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UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO MESQUITA FILHO” FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS CAMPUS DE MARÍLIA DANIELE APARECIDA RUSSO A ESCOLA COMO OBJETO DE ESTUDO: o conhecimento produzido em periódicos publicados pelo INEP (1995-2010) Marília - SP 2012

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UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

“JÚLIO MESQUITA FILHO”

FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS

CAMPUS DE MARÍLIA

DANIELE APARECIDA RUSSO

A ESCOLA COMO OBJETO DE ESTUDO: o conhecimento produzido em

periódicos publicados pelo INEP (1995-2010)

Marília - SP

2012

1

UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

“JÚLIO MESQUITA FILHO”

FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS

CAMPUS MARÍLIA

DANIELE APARECIDA RUSSO

A ESCOLA COMO OBJETO DE ESTUDO: o conhecimento produzido em

periódicos publicados pelo INEP (1995-2010)

Dissertação apresentada à banca examinadora

da Faculdade de Filosofia e Ciências,

Universidade Estadual Paulista como parte dos

requisitos para obtenção do título de Mestre

em Educação.

Área de Concentração: Políticas Públicas e

Administração da Educação no Brasil

Orientadora: Profª Drª Graziela Zambão

Abdian Maia.

Marília - SP

2012

2

DANIELE APARECIDA RUSSO

A ESCOLA COMO OBJETO DE ESTUDO: o conhecimento produzido em

periódicos publicados pelo INEP (1995-2010)

Banca Examinadora

________________________________________________

Profª Drª Graziela Zambão Abdian Maia (Orientadora)

UNESP/ Marília

________________________________________________

Profª Drª Elianeth Dias Kantack Hernandes

UNESP/ Marília

________________________________________________

Profª Drª Yoshie Ussami Ferrari Leite

UNESP/ Presidente Prudente

Marília, 12 de setembro de 2012.

3

Russo, Daniele Aparecida

R93e

A escola como objeto de estudo: o conhecimento produzido em periódicos publicados pelo INEP (1995-2010) / Daniele Aparecida Russo. -- Marília, 2012.

104f. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Filosofia e

Ciências, Universidade Estadual Paulista, 2012.

Bibliografia: f. 99-104

Orientador: Graziela Zambão Abdian

1. Escola como objeto de estudo. 2. Administração da educação. 3. Ciência da educação. I. Autor. II. Título

CDD.371.2

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AGRADECIMENTOS

Manifesto gratidão e carinho àqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para a

elaboração deste trabalho.

Agradeço, primeiramente, a Deus que me concedeu a oportunidade de estudo e de

conclusão deste mestrado.

Agradeço, especialmente, à Professora Graziela que foi mais do que importante no

meu crescimento acadêmico, dedicando-se a minha formação, orientando-me seguramente,

compartilhando comigo seus nobres conhecimentos, muito obrigada!

Agradeço todos os professores que passaram pela minha formação, pela paciência,

dedicação e ensinamentos disponibilizados nas aulas e em outros momentos também, cada um

de forma especial contribuiu para a conclusão desse trabalho e consequentemente para minha

formação.

Muito obrigada aos meus pais, Edson e Maria, pelo apoio constante, pelas orientações

e ensinamentos com afeto e dedicação que me possibilitaram trilhar meus caminhos sem

medo e cheia de esperança, pois eles acreditaram nos meus objetivos.

Agradeço também a minha irmã, Daiane, e a minha vovó, Dinorah, sempre solidárias e

amigas.

Ao Lucas pelo apoio, compreensão e amor.

Aos amigos, aos companheiros profissionais, a todos aqueles que de alguma forma

estiveram e estão próximos a mim, fazendo esta vida valer cada vez mais a pena.

5

RUSSO, Daniele Aparecida. A Escola como objeto de estudo: o conhecimento produzido

em periódicos publicados pelo INEP (1995-2010). Dissertação (Mestrado em Educação) –

Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2012. 104f.

RESUMO

Considerando a trajetória do conhecimento em Administração da educação, os resultados de

pesquisa anterior intitulada “A Escola como objeto de estudo da Ciência da educação no

Brasil (1990-2005)” e, atualmente, integrando o projeto “Indicadores de desempenho, gestão

e qualidade da escola básica” (Edital n. 38/2010 Capes/Inep), esta pesquisa realizou

levantamento e análise da produção de conhecimento sobre a escola tomando como subsídio

teórico a sociologia das organizações escolares (COSTA, 2003; LIMA, 2008). A pesquisa

trabalhou com dois periódicos de grande circulação nacional que são publicados pelo Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP: Revista Brasileira de

Estudos Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto, entre 1995 e 2010, período escolhido por

focalizar dois governos: Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e Luis Inácio Lula da Silva

(2003-2010). A intenção foi a de evidenciar a contribuição desses estudos para a produção do

conhecimento em Administração escolar no Brasil. A dissertação está estruturada em três

capítulos. No Capítulo 1, primeiramente, são apresentados o Instituto Nacional de Estudos e

Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP e os periódicos: Revista Brasileira de

Estudos Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto; em seguida, analisam-se alguns aspectos da

Política Educacional da década de 1990 em diante, destacando suas continuidades e rupturas

nos governos presidenciais, Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e Luiz Inácio Lula da

Silva (2003-2010), explicitando o contexto em que foram publicados os artigos nos periódicos

que se constituem objeto do estudo. O Capítulo 2 contempla o referencial teórico para análise

dos artigos, versando sobre as seis imagens organizacionais da escola apresentadas por Costa

(2003) e os quatro modelos teóricos para o estudo da escola enquanto organização educativa

propostos por Lima (2008), os quais possibilitaram a análise dos artigos levantados. O

Capítulo 3 realiza análise do conjunto da produção, evidenciando: quantidade, títulos e

autores por período (1995-2002; 2003-2010); referencial teórico e metodológico; principais

temáticas contempladas; e análise dos artigos com o subsídio teórico proposto no Capítulo 2.

Quanto aos resultados, de modo geral, foi possível analisar 33 artigos sendo que a maioria

perspectivou a escola enquanto democracia.

PALAVRAS CHAVE: Escola como objeto de estudo. Administração da educação. Revista

Brasileira de Estudos Pedagógicos. Em Aberto.

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RUSSO, D. A. The school as a study object: Knowledge produced in journals by INEP

(1995 – 2010). (Dissertation: Masters degree in Education) - Faculdade de Filosofia e

Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2012. 104f.

ABSTRACT

Considering the knowledge in School Administration, results of a prior research called “The

school as an object of study of Educational Science in Brazil (1900 – 2005)” and currently

integrating the project “Brazil basic school performance, management and quality indicators”

(Edictal nº 38/2010 Capes/Inep), this research performed collection and analysis of school

knowledge production, taking as a theory subsidy the sociology of school organization

(COSTA, 1996; LIMA, 2008). The research worked on two widely read national journals,

which are published by Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio

Teixeira - INEP: Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) and Em Aberto from

1995 to 2010, periods chosen for focusing on two governments: Fernando Henrique Cardoso

(1995 – 2002) and Luis Inácio Lula da Silva (2003 – 2010). Aiming to point out these studies

contribution for knowledge production in School Management in Brazil, dissertation is

structured on three chapters: On chapter one, to start with, INEP and the journals Revista

Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) and Em Aberto are presented. After that, some

aspects of the Educational politics from the 90’s on, pointing out its continuities and break

ups on both president governments, marking the contexts in which in which the articles

object of study were published. Chapter 2 shows the theory references for article analysis,

talking about images of six different schools showed by Costa (1996) and four study theory

models for study proposed by Lima (2008), which allowed article analysis. Chapter 3

analyses production setting analysis pointing out quantity, titles and authors by period (1995-

2002; 2003-2010); theory and methodology references; main themes and article analysis

based on tools provided on chapter 2. As for the results, generally speaking, it was possible to

analyze 33 articles on which most of them view school as democracy.

KEYWORDS: School as a study object. School administration. Brazilian journal of

education studies. Em aberto.

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LISTA DE FIGURAS

Capas de Publicações da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos ........................... 23

Capas de Publicações da Revista Em Aberto .......................................................................... 27

8

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Em Aberto: relação palavra chave, título, autor e v./n./ano (1995-

2002)................................................................................................................................70

Tabela 2 – RBEP: relação palavra chave, título, autor e v./n./ano (1995-

2002)................................................................................................................................71

Tabela 3 – Em Aberto: relação palavra chave, título, autor e v./n./ano (2003-

2010)................................................................................................................................73

Tabela 4 – RBEP: relação palavra chave, título, autor e v./n./ano (2003-

2010)................................................................................................................................73

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ALCA - Área de livre comércio das Américas

ANPAE - Associação Nacional de Política e Administração da Educação

BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento

BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento

BM - Banco Mundial

CAPES - Coordenaçao de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CBPE - Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais

CDES - Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social

ENCCEJA - Exame Nacional Para Certificação de Competências

ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio

FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

FMI - Fundo Monetário Internacional

FUNDEB - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de

Valorização dos Profissionais da Educação

FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério

IDEB - Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

IES - Instituições de Ensino Superior

INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MARE - Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado

MEC - Ministério da Educação

MERCOSUL - Mercado Comum do Sul

OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico

OEA - Organização dos Estados Americanos

PAC - Programa de Aceleração do Crescimento

PAR - Plano de Ações Articuladas

PCB - Partido Comunista Brasileiro

PCdoB - Partido Comunista do Brasil

PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais

PDDE - Programa Dinheiro Direto na Escola

PDE - Plano de Desenvolvimento da Educação

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PDE - Plano de Desenvolvimento da Educação

PL - Partido Liberal

PMN - Partido da Mobilização Nacional

PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

PPP - Parcerias Público-Privadas

PREAL - Programa de Reformas Educacionais da América Latina e Caribe

PROER - Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional

PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira

PT - Partido dos Trabalhadores

RBEP - Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos

RBPAE - Revista Brasileira de Política e Administração da Educação

SAEB - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica

SEDIAE - Secretaria de Avaliação e Informação Educacional

SEEC - Serviço de Estatística da Educação e Cultura

SUDENE - Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste

UNAFISCO - Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal

UNESP - Universidade Estadual Paulista

UNIOESTE - Universidade do Oeste do Paraná

UNISINOS - Universidade Vale do Rio dos Sinos

UPF - Universidade de Passo Fundo

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................... 12

CAPÍTULO 1 – POLÍTICAS EDUCACIONAIS E OS GOVERNOS FHC E LULA:

CONTEXTO BRASILEIRO 1995-2010 .................................................................. 18

1.1 O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP)18

1.2 RBEP e Em Aberto ............................................................................................ 22

1.3 – Diretrizes da Política Educacional (1995-2010) .............................................. 28

CAPÍTULO 2 - ORGANIZAÇÃO ESCOLAR: IMAGENS E MODELOS ........... 50

CAPÍTULO 3 – OS ARTIGOS PUBLICADOS ENTRE 1995-2002 e 2003-2010:

ANÁLISE GERAL.................................................................................................... 70

3.1 - O período de 1995-2002 .................................................................................. 70

3.2 - O período de 2003-2010 .................................................................................. 72

3.3 Inferências a partir do contexto .......................................................................... 75

3.4 Aproximações com Imagens e Modelos organizacionais da escola ..................... 77

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 96

REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 99

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INTRODUÇÃO

Para introduzir a pesquisa serão destacados alguns trabalhos acadêmicos vivenciados

direta ou indiretamente pela autora que, mesmo brevemente contemplados, permitem

contextualizar e justificar os objetivos deste estudo, sendo eles a pesquisa de iniciação

científica, o Projeto Integrado ao qual está vinculada esta proposta e as considerações dos

professores integrantes da banca de exame geral de qualificação, ocorrida em dezembro de

2011.

A trajetória do conhecimento em Administração da educação fundamentou a pesquisa

de iniciação científica desenvolvida com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do

Estado de São Paulo (FAPESP) ao indicar, sobretudo, as preocupações com o estudo da

escola, principalmente a partir de meados dos anos 1990. Destacou-se que, anteriormente a

este período, o paradigma da Administração empresarial dominou os estudos em

Administração da educação que tomaram como referência, quase que exclusivamente, a

Teoria Geral da Administração. Pautada no paradigma da Administração empresarial, a

Administração da educação considerava que administrar uma escola equivale a administrar

uma empresa qualquer, com algumas adaptações.

As décadas de 1960 e 1970 foram marcadas por essa influência nos livros e artigos

publicados na área, sendo dois grandes representantes: Ribeiro (1952; 1968) e Alonso (1976).

Para Ribeiro (1968), a Administração funda-se em três elementos: racionalização do

trabalho; divisão do trabalho; interesse no trato pela administração, tendo em vista a

complexidade dos empreendimentos humanos e o jogo de interesses daí advindos. Seguindo a

lógica, Alonso (1976) adota os princípios da teoria geral dos sistemas para a análise da

organização escolar e propõe que a administração escolar tenha como função o ajustamento

dos fatores internos e externos do sistema escolar, para que ele se mantenha em equilíbrio.

A década de 1980 é marcada fortemente pela crítica à construção teórica anterior que

assemelhou a escola à empresa e adotou a Teoria Geral da Administração no desenvolvimento

teórico da Administração escolar. O livro de Paro (1986)1 pode ser considerado um marco

deste período ao destacar, entre outros aspectos de grande relevância e rigor científicos, a

especificidade da Administração escolar como uma das possibilidades de contribuição com o

processo de transformação social.

1 PARO, V. H. Administração escolar: introdução crítica. São Paulo: Cortez: Autores Associados,

1986.

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Félix (1989, p. 71), ao encontro de tal crítica, identificou que a Administração escolar

está intimamente relacionada ao contexto econômico, político e social do capitalismo e

destacou a necessidade de ela ser compreendida (e questionada) como elemento de mediação

entre o capital e a manutenção da sociedade como tal.

Considerando a construção do conhecimento em Administração da educação na

década de 1980, é possível dizer que houve alteração na perspectiva adotada, pois os autores

identificaram, além da impossibilidade de adotar a Teoria Geral da Administração na

Administração escolar, a necessidade de as pesquisas olharem, explorarem, analisarem e/ou

compreenderem as realidades específicas que são as organizações escolares e sua

Administração.

Na década seguinte, os pesquisadores adotaram uma perspectiva centrada na

organização escolar, preocuparam-se em olhar para as organizações escolares, analisar,

explicar, compreender o que elas fazem em seu cotidiano, na construção de seu processo

educacional. Russo (2004) denominou este processo de “mudança paradigmática na

Administração escolar”. Maia (2008), em pesquisa realizada sobre as publicações da

Associação Nacional de Política e Administração da Educação - ANPAE, também identificou

o percurso semelhante que culminou com a mudança de abordagem em Administração escolar

na Revista Brasileira de Política e Administração da Educação (RBPAE).

Movimento semelhante aconteceu com a produção teórica de Portugal que, no início

da década de 1990, passa a contemplar a escola como objeto de estudos da Ciência da

Educação. Nóvoa (1995) trata da emergência de uma sociologia das organizações escolares,

situada entre uma perspectiva centrada na sala de aula e aquelas sócio-institucionais,

focalizadas no sistema educativo, como sendo uma das realidades mais interessantes da

investigação em Ciências da Educação. As instituições escolares adquirem uma dimensão

própria enquanto espaço organizacional, onde também se tomam importantes decisões

educativas, curriculares e pedagógicas.

Em pesquisa anterior2, após realizar o levantamento e análise de livros publicados em

primeira edição na década de 1990 e meados de 2000, os quais privilegiam a escola como

objeto de estudo da Ciência da Educação, foram contemplados quarenta e cinco livros.

2 Pesquisa de iniciação científica financiada pela FAPESP em 2008, com o tema “A Escola como objeto nde

estudo da Ciência da Educação no Brasil (1990-2005)”, sob orientação da Dra Graziela Zambão Abdian. A

pesquisa foi publicada em forma de artigo científico: RUSSO, D. A.; MAIA, G. A. Z. A Escola como objeto de

estudo da Ciência da Educação no Brasil (1990-2005). Revista Brasileira de Política e Administração da

Educação, v. 25, p. 523-541, 2010.

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Procedendo à análise do conjunto da produção, evidenciou-se que dos quarenta e cinco

livros levantados, cinco são do primeiro período (1990-1995), treze são do segundo período

(1996-2000), e vinte e sete são do último período referente a 2001-2005. Observou-se que a

produção de livros que contempla a escola como objeto de estudo foi crescendo

significadamente durante os anos de 1990 a 2005. O material coletado foi analisado sob os

subsídios teóricos de Saviani (1989) e, principalmente, de Costa (2003), que contempla

“imagens organizacionais” a partir das quais podem ser explicadas as escolas.

Entre os anos de 1990 e 1995, houve maior concentração da produção em relação à

imagem organizacional da escola enquanto democracia, porém, ainda estavam presentes

traços da imagem organizacional da escola como empresa, anarquia e cultura. No período

1996-2000, embora traços da imagem organizacional da escola como cultura e anarquia

estejam presentes, a produção esteve marcada pela ênfase na imagem organizacional da escola

enquanto democracia. Em relação à produção do último período analisado (2001-2005),

identificou-se que, embora um autor tenha se aproximado da imagem organizacional da escola

enquanto arena política e outro autor tenha contemplado a organização escolar enquanto

empresa, de modo geral, a produção também se aproxima da imagem organizacional da

escola enquanto democracia.

Juntamente com o crescente número de produções que contemplaram a escola como

objeto de estudo, também foi crescente o número de livros publicados que perspectivaram a

organização escolar enquanto democracia.

A produção do período é, marcadamente, construída com a perspectiva de uma

imagem democrática da escola, ou seja, de modo geral, os autores diagnosticam que não há

vivencias de democracia no interior da escola, projetam algumas possibilidades e indicam a

necessidade de mudanças em sua Administração para que venha a ser alcançada. Ao

considerar o referencial de Saviani (1989), a pesquisa constatou serem as Teorias crítico-

reprodutivistas as que predominaram no estudo da escola no período em referência (1990-

2005). O grupo inclui críticas à Teoria do sistema de ensino enquanto violência simbólica,

Teoria da escola enquanto aparelho ideológico de estado (AIE) e Teoria da escola dualista.

Como se tratou de pesquisa de iniciação científica, a preocupação esteve em realizar

uma análise que propiciasse uma forma de mapeamento da área, especificamente a respeito da

temática da escola como objeto de estudo da Administração escolar. Os resultados do estudo,

os desdobramentos das discussões no grupo de pesquisa e o vínculo da orientadora com a

Universidade Vale do Rio dos Sinos para realização de seu pós-doutorado culminaram com a

elaboração de novo projeto integrado, financiado pela CAPES/INEP do Observatório de

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Educação, intitulado: Indicadores de qualidade e gestão democrática. Tal projeto congrega

quatro universidades, cada uma com sua pesquisa específica, sendo elas: Universidade de

Passo Fundo (UPF); Universidade do Oeste do Paraná (UNIOESTE); Universidade Vale do

Rio dos Sinos (UNISINOS) e Universidade Estadual Paulista (UNESP/Marília).

Esta pesquisa de mestrado, portanto, integra o subprojeto de Marília, intitulado

“Indicadores de desempenho, gestão e qualidade da escola básica”, cujo objetivo é analisar as

concepções de educação, gestão escolar e qualidade de ensino veiculadas nos âmbitos dos

governos (federal, estadual de São Paulo e dos municípios integrantes da pesquisa), após a Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, da mídia (com prioridade à Revista Nova Escola

entre os anos 2005-2010) e dos periódicos qualificados (2000-2010) e as concepções

vivenciadas pelos integrantes das escolas públicas do ensino fundamental (pais, alunos,

funcionários, professores e equipe de gestão).

Com a intenção de contribuir com tal pesquisa, no exame geral de qualificação,

ocorrido em dezembro de 2011, realizou-se a proposta de identificar, sistematizar e analisar as

concepções de gestão escolar, qualidade de ensino e avaliação em larga escala, produzidas

academicamente e divulgadas por periódicos nacionais qualificados (1995-2010). Naquele

momento, o levantamento dos periódicos partiu da lista feita em pesquisa realizada e

apresentada no artigo “Temáticas privilegiadas em periódicos nacionais: uma análise das

publicações na área de administração da educação (1982-2000)” (CASTRO; WERLE, 2009),

em que dezesseis periódicos qualificados foram apontados pelas estudiosas como resultado de

análise realizada com temáticas de maior incidência e da qualidade dos periódicos verificada

no sistema Qualis de avaliação. As palavras chave escolhidas para a busca dos artigos foram:

gestão escolar; qualidade de ensino; avaliação em larga escala. A partir da busca on-line por

meio do banco de dados do Scielo ou por meio do site do próprio periódico, foram levantados

230 artigos para serem analisados.

Diante da alta quantidade dos artigos levantados, mas principalmente da necessidade

de focalizar os objetivos da pesquisa no sentido de realizar uma assertiva que viesse a

contribuir com a Administração escolar, os professores integrantes da banca do exame geral

de qualificação sugeriram a alteração em três âmbitos: critérios para escolha dos periódicos a

integrarem o levantamento e análise; justificativa do período a ser analisado; e as palavras

chave da busca. Este último aspecto foi amplamente debatido no sentido de a dissertação de

mestrado ganhar em autonomia no que tange ao trabalho de iniciação científica e à pesquisa

integrada.

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Considerando tal desenvolvimento, as questões norteadoras da pesquisa ficaram assim

delimitadas: o que foi produzido de conhecimento sobre a escola como objeto de estudo na

Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto nos dois governos nacionais

que se sucederam (Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva)? Qual (is)

perspectiva (s) esteve (estiveram) presente (s) a respeito da escola nos dois períodos (1995 -

2002 e 2003-2010)? É possível identificar mudanças de perspectivas e de referencial? Há

permanências na concepção de escola? Na tentativa de responder essas questões, a pesquisa

tem como objetivo levantar, identificar, sistematizar e analisar os artigos que contemplam a

escola como objeto de estudo nos dois periódicos de grande relevância nacional que são

publicados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira -

INEP: Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto, entre 1995 e 2010,

período escolhido por focalizar os dois governos com propostas políticas diferentes, o

governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e o governo do presidente

Luis Inácio Lula da Silva (2003-2010).

A escolha dos dois periódicos, RBEP e Em Aberto, foi por serem publicados pelo

INEP, ou seja, um Instituto Nacional vinculado ao governo, já que a escolha dos períodos é

justificada por abranger os dois governos que se sucederam, sendo eles o governo do FHC e

do Lula.

Como justificativa teórica, é preciso lembrar que a trajetória do conhecimento em

Administração da Educação indicou que a escola passa a ser focalizada como objeto de estudo

por pesquisadores nacionais e internacionais, principalmente, no período coincidente com os

governos.

O levantamento foi realizado junto ao site do INEP (www.inep.gov.br) e, em cada um

dos periódicos (RBEP e Em Aberto), a busca utilizou-se das seguintes palavras chave: -

escola; - organização(ões) escolar(es); - organização(ões) educativa(s); - cultura da escola;-

administração escolar;- gestão escolar. A dissertação está estruturada, além esta Introdução,

em três capítulos seguidos das Considerações finais. No Capítulo 1, apresenta-se o Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP, os periódicos Revista

Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto, publicados pelo INEP; em seguida,

analisam-se alguns aspectos da Política Educacional da década de 1990 em diante, destacando

suas continuidades e rupturas nos governos presidenciais, Fernando Henrique Cardoso (1995-

2002) e Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), explicitando o contexto em que foram

publicados os artigos nos periódicos que se constituem objeto do estudo.

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No Capítulo 2 consta o referencial teórico para análise dos artigos. Este capítulo versa

sobre as seis imagens organizacionais da escola apresentadas por Costa (2003) e os quatro

modelos teóricos, para o estudo da escola enquanto organização educativa, propostos por

Lima (2008). Dessa forma, imagens e modelos da escola possibilitaram a análise dos artigos

levantados.

No Capítulo 3, foi realizada análise do conjunto da produção, evidenciando:

quantidade, títulos e autores por período (1995-2002; 2003-2010); referencial teórico e

metodológico; principais temáticas contempladas. Também neste capítulo, efetua-se a análise

dos artigos com os subsídios teóricos propostos no Capítulo 2.

O texto foi concluído com as Considerações Finais, em que se retomam alguns

aspectos da pesquisa, em especial ressaltam-se os principais resultados observados.

18

CAPÍTULO 1 – POLÍTICAS EDUCACIONAIS E OS GOVERNOS FHC E LULA:

CONTEXTO BRASILEIRO 1995-2010

Neste capítulo, apresentam-se o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

Educacionais Anísio Teixeira - INEP, os periódicos Revista Brasileira de Estudos

Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto publicados pelo INEP. Em seguida, são analisadas algumas

diretrizes da Política Educacional da década de 1990 em diante, destacando suas

continuidades e rupturas nos dois governos presidenciais.

1.1 O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP)

Segundo Machado (2007, p. 15), as mudanças advindas da Revolução de 1930, em

que a educação era tida como elemento de “salvação nacional” nos discursos de Vargas,

produziram o contexto adequado para que ela passasse a integrar o projeto republicano.

Gustavo Capanema, ministro da Educação, assumiu o cargo em 1936 com a tarefa de

reorganizar a pasta e concretizar a aspiração dos Pioneiros. Foi em tal conjuntura que se deu a

criação do INEP, por lei, no dia 13 de janeiro de 1937, sendo chamado inicialmente de

Instituto Nacional de Pedagogia. O novo órgão teria como missão realizar pesquisas sobre os

problemas do ensino, nos seus diferentes aspectos.

No ano seguinte, o Instituto iniciou seus trabalhos de fato, com a publicação do

Decreto-Lei nº 580, regulamentando sua organização e sua estrutura e modificando sua

denominação para Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos. Foi nomeado para o cargo de

diretor-geral o professor Lourenço Filho.

Segundo esse Decreto-Lei, cabia ao INEP, além de participar da orientação e seleção

profissional dos funcionários públicos da União,

Organizar a documentação relativa à história e ao estado atual das doutrinas e

técnicas pedagógicas; manter intercâmbio com instituições do País e do estrangeiro;

promover inquéritos e pesquisas; prestar assistência técnica aos serviços estaduais,

municipais e particulares de educação, ministrando-lhes, mediante consulta ou

independentemente dela, esclarecimentos e soluções sobre problemas pedagógicos;

divulgar os seus trabalhos. (BRASIL, 1938).

Nas décadas anteriores a sua criação, algumas tentativas de sistematizar os

conhecimentos educacionais e propor melhorias ao ensino já haviam sido articuladas, sem

conseguir, no entanto, ter a continuidade desejada. O INEP configurou-se, então, o primeiro

órgão nacional a se estabelecer de forma duradoura como "fonte primária de documentação e

investigação, com atividades de intercâmbio e assistência técnica" (LOURENÇO FILHO,

19

1963). Nos anos seguintes, o INEP tornou-se uma referência para a questão educacional no

país.

O ano de 1944 foi importante para o INEP, principalmente devido ao lançamento da

Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP), que ocorreu no mês de julho. Todas as

informações educacionais produzidas passaram a ser publicadas neste veículo, que até hoje

atende aos gestores, pesquisadores e estudiosos da Educação.

Em 1952, assumiu a direção do Instituto o professor Anísio Teixeira (permanecendo à

frente do INEP até abril de 1964) que passou a dar maior ênfase ao trabalho de pesquisa. Seu

objetivo era estabelecer centros de pesquisa como um meio de "fundar em bases científicas a

reconstrução educacional do Brasil". (INEP, 1987). A idéia concretizou-se com a criação do

Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE), com sede no Rio de Janeiro, e dos

Centros Regionais, nas cidades de Recife, Salvador, Belo Horizonte, São Paulo e Porto

Alegre. Tanto o CBPE como os centros regionais estavam vinculados à nova estrutura do

INEP.

Em 1972, o INEP foi transformado em órgão autônomo, passando a denominar-se

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, que objetivava realizar

levantamentos da situação educacional do país. Esses levantamentos deveriam subsidiar a

reforma do ensino em andamento – mediante a Lei nº 5.692/71 –, bem como ajudar na

implantação de cursos de pós-graduação. Um ano depois, os Centros Regionais, que haviam

se agregado em parte às universidades ou às secretarias de educação dos estados, foram

extintos. Em 1976, a sede do INEP foi transferida para Brasília. No ano seguinte, o CBPE foi

extinto, marcando o fim do modelo idealizado por Anísio Teixeira e que deu ao INEP

reconhecimento nacional e internacional.

Em 1981 foi lançado o Em Aberto, que possuía um caráter técnico e de

assessoramento interno ao MEC, sendo modificado, mais tarde, para o atendimento de

professores e especialistas fora da estrutura do Ministério.

No início dos anos 1990, o INEP atuou como um financiador de trabalhos acadêmicos

voltados para a educação, sendo que, a partir de 1995, houve um processo de reestruturação e,

com a reorganização do setor responsável pelos levantamentos estatísticos, pretendeu-se que

as informações educacionais pudessem, de fato, orientar a formulação de políticas do

Ministério da Educação.

O primeiro passo se deu com a incorporação do Serviço de Estatística da Educação e

Cultura (SEEC), em 1996, à Secretaria de Avaliação e Informação Educacional (SEDIAE), do

Ministério da Educação. O SEEC, criado em 1937, era um órgão do Poder Executivo, com

20

longa tradição na realização de levantamentos estatísticos na educação brasileira. Em 1997, a

SEDIAE é integrada à estrutura do INEP, passando a existir, a partir desta data, um único

órgão encarregado das avaliações, pesquisas e levantamentos estatísticos educacionais no

âmbito do governo federal.

As mudanças ocorridas no INEP estão relacionadas às mudanças ocorridas nos

governos. Dessa forma, pode-se afirmar que trajetória do INEP reflete as instabilidades

políticas e descontinuidades administrativas que marcaram a história republicana do país no

século passado.

Com o governo da Nova República, em 1985, o INEP passou por um novo desenho

institucional. Retirou-se do fomento à pesquisa, para retomar sua função básica de suporte e

assessoramento aos centros decisórios do Ministério da Educação.

Após o período de dificuldades pelas quais passou no início do governo Collor3,

quando quase foi extinto, o INEP iniciou outro processo de reestruturação e redefinição de sua

missão, centrada em dois objetivos: reorientação das políticas de apoio às pesquisas

educacionais, buscando melhorar sua performance no cumprimento das funções de suporte à

tomada de decisões em políticas educacionais; reforço do processo de disseminação de

informações educacionais, incorporando novas estratégias de modalidades de produção e

difusão de conhecimentos e informações.

Durante o governo Fernando Henrique Cardoso ocorreram mudanças significativas no

INEP, algumas já mencionadas. A partir da reestruturação promovida pela Lei nº. 9.448/97, o

INEP ingressou em fase de franca recuperação, reassumindo sua posição de destaque no

cenário educacional brasileiro. Nesse mesmo ano, 1997, o INEP foi transformado em

autarquia federal.

Observa-se que o processo de reestruturação do INEP somente seria deslanchado na

segunda metade da década de 1990, após a aprovação da nova LDBEN (Lei nº. 9.394/96), a

qual redefiniu as competências e atribuições das três instancias de governo. O novo marco

legal favoreceu a descentralização da gestão educacional, ao mesmo tempo em que promoveu

o fortalecimento do papel do Ministério da Educação como formulador e coordenador das

políticas nacionais. Outra mudança importante trazida pela LDBEN foi a exigência de um

processo nacional de avaliação do rendimento escolar e dos estabelecimentos de ensino,

cabendo à União assegurar a sua realização, em colaboração com os sistemas de ensino.

3 O Governo Collor foi iniciado com a posse do presidente Fernando Collor de Mello, em 15 de março de 1990,

e encerrado em 29 de setembro de 1992, com o impeachment do presidente.

21

O INEP, durante o governo Lula, reorganizou o sistema de levantamentos estatísticos

e teve como eixo central de atividades as avaliações em praticamente todos os níveis

educacionais.

Para gerar seus dados e estudos educacionais, o INEP realiza levantamentos

estatísticos e avaliativos em todos os níveis e modalidades de ensino:

Censo Escolar: levantamento de informações estatístico-educacionais de âmbito

nacional, realizado anualmente;

Censo Superior: coleta, anualmente, uma série de dados do ensino superior no País,

incluindo cursos de graduação, presenciais e à distância.

Avaliação dos Cursos de Graduação: é um procedimento utilizado pelo MEC para o

reconhecimento ou renovação de reconhecimento dos cursos de graduação representando uma

medida necessária para a emissão de diplomas.

Avaliação Institucional: compreende a análise dos dados e informações prestados

pelas Instituições de Ensino Superior (IES) no Formulário Eletrônico e a verificação, in loco,

da realidade institucional, dos seus cursos de graduação e de pós-graduação, da pesquisa e da

extensão.

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior: Criado pela Lei n° 10.861, de

14 de abril de 2004, o Sinaes é o novo instrumento de avaliação superior do MEC/Inep. Ele é

formado por três componentes principais: a avaliação das instituições, dos cursos e do

desempenho dos estudantes.

Exame Nacional do Ensino Médio (Enem): exame de saída facultativo aos que já

concluíram e aos concluintes do ensino médio, aplicado pela primeira vez em 1997.

Exame Nacional Para Certificação de Competências (Encceja): é uma proposta do

Ministério da Educação de construir uma referência de avaliação nacional para jovens e

adultos que não puderam concluir os estudos na idade própria.

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb): pesquisa por amostragem,

do ensino fundamental e médio, realizada a cada dois anos.

Atualmente, o INEP é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Educação

(MEC)4, cuja missão é promover estudos, pesquisas e avaliações sobre o Sistema Educacional

4 Com base na Portaria nº. 2.255, de 25 de agosto de 2003, Art. 1, O INEP já transformado em autarquia federal

vinculada ao Ministério da Educação, nos termos da Lei nº. 9.448, de 14 de março de 1997,é alterada pela Lei nº.

10.269, de 29 de agosto de 2001, tem por finalidades:

I - organizar e manter o sistema de informações e estatísticas educacionais;

II - planejar, orientar e coordenar o desenvolvimento de sistemas e projetos de avaliação educacional, visando o

estabelecimento de indicadores de desempenho das atividades de ensino no País;

22

Brasileiro com o objetivo de subsidiar a formulação e implementação de políticas públicas

para a área educacional a partir de parâmetros de qualidade e equidade, bem como produzir

informações claras e confiáveis aos gestores, pesquisadores, educadores e público em geral.

No que tange às publicações do INEP, as informações produzidas pelo Instituto

constituem referencia básica para os principais programas educacionais do governo federal de

apoio aos sistemas estaduais e municipais de ensino e base de dados para pesquisadores, em

geral. Dois periódicos de relevância nacional constituem publicações históricas do INEP: a

Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP), lançada em 1944, e o Em Aberto, cujo

primeiro número foi lançado em 1981. Ambos são veiculados até hoje e são o principal

material desta pesquisa. A seguir serão apresentados os dois periódicos.

1.2 RBEP e Em Aberto5

Criada em 1944, a RBEP tem periodicidade quadrimestral, com a publicação de artigos

inéditos de natureza técnico-científica, resultantes de estudos e pesquisas que contribuam para

o desenvolvimento do conhecimento educacional e que possam oferecer subsídios às decisões

políticas na área. Seu público leitor é formado por professores, pesquisadores e alunos de

graduação e pós-graduação, técnicos e gestores da área de educação. A RBEP compõe-se das

seguintes seções: a) Estudos – publica artigos inéditos, resultantes de estudos, pesquisas,

debates e experiências relacionadas com a educação e áreas afins;

b) Resenhas – analisa criticamente os lançamentos recentes na área.

Ela oferece acesso livre imediato ao seu conteúdo, seguindo o princípio de que

disponibilizar gratuitamente o conhecimento científico ao público proporciona maior

democratização mundial do conhecimento.

III - apoiar os Estados, o Distrito Federal e os Municípios no desenvolvimento de sistemas e projetos de

avaliação educacional;

IV - desenvolver e implementar, na área educacional, sistemas de informação e documentação que abranjam

estatísticas, avaliações educacionais, práticas pedagógicas e de gestão das políticas educacionais;

V - subsidiar a formulação de políticas na área da educação, mediante a elaboração de diagnósticos e

recomendações decorrentes da avaliação da educação básica e superior;

VI - coordenar o processo de avaliação dos cursos de graduação, em conformidade com a legislação vigente;

VII - definir e propor parâmetros, critérios e mecanismos para a realização de exames de acesso ao ensino

superior;

VIII - promover a disseminação de informações sobre avaliação da educação básica e superior; e

IX - articular-se, em sua área de atuação, com instituições nacionais, estrangeiras e internacionais, mediante

ações de cooperação institucional, técnica e financeira, bilateral e multilateral.

5Informações baseadas no site http://portal.inep.gov.br/institucional-historia

23

A RBEP utiliza o LOCKSS6 para criar um sistema de arquivo distribuído entre as

bibliotecas participantes e permite às mesmas criar arquivos permanentes da revista para a

preservação e restauração.

A seguir, seguem as imagens das capas do periódico, com ênfase na primeira publicação

(1944) e naquelas que se constituirão da análise da pesquisa (1995-2010).

Capas de Publicações da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos

Primeira publicação (1944)

Publicações (1995)

Publicações 1996

6 LOCKSS é um software livre desenvolvido pela Biblioteca da Universidade de Stanford, que permite preservar

revistas online escolhidas ao sondar os websites das mesmas por conteúdo recém publicado e arquivando-o.

Cada arquivo é continuamente validado contra cópias de outras bibliotecas. Caso o conteúdo esteja corrompido

ou perdido, as cópias são usadas para restauração. (http://seer.ibict.br).

24

Publicação 1997

Publicações 1998

Publicações 1999

Publicações 2000

25

Publicações 2001, 2002, 2003 e 2004

Publicações 2005

Publicações 2006

Publicações 2007

26

Publicações 2008

Publicações 2009

Publicações 2010

Observa-se que a RBEP modernizou-se e, a partir de 1998, as capas são diferenciadas

com desenhos, fotos ou figuras.

A Revista Em Aberto foi criada em 1981 e, diferentemente da RBEP, é um periódico

monotemático, que tem por objetivo estimular e promover a discussão de questões atuais e

relevantes da educação brasileira, trazendo opiniões divergentes ou confrontos de pontos de

vista. Publica artigos e bibliografias seletivas. Segundo sua descrição, é largamente utilizada

como material didático nos cursos de graduação e de pós-graduação.

27

A periodicidade é irregular. Esta revista oferece acesso livre imediato ao seu conteúdo,

seguindo o princípio de que disponibilizar gratuitamente o conhecimento científico ao público

proporciona maior democratização mundial do conhecimento. Ela também utiliza o LOCKSS

para criar um sistema de arquivo distribuído entre as bibliotecas participantes.

A seguir, seguem algumas imagens de capas da Revista (2008-2010) em que é

possível identificar uma padronização: duas cores (azul e branco) marcam as capas, assim

como o título temático da revista com o seu respectivo número no canto direito superior:7

Capas de publicações da Revista Em Aberto

Publicação 2008

Publicações 2009

Publicações 2010

7 Apesar de integrar a análise os anos de 1995 a 2010, no site, constam as capas a partir de 2008.

28

No sentido de contextualizar a publicação dos periódicos, destacando as diretrizes que

permaneceram e aquelas que foram modificadas, serão analisados os principais aspectos que

marcaram os dois governos federais entre os anos de 1995 e 2010.

1.3 – Diretrizes da Política Educacional (1995-2010)

A análise é construída a partir de alguns autores (ABDIAN, 2010; FREITAS, 2005;

BARROSO, 2005; OLIVEIRA, 2005) que pontuam elementos da política educacional que

passam a direcionar, em grande medida, as ações e vivências no interior da escola pública

brasileira.

Compartilha-se com Abdian (2010) quando afirma que dois movimentos

concomitantes marcam a emergência da escola como “foco” das atenções atuais na educação,

sendo o da política educacional e o dos estudos acadêmicos.

Em nível global, Barroso (2005, p. 726) aponta que a problemática da reforma e

reestruturação do Estado constitui, principalmente a partir dos anos 1980 do século XX, um

tema central do debate político, “num conjunto alargado de países, em todos os continentes, e

está na origem de medidas políticas e legislativas, muito diversas, que afectaram a

administração pública em geral e, consequentemente, a educação”. O autor elenca as

seguintes medidas: descentralização; a autonomia das escolas; a livre escolha da escola pelos

pais; o reforço de procedimentos de avaliação e prestação de contas; a diversificação da oferta

escolar (cada “público” sua escola); a contratualização da gestão escolar e da prestação de

determinados serviços; etc.

É no contexto deste debate que, na educação, são promovidas e aplicadas medidas

políticas e administrativas que, em geral, segundo Barroso (2005), alteram os modos de

regulação dos poderes públicos no sistema escolar, substituindo, por exemplo, poderes

públicos por entidades privadas, em muitos dos domínios que constituíam, até aí, um campo

privilegiado da intervenção do Estado.

Estas medidas tanto podem obedecer (e serem justificadas), de um ponto de vista

mais técnico, em função de critérios de modernização, desburocratização e combate

à “ineficiência” do Estado (“new public management”), como serem justificadas por

imperativos de natureza política, de acordo com projectos neoliberais e

neoconservadores, com o fim de “libertar a sociedade civil” do controlo do Estado

(privatização), ou mesmo de natureza filosófica e cultural (promover a participação

comunitária, adaptar ao local) e de natureza pedagógica (centrar o ensino nos alunos

e suas características específicas). (BARROSO, 2005, p. 726).

29

Conforme Barroso (2005), no domínio da educação, a influência das idéias neoliberais

fez-se sentir quer por meio de múltiplas reformas estruturais, de dimensão e amplitude

diferentes, destinadas a reduzir a intervenção do Estado na provisão e administração do

serviço educativo, quer por meio de retóricas discursivas (dos políticos, dos peritos, dos meios

de informação) de crítica ao serviço público estatal e de “encorajamento do mercado”. Este

“encorajamento do mercado” traduz-se, segundo o autor, sobretudo, na subordinação das

políticas de educação a uma lógica estritamente econômica (“globalização”); na importação

de valores (competição, concorrência, excelência etc.) e modelos de gestão empresarial, como

referentes para a “modernização” do serviço público de educação; na promoção de medidas

tendentes à sua privatização.

A educação está em pleno processo de recomposição das relações entre Estado e

mercado, no que se refere ao fornecimento e financiamento dos serviços públicos. Contudo,

segundo Barroso (2005, p.745), por mais estimulantes que sejam as teorias e as estratégias da

complementaridade dos modelos e da variedade de situações em que podem ser aplicados, é

importante não esquecer que, para além das soluções técnicas, há sempre que se colocar as

questões políticas.

Barroso (2005) ainda afirma que, por um lado, falta ao mercado (entre outras coisas) a

sensibilidade social que permita atender aos que, pelas mais diversas razões, exigem mais

tempo, mais dinheiro e melhores recursos para obterem o sucesso educativo a que têm direito.

Por outro, o Estado social não pode estar limitado (como querem os defensores de políticas

neoliberais neste domínio) a cumprir as funções de “carro-vassoura” dos excluídos que o

mercado enjeita (por questões de rentabilidade e eficácia).

E, aqui, o recurso à metáfora do “carro-vassoura” justifica-se plenamente se nos

recordarmos que esta designação é dada, nas corridas de ciclismo, ao carro que vai

na cauda do pelotão para recolher os ciclistas que são obrigados a desistir, por não

conseguirem acompanhar o andamento dos outros corredores. (BARROSO, 2005,

p.746).

É este o grande desafio que se coloca a todos os que continuam a acreditar na

necessidade de “provermos colectivamente um serviço público que garanta o pleno direito à

educação e o acesso a uma cultura comum, para todas as crianças e jovens, em condições de

equidade, de igualdade de oportunidades e de justiça social”. (BARROSO, 2005, p. 747).

Com os autores trazidos para o debate, é possível identificar que a política

educacional, principalmente a partir dos anos de 1990, está baseada em critérios

predominantemente economicistas, e sendo assim, os pesquisadores, preocupados em

30

estabelecer a crítica e investigar o modo de vida na escola, parecem deixar inúmeros

questionamentos com respostas diferentes.

Especificamente no Brasil, o cenário atual de hegemonia capitalista, respaldado na

doutrina neoliberal e na globalização dos mercados, influenciou uma ampla reforma do

Estado concretizada via reformas setoriais, dentre elas, a da educação.

Abdian (2010) identifica que a reforma educacional brasileira da década de 1990

privilegiou e talvez ainda venha privilegiando, questões relacionadas aos aspectos financeiros

e à adequação do sistema educacional à lógica do capitalismo, mediante, entre outros

aspectos, redefinição do sistema de financiamento e regulação da política com a concretização

de rígido e centralizado sistema de avaliação nacional. A autora ainda expressa que no

contexto das reformas, a gestão da educação ganhou atenção maior na medida em que se

tornou uma das responsáveis direta pela melhoria da produtividade do setor educacional

público diante das novas demandas dos setores produtivos e das orientações das agências

internacionais de financiamento.

Com a intenção de melhorar a qualidade de ensino, a eficácia e a eficiência do

sistema educacional, o governo brasileiro passou a incentivar a descentralização do ensino

(via municipalização), revisão do processo de financiamento dos níveis de ensino, com o foco

centrado na educação básica e preocupação com a autonomia da escola.

Em relação às alterações na organização da escola, é preciso destacar que os

diretores passam a ser considerados a principal carreira em que se dá a incorporação do novo

gerencialismo, sendo crucial para a transformação dos regimes organizacionais das escolas.

Neste contexto, são concretizados programas que se remetem diretamente às escolas.

São, por exemplo, o “Programa Dinheiro Direto na Escola” que estimula a administração por

objetivos, a pedagogia de projetos, a cultura da eficiência e demonstração dos resultados; os

cursos de formação continuada de diretores de escola (“Circuito Gestão; ProGestão”8) com o

principal objetivo de formar lideranças que conduzam, de forma eficiente e eficaz, as metas

traçadas pela política educacional.

Neste sentido, o Estado se torna mais flexível na definição dos processos e rígido na

avaliação da eficiência e eficácia dos resultados, principalmente mediante a realização das

avaliações nacionais do ensino, em todos os níveis e modalidades.

8 CALIXTO, E. A.; MAIA, G. Z. A. Programa Progestão e a gestão democrática. Org & Demo (Unesp.

Marília), v. 9, p. 203-222, 2009.

MESSAS, J. C. A. e. Administração da educação e administração pública: relações e implicações. 257f. Tese

(doutorado em Educação) – Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista. Marília, 2007.

31

Ao contrário, os diferentes pesquisadores que se voltam ao estudo da escola defendem

sua especificidade e a necessidade de substituição de critérios econômicos por critérios

pedagógicos e políticos porque, “uma administração que não discute o sentido público ou

moral das finalidades a que se volta, limitando-se a buscar os meios necessários à sua

realização, pode até ser eficaz, mas, certamente, não será educacional.” (SILVA JR, 2002, p.

204).

E, diante desse contexto mercantil, como pode ser pensada a Administração/Gestão9

na organização escolar?

Abdian (2010) recorre ao conceito clássico de Administração, retomado por Paro

(1986), que o faz abstraindo de um contexto específico e assim formula: “Administração é a

utilização racional de recursos para se atingir fins determinados”. Bem, se os fins não estão

determinados previamente e serão construídos pelo coletivo da escola em um processo

dialógico e dialético, qual seria a função da Administração/gestão escolar constituída,

normalmente e guardadas as especificidades locais, pelo diretor, vice-diretor e coordenador

(ou supervisor)?

Compartilha-se da idéia de Abdian (2010) quando considera que a

Administração/gestão pode contribuir para a consecução dessa escola no sentido de “embalá-

la” (MACHADO, 2000), fazê-la caminhar rumo à construção da qualidade negociada.

Freitas (2005), com outra intenção e outro referencial, afirma que há anos os

pesquisadores constroem críticas às políticas neoliberais e que, “nesse mesmo tempo, as

políticas democráticas e participativas ocuparam espaços em vários lugares”, sendo que seus

resultados precisam ser avaliados mediante o estabelecimento de uma agenda de pesquisa que

não é tarefa individual, mas de grupos de pesquisa comprometidos com políticas públicas

progressistas.

Em perspectiva semelhante a de Abdian (2010), Oliveira (2005) coloca que a gama de

pesquisas nesse campo, no que se refere à gestão – a tensão entre descentralização e

centralização; autonomia financeira e administrativa e sistemas nacionais de avaliação; a

autonomia pedagógica requerida das escolas e as prescrições curriculares, entre outros –, pode

ser considerada correlata à problemática da regulação educacional. A autora destaca também

que o grande número de trabalhos dessa natureza publicados nos últimos cinco anos revela a

necessidade de compreensão de uma realidade contraditória, em constante mutação. “Os

fenômenos retratados de maneira parcelada nesses estudos apontam, ainda, a necessidade de

9 Aqui Administração e Gestão são entendidas como sinônimos.

32

novas abordagens que procurem compreender a complexidade dos fatores e processos que

vêm alterando significativamente essa realidade”. (OLIVEIRA, 2005, p.764).

Nesse contexto, outro aspecto que merece destaque é a grande atenção dispensada para

o ensino fundamental, etapa obrigatória da Educação Básica, considerada o pilar da

consolidação do domínio da escrita e do cálculo e que surgia de incentivos à melhoria dos

índices de aprovação e de aprendizagem.

Uma grande reforma administrativa brasileira, especificamente interessante para este

estudo, foi a “Reforma Bresser”, ocorrida no governo de Fernando Henrique Cardoso,

considerando que suas diretrizes estiveram pautadas nas principais políticas neoliberais que

atualmente permeiam o campo educacional.

A referida reforma, após um longo período de conturbações políticas, econômicas e

sociais, foi implantada pela promulgação da Emenda Constitucional nº 19/1998, alterando

dispositivos da Constituição Federal (1988). A vigência dessa Emenda positivou, em nível

constitucional, a chamada Reforma Gerencial do Estado, implementada basicamente no

primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso (1995 - 1998), cujo mentor foi o Ministro

Luiz Carlos Bresser Pereira. Com base no cenário internacional, a Reforma Gerencial de 1995

teve seu foco principal na transformação do modelo burocrático para o modelo gerencial,

tendo como princípio a eficiência do serviço público, pois

[...] era uma imposição histórica para o Brasil, como para todos os demais países que

havia nos cinqüenta anos anteriores montado um Estado do Bem Estar. O grande

crescimento que o aparelho do Estado se impusera para que pudesse garantir os

direitos sociais, exigiam que o fornecimento dos respectivos serviços de educação,

saúde, previdência e assistência social fosse realizado com eficiência. Esta eficiência

tornava-se, inclusive, uma condição de legitimidade do próprio Estado e de seus

governantes. (NEVES, 2010, p. 93).

Conforme documentos do extinto Ministério da Administração Federal e Reforma do

Estado – MARE (1995), todo esse processo de reforma gerencial que criticava a ineficiência

estrutural da administração pública burocrática objetivou deixar explícito que:

A reforma do Estado deve ser entendida dentro do contexto da redefinição do papel

do Estado, que deixa de ser o responsável direto pelo desenvolvimento econômico e

social, para se tornar seu promotor e regulador. O Estado assume um papel menos

executor ou prestador direto de serviços mantendo-se, entretanto, no papel de

regulador e provedor destes. Nesta nova perspectiva, busca-se o fortalecimento das

suas funções de regulação e de coordenação, particularmente no nível federal, e a

progressiva descentralização vertical, para os níveis estadual e municipal, das

funções executivas no campo da prestação de serviços sociais e de infra-estrutura.

Considerando essa tendência, pretende-se reforçar a governança – a capacidade de

governo do Estado – por meio da transição programada de um tipo de administração

pública burocrática, rígida e ineficiente, voltada para si própria e para o controle

33

interno, para uma administração pública gerencial, flexível e eficiente, voltada para

o atendimento da cidadania [...]. (MARE, 1995, p. 4).

Praticamente todas as principais metas da reforma gerencial ou “Reforma Bresser”

causaram grandes impactos nas políticas públicas educacionais atuais, especialmente, no que

diz respeito à avaliação da qualidade do ensino no país. Segundo Paz (2011), em síntese, as

mudanças ocasionadas pela Reforma Bresser são: a redefinição dos objetivos da

administração pública, voltando-a para o cidadão-cliente;

o aperfeiçoamento dos instrumentos de coordenação, formulação, implementação e avaliação

de política públicas; afirmação de que a administração pública deve ser permeável à maior

participação dos agentes privados e das organizações da sociedade civil, deslocando-se a

ênfase dos procedimentos (meios) para os resultados (fins); o redesenho de estruturas mais

descentralizadas, a desestatização, que compreende a privatização, a terceirização e a

desregulamentação; a definição precisa dos objetivos que o administrador público deverá

atingir em sua unidade e o controle ou cobrança a posteriori dos resultados; à avaliação

sistemática, à recompensa pelo desempenho, e à capacitação permanente, que já eram

características da boa administração burocrática, acrescentam-se os princípios da orientação

para o cidadão cliente, do controle por resultados, e da competição administrada.

A “Reforma Bresser”, que flexibilizou os processos e os regulamentos burocráticos,

conferiu um grau mais elevado de autonomia e de accountability às agências governamentais

e aos seus gerentes, iniciou-se a partir do governo FHC e continuou influenciando as políticas

do governo Lula. A postulação da “Reforma Bresser” estava inserida em um contexto mais

amplo de reformas neoliberais e não se deu originalmente por ideologia das entidades

políticas e econômicas brasileiras, mas, em sua grande totalidade, atrelada a acordos com

organismos internacionais.

Os principais organismos internacionais que promoveram políticas reformistas no que

se refere à educação são: o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Banco

Mundial (BM), a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a

Organização dos Estados Americanos (OEA), o Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (PNUD) e o Programa de Reformas Educacionais da América Latina e

Caribe (PREAL). Dessas instituições, para o caso da educação brasileira, destaca-se a forte

atuação do Banco Mundial e do FMI.

De modo geral, as reformas administrativas estimuladas pelos organismos

internacionais desencadearam reformas educacionais que, pautadas na mesma perspectiva

neoliberal, buscaram a redefinição da educação em termos de mercado.

34

Paz (2011) destaca o direcionamento da educação ao mercado, ao afirmar que o Banco

Mundial vem, desde os anos 1990, recomendando um pacote de reformas educativas para os

mais variados países, que contém, dentre outros, os seguintes elementos centrais: prioridade

na educação primária; melhoria da eficácia da educação; ênfase nos aspectos administrativos;

descentralização e autonomia das instituições escolares, entendida como transferência de

responsabilidades de gestão e de captação de financiamento, enquanto ao Estado caberia

manter centralizada as funções de fixar padrões, facilitar os insumos que influenciam o

rendimento escolar, adotar estratégias flexíveis para a aquisição e uso de tais insumos e

monitorar o desempenho escolar; a análise econômica como critério dominante na definição

das estratégias.

Empreendendo uma análise mais específica, podem-se resumir as políticas do Governo

FHC (propulsor da “Reforma Bresser”) e do Governo Lula, de forma sintética, apontando as

medidas das principais políticas públicas do período (PAZ, 2011). Convém lembrar que

ambos os governos emergiram em meio às fortes transformações decorrentes da reforma, mas

a maioria de suas ações esteve pautada no atendimento aos acordos consensuais realizados

com o Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e Organização Mundial do Comércio,

visando à progressão das idéias neoliberais pós-crise de 70.

Durante o Governo FHC (1995-2002), foram estabelecidas algumas medidas

específicas na Educação e entre elas: a criação do Programa Dinheiro Direto na Escola –

PDDE – 1995; a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases nº. 9394/96; a implementação do

Fundef - Lei n. 9.424/96 – mas sem a inclusão da Educação Infantil, Ensino Médio e

Educação de Jovens e Adultos na política de financiamento; o estímulo à municipalização por

meio da vinculação do Fundef ao número de alunos; a criação dos Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCN) -1997. Houve também o aprimoramento do SAEB – 1995 – possibilidade de

comparação dos resultados ao longo do tempo e a perspectiva de compreensão das

consequências de políticas e práticas educacionais sobre o desempenho dos estudantes; o

apoio a programas de correção do fluxo escolar e caracterização da reprovação em larga

escala como medida ineficaz e excludente; a formação inicial e continuada de professores por

meio do incentivo às assessorias pedagógicas privadas e o estímulo ao Ensino Fundamental de

Nove Anos.

Durante o Governo Lula (2003-2010), pode-se destacar: a implantação do Ensino

Fundamental de Nove Anos; a continuidade e o aprofundamento da avaliação em larga escala

com avaliações externas – Prova Brasil, Provinha Brasil, Saeb, Enem, Enceja, Enade, etc; a

criação do Fundeb – Lei nº 11.494/2007 – com a inclusão da Educação Infantil, Ensino Médio

35

e Educação de Jovens e Adultos no aporte de Recursos; a criação do Plano de

Desenvolvimento da Educação (PDE) – Decreto nº 6.094/2007 e do Plano de Ações

Articuladas (PAR); a instituição do piso nacional para professores – Lei nº 11.738/2008; a

influência de economistas, empresários e da OCDE (Organização para a Cooperação e

Desenvolvimento Econômico) na gestão e implantação de novos mecanismos de avaliação

externa; a criação do IDEB e metas envolvendo transparência nos resultados de escolas e

redes de ensino; a Avaliação nacional inclui a vertente censitária (Prova Brasil) e o SAEB

passa a ser utilizado para a elaboração do IDEB no âmbito das unidades da federação; o Plano

Nacional de Formação de Professores da Educação Básica e continuação do estímulo à

parceria com assessorias pedagógicas privadas.

A urgência na criação de políticas públicas objetivando o desenvolvimento econômico

e social do país desencadeou diversas ações do governo Lula. A principal delas foi o

lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em 28 de janeiro de 2007,

que engloba um conjunto de políticas econômicas, planejadas para os quatro anos seguintes, e

que tem como objetivo acelerar o crescimento econômico do Brasil, prevendo investimentos

totais de R$ 503,9 bilhões até 2010, sendo uma de suas prioridades o investimento em

infraestrutura, saneamento, habitação, transporte, energia e recursos hídricos, entre outros.

Frente aos objetivos do PAC, cada ministério teve que apresentar uma série de ações

que se enquadrariam no referido programa. O Ministério da Educação aproveitou, então, e

lançou em 24 de abril de 2007, o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Tal plano

foi lançado concomitantemente ao Decreto nº 6.094/2007, que instituiu o "Plano de Metas

Compromisso Todos pela Educação". O Decreto nº. 6.094/2007, estruturalmente, trata em seu

Capítulo I do estabelecimento de 28 metas para a melhoria na qualidade da educação; no

Capítulo II sobre o IDEB; no Capítulo III do termo de adesão voluntária dos municípios,

estados e Distrito Federal ao Compromisso; e no Capítulo IV sobre o Plano de Ações

Articuladas (PAR) como requisito para recebimento da assistência técnica e financeira aos

entes participantes do Compromisso.

O notável é que, convidadas a participar como representantes da sociedade civil, as

empresas é que acabaram dando o delineamento final ao PDE, contribuindo para a definição

das metas contidas no Decreto nº. 6.094/2007/INEP10

.

10

Sucintamente as metas baseiam-se em: estabelecer como foco a aprendizagem, apontando resultados

concretos a atingir; acompanhar cada aluno da rede individualmente; combater a repetência e a evasão; ampliar

as possibilidades de permanência do educando; promover a educação infantil; manter programa de alfabetização

de jovens e adultos; oferecer formação inicial e continuada de profissionais da educação; valorizar o mérito do

trabalhador da educação; fixar regras claras, considerados mérito e desempenho, para nomeação e exoneração de

36

É importante reforçar que devido às limitações deste estudo, serão discutidas as ações

do PDE em relação aos programas para a elevação da qualidade da educação, restringindo a

análise àqueles voltados ao ensino fundamental, posto que as propostas para o ensino médio e

a educação superior são extremamente amplas e ultrapassam os objetivos propostos.

Sendo assim, no que se refere ao ensino fundamental, podemos destacar três ações

estratégicas do PDE: 1) a implantação da “Provinha Brasil”, destinada a avaliar o desempenho

em leitura e escrita das crianças de 6 a 8 anos de idade, tendo como objetivo verificar se as

crianças da rede pública estão chegando aos 8 anos efetivamente alfabetizadas e letradas; 2) o

“Programa Dinheiro Direto nas Escolas” (PDDE) que concede, a título de incentivo, um

acréscimo de 50% de recursos financeiros às escolas que cumprirem as metas do IDEB; e 3) o

programa “Gosto de Ler” que pretende, por meio da Olimpíada Brasileira da Língua

Portuguesa, estimular o gosto pela leitura, nos alunos do ensino fundamental.

Mesmo que nos últimos quatro anos o MEC tenha dado grande ênfase à política de

avaliação educacional, com a consolidação do SAEB, assumindo a responsabilidade atribuída

pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de assegurar processo nacional de

avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração

com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade

do ensino, ainda, de modo geral, como aponta Paz (2011), a escola pública apresenta os

mesmos problemas de sempre: infraestrutura deficiente, professores mal remunerados, um

ensino de baixa qualidade e índices de evasão muito grandes.

A questão central deve ser não apenas detectar onde está o problema, mas intervir

técnica e financeiramente para saná-lo. Desse modo foi desenvolvido o IDEB que, segundo o

INEP, serve para avaliar os sistemas de ensino dos estados e municípios, bem como

possibilitar uma compreensão da qualidade do ensino oferecido em cada escola.

O IDEB foi criado em 2007 (Governo Lula) pelo INEP e resulta da combinação de

dois fatores que interferem na qualidade da educação: indicadores de fluxo (taxas de

aprovação, reprovação e evasão), medidos pelo Censo Escolar, indicadores de desempenho

em exames padronizados como o SAEB e Prova Brasil, realizados a cada dois anos ao final de

determinada etapa da educação básica.

diretor de escola; promover a gestão participativa na rede de ensino; integrar os programas da área da educação

com os de outras áreas como saúde, esporte, assistência social, cultura, dentre outras, com vista ao

fortalecimento da identidade do educando com sua escola; transformar a escola num espaço comunitário; firmar

parcerias externas à comunidade escolar, visando a melhoria da infraestrutura da escola ou a promoção de

projetos socioculturais e ações educativas; organizar um comitê local do Compromisso para acompanhamento

das metas de evolução do IDEB.

37

A Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB),

criados pelo INEP, são avaliações em larga escala, cujos testes são aplicados na quarta e

oitava séries (quinto e nono anos) do ensino fundamental e terceira série do ensino médio e

estão restritos à aplicação de testes de Língua Portuguesa, Matemática e questionários

socioeconômicos.

É oportuno ressaltar que a combinação de indicadores de fluxo e de proficiência dos

alunos, que resultam no IDEB, é calculada em valores de 0 a 10. A meta do MEC é que o

Brasil atinja até 2021, ano que antecede a comemoração do bicentenário da Independência do

Brasil, níveis educacionais de países desenvolvidos, o que corresponde à média seis para os

anos iniciais do Ensino Fundamental. Importa evidenciar que o ponto de partida para a criação

das metas foi a definição do IDEB 2005 (inicial), resultante dos dados de desempenho

apresentados na Prova Brasil e dos Censos Escolares de 2005 e 2006, que permitiram a

conjunção das taxas de aprovação.

Para Silva Júnior e Ferretti (2004), no plano do imaginário social brasileiro FHC e

Lula são figuras públicas diferentes. FHC é visto como competente politicamente por ter

formação acadêmica e científica, enquanto Lula parece à sociedade, o povo no poder. Em

ambos os governos, contrariamente aos discursos, os objetivos econômicos e sociais postos

para a escola não se realizaram. Ao contrário, acentuam-se os problemas econômicos internos

ao Brasil, especificamente os de natureza social, com destaque para a violência e para aqueles

que, nos discursos dos reformadores, consistiam em suas principais metas.

Os aspectos evidenciados integram parte do contexto no qual foram produzidos os

artigos levantados e que serão analisados. A seguir, serão apresentados os dois governos

presidenciais com suas especificidades.

1.4 - Os dois governos: rupturas e permanências

Lima (2007) contempla as diferentes fases da contrarrevolução neoliberal no Brasil.

Para ele, no início da década de 1990, os governos de Fernando Collor de Mello (1990-1992)

e Itamar Franco (1993-1994) identificaram o momento de adesão do país ao projeto

neoliberal. A burguesia brasileira, articulada com o avanço do neoliberalismo, ansiava por

uma nova via de desenvolvimento econômico a partir da inserção do país no mercado

internacional e pela substituição do modelo desenvolvimentista por novos padrões de

acumulação, reivindicando o fim da intervenção estatal no mercado interno e a

desregulamentação dos direitos sociais e trabalhistas.

38

O projeto do governo FHC (1995-2002) representou mais um episódio dos acordos e

alianças estabelecidos pela burguesia brasileira para manter seus interesses políticos e

econômicos. O novo bloco no poder, sob a hegemonia do capital financeiro (em sua dupla

face – nacional e internacional), instaurou uma nova racionalidade na condução da contra-

revolução neoliberal. Um projeto afinado com as reformas estruturais elaboradas pelos

organismos internacionais para a periferia do sistema, especialmente com a reforma do

Estado, que reorganiza o conjunto das políticas sociais, entre elas à nova (des)ordem do

capital. O governo Lula implementa uma terceira fase do projeto neoliberal caracterizada por

traços de descontinuidade em relação à fase clássica do neoliberalismo.

Para Lima (2007), na metade da década de 1990, o Brasil ingressou na segunda fase da

contra-revolução neoliberal. A reconfiguração da luta de classes exigida pelo consenso de

Washington e, posteriormente, pelo “pós-Consenso de Washington”, consubstanciou as bases

desse novo projeto de sociabilidade para a periferia do capitalismo e impôs à burguesia

brasileira uma nova racionalidade, que continuasse respondendo à crise econômica e política

deixada pelo presidente Collor de Mello, mas que ampliasse a legitimidade do neoliberalismo,

como única saída possível para garantia da estabilidade econômica com justiça social, ou seja,

da ampliação da lucratividade para a burguesia com a necessária coesão social.

A atuação de Fernando Henrique Cardoso à frente do Ministério da Fazenda do

governo do Itamar Franco, no período de maio de 1993 a março de 1994, e o lançamento do

Plano Real; suas estreitas relações com o FMI e o Banco Mundial; e sua atuação política no

Partido da Socialdemocracia Brasileira (PSDB), do qual foi membro fundador, colocam-no

em posição privilegiada na disputa eleitoral de 1994. Segundo Lima (2007), apesar de sua

trajetória política de oposição ao regime militar, em seu horizonte intelectual e político não

estava presente a ruptura efetiva com a ordem burguesa.

FHC identifica as relações diferenciadas existentes entre os países imperialistas e os

países dependentes, mas afirmou que a elaboração de um projeto nacional de

desenvolvimento é possível para os países dependentes, por meio de sua associação com o

capital internacional. O Estado brasileiro, capital nacional, e capital internacional compõem o

campo de ação política deste projeto de desenvolvimento associado. Outro indicador

importante do horizonte político de FHC é sua filiação ao PSDB, partido que se identifica

como socialdemocrata, apresentando como seu princípio norteador a democracia como valor

universal, como afirma sua declaração programática. A identificação de FHC como

socialdemocrata é uma referencia importante para a análise dos reordenamentos entre Estado

e sociedade civil realizados no Brasil a partir da metade da década de 1990.

39

Baseadas nestes pressupostos políticos, nos resultados de estabilidade econômica e de

controle da inflação gerados no início do Plano Real, no final de 1993, e com o apoio dos

organismos internacionais, as várias frações da burguesia brasileira, apesar de seus interesses

particularistas, uniram-se na defesa do projeto neoliberal conduzido pelo governo FHC.

Por meio de todas estas políticas – desregulamentação dos direitos trabalhistas e

sociais, privatização de setores estratégicos da economia brasileira, abertura comercial e

desregulamentação financeira –, o capital conquistou vitórias em sua ofensiva ao trabalho. As

empresas e bancos estadunidenses e europeus que operavam no Brasil lucraram com a

redução salarial e com o corte dos direitos, concebidos como “benefícios”, aos trabalhadores

brasileiros.

Estas empresas e os bancos também investiram maciçamente na compra

(isoladamente ou em parceria com a burguesia brasileira) dos bancos estatais e das

principais empresas estatais brasileiras. Por fim, a fração hegemônica da burguesia

no bloco no poder, o capital financeiro, ganhou amplamente. Por mais existam

interesses específicos de cada fração indicando contradições, fissuras e disputas

internas (no governo de Cardoso seriam identificados principalmente como

desenvolvimentistas e monetaristas), todas estariam reunidas em torno do projeto

neoliberal de governo vigente a partir da metade da década de 1990. (LIMA, 2007,

p. 95).

O projeto de governo para o período de 1995-1998, intitulado Mãos à obra, Brasil

(CARDOSO, 1994), considerou o desenvolvimentismo como um período de aceleração da

industrialização, viabilizado pela capacidade de investimento do Estado e da participação do

capital estrangeiro. Entretanto, o documento avalia que, diante a globalização econômica e da

abertura comercial, o Brasil deve estar inserido no mercado mundial de forma mais

contundente, bem como que uma suposta crise fiscal do Estado, causada pelo financiamento

excessivo de atividades econômicas e de políticas sociais durante aquele período, indicaria a

necessidade urgente de alterações em sua configuração. As ações políticas do governo FHC

ganhavam novos contornos com o documento intitulado Plano diretor da reforma do

aparelho de Estado (Brasil, 1995a), elaborado pelo Ministério da Administração Federal e

Reforma do Estado (MARE) na gestão de Luiz Carlos Bresser Pereira, representante do

governo brasileiro no Consenso de Washington. Este documento foi aprovado pela Câmara da

Reforma do Estado, composta, entre outros, por Pereira, pelo ministro do Trabalho, Paulo

Paiva, pelo ministro do Planejamento e Orçamento, José Serra, e pelo ministro da Fazenda,

Pedro Malan, consultor do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ex-diretor-

executivo do Banco Mundial e principal negociador da dívida brasileira durante o governo

40

Collor de Mello. No que se refere diretamente à reforma administrativo-gerencial do aparelho

de Estado, o documento destacou o aumento de gastos com os servidores públicos; a rigidez

da estabilidade a eles assegurada; a necessidade de estimular um espírito empreendedor na

política de recursos humanos, por meio do condicionamento da remuneração do servidor ao

seu desempenho profissional; a transformação das autarquias em organizações públicas não-

estatais, denominadas organizações sociais; e a importância da reforma da previdência e do

fim da obrigatoriedade do regime Jurídico Único como estratégias fundamentais para o

enfrentamento tanto da crise fiscal como da inoperância e desqualificação do serviço público.

O Estado deixaria de ser o responsável direto pelo desenvolvimento econômico e

social, pela produção de bens e serviços, para exercer a função de regulador desse

desenvolvimento, transferindo a responsabilidade pela sua execução para o setor privado, por

meio da política de privatização, e para o setor público não estatal, um setor parcialmente

subsidiado pelo Estado e que executaria serviços não exclusivos do Estado. Esta lógica estaria

presente também no plano plurianual (PPA) do governo Cardoso para o período 1996-1999 e

no programa Brasil em ação: investimentos para o desenvolvimento (BRASIL, 1996c).

Ao longo do primeiro mandato do governo FHC, os cortes de verbas públicas com as

áreas sociais, o aprofundamento da política de privatização, as altas taxas de juros, o

contingenciamento das verbas inicialmente planejadas no orçamento da União para garantia

do pagamento das dívidas externa e interna ampliaram o desemprego e as desigualdades

econômicas no país. Este quadro social fez com que o governo elaborasse um conjunto de

propostas direcionadas para as áreas sociais no sentido de criar um clima de coesão social e

apoio às reformas estruturais em curso.

Lima (2007) aponta que a partir de 1998, esta reconfiguração do discurso e das ações

do governo FHC, evidenciando uma aproximação com as perspectivas preconizadas pelo pós-

Consenso de Washington, fez com que a questão do alívio à pobreza se tornasse ponto nodal

de suas políticas. Em pleno processo de campanha eleitoral para a reeleição, a equipe de FHC

elaborou o programa de governo Avança Brasil: mais quatro anos de desenvolvimento para

todos (CARDOSO, 1998), apresentando um novo eixo norteador deste governo para o

seguinte (1999-2002): a inclusão dos excluídos. Estabilidade econômica com justiça social

seria o elemento político central do documento, que recuperava a análise sobre a estabilização

econômica conseguida com o Plano Real e o conjunto de reformas estruturais empreendidas

no primeiro governo, partes constitutivas da reforma do Estado em curso, indicando que

caberia ao segundo governo avançar para consolidar o real, duplicar as exportações,

consolidar a democracia e lutar contra a fome, a pobreza e a exclusão.

41

No ano de 2000, foi realizado um corte no orçamento geral da União no valor de R$

8,6 bilhões, para cumprimento das metas de superávit fiscal estabelecidas com o

FMI. Este mesmo processo foi repetido em 2001. Um mês após a divulgação do

Orçamento Geral da União para aquele ano, o governo Cardoso realizou um

primeiro contingenciamento de R$ 5,8 bilhões e, em julho do mesmo ano, um

segundo corte de R$ 968,1 milhões. O corte realizado na proposta orçamentária de

2002 foi inicialmente (fevereiro) de R$ 13,2 bilhões e posteriormente (maio) de R$

5,3 bilhões para garantir o superávit primário de 2,83% do Produto Interno Bruto

(PIB), conforme acordado com o FMI. Diante deste quadro, um conjunto de

movimentos sociais realizou, em setembro de 2000, o Plebiscito Nacional da Dívida,

quando 6 milhões de brasileiros exigiram a suspensão do pagamento da dívida e a

realização de uma auditoria dos contratos. “De acordo com estudos do Sindicato

Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco), entre 1979 e 2002, o

país mandou para o exterior 163 bilhões de dólares a mais do que recebeu.”

(JUBILEU BRASIL, 2003a) Entretanto, o governo Cardoso ignorou a realização do

plebiscito e manteve seus acordos e contratos com o FMI. (LIMA, 2007, p. 99-100)

Ao término da segunda fase da contrarrevolução neoliberal sob a condução do governo

FHC, o cenário era ainda mais devastador do que o da primeira fase de Collor de

Mello/Itamar Franco. Uma sequência de escândalos, desvios e irregularidades envolviam os

diversos escalões do governo. Da proteção sem limites ao capital financeiro, por meio do

Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional

(Proer), de 1996, às doações de banqueiros para campanhas eleitorais da base de apoio do

governo (processos da “pasta rosa” em 1996); do desvio de verba pública por governadores e

prefeitos na CPI dos precatórios (1996) à compra de votos para aprovação de projetos de

interesse do bloco no poder, inclusive a emenda da reeleição de FHC, passando pela

privatização da Companhia Vale do Rio Doce e do sistema de telecomunicações em 1997,

pelas fraudes na Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), com o desvio

de R$ 1,4 bilhão, até os altos depósitos em contas bancárias nos paraísos fiscais envolvendo a

cúpula palaciana. Fica evidente, portanto, que o projeto neoliberal de “desenvolvimento

associado” de FHC ampliou mais a dependência do país. (LIMA, 2007).

Além das dívidas externa e interna, a desindustrialização e a desnacionalização de

setores estratégicos do país indicaram o caminho para as negociações relativas à Área de livre

comércio das Américas - ALCA11

, comprometendo a soberania do país e configurando o

desmonte da Nação. Desindustrialização e desnacionalização articuladas ao intenso processo

de subordinação da ciência e tecnologia à lógica empresarial. A política de privatização

vigente ampliou a histórica concentração de renda no país, que convivia com a mais perversa

11

O ALCA (Área de livre comércio das Américas) foi implantado em 34 países da América, exceto Cuba, no

ano de 1994. Ele tem por objetivo suprimir as barreiras alfandegárias entre os países.

(pt.wikipedia.org/wiki/ALCA).

42

desigualdade de riquezas, duas faces de um mesmo projeto, que fizeram com que o Brasil

entrasse no século XXI como “país campeão mundial da desigualdade na distribuição de

renda” (GONÇALVES, 1999, p. 48).

Era preciso buscar, como aponta Lima (2007, p.104), no interior da “esquerda”

brasileira, as condições de continuidade da política vigente nesta nova face da

contrarrevolução burguesa. Era preciso acenar com mudanças superficiais, para que o

essencial do neoliberalismo à brasileira fosse preservado. Era preciso mudar para que tudo

continuasse como está. Este foi o sentido da articulação política realizada pela Coligação Lula

Presidente: iniciava-se, desta forma, a terceira fase da contra revolução neoliberal no Brasil.

(LIMA, 2007).

Em fevereiro de 1980, ocorreu a fundação do Partido dos Trabalhadores (PT) formado

a partir de lutas do “novo sindicalismo” e dos movimentos contra o regime militar,

organizados por intelectuais e frações das camadas médias, de movimentos da Igreja católica

(Comunidades Eclesiais de Base), dos movimentos sociais de minorias (negros, mulheres e

outros) e de grupos marxistas-leninistas e trotskistas, recolocando na cena política a

organização da classe trabalhadora. O elemento político central da fundação do PT foi sua

base social classista. Apesar do amplo arco de tendências, destaca Lima (2007), grupos e

movimentos que marcaram sua origem, a novidade radical do PT era sua constituição como

um partido da classe operária, criado para organizá-la e elevá-la à condição de classe dirigente

e dominante.

Em relação aos reordenamentos internos do PT, é importante destacar a sequencia de

vitórias eleitorais a partir da metade da década de 1980, especialmente a eleição de Luiz

Inácio Lula da Silva em 1986 como o deputado federal mais votado do país e a vitória

eleitoral na prefeitura de São Paulo em 1988. Também os trabalhos do partido na Assembleia

Constituinte e a possibilidade de chegar à Presidência da república, demonstrada nas eleições

de 1989, foram fatores que levaram tendências e dirigentes do partido a uma reavaliação em

relação à condução das lutas partidárias, estimulando a concepção de que a ocupação do poder

deveria constituir-se no eixo norteador das ações partidárias, substituindo a organização da

classe trabalhadora. Segundo Lima (2007, p. 107), a análise da constituição da “Frente Brasil

Popular” em 1989, para disputar as eleições presidenciais, indica de que forma e com que

conteúdo a burocracia partidária atuou para operar esta reavaliação ao longo da década de

1990.

A maior expressão do pacto social foram as alianças estabelecidas pela cúpula petista

para formação da Coligação Lula Presidente, que concorreria às eleições presidenciais de

43

2002: PT, Partido Liberal (PL), PCdoB, Partido da Mobilização Nacional (PMN) e PCB,

articulando inclusive a escolha do vice-presidente José Alencar, do PL, empresário da

indústria têxtil mineira. Se no início da campanha estas alianças envolviam frações da

burguesia brasileira, a partir da divulgação da “Carta ao povo brasileiro” (SILVA, 2002a), em

junho de 2002, a Coligação Lula Presidente redefiniria suas alianças, articulando-se com os

segmentos estreitamente vinculados ao capital internacional, que inicialmente apoiavam o

candidato do PSDB, José Serra.

A Coligação Lula Presidente elaborou seu “Programa de governo um Brasil para

todos: crescimento, emprego e inclusão social”. O programa partiu da avaliação de que um

novo modelo de desenvolvimento só poderia ser implantado a partir de um esforço articulado

do Estado e da sociedade por intermédio da realização de um novo contrato social. Para o

programa, estas ações que articulam o Estado, o setor privado e a sociedade civil estariam

“configurando a implantação de propostas relevantes para o interesse público e a

radicalização do processo democrático no Brasil, elementos fundamentais para a integração

soberana do Brasil no mundo e para a defesa do avanço das negociações do Mercosul”.

(LIMA, 2007, p.112).

Com o estabelecimento de alianças com a burguesia, o PT perdia o elemento político

central da radical novidade que o caracterizou: sua base social classista. A política realizada

pelo PT em suas origens seria substituída pela entrada do partido no mercado eleitoral. A

vitória eleitoral da Coligação Lula Presidente não significou, portanto, a vitória da esquerda

ou da classe trabalhadora, ou mesmo a inauguração do pós-neoliberalismo, como afirmam

diversos intelectuais ligados ao partido. A vitória da Coligação Lula Presidente significou a

vitória de um governo de colaborações de classes, portanto, sob direção do capital e não do

trabalho.

Lima (2007) destaca três importantes ações governamentais no governo Lula: a

criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social - CDES, as Parcerias Público-

Privadas, chamadas de PPP e a reforma sindical. A criação do CDES como órgão de governo,

vinculado diretamente à Presidência da República, está fundamentada na perspectiva de que

somente um novo contrato social que incentive a mobilização cívica e os grandes acordos

nacionais pode contribuir para um novo modelo de desenvolvimento do país. A Lei nº 10.683

de 28 de maio de 2003, criou o CDES, com o objetivo de cumprir o papel de articulador entre

governo e sociedade.

A PPP é uma parceria entre a administração pública e a iniciativa privada, cujo objeto

é a prestação e exploração de todo serviço público. Portanto não trata apenas de infraestrutura

44

(obras, malhas rodoviárias), mas de serviços como saúde e educação, entre outros. É um

contrato de concessão do governo ao setor privado para que este último realize obras ou preste

determinado serviço público, cobrando tarifas dos usuários. O argumento central para sua

proposição é o de que o governo federal não possui recursos para assumir o financiamento de

todos os serviços públicos.

A análise da Lei nº 11079/2004 demonstra que o governo federal destinou verbas

públicas para o financiamento de políticas sociais focalizadas nos segmentos populacionais

mais pobres; as demais políticas serão privatizadas, sob a necessária aparência de uma nova

divisão de responsabilidades sociais nos marcos do pacto social proposto pelo governo Lula.

Trata-se, segundo Lima (2007), de uma nova estratégia de privatização dos serviços públicos,

ampliando a ação dos setores privados e destruindo a concepção destes serviços como direitos

sociais.

A reforma sindical pode ser identificada como outra importante estratégica de

reconfiguração da luta de classes no Brasil. Uma reformulação elaborada pelo empresariado e

pela burocracia sindical dos trabalhadores sob a condução do governo Lula.

Lima (2007) faz um balanço dos primeiros anos do governo Lula. Para a autora fica

evidente que o PT tornou-se um partido de ordem burguesa. O governo Lula não foi um

governo dos trabalhadores/para os trabalhadores, mas uma coligação entre frações da classe

trabalhadora que aderiram ao projeto burguês de sociabilidade e frações da burguesia em suas

faces brasileira e internacional.

O governo Lula não implementa um projeto nacional de desenvolvimento, na

medida em que suas políticas aprofundam e ampliam a desnacionalização e a

desindustrialização de setores estratégicos do país, destroem os direitos sociais e

trabalhistas historicamente conquistados, estimulam a abertura comercial sem

limites para o capital estrangeiro, tudo isso buscando articular o consenso passivo e

o consenso ativo dos trabalhadores, mas também reprimindo, se necessário, para

garantia da lucratividade do capital, conforme deixa claro o Decreto nº 5.261/2004.

(LIMA, 2007, p. 124).

Observa-se que houve a expansão da esfera privada nos dois governos e, conforme

Silva Júnior; Ferretti (2004, p. 28), houve a “privatização dos direitos sociais e subjetivos” do

cidadão e dos deveres do Estado, elevando o social a nível universal, sob a forma do capital

financeiro. Como parte dessas transformações no plano teórico-metodológico, instaurou-se o

debate sobre os paradigmas científicos, as teorias pedagógicas e as metodologias e os saberes

produzidos, tendo em vista sua realização na instituição escolar por meio das reformas

educacionais que ocorreram em nível planetário.

45

O dinheiro converteu-se no principal móvel econômico em razão do metabolismo

social do capitalismo concretizado pelo sistema financeiro e pela globalização do mercado

mundial.

As corporações transnacionais assumem os centros de poder em nível planetário, em

detrimento dos Estados nacionais, sob os escudos de organizações financeiras, como o Fundo

Monetário Internacional (FMI), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Banco

Mundial, que além, da administração econômica global, também se põem como função a

regulação social e política no mundo.

Este quadro do capitalismo em nível planetário expressou-se no Brasil de forma

implacável, especialmente na esfera social, incluindo a educação.

Lula, à frente da Presidência da República do Brasil, herdou um complexo jurídico-

institucional bastante consolidado e produzido ao longo do governo de Fernando Henrique

Cardoso, no qual se destacam as reformas do Estado e da educação.

Segundo Silva Júnior e Ferretti (2004), o governo de Fernando Henrique Cardoso teve

no centro de suas propostas políticas a construção e o fortalecimento da cidadania e o

aumento das possibilidades de emprego, projeto tornado público por meio de discursos dos

reformadores com grandes espaços e tempos na mídia. Anunciava-se a construção do novo

cidadão brasileiro, cujo perfil teria como pilares o modelo de competência, a empregabilidade

– diretrizes centrais da reforma do Estado e da educação no Brasil – e a participação política e

social nos rumos do país. Por isso a necessidade de uma intensa mudança institucional e da

construção de uma nova organização social, induzidas por um novo paradigma de Estado,

cuja racionalidade encontrava-se vazada por valores mercantis.

Tratava-se de um projeto político muito convincente se não fossem as conjunturas

mundial e brasileira. A conjuntura brasileira estava marcada na segunda metade da década de

1990, como já observado anteriormente, pela: disseminação do novo paradigma de

organização das corporações em nível mundial; desnacionalização da economia brasileira;

desindustrialização brasileira; transformação da estrutura do mercado de trabalho;

terceirização e precarização do trabalho em função de sua reestruturação; reforma do Estado e

restrição do público conjugada com a ampliação do privado; flexibilização das relações

trabalhistas; enfraquecimento das instituições políticas de mediação entre a sociedade civil e o

Estado, especialmente dos sindicatos, centrais sindicais e partidos políticos; reorganização da

sociedade civil tendo como eixo central a privatização política dos direitos sociais e subjetivos

dos cidadãos, com destaque da força e das organizações de que se armou o terceiro setor.

46

Neste movimento, afirmam Silva Júnior e Ferretti (2004, p.37-38), o governo FHC

consolidou hiperpresidencialismo como forma de governo, ou seja, uma hipertrofia do

Executivo em detrimento dos demais poderes da República. Com isso, tornou frágil ao

máximo o capital nacional (já conjugado com o internacional em face da abertura econômica

de Collor em 1990), destacadamente o industrial, redesenhou a sociedade civil, instituindo as

ONGs como interlocutoras principais, transferindo deveres do Estado e direitos sociais

subjetivos do cidadão para a sociedade civil, porém, sob seu controle (privatização política ou

mercantilização da democracia). Um movimento que produziu um novo paradigma de

políticas públicas orientado pelo instrumental, pela adaptação e busca do consenso, traço

político assumido pela cultura política defendida pelo presidente Lula.

Silva Júnior e Ferretti (2004, p.38) observam a submissão do governo FHC às

agências multilaterais, a ponto de chegarmos ao final do primeiro semestre de 2002 gastando

“vários salários mínimos de R$ 200 por segundo para pagar, com o superávit primário,

somente os juros de nossa política e impagável dívida externa consolidada de R$ 1,96 trilhão,

conforme se pode ler na página 32 da Portaria nº 365/STN.” Os autores ainda completam

informando que, segundo o diretor do Banco Central brasileiro, Henrique Meireles, gastou-se

R$ 140 bilhões em 2003 somente para o pagamento dos juros da dívida externa brasileira.

Em tal contexto, Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a Presidência da República do

Brasil com esmagadora maioria de votos e a confiança de um povo e das agências

multilaterais que influenciaram seu antecessor.

Em sua própria trajetória, desde sindicalista a presidente da República, Lula sempre

esteve próximo da sociedade civil organizada por meio de movimentos sociais que

procuravam estabelecer condições para um paradigma de políticas públicas de demandas

sociais. Basta observar desde a emergência do novo sindicalismo no final da década de 1970,

passando pela criação do Partido dos Trabalhadores, até 1998, quando foi derrotado em

primeiro turno por Fernando Henrique Cardoso. Este foi o momento em que o Partido dos

Trabalhadores parece ter-se redesenhado numa direção mais pragmática no jogo político

eleitoral brasileiro. E a nova política do partido parece centrar-se na continuidade dos mesmos

padrões de FHC no que se refere ao capital financeiro nacional e internacional. (SILVA

JÚNIOR; FERRETTI, 2004).

Daí porque lermos reiteradamente na mídia os elogios das agencias multilaterais à

política econômica do governo Lula, bem como em relação aos expedientes

utilizados para a contenção da inflação, especialmente o aumento da taxa básica dos

juros. Ainda que com uma redesenhada sociedade civil, Lula procurou diálogo para

governar, mostrando, neste caso, uma ruptura com FHC. Nesse mesmo movimento,

47

aproxima-se do capital nacional, buscando, de um lado, o fortalecimento do capital

produtivo industrial (também já modificado, porque já articulado com o capital

internacional financeiro ou produtivo) e, de outro lado, o crescimento econômico

brasileiro. Isto para, com base num status político e econômico mais forte, buscar

reverter o quadro de submissão ao capital financeiro nacional e internacional

produzido pelo monetarismo de Pedro Malan, ministro da Fazenda de Fernando

Henrique Cardoso. (SILVA JÚNIOR; FERRETTI, 2004, p. 39).

É necessário considerar, no entanto, que as reformas, tal como propostas no âmbito do

Estado, “não se realizam necessariamente de acordo com o espírito que as anima, pela simples

razão de que sua implementação se dá em instituições historicamente constituídas, das quais a

escola é a principal.” (SILVA JÚNIOR; FERRETTI, 2004, p. 44).

Carece de sentido supor que a cultura da escola seja algo que só faz sentido para ela,

sem implicações sociais e culturais mais amplas.

Também não faz sentido entender cultura escolar sem considerar a densidade histórica

da instituição que se constitui numa “condensação de múltiplas e diferentes temporalidades

históricas, desde a origem da escola pública e laica na modernidade”. (SILVA JÚNIOR;

FERRETTI, 2004, p. 42).

A proposição da reforma é resultado do embate entre diferentes significados

produzidos pelas objetivações e apropriações que pretendem se tornar concretas na prática

escolar, considerando uma questão maior: que papel é atribuído, de fato, à educação no

contexto nacional por meio das reformas propostas?

Tomando a escola como espaço de conflitos e contradições sociais, entende-se, com

Silva Jr e Ferretti (2004), que ela é constituída pelos múltiplos processos de apropriação e

objetivações das relações que se dão em seu espaço e pelo controle dos sujeitos presentes nos

processos de socialização que enseja.

Endente-se que os programas e as reformas políticas propostas pelo Estado são

implementados em instituições vivas, como a escola. Viva no sentido de ser ativa, de fazer

política, não se limitando em apenas reproduzi-los, além de ser constituída historicamente.

Nesse sentido, concorda-se com Silva Júnior e Ferretti (2004) quando distinguem a escola

como um espaço de “condensação de múltiplas e diferentes temporalidades históricas”,

considera-se, portanto, a historicidade da instituição.

E, por outro lado, a escola deve ser analisada não isoladamente, mas a partir do

contexto na qual está inserida, com implicações sociais e culturais. Por isso a importância de

analisar o contexto em que a escola está inserida, entendendo os governos e as diretrizes da

política educacional.

48

A escola deve ser pensada articulada social e culturalmente com a sociedade, pois está

inserida nela, sofrendo suas influências. E a escola, também, contribuindo com sua vasta

história e importância na construção das diretrizes da política educacional, mesmo com

espaço de autonomia relativa. Ou seja, a escola é uma organização historicamente construída

e constituída, influenciada pela política externa, mas também produtora de política.

A dinâmica da realidade vai produzindo novas configurações, conforme o contexto

político vivenciado historicamente.

Portanto, a partir do contexto da década de 1990, pode-se dizer que a escola está

inserida no desenvolvimento capitalista de nosso país e na inserção subordinada do Brasil na

economia mundial com a configuração histórica e espacial da luta de classes.

Neste quadro político há disputas entre projetos antagônicos de educação e tem-se a

escola fazendo política, diante da autonomia que a resta, resultando em uma luta pela

educação pública e gratuita que é direito de todos e dever do Estado.

As reformas, bem como sua implementação, se dá em instituições historicamente

constituídas, no caso a escola, implica também a necessidade de entender as reformas

educacionais na sua concretização, ou seja, são históricas, expressam interesses diferentes, são

contraditórias. Considerando as atividades como tendo especificidades próprias e tempos

históricos específicos de cada uma delas, é dessa perspectiva que pretendo examinar a

organização escolar nas publicações do INEP.

Mais uma vez, Silva Júnior e Ferretti (2004) parte do pressuposto de que a instituição

escolar não é mera agência reprodutora. Já que como resultado do próprio processo histórico,

cada unidade escolar, ao mesmo tempo que incorpora valores, normas, procedimentos

socialmente instituídos, constrói sua própria forma de ser e de se organizar. Na escola são

elaborados valores e normas, estabelecidos costumes, condutas e referencias que são

utilizados coletivamente como critérios para examinar, analisar, incorporar, negar ou

modificar o que lhe é proposto por meio da prática escolar.

Não se pode entender a escola como estática ou que se constitui separada da

sociedade. Mas entendê-la como resultado das diferentes temporalidades históricas postas

concomitantemente na cotidianidade.

Focalizando a escola, questiona-se: este contexto é refletido na produção científica dos

periódicos do INEP? Como? Há perspectivas predominantes? Quais são as perspectivas

predominantes? O que foi produzido de conhecimento sobre a escola como objeto de estudo

na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto nos dois governos

nacionais que se sucederam (Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva)? Qual

49

(is) abordagem (ns) esteve (estiveram) presente (s) sobre a escola nos dois períodos (1995-

2002 e 2003-2010)? É possível identificar mudanças de perspectivas e de referencial? Há

permanências na concepção sobre a escola?

Na aspiração das respostas, segue o referencial teórico que possibilitou a análise dos

artigos levantados, sendo eles Costa (2003) que propõe seis imagens organizacionais da

escola e Lima (2008) indicando quatro modelos teóricos para o estudo da escola.

50

CAPÍTULO 2 - ORGANIZAÇÃO ESCOLAR: IMAGENS E MODELOS

O objetivo desse capítulo é construir o referencial para analisar os artigos levantados

nos periódicos (1995-2010). Com base em Costa (2003) e Lima (2008), apresentam-se

imagens e modelos da escola enquanto organização. Lima (2008) apresenta quatro modelos

teóricos para o estudo da escola enquanto organização educativa e Costa (2003) propõe seis

imagens organizacionais da escola, acrescentando à perspectiva de Lima (2008), as imagens

da escola enquanto democracia e cultura.

Para Lima (2008, p.15), interessa considerar modelos teóricos para o estudo da escola

como organização educativa, possibilitando a sua descrição enquanto tal, mas, sobretudo,

permitindo a sua compreensão e interpretação. Ele destaca que é importante concentrar o

estudo em número limitado de propostas teóricas com o objetivo de selecionar uma síntese de

modelos, como ponto de partida para a construção de um quadro conceitual adequado ao

estudo da escola como organização.

O autor fez a opção pela proposta de estudo de quatro faces das organizações

educacionais, apresentadas por Per-Erik Ellström (1984 apud Lima, 2008), considerando os

modelos racional (objetivos claros e consensuais e tecnologia clara), político (objetivos em

conflito, mas tecnologia clara), de sistema social (objetivos consensuais mas tecnologia

ambígua) e anárquico (objetivos em conflito e tecnologia ambígua). O autor concentrou-se

mais nos modelos racional e anárquico, justificando que os modelos político e sistema social

têm sido menos utilizados para o estudo da escola como organização. Relativamente ao

modelo anárquico ele representa um dos mais recentes desenvolvimentos nos estudos

organizacionais. O modelo racional e o modelo anárquico são, de um ponto de vista teórico,

modelos mais congruentes, situando-se em dois pólos distintos, talvez extremos.

Costa (2003) referencia sua obra como um “roteiro” a partir de várias perspectivas

organizacionais pelas quais os estabelecimentos de ensino podem ser interpretados. O autor

também alerta para o fato de que não existe um único e melhor modelo para compreender

e/ou administrar os contextos organizacionais escolares, mas que o conhecimento de

diferentes pressupostos e posicionamentos teóricos, traduzidos em diversas perspectivas e

imagens organizacionais, podem permitir uma visão mais holística da escola que é essencial

para as investigações dos especialistas, para a tomada de decisões dos gestores, para as

práticas esclarecidas dos atores escolares e para análise crítica dos demais interessados nos

processos educacionais. Portanto, os autores trabalham, respectivamente, com modelos e

imagens explicativos e não normativos.

51

Costa (2003) apresenta seis imagens organizacionais da escola e alerta para o fato de a

escolha se tratar de uma proposta temporal e espacialmente situada. A educação, segundo o

autor, possui uma faceta individual, uma dimensão social e também organizacional, sendo que

esta última consiste na concretização e materialização da educação organizada em espaço

próprio, o estabelecimento, que a cultura ocidental denominou escola. Apesar de o primeiro

capítulo ter sido dedicado à dimensão social da educação, identificando e analisando as

diretrizes dos governos, a perspectiva para analisar os artigos será a organizacional,

contextualizada, é claro, pela dimensão social.

Em relação ao conceito de organização, Costa (2003, p. 10) cita alguns autores que

apresentam diferentes definições. Para Etzioni (1984 apud COSTA, 2003, p.10) “as

organizações são unidades sociais (ou agrupamentos humanos) intencionalmente construídas

e reconstruídas, a fim de atingir objectivos específicos.” Lima (1992 apud COSTA, 2003,

p.11), por sua vez, aponta para o fato de se encontrar frequentemente na literatura

organizacional a palavra organização acoplada a uma determinada qualificação da qual

depende a definição daquele conceito como, por exemplo, organização social, organização

formal, organização informal, organização complexa. Já Worsley (1977 apud COSTA, 2003,

p. 11) salienta que “as organizações são corpos, que persistem no tempo, e que são

estruturados especialmente para atingir fins específicos.” Finalmente, Costa (2003) destaca

Muñoz e Roman (1989) que apontam como elementos fundamentais do conceito de

organização a composição (indivíduos e grupos inter-relacionados), orientação para objetivos

e fins, diferenciação de funções, coordenação racional intencional e continuidade através do

tempo. Para Costa (2003, p.12), a definição de organização assume conotações diferenciadas

em função das perspectivas organizacionais que “lhe dão corpo, já que estamos em presença

de um campo de investigação plurifacetado, constituído por modelos teóricos (teorias

organizacionais) que enformam os diversos posicionamentos, encontrando-se, por isso, cada

definição vinculada aos pressupostos teóricos dos seus proponentes.”

Costa (2003), diante de tipologias e propostas que privilegiam as metáforas e as

imagens organizacionais, sistematizou seis distintos modos de perspectivar a organização

escolar que chamou de imagens organizacionais da escola, sendo elas: a escola como

empresa, a escola como burocracia, a escola como democracia, a escola como arena política,

a escola como anarquia e a escola como cultura.

A primeira imagem organizacional proposta por Costa (2003) é a que concebe a escola

como empresa, o que significa atribuir-lhe um conjunto de características que tiveram a sua

52

origem em concepções e práticas utilizadas na área da produção industrial, das quais se

destacam:

estrutura organizacional hierárquica, centralizada (com base na unidade de

comando) e devidamente formalizada; divisão do trabalho e especialização através

da definição precisa de cargos e funções; ênfase na eficiência e na produtividade

organizacional (máximo rendimento pelo menor custo); planificação e identificação

rigorosa e pormenorizada dos objetivos a alcançar; identificação da melhor maneira

de executar cada tarefa (one best way) e conseqüente padronização; uniformização

dos processos, métodos, tecnologias, espaços e tempos; individualização do trabalho

(a cada indivíduo, sua tarefa e seu espaço próprio de actividade; o grupo é menos

eficiente). (COSTA, 2003, p. 25).

Sustentada por pressupostos teóricos relacionados a uma concepção economicista e

mecanicista do homem e por uma visão reprodutora da educação, esta perspectiva entende o

aluno como matéria prima a ser moldada. A imagem empresarial da escola, segundo Costa

(2003), encontra a sua fundamentação teórica nos métodos clássicos de organização e

administração industrial, especificamente, nos trabalhos de Taylor e Fayol.

Taylor publica em 1911 a sua mais famosa obra, intitulada “The Principles of

Scientific Managemen”, que apresenta as soluções consideradas imprescindíveis para

aumentar a eficiência das empresas do seu país. Essas propostas passaram pela necessidade de

separação entre a função administrativa e as restantes desempenhadas pelos trabalhadores.

Fayol dedica as primeiras páginas da sua mais conhecida obra “Administration

Industrielle et Générale” à identificação do conjunto das operações de toda a empresa e as

divide em seis grupos: técnicas, comerciais, financeiras, segurança, contabilidade e

administrativas. Porém, entre todas elas, o autor vai dedicar a sua atenção a esta última

função, a administrativa, que decompõe em cinco elementos: previsão, organização, comando,

coordenação e controle.

Costa (2003) menciona que se trata de uma imagem da escola sujeita aos diversos

pontos de vista, em que se encontram críticos e defensores. Para alguns autores, a visão

empresarial da escola é percebida como se tratando de uma crise da escola e da organização

do ensino, como para Coleman e Húsen (1990), que identificam que a escola perdeu a sua

especificidade de prolongamento da família, de ligação ao meio, para se transformar em um

tipo de administração anônima e em uma indústria de transformação. Para outros autores, ao

contrário, a aplicação das técnicas de gestão empresarial na escola não apresenta significativas

dificuldades e constitui a forma mais adequada de conduzir esta empresa social que é a escola.

Próximo à imagem da escola enquanto empresa, há o modelo de sistema social que,

segundo Lima (2008, p.18), é uma aplicação da teoria dos sistemas, encara os processos

53

organizacionais mais como fenômenos espontâneos, acentuando o seu caráter adaptativo e

muito menos a intencionalidade da ação organizacional. Neste modelo há valorização do

estudo da organização informal, dos processos de integração, de interdependência e de

colaboração, admitindo a existência de consenso entre os objetivos, estes que são dados e não

constituem matéria de discussão. Este modelo, segundo o autor, privilegia a consideração da

cultura organizacional e do clima organizacional.

Costa (2003), ao identificar esta perspectiva teórica que equipara a escola à empresa,

utiliza ideias de Lima (1992) para classificar os autores em dimensões diferentes quanto à

aproximação e/ou distanciamento da concepção. A primeira refere-se àqueles que, fazendo

um discurso normativo, defendem e desenvolvem a associação dos dois conceitos, já que a

administração da escola não é diferente da administração de outras organizações e por isso os

modelos de gestão empresarial, a eficácia, a formação técnica de gestores, entre outras, são

temáticas insubstituíveis para eles. A segunda associa-se aos que utilizam a imagem

empresarial em uma perspectiva descritiva e explicativa assemelhando a escola à fábrica, as

aulas à linha de montagem, os alunos à matéria prima, os tempos, os espaços e os currículos

às tecnologias padronizadas, os diplomas a produtos padronizados. Por último, os que

recusam a utilização desta imagem criticando a comparação entre a escola e a empresa do

ponto de vista explicativo, descritivo ou comparativo.

Costa (2003), para além desses três posicionamentos apontados por Lima (1992),

considera pertinente acrescentar um quarto e o faz: trata-se de uma analogia cujos seguidores,

não defendendo uma completa associação das noções de escola e de empresa, entendem

existirem vantagens na sua utilização devido à importância que a perspectiva empresarial

atribui aos objetivos, à direção, à eficiência e à rentabilidade das pessoas e dos meios.

Segundo Costa (2003), muitos investigadores apontam que o taylorismo constitui uma

das marcas dominantes em vários aspectos dos modos de organização da ação educativa nas

escolas.

A analogia com a concepção de taylor da indústria é presentemente bastante

evidente. Tem que haver uma hierarquia clara, tanto directores como professores

com responsabilidades directivas são gestores industriais, os professores são

trabalhadores e os alunos são matérias-primas a ser processadas. A monitorização

desta linha de produção tem que ser implantada em termos de padrões educacionais -

a testagem e os processos de avaliação mencionados acima. E tem que haver

também uma atenção crescente sobre os elementos de execução financeira da gestão

educacional. (BOTTERY, 1993, p.29 apud COSTA, 2003, p.33).

Costa (2003) cita também Martín-Moreno (1989), que apresenta onze características

gerais que presidem à organização de uma escola de tipo taylorista: uniformidade curricular;

54

metodologias dirigidas para o ensino coletivo, métodos de ensino uniformizados;

agrupamentos rígidos de alunos, homogêneos, turmas iguais; posicionamento insular dos

professores, ou seja, como na produção industrial em cadeia, cada professor molda durante

um período de tempo, uma faceta do produto (aluno) e envia-o para outro professor,

retomando o processo com outro produto; escassez de materiais; uniformidade na organização

dos espaços educativos; uniformidade de horários; avaliação descontínua; disciplina formal;

direção unipessoal, ou seja, hierárquica e centralizada da escola na figura do diretor que,

velando pelo cumprimento das normas e disposições da administração central, decide sobre

todos os aspectos da vida escolar; insuficientes relações com a comunidade.

Costa (2003) trata da fundamentação teórica da burocracia enquanto modelo

organizacional a partir de uma perspectiva sociológica, utilizando, fundamentalmente, o

pensamento do seu primeiro teorizador, o sociólogo alemão Max Weber que foi o primeiro e,

segundo o autor, o maior teorizador da burocracia enquanto modelo organizacional.

O modelo racional, proposto por Lima (2008), aproxima-se da imagem burocrática da

escola proposta por Costa (2003). Este modelo racional acentua o consenso e a clareza dos

objetivos organizacionais e pressupõe a existência de processos e de tecnologias claros e

transparentes.

A acção organizacional é entendida como sendo o produto de uma determinada

decisão claramente identificada, ou de uma escolha deliberada, calculada, em suma,

racional. Embora o modelo racional não seja exclusivo da burocracia, prefiro

designá-lo por modelo burocrático – um modelo que estuda as organizações como

organizações burocráticas. Com efeito, a racionalidade não é exclusiva do modelo

racional, assume contornos diferentes e está presente em outros modelos e, por outro

lado, a burocracia, em sentido weberiano, constitui o modelo mais racional, aquele

que afasta erros, afectos e sentimentos (considerados irracionais) – desvios em

relação ao curso racional da acção. (LIMA, 2008, p. 21).

Na imagem da escola enquanto organização burocrática insiste-se na rigidez das leis e

dos regulamentos, na hierarquia, na organização formal, na especialização e em outros

elementos que são comuns às grandes organizações consideradas burocráticas.

Para Costa (2003), o quadro conceitual e teórico desenvolvido pelo modelo

burocrático de organização terá sido, certamente, um dos mais utilizados na caracterização

dos sistemas educativos e das escolas. Ele aponta que entre os indicadores mais significativos

da imagem burocrática da escola são:

Centralização das decisões nos órgãos de cúpula dos ministérios da educação,

traduzida na ausência de autonomia das escolas e no desenvolvimento de cadeias

administrativas hierárquicas; regulamentação pormenorizada de todas as actividades

55

a partir de uma rigorosa e compartimentada divisão do trabalho; previsibilidade de

funcionamento com base numa planificação minuciosa da organização;

formalização, hierarquização e centralização da estrutura organizacional dos

estabelecimentos de ensino (modelo piramidal); obsessão pelos documentos escritos

(duplicação, certifucação, arquivomania); actuação rotineira (comportamentos

estandarizados) com base no cumprimento de normas escritas e estáveis;

uniformidade e impessoalidade nas relações humanas; pedagogia uniforme: a mesma

organização pedagógica, os mesmos conteúdos disciplinares, as mesmas

metodologias para todas as situações; concepção burocrática da função docente.

(COSTA, 2003, p. 39).

O Estado moderno (capitalista e democrático) surge, segundo Weber (1979 apud

COSTA, 2003, p. 41), dependente de um desenvolvimento incondicional da burocracia uma

vez que "é evidente que, tecnicamente, o grande Estado moderno é absolutamente dependente

de uma base burocrática." O tipo mais puro de organização administrativa, segundo Weber

(1971, p. 24), citado por Costa (2003, p. 42), é capaz de atingir o mais alto grau de eficiência

e, neste sentido é, formalmente, o mais racional e conhecido meio de exercer dominação sobre

os seres humanos.

A organização burocrática apresenta um conjunto de seis grupos de características que,

segundo Weber (1979 apud COSTA, 2003, p.43), especificam a organização burocrática

relativamente a outros modos de organização, sendo eles: existência de normas e

regulamentos que fixam cada área de jurisdição (divisão do trabalho); estruturação hierárquica

da autoridade de acordo com um sistema firmemente ordenado de mando e subordinação;

administração com base em documentos escritos devidamente preservados; princípios da

especialização e do treinamento específico do cargo; exigência ao funcionário de plena

capacidade de dedicação ao trabalho; desempenho de cada cargo com base na universalidade,

uniformidade e estabilidade das regras gerais.

A lógica burocrática tomou conta das várias funções administrativas do Estado e,

portanto, também do sistema educativo, já que a educação é uma dessas funções. A burocracia

manifesta-se não só como modelo caracterizador da administração pública e da administração

dos sistemas educativos, mas, também, como modelo explicativo do funcionamento de outras

dimensões educativas tais como: a relação pedagógica, os conteúdos lecionados, a seleção e

preparação das elites. O modelo burocrático usufrui de maiores potencialidades heurísticas

quando aplicado à análise dos sistemas educativos do que quando aplicado às organizações de

menor dimensão ou aos processos micro-organizacionais, como é o caso das escolas, das suas

situações, dos seus componentes, dos procedimentos e da interação entre os atores, não

obstante tratar-se de uma perspectiva não desprovida de alguns atrativos (COSTA, 2003).

56

Para outros autores, a aplicação do modelo burocrático à escola é objeto de recusa e de

oposição radical, como se pode depreender, por exemplo, da citação que Costa (2003, p. 53)

faz de Clark e Meloy (1990, p. 21), em que apontam que "dentro da estrutura burocrática

nunca mudaremos para novas escolas, para escolas livres."

A alternativa aos ditames burocráticos está na concepção e no funcionamento

democrático dos estabelecimentos de ensino que se traduzem nos seguintes itens:

Democracia, autoridade de grupo e prestação de contas; variabilidade, generalidade

e interectividade no desempenho das tarefas; autodisciplina e controlo exercido

individual e colectivamente; empenho do grupo e consenso sobre os objectivos e os

meios organizacionais. (CLARK e MELOY, 1990 apud COSTA, 2003, p. 53).

A escola enquanto democracia constitui, segundo Costa (2003), possivelmente um dos

lugares mais comuns do discurso educacional português (e talvez brasileiro) das duas últimas

décadas, sendo os indicadores desta imagem organizacional da escola: desenvolvimento de

processos participativos na tomada de decisões; utilização de estratégias de decisão colegial

através da procura de consensos partilhados; valorização dos comportamentos informais na

organização relativamente à sua estrutura formal; incremento do estudo do comportamento

humano e defesa da utilização de técnicas para a "correção" dos desvios psicológicos,

assistentes sociais, terapeutas comportamentais, entre outros; visão harmoniosa e consensual

da organização; desenvolvimento de uma pedagogia personalizada.

A fundamentação teórica desta imagem da escola toma como referência as teorias

organizacionais na sequencia dos estudos iniciados pela Teoria das Relações Humanas e dos

desenvolvimentos conceituais daí decorrentes. Concentrando todas as suas potencialidades na

problemática dos indivíduos nas organizações, este modelo organizacional vai prestar menos

atenção à dimensão formal e estrutural das organizações. Costa (2003) alerta para o fato de

que não significa que a questão da eficiência e da rentabilidade seja desconsiderada, mas,

agora, é com base em novos suportes teóricos de adequação da pessoa à organização. Como a

citação que Costa (2003, p.57) faz de Aktouf (1989, p.200): "é necessário, antes de mais,

procurar ter empregados psicologicamente satisfeitos, o rendimento seguir-se-á e será durável,

caso contrário depressa conhecerá o declínio. Chega-se lá através dos sentimentos, da vida em

grupo, do sistema informal, do afectivo."

Segundo Costa (2003), a paternidade da Teoria das Relações Humanas é atribuída à

Elton Mayo, considerando as famosas experiências que este autor desenvolveu nos finais dos

anos vinte e princípios dos anos trinta, na Western Electric Company em Hawthorne e que

57

vieram a ficar conhecidas por Experiências de Hawthorne. Costa (2003) apresenta

sistematizados em cinco os resultados e as conclusões principais da Experiência de

Hawthorne: o nível de produção não depende da capacidade fisiológica do trabalhador, mas é

estabelecido por normas sociais; as recompensas e sanções não econômicas, como o respeito e

a afeição dos colegas, influenciam significativamente o comportamento dos trabalhadores; os

trabalhadores não agem ou reagem como indivíduos, mas como membros de grupos; o

reconhecimento do fenômeno da liderança, formal ou informal, é visto como pressuposto

básico para o estabelecimento e imposição das normas do grupo; a comunicação entre as

diversas hierarquias, a participação nas decisões e a liderança democrática passaram a ser

salientadas como processos essenciais de atuação no contexto organizacional.

Com as experiências de Hawthorne foi encontrado um novo objeto de estudo: os

fatores sociais e psicológicos do comportamento organizacional. A introdução do fator

humano no contexto organizacional trouxe, para o mundo empresarial, novos técnicos

(especialistas em psicologia e sociologia das organizações), novos espaços de intervenção

(comportamento humano nas organizações) e novas áreas de investigação (as estruturas

informais na organização, as necessidades, motivações e satisfação individual e grupal, a

liderança, a dinâmica de grupos, a participação nos processos de decisão, entre outras).

Costa (2003) aponta que esta valorização paradigmática deve-se, não só aos trabalhos

iniciais de Elton Mayo, mas a todo um vasto e marcante conjunto de investigadores que,

mantendo os pressupostos básicos desta orientação teórica, enveredaram por novas

abordagens, entre as quais, destacam-se a Teoria Comportamental e a corrente do

Desenvolvimento Organizacional.

É com a Teoria Comportamental, entendida por Chiavenato (2003, p. 364) como uma

das mais democráticas teorias administrativas, que o interesse pelas pessoas assume uma

dimensão mais aprofundada. Mais recente é a perspectiva do Desenvolvimento

Organizacional, entendida por alguns autores como uma aplicação e um prolongamento da

teoria comportamental ao desenvolvimento da organização. Trata-se de uma perspectiva cujo

incremento decorre fundamentalmente da necessidade de adaptação, flexibilidade e mudança

com que as organizações que pretendem o sucesso se deparam considerando os ambientes

cada vez mais instáveis e turbulentos.

A Teoria das Relações Humanas, desde os trabalhos iniciais efetuados a partir dos

anos vinte até aos diversos desenvolvimentos posteriores, constitui a fundamentação teórica,

em termos organizacionais, da imagem democrática da escola. Segundo Costa (2003), um dos

autores que mais marcou o desenvolvimento de uma concepção democrática da escola foi,

58

certamente, John Dewey. Unanimemente reconhecido como um dos mais notáveis pedagogos

do movimento da Escola Nova, Dewey concebe a educação como preparação para a vida em

sociedade e a escola como o lugar onde essa preparação se processa, ou seja, na escola

devemos criar “[...] uma projecção do tipo de sociedade que desejaríamos realizar; e,

formando os espíritos de acordo com esse tipo, modificar gradualmente os principais e mais

recalcitrantes aspectos da sociedade adulta.” (DEWEY, 1959 apud COSTA, 2003, p. 62).

Dewey defende um modelo de estabelecimento de ensino como comunidade de vida

em miniatura que, refletindo o funcionamento global da sociedade, prepare o indivíduo para a

vida social de acordo com um modelo democrático que valoriza a participação do educando

nos processos pedagógicos.

Enfim, para Costa (2003), a imagem da escola como democracia propõe uma

concepção dos estabelecimentos de ensino que, valorizando as pessoas, aponta para modos de

funcionamento participativos entre todos os intervenientes na vida escolar, de modo que a

harmonia e o consenso prevaleçam.

Em relação à escola como arena política, têm-se os modelos políticos de organização

afirmados a partir de um conjunto de indicadores que os defensores deste modelo

organizacional apontam como caracterizadores da organização escolar:

[...] a escola é um sistema político em miniatura cujo funcionamento é análogo ao

das situações políticas existentes nos contextos macro-sociais; os estabelecimentos

de ensino são compostos por uma pluralidade e heterogeneidade de indivíduos e de

grupos que dispõem de objectivos próprios, poderes e influências diversas e

posicionamentos hierárquicos diferenciados; a vida escolar desenrola-se com base na

conflitualidade de interesses e na consequente luta pelo poder; os interesses (de

origem individual ou grupal) situam-se quer no interior da própria escola, quer no

seu exterior e influenciam toda a actividade organizacional; as decisões escolares,

tendo na base a capacidade de poder e de influência dos diversos indivíduos e

grupos, desenrolam-se e obtêm-se, basicamente, a partir de processos de negociação;

interesses, conflito, poder e negociação são palavras-chave no discurso utilizado por

esta abordagem organizacional. (COSTA, 2003, p.73).

O modelo político, segundo Lima (2008, p. 17-18), realça a diversidade de interesses e

de ideologias, a inexistência de objetivos consistentes e partilhados por todos, a importância

do poder, da luta e do conflito, e a racionalidade política. Embora possa haver algumas

dificuldades de aplicação deste modelo ao estudo da escola pública, controlada centralmente

pelo Estado, ele tem as vantagens de chamar a atenção para a heterogeneidade que caracteriza

os diversos atores educativos, muitas vezes apreendidos como grupos homogêneos.

Segundo Costa (2003), os modelos políticos constituíram-se na sequencia de

profundas alterações a que estiveram sujeitas as teorias organizacionais e administrativas e

cujo objetivo é a inversão dos pressupostos dominantes e inerentes aos modelos clássicos, tais

59

como a racionalidade e a previsibilidade organizacional. Tratou-se, segundo o autor, de um

volte-face completo nas concepções organizacionais, ocorrido durante os anos setenta, que se

traduziu numa diferente fundamentação conceitual e na valorização de novos espaços de

investigação entre os quais se ressalta a questão do poder nas organizações.

A fundamentação teórica deste modelo organizacional (BALDRIGE, 1989 apud

COSTA, 2003, p.76) é desenvolvida pelas três seguintes áreas de investigação: no quadro da

tradição sociológica, as teorias do conflito (conflict theory); no campo da ciência política, os

estudos sobre a distribuição do poder nas comunidades (community power studies); no âmbito

da teoria organizacional, as investigações sobre o comportamento dos grupos nas

organizações (interest group theory).

Também Hoyle (1988), citado por Costa (2003), situa o quadro teórico dos modelos

políticos em diversas áreas disciplinares das ciências sociais: a sócio-psicologia, a teoria

política, a sociologia, as perspectivas da tomada de decisões e a teoria organizacional.

Contudo, embora Hoyle (1988) valorize a contribuição destas disciplinas para o

desenvolvimento do modelo político de análise organizacional, entende que não assumiram

uma perspectiva de investigação efetivamente micropolítica. Ainda segundo este autor, são

três os grupos de investigadores que merecem destaque especial pela sua vinculação a esta

dimensão micropolítica, os quais são liderados por March, Crozier e Bacharach. Os trabalhos

destes autores constituíram passos fundamentais na construção do modelo político de análise

organizacional. Recusaram a concepção homogênea, racional e consensual da organização

que cedeu lugar à heterogeneidade. Costa (2003, p. 81) procurou sintetizar um conjunto de

ideias que caracterizam tal perspectiva a partir dos seguintes conceitos: interesses, conflito,

poder, negociação.

Em relação aos interesses, Costa (2003) aponta que a perspectiva micropolítica

valoriza primordialmente os indivíduos e secundariza a coletividade ou a instituição como

unidade. Os indivíduos não são, por isso, nem elementos mecânicos, nem sujeitos passivos,

mas detêm interesses de ordem diversa e procuram realizá-los por meio das organizações. Os

indivíduos procuram associar-se formando coligações para, em conjunto, melhor atingirem os

seus objetivos, estes que de acordo com o modelo organizacional em questão, não são

objetivos previamente definidos pela organização, mas objetivos sujeitos à constante

instabilidade, ambiguidade e contestação.

A diversidade de interesses inerentes aos vários grupos que compõem a organização

escolar traduz-se na hora da decisão, em situações de conflitos. Para os defensores da

perspectiva política, o conflito surge como natural e inevitável perante o qual os responsáveis

60

escolares devem estar preparados para o entenderem enquanto uma parte e um momento do

processo global benéfico para o desenvolvimento de mudança organizacional.

A origem do conflito não se situa exclusivamente no interior da organização, mas,

estando esta numa situação de vulnerabilidade relativamente ao seu ambiente, os

condicionantes externos deverão ser também considerados como fonte do conflito intra-

organizacional. Trata-se, neste sentido, da presença das perspectivas sistêmicas nos modelos

políticos e por isso de uma concepção da escola enquanto sistema político.

De um modo geral, pode-se dizer que nas situações conflituais surgem como

vencedores aqueles que detêm maior poder e nos processos de negociação conseguem

melhores resultados os que representam um maior peso organizacional. Costa (2003) ressalta

que há dois tipos de poder que assumem importâncias diversificadas nos contextos

organizacionais: o poder de autoridade e o poder de influência. Autoridade corresponde ao

poder formal, cuja fonte se situa na estrutura hierárquica da organização; a influência consiste

no poder informal que pode ser suportado por diversificadas fontes tais como o carisma, o

conhecimento, a experiência pessoal ou o controle dos recursos.

Segundo Costa (2003, p. 83), entre os diversos atores escolares que dispõem de

substanciais fontes de poder merecem destaque os vários responsáveis dos estabelecimentos

de ensino (diretores, gestores), considerando cinco formas de poder que estes têm a

disposição: o poder de posição oficial, de especialista, pessoal, controle das recompensas e o

poder coercivo. Também os professores detêm diversas formas de poder, que segundo

Formosinho (1980 apud COSTA, 2003, p. 84), propõe uma classificação das bases de poder

dos professores em seis tipos fundamentais: o poder físico, remunerativo, pessoal,

cognoscitivo, normativo e o poder autoritário.

As decisões na arena política resultam de complexos processos de negociação e

compromisso que, não conseguindo satisfazer completamente as preferências dos vários

subgrupos ou indivíduos, traduzem as preferências daqueles que detém maior poder e/ou

influências. Mesmo aqueles grupos reconhecidamente mais fracos, seja do ponto de vista da

autoridade, seja da influência, não estão numa situação de total ausência de poder, pois terão a

sua disposição diversificadas formas de contestação que podem não ser vantajosas ao

funcionamento organizacional. O processo formal de decisão é baseado fundamentalmente em

procedimentos negociais, assumindo importância as formas de intercâmbio ou de troca

(exchange theory), já que os diversos grupos ou atores dispõem de bens de troca que utilizam

na negociação.

61

Segundo Costa (2003), os modelos políticos embora não constituam the one best way

no estudo da organização escolar, dispõem sem dúvida de significativas potencialidades para

compreensão do funcionamento interno das escolas, bem como para a explicação daquilo que

se passa na escola na sua relação com o contexto social e político mais vasto.

O conceito de anarquia não surge, segundo Costa (2003), negativamente conotado,

mas como uma metáfora cujo uso permite visualizar um conjunto de dimensões que poderão

ser encontradas das organizações escolares, entre as quais se apontam as seguintes:

a escola é, em termos organizacionais, uma realidade complexa, heterogênea,

problemática e ambígua; o seu modo de funcionamento pode ser apelidado de

anárquico, na medida em que é suportado por intenções e objectivos vagos,

tecnologias pouco claras e participação fluida; a tomada de decisões não surge a

partir de uma seqüência lógica de planejamento, mas irrompe, de forma desordenada

imprevisível e improvisada, do amontoamento de problemas, soluções e estratégias;

um estabelecimento de ensino não constitui um toldo unido coerente e articulado,

mas uma sobreposição de diversos órgãos, estruturas, processos ou indivíduos

frouxamente unidos e fragmentados; as organizações escolares são vulneráveis

relativamente ao seu ambiente externo (...) que, sendo turbulento e incerto, aumenta

a incerteza e a ambigüidade organizacionais; diversos processos organizativos

desenvolvidos pela escola (planificação, tomada de decisões, avaliação,

certificação), mais do que tecnologias de correntes de pressupostos de eficiência ou

de eficácia organizacionais, assumem um caráter essencialmente simbólico

(COSTA, 2003, p. 89-90).

Este conjunto de indicadores sobre funcionamento dos estabelecimentos de ensino

teve a sua origem na sequencia de diversos estudos principalmente desenvolvidos por autores

dos Estados Unidos na década de 1970.

A imagem de anarquia organizada não envolve um juízo de valor ou uma apreciação

negativa, embora a expressão possa, à primeira vista, sugeri-lo. “As anarquias organizadas

não são más organizações. Não são incomuns. Na verdade, são bastante comuns, situações de

decisão envolvendo objetivos problemáticos, tecnologia não clara, e participação fluida, são

familiares a todos os tipos de organização”. (MARCH, 1980, p. 439 apud LIMA, 2008, p. 31).

A ambiguidade organizacional, sendo característica desta imagem de anarquia

organizada é ainda desenvolvida por meio do recurso a outras metáforas. Por exemplo, a

metáfora do garbage can (caixote de lixo) que tem a vantagem de chamar a atenção para a

falta de intencionalidade de certas ações organizacionais e de contrapor ao modelo

burocrático e ao seu circuito sequencial – identificação do problema, definição, seleção da

solução, implementação e avaliação. “Para compreendermos processos no interior das

organizações, podemos ver uma oportunidade de escolha como um caixote do lixo em que

vários tipos de problemas e de soluções são depositados pelos participantes à medida que são

engendrados”. (COHEN, MARCH e OLSEN, 1972 apud LIMA, 2008, p. 32).

62

Esta metáfora, ao pressupor a existência de elementos organizacionais relativamente

independentes ou desligados uns dos outros, ao contrário do que acontece com os modelos de

sistema social e burocrático, como bem aponta Lima (2008, p. 33), ressalta outros aspectos

relevantes presentes em outra metáfora, a loosely coupled systems (sistemas debilmente

articulados).

Designadamente a escola tem sido vista como um loosely coupled, isto é, como uma

organização em que muitos dos seus elementos são desligados, se encontram

relativamente independentes, em termos de intenções e de acções, processos e

tecnologias adoptados e resultados obtidos, administradores e professores,

professores e professores, professores e alunos etc. (LIMA, 2008, p. 33).

Em relação à imagem da escola anárquica, segundo Costa (2003), alinham-se três

grandes temáticas: a escola como anarquia organizada, a decisão organizacional como

“caixote do lixo” e a escola como sistema debilmente articulado. Costa (2003) acrescentou

uma quarta temática cuja divulgação pública é mais recente, refere-se à escola como um

sistema caótico.

Por anarquia organizada, Costa (2003) cita Cohen, March e Olsen (1972), que a

entendem como uma organização na qual se encontram três características: objetivos

problemáticos, tecnologias pouco claras e participação fluida.

Fazendo assentar em novas bases as suas concepções organizacionais autores afirmam

a necessidade de alteração das teorias de gestão vigente:

[...] as anarquias organizadas requerem uma teoria revista da gestão. As partes mais

significativas das teorias contemporâneas da gestão introduzem mecanismos para

controlar e coordenar que presumem a existência de objectivos e tecnologias bem

definidos, bem como um envolvimento substancial das participantes nos assuntos da

organização. Onde os objectivos e a tecnologia são vagos e a participação é fluida,

muitos dos axiomas e dos procedimentos padronizados de gestão desmoronam-se.

(COHEN, 1972 apud COSTA, 2003, p.91).

A questão do processo de decisão nas organizações constitui, segundo Costa (2003),

uma temática central na teoria da anarquia organizada que foi equacionada por meio da

metáfora “caixote de lixo”. De acordo com esta perspectiva, a tomada de decisões não segue

os processos da sequencialidade lógica do tipo da causalidade linear (problema-objetivos-

estratégias-negociação-decisão), mas decorre no interior de um contexto situacional, em que é

manifesta a desarticulação entre os problemas e as soluções, entre os objetivos e as estratégias

e onde confluem e se misturam desordenadamente problemas, soluções, participantes e

oportunidades de escolha. Comentando as teorias do caixote de lixo e da anarquia, Costa

63

(2003, p. 94) cita Foster (1986, p.133), o qual interpreta a tomada de decisões segundo estes

modelos da seguinte forma:

As soluções e os problemas são despejados no "caixote de lixo" figurativo das

organizações, onde as soluções planeadas se ligam a problemas descabidos e os

problemas encontram soluções pouco usuais. Os encontros furtuitos determinam

geralmente o que acontece e os eventos mais relevantes relacionam-se

exclusivamente com causas menores.

O modelo do caixote do lixo, situando-se na observação do processo da tomada de

decisões com base em pressupostos organizacionais distintos dos que prevaleciam, surge,

segundo Costa (2003), com base em Estlesr (1988) como uma alternativa dos anos setenta aos

três modelos de decisão que o precederam: modelo racional-burocrático típico da revolução

industrial; o modelo do consenso, participativo, com início nos anos vinte; o modelo político a

partir dos anos sessenta.

Costa (2003, p. 96) ressalta que a concepção da escola como anarquia organizada e a

explicação das decisões escolares como caixote de lixo não significam que o funcionamento

destas instituições seja basicamente desorganizado ou completamente sujeito à desordem.

Certamente, há ordem na atividade organizacional, porém, trata-se de uma ordem diferente

em relação às explicações lineares da racionalidade dos modelos tradicionais.

Em 1976, segundo Costa (2003), Karl Weick publicou, na revista Administrative

Science Quarterly, um artigo intitulado "Educational Organization as Loosely Coupled

Systems" que se tornou uma referência obrigatória para os estudos organizacionais a respeito

da escola. De acordo com esta perspectiva, as escolas são loosely coupled já que, entre as

diversas estruturas, órgãos e acontecimentos não existe uma união forte, uma coordenação

eficiente e racional, mas, antes, uma conexão frouxa ou mesmo uma desarticulação entre os

diferentes elementos que, embora aparentemente unidos, estão separados e preservam uma

identidade própria.

Segundo Costa (2003, p. 98), são várias as situações escolares que podemos apelidar

de loosely coupled, a débil conexão existente entre "a intenção e a ação, os meios e os fins, o

ontem e o amanhã ou, tomando por base a estrutura hierárquica da organização, a fraca

articulação entre o topo e a base, a linha e o staff, os professores e os administradores,

podendo a lista continuar". Mesmo que a estrutura formal não coordene satisfatoriamente a

atividade educativa, não significa a desagregação da escola porque entre os diversos órgãos e

atores se estabeleceu uma lógica de confiança ou the logic of confidence que corresponde ao

pressuposto de que cada indivíduo confia na competência e no trabalho dos outros.

64

A escola como um sistema caótico constitui uma abordagem organizacional da escola

de divulgação recente, em que os poucos textos conhecidos nesta área datam dos anos

noventa, há um reduzido número de autores, estando pouco desenvolvida teoricamente e,

ainda menos, empiricamente.

Costa (2003) aponta que parece ser com Sungalia (1990), em artigo intitulado

"Organizations Alive: Have We at Last Found the Key to a Science of Educational

Administration?" e no qual a teoria do caos aparece como resposta positiva e como solução

para as dificuldades e ambigüidades teóricas no campo da administração da educação, que a

concepção da escola como sistema caótico aparece pela primeira vez sistematizada.

Costa (2003) aponta um conjunto de sete conceitos centrais que caracterizam a teoria

do caos na organização escolar, encontrados no trabalho de Griffiths (1991) e seus colegas,

sendo eles: efeito borboleta, parte do princípio que qualquer acontecimento pode influenciar e

alterar o funcionamento organizacional, podendo mesmo um pequeno fato originar um grande

efeito (princípio da não linearidade), o efeito borboleta costuma ser ilustrado com a imagem

de uma borboleta que se bater as asas no Brasil, o resultado pode ser um ciclone no Texas;

ataque de turbulência que significa que no decorrer de períodos de ordem e de estabilidade

organizacional podem irromper, inesperada e repentinamente, momentos de distúrbio e de

desordem, de insubordinação e de contestação, os quais não são imediatamente explicáveis;

estruturas dissipativas, sendo necessário um alerta constante em relação às menores coisas,

alterações que acontecem na organização; choques do acaso que todos os sistemas caóticos

estão dependendo de choques aleatórios, principalmente os sistemas não lineares para os quais

mesmo os choques menores podem significar grandes alterações, a alteração das situações

iniciais; forças de atração estranha, há existência de elementos ou forças ocultas que emergem

repetidamente como componentes centrais do sistema, fazendo com que os acontecimentos

giremsua volta (strange attractors), introduzindo alguma ordem nos sistemas caóticos;

simetrias recorrentes ligada ao conceito anterior de strange attractors, significa que na teoria

do caos, mais do que a unidade individual, interessa prestar atenção às formas que se mantêm

e permanecem simétricas nos diversos níveis do sistema e que ocorrem de tempos em tempos;

mecanismos de feedback, componente fundamental dos modelos sistêmicos, consiste no

processo de retroação segundo o qual, os resultados, as saídas (outputs) entram novamente no

sistema (transformando-se em inputs) introduzindo novas informações na organização.

Segundo Costa (2003, p.105) a imagem anárquica da escola, tendo em conta as várias

contribuições teóricas, constitui, atualmente, uma referência "obrigatória" dos diversos

trabalhos que elegem a organização escolar como objeto de estudo.

65

Por fim, com uma origem marcadamente empresarial, considerando a influência das

empresas japonesas, a perspectiva cultural das organizações foi introduzida no contexto da

análise organizacional da escola, constituindo uma das principais imagens que, desde o início

da década de 1980, diversos estudos situados nesta área de investigação têm vindo a utilizar e

que se poderá sintetizar nos seguintes aspectos:

[...] não só as organizações são diferentes, não só a escola é diferente das outras

organizações, mas também cada escola é diferente de qualquer outra escola; a

especificidade própria de cada escola constitui a sua cultura que se traduz em

diversas manifestações simbólicas tais como valores, crenças, linguagem, heróis,

rituais, cerimónias (a escola é uma mini-sociedade); a qualidade e o sucesso de cada

organização escolar dependem do seu tipo de cultura: as escolas bem sucedidas são

aquelas em que predomina uma cultura forte entre os seus membros (identidade e

valores partilhados); em termos de investigação os defensores desta perspectiva,

entendendo a realidade organizacional como construção social, enquadram-se

maioritariamente numa metodologia qualitativa e apontam o seu objecto de estudo

para o interior da cultura escolar, designadamente para as dimensões simbólicas,

mágicas e subjectivas do seu funcionamento; as tarefas primordiais dum gestor não

se devem situar ao nível da estrutura, das formas ou dos processos racionais de

decisão, mas a sua preocupação constante deverá ser canalizada para os aspectos

simbólicos (gestão do simbólico) já que a cultura pode (e deve) ser não só utilizada

como também alterada. (COSTA, 2003, p.109).

A ligação da noção de cultura à realidade organizacional tem vindo a ser eleita, desde

o início dos anos oitenta, como uma das principais áreas de interesse, quer enquanto objeto de

estudo dos analistas organizacionais, quer como espaço de intervenção para consultores e

gestores do mundo empresarial.

Segundo Costa (2003), Pescale e Athos (1981) procedem a uma análise comparativa

entre as empresas americanas e as japonesas tentando justificar que a superioridade destas se

deve fundamentalmente ao seu tipo de gestão que se traduz numa cultura organizacional

própria e na valorização de determinadas dimensões empresariais, entretanto, descuidadas

pelos americanos.

Os dois grandes acontecimentos literários considerados por vários investigadores

como os mais marcantes no início das preocupações dos investigadores por este campo de

estudo, são dois sucessos editoriais publicados em 1982 nos Estados Unidos da América, um

da autoria de Terrence Deal e Allen Kennedy denominado Corporate Cultures e o outro de

Thomas Peters e Robert Waterman com o título In Search of Excellence.

De acordo com Deal e Kennedy (1982, apud Costa, 2003), o indicador fundamental

das empresas de sucesso é o tipo de cultura presente em cada uma dessas organizações, a

existência de uma cultura forte que os autores identificam com a noção de corporate cultures,

estas que são apresentadas pelos autores como aquelas que colocaram sempre nos seus lugares

66

de topo fundadores e/ou gestores (heróis) que se afastaram dos padrões tradicionais da gestão,

recusando os modelos racionais, e se posicionaram como gestores do simbólico, como atores

que, no seio da teia cultural, se dedicaram não só a perceber e a gerir a cultura, mas, também,

a construí-la, a moldá-la e a alterá-la, já que a cultura constitui, segundo os autores, uma

variável suscetível de intervenção (COSTA, 2003, p.112).

O modelo da empresa excelente que se pode encontrar no segundo trabalho, In Search

of Excellence, situa-se na mesma linha teórica de Corporate Cultures e com base num estudo

conduzido em 62 empresas dos Estados Unidos consideradas excelentes e inovadoras, refere-

se ao daquela que, perante ambiguidade permanente dos contextos organizacionais, consegue

manter, por um lado, uma flexibilidade para responder de forma inovadora às mudanças

ambientais e, por outro, uma firmeza traduzida num conjunto de valores partilhados entre os

seus membros, tarefa prioritária de seus líderes.

Se, relativamente aos trabalhos pioneiros, não é difícil encontrar algum consenso à

volta da noção de cultura organizacional, os desenvolvimentos posteriores desta imagem

organizacional, pela sua diversidade, vieram alterar essa situação, de tal forma que,

possivelmente, uma das melhores aproximações à noção de cultura organizacional será hoje a

de grande guarda-chuva ao abrigo do qual se encontram protegidas distintas formas de encarar

as organizações.

Dois dos mais importantes desacordos que dividem os investigadores situados à volta

da imagem organizacional da cultura são: a questão da existência de uma cultura ou de

culturas nas organizações e a dicotomia ao redor da possibilidade ou não de gestão da cultura.

Para alguns autores, cultura significa um modelo de análise interpretativa da realidade

organizacional, para outros, porém, consiste em instrumento a serviço da gestão das

organizações.

Um dos campos de reflexão que tem merecido a atenção de diversos autores dedicados

às temáticas da cultura organizacional é o da tentativa de categorização das culturas em

tipologia ou modelos.

Entre algumas das mais divulgadas tipologias de culturas, Costa (2003, p. 125) refere-

se a título ilustrativo, a de Deal e Kennedy (1988) que identificam quatro tipos culturais:

cultura macho, de alto risco e feedback rápido, privilegia a satisfação imediata e valoriza o

individualismo; cultura work hard/play hard, com poucos riscos, mas de feedback rápido,

orienta-se para o cliente, enfatiza o deslumbramento, a aparência e a competitividade; cultura

bet-your-company, de alto risco, mas de feedback lento, desenvolve atividades a longo prazo;

67

cultura process, de baixo risco e de feedback lento, baseia-se em regras e em procedimentos

rotineiros e é usualmente designada burocracia.

O desenvolvimento da perspectiva cultural na análise da realidade escolar terá sido,

segundo Costa (2003, p. 128), influenciado pelos sucessos editoriais e pelas investigações

realizadas no campo da cultura da empresa. Também influenciou a mudança de sentido

operada na linha de investigação seguida pelos estudos em organização e administração

escolar com a introdução de novas formas de abordar a realidade social presente na escola

com base em pressupostos teóricos e metodológicos oriundos da tradição fenomenológica.

Costa (2003, p. 128), com base em Bush (1986, p.89), destaca que:

É no início dos anos setenta, nomeadamente com um texto sobre as organizações

como invenções sociais publicado pelo autor em 1973 e um outro de 1975, no qual

aplica estes pressupostos ao estudo da administração escolar que se vai dar início à

“Revolução Greenfield”, sugundo a termonologia de Evers e Lakomski (1991: 76), e

que os modelos da subjectividade se tornaram proeminentes na gestão escolar.

A introdução desta visão subjetiva e fenomenológica na análise da realidade escolar e

na sua administração por parte de Greenfield constitui certamente um dos quadros teóricos

subjacentes ao desenvolvimento da imagem cultural da escola.

Segundo Costa (2003), ainda é comum encontrar partes expressivas de textos e de

trabalhos a respeito da eficácia escolar dedicados à questão cultural aparecendo a cultura

diversas vezes apontada como a chave para a eficácia e para o aperfeiçoamento efetivo da

organização escolar.

As preocupações com a melhoria de funcionamento da escola através da valorização

da cultura organizacional têm vindo, ultimamente, a associar-se a outros conceitos, sendo de

destacar os de qualidade e de excelência.

De acordo com a sistematização que ao longo deste capítulo apresentámos sobre a

imagem da escola como cultura, poder-se-á, então, concluir que, se, como aponta

Nóvoa, a escola enquanto instituição nunca deixou de privilegiar a metáfora cultural,

esta apresenta-se-nos, agora, também, com novas potencialidades heurísticas no

quadro da análise organizacional e administrativa dos estabelecimentos de ensino

(COSTA, 2003, p. 137-138).

A escola enquanto organização tornou-se mais visível nos últimos tempos,

principalmente a partir da década de 1990, como visto anteriormente, constituindo-se em um

dos objetos de estudos mais procurado pela investigação educacional.

É importante esclarecer que apesar da maioria das imagens propostas por Costa (2003)

se fundamentarem na empresa, nesta pesquisa, a escola não é compreendida como uma

empresa.

68

Até meados da década de 1980, o paradigma da Administração empresarial dominou

os estudos em Administração da educação no Brasil que tomaram como referência, quase que

exclusivamente, a Teoria Geral da Administração. Mas, a década de 1980 é marcada

fortemente pela crítica à construção teórica anterior que assemelhava a escola à empresa e

adotava a Teoria Geral da Administração no desenvolvimento teórico da Administração

Escolar. Paro (1986) pode ser considerado o marco deste período ao destacar, entre outros

aspectos de grande relevância e rigor científicos, a especificidade da escola, bem como da sua

Administração Escolar como um dos pressupostos para que contribua com o processo de

transformação social.

Considerando a construção do conhecimento em Administração da educação na

década de 1980, é possível dizer que houve alteração na perspectiva adotada, pois os autores

identificam que não é possível adotar a Teoria Geral da Administração na Administração

Escolar e defendem o olhar, explorar, analisar e/ou compreender as realidades específicas que

são as organizações escolares e sua Administração.

Na década seguinte (1990), os pesquisadores adotam uma perspectiva centrada na

organização escolar, preocupam-se em olhar para as organizações escolares, analisar,

explicar, compreender o que elas fazem em seu cotidiano, como constroem o processo

educacional. Russo (2004) denominou este processo de “mudança paradigmática na

Administração Escolar”. Maia (2004), em pesquisa realizada sobre as publicações da

ANPAE, também identificou o percurso semelhante que culminou com a mudança de

abordagem em Administração escolar na Revista Brasileira de Política e Administração da

Educação (RBPAE).

Portanto, compartilha-se da mudança de paradigma, voltando o olhar para as

especificidades da organização escolar ao considerar que ela não é formada apenas pela faceta

organizacional, pois é constituída historicamente.

E, nesse sentido, Silva Júnior e Ferretti (2004, p.51) apontam que a instituição escolar,

com sua origem na produção histórica do Estado moderno, tem sua forma histórica e seus

objetivos sociais de contribuir para a manutenção e regulação do pacto social de um

determinado momento histórico, bem como de socializar o conhecimento acumulado pela

humanidade, este transformado e selecionado por meio de pedagogias e do currículo.

Essa complexa trama, constituinte e constituída de diferentes, simultâneas e

contraditórias temporalidades históricas, circunscreve-se à possibilidade de examinar

criticamente as mediações entre o cotidiano escolar, as práticas escolares e as reformas e

69

políticas educacionais. Em tal processo é produzida a cultura escolar, entendida por Silva

Junior e Ferretti (2004) como expressão historicamente específica das instituições escolares.

A forma histórica escolar condensa múltiplas dimensões, dentre as quais são

destacadas: o currículo, o projeto pedagógico, a organização do trabalho educativo, as

propostas de gestão, as metodologias de ensino etc. E, como propõe Silva Júnior e Ferretti

(2004), o institucional, a organização e a cultura imbricam-se na construção histórica da

instituição escolar orientados pelos objetivos historicamente produzidos para ela.

Considerando as imagens e modelos organizacionais da escola apresentados e as

diretrizes políticas dos últimos governos, o objetivo é compreender com qual (is) referenciais

teóricos/metodológicos os autores que publicaram nos periódicos Em Aberto e RBEP

perspectivam a escola do ponto de vista organizacional.

70

CAPÍTULO 3 – OS ARTIGOS PUBLICADOS NA RBEP E EM ABERTO (1995-2002;

2003-2010)

Neste capítulo será feito o mapeamento geral dos artigos levantados e, em seguida,

será realizada análise dos artigos com base no referencial teórico desenvolvido.

3.1 - O período de 1995-2002

Nas Tabelas 1 e 2, é possível identificar as palavras chave, os títulos, o(s) autor(es),

volumes, números e anos dos artigos levantados nos dois periódicos:

Tabela 1 – Em Aberto: relação palavra chave, título, autor e v./n./ano (1995-2002)

EM ABERTO

Palavra chave Título Autor Vol/Num/Ano

Escola

A Gestão da Escola Básica: conhecimento e reflexão sobre a prática cotidiana

da diretora de escola municipal

Marta Kuz Sisson de Castro

v.17, n.72 fev/jun 2000

Autonomia da Escola e Democratização de sua

Gestão: novas demandas para o gestor Lauro Carlos Wittmann

v.17, n.72 fev/jun 2000

Diretores de Escola: o desacerto com a

democracia

Artemis Torres e

Lindalva Maria N. Garske v.17, n.72

fev/jun 2000 Qualificação da Gestão da Escola: primeiros passos

de um programa de âmbito estadual Jarbas José Cardoso

v.17, n.72 fev/jun 2000

Gestão Financeira na Escola Pública: o caso do

PDDE Ana Maria de

Albuquerque Moreira v.18, n.74

fev/jun 2001

Gestão Escolar

Educação e gestão descentralizada: conselho

diretor, caixa escolar e projeto político-

pedagógico

Antônio Cabral Neto e

Maria Doninha de Almeida

v.17, n.72 fev/jun 2000

Uma Inter-relação: políticas públicas, gestão democrático-participativa

na escola pública e formação da equipe

escolar Katia Siqueira de Freitas v.17, n.72

fev/jun 2000

Continua...

71

A Relação entre Política Pública de reforma

Educacional e a Gestão do cotidiano escolar Marisa Schneckenberg

v.17, n.72 fev/jun 2000

Gestão Democrática Escolar: um estudo de expectativas, efeitos e

avanços Dalva Câmara de Oliveira v.17, n.72

fev/jun 2000

Organização Educativa Federalismo e gestão

educativa no Brasil: notas para debate Walter E. Garcia

v.19, n.75 jul 2002

Tabela 2 – RBEP: relação palavra chave, título, autor e v./n./ano (1995-2002)

REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Palavra chave Título Autor Vol/Num/Ano

Escola

Eleições de diretores: a escola pública

experimenta a democracia Nircélio Zabot v.76, n.184

set/dez 1995 Eleição de diretores de

escolas públicas: avanços e limites da prática Vitor Henrique Paro

v.77, n.186 maio/ago 1996

Diálogo com Anísio Teixeira sobre a escola

brasileira Zaia Brandão v.80, n.80

jan/abr 1999 O Resgate da escola nova

pelas reformas educacionais

contemporâneas Roselane Fátima Campos

e Eneida Oto Shiroma v.80, n.196

set/dez 1999 Avaliação escolar no contexto de novas

competências Iza Locatelli v.81, n.197

jan/abr 2000

Arquitetura escolar: imagens e representações

Helena Moussatche, Alda Judith Alves-

Mazzotti e Tarso Bonilha Mazzotti

v.81, n.198 maio/ago 2000

A Escola: um projeto visando ao ensino interdisciplinar e

transversal Hilda Rabelo de Oliveira e Alberto N. Senapeschi

v.82, n.200/201/202 jan/dez 2001

Governo Fernando Henrique Cardoso e o

Programa “Toda Criança na Escola” Nicholas Davles

v.83, n.203/204/205 jan/dez 2002

Organização Educativa

Educação Patrimonial: uma experiência em busca

de uma inovação no ensinar e no aprender Adriana Campam

v.78 n.188/189/190 jan/dez 1997

72

Neste período, no periódico Em Aberto houve busca, mas não houve resultados de

artigos que contemplam a escola como objeto de estudo com as palavras-chave: organização

escolar, cultura da escola e administração escolar. Assim também ocorreu na RBEP, em que

não houve resultados na busca com as palavras-chave: organização escolar, cultura da escola,

administração escolar e gestão escolar.

Neste período (1995 a 2002), foram levantados dezenove artigos publicados nos

periódicos Em Aberto e Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos que têm como objeto de

estudo a escola. Desses dezenove artigos publicados, dez são da Em Aberto e nove são da

RBEP.

No periódico Em Aberto, destaca-se que a produção concentrou-se no ano de 2000,

com oito artigos publicados, em seguida, um artigo publicado em 2001 e um em 2002.

Foram cinco artigos encontrados com a palavra chave “escola”, quatro artigos

encontrados com a palavra chave “gestão escolar” e apenas um artigo com a palavra chave

“organização educacional”. No entanto, ressalta-se que a palavra chave de busca levou aos

artigos encontrados, mas não necessariamente correspondem aos títulos dos artigos.

Foram seis artigos de autor único e dois artigos de mais de uma autoria, publicados em

2000. Em 2001, foi publicado um artigo com mais de um autor e em 2002 um artigo

publicado de um autor. Houve predominância de publicações de artigos de uma autoria.

Na RBEP foram encontrados dois artigos publicados em 1999 e dois em 2000. Um

artigo publicado, respectivamente, em 1995, 1996, 1997, 2001 e 2002.

A palavra chave que predominou na busca dos artigos também foi “escola”, com oito

artigos encontrados e um artigo encontrado com a palavra chave “organização escolar”.

Um artigo publicado em 1995, um artigo em 1996 e um em 1997 de autor único. Em

1999, foram publicados um artigo com mais de uma autoria e um artigo de autor único. Em

2000, um artigo de autor único e um com mais de um autor. Em 2001 foi publicado um artigo

com mais de um autor e em 2002 um artigo de autor único. Observa-se que de 1995 a 1997 os

artigos publicados foram de autor único e de 1999 a 2002 predominou artigos com mais de

um autor.

3.2 - O período de 2003-2010

Nas Tabelas 3 e 4 é possível identificar as palavras chave, os títulos, o(s) autor(es),

volumes, números e anos dos artigos levantados nos dois periódicos:

73

Tabela 3 – Em Aberto: relação palavra chave, título, autor e v./n./ano (2003-2010)

EM ABERTO

Palavra chave Título Autor Vol/Num/Ano

Escola Escola de tempo integral e

cidadania escolar Zaia Brandão

v.22 n.80

abr.2009

Tabela 4 – RBEP: relação palavra chave, título, autor e v./n./ano (2003-2010)

REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Palavra chave Título Autor Vol/Num/Ano

Escola

“Qual base de conhecimentos que meu

aluno deve ter?”: uma experiência de ensino e

aprendizagem de construção de indicadores

educacionais

Aline M. Reali, Cláudia R. Reyes, Elisabeth M.

Martucci, Maria da Graça Mizukami, Emilia F. de

Lima, Regina Tancredi e Roseli R. de Mello

v.85 n.209/210/211 jan/dez 2004

Processo de construção de normas na escola e

formação para a cidadania

Maria Augusta Salin Gonçalves e Orene Maria

Piovesan

v.87 n.216

maio/ago 2006 Representações de professores sobre cotidiano escolar Lúcia Velloso Maurício

v.87 n.216

maio/ago 2006 O “aluno da escola

pública”: o que dizem as professoras Alda Judith Mazzotti

v.87 n.217

set/dez 2006 Políticas de organização curricular para a escola

pública em tempo integral: as lições de uma

experiência Rosimar Serena Siqueira

Esquinsani

v.91 n.227

jan/abr 2010 A Relação família-escola:

implicações no desempenho escolar dos

alunos dos anos iniciais do ensino fundamental

Adriana Varani e Daiana Cristina Silva

v.91 n.229

set/dez 2010

Administração Escolar

Mudanças discursivas nas políticas de

democratização da educação Luciana Rosa Marques

v.90 n.225

maio/ago 2009

Cooperativismo: alternativa viável para a

gestão escolar? Um estudo de caso

Gerrá Leite Correia de Araújo e Candido Alberto

Gomes

v.87 n.217

set/dez 2006 Gestão democrática como

processo de alteração estrutural

Carlos Antonio Ferreira Monteiro

v.88 n.219

maio/ago 2007

Modalidade de Aldenice Alves Bezerra v.90 Continua...

74

Gestão Escolar

provimento do dirigente escolar: mais um desafio

para as políticas da educação municipal

n.224 jan/abr 2009

Equidade e desempenho escolar: é possível

alcançar uma educação de qualidade para todos? Maria Alice Setúbal

v.91 n.228

maio/ago 2010

Cultura da escola

Heterogeneidade, ciclos e a prática pedagógica

Maria de Lourdes Rangel Tura e Maria Inês

Marcondes

v.89 n.222

maio/ago 2008

Qualidade na educação e a idéia de uma formação

pública Vandré Gomes da Silva

v.90 n.226

set/dez 2009

No segundo período (2003 a 2010), no periódico Em Aberto houve busca, mas não

houve resultados de artigos que contemplam a escola como objeto de estudo com as palavras-

chave: organização escolar, organização educativa, cultura da escola, administração escolar e

gestão escolar. Na RBEP não houve resultados na busca com as palavras-chave: organização

escolar e organização educativa.

Neste período de 2003 a 2010, foram levantados quatorze artigos publicados nos

periódicos Em Aberto e RBEP que têm como objeto de estudo a escola, sendo um artigo

publicado na Em Aberto e treze publicados na RBEP.

O artigo encontrado no periódico Em Aberto foi publicado em 2009, é de autor único e

foi encontrado com a palavra chave “escola”.

Na RBEP foram quatro artigos publicados em 2006, três em 2009 e três em 2010. A

produção ficou equilibrada em 2004, 2007 e 2008, sendo um artigo publicado em cada ano.

A palavra chave que predominou na busca dos artigos foi “escola”, com seis artigos

encontrados. Quatro artigos foram encontrados com a palavra chave “gestão escolar”, dois

artigos encontrados com a palavra chave “cultura escolar” e um com a palavra chave

“administração escolar”.

Um artigo publicado em 2004 foi de mais de um autor. Em 2006 foram dois artigos de

mais de uma autoria e dois artigos de autor único. Em 2007, um artigo de autor único e em

2008 um artigo com mais de um autor. Foram três artigos de uma autoria publicados em 2009.

Em 2010 foi publicado um artigo com mais de um autor e dois artigos de autor único.

Observa-se que houve predominância de artigos publicados com autoria única (8) em

detrimento dos artigos em coautoria (5).

75

3.3 Inferências a partir do contexto

No início dos anos 1990, o INEP atuou como um financiador de trabalhos acadêmicos

voltados para a educação, sendo que, a partir de 1995, houve um processo de reestruturação e,

com a reorganização do setor responsável pelos levantamentos estatísticos, pretendeu-se que

as informações educacionais pudessem, de fato, orientar a formulação de políticas do

Ministério da Educação. É nesta conjuntura, que os artigos levantados encontraram-se.

As pesquisas analisadas vão ao encontro do cenário da década de 1990, em que

especificamente no Brasil, o contexto da hegemonia capitalista, respaldado na doutrina

neoliberal e na globalização dos mercados, influenciou uma ampla reforma do Estado

concretizada via reformas setoriais, dentre elas, a da educação. Este quadro do capitalismo em

nível planetário expressou-se no Brasil, atingindo a esfera social, incluindo a educação.

É nesse contexto, com a intenção de melhorar a qualidade de ensino, a eficácia e a

eficiência do sistema educacional, que o governo brasileiro passou a incentivar a

descentralização do ensino (via municipalização), revisão do processo de financiamento dos

níveis de ensino, com o foco centrado na educação básica e preocupação com a autonomia da

escola e o aperfeiçoamento dos instrumentos de coordenação, formulação, implementação e

avaliação de políticas públicas.

As medidas específicas para a educação tomadas e realizadas pelos governos FHC e

Lula são analisadas pelos autores dos artigos, mas a constatação refere-se, em todos eles, à

realidade das escolas com a denúncia de seus problemas.

Embora tenha havido programas e propostas de melhorias sociais, observa-se com a

leitura dos artigos que, em ambos os governos, contrariamente aos discursos, os objetivos

econômicos e sociais postos para a escola não se realizaram em sua totalidade e em sua

efetividade. Ao contrário, acentuaram-se alguns problemas, inclusive nas organizações

escolares. Este contexto é refletido na produção científica dos periódicos do INEP.

No periódico Em Aberto, toda a publicação levantada foi a partir de 2000 e os dados

mostraram, de forma geral, uma intenção de construção democrática, de liderança pessoal e

coletiva, de esperança e persistência como uma constante na prática cotidiana dos sujeitos das

diferentes pesquisas. Autonomia, construção compartilhada do projeto político pedagógico,

descentralização, gestão democrática são conceitos frequentes nos artigos.

Também fica evidente que há reivindicações de participação social incorporada por

vários segmentos sociais que se defrontam com a falta de participação de alguns sujeitos da

comunidade escolar. E, de modo geral, considera-se, com a leitura dos artigos, que não

76

existem fórmulas de gestão democrática, mas ela se constrói no processo político e cultural

em que se insere cada instituição pública.

Dos 11 artigos levantados no periódico Em Aberto, dez foram publicados em 2000,

governo FHC, e apenas um foi publicado em 2009, governo Lula.

Na RBEP, os artigos de 1995 a 2002, principalmente dos anos de 1995 a 1997, de

modo geral, parecem mais “radicais”, no sentido de propor como inovação a escola

democrática. Todos partem da efervescência social e abertura política da década de 1980 e

tratam de assuntos, como a eleição de diretores, como algo revolucionário.

Os autores, de modo geral, apontam que não se podem ignorar as mudanças que

invadem o cotidiano das cidades, dos alunos, das casas e das instituições. Não se pode ignorar

a mídia, a tecnologia, a mundialização, pois se corre o risco das escolas tornarem-se alienadas

à realidade existente.

Avaliação interna e externa, arquitetura escolar, ensino interdisciplinar e transversal,

fragilidade das estatísticas oficiais que não retratam a realidade, mas podem ser manipuladas

para registrarem bons programas de governo e o rompimento com um currículo fechado e

disciplinador, foram temas tratados nas pesquisas de 1995 a 2002.

Possibilidade de agir politicamente sobre o mundo, renovando-o ao invés de a ele

apenas se conformar, construção do currículo, formação para cidadania, as resistências e

dificuldades dos professores a um processo de mudança para romper com padrões tradicionais

a respeito da organização escolar, tentativas e propostas da escola pública de tempo integral, o

papel da família na vida escolar do aluno, a participação de toda a comunidade na escola,

municipalização, cooperativismo e a qualidade do ensino são temas discutidos nas pesquisas

de 2003-2010 que apontam caminhos para a política de democratização nas organizações

escolares.

Os referenciais teóricos são diferentes. Nos anos de 1995 a 1997, foram publicados

artigos na RBEP em que os referenciais são mais radicais, almejam transformações da

sociedade por meio da escola. A partir desses anos, nos dois periódicos, têm artigos que

denunciam a realidade, mas menos radicais, outros propõem mudanças, mas considerando o

contexto capitalista.

As pesquisas, de modo geral, indicam alternativas para a melhoria da qualidade de

ensino – que na maioria delas é vista por meio da democracia –, sugerem a importância de dar

visibilidade a essas experiências. Os autores, de modo geral, ressaltam que a alteração

estrutural sem efetiva descentralização, autonomia, formação e recursos demonstrou

insuficiência para promover a participação e democratizar o poder nas escolas.

77

As perspectivas predominantes nos artigos analisados de 1995 a 2010 são de

mudanças com relação à realidade capitalista e empresarial, objetivando perspectivas mais

democráticas, pois as pesquisas, em sua totalidade, visam qualidade e melhoria da escola.

Percebeu-se, no entanto, que as críticas foram sendo amenizadas com a mudança de governo.

3.4 Aproximações com Imagens e Modelos organizacionais da escola

Dos 11 artigos levantados do periódico Em Aberto, quatro referem-se à pesquisa com

coleta de dados empíricos (NETO; ALMEIDA, 2000; CASTRO, 2000; OLIVEIRA, 2000;

BRANDÃO, 2009) e sete são pesquisas bibliográficas (TORRES; GARSKE, 2000;

FREITAS, 2000; WITTMANN, 2000; CARDOSO, 2000; SCHNECKENBERG, 2000;

MOREIRA, 2001; GARCIA, 2000). No período de 1995 a 2002, foram dez artigos

levantados, em que três são pesquisas empíricas e sete são bibliográficas. No segundo período

que compreende de 2003 a 2010, foi levantado um artigo e este se refere à pesquisa empírica.

Todos os artigos aproximam-se da imagem organizacional da escola enquanto

democracia. No período de 1995 a 2002, em quatro artigos (FREITAS, 2000;

NETO;ALMEIDA, 2000; TORRES;GARSKE, 2000; GARCIA, 2002) ficam evidentes as

críticas à empresa e ao sistema social e a burocracia e ao modelo racional e a busca pela

democracia. Dois desses artigos (SCHNECKENBERG, 2000; MOREIRA, 2001), além da

aproximação da escola como democracia, também se aproximam da imagem organizacional

da escola enquanto cultura. Quatro artigos (OLIVEIRA, 2000; CARDOSO, 2000;

WITTMANN, 2000; CASTRO, 2000) aproximam-se apenas da imagem democrática. O

artigo levantado em 2009 (BRANDÃO, 2009), segundo período, aproxima-se da imagem

democrática da escola.

Com a palavra chave “escola”, foram levantados seis artigos, sendo cinco do primeiro

período (TORRES;GARSKE, 2000; CARDOSO, 2000; WITTMANN, 2000; MOREIRA,

2001) e um do segundo período (BRANDÃO, 2009). Quatro abordando a escola como

democracia, um que trabalha com a democracia e com a cultura e um constatando, na prática,

traços da imagem organizacional da escola enquanto empresa e sistema social, burocracia e

modelo racional, mas defendendo a democracia.

Dos quatro artigos levantados com a palavra chave “gestão escolar” (FREITAS, 2000;

NETO;ALMEIDA, 2000; SCHNECKENBERG, 2000; OLIVEIRA, 2000), dois trazem a

empresa e o sistema social e a burocracia e o modelo racional presentes na realidade

observada por meio das pesquisas, mas objetivando e propondo a democracia. Um artigo

78

constata a escola como democracia e cultura e um artigo perspectiva a escola como

democracia.

Com a palavra chave “organização educativa”, um artigo foi encontrado (GARCIA,

2002) e este observa a escola caminhando para a imagem democrática, mas constatando

aspectos da imagem organizacional da escola enquanto empresa e sistema social.

É possível identificar as imagens da escola enquanto democracia, empresa e sistema

social, burocracia e modelo racional em quatro artigos (FREITAS, 2000; NETO;

ALMEIDA, 2000; TORRES; GARSKE, 2000; GARCIA, 2002) no periódico Em Aberto.

Nesses artigos, de modo geral, fica presente a ideia de que as políticas educacionais

oficializaram a descentralização administrativa, abrindo o espaço legal para as comunidades

escolar e local participarem.

Para Freitas (2000), por exemplo, a participação requer a competência para formar e

trabalhar com representantes do sistema de ensino e das comunidades escolar e local, ou seja,

a visão política e a capacidade de dialogar são essenciais. Para a autora, o estilo de liderança

do gestor é determinante para o inter-relacionamento dessas comunidades e de sucesso

escolar. Em sua pesquisa (“Uma Inter-relação: políticas públicas, gestão democrático-

participativa na escola pública e formação da equipe escolar”), as escolas que apresentaram

melhor desempenho, tinham líderes proativos e dedicados à escola. Segundo Freitas (2000),

eles sempre estavam presentes durante os planejamentos, fornecendo apoio e orientação e, ao

mesmo tempo, ouviam seus pares e valorizavam suas contribuições, eram abertos à

participação e ao diálogo. Observa-se que o comprometimento do líder e a vontade de

envolver toda a comunidade escolar são decisivos e, nas escolas onde os líderes demonstram

confiança na equipe de funcionários, o desempenho geral, provavelmente, foi superior.

A pesquisa-ação realizada por Freitas (2000) identificou a face cotidiana da escola,

ensinando estudantes e pesquisadores o que eles precisavam para ajudar a escola a superar

seus momentos de dificuldade e viver a autonomia plenamente e melhor, mesmo diante de um

contexto capitalista, em que a competitividade estava muito presente.

A pesquisa e a extensão sobre o tema, segundo Freitas (2000), garantiram alguns

avanços educacionais na região baiana. A Universidade Estadual de Santa Cruz iniciou um

curso de especialização em Administração da Educação: Gestão Participativa, com a

participação de 26 gestores escolares. Eles eram secretários municipais de Educação, diretores

de Diretoria Regional de Educação (Direc), coordenadores municipais de Educação, diretores

de escolas e professores. A Universidade do Sudoeste da Bahia também contemplou formar

79

um núcleo de estudos sobre gestão participativa, a exemplo do implantado na Universidade

Federal da Bahia.

Vivendo a escola e o sistema de ensino nordestino, percebem-se altas perdas e

baixos ganhos no cotidiano da escola pública. As escolas falam. Fornecem muitas

informações sobre seu cotidiano: dificuldades, acertos, desacertos; demonstram sua

vontade de acertar, de ser competentes, de ser eficientes, eficazes e a necessidade de

serem ouvidas e atendidas. (FREITAS, 2000, p. 58).

Nos últimos anos, a gestão se destacou como tema básico nas discussões e nas

proposições de medidas relativas ao projeto de modernização da administração pública

brasileira. Nesse cenário, a descentralização foi indicada como um requisito essencial à

democratização. Neto e Almeida (2000) apontam que a inclusão da temática de

descentralização na agenda de mudanças insere-se, ainda, no processo de redefinição do papel

do Estado ante a crise marcada pela sua incapacidade de ofertar os serviços essenciais à

população e pela ausência de agilidade administrativa por conta de sua burocracia.

Neto e Almeida (2000) exemplificam, com sua pesquisa, que no Estado do Rio Grande

do Norte sendo tomado como subsídio para a análise, com base na orientação das diretrizes

nacionais e regionais, realizou uma reforma administrativa no sistema de educação estadual,

ancorada nos pressupostos da descentralização. O conteúdo do Plano de Educação Básica

1994/2003, elaborado em resposta a essa orientação política, expressa as exigências de tal

reforma, realçando a importância da descentralização como eixo básico. Dessa forma, o Plano

se constitui um detalhamento das diretrizes sistematizadas nos planos nacionais e regionais de

educação.

Neto e Almeida (2000) afirmam, sobre a descentralização pedagógica, que deve ser

considerada a situação/contexto quanto ao projeto político-pedagógico. Muitas escolas

elaboraram o projeto ou se encontravam em processo de organização do mesmo. Porém, um

número também significativo de escolas não acionou a realização desse aspecto da

descentralização, conforme apontado em suas pesquisas. Em Natal, por exemplo, em um dos

Centros visitados, apenas 35,7% das escolas dispunham do projeto político-pedagógico

concluído. O restante de suas escolas, 64,3%, não cuidou desse aspecto, nem providenciou a

organização dessa importante etapa da descentralização. Em outro Centro, dentre os que

compõem o estudo em Natal, 73,3% das escolas estavam em fase de elaboração do projeto e

26,7% haviam concluído a sua elaboração. Em um dos centros pesquisados no município de

Mossoró, 7,7% das escolas elaboraram o seu projeto político-pedagógico, enquanto 92,3%

estavam em processo de elaboração. Em outro Centro, 13% tinham o seu projeto político-

80

pedagógico elaborado e 87% encontrava-se em fase de elaboração. No município de Caicó,

que dispunham de um único Centro coordenando 20 unidades escolares, conforme as

informações obtidas, todas as escolas (100%) elaboraram o projeto político pedagógico

(NETO; ALMEIDA, 2000, p.48).

A reforma administrativa acionada pela Secretaria de Educação do Estado do Rio

Grande do Norte para implantar a descentralização, proposta nas diretrizes educacionais, não

propiciou a participação efetiva dos atores educacionais na sua estruturação, como constatou

Neto e Almeida (2000, p. 44), uma vez que não criou condições favoráveis ao envolvimento

daqueles que se situam na base do sistema educacional (professores, técnicos, pais,

comunidade, etc.). A liberação dos recursos destinados ao financiamento do projeto

administrativo-pedagógico era atrelada a critérios relativos à produtividade da escola,

considerando essencialmente a questão da quantidade, número de alunos matriculados,

número de alunos aprovados, diminuição da repetência e da evasão, sucesso nas provas

aplicadas pelo MEC, etc., secundarizando a dimensão qualitativa do trabalho pedagógico.

No entanto, Neto e Almeida (2000), mesmo percebendo, na experiência analisada,

indicativos de um processo de desconcentração, associado à questão da transferência das

responsabilidades do Estado para com a sociedade, como estratégia de redução dos gastos

públicos e de suas obrigações, apontam que é preciso considerar os dois ângulos desse

processo.

Se por um lado, ele apresenta limites próprios de uma proposta de descentralização

que tem por base a delegação de tarefas e a introdução de novos mecanismos de

controle, por outro, ele pode criar as condições favoráveis para a dinamização e a

melhoria do trabalho na escola, em todas as suas dimensões: funcionamento do

Conselho Diretor, da Caixa Escolar e de um autêntico Projeto Político-Pedagógico.

(NETO; ALMEIDA, 2000, p. 44-45).

Assim, a descentralização e a desconcentração não devem ser entendidas como

positivas ou negativas. Dependem das características e especificidades que configuram cada

um desses processos.

Torres e Garske (2000) estudaram o tema da formação de diretores de escolas e

apontaram que esse assunto encontrava-se na agenda de administradores, educadores e todos

os que tomam decisões sobre educação escolar, nas mais diferentes instâncias organizadas da

sociedade. Todo um conjunto de determinações faz com que tal tema se apresente de forma

atual e instigante. Em primeiro lugar, há uma reivindicação de participação social já

incorporada por vários segmentos sociais aos seus comportamentos políticos e ao seu

entendimento sobre o conteúdo da cidadania. Para Torres e Garske (2000, p. 60) houve

81

também as próprias necessidades de reforma, advindas do processo, em curso, de

modernização dos instrumentos de gestão e, finalmente, a própria convicção de que é

necessário rever as práticas sociais em geral e, especialmente, aquelas mais intimamente

ligadas à educação.

As autoras apresentaram algumas constatações sobre o que consideram poder

caracterizar como um esforço de conciliação, pelos diretores, entre duas posturas: uma, que

pretende ser a mais democrática possível; outra, que mantém o tradicional comportamento

clientelístico, até mesmo como questão de sobrevivência institucional. Também fizeram uma

breve retrospectiva histórica sobre o processo de implantação da gestão democrática, em Mato

Grosso, concentrando-se na descontinuidade político administrativa que o caracterizou. Com

isso, pretenderam fornecer subsídios ao leitor para que compreenda melhor e avalie as

contradições desse processo, bem como as perspectivas que se apresentam. Finalmente,

levantaram ponderações críticas sobre soluções que vêm sendo buscadas pelas Secretarias de

Educação, em seu esforço de viabilização do novo modelo de gestão em pauta, em especial no

que diz respeito à preparação de diretores.

Com um subtítulo bem sugestivo, “A dança do poder: descontinuidades e tropeços”,

Torres e Garske (2000, p.64) apontam que a gestão democrática não foi uma invenção do

governo de 1986, quando o País foi literalmente ocupado politicamente pelo PMDB, partido

de oposição que mais se destacava naquele momento e que saiu vitorioso em 96% dos Estados

brasileiros. A vitória da oposição sobre o conservadorismo político de mais de duas décadas

coincidiu com o que se costuma caracterizar como a revitalização da sociedade civil. Nesta,

segundo as autoras, foram efetivamente fermentadas ideias a propósito dos modos como

deveria ser reorganizada a sociedade, as relações entre os homens, enfim, sobre os modos

capazes de varrer da sociedade os sinais do período autoritário. Entre essas ideias novas,

encontrava-se a que propunha um novo tipo de escola, baseado no entendimento de que a

democracia deveria permear todas as práticas sociais.

É preciso, desse modo, que os segmentos da escola comecem a perceber que as

formas participativas apregoadas pelo Estado tornam o termo democracia uma

simples adjetivação da gestão, retirando, com isso, o seu sentido humano e político.

Daí a necessidade de se contar com a construção de um novo e diferente projeto de

escola. Um projeto que seja financiado pelo Estado, mas que represente

efetivamente os anseios, as expectativas e os sonhos dos segmentos da escola. Um

projeto que garanta o desmantelamento da hierarquização do poder no interior das

instâncias educativas, da fragmentação entre as tarefas de concepção e execução do

trabalho, da centralização do comando, enquanto princípios que limitam a

participação e que fortalecem o modelo de gestão fundamentado na burocracia.

(TORRES; GARSKE, 2000, p. 69).

82

Garcia (2002) faz algumas referências de caráter histórico cultural que marcaram a

evolução do sistema educativo brasileiro ao longo de sua trajetória, na qual o processo

colonizador moldou certas formas de pensar e de refletir sobre os problemas da cultura e da

educação. O debate sobre o federalismo, por exemplo, feito em sua pesquisa, em razão da

extensão territorial do país, a par das lutas históricas do processo de consolidação das

fronteiras geográficas, passando pelas várias tentativas e lutas internas para reforçar focos de

poder hegemônico, constituem um capítulo especial de construção da nacionalidade.

O autor também aponta o Período Colonial, o advento da República, a Constituição de

1988, o surgimento da LDB, enfim, “momentos importantes que permanecem como substrato

que condiciona a forma pela qual se constroem as estruturas e a agenda de debate

educacional”. (GARCIA, 2002, p.70).

Garcia (2002) menciona ações de configuração que estavam em plena fase de

implementação ao longo da década de 1990 que vai se encerrando quando o País, que havia

retardado a adoção de certas medidas sugeridas pelo processo de globalização econômica, vê-

se envolvido pela necessidade ou imposição de medidas que tendem a unificar procedimentos

nas políticas econômica e fiscal, com evidentes incidências nas políticas sociais, inclusive na

política educativa.

Garcia (2002) fala que a partir da Conferência de Jomtien (Tailândia, 1990) e da

reunião de Cúpula de Presidentes pela Criança (New York, 1990), o país assume inúmeros

compromissos com a agenda internacional de educação e o autor questiona: “Gestão de

política educacional ou execução de programas?” (p.73). A entrada em cena dos organismos

internacionais de financiamento, no gerenciamento educacional, faz ressurgir, com força

paradigmática, a avaliação como componente fundamental de todos os programas

implantados.

Garcia (2002) indica algumas questões que, segundo ele, podem ajudar a enriquecer o

debate sobre os rumos da gestão educativa e as configurações que vão assumindo o sistema

educativo:

1) A escassez de recursos com as restrições conhecidas tem provocado a emergência

de distintos expedientes que levam à redução dos orçamentos determinados pela

legislação vigente. 2) Vimos observando, desde as ações do governo federal, uma

tendência de se recorrer ao uso do marketing e da propaganda como instrumentos

não só de promover o trabalho realizado, mas para construir a imagem de que se está

resolvendo todos os problemas da área. 3) Tendência associada à anterior, e que vem

se impondo em vários lugares, sob a justificativa de melhorar o desempenho das

crianças carentes no sistema escolar convencional, é o Programa Bolsa-Escola, que

consiste em assegurar à criança pobre um pagamento mensal, com a contrapartida,

83

do aluno e de sua família, de atendimento de uma série de quesitos enquanto

estudante (freqüência, aproveitamento, etc.). (GARCIA, 2002, p.75-76).

Ficam evidentes críticas a empresa e ao sistema social, burocracia e ao modelo

racional e a busca pela democracia.

Quatro artigos (OLIVEIRA, 2000; CARDOSO, 2000; WITTMANN, 2000; CASTRO,

2000) aproximam-se apenas da imagem democrática.

A eleição para diretores de escola é uma questão forte na democratização do ensino. A

eleição constitui uma das formas de acesso ao cargo de diretor de escola, mas, segundo Castro

(2000), o sistema de indicação, clientelístico e tradicional, ainda persiste. Para a autora a

definição do papel da diretora de escola, nas escolas municipais do Estado do Rio Grande do

Sul, passa pela tensão entre os critérios políticos e técnicos.

Que conhecimentos a diretora de escola necessita para exercer bem sua missão? Castro

(2000, p.85) responde que não existem respostas fáceis para esta questão, pois com a eleição,

a questão da formação e do conhecimento fica relegada a um segundo plano, e o

conhecimento gerado na prática precisa ser constantemente construído, pois as pessoas

mudam, causando uma descontinuidade no processo.

Garcia (2000) realizou uma análise preliminar dos resultados de pesquisa com as

diretoras de escola municipal, apresentou quatro dimensões que dão forma ao processo

administrativo nas escolas estudadas, sendo elas: a dimensão do papel da diretora, associada à

dimensão da escola como instituição, suas relações interinstitucionais e as relações com o

contexto social mais amplo, de forma dinâmica, complexa e interativa. O autor também

analisou alguns dos temas emergentes nestas dimensões como as relações com os pais, as

relações com a Secretaria Municipal de Educação e o papel e liderança da diretora,

concluindo que há comentários entre as diretoras sobre a existência da fragmentação, a falta

de clareza sobre o papel da diretora e a sobrecarga de trabalho. Mas os dados mostraram uma

ação de construção democrática, de liderança pessoal e coletiva, de esperança e persistência

como uma constante na prática cotidiana das diretoras de escola.

A gestão escolar e, consequentemente, a atuação e formação do seu gestor enfrentam

grandes desafios e mudanças. Para Wittmann (2000), o avanço e a relevância social e política

da teoria e da prática da administração da educação emergem da superação da aplicação

mecanicista e acrítica de teorias de administração produzidas, a partir de e em função das

empresas capitalistas de produção. “A crescente fidelidade à educação, na construção teórica

e na atuação pratica da sua administração, fundou sua crescente pertinência e relevância”.

(WITTMANN, 2000, p. 88).

84

Os avanços no pensar e fazer da educação vem demonstrando que todos podem

aprender e que a construção de um processo educativo de qualidade para todos implica a

construção coresponsável e compartilhada do projeto político-pedagógico, no âmbito da

escola. Isto implica a autonomia da escola e sua gestão democrática. Em resumo, Wittmann

(2000) enfatiza que o gestor da escola defronta-se com novas demandas, oriundas da evolução

da sociedade e da base material das relações sociais.

Para Wittmann (2000, p. 95), sobre a totalidade da prática educativa, “a administração

é a concretização da dinâmica integradora de todos os atos pedagógicos, desde a relação

professor-aluno até o clima ou cultura da escola” e, para um resultado efetivo, deve ser

democrática.

A gestão democrática do ensino público foi instituída no Brasil pela Constituição

brasileira, em 1988, e no Espírito Santo, pela Constituição estadual, promulgada em 1989,

como fruto da luta perseverante do magistério em todo o País. Oliveira (2000), após

contextualizar a gestão democrática, ressalta que para que a direção colegiada – um ponto

essencial na gestão democrática – caminhe, é essencial a compreensão por parte de seus

membros, das formas contraditórias pelas quais o poder se manifesta na escola e na sociedade

em geral.

Os líderes envolvidos na gestão escolar deveriam, segundo Oliveira (2000), relacionar-

se com seus representados de forma a existir em suas ações, uma real correspondência com as

expectativas de sua comunidade. Afinal,

A democracia, nas relações internas da escola, não terá sentido se desvincularem-se

ações que visem à autonomia escolar e à criação de novas formas de poder. A

participação dos pais e alunos na escola não deve ficar restrita aos órgãos oficiais.

Deve-se dar sobre variadas formas e estar vinculada, tanto quanto possível, a outros

movimentos e espaços políticos. Os avanços que se derem no sentido da

democratização das relações da unidade escolar serão em função das lutas que se

fizerem em toda a sociedade civil. (OLIVEIRA, 2000, p. 154-155).

Oliveira (2000) ainda completa, ressaltando que essas são questões que deverão ser

consideradas por todos aqueles que almejam e lutam por uma escola democrática e de

qualidade.

Mas, é preciso considerar que não existem fórmulas de gestão democrática. Para

Cardoso (2000), ela se constrói no processo político e cultural em que se insere cada

instituição pública.

Por isso, exemplificando o exercício da democracia com sua pesquisa, o autor aponta o

Plano de Governo para o período 1999-2002, apresentado à Assembléia Legislativa, por

85

ocasião da sessão de instalação da Legislatura, inserido nos tempos de mudança sociais e

legais, preconiza na educação, construir uma escola de sucesso. Dentre as ações, segundo

Cardoso (2000), há políticas que asseguram às escolas públicas do Estado, progressivos graus

de autonomia, administrativa, financeira e pedagógica e a formação de gestores para a escola

pública. Tais diretrizes implicam a implementação da gestão democrática e da autonomia de

forma responsável e consequente, no âmbito da rede pública estadual.

Diante deste quadro, Cardoso (2000) elucida o programa da Autonomia e da

Qualidade da Gestão das Escolas da Rede Pública Estadual, no caso de Santa Catarina, em

que a Secretaria de Estado da Educação e do Desporto (SED/SC) em parceria com a

Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) e a Associação Nacional de Políticas e

Administração da Educação (Anpae) operacionalizaram as políticas do governo neste

programa que expressa o compromisso com a construção de uma educação pública de

qualidade para todos os catarinenses. Com esta finalidade, serão implementadas políticas que

levarão em consideração a centralidade da escola e a democratização da educação, expressas

em dispositivos legais, visando assegurar progressivos graus de autonomia da escola e a

qualificação de seus gestores.

Para Cardoso (2000), a questão da gestão democrática demanda uma ruptura no

processo de planejamento, nas formas de organização e nas soluções administrativas. “A

armadilha da modernização administrativa pode nos jogar na sofisticação da irrelevância e na

quietude dos que se satisfazem apenas com o linguajar dos consultores de plantão que em

muitos casos estão distantes do concreto”. (CARDOSO, 2000, p. 159). A tradição autoritária

da administração brasileira foi potencializada pelo período militar e presente na autocracia

civil. Na gestão e planejamento da educação, “ela é sustentada por enraizadas concepções e

práticas heterogestionárias, reforçadas pela tecnocracia e tecnoburocracia”. (CARDOSO,

2000, p.159).

Dois artigos (SCHNECKENBERG, 2000; MOREIRA, 2001), além da aproximação da

democracia, também se aproximam da imagem organizacional da escola enquanto cultura.

Para Schneckenberg (2000) cabe expor uma compreensão das relações estabelecidas

no cotidiano da gestão escolar, a partir da implantação e implementação de políticas públicas

de reforma educacional. Para tanto, sua pesquisa trata das questões referentes às formas de

definição de políticas de reforma educacional, ao significado destas como expressão de poder

do Estado, ao planejamento da mudança, no contexto escolar e à atuação da gestão escolar na

implementação da mudança. Tal contexto, segundo, Schneckenberg (2000), evidenciou a

necessidade de conhecer e interpretar, com todas as características dinâmicas, críticas e

86

contraditórias, o processo de implementação de política de reforma educacional, ou seja, trata-

se de conhecer como reagem os atores da gestão escolar diante da perspectiva de mudança no

cotidiano escolar, já que neste se encontra o desafio da sua operacionalização. O êxito da

reforma relaciona-se diretamente ao entendimento que os atores do cotidiano escolar fazem de

seus objetivos e de sua metodologia.

A intenção de democratização das práticas escolares vem sendo enfocada de

diversas formas: como a implantação de práticas de gestão participativa; como

acesso e permanência na escola, acompanhados da busca de maior qualidade do

ensino e, mais amplamente a partir da compreensão da natureza da instituição

escolar e da sua função social. Entretanto, buscar o verdadeiro significado da

democratização da escola pública e de sua gestão, em especial, é partir da análise e

do entendimento da natureza e função da escola, bem como do movimento interno e

externo que ela realiza em função da sua finalidade socioeducativa. Refletir, no

entanto, sobre o trabalho da gestão escolar no processo de implementação de

políticas públicas de reforma educacional, representa a inscrição desta no amplo

processo de democratização da escola. Requer pensar sobre a noção do cotidiano

escolar como categoria que fundamenta o processo de organização, efetivação e

avaliação da proposta de reforma. (SCHNECKENBERG, 2000, p.122).

O entendimento do cotidiano escolar é essencial na formulação de política de reforma

educacional. É fundamental, segundo Schneckenberg (2000), a compreensão de como a

escola desempenha suas ações nas relações sociais que se travam no dia-a-dia da prática

escolar, respeitando e considerando sua cultura. O caminho é longo e desafiador, quando se

trata de um processo de reforma educacional num contexto de gestão democrática. É uma

questão política e institucional que, para a autora, exige a vigência de relações de colaboração

recíproca entre os envolvidos, através de uma ação competente e orientada em determinada

direção, a qual considera tanto as condições concretas do cotidiano escolar quanto o contexto

social em que se encontra a escola.

Embora traços da imagem organizacional da escola como empresa e sistema social,

burocracia e modelo racional e cultura estejam presentes, observa-se que a produção dos dois

períodos, no periódico Em Aberto esteve marcada pela ênfase na imagem organizacional da

escola enquanto democracia.

Dos 22 artigos levantados em RBEP, oito artigos são resultados de pesquisas

bibliográficas (ZABOT, 1996; BRANDÃO, 1999; CAMPOS; SHIROMA, 1999;

LOCATELLI, 2000; DAVIES, 2002; MONTEIRO, 2007; SILVA, 2009; SETUBAL, 2010) e

14 são de pesquisas com coleta de dados empíricos (PARO, 1996; CAMPAM, 1997;

MOUSSATCHE; ALVES MAZZOTTI; MAZZOTTI, 2000; OLIVEIRA; SENAPESCHI,

2001; REALI; REYES; MARTUCCI; MIZUKAMI; LIMA; TANCREDI; MELLO, 2004;

87

GONÇALVES; PIOVESAN, 2006; MAURICIO, 2006; MAZZOTTI, 2006; ARAUJO;

GOMES, 2006; TURA; MARCONDES, 2008; MARQUES, 2009; BEZERRA, 2009;

ESQUINSANI, 2010; VARANI; SILVA, 2010). Entre os anos de 1995 a 2002, cinco artigos

são de pesquisas bibliográficas e quatro são de pesquisas empíricas. De 2003 a 2010, o

número de pesquisas bibliográficas é de três e de pesquisas empíricas de 10 artigos. Torna-se

evidente que durante o primeiro período analisado, o número de pesquisas bibliográficas é

maior que o número de pesquisas empíricas e, no segundo período, as pesquisas empíricas

sobressaíram em relação às pesquisas bibliográficas.

De 1995 a 2002, foram levantados nove artigos, todos perspectivam a escola enquanto

democracia, sendo que um também se aproxima da burocracia e modelo racional

(BRANDÃO, 1999), um da empresa e sistema social (CAMPOS; SHIROMA, 1999), um da

arena política e modelo político (CAMPAM, 1997) e seis artigos da democracia (ZABOT,

1995; PARO, 1996; MOUSSATCHE; ALVES MAZZOTTI; MAZZOTTI, 2000;

LOCATELLI, 2000; OLIVEIRA; SENAPESCHI, 2001; DAVIES, 2002).

Foram levantados 13 artigos de 2003 a 2010. Um artigo aproxima-se da imagem

organizacional da escola enquanto democracia (ARAÚJO; GOMES, 2006), seis da

democracia e cultura (REALI; REYES; MARTUCCI; MIZUKAMI; LIMA; TANCREDI;

MELLO, 2004; MONTEIRO, 2007; SILVA, 2009; BEZERRA, 2009; MARQUES, 2009;

ESQUINSANI, 2010), dois da democracia, da arena política e do modelo político

(MAURICIO, 2006; GONÇALVES; PIOVESAN, 2006), um da cultura, da anarquia e do

modelo anárquico (MAZZOTTI, 2006) e três artigos clarificam o contexto capitalista em que

a escola está inserida, aproximando da empresa e do sistema social, mas objetivando e

apontando práticas democráticas (TURA; MARCONDES, 2006; VARANI; SILVA, 2010;

SETÚBAL, 2010).

No periódico RBEP (1995-2010), portanto, cinco artigos aproximaram-se da escola

enquanto democracia (ZABOT, 1995; PARO, 1996; MOUSSATCHE; MAZZOTTI;

BONILHA MAZZOTTI, 2000; LOCATELLI, 2000; OLIVEIRA; SENAPESCHI, 2001;

DAVIES, 2002).

Locatelli (2000) estudou a avaliação educacional, definida como etapa associada ao

processo de formulação, implementação e monitoramento das políticas educacionais. Segundo

a autora, mais do que conteúdos, são avaliadas as competências e habilidades dos alunos.

Identificam-se, ainda, os fatores intra e extraescolares que afetam positiva e negativamente o

processo de ensino e aprendizagem. Apesar de todos os esforços empreendidos no

aperfeiçoamento dos métodos e instrumentos utilizados na avaliação educacional em

88

diferentes níveis (federal, estadual e municipal), Locatelli (2000) aponta que é necessário

reconhecer o papel central da escola como agente catalisador de mudanças dos sistemas

educacionais. A avaliação interna não pode se restringir à avaliação do desempenho dos

alunos, devendo coletar indicadores que permitam acompanhar, aperfeiçoar e reordenar o

projeto pedagógico da escola. Nesse contexto, perspectivando a democracia, “o diálogo

envolvendo a avaliação externa e a avaliação interna, integrando alunos, professores e

diretores, torna-se indispensável”. (LOCATELLI, 2000, p. 141).

Locatelli (2000) aponta que a resolução de problemas está presente em nossa vida o

tempo todo: resolvemos problemas pessoais, problemas sociais, problemas científicos e só se

aprende a resolver problemas, resolvendo-os. A avaliação escolar no contexto de utilização de

novas competências deveria, segundo Locatelli (2000), ser trabalhada em duas vertentes: a

avaliação intraescolar envolvendo as ações e relações realizadas e estabelecidas no âmbito da

escola, criando-se um diálogo entre direção, pais, alunos, professores e autoridades gestoras

do sistema e a avaliação dos alunos centrada na análise das competências e habilidades por

eles demonstradas no transcurso de sua trajetória escolar.

Além da avaliação, a eleição direta dos diretores também é um assunto presente nos

artigos que objetivam a democracia.

Para Zabot (1995), sem mexer na estrutura hierarquizada e burocrática da escola,

pouco se pode esperar do avanço para a democracia. Esta representada, por exemplo, pela

eleição direta dos diretores, porém, só essa atitude, embora também importante, é insuficiente

para mudar a realidade. Para o autor, o diretor de escola deve relacionar-se com maturidade

com a comunidade escolar, gerindo com autonomia os problemas do dia-a-dia e lidando com

seus condicionamentos, assim, juntos, extrairão do esforço coletivo de gestão colegiada a

escola de qualidade esperada por todos. “Esta opção pode afastar-nos das armadilhas

alimentadas por ondas recentes, que buscam introduzir na gestão educacional modismos mal

assimilados e transpostos mecanicamente da gestão empresarial para a realidade da escola”.

(ZABOT, 1995, p.698). Para essas ideias, Zabot (1995) baseou-se em Paro (1995) e o autor

ainda acrescenta que “a contribuição do professor Vitor Paro tem, com mais esta sobre a

eleição de diretores, enfim, grande mérito para a história da educação brasileira recente. É um

trabalho para a construção da democracia, que se alimenta e se constrói com registro,

participação e crítica”. (ZABOT, 1995, p. 698).

Paro (1996) considera a importância de se contar com pessoas que se dispõem a

participar democraticamente, porque, mesmo contando com reduzido número de adeptos

89

atuantes, a prática democrática tem conseguido imprimir uma nova qualidade nos rumos das

ações desenvolvidas no interior da escola.

A eleição de diretores não tem o imediatismo que muitos desejariam. Seu papel é

apenas o de contribuir, para que a população possa contar com um recurso que lhe possibilite

exercer alguma pressão sobre o Estado, para que ele atue na direção desejada. Em síntese,

segundo Paro (1996), a razão determinante da opção pela eleição, como mecanismo de

seleção de diretores, é a crença de que, por um lado, pode-se escolher um profissional que se

articule com os interesses da escola, e por outro, o próprio método de escolha condiciona, em

certa medida, seu compromisso, não com o Estado, como fazem as opções do concurso e da

nomeação, mas com os servidores e usuários da escola.

Mas, por mais importante que seja esse comprometimento - porque deixa aberta a

possibilidade de o diretor, articulando-se com usuários e servidores, pressionar o

Estado - ele é apenas um recurso para melhorar a escola, não uma certeza. Tudo

dependerá do jogo de forças envolvidas, que não é função, obviamente, apenas da

eleição do diretor. (PARO, 1996, p. 392).

Um exemplo de pesquisa empírica que perspectiva a democracia, é a de Oliveira e

Senapeschi (2001) que trabalharam com crianças na faixa de sete anos, alunos da 1ª série do

ensino fundamental de uma escola estadual na periferia de São Carlos/SP. O objetivo do

projeto foi trabalhar conteúdos curriculares sem que fossem fragmentados, deixando que a

interdisciplinaridade e a transversalidade estivessem presentes durante todo o seu transcorrer.

Procuraram, também, desenvolver nas crianças o gosto pela escola e pelo trabalho. Segundo

os autores, os alunos estiveram motivados, e questões curriculares como alfabetização e

leitura, medidas e aritmética, ciências e meio ambiente, desenho e criatividade, artes, trabalho

e respeito mútuo, ética e pesquisa estiveram sempre presentes, tratadas dentro da metodologia

proposta para o projeto.

Oliveira e Senapeschi (2001, p.114) apontam que, em sua pesquisa, os objetivos

traçados para a proposta foram alcançados em todas as etapas do trabalho, visando o

envolvimento da criança na busca pessoal do saber, favorecendo a autoestima e discutindo

valores, tendo por finalidade a formação do cidadão crítico e colaborativo. No entanto, a

proposta de trabalho escolar situou-se, segundo os autores, além das preocupações alienantes

e individualistas do currículo tradicional, articulando as diferentes áreas do conhecimento,

configurando-se numa prática de organização do trabalho escolar que conseguiu fazer face à

fragmentação, à alienação e ao individualismo do currículo, também, questões relevantes para

a vida social estiveram presentes.

90

Outra pesquisa empírica que se aproxima da democracia trabalhou com imagens e

representações da arquitetura escolar. Moussatche; Alves Mazzotti; Mazzotti (2000)

consideram que os discursos sobre a escola utilizam-se de termos como "abandonada",

"decadente", "obsoleta", vinculando a escola a uma imagem negativa que, segundo os autores,

justifica o afastamento da escola pelas camadas menos favorecidas, reforçando, também, a

discriminação do usuário desses ambientes. Estes são descritos como "incapazes de manter as

instalações" e, portanto, "não merecedores" do direito de frequentar uma escola de qualidade.

Assim, Moussatche; Alves Mazzotti; Mazzotti (2000) apontam que durante mais de

um século, o direito à escolarização foi entendido como uma "concessão" das camadas

dominantes, ao invés de uma "conquista" da sociedade, como um todo. O estudo mostrou que

a arquitetura escolar tem um papel relevante no processo de construção social da Escola, no

Brasil, onde sua "apropriação" como imagem da escola pública parece estar dificultando a

atuação de uma instituição que poderia, caso fosse representada positivamente, favorecer o

desenvolvimento social.

Davles (2002) examina a evolução das matrículas nacionais no ensino fundamental

regular de 1997 a 2002, no período do governo Fernando Henrique Cardoso, e constata que o

seu crescimento deve-se, em grande parte, à inclusão nelas de matrículas que em 1997, por

exemplo, de educação de jovens e adultos (cerca de 100 mil) e do setor privado (cerca de 400

mil).

Assim, Davies (2002) constata que das 2,3 milhões de matrículas formalmente novas

no ensino fundamental regular em 1999 (na comparação com 1997), cerca de 1,3 milhão não

representaria acréscimo real. Este "remanejamento", segundo o autor, explica-se

provavelmente pelo fato de as matrículas no ensino fundamental regular representarem um

potencial de receita do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e

de Valorização do Magistério (Fundef), que não beneficia outros níveis e modalidades de

ensino. Se descontar essas matrículas "remanejadas", o número de matrículas novas no Ensino

Fundamental Regular cai para 947 mil, fragilizando assim a campanha federal "Toda criança

na escola", ao não cumprir a meta de matricular as 2,7 milhões de crianças de 7 a 14 anos que

estariam fora da escola em 1997, segundo estimativa do MEC. O estudo registra também a

forte transferência de 3,2 milhões de matrículas do ensino fundamental regular das redes

estaduais para as municipais, no processo conhecido como municipalização, bem como a

supressão de cerca de 800 mil matrículas estaduais neste nível (sobretudo em São Paulo e

Minas). Por fim, Davies (2002) ressalta a dificuldade de comparabilidade e confiabilidade das

estatísticas educacionais, mostrando, talvez, uma falsa democracia.

91

Campam (1997) aborda uma proposta pedagógica desenvolvida durante o estágio

curricular do curso de Pedagogia, com alunos da segunda série de uma Escola Estadual de

Porto Alegre/RS. Baseada na teoria crítica de currículo, esta proposta buscou uma abordagem

de ensino e aprendizagem que se diferenciasse da proposta curricular tradicional escolar e, ao

mesmo tempo, trabalhou os princípios educativos da Preservação Cultural discutidos pela

Educação Patrimonial. Autora constatou a importância de se pensar a prática educativa com

um olhar crítico sobre a estrutura curricular e os saberes escolarizados, além de proporcionar

elementos para a formação de uma consciência cultural mais crítica. As críticas sobre o

currículo são pertinentes à medida que buscam romper com uma concepção moderna e

positivista de ensino dentro da escola. Houve uma participação investigadora por parte dos

alunos, diante das curiosidades despertada. E, dessa forma é possível aproximar essa

experiência à perspectiva democrática da escola e por proporcionar várias opiniões e

aprendizados, valorizando e respeitando as diferentes colocações, também está presente a

imagem de arena política e modelo político.

Foram levantados 13 artigos de 2003 a 2010 no periódico RBEP. Um artigo aproxima-

se da imagem organizacional da escola enquanto democracia (ARAÚJO; GOMES, 2006),

seis da democracia e cultura (REALI; REYES; MARTUCCI; MIZUKAMI; LIMA;

TANCREDI; MELLO, 2004; MONTEIRO, 2007; SILVA, 2009; BEZERRA, 2009;

MARQUES, 2009; ESQUINSANI, 2010), dois da democracia, da arena política e do modelo

político (MAURICIO, 2006; GONÇALVES; PIOVESAN, 2006), um da cultura, da anarquia

e do modelo anárquico (MAZZOTTI, 2006) e três artigos clarificam o contexto capitalista em

que a escola está inserida, aproximando da empresa e do sistema social, mas objetivando e

apontando práticas democráticas (TURA; MARCONDES, 2006; VARANI; SILVA, 2010;

SETÚBAL, 2010).

A pesquisa de Araújo e Gomes (2006) analisam a Cooperativa de Ensino da Cidade de

Goiás e o Colégio Alternativo, na cidade de Goiás, fundados em virtude da insatisfação de um

grupo de pais de camadas sociais médias tanto com a escola pública quanto com a particular.

O estudo de caso coletou dados por meio de observação, análise documental, entrevistas e

grupos focais. Os resultados apresentam um estabelecimento em que todos os atores

participam da gestão. Do ponto de vista pedagógico, alcança eficazmente a apropriação de

conteúdos pelos seus alunos para concursos públicos e o acesso à educação superior,

conforme as aspirações dos pais. As despesas revelam que a remuneração docente é a mais

alta da comunidade, porém a contribuição financeira das famílias é menor que a mensalidade

da escola privada.

92

A Cooperativa, pelas evidências apresentadas por Araújo e Gomes (2006), organiza-se

em bases participativas, objetivando não só suprir seus cooperados de bens e serviços

educacionais, como também realizar determinados programas educativos e sociais.

Quanto à estimativa da despesa média aluno/ano, é aparentemente muito mais

elevada que o custo dos estabelecimentos públicos pesquisados em 2001 (Brasil,

2002), por ser um estabelecimento relativamente pequeno, que não se valia de modo

amplo das vantagens da economia de escala. Entretanto, os cooperados pagavam

menos do que se tivessem os filhos numa unidade escolar privada stricto sensu. As

turmas eram menores e os professores não só percebiam o maior salário por hora-

aula do município como só em dois casos eram menos remunerados que os seus

colegas das escolas públicas investigadas em todo o País (Brasil, 2002). (ARAÚJO;

GOMES, 2006, p. 323).

Segundo os autores, os processos de participação eram ativos para os diferentes atores

integrantes da comunidade escolar. A reputação do Colégio na comunidade era elevada, tanto

pelo aproveitamento dos alunos e a sua aprovação em processos seletivos em geral como pelo

rigor da disciplina.

Perspectivando a democracia, mas constatando a empresa e o sistema social, Setúbal

(2010) aponta que nos últimos anos, verifica-se no Brasil a ampliação dos setores da

sociedade que participam dos debates sobre educação. Uma das vozes que ganha cada vez

mais força é a dos economistas que, de algum modo, estão orientados pelas teorias do capital

humano. Essa pesquisa procurou debater algumas posições-chave assumidas por esse grupo

de economistas, em particular as que foram apresentadas no livro “Educação Básica no Brasil:

construindo o país do futuro”. Esse debate é proposto, segundo a autora, a partir de três temas:

os mecanismos institucionais de gestão, o lugar da escola e da família e a educação no

contexto da vulnerabilidade social. Por fim, Setúbal (2010) procura apontar algumas

premissas para que o sistema educacional possa ter ganhos de qualidade com equidade,

sobretudo nos territórios urbanos em situação de alta vulnerabilidade social.

A autora traz bem a questão econômica, de mercado. Propõe mudanças, mas

considerando a realidade capitalista já instalada.

O caminho não é simples e exige um esforço de todos, tanto dos governos como da

sociedade civil e dos pais de alunos, no sentido de buscarmos uma visão de

educação mais sistêmica, ajustada às necessidades do mundo moderno; uma política

de educação que leve em conta as questões de gestão e, portanto, de seus

mecanismos institucionais, de forma simultânea aos aspectos pedagógicos; e uma

visão de educação na qual o professor e o trabalho docente ocupem lugares centrais,

associada à compreensão de que o esforço nacional pela melhoria da qualidade da

educação passa também pela articulação de políticas sociais de forma integrada à

escola. (SETÚBAL, 2010, p. 363).

93

Ainda perspectivando a democracia, mas constatando a empresa e o sistema social,

Tura e Marcondes (2008) analisam, no contexto de produção das novas reformas

educacionais, o problema das turmas homogêneas/heterogêneas, que tem sido discutido em

vários estudos sobre o sistema de ciclos adotado em muitos municípios brasileiros. As autoras

trazem para a análise concepções de professoras dos primeiros anos do ensino fundamental

que trabalhavam em escolas da rede municipal do Rio de Janeiro, onde foi instituído um

Primeiro Ciclo de Formação a partir de 2000. A pesquisa utilizou como instrumento de coleta

de dados um questionário respondido por 127 professoras.

A análise dos dados revelou as dificuldades das professoras em romper com os

padrões tradicionais a respeito da organização escolar e, também, as insuficiências ou

incompletudes do projeto implementado. Para Tura e Marcondes (2008) esses problemas

precisam ser superados para que sinais como indicadores da ressignificação das concepções

docentes a respeito da organização das turmas possam se concretizar em novas posturas para

o trabalho pedagógico.

Mazzotti (2006) apresenta resultados de uma pesquisa que investigou as

representações de “aluno da escola pública” construídas por professores da rede pública de

ensino fundamental do Rio de Janeiro. Utilizando a abordagem estrutural de Abric, a

pesquisadora conclui que o núcleo da representação é constituído pelos elementos pobre e

aprende a “se virar” sozinho. A pesquisadora observou que, para os professores, o aluno tem

que aprender a “se virar” sozinho porque é pobre e a pobreza implicaria desagregação familiar

e luta pela sobrevivência, impedindo os pais de oferecerem aos filhos a atenção de que

necessitam. Dadas todas estas características, esse aluno representaria um desafio para os

professores, desafio este que eles se sentem impotentes para enfrentar.

Considerando os resultados obtidos nas diferentes etapas do estudo, as autoras

concluem que, para os professores que participaram do estudo, o aluno típico da escola

pública é hoje a criança de família pobre que luta pela sobrevivência e dá pouca ou nenhuma

assistência aos filhos, delegando à escola funções que tradicionalmente cabem à família. Esta

imagem está muito distante daquelas que os professores concebem como ideal. A partir desses

dados é possível identificar a imagem cultural, anárquica e modelo anárquico da escola.

Tal situação, conforme aponta Mazzotti (2006), aliada à crescente carência de recursos

materiais e humanos existente nas escolas, faz com que esses profissionais vivenciem uma

situação de desamparo, por ter que assumir responsabilidades cada vez maiores, contando

com apoio cada vez menor. Além das funções que cabiam à família, tarefas que eram

desempenhadas por inspetores, pessoal de secretaria e mesmo por serventes foram sendo

94

transferidas aos professores, à medida que aqueles profissionais foram escasseando nas

escolas. A autora ainda aponta que também os especialistas, que ofereciam apoio

psicopedagógico, e os professores de música, artes e educação física, que enriqueciam e

amenizavam seu trabalho, desapareceram das escolas. “Os espaços de discussão, que

permitiriam a reflexão conjunta e a troca de experiências, também lhes foram tomados”.

(MAZZOTTI, 2006, p. 363).

Gonçalves e Piovesan (2006) estudaram os processos de construção de normas na

escola e formação para a cidadania e, dessa forma, aproximaram-se das imagens

organizacionais da escola enquanto democracia, arena política e modelo político.

A pesquisa reflete sobre pesquisa-ação realizada em escola de ensino fundamental,

com a finalidade de minimizar conflitos na escola, focalizando principalmente o processo de

construção de normas, etapa final, que envolveu alunos, pais, professores, direção e

funcionários da escola, e discute os resultados referentes às reuniões realizadas anteriormente

com os professores. O material – gravação das reuniões, diário de campo e relato de

observações – foi analisado com procedimentos interpretativos. Como resultado significativo,

as autoras apontam a abertura de espaço para o diálogo, possibilitando que todos os

segmentos da escola participassem do processo de construção de normas e garantindo

liberdade a todos para assumir posicionamentos e defender ideias.

Segundo Gonçalves e Piovesan (2006), a escola não pode perder de vista o seu

objetivo de incentivar o processo de participação de forma permanente, possibilitando, com

frequência, momentos de discussão, nos quais alunos, funcionários, pais e professoras possam

ser realmente críticos, confrontem as suas ideias, reconstruam concepções e decisões e

planejem ações coletivas, fazendo do espaço da escola um lugar de formação para a

cidadania. “Não há dúvidas de que esses momentos são sempre perpassados por conflitos,

contradições e rupturas, mas também por vivências de entendimento mútuo e construção

conjunta”. (GONÇALVES; PIOVESAN, 2006, p.218).

Silva (2009) pesquisa a qualidade na educação e a ideia de uma formação pública,

aproximando-se da democracia e da cultura. Para ela (2009, p. 547), uma formação pública

não se converte automaticamente num parâmetro de qualidade, mas é parte de um critério

fundamental para sua avaliação: uma escola que possibilite e favoreça o contato do aluno com

sua herança humana, libertando-o para agir politicamente no mundo que gradualmente passa a

ser o “seu mundo”.

Monteiro (2007) apresenta discussões a partir de experiências democráticas,

considerando a cultura da escola. Sua pesquisa foi construída a partir de questões discutidas

95

em uma dissertação de mestrado a respeito do princípio constitucional da gestão democrática

do ensino público. A autora conclui que a alteração estrutural sem efetiva descentralização,

autonomia, formação e recursos demonstrou insuficiência para promover a participação e

democratizar o poder nas escolas.

Do total dos 22 artigos levantados no período todo na RBEP, 21 perspectivam a

imagem organizacional da escola enquanto democracia, sendo que um também se aproxima

da imagem organizacional anarquia e do modelo anárquico, um da burocracia e do modelo

racional, cinco da empresa e do sistema social, três da arena política e do modelo político e

seis da cultura. Um artigo aproxima-se da escola enquanto cultura, anarquia e modelo

anárquico.

Em ambos periódicos, a imagem organizacional da escola enquanto democracia

prevaleceu.

Fica evidente que no primeiro período (1995-2002), os dois periódicos publicaram

quantidade aproximada de artigos que contemplam a escola como objeto de estudo. Já no

segundo período (2003-2010), a RBEP disparou nas publicações que contemplam e escola em

relação ao Em Aberto.

96

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo desta pesquisa foi levantar, identificar, sistematizar e analisar os artigos que

contemplam a escola como objeto de estudo nos dois periódicos de grande relevância nacional

que são publicados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio

Teixeira - INEP: Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto, entre 1995

e 2010, período escolhido por focalizar dois governos reconduzidos e sucessivos: Fernando

Henrique Cardoso (1995-2002) e Luis Inácio Lula da Silva (2003-2010). Retomando como

justificativa teórica a trajetória do conhecimento em Administração da Educação, na

Introdução foi indicado que a escola passa a ser focalizada como objeto de estudo por

pesquisadores nacionais e internacionais, principalmente, no período coincidente com os

governos.

O que foi produzido de conhecimento sobre a escola como objeto de estudo na Revista

Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto nos dois governos nacionais que se

sucederam foi contemplado em 33 artigos. No período de 1995 a 2002, foram levantados 19

artigos publicados nos periódicos Em Aberto e Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos

que apresentaram como objeto de estudo a escola. Desses 19 artigos publicados, dez são do

Em Aberto e nove são do RBEP. E, no período de 2003 a 2010, foram levantados 14 artigos

publicados nos periódicos Em Aberto e RBEP, sendo um artigo publicado no Em Aberto e 13

publicados no RBEP.

No primeiro capítulo, apresentamos o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

Educacionais Anísio Teixeira - INEP, os periódicos Revista Brasileira de Estudos

Pedagógicos (RBEP) e Em Aberto, publicados pelo INEP e, em seguida, analisamos alguns

aspectos da Política Educacional da década de 1990 em diante, destacando suas continuidades

e rupturas nos governos presidenciais, Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e Luiz Inácio

Lula da Silva (2003-2010), explicitando o contexto em que foram publicados os artigos nos

periódicos que se constituem objeto do estudo.

A partir deste capítulo, foi possível afirmar que as pesquisas analisadas nos artigos

levantados analisam criticamente o cenário da década de 1990, em que especificamente no

Brasil, o contexto da hegemonia capitalista, respaldado na doutrina neoliberal e na

globalização dos mercados, influenciou uma ampla reforma do Estado, incluindo reformas na

educação. Esta conjuntura mundial capitalista expressou-se no Brasil, atingindo a esfera

social, incluindo a educação. Este contexto é refletido na produção científica dos periódicos

do INEP.

97

As pesquisas, em sua totalidade, visam qualidade e melhoria na Educação. As

perspectivas predominantes nos artigos analisados de 1995 a 2010 são perspectivas de

mudanças com relação à realidade capitalista e empresarial, objetivando perspectivas mais

democráticas. No entanto, há diferenças teóricas adotadas entre os autores, expressas, por

exemplo, nos textos de Setubal (2010) e Paro (1996), entre outros, em que há prevalência,

respectivamente, de referencial conservador e progressista.

Baseando-se no segundo capítulo, ou seja, no referencial teórico para análise dos

artigos, sendo ele as seis imagens organizacionais da escola apresentadas por Costa (2003) e

os quatro modelos teóricos para o estudo da escola enquanto organização educativa propostos

por Lima (2008), é possível afirmar que imagens e modelos da escola enquanto organização

possibilitaram a análise dos artigos levantados e analisados no terceiro capítulo.

Para evidenciar, retomam-se os resultados: Dos 11 artigos levantados do periódico Em

Aberto, todos se aproximam da imagem organizacional da escola enquanto democracia. No

período de 1995 a 2002, em quatro artigos (FREITAS, 2000; NETO;ALMEIDA, 2000;

TORRES;GARSKE, 2000; GARCIA, 2002) ficam evidentes as críticas à empresa e ao

sistema social,a burocracia e ao modelo racional e a busca pela democracia. Dois desses

artigos (SCHNECKENBERG, 2000; MOREIRA, 2001), além da aproximação da

democracia, também se aproximam da imagem organizacional da escola enquanto cultura.

Quatro artigos (OLIVEIRA, 2000; CARDOSO, 2000; WITTMANN, 2000; CASTRO, 2000)

aproximam-se apenas da imagem democrática. O artigo levantado em 2009 (BRANDÃO,

2009), segundo período, aproxima-se da imagem democrática da escola.

Observa-se que, embora traços da imagem organizacional da escola como empresa e

sistema social, burocracia e modelo racional e cultura estejam presentes, a produção dos dois

períodos esteve marcada pela ênfase na imagem organizacional da escola enquanto

democracia.

Na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos foram levantados 22 artigos. De 1995 a

2002, foram levantados nove artigos, todos perspectivam a escola enquanto democracia,

sendo que um também se aproxima da burocracia e do modelo racional (BRANDÃO, 1999),

um da empresa e do sistema social (CAMPOS; SHIROMA, 1999), um da arena política e do

modelo político (CAMPAM, 1997). Seis artigos apenas da democracia (ZABOT, 1995;

PARO, 1996; MOUSSATCHE; MAZZOTTI; BONILHA MAZZOTTI, 2000; LOCATELLI,

2000; OLIVEIRA; SENAPESCHI, 2001; DAVIES, 2002).

Entre 2003 a 2010 foram levantados 13 artigos. Um artigo aproxima-se da imagem

organizacional da escola enquanto democracia (ARAÚJO; GOMES, 2006), seis da

98

democracia e cultura (REALI; REYES; MARTUCCI; MIZUKAMI; LIMA; TANCREDI;

MELLO, 2004; MONTEIRO, 2007; SILVA, 2009; BEZERRA, 2009; MARQUES, 2009;

ESQUINSANI, 2010), dois da democracia, da arena política e do modelo político

(MAURICIO, 2006; GONÇALVES; PIOVESAN, 2006), um da cultura, da anarquia e do

modelo anárquico (MAZZOTTI, 2006) e três artigos clarificam o contexto capitalista em que

a escola está inserida, aproximando da empresa e do sistema social, mas objetivando e

apontando práticas democráticas (TURA; MARCONDES, 2006; VARANI; SILVA, 2010;

SETÚBAL, 2010).

É possível identificar que, de modo geral, todos os artigos perspectivam a escola

enquanto democracia, embora tenham referenciais distintos. Há permanências na concepção

de escola no que se refere à crítica aos fatores econômicos e burocráticos e a busca pela

democracia.

Os resultados desta pesquisa permitem indicar, portanto, que, entre 1995-2010,

observou-se maior concentração da produção em relação à imagem organizacional da escola

enquanto democracia, apesar da presença, em sua minoria, dos traços das outras imagens

organizacionais da escola como empresa, burocracia, arena política, anarquia e cultura e os

modelos racional, político, anárquico e sistema social.

Retomando as questões iniciais apontadas na Introdução, pode-se dizer que: não há

alterações significativas na produção acadêmica veiculada nos dois períodos analisados

(1995-2002 e 2003-2010); há certo equilíbrio quantitativo da produção nos dois periódicos,

com alteração apenas nos períodos analisados; há sutil predominância de artigos mais críticos

à Política educacional brasileira na RBEP e no primeiro período e, finalmente, apesar de

referenciais teóricos e metodológicos diferenciados, há predominância significativa da

produção, nos dois periódicos e nos dois períodos, que analisam criticamente o contexto e

perspectivam uma escola pública brasileira democrática.

O levantamento e análise realizados indicam, também, que em nenhum texto foi

encontrada citação/referência direta ou indireta aos autores (LIMA, 2008; COSTA, 2003),

utilizados como subsídios teóricos da pesquisa. Esta constatação pode sugerir à comunidade

acadêmica uma lacuna a ser explorada nos estudos que valorizam a escola, ou seja, a de poder

compreender a organização escolar em seu cotidiano, com seus conflitos, interesses,

desorganização, jogos etc., a partir de referencial explicativo que não desconsidera a

constituição histórica da instituição escolar, mas valoriza as dimensões que a produzem

enquanto tal.

99

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