Uma visão metacognitiva das estratégias diagnósticas de enfermagem
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MARCOS ANTÔNIO GOMES BRANDÃO
UM A VISÃO METACOGNITIVA DAS ESTRATÉGIAS DIAGNÓSTICAS DE
ENFERMAGEM
Dissertação apresentada ao Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro, para a obtenção do título de Mestre em Tecnologias Educacionais nas Ciências da Saúde. Or ientador: Prof. Dr . Maurício Abreu Pinto Peixoto
Rio de Janeiro
1999
2
MARCOS ANTÔNIO GOMES BRANDÃO
UMA VISÃO METACOGNITIVA DAS ESTRATÉGIAS DIAGNÓSTICAS DE ENFERMAGEM
COMISSÃO EXAMINADORA
DISSERTAÇÃO PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE
Presidente e Orientador: Prof. Dr. Maurício Abreu Pinto Peixoto Examinadores: Prof. Dr. Alberto Oliva Prof. Dr.ª Suely de Souza Baptista Suplente: Prof. Dr.ª Tereza Cristina Escrivão Soares Cortez
Rio de Janeiro, 01 de novembro de 1999.
3
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer a todos que colaboraram de maneira direta e
indireta na elaboração do trabalho e ainda de forma particular:
a Maurício Abreu Pinto Peixoto, pela orientação cuidadosa e precisa
que desenvolveu por toda a elaboração deste estudo;
a três pessoas pela carinhosa ajuda, sem a qual não conseguiria ter
findado meu trabalho: minha mãe, minha noiva e minha irmã;
a Cecília Izidoro e Elen Martins, por todas as trocas que fizemos na
trajetória como mestrandos do Nutes;
a Regina Carvalho e Marcus Teódolo, pela solidariedade e ajuda no
“caminho das pedras” ;
à Profª. Ieda de Alencar Barreira, pelas valiosas sugestões na etapa
inicial do estudo;
aos colegas do Departamento de Enfermagem Fundamental, pela
amizade;
aos vinte e dois aprendizes, pela sincera e motivada colaboração à
execução deste trabalho.
aos estudantes de graduação da Escola de Enfermagem Anna Nery,
pela possibilidade de aprendizagem a mim oferecida e que interferiu definitivamente no
curso deste trabalho.
4
“ Parecia-me que poderia encontrar muito
mais verdade nos raciocínios que cada um
forma sobre os assuntos que para si são
importantes” .
Descartes
5
SUMÁRIO
Resumo ........................................................................................................... 7
Abstract .......................................................................................................... 8
1 −− “ O CONTEXTO DO ESTUDO” −− INTRODUÇÃO ..................................... 9 1.1 − O objeto de estudo............................................................................................... 9
1.2 − Metacognição e o conhecimento metacognitivo.................................................10
1.3 − O diagnóstico de enfermagem...........................................................................21
1.3.1 − O diagnóstico de enfermagem no contexto do processo de enfermagem...27
1.3.2 − O diagnóstico de enfermagem no contexto da categoria diagnóstica.................31
1.3.3 − O diagnóstico de enfermagem no contexto do enunciado diagnóstico...............32
1.4 − A classe das estratégias diagnósticas.................................................................34
1.5 − A interface metacognição − processo diagnóstico em enfermagem...................36
1.6 − Questões norteadoras.........................................................................................40
1.7 − Objetivos do estudo...........................................................................................41
1.8 − Justificativas e contribuições.............................................................................41
2 −− “ COMO FOI FEITO” −− METODOLOGIA ................................................. 45
2.1 − Tipo de estudo e abordagem..............................................................................45
2.2 − Sujeitos e critérios de seleção............................................................................46
2.2.1 − Os sujeitos das entrevistas preliminares em grupo.................................................48
2.2.2 − Os sujeitos das entrevistas individuais...................................................................49
2.3 − Métodos.............................................................................................................51
2.3.1 − Coleta de dados......................................................................................................51
2.3.2 − Tratamento e análise dos dados..............................................................................58
3 −− “ A DESCRIÇÃO DAS ESTRATÉGIAS DIAGNÓSTICAS DE
ENFERMAGEM” −− RESULTADOS ............................................................... 63
3.1- As estratégias diagnósticas de enfermagem aplicadas antes do encontro com o cliente..............................................................................................................................64
3.1.1 − Estratégia Um − Ouvir a passagem de plantão...........................................64
3.1.2 − Estratégia Dois − Leitura do prontuário.................................................................67
6
3.2 − As estratégias diagnósticas de enfermagem aplicadas durante o encontro com o cliente..............................................................................................................................73
3.2.1 − Estratégia Três − A conversa com o cliente...........................................................73
3.2.1 − Estratégia Quatro − Exame físico..........................................................................80
3.2.3 − Estratégia Cinco − Observação .............................................................................87
3.2.4 − Estratégia Seis − Os testes de hipóteses diagnósticas............................................92
3.3 − As estratégias diagnósticas de enfermagem aplicadas após o encontro com o cliente..............................................................................................................................95
3.3.1 − Estratégia Sete − O questionamento a profissionais da equipe de enfermagem......95
3.3.2 − Estratégia Oito − Relacionamento entre dados......................................................99
3.3.3 − Estratégia Nove − A consulta ao livro.................................................................107
3.3.4 − Estratégia Dez − O questionamento ao professor ................................................112
4 −− “ OS SIGNIFICADOS” −− DISCUSSÃO................................................... 118
4.1 − Da metodologia − “Reconhecendo as escolhas” ..............................................118
4.2 − Dos resultados − “A noção do todo” ................................................................134
4.2.1 − Considerações sobre as estratégias usadas antes do encontro..............................134
4.2.1.1− Como os conhecimentos sobre a aprendizagem melhoram o aproveitamento das estratégias de pré-encontro?...........................................................................................145
4.2.2 − Considerações sobre as estratégias diagnósticas usadas durante o encontro........153
4.2.2.1 − Como os conhecimentos sobre a aprendizagem melhoram o aproveitamento das estratégias de encontro?.................................................................................................163
4.2.3 − Considerações sobre as estratégias diagnósticas utilizadas após o encontro........170
4.2.3.1 − Como os conhecimentos sobre a aprendizagem melhoram o aproveitamento das estratégias de pós-encontro?...........................................................................................177
5 −− “ LIÇÕES DA EXPERIÊNCIA” : −− CONCLUSÃO ................................... 185
6 −− REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS:........................................................ 187
BRANDÃO, M.A.G. Uma visão metacognitiva das estratégias diagnósticas de
enfermagem. Rio de Janeiro, 1999. 191p. Dissertação (Mestrado em Tecnologia
Educacional nas Ciências da Saúde) - NUTES/CCS. Universidade Federal do Rio de
Janeiro, 1999.
RESUMO
Neste estudo qualitativo, as estratégias diagnósticas de enfermagem foram descritas de
um ponto de vista metacognitivo. Vinte e dois estudantes novatos de um curso de
graduação em enfermagem foram entrevistados, utili zando-se de um formato semi-
estruturado. Foi explorado o conhecimento metacognitivo dos sujeitos sobre seus
processos diagnósticos. Dez estratégias diagnósticas foram classificadas em três
categorias: (1) as estratégias diagnósticas aplicadas antes do encontro com o cliente;
(2) as estratégias diagnósticas aplicadas durante o encontro com o cliente; (3) as
estratégias diagnósticas aplicadas após o encontro com o cliente. Essas estratégias
mostraram uma grande diversidade de significados para os sujeitos. Conclui-se que: as
entrevistas semi-estruturadas foram válidas para analisar o raciocínio diagnóstico e a
perspectiva metacognitiva foi eficiente para identificar os significados das estratégias
diagnósticas de enfermagem.
Palavas-chave: processos cognitivos; metacognição; educação em enfermagem;
diagnóstico de enfermagem; estratégias diagnósticas.
8
BRANDÃO, M.A.G. A metacognitive approach on nursing diagnostics strategies.
Rio de Janeiro, 1999. 191p. Dissertação (Mestrado em Tecnologia Educacional nas
Ciências da Saúde) - NUTES/CCS. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1999.
ABSTRACT
This qualitative study describes nursing diagnostic strategies on a metacognitive
approach. Twenty two novices students of a nursing baccalareaute course were
interviewed using a semi-structured approach. Metacognitive knowledge about process
diagnosis was explored. Ten diagnostics strategies were classified in three categories:
(1) nursing diagnostic strategies used before client’s encounter; (2) nursing diagnostic
strategies used in client’s encounter; (3) nursing diagnostic strategies used after client’s
encounter. A single strategy could have many differents meanings among subjects. It
was concluded that semi-structured interviews were adequates to analyse diagnostic
reasoning and metacognitive perspective was effective to identify meanings for nursing
diagnostic strategies.
Key-words: cognitive processes; metacognition; nursing education; nursing diagnosis;
diagnostics strategies.
9
1 −− “ O CONTEXTO DO ESTUDO” −− INTRODUÇÃO
1.1 −− O objeto de estudo
O objeto do presente estudo são as estratégias diagnósticas1
utili zadas por estudantes do quinto período de um curso de graduação em enfermagem
de uma escola de enfermagem da rede pública de ensino superior. Buscamos, com o
proposto estudo, descrevê-las de um ponto de vista metacognitivo, explorando as
definições, finalidades, circunstâncias, modos de utilização e os critérios de avaliação2
de cada estratégia identificada.
Apresentado o objeto de estudo, as questões que daí emergem são as
seguintes: Por que elegemos esse tema para investigação? Como foi construído o
objeto de estudo?
A fim de responder aos questionamentos acima apresentados,
buscaremos apresentar, primeiramente, alguns aspectos relevantes sobre a
metacognição, o conhecimento metacognitivo, o diagnóstico de enfermagem, as
estratégias diagnósticas e o processo diagnóstico e, posteriormente, construir uma
interface entre eles.
1 No estudo, estratégias diagnósticas são ações, técnicas e procedimentos de que se valem os sujeitos no processo de diagnosticar. Para que sejam consideradas estratégias, os sujeitos devem conhecer, ainda que parcialmente, suas finalidades circunstâncias e modos de usar na tarefa diagnóstica, isto é, precisam ter intencionalidade e ser do domínio da consciência.
2 Esses são os cinco “aspectos-chave” destinados a facil itar a utili zação de estratégias de compreensão da leitura. No estudo, serão uti li zados para obter dos sujeitos as descrições das suas estratégias diagnósticas. (Winograd & Hare apud Lopes da Silva & Sá, 1993).
10
1.2 −− Metacogn ição e o conh ecimento metacognitivo
O que significa conhecimento metacognitivo?
Para delinearmos a resposta, passamos obrigatoriamente, pelo
conceito de metacognição, e é desse ponto que partiremos.
A metacognição, etimologicamente, significa “a cognição da
cognição” e, com esse sentido, o termo foi introduzido pela primeira vez nos anos 70
por Flavell (apud Salema, 1997). Esse autor a definiu, incluindo três competências:
1. O conhecimento que um indivíduo possui sobre os seus próprios
processos mentais, e os produtos cognitivos gerados por esses
processos;
2. o conhecimento sobre as propriedades pertinentes à aprendizagem
da informação, ou sobre os dados de uma determinada tarefa;
3. a avaliação ativa e a regulação dos processos em função dos
objetivos cognitivos.
Posteriormente, Flavell apresenta a metacognição como uma
consciência de si mesmo, isto é, “um profundo senso do ego como armazenador e
utili zador ativo e deliberado da informação” ( apud Hacker, 1998, p. 8).
Outras contribuições ao conceito de metacognição foram propostas e
são apontadas por Hacker (1998, p. 8-11). Uma delas é de autoria de Kluwe (1982),
que menciona dois atributos para o conceito. Para Kluwe, “o indivíduo pensante tem
algum conhecimento sobre o seu próprio conhecimento e dos outros” 3 e “pode
3 Esse conceito está ligado ao atributo do conhecimento metacognitivo de ser capaz de permitir a consciência sobre o conhecimento conceitual ou declarativo do indivíduo (Dunlosky, 1998). O conhecimento conceitual é o que sabemos e fica armazenado na memória. É o que costumamos
11
monitorar e regular o curso de seu próprio pensamento, isto é, pode atuar como agente
causal do seu próprio pensamento” 4.
Outra contribuição ao conceito foi trazida por Paris & Winograd
(apud Hacker, 1998, p.11) e trata da autoconfiança e auto-gerenciamento da cognição.
Para eles, autoconfiança são reflexões pessoais sobre os estados e habilidades de
conhecimento, estado afetivo concernente ao conhecimento, habilidades, motivação, e
características como aprendizes. Já o auto-gerenciamento refere-se à “metacognição
em ação” ou processos mentais que auxiliam a “orquestrar aspectos da resolução de
problemas”
Das contribuições desses autores, vemos que é básico para o
conceito de metacognição a idéia de pensamento sobre os próprios pensamentos, que
podem ser o que alguém sabe (conhecimento metacognitivo); o que alguém está
fazendo (habilidade metacognitiva); ou o estado afetivo ou cognitivo de alguém
(experiência metacognitiva).
O pensamento metacognitivo diferencia-se de outros tipos de
pensamento quando consideramos sua fonte. Na verdade, ele não emerge da realidade
externa imediata ao sujeito, origina-se, sim, nas próprias representações mentais
internas do sujeito sobre a realidade. Inclusas aí também o que se sabe sobre as
representações internas, como trabalham e como são sentidas.
Em suma, a metacognição envolve tanto aspectos de tomada de
consciência, monitoração, regulação, quanto crenças e aspectos afetivos. Contudo, o
denominar conhecimento.
4 Já esse conceito esteve ligado ao conhecimento metacognitivo sobre o conhecimento procedimental do indivíduo (Dunlosky, 1998), isto é, sobre o que costumamos chamar de habil idade, saber fazer, ou know how.
12
cerne dessa “cognição da cognição” está na orientação voltada para dentro do
indivíduo como um ser que sabe e, ainda mais, que sabe o que sabe.
Delimitado o conceito, acreditamos oportuno responder a uma
pergunta dirigida ao entendimento das finalidades da metacognição:
Para que serve a metacognição?
Provavelmente a resposta a esse questionamento seja mais difícil do
que apresentar os conceitos atribuídos ao termo. Como afirma Carr & Biddlecomb
(1998, p. 69) “a metacognição é multifacetada estando incluídos o conhecimento sobre
as estratégias, as tarefas, o self e habilidades para avaliar as estratégias”.
A reflexão sobre os próprios pensamentos pode resultar em melhora
na resolução de problemas complexos, visto que permite a exploração do
conhecimento sobre as estratégias. Com isso, os modelos de resolução poderão ficar
mais flexíveis, permitindo o uso de estratégias mais eficazes e complexas (Berardi-
Coletta et al., 1995). Isso é possível pela capacidade da metacognição em,
estrategicamente, decodificar a natureza do problema e formar suas respectivas
representações mentais (conhecimento sobre a tarefa e indivíduo), permitindo a
identificação e superação de obstáculos que impedem o progresso cognitivo. Assim, o
compartilhamento do conhecimento metacognitivo e das habilidades podem ser úteis,
principalmente, para os estudantes iniciantes com esquemas (representações mentais do
conhecimento) em transição.
Segundo Carr & Biddlecomb (1998, p. 72) o conhecimento
metacognitivo sobre as estratégias é particularmente importante para os indivíduos que
começam a adquirir o domínio sobre elas. Isso, é de destacada importância quando
13
trazemos aos sujeitos do estudo, novatos em diagnóstico.
Todavia a pergunta ainda ronda sem resposta e assume uma nova
dimensão: A metacognição poderia trazer vantagens ao processo de diagnóstico em
enfermagem?
Tal qual na resolução de problemas (que engloba as tarefas
diagnósticas) e na matemática, o conhecimento metacognitivo e uso de estratégias
metacognitivas são competências necessárias ao alcance do resultado com mais
facilidade e eficiência.
Mediante as contribuições trazidas pelos estudos na área de
diagnóstico, na qual predomina a corrente do Processamento da Informação (PI)5,
sabemos que o sucesso diagnóstico está relacionado às representações mentais que o
indivíduo tenha sobre o cliente (conhecimento conceitual) e ao domínio das estratégias
(conhecimento procedimental). Assim, uma vez que, a metacognição é capaz de atuar
nesses dois tipos de conhecimento, é também, provavelmente, capaz de atuar
positivamente no processo diagnóstico em enfermagem.
Finalmente, a metacognição serve ao aprendiz muito mais do que
meramente como um organizador do conhecimento; mais que isso, permite a ele tomar
um papel ativo na sua aprendizagem como monitorador, organizador, conhecedor e
avaliador. Como afirma Silva (1998, p. 91) “metacognição é então um discurso de
segundo nível sobre o processo de aprendizagem, assim como também uma proposta
educacional” .
Como atua a metacognição é, para nós, outro tópico de abordagem
5 Ver Sutherland (1996) com sua obra O desenvolvimento cognitivo actual.
14
fundamental. A pesquisa metacognitiva e suas aplicações, dentro do ambiente
educacional, permitem compreender de que maneira ela facilita a aprendizagem. Várias
explicações, não excludentes entre si, auxiliam no entendimento dessa contribuição e
são delineadas de modo resumido a seguir.
Como a metacognição atua sobre o aprendizado do indivíduo?
As experiências iniciais com a metacognição buscavam entender as
contribuições metacognitivas em termos de padrões desenvolvimentais gerais do
conhecimento sobre processos da memória, principalmente em relação à consciência do
armazenamento e reativação da informação. Do crescimento do corpus de
conhecimento metacognitivo, surgiram três categorias de estudo que delimitam como a
metacognição auxilia na aprendizagem (Hacker, 1998, p. 11-19).
A primeira categoria correspondente aos estudos de monitoração
cognitiva, que tratam do conhecimento individual sobre seu conhecimento e processos
de pensamento, e como o sujeito pode monitorar, conscientemente, os seus processos
e conhecimentos correntes. O cerne dessa questão é a auto-regulação da
aprendizagem, o que é capaz de melhorar a eficiência do aprendiz. Neste sentido a
metacognição trabalha como elemento-chave da auto-regulação ao auxiliar o sujeito a
reconhecer o que sabe e o que não sabe sobre um assunto, isto é, a auto-avaliação do
conhecimento conceitual sobre um determinado assunto ou do conhecimento
procedimental (domínio das estratégias) necessário à realização da tarefa.
Os estudos da regulação cognitiva fazem parte da segunda categoria
de pesquisas e propõem que a metacognição atua, ajudando o sujeito a regular seus
processos de pensamentos e o uso de estratégias em situações com demandas
15
diferentes. Nessa categoria, os estudos se concentram na busca por possíveis
modificações, utilização ou abandono de uma estratégia já dominada quando a tarefa é
modificada. Os resultados demonstram que a metacognição é capaz de facilitar a
seleção da estratégia adequada a uma tarefa, a regulação de estratégias eficientes
e o ensino de generalizações das estratégias para novas situações.
A terceira categoria refere-se aos estudos de monitoração e
regulação. Aqui a contribuição da metacognição inclui a monitoração pessoal da
informação disponível durante o processo de pensamento, e o uso consciente dessa
informação regula os processos subseqüentes da memória. Na contribuição de Paris &
Winograd, a “metacognição em ação orquestra aspectos da resolução de problemas” ,
incluindo os “planejamentos que os aprendizes fazem antes de seguir na tarefa”, “os
ajustes que fazem na tarefa” e as “revisões feitas posteriormente” (apud Hacker, 1998,
p.17). Outra linha de estudos dessa categoria demonstra que a consciência
metacognitiva proporciona ao aprendiz capacidade de selecionar entre estratégias
eficientes para a realização da tarefa, quando ele monitora as informações obtidas
durante a aplicação da estratégia.
Finalmente, podemos, a partir das contribuições das três categorias
de estudos, trazer algumas respostas à pergunta: Como a metacognição pode auxili ar
na aprendizagem?
Hacker (1998, p. 20) afirma que a metacognição tem capacidade de
auxiliar educadores a construir ambientes de ensino que se focalizam na aprendizagem
estratégica, flexível e criativa, na tomada de consciência sobre as características das
estratégias eficazes e na discussão sobre aspectos motivacionais e cognitivos do
pensar. A teoria metacognitiva trabalha de modo reconhecidamente eficaz, pois
engloba traços fundamentais do aprender: o papel do gerenciamento executivo e
16
consciente do próprio pensamento, as diferenças individuais em auto-avaliação e
gerenciamento do desenvolvimento cognitivo e aprendizagem, e o pensamento
construtivo e estratégico.
Uma afirmativa de Hacker (1998, p.20) sintetiza as contribuições da
metacognição na aprendizagem:
“ Então, a promessa da teoria metacognitiva é a de focalizar-se precisamente naquelas características do pensamento que podem contribuir para a consciência do estudante e entendimento de seu ser auto-regulador, isto é, de ser um agente do seu próprio pensamento.”
Ainda que parcialmente respondida nas abordagens anteriores, outra
questão carece de um maior aprofundamento. Refere-se às circunstâncias de emprego
da metacognição, conforme apresentação subseqüente.
Quando util izar a metacognição?
A metacognição serve à maioria das situações de aprendizagem,
melhorando a performance do aprendiz na tarefa. Sua participação, contudo, é pouco
necessária nas situações que exijam o uso de estratégias associativas, isto é, naquelas
que basta a recordação literal da informação, sem introdução de mudanças estruturais.
Um exemplo de estratégia associativa é a repetição, que consiste em recitar nomes ou
itens, algumas vezes, na fase de aquisição da informação (Pozo, 1996, p.183).
A repetição memorística, quando no nível das estratégias
associativas, é vulgarmente denominada entre nós como “decoreba” e, com essa
característica, a informação, que o é objeto de aquisição, carece das elaborações mais
profundas como a monitoração, regulação e auto-avaliação, destacadas na teoria
metacognitiva. Entretanto isso não quer dizer que a repetição não seja útil à
aprendizagem. Para Pozo (1996, p.186), essa estratégia é eficaz, quando os materiais
17
carecem de significados lógicos ou psicológicos. Elas são capazes de minimizar o
esforço cognitivo em recordar informações, permitindo ao aprendiz lidar com uma
maior quantidade de dados.
As competências metacognitivas devem ser usadas na segunda
categoria de estratégias: as de restruturação. De acordo com Pozo (1996, p.187), elas
“recorrem à conexão dos materiais de aprendizagem com os conhecimentos anteriores,
situando-os em estruturas de significados mais ou menos amplas”. O autor, continua
mencionando dois tipos dessas estratégias: (1) as de elaboração, que consistem em
buscar uma relação, significado ou referencial em comum aos itens aprendidos; e (2) as
de organização, que implicam uma organização semântica ou organização hierárquica
entre esses itens. Exemplificando, temos: imagem mental, palavra-chave, rima,
mnemônicos, analogia (entre as estratégias de elaboração); e mapas conceituais, V
heurístico, construção de redes de conhecimento (entre as de organização).
A categoria de restruturação exige a monitoração, regulação e auto-
avaliação metacognitivas para obtenção de melhor performance de aprendizagem, pois
as operações mentais exigidas extrapolam a simples recordação de informações; ao
contrário, exigem interrelações entre as informações anteriores e novas, que, por
diversas vezes, são capazes de modificar os seus significados.
O processo diagnóstico parece depender, significativamente, das
estratégias de restruturação, já que, exige extensivas conexões entre o novo
conhecimento e o anterior, utilizando múltiplas informações ricas em significados.
Fixados os limites da metacognição no que concerne ao conceito,
finalidades, como funciona, e circunstâncias apropriadas ao seu emprego, parece-nos
oportuno apresentar as considerações sobre o conhecimento metacognitivo.
18
O que é conhecimento metacognitivo?
Flavell distingue o conhecimento metacognitivo referindo-se,
segundo as palavras de Lopes da Silva & Sá (1993, p. 22-23), “a todo conhecimento
que o indivíduo adquiriu sobre si próprio e sobre as pessoas como agentes cognitivos
ou psicológicos ou, mais especificamente, sobre aquelas variáveis ou fatores que
podem influenciar o curso e os resultados das ações psicológicas” .
Posteriormente, o próprio Flavell (1979, p. 906) expande o conceito,
afirmando que o conhecimento metacognitivo refere-se ao próprio conhecimento
armazenado de mundo, e “que torna a pessoa uma criatura cognitiva com suas diversas
tarefas cognitivas, metas, ações e experiências”. Consiste, pois, em um próprio
conhecimento ou crença sobre três fatores gerais: (1) sobre a própria natureza
individual ou a natureza dos outros como processador cognitivo; (2) sobre a tarefa,
suas demandas, e como tais demandas podem ser atendidas sob condições variadas; e
(3) sobre as estratégias cognitivas e metacognitivas para desenvolver a tarefa6.
O conhecimento metacognitivo incide sobre 3 variáveis ou fatores, a
pessoa, a tarefa, e o conhecimento das estratégias.
As variáveis referentes à pessoa são os fatores (conhecimentos e
crenças) que dão a consciência que a pessoa tem de seu processo cognitivo pessoal.
Em um contexto geral, envolve o conhecimento das diferenças intra-individuais (por
exemplo, qual sua maior facilidade com os conteúdos abordados na disciplina), inter-
individuais (reconhecer o mérito maior do outro na disciplina), ou universais
(reconhecer que todos os seres humanos erram) (Lopes da Silva & Sá, 1993).
No âmbito clínico, a variável pessoal pode ser exemplificada quando
6 São denominadas estratégias cognitivas as que são util izadas para fazer progressos em busca do alcance da meta, e as metacognitivas, invocadas para monitorar o progresso das estratégias.
19
o aluno reconhece que sua competência maior é como aprendiz visual (Beitz, 1996). É
possível que essa variável tenha fortes implicações na necessidade de reconhecimento
de habilidades específicas de aprendizado de um indivíduo.
As estratégias de aprendizado que trabalhem esse aspecto (a ser
discutido posteriormente) podem ser muitas, mas, certamente, a premissa básica é que
o estudante e o docente devem reconhecer suas próprias habili dades e estratégias para
aprender.
A segunda variável, referente à tarefa, inclui duas subcategorias:
uma relacionada à quantidade e à qualidade da informação disponível para a sua
realização; e a outra associada aos seus objetivos e exigências, que terá influência na
tarefa a ser desenvolvida (Lopes da Silva & Sá, 1993). Ambas sofrem a influência
determinante da experiência vivenciada pelo aprendiz (Beitz, 1996).
No âmbito clínico, temos como exemplos na subcategoria associada
a exigências da tarefa: um estudante que reconhece que cuidar de um indivíduo com
traumas múltiplos é, geralmente, mais difícil que de um com febre leve (Beitz, 1996); e
o aluno que reconhece as metas que procura atingir ao prescrever e implementar
determinado cuidado de enfermagem. Na subcategoria de quantidade e qualidade da
informação: o aprendiz que controla as características e a quantidade de dados
disponíveis em uma coleta de dados, a fim de elaboração de uma conclusão diagnóstica
A terceira variável refere-se ao conhecimento das estratégias.
Segundo Lopes da Silva & Sá ( 1993, p.23), “abarcam as informações sobre os meios,
processos, ou ações que permitirão ao sujeito atingir os seus objetivos com maior
eficácia, numa determinada tarefa cognitiva”. Envolve o reconhecimento de quais
processos de aprendizado são mais úteis a certa situação e a identificação de falhas no
20
aprendizado (Beitz, 1996). Depende substancialmente das estratégias metacognitivas,
isto é, das concebidas para verificar se o objetivo foi atingido (Salema, 1997).
Como exemplos clínicos: saber selecionar qual etapa da coleta de
dados clínicos (entrevista, exame físico, observação, análise de outras fontes) deverá
fazer primeiro na situação específica, para obter dados mais fidedignos; ou saber se,
nesse cliente, é mais eficaz uma estratégia de teste de múltiplas hipóteses ou de
hipótese única, para estabelecer um diagnóstico preciso.
Beitz (1996) afirma que todas as três variáveis são trabalhadas na
realidade clínica de um modo conjunto. Entretanto, para ela, as variáveis que podem
ser melhor desenvolvidas são as referentes à pessoa e ao conhecimento de estratégias
No presente estudo, predominantemente, investigamos os elementos referentes à
estratégia (terceira variável).
O domínio do conhecimento metacognitivo é de suma importância
para este estudo, na medida em que dele dependeremos para reconhecer as
particularidades das estratégias utilizadas. Antes, porém, acreditamos ser oportuno
delimitar as características do diagnóstico de enfermagem.
21
1.3 −− O diagnó stico de enfermagem
Em relação ao termo encaminhamos a primeira pergunta, referente ao
conceito de diagnóstico de enfermagem (DE).
O que é um diagnóstico de enfermagem?
Trataremos de respondê-la inicialmente com uma busca à
compreensão do termo e de suas implicações na enfermagem.
Recorrendo à etimologia do termo “diagnóstico” , verificamos que
deriva de diagnose, palavra de origem grega que significa conhecer mediante.
Diagnóstico é, portanto, no sentido amplo da palavra, conhecer algo, mediante um
processo de investigação que determina natureza, causa e conseqüência de um dado
evento.
O diagnóstico é do domínio de várias disciplinas e práticas, ainda
que, por muitas vezes, seu significado seja rapidamente associado à prática médica de
detecção da doença. Quando um mecânico automotivo detecta o defeito e a sua origem
em um carro, ele está fazendo diagnóstico; também quando um engenheiro determina
os motivos pelos quais um prédio está afundando no solo, ele está diagnosticando. Na
verdade, mudam os objetivos, os métodos e os procedimentos, mas permanece o
conceito para o termo.
O uso do vocábulo diagnóstico, na área da saúde, geralmente está
relacionado ao diagnóstico médico; o que implica dizer que nessa situação, o único
responsável pelo diagnóstico de um cliente é o médico. Em muitos casos, os
enfermeiros sequer utilizam a palavra diagnóstico para denominar as conclusões a que
22
chegaram. É ainda fato raro, em particular no Brasil, ouvirmos de enfermeiros
afirmativas como: “Eu diagnostiquei...” , “Eu cheguei ao diagnóstico...” , “O meu
diagnóstico é...” . No lugar, figuram frases como: “Eu acho que ele tem isso...” , “O
problema que eu achei foi...” , “O comprometimento é...” .
O que pode parecer uma simples diferença na construção lingüística,
na verdade, carrega uma profunda discussão histórica e social que não está em nossos
propósitos iniciar ou continuar. Todavia o que pode ser considerado como um fator
influenciador é o fato de que, historicamente, a natureza da prática da enfermagem
permaneceu, e ainda permanece, com algumas indefinições, até mesmo para os
enfermeiros. Essas indefinições são amplas no âmbito do diagnóstico, o que gera maior
confusão na área.
Não são conclusivas sequer as definições para o termo enfermagem.
Somemos a isso, o fato de que “muitas enfermeiras foram ensinadas a evitar afirmações
definitivas ao documentar, e foram aconselhadas a usar frases como ‘parece ser’ ou
‘aparenta ser’ . Esse processo de socialização recompensava a enfermagem por não
diagnosticar” (Carpenito, 1997, p. 28).
Contudo, os enfermeiros, paulatinamente, vêm assumindo a prática
de diagnosticar como de sua competência, e a partir da década de 50, aparece
referência ao diagnóstico de enfermagem como uma atividade desse profissional
(Carpenito, 1997, p.28).
Concordamos com as afirmativas da autora supracitada e
acreditamos que o debate sobre a questão não deva envolver se devemos ou não
diagnosticar, mas, sim, o que podemos diagnosticar e como faremos. Tal
afirmativa aparece como um ponto base para o objeto deste estudo, na medida em que
23
nos preocuparemos em determinar quais estratégias os estudantes utilizam para fazer
os diagnósticos que lhes competem.
Como representação da literatura específica, selecionamos a
definição de Schoemaker de 1984, pois apresenta o diagnóstico de enfermagem com
uma contundente natureza de processo e julgamento:
O diagnóstico de enfermagem é um julgamento clínico sobre um indivíduo, uma família, ou uma comunidade que deriva de um processo sistemático de coleta de dados, proporcionam a base para a prescrição da terapia definitiva pela qual a enfermeira é responsável. (Schoemaker apud Carpenito, 1997)
Tomando-se por base essa e outras contribuições, construímos nossa
definição para diagnóstico de enfermagem como uma atividade de resolução de
problemas que exige uma série de julgamentos e tomadas de decisões7 sobre o uso
consciente das estratégias diagnósticas de enfermagem; dependendo, portanto,
diretamente da aplicação do conhecimento conceitual e do conhecimento estratégico
armazenados na memória de longo prazo8; e potencializado pelo conhecimento
metacognitivo.
Uma questão, no entanto, deve ser melhor esclarecida: Valendo-se de
quais contribuições teóricas, foi construída a definição apresentada?
Nossa definição deriva de alguns referenciais teóricos que sustentam
os estudos de resolução de problemas (R.P.). A contribuição metacognitiva a essa
definição será apresentada por meio da interface metacognição-processo diagnóstico
7 Para Carvalho (1971, p. 40), tomada de decisão “se refere a um processo deliberativo, o qual inclui os possíveis cursos de ação, determinados pelas implicações de enfermagem relativas às inferências, ou seja, é através do processamento decisório que são determinadas as prioridades de enfermagem pertinentes à assistência a ser prestada ao paciente, família ou comunidade” .
8 Carnevali & Thomas (1993, p.23) afirmam que “a memória de longo prazo é a parte do sistema de memória capaz de reter a informação por mais do que minutos ou segundos, de fato, parece ser apta a armazenar quantidades il imitadas de material indefinidamente.”
24
de enfermagem, no próximo tópico.
Iniciando com a resolução de problemas, o assunto foi levantado por
Da Costa & Moreira (1997), que produziram uma série de quatro artigos em que
exploram as produções da literatura na área. Desses estudos, aproveitamos para a
construção de nosso conceito os entendimentos sobre habilidade, conhecimento
conceitual e procedimental, entre outros. Porém em virtude da predominância dos
trabalhos serem desenvolvidos no campo da física, maiores explorações não foram por
nós conduzidas. Em relação às bases teóricas utili zadas pelos autores em R.P,
destacaram-se as teoria Piagetiana, da Aprendizagem Significativa de Ausubel-Novak e
do Processamento da Informação (PI).
No domínio do processo diagnóstico médico e de enfermagem, os
estudos trouxeram-nos mais contribuições para o delineamento do conceito.
Ofereceram-nos o entendimento de aspectos como: a obtenção e processamento dos
dados, modelos de raciocínio, etapas e trilhas do processo, entre outros. Esses
trabalhos tiveram como referencial teórico comum o processamento de informação
(P.I.), e, em virtude de sua recorrência nas pesquisas desenvolvidas na área, sentimos a
necessidade de melhor apresentá-lo.
As bases para a teoria do P.I. surgem com o nascimento das ciências
cognitivas nos anos 50, a partir das contribuições de Bruner, Goodnow e Austin sobre
as estratégias de tomada de decisão e dos trabalhos de resolução de problemas de
Newell, Shaw e Simon em 1972 (apud Taylor, 1997).
O movimento do P.I. também traz contribuições à educação ao tratar
da aprendizagem como uma competência dependente de capacidades mentais
individuais tais como a memória, esquemas mentais e processamentos. Seu enfoque
direciona-se para a mente e as operações que é capaz de realizar. A escola de
25
processamento da informação é apontada como uma das correntes contemporâneas
alternativas a Piaget. Segundo Sutherland (1996), o P.I. predomina nos EUA, na linha
dos pensamentos sobre o desenvolvimento cognitivo.
Os trabalhos produzidos sob esse referencial analisam seus dados
tanto com uma abordagem quantitativa (Tanner et al., 1987; Cholowski & Chan,
1992), como qualitativa (Taylor, 1997). Contudo, são geralmente não-matemáticos,
baseados no processo de trilha, utilizando-se de relatos verbais do sujeito para traçar o
raciocínio que conduz a um julgamento (Gordon, et al., 1994, p. 57).
Especificamente na área do diagnóstico, a teoria do processamento
da informação busca descrever como o clínico faz seus julgamentos, utilizando-se de
meios explicativos sobre os julgamentos humanos, nos quais são identificados e
analisados os processos cognitivos, as operações, e as capacidades envolvidas na tarefa
(Gordon et al., 1994, p. 57).
Partindo da teoria do processamento da informação modelos de
raciocínio diagnóstico foram apresentados como capazes de explicar o processo de
elaboração do diagnóstico médico e de enfermagem, como o hipotético-dedutivo e os
baseados na memória (Bordage & Lemieux, 1991).
Outra questão que acreditamos ser oportuna de ser apresentada é a
seguinte: Será que, os enfermeiros sempre fazem diagnósticos?
Ainda que muitos enfermeiros não tenham consciência, não
documentem ou verbalizem a assertiva diagnóstica, acreditamos que eles sempre
obtém, pelo menos num nível abstrato, uma determinação conclusiva do estado do seu
cliente que necessita do cuidado de enfermagem. Supomos ser impossível a realização
do real cuidar sem a prévia determinação do diagnóstico de enfermagem.
O que de fato ocorre é que, pela ausência de uma clara trajetória
26
histórica como diagnosticadores, os enfermeiros não consideram suas conclusões como
diagnósticos, o que os leva a não ter consciência de que chegam a vários deles. Os
determinantes podem ser atribuídos à hegemonia da linguagem médica; a questões
sociais e culturais, à dúvida da natureza da enfermagem como prática, ciência ou arte; à
existência, ainda incipiente, de uma linguagem de enfermagem universal como é, por
exemplo, a do diagnóstico médico; e o pouco domínio do processo diagnóstico de
enfermagem.
Muitas vezes o enfermeiro desconhece que fez um DE quando, por
exemplo, ouviu um cliente queixar-se de medo, apresentar sudorese e mostrar-se
irritado e afirmou ao colega: “ele está com medo de morrer” . Ao concluir, a partir das
manifestações, a existência de uma reação humana (medo), na verdade, diagnosticou.
O que esse enfermeiro pode considerar sem valor diagnóstico foi construído por
intermédio de um complexo processamento que envolveu amplas competências
abstratas e concretas. E retornando ao conceito de diagnóstico já colocado, temos:
conhecer algo (o medo) mediante um processo de investigação (relato verbal) que
determina natureza (emocional), causa (cirurgia) e conseqüência (irritação, angústia)
de um determinado evento.
Além do amplo desconhecimento sobre as estratégias envolvidas no
processo diagnóstico, e que são objetos de estudo nesta pesquisa, geralmente os
enfermeiros não reconhecem o diagnóstico como a base para seleção do cuidado. De
fato, o planejamento e a implementação do cuidado são conseqüências do diagnóstico.
O diagnóstico de enfermagem ainda é um conceito em evolução e,
conseqüentemente, nenhuma definição parece ser capaz de abarcar todas as dimensões
envolvidas. Entretanto, Carpenito (1997) estabelece três contextos, que, segundo ela,
aparecem ao longo do tempo quando se fala em diagnóstico de enfermagem: o de
27
segundo passo do processo de enfermagem, o de uma lista de categorias ou títulos
diagnósticos e o de uma afirmativa redigida em duas ou três partes (enunciado
diagnóstico). Esses três contextos apontados pela autora serão utili zados para
solidificar a resposta ao questionamento apresentado.
1.3.1 −− O diagnóstico de enfermagem no contexto do processo de
enfermagem
O diagnóstico de enfermagem (DE) surge como uma etapa do
processo de enfermagem necessária ao desenvolvimento do cuidado ao cliente. Porém,
a compreensão da dinâmica desta relação diagnóstico versus processo de enfermagem,
obriga-nos a seguir uma abordagem progressiva: definir o que é processo de
enfermagem, descrevê-lo, dizer onde o diagnóstico nele se insere e, finalmente, quais
seriam as implicações da supressão do diagnóstico do corpus do processo.
Para Iyer et al. (1993, p.10):
O processo de enfermagem é o método, através do qual essa estrutura [teórica] é aplicada à prática da enfermagem. Trata-se de uma abordagem deliberativa de solução de problemas que exige habilidades cognitivas, técnicas e interpessoais, e está voltada à satisfação das necessidades do sistema do cliente/família.
Partindo dessa definição, descreveremos, então, o processo de
enfermagem.
Tal processo possui algumas das características de um método9.
Abaixo apresentaremo-las, utili zando as contribuições de autores citados em Lakatos
& Marconi (1983):
9 Para Lakatos & Marconi (1983, p.40), “o método é o conjunto das atividades sistemáticas e racionais que, com maior segurança ou economia, permite alcançar o objetivo − conhecimentos válidos e verdadeiros − traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decisões do cientista” .
28
1. “ o método é um caminho para se chegar ao resultado”
(Hegenberg) − e como caminho, o processo de enfermagem segue
uma sucessão de etapas ordenadas que se inicia com a coleta de
dados, passa pelo diagnóstico, planejamento e implementação do
cuidado e conclui-se na avaliação final.
2. “ método é uma forma de selecionar técnicas, forma de avaliar
alternativas” (Hegenberg) − e, desse modo, o processo é quem
permite ao enfermeiro selecionar as técnicas, estratégias e
habilidades clínicas necessárias à concretização do cuidado de
enfermagem.
3. “ método é o conjunto coerente de procedimentos racionais ou
prático-racionais” (Nérici) − que se materializa no processo de
enfermagem como uma coerente interrelação de etapas, as quais
para serem operacionalizadas, implicam em operações cognitivas e
motoras.
São essas características de método que permitiram ao processo de
enfermagem ser legitimado, por enfermeiras norte-americanas, como seu marco teórico
da prática, determinando contribuições também no ensino da profissão. No Brasil, a
partir dos trabalhos da Dr.ª Wanda Horta (Horta, 1979), ele desponta como um marco
teórico também para muitas das enfermeiras brasileiras.
Em se tratando de propósitos, o processo de enfermagem, por ser um
método, atinge o objetivo de oferecer uma estrutura na qual as necessidades
individualizadas do cliente, da família e da comunidade possam ser satisfeitas (Iyer et
al., 1993, p. 11).
Quando encaramos o processo de enfermagem em termos de
29
organização, cinco etapas principais são identificáveis: a coleta de dados (construção
do histórico); o diagnóstico; o planejamento do cuidado; a implementação do
cuidado; e a avaliação final sobre o alcance de objetivos do cuidado e sobre a
evolução do estado dos diagnósticos e problemas do cliente.
O diagnóstico localiza-se como a segunda etapa do processo de
enfermagem, capaz de dar aos dados coletados um tratamento, por intermédio de
várias operações mentais, estratégias e habilidades que compõem o processo
diagnóstico. Contudo, acreditamos que o limite entre a coleta de dados (primeira
etapa) e diagnóstico (segunda etapa) existe mais no nível didático. De fato, o que
parece ocorrer é uma interpenetração dessas fases.
Por vezes, o diagnóstico se insere no processo de enfermagem como
um “ fechamento” conclusivo sobre os dados clínicos coletados. Esse fechamento pode
gerar ou não uma assertiva definitiva (categoria diagnóstica), que denomina o produto
final do processo diagnóstico. Um exemplo, já apresentado, de categoria diagnóstica é
o “medo”.
Sem o diagnóstico de enfermagem, o cuidado, materializado em
intervenções de enfermagem, não atinge a individualização e nem a eficácia necessárias
ao alcance dos objetivos clínicos. A implementação de intervenções de enfermagem
sem a anterior elaboração diagnóstica determina a execução de ações de enfermagem
desvinculadas da realidade do cliente e baseadas somente em aspectos epidemiológicos.
De fato, prescrever sem ter antes diagnosticado gera um cuidado
baseado na necessidade usual de uma categoria de clientes que vivem uma situação
clínica semelhante. No entanto, nem sempre permite oferecer o cuidado que aquele
cliente específico precisa de fato. Traduz-se na tentativa de selecionar o cuidado
geralmente pelo diagnóstico médico ou condição, sem antes verificar a natureza da
30
manifestação da reação humana naquele cliente em especial. Como conseqüência, o
enfermeiro pode lançar um “pacote de cuidados” , às vezes útil, mas nem sempre. Na
pior das hipóteses, colocando em risco a saúde do cliente. As falas de dois sujeitos de
nosso estudo sintetizam a idéia:
[...] porque a gente via tudo em bloco, então anemia, ele tá com anemia: orientação pra anemia! Aí começava: vísceras, alimentos folhosos... Ele está com constipação: aí você ia lá e: tum! Entendeu? A gente não pegava o paciente como um todo, a gente pegava por partes... você pode perguntar pra qualquer acadêmico, até o quarto período as orientações da gente são soltas, você não tem aquele alinhamento, você acha que aquilo não é necessário. (Alessandra)
Foi aquela questão, aquilo que eu estava falando, o diagnóstico promove a assistência de enfermagem muito mais voltada para as reais necessidades que o paciente apresenta. Porque às vezes você tem uma série de intervenções de enfermagem para um determinado diagnóstico, porém você não vai implementar todas aquelas intervenções que você tem pra’quele diagnóstico, naquele paciente. Você vai adequar às necessidades que aquele paciente está apresentando. Uma adequação de intervenção, de plano assistencial. (Leandro)
Parece-nos que tão fundamental quanto o diagnóstico, é a capacidade
de reconhecer as estratégias que permitem ao indivíduo elaborá-lo. Assim, acreditamos
que a metacognição seja indispensável ao alcance dos melhores resultados na tarefa de
diagnosticar. Assim, estudantes com um grau elevado de conhecimento metacognitivo
deverão ser capazes de aplicar com maior facilidade as estratégias diagnósticas.
Em suma, o diagnóstico é uma tarefa de resolução de problemas
predominando na segunda etapa do processo de enfermagem, serve de base para a
seleção das intervenções de enfermagem, e, sem ele, o cuidado de enfermagem torna-se
vazio, generalizado e arriscado.
1.3.2 −− O diagnóstico de enfermagem no contexto da categoria
diagnóstica
Na década de 60, Abdellah identifica 21 problemas que dariam
31
origem a categorias diagnósticas futuras nos trabalhos do National Group for the
Classification of Nursing Diagnosis e, posteriormente, da North America Nursing
Diagnosis Association (NANDA). Para Abdellah, diagnóstico de enfermagem é “a
determinação da natureza e extensão dos problemas de enfermagem apresentados pelos
pacientes ou família que recebem cuidados de enfermagem”. (apud Iyer et al. 1993,
p.57)
Gordon (1979) define o diagnóstico de enfermagem como: “um
problema de saúde real ou potencial que as enfermeiras em virtude de sua formação e
experiência são capazes e licenciadas a tratar”.
O “problema” de que trata Gordon é a própria categoria diagnóstica.
Existem esforços internacionais em classificar as categorias diagnósticas de
enfermagem, entre eles o da NANDA.
A listagem diagnóstica da NANDA (taxonomia diagnóstica) recebe
contribuições de enfermeiros de vários países e é atualizada a cada dois anos.
Atualmente, estão classificados mais de uma centena de diagnósticos. São exemplos:
Constipação, hipertermia, ansiedade, lidar ineficaz do regime terapêutico, entre outros
(Carpenito, 1998)
32
1.3.3 −− O diagnóstico de enfermagem no contexto do enunciado
diagnóstico
Existem várias maneiras de se enunciar um diagnóstico de
enfermagem, e a construção do enunciado depende diretamente do sistema diagnóstico
utili zado. As orientações variam desde a ausência de estruturas formais, como os que
preconizam somente a redação do problema como sinônimo de diagnóstico, até
estruturas preestabelecidas como nos sistemas de classificação da prática10. Todavia
acreditamos que a definição estrutural proposta por Gordon (1979) engloba os
componentes envolvidos nos enunciados diagnósticos e tem maior significado, quando
analisamos o diagnóstico proposto pela North American Nursing Diagnosis
Association.
A definição estrutural representa os componentes responsáveis pelo
termo diagnóstico. Para Gordon (1979:490), essa definição é capaz de tornar claro o
conceito tratado e auxiliar no planejamento e registro do diagnóstico de enfermagem.
A autora aponta ainda três categorias de componentes estruturais: o problema, a
etiologia e os sinais e sintomas.
[...] entende-se por problema de saúde atual , o desvio da linha da saúde e a identificação dos fatores de riscos os quais decorrem de uma predisposição individual, familiar e comunitária. E por problema de saúde potencial, a presença dos fatores de risco. (Perez et al., 1990, p.15)
Para a autora, o problema (o que, posteriormente, seria expandido
para apreender a dimensão da categoria diagnóstica) é um termo ou termos
descrevendo o estado do cliente (Gordon, 1979, p.490).
10 A Taxionomia diagnóstica de enfermagem da NANDA é um exemplo de sistema de classificação da prática de enfermagem. Entre os sistemas de classificação diagnóstica de enfermagem é o mais difundido no Brasil .
33
A etiologia é o segundo componente estrutural e representa o fator
desencadeador da reação do cliente, que se manifesta na forma de problema ou de
diagnóstico de enfermagem.
Para Perez et al. (1990, p.16), essas etiologias podem ser
comportamentos do cliente e fatores ambientais, ou a interação entre ambos. Já para
Iyer et al. (1993, p.80), a etiologia ou fatores relacionados indicam os aspectos
fisiológicos, psicológicos, socio-culturais, ambientais ou espirituais que estejam
contribuindo ou ocasionando a reação humana do cliente.
Na visão de Carpenito (1993), as etiologias ou fatores relacionados
são classificados como fatores contribuintes para a mudança no estado de saúde. São
agrupados em categorias a saber: patofisiológica (biológica e psicológica); relacionadas
ao tratamento; situacional (ambiental e pessoal); e maturacional ou desenvolvimental.
Em situações nas quais o diagnóstico de enfermagem é de risco11, os
fatores etiológicos são substituídos por fatores de risco. Trata-se de uma conseqüência
lógica, pois o diagnóstico ou problema atual não existe. Na verdade, existe o risco para
que um problema se estabeleça.
O estabelecimento da etiologia é importante, na medida em que pode
nortear as intervenções de enfermagem (Iyer et al., 1993)
O terceiro componente estrutural do diagnóstico de enfermagem é
representado pelos sinais e sintomas ou características definidoras. Segundo Gordon
(1979, p.490):
11 “Diagnóstico de enfermagem de risco descreve um julgamento clínico sobre a maior vulnerabilidade que um indivíduo, famíl ia ou comunidade apresenta para desenvolver um problema, comparando-se com outros em situação igual ou similar” . (NANDA, 1994)
34
[...] são expressas como um grupo de sinais e sintomas clínicos que podem ser observados no paciente e família. A exatidão no uso das categorias diagnósticas requer que medições e avaliações válidas sejam feitas, e que definições de sinais e sintomas da categoria diagnóstica realmente estejam presentes.
Para a NANDA (1994, p.103), características definidoras são
“achados observáveis e inferências que se agrupam como manifestações de diagnóstico
de enfermagem”.
Esses três componentes estruturais envolvem conseqüências naturais
do julgamento diagnóstico-terapêutico e, portanto, são vitais ao processo de raciocínio
diagnóstico.
Nesse estudo em particular, a questão do conceito do diagnóstico de
enfermagem se fecha no prisma da aprendizagem. O conceito que construímos por
meio das diversas etapas da pesquisa é de que: um diagnóstico de enfermagem, na
verdade, é o produto do processamento das informações obtidas mediante coleta
clínica. Trata-se de um produto de caráter conclusivo, construído por intermédio
da utilização de competências conceituais (conhecimento conceitual cognitivo e
conhecimento metacognitivo), competências procedimentais (estratégias
cognitivas e metacognitivas) e variáveis afetivas (orientações motivacionais).
1.4 −− A classe das estratégias diagnó sticas
O modelo de metacognição que Flavell propõe (apud Hacker, 1998,
p. 5) indica que a habilidade individual de controlar os processos cognitivos depende
de quatro classes de fenômenos: o conhecimento metacognitivo, a experiência
metacognitiva, as metas (ou tarefas) e ações (ou estratégias). Em virtude do objeto de
estudo que elegemos, a classe das estratégias será agora discutida com mais
profundidade.
35
Partindo do aspecto conceitual, estratégias são abordadas como
sinônimos de ações, procedimentos, habili dades. Contudo, gostaríamos de estabelecer,
antes de qualquer apresentação das definições apontadas na literatura, os limites do
nosso conceito para o termo. Para nós: estratégias diagnósticas são ações, técnicas e
procedimentos de que se valem os sujeitos no processo de diagnosticar, mas que
tenham suas características reconhecidas pelos sujeitos. Para que tais sejam
consideradas estratégias, os sujeitos devem conhecer, ainda que parcialmente,
suas finalidades, circunstâncias e modo de usar na tarefa diagnóstica.
A definição acima encontra-se em consonância com a proposição de
Brown et al. (apud Beitz, 1996, p. 31) de que “técnicas e intervenções educacionais
tornam-se estratégias somente se o aprendiz tem o conhecimento de quando, onde e
como usá-las” .
Nosso conceito de estratégias guarda relação com a definição de
Pozo (1996, p. 178), na qual as estratégias de aprendizagem seriam “conseqüências
integradas de procedimentos ou atividades que se escolhem com o propósito de
facilitar a aquisição, armazenamento e/ou utili zação da informação” .
Para nós não representam estratégias diagnósticas, por exemplo, a
consulta a uma fonte de dados por recomendação docente, mas isenta de uma
consciência pelo estudante dos propósitos almejados por ela. Ou ainda, o exame físico
com a única finalidade de treinar a habilidade técnica.
Podemos então depreender de nosso conceito que serão estratégias,
neste estudo, somente as ações, técnicas e procedimentos que sofram influência do
conhecimento metacognitivo do aluno. Isso quer dizer que devem ser alvo de descrição
consciente, advinda da capacidade do sujeito em reconhecê-la como um recurso capaz
de permitir um avanço cognitivo rumo ao alcance do resultado e/ou a monitoração,
36
regulação e auto-avaliação dos processos cognitivos inerentes ao processo diagnóstico.
Entendemos, portanto, que as estratégias diagnósticas devem
guardar, dependendo de suas características, um aspecto cognitivo ou metacognitivo.
Utilizamos para isso as considerações presentes em Salema (1997) de que as
estratégias cognitivas servem ao desenrolar do processo cognitivo, e as estratégias
metacognitivas, à monitoração dos avanços. Gagné em 1974 definiu as estratégias
cognitivas como “sendo habilidades de manejo de si próprio que o aprendiz adquire,
provavelmente durante um período de vários anos, para dirigir seu próprio processo de
prestar atenção, aprender e pensar” (apud Antonijevic & Chadwick, 1983, p. 21).
Delimitado, pois, o conceito de estratégias diagnósticas, levantamos
mais outro conceito que deve ser apresentado, para que a construção do objeto de
estudo se faça de modo claro. Achamos oportuno, agora, a apresentação da interface
entre o conceito de metacognição e o processo diagnóstico em enfermagem.
1.5 −− A interface metacogn ição −− processo diagnóstico em
enfermagem
O debate envolvendo questões relacionadas ao julgamento clínico em
enfermagem coloca-se como um dos grandes desafios para a profissão neste final de
século. A tomada de decisão do enfermeiro depende desse julgamento para influenciar
fortemente a vida dos clientes que estão sob o seu cuidado. Portanto, merece a
temática cuidadosa atenção no âmbito da pesquisa, ensino e assistência. Esses diversos
recortes do julgamento clínico parecem envolver duas dimensões principais, a saber: a
diagnóstica e a terapêutica. Escolheu-se a primeira como objeto deste estudo.
Uma reflexão sobre os processos de julgamento diagnóstico e
resolução de problemas encaminha-nos a questionamentos sobre como aprendemos tal
37
competência e que consciência temos desse processo. Tais reflexões exigem a
colocação de perguntas essencialmente metacognitivas acerca das estratégias, sejam
elas: Quais as estratégias e procedimentos de diagnóstico utili zados em enfermagem?
Por que são usados? Quais as finalidades? Como são usados? Em que circunstâncias
tais estratégias e procedimentos devem ser usados? Como avaliar sua eficácia no
alcance de metas da tarefa diagnóstica? Como monitorar e regular seu uso na
tarefa?
Uma abordagem metacognitiva sobre o processo diagnóstico12 se
apresenta, a nosso ver, como uma rica oportunidade de explorar um campo de enormes
possibili dades teóricas com fortes implicações no aprendizado, ensino e na prática
profissional, que permanece ainda pouco investigado. São exemplos de tais
possibili dades, a identificação de estratégias cognitivas e metacognitivas, a
diferenciação entre o uso das estratégias por novatos e experientes, a determinação de
domínios gerais e específicos para uso das estratégias, a mensuração de grau de
conhecimento metacognitivo na tarefa, entre outros.
Considerando o que já foi registrado anteriormente, o conhecimento
metacognitivo mostra-se um elemento facilitador do aprendizado do processo
diagnóstico, uma vez que nele estão envolvidos procedimentos cognitivos e
metacognitivos.
Acreditamos que um maior conhecimento metacognitivo possa trazer
melhoras na tarefa diagnóstica, ao influenciar, como afirma Hacker et al. (1998), o
curso do empreendimento cognitivo por meio de uma deliberada e consciente busca da
informação na memória ou mediante processos cognitivos automáticos e não-
12 O termo aparece como sinônimos para julgamento diagnóstico e raciocínio diagnóstico na maioria dos estudos versando sobre a temática. Para nós, o emprego de processo diagnóstico é mais adequada a natureza do nosso objeto de estudo.
38
conscientes.
Na literatura encontramos relatos referentes ao papel das estratégias.
Como aponta Escudero (1996), as estratégias melhoram a aprendizagem e a obtenção
de resultados, podendo compensar baixos níveis do conhecimento conceitual.
Trazendo as contribuições de Salema (1997) no que diz respeito à
leitura e interpretação de textos para o campo do diagnóstico, podemos desenvolver
alguns aspectos metacognitivos que o sujeito deve apresentar, desenvolver ou
reconhecer como importantes para a elaboração de um diagnóstico:
• a tomada de consciência e o conhecimento de si próprio, como
aprendiz e um sujeito capaz de diagnosticar, das suas características,
das suas relações com o diagnóstico e do seu modo de pensar;
• a tomada de consciência e conhecimento da natureza da tarefa de
diagnosticar, isto é, de seus procedimentos, que exigem por sua vez,
uma tomada de consciência e conhecimento de um conjunto de
estratégias ao longo do processo;
• o controle consciente do processo de realização de tarefas, o que
obriga o sujeito a monitorar suas estratégias em função da tomada de
consciência e do conhecimento da tarefa, do processo, das estratégias
utili zadas e de si próprio.
Na aprendizagem, a escola metacognitiva assume como um de seus
pressupostos que a aprendizagem eficaz depende da adoção de estratégias cognitivas e
orientações motivacionais, as quais permitem ao aprendiz selecionar corretamente as
estratégias para cada tarefa, flexibilizá-las e dominá-las plenamente (Lopes da Silva &
Sá, 1993). E com a atividade de diagnóstico não parece ser diferente.
Entendemos que um grau mais elevado de conhecimento
39
metacognitivo pode potencializar o processo de diagnóstico em enfermagem, na
medida em que implica tomada de consciência e possibilidade de autocontrole da
tarefa. Como conseqüência, um elevado nível de conhecimento metacognitivo pode
determinar experiências metacognitivas satisfatórias.
Estudos em metacognição e resolução de problemas (Slife et al.,
1985; Swanson, 1990) demonstram que graus mais elevados de conhecimento
metacognitivo têm proporcionado compensações de deficiências em outros domínios
do processamento de uma informação. Swanson observou que crianças com altas
habilidades metacognitivas podem compensar a limitação de habilidades acadêmicas,
durante a resolução de problemas, por acessar a um certo “conhecimento” sobre a
cognição. Slife et al. encontraram indicadores que estudantes com metacognição
elevada foram mais aptos a monitorar respostas certas e erradas corretamente do que
os com reduzida metacognição (apud Swanson & Trahan, 1996).
Apesar de não explicitar um domínio metacognitivo, Schraagen
(1993, p.287-288) delimitou quatro aspectos para a resolução de um problema e que
são importantes serem considerados em nosso estudo. São eles: domínio do
conhecimento, estratégias heurísticas, estratégias de controle e estratégias de
aprendizagem. Partindo dessa subdivisão, uma atividade de conclusão diagnóstica
envolve os quatro aspectos apontados (estando implícitas estratégias cognitivas,
metacognitivas e aspectos motivacionais). Talvez a predominância de um ou outro
domínio em determinada situação deve sofrer influência de variáveis, tais como: a
experiência e motivação do diagnosticador, a complexidade e especificidade da tarefa,
o conhecimento do diagnosticador, entre outros.
Portanto, a metacognição apresenta-se para nós como uma
alternativa teórica ao puro processamento da informação, sendo capaz de permitir a
40
investigação dos diversos aspectos-chave das estratégias diagnósticas. É a partir do
conhecimento metacognitivo que podemos determinar quais estratégias
diagnósticas os estudantes usam, bem como por quê, como, e quando usam. Ainda
nos é possível reconhecer no processo diagnóstico capacidades predominantemente
metacognitivas como a monitoração, regulação e auto-avaliação.
O uso da metacognição permite ao sujeito tomar consciência do
processo, conferindo-lhe a capacidade para interromper os procedimentos em curso,
avaliá-los e corrigi-los, com propósito de atingir melhores resultados na tarefa (Lopes
da Silva & Sá, 1993).
Definido mais claramente nosso objeto de estudo como um recorte
importante para investigação da problemática do processo diagnóstico em enfermagem,
explicitaremos as questões que foram norteadoras para nosso trabalho.
1.6 −− Questões norteadoras
Considerando o abordado sobre a seleção e construção do objeto de
estudo, apresentamos os questionamentos norteadores do estudo:
• De quais estratégias diagnósticas utilizam-se os alunos no processo diagnóstico em
enfermagem?
• Como tais alunos descrevem essas estratégias?
Como conseqüência natural dos questionamentos levantados,
propusemos objetivos que permitiriam que uma compreensão mais clara fosse atingida.
A seguir apresentamos os objetivos traçados para esta dissertação.
41
1.7 −− Objetivos do estudo
São eles:
• Identificar as estratégias diagnósticas de enfermagem empregadas por estudantes
do quinto período de um curso de graduação.
• Descrever o emprego das estratégias diagnósticas, observadas as definições,
finalidades, circunstâncias, modos de utilização e os critérios de avaliação
fornecidos pelos sujeitos.
• Discutir a aplicação das estratégias diagnósticas de enfermagem com base na
perspectiva da metacognição.
Em suma, objetivamos encarar o processo diagnóstico, e mais
especificamente as estratégias nele contidas, sob um olhar pouco explorado, até o
momento, em que o sujeito, com sua consciência metacognitiva, é capaz de descrever e
conferir significado aos elementos do processo. Tais elementos, para nós, não são
somente etapas, atividades e procedimentos, ao contrário, assumem o relevante caráter
de estratégias diagnósticas.
Essa consciência individual acerca das estratégias diagnósticas está
na dependência direta do conhecimento metacognitivo. Portanto, explorar o emprego
das estratégias do processo diagnóstico por intermédio dos cinco aspectos-chave
(definições, finalidades, circunstâncias, modos de utilização e os critérios de avaliação)
é procurar visualizá-lo pelo prisma metacognitivista.
1.8 −− Justificativas e contribuições
Entre os prováveis beneficiados com os resultados desta pesquisa
estão os estudantes, professores e a escola enquanto instituição de formação dos
42
futuros enfermeiros.
O trabalho justifica-se, primeiramente, por auxiliar os estudantes no
reconhecimento das estratégias que compõem o processo diagnóstico de enfermagem.
Desenvolver o conhecimento metacognitivo é importante para o aprendiz, visto que
uma das competências esperadas para seu sucesso na vida profissional é a de que ele
saiba gerenciar seu próprio aprendizado (Lopes da Silva & Sá, 1993; Dryden & Vos,
1996).
A compreensão e a tomada de consciência do processo de
diagnosticar, oferecidas por um prisma metacognitiva, instrumentaliza o estudante de
enfermagem na obtenção de melhores resultados na tarefa diagnóstica. Traz ainda
como importante conseqüência a possibilidade de oferecer melhor direcionamento ao
aprendizado de estratégias capazes de permitir a resolução de problemas.
O domínio de uma tarefa torna implícito as estratégias envolvidas nos
procedimentos habituais. Isso impede que ela seja pensada, criticada, ajustada ou
modificada, favorecendo uma tendência à rigidez. Vez que o objetivo de uma estratégia
é otimizar a tarefa, é necessário, portanto, que sejam conscientes ao aprendiz. Por isso,
Brown et al. (apud Beitz, 1996, p.31) afirmam que uma dada técnica só se torna uma
estratégia, na medida em que o estudante sabe explicitamente quando, onde e como
usá-la. Dessa maneira então é que o conhecimento metacognitivo permite, mediante a
gerência consciente, aumentar a eficiência na tarefa ou processo.
Todavia, como sugerem Wade & Reynolds (apud Beitz, 1996, p.31),
antes que os professores utilizem a metacognição no ensino, os alunos necessitam
reconhecer as habilidades que eles normalmente têm. Sugerem que os estudantes, por
meio de uma avaliação, descrevam suas estratégias metacognitivas observáveis e que
“estão na mente”, e ainda quando as utilizam. Assim é que nosso estudo desponta
43
como mais uma ferramenta facili tadora para que eles possam realizar essa avaliação
metacognitiva.
Em segundo lugar, há ainda benefícios para a docência. Ao
reconhecermos as estratégias diagnósticas de enfermagem e seus aspectos-chave,
tornamos disponíveis tanto a estudantes quanto aos seus professores ferramentas que
permitem selecionar, monitorar, regular e avaliar as mais eficazes e oportunas a serem
usadas. Essa meta-habilidade13 é vital para o docente, particularmente porque fornece
exemplos concretos de aplicação consciente das estratégias, o que é crítico para o
desenvolvimento de uma flexibilidade metacognitiva no aprendiz (Beitz, 1996, p.31).
Ao orientar seu aluno no uso de uma estratégia, o professor de
enfermagem poderá incluir uma cuidadosa orientação sobre seus aspectos-chave.
Estará melhor instrumentalizado, também, para discutir com os alunos sobre as
flexibilizações na tarefa diagnóstica nas diversas realidades da prática clínica.
Em terceiro lugar, traz contribuições para as instituições de ensino
enquanto formadoras de profissionais competentes e críticos. O reconhecimento por
parte do aprendiz de suas habilidades cognitivas e metacognitivas pode lhe conferir um
grau mais elevado de reflexão, permitindo que compreenda mais facilmente seu papel
como sujeito ativo da construção da prática e do saber profissional.
Em quarto lugar, há o interesse acadêmico-científico. Estudos sobre
temáticas que envolvem a resolução de problemas e processo diagnóstico são de
interesse contemporâneo, tanto na área clínica, quanto tecnológica, e são alvos de
grande número de investigações em ciências cognitivas. Além disso, o crescente
interesse metacognitivo tem potencializado a atenção dada a teorias e modelos de
13 Meta-habilidade é um conhecimento sobre a habil idade. É o domínio da habili dade de reconhecer as características da habilidade ou estratégia.
44
resolução de problemas (Taylor, 1997, p.330).
E nisso, a transferência do conhecimento estratégico, objeto de
vários estudos, desponta como uma questão-chave no processo educacional e na
prática clínica. A possibilidade de que o conhecimento procedimental referente a
estratégias diagnósticas possa ser transferido entre sujeitos por meio do ensino, pode
oferecer, aos novatos, excelentes perspectivas de evolução rumo à maior proficiência
diagnóstica. Nisso, Schraagen (1993) concorda que as estratégias heurísticas, de
controle e de aprendizagem são capazes de serem ensinadas, ou seja, podem ser
transferidas entre os sujeitos.
Finalmente, ao recorrermos à metacognição para explicarmos o
processo diagnóstico, estamos buscando, em essência, oferecer uma alternativa que
seja de fato um encaminhamento à transformação da prática diagnóstica de
enfermagem em uma atividade mais clara, flexível e consciente para o estudante de
enfermagem, seu professor e para a instituição que os abriga.
2 −− “ COMO FOI FEITO” −− METODOLOGIA
Este capítulo recebeu uma designação de “metodologia” , uma vez
que o termo vem sendo utilizado, preferentemente, pelos autores de estudos
qualitativos.
Subdividido em tópicos, apresenta o “ como foi feito” . Já no capítulo
de “Discussão da metodologia” , esses procedimentos são discutidos à luz dos
referenciais teóricos utilizados e das particularidades da pesquisa.
Visando mais clareza, o texto é orientado por perguntas (em itálico),
que fizemos durante a elaboração do trabalho.
Iniciemos então com a apresentação do tipo de estudo e da
abordagem escolhida.
2.1 −−Tipo d e estudo e abordagem
Uma vez que já apresentamos o nosso objeto de investigação e os
objetivos que buscamos atingir, acreditamos ser necessário definir o tipo de estudo
aqui desenvolvido. Para tal utilizaremos as contribuições de alguns autores. A primeira
questão que responderemos é a seguinte:
Qual o tipo de estudo desenvolvido?
Nosso estudo está caracterizado como do tipo descritivo, pois busca
oferecer uma descrição das estratégias diagnósticas utilizadas por estudantes de
enfermagem. Também atende a uma particularidade dessas pesquisas ao estabelecer
uma interpretação das variáveis observadas em cada estratégia e que, no nosso caso,
são os aspectos-chave propostos por Winograd & Hare em 1988 e citados por Lopes
46
da Silva & Sá (1993).
Assim sendo, selecionamos, como abordagem, a qualitativa, pois
atendeu a quatro critérios qualitativos aqui apresentados e que são discutidos na
“Discussão da metodologia” :
• Os dados coletados foram predominantemente de natureza
descritiva.
• Estivemos mais direcionados ao processo do que ao produto.
• Os significados dados por nossos sujeitos aos seus relatos foram
os principais elementos de análise.
• A análise de dados seguiu um processo indutivo durante e após o
processo de coleta de dados.
Tratando-se de um estudo qualitativo, não nos interessou o uso de
técnicas estatísticas para o tratamento dos dados, mas, sim, um tratamento qualitativo
do conteúdo dos discursos dos estudantes. Antes, porém, de abordar o método
estabelecido para o estudo, trataremos de apresentar os sujeitos e as características do
campo de trabalho.
2.2 −− Sujeitos e critérios de seleção
Os relatos dos sujeitos, que figuram neste estudo com nomes
fictícios, foram selecionados de entrevistas com vinte e dois alunos do quinto período
do curso de graduação em enfermagem de uma universidade pública do Rio de Janeiro.
Todos classificados, simultaneamente, como novatos em diagnóstico e clínicos
iniciantes no uso da memória.
Desses, doze participaram de entrevistas preliminares em grupo, e os
dez restantes, na fase final das entrevistas individuais, e sendo a fala de nove estudantes
47
analisadas no presente estudo1 .
Foram selecionados por atenderem aos critérios que os classificavam
como clínico iniciante no desenvolvimento do uso da memória na prática clínica
propostos por Carnevali & Thomas (1993); e como novatos, segundo os critérios de
proficiência clínica propostos por Benner & Tanner (1987). Essas duas classificações
foram selecionadas como critério para inclusão dos sujeitos, uma vez que caracterizam,
prática e teoricamente, os estudantes que despertaram nosso interesse para estudo de
seus processos para diagnóstico.
Na classificação de Carnevali & Thomas (1993, p. 31), o estudante
em estágio clínico iniciante vivencia os primeiros encontros com os clientes e famílias,
engajando-se em atividades de diagnóstico e planejamento de ações de tratamento.
Está recebendo experiência e o cerne de seu processo de tomada de decisão é baseado
no conhecimento científico.
Para Benner & Tanner (1987, p. 28), o novato é o iniciante que não
possui experiência com as situações clínicas reais, dependendo significativamente de
regras, normas e do conhecimento teórico para guiar suas ações.
Nossos vinte e dois sujeitos já haviam cursado a maioria das
disciplinas básicas das ciências da saúde (anatomia, fisiologia, bioquímica, patologia,
farmacologia, entre outras), sendo que alguns ainda não haviam enfrentado situações
de cuidado direto a indivíduos doentes. Nem tão pouco possuíam por prática o
processo diagnóstico de enfermagem.
É apenas no quinto período que habitualmente os estudantes
aprofundam-se tanto nos procedimentos de diagnóstico (processo diagnóstico) como
na linguagem diagnóstica de enfermagem (proposta pela NANDA). Como eles mesmos
1 Um sujeito excluído na fase de tratamento dos dados. (Ver página 59).
48
afirmaram em suas entrevistas, até esse momento (segmento hospitalar), o conceito de
diagnóstico de enfermagem não existia2 (pelo menos aquele defendido pela NANDA).
Assim:
Mas é esta questão: na realidade a gente acaba fazendo diagnóstico é... no PCI VII3 especificamente. (Ana)
Também primeiro assim, porque o que eu tenho de diagnóstico chegou agora. Através dos PCI. Até o PCI IV e V a gente nunca tinha diagnóstico de enfermagem. Diagnóstico de enfermagem pra mim é no PCI VII , tanto que no PCI VII, eu comprei a NANDA4. (Patrícia)
2.2.1 −− Os sujeitos das entrevistas preliminares em grupo
Os doze sujeitos que compuseram a fase das entrevistas em grupo
foram divididos em dois grupos de seis, com certas diferenças a serem descritas.
O primeiro subgrupo foi composto por estudantes que iniciavam o
Programa Curricular Interdepartamental VII 5 (PCI VII) . Não haviam à época
desenvolvido ainda as atividades práticas do segmento de estágio hospitalar
supervisionado. Por isso, caracterizavam-se por não possuírem vivência na prestação
de cuidados de enfermagem a indivíduos doentes e internados, e seus contatos com
situações diagnósticas de enfermagem ainda eram incipientes. Dessa maneira, seus
relatos abordavam o processo diagnóstico e seus elementos com uma característica
2 A partir dessa etapa curricular, há progressiva transformação de um conceito de diagnóstico como mera identificação de problemas para outro que, pressupondo raciocínio clínico, inclui o anterior mas o transcende.
3 PCI é uma sigla para indicar um Programa Curricular Interdepartamental, composto por três disciplinas: diagnóstico de saúde, prática de enfermagem e teórico-prática.
4 A aluna cita a NANDA (North American Nursing Diagnosis Association) fazendo menção ao l ivro “Manual de Diagnósticos de enfermagem” de Linda Juall Carpenito (1998), que inclui a taxonomia diagnóstica de enfermagem dessa associação.
5 Esse programa desenvolve 20 horas semanais de atividade, oferecendo, no segmento prático, a oportunidade de cuidados integrais de enfermagem, isto é, uma modalidade de cuidar que encarrega um único profissional pela prestação de todos os cuidados de enfermagem, no seu turno de trabalho. É característico do modelo de enfermagem principal (Iyer et al., 1993).
49
teórica, e ainda afastados das situações reais da prática.
Esses aprendizes contribuíram para o estudo por meio da
apresentação de estratégias diagnósticas que já dominavam. E, como era de se esperar
pelo estágio de desenvolvimento clínico em que estavam, foram predominantemente de
estratégias de coleta.
O segundo subgrupo de seis estudantes foi composto pelos que
haviam terminado a disciplina de cuidados a clientes hospitalizados (PCI VII) . Já
possuíam alguma experiência de cuidado a indivíduos doentes e internados, e como
percebemos nos relatos, alguma familiaridade com o conceito e processo de
diagnóstico de enfermagem.
Seus relatos, ao contrário do primeiro subgrupo, foram ricos em
exemplos de situações reais da prática. De certo modo, o conhecimento teórico sobre o
processo diagnóstico já estava modificado por ação das vivências do mundo real e pela
aplicação dos conhecimentos aprendidos em sala de aula.
Suas contribuições foram, além da identificação das estratégias de
coleta, também da descrição de estratégias de processamento e da explicitação mais
clara de aspectos-chave dessas.
2.2.2 −− Os sujeitos das entrevistas individuais
Todos os dez sujeitos selecionados para essa fase haviam cursado
totalmente o PCI VII . Já vivenciaram, portanto, o seu primeiro contato formal com
conteúdos sobre conceitos de diagnóstico de enfermagem, linguagem e processo
diagnóstico. Também haviam registrado no prontuário suas conclusões diagnósticas
sobre os clientes assistidos (geralmente utilizando a linguagem diagnóstica da
NANDA). Ressalte-se aqui o grau de autoconfiança e a solidificação dos conceitos
50
decorrentes dessa nova ação.
Todos haviam terminado recentemente o PCI VII (menos de dois
meses), à época das entrevistas. Contudo, nenhum deles pertencia ao conjunto de
estudantes das entrevistas em grupo.
Seus relatos, assim como os dos estudantes do subgrupo anterior,
possuíam a riqueza de situações reais da prática. Fato compreensível, na medida em
que se situavam no mesmo nível curricular. Suas características permitiam classificá-los
tanto como novatos, quanto clínicos iniciantes. Caracterizavam-se, também, por
estarem na segunda década de vida e por não possuírem experiência prévia como
profissionais de enfermagem6. Os dez sujeitos entrevistados receberam nomes fictícios
e foram entrevistados na ordem que se segue:
Primeiro - Bianca
Segundo - Ana
Terceiro - Marília
Quarto - Patrícia
Quinto - Excluído por problemas na fita k-7
Sexto - Érica
Sétimo - Clara
Oitavo - Tatiane
Nono - Fabiana
Décimo - Marta
Foram as falas desses nove sujeitos que, submetidas à análise após a
fase de coleta de dados, ofereceram as contribuições para a descrição pormenorizada
6 Estudantes de enfermagem, da instituição estudada, ocasionalmente exercem atividades como técnicos ou auxiliares de enfermagem.
51
das estratégias diagnósticas e as discussões que se fizeram pertinentes ao estudo.
2.3 −− Método s
2.3.1 −− Coleta de dados
A coleta de dados aconteceu em duas fases, com técnicas e
propósitos diferentes.
A adequação do pesquisador à técnica de coleta de dados, a
validação da técnica selecionada e a identificação de estratégias diagnósticas em
enfermagem foram os objetivos da primeira fase desenvolvida com a aplicação de duas
entrevistas em grupo com doze sujeitos.
Na segunda fase, em que dez entrevistas individuais foram realizadas,
o propósito principal foi a obtenção de dados, que, sendo submetidos à análise
qualitativa, permitiram o alcance dos objetivos do estudo, já apresentados no capítulo
de introdução.
Cabe ressaltar que apesar das diferenças existentes entre as técnicas
de entrevista em grupo e as de entrevista individual, percebemos ter sido suficiente o
treinamento de adequação do pesquisador realizado na primeira fase. Estávamos,
então, possivelmente, preparados para a coleta na segunda fase.
A seguir, faremos a apresentação das características de cada uma das
fases de coleta, discutindo as suas características próprias.
2.3.1.1 − A primeira fase da coleta de dados − entrevistas em grupo
Já mencionado, três foram os objetivos dessa fase: adequação do
52
pesquisador à técnica de coleta de dados, validação da técnica selecionada e
identificação preliminar de estratégias diagnósticas existentes.
Foram realizadas duas entrevistas em grupo com estudantes
possuidores do perfil de inclusão no estudo. O orientador deste estudo participou
ativamente da primeira entrevista em grupo, auxiliando-nos nos questionamentos e,
posteriormente, discutindo questões inerentes à técnica.
As discussões com o orientador e a prática obtida nas duas
entrevistas em grupo permitiram que alcançássemos a proficiência necessária à
aplicação da técnica na fase posterior das entrevistas individuais.
Por outro lado, essa fase permitiu que validássemos a entrevista
como técnica, capaz de trazer as respostas que o estudo se propunha a procurar. Isso
aconteceu, pois tal técnica de coleta de dados esteve em consonância com nossos
propósitos de explorar as estratégias diagnósticas, tomando-se por base um referencial
teórico metacognitivo; e é reconhecidamente uma técnica de uso bem sucedido nos
estudos de natureza qualitativa (Lüdke & André, 1986, p. 33).
Após o desenvolvimento das duas entrevistas em grupo, não tivemos
dúvidas sobre a sua validade como técnica de coleta de dados e abandonamos
quaisquer considerações sobre a seleção de outras técnicas como, por exemplo, o
relato corrente7 para nossa coleta.
As entrevistas em grupo também permitiram que detectássemos
algumas estratégias diagnósticas, preparando-nos para que, ao encontrá-las na fase
seguinte, pudéssemos identificá-las dos discursos e explorar em profundidade.
As limitações listadas por Bogdan & Biklen (1992, p. 138-139) para
7 O relato corrente é um tipo de verbalização feito, geralmente, enquanto o indivíduo está resolvendo um problema, baseado no conteúdo da memória de trabalho, isto é, na informação que está sendo ainda processada durante o relato. Para maiores detalhes ver Dominowski (1998, p. 27-29).
53
a técnica de entrevista em grupo não foram observadas no estudo (entrevistados que
insistem em dominar a sessão e a dificuldade de identificar os autores dos relatos na
transcrição da fita gravada).
Como foram construídas as entrevistas em grupo?
Optamos pela entrevista semi-estruturada8. A preocupação com a
estruturação foi reduzida, pois, na primeira fase, estivemos desejosos em conhecer os
entendimentos mais gerais relacionados ao uso das estratégias diagnósticas pelos
sujeitos. Tanto assim que o fluxo das informações ocorreu de modo mais livre, sendo
as intervenções, predominantemente, utilizadas para manter o grupo limitado à
temática. Desse modo, o roteiro foi composto por uma única pergunta: Como vocês
fazem um diagnóstico de enfermagem?
Todavia, em virtude da semi-estruturação da entrevista, outros
questionamentos foram levantados durante o processo, em função das respostas dos
participantes. Essa também é uma das vantagens apontadas por Triviños (1987, p. 146)
para a técnica em foco. As perguntas adicionais foram dirigidas à identificação de
estratégias e ao significado que assumiam no contexto específico.
As entrevistas em grupo foram realizadas em local acordado entre as
partes envolvidas, em ambiente silencioso. Tiveram a duração de quarenta e cinco
minutos a primeira, e uma hora a segunda. Cabe destacar que a primeira entrevista foi
realizada antes do início das atividades práticas da disciplina que os sujeitos cursavam,
e a segunda ocorrida ao final das atividades práticas.
8 Segundo Triviños (1987, p.145), a entrevista semi-estruturada é um dos principais meios que tem o investigador quali tativo, para realizar a coleta de dados. Define-a como “aquela que parte de certos questionamentos básicos, e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do informante (p. 146).”
54
Os sujeitos foram consultados sobre o interesse e a concordância
para participação no estudo foi dada verbalmente e documentada por gravação em fita
K-7. A autorização, tanto para gravar quanto para usar os dados, foi precedida de uma
explicação por parte do entrevistador sobre o objeto de estudo e objetivos a serem
alcançados. Foi informado também a todos os entrevistados que os preceitos éticos de
sigilo das informações e identidade estavam garantidos.
A documentação dos relatos prestados pelos sujeitos foi feita em fitas
k-7, seguindo as recomendações de Bogdan & Biklen (1992, p.93), que afirmam:
“quando o estudo envolve entrevistas extensas ou quando a entrevista é a principal
técnica no estudo, nós recomendamos usar um gravador”.
O estudo envolveu as duas características apresentadas, portanto
optamos pela gravação, como recurso de registro das notas de campo. Posteriormente,
as fitas foram transcritas na íntegra de seus conteúdos.
Aos sujeitos identificados pelas falas, foram atribuídos nomes
fictícios para garantir o sigilo de suas identidades.
O material obtido a partir dos relatos dos sujeitos dessa primeira fase
da coleta foi submetido à análise qualitativa, que será objeto de discussão posterior.
Antes, porém, descreveremos o processo de coleta dos dados na fase posterior, a das
entrevistas individuais.
2.3.1.2 − A segunda fase da coleta de dados − entrevistas individuais
Passaremos agora à apresentação da parte mais estreita desse
“afunilamento” que elegemos para conduzir a coleta de dados, justamente utili zando-se
das considerações de Lüdke & André (1986) sobre esta delimitação progressiva do
foco de estudo.
55
Na maior parte dos estudos qualitativos, o processo de coleta se assemelha a um funil. A fase inicial é mais aberta, para que o pesquisador possa adquirir uma visão bem ampla da situação, dos sujeitos, do contexto e das principais questões do estudo. Na fase imediatamente subseqüente, no entanto, passa a haver um esforço de focalização progressiva do estudo, isto é, uma tentativa de delimitação da problemática focalizada, tornando a coleta de dados mais concentrada e mais produtiva. (Lüdke & André ,1986, p.46)
O produto do “afunilamento” ou focalização determinou a realização
de dez entrevistas individuais. Cada entrevista feita posteriormente sofria influência da
anterior, na medida em que os dados eram codificados e interpretados no campo de
pesquisa. O processo assemelhou-se a indução analítica modificada9. Isso permitiu que
fossem identificadas estratégias diagnósticas empregadas por estudantes incluídos no
estágio “clínico iniciante” da classificação de Carnevali e Thomas (1993). Também
com isso, foi possível construirmos descrições sobre os aspectos-chave propostos por
Winograd & Hare (apud Lopes da Silva & Sá, 1993, p.46), para o domínio da
estratégia, utilizando-se do conhecimento metacognitivo dos estudantes sobre a tarefa
de diagnóstico em enfermagem.
A interpretação do parágrafo anterior implica na confirmação de que
os objetivos do estudo foram atingidos diretamente, a partir dos dados obtidos nas
entrevistas semi-estruturadas individuais. Em conseqüência disso, seria correto afirmar
que a primeira fase foi preparatória à segunda, isto é, que as entrevistas em grupo
foram predominantemente exploratórias, e as entrevistas individuais, analíticas, em sua
maior parte.
9 A indução analítica é um método que permite a coleta e análise do dado, bem como o seu desenvolvimento e teste teórico. A versão modificada permite a coleta e análise dos dados na medida em que são coletados. Inclui o desenvolvimento precoce de definições e explicações de um fenômeno. A definição e explicação, geradas durante a coleta, são modificadas quando surgem novos casos que não lhes atendam. Existe a busca de casos que não confirmem o fenômeno, e as definições e explicações são reformuladas (Bogdan & Biklen, 1992, p. 65-68).
56
Como foram construídas as entrevistas individuais?
Assim como nas entrevistas em grupo, optamos nessa fase também
pelas semi-estruturadas. Tal opção deveu-se à liberdade de adaptações que nosso foco
de investigação exigia, ainda que preservando limites num esquema que permitisse um
desenrolar satisfatório da coleta (Lüdke & André, 1986, p. 34).
Do mesmo modo que na fase anterior, uma pergunta abriu a
entrevista: Como você faz um diagnóstico de enfermagem? Da resposta a ela, os
sujeitos apresentavam as estratégias diagnósticas que lançavam mão durante o
processo.
Quando uma estratégia era identificada, direcionávamos a entrevista
pela exploração dos cinco aspectos-chave, utilizando-se, pelos menos, das seguintes
perguntas:
• “ O que é a estratégia para você?” − Buscar uma definição do
termo e compreensão por parte do sujeito;
• “ Para que você emprega essa estratégia?” − Identificar as
finalidades específicas para o emprego da estratégia no processo
diagnóstico.
• “ Como você usa essa estratégia?” − Descrever o modo de
utili zação da estratégia.
• “ Quando você usa essa estratégia?” - Evidenciar as
circunstâncias adequadas ao uso.
• “ Qual estratégia você usa para avaliar a eficácia dessa
estratégia?” ou “ Você já parou para pensar se ela te leva ao
diagnóstico?” − Levantar aspectos sobre a monitoração e avaliação
do uso da estratégia diagnóstica.
57
Com as quatro primeiras perguntas tínhamos o propósito de explorar
a auto-apreciação dos estudantes em relação aos seus conhecimentos, habilidades e
características no processo diagnóstico. Com a última pergunta buscamos a segunda
dimensão do conhecimento metacognitivo denominada de “metacognição em ação” .
Com isso visamos detectar aspectos específicos das capacidades de regulação e
monitoração cognitiva do processo diagnóstico de enfermagem (Hacker, 1998).
Em algumas circunstâncias, os sujeitos respondiam à outra pergunta
dentro da anterior, e nesses casos a pergunta que trataria do aspecto-chave abordado
era omitida, para evitar redundância.
As entrevistas foram realizadas em local acordado entre as partes
envolvidas, qual, como na fase anterior, tratou-se de ambientes silenciosos com mínima
interrupção externa. Tiveram a média de aproximadamente quarenta minutos, variando
em extremos de vinte a cinqüenta e cinco minutos.
Tivemos sempre a preocupação de informar aos sujeitos envolvidos
nessa fase sobre as características do estudo, o caráter não-obrigatório da participação
e da manutenção do sigilo acerca das identidades dos sujeitos.
A documentação na íntegra dos relatos prestados pelos sujeitos foi
feita em fitas k-7, com suas permissões prévias. Novamente elegemos o gravador, pois
o conteúdo das falas era extenso, e agora, principalmente, as questões seriam
investigadas em profundidade, e segmentos do discurso deveriam ser analisados
cuidadosamente. Posteriormente, o conteúdo das fitas foi transcrito na íntegra.
Aos nove sujeitos identificados pelas falas, foram atribuídos nomes
fictícios para garantir o sigilo de suas identidades.
A priori não foi selecionado o quantitativo dos entrevistados que
seriam os sujeitos. Utilizando-se de uma análise indutiva das entrevistadas, percebemos
58
que o ponto de saturação começou a ser atingido próximo à sexta entrevista individual,
mas achamos oportuno seguir para que essa percepção pudesse tornar-se mais
sedimentada. Para Bogdan & Biklen (1992, p. 64), os pesquisadores qualitativos
avaliam quando finalizar o trabalho de campo, utilizando-se do termo saturação dos
dados, que é o ponto de coleta de dados em que a informação torna-se redundante.
Finalizamos a coleta à décima entrevista, pois o ponto de saturação já nos parecia
alcançado.
A todos os entrevistados foi feito um convite para tomarem ciência
dos resultados do estudo, e colocamo-nos ao dispor para discutirmos com eles os
achados da pesquisa.
Uma vez que todo o processo de coleta de dados já foi apresentado,
encaminhamo-nos para discutir os aspectos metodológicos do tratamento e análise dos
dados.
2.3.2 −− Tratamento e análise dos dados
2.3.2.1 − Durante a etapa de coleta de dados.
Essa etapa aconteceu durante todo transcorrer da coleta de dados.
Nela, submetemos os dados coletados a um processo adaptado da indução analítica
modificada (Bogdan & Biklen, 1992, p.65-68).
Inicialmente, estávamos interessados em detectar as estratégias
diagnósticas e explorar os aspectos-chave de cada uma. Por meio das entrevistas,
aprofundamos a procura por esses elementos.
Já durante as entrevistas em grupo, os sujeitos começaram a apontar
algumas das estratégias diagnósticas utilizadas, que, baseadas em suas características,
59
foram consideradas como de coleta de dados clínicos ou de processamento da
informação.
Essas duas categorias de estratégias que surgiram indutivamente
serviram para direcionar as entrevistas posteriores. Durante o processo de entrevista,
nos mantivemos atentos no propósito de identificar tanto as estratégias de coleta
quanto as de processamento.
A cada entrevista feita, escutávamos, posteriormente, por algumas
vezes, o conteúdo na íntegra, com o propósito de detectar novos elementos que
modificassem os preceitos até então obtidos.
Na seleção dos novos sujeitos a serem entrevistados, procuramos
aumentar a diversidade dos aprendizes. Procurávamos então encontrar alunos que
pudessem apresentar modelos diagnósticos díspares daqueles até então identificados.
Para tal, selecionamos sujeitos que, dado nosso contato prévio, permitiriam supor a
consecução de tal objetivo (todos haviam sido nossas alunas anteriormente).
À medida que as entrevistas eram feitas, alguns pré-conceitos eram
modificados, sendo esses temas aprofundados em entrevistas posteriores.
A alteração das duas categorias (de coleta de dados clínicos e de
processamento da informação) aconteceria mais tarde na etapa de análise posterior ao
trabalho de campo. Apresentamos, no tópico seguinte, essa etapa que determinou a
elaboração das três subcategorias definitivas apresentadas na discussão dos resultados.
2.3.2.2 − Após a etapa de coleta de dados
Ao findarmos a coleta dos dados, iniciamos outro processo não
menos trabalhoso: as transcrições, na íntegra, do conteúdo das nove entrevistas, uma
vez que, por conta de uma falha no material gravado (fita k-7), uma das fitas não pôde
60
ser fielmente transcrita, sendo, portanto, o sujeito excluído dos resultados e discussão.
Nesse processo de transcrição tivemos auxílio de pessoas exteriores ao estudo, que
cuidadosamente nos auxili aram na materialização de horas de falas em quase uma
centena de páginas escritas.
Uma vez que dispúnhamos dos nove registros escritos das
entrevistas, iniciamos o tratamento dos dados pelo processo de codificação, que
trataremos a seguir.
Como desenvolvemos as categorias de codificação?
Entendemos as categorias de codificação como agrupamentos de
dados descritivos que podem ser separados do conjunto dos outros dados. Para fazê-
las foi necessária a leitura, por diversas vezes, de cada entrevista transcrita e a
aplicação de três técnicas que visaram ao trabalho dos dados brutos de pesquisa.
As duas primeiras foram uma aproximação das técnicas de leitura
propostas por Adler & Van Doren (1990, p. 37-153): leitura inspecional e leitura
analítica.
Assim, as técnicas de trabalho com os dados foram:
1. A leitura inspecional de cada entrevista. Essa técnica caracterizou-se pela leitura
de trechos das transcrições, na busca pelas idéias principais que caracterizavam cada
trecho de fala. Não estávamos preocupados em proceder às análises e interpretações
do conteúdo das falas dos sujeitos. Pelo contrário, nosso propósito maior foi buscar
a estrutura lógica das entrevistas, mediante a relação existente entre as idéias
principais que foram colocadas. Produzimos como material escrito um breve
comentário sobre o que havíamos percebido na entrevista, que foram utilizados na
interpretação dos significados do conjunto das falas.
61
2. A leitura analítica de cada entrevista. Uma vez que já tínhamos o arcabouço
lógico do conteúdo das entrevistas e uma visão geral das estratégias diagnósticas
usadas pelos estudantes, dirigimo-nos a ler cuidadosamente cada transcrição com
um propósito maior de codificação. Buscamos destacar as estratégias diagnósticas e
os trechos que pareciam destacar os cinco aspectos-chave. Usamos um instrumento
especialmente construído para permitir essa codificação.
3. A codificação no próprio texto por leitura analítica e sublinhado. Nessa etapa,
desenvolvemos a segunda fase de leitura analítica e destacamos, por sublinhado,
todos os segmentos que tratavam das estratégias diagnósticas e seus aspectos-
chave. Com lápis, escrevemos no próprio texto o que cada sublinhado representava.
Essa fase é a que nos permitiu trabalhar em definitivo com os dados, por intermédio
de um processo semelhante à tradução. Como colocam Bogdan & Biklen (1992, p.
176), “a escrita do estudo qualitativo é realmente como fazer uma tradução” .
Como apresentamos e discutimos os achados do estudo na análise
qualitativa?
Os dados já codificados foram analisados e apresentados, na
categoria: “A descrição das estratégias diagnósticas de enfermagem” . Essa categoria,
que apresenta descritivamente os achados do estudo, foi subdividida em três
subcategorias que alocaram as descrições das dez estratégias identificadas. As
subcategorias foram denominadas de estratégias diagnósticas de enfermagem
aplicadas antes do encontro com o cliente, estratégias diagnósticas de enfermagem
aplicadas durante o encontro com o cliente, e as estratégias diagnósticas de
enfermagem aplicadas após o encontro com o cliente.
As três subcategorias guardam relação com o encontro entre os
62
sujeitos e o cliente, ou seja, o evento no qual os estudantes interagiam diretamente com
os indivíduos hospitalizados, buscando identificar diagnósticos de enfermagem e
oferecer os cuidados requeridos. Dadas as várias finalidades e circunstâncias de uso das
estratégias, a relação temporal com o encontro foi o critério capaz de categorizá-las.
A primeira subcategoria, a das estratégias diagnósticas de
enfermagem aplicadas antes do encontro com o cliente, trata das encontradas nos
relatos que são predominantemente implementadas antes do contato direto com o
cliente. Esse contato direto é o denominado encontro.
A segunda subcategoria diz respeito às estratégias diagnósticas de
enfermagem aplicadas durante o encontro com o cliente, ou seja, na ocasião em que o
sujeito inicia o contato direto com o cliente e coleta, diretamente dele, as informações.
A terceira e última subcategoria aborda as estratégias diagnósticas
com propósitos principais de permitir a manipulação concreta ou abstrata da
informação, aplicadas predominantemente após o encontro com o cliente.
Uma vez que já tínhamos todas as descrições das estratégias
elaboradas nas subcategorias, passamos a desenvolver a interpretação dos dados,
utili zando-se agora das contribuições da literatura específica. Construímos uma
discussão com as referências à literatura associada, tendo como método a interpretação
qualitativa dos dados. A essa categoria denominamos: “ a noção do todo” .
Nessa categoria, tratamos de discutir os achados do estudo, tendo
como cerne teórico os conceitos metacognitivos, da corrente do processamento da
informação em educação e das teorias sobre o processo diagnóstico em enfermagem.
Aí fazemos considerações sobre aspectos mais amplos do processo diagnóstico e
procuramos abordar as relações existentes entre as várias estratégias diagnósticas,
subsidiadas pelos dados que emergiram do mundo de significados dos nossos sujeitos.
3 −− “ A DESCRIÇÃO DAS ESTRATÉGIAS
DIAGNÓSTICAS DE ENFERMAGEM” −− RESULTADOS
O processo de análise qualitativa dos dados iniciou-se, como já
discutido no capítulo anterior, durante o trabalho de campo, intensificando-se após o
fim do processo de coleta.
Este capítulo tratará da apresentação descritiva dos achados obtidos
no processo de construção do estudo. Para atingir esse propósito, utilizamos os dados
obtidos por meio das entrevistas com os sujeitos. Tais dados foram preparados pela
técnica de transcrição, analisados mediante os procedimentos de codificação e
descritos a partir dos significados contidos nas falas dos sujeitos.
Atendendo ao objetivo principal do estudo, descrevemos as
estratégias diagnósticas, utilizando-se dos aspectos-chave propostos por Winograd &
Hare (apud Lopes da Silva & Sá, 1993, p.46) evidenciados a partir da apreensão dos
discursos dos entrevistados.
Compreendemos que nossas contribuições sejam não somente em
apresentar a descrição pormenorizada das estratégias diagnósticas de enfermagem de
novatos, mas venham também ilustrar, com clareza, que o processo diagnóstico em
enfermagem é mais do que um evento de processamento de dados clínicos; é ainda, aos
olhos de nossos estudantes, uma parte de seu aprender em enfermagem.
Apesar de diversos conceitos, habilidades e estratégias comporem a
tarefa de diagnosticar, havia na totalidade do processo um grupo de significados que,
na verdade, determinavam e orquestravam toda a tarefa. Essa consciência do todo será
objeto de discussão posterior no estudo.
À hora, procederemos à descrição das estratégias diagnósticas de
enfermagem, classificando-as em três subcategorias relacionadas ao evento de encontro
64
com o cliente. Foram elas: estratégias diagnósticas de enfermagem aplicadas antes do
o encontro com o cliente; estratégias de enfermagem aplicadas durante o encontro
com o cliente; e estratégias diagnósticas de enfermagem aplicadas após o encontro
com o cliente.
3.1- As estratégias diagnó sticas de enfermagem aplicadas
antes do encontro com o cliente
Aqui foram agrupadas as estratégias que predominantemente eram
utili zadas antes de o estudante entrar em contato com o cliente. Para Carnevali &
Thomas (1993, p. 46-50), esse momento de coleta prévio de dados é um dos elementos
do processo de raciocínio diagnóstico em enfermagem, denominado de “coleta de
dados de pré-encontro sobre a situação do cliente”.
Nesse agrupamento, foram colocadas as estratégias de ouvir a
passagem de plantão e leitura do prontuário.
3.1.1 −− Estratégia Um −− Ouvir a passagem de plantão
Essa estratégia apresentou-se como um procedimento nem sempre
movido pelo interesse diagnóstico de enfermagem. Tratou-se de um evento em que
profissionais de um plantão anterior trocavam informações com os do plantão seguinte.
O processo apresentou-se predominantemente como descrições sumariadas sobre as
principais intercorrências apresentadas pelo cliente durante o plantão. Outro objeto de
relato na passagem de plantão envolvia as condutas tomadas e as prescritas para serem
executadas pelo plantão a ser iniciado.
A maneira pela qual os sujeitos interpretavam esse evento era crítica
em defini-la ou não como estratégia diagnóstica. Alguns dos entrevistados encararam o
65
momento da passagem como um evento predominantemente administrativo e que
apenas visava facili tar o norteamento das ações terapêuticas durante o plantão. Para
esses indivíduos, portanto, a passagem de plantão não se constitui em estratégia
diagnóstica1.
Por outro lado, houve entrevistados que falaram da passagem de
plantão no âmbito de uma estratégia diagnóstica. Tais sujeitos foram capazes de
apreciar os aspectos-chave que interferem no processo diagnóstico. E o primeiro
elemento que apresentaremos diz respeito às finalidades da estratégia.
A quais finalidades serviu a estratégia de ouvir a passagem de plantão?
Destacaram-se como finalidades principais: oferecer uma visão
geral da situação do cliente e facili tar a focalização no processo de coleta.
Os estudantes afirmaram que, ao ouvirem dos profissionais as
descrições sobre o cliente e sua situação, conseguiam obter informações que
facilitavam posteriormente a coleta de dados durante o encontro. Tais informações
propiciavam tanto a focalização do dado a ser coletado, quanto serviam como
elemento a ser confirmado no cliente. Por exemplo:
Na passagem de plantão, eu ficava observando o que os pacientes tinham [...] Era, porque, por exemplo, de repente o paciente não dormiu numa noite e teve febre. Ao chegar na enfermaria, eu perguntava se ele tinha dormido naquele período após a enfermeira ter passado, e ia verificar a temperatura pra ver se aquela febre estava se mantendo ou tinha passado. Eu acho que a passagem de plantão é importante, mas pela falta de maturidade dos acadêmicos na hora do estágio, a gente não aproveita quase. (Ana)
1 Cabe relembrar que, no presente texto, conceituaemos estratégias diagnósticas como ações, técnicas e procedimentos de que se valem os sujeitos no processo de diagnosticar, mas que tenham suas características reconhecidas pelos sujeitos. Para que tais sejam consideradas estratégias, os sujeitos devem conhecer, ainda que parcialmente, suas finalidades, circunstâncias e modo de usar na tarefa diagnóstica.
66
[...] através de como outras pessoas viram aquele doente e falaram de que ele teve um problema durante a noite. Eu vou investigar isso, se realmente aconteceu, se continua acontecendo. Seria uma forma de realmente levantar se está com aquele diagnóstico ou não. (Patrícia)
No entanto, para essa estratégia os entrevistados reconheceram
limitações impostas pela fidedignidade da informação prestada, que poderiam levar a
erros no processo diagnóstico. Entendiam a necessidade de confirmar as informações
no cliente e interpretar sua validade no processo. Vejamos a questão emergindo das
falas:
Não me dá certeza total. Porque a pessoa pode falar pra mim que o paciente passou a noite normal, e eu chegar lá e ele dizer pra mim que passou mal à noite. Não é uma coisa correta, uma coisa certa. Pode ajudar, mas não é dizer que sempre vai ser uma coisa que vai me indicar algum problema. (Patrícia)
Eu acho que a passagem de plantão é importante, mas você não deve levar em consideração tudo o que se fala na passagem de plantão. Porque às vezes as pessoas por má vontade ou por indiferença aos pacientes, elas podem omitir informações, ou então não querer dizer: ‘Ah o paciente passou mal ou não’ . Ou ela nem se deu ao trabalho de ver se o paciente estava bem ou não e ‘chutou’ . (Érica)
Além das finalidades, conseguimos evidenciar o modo como os
estudantes utilizavam a passagem de plantão como uma estratégia diagnóstica, e
trataremos da questão no tópico seguinte.
Como os estudantes utili zavam-se da passagem de plantão para fazer
diagnósticos?
Os discursos foram bastante diferenciados. Contudo, a participação
na passagem de plantão sempre apareceu como um processo de “ouvir relatos” . Não
encontramos menção a qualquer participação ativa, mediante perguntas, por parte dos
estudantes.
Esse quadro não é diferente do que temos observado nas sessões de
troca de plantão. A ação predominante do estudante é presenciar a passagem de
67
plantão, abstendo-se de participar ativamente dela.
Ana apresentou em sua fala uma percepção de que a passagem de
plantão não era bem aproveitada pelos estudantes, atribuindo essa limitação à reduzida
experiência com a estratégia (falta de maturidade) e à inconsciência da ação. Vejamos
o relato:
Eu acho que a passagem de plantão é importante, mas pela falta de maturidade dos acadêmicos na hora do estágio a gente quase não aproveita... Bom, maturidade no sentido de [pausa]. É porque é tudo novo, a gente não entende direito [...] a gente quer fazer tudo mecanicamente, o mais rápido possível, e não tem consciência de que, de repente, o fato do paciente estar com uma febre pode trazer pra ele complicações [...] Então, a gente enquanto aluno, nesse período, acaba fazendo tudo mecanicamente. Então eu acho que aí existe uma falta de maturidade de entender a importância daquela situação pra prevenir agravamentos. (Ana)
Essa conduta, percebida no discurso dos sujeitos de vivenciar a
passagem de plantão de modo passivo, implicava que as informações ali obtidas eram
muito amplas e deveriam ser acrescentadas a outras, coletadas a partir do encontro
com o cliente.
3.1.2 −− Estratégia Dois −− Leitura do prontuário
Nessa estratégia estiveram incluídos os procedimentos de leitura dos
impressos clínicos em uso no hospital. Os estudantes fizeram referência aos dados de
histórico, tanto médico quanto de outros profissionais, e às notas narrativas sobre as
alterações evolutivas elaboradas pelos vários profissionais de saúde.
Apareceu como uma estratégia de coleta de dados que permitia aos
estudantes obter informações de pré-encontro, oferecendo aos entrevistados uma idéia
geral sobre a situação que encontrariam no cliente e permitindo ao estudante supor
qual o nível de aceitação teria, por parte do cliente, no momento de utilizar as
estratégias diagnósticas no encontro.
68
Para que os alunos liam os registros previamente com finalidade
diagnóstica?
Existiu uma certa variação entre as finalidades da estratégia entre os
sujeitos. A convergência, entretanto, apontou para o objetivo principal de permitir a
formação de uma “idéia geral” sobre a situação a ser encontrada no momento do
encontro. Tal finalidade é apresentada nos discursos a seguir:
Mas eu não me sinto muito segura a ir até o paciente sem saber a história dele; ainda não me sinto muito segura. Aí eu vou e procuro algumas informações no prontuário. Primeiro eu dou uma observada , e depois eu vou lá e converso com ele. Porque dá pra gente ter uma idéia geral, e até da recepção. Se ele vai falar bem ou não vai. Se vai aceitar conversar comigo ou não. (Marília)
Geralmente antes d’eu fazer exame físico, antes de ir lá conversar com o paciente, eu tenho a mania de olhar a evolução anterior, pra saber como ele estava, e como é que eu vou encontrar. (Érica)
[...] pra ver, vamos dizer assim, o quadro que ele chegou. (Patrícia)
Eu uso o prontuário para conhecer o paciente... saber a vida dele. Conhecer a história clínica dele. (Bianca)
Os discursos deram uma idéia de reconhecimento prévio, como se
fossem imagens amplas, mas pouco nítidas sobre o quadro a ser encontrado quando do
contato.
Outra finalidade que apareceu nos discursos tinha relação com a
contribuição que os registros ofereciam ao acompanhamento de alterações no quadro
do cliente. Tais mudanças foram denominadas genericamente por nossos entrevistados
de “evolução do paciente” , e eram tomadas a partir das notas narrativas presentes nos
impressos do prontuário. Assim:
[...] pra me definir se aquele problema está evoluindo, ou se está estável ou não. O comprometimento, como ele está evoluindo? Se não está evoluindo, essas coisas. (Marília)
Se ele está tendo evolução desde que ele chegou, e como estava naquele dia e no anterior. (Patrícia)
69
Pra poder avaliar como é que o paciente está no momento. Se ele melhorou ou não, se ele piorou ou não. (Érica)
É importante pra isso também; pra você ver a evolução dele. Do tipo como ele estava ontem, hoje, ontem, anteontem, assim. (Bianca)
Como os estudantes liam o prontuário antes do encontro com o cliente?
Existiu uma certa variação quanto à aplicação da estratégia
diagnóstica, que dependeu da relação entre fatores inerentes aos sujeitos e às situações
de seus clientes. Baseados nessa interação entre os aspectos da estratégia, os
estudantes assumiram posições diferentes sobre quanto e qual conteúdo procurariam
nos registros de prontuário. Por exemplo, Bianca não lia todas as informações; ao
passo que Patrícia e Marília buscavam, de modos diferentes, ler todo o conteúdo
documentado. Por exemplo:
Eu não tenho paciência pra ler tudo; vou passando. Sei lá, eu vou passando e vejo o que é mais importante. Mas eu não leio tudo. (Bianca)
Eu tentava ler tudo desde que o paciente chegou. Porque vamos dizer assim, eu tô lendo e não vou prestar assistência àquela pessoa, eu tô lendo, tô lendo... por ler, vamos dizer assim. Quando eu precisava, não. Eu queria constatar alguma coisa. (Patrícia)
Eu procuro ver todo o prontuário, mas eu começo de traz pra frente. Eu tento ver o que está acontecendo agora com ele. Porque é no que eu vou intervir de primeiro. Já pensou se fosse um paciente antigo com várias entradas no HU? Tem certas coisas que não me interessam lá atrás. Então, pra saber se essas coisas me interessam ou não, eu preciso saber do presente. (Marília)
Ainda que motivados por objetivos diferentes, nossos sujeitos
geralmente procuravam fazer a leitura dirigida ao alcance desses objetivos. Uma
interessante particularidade que apareceu nos relatos de duas entrevistadas foi um
maior destaque que elas deram às informações mais recentes.
Marília descreveu um processo de busca retrospectiva, a partir das
informações mais atuais para as passadas, apresentando como justificativa do critério
70
de prioridade o fato de que suas intervenções estariam, em primeiro lugar, dirigidas aos
eventos mais recentes. Quando concentrava a leitura em dados mais antigos, o fazia
para aprofundar a compreensão entre os dados que formavam a representação mental
da situação problema do cliente. Assim colocou:
No primeiro contato com ele eu vou indo mais pra trás pra saber a história daquele paciente. Se é uma doença que venha evoluindo ou não, se é completamente diferente, ou se são diferentes. Se uma tem relação com a outra, ou não. E isso já precisa de um certo tempo, né?. (Marília)
E ela prossegue, colocando que, na ação mais imediata em que não
possuía tempo para uma análise mais cuidadosa dos registros, concentrava-se nas
últimas evoluções. Assim afirmou:
Pra atuar em cima dele [paciente], ali no momento eu veria as últimas evoluções. É eu dou prioridade pras últimas informações, até porque eu acho que pras minhas intervenções, no momento, seria mais importante. (Marília)
Para Bianca, sua seleção pelo que iria ler no prontuário englobava os
fatos mais atuais, de semanas e dias atrás. Na fala abaixo transpareceu não acreditar no
benefício de ler fatos de um passado mais distante.
Por exemplo até há cinco anos atrás o paciente estava se sentindo assim, tava assado... Acho que isto não é importante! Ou então voltar tantos anos atrás. O importante é o há dias, há uma semana atrás, duas semanas atrás... (Bianca)
Ainda que todos esses entrevistados procurassem ler os relatos dos
prontuários, sempre que possível, somente um foi capaz de estabelecer com clareza
uma relação direta entre as circunstâncias de uso da estratégia e o modo como usá-la.
Na sua fala, Marília diferenciou dois tipos de leitura do material,
dependendo do tempo que dispunha para a tarefa:
1. Se tinha tempo disponível o suficiente para a leitura − nas
situações em que o cliente não demandava um grande número de
atividades de cuidado, a entrevistada lia o prontuário de uma
71
forma mais aprofundada, com propósito de saciar sua
“curiosidade”. Vejamos o trecho de sua fala:
Mas se eu tenho tempo, por exemplo com um paciente que não requer muita atenção minha ali toda hora do lado dele, eu sento e leio até mesmo por curiosidade. Eu gosto, sei lá, eu acho que a gente deve ter esse hábito, não sei. (Marília)
1. Caso não tivesse tempo disponível o suficiente − nas situações
em que tinha dificuldade de planejar seu tempo, fazia uma leitura
menos profunda, mais direcionada aos seus objetivos específicos
na situação (como afirma em outros momentos de sua entrevista).
[...] já teve situações que por eu estar meio enrolada e ‘ que já foram muitas’[r isos], em que não deu tempo pra eu pegar o prontuário do paciente e ler, ler, ler, como eu gosto de fazer. (Marília)
Como avaliavam a eficácia da estratégia no processo diagnóstico?
Durante a entrevista, a maioria dos sujeitos que fizeram referência a
essa estratégia não verbalizaram reconhecer diretamente se possuíam algum
procedimento para avaliar o papel da leitura de prontuário durante a tarefa. Essa busca
por recursos de regulação ou monitoração durante o processo mostrou-se pouco
acalentadora. Porém, explorando mais em profundidade, durante a entrevista, surgiram
nas falas avaliações sobre a importância da estratégia no diagnóstico e sobre como tirar
melhor proveito da estratégia nas situações de encontro e pós-encontro.
Ainda que reconhecessem a importância da estratégia, nossos
entrevistados não a colocaram entre as principais do processo diagnóstico; ao
contrário, encaravam-na como um início para a tarefa de coleta de dados. Percebemos,
assim, que tal leitura, assim, como a passagem de plantão, foi considerada de
importância periférica, quando comparada às que seriam usadas durante e após o
72
encontro com o cliente.
Quando questionamos Patrícia se ela teria certeza de que a leitura do
prontuário a encaminhava ao diagnóstico, respondeu da seguinte maneira:
Ah, eu acho que ficaria na dúvida, porque tem informações que são muito... falhas. Eu acho assim, eu leio o prontuário pra ter uma informação. Só que, a partir do momento que eu li, e depois que eu vá ver o paciente, aí eu vou ter realmente: será que aconteceu isso? Aquilo ali tá certo? Acho que é um ponto de chegada; e aí eu vou avaliar. (Patrícia)
Essa percepção sobre uma menor participação do prontuário no
processo foi compartilhada por outros sujeitos, como podemos observar nas falas a
seguir:
Tipo: é que nem olhar o prontuário, às vezes eu olhei e achei que não teve grandes... às vezes, o contato com o paciente é melhor, me responde mais. Às vezes, as informações não estão completas no prontuário, mas tem situações que se encaixa. ‘Pô valeu a pena olhar o prontuário’ . (Marília)
Como acadêmica de enfermagem a gente tende a se prender muito no prontuário. Ao que o outro disse em relação ao paciente. Isso também é um pouco da insegurança nossa, mesmo. (Clara)
Mas eu acho o prontuário importante, mas não é realmente uma das coisas mais importantes. Por exemplo: se ele fez uma cirurgia há algum tempo atrás, geralmente ele (paciente) vai falar. (Bianca)
Na fase de pré-encontro, a leitura do prontuário era aplicada
basicamente com um propósito de fornecer uma idéia geral e de focalizar a coleta de
dados. Porém, boa parte de sua importância foi recuperada, quando os estudantes
entraram em contato com o cliente.
E são das estratégias diagnósticas da fase de encontro que trataremos
na categoria a seguir.
73
3.2 −− As estratégias diagnósticas de enfermagem aplicadas
durante o encontro com o cliente
Alocamos aqui as estratégias que predominantemente foram
utili zadas durante o contato com o cliente, para coletar ou direcionar a coleta de
informações clínicas.
Começaremos por abordar as estratégias mais comuns, tanto nos
discursos quanto na literatura específica que trata do processo diagnóstico, e,
posteriormente, apresentaremos outras que apareceram no estudo, mas não de menor
importância. Foram elas: a conversa com o cliente, o exame físico, a observação e os
testes de hipóteses diagnósticas.
3.2.1 −− Estratégia Três −− A conversa com o cliente
Foi com essa designação que o contato verbal entre o estudante e o
cliente apareceu na maioria entrevistas.
As finalidades que encontramos para o diálogo fizeram aparecer uma
subdivisão na estratégia, que foi se tornando mais clara ao longo das entrevistas e
surgiu como um dos destaques da análise feita ainda no trabalho de campo. O que
tivemos, de fato, foi a mesma ação (estabelecer contato verbal com o cliente),
assumindo duas características distintas em função dos propósitos: a de conversa
empática e a de entrevista clínica.
A primeira subdivisão da conversa empática com o cliente apareceu
como um diálogo empático, em que o aluno procurava apresentar-se ao cliente de um
modo menos formal. Sua maior preocupação era estabelecer uma interação por
intermédio de um relacionamento de confiança e proximidade. Procurava evitar uma
busca motivada por interesses puramente diagnósticos, abordando temas gerais que
74
facilitassem a comunicação.
O diálogo incluiu informações que, à primeira vista, foram de pouco
interesse clínico, mas representavam chaves de entrada na anamnese de enfermagem.
Muito desse diálogo envolvia assuntos da vida do cliente, preferências e práticas
sociais.
A segunda subdivisão, a da entrevista clínica, respeitou as
características tradicionais que encontramos na literatura como componentes da
técnica: o uso de perguntas abertas e fechadas e a exploração e validação dos dados
(Carpenito, 1997, p.59). Todavia, dado nossos objetivos de estudo, não estabelecemos
uma ótica externa para observar o fenômeno; ao contrário, utili zamos dos significados
(e conseqüentes finalidades) que os sujeitos conferiram à entrevista com o cliente.
Graças a sua ampla abordagem pelos sujeitos, acreditamos poder
apresentar finalidades claras que os mesmos encontraram para o fato de conversar com
o cliente. Também foi uma das poucas estratégias em que os sujeitos não tiveram
dúvidas de seu valor como instrumento para o alcance de uma conclusão diagnóstica.
Iniciemos, então, pelas finalidades conferidas à estratégia.
Quais foram as finalidades diagnósticas da conversa com o cliente?
Em relação à conversa empática, percebemos tratar-se de uma
estratégia de coleta de dados, utilizada para vencer obstáculos da comunicação clínica.
Vejamos os discursos:
[...] muitos não recebem a gente muito bem, tem lá suas dúvidas. ‘Será que essa menina tá pronta para tá aqui comigo?’ Aí, conversando assuntos não muito voltados ao problema dele, coisas sobre o dia a dia, de repente pode ter uma certa abertura pra eu chegar e perguntar aquilo que eu quero saber... É propositadamente, eu sempre chego pra ele, buscando assuntos não voltados para o problema, mais pra ele me aceitar melhor. (Ana)
75
Mas eu acho que para todos eu chegava primeiro no tipo uma brincadeira, numa conversa tipo assim informal, e daí aos pouquinhos. Depois eu ia perguntando o que eu queria. Sabendo o que eu queria. (Patrícia)
Eu acho que nada melhor do que começar com uma conversa distraída, e a partir daí ir me aprofundando e chegando à queixa principal do paciente. (Fabiana)
Porque eu conversar com ele [paciente], eu posso conversar sobre mil coisas. Agora eu perguntar, eu estou guiando algo a ele. Eu posso muito bem estar conversando de um assunto e de repente perguntar: como o senhor dormiu à noite?... E na conversa eu já consigo interagir melhor com o paciente pra depois entrar na verdadeira pergunta que eu quero fazer. (Clara)
Os propósitos desse tipo de comunicação que depreendemos dos
relatos acima selecionados foram o de facilitar o estabelecimento de uma relação
empática de troca de informações e percepções, que confere segurança emocional
tanto ao cliente quanto ao estudante, assim como o de promover a obtenção de
informações de um modo não direto, que poderia parecer invasivo.
No que se refere à segurança dos alunos no contato, a fala de Ana
destacou-se. Em certas situações, a interação, por meio da conversa, surgiu como um
recurso que os alunos usaram para vencer uma apontada desconfiança que os clientes
tinham sobre sua competência no processo de cuidado.
Já a obtenção de dados relevantes, por meios indiretos, apareceu
mais claramente em outros trechos das entrevistas feitas com Clara e Ana. As
estudantes exemplificaram que, tanto a abordagem indireta de um tema relativamente
privado, quanto uma focalização progressiva da coleta, facilitaram a identificação de
uma informação mais fidedigna, sem prejudicar o relacionamento entre as partes.
Vamos aos exemplos:
Vamos supor, numa maternidade, quando você pergunta quantas gestações anteriores teve, elas geralmente não informam que teve aborto. Mas com a conversa, ela confiando em você, você se mostrando como um bom profissional, isso vai deixar ela mais à vontade pra falar que um dia já fez aborto. Agora se eu chegar pra ela: ‘ Você já fez aborto?’ O questionar é uma coisa muito direta. (Clara)
76
[...] porque ele [paciente] começa a colocar certas coisas sem muitas vezes eu nem perguntar e vão surgindo oportunidades que eu acho que são propícias pra eu entrar com a pergunta. (Ana)
Para a entrevista clínica, a principal finalidade apontada pelos
estudantes foi a de permitir a obtenção de dados que tivessem um interesse clínico mais
explícito, ou seja, eram, geralmente, com os questionamentos dessa modalidade de
comunicação que os estudantes estavam voltados a identificar dados específicos que
seriam utilizados nas conclusões diagnósticas.
Curiosamente, esse direcionamento maior para a coleta de dados não
implicou uma estruturação muito rígida do diálogo por parte da maioria dos sujeitos.
Existiu, sim, um objetivo claro de buscar informações que tivessem relevância no
processo diagnóstico dos alunos. Destacamos a citação abaixo como exemplo desses
traços:
Quando eu ainda não conheço o paciente eu vou perguntar tudo. Vou fazer como se fosse aquela anamnese com o paciente. No primeiro momento, pra conhecer como tá este paciente[...] Não é que eu vou conduzir o que ele fala. Vamos supor: eliminação; eu vou deixar ele falar tudo que ele tem pra dizer sobre aquilo. Não vou conduzir a resposta dele. Assim, mas vou colocar tópicos do que eu quero ouvir dele. (Marta)
Como e em que circunstâncias os estudantes conversavam com os clientes no
processo diagnóstico?
Por configurar-se como uma das mais importantes estratégias, nossos
estudantes utilizavam-na praticamente por todo o processo diagnóstico. A partir do
momento em que iniciavam o encontro com o cliente, os sujeitos afirmavam sempre
manter comunicação com o cliente, seja em concomitância com outras estratégias (por
exemplo, exame físico), durante a realização de cuidados terapêuticos ou em situações
de difícil acesso (clientes introspectivos), entre outras.
Tão variável quanto às circunstâncias, foram as formas de utilizar a
77
estratégia. Essas formas dependiam muito do sistema de crenças, motivações, estrutura
cognitiva e metacognitiva dos sujeitos. Porém, apesar disso, existe alguma confluência
que apresentaremos a seguir.
Em suas descrições, muitos estudantes demonstraram orientar a
conversa, seja pela entrevista clínica ou pela conversa empática, utilizando-se das
queixas do cliente. Buscavam com isso proximidade da situação vivenciada pelo
cliente, estimulando a verbalização e o direcionamento da coleta de dados.
Na fala de Ana, a investigação a partir das queixas melhorou o
processo de comunicação ao permitir um aumento na receptividade que o cliente tinha
pelo aluno. Ela demonstrou que esse tipo de investigação era entendido por seu cliente
como um interesse em sua situação problema. O discurso foi esclarecedor:
[...] ele reclama que está doendo no abdômen e você fica olhando para o pé? Fica meio uma coisa de não estar dando atenção a ele. (Ana)
De um modo geral, essa orientação às queixas iniciou-se com
algumas perguntas pré-determinadas que, nas descrições, envolveram queixas, padrão
de sono anterior, aceitação alimentar, eliminação. Para a maioria dos casos, foram
perguntas orientadas a um menu, que desencadeavam o aparecimento de outras
informações. Em um continum, a tarefa de coleta foi tornado-se mais focalizada até a
obtenção (ou não) de um diagnóstico.
Esse menu envolve critérios de prioridade estabelecidos pelos alunos,
a partir dos significados obtidos na tarefa. Prioridades determinadas tanto pela
ocorrência de anormalidades, quanto pela hierarquia das necessidades. Vamos às falas:
Inicialmente, você tem que chegar, conversar, perguntar para ele. Vou relatar aqui a conversa: você chega, pergunta se ele está bem, o que está sentindo. Por que se perguntar se ele dormiu bem, ele acaba não te dizendo. Tentar conversar, tentando tirar as coisas [...] Às vezes, você chega e pergunta se ele está comendo, como passou a noite e quantos filhos tem [...] E aí ele vai começar a te contar toda a vida dele. (Ana)
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Primeiro eu vou ver as queixas, e, em cima das queixas do cliente, se ele estiver falando, se ele estiver sentindo dor..., do sono... você pega as queixas do cliente, ver o que ele vai relatar pra você, e vê o que ele tá sentindo. Se ele não dormiu bem, aí pode ser o diagnóstico do sono. (Marta)
Eu até tinha uma listinha pra prosseguir, vou perguntar primeiro... porque isso vai ser básico pra qualquer paciente, e tem paciente que você vai se estender além daquilo de acordo com a resposta dele, entendeu? Mas é uma coisa básica: qual é a queixa, vai perguntar sobre alimentação, sobre eliminações. E, de acordo com o que ele apresentar, você vai se estender pra esse lado ou pra aquele. (Bianca)
Entre os pontos do menu de perguntas que apresentaram recorrência,
estiveram as necessidades elementares (ou de sobrevivência2).
Uma vez obtidos os primeiros dados anormais (queixas), o
direcionamento já apresentado anteriormente tomou lugar, sendo orientado aos
problemas detectados na conversa. Ana assim expressa o direcionamento:
Eu acho que consigo direcionar a conversa, tentando descobrir as queixas, e o que ele passou. (Ana)
Outra particularidade referente a como aplicar a estratégia, dizia
respeito ao direito do cliente em ter sua privacidade respeitada. Marta destacou
claramente o que foi bordejado por outros sujeitos. Ela apontou a importância de não
ser invasivo nas perguntas, perguntando de uma maneira não-agressiva, intimidadora
ou embaraçosa. Afirmou que essa proximidade seria preservada por meio da interação
estabelecida na conversa empática.
Dirigindo-se às circunstâncias para emprego da estratégia diagnóstica
de conversa, identificamos que nossos sujeitos utili zaram-na numa diversidade de
situações de diagnóstico e terapêutica. Contudo, um aspecto de destaque referiu-se à
influência que a receptividade do cliente exerceu sobre a seleção da conversa empática
2 Para Kalish (apud Iyer et al. 1993), as necessidades humanas básicas, que se localizam na base da pirâmide de prioridades, são as de sobrevivência. Temos como exemplos algumas das apontadas pelos sujeitos: eliminação, alimentação e sono.
79
ou da entrevista clínica.
De duas entrevistas, apreendemos que, para nossos sujeitos, os
clientes mais receptivos permitiam o desenvolvimento de uma investigação mais fácil,
levando-nos a propor que, nas situações em que a receptividade é grande, menos
conversa empática é necessária. Portanto é, facilitada a focalização maior nos dados
de interesse clínico, por meio da entrevista clínica. Selecionamos os dois trechos de
entrevistas donde retiramos a hipótese:
[...] porque tem pacientes mais receptivos. Você já entrou e ele já está te dando um sorriso e você pode até perguntar [entrevista clínica] se ele está sentindo dor logo de cara, se ele dormiu bem, se ele não dormiu e tal. [...] Mas já tem aqueles mais... que você vai ter que chegar, ser mais agradável, pra ele sentir segurança e começar a contar as suas queixas. Mesmo porque tem aquilo de: ‘ se eu começar a reclamar ela vai achar que eu sou chato’ . (Ana)
Tem paciente que ele é mais rude, ele está mais agressivo, ele está mais revoltado. E eu procuro conversar mais [conversa empática], que é pra tentar me envolver mais com ele, e questiono menos [entrevista clínica]. (Clara)
Uma vez que já expusemos finalidades, modo e circunstâncias de uso
dessa estratégia diagnóstica, levantamos um último questionamento a ser desenvolvido
no tópico seguinte.
Como os sujeitos avaliaram a util ização da conversa com o cliente para fins
diagnósticos?
A maioria dos sujeitos reconheceu que, de algum modo, a estratégia
trouxe benefícios ao processo diagnóstico, como podemos perceber nos exemplos
abaixo:
Eu, através da conversa, eu vou vendo se vai chegando a algum diagnóstico que eu estou pensando ou não. (Érica)
Eu acho que eu consigo direcionar a conversa, tentando descobrir as queixas e o que ele passou. Olhando pra toda parte da saúde dele no geral. (Ana)
80
Todavia, apesar de reconhecer os benefícios, a maioria dos sujeitos
não foi capaz de reconhecer como controlava o processo de conversa. Também não
demonstraram ter consciência sobre a monitoração das informações obtidas no
processo. Esse fraco controle metacognitivo apareceu nos destaques a seguir:
Mas como é que eu vou dizer...[pausa] eu não sei explicar. Eu nunca parei pra pensar nisso. (Érica)
[...] ia acontecendo, nunca tive... nunca parei pra pensar. (Patrícia)
Isso aí eu ainda não pensei. (Ana)
Curiosamente, nossos sujeitos fizeram cuidadosas auto-apreciações
sobre a estratégia em geral, contudo não reconheceram, na maioria das vezes, que
apresentavam recursos capazes de regular e monitorar o uso da estratégia diagnóstica
na ação. Essa falta de conhecimento metacognitivo será objeto de discussão num
próximo capítulo do estudo.
Marília, porém, destacou-se por apresentar um processo de
modulação (estratégia metacognitiva) que foi encaminhando o processo de
investigação a partir da análise dos resultados obtidos.
De primeiro contato eu sempre procuro me apresentar, conversar tipo assim: ‘ como foi sua noite de ontem’ . É assim, quando eu vejo que tá dando certo, eu vou por aquele caminho, mas se não tá dando certo, eu mudo. (Marília)
Sentimos que podemos agora apresentar outra estratégia: o exame
físico.
3.2.2 −− Estratégia Quatro −− Exame físico
A realização do exame físico foi uma estratégia diagnóstica muito
presente nos relatos dos nossos entrevistados. Classicamente, é conceituado como um
conjunto de técnicas que requer habili dades específicas e é levado a cabo, com a meta
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de obter dados clínicos capazes de permitir um diagnóstico ou reconhecimento da
situação do indivíduo. Basicamente, é apresentado como uma técnica para a coleta de
dados.
No contexto do estudo, o exame físico despontou como uma
estratégia diagnóstica, característica do momento do encontro, e, na maioria das vezes,
esteve fortemente relacionado a outras estratégias do processo. Encontramos seu
enfoque direcionado tanto para a obtenção de dados básicos (coleta), quanto para
confirmação de outras informações já evidenciadas, mas que precisaram de
clareamento.
A literatura que consultamos não deixa claro esse caráter, por vezes,
confirmador e, por outras, esclarecedor do exame físico, ao contrário, geralmente
trata-o como um conjunto de procedimentos de identificação de achados normais e
anormais.
Para quais finalidades servia o exame físico no processo diagnóstico?
A primeira finalidade identificada referiu-se ao exame físico como
uma ferramenta de coleta de dados clínicos, apresentando-se como uma busca por
informações anormais, ou melhor, que possam ser classificadas como anormais,
quando confrontadas com um padrão de normalidade que o examinador possui na
memória.
Nos relatos, nossos alunos falaram, muitas vezes, de examinar em
busca de dados anormais3. Portanto, em termos de exame físico, foi a primeira vez que
a relação normalidade versus anormalidade apareceu de maneira destacada. Vejamos
3 Dados anormais são achados que fogem aos critérios tidos com característicos de normalidade.
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por meio dos relatos de três sujeitos:
Saber se as funções, pelo menos as vitais, dela estão normais ou alteradas. Que vai poder causar o prejuízo nas funções dela. (Érica)
Você tem aquele padrão normal, você vai ver se encontra alguma anormalidade. Se aquele padrão que você tem é de pessoa normal. (Marta)
Bom, exame físico serviria pra você inspecionar o que haveria de anormal no paciente, de acordo com as queixas dele [...] E ver no caso o que está anormal, o que tinha de anormalidade pra poder fazer um diagnóstico até. (Ana)
Sendo assim, a finalidade do exame físico como estratégia de coleta
foi permitir que o sujeito encontrasse dados que, ao não atenderem aos critérios e
padrões de normalidade armazenados na memória do examinador, pudessem ser
classificados como dados anormais ou problemas. E a aplicação do exame físico
também proporcionava a avaliação da veracidade de informações subjetivas fornecidas
pelo cliente e obtidas a partir do uso de outras estratégias, tais como: conversa
empática, entrevista clínica ou observação.
Essa avaliação se deu por meio do confrontamento dos significados
que um dado possuía como de anormalidade ou normalidade. As falas, ainda que não
totalmente corretas sob o ponto de vista das recomendações literárias, foram
esclarecedoras para a pesquisa:
[...] porque, apesar do relato do paciente, as pessoas podem inventar para chamar atenção. Na questão da dor, a pessoa diz: ‘ tô com dor aqui’ . E você só saberá realmente se está com dor naquele lugar se você palpar. (Ana)
Assim, quando o paciente apresenta ruídos, tá tossindo muito, tá saindo muita secreção, eu vou direto ao pulmão, e me dá a resposta, entendeu? (Marília)
Sintetizando, duas finalidades no contexto do diagnóstico foram
identificadas para o exame físico: a identificação de informações normais e anormais e
a confirmação de dados encontrados por outras estratégias. No primeiro tipo, o
enfoque recaiu sobre a natureza cognitiva de alcançar um objetivo, e, no segundo
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propósito, a natureza era mais metacognitiva, trabalhando com a questão da avaliação
do achado.
Na realidade, o que percebemos, ao tomar o senso de totalidade das
entrevistas, foi que, dependendo da situação, uma mesma estratégia diagnóstica
atendeu a um ou a outro objetivo, ou ainda aos dois simultaneamente. Essa
flexibilidade, em caráter cognitivo e metacognitivo da estratégia, permeou muitas das
entrevistas.
Entretanto, uma questão a ser discutida a partir de agora é lançada:
Os diferentes propósitos do exame diferenciariam o modo de se fazer e as
circunstâncias para sua aplicação?
Como e quando faziam o exame físico?
Em separado, foram essas as perguntas colocadas aos sujeitos, o que
geraram algumas respostas significativas, que serão objeto de descrição a partir de
agora.
Em resposta ao “como faziam” , os estudantes geralmente
relacionaram o exame físico a outras estratégias de coleta, ou seja, para muitos, o
examinar ocorria simultâneo com a entrevista, conversa, observação. Para exemplificar,
descreveremos como o processo é conduzido por Ana e depois por Marília.
Para Ana, o processo começava com uma conversa e observação do
cliente. Essas ações possuíam o propósito declarado de iniciar uma interação entre as
partes e permitir uma avaliação do estado emocional do cliente. Surgiram como
desdobramentos da estratégia diagnóstica de exame físico, permitindo ao sujeito obter
do cliente informações que não teria, se a interação não acontecesse. Novamente
despontou a necessidade de proximidade entre estudante e seu cliente, que pareceu ser,
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aos olhos de nossos sujeitos, tão importantes quanto o processo em si. A fala ilustrou
esse primeiro momento:
Deixa eu ver... Bom, inicialmente, instintivamente [risos], eu fazia assim: eu chegava no paciente, conversava, olhava... assim, principalmente quando estava internado. Perguntava como ele tinha passado e tal. Começa com aquela interação, e daí a gente já ia observando o estado emocional. Porque aí ele vai dizer se foi, e vai contar da noite, reclamar. E desde aí, já começa o exame físico. (Ana)
A aplicação da estratégia prosseguiu sempre, estando paralela ao
estabelecimento de uma comunicação com o cliente:
[...] aí conversava, verificava a pressão inicialmente, pulsação, temperatura e tal... e aí eu vou conversando com ele nessa interação. (Ana)
O que apreendemos de fundamental do significado das falas, foi a
percepção de que, geralmente para nossos entrevistados, o domínio do modo de
examinar ocorreu, na medida em que a interação com o cliente era estabelecida. De
fato, pareceu existir uma grande preocupação em não deixar o cliente parecer um
objeto de exame, pelo menos no âmbito do discurso.
[...] porque, às vezes, a pessoa faz um exame físico e o profissional fica lá calado e o outro fica lá ‘meu Deus o que ele vai fazer comigo?’ não vai explicando a situação, eu vou fazer isso, vê se tá legal aqui? (Ana)
A idéia do holismo, comum na enfermagem, também apareceu como
uma das exigências e pareceu estar relacionada à questão da interação durante o
exame. Ilustramos com um segmento de fala:
Porque não é só olhar o corpo, Ah, se tem esta mancha ou se tem pigmentação. É ver o paciente como o famoso todo. (Ana)
Já no tocante ao sistema de coleta de dados básicos de enfermagem4,
4 Carnevali & Thomas (1993, p. 53) destacam que um sistema de coleta de dados básicos de enfermagem são estruturas que orientam a coleta de informações de enfermagem. Expõem dois tipos diferentes: (1) o modelo orientado ao menu ou sistema compreensivo, que se tende a mover-se de áreas gerais a específicas; (2) o modelo orientado ao problema que se inicia em uma área localizada, baseada no julgamento clínico ou diagnósticos preliminares ou provisórios feitos em uma avaliação inicial e escala de prioridade. A área focalizada pode ter sido determinada pela enfermeira ou cliente.
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a entrevistada falou de uma flexibilidade do modelo céfalo-caudal (que é um modelo de
busca orientada ao menu). Desse modo, sua escolha recai num modelo orientado ao
problema, no qual a ordem sobre quais dados coletar foi determinada pela queixa do
cliente. Vamos à fala em que esse significado emergiu:
Porque eu acho assim, não tem uma ordem, e, na maioria das vezes, eu nem fazia nesta ordem de olhar cabeça, mucosa e tal [céfalo-caudal], porque não dava. Tipo assim, dependendo da situação do paciente tem outras coisas que você tem de dar prioridade. Ele reclama que está doendo no abdômen, e você fica olhando para o pé? Fica meio de uma coisa de você não estar dando atenção a ele. (Ana)
Mais adiante, na entrevista, a aluna declarou explicitamente sua
preferência pela avaliação orientada ao problema, baseado no critério de prioridade, e
justificou o objetivo que buscava alcançar com a escolha:
Porque eu sabia que o problema dele era pulmonar, e então eu sempre começava por lá, e aí, sim, eu ia perguntar se passou bem a noite [...] Eu acho que foi por isso, por saber da patologia dele e tentar ouvir as características daquela patologia em termos de sons (Ana).
Não existiu uma descrição profunda por parte de Marília de como
fazia o seu exame físico, mas percebemos que ela esteve focada na busca por respostas.
Respostas que confirmassem, ou não, uma provável situação; diferente de Ana, que
aplicou suas habili dades de exame para encontrar. Isso implica diferentes maneiras de
executar a tarefa e, no caso, o “ fazer” era direcionado pela hipótese.
No modelo de exame da aluna, a suspeita do diagnóstico, a hipótese
em si, determinou a condução da estratégia que esteve voltada à confirmação. Vejamos
no seu discurso:
Agora, tem outras coisas que eu busco mesmo. Assim, se o paciente tá muito tempo deitado... eu sempre auscultava o pulmão para saber se ele tava com um ruído, porque ficar deitado ali muito tempo prejudica. Isso era com um objetivo” [de diagnóstico]. (Marília)
Posteriormente, propõe-se a expandir a descoberta do impacto do problema em várias áreas funcionais do cliente, em sua vida diária e nos recursos externos relevantes.
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Em relação às circunstâncias apropriadas ao emprego da estratégia,
não conseguimos obter descrições muito claras de alguns entrevistados. Seus relatos
não delimitavam o domínio do aspecto-chave relacionado ao quando usar o exame
físico no processo diagnóstico. Somente o que conseguimos detectar foi uma relação
entre as queixas e o exame físico, uma necessidade de ser mais amplo (exame físico
completo) no primeiro encontro com o cliente. Tais elementos estiveram presentes nos
discursos a seguir colocados:
Você vai fazer o exame físico a partir do momento que você procura a queixa do paciente. Você vai fazer o exame físico completo e geralmente encontra outro problema. Por isso que você tem de fazer completo. Mas você vai primar o que ele está se queixando [...] em qualquer situação, quando o paciente estiver se queixando [...] Também, assim, não seria o caso de necessário sempre. Todo dia com aquele mesmo paciente; agora, em todas as situações. (Bianca)
[...] porque quando a gente está no estágio, a gente não acompanha o paciente durante muito tempo. Se a gente acompanhasse, eu acho que o exame físico, esse completo que eu falei que deveria ser feito do início, e depois você iria se preocupar com as áreas que estivessem mais afetadas. E, de acordo com os relatos dele, você iria investigar também. Eu acho melhor na hora que o paciente está mais à vontade, não assim sem ele ter tomado café, nem nada. Se fosse pra estipular um horário, eu acho que dez horas da manhã, eu acho que pra mim e para o paciente seria o ideal. (Érica)
No caso se for a primeira vez do paciente, o exame físico é sempre feito. Tem de ser feito pra poder conhecer... saber como está este paciente. (Marta)
Em virtude da fragili dade dos relatos, passaremos para a descrição da
avaliação da eficácia da estratégia.
Como avaliavam se o exame físico foi adequado ao processo diagnóstico?
Somente em dois relatos apareceu menção à avaliação da eficácia do
exame físico como estratégia. Tal avaliação se deu a partir da confirmação da
ocorrência de achados aguardados para um determinado perfil diagnóstico; e na falas
seguintes que este aspecto apareceu mais claramente:
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Assim, quando o paciente apresenta ruídos, tá tossindo muito, tá saindo muita secreção eu vou direto no pulmão e me dá a resposta entendeu? (Marília)
Tipo assim: eu estou fazendo o exame físico e vejo que o tônus muscular da perna do paciente não tá legal, ele não tem firmeza nas pernas. Então, a partir do exame físico que eu fiz, e através do relato dele também, eu vou chegar ao diagnóstico de mobil idade física prejudicada. Eu acho que tanto o exame físico quanto o relato do paciente são importantes pra fazer o diagnóstico. Os dois andam juntos. (Érica)
Esse aspecto-chave da estratégia refletiu uma tendência que se
repetiu com quase todas as estratégias em todas as entrevistas. Nossos sujeitos
possuíam pouca consciência sobre avaliação, monitorações ou regulações da aplicação
das estratégias diagnósticas.
3.2.3 −− Estratégia Cinco −− Observação
Esteve presente nos relatos como uma estratégia diagnóstica que
complementava a coleta de dados feita por meio do exame físico e relato verbal do
cliente. Permite que, a partir da entrada de uma informação observada e relevante, o
estudante julgue a necessidade de retornar à uma nova coleta com propósito de
complementar os dados.
A observação hora foi apontada como destinada ativamente a obter
um dado, e hora não esteve concentrada nessa busca por dados. Esse descompromisso
com a busca ativa foi colocado como fator promotor da identificação de informações
relevantes. A estudante que defendeu essa idéia (Ana) entendeu que uma busca ativa
por dados na observação poderia levar a erros na tarefa diagnóstica, pois existia o risco
real de se “ inventar situações que não estão ocorrendo” .
O que de fato parece estar por detrás dessa afirmativa de Ana é a
busca por minimizar uma relação pouco válida no processo diagnóstico e que por
vezes acontece. Trata-se de encontrar coisas que não existem, pelo simples fato de
desejar (ou precisar) encontrá-las. Como a própria estudante verbaliza em dado
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momento de sua entrevista, é preciso encontrar um diagnóstico, e o professor espera
que ela encontre um diagnóstico. Entre outras coisas, nessa situação, se é capaz de
“ inventar situações que não estão ocorrendo” .
Passaremos, no próximo tópico, a destacar os principais objetivos de
aplicação da observação como estratégia diagnóstica.
Quais os objetivos de aplicar a observação como estratégia diagnóstica em
enfermagem?
Encontramos, predominantemente, a finalidade de obtenção de
dados. Foi utilizada, associada a outras estratégias de coleta aplicadas no contato com
o cliente. E sua importância no processo variou de um entrevistado a outro.
Com fins de oferecer uma compreensão dos significados que a
estratégia assumiu para os estudantes, apresentaremos trechos de suas falas que
trataram das finalidades diagnósticas:
É observar do tipo você estar lidando com o paciente e ele não te relata e você não teve a oportunidade de observar no momento do exame físico... De repente, ele começa a tossir e escarrar secreção e por ali você está observando que está acontecendo aquilo. Aí, é a questão de você ir lá conversar novamente, ver o que está acontecendo com ele na questão da secreção, e chegar a um diagnóstico. (Ana)
Pra ver se, na minha observação, eu posso achar uma coisa que pode estar prejudicando aquele doente e a partir disso eu posso intervir. (Patrícia)
Eu estou buscando retirar possibilidades de coisas mais graves que aconteceriam, ou estivessem em estado mais grave sem ninguém ter perguntado antes; então primeiramente seria tirar este problema mais sério. Em segundo, seria dar a intervenção inicial. Proporcionar a intervenção que é mais imediata, mais necessária. Você procurar no paciente o que ele precisa de mais urgente. (Tatiane)
[...] porque eu acho que pela fisionomia da pessoa dá pra você montar um diagnóstico [...] de longe eu já tento observar como ele [cliente] está. Até mesmo pra ver, ele tá dormindo? Ele tá acordado? Ele tá bem? Depois eu vejo a necessidade de chegar até ele ou não. (Clara)
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Os achados obtidos por meio da observação tiveram destinos
diferentes entre os sujeitos.
Para Ana e Patrícia, a observação desempenhou o papel de
evidenciadora das informações novas que pudessem determinar uma hipótese
diagnóstica, ou sugerir a necessidade de retorno a outra coleta de dados clínicos.
Já para Tatiane, a observação apresentou-se como recurso capaz de
facilitar a priorização diagnóstica e terapêutica. Facilitava que problemas mais graves
fossem descartados logo de início.
E, finalmente, para Clara, a estratégia manifestou-se por dois
propósitos: fonte de dado para um diagnóstico e orientador para a seleção do momento
adequado ao encontro estudante-cliente.
Como e quando usaram da observação no diagnóstico em enfermagem?
Existiu uma diversidade em como utilizar a estratégia de observação,
sendo sem sentido buscar uma descrição passo-a-passo. Elegemos, porém, uma
característica que foi convergente nos discursos.
Esteve presente uma crença de que a observação deveria ser feita,
preferencialmente, de modo sutil, sem invasão ou interferência excessiva nos hábitos
do cliente. Existiu uma preocupação em permitir ao cliente gozar de sua privacidade,
preservando também o seu direito em permanecer só:
Não é nem que eu não saiba. Eu faço independente de saber se é certo ou errado, mas.. é observar de uma forma que você não fique tentando até encontrar coisas. Porque às vezes a gente começa a olhar, e começa a ver coisas, e inventar de uma certa forma. Também não ficar fazendo pressão, porque o acadêmico tem mania de ficar toda hora ali e o paciente fica sem muita vontade... e ele acaba sendo nem o natural dele, porque tem tanta gente ali em cima. Então fica olhando ali de longe, vendo o que ele faz, se ele esta ficando sozinho, observando mesmo. (Ana)
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É eu observar o paciente de fora, deixar ele como se estivesse num meio. Você observando ele como se estivesse numa redoma de vidro, e você olhando ele assim de fora sem fazer alterações. (Érica)
Você tem de observar de uma maneira, sei lá... não se envolvendo com o paciente. Observar de uma maneira que você fique fora do contexto dele. (Bianca)
Os sujeitos entendiam que a observação era uma estratégia
diagnóstica a ser utilizada em diversas circunstâncias, seja antes das outras estratégias
de encontro, como na observação antes da entrevista; ou somada a outras estratégias,
como durante o exame físico.
Precedendo outras estratégias diagnósticas, a observação apresentou-
se como uma inspeção capaz de revelar achados importantes. As falas apresentaram
essa característica:
Antes de questionar alguma coisa com o cliente, eu de longe eu já tento observar como ele [cliente] está. (Clara)
Eu fico encarregada pela aquela enfermaria, aí eu passo e dou uma olhada naquela enfermaria. Dar uma olhada geral. Eu dou aquela primeira vista no paciente (Tatiane)
Já, quando utili zada em conjunto com outras estratégias, a
observação oportunizou a uma mais ampla e adequada coleta de dados,
complementando ambas em um processo potencializador.
Todavia, tanto precedendo quanto ocorrendo paralelamente, a
estratégia foi encarada pelos sujeitos como de valor relevante, até mesmo por aqueles
que não faziam uso comum dela, como observamos no relato abaixo:
Eu sou uma pessoa que pouco observo e, de repente, isto é uma das coisas fundamentais na nossa profissão [...] eu sou uma pessoa que falo muito e observo pouco, então eu me fixo muito no que a pessoa passa verbalmente e não na observação dela. (Fabiana)
A percepção da eficácia da observação e sua necessidade é assunto
para o próximo tópico.
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Qual eficácia a observação ofereceu ao processo diagnóstico de nossos
estudantes?
Novamente a questão foi crítica e nossos sujeitos não possuíam muita
clareza e consciência sobre a validade da observação no processo diagnóstico.
Entretanto, dada uma percepção muito recorrente sobre a importância dessa estratégia
diagnóstica, uma avaliação foi feita basicamente a partir dos resultados obtidos.
Foram geralmente os resultados alcançados com o emprego da
estratégia que permitiram aos sujeitos percebê-la como válida, e não a reflexão no
processo em si. Isso ficou claro nos discursos destacados:
Bom, avaliar na realidade eu nunca fiz. Mas foi o que eu tô falando, traz resultados mas não é uma avaliação. Quando eu chego a determinado momento e digo: ’eu acho que ele tem isso!’ Aí, sim, eu tenho um produto. (Ana)
Assim, conscientemente, nunca pensei, mas que isso já − pensando agora com você − que isso já aconteceu várias vezes. A partir do que deu certo, e assim a partir também do que deu errado. (Tatiane)
Uma das entrevistadas expôs de maneira mais clara sua avaliação da
estratégia:
Com certeza, com certeza. A minha observação é o início de tudo. É o início de eu montar o meu diagnóstico. Eu não consigo; isso já é de mim; eu não consigo antes de fazer qualquer coisa não observar o cliente. (Clara)
Mais a seguir, no decorrer da entrevista, a estudante sedimentou sua
crença na necessidade de observar antes de desenvolver outras ações. E,
conscientemente, apresentou o valor da estratégia em sua prática:
Aprendi também a não me prender a prontuário, nada disso. A primeira coisa que eu faço é observar o cliente e, depois que eu observo, vejo o que ele está precisando no momento; eu vou lá na prescrição dele e vejo que medicações dar. Depois eu faço esta parte toda. (Clara)
Da interpretação do conjunto da entrevista de Clara, percebemos
que, para ela, a observação colocou-se como uma prioridade, pois vinha de um
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processo interno em que sua avaliação tinha maior valor do que a dos outros
profissionais. Porém, essa discussão fica para outro capítulo do estudo.
Com essa estratégia, fechamos a descrição das estratégias
diagnósticas que possuem uma predominância no propósito de coletar dados para
dirigirmo-nos às que predominam após o encontro.
3.2.4 −− Estratégia Seis −− Os testes de hipóteses diagnósticas
Tais testes representaram uma estratégia diagnóstica, caracterizada
pela seleção de uma hipótese (idéia preestabelecida) que justificava a organização dos
dados na representação mental que se formava a partir do estabelecimento de relações.
Essa hipótese representava uma construção acessada da memória de longo prazo.
Esteve mais claramente explicada na fala de Marília (apesar de
aparecer em outras de modo mais sutil), por isso selecionamos suas falas para
descrever a estratégia.
A entrevistada (Marília) declarou que o encontro com o cliente
permitia a construção da “ idéia preestabelecida” . Daí, a busca de informações se dava
por uma condução por meio da aceitação ou rejeição de indicadores que confirmavam
ou descartavam a hipótese estabelecida.
[...] assim, geralmente quando você tá ali com o cliente, você já tem uma idéia preestabelecida: ‘bom vou pesquisar isso por aqui’ ... é isso aí, eu vou ver se com as respostas que ele tá me dando se confirmam a hipótese ou não, sei lá. Elas vão me dando informações que eu vou: tá indo, é por esse caminho. (Marília)
Outra descrição apresentada pela estudante faz menção à testagem de
duas hipóteses diferentes. Quando questionada se já havia vivenciado situações em que
duas alternativas existiam, a estudante respondeu:
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É, aí eu vou trabalhar com duas hipóteses[...] Vou fazendo perguntas que me levem às duas respostas, ou dependendo da resposta que ele for dando, eu vou excluindo as coisas. (Marília)
Para quais finalidades diagnósticas os testes de hipóteses eram utilizados?
A estudante destacou em sua entrevista uma finalidade principal para
o teste das hipóteses geradas durante o encontro.
A finalidade foi de permitir a seleção de perguntas adequadas à
hipótese, o que cooperava com o controle do processo de coleta de dados. Tais
perguntas caracterizavam-se como dirigidas ao teste da hipótese (no caso de uma
hipótese considerada) ou específicas para cada hipótese gerada (no caso de duas
hipóteses). Ilustramos com a fala da estudante.
Então vou fazendo perguntas que sejam específicas pra cada uma [hipóteses]. Aí se uma confirma: ‘bom tá indo pra cá’ . Aí eu faço outra pergunta, se essa não se confirmar, eu vou excluindo. (Marília)
Como e quando as hipóteses foram testadas no processo diagnóstico?
Marília explicou como conduzia a aplicação da estratégia, afirmando
que o testar de hipóteses envolvia tanto uma reflexão sobre os achados, quanto o
controle da condução do processo. Abaixo, o trecho do discurso que delimitou essa
conclusão:
[...] eu vou raciocinando em cima daquilo. ‘Bom, isso aqui tá me levando pra isso. Aí, por que isso tá acontecendo?’ Aí eu vou lá [no paciente] e vejo. (Marília)
No estudo, a estudante demonstrou ser capaz de organizar e planejar
a ação de coleta de dados, utilizando-se das interpretações conscientes dos achados, e
tomando a estratégia de testagem de hipóteses como a reguladora da coleta.
No seu caso específico, a confirmação da hipótese que ocorria por
94
teste permitia selecionar as perguntas a serem feitas ao cliente (“ vou fazendo
perguntas que sejam específicas pra cada uma” ). No tocante a isso, falamos
claramente de controle do conteúdo das informações a serem investigadas pelas
estratégias de coleta. Assumimos, então, com clareza, que a capacidade de controle e
regulação da estratégia recaia sobre o processo de coleta.
Em relação às circunstâncias para o uso da estratégia, elas não
ficaram totalmente claras. Porém, em termos gerais, a principal utilização se dava,
predominantemente, durante o encontro com o cliente. E em razão de suas
características de direcionar a coleta, o teste das hipóteses ocorria em concomitância
com as estratégias de coleta.
Como era avaliada a eficácia da estratégia de testar as hipóteses
diagnósticas?
Ainda que Marília não tenha sido diretamente questionada, em
diversas circunstâncias, ofereceu relatos sobre como sabia se o teste estava trazendo os
resultados favoráveis para o alcance do diagnóstico, bem como a forma de determinar
se a estratégia fora útil ou não.
A avaliação da eficácia da estratégia apareceu em trechos já
discutidos. A estudante tinha idéia dos seus benefícios, quando ela permitia o
estabelecimento das relações entre os achados ou quando auxiliava a montagem do
“ quebra-cabeça” .
Por outro lado, uma circunstância é avaliada como elemento
limitador ao emprego da estratégia de teste da hipótese diagnóstica: quando o
conhecimento conceitual teórico era reduzido. A falta do conhecimento teórico foi,
para a entrevistada, um limitador na confirmação da hipótese. Ela afirmou que a
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“ teoria” obtida por meio do livro (conhecimento) era um instrumento capaz de dar as
respostas necessárias ao aceite ou rejeição da hipótese. Vamos à sua fala:
“ Tem a questão das hipóteses. Assim, se eu tô fazendo perguntas até onde vai minha limitação. Se tá concordando, tá concordando, aí essa hipótese vai ser mantida. Aí se tá faltando alguma coisa ainda, que me diga: ‘é isso realmente’ ; como eu vou chegar até ela eu vou procurar no livro. Falta isso. Deixa eu ver se isso realmente acontece” (Marília).
3.3 −− As estratégias diagnósticas de enfermagem aplicadas
após o encontro com o cliente
Nessa categoria foram agrupadas as estratégias diagnósticas de
enfermagem que, caracterizando-se por ocorrerem após o encontro, permitiam aos
novatos trabalhar com as informações já coletadas.
Uma vez que os dados coletados por meio das estratégias
anteriormente apresentadas estavam disponíveis, nossos sujeitos lançavam mão de
recursos capazes de permitir que tais dados fossem avaliados ou processados em busca
da meta de chegar conclusivamente a um diagnóstico de enfermagem.
As estratégias de pós-encontro foram descritas, predominantemente,
como usadas após o encontro com o cliente, sempre quando um volume adequado de
dados estivessem presentes para o processamento.
As estratégias que destacamos foram: o questionamento a
profissionais da equipe de enfermagem, relacionamento entre dados, o
questionamento ao professor e a consulta ao livro.
3.3.1 −− Estratégia Sete −− O questionamento a profissionais da equipe de
enfermagem
Foi uma estratégia diagnóstica do processo de coleta de dados,
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permitindo aos sujeitos obterem mais especificidade sobre as informações clínicas que
ainda estivessem obscuras. Complementou outras estratégias de coleta utilizadas no
encontro, notadamente a observação e a entrevista clínica.
O pleno desenvolvimento do questionamento aos profissionais
dependeu da capacidade do estudante de reconhecer a informação de um modo geral e
depois selecionar especificamente qual dúvida possuía, ou qual aspecto da informação
desejava ter esclarecimento na pergunta ao profissional.
O questionamento era feito verbalmente e dirigido aos enfermeiros
ou técnicos e auxiliares de enfermagem que já haviam tido contato com o cliente. O
conteúdo do questionamento era bastante específico e buscava esclarecer dúvidas
sobre um ou mais dados. Por exemplo:
[...] eu perguntei pra ele algumas coisas que não tinha entendido, e ele me passou informações. (Marília)
Uma vez que caracterizamos o conceito da estratégia, dirigiremos
nosso olhar para as finalidades da estratégia diagnóstica.
Quais as finalidades diagnósticas do questionamento aos profissionais?
As finalidades que destacamos das entrevistas relacionaram-se à
coleta de informações adicionais e focalizadas e à confirmação de achados obtidos por
meio de outras estratégias diagnósticas de coleta.
A primeira finalidade não era muito diferente das anteriores, em que
o aluno, diante da necessidade de obter dados, buscava no questionamento a
profissionais uma outra fonte de informações. Entretanto, caracterizava-se por ser mais
focalizado do que as perguntas de pré-encontro.
Desse modo, as perguntas aos profissionais primaram pela
97
focalização, permitindo-nos perceber a estratégia como complementar às outras. De
fato, os estudantes nem sempre utilizaram-na no processo diagnóstico de enfermagem,
reservando-a normalmente para as situações que necessitavam de uma informação
incapaz de ser obtida por outros meios. Para esclarecimentos, destacamos um trecho
da fala de Marília:
Se eu for ali com uma dúvida e o paciente não coloca pra mim o que eu quero saber, da forma que eu quero saber, até mesmo pra saber o que perguntar pra ele; surgem dúvidas que, muitas vezes, eu penso: ‘ como vou perguntar isso’? É eu preciso estar com aquela dúvida esclarecedora pra montar uma idéia. Aí eu vou e pergunto ao profissional. (Marília)
A segunda finalidade atribuída à estratégia foi de busca pela
confirmação de achados. Nela, o estudante não procurava a informação a fim de
construir uma “idéia geral” do cliente (como nas de pré-encontro).Desejava, sim, obter
uma confirmação da procedência do dado obtido por meio de outras estratégias na
coleta. Vejamos onde se apresentou esse aspecto:
Também pra saber se o doente está dizendo a verdade ou não. Às vezes ele pode omiti r ou distorcer algumas coisas. (Érica)
Como e quando implementavam a estratégia, e como avaliavam sua
eficácia no processo?
Por conta de sua aplicação circunstancial e de uma importância
menor em relação às outras estratégias diagnósticas, as descrições dos aspectos-chave
do questionamento aos profissionais apareceram fracamente construídas nos relatos
dos sujeitos.
Os questionamentos eram verbais e dirigidos aos enfermeiros e
técnicos que, normalmente, cuidavam do cliente, que, na situação, era o foco do
diagnóstico. As perguntas tendiam a ser muito específicas e baseadas nas finalidades
98
descritas anteriormente, como percebemos no trecho abaixo:
Eu coloco o problema pra ele, o que tá me trazendo dúvidas. Eu falo: ‘Poxa, como aconteceu isso? Me fala como foi isso?’ (Marília).
Em relação às circunstâncias ao emprego da estratégia, os sujeitos
destacaram a aplicação no momento da dúvida, seja essa dúvida em relação à
veracidade de uma informação obtida ou, ainda, em relação à estruturação da
representação mental que formaria o diagnóstico de enfermagem. Isso emergiu nos
relatos a seguir:
Quando surgem às vezes, isso não é um hábito... então, dúvidas surgem e um profissional pode me esclarecer melhor... (Marília)
É geralmente quando eu estou com dificuldade de achar um diagnóstico. Tipo assim, se realmente aquele diagnóstico é do paciente. (Érica)
Os sujeitos colocaram que conseguiam avaliar o valor positivo da
estratégia, quando eram alcançados os resultados de esclarecimento da dúvida sobre o
dado investigado.
No modelo representativo de Érica, acontecia de modo semelhante
ao encaixe das peças de um quebra-cabeça, em que uma suposta peça tem seu
posicionamento no todo considerado como válido se consegue encaixar-se às outras
peças já dispostas ao seu lado.
Esse modelo do encaixe de peças, pareceu representar muito bem a
estratégia. Nele, uma vez que “peças” anteriores obtidas por meio das outras
estratégias de coleta já foram colocadas na formação da representação diagnóstica,
podiam agora ser encaixadas as outras “peças” (mais específicas) obtidas mediante o
questionamento aos profissionais. Vamos às falas esclarecedoras:
[...] como se o profissional confirmasse, às vezes, o que o paciente disse. É como se as peças se encaixassem. Não sei te explicar direito a estratégia. (Érica)
Surge um resultado pra mim [...] e se essa dúvida se esclarece, facilita a chegada até o paciente. (Marília)
99
3.3.2 −− Estratégia Oito −− Relacionamento entre dados
Implicou tentativas de reconhecer as relações existentes entre as
informações coletadas durante o encontro e compreender o papel de tais relações no
processo diagnóstico em enfermagem. Essa estratégia diagnóstica representou o
processo abstrato de estabelecer novos elos, para que, ao final do processo, fosse
atingida a conclusão diagnóstica. Geralmente, a junção (elos) entre as informações
dependia do conhecimento conceitual do aprendiz.
Para tornar mais sedimentado o entendimento da estratégia,
passaremos a discutir outros aspectos-chave, iniciando com os propósitos.
Quais os propósitos de estabelecer relações entre os dados no processo
diagnóstico de enfermagem?
Uma ampla variedade de finalidades apareceu nos discursos dos
sujeitos, mas apresentaremos as principais: diagnosticar a causa principal do problema
e cooperar com a formação de uma representação mental do diagnóstico de
enfermagem.
O primeiro propósito para a aplicação da estratégia foi sugerido por
Marta e diz respeito à detecção da “causa principal” (problema ou diagnóstico
principal). Ao compreender as relações existentes entre problemas secundários
manifestados no cliente, a estudante teria uma maior chance de chegar à “causa
principal” que desencadeou os problemas secundários. A aluna compreendeu que os
dados clínicos anormais (problemas secundários), na verdade, era a ponta do iceberg,
isto é, apenas manifestações conseqüentes de um problema primário para o qual
deveriam estar dirigidos os esforços diagnósticos. Vejamos a fala esclarecedora:
100
Pra você dar intervenção pra resolver um problema maior, que tá causando aquele ali. De repente, um diagnóstico maior. Uma coisa principal, um diagnóstico que estaria causando uma coisa menor. Não digo menor, mas secundária ali. Diagnosticar uma causa principal que, de repente, estaria causando problemas secundários. E você só detecta os problemas secundários e, de repente, é o que você está vendo, e esquece de dar uma intervenção para a causa principal. E eu não sei se tenho esta capacidade de ver os problemas secundários e tentar relacionar com a causa principal. Acho que o certo seria isso, mas ainda não tenho esta capacidade, esta visão. (Marta)
O segundo propósito identificado para o relacionamento entre dados
foi o de cooperar com o aparecimento de uma representação mental ou “ idéia”
presente na memória do sujeito. Dois modelos determinaram a formação da
representação mental: “a montagem do quebra-cabeça” e a “ formação da rede”
A montagem do quebra-cabeça que predominou em toda a entrevista
de Marília aborda um método de diagnóstico que influenciou a aplicação de várias
estratégias Dada sua complexidade, apenas apresentaremos o trecho em que esse
modelo apareceu em relação direta com a estratégia de relacionar os dados:
Quando as minhas dúvidas vão sendo respondidas e a minha idéia, a idéia, a lógica, vai montando na minha cabeça [...] Porque pra chegar a um diagnóstico, as coisas têm uma relação [...] E acho que essa relação, esse ponto em comum entre elas, tem uma resposta, no caso seria essa a conclusão [...] É interagir as informações, todos os dados que eu colhi. Elas vão montando. Acho que o diagnóstico é um quebra-cabeça montado. (Marília)
Já a formação da rede apareceu na segunda metade da entrevista feita
com Tatiane e representou seu modelo cognitivo de processar as informações. Nesse
tópico, entretanto, somente apresentaremos um trecho de sua fala com relação à
estratégia aqui tratada:
Eu tento formar uma rede. Eu tenho uma dificuldade enorme de gravar coisas lineares. Por exemplo: se eu não gravar algum elemento da linha, eu tenho outro caminho de como chegar, nessa rede. Porque, quando eu tô fazendo diagnóstico, eu estou aprendendo; então, pra poder lembrar deste diagnóstico também eu vejo se... Por exemplo, como eu falei: no diagnóstico, ele tem dois sintomas. Se este sintoma tem o paciente, deixa eu procurar se tem este segundo. De repente, tem associação. É a rede. Eu tento em tudo fazer a rede. (Tatiane)
101
Diante das finalidades da estratégia, passaremos ao tópico seguinte
fundamental para um melhor entendimento do estabelecimento das relações.
Como os sujeitos estabeleciam relações entre os dados?
Uma diversidade de descrições foram oferecidas pelos sujeitos no
que se refere ao know how dessa estratégia diagnóstica. Isso provavelmente, se explica
pela influência da estrutura mental de cada sujeito.
Nesse tópico, descreveremos quais recursos nossos sujeitos
utili zaram para conseguir estabelecer as relações entre os dados no processo
diagnóstico de enfermagem. Para isso, dividiremos os recursos em dois tipos: os
intrínsecos e o extrínseco.
Entre os recursos intrínsecos ao diagnosticador, colocaremos os que
partem de um referencial interno do sujeito e que sua aplicação na estratégia depende
predominantemente do aprendiz. Foram incluídos nesse tipo a investigação das
hipóteses diagnósticas, o uso do conhecimento conceitual e as anotações pessoais dos
estudantes.
O recurso extrínseco ao diagnosticador dependia da busca de uma
fonte externa que facilitasse a aplicação da estratégia. Nesse caso, o questionamento ao
professor foi o exemplo.
Comecemos a apresentação dos recursos intrínsecos pela
investigação das hipóteses diagnósticas.
O recurso de investigar elementos das hipóteses assemelha-se, na
visão de Marília, a uma operação de procurar “peças de um quebra-cabeça”, para
encaixá-las de modo adequado a obter, no final, o quebra-cabeça montado (o
diagnóstico de enfermagem).
102
As “peças” conseguidas por intermédio das respostas a uma hipótese
investigada vão interagindo por relação, permitindo que, no fim, se tenha a imagem
final do quebra-cabeça.
Ah, vou fazendo umas perguntas e ele [paciente] vai me respondendo. Se as respostas dele vão se encaixando naquilo que eu quero. Confirmou, aí eu vou tentar confirmar de outra forma, assim. [Montar o quebra-cabeça] é interagir as informações, todos os dados que eu colhi. Eles vão montando. Acho que o diagnóstico é um quebra-cabeça montado. (Marília)
Também detectamos a investigação de uma hipótese diagnóstica na
entrevista de Fabiana. Contudo, à sua descrição, podemos atribuir forte semelhança ao
raciocínio hipotético-dedutivo. Assim:
Às vezes, acontece isso: é.. ele [cliente] vai falando e você vai pensando no que pode ser e daqui a pouco ele entra com outra informação, e você já descarta aquilo que pensava antes. É de certa forma isso acontece. Aí ele vai continuando a falar, e daqui há pouco você pode pensar em outro... Você tá entendendo? Quando ele acaba a conversa, você já tem alguma coisa em mente que você pode dizer a ele do que esteja acontecendo. Agora que você me despertou pra isso, eu acho de certa forma eu faço a coisa mais por eliminação, entendeu? Do tipo: ele vai falando e eu vou eliminando aquilo que não é. (Fabiana)
Esse modelo de raciocínio permitia à aluna avançar na percepção da
necessidade de coletar novos dados.
O segundo recurso intrínseco que detectamos foi denominado pelos
estudantes entrevistados de “pré-conhecimento” , “conhecimento teórico” ou
simplesmente “conhecimento” . Para nós, referia-se ao conhecimento conceitual
diagnóstico, que permitiu a operacionalização da associação entre os achados e a
conclusão diagnóstica final.
De um referencial intrínseco, os estudantes buscavam na memória de
longo prazo, o conhecimento teórico que permitia a visualização das relações entre os
dados:
103
Ah, com o pré-conhecimento que eu tenho [que estabelece as relações]. Eu sei que isso com isso dá isso, entendeu? O conhecimento que eu tenho. Porque, se não tivesse o conhecimento, aquilo não ia me dizer nada [...] E não dá pra você ver as relações dessas coisas, se você não conhece [...] É, eu estudo primeiro, né? Eu estudo. Tem que saber o porquê das coisas, vou na teoria, no livro, e lá ele me diz que, se isso aqui estiver junto com isso pode ser isso. E aí aquela outra coisinha lá junto com esses dois aqui pode ser mais isso, entendeu? Porque, se eu não souber, não vou saber relacionar essas coisas. (Marília)
Imagina o céu, as estrelas. Eu só consigo fazer a ponte entre uma e outra, se eu tenho o conhecimento de que me diga que aquela estrela ali tem alguma associação com outra. Aí eu vou fazendo as constelações. (Tatiane)
Mas isso vem também com base no que eu já estudei. Não vou sair por aí relacionando umas coisas que não têm nada a ver com a outra? Vai com base mesmo no que eu estudei, nas coisas que eu já passei [...] E exatamente também o conhecimento científico. (Clara)
O conhecimento serviu à compreensão das relações, permitindo o
encontro dos “pontos comuns” entre as informações. Foi capaz de interferir nos
processos de formação da representação mental.
As notas pessoais escritas (anotações) dos aprendizes apareceram
como o último recurso intrínseco. Duas vantagens foram evidenciadas dos discursos.
Em primeiro lugar, foi atribuída à leitura o papel de contribuir para a
percepção das relações (interligação das informações) existentes entre os dados. Ao
lerem suas anotações, os aprendizes poderiam facilmente visualizar no papel as
informações selecionadas que já haviam chegado a eles por meio de outros meios, por
exemplo, relatos (passagem de plantão e entrevista). Em segundo lugar, trazia a
vantagem de preservar o conteúdo das informações coletadas no pré e durante o
encontro. Sem as notas, muitos dados poderiam se perder, dificultando o diagnóstico.
Tipo assim, eu anotava na passagem de plantão que o paciente tinha isso, isso e isso. E aí, na hora da conversa e exame físico, tinha anotações do exame físico e os relatos dele e até o que foi observado durante o tempo de estágio. Aí eu começava a ler e percebia que tinha a ver uma coisa com a outra, as minhas anotações. Porque, se fosse guardar tudo mentalmente, naquele stress, eu não iria lembrar e ia acabar que alguma coisa ia passar, e por mais que anote, pela falta de experiência da prática, acaba passando mesmo, tem algumas coisas que acabo não anotando. (Ana)
104
Como colocado, as notas escritas de Ana abordavam a situação
percebida na passagem de plantão, sendo, posteriormente, acrescidas de outras
anotações feitas a partir da conversa com o cliente, exame físico e da observação. A
entrevistada afirmou, ainda, que da leitura das notas ela começava a perceber que as
informações tinham relações entre si.
Como recurso extrínseco, o professor despontou como agente
facilitador da percepção dos estudantes em relação às interações existente entre os
dados. Assim afirmou uma entrevistada:
Quando eu tenho dificuldade de fazer essa associação dos dados; aí eu procuro o professor pra me auxil iar nesta parte. (Érica)
O professor surgiu como uma alternativa capaz de compensar as
dificuldades de processamento dos novatos, oferecendo auxílio ao apontar a existência
de aspectos comuns entre informações consideradas isoladamente pelo aluno.
Quando a estratégia de relacionamento entre dados foi util izada?
De um modo geral não existiu grande clareza das circunstâncias
adequadas ao emprego da estratégia diagnóstica abordada. Contudo, o relacionamento
entre dados foi feito tanto durante, quanto ao final da coleta de dados.
O relacionamento durante a coleta surgiu primeiro na fala de Marília
(quarta entrevistada). Para ela, o processo ia acontecendo na medida em os que dados
fossem obtidos por meio da aplicação das estratégias de coleta.
A entrevistada afirmou não possuir um momento no qual o processo
de juntar as informações ocorresse como uma operação separada. Ao contrário,
afirmou que um dado conduzia ao outro:
105
Acho que vai acontecendo, Marcos [o relacionar das informações]. Não dá pra você parar e fazer uma coisa, agora eu vou parar e vou juntar as informações [...] conforme as coisas vão evoluindo uma coisa vai levando à outra. (Marília)
Sua descrição esteve em forte consonância com o modelo de “montar
um quebra-cabeça”. Pegava as “peças” e as colocava em relação com as outras,
buscando formar uma representação da imagem diagnóstica (quebra-cabeça montado).
O relacionamento dos dados durante a coleta surgiu depois, em outro
relato na sétima entrevista. Foi apresentado também como uma operação mental que
corre paralela ao processo de cuidar. A entrevistada colocou assim sua percepção:
Tipo assim, não quer dizer que eu vou ficar lá estatelada, parando e pensando; não é isso, entendeu? Conforme eu vou mesmo cuidando eu vou pensando numa coisa que pode estar relacionada à outra; que pode ser por causa de uma outra coisa, entendeu? Eu vou relacionando as coisas. Eu acho que isso é analisar. (Clara)
As relações também eram estabelecidas no pós-encontro com o
cliente. Nesse tipo, cabe destaque à fala de Ana. Para ela, a estratégia era melhor
aplicada ao final das atividades, já que existia prejuízo, por interferência, causado pela
própria dinâmica das atividades de enfermagem, caracterizada pela grande quantidade
de procedimentos realizado no cliente. Assim, afirma:
E ainda mais no primeiro momento da passagem de plantão; logo após começa a rotina, aí tem banho no leito, não sei o quê... aquela correria, e acaba a gente fazendo tudo mecanicamente. Depois que pára, ‘Ah durante o banho ele tinha isso eu vi isso e tal’ . Depois que você pára, você fica diante do leito do paciente assim e você vê que ele está descansado, e aí começa a pensar um pouco [grifo nosso]. Mas, ao mesmo tempo, já começa aquela questão de escrever no prontuário, de fazer o gráfico, aí tem que botar direitinho e tal. Quer dizer, tem um período que você pára, começa a pensar, mas aí depois começa tudo de novo. Você só tem tempo para terminar as tarefas, e aí fica assim muito... mecânico. (Ana)
Entendidas as circunstâncias para emprego dessa estratégia, iremos
descrever as considerações dos sujeitos sobre sua eficácia.
106
Como os sujeitos avaliavam a eficácia do estabelecimento de relações?
Na maioria dos casos, os estudantes não tinham consciência se
avaliavam e como avaliavam a estratégia de estabelecer relação entre os dados. A fala
de Clara é típica:
Não. Não tinha pensado [risos]. Tipo assim, na minha cabeça, eu sempre tinha assim como que eu vou montar um diagnóstico. Eu já sinto a necessidade de quando fazer a minha evolução de colocar ali um diagnóstico de enfermagem. Não para os outros mas para mim. Porque eu acho que é necessário. Se eu vejo que é necessário aquilo ali é claro que eu vou pensar nas coisas que eu preciso para montar um diagnóstico [...] Acho que já é assim direcionado. Eu vou fazendo e não penso mais na... Acontece. (Clara)
Nos casos em que conseguimos apreender recursos de avaliação da
estratégia, encontramo-los submetidos aos resultados. Esses resultados foram
interpretados sob dois pontos de vista.
A primeira interpretação do alcance de resultados na aplicação da
estratégia se deu pelos esclarecimentos de dúvidas e a formação lógica da
representação mental diagnóstica. Em termos concretos, se os resultados do
relacionamento entre as informações apontassem para a confirmação da representação
mental, a estratégia e, especificamente, a trama cognitiva era considerada satisfatória.
Quando as minhas dúvidas vão sendo respondidas e a minha idéia, a idéia, a lógica, vai montando na minha cabeça. (Marília)
A segunda interpretação dos resultados referiu-se à eficácia das
intervenções de enfermagem. Nas situações em que as intervenções eram dirigidas ao
problema/diagnóstico principal, sua efetividade era maior e, portanto, valia a pena
associar as informações e os diagnósticos secundários para alcançar a conclusão do
principal:
De repente, eu faço as intervenções e melhoram os problemas secundários temporariamente. No caso estaria influenciando nas intervenções. (Marta)
107
3.3.3- Estratégia Nove −− A consulta ao livro
Despontou como uma estratégia diagnóstica, na medida em que a
interpretação das informações ali contidas interferia na coleta e no processamento dos
dados diagnósticos.
O livro5 apareceu para a estudante como o depositário do
conhecimento teórico capaz de oferecer elementos para a representação mental dos
diagnósticos de enfermagem (perfis diagnósticos).
As representações diagnósticas podem ser entendidas como
esquemas mentais de diagnósticos. Portanto, modelos ou redes que possuíam diversos
elementos dos conhecimentos conceitual e procedimental (definições, etiologias, sinais
e sintomas, e critérios) diretamente relacionados ao próprio diagnóstico.
Para que consultar um livro de diagnóstico de enfermagem?
Três finalidades principais para a estratégia, dependentes do perfil do
estudantes, foram destacadas.
A primeira finalidade encontrada para a consulta ao livro, no
processo diagnóstico, era de buscar elementos dos perfis diagnósticos de enfermagem
que permitiriam a construção de representações mentais de diagnóstico.
Da fala de uma das entrevistadas, depreendemos que a procura pelos
elementos dos perfis, no livro, gerava alguns esquemas (denominados de “roteiro”
ou “roteirinhos” ). Tais permaneciam armazenados na memória, representando os
diagnósticos aprendidos. Apresentaremos agora as citações em que a finalidade
5 O li vro a que os sujeitos fazem menção é um manual de diagnóstico de enfermagem, no qual definições diagnósticas e perfis diagnósticos são apresentados.
108
apareceu claramente:
E até nesta questão que eu te coloquei: no início pegamos, fizemos um roteirinho de diagnósticos e tentamos encontrar nos pacientes [...] Não, na realidade eu não cheguei a fazer nada escrito, eu falei roteiro porque, tipo assim, eu peguei alguns e ficou na minha cabeça e então eu não esqueci. E se aparecesse algum novo eu não sabia nunca. Inicialmente, eu peguei o livro pra saber o que era diagnóstico de enfermagem e tentar conhecer alguns. Tentar ver, dar uma folheada. ‘Ah, existe este! Existe este outro!’ (Ana).
Acho que o livro é fundamental, porque sem o conhecimento, você... Sem saber quais são os diagnósticos. Saber porque eles acontecem. Você não vai conseguir diagnosticar nada. (Érica)
A segunda finalidade foi a de permitir a classificação de uma situação
detectada no cliente como um diagnóstico de enfermagem . Nesse sentido, a consulta
ao livro toma lugar como uma estratégia que permitiu uma confrontação entre
representação mental, formado a partir do processamento dos dados, e o perfil
diagnóstico, apresentado pelo livro. A partir da comparação entre características
comuns aos dois modelos, os estudantes reestruturavam a situação encontrada em um
novo esquema que contemplasse também os elementos contidos no livro. Vamos à
parte do discurso em que tais aspectos apareceram:
Posteriormente, eu já tentei até que, inconscientemente, ver que o paciente tinha determinada situação e, apesar de não saber o quê que era, eu corria no livro pra ver se tinha algum diagnóstico de enfermagem relacionado àquilo. Eu acho que aí era uma utili zação até que razoável na minha opinião. (Marília)
Às vezes, você sabe que a pessoa está com algum problema, entre aspas, que pode levar a um diagnóstico. Mas você não sabe qual é o diagnóstico correto e a procedência dele. (Érica)
A terceira e última finalidade detectada tratou da capacidade da
leitura do livro em ajustar o processo de coleta de dados. Ao lerem os perfis
diagnósticos apresentados no livro, os sujeitos avaliavam a necessidade de
complementar os dados no cliente, ou seja, tornavam a aplicar as estratégias na coleta
de informações previamente omitidas. Uma das entrevistadas assim descreveu a
finalidade:
109
Mas, às vezes, eu tento confirmar mesmo. Lá no paciente, por exemplo: uma informação que tenha faltado, que eu tenha deixado passar em branco. (Marília)
Uma vez que já tenhamos apresentadas as finalidades dessa
estratégia, a ordem lógica nos encaminha ao tópico seguinte, que explora o “know-
how” da estratégia e as circunstâncias adequadas à sua aplicação.
Como ler o livro para elaborar um diagnóstico de enfermagem?
Existe uma certa diversidade na utilização do livro para fazer um
diagnóstico que foi influenciada por características dos sujeitos como diagnosticadores.
Primeiro, iremos apresentar dois modos de usar a consulta ao livro,
que puderam ser delineados da fala de Marília.
No primeiro modo, Marília iniciava a busca no livro a partir da
proposição de um “diagnóstico provisório” (categoria diagnóstica provisória). Uma
vez possuindo esse diagnóstico provisório, a aluna fazia uma confrontação com as
informações contidas no livro. Considerava que seu raciocínio estava correto, se
encontrasse coincidência entre os dados (“respostas” ) propostos pelo livro e as
características do seu diagnóstico provisório.
Eu vou no local onde ela [busca no livro] pode me responder.[...] Por exemplo, eu já tenho lá um diagnóstico assim, como se fala... provisório. Eu vou lá onde aquilo [categoria diagnóstica provável] está no livro. Vou lá onde eu acho o que é. Eu vou lá, e vejo se eu estou... se a minha linha de raciocínio está indo correta, corretamente. Se as respostas coincidem. (Marília)
Quando a categoria provisória atendia aos critérios do perfil
diagnóstico do livro, a aluna aceitava o diagnóstico provisório como certo. Sua fala é
ilustrativa:
[...] Aí eu vou lá no livro, vejo que tá faltando alguma coisa. Aí eu vou lá no paciente... se confirmar-se lá com ele. Aí bom, realmente deu certo, é isso! As coisas vão se encaixando, aí cheguei ao diagnóstico. (Marília)
110
Esse modo de usar parece estar em consonância com a finalidade de
permitir a classificação, como um diagnóstico de enfermagem, da representação mental
criada a partir da situação do cliente.
O segundo modo de usar a leitura do livro esteve reservado às
circunstâncias em que o “quebra-cabeça” ainda estava incompleto. Aí, Marília buscava
mais “peças” (informações) no cliente, por reconhecer que sua coleta omitira dados
que seriam necessários para a conclusão diagnóstica. Tal interpretação ocorria, quando
lacunas surgiam na representação mental diagnóstico, que fora reestruturado a partir da
leitura do livro. Tratava-se de um processo de coleta focalizado na busca do
preenchimento dessas lacunas deixadas na coleta das informações.
[...] e ver o que tem de novo, o que está faltando, entendeu? E aí vou lá no paciente e vou tentar complementar o que estava faltando, entendeu? [...] por exemplo: uma informação que tenha faltado, que eu tenha deixado passar em branco. Aí eu vou lá no livro, vejo que tá faltando alguma coisa. Aí eu vou lá no paciente... se confirma lá com ele. Aí bom, realmente deu certo, é isso! (Marília)
Já Bianca utilizava o livro de outro modo. Ela partia de uma
categoria maior (no caso sistema orgânico) em que os possíveis diagnósticos pudessem
estar localizados. Ao encontrar a categoria, começava a interpretar os perfis contidos
nela e a considerar os que atendiam melhor à situação que observou na prática.
Tratava-se de partir do geral para o específico para descartar diagnósticos
concorrentes. Destacamos sua fala a seguir:
Primeiro você vê que ele tem um problema cardíaco. Então lá estão os possíveis diagnósticos que aquele paciente pode ter a partir daquele problema. E você vai, vai ver quais os problemas que estão dentro daquela categoria. Você vai descartar: ‘esse não; esse não; esse pode ser; esse pode ser!’ (Bianca).
Quando ler o livro para elaborar um diagnóstico de enfermagem?
Em relação às circunstâncias de emprego da estratégia, duas
111
situações foram apreendidas.
A primeira das circunstâncias falava dos momentos em que o
conhecimento conceitual diagnóstico não estava armazenado na memória da estudante,
podendo ser, como já visto anteriormente, nas situações de falta de conhecimento
acerca dos perfis (fase inicial) ou na incerteza de classificação como diagnóstico de
enfermagem das representações mentais encontradas. Os discursos dos sujeitos deixou
clara a relação do livro com a memória:
Ah, por exemplo, eu me deparo com uma situação que eu não estudei bem, e eu não vou saber lidar com ela, aí eu vou no livro. É quando eu chego na dúvida. Ou então quando eu não sei mesmo. (Marília)
Bom, era mais tipo assim: conhecer o diagnóstico, ver os sinais e sintomas e tentar colocar na minha cabeça o que eu encontrava no paciente. (Ana)
A outra circunstância fez referência à quantidade de dados
disponíveis. Era possível “pegar o livro” com finalidades diagnósticas a partir do
momento em que você tinha os dados anotados. E buscava, então, uma fonte capaz de
encontrar o perfil que atendesse à situação problema detectada. Ilustramos com a fala
onde isso apareceu:
Só depois que você faz as anotações todas, é que depois pega o livro pra ver o que se encaixa no doente. Isso quando dá tempo, porque no estágio não tem tempo pra você consultar livro. (Bianca)
Como os estudantes avaliavam a eficácia de ler um livro sobre
diagnóstico de enfermagem?
Nenhum dos sujeitos, exceto Marília, foi capaz de descrever
explicitamente como perceberam a eficácia da estratégia no alcance da conclusão
diagnóstica.
Para Marília, o critério para avaliação da eficácia da consulta ao livro
112
ocorreu pelo esclarecimento de suas dúvidas e pelo fechamento do “quebra-cabeça”
montado, o próprio diagnóstico de enfermagem. Nesse contexto, o livro apareceu
como uma estratégia que permitiu à aluna avaliar os progressos obtidos na tarefa
cognitiva de concluir o diagnóstico. Mais do que um regulador, o conhecimento
contido no livro assumia a função metacognitiva de oferecer uma avaliação do
progresso cognitivo da entrevistada na busca por atingir um resultado.
Eu sei quando ele [livro] está surtindo efeito se ele me responde o que eu quero, mas agora se ele não responde... Se a dúvida foi sanada, entendeu? ‘Pô, foi isso! Se confirmou, é isso então... Se, às vezes, ali lendo elas vão se juntando aí pode fechar. (Marília)
Em suma, o livro apareceu, ou mais especificamente os perfis
diagnósticos nele contidos, como uma estratégia tanto de auxiliar no processamento,
quanto de promover a conclusão diagnóstica, na medida em que ofereceu a
possibili dade de confirmar tanto as hipóteses quanto a seleção de trilhas para a busca
diagnóstica.
3.3.4 −− Estratégia Dez −− O questionamento ao professor
Os sujeitos referiram que buscavam o professor para auxiliá-los,
tanto a processar as informações quanto para determinar uma designação diagnóstica à
situação encontrada. Também o questionavam para tirar dúvidas nas situações em que
outras fontes de conclusão como o livro ou uma colega não pudessem esclarecer.
Muitas vezes, era o professor quem tinha o papel de confirmar se a
interpretação de uma informação fora correta.
Sua atuação em relação às estratégias de coleta de dados não
despontou dos relatos dos entrevistados. Isso parece manter coerência com todo o
restante do conteúdo da entrevista, uma vez que os sujeitos não verbalizaram queixa
em relação ao domínio das habili dades de coleta de dados clínicos. De fato, as grandes
113
dificuldades apresentadas por nossos estudantes, em suas percepções, era de processar
as informações obtidas e conferir um rótulo diagnóstico ao julgamento clínico feito,
valendo-se delas.
O questionamento ao professor entra como uma estratégia, na
medida em que era intencionalmente utilizado pelos alunos para auxili ar no
processamento e na conclusão diagnóstica. Para entender, no entanto, como ocorria
esse processo, começaremos por descrever as finalidades encontradas.
Para que os estudantes questionavam ao professor durante o processo
diagnóstico?
As finalidades de questionamento variaram muito em relação ao
modelo de processamento de cada estudante. Contudo, algumas ficaram destacadas nas
falas e trataremos então de apresentá-las abaixo
O primeiro propósito para procurar ajuda docente por meio do
questionamento foi quando apareciam dúvidas sobre os significados de um dado
clínico, ou seja, existia a dificuldade de inferir6 a partir da informação. Por exemplo, ao
perceber um som do tipo “assobio” na ausculta pulmonar, o estudante confere a ele um
significado de “sibilo” . Essa inferência esteve baseada, predominantemente, no seu
conhecimento conceitual sobre “sons respiratórios normais e anormais” e à sua
experiência prática.
Devido à reduzida experiência prática dos estudantes, eles tiveram
6 Para Iyer et al. (1993, p. 60-61), a atividade de inferir é conferir significado a uma ou mais indicação(ões) ou achado(s). Constitui um julgamento feito com base na experiência e conhecimento. As inferências podem dirigir-se a um único achado ou a agrupamentos de indicações. Por exemplo: a temperatura de 38,8ºC é uma indicação que pode gerar uma inferência de temperatura elevada. Por outro lado o grupo de indicadores; temperatura 38,8ºC, incisão avermelhada, e drenagem purulenta podem permitir o julgamento por inferência de incisão infectada.
114
dificuldade para discernir se sua inferência estava correta, solicitando então o auxílio
do professor. Apresentamos o seguinte trecho da fala de uma entrevistada como
ilustração:
Eu tenho muita dúvida e acabo chamando o profissional que no caso seria o professor da prática pra ver se realmente concorda com aquela situação. Porque quando a gente vai diagnosticar alguma coisa, um sibilo alguma coisa, na gente há uma dúvida; será que é realmente? E então acaba a gente chamando o professor da prática pra verificar se é realmente aquele sibilo. Pra tirar as dúvidas. (Ana)
A segunda finalidade relacionava-se às contribuições do docente em
auxiliar o estudante a nomear a situação encontrada com um rótulo ou categoria
diagnóstica. Esse propósito era atingido após o sujeito já possuir a representação do
diagnóstico pronta e somente faltar atribuir uma designação taxionômica ao
diagnóstico de enfermagem. Vejamos a fala em que esse aspecto apareceu:
A gente nunca ouviu falar em diagnóstico de enfermagem, e de repente, você tem de fazer diagnóstico de enfermagem; então você fica meio perdido, não sabe exatamente o quê. Aí você tem uma idéia. Tem problema então do sono, mas você não sabe exatamente o que é, então vai precisar de um professor pra dar um auxílio nisso. E, como eu falei, é uma taxonomia enorme, muitos diagnósticos pra você [...] É pra dar o nome correto. (Bianca)
A terceira finalidade identificada era do professor como agente
colaborador da “associação dos dados” (relacionamento entre dados). Ele auxiliava os
estudantes no preenchimento de lacunas de informações (“quando faltam peças” ), no
estabelecimento de relações entre as informações encontradas, potencializando tanto o
esclarecimento da representação mental diagnóstica, quanto ao alcance da conclusão
final. Vejamos dois trechos de discursos em que tal propósito encontrava-se em
destaque:
Quando eu tenho dificuldade de fazer esta associação entre os dados, aí eu procuro o professor pra poder me auxiliar nesta parte. Porque, no diagnóstico, a parte mais complexa, é você... Porque colher dados todo mundo colhe; é fácil você colher dados . Agora fazer associação, ver que tem uma coisa com a outra que vai influenciar no paciente, eu acho que é a parte mais complexa no diagnóstico. (Érica)
115
Quando faltam peças assim...Vão faltando peças. Às vezes, faltam peças que eu não me dou conta, mas o professor sempre alerta. ‘Poxa, ah, é isso mesmo! Eu vou lá... Confirma? Aí eu: é!’ ...às vezes, você tem as peças certas mas não sabe qual a ligação delas. Aí o professor vai esclarecendo. Aí com informações que ele traz. Aí você vai: ‘Poxa! É, realmente é isso!’ E vai chegando à resposta. (Marília)
A última das finalidades de emprego da estratégia era obter do
professor cooperação na obtenção de certeza do correto diagnóstico nas situações em
que existiam mais alternativas a considerar, ou seja, no diagnóstico diferencial
(Carnevali & Thomas, 1993, p. 60). Vamos à fala esclarecedora:
Aqui dentro do sono você tem isso, mas pode ser isso, esse não pode ser, pode ser esse; então ele vai ver: então é qual? Ele [professor] vai esclarecer. Mas a partir de que você tem o livro na mão. Eu tenho a, b, c e d porque fica meio complicado dizer. Você nunca ouviu falar, você não decorou todos aqueles diagnósticos. Você tem o livro: pode ser esse, pode ser aquele. (Bianca)
Como e quando os estudantes questionavam ao professor durante o processo
diagnóstico?
Somente Marília explicou como questionava ao professor com fins
de diagnóstico. Como observaremos na fala a seguir, seu processo é de comunicação
efetiva com o docente. A estudante levantava perguntas que traziam novas “peças” e
modos de organizá-las na montagem do quebra-cabeça, o próprio processo diagnóstico
para a entrevistada.
Perguntei a ele; conversando com ele, o professor vai sempre esclarecendo, explicando as coisas, né? ‘Olha isso aqui!’ Eu mesma aponto o que eu tenho dúvida; alguma coisa que eu suspeite, mas não esteja tendo forma de chegar ao ponto que vai me responder a essa suspeita. Ele sempre fala, vai dando esclarecimentos que vão facilitando a montagem do quebra-cabeça. (Marília)
E quando os sujeitos procuravam o professor e faziam os
questionamentos?
O que parecia acontecer era que os sujeitos geralmente perguntavam
116
a partir do momento que já tinham as informações coletadas e delas geravam suspeitas
diagnósticas. Dependendo da finalidade de procura ao docente, os estudantes podiam
buscar esclarecimentos, ou confirmações. Os trechos que destacamos são bons
exemplos:
Assim cheguei ao diagnóstico, né? Aí eu vou lá e pergunto se ele [professor] realmente concorda comigo. É pra confirmar, ou pra esclarecer dúvidas. (Marília)
[...] ah, eu geralmente procurava o professor, quando eu tinha dúvida em alguma coisa, e quando eu me interessasse em saber mais de outra coisa. Teria de ter um interesse de saber de alguma coisa. (Patrícia)
No caso, pra ter certeza [do normal] até hoje a gente... Eu tenho muita dúvida e acabo chamando o profissional que, no caso, seria o professor da prática pra ver se realmente concorda com aquela situação. (Ana)
Quando você quer fazer o diagnóstico correto. Você quer se certificar. (Bianca)
Como os alunos avaliavam a eficácia do emprego dessa estratégia no
processo diagnóstico?
O recurso que os sujeitos lançavam mão para avaliar as vantagens de
ter questionado ao professor durante o processo diagnóstico de enfermagem, era o
mesmo de outras estratégias já apresentadas, ou seja, por intermédio da obtenção de
resultados claros frente às metas traçadas para o emprego da estratégia. No caso em
foco, os aprendizes consideravam válido o questionamento se o professor esclarecia
suas dúvidas em relação ao processamento das informações.
Das falas, podemos perceber claramente que o questionamento ao
professor, no processo diagnóstico, foi considerado pouco útil ou inútil, quando os
alunos não conseguiram obter avanços em seu processo cognitivo de diagnosticar. Por
exemplo:
117
Quando eu consigo chegar ao meu produto final, que é o diagnóstico. Quando eu chego no professor e ele explica, explica, e eu não chego a lugar nenhum, pra mim não valeu de nada. (Érica)
A partir da evolução dele. Se você diagnosticou isso, e você tem de fazer isso, isso e isso; as intervenções são essas. A partir da intervenção você vê: se ele está evoluindo, foi uma boa estratégia. (Bianca)
Com a descrição desse elemento-chave, finalizamos este capítulo do
estudo, para delinear no próximo as discussões que permitam a compreensão que a
metacognição pode trazer ao entendimento do fenômeno diagnóstico em enfermagem
4 −− “ OS SIGNIFICADOS” −− DISCUSSÃO
4.1 −− Da metodo logia −− “ Reconh ecendo as esc olhas”
O propósito deste capítulo foi desenvolver as interpretações e
discussões metodológicas que marcaram o estudo. E, ao nosso entender, apresentá-las
em separado do capítulo de metodologia representou um recurso de natureza didática,
que reflete também nossa preocupação em manter claro o movimento de construção de
nossa pesquisa.
Procuramos, durante o texto, manter a integração necessária entre o
como foi feito apresentado no capítulo de Metodologia e as razões e os
desdobramentos desse fazer discutidos neste capítulo.
Por que um estudo descritivo?
Antes de classificarmos nosso estudo, achamos oportuno destacar
que não existe uma nomenclatura classificatória única. Contudo, uma convergência tem
apontado para utilizar-se de três tipos ou níveis de pesquisa: exploratória, descritiva e
explicativa (Gil, 1991, p. 44).
No primeiro tipo (das exploratórias), estão os estudos que “têm a
finalidade de desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e idéias, com vistas na
formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos
posteriores” (Gil, 1991, p.44).
Complementamos com Triviños (1992, p. 109) que afirma: “os
estudos exploratórios permitem ao investigador aumentar sua experiência em torno de
determinado problema [...] Um estudo exploratório, por outro lado, pode servir para
119
levantar possíveis problemas de pesquisa” .
As descritivas têm como objetivo primordial “a descrição de
características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento das
relações entre as variáveis” (Gil, 1991, p.45). Já Triviños (1992, p.110) apresenta
como finalidade principal desse tipo de pesquisa a pretensão de descrever com exatidão
os fatos e fenômenos de determinada realidade.
As pesquisas explicativas são as “que têm como preocupação
central identificar os fatores que determinam ou que contribuem para a ocorrência dos
fenômenos” (Gil 1991, p. 46). Triviños (1992, p.112) classifica esse tipo como
pesquisas experimentais, que consistem em modificar, de modo deliberado, as
condições de um fato ou fenômeno e em observar e interpretar suas mudanças.
Observadas as particularidades de cada tipo de estudo acima
apresentadas, classificamos nosso estudo como descritivo, e justificamos abaixo essa
afirmativa.
O estudo é descritivo dada a importância que conferimos às
descrições dos aprendizes sobre o fenômeno, o processo diagnóstico em enfermagem.
Nos estudos descritivos qualitativos, a descrição deve considerar que nada é trivial e
que qualquer aspecto é potencialmente um achado capaz de trazer clareza ao
entendimento do assunto estudado (Bogdan & Biklen, 1992).
De acordo com Triviños (1992, p. 110), os estudos de natureza
descritiva representam a maioria dos estudos desenvolvidos no campo da
educação. Essa característica afina o trabalho por nós produzido com o fluxo da
produção científica do campo de saber a que pertence.
Baseados nessa característica da importância dos relatos dos sujeitos,
buscamos em suas falas a exploração dos aspectos-chave (O quê, para quê, como,
120
quando, e como avalia) de cada estratégia diagnóstica identificada. E somente por meio
da descrição é que acreditamos que isso poderia ficar claro e possuir validade
científica.
Por que uma abordagem qualitativa?
A abordagem qualitativa, a nosso ver, foi a única capaz de atender às
demandas requeridas pelo estudo. Digamos assim, o próprio delineamento do objeto
de estudo exigiu que desenvolvêssemos um estudo de natureza descritiva qualitativa.
Essa conclusão, obtivemos a partir da reflexão sobre as cinco
características básicas dos estudos qualitativos propostas por (Bogdan & Biklen,
1992), que foram apresentadas na metodologia, mas que tomamos como objeto de
discussão neste capítulo. Vamos a elas:
1. Os dados coletados são predominantemente descritivos. Para nós, o material
obtido das entrevistas com os estudantes foi a matéria-prima para a análise
qualitativa, sendo considerados importantes, a priori, todos os dados obtidos da
descrição de seus processos diagnósticos. Os aspectos-chave explorados para cada
estratégia diagnóstica apresentaram-se como elementos da “situação estudada” e
foram considerados essenciais para a compreensão do fenômeno estudado. Ainda
em consonância com a caracterização de Bogdan & Biklen, as citações dos sujeitos
foram usadas freqüentemente para subsidiar uma afirmação nossa ou esclarecer um
ponto de vista.
2. A preocupação com o processo mais do que simplesmente com o produto. Foi
essa a segunda característica apresentada pelos autores já referidos que atendeu às
demandas de nosso estudo. Isso se deu, uma vez que nosso recorte da temática do
diagnóstico de enfermagem concentrou-se na busca pelas estratégias que
121
determinam a condução do processo. Sempre estivemos preocupados em obter
clareza sobre quais estratégias estavam envolvidas no diagnóstico, além de,
geralmente, caracterizá-las sob o ponto de vista de suas finalidades, características,
utili zação, monitoração e regulação.
3. Os significados que as pessoas dão às coisas são focos de atenção essenciais.
Essa característica dos estudos qualitativos de “capturar a perspectiva dos
participantes” convergiu totalmente para a natureza metacognitiva de nosso estudo.
Estivemos interessados no processo diagnóstico a partir do ponto de vista dos
sujeitos, e mais especificamente na sua capacidade de utili zar-se do conhecimento
metacognitivo para oferecer uma descrição detalhada de suas estratégias
diagnósticas. Os aspectos-chave atribuídos a cada estratégia tiveram como base de
discussão os sistemas de significados dos sujeitos estudados.
4. A análise de dados tende a seguir um processo indutivo. Atendendo à esta
característica, as abstrações tanto sobre o objeto de estudo, quanto dos resultados
obtidos foram consolidados a partir da análise e reflexão dos dados. Não estivemos
preocupados em definir a priori hipóteses que seriam comprovadas; não existiram,
portanto, respostas provisórias (conceito clássico para o termo hipótese1) ao
problema de estudo de identificar as estratégias diagnósticas; muito pelo contrário,
tivemos desde o início questionamentos norteadores que permitiram a condução da
investigação científica. Foi a indução qualitativa que orientou nossa coleta e análise
dos dados, tendo a metacognição como principal quadro referencial teórico.
1 Ver Salomon (1995) na obra Como fazer uma monografia.
122
Por quê estudantes do quinto período para compor o grupo de sujeitos?
Para começar a responder esse questionamento, colocaremos outro
que levantamos e chegamos a considerar no planejamento do estudo: os estudantes do
quarto período poderiam compor o rol de sujeitos do estudo, uma vez que nossa
preocupação é em especial da ordem metacognitiva e não do referencial diagnóstico
em si?
Não, foi a resposta que concluímos. Para chegar até ela, tivemos de
elaborar, antes das entrevistas individuais com os sujeitos, duas entrevistas em grupo
com alunos do quinto período, com propósitos de:
1. experimentar a validade da entrevista como técnica para coleta de
dados;
2. evidenciar algumas das estratégias diagnósticas;
3. testar o grau de conhecimento metacognitivo desses alunos, que
permitiria a descrição do processo diagnóstico.
Foi a interpretação e análise dos discursos que nos permitiu chegar à
resposta negativa, basicamente por conta de três fatores que apresentaremos a seguir.
O primeiro fator diz respeito ao conceito de diagnóstico que
compartilham os alunos de enfermagem até o quarto período. O termo diagnóstico de
enfermagem não comunica a esses alunos uma unidade de sua prática, ao contrário, as
ações estarão subordinadas a manifestações do diagnóstico médico ou à recomendação
docente. As falas de alguns estudantes apresentam claramente essa dimensão:
Na maioria das vezes nós estamos ali , nós aprendemos sobre aquela doença, nós sabemos todas as orientações que tem que dar pra’quela doença, e o nosso objetivo no campo de estágio é passar o que a gente sabe sobre aquela doença. Mas nunca foi passado pra gente que temos que chegar lá, ver qual o problema dele e fazer um possível diagnóstico. Isso nunca foi passado [...] mas nós mesmos procurar... ‘Ah, vamos diagnosticar, vamos ver. Vamos fazer uma coleta. Ela só tem isso, isso e isso’ . E no final: ’ Ih gente, eu acho que aquele cliente tem um prejuízo disso! Eu acho que tem falta daquilo!’ Nós não fazemos isso. (Claudia)
123
Pra gente o paciente já vem diagnosticado, então seu fulano tem isso,
tem déficit disso. Tem isso! Tem hipertensão. Então o que você faz para hipertensão? Quais são as medidas de higiene e terapêutica? Qual o tratamento? Isso você tem de saber. Tem de passar pra ele, porque é cobrado de você isso. (Alessandra)
O próprio professor já vai chegar pra você e dizer: ‘ seu cliente vai ter hipertensão, diabetes...’ é sempre isso, hipertensão e diabetes. ‘Aí vocês já sabem que têm de estudar isso, não sabem?’ Então se ele tiver outra coisa, nós não fomos preparados pra chegar lá e perceber outra coisa, a gente vai direcionado pra’quilo.(Claudia)
O que acontece é o seguinte: no primeiro, segundo, terceiro e quarto períodos você tem um instrumento de diagnóstico para preencher, então aquilo já vem pronto pra você. Preenche e aquilo ali é o seu diagnóstico de enfermagem [...] (Alessandra)
[...] é aquilo ali. Quando a gente chega no VI e VII , a gente vai ter que coletar os dados, fazer um diagnóstico, implementar, fazer o que a gente sabe, sendo que a gente nunca fez isto antes. Se a gente começasse a fazer este diagnóstico e implementar desde o primeiro período, as dúvidas que chegam agora e temos aqui, nós teríamos no primeiro. (Alessandra)
O segundo fator refere-se ao desconhecimento dos procedimentos de
elaboração do diagnóstico. Geralmente, os professores, antes do quinto período, não
instruem seus alunos nas práticas do processo diagnóstico, nem tão pouco abordam o
assunto nas aulas. Em outras palavras, não existem orientações claras de quais
elementos cognitivos estão envolvidos no processo diagnóstico de enfermagem. Ainda
que indesejável, essa realidade encontra-se em consonância lógica com o primeiro fator
apresentado. Ora, se não realizamos diagnóstico de enfermagem, como ensinaremos
diagnóstico de enfermagem? O discurso de uma entrevistada deixa isso transparecer:
[...] agora pra saber se o seu João tem lá hipertensão, o caminhozinho lá da roça, a gente não sabe. (Alessandra)
O último fator, e certamente o que mais influiu na exclusão dos
estudantes que não tivessem cursado ainda o PCI VII , foi a frágil consciência
metacognitiva sobre o processo diagnóstico. Vários entrevistados desconheciam que
seus processos de investigação e conclusões representassem o processo de diagnóstico
em enfermagem. Como afirmaram, desconheciam que seus achados, na verdade,
124
fossem um produto do raciocínio específico da profissão. Muitas das vezes não sabiam
como classificar o que encontravam. Faltava a eles o próprio conceito de diagnóstico
de enfermagem. Assim:
É o que a gente falou o tempo todo aqui: ‘gente aquilo é um diagnóstico!’ Nós não sabíamos que era um diagnóstico e aquilo era um diagnóstico. (Claudia)
Quando a gente chega no diagnóstico, a gente fala: ‘não acredito, é este o diagnóstico? Por que a gente pega, faz esta coleta toda, vai no prontuário, faz entrevista com todo mundo pra chegar àquele diagnóstico X, mas que diagnóstico é esse? E aí, quando você consegue chegar naquele diagnóstico: ‘Pô, mas será que é esse que é o diagnóstico?’ (Alan).
Eu fiz isso a vida toda e não sabia! [...] De repente, você até achou [o diagnóstico] e diz: ‘Ah, não é isso não!’ (Sandra).
E, às vezes, você até registra lá na sua evolução diagnóstico e nem sabe que você está diagnosticando algo. (Leandro)
Os fatores apresentados determinaram que somente os alunos que já
tivessem cursado o quinto período poderiam compor a amostra para o estudo.
Curiosamente, essa delimitação permitiu-nos classificar os estudantes dos períodos
anteriores, na instituição estudada, como pertencentes ao primeiro estágio (pré-clínico)
do desenvolvimento da memória para julgamentos clínicos e decisões, proposto por
Carnevali & Thomas (1993, p. 30-34). Para as autoras, o pré-clínico tem fraca
consciência do processo de julgamento clínico, sendo por vezes mal sucedido na
organização dos conceitos em categorias diagnósticas.
Por tudo considerado, acreditamos ter eleito os estudantes da
instituição pesquisada no mais precoce estágio de competência para a elaboração dos
diagnósticos de enfermagem, isto é, no quinto período do curso de graduação.
Ainda que seja no início da trajetória de formação profissional,
supomos que o momento é crucial para explorarmos a consciência metacognitiva
diagnóstica que começa a se construir. Achamos que o reconhecimento, tanto das
estratégias, quanto do conhecimento metacognitivo sobre elas, possa permitir que
125
futuramente docentes consigam auxiliar seus alunos na tarefa que se apresenta.
Como determinamos nosso ponto de saturação dos dados?
Sentimos a necessidade de fazer tal questionamento, para que se
torne mais fácil a compreensão metodológica do estudo.
O ponto de saturação foi tornando-se claro, assim que as metas a
serem atingidas com as entrevistas também foram alcançadas. No tocante a isso,
Bogdan & Biklen (1992, p. 64) afirmam:
[...] é claro, você sempre aprende mais por permanecer no estudo, mas o que acontece é que você atinge um ponto de diminuição do retorno. Este é o período em que você aprende uma quantidade decrescente, para o tempo que você despende. O truque é encontrar o ponto e parar.
No pólo metodológico, o nosso “truque” foi reconhecer que as
estratégias já se repetiam, e que os aspectos-chave delas investigados convergiam para
uma regularidade. Essa repetição claramente se confirmou na décima entrevista,
quando decidimos que já não havia vantagem substancial em prosseguir no trabalho de
campo.
Na questão do quantitativo dos entrevistados, também observamos
que outros estudos em diagnóstico utilizaram-se de um número de sujeitos próximo ao
nosso para construir suas análises. (Tanner et al., 1987; Watson, 1994; Hill &
Hannafin, 1997).
Já o critério teórico para determinar o ponto de saturação foi o fato
de termos percebido progressivamente, até a solidificação na décima entrevista, que o
conhecimento e experiência metacognitivos de nossos estudantes era amplo o
suficiente para auxiliar-nos a entender o processo diagnóstico de enfermagem.
Isso se torna particularmente relevante, na medida em que, ao início
126
da pesquisa, julgávamos ser muito reduzido o conhecimento metacognitivo dos
sujeitos. O que se deu pelo fato de as primeiras entrevistas serem feitas (e isso
percebemos depois) com alunos que se aproximavam do nosso próprio modelo de
raciocínio diagnóstico. Dessa maneira, a comparação inconsciente favorecia a
afirmativa do reduzido conhecimento metacognitivo.
No entanto, com o prosseguir das entrevistas, foi possível conversar
com alunos que apresentavam padrões de pensamentos diferentes do nosso. Essa
percepção só aflorou após longo período de incompreensão do discurso.
Progressivamente, entretanto, foi sendo possível perceber que, em
todos os casos, era o pesquisador que, projetando de forma inconsciente seus próprios
padrões, obscurecia a visão da realidade do discurso.
Assim, fomos capazes de perceber que, por um lado, naqueles em
que o padrão era similar ao nosso, o conhecimento metacognitivo não era tão reduzido
quanto havíamos suposto. Por outro lado, nas estudantes cujo padrão diferia de forma
importante, foi possível perceber a existência de diferenças em que antes havia a
sensação de inexistência.
Nesse momento, portanto, houve clareza na identificação da
diversidade dos padrões existentes. Estava, assim, superada a “ ilusão da
transparência” 2.
A entrevista é a técnica de coleta de dados mais adequada ao nosso estudo?
Para delinearmos a resposta, começaremos com uma definição para o
2 O risco da “ ilusão da transparência” é descrito por Bourdieu apud (Minayo, 1994, p.197) como o perigo da compreensão espontânea, como se o real se mostrasse claramente ao observador (pesquisador).
127
termo “entrevista” .
A entrevista é “uma conversa com propósitos, usualmente entre duas
pessoas (mas algumas vezes envolvendo mais), que é dirigida por alguém de modo a
obter informação” (Bogdan & Biklen, 1992, p. 135). Como aponta alguns autores,
entre eles Simon & Ericsson (apud Dominowski, 1998) e Escudero (1996), tanto a
entrevista como a técnica de protocolo verbal de “pensar alto” (think aloud) são
utili zadas para caracterizar o modo como especialistas e novatos resolvem um
problema.
Ericsson & Simon (apud Dominowski, 1998, p. 27) distinguem dois
tipos de relatos: o concorrente e o retrospectivo. O primeiro é realizado durante a
realização da tarefa. E o segundo após parte ou o todo de uma atividade estar
completado.
A entrevista pode ser considerada um relato retrospectivo,
utili zando-se das distinções de Ericsson & Simon (apud Dominowski, 1998, p.27)
sobre os tipos de verbalização.
Já o pensar alto refere-se a uma técnica de relato corrente, ou seja, o
sujeito fala alto sobre o que vem à sua mente, enquanto realiza determinada tarefa.
Segundo Simon & Ericsson (1980, 1993) ela distingue-se em três níveis:
• nível 1 − a vocalização do conteúdo verbal da memória de
trabalho3, envolvido na tarefa;
• nível 2 − também a vocalização do conteúdo da tarefa, mas o
conteúdo em si não está em uma forma verbalizável, e, sim,
3 A memória de trabalho, termo progressivamente empregado para substituir o “memória de curto prazo” , refere-se a um segmento responsável por reter, por curtos segundos, a informação a ser processada ou armazenada (15 a 20 segundos, se não houver repetição). Está a “meio caminho” entre as memórias sensória e de longo prazo, sendo responsável por processar os elementos advindos desses dois segmentos (Carnevali & Thomas, 1993, p. 15-34).
128
representado, por exemplo, por informações espaciais, visuais,
motoras que exigem um relato verbal, às vezes difícil de descrever;
• nível 3 − no qual a verbalização envolve mudanças no conteúdo
da memória, realização de inferências e processamento adicional
(Dominowski, 1998, p. 27-29).
Como uma técnica de relato corrente, o pensando alto é uma técnica
amplamente utili zada nos estudos de resolução de problemas, sob a corrente do
processamento da informação.
A partir da caracterização oferecida sobre o pensando alto, uma
pergunta pode surgir: Por que não utili zar o pensar alto para a coleta de dados,
optando-se pela entrevista?
A resposta está nos propósitos de cada técnica. Nossos propósitos de
estudo são diferentes daqueles traçados pelos processadores da informação (PI), o que
influencia na seleção do tipo de verbalização. A preocupação dos PI é selecionar um
relato que preserve uma descrição fidedigna do conteúdo da memória de trabalho,
exigindo uma verbalização enquanto a ação é desenvolvida, e para tal fim o pensando
alto é a técnica mais adequada.
Ao contrário, para nós, não existe a preocupação fundamental de
explorar o conteúdo da memória de trabalho. Existe, sim, a finalidade de reconhecer
parte do conhecimento estratégico4 específico sobre a tarefa de diagnosticar , que é
o conhecimento metacognitivo sobre si, sobre uma estratégia, ou tarefa que guia o uso
das estratégias diagnósticas (Carr & Biddlecomb, 1998, p. 72).
Na visão dos autores referidos que pertencem à escola do
processamento da informação, relatos verbais são manifestações do conteúdo da
4 O termo é utili zado, geralmente, como sinônimo de conhecimento procedimental.
129
memória de trabalho e, portanto, são capazes de permitir o entendimento de operações
mentais realizadas em uma determinada tarefa. Para eles, o relato retrospectivo, por ser
uma descrição feita após o fato ter ocorrido, possivelmente envolva uma mudança no
conteúdo da memória de trabalho. Portanto, isso pode gerar esquecimentos ou
memórias inventadas, reduzindo a precisão do pensamento envolvido na tarefa
(Dominowski, 1998, p. 27-28).
O que é uma limitação do relato retrospectivo para os processadores
da informação não foi para nós. Não altera nossa compreensão metacognitivista do
fenômeno do diagnóstico em que ocorram as mudanças no conteúdo da memória. Ao
contrário, tais mudanças são esperadas durante o processo de conscientização
metacognitiva e não representam, para nós, problemas metodológicos no estudo.
Quando direcionamos nossa atenção para o estudo dos aspectos-
chave das estratégias diagnósticas de um ponto de vista metacognitivo, estamos
também aceitando que não conduziremos nossa coleta para, exclusivamente, explorar
os processos mentais envolvidos na atividade. Certamente estaremos preocupados com
a descrição que os estudantes façam sobre as estratégias utilizadas em seu processo
diagnóstico. E, para isso, acreditamos que a técnica de entrevista foi um excelente
recurso de coleta de dados.
Por que entrevistas em grupo na primeira fase da coleta de dados?
O próprio entendimento das finalidades da entrevista em grupo traz a
resposta à questão colocada.
Sobre a técnica de entrevista em grupo Bogdan & Biklen (1992)
afirmam:
130
Entrevistas em grupo podem ser úteis para introduzir o pesquisador no mundo dos sujeitos. Nesta situação, um número de pessoas são colocadas juntas e encorajadas a falar sobre o assunto de interesse [...] Usualmente este é um bom modo de obter “ insights” sobre o que perseguir em uma entrevista individual. Quando refletindo junto em um mesmo tópico, os sujeitos podem, muitas vezes, estimular o outro a falar sobre tópicos que você pode explorar depois (p. 138).
De fato, as entrevistas em grupo permitiu-nos atender a necessidades
de determinaram os primeiros “ insights” sobre as estratégias diagnósticas utili zadas
pelos estudantes clínico-iniciantes. Foi por meio de uma livre estruturação da entrevista
e da densa troca das entrevistas em grupo que os sujeitos dessa primeira fase sentiram-
se à vontade para apresentar suas descrições sobre o processo diagnóstico.
Como Lüdke & André (1986, p. 33-34) afirmam, a entrevista
permeia um caráter de interação que outras técnicas; o questionário, por exemplo; não
consegue preservar. Entrevistar implica descompromisso com a relação hierárquica
entre o pesquisador e o pesquisado, o que nos serviu de maneira plenamente
satisfatória.
O que seria adequar o pesquisador à técnica de coleta de dados? Para que
fazê-lo?
Adequar-nos à técnica de entrevista foi de fato habituar-nos com a
tarefa de questionar em profundidade os estudantes e minimizar a dissimetria entre o
entrevistado e entrevistador (Minayo, 1994)
As entrevistas em grupo serviram excelentemente como treinamento,
uma vez que, graças a múltiplas opiniões emitidas pelos sujeitos (às vezes
simultaneamente), existiu uma inerente dificuldade em manter o controle do fluxo de
perguntas e respostas. Também permitiram-nos estabelecer uma maior cumplicidade
com as questões que povoavam o universo de significado dos sujeitos.
131
Após a escuta das gravações das duas entrevistas em grupo,
conseguimos desenvolver uma reflexão sobre nosso desempenho e dos sujeitos, sendo
possível proceder aos ajustes fundamentais que nos habilitaram para aplicar,
posteriormente, as individuais.
Para sedimentar o que já abordamos, selecionamos um trecho obtido
de Lüdke & André (1986, p. 36) que trata das competências necessárias ao
entrevistador científico:
Quase todos os autores, ao tratar da entrevista, acabam por reconhecer que ela ultrapassa os limites da técnica, dependendo em grande parte das qualidades e habil idades do entrevistador. É inegável que há qualidades específicas que denotam o entrevistador competente, tais como uma boa capacidade de comunicação verbal, aliada a uma boa dose de paciência para ouvir atentamente. Mas é inegável também que essas e outras qualificações do bom entrevistador podem ser desenvolvidas através do estudo e da prática, principalmente se esta partir da observação de outro entrevistador mais experiente, que possa inclusive funcionar como supervisor da prática do iniciante. Não há receitas infalíveis a serem seguidas, mas sim cuidados a serem observados e que, aliados à inventiva honesta e atenta do condutor, levarão a uma boa entrevista.
Como os autores abordam, existem habilidades que o entrevistador
deve possuir, a fim de garantir o sucesso da técnica de coleta. E tais “habili dades”
foram satisfatoriamente alcançadas e potencialmente aumentadas pela discussão com
um “ supervisor da prática do iniciante” , que, em nosso caso, foi o professor
orientador desta pesquisa.
Como as entrevistas individuais atenderam a um perfil analítico?
Verdadeiramente esse aspecto só pôde ser atingido, uma vez que nos
mantivemos dentro da focalização do objeto que desejávamos investigar.
Para Lüdke e André (1986, p.46-48), citando Bogdan & Biklen
(1982), existem estratégias que facilitam ao pesquisador manter-se afastado do risco de
132
terminar a coleta com um amontoado de informações difusas e irrelevantes (p.46).
Além da focalização já discutida, os autores acima citados, sugerem
que uma “formulação de questões analíticas” seja conduzida para potencializar o
processo de coleta. Assim apresentam a questão:
É conveniente que no processo de delimitação progressiva do foco principal de investigação sejam também formuladas algumas questões ou proposições específicas, em torno das quais a atividade de coleta possa ser sistematizada. Além de favorecer a análise, essas questões possibil itam a articulação entre os pressupostos teóricos do estudo e os dados da realidade. (Lüdke & André , 1986, p.46)
No estudo, as “ questões ou proposições específicas” que
despontaram como perguntas analíticas foram as que investigavam as informações
surgidas pela abordagem dos aspectos-chave das estratégias diagnósticas. Isso quer
dizer que elas foram representadas pelos questionamentos adicionais dirigidos aos
sujeitos, durante as entrevistas individuais semi-estruturadas, e que buscaram explorar
os cinco aspectos-chave que cada estratégia apontada guardava em si.
Por exemplo, uma vez definido que uma das estratégias foi a consulta
ao professor, formulamos durante o curso da entrevista, entre outras, as seguintes
questões: “ O que é perguntar ao professor? Para que você pergunta ao professor, em
se tratando de diagnóstico? Como é seu processo de consultar o professor? Quando
ou em que circunstâncias você pergunta ao professor? Você já parou para avaliar se
perguntar ao professor trazia resultados, te levando ao diagnóstico? Qual estratégia
você utilizava para avaliar se o questionar o professor te levava ao diagnóstico?”
Todos os exemplos de questionamentos acima colocados trataram
dos aspectos-chave que são fundamentais para o processo analítico e discussão dos
resultados obtidos pelo estudo.
Um outro recurso de sistematização da coleta apontado por Lüdke &
André (1986) que utilizamos foi o “aprofundamento da revisão da literatura”. Os
133
autores assim apresentam as vantagens desse recurso:
Relacionar as descobertas feitas durante o estudo com o que já existe na literatura é fundamental para que se possam tomar decisões mais seguras sobre as direções em que vale a pena concentrar o esforço e as atenções (p. 47).
Dadas as características do tipo de análise eleita para o estudo (uma
adaptação da indução analítica modificada)5, tornou-se quase que uma exigência
recorrermos constantemente ao referencial teórico, especialmente metacognitivo e
sobre o processamento da informação (P.I.), durante a fase de coleta de dados.
É seguro afirmar, por exemplo, que foi esse aprofundamento no P.I.
e metacognição que permitiu-nos compreender o agrupamento da informação e a
formação dos esquemas mentais (Sierra & Carretero, 1996; Hacker et al., 1998),
que surgiram nas falas de alguns sujeitos com designações de “relacionar as
informações” e “ montar o quebra-cabeça” .
Foi também no aprofundamento da literatura que nosso objeto de
estudo foi se aproximando cada vez mais da metacognição, na compreensão dos
significados das estratégias e do processamento da informação no entendimento dos
elementos constituintes do processo diagnóstico.
As preocupações metodológicas de que tratamos nos parágrafos
anteriores, ao nosso ver, permitiram garantir que as entrevistas individuais atendessem
a um perfil analítico, bem como facilitaram a condução à fase de análise após o fim da
coleta de dados.
5 Na indução analítica modificada o referencial teórico auxili a na redefinição e modificação dos preceitos teóricos, a partir do encontro de novos casos do fenômeno (Bogdan & Biklen, 1992).
4.2 −− Dos resultados −− “ A noção do todo ”
Nesta seção, discutiremos aspectos que emergiram dos resultados.
Neste estudo, a “noção do todo” refere-se às percepções mais amplas sobre as
estratégias diagnósticas que despontaram da análise e discussão do conjunto dos
aspectos-chave investigados
Tratar os dados nessa perspectiva foi uma necessidade percebida pelo
autor durante o processo de análise. Sendo minucioso tal processo, corria-se o risco
de, ao enfatizar-se a parte, perder-se a noção do todo. Por isso, a análise é discutida de
forma mais abrangente. Argumento adicional é o de coibir as redundâncias inevitáveis
quando se apresentam estratégias diferentes, mas oriundas da mesma fonte.
Assim buscamos uma discussão mais totalizante, nas três
subcategorias que se seguem. Elas fazem menção direta aos três momentos de
aplicação das estratégias diagnósticas: pré-encontro, encontro, e pós-encontro.
Nelas, são discutidos tanto os aspectos cruciais da totalidade dos dados, quanto as
colaborações metacognitivistas das estratégias diagnósticas de enfermagem.
4.2.1 −− Considerações sobre as estratégias usadas antes do encontro
Procederemos nessa subcategoria à discussão de aspectos que
consideramos relevantes na compreensão do papel das estratégias diagnósticas de ouvir
a passagem de plantão e de leitura do prontuário.
Inicialmente, discutiremos um achado que ficou patente em relação
às finalidades das referidas estratégias. Estas compartilhavam um propósito comum de
oferecer o que foi denominado de “ idéia geral do paciente” , que se apresentou,
explicitamente, nos seguintes trechos das entrevistas:
135
Eu, na passagem de plantão, eu ficava observando os que os pacientes tinham [...]. (Ana)
[...] aí eu vou e procuro algumas informações no prontuário... Porque dá pra gente ter uma idéia geral... (Marília)
Assistir à passagem de plantão e fazer a leitura dos registros clínicos
em prontuário permitia aos estudantes obterem um quadro amplo com o que iriam
defrontar-se durante o encontro com os clientes.
Essas duas estratégias diagnósticas aparecem na literatura como
elementos do raciocínio diagnóstico em enfermagem. Para Carnevali & Thomas (1993,
p. 46-50), o material escrito (que inclui os registros em prontuário) e o relato da
passagem de plantão facili tam a focalização da coleta de dados durante o encontro,
mantendo o diagnosticador dentro da capacidade de sua memória de trabalho.
Contudo, as autoras referenciadas não levantam claramente que as
estratégias diagnósticas apresentadas possam oferecer uma representação geral do
quadro a ser detectado no encontro. Isso talvez se explique pela diferença entre os
níveis de proficiência na tarefa diagnóstica.
Ao passo que trabalhamos com novatos, Carnevali & Thomas (1993)
constróem seu modelo de raciocínio diagnóstico com as contribuições de autores que
estudaram diferentes níveis de experiência no uso do diagnóstico (de enfermagem e
médico).
Apesar de estudarmos novatos em diagnóstico, não nos parece
conveniente desprezar as finalidades que determinaram para uma estratégia. E, em se
tratando do propósito de oferecer uma “ idéia geral” que encontramos para as duas
estratégias, isso é um aspecto a ser cuidadosamente explorado.
Para explorar a discussão das finalidades das estratégias de pré-
encontro, evidenciadas no estudo, utilizaremos elementos baseados na teoria dos
136
esquemas mentais.
Sierra & Carretero (1996, p. 125-137) referem-se aos esquemas
mentais como modelos do mundo exterior, que reproduzem o conhecimento que
temos e organizam a informação na memória de longo prazo. Esse conhecimento é
adquirido mediante a experiência passada com conceitos, ações, situações, fatos, entre
outros.
Utilizando-se da contribuição de Rumelhart e Brewer & Nakamura,
Sierra & Carretero (1996, p. 126) destacam características inerentes aos esquemas.
Delas, apresentaremos uma que acreditamos facilitar a discussão de nossos achados.
Os referidos autores afirmam que “nos esquemas está representado o conhecimento
semântico e o conhecimento episódico1 procedentes, das experiências individuais e
concretas”. O que supomos é que nossos alunos, ao acessarem as informações por
meio da aplicação das estratégias de pré-encontro, buscam, nas situações de seus
clientes, acesso aos esquemas prévios que armazenaram na memória de longo prazo.
Esquemas que incluem tanto o conhecimento semântico sobre as situações clínicas dos
clientes, quanto o conhecimento episódico.
Ainda que não seja possível afirmar, com certeza, de que modo
ocorre esse acesso aos esquemas por parte dos nossos estudantes, podemos fazer
inferências a partir das contribuições de outros estudos produzidos.
Para Sierra & Carretero (1996, p. 130), a função dos esquemas nos
processos de memória tem lugar, sobretudo, na fase de codificação2 da informação.
1 O conhecimento semântico refere-se àquele armazenado na primeira subcategoria da memória de longo prazo: a memória semântica (Tulving apud Carnevali & Thomas, 1993, p. 23). Esse conhecimento refere-se aos conceitos aprendidos. Já o conhecimento episódico permanece armazenado na segunda subcategoria da memória de longo prazo: a memória episódica. Refere-se aos vários eventos experimentados na vida do indivíduo, sendo, portanto, uma memória vivencial. (Ver página 159)
2 Segundo Carnevali & Thomas (1993, p. 18), a “codificação é um termo utili zado por cientistas
137
Isso quer dizer que os esquemas influenciam em que tipo de dados serão selecionados,
abstraídos, interpretados e integrados, de modo a constituir novos esquemas ou
modificar os anteriores. Desse modo, algumas informações ricas em significados são
processadas, “enquanto que as formas ‘superficiais’ são perdidas ou esquecidas”.
Taylor (1997, p. 332) encontrou indícios que estudantes, então
classificados como novatos, não foram hábeis em interagir durante a passagem de
plantão. Atribuiu essa característica ao limitado aprendizado experiencial, que
determinava o precário reconhecimento de achados clínicos fundamentais à resolução
do problema.
De tais contribuições, podemos propor que, ao encontrarmos nos
estudantes a noção da busca pela “ idéia geral” , na verdade, estamos detectando uma
atividade, provavelmente inconsciente, de estruturação de esquemas mentais sobre a
situação dos clientes, mas que ainda sofre limitação, dados os reduzidos graus de
conhecimento semântico e episódico. E são, provavelmente, esses conhecimentos e as
metas a serem atingidas pela aplicação das estratégias de pré-encontro que influenciam
as informações obtidas por elas.
Subsidiando nossa compreensão, Carr & Biddlecomb (1998, p. 74-
75) afirmam que a ativação de um esquema depende tanto da informação, quanto das
metas que os sujeitos tenham em um determinado momento.
Acreditamos que, em relação ao aproveitamento das informações, os
conhecimentos prévios dos aprendizes interfiram de modo a determinar quais
informações da passagem de plantão ou do prontuário devam ser levadas em
consideração para a coleta e processamento no encontro e pós-encontro.
cognitivos para descrever a transformação dos estímulos recebidos em informação mental, que então ficará disponível para mais refinamento e mais processamento mental” .
138
O conhecimento semântico, formado pelos conceitos teóricos
aprendidos ao longo do curso de graduação que permanecem armazenados na memória
de longo prazo, representa a principal fonte de esquemas para esses clínicos iniciantes.
Nisso, Carnevali & Thomas (1993, p. 32) afirmam que:
No domínio da enfermagem estas ligações [entre informação clínica e conhecimento teórico] envolvem o conhecimento de estruturas normais relacionadas à idade e à fisiologia, patofisiologia, respostas humanas à saúde e à doença, à natureza do tratamento médico, ao conhecimento sobre fatores ambientais, psicossocial e outros.
Por outro lado, dadas suas reduzidas experiências com situações
clínicas, os novatos, provavelmente, dispõem de poucos esquemas na subcategoria do
conhecimento episódico. Os esquemas armazenados na memória dos novatos podem
ainda ser muito amplos, carecendo da riqueza de relações observadas nos dos
enfermeiros experientes.
Considerando tais características, é conveniente esperar de nossos
aprendizes (típicos novatos no raciocínio diagnóstico) a seleção de um número menor
de informações significativas do que faria um experiente profissional. Além disso, suas
operações mentais de seleção, abstrações, interpretações e integrações de dados nos
esquemas deverão ser, predominantemente, determinadas pelo conhecimento teórico
(semântico).
Como conseqüência da estrutura cognitiva diagnóstica, os novatos
obtêm, no pré-encontro, um quadro amplo sobre a situação do cliente, ou como
chamam “uma idéia geral” .
Já em relação à influência que as metas podem ter sobre os
esquemas, Carr & Biddlecomb (1998, p. 75) concordam que uma meta pode modificar
o resultado esperado de uma atividade.
No caso dos estudantes de enfermagem investigados, a
139
predominância era construir uma “ idéia geral” que pudesse ser lapidada pelo uso de
outras estratégias diagnósticas. Essa meta pareceu estar em coerência com o nível de
proficiência diagnóstica dos sujeitos.
Todavia, ao contrário do que possa pensar, pelo menos uma
vantagem é tirada da idéia ampla. Acreditamos que, ao buscá-la, os aprendizes,
conseqüentemente, descartam uma busca por excessivos detalhes que poderiam
prejudicar o raciocínio. Como levantado por autores que estudaram a tomada de
decisão em enfermagem (Benner & Tanner, 1987; Holden & Klinger, 1988), os
novatos caracterizam-se por utilizar-se de um número maior de dados para estabelecer
suas conclusões, o que muitas vezes acaba criando um elevado esforço cognitivo,
incrementando o risco de erros na tarefa.
Desse modo, nossos sujeitos estão obtendo um ganho pela aplicação
das estratégias de pré-encontro (ainda que não conscientemente percebido). Nesse
caso, menos detalhes são procurados na fase inicial, que é mais difusa (pré-encontro),
reservando-se um possível refinamento na coleta para a fase mais analítica (durante o
encontro).
O por quê dessa conduta de procura por uma “idéia geral” também é
um interessante objeto de discussão. Propomos alguns motivos que supomos explicar a
aceitação de um quadro amplo, ou um quase rascunho da situação, por parte dos
sujeitos estudados.
O primeiro motivo, certamente, tem relação com o já discutido nível
de conhecimento semântico e experimental dos estudantes e com as metas traçadas.
O segundo provável motivo é inerente ao valor que alguns sujeitos
conferem à estratégia (o que deve influenciar a determinação da meta). Certos
entrevistados colocaram elementos limitadores para as estratégias de pré-encontro que
140
não conferiram à maioria das outras.
Os fatores limitadores à aplicação das estratégias de pré-encontro
foram mais intensamente apontados para a passagem de plantão. Afirmaram, por
exemplo, que nem sempre as informações prestadas pelos profissionais na passagem
eram fidedignas. Isso poderia dar aos aprendizes falsas percepções que dificultariam o
processo diagnóstico. Sendo assim, era como que filtrassem as informações. Achamos
oportuno separar uma fala em que essa percepção está em destaque.
Eu acho que a passagem de plantão é importante, mas você não deve levar em consideração tudo o que se fala na passagem de plantão. Porque, às vezes, as pessoas, por má vontade ou por indiferença aos pacientes, elas podem omitir informações, ou então não querer dizer: ‘ Ah, o paciente passou mal ou não’ . Ou ela nem se deu ao trabalho de ver se o paciente estava bem ou não e ‘chutou’ . (Érica)
Outro possível motivo pode referir-se a uma dificuldade em recordar-
se de informações verbalizadas na troca de plantão. Em relação à essa questão, Taylor
(1997, p. 332) detectou que os novatos e intermediários possuem uma limitada
capacidade de lembrar dos relatos feitos na passagem de plantão. Dada essa
deficiência, preferem utilizar-se mais dos registros escritos na forma de notas narrativas
e registros pessoais.
Uma das entrevistadas aponta as notas pessoais como um recurso
facilitador da recordação da informação, preservar, assim, as informações importantes
que deverão ser processadas para permitir a conclusão diagnóstica. Afirmou:
Tipo assim: eu anotava na passagem de plantão que o paciente tinha isso, isso e isso [grifo nosso]. [...].Porque, se fosse guardar tudo mentalmente, naquele stress eu não iria lembrar, e ia acabar que alguma coisa ia passar, e, por mais que anote, pela falta de experiência da prática, acaba passando mesmo, tem algumas coisas que não acaba anotando. (Ana)
Já em relação à maior preferência dos novatos pelos registros em
prontuário, supomos que isso possa ser atribuído primeiramente a um motivo óbvio: a
informação escrita torna-se um estímulo retido. De fato, um estímulo das memórias
141
sensorial e de trabalho é perdido em questão de segundos3, e, para a retenção
acontecer, algum tipo de processamento é necessário. Contudo, no caso da informação
escrita, o estímulo permanece e novos acessos podem ser feitos, voltando a ativar a
informação. Nessa situação, o indivíduo possui um tempo maior para, de um modo
mais calmo, poder trabalhar com os dados que tenham relação com seus esquemas
mentais.
O registro escrito auxilia os novatos a minimizar uma limitação
imposta pelos relatos verbais dos profissionais, a questão da linguagem. Como
presenciamos em nossa prática clínica, a comunicação verbal dos profissionais de
enfermagem é rica de uma terminologia (técnica e particular) que determina uma
linguagem que os novatos ainda não dominam. Então, nos parece coerente supor que
muito do que é falado pode parecer sem sentido, sendo facilmente perdido nos
processos mentais. É claro que os estudantes sempre possuem o recurso de perguntar
aos profissionais o que querem de fato dizer, mas essa não parece ser a prática.
Por outro lado, um dado escrito, mesmo que incompreendido, pode
ser questionado ao professor ou descoberto junto a outro colega, só para exemplificar.
Essa característica parece ser motivo de sobra para justificar a maior preferência pelo
material escrito.
Como segundo motivo, por ser um dado de segunda pessoa, os
registros já demonstram uma estruturação das informações que foi conseqüência de um
processamento por parte do indivíduo que registrou. Desse modo, o novato minimiza
seu esforço cognitivo em buscar compreender informações colocadas de modo mais
3 Na memória sensorial (porção do cérebro que recebe os estímulos de ambientes externos e internos, por meio dos sentidos), o estímulo visual se perde automaticamente ou permanece por meio segundo, ao passo que os sons da fala retém-se por 2 a 3 segundos. Já na memória de trabalho (que recebe os estímulos mentais), a informação permanece por 15 a 20 segundos, sem processamento (Carnevali & Thomas, 1993, 15-18).
142
caótico. Os registros clínicos costumam apresentar uma ordenação sobre os dados
obtidos na coleta e no processamento.
Um registro escrito lembra mais um mapa, que facilitaria ao aprendiz
caminhar de modo mais tranqüilo na procura pelo entendimento da situação a ser
encarada no encontro. Apesar de esse “mapa” ser desprovido de um detalhamento de
informações clínicas necessárias ao diagnóstico de enfermagem, ainda é melhor do que
relatos pouco ordenados.
A despeito da validade dos registros, para os novatos, eles são de
valor secundário quando comparados à fonte primária que, no caso dos relatos, é o
próprio cliente. Isso nem tanto pela possibili dade da presença de dados incorretos, mas,
provavelmente pelo peso relativo que o encontro com o cliente representa para os
estudantes de enfermagem. Ilustraremos com a fala seguinte:
Tipo: é que nem olhar o prontuário, às vezes, eu olhei e achei que não teve grandes... às vezes, o contato com o paciente é melhor, me responde mais. Às vezes, as informações não estão completas no prontuário, mas tem situações que se encaixa. “Pô, valeu a pena olhar o prontuário’ . (Marília)
No estudo desenvolvido por Lamond et al. (1996) com 114
enfermeiras inglesas sobre as fontes de informação usadas para a tomada de decisão
(incluídas as diagnósticas), os autores determinaram que as informações escritas foram
utili zadas em menor freqüência que as verbais, observação e conhecimento prévio. No
estudo, as notas de enfermagem e notas médicas representaram valores próximos de
4% do total das fontes utili zadas, ao passo que os relatos dos clientes representaram
mais de 18 % das fontes. Os referidos autores não apresentam os possíveis motivos
para essa preferência, contudo podemos propor algumas explicações para nossos
achados com os aprendizes.
Para justificar a preferência pelo relato do cliente, voltamos à questão
da linguagem. No caso do registro clínico, a linguagem é rica em terminologia técnica,
143
assim como os relatos verbais da passagem de plantão. Mas como visto, a informação
escrita facili ta, ao novato, a retirada de dúvidas e uma compreensão mais cuidadosa,
quando comparada com a efêmera verbalização profissional. Contudo, anotações em
prontuário são complexas, comparadas com a linguagem da maioria dos clientes.
Na maioria dos casos, a linguagem do cliente é leiga, sob o ponto de
vista clínico. Clientes costumam a referir a si mesmos como a maioria das pessoas
fazem na “fala pública”. Os termos técnicos podem até pontuar o discurso, mas não
chegam a predominar. Supomos então que o novato compreenda mais facilmente o que
se fala, isto é, uma comunicação mais efetiva se estabelece. Somemos a isso, a
possibili dade de questionar ao cliente, em caso de dúvida, sobre o significado de sua
fala, o que nem sempre é fácil de fazer quando se lê um prontuário ou quando se
observa (no caso dos entrevistados o processo é simplesmente o de observação não
participante) a passagem de plantão.
Outro desdobramento da questão diz respeito à predominância, no
prontuário, da linguagem médica. Acreditamos que os registros lá contidos nem
sempre ofereçam aos novatos de enfermagem, as informações necessárias para a
elaboração do diagnóstico de enfermagem. Em virtude das particularidades de cada
uma das profissões, nem sempre um registro médico supre a necessidade de
informação do enfermeiro, e vice-versa.
O que sabemos é que, normalmente, não existem na documentação
médica diversos elementos necessários ao diagnóstico de enfermagem, como, por
exemplo, as características definidoras e os fatores etiológicos. E essa ausência pode
tornar o prontuário menos importante, quando comparado ao contato com o cliente.
Além da questão da “idéia geral” que predominou em vários
momentos da entrevista, as estratégias de pré-encontro podem colaborar de outro
144
modo no diagnóstico durante o encontro. Contribuições também podem ser oferecidas
por meio de dois processos: focalização na obtenção de dados específicos por meio
da coleta (passagem de plantão) e detecção das alterações evolutivas que facilitam a
avaliação (leitura do prontuário).
No que se refere à focalização da coleta, a passagem de plantão
pode evidenciar dados específicos que serão investigados com maior afinco durante o
encontro. Detectamos esse elemento em destaque na seguinte fala:
Era, porque, por exemplo, de repente, o paciente não dormiu numa noite e teve febre. Ao chegar na enfermaria, eu perguntava se ele tinha dormido naquele período após a enfermeira ter passado, e ia verificar a temperatura pra ver se aquela febre estava se mantendo ou tinha passado. (Ana)
Carnevali & Thomas (1993, p. 47-49) atribuem aos relatos verbais as
características de direcionar a atenção, facilitando a seleção das áreas que serão
investigadas e descartando as informações que não possuem importância na situação.
Para elas, essa atividade reduz o esforço cognitivo e aumenta a efetividade da
observação e processamento da informação.
Para a leitura dos registros em prontuário, a percepção das
alterações evolutivas tiveram maior valor:
[...] pra me definir se aquele problema está evoluindo, ou se está estável ou não [...] O comprometimento; como ele está evoluindo; se não está evoluindo, essas coisas. (Marília)
A fala acima é uma das que se refere à leitura do prontuário como
capaz de oferecer aos alunos a possibilidade de perceber as mudanças em certos
aspectos do quadro do seu cliente.
No tocante a isso, os sujeitos consultavam o prontuário como um
elemento mais dinâmico da informação clínica. Daí poderiam destacar o status atual de
problemas, dados ou diagnósticos que seriam investigados mais a fundo no encontro e
processados durante ou após.
145
O interesse pelos dados evolutivos talvez explique a preferência que
os alunos tinham pelos dados mais recentes. Como uma delas afirma:
Por exemplo, até há cinco anos atrás o paciente estava se sentindo assim, tava assado... Acho que isto não é importante! Ou então voltar tantos anos atrás. O importante é o há dias, há uma semana atrás, duas semanas atrás...(Bianca)
4.2.1.1 − Como os conhecimentos sobre a aprendizagem melhoram o
aproveitamento das estratégias de pré-encontro?
A primeira colaboração a ser prestada pela metacognição diz respeito
ao aproveitamento melhor dos dados clínicos por parte dos alunos, por intermédio do
esclarecimento das metas que os estudantes desejam atingir pela aplicação das
estratégias.
Ao discutirem com os estudantes acerca de suas metas traçadas para
a passagem do plantão, os professores de enfermagem podem auxiliar seus alunos a
verem o evento com um olhar menos administrativo e mais como um momento
adequado à obtenção de importantes informações sobre o estado de um cliente. Essa
tomada de consciência, com a conseqüente apresentação da passagem como uma
estratégia diagnóstica, possivelmente pode cooperar na modificação das metas e,
inclusive, as expectativas dos estudantes em relação ao conhecimento clínico que
obterão a partir desse novo ponto de vista.
Carr & Biddlecomb (1998, p. 75) afirmam que a consciência pode
auxiliar em mudanças na aplicação da criatividade sobre os esquemas mentais. Desse
modo, os dados obtidos por meio de uma participação mais ativa na troca do plantão
permitirá a construção e reconstrução dos esquemas mentais diagnósticos.
A consciência sobre a questão da “ idéia geral” que geralmente
existe na cabeça dos novatos pode ser discutida com os eles, cabendo ao docente
146
diferenciar esse conceito do de “ uma idéia pouco necessária” . O que deve estar claro
para o aprendiz é que a “ idéia geral” pode facilitar a estruturação das informações
específicas, assim como, ao vermos um quebra-cabeça montado, nos facilita montá-lo
em seguida.
Beitz (1996, p. 27) propõe que os docentes de enfermagem
incorporem ao ensino algumas estratégias metacognitivas para facilitar a aprendizagem
clínica. Uma delas é a identificação da organização das idéias, isto é, uma
explicitação de como as atividades estão organizadas em se tratando de idéias, por
meio de um “grande quadro” . Nesses termos, os professores podem utilizar-se de uma
ampla explanação (com objetivos ou questões cuidadosamente selecionadas) sobre o
estado dos clientes antes que os alunos tenham com eles o encontro. Ou ainda, podem
visitar alguns clientes acompanhados dos alunos (o que se assemelha a clássica “visita
médica”), fazendo uma breve apresentação da situação clínica de interesse diagnóstico
para a enfermagem, como se fosse num “grande quadro” .
As estratégias apresentadas no parágrafo anterior também podem ser
utili zadas pelo aprendiz em separado, ou ainda, em pequenos grupos de aprendizes. A
nosso ver, a aprendizagem em grupo deverá ser mais efetiva, na medida em que se
procederão trocas de conceitos e significados entre os estudantes. De certo modo, um
processo de ensino-aprendizagem ocorre nesse compartilhamento de conhecimentos e
experiências.
Nossa afirmativa para a aprendizagem com a participação docente e
em grupo encontra ressonância também nos conceitos de Vygotsky. Interpretando esse
teorista da educação, Beitz (1996, p. 25) afirma que “todos os processos de
aprendizagem são inicialmente sociais” . Portanto, a autora defende que outros
indivíduos (professores, por exemplo) “ podem facilitar e promover processos
147
metacognitivos por ensinar aprendizes a planejar e monitorar seu próprio
entendimento” .
Outro ponto crítico, já levantado anteriormente, diz respeito à
limitação dos novatos em relação ao domínio da linguagem profissional, comum nos
relatos verbais da passagem de plantão. Para esse problema, os professores podem
utili zar recursos de aprendizagem criativos que facilitem o acesso dos estudantes ao
linguajar dos profissionais de enfermagem. Um desses recursos pode ser a gravação de
passagem de plantões em fitas magnéticas, que serão reproduzidas e “traduzidas” em
sala de aula. A análise do discurso e do seu conteúdo oferecerá aos estudantes e
docentes várias possibilidades de aprendizagem, como, por exemplo, de aspectos
clínicos, éticos, sociais, e culturais contidos no linguajar profissional.
Esse material gravado, quando transcrito, pode ainda ser utilizado
para o treinamento de algumas estratégias que facilitem o maior aproveitamento das
informações verbalizadas. Estratégias de aprendizagem do tipo relacionadas com
metas4 podem auxiliar bastante (Lopes da Silva & Sá, 1993, p. 20).
Uma adaptação ao contexto clínico de enfermagem das estruturas
de nível superior propostas por Meyer (apud Pozo, 1996, p. 193-195) pode ser outra
estratégia a facilitar análises de materiais escritos. Os estudantes podem submeter o
material textual à identificação organizada das cinco estruturas de nível superior
(transcritos da passagem de plantão, por exemplo). Abaixo, destacamos as estruturas
de Meyer e contextualizamos para o domínio do diagnóstico de enfermagem:
• covariação, isto é, a relação entre o antecedente e o
4 Lopes da Silva & Sá (1993, p. 20) distinguem três tipos de estratégias de aprendizagem: estratégias específicas à tarefa, estratégias relacionadas com metas e estratégias gerais. As estratégias relacionadas com metas são procedimentos que podem ser usados em diferentes domínios para atingir uma determinada meta, como, por exemplo, a identificação das idéias principais em um texto escrito.
148
conseqüente. Por exemplo, a relação existente entre um fator
etiológico e a manifestação de um problema por ele gerado;
• comparação, isto é, as semelhanças e diferenças entre duas ou
mais idéias ou elementos. Por exemplo, a comparação entre
incontinência urinária e retenção, a partir da perspectiva
neurosensorial;
• coleção, isto é, a percepção do agrupamento entre várias idéias
ou elementos, ou que possuem a propriedade da formar uma
seqüência no tempo ou no espaço. Como exemplo, o estudante
destaca das falas que a taquicardia e dilatação pupilar estão
agrupadas, e percebe-as como elementos da coleção denominada de
reação adrenérgica;
• descrição, isto é, uma afirmação geral com apoio em detalhes ou
atributos, explicações ou contextos. Por exemplo, reconhece uma
fala da enfermeira explicando detalhadamente como avaliou a
extensão de uma úlcera de decúbito;
• resposta, isto é, são as perguntas e respostas, o problema e
solução, ou comentário e réplica. Como exemplo, o estudante
percebe no material escrito o trecho que o enfermeiro questiona ao
auxiliar a coloração da urina e ele responde com uma classificação de
normalidade.
Ainda em relação à passagem de plantão, os estudantes devem ser
motivados a participarem mediante perguntas, buscando de modo ativo a informação
desejada. Um melhor resultado pode ser obtido, provavelmente, se ele já tiver
previamente com algumas perguntas em mente na hora da troca do plantão. Para isso,
149
uma estratégia que nos parece dar resultado é proceder a uma visita anterior aos leitos
de alguns clientes que deseja cuidar e buscar então evidenciar elementos que depois
possam ser questionados aos profissionais. Nesse caso a pergunta faz um papel de
objetivo, sendo capaz de determinar a seleção da informação a ser retida na memória.
Em se tratando de estratégias capazes de promover a elaboração e
memorização da informação, temos a anotação pessoal. Ela pode ser um excelente
recurso para otimizar os processos de memória, evitando que informações importantes
sejam perdidas; além disso, facilitam a detecção dos referenciais e significados comuns,
aos itens que devem ser aprendidos (Pozo, 1996, p. 187).
Por exemplo, os estudantes podem ser instruídos quanto à tomada de
notas pessoais dos dados verbalizados na troca de plantão. Contudo, o docente deve
trabalhar com os alunos a necessidade de traçarem propósitos claros para os registros,
tanto em relação às informações a serem documentadas, quanto ao uso que delas será
feito (as estratégias acima colocadas facili tam a construção desses objetivos
específicos).
O mapa conceitual de Novak é um recurso potencializador da
construção dos esquemas mentais necessários ao aproveitamento dos dados da
passagem de plantão. Como propuseram Novak & Gowin (1988 apud Ontoria et al.,
1994, p. 27), “um mapa conceitual é um recurso esquemático para representar um
conjunto de significados conceituais incluídos numa estrutura de proposições” .
Mapas conceituais podem, por exemplo, ajudar os aprendizes na
organização das informações verbais recebidas, por intermédio de um método que tem
como características a hierarquização, a seleção e o impacto visual5.
5 Para maiores detalhes sobre hierarquização, seleção e impacto visual nos mapas conceituais ver Ontoria et al. (1994, p. 31-32).
150
Em relação à leitura dos registros em prontuário, a metacognição
pode trazer, também, ganhos reais aos aprendizes, seja por meio da auto-apreciação ou
do conhecimento estratégico que coopera com os estudantes na percepção do que
selecionar para a leitura clínica, para que ler, como e em quais circunstâncias fazê-la.
Mediante a auto-apreciação metacognitiva levantada por Paris &
Winograd (apud Hacker, 1998, p. 10-11), o aprendiz torna-se capaz de reconhecer
suas habili dades na execução da leitura, maximizando os ganhos com a aplicação da
técnica. Para isso é necessário reconhecer sua competência geral como leitor, o que
muito provavelmente determinará um melhor domínio da técnica de leitura dos textos
clínicos, com a conseqüente melhora na tarefa diagnóstica.
A auto-apreciação, por representar uma reflexão pessoal sobre as
habilidades e conhecimentos, pode permitir ao estudante se classificar como um bom
leitor ou não6. Como afirma Salomon (1994, p. 38): “mas para se atingir este objetivo
[leitura proveitosa] é preciso que o interessado comece a medir suas possibili dades:
que espécie de leitor é, quais as suas condições e seu poder de decisão em desenvolver
habilidades, através de treinamento” .
Dominar sob o ponto de vista cognitivo a técnica de leitura, ajuda em
muito. Porém, carece que seja conseguido também a competência metacognitiva,
envolvendo o conhecimento estratégico. Como afirmam Carr & Biddlecomb (1998, p.
71) em relação ao conhecimento estratégico, “as pesquisas examinando a relação entre
conhecimento metacognitivo e sucesso indicam que crianças que são conscientes do
para quê, quando e como as estratégias devam ser usadas são mais hábeis a usar
tais estratégias com sucesso” [grifos nossos].
Os mesmos autores supracitados, referindo-se a outras fases da vida
6 Sobre as características de bons e maus leitores, ver Salomon (1994, p. 39).
151
além da infância, reconhecem que tal conhecimento guia o uso das estratégias,
permitindo aos estudantes que dele façam uso obterem melhores resultados na
aplicação, quando comparados aos que não têm tal conhecimento (Carr & Jessup apud
Carr & Biddlecomb, 1998, p. 72).
Desse modo, é de inquestionável valor para o novato saber que:
1. a leitura do prontuário pode ter um objetivo de coletar dados ou
ainda de avaliar os dados obtidos;
2. é eficaz ler trechos cuidadosamente selecionados, desprezando
detalhes sem valor;
3. terá melhor aproveitamento da leitura nas circunstâncias em que
ler os registros com objetivos claros em mente, preservando-se de
perder tempo e atenção durante a tarefa.
A esquematização da informação (esquemas simples, fluxogramas,
entre outros) pode servir para uma melhor organização dos dados contidos nos
prontuários, uma vez que conferem uma visão de totalidade da situação lida, e ainda
são capazes de permitir uma avaliação das relações existentes entre as diversas
unidades ou grupos de dados.
Também a discussão em grupo com os aprendizes sobre suas
crenças individuais como diagnosticadores deve contribuir para o domínio das
estratégias de pré-encontro. A utilização intencional dessa variável pessoal7 do
conhecimento metacognitivo, pode melhorar os resultados alcançados pelos sujeitos na
tarefa diagnóstica (Lopes da Silva & Sá, 1993, p. 22-23).
De fato, o conhecimento metacognitivo pode auxiliar estudantes de
7 A variável pessoal é uma das categorias do conhecimento metacognitivo e diz respeito às crenças ou aos conhecimentos dos indivíduos como dotados de capacidade cognitiva. Envolve os conhecimentos intra-individuais, interindividuais e universais (Lopes da Silva & Sá, 1993, p. 23).
152
enfermagem, por exemplo, nas seguintes competências:
• no reconhecimento de suas capacidades individuais para
selecionar, interpretar ou avaliar as informações obtidas da passagem
de plantão;
• na percepção das potencialidades dos seus pares em cooperar
com o fornecimento de novos dados durante os relatos de troca de
plantão;
• na compreensão da natural dificuldade do novato em reconhecer
situações que exijam predominantemente o conhecimento prático.
Finalmente, os docentes podem colaborar com o aprendizado
diagnóstico de seus alunos ao compartilhar com eles dois preceitos principais:
O primeiro preceito decorrente das teorias de aprendizagem de
Ausubel (1989) diz respeito à aquisição e retenção de uma nova informação na
estrutura cognitiva do indivíduo. Assim, as novas idéias, no caso informações clínicas,
só podem apreender-se ou reter-se de modo útil, desde que possuam referência em
conceitos ou proposições já disponíveis. Cabe ao professor, nesse caso, tornar explícito
para o aprendiz que o conhecimento não surge apenas e, daí, vai se acumulando; ao
contrário, constrói-se, tendo por base os esquemas ou estruturas prévias já
armazenadas na memória. Isso implica valorizar o material já aprendido em
circunstâncias anteriores e reconhecer que um conteúdo novo geralmente é uma
combinação diferente de coisas já existentes.
O outro preceito, e que não está dissociado do primeiro, solicita a
ação do professor como clínico. Este, como enfermeiro, deve ativamente auxiliar o
estudante a perceber os dados relevantes ao processo diagnóstico. Necessitando, ainda,
potencializar o conhecimento estratégico, seja por meio de intervenções individuais ou
153
ainda por orientações coletivas.
Esse treinamento estratégico é capaz de ajudar os aprendizes a
decomporem tarefas difíceis em etapas mais simples.
Como propõem Lopes da Silva & Sá (1993, p. 45-46), os cinco
aspectos-chave de Paris & Winograd podem ser aplicados no treinamento explícito das
estratégias de resolução de problemas. Supomos que esses cinco aspectos-chave
também sejam um ótimo recurso tanto para o treino estratégico de diagnóstico em
enfermagem, quanto para facilitar a auto-avaliação dos aprendizes em diagnóstico.
4.2.2 −− Considerações sobre as estratégias diagnósticas usadas durante
o encontro
Procederemos, nesta subcategoria, à discussão de quatro estratégias
diagnósticas utilizadas predominantemente durante o encontro do estudante com seu
cliente. São elas: a conversa com o cliente, o exame físico, a observação e os testes de
hipóteses diagnósticas.
O ponto de partida para a interpretação serão os elementos comuns
encontrados para as três estratégias, capazes de dar uma sensação de totalidade e
coerência aos achados da pesquisa. O primeiro elemento que esteve em destaque diz
respeito à grande preocupação dos sujeitos em aplicar as estratégias, levando em
consideração a interação8 com os seus clientes.
8 A interação é um conceito amplamente uti li zado na enfermagem. Apreende uma natureza de proximidade com o cl iente. Para Imogene King, trata-se de um conceito relevante ao sistema interpessoal e podem, caracterizar-se por valores, mecanismos para estabelecer relações humanas e reciprocidade (King apud George, 1993). Neste estudo, a interação representa uma habil idade que durante a coleta exige do estudante ser capaz de compreender as percepções e necessidades do cliente durante o processo.
154
Interagir com o cliente foi uma preocupação presente, em especial,
durante o exame físico, a entrevista clínica e, é claro, na conversa empática. Já o direito
do cliente à privacidade foi um destaque no exame físico e na observação. Os exemplos
tratam das três estratégias:
Porque eu conversar com ele [paciente], eu posso conversar sobre mil coisas. Agora eu perguntar, eu estou guiando algo a ele. Eu posso muito bem estar conversando de um assunto e, de repente, perguntar: como o senhor dormiu à noite?... E, na conversa, eu já consigo interagir melhor com o paciente pra depois entrar na verdadeira pergunta que eu quero fazer. (Clara)
[...] porque, às vezes, a pessoa faz um exame físico e o profissional fica lá calado e o outro fica lá ‘meu Deus, o que ele vai fazer comigo?’ não vai explicando a situação, eu vou fazer isso, vê se tá legal aqui? (Ana)
Não é nem que eu não saiba. Eu faço independente de saber se é certo ou errado, mas.. é observar de uma forma que você não fique tentando até encontrar coisas. Porque, às vezes, a gente começa a olhar, e começa a ver coisas, e inventar de uma certa forma. Também não ficar fazendo pressão, porque o acadêmico tem mania de ficar toda hora ali e o paciente fica sem muita vontade... e ele acaba sendo nem o natural dele, porque tem tanta gente ali em cima. Então, fica olhando ali de longe, vendo o que ele faz, se ele está ficando sozinho, observando mesmo (Ana)
Curiosamente, os estudos sobre raciocínio e estratégias diagnósticas
em enfermagem que consultamos não destacam a interação entre o clínico e seu cliente
como parte do processo diagnóstico (Gordon, 1980; Holzemer, 1986; Tanner et al.,
1987; Carnevali & Thomas, 1993; Taylor, 1997). Ainda que possa estar subentendido
que para diagnosticar é necessário interagir, para nós, é fundamental apresentar
explicitamente a questão, sob risco de prejudicar o aprendizado e domínio do processo
diagnóstico. Portanto, entendemos que estão corretos nossos sujeitos ao empenhar-se
no alcance da interação com o cliente.
Descontadas as vantagens éticas da relação cliente-enfermeiro, resta
ainda um grande ganho em acesso às informações oferecidas pelo primeiro. Interagir
com o cliente, provavelmente, traz mais informações e fidedignidade, quando
comparamos a um processo de coleta em que o investigador não considere como
155
fundamental perceber necessidades do investigado.
Ao estabelecerem uma conversa empática durante o processo de
coleta verbal dos dados, os sujeitos estavam buscando atingir uma eficácia maior, visto
que entre as próprias finalidades incluíram a garantia de que, agindo desse modo,
obtinham informações que possivelmente seriam mantidas em sigilo, caso fosse
conduzida uma entrevista clínica não interativa.
O segundo elemento em que encontramos convergência entre as
estratégias de encontro, notadamente de exame físico e entrevista, foi a distinção entre
dois tipos de orientação de coleta de dados utili zados pelos sujeitos. Foram eles:
• A orientação pelos dados básicos de enfermagem.
• A orientação focalizada nas queixas do cliente.
Os tipos encontrados acima estão em consonância com os sistemas
de coleta de dados de enfermagem propostos por autores como Carnevali & Thomas
(1993) e Carpenito (1997).
Na orientação pelos dados básicos, também denominado de modelo
orientado ao menu, algumas informações pré-determinadas são investigadas (como,
por exemplo: hábitos de vida, padrões de alimentação, eliminação e sono-repouso).
Trata-se de uma busca do geral para o específico pelo uso de um sistema que organize
os elementos a serem investigados. Em relação aos sistemas orientados ao menu, temos
como exemplos: revisão de sistemas orgânicos (de uso comum na medicina e também
na enfermagem), padrões funcionais de saúde9, ou necessidades humanas básicas10.
9 Sistema de organização da coleta organizado por Gordon, baseado em funções. São onze os padrões funcionais a saber: percepção e controle da saúde, nutricional-metabólico, eliminatório, atividade-exercício, sono-repouso, cognitivo-perceptório, autopercepção-autoconceito, papel-relacionamento, sexual-reprodutivo, estratégia de resolução-tolerância ao estresse, valor-crença (Carpenito, 1997, p. 61).
10 Outro sistema de organização, baseado em elementos universais necessários ao ser humano. As necessidades podem ser classificadas de diversos modos, mas no Brasil a classificação mais comum foi
156
Tais modelos visam a delimitar o universo de possibilidades diagnósticas ao manter
organizado o fluxo de informações coletadas (Carpenito, 1997, p. 61).
Para a estratégia diagnóstica de entrevista clínica, nossos aprendizes
não referiram nenhuma preferência pelo uso de qualquer modelo de coleta orientado ao
menu. Na verdade, buscavam alguns elementos específicos incluídos nesses modelos,
mas sem a preocupação de desenvolver uma investigação orientada por tais modelos.
Alguns dos elementos comumente procurados foram a eliminação, a alimentação e o
padrão de sono.
Os sujeitos nem tão pouco fizeram qualquer menção ao uso de
roteiros sistematizados para a coleta dos dados básicos de enfermagem, por intermédio
da aplicação das estratégias diagnósticas de encontro.
Já para a estratégia de exame físico, foi relativamente comum
encontrar, nos relatos, menções ao uso de uma orientação céfalo-caudal ou exame da
cabeça aos pés. Contudo, nem sempre fielmente seguida pelos sujeitos, no tocante à
ordem das regiões corporais investigadas. O que os estudantes costumavam fazer era
uma modificação do direcionamento céfalo-caudal, de acordo com as prioridades que
traçavam para o exame, e pelas queixas dos clientes. A fala de Ana é significativa e
serve como um bom exemplo:
Porque eu acho assim, não tem uma ordem, e, na maioria das vezes, eu nem fazia nesta ordem de olhar cabeça, mucosa e tal [céfalo-caudal], porque não dava. Tipo assim, dependendo da situação do paciente, tem outras coisas que você tem de dar prioridade. Ele reclama que está doendo no abdômen, e você fica olhando para o pé? (Ana).
O trecho do discurso acima destacado levanta ainda outra discussão
acerca dos modelos de orientação.
a de Mohana (1964), adotada por Horta (1979), que a divide em: psicobiológicas, psicossociais e psicoespirituais (apud Benedet e Bub, 1998).
157
De um modo geral, os estudantes estiveram fortemente inclinados a
examinar baseados nas queixas dos indivíduos, ou seja, numa orientação focalizada
nas queixas do cliente. Essa preocupação por guiar-se por meio dos problemas
apontados pelo cliente é característico do modelo de coleta de dados orientado ao
problema ou avaliação focalizada.
Como afirmam Carnevali & Thomas (1993, p. 53), o modelo
orientado ao problema inicia-se em uma área focalizada, baseada no julgamento
clínico ou diagnósticos preliminares ou provisórios feitos em uma avaliação inicial e
escala de prioridade. A área focalizada pode ter sido determinada pela enfermeira ou
pelo cliente. Posteriormente, propõe-se a expandir a descoberta do impacto do
problema em várias áreas funcionais, em sua vida diária e nos recursos externos
relevantes.
Para essa focalização, que predominou nos relatos, os estudantes
utili zam-se basicamente de dois tipos de achados: as queixas verbais dos clientes e de
informações prévias sobre qual sistema, padrão ou necessidade estivessem prejudicados
pelo problema (por exemplo, problema pulmonar).
Ao possuir a queixa do cliente, o estudante dirigia seu exame físico
ao foco de origem da queixa, que, em muitos casos, era a investigação de um sistema,
padrão ou necessidade que imaginava ter direta relação com o problema, manifesto na
forma de queixa.
Supomos que uma das razões que justifique a maior preferência dos
sujeitos pelo modelo orientado ao problema, seja a percepção de que, ao agirem dessa
maneira, estarão demonstrando ao cliente uma preocupação com seus males. Assim:
[...] ele reclama que está doendo no abdômen, e você fica olhando para o pé? Fica meio de uma coisa de você não estar dando atenção a ele (Ana)
Todas as características apresentadas anteriormente nos remetem à
158
compreensão de que o processo cognitivo diagnóstico de enfermagem dos novatos
estudados não pode ser observado de modo desvinculado de suas crenças individuais
sobre como devem agir ao abordar um cliente. Os estudantes demonstram que estavam
empenhados também em manter uma proximidade de relacionamento com sua clientela
durante o processo de coleta de dados clínicos. Para eles, de um modo consciente ou
não, o propósito de obter um diagnóstico não poderia estar desvinculado da interação
que procuravam manter a qualquer custo.
Desse modo, a grande preocupação que ronda a enfermagem
profissional, em relação à manutenção de uma estreita relação enfermeiro-paciente, foi
um elemento capaz de influenciar a aplicação das estratégias durante o encontro.
Propomos que, para aplicar adequadamente uma estratégia
diagnóstica, é desejável que o sujeito detenha uma consciência metacognitiva de suas
crenças e sistemas de valores. Tal qual afirma Lopes da Silva & Sá (1993, p. 27), as
crenças individuais podem interferir na motivação do aprendiz, que, por sua vez,
também influencia as operações cognitivas.
A flexibilidade com que as finalidades de aplicação das estratégias
diagnósticas de exame físico e entrevista clínica variavam entre propósitos de coleta e
de avaliação foi outro aspecto evidenciado que merece discussão. Essas duas
estratégias diagnósticas tanto apresentaram-se como predominantemente direcionadas
à obtenção de dados clínicos (coleta), quanto de avaliação das informações obtidas ou
das suspeitas diagnósticas levantadas (avaliação).
No que se refere ao propósito de coleta dos dados, o que se buscava
com a entrevista ou o exame era a detecção de manifestações normais ou anormais.
Nesse sentido, a fala abaixo é significativa:
159
Bom, exame físico serviria pra você inspecionar o que haveria de anormal no paciente, de acordo com as queixas dele [...] E ver no caso o que está anormal, o que tinha de anormalidade pra poder fazer um diagnóstico até. (Ana)
Em se tratando de operação mental, o que parecia existir era a
comparação dos achados dos clientes com os elementos armazenados na memória de
longo prazo e, a partir daí, era possível se proceder ao julgamento da normalidade ou
não do achado. Para discutir essa questão, utilizaremos as contribuições das teorias
sobre a memória humana.
A memória de longo prazo tem sido dividida por Tulving em duas
subcategorias que são relevantes para a nossa discussão: a memória semântica e a
memória episódica (apud Carnevali & Thomas, 1993, p. 23).
A memória semântica é onde o conhecimento permanece
armazenado, provavelmente em redes de relações entre as informações (Carnevali &
Thomas, 1993, p. 26-29). O conhecimento teórico aprendido localiza-se aí. Para
pesquisadores como Bordage & Zacks (1984) e Papa et al. (1990), esse tipo de
memória tem papel destacado no processo de raciocínio diagnóstico em medicina. Isso
não nos parece ser diferente na enfermagem.
Já na memória episódica, ficam armazenados os vários eventos
experimentados na vida do indivíduo (Carnevali & Thomas, 1993, p. 25-26). Trata-se,
portanto, de uma memória vivencial. Os pesquisadores em medicina, como Norman et
al. (1989) e Schmidt et al. (1990), advogam em favor da memória episódica como
principal elemento do raciocínio diagnóstico médico.
A despeito de quem tenha razão acerca do raciocínio diagnóstico
médico, o que parece acontecer aos nossos sujeitos, é que exista uma predominância
da utilização dos elementos armazenados na memória semântica. Isso torna-se mais
explícito, quando pensamos no estágio de desenvolvimento dos nossos estudantes
160
(clínicos iniciantes).
Como clínicos iniciantes típicos, os aprendizes, aqui estudados,
possuem pouca experiência com situações clínicas reais (reduzidas memórias de
episódios clínicos). Sua busca na memória de longo prazo, geralmente, é por elementos
como as categorias diagnósticas com seus perfis, conceitos fisiológicos, preceitos
biológicos, entre outros, e que compõem o conhecimento teórico biomédico
(armazenados na memória semântica). Boshuizen & Schmidt (1992) afirmam que os
novatos utilizam, predominantemente, o conhecimento biomédico no raciocínio clínico,
em detrimento do conhecimento clínico experiencial (que ainda não possuem).
A tarefa do estudante de enfermagem ante essa situação de aplicação
da estratégia é, provavelmente, a de conduzir um processo que Elieson & Papa (1994,
p. S81) denominam de “ reconhecimento do padrão” . Esse processo que, na fala de
nossos aprendizes figura como “ identificar as anormalidades e normalidades” , envolve
a comparação das informações “normais” e “anormais” encontradas com os achados
(ou grupos) característicos, armazenados na memória semântica.
Posteriormente, com o incremento da experiência clínica, outra
comparação vai tornando-se possível: a que é realizada entre as informações obtidas da
coleta e os diversos exemplos clínicos do mundo real armazenados na memória
episódica.
As operações acima abordadas envolvem um caráter de
processamento da informação que, certamente, influencia a performance diagnóstica. É
claro que quanto mais conhecimento conceitual possuir o novato, e quanto mais ele
estiver estruturado, melhor será seu desempenho no diagnóstico. Também, quanto mais
experiências clínicas vivenciar, melhor será para o alcance da meta, já que um número
maior de eventos estarão armazenados na memória episódica.
161
No que se refere às estratégias de coleta com características de
avaliação, temos uma utilização para confirmar um achado obtido por meio da
aplicação de uma estratégia diferente:
Assim, quando o paciente apresenta ruídos, tá tossindo muito, tá saindo muita secreção, eu vou direto ao pulmão, e me dá a resposta, entendeu? (Marília)
Essas avaliações são tratadas por autores metacognitivistas como
Davidson & Sternberg (1998, p. 50), os quais afirmam que a avaliação e a monitoração
são processos metacognitivos que auxiliam a codificação11 efetiva de uma informação.
Já Carr & Biddlecomb (1998, p. 72) afirmam que a consciência
metacognitiva de monitorar e avaliar o próprio trabalho e processar a informação de
um modo ativo são características dos bons aprendizes.
Ao utilizarem uma outra estratégia para confirmar, descartar ou
aprofundar uma informação, nossos estudantes estão avaliando, de uma maneira
indireta, a eficácia de uma dada estratégia diagnóstica. Essa experiência metacognitiva,
se trazida à consciência, pode, a nosso ver, expandir o conhecimento metacognitivo
que eles possuem.
Em última instância, as vantagens que essa consciência traz ao
processo diagnóstico são capazes de facilitar a coleta e processamento da informação,
que culmina em melhores resultados na tarefa diagnóstica.
Quando identificamos os testes de hipóteses como estratégia
diagnóstica, estamos levantando um elemento fundamental em muitas investigações
11 A codificação é um processo que envolve a determinação de aspectos informativos de um problema, que serão armazenados na memória de trabalho, pela utili zação de importantes aspectos acessados da memória de longo prazo (Davidson & Sternberg, 1998, p. 49). Para Carnevali & Thomas (1993, p. 18), “ é o termo que cientistas cognitivistas usam para descrever a transformação de estímulos recebidos em informação mental, que estará disponível para refinamento adicional e mais processamento mental” .
162
sobre o raciocínio diagnóstico em enfermagem (Gordon, 1980; Holzemer, 1986; Jones,
1987; Tanner et al., 1987; Lange et al., 1997).
Como detectado na fala de Marília, nossos sujeitos testavam as
hipóteses por meio de perguntas adequadas a elas, o que cooperava com o controle do
processo de coleta de dados. Tais perguntas caracterizavam-se como dirigidas ao teste
da hipótese (no caso de uma hipótese considerada) ou específicas para cada hipótese
gerada (no caso de duas hipóteses ou mais).
Em relação à estratégia de testes de hipóteses, Gordon (1980, p. 39-
40) destaca dois tipos: o teste de uma única hipótese e o teste de múltiplas hipóteses.
No primeiro tipo, cada alternativa é testada em separado e
descartada, caso não fosse confirmada. A grande vantagem é a redução do esforço da
memória, com a baixa inferência sobre os dados. E as principais desvantagens são o
gasto excessivo de tempo e a omissão de grande número de informações.
No segundo tipo (do teste de múltiplas hipóteses), várias hipótese
são consideradas simultaneamente para uma mesma situação. Nesse, se acaso uma
situação é conhecida, pode-se predizer as prováveis hipóteses que devam ser testadas.
Por exemplo, na situação “problemas de comunicação”, várias hipóteses prováveis
podem ser geradas e testadas simultaneamente, e uma pode até mesmo descartar a
outra. A principal vantagem é a percepção das relações entre os dados na situação
diagnóstica. Já a grande desvantagem é que, geralmente, múltiplas inferências são
exigidas, o que pode resultar em risco maior para erros cognitivos (Gordon, 1980, p.
40).
Mais do que advogar o uso deste ou daquele teste, acreditamos que
seja vantajoso destacar a colaboração que a estratégia de testes de hipóteses trouxe à
condução da coleta de dados de Marília, como vemos na significativa fala abaixo:
163
[...] eu vou raciocinando em cima daquilo. ‘Bom, isso aqui tá me levando pra isso. Aí, por que isso tá acontecendo?’ Aí, eu vou lá [no paciente] e vejo. (Marília)
Quando a estudante utilizava-se das interpretações conscientes dos
achados, como reguladora da coleta, estava conferindo à estratégia um caráter
metacognitivo.
Como afirma Garner (apud Escudero, 1996), as estratégias
metacognitivas controlam os progressos cognitivos, melhorando a aprendizagem. Daí,
podemos entender que, ao usar os testes de hipóteses, a estudante está sendo tanto
capaz de controlar a aplicação de habilidades de entrevista, exame e observação,
quanto aprender com esse uso.
4.2.2.1 − Como os conhecimentos sobre a aprendizagem melhoram o
aproveitamento das estratégias de encontro?
Por mais uma vez o docente pode auxili ar o aprendiz no domínio do
processo diagnóstico, fazendo uso de componentes da metacognição.
Em primeiro lugar, os professores podem promover juntos aos
estudantes uma exploração do conhecimento metacognitivo referente à pessoa. Como
já tratada anteriormente, essa categoria envolve as crenças ou os conhecimentos
cognitivos do sujeito.
No tocante a isso, a crença da interação cliente-enfermeiro foi ampla
e profundamente encontrada nos discursos dos novatos, sendo capaz de influenciar o
diagnóstico de enfermagem. O que sempre esteve claro, nos discursos dos que
descreveram as estratégias de encontro, foi a grande preocupação em garantir o
processo de interação com o cliente, determinando direcionados no processo de coleta
de dados, como, por exemplo, na orientação para as queixas do cliente e modulação
164
das estratégias em respeito à privacidade do cliente.
Curiosamente, a obtenção e o processamento dos dados clínicos não
foram as únicas metas primordiais para a aplicação das estratégias diagnósticas durante
o encontro. Além disso, as estratégias dependiam de uma regulação interna aos
sujeitos, que estava baseada nas crenças individuais e coletivas de como um estudante
de enfermagem deve abordar um cliente, a fim de obter dele informações para o seu
diagnóstico.
O que de fato pareceu existir foram pré-requisitos inerentes ao
processo de aplicação das estratégias durante o encontro. No tocante aos pré-
requisitos necessários à coleta, Iyer et al. (1993, p. 19) destacam:
A fase de histórico é influenciada pelas opiniões [crenças], conhecimentos e habil idades das enfermeiras [...] Conhecimento e habilidades constituem os fundamentos para a interação enfermeira-cliente.
Quando tratando especificamente do pré-requisito que denomina de
“opiniões”, e que aqui chamamos de crença, as mesmas autoras colocam:
As opiniões da enfermeira incluem posicionamentos filosóficos acerca da enfermagem, da saúde, do cliente como indivíduo e como consumidor de cuidados de saúde, e as interações entre esses fatores. Estes tornam-se parte da estrutura teórica na qual se baseia a atividade da enfermeira. (p. 20)
Finalmente, quando apresentam as habilidades, Iyer et al. (1993,
p.21) mencionam outro fator que guarda relação com o elemento que é fulcro dessa
discussão, vejamos:
“ Habilidades interpessoais são importantes, durante todas as fases do processo de enfermagem, mas são particularmente cruciais para um histórico bem elaborado. Uma vez que se trata de um processo interativo e de comunicação, a enfermeira deve ter habili dades de comunicação muito desenvolvidas.
Agentes de um processo fortemente dependente da interação e do
165
relacionamento, os estudantes precisam ser claramente orientados sobre a necessidade
de reflexão. Esse chamamento torna-se de natureza metacognitiva, na medida em que
procura trazer os estudantes à auto-reflexão de seu papel na aplicação das estratégias
diagnóstica. Portanto, um conhecimento metacognitivo referente a variáveis individuais
precisa ser construído (com a presença mediadora do professor) para que os novatos
sejam capazes de vivenciar experiências metacognitivas específicas a esse domínio do
diagnóstico (Lopes da Silva & Sá, 1993, p. 23).
As estratégias que docentes e alunos podem utilizar para construir tal
conhecimento e experiência podem ser muitas, como, por exemplo, o auto-
questionamento e a discussão em grupo. Entretanto, o que não pode ser perdido de
vista são as exigências metacognitivas dessa aprendizagem e o sistema de crenças e
filosofias que regem o processo.
Em segundo lugar, a memória é um outro elemento que, tendo
relação com a metacognição, é capaz de cooperar com o pleno aproveitamento das
estratégias de encontro. Como afirma Beitz (1996, p. 25), a “ metacognição é
estreitamente ligada à teoria de processamento da memória” . Esse elo foi criado pelo
próprio Flavell, ao aceitar a definição de memória como “cognição aplicada”, o que,
baseado nesses preceitos teóricos, tornou o conhecimento sobre a memória em um
caso de metacognição (apud Hacker,1998, p. 2).
A despeito da discussão que possa ser criada entre a natureza da
metamemória e metacognição, muitos autores metacognitivistas utilizam-se de
elementos classicamente estudados por teoristas da memória (Miller; Clark & Paivio
apud Beitz, 1996, p. 25). E a interface existente entre as duas contribuições permite-
nos explorar elementos da memória neste texto.
166
Como já discutido anteriormente, os estudantes exploram tanto a
memória de trabalho quanto a de longo prazo para inicialmente processar as
informações obtidas no encontro. Como afirmou Carnevali & Thomas (1993, p. 18),
“ diversas atividades cognitivas têm lugar na memória de trabalho” . Entre elas, uma
parece se destacar na fase de encontro: a codificação.
Discutiremos essa atividade, utilizando-se de Davidson & Sternberg
(1998, p. 49-50), que abordam o processamento metacognitivo dos dados. Para eles, a
codificação inclui a identificação, de dados, o armazenamento na memória de trabalho
e a recordação da memória de longo prazo. Porém, como a metacognição interfere
nesse primeiro momento do processamento?
Para responder ao questionamento, utilizamos considerações de
Davidson & Sternberg (1998) sobre o conhecimento metacognitivo. Como levantam os
autores, o conhecimento metacognitivo sobre os problemas leva a uma mais apurada
codificação do problema. Essa habilidade permite ao aluno compreender, por exemplo,
que certas informações da passagem de plantão, prontuário ou da observação precisam
de cuidadosa codificação, a fim de minimizar a ocorrência de erros nas afirmativas
diagnósticas de enfermagem.
A codificação dos dados pode, ainda, ter um valor muito grande em
evitar os erros cognitivos.
Kassirer & Kolpeman (1989) categorizam quatro tipos de erros no
raciocínio diagnóstico médico e que, provavelmente, aconteçam também no raciocínio
diagnóstico de enfermagem. Baseados nisso, supomos que uma codificação ausente ou
incompleta pode gerar um erro na coleta e no processamento da informação (terceiro
tipo de erro, que se refere à incorreta interpretação de dados existentes, à insuficiente
167
coleta de dados relevantes, ou ao deficiente desenvolvimento e revisão da hipótese de
trabalho).
Contextualizando para nossos achados, um erro de codificação pode
acontecer, por exemplo, quando um aluno não leva em consideração o prazo de
manifestação dos episódios aumentados de evacuação, concentrando-se somente na
existência ou não dos eventos. No caso, existem diferenças fundamentais para o
diagnóstico de enfermagem de diarréia e que depende da codificação do aspecto
temporal da informação, isto é, existe uma grande diferença se os eventos instalaram-se
há 12 horas ou há 36 horas e permanece por este período!
Da discussão do parágrafo anterior, estamos realmente propondo que
o professor terá uma contribuição como potencializador da metacognição, se
considerar a importância do processo de codificação da informação clínica obtida
durante o encontro (e pré-encontro também). Porém, para isso, deve trabalhar não
somente os elementos sintáticos da situação (sinais e sintomas, processos patológicos,
respostas humanas), mas também os elementos semânticos atribuídos aos dados, isto é,
os significados atribuídos aos sinais e sintomas, processos patológicos e respostas
humanas.
Bordage & Lemieux (1990) defendem a idéia de que os experientes
possuem mais compreensão dos dados semânticos do que os novatos. Essa seria uma
possível explicação para o fato de experientes conseguirem obter um resultado
diagnóstico com o uso de um menor número de informações, quando comparado aos
novatos. Em termos de domínio das estratégias por nossos estudantes, essa concepção
é extremamente útil.
Novatos em diagnóstico de enfermagem podem ser orientados a
168
dirigir mais atenção que a usual aos aspectos semânticos de uma situação e minimizar a
preocupação em coletar um número excessivo de informações, que só determinarão
maior esforço de coleta e processamento. Um dos aspectos semânticos que consideram
ter interesse Bordage & Lemieux (1990, p. S23) são os “eixos semânticos” . Esses
eixos são conceitos capazes de determinar o raciocínio diagnóstico médico pelo
contraponto; são exemplos de eixos: “agudo-crônico” , “central-periférico”, “bilateral-
unilateral” , “ total-parcial” . Tais eixos devem ser considerados também quando
tratamos de diagnóstico de enfermagem.
Propomos que, para serem aproveitados os elementos semânticos da
situação, os estudantes e até mesmo seus professores, utilizem-se de dois grupos de
estratégias de aprendizagem: (1) as direcionadas a armazenamento dos conceitos pela
memória e (2) as dirigidas à estruturação dos conceitos.
No grupo das estratégias dirigidas ao armazenamento dos dados, o
sujeito pode fazer uso das notas pessoais e da esquematização (esquemas simples,
fluxogramas, entre outros), atentando para não omitir o registro dos elementos de
valor semântico.
No grupo de estratégias de estruturação, é possível a aplicação do
mapa conceitual e o V heurístico, dadas as suas particularidades de organização dos
conceitos que estejam no material estudado (Ontoria et al., 1994; Pozo, 1996).
Todo o conjunto de intervenções apresentado anteriormente parece-
nos ser capaz de auxiliar tanto ao educador, quanto ao aprendiz no domínio conceitual
e estratégico durante a fase de encontro.
Crenças e conhecimentos metacognitivos são, portanto, recursos
usados para permitir a ocorrência de um número crescente de experiências
169
metacognitivas, que serão de fundamental importância ao emprego das estratégias
diagnósticas de enfermagem por parte dos estudantes.
Os testes de hipóteses podem ser melhor aproveitados se forem
explicitamente discutidos pelos professores com seus alunos. Ajuda ao novato saber
das vantagens e desvantagens dos dois tipos de teste de hipótese (única e múltipla),
bem como em que circunstância é melhor aplicar um ou outro.
No caso do teste de única hipótese, Gordon (1980, p. 40) propõe
que deva ser usado quando hipóteses concorrentes já tenham sido eliminadas. No caso
específico de nossos sujeitos, nas etapas finais da aplicação das estratégias de encontro.
Isso reduz a desvantagem do gasto excessivo de tempo com processamento de
informações dispensáveis ao diagnóstico.
No caso do teste de múltiplas hipóteses, a mesma autora propõe seu
uso nas fases iniciais do processo diagnóstico, quando a possibilidade de hipóteses
prováveis geradas é grande. Nesse início de processo diagnóstico, predominam os
atributos contextuais que têm como exemplos: tipo de queixa, idade, sexo, raça, o
tempo de pós-operatório ou internação hospitalar (Gordon, 1980, p. 40). Para nosso
estudo, no pré-encontro ou no início da aplicação das estratégias de encontro.
Nesse momento, cabe uma diferenciação de enfoque entre os novatos
e os experientes enfermeiros. Estudos sobre experiência em enfermagem, como de
Benner & Tanner (1987), exibem diferenças significativas na quantidade e qualidade
das informações coletadas pelos novatos e experientes. O novato se apega a regras,
normas e sistematizações por não possuir a familiaridade com situações da realidade
clínica. Isso implica que se comparado ao experiente, o novato coleta uma quantidade
maior de dados, ou quando não, uma quantidade maior de dados que não facilitam o
processo diagnóstico.
170
Acreditamos, portanto, que a adequada seleção do tipo de teste de
hipótese possa minimizar o risco natural que têm os novatos em coletar grande
quantidade de informações, o que acaba gerando uma dificuldade de processamento.
4.2.3 −− Considerações sobre as estratégias diagnósticas utili zadas após
o encontro
Nessa subcategoria, discutiremos os achados da nossa pesquisa
referente às estratégias diagnósticas que, predominantemente, foram aplicadas no pós-
encontro. Delas, destacou-se um forte caráter de abstração, com uso predominante de
operações mentais dependentes do conhecimento armazenado na memória.
Iniciaremos, abordando as que tiveram um forte traço no
processamento da informação: relacionamento entre dados, a consulta ao livro e o
questionamento ao professor.
Nossas possibilidades de discussão eram muitas; contudo, decidimos
fazê-la, utilizando-se de elementos da teoria dos esquemas (Sierra & Carretero, 1996)
com as devidas interfaces metacognitivas. Assim já fizemos, quando discutimos, na
primeira categoria, as estratégias de pré-encontro.
Em primeiro lugar, reapresentamos a definição de Sierra & Carretero
(1996, p. 125-137) referindo-se aos esquemas mentais como modelos do mundo
exterior, os quais reproduzem o conhecimento que temos e organizam a informação na
memória de longo prazo. Esse conhecimento é adquirido mediante a experiência
passada com conceitos, ações, situações, fatos, entre outros. Permitem ainda a
interpretação dos novos elementos a serem aprendidos.
Os mesmos autores afirmam que os esquemas interferem com a
171
aquisição e a representação de novos conteúdos, permitindo a interpretação da
informação (Sierra & Carretero, 1996, p. 126).
Acreditamos que os esquemas interfiram fortemente nas estratégias
diagnósticas de pós-encontro, ao agirem sobre a memória dos nossos sujeitos. Essa
ação dos esquemas predomina na atividade cognitiva de codificação da informação,
por meio de quatro processos: seleção, abstração, interpretação e integração (Sierra
& Carretero, 1996, p. 130).
No processo de seleção, os esquemas interferem, auxiliando no
recebimento e na retenção somente da informação que tenha relação com os esquemas
diagnósticos. Desse modo, os perfis diagnósticos conhecidos determinam a coleta e
conseqüente aproveitamento dos dados clínicos.
Os “roteiros” ou “roteirinhos” a que Ana faz menção são esquemas
diagnósticos armazenados na memória. Foram construídos por ação da estratégia de
consulta ao livro e, provavelmente, representam, em sua maioria, elementos do
conhecimento semântico, isto é, perfis teóricos sobre um diagnóstico de enfermagem.
Vejamos o trecho significativo em que isso se torna explícito:
[...] não, na realidade eu não cheguei a fazer nada escrito; eu falei roteiro porque, tipo assim, eu peguei alguns [diagnósticos de enfermagem] e ficou na minha cabeça e então eu não esqueci. E, se aparecesse algum novo, eu não sabia nunca. Inicialmente, eu peguei o livro pra saber o que era diagnóstico de enfermagem e tentar conhecer alguns. Tentar ver, dar uma folheada. Ah, existe este! Existe este outro! (Ana)
O recurso de armazenar alguns esquemas na memória (“ficou na
minha cabeça e então eu não esqueci”) é claramente indispensável ao processo de
seleção. Segundo Sierra & Carretero (1996, p. 130), “considera-se uma condição
necessária, para o armazenamento de novos conhecimentos, a existência de esquemas
relevantes previamente adquiridos. No caso de não se dispor desses esquemas, a
retenção costuma ser mínima” .
172
Essa necessidade de esquemas relevantes previamente adquiridos
aparece no trecho em que Ana afirma: “e, se aparecesse algum novo, eu não sabia
nunca”. Na inexistência do conhecimento prévio, a informação tende a ser ignorada ou
rapidamente esquecida. Tal propriedade permite que reconheçamos como válida a
finalidade que os estudantes conferem ao livro como depositário de conhecimento
semântico diagnóstico.
Ao acessar previamente o conteúdo do livro, o aprendiz está
interferindo ativamente no processo de codificação, aumentando suas chances de
reconhecer e reter os dados clínicos relevantes ao processo diagnóstico.
As notas pessoais também podem oferecer um excelente recurso para
preservar esquemas que serão usados posteriormente na seleção de informação.
O segundo processo, o de abstração, interfere com os esquemas
por permitir a extração dos aspectos que tenham significado, permitindo a
eliminação dos superficiais (Sierra & Carretero, 1996, p. 131).
Para Batini (apud Serafini, 1996, p. 184), “as abstrações são
processos de simplificação e de focalização da nossa atenção por meio dos quais
isolamos os conceitos a partir das nossas percepções da realidade” .
Principalmente duas estratégias diagnósticas dessa fase pós-encontro
são ligadas ao processo de abstração: as de relacionamento entre dados e de
questionamento ao professor.
Na estratégia diagnóstica de relacionamento entre dados, a finalidade
de buscar a “causa principal” , isto é, o diagnóstico primário, levantada por uma das
entrevistadas, pode ser influenciada por um dos tipos de abstração denominada de
generalização.
A generalização é a relação que se estabelece entre duas classes de
173
níveis diferentes, sendo a mais abrangente denominada de sobreclasse e a menos, de
subclasse (Serafini, 1996, p. 188). Desse prisma algumas manifestações classificadas
como problemas são subclasses do diagnóstico primário.
A hereditariedade das propriedades é uma condição da
generalização que influencia a atividade de codificação. Segundo Serafini (1996, p.
188), “esta propriedade garante que as subclasses herdem as propriedades definidas
para as sobreclasses” . Essa propriedade tem valor para nossos estudantes, se é
reconhecido que um grupo de problemas de ordem mais elementar podem repetir as
propriedades de um problema superior a que estão subordinados. Isso permite,
conseqüentemente, diferenciar e hierarquizar aspectos de maior ou menor
significado para a conclusão diagnóstica, facilitando a retenção de elementos
essenciais aos esquemas diagnósticos.
O relacionamento entre dados deve incluir um entendimento abstrato
do valor que o sujeito deve conferir a diferentes dados clínicos, percebendo então
que os significados são relativos. Assim, distinta importância diagnóstica deve ser
dada às várias informações que foram coletadas.
Por outro lado, esse processo de abstração pode gerar dois
inconvenientes, que devem ser cuidadosamente observados. O primeiro seria a
realização de generalizações incorretas, atribuindo propriedades da classe abaixo,
que uma sobreclasse não tenha realmente. O segundo seria a perda de uma
considerável quantidade de detalhes, gerando distorções nas tarefas de memória
(Sierra & Carretero, 1996, p. 132).
Considerando o primeiro inconveniente, é primordial que os
estudantes sejam alertados desse risco e estimulados a discutirem suas
generalizações com outros colegas que tenham vivenciado o conhecimento e
174
experiência específicos, com profissionais ou com professores. A troca minimiza a
possibili dade de erros de generalização.
Considerando o segundo inconveniente, sabemos que, em se tratando
de processo diagnóstico, um detalhe pode não ser um mero detalhe, isto é, a
desconsideração ou esquecimento de um dado pode gerar erros diagnósticos
(Kassirer & Kopelman, 1989). E para minimizar esse aspecto, o questionamento ao
professor foi uma estratégia que os aprendizes entrevistados utilizaram.
Os professores foram apontados como colaboradores no processo
diagnóstico, alertando os alunos para a coleta e processamento de dados
importantes. O trecho de uma fala destaca esse papel:
[...] às vezes, faltam peças que eu não me dou conta, mas o professor sempre alerta. (Marília).
Muitas das “peças” podem ser detalhes que são fundamentais à
conclusão diagnóstica. Desse modo, o docente assume um papel fundamental em
discutir com seus alunos aspectos que são significativos para o diagnóstico.
O questionamento ao professor e a consulta ao livro também
favorecem o terceiro processo de codificação, denominado de interpretação.
Segundo Sierra & Carretero (1996, p. 132), as “ interpretações são
definidas como as inferências efetuadas pelo esquema acerca da informação
selecionada” . Isso quer dizer que os esquemas podem realizar uma inferência
pragmática, completando detalhes omitidos em uma informação. Por exemplo, por
meio dos esquemas armazenados, o conhecimento das relações existente entre
características definidoras de um mesmo diagnóstico permite que a característica
omitida seja considerada por meio de inferência. São os casos em que o dado está
subentendido na situação.
Contudo nas situações em que os esquemas não eram capazes de
175
permitir a inferência pragmática funcionavam o questionamento ao professor e a
consulta ao livro. Como finalidades apontadas para essas estratégias, despontaram
o auxílio no julgamento inferencial no questionamento ao docente (fala de Ana) e a
detecção de lacunas na consulta ao livro (fala de Marília). Vejamos tais destaques de
discurso:
Porque, quando a gente vai diagnosticar alguma coisa, um sibilo, alguma coisa, na gente há uma dúvida; será que é realmente? E então acaba a gente chamando o professor da prática pra verificar se é realmente aquele sibilo. (Ana).
Mas, às vezes, eu tento confirmar mesmo. Lá, no paciente, por exemplo: uma informação que tenha faltado, que eu tenha deixado passar em branco. (Marília)
Finalmente, o processo de integração também sofre influência das
estratégias diagnósticas. Como definido, as “representações integradas da memória são
formadas pelos conteúdos selecionados da experiência imediata, pelo conhecimento
relevante ativado, pelas atribuições de informação complementar e pelo conteúdo
resultante de qualquer outra interpretação que se efetue” (Sierra & Carretero, 1996, p.
133).
Os processos de integração de novos conteúdos podem formar um
novo esquema ou modificar um esquema existente. Todas as estratégias de pós-
encontro podem influenciar nesses dois procedimentos.
Quando buscam a confirmação pelo diagnóstico diferencial ou
solicitam ajuda docente para conferir um rótulo diagnóstico à situação percebida, o
novato está buscando criar ou modificar um esquema preexistente em sua memória.
Ainda, quando comparam o caso evidenciado com os perfis
diagnósticos presentes no livro, o estudante novamente cria ou modifica um esquema
anterior.
Certamente que o esforço em relacionar os dados influencia
176
fortemente nos quatro processos de codificação apresentados, e, talvez por isso mesmo
essa estratégia foi tão recorrente nos discursos dos aprendizes.
E, para que ocorresse o aparecimento ou modificação de um
esquema armazenado na memória, dois modelos foram evidenciados a partir das
entrevistas: o modelo de quebra-cabeça (Marília) e o modelo de rede (Tatiane). De
uma visão holística das entrevista, percebemos que todos os cinco aspectos-chave
estavam em consonância com esses modelos cognitivos.
A menção explícita ao modelo de quebra-cabeça apareceu durante
exploração da estratégia de relacionamento entre dados e teve o propósito de cooperar
com o aparecimento de uma “ idéia” (esquema mental diagnóstico) presente na
memória do sujeito:
Quando as minhas dúvidas vão sendo respondidas e a minha idéia, a idéia, a lógica, vai montando na minha cabeça [...] Porque pra chegar a um diagnóstico, as coisas têm uma relação [...] E acho que essa relação, esse ponto em comum entre elas, tem uma resposta, no caso seria essa a conclusão [...] É interagir as informações, todos os dados que eu colhi. Elas vão montando. Acho que o diagnóstico é um quebra-cabeça montado. (Marília)
Para a aluna, as informações são peças obtidas por meio da coleta e
se encaixam mediante a interação entre os significados. As diversas estratégias são
responsáveis pela obtenção, seleção, organização e encaixe de cada uma das peças. No
final, um diagnóstico é obtido com a representação do esquema pronto, ou seja, “o
quebra-cabeça montado”.
O outro modelo (o de rede) também trata de coleta, mas a
predominância recai no processamento da informação, como vemos na fala abaixo:
Eu tento formar uma rede. Eu tenho uma dificuldade enorme de gravar coisas lineares. Por exemplo: se eu não gravar algum elemento da linha, eu tenho outro caminho de como chegar nessa rede. Porque, quando eu tô fazendo diagnóstico, eu estou aprendendo; então, pra poder lembrar deste diagnóstico, também eu vejo se... Por exemplo, como eu falei: no diagnóstico, ele tem dois sintomas. Se este sintoma tem o paciente, deixa eu procurar se tem este segundo. De repente, tem associação. É a rede. Eu tento em tudo fazer a rede. (Tatiane)
177
Na rede, Tatiane busca as várias trilhas que ligam, de um modo
amplo, os elementos de uma situação. Sinais e sintomas guardam diversas relações
entre si, permitindo um número maior de acessos ao esquema.
Essa característica em rede está em consonância com as formas de
organização e estruturação dos esquemas. Como podemos perceber, a estudante
levanta a possibilidade de acessar um elemento pela utilização de trilha alternativa
(“Por exemplo: se eu não gravar algum elemento da linha, eu tenho outro caminho de
como chegar nessa rede”). Sierra & Carretero (1996, p. 127) destacam duas
características dos esquemas que são diretamente ligadas ao modelo cognitivo da
novata.
A primeira característica é que os conteúdos estão organizados em
unidades de caráter holístico, isto é, quando um dos componentes é ativado o mesmo
acontece com o restante. Isso justifica a negação da linearidade por parte da aluna.
A segunda característica é que os conteúdos que formam as unidades
holísticas estão agrupados em unidades interrelacionadas. Assim, os elementos são
colocados em proximidade, formando grupos, o que facilita o acesso a eles.
Ainda que os dois modelos possam gerar diversas especulações
teóricas, não temos resultados suficientemente claros para fazê-las, dessa maneira,
entendemos que a temática pode fomentar estudos futuros.
4.2.3.1 − Como os conhecimentos sobre a aprendizagem melhoram o
aproveitamento das estratégias de pós-encontro?
Neste tópico, discutimos como aprendizes e educadores podem obter
melhor resultado na aplicação das estratégias de pós-encontro. Fazemos isso, mediante
preceitos teóricos baseados na Teoria dos esquemas e na metacognição. Aqui é
178
importante ressaltar o componente especulativo do texto que se segue. É sabido ser o
capítulo de discussão o lugar adequado para especulações do autor. E esse capítulo
não foge à regra. No entanto este tópico, em particular, procura explicitar alguns dos
desdobramentos possíveis da aplicação das teorias de aprendizagem sobre o
diagnóstico de enfermagem. Nesse sentido, fica claro que este tópico deve ser
entendido menos como resultado da atual pesquisa e mais como delineamento de
futuras linhas de investigações.
Algumas das ações já foram propostas nos tópicos anteriores.
Mostramos como algumas estratégias de aprendizagem podiam promover uma melhor
utili zação das estratégias diagnósticas. A partir de agora, discutiremos a colaboração
de outras.
As estratégias de aprendizagem podem referi-se a cada um dos
processos responsáveis pela codificação da informação. As que visam o domínio do
processo diagnóstico exigem uma adequada escolha das informações que serão
processadas. Como discutido anteriormente, a seleção depende dos esquemas prévios
que o estudante tenha na memória. Como vimos, o livro influencia na formação dos
“roteiros” , por intermédio da apresentação dos perfis diagnósticos (conhecimento
conceitual).
Nos próximos parágrafos discutiremos contribuições que possam
potencializar esse processo de seleção.
Beitz (1996, p.28), ao recomendar algumas estratégias
metacognitivas promotoras da aprendizagem em enfermagem, inclui os “esquemas
clínicos de enfermagem” e, em particular, apresenta uma forma que denomina
“organizador avançado” . Ele é um guia para estudo do processo de doença de
179
clientes, que organiza os dados.
O organizador ordena os dados de uma doença ou problema em
cinco subdivisões: (1) patofisiologia; (2) sinais e sintomas/achados clínicos; (3)
tratamento médico; (4) tratamento cirúrgico; (5) tratamento de enfermagem (Beitz,
1996, p.29).
Supomos que um organizador avançado modificado possa auxili ar
nas etapas iniciais da aprendizagem com diagnósticos de enfermagem, quando o livro
ainda é uma das principais estratégias para consulta no pós-encontro. O organizador
deve conter as seguintes subdivisões do material retirado das referências escritas:
• diagnóstico de enfermagem;
• mecanismos fisiológicos, psíquicos, culturais, sociais e
patológicos envolvidos (buscando reconhecer pelo menos um pouco
de cada);
• sinais e sintomas/ achados clínicos característicos do diagnóstico;
• fatores etiológicos ou relacionados − critérios que determinam a
ocorrência do diagnóstico de enfermagem;
• diagnósticos de enfermagem que podem estar relacionados
diretamente ao diagnóstico de enfermagem principal;
• estratégias de coleta que comumente permitem a detecção do
diagnóstico.
Com essa modificação, buscamos envolver os principais aspectos que
são exigidos para o domínio de conhecimento semântico sobre os diagnósticos. Esses
aspectos, assim ordenados, representam “roteiros” diagnósticos amplamente
estruturados, sendo que seu domínio deve interferir na seleção de informações clínicas.
No entanto, destacamos a última subdivisão desse organizador. Ela foi incluída com o
180
objetivo principal de contribuir com o estudante no domínio do conhecimento
procedimental das estratégias diagnósticas.
Progressivamente, os novatos podem criar suas próprias
modificações dos organizadores avançados. No entanto, é de fundamental importância
que o docente estimule que, entre esses novos organizadores, estejam incluídos os que
contemplem o conhecimento episódico relativo às experiências diagnósticas.
O docente pode cooperar, também, estimulando os estudante a
documentar, para posterior análise, as principais informações clínicas coletadas em um
caderno de notas.
Propomos que o caderno de anotação se transforme em uma
estratégia de aprendizagem diagnóstica, por intermédio do trabalho com os dados nele
registrados. A título de ressalva, é comum, aos sujeitos entrevistados no estudo, a
prática de fazer um registro como “rascunho” , submetendo ao professor para correções
antes da documentação nos impressos do hospital. Contudo, o que propomos
ultrapassa a correção da escrita.
Sugerimos que as páginas sejam divididas horizontalmente pela
metade, reservando-se o espaço superior às anotações dos achados. Posteriormente, o
aprendiz registra o que considera fundamental para compor seu registro pessoal ou a
anotação clínica nos impressos hospitalares.
Dos dados escritos, o estudante sublinha os que considera principais.
Na metade inferior da página, responde às seguintes perguntas: Qual
(ais) diagnóstico (s) de enfermagem ou problema (s) detectei ou desconfio que meu
cliente tenha? Qual a importância da informação que sublinhei, para esse
diagnóstico ou suspeita? Quais são os dados sublinhados, que quali ficam as
informações? Quais os contrapontos que eu identifico para alguns dos dados
181
sublinhados?
A documentação dos achados, no caderno de notas, auxilia no
processo de seleção da informação, por oferecer uma representação escrita de
elementos do esquema mental.
Primeiramente, os novatos podem perceber a questão quantitativa da
informação presente em seus registros, tomando ciência do que foram capazes de obter
na coleta. Contudo, é fundamental alertá-los que um número excessivo de dados tende
mais a dificultar do que facilitar o raciocínio diagnóstico, pela grande quantidade de
informação que deverá ser codificada e interpretada.
Em um estudo desenvolvido por Bordage & Lemieux (1991) com
experientes e novatos acerca de seus raciocínios diagnósticos, os autores encontraram
que, entre as razões de falha na tarefa de resolução do caso diagnóstico, incluía-se o
estudante verboso, isto é, os que usavam de excessivo vocabulário não-estruturado
(“dispersão vazia”). Esse tipo caracterizou os sujeitos que geravam múltiplos
diagnósticos assim que a informação chegava ao seu conhecimento, porém eram
desestruturados e não-relacionados (Bordage & Lemieux, 1991, p. S71).
No tocante a isso, é essencial que os docentes tornem explícito que a
preocupação excessiva em diagnósticos precoces, sem a adequada contextualização do
quadro clínico, é prejudicial ao raciocínio diagnóstico.
Como acreditamos, a questão quantitativa dos dados pode interferir
na qualitativa. Ao propormos aos estudantes sublinharem os dados principais e
escreverem sobre sua importância para a situação diagnóstica, estamos interferindo
positivamente na percepção da importância da informação para o esquema (Sierra &
Carretero, 1996, p. 131).
Outra contribuição trazida pelas respostas no caderno de notas diz
182
respeito ao processo de abstração dos esquemas. Como Sierra & Carretero (1996,
p.131) afirmam: “mediante os processos de abstração, são extraídos os aspectos
significativos e são eliminados os aspectos ‘superficiais’” .
Entendemos, também, que parte desse domínio dos “aspectos
significativos” da informação possa ser discutido por intermédio dos preceitos teóricos
da estrutura semântica de Bordage & Lemieux (1991), notadamente dos “eixos
semânticos” . Eles representam níveis lógicos das abstrações, que facilitam a
estruturação do conhecimento, por criar uma associação entre o dado semântico e o
seu contraponto (Lemieux & Bordage, 1992, p. 18).
Quando propomos as duas últimas perguntas-padrão, estamos a
tentar promover um reconhecimento metacognitivo dos aspectos semânticos
envolvidos na situação. Por exemplo, a formação de um esquema mental efetivo sobre
o diagnóstico de enfermagem de dor depende de eixos semânticos como aguda-
crônica, contínua-intermitente, súbita-gradual.
De certo, supomos que uma desconsideração dos aspectos
semânticos dos dados dificulte a aprendizagem. Se extrapolamos a questão para a
compreensão dos significados da teoria da aprendizagem de Ausubel (apud Ontoria et
al., 1994), veremos que a inclusão dos aspectos semânticos pode ampliar as estruturas
de conceitos que o aprendiz possui, determinando, conseqüentemente, uma maior
capacidade de estabelecer novas relações entre as informações, o que gera novos
significados.
Ao responderem os questionamentos propostos, os aprendizes
tomam simultaneamente consciência da importância do dado selecionado, sendo
capazes de procederem a novas perguntas, por exemplo: Com que freqüência registro
dados sem importância? Qual o peso relativo dos dados secundários no meu processo
183
de seleção? Por que não selecionei, para este cliente, dados que se mostraram
fundamentais em uma situação anterior? Para quais dados esqueci de incluir um
quali ficador?
A tomada de consciência metacognitiva que se obtém do esforço em
responder aos questionamentos é capaz de interferir, melhorando, na aprendizagem dos
esquemas de eventos diagnósticos.
Outra estratégia que pode ser amplamente explorada é o mapa V (ou
V heurístico) proposto por Novak e Gowin (Novak e Gowin, 1995). Ela auxilia na
promoção dos processos de seleção, abstração, interpretação e integração da
informação (apud Pozo, 1996, p. 193-197), auxilia a tomada de consciência dos
elementos envolvidos no conhecimento construído nas situações teóricas e práticas do
contato com os diagnósticos de enfermagem.
Os mapas V (Novak e Gowin, 1995) foram desenvolvidos com a
finalidade de proporcionar um instrumento facili tador do aprender a aprender ciência.
Na visão dos seus idealizadores trata-se de método para adquirir-se conhecimento de
como o conhecimento é construído e usado, portanto, para uma competência de
metaconhecimento.
No contexto de potencializador da aprendizagem diagnóstica, o mapa
V pode ser um poderoso recurso para integrar os conhecimentos semântico (teórico),
episódico (das experiências práticas) e estratégico (estratégias diagnósticas). Isso se
dá, pois é capaz de explorar um fenômeno (no caso o processo diagnóstico) sob um
enfoque conceitual (pensamento) e metodológico (do fazer). O docente também pode
fazer adaptações no mapa V, com a finalidade de facilitar sua utilização pelos novatos.
Essa estratégia tem a grande vantagem de vincular o conhecimento teórico com a
realidade prática do cuidado de enfermagem, além de exigir o trabalho com o
184
metaconhecimento (Pozo, 1996, p. 195).
Outros recursos que promovam predominantemente a aprendizagem
tanto dos significados, quanto das relações existentes entre as informações, têm valor.
Entre os exemplos, incluímos: os mapas conceituais e os estudos de casos clínicos.
Finalmente, quaisquer que sejam as estratégias que os aprendizes
utili zem, devem estar implícitos os preceitos relacionados ao conhecimento
metacognitivo e à experiência metacognitiva, pois, mais do que meramente
diagnosticar, é esperado do estudante que saiba como diagnosticou; isto é, dele é
requerido um domínio que ultrapassa o âmbito cognitivo, para atingir o nível mais
elevado da cognição da cognição.
5 −− “ LIÇÕES DA EXPERIÊNCIA” : −− CONCLUSÃO
O uso de entrevistas semi-estruturadas permitiu a identificação e
análise de processos mentais nos estudantes de enfermagem deste estudo.
A aplicação de questionamentos baseados nos cinco aspectos-chave
(definições, finalidades, circunstâncias, modos de utilização e os critérios de avaliação)
permitiram que as estratégias diagnósticas de enfermagem fossem analisadas em
profundidade. Ainda, os aspectos-chave preservaram o caráter metacognitivista do
processo de coleta e análise dos dados do presente estudo.
Os sujeitos, estudantes de enfermagem, descrevem processos mentais
que, quando utili zados para a elaboração de um diagnóstico, podem ser identificados
como estratégias diagnósticas.
Essas estratégias mostraram grande diversidade, sendo o seu
significado fortemente individualizado.
Os significados tornaram difícil caracterizar de forma unívoca as
estratégias diagnósticas. Não foi possível, no grupo estudado, descrever uma dada
estratégia unicamente pelas ações executadas pelo aluno. Foi necessário considerar um
contexto mais amplo, em que ao conjunto de ações se adicionam as razões e os
objetivos visados pela estratégia. Por isso, a perspectiva metacognitivista mostrou-se
bastante adequada ao permitir explicitar significados para as ações. Assim, apenas o
significado atribuído pelo estudante a um dado conjunto de ações que tornou possível
caracterizá-lo ou não como estratégia. Ainda mais, o mesmo conjunto de ações, ainda
classificado como estratégias diagnósticas, podia ser diferentemente conceituado
conforme o significado a ele atribuído por um estudante específico.
De tais considerações foi possível identificar um total de dez
estratégias diagnósticas, a saber:
186
• Estratégia Um − Ouvir a passagem de plantão.
• Estratégia Dois − Leitura do prontuário.
• Estratégia Três − A conversa com o cliente.
• Estratégia Quatro − Exame físico.
• Estratégia Cinco − Observação.
• Estratégia Seis − Os testes de hipóteses diagnósticas.
• Estratégia Sete − O questionamento a profissionais da equipe de enfermagem.
• Estratégia Oito − Relacionamento entre dados.
• Estratégia Nove − A consulta ao livro.
• Estratégia Dez − O questionamento ao professor.
6 −− REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS: ADLER, M. J. & VAN DOREN, C. Segundo nível de leitura: leitura inspecional. In.
___. Como ler um livro. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1990. p.37-47.
ADLER, M. J. & VAN DOREN, C. O terceiro nível de leitura. In. ___. Como ler um
livro. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1990. p.59-153.
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Tecnologia educacional, v. 12, p.20-28, 1983.
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Education. Holist. Nurs. Pract., v. 10, p. 23-32, 1996.
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abordagem baseada na teoria das necessidades humanas básicas e na classificação
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BORDAGE, G. & LEMIEUX, M. Which medical textbook to read? Emphasizing
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RESUMO ..............................................................Erro! Indicador não definido.
ABSTRACT ..........................................................Erro! Indicador não definido.
1 −− “ O CONTEXTO DO ESTUDO” −− INTRODUÇÃOErro! Indicador não definido. 1.1−O objeto de estudo.................................................Err o! Indicador não definido.
1.2 − Metacognição e o conhecimento metacognitivo...Err o! Indicador não definido.
O que significa conhecimento metacognitivo?.................................................................. 10
Para que serve a metacognição?....................................................................................... 12
Como a metacognição atua sobre o aprendizado do indivíduo?......................................... 14
Quando uti li zar a metacognição?..................................................................................... 16
O que é conhecimento metacognitivo?............................................................................. 18
1.3 − O diagnóstico de enfermagem.............................Err o! Indicador não definido.
O que é um diagnóstico de enfermagem?......................................................................... 21
1.3.1 − O diagnóstico de enfermagem no contexto do processo de enfermagem...27
1.3.2 - O contexto da categoria diagnóstica........................................................... 30
1.3.3 − O contexto do enunciado diagnóstico ........................................................ 32
1.4 − A classe das estratégias diagnósticas...................Err o! Indicador não definido.
1.5 − A interface metacognição − processo diagnóstico em enfermagemErr o! Indicador não definido.
1.6 − Questões norteadoras...........................................Err o! Indicador não definido.
1.7 − Objetivos do estudo.............................................Err o! Indicador não definido.
1.7.1 − Geral ..............................................................Err o! Indicador não definido.
1.7.2 − Específicos.....................................................Err o! Indicador não definido.
1.8 − Justificativas e contribuições...............................Err o! Indicador não definido.
2 −− “ O COMO FOI FEITO” −− METODOLOGIA ....Erro! Indicador não definido. 2.1 −Tipo de estudo e abordagem...............................................................................45
Qual o tipo de estudo desenvolvido?................................................................................. 45
2.2 − Sujeitos e critérios de seleção..............................Err o! Indicador não definido.
2.2.1 − Os sujeitos das entrevistas preliminares em grupo.....................................48
2.2.2 − Os sujeitos das entrevistas individuais........................................................ 49
2.3 − Métodos...............................................................Err o! Indicador não definido.
2.3.1 − Coleta de dados .............................................Err o! Indicador não definido.
194
2.3.1.1 − A primeira fase da coleta de dados − entrevistas em grupo................................ 51
Como foram construídas as entrevistas em grupo?........................................................... 53
2.3.1.2 − A segunda fase da coleta de dados − entrevistas individuais.............................. 54
Como foram construídas as entrevistas individuais?......................................................... 56
2.3.2 − Tratamento e análise dos dados................................................................. 58
2.3.2.1 − Durante a etapa de coleta de dados.................................................................... 58
2.3.2.2 − Após a etapa de coleta de dados........................................................................ 59
Como desenvolvemos as categorias de codificação?......................................................... 60
Como apresentamos e discutimos os achados do estudo na análise qualitativa?................ 61
3 −− “ A DESCRIÇÃO DAS ESTRATÉGIAS DIAGNÓSTICAS DE
ENFERMAGEM” −− RESULTADOS ......................Erro! Indicador não definido. 3.1- As estratégias diagnósticas de enfermagem que antecederam o encontro com o
cliente................................................................................Err o! Indicador não definido.
Estratégia Um − Ouvir a passagem de plantão...........Err o! Indicador não definido.
A quais finalidades serviu a estratégia de ouvir a passagem de plantão?........................... 65
Como os estudantes uti li zavam-se da passagem de plantão para fazer diagnósticos?........ 66
Estratégia Dois − Leitura do prontuário.....................Err o! Indicador não definido.
Para que os alunos l iam os registros previamente com finalidade diagnóstica?................. 68
Como os estudantes l iam o prontuário antes do encontro com o cliente?.......................... 69
Como avaliavam a eficácia da estratégia no processo diagnóstico?................................... 71
3.2 − As estratégias diagnósticas de enfermagem aplicadas durante o encontro com o
cliente................................................................................Err o! Indicador não definido.
Estratégia Três − A conversa com o cliente...............Err o! Indicador não definido.
Quais foram as finalidades diagnósticas da conversa com o cliente?................................. 74
Como e em que circunstâncias os estudantes conversavam com os clientes no processo diagnóstico?..................................................................................................................... 76
Como os sujeitos avaliaram a util ização da conversa com o cliente para fins diagnósticos?79
Estratégia Quatro − Exame físico...............................Err o! Indicador não definido.
Para quais finalidades servia o exame físico no processo diagnóstico?.............................. 81
Como e quando faziam o exame físico?............................................................................ 83
Como avaliavam se o exame físico foi adequado ao processo diagnóstico?....................... 86
Estratégia Cinco − Observação ..................................Err o! Indicador não definido.
Quais os objetivos de aplicar a observação como estratégia diagnóstica em enfermagem?. 88
Como e quando usaram da observação no diagnóstico em enfermagem?.......................... 89
Qual eficácia a observação ofereceu ao processo diagnóstico de nossos estudantes?.......... 91
Estratégia Seis − Os testes de hipóteses diagnósticas.Err o! Indicador não definido.
Para quais finalidades diagnósticas os testes de hipóteses eram util izados? ...................... 93
195
Como e quando as hipóteses foram testadas no processo diagnóstico?.............................. 93
Como era avaliada a eficácia da estratégia de testar as hipóteses diagnósticas? ................ 94
3.3 − As estratégias diagnósticas de enfermagem aplicadas após o encontro com o
cliente................................................................................Err o! Indicador não definido.
Estratégia Sete − O questionamento a profissionais da equipe de enfermagemErr o! Indicador não definido.
Quais as finalidades diagnósticas do questionamento aos profissionais?........................... 96
Como e quando implementavam a estratégia, e como avaliavam sua eficácia no processo?97
Estratégia Oito − Relacionamento entre dados...........Err o! Indicador não definido.
Quais os propósitos de estabelecer relações entre os dados no processo diagnóstico de enfermagem?................................................................................................................... 99
Como os sujeitos estabeleciam relações entre os dados? ................................................. 101
Quando a estratégia de relacionamento entre dados foi uti li zada?.................................. 104
Como os sujeitos avaliavam a eficácia do estabelecimento de relações?.......................... 106
Estratégia Nove − A consulta ao livro........................Err o! Indicador não definido.
Para que consultar um livro de diagnóstico de enfermagem?.......................................... 107
Como ler o livro para elaborar um diagnóstico de enfermagem?.................................... 109
Quando ler o livro para elaborar um diagnóstico de enfermagem?.................................. 110
Como os estudantes avaliavam a eficácia de ler um livro sobre diagnóstico de enfermagem?111
Estratégia Dez − O questionamento ao professor.......Err o! Indicador não definido.
Para que os estudantes questionavam ao professor durante o processo diagnóstico?........ 113
Como e quando os estudantes questionavam ao professor durante o processo diagnóstico?115
Como os alunos avaliavam a eficácia do emprego dessa estratégia no processo diagnóstico?116
4 −− “ OS SIGNIFICADOS” −− DISCUSSÃO............Erro! Indicador não definido. 4.1 − Da metodologia − “Reconhecendo as escolhas....Err o! Indicador não definido.
Por que um estudo descritivo?........................................................................................ 118
Por que uma abordagem qualitativa?.............................................................................. 120
Por quê estudantes do quinto período para compor o grupo de sujeitos?......................... 122
Como determinamos nosso ponto de saturação dos dados?............................................. 125
A entrevista é a técnica de coleta de dados mais adequada ao nosso estudo?................... 126
Por que entrevistas em grupo na primeira fase da coleta de dados?................................. 129
O que seria adequar o pesquisador à técnica de coleta de dados? Para que fazê-lo?......... 130
Como as entrevistas individuais atenderam a um perfil analítico?.................................. 131
4.2 − Dos resultados − “A noção do todo” ....................Err o! Indicador não definido.
4.2.1 − Considerações sobre as estratégias usadas antes do encontroErr o! Indicador não definido.
Como os conhecimentos sobre aprendizagem podem melhorar o aproveitamento das estratégias de pré-encontro?.................................................Err o! Indicador não definido.
4.2.2 − Considerações sobre as estratégias diagnósticas usadas durante o encontroErr o! Indicador não definido.
Como os conhecimentos sobre aprendizagem podem melhorar o aproveitamento das
196
estratégias de encontro?.......................................................Err o! Indicador não definido.
4.2.3 − Considerações sobre as estratégias diagnósticas util izadas após o encontroErr o! Indicador não definido.
Como os conhecimentos sobre aprendizagem podem melhorar o aproveitamento das estratégias de pós-encontro?.................................................Err o! Indicador não definido.
5 −− “ LIÇÕES DA EXPERIÊNCIA” : −− CONCLUSÃOERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
6 −− REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS:.. ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
197
Brandão, Marcos Antônio Gomes
Uma visão metacognitiva das estratégias diagnósticas de
enfermagem / Marcos Antônio Gomes Brandão. Rio de Janeiro:
UFRJ/NUTES, 1999.
192p.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, 1999.
1. Enfermagem - Diagnóstico. 2. Metacognição. 3. Estratégias
diagnósticas. I - Título. II - Tese (Mestr. - UFRJ/NUTES).
CDD 610.73075