouxe uma enorme falta de interesse por parte do governo em

“garantir as condições mínimas para o funcionamento da escola pública, ou

seja, a formação e a remuneração adequada dos professores” (id., p. 65).

Devido a esse descaso por parte do governo, as primeiras Escolas

Normais foram fundadas no período da regência (1831-1840), mas:

“A carreira do magistério não apresentava atrativos. Os

ordenados eram baixos e a estabilidade, precária, face às

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disputas políticas regionais (...). tais disposições negativas

impediam que se formassem grandes contingentes de

professores para a escola pública, como se esperava com

a expansão do ensino normal. E não apenas devido à

falta de professores, mas especialmente à ausência de

alunos, muitos desses cursos chegaram a fechar

temporária ou mesmo definitivamente” (id., p. 85-86).

De acordo com os argumentos expostos pode-se afirmar que a

educação escolar no Brasil sempre esteve atrelada a exclusão das classes

menos favorecidas, somente a elite brasileira tinha acesso a tal privilégio, essa

postura excludente acarretou o descaso com o ensino elementar (primário) e a

desqualificação do magistério, pois a profissão de professor era mal

remunerada e desprestigiada socialmente.

Muitas reformas e leis foram feitas, mas o número de analfabetos não

parava de crescer, pois o acesso à Educação continuava restrito: “Há um

caráter elitista explícito na distribuição do saber letrado. A educação

escolarizada só era conveniente à camada dirigente (pequena nobreza e seus

descendentes)...” (MOLL, 2002, p. 13).

Devido a esses longos anos de descaso com a educação, o Brasil

(século XIX e início do século XX) apresenta um alto índice de analfabetismo:

Fonte: RIBEIRO (1982, p. 82 apud MOLL, 2002, p. 21).

Especificação 1890 1900 1920

Total 14.333.915 17.388.434 30.635.605

Alfabetizados 2.120.559 4.448.681 7.493.357

Analfabetos 12.213.356 12.939.753 23.142.248

% de Analfabetos 85% 75% 75%

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A educação brasileira, de cunho Tradicional, segue anos após anos com

seu caráter elitista e dual, onde prevê para as classes dominantes um ensino

científico (formar o intelectual) e para as classes dominadas um ensino

profissionalizante (formar o trabalhador braçal).

A partir da década de 40 a escola pública primária vai crescendo

quantitativamente o que, necessariamente, não implica em uma mudança

qualitativa no cenário educacional brasileiro, pois aumenta-se o contingente de

alunos matriculados, mas não há uma preocupação com a permanência destes

alunos nas escolas – havendo altos índices de repetência e evasão escolar.

Evolução do Fluxo Escolar, Permanência/Exclusão do Sistema de Ensino: 1942-1983.

Séries 1942/53 1947/58 1952/63 1957/68 1962/73 1967/78 1972/83

1ª 1000 1000 1000 1000 1000 1000 1000

2ª 404 416 385 415 443 454 519

3ª 274 286 277 316 351 367 413

4ª 155 172 172 207 229 294 347

Fonte: Anuário Estatístico do Brasil (1984 apud MOLL, 2002, p. 35).

Cabe observar que o quadro acima demonstra que o fracasso escolar

nas séries iniciais avança ininterruptamente durante décadas, sem que haja

uma reestruturação nas políticas educacionais, evidenciando o descaso com a

Educação no Brasil.

Na década de 50 o movimento escolanovista2 ressurge, mas, em 60

devido ao golpe militar (1964) surge a tendência tecnicista que transporta o

modelo empresarial para as salas de aula, tendo como objetivo: “à preparação

2 Escola Nova – No Brasil esse movimento surge no século XX, na década de 20, faz duras críticas a Escola Tradicional, considera o aluno o centro do processo de ensino-aprendizagem.

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de recursos humanos, ou seja, de mão-de-obra qualificada para a indústria”

(ARANHA, 1996, p. 175).

Durante as décadas de 60 e 70, com a implantação acentuada do

tecnicismo, o tipo de educação que vigorava no Brasil tinha um cunho

compensatório que:

“Confundindo convenientemente ‘diferença’ como

‘deficiência’, criava mitos com relação ao fracasso escolar

(...). Nesse contexto, o livro didático passou a ser um

recurso imprescindível, indispensável: virou programa e,

mais do que programa virou método” (SMOLKA, 2003, p.

16).

Diante deste cenário educacional excludente que vigorou (vigora?)

durante anos, a educação brasileira foi descaracterizada, assumiu diversas

facetas e acabou por não oferecer efetivamente uma educação de qualidade –

onde as diferenças culturais fossem consideradas e valorizadas no contexto

escolar e não fossem sinônimas de exclusão e evasão.

Por desconsiderar as vivências (a história) da criança a escola acaba

adotando metodologias que cobram comportamentos e conhecimentos que são

desvinculados de sua realidade. Dentro desta perspectiva para ser alfabetizada

fazia-se necessário que a criança tivesse desenvolvido habilidades motoras,

discriminação visual e auditiva, atenção e etc., ou seja, “pré-requisitos para

alfabetização”. Sua bagagem cultural não era considerada e sua voz era

silenciada. Alfabetização era sinônimo de mecanização, onde as crianças

tinham como detentores de conhecimentos o professor e o livro didático.

A partir da década de 80 inúmeras foram as contribuições para que

houvesse uma ressignificação dos processos educativos, assim o caráter

behaviorista-comportamentalista que vigorou nas décadas de 60 e 70 deu lugar

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ao enfoque cognitivista. A partir desse enfoque o centro do processo de ensino-

aprendizagem passou a ser o sujeito que interage com objeto de

conhecimento, no sentido de apreender e compreender, podendo desta

maneira construir uma aprendizagem significativa. O construtivismo no Brasil

ganhou força a partir da publicação dos resultados das pesquisas de Emília

Ferreiro e Ana Teberosky. Muitos autores e autoras influenciados por tais

resultados, dentre as quais: Telma Weisz, Ana Luiza Bustamante Smolka,

Magda Becker Soares, entre outras; começaram a rever certos conceitos

subjacentes à prática de alfabetização. Estas, através de suas pesquisas,

trouxeram inúmeras contribuições para o campo da alfabetização, sendo que

cada uma ao escrever sobre o tema emite o seu conceito de acordo com a sua

concepção:

“Existem duas formas segundo as quais comumente se

entende a alfabetização: ou como um processo de

aquisição individual de habilidades requeridas para a

leitura e escrita, ou como um processo de representação

de objetos diversos, de naturezas diferentes” (TFOUNI,

2002, p. 14).

“Na minha hipótese, o ensino da língua escrita precisa

considerar não só o usuário, mas também o ser-leitor

curioso, do mundo que se interroga, interpretando,

pensando, criando e capturando retalhos nas experiências

sensíveis e nas conversas cotidianas. Ao propor o

substantivo composto ser-leitor, tendo dar mais

visibilidade à condição do ser necessariamente implicada

à de leitor de uma linguagem multifolhada, em que várias

linguagens se atravessam” (ZACCUR, 2001a, p. 34).

“(...) para mim, a alfabetização implica leitura e escrita que

vejo como momentos discursivos. (...) o próprio processo

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de aquisição vai dando numa sucessão de momentos

discursivos, de interlocução, de interação” (SMOLKA,

2003, p. 29).

“Opondo-se a essas atividades ‘controladas’ de escrita, as

concepções psicogenética e psicolingüística sobre a

aquisição da escrita geraram as atividades de ‘escrita

espontânea’; o pressuposto é que não é preciso esperar

que a criança tenha aprendido escrever para que escreva,

mas que é escrevendo que ela aprenderá a escrever:

escrevendo espontaneamente, experimentando soluções

para as grafias de que necessita” (SOARES, 2001, p. 55).

“Antes de que a escrita apareça como uma tarefa escolar

ineludível, antes de que a criança seja iniciada nos rituais

da alfabetização, a escrita existe (...). A escrita existe

inserida em múltiplos objetos físicos do ambiente que

rodeia uma criança do meio urbano. A escrita existe

inserida numa complexa rede de relações sociais (...), a

criança tenta compreender que classe de objetos que são

essas marcas gráficas, que classe de atos são aqueles

em que os usuários as utilizam” (FERREIRO, 2003, p.

102).

“(...) a escrita, a leitura e a linguagem oral não se

desenvolvem separadamente, atuam de maneira

interdependente desde a mais tenra idade. (...) a

alfabetização inicial não é um processo abstrato, mas

ocorre em contextos culturais e sociais determinados”

(TEBEROSKY, 2003, p. 17).

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De fato, os conceitos relacionados possibilitam uma série de reflexões,

estes são apenas uma amostra de alguns pontos de vista sobre alfabetização,

isto é, não há uma concepção única que dê conta de todos os conceitos. As

ênfases dos autores variam de acordo com os aspectos considerados por eles,

que podem ser: o aspecto discursivo; o cognitivo; o perceptivo-motor; o social;

o histórico e o cultural. Mas, não há como desprezar que alguns autores

restringem a alfabetização inicial quando reduzem-na a simples aquisição de

habilidades percetivas-motoras, deixando de considerá-la como um processo

contínuo que requer sentido, perpetuando assim, o caráter excludente da

educação brasileira disseminado durante longos séculos.

1.1 - ABORDAGENS TEÓRICAS E AS PRÁTICAS DE

ALFABETIZAÇÃO

O cenário educacional brasileiro passou por inúmeras transformações,

principalmente no final do século XIX, quando a escola tradicional entrou em

crise, pois era esta a concepção que predominava em nosso país, mas que

não estava dando conta das transformações que estavam ocorrendo na

sociedade, principalmente no âmbito econômico. Com isso a escola teve que

mudar para poder acompanhar as mudanças sociais e não ficar defasada e

obsoleta, a partir disso deu-se o início a uma preocupação quase que frenética

de qual seria a melhor maneira de se educar neste contexto de eminentes

transformações.

Nesta busca incessante de mudança, muitas instituições tiveram o seu

ensino atrelado a teorias simplistas e reducionistas, onde continuava-se dando

ênfase à uma aprendizagem mecânica/automatizada, onde o aluno era uma

mero repetidor de informações descontextualizadas e fragmentadas. Faz-se

necessário compreender como os educadores vêem a construção de

conhecimentos de seus alunos, já que toda prática educativa “é expressão de

uma teoria de conhecimento, quer ela seja consciente ou não, por parte do

educador” (MOLL, 2002, p. 74).

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A Teoria Empirista vê o educando de forma abstrata (tábula rasa)

prioriza o meio, isto é, baseada nas experiências que são transmitidas pelo

meio. O conhecimento vem de fora para dentro; a Teoria Inatista que acredita

que os conhecimentos já estão dentro de nós, isto é, todo o potencial humano

já está pré-determinado geneticamente quando o sujeito nasce até tornar-se

adulto; a Teoria Interacionista, diferente das demais, amplia a visão de

conhecimento, pois considera que a construção do conhecimento deriva da

interação homem-mundo, por isso a construção do conhecimento torna-se

contínua e não pronta e acabada (MIZUKAMI, 1986; MACIEL, 2001).

Essas teorias/concepções de ensino-aprendizagem fundamentaram

diferentes abordagens/tendências que influenciaram e influenciam as nossas

escolas e professores. Segundo Mizukami (1986) e Aranha (1996), as

diferentes abordagens desse processo podem ser compreendidas da seguinte

maneira:

Na abordagem tradicional o ensino é centrado no professor que é o

dono do saber, este saber é dado como pronto e acabado – acumulado e

repassado de geração em geração. A aprendizagem é voltada para a

memorização, não há lugar para o questionamento do educando, pois este é

visto como um ser passivo e vazio no qual o professor derrama todo o

conteúdo do currículo escolar.

A abordagem behaviorista (é a base do Tecnicismo) é basicamente

centrada no estímulo-resposta, vê o conhecimento como resultado das

experiências observáveis e nesta perspectiva para que a aprendizagem

aconteça deve haver a mudança de comportamento (condicionamento). O

ensino é feito através do treinamento de habilidades com objetivos pré-

determinados.

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Temos na abordagem humanista um ensino que advém das

experiências que os alunos reconstroem, ou seja, o aluno é o centro do

trabalho pedagógico.

“O professor em si, não transmite conteúdo, dá

assistência, sendo um facilitador da aprendizagem. O

conteúdo advém das próprias experiências dos alunos. A

atividade é considerada um processo natural que se

realiza através da interação com o meio. O conteúdo da

educação deveria consistir em experiências que o aluno

reconstrói. O professor não ensina: apenas cria condições

para que os alunos aprendam” (MIZUKAMI, 1986, p. 38).

Com o surgimento da abordagem cognitivista que é um tipo de

abordagem Interacionista, ou seja, o conhecimento advém da interação

homem-mundo, sendo ele uma construção contínua que requer ressignificação

constante - o Construtivismo entra na Educação. O construtivismo traz uma

infinidade de mudanças ao campo educacional, dentre elas, o aluno antes tido

como um ser passivo começa a ser visto como um sujeito construtor de

conhecimentos e o professor passa a ser o mediador desse processo de

ensino-aprendizagem e não mais um transmissor de conteúdos pré-

estabelecidos.Tem como seu maior representante Piaget e sua Teoria

Psicogenética, que aborda a construção do conhecimento através de um novo

enfoque, ou seja, traz o conflito cognitivo que é um desequilíbrio/equilíbrio

frente ao novo conhecimento como um processo que impulsiona os avanços

conceituais.

“O ensino que seja compatível com a teoria piagetiana

tem que ser baseado no ensaio e no erro, na pesquisa, na

investigação, na solução de problemas por parte do aluno

e não em aprendizagem de fórmulas, nomenclaturas,

definições etc” (id., p. 76).

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Finalmente, a abordagem Sócio-Histórica (Sócio-interacionista) que

tem como principal representante Vygotsky, ampliou as concepções trazidas

por Piaget. Para Vygotsky o conhecimento parte da relação dialética entre

sujeito e meio (sujeito e objeto se influenciam reciprocamente). O ensino deve

valorizar o contexto social, para que a construção do conhecimento seja mais

significativa.

De acordo com o que foi dito sobre as abordagens teóricas pode-se

concluir que:

Ä A Teoria Empirista de Alfabetização é a que embasa as práticas

educativas nas quais os alunos recebem o conhecimento pronto e acabado.

A escrita é alçada a um patamar de neutralidade onde prevalece a técnica e

as habilidades, tornando-se distante da realidade das crianças, carecendo

de sentido e de significado. Esta teoria tem como recurso as cópias (de

letras e palavras isoladas), as redações com temas delimitados, cartilhas e

livros didáticos.

Ä A Teoria Inatista de Alfabetização aborda a alfabetização como algo

natural, isto é, “aposta no processo maturacional ligado à aprendizagem da

língua escrita e preconiza o ‘estalo’ como o momento a partir do qual o

aluno pode alfabetizar-se” (MOLL, 2002, p. 101).

Ä A Teoria Interacionista de Alfabetização vê a construção da escrita como

um produto da evolução histórico-cultural da humanidade e a aquisição

deste sistema de representação envolve processos cognitivos e implica uma

conceitualização por parte da criança, não é algo espontâneo, pois exige

ação e reflexão.

Ao refletir sobre qual (is) teoria (s) embasará sua prática pedagógica o

professor estará decidindo a direção e a intencionalidade de sua ação. Mas,

cabe salientar que muitas vezes as teorias não dão conta da realidade e que

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elas não são as únicas fontes existentes para a compreensão das situações de

ensino-aprendizagem.

“Apesar de terem muitos aspectos sistematizados, as

teorias ou são incompletas no sentido de estarem ainda

em elaboração ou reelaboração, ou constituem

explicações provisórias num determinado momento, já

que lhes falta, em alguns aspectos, validação empírica ou

confronto com o real. (...) Constituem elas, pois o produto

de um trabalho que não deve ser desconsiderado. (...)

Elas são elaboradas para explicar, de forma sistemática,

determinados fenômenos, e os dados do real é que irão

fornecer o critério para a sua aceitação ou não,

instalando-se assim, um processo de discussão

permanente entre teoria e prática” (MIZUKAMI, 1986, p.

106-107).

Cabe então, ao professor, assumir uma postura investigativa para

buscar com cautela no universo teórico, uma teoria que se aproxime do

contexto no qual está inserido, construindo assim a sua práxis pedagógica.

1.2 - ALFABETIZAÇÃO UMA QUESTÃO DE MÉTODO!?.

Durante muito tempo o maior questionamento dos professores

alfabetizadores foi “como devemos alfabetizar?” E dentro deste contexto os

Métodos de Ensino ganhavam status de facilitadores da aprendizagem, isto é,

“para obter sucesso no processo de ensino da língua escrita, é preciso que se

tenha feito a opção pelo melhor método” (MOLL, 2002, p. 54). Esta

abordagem, pautada nos métodos, traz como conseqüência uma alfabetização

inicial reducionista, mecânica e descontextualizada sócio-culturalmente.

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A prática pedagógica que tem como referência a abordagem tradicional,

pauta-se nos métodos de ensino e acaba descaracterizando e empobrecendo

os processos que engendram a alfabetização inicial, pois desconsideram que a

aprendizagem da leitura e da escrita está além dos métodos e fazendo isto

deixam de considerar a perspectiva do sujeito que aprende e não atentam para

o fato que o método não é fonte de conhecimento, pois este depende de um

sujeito ativo que age e reflete acerca do seu próprio processo de

aprendizagem.

Ä Método Sintético – A alfabetização parte de elementos mais simples

(menores que da fala): letra, fonema ou sílaba que são combinados para

formar as palavras, frases e textos. Pode ser fônico, alfabético ou silábico e

está intimamente ligado a discriminação auditiva, isto é, para a criança

aprender a ler e a escrever primeiro teria que distinguir o som e

posteriormente associá-lo ao sinal gráfico (fonema-grafema). A ênfase

dada a alfabetização recaía no treino e na repetição (BARBOSA, 1990;

FERREIRO, 1999).

Ä Método Analítico (global e ideovisual) – A alfabetização parte dos

elementos mais significativos da língua palavras, sentenças e contos. Parte

das unidades maiores para as menores e buscam de certa forma:

“Uma alfabetização com sentido, significativa, mas

centram a atenção em estratégias visuais, cristalizando o

processo de alfabetização em etapas e procedimentos

que, via de regra, nada tem a ver com o processo de

aprendizagem do aluno” (MOLL, 2002, p. 55).

Ä Método Misto ou Eclético – Por ser a união dos métodos analíticos e

sintéticos, continuam limitados, ou seja, a criança continua não tendo

oportunidade de produzir seus próprios textos partindo de suas vivências.

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Emília Ferreiro e Ana Teberosky, em Psicogênese da Língua Escrita,

afirmam que o método sintético é mecanicista e voltado para a percepção

auditiva e, o método analítico voltado para a percepção visual, neste sentido,

para elas: “A ênfase dada às habilidades perceptivas descuida de aspectos

que, para nós, são fundamentais: a competência lingüística da criança; suas

capacidades cognoscitivas” (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999, p. 23).

Embora, muitos sejam contrários as práticas pedagógicas de

alfabetização calcadas nos métodos (sintético, analítico e misto), por estarem

ligados a técnicas que visam a aquisição de habilidades (pré-requisitos para a

alfabetização), seria ingenuidade acreditar que se pode alfabetizar baseada no

senso comum. Devemos ressignificar o conceito de método, que durante

muitos anos esteve associado a técnicas, tornando-o sinônimo da práxis

organizada do professor para alcançar um objetivo, pois se o método não tiver

respaldo em alguma teoria corre o risco de perder o sentido.

Sabemos que as crianças não se alfabetizam sozinhas, elas necessitam

de um ensino sistematizado, cabendo, então, ao professor através de sua

práxis, auxiliar seus alunos nesta sistematização de conhecimentos, propondo

atividades desafiadoras nas quais suas hipóteses serão testadas e

confrontadas, promovendo o seu avanço conceitual. As atividades

descontextualizadas e mecânicas (cobrir pontilhados, ditado, etc.) torna a ação

pedagógica do professor pouco criativa e não favorece o efetivo

desenvolvimento conceitual de seu aluno, já que subestima a sua capacidade

intelectual.

1.3 - O USO DAS CARTILHAS NA ALFABETIZAÇÃO

Durante muito tempo as cartilhas foram consideradas as “estrelas” das

classes de alfabetização, erroneamente alcançaram o patamar de método de

alfabetizar e renderam milhões ao mercado editorial. As cartilhas são

instrumentos pautados em métodos de ensino, pois suas atividades estão

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vinculadas a aquisição de habilidades sejam elas: coordenação-motora fina,

lateralidade, direcionalidade, associação, seqüências e etc.

“A cartilha tem sua origem ligada aos silabários do século

XIX. As cartilhas brasileiras têm suas origens históricas

em Portugal e foram trazidas através dos jesuítas nos

primórdios da educação. Por volta do final do século XV,

Portugal utilizava nas escolas cartinhas que,

posteriormente, foram chamadas de cartilhas. Eram

pequenos livros que reuniam o abecedário, o silabário e

rudimentos de catecismo. As décadas de 10, 20 e 30

trazem ao cenário educacional várias cartilhas

fundamentadas pelos métodos” (CESCA, 2002, p. 8).

Como o método não era questionado, as cartilhas, suas representantes,

também não poderiam ser. Caso o aluno não aprendesse a culpa não era

vinculada a ela, já que é um método, nem ao professor porque seguiu

corretamente todas as instruções dos manuais (livro do professor) e, é claro a

culpa recaía na criança, pois se deixou de aprender foi porque estava

desatenta, era imatura, pobre ou disléxica.

São muitos os exemplos de cartilhas descontextualizadas, reducionistas

e fragmentadas que lançam mão de técnicas intrinsecamente ligadas a

aquisição de habilidades perceptuais que visam a “prontidão para

alfabetização”.

FONTE: Aventuras em Alfabetização 1C p. 5 - Waldir Lima Editora LTDA.

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FONTE: A Escola é Nossa,

1ª série, p. 209. Scipione

Hoje, ainda encontramos em nossas salas de aula, professores que

voltam suas práticas pedagógicas estritamente para o uso de cartilhas,

limitando assim a sua contribuição/ação como mediador do processo de

construção da leitura e da escrita. Estando mais preocupados com qual cartilha

trabalhar, deixam de lado duas questões, ao meu ver, fundamentais que são:

como os meus alunos aprendem e, como trabalhar com crianças que estão na

fase inicial do processo de alfabetização de maneira que favoreça a sua

aprendizagem.

Em algumas localidades, as cartilhas são o único material impresso que

algumas crianças têm contato, dependendo da condição econômica, por isso

não devemos negar a essas crianças o acesso a elas. Mas, cabe ao professor

redimensionar/ressignificar suas práticas pedagógicas de maneira que possa

contribuir significativamente para a construção de um aluno crítico, reflexivo e

que seja intelectualmente ativo no seu processo de aprendizagem. E

pretendendo trabalhar com cartilhas de maneira contextualizada e significativa

para seus alunos, o professor deve pesquisar uma cartilha que mais se

aproxime das vivências de seus alunos, ou seja, o professor-pesquisador deve

se perguntar: “De que maneira o uso de tal cartilha pode contribuir para a

aprendizagem efetiva de meus alunos?”, não devendo torná-la um método, e

sim um instrumento como um outro qualquer que pode ser usado de forma

criativa, crítica.

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“Cartilhas usadas podem servir para o aluno montar uma

outra (...), optando por palavras significativas e desenhos

esclarecedores para ele. Esse tipo de atividade com

cartilhas usadas inibe o processo automático...” (RUSSO;

VIAN, 1999, p. 23).

Como mencionado anteriormente, o uso das cartilhas muitas vezes limita

a escrita, pois as crianças procuram, talvez por medo de errar, escrever

palavras que já foram treinadas na cartilha, inibindo assim, a construção e o

confronto de suas hipóteses. O uso indiscriminado das cartilhas pode vir a

dificultar o trabalho do professor que não consegue identificar em que nível de

conceitualização da leitura e da escrita as hipóteses de seu aluno se

encontram. Neste sentido, acaba por não contribuir de maneira significativa

com o avanço do desenvolvimento conceitual de seu aluno, pois deixa de

propor atividades desafiadoras, que o leve aos conflitos cognitivos promovendo

o avanço rumo a conquista da base alfabética da escrita.

Dentro desta perspectiva despontam o trabalho experimental de Emilia

Ferreiro e Ana Teberosky, que pautando-se na teoria psicogenética de Jean

Piaget, procuram explicar os processos (caminhos) pelo quais a criança passa

até alcançar compreensão da leitura e da escrita. Afirmam que:

“O sujeito que conhecemos através da teoria de Piaget é

aquele que procura ativamente compreender o mundo

que o rodeia e trata de resolver as interrogações que este

mundo provoca. Não é um sujeito que espera que alguém

que possui um conhecimento o transmita a ele por ato de

benevolência. É um sujeito que aprende basicamente

através de suas próprias ações sobre os objetos do

mundo e que constrói suas próprias categorias de

pensamento ao mesmo tempo em que organiza seu

mundo” (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999, p. 29).

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CAPÍTULO 2

CONHECENDO A PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

Emilia Ferreiro, Ana Teberosky e seus colaboradores fizeram um

trabalho experimental (situações experimentais utilizando o “Método de

Indagação” inspirado no “Método Clinico ou de Exploração Crítica”3 próprios

dos estudos piagetianos), em Buenos Aires, nos anos de 1974, 1975 e 1976

em escolas e jardins de infância. As pesquisas realizadas por Emilia Ferreiro

“tratam da aplicação da teoria psicogenética de Piaget e dos conceitos da

psicolingüística contemporânea na compreensão dos processos de aquisição

de conhecimento e [em particular] da língua escrita” (ELIAS, 2000, p. 162).

Os princípios básicos que guiaram a pesquisa experimental de Ferreiro e

Teberosky (1999) são três:

1. Não identificar leitura com decifrado – não entender que a leitura é a

decodificação do escrito em sons, implicando na ausência de

significado.

2. Não identificar escrita com cópia de um modelo – a escrita não deve ser

reduzida exclusivamente a cópias como se fosse um objeto alheio a

capacidade de compreensão do sujeito.

3. Não identificar progressos na conceitualização com avanços no

decifrado ou exatidão da cópia - este terceiro princípio é conseqüência

dos dois primeiros, ou seja, torna-se inevitável entendermos que a

escrita como objeto social requer uma atuação ativa do sujeito

aprendente (independente deste estar ou não recebendo o ensino

formal).

3 “O método piagetiano de exploração das noções infantis consiste em um diálogo no qual o experimentador elabora hipóteses sobre as razões do pensamento da criança, provoca perguntas e cria situações para testar, no próprio momento, suas hipóteses” (FERREIRO, 1999, p. 12).

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A partir da publicação das pesquisas - em língua espanhola: Los

sistemas de escritura em el desarrollo del nino, e em português (primeira

edição data de 1986): Psicogênese da língua escrita – o foco da alfabetização

inicial até então centrado no como se deve ensinar (métodos de ensino) foi

revisto e a questão passou do como se ensina para como se aprende, ou seja,

o aluno passa a ser visto como um “sujeito cognoscente” – pensante que

constrói e reconstrói o real para poder apropriar-se dele.

A pesquisa vai de encontro aos conceitos tradicionais sobre a

aprendizagem da leitura e da escrita, assim sendo, questiona o erro (usado

como critério de classificação e exclusão), as cartilhas (exercícios

preparatórios) e os pré-requisitos para a alfabetização que entendem a

lectoescrita como uma técnica (codificação/decodificação), com valor em si e

que deve ser aprendida na escola.

“A escola (como instituição) se converteu em guardiã

desse objeto social que é a língua escrita e solicita do

sujeito em processo de aprendizagem uma atitude de

respeito cego diante desse objeto, que não se propõe

como um objeto sobre o qual se pode atuar, mas como

um objeto para ser contemplado e reproduzido fielmente,

sem modificá-lo” (FERREIRO, 2001a, p. 21).

Ferreiro não vê a escrita como um produto estritamente escolar, mas sim

como um objeto social, cultural e histórico - considera que a aquisição da

leitura e da escrita é de natureza conceitual e não requer o desenvolvimento de

habilidades perceptivo-motoras, com isso ela inova qualitativamente o campo

da alfabetização, pois traz o conceito da Hipótese Silábica que acontece

quando a criança estabelece que cada letra vale por uma sílaba.

Na sua obra intitulada “Com todas as letras” (2001a, p. 29-30), a autora

traça um paralelo entre a aquisição da linguagem oral e da linguagem escrita

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para que possamos perceber o quanto é arbitrário o estabelecimento de pré-

requisitos pra a alfabetização, ou seja, diz que ninguém nega a uma criança

que está começando a falar informações lingüísticas, referindo-se, a mãe que

canta e conversa com seu filho independente de seu entendimento; e às

pessoas que conversam perto e com as crianças sem omitir fonemas. Nesta

linha de raciocínio, significa que é dada a esta criança condições de interação

com a linguagem oral, ninguém a manda calar-se por não entender o que ela

está falando ou só a permitem falar quando pronunciar corretamente todos os

sons pelo contrário há um grande incentivo por parte de todos que a rodeiam,

fazem perguntas e tentam entendê-la. No caso da aquisição da escrita ocorre

exatamente o oposto, ou seja, quando a criança começa a sua tentativa de

escrever, logo é desqualificada, ninguém tenta entender o que ela quis

escrever, enxergam um amontoado de garatujas4 e não a incentivam – às

vezes por considerar que é somente após receber a instrução formal que

estará apta a escrever ou por que se afastou do método adotado pelo

professor.

Segundo Ferreiro (2001a), o problema dos pré-requisitos para a

aprendizagem da leitura e da escrita compreende:

“Os pré-requisitos como problema escolar, estabelecem

barreiras: os sujeitos devem ter habilidades definidas

como requisitos prévios para poderem ter acesso a certos

conteúdos. Estas habilidades estão vinculadas a

maturação. Os pré-requisitos como problema teórico: em

uma visão psicológica elementarista, os pré-requisitos

seriam a busca de habilidades e destrezas – avaliados

pelo professor; em uma perspectiva construtivista, os pré-

requisitos seriam aquelas noções, representações,

conceitos, operações, relações, etc., que aparecem

4 Ferreiro (2001b) entende que as garatujas são tentativas das crianças no sentido de estarem compreendendo o sistema de escrita, considerando-as escritas reais impregnadas de ações cognitivas.

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teoricamente fundamentadas e empiricamente validadas

como as condições iniciais sobre as quais se constroem

novas concepções” (id., p. 61).

Do ponto de vista construtivista os pré-requisitos seriam antecessores de

qualquer conhecimento que devem ser estabelecidos, mas não tem relação

somente com o ensinado formalmente e sim com conhecimentos construídos e

reconstruídos pelo sujeito em interação com o objeto de conhecimento, neste

caso a língua escrita.

Em suma, Ferreiro e Teberosky vêem a escrita como um sistema de

representação da linguagem que não pode ser apresentado às crianças como

um objeto descontextualizado e sem significado.

A escola como instituição deveria possibilitar a interação das crianças

com a diversidade de materiais escritos, considerando também suas vivências,

não as vendo como sujeitos passivos e vazios “as crianças são facilmente

alfabetizáveis; foram os adultos que dificultaram o processo de alfabetização

delas” (id., p. 17).

Nas diferentes situações experimentais, Ferreiro observou atentamente

as elaborações das crianças frente aos sinais gráficos, percebendo que estas

elaborações não são impostas pelos adultos ou pelo meio e sim elaboradas por

um sujeito intelectualmente ativo. “Desde aproximadamente os quatro anos, as

crianças possuem sólidos critérios para admitir que uma marca gráfica possa

ou não ser lida, antes de serem capazes de ler os textos apresentados”

(FERREIRO, 2001b, p. 45).

2.1 - A PSICOGÊNESE E A CRIANÇA

Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1999) fizeram as pesquisas

experimentais com crianças na faixa etária de 4 (quatro) à 6 (seis) anos. Entre

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as suas descobertas estão: algumas crianças confundiam imagem e texto, não

os diferenciavam sendo o texto amplamente “predizível a partir da imagem” ou

então, o texto seria a etiqueta do desenho; a quantidade estabelecida pelas

crianças para que a escrita possa ser lida é no mínimo três caracteres e a

variedade diz respeito a não repetição dos caracteres, mesmo que haja número

suficiente de caracteres, o escrito não poderá ser lido se os caracteres forem

iguais, nestes casos as letras não são percebidas pelas crianças como objetos

substitutos, que tem a função de representar outro objeto.

Assim sendo, as crianças neste momento estão buscando meios de

diferenciar uma escrita da outra (não há estabilidade), já que a quantidade

mínima é fixa, busca-se a diferenciação através da variedade. Este esforço de

diferenciação não deve ser desconsiderado, pois neste momento as crianças

estão testando suas hipóteses, ou seja, interagindo com as marcas gráficas.

Nesse processo de desenvolvimento sobre a escrita e a leitura há

também um momento em que as crianças acreditam que somente os

substantivos estão escritos: nomes e objetos. A leitura é feita somente a partir

dos substantivos. No momento seguinte admitem que os substantivos e os

verbos estejam escritos, desconsideram as preposições e os artigos, por estes

terem menos de três letras e de acordo com a hipótese da quantidade mínima

de caracteres não podem ser lidos. Como a apropriação da linguagem escrita é

processual e conceitual a criança evolui e começa a considerar que todos os

elementos estejam escritos no texto, superando suas hipóteses anteriores

(FERREIRO; TEBEROSKY, 1999).

Por considerar o sujeito intelectualmente ativo, as pesquisadoras

consideram que o “método (enquanto ação específica do meio) pode ajudar ou

frear, facilitar ou dificultar; porém, não pode criar aprendizagem” (FERREIRO,

1999, p. 31). Sendo a cartilha uma representante dos métodos tradicionais de

alfabetização, Emilia Ferreiro tece uma crítica ferrenha a este material. Para a

pesquisadora as cartilhas ou manuais de alfabetização são extremamente

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desnecessários, pois não contribuem em nada para o desenvolvimento

intelectual e conceitual da criança no que tange a leitura e a escrita.

“Nesses manuais apresentam-se orações estereotipadas,

impossíveis de encontrar em textos com função

comunicativa, informativa ou puramente estética: ‘minha

mãe me ama’, ‘o boi baba’, ‘o dedo do Dudu dói’ são

pseudos-enunciados que só existem nos manuais

escolares que não comunicam nada, que não informam a

cerca de nada e que as crianças devem aceitar sem

perguntar o que quer dizer” (FERREIRO, 2001a, p. 34).

Sendo assim, Ferreiro argumenta que tais cartilhas ou manuais, inibem e

dificultam a apropriação da criança frente a linguagem escrita, por ser um

material rígido, com instruções pré-programadas e que não dialogam com a

criança, ou seja, trata-se de uma seqüência de atividades estabelecidas pelos

autores e que não vai ao encontro do nível intelectual do seu principal

interlocutor, a criança.

O ensino baseado nas cartilhas acaba por inibir a escrita espontânea

das crianças, pois associa a alfabetização inicial a treinos, cópias e

associações, não dando chances para que a criança elabore e teste suas

hipóteses. A cartilha controla a escrita, ou seja, a criança deixa de tentar

escrever uma palavra que ainda não foi trabalhada/treinada (SOARES, 2001).

Cabe salientar que quando permitimos que a criança se expresse

livremente através da escrita, ela estará nos fornecendo um material

riquíssimo, no qual poderemos observar em que nível de conhecimento ela se

encontra, o que já alcançou e o que ainda falta alcançar. Conceder à criança a

liberdade de expressar suas idéias, sentimentos, emoções, desejos,

frustrações, etc., através da linguagem escrita é permitir que ela se sinta a

autora de seu texto e que este esteja impregnado de significados e

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significações para ela e, esta liberdade de expressão não pode ser confundida

com exercícios do tipo “forme frases”, onde através de uma seqüência

ordenada de desenhos a criança treinará as palavras que foram extraídas das

cartilhas. O que devemos buscar é uma maior interação da criança com o

material escrito (textos variados – jornais, revistas, livros em geral, receitas,

cartas, dicionários, etc.) e não pedir que escrevam frases soltas, fragmentadas

e sem sentido utilizando “palavrinhas” conhecidas.

Exaltar a importância da “escrita espontânea” não quer dizer que as

crianças não tenham que aprender os aspectos formais da língua escrita, pelo

contrário, é importante que “a criança se submeta a regulamentação que a

ortografia impõe ao uso dos símbolos, que aprenda convenções ortográficas e

escreva de acordo com elas” (SOARES, 2001, p. 65). Neste contexto, as

concepções tradicionais de alfabetização precisam ser revistas, pois seus

métodos de ensino não consideram a criança como sujeito do seu processo de

ensino-aprendizagem.

Ferreiro constatou que a escrita do próprio nome é uma das peças

fundamentais da alfabetização inicial. A pesquisadora afirma que deve ser

permitido a criança “o acesso o quanto antes possível à escrita do próprio

nome” (FERREIRO, 2001a, p. 46)., pois além de ser um elemento significativo,

o nome causa grandes conflitos cognitivos, por se tratar de um modelo de

escrita estável, se até então qualquer letra poderia representar cada som, na

escrita do nome próprio esta generalização não será apropriada, a criança ao

representar o seu nome graficamente, após a emissão, perceberá que faltam

letras, ou que há letras a mais (hipótese da quantidade de caracteres):

MAR CE LO AN DRÉ

A E O A E

Na escrita de Marcelo a quantidade estabelecida (mínimo três) estaria

coerente, mas na escrita de André a criança entraria em conflito, pois duas

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letras não podem ser lidas, o que levaria a criança a agrupar mais uma letra ao

escrito, assim sendo não reconheceriam nas suas representações feitas a

partir de suas hipóteses o protótipo convencional de seus nomes.

Outros conflitos poderão ocorrer a partir da escrita do próprio nome: a

ordem (porque as letras devem seguir sempre a mesma ordem?); a inicial

(como que crianças que tem a mesma inicial não têm o mesmo nome?); o

tamanho (se a criança associar características físicas ao nome), etc.

“Fora de uma estimulação do tipo escolar específica, e na

ausência de uma pauta cultural incitadora [as crianças],

chegam à escola de ensino fundamental não-semente

sem saber escrever seu nome, mas também sem possuir

formas gráficas estáveis” (FERREIRO, 1999, p. 224).

Ferreiro (1999) observou, quanto a escrita do próprio nome, que em um

primeiro momento à criança utiliza caracteres indefinidos e variados

(obedecendo a quantidade mínima) e que também se pode ler além do seu

nome, o seu sobrenome numa única escrita – escrita global; depois a criança

descobre que é possível fazer uma correspondência termo a termo de cada

letra do seu nome e uma parte do seu nome completo; neste momento, a

criança limita-se ao nome e exclui o sobrenome e começa então, a utilizar a

hipótese silábica do nome próprio (dando início ao conflito forma fixa X

hipótese silábica); em seguida mistura as leituras da hipótese silábica e o início

do alfabético; finalmente, generaliza-se o nível alfabético – o nome não oferece

dificuldades, as questões centram-se agora no nível ortográfico.

A hipótese silábica é o motor que impulsiona a criança a ir além. Quando

a criança conhece uma palavra estável e utilizando-se da hipótese silábica para

escrevê-la percebe que não está de acordo com o escrito original, ocorrem

conflitos cognitivos, ou seja, a criança vai em busca de explicações plausíveis

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que reformulem seus conhecimentos prévios sobre o escrito, assim ela

reconstrói suas hipóteses e novas construções se generalizam gradativamente.

A atribuição de uma letra para cada sílaba – Hipótese Silábica – não é

resultado de um repasse do adulto para as crianças, e sim, resultante de uma

construção interna, onde a criança está procurando coordenar o valor sonoro

do todo as partes (FERREIRO, 2001b).

“Portanto, o fato de que se possa chegar até a hipótese

silábica, apesar do meio, não indica que se possa, seguir

progredindo sem ter novas informações cada vez mais

dependentes do meio – para processar” (FERREIRO,

1999, p. 235).

Quando consideramos as hipóteses das crianças, deixamos de avaliá-la

quantitativamente e passamos a enxergar o seu processo de alfabetização

inicial de modo qualitativo. Assim, as classificações, as discriminações e as

penalizações oriundas dos métodos tradicionais de ensino tendem a serem

superadas.

“Em língua escrita todas as metodologias tradicionais

penalizam continuamente o erro, supondo que só se

aprende através da reprodução correta, e que é melhor

não tentar escrever, nem ler, se não se está em

condições de evitar o erro. A conseqüência inevitável é a

inibição: as crianças não tentam ler nem escrever e,

portanto, não aprendem” (FERREIRO, 2001a, p. 31).

Antes da Psicogênese quando as crianças omitiam uma ou outra letra

(relação parte-todo) de suas escritas, eram vistas como incapazes, imaturas e

que tinham dificuldades de aprendizagem. As escritas iniciais feitas de maneira

espontânea eram desconsideradas e subjugadas, pois não havia espaço para

a construção e sim para a memorização e a repetição. Neste contexto de

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desqualificação da escrita infantil, o erro acabava se tornando um elemento a

mais para reforçar o preconceito, os rótulos e a baixa alto-estima das crianças

que não se sentiam aptas a escrever.

A partir da Psicogênese os erros na fase de alfabetização passaram a

ser vistos como respostas construídas pelas crianças, não de forma errônea,

mas que permitiriam a evolução de seus conhecimentos rumo a novas

conquistas – Erros Construtivos.

“Em uma visão construtivista o que interessa é a lógica do

erro: trata-se às vezes de idéias que não são erradas em

si mesmas, mas aparecem como errôneas porque são

sobregeneralizadas, sendo pertinentes apenas em alguns

casos, ou de idéias que necessitam ser diferenciadas ou

coordenadas, ou, às vezes, idéias que geram conflitos,

que por sua vez desempenham papel de primeira

importância na evolução” (id., p. 82-83).

Quando os erros são penalizados sem o entendimento de sua lógica,

deixa-se de observar como as crianças evoluem no seu processo de

apropriação da linguagem escrita. Esse processo de cunho evolutivo e

dinâmico não ocorre de maneira linear, abstrata e imediata, mas, envolve

construção, retrocesso e reconstruções constantes do conhecimento,

permitindo inúmeros avanços conceituais.

Em Psicogênese da Língua Escrita (1999), Ferreiro e Teberosky,

descrevem as etapas da evolução conceitual da escrita nas crianças, que são:

Nível 1 – Hipótese Pré-Silábica

Para a criança neste nível: “escrever é reproduzir os traços típicos de

escrita que a criança identifica como a forma básica da mesma” (p. 193).

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· A escrita não se utiliza de grafias convencionais (garatujas ou

pseudoletras);

· As escritas se assemelham entre si – não funcionam como veículo de

informação;

· A criança tenta a correspondência figurativa entre escrita e o objeto

referido - associam escrita com algumas características do objeto;

· Apresenta dificuldade momentânea de diferenciar escrever e desenhar;

· As grafias são variadas e a quantidade é constante – cada letra vale

pelo todo;

· Leitura do escrito é sempre global e individual – somente ela sabe o que

quis escrever.

Nível 2 – Intermediário I

Neste nível a criança considera que: “para ler coisas diferentes (isto é,

atribuir significados diferentes), deve haver uma diferença objetiva nas escritas”

(p. 202).

· A forma de grafismo é mais definida mais próxima às letras;

· Segue-se trabalhando com a hipótese de que falta uma certa quantidade

mínima de grafismos para escrever algo com a hipótese de variedade

nos grafismos;

· A diferença de significação se dá por meio de variações de posição de

ordem linear - usa as permutas linear para expressar diferenças de

significados, mantendo constante a quantidade e a exigência de

variedade;

· Problemas gerais de classificação e ordenação;

· Aquisição de formas fixas de escrita relacionadas com contingências

culturais e pessoais (estas não são usadas para produzir diferenças

objetivas na escrita, mas simplesmente para garantir o significado

diferente para escritos idênticos);

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· Bloqueio para responder ao seguinte raciocínio: se aprende a escrever,

copiando a escrita de outros, na ausência do modelo, não há

possibilidade de escrita;

· Leitura global.

Nível 3 – Hipótese Silábica

Neste nível a criança está na tentativa de: “dar um valor sonoro a cada

uma das letras que compõe uma escrita” (p. 209).

· Surgimento da hipótese silábica (cada letra vale uma sílaba) que é uma

construção original da criança;

· Mudança qualitativa – supera a etapa de uma correspondência global

entre a forma escrita e a expressão oral atribuída, para passar a uma

correspondência entre partes do texto (cada letra) e partes da expressão

oral (recorte silábico do nome);

· A criança pela primeira vez trabalha com a hipótese que a escrita

representa partes sonoras da fala;

· Escrita de letras com ou sem valor sonoro convencional;

· Conflito cognitivo entre a quantidade mínima de caracteres e a hipótese

silábica;

· Esses conflitos obrigam a criança a abandonar progressivamente a

hipótese em favor de uma análise fonética mais exaustiva da palavra.

Nível 4 – Silábico-Alfabética

Neste nível é fundamental para a evolução:

“A criança abandona a hipótese silábica e descobre a

necessidade de fazer uma análise que vá ‘mais além’ da

sílaba pelo conflito entre a hipótese silábica e a exigência

da quantidade mínima de grafias e o conflito entre as

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formas gráficas que o meio lhe propõe e a leitura dessas

formas em termos de hipótese silábica” (p. 214).

· O conflito entre a hipótese silábica e a quantidade mínima de caracteres

torna-se mais evidente na escrita de nomes para ao quais as crianças

não tem uma imagem visual estável;

· Escritas diferenciadas;

· Mistura da hipótese silábica e de um começo alfabético;

· Procura de uma correspondência satisfatória.

Nível 5 – Alfabético

Neste nível: “a criança se defrontará com as dificuldades próprias da

ortografia, mas não terá problemas de escrita no sentido estrito” (p. 219).

· A leitura das partes do nome não oferece já nenhuma dificuldade;

· Compreensão que cada um dos caracteres da escrita corresponde a

valores sonoros menores que a sílaba (devem escrever tantas grafias

quantos fonemas tenha a palavra);

· Análise sonora sistemática dos fonemas das palavras que vai escrever;

· Este nível constitui o final da evolução, pois a criança já compreende o

modo de construção do código;

· A escrita e a leitura do nome próprio operam sobre os princípios

alfabéticos.

Os níveis de conceitualização explicitados por Emilia Ferreiro,

constituem os processos de evolução que a criança percorre para que se

aproprie significativamente da linguagem escrita, esta entendida como um

processo de representação da linguagem e não meramente como a transcrição

da língua oral, em que se estabelecem relações de codificação (fonemas-

grafemas) e decodificação (grafemas-fonemas). Assim sendo, para que a

criança possa percorrer e construir as sua conceitualizações a respeito da

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língua escrita de forma significativa se faz necessário sua inserção em um

ambiente alfabetizador.

Muito se tem falado da inserção da criança no universo da leitura e da

escrita e que muito antes dela entrar na escola ela já mantém contato com

materiais de leitura e escrita através de outdoors, cartazes, quando alguém lê

uma história, bilhetes, cartas, anotações de recados, etc. Mas, será que todas

as crianças têm contato com estes materiais? Será que são de fácil acesso

para as crianças, de maneira que facilite a sua manipulação e interesse? É

certo que as crianças devem ser desafiadas e estimuladas a manusear e a

interagir com diversos materiais gráficos, não ficando somente restritas a

cartilhas e outros materiais didáticos. No ensino formal, as escolas e os

professores devem oferecer aos alunos condições de estarem em contato com

uma diversidade de materiais gráficos, mas não quaisquer materiais, estes

devem ter qualidade e ser relevantes para a criança.

O ambiente alfabetizador por si só não constrói conhecimentos, faz-se

importante presença do professor-mediador, aquele que irá sistematizar este

conhecimento através de um ensino intencional, organizado e contextualizado,

oferecendo materiais variados e propondo atividades significativas,

desafiadoras e produtivas, convidando o aluno a perceber e a construir a leitura

e a escrita. A escola cabe organizar tempo e espaço para que a criança

adquira/construa conhecimentos novos acerca da leitura e da escrita. Assim, o

ambiente da sala de aula deve ser um local rico de significações para as

crianças, local onde suas produções sejam consideradas e respeitadas. Cabe

ressaltar, que ambiente alfabetizador não quer dizer ter uma escola ou sala de

aula abarrotada de cartazes e de murais, muitas vezes ultrapassados e sem

sentido para as crianças e, que somente causam poluição visual.

“Ambiente material permite à criança aprender que os

objetos escritos têm a intenção comunicativa e põe à

prova suas hipóteses, e que sem hipóteses a comprovar,

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o ambiente material não é significativo. (...) A presença do

material real permite que a criança interaja e aprenda com

ele” (TEBEROSKY, 2003, p.112).

O ambiente deve favorecer a aprendizagem da criança e, é o professor o

responsável por organizar as atividades desafiadoras que levem as crianças a

elaborarem as suas próprias idéias acerca da leitura e da escrita. O professor

deve orientar e conduzir a criança rumo às explorações, as descobertas e as

conceitualizações – ajudando a criança a compreender a escrita como um

objeto social, histórico e cultural e não como uma técnica onde prevalece a

automatização e a produção de significantes sem significados.

“Além disso, é preciso que a professora compreenda o

processo lingüístico e psicolingüístico de aprendizagem

da língua escrita, compreensão que, associada a seu

conhecimento das relações entre o sistema fonológico e o

sistema ortográfico, permitirá que ela dirija e oriente com

segurança os ensaios de escrita da criança, que ela saiba

identificar em que estágio do processo de apropriação do

sistema a criança se encontra, saiba interpretar as

hipóteses com que a criança está operando, saiba

selecionar e organizar dados, decidindo que aspectos

devem ser trabalhados no estágio em que a criança se

encontra, saiba levá-la a confrontar essas hipóteses com

as convenções e regras do sistema, e, a partir de tudo

isso, conduza a criança à escrita ortográfica” (SOARES,

2001, p. 72).

2.2 - A PSICOGÊNESE E O PROFESSOR

A psicogênese trouxe inovações e reeducou o olhar que tínhamos sobre

a criança que está sendo alfabetizada, se antes nos limitávamos a olhá-la

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como um sujeito passivo que recebe informações prontas hoje, ressignificamos

o nosso olhar e a vemos como um sujeito ativo que necessita estar em

constante interação com o objeto do conhecimento para que possa construir e

testar suas hipóteses de maneira que se aproprie conceitualmente do objeto a

conhecer.

Mas, que papel cabe ao professor nesse processo, no qual a criança é o

centro? Como o professor pode ajudar a criança a prosseguir rumo a novas

conquistas conceituais? Será que o professor deve ser um mero observador

que deixa a criança de maneira espontânea se aproximar e interagir com os

materiais gráficos?

São tantas as questões que povoam a mente do professor que ele

acaba, talvez por medo ou insegurança perante o “novo” se esquivando, não

revendo suas práticas e não reeducando o seu olhar...

Cabe esclarecer que Emília Ferreiro com seus estudos sobre a

Psicogênese da Língua Escrita, não criou um método de alfabetizar, mas

trouxe contribuições fundamentais para que possamos entender os caminhos

percorridos pelas crianças rumo a conquista da escrita alfabética. Alguns

professores referem-se a Ferreiro como criadora de um método de

alfabetização e utilizam erroneamente os resultados de suas pesquisas.

Amiúde, utilizam as etapas da evolução conceitual da escrita nas crianças

como forma de classificação (o que acarreta uma seleção na sala de aula) e os

erros construtivos ao invés de serem vistos como uma maneira de evidenciar

como a criança constrói seus conhecimentos, acabam sendo ignorados e são

“corrigidos” somente para mostrar que a criança errou. Neste sentido o

professor acaba dando continuidade a visão fragmentada e mecanizada de

alfabetização, pois:

“As hipóteses que a criança constrói sobre a escrita são

atropeladas pela ‘lógica’ do método. O processo de

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construção do conhecimento que a criança vem

processando para entender a escrita é desrespeitado

(senão negado). A lógica da criança é subordinada à

escrita ortográfica, nem sempre lógica. Neste descaminho

o que era linguagem se reduz à visão redutora e

deturpada de ‘língua’, onde os signos se esvaziam de

sentido, transformando-os em meros segmentos fônicos

destituídos de significação” (ZACCUR, 2001b, p. 22).

No sentido amplo o papel do professor não é o de transmissor de

conhecimentos prontos, nem o de classificador e muito menos o de mero

observador. Cabe a ele o papel fundamental de mediar o processo de

construção da criança: estimulando a criança a expressar-se graficamente;

acompanhando o seu processo de desenvolvimento até a tomada de

consciência frente a língua escrita; compreendendo o processo de elaboração

e reelaboração das hipóteses infantis; confiando na capacidade intelectual da

criança; oferecendo materiais gráficos variados possibilitando a interação da

criança com diversos tipos de textos. Em suma, o professor raciocinando junto

com a criança pode conduzi-la rumo a novas conquistas. O Professor é quem

vai desafiar, provocar e propor atividades reais que levem a criança a avançar

em suas conceitualizações. Alguém que intencionalmente organiza, sistematiza

e interage com a criança possibilitando que ela se aproprie de maneira

significativa da linguagem escrita.

Os métodos tradicionais de ensino acabam por aprisionar as práticas do

professor que preocupa-se mais com as metodologias de ensino do que com a

maneira que a criança aprende e constrói conhecimentos. O professor precisa

resgatar a sua autonomia, precisa caminhar junto à criança, pois a criança não

só aprende, mas, também ensina e, o professor quando assume o papel de

interlocutor descobre que a criança é capaz de lhe proporcionar vivências

riquíssimas carregadas de sentido, porque não são passivas/vazias e, sim

inteligentes e criativas.

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Ao propor atividades de cópias de modelos, o professor não está

contribuindo para o avanço das crianças, está apenas controlando a escrita da

criança, tornando-a mecânica e descontextualizada. As crianças, por serem

inteligentes, acabam entendendo a lógica de tais atividades e as fazem de

maneira “correta”, o que necessariamente não implica na construção de

conhecimentos – a criança está somente reproduzindo modelos, o que acaba

por impedir a elaboração e a construção de suas hipóteses. Suas construções

são silenciadas por movimentos automatizados, onde o erro e as hipóteses não

podem coabitar.

O professor deve proporcionar a criança a interação e o pensar sobre a

escrita propondo atividades com sentido e que levem a criança a raciocinar

sobre suas ações.

“O conhecimento é construído através de um processo

caracterizado pela busca, pelo confronto de

possibilidades, certezas e incertezas. Na apropriação da

linguagem escrita, a criança formula hipóteses, confronta-

as, confirmando-as ou não, nas situações de interação e

interlocução com os seus colegas, sua professora e o

meio social mais amplo” (SAMPAIO, 2001, p. 34).

O diálogo, a interação e a interlocução devem ser a base da prática

pedagógica. As práticas que trazem subjacentes a homogeneização e a

estagnação impedem/retardam o avanço da criança e acabam menosprezando

suas produções.

“A correção feita no trabalho da criança não pode ajudá-la

a compreender o que ainda não sabe e avançar no

sentido de ampliar seus conhecimentos. (...) Não é dada

qualquer indicação sobre qual seria a resposta ‘correta’ ou

o que era esperado da criança para que pudesse ‘acertar’

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o exercício proposto. A produção da criança é

desvalorizada e não apresentam elementos que possam

ajudá-la no processo de construção de novos

conhecimentos” (ESTEBÁN, 2001, p. 49).

A escrita precisa ser entendida como um objeto social de comunicação e

interação e não como um objeto em si (cristalizado e imutável). “A invenção da

escrita foi um processo histórico de construção de um sistema de

representação, não um processo de codificação” (FERREIRO, 2001b, p. 12) e,

o professor como interlocutor privilegiado deve buscar meios de aproximar e

despertar o interesse da criança pela linguagem escrita, mostrando que: “É

possível aproximar-se dela sem medo, porque se pode agir sobre ela,

transformá-la e recriá-la. É precisamente a transformação e a recriação que

permitem uma real apropriação” (FERREIRO, 2001a, p. 47).

Enquanto o professor cristalizar suas práticas, não se assumindo como

um pesquisador, que está sempre buscando alternativas plausíveis para

auxiliar o aluno no seu processo de construção de conhecimento, ele estará

assumindo uma postura tradicional-tecnicista (baseado em técnicas de

alfabetizar), concebendo a aprendizagem como cópia de modelos, tendo por

conseqüência o copiar sem questionar; o escrever sem expressar e o ler sem

compreender – imperando a automatização e não a construção; a

contemplação e não a interação; a aceitação e não a apropriação significativa

da linguagem escrita.

O reeducar do olhar do professor é fundamental e, quando negado

corrobora para perpetuar a sua fragmentação, exclusão e desqualificação

como mediador e pesquisador e a da criança como um ser ativo, porque um

olhar sem perspectivas de mudanças, sem esperança é um olhar vazio que

acaba refletindo práticas que silenciam, que negam e empobrecem o fazer

pedagógico. Quando o professor nega ao aluno a oportunidade de se ver como

construtor de conhecimentos acaba dificultando o seu processo de

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desenvolvimento intelectual, segundo Estebán (2001): “A forma como o

professor recebe e direciona o trabalho da criança tem implicações na

construção do fracasso e do sucesso do aluno” (p. 52). O professor que está

aberto ao diálogo e, o incorpora as suas práticas, torna-se um facilitador do

processo vivido por seu aluno em sala de aula. Neste sentido, a pesquisadora

sentiu a necessidade de adentrar este universo escolar, onde as práticas

pedagógicas precisam ser compreendidas e em alguns casos ressignificadas,

pois elas podem facilitar, retardar ou dificultar a aprendizagem das crianças

que estão na fase inicial do processo de alfabetização.

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CAPÍTULO III

A PSICOPEDAGOGIA

Antes de ressaltar o enfoque preventivo deste trabalho, cabe

contextualizar o termo Psicopedagogia. Assim sendo, estarei abordando,

inicialmente, a constituição da Psicopedagogia e o seu objeto de estudo, tendo

como interlocutora principal a autora Nadia A. Bossa, através de seu livro

intitulado: “A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática”.

Segundo Bossa (2000) a psicopedagogia surgiu de uma demanda: a

compreensão do processo de aprendizagem e não como aplicação da

Psicologia à Pedagogia, pois engloba todos os fatores que influem no processo

de aprendizagem, não somente os psíquicos ou metodológicos. Ainda segundo

a autora, a psicopedagogia encontra-se na busca de uma definição

sistematizada de seu corpo teórico próprio, de sua área de atuação e de seu

objeto de estudo e, para tal busca respaldo em outras áreas como: Psicologia,

Psicanálise, Lingüística, Sociologia, Filosofia, Medicina e Pedagogia. Neste

sentido, a psicopedagogia assume um caráter interdisciplinar, pois ao buscar

conhecimentos em outras áreas “cria seu próprio objeto, condição essencial da

interdisciplinaridade” (p. 17).

É imprescindível que o psicopedagogo faça uso da interdisciplinaridade

em seu trabalho, ou seja, utilize os conhecimentos advindos das diversas áreas

de conhecimento, com o intuito de obter um diagnóstico coerente e seguro,

tendo como resultado uma intervenção ou prevenção psicopedagógica

eficiente. Partindo deste princípio, a psicologia genética contribui para o

entendimento dos processos cognitivos, ou seja, como o sujeito constrói a sua

aprendizagem na interação com o objeto do conhecimento; psicanálise

favorece a compreensão do mundo inconsciente do sujeito epistemofílico; a

lingüística permite a compreensão dos processos de aquisição da linguagem

oral e escrita; a sociologia e a filosofia permitem o entendimento global sobre a

evolução humana numa perspectiva social, histórica e cultural; a pedagogia

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traz as abordagens que constituíram o seu campo teórico a respeito dos

processos de ensino-aprendizagem; a psicologia social fica encarregada da

constituição do sujeito em relação ao meio, seu contexto histórico-cultural;

noções de neurologia permitem que o psicopedagogo possa compreender o

funcionamento dos mecanismos cerebrais e suas disfunções que acabam

prejudicando a aprendizagem.

A psicopedagogia torna-se um campo de atuação com uma gama de

conhecimentos, que se entrelaçam com o objetivo de estudar o processo de

aprendizagem humana, seus padrões normais e patológicos, bem como este

sujeito epistêmico (sujeito do conhecimento) e epistemofílico (sujeito do desejo)

influenciado pelo meio no qual está inserido. Neste sentido, a dificuldade de

aprendizagem passa a ser ressignificada, pois é vista dentro de um contexto

mais amplo, onde perpassam vários fatores.

“Atualmente, a Psicopedagogia trabalha com uma

concepção de aprendizagem, segundo a qual participa

desse processo um equipamento biológico com

disposições afetivas e intelectuais que interferem na

forma de relação do sujeito com o meio, sendo que essas

disposições influenciam e são influenciadas pelas

condições socioculturais do sujeito e do seu meio.

(BOSSA, 2000, p. 22)”.

De acordo com os argumentos expostos, pode-se afirmar que a escuta e

o olhar psicopedagógico devêm estar abertos para este sujeito singular em sua

totalidade indo além das aparências e dos rótulos, pois este é dotado de uma

dimensão orgânica, psíquica, afetiva, cognitiva, social, cultural e histórica.

“O conceito de aprendizagem com o qual trabalha a

Psicopedagogia remete a uma visão de homem como

sujeito ativo num processo de interação com o meio físico

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e social. Neste processo interferem o seu equipamento

biológico, as suas condições afetivo-emocionais e as suas

condições intelectuais. A psicopedagogia entende, ainda,

que essas condições afetivo-emocionais e intelectuais são

geradas no meio familiar e sóciocultural na qual nasce e

vive o sujeito. O produto de tal interação é a

aprendizagem” (id., 2000, p. 75).

3.1 - UM BREVE HISTÓRICO DA PSICOPEDAGOGIA

Segundo Bossa (2000) a Psicopedagogia teve início na Europa, por

volta do século XIX, devido a demanda dos problemas de aprendizagem. Neste

período acreditava-se que tais problemas eram de origem orgânica, ou seja, as

crianças que não aprendiam na escola eram consideradas portadoras de

déficits mentais, sensoriais ou neurológicos, perceptuais, lingüísticos e afetivos.

Em 1946, na França, foram criados os primeiros Centros

Psicopedagógicos, nestes centros eram tratadas crianças com problemas de

aprendizagem ou comportamentais. Embora tivesse como base conhecimentos

advindos da Psicologia, Psicanálise e Pedagogia, os tratamentos oferecidos

eram de cunho médico e pedagógico e visavam a promover a reeducação da

criança e a sua readaptação ao meio familiar e escolar (id., 2000).

No Brasil, como vimos nos capítulos anteriores, as camadas populares

foram excluídas do saber sistematizado durante muito tempo. Mas, no interior

das escolas brasileiras perduram até hoje práticas seletivas, embora invisíveis

ou camufladas, que acabam na maioria das vezes responsabilizando os alunos

pelos seus insucessos escolares. Práticas que geram evasões, reprovações e

repetências que, culminam com o afastamento e com a apatia dos alunos

frente ao nosso sistema de ensino.

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A escola como um espaço privilegiado, que tem por finalidade promover

a socialização do saber sistematizado, na maioria das vezes, permanece

imóvel, continuando a sua tarefa classificatória e excludente, não se

questionando sobre a não aprendizagem ou pela falta de interesse de seus

alunos perante o conteúdo escolar. Enquanto a escola não mudar a sua

postura, não se percebendo responsável por grande parte da aprendizagem

humana, continuará gerando um grande contingente de crianças que

apresentam dificuldades de aprendizagem.

Nesta perspectiva, Moll (2002) explicita três abordagens que embasaram

(embasam) o pensamento dos profissionais de educação por muito tempo e,

que eram adotadas como justificativa para o fracasso escolar das classes

populares no Brasil:

· Abordagem Psicologicista – aponta o fracasso escolar na capacidade

individual de aprender, ou seja, quando o sujeito não aprende, ele é o

único responsável pelo seu insucesso.

· Abordagem Biologicista – relaciona a não-aprendizagem à desnutrição

ou a disfunção biológica (alterações neurológicas).

· Abordagem Culturalista – esta abordagem considera que a não

aprendizagem é conseqüência de um ambiente sócio-cultural

desfavorável.

Muitas dessas abordagens ainda permanecem no interior de nossas

escolas, busca-se no sujeito aprendente a culpa pela sua não-aprendizagem.

Tais abordagens precisam ser superadas, pois enquanto buscamos culpados,

deixamos de investigar outros fatores que influenciam o processo de

aprendizagem e acabamos por patologizar o não-aprender.

“Pensar a escola, à luz da Psicopedagogia, significa

analisar um processo que inclui questões metodológicas,

relacionais e socioculturais, englobando o ponto de vista

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de quem ensina e de quem aprende, abrangendo, (...), a

participação da família e da sociedade” (BOSSA, 2000, p.

91).

Muitos profissionais não satisfeitos, com tais abordagens, partiram em

busca de conhecimentos sobre as dificuldades de aprendizagem. E essa busca

fez com que, no Brasil, surgissem cursos, primeiramente de curta duração,

“esses cursos eram ministrados por profissionais brasileiros com experiência

no atendimento de crianças com dificuldades escolares ou por profissionais

estrangeiros que eram convidados... (Id., 2005). Posteriormente, foram criados

cursos de longa duração. Bossa (2000) afirma que os primeiros cursos de

especialização em psicopedagogia surgiram no final da década de 70:

“Formação de Especialistas em Psicopedagogia, na Clínica Médico-

Pedagógica de Porto Alegre” (p. 52). A função era de complementação dos

estudos de psicólogos e educadores que buscavam explicações acerca dos

problemas de aprendizagem. Mas, antes mesmo da criação do curso (iniciativa

institucional), alguns profissionais já se organizavam em núcleos de estudos e

aprofundamento.

“Os primeiros psicopedagogos eram profissionais da

educação, sensíveis, idealistas que queriam ajudar na

reintegração daqueles que estavam à margem. As

dificuldades para aprender eram atribuídas a inaptidão. O

aprendiz, possivelmente, deveria ser portador de algum

distúrbio que o impedia de aprender como seus demais

pares, as causas estavam depositadas principalmente

nele” (RUBINSTEIN, 2005).

Em 1980 surgiu a Associação de Psicopedagogos do Estado de São

Paulo e posteriormente, 1985, tornou-se A Associação Brasileira de

Psicopedagogia (ABPp). A ABPp é a organização formal da categoria, mesmo

não sendo ainda reconhecida legalmente, promove encontros entre os

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profissionais para que possam trocar experiências, realiza debates,

congressos, cursos, seminários e reflexões acerca do campo de atuação do

profissional da psicopedagogia. Neste caminhar, em 1994, tornou-se essencial

a regulamentação da profissão de psicopedagogo, muitas instituições e

universidades solicitaram a ABPp que desse ênfase a essa questão. Mas, para

que se desse andamento a esse processo, tornou-se imprescindível à

construção de uma identidade própria da psicopedagogia, visto esta ainda não

estar bem definida, pois assim a regulamentação da profissão de

psicopedagogo viria se concretizar.

“Em se avaliando, pois, as dificuldades impostas pela

complexidade do próprio objeto de estudo da

Psicopedagogia, a sua recente existência enquanto área

de estudos, as suas origens teóricas e a questão da

formação no Brasil, constamos que a busca de uma

identidade implica, por este aspecto, um processo árduo”

(BOSSA, 2000, p. 57).

Cabe ressaltar que a psicopedagogia brasileira é influenciada pelo

ideário argentino devido a proximidade e o fácil acesso a sua literatura. Tanto

na Argentina quanto no Brasil a atuação psicopedagógica está ligada a área de

Saúde e Educação. Mas, a psicopedagogia brasileira difere da Argentina no

que diz respeito a formação, ou seja, a formação brasileira ocorre em nível de

pós-graduação lato sensu e a formação Argentina ocorre em nível de

graduação (5 anos); outro aspecto diz respeito a utilização de alguns testes, na

realização do diagnóstico psicopedagógico, pois no Brasil não é permitido ao

psicopedagogo utilizar testes, sendo de uso exclusivo de psicólogos, enquanto

na Argentina o acesso é permitido. Conforme assinalei anteriormente, no

Brasil ainda estamos em busca de uma identidade para a psicopedagogia,

enquanto que na Argentina esta já me parece consolidada.

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A nossa formação merece uma especial atenção por parte da

Associação Brasileira de Psicopedagogia, pois devido a formação em

psicopedagogia acontecer em nível de pós-graduação (lato sensu), é facilitada

a presença de profissionais advindos das diversas áreas de graduação

(terapêutica, letras, assistentes sociais, pedagogos, fonoaudiólogos,

psicólogos, etc), o que pode dificultar a construção da identidade do

psicopedagogo, já que estes profissionais receberam formação baseada em

diferentes teorias de pensamento.

Além da diversidade de profissionais advindos de outras áreas, um outro

fator merece atenção: a metodologia adotada pelo psicopedagogo ao iniciar o

seu processo diagnóstico e a intervenção. É certo que não se pode

homogeneizar a sua forma de atuação, pois esta vai se delineando no

desenrolar do trabalho, já que cada sujeito apresenta um problema

específico/particular e o psicopedagogo atua conforme os seus pressupostos

teóricos e sua auto-percepção profissional. Porém, os psicopedagogos devem

seguir alguns princípios éticos que estão expostos no Código de Ética,

devidamente aprovado pela Associação Brasileira de Psicopedagogia, no ano

de 1996. No artigo 6º, do referido código, constam os deveres fundamentais do

psicopedagogo:

a. Manter-se atualizado quanto aos conhecimentos científicos e técnicos

que tratem do fenômeno da aprendizagem humana.

b. Zelar pelo bom relacionamento com especialistas de outras áreas,

mantendo uma atitude crítica, de abertura e respeito em relação às

diferentes visões de mundo.

c. Assumir somente as responsabilidades para as quais esteja preparado

dentro dos limites da competência psicopedagógica.

d. Colaborar com o progresso da Psicopedagogia.

e. Difundir seus conhecimentos e prestar serviços nas agremiações de

classe sempre que possível.

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f. Responsabilizar-se pelas avaliações feitas, fornecendo ao cliente uma

definição clara do seu diagnóstico.

g. Preservar a identidade, parecer e/ou diagnóstico do cliente nos relatos e

discussões feitos a título de exemplos e estudos de caso.

h. Responsabilizar-se por crítica feita a colegas na ausência destes.

i. Manter atitude de colaboração e solidariedade com colegas sem ser

conivente ou acumpliciar-se, de qualquer forma, com ato ilícito ou calúnia.

j. O respeito e a dignidade na relação profissional são deveres

fundamentais do psicopedagogo para harmonia da classe e manutenção do

conceito público.

Em suma, a psicopedagogia nasceu da necessidade de se compreender

o processo de aprendizagem humana, já que antes tais problemas eram

patologizados. Hoje, a psicopedagogia está constituindo seu corpo teórico, a

sua identidade e ampliando o seu olhar para compreender cada vez mais a

relação do sujeito aprendente com o seu contexto sócio-histórico-cultural.

“Atualmente, a psicopedagogia refere-se a um saber e a

um saber-fazer, às condições subjetivas e relacionais –

em especial familiares e escolares – às inibições, atrasos

e desvios do sujeito ou do grupo a ser diagnosticado. O

conhecimento psicopedagógico não se cristaliza numa

delimitação fixa, nem nos déficits e alterações subjetivas

do aprender, mas avalia a possibilidade do sujeito, a

disponibilidade afetiva de saber e de fazer, reconhecendo

que o saber é próprio do sujeito” (BOSSA, 2000, p. 29).

3.2 - CAMPO DE ATUAÇÃO DA PSICOPEDAGOGIA

PREVENTIVA

De acordo com Scoz (1998 apud Bossa, 2000) o psicopedagogo é um

profissional que identifica e intervem nos processos de aprendizagem

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obstacularizados. O psicopedagogo está habilitado para lidar com as

dificuldades de aprendizagem, um dos fatores de maior pertinência dentro das

escolas brasileiras, que acaba por dificultar o desenvolvimento afetivo-cognitivo

do aluno. “Este profissional detêm um corpo de conhecimentos científicos

oriundos das articulações de várias áreas aliado a uma prática clínica e/ou

institucional que considera a multiplicidade de fatores que interferem na

aprendizagem” (id., p. 73).

No projeto de Lei nº 3.124/97, do Deputado Barbosa Neto, que

regulamenta a profissão do psicopedagogo, consta como suas atribuições:

· Intervir visando a solução dos problemas de aprendizagem tendo como

enfoque o aprendiz ou a instituição de ensino público ou privado.

· Realizar diagnóstico e intervenção psicopedagógica, utilizando métodos,

instrumentos e técnicas próprias da Psicopedagogia.

· Atuar na prevenção dos problemas de aprendizagem.

· Desenvolver pesquisas e estudos científicos relacionados ao processo

de aprendizagem e seus problemas.

· Oferecer assessoria pedagógica aos trabalhos realizados em espaços

institucionais.

· Orientar, coordenar e supervisionar cursos de especialização em

Psicopedagogia, em nível de pós-graduação, expedidos por instituições

ou escolas devidamente autorizadas ou credenciadas nos termos da

legislação vigente.

Nesta perspectiva, a psicopedagogia torna-se uma área de atuação

voltada para a compreensão dos fatores que obstacularizam o

desenvolvimento da aprendizagem, objetivando o reconhecimento da

capacidade humana de aprender, visando a retirada de tais obstáculos para

que a aprendizagem se efetive.

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Num primeiro momento, logo se pensa que Psicopedagogia está restrita

a escola, ambiente onde são vivenciados os mais variados problemas de

aprendizagem. Mas, são vários os campos de atuação psicopedagógica:

Psicopedagogia Clínica (consultórios, hospitais) e a Psicopedagogia

Institucional (empresas, escolas, creches, organizações assistenciais).

“A Psicopedagogia, como podemos ver, tem o seu lugar

na clínica e na instituição. Cada um desses espaços

implica uma metodologia específica de trabalho. Em

ambos, no entanto, devemos considerar especialmente as

circunstâncias, isto é, o contexto de vida do sujeito, ou

seja, a família, a escola, a comunidade” (BOSSA, 2000, p.

87).

A psicopedagogia voltada para a instituição escolar, tem como objetivo

melhorar a qualidade do ensino, cabendo ao psicopedagogo estar mobilizando

a comunidade escolar, com o intuito de que o papel da escola frente aos

distúrbios de aprendizagem da criança seja revisto.

Nesta abordagem, a Psicopedagogia assume uma ação preventiva, ou

seja, adota uma postura crítica frente a dificuldade de aprendizagem, o que

requer uma mudança de postura por parte da escola e de seus profissionais,

no sentido de estar favorecendo a construção e a apropriação do conhecimento

de forma significativa por parte do aluno.

“Na escola, o psicopedagogo também utiliza instrumental

especializado, sistema específico de avaliação e

estratégias capazes de atender aos alunos em sua

individualidade e de auxiliá-lo em sua produção escolar e

para além dela, colocando-o em contato com suas

reações diante da tarefa e dos vínculos com o objeto do

conhecimento” (SCOZ, 1998 apud BOSSA, 2000, p. 68).

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A Psicopedagogia Escolar ou Preventiva:

· Faz com que todos, no ambiente escolar, repensem suas relações com

a aprendizagem (motivações, frustrações, desejos, etc.);

· Orienta a escola a repensar questões acerca de seu Projeto Político

Pedagógico;

· Realiza um diagnóstico da real situação da instituição com objetivo de

traçar planos que evitem/previnam a incidência das dificuldades de

aprendizagem;

· Auxilia o professor na definição de sua proposta didático-metodológica e

no que se refere a relação professor-aluno pode orientá-lo, trazendo

materiais que abordem o desenvolvimento infantil para que possa refletir

no sentido de estar percebendo se a sua maneira de ensinar está

apropriada a forma do aluno aprender;

· Prover professores, diretores, coordenadores e orientadores de

materiais que permitam a sua reflexão sobre o ato de aprender;

· Pode colaborar para a prevenção de possíveis dificuldades de

aprendizagem;

· Detectar e intervir em problemas de aprendizagem já instalados,

favorecendo o ato de aprender;

· Contribuir para a elaboração de instrumentos avaliativos e

reprogramação curricular;

· Promover estratégias para integração família-escola;

· Elaborar palestras, oficinas, cursos para pais, alunos ou profissionais da

escola;

· Atendimento aos pais para esclarecimento de dúvidas;

· Encaminhar o aluno para atendimento com outros profissionais

(fonoaudiólogo, psicólogo, psiquiatras, etc.).

Considerando que a escola mude a sua postura frente aos problemas de

aprendizagem, jamais conseguiria dar conta de todos, pois algumas crianças

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apresentam transtornos de aprendizagem já instalados, seja na estrutura de

sua personalidade e/ou família; ou ainda comprometimentos advindos de

lesões cerebrais que acarretem déficits cognitivos irreversíveis. Nestes casos,

será requerida uma intervenção psicopedagógica especializada, ou seja, na

clínica.

Sendo assim, emergem duas formas de atuação psicopedagógica: uma

preventiva que tem por objetivo prevenir ou evitar os problemas de

aprendizagem dentro da instituição escolar e a outra clínico-terapêutica que

trataria das crianças que apresentassem um maior comprometimento, não

podendo ser sanado na escola. Deve-se, no entanto esclarecer, que a

psicopedagogia preventiva assume um caráter clínico na medida que investiga

e analisa profundamente uma dada situação. Assim como, “o trabalho clínico

na Psicopedagogia tem função preventiva na medida em que, ao tratar de

determinados problemas, pode prevenir o aparecimento de outros” (BOSSA,

2000, p. 86).

Na sua função preventiva, cabe ao psicopedagogo:

“Detectar possíveis perturbações no processo de

aprendizagem; participar da dinâmica das relações da

comunidade educativa, a fim de favorecer os processos

de interação e troca; promover orientações metodológicas

de acordo com as características dos indivíduos e grupos;

realizar processos de orientação educacional, vocacional

e ocupacional, tanto na forma individual quanto em grupo”

(id., p. 30)

Ainda, de acordo com a autora, no ensino público, a atuação clínica

poderia ser oferecida no serviço público de atendimento, pois o psicopedagogo

poderia contribuir de forma efetiva para a permanência dos alunos no ensino

regular.

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“A Psicopedagogia Clínica procura compreender de forma

global e integrada os processos cognitivos, emocionais,

sociais, culturais, orgânicos e pedagógicos que interferem

na aprendizagem, a fim de possibilitar situações que

resgatem o prazer de aprender em sua totalidade,

incluindo a promoções da integração entre pais,

professores, orientadores educacionais e demais

especialistas que transitam no universo educacional do

aluno. (...) O Psicopedagogo também trabalha a postura,

a disponibilidade e a relação com a aprendizagem, a fim

de que o aluno se torne agente de seu processo,

aproprie-se do seu saber” (SCOZ, 1998 apud BOSSA,

2000, p. 67).

Embora a psicopedagogia tenha duas vertentes, clínico e institucional,

este trabalho está voltado para a Psicopedagogia Preventiva, preocupando-se

especialmente com a instituição escolar, tendo como objetivo primordial

oferecer ao profissional da educação meios de prevenir ou intervir nos

problemas relacionados com a aprendizagem, com o intuito de diminuir a

demanda de crianças encaminhadas para os consultórios especializados.

Neste trabalho preventivo, realizado na escola, deve ser considerado um

contexto mais amplo e não somente voltar o olhar para o sujeito que não

aprende, cabe considerar: aluno, professor, família e todos que convivem e

interferem no processo de aprendizagem do aluno.

“Nesse trabalho preventivo junto à escola, deve-se levar

em consideração, inicialmente, quem são os

protagonistas dessa história: professor e aluno. Porém,

estes não estão sozinhos: participam, também, a família e

outros membros da comunidade que interferem no

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processo de aprendizagem – aqueles que decidem sobre

as necessidades e prioridades escolares” (BOSSA, 2000,

p. 91).

Segundo Bossa (2000), o psicopedagogo que atua preventivamente

pode:

· Orientar a instituição nas questões didático-metodológicas; orientar

professores; fazer aconselhamento aos pais – com o objetivo de

minimizar a freqüência dos problemas de aprendizagem.

· Diagnosticar a instituição a partir de sua realidade; elaborar planos de

intervenção, procurando avaliar currículos junto com os professores –

com o objetivo de diminuir e tratar dos problemas de aprendizagem já

instalados.

· Atuar diretamente através do procedimento clínico – com objetivo de

eliminar os transtornos já instalados. Neste item, o caráter preventivo

encontra-se na eliminação de um transtorno, para que se evite o

aparecimento de outros.

Em síntese, o psicopedagogo para efetivar a sua atuação necessita

observar e diagnosticar a realidade da escola, podendo, então, criar estratégias

adequadas para que as dificuldades de aprendizagem sejam prevenidas,

minimizadas ou evitadas; tornando o ambiente escolar um espaço favorável

para a construção e a apropriação de conhecimentos por parte de todos que

fazem parte do processo ensino-aprendizagem.

“O diagnóstico psicopedagógico é um processo, um

contínuo sempre revelável, onde a intervenção do

psicopedagogo inicia, (...) numa atitude investigadora, até

a intervenção. É preciso observar que essa atitude

investigadora, de fato, prossegue durante todo o trabalho,

na própria intervenção, com o objetivo da observação ou

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acompanhamento da evolução do sujeito” (BOSSA, 2000,

p. 95-96).

O termo “sujeito”, empregado na citação acima, considero a instituição

escolar, bem como todos os integrantes que fazem parte do processo de

aprendizagem.

Neste sentido, o próximo capítulo do presente trabalho, abordará de que

forma o psicopedagogo utilizando-se dos estudos de Emilia Ferreiro e Ana

Teberosky, sobre a Psicogênese da Língua Escrita, poderá auxiliar e ampliar a

compreensão do professor sobre os caminhos que a criança percorre

conceitualmente, para que se aproprie significativamente da linguagem escrita,

tendo como objetivo prevenir as dificuldades de aprendizagem na classe de

alfabetização.

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CAPÍTULO IV

PSICOGÊNESE E PSICOPEDAGOGIA UMA PARCERIA

Ao traçar um elo entre a Psicogênese e a Psicopedagogia, não se pode

esquecer de delimitar o objetivo. Assim, o foco deste estudo é a prevenção das

dificuldades de aprendizagem, na classe de alfabetização, onde o

psicopedagogo estará junto ao professor, fazendo uma releitura de suas

práticas e falas, para que a partir delas, e utilizando os estudos sobre a

evolução conceitual da linguagem escrita, sejam criadas estratégias

metodológicas para um determinado grupo.

“A função preventiva está implícita na atitude de se

considerar aquele grupo específico como os sujeitos da

aprendizagem, de forma a adequar conteúdos e métodos,

ou seja, respeitando as características do grupo a pensar

o plano de trabalho. (...) Dessa forma estou prevenindo

alguns obstáculos que poderiam surgir se meu plano de

trabalho não atendesse os interesses do grupo sujeito

dessa aprendizagem” (BOSSA, 2000, p. 86).

De acordo com os argumentos expostos, estarei direcionando a minha

escuta e o meu olhar psicopedagógico, para as falas e as práticas de algumas

professoras da classe de alfabetização, de uma determinada escola pública do

município do Rio de Janeiro5.

5 Estas falas e práticas foram extraídas de minha monografia de graduação intitulada: “A criança e a alfabetização inicial: discutindo as práticas pedagógicas”, 2004, onde mantive um diálogo constante com o fazer pedagógico das professoras que lecionam no ciclo inicial e no ciclo intermediário, de uma escola municipal. A pesquisa sendo de cunho qualitativo contou com o trabalho de campo (onde mantive contato com o objeto de estudo durante dois meses), ou seja, a pesquisadora pode estudar, conhecer e investigar os aspectos qualitativos inerentes ao tema de estudo, além de construir um conhecimento mais significativo partindo da realidade. Neste momento, será feita uma releitura de tais práticas e falas, dentro de uma perspectiva psicopedagógica.

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A pesquisadora não tem como propósito denunciar ou especular sobre

as práticas pedagógicas das educadoras, mas, sim o desejo de compreender

aspectos inerentes a alfabetização inicial. Neste sentido a análise dos dados

terá uma interpretação qualitativa, o que Minayo (2002) denomina de “método

hermenêutico-dialético”, nesse método:

“A fala dos autores sociais é situada em seu contexto para

melhor ser compreendida. Essa compreensão tem, como

ponto de partida, o interior da fala. E, como ponto de

chegada, o campo da especificidade histórica e totalizante

que produz a fala” (MINAYO, 1992 apud MINAYO, 2002,

p. 77).

A autora entende que “os resultados de uma pesquisa em ciências

sociais constituem-se sempre numa aproximação da realidade social, que não

pode ser reduzida a nenhum dado de pesquisa” (MINAYO, 2002, p. 77).

4.1 - AS PRÁTICAS COTIDIANAS: UM OLHAR

PSICOPEDAGÓGICO

“... o olhar não se limita a registrar passivamente, mas

realmente ‘executa’, isso é, reconstrói a realidade viva da

obra, multiplicando as perspectivas, escolhendo os pontos

de vista, dando relevo a certas linhas do que a outras,

notando os tons e as relações, e os contrastes, e os

relevos e as sombras, e as luzes, em suma, dirigindo,

regulando e operando a visão” (WEFFORT, 1996, p. 31).

O psicopedagogo, num primeiro momento, precisa compreender as

práticas pedagógicas das professoras alfabetizadoras e as implicações destas

práticas no que tange a criança na fase inicial da alfabetização escolar.

Apoiando-se nas pesquisas de Emilia Ferreiro, adentrei o espaço onde estas

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práticas cotidianas se concretizam: a sala de aula. Neste espaço quase

sagrado para muitos professores, não busquei o confronto ou a contradição,

mas, o entendimento. Não busquei criticar ou depreciar o trabalho docente,

mas, acompanhar com um olhar questionador e inquieto.

Todavia é preciso ressaltar que quando alguém entra em uma sala de

aula, por mais discreto que seja, acaba modificando este ambiente: pode inibir

a prática da professora, pode causar curiosidade entre as crianças, mas, na

melhor das hipóteses, a sua presença também pode contribuir para uma

reeducação do olhar docente uma “re-alfabetização”, ou seja, “reaprender a

olhar – romper com visões cegas, esvaziadas de significados -, onde a busca

de interpretar, dar significados ao que vemos, lemos da realidade é o principal

desafio [do educador alfabetizador]” (WEFFORT, 1996, p. 6).

Diante dos argumentos apresentados anteriormente, pode-se afirmar

que o professor como mediador do processo de aprendizagem da leitura e da

escrita de seu aluno, precisa olhá-lo sem subjugá-lo, precisa resgatar a sua

identidade dando-lhe a chance de trazer suas vivências para a sala de aula, e

esta precisa ser vista como local de diálogo, de interações e de significados,

onde todos têm voz, e esta voz não ecoa no vazio, pois encontra no professor

um interlocutor que entende a escrita como um objeto social e não como um

objeto com fim em si e estritamente escolar.

A partir dessas considerações iniciais, pode-se então desenvolver uma

reflexão acerca das observações e das falas cotidianas das professoras, pois a

partir delas - com um olhar cuidadoso - estarei mergulhando no cotidiano,

trazendo argumentos para ampliar a nossa práxis.

Dando prosseguimento a reflexão, segue a fala de uma das professoras:

“Neste lado [direito em relação a sua mesa] sentam as

crianças que não sabem nada: não distinguem letras e

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não reconhecem sons (...), estão engatinhando na

descoberta da leitura e da escrita. Essas crianças não

sabem e não conseguem aprender. Estou fazendo um

trabalho voltado para elas [cobrir o pontilhado, silabação e

ordenação]. Neste outro lado sentam-se as crianças que

já identificam as palavras do mural [baú, bebê, boi, baba,

bobo, Bia, etc.]. Na hora das atividades eu divido o quadro

ao meio e cada um copia seus respectivos exercícios...”

(Diário de Campo, Professora X, 09 de março de 2004).

Por conhecer a educadora, ela estava bem a vontade e fez questão de

me informar sobre o andamento da turma. Contudo, não se pode deixar de

ressaltar que quando ela diz que as crianças não sabem nada, mesmo que

inconscientemente, a professora acaba negando, ou melhor, desconsiderando

a bagagem cultural das crianças, percebendo-as como seres vazios -

desprovidos de conhecimentos, sugerindo que a imposição de exercícios de

coordenação motora e cópias descontextualizadas fossem gerar

conhecimentos efetivos. Quando afirma que os que “sabem” conseguem

identificar as palavras no mural, não lhe ocorreu que muitas vezes a criança

decora, decodifica, mas não lê efetivamente, pois leitura requer compreensão

indo além da superficialidade da identificação.

Leitura:

A goiaba é do Fábio.

Fábio abafou a goiaba.

A goiaba ficou boa.

Fábio deu a goiaba ao vovô.

Responda:

De quem é a goiaba? __________

O que Fábio fez com a goiaba?__________

A quem Fábio deu a goiaba? ______________

(Diário de Campo, Professora X, 25 de março de 2004)

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A leitura e o exercício acima são os que geralmente a professora utiliza

no seu fazer pedagógico. Diante do exposto, percebe-se a necessidade de

uma maior interação das crianças com diversos tipos de textos, e não somente

limitá-los a “leitura” fragmentada das “palavrinhas” do mural que corresponde

ao lançamento ordenado das letras do alfabeto ou a exercícios sem significado

que não considera a realidade das crianças.

“(...) a ação pedagógica supõe atividades de diferentes

naturezas. Em primeiro lugar, atividades que criem

oportunidades para que o aluno ‘descubra’ a possibilidade

ou a necessidade de usar a língua escrita como forma de

comunicação, de interlocução, o que supõe o

estabelecimento de situações de produção de texto tanto

quanto possível naturais e reais, a despeito da inevitável

artificialidade do contexto escolar – situações em que a

expressão escrita se apresente como uma resposta a um

desejo ou a uma necessidade de comunicação, de

interação, em que o aluno tenha, pois, objetivos para

escrever, e destinatários (leitores) para quem escrever”

(SOARES, 2001, p. 70).

Quando o professor limita a curiosidade e a expressividade de seus

alunos, ele os silencia, tornando-os inibidos frente a leitura e a escrita, nega-se

a percebê-lo como um sujeito que constrói e reconstrói suas hipóteses e

representações.

“A ênfase praticamente exclusiva na cópia, durante as

etapas iniciais da aprendizagem, excluindo tentativas de

criar representações para séries de unidades lingüísticas

similares (listas) ou para mensagens sintaticamente

elaboradas (textos), faz com que a escrita se apresente

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como um objeto alheio à própria capacidade de

compreensão. Está ali para ser copiado, reproduzido,

porém não compreendido, nem recriado” (FERREIRO,

2001a, p. 19).

Ao dividir a turma em dois grupos: quem “sabe” num canto e quem “não

sabe” em outro canto, a professora acaba criando na sala de aula uma

hierarquia de saberes, além de causar constrangimentos e pré-conceitos entre

as crianças. Segundo os pressupostos teóricos de Ferreiro (2001a), no

processo de alfabetização:

“Permite-se e estimula-se que as crianças tenham

interação com a língua escrita, nos mais variados

contextos (...); que explorem textos buscando

semelhanças e diferenças; que usem o contexto para

antecipar significados; que vejam desde o início todas as

letras. Podem copiar se o necessitarem, porém se

estimula também que escrevam sem copiar (...); podem

pedir e receber informações, e também podem dá-las, por

que o professor deixa de ser o único que sabe na sala de

aula (todos sabem algo cada qual em seu nível)”

(FERREIRO, 2001a, p. 45-46, grifo meu).

A professora poderia promover a interação dos alunos, estabelecendo

um trabalho coletivo, podendo formar os grupos partindo de observações feitas

no cotidiano, ou seja, neste momento, poderia utilizar os conceitos que se

referem as etapas da evolução conceitual da escrita nas crianças, pois a

favoreceria na organização de grupos variados, possibilitando a interação entre

as crianças e não a divisão e o distanciamento.

“(...) o desenvolvimento e a aprendizagem são processos

de construção de conhecimentos, mas é evidente que

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essa construção não ocorre por acaso, mas em um

contexto social, na interação com outros participantes”

(TEBEROSKY, 2003, p. 77).

Sendo assim, o professor não traz “conhecimentos” prontos,

consolidados, e os transmite, ele cria condições para que a criança possa

interagir com o material gráfico, propõe situações-problemas, estimula e está

junto à criança auxiliando-a na construção de seus conhecimentos.

“Nesse contexto, a construção se transforma em co-

construção de conhecimentos. Por um lado, a criança

adquire conhecimentos na interação construtiva com o

material escrito e, por outro, todo processo de

aprendizagem implica relações sociais. Mas, além disso,

é necessária a mediação dos adultos, principalmente

porque a leitura [e a escrita] é uma aprendizagem cultural

de natureza simbólica” (TEBEROSKY, 2003, p. 77-78).

Tendo idéias similares as da professora X, a professora W do ciclo

inicial, pouco antes de começar o Centro de Estudo, em conversa com as

outras professoras afirmou que:

“As crianças daqui são muito fracas e não aprendem

mesmo, não há como elas aprenderem, pois não

conhecem letras, não conhecem sons, inclusive vem

crianças de outras escolas e tenho que fazer um trabalho

diferenciado para elas – começar do zero. Não me

estresso mais, se tiver que aprender, aprende, senão fica

sem aprender. Trabalho encontros vocálicos [ai, eu, ui,

etc.], sílabas e elas têm que aprender nem que seja por

osmose. Não conheço e nem sei trabalhar construtivismo,

e muito menos Emilia Ferreiro, não acredito nisso que as

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crianças vão aprendendo aos poucos, tem que ir

devagar... trabalho mesmo com cópias” (Diário de Campo,

10 de março de 2004).

Dentre muitos aspectos relevantes que trazem a fala da professora W é

primordial destacar a sua visão à respeito das crianças que se encontram na

fase inicial da alfabetização, ou seja, são fracas, não têm condições de

aprender e encontram-se completamente vazias, pois ela teria que começar do

zero com as crianças oriundas de outras instituições.

De fato, essa fala permite uma série de reflexões, entre elas a

desconsideração dos conhecimentos prévios das crianças, das suas

conquistas conceituais e de suas interações, pois estas, são descartadas de

forma tão rude que chega a ser cruel, a criança acaba sendo esvaziada e

descaracterizada, como se uma mão invisível adentrasse o seu cérebro e com

uma borracha apagasse todas as suas conquistas, descobertas, construções e

avanços anteriores. A criança, agora oca, poderia ser enfim, alfabetizada.

Neste sentido, a escrita torna-se um objeto estritamente escolar e com um fim

em si mesmo, não sendo vista como um objeto social e histórico, com o qual a

criança precisa interagir para construir conhecimentos efetivos. O

conhecimento e a aprendizagem não podem ser transmitidos por osmose, pois

não acontecem de maneira linear e sim através de equilíbrios e desequilíbrios

constantes.

“(...) no processo evolutivo não há linearidade nem

sobreposição de itens aprendidos sucessivamente. (...)

não se devem interpretar falsamente as oscilações como

indício de que, ao longo do desenvolvimento, a criança

está marcando passo ou regredindo. As idas e vindas

acontecem em virtude de reformulações constantes, que

atingem a organização interna das ações. As novidades

se combinam com as aquisições anteriores e o resultado

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são reestruturações gerais do conhecimento” (SEBER,

1997, p. 27-28).

Reduzir a aprendizagem das crianças à cópias de modelos por

considerá-las vazias ou incapazes é desconsiderar as suas conquistas e o sua

capacidade intelectual.

“Se o adulto prender-se apenas àquilo que a criança não

tem condições de realizar em virtude de seu nível de

organização intelectual, sua interação com ela será

desastrosa. Ela nunca irá valorizar nada do que a criança

estiver fazendo, seus sentimentos em relação a ela serão

primordialmente negativos. Ele só se importa com o que

lhe falta atingir, e não aprecia o que ela já conquistou”

(SEBER, 1997, p. 30).

Sendo assim, se apenas nos detivermos a desqualificar as produções

das crianças, acabaremos renegando-as como sujeitos pensantes,

favorecendo a contemplação e não a apropriação e a construção de conceitos

acerca da leitura e da escrita, tornando-as inseguras frente a esse processo.

Por outro lado, se considerarmos que a criança precisa exercer um papel ativo

no próprio processo de ensino-aprendizagem, estaremos lhe transmitindo

autoconfiança e, desta forma ela se sentirá apta e segura para interagir com

materiais gráficos variados possibilitando assim, o seu avanço rumo a

construção de conhecimentos significativos.

Neste sentido, faz-se necessário a promoção de um “ambiente

alfabetizador”, ou seja, um ambiente que possa favorecer a tomada de

consciência da criança no que se refere a conquista conceitual da leitura e da

escrita, onde haja uma variedade de materiais gráficos e de atividades

prazerosas voltadas para a produção e a construção de textos.

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“A produção de escritos permite à criança aceder ao

modo de funcionamento do texto escrito e aprender sua

estrutura. A participação em atividades de leitura

compartilhada permite à criança aceder ao mundo da

linguagem escrita e apropriar-se de suas funções, formas

e expressões” (TEBEROSKY, 2003, p. 112).

Seguindo essa linha de raciocínio, cabe ao professor estar oferecendo a

criança diferentes suportes de textos6 e não somente impor-lhes o uso das

cartilhas e das folhas mimeografadas.

“- Professora X, mais tarde passarei em sua sala para

levar os dicionários – disse a coordenadora pedagógica.

- Dá somente para o lado que já sabe ler, pois do outro

lado as crianças nem sabem ler, vão pegar o dicionário e

vão estragar todo, vão rabiscar tudo. Dá somente para

aquelas que já estão conhecendo as palavras, não dá

para as outras não – respondeu a professora X” (Diário de

Campo, 12 de março de 2004).

Neste diálogo percebe-se a atitude de privação da professora com

relação a criança, pois se não sabe ler não precisa ter um dicionário. A criança

não tem a oportunidade de estar em contato com materiais gráficos variados,

para que possa estar interagindo, criando e testando suas hipóteses. Lembro-

me que ao receber o dicionário, muitas dessas crianças que “não sabem ler”

ficaram animadíssimas, logo abriram o dicionário e começaram a procurar as

letras que conheciam e vieram ao meu encontro para mostrar que estavam

conseguindo ler no dicionário as letras que a professora havia lhes ensinado.

Momentos em que a criança mostra-se interessada em estar buscando e

6 “Denominaremos ‘portador de texto’ ou ‘suporte material’ qualquer objeto que leve um texto impresso. Sob esta denominação incluamos livros, invólucros de medicamentos ou de alimentos, jornais, cartazes de propaganda, etc” (FERREIRO, 1999, p. 190).

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questionando muitas vezes passam despercebidos, não sendo considerados

como momentos de descobertas.

Durante o tempo em que estive em sala de aula realizando esta

pesquisa, muitas vezes levei algo para ler e, as crianças curiosíssimas vinham

me perguntar o que estava lendo e porque estava lendo, ou ainda, o porquê de

estar marcando de caneta verde as letras. Sempre se mostraram curiosas e

interessadas frente ao material escrito, mas estas indagações não são

consideradas, pois o que impera é o programado, o estabelecido, ou seja, a

transmissão e as atividades de cópias e de memorização, não a construção e a

interação.

“O tempo escolar deve contemplar atividades que levem

os alunos a manusear os livros, a folheá-los, lê-los e

compartilhá-los, e a estender suas opiniões e

aprendizagens a murais, dramatizações e manifestações

plásticas que traduzem o impacto efetivo e cognitivo da

experiência obtida” (TEBEROSKY, 2003, p. 145).

O professor-mediador deve estar atento aos níveis de conceitualização

da criança, neste sentido poderá interferir de forma que promova a

desestruturação e a reestruturação das condutas conceituais consolidadas na

criança, ou seja, o professor precisa intervir no processo de aprendizagem da

criança, mas para isso: “torna-se imprescindível conhecer as idéias que as

crianças elaboram sobre a escrita, conforme seu nível evolutivo” (SEBER,

1997, p. 20).

Mas, se o professor preferir ensinar através dos métodos tradicionais de

ensino – seguindo as cartilhas e ensinando as famílias silábicas – perderá a

oportunidade de ser o interlocutor da criança, deixando de acompanhá-la no

seu processo de desenvolvimento intelectual.

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Submeter à criança aos treinos de letras, sílabas e palavras é

apresentar-lhe a escrita como algo descontextualizado.

“- Essas crianças estão tendo uma dificuldade enorme

para aprender a ler e a escrever - disse a professora X.

- Realmente muitas não sabem nem o A, E, I, O, U.

Ensino para elas e logo em seguida esquecem -

respondeu-lhe a professora Y.

- Só Deus mesmo - retrucou a professora X.

Dando um suspiro meio desanimado, a professora Y

tornou a dizer:

- É verdade, só entregando para Deus, pois está difícil de

alfabetizá-las, se não conseguem nem formar sílabas.

- Pior as outras que não conseguem sair das vogais –

finalizou a professora X” (Diário de Campo, 25 de março

de 2004).

De acordo com o diálogo, acima, as professoras criticam os

conhecimentos construídos pelas crianças, mas em nenhum momento fazem

uma auto-avaliação de suas práticas, ou seja, consolida-se a lógica inerente ao

ensino tradicional: a minha prática está correta, pois o método adotado (sem

questionamento) está sendo aplicado de acordo com o estabelecido então, se

a criança não está aprendendo, a culpa é dela.

Contudo, é preciso ressaltar que talvez isso aconteça por falta de

conhecimento das professoras, elas não reeducam o seu olhar e permanecem

com suas certezas, que não são questionadas.

“As seqüências didáticas tradicionais baseiam-se em uma

série de falsos pressupostos que se mantém com a

inércia dos hábitos adquiridos e que resistem a qualquer

análise racional. Não seria demasiado grave se não fosse

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porque essas didáticas tornaram ainda mais difícil o

processo para quem a escolarização é uma empresa de

alto risco” (FERREIRO, 2001a, p. 35-36).

Por outro lado é preciso apontar que não se pretende uma mudança

radical das professoras no que diz respeito aos métodos adotados, mas sim,

uma ressignificação. É certo que as crianças terão que aprender a escrever

corretamente, ou seja, de acordo com as convenções ortográficas, mas em um

primeiro momento devemos deixá-las atuar, experimentar e inferir de maneira

que possam estar construindo suas hipóteses sobre a língua escrita. “O

caminho da base conceitual da escrita deriva das tentativas de experimentação

e não de respostas associativas repetidas de modo mecânico, sem nenhum

entendimento” (SEBER, 1997, p. 243).

Coloque as palavras na coluna certa:

Pão – sapato – pé – pata – lata – macaco

sobremesa – camaleão

monossílaba

s

dissílaba

s

trissílaba

s

Polissílabas

1 sílaba 2 sílabas 3 sílabas 4 sílabas

(Diário de Campo, Professoras X e Y, 27 de abril de 2004)

Para que ensinar “classificação quanto ao número de silabas” se as

crianças ainda estão avançando rumo a conquista alfabética?

“A escrita representa a língua e não a fala. Qualquer

intenção de justificar a ortografia a partir da pronúncia

leva a desprezar as variantes de fala das crianças das

populações socialmente marginalizadas, e a dificultar a

sua aprendizagem. Está é uma das razões fundamentais

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porque a correção ortográfica não pode ser exigida nas

primeiras etapas da alfabetização, com risco de distorcer

o processo desde o início” (FERREIRO, 2001a, p. 27).

Sem o intuito de fazer panfletagem à favor do construtivismo em

detrimento do tradicional, penso que partindo da teoria psicogenética podemos

ressignificar o tradicional, pois o construtivismo nos permite ter um olhar

ampliado do processo de aprendizagem – prevendo uma nova maneira de

ensinar, centrando-se na perspectiva do sujeito aprendente, não considerando

as crianças como seres passivos que devem adotar uma conduta

contemplativa frente a leitura e a escrita, mas que aprendem em interação, isto

é, o conhecimento efetivo é construído a partir das trocas realizadas entre o

sujeito e o meio, entendendo a construção do conhecimento como um

processo dinâmico de construção e de reconstrução. De acordo com esse

pressuposto teórico, a criança é vista como um ser inteligente e construtivo que

atua sobre a escrita, objeto social, construindo suas conceitualizações.

“As crianças são facilmente alfabetizáveis desde que

descubram, através de contextos sociais funcionais, que a

escrita é um objeto interessante que merece ser

conhecido (como tantos outros objetos da realidade aos

quais dedicam seus melhores esforços intelectuais)”

(FERREIRO, 2001a, p. 25).

As práticas da professora X não se alternavam, continuavam seguindo o

lançamento ordenado das letras do alfabeto trabalhando as famílias silábicas,

utilizando as folhas mimeografadas ou o quadro de giz, promovia as cópias e a

interpretação de textos tirados do livro didático.

Leitura:

Dudu é o gato.

O gato é da Bia.

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Bia deu água ao Dudu.

Dudu bebeu a água.

Complete:

Dudu é o _______

Dudu é da _______

O gato bebeu________ (Diário de Campo, 26 de abril de

2004)

Não há aqui a crítica pelo uso das folhas mimeografadas, mas sim ao

seu conteúdo. Na verdade, há uma falsa dicotomia propagada em relação ao

construtivismo e o uso de folhas mimeografadas que precisa ser quebrada, ou

seja, não é porque sou construtivista que não posso apresentar ao meu aluno

uma proposta bem elaborada e criativa em folhas mimeografadas, se estas

folhas trouxerem como conteúdo atividades que desafiem e estimulem o

raciocínio do aluno, que o faça pensar de maneira autônoma e criativa

favorecendo o seu desenvolvimento cognitivo. Mas, se tiver como conteúdo,

um texto que não comunica, que não informa, não torna o aluno um leitor

crítico – que sabe interpretar um texto e não lhes proporciona o prazer de ler -

pois são conteúdos estanques, dissociados da sua realidade o professor estará

somente visando a cópia, priorizando as condutas mecânicas. Quando o

professor somente utiliza pseudotextos, acaba corroborando para aumentar o

desinteresse do aluno frente ao texto escrito.

“(...) os estudantes não sabem resumir um texto, não são

capazes de reconhecer as idéias principais e, o que é

pior, não sabem seguir uma linha argumentativa de modo

a identificar se as conclusões que se apresentam são

coerentes com a argumentação procedente. Portanto, não

são leitores críticos capazes de perguntar-se, diante de

um texto, se há razões para compartilhar do ponto de

vista ou da argumentação do autor” (FERREIRO, 2001a,

p. 18-19).

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Cabe ressaltar, que o professor deve ter critérios ao selecionar os

materiais gráficos que irá utilizar em suas aulas, para que estes ao invés de

auxiliá-la não se tornarem empecilhos frente aos seus objetivos. A professora X

levou jornal para a sala de aula e propôs para as crianças que recortassem as

letras e formassem algumas palavras que já haviam sido trabalhadas, tais

como: “dado, casa, bica, cabo, bebeu, etc” (Diário de Campo, 23 de abril de

2004), mas, a atividade que deveria ter proporcionado interesse nas crianças,

acabou não tendo o resultado esperado, pois a maioria das crianças não

estava conseguindo identificar as letras no jornal, porque a professora utiliza

em sala a letra cursiva e no jornal a letra é em script minúscula dificultando a

identificação por parte das crianças. A idéia de trazer o jornal para a sala de

aula foi boa, mas a professora acabou desconsiderando o nível de

desenvolvimento intelectual de seus alunos e, “a lógica do sujeito não pode

estar ausente de nenhuma aprendizagem quando esta toma forma de uma

apropriação de conhecimento” (FERREIRO, 1999, p. 163).

A utilização de diferentes portadores de texto em sala de aula pode ser

uma atividade muito enriquecedora para a criança e para o professor, pois

pode possibilitar a previsão, ou seja, “a [previsão] permite antecipar a

mensagem em cada caso. Mas, além disso, o tipo de portador de texto não

somente determina o conteúdo, mas também o tipo de ação que se exerce

sobre ele” (FERREIRO, 1999, p. 182).

4.2 - REVISITANDO E DIALOGANDO COM AS PRÁTICAS

COTIDIANAS

“O ver e o escutar fazem parte do processo de construção

[do] olhar. Também não fomos educados para a escuta.

Em geral não ouvimos o que o outro fala; mas sim o que

gostaríamos de ouvir. Nesse sentido imaginamos o que o

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outro estaria falando... Não partimos de sua fala; mas da

nossa fala interna. Reproduzimos desse modo o

monólogo que nos ensinaram” (WEFFORT, 1996, p. 38).

Ao trazer a fala das professoras alfabetizadoras através do questionário

(em anexo) e da entrevista semi-estruturada (roteiro em anexo), estarei

buscando o esclarecimento de algumas dúvidas que foram surgindo durante a

observação participante, bem como, estar dando voz as professoras que,

espero eu, ao estarem revisitando suas práticas através de suas falas, estejam

se ouvindo e, a partir dessa fala-escuta reflitam e reeduquem o seu olhar...

“O professor alfabetizador está muito só: em vez de ser

considerado como o professor mais importante de toda a

escola primária, é considerado como aquele que realiza o

trabalho menos técnico e que qualquer outro poderia fazer

(...). É o professor com salas mais superlotadas de quem

se espera um grande espírito de sacrifício, uma atitude

“muito maternal” (já que há mais mulheres que homens no

ofício) e muita paciência em troca de uma baixa

remuneração e muito pouco apoio intelectual”

(FERREIRO, 2001a, p. 51-52).

Geralmente, as professoras que recebem a incumbência de alfabetizar,

não ficam muito satisfeitas com tal atribuição e, talvez por esta falta de

encantamento com a sua área de atuação, acabam por aceitar que as cartilhas

e os pré-requisitos para alfabetização circundem suas práticas pedagógicas.

Tal afirmação foi evidenciada quando as professoras, através do

questionário, deixaram transparecer a sua insatisfação de estarem lecionando

no ciclo inicial e no ciclo intermediário. A seguinte pergunta foi feita para as

professoras: “Você ‘gosta’ ou está ‘gostando’ de lecionar neste período do

ciclo? Por que?”.

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Duas professoras foram diretas ao responderem que não estão

gostando e, a terceira respondeu-me: “Existem seus pontos positivos e

negativos, porém os negativos como em qualquer coisa sobressaem mais”.

(professora Y). Os “por quês” variaram, mas estão estritamente ligados as

dificuldades e dúvidas que perpassam suas práticas, entre elas, a

heterogeneidade de conhecimentos que coabitam as salas de aula. Segundo a

professora X: “A turma está muito dividida. Possui um grupo alfabetizado e

outro (quase a metade da turma) não alfabetizado”.

Diante do exposto, evidencia-se a dificuldade da professora estar

alfabetizando dentro de uma multiplicidade de saberes e, talvez por essa

dificuldade e/ou a falta de leituras específicas sobre o assunto, acabe não

considerando que as crianças possuem ritmos diferentes de aprendizagem, o

que pode vir a explicar, mas não justificar, a divisão do quadro ao meio na hora

dos exercícios, além é claro, das tradicionais atividades mecanizadas, onde

prevalece o ponto de vista do adulto.

“(...) para essas crianças a escolarização principia com

desrespeito. Certamente, ao dar prioridade ao coletivo,

seja na escolha de palavras a ensinar, seja na busca de

respostas homogêneas das crianças, talvez o professor

alcance maior disciplina e uniformidade de condutas em

detrimento das liberdades individuais, o que facilita sua

tarefa” (SEBER,1997, p. 103).

Ao abordar a questão dos métodos de ensino, as professoras revelaram

que utilizam métodos variados: silabação, fônico, palavração e o construtivismo

– somente a professora X disse não utilizar o construtivismo. Nesta resposta as

professoras W, X e Y atribuíram, equivocadamente, ao construtivismo o status

de método de alfabetização, não atentando que o construtivismo é uma

concepção de ensino-aprendizagem. Além disso, as professoras W e Y,

afirmaram que utilizam os métodos tradicionais e o construtivismo

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simultaneamente. O que nos remete a uma contradição, pois como podem

utilizar os métodos tradicionais que priorizam a transmissão de conhecimentos

prontos e acabados, juntamente com o construtivismo que prioriza a

construção de conhecimentos, vendo o sujeito como um ser pensante e

construtivo?

Essa contradição levou-me ao seguinte questionamento: “O que é o

construtivismo? Como você conheceu o construtivismo? Em que momentos

você utiliza o construtivismo e em que momentos utiliza os métodos

tradicionais?”.

A Professora X disse:

“Não uso o construtivismo. Fiquei sabendo através das

pessoas que fizeram cursos, de propagandas, materiais

que chegam na escola e como escrevi no questionário

utilizo um pouco de cada método, o fônico, a silabação, a

palavração” (Entrevista, 05 de maio de 2004).

A professora Y disse:

“Utilizo um pouco do construtivismo. Conheci aqui na

escola. Uso o construtivismo quando trabalho com jornais,

revistas, trabalho com brinquedos e brincadeiras. Utilizo

mais o tradicional, principalmente com o grupo ‘ruim’ com

o outro grupo ‘bom’ trago mais novidades, utilizo coisas

diferentes” (Entrevista, 05 de maio de 2004).

A professora W mostrou-se bastante insegura diante das perguntas,

pegou o roteiro das minhas mãos e foi lendo e ‘treinando’ suas falas, pediu-me

que não ligasse o gravador. Levantou-se e foi até o refeitório com o roteiro,

uma caneta e uma folha em branco. Quando voltou trouxe respostas prontas e,

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enquanto eu perguntava, agora com o gravador ligado, ela lia no papel e

respondia. Na hora que estava lendo o roteiro, sem o gravador ligado, disse

que o construtivismo seria: “uma forma lúdica de ensinar”, quando foi me

responder com o gravador ligado, sua resposta foi:

“Bom, pelo que eu me lembro o construtivismo é a teoria

baseada no princípio do significado. Conheci o

construtivismo nos cursos dados pelo Município. Utilizo o

construtivismo quando trago brincadeiras para a sala de

aula, recorte e colagem” (Entrevista, 29 de abril de 2004).

As enunciações das professoras revelam um conhecimento limitado

sobre o construtivismo, pois associam o construtivismo ao lúdico, ou seja,

quando trazem brincadeiras para a sala de aula estão sendo construtivistas,

não importando se estas brincadeiras estão ou não permitindo que as crianças

estejam construindo conhecimentos efetivos. Talvez, este entendimento

limitado sobre o construtivismo acabe por afastá-lo das salas das professoras

W, X e Y, pois como vão utilizar algo que desconhecem? Neste sentido, fica

mais fácil utilizar os métodos tradicionais de alfabetização já que os conceitos

subjacentes a estes métodos são familiares a todos nós educadores, isto é,

quem nunca ouviu falar de: Ivo vê a uva; a fada é boa; ou do best seller “Sonho

de Talita”?

Embora as professoras X e Y afirmem que não fazem uso das cartilhas

que são enviadas pela Prefeitura e, que segundo a professora X traz: “textos

que são muito extensos e difíceis, e já que as crianças não conseguem ler uma

única palavra como vão conseguir ler um texto enorme?” (Entrevista, 05 de

maio de 2004), elas acabam por utilizar exercícios e textos de outras cartilhas

que seguem as seqüências didáticas pré-estabelecidas por elas.

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A partir destes questionamentos iniciais, trouxe a seguinte pergunta para

as professoras: “Você conhece algum teórico/autor que seja construtivista?

Qual (quais)?”.

Todas as professoras disseram conhecer, para o meu espanto e

felicidade, Emília Ferreiro - foi a única autora citada, foi unânime. Então,

aproveitando-me dessa resposta parti para as seguintes questões: “O que você

sabe sobre contribuições/pesquisas de Emilia Ferreiro (concordam ou

discordam)? Já utilizou alguns dos conceitos de Emilia Ferreiro em sala de

aula? Quais?”.

A professora W, lendo em suas anotações, disse: “Sei que a

contribuição dela foi na linguagem e na escrita, não utilizo seus conceitos”

(Entrevista, 29 de abril de 2004).

A professora X revelou que nunca utilizou e nem sabe utilizar os

conceitos de Emilia Ferreiro. Mas, a professora Y, surpreendeu-me ao dizer

que já utilizou os conceitos de Ferreiro, em suas aulas: “Já utilizei alguns de

seus conceitos, poucos, não foram muitos”. Perguntei-lhe quais seriam estes

conceitos utilizados e ela respondeu: “Agora não vou lembrar, mas pouca

coisa, entendeu, pouca coisa” (Entrevista, 05 de maio de 2004).

Neste momento, cabe ressaltar a resposta da professora W, que

dissociou linguagem e escrita, percebendo-as como objetos estanques que não

se inter-relacionam, assim a escrita torna-se um objeto em si, onde a sua

apropriação remete-se a aquisição de uma técnica.

“Há uma diferença substancial entre apontar, como

objetivo da alfabetização, a aquisição de uma técnica de

transcrição de formas sonoras, e apontar, como objetivo,

a compreensão do modo de representação da linguagem

que corresponde a um sistema alfabético de escrita, seus

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usos sociais e a construção e compreensão de textos

coerentes e coesos” (Ferreiro, 2001a, p. 25).

Dicotomizar a linguagem e a escrita pode trazer como implicação o

ensino fragmentado e estanque, pois a professora pode conceber a escrita

como representação da fala e não da língua. Desse modo, a professora

privilegia a fala correta e não a escrita, ou seja, se o aluno fala corretamente

(língua culta), poderá vir a escrever corretamente. E nesta busca de

homogeneização da fala, a professora pode correr o risco de desrespeitar a

criança e o seu contexto social.

“São os adultos que têm dificultado o processo [de

alfabetização] imaginando seqüências idealizadas de

progressão cumulativa, estimulando modos idealizados de

fala que estariam ligados à escrita e construindo

definições de ‘fácil’ e de ‘difícil’, que nunca levaram em

conta de que maneira se define o fácil e o difícil para o

ator principal da aprendizagem: a criança. Tudo isso

tornou o processo mais difícil do que deveria ser, produziu

fracassos escolares desnecessários, estigmatizou uma

grande parte da população e transformou a experiência

de alfabetização em uma experiência literalmente

traumática para muitas crianças” (FERREIRO, 2001a, p.

25).

Dando prosseguimento à reflexão, busquei direcionar o olhar das

professoras para o aprendizado de seus alunos, então, trouxe a seguinte

pergunta: “Como os seus alunos aprendem?” (Questionário).

A professora W respondeu: “Faço uma mistura de métodos e uso de

tudo um pouco: músicas, jornais, filme, o cotidiano deles, etc.”. A professora X

disse: “Utilizo textos, músicas, cartões com o alfabeto”, e finalizando a

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professora Y afirmou que: “Trabalho um pouco de cada método, pois a turma é

muito misturada. Procuro trabalhar com jornais e revistas”.

Diante das respostas, pensei que elas não haviam entendido a pergunta,

pois não me disseram como os seus alunos aprendem e sim, como elas

ensinam. Assim, retornei a pergunta durante a entrevista semi-estruturada,

dessa vez procurei explicar melhor o que eu queria saber, ou seja, “como os

seus alunos aprendem? Quando você traz um conteúdo novo qual é a reação

deles?”.

Todavia, as respostas foram as mesmas, as professoras tornaram a dar

ênfase no como ensinam, não direcionando o seu olhar para a aprendizagem

de seus alunos, não os vendo como sujeitos ativos, construtivos e que

constroem suas hipóteses para que possam se apropriar de maneira

significativa do objeto de estudo, neste caso a escrita, entendida como objeto

social.

“A construção de um objeto de conhecimento implica

muito mais que mera coleção de informações, implica a

construção de um esquema conceitual que permita

interpretar dados prévios e novos dados (isto é, que

possa receber informação e transformá-la em

conhecimento); um esquema conceitual que permita

processos de inferência acerca das propriedades não-

observadas de um determinado objeto e a construção de

novos observáveis, na base do que se antecipou e do que

foi verificado” (FERREIRO, 2001b, p. 66).

Em linhas gerais trata-se da necessidade do professor estar buscando

compreender de que maneira o seu aluno está aprendendo, como ele está

construindo seus conhecimentos acerca do conteúdo que lhe é apresentado,

pois não basta o professor trazer informações prontas, se estas não

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possibilitam ao aluno uma interação ativa e construtiva com o objeto de

conhecimento, permitindo que o aluno progrida e avance conceitualmente.

A partir dessas considerações, pode-se então afirmar que cabe ao

professor fazer:

“A distinção entre métodos ou procedimentos de ensino e

o processo de aprendizagem. O propósito de manter o

processo de aprendizagem sob controle traz implícita a

suposição de que os procedimentos de ensino

determinam os passos na progressão da aprendizagem”

(FERREIRO, 2001b, p. 67).

No âmbito dessa discussão e na tentativa de um maior entendimento

acerca das dificuldades de alfabetização das crianças que se encontram no

ciclo inicial e intermediário da escola pesquisada, trouxe a seguinte questão:

“Quais instrumentos você considera auxiliar ou retardar a aprendizagem de

seus alunos?”.

Mais uma vez houve unanimidade, as professoras foram categóricas ao

afirmarem que a família é quem muitas vezes dificulta a aprendizagem da

criança, ou seja, a criança que não tem o apoio familiar, certamente estará

propícia ao fracasso escolar. Em primeiro lugar, faz-se necessário esclarecer

que realmente muitas crianças que não têm o apoio de seus familiares sentem-

se desestimuladas e desprestigiadas; em segundo lugar, e com um olhar mais

cuidadoso sobre esta questão, um outro aspecto pode ser revelado, ou seja, a

família pode desestimular, mas não pode impedir a aprendizagem.

Por isso, faz-se necessário o professor ser o interlocutor do aluno,

atuando junto à ele – estimulando o seu desenvolvimento intelectual e

propondo atividades significativas e desafiadoras. Colocando o aluno para

pensar o professor estará lhe proporcionando experimentações reais e não

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pautadas em técnicas de ensino. Dessa maneira o aprendizado da escrita

como um sistema de representação, e não como um código que deva ser

codificado e decodificado, acontecerá de forma efetiva.

“A mutualidade se reflete nos entendimentos, [o professor]

sabe entrar no ponto de vista da criança, e aos poucos ela

também aprende a colocar-se na perspectiva dele e dos

amigos; na coerência de idéias, pois o raciocínio evolui;

na autoconfiança para criar maneiras singulares de

pensar a realidade e no prazer de ser construtor de

conhecimentos novos” (SEBER, 1997, p. 180).

Um terceiro aspecto pode ser ressaltado, em nenhum momento as

professoras consideraram que as suas práticas podem estar dificultando o

aprendizado dos seus alunos. Novamente, elas permanecem com suas

certezas que não são questionadas e que não potencializam os saberes dos

alunos. Suas práticas ao invés de serem ressignificadas tornam-se visões

universais, e não se constituem como práticas emancipatórias por não

abarcarem o conhecimento de mundo e não considerarem as vivências dos

alunos enquanto sujeitos cognitivos, epistemofílicos e históricos. Quando o

professor não questiona suas certezas corre o risco de tornar-se obsoleto ou

um “boneco de marionetes” nas mãos de teorias que acabam por desvalorizar

a sua prática pedagógica. O professor precisa ouvir o aluno e estar buscando

junto com ele, maneiras criativas e dinâmicas que possibilitem, ao aluno, o

desenvolvimento intelectual, não falo de “modismos”, ou seja, colocar tudo que

surge de novidade dentro da sala de aula, falo no sentido do professor se

assumindo como pesquisador, estar buscando respaldo teórico, resgatando

assim, a autonomia de sua prática.

“Com dúvidas e questionamentos, o professor progride

intelectualmente. Em contrapartida, estaciona quando

nada mais lhe resta para perguntar. As incertezas, os

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conflitos auxiliam, portanto, na busca de fontes de

conhecimento. Aumentando seus conhecimentos, o

professor tem chance de ver de modo diferente antigas

atitudes num confronto aberto com uma postura

pedagógica qualitativamente diferenciada” (SEBER, 1997,

p. 149).

Desse modo, o professor alfabetizador não deve se sentir inferior ou se

sentir castigado por estar lecionando nas séries iniciais, pelo contrário, deve

assumir uma postura profissional, ser um pesquisador, um leitor, ou seja, um

efetivo usuário da língua escrita, pois geralmente os “professores lêem pouco,

escrevem menos e estão mal alfabetizados para abordar a diversidade de

estilos da língua escrita. Na realidade eles são o produto das más concepções

de alfabetização...” (FERREIRO, 2001a, p. 48).

De acordo com esta afirmativa de Ferreiro, podemos perceber que as

professoras, ainda hoje, alfabetizam como foram alfabetizadas, ou seja, dentro

das concepções tradicionais de ensino, onde não há uma valorização dos

sujeitos aprendentes enquanto construtores de conhecimentos e a língua

escrita é associada a uma transcrição gráfica da fala (codificação e a

decodificação) sendo assim, dissociada do contexto social e vista como um

objeto estritamente escolar.

Partindo desta constatação ao entrelaçar as falas cotidianas das

professoras (observação), o questionário e a entrevista semi-estruturada,

percebemos que há algumas contradições, uma delas é quando as professoras

W e X dizem usar o construtivismo e, isto de fato não se concretizar, talvez,

como apontado anteriormente, por falta de leituras que abranjam o assunto,

como afirma Ferreiro (2001a): “os professores lêem pouco”, e esta falta de

leitura acaba por influenciar suas práticas, fazendo com que algumas

professoras atuem somente guiadas pelo bom-senso, dissociadas das teorias,

tornando suas ações esvaziadas de sentido e de intencionalidade. E esse

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distanciamento entre a prática e a teoria pode trazer como conseqüência uma

experiência desanimadora para as crianças que se encontram na fase inicial da

alfabetização, como também para o professor, que torna-se um “escravo” de

métodos de ensino que descaracterizam e estereotipam a sua prática

pedagógica. Cabe fazer um adendo, no que diz respeito as teorias o que

proponho é um diálogo constante entre a teoria e a prática e, não que as

professoras sejam engolidas pelas teorias, pois estas devem nos auxiliar no

entendimento de nossas práticas, as nossas ações precisam ser conscientes

para que não sejamos somente guiadas pela intuição.

Geralmente o professor alfabetizador não potencializa o conhecimento

de seus alunos, não lhes dá voz e não interage com eles com o intuito de

auxiliá-lo no processo de alfabetização. A partir dessa reflexão, ao perguntar as

professoras W, X, Y (questionário) se: “Os seus alunos ao final do ano letivo

estariam alfabetizados”, elas responderam:

Professora W: “A maioria sim, porque faço o meu trabalho com

responsabilidade”. A professora X: “Não algumas crianças não possuem auxílio

em casa e não conseguem assimilar as noções, depois de um determinado

tempo esquecem”. E a professora Y: “Não, pois tenho alunos que faltam

bastante, não tem condições para aprender”.

O primeiro ponto a ser ressaltado é o pessimismo das professoras no

que se refere a aprendizagem de seus alunos, pois afirmar que alguns alunos

não têm condições de aprender, é menosprezar as construções das crianças e

deixar de vê-las como sujeitos construtivos, pois mesmo que elas não se

alfabetizem, ou permaneçam dentro de seu nível conceitual, não quer dizer que

não tenham aprendido nada, que não tenham construído suas hipóteses, feito

suas inferências sobre o material escrito, mas isto só será reconhecido como

uma conquista do aluno se o professor assumir o seu papel de pesquisador, de

interlocutor, de mediador e de facilitador da aprendizagem de seu aluno, pois

enquanto o professor se manter distante, se apoiando em práticas tradicionais

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de ensino essas conquistas passarão despercebidas, mesmo que o seu

trabalho seja feito com responsabilidade, como afirma a professora W.

O segundo aspecto, diz respeito a conduta das professores de não

estarem se questionando, pois se a criança “aprende” e no momento seguinte

“esquece”, então, como se deu essa aprendizagem, será que foi de maneira

efetiva e significativa ou a criança apenas assimilou as técnicas de algumas

atividades e na verdade não internalizou/não construiu efetivamente o seu

conhecimento acerca do conteúdo apresentado? Essas e outras perguntas

devem estar sempre perpassando as práticas docentes, pois só assim, tais

práticas estarão voltadas para a transformação e não para a perpetuação de

visões universais, no que se refere ao processo de aprendizagem da criança.

Estar em sala de aula com essas professoras - observando, interagindo,

dando voz a elas – me fez perceber que enquanto educadoras não somos

donas da verdade, mas precisamos estar em constante vigília de nossas

práticas, questionando-as, aperfeiçoando-as, ou seja, mantendo um diálogo

constante com as teorias, com as leituras, com as colegas de profissão,

buscando uma reeducação de nossas certezas e de nossos dogmas

cristalizados, pois a partir do momento que deixamos de perguntar, de

questionar e de refletir – deixamos de aprender.

A base do aprendizado são as dúvidas, as incertezas, as buscas de

conhecimentos e se deixamos de perguntar, deixamos de crescer como

pessoas e como profissionais. As nossas práticas não devem aprisionar os

nossos alunos e sim libertá-los para uma plena atuação na sociedade em que

vivem, tornando-os críticos, leitores, autores, escritores... É certo que temos

muito a ensinar, mas também temos muito para aprender... E nesse

aprendizado nossas práticas poderão se tornar melhores possibilitando que

nossos alunos aprendam de maneira efetiva, nos libertando do aprisionamento

automatizado das concepções tradicionais que circundam a alfabetização

inicial. Nós educadoras precisamos resgatar a nossa condição de sujeitos

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históricos, nossa e dos alunos, resgatando o nosso referencial, construindo a

nossa identidade, procurando manter um distanciamento de práticas

excludentes, que não nos valoriza enquanto autênticos sujeitos construtores de

conhecimentos.

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CONCLUSÃO

“A marca única, genuína (sangrada) do autor emerge

dessa busca de si mesmo contaminada do outro, na

palavra. Dessa maneira quando escrevemos, não

buscamos somente respostas únicas, mas sim

essencialmente PERGUNTAMOS. Permanente

inquietação de ser vivo, que nos remete a nós mesmos e

a essência de nossa existência” (WEFFORT, 1996, p. 38).

Estar em uma sala de aula com o olhar de uma psicopedagoga requer

que nossos olhos estejam despidos de pré-conceitos, de julgamentos e de

falsos “achismos”, neste sentido fez-se necessário que eu reeducasse o meu

olhar, não os fechando, mas o direcionando. Como aliada trouxe a teoria, mas

procurando me encontrar como profissional da psicopedagogia, tentei não

deixá-la abafar minha voz, mantendo com ela um diálogo constante.

Dentro das salas de aulas observadas, bem como, nas falas das

professoras ficou evidenciado que há uma predominância dos métodos

tradicionais de ensino, ou seja, o ensino continua pautado nas cópias, na

memorização, na repetição e no uso de atividades retiradas das cartilhas. As

professoras continuam presas as amarras de um ensino excludente e

classificatório, no qual as crianças por mais esforçadas e interessadas que

sejam, não são percebidas como sujeitos pensantes e capazes de construir

conhecimentos, pois se não conseguem acompanhar o conteúdo escolar, são

tidas como incapazes, problemáticas ou “não querem nada”. A língua escrita

nesta perspectiva é tida como um dogma, não pode ser transformado, não

pode ser recriado e muito menos questionado. A escrita torna-se então, para a

criança um objeto estranho com o qual ela não pode interagir de maneira

significativa e real, assim a criança a recebe em pedaços, em doses

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homeopáticas, porque dessa maneira fica mais fácil para compreender. Mais

fácil pra quem? Não importa, mais fácil e pronto.

De acordo com os estudos realizados, não por panfletagem ou apologia

ao construtivismo ou a Emilia Ferreiro, considero que alguns de seus conceitos

poderiam dar uma nova dimensão a algumas práticas pedagógicas que

precisam ser desconstruídas, ressignificadas... Não digo que as professoras

devam pegar as contribuições de Ferreiro e segui-la fielmente sem

questionamentos, parto do princípio que o professor, ao se assumir

pesquisador e leitor, faça uma releitura de tais conceitos e a partir desta

releitura adequem a sua realidade e as suas necessidades cotidianas.

As dúvidas e as contradições das professoras não me preocupam,

desde que subjacentes a elas estejam o desejo e a busca do saber e do

conhecer. O que me preocupa são as certezas cristalizadas que não são

questionadas e que acabam por acarretar o empobrecimento de suas práticas

pedagógicas.

É certo que alfabetizar neste contexto heterogêneo, onde há uma

multiplicidade de saberes, é uma tarefa difícil, mas não é justificativa para

pautarmos a alfabetização inicial em métodos voltados para a

homogeneização, onde prevalece a automatização, pois estes privilegiam a

transmissão de saberes em detrimento da construção. Precisamos dar voz as

crianças, valorizar as suas produções, não através de prêmios ou de

classificações, mas estimulando-as a produzir, a ler, a escrever e a interagir

com os materiais gráficos – enxergando-as como sujeitos cognitivos e

históricos.

Cabe ao psicopedagogo auxiliar as educadoras no sentido de estarem

se vendo como pessoas autônomas e capazes, pois caso contrário, não

resgatarão o verdadeiro sentido de suas práticas, não potencializarão os seus

saberes se atribuírem aos manuais de alfabetização a tarefa de alfabetizar os

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seus alunos. Neste sentido, continuarão a perpetuar as práticas excludentes

que desde a nossa colonização, estiveram subjacentes no cenário educacional

brasileiro, sendo assim, não há como desprezar que enquanto suas práticas

estiverem moldadas e padronizadas com os resquícios do ensino jesuítico, as

crianças com dificuldades de aprendizagem, advindas das classes populares,

continuarão a crescer, pois elas não vêem a escola como um local que valorize

a diversidade cultural, mas sim que prioriza a homogeneização e no professor

não encontra um parceiro, um interlocutor que considera as suas vivências,

suas construções e suas conceitualizações, mas sim que o classifica e, mesmo

que inconscientemente, o exclui.

Dar voz às professoras para entender as suas práticas pedagógicas na

alfabetização inicial, foi um ponto de partida para novos questionamentos, ou

seja, como pesquisadora estarei partindo, futuramente, para questões que

neste momento não fui capaz de responder, por isso trago apenas algumas

conclusões, que não são finais, pois ainda tenho muito que pesquisar e que

entender, ou seja, faz-se necessário um maior entendimento de: Como se deu

a trajetória dessas professoras alfabetizadoras? Como trabalhar com essas

crianças que possuem conhecimentos tão diversificados e que se encontram

em níveis distintos de conhecimentos? E os curso de capacitação poderiam

auxiliar essas professoras? De que maneira? Será que o contexto no qual

estão inseridas acabam por influenciar as suas práticas? Será que as

professoras são realmente produtos das más concepções de alfabetização?

Essas e outras questões estão povoando e inquietando a minha mente, o meu

eu-pesquisador.

Contudo, não se pode deixar de destacar que não podemos negar os

saberes dessas professoras, mas também não podemos deixar de questionar

as suas certezas, pois como já foi dito, quando deixamos o questionamento de

lado, deixamos também o aprendizado.

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Finalizando, considero que ao psicopedagogo compete o papel na

unidade escolar é o de promover um ambiente propício para o resgate do

prazer de ensinar e de aprender; onde os “atores sociais” interajam de maneira

significativa, suscitando o desejo da construção e apreensão de novos

conhecimentos.

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MOLL, Jaqueline. Alfabetização possível: reinventando o ensinar e o

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TEBEROSKY, Ana; COLOMER, Teresa. Aprender a ler e a escrever: uma

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TFOUNI, Leda Verdiani. Letramento e alfabetização. 4. ed. São Paulo:

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WEFFORT, Madalena Freire. Observação, registro, reflexão: instrumentos

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Alfabetização dos alunos das classes populares. 4. ed. São Paulo: Cortez,

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ANEXOS

ÍNDICE DE ANEXOS

Anexo 1 >> Questionário

Anexo 2 >> Roteiro de Entrevista

Anexo 3 >> Atividades Extras

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ANEXO 1

QUESTIONÁRIO

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QUESTIONÁRIO DESTINADO AS DOCENTES DO CICLO INICIAL (C.A.) E

CICLO INTERMEDIÁRIO (1ª SÉRIE).

1) Em que ciclo você leciona nesta escola?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

2) Qual é a sua formação?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

3) É a primeira vez que leciona neste período do ciclo ou já lecionou antes?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

4) Você “gosta” ou está “gostando” de lecionar neste período do ciclo? Por

que?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

5) Como seus alunos aprendem?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

6) Como você alfabetiza? Apóia-se em métodos? Quais?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

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7) Como você sente que estão seus alunos frente aos conhecimentos?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

8) Que instrumentos você considera auxiliar ou retardar a aprendizagem de

seus alunos?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

9) Você acha que ao terminar o ano letivo todos os seus alunos estarão

alfabetizados? Por quê?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

10) Você já participou de cursos de capacitação de professores? Quais?

_____________________________________________________________

_____________________________________________________________

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ANEXO 2

ROTEIRO DE ENTREVISTA

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ROTEIRO PARA ENTREVISTA GRAVADA COM DOCENTES DO

CICLO INICIAL (C.A.) E INTERMEDIÁRIO (1ª SÉRIE).

1) Como foi respondido no questionário você falou que utiliza o

Construtivismo. O que é Construtivismo? Como você conheceu o

Construtivismo?

2) Em que momentos você utiliza o construtivismo e em que momentos

você utiliza os métodos tradicionais? Que métodos tradicionais você

utiliza?

3) Você conhece algum teórico/autor que seja Construtivista? Qual (quais)?

4) Caso Emília Ferreiro não seja citada, perguntar se já ouviram falar dela

e de suas pesquisas. Caso seja citada, perguntar o que sabem sobre as

suas contribuições (concordam ou discordam?).

5) Já utilizou alguns conceitos de Emília Ferreiro em sala de aula? Quais?

6) Como os seus alunos aprendem?

7) Como você sente que está a aprendizagem de seus alunos (aprendem

com facilidade e/ou têm muita dificuldade de aprender)?

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ANEXO 3

ATIVIDADES EXTRAS

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ÍNDICE FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3 DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

CONTEXTUALIZANDO A ALFABETIZAÇÃO 11

1.1 - As abordagens teóricas e as práticas de alfabetização 18

1.2 - Alfabetização uma questão de método!?. 22

1.3 - O uso das cartilhas na alfabetização 24

CAPÍTULO II

CONHECENDO A PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA 28

2.1 - A Psicogênese e a criança 31

2.2 - A Psicogênese e o professor 42

CAPÍTULO III

A PSICOPEDAGOGIA 48

3.1 - Um breve histórico da Psicopedagogia 50

3.2 - Campo de atuação da Psicopedagogia Preventiva 55

CAPÍTULO IV

PSICOGÊNESE E PSICOPEDAGOGIA UMA PARCERIA 63

4.1 - As práticas cotidianas: um olhar psicopedagógico 64

4.2 - Revisitando e dialogando com as práticas cotidianas 78

CONCLUSÃO 92

ANEXOS 96

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 100

ÍNDICE 109

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes

Título da Monografia: Psicogênese e Psicopedagogia: semeando uma

parceria.

Autor: Denise Alves de Aguiar Bernardo

Data da entrega: 28 de fevereiro de 2006

Avaliado por: Conceito:

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