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UNIVERSIDADE ANHANGUERA-UNIDERP
ALINE DUARTE EDILSON
ANÁLISE DO PERFIL SOCIOECONÔMICO, CARACTERIZAÇÃO DE
ACIDENTES E AVALIAÇÃO DO ACESSO A INFORMAÇÕES SOBRE
MEDIDAS PREVENTIVAS DE ACIDENTES OCASIONADOS POR ANIMAIS
AQUÁTICOS A PESCADORES DA BACIA DO ALTO PARAGUAI, MATO
GROSSO DO SUL
CAMPO GRANDE – MS
2014
ALINE DUARTE EDILSON
ANÁLISE DO PERFIL SOCIOECONÔMICO, CARACTERIZAÇÃO DE
ACIDENTES E AVALIAÇÃO DO ACESSO A INFORMAÇÕES SOBRE
MEDIDAS PREVENTIVAS DE ACIDENTES OCASIONADOS POR ANIMAIS
AQUÁTICOS A PESCADORES DA BACIA DO ALTO PARAGUAI, MATO
GROSSO DO SUL
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Meio Ambiente e
Desenvolvimento Regional da
Universidade Anhanguera-Uniderp, como
parte dos requisitos para a obtenção do
título de Mestre em Meio Ambiente e
Desenvolvimento Regional.
Comitê de Orientação:
Prof. Dr. José Sabino
Prof. Dr. Celso Correia de Souza
CAMPO GRANDE – MS
2014
AGRADECIMENTOS
A Deus, por me dar saúde, coragem, paciência e força neste e em todos
os outros momentos da minha vida.
A minha família, por todo o apoio, carinho, incentivo e paciência
dispensados nesta minha jornada.
Ao meu pai pela essencial contribuição e suporte para a realização das
pesquisas e conclusão do trabalho.
A minha mãe querida pelo carinho e incentivo que foram fundamentais
durante esta jornada.
Ao meu namorado pelo apoio, ajuda e principalmente pela compreensão
na reta final desta jornada.
Aos meus amigos pela ajuda e apoio durante a realização das
pesquisas.
Ao meu orientador, Prof. Dr. José Sabino, por todas as correções,
sugestões e orientações durante este trabalho.
Ao meu coorientador, prof. Dr. Celso Correa de Souza, pelo incentivo
durante esta jornada e orientação na parte estatística.
Ao tesoureiro da colônia de pesca de Miranda João Simões, pelo apoio,
recepção e ajuda durante a execução da pesquisa.
A presidente da Colônia de pescadores de Corumbá Luciene de Lima
pela recepção e apoio durante a realização da pesquisa.
A Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino
Superior) pelo apoio financeiro e concessão da bolsa de mestrado para
realização desta pesquisa.
A Prof. Dra. Elisabeth Nogueira Ferroni Schwartz coordenadora geral do
projeto de Toxinologia da Capes: “Peixes Continentais Peçonhentos:
Epidemiologia dos Acidentes, Ações Preventivas, Mecanismos Fisiopatológicos
e Bioprospecção”. Ao financiamento concedido por este projeto.
A todos os docentes do curso de Mestrado em Meio Ambiente e
Desenvolvimento Regional da Universidade Anhanguera-Uniderp, pela
contribuição fundamental para minha formação.
LISTA DE FIGURAS
Artigo I
Figura 1. Localização da Bacia do Alto Paraguai, no Brasil...........................26
Figura 2 Colônia de Pescadores Profissionais do município de Miranda (P1),
Mato Grosso do Sul...........................................................................................27
Figura 3. Colônia de Pescadores Profissionais do município de Corumbá (P2),
Mato Grosso do Sul...........................................................................................27
Figura 4. Quadro de lesão causada por mordida de piranha (Pygocentrus
nattereri)...........................................................................................................39
Artigo II
Figura 1. Localização da Bacia do Alto Paraguai, no Brasil...........................54
Figura 2 Colônia de Pescadores Profissionais do município de Miranda (P1),
Mato Grosso do Sul...........................................................................................55
Figura 3. Colônia de Pescadores Profissionais do município de Corumbá (P2),
Mato Grosso do Sul...........................................................................................55
LISTA DE TABELAS
Artigo I
Tabela 1. Perfil socioeconômico, escolaridade e faixa etária dos pescadores
profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do
Sul......................................................................................................................31
Tabela 2. Tempo de atuação na profissão, número de acidentes e local do
corpo atingido em pescadores profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato
Grosso do Sul....................................................................................................35
Tabela 3. Faixa etária em relação ao número de acidentes de pescadores
profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do
Sul......................................................................................................................36
Tabela 4. Tempo de atuação em relação ao número de acidentes sofridos por
pescadores profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do
Sul......................................................................................................................37
Tabela 5. Animal causador do acidente e tipo de lesão ocasionada em
pescadores profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do
Sul....................................................................................................................39
Tabela 6. Tipo de dor e sintomas dos acidentes ocasionados por animais
aquáticos em pescadores profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso
do Sul.................................................................................................................41
Tabela 7. Tratamento empregado nas lesões, tempo de afastamento do
trabalho por acidentes envolvendo animais aquáticos em pescadores
profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do
Sul......................................................................................................................44
Artigo II
Tabela 1. Pescadores que tiveram ou não acesso a informações sobre
prevenção de acidentes ocasionados por animais aquáticos, na Bacia do Alto
Paraguai, Mato Grosso do Sul...........................................................................58
Tabela 2. Meios de comunicação pelos quais os pescadores, tiveram acesso a
informação de prevenção de acidentes envolvendo animais aquáticos na Bacia
do Alto Paraguai, Mato Grosso do Sul...............................................................59
Tabela 3. Uso de Equipamentos de proteção (EPI’s) por pescadores
profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do
Sul......................................................................................................................60
SUMÁRIO
1 Introdução Geral.............................................................................................8
2 Revisão de Literatura...................................................................................11
3 Referências Bibliográficas...........................................................................17
Artigo I..............................................................................................................21
Análise do perfil socioeconômico e caracterização de acidentes
ocasionados por animais aquáticos a pescadores da Bacia do Alto
Paraguai, Mato Grosso do Sul........................................................................21
Resumo.............................................................................................................21
Abstract............................................................................................................23
Introdução........................................................................................................24
Material e Métodos...........................................................................................26
Resultados e Discussão..................................................................................30
Conclusões.......................................................................................................46
Agradecimentos...............................................................................................47
Referências Bibliográficas..............................................................................48
Artigo II.............................................................................................................50
Avaliação do acesso a informações sobre prevenção de acidentes
ocasionados por animais aquáticos a pescadores da Bacia do Alto
Paraguai, Mato Grosso do Sul........................................................................50
Resumo.............................................................................................................50
Abstract............................................................................................................51
Introdução........................................................................................................52
Material e Métodos...........................................................................................54
Resultados e Discussão..................................................................................58
Conclusões.......................................................................................................63
Agradecimentos...............................................................................................64
Referências Bibliográficas..............................................................................65
Conclusão Geral..............................................................................................68
Apêndice 1........................................................................................................69
8
1 Introdução Geral
A pesca em águas interiores é amplamente reconhecida como
importante fonte de alimento em diferentes continentes (FAO, 2000; 2002). De
modo geral no mundo, mas particularmente no Brasil, a pesca continental
atende a populações ribeirinhas detentoras de baixos indicadores
socioeconômicos (FERNANDEZ-BACA, 1998; KULBICKI, 2003; BENNETT e
THORPE, 2008). Tal perfil se aplica à pesca profissional artesanal em água
doce no Brasil, cuja atividade emprega milhares de pessoas em locais onde a
assistência médica e previdenciária são precárias.
Em cidades ribeirinhas e vilarejos no interior do país, grande parte das
pessoas trabalha por conta própria e sem carteira assinada, o que favorece a
não notificação de acidentes de trabalho e a limitação da estimativa e controle
(GARRONE NETO et al., 2005). Os acidentes de trabalho ocorridos com
trabalhadores que apresentam registro na carteira de trabalho, ainda que em
um sistema deficiente, têm maior número de notificações (GARRONE NETO et
al., 2005).
A pesca comercial, notadamente a marítima, é considerada uma das
ocupações laborais mais perigosas: Um estudo retrospectivo de um ano entre
os pescadores comerciais dinamarqueses revelou que a taxa global de lesão
durante a atividade de pesca foi de 20,4 por 100 pessoas/ano, mostrando a
elevada ocorrência de acidentes de trabalho (JENSEN,1996).
Na BAP e na região do Pantanal a pesca se tornou uma das principais
atividades econômicas, sociais e ambientais da região (CATELLA, 2006). A
pesca ainda é realizada de modo artesanal, expondo os profissionais a riscos
(SILVA et al., 2010). Segundo GARRONE NETO et al. (2005), a maior causa
de acidentes em pescadores está relacionada a lesões envolvendo animais
aquáticos e, devido a sua elevada frequência e gravidade, é considerado um
problema de saúde pública que causa sofrimento e prejuízos socioeconômicos.
Várias espécies de animais causadoras de acidentes podem conter
toxinas e apresentar peçonha. Segundo HADDAD JR (2013), toxinas são
substâncias produzidas por animais que, dentro do organismo de outro animal,
reagem com determinadas células e órgãos, causando efeitos deletérios e as
peçonhas são toxinas que provocam seus efeitos após serem injetadas por
9
espículas, presas ou ferrões. A ação das toxinas é variável, mas os principais
efeitos são neurotóxicos, proteolíticos, miotóxicos, hemotóxicos (hemolíticos) e
citotóxicos (HADDAD JR, 2013).
Os peixes fazem parte do grupo de animais aquáticos capazes de
provocar acidentes em seres humanos, principalmente em profissionais
relacionados à pesca. A gravidade dos acidentes vária de acordo com a
espécie envolvida e a circunstância do acidente. Segundo (HADDAD JR,
2008), os acidentes por bagres são os mais comuns no Brasil, especialmente
aqueles da família Pimelodidae, como os mandijubas (Pimelodus clarias Bloch,
1752) e os mandis-chorões (Pimelodus maculatus Lacépède, 1803), maiores
responsáveis pelos acidentes envolvendo veneno.
Acidentes por animais aquáticos venenosos e traumatizantes podem
provocar morbidez importante em humanos (HADDAD JR, 2013). Em 236
ocorrências por animais marinhos, os ouriços-do-mar causaram cerca de 50%
dos acidentes, os cnidários (cubomedusas e caravelas) 25% e peixes
venenosos (bagres, arraias e peixes-escorpião) 25% dos episódios. Nos rios e
lagos, as arraias, bagres e mandis causam acidentes; estes animais
apresentam mecanismos de envenenamento e os efeitos das toxinas são
semelhantes aos das espécies marinhas. Em uma série de cerca de 200
acidentes em pescadores de água doce, quase 40% foram causados por
bagres e mandis, 5% por arraias de água doce e 55% por peixes
traumatogênicos, como as piranhas e as traíras (HADDAD JR, 2013).
Os pescadores sobrevivem da captura e venda de produto pescado,
mas a atividade tem sido cada vez mais desvalorizada no mercado, devido à
ação de atravessadores. Ao impor baixos preços ao pescado, induzem os
pescadores a estender suas jornadas de trabalho, o que os deixam mais
expostos a situações de risco e acidentes (GARRONE NETO et al., 2005).
Dessa forma, a maior parte desses profissionais não se atenta para sua saúde
e segurança durante a realização de suas atividades laborais, preocupando-se
apenas em trabalhar para garantir o sustento da família. A maioria dos
pescadores desconhece ou ignora medidas de prevenção, primeiros socorros e
uso de equipamentos de segurança, isto acaba muitas vezes por agravar o
quadro de saúde destes profissionais (DOIMO et al., 2012), fatos que reforçam
a importância do presente estudo.
10
SILVA et al. (2010) ressaltam a necessidade da elaboração de material
educativo, adequadamente ilustrado, com uso de recursos modernos de
desenho gráfico e focado em linguagem acessível ao público alvo. A
importância da educação e prevenção acerca do tema assume alta relevância
e tem desdobramentos e impactos socioeconômicos, na medida em que o
pescador bem orientado pode prevenir-se de traumas e, caso acidentado,
assumir a conduta mais adequada.
Pelo exposto, o objetivo desta investigação é realizar uma análise do
perfil socioeconômico dos profissionais da pesca, da ocorrência e
caracterização dos acidentes e verificar se eles têm acesso a informações
quanto à prevenção de acidentes ocasionados por animais aquáticos.
11
2 Revisão de Literatura
O Brasil apresenta a maior rede hidrográfica do mundo, com a mais rica
ictiofauna continental do Planeta (REIS et al., 2003). Essa fauna de peixes, por
vezes, pode ser perigosa e causar acidentes com frequência em pescadores
(HADDAD JR, 2008).
Segundo a Lei n. 11.959/09 a pesca artesanal é a praticada diretamente
por pescador profissional, de forma autônoma ou em regime de economia
familiar, com meios de produção próprios ou mediante contrato de parceria
(BRASIL, 2009). A pesca artesanal está fundada nos conhecimentos dos
antepassados que são transmitidos ao pescador, através das gerações, pela
tradição e efetivada pela interação com os companheiros de profissão. É
frequentemente realizada em pequenas embarcações a remo ou a vela, ou
mesmo motorizada, e a pesca, geralmente, é realizada sem instrumentos de
apoio à navegação e equipamentos obrigatórios. Desta maneira, os
pescadores trabalham apenas com a experiência e conhecimento rudimentar
(LEBRE et al., 2012).
Segundo (JENSEM, 1996), acidente de trabalho em pescadores tornou-
se um problema global de difícil solução. Estudos com pescadores
dinamarqueses mostram que existe um alto índice de lesões fatais e que estas
são mais conhecidas e registradas, e as lesões não fatais são menos
conhecidas e merecem importância devido a sua elevada frequência sendo
geralmente causadas pela falta de atenção durante a realização das atividades.
As Autoridades Marítimas da Dinamarca não fornecem informações confiáveis
sobre a significância do problema (JENSEM, 1996).
Estudos mostram que a pesca de arrastão está entre as ocupações mais
perigosas na Grã-Bretanha: taxas de acidentes fatais indicam145, 143, e 116
por 100.000 trabalhadores/ano (STEPHEN, 2002). Pescadores têm de lidar
com os riscos ocupacionais e aqueles relacionados ao clima; estes, juntamente
com as pressões econômicas, muitas vezes fazem essa indústria não receptiva
à introdução de medidas de segurança (STEPHEN, 2002).
A Austrália tem uma zona de pesca exclusiva de 9 milhões de km².
Estudos publicados sugerem que a pesca comercial na Austrália também é
12
uma ocupação de alto risco, com taxas de mortalidade bem acima da maioria
dos outros grupos profissionais (DRISCOLL et al., 1994).
Parece que a fadiga é um dos indutores dos acidentes, potencializada
pelo trabalho árduo, sem períodos adequados de descanso e sono pode ser
um fator importante na causa da alta taxa de acidentes fatais. Ela pode
também ter um efeito adverso sobre a saúde geral (SCHILLING, 1966).
No Brasil, os acidentes envolvendo animais aquáticos estão entre os
mais comuns. Segundo GARRONE NETO et al. (2005), em um estudo
realizado na região do médio Araguaia, 86% dos acidentes laborais envolvendo
pescadores são ocasionados por animais aquáticos.
Segundo DOIMO et al. (2012), 90% dos pescadores artesanais marinhos
da Estação Ecológica de Juréia-Itatins, no estado de São Paulo desconhecem
o uso de equipamentos de proteção, apenas 1% conhece o uso de EPI’s e 3%
fazem uso de botas. Todos os pescadores carregam coletes salva vidas em
embarcações, mas somente 80% os utilizam, enquanto que 90% apresentaram
ferimentos nas mãos devido à manipulação do pescado sem fazer uso de
luvas.
Em conjunto, todos esses dados reforçam a alta ocorrência de acidentes
envolvendo animais aquáticos e o desconhecimento da importância de
medidas de prevenção e proteção por parte dos trabalhadores, que acabam
colocando suas vidas em risco. Tal realidade, reforça a necessidade da criação
de material educativo que contenha informações adequadas sobre prevenção
de acidentes envolvendo animais aquáticos.
Na Bacia do Alto Rio Paraguai, particularmente nos municípios da
Região do Pantanal, ferimentos e envenenamentos em pescadores
profissionais são comuns e pouco estudados (SILVA et al., 2010).
O rio Paraguai nasce em território brasileiro e sua bacia hidrográfica
abrange uma área de 1.095.000 km². Segundo BEZERRA e OLIVEIRA (2011),
a importância do rio Paraguai na percepção do pescador está ligada à questão
de sobrevivência, notadamente como oportunidade de pesca. Por outro lado,
considera o rio sua vida, sua existência. Por meio do rio, criaram seus filhos, e
o ambiente é fonte de renda e de vida.
A Bacia do Alto Rio Paraguai (BAP) ocupa uma área de
aproximadamente 600.000 km² na América do Sul, dos quais 363.442 km²
13
estão em território brasileiro. O Pantanal brasileiro tem 147.629 km², está
totalmente inserido na BAP e responde por 41% desta região (PROJETO
PANTANAL et al., 2004). As nascentes dos rios da BAP ocupam uma área de
215.813 km² localizadas nos planaltos do seu entorno e representam 59% da
área da Bacia. Isso significa que uma porção expressiva da drenagem
hidrográfica central do continente sul-americano depende da BAP (PROJETO
PANTANAL et al., 2004).
Os Municípios de Corumbá e Miranda estão entre os mais importantes
formadores do Pantanal, no Mato Grosso do Sul, pelas suas contribuições no
desenvolvimento socioeconômico da região e seus recursos hídricos. Segundo
o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2013), a população
estimada para os dois municípios é de 134.017 habitantes (cerca de 107.347
em Corumbá e 26.670 em Miranda). Suas economias são baseadas
essencialmente na agropecuária e na pesca, que representa a segunda
atividade econômica, agregando valores diretos, com a atividade pesqueira
profissional artesanal e, valores indiretos, com o turismo de pesca amadora.
Segundo dados médios do Sistema de Controle de Pesca -
SCPESCA/MS (CATELLA et al., 2010), a quantidade de pescado capturado e
vistoriado, para a pesca profissional e esportiva, na Bacia do Alto Paraguai, em
Mato Grosso do Sul, foi de 362 toneladas. A maioria do pescado é vendida
informalmente a restaurantes e hotéis por preços melhores que os pagos pelas
peixarias, evidenciando a importância deste setor na econômica dos municípios
da região.
No Pantanal são reconhecidas em torno de 270 espécies de peixes
(BRITSKI et al., 2007). Entre estas estão as espécies de peixes nobres e de
interesse para a pesca que apresentam alto valor comercial como: pacu
(Piaractus mesopotamicus Holmberg, 1887), surubins (Pseudoplatystoma spp.)
dourado (Salminus brasiliensis Cuvier, 1817), jaú (Paulicea luetkeni
Steindatchner, 1875), piavuçu (Leporinus macrocephalus Garavello e Britski,
1988), piraputanga (Brycon hilarii Valenciennes, 1849), barbado (Pinirampus
pinirampu Spix e Agassiz, 1829), jurupoca (Hemisorubim platyrhinchos
Valenciennes, 1840) e jurupencem (Sorubim lima Bloch e Schneider, 1801)
(SILVA et al,. 2010). Muitas espécies são capazes de provocar acidentes
graves por ferrões ou mordidas, a maioria dos acidentes são ocasionados por
14
espécies de baixo valor comercial, com destaque para as piranhas (subfamília
Serrasalminae), mas também por mordidas de traíras (Hoplias malabaricus
Bloch, 1794), e ferrões de arraias (Potamotrygon spp.), mandis (Pimelodus
spp., Pimelodella spp. e Rhamdia spp.), armaus (família Doradidae) e cascudos
(família Loricariidae).
Algumas espécies de bagre mandijubas (Pimelodus maculatus
Lacépède, 1803) e mandis-chorões (Pimelodella brasiliensis Steindachner,
1877) são os maiores responsáveis pelos acidentes em pescadores amadores
e profissionais (HADDAD JR e LASTORIA, 2005). Outros peixes de couro,
como os pintados (Pseudoplastytoma corruscans Spix e Agassiz, 1829) e
surubins (Pseudoplatystoma spp.), que apresentam alto valor comercial e
importante valor culinário, junto de armaus (Oxydoras spp.), portam ferrões que
podem apresentar toxinas, que, quando presentes, causam dor e necrose
(HADDAD JR, 2008).
SILVA et al. (2010) relatam que todos os pescadores entrevistados no
município de Coxim e Corumbá, em Mato Grosso do Sul, alegaram ter sofrido
algum tipo de trauma causado por animal aquático, principalmente peixes, e
que as situações que os levaram aos traumas foram ações corriqueiras durante
o exercício de suas atividades durante a pesca.
Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (BRASIL, 2001), a
pesca artesanal expõe os pescadores a vários riscos de acidentes, que podem
ser reunidos em grupos como: ergonômicos (problemas de postura), naturais
(incidência de sol na pele e olhos, friagem, ventos frios, ondas fortes), físicos
(lesões nas mãos e nos pés), químicos (contato com secreções venenosas ou
de substâncias químicas) e biológicos (contato com algas e coliformes fecais).
Para evitar estes riscos, existem os equipamentos de proteção individual
(EPIs) que são definidos pela norma regulamentadora 6 (NR6) como todo
dispositivo ou produto, de uso individual utilizado pelo trabalhador, designado a
proteção contra riscos capazes de ameaçar a sua segurança e a sua saúde
(BRASIL, 1978). Na população de pescadores os EPI’s são recursos pouco
utilizados e não existe fiscalização de nenhuma instituição pública quanto ao
uso destes equipamentos, ficando a responsabilidade para o próprio pescador.
A norma regulamentadora que tem por objetivo a proteção e a
regulamentação das condições de segurança e saúde dos trabalhadores
15
aquaviários é a NR 30 (BRASIL, 1978). Porém, esta norma tem aplicação
limitada à pesca artesanal.
Os riscos que os trabalhadores que atuam na atividade de pesca e
aquicultura está classificado com grau de risco médio (GR-3) conforme o CNAE
– Classificação Nacional de Atividades Econômicas (DOIMO et al., 2012).
O processo de captura dos peixes em condições naturais expõe o
pescador a uma série de riscos, desde o preparo dos apetrechos e
enfrentamento das condições naturais adversas, passando pelo manuseio do
pescado, durante ou depois da pesca (DALL’OCA, 2004). Nesse ambiente e
condições, acabam ocorrendo momentos de desatenção e não se tem o uso de
equipamentos primários de segurança que são essenciais. Muitos deles
trabalham descalços, são imprudentes na hora de manusear o pescado vivo,
seja na hora da retirada do anzol ou da rede de pesca, no deslocamento de um
local para outro ou dentro do barco; essas são causas facilitadoras dos
acidentes, que acabam por acometer as mãos e os pés dos pescadores
(DALL’OCA, 2004).
Segundo GARRONE NETO et al. (2005), os acidentes laborais com
pescadores constituem importante problema de Saúde Pública no Brasil, visto
sua elevada frequência e gravidade. Por acometerem principalmente pessoas
jovens e em idade reprodutiva, acarretam, além de sofrimento para os
trabalhadores acidentados e seus familiares, graves consequências sociais e
econômicas.
Associado aos acidentes é provável que o desconhecimento de medidas
preventivas e de primeiros socorros por parte dos pescadores agrave o quadro
das lesões, fatos que mostram a importância da criação e do uso de materiais
educativos que levem informações adequadas sobre acidentes envolvendo
animais aquáticos ao público alvo.
A comunicação e a educação estão intimamente ligadas, pois mesmo
independentes, possuem objetivos comuns para o atendimento das
necessidades essenciais de comunicação e aprendizagem do ser humano. No
contexto da saúde, essa relação se expressa por meio da aprendizagem, o ser
humano obtém conhecimentos, habilidades e atitudes e desenvolve diferentes
formas e graus de receber e responder as mensagens de saúde. Por outro
16
lado, a eficiência da comunicação entre emissor e receptor determinará o grau
de aproveitamento da mensagem (MOREIRA et al., 2003).
Segundo MOREIRA et al. (2003), material educativo impresso é definido
como folhetos, panfletos, folder, livreto cuja idéia é proporcionar informação
sobre promoção da saúde, prevenção de doenças, tratamento e autocuidado.
Dentro deste contexto, entende-se necessário analisar o perfil
socioeconômico desses profissionais, fazer um levantamento geral
caracterizando os acidentes, e averiguar se eles têm acesso a algum tipo de
informação quanto a prevenção de acidentes ocasionados por animais
aquáticos.
17
3 Referências Bibliográficas
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and south america. IDDRA Institute for Sustainable Development E Aquatic
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BRITSKI, H. A.; SILIMON, K. Z. S.; LOPES, B. S. Manual de Identificação de
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21
Artigo l
Análise do perfil socioeconômico e caracterização de acidentes
ocasionados por animais aquáticos a pescadores da Bacia do Alto
Paraguai, Mato Grosso do Sul
Aline Duarte Edilson¹
1Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento
Regional
Resumo
No estado do Mato Grosso do Sul, localizado na região do Pantanal, existe um
total de 3255 pescadores profissionais oficialmente registrados e agrupados em
colônias. Estes profissionais estão sujeitos a acidentes com animais aquáticos
durante a atividade de pesca. O objetivo deste trabalho foi realizar uma análise
do perfil socioeconômico dos pescadores, da ocorrência e caracterização de
acidentes envolvendo animais aquáticos, o que faz evidente conexão da
temática destes acidentes à linha do programa Sociedade, Ambiente e
Desenvolvimento Regional Sustentável. O estudo foi realizado nos municípios
de Miranda e Corumbá, Mato Grosso do Sul, por meio de questionário semi
estruturado aplicados em 140 pescadores, 93 pertencentes à comunidade de
Corumbá, e 47 pertencentes à comunidade de Miranda. Os dados foram
analisados por meio do software Sphinx 5.0. A análise dos dados revelou que
entre os profissionais da pesca avaliados, 86,4% tem idade superior a 30 anos,
66,4% são do sexo masculino, 72,9% não concluíram o ensino fundamental,
15% são analfabetos e 48% têm renda inferior a um salário mínimo. As
principais espécies envolvidas nos acidentes são peixes comuns da região que
apresentam estruturas capazes de causar ferimentos como: bagres que
representaram 32,1% dos acidentes e outros peixes, destacando-se as
piranhas (35% dos acidentes), outros peixes como pintado e jurupencem (24%)
e as arraias (8,6% dos eventos). Os dados permitem concluir que os
pescadores, em sua maioria tem idade superior a 30 anos, apresenta baixo
22
grau de escolaridade, tem renda inferior a um salário mínimo e que acidentes
envolvendo animais aquáticos são comuns e causado por espécies de peixes
comuns da região.
Palavras-chave: Pantanal-Sul, pescador artesanal, injúrias, saúde pública.
23
Abstract
In the state of Mato Grosso do Sul, located in the Pantanal region, a total of
3255 professional fishermen grouped in colonies, which are prone to accidents
with aquatic animals during the fishing activity. The aim of the study was to
analyze the profile of fishermen, the occurrence and characterization of
accidents involving aquatic animals, which makes clear the connection to the
theme of these accidents online Society, Environment and Sustainable
Regional Development. The study was conducted in the municipalities of
Miranda and Corumbá, Mato Grosso do Sul State, through semi structured
survey applied to 140 fishermen, 93 belonging to the community Corumbá, and
47 belonging to the community of Miranda. The data were analyzed by the
Sphinx 5.0 software. Data analysis revealed that among the fishermen reviews,
86,4% age above 30 years, 66,4% were male, 72,9% had not completed
primary school, 15% are illiterate and 48% is below the minimum wage. The
main species involved in accidents are common fish in the area that have
structures capable of causing injury as catfish representing 32,1% of accidents
and other fish highlighting the piranhas representing 35%, other fish as spotted
surubim and jurupencem represented 24%, and stingrays 8,6%. It was
concluded that fishermen have mostly older than 30 years, has a low level of
education, has less than one minimum wage and that accidents involving
aquatic animals are common and caused by species of fish common in the
region.
Keywords: Pantanal-Sul, artisanal fisherman, injuries, public health.
24
Introdução
A pesca é uma importante atividade econômica e social realizada no
Pantanal e em toda a Bacia do Alto Paraguai em Mato Grosso do Sul
(BAP/MS), nas modalidades profissional, artesanal, esportiva (amadora) e de
subsistência. As características físicas do Pantanal, associadas ao regime de
inundação anual, propiciam uma grande produção natural de peixes. Em
decorrência das características ambientais e da amplitude e riqueza dos
sistemas aquáticos, a atividade pesqueira se tornou importante atividade
econômica do Estado (CATTELA, 2006).
A atividade pesqueira é marcada por grandes dificuldades e
complexidades, das quais se ressaltam tanto os seus potenciais elementos
agressivos à vida e à saúde do profissional da pesca, como o exotismo da
convivência entre a mais aprimorada tecnologia da pesca e os instrumentos
mais antigos e rústicos servindo ao mesmo fim (DALL‟OCA, 2004).
De acordo com os dados do IMASUL - Instituto de Meio Ambiente de
Mato Grosso do Sul, existe um total de 3255 pescadores registrados agrupados
em várias colônias (IMASUL, 2013). Estes profissionais são oriundos do próprio
Estado ou de outras unidades da federação, como São Paulo, Paraná, Minas
Gerais, Bahia e Ceará, indicando a extensão do mercado de trabalho e da
dimensão da população de pescadores no estado que estão sujeitos a
acidentes com animais aquáticos durante a atividade de pesca (DALL‟OCA,
2004).
É comum a ocorrência de acidentes em humanos provocados por
animais aquáticos, sejam eles marinhos ou fluviais, podendo ser observados
em diversas situações, levando a processos dolorosos, necroses, mutilações,
morbidades e até óbitos. Estudos anteriores mostram que os acidentes são
causados por diferentes estruturas físicas, como dentes com capacidade de
lacerar ou perfurantes, além de ferrões (SILVA et al., 2010).
Acidentes com animais aquáticos acabam por ser comuns não só em
pescadores profissionais como amadores e ocorrem, em geral, por imprudência
ou imperícia humana, uma vez que as estruturas e peçonhas fazem parte do
mecanismo de defesa de alguns animais. Raramente se vê uma agressão na
25
qual o animal não tenha sido provocado ou manipulado de forma inadequada,
quando não é pisoteado ou retirado de anzóis (HADDAD JR, 2008).
Os acidentes com peixes apresentam gravidade variável. Os venenos
presentes nos ferrões são termolábeis e a aplicação de água quente de
temperatura tolerável no membro atingido, por 30 a 90 minutos, atenua a dor,
mas não exclui a necessidade do paciente ser encaminhado a um serviço
médico para limpeza do ferimento e extração de possíveis fragmentos de
ferrões ou espículas do ferimento (HADDAD JR, 2008). Associado aos
acidentes é provável que o desconhecimento de medidas preventivas e de
primeiros socorros por parte dos pescadores agrave o quadro, fatos que
reforçam a importância deste estudo.
O tema é relevante não só para as comunidades pesqueiras do
Pantanal, mas também para o desenvolvimento do turismo de pesca esportiva
na região, devido à alta ocorrência de acidentes causados por animais fluviais
peçonhentos e traumatizantes (SILVA et al.,2010).
Por tudo que foi apresentado, o objetivo do trabalho foi realizar uma
análise do perfil socioeconômico dos profissionais da pesca na Bacia do Alto
Paraguai e caracterizar os acidentes envolvendo animais aquáticos.
26
Material e Métodos
Os estudos foram realizados em duas colônias de pescadores, situadas
no Pantanal, inseridos na Bacia do Alto Paraguai (Figura1), nos municípios de
Miranda (Latitude: -20.2429, Longitude: -56.364, 20°14‟34‟‟ Sul, 56°21‟50‟‟
Oeste), (P1 Figura 2) rio Miranda, e Corumbá (Latitude: -19.0098, Longitude: -
57.6547, 19°0‟35‟‟Sul, 57°39‟17‟‟Oeste) (P2 Figura 3), rio Paraguai. A coleta
dos dados foi realizada no mês de julho de 2013.
Figura 1. Localização da Bacia do Alto Paraguai, no Brasil.
Fonte: PROJETO PANTANAL ANA, GEF, PNUMA, OEA (2004).
Corumbá
Miranda
27
Figura 2. Colônia de Pescadores Profissionais do município de Miranda (P1),
Mato Grosso do Sul.
Foto: Aline Duarte (2013).
Figura 3. Colônia de Pescadores Profissionais do município de Corumbá (P2),
Mato Grosso do Sul.
Foto: Aline Duarte (2013).
O dimensionamento da amostra foi realizado utilizando o cálculo de
variável nominal ou ordinal e população finita conforme a equação (1)
(FONSECA e MARTINS, 2006).
28
qpzNe
Nqpzn
ˆˆ)1(
ˆˆ22
2
(1)
onde:
- n tamanho da amostra aleatória;
- z abscissa da curva normal padrão, fixado o nível de confiança
em 95% (z = 1,96);
- p̂ estimativa da verdadeira proporção de um dos níveis da
variável escolhida para o estudo.
- pq ˆ1ˆ ;
- e erro amostral, expresso em decimais, e representará a
máxima diferença que o pesquisador admite suportar entre a média
populacional e a média estimada, isto é: epp ˆ , em que p é a
verdadeira proporção (frequência relativa) do evento a ser calculado
a partir da amostra; e
- N é o tamanho da população.
De acordo com a equação (1), a amostra de pescadores investigados foi
de 140, com nível de confiança de 95% e erro amostral de 7%. Foram
investigados 93 pescadores na cidade de Corumbá e 47 em Miranda, de forma
proporcional ao número total de 942 pescadores nas duas cidades.
A abordagem aos entrevistados foi não probabilística, sendo
entrevistados aqueles pescadores que primeiro se apresentaram.
Na elaboração do questionário semi estruturado (Apêndice 1) contou-se
com o auxílio do software Sphinx 5.0 optando-se tanto por questões fechadas
únicas, múltiplas e escalares, quanto por questões abertas, dividido em três
grupos, totalizando três questões, explorando os seguintes constructos:
a) Perfil do entrevistado: Questões abertas e fechadas únicas sobre
nome, local da entrevista, sexo, faixa etária, instrução, renda e tempo
de atuação na pesca;
b) O questionário contém questões abertas e fechadas sobre o número
de acidentes sofridos, a circunstância do acidente, local do corpo
atingido, animal causador;
29
c) Informações sobre os tipos de lesões e sintomas associados,
contendo questões sobre tempo e intensidade da dor, sintomas
secundários, tratamentos empregados, atendimento médico e o
tempo de afastamento do trabalho por causa do acidente.
A tabulação e análise estatística dos dados foram realizadas com o
auxílio do software Sphinx 5.0, aplicando-se as análises univariadas e
bivariadas (Quanto ao perfil socioeconômico e caracterização dos acidentes),
com os dados tratados e analisados tendo em vista os objetivos de pesquisa
previamente definidos.
Visando cumprir requisitos legais, a pesquisa foi submetida ao Comitê
de Ética da Universidade Anhanguera-Uniderp e teve parecer favorável.
Número do processo: 322.161.
30
Resultados e Discussão
Os dados do perfil sócioeconômico estão apresentados na Tabela 1.
Quanto à faixa etária, há uma menor quantidade de indivíduos jovens
com idade entre 18 e 30 anos atuando na profissão (13,6 %), o que mostra que
há certa dificuldade na renovação da força de trabalho dessa categoria. O
maior número de pescadores está concentrado entre as faixas etárias de 30 a
60 anos, correspondendo um total de 98 dos 140 entrevistados (70% da
amostra), e esse perfil é corroborado por DALL‟OCA (2004) em um estudo com
pescadores do estado de Mato Grosso do Sul. Isso indica que a maior parte
dos pescadores encontra-se em idade madura e que há pescadores com mais
de 60 anos atuando na profissão por necessidade para manutenção de suas
famílias. Esses profissionais acabam se submetendo a riscos, pois muitos já
apresentam algumas enfermidades e menor agilidade para realizar certas
atividades.
A atividade de pesca foi durante muito tempo uma atividade herdada
por gerações, pelo fato de existirem famílias em que todos os membros são
pescadores, atualmente este fato vem se modificando devido a falta de
individuos jovens neste mercado de trabalho (DALL‟OCA, 2004). Cabe
destacar ainda que os pescadores profissionais encaminham-se para a velhice
sem assegurar melhores condições de vida, pois a necessidade de trabalhar
para garantir a sobrevivência e a falta de outra opção tornam difícil, para o
pescador mais maduro, iniciar ou procurar um novo tipo de trabalho
(DALL‟OCA, 2004).
Quanto ao sexo, os resultados evidenciaram que há um grande número
de mulheres atuando na profissão, correspondendo a 33,6 %, mas a maioria
ainda é representada por homens (66,4%).
GARRONE NETO et al. (2005), em um estudo realizado na região do
médio Araguaia, apresentaram resultado menor para o número de mulheres
que atuam na pesca, fato que mostra que na região do Pantanal há um maior
número de mulheres atuando na profissão.
31
Tabela 1. Perfil socioeconômico, escolaridade e faixa etária dos pescadores
profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do Sul
Variável Frequência (%)
Faixa etária
<18 anos
0
0,0
18 - 30 19 13,6
30 - 40 31 22,1
40 - 50 34 24,3
50 - 60 33 23,6
>60 anos 23 16,4
Total 140 100
Escolaridade
Analfabeto 21 15,0
Fundamental Incompleto 102 72,9
Fundamental Completo 6 4,3
Médio Incompleto 5 3,6
Médio Completo 5 3,6
Superior 1 0,7
Total 140 100
Renda familiar
<1 Salário Mínimo 68 48,6
1 - 2Salários Mínimos 62 44,3
2 - 3 Salários Mínimos 10 7,1
3 - 4 Salários Mínimos
Total
0
140
0,0
100
Total observado de cada variável 140 100
As mulheres atuam na profissão muitas vezes para acompanharem seus
maridos, porém durante as entrevistas houve muitos relatos de mulheres que
trabalham por necessidade de contribuir com a renda familiar. Todavia, muitas
alegam serem sozinhas e estão na profissão por necessidade de se manter e
32
por falta de outras oportunidades no mercado de trabalho, principalmente
devido à baixa escolaridade, ficando evidente o crescente número de mulheres
que estão se tornando chefes de família e precisam garantir o sustento de seus
filhos.
Relato de uma pescadora : ‘‘É uma vida difícil, mas precisamos nos manter e
já que temos pouco estudo, temos que continuar trabalhando aqui mesmo’’.
Quanto à escolaridade, a maior parte dos profissionais da pesca (72,9%,
correspondente a 102 pessoas), tem baixo nível de instrução. Desse quadro
emergem inclusive 15% de analfabetos (correspondendo a 21 pessoas dentre
as 140 entrevistadas) (Tabela 1). Os dados do presente estudo corroboram
com as análises de DALL‟OCA (2004) e GARRONE NETO et al. (2005).
A maioria da população de pescadores tem o ensino fundamental
incompleto e não teve oportunidade de concluir seus estudos. Muitos aliam a
baixa escolaridade com a falta de tempo e a necessidade de trabalhar longos
períodos para garantir o sustento da família.
A não exigência de estudos para a atuação na profissão é um fato que
acaba por contribuir com o elevado índice de baixa escolaridade, já que os
conhecimentos são adquiridos na atividade prática do profissional.
O segmento da pesca vive um processo de exclusão social de origem
econômica. Tal quadro apenas reforça que no Brasil, por muito tempo, a
educação escolar foi um bem social exclusivamente dirigido as classes
economicamente mais favorecidas (DALL‟OCA, 2004).
Em relação à renda familiar (Tabela 1), 48,6% possuem renda de até um
salário mínimo. A maioria dos entrevistados alegou que durante muitos meses
teve renda inferior a este valor de referência, fato corroborado por GARRONE
NETO et al. (2005) e DALL‟OCA (2004).
As rendas de até um salário mínimo geralmente são de famílias nas
quais trabalham uma ou duas pessoas. Uma segunda categoria, com 44,3%
dos entrevistados, alegou ter uma renda entre 1 a 2 salários mínimos,
composta de famílias que apresentam duas ou mais pessoas que trabalham na
pesca. Apenas 7,1% declararam ter uma renda maior que dois salários.
Deste modo, a maioria dos pescadores sobrevive com renda média de
certa forma insuficiente para oferecer uma boa qualidade de vida a sua família
33
e acabam sobrevivendo com dificuldades, necessitando prolongar suas horas
de trabalho, na tentativa de melhorar suas rendas.
Para minimizar os baixos ganhos e em função da suspensão da pesca
durante o período da piracema (entre os meses de outubro a março), os
pescadores cadastrados no Registro Geral de Pesca recebem um salário
mínimo do Governo (SILVA et al., 2007).
Quanto ao tempo de atuação na profissão, 74,4% dos entrevistados
atuam a mais de 10 anos na pesca (Tabela 2). Todos alegam ter iniciado a
atividade precocemente por falta de opção, por não vislumbrar uma melhor
perspectiva de vida, dados similares aos de DALL‟OCA (2004) e GARRONE
NETO et al. (2005).
Muitos alegaram adquirir a profissão por herança familiar, já que a
maioria afirmou ter aprendido a pescar com o pai, tio ou avô ou faz parte de
uma família de pescadores.
A atividade pesqueira exige conhecimentos e experiência do pescador
para lidar com as situações adversas durante a execução das atividades, o que
é adquirido com o tempo de atuação na profissão e muitas vezes com os
companheiros ou familiares mais experientes.
Muitos entrevistados estão descontentes com a atividade pesqueira,
porque alegam sofrerem riscos e que a profissão é desvalorizada, mas mesmo
assim não mostraram interesse em mudar de profissão.
Quanto ao número de acidentes sofridos (Tabela 2), todos os
pescadores entrevistados sofreram algum tipo de ferimento envolvendo animal
aquático, que geralmente é ocasionado pelo contato com estruturas que estão
presentes no corpo do animal que são capazes de provocar ferimentos.
Os traumas ocorrem geralmente durante a realização de atividades
corriqueiras do exercicíco da profissão (SILVA et al., 2010). Os pescadores
afirmaram ser comum a ocorrência de acidentes envolvendo animais aquáticos
(tabela 2) e que é difícil calcular quantas vezes já sofreram. Dentre os
entrevistados, 44,3% afirmaram ter sofrido mais de 10 acidentes, enquanto
32,1% alegaram ter sofrido menos de 4 acidentes por terem cuidados durante a
atividade laboral.
Os pescadores relataram que a maioria dos acidentes ocorreu por
atividades simples durante o manuseio do pescado, tais como tirar o peixe do
34
anzol, entrar na água, limpar e manipular o peixe no barco, fatos corroborados
por GARRONE NETO et al. (2005) e SILVA et al. (2010).
Os acidentes por animais aquáticos são um agravo à saúde e em alguns
casos podem levar a incapacidade temporária para o trabalho (GARRONE
NETO et al., 2005; SILVA et al., 2010).
Segundo (JENSEN, 1996), um estudo realizado com pescadores
dinamarqueses, mostrou a alta de incidência de acidentes que ocasionam
lesões, incluindo acidentes envolvendo animal aquático.
Os dados do presente estudo apontam que a maior parte dos
profissionais (97,9%) se utiliza de embarcações para a pesca, fato corroborado
por DALL‟OCA (2004), que relata tipos como a canoa, chalana, lanchas e
barcos motorizados. Este último permite deslocamentos mais rápidos rio acima
ou abaixo, são menos cansativos que os utilizados a remo e possibilita que se
desloquem para diferentes locais, podendo obter maior quantidade de peixes.
Alguns pescadores afirmaram pescar com companheiros quando não possuem
embarcação. Apenas 2,1% pescam em barranco sem nenhum tipo de
embarcação.
Quanto ao período em que os acidentes ocorrem, observou-se que
45,7% dos entrevistados preferem pescar no período matutino e,
consequentemente, sofrem muitos acidentes neste período, de modo similar
aos registrado por GARRONE NETO et al. (2005), enquanto 29,3% se
acidentam no perído da tarde e 25,0% sofreram alguma lesão no período
noturno. Todos alegaram sofrer acidentes nos três períodos, mas consideram o
período noturno mais propenso a acidentes, visto que a visibilidade fica mais
dificultada e os profissionais mais expostos à situações de risco tanto de
elementos do ambiente, quanto de equipamentos utilizados na atividade
pesqueira. DALL‟OCA (2004) relata que pode haver redução da eficiência no
trabalho e alterações na saúde.
Quanto ao local do corpo afetado por ferimento, acima de 75% dos
entrevistados sofreram ferimentos nas mãos (Tabela 2), a maior parte se feriu
no momento da retirada do peixe do anzol, no manuseio ou no momento de
limpar o pescado com ferrões ou mordidas e, 24% ferimentos nos pés por
arraias ou peixes com ferrões, geralmente andando no barco, dentro da água
ou no barranco, fato corroborado por SILVA et al. (2010).
35
Tabela 2. Tempo de atuação na profissão, número de acidentes e local do
corpo atingido em pescadores profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato
Grosso do Sul
Variável Frequência (%)
Tempo de atuação
<5 anos 14 10,0
5 - 10 anos 22 15,7
10 - 20 anos 46 32,9
20 - 30 anos 33 23,6
>30 anos 25 17,9
Total 140 100
Número de acidentes
<2 7 5,0
2 – 4 38 27,1
4 – 6 21 15,0
6 – 8 9 6,4
8 – 10 3 2,1
10 – 12 28 20,0
>12 34 24,3
Total 140 100
Local do corpo
Mãos
Braços
Costas
Pés
Pernas
Tórax
Cabeça
Total
106
2
0
24
8
0
0
140
75,7
1,4
0,0
17,1
5,7
0,0
0,0
100
Total observado de cada
variável
140 100
36
Segundo JENSEN (1996), em um estudo realizado com pescadores da
Dinamarca, os membros superiores são os mais atingidos em acidentes de
trabalho com pescadores, as mãos representarem 20% dos acidentes
ocasionados nos membros superiores. De fato, as mãos são os membros mais
expostos, pois estão em contato com os equipamentos e os animais
capturados, ficando sujeita a riscos se não forem protegidas (Tabela 2).
Quando se compara a faixa etária com o número de acidentes sofridos
pelos pescadores, pode-se perceber que a dependência é pouco significativa
(Tabela 3). Independentemente da idade, a maioria dos entrevistados sofreu
mais de dois acidentes durante todo o período de atuação na atividade
pesqueira, porém geralmente quanto maior a idade, maior é o tempo de
atuação na profissão e consequentemente maior é o número de acidentes
sofridos.
Tabela 3. Faixa etária em relação ao número de acidentes de pescadores
profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do Sul
Faixa etária/n° de acidentes
Menos de 2.0 (%)
De 2.0 a 4.0 (%)
De 4.0 a 6.0 (%)
De 6.0 a 8.0 (%)
De 8.0 a 10.0 (%)
De 10.0 a 12.0 (%)
12.0 e mais (%)
TOTAL (%)
De 18 a 30 anos
15.8 21.1 21.1 0.0 0.0 26.3 15.8 100
De 30 a 40 anos
6.5 41.9 19.4 9.7 3.2 12.9 6.5 100
De 40 a 50 anos
2.9 14.7 14.7 5.9 2.9 23.5 35.3 100
De 50 a 60 anos
3.0 24.2 12.1 0.0 0.0 24.2 36.4 100
Acima de 60 anos
0.0 34.8 8.7 17.4 4.3 13.0 21.7 100
TOTAL (%)
5.0 27.1 15.0 6.4 2.1 20.0 24.3 100
A dependência é pouco significativa. Qui2 = 33.86, gl = 24, 1-p =
91.27%.
Fica evidente que os pescadores são expostos a acidentes com animais
aquáticos durante suas jornadas de trabalho independente da idade que
possuem. Tanto os indivíduos mais jovens com sua pouca experiência na
profissão e maior agilidade, quanto os indivíduos de meia idade e até os mais
37
velhos que possuem mais experiência, conhecimento e talvez uma menor
agilidade para realização das atividades cotidianas da profissão são vítimas de
acidentes que acarretam em lesões causadas pelo contato com estruturas
presente nos animais aquáticos.
Os ferimentos durante a pesca são acontecimentos frequentes e muitas
vezes graves neste tipo de atividade laboral. Segundo GARRONE NETO et al.
(2005), os pescadores minimizam a importância desses acontecimentos pelo
receio de assumir um estado de fragilidade que um evento como esse pode
impor.
Quanto ao tempo de atuação relacionada ao número de acidentes
(Tabela 4), a dependência foi muito significativa (Qui² foi de 77,73).
Profissionais da pesca que tiveram um menor tempo de atuação na profissão
sofreram menos acidentes, enquanto profissionais que atuam há mais tempo
(acima de 20 anos) tiveram índice de mais de 40% para doze ou mais
acidentes sofridos envolvendo animais aquáticos durante suas atividades
laborais.
Tabela 4. Tempo de atuação em relação ao número de acidentes sofridos por
pescadores profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do Sul
A dependência é muito significativa. Qui² = 77.73, gl = 24, 1-p =
>99.99%. As células marcadas em azul (rosa) são aquelas para as quais a
frequência real é claramente superior (inferior) à frequência teórica.
Tempo de atuação/n° de acidentes
Menos de 2.0 (%)
De 2.0 a 4.0 (%)
De 4.0 a 6.0 (%)
De 6.0 a 8.0 (%)
De 8.0 a 10.0 (%)
De 10.0 a 12.0 (%)
12.0 e mais (%)
TOTAL (%)
Menos de 5 anos
28.6 21.4 21.4 7.1 7.1 0.0 14.3 100
De 5 a 10 anos
9.1 40.9 22.7 9.1 0.0 18.2 0.0 100
De 10 a 20 anos
2.2 45.7 17.4 0.0 0.0 21.7 13.0 100
De 20 a 30 anos
0.0 6.1 12.1 3.0 6.1 27.3 45.5 100
Acima de 30 anos
0.0 12.0 4.0 20.0 0.0 20.0 44.0 100
TOTAL 5.0 27.1 15.0 6.4 2.1 20.0 24.3 100
38
Fica evidente que quanto maior o tempo de atuação na profissão, o
profissional pescador, apesar da experiência adquirida com os anos de
profissão fica mais exposto a riscos e consequentemente sofrem mais
acidentes envolvendo animais aquáticos.
Segundo GARRONE NETO et al. (2005), a maioria dos profissionais da
pesca atuam há mais de dez anos na profissão, muitas vezes com uma jornada
de mais de 12 horas por dia ficando expostos a riscos de acidentes durante
um tempo prolongado.
Quanto ao animal causador (Tabela 5), pode-se percebe que as arraias
(Potamotrygon spp.) representaram 8,6% dos acidentes. HADDAD JR et al.
(2004), em investigação sobre acidentes em humanos causados por arraias,
relatam que todos os casos apresentaram os mesmos sintomas e, ainda,
afirmam ser um dos casos mais graves de infecções envolvendo traumas de
peixes em humanos. Esta categoria de acidente necessita de tratamento
controlado e profissional, muitas vezes com uso de analgésicos opiáceos e
antibióticos (HADDAD JR et al., 2004). Estes autores destacam ainda
complicações secundárias como neurotoxicidade, cardiotoxicidade e
perturbações circulatórias (isquemias), provavelmente pelo efeito direto sobre o
miocárdio das toxinas presentes nos ferrões de ações semelhantes às
prostaglandinas e acetilcolina.
O maior número de ocorrência, totalizando 35%, é ocasionado por
outros tipos de peixes como dourado (Salminus brasiliensis Cuvier, 1817) e
traíra (Hoplias malabaricus Bloch, 1794) (Tabela 5). Porém, o acidente mais
comum relatado nas entrevistas é por mordida de piranha (Pygocentrus
nattereri Kner, 1860) (Figura 4), e (Serrasalmus marginatus Valenciennes,
1847).
Ferroadas de bagres e mandis (Pimelodus, Pimelodella e Rhamdia)
totalizaram 32,1%. Estudos sobre aspectos clínicos e terapêuticos dos
acidentes causados por mandijubas (mandis amarelos) é citado que o veneno
é altamente vasoconstritor e a vasodilatação provocada pela água quente é
responsável pela melhora (HADDAD JR e LASTORIA, 2005). A imersão da
extremidade afetada na água quente, em torno de 50º C, traz alívio rápido ao
paciente, que deve permanecer com a extremidade afetada imersa na água
quente por 30 a 90 minutos (HADDAD JR e LASTORIA, 2005).
39
Figura 4. Quadro de lesão causada por mordida de piranha (Pygocentrus
nattereri). Foto: Vidal Haddad Junior (2003).
Tabela 5. Animal causador do acidente e tipo de lesão ocasionada em
pescadores profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do Sul
Variável Frequência (%)
Animal causador
Bagre 45 32,1
Arraia 12 8,6
Outros peixes (dourado, cachorra,
piranhas, traíra)
49 35,0
Outros animais (não constam da
lista)
34 24,3
Total 140 100
Tipo de lesão
Eczema 104 74,3
Ferimentos Puntiformes 78 55,7
Ferimentos Lacerados 67 47,9
Edema 136 97,1
Eritema 111 79,3
Necrose 6 4,3
Prurido
Total
4
140
2,9
100
Total observado de cada variável 140 100
40
As espécies de peixes que mais causam lesões nos pescadores como
bagre e mandi (Pimelodus, Pimelodella e Rhamdia) e piranhas (Pygocentrus
nattererie e Serrasalmus marginatus) são espécies de baixo valor comercial e
são mais utilizadas como iscas, ou servem de alimentos para os próprios
pescadores.
Vertebrados como jacaré (Caiman yacare Daudin, 1802) e outros
peixes como jurupencem (Sorubim lima Bloch E bloche Schneider, 1801),
pintado (Pseudoplatystoma corruscans Spix & Agassiz, 1829) e até mesmo
crustáceos representaram outros 24,3% dos acidentes.
Dentre os diferentes tipos de lesões, 74,3% dos ferimentos causam
eczema (inflamação) na região atingida (Tabela 5). Lesões como laceração,
hematoma e edema, fratura, entorse e distensão são alguns dos principais
tipos de lesões e ocorrem com frequência nos acidentes de trabalho com
pescadores marinhos da Dinamarca (JENSEN, 1996).
Os ferimentos puntiformes representaram 55,7% e foram causados por
animais que apresentam ferrão, como arraias (Potamotrygon spp.), bagre e
mandi (Pimelodus, Pimelodellae, Rhamdia), jurupencem (Sorubim lima Bloch e
Schneider, 1801) e pintado (Pseudoplatystoma corruscans Spix & Agassiz,
1829), que ao penetrarem nos tecidos da vítima, os ferrões liberam a peçonha
do tecido glandular que os recobrem, fluindo no ferimento acompanhado de dor
intensa, instantânea e latejante. O local fica edematoso e eritematoso,
persistindo por mais de seis horas, podendo progredir para um quadro
infeccioso permanecendo por vários dias, o que pode indicar a presença de
fragmentos do ferrão (HADDAD JR e LASTÓRIA, 2005).
Os ferimentos lacerados representaram 47,9% e foram causados por
animais que mordem e laceram como dourado (Salminus brasiliensis Cuvier,
1817), traíra (Hoplias malabaricus Bloch, 1794), piranha (Pygocentrus nattereri
Kner 1860, (Serrasalmus marginatus Valenciennes, 1847). Segundo HADDAD
JR (2008), as infecções bacterianas são fatores complicadores dessa categoria
de acidente e, na maioria das vezes, são causadas por estafilococos e
estreptococos, mas podem estar associadas a bactérias como Vibrio vulnificus
(água salgada) e Aeromonas hidrophyla (água doce), que causam infecções
muito graves com necroses dos tecidos próximos ao local da injúria, podendo
se espalhar por todo o órgão afetado.
41
Um total de 97,1% das lesões (Tabela 5) acarretaram em edema
(inchaço) na região ferida, 79,3% ocasionaram eritema (vermelhidão) e 4,3%
dos entrevistados afirmaram ter sofrido necrose devido a lesões ocasionadas
por arraias, com 2,9% alegando ter tido prurido (coceira) quando os ferimentos
estavam cicatrizando.
Todos os entrevistados alegaram sentir dor ao sofrer qualquer tipo de
lesão (Tabela 6), dos quais 85% afirmaram sentir dor forte a muito forte, nos
diferentes tipos de lesão, sejam laceradas ou puntiformes.
Tabela 6. Tipo de dor e sintomas dos acidentes ocasionados por animais
aquáticos em pescadores profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso
do Sul
Variável Frequência (%)
Tipo de dor
Sem Dor 0 0,0
Constante 0 0,0
Leve 3 2,1
Moderada
Forte
Muito forte
Total
18
46
73
140
12,9
32,9
52,1
100
Dormência
Não resposta 80 57,1
Baixíssima intensidade 8 5,7
Baixa intensidade 15 10,7
Média intensidade 25 17,9
Alta intensidade 9 6,4
Altíssima intensidade
Total
3
140
2,1
100
42
Continuação tabela 6...
Irradiação da dor
Não resposta 100 71,4
Baixíssima intensidade 4 2,9
Média intensidade 11 7,9
Alta intensidade 16 11,4
Altíssima intensidade
Total
7
140
5,0
100
Febre
Não resposta
Baixíssima intensidade
114
5
81,4
3,6
Baixa intensidade 8 5,7
Média intensidade 9 6,4
Alta intensidade 3 2,1
Altíssima intensidade
Total
1
140
0,7
100
Total observado de cada
variável
140 100
Pode-se observar que a dor é de grau elevado e pode diferir de acordo
com o organismo da pessoa e também depende da espécie causadora da
lesão. A dor leve a moderada foi relatada nas entrevistas nos casos de lesões
mais superficiais somando um total de 15% (Tabela 6).
As análises mostraram que 55,7% dos entrevistados alegaram ter
sofrido outros sintomas além da dor local: os resultados mais marcantes foram
para dormência totalizando 42,8%; destes 28,6% apresentaram dormência de
baixa a média intensidade, irradiação da dor no membro representou 28,6%;
dentre estes 11,4% foram de alta intensidade (Tabela 6). Febre representou
18,5%; dentre estes 12,1% foram de baixa a média intensidade (Tabela 6).
43
Sintomas como náuseas e vômitos representaram 0,7%, mal estar 3,5%,
espirros 0,7%, arritmia 1,4%, sudorese 8,6% e infecção secundária 4,2%. É
importante lembrar que os sintomas dependem da reação do organismo, do
tipo de lesão e da presença de substânicas tóxicas nas estruturas responsavéis
por ocasionar acidentes.
Apenas 20,7% dos entrevistados procuraram tratamento médico,
geralmente ao terem complicações no ferimento ou sofrerem acidentes por
arraia (Potamotrygon spp.), que ao ferroar libera toxinas que podem provocar
sintomas mais graves. A busca por serviço médico também foi registrada no
caso de ferimento lacerado, como mordida de jacaré, (Caimam yacare) ou por
ocorrência de uma infecção secundária.
Merece destaque o fato de que 79,3% dos entrevistados que sofreram
acidentes com animais não procuraram tratamento médico, percentual similar
ao registrado por GARRONE NETO et al. (2005) em estudo na região do médio
Araguaia. Naquela região, 87,9% dos entrevistados também não procuraram
tratamento médico ao sofrer algum tipo de acidente de trabalho.
Quando se trata de acidentes de trabalho com pescadores, mesmo em
países com altos indicadores socioeconômicos como a Dinamarca, apesar da
redução do número de lesões que necessitam de tratamento médico ainda é
elevada a ocorrência de lesões que precisam ser tratadas por profissional e em
ambiente hospitalar (JENSEN, 1996).
Muitos alegaram falta de informação, falta de tempo e conhecimento, ou
acreditaram que não havia necessidade de procurar atendimento médico e
disseram utilizar diferentes tipos de substâncias para tratamento das lesões
(Tabela 7) como plantas medicinais, líquido do olho do animal, salmoura,
vinagre e até substâncias nocivas como gasolina, urina e querosene na
tentativa de curar a lesão ou ao menos amenizar a dor do momento. Segundo
SILVA et al. (2010), a utilização dessas substâncias pode agravar ainda mais
as lesões e em alguns casos contribuir para o aumento da intensidade da dor e
necroses dos tecidos locais das injúrias.
Dos entrevistados, 62,9% afirmaram utilizar álcool no momento em que
sofreu o ferimento, para que a região ficasse limpa e não ocorresse infecção
(Tabela 7).
44
Quanto ao tempo de afastamento do trabalho, a maioria dos pescadores
entrevistados (57,9%) declarou continuar trabalhando normalmente após sofrer
ferimentos, e quando se afastou, 23,6% procuram ficar o menor tempo
possível, geralmente de 1 a 7 dias, por terem sofrido lesões superficiais, de
menor gravidade e pelo fato de necessitarem trabalhar para manter suas
famílias (Tabela 7).
Aqueles entrevistados que tiveram necessidade de ficar mais de 15 dias
afastados do trabalho (Tabela 7), alegaram ter causado sofrimento a seus
familiares e prejuízos econômicos, fato corroborado por GARRONE NETO et
al. (2005).
Tabela 7. Tratamento empregado nas lesões, tempo de afastamento do
trabalho por acidentes envolvendo animais aquáticos em pescadores
profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do Sul
Variável Frequência (%)
Tratamento empregado
Não resposta 24 17,1
Álcool 88 62,9
Gelo 15 10,7
Vinagre 3 2,1
Urina 2 1,4
Assistência Médica 29 20,7
Outros (especificar) 1 0,7
Total 140 100
Ausência do trabalho
Continuou trabalhando 81 57,9
1 - 7 dias 33 23,6
8 - 15 dias 8 5,7
16 - 30 dias 11 7,9
>30 dias 7 5,0
Total 140 100
Total observado de cada
variável
140 100
45
Segundo JENSEN (1996), dos pescadores dinamarqueses que sofreram
acidentes de trabalho, 63,2% ficaram incapacitados de realizar suas atividades
laborais por pelo menos um dia, apontando a causa de grandes prejuízos
socioeconômicos.
As arraias são responsáveis pelos afastamentos mais prolongados dos
pescadores de suas atividades laborais, isso porque possuem um ou dois
ferrões na base da cauda, que contêm veneno capaz de ocasionar
incapacidade física temporária ou até permanente (HADDAD JR, 2008).
Há um indicativo que, provavelmente a exposição prolongada e
tratamentos inadequados dos ferimentos, estão associados a infecções
secundárias bacterianas, que obrigaram os pescadores a se afastar do trabalho
por períodos prolongados para tratamento médico (SILVA et al., 2010).
Relato de um pescador : „„Não podemos parar, nosso sustento depende
da quantidade de peixe que pescamos, se pararmos passaremos fome’’.
Os resultados mostraram que a maioria dos pescadores tem idade
superior a 30 anos, 66,4% pertencem ao sexo masculino, um total de (72,9%
tem ensino fundamental incompleto) evidenciando a baixa escolaridade.
Quanto a renda 48,6% apresentam renda inferior a um salário minimo.
Em relação ao tempo de atuação 74,4% atuam há mais de 10 anos na
profissão, 44,3% sofreram mais de 10 acidentes, o local do corpo mais atingido
foram as mãos representando 74,4% dos entrevistados.
Os animais causadores dos acidentes são espécies de peixes comuns
da região, como piranhas e bagres, e a maioria das vítimas (79,3%) não
procurou tratamento médico e utilizando-se de produtos alternativos para tratar
as lesões o que pode acarretar em complicações.
46
Conclusões
Quanto ao perfil socioeconômico, os profissionais em sua maioria
apresentou baixo grau de escolaridade, renda inferior a um salário mínimo,
idade superior a 30 anos e exercem a profissão a mais de 10 anos.
Acidentes causados por animais aquáticos são vistos como comuns e
corriqueiros. Os animais evolvidos nos acidentes são principalmente peixes
comuns da região que portam estruturas capazes de causar ferimentos
lacerantes ou puntiformes por dentes ou ferrões, que muitas vezes podem
estar associados a toxinas.
A maioria dos profissionais, ao sofrer um acidente, não procura
tratamento médico, fazendo uso de produtos alternativos para tratar suas
lesões e prosseguem exercendo suas atividades laborais normalmente, quando
necessitam se afastar, permanecem o menor tempo possível, colocando desta
forma sua saúde em risco.
47
Agradecimentos
Agradeço a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Ensino Superior) pelo apoio financeiro e concessão da bolsa de mestrado para
realização desta pesquisa. À Universidade Anhanguera-Uniderp e ao
financiamento concedido pelo Projeto de Toxinologia - Capes: “Peixes
Continentais Peçonhentos: Epidemiologia dos Acidentes, Ações Preventivas,
Mecanismos Fisiopatológicos e Bioprospecção”.
48
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49
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50
Artigo II
Avaliação do acesso a informações sobre prevenção de acidentes
ocasionados por animais aquáticos a pescadores da Bacia do Alto
Paraguai, Mato Grosso do Sul
Aline Duarte Edilson¹
1Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento
Regional
Resumo
A pesca artesanal é uma importante atividade econômica e social realizada no
Pantanal. O objetivo do estudo foi avaliar se os pescadores profissionais têm
acesso a informações sobre prevenção de acidentes envolvendo animais
aquáticos, por quais meios essas informações foram transmitidas, se as
mesmas contribuíram para a redução de acidentes, além de verificar quanto ao
uso de equipamentos de proteção individual. Tais características fazem
evidente conexão da temática destes acidentes à linha do programa
Sociedade, Ambiente e Desenvolvimento Regional Sustentável. Foi aplicado
questionário semi estruturado a 140 pescadores, 93 pertencentes à
comunidade P1 (Corumbá), e 47 pertencentes à comunidade P2, (Miranda). Os
dados foram analisados por meio do software Sphinx 5.0. A análise dos dados
revelou que 90% dos entrevistados não têm acesso à informação sobre
prevenção de acidentes com animais aquáticos e apenas 10% alegaram saber
sobre cuidados com equipamentos de pesca, 6,4% adquiriram a informação
através de palestra e 57,14% utilizaram algum tipo de Equipamento de
Proteção Individual. Pode-se concluir que os pescadores profissionais
necessitam de informações qualificadas sobre prevenção de acidentes
envolvendo animais aquáticos.
Palavras-chave: Pantanal, pesca profissional, acidentes, precaução.
51
Abstract
Artisanal fishing is an important economic and social activity performed in the
Pantanal. The aim of the study was to assess whether professional fishermen
have access to information about prevention of accidents involving aquatic
animals, by what means this information was transmitted, if they contributed to
the reduction of accidents and check on the use of personal protective
equipment, which makes clear the connection to the theme of these accidents
online Society, Environment and Sustainable Regional Development. Semi-
structured questionnaire to 140 fishermen, 93 belonging to P1 (Corumbá)
community, and 47 belonging to P2, (Miranda) was applied community. The
data were analyzed by the Sphinx 5.0 software. Data analysis revealed that
90% of respondents did not have access to information on accident prevention
with aquatic animals, only 10% claimed to know about caring for fishing tackle,
6,4% acquired the information through lecture and 57,14% use some kind of
Personal Protective Equipment. It can be concluded that professional fishermen
need qualified information on the prevention of accidents involving aquatic
animals.
Keywords: Pantanal, professional fishing, accidents, prophylactic.
52
Introdução
Na Bacia do Alto Paraguai (BAP), onde está situado o Pantanal, a pesca
profissional-artesanal e a comercialização de pescado constituem uma
importante atividade econômica e social. As colônias de pesca de Miranda e
Corumbá estão entre as que abrigam o maior número de pescadores
cadastrados no Registro Geral de pesca (RGP) (BUENO et al., 2010).
A pesca artesanal é uma das atividades cujas condições de trabalho são
ainda precárias, deixando os profissionais desprotegidos e sujeitos a riscos de
acidentes e doenças (DOIMO et al., 2012).
Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (BRASIL, 2001), a
pesca artesanal expõe os pescadores a vários riscos de acidentes, que podem
ser reunidos em grupos como: ergonômicos (problemas de postura), naturais
(incidência de sol na pele e olhos, friagem, ventos frios, ondas fortes), físicos
(lesões nas mãos e nos pés), químicos (contato com secreções venenosas ou
de substâncias químicas) e biológicos (contato com algas e coliformes fecais).
Para GARRONE NETO et al. (2005), as principais causas de acidentes
no trabalho de pescadores são as lesões causadas pelos animais do ambiente
aquático.
Este tipo de acidente ocorre em geral por imprudência dos profissionais,
que entram em contato com estruturas que fazem parte do mecanismo de
defesa desses animais. Os eventos geralmente ocorrem ao manipular o
pescado, no momento da retirada do anzol ou através do pisoteio (HADDAD
JR, 2008).
Para evitar estes riscos e prevenir acidentes, existem os equipamentos
de proteção individual (EPI’s) que são destinados à proteção contra riscos
capazes de ameaçar a segurança e saúde do trabalhador. No caso do
pescador artesanal, o uso de EPI’s é de responsabilidade própria já que não
existe uma relação empregatícia (DOIMO et al., 2012).
Os pescadores profissionais não se preocupam com sua segurança e
saúde, deixando sua atividade laboral em lugar secundário, pois não procuram
por atendimento médico, não fazem exames periódicos e acidentes de trabalho
vêm ocorrendo cada vez mais pelo não uso dos EPI’s (MELLO et al., 2012).
53
Diante dessa realidade, torna-se necessária a utilização de ferramentas
educativas sobre prevenção de acidentes de trabalho envolvendo animais
aquáticos. Materiais educativos já fazem parte da cultura dos serviços de
saúde pública e atuam como dispositivos na dinâmica de mediação entre
políticas e práticas de saúde (SANTOS et al., 2009).
Segundo MONTEIRO et al. (2004), as imagens, quando coletadas,
processadas, organizadas e divulgadas, tornam-se instrumentos de excelência
na conscientização e apreensão de dados referentes a assuntos previamente
almejados, podendo se fazer o uso que assim desejar.
O objetivo deste trabalho foi analisar se os pescadores de duas regiões
do Pantanal têm acesso a informações de prevenção sobre acidentes
envolvendo animais aquáticos, por quais meios as informações foram
transmitidas, se estas informações contribuíram para a redução de acidentes e
verificar se há uso de equipamentos de proteção individual.
54
Material e Métodos
Os estudos foram realizados em duas colônias de pescadores, situadas
no Pantanal, nos municípios de Miranda P1 (Latitude: -20.2429, Longitude: -
56.364, 20°14’34’’ Sul, 56°21’50’’ Oeste), (rio Miranda) e Corumbá P2 (Latitude:
-19.0098, Longitude: -57.6547, 19°0’35’’Sul, 57°39’17’’Oeste), (rio Paraguai),
localidades situadas na Bacia do Alto Paraguai (Figura1).
Figura 1. Localização da Bacia do Alto Paraguai, no Brasil.
Fonte: PROJETO PANTANAL ANA, GEF, PNUMA, OEA (2004).
Miranda
Corumbá
55
Figura 2. Colônias de Pescadores Profissionais do município de Miranda P1,
Mato Grosso do Sul.
Foto: ALINE DUARTE (2013).
Figura 3. Colônia de Pescadores Profissionais do município de Corumbá P2,
Mato Grosso do Sul.
Foto: ALINE DUARTE (2013).
O dimensionamento da amostra foi realizado utilizando o cálculo de
variável nominal ou ordinal e população finita conforme a equação (1)
(FONSECA e MARTINS, 2006).
56
qpzNe
Nqpzn
ˆˆ)1(
ˆˆ22
2
(1)
onde:
- n tamanho da amostra aleatória;
- z abscissa da curva normal padrão, fixado o nível de confiança
em 95% (z = 1,96);
- p̂ estimativa da verdadeira proporção de um dos níveis da
variável escolhida para o estudo.
- pq ˆ1ˆ ;
- e erro amostral, expresso em decimais, e representará a
máxima diferença que o pesquisador admite suportar entre a média
populacional e a média estimada, isto é: epp ˆ , em que p é a
verdadeira proporção (frequência relativa) do evento a ser calculado
a partir da amostra; e
- N é o tamanho da população.
De acordo com a equação (1), a amostra de pescadores investigados foi
de 140, com nível de confiança de 95% e erro amostral de 7%. Foram
investigados 93 pescadores na cidade de Corumbá e 47 em Miranda, de forma
proporcional ao número total de 942 pescadores nas duas cidades.
O questionário foi aplicado no mês de julho de 2014, a abordagem aos
entrevistados foi não probabilística, sendo entrevistados aqueles pescadores
que primeiro se apresentaram.
Na elaboração do questionário semi estruturado (Apêndice 1) contou-se
com o auxílio do software Sphinx 5.0 optando-se tanto por questões, fechadas
únicas e múltiplas, quanto por questões abertas explorando os seguintes
constructos:
a) Verificar se existe acesso à informação de prevenção de acidentes com
animais ligados à atividade de pesca;
b) Qual o meio de comunicação transmitiu a informação e se esta informação
contribuiu para a prevenção;
57
c) Se os pescadores profissionais fazem o uso de Equipamentos de Proteção
Individual (EPI’s).
A tabulação e análise estatística dos dados foram realizadas com o
auxílio do software Sphinx 5.0, aplicando-se as análises univariadas (sobre
prevenção de acidentes com animais aquáticos) com os dados tratados e
analisados tendo em vista os objetivos de pesquisa previamente definidos.
Visando cumprir requisitos legais, a pesquisa e o questionário foram
submetidos ao Comitê de Ética da Universidade Anhanguera-Uniderp e teve
parecer favorável. Número do processo: 322.161.
58
Resultados e Discussão
Quanto à informação sobre prevenção de acidentes com animais
aquáticos, pode-se perceber a carência de informações qualificadas sobre o
assunto por parte do público alvo. Tal deficiência é ressaltada pelo baixo
percentual dos entrevistados (apenas 10%) que alegaram ter conhecimento
sobre algum tipo de medida preventiva. Noventa por cento dos entrevistados
não tiveram acesso a qualquer informação sobre prevenção de acidentes e
apenas 10% alegaram ter tido alguma informação sobre prevenção de
acidentes e primeiros socorros (Tabela 1),
Tabela 1. Pescadores que tiveram ou não acesso a informações sobre
prevenção de acidentes ocasionados por animais aquáticos, na Bacia do Alto
Paraguai, Mato Grosso do Sul
Prevenção de acidente Frequência ( % )
Sim 14 10,0 Não 126 90,0
Total obs. 140 100,0
Portanto, é possível perceber que praticamente não existe acesso a
informações de prevenção, ficando evidente que esses profissionais têm
carência de informações adequadas e necessitam de orientações educativas.
Dos entrevistados que tiveram acesso à informação, a maioria alegou saber
sobre cuidados com equipamentos e apetrechos utilizados na atividade de
pesca e cursos de primeiros socorros, mas negam saber como prevenir-se de
acidentes com animais. Tais limitações podem ser associadas ao baixo acesso
à informação qualificada sobre o assunto, o que reforça a necessidade de
orientações adequadas. Tais resultados corroboram as informações de SILVA
et al. (2010), de que estes profissionais não têm informações adequadas sobre
medidas de prevenção de acidentes, o que torna necessária a elaboração de
materiais como folheto educativo ilustrado. Os materiais devem ainda ter
linguagem adequada ao público alvo, com o objetivo de informar quanto aos
equipamentos de proteção, diminuir acidentes, prejuízos econômicos e trazer
melhor qualidade de vida para a população em questão.
59
Dentre os pescadores que tiveram acesso à informação, 6,4%
adquiriram informações através de palestra, 1,4% pelo rádio, 1,4% pela TV e
apenas uma pessoa afirmou ter recebido uma cartilha, mas com informações
sobre acidentes com equipamentos de pesca (Tabela 2).
Tabela 2. Meios de comunicação pelos quais os pescadores, tiveram acesso à
informação de prevenção de acidentes envolvendo animais aquáticos na Bacia
do Alto Paraguai, Mato Grosso do Sul
Meio de comunicação Frequência ( % )
Sem acesso à informação 126 90,0
Rádio 2 1,4
TV 2 1,4
Jornal 0 0,0
Palestras 9 6,4
Cartilha 1 0,7
Pôster 0 0,0
Total obs. 140 100,0
A comunicação e a educação estão intimamente ligadas, pois mesmo
independentes, possuem objetivos comuns para o atendimento das
necessidades essenciais de comunicação e aprendizagem do ser humano. No
contexto da saúde, essa relação se expressa por meio da aprendizagem, o ser
humano obtém conhecimentos, habilidades e atitudes e desenvolve diferentes
formas e graus de receber e responder as mensagens de saúde. Por outro
lado, a eficiência da comunicação entre emissor e receptor determinará o grau
de aproveitamento da mensagem (MOREIRA et al., 2003).
Segundo MOREIRA et al. (2003), material educativo impresso é definido
como folhetos, panfletos, folder ou livreto, cuja ideia é proporcionar informação
sobre promoção da saúde, prevenção de doenças, tratamento e autocuidado.
O material educativo produzido para o público deve visivelmente exibir a ideia,
que garanta o entendimento e evite mal-entendidos que possam designar
conceitos e ações inapropriadas.
60
A ausência de conhecimento suficiente pode explicar a falta de interesse
na prevenção de lesões não fatais de profissionais da pesca. Estudos
anteriores não estimam as taxas de lesões não fatais em pescadores
profissionais, destacando dados estatísticos para lesões fatais (JENSEN,
1996).
Quanto ao aproveitamento das informações, de todos os entrevistados
que tiveram acesso a algum tipo de informação, um pescador relatou que a
informação não ajudou na prevenção de acidentes, por que o mesmo não
aderiu às orientações transmitidas. A outra parcela afirmou que as informações
transmitidas contribuíram para seu conhecimento e ajudaram a prevenir
acidentes.
A informação, quando transmitida de forma adequada, e se o pescador
estiver receptível a mesma, acaba por gerar bons efeitos que podem contribuir
para a redução do número de acidentes.
Quanto ao uso de equipamentos de proteção, a maior parte dos
entrevistados (57,14%) alega utilizar, algum tipo de Equipamento de Proteção
Individual - EPI’s (Tabela 3). Porém, pode-se perceber que estes profissionais
fazem o uso intuitivo, afirmando não ter informações qualificadas quanto ao uso
correto dos equipamentos; outra parcela dos entrevistados (42,86%) ignora ou
desconhece o uso, afirmando que certos EPI’s atrapalham suas atividades
laborais, desconsiderando a importância de se prevenir.
Tabela 3. Uso de Equipamentos de proteção (EPI’s) por pescadores
profissionais da Bacia do Alto Paraguai, Mato Grosso do Sul
Categoria Frequência (%)
Bota/Botina 38 27,15
Colete 9 6,43
Luvas 0 0,0
Dedeiras 2 1,42
Mais de um equipamento 31 22,14
Nenhum equipamento 60 42,86
Total obs. 140 100
61
Nenhum dos entrevistados faz uso de luvas como equipamento de
segurança para se proteger de ferimentos, o que explica a alta incidência de
leões nas mãos. Esses dados corroboram a análise de DOIMA et al. (2012) de
que na população de pescadores o uso de certos EPI’s é um recurso ainda
pouco utilizado, uma vez que grande parte dos profissionais da pesca ignora ou
desconhece o uso deste tipo de equipamento.
A norma regulamentadora 6 (NR6), define EPI - Equipamento de
Proteção Individual como: Todo dispositivo ou produto, de uso individual
utilizado pelo trabalhador, designado a proteção contra riscos capazes de
ameaçar a sua segurança e a sua saúde (BRASIL,1978).
O uso adequado dos EPI’s diminui os riscos de exposição e acidente no
trabalho principalmente onde existe manuseio de materiais perfuro cortantes,
ferroadas de peixes, fraturas e esmagamentos (DOIMA et al., 2013).
Não existe fiscalização de nenhuma instituição pública quanto ao uso
destes equipamentos ficando a responsabilidade para o próprio pescador. O
CNAE – Classificação Nacional de Atividades Econômicas classifica o Código
A – 03 (Pesca e Aquicultura) com grau de risco médio (GR-3). No caso de
pescadores artesanais, onde raramente possuem relação empregatícia o uso
de EPI’s é total responsabilidade própria (DOIMO et al., 2012).
A norma regulamentadora 30 (NR30) tem por objetivo a proteção e a
regulamentação das condições de segurança e saúde dos trabalhadores
aquaviários (BRASIL, 2002). É aplicada aos trabalhadores de embarcações
comerciais, de bandeira nacional, bem como as de bandeiras estrangeiras
utilizadas no transporte de mercadoria, passageiros ou de prestação de
serviços. Esta norma possui um Anexo, de mesmo objetivo, destinado aos
trabalhadores de bordo que se enquadram em outras categorias, como de
embarcações artesanais, comerciais e industriais de pesca, entre outras. Esta
norma é geral para o sistema aquaviário e tem aplicação limitada à pesca
artesanal.
Dessa forma, não existe uma legislação específica que normatize o uso
de equipamentos de proteção individual (EPI´s) a pescadores artesanais, ou
que fiscalize o uso destes equipamentos.
A precariedade da legislação trabalhista e a realização de pesca ainda
de modo artesanal são citadas como alguns dos problemas que podem intervir
62
na condição de vida e de saúde dos trabalhadores, especificamente com
relação aos pescadores do Brasil (ROSA e MATTOS, 2010).
Este estudo aponta para lacunas de educação e prevenção de acidentes
com organismos aquáticos do Pantanal com a comunidade pesqueira. Além de
evidenciar a importância do processo educativo, é possível destacar a
amplitude do problema e a urgente necessidade de produzir e levar
informações e ações educativas de prevenção desses acidentes envolvendo
animais aquáticos, incluindo orientações sobre o uso correto de EPI’s. Espera-
se que os dados possam contribuir para a redução de impactos
socioeconômicos e diminuição do número de acidentes, na medida em que o
pescador bem orientado e informado pode prevenir-se de traumas e, caso
acidentado, possa agir de maneira adequada.
63
Conclusões
Os profissionais da pesca praticamente não têm acesso à informação
sobre prevenção de acidentes ocasionados por animais aquáticos, revelando
ainda a limitada difusão do tema sobre prevenção de acidentes durante a
pesca.
O uso de certos EPI’s é ignorado ou desconhecido e os equipamentos
de proteção são utilizados de forma intuitiva, sem o conhecimento de sua real
importância e aplicabilidade.
É evidente a carência de informações qualificadas por parte do público
alvo, fato que aponta para a necessária criação de material educativo
informativo que aborde o tema em linguagem adequada e de fácil
compreensão.
64
Agradecimentos
Agradeço a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Ensino Superior) pelo apoio financeiro e concessão da bolsa de mestrado para
realização desta pesquisa. À Universidade Anhanguera-Uniderp e ao
financiamento concedido pelo Projeto de Toxinologia - Capes: “Peixes
Continentais Peçonhentos: Epidemiologia dos Acidentes, Ações Preventivas,
Mecanismos Fisiopatológicos e Bioprospecção”.
65
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68
Conclusão Geral
A maioria dos pescadores entrevistados apresentou baixo grau de
escolaridade, renda inferior a um salário mínimo e idade superior a 30 anos.
Os acidentes envolvendo animais aquáticos ocorrem com elevada
frequência, tornando-se comuns durante as jornadas de trabalho.
Os acidentes geralmente são causados por espécies de peixes comuns
da região que portam estruturas capazes de causar ferimentos por dentes ou
ferrões, que podem estar associados a toxinas.
Os pescadores profissionais praticamente não têm acesso a
informações sobre prevenção de acidente envolvendo animais aquáticos,
ficando evidente a necessidade da divulgação de informações qualificadas
sobre o assunto. Nesse contexto, poucos profissionais tiveram acesso a
informações sobre prevenção de acidentes com equipamentos de pesca.
Muitos equipamentos de proteção individual (EPI’s) são utilizados de
forma intuitiva, sem o conhecimento adequado da sua real importância e
aplicabilidade, entretanto, outros são desconhecidos ou ignorados por parte
dos profissionais.
Torna-se evidente a necessidade da criação de materiais educativos que
apresentem imagens e conteúdos informativos, em linguagem adequada ao
público alvo e com destaque para informações sobre prevenção e tratamento
de acidentes envolvendo animais aquáticos.
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Apêndice 1: PROTOCOLO DE ACIDENTES COM PESCADORES DO PANTANAL 2012/2013
1. Local:
2. Nome:
14. Animal causador:
1. Bagre
2. Arraia
3. Outros peixes (dourado, cachorra, piranhas, traíra)
4. Outro animal (não consta da lista)
3. Faixa etária:
1. Até 18 anos 2. De 18 a 30 anos
3. De 30 a 40 anos 4. De 40 a 50 anos
5. De 50 a 60 anos 6. Acima de 60 anos
15. Tipo de lesão na pele:
1. Eczema ( inflamação) 2. Ferimentos Puntiformes
3. Ferimentos Lacerados 4. Edema (inchaço)
5. Eritema ( vermelhidão) 6. Necrose (morte de parte do tecido)
7. Prurido (coceira)
16. Dor (dar detalhes): tempo, intensidade, etc.
4. Sexo:
1. Masculino 2. Feminino
1. Sem Dor 2. Constante 3. Leve
4. Moderada 5. Forte 6. Muito Forte
5. Escolaridade:
1. Analfabeto
2. Ensino Fundamental Incompleto
3. Ensino Fundamental Completo
4. Ensino Médio Incompleto
5. Ensino Médio Completo
6. Superior
6. Renda familiar:
1. Até 1 Salário Mínimo 2. De 1 a 2 Salários Mínimos
3. De 2 a 3 Salários Mínimos 4. De 3 a 4 Salários Mínimos
5. De mais de 4 Salários Mínimos
7. Tempo de atuação na pesca:
1. Menos de 5 anos 2. De 5 a 10 anos
3. De 10 a 20 anos 4. De 20 a 30 anos
5. Acima de 30 anos
8. Quantas vezes sofre u acidente (tipo de pesca)?
17. Outros sintomas:
1. Sim 2. Não (vá p ara questão 29)
Outros sintomas:
18. Náuseas/vômitos: 19. Febre: 20. Mal-estar (fadiga, tontura): 21. Falta de ar: 22. Espirros: 23. Arritmia (bate de ira): 24. Sudorese fria: 25. Infecção secundária: 26. Agitação psicomotora: 27. Irradiação da dor para a raiz do membro. 28. Dormência:
1 2 3 4 5
9. Data e horário do acidente:
10. Você conhece algum tipo de medida preventiva ou utiliza algum
equipamento de proteção para evitar a ocorrência de acidentes? (de
talhes).
11. Como ocorreu o acidente? Procurar obter detalhes do momento do
contato.
Baixíssima intensidade (1), Baixa intensidade (2), Média intensidade (3),
Alta intensidade (4), Altíssima intensidade (5).
29. Você procurou tratamento médico?
1. Sim 2. Não
30. Tratamento sempre gados?
1. Álcool
2. Gelo
3. Vinagre
4. Urina
5. Assistência Médica
6. Outros
(especificar):
12. Você já teve acesso a algum tipo de informação sobre acidentes
causados por animais aquáticos a pescadores?
31. Tempo que ficou ausente do trabalho por causa do acidente?
1. Continuou trabalhando 2. De 1 a 7 dias
3. De 8 a 15 dias 4. De 16 a 30 dias
5. Acima de 30 dias
13. Local do corpo atingido:
1. Mãos 2. Braços 3. Costas 4. Pés
5. Pernas 6. Tórax 7. Cabeça
32. Você teve acesso a algum tipo de informação para prevenir acidentes com peixes ou outro animal? (durante a pesca)?
1. Sim 2. Não
70
33. Se a resposta anterior for sim, que tipo de informação foi
veiculada? Qual meio?
Radio Palestra
TV Cartilha
Jornal Pôster
34. Essa informação ajudou na prevenção de acidentes?
1. Sim 2. Não