UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES AVM ... - Pós-Graduação · ocorra a precarização das relações de...

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1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES AVM FACULDADE INTEGRADA PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FRAUDE ÀS RELAÇÕES DE EMPREGO AUTOR ROSANE APARECIDA RODRIGUES ORIENTADOR PROF. CARLOS AFONSO LEITE LEOCADIO RIO DE JANEIRO 2013 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES AVM FACULDADE INTEGRADA

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FRAUDE ÀS RELAÇÕES DE EMPREGO

AUTOR

ROSANE APARECIDA RODRIGUES

ORIENTADOR

PROF. CARLOS AFONSO LEITE LEOCADIO

RIO DE JANEIRO 2013

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES AVM FACULDADE INTEGRADA

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FRAUDE ÀS RELAÇÕES DE EMPREGO Monografia apresentada à Universidade Candido Mendes – AVM Faculdade Integrada, como requisito parcial para a conclusão do curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito e Processo do Trabalho. Por: Rosane Aparecida Rodrigues

RIO DE JANEIRO 2013

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Este trabalho é dedicado às pessoas que sempre estiveram ao meu lado, me acompanhando, apoiando e principalmente acreditando em mim: meu querido esposo e meus pais. Muito obrigada.

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RESUMO

O trabalho possui na sua essência uma dimensão objetiva e uma dimensão subjetiva o que proporciona ao trabalhador um sentido de dignidade pessoal, o que lhe imprime um valor social. Por isto, o trabalho deve ser digno e ser oferecido nos termos da lei sem que haja fraude ao sistema jurídico. As fraudes as relações de trabalho ferem o principio da dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho prejudicando os trabalhadores que têm seus direitos trabalhistas burlados devido a ganância dos empresários em obter cada vez mais lucros com o uso de uma força de trabalho barata. Cumpre ressaltar que as empresas se aprimoram cada vez mais em encontrar meios eficazes de fraudar o sistema jurídico. Exemplo dessas fraudes são o uso de contratos de representação comercial, arrendamento, parceria rural, pejotização, socialização de empregados, trabalho temporário para mascarar uma efetiva relação de emprego. Essas fraudes trazem consequências desastrosas tanto na área econômica como também nas áreas sociais e politicas. As piores consequências atingem diretamente os trabalhadores e também a sociedade como a precarização das relações de trabalho, a mercantilização do trabalho e a concorrência desleal. Desse modo é imprescindível que a Justiça do Trabalho e a fiscalização do trabalho atuam para combater essas fraudes e, principalmente, resguardar os direitos trabalhistas destes trabalhadores e evitar que essas fraudes se perpetuem e contaminem todo o sistema jurídico.

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METODOLOGIA

O presente trabalho constitui-se em uma descrição detalhada das fraudes

as relações de emprego, de suas consequências no meio jurídico, social e

econômico, bem como os meios eficazes de se combater esta pratica que lesa os

direitos dos trabalhadores.

Para tanto, o estudo que ora se apresenta foi levado a efeito a partir do

método da pesquisa bibliográfica, em que se buscou o conhecimento em diversos

tipos de publicações, como livros e artigos em jornais, revistas e outros periódicos

especializados, além de publicações oficiais da legislação e da jurisprudência.

Por outro lado, a pesquisa que resultou nesta monografia também foi

empreendida através do método dedutivo e o histórico comparativo, porque teve

como marco referencial e fundamento exclusivo tratar as diferenças entre as

relações de trabalho e as relações de emprego para então identificar há

existência de fraude a legislação trabalhista ou não. Ademais, buscou-se

identificar a realidade social em estudo e o tratamento jurídico a ela conferido, sob

o ponto de vista específico do direito positivo brasileiro.

Desse modo realizou-se em um primeiro momento, uma análise

histórica dos textos referentes ao tema, num segundo momento, foi feita uma

análise sucinta sobre o intuito das empresas e empregadores para fraudarem o

sistema jurídico e, por último analisou-se as consequências jurídicas dessas

fraudes e como evitar a perpetuação dessas fraudes, protegendo os

trabalhadores e resguardando os seus direitos.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................... 8

CAPÍTULO I

DO DIREITO FUNDAMENTAL AO TRABALHO .................................................11

1.1 A DIMENSÃO SUBJETIVA DO TRABALHO ................................................11

1.2 A DIMENSÃO OBJETIVA DO TRABALHO ..................................................12

1.3 EVOLUÇÃO HISTORICA DAS RELAÇÕES DE TRABALHO.......................13

1.4 CONSILIUM FRAUDIS X FRAUDE OBJETIVA .............................................14

CAPÍTULO II

FORMAS DE FRAUDES AS RELACOES DE EMPREGO .................................16

2.1 TRABALHO TEMPORARIO...........................................................................16

2.2 CONTRATOS CIVIS.......................................................................................21

2.3 A FIGURA DA PEJOTIZAÇÃO.....................................................................43

2.4 SOCIALIZAÇÃO DE EMPREGADOS............................................................50

CAPÍTULO III

CONSEQUENCIAS DA FRAUDE AS RELACOES DE EMPREGO ..................64

3.1 MERCANTILIZAÇÃO DO TRABALHO.........................................................64

3.2 PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO..................................66

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3.3 CONCORRENCIA DESLEAL..........................................................................70

CONCLUSÃO........................................................................................................71

BIBLIOGRAFIA.....................................................................................................74

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho é um estudo sobre as várias faces das fraudes às

relações de emprego. Nesse contexto, o trabalho dedica-se a analisar a

regularidade de algumas espécies contratos de trabalho de modo a garantir que

tais contratos não sejam desvirtuados do seu objetivo e, principalmente, que não

ocorra a precarização das relações de trabalho.

Este estudo dedica-se a delinear as dimensões objetiva e subjetiva do

trabalho com o fim de se identificar a importância do trabalho na vida do ser

humano. Delineia também a análise histórica das relações de trabalho regidas

pelo Código Civil, a evolução do trabalho na sociedade e o estudo do instituto

utilizado para a caracterização da fraude trabalhista o que difere do instituto de

direito civil, ou seja, a figura da fraude objetiva versus o consilium fraudis. Cumpre

ressaltar que nas fraudes às relações de emprego será aplicado o instituto da

fraude objetiva previsto no art. 9º da CLT. Neste caso o requisito subjetivo, isto é,

a vontade de fraudar a lei é dispensável para se caracterizar a relação de

emprego porque na fraude objetiva basta a presença dos elementos

caracterizadores da relação de emprego para se estabelecer o vinculo de

emprego entre o tomador e o trabalhador, o importante é o contrato-realidade

pautado no principio da primazia da realidade

Diante deste contexto histórico traçado, o presente estudo analisa

algumas espécies de contrato de trabalho, a relação jurídica estabelecida entre o

trabalhador e o tomador de seus serviços, a presença dos elementos fático-

jurídicos caracterizadores da relação de emprego e o desvirtuamento da

finalidade dos contratos de trabalhos celebrados. E adicionalmente o presente

estudo apresenta as consequências das fraudes às relações de emprego que

afetam diretamente os direitos dos trabalhadores e também toda a sociedade.

O estudo do tema e das questões analisadas em torno dessas questões

trabalhistas justifica-se pelo fato de sua grande relevância na área econômica,

social e politica e, primordialmente, porque traz prejuízos, às vezes irreparáveis,

aos trabalhadores que deixam de ter garantidos seus direitos mínimos previstos

constitucionalmente e nas leis do trabalho. Segundo Rui Alvim (1991, p. 39)

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Afora o fato alarmante de tal disposição criar incentivo à ganância do empresariado livre, à medida que o livra, nas contratações, do rol de direitos embutidos na legislação trabalhista, em cabal desrespeito à igualdade constitucional, essa absurdez mistura todo e qualquer tipo de trabalho.

As fraudes as relações de emprego representam a ganância do

empresário em conseguir cada vez mais e mais lucro a custa da exploração

desenfreada da classe trabalhadora. Assim, Süssekind (2003, pág. 217) dispõe

que:

Em toda comunidade, durante a história da civilização, apareceram, como surgirão sempre, pessoas que procuram fraudar o sistema jurídico em vigor, seja pelo uso malicioso e abusivo do direito de que são titulares, seja pela simulação de atos jurídicos, tendentes a desvirtuar ou impedir a aplicação da lei pertinente, seja, enfim, por qualquer outra forma que a má-fé dos homens é capaz de arquitetar. Por isto mesmo, inúmero são os atos praticados por alguns empregadores inescrupulosos visando a impedir a aplicação dos preceitos de ordem pública consagrados pelas leis de proteção ao trabalho.

Dessa forma, este trabalho justifica porque busca identificar essas fraudes

e suas consequências e evitar que elas ocorram e prejudiquem os direitos dos

trabalhadores.

A pesquisa que precedeu esta monografia teve como ponto de partida o

pressuposto de que os direitos dos trabalhadores devem ser garantidos com o fim

de se evitar o enriquecimento ilícito do tomador de serviços que utiliza sua mão-

de-obra e aufere lucros com a exploração desses trabalhadores. Desse modo

evita-se não somente o enriquecimento ilícito, mas também a precarização das

relações de trabalho, a concorrência desleal e a mercantilização do trabalhador.

Assim a fundamentação teórica para estas garantias foi baseada na

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (artigos 5º, inciso XLIX,

artigo 6º, 7º, 170 e 193) Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-lei nº

5.452/1943, artigos 3º, 6º, 9º e 157, inciso I), Jurisprudência Trabalhista (Sumula

331 do TST), Lei 6019/1979– Trabalho Temporário, Lei 4504/1964 – Estatuto da

Terra, dentre outras.

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CAPÍTULO I

DO DIREITO FUNDAMENTAL AO TRABALHO

O conceito de trabalho percorreu anos de história, vinculando-se cada vez

mais às mudanças nas estruturas sociais. Segundo Martins (2005, p.4)

trabalho foi considerado na Bíblia como castigo. Adão teve de trabalhar para comer em razão de ter comido a maçã proibida. Trabalho vem do latim tripalium, que era uma espécie de instrumento de tortura de três paus ou uma canga que pesava sobre os animais.

O trabalho, então, era considerado um instrumento de tortura, era um

castigo imposto pelos deuses, retratava apenas sofrimento. Mais tarde, veio a

escravidão. Os escravos tinham apenas o dever de trabalhar e a eles não era

garantido nenhum direito. Os mesmos eram denominados de “coisa” e utilizados

como o meio dos senhores obterem suas riquezas. Trabalho naquela época era

algo ruim, algo pejorativo e envolvia apenas a força física.

Depois deste período, veio à servidão, que conforme Martins (2005, p.4)

“os senhores feudais davam proteção militar e política aos servos, que não eram

livres, mas, ao contrário, tinham de prestar serviço na terra do senhor feudal.” O

que ocorria naquela época era que os servos trabalhavam em troca,

simplesmente, de proteção e de uso da terra, sendo o trabalho ainda considerado

como castigo, imperando a lei do mais forte. O trabalho continuava sendo um

dever dos servos para com os seus senhores. Entretanto, aos servos não era

garantido nenhum direito, nenhuma escolha, continuavam presos às imposições

de seus senhores.

Mais adiante, segundo Martins (2005) surgem as corporações de ofício e

neste tipo de trabalho havia certa liberdade do trabalhador e o fim maior dessas

corporações era os seus próprios interesses. Com a Revolução Francesa foram

abandonadas essas formas de corporações por ferir o ideal de liberdade do

homem. Ideal que era o fundamento de tal revolução.

Segundo Fábio Goulart com a Revolução Industrial foi possível atingir a

relação jurídica de prestação de trabalho pessoal e subordinado. O trabalho

manual foi substituído pela produção automatizada, correndo assim a sucessiva

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transformação do processo de exploração do trabalho humano. Com esta

transformação o sistema produtivo passou de uma economia agrária para o

sistema produtivo capitalista voltado para economia de mercado, mudando mais

uma vez o conceito de trabalho. A partir de então o trabalho passou a ter em si

um valor social e passou a ter a intervenção do Estado de forma a garanti-lo.

Dessa forma, o trabalho passou a ter a natureza de direito social

constitucionalmente garantido.

Por fim, o trabalho se caracteriza como o maior bem da vida, é deve ser

digno, que invista a pessoa de seus valores sociais. O trabalho traz em seu bojo

uma dimensão subjetiva e objetiva, é o mecanismo que sustenta o cidadão.

Portanto, é importante avaliar tais dimensões de forma a buscar o verdadeiro

sentido do trabalho, o que será analisado a seguir.

1.1 A DIMENSÃO SUBJETIVA DO TRABALHO

O trabalho é um meio que individualiza a pessoa no contexto social, que

determina seu caráter, que o identifica perante os demais indivíduos. É condição

fundamental para o crescimento humano, é o elemento básico e integrador de

toda uma sociedade.

Segundo Strefling (2006, p. 773) “o trabalho, em sentido subjetivo, é o

agir do homem enquanto ser dinâmico, capaz de levar a cabo várias ações que

pertencem ao processo do trabalho e que correspondem à sua vocação pessoal.”

É por meio do trabalho que as sociedades se desenvolvem. Assim, para João

Lobo (2004, p.4),

a fronteira que delimita o conceito de trabalho enquanto fator de realização humana daquele outro em que o trabalho conte em si a carga negativa opressora do tripalium (instrumento composto por três paus ou varas cruzadas, usado para prender animais e também como instrumento de tortura – que exprime, na sua origem semântica, a noção de trabalho e o sacrifício que a realização do mesmo implica) nem sempre é clara e necessita de diferenciação legal em homenagem à proteção dos valores fundamentais da pessoa humana.

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Portanto, essa fronteira separa bem dois conceitos de trabalho. O

primeiro, como fator de realização humana, o que imprime o caráter subjetivo do

trabalho. O segundo, como sacrifício para alcançar, por exemplo, o seu sustento,

o que demonstra o caráter objetivo do trabalho.

O trabalho como fator de realização pessoal exterioriza o seu fim maior

que é a dignificação do ser humano enquanto indivíduo. Por outro lado, o

sacrifício necessário para alcançar este fim traz em si uma carga negativa, ou

seja, um esforço físico, psicológico e outros. Segundo Strefling (2006, p. 785)

o homem ama o trabalho, quando sente paixão por criar e possuir o criado. Pelo contrário, não pode amar, quando é só fadiga física, esforço, mercadoria entregue em troca de um salário. Quando o homem não pode trabalhar e levar a cabo sua obra, não alcança sua plenitude. Isto é reduzi-lo ao desemprego antropológico, a ser uma pedra, ou uma parasita que vive de subsídios ou heranças.

Por isto, o trabalho deve ser algo que traga satisfação e que possa ser

feito com amor e dedicação. Deve ser o meio de vida, de dignificação do ser

humano, de dever cumprido e de ser útil e contribuidor para a evolução de toda

uma sociedade que em contrapartida deve ser justa, solidária e igualitária.

1. 2 A DIMENSÃO OBJETIVA DO TRABALHO

A dimensão objetiva do trabalho é algo que se realiza com o fito de atingir

um bem maior, com o fim de dar sentido à vida. Assim, segundo Strefling (2006,

p. 773) a dimensão objetiva do trabalho “é o conjunto de atividades, recursos,

instrumentos e técnicas de que o homem se serve para produzir, para dominar a

terra, segundo as palavras do livro do Gênesis.” Diante deste ponto de vista,

trabalho é meio, instrumento para se alcançar um determinado objetivo. Na

concepção de Giddens (1997, p. 578),

podemos definir o trabalho como a realização de tarefas que envolvem o dispêndio de esforço mental e físico, com o objetivo de produzir bens e serviços para satisfazer necessidades humanas.

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Esta definição representa o trabalho tanto em seu aspecto objetivo quanto

subjetivo. Na sua dimensão objetiva, trabalho é algo que se realiza com o fito de

atingir um bem maior, como o seu próprio sustento e de sua família e a

possibilidade de lazer. Na sua dimensão subjetiva, tem-se a satisfação das

necessidades humanas que pode ser expressa por meio da obtenção

conhecimento, identidade pessoal, dignidade, reconhecimento profissional, dentre

outras.

Portanto, produzir algo é mais do que uma necessidade humana, é

imprimir sentido ao bem maior que é a vida. É dar condição de desfrutar do fruto

do trabalho, sendo então o trabalho meio para a obtenção do fim supremo “a

vida”. É um direito que deve ser garantido a todos.

Para Strefling os avanços no campo social, político, educacional, cultural

não foram suficientes para garantir a todas as pessoas o direito fundamental ao

trabalho. Ou seja, apesar desses direitos serem garantidos pela Constituição da

República de 1988, pode-se perceber que na prática nem sempre é assim. Muitas

vezes, veem-se pessoas e pessoas desempregadas, sem oportunidades, seja

porque não teve uma boa condição social para estudar em boas escolas, ou, até

mesmo, por outras circunstâncias da vida.

Para que possa ser garantido a todos os cidadãos o direito ao trabalho é

preciso que o Estado adote politicas eficazes e, principalmente, que tenha meios

de evitar o desvirtuamento dos contratos de trabalho de modo a preservar os

direitos mínimos dos trabalhadores, bem como evitar o enriquecimento ilícito de

algumas empresas por meio de contratações irregulares causando assim

repercussão em toda a sociedade. Algumas dessas repercussões é a

concorrência desleal, a mercantilização do trabalho e a precarização das relações

de trabalho. Este assunto será abordado em capitulo especifico.

1.3 EVOLUCAO HISTORICA DAS RELACOES DE TRABALHO

Após a análise central da evolução do conceito de trabalho acima

exposto, cabe destacar neste ponto a evolução da relação de trabalho no âmbito

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do direito civil em contraponto ao direito do trabalho. Outro ponto a ser discutido é

a aplicação subsidiária dos institutos de direito civil ao direito do trabalho.

Primeiro convém ressaltar que o Direito Civil, no Brasil, surgiu bem antes

da Consolidação do Direito do Trabalho. O código civil de 1916 trazia e o Código

Civil de 2002 traz em seu bojo diversos institutos relativos à prestação de

serviços, seja por meio de locação de serviço, representação comercial,

contratos de parceria e meação (em lei especifica), dentre outros. Esses institutos

caracterizam uma relação de trabalho típica onde não há vínculo empregatício

entre o prestador e o beneficiário da mão-de-obra.

Entretanto, o que tem ocorrido com frequência é a utilização destes

institutos com o fim de mascarar a relação de emprego e afastar o dever de

garantir os direitos sociais a esses trabalhadores como previsto

constitucionalmente.

1.4 CONSILIUM FRAUDIS X FRAUDE OBJETIVA

No direito civil as características dos contratos de prestação de serviço

diferem dos contratos de trabalho previstos na legislação trabalhista. Da mesma

forma ocorre com os institutos utilizados para se determinar a nulidade de tais

contratos.

Na seara civilista para que seja declarada a nulidade de um contrato é

preciso a presença do consilium fraudis, já na seara trabalhista as fraudes aos

contratos de trabalho são declaradas com base no artigo 9º da CLT que trata do

instituto da fraude objetiva. De acordo com Ronaldo Lima

à fraude às relações de trabalho sempre foi regida por princípios diversos dos do direito civil, pois enquanto neste faz-se normamalmente necessária a prova do consilium fraudis para o reconhecimento do vício do ato jurídico no direito do trabalho, em razão do estado de hipossuficiência jurídica do empregado (e, na predominância das relações de trabalho, hipossuficiência também econômica), adotou-se o instituto da fraude objetiva, cristalizada no artigo 9º da CLT [...]

Assim a fraude objetiva é decorrente do contrato realidade, pois estando

presentes os requisitos da relação de emprego previsto no artigo 2º e 3º da CLT

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estará configurado o vínculo de emprego entre o trabalhador e o tomador de

serviços. Nesta situação não é importante saber se as partes tinham ou não

intenção de fraudar o sistema jurídico como ocorre no instituto de direito civil, ou

seja, consilium fraudis.

Por fim, na área trabalhista é imprescindível apenas a presença dos

elementos fático-jurídicos da relação de emprego para se verificar a presença da

fraude, não sendo necessário apurar-se o intuito nem sequer a intenção daqueles

que praticaram a fraude como ocorre nos contratos civis.

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CAPÍTULO II

FORMAS DE FRAUDES AS RELACOES DE EMPREGO

De inicio conceituaremos o que vem a ser fraude na relação de emprego.

A fraude na relação de emprego segundo definição de Carelli 1. é a utilização de

artifícios ou contratos vários que tentam mascarar uma relação empregatícia

existente na vida real, ou seja,

Quando ocorre uma situação em que um contrato civil qualquer é utilizado com o objetivo de que todas as regras trabalhistas não prevaleçam, ou melhor, que os direitos dos trabalhadores não sejam aplicados, ocorre o que chamamos de “fraude na relação de emprego”, que é justamente a utilização de artifícios ou contratos vários que tentam mascarar uma relação empregatícia existente na vida real.

Assim, de modo a evitar essas burlas faz-se necessário conhecer os

requisitos essenciais de algumas relações de trabalho com o fito de analisar se os

mesmos estão sendo fielmente cumpridos. Esse conhecimento é de extrema

relevância para se estabelecer as principais diferenças entre as relações de

trabalho e as relações de emprego e para concluir se há ou não algum

desvirtuamento de sua finalidade.

Neste capitulo serão abordadas as diversas formas de fraude as relações

de emprego. Mas, primeiro, será tratada a questão do trabalho temporário que é

uma forma legal de intermediação de mão-de-obra. Segundo, será analisada

algumas figuras contratuais de natureza civil normalmente utilizada para fraudar o

sistema jurídico trabalhista como a representação comercial, os contratos de

parceria rural. Por ultimo, mas ainda relacionado aos contratos civis será

analisado a figura da pejotização e socialização de empregados.

2.1 TRABALHO TEMPORARIO

Esta forma de trabalho está disciplinada na Lei 6019/74 e no Decreto nº

73.841/74. A lei e o decreto trazem a definição, as hipóteses e os requisitos do

1 CARELLI, Rodrigo. As Fraudes nas relações de emprego. Disponível em: http://www.soc.puc-rio.br. Link: cedes/PDF/cidadaniatrabalho/fraude.pdf. Data de acesso: 26/11/2012.

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trabalho temporário, bem como os requisitos necessários para a constituição de

uma empresa de trabalho temporário.

2.1.1 Conceito e hipóteses

De acordo com o artigo 2º da lei 6019/74 o trabalho temporário é aquele

prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória

de substituição de seu pessoal regular e permanente ou a acréscimo

extraordinário de serviços.

Assim o que se extrai desta definição é que o trabalho temporário só é

possível em duas hipóteses são elas: 1. para atender à necessidade transitória de

substituição de seu pessoal regular e permanente; 2. Ou em caso de acréscimo

extraordinário de serviços. Para Carelli (2010, p.21)

trabalho temporário foi criado em um momento de adoção de práticas de “reestruturação produtiva”, porém, com um claro e justo objetivo: dotar as empresa de mecanismos de contratação de trabalhadores em situações transitórias, sem que com isso fossem obrigadas a aumentar o quadro permanente

O intuito deste tipo de trabalho foi justamente permitir que empresas, em

situações excepcionais, pudessem contratar trabalhadores para suprir a falta de

seus trabalhadores efetivos ou para atender uma demanda extraordinária de

serviços, sendo, portanto, uma forma legal de se intermediar mão-de-obra.

O trabalho temporário é uma forma lícita de se contratar trabalhadores,

por intermédio de outra empresa que fornecerá a mão-de-obra, para trabalharem

inseridos na dinâmica da empresa contratante e com a presença dos elementos

fático-jurídicos da relação de emprego, quais sejam: subordinação e

pessoalidade. Entretanto, mesmo existindo a presença desses elementos a lei

permitiu a intermediação de mão-de-obra, mas desde que sejam cumpridos todos

os requisitos legais e o intuito da lei 6019/74. É importante salientar que o

descumprimento das hipóteses e dos requisitos legais ensejará a

responsabilidade do tomador de serviços e o vinculo de emprego se formará com

o tomador de serviços.

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2.1.2 Sujeitos e a Natureza Jurídica do Contrato de Trabalho Temporário

No contrato de trabalho temporário há uma relação trilateral entre três

sujeitos, são eles: o trabalhador temporário, a empresa de trabalho temporário e a

empresa contratante.

A definição de trabalhador temporário já foi mencionada. O artigo 4º da lei

6019/74 define que a empresa de trabalho temporário pode ser uma pessoa física

ou jurídica urbana, cuja atividade consiste em colocar à disposição de outras

empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas

remunerados e assistidos. Desse modo o fim da empresa de trabalho temporário

é intermediar legalmente mão-de-obra para atender as necessidades da empresa

contratante, que segundo Carelli(2010, p.23)

é aquela que contrata empresa de trabalho temporário para colocação de determinada quantidade de trabalhadores para executar atividades próprias de empregados, sob subordinação jurídica da empresa cliente ou contratante, em determinados casos especiais e previstos na legislação

Essas contratações só poderão ocorrer nas hipóteses legais para que não

haja a descaracterização desses contratos e a intermediação se torne ilegal, por

isto é importante seguir o disciplinado na lei 6019/74. Como visto, o contrato de

trabalho temporário tem natureza jurídica de relação trilateral e para a

concretização desta relação trilateral são realizados dois contratos: um de

natureza civil e outro de natureza trabalhista.

O primeiro contrato, de natureza civil, é celebrado entre o tomador do

serviço (empresa contratante) e a empresa de trabalho temporário. Este contrato

para ser celebrado deve cumprir os requisitos previstos no artigo 9º e 10 da lei

6019/74. O segundo, de natureza trabalhista é celebrado entre a empresa de

trabalho temporário e o trabalhador temporário. Diferentemente do contrato civil

este contrato deve cumprir os requisitos do artigo 11 da lei 6019/74, ou seja, deve

ser escrito e devem constar, expressamente, os direitos conferidos aos

trabalhadores no artigo 12 da Lei 6019/74.

Os direitos trabalhistas são responsabilidade da empresa de trabalho

temporário que coloca a força de trabalho do trabalhador temporário à disposição

da empresa tomadora de serviços. Cabe a ela garantir os direitos destes

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trabalhadores, somente nos casos de descumprimento dos requisitos da lei

6019/74 é que o tomador de serviço poderá ser responsabilizado e ter que

garantir os direitos trabalhistas desses trabalhadores, já que foi o beneficiado

direto da força de trabalho desses.

2.1.3 Requisitos para a validade

O contrato de trabalho temporário para ser válido é imprescindível que

seja observado com muita atenção os requisitos de validade previstos na lei

6019/74 e no decreto regulamentador. Com bem leciona Maurício Godinho

Delgado (2004, p.453) a ausência dos requisitos formais do contrato temporário

implica sua automática descaracterização, dando origem a um contrato

empregatício clássico, por tempo indeterminado, com respeito ao trabalhador

envolvido. Os requisitos de validade previstos na lei 6019/74 são os seguintes:

1. Ocorrência das hipóteses legais do artigo 2º, ou seja: a) para atender à

necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente; b.

Ou em caso de acréscimo extraordinário de serviços.

2. O contrato entre a empresa de trabalho temporário e a empresa

contratante deve ser escrito e constar expressamente o motivo justificador da

demanda de trabalho temporário, deve ainda prever a modalidade de prestação

do serviço e não poderá exceder três meses, salvo autorização conferida pelo

órgão local do Ministério do Trabalho e Emprego, caso em que não poderá

ultrapassar 6 (seis) meses.

3. O contrato entre a empresa de trabalho temporário e o trabalhador

temporário deve ser escrito e deve constar, expressamente, os direitos conferidos

aos trabalhadores no artigo 12 da Lei 6019/74.

4. A empresa de trabalho temporário deve cumprir os requisitos dos

artigos 4º, 5º e 6º, ou seja: a) ser pessoa física ou jurídica urbana; b) a atividade

fim da empresa deve ser a colocação à disposição de outras empresas,

temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados; c) a remuneração do

trabalhador temporário deve ser feita pela empresa de trabalho temporário, que

deverá ainda garantir todos os direitos trabalhistas previstos na lei nº 6019/74; d)

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dependerá de registro na Superintendência Regional do Trabalho e Emprego; e)

registro na Carteira de Trabalho e Previdência Social do trabalhador sua condição

de temporário;

A ausência desses requisitos desconfigura o contrato de trabalho

temporário e terá como consequência o reconhecimento do vínculo de emprego

com o tomador de serviços, pois estarão presentes todos os requisitos da relação

de emprego. Muitas vezes, os contratos de trabalho temporário são usados para

fraudar a verdadeira relação de emprego existente entre o tomador de serviços e

o trabalhador temporário. Estes contratos devem ser utilizados para o intuito legal

e não para fraudar o sistema jurídico, por isto é de suma importância o

cumprimento dos requisitos legais. Decisões do TST que reconhecem o vinculo

de emprego entre o trabalhador temporário e a empresa tomadora de serviços:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO RELATIVA AO PERÍODO DE ESTABILIDADE PROVISÓRIA DA GESTANTE. CONTRATAÇÃO IRREGULAR. CONTRATO TEMPORÁRIO. FRAUDE. VÍNCULO DE EMPREGO DIRETAMENTE COM A TOMADORA DE SERVIÇOS. Ausente demonstração de atendimento dos requisitos do art. 896 da CLT, mantém-se o despacho que não recebeu o recurso de revista. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (TST, AIRR - 23740-80.2003.5.01.0049, Relator Ministro: Fernando Eizo Ono, Data de Julgamento: 28/04/2010, 4ª Turma, Data de Publicação: 07/05/2010). (http://www.tst.jus.br. Acesso em 27/12/2012)

Diante do exposto, pode-se concluir que a contratação de trabalhador por

intermédio de empresa de trabalho temporário nos estritos termos da Lei n°

6.019/74, afasta a possibilidade de caracterização de vínculo direto com o

tomador dos serviços. Nos termos desta lei o tomador de serviços não é, em

regra, o responsável pelos direitos dos trabalhadores temporários, exceto nos

casos de falência da empresa de trabalho temporário em que a responsabilidade

do tomador será solidária no tocante ao recolhimento das contribuições

previdenciárias e relativo à remuneração e indenização devidas pelo período que

esteve sob as ordens do tomador.

Ademais, nos casos de fraude ao trabalho temporário, como já visto, o

vinculo de emprego se formará com o tomador de serviços que terá

responsabilidade direta pelo pagamento dos direitos trabalhistas nos termos da

Sumula 331 do TST.

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2.2. CONTRATOS CIVIS

Os contratos civis são utilizados, muitas vezes, para mascarar uma

relação de emprego. Ronaldo Lima leciona que

As primeiras formas de manifestação de fraude nas relações de trabalho debruçaram-se exatamente nas figuras contratuais clássicas do direito civil ou do direito comercial. De fato, para furtarem-se à satisfação dos direitos sociais dos trabalhadores, determinados empregadores intentam afastar a figura da relação de emprego impondo ao trabalhador a sua contratação por meio de uma das figuras contratuais clássicas da legislação civil, embora a prestação de serviços se desenvolva como típica relação de emprego, isto é, de forma pessoal, subordinada, contínua, onerosa e com alteridade (CLT, art. 2º e 3º).

Por isto, serão estudados, em um primeiro momento, três contratos de

direito civil utilizado para fraudar o sistema jurídico trabalhista. São eles: contratos

de arrendamento rural, contratos de parceria rural, contrato para representação

comercial. Além destes há outros meios utilizados pelas empresas para disfarçar

a relação de emprego, como: a “pejotização”, que é a obrigação de constituição

de uma empresa para celebração de contrato de prestação de serviço, muito

utilizado pelas empresas de informática; e outro um pouco semelhante que é a

“socialização do empregado”. Essas formas de fraudes serão tratadas em tópico

específico.

2.2.1 Contrato de arrendamento, parceria e meação rural

Os contratos de arrendamento, parceria e meação são institutos de direito

civil e estão disciplinados no Estatuto da Terra – Lei nº 4504/1964 e Decreto nº

59.566/1966. Assim como outros contratos de natureza civil, estes contratos

devem ser celebrados por agentes capazes, dever ter objeto lícito e forma

prescrita ou não defesa em lei para que seja existente, válido e eficaz. A

celebração desses contratos tem uma grande relevância para a sociedade, pois

torna as terras rurais produtivas fazendo a mesma cumprir a função social da

propriedade como previsto na Constituição da Republica Federativa do Brasil de

1988. Não só a função social é cumprida, mas também econômica e social, pois

com o desenvolvimento da agricultura é disponibilizados novos postos de

trabalho, o que beneficiara toda a sociedade.

22

2.2.1.1 Conceito

O arrendamento rural, conforme se extrai do artigo 95 do Estatuto da

Terra, é o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por

tempo determinado ou não, o uso e gozo de imóvel rural ou partes do mesmo,

incluindo ou não outros bens, benfeitorias ou facilidades, com o objetivo de nele

ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa

ou mista, mediante certa retribuição ou aluguel, observados os limites percentuais

da Lei conforme leciona Isaias Resplandes em seu artigo Arrendamento Rural.

Dessa forma, a contraprestação do arrendamento é uma retribuição ou o

pagamento de um aluguel pelo uso e gozo do imóvel rural, o que pode ser

assemelhar a um contrato de locação e que independe do resultado da produção

auferida com o uso da terra.

Para ser válido, o contrato de arrendamento deve cumprir os requisitos

impostos pelo artigo 95 da Lei nº 4504/1964 - Estatuto da Terra, o que será

analisado no próximo tópico. Além do contrato de arrendamento rural, há o

contrato de parceria rural. Este contrato é definido pelo § 1º do artigo 96 do

Estatuto da Terra que dispõe que o contrato de parceria rural

É o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso específico de imóvel rural, de parte ou partes dele, incluindo, ou não, benfeitorias, outros bens e/ou facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa vegetal ou mista; e/ou lhe entrega animais para cria, recria, invernagem, engorda ou extração de matérias-primas de origem animal, mediante partilha, isolada ou cumulativamente, dos seguintes riscos: I - caso fortuito e de força maior do empreendimento rural; II - dos frutos, produtos ou lucros havidos nas proporções que estipularem, observados os limites percentuais estabelecidos no inciso VI do caput deste artigo; III - variações de preço dos frutos obtidos na exploração do empreendimento rural.

De acordo com essa definição, pode-se salientar que a relação de

trabalho é estabelecida entre a pessoa que cede o imóvel rural ou entrega animal

para cria, recria e outras finalidades previstas no Estatuto da Terra e a pessoa

que recebe tal imóvel ou tais animais. O parágrafo único do art. 4º do decreto n.º

59.566/66 define as partes contratantes nos seguintes termos:

23

Parágrafo único: Para os fins deste Regulamento denomina-se parceiro-outorgante, o cedente, proprietário ou não, que entrega os bens; e parceiro-outorgado, a pessoa ou o conjunto familiar, representado pelo chefe, que os recebe para os fins próprios das modalidades de parceria definidas no art. 5º.

Em primeiro lugar, conclui-se que para ser parceiro-outorgante não

precisa ser proprietário do imóvel ou dos produtos cedidos, pode ser apenas

possuidor, enfiteuta ou usufrutuário do imóvel. Já o parceiro-outorgado pode ser o

conjunto familiar ou pessoa em sua representação, conferindo à família do

agricultor ou pecuarista que contrata com o parceiro outorgante as mesmas

atribuições constantes no contrato de parceria.

Extrai-se da definição do contrato de parceria a existência de alguns tipos

parceria, são eles: agrícola; pecuária, agroindustrial; extrativa; mista. Estes tipos

são definidos no art. 5º do Decreto n.º 59.566/66:

Art. 5º - Dá-se a parceria: I – agrícola, quando o objeto da cessão for o uso de imóvel rural, de parte ou partes do mesmo, com o objetivo de nele ser exercida a atividade de produção vegetal; II – pecuária, quando o objetivo da cessão forem animais para cria, recria, invernagem ou engorda; III – agroindustrial, quando o objeto da cessão for o uso do imóvel rural, de parte ou de partes do mesmo, e/ou maquinaria e implementos com o objetivo de ser exercida atividade de transformação de produto agrícola, pecuário ou florestal; IV – extrativa, quando o objeto da cessão for o uso de imóvel rural, de parte ou partes do mesmo, e/ou animais de qualquer espécie com o objetivo de ser exercida atividade extrativa de produto agrícola, animal ou florestal; V – mista, quando o objeto da cessão abranger mais de uma das modalidades de parceria definidas nos incisos anteriores.

Como se verifica é possível a celebração de contratos de parceria para

vários fins rurais, como exemplo, produção de hortaliças, frutas, criação de

animais para cria, dentre outras.

Voltando ao conceito de contrato de parceria ressalta-se que o mesmo

difere do contrato de arrendamento, pois enquanto neste há o pagamento de um

“aluguel” pelo uso do imóvel rural, naquele há a repartição dos produtos ou lucros

auferidos, bem com a repartição dos prejuízos entre os parceiros. No

arrendamento é o arrendatário que suporta todos os riscos da atividade agrícola,

independente do resultado de sua produção, o que não ocorre na parceria.

24

Dessa forma, serão demonstradas as principais diferenças entre estes

contratos tendo como base o disposto no Estatuto da terra, são elas 2:

1. Preço: no arrendamento o preço é certo e ajustado entre o arrendador e o

arrendatário numa quantia fixa em dinheiro; na parceria não existe preço certo, os

parceiros dividem os frutos de acordo com o que foi convencionado;

2. Riscos do negocio: no arrendamento o proprietário do imóvel rural não

participa dos riscos do negocio, apenas esta alugando as terras ou pastos; na

parceria o proprietário e o parceiro-outorgado participam dos riscos do negocio,

assumem os lucros ou prejuízos;

3. Uso do imóvel rural: no arrendamento o proprietário cede o uso e gozo do

imóvel rural arrendado, podendo o arrendatário tirar todo o proveito da terra; na

parceria o proprietário cede, unicamente, o uso e parte do gozo, pois os frutos e

produtos colhidos no imóvel são repartidos de acordo com o que foi

convencionado;

4. Abrangência do contrato: no arrendamento há o aluguel das terras para

plantação ou pasto para engorda do gado, ou seja, se limita a terras e pastos; na

parceria a abrangência é mais ampla, podendo abranger a entrega de animais

para cria, recria, invernagem, engorda ou extração de matérias-primas de origem

animal.

5. Remuneração: no arrendamento a remuneração do arrendador é certa, in

natura ou em espécie, independente de êxito nas safras; na parceria o lucro é

sempre representado por uma quota ou percentual.

O conhecimento das principais diferenças entre esses contratos é

importante para analise dos requisitos de validade dos mesmos. Há ainda o

contrato de meação que é definido por Vólia Bomfim (2011, p. 427, 428) como

meação agrária que é estabelecida através de um contrato de parceria, onde o

proprietário tem direito a 50% do que o seu parceiro, não proprietário, produzir.

Dessa forma, o contrato de meação nada mais é do que um contrato de parceria

onde o resultado da produção será repartido em igual proporção. No caso de um

contrato de parceria típico o resultado da produção pode ser dividido em partes

desiguais conforme estabelecido nas clausulas contratuais.

2 Sistema Faerj. Fazenda Legal. Tributário. 3ª Ed. 2008. Gráfica Rioflorense.

25

A forma de participação dos frutos do contrato de parceria é estabelecida

no inciso VI do artigo 96 do Estatuto da Terra e a quota do proprietário do imóvel

rural pode variar de 20% a 75%. O percentual da quota vai depender do quantum

disponibilizado pelo proprietário, exemplo, se fornecer apenas a terra nua terá

direito a apenas 20% da produção; se fornecer a terra preparada e moradia terá

direito a 30% da produção e assim por diante.

O critério de participação dos frutos deve ser estipulado no contrato,

assim como as clausulas de prazo de vigência, forma de extinção ou prorrogação

do contrato, dentre outras conforme prevê o inciso V do artigo 96 do Estatuto da

Terra. E importante destacar que o estabelecimento das clausulas contratuais e o

seu efetivo cumprimento pelas partes é necessário para que tais contratos não

sejam considerados nulos. Esses tipos de contrato de natureza civil não devem

ser usados para encobrir uma relação de emprego, mas sim com o fim de atender

o objetivo do Estatuto da Terra e, principalmente, para dar um fim social a

propriedade conforme já exposto.

Desse modo, ultrapassada a questão conceitual destes institutos, convém

agora dispor sobre os requisitos de validade destes contratos.

2.2.1.2 Requisitos para validade

O Estatuto da Terra estabelece como requisito de validade do contrato de

arrendamento. Neste contrato há o pagamento de um aluguel pelo uso e gozo da

terra. Entretanto, na prática, o que se vê é a celebração destes contratos de forma

verbal e sem o pagamento do referido aluguel, sendo utilizado apenas para

desfigurar uma relação de emprego existente entre o dono da terra e o

trabalhador que a utiliza para atividade rural. Dessa forma, se presentes os

requisitos da relação de emprego, ou seja, subordinação, pessoalidade,

onerosidade, habitualidade, estará configurada a burla a legislação trabalhista e

será reconhecido o vinculo de emprego com o arrendador.

No Estatuto da Terra e no Decreto nº 59566/66 estão previstos os

requisitos de validade do contrato de parceria que se passa a expor. As partes ao

26

celebraram um contrato de parceria rural devem cumprir as clausulas obrigatórias

previstas no inciso V do artigo 96 do Estatuto da Terra.

V - no Regulamento desta Lei, serão complementadas, conforme o caso, as seguintes condições, que constarão, obrigatoriamente, dos contratos de parceria agrícola, pecuária, agroindustrial ou extrativa: a) quota-limite do proprietário na participação dos frutos, segundo a natureza de atividade agropecuária e facilidades oferecidas ao parceiro; b) prazos mínimos de duração e os limites de vigência segundo os vários tipos de atividade agrícola; c) bases para as renovações convencionadas; d) formas de extinção ou rescisão; e) direitos e obrigações quanto às indenizações por benfeitorias levantadas com consentimento do proprietário e aos danos substanciais causados pelo parceiro, por práticas predatórias na área de exploração ou nas benfeitorias, nos equipamentos, ferramentas e implementos agrícolas a ele cedidos; f) direito e oportunidade de dispor sobre os frutos repartidos

Quanto à primeira condição, ou seja, quota-limite do proprietário na

participação dos lucros, as partes devem cumprir os percentuais previstos no

inciso VI do artigo 96 do Estatuto da Terra. Quanto aos prazos de duração, bases

de renovação, formas de extinção ou rescisão, direito a indenizações por

benfeitorias ou por danos serão aqueles definidos pelas partes.

Quanto a ultima condição, direito e oportunidade de dispor sobre os frutos

repartidos, cabe uma maior analise o que será feito no item 2.3.1.3. Mas em um

primeiro momento, pode-se dizer que, conforme esta clausula, o parceiro-

outorgado deve ter o livre poder para negociar o fruto da produção que lhes cabe,

não podendo o parceiro-outorgante exercer ingerência sobre o parceiro-

outorgado, nos termos do inciso II do artigo 93 da Lei 4504/64 de modo a não

desvirtuar o fim do contrato de parceria.

O Estatuto da Terra estabelece no § 1o ao § 5o do artigo 96 os requisitos

de validade do contrato de parceria rural, são eles:

1. Partilha isolada ou cumulativa dos riscos de caso fortuito e de força maior do

empreendimento;

2. Partilha isolada ou cumulativa dos frutos, produtos ou lucros havidos nas

proporções que estipularem, observados os limites percentuais estabelecidos no

inciso VI do caput deste artigo 96;

27

3. Partilha isolada ou cumulativa das variações de preço dos frutos obtidos na

exploração do empreendimento rural;

4. Prefixação, em quantidade ou volume, do montante da participação do

proprietário, desde que, ao final do contrato, seja realizado o ajustamento do

percentual pertencente ao proprietário, de acordo com a produção (§ 2o do artigo

96 do Estatuto da Terra);

5. O pagamento deve ser em percentual da lavoura e não pode ser parte em

dinheiro (§ 4o do artigo 96 do Estatuto da Terra); e

6. A direção do trabalho não deve ser de inteira e exclusiva responsabilidade do

proprietário. (§ 4o do artigo 96 do Estatuto da Terra).

Desse modo, se cumpridos os requisitos acima elencados, estará diante

de um verdadeiro contrato de parceria como legalmente previsto. Em

contrapartida, se não estiverem presentes, poderá ser desconfigurado o contrato

de parceria. Dessa forma, dependendo do caso em concreto, o descumprimento

dos requisitos do contrato de parceria poderá configurar a presença de uma

relação de emprego.

Como visto o Estatuto da Terra tem o fito de estabelecer as regras

mínimas para o trabalho do parceiro-outorgado e do arrendatário rural e traça

limites, clausulas e regras específicas para que tais contratos cumpram a sua

finalidade. Dentre estas regras, prevê no § 4o do artigo 96 do Estatuto da Terra a

possibilidade de aplicação das leis trabalhistas no caso do contrato se tornar uma

simples locação de serviço. Por isto, os contratantes devem estar atentos tanto na

fase contratual com na fase de execução do contrato para evitar o seu

desvirtuamento. O intuito do legislador neste ponto foi garantir o direito destes

trabalhadores quando, por exemplo, o parceiro-outorgante utilizar estes institutos

apenas com o intuito de mascarar uma relação de emprego e reduzir os custos e

despesas com a contratação de empregados.

Por fim, o que se conclui é que o que deve ser avaliado é o contrato

realidade, o que importa é a realidade apresentada e caso a relação de trabalho

fuja a sua finalidade estar-se-á diante de uma relação de emprego. A seguir,

serão tratados os elementos caracterizadores da relação de emprego e,

consequentemente, a possibilidade do reconhecimento do vínculo de emprego,

principalmente, quando o único intuito do tomador de serviço é a exploração de

28

mão-de-obra para a obtenção de lucro. Serão apresentadas algumas situações

que podem levar a descaracterização do contrato de parceria e o reconhecimento

do vinculo de emprego.

2.2.1.3 Configuração de relação de emprego

A relação de emprego é fruto de diversos elementos fático-jurídicos.

Esses elementos são aqueles que irão determinar a existência ou não da relação

de emprego e estão previstos no artigo 2º e 3º da CLT. Para que haja vínculo

entre o trabalhador e o tomador de serviços será necessário à existência de todos

os elementos fático-jurídicos, são eles: continuidade, subordinação, onerosidade,

pessoalidade.

Segundo Volia Bomfim (2011, p.262) para que um trabalhador urbano ou

rural seja considerado empregado, mister que preencha, ao mesmo tempo, os

requisitos da pessoalidade, subordinação, onerosidade e não eventualidade. Tais

requisitos estão previstos nos artigos 3º da CLT e artigo 2º da Lei 5889/73.

De acordo com o artigo 2º da Lei 5889/73 empregado rural “é toda pessoa

física que, em propriedade rural ou prédio rustico, presta serviços de natureza não

eventual a empregador rural, sob dependência deste e mediante salario.” Nesta

definição estão presentes todos os elementos da relação de emprego e podem-se

traçar, neste ponto, algumas diferenças entre o contrato de trabalho e o contrato

de parceria. Primeiro nos contratos de parceria não há o requisito da

subordinação e nem da onerosidade. O §4 do artigo 96 Estatuto da Terra afasta a

presença desses requisitos.

§4o Os contratos que prevejam o pagamento do trabalhador, parte em dinheiro e parte em percentual na lavoura cultivada ou em gado tratado, são considerados simples locação de serviço, regulada pela legislação trabalhista, sempre que a direção dos trabalhos seja de inteira e exclusiva responsabilidade do proprietário, locatário do serviço a quem cabe todo o risco, assegurando-se ao locador, pelo menos, a percepção do salário mínimo no cômputo das 2 (duas) parcelas.

Assim, se o parceiro-outorgado receber como pagamento parte em

dinheiro e parte em percentual na lavoura, será considerada simples locação de

29

serviço, porque a remuneração em dinheiro de qualquer dos parceiros é

incompatível com o instituto da parceria. Esta situação, pagamento em dinheiro,

se aproxima a figura do contrato de trabalho onde está presente o requisito da

onerosidade devido ao pagamento de remuneração de salário pelo trabalho

prestado.

Não há subordinação nos contratos de parceria, já nos contratos de

trabalho a subordinação é requisito essencial para a caracterização do vinculo de

emprego. Por isto, quando a direção dos trabalhos do parceiro-outorgado estiver

sob inteira e exclusiva responsabilidade do parceiro-outorgante estará

configurado o requisito da relação empregatícia, ou seja, a subordinação e a

pessoalidade, que é a estrita relação do parceiro outorgado com o parceiro-

outorgante, caracterizada pela exclusividade que este tem na direção dos

trabalhos. Assim, acontecendo estas situações, o contrato de parceria dará lugar

à relação empregatícia, motivo pelos quais as regras aplicáveis serão as previstas

na legislação trabalhista.

O TRT da 23ª Região reconheceu o vinculo de emprego entre o parceiro-

outorgante e o parceiro-outorgado devido à existência de subordinação jurídica. O

TRT da 4ª Região também reconheceu o vinculo de emprego durante o período

do contrato de parceria, pois o considerou nulo nos termos do artigo 9º da CLT,

veja:

EMENTA: RELAÇÃO DE EMPREGO x CONTRATO DE PARCERIA. EXISTÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA CARACTERIZADORA DE RELAÇÃO DE EMPREGO. Não basta nomear-se “contrato de parceria” para se afastar uma autêntica relação de emprego, máxime quando as provas dos autos evidenciam que a Reclamada exercia sobre o obreiro poderes de direção, comando e controle, caracterizadores da subordinação jurídica, que é o traço basilar da relação empregatícia". (TRT 23ª Região. RO n.º 1260/99, Ac. TP n.º 3661/99, Relator Juiz João Carlos, julgado em 14 de dezembro de 2002). (http://www.trt23.jus.br. Acesso em 22/11/2012)

VÍNCULO DE EMPREGO. Hipótese na qual é comprovado que a relação havida sob o manto da relação de emprego é continuidade daquela antes denominada de parceria agrícola. Reconhecimento do vínculo empregatício desde o início do alegado contrato de parceria devido a sua nulidade, nos termos do art. 9º, da CLT. Recurso do reclamado desprovido. (...)9ºCLT (TRT 4ª Região, RO 5387120105040461 RS 0000538-71.2010.5.04.0461, Relator: DENIS MARCELO DE LIMA MOLARINHO, Data de Julgamento:

30

28/07/2011, Vara do Trabalho de Vacaria) (http://www.trt4.jus.br. Acesso em 22/11/2012)

Outro ponto que merece destaque e que está intimamente relacionada ao

requisito da subordinação é a vedação do inciso II do artigo 93 da Lei 4504/64.

Este artigo veda que o parceiro-outorgante exija do parceiro-outorgado a

exclusividade na venda da colheita. Nestes termos o parceiro-outorgado deve ter

total liberdade em negociar a sua parte da produção. Não podendo existir

ingerência do parceiro-outorgante nos frutos devidos ao parceiro-outorgado.

Dessa forma, se o parceiro-outorgado tem liberdade para negociar a sua parte

não há que se falar em desvirtuamento do contrato de parceria e nem da

existência de subordinação.

O TRT da 23ª Região julgou um caso em que decidiu pela validade do

contrato de parceria justamente porque o parceiro-outorgado tinha total liberdade

para negociar a sua parte da produção, não tendo ficado caracterizado o requisito

da subordinação jurídica essencial para a caracterização do vinculo de emprego.

RELAÇÃO DE EMPREGO. INEXISTENTE. REQUISITOS DO ART. 2º DA LEI N.º 5.889/73. PARCEIRA RURAL. O Direito do Trabalho deve aplicar, em sua máxima efetividade, o princípio da primazia da realidade, a fim de coibir as contratações fraudulentas revestidas de contornos diversos, mas que na essência revelem presentes os requisitos caracterizadores do vínculo empregatício. Contudo, quando se detecta que a intenção do trabalhador não foi a de se unir ao Demandado pelo vínculo laboral, mas atuar na qualidade de parceiro rural, recebendo percentual da lucratividade do negócio muito próximo à meação (40%), com liberdade para negociar sua parte, não sofrendo, ainda, ingerência do Reclamado na quase totalidade do desenvolvimento de sua atividade laboral, revela-se a inexistência do liame empregatício, posto que ausentes, sobretudo, os requisitos da subordinação e da onerosidade. Recurso do Reclamante ao qual se nega provimento. (TRT23. RO - 00380.2007.086.23.00-8. Publicado em: 17/04/08. 2ª Turma. Relator: DESEMBARGADOR LUIZ ALCÂNTARA) (http://www.trt23.jus.br. Acesso em 05/12/2012)

Entretanto, quando existir clausula que determine que o parceiro-

outorgado deve preferencialmente ou exclusivamente vender a sua parte da

produção para o parceiro-outorgante, estará presente a ingerência deste sobre

aquele. Além disso, normalmente tal clausula prevê que somente no caso

parceiro-outorgante não querer comprar a produção, o parceiro-outorgado poderá

vender para um terceiro, o que caracteriza total falta de liberdade negocial do

parceiro-outorgado. Tal situação pode levar a caracterização do requisito

31

fundamental do contrato de trabalho, ou seja, a subordinação e, se presentes os

demais requisitos da relação de emprego, o reconhecimento do vinculo de

emprego.

A segunda diferença é que no contrato de parceria o risco da atividade

econômica é dividido entre o parceiro-outorgante e o parceiro-outorgado, o que

difere de contrato de trabalho. No contrato de trabalho o risco da atividade é de

inteira responsabilidade do empregador conforme o artigo 2º da CLT e artigo 3º

da Lei 5889/73. Essa diferença foi bem definida no Agravo de Instrumento do

Recurso de Revista julgado pela 4ª Turma do TST,

Trata-se, como visto, também de tipo de contrato de sociedade, em que uma das partes comparece necessariamente com o trabalho principal da criação e pastoreio, enquanto a outra, com o lote de animais em que será desenvolvido esse trabalho. Esta espécie contratual, à semelhança da parceria agrícola, também admite variações relativamente extensas, em que as partes repartem entre si os ônus da oferta do imóvel rústico ou prédio rural em que será concretizada a parceria, assim como da utilização de maquinário, implementos agrícolas e de outras despesas correlatas [...] [...] A parceria agrícola, no caso, avícola, é um contrato personalíssimo, com características de contrato de sociedade em que as partes, de comum acordo, estipulam os seus percentuais nos lucros obtidos, não existindo subordinação, mas riscos no empreendimento. Com efeito, a questão do risco da atividade econômica é requisito sine qua non para o reconhecimento do contrato de parceria, à luz do artigo 4.º do Decreto n.º 59.566/1966.( TST, AIRR - 152100-63.2009.5.09.0093 , Relatora Ministra: Maria de Assis Calsing, Data de Julgamento: 16/10/2012, 4ª Turma, Data de Publicação: 19/10/2012) (http://www.tst.jus.br. Acessado em 22/11/2012)

Como dito acima, na parceria agrícola não há subordinação e o risco do

negocio é ônus das partes. Alice Monteiro de Barros (2007, p.407), entende que:

Não restando demonstrado que o credor de trabalho exerce qualquer tipo de direção ou fiscalização, tal fato poderá afastar a relação de emprego, mormente quando se evidencia que o trabalhador laborava em regime de parceria para várias pessoas, possuindo estrutura econômico-financeira para suportar os ônus advindos desse tipo de contrato.

Portanto, se os parceiros têm condições de arcar com o ônus da atividade

exercendo fielmente as disposições contratuais e repartindo tanto os lucros como

prejuízos, estar-se-á diante de um regular contrato de parceria. Entretanto,

quando o parceiro-outorgado for uma pessoa simples que não tenha nenhuma

capacidade econômico-financeira para gerir o negócio poderemos estar diante de

32

uma fraude à relação de emprego. Pois, o parceiro-outorgante, aquele de detém

efetivamente a capacidade econômica para administrar o negócio, estará

realizando os contratos de parceria apenas para se eximir de pagar os direitos

trabalhistas destes ditos “parceiros-outorgados”.

Há situações em que o parceiro-outorgado para obter um maior resultado na

produção acaba colocando os membros da família para ajudar no plantio,

colheita, ou seja, nas fases de produção. Muitas vezes, empregam até mesmo os

filhos menores nas lavouras para conseguir obter uma renda mensal que seja

digna e possa cobrir as suas despesas familiares. A renda mensal, às vezes, não

chega a um salario mínimo por trabalhador quando dividida pelo número de

membros da família ou terceiros contratos pelo parceiro-outorgado para ajudar na

produção. Isto demonstra bem que o parceiro-outorgado não teria condições

econômico-financeiras para arcar com os riscos da atividade. Situação similar foi

decidida pela 8ª Turma do TST que manteve decisão do TRT da 3ª região que

anulou os contratos de parceria agrícola por contrariar o instituto.

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. AUTOS DE INFRAÇÃO. NULIDADE.O Regional, com fundamento no conjunto fático-probatório produzido nos autos, decidiu pela nulidade do contrato de parceria agrícola firmado entre os trabalhadores, por contrariar a lei que rege o instituto e, por conseguinte, concluiu pela consistência dos autos de infração impugnados pelo autor. [...] Agravo de instrumento conhecido e não provido. (TST, AIRR 589406120085030068 58940-61.2008.5.03.0068, Relator: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 04/05/2011, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 06/05/2011) (http://www.tst.jus.br. Acesso em 05/12/2012)

Outro ponto que merece destaque é que em algumas situações o

parceiro-outorgante arca com as despesas para o plantio, num primeiro momento,

e depois desconta os valores do parceiro-outorgado no momento da divisão da

produção. Em contrapartida o parceiro-outorgado também arca com algumas

despesas para colher o produto, como exemplo na colheita do café, maquina

colhedora de café, a gasolina para abastecer a maquina dentre outros. Mas estas

despesas, muitas vezes, não são divididas entre os parceiros, ficando o encargo

apenas com o parceiro-outorgado. Desse modo, presencia-se um real

desequilíbrio entre a divisão das obrigações. O trabalhador que já não capacidade

econômica para arcar com o negocio, acaba tendo que arcar com despesas que

não são divididas igualmente entre as partes, restando na verdade como lucro na

33

produção uma parte inferior ao do parceiro-outorgante. O que se verifica nesta

situação é que os riscos do negocio não são divididos igualmente entre as partes.

O TRT da 10ª Região ao julgar o Recurso Ordinário nº 00732-2005-008-10-00-

9 definiu bem este fato, veja:

Esta definição legal sugere, pois, a existência de um contrato, mediante o qual o parceiro-outorgado concorre com sua força de trabalho, mas também dirige, cabendo a ele empreender a atividade econômica, estando sobre ele na devida proporção os riscos do empreendimento, apesar do parceiro outorgante contribuir com outros itens da parceria, além da terra ou animais. Em síntese, nesta modalidade de contrato, o parceiro-outorgado não trabalhará exclusivamente por conta alheia, eles procurarão através do encontro de forças, obter lucros do cultivo da terra ou do trato de animais. (TRT-10 - RECURSO ORDINARIO: RO 732200500810009 DF 00732-2005-008-10-00-9. Relator: Francisco Luciano de Azevedo Frota. Data de julgamento: 24/05/2006, Data da Publicação:16/06/2006) (http://www.trt10.jus.br. Acesso em 22/11/2012)

Nesta decisão o TRT considerou válido o contrato de parceria, pois não

ficou caracterizado o desvirtuamento do requisito ora em análise, ou seja, havia,

neste caso, igualdade entre os contratantes que ajustaram obrigações recíprocas,

no limite de suas necessidades e possibilidades de cumprimento do ajustado,

estando em conformidade com as disposições legais da Lei 4504/64. Por isto, é

importante analisar caso a caso.

Além das diferenças já apresentadas, há também a questão da

celebração de contratos de parceria na atividade principal empregador. Assim

como nos contratos de trabalho, não é possível o empregador celebrar contratos

de parceria para execução da atividade-fim da empresa. Segundo Vólia Bomfim

(2011, p.428)

O artigo 12 da Lei 5889/73 c/c o artigo 25 do Decreto nº 73.626/74 autorizou o contrato misto, que quer dizer que, entre o mesmo empregado e o mesmo patrão é possível haver dois contratos distintos: um de emprego e outro de natureza civil (arrendamento, meação ou parceria), desde que este último recaia sobre cultura secundária, não podendo o patrão descontar dos salários do empregado-parceiro os lucros ou prejuízos obtidos na plantação intercalar ou subsidiária. Caso haja necessidade de contratar empregados safristas para o trabalho na plantação secundária, a responsabilidade trabalhista recairá exclusivamente sobre o empregador (art. 25, §2º do Decreto nº 73.626/74). O fato de um empregado manter com seu patrão contrato misto retira-lhes o direito à remuneração do repouso e feriados, na forma do artigo 2º da Lei 605/49).

34

O que se extrai do exposto por Vólia Bomfim é que só é possível a

realização de contratos de parceria sobre cultura secundária do empregador. Se o

empregador tem como atividade-fim o cultivo de café, não poderá nesta atividade

realizar contratos de parceria. No entanto, se tivesse uma plantação subsidiária

poderia realizar contratos de parceria como autorizado no artigo 12 da Lei

5589/73. Por fim, se cumpridos todos os requisitos dos contratos civis não há que

se falar em nulidade dos mesmos. Mas, infelizmente, alguns produtores usam

esta figura contratual apenas com o fim de dissimular relações trabalhistas.

Segundo Chiarelli

Em alguns casos, desfigura-se a parceria, servindo, apenas, para encobrir verdadeiros contratos de assalariados, que passam a ser retribuídos apenas com bens in natura. A finalidade de caracterizar, externamente, a relação de emprego, como se parceria fosse, reside no interesse patronal de desobrigar-se dos ônus sociais e dos compromissos que a legislação trabalhista dá ao empregador. Daí, a figura da "falsa parceria", muitas vezes presumível, mas nem sempre de fácil caracterização ante os tribunais trabalhistas.

Por isto, é importante avaliar o cumprimento pelas empresas

/empregadores rurais dos requisitos estabelecidos pelo Estatuto da Terra. Desse

modo, Süssekind (2003, pág. 217) dispõe que:

Em toda comunidade, durante a história da civilização, apareceram, como surgirão sempre, pessoas que procuram fraudar o sistema jurídico em vigor, seja pelo uso malicioso e abusivo do direito de que são titulares, seja pela simulação de atos jurídicos, tendentes a desvirtuar ou impedir a aplicação da lei pertinente, seja, enfim, por qualquer outra forma que a má-fé dos homens é capaz de arquitetar. Por isto mesmo, inúmero são os atos praticados por alguns empregadores inescrupulosos visando a impedir a aplicação dos preceitos de ordem pública consagrados pelas leis de proteção ao trabalho.

Para Süssekind (2003, p. 217) em toda a civilização aparecem pessoas

querendo fraudar o sistema jurídico em vigor com vistas a obter vantagens

desproporcionais em relação aos benefícios que devem ser concedidos a

sociedade. Devem ser analisadas as consequências destas contratações no meio

social e jurídico com vistas a se evitar abusos por parte dos empregadores que

tentem desvirtuar o objetivo principal e primordial do Estatuto da Terra.

35

2.2.2. Representante comercial

Com a evolução das atividades de comercio e com o aumento dos

negócios surgiu o instituto da representação comercial. Segundo Cozzi este

instituto veio proporcionar as empresas produtoras maiores facilidade na

divulgação e venda de seus produtos.

Tal instituto foi regulamentado em 1965, com a publicação da Lei nº

4886/65 que foi alterada posteriormente pela Lei nº 8.420/92. Este instituto surgiu

com objetivo de disciplinar direito e obrigações típicas do contrato civil.

Posteriormente, em 2002, o novo Código Civil disciplinou a figura do contrato de

agência, também chamado de representação comercial, como aquele em que

uma pessoa (agente), assume em caráter não eventual, e sem vínculo

empregatício, a obrigação de realizar negócios mercantis, mediante remuneração,

em determinada região. Tal conceito se assemelha ao disciplinado na Lei

4886/65.

Para Ramos (2009, p.535) a representação comercial é modalidade

especial de contrato de colaboração em que o colaborador, chamado de

representante, assume a incumbência de obter pedidos de compra e venda de

produtos comercializados pelo colaborado, chamado de representado. Já o artigo

1º da Lei 4886/65 define como representante comercial.

a pessoa jurídica ou física, sem relação de emprego, que desempenha, em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas a mediação para a realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos, para transmiti-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios.

Dessa forma, cabe ressaltar que o instituto da representação comercial

tem o objetivo de facilitar as negociações mercantis entre o representado

(fornecedor do produto) e o cliente. O representante comercial percorre diversas

regiões para vender os produtos do representado e, para isto, recebe uma parcela

do preço da venda, chamada de comissão e realiza o serviço com total

autonomia. Para garantir os direitos decorrentes da relação de trabalho existente

entre o representante e o representado a Lei 4886/65 trás em seu bojo diversos

dispositivos, dentre eles os requisitos legais para a celebração do contrato de

representação comercial. Assim, a aplicação integral das disposições da Lei

36

4886/65 protege não somente o representante, mas também os direitos do

representado frente a uma eventual demanda judicial para descaracterização do

contrato de representação comercial e o pleito de reconhecimento de vinculo de

emprego.

De inicio presume-se que os contratos de representação comercial

celebrado nos termos da lei são válidos e eficazes produzindo todos os seus

efeitos jurídicos. Entretanto, tal presunção é apenas relativa, pois pode ser elidida

por prova contrária. O que se tem notado na prática é que, muitas vezes, alguns

representados (empregadores) agem de modo a fraudar o sistema jurídico (a

relação de emprego) com o fim de reduzir as despesas com o contrato de

trabalho. Para isso, contratam verdadeiros “vendedores-empregados” com o título

de representante comercial visando apenas se eximir dos custos com os direitos

trabalhistas devidos.

Entretanto, para se evitar este tipo de atuação fraudulenta é necessária à

atuação do Estado, seja por meio da atuação da fiscalização do trabalho ou pela

atuação da Justiça do Trabalho quando demandada para que seja verificada a

real relação jurídica existente. A representação comercial é uma relação de

trabalho entre representado e representante o que difere da função de vendedor

pracista que é uma relação de emprego entre empregado e empregador. O

representante comercial é regido pela Lei 4886/65 enquanto o vendedor pracista

é regido pela Lei 3207/57 e pela CLT. A diferença entre eles foi muito bem

definida pelo TRT da 24ª Região ao julgar o seguinte recurso ordinário:

REPRESENTANTE COMERCIAL X VENDEDOR PRACISTA.

CRITÉRIOS DE DIFERENCIAÇÃO.1. A atividade de

representação comercial, quando exercida por pessoa física, em

muito se assemelha ao empregado denominado vendedor viajante

ou pracista, pois ambos se ativam na venda de produtos do

contratante e - ao largo das vistas deste-, o que mitiga, em muito,

a subordinação jurídica ínsita ao contrato de trabalho. 2. Nem

mesmo o dever de prestar contas da atividade desenvolvida

diferencia o representante comercial do vendedor pracista, pois

aquele também está obrigado a prestá-las por força do disposto

no art. 28 da Lei 4.886/65 e tão próximo são as atividades

desenvolvidas pelo representante comercial em relação ao

37

vendedor empregado que a própria lei supramencionada

estabelece para os representantes direitos similares aos dos

empregados. 3. O que, em princípio, diferencia o representante

comercial do empregado vendedor, são os requisitos formais

previstos como indispensáveis pela Lei 4.886/65, quais sejam:

estar inscrito no Conselho Regional de Representantes

Comerciais (art. 2o), pois só assim estaria habilitado para o

exercício da profissão (arts. 5o e 19, b), além da formalização de

contrato escrito de representação comercial (arts. 27 e 40).4.8864.

É claro que o mero preenchimento dos requisitos formais não

afastará a possibilidade de reconhecimento do vínculo de

emprego, diante do princípio da primazia da realidade sobre a

forma, mas então caberá ao trabalhador provar a existência de

subordinação jurídica que descaracterize a relação de trabalho

autônoma.5. Decisão unânime. (TRT-24ª Região - RO nº

1297200200424005 MS 01297-2002-004-24-00-5 (RO), Relator:

AMAURY RODRIGUES PINTO JUNIOR, Data de Julgamento:

26/05/2004, 4ª Vara do Trabalho de Campo Grande/MS, Data de

Publicação: DO/MS Nº 6275 de 29/06/2004, pag. 36)

(http://www.trt24.jus.br. Acesso em 05/12/2012)

Nesta decisão o TRT da 24ª Região negou o recurso da ré que tentava

provar que o reclamante tinha uma relação de trabalho e não uma relação de

emprego. Com está decisão conclui-se que nos casos em que não são cumpridos

os requisitos da Lei 4886/65 e desde que presentes o requisito da subordinação

jurídica/estrutural e a pessoalidade estará caracterizada a relação de emprego do

trabalhador como vendedor. Desse modo, serão apresentados os requisitos

legais para a celebração de um contrato de representação comercial e as

situações em que levam a sua nulidade, nos termos do artigo 9 da CLT, e,

consequentemente, o reconhecimento do vinculo de emprego.

2.2.2.1 Requisitos de validade da Representação comercial

Para Vólia Bomfim a verdadeira atividade de representação comercial é

aquela onde estão presentes, conforme Lei 4886/65, os requisitos da autonomia,

38

impessoalidade, onerosidade e não eventualidade, o que difere do contrato de

trabalho onde deve estar presente a subordinação jurídica e a pessoalidade.

Há que se destacar que o requisito da subordinação também está

presente na representação comercial só que sob outro prisma. Ou seja, a

subordinação existente entre o representante e o representado se limita, segundo

disposições legislativas, ao modo de organização empresarial onde o

representante devera seguir as orientações do representado para as vendas,

sendo empresarial e não pessoal.

Os elementos da subordinação empresarial desta relação de trabalho

estão previstos nos artigos 27 e 28 da Lei 4886/65 e não se assemelham aos

requisitos da subordinação da relação de emprego característico do contrato de

trabalho. Entretanto, não há nenhum impedimento para o reconhecimento da

relação de emprego nos casos em que ocorra o desvirtuamento dos requisitos da

representação comercial.

Dessa forma, se estiverem presentes os requisitos caracterizadores da

relação de emprego, como previsto nos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis

do Trabalho – CLT será possível então reconhecimento do vinculo de emprego

entre o prestador e o tomador dos serviços. O principal requisito para a

diferenciação da representação comercial da relação de emprego é a

subordinação, mas nem sempre é simples distinguir estes contratos, o melhor é a

analise de cada caso em concreto.

Insta destacar que o instituto da representação comercial é legal, mas tem

sido utilizado, muitas vezes, para burlar a relação de emprego. Ainda assim tal

instituto tem aplicação na seara empresarial com muito êxito alcançando o

objetivo da lei. Para Carelli (2010, p.75) a representação comercial tem espaço

garantido no sistema jurídico pátrio, mas não quer dizer que é justa a sua

exclusão das garantias constitucionais sociais, devendo ter a mesma proteção

dos trabalhadores subordinados. Mas infelizmente os direitos sociais não foram

estendidos a estes trabalhadores.

Por isto, é de extrema importância a analise dos casos concretos para se

avaliar, com base no principio da primazia da realidade, a real relação jurídica

existente entre o representante e o representado de modo a garantir o direito de

39

ambos, principalmente, daquele que está em condição de desvantagem, o

hipossuficiente.

Desta forma, não importa, de inicio, as condições estabelecidas por meio

de contratos, mas sim a situação real, pratica da relação existente, o que devera

ser avaliado caso a caso. Assim, caso seja identificado elementos que

caracterizem a subordinação jurídica e a pessoalidade na prestação do serviço,

estará presente a relação de emprego regida pela CLT e o representante passará

a ser denominado de vendedor-empregado.

Os requisitos da representação comercial estão previstos na Lei 4886/65

são eles: 1. Imposição, pelo artigo 2º a Lei 4886/65, do Registro do Representante

Comercial no Conselho Regional de Representantes Comerciais (CORE); 2.

Impossibilidade de contratação de representante comercial para realizar a

atividade-fim da empresa; 3. Emissão de nota fiscal, pagamento de impostos

pelos serviços prestados; 4. Preenchimento dos elementos obrigatórios do

contrato de representação comercial disciplinados nos artigos 27 da Lei 4886/65,

que são: a) condições e requisitos gerais da representação; b) indicação genérica

ou especifica dos produtos ou artigos objeto da representação; c) prazo certo ou

indeterminado da representação; d) indicação da zona ou zonas em que será

exercida a representação; e) garantia ou não, parcial ou total, ou por certo prazo,

da exclusividade de zona ou setor de zona; f) retribuição e época de pagamento,

pelo exercício da representação, dependente da efetiva realização dos negócios,

e recebimento, ou não, pelo representado, dos valores respectivos; g) os casos

em que se justifique a restrição de zona concedida com exclusividade; h)

obrigações e responsabilidades das partes contratantes; i) exercício exclusivo ou

não da representação a favor do representado; j) indenização devida ao

representante pela rescisão do contrato fora dos casos previstos no artigo 35,

cujo montante não poderá ser inferior a 1/12 (um doze avos) do total da

retribuição auferida durante o tempo em que exerceu a representação.

O preenchimento desses requisitos retrata um verdadeiro contrato de

representação comercial afastando assim o reconhecimento de vinculo de

emprego por cumprir os objetivos do contrato civil. Entretanto se ficar

caracterizado o desvirtuamento desses requisitos e a presença da subordinação

jurídica e pessoalidade na prestação dos serviços haverá vinculo de emprego.

40

A seguir serão demonstrados os requisitos da relação de emprego e

apresentadas situações que podem configurar a existência de um contrato de

trabalho e não de representação comercial.

2.2.2.2 Configuração de relação de emprego

A relação de emprego é fruto de diversos elementos fático-jurídicos.

Esses elementos são aqueles que irão determinar a existência ou não da relação

de emprego e estão previstos no artigo 2º e 3º da CLT. Para que haja vínculo

entre o trabalhador e o tomador de serviços será necessário à existência de todos

os elementos fático-jurídicos, são eles: continuidade, onerosidade, subordinação,

pessoalidade.

Entende-se por continuidade, o trabalho realizado de maneira não

eventual. Segundo Martins (2005, p.93), “aquele que presta serviço

eventualmente não é empregado”, sendo então requisito essencial para a

configuração do vínculo de emprego.

A onerosidade trata justamente da contraprestação que deve ser

proporcionada aos trabalhadores pela execução de um serviço. Cabendo ao

trabalhador sua força de trabalho e o tomador de serviço pagar salário pelo

serviço prestado. Então a todo serviço prestado deverá existir um contraprestação

retributiva.

A subordinação ocorre quando o trabalhador desempenha suas

atividades laborais com dependência do tomador de serviços. Este tem total

poder para ditar as regras, formas de prestação do serviço, podendo cobrar dos

trabalhadores agilidade, técnica, perfeição na execução dos serviços desde que

não exorbitem de seu poder diretivo. A subordinação pode ser jurídica ou

estrutural. A subordinação estrutural, segundo Mauricio Godinho, é a que se

manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços,

independentemente de receber ou não suas ordens diretas, mas acolhendo,

estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento.

A pessoalidade ocorre quando o trabalhador presta serviço pessoalmente,

intuito personae, não podendo fazer-se substituir por outro trabalhador. No caso

do trabalho do vendedor pracista (contrato de emprego), pode-se notar a

presença de todos esses elementos fático-jurídicos da relação de emprego, o que

41

não ocorre com a representação comercial em que faltam os requisitos da

subordinação jurídica ou estrutural e a pessoalidade.

Para Carelli (2010, p.82 e 83) são elementos da existência do contrato de

emprego e não da representação comercial, os seguintes: a) colocação a

disposição da empresa da energia de trabalho durante certo lapso de tempo, seja

ele diário, semanal ou mensal, com o correspondente controle; b) obrigação de

comparecimento pessoal a empresa, seja diário, semanal ou mensal; c) obrigação

de utilizar métodos de venda; d) fixação do período para viagem; e) obediência ao

regulamento da empresa; f) recebimento de instruções para o aproveitamento da

zona; g) recebimento de quantia mensal fixa, a titulo de retribuição, h) utilização

de material da empresa, e não utilização de instrumentos próprios de trabalho; i)

imposição de mínimo de produção; j) recebimento de ajuda de custo.

Carelli ao listar os elementos acima como elementos do contrato de

emprego bem demonstra a presença clara da pessoalidade e da subordinação,

pois é a empresa quem determina todas as regras a serem seguidas pelo

trabalhador, não tendo o mesmo qualquer independência tanto no ajuste quanto

na execução de serviços, o que o torna totalmente subordinado as decisões e

imposições da empresa.

Além dos elementos expostos por Carelli, podem-se destacar outros

citados por Rafael, como exemplo, se há estipulação de metas a serem

cumpridas, controle de horários, uso de uniformes, ferramentas de trabalho,

pagamento de combustível, diárias e hotéis, correspondência por emails,

execução de serviços on-line com o programa de vendas da empresa, o exercício

ou não do poder disciplinar, cumprimento de cotas de vendas, estipulação de área

de atuação, supervisionamento, exigência de participação em treinamentos,

proibição de concessão de abatimentos, descontos e prorrogações nas vendas,

entre outros.

Esses elementos são indícios fortes da subordinação jurídica e devem ser

analisados caso a caso. Em diversas decisões os Tribunais Regionais do

Trabalho tem se pautado nestes elementos para reconhecer a subordinação

jurídica e, consequentemente, se presentes os demais requisitos da relação de

emprego, o reconhecimento do vinculo de emprego.

42

2.2.2.3 Decisões dos TST e TRT

Destacam-se, neste ponto, algumas decisões do Tribunal Regional do

Trabalho - TRT que reconhecem a relação de emprego por estarem presentes os

requisitos da subordinação jurídica e a pessoalidade, descaracterizando assim a

representação comercial.

RELAÇÃO DE EMPREGO. REPRESENTAÇÃO COMERCIAL X EMPREGADO. SUBORDINAÇÃO JURÍDICA COMPROVADA. CONFIGURAÇÃO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO. Existe um estreito liame nas relações havidas entre um representante comercial e a empresa por ele representada, sendo que a própria Lei 4.886/65 traz em seu bojo muitos elementos característicos do vínculo empregatício, cabendo ao julgador apreciar as provas dos autos de forma específica, para analisar com acuidade as diferenças muitas vezes tênues, mas que distinguem o empregado do representante comercial. Faz-se imprescindível, portanto, serem encontrados os requisitos da relação empregatícia, mormente a subordinação jurídica, pois, mesmo que as partes tenham pactuado contrato de representação comercial, de natureza civil, existindo nos autos os elementos de convicção quanto à ocorrência de trabalho subordinado, configurando a sujeição do autor ao poder diretivo da reclamada, nos moldes exigidos pelos artigos 2º e 3º da CLT, o reconhecimento da relação de emprego é medida que se impõe. In casu, restou provada a presença da subordinação jurídica, bem como os demais requisitos da relação empregatícia, quais sejam, pessoalidade, onerosidade e habitualidade, o que afasta a relação autônoma do contrato de representação comercial prevista na Lei 4.886/65. Recurso conhecido e parcialmente provido.( TRT 16ª Região RO nº 01198-2006-001-16-00-1 MA 01198-2006-001-16-00-1, Relator: JAMES MAGNO ARAÚJO FARIAS, Data de Julgamento: 31/05/2011, Data de Publicação: 06/06/2011) (http://www.trt16.jus.br. Acesso em 06/12/2012)

No caso julgado pelo TRT da 16ª Região o reclamado exigiu que o

representante comercial constitui-se uma pessoa jurídica para a celebração do

contrato civil apenas com o intuito de mascarar a relação de emprego e,

principalmente, o requisito da subordinação jurídica e da pessoalidade. Sendo

outra forma de tentar burlar as leis trabalhistas. Porém, com base no principio da

primazia da realidade o Tribunal reconheceu o vinculo de emprego. Para Carelli

(2010, p. 86) o contrato de representação comercial deve ser avaliado tendo em

vista as condições reais de exercício da atividade, não sendo suficiente a

regularização formal para inexistência do contrato de trabalho. Por outro lado, há

decisões do TRT que afastam a relação de emprego e dá validade jurídica as

43

representações comerciais devido ao cumprimento efetivo dos requisitos legais,

como exemplo, cita-se:

REPRESENTAÇAO COMERCIAL X VÍNCULO EMPREGATICIO. ELEMENTO ESSENCIAL PARA DEFINIÇAO. TRABALHO SUBORDINADO. CONFISSAO DO AUTOR. TRABALHO AUTÔNOMO. CARACTERIZAÇAO. A representação comercial consiste em atividade de mediação para realização de negócios mercantis, sendo espécie do gênero trabalho autônomo, que se caracteriza pela independência do trabalhador, tanto no ajuste quanto na execução de serviços. Embora haja uma larga zona cinzenta que torna, muitas vezes, difícil a tarefa de definir se a relação é de emprego ou dotada de autonomia, infere-se que a subordinação jurídica ainda é um elemento constitutivo da relação de emprego, apresentando-se como traço marcante desta distinção. Constatando-se, ante confissão autoral, que a atividade não envolvia ingerência da empresa, uma vez que o reclamante tinha liberdade para estruturar sua rotina de venda, quer quanto a rotas, métodos, horários ou clientes, sem obrigatoriedade de comparecimento à empresa reclamada e sem receber ordens de supervisor, resta clara a ausência do elemento subordinação, essencial à caracterização do liame empregatício. Recurso ordinário ao qual se nega provimento. (TRT 13ª Região, RO 131032 PB 00644.2011.002.13.00-0, Relator Ubiratan Moreira Delgado, DOPB 09/02/2012). (http://www.trt3.jus.br. Acesso em 22/11/2012)

Diante do exposto, conclui-se que a representação comercial é um

instituto legal, necessário e muito útil para as relações mercantis. Por meio da

representação as empresas conseguem divulgar os seus produtos e ganhar o

mercado consumidor com maior facilidade. Contudo, tal instituto não deve ser

usado para fraudar o sistema jurídico e deixar ao largo os direitos dos

trabalhadores. A representação deve ser utilizada nos termos da lei de modo a

preservar os direitos do representante e do representado e, principalmente, o fim

almejado pelo legislador.

2.3. A FIGURA DA PEJOTIZAÇÃO

Como se não bastasse à existência de diversos meios utilizados para

lesar os direitos dos trabalhadores, como as burlas aos contratos de trabalho

temporário, os falsos contratos de arrendamento, parceria rural, representação

comercial, a cada dia esses meios são aprimorados e a “pejotização” é mais uma

dessas evoluções, assim como a “socialização de empregados” que será tratada

em tópico específico.

44

2.3.1 Conceito

De inicio o termo “pejotização” remete ao estudo dos institutos de

natureza civil e faz pensar que é simplesmente a criação de uma empresa (uma

pessoa jurídica nos termos do CCB) para um determinado fim, que pode ser a

produção ou circulação de bens ou a prestação de serviços. Em regra as

empresas são constituídas com essas finalidades, porém há exceções. É aí que

foi criada a figura da “pejotização”, porque é a criação de uma empresa com o fito

de burlar as leis trabalhistas e suprimir os direitos dos trabalhadores e não com o

objetivo de atender as finalidades legais previstas no Código Civil Brasileiro e

demais leis sobre o tema.

Essas empresas às vezes são constituídas com o objetivo do artigo 593

do CCB (prestação de serviço) e outras por meio do artigo 129 da Lei Tributária

nº11196/05, ou seja:

Art. 129. Para fins fiscais e previdenciários, a prestação de serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural, em caráter personalíssimo ou não, com ou sem a designação de quaisquer obrigações a sócios ou empregados da sociedade prestadora de serviços, quando por esta realizada, se sujeita tão somente à legislação aplicável às pessoas jurídicas, sem prejuízo da observância do disposto no art. 50 da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 — Código Civil.

Este dispositivo veio beneficiar as empresas que contratam serviços

intelectuais. Assim, como notórios ares de legalidade, é possível aplicar aos

prestadores de serviço intelectuais as normas aplicáveis às pessoas jurídicas. É

importante salientar que tais empresas são constituídas na forma lei, isto é, são

criadas de acordo com as regras do CCB. Entretanto, o problema é detectado no

seu intuito, no seu fim.

2.3.2 Meios e princípios bases para a desconstituição de uma “PJ”

Muitas vezes “verdadeiros empregados” são obrigados a criar uma

empresa para que possam prestar serviços. Ao invés de celebrarem contratos de

trabalho, são obrigados a formalizarem um contrato de natureza civil ou

45

comercial. A criação de uma empresa (“PJ”) torna-se o meio imprescindível para a

contratação do trabalhador. Diante de tal obrigação o trabalhador, que necessita

de um trabalho para a sua subsistência, acaba por aceitar as regras definidas

pela empresa. Sem escolha ele concorda ou fica sem trabalho. Em contrapartida

é possível identificar este tipo de fraude como leciona Alice Monteiro de Barros

O fato de o trabalho executado ser intelectual não descaracteriza o liame empregatício, pois ele consistirá sempre na exteriorização e no desenvolvimento da atividade de uma pessoa em favor de outrem. Por outro lado, inexiste incompatibilidade jurídica, tampouco moral, entre o exercício dessa profissão e a condição de empregado. Isso porque a subordinação é jurídica, e não econômica, intelectual ou social; ela traduz critério disciplinador da organização do trabalho sendo indispensável à produção econômica.

O que se conclui é que a imposição pela empresa contratante para que o

prestador de serviço crie uma pessoa jurídica, nada mais é do que uma burla aos

direitos sociais e trabalhistas deste trabalhador. Nestes casos, o fim da

contratante é reduzir seus custos tanto trabalhistas como fiscais e previdenciários,

praticando uma fraude contra o sistema jurídico brasileiro.

Segundo Carelli (2010, p. 143) a previsão do artigo 129 da Lei

11168/2005 é apenas para fins tributários, sendo possível desconsiderar a

personalidade jurídica nos casos de desvio de finalidade ou pela confusão

patrimonial como disciplina o artigo 50 do CCB. Acrescenta ainda o seguinte:

Com a aplicação do artigo 50 do CCB combinado com o artigo 9º da CLT, sempre que tiver uma utilização de pessoa jurídica pra mascarar uma relação de emprego, desconsiderada será a personalidade jurídica e caracterizado o vinculo de empregatício.

Convém expor que o p. único do artigo 8º da CLT autoriza a aplicação

subsidiária do direito comum às leis trabalhistas naquilo que for compatível. Por

isto, é possível aplicar a disposição do artigo 50 do CCB em conjunto com o artigo

9º da CLT para desconsiderar a pessoa jurídica e dar nulidade aos contratos que

tem o fito de dissimular uma relação de emprego.

Esses artigos são instrumentos eficazes para tornar nulo de pleno direito

os contratos celebrados como o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar os

preceitos da legislação trabalhista. Desta feita, as contratações com esse fim não

serão eficazes para impedir o reconhecimento de vinculo de emprego, pois

46

presente os elementos fático-jurídicos da relação de emprego o vínculo se

formará entre o trabalhador e o tomador do serviço como pode ser observado na

decisão do TST.

VÍNCULO EMPREGATÍCIO. PEJOTIZAÇÃO. A criação de 'empresa de fachada', apenas para que fosse concretizada a contratação (fenômeno chamado pejotização é muito comum no âmbito dos profissionais de TI - Tecnologia da Informação. Por certo que os empregados aderem a tal situação visando a salários melhores, mas a Justiça do Trabalho não pode chancelar o mascaramento da relação jurídica, ainda que, indiretamente, tenha acarretado algum benefício para as partes. Não se pode deixar de invocar o princípio da irrenunciabilidade, o qual tem por efeito a inafastabilidade de sua aplicação pela vontade dos interessados. Por conseguinte, não estava ao alvedrio das partes afastar a existência do contrato de trabalho por sua mera vontade. Configurados todos os elementos dos arts. 2º e 3º da CLT, devido é o reconhecimento do vínculo empregatício entre os litigantes. Recurso conhecido e parcialmente provido. Processo: 00793-2010-020-10-00-7 RO; (Acordão 2ª Turma); Relator: Desembargador Mário Macedo Fernandes Caron; Publicado em: 17/06/2011 no DEJT. (http://www.tst.jus.br. Acesso em 19/11/2012)

Nesse acórdão o TST reconheceu que a empresa foi criada apenas para

encobrir a relação de emprego. Para o direito trabalho não importa a roupagem

que é dada ao contrato firmado, mas sim o que se figura na pratica, na realidade

dos fatos, pois de acordo com o principio da primazia da realidade os fatos reais

se sobrepõem as formas. Arnaldo Sussekind (1999, p. 173) ensina que “a relação

objetiva evidenciada pelos fatos define a verdadeira relação jurídica estipulada

pelos contratantes, ainda que sob a capa simulada, não corresponda à realidade”.

Em fim, este princípio visa proteger o trabalhador que fragilizado aceita se

submeter às regras impostas pela empresa para a sua contratação.

Além disso, os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana,

do valor social do trabalho protegem estes trabalhadores que são o polo mais

fraco da relação. Estes princípios são os pilares, a base de toda uma relação

jurídica e estruturam o Estado Democrático de Direito. A 3ª Turma do TST ao

proferir decisão no processo nº AIRR - 981-61.2010.5.10.0006 reconheceu o

vinculo de emprego de um trabalhador com base nestes princípios e devido a

presença dos elementos fático-jurídicos da relação de emprego, veja:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. 1) NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. 2) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROTELATÓRIOS. MULTA. 3) VERBAS

47

RESCISÓRIAS. 4) RECONHECIMENTO DE VÍNCULO DE EMPREGO. TRABALHO EMPREGATÍCIO DISSIMULADO EM PESSOA JURÍDICA. FENÔMENO DA -PEJOTIZAÇÃO-. PREVALÊNCIA DO IMPÉRIO DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA (ART. 7º, CF/88). MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 126/TST. A Constituição da República busca garantir, como pilar estruturante do Estado Democrático de Direito, a pessoa humana e sua dignidade (art. 1º, caput e III, CF), fazendo-o, entre outros meios, mediante a valorização do trabalho e do emprego (art. 1º, IV, in fine; Capítulo II do Título II; art. 170, caput e VIII; art. 193), da subordinação da propriedade à sua função social (art. 5º, XXIII) e da busca do bem-estar e da justiça sociais (Preâmbulo; art. 3º, I, III e IV, ab initio; art. 170, caput; art. 193). Com sabedoria, incentiva a generalização da relação empregatícia no meio socioeconômico, por reconhecer ser esta modalidade de vínculo o patamar mais alto e seguro de contratação do trabalho humano na competitiva sociedade capitalista, referindo-se sugestivamente a trabalhadores urbanos e rurais quando normatiza direitos tipicamente empregatícios (art. 7º, caput e seus 34 incisos). Nessa medida incorporou a Constituição os clássicos incentivos e presunção trabalhistas atávicos ao Direito do Trabalho e que tornam excetivos modelos e fórmulas não empregatícias de contratação do labor pelas empresas (Súmula 212, TST). São excepcionais, portanto, fórmulas que tangenciem a relação de emprego, solapem a fruição de direitos sociais fundamentais e se anteponham ao império do Texto Máximo da República Brasileira. Sejam criativas ou toscas, tais fórmulas têm de ser suficientemente provadas, não podendo prevalecer caso não estampem, na substância, a real ausência dos elementos da relação de emprego (caput dos artigos 2º e 3º da CLT). A criação de pessoa jurídica, desse modo (usualmente apelidada de pejotização), seja por meio da fórmula do art. 593 do Código Civil, seja por meio da fórmula do art. 129 da Lei Tributária nº 11.196/2005, não produz qualquer repercussão na área trabalhista, caso não envolva efetivo, real e indubitável trabalhador autônomo. Configurada a subordinação do prestador de serviços, em qualquer de suas dimensões (a tradicional, pela intensidade de ordens; a objetiva, pela vinculação do labor aos fins empresariais; ou a subordinação estrutural, pela inserção significativa do obreiro na estrutura e dinâmica da entidade tomadora de serviços), reconhece-se o vínculo empregatício com o empregador dissimulado, restaurando-se o império da Constituição da República e do Direito do Trabalho. Por tais fundamentos, que se somam aos bem lançados pelo consistente acórdão regional, não há como se alterar a decisão recorrida. Agravo de instrumento desprovido. (TST, AIRR - 981-61.2010.5.10.0006 , Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 29/10/2012, 3ª Turma, Data de Publicação: 31/10/2012) (http://www.tst.jus.br. Acesso em 19/11/2012)

Como foi analisado, presente a subordinação, a pessoalidade, a

onerosidade e a não eventualidade, caberá ao poder judiciário conforme seu livre

convencimento declarar a nulidade de tal contrato e reconhecer o vinculo de

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emprego com o tomador de serviço. Assim como nos demais meios de fraude, o

que determinará se há ou não relação de emprego é justamente a presença dos

elementos fático-jurídicos da relação de emprego.

2.3.1 Como identificar a fraude e configurar a relação de emprego

Outro ponto que merece destaque é como identificar se tais contratos são

fraudes a legislação trabalhista ou se cumprem sua finalidade como determina o

Código Civil Brasileiro. Carelli (2010, p.144 e 145) em sua obra intitulada como

“Formas Atípicas de Trabalho” descreve de forma sucinta alguns pontos que

podem indicar a ilegalidade de tais contratos, são eles:

- Colocação à disposição da empresa de energia de trabalho durante certo lapso de tempo, seja ele diário, semanal ou mensal, como o correspondente controle; - Obrigação de comparecimento pessoal à empresa, seja ele diário, semanal ou mensal; - Obrigação de utilizar métodos ou técnicas de trabalho; - Fixação do período para viagem ou qualquer deslocamento; - Obediência ao regulamento de empresa; - Recebimento de instruções técnicas; - Recebimento de quantia mensal fixa, a título de retribuição; - Exigência por parte da empresa contratante da constituição da pessoa jurídica; - Pagamento de impostos e gastos pela empresa contratante; - Utilização de endereço de contador ou inexistentes como sede de empresa; - Utilização de material da empresa, e a não utilização de instrumentos próprios de trabalho; - Imposição de mínimo de produção ou metas de trabalho; - Recebimento de ajuda de custo; - Trabalho realizado em grupo conjuntamente com empregados; - Remuneração calculada por tempo de trabalho e não por resultado; - Inexistência de independência financeira do contratado.

Esses são alguns indícios que podem caracterizar a fraude e devem ser

analisados nos caso concreto. Ademais, é importante mencionar a

Recomendação 198 da Organização Internacional do Trabalho, porque ela traça a

politica nacional de proteção aos trabalhadores em uma relação de trabalho.

Dentre estas políticas tem-se:

Combater às relações de trabalho disfarçadas no contexto de, por exemplo, outras relações que possam incluir o uso de outras formas de acordos contratuais que escondam o verdadeiro status legal, notando que uma relação de trabalho disfarçado ocorre quando o empregador trata um indivíduo diferentemente de como trataria um empregado de maneira a esconder o verdadeiro status legal dele ou dela como um empregado, e estas situações podem

49

surgir onde acordos contratuais possuem o efeito de privar trabalhadores de sua devida proteção.

Tal política vem ao encontro de que foi tratado nos parágrafos

antecedentes, garantindo ao trabalhador uma proteção integral de seus direitos.

Ela traça ainda meios para guiar a existência da relação de trabalho como, por

exemplo, o tipo de trabalho e a remuneração do trabalhador. O item 13 alínea “a”

e “b” da Recomendação 198 aduz alguns indicadores da existência da relação de

trabalho que são os seguintes:

a) o fato de que o trabalho: é realizado de acordo com as instruções e sobre o controle de outro grupo; envolvendo a integração do trabalhador na organização da empresa; é executado unicamente ou principalmente para o benefício de outra pessoa; deve ser realizado pessoalmente pelo trabalhador; é realizado dentro de horas de trabalho especificas ou dentro do local de trabalho especifico ou acordado pelo grupo que requisitou o trabalho; é de uma duração particular e tem uma certa continuidade; requer a disponibilidade do trabalhador; ou envolva a provisão de ferramentas, materiais e maquinário pelo grupo requisitado para o trabalho; (tipo de trabalho) b) pagamento periódico da remuneração para o trabalhador; o fato de que tal remuneração constitui a única ou principal fonte de renda do trabalhador; provisão de pagamento em espécie, com alimentação, aluguel ou transporte; reconhecimento de autorizações tais como descanso semanal e feriados anuais; pagamento pelo grupo que requisitou o trabalho para curso empreendido pelo trabalhador a fim de realizar o trabalho; a ausência do risco financeiro para o trabalhador. (remuneração do trabalhador).

Estes indicadores somados aos expostos por Carelli demonstram uma

forma eficaz e robusta para determinar a fraude ora tratada. Assim, o que se

extrai destes indicadores na “pejotização” é que constituidor da “PJ” é

simplesmente um empregado. A aparência de prestação de serviços entre

pessoas jurídicas é, na sua essência, pura fraude, pois o trabalho é realizado por

pessoa física detentora de todos os requisitos da relação de emprego.

O intuito das empresas ao praticarem essa fraude é reduzir os seus

custos com verbas trabalhistas e ganhar maior competitividade no mercado, pois

com um menor custo de produção podem reduzir o preço do produto. Todavia

essa pratica gera concorrência desleal, o que acarreta prejuízos para a ordem

econômica além dos prejuízos que causa a ordem social pela violação dos

direitos dos trabalhadores e da legislação previdenciária. Por fim, torna o trabalho

50

uma mercadoria e precariza as relações de trabalho, pois deixam de garantir a

esses trabalhadores um meio ambiente de trabalho seguro e saudável.

2.4. SOCIALIZAÇÃO DE EMPREGADOS

Em um primeiro momento, pode-se dizer que a socialização de

empregados é mais uma evolução das formas de burla a legislação trabalhista.

Os empregadores a cada dia estudam meios mais eficazes para tentar encobrir

uma relação empregatícia. Eles se utilizam de meios legais para cometer uma

ilegalidade. Assim como nas demais fraudes a socialização de empregados é

utilizada com a finalidade de pura e simplesmente simular um contrato de

sociedade para mascarar uma relação de emprego.

Todavia tal situação pode ser constatada por meio o desvirtuamento dos

requisitos essências do contrato de sociedade e com base no princípio da

primazia da realidade, já explicado nos tópicos antecedentes, é possível

considerar como empregado o “sócio-trabalhador” que foi incluído no contrato

social de uma empresa como sócio para disfarçar o vínculo de emprego. Assim

provados a presença os elementos fático-jurídicos da relação de emprego o Juiz

do Trabalho tornará nulo o contrato de sociedade com este trabalhador e

reconhecerá o vínculo de emprego garantindo-lhe todos os direitos trabalhistas.

Para se entender este tipo de fraude, convém conceituar contrato de

sociedade e contrato de trabalho para depois traçar as principais diferenças entre

eles. Em um segundo momento será discutido os meios para se identificar essa

fraude e, consequentemente, aplicar a nulidade a esses contratos fraudulentos

para torná-los nulos de pleno direito nos termos do artigo 9º da CLT.

2.4.1 Conceitos

Definir o que vem a ser contrato de sociedade é o primeiro passo para a

identificação das diferenças deste com o contrato de trabalho e primordial para a

verificação da utilização simulada destes contratos de sociedade.

51

Então, o que vem a ser contrato de sociedade? Segundo o artigo 981 do

CCB, “celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se

obrigam a contribuir, com bens e serviços, para o exercício de atividade

econômica e a partilha, entre si, dos resultados”.

Isto posto o contrato de sociedade nada mais é do que a junção de duas

ou mais pessoas que unem esforços ou recursos para a obtenção de um fim

comum. Estes contratos de sociedade podem ser celebrados para se constituir

uma sociedade simples ou uma sociedade empresária. E ambas as formas são

meios de fraude a relação de emprego como será melhor demonstrado no tópico

específico.

Primeiro, é importante tratar de forma sucinta estes tipos de sociedade

para um melhor entendimento, observe: 1.Sociedade simples: Para André Luiz

Ramos são aquelas que não exploram atividade empresarial, mas atividade civil;

2.Sociedade empresária: são aquelas que exploram atividade empresarial, ou

seja, exercem profissionalmente atividade econômica organizada para a produção

ou circulação de bens ou de serviços (artigo 966 do CCB).

Em síntese, para Fábio Ulhoa (2005, p.110 e 111) o que distingue

sociedade simples de sociedade empresária não é simplesmente o intuito

lucrativo. Para ele há também sociedades simples (não empresarias) que tem

intuito lucrativo, como exemplo a sociedade de advogados e as rurais sem

registro na Junta. Assim, o que realmente distingue essas sociedades é o seu

objeto social, pois conforme artigo 982 do CCB sociedade empresária é aquela

que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário e simples as

demais.

A Sociedade simples é aquela que exerce uma atividade de natureza

intelectual, de cunho científico, literário e artístico, podendo ser econômica, porém

não é atividade organizada. Além da sociedade de advogados (artigo 16 e 17 da

Lei 8906/94 – Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados) e rurais, há

outras, como consultórios médicos, odontológicos, as cooperativas, que devem

ser necessariamente simples por força do artigo 982 do CCB.

Portanto, as sociedades simples assim como as sociedades empresárias

podem ser utilizadas como meio para fraudar ao ordenamento jurídico e lesar

52

direitos trabalhistas. Essas sociedades possuem alguns elementos essenciais

para a sua constituição, são eles: 1. Existência de duas ou mais pessoas; 2. A

contribuição de cada sócio para a sociedade; 3. Cooperação dos sócios para o

fim comum e affectio societatis; 4. Participação dos sócios nos lucros e prejuízos.

Esses elementos demonstram que neste tipo de contrato há: 1.

Pessoalidade, pois são pessoas que se unem pessoalmente para um fim comum,

são eles que irão administrar, gerenciar pessoalmente a sociedade; 2. A não

eventualidade, porque há continuidade da atividade econômica, os serviços são

prestados com continuidade; 3. Onerosidade, pois os sócios recebem pró-labore e

parte dos lucros da sociedade; 4. Subordinação, que é a submissão ao contrato

social, ao estatuto da sociedade, aos contratos e as leis que regem a sociedade e

não subordinação à sociedade como ocorre no contrato de trabalho; 5.

Autonomia para o desempenho (administração, controle e direção) da sociedade

de forma igualitária aos demais sócios (ou de acordo como o esforço despendido

– nº de cotas). Em relação ao elemento affectio societatis, Mello Franco (2004,

p.177) o define da seguinte maneira:

affectio societatis significa confiança mútua e vontade de cooperação conjunta, a fim de obter determinado benefício, e o elemento confiança é da essência da sociedade. Por tal razão, é dever do sócio colaborar, mas colaborar lealmente para a consecução do fim comum. Se p sócio falta com o seu dever, rompe-se a affectio societatis e a sanção é a exclusão.

De forma sucinta o affectio societatis é a convergência de esforços dos

sócios para alcançar um objetivo comum. Para isto, os sócios devem agir com

lealdade e de acordo com os propósitos da lei para que a sociedade não seja um

meio para a prática de fraudes. Que ela não seja utilizada para forjar relações

jurídicas inexistentes com o fito de reduzir custos, tanto trabalhistas como fiscais e

previdenciários.

Por outro lado, o conceito de contrato de trabalho pode até se assemelhar

ao conceito de sociedade em alguns pontos, contudo é diferente em muitos

outros. Com leciona Octávio Magnano (1992, p.47) o contrato de trabalho

é o negócio jurídico de direito privado pelo qual uma pessoa física

(empregado) se obriga à prestação pessoal, subordinada e não

eventual de serviço, colocando sua força de trabalho à disposição

de outra pessoa, física ou jurídica, que assume os riscos de um

53

empreendimento econômico (empregador) ou de quem é a este,

legalmente, equiparado, e que se obriga a uma contraprestação

(salário).

No contrato de trabalho há a presença dos elementos fático-jurídicos da

relação de emprego, são eles: subordinação, onerosidade, não eventualidade,

pessoalidade. A primeira vista, poderia se concluir equivocadamente que os dois

contratos possuem os mesmos requisitos, com exceção da autonomia. No

entanto, apesar dos elementos terem a mesma denominação eles são na sua

essência bem diferentes. Por isto entender a definição desses elementos é a base

para concluir pela existência ou não do vinculo de emprego entre o sócio

minoritário e a sociedade.

Além dessa semelhança, estes contratos se assemelham em outros

aspectos como exemplo, por serem ambos os negócios jurídicos de direito

privado e porque ambos dependem do acordo de vontades entre as partes (entre

os sócios); (entre empregado e empregador). Por fim, passa-se a análise das

diferenças entre estes contratos.

2.4.2 Diferenças entre Contrato de Sociedade e Contrato de Trabalho

Neste ponto, serão destacadas as principais diferenças entre o contrato

de sociedade e o contrato de trabalho, são elas:

1. Sujeitos da Relação: no contrato de sociedade os sujeitos do negócio

jurídico são denominados de sócios (pessoas físicas); no contrato de trabalho os

sujeitos são: empregado (pessoa física) e empregador (pessoa física ou jurídica);

2. Objeto do contrato: no contrato de sociedade o objeto é, como define o

artigo 966, 981 do CCB, a exploração de atividade econômica organizada para a

produção ou circulação de bens e serviços, ou seja, é a junção de esforços

(affectio societatis) com vistas a formação de uma entidade para a exploração de

uma atividade econômica; no contrato de trabalho o objeto do ponto de vista do

empregado é o salário que recebe pelo serviço prestado, do ponto de vista do

empregador é a força de trabalho que lhe é entregue.

54

3. Relação entre os sujeitos do contrato (Autonomia e/ou Subordinação):

no contrato de sociedade a relação entre os sujeitos se dá pela união de esforços

para se alcançar um fim social, nesta relação prevalece a autonomia dos sócios

para administrar, dirigir e controlar a sociedade. Neste contrato todos os sócios

estão no mesmo patamar hierárquico. A subordinação neste contrato se dá pela

subordinação do sócio aos Estatutos sociais, aos contratos e as leis e não a

sociedade3; no contrato de trabalho a relação entre os sujeitos do contrato é

norteada pela subordinação, ou seja, o empregado deve seguir as regras

impostas pelo empregador que exercerá sobre ele o poder de direção, disciplina.

O empregado não tem nenhuma autonomia sobre o seu serviço é totalmente

subordinado as regras do empregador, devendo seguir todas as suas

determinações e orientações na prestação do serviço. No contrato de trabalho o

empregador e o empregado estão em patamares hierárquicos distintos, pois o

empregado está subordinado o empregador. Aqui a subordinação relaciona o

empregado à figura do empregador.

4. Onerosidade: no contrato de sociedade a remuneração dos sócios é

duvidosa, variável e incerta, isto é depende do bom andamento da atividade

explorada e é paga por meio de pró-labore e a divisão dos lucros; no contrato de

trabalho a remuneração do empregado é certa, logo é indispensável e independe

do lucro ou do prejuízo do empregador, basta a prestação do serviço nos termos

do contrato para ter direito à remuneração pela sua força de trabalho despendida

em favor do empregador.

5. Pessoalidade: no contrato de sociedade as pessoas que se unem

pessoalmente para um fim comum, são eles que irão administrar, gerenciar

pessoalmente a sociedade, os sócios podem ser substituídos por outros conforme

CCB; no contrato de trabalho a pessoalidade se caracteriza pela prestação

pessoal do serviço, isto é, o empregado não pode se fazer substituir. Outro

trabalhador não pode realizar as tarefas que lhes destinadas.

6. Não eventualidade: no contrato de sociedade, a não eventualidade está

caracterizada pela continuidade da atividade econômica gerenciada pelos sócios,

os serviços são prestados com continuidade; no contrato de trabalho a atividade

3 TST, AIRR - 101040-82.2002.5.02.0031, Relator Ministro: Lélio Bentes Corrêa, Data de Julgamento: 25/05/2011, 1ª Turma, Data de Publicação: 03/06/2011

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prestada pelo empregado apresenta caráter permanente e de natureza contínua,

ou seja, é a destinação do trabalho de modo constante, permanente e que

mantenha uma regularidade no desenvolvimento da atividade em benefício do

empregador.

7. Risco do negócio jurídico: no contrato de sociedade o risco do negócio

é repartido entre os sócios, se há lucro todos ganham e se há prejuízo todos

perdem; no contrato de trabalho o risco do negócio recai somente sobre o

empregador, em apenas um dos sujeitos da relação.

Ultrapassada a descrição das diferenças desses contratos, é necessário

ainda detalhar um pouco mais os contratos de sociedade que podem ser

utilizados para burlar os direitos trabalhistas.

2.4.3 O que é a socialização de empregados e como identificar os indícios

desta fraude

Superada as análises conceituais dos dois contratos, é essencial

explicar o que é a socialização de empregados para depois adentrar-se nos meios

de se identificar está socialização e configurar a fraude.

Desse modo a socialização de empregados é definida por Ronaldo Lima

(2008, p.74)

a denominada “socialização” de trabalhadores, isto é, a contratação dos trabalhadores como sócio da própria empresa empregadora, não obstante o suposto sócio realizar materialmente suas atividades com todas as características da relação de emprego. Por meio da socialização, o trabalhador é materialmente inserido na estrutura orgânica da empresa com todos os requisitos da relação de emprego e formalmente inserido no contrato social do empreendimento na condição de sócio minoritário.

A socialização como se pode ver é a utilização de um contrato de

sociedade para simular um negócio jurídico de natureza civil/empresarial. A

empresa para se livrar dos encargos com a contratação de trabalhadores por

meio de contratos de trabalho, ela faz uso do contrato de sociedade. Dessa forma

insere o trabalhador na estrutura da empresa tornando-o formalmente um sócio

da mesma.

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Nesta situação ao “sócio/trabalhador” é cedida apenas uma cota irrisória

da sociedade, normalmente 1% (um por cento) com o fim de intitulá-lo como

“sócio”. Entretanto, a figura de sócio é só um artifício para esconder a real relação

jurídica existente entre os verdadeiros “sócios/empresa” e o “sócio/trabalhador”

que é a relação de emprego. Neste ponto, pode-se destacar o primeiro indício da

fraude: a inclusão de trabalhador no contrato social da empresa com cota irrisória,

como se pode ver na decisão do TST:

VÍNCULO DE EMPREGO E EMPREGADO SÓCIO COTISTA MINORITÁRIO DE SOCIEDADE DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. COOEXISTÊNCIA. POSSIBILIDADE. A participação minoritária do empregado no quadro societário de uma das empresas pertencente ao mesmo grupo econômico para a qual presta serviços não descaracteriza a relação de emprego quando há trabalho subordinado mediante a paga de salário. Isso porque tal situação não se coaduna com a figura de sócio que recebe apenas pro labore e desenvolve o labor em igual patamar hierárquico ao de seus sócios, com poder deliberativo na condução ou destino da empresa. Nas circunstâncias dos autos, se o Regional não vislumbrou fraude à legislação trabalhista, não se evidencia incorreto o entendimento de poder existir, concomitante à participação minoritária de cotas no quadro societário da empresa de responsabilidade limitada, vínculo de emprego, desde que não detentor o empregado de atos de gestão na atividade empresária. Portanto, existindo contrato de trabalho livremente pactuado entre o autor e as demandadas (art. 442 da CLT), tendo o Regional concluído pela presença dos elementos caracterizadores da relação empregatícia (subordinação, habitualidade, pessoalidade e onerosidade), ainda que o autor tenha adquirido um percentual mínimo de cotas (1%), prevalece o vínculo de emprego. Nesse contexto factual, não se processa o apelo, pois inevitável a aplicação das Súmulas 23, 126 e 296, I, do TST. Recurso de revista não conhecido. ( TST, RR - 28600-50.2004.5.02.0021 , Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 15/08/2012, 6ª Turma, Data de Publicação: 14/09/2012). (http://www.tst.jus.br. Acesso em 20/11/2012)

Nesta decisão também foram identificados outros elementos que levaram

ao reconhecimento do vínculo de emprego, como por exemplo, a subordinação,

pessoalidade, onerosidade e habitualidade. Agora serão elencados os demais

indícios de fraude para a desconstituição desses contratos de sociedades

simulados, são os seguintes:

1.Remuneração (onerosidade): Como visto no tópico sobre diferenças

entre contrato de sociedade e contrato de trabalho, a remuneração dos sócios é o

pró-labore e a divisão dos lucros. Neste item é importante analisar os contratos de

57

sociedade para verificar como está disciplinado o pagamento da remuneração dos

sócios. Se há para estes sócios apenas o pagamento de pró-labore não havendo

repartição do lucro da empresa, já terá um indício da fraude. Por outro lado, pode

até estar disciplinada divisão dos lucros, só que como o percentual de

participação na sociedade é totalmente irrisório o lucro obtido também o será. Só

estará regulado para manter a aparência fictícia de um contrato regular. É

importante analisar junto ao sócio minoritário o quanto ele aufere de remuneração

ao mês, pois esta normalmente é apurada com base nos dias ou horas

trabalhadas, o que demonstra claramente que o status de sócio é só uma

fachada.

2.Subordinação: Este requisito é um dos principais elementos para

caracterizar o vínculo de emprego e, neste tipo de fraude ele pode ser identificado

pela análise de alguns pontos, veja:

a) prestação pessoal e subordinada dos trabalhos – o “sócio-trabalhador” é

limitado a realizar os serviços de forma pessoal e sob a direção dos sócios

majoritários, eles não detém autonomia característica dos contratos de sociedade.

Aqui não está presente o affectio societatis, que é a união de esforços para um

fim comum. Pois, o fim do “sócio-trabalhador” é ganhar o seu salário e do sócio

majoritário é obter cada vez mais lucro. Por outro lado, mesmo que exista certo

grau de autonomia, como por exemplo, poderes para negociar em nome da

sociedade, isto não quer dizer que não possa existir uma relação de emprego,

porque alguns empregados podem deter este poder nos termos do artigo 62, II da

CLT, como reconhecido na decisão do TRT da 3ª região ao julgar o Recurso

Ordinário nº 00225.2003.017.03.00-2:

RELAÇÃO DE EMPREGO – SÓCIO MINORITÁRIO – CONFISSÃO DO PREPOSTO ACERCA DA AUSENCIA DA INTEGRALIZAÇÃO DAS COTAS – PARTICIPAÇÃO INFIMA – FRAUDE – A distinção entre a figura do sócio e do empregado nem sempre é tarefa fácil ao julgador, havendo casos que se situam na chamada ‘zona gris’. Assim, cabe perquirir acerca dos aspectos fáticos que tornam peculiar o caso concreto, extraindo-se a conclusão que mais adequadamente o enquadre em face das normas legais. No caso em exame, vários são os elementos que levam ao convencimento de que a qualidade de sócio do reclamante não passava de máscara para o vínculo empregatício, que já existia previamente e permaneceu, na realidade, mesmo com a dispensa perpetrada pela reclamada. O reclamante detinha apenas 1% das cotas de uma sociedade componente do grupo

58

econômico, em relação às quais não teve qualquer dispêndio financeiro, segundo o depoimento do próprio preposto da reclamada. Portanto, não arcava com os riscos do empreendimento econômico, não se equiparando ao outro sócio, a quem era atribuída a gerência da sociedade, revelando a inexistência da affectio societatis. O fato de deter certo grau de autonomia, com poderes para realizar negócios em nome da sociedade, não é causa excludente da relação de emprego, pois a legislação prevê a hipótese do empregado com poderes de mando e gestão (art. 62, II, da CLT). Enfim, resta configurada a fraude à legislação trabalhista (art. 9º da CLT), ensejando o reconhecimento da continuidade da relação empregatícia por todo o período” (TRT 3ª Região, Recurso Ordinário, Processo n. 00225.2003.017.03.00-2,3ª Turma, rel. juíza Maria Cristina Diniz Caixeta, DJMG de 7 fev. 2004). (http://www.trt3.jus.br. Acesso em 20/11/2012)

Como se observa o vinculo de emprego foi reconhecido por estarem presentes os

elementos da relação de emprego.

b) os “sócios-trabalhadores” não podem ingerir na gestão da sociedade –

habitualmente são incluídas cláusulas nestes contratos de sociedade que

implicitamente proíbem a ingerência dos sócios minoritários no desenvolvimento

da empresa. Tais cláusulas têm o fim de impedir que estes sócios interviram nas

decisões da empresa. Eles não podem comprar cotas dos sócios majoritários que

decidam sair da sociedade, não tem poder de decisão, ou seja, são apenas

sócios formais e nada mais. Na essência são empregados vestidos de sócios;

c) Patamar hierárquico inferior – no contrato de sociedade todos os sócios estão

no mesmo patamar hierárquico, isto é, todos detém o mesmo poder de decisão e

autonomia na empresa. Contudo a ausência desta autonomia e a colocação do

“sócio-trabalhador” em um patamar hierárquico inferior aos sócios majoritários é

um grande indício da fraude a relação de emprego. Neste caso a relação entre os

sócios-trabalhadores e sócios majoritários é uma típica relação de subordinação

caracterizada pela plena ausência de autonomia, poder de decisão e de gestão. O

único direito deste sócio é cumprir as ordens e determinações dos sócios

majoritários (reais empregadores).

3.Pessoalidade: Este requisito estará presente quando o “sócio-

trabalhador” não puder se fazer substituir por outro para o desempenho de

alguma tarefa. No verdadeiro contrato de sociedade os sócios podem se fazer

substituir. Um exemplo prático pode ser visto em uma decisão do TST que

59

identificou a presença do elemento pessoalidade em uma sociedade de

advogados ao ser trazidos o seguinte elemento:

[...] visto que o reclamante "não poderia passar para terceiros a subscrição de peças processuais do reclamado" (fl. 697), bem como "o autor era impedido de advogar para clientes fora do escritório do réu, sendo que todos os clientes por ele angariados, deveriam, necessariamente, ser indicados àquele escritório[...] (TST, AIRR nº 54800-55.2004.5.03.0025, Relator: Ministro Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 19/09/2012, 1ª Turma, Data de Publicação no DEJT: 28/09/2012) (http://www.tst.jus.br. Acessado em 22/11/2012).

4. Onerosidade: Na mesma decisão citada acima o TST também

identificou este requisito, pois a dita “sócia” não fazia retiradas da sociedade, mas

sim recebia salário fixo da sociedade. É mister que se avalie o caso concreto para

se verificar se a remuneração recebida pelo sócio minoritário tem natureza de

salário ou se é pró-labore.

5. Risco do negócio: se o risco do negócio não recair por o sócio

minoritário haverá indício de que na verdade ele não é na verdade um sócio, mas

sim um empregado. Por que na relação de emprego o risco do negócio é de

responsabilidade apenas do empregador e na sociedade o risco é de todos os

sócios.

Superada essa questão, no próximo tópico será destacado alguns

julgados do TST sobre essas situações.

2.4.4 Decisões do TST sobre a matéria

Diante dos elementos estudados até este momento, é interessante a

apresentação de dois julgados que demonstram bem as duas situações

analisadas, a saber: 1. Validade do Contrato de sociedade; 2. Nulidade do

contrato de sociedade e reconhecimento de vinculo empregatício.

Em decisão prolatada em maio de 2011 a 1ª Turma do TST confirmou

Acórdão do TRT da 2ª Região que negou provimento a uma Reclamante que

pleiteava vinculo de emprego com o escritório de advocacia. A reclamante era

sócia minoritária da sociedade de advogados. Diante das alegações da

60

Reclamante o Tribunal não vislumbrou a presença dos elementos da relação de

emprego como se verifica em parte extraída do referido Acórdão:

[...] 3. A situação de fato é bastante simples: a reclamada é uma sociedade de advogados, constituída de acordo com as disposições dos artigos 15, 16 e 17 da Lei 8.906/94, e a recorrente ingressou na sociedade nos termos da 38ª alteração contratual averbada junto ao à OAB-SP em 30 de outubro de 2.000 e posteriormente, através da 48ª alteração, retirou-se da sociedade com a respectiva averbação junto à OAB em 11 de abril de 2002. Sua participação na sociedade foi realmente simbólica, com apenas uma quota social, mas o contrato registra que todos os demais sócios têm participação minoritária. Apenas um dos sócios - o sócio principal, que carrega o nome do escritório - detém 99% das quotas, sendo esta a síntese da situação de fato, sobre a qual não há controvérsia. Agora a situação jurídica. 4. Impossível a priori considerar ilegal um ato jurídico escrito e assinado por advogados, ato esse - o contrato de sociedade - cuja autenticidade está reconhecida e anotada nos livros da própria Ordem dos Advogados. O fato do sócio principal ser detentor de 99% das quotas sociais não parece trazer nenhum ilícito. Deve ser considerado em primeiro lugar que o contrato da sociedade está registrado na Ordem dos Advogados e em segundo lugar deve ser considerado o aspecto financeiro do investimento. Se um advogado investiu o seu próprio capital na formação do escritório de advocacia e decidiu aceitar o ingresso de outros advogados, convertendo o capital em milhares de quotas e cedendo uma quota para cada advogado que ingressa na sociedade, não há nisso nenhum mal, antes um negócio de oportunidade societária, que o advogado é livre para aceitar ou não, sem o direito de dizer depois que foi ludibriado. É uma questão até mesmo moral o advogado confirmar o ato jurídico que assinou, salvo se inadvertidamente se confundiu e se viu enrolado com as leis, o que não é comum acontecer. [...] A subordinação jurídica alegada pela recorrente está relacionada às diretrizes estabelecidas pelo escritório de advocacia, como sociedade civil, e não propriamente pela figura do sócio majoritário, embora pelo contrato seja o que detém maiores poderes de decisão. A pessoalidade na prestação dos serviços e a continuidade são também fatos inerentes à profissão, pois a recorrente agia na qualidade de advogada em favor do grupo de advogados e da sociedade, não sendo razoável pensar de outra forma. E a onerosidade está vinculada à participação nos lucros nas condições estipuladas no contrato, de forma igual em favor de todos os advogados. Os elementos formadores do contrato de trabalho - pessoalidade, continuidade, subordinação jurídica e onerosidade - são também comuns a certos contratos civis, sobretudo à sociedade de advogados, quando profissionais se juntam com finalidade lucrativa. A única distinção importante é quanto à subordinação jurídica, que no Direito do Trabalho relaciona o empregado à figura do empregador, ao passo que nas sociedades constituídas a subordinação do sócio se dá ao estatuto, ao contrato ou às leis, e não à sociedade. No caso sub examinem transcrevo apenas a declaração da recorrente, tirada do seu depoimento: "a depoente

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deveria trabalhar na condição de sócia ou autônoma; resolveu ser sócia porque a condição de autônoma pareceu-lhe não era real" (fls. 230). Portanto, se optou em ser sócia porque a condição de autônoma não lhe parecia real - ou seja, lhe parecia simulada ou fraudulenta -, resulta confessado que a condição de sócia lhe caiu bem, porque era real e verdadeira, lícita e mais vantajosa do ponto de vista pessoal e profissional. Não há relação de emprego entre o advogado e a sociedade de advogados da qual fez parte, ainda que na condição de sócio minoritário. Por tais fundamentos voto pela manutenção da sentença. 7. A jurisprudência oferecida na petição 085053, de 30.9.2005, consistente em dois acórdãos favoráveis à tese do vínculo empregatício não favorece à recorrente. Em se tratando de relação de emprego cada caso é um caso, de sorte que a conclusão judicial de um não serve de parâmetro para outros, onde as circunstâncias fáticas são diferentes. Aqui há confissão da recorrente no sentido de que optou livremente em ingressar na sociedade como sócia, por não lhe parecer interessante ficar como autônoma (figura que, a priori, poderia ser de um autêntico empregado, o que não ocorre com quem aceita ser sócio). Os fundamentos jurídicos utilizados nos casos oferecidos não guardam similaridade com o caso sub examinem. Todas as condições previstas no art. 997 do Código Civil para a validade do contrato social foram cumpridas pelos interessados, assim como as solenidades previstas no código para a validade das alterações posteriores. Como o caso envolve relação jurídica entre advogados, profissionais formados para cumprir e fazer cumprir as leis, não há como aceitar a alegação de que a sociedade teve objetivo de fraudar os direitos trabalhistas da recorrente. A fraude, com a conivência da recorrente, levaria à simulação. Mantenho a decisão. 8. Nego provimento ao recurso. Nada mais. (TST, AIRR - 101040-82.2002.5.02.0031 , Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, Data de Julgamento: 25/05/2011, 1ª Turma, Data de Publicação: 03/06/2011) (http://www.tst.jus.br. Acesso em 20/11/2012)

Por outro lado, a 1ª Turma do TST decisão proferida em setembro de

2012 reconheceu o vínculo de emprego do sócio minoritário de uma sociedade de

advogados, por identificar todos os elementos da relação de emprego, veja a

ementa do acórdão:

VÍNCULO DE EMPREGO. DESVELAMENTO AO RÉS DO CONJUNTO FÁTICO PROBATÓRIO. NÃO CONHECIMENTO. SÚMULA 126. 1. Registrada pelo Tribunal Regional a presença dos elementos caracterizadores da relação empregatícia - pessoalidade, não-eventualidade, onerosidade e subordinação -, premissas fáticas intangíveis a teor da Súmula 126 do TST, não se credencia à cognição extraordinária desta Corte a suposta violação dos arts. 2º e 3º da CLT. 2. Os arestos colacionados afiguram-se inespecíficos, a teor da Súmula nº 296 do TST, haja vista que não contemplam identidade de premissas fáticas. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (TST, AIRR nº 54800-55.2004.5.03.0025, Relator: Ministro Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 19/09/2012, 1ª Turma, Data

62

de Publicação no DEJT: 28/09/2012 (http://www.tst.jus.br. Acesso em 20/11/2012)

Para melhor entendimento, extraiu-se parte deste acórdão que trata muito

bem a fraude à relação de emprego praticada por uma sociedade de advogados.

A agravante persiste na tese de que o agravado compunha a sociedade de advogados como sócio, nos moldes dos arts. 37 e 39 do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil. Repisa a violação dos arts. 2º e 3º da CLT e transcreve julgados para comprovar divergência jurisprudencial. Ao exame. De plano verifica-se que os arestos transcritos na íntegra às fls. 1.013/1.023 são imprestáveis para demonstrar o conflito pretoriano, nem tanto por não ter a agravante se preocupado em estabelecer o conflito analítico de teses, mas, sobretudo, porque não apresentam a respectiva fonte oficial ou o repositório autorizado em que foram publicados, aplicando-se na hipótese os óbices contidos na Súmula n.º 337, I, a, III e IV, do TST. Colhe-se da decisão impugnada que o Regional, sopesando a integralidade do conjunto probatório, apesar de sinalar que a situação do reclamante se enquadrava na zona grise, verificou a existência de subordinação própria da relação de emprego, pois concluiu por demonstrado que "o reclamante não mantinha o poder de direção sobre a própria atividade; não detinha a posição de empregador em potencial e não se concentrava nele (reclamante) a organização do trabalho, o que obsta a configuração do vínculo societário pretendido pelo réu, ainda que analisada a questão sob o enfoque das normas estatutárias da Ordem dos Advogados do Brasil". Detectou ainda a presença de pessoalidade, visto que o reclamante "não poderia passar para terceiros a subscrição de peças processuais do reclamado" (fl. 697), bem como "o autor era impedido de advogar para clientes fora do escritório do réu, sendo que todos os clientes por ele angariados, deveriam, necessariamente, ser indicados àquele escritório". Verifica-se, ainda, da decisão impugnada que a função desenvolvida pelo agravado se inseria na atividade preponderante da recorrente consistente no exercício da advocacia e do gerenciamento da área trabalhista do escritório. Daí ser fácil inferir a não-eventualidade. O Regional descobriu, ainda, a onerosidade, consignando que o agravado "não fazia retiradas, mas recebia salário fixo". Rechaçou a tese recursal sobre o agravado ser sócio da sociedade de advogados, devido à "falta do requisito affectio societatis, caracterizador do vínculo societário", salientando que "Não é sócio de sociedade, mas autêntico empregado, aquele que recebe salário, que está subordinado a outro sócio e que não tem vontade própria - circunstâncias que foram evidenciadas pelas provas dos autos, sobretudo pelas referidas por esta decisão". Registrada pelo Regional a presença dos elementos caracterizadores da relação empregatícia - pessoalidade, não-eventualidade, onerosidade e subordinação -, premissas fáticas intangíveis a teor da Súmula 126 do TST, não se credencia à cognição extraordinária desta Corte a pretensa violação dos arts. 2º e 3º da CLT, nem os arestos colacionados às fls. 1.013/1.023, porque inespecíficos, dada a diversidade de premissas fáticas, a qual teria sido

63

facilmente detectada se a recorrente tivesse o devido zelo processual de estabelecer o conflito analítico de teses. Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. (TST, AIRR nº 54800-55.2004.5.03.0025, Relator: Ministro Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 19/09/2012, 1ª Turma, Data de Publicação no DEJT: 28/09/2012) Grifo nosso. (http://www.tst.jus.br. Acesso em 21/11/2012)

Desta feita, o que se extrai desta decisão é que mesmo em uma

sociedade de advogados é possível identificar a pratica de atos simulados para

mascarar uma efetiva relação de emprego. Destarte é fundamental a análise do

caso em concreto para que seja avaliada a existência ou não de fraude.

64

CAPÍTULO III

CONSEQUENCIAS DA FRAUDE AS RELACOES DE

EMPREGO

3.1 MERCANTILIZAÇÃO DO TRABALHO

A mercantilização do trabalho é uma das consequências da fraude às

relações de trabalho. Por meio destas fraudes o trabalhador é tratado como se

fosse mercadoria. Normalmente a intermediação de mão-de-obra é o meio

utilizado para que um terceiro aufira lucro com a exploração da mão-de-obra de

trabalhadores que tem seus direitos trabalhistas cerceados.

Não só por meio desta intermediação que se verifica está pratica, mas

também nos demais tipos de fraudes. O fim desta prática é livrar o empregador

(tomador de serviços) das suas responsabilidades frente aos trabalhadores, pois

crê que seu patrimônio estará protegido de possíveis reclamações trabalhistas.

Esta praxe fere o principio da dignidade da pessoa humana, pois trata o

trabalhador não como ser humano sujeito de direitos e obrigações, mas

simplesmente como um objeto a ser comercializado. Como algo que é colocado a

disposição de um tomador de serviço que irá tiver proveito de sua força mediante

a paga de uma quantia irrisória. A esses trabalhadores sequer são dadas, muitas

vezes, condições dignas de trabalho e um ambiente seguro e saudável.

Para combater esta praxe a Declaração da Filadélfia de 1944, estatui o

principio da não mercantilização, ou seja, declarou que o trabalho não é uma

mercadoria. O sentido desta declaração é justamente evitar que essa pratica se

perpetue e, fundamentalmente, garantir os direitos dos trabalhadores e sua

dignidade. Em várias decisões o TST e os Tribunais Regionais do Trabalho têm

combatido os artifícios que tentam tornar o trabalho uma mercadoria, cita-se:

RECURSO ORDINÁRIO - COOPERATIVA DE TRABALHO - FRAUDE CARACTERIZADA - VÍNCULO DE EMPREGO COM ELA RECONHECIDO – RESTRIÇÃO DO PEDIDO. Uma vez que os depoimentos pessoais das representantes da Cooperativa e do Hospital, beneficiário final da mão-de-obra, revelam a prática da marchandage, pura exploração da mão-de-obra, como se mercadoria fosse, ao arrepio do próprio art. 442 da CLT, pois

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havia subordinação e pessoalidade, com fiscalização por ambas reclamadas, deve ser reconhecido o vínculo de emprego com a primeira, como pretendido pelo Autor, observados os arts. 128 e 460 do CPC e vedada a reformatio in pejus. Recurso improvido. ( TRT. 15ª Região. Processo 00411-2001-094-15-00-3 RO. Juiz(a): José Pedro de Camargo R. de Souza. Publicado em 01.10.2004). (http://www.trt15.jus.br. Acesso em 22/11/2012) RELAÇÃO DE EMPREGO. INTERMEDIAÇÃO. O sistema de marchandage, ou comércio de mão-de-obra não raro dissimulado como terceirização, é proibido em vários países e até punido criminalmente. No Código Penal Brasileiro, a matéria aproxima-se da configuração de crime contra a organização do trabalho (arts. 203 e 207). Nesse sistema, o locador é mero intermediário, imiscuindo-se na relação direta entre o trabalhador e seu patrão natural, a ponto de, em grau extremo, o lucro da intermediação aviltar o salário. Relação de emprego. Tomadora bancária. Baneser. É bancária a empregada contratada pelo Baneser e imediatamente posta a serviço do Banespa em função administrativa inalienável de seus objetivos empresariais, ativando-se sempre e exclusivamente nas dependência do estabelecimento bancário, subordinada a chefias constituídas por empregados do banco, dos quais recebia ordens e orientações, observando seus horários de entrada/saída e com eles convivendo e concorrendo funcionalmente. (TRT. 2ª Região. Processo n° 20000413032/2000. Relator(a): Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva; Publicação: 14/08/2001). (http://www.trt2.jus.br. Acesso em 22/11/2012)

Como se observa a pratica de marchandage, como muitos chamam e que

retrata justamente o uso da força de trabalho como mercadoria, tem sido utilizada

com muita frequência por vários empregadores. Estes ao perceberem que a

intermediação de mão-de-obra é uma maneira de reduzir custos acabam

contratando trabalhadores por intermédio de um terceiro. Em conjunto com a

redução dos custos vem a precarização das condições de trabalho.

O trabalho humano passa a ser uma simples mercadoria que pode ser

comercializada. E como tudo que é comercializado, alguém tem que obter lucro

com a venda da mercadoria e, normalmente, quem ganha são as partes que

comercializam e não a própria mercadoria. O mesmo ocorre com o trabalhador

quando utilizado com este fim, pois quem ganha com sua força de trabalho são os

intermediadores e os tomadores e não o próprio trabalhador. A este trabalhador

sequer lhes são assegurados direitos mínimos e, muitas vezes, trabalham em

condições desiguais aos empregados da tomadora de serviço.

66

Essa pratica é um contraponto aos direitos mínimos e essenciais dos

trabalhadores e inferioriza o bem maior do ser humano que é sua força de

trabalho. Como leciona Souto Maior (2000, p.102)

O trabalho é da essência humana, no sentido de dever de valorização pessoal e de integração social, e será ao mesmo tempo um dever e um direito, na relação do indivíduo com a sociedade e o Estado. O direito do trabalho, que regula o trabalho prestado por uma pessoa a outra, deve ter por base, portanto, o respeito à essência do trabalho, enquanto dever e direito. Nisso consiste a ética do direito do trabalho, e sua existência só terá sentido na medida em que respeita isso.

Nessa linha, o direito ao trabalho digno, justo, que valorize o trabalhador e

que o faço sentir parte de uma sociedade onde os direitos são garantidos

igualitariamente a todos é o que efetivamente deve ocorrer. Por isto, é essencial a

atuação da Justiça do Trabalho e da fiscalização do trabalho com vistas a corrigir

estas irregularidades e impedir que estas se perpetuem lesando o direito

fundamental ao trabalho digno.

3.2 PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO

Com a globalização ocorreram diversas mudanças na área econômica e

social do mundo do trabalho, o que trouxe novas formas de trabalho e também

novas formas de fraudes as relações de emprego. A flexibilização dos direitos

trabalhistas pode de inicio trazer o sentido de ampliação dos direitos trabalhistas,

mas nem sempre é isto que se verifica no dia a dia das empresas.

Com os avanços tecnológicos as empresas precisaram se adequar ao

mercado de trabalho globalizado, o que acarretou um aumento de competitividade

e necessidade de redução de custos. Dessa forma, para alcançarem estes

objetivos (competir, produzir e lucrar cada vez mais) a terceirização de serviços

tornou-se um meio indispensável para que as mesmas pudessem se dedicar as

atividades principais e delegar às demais a terceiros. Entretanto, o que se verifica

na prática é que na ânsia por maior lucro os empregadores vêm terceirizando

também suas atividades-fim e utilizando-se de vários meios, como os já

estudados, para mascarar uma relação de emprego.

Ademais, para muitos empresários os gastos com as normas de proteção

ao trabalho se tornam um empecilho a novos investimentos, aumentam os custos

67

e diminuem as margens de lucro. Desse modo, porque contratar diretamente um

empregado se pode fazê-lo por intermédio de um “gato”, um terceiro que de início

será o responsável pelos custos da relação de emprego. Este terceiro para auferir

algum lucro acaba sonegando direitos dos trabalhadores e, muitas vezes, não tem

sequer como arcar com estes custos já que não tem capacidade econômico-

financeira para gerir o negócio. Nestes casos, o maior prejudicado é o trabalhador

que fica a margem da lei, sem ter garantido seus direitos trabalhistas. A

consequência destes atos é simplesmente a precarização das relações de

trabalho.

Em parte extraída da decisão da 2ª Turma do TST que trata da

precarização dos direitos do trabalhador com consequência da terceirização

ilícita, o magistrado ressalta a questão da falta de capacidade financeira para

arcar com os direitos trabalhistas, veja:

Tanto a doutrina como a jurisprudência trabalhista, com acerto, têm se orientado de modo a garantir os direitos do trabalhador. É que a praxe vem demonstrando que as empresas, no afã de obter maior lucratividade, estão terceirizando serviços não vinculados à sua atividade-fim, contratando empresas inidôneas financeiramente, sem se preocuparem com a precarização dos direitos do trabalhador. São comuns os casos em que essas empresas se dissolvem irregularmente, sem deixar bens capazes de cobrir o passivo. (AIRR - 48240-16.2006.5.01.0015 , Relator Ministro: Renato de Lacerda Paiva, Data de Julgamento: 12/11/2008, 2ª Turma, Data de Publicação: 28/11/2008) (http://www.tst.jus.br. Acesso em 22/11/2012)

A Inidoneidade financeira das empresas intermediadoras de mão-de-obra

para arcar com os direitos dos trabalhadores é, nestas situações, algo corriqueiro,

e por isto, em muitos casos, o judiciário traz a baila a responsabilidade subsidiária

do tomador de serviços com vistas a garantir os direitos essenciais destes

trabalhadores e para evitar o enriquecimento ilícito dos tomadores de serviço, já

que o mesmo foi o maior beneficiado com esta força de trabalho. Outro trecho

extraído da 5ª Turma do TST decide bem está questão:

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. MULTA PREVISTA NOS ARTS. 467 e 477 DA CLT. O Tribunal Regional manteve a decisão que reconheceu a responsabilidade subsidiária do Estado de Minas Gerais acerca dos débitos trabalhistas deferidos ao Autor, inclusive a multa prevista nos arts. 467 da CLT. Na decisão ficou firmado o seguinte entendimento: "A terceirização se verifica quando o empregador transfere a outrem a execução de serviços próprios de sua atividade habitual, não relacionada, entretanto,

68

com seu objetivo principal. É a chamada contratação de empresas para assumir as atividades acessórias, ou atividades-meio, que passam a ficar sob a responsabilidade da prestadora de serviços. Esse fenômeno - em tudo ligado com a onda neoliberal de precarização das relações de trabalho - não pode ser introduzido sem a adoção de salvaguardas que permitam a manutenção de garantias mínimas aos empregados da prestadora de serviços. É comum que empresas sem nenhuma idoneidade financeira assumam esse papel. A postura passiva do Judiciário Trabalhista, alé Esse fenômeno - em tudo ligado com a onda neoliberal de precarização das relações de trabalho - não pode ser introduzido sem a adoção de salvaguardas que permitam a manutenção de garantias mínimas aos empregados da prestadora de serviços. É comum que empresas sem nenhuma idoneidade financeira assumam esse papel. A postura passiva do Judiciário Trabalhista, além de refletir profunda injustiça, permitiria a proliferação incontrolável dessas sociedades "de fachada", cujo capital social não passa de uma mesa e algumas cadeiras, inteiramente incapazes de responder pelos créditos trabalhistas dos empregados. A jurisprudência trabalhista, crítica e criativa, tem reconhecido a responsabilidade do tomador de serviços e, assim, cumprido seu papel de zelar pela proeminência dos princípios basilares da dignidade da pessoa humana e do primado social do trabalho como valor social, fiel ao art. 1º da Constituição e seu preâmbulo. (TST, RR - 112000-04.2007.5.08.0016 , Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 24/09/2008, 5ª Turma, Data de Publicação: 10/10/2008) (http://www.tst.jus.br. Acesso em 22/11/2012)

Por isto, a expressão “precarização das relações de trabalho” está

diretamente ligada às mudanças sociais e econômicas do mundo do trabalho,

onde a geração de lucro é o objetivo maior das empresas. Para elas não importa

os meios que serão dispendidos para alcançar o objetivo, mesmo que isto

implique em cercear direitos trabalhistas.

As fraudes as relações de emprego precarizam as relações de trabalho,

porque deixam de garantir aos trabalhadores vítimas dessas fraudes direitos

essências, como a disponibilização de um ambiente de trabalho seguro e

saudável. Habitualmente estes trabalhadores ficam largados a própria sorte. Por

isto, tem ocorrido um crescimento enorme dos índices de acidentes de trabalho e

doenças ocupacionais que prejudiquem não somente o próprio trabalhador, mas

também seus familiares e a sociedade. Acentua as desigualdades sociais e

aumenta os encargos da previdência social, pois aumenta os gastos como

pensões por morte, no caso de acidentes de trabalho fatal, dentre outros

benefícios arcados pela previdência social.

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Para a autora Irene Galeazzi (2002, p. 242-247) a definição de trabalho

precário contempla pelo menos duas dimensões: 1. a ausência ou redução de

direitos e garantia do trabalho; 2. a qualidade no exercício da atividade.

Em outras palavras, a primeira dimensão (ausência ou redução de direitos

e garantia do trabalho) é justamente a supressão de direitos como férias, décimo

terceiro salário, salário inferior para trabalho de igual valor dentre outros. Em um

trecho extraído de decisão da 5ª turma do TST, o mesmo reconheceu o direito a

isonomia salarial a um trabalhador terceirizado, veja:

1.1. TERCEIRIZAÇÃO. ISONOMIA SALARIAL ENTRE EMPREGADOS DA EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS E OS DA TOMADORA . O Tribunal Regional, quanto ao tópico em destaque, assim consignou: "Ressalte-se, por ser oportuno, que a questão debatida não diz respeito ao vínculo de emprego com a CEF, o que não foi reconhecido pela sentença de primeiro grau, não havendo que se falar em violação à regra do artigo 37, II, da CRF, afastando a tese da recorrente, no aspecto. É que, ao contrário das alegações das recorrentes, a autora desenvolvia atividades bancárias, implicitamente ligadas à atividade-fim da empresa, sem contudo usufruir os benefícios inerentes à categoria, havendo violação ao princípio constitucional da isonomia e risco de precarização de mão de obra especializada, por meio de terceirização de tarefas não-terceirizáveis. Somente nesta hipótese, pode-se admitira isonomia salarial, em face da impossibilidade de se declarar o vínculo diretamente com a CEF, ante a inexistência de aprovação em concurso público. (TST, RR - 97900-77.2005.5.03.0105 , Relator Ministro: João Batista Brito Pereira, Data de Julgamento: 12/11/2008, 5ª Turma, Data de Publicação: 21/11/2008) (http://www.tst.jus.br. Acesso em 22/11/2012

O que se extrai desta decisão é que a Justiça do Trabalho, em decisões

brilhantes, vem garantindo aos trabalhadores seus direitos sociais de modo a dar-

lhes uma condição digna de trabalho, e com o fim de evitar a exploração destes

trabalhadores. A segunda dimensão está diretamente relaciona as condições de

trabalho no “chão da fábrica”, ou seja, com a precarização os trabalhadores

deixam ter garantidos a manutenção de um meio ambiente de trabalho em

condições dignas de labor. Deixam de ter um ambiente que proporcione um

trabalho saudável e que garanta a integridade física, mental e moral.

Destarte, a precarização das condições e do contrato de trabalho fere o

principio da dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho. Desse

modo praticas que levem a esta precarização devem ser combatidas, seja pela

atuação da fiscalização do trabalho, seja por meio de politicas publicas

70

orientativas e preventivas e, inclusive, pela atuação da Justiça do Trabalho para

corrigir tais distorções e conflitos.

3.3 CONCORRENCIA DESLEAL

A ordem social e econômica assentada na CF é fundada na valorização

do trabalho humano e na livre iniciativa para fins de assegurar a todos existência

digna conforme os ditames da justiça social (art. 170). Com base neste dispositivo

constitucional a justiça social é a peça chave para se apurar a responsabilidade

daqueles que exercem atividade econômica, pois o fim de tal atividade deve ser

gerar aspectos benéficos para toda a sociedade.

Entretanto, quando a atividade econômica passa a ser empreendida com

outros fins gerará efeitos maléficos a sociedade. Os efeitos maléficos são gerados

devidos às fraudes às relações de emprego o que trará consequências na seara

social, econômica e politica trazendo prejuízos não só para os trabalhadores

como também para as empresas que cumprem fielmente a legislação trabalhista.

Uma dessas consequências é a concorrência desleal que desequilibra as regras

de competição e de mercado ferindo assim o principio da isonomia. As fraudes às

leis trabalhistas reduzem os custos e despesas das empresas fraudadoras e com

isso estas conseguem colocar seu produto com um preço menor no mercado o

que prejudicará as demais empresas que cumprem na integra às leis.

Por isto, estas fraudes devem ser combatidas para que não causem

prejuízos à sociedade e para que as empresas possam concorrer no mercado de

forma igualitária.

71

CONCLUSÃO

O conceito de trabalho teve diversas mudanças devido à evolução da

sociedade. O trabalho em suas diversas acepções teve sempre o fim de dar ao

indivíduo condições de uma existência digna, se caracterizando como maior bem

da vida, pois traz em seu bojo um valor social que proporciona a plenitude do ser

enquanto pessoa humana.

O trabalho traz em si uma dimensão subjetiva e objetiva, que é o

mecanismo que sustenta o cidadão. Na sua dimensão objetiva, trabalho é algo

que se realiza com o fito de atingir um bem maior, como o seu próprio sustento e

de sua família e a possibilidade de lazer. Na sua dimensão subjetiva, tem-se a

satisfação das necessidades humanas que pode ser expressa por meio da

obtenção conhecimento, identidade pessoal, dignidade, reconhecimento

profissional e plenitude. Portanto, o trabalho é mais do que uma necessidade

humana, é o sentido da vida, é meio para desfrutar o seu fruto, é um direito que

deve ser garantido a todos. O trabalho tornou-se ao longo de sua história direito

fundamental garantido constitucionalmente, sendo responsabilidade de o Estado

assegurar a qualquer pessoa um trabalho digno e que lhe imprima um valor

social. Por isto, é importante estar atento as relações de trabalho estabelecidas

entre o tomador e o trabalhador, pois em algumas não há relação de emprego,

mas mera prestação de serviço como ocorre na locação de serviço,

representação comercial, contratos de parceria rural, dentre outros.

Entretanto, o que tem ocorrido com freqüência é a utilização destes

institutos com o fim de mascarar a relação de emprego e afastar o dever de

garantir os direitos sociais a esses trabalhadores como previsto

constitucionalmente. Assim para se apurar a fraude às relações de emprego, o

direito do trabalho se pauta no instituto da fraude objetiva, diferentemente do

direito civil que se pauta no instituto do consillium fraudis. Na seara trabalhista é

imprescindível apenas a presença dos elementos fático-jurídicos da relação de

emprego para se verificar a presença da fraude, não sendo necessário apurar-se

o intuito nem sequer a intenção daqueles que praticaram a fraude como ocorre

nos contratos civis.

72

Assim, de modo a identificar as fraudes e adotar medidas eficazes para

combatê-las é que se estudou os requisitos essenciais de algumas relações de

trabalho. O intuito foi identificar o fiel cumprimento do contrato pelas partes

contratantes. Como se pode observar, muitas vezes, os contratos celebrados são

apenas mera formalidade, ou seja, na essência são utilizados para mascarar uma

relação de emprego.

O primeiro tipo de contrato analisado foi o contrato de trabalho

temporário. Neste contrato mesmo estando presentes todos os requisitos da

relação de emprego a lei lhe permitiu a intermediação de mão-de-obra em casos

específicos. Dessa forma, somente nos casos permitidos por lei é possível esta

intermediação, pois se houver o descumprimento destes requisitos e a utilização

deste tipo de contrato para fraudar a lei, estará caracterizada a relação de

emprego entre o tomador de serviços e o trabalhador.

Nos demais tipos de contrato analisados como a representação

comercial, os contratos de parceria rural, a figura da pejotização e a socialização

de empregados também é possível se caracterizar a relação de emprego com o

tomador de serviços. Cada um destes contratos possui requisitos de validade,

assim com o contrato de trabalho temporário e a partir do momento que estes

requisitos não são cumpridos e se estiverem presentes os elementos fático-

juridicos da relação de emprego poderá se caracterizada a fraude a relação

emprego de modo a garantir a esses trabalhadores os seus direitos trabalhistas e,

principalmente, evitar que o trabalhador seja utilizado como mercadoria pelos

tomadores de serviço que objetivam apenas o seu lucro sem se importar com a

dignidade dos trabalhadores.

O estudo demonstrou bem que o desvirtuamento dos contratos de

trabalho gera conseqüências graves para os trabalhadores e para a sociedade.

Estas fraudes ferem o principio da dignidade da pessoa humana, pois trata o

trabalhador não como ser humano sujeito de direitos e obrigações, mas

simplesmente como um objeto a ser comercializado. Ademais, precarizam as

relações de trabalho, porque deixam de garantir aos trabalhadores vítimas dessas

fraudes direitos essências, como a disponibilização de um ambiente de trabalho

seguro e saudável. Por último, geram também concorrência desleal, pois reduzem

os custos e despesas das empresas fraudadoras. Assim as fraudadoras

73

conseguem colocar seus produtos no mercado com um preço inferior, o que

prejudica as empresas que não cometem fraude, pois não conseguem competir

em condições de igualdade.

Por isto, viu-se que é essencial a atuação da Justiça do Trabalho e da

fiscalização do trabalho com o fito de corrigir as irregularidades e impedir que elas

se perpetuem e lesem o direito fundamental ao trabalho digno e para evitar

prejuízos a sociedade e demais empresas cumpridoras das leis do trabalho.

74

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77

ÍNDICE

RESUMO............................................................................................................... 4

METODOLOGIA.................................................................................................... 5

SUMÁRIO.............................................................................................................. 6

INTRODUÇÃO....................................................................................................... 8

CAPÍTULO I

DO DIREITO FUNDAMENTAL AO TRABALHO.................................................10

1.1 – A DIMENSAO SUBJETIVA DO TRABALHO............................................. 11

1.2 – A DIMENSÃO OBJETIVA DO TRABALHO............................................... 12

1.3 – A EVOLUCAO HISTORICA DA RELAÇOES DE TRABALHO................. 13

1.4 – CONSILIUM FRAUDIS X FRAUDE OBJETIVA......................................... 14

CAPÍTULO II

FORMAS DE FRAUDES AS RELACOES DE EMPREGO................................. 16

2.1 – TRABALHO TEMPORARIO....................................................................... 16

2.1.1 Conceito e hipóteses................................................................................ 17

2.1.2 Sujeitos e a Natureza Jurídica do Contrato de Trabalho Temporário...18

2.1.3 Requisitos para a validade....................................................................... 19

2.2– CONTRATOS CIVIS................................................................................... 21

2.2.1 Contrato de arrendamento, parceria e meação rural..............................21

2.2.1.1 Conceitos ................................................................................................22

2.2.1.2 Requisitos de validade...........................................................................25

2.2.1.4 Configuração de relação de emprego...................................................28

2.2.2 Representante comercial...........................................................................35

2.2.2.1 Requisitos de validade da representação comercial...........................37

2.2.2.2 Configuração da relação de emprego ............................................... 40

2.2.2.3 Decisões do TST e TRT .........................................................................42

2.3 - A FIGURA DA PEJOTIZAÇÃO .................................................................. 43

2.3.1

Conceito................................................................................................................44

2.3.2 Meios e princípios bases para a desconstituição de uma “PJ”.............44

2.3.3 Como identificar a fraude e configurar a relação de emprego .............48

2.4 - SOCIALIZAÇÃO DE EMPREGADOS...........................................................50

78

2.4.1 Conceitos.................................................................................................. 50

2.4.2 Diferenças entre Contrato de Sociedade e Contrato de Trabalho .......53

2.4.3 O que é a socialização de empregados e como identificar os indícios

desta fraude ....................................................................................................... 55

2.4.4 Decisões do TST sobre a matéria.............................................................59

CAPÍTULO III

CONSEQUENCIAS DA FRAUDE AS RELACOES DE EMPREGO................... 64

3.1 – MERCANTILIZACAO DO TRABALHO ..................................................... 64

3.2 – PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO............................... 66

3.3 – CONCORRENCIA DESLEAL..................................................................... 70

CONCLUSÃO...................................................................................................... 71

BIBLIOGRAFIA................................................................................................... 74