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1 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA UMA ANÁLISE SOBRE A APLICAÇÃO DO ARTIGO 408, § 4°, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL JULIANA BERTEMES POLUCENIO SÃO JOSÉ, OUTUBRO DE 2007

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA

UMA ANÁLISE SOBRE A APLICAÇÃO DO ARTIGO 408, § 4°, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

JULIANA BERTEMES POLUCENIO

SÃO JOSÉ, OUTUBRO DE 2007

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA

UMA ANÁLISE SOBRE A APLICAÇÃO DO ARTIGO 408, § 4°, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

Monografia apresentada como requisito para obtenção do grau em Direito na Universidade do Vale do Itajaí.

JULIANA BERTEMES POLUCENIO

Orientador: Professor Doutor Gilberto Callado de Oliveira

São José, Outubro de 2007

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DEDICATÓRIA Gostaria de agradecer todos aqueles que estiveram comigo durante esta caminhada. Entre eles eu posso destacar algumas pessoas. Primeiramente o meu irmão Adriano, que esteve muito presente durante o começo da minha Universidade. Acolheu-me na sua empresa, permitindo assim, que eu pudesse conciliar os estudos com o trabalho, além de dar um enorme apoio moral e financeiro. Também me ofereceu muitos conselhos ao longo destes cinco anos, brigou comigo quando foi necessário e nunca deixou que eu esquecesse o meu verdadeiro objetivo. Maninho obrigado por ser meu papai de coração. Outra pessoa que merece ser lembrada é a minha Vó Carmem, foi á ela que eu recorri em todos os momentos de dificuldades. Ela foi o grande alicerce desta minha trajetória, esteve ao meu lado desde a primeira fase. Alguns dos momentos mais felizes destes cincos ano eu devo tudo a ela. Vózinha, obrigada por ser minha segunda mãe. Gostaria também de agradecer ao meu pai. Mesmo que tenhamos algumas diferenças, sei que ele fez tudo que era possível, e impossível, para que o meu sonho de estar formada se realizasse. Eu te amo muito pai, obrigada. Gostaria de agradecer também, ao meu irmão Alexandre, meu amigo para todas as horas, que compartilhou comigo todos os momentos, bons e ruins, da minha faculdade, além de ter me dado um sobrinho lindo, o Gui, que é a grande paixão da minha vida. Sobre a minha mãe, eu nem tenho palavras para descreve-lá. É a melhor mãe do mundo, batalhou, correu, sofreu e ficou feliz, enfim, dividiu comigo todos os sentimentos desde que entrei na faculdade. Não tenho palavras para descrever o quanto eu a amo, e o quanto eu vou ser eternamente agradecida por ela ter aceitado participar deste desafio ao meu lado. Não existe no mundo ninguém com um coração igual ao seu. Mãe eu te amo muito, obrigada por tudo, sempre. Por fim, gostaria de agradecer ao meu noivo, um anjo que apareceu na minha vida. É o meu melhor amigo, meu melhor companheiro, e é muito mais do que eu sempre sonhei para mim. Mesmo com a distância que às vezes nos separa, esteve muito presente nesta reta final, me dando carinho e muito apoio nos momentos mais complicados. Agüentou meu mau—humor, e teve muita paciência comigo, me deu carinho e atenção. Amor, não sei descrever quão importante és para mim, você é único, especial e insubstituível na minha vida. Hoje encerro uma fase muito importante da minha vida, mas ao seu lado, iniciarei uma fase ainda mais bela, cheia de sonhos e felicidade. Amo-te para sempre, obrigado por tudo.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

São José, Outubro de 2007

Juliana Bertemes Polucenio] Graduando

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RESUMO O Tribunal do Júri é uma instituição do Poder Judiciário, que tem por finalidade julgar os crimes dolosos contra vida. O Júri possui duas fases bem distintas. A primeira fase é denominada judicium accusationis. Essa fase tem início com o oferecimento da denúncia, e tem fim, com a decisão do Juiz Singular. A segunda fase do Júri é denominada judicium causae. São decisões do judicium acusationis: Pronúncia, Impronúncia, Absolvição Sumária e Desclassificação. Todas estas decisões serão abordadas detalhadamente nesta monografia. A sentença de pronúncia é uma decisão interlocutória de caráter misto, que encerra a primeira fase do Júri, e julga procedente a pretensão punitiva do Estado. É efeito da pronúncia o réu ser encaminhado para julgamento perante o Tribunal do Júri. Pode o Magistrado, ao prolatar sentença de pronúncia, reconhecer nova classificação do delito, ou nova qualificadora, segundo o artigo 408, § 4°, do Código de Processo Penal. Controverso, a conexão com o artigo 384 e seu parágrafo único, do mesmo Código, que determina que o Juiz, ao reconhecer nova classificação, deverá abrir prazo para a defesa manifestar-se, e para acusação aditar a denúncia. Estudarei esta divergência, com base na doutrina e na jurisprudência brasileira, diferenciando os casos de emendatio libelli e mutatio libelli. Ao final tentarei apontar um caminho para resolução do problema relacionado a dos artigos acima mencionados. Palavras-chave: Judicium Accusationis. Pronúncia. Nova Classificação. Emendatio Libelli. Mutatio Libelli.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................7 2 TRIBUNAL DO JÚRI....................................................................................10 2.1 Origem...............................................................................................................11 2.2 Histórico no Brasil..............................................................................................14 2.3 Competência do Tribunal do Júri.......................................................................19 3 DECISÕES DO JUDICIUM ACUSATIONIS...........................................23 3.1 Pronúncia...........................................................................................................25 3.2 Impronúncia........................................................................................................31 3.3 Absolvição Sumária............................................................................................34 3.4 Desclassificação da Infração Penal....................................................................37 4 UMA ANÁLISE SOBRE A APLICAÇÃO DO ART 408, § 4°, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.........................................................39 4.1 Doutrina.............................................................................................................41 4.2 Jurisprudência...................................................................................................49 4.2.1 Tribunal de Justiça de Santa Catarina..............................................................49 4.2.2 Superior Tribunal de Justiça.............................................................................52 4.2.3 Supremo Tribunal Federal................................................................................54 4.3 Emendatio Libelli e Mutatio Libelli....................................................................58 5 CONCLUSÃO...................................................................................................60 6 REFERÊNCIAS.................................................................................................63

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1. INTRODUÇÃO

O objetivo principal deste trabalho é analisar a aplicação do art. 408, § 4°, do

Código de Processo Penal. Este artigo confere ao Juiz de Direito a faculdade de

imputar nova classificação ao delito. Será estudado, entretanto, se é necessário o

aditamento da denúncia, pelo Promotor de Justiça, nos casos em que o Juiz alterar

a classificação trazida pela peça acusatória.

Outros temas também serão abordados nesta monografia, para que o leitor

possa entender este assunto de forma mais clara.

No primeiro capítulo, será transcrito um histórico sobre a origem do Tribunal

do Júri, desde o seu surgimento na Idade Antiga e até a sua chegada no Brasil.

Logo após será apresentada a trajetória desta instituição em nosso país, e de que

forma evoluiu para conquistar as características descritas na atual Constituição

Federal. No final deste capítulo será abordada a regra de competência para os

julgamentos pelo Tribunal do Júri, assim como as exceções a esta regra.

No segundo capítulo, o leitor conhecerá as possibilidades que possui o

Magistrado ao encerrar o judicium accusationis. Estas decisões podem encerrar a

primeira fase do procedimento bifásico do Júri, ou ainda, encerrar o processo. Neste

momento pode o Juiz: Pronunciar o réu, Impronunciar, Desclassificar ou Absolver

Sumariamente

Durante o terceiro capítulo, será abordado o tema principal dessa

monografia, a análise do artigo 408, § 4°, do CPP, e a sua utilização nas sentenças

de pronúncia. O estudo acontecerá através da pesquisa realizada em doutrinas e

jurisprudências. Será apontado o entendimento de vários autores, e algumas

decisões dos Tribunais pátrios, para que ao final se conclua quando o artigo supra

deve ser utilizado.

O estudo deste tema tem o objetivo de aperfeiçoar o procedimento do

Tribunal do Júri e tentar dirimir as dúvidas sobre este artigo, visto tratar-se de um

tema de muita discussão no âmbito do Direito Processual Penal.

Os delitos de competência do Tribunal do Júri estão descritos

expressamente no art. 74, § 1°, do CPP, (crimes dolosos contra vidas) tentados ou

consumados. A Ação Penal no processo do Júri tem duas fases, judicium

accusationis e judicium causae, por esse motivo é chamado de procedimento

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bifásico. Nos procedimentos do Júri após despacho saneador, previsto no artigo 407

do CPP, o Juiz deve prolatar a sentença pronúncia, impronúncia, absolvição

Sumária ou desclassificação.

O acusado será pronunciado, quando o Juiz se convencer da materialidade

do delito, e houver indícios veementes de autoria. Será impronunciado, nos casos

em que o Magistrado não reconhecer a materialidade ou indícios de autoria. Será

absolvido sumariamente, se estiver comprovada a materialidade e a autoria, porém,

o crime foi cometido em condições que excluem a culpabilidade ou a antijuricidade.

Por fim, será desclassificado o delito, quando durante a instrução penal, o Juiz

entendeu que ocorreu crime que não é de competência do Júri.

A finalidade deste trabalho é resolver a questão: há necessidade de

aditamento da denúncia, quando o Juiz prolatar sentença de pronúncia, que

reconheça classificação divergente da anteriormente estipulada pelo promotor na

denúncia?

Existe entendimento em todos os sentidos. Alguns doutrinadores entendem

que o artigo 408, § 4°, é perfeitamente aplicável, e o Juiz, pode dar nova

classificação ao crime tipificado da denúncia.

Justificam este entendimento pelo fato de a sentença da pronúncia ser mero

juízo de admissibilidade da pretensão punitiva do estado. Afirmando, que não há

cerceamento de defesa, porque, toda a matéria será apreciada novamente pelos

Jurados, e, durante a sessão no plenário poderá o réu contraditar todas as

acusações.

Entretanto, alguns autores entendem que é necessário adotar as

providências do artigo 384 do CPP e seu parágrafo único. Neste caso, o Magistrado

deve encaminhar os autos para que a defesa se pronuncie, e, logo após, enviar para

o Promotor de Justiça, para que ele proceda ao aditamento da denúncia ou a

queixa. Isto ocorrerá sempre que o Juiz reconhecer nova classificação ou nova

qualificadora.

Para os que defendem esta tese, caso o juiz altere a capitulação do delito,

de acordo com o seu livre arbítrio, estará ferindo o princípio acusatório. Segundo

este princípio, apenas o Ministério Público tem competência para acusar. Se o juiz

acusar e julgar ao mesmo tempo, estará assumindo uma função que não lhe

pertence.

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Os doutrinadores ainda afirmam que se o juiz utilizar o artigo 408, § 4°, em

detrimento ao artigo 384, ambos do CPP, afrontará os princípios constitucionais da

ampla defesa e do contraditório.

A finalidade desta pesquisa será auxiliar o leitor quanto à aplicação, ou não,

do artigo 408, § 4°, do CPP. Contribuindo assim, para o efetivo cumprimento das

normas processuais e constitucionais, sempre em busca da verdade real dos fatos.

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2 TRIBUNAL DO JÚRI

O estudo deste tema tem o objetivo de aperfeiçoar o procedimento do

Tribunal do Júri, visto tratar-se de um assunto de muita discussão no âmbito do

Direito Processual Penal.

A instituição do Tribunal do Júri viu-se debatida e questionada através dos

tempos. A origem desta instituição também desperta divergência entre os

estudiosos, pois nenhum deles afirma com precisão a origem mais remota do Júri.

Mesmo possuindo a denominação Tribunal, o Júri é um órgão do Poder

Judiciário incluso no primeiro grau de jurisdição penal, trata-se de jurisdição comum

ou ordinária. Este órgão tem natureza mista, pois permite a participação dos jurados

populares que formam o conselho de sentença, e do Juiz togado que preside a

seção no plenário (CALVO FILHO, SAWAYA, 2002).

Os delitos de competência do Tribunal do Júri estão descritos

expressamente no art. 74 § 1° do Código de Processo Penal que assim dispõe:

Art. 74. A competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri. § 1º Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos arts. 121, §§ 1o e 2o, 122, parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados.

A ação penal no processo do Júri tem duas fases, por isto é chamado de

bifásico ou escalonado. A primeira fase é conhecida por judicium accusationis

encerra-se com a sentença de Pronúncia, a qual será abordada especificamente

durante este trabalho. E a segunda fase, o judicium causae, tem início com o

oferecimento do libelo acusatório.

Segundo Adriano Marrey o Júri é mais que uma instituição do poder

judiciário, é uma instituição política com fim social democrático, in verbis:

Júri, mais que um mero órgão judiciário, é uma instituição política, acolhida entre Direito e Garantias Individuais, a fim de que permaneça conservado em seus elementos essenciais, reconhecendo-se seja, implicitamente, um direito dos cidadãos o de serem julgados por seus pares, ao menos sobre a existência material do crime e a procedência da imputação ( MARREY, 2000, p. 100).

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2.1 ORIGEM

O Júri teve sua origem na idade antiga. O instituto dos jurados já se

encontrava no Direito Processual Romano e na Grécia antiga. Na Atenas clássica o

povo era chamado para decidir sobre questões inerentes ao judiciário. Havia nesta

época duas instituições que cuidavam do bom e harmonioso convívio social.

(TUCCI, 1999).

Uma instituição era o Areópago, um célebre Tribunal de Atenas que

funcionava numa colina consagrada. Seus integrantes, antigos arcontes, seguiam

apenas sua consciência, e tinham competência para julgar os crimes de sangue. A

outra instituição era a Heliéia, tribunal composto por heliastas, que julgavam após

ouvir a defesa do réu e de acordo com as suas convicções. Os jurados, para

participarem dessas instituições precisavam ter idade mínima de 30 anos, estarem

em dia com o tesouro do estado e ter conduta ilibada. Os jurados, desde aquela

época já prestavam juramento antes de julgarem (TUCCI, 1999).

Em Roma também se encontram indícios do nascimento Júri. Há quem

afirme ser esta a verdadeira origem desta instituição. Muitas características

romanas ainda estão presentes no Tribunal do Júri como conhecemos atualmente.

(ROSA, 2000).

Existia em Roma a assembléia das “centúrias”, pertencentes ao “Comitatus

Maximus”, que na época era conhecido como “Grande Júri”. Sérvio Túlio, Imperador

de Roma, dividiu os plebeus em classes, de acordo com os bens que possuíam.

Surge deste fato a denominação “centúrias”. Estas assembléias julgavam os crimes

sob a presidência de um Cônsul ( ROSA, 2000).

Antonio José M. Feu Rosa assim descreve o procedimento:

As centúrias recolhiam-se a lugares separados, cercados de muros (septa) dos quais saíam por uma ponte estreita, cavaleiros romanos, de guarda a esses lugares, recolhiam as cédulas dos votantes. O magistrado que presidia pronunciava o veredictum. A condenação fazia-se por maioria dos votos; em caso de empate, o réu era absolvido. (ROSA, 2000, p. 09 e 10).

Ainda em Roma pode-se comentar sobre a quaestio, órgão composto por

cidadãos romanos, representantes do povo, comandados pelo pretor. Todas as

atribuições deste tribunal colegiado, sua competência e as penas imputáveis eram

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definidas por leis anteriormente elaboradas. Já existia implicitamente o princípio da

legalidade.

As quaestiones surgiram em Roma no ano 149 A.C, e podem ser definidas

como uma espécie de comissão de inquérito. A primeira quaestio surgiu com as

finalidades de investigar e julgar os crimes de funcionários públicos contra a

província (quaestio repetundis). Com o transcorrer do tempo outras quaestios foram

criadas, e possuíam competência para julgar as seguintes matérias: homicídios

contra familiares próximos (quaestio parricidiis), adultério (quaestio de adulteriis).

Mas adiante a quaestio passou a ser permanente, e a partir daquele momento

começou a ser denominada quaestiones perpetuae. (TUCCI, 1999).

A quaestio era composta por jurados conhecidos como iudices iurati, que

poderiam ser quaisquer cidadãos de Roma. Estes encontravam-se inscritos em uma

lista oficial, formada por Senadores e Cavaleiros. Os jurados, assim como nos dias

atuais, também poderiam ser recusados, obedecendo a um limite pré-estabelecido.

Os nomes dos jurados eram sorteados dentro de uma urna. Estes eram presididos

por um pretor denominado quaesitor, o qual examinava a acusação, a competência,

convocava os jurados, presidia os debates e aplicava a pena. Os jurados sorteados

e não recusados acompanhavam todo o julgamento, e, ao final votavam, podendo

absolver ou alargar a instrução (TUCCI, 1999).

O processo tinha como impulso inaugural uma proposta de acusação, que

poderia ser apresentada por qualquer cidadão romano capaz. Este deveria oferecer

um libelo (postulatio, petitio) que deveria conter a descrição do crime, bem como o

dispositivo legal violado, uma espécie de denúncia conhecida como delatio criminis.

Se existisse mais de um denunciante o juiz decidia pelo cidadão mais interessado

(TUCCI, 1999).

O próximo passo era promover acareação entre o criminoso e o delator. Daí

por diante o delator não poderia dispor da denúncia, pois passaria a defender um

direito coletivo. Com o oferecimento do libelo, o acusado já era inscrito em uma

espécie de rol dos culpados, e deste só era retirado quando absolvido. (TUCCI,

1999).

Logo após o acusado era citado para comparecer em juízo. Se não o fizesse

seus bens seriam confiscados. Caso em juízo o réu admitisse a culpa era

considerado confesso. Não confessando, o réu e o acusador voltariam ao juízo,

após a instrução criminal. (TUCCI, 1999).

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No dia do julgamento ocorria a seleção dos jurados, os debates orais e por

fim, a apresentação das provas. Ao final os jurados votavam e o quaesitor anunciava

o resultado. Em regra a decisão era soberana, podendo ser revista apenas em

casos gravíssimos (TUCCI, 1999).

Todos estes avanços no Direito Processual Penal foram modificados pelos

Bárbaros, que invadiram o Império Romano, e posteriormente pela instalação do

Sistema Feudal em toda a Europa. Estagnaram-se consideravelmente todos os

avanços científicos da época. Acreditava-se, naquele momento, apenas na Justiça

Divina.

Com Guilherme, o Conquistador, o Júri chegou à Inglaterra (ROSA, 2000). O

procedimento possuía contornos do Direito Romano. Logo após difundiu-se pelo

resto da Europa junto com a Revolução Francesa.

Rogério Lauria Tucci descreve da seguinte maneira o Júri na Inglaterra:

Os jurados, então, segundo tudo indica, eram os compurgatores, e implantavam o júri nas terras conquistadas, amoldando-o aos costumes ingleses, de sorte a originar um órgão julgador diferenciado, dito de caráter misto (TUCCI, 1999, p. 27).

Ainda neste período, o Júri era composto por 24 jurados, escolhidos entre

vizinhos do réu e moradores do lugar onde aconteceu o crime, sendo permitida

também a recusa dos jurados. Estes possuíam conhecimento do fato e do acusado,

para assim poder julgá-lo. Existia então um Júri de acusação e um Júri de

julgamento. Neste momento, surge também o sigilo das votações dos jurados na

sala reservada.

Outro marco histórico é a Revolução Francesa, que além de difundir o Júri

por toda Europa, ocasionou uma grande mudança na mentalidade dos jurados que

não mais julgavam em nome de Deus e do Rei, e sim, livremente em nome da

própria sociedade (TUCCI, 1999).

Os colonizadores ingleses trouxeram o Júri para o continente Norte

Americano. A instituição era responsável pelo julgamento de todos os crimes. Desde

então se tornou símbolo de liberdade entre os cidadãos. Atualmente os estados

Norte Americanos organizam seu júri de maneira diversa, e detêm autonomia para

prescrever suas próprias leis. Entretanto, são preservados os princípios da

publicidade e da oralidade (TUCCI, 1999).

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2.2 HISTÓRICO NO BRASIL

No Brasil a instituição do Júri surgiu com impulso do Príncipe Regente D.

Pedro, que sugeriu a criação de um ‘Juízo de Jurados’. Por este motivo foi

promulgada a Lei de 18.6.1822, que criou os ‘Juízes de Fato’, com competência

para julgar os crimes de imprensa. Esses Juízes exerceriam a função de jurados, em

um número de 24 homens, de conduta ilibada. Da decisão proferida por estes juízes,

poderia ser impetrado recurso de apelação somente ao Príncipe Regente

(TUBENCHLAK, 1997).

A seguir, o Júri torna-se órgão do Poder Judiciário, com o advindo da

Constituição Imperial de 1824, tendo competência também para julgar causas

penais e cíveis (CAPEZ, 2004). Dispunha nos seus arts. 151 e 152:

O Poder Judicial é independente, e será composto de juízes e jurados, os quais terão lugar, assim no cível como no crime, nos casos e pelo modo que os Códigos determinarem e os jurados se pronunciam sobre o fato, e os juízes aplicam a lei (NASSIF, 2001, p. 15).

Desta maneira caberia aos jurados decidir sobre o fato, e ao juiz togado

decidir sobre o direito.

Adiante, a Lei de 20.09.1830, criou o Júri de Acusação e o Júri de Julgação.

O primeiro era composto por vinte e três membros e o segundo por doze membros,

escolhidos entre os cidadãos que possuíssem os seguintes requisitos: ser eleitor, ter

bom senso e probidade. Estariam excluídos aqueles que não acumulassem estes

requisitos acima descritos, além dos Deputados, Senadores, Ministros de Estado,

Bispos, Magistrados, Oficiais de Justiça, Presidentes, Secretários de Governo das

Províncias e Comandantes de Armas do alto escalão (TUBENCHLAK, 1997).

Com a entrada em vigor da Lei n° 261 de 3.12.1841, a instituição do Júri

sofreu algumas modificações. Uma delas excluiu o ‘Júri de Acusação’

(TUBENCHLAK, 1997). A partir deste momento a averiguação de indícios de

culpabilidade passou a ser função das autoridades policiais, enquanto a sentença de

pronúncia estaria atribuída aos Juízes Municipais (TUCCI, 1999).

Em 1891 passou a vigorar uma nova Constituição, a primeira Republicana.

Esta elevou o Tribunal Popular para o nível de garantia individual, e manteve a

instituição do Júri nos seguintes termos do art. 72 § 31: “É mantida a instituição do

Júri” (TUBENCHLAK, 1997).

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A mesma Constituição de 1891 instituiu os Estados Federados no território

brasileiro, tomando o lugar das antigas províncias. Os novos Entes Federados

possuíam autonomia e podiam legislar sobre determinados temas, e, durante a

elaboração das legislações processuais penais surgiram divergências a respeito dos

procedimentos do Júri. Algumas Federações entendiam ser o Júri soberano, mas

admitiam recurso de apelação quando a decisão proferida apresentasse falha

quanto à matéria de direito. E a minoria entendia não ser possível recurso de

nenhuma espécie para as decisões do conselho de sentença popular (ROSA, 2000).

Ainda merece destaque a Lei n° 19 de 1895, promulgada pelo Estado do Rio

Grande do Sul, que regulamentava o Júri da maneira descrita abaixo por Aramis

Nassif:

As sentenças do júri, serão proferidas pelo voto descoberto da maioria ( art. 65, § 1°) e os jurados não podem ser recusados; à medida, porém que forem sendo sorteados, poderão as partes opor-lhes suspeição motivada, que será decidida pelo Presidente do Tribunal ( art. 66).(NASSIF, 2001, p.18).

Mais adiante ocorreu no nosso País a Revolução de 1930, quando Getúlio

Vargas assumiu o poder. Em 1934 foi elaborada uma nova Constituição, que

manteve o Tribunal do Júri, nos seguintes termos: “É mantida a instituição do Júri

com a organização e as atribuições que lhe der a lei”. Esta redação foi objeto de

muitas críticas, visto não determinar que o Júri se mantivesse como era na

Constituição anterior, tampouco, que novas leis ordinárias fossem elaboradas para

regulamentar a Constituição (TUCCI, 1999).

Com o fim do mandato de Vargas aproximando-se, este revogou a

Constituição supra mencionada e outorgou uma nova Carta Magna ao povo

brasileiro, iniciando neste momento um novo Regime de Governo, considerado

ditatorial. Estabelecia-se então, o Estado Novo.

Esta nova Constituição de 1937 tinha a alcunha de “Polaca”, pois em muito

se assimilou à Carta Magna polonesa. Mas, para espanto de muitos juristas, esta

Constituição não se pronunciou a respeito do Tribunal do Júri. Entretanto, o mesmo

texto legal, no seu art. 183, afirmava que continuavam a vigorar as disposições,

enquanto não revogadas, explícita ou implicitamente, que não ferissem a

Constituição de 1937 (TUBENCHLAK, 1997).

Já em 1938 foi promulgado o Decreto – Lei n ° 167 que regulamentava o

Júri. O referido decreto suprimiu a soberania desta instituição, permitindo aos

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Tribunais de Apelação reformar as sentenças proferidas no mérito (CAPEZ, 2004).

Desta maneira o Tribunal Popular continuou a existir mesmo sem previsão

constitucional. As mudanças provocaram divergências entre vários juristas, conforme

descreve James Tubenchlak:

No entender de alguns, o Júri fora praticamente abolido; no de outros, a reforma anunciava sua morte virtual, houve ainda quem vislumbrasse mais um aspecto antidemocrático da ditadura getuliana. Não faltaram, porém, vozes de apoio à reforma, que aumentou as prerrogativas do Poder Judiciário, para conter o arbítrio e opor diques ao abuso (TUBENCHLAK, 1997, p.7).

Com o término da ditadura Varguista, sobreveio a Constituição de 1946, que

novamente elencou o Júri no rol de garantias individuais, e reafirmou a soberania

das decisões deste Tribunal. Também cabe ressaltar que esta mesma legislação

estabeleceu a competência privativa do Júri para julgar os crimes dolosos contra

vida, ratione materiae (TUBENCHLAK, 1997). Assim descritos no art. 141, § 28,

CF/46:

Era mantida a instituição do júri com a organização que lhe der a lei, contando que seja ímpar o número de seus membros e garantido o sigilo das votações, a plenitude de defesa do réu e a soberania dos veredictos. Serão obrigatoriamente de sua competência os crimes dolosos contra a vida (NASSIF, 2001, p. 21).

Em 1948 surgiu a Lei nº. 163, regulamentando o dispositivo legal acima

mencionado, que mais tarde viria a constar no Código de Processo Penal. Esta lei

autorizou o Recurso de Apelação em decisões proferidas pelo Tribunal Popular que

fossem manifestamente contrárias às provas dos autos. Dispositivo inconstitucional,

pois feria a soberania dos veredictos atribuídos ao Júri (TUBENCHLAK, 1997).

Quase vinte anos após a entrada em vigor da última Constituição, o Brasil

sofreu um golpe militar, em 1964. Como conseqüência deste golpe, e do novo

regime implantado no país, uma nova Constituição foi elaborada.

A Constituição de 1967 manteve a instituição do Júri, nos termos da

Constituição anterior, mantendo a soberania dos veredictos e o status de garantia

fundamental. (CALVO FILHO, SAWAYA, 2002). Esta carta tinha como

características a centralização do poder na União e um aumento dos poderes

inerentes ao Chefe de Estado (NASSIF, 2001).

Nesta época um período de instabilidade política instaurava-se no Brasil,

advento da ditadura militar. Em 1969 foi elaborada a Emenda Constitucional nº. 1,

que deu nova redação ao artigo que dispunha sobre o Júri na Constituição de 1967.

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A Emenda Constitucional n° 1 assim prescrevia no seu art. 153, § 18: “É mantida a

instituição do Júri, que terá competência para o julgamento dos crimes dolosos

contra a vida”. Constata-se então, que foi retirada neste momento a soberania do

Tribunal do Júri (ROSA, 2000).

Após o fim da ditadura militar que perdurou por vários anos no nosso país,

em 1988 passa a vigorar uma nova Constituição, democrática, que reconheceu o

direito aos acusados de serem julgados por seus pares.

A atual Carta Magna brasileira manteve o Júri como garantia e direito

fundamental, restabeleceu a soberania dos veredictos, e definiu a competência

mínima para os julgamentos deste Tribunal, mantendo como preceito constitucional

exclusivo a competência relativa aos crimes dolosos contra vida. A Constituição

vigente é fruto de reivindicações políticas e movimentos populares de um povo

cansado da arbitrariedade de seus governantes e em busca dos seus direitos

políticos e jurídicos. ( NASSIF, 2001).

Expressamente a Constituição Federal de 1988, art. 5º, inciso XXXVIII:

É reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Pode-se afirmar que, com o reconhecimento desta instituição para

competência acima descrita, o constituinte não excluiu a possibilidade de o

legislador comum ampliar os crimes de abrangência deste Tribunal Popular, sendo

irrevogável, entretanto, a competência determinada pela Constituição Federal.

(NASSIF, 2001)

A existência do Júri assegura que os cidadãos sejam julgados por outros

cidadãos, os quais assumem o papel de Juiz Natural, para decidir sobre as causas

previstas na Constituição Federal, sendo selecionados de acordo com os requisitos

da Lei Processual Penal.

O retorno da soberania do Júri representa uma grande conquista para a

sociedade. Antonio Jose M. Feu da Rosa muito bem descreve este novo momento:

A justiça, e, por conseguinte, os meios mais próprios de obtê-la, são direitos da sociedade. Quem poderia contestar-lhe o direito de julgar e agir em conseqüência disto? Que ela se engane, é possível. Mas uma questão de prerrogativa soberana não é uma questão de infalibilidade. Se para ser legítima uma atribuição qualquer da soberania devesse ser exercida duma maneira infalível, não haveria soberania possível. Mas, em caso de erro do povo, como os

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indivíduos, suporta muito melhor o que vem daqueles que estão investidos, em seu nome, de seus interesses, do que daqueles que lhe são estranhos ( ROSA, 2000, p.17).

A soberania dos veredictos deve ser analisada em termos, apesar da

autonomia dos jurados na hora de proferirem sua decisão no conselho de sentença,

esta decisão está sujeita a revisão por outros órgãos de jurisdição, conforme

prescreve o art. 593, inciso III do CPP, e por meio de Ação de Revisão Criminal

prevista no art. 621 do CPP. Entretanto, esta só é possível quando almejar melhor

condição ao réu.

Alguns autores discutem a respeito da soberania do Júri e afirmam não

existir de verdade, pois o Tribunal do Júri está sujeito, em alguns casos, à revisão de

suas decisões. O autor acima mencionado afirma não ser possível existir esta

soberania em sua plenitude, pois, ainda vigoram os artigos do Código de Processo

Penal que contrariam a soberania desta instituição. “Porque, aliás, nunca é demais

repetir e ressaltar que a palavra soberania exclui qualquer restrição. Não se pode

falar em soberania sujeita a um poder superior” (ROSA, 2000, p. 16).

Destaca-se ainda a posição de Fernando da Costa Tourinho Filho:

Hoje, repensando bem, e tendo em vista que as Constituições, desde 1946 até a atual, vêm mantendo o Júri no capítulo destinado aos direitos e garantias fundamentais do homem, ao contrário do que dizia o art. 151 da Carta Imperial (“O poder judicial é independente, e será composto de juízes e jurados, os quais terão lugar, assim no cível como no crime, nos casos e pelo modo que os códigos determinarem”), entendemos que de jure constituto dever-se-á revogar a alínea d do inc. III do art. 593 do CPP. ( TOURINHO FILHO, 2005, p. 99)

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2.3 COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI

A Constituição Federal de 1988 no seu art. 5º, inciso XXXVIII, assegurou a

instituição do Júri e definiu a competência do Tribunal Popular para o julgamento dos

crimes dolosos contra a vida.

O art. 74° do Código de Processo Penal brasileiro regula os crimes de

competência deste tribunal, quais sejam: homicídio, induzimento ao suicídio,

infanticídio e aborto, prescritos nos seguintes artigos: arts. 121, § 1o e § 2o, 122,

parágrafo único, 123, 124, 125, 126 e 127 do Código Penal, consumados ou

tentados (NASSIF, 2001). Cabe destacar que o latrocínio e o seqüestro com morte,

previstos respectivamente nos arts. 150, §3°e §2°, 150, §3° do CP, são de

competência do juízo singular. Neste sentido confirma a Súmula n° 603 STF: “A

competência para o processo e julgamento do latrocínio é do juiz singular e não do

Tribunal do Júri” .

Destaca Romualdo Filho e Paulo Sawaya:

Por sua vez, não basta o que o cidadão perpetre um crime para que, de pronto, seja determinada a competência do Júri. Necessitamos de outro elemento, qual seja, o dolo, certo que o crime deve ser doloso, pois, se for culposo ou preterdoloso, não preencherá o requisito constitucional, quando terá por Juiz natural outro que não o Júri. (...) Temos assim que ainda que não é suficiente a ocorrência de um crime doloso para que seja fixada a competência de Júri. Necessita-se que o crime doloso seja praticado contra o bem jurídico vida (CALVO FILHO, SAWAYA, 2002, p. 50 e 52).

Em regra, todos os cidadãos brasileiros que incorrerem nos delitos supra

mencionados devem ser julgados pelo Tribunal do Júri. Entretanto a Constituição

Federal determina que algumas pessoas, em decorrência da sua função, tenham

jurisdição diferenciada. Seguem os artigos:

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos ( ...) X - julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça.

Art. 96. Compete privativamente: (...) III - aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral.

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Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: (...) b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente- Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República; nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente.

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar, originariamente: a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais;

Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais: I - processar e julgar, originariamente: a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União ressalvado a competência da Justiça Eleitoral;

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição: § 4° Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinados militares, ressalvada a soberania do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças.

No que tange aos Prefeitos Municipais, cabe ressaltar dois aspectos.

Quando estes cometerem crimes dolosos contra a vida em que haja um co-réu, o

processo será cindido, o cidadão comum será processado pelo Tribunal do Júri e o

Prefeito será processado e julgado pelo respectivo Tribunal de Justiça. Esta

prerrogativa de função inerente aos Prefeitos também só atinge aos processos

iniciados durante o seu mandato (MARREY, 2000).

O legislador, ao referir-se aos crimes comuns, está mencionando todos

aqueles que não são considerados crimes de responsabilidade. Outra informação

importante é que a competência acima descrita, denominada competência por

prerrogativa da função, exclui a competência pelo lugar da infração. Desta maneira,

se um Juiz pertencente a uma comarca de Santa Catarina cometer um crime no

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Estado do Paraná, quem julgará este magistrado será o Tribunal de Justiça de Santa

Catarina. Cabe também ressaltar que os julgamentos procedidos nas exceções

acima mencionadas, serão processados em uma única instância. Se necessário

caberá Habeas Corpus, Recurso Extraordinário e Recurso Especial (CALVO FILHO,

SAWAYA, 2002).

Há uma situação prevista legalmente, em que a Justiça Federal tem

competência originária para julgar os crimes dolosos contra a vida. O Júri Federal

ocorrerá sempre que o crime doloso contra vida for cometido por servidores públicos

ou agentes da administração, quando no exercício de suas funções, agirem no

interesse da Administração Federal, conforme art. 109, inciso IV( NASSIF, 2001).

Uma questão, levantada pelo autor Aramis Nassif, destaca um exemplo a

respeito da conexão entre o delito de competência do Juiz Singular Federal e do

Tribunal do Júri:

(...) Um fiscal do IBAMA dirgir-se até o local da sede de uma empresa, com finalidade de autuar por dano ambiental. Todavia, o sócio-gerente, ao receber a notificação, desfere tiros contra o agente oficial e o mata. O Tribunal do Júri, por força da conexão, julgará, também, a pessoa jurídica? (NASSIF, 2001, p. 29)

A resposta é não. Porque a Lei dos crimes ambientais resguarda que os

delitos ali descritos terão os procedimentos da Lei 9.099/95. Desta maneira, este

processo hipotético terá que ser separado.

Serão também de competência da Justiça Federal os crimes dolosos contra

vida, tentados ou consumados, ocorridos em aeronaves e navios, públicos ou

privados, nacionais ou não. Será competente o Juízo Federal do primeiro lugar onde

o navio atracar ou o avião aterrissar. Entretanto, nos casos de crimes dolosos contra

a vida ocorridos em navios de guerras e aeronaves militares, prevalecem os tratados

de Direito Internacional que consideram estes territórios extensão dos territórios

nacionais dos respectivos países (CALVO FILHO, SAWAYA, 2002).

Existem casos em que os crimes de competência do Júri ocorrem em

concorrência com outros crimes de diversa competência. Estamos diante de casos

de conexão ou continência. O Código de Processo Penal assim descreve:

Art. 76. A competência será determinada pela conexão: I – se, ocorrendo duas ou mais infrações houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, u por várias pessoas umas contra as outras; II – se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para

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conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas; III - quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração. Art. 77. A competência será determinada pela continência quando: I – duas ou mais pessoas forem acusadas da mesma infração. Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras: I – no concurso entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum prevalecerá a competência do júri.

A conexão fica configurada quando ocorrem vários crimes cometidos por

diversas pessoas. Destes crimes origina-se apenas uma ação penal que julgará

todos os crimes conexos. A conexão acarreta na unidade de julgamento entre os co-

autores da infração penal, não esquecendo, nestes casos, que o Tribunal do Júri

atrai a competência dos demais crimes. Caso algum dos co-autores detenha

competência por prerrogativa de função a ação penal será separada. A competência

do Júri prevalecerá sobre as outras, ressalvada a jurisdição especial.

Já a Continência ocorre quando há pluralidade de agentes, mas apenas uma

infração penal. Tanto a conexão quanto a continência exigem a unidade de ações

penais, seja para economia no trâmite processual, ou porque há interligação de

provas entre os autores e os crimes (CALVO FILHO, SAWAYA, 2002).

Existe também a possibilidade de alteração territorial da competência do

Júri. Isso pode ocorrer quando a Comarca que tramita a respectiva ação penal for

desmembrada, e desta surgir uma nova Comarca. Neste caso, se o delito tiver

ocorrido no território pertencente a esta nova comarca, os autos serão remetidos à

mesma para que lá continuem a tramitar.

Outro caso possível de mudança da competência do Júri ocorre quando há o

desaforamento da ação penal. Desaforar significa mudar de foro, alterando a

competência territorial do Júri para outra Comarca. Pode acontecer a requerimento

das partes ou representação do juízo, com o fim de garantir segurança e

imparcialidade do Júri (MARREY, 2000). Prescreve o art. 424 do CPP:

Art. 424. Se o interesse da ordem pública o reclamar, ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou sobre a segurança pessoal do réu, o Tribunal de Apelação, a requerimento de qualquer das partes ou mediante representação do juiz, e ouvido sempre o procurador-geral, poderá desaforar o julgamento para comarca ou termo próximo, onde não subsistam aqueles motivos, após informação do juiz, se a medida não tiver sido solicitada, de ofício, por ele próprio.

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3 DECISÕES DO JUDICIUM ACCUSATIONIS

O Tribunal do Júri é um procedimento bifásico, ou escalonado, como alguns

autores denominam. Existem duas fases bem distintas durante este procedimento. A

primeira fase é conhecida como judicium accusationis, ou sumário de culpa, e tem

como finalidade averiguar a existência de um crime cuja competência seja reservada

ao Tribunal do Júri, ou ainda, julgar procedente a admissibilidade da acusação que

está sendo imputada ao réu. Esta primeira fase ocorre perante o Juiz Singular.

(OLIVEIRA, 2004).

Caso o réu seja pronunciado, terá início a segunda fase do Tribunal do Júri.

Esta fase é conhecida com judicium causae, ou ainda, fase de julgamento. O

objetivo desta segunda fase é levar as questões de fato e de direito para que sejam

analisadas pelo Juiz natural da causa, neste caso o Júri Popular. Este procedimento

deve ser simplificado, pois os Juízes desta fase não possuem o conhecimento

especifico sobre a matéria (OLIVEIRA, 2004).

O procedimento do Júri inicia-se da mesma forma que nas ações ordinárias

criminais. A peça inaugural deste procedimento é a denúncia oferecida pelo

represente do Ministério Público, pois os crimes de competência do Júri são

exemplos de Ação Penal Pública Incondicionada. Entretanto, esta pode iniciar

mediante queixa crime, quando no prazo legal o representante do parquet não der

início à ação, como prevê o art. 29 do CPP (TOURINHO FILHO, 2005).

Se o magistrado competente receber a denúncia, o acusado será citado para

comparecer em juízo e ser interrogado (art. 394 CPP). Caso ele não seja

encontrado, ou não queira comparecer por vontade própria, o Juiz lhe nomeará

defensor dativo (art. 396, § único CPP). Após o interrogatório ou a nomeação do

defensor, transcorre o prazo para apresentação da defesa prévia (art. 395 CPP).

Logo após, o magistrado profere despacho no qual marca a audiência para oitiva

das testemunhas, primeiro as de acusação e depois as da defesa (art. 396 CPP).

Após a oitiva das testemunhas decorre o prazo para apresentação das alegações

finais. Primeiro manifesta-se a acusação e depois a defesa (art. 406 CPP). É

vedada, neste momento, a juntada de documentos (art. 406 § 2° CPP), contrariando

o que tangencia o art. 400 do mesmo código, que assegura às partes a possibilidade

de juntar documentos em qualquer fase do processo. Divergência esta que Tourinho

Filho diz não ser necessária, pois a pronúncia não é sentença definitiva e estes

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documentos poderão ser juntados mais tarde, para serem apreciados pelo Juiz

Natural da causa. (TOURINHO FILHO, 2005)

Encerrados estes procedimentos e preclusos todos os prazos, os autos

voltam ao Juiz para que este proceda ao saneamento do processo, com a finalidade

de dirimir dúvidas e sanar nulidades (art. 407 CPP). (TOURINHO FILHO, 2005)

Após a apresentação das alegações finais, o Juiz pode tirar as seguintes

conclusões: primeiro que existe prova da materialidade de um delito, porém

ocorreram situações de excludentes de ilicitude ou excludente de culpabilidade do

autor; ou estar convencido da existência de crime que não seja de competência do

Tribunal do Júri; ou que não existem indícios suficientes de autoria ou materialidade;

ou ainda concluir que existiu um crime doloso contra a vida e há indícios veementes

de que o acusado seria o autor do delito. (OLIVEIRA, 2004)

A partir deste momento é que se iniciam as peculiaridades do procedimento

do Júri, e o Juiz, para encerrar a primeira fase do processo bifásico deste Tribunal,

poderá proferir sentença de pronúncia, impronunciar o réu, absolvê-lo sumariamente

ou desclassificar o delito.

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3.1 PRONÚNCIA

A sentença de pronúncia é uma decisão interlocutória mista, que julga

procedente a acusação imputada ao réu, põe fim à primeira fase do procedimento

bifásico do Júri (judicium accusationis), e dá início ao segundo, conhecido como

judicium causae. Neste momento ainda não se julga o mérito da ação, pois a função

desta sentença é apenas julgar admissível a acusação formulada contra o réu da

ação penal. É assim denominada por possuir os mesmos requisitos legais de uma

sentença, quais sejam: relatório, fundamentação e dispositivo. (NUCCI, 2006)

Cabe ao Juiz de Direito, em exercício na Vara onde tramita o processo,

proferir a sentença de pronúncia. Os juízes substitutos também possuem o direito de

proferir esta decisão. (MARREY, 2000)

Para que o magistrado prolate a sentença de pronúncia deve estar

convencido da presença de dois requisitos: a materialidade do delito e indícios

veementes de que o réu seja o autor do crime, conforme o art. 408 do CPP: “Se o

juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor,

pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento”.

A materialidade do delito, nos casos de crime contra a vida, será

comprovada na maioria dos casos através de laudo pericial, mais precisamente

através do laudo cadavérico. Entretanto, não sendo este possível, o magistrado

pode formar a materialidade através de prova testemunhal. (NUCCI, 2006)

Quanto à existência de indícios veementes, é preciso que o magistrado,

durante o transcorrer da ação, verifique o nexo de causalidade entre o crime

ocorrido e as ações praticadas pelo agente.

O Código de Processo Penal descreve indício como: “Art. 239: Considera-se

indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize,

por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias”.

Segundo Guilherme Nucci: “indícios são elementos indiretos que, através de

um raciocínio lógico, auxiliam a formação do convencimento do juiz, constituindo

prova indireta” (NUCCI, Guilherme de Souza, 2006, p. 687). Deve o magistrado

constatar, embora não determine expressamente o código, uma quantidade

suficiente de indícios, com o fim de preservar o devido processo legal. Ainda neste

sentido, deve o Juiz, ao pronunciar o réu, ter dúvida razoável sobre a sua

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culpabilidade, levando esta dúvida para o julgador legítimo da causa, o Júri Popular.

(NUCCI, 2006)

O princípio do Direito Penal in dúbio pro réu, não se aplica às sentenças de

pronúncia, visto que, em caso de dúvida, entendem a doutrina e a jurisprudência que

deve prevalecer o princípio in dubio pro societate, não subtraindo da sociedade o

direito garantido pela Constituição Federal de realizar o julgamento de seus pares.

O doutrinador Adriano Marrey, no mesmo sentido, dispõe sobre o assunto:

“O juiz verificará se é certa a existência do crime imputado ao réu e provável a

autoria que lhe é atribuída. A expressão ‘ indício suficiente’ tem o sentido de

probabilidade suficiente e não a de simples possibilidade de autoria.” (MARREY,

Adriano, 2000, p. 260).

A sentença de pronúncia deve ser escrita em vocabulários sóbrios e

imparciais, devendo-se evitar termos injuriosos ao acusado, frases a favor da defesa

ou acusação, ou qualquer outro meio que insira nesta decisão avaliações sobre o

mérito da ação. Esta moderação é necessária para evitar influência sob a decisão

dos jurados, que deve ser soberana. (TOURINHO FILHO, 2005). É nula a pronúncia

viciada pelo excesso de linguagem. (TUBENCHLAK, 1997)

O Juiz deve ser prudente, evitando manifestar-se quanto ao mérito da

acusação, e deve verificar a presença de fumus boni júris. O magistrado não pode

antecipar a decisão do Tribunal Popular, proferindo sentença que conclua que as

provas obtidas durante a instrução seguem a tese de alguma das partes. Quem

pronunciar de outra maneira estará excedendo os limites de sua competência. A sua

redação deve demonstrar a prova indiciária. Entretanto, deve prezar pelo equilíbrio,

porque o excesso de superficialidade pode ser objeto de argüição pela defesa ou

acusação. (MARREY, 2000).

A decisão do Juiz precisa ser motivada, em cumprimento ao art. 93, inciso IX

da CF/88, que determina que todas as decisões do Poder Judiciário precisam ser

fundamentadas. O Magistrado precisa demonstrar que está convencido da

existência do crime doloso contra a vida, e demonstrar também, diante das provas

contidas nos autos, como chegou a esta conclusão, além de quais são os indícios de

o acusado ter cometido o crime doloso contra a vida. (TOURINHO FILHO, 2005)

O dolo é circunstância essencial, pois caso ocorra culpa e não dolo, a

competência do Tribunal do Júri está subtraída. O Código Penal, no art. 18, dispõe:

“Diz-se crime: I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de

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produzi-lo, II culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência,

negligência ou imperícia.”. Para Tourinho Filho: “Dolo, dizem os doutrinadores, é a

vontade livre e consciente de praticar o crime, ou aceitar a ocorrência do resultado”.

(TOURINHO FILHO, Fernando da Costa, 2005, p. 77).

Na sentença de pronúncia precisa constar em qual dispositivo legal o réu

incorreu, conforme determina o art. 408, § 1°, do CPP. O Juiz deve classificar os

crimes e especificar as qualificadoras, se existirem, porém deve abster-se de incluir

as circunstâncias atenuantes e agravantes (arts. 61, 65, 66 do CP), deixando estas

considerações para o presidente do Tribunal do Júri. (MARREY, 2000). As

qualificadoras que forem reconhecidas pelo magistrado devem ser fundamentadas,

e serão nulas as sentenças que não analisarem estas circunstâncias trazidas pela

denúncia. (MIRABETE, 2003).

Devem-se incluir também as circunstâncias de aumento de pena específica,

aquelas contidas nos parágrafos seguintes ao tipo penal, e evitar a menção ao

concurso de crimes (arts. 69 a 71 do CP), citando somente o concurso de pessoas

(art. 29 do CP). Também é vedado pela Lei de Introdução ao Código de Processo

Penal, no seu art. 7°, o reconhecimento na pronúncia de causa especial de

diminuição da pena. (NUCCI, 2006).

Neste sentido discorre o doutrinador Eugenio Pacelli:

A decisão de pronúncia, em que previamente se admitiu a presença de um crime da competência do Tribunal do Júri, é que delimitará o campo temático a ser apurado. A exceção fica por conta das circunstâncias agravantes e das causas de aumento de pena. Essas, como não podem ser incluídas na decisão de pronúncia, para evitar a influência desse ato judicial na formação do convencimento dos jurados e por se tratar de matéria atinente a aplicação da pena, deverão constar necessariamente do libelo. Quanto ao mais, o libelo deve reproduzir a pronúncia. (OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de, 2004, p. 698).

O mesmo artigo 40,8 em seu § 4° determina: “O juiz não ficará adstrito à

classificação do crime, feita na queixa ou denúncia, embora fique o réu sujeito à

pena mais grave, atendido, se for o caso, o disposto no Art. 410 e seu parágrafo”.

Como este artigo supra mencionado é o tema principal deste trabalho, será

abordado amplamente no próximo capítulo.

O Juiz, nesta fase do processo, deve cuidar para que alguém que não

mereça ser condenado venha ficar à mercê do Tribunal Popular soberano, e deve

perguntar se haverá uma grande injustiça caso isto venha a ocorrer. Se a resposta

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for positiva, não deve pronunciá-lo. O juiz deve basear-se em fortes indícios e

chegar perto da certeza. (TOURINHO FILHO, 2005).

Há casos em que o magistrado irá se deparar, durante a pronúncia, com

crimes conexos ao crime doloso contra a vida, pelos casos de conexão já

mencionados. Nesta hora deve o Juiz pronunciar o réu por todos os crimes que lhe

são imputados, não podendo absolvê-lo ou condená-lo pelos crimes que não são de

sua competência. O Júri tem competência atrativa e deverá julgar todos os delitos

cometidos pelo acusado. (MARREY, 2000)

Assim exemplifica o doutrinador Guilherme Nucci:

O réu responde por homicídio seguido de furto; havendo pronúncia pelo crime contra vida, remete-se, automaticamente, o furto para análise dos jurados, exista ou não prova suficiente da materialidade, haja ou não provas suficientes acerca da autoria. É competente, na integralidade, o Conselho de Sentença para apreciar o crime patrimonial. (NUCCI, Guilherme de Souza, 2006, p. 692)

O réu deverá ser intimado pessoalmente da sentença de pronúncia caso a

classificação que lhe for imputada tratar-se de crime inafiançável, porém, se o crime

for afiançável deverá ocorrer a intimação nos termos do art. 415 do Código de

Processo Penal:

Art. 415 - A intimação da sentença de pronúncia, se o crime for afiançável, será feita ao réu: I - pessoalmente, se estiver preso; II - pessoalmente, ou ao defensor por ele constituído, se tiver prestado fiança antes ou depois da sentença; III - ao defensor por ele constituído se, não tendo prestado fiança, expedido o mandado de prisão, não for encontrado e assim o certificar o oficial de justiça; IV - mediante edital, no caso do nº II, se o réu e o defensor não forem encontrados e assim o certificar o oficial de justiça; V - mediante edital, no caso do nº III, se o defensor que o réu houver constituído também não for encontrado e assim o certificar o oficial de justiça; VI - mediante edital, sempre que o réu, não tendo constituído defensor, não for encontrado.

Nos crimes inafiançáveis, enquanto não houver intimação pessoal do

acusado, os autos ficaram estagnados, pois os atos seguintes deverão ocorrer

somente após a preclusão do prazo para o recurso.

Além de ser encaminhado para o julgamento pelos seus pares, outro

principal efeito da pronúncia é a determinação de que o réu seja recolhido à prisão,

expedindo mandado para sua captura, conforme art. 408, § 1°. Entretanto, o mesmo

artigo, em seu § 2°, prescreve que se o réu for primário e possuir bons antecedentes

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poderá o Juiz deixar de decretar sua prisão, ou colocá-lo em liberdade se já estiver

preso. Trata-se de uma faculdade do Juiz e este deve analisar cada caso. Em todos

os casos, porém, deve o Juiz esclarecer na sua decisão se o réu aguardará preso ou

em liberdade seu julgamento.

O princípio constitucional de presunção de inocência, contida na CF/88, no

seu art. 5°, LVII, deve ser analisado também no caso da pronúncia, apesar da quase

certeza que leva o magistrado a pronunciar o réu. Se este for primário, possuir bons

antecedentes, não ocasionar perigo a ordem pública, nem o risco de voltar a

cometer ato ilícito contra a sociedade, deverá o magistrado não determinar sua

prisão, ou revogá-la se estiver preso. (MARREY, 2000)

Outro efeito da pronúncia, contido no art. 408, § 3° do CPP, é a fiança: “Se o

crime for afiançável, será, desde logo, arbitrado o valor da fiança, que constará do

mandado de prisão”. A Constituição Federal garante no art. 5°, inciso LXVI:

“ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade

provisória, com ou sem fiança”. O Juiz deve arbitrar fiança, nos crimes afiançáveis,

porém, atualmente, também deve arbitrar nos demais crimes, se o réu for primário e

possuir bons antecedentes (MARREY, 2000).

Da sentença de pronúncia cabe Recurso em Sentido Estrito, conforme o art.

581, inciso IV do CPP: “Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou

sentença: IV que pronunciar ou impronunciar o réu.”. Também é possível a utilização

de Habeas Corpus para recorrer da decisão de pronúncia.

Classifica-se como despronúncia, o ato pelo qual o Tribunal profere acórdão

que reforme a decisão do magistrado, ou este mesmo, por força do efeito devolutivo

do recurso de sentido estrito, venha a reformar sua decisão, impronunciando o réu.

(TUBENCHLAK, 1997)

O artigo 416 do CPP reconhece a possibilidade da correção da pronúncia

depois do trânsito em julgado da decisão, por surgimento de circunstância

superveniente:

Art. 416: Passada em julgado a sentença de pronúncia, que especificará todas as circunstâncias qualificativas do crime e somente poderá ser alterada pela verificação superveniente de circunstância que modifique a classificação do delito, o escrivão imediatamente dará vista dos autos ao órgão do Ministério Público, pelo prazo de 5 (cinco) dias, para oferecer o libelo acusatório.

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Baseado neste artigo, conclui-se que o procedimento aplicável quando surgir

nova circunstância que altere a pronúncia é a abertura do prazo para o Ministério

Público aditar a denúncia e, logo após, conceder prazo à defesa para manifestar-se.

Neste caso a não observação destas providências atentaria contra a titularidade

concedida ao Ministério Público na Ação Penal, e também contra os princípios da

ampla defesa e do contraditório. (NUCCI, 2006).

O exemplo mais clássico desta situação é quando o Juiz pronuncia o réu por

tentativa de homicídio e logo após a vítima vem a falecer. Neste caso, será aberto

novo prazo para que a defesa produza provas. (TOURINHO FILHO, 2005).

Acrescente-se ainda que os fundamentos da pronúncia não têm efeitos

preclusivos absolutos, pois os argumentos do Juiz podem ser alterados pelo

judicium causae. Ainda neste sentido, dispõe o doutrinador Frederico Marques:

“Tais fatos mostram que, no processo, só permanece intocável, da pronúncia, a

declaração de admissibilidade dos jus accusationis, visto que a preclusão pro

judicato impede que tal assunto seja reexaminado até mesmo no juízo da causa”

(MARQUES, José Frederico, 1997, p. 232)

Apesar do art. 416 do CPP mencionar o trânsito em julgado da sentença de

pronúncia, esta não transita em julgado, pois se trata de decisão processual que tem

o objetivo de julgar admissível a pretensão punitiva do estado. Neste caso, o que

ocorre com o transcorrer do prazo para recurso é a preclusão desta sentença.

Cabe ressaltar que a pronúncia interrompe o curso da prescrição, conforme

o art. 117, inciso II, do CP: “O curso da prescrição interrompe-se: II pela pronúncia”.

O autor Fernando Capez ainda ressalta: “A pronúncia interrompe o curso da

prescrição da pretensão punitiva e não perde essa força interruptiva nem mesmo em

face de desclassificação ulterior por parte dos jurados (RT650/264)”. (CAPEZ,

Fernando, 2004, p.187).

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3.2 IMPRONÚNCIA

A impronúncia é uma decisão interlocutória de caráter terminativo, pois

encerra a primeira fase do Júri, mas não dá início a segunda fase, tampouco analisa

o mérito da ação penal. (NUCCI, 2006). Segundo Eugenio Pacelli: “Trata-se, ao

contrário,de uma decisão interlocutória mista, porque encerra o processo, sem,

porém, julgar a pretensão punitiva, ou seja, sem aplicar a condenação ou absolvição

do acusado”. (OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de, 2004, p.688)

Nos casos em que o Juiz não se convencer da existência dos elementos

necessários para a pronúncia, deve prolatar sentença de impronúncia. Nesses casos

os elementos materialidade e indícios de autoria não estarão presentes, pois, se o

Juiz estiver em dúvida quanto à presença destes requisitos, deve pronunciar o réu

(CALVO FILHO, SAWAYA, 2002).

Se o Magistrado não encontrar, durante a instrução criminal, comprovação

dos fatos descritos na denúncia, ou ainda, não encontrar provas que levem a

concluir que o acusado cometeu o fato citado, deverá o Juiz impronunciá-lo e julgar

improcedente a peça acusatória ( OLIVEIRA, 2004)

Enquanto na pronúncia julga-se a admissibilidade de acusação, na

impronúncia julga-se inadmissível a pretensão punitiva do Estado.

Segundo o doutrinador Julio Mirabete: A impronúncia é um julgamento de inadmissibilidade de encaminhamento da imputação para o julgamento perante o Tribunal do Júri porque o juiz não se convenceu da existência de prova da materialidade do crime ou de indícios da autoria, ou nenhum dos dois. (...) Embora a pronúncia não exija mais do que a suspeita jurídica derivada de um concurso de indícios, devem ser idôneos, convincentes e não vagos, duvidosos, de modo que a impronúncia se impõe quando de modo algum ensejariam o acolhimento da acusação pelo Júri. (MIRABETE, Julio Fabbrini, 2003, p. 526)

Conforme art. 409 do Código de Processo Penal:

Art. 409: Se não se convencer da existência do crime ou indício suficiente de que seja o réu o seu autor, o juiz julgará improcedente a denúncia ou queixa. Parágrafo Único: enquanto não extinta a punibilidade, poderá, em qualquer tempo, ser instaurado o processo contra o réu, se houver novas provas.

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A impronúncia é uma sentença terminativa que faz coisa julgada formal e

não material, pois não extingue a punibilidade, já que o processo pode ser reaberto

quando surgirem novas provas. Porém, se o Juiz na hora de prolatar a decisão,

impronuncie o réu, ao invés de absolvê-lo sumariamente, não será aceito que nova

denúncia seja oferecida contra o acusado (CALVO FILHO, SAWAYA, 2002).

Entretanto, Capez faz uma ressalva: “Excepcionalmente, quando a

impronúncia entender que o fato narrado não constitui crime ou que ficou provada a

inexistência do fato, opera-se coisa julgada material e o processo não pode mais ser

reaberto” (CAPEZ, Fernando, 2004, p. 188).

Cabe ressaltar que a impronúncia não significa que o réu foi absolvido. O

Juiz apenas decide que aquele acusado não preencheu os requisitos necessários

para ser encaminhado ao Tribunal do Júri. Portanto, enquanto não extinta a

punibilidade, isto quer dizer, enquanto não transcorrer todo o prazo prescricional,

poderá ser instaurado novo processo, isto se surgirem novas provas. (ROSA, 2000)

Após o trânsito em julgado da decisão de impronúncia, devem os autos dos

crimes conexos ser remetidos para o juízo singular competente, pois não existirá

mais a competência atrativa do júri (CALVO FILHO, SAWAYA, 2002).

Esta decisão transita em julgado, mas só se transforma em decisão

definitiva depois de extinta a punibilidade, nos termos dos motivos acima expostos.

(ROSA, 2000). É efeito da impronúncia a imediata libertação do acusado que se

encontra detido.

O recurso pertinente para decisão de impronúncia é o recurso em sentido

estrito, artigo 581, IV. Este recurso é cabível apenas para a acusação, entretanto,

cabe discussão sobre a legitimidade da defesa. Segundo Mirabete: “(...) devendo se

entender que ela tem legítimo interesse quando pleitear a absolvição sumária, ainda

que afirmando a existência do fato e da autoria com alegação de causa excludente

de antijuricidade” (MIRABETE, 2003, p. 527). Também é legítimo para impetrar

recurso o assistente de acusação nos casos em que o representante do Ministério

Público não o fizer. (LEAL, 2001)

A impronúncia também pode ocorrer nos casos em que o réu recorrer da

decisão de pronúncia, através de recurso em sentido estrito, e com o efeito

devolutivo, pode o Juiz resolver impronunciá-lo (artigo 589 CPP). O respectivo

Tribunal de Justiça que julgar o recurso também pode reformar a decisão e

impronunciar o réu. (NUCCI, 2006).

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Conforme citado no subtítulo da pronúncia, alguns autores denominam de

despronúncia este ato de o Tribunal reformar a decisão do Juiz Singular, ou ainda,

este, a quo, retratar sua decisão.

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3.3 ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA

Absolvição sumária é uma decisão de mérito, pois encerra ação penal com

análise do meritum cause, decidindo ser improcedente a pretensão punitiva do

estado (NUCCI, 2006). Trata-se de uma sentença definitiva que faz coisa julgada

material, é uma absolvição prolatada pelo juízo monocrático. (CAPEZ, 2004)

Segundo o Código de Processo Penal no seu artigo 411:

Art. 411. O juiz absolverá desde logo o réu, quando se convencer da existência de circunstâncias que exclua o crime ou isente de pena o réu (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e 28, § 1°, do CP), recorrendo, de ofício, da sua decisão. Este recurso terá efeito suspensivo e será sempre para o Tribunal de Apelação.

Em alguns casos no nosso direito penal, mesmo que alguém pratique atos

vedados pela legislação, este não constituirá um crime, pois serão praticados em

circunstâncias específicas, que podem variar em função da pessoa ou do fato

(OLIVEIRA, 2004).

Neste sentido dispõe o doutrinador Eugenio Pacelli:

As excludentes de ilicitude - causas de justificação – e de culpabilidade excluem o crime e a correspondente punibilidade, por força, então, do próprio ordenamento (arts. 20, 21, 22, 23, 26, e 28, § 1°, todos dos Código Penal). E quando não se cuidar de crime não haverá motivo para se reclamar a competência do Tribunal do Júri. (OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de, 2004, p. 682).

O Código Penal considera excludente de antijuricidade, nos termos do artigo

23 do CP, afirmando que não é considerado crime quando o fato foi praticado em: I

– estado de necessidade, II legítima defesa, III estrito cumprimento do dever legal e

exercício regular de direito.

O mesmo código ainda prescreve as causas excludentes de culpabilidade.

Embora seja considerado crime, estará o réu isento da pena de acordo com os

seguintes artigos: artigo 20 § 1°: erro sobre o elemento do tipo; artigo 21: erro sobre

a ilicitude do fato; artigo 22: coação irresistível e obediência hierárquica; artigo 26

inimputabilidade por doença mental, com desenvolvimento mental incompleto ou

retardado; artigo 28 § 1°: inimputabilidade por embriaguez fortuita.

Caso o Magistrado reconheça uma destas causas de exclusão de ilicitude ou

de culpabilidade, ou ainda se o réu for inimputável, deverá prolatar sentença de

absolvição sumária, e o réu será considerado inocente. Entretanto, o

reconhecimento desta possibilidade deve ser afastado de qualquer ambigüidade,

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pois, como já vimos anteriormente, em caso de dúvida o Juiz não deve afastar o

julgamento da causa do seu Juiz Natural (LEAL, 2001).

O autor Adriano Marrey dá ênfase a este aspecto: “é admissível unicamente

na hipótese de haver prova concludente, cabal, ampla, plena, perfeitamente

excludente da culpabilidade, da exclusão de punibilidade ou exclusão da

responsabilidade”. (MARREY, 2000, p. 111).

Nos casos em que o réu for semi-imputável, nos termos do parágrafo único

do artigo 26 do CP, não deve ser absolvido sumariamente. Se houver prova de

materialidade e indícios veementes de autoria o acusado tem que ser pronunciado

normalmente, e a sua condição deve ser alegada para o efeito de redução da pena

(NUCCI, 2006).

Algumas pessoas questionam se é correta esta retirada da competência do

Júri, nos casos de absolvição sumária. O autor Fernando Capez diz ser a absolvição

sumária uma medida excepcional, pois subtrai a competência constitucional do Júri.

(CAPEZ, 2006).

Porém, ela ocorre porque o Tribunal do Júri possui algumas peculiaridades.

Como os Juízes desta causa são pessoas leigas e sem conhecimento específico do

direito, o legislador adotou esta medida de cautela, não deixando as pessoas que se

enquadram nos artigos acima mencionados à mercê de um julgamento pelo Tribunal

Popular (OLIVEIRA, 2004).

Também se deve ressaltar que o Júri está incluído na Constituição Federal,

no artigo que trata sobre os direitos e as garantias fundamentais, e estes estariam

feridos se um cidadão fosse levado a julgamento pelo Júri por ter cometido um ato

lícito (TOURINHO FILHO, 2005).

Transcorre sobre este assunto Guilherme Nucci:

Estando o juiz convencido, com segurança, desde logo, da ilicitude da conduta do réu ou da falta de culpabilidade, não há razão para determinar que o julgamento seja realizado pelo Tribunal Popular. Não fosse assim e a instrução realizada em juízo seria totalmente despicenda. Se existe, é para ser aproveitada, cabendo, pois, ao magistrado togado aplicar o filtro que falta ao juiz leigo, remetendo ao júri apenas o que for, em função da dúvida intransponível, um crime doloso contra vida. (NUCCI, 2006, p. 699)

Se o réu for absolvido durante o encerramento do judicium accusationis, o

Juiz Singular deve recorrer, de ofício, desta decisão, nos termos do artigo 411 in fine

do CPP, o chamado reexame necessário. Este recurso tem efeito suspensivo. Se o

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réu estiver preso, permanecerá segregado até o julgamento do recurso. Enquanto o

processo não for julgado pela instância superior a sentença de absolvição não

transita em julgado e terá a mesma força de impronúncia. (TOURINHO FILHO,

2005).

As partes também são legítimas para recorrer desta decisão, através de

recurso em sentido estrito, segundo o artigo 581, inciso VI do CPP. Em caso de

supressão desta função pelo Juiz de primeiro grau e haja interposição de recurso

pelas partes, pode considerar o Tribunal estar sanada esta obrigação (TOURINHO

FILHO, 2005). Entretanto, o Código de Processo Penal determina em seu artigo

564, inciso III, “n”, que a não interposição do recurso gera nulidade.

Como o Ministério Público também é legítimo para impetrar este recurso,

esta legitimidade também alcança o assistente de acusação. (LEAL, 2001).

Discorda desta legitimidade o autor Mirabette, argumentando que o código não traz

expressamente a possibilidade de o assistente de acusação interpor recurso em

sentido estrito (MIRABETTE 2003).

Para os crimes conexos, após a revisão da decisão do Juiz de primeira

instância, pelo Tribunal hierarquicamente superior, devem os autos ser remetidos a

uma Vara Criminal, local onde será apreciado por um Juiz Singular, assim como na

pronúncia e na impronúncia. (LEAL, 2001), Não deve, em nenhuma circunstância, o

Juiz que absolveu o acusado pronunciar-se quanto aos crimes conexos. (CAPEZ,

2004). Também deve aguardar o trânsito em julgado da decisão superior para

encaminhar os autos para o Juízo Singular (TOURINHO FILHO, 2005).

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3.4 DESCLASSIFICAÇÃO DA INFRAÇÃO PENAL

A desclassificação é uma decisão interlocutória que altera o juízo

competente para julgar a ação, sem analisar o mérito e sem extinguir o processo, é

apenas uma decisão processual. (NUCCI, 2006).

Ocorrerá desclassificação do delito quando o Magistrado constatar, com

absoluta certeza, que ocorreu crime que diverge da competência do Tribunal do Júri.

Como sabemos, o povo é soberano para julgar os crimes dolosos contra vida,

portanto, o Juiz, em qualquer sinal da presença do dolo nos crimes contra a vida não

deve desclassificá-los. (NUCCI, 2006).

Conforme redação do artigo 410 do CPP:

Art. 410: Quando o juiz se convencer, em discordância com a denúncia ou queixa, existência de crime diverso dos referidos no Art. 74, § 1°, e não for competente para julgá-lo, remeterá o processo ao Juiz que o seja. Em qualquer caso, será reaberto ao acusado prazo para a defesa e indicação de testemunhas, prosseguindo-se, depois de encerrada a inquirição, de acordo com os arts. 499 e seguintes. Não se admitirá, entretanto, que sejam arroladas testemunhas já anteriormente ouvidas. Parágrafo Único: Tendo o processo de ser remetido a outro juízo, à disposição deste passará o réu, se estiver preso.

Pode acontecer que o réu seja denunciado por um crime de homicídio, mas

com a averiguação probatória, conclui o Juiz que não se trata de homicídio, e sim,

de um latrocínio. Pode também concluir que não existiu o animus necandi, que o

crime foi de lesões seguidas de morte e não propriamente de homicídio. Neste caso,

o Juiz desclassifica o delito e remete este processo ao juízo competente (ROSA,

2000).

Ainda é importante destacar que o Juiz deve desclassificar o crime e abster-

se de dar nova qualificação penal ao fato. Desta maneira, estará analisando o mérito

da ação, além do que, o Juiz que irá receber este processo poderá discordar da

classificação imposta pelo juízo anterior. (CALVO FILHO, SAWAYA, 2002).

Neste mesmo sentido o doutrinador Tourinho Filho explica porque não se

deve dar nova imputação: “é claro que nessa decisão não deve o Juiz dar a

qualificação jurídico–penal do fato, mesmo porque o juízo competente poderá

discordar, criando uma situação, quando não intransponível, pelo menos delicada e

embaraçosa” (TOURINHO FILHO, 2005). Entretanto, a fundamentação desta

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decisão não acarreta pré – julgamento. (MIRABETE, 2003). Desta maneira, o Juiz

não vincula o seu colega que irá receber esta ação.

Mesmo nos casos em que não houver uma Vara específica do Júri, apenas

uma Vara Criminal, por exemplo, mesmo nestes casos, o Juiz não pode sentenciar o

processo sem conceder prazo para a defesa. A falta de abertura deste prazo gera

nulidade insanável. (MIRABETE, 2003)

A doutrina ainda traz a possibilidade de a desclassificação ocorrer perante o

Tribunal do Júri, nos termos do artigo 74, § 3° in fine e 492, § 2° do CPP. Nestes

casos, poderá ocorrer desclassificação própria ou imprópria. A desclassificação

própria acontecerá quando o conselho de sentença afastar o tipo penal descrito na

pronúncia e desclassificar para outro tipo penal, sem reconhecer novo fato delituoso.

Neste caso, o Júri nem condena nem absolve o réu por este novo delito, apenas

afirma que não é de competência deste Tribunal. Já na desclassificação imprópria,

o Júri não reconhece o tipo penal descrito na pronúncia, mas acaba condenando o

acusado por outro delito. (LEAL, 2001).

Desta decisão que desclassifica a infração, cabe recurso, que será

interposto pela parte sucumbente, geralmente a acusação. A defesa também é

legítima para pleitear a absolvição sumária, e é pertinente o recurso em sentido

estrito, nos termos do artigo 581, inciso II do CPP. (MIRABETE, 2003). Caso o

representante do parquet não se manifeste, também é legítimo para interpor este

recurso, o assistente de acusação (LEAL, 2001).

Após o trânsito em julgado desta decisão, os atos processuais praticados

não serão anulados, e será dado prazo para a defesa, que poderá produzir novas

provas, arrolar testemunhas, excluindo, entretanto, as que já foram inquiridas

(MIRABETE, 2003). Também devem ser cumpridos os procedimentos dos artigos

499 e 500 do CPP, antes de o Magistrado sentenciar o processo. Isto ocorrerá seja

o crime apenado com detenção ou reclusão. (CAPEZ, 2004)

É entendimento de alguns doutrinadores que o Magistrado acolhedor deste

processo não deverá suscitar conflito de competência, em razão de o recurso já ter

transitado em julgado, e pelo fato de o Ministério Público, que é dono da ação penal,

já haver confirmado esta decisão. (LEAL, 2001). Para Eugenio Pacelli o Juiz pode

discordar da decisão que declinou competência, assim sendo deverá suscitar

conflito negativo de competência (OLIVEIRA, 2004).

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4 UMA ANÁLISE SOBRE A APLICAÇÃO DO ART. 408, § 4°, DO

CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

O artigo 408, § 4°, do Código de Processo Penal assim dispõe:

Art. 408: Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios do que o réu seja seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento. (...) § 4° O juiz não ficará adstrito à classificação do crime do crime, feita na queixa ou na denúncia, embora fique o réu sujeito à pena mais grave, atendido, se for o caso, o disposto no artigo 410 e seu parágrafo.

Segundo o artigo acima mencionado, é de competência do Magistrado

reconhecer nova classificação do fato, de maneira a alterar o tipo penal descrito na

denúncia. Neste caso, o Juiz pode promover esta mudança sem que o Ministério

Público adite a peça acusatória. É grande a controvérsia que envolve o artigo.

Destaca-se também, a letra do artigo 384 do Código de Processo Penal:

Art. 384: Se o juiz reconhecer a possibilidade de nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente no autos de circunstancia elementar, não contida, explicitamente ou implicitamente, na denúncia ou na queixa, baixará o processo, a fim de que a defesa, no prazo de 8 ( oito) dias, fale e, se quiser, produza provas, podendo ser ouvida até três testemunhas. Parágrafo Único: Se houver possibilidade de nova definição jurídica que importe aplicação de pena mais grave, o juiz baixará o processo, a fim de que o Ministério Público posso aditar a denúncia ou a queixa, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, abrindo, em seguida, o prazo de 3 (três) á defesa, que poderá oferecer prova, arrolando até três testemunhas.

A polêmica envolvendo o artigo 408 § 4° do CPP, está muito bem descrita

por Rogério Tucci:

A questão a discutir é a de se saber se o dispositivo é uma repetição do art. 383 do Código de Processo Penal, uma exceção ao art. 384 ou se deve ser aplicado sem prejuízo também da aplicação do mesmo art. 384, havendo entendimento em todos os sentidos. (TUCCI, 1999, p.124).

Uma corrente de doutrinadores defende que a denúncia precisa ser aditada,

divergindo do art. 408, § 4°, que garante ao Juiz a faculdade de determinar a

classificação que entender correta. Para os que defendem esta tese este dispositivo

legal confronta com o artigo 5°, LV da CF/55, que garante aos litigantes de qualquer

processo judicial o direito do contraditório e da ampla defesa. Nesta hipótese,

quando o Juiz reconhecer novo tipo penal, também de competência do Júri, ou

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qualificadora não descrita na denúncia, é necessário baixar o processo em

diligências para o Ministério Público, a fim de que este adite a peça inicial.

Entretanto, há quem acredite ser desnecessário este aditamento, haja vista

que o artigo 408 no CPP, no seu § 4°, confere ao Juiz a faculdade de dar nova

classificação ao crime sem necessitar que o promotor proceda ao aditamento.

Alega-se que o acusado no processo defende-se dos fatos que lhe foram imputados

e não da capitulação específica. Argumentam também, que a denúncia neste

procedimento não é peça de imputação do Magistrado, ao contrário, é um mero

pressuposto da Sentença de Pronúncia, cujo conteúdo vai ser submetido ao

contraditório.

A partir deste momento, apresentarei a tese defendida por cada um dos

autores pesquisados sobre este tema controverso. Na seqüência, uma breve síntese

de jurisprudências dos nossos Tribunais pátrios.

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4.1 DOUTRINA

Segundo o autor Saulo Brum Leal, o Juiz pode dar nova classificação ao

fato, desde que este esteja perfeitamente descrito na denúncia, sem prejuízo para a

defesa. Assim dispõe:

A circunstância de ser necessária uma correlação entre a sentença e a acusação Não impede que o juiz, corrigindo a capitulação contida na peça acusatória, dê a exata definição jurídica a fato perfeitamente descrito na denúncia, eis que, em tal hipótese, não se poderá vislumbrar surpresa ou prejuízo para a defesa dado que o réu se defende do fato, e não da capitulação. ( LEAL, 2001, p. 45)

No que tange às qualificadoras, o mesmo autor defende que para a

qualificadora ser incluída na sentença de pronúncia deve estar contida, explícita ou

implicitamente, na denúncia, preservando assim o direito ao contraditório. Se o

Magistrado reconhecer qualificadora não contida na denúncia, acarretará nulidade

no processo por cerceamento de defesa. Para que ele inclua circunstância

qualificadora nestes casos, deverá enviar os autos para que o promotor adite a

denúncia nos termos do artigo 384, parágrafo único. (LEAL, 2001).

Este autor entende não ser possível afastar qualificadora descrita na

denúncia, devendo ser afastada somente se comprovada sua improcedência. Na

dúvida sobre o reconhecimento, o Juiz deve acolher a qualificadora e deixar que o

Tribunal do Júri decida esta questão. (LEAL, 2001).

O doutrinador Eugênio Pacelli de Oliveira faz distinção entre o

procedimento adotado pelo artigo 384 do CPP e o artigo 408, § 4° do CPP. Segundo

ele, o artigo 384 do CPP autoriza o mutatio libelli, e, neste caso o Juiz pode alterar a

classificação descrita na peça acusatória, reconhecendo fatos descritos ou não na

denúncia, desde que abra os prazos contidos no artigo supra, para que a defesa

possa contraditar e produzir novas provas. Se desta nova classificação resultar pena

mais grave, utiliza-se o parágrafo único do mesmo artigo, baixando os autos para

aditamento pelo Ministério Público. (OLIVEIRA, 2004).

Por conta deste entendimento, o autor acima mencionado discorda do artigo

408, § 4°, do CPP: “Entretanto, o procedimento previsto no art. 408, §4°, do CPP

dispensa tanto a participação do Ministério Público para o oferecimento de

aditamento como também a reabertura do prazo de defesa” (OLIVEIRA, 2004, p.

693). Segundo o autor, isto é uma afronta ao princípio acusatório, visto que quem

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procederá à acusação é o Juiz e não o Ministério Público, detentor desta

prerrogativa, e ao princípio da ampla defesa, pois o acusado durante a instrução não

se defendeu do que lhe será imputado (OLIVEIRA, 2001).

O autor Aramis Nassif dá mais ênfase ao assunto, ao tratar da possibilidade

ou não de afastar-se qualificadora trazida pelo Promotor na denúncia. Afirma que a

jurisprudência entende não ser possível excluir esta circunstância, pois este tema é

reservado ao Tribunal Popular. Entretanto filia-se à corrente do Tribunal de Justiça

do Rio Grande do Sul, a qual afirma que, se o Magistrado pode absolver

sumariamente, pode afastar qualificadora, sustentando que quem pode mais pode

menos (NASSIF, 2001).

Neste sentido reconhece o autor:

Trata-se de decotar o plus acusatório, adaptando o fato a realidade probatória, o que esta dentro da configuração formal do art. 408, § 4°, CPP. (...) A denúncia, nesse procedimento, não e peça de imputação do Colegiando, ao contrário, mero pressuposto da pronúncia, cujo conteúdo vai ser submetido ao contraditório. A pronúncia, por isso, pode excluir qualificadora narrada na denúncia. (NASSIF, 2001, p. 45).

Rogério Lauria Tucci destaca a diferença entre o emendatio e mutatio

libelli. Segundo o autor, emendatio libelli seria apenas a adequação da classificação

jurídica aos fatos já existentes, não sendo necessário que o réu produza novas

provas, haja vista que ele se defende dos fatos e não da classificação. Já o mutatio

libelli ocorre quando o Magistrado reconhece nova classificação do delito,

fundamentado em fatos não contidos na denúncia. Desta maneira, abre-se novo

prazo para defesa. Em se tratando de crime que resulte em pena mais grave do que

o descrito na denúncia, faz-se necessário o aditamento pelo Ministério Público

(TUCCI, 1999)

Conclui o doutrinador que o artigo 408, § 4° do CPP é uma exceção ao

artigo 384 do mesmo CPP, afirmando que pode ocorrer o mutatio libelli sem a

aplicação das determinações do artigo 384. Assim, poderá o Juiz reconhecer nova

qualificadora não descrita na peça acusatória. E afirma ainda, que não ocorrerá

ofensa ao princípio do contraditório e da ampla defesa. In verbis: “Mas a mutatio

libelli, nesses termos, sem a oportunidade de manifestação do acusado, não

ofenderia o contraditório e a ampla defesa? Não, porque a ampla defesa está

assegurada na segunda fase do procedimento do júri” (TUCCI, 1999, p. 125).

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O renomado doutrinador Fernando da Costa Tourinho Filho trata esta

matéria por outro liame. Deve-se aplicar o artigo 408, § 4°, quando o Magistrado

necessitar fazer uma mera correção formal. Um exemplo seria o caso em que o

Promotor de Justiça descreve, na denúncia, toda a conduta delituosa como

homicídio, porém classifica o crime em infanticídio. Neste exemplo pode o

magistrado, ao pronunciar o réu, corrigir o tipo penal nos termos do artigo 408, § 4°

do CPP, sem abrir prazo para o acusado (TOURINHO FILHO, 2005).

Entretanto entende que se aplicará a regra do artigo 384 do CPP quando

surgirem novas provas durante a instrução do processo. Assim exemplifica Tourinho

Filho: “Mas, se for denunciado por infanticídio e na instrução se apura ter havido

homicídio, a regra do parágrafo único do art. 384 é de rigor.” (TOURINHO FILHO,

2005, p.73,74). Também, para os casos em que o Juiz reconhecer a existência de

qualificadora não descrita na denúncia, o parágrafo único do artigo acima

mencionado deve ser observado. (TOURINHO FILHO, 2005).

Cabe destacar também uma peculiaridade observada durante a pesquisa.

Na leitura do Manual de Processo Penal, do doutrinador Tourinho Filho, 6° edição,

publicado em 2004, observa-se que o autor tinha posição divergente da publicada

mais recentemente no seu Curso de Processo Penal anteriormente citado.

Neste sentido resumia o autor:

(...) limitar-se-á a pronunciar o réu como incurso nas penas do artigo que entender tenha sido violado. Muito claro a propósito, o art. 408, § 4°, do CPP. Cremos, assim, não haver necessidade de se invocar a regra do art. 384 e, muito menos, a do seu respectivo parágrafo. É que não se trata de decisão de mérito. Esse, contudo, não é o entendimento majoritário. (TOURINHO FILHO, 2004, p. 647).

Fica demonstrado, no exemplo acima, que este entendimento de aplicar-se o

artigo 384 do CPP, em detrimento ao artigo 408, § 4°do CPP, é uma conduta à qual

a doutrina e a jurisprudência vêm se adequando.

Para Adriano Marey, não é faculdade de o Juiz pronunciar o réu por fatos

não contidos na denúncia, pois as afirmações da denúncia delimitam o alcance da

pronúncia. Para que o magistrado vá além do contido na denúncia, deverá observar

a regra do artigo 384, possibilitando vista à defesa, e, se for o caso de pena mais

grave, encaminhando os autos para que o promotor adite a denúncia.

Em relação às qualificadoras o autor afirma que o Juiz deve incluir na

pronúncia aquelas contidas na denúncia, ou implicitamente contidas. Caso apure-se

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a presença da qualificadora durante a instrução, e a denúncia for omissa a seu

respeito, não poderá ser reconhecida sem que se possibilite defesa ao réu. Nestes

casos devem-se baixar os autos para o aditamento pelo Ministério Público.

(MARREY, 2000).

E justifica seu raciocínio no cerceamento de defesa do acusado:

Incurial seria, por afetar o direito à plena defesa que, então, em face de qualificadora se deixasse de ouvir antes o réu, com a faculdade de deduzir defesa, tal como a lei processual penal admite. (...) se tiver a denúncia sido falha, e omitido alusão a alguma circunstância dessa espécie, a pronúncia não a poderá simplesmente acolher, sob pena de violação do direito á ampla defesa. Ficaria o réu sem a possibilidade de discutir a circunstância surgida durante a instrução. (MARREY, 2000, p. 267).

Sobre esta matéria, o doutrinador Fernando Capez afirma não ser

necessário aplicar o artigo 384, já que o código traz no artigo 408, § 4°, a

possibilidade de o Magistrado atribuir classificação divergente da denúncia ou da

queixa, e assim justifica:

(...) não há necessidade de se abrir prazo para manifestação da defesa ou aditamento da denúncia, não se aplicando o disposto no art. 384 do CPP (mutatio libelli), por se tratar de decisão meramente interlocutória e em face do que dispõe expressamente o art. 408, § 4°, do CPP. (CAPEZ, 2004, p.186)

O autor ressalva que a jurisprudência tem entendimento diverso do seu.

Afirma que os tribunais vêm exigindo, nos casos de mutatio libelli, que o Juiz tome

as providências previstas no artigo 384 e seu parágrafo único, para não causar

surpresa às partes. Quanto à inclusão de qualificadoras, afirma Capez, que os

tribunais também entendem ser necessário o aditamento da denúncia. Se o

problema for apenas corrigir classificação errônea dada pelo Promotor, o Juiz

poderá dar classificação correta, nos termos do artigo 383 do CPP, o emendatio

libelli (CAPEZ, 2004).

O autor James Tubenchlak afirma que a norma penal que autoriza o

Magistrado a dar classificação diferente da contida na denúncia ou na queixa

descrita no artigo 408, § 4°, do CPP, é absurda. O autor considera esta norma

inconstitucional, pois fere a plenitude de defesa assegurada pela Constituição

Federal, no seu artigo 5°, XXXVIII, “a”. Afirma que, se o Juiz reconhecer indícios de

alguma qualificadora não deverá incluí-la na pronúncia, somente se proceder nos

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termos do artigo 384, parágrafo único, baixando os autos para que o Ministério

Público adite a denúncia (TUBENCHLAK, 1997).

Tubenchlak defende que o Juiz pode repudiar qualificadoras constantes na

denúncia, afirmando novamente que o caso contrário não é permitido, tornando a

pronúncia nula. Caso o magistrado inclua nova qualificadora, pode ainda o Ministério

Publico recorrer, embora não seja sucumbente. In verbis: “possui legítimo interesse

nos termos do art. 127 da Constituição, em defesa dos direitos individuas

indisponíveis” (TUBENCHLAK, 1997, p.85).

Em alguns casos, quando o Magistrado determinar a baixa dos autos, pode

o Promotor de Justiça não promover o aditamento, sendo ilícito o Juiz reconhecer

esta qualificadora, pois estaria decidindo ultra petita. Defende uma parte da doutrina

que na ocorrência desta situação pode aplicar-se, por analogia, o artigo 28 do CPP,

remetendo os autos para que o Procurador de Justiça adite a denúncia. O autor

discorda desta possibilidade, afirmando: “seria constrangedor a substituição de um

órgão acusador por outro, máxime atendendo a uma sugestão do juiz”

(TUBENCHLAK, 1997, p.86).

O doutrinador acima prescreve sobre a possibilidade de o Magistrado fazer a

alteração da classificação que foi corretamente descrita pelo Promotor, mas foi de

forma errônea tipificada. Afirma que já sustentou esta tese, pelo argumento do

emendatio libelli, concluindo que o réu se defende dos fatos e não da capitulação,

não sendo necessário o aditamento da denúncia nem abertura de prazo para

defesa. Entretanto, após refletir repetidamente sobre a matéria, assumiu outra linha

de pensamento, nestes termos: (TUBENCHLAK, 1997)

Deve ser alvo de correção qualquer erro que torne possível que o réu permaneça em estado de incertezas, de aporia sobre verdadeira dimensão da peça acusatória veja dificultada sua defesa em razão – repita-se – de um erro pelo qual não contribuiu. (...) Uma acusação que narra um fato e o classifica erroneamente não pode prosperar. Que o juiz a devolva ao órgão acusado para o fim de corrigi-la. (TUBENCHLAK, 1999. p.90)

Para os autores Romualdo Sanches Calvo Filho e Paulo Fernando

Soubihe Sawaya, o Juiz, em regra, pode incluir, na sentença de pronúncia,

circunstância qualificadora. É entendimento de alguns Tribunais que, para que o Juiz

possa incluir qualificadora na pronúncia, sem precisar que o Promotor de Justiça

adite a peça acusatória, a circunstância precisa estar descrita na denúncia mesmo

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que implicitamente. Outros Tribunais entendem que o Juiz pode incluir qualificadora

não descrita na denúncia, desde que se abra prazo para a defesa e o órgão

acusatório proceda ao aditamento da peça, se for o caso (CALVO FILHO, SAWAYA,

2002).

Os doutrinadores descrevem ainda, que há entendimento no sentido de não

ser faculdade do Magistrado afastar qualificadora, pois usurparia a competência

constitucional do Tribunal do Júri. Entretanto, eles entendem de forma oposta, e

aceitam ser possível afastar qualificadora quando na instrução ficar evidente que as

circunstâncias são manifestamente improcedentes (CALVO FILHO, SAWAYA,

2002).

No entendimento de Antonio José M. Feu Rosa, o Juiz pode pronunciar o

réu de acordo com as suas convicções, imputando a classificação penal que

considera correta, mesmo que desta nova classificação resulte pena mais grave,

desde que não afastada a competência do Tribunal do Júri. Se os fatos foram

descritos corretamente na denúncia, e o Juiz só precise fazer uma alteração no tipo

penal, ele tem a faculdade de pronunciar o réu de acordo com a classificação que

entender correta.

Porém, mais adiante no seu livro o autor afirma que em algumas situações

faz-se necessário aditar a denúncia:

(...) Surgimento de novos crimes menores, ou alteração da figura penal, de tentativa para crime consumado, haverá necessidade do retorno dos autos ao Ministério Público para aditamento á denúncia, oferecendo-se, a seguir oportunidade á defesa, inclusive para requerer provas. Já a transformação mencionada do homicídio simples pata qualificado, o Juiz poderá fazê-la independentemente de aditamento. (ROSA, 2000, p. 85).

Segundo o autor Julio Fabbrini Mirabete, o Juiz deve acolher as

qualificadoras descritas de forma expressa ou implicitamente na denúncia, mesmo

aquelas não classificadas pelo Promotor. Porém, estas circunstâncias para serem

reconhecidas precisam ser previamente aditadas. Também destaca Mirabete, que o

Juiz precisa fundamentar a existência dessas qualificadoras, não somente

acolhendo-as por constarem na peça inicial. Conclui-se que nestes casos o autor

afirma que o artigo 408, § 4°, do CPP, é perfeitamente aplicável, desde que,

tomadas as providências do artigo 384, parágrafo único. (MIRABETE, 2003).

Para o doutrinador, como a pronúncia trata de um juízo de admissibilidade,

as qualificadoras somente serão afastadas se forem claramente improcedentes ou

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sem apoio nos autos, vislumbrando assim, o princípio in dúbio pro societate

(MIRABETE, 2003).

Entretanto, quando a problemática envolver a desclassificação do delito para

outro que seja também de competência do Tribunal do Júri, o autor entende ser

correta a regra do artigo 408, § 4°, e não aplicável o disposto no parágrafo único do

artigo 384 do CPP. E assim justifica:

A pronúncia é decisão de caráter processual, na qual o juiz julga procedente o direito de acusar do Estado- Administração e a abertura de vista à defesa só se justifica se a desclassificação do fato e circunstância descrita na inicial for para crime de competência do juiz singular, que vai proferir decisão de mérito. (MIRABETE, 2003, p. 519).

O autor Guilherme de Souza Nucci afirma que o Juiz só pode afastar

qualificadoras que se mostrarem claramente improcedentes e em desacordo com as

provas obtidas na instrução (NUCCI, 2006).

No que tange ao assunto da desclassificação do delito, o autor expõe que o

Magistrado tem liberdade para dar nova classificação que diferencie daquela

descrita na denúncia, afirmando que o réu se defende dos fatos e não da definição

jurídica. É exemplo desta situação, quando o Promotor descreve um homicídio e

classifica como infanticídio. Nesta situação o magistrado pode corrigir a tipificação

(NUCCI, 2006).

Porém, o autor afirma que o artigo 408, § 4°, não considera a necessidade

das circunstâncias estarem descritas na denúncia, e isto é fundamental para definir

a aplicação do artigo acima. Nestes termos: “Entretanto, é preciso considerar que,

embora este parágrafo nada fale a respeito, o reconhecimento de nova definição

jurídica do fato necessita estar ligado à circunstância devidamente descrita na

denúncia” (NUCCI, 2006, p. 692).

Desta maneira, o autor afirma que se o Juiz mudar a classificação do delito,

baseado em fatos que não foram descritos de maneira expressa nem intrínseca na

denúncia, causará evidente prejuízo ao réu, que não se defendeu amplamente da

acusação, conforme assegura a Constituição Federal. Nesta situação, o Juiz deve

observar o artigo 384 do CPP e abrir novo prazo para a defesa (NUCCI, 2006).

Ainda para combater o argumento de muitos doutrinadores, Nucci afirma que

mesmo que a pronúncia seja um mero juízo de admissibilidade, podendo ser

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modificado pelos jurados, ela impulsiona vários efeitos, entre eles a prisão do réu.

Neste caso, deve ser resguardado o direito à plenitude de defesa (NUCCI, 2006).

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4.2 JURISPRUDÊNCIA

Após conhecer um pouco do entendimento da doutrina no que tange ao

alcance do artigo 408, § 4°, do CPP, e a sua aplicação nas sentenças de pronúncia,

verificamos que esta matéria é muito divergente entre os autores pesquisados. Para

auxiliar no estudo deste tema, tomaremos conhecimento do que decidem os nossos

Tribunais Colegiados sobre este tema.

4.2.1 Tribunal de Justiça de Santa Catarina

Vejamos algumas decisões:

EMENTA: NULIDADE - PRONÚNCIA - QUALIFICADORA NÃO CAPITULADA NA DENÚNCIA - DESCRIÇÃO IMPLÍCITA - ADMISSÃO - POSSIBILIDADE. PRONÚNCIA - HOMICÍDIO QUALIFICADO (MOTIVO TORPE E RECURSO QUE DIFICULTOU OU IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA) - PRETENDIDO RECONHECIMENTO DA LEGÍTIMA DEFESA E AFASTAMENTO DAS QUALIFICADORAS - AUSÊNCIA DE PROVA ESCORREITA - IN DUBIO PRO SOCIETATE - MANUTENÇÃO - RECURSO NÃO PROVIDO. Extrai-se do corpo do acórdão: (...) Entretanto, é preciso considerar que, embora este parágrafo nada fale a respeito, o reconhecimento de nova definição jurídica do fato necessita estar ligado a circunstâncias devidamente descritas na denúncia. Caso haja elementares não contidas na peça acusatória, o prejuízo para o réu torna-se evidente, uma vez que não se defendeu correta e amplamente, como lhe assegura a Constituição federal. (...) De qualquer forma, no caso dos autos, embora a denúncia não tenha capitulado a qualificadora do motivo torpe (CP, art. 121, § 2o, inc. I), ela está implícita naquela peça (...). (TJSC, 2007)

EMENTA: Pronúncia - Homicídio e lesões corporais - Inclusão da qualificadora do motivo fútil e exclusão do motivo torpe. Recurso das partes - Preliminar de anulação da sentença rejeitada - Mérito - Mantida a provisional com a qualificadora do motivo fútil - Recursos desprovidos. Extrai-se do acórdão: Primeiramente, não há como se acolher a tese de nulidade da sentença por cerceamento de defesa ou por falta de fundamentação quanto a inclusão da qualificadora do motivo fútil porque na exordial acusatória, mesmo que implicitamente, vê-se descrita tal qualificadora, caracterizando-se a hipótese do emendatio libelli, perfeitamente possível em nosso ordenamento jurídico. Leia-se o entendimento de JULIO FABBRINI MIRABETE: “Permite o Código que a sentença possa considerar na capitulação do delito dispositivos penais diversos dos constantes na denúncia, ainda que tenha de aplicar pena mais grave. Não há no caso uma verdadeira

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mutatio libelli mas, simplesmente uma corrigenda da peça acusatória (emendatio libelli). Estando os fatos descritos na denúncia, pode o juiz dar-lhe na sentença definição jurídica diversa, inclusive quanto às circunstâncias da infração penal porquanto o réu se defendeu daqueles fatos e não de sua capitulação inicial. (...)" ("Código de Processo Penal Interpretado", 5ª ed., São Paulo: Atlas, 1997., p. 488/9). (TJSC, 2006 b).

EMENTA: Pronúncia. Homicídio qualificado pelo motivo fútil asfixia e emboscada - Artigo 121, § 2º, incisos II, III e IV, do Código Penal. Preliminar suscitada pelo Parquet ad quem de nulidade da provisional, por descumprimento do artigo 384, do CPP - Rejeição - Motivo fútil explicitamente constante da denúncia com perfectibilização do contraditório também no que se refere à aludida qualificadora. A suportar a rejeição, ainda, exegese do artigo 408, § 4º, do CPP. Retorno dos autos à douta Procuradoria Geral de Justiça para que se manifeste sobre o mérito do recurso. Extrai-se do corpo do acórdão: Na fase instrutória foi a elementar amplamente debatida, não havendo o menor indício de que o princípio constitucional do contraditório não tenha se operado em relação a ela, visto que, inclusive, em alegações finais foi a mesma rebatida pelo defensor, que, perseguindo o seu mister, também repeliu as demais constantes na denúncia. Por isso, não há falar-se, in casu, na aplicação do artigo 384 do CPP, uma vez que a mutatio libelli não tem aplicação nos presentes autos. Ademais, consoante prevê o § 4º do art. 408 do CPP, o juiz para efeitos da pronúncia não fica adstrito à classificação do crime formulada na queixa ou na denúncia, embora fique o réu sujeito a pena mais grave (...). (TJSC, 1990 c).

EMENTA: (...) SENTENÇA PROVISIONAL - RECONHECIMENTO DE QUALIFICADORA NÃO CAPITULADA NA DENÚNCIA - CIRCUNSTÂNCIA DESCRITA NA INICIAL ACUSATÓRIA - DESNECESSIDADE DE ABERTURA DE PRAZO PARA A MANIFESTAÇÃO DA DEFESA - HIPÓTESE DE EMENDATIO LIBELLI - SURPRESA OU PREJUÍZO INEXISTENTES - PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADA. O acusado se defende dos fatos narrados na inicial acusatória, e não da classificação jurídica dada aos mesmos. Extrai-se do corpo do acórdão: O artigo 384, do Código de Processo Penal, traz, em seu texto, a necessidade de abertura do prazo para que se manifeste a defesa quando inexistir, na denúncia, implícita ou explícita descrição de circunstâncias elementares ou qualificadoras do tipo penal que se entendeu infringido. Em outras palavras, no caso proposto, o referido dispositivo aplicar-se-ia somente se a circunstância qualificadora do ilícito não qual foram pronunciados não tivesse sido descrita, ao menos implicitamente, na exordial acusatória. Não é o que se vislumbra nos autos. Vicente Greco Filho é claro ao fazer notar que a emendatio libelli não caracteriza cerceamento de defesa: "Pode-se dizer que a única classificação definitiva é que se estabilizou com o trânsito em julgado da sentença; as demais são provisórias e podem ser modificadas na decisão seguinte. Desde que os fatos sobre os quais incide sejam sempre os mesmos, a alteração da classificação

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independe de qualquer providência ou procedimento prévio, inexistindo nisso qualquer cerceamento de defesa ou surpresa, porque o acusado defende-se de fatos e não da classificação legal, ainda que o juiz deva aplicar pena mais elevada em virtude da nova classificação" ("Manual de Processo Penal", 3ª ed. atual., São Paulo: Saraiva, 1995. p. 287, sublinhamos). Saliente-se, ademais, a sua lição acerca da conceituação de fato implicitamente contida na denúncia: "Fato contido implicitamente na denúncia ou queixa significa a circunstância de fato que, apesar de não referida verbalmente na peça inicial, é compreendida nos conceitos nela expressos. Assim, por exemplo, se a denúncia imputa matar, implicitamente está imputando causar lesão corporal; ou, se descreve subtrair para si coisa alheia, está implicitamente também afirmando causar prejuízo a outrem, e assim por diante. Nesses casos, não há necessidade de se adotar o procedimento do art. 384, porque o acusado, ao se defender do que está explícito, também se defende do que está implícito." (ob. cit., p. 289). (TJSC, 2000 d).

EMENTA: RECURSO CRIMINAL - SENTENÇA DESCLASSIFICATÓRIA DO CRIME - FATO DIVERSO AO DESCRITO NA DENÚNCIA - INEXISTÊNCIA DE CORRELAÇÃO - INOBSERVÂNCIA AO ARTIGO 384, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - VÍCIO INSANÁVEL - RECURSO PROVIDO - SENTENÇA ANULADA Havendo inobservância ao preceituado no artigo 384, caput, do CPP, o melhor caminho e solução é a anulação da sentença, evitando assim ferir o princípio da ampla defesa. Extrai-se do acórdão: "Processo Penal. Mutatio libelli. É nula a sentença que condena o acusado por crime não descrito na denúncia, sem oferecer-lhe oportunidade para manifestar-se, na forma do art. 384 do Código de Processo Penal" (RSTJ 99/387). "Nula é a sentença que extrapola os limites traçados no pedido acusatório, por desclassificar o crime para nova figura jurídica cujas circunstâncias elementares do tipo não se enquadram explícita ou implicitamente na peça vestibular" (RT 618/301). “Viola o direito da ampla defesa a decisão condenatória que, desclassificando a acusação contida na denúncia, causa surpresa ao réu, apenando-o por tipificação penal contida na exordial, desobedecendo mandamento contido no art. 384 do CPP" (RT 616/353). (TJSC, 2000 e).

As decisões supra mencionadas demonstram que os Desembargadores do

Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina entedem que o artigo 408, § 4°, do

Código de Processo Penal deve ser utilizado, desde que, se reconheça na denúncia,

mesmo que implicitamente, a circunstância qualificadora que o Magistrado deseja

incluir ou a circunstância que motive a nova classificação do delito. É permitido,

entretanto, nos casos de emendatio libelli, quando o Juiz fará uma correção na

capitulação trazida pela denúncia, visto que os fatos se encontram narrados na

mesma peça. A justificativa destas decisões é de que o réu se defende dos fatos

descritos e não da capitulação imputada. Caso contrário, não estando a

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circunstância descrita na denúncia e não adotadas as formalidades do artigo 384 do

CPP, a decisão será nula por cerceamento de defesa.

4.2.2 Superior Tribunal de Justiça

EMENTA: CRIMINAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. MUTATIO LIBELLI. ADITAMENTO DA DENÚNCIA PARA INCLUIR QUALIFICADORA NÃO PREVISTA NA EXORDIAL ACUSATÓRIA. RÉU INTIMADO PARA SE MANIFESTAR ACERCA DO FATO NOVO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. IMPARCIALIDADE DO MAGISTRADO. PRONÚNCIA. DECISÃO QUE ENCERRA JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. MATÉRIA SUBMETIDA A JULGAMENTO PELO CONSELHO DE SENTENÇA. VIOLAÇÃO AO SISTEMA ACUSATÓRIO. BUSCA DA VERDADE REAL E DA EFETIVIDADE DO PROCESSO. ADEQUAÇÃO DA CONDUTA DO RÉU À REALIDADE DOS FATOS. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA. (...) II. Em observância às normas legais, o Magistrado singular determinou que o Parquet fosse ouvido acerca da possibilidade de nova definição jurídica do crime, o que importaria na eventual imposição de pena mais grave. III. Tendo o Órgão acusatório aditado a denúncia, foi determinada vista dos autos à Defesa, oportunizando ao réu o direito de oferecer prova e arrolar testemunhas. IV. Providência adotada com intuito de adequar a exordial acusatória à realidade dos fatos, em busca da verdade real, que deve sempre prevalecer em face da importância dos interesses envolvidos na esfera do processo penal. V. Magistrado que não inovou a acusação, tendo facultado ao Parquet a inclusão ou não da qualificadora. VI. Inexistência de violação ao princípio da ampla defesa, porquanto foi oportunizado ao réu o direito de produzir provas com intuito de infirmar o fato novo. Extrai-se do acórdão: (...) A vexata quaestio está em definir como o julgador deve proceder nas hipóteses do art. 384 e seu parágrafo único do CPP, de forma a que não perca a sua posição de imparcialidade. Para dar vida aos citados dispositivos legais, o julgador deve, apenas, como fez na hipótese dos autos, alertar a titular da ação penal de elemento que autorizaria, em tese, a possibilidade de nova definição jurídica que importa de aplicação de pena mais grave. (STJ, 2006)

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. CORREÇÃO DA CAPITULAÇÃO FEITA NA DENÚNCIA. SIMPLES EMENDATIO LIBELI E NÃO MUTATIO LIBELI. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. EXCESSO DE PRAZO. SÚMULA 21-STJ. 1 - Quando a nova classificação prescindir de elementar não contida na denúncia, sua concretização ocorre com a simples correção da capitulação legal, em face dos fatos suficientemente narrados, excludente da tese de nulidade por maltrato ao contraditório. Não há, por outro lado, necessidade da baixa dos autos, posto que não

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se configura a hipótese do art. 384 do CPP (mutatio libeli), mas a do art. 383 (emendatio libeli). (...) Com efeito, conforme bem acentuado pela instância a quo, não tendo sido operada uma mutatio libeli (art. 384, do CPP), mas, apenas, emendatio libeli (art. 383, do CPP), exclui-se a nulidade da pronúncia por infringência ao contraditório, pois a nova classificação prescindiu de elementar não contida na denúncia, mas concretizou-se na simples correção da capitulação legal, em face dos fatos suficientemente narrada na peça acusatória. (STJ, 1999 b).

EMENTA: CRIMINAL. RHC. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ADITAMENTO DA DENÚNCIA PARA INCLUIR QUALIFICADORA NÃO PREVISTA NA EXORDIAL ACUSATÓRIA. RÉU INTIMADO PARA SE MANIFESTAR ACERCA DO FATO NOVO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. PREJUÍZO NÃO COMPROVADO. RECURSO DESPROVIDO. I. Hipótese em que, no decorrer da instrução, verificou-se ter sido o crime praticado mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, embora tal circunstância não estivesse contida, nem de forma implícita, na denúncia. II. Tendo o Órgão acusatório aditado a denúncia, foi determinada vista dos autos à Defesa, possibilitando ao réu o direito de oferecer prova e arrolar testemunhas. III. Providência adotada com intuito de adequar a exordial acusatória à realidade dos fatos, em busca da verdade real, que deve sempre prevalecer em face da importância dos interesses envolvidos na esfera do processo penal. IV. Inexistência de violação ao princípio da ampla defesa, porquanto foi concedido ao réu o direito de produzir provas com intuito de infirmar o fato novo. (STJ, 2007 c).

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO. QUALIFICADORA. DESCRIÇÃO DOS FATOS. IMPUTAÇÃO. CLASSIFICAÇÃO DO DELITO. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. NÃO-RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE REJEIÇÃO POR INADEQUAÇÃO DA CLASSIFICAÇÃO. PRÉ-JULGAMENTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. CONCESSÃO PARCIAL DA ORDEM. 1. O acusado tem assegurada a ampla defesa se os fatos, com todas as circunstâncias que os envolvem, estiverem bem descritos na denúncia, sendo que eventual condenação ou pronúncia deve cingir-se à matéria fática claramente articulada na peça acusatória. 2. Não tem o condão de ensejar prejuízo à defesa a classificação do crime atribuída pelo órgão do Ministério Público na denúncia, pois o acusado se defende dos fatos e não da classificação, cabendo ao juiz, no momento de proferir sentença condenatória ou de pronúncia, conforme o caso, enquadrar a conduta versada na denúncia em um ou mais tipos penais, conforme o seu convencimento. 3. Verificando o magistrado que os fatos revelados durante a instrução criminal e aqueles informados na denúncia são dissonantes, deve possibilitar, à acusação, o aditamento da denúncia, conferindo à defesa o direito de oitiva e produção de provas sobre os fatos aditados, em atenção ao princípio da ampla defesa. (...) (STJ, 2005 d).

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EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO. DESCRIÇÃO DOS FATOS. IMPUTAÇÃO. CLASSIFICAÇÃO DO DELITO. CO-AUTORIA. PARTICIPAÇÃO. EMENDATIO LIBELLI. ACAREAÇÃO. CONFORMIDADE DOS QUESITOS. ALEGAÇÃO DE NULIDADE, CERCEAMENTO DE DEFESA E DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO-CONFIGURADO. DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. O acusado tem assegurado o exercício da ampla defesa se os fatos, dos quais se defende, com todas as circunstâncias que os envolvem, estiverem bem descritos na denúncia, sendo que eventual condenação ou pronúncia deve cingir-se à matéria fática claramente articulada na peça acusatória. 2. A adequação típica promovida pelo magistrado na sentença, considerando os fatos previamente descritos na denúncia, se diversa daquela atribuída pelo órgão ministerial, constitui simples emendatio libelli. (STJ, 2005 e)

Em conformidade com as jurisprudências apresentadas, pode-se concluir,

sobre o entendimento do STJ, no que tange à problemática deste trabalho.

Primeiramente, que o Juiz deve observar o procedimento legal descrito no artigo 384

do CPP quando concluir que se trata de uma classificação diferente daquela

prescrita na denúncia. Neste caso o parquet deve ser intimado para adequar a

exordial acusatória aos fatos, sempre em busca da verdade real. Promovido o

aditamento da denúncia, deve o réu ser intimado para manifestar-se e produzir

provas, garantindo, desta maneira, o principio da ampla defesa e do contraditório.

Esse Tribunal ainda faz menção ao emendatio libelli. Entende-se que ocorre

emendatio libelli quando o Magistrado apenas profere uma correção na capitulação

trazida pela denúncia, já que os fatos encontram-se descritos na peça acusatória. É

apenas uma adequação da tipificação jurídica aos fatos já existentes. Desta

maneira, não há ofensa ao princípio do contraditório.

4.2.3 Supremo Tribunal Federal

EMENTA: "HABEAS CORPUS" - ADITAMENTO DA DENÚNCIA - ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA - PRETENDIDA OBSERVÂNCIA DO ART. 384, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPP - INAPLICABILIDADE - ADITAMENTO QUE SE LIMITA A FORMALIZAR NOVA CLASSIFICAÇÃO JURÍDICA DOS FATOS QUE FORAM DESCRITOS, COM CLAREZA, NA DENÚNCIA - HIPÓTESE DE SIMPLES "EMENDATIO LIBELLI" – POSSIBILIDADE - APLICABILIDADE DO ART. 383 DO CPP (...). "HABEAS CORPUS" DEFERIDO. DENÚNCIA QUE DESCREVE, DE MODO PRECISO, OS "ESSENTIALIA DELICTI" -

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IRRELEVÂNCIA DA CLASSIFICAÇÃO JURÍDICA - ADITAMENTO QUE SE LIMITA A CORRIGIR A CAPITULAÇÃO LEGAL DOS DELITOS - "EMENDATIO LIBELLI". - Se o magistrado reconhecer a possibilidade de atribuir, ao fato delituoso, quando da prolação da sentença, qualificação jurídica diversa daquela que constou da peça acusatória, essa conduta judicial não ofenderá o direito de defesa do acusado, desde que a nova capitulação encontre apoio em circunstância elementar que se contenha, de modo explícito ou implícito, na denúncia ou na queixa. É que, em tal contexto, essa atuação processual do magistrado, plenamente legitimada pelo que dispõe o art. 383 do CPP, configurará mera hipótese de "emendatio libelli". Doutrina. Precedentes. - Aditamento que se limitou, no caso, a meramente formalizar nova classificação jurídica dos fatos que já se achavam descritos, com clareza, em seus elementos essenciais, na própria peça acusatória. Inaplicabilidade, à espécie, do art. 384 do CPP. "MUTATIO LIBELLI" - NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DO ART. 384 DO CPP - SITUAÇÃO INOCORRENTE NA ESPÉCIE. - O réu não pode ser condenado por fatos cuja descrição não se contenha, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa, impondo-se, por tal razão, ao Estado, em respeito à garantia da plenitude de defesa, a necessária observância do princípio da correlação entre imputação e sentença ("quod non est in libello, non est in mundo"). Cabe, ao juiz - quando constatar a existência, nos autos, de prova evidenciadora de circunstância elementar, não contida, explícita ou implicitamente, na peça acusatória -, adotar, sob pena de nulidade (RT 740/513 - RT 745/650 - RT 762/567), as providências a que se refere o art. 384 do CPP, que dispõe sobre a "mutatio libelli", ensejando, então, ao acusado, por efeito da garantia constitucional de defesa, o exercício das prerrogativas que essa norma legal lhe confere, seja na hipótese de "mutatio libelli" sem aditamento (CPP, art. 384, "caput"), seja no caso de "mutatio libelli" com aditamento (CPP, art. 384, parágrafo único). Hipóteses inocorrentes na espécie, por se achar configurada mera situação de "emendatio libelli" (CPP, art. 383). (STF, 2006).

EMENTA: - PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRONÚNCIA. ALEGAÇÃO DE NULIDADE: IMPROCEDÊNCIA. COMPATIBILIDADE ENTRE AS QUALIFICADORAS "DISSIMULAÇÃO" E "OU OUTRO RECURSO QUE DIFICULTE OU TORNE IMPOSSÍVEL A DEFESA DO OFENDIDO", PREVISTAS NO ART. 121, § 2º, IV, DO CÓDIGO PENAL. I. - Inexistência de nulidade da pronúncia que acolhe qualificadora implicitamente contida na denúncia. II. - Compatibilidade entre as qualificadoras "dissimulação" e "ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido", previstas no inciso IV, § 2º, do art. 121 do Código Penal. III. - H.C. indeferido. Extrai-se do acórdão: É que o Ministério Público aditou a denúncia, em obediência ao disposto no art. 384 do CPP, incluindo, como se disse, a qualificadora prevista no inciso IV, § 2°, do art. 121 do Código Penal, por reconhecer que ora paciente havia utilizado “ recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido”. O juiz pronunciou o acusado exatamente conforme constava da denúncia, reconhecendo, ainda, a figura da “dissimulação”, constante de mesmo dispositivo legal. (STF, 1997 b).

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EMENTA: HABEAS CORPUS. NULIDADE DO PROCESSO. JÚRI. DENUNCIADO POR HOMICIDIO SIMPLES, A SENTENÇA DE PRONUNCIA ENQUADROU O PACIENTE EM DELITO DE HOMICIDIO QUALIFICADO, SEM ATENÇÃO AO ART. 384 E SEU PARAGRAFO ÚNICO, BEM ASSIM AOS ARTS. 408, PARAGRAFO 4°, E 410, TODOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS CONCEDIDO, PARA ANULAR O JULGAMENTO E O PROCESSO, A PARTIR DA SENTENÇA DE PRONUNCIA, INCLUSIVE, PROCEDENDO-SE, A SEGUIR, NA FORMA PREVISTA NA LEI PROCESSUAL PENAL. (STF, 1986 c).

EMENTA: Habeas Corpus. - Improcedência da alegação de inépcia da denúncia. - Tendo em vista o disposto no § 4º do artigo 408 do Código de Processo Penal, nada impede que o juiz, que na sentença de pronúncia pode dar nova classificação ao crime, ainda que fique o réu sujeito a pena mais grave, especifique qualificadora, implícita no fato descrito na denúncia, tanto mais quanto é certo que o artigo 416 do mesmo Código determina que a sentença de pronúncia especificará todas as circunstâncias qualificativas do crime. (...) Extrai-se do acórdão: Por outro lado, e tendo em vista o disposto no § 4° do artigo 408 do Código de Processo Penal, nada impede que o juiz, que na sentença de pronúncia pode dar nova classificação ao crime, ainda que fique o réu sujeito a pena mais grave, especifique qualificadora implícita no fato descrito na denúncia, tanto mais que é certo que o artigo 416 do mesmo código determina que a sentença de pronúncia especifique todas as circunstâncias qualificativas do crime. (STF, 1978 d).

EMENTA: HABEAS CORPUS. PACIENTE PRONUNCIADO POR INFRAÇÃO AO ART. 121, § 2º, INCISOS III E IV, DO CP. PRETENSÃO DE EXCLUSÃO DAS QUALIFICADORAS DO "MEIO CRUEL" -- POR AUSÊNCIA DE FATO TÍPICO QUE A SUSTENTASSE -- E DA "DISSIMULAÇÃO", QUE NÃO TERIA SIDO MENCIONADA NA PRONÚNCIA, SENDO FRUTO DE COMPLEMENTAÇÃO POR PARTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ALEGAÇÃO DE REFORMATIO IN PEJUS. (...) Não há falar em surpresa para a defesa, se a conduta tida por dissimulada foi totalmente descrita na denúncia, permitindo, desde o nascedouro do processo, que os acusados se defendessem da acusação, especialmente da incidência da qualificadora ora impugnada, observando-se o contraditório e a ampla defesa. Caso, ademais, em que o aresto hostilizado não se utilizou de fundamento novo, estranho aos autos, para manter a qualificadora da dissimulação. Por outro lado, não há espaço para alegação de reformatio in pejus se inexistiu agravamento da situação do paciente em face da interposição do recurso em sentido estrito. Habeas corpus indeferido. ( STF, 2004 e ).

A nossa Suprema Corte Federal entende também que, se faz necessário

distinguir os casos de emendatio libelli e mutatio libelli para decidir sobre a aplicação

do artigo 408, § 4°, ou artigo 384 e seu parágrafo único, ambos do CPP. Quando

ocorrer a formalização dos fatos descritos na denúncia, explícita ou implicitamente,

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não haverá prejuízo para o acusado, pois enquadra-se no caso de emendatio libelli

( art. 383 e art. 408, § 4°, do CPP). Não há surpresa para os réus se não houver

fundamento novo.

Entretanto, reconhecendo-se nova qualificadora não descrita na peça inicial

acusatória, adotam-se os procedimentos do artigo 384 do CPP, e seu parágrafo

único, pois caracteriza um caso de mutatio libelli. A não adoção dos mesmos poderá

acarretar a nulidade de todos os atos praticados após a sentença de pronúncia.

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4.3 MUTATIO LIBELLI e EMENDATIO LIBELLI

Após a exposição das questões inerentes ao artigo tema central deste

trabalho, são necessárias algumas ponderações, a fim de tentar dirimir as dúvidas

sobre este assunto controverso. Através da pesquisa realizada, embasada na

doutrina e na jurisprudência brasileira, cheguei a algumas conclusões. Entretanto,

não quero, de forma alguma, desvalorizar o posicionamento contrário ao que será

apresentado.

No meu entendimento, a questão relevante para resolver este problema, é

esclarecer se o Magistrado, ao prolatar sentença de pronúncia que diverge da

classificação imputada pelo Promotor de Justiça na denúncia, está reconhecendo

novos fatos obtidos durante a instrução criminal, ou está adequando a capitulação

aos fatos descritos na denúncia.

Concluindo-se pela primeira solução, caso em que o Magistrado tenha

colhido novos fatos durante a instrução criminal, e com base neles chegue a uma

nova classificação do delito, deve-se aplicar o artigo 384 do CPP e seu parágrafo

único, em detrimento ao artigo 408, § 4°, também do CPP. Estamos diante de um

caso de mutatio libelli, onde deve o Juiz adotar as formalidades do artigo 384 do

CPP. Desta maneira, o Juiz responsável deve abrir prazo para que a defesa se

manifeste, produza provas e arrole testemunhas (no máximo 3). Nos casos em que

a nova classificação importe em crime de pena mais grave, deve-se enviar os autos

para o Ministério Público aditar a denúncia ou a queixa, e logo após para a defesa,

para que esta se manifeste, produza provas e arrole testemunhas. Portanto,

preserva-se o direito constitucional da ampla defesa e do contraditório.

Porém, chegando-se à segunda conclusão, afirmando que o Juiz

reconheceu nova classificação ou nova qualificadora, embasado em fatos descritos,

explícita ou implicitamente, na denúncia, ou ainda, se está apenas corrigindo um

erro formal do Promotor que descreveu o crime de uma maneira e classificou de

outra, aplica-se o procedimento de emendatio libelli. Até porque, o réu se defende

dos fatos descritos e não da tipificação jurídica. Nestes casos é possível a aplicação

do artigo 408, § 4°, do CPP. Neste momento, e sob estas condições, o artigo supra

deve ser utilizado sem a necessidade de aditar a denúncia ou abrir prazo para a

defesa. Desta maneira, não se caracterizará afronta aos direitos constitucionais do

réu.

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Outro tema subsidiário apontado neste trabalho foi a possibilidade de o Juiz

afastar qualificadora contida na denúncia. Concluí que a qualificadora só deve ser

afastada se manifestamente improcedente ou descabida, caso contrário, o Juiz ao

pronunciar o réu, deve mantê-la, de forma a não retirar a competência natural do

Tribunal do Júri.

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5 CONCLUSÃO

Pode-se afirmar ao final deste trabalho que o Tribunal do Júri é um órgão do

Poder Judiciário, do primeiro grau de jurisdição. Tem este órgão um procedimento

bifásico de natureza mista, pois, em sua primeira fase, quem decide é o Juiz

Singular, e na segunda fase, quem delibera é o Conselho de Sentença, formado por

jurados leigos.

O Júri teve sua origem em Roma e na Grécia antiga, e possui características

idealizadas pelos Tribunais daquela época. Entretanto, posteriormente, com a

instalação do Sistema Feudal, os avanços jurídicos permaneceram estagnados, pois

naquele momento julgava-se em nome de Deus. Após a Idade Média, o Júri chegou

à Inglaterra, com Guilherme, o Conquistador. Em seguida, o Júri expandiu-se pela

Europa, junto com a Revolução Francesa. Com os colonizadores ingleses, o Júri

chegou ao continente Norte Americano.

Em nosso país, o Júri surgiu através da Lei de 18.6.1822, que criou os

“Juizes de Fato”, com competência para julgar os crimes de imprensa. Em 1824, o

Júri apareceu pela primeira vez em uma Constituição brasileira. Daí por diante o Júri

foi evoluindo, e ganhou o status de garantia e direito fundamental, nos moldes da

atual Constituição Federal. É contestada, entretanto, a soberania de seus veredictos,

visto que o Código de Processo Penal possibilita a revisão das decisões do Tribunal

do Júri.

O Tribunal do Júri, em nosso país, tem competência para julgar os crimes

dolosos contra vida, tentados ou consumados.

Como vimos, o Júri é um procedimento bifásico. A primeira fase é

denominada judicium accusationis, ou juízo de acusação, e tem por objetivo julgar a

pretensão punitiva do Estado. A segunda fase é chamada de judicium causae, ou

juízo da causa, é durante esta fase que os Jurados deliberam sobre a culpabilidade

do acusado.

Observa-se, que o Magistrado ao encerrar o judicium accusationis, pode

prolatar as seguintes decisões: Pronúncia, Impronúncia, Absolvição Sumária ou

Desclassificação.

A pronúncia é uma decisão interlocutória de caráter misto, que julga

procedente a acusação. A impronúncia é uma decisão interlocutória de caráter

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terminativo, que encerra a primeira fase do Júri e julga improcedente a acusação. A

absolvição sumária é uma decisão de mérito, que também julga improcedente a

pretensão punitiva do Estado. A desclassificação é uma decisão interlocutória, que

altera o juízo competente para julgar a ação.

Ao final desta monografia, nos permitimos repetir a pergunta feita lá na

introdução. Há necessidade de aditamento da denúncia, quando o Juiz prolatar

Sentença de Pronúncia, que seja divergente da classificação anteriormente

estipulada pelo promotor na denúncia?

Sim, segundo meu entendimento deve o juiz ordenar o aditamento da

denúncia, sempre que ele reconhecer nova qualificadora ou nova classificação do

delito.

Mesmo que o Juiz fundamente sua decisão no artigo 408, § 4°, do Código

de Processo Penal, que confere ao Juiz Singular o direito de pronunciar o réu de

acordo com os ilícitos penais que entender este ter violado, a doutrina e

jurisprudência vêm caminhando em sentido diferente. Estes vêm delineando uma

nova corrente. Essa corrente defende que o juiz em qualquer caso deve mandar

abrir vista ao Ministério Publico, para que ele proceda ao aditamento da denúncia, e

para que o réu possa ter vista para apresentar sua defesa e arrolar testemunhas.

Acredito que a questão relevante é descobrir se a circunstância que deu

origem a nova classificação ou nova qualificadora estava descrita na denúncia. Se

estiver presente na denúncia, mesmo que de forma implícita, poderá o juiz

reconhecer nova tipificação jurídica, sem prejuízo para a defesa. Até porque,

conforme entendimento dos Tribunais Superiores Pátrios, o réu se defende dos fatos

descritos na denúncia e não da capitulação. Portanto não há nulidade na Pronúncia,

quando esta apenas adequar a titulação jurídica a realidade dos fatos (emendatio

libelli).

Entretanto, se a circunstância não estiver descrita na exordial acusatória, ou

se a circunstância foi averiguada durante a instrução criminal, nestes casos, deve o

juiz mandar aditar a denúncia (mutatio libelli), e conferir prazo para que a defesa se

manifeste e produza provas. Adotada esta providência, o direito ao contraditório e a

ampla defesa estará resguardado, pois com o surgimento de novos fatos o réu

precisa defender-se plenamente.

Por fim, conclui que o Magistrado não deve afastar as qualificadoras

descritas na denúncia, embora haja entendimento contrário. Pois, é de competência

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do Tribunal do Júri decidir sobre as qualificadoras, não devendo o Juiz subtrair esta

competência. A exceção desta regra ocorre, quando a circunstância demonstra-se

manifestamente improcedente ou descabida, devendo o Juiz neste caso, afastá-la

da titulação contida na pronúncia.

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6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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