UMA CONCEPÇÃO SISTÊMICA DA OBRA DE ARTE NA CONTEMPORANEIDADE

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    UMA CONCEPO SISTMICA DA OBRA DE ARTE NACONTEMPORANEIDADE

    Andria Machado OliveiraUFRGS-Brasil/UdM - Canad

    Hermes Renato HildebrandUNICAMP/PUCSP Brasil

    RESUMO:

    O presente artigo apresenta uma viso sistmica da obra de arte na contemporaneidade,com foco na arte digital. Tal abordagem tem como fundamentao terica as idias deprocessos de individuao de Gilbert Simondon, de processos de comunicao de VilmFlusser e a Teoria da Complexidade. Estas teorias convergem na busca de um modelo que

    trata a obra de arte como um processo contnuo onde as vises entre natural e artificial,obra e espectador (inter(ator)) e arte, cincia e tecnologia se apresentam hbridas. Umaabordagem sistmica que extrapola a noo de objeto artstico isolado e individuado e ondeo conceito de sistema como obra de arte influenciado pela cincia, atravs de novasformulaes tericas que observam os fenmenos sob o ponto de vista sistmico, atravsdos suportes e interfaces tecnolgicas, expondo novas possibilidades fsicas, conceituais epoticas.

    Palavras-chave: arte, tecnologia, sistema, individuao, comunicao.

    ABSTRACT:

    This article shows a systematic point of view in the artwork in contemporary, specially indigital art. Such approach is based on Gilbert Simondons idea of individuation process,Vilm Flussers idea of communication process and Complexity Theory. These theories arelooking for a model which treats the artwork as a continuous process where natural andartificial, artwork and spectator (interactor), and art, science and technology are presentedhybrid. In this sense, we seek a systematic approach which goes beyond the notion ofisolated and individuated artefact and where the artwork as a system concept is influencedby science through new theoretical formulations which realize the phenomena observedunder the systemic point of view and expose new physical, conceptual and poetic

    possibilities through media and technological interfaces.Keywords: art, technology, system, individuation, communication.

    Introduo

    Hoje, os suportes digitais apoiados nos meios de produo permitem novas formas

    de conexo entre Arte, Cincia e Tecnologia. Tal dinmica nos leva concepo de

    sistema como obra de arte. Desloca-se o foco da obra circunscrita em si paraabarcar as relaes sistmicas onde ela encontra-se inserida. Focar nos sistemas

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    em vez da obra de arte propriamente dita dar nfase, s conexes, aos ns,

    fluidez das bordas e dobras, aos espaos vazios, subjetividade, ao sujeito mediado

    pelo Outro na linguagem e na cultura e, de fato, s foras no visveis do mundo que

    nos cerca. Consideramos que estas questes so vitais, em funo da vertiginosa

    dinmica que as tecnologias propiciam nos processo de mediao, cada vez mais

    densos, complexos, emergentes e adaptveis ao ambiente.

    Processo de Comunicao como Sistema

    Nossas ferramentas, linguagens e sistemas, hoje, colocam-se diante de uma "crise

    de representao" generalizada (Plaza, 1991, p.45), portam-se como se estivessem

    esfacelados, mas, na verdade, deixam claro que, atravs de nossas observaes

    dos fenmenos naturais e culturais organizam-se segundo modelos que s vezes

    no esto totalmente estruturados em nossos sentidos. Contudo, eles possuem

    caractersticas que possivelmente se organizaram a partir de novos modelos de

    observao que concebemos, num processo sistmico e contnuo de produo de

    conhecimento; numa outra metodologia de investigao cientfica.

    Os meios de comunicao geram novos signos, que, por sua vez, abrem novas

    possibilidades de significao, e, assim, se pretendemos viver intensamente esse

    momento, devemos buscar compreender como se organizam os signos que, cada

    vez mais, abrem suas portas interao do homem com o mundo que nos cerca, e

    atravs de nossas mentes. Entre esses meios, destacamos as mdias digitais, que,

    com os cdigos de baixo nvel, os pxeis e uma lgica binria, ordenam-se segundo

    o modelo de Boole. Esse modelo, seus algoritmos e o conhecimento matemtico

    esto intrinsecamente relacionados aos meios de comunicao.

    As imagens e ambientes gerados pelos sistemas computacionais simulam objetos,

    que as vezes no existem. So codificaes matemticas, conduzindo-nos aos

    novos paradigmas de percepo em que a questo digital se impe. Este processo

    de elaborao de conhecimento como um sistema univocamente determinado rene

    produo e distribuio das informaes, num s princpio, criando ambientes que

    so simulacros de nossas mentes.

    Atualmente, podemos olhar as produes como elos de um processo cognitivo

    nico, onde mente e mundo fazem parte do mesmo ecossistema, convivemos,

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    intimamente, com a lgica binria e com o mundo digital e, assim, a arte, a

    matemtica, cincia e tecnologia, e tudo mais, unem-se em busca de suas

    similaridades e dilogos. O perfil produtivo do momento em que vivemos, est

    apoiado nos conceitos e procedimentos lgicos matemticos das ferramentas que

    so nossos artifcios e que usamos para produzir a comunicao humana. Segundo

    Flusser (2009) a comunicao foi criada pelo homem com o propsito de promover o

    esquecimento da falta de sentido e da solido de uma vida para a morte, a fim de

    tornar a vida vivvel. Ele afirma que

    A comunicao humana um artifcio cuja inteno nos fazer esquecer a

    brutal falta de sentido de uma vida condenada morte. Sob a perspectiva

    da natureza , o homem um animal solitrio que sabe que vai morrer e que

    a na hora da sua morte est sozinho. [...] Sem dvida no possvel viver

    com esse conhecimento da solido fundamental e sem sentido. A

    comunicao tece o vu do mundo codificado, o vu da arte, da cincia, da

    filosofia e da religio, ao redor de ns [...](2009, p.91).

    Para Flusser, esse propsito, na medida em que estabelece um mundo codificado,

    ou seja, um mundo construdo a partir de smbolos ordenados tem como objetivo

    represar as informaes adquiridas. E, assim, ao armazenar informaes, estamosvivendo e negando a nossa natureza para a morte na solido (2009, p.89-100), ou

    seja, a partir dos processos de comunicao criamos um mundo codificado e

    artificial que constri e potencializa o mundo natural. Ou melhor, Flusser nos mostra

    que no temos como separar a produo do natural e do artificial na vida, e caso

    haja separao, nos leva morte, ao isolamento ou despotencializao da vida.

    Sistema e Processo de Individuao

    Deste modo, ao compartilharmos esses pontos de vista estamos dando vazo

    pulso de vida e de morte simultaneamente, formulada por Freud, na medida em

    que descobrimos novos padres de representao cultural e natural. Esse fato no

    permite apenas a ampliao do conhecimento, como tambm estabelece a

    constituio de subjetividades, novos sentidos para a vida e novas percepes da

    realidade. Na perspectiva do sistema como obra de arte, Gilbert Simondon nos

    auxilia ao apontar a idia de sistema como algo em contnuo movimento emprocesso de individuao. Para ele, a individuao no um resultado, mas um

    processo contnuo atravs do qual o indivduo se constitui como tal, construindo a

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    sua subjetividade no campo do pr-individual de singularidades e de

    potencialidades. Todo indivduo um processo dinmico. Este processo acontece

    no dilogo entre as diferenas e na criao e dissoluo das tenses,

    incompatibilidades e desigualdades em busca de um equilbrio temporrio e

    intrnseco aos sistemas, ao qual Simondon denomina metaestvel.

    Neste sentido, hoje, a obra de arte, produtor e observador (inter(ator)) constituem-se

    num sistema como um processo nico. De acordo com Simondon, deve-se

    conhecer o indivduo pela individuao muito mais do que a individuao a partir do

    indivduo (2003, p.100). Ele concebe o indivduo em sua subjetividade a partir da

    individuao, ou seja, a partir de uma ontologia que pondera o ser no como nico,

    pronto e isolado, mas como algo que est sempre se tornando. Um processo

    dinmico que no permite o congelamento das formas, corpos, espaos e tempo,

    uma vez que est num contnuo processo de saturao e transformao; numa

    permanente diferenciao de si mesmo. Simondon entende que [...] primeiro, existe

    o princpio de individuao; em seguida, este princpio opera em uma operao de

    individuao; por fim, o indivduo constitudo aparece (2003, p.100).

    Os indivduos obra, produtor e inter(ator) pertencem ao mesmo processo deindividuao, estando em interatividade constante via relaes de causalidade. Essa

    interao ocorre entre corpos em atividade relacional em sistemas de individuao,

    j que a interao, aqui, vista como ressonncia interna de um sistema (Oliveira,

    2008). Os indivduos vivos no so termos prontos de uma relao, mas, como

    Simondon nos diz, teatro e agente de uma relao em uma comunicao interativa

    em que no est em relao nem consigo mesmo nem com outra realidade, j que

    ele es el ser de la relacin, y no ser en la relacin, pues la relacin es operacinintensa, centro activo(1964, p.38).

    Assim, a individuao no resultado de forma e matria, corpo e alma, mas sim

    expresso de uma resoluo em constante (trans)formao. A interatividade, vista

    pela individuao, uma experincia de presentificao, indo alm da

    representao. Deleuze comenta que

    dir-se- tanto que ela (individuao) estabelece uma comunicao interativaentre as ordens dspares de grandeza ou de realidade; ou que ela atualiza a

    energia potencial ou integra as singularidades; ou que ela resolve o

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    problema posto pelos dspares, organizando uma dimenso nova na qual

    eles formam um conjunto nico de grau superior (1969, p. 119).

    Observa-se que a funo do pblico alterada nessa viso sistmica das obras de

    arte. Segundo Milton Sogabe,

    a interao propriamente dita, no sentido do pblico afetar os eventos que l

    acontecem, d ao pblico uma nova funo ou caracterstica, solicitando

    sua participao no s atravs da interpretao ou reflexo mental, mas

    tambm a sua atuao corporal na obra (2008, p.1988).

    Aqui, ressalta-se novamente, que esta atuao na obra no se restringe a uma ao

    definida a priori, como apertar um boto, mas uma ao de experimentao ao nvelmolecular dos corpos ou elementar dos objetos tecno-estticos, uma ao de

    agenciamentos, agenciar estar no meio, sobre a linha de encontro de um mundo

    interior e de um mundo exterior (Deleuze, 1969, p.131). Assim, o pblico inter(ator)

    pertence a obra, j que, por exemplo, o espao das instalaes que era ocupado com

    elementos tridimensionais d lugar ao pblico que precisa se movimentar e atuar

    dialogando com os elementos virtuais que se atualizam (Sogabe, 2008, p.1990).

    Osmose, (1995) de Charlotte Davies,Captura em Tempo Real. So 12 mundos em Osmose

    que podem ser explorados em qualquer ordem.

    Podemos observar tais relaes em obras de realidade virtual, como Osmose

    (1995) e Ephmre (2000) de Charlotte Davies e Avraham Eilat respectivamente.

    Osmose propicia uma experincia sem contigidade com o referente real e comoutras situaes espao-temporais. Segundo Oliver Grau,

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    enquanto ambientes virtuais anteriores apresentavam portais que

    resultavam em transies abruptas, no mundo das imagens de Osmose o

    observador vivencia transies osmticas de uma esfera a outra, vendo

    uma esfera esmorecer lentamente antes de se amalgamar prxima (2007,

    p.222)

    Nessa obra o inter(ator) atinge um estado de imerso atravs das transformaes da

    paisagem digital, experimentando sensao de leveza, ausncia de gravidade e

    movimento multidirecional. Em Osmose utiliza-se capacete de realidade virtual,

    recursos da computao grfica 3D e sons interativos que so explorados

    sinestesicamente.

    As relaes entre obra e inter(ator) tambm so analisadas na videoinstalao in

    process Jogo de Corpos dos autores desse texto. Nesta obra, as figuras vo

    sobrepondo-se, movendo-se pelas paredes, aparecem, escondem-se, repetem-se,

    diluem-se, fragmentam-se, cortam o espao, alteram seus tamanhos, misturam-se

    com os sons e com as sombras dos inter(atores). O meio digital oferece a

    possibilidade de movimento de animao quelas figuras que estavam em repouso

    em imagens de xilogravuras e s sombras capturadas na obra.

    Cria-se um meio hbrido de imagem e som que proporcionar um espao imersivo

    na sala escura com ritmo de projeo das imagens que permitir a interao

    (atuantes). Os inter(atores) agem na cena como personagens daquele drama,

    experimentam de maneiras no habituais, percebem seus corpos com as

    configuraes dos corpos projetados. Todos interagem na obra, entretanto, a obra

    no totalmente dada, fechada; pelo contrrio, ela atualiza-se a partir da ao dos

    indivduos naquele meio: os sujeitos atuam em cenas alm-cotidiano propostas pela

    obra e tecnologia. As relaes entre obra, tecnologia e humano pressupem

    interao em processo de individuao.

    O meio criado nesta videoinstalao abriga as deformaes das imagens projetadas

    das figuras femininas da srie Avesso e das sombras dos corpos dos inter(atores),

    visando construir um espao no euclidiano, projetivo de imerso. As imagens das

    xilogravuras trazem um rebatimento do espao, uma busca escheriana de uma

    construo paradoxal, um espao que vai se esfacelando. As figuras femininas,antes fixas em seus lugares nas xilos, agora se misturam com os fundos, mostrando-

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    se com seus avessos, sem lado, assim como as Faixas de Mobius e os desenhos

    de Escher. O meio criado pela tecnologia digital permite que estes rebatimentos

    repitam-se e espandam-se, gerando um espao projetivo de representao na obra.

    Videoinstalao Jogos de Corpos, (2010),de Andria Oliveira e Hermes Renato Hildebrand

    Assim, a videoinstalao, como um work-in-process um sistema como obra e de

    fato, de acordo com o seu tempo, uma obra inacabada e em processo, seguindo

    em direo a uma necessria busca pela expanso dos limites da arte, propondo

    novos caminhos para o entendimento do contemporneo. O objetivo dessapesquisa-criao encontrar padres emergentes, por isso mesmo novo nas

    relaes entre os seres vivos e o meio.

    Sistema e Teoria da Complexidade

    Tais relaes tambm podem ser encontradas nas obras do grupo SCIArts Equipe

    Interdisciplinar que desenvolve seus trabalhos na interseco entre arte, cincia e

    tecnologia e a partir da idia de sistema como obra de arte (Hildebrand, 2009). Aproduo do grupo procura exprimir a complexidade existente na relao entre estes

    elementos e a representao de conceitos artstico-cientficos contemporneos que

    demandem novas possibilidades miditicas e poticas. A obra Por um Fio prioriza

    as relaes entre as diversas obras existentes em uma mostra de arte e opera com

    os processos paradoxais da observao humana onde interagem simultaneamente

    espaos virtuais e realidade, imagens em tempo real e pr-gravadas.

    O estranhamento provocado pela incerteza da observao. Ora temos a imagem

    em tempo real, ora ela apresenta-se pr-definida, em ambos os casos elas esto

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    mediadas por interfaces eletrnicas. O inter(ator) aciona sensores que vo produzir

    significados que o deixam inseguro a respeito do que se est vendo. Assim, nossa

    percepo sobre as outras obras da mostra e, consequentemente, nossas

    interpretaes esto Por um Fio.

    J em Entremeios I e II as obras operam nos espaos entre obras e transforma a

    individualidade das obras presentes nos eventos - Mediaes: Arte-Tecnologia, na

    Fundao Ita Cultural em 1997 e na II Bienal do Mercosul, no Rio Grande do Sul

    em 2000. So dois sistemas integrados que ganham significados com a presena

    dos inter(atores) no ambiente. Elas possuem como caracterstica principal, no

    serem objetos um espaos definidos, mas sim sistemas onde tudo se torna parte de

    um organismo vivo e integrado. Buscam relaes entre todos os elementos

    existentes, sejam as obras, os acontecimentos circundantes e as pessoas que

    interagem com as obras. As obras Re-Trato, Des-Espelho e Mar-Ciso atuam

    com o sujeito mediado pelo Outro, pela linguagem e pela cultura.

    Instalaes Interativas do Grupo SCIArts,Entremeios, (1997) e Mar-Ciso, (2006)

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    Des-espelho, (1998), do Grupo SCIArts

    Os sistemas so construdos de maneira que se produzam espelhos bizarros que

    reflitam outras faces de ns mesmos para a nossa prpria contemplao. Essas

    obras propem jogos de imagens no qual o indivduo se reconhea a partir de outros

    pontos de vista, que no o de seu prprio, mas de outro externo e que causa

    estranhamento de si mesmo.

    Por fim, Atrator Potico, Gira.S.O.L e MetaCampo so produes que operam

    com as foras no visveis da natureza. A instalao hipermdia interativa Atrator

    Potico constri sua potica atravs do dilogo entre imagem, som, ferro-fludo (um

    lquido magntico que se conforma ao campo formado por bobinas

    eletromagnticas) e a interao com o pblico e foi realizada em parceria com o

    msico Edson Zampronha. A obra Gira S.O.L. - Sistema de Observao da Luz -

    utiliza-se de uma estrutura que possui a propriedade de se organizar diante de um

    estmulo ambiental tal como a flor girassol. A relao entre a natureza e a tecnologia,

    atravs da utilizao da energia solar constri a potica da obra. A idia de sistema

    como obra de arte faz parte de uma viso processual e relacional do mundo que,

    cada vez mais, vem se afirmando em todos os campos do conhecimento.

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    Instalaes Interativas do Grupo SCIArtsAtrator Potico e Gira S.O.L., (2005 e 2007),

    Essa ideia faz referncia obra propriamente dita, que no se apresenta como um

    objeto ou um espao fsico delimitado e visvel, mas como um sistema. Metacampo

    uma instalao interativa que envolve sensores, sistema de controle digital com

    computador e microcontrolador e atuadores eletromagnticos. A interao se d pela

    ao do vento, externo ao espao expositivo, e pela presena das pessoas no

    espao interno da obra e opera com o conceito de autonomia. Hastes verticais so

    movimentadas atravs da ao do vento provocado artificalmente. Essa obra estsendo projetada para ser realizada no evento Emoo Art.Ficial, em junho, no Ita

    Cultural, em 2010. Consiste de um objeto artstico com caractersticas adaptveis e

    virtualmente imprevisveis, portanto, a autonomia do sistema implica no conceito de

    emergncia de processos, bem como adaptabilidade a mudanas de condies

    ambientes, sejam elas reais ou virtuais

    As instalaes desenvolvidas pelo grupo SCIArts, desde o princpio, baseiam-se na

    idia de um sistema interligando eventos, influenciado pelas teorias dos sistemas

    complexos, dos campos mrficos, da teoria das redes e do efeito borboleta. Na

    Argentina, nos anos 60, o Centro de Estudios de Arte y Comunicacin (CAYC),

    apontou para essas possibilidades criativas, trazendo a idia da arte de sistemas.

    preciso considerar o contedo semntico presente na expresso arte de

    sistemas e compar-lo com o conceito sistema como obra de arte, aqui proposto.

    No primeiro caso, h uma generalidade artstica que, de alguma maneira, se

    conforma em um sistema, enquanto, no segundo caso, a natureza do sistema que

    permite v-lo como obra artstica. H ainda uma diferena crucial no enfoque dado

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    ao conceito de sistema, hoje, as teorias consideradas fazem suas observaes com

    base nos sistemas complexos.

    De maneira simplificada podemos dizer que a Teoria da Complexidade definesistemas complexos a partir de modelos constitudos por muitas partes

    heterogneas que interagem localmente sem interferncias de um controle central. A

    partir dessa abordagem, afirmamos que o universo sistmico. A poltica, a

    economia, o trfego nas grandes cidades e os sistemas inteligentes, inclusive o

    homem, pode ser descritos como sistemas que compartilham comportamentos ou

    dinmicas semelhantes, e, apesar das particularidades, e das escalas, mantm

    similaridades em suas composies. O entendimento de tais dinmicas sistmicas

    requer a integrao de inmeras perspectivas oriundas das mais diversas reas do

    conhecimento, partindo da fsica qumica, da biologia cincia da computao, da

    cincia social economia, da matemtica s artes.

    O tipo de abordagem que se realiza dentro da perspectiva da complexidade enfatiza

    aspectos da organizao, da arquitetura dos sistemas em detrimento do

    estabelecimento de estados individuais, aproximando-se dos processos de

    individuao de Simondon. O objetivo da teoria da complexidade buscarcompreender como novas classes de entidades se estabelecem e permanecem,

    como por exemplo, sistemas qumicos autnomos, organismos vivos, estruturas

    cognitivas e sociedades, modelando-as no contexto de uma abrangente teoria da

    evoluo. Dentro de uma perspectiva de aplicao to ampla, no descabido

    supor que as Artes e suas prticas possam ser consideradas como objetos de

    estudo no campo de conhecimento configurado pelas teorias dos sistemas

    complexos.

    Aventar tal possibilidade sistmica de anlise que reflete sobre a comunicao

    humana, no implica negar ou desconsiderar outras abordagens. Ao contrrio, a

    utilizao de um instrumental oriundo da teoria da complexidade, da individuao e

    da observao do porque comunicamos, coloca-se aqui como tentativas de

    contribuir para a ampliao do conhecimento crtico da Arte, principalmente quando

    se trata de refletir sobre caractersticas emergentes como as que se apresentam nas

    obras de Artes Contemporneas com base nas Tecnologias. As prticas artsticas de

    hoje e as rupturas com padres pr-estabelecidos representam, no contexto da Arte,

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    demandam novos paradigmas e, eventualmente, a reformulao de aspectos

    ontolgicos de observao das Artes.

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    Andria Machado Oliveira

    Professora e Artista Multimdia, Mestre em Psicologia Social e Institucional/UFRGS edoutoranda em Informtica na Educao/UFRGS-Brasil e UdM-Canad. Integrante dosgrupos: Modos de Trabalhar, Modos de Subjetivar/UFRGS; e NESTA (Ncleo de Estudosem Subjetivao, Tecnologia e Arte)/UFRGS. Bolsista CNPQ.

    Av. Otto Niemeyer, 2417-115Porto Alegre RS Brasil - 91910 [email protected]

    Hermes Renato Hildebrand

    Professor da UNICAMP/PUCSP e Artista Multimdia, Mestre em Multimeios/UNICAMP eDoutor em Comunicao e Semitica/PUCSP. Desenvolve produes artsticas com o grupode artistas SCIArts - Equipe Interdisciplinar. Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas -LIPACS Laboratrio Interdisciplinar de Pesquisa-Ao com Comunidades Saudveis(Cultura, Sociedade e Mdia/UNICAMP/TIDIA-aE)

    Rua Antonio Galvo de Oliveira Barros, 126Baro Geraldo Campinas So PauloSP Brasil - [email protected]