União Brasileira de Artesãos

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Processo: RE 201819 RJ Relator(a): ELLEN GRACIE Julgamento: 11/10/2005 Órgão Julgador: Segunda Turma Publicação: DJ 27-10-2006 PP-00064 EMENT VOL-02253- 04 PP-00577 Parte(s): UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES - UBC VERA LUCIA RODRIGUES GATTI E OUTROS ARTHUR RODRIGUES VILLARINHO ROBERTA BAPTISTELLI E OUTRO Ementa SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO. I. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados. II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais.

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Processo:RE 201819 RJ

Relator(a):ELLEN GRACIE

Julgamento:11/10/2005

rgo Julgador:Segunda Turma

Publicao:DJ 27-10-2006PP-00064EMENT VOL-02253-04PP-00577

Parte(s):UNIO BRASILEIRA DE COMPOSITORES - UBCVERA LUCIA RODRIGUES GATTI E OUTROSARTHUR RODRIGUES VILLARINHOROBERTA BAPTISTELLI E OUTRO

EmentaSOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIO BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSO DE SCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITRIO. EFICCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO.I. EFICCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAES PRIVADAS. As violaes a direitos fundamentais no ocorrem somente no mbito das relaes entre o cidado e o Estado, mas igualmente nas relaes travadas entre pessoas fsicas e jurdicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pelaConstituiovinculam diretamente no apenas os poderes pblicos, estando direcionados tambm proteo dos particulares em face dos poderes privados.II. OS PRINCPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAES. A ordem jurdico-constitucional brasileira no conferiu a qualquer associao civil a possibilidade de agir revelia dos princpios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que tm por fundamento direto o prprio texto daConstituioda Repblica, notadamente em tema de proteo s liberdades e garantias fundamentais. O espao de autonomia privada garantido pelaConstituios associaes no est imune incidncia dos princpios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitaes de ordem jurdica, no pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade no confere aos particulares, no domnio de sua incidncia e atuao, o poder de transgredir ou de ignorar as restries postas e definidas pela prpriaConstituio, cuja eficcia e fora normativa tambm se impem, aos particulares, no mbito de suas relaes privadas, em tema de liberdades fundamentais.III. SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. ENTIDADE QUE INTEGRA ESPAO PBLICO, AINDA QUE NO-ESTATAL. ATIVIDADE DE CARTER PBLICO. EXCLUSO DE SCIO SEM GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.APLICAO DIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS AMPLA DEFESA E AO CONTRADITRIO. As associaes privadas que exercem funo predominante em determinado mbito econmico e/ou social, mantendo seus associados em relaes de dependncia econmica e/ou social, integram o que se pode denominar de espao pblico, ainda que no-estatal. A Unio Brasileira de Compositores - UBC, sociedade civil sem fins lucrativos, integra a estrutura do ECAD e, portanto, assume posio privilegiada para determinar a extenso do gozo e fruio dosdireitos autoraisde seus associados. A excluso de scio do quadro social da UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do contraditrio, ou do devido processo constitucional, onera consideravelmente o recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber osdireitos autoraisrelativos execuo de suas obras. A vedao das garantias constitucionais do devido processo legal acaba por restringir a prpria liberdade de exerccio profissional do scio. O carter pblico da atividade exercida pela sociedade e a dependncia do vnculo associativo para o exerccio profissional de seus scios legitimam, no caso concreto, a aplicao direta dos direitos fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao contraditrio e ampla defesa (art.5,LIVeLV,CF/88).IV. RECURSO EXTRAORDINRIO DESPROVIDO.DecisoAps o voto da Ministra-Relatora, conhecendo e dando provimento ao recurso extraordinrio, o julgamento foi suspenso, em virtude do pedido de vista formulado pelo Senhor Ministro Gilmar Mendes. 2 Turma, 08.06.2004. Deciso: Depois do voto da Ministra-Relatora, conhecendo e dando provimento ao recurso extraordinrio, e do voto do Ministro Gilmar Mendes, negando-lhe provimento, o julgamento foi suspenso, em virtude do pedido de vista formulado pelo Senhor Ministro Joaquim Barbosa. 2 Turma, 16.11.2004. Deciso: Depois dos votos da Ministra-Relatora e do Ministro Carlos Velloso, conhecendo e dando provimento ao recurso extraordinrio, e dos votos dos Ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa negando-lhe provimento, o julgamento foi suspenso, em virtude do pedido de vista formulado pelo Ministro-Presidente. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Gilmar Mendes. 2 Turma, 26.04.2005. Deciso: Apresentado o feito em mesa pelo Presidente da Turma, o julgamento foi adiado em virtude da ausncia, justificada, da Senhora Ministra-Relatora. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros Carlos Velloso e Ellen Gracie. 2 Turma, 27.09.2005. Deciso: A Turma, por votao majoritria, conheceu e negou provimento ao recurso extraordinrio, vencidos a Senhora Ministra-Relatora e o Senhor Ministro Carlos Velloso, que lhe davam provimento. Redigir o acrdo o eminente Ministro Gilmar Mendes. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. 2 Turma, 11.10.2005.Resumo Estruturado- VIDE EMENTA E INDEXAO PARCIAL: CARTER PBLICO, ATIVIDADE, UNIO BRASILEIRA DOS COMPOSITORES, COBRANA,DIREITO AUTORAL, CONFIGURAO, SERVIO PBLICO, DELEGAO LEGISLATIVA, CABIMENTO, APLICAO DIRETA, DIREITOS FUNDAMENTAIS. PENALIDADE, UBC, IMPOSIO, SCIO, CARACTERIZAO, EXCESSO, LIBERDADE, DIREITO DE ASSOCIAO. - FUNDAMENTAO COMPLEMENTAR, MIN. JOAQUIM BARBOSA: APLICABILIDADE, DIREITO FUNDAMENTAL, MBITO, RELAO PRIVADA, RELAO HORIZONTAL, DECORRNCIA, ROMPIMENTO, BARREIRA, DIREITO PBLICO, DIREITO PRIVADO, FENMENO, CONSTITUCIONALIZAO, DIREITO PRIVADO. - FUNDAMENTAO COMPLEMENTAR, MIN. CELSO DE MELLO: EFICCIA HORIZONTAL, DIREITO FUNDAMENTAL, RELAO, PARTICULAR, LIMITAO, AUTONOMIA, VONTADE. NECESSIDADE, ASSOCIAO CIVIL, ENTIDADE CIVIL, SUBMISSO, PRINCPIO CONSTITUCIONAL, NECESSIDADE, RESPEITO, CONTRADITRIO, AMPLA DEFESA. - VOTO VENCIDO, MIN. ELLEN GRACIE: INEXISTNCIA, VIOLAO, PRINCPIO DA AMPLA DEFESA, EXCLUSO, SCIO, OBSERVNCIA, PROCEDIMENTO, ESTATUTO, SOCIEDADE CIVIL, DIREITO PRIVADO. AUSNCIA, PREJUZO ECONMICO, SCIO, POSSIBILIDADE, RECEBIMENTO, DIREITO AUTORIAL, MEIO, ESCRITRIO CENTRAL DE ARRECADAO E DISTRIBUIO, ECAD, EXISTNCIA, LIBERDADE, ASSOCIAO PRIVADA, ORGANIZAO, FIXAO, NORMA, FUNCIONAMENTO, RELACIONAMENTO, CONFORMIDADE, LEGISLAO CIVIL. - VOTO VENCIDO, MIN. CARLOS VELLOSO: OFENSA INDIRETA,CONSTITUIO FEDERAL, NECESSIDADE, ANLISE, LEGISLAO INFRACONSTITUCIONAL, VERIFICAO, VIOLAO, DEVIDO PROCESSO LEGAL, AMPLA DEFESA.

EMENTA

SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIO BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSO DE SCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITRIO. EFICCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO. I. EFICCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAES PRIVADAS. As violaes a direitos fundamentais no ocorrem somente no mbito das relaes entre o cidado e o Estado, mas igualmente nas relaes travadas entre pessoas fsicas e jurdicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituio vinculam diretamente no apenas os poderes pblicos, estando direcionados tambm proteo dos particulares em face dos poderes privados. II. OS PRINCPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAES. A ordem jurdico-constitucional brasileira no conferiu a qualquer associao civil a possibilidade de agir revelia dos princpios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que tm por fundamento direto o prprio texto da Constituio da Repblica, notadamente em tema de proteo s liberdades e garantias fundamentais. O espao de autonomia privada garantido pela Constituio s associaes no est imune incidncia dos princpios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitaes de ordem jurdica, no pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade no confere aos particulares, no domnio de sua incidncia e atuao, o poder de transgredir ou de ignorar as restries postas e definidas pela prpria Constituio, cuja eficcia e fora normativa tambm se impem, aos particulares, no mbito de suas relaes privadas, em tema de liberdades fundamentais. III. SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. ENTIDADE QUE INTEGRA ESPAO PBLICO, AINDA QUE NO-ESTATAL. ATIVIDADE DE CARTER PBLICO. EXCLUSO DE SCIO SEM GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.APLICAO DIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS AMPLA DEFESA E AO CONTRADITRIO. As associaes privadas que exercem funo predominante em determinado mbito econmico e/ou social, mantendo seus associados em relaes de dependncia econmica e/ou social, integram o que se pode denominar de espao pblico, ainda que no-estatal. A Unio Brasileira de Compositores - UBC, sociedade civil sem fins lucrativos, integra a estrutura do ECAD e, portanto, assume posio privilegiada para determinar a extenso do gozo e fruio dos direitos autorais de seus associados. A excluso de scio do quadro social da UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do contraditrio, ou do devido processo constitucional, onera consideravelmente o recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber os direitos autorais relativos execuo de suas obras. A vedao das garantias constitucionais do devido processo legal acaba por restringir a prpria liberdade de exerccio profissional do scio. O carter pblico da atividade exercida pela sociedade e a dependncia do vnculo associativo para o exerccio profissional de seus scios legitimam, no caso concreto, a aplicao direta dos direitos fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao contraditrio e ampla defesa (art. 5, LIV e LV, CF/88). IV. RECURSO EXTRAORDINRIO DESPROVIDO.

(STF , Relator: ELLEN GRACIE, Data de Julgamento: 11/10/2005, Segunda Turma)