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8/3/2019 União Estável -Álvaro Villaça http://slidepdf.com/reader/full/uniao-estavel-alvaro-villaca 1/29 UNIÃO ESTÁVEL ( Jurisprudência, evolução legislativa e novo Código Civil)  Sumário : 1.- Espécies e conceito de concubinato.2 ± Orientação da Jurisprudência após a Constituição de 1988. 3 - Análise da Lei 8.971/94 (primeira regulamentação da união estável). 4 ± Análise da Lei 9.278/96 ( segunda regulamentação da união estável ). 5 ± União Estável no novo Código Civil. 6 ± Meu entendimento conclusivo. por: ÁLVARO VILLAÇA AZEVEDO, Doutor em Direito, Professor Titular de Direito Civil , Regente de Pós- Graduação e ex-Diretor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo - USP; Professor Titular de Direito Romano, de Direito Civil e ex- Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, em São Paulo; Professor Titular de Direito Romano e Diretor da Faculdade de Direito da Fundação Armando Alvares Penteado ± FAAP, em São Paulo;  Advogado e ex-Conselheiro Federal e Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil, Parecerista e Consultor Jurídico.  1 ± Espécies e conceito de concubinato.  

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UNIÃO ESTÁVEL 

( Jurisprudência, evolução legislativa e novo Código Civil) 

Sumário : 1.- Espécies e conceito de concubinato.2 ± Orientação daJurisprudência após a Constituição de 1988. 3 - Análise da Lei8.971/94 (primeira regulamentação da união estável). 4 ± Análise daLei 9.278/96 ( segunda regulamentação da união estável ). 5 ± UniãoEstável no novo Código Civil. 6 ± Meu entendimento conclusivo.

por: ÁLVARO VILLAÇA AZEVEDO, Doutor em Direito, Professor Titular deDireito Civil, Regente de Pós-Graduação e ex-Diretor da Faculdadede Direito da Universidade de SãoPaulo - USP; Professor Titular deDireito Romano, de Direito Civil e ex-Diretor da Faculdade de Direito daUniversidade Mackenzie, em SãoPaulo; Professor Titular de DireitoRomano e Diretor da Faculdade deDireito da Fundação Armando AlvaresPenteado ± FAAP, em São Paulo;

 Advogado e ex-Conselheiro Federal eEstadual da Ordem dos Advogados doBrasil, Parecerista e Consultor Jurídico. 

1 ± Espécies e conceito de concubinato. 

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   A classificação primitiva de concubinato puro eimpuro, por mim mostrada (Álvaro Villaça Azevedo, Do Concubinatoao Casamento de Fato, Ed. Cejup, Belém, 2ª ed., 1987), anteriormente à Constituição de 5.10.1988, nasceu pelaimpossibilidade de existir do casamento de fato, a partir do Decreto

181,

de 1890,

que secularizou o casamento,

só admitindo,

depoisdele, o casamento civil. Pelo casamento de fato, que existiu na antigüidade e

especialmente, depois, no Direito Romano (usus), e, ainda, nasOrdenações do Reino de Portugal (casamento clandestino ou de fato), bastava a vida em comum ³more uxorio´ (como marido e mulher), paraque existisse o casamento. 

Com a criação do casamento civil, quem se separasse judicialmente (à época desquite, hoje separação judicial), não

podendo contrair novo matrimônio, constituía novo lar , de fato. Essa relação concubinária, já que o vínculo matrimonial

persistia após essa separação, até o advento do divórcio, com a Lei6.515 de 26 de dezembro de 1977, considerei-a pura, por que nãoadulterina e não incestuosa. E continuou existindo, como sempre, oconcubinato impuro (adulterino e incestuoso). 

O concubinato puro é, portanto, uma uniãoduradoura, sem casamento, entre homem e mulher , constituindo-se afamília de fato, sem detrimento da família criada pelo casamento.Como acontece, por exemplo, na união entre solteiros, entre viúvos, entre separados judicialmente ou de fato ( neste caso, cessam osefeitos decorrentes do casamento). O concubinato, nesse caso, puro, foi denominado união estável pela Constituição Federal de 1988 ( art.226). 

2.- Orientação da Jurisprudência após a Constituição de 1988 

 Antes de editada a Constituição Federal de 5.10.88, emais remotamente, a Jurisprudência negava quaisquer direitosdecorrentes da relação concubinária. 

Depois, passou a Jurisprudência a conceder indenização à concubina, por serviços domésticos prestados a seucompanheiro. 

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  Finalmente, com fundamento, entre outros, no art.1.363 do Código Civil de 1916 ( hoje, art. 981 do novo Código ), editou-se a Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal, do teor seguinte: ³Comprovada a existência de sociedade de fato entre osconcubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do

patrimônio adquirido pelo esforço comum´. Por ela,

considerou-se,

deum lado o concubinato, de outro a sociedade de fato entreconcubinos. 

Como visto, referido princípio sumulado criou, emnosso direito de família, a ³teoria da sociedade de fato´, exemplo doque ocorreu na jurisprudência francesa. 

Desse modo, não bastava a prova da vida concubináriapura, mas a existência de sociedade de fato entre os concubinos, para justificar-se a partilha de seus bens. 

O intuito foi, mesmo, de mostrar a necessidade de umaparticipação extra-concubinária, na aquisição patrimonial, a títulooneroso (não gratuito). Caso contrário, não haveria de fazer-se essadiferenciação entre sociedade concubinária e de fato, pois esta últimapode ocorrer , independentemente de relação familiar , com o somatóriode esforços e/ou recursos para a obtenção de fins comuns, numasociedade civil ou comercial. 

Malgrado esse entendimento da necessidade decolaboração da concubina, para o aumento do patrimônio do casalconcubinário, com uma visão muito mais econômica do que pessoal, aConstituição Federal de 1988 contribuiu para uma interpretação mais justa nas relações concubinárias. 

 Assim, o enunciado da Súmula 380 do SupremoTribunal Federal, com a evolução jurisprudencial ocorrida nessa mais Alta Corte de Justiça, entendeu-se como harmonizado com aorientação consagrada pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme sepercebe por julgados deste, desde sua instalação, que se deu por obra do legislador constituinte. Destaque-se que, por essa evolução, 

se começou a admitir a contribuição indireta para a formação dopatrimônio dos concubinos. Julgou-se, então, reiteradas vezes, no Superior 

Tribunal de Justiça, que a participação, para a formação do patrimôniocomum, não necessita de existir com contribuição em dinheiro, materialmente, mas pode consistir na realização de trabalhos noâmbito doméstico, de cunho eminentemente pessoal. 

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  Destaque-se, nesse ponto, importante decisão doSuperior Tribunal de Justiça, de 21.8.90, por sua 3ª Turma, sendoRelator o Ministro Cláudio Santos (Boletim da AASP 1766, de 28.10 a3.11.92, pp. 407 a 414), em que se reconheceu a ³contribuição indiretapara a formação do patrimônio do casal´ e a ³inexistência de dissídio

com a Súmula nº 380/STF´,

com a conseqüente partilha de bens entreos concubinos. Em excelente pesquisa, nesse aludido julgado, quanto

ao entendimento de nossa Corte Suprema, aponta o mesmo MinistroCláudio Santos, em seqüência, que ³apenas o Ministro Leitão de Abreu se posicionou favorável à presunção da sociedade de fato, quando provada a vida µmore uxorio¶, admitindo, em conseqüência, odireito à partilha dos bens adquiridos durante o concubinato (RT540/219).´ 

Menciona-se,

ainda,

nesse acórdão sob análise,

 decisão da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Riode Janeiro, na Apelação Cível 3.600/88, sendo Relator oDesembargador Carlos Alberto Menezes Direito, em que sereconheceu a união estável acolhida, constitucionalmente, comoentidade familiar , sendo certo que, provada essa união, ³pela longaconvivência comum é cabível a meação dos bens adquiridos naconstância desta´. 

Lembra, então, nesse passo, o Ministro Cláudio Santosque foi relator desse último citado caso, destacando: ³O tema em si, não foi abordado, eis que não conhecido o recurso, porém, em meuvoto fiz as seguintes considerações, inclusive, transcrevendo trechodo brilhante voto do relator na instância ordinária: µNo que tange àcontrariedade ao artigo 1.363 do Código Civil, a versar sobre acelebração do contrato de sociedade, não demonstrada está aviolação, tanto mais que não cogitou a decisão desse tipo desociedade mas sim dos efeitos da união estável, com a aparência decasamento¶. Efetivamente, é a seguinte a fundamentação do acórdão, na lavra do Des. Carlos Alberto Menezes Direito: µÉ certo que ainterpretação construtiva que buscou escólios no artigo 1.363 do

Código Civil,

tende necessariamente a encontrar ampraro no fatonatural da vida em comum, deslocando-se do cenário meramenteeconômico¶. Como anota Álvaro Villaça Azevedo, µlitteris¶: µMesmo aadmitir-se, com a citada Súmula nº 380, que é indispensável o µesforçocomum¶ dos concubinos nessa formação de seu patrimônio, há queentender-se esse esforço em sentido amplo, pois, nem sempre eleresulta de natureza econômica, podendo implicar estreita colaboração

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de ordem pessoal, às vezes de muito maior valia¶ (cfr. Do Concubinatoao Casamento de Fato, CEJUP, 2ª ed., pág. 80).´ 

Muitos outros julgados, além dos já citados, vêmsurgindo sem a exigência do exercício do trabalho remunerado da

companheira,

ao tempo da aquisição patrimonial pelo companheiro,

 como assentado no REsp 361-RJ (DJ 30.10.89, 4ª Turma, Relator Ministro Fontes de Alencar). 

Tenha-se presente exemplar acórdão da 2ª CâmaraCivil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em 17.12.91, sendo Relator o Desembargador Cezar Peluso (Boletim da AASP1765, de 21 a 27.10.92, p. 396), em que se entendeu que, ³Adquiridopatrimônio durante a união estável, sujeita aos princípios jurídicos dodireito de família, têm os concubinos, ou ex-concubinos, direito àpartilha, ainda que a contribuição de um deles, em geral da mulher , 

não haja sido direta,

ou pecuniária,

senão indireta,

a qual tanto podeestar na direção educacional dos filhos, no trabalho doméstico, ou emserviços materiais doutra ordem, como na ajuda em termos de afeto, estímulo e amparo psicológico.´ 

Como restou evidenciado, até este ponto de minhaexposição, há um ano e meio, aproximadamente, da edição do textoconstitucional vigente, em meu citado livro (Do Concubinato aoCasamento de Fato), defendia eu a necessidade de inserir-se oconcubinato puro sob proteção da Lei Maior e de admitir-se apresunção de condomínio dos bens adquiridos onerosamente naconstância do concubinato pelo esforço dos concubinos, fosse decaráter econômico (material) ou pessoal (imaterial, espiritual). 

Ressalte-se, neste passo, o texto do art. 10, propostoem meu esboço de Anteprojeto (p.281 da aludida monografia -1ªedição de 1986 e 2ª edição de 1987 - e p. 27, do nº 4 desta RevistaLiterária de Direito): ³Patrimônio - Os bens móveis e imóveis, adquiridos por um ou por outro ou por ambos os concubinos, naconstância do concubinato e a título oneroso, são considerados frutodo trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, 

em condomínio,

e em partes iguais,

salvo estipulação contratualescrita, em contrário´. Com a edição da Lei 9.278/96, que instituiu, entre nós, 

o Estatuto dos Concubinos, minha posição doutrinária ficouconsolidada, desaparecendo a razão de ser , em matéria de direito defamília, de diferenciar entre concubinato puro e sociedade de fato, pois a simples convivência concubinária pura, nos moldes dessa

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legislação, assegura aos conviventes o direito de propriedade, emigualdade de condições, sobre os bens adquiridos, onerosamente, naconstância do concubinato, salvo prova escrita em contrário. Comoadiante será demonstrado, esse mesmo entendimento está presenteno novo Código Civil. 

3.- Análise da Lei 8.971/94 (primeira regulamentação da uniãoestável) 

Com a edição da Lei nº 8.971, de 29.12.1994, regulou-se o "direito dos companheiros a alimentos e à sucessão". 

O art. 1º, dessa lei, concedia à companheira ou aocompanheiro, na união estável (concubinato puro), após a

convivência de cinco anos ou a existência de prole,

o direito aalimentos, nos moldes da Lei nº 5.478, de 25.07.1968, "enquanto nãoconstituir nova união e desde que prove a necessidade". 

Confesso que, em princípio e pelo meu Esboço de Anteprojeto de "Estatuto dos Concubinos", não fui favorável àconcessão de direito a alimentos entre conviventes, a não ser quandocontratados, por escrito. 

 Acontece que já existia uma tendência jurisprudencial àconcessão desses alimentos, após a edição da Constituição de 1988;

talvez, por essa, em seu art. 226, em seu § 3º, recomendar que a leifacilite a conversão da união estável em casamento. 

Desse modo, concedendo direito alimentar aosconviventes, reconheceu a lei, sob cogitação, os mesmos direitos edeveres, existentes entre cônjuges, constantes da Lei de Alimentos, nº5.478, de 1968. 

Todavia, entre os conviventes, esse direito-dever alimentar surgia, tão somente, após o decurso do prazo de cinco anosou o nascimento de filho. 

O dispositivo, sob análise, estabeleceu que opostulante de alimentos comprovasse a necessidade destes; nãosendo, portanto, à época, automática a aquisição desse direitoalimentar. Estabeleceu, ainda, causa de cessação dessepensionamento, com a constituição, pelo alimentando, de nova união, fosse concubinária ou matrimonial. 

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  Porém, esse art. 1º não mencionava a hipótese de maucomportamento do convivente alimentando, que é prevista, corretamente, pela Jurisprudência, como causa de perda da pensãoalimentícia. Não é correto que o convivente, que se entregue a mauscostumes, como a prostituição, por exemplo, continue a receber 

alimentos de seu companheiro. 

Também não entendo que seja justo que o conviventeculpado da rescisão do contrato concubinário, seja escrito ou não, possa pleitear alimentos do inocente. 

 Ao seu turno, o art. 2º, da lei sob comentário, cuidavado direito sucessório dos conviventes, nos parâmetros, mencionadosem seus três incisos. Os dois primeiros reeditavam o preceituado noparágrafo 1º do então vigente art. 1.611 do Código Civil, de 1916, quetratava de iguais direitos, mas do cônjuge viúvo, que era casado sob

regime de bens diverso do da comunhão universal (usufruto vidual). Entendia não conveniente essa reafirmação, para os

conviventes, do aludido direito a usufruto, pois, na prática, eleestorvava o direito dos herdeiros. Melhor seria tornar o conviventesobrevivo herdeiro, adquirindo sua parte na herança concorrendo comos aludidos filhos "loco filiae" ou "loco filii", conforme o caso (comofilha ou filho), como considerou o novo Código Civil, em seu art. 1.790. Assim, por exemplo, a (o) sobrevivente, concorrendo com dois filhos, receberia cota da herança correspondente a um terço, ficando cadaqual com o seu, sem o atrapalho do usufruto, gravando direito dosfilhos herdeiros. 

Nem para os cônjuges, ao meu ver , deve existir essaespécie de usufruto, pois cria enorme transtorno no relacionamentodos herdeiros-filhos ou netos, que vêem obstado seu pleno exercícioproprietário, pelo usufruto existente em seus bens, em favor de seuspais ou seus avós. 

Pelo novo Código Civil, podemos dizer que o usufrutovidual foi substituído, integralmente, pela concessão de cota-parte da

herança ao cônjuge sobrevivo,

solução de alta praticidade e de justiça.Também o companheiro é acrescentado no texto desse Código. Tudo, conforme arts. 1.829, incisos I e II, e 1.790, incisos I a IV. 

Destaque-se, ainda, quanto ao inciso III, do artigo 2º, da Lei 8.971/94, ora comentada, em plena vigência,até o advento donovo Código Civil, no tocante ao direito sucessório, que ele concediadireito ao (à) companheiro (a) sobrevivente sobre a totalidade da

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herança do falecido, quando este não deixasse descendentes eascendentes. Atualmente, pelo inciso IV do art. 1.790 do novo CódigoCivil, o (a) companheiro (a) participará da sucessão do outro, recebendo a totalidade da herança, quando não houver parentessucessíveis. 

Nessa hipótese de sucessão hereditária, entendiaque o companheiro ficou com mais direitos do que o cônjuge, poisaquele que, em vida de seu convivente, em caso de rescisão docontrato de união estável, tinha só direito à partilha dos bensadquiridos, onerosamente, na constância concubinária, e emigualdade de condições, salvo disposição expressa em contrário, emcaso de sucessão, na qualidade de herdeiro necessário, receberiatodos os bens do convivente morto, inclusive os adquiridos a títulogratuito, incluindo, ainda, os bens adquiridos pelo falecido antes darelação concubinária. Tudo em detrimento dos herdeiros colaterais. 

 Ante o citado texto do inciso IV do art. 1.790, o (a)companheiro (a) só terá direito à totalidade da herança, se o falecidonão deixar parentes na linha sucessória, inclusive os herdeiroscolaterais. 

Por sua vez, o artigo 3º da lei sob foco,revogado, emcaso de sucessão por morte, concedia direito à metade dos bensadquiridos pelos concubinos, ao sobrevivente, quando esse patrimônioresultasse de ³atividade em que haja colaboração´ deste último.Cuidava-se, nesse caso, portanto, de meação e não de herança. 

Todavia, não esclarecendo sobre que espécie decolaboração devesse considerar-se, acabava esse artigo por reeditar o preceituado na Súmula nº 380 do Supremo Tribunal Federal(³Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônioadquirido pelo esforço comum´). Por essa mesma Súmula exige-se acomprovação de sociedade de fato, entre os concubinos, e a prova daaquisição do seu patrimônio, por esforço comum, de naturezaeconômica. 

 Ante esse artigo 3º, sob comentário, revogado, cogitava-se da sucessão por morte de concubino, quando existissemherdeiros necessários (descendentes ou ascendentes), situação emque, sobre a aludida herança, teria o concubino sobrevivente direito àmetade do que ajudou a adquirir , salvo estipulação escrita, emcontrário. Essa ajuda é presumida, quanto aos bens adquiridosonerosamente, na constância da união; pois, como visto, a Súmula nº

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380 do Supremo Tribunal Federal foi revogada pela Jurisprudência doSuperior Tribunal de Justiça, e, ainda, se alguma dúvida pairasse, pelodisposto no artigo 5º da Lei nº 9.278/96, adiante comentada, emborarevogada pelo novo Código Civil, que cuidou inteiramente da matériasobre união estável. 

4.- Análise da Lei 9.278/96 (segunda regulamentação da uniãoestável) 

 A Lei nº 9.278, de 10 de maio de 1996, queregulamentava o parágrafo 3º do artigo 226 da Constituição Federal, de 05 de outubro de 1988, reconhecia, em seu artigo 1º, como familiar , como união estável ou concubinária propriamente, a convivênciaduradoura, pública e contínua, de um homem e de uma mulher , estabelecida com objetivo de constituição de família. 

Na verdade, o artigo, em pauta, regulava a uniãoestável ou concubinária, pois a expressão entidade familiar é maisampla, pois o parágrafo 4º, do art. 226, da Constituição Federal, a elase refere, também, como a comunidade formada por qualquer dospais e seus descendentes. Aqui, não existe a presença do casalconcubinário. 

Tanto é verdade que, no parágrafo 3º do citado artigodo texto constitucional, o legislador se refere à união estável entre ohomem e a mulher , como entidade familiar. 

Essa modificação terminológica ocorreu no Projeto doSenado, pois, no da Câmara dos Deputados, como visto, constava aexpressão união estável (³Considera-se união estável o concubinatomore ux orio...´) 

Fica clarividenciado, ainda, que o comentado art. 1º, sob exame, não reconhecia a união entre o mesmo sexo, como apta areceber a proteção do Estado, como órgão familiar , embora existaprojeto da então Deputada Marta Suplicy, nesse sentido. 

Tenha-se presente que esse mesmo art. 1º nãoestabeleceu prazo certo para a existência da união estável, devendo, é óbvio, em cada caso, verificar-se se, realmente, existia essa espéciede casamento de fato, pela posse recíproca dos concubinos, comintuito de formação do lar , desde que a convivência fosse duradoura, ademonstrar a existência da família. 

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  Destaque-se, mais, que esse artigo, sob foco, nãoaludia, expressamente, à união estável, pura, ou seja, não incestuosae não adulterina, a qual, inegavelmente, foi objeto de suaregulamentação. 

É certo que o parágrafo 3º,

do art. 226 da ConstituiçãoFederal, também, não especifica nesse sentido; contudo, ambos osdispositivos legais apontam o objetivo de constituição familiar , o queimpede que exista concubinato impuro (contra o casamento pré-existente de um dos concubinos ou em situação incestuosa) ouconcubinato desleal (em concorrência com outro concubinato puro). 

Desponta, nítido, o conceito de união estável, traçadonesse artigo 1º, como pudemos observar. Por ele, desse modo, aunião estável é a convivência duradoura, pública e contínua, de umhomem e de uma mulher , para a constituição de uma família de fato.

Mais completo o conceito do art. 1.723 do novo Código Civil,

adianteanalisado. 

 Ao seu turno, o artigo 2º, dessa mesma lei, enumeravaos direitos e deveres iguais dos conviventes, tais o respeito e aconsideração mútuos (inciso I), a assistência moral e materialrecíproca (inciso II), a guarda, o sustento e a educação dos filhoscomuns (inciso III).Esses deveres com melhor redação e de modomais sucinto, apresentam-se no art. 1.724 do novo Código Civil, diantecogitados. 

Os direitos e deveres mencionados nos incisos I e IIsão recíprocos, demonstrando-se não só no tratamento íntimo dosconviventes, mas também em seu relacionamento social. 

 Assim, podem ser descumpridos os deveres derespeito e de consideração, quando existe conduta injuriosa grave deum dos conviventes, atingindo a honra ou a imagem do outro, compalavras ofensivas, com gestos indecorosos ou com deslealdade. 

Por outro lado, a assistência moral é de suma

importância,

principalmente,

na atualidade,

em que as pessoas poucose comunicam no lar , descuidando do companheiro, sem diálogo esem considerá-lo, em verdadeiro estado de abandono moral. É a vidade um convivente, como se o outro não existisse. 

Já a assistência material mostra-se no âmbito dopatrimônio, dos alimentos entre conviventes, principalmente. Nesse

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passo, a mesquinharia, a sovinice, a avareza configuram, certamente, injúria de caráter econômico. 

Tanto o dever de assistência material, quanto imaterial, dos companheiros, estão previstos no aludido inciso II do artigo 2º sob

análise,

expressamente. Nenhuma dúvida,

portanto,

de que devam ser respeitados pelos conviventes, também por que são repetidos no novoCódigo Civil. 

Os direitos e deveres mencionados no inciso III, dodispositivo legal sob análise, são dos conviventes em relação a seusfilhos comuns. A guarda dos filhos tem a ver com a posse que seuspais, em conjunto ou isoladamente, em caso de sua separação, exercem, em decorrência de seu poder-dever familiar (antigo pátriopoder). O sustento são os alimentos materiais indispensáveis àpreservação da subsistência e da saúde, bem como os relativos à

indumentária. A educação são os alimentos de natureza espiritual,

 imaterial, incluindo, não só o ensinamento escolar , como os cuidadoscom as lições, no aprendizado, no âmbito familiar e de formação moraldos filhos. 

Quanto ao artigo 3º, embora tenha sido vetado, seráobjeto de análise, com o texto do último projeto de lei da Câmara (nº1.888-F/91), para melhor entendimento global da lei ora analisada. 

Esse artigo referia-se a contrato escrito de quepoderiam valer-se os conviventes, para regular seus interesses(direitos e deveres), principalmente de ordem patrimonial. Poderiamestabelecer , por exemplo, regras quanto a seus bens, considerando, como particulares, alguns ou todos os bens adquiridos na constânciaconcubinária, prevendo, de modo genérico, seu destino patrimonial, em condomínio ou em estado de separação parcial ou total. 

Malgrado o veto desse artigo 3º, não estavam obstadosos companheiros, como nunca estiveram, e atualmente não estão, deprogramar o regime de seu patrimônio, como podem os cônjuges, nocasamento, pactuar seu regime de bens (pacto antenupcial). 

Como a união estável é situação de fato, esse contratoescrito pode ser feito a qualquer tempo; o mesmo não ocorre com ocasamento, em que o pacto é anterior a este e imutável. 

Também como veremos ao analisar , adiante, o artigo5º da lei, em foco, ele admitia, expressamente, a possibilidade de

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realização de contrato, por escrito, entre os companheiros, comopossibilita o art. 1.725 do novo Código Civil. 

Podem os conviventes, livremente, ainda, assegurar , pelo contrato, outros direitos e deveres, entre si e com relação a seus

filhos,

existentes ou futuros,

outras hipóteses de pensionamento e deseguros; entre outras situações. Logicamente, e como assentado nesse vetado art. 3º, 

as normas contratadas não podiam contrariar o preceituado nessa leiemergencial, as normas de ordem pública relativas ao casamento, osbons costumes e os princípios gerais de direito. Como aconteceatualmente. 

 A presente lei estabelecia certos parâmetros, emdefesa dos concubinos, para que, em sua liberdade convivencial, não

ofendessem direitos,

um do outro,

colocando em risco a estabilidadeda família brasileira. Contendo algumas normas de ordem pública, como as relativas ao casamento, não podem ser modificadas pelaspartes, sendo cogentes, portanto. As normas dispositivas, ao seuturno, autorizam essas alterações, expressamente, como também asque se apresentam em caráter facultativo. No artigo sob análise, sugeria-se que ³os conviventes poderão´ realizar contratos. Estáimplícito que não são obrigados os concubinos à realização dessascontratações convivenciais; pois, na ausência da convenção, a leiassegurava a proteção indispensável, para que se evitassem lesõesde direito. E, por força do citado artigo 5º da mesma lei,os conviventescontinuavam podendo realizar contratos, como podem, ainda hoje, ante o art. 1.725 do novo Código Civil. 

Vê-se nítida a preocupação do legislador , nesse artigo, de impedir qualquer ofensa às normas reguladoras do casamento civil;por que são cogentes. 

Quanto aos bons costumes e aos princípios gerais dedireito, devem ser eles preservados em qualquer contratação, inclusive e, principalmente, no âmbito do Direito de Família. 

Mesmo com o veto desse artigo, repita-se, nãoestiveram, como não estão atualmente, os conviventes impedidos derealizar contratos de convivência. 

O Presidente da República, Fernando HenriqueCardoso, certamente, ao vetá-lo, quis evitar muitas formalidadesprevistas na legislação, asseverando: ³a amplitude que se dá ao

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contrato de criação da união estável importa admitir um verdadeirocasamento de segundo grau, quando não era esta a intenção dolegislador , que pretendia garantir determinados efeitos a post eriori adeterminadas situações nas quais tinha havido formação de umaentidade familiar. Acresce que o regime contratual e as precauções

contratuais do projeto não mantiveram algumas das condicionantesque constavam no projeto inicial.´ Em verdade, a união estável não é um casamento de

segundo grau, ainda que regulado, quanto aos interessesconcubinários; é um resquício do casamento de fato, comodemonstrado historicamente (sua norma mais próxima, entre nós, édas Ordenações Filipinas). 

O contrato é um meio flexível para garantir osconcubinos, nesse mar de incertezas e de injustiças em que navegou

nossa Doutrina e nossa Jurisprudência. Minha idéia era a de que, mantido o Estatuto dos

Concubinos, fosse revogada, expressamente, a Lei nº 8971, de29.12.94, que nada mais fez do que conceder aos concubinos osmesmos direitos dos cônjuges, alí mencionados. 

Quanto ao veto, se tivesse nosso Presidente o intuitode proibir essas contratações, por completo, tê-lo-ia feito, expressamente. Ao invés, admitia a existência desse contrato escrito, na parte final do ³caput´ do art. 5º, e de seu § 2º, tal como admitidoatualmente no novo Código Civil ( art. 1.725). 

Não pretendeu, portanto, o Presidente FernandoHenrique Cardoso eliminar a contratação; preocupou-se em não criar uma nova espécie de concubinato, quando assenta: ³não se justifica aintrodução da união estável contratual nos termos do art. 3º,  justificando-se pois o veto em relação ao mesmo e, em decorrência, também, no tocante aos artigos 4º e 6º´. 

Em verdade, não se cuidou de criar espécie de

concubinato contratual,

pois todo ele nasce de um contrato verbal. Ocerto é que, não sendo escrito, ele não tem o alcance de proteção deque muitos concubinos necessitam. O contrato escrito dá a quemquiser e tiver muitos interesses, a tranqüilidade em seurelacionamento. Esse contrato já está arraigado no uso social, principalmente quando existe, em jogo, patrimônio de alto valor. 

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  Também, o art. 4º foi vetado, à época, sob a mesmaatrás mencionada justificativa, merecendo análise, entretanto, o textodo projeto final, referido. 

Esse artigo cuidava do registro do contrato de

convivência no Cartório do Registro Civil de residência de qualquer dos conviventes, com comunicação ao Cartório de Registro deImóveis, para averbação, caso integrassem a contratação bensimóveis de um ou de ambos os concubinos. 

 Assentava o dispositivo, sob estudo, que esse registropoderia ser feito, para que o contrato tivesse validade contra terceiros. 

Lembre-se de que esses contratos poderiam ser registrados para terem eficácia contra terceiras pessoas. Todavia, essas contratações têm força obrigatória entre os contratantes, 

independentemente de qualquer registro. Aliás,

como vinha e vemacontecendo. Há mais de vinte anos, venho elaborando esses

contratos para salvaguarda dos interesses dos meus clientes, tendoas avenças sido reconhecidas em juízo, inclusive para concessão dealimentos. Nessa longa experiência, em que firmavam essascontratações os concubinos e seus parentes e amigos, comotestemunhas, viram os conviventes esses contratos ser recusados nosregistros públicos, sob alegação de que eram ³casamento emescritório´; nulos, portanto. 

Essas avenças sempre foram válidas, por que, baseadas no art. 1363 do Código Civil, atualmente art. 981, comocontrato de sociedade, em que os conviventes declaram o somatóriodos esforços e/ ou recursos para o fim específico de criarem suafamília de fato. Também se utilizam das regras do condomínio, quando pretendem que a sociedade conceda direitos patrimoniais, discriminando os percentuais ideais de propriedade que devam existir etc. 

Valha,

então o princípio da obrigatoriedade doscontratos, que esteve expressamente consagrado no art. 928, doCódigo Civil de 1916(³pacta sunt servanda´). 

 Aliás, o art. 5º, analisado mostrava que até o legislador se fez sensível a esse aspecto patrimonial, estabelecendo normadispositiva no sentido de que, não havendo estipulação em contratoescrito, os bens móveis e imóveis, adquiridos, onerosamente, por um

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ou por ambos os concubinos, no período em que durar a uniãoestável, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, pertencendo a ambos, em condomínio e em partes iguais. Preceitosemelhante, no mesmo sentido, é o constante do art. 1.725 do novoCódigo Civil. 

Desse modo, se os concubinos, ao comprarem umimóvel, por exemplo, quiserem ressaltar direito de um maior do que odo outro, poderão mencionar na escritura pública ou no compromissoparticular , dessa aquisição, percentual diferente, como, exemplificativamente setenta por cento ideal do imóvel para um etrinta por cento para outro. Poderão, também de modo genérico, fazer contrato, programando toda a sua vida econômico-financeira, comopossibilitam, expressamente, os citados artigos. 

Veja-se, mais, que a presunção estabelecida nesses

artigos é ³iuris tantum´( e não ³iuris et de iure´),

pois admite prova emcontrário. Realmente, a união pode ser conturbada, de tal sorte, por um dos concubinos, que reste comprovada sua completa ausência decolaboração, como, por exemplo, a vida irresponsável, de má condutaou de prodigalidade; a de mero companheirismo, na relação aberta; apautada por vícios de embriaguez, de jogo etc. 

 Assim, o legislador presume a situação de condomínionatural ou de situação semelhante ao regime de separação de bens, no que couber , nessa aquisição de bens, como regra; todavia, paraque ocorram as referidas exceções, deverão ser elas provadas,  judicialmente. 

O § 1º desse mesmo artigo 5º estabelecia outra causade cessação da aludida presunção, qual a de que sejam os bensadquiridos na constância do concubinato, com o produto dos bensadquiridos anteriormente a este. 

Cuida-se, nesse caso, de subrogação real; uma coisanova substituindo a antiga. Suponhamos, por exemplo, que o bemantigo, anterior à convivência ou de propriedade exclusiva de um dos

conviventes,

seja vendido por 100 e que o novo seja adquirido por 200; nesse caso, a subrogação será no valor correspondente a 100, tão-somente. 

Esse mesmo espírito subsiste com o novo CódigoCivil. 

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  No § 2º desse art. 5º, estabelecia o legislador outrapresunção ³iuris tantum´, pois, embora a administração do patrimôniocomum dos conviventes fosse atribuída a ambos, poderiam estesdispor , diferentemente, conforme suas conveniências, em contratoescrito. Mais uma vez, nesse ponto, assegurado o direito dos

concubinos de regularem seus interesses por contratação escrita,

oque pode ocorrer presentemente. Se um dos conviventes perder a confiança depositada

no outro, quanto à administração do patrimônio comum, poderáinterpelá-lo, fazendo cessar o fenômeno dessa representação, pedindo prestação de contas. 

Embora vetado o art. 6º, entendo conveniente comentá-lo para que se tenha a noção completa do Estatuto dos Concubinos, como existiu entre nós. 

Esse art. 6º cuidava da dissolução da união estável, por vontade das partes, por morte de um dos conviventes, por rescisão oupor denúncia do contrato. Aliás, essas são causas de extinção doscontratos em geral, inclusive do contrato de casamento, regulado noCódigo Civil, por normas de ordem pública. 

Pela primeira hipótese, os conviventes extinguem aunião estável, amigavelmente e por escrito, estipulando, nesseacordo, o que for de seu interesse. Trata-se, nesse caso, de resiliçãobilateral ou distrato, por escrito, mediante transação (acordo), paraextinguir a relação concubinária, sem quebra dos preceitos legais.Esse acordo escrito é possível, mesmo que não tenha havido contratoescrito de concubinato (§ 1º). Essa situação existe, independentemente de lei. 

Exigia o vetado art. 6º, sob análise, se os conviventestivessem firmado contrato escrito de convivência e averbado emCartório, que qualquer dos concubinos deveria requerer a averbaçãodo acordo dissolutório da união estável (§ 2º). 

Sem essa exigência,

o contrato e o distrato que foremfirmados, atualmente, não necessitam constar de Registro Público. Essa falta de registro, para valer contra terceiros, 

produz clima de insegurança nos negócios, de alto risco para asociedade. Sim, por que, por exemplo, se um companheiro vende umbem imóvel do patrimônio concubinário, sem a assinatura de suaconsorte, ficará esta prejudicada, caso o terceiro, adquirente, esteja de

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boa fé. Supondo-se, é claro, que esse imóvel esteja registrado emnome do vendedor , tão-somente. 

Desse modo, se houvesse, nesse registro imobiliário aaverbação do contrato concubinário ou de declaração do estado

convivencial,

o terceiro adquirente não poderia alegar boa-fé. 

 A lei poderá, de futuro, mencionar , ainda, anecessidade de que os companheiros, sempre em negociações combens cadastrados, declarem, em conjunto ou isoladamente, seuestado concubinário, sob pena de cometimento de crime (de omissãoou de falsas declarações). 

No § 3º, seguinte, cuidava-se da rescisão, em caso deruptura da união estável por violação dos deveres constantes dessa leie do contrato escrito, se existir. 

Nesse caso de rescisão, tem-se em mira oinadimplemento culposo da regra legal ou contratada. Sim, por quenão há que falar-se em rescisão, sem que exista culpa do que aprovocou. 

 A ausência desse parágrafo, assim, em nada altera asituação presente, pois os deveres dos concubinos estão retratadosna lei, ou poderão constar , também, com outros, do contrato escrito. 

Havendo descumprimento culposo desses deveres, 

estará acarretada a ruptura da contratação, escrita ou verbal. Por outro lado, declarava o § 4º, vetado, que a

denúncia do contrato concubinário, escrito ou verbal, ocorria pelasimples separação de fato dos conviventes. Tal pode, ainda, acontecer , quando, sem culpa de qualquer deles, ocorrer ditaseparação. Sim, por que a denúncia é a resilição unilateral, autorizadapela lei ou pelo contrato, em que a parte exerce o direito de extinguir ocontrato, exercício de direito esse que não se coaduna com a idéia deculpa. Nesse caso, a denúncia ou resilição unilateral é imotivada, 

vazia,

pelo simples fato da separação,

sem qualquer cometimentoilícito, que possa ter dado causa à rescisão desse contrato. Sem esse dispositivo legal, haverá de perquirir-se se a

separação ocorreu por abandono injustificado do companheiro, o queconfigura quebra de dever assistencial, previsto no inciso II, do art. 2º, desta analisada lei, bem como do atual art. 1.724 do novo Código,ouse o abandono foi justificado ou a deixa do casal concubinário foi

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consentida, situações em que, ausente de culpa, não existirá atoilícito. 

O art. 7º tratava de prestação de assistência material, de caráter alimentar , em caso de rescisão contratual, que deve ser 

paga pelo concubino culpado ao inocente,

quando este necessitassedesse pensionamento. Os alimentos regulam-se, atualmente, pelosarts. 1.694 e seguintes do novo Código. 

Entretanto, se a união estável fosse dissolvida por morte de um dos conviventes (§ único), o sobrevivente teria direito realde habitação do imóvel destinado à residência da família, enquantovivesse ou não constituísse nova união ou casamento. O novo CódigoCivil, em seu art. 1.831 assegura direito real de habitação referindo-setão-somente ao cônjuge sobrevivente. 

O direito real de habitação consiste na utilizaçãogratuita de imóvel alheio. O titular desse direito deverá residir , comsua família, nesse imóvel, não podendo alugá-lo, emprestá-lo. É o quese depreende do art. 1.414 do novo Código Civil ( art. 746 do Códigoanterior). 

Esse direito era concedido ao concubino sobrevivente, condicionalmente, sob termo ou condição resolutivos. O direitoexistirá, enquanto viver o titular (termo resolutivo, sempre certo; amorte ocorrerá, mas não se sabe quando) e enquanto não concubinar-se ou não se casar (condição resolutiva, ³ex lege´- o evento é futuro eincerto, pois poderá ou não ocorrer novo concubinato ou novocasamento). 

Como era de esperar-se, o art. 9º eliminava apossibilidade de que as causas relativas ao concubinato fossem dacompetência das varas comuns. 

Esse artigo fixou a competência das Varas de Família, para tratamento das questões concubinárias, assegurando o segredode justiça. 

Com isso, acrescentava-se ao inciso II, do art. 155, doCódigo de Processo Civil, mais essa hipótese legal de admissão desegredo de justiça. 

 A redação desse art. 155 e de seu inciso II existe comodeterminada pela Lei nº 6.515, de 26.12.1977 (Lei do Divórcio), noseguinte teor: ³Art. 155 - Os atos processuais são públicos. Correm, 

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todavia, em segredo de justiça os processos´:« ³II - que dizemrespeito a casamento, filiação, separação dos cônjuges, conversãodesta em divórcio, alimentos e guarda de menores´ e ³matéria relativaà união estável´ (conforme Lei nº 9.278/96, art. 9º). Atualmente, encontra-se revogado esse último citado art. 9º. 

Destaque-se, nesse passo, que, por esse artigo, resgatara-se o dever do Estado brasileiro de assegurar aoconcubinato puro ou união estável, a natureza familiar do instituto, sempre considerada, e como casamento de fato, até o Decreto nº 181, de 1890. Desse modo, agiu o legislador respeitando as tradições dafamília brasileira. 

Todavia, a matéria relativa à união estável éassegurada pela Constituição como uma forma de constituição defamília, regulamentada no novo Código Civil como instituto próprio

desse ramo do direito civil. Daí, não tenho dúvidas em recomendar que continue a

existir o segredo de justiça nas relações de união estável econcubinárias, dada a natureza íntima que a matéria encerra. O juizpoderá decretar esse segredo, a qualquer tempo. 

Poderá, agora, com maior segurança, um concubinopleitear contra o outro medida cautelar de separação de corpos, quevinha sendo admitida, com alguma relutância pelo Poder Judiciário. 

Por outro lado, o casamento, que, atualmente, realizar-se só perante a autoridade religiosa (Católica, Protestante ou Judaica, por exemplo), e que é considerado concubinato puro ou uniãoestável, se não for registrado, com os procedimentos da habilitação aocasamento civil, terá a mesma proteção, concedida pela lei sobcomentário, e pelo atual Código Civil. 

5 ± União estável no novo Código Civil ( Consultar Álvaro Villaça Azevedo, Comentários ao Código Civil, 

Coordenador Antônio Junqueira de Azevedo,

Ed. Saraiva,

São Paulo,

 vol. 19, especialmente pp. 250 a 285). 

a ) Conceito 

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  O conceito de união estável retrata-se no art. 1.723 do novoCódigo e é o mesmo do já mencionado art. 1º da Lei nº 9.278, de 1996, com osseus elementos essenciais. 

 A união estável, reconhecida como entidade familiar , é entrehomem e mulher , não comportando convivência homossexual, entre o mesmo

sexo,

principalmente pela conceituação constitucional. Outro elemento conceitual é a convivência pública, contínua e

duradoura entre os companheiros, devendo a união estável, como um fatosocial, ser evidenciada publicamente, tal como acontece com o casamento, emque os companheiros são conhecidos, no local em que vivem, nos meiossociais, principalmente de sua comunidade, junto aos fornecedores de produtose serviços, apresentando-se, enfim, como se casados fossem. Fiz o povo, emsua linguagem autêntica, que só falta aos companheiros ³ o papel passado´.  

Essa convivência, como no casamento, existe comcontinuidade; os companheiros não só se visitam, mas vivem juntos, participam

um da vida do outro, sem termo marcado para separarem-se. Quanto ao prazo para início da eficácia da união estável, 

voltou o legislador do novo Código Civil a preferir não fixá-lo, dizendo que essaunião existe quando duradoura. 

Lembre-se de que, no Projeto de novo Código Civil, n. 118, jácom a redação final de 1997, dada pelo Senado Federal, voltara a exigência, no seu art. 1.735, da duração da convivência dos companheiros e por mais decinco anos consecutivos, reduzindo-se o prazo para três anos, havendo filhocomum ( § 1º), devendo ainda a coabitação existir sob o mesmo teto. Nestecaso, se tivesse sido editado tal entendimento, teria sido revogada a Súmula382 do Supremo Tribunal Federal, que admite que os companheiros vivam sobtetos distintos. 

Quanto ao referido prazo de cinco anos, existe inconveniente, por exemplo, se já estiverem os companheiros decididos a viver juntos, comprova ineqüívoca (casamento religioso, por exemplo), e qualquer deles adquirir patrimônio, onerosamente, antes do complemento desse prazo. Por outro lado, pode haver início da união já com filho comum! 

Destaque-se, ainda, em parênteses, que o Decreto n. 181, de1890, ao criar o casamento civil, no Direito brasileiro, como único modo de

constituição da então ³família legítima´ tornou ineficazes,

ante oreconhecimento do Estado brasileiro, as três formas de constituição de famíliaque constavam nas Ordenações Filipinas ( de 1603): o casamento religioso, ocasamento por escritura, com duas testemunhas, e o casamento de fatoou clandestino. Este, sendo casamento, à época (atualmente é união estável), que sempre existiu desde a Antigüidade, constituía-se pela simples convivênciaduradoura (... per tant o t empo...). Assim, as referidas Ordenações nãomencionaram prazo certo para esse casamento de fato, atualmente uniãoestável. 

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  Realmente, a união estável nasce com o afeto entre oscompanheiros, constituindo sua família, sem prazo certo para existir ou paraterminar. 

Em casa caso concreto, deverá o juiz perceber se houve, realmente, ou não, duração suficiente para a existência da união estável. 

Todavia, é no intuito de constituição de família que está ofundamento da união estável. Esse estado de espírito de viver no lar pode nãoexistir , por exemplo, no companheirismo, que objetive, além da companhiaesporádica, relações sexuais ou sociais, com ampla liberdade de que tenhamoutras convivências os companheiros, não encarando os afazeres domésticoscom seriedade. Nessa situação pode um casal viver mais de dez anos, semque se vislumbre união estável. Os Tribunais chamam esse estado de merocompanheirismo, de união aberta ou de relação aberta. 

Quanto à necessidade de dizer-se que a convivência existecomo se ³casados fossem´ os companheiros, nada há que acrescentar a essa

idéia do ³more uxorio´; todavia ela está contida na expressão ³ convivênciapública, contínua e duradoura´, com o objetivo de constituição de família (modomais moderno de dizer-se dessa relação familiar , um homem e uma mulher , convivendo,seriamente, em família por eles constituída). A convivência sob omesmo teto é, às vezes, evitada para que não se causem traumas em filhos, isso acontece até no casamento, principalmente, em segundas núpcias, emque os filhos do casamento anterior não querem aceitar um novo pai ou umanova mãe! A Súmula 382 do Supremo Tribunal Federal pode até aplicar-se, analogicamente. Ela admite, na união estável, que os companheiros vivam sobtetos diversos. 

Tenha-se presente, ainda, que a convivência pública não quer dizer que não seja familiar , íntima, mas sim de que todos têm conhecimento, pois o casal vive, também, com relacionamento social, apresentando-se comomarido e mulher. 

Tenha-se presente, ainda, que as pessoas impedidas decasarem-se não podem viver em união estável, a não ser que separadas deseu cônjuge judicialmente ou de fato. 

 A própria Lei do Divórcio, n. 6.515, de 26-12-1977, já atestava, no § 1º de seu art. 5º, a possibilidade de ruptura da sociedade conjugal, pelaseparação de fato do casal prolongada por mais de cinco anos consecutivos, 

com impossibilidade de sua reconstituição. Esse prazo de cinco foi reduzidopara um ano, pela Lei n. 8.408, de 13-2-1992. Por seu turno, a Constituição Federal de 5-10-1988 possibilita, 

pelo § 6º de seu art. 226, a dissolução do casamento civil, após préviaseparação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou apóscomprovada separação de fato por mais de dois anos (divórcio direto). b) Deveres entre os companheiros 

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  Os deveres que devem existir , nas relações pessoais entrecompanheiros, são: lealdade, respeito e assistência, bem como, quanto aosfilhos, sua guarda, sustento e educação, previstos no art. 1.724 do novoCódigo. 

Começando pelo dever de lealdade, seu descumprimento

provoca injúria grave; paralelamente à deslealdade,

está,

no casamento,

oadultério, que implica a quebra do direito-dever de fidelidade. 

É certo que não existe adultério entre companheiros; todavia, devem ser eles leais. A lealdade é gênero de que a fidelidade é espécie;aquela figura no âmbito genérico da conduta dos casais, tanto que, muitasvezes, entre cônjuges, não se configurando o adultério, de difícil prova, o maucomportamento de um deles, ainda que faça presumir , às vezes, adultério, já, por si, caracteriza-se como injurioso, apto a autorizar a dissolução dasociedade matrimonial, quando, por esse ato, torna-se, ao inocente, insuportável a vida no lar conjugal. 

Também a deslealdade entre companheiros, quando um delesmantém relação sexual ou, simplesmente, namora ou mantém relações íntimascom terceiro, pode causar repulsa de tal ordem que torne insuportável aconvivência ao companheiro inocente. 

No tocante ao direito-dever de respeito, entre os conviventes, éele descumprido, quando existe conduta injuriosa grave de um doscompanheiros, atingindo a honra ou a imagem do outro, com palavrasofensivas, com gestos indecorosos ou com deslealdade. 

É também de suma importância, principalmente na atualidade, em que as pessoas pouco se comunicam no lar , descuidando do companheiro, sem diálogo e sem considerá-lo, em estado de abandono moral, o dever deassistência moral. É como se um dos conviventes não existisse. Oscompanheiros devem manter clima de solidariedade, nos bons e nos mausmomentos de sua convivência. 

Já a assistência material mostra-se no âmbito do patrimônio, dos alimentos entre conviventes, principalmente. Nesse passo, a mesquinharia, a sovinice, a avareza configuram, certamente, injúria de caráter econômico. 

Tanto o dever de assistência material quanto imaterial doscompanheiros, estão previstos na palavra ³assistência´ do art. 1.724, sob

cogitação. Nenhuma dúvida,

portanto,

de que devam ser respeitados pelosconviventes. Os direitos e deveres por último mencionados são dos

conviventes em relação a seus filhos comuns. A guarda dos filhos tem que ver com a posse que seus pais, em conjunto ou isoladamente, em caso de suaseparação, exercem, em decorrência de seu poder-dever familiar (pátriopoder). O sustento são os alimentos materiais indispensáveis à preservação dasubsistência e da saúde, bem como os relativos à indumentária. A educação

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são os alimentos de natureza espiritual, imaterial, incluindo não só oensinamento escolar , como os cuidados com as lições, no aprendizado, noâmbito familiar e de formação moral dos filhos. c) Regime patrimonial de bens 

O art. 1.725 do novo Código Civil,

procurando evitar o texto doart. 5º da Lei nº 9.278/96, muito mais rico em hipóteses, e úteis, e maisconsentâneo com a realidade, acabou por adotar , em tese, o mesmopensamento do caput do aludido art. 5º, com exagerada dose de atecnia. 

Lembre-se, inicialmente, de que, após a edição das leis sobreunião estável, nº 8.971/1994 e 9.278/1996, o Ministério da Justiça, pelo entãoMinistro Nelson Jobim, fez publicar , no Diário Oficial de 2-10-1996, o Anteprojeto de Lei sobre o Estatuto da União Estável, também com o propósitode regular o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.  

Nasceu esse Anteprojeto em razão dos vetos apresentados

pelo Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, quando da sançãoda Lei nº 9.278/96. 

 A posição desse Projeto do Governo, explica o então MinistroNelson Jobim, na exposição de Motivos, tinha em mira harmonizar os textosdas leis anteriores, já citadas, de 1994 e de 1996, com a seguinte justificativa:³Na realidade, não obstante as inegáveis qualidades dos projetos de lei que setransformaram na legislação atualmente vigente e, em particular , dos estudosdo saudoso Senador Nelson Carneiro e do Professor Álvaro Villaça, aaprovação sucessiva dos dois textos legislativos criou insegurança jurídica paraa sociedade brasileira, que se refletiu não somente nos meios jurídicos, mastambém em todos os órgãos da imprensa.´. 

Em verdade, entendo que a crise, se é que existiu, veio emrazão dos vetos na Lei nº 9.278/96, que tornaram truncado aquele texto, retirando-se-lhe partes importantes. 

No afã de aproximar o instituto da união estável ao docasamento civil, como se fosse aquela um casamento de segundo grau, inseriuo pré-legislador do aludido Projeto de Governo um capítulo sobre regime debens na união concubinária pura. 

Parte dessa idéia passou para o novo Código Civil, quando

este se refere,

pelo art. 1.725,

à aplicação,

³no que couber´,

do ³regime dacomunhão parcial de bens´. Embora não se tenha, no novo Código Civil, utilizado todo o

capítulo sobre regime de bens, previsto naquele Projeto do Governo, o certo éque constou essa utilização analógica do regime da comunhão parcial de bens, completamente destoante da situação de fato, em que vivem oscompanheiros. 

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  No meu ponto de vista, mesmo com o texto atual do art. 1.725do novo Código Civil, está presente nele o art. 5º da Lei nº 9.278/96. 

 Aliás, o art. 5º, citado, mostra que o legislador se fez sensívelao aspecto patrimonial na união estável, estabelecendo norma dispositiva nosentido de que, não havendo estipulação em contrato escrito, os bens móveis e

imóveis adquiridos,

onerosamente,

por um ou por ambos os companheiros,

noperíodo em que durar a união estável, são considerados fruto do trabalho e dacolaboração comum, pertencendo a ambos, em condomínio e em partesiguais. 

Esse o espírito da nova legislação, em que está presente oprimitivo esboço, de meu anteprojeto, elaborado um ano e meio antes daConstituição de 1988. 

 Assim, como já disse, quando da análise do aludido art. 5º, daLei de 1996, se os concubinos, ao comprarem um imóvel, por exemplo, quiserem ressaltar direito de um maior do que o do outro, poderão mencionar 

na escritura pública ou no compromisso particular , dessa aquisição, percentualdiferente, como, exemplificativamente , 70% ideal do imóvel para um e 30%para outro. Poderão, também de modo genérico, fazer contrato, programandotoda a sua vida econômico-financeira, como possibilita, expressamente, esseartigo. 

Já com a adoção do regime de comunhão parcial de bens, naunião estável, salvo estipulação contrária, será permitida a utilização de outroregime patrimonial pelos companheiros, por menção no termo de aquisição, por documento à parte, seja, por exemplo, uma carta, uma declaração ou umacláusula do contrato de convivência. 

É meu entendimento que, pretendendo aproveitar o modelo dacomunhão parcial, ³no que couber´, como mencionado no art. 1.725 do novoCódigo, acaba o texto voltando ao regime previsto no art. 5º da lei de 1996 , relativo a condomínio, que é o único que atende à possibilidade de constantemutação no patrimônio dos companheiros, inclusive com a possibilidade dealienação judicial para extinção do condomínio, o que é impossível emqualquer regime de bens onde exista comunhão, regulada pelo Código Civil(condomínio de mãos juntas), que deve durar enquanto durar o casamento, ouenquanto os cônjuges de comum acordo não resolverem alienar o bemafetado. 

Reste clarividenciado que,

mesmo que se equivoquem oscompanheiros, na aquisição de quaisquer bens, a título oneroso, a regra do art.1.725 do novo Código Civil é dispositiva, podendo ser alterado, a qualquer tempo, o negócio por contrato escrito entre os adquirentes, modificando, por exemplo, os percentuais ou cotas condominiais entre eles existentes. 

O mesmo contrato escrito pode ser utilizado peloscompanheiros, para regularem outras situações não patrimoniais, relativas àsua convivência. 

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  O art. 1.725, portanto, admite, expressamente, a possibilidadede realização de contrato, por escrito, entre os companheiros. 

d) Relações com terceiros Sugestão importante, que fiz no Seminário de 4-7-2002, na

Câmara dos Deputados, foi a da inclusão de um parágrafo único no art. 1.725, que correspondesse ao art. 5º do Anteprojeto de Lei do Governo, que pretendiaunificar as Leis nº 8.971/94 e 9.278/96, inserido em seu item Relações comTerceiros, do teor seguinte: ³parágrafo único. Nos instrumentos que vierem afirmar com terceiros, os companheiros deverão mencionar a existência daunião estável e a titularidade do bem objeto de negociação. Não o fazendo, ousendo falsas as declarações, serão preservados os interesses dos terceiros deboa-fé, resolvendo-se os eventuais prejuízos em perdas e danos entre oscompanheiros e aplicando-se as sanções penais cabíveis´. 

Havendo omissão ou sendo falsas essas declarações, serãopreservados os interesses dos terceiros de boa-fé, resolvendo-se os eventuaisprejuízos em perdas e danos dos companheiros, aplicando-se as sançõespenais cabíveis, completa o citado art. 5º do referido Projeto. 

É possível que não exista boa-fé do terceiro; por exemplo, nocaso de negociar com um dos companheiros, sabendo de sua situação familiar convivencial. 

Por outro lado, se o casal concubinário comparece ao negóciode alienação, não haverá prejuízo ao terceiro, mesmo que não declinem suacondição de companheiros. E, nada dizendo, seus direitos e deveres sãoconsiderados iguais. 

O maior perigo está na alienação unilateral de um bem, por um dos companheiros, ilaqueando a boa-fé do terceiro, em prejuízo da cotaideal do outro companheiro, omitindo ou falsamente declarando seu estadoconcubinário. Nesse caso, o companheiro faltoso poderá estar conforme asituação, se o bem for do casal, alienando, a non domi no, a parte pertencenteao outro, inocente. Esse ato ilícito leva o faltoso, também, no âmbito civil, ànecessidade de compor as perdas e danos sofridos pelo companheiroinocente.

Tudo,

é claro,

com a aplicação das ³sanções penais cabíveis´. Aliás, o pré-legislador poderia ter referido, expressamente, o art. 299 do CódigoPenal, que tipifica o crime de falsidade ideológica, consistente em omitir , emdocumento público ou particular , declaração que dele deveria constar , ou neleinserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que deveria ser escrita;tudo com a finalidade de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdadesobre fato juridicamente relevante. 

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  É certo, como visto, que a omissão ou inserção de que trata odispositivo penal citado deve ser dolosa, com o intuito de prejudicar , de causar dano. Nessa ação ou omissão está presente a intenção fraudulenta derealização de um ato contrário à lei. 

Desde ora, entretanto, enquanto não surge esse salutar 

preceito,

recomenda-se,

a quem negociar com pessoas,

que não se declaremcompanheiros ou conviventes, a providência de exigir , expressamente, docontratante alienante, a menção, no documento de alienação, de seu estadofamiliar , sob pena de cometimento de ilícito penal, por falsas declarações oupor afirmações que não correspondam à verdade; além da responsabilidadecivil pelos prejuízos decorrentes dessa ilicitude. 

e) Conversão da união estável em casamento O art. 1.726 do novo Código Civil, como acontecia com o art.

8º da Lei nº 9.278/96, atende à exigência constitucional contida no § 3º do art.226, que determina que o legislador tudo fará para facilitar a conversão daunião estável em casamento. 

O art. 1.726 facilita menos essa conversão do que o art. 8º daLei nº 9.278/96, pois determina que as partes devem requerê-la ao juiz dedireito. Isso porque é impossível adaptar o fato da união ao registro direto. 

Todavia, quando da solicitação desse requerimento, certamente, referido oficial deveria abrir processo de habilitação para ocasamento, com o cumprimento de todas as regras relativas ao casamentocivil. Sim, porque a união estável não possui regras procedimentais para suaconstituição. O concubinato puro constitui-se pelo próprio fato da convivência, com o intuito de criação de família. 

Caso contrário, restaria frustrada a figura do casamento civil, com todos seus rigores; praticamente, bastaria viver o casal em concubinatopuro, algum tempo, sem qualquer formalidade, convertendo essa união de fato, também sem qualquer formalidade, em casamento civil. Aquele (concubinato)seria um caminho simplificado a este (casamento civil). 

Todavia, cessou a competência do Oficial do Registro Civil, em face do art. 1.726, pois os companheiros não mais devem requerer , perante

ele,

como preconizava o art. 8º da Lei de 1996. Pelo novo Código Civil esse requerimento será feito pelos

companheiros, perante o juiz, que decidirá sobre a conversão de sua uniãoestável em casamento, examinando as circunstâncias do caso concreto. Sehouver deferimento judicial, será feito o conseqüente assento no Registro Civil.Nessa situação, a determinação da lavratura desse assentamento estará adispensar o processo de habilitação para o casamento. Isto, sem muita

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facilitação, porque a matéria estará sob os cuidados do Poder Judiciário, quetomará todas as cautelas para evitar eventuais simulações. 

Tanto no sistema anterior (do art. 8º da Lei de 1996) como noatual, do novo Código Civil (art. 1.726), os incômodos são tamanhos seja coma tramitação do processo de habilitação ou com o aguardo da decisão judicial , 

que mais fácil seria aos companheiros submeter-se ao processo de habilitaçãonão para conversão de sua união estável em casamento (hoje não maispossível), mas para casar-se. 

Sim, porque a conversão automática é impossível, pois jamaispoderia a lei mencionar que quem vive em união estável, por tanto tempo oudiante de certas circunstâncias, seja casado. Ninguém pode ser obrigado acasar-se, mormente por determinação legal ou judicial. 

 À época do casamento de fato, ao contrário, cuidava-se dealgo institucional, que estava ligado às tradições dos povos, antes do Decretonº 181, de 1890, que cancelou essa situação histórica. 

Por esse decreto, por imposição de quase quatro mil anos, quem vivesse como marido e mulher , duradouramente ( per tant o t empo), estava casado (casamento de fato). f ) Concubinato 

O art. 1.727 do novo Código Civil refere-se, separadamentedos demais artigos, a concubinato, mostrando que, neste, existe cometimentode adultério quando há o relacionamento de um homem ou de uma mulher casados, com quem não é seu cônjuge. 

Certamente que esse artigo trata do concubinato impuro ouadulterino, já que as pessoas que estão impedidas de casar-se, por estaremseparadas judicialmente ou de fato (mas não divorciadas), estão excluídasdessa situação concubinária impura, não tendo qualquer relacionamentocoabitacional com seu cônjuge. 

Já analisei, atrás, o art. 1.723 do novo Código Civil, que, por minha sugestão acolhida, reza em seu § 1º que à união estável não se aplica aincidência do inciso VI, ³no caso de a pessoa casada se achar separada de fatoou judicialmente´; e, em seu § 2º, que as causas suspensivas do art. 1.523³não impedirão a caracterização da união estável´. 

Mesmo assim, estarão vivendo em concubinato, se for o caso, as pessoas que apresentem os impedimentos do art. 1.521, porque só nãoincide o inciso VI, nos apontados casos de separação judicial ou de fato. 

Situação que se questiona é a do casamento de colaterais deterceiro grau (tio com sobrinha e vice-versa), proibida no inciso IV do mesmoart. 1.521. 

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  Fiz, no Seminário na Câmara dos Deputados, em 4-6-2002, em que realizei palestra, sugestão para futura modificação do inciso IV desseart. 1.521, para que conste em sua parte final que os colaterais estarãoimpedidos de casar-se, não até o terceiro, mas até o segundo grau, sob aseguinte justificativa: ³Com esse impedimento atingindo os colaterais, até oterceiro grau, estariam impedidos de casar-se tios com sobrinhas e vice-versa.

Ora,

o Decreto-Lei nº 3.200,

de 19-04-1941,

que possibilita o casamento decolaterais do terceiro grau ( arts. 1º, 2º e 3º), ficará revogado nesse ponto, oque poderá criar um conflito com as pessoas que se casaram por essa regra.Esses casamentos vêm sendo admitidos desde o advento desse decreto-lei, pacificamente´. 

6.-Meu entendimento conclusivo Como deixei claro, em meu artigo, no número 4 da

Revista Literária de Direito, entendi que deveria voltar a existir ocasamento religioso, só com celebração religiosa, ao lado do

casamento civil,

com os formalismos abrandados,

inclusive no tocanteà separação e ao divórcio.  Assim, com maior ou menor liberdade, teríamos o

casamento sob todos os seus aspectos históricos-existenciais maisimportantes. 

 A sociedade moderna está repelindo os excessos deformalismo, com tendência ao casamento simples, do passado. 

O casamento, na antigüidade, sempre mostrou-se pela

celebração religiosa ou das próprias partes interessadas, semparticipação do Estado. 

 Assim, a celebração religiosa deve ter autonomia e ser reconhecida pelo Estado, por si só, independentemente de registrocivil. 

 Ao lado desse casamento religioso, sempre existiu ocasamento de fato, que corresponde ao casamento clandestino ou de³conhuçudos´, pela simples convivência como marido e mulher , quechegou até nós pelas Ordenações do Reino, até a edição do Decretonº 181, de 1890, que criou os rigores de forma, hoje existentes, instituindo, há pouco mais de cem anos, o casamento civil. Antes, tudoera natural em matéria de casamento, como sempre foi no passado. 

Desse modo, pelas mesmas Ordenações existiam ocasamento religioso, o clandestino (pela convivência, que correspondeao concubinato puro, hoje união estável) e o por escritura pública, comduas testemunhas. 

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   A par dessas formas de constituição, existia oconcubinato impuro (incestuoso ou adulterino), sempre condenado.Daí, o sentido pejorativo da palavra concubinato, que se apagou, paulatinamente, entre nós, como uma reconquista, pelo nosso povo, do antigo casamento de fato. 

O casamento civil, imposto pelo Estado, em 1890, aniquilou todas as aludidas formas naturais de constituição de família, que, há aproximadamente 3.000 anos, vinham sendo praticadas. 

 A Constituição Federal, de 1988, abriu caminho à livreescolha popular de seu modo de convivência familiar , exemplificandoas formas que podem ser escolhidas e resgatando a figura docasamento de fato, pelo reconhecimento da união estável. 

 Ainda que existam modalidades matrimoniais, 

mencionadas na lei,

pelo Estado,

não pode este impedir que asociedade se utilize das formas tradicionais de constituição familiar. O Poder maior é do povo. O Estado deve regulamentar 

o que existe, impedindo lesões de direito. Nesse clima saudável da nova Constituição Federal, 

regulamentou-se o Estatuto dos Concubinos, pela comentadalegislação, fazendo justiça ao nosso povo, que vivia desnorteado, emum clima de liberdade selvagem, sem responsabilidades que vinhamsendo sanadas, com muito esforço, pelos nossos Tribunais. Agora, o

novo Código Civil sedimenta a matéria, com regras de acolhimento doinstituto da união estável, que conseguiu seu lugar máximo deproteção. 

 ÁLVARO VILLAÇA AZEVEDO