UNIVERSIDADE ANHANGUERA – UNIDERP … · À Dona Hilda Carlos Rocha ... equipe do projeto com...
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UNIVERSIDADE ANHANGUERA – UNIDERP
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEIO AMBIENTE E
DESENVOLVIMENTO REGIONAL
ANDREIA FERNANDES BRILHANTE
FAUNA FLEBOTOMÍNEA (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM ÁREA D E TURISMO
PESQUEIRO, MUNICÍPIO DE BONITO, ESTADO DE MATO GROS SO DO SUL,
BRASIL, 2009-2010
CAMPO GRANDE – MS
2011
ANDREIA FERNANDES BRILHANTE
FAUNA FLEBOTOMÍNEA (DIPTERA: PSYCHODIDAE) EM ÁREA D E TURISMO
PESQUEIRO, MUNICÍPIO DE BONITO, ESTADO DE MATO GROS SO DO SUL,
BRASIL, 2009-2010
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em nível de Mestrado Acadêmico em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional da Universidade Anhanguera-Uniderp, como parte dos requisitos para obtenção do título em Mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional.
Orientação: Profa. Dra. Vânia Lúcia Brandão Nunes
CAMPO GRANDE – MS
2011
Aos meus pais Antonio e Marina pelo
amor incondicional e apoio em todas
as minhas decisões.
À minha irmã Débora, uma das
maiores felicidades da minha vida.
"A entrada para a mente do homem é
o que ele aprende, a saída é o que
ele realiza. Se sua mente não for
alimentada por um fornecimento
contínuo de novas idéias, que ele põe
a trabalhar com um propósito, e se
não houver uma saída por uma ação,
sua mente torna-se estagnada. Tal
mente é um perigo para o indivíduo
que a possui e inútil para a
comunidade."
Jeremias W. Jenks
v
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, pelas oportunidades em minha vida.
À Professora Dra. Vânia Lúcia Brandão Nunes, pela orientação, carinho e amizade
que adquirimos nesses poucos anos trabalhando juntas.
À Dona Hilda Carlos Rocha e Dona Geucira Cristaldo pelo apoio técnico e amizade
durante a realização do projeto.
Ao Professor Msc. Helder Antônio de Sousa pelo auxílio nas capturas dos insetos e
companhia nas viagens.
À Professora Dra. Maria Elizabeth Cavalheiros Dorval, pela ajuda constante nos
trabalhos e amizade.
À Professora Dra. Eunice Aparecida Bianchi Galati pela consultoria científica,
incentivo, ajuda nas dúvidas e na identificação taxonômica dos flebotomíneos.
À enfermeira Andreia Batista e as auxiliares Rita e Selma, por sempre receber a
equipe do projeto com hospitalidade e alegria durante as viagens ao distrito.
Ao Professor Dr. Sílvio Fávero no auxílio na análise estatística.
Ao meteorologista Natálio Abrão pela colaboração nos dados climáticos.
Ao Professor Dr. Ademir Kleber Morbeck de Oliveira pela descrição da vegetação
dos sítios de captura.
À secretária do programa Alinne Signorelli pelo incentivo, bom atendimento e por
estar sempre disposta a ajudar.
Às amigas Rejane Damaris de Oliveira, Wicildes C. Rocha Sales e Tássia G.
Madeira de Matos, que mesmo de longe sempre torcendo por mim.
Aos colegas do mestrado, com quem vivi bons momentos e a amizade que
construímos ao longo do curso.
Aos moradores do distrito Águas do Miranda pela receptividade e colaboração na
realização do trabalho.
vi
Ao meu querido André Luiz Ricardo Cantalogo pelas palavras de incentivo nas horas
difíceis.
À Prefeitura Municipal de Bonito pelo apoio logístico.
À CAPES pela concessão da bolsa de estudos.
À Universidade Anhanguera-Uniderp pelo apoio financeiro.
vii
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS .............................................................................................. viii
LISTA DE TABELAS ............................................................................................. ix
RESUMO................................................................................................................ x
ABSTRACT ............................................................................................................ xi
1 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA ..................................................................... 01
2 OBJETIVOS ........................................................................................................ 03
2.1 Objetivo geral................................................................................................... 03
2.2 Objetivos específicos....................................................................................... 03
3 REVISÃO DE LITERATURA .............................................................................. 04
3.1 Aspectos gerais................................................................................................ 04
3.2 Leishmaniose tegumentar................................................................................ 04
3.3 Leishmaniose visceral...................................................................................... 07
3.4 Os flebotomíneos............................................................................................. 08
3.5 As leishmanioses em Mato Grosso do Sul...................................................... 11
4 MATERIAL E MÉTODOS .................................................................................. 16
4.1 Área de estudo................................................................................................. 16
4.2 Inquérito sobre flebotomíneos.......................................................................... 19
4.3 Sítios de captura.............................................................................................. 20
4.4 Análise dos dados.......................................................................................... 21
5 RESULTADOS .................................................................................................... 22
6 DISCUSSÃO....................................................................................................... 29
7 CONCLUSÕES................................................................................................... 34
REFERÊNCIAS...................................................................................................... 36
viii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Mapa de Mato Grosso do Sul coma a localização de Bonito............... 16 Figura 2 - Foto aérea do Distrito Águas do Miranda, Bonito, Mato Grosso do Sul.......................................................................................................................... 18 Figura 3 - Estradas de acesso ao Distrito Águas do Miranda, Bonito, Mato Grosso do Sul......................................................................................................... 19 Figura 4 - Média de Williams dos espécimes de Lu. longipalpis, Ny. whitmani e Pa. shannoni, por estação do ano, Águas do Miranda, Bonito, MS, dezembro de 2009 a novembro de 2010...................................................................................... 25 Figura 5 - Número de flebotomíneos das três espécies mais frequentes confrontados com as médias mensais de precipitação pluviométrica (mm), temperatura (ºC) e umidade relativa do ar (%), Águas do Miranda, Bonito, MS, dezembro de 2009 a novembro de 2010................................................................ 26 Figura 6 - Variáveis climáticas (precipitação (mm), temperatura (ºC) e umidade relativa do ar (UR) (%), escalonadas com o número de flebotomíneos das três espécies mais frequentes, pela análise escalonada multidimensional não métrica (NMDS) com distância de Bray-Curtis, Águas do Miranda, Bonito, MS, dezembro de 2009 a novembro de 2010................................................................ 26
ix
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Flebotomíneos capturados com armadilhas luminosas em ambientes distintos, índices de diversidade de Shannon (H), equitabilidade de Pielou (J) e porcentagem, no distrito de Águas do Miranda, Bonito, MS, Brasil, dezembro de 2009 a novembro de 2010............................................................. 23 Tabela 2 - Índice de abundância das espécies padronizado (IAEP) de flebotomíneos capturados com armadilhas luminosas em diferentes ambientes, Águas do Miranda, Bonito, MS, dezembro de 2009 a novembro de 2010........... 24 Tabela 3 - Índice de Similaridade calculado pelo coeficiente de Sorensen entre os ambientes amostrados, Águas do Miranda, Bonito, MS, Brasil, dezembro de 2009 a novembro de 2010.............................................................................. 25 Tabela 4 - Médias mensais das variáveis climáticas (precipitação, temperatura, umidade relativa), Águas do Miranda, Bonito, MS, Brasil, dezembro de 2009 a novembro de 2010............................................................. 26
x
RESUMO
O estado de Mato Grosso do Sul (MS) vem apresentando altos índices de infecções
por leishmânias tanto na população humana quanto na canina. O estudo teve como
objetivos identificar a fauna flebotomínea, seus índices de diversidade, de
abundância padronizada, de similaridade e a taxa de infecção natural por flagelados
no distrito de Águas do Miranda, município de Bonito, MS, foco de leishmanioses,
com o propósito de dimensionar o potencial de transmissão dessas parasitoses
naquela região. Os flebotomíneos foram capturados mensalmente no período de
dezembro de 2009 a novembro de 2010, utilizando armadilhas luminosas
automáticas do tipo CDC, que foram ligadas das 18:00h às 6:00h. Os sítios de
captura foram definidos de maneira a cobrir matas, área de cerrado, peridomicílios e
abrigos de animais. Foram capturados 6.699 espécimes de flebotomíneos, 3.929
machos e 2.770 fêmeas, pertencentes a quatro subtribos, sete gêneros e 16
espécies: Brumptomyiina: Brumptomyia sp, Br. avellari, Br. brumpti; Lutzomyiina:
“Complexo cortelezzii”, Evandromyia lenti, Ev. termitophila, Lutzomyia longipalpis,
Sciopemyia sordellii; Psychodopygina: Nyssomyia neivai, Ny. whitmani,
Psathyromyia aragaoi, Pa. campograndensis, Pa. hermalenti, Pa. shannoni, Pa.
punctigeniculata e Sergentomyiina: Micropygomyia quinquefer. Ny. whitmani foi a
espécie mais frequente, seguida de Pa. shannoni e Lu. longipalpis, encontradas em
todos os tipos de ambientes, porém com grande expressão em abrigos de animais.
Importante ressaltar o encontro de duas espécies naturalmente infectadas por
flagelados: Ny. whitmani e Pa. shannoni, ambas capturadas em galinheiro. Na
localidade estudada foram encontradas espécies comprovadamente vetoras de
agentes etiológicos de leishmanioses. A maior frequência de flebotomíneos ocorreu
em ambientes com ação antrópica e os abrigos de animais forneceram condições
favoráveis para a proliferação, manutenção e amplificação de criadouros de
flebotomíneos. A população local deve ser conscientizada sobre a importância das
leishmanioses e a necessidade de saneamento ambiental.
PALAVRAS-CHAVE: flebotomíneos; leishmanioses; infecção natural; abrigos de
animais.
xi
ABSTRACT
Mato Grosso do Sul state (MS) has presented high rates of leishmania infections
both in canine and human populations. The study aimed to identify the phlebotomine
fauna, diversity, abundance, similarity and natural infection by flagellates in the
district Águas do Miranda, municipality of Bonito, state of Mato Grosso do Sul, Brazil,
the focus of leishmaniasis, with the purpose of gauging the potential for transmission
of leishmaniasis agents in that region. The phlebotomines were captured monthly in
the period from December 2009 to November 2010, with CDC light traps, from 6 p.m.
to 6 a.m. The capture sites were defined in such a way to include woods, savannah
areas, peridomiciles and animal shelters. 6,699 specimens were caught, 3,929 males
and 2,770 females, belonging to four sub-tribes, seven genera and 16 species:
Brumptomyiina: Brumptomyia sp, Br. avellari, Br. brumpti; Lutzomyiina: “cortelezzii
complex”, Evandromyia lenti, Ev. termitophila, Lutzomyia longipalpis, Sciopemyia
sordellii; Psychodopygina: Nyssomyia neivai, Ny. whitmani, Psathyromyia aragaoi,
Pa. campograndensis, Pa. hermalenti, Pa. shannoni, Pa. punctigeniculata and
Sergentomyiina: Micropygomyia quinquefer. Ny. whitmani was the most frequently
found species, followed by Pa. shannoni and Lu. longipalpis. They were found in all
types of environment, but most expressively in animal shelters. It is worth noticing the
occurrence of two naturally infected species by flagellates: Ny. whitmani and Pa.
shannoni, both caught in hen houses. In the sites studied, several species were
found that proved to be vectors of leishmaniasis agents in the Americas. The highest
incident of sand flies occurred in environments with anthropic intervention. It may be
concluded that the animal shelters provide favorable conditions for the spread,
maintenance and enlargement of breeding sites. The local population should be
made aware of the importance of leishmaniasis and the need for environmental
sanitation.
KEY WORDS: Sandflies; leishmaniasis; natural infection; animal shelters
1
1 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
As leishmanioses constituem importantes agravos em saúde pública devido à
severidade de suas manifestações clínicas, ampla distribuição geográfica e
crescente tendência à urbanização. Ressaltam-se, ainda, as dificuldades para o
controle, devido à complexidade de seus quadros epidemiológicos e às indefinições
quanto à melhor forma de tratamento. Possuem como agentes etiológicos várias
espécies de protozoários do gênero Leishmania e podem apresentar várias formas
clínicas, compreendendo duas principais: leishmaniose visceral (LV) e leishmaniose
tegumentar (LT). A transmissão dessas protozooses ocorre pela picada de fêmeas
infectadas de flebotomíneos (Diptera: Psychodidae: Phlebotominae) (LAINSON e
SHAW, 2005; BRASIL, 2006; 2010a).
Essas antropozoonoses atingem além do homem, animais domésticos e
silvestres. Alguns deles desempenham papel de reservatórios e estão associados ao
ciclo de transmissão silvestre-doméstico, principalmente quando possuem atividade
sinantrópica. (GONTIJO e MELO, 2004; BRASIL, 2006; 2010a).
Segundo relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) as leishmanioses
apresentam ampla distribuição nas Américas e estão entre as dezessete principais
doenças tropicais negligenciadas do mundo (WHO, 2010b). No Brasil, os maiores
números de casos de leishmaniose visceral são notificados na região Nordeste e os
de leishmaniose tegumentar na região amazônica (BRASIL, 2006; 2010a; b).
O desenvolvimento regional e crescimento demográfico são fatores
determinantes na modificação do ambiente e na dispersão de doenças (AZEVEDO
et al., 1996; PATZ et al., 2000). O rápido crescimento demográfico em áreas sem
infraestrutura básica de saneamento ampliou a ocorrência de novas patologias em
regiões consideradas indenes e provocou o ressurgimento de enfermidades antes
controladas e/ou eliminadas. Ressalta-se a maior agressividade dos patógenos
quando atinge novas populações hospedeiras e/ou indivíduos imunologicamente
comprometidos (SABROZA; TOLEDO e OSANAI, 1992).
2
Em Mato Grosso do Sul (MS) as leishmanioses constituem sérios problemas
em saúde pública. A LV tem apresentado aumento no número de casos humanos e
caninos, sendo um dos estados com maior número de notificações da região Centro-
Oeste do País (OLIVEIRA, A.L.L et al., 2006; ANDRADE et al., 2009; BRASIL,
2010b) e a LT tem sido assinalada na maioria dos municípios (NUNES, 2001;
DORVAL, 2006; BRASIL, 2010a). Apesar da ampla distribuição e do crescente
número de notificações, são escassos os estudos epidemiológicos sobre
leishmanioses em MS.
O distrito Águas do Miranda, município de Bonito, tem o turismo de pesca
como principal fonte econômica e apresenta condições socioeconômicas e
ambientais favoráveis à transmissão dessas endemias. Esses fatos aliados ao
resultado de pesquisa na população canina do distrito, que mostrou 40% dos
animais sororreagentes para Leishmania (dados não publicados) levaram ao
presente estudo que objetivou estudar a fauna flebotomínea, abrangendo sua
diversidade, frequência, abundância, similaridade das espécies nos ambientes
amostrados e taxa de infecção natural por flagelados, visando dimensionar o
potencial de transmissão de leishmanioses naquela região.
3
2 OBJETIVOS
2.1 Objetivo geral
Conhecer a fauna flebotomínea para dimensionar o potencial de transmissão
de leishmanioses no distrito de Águas do Miranda, município de Bonito, Mato Grosso
do Sul, Brasil.
2.2 Objetivos específicos
• determinar o índice de diversidade, de equitabilidade, de abundância
padronizado, de similaridade das espécies entre os ambientes amostrados e
verificar a taxa de infecção natural para as espécies de flebotomíneos
capturadas;
• avaliar a possibilidade de transmissão de leishmanioses na área.
4
3 REVISÃO DE LITERATURA
3.1 Aspectos Gerais
As leishmanioses são doenças infecto-parasitárias que têm por etiologia
várias espécies de protozoários da ordem Kinetoplastida, família
Trypanossomatidae, gênero Leishmania, e podem determinar no homem
manifestações clínicas nas formas: visceral, cutânea, cutaneomucosa, disseminada
e difusa. Esses parasitas possuem as seguintes formas evolutivas: as amastigotas,
sem flagelo livre, encontradas no hospedeiro vertebrado e as promastigotas com
flagelo livre que habitam o tubo digestivo dos hospedeiros invertebrados (LAINSON
e SHAW, 2005; MICHALICK, 2005).
A principal via de transmissão das leishmânias para o homem e outros
hospedeiros é através da picada da fêmea de flebotomíneo (Diptera: Psychodidae:
Phlebotominae) que no momento da hematofagia, regurgita as formas infectantes
(promastigotas) no hospedeiro vertebrado (LAINSON e SHAW, 2005; MICHALICK,
2005).
Espécies do gênero Leishmania possuem ampla distribuição geográfica,
desde as Américas, aos países africanos, asiáticos e alguns da Europa próximos ao
Mediterrâneo (LAINSON e SHAW, 1987), assim sendo, as leishmanioses estão
geograficamente bem difundidas, e segundo a OMS, estima-se que
aproximadamente 350 milhões de indivíduos encontram-se em áreas de risco de
infecção, com registros anuais de cerca de 1,2 milhões de casos de leishmaniose
tegumentar (LT) e 500.000 de leishmaniose visceral (LV) (WHO, 2010a).
3.2 Leishmaniose tegumentar (LT)
No Brasil já foram identificadas sete espécies de Leishmania associadas à LT,
abrangendo dois subgêneros Leishmania e Viannia: Le. (Vi.) braziliensis Vianna,
1911, Le. (Vi.) guyanensis Floch, 1954, Le. (Vi.) lainsoni Silveira, Shaw, Braga e
Ishikawa, 1987, Le. (Vi.) naiffi Lainson e Shaw, 1989; Le. (Vi.) shawi Lainson, Braga,
5
Souza, Póvoa e Ishikawa, 1989; Le. (Vi.) lindenbergi Silveira, Ishikawa, De Souza e
Lainson, 2002 e Le. (Le.) amazonensis Lainson e Shaw, 1972 (BRASIL, 2010a).
Le. braziliensis é o agente etiológico da leishmaniose cutânea e/ou
cutâneomucosa, também conhecida como “úlcera de Bauru”, “ferida brava” ou “nariz
de tapir”. Suas manifestações clínicas no homem abrangem lesões cutâneas únicas
ou em pequeno número, sendo que ulcerações arredondadas e com bordas
elevadas, caracterizam o padrão clássico de descrição da lesão. No caso da
leishmaniose cutâneomucosa, também chamada de espúndia, pode ocorrer
múltiplas lesões de aparência acneiforme, atingindo com maior frequência a região
da face e tronco. A disseminação do parasito pode se dar por via hemática ou
linfática, causando lesões distantes do local onde a fêmea de flebotomíneo inoculou
as formas infectantes. Pode determinar mutilações e deformidades no homem
trazendo como consequências transtornos psicológicos e sociais (NUNES, 2001;
GENARO e REIS, 2005; BRASIL, 2010a).
Le. braziliensis foi a primeira espécie de Leishmania a ser incriminada como
agente etiológico da LT no Brasil e considerada a sua única etiologia por várias
décadas. No entanto, com o aprimoramento de técnicas de diagnóstico, estudos
epidemiológicos e ecológicos outras espécies também foram descritas como
causadoras da doença (MARZOCHI, 1992; BRASIL, 2010a). Dentre as espécies do
subgênero Viannia, possui a maior distribuição geográfica, sendo encontrada em
todas as regiões do Brasil, e também em países fronteiriços como Paraguai e
Argentina. Na sua transmissão há a participação de várias espécies de
flebotomíneos (HASHIGUCHI et al., 1992; BRASIL, 2010a; QUINTANA; SALOMÓN
e DE GROSSO, 2010).
O parasitismo de marsupiais e roedores por essa espécie de Leishmania leva
a crer que esses animais sejam os reservatórios primários de Le. (Vi.) braziliensis
(LAINSON, 1997; DE LIMA et al., 2002; SCHALLIG et al., 2007).
O ciclo de transmissão das espécies Le. guyanensis, Le. shawi, Le. lainsoni,
Le. naiffi, aparentemente está restrito a estados da região Norte. Seus possíveis
reservatórios são respectivamente: preguiça (Choloepus didactylus), tamanduá
(Tamandua tetradactyla) e gambá (Didelphis albiventris); macacos (Chiropotes
satanas e Cebus apella), quati (Nasua nasua) e preguiça (Choloepus didactylus);
paca (Agouti paca) e tatu (Dasypus novemcinctus). Esses animais são comuns em
6
outras regiões do Brasil, o que leva a supor que essas espécies de Leishmania
possam apresentar distribuição geográfica bem mais ampla, se as mesmas
sobrepõem a de seus hospedeiros silvestres (LAINSON e SHAW, 2005; BRASIL,
2010a).
A LT que tem por etiologia a Le. (Le.) amazonensis pode manifestar-se por
um amplo espectro de formas clínicas, sendo mais frequentes lesões cutâneas
papulares ou ulceradas, únicas, por vezes auto-resolutivas. O processo de infecção
pode iniciar com a formação de apenas uma úlcera, podendo esta lesão se
multiplicar, devido a metástase do parasito pela via linfática e/ou migração de
macrófagos parasitados. A sua maior importância, deve-se ao fato de alguns
indivíduos desenvolverem a leishmaniose cutânea difusa anérgica (LCD) (LAINSON
e SHAW, 2005; GENARO e REIS, 2005; BRASIL, 2010a).
O ciclo de transmissão desse protozoário é amplo, ocorrendo em florestas
primárias e secundárias no Norte do país, como também em outros estados das
regiões Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste. Possui como reservatórios
primários, animais terrestres e semiterrestres, principalmente roedores do gênero
Proechimys, bem como, outras espécies de roedores e canídeos que podem atuar
como reservatórios secundários (LAINSON et al., 1994; BRASIL, 2010a).
No Brasil é crescente o número de casos de LT que já foi assinalada em
todos os estados, com maior número de notificações nas regiões Norte e Nordeste
(BRASIL, 2010a;b). Sua ocorrência pode estar associada com modificações
antrópicas, em favor do desenvolvimento econômico, bem como a implementação
de grandes empreendimentos como a construção de ferrovias, aberturas de
estradas, desmatamentos para fins agropecuários e industriais, expondo o homem
ao risco de se infectar pelo fato de adentrar no ambiente dos reservatórios naturais e
vetores. Estes fatores favorecem, ainda, o surgimento de um ciclo doméstico e/ou
peridoméstico, promovendo então urbanização dos agentes etiológicos e seus
vetores. (BASANO e CARMAGO, 2004; DIAS et al., 2007; BRASIL, 2010a).
A ocorrência de casos urbanos e periurbanos de LT também pode estar
ligada à migração de populações para as periferias das cidades, muitas vezes
levando seus animais de estimação, sujeitas às precárias condições de saneamento
e habitação, numa convivência com potenciais transmissores da doença, facilitando,
7
desta forma, a infecção peridomiciliar, como já registrado em Brasília e no Paraná
(SAMPAIO et al., 2009; MONTEIRO et al., 2009).
3.3 Leishmaniose visceral (LV)
É causada por espécies do gênero Leishmania, pertencentes ao complexo Le.
(Le.) donovani. Na Índia, Sudão, Blangadesh, China e Nepal é causada pela Le.
(Le.) donovani. Nas Américas o agente etiológico é a Le. (Le.) chagasi (Cunha e
Chagas, 1937), já em regiões do continente asiático, africano e no Mediterrâneo é a
Le. (Le.) infantum. Técnicas moleculares mostraram que Le. (Le.) chagasi é
bioquímica e antigenicamente indistinguível de Le. (Le.) infantum, a tendência atual
é, portanto, considerá-las como sendo a mesma espécie (TESH, 1995; MAURICIO;
STOHARD e MILES, 2000; GONTIJO e MELO, 2004; LAINSON e SHAW, 2005;
BRASIL, 2006; COURA, 2008).
A LV também conhecida como Calazar pode determinar no homem
manifestações clínicas leves, moderadas e até graves, como: hepatomegalia,
esplenomegalia, febre prolongada, diarreia, perda de peso. Estas manifestações
ocorrem principalmente em crianças desnutridas, idosos e imunodeprimidos. Há
também indivíduos que se apresentam assintomáticos, que geralmente são
provenientes de zonas endêmicas onde há evidências epidemiológicas e
imunológicas da infecção (GONTIJO e MELO, 2004; BRASIL, 2006).
No ambiente silvestre raposas e marsupiais são os hospedeiros vertebrados
de Le. chagasi, sendo a raposa considerada o reservatório natural desse parasito
(SHERLOCK, 1996). Existem registros do encontro de animais naturalmente
infectados por Le. chagasi nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Norte do Brasil
(LAINSON; SHAW e LINS, 1969; NUNES et al., 1988; CABRERA et al., 2003;
SOUZA et al., 2010). Esses animais silvestres podem estar ou não associados ao
ciclo urbano ou periurbano da doença, dependendo do seu comportamento
sinantrópico (GONTIJO e MELO, 2004).
No ambiente urbano, o cão doméstico (Canis familiaris) representa o principal
hospedeiro no ciclo da doença e a fonte de infecção para os vetores, podendo estes
animais infectados precederem os casos humanos. Nos programas de vigilância e
8
controle da LV, a eutanásia dos animais infectados é utilizada como medida de
controle dessa endemia (GONTIJO e MELO, 2004; BRASIL, 2006).
A LV está amplamente distribuída no território nacional, com casos
autóctones notificados em várias Unidades Federadas, exceto nos estados do Acre,
Amapá, Amazonas, Paraná e Santa Catarina. Os maiores registros ficam na região
Nordeste (BRASIL, 2010b).
Em Teresina (PI), Cerbino Neto, Werneck e Costa (2009) relataram altas
taxas de incidência da doença, estando associada aos bairros periféricos com maior
cobertura vegetal, submetidos à ocupação rápida e sem infraestrutura sanitária
adequada.
De acordo com Gontijo e Melo (2004) a LV tem merecido uma atenção
especial devido a sua urbanização, e pouco se tem conhecimento sobre a
epidemiologia nesse ambiente. No que diz respeito à cadeia de transmissão, o
cenário urbano parece ser bem mais complexo e variado do que o rural. Há registros
de casos em várias cidades como Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG),
Araçatuba (SP), Santarém (PA), Corumbá (MS), Teresina (PI), Natal (RN), São Luís
(MA), Fortaleza (CE), Camaçari (BA), Campo Grande (MS) entre outras (BRASIL,
2006; BRASIL, 2010b).
3.4 Os flebotomíneos
Os flebotomíneos são insetos pertencentes à ordem Diptera, família
Psychodidae e subfamília Phlebotominae, e têm sua importância em saúde pública,
por serem vetores de leishmanioses, assim como de arboviroses e bartoneloses
(SHERLOCK, 2003).
Tanto machos como fêmeas necessitam de açúcares para sua dieta, porém
somente a fêmea necessita do sangue de vertebrados para maturação de seus
ovários, e daí a sua importância médica na transmissão de doenças. Já os machos
sugam apenas suco de vegetais, no entanto há relato de sangue em tubo digestivo
de machos (GONTIJO; COELHO e FALCÃO, 1987; DA SILVA e GRÜNEWALD,
1999; SHERLOCK, 2003).
9
Possuem ampla distribuição geográfica, sendo conhecidas aproximadamente
800 espécies, 60% delas encontradas na Região Neotropical. No Brasil tem-se
conhecimento de 229 espécies, 28,6% do total e 47,7% das que ocorrem na Região
Neotropical (AGUIAR e MEDEIROS, 2003). De acordo com Young e Duncan (1994),
19 espécies, até o momento, são incriminadas na transmissão de leishmanioses ao
homem e animais no Brasil, o que representa 8,4% do total.
São insetos holometábolos de 1 a 3mm, geralmente de cor clara, e com o
corpo muito piloso. Seu ciclo passa pelas fases de ovo, larva (quatro estádios), pupa
e adulto, e a duração de cada um desses estágios varia de acordo com a espécie,
condições ambientais e alimentares a que estão expostos (YOUNG e DUNCAN,
1994; BRAZIL e BRAZIL, 2003).
Esses dípteros se desenvolvem em locais ricos em matéria orgânica em
decomposição. Seus abrigos podem variar de acordo com o micro-habitat, variações
climáticas e com a espécie. Abrigam-se em locais com bom teor de umidade,
matéria orgânica em decomposição, pouca ou nenhuma luz, onde possam se
proteger das intempéries do ambiente (AGUIAR e VILELA, 1987; AGUIAR e
MEDEIROS, 2003). Geralmente, os flebotomíneos possuem atividade crepuscular e
noturna, porém algumas espécies podem ter hábitos tanto diurno quanto noturno,
como observado para Lutzomyia almerioi em cavernas da Serra da Bodoquena
(MS), e para Nyssomyia umbratilis na Amazônia (GALATI et al., 2003a; BRAZIL e
BRAZIL, 2003; GENARO e REIS, 2005).
Os flebotomíneos podem apresentar especificidades com relação aos seus
habitats, sendo que algumas espécies vivem em copas de árvores, e outras ao nível
do solo, definindo então seus comportamentos e hábitos alimentares (AGUIAR e
MEDEIROS, 2003).
Criadouros naturais de flebotomíneos são extremamente difíceis de serem
encontrados e podem ou não estarem dissociados dos abrigos, embora alguns
destes possam servir para o desenvolvimento de suas formas imaturas. Em florestas
há uma grande variedade de locais que servem de abrigos, tais como: espaços entre
folhas caídas e o solo, tronco de árvores e toca de animais. Os locais de criação
desses insetos ainda pouco conhecidos, merecendo estudos aprofundados para
obter resultados mais concretos (BRAZIL e BRAZIL, 2003).
10
As ações antrópicas favorecem a dispersão e adaptação de vetores e
reservatórios naturais de Leishmania, assim como a criação de ecótopos para a
proliferação desses vetores (LAINSON e SHAW, 2005).
Provavelmente devido a um intenso desmatamento da cobertura vegetal da
periferia da cidade de Dom Pedro, estado do Maranhão, ocorreu a periurbarnização
de Ny. whitmani, um dos principais vetores de Le. braziliensis. Fenômenos dessa
natureza decorrentes de desmatamentos em áreas situadas em grandes cidades
poderiam determinar um padrão urbano de transmissão de LT (LEONARDO e
REBÊLO, 2004).
Habitações humanas em condições precárias e/ou em locais inadequados
sem saneamento básico, juntamente com a construção de abrigos de animais
próximos ao ambiente peridomiciliar são comuns em áreas rurais e periferias de
centros urbanos. Nessas áreas os reservatórios naturais ficam mais próximos e os
flebotomíneos são capturados em grande número, expondo homem e animal
doméstico ao risco de infecção (TEODORO et al., 2007; 2010).
Diversos trabalhos já relataram o grande número de flebotomineos
capturados em abrigos de animais como galinheiros, pocilgas, canis, poleiros entre
outros, sendo estes geralmente localizados próximos aos ambientes peridomiciliares
e de matas e seus fragmentos (REBÊLO et al., 1999; TEODORO et al., 2007;
NUNES et al., 2008; ANDRADE et al., 2009; ALMEIDA et al., 2010a).
Estudos relacionados ao hábito alimentar desses insetos têm sido de grande
importância, pois além de esclarecer sobre a epidemiologia das leishmanioses,
contribuem nas atividades de controle e vigilância (DIAS; LOROSA e RÊBELO,
2003).
Algumas pesquisas mostram a galinha como umas das preferências
alimentares de algumas espécies de flebotomíneos, e que o sangue dessa ave pode
auxiliar o desenvolvimento da Leishmania no vetor, apontando para o risco que a
sua criação no ambiente peridomiciliar traz para a população humana, tanto na
transmissão de LT como de LV, já que se trata de um fator atrativo tanto para Lu.
longipalpis como Ny. whitmani. (DIAS; LOROSA e RÊBELO, 2003; TEODORO et al.,
2007; SANT’ ANNA et al., 2010).
11
Em MS estudo com Lu. longipalpis mostrou seu ecletismo alimentar e
preferência significativa por sangue humano e de aves. O mesmo não ocorreu com
relação aos cães. Os autores concluem que a alta antropofilia de Lu. longipalpis tem
sérias implicações, levantando novos questionamentos em relação a importância
dos cães na epidemiologia da LV e a relevância do homem como fonte de infecção
para os flebotomíneos (OLIVEIRA et al., 2008).
3.5 As leishmanioses em Mato Grosso do Sul
O estado de Mato Grosso do Sul (MS), está localizado na região Centro-
Oeste do Brasil, sendo a capital Campo Grande. Possui área de 357.145,836 km² e
2.449.024 habitantes segundo Censo 2010. O clima predominante é o tropical, com
verões chuvosos e invernos secos. As médias termométricas variam entre 25°C na
baixada do Paraguai e 20°C no Planalto. A vegetação é coberta na maior parte por
Cerrado, havendo também a Floresta Estacional Semidecidual (IBGE, 2011;
PORTAL MS, 2011).
Alega-se que o primeiro caso humano autóctone de LV nas Américas com
comprovação parasitológica, seja proveniente da região de Porto Esperança,
município de Corumbá (MS) (MIGONE, 1913). A partir 1980 começaram a ser
notificados casos humanos naquele município e estudos na população canina
mostraram prevalência sorológica para Leishmania, de 8,7% dentre 481 animais
examinados (NUNES et al., 1988; YAMAMOTO et al., 1988). Na mesma ocasião,
estudos em animais silvestres, resultaram no encontro de um canídeo (Cerdocyon
thous) naturalmente infectado por Le. chagasi (MELO et al., 1988). Dez anos depois,
Santos et al. (1998) ao realizarem um outro inquérito sorológico canino na mesma
região relataram 24% de positividade, revelando, portanto, o aumento na prevalência
da leishmaniose visceral canina (LVC).
Estudos iniciais da fauna flebotomínea em Corumbá e entorno mostraram a
presença de Lu. cruzi e de Lu. forattinii, tanto em peri como em intradomicílios, em
alta densidade populacional e com acentuada atividade antropofílica. Esses
achados, somados ao não encontro de Lu. longipalpis, sugeriram a participação das
duas primeiras espécies na veiculação de Le. chagasi naquela região (GALATI et
al., 1997). Trabalhos realizados posteriormente assinalaram a presença de Lu.
12
longipalpis criando novas abordagens com relação à epidemiologia local da LV
(SANTOS et al., 2003). O encontro de espécimes de Lu. cruzi e de Lu. forattinii
naturalmente infectados por Le. chagasi, levou à suspeita de estarem envolvidos na
transmissão de LV em Corumbá (SANTOS et al., 1998; PITA-PEREIRA et al., 2008).
Com o passar dos anos, observou-se a expansão da LV para outras regiões
de MS, sendo atualmente diagnosticada tanto na população humana quanto na
canina. De acordo com o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN)
até o ano de 2010 os municípios com índices de transmissão intensa e moderada
são: Aquidauana, Anastácio, Brasilândia, Bodoquena, Bonito, Camapuã, Miranda,
Sidrolândia, Terenos, Três Lagoas e Campo Grande. Atualmente a LV é importante
motivo de preocupação para a saúde publica, devido a sua expansão, pelo
incremento do número de casos, pela morbidade, por ser diagnosticada em
populações rurais e urbanas, por acometer indivíduos jovens e adultos e em
qualquer faixa etária (BRUSTOLONI, 2006; OLIVEIRA, A.L.L et al., 2006; LIMA-
JUNIOR et al., 2009; MATO GROSSO DO SUL, 2010).
Campo Grande, capital do estado, possui o maior número de casos
notificados de LV, tendo registrado de 2000 a 2010, 1.064 casos. Em Três Lagoas
há também elevado número de casos humanos e alguns óbitos (OLIVEIRA, A.L.L et
al., 2006; LIMA-JUNIOR et al., 2009; MATO GROSSO DO SUL, 2010).
Nessas cidades a frequência de Lu. longipalpis é alta. Esta espécie apresenta
ampla distribuição em MS, tanto em áreas rurais como urbanas, e é incriminada na
transmissão de casos humanos e caninos de LV em várias regiões do estado
(OLIVEIRA et al., 2003; OLIVEIRA, A.G et al., 2006; NASCIMENTO et al., 2007;
NUNES, 2001; NUNES et al., 2001; 2008; SAVANI et al., 2005; ANDRADE et al.,
2009; CARVALHO, G.M.G et al., 2010).
Entre as décadas de 70 e 80 começaram as notificações de leishmaniose
tegumentar em MS. Geralmente os casos estavam correlacionados com a
implantação de projetos agropecuários, abertura de estradas e assentamentos de
trabalhadores rurais sem terra pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (INCRA) (NUNES, 2001). A partir dessa época é crescente o número de
notificações de casos de LT em MS, porém escassos os estudos de ordem
epidemiológica sobre essa parasitose no estado (NUNES, 2001; DORVAL et al.,
2006; BRASIL, 2010b).
13
Na década de 90, estudos no município de Corguinho, mostraram a
ocorrência de LT em moradores da região quilombola de Boa Sorte. Os pacientes
trabalhavam em áreas de desmatamento e praticavam a caça e a pesca, o que
apontou para transmissão extradomiciliar da parasitose. O parasito foi isolado e
identificado como Le. (Vi.) braziliensis (NUNES et al., 1995). A abundância, assim
como a presença de Ny. whitmani naturalmente infectada, sugeriram a associação
dessa espécie à transmissão de LT na região (GALATI et al., 1996).
Estudos em assentamento agrícola no município de Bonito constataram sete
casos de leishmaniose cutânea em pacientes do sexo masculino, na faixa etária de
19 a 48 anos. O parasito foi isolado e identificado como Le. (Vi.) braziliensis. Alguns
pacientes trabalhavam como empreiteiros em fazendas fora do assentamento e
outros tinham o hábito de caçar em ceva, assim sendo, o padrão de transmissão de
LT naquela localidade pode ser considerado como ocupacional e cultural (NUNES,
2001). Nesse assentamento e em áreas próximas, foi evidenciada a presença de Ny.
whitmani em ambientes antrópicos e silvestres, sendo umas das espécies mais
abundantes. Nessas localidades também encontraram Lu. longipalpis e Lu. almerioi
em abundância (NUNES, 2001; GALATI et al., 2003b).
Levantamento sobre LT, em prontuários do Hospital Universitário da
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Campo Grande, no período
de 1976 a 1999, mostraram o atendimento de 160 casos. A maioria apresentava
lesões cutâneas únicas, era do sexo masculino, na faixa etária de 30 a 41 anos e
trabalhadores rurais, apontando para um caráter ocupacional na transmissão dessa
parasitose (NOGUCHI, 2001).
No município de Bela Vista, Dorval et al. (2006) constataram a presença de
Le. (Le.) amazonensis em seis militares que apresentavam lesões cutâneas únicas,
principalmente na forma ulcerada. Capturas de flebotomíneos em armadilhas do
tipo Disney, constataram Bichromomyia flaviscutellata como espécie dominante,
sendo que dois hamsters sentinelas adquiriram infecção por Le. amazonensis
(DORVAL et al., 2010).
Dois gatos domésticos, um deles de Campo Grande e outro de Ribas do Rio
Pardo foram diagnosticados com LT, e a etiologia foi atribuída a Le. amazonensis
(SOUZA et al., 2005; 2009).
14
Técnicas moleculares permitiram a detecção de cães infectados tanto por Le.
chagasi, como por Le. (Viannia) sp e Le. amazonensis na região rural de Bonito
(SAVANI, 2004).
Lima-Junior et al. (2009), em isolados de Leishmania criopreservados obtidos
por aspirado medular e/ou biópsia de lesão, utilizando a reação em cadeia da
polimerase (PCR) diagnosticaram Le. amazonensis em 2 de 39 pacientes, um
procedente de Chapadão do Sul (MS) e outro do estado do Amazonas (AM). O
restante dos pacientes, procedentes de vários municípios de MS, sendo a maioria de
Campo Grande, foram positivos para Le. chagasi.
Em cavernas da Serra da Bodoquena foi observada alta densidade
populacional de Lu. almerioi Galati e Nunes 1999, espécie com atividade
antropofílica e considerada vetor permissivo de Le. chagasi e Leishmania spp.
Ressalta-se que essa espécie possui hábito diurno e noturno o que revela a sua
importância para a região, um importante pólo turístico (GALATI et al., 2003a;
SAVANI et al., 2009; GALATI, 2010).
Na área urbana de Bonito, foco de LV e de LVC, trabalhos realizados no
período de março de 2005 a fevereiro de 2006, mostraram Lu. longipalpis como a
espécie mais frequente e a mais abundante, representando 93,5% dos
flebotomíneos capturados. Sua frequência mais expressiva ocorreu nos ecótopos
próximos de galinheiro e de pocilga. A espécie foi capturada em todos os meses do
ano, com picos no verão, inverno e primavera. Bi. flaviscutellata foi capturada no
intra e peridomicílio, nas proximidades de mata remanescente. Portanto, na área
urbana de Bonito foram encontradas duas espécies que comprovadamente
participam da transmissão de leishmanioses, Lu. longipalpis e Bi. flaviscutellata,
ressaltando-se que ambas foram encontradas naturalmente infectadas. Na área
urbana de Bonito, Ny. whitmani apresentou baixa frequência e só foi encontrada em
ecótopos nos limites da cidade, na margem de mata e em ecótopos que faziam
divisa com área de cerrado e de mata (NUNES et al., 2008).
Em estudos realizados posteriormente na mesma área, Andrade et al. (2009)
relataram uma fauna semelhante a encontrada por Nunes et al. (2008), com
predomínio de Lu. longipalpis, que contribuiu com 90,40% do total de 2.772
espécimes capturados. Na ocasião foi realizado inquérito sorológico canino que
apresentou 30% dos animais reagentes para Leishmania. Casos humanos de LV
15
começaram a ser notificados em Bonito a partir de 2002. Lu. longipalpis, pode ser
incriminada na transmissão dos casos de LV e de LVC na área urbana de Bonito.
Ressalta-se que nesse município essa espécie foi encontrada tanto na área urbana
quanto rural, sobretudo em ambientes antrópicos representados pela criação de
aves e de suínos, onde os abrigos desses animais e as condições precárias de
higiene viabilizam fonte de alimento, e consequentemente a domiciliação do vetor
(NUNES, 2001; GALATI et al., 2003b; NUNES et al., 2008; ANDRADE et al., 2009).
Paiva et al. (2010), estudando espécimes de flebotomíneos capturados em
Campo Grande pela PCR encontraram: Evandromyia lenti, Lu. longipalpis,
Micropygomyia quinquefer, Ny. whitmani, Psathyromyia aragaoi e Psychodopygus
claustrei naturalmente infectados por Le. braziliensis, que tem por vetor comprovado
Ny. whitmani. Os autores sugerem que essas espécies possam participar do ciclo de
infecção, se alimentando em reservatórios de Le. braziliensis, o que não significa
que possam transmitir Leishmania ao homem e a outros hospedeiros vertebrados.
Portanto, estudos realizados em MS já evidenciaram a presença de três
espécies de Leishmania: Le. (Le.) chagasi, Le. (Le.) amazonensis e Le. (Vi.)
braziliensis e seus respectivos vetores: Lu. longipalpis, Bi. flaviscuttelata e Ny.
whitmani, encontrados tanto em áreas rurais como urbanas (GALATI et al., 1996;
OLIVEIRA, A.G et al., 2006; NUNES et al., 2008; DORVAL et al., 2010; ALMEIDA et
al., 2010a;b; CARVALHO, G.M.G et al., 2010). Foram encontrados, também, vetores
permissivos Lu. almerioi, Lu. cruzi e Lu. forattinii, que necessitam de mais estudos
para esclarecimento de suas competências vetoriais (GALATI et al., 2003a;b;
SANTOS et al., 2003; PITA-PEREIRA et al., 2008; SAVANI et al., 2009).
16
4 MATERIAL E MÉTODOS
4.1 Área de estudo
O município de Bonito localiza-se a 21o07´16´´LS e 56o28´55´´LW, na região
sudoeste de Mato Grosso do Sul (Figura 1), na unidade geomorfológica denominada
Planalto da Bodoquena. A população humana de Bonito é de aproximadamente
19.598 habitantes. Sua sede dista 280 km de Campo Grande, a capital do estado e é
um importante pólo turístico regional, nacional e internacional. Possui dois distritos:
Jabuti e Águas do Miranda e alguns aglomerados rurais, o Pesqueiro do Noé e os
Assentamentos, Santa Lúcia e Guaicurus (PREFEITURA MUNICIPAL DE BONITO,
2009; IBGE, 2011).
Figura 1 - Mapa de Mato Grosso do Sul com a localização de Bonito. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:MatoGrossodoSul_Municip_Bonito.svg
17
A Serra de Bodoquena possui relevo residual e apresenta formas e
características relacionadas às litologias calcárias (ALVARENGA; BRASIL e
DE’LARCO, 1982; BOGGIANI e COIMBRA, 1995).
O município de Bonito pertence à Bacia Hidrográfica do Paraguai, sub-bacia
do Miranda e Aquidauana. Seus principais cursos d’água são o rio Miranda e o rio
Formoso. Este último, outros rios e córregos que nascem em Bonito representam um
sistema hidrográfico particular associado às rochas calcárias que formam uma
complexa rede de drenagem cuja característica principal é a limpidez de suas águas.
A vegetação situa-se no grande domínio dos cerrados, apresentando
particularidades associadas às condições ambientais locais, como manchas de
matas em áreas de solos mais férteis e com presença maior de água. Destaca-se a
cobertura da Serra da Bodoquena, uma mata típica associada às rochas calcárias
conhecidas como Mata Seca ou Floresta Tropical Estacional Semidecidual
Submontana, com uma variedade muito grande de espécies, tanto de árvores,
arbustos, orquídeas, dentre outras (VELOSO; RANGEL-FILHO e LIMA, 1991).
Outros tipos de matas no município são as Ciliares ou Ribeirinhas,
associadas aos solos férteis e com umidade às margens dos rios. Hoje, restam
poucas manchas no entorno dos rios Miranda, Mimoso, do Peixe, Formoso e Prata.
Essas matas apresentam uma rica variedade de vegetação e fauna e devido ao
grande valor das madeiras e à fertilidade das terras, foram em grande parte
eliminadas (VELOSO; RANGEL-FILHO e LIMA, 1991).
O clima de Bonito é do tipo tropical sob a influência de massa polar, durante
o inverno, junho a setembro, quando o ambiente é mais seco. A temperatura média
anual é de 22ºC e a média das chuvas 1.450 mm/ano, com precipitações menos
intensas no inverno, variando de 30 a 60 mm/mês. O exuberante patrimônio natural
da mesorregião onde está inserido o município transformou-se em referência do
turismo de aventura e ecoturismo (BOGGIANI e COIMBRA, 1995).
O distrito Águas do Miranda (Figura 2), criado em 23 de março de 2003,
situa-se a S 20o 45’ 44,4”, W 560 05’ 42,8”, a 75 km da sede municipal e a 180 km de
Campo Grande. É conhecido também, como Ponte do Rio Miranda devido à ponte
que faz sua interligação ao município de Anastácio, e como Km 21 pelo seu ponto de
acesso pela rodovia BR 419 (PREFEITURA MUNICIPAL DE BONITO, 2009).
18
Figura 2 – Foto área do Distrito Águas do Miranda, município de Bonito, MS. Fonte: http://www.googleearth.com, data da imagem: 18/04/2009. Acesso em: 17/10/2011.
A população humana fixa compreende cerca de 450 pessoas, podendo
chegar a 10 vezes na época aberta à pesca, que vai de março a final de outubro. A
comunidade água-mirandense é formada por todas as etnias raciais, com
predomínio da negra. A economia local está alicerçada principalmente no turismo de
pesca e na pecuária de corte. Pratica-se, ainda, o extrativismo vegetal em cinco
unidades carvoeiras (PREFEITURA MUNICIPAL DE BONITO, 2009).
No distrito funciona uma escola de ensino fundamental e médio, Escola
Municipal Rural Águas do Miranda - Pólo, que é frequentada pelas crianças e
adolescentes moradores do distrito e de localidades vizinhas: pesqueiros, fazendas,
sítios e chácaras. Ainda na área de prestação de serviços, possui um posto de
saúde, com uma enfermeira, uma auxiliar de enfermagem e um médico clínico geral,
que atende às quintas e sextas-feiras; um posto da Policia Militar Florestal e uma
estação de tratamento de água. O lixo é coletado às segundas, quartas e sextas-
feiras e depositado em um aterro a céu aberto. Conta com serviço diário de táxi para
Anastácio (MS) e transporte em ônibus às terças e quartas-feiras para Anastácio e
19
às segundas para Bonito. Na área comercial conta com dois supermercados, três
pousadas, dois restaurantes e uma sorveteria (PREFEITURA MUNICIPAL DE
BONITO, 2009).
Administrado pelo prefeito de Bonito, conta com um Secretário
Administrativo, que exerce suas atividades como representante local em escritório
locado em uma sala adjacente à Escola Municipal. Possui duas associações: a dos
Moradores e a dos Pescadores. O acesso a Águas do Miranda, partindo de Campo
Grande (Figura 3), é feito pela rodovia BR 262, até Anastácio (110km), pela BR 419
até o Posto Km 21 (21km) e pela MS 345 (30 km sem pavimentação).
Figura 3 – Estradas de acesso a Águas de Miranda partindo de Campo Grande. Fonte: Google Maps, 2009 (Adaptado). Acesso em 17/10/2011.
4.2 Inquérito sobre flebotomíneos
Os flebotomíneos foram capturados utilizando armadilhas luminosas
automáticas modificadas do tipo CDC, acopladas a gaiolas coletoras. As capturas
foram mensais por 3 dias consecutivos, com as armadilhas ligadas ao crepúsculo,
mais ou menos, às 18:00 horas e recolhidas às 6:00 horas, sem obedecer horário de
20
verão. No posto de saúde local os insetos foram recapturados em tubos de
polietileno. Para identificação e verificação de infecção natural, a fêmea foi
imobilizada com éter sulfúrico e colocada em lâmina seca e estéril para retirada das
patas e asas. Então, foi transferida para uma gota de solução fisiológica estéril, onde
se completou a dissecção, com exposição do tubo digestivo para pesquisa de
promastigotas e das espermatecas, principal aspecto morfológico utilizado para a
identificação da espécie.
Os flebotomíneos machos foram acondicionados em placas de Petri, mantidos
sob refrigeração e levados para clarificação e identificação no Laboratório de
Parasitologia Humana da Unidade Agrárias da Universidade Anhanguera/Uniderp.
A identificação das espécies seguiu a classificação proposta por Galati (2003)
e as abreviações segundo Marcondes (2007).
4.3 Sítios de captura
Os sítios de capturas foram distribuídos de maneira a cobrir matas e suas
margens, área de cerrado, peridomicílios e abrigo de animais como, galinheiro,
pocilga e poleiro. As armadilhas foram instaladas e distribuídas da seguinte forma:
Armadilha A1: no peridomícilio do imóvel 1, próximo a árvores frutíferas, nativas,
tubérculos e gramíneas;
Armadilha A2: no peridomicílio do imóvel 2, próximo a árvores pioneiras, frutíferas e
bambuzal;
Armadilha A3: no peridomicílio do imóvel 3 que é margeado por um córrego, dentro
de um bambuzal e próximo a árvores frutíferas e ornamentais;
Armadilha A4: na pocilga do imóvel 4 próximo a árvores frutíferas, nativas e
gramíneas;
Armadilha A5: em área de cerrado distante cerca de 3 km da área urbana do distrito,
com sucessão secundária, árvores de troncos finos e médios, com lianas no dossel,
com retirada seletiva de madeira e presença de espécies pioneiras;
Armadilha A6: em área de mata ciliar em chácara distante cerca de 4 km da área
urbana com indícios de sucessão secundária após retirada seletiva de madeira;
Armadilha A7: em galinheiro da mesma chácara (A6) próximo a árvores frutíferas,
nativas e bambu;
21
Armadilha A8: em mata ciliar residual do imóvel 5 com presença de várias árvores
frutíferas, nativas e presença de bambu;
Armadilha A9: em poleiro do imóvel 5, próximo de árvores frutíferas e nativas.
4.4 Análise dos dados
Para determinar a abundância relativa das espécies utilizou-se a
porcentagem. O índice de Shannon (H) com base Logn para analisar a diversidade
das espécies, e equitabilidade pelo índice de Pielou (J) para verificar a proporção
com que cada espécie contribui em cada ambiente (HAYEK e BUZAS, 1997).
O índice de similaridade pelo coeficiente de Sorensen para verificar a
concomitância das espécies entre os ambientes amostrados (COELHO-PINTO,
2006).
A abundância e a distribuição geográfica das espécies nos vários ambientes
amostrados foram calculadas conforme Roberts e Hsi (1979).
A média geométrica de Williams (HADDOW, 1960) foi usada para avaliar a
assiduidade das três espécies mais frequentes e abundantes nas quatro estações
do ano.
Para a ordenação das variáveis climáticas com as três espécies mais
abundantes, foi utilizada a técnica de escalonamento multidimensional não métrico
(NMDS) com distância de Bray-Curtis através do software Past version 1.91
(HAMMER; HAPER e RYAN, 2001).
Como não há uma estação meteorológica naquele distrito, os dados
climáticos utilizados foram da Estação Meteorológica de Aquidauana, distante cerca
de 30 km.
22
5 RESULTADOS
Foram capturados 6.699 espécimes de flebotomíneos, 3.929 machos e 2.770
fêmeas, com razão sexual de 1,42: 1,0.
Foram identificadas dezesseis espécies pertencentes a quatro subtribos e
sete gêneros: Brumptomyiina: Brumptomyia sp, Brumptomyia avellari (Costa Lima,
1932), Brumptomyia brumpti (Larrouse, 1920); Lutzomyiina: “complexo cortelezzii”,
Evandromyia lenti (Mangabeira, 1938), Evandromyia termitophila (Martins, Falcão e
Silva, 1964), Lutzomyia longipalpis (Lutz e Neiva, 1912), Sciopemyia sordellii
(Shannon e Del Ponte, 1927); Psychodopygina: Nyssomyia neivai (Pinto, 1926),
Nyssomyia whitmani (Antunes e Coutinho, 1939), Psathyromyia aragaoi (Costa Lima,
1932), Psathyromyia campograndensis (Oliveira, Andrade-Filho, Falcão e Brazil,
2001), Psathyromyia hermalenti (Martins, Silva e Falcão, 1970), Psathyromyia
shannoni (Dyar, 1929), Psathyromyia punctigeniculata (Floch e Abonnenc, 1944) e
Sergentomyiina: Micropygomyia quinquefer (Dyar, 1929) (Tabela 1).
A maior riqueza ocorreu nos abrigos de animais com quinze espécies
capturadas, e a menor nos peridomícilios com nove (Tabela 1).
Os maiores valores de diversidade e equitabilidade de espécies (H=2,06; J=0,83)
ocorreram na área de matas e cerrado, com valores muito próximos nas áreas de
peridomicílios (H=2,00; J=0,91), e por último nos abrigos de animais (H=1,24;
J=0,45). Apesar dos abrigos de animais mostrarem o maior número de espécies,
tiveram baixos índices de H e J, devido ao maior número de espécimes de Ny.
whitmani, Lu. longipalpis e Pa. shannoni (Tabela 1).
Tabela 1 - Flebotomíneos capturados com armadilhas luminosas em ambientes distintos, índices de diversidade de Shannon (H), equitabilidade de Pielou (J) e porcentagem, Águas do Miranda, Bonito, MS, Brasil, dezembro de 2009 a novembro de 2010.
Ambientes Peridomicílios Matas e cerrado Abrigos de animais Subtotal Total % Espécies/Sexo M F(d) M F(d) M F(d) M F(d) M/F M/F
Brumptomyia sp - 2(2) - - - - - 2(2) 2 0.03
Brumptomyia avellari - - 2 - - 1(1) 2 1(1) 3 0.04
Brumptomyia brumpti 1 1(1) 4 1(1) 4 4(4) 9 6(6) 15 0.22
Complexo cortelezzii 2 3(3) 2 25(24) 20 76(55) 24 104(82) 128 1.91
Evandromyia lenti 1 2(2) 15 11(10) 5 4(2) 21 17(14) 38 0.57
Evandromyia termitophila - - - - - 1(1) - 1(1) 1 0.01
Lutzomyia longipalpis 5 5(5) 23 9(8) 601 293(224) 629 307(237) 936 14.00
Micropygomyia quinquefer - - - - 2 2(2) 2 2(2) 4 0.06
Nyssomyia neivai 2 - 8 17(17) 305 41(37) 315 58(54) 373 5.56
Nyssomyia whitmani 4 3(3) 30 22(19) 1612 1.671(1.396)a 1646 1.696(1.418) 3342 49.90
Psathryromyia aragaoi - - - 9(9) 1 1(1) 1 10(10) 11 0.16
Psathyromyia campograndensis - 2(2) - - - 4(4) - 6(6) 6 0.09
Psathyromyia hermanlenti - - 2 2(2) 1 3(3) 3 5(5) 8 0.12
Psathyromyia punctigeniculata - - - 1(1) - 8(3) - 9(4) 9 0.13
Psathyromyia shannoni 2 1 26 12(7) 1.249 530(401)b
1.277 543(408) 1820 27.16
Sciopemyia sordellii - - - 2(1) - 1 3(1) 3 0.04
Subtotal 17 19(18) 112 111(99) 3.800 2.640(2.134) 3.929 2.767(2.251) 6.699 100
Total 36 223 6.440 6.699
Shannon (H) 2,00 2,06 1,24 1,30
Pielou (J) 0,91 0,83 0,45 0,47
M: Macho; F: Fêmea; (d): Fêmea dissecada; a: uma fêmea com flagelados capturada em outubro de 2010; b: uma fêmea com flagelados capturada em novembro de 2010. Quantidade de armadilhas por ambiente: peridomicílios: 3; áreas de matas e cerrado: 3; abrigos de animais: 3.
24
A Tabela 2 mostra o Índice de Abundância das Espécies Padronizado (IAEP)
calculado para cada ambiente e o total destes. Ny. whitmani e Ny. neivai com
IAEP=0,952 apresentaram os maiores índices de abundância, que ocorreram nos
abrigos de animais, Pa. shannoni IAEP=0,885 e Lu. longipalpis IAEP=0,869 ficaram
na segunda e terceira posição, respectivamente.
Nas áreas de matas e cerrado, Ny. whitmani ficou na primeira posição
IAEP=0.823, seguida de Pa. shannoni IAEP=0,788 e de Lu. longipalpis IAEP=0,705.
Nos peridomicílios, Lu. longipalpis foi a mais abundante com IAEP=0,718, Ny.
whitmani IAEP=0,615 e Pa. shannoni IAEP=0,492, ocuparam a segunda e a terceira
posição, respectivamente.
Tabela 2 - Índice de abundância das espécies padronizado (IAEP) de flebotomíneos capturados com armadilhas luminosas em diferentes ambientes, Águas do Miranda, Bonito, MS, dezembro de 2009 a novembro de 2010
Ambiente Peridomicílios Matas e cerrado Abrigos de animais Total
Espécies IAEP Posição IAEP Posição IAEP Posição IAEP Posição
Brumptomyia sp 0,256 4ª - - - - 0,164 9ª
Br. avellari - - 0,058 10ª 0,026 11ª 0,107 12ª
Br. brumpti 0,153 6ª 0,255 7ª 0,178 9ª 0,342 7ª
Complexo cortelezzii 0,615 2ª 0,529 4ª 0,845 4ª 0,678 4ª
Ev. lenti 0,256 4ª 0,470 5ª 0,214 8ª 0,357 6ª
Ev. termitophila - - - - 0,028 10ª 0,014 13ª
Lu. longipalpis 0,718 1ª 0,705 3ª 0,869 3ª 0,853 1ª
Mi. quinquefer - 8ª - - 0,500 5ª 0,164 9ª
Ny. neivai 0,153 6ª 0,341 6ª 0,952 1ª 0,457 5º
Ny. whitmani 0,615 2ª 0,823 1ª 0,952 1ª 0,830 2ª
Pa. aragaoi - 8ª 0,200 8ª 0,314 7ª 0,228 8ª
Pa. campograndensis 0,230 5ª - - 0,357 6ª 0,135 10ª
Pa. hermanlenti - - 0,164 9ª 0,357 6ª 0,164 9ª
Pa. punctigeniculata - - 0,047 11ª 0,178 9ª 0,114 11ª
Pa. shannoni 0,492 3ª 0,788 2ª 0,885 2ª 0,778 3ª
Sc. sordellii - - 0,058 10ª 0,028 10ª 0,107 12ª
25
A Tabela 3 mostra o Índice de Similaridade calculado pelo coeficiente de
Sorensen entre os ambientes amostrados. Quando comparados os ambientes de
peridomicílios e os abrigos de animais, este obteve um índice de 0,66. Muito próximo
disso foram os peridomicílios e matas e cerrado com 0,70. E o maior valor ocorreu
entre os ambientes de mata e cerrado e os abrigos de animais com 0,88,
constatando-se nesses ambientes maior concomitância entre as espécies.
Tabela 3 - Índice de Similaridade calculado pelo coeficiente de Sorensen entre os
ambientes amostrados, dezembro de 2009 a novembro de 2010
Ambientes Índice de Similaridade
Peridomicílios + Abrigos de animais 0,66
Peridomicílios + Matas e cerrado 0,70
Matas e cerrado + Abrigos de animais 0,88
Pela média geométrica de Williams observou-se que Lu. longipalpis teve picos
na primavera e verão, Ny. whitmani esteve mais presente no inverno e na primavera
e Pa. shannoni obteve seu pico na primavera (Figura 4).
Figura 4 – Média do total de espécimes de Lu. longipalpis, Ny. whitmani e Pa. shannoni, por estação do ano, Águas do Miranda, Bonito, MS, dezembro de 2009 a novembro de 2010
0
50
100
150
200
250
300
350
Primavera Verão Outono Inverno
Méd
ia d
e W
illia
ms
Lu.longipalpis
Ny.whitmani
Pa.shannoni
26
As médias mensais das variáveis climáticas considerando a precipitação,
temperatura e umidade relativa do ar (Tabela 4), foram confrontadas com número de
flebotomíneos das três espécies mais frequentes (Figura 5).
Tabela 4 - Médias mensais das variáveis climáticas (precipitação, temperatura, umidade relativa) Águas do Miranda, Bonito, MS, dezembro de 2009 a novembro de 2010.
Meses Precipitação (mm) Temperatura (ºC) Umidade Relativa (%)
Dezembro 261,6 27,29 79,62
Janeiro 311,2 27,11 79,61
Fevereiro 135,4 27,99 77,36
Março 117,4 27,39 75,32
Abril 21,4 24,94 72,53
Maio 117,4 20,25 77,21
Junho 6,2 21,78 70,33
Julho 15,0 20,1 65,91
Agosto 0,0 22,11 52,74
Setembro 54,6 25,8 57,41
Outubro 152,6 25,34 65,76
Novembro 196,0 25,23 69,89
27
Figura 5 - Número de flebotomíneos das três espécies mais frequentes confrontados com as médias mensais de precipitação pluviométrica (mm), temperatura (ºC) e umidade relativa do ar (%), Águas do Miranda, Bonito, MS, dezembro de 2009 a novembro de 2010
Figura 6 - Variáveis climáticas (precipitação (mm), temperatura (ºC) e umidade relativa do ar (UR) (%), escalonadas com o número de flebotomíneos das três espécies mais abundantes, através da análise escalonada não métrica (NMDS) com distância de Bray Curtis, Águas do Miranda, Bonito, MS, dezembro de 2009 a novembro de 2010
0
5
10
15
20
25
30
0
200
400
600
800
1000
Dez Jan Fev Mar Abr Maio Jun Jul Ago Set Out Nov
Fle
boto
mín
eos
(n)
/ Pre
cipi
taçã
o (m
m)
Tem
pera
tura
(Cº)
/ U
R (
%)
Ny. whitmani Pa. shannoniLu. longipalpis Rainfall (mm)RH (%) Temperature (ºC)
28
A Figura 6 mostra que Lu. longipalpis teve uma correlação positiva com a
precipitação, ocorrendo o oposto com Ny. whitmani e Pa. shannoni. Já a
temperatura não foi significativa para nenhuma das espécies.
Dois espécimes fêmeas de flebotomíneos em um total de 2.251 dissecadas,
apresentaram-se naturalmente infectados por flagelados resultando em uma taxa de
infecção de 0,09%. Um dos espécimes, examinado em outubro de 2010, foi
identificado como Ny. whitmani e apresentou a infecção na porção anterior do
intestino, o outro, capturado em novembro de 2010, foi identificado como Pa.
shannoni e os flagelados também apresentaram posição peripilária. Ambas as
espécies foram capturadas em galinheiro, onde, além das aves foram observados
roedores dentro e nas imediações. As taxas de infecção natural, pela microscopia
óptica foram 0,07% para Ny. whitmani e 0,23% para Pa. shannoni, uma vez que
foram dissecadas 1.418 e 408 fêmeas, respectivamente.
29
6 DISCUSSÃO
Segundo Maciel e Missawa (2009) o conhecimento da fauna flebotomínea é
indispensável na compreensão do processo de transmissão das leishmanioses, visto
que esses insetos participam no ciclo da doença.
As espécies de flebotomíneos capturadas no distrito Águas do Miranda, já
foram assinaladas em outros municípios de MS, em áreas urbanas, rurais, de
florestas primárias, remanescentes e de cavernas (GALATI et al., 1996; 1997;
2003a; 2003b; 2006, OLIVEIRA et al., 2003; OLIVEIRA, A.G. et al., 2006; NUNES et
al., 2008; DORVAL et al., 2009; 2010; ALMEIDA et al., 2010a;b).
Ny. whitmani, Pa. shannoni, Lu. longipalpis foram as espécies mais
frequentes e estiveram em maior densidade populacional em galinheiro,
corroborando observações de que os abrigos de animais constituem fontes de
criação e favorecem a adaptação desses insetos a ambientes antrópicos
(TEODORO et al., 1999; 2007; 2010; NUNES, 2001; NUNES et al., 2008;
CARVALHO, M.S.L et al., 2010).
Ny. whitmani foi capturada em todos os meses, tem sua importância por ser o
transmissor de Le. (Vi.) braziliensis em diferentes regiões do país (AZEVEDO et al.,
1990; RANGEL; LAINSON e SOUZA, 1990; QUEIROZ et al., 1994; COSTA et al.,
2007; BRASIL, 2010; PAIVA et al., 2010); de Le. (Vi.) shawi na região Norte e de Le.
(Vi.) guyanensis na Amazônia (RANGEL e LAINSON, 2003).
A sua ampla distribuição geográfica e associação com diferentes espécies de
Leishmania sugere a hipótese de que a mesma constitui um complexo de espécies
crípticas alopátricas, com tipos característicos de comportamento epidemiológico
(RANGEL; LAINSON e SOUZA, 1990; RANGEL et al., 1996).
Neste estudo foi observado alta similaridade entre os ambientes de matas e o
antrópico. Ny. whitmani obteve maior densidade populacional em galinheiro,
mencionando-se que a proximidade do mesmo com a mata nativa poderia explicar o
maior número de espécimes neste ecótopo, corroborando os resultados encontrados
por Nunes (2001) e Galati et al. (2003b) de que este ecótopo fornece fonte de
alimento e criação desses insetos, à semelhança de outros abrigos de animais.
30
No interior do Paraná e no Maranhão há registros desta espécie estar se
urbanizando (LEONARDO e REBÊLO, 2004; TEODORO et al., 2003), porém ainda
guarda estreita relação com ambientes de matas e fragmentos , assim como em
Bonito (MS) (NUNES et al., 2008).
A taxa de infecção natural de 0,07% para Ny. whitmani foi menor do que a
observada em Corguinho (MS) por Galati et al. (1996) que detectaram um índice de
0,16% em 613 fêmeas dissecadas. Confirma-se, portanto, os baixos índices de
infecção natural dessa espécie de flebotomíneo quando utilizado apenas
microscopia óptica.
Pa. shannoni foi a segunda espécie mais frequente, tendo sido apreendida
em todos os ambientes, com maior densidade populacional em galinheiro. Assim
como observado por outros pesquisadores, o número de machos foi superior ao de
fêmeas (GALATI et al., 1996; OLIVEIRA et al., 2003 ; NUNES et al., 2008; DORVAL
et al., 2009). Essa espécie tem ampla distribuição geográfica em MS (GALATI et al.,
1996; BRAGA-MIRANDA; MIRANDA e GALATI, 2006; OLIVEIRA, A.G et al., 2006;
NUNES et al., 2008; ANDRADE et al., 2009; DORVAL et al., 2009; ALMEIDA et al.,
2010a;b).
Em algumas regiões do Brasil, México e Estados Unidos têm-se registros de
sua atividade antropofílica (VEXENAT et al., 1986; CRUZ-RUIZ et al., 1994; GALATI
et al., 1996; MASCARI, 2005) e é considerada importante vetora de arboviroses
(COMER et al., 1990).
Existem relatos sobre sua infecção natural por flagelados (QUEIROZ et al.,
1994), e ainda, por formas indistinguíveis de Leishmania de origem humana
(ROWTON et al., 1991). A esta espécie também é atribuída a veiculação de
Endotrypanum schaudinni, um tripanossomatídeo de preguiças (Choloepus
juruanus) (FRANCO e GRIMALDI JR, 1999). Estudos experimentais com cães
infectados por Le. infantum mostraram a capacidade de Pa. shannoni se infectar, o
que sugere a possibilidade de sua participação na veiculação dessa espécie de
Leishmania (TRAVI et al., 2002).
No município de Dourados (MS), já foram encontrados espécimes
naturalmente infectados e positivos para Leishmania pela análise de PCR (SANTOS,
2010).
31
Uma vez que a espécie tem apresentado comportamento antropofilico nas
diversas regiões em que vem sendo detectada, fazem-se necessários estudos sobre
a sua capacidade vetorial para Leishmania.
Lu. longipalpis foi a terceira espécie mais frequente e capturada em todos os
ambientes amostrados. A esta espécie é atribuída a transmissão de Le. (Le.)
chagasi nas Américas (LAINSON e SHAW, 2005). Tem ampla distribuição
geográfica em MS, sendo encontrada em áreas de cavernas e florestas da Serra da
Bodoquena, como também em áreas urbanas do estado (GALATI et al., 2003a;b;
2006; OLIVEIRA, A.G et al., 2006; NUNES et al., 2008; DORVAL et al., 2009;
ALMEIDA et al., 2010a;b; CARVALHO, G.M.G et al., 2010).
Em Águas do Miranda, é possível que a essa espécie seja atribuída a
transmissão de LV na população canina, que mostrou 40% dos animais amostrados
sororreagentes para Leishmania. O parasito isolado a partir de cães com LVC foi
identificado pela PCR como Le. (Le.) chagasi (dados não publicados). Esses
resultados aliado ao fato de que a LVC precede a LV humana recomenda a
implementação de medidas preventivas contra a parasitose naquela região.
Lu. longipalpis foi encontrada em ambientes antrópicos com criação de
animais, o que é habitual em outros ambientes urbanizados onde ocorre a LV e a
LVC (LAINSON e SHAW, 2005, PAIVA et al., 2010). Estudos referentes ao hábito
alimentar desta espécie concluíram que a galinha representa um papel importante
na sua peridomicialiação, pois Lu. longipalpis tem mais propensão a se alimentar em
aves do que em outros animais (AGUIAR; VILELA e LIMA, 1987; DIAS; LOROSA e
RÊBELO, 2003).
Lu. longipalpis apresentou maior densidade populacional nos meses
chuvosos, sendo o mesmo observado na área urbana de Bonito (MS) (NUNES et al.,
2008). O contrário ocorreu com Ny. whitmani que predominou nos meses mais secos
e frios, com picos em julho e agosto, com exceção de maio e junho, resultados
esses semelhantes aos registrados em Corguinho por Galati et al. (1996) e no Rio
de Janeiro por Souza et al. (2002). Pa. shannoni se comportou praticamente da
mesma forma que Ny. whitmani, porém seu pico ocorreu no mês de novembro.
Importante ressaltar que no mês de fevereiro houve uma grande enchente, e
foi feita a limpeza do galinheiro da chácara onde era instalada a armadilha A7,
32
provavelmente isto possa explicar o baixo número de espécimes capturados após o
pico chuvoso (Figura 5).
É fato que as condições climáticas contribuem para o ciclo de vida dos
flebotomíneos. Alguns pesquisadores apontam uma correlação significativa da
precipitação e umidade na densidade populacional desses insetos, entretanto, a
temperatura não influencia da mesma forma, assim como foi observado no presente
estudo (BARATA et al., 2004; DIAS et al., 2007).
Nesta pesquisa, observa-se que de março a outubro, período aberto à pesca
em Águas do Miranda, Ny. whitmani apresentou quatro picos de densidade
populacional, abril, julho, agosto e outubro, o que pode refletir risco de transmissão
de LT para a população local e turistas que praticam a pesca naquela região. Porém
baixo risco de transmissão de LV, uma vez que no mesmo período foi observado
baixa densidade populacional para Lu. longipalpis (Figura 5).
Ny. neivai já foi assinalada em baixa densidade em MS, nos municípios de
Aquidauana, Bataguassu, Bonito, Brasilândia, Santa Rita do Rio Pardo, Três
Lagoas, Terenos e Dourados (ANDRADE-FILHO; GALATI e FALCÃO, 2007;
FERREIRA-JUNIOR et al., 2007; ALMEIDA et al., 2010b). No presente estudo sua
presença foi expressiva em abrigo de animais, seguida de áreas de mata e
peridomícilio. Essa espécie é considerada antropofílica (GALATI et al., 2010) e já
possui relatos de sua infecção natural por diferentes espécies de Leishmania
(MARCONDES et al., 2009; SARAIVA et al., 2009; OLIVEIRA et al., 2011). Nas
regiões Sul e Sudeste do Brasil é incriminada como responsável pela transmissão
de Le. braziliensis (RANGEL e LAINSON, 2003). Trabalhos realizados na região
noroeste do Paraná relataram que a preferência alimentar de Ny. neivai se dá de
acordo com a disponibilidade de hospedeiros, o que sugere ecletismo alimentar
dessa espécie (DIAS-SVERSUTTI et al., 2007).
O “Complexo cortelezzi” compreende as espécies Ev. corumbaensis, Ev.
sallesi e Ev. cortelezzi e foi assim denominado pelo fato destas espécies serem
morfologicamente muito semelhantes. No presente trabalho foi possível verificar a
presença desse complexo em áreas de matas, peridomícilios e galinheiro. As
espécies desse complexo possuem hábito alimentar desconhecido e em outros
trabalhos realizados em MS foram observadas em cavernas, florestas, cerrado,
peridomicíclios e áreas urbanas (GALATI et al., 1997, 2003b; 2006; OLIVEIRA et
33
al., 2003; NUNES et al., 2008; DORVAL et al., 2009). Trabalhos recentes relatam a
infecção natural por flagelados em espécies desse complexo (CARVALHO et al.,
2008; SARAIVA et al., 2009 ANDRADE et al., 2011), o que sugere a necessidade de
estudos mais aprofundados em relação às mesmas, tendo em vista a atual
permissividade dos flebotomíneos quanto à infecção por Leishmania sp. (GALATI et
al., 2003a; SAVANI et al., 2009; GALATI, 2010).
Ev. lenti esteve representada em maior número nas áreas de matas e
cerrado. Foi encontrada nesses mesmos tipos de ambientes por Galati et al. (1996)
e Dorval et al. (2009). Esta espécie tem sido capturada também em áreas urbanas
(OLIVEIRA et al., 2003; ANDRADE et al., 2009) o que demonstra sua adaptação a
ambientes modificados. No estado de Góias suspeita-se de atuar como vetora de LT
(MARTINS et al., 2002).
Br. avellari e Br. brumpti estiveram presentes em baixa densidade em todos
os ambientes amostrados. Estas espécies pertencem a grupos que habitam tocas de
dasipodídeos (DAMASCENO; AROUCK e CAUSEY, 1949) que são comuns nesses
ambientes. Em outras áreas de mata em MS estas espécies mostraram-se
abundantes (DORVAL et al., 2009).
Pa. aragaoi e Pa. hermalenti apresentaram percentual baixo e se
comportaram da mesma forma que as espécies do gênero Brumptomyia.
Pa. campograndensis teve baixo índice de abundância e foi capturada em
peridomicílios e abrigos de animais. Em MS já foi reportada em florestas e cavernas
(GALATI et al., 2003b; 2006) e em matas periurbanas. Pouco se sabe sobre seu
comportamento (OLIVEIRA et al., 2003).
Pa. punctigeniculata foi capturada em ecótopos de mata e galinheiro, e há
relatos que apontam para a sua antropofilia (GALATI et al., 1996; 2001).
Ev. termitophila foi inexpressiva, sendo capturado apenas um exemplar em
abrigos de animais. Em áreas urbanas essa espécie foi abundante em galinheiro
(OLIVEIRA et al., 2003).
Mi. quinquefer e Sc. sordellii foram pouco frequentes, possuem
labroepifaringe muito curta e se alimentam de animais de sangue frio (GALATI,
1990).
34
7 CONCLUSÕES
A localidade estudada revelou uma fauna flebotominea diversificada, com 16
espécies, algumas delas comprovadamente vetoras de leishmanioses nas Américas,
Lu. longipalpis e Ny. whitmani, e espécies que já foram descritas naturalmente
infectadas, podendo atuar como permissivas, Ny. neivai, Pa. shannoni e aquelas do
“Complexo cortelezzii”.
A maior frequência e riqueza das espécies de flebotomíneos capturadas
ocorreram em ambientes com ação antrópica, fator importante no processo de
domiciliação desses insetos.
A predominância de Ny. whitmani em galinheiro próximo a uma mata nativa
demonstrou que esta espécie teve uma estreita relação com ambiente silvestre e
antrópico, onde a mata serviu de abrigo e o galinheiro a fonte de alimentação e
criadouro desses insetos. Também se deve alertar para o fato dessa espécie ter sido
capturada com infecção natural por flagelados.
A expressiva densidade populacional de Ny. whitmani de março a outubro,
sugere risco de transmissão de LT para a população local e turistas que praticam a
pesca naquela região.
Lu. longipalpis foi capturado em todos os ambientes amostrados e pode ser o
vetor responsável na transmissão de Le. chagasi na população canina do distrito,
que em pesquisa realizada no ano de 2009, mostrou 40% dos animais domésticos
sorreagentes para Leishmania e o parasito isolado pela técnica de PCR foi Le.
chagasi.
O encontro de um espécime de Pa. shannoni naturalmente infectado por
flagelados, em galinheiro próximo a mata, reflete a necessidade do esclarecimento
sobre sua importância epidemiológica na transmissão de leishmanioses, visto que
trata-se de uma espécie com atividade antropofílica.
Deve-se alertar a população água-mirandense sobre a importância das
leishmanioses e a necessidade de saneamento ambiental, principalmente no que diz
respeito aos abrigos de animais que demonstraram fornecer condições favoráveis
35
para a proliferação, manutenção e amplificação de criadouros de flebotomíneos,
elementos indispensáveis na transmissão vetorial dessas importantes endemias.
36
REFERÊNCIAS
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