UMA ANÁLISE DA EXECUÇÃO FINANCEIRA TERMOS DE P DE … · dezembro de 2003, regulamentada pelo...
Transcript of UMA ANÁLISE DA EXECUÇÃO FINANCEIRA TERMOS DE P DE … · dezembro de 2003, regulamentada pelo...
Centro de Convenções Ulysses Guimarães Brasília/DF – 25, 26 e 27 de março de 2014
UMA ANÁLISE DA EXECUÇÃO FINANCEIRA NOS TERMOS DE PARCERIA QUE SE UTILIZAM DE RECURSOS ADVINDOS DOS MECANISMOS
DE INCENTIVO E FOMENTO À CULTURA
EDUARDO PROSDOCIMI GERLAINNE ROMERO RENATA BERNARDO
2
Painel 04/010 Transparência e controle social em convênios e mecanismos de incentivo e fomento
UMA ANÁLISE DA EXECUÇÃO FINANCEIRA NOS TERMOS DE PARCERIA QUE SE UTILIZAM DE RECURSOS ADVINDOS DOS
MECANISMOS DE INCENTIVO E FOMENTO À CULTURA
Eduardo Prosdocimi Gerlainne Romero Renata Bernardo
RESUMO O trabalho analisa a execução financeira nos Termos de Parceria (TP) celebrados entre o Poder Público de Minas Gerais e as entidades privadas sem finalidade lucrativa, qualificadas com o título de OSCIP estadual, em que se verificam a existência dos recursos incentivados, ou seja, receitas que são oriundas de mecanismos de incentivo e fomento à cultura. Inseridos em 2003 no cenário da administração pública mineira, os TPs configuraram uma alternativa estratégica para a execução de políticas públicas estaduais de cultura. Uma das grandes vantagens desse modelo é a possibilidade de utilização de receitas que não sejam oriundas do Tesouro Estadual como recursos complementares aos recursos públicos, contribuindo para a sustentabilidade das parcerias. Há de se observar, contudo, que, apesar de a complementação de recursos advindos dos mecanismos de incentivo e fomento à cultura ser benéfica, a lógica de execução financeira e de prestação de contas do recurso é diferente, sem que haja legislação específica que regulamente as parcerias que operam com as duas fontes de recursos, o que será analisado e problematizado no presente trabalho.
3
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem por objetivo incitar a discussão sobre a
regulamentação do formato de execução financeira das entidades qualificadas como
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP que recebem
recursos repassados diretamente pelo Tesouro e, em função das suas atividades,
recebem recursos oriundos dos mecanismos de incentivo e fomento à cultura.
De acordo com Botelho (2007) e Calabre (2007), o financiamento de
parcela da produção e difusão da cultura no Brasil sempre esteve vinculado à ação do
Poder Público, podendo ser por meio de execução de políticas públicas diretas ou por
meio de fomento a outras entidades privadas. Esta relação de dependência financeira,
de acordo com Ribó (apud Ponte, 2012), pode gerar um efeito indesejável de
desconfiança entre sociedade e Estado. No caso de Minas Gerais, este efeito agrava-
se ainda mais quando da existência de recursos repassados diretamente do Tesouro
para execução de um Termo de Parceria e recursos oriundos dos mecanismos de
incentivo à cultura. Isto porque não há uma regulação específica para tal situação, o
que exige das OSCIPs que recebem estes recursos a adoção dos mesmos
procedimentos e regras para execução e prestação de contas de ambos os recursos.
Cumpre ressaltar que a opção é sempre pela legislação mais restritiva, ou seja, que
estabelece procedimentos e controles processuais mais detalhados e impõe a
observância das regras do Regulamento de Compras e Contratações. Ou seja, ainda
que as legislações dos mecanismos de incentivo e fomento não determinem que a
execução dos recursos se dê conforme as disposições de um Regulamento de
Compras e Contratações – RCC (que é elaborado conforme diretrizes de um Manual
e deve, necessariamente, ser aprovado pelo Poder Público), a legislação mineira de
parcerias com OSCIPs acaba por exigir das entidades a execução de todo e qualquer
recurso recebido sob a égide deste RCC.
Tendo em vista a experiência mineira, torna-se clara a importância das
OSCIPs para materialização das políticas da área cultural, haja vista toda a
flexibilidade de execução proporcionada pelo modelo e legislação. A inovação, a
velocidade, e a dinâmica exigida para a execução das políticas culturais só é
possível no Governo de Minas Gerais, em grande medida, graças às OSCIPs.
4
2 A REFORMA DO ESTADO E O PROCESSO DE PUBLICIZAÇÃO NO BRASIL
Desde os anos 80 está em curso um movimento internacional em direção
às reformas no aparelho do Estado. Em geral estas reformas defendiam que em
função da crise fiscal do estado, do tamanho exagerado de sua estrutura e da
falência do modelo intervencionista, bem como da necessidade de prestação de
melhores serviços para a sociedade, era necessário alterar drasticamente sua forma
de gestão.
Segundo Saravia (2005), as transformações do contexto político,
econômico, social e tecnológico no qual se inseriam as organizações públicas
tornaram obsoletos os sistemas clássicos de gestão. Ele afirma, ainda, que a crise
fiscal exigia um desempenho mais eficaz das instituições públicas e tornavam
permanente a preocupação com a estrutura de custos das atividades estatais. A
nova realidade exigia uma flexibilidade e uma rapidez que não eram compatíveis
com a racionalidade normativa e processualística do modelo racional-legal. Tudo
isso, num quadro de referência pautado pela crise ética do Estado e pela crescente
demanda da sociedade por maior transparência e participação, que tornou
imperativa a criação de novas formas de controle sobre o gasto e sobre o
desempenho de instituições públicas, bem como de novas formas de controle social.
É nesse contexto que emerge uma racionalidade favorável aos instrumentos de
contrato de gestão, como vetor para alcance da eficiência e, consequentemente, da
melhoria da gestão pública.
No Brasil, no âmbito federal, a reforma do Estado teve início em 1995,
com a criação do Ministério de Administração e Reforma do Estado – MARE e a
publicação do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado - PDRAE,
documento que consubstanciava os princípios norteadores da proposta reformista. A
principal inovação do Plano Diretor era a proposta de divisão do Estado e de suas
funções em quatro setores. O primeiro é o Núcleo Central, que corresponde aos
Poderes Legislativo e Judiciário, ao Ministério Público e, no Poder Executivo, ao
Presidente da República, aos ministros e aos seus auxiliares e assessores diretos.
Este setor é responsável pela tomada de decisões estratégicas, que define as leis e
as políticas públicas, e cobra o seu cumprimento e, portanto, a forma de propriedade
5
mais adequada é a estatal, sob a forma de administração mista (burocrática e
gerencial). O segundo setor é o de Atividades Exclusivas, no qual se concentram as
ações que dependem do poder extroverso do Estado (poder de regulamentar,
fiscalizar, fomentar), cuja forma de propriedade mais adequada é a estatal e forma
de administração gerencial. O terceiro setor é o de Atividades Não-Exclusivas de
Estado, no qual se concentram aquelas atividades que podem ser executadas
igualmente pela iniciativa privada e pelo Poder Público, sendo usualmente
executadas por este devido às externalidades positivas que geram ou pelo grande
volume de recursos requeridos. Para este setor foi sugerida a propriedade pública
não-estatal e a forma de administração sugerida é a gerencial, focada em resultados
e eficiência no gasto dos recursos públicos. O PDRAE propõe a transferência de
suas atividades, por meio de um programa de "publicização", para instituições
privadas sem fins lucrativos, mantendo-se a responsabilidade e o fomento do
Estado. Por fim, o quarto setor é o de Produção para o Mercado, no qual o Estado
atua como agente privado produtor de mercadorias e serviços. Para este setor foi
sugerida a retirada da participação do Estado por meio da privatização, ou seja, a
transferência da propriedade para a iniciativa privada. Ainda, para este setor foi
sugerida a forma de administração gerencial.
Com o movimento de publicização pretendia-se conferir maior eficiência e
a qualidade aos serviços. Isso porque o Estado continuaria fomentando a execução
dos serviços, conferindo autonomia à instituição executora e, por meio de
mecanismos de contratualização, controlando apenas os resultados alcançados.
Do ponto de vista da institucionalização desse modelo, foram criados no
governo federal dois modelos de parcerias com organizações do terceiro setor: o de
Organizações Sociais (OS), instituído pela Lei nº 9.637, de 15 de maio de 1998; e o
de Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), instituído pela
Lei nº 9.790 de 23 de março de 1999. Apesar da aproximação conceitual e jurídica
com as OSs, as OSCIPs não se confundem com essas, especialmente quanto a
forma de financiamento e ao espectro das atividades. As OSs são financiadas por
meio de dotações orçamentárias constantes no orçamento do Poder Público, ao
passo que os repasses para as OSCIPs são realizados de acordo com cronograma
estabelecido nos Termos de Parcerias. As OSCIPs são entidades previamente
6
existentes, que recebem essa qualificação do Poder Público, sendo passível de
celebrar TP, representando a chamada publicização do direito privado; ao passo que
as OSs são entidades privadas criadas por iniciativa do Poder Público, com intuito
de realizar contratos de gestão, representando o fenômeno de privatização do
Direito Público. Outra diferença entre OSs e OSCIPs está na composição do corpo
decisório, que nas OSCIPs é aquela definida no Estatuto da Entidade e, nas OSs, o
corpo decisório é formado obrigatoriamente por membros do Poder Público e por
representantes da sociedade civil. Outra diferença encontra-se no leque de
atividades que podem desempenhar, pois as OSs têm objetivos bem mais limitados
que as OSCIPs, atuando em menos áreas e tratando de menos temas.
3 OPÇÃO DE MINAS GERAIS: MODELO DE PARCERIAS COM OSCIPS
Desde 2003, o Estado de Minas Gerais vem implantando um conjunto de
reformas da administração pública, que ficou conhecido como Choque de Gestão.
Dentre os instrumentos que vem sendo implantados para modernizar a gestão
pública, destaca o modelo de contratualização ou Termo de Parceria celebrado com
as OSCIPs1. Com inspiração no modelo federal, a Lei Estadual nº 14.870, de 16 de
dezembro de 2003, estabelece a qualificação de pessoa jurídica de direito privado
sem fins lucrativos como OSCIP e institui o Termo de Parceria. O instrumento
estabelece um conjunto de compromissos entre os signatários, que implica, por um
lado, na garantia dos recursos, pactuação dos resultados desejados e controle, e por
outro lado na responsabilidade da instituição privada de adotar os meios mais
adequados para alcance dos resultados, bem como realizar a prestação de contas
sobre seu desempenho e a execução do recurso financeiro. Segundo Bernardo e
Martins (2013), a efetividade dos Termos de Parceria depende da adequada
manutenção do equilíbrio entre dois elementos centrais da lógica de contratualização:
o grau de autonomia concedido e o tipo de controle adotado. Esse equilíbrio é tênue,
1 O marco regulatório do Termo de Parceria em Minas Gerais é a Lei Estadual nº. 14.870, de 16 de dezembro de 2003, regulamentada pelo Decreto Estadual nº. 46.020, de 09 de agosto de 2012. Integram a legislação mineira, ainda, os seguintes atos normativos: Lei nº. 17.349/2008 (altera a Lei nº. 14.870/2003), Decreto nº. 46.182/2013 (altera o Decreto nº. 46.020/2012), Decreto nº. 46.423/2014 (altera o Decreto nº. 46.020/2012) e a Resolução SEPLAG nº. 11/2014 (define os procedimentos referentes à gestão patrimonial das Oscips no âmbito da execução dos Termos de Parceria).
7
permeado por tensões e, como o pêndulo de uma balança, pode privilegiar um ou
outro aspecto, de acordo com fatores relacionados ao desenho do modelo e,
principalmente, à sua implementação.
No caso mineiro, devido à pluralidade de atores, a legislação buscou
estabelecer claramente o papel de cada um e institui procedimentos para
elaboração, monitoramento, avaliação, fiscalização e coordenação dos Termos de
Parceria. A legislação mineira define que às OSICPs compete executar as atividades
inerentes ao Termo e zelar pela boa qualidade das ações e serviços prestados,
buscando alcançar eficiência, eficácia, efetividade e economicidade. Ao órgão
estatal parceiro (OEP), que é o contratante da parceria, cabe acompanhar,
supervisionar e fiscalizar a execução do Termo de Parceria, garantindo o repasse de
recursos conforme previsto e zelando pelo alcance dos resultados. Além do OEP,
existe uma Comissão de Avaliação (CA) que auxilia no acompanhamento dos
resultados alcançados e da aplicação dos recursos. Essa Comissão é integrada por
um representante do OEP, um representante da OSCIP, um representante da
Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão – SEPLAG, um representante do
Conselho Estadual de Políticas Públicas dá área temática do Termo de Parceria e
um especialista da área em que se enquadre o objeto do Termo de Parceria (não
integrante da administração estadual).
Importante destacar, ainda, que às OSCIPs com Termo vigente poderão
ser destinados recursos orçamentários do Poder Público para execução das ações
previstas. A legislação define uma série de regras para o uso desta receita, que
incluem a necessidade de os recursos repassados sejam obrigatoriamente aplicados
em cadernetas de poupança ou em fundo de aplicação financeira de curto prazo
quando não forem utilizados nos trinta dias subsequentes à sua liberação (art. 55 do
Decreto nº 46.020, de 09 de agosto de 2012). Outra regra específica é que as
receitas financeiras auferidas por repasse do OEP, bem como as receitas
arrecadadas pela OSCIP, previstas no Termo de Parceria, sendo estas somente até
o limite da meta estabelecida no instrumento jurídico, serão, obrigatoriamente,
aplicadas na execução do objeto da parceria, devendo constar das prestações de
contas anuais e de encerramento (§s 1º e 2º do art. 55 do Decreto nº 46.020, de 09
de agosto de 2012, alterado pelos Decretos no 46.182/2013 e no 46.423/2014).
8
São consideradas receitas arrecadas diretamente pela OSCIP, em função
da existência do Termo de Parceria, dentre outras, as seguintes:
I – resultados de bilheteria de eventos promovidos pela OSCIP, ligados diretamente ao objeto do Termo de Parceria;
II – patrocínios advindos em função da prestação de serviços previstos ou em decorrência do Termo de Parceria;
III – recursos direcionados ao fomento de projetos relacionados diretamente ao objeto do Termo de Parceria;
IV – taxas de administração ou de gestão de recursos advindos por meio das leis de incentivo, dentre outros;
V – receitas de prestação de serviços ligados à execução do objeto do Termo de Parceria;
VI – receita de comercialização de produtos oriundos da execução do objeto do Termo de Parceria;
VII – recursos captados por meio de renúncia fiscal de qualquer dos entes federados;
VIII – recursos advindos de incentivo fiscal; e
IX – direitos sobre marcas e patentes, advindos da execução do Termo de Parceria. (§ 4º, art. 55 do Decreto nº 46.020, de 09 de agosto de 2012, alterado pelos Decretos n
o 46.182/2013 e n
o 46.423/2014).
Importante ressaltar que, não apenas os recursos orçamentários
repassados pelo Poder Público, mas também todas as receitas arrecadadas pela
OSCIP, previstas no Termo de Parceria, devem ser submetidas às regras do
Regulamento de Compras e Contratações (RCC) da OSCIP.
4 OS MECANISMOS DE INCENTIVO E FOMENTO À CULTURA NO PAÍS
No Brasil a relação entre o Estado e a cultura é antiga, entretanto, a
elaboração de políticas para o setor, bem como o estudo de tais políticas é objeto de
interesse recente, datando das décadas de 30 e 40, com a consolidação de uma
ação organizada na década de 50 (Calabre, 2007). Segundo Arruda (2003), a ação
normatizadora do Estado combinava-se ao papel indutor, de organização da área
por intermédio dos mecanismos de financiamento. Foi somente a partir dos anos 80
que as leis de incentivos fiscais para a cultura tornaram-se instrumentos
privilegiados para a área da cultura.
O Programa Nacional de Apoio à Cultura (PRONAC), instituído pela Lei°
8.313, 23 de dezembro de 1991, conhecida como Lei Rouanet representa a
consolidação desse formato de financiamento por meio de renúncia fiscal. Conforme
9
afirma Durand (2001), a legislação segue uma tendência internacional já confirmada
nos últimos 20 anos, de adoção de um padrão “misto” de financiamento da cultura,
associando recursos públicos a “fundo perdido”, a receitas geradas in loco (por
exemplo, através da locação de espaço e da exploração de lojas, restaurantes,
estacionamentos, etc) e os recursos de origem empresarial mobilizados na rubrica
do “patrocínio corporativo”. A renúncia fiscal é um dos principais mecanismos que o
Ministério da Cultura (MinC) utiliza atualmente para estimular o apoio da iniciativa
privada ao setor cultural. De acordo com informações disponíveis no site do
Ministério, a sistemática é simples: o proponente apresenta uma proposta cultural ao
MinC e, caso seja aprovada, é autorizado a captar recursos junto às pessoas físicas
pagadoras de Imposto de Renda (IR) ou empresas tributadas com base no lucro real
para a execução do projeto. As propostas de projetos podem ser de pessoas físicas
com atuação na área cultural (artistas, produtores culturais, técnicos da área cultural
etc.); pessoas jurídicas públicas de natureza cultural da administração indireta
(autarquias, fundações culturais etc.); e pessoas jurídicas privadas de natureza
cultural, com ou sem fins lucrativos (empresas, cooperativas, fundações, ONG's,
organizações culturais etc.).
A diferença entre doação e patrocínio é que, na doação, o investimento é
realizado em uma empresa sem fins lucrativos, enquanto que, no patrocínio, o
investimento é feito em uma empresa com fins lucrativos. Via de regra, a empresa
que opta por financiar um projeto por meio de renúncia fiscal obtém ganhos do ponto
de vista simbólico ou de imagem, uma vez que pode associar sua marca à um
evento ou artista de prestígio. Segundo a Lei Rouanet, o apoio das empresas à um
projeto pode ser revertido no total ou em parte para o investidor do valor
desembolsado deduzido do imposto devido, dentro dos percentuais permitidos pela
legislação tributária. Para empresas, até 4% do imposto devido; para pessoas
físicas, até 6% do imposto devido2.
2 Os projetos culturais podem ser enquadrados no artigo 18 ou artigo 26 da Lei Rouanet. Quando o projeto é enquadrado no artigo 18, o patrocinador poderá deduzir 100% do valor investido, desde que respeitado o limite de 4% para pessoa jurídica e 6% para pessoa física. O patrocinador que apoia um projeto enquadrado no artigo 26 poderá deduzir, em seu imposto de renda, o percentual equivalente a 30% para pessoa jurídica (no caso de patrocínio) / 40% (no caso de doação) e 60% para pessoa física (no caso de patrocínio) / 80% (no caso de doação). Outra diferença está na forma de abatimento do Imposto de Renda. No artigo 18, não é possível abater o investimento como
10
De acordo com a Lei Rouanet, são enquadradas, no artigo 18, as
seguintes atividades:
a) artes cênicas;
b) livros de valor artístico, literário ou humanístico;
c) música erudita ou instrumental;
d) exposições de artes visuais;
e) doações de acervos para bibliotecas públicas, museus, arquivos
públicos e cinematecas, bem como treinamento de pessoal e aquisição
de equipamentos para a manutenção desses acervos;
f) produção de obras cinematográficas e videofonográficas de curta e
média metragem e preservação e difusão do acervo audiovisual;
g) preservação do patrimônio cultural material e imaterial;
h) construção e manutenção de salas de cinema e teatro, que poderão
funcionar também como centros culturais comunitários, em municípios
com menos de cem mil habitantes.
Em 2008 o estado de Minas Gerais também regulamentou um mecanismo
de incentivo à cultura por meio da renúncia fiscal com a promulgação da Lei nº
17.615, de 04 de julho de 2008, alterada pela Lei nº 20.694, de 23 de maio de 2013,
com o objetivo de estimular a realização de projetos culturais no Estado. A lei
permite que as empresas contribuintes do ICMS3, que estejam em situação regular,
ou empresas inscritas em Divida Ativa patrocinem projetos culturais por meio da
dedução do imposto estadual devido. Dessa forma, a legislação cria mecanismos de
mediação e interlocução entre o empreendedor e o incentivador, aproximando
produtores, artistas, investidores e público, dinamizando e consolidando o mercado
cultural no estado. Nos termos da Lei nº 20.694/13, a empresa patrocinadora pode
deduzir, a partir do faturamento da sua empresa, 99%, 97% ou 95% do valor total
investido no projeto, na forma de desconto do imposto devido de ICMS, mês a mês.
despesa operacional, porém no artigo 26 é possível. Abatendo como despesa operacional, o investidor amplia seu incentivo em cerca de 25%.
3 ICMS é a sigla que identifica o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação. É um imposto que cada um dos Estados e o Distrito Federal podem instituir, como determina a Constituição Federal de 1988.
11
Os percentuais de 1%, 3% e 5% restantes são passados ao projeto cultural a título
de contrapartida (participação própria), sem isenção fiscal. Antes da alteração legal
realizada em 2013, a empresa podia deduzir 80% do valor investido por meio de
renúncia fiscal do ICMS e teria que repassar os 20% restantes na forma de
contrapartida repassada ao projeto.
Segundo a Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais 4 , a Lei
Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais já beneficiou total de 4.500
projetos, o que corresponde a investimento de cerca de R$ 550 milhões em projetos
culturais e geração de cerca de 100 mil empregos diretos e indiretos.
5 BREVE APRESENTAÇÃO DOS TERMOS DE PARCERIA QUE UTILIZAM RECURSOS ADVINDOS DOS MECANISMOS DE INCENTIVO E FOMENTO À CULTURA
Desde a implementação do marco legal que trata da contratualização
entre o Poder Público mineiro e as organizações qualificadas com o título de OSCIP
estadual, já foram celebrados 34 (trinta e quatro) Termos de Parceria, sendo que,
em fevereiro de 2014 existem vigentes 11 (onze) parcerias. Para fins deste trabalho,
abordaremos os Termos de Parceria celebrados cujo objeto tenha correlação à
política pública da área cultural, notadamente aqueles em que se verificam a
utilização dos recursos advindos dos mecanismos de incentivo e fomento à cultura
(recursos incentivados). Dos cinco Termos de Parceria cujos objetos são correlatos
à políticas públicas culturais, ou seja 45% dos total das parecerias, quatro se
utilizam de recursos incentivados, que serão apresentados a seguir.
4 Ver: http://www.agenciaminas.mg.gov.br/multimidia/videos/video-governo-de-minas-facilita-utilizacao-da-lei-estadual-de-incentivo-a-cultura/
12
5.1 Termo de Parceria celebrado entre a Fundação TV Minas Cultural e Educativa - FTVM e a Associação de Desenvolvimento da Radiodifusão - ADTV, com interveniência da Secretaria de Estado de Cultura - SEC e da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão - SEPLAG
A parceria em questão, vigente desde dezembro de 2005, possui como
objeto o fomento, execução e promoção de atividades culturais, educativas e
informativas, por meio da produção e veiculação de radiodifusão. Em suma, o objeto
consiste na operação da Rede Minas, emissora pública de televisão cultural e
educativa presente em grande número de municípios mineiros. À ADTV competem,
dentre outras, realizar a produção de grande parte dos conteúdos que veiculam na
grade de programação da Rede Minas, captação de recursos para produção de
conteúdo, investimento em manutenção, expansão e modernização do parque
tecnológico e se responsabilizar pela gestão de pessoal contratado para execução
no Termo de Parceria. À FTVM cabe realizar o papel de definição das diretrizes
estratégicas relativas à TV pública, realizar o monitoramento das ações executadas,
repassar os recursos previstos no Termo de Parceria e emanar as demais diretrizes
necessárias ao cumprimento do objeto pactuado.
Ao longo da vigência do Termo de Parceria, o valor global já investido
diretamente pelo Poder Público, na forma de repasse da FTVM para a ADTV supera
a marca dos cento e quarenta milhões de reais. A estes recursos, somam-se as
receitas arrecadadas já arrecadadas pela ADTV, previstas no Termo de Parceria,
que são revertidas ao cumprimento do objeto da parceria, conforme demonstrado
abaixo. Até 2013 os rendimentos de aplicações financeiras das contas bancárias
também compunham o valor global de receitas do Termo de Parceria, contudo, a
partir de 2014, com a publicação do Decreto Estadual 46.432/2014, aqueles
compõem uma reserva de recursos, para utilização em determinadas ocasiões. Por
fim, existe, em alguns casos, o transporte de saldo remanescente de recursos não
utilizados no ano imediatamente anterior, sendo estes utilizados ao longo do ano de
vigência. Para ilustrar a composição das receitas que compõem o Termo de
Parceria, a tabela a seguir demonstra o comportamento destas em 2013.
13
Tipo de receita Valor global em 2013 (R$) % em 2013
Repasse da FTVM 25.856.376,14 71,17
Patrocínios diretos à programação cultural 1.386.828,74 3,82
Comercialização direta de mídia avulsa 1.912.083,28 5,26
Projetos especiais contratados junto à organizações públicas e privadas
2.693.032,06 7,41
Recursos advindos dos mecanismos de incentivo e fomento à cultura
992.604,85 2,73
Rendimentos de aplicações financeiras 171.121,61 0,47
Saldo remanescente 3.317.189,21 9,13
TOTAL 36.329.235,89 100,00
Quadro 2: Composição das receitas em 2013 do Termo de Parceria celebrado entre a FTVM e a
ADTV, com interveniência da SEC e da SEPLAG. Fonte: Elaboração própria, fevereiro/2014
Como demonstrado, em 2013 as receitas arrecadadas corresponderam a
19% do total, sendo os recursos incentivados com participação de praticamente 3%
do Termo de Parceria.
5.2 Termo de Parceria celebrado entre a Fundação Clóvis Salgado e o Instituto Cultural Sérgio Magnani, com interveniência da Secretaria de Estado de Cultura
Este Termo, também vigente desde dezembro de 2005, cujo objeto é
apoiar a produção, exibição e formação artística mineira por meio de apoio a gestão
e geração de recursos para a execução de projetos e programas do Sistema
Estadual de Cultura, especialmente da Fundação Clóvis Salgado, é materializado,
grande medida, na viabilização da captação de recursos por meio de mecanismos
de incentivo e fomento à cultura, para serem revertidos à execução de parcela da
programação artística e cultural do OEP. Neste sentido, são funções do ICSM
elaborar, conforme as diretrizes estabelecidas pela FCS, os projetos a serem
submetidos aos mecanismos (federal, estadual e municipal), gerenciar e
operacionalizar a execução financeira destes, realizar as devidas prestações de
14
contas junto aos órgãos reguladores, viabilizar a captação dos recursos junto às
organizações que aportam as receitas, se responsabilizar pela gestão de pessoal
contratado para execução no Termo de Parceria, dentre outras. De forma adicional,
é importante citar que, uma das atribuições do ICSM é, também, gerir o Centro
Técnico de Produção, espaço em que são armazenados e disponibilizados para
locação os acervos de cenários, figurinos e adereços das diversas obras,
apresentações e peças realizadas pela FCS.
Ao longo da vigência da parceria em questão, o valor global já repassado
pela FCS ao ICSM supera a marca de oito milhões de reais. No concernente à
entrada de recursos advindos de captações realizadas pela OSCIP, previstas no
Termo de Parceria, somente são monitoradas no instrumento jurídico as receitas
advindas da gestão do Centro Técnico de Produção (locação de componentes dos
diversos acervos, cursos, etc). No concernente aos recursos incentivados, estes não
são, atualmente, monitorados formalmente no Termo, especialmente pelo fato de
que a captação de receitas junto aos mecanismos de incentivo e fomento à cultura
depende de um esforço compartilhado entre OEP e OSCIP. Ademais, a quantidade
de recursos incentivados a serem utilizados em determinado período para a
programação cultural e artística depende, basicamente, da própria demanda do
Poder Público, portanto, mensurar metas específicas e periódicas acaba por ser
uma tarefa pouco prática neste caso.
5.3 Termo de Parceria celebrado entre a Secretaria de Estado de Cultura e o Instituto Cultural Sérgio Magnani
Com a transferência da sede do Governo de Minas para a Cidade
Administrativa Presidente Tancredo Neves, os prédios situados na Praça da
Liberdade, que abrigavam os órgãos e entidades da administração pública estadual
foram reformados e transformados em equipamento culturais (museus e espaços
culturais). Passado o momento de adequação física destes espaços, verificou-se a
necessidade de realizar um trabalho de gestão integrado daqueles, proporcionando
à população mineira atrações e eventos culturais, exposições permanentes e
pontuais, dentre outros atrativos. Neste sentido, celebra-se, em 2012, o Termo de
15
Parceria em questão, cujo objeto é promover ações de comunicação, promoção de
eventos, captação e geração de recursos e gestão de longo prazo do Circuito
Cultural Praça da Liberdade. Dentre as atribuições do ICSM destacam-se a
execução de ações de comunicação junto às diversas formas de mídias,
planejamento e realização de eventos e exposições culturais, potencializar e integrar
a programação dos equipamentos culturais geridos diretamente pela iniciativa
privada, implementar e executar um programa de formação de público (educativo),
se responsabilizar pela gestão de pessoal contratado para execução no Termo de
Parceria, dentre outras.
Uma breve leitura deste objeto já demonstra a importância da captação
de recursos para a execução das atividades do ICSM. Em suma, todas as receitas
que são arrecadadas pelo ICSM, previstas no Termo de Parceria, são recursos
incentivados, advindos dos mecanismos de incentivo e fomento à cultura. Todos os
recursos captados até o presente momento foram advindos dos mecanismos de
incentivo e fomento à cultura e foram direcionados para realização de eventos
culturais e demais programações dos equipamentos culturais componentes do
Circuito. Desde o início da vigência da parceria até fevereiro de 2014 foi captado
aproximadamente novecentos mil de reais advindo dos mecanismos. Por outro lado,
em termos de repasse da Secretaria de Estado de Cultura, já foram investidos cerca
de 7,8 milhões de reais na parceria.
5.4 Termo de Parceria celebrado entre a Secretaria de Estado de Cultura e o Instituto Cultural Filarmônica, com interveniência da Fundação Clóvis Salgado
A Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, política cultural de grande
renome e reconhecimento junto à crítica nacional e internacional, é o elemento
central da parceria em questão. Tendo como objeto o desenvolvimento de atividades
culturais para a sociedade, voltadas para a difusão da música clássica, por meio da
criação, estruturação e manutenção de uma nova orquestra sinfônica para o Estado
de Minas Gerais, de natureza privada e sem fins lucrativos, que se denominará
Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, o Termo foi celebrado em janeiro de 2008.
16
Com valor global investido pela Secretaria de Estado de Cultura próximo
a 90 milhões de reais, cabe ao ICF realizar os concertos de assinatura, concertos
para a juventude, clássicos no parque, concertos didáticos, turnês no interior de
Minas Gerais, turnês nacionais e internacionais e estimular o aparecimento de novos
talentos na música clássica. Sendo os recursos captados pelo ICF, previstos no
Termo de Parceria, de grande importância para esta política pública, tem-se que, a
previsão para o ano de 2014 é de que estas correspondam a aproximadamente 25%
(vinte e cinco por cento) do valor global disponível. Os recursos incentivados estão
previstos em quatro milhões de reais, ou cerca de 16% do valor global de receitas.
Com a construção Sala de Concertos da Orquestra (Sala Minas Gerais,
que irá compor o complexo cultural denominado Estação da Cultura Presidente
Itamar Franco) espera-se que as receitas arrecadadas pelo ICF, previstos no Termo
superem ainda mais os resultados atuais, e, consequentemente, potencializem os
recursos disponíveis para investimento nesta importante política pública bem como
aumente proporcionalmente a participação destes recursos no valor global
disponível ao ICF.
6 ANÁLISE DA EXECUÇÃO FINANCEIRA DOS TERMOS DE PARCERIA À LUZ DA LEGISLAÇÃO MINEIRA E DA LEGISLAÇÃO DOS MECANISMOS DE INCENTIVO À CULTURA NO PAÍS
Antes de adentrar propriamente à execução financeira, é interessante
demonstrar como se dá o planejamento financeiro nos Termos de Parceria e nos
marcos legais de incentivo e fomento à cultura.
Minas Gerais, ao legislar sobre os Termos de Parceria, prevê que o
planejamento financeiro se dá a partir da previsão das receitas e despesas em nível
analítico, estipulando, item por item, as categorias contábeis usadas pela entidade e
o detalhamento das remunerações e dos benefícios de pessoal a serem pagos aos
dirigentes e empregados com recursos oriundos do instrumento jurídico ou a ele
vinculados. Este documento que resume o planejamento, denominado de Memória
de Cálculo, representa a delimitação de toda previsão de despesas inerentes ao
objeto da parceria, sem identificar, nominalmente, a fonte de receita pagadora para
17
cada item de despesa, se advinda do repasse do OEP ou de receita arrecadada,
prevista no Termo de Parceria. Destaca-se que, em algumas ocasiões,
determinados itens de despesa possuem como fonte pagadora tanto o repasse do
OEP como a receita captada.
Nos marcos legais de incentivo e fomento à cultura o planejamento se dá
a partir de orçamento analítico, encaminhado juntamente com o projeto cultural, para
a devida análise dos órgãos reguladores. Em que pese a ideia do documento ser
bastante similar à Memória de Cálculo, tem-se que o orçamento analítico não
contempla um detalhamento tão específico dos itens de despesa do projeto.
Conforme demonstrado neste trabalho, torna-se relevante no cenário
mineiro clarificar e normatizar a situação das OSCIPs que possuem Termo de
Parceria celebrado com o Poder Público de Minas e que recebem recursos dos
mecanismos de incentivo à cultura. Não se pretende neste artigo apontar a solução,
mas fomentar o início da discussão sobre este tema.
A Legislação mineira, mais precisamente o Decreto 46.020/2012, afirma
que todos os recursos arrecadados previstos no Termo de Parceria, o que inclui os
recursos advindos dos mecanismos de incentivo à cultura, devem observar as
regras de execução dos recursos repassados por meio dos Termos de Parceria.
Conforme já afirmado, a execução destes recursos deve observar o RCC, que é
totalmente pautado pelos princípios da Administração Pública. Contudo, cada ente
federado que trabalha com leis de incentivo possui sua regulação própria acerca da
execução e prestação de contas dos recursos incentivados.
Pela legislação mineira, o RCC é o documento normatizador da OSCIP,
que contém os procedimentos a serem adotados para a contratação de obras e
serviços, bem como para compras com o emprego de recursos provenientes do
poder público, observados os princípios da legalidade, da impessoalidade, da
moralidade, da publicidade, da economicidade, da razoabilidade e da eficiência.
Tendo em vista que o RCC deve ser aprovado pelo OEP e pela SEPLAG, esta
secretaria, exercendo o papel de área central de controle da metodologia de
implementação do modelo de parcerias, estruturou um Manual de Construção do
Regulamento de Compras e Contratações. Este Manual contém os requisitos
mínimos a serem seguidos pelas entidades ao elaborem o próprio documento
normatizador. Isto representa, na verdade, um contraponto à autonomia gerencial
18
conferida à entidade, dado que o RCC, sendo um documento institucional que, em
tese, replica os procedimentos considerados adequados para realizar a boa gestão
dos recursos empreendidos nas políticas públicas, na verdade replica normas e
requisitos pré-determinados pelo Poder Público. Em que pese esta questão, a
construção do RCC seguindo este passo é fundamental para assegurar, ao Poder
Público e à sociedade em última análise, que as OSCIPs seguirão procedimentos
considerados adequados (ainda que pelo próprio Poder Público) para realizar o
melhor manejo de recursos públicos em prol de determinados resultados.
Verifica-se, então, que o RCC replica, em grande medida, os anseios e
procedimentos para compras e contratações considerados aceitáveis pelo próprio
Poder Público, e, em pequena escala, as características específicas de cada
entidade e cada política pública executada. De forma a ilustrar esta questão, tem-se,
no Manual de Construção do Regulamento de Compras e Contratações, elaborado
pela SEPLAG e disponível no sítio eletrônico desta, o seguinte trecho:
Visando auxiliar as entidades parceiras na elaboração desse RCC, serão apresentadas a seguir algumas exigências legais e outros aspectos relevantes a serem seguidos, quais sejam:
Modalidades de seleção das propostas e critérios de escolhas
Publicidade
Procedimentos de compras
Exigibilidades dos fornecedores
Cancelamento e recursos nos processos de aquisições e compras
Procedimento de contratação de trabalhadores
Outras orientações
Considerações finais. (Manual de Construção do Regulamento de Compras e Contratações, página 6).
Na verdade, o que é apresentado no Manual são os requisitos mínimos
para o conteúdo de todo um RCC, excetuando-se condições muito específicas de
uma política pública, que, quando inseridas, exigem intensa negociação entre
OSCIP, OEP e SEPLAG. Há, portanto, pouca abertura para que a OSCIP consiga
implementar grandes inovações no RCC, fazendo com que, atualmente, grande
número de Regulamentos possuam conteúdo bastante similar.
É importante destacar, também, que a execução financeira nos Termos
não ocorre de forma idêntica ao constante na Memória de Cálculo, dado que esta é
um referencial para a destinação dos recursos do Termo de Parceria e não vincula
os gastos da OSCIP ao longo da execução do Termo de Parceria, sendo utilizada
19
pelo OEP para acompanhar a adequação dos gastos. Neste ponto, o fundamental é
que a despesa possua coerência com o objeto do Termo de Parceria e não
necessariamente que seja previamente planejada pela OSCIP. O OEP utilizada a
Memória de Cálculo para acompanhar a adequação das despesas, inclusive com a
solicitação de justificativa, sempre que julgar necessário.
No que se refere à esfera federal, em 24 de junho de 2013 foi publicada a
Instrução Normativa 01 do Ministério da Cultura, que estabelece procedimentos para
apresentação, recebimento, análise, aprovação, execução, acompanhamento e
prestação de contas de propostas culturais, relativos ao mecanismo de incentivos
fiscais do Programa Nacional de Apoio à Cultura – Pronac. Percebe-se que as
entidades que recebem recursos devido aos mecanismos de incentivo à cultura
devem observar esta IN para execução dos seus recursos. Já em relação à esfera
Estadual, em 2012 foi publicada a Instrução Normativa 03, que estabelece normas e
regulamenta os procedimentos da formalização do incentivo, da readequação, da
execução e da Prestação de Contas de projeto artístico cultural realizado por pessoa
física ou jurídica com recursos concedidos por intermédio de incentivos fiscais da Lei
Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais, mecanismo da Secretaria de
Estado de Cultura de Minas Gerais (SEC). Contudo, quando se trata de OSCIPs do
Estado de Minas Gerais, elas possuem outra regra a observar, o citado Decreto
46.020/2012.
No concernente à execução financeira analisada sob a égide da
legislação referente aos mecanismos de incentivo e fomento à cultura, existem
poucas determinações condicionantes à ação das associações e fundações
privadas. Em suma, conforme já apresentado nesta seção, os proponentes dos
projetos culturais devem encaminhar, juntamente com as propostas, orçamentos
analíticos, com vistas a associá-los e enquadrá-los aos objetivos dos mecanismos
de incentivo e fomento à cultura. Caso os projetos sejam aprovados pelos órgãos
reguladores (Ministério da Cultura e Secretaria de Estado de Cultura, em especial
para este trabalho), a execução financeira deve ser alinhada ao planejado nos
orçamentos analíticos encaminhados. Assim sendo, os órgãos reguladores
acompanham e fiscalizam a consistência e o alinhamento da execução financeira
vis-a-vis ao planejamento aprovado.
20
Assim, para os órgãos reguladores dos mecanismos de incentivo e
fomento à cultura não é necessária a aplicação de um RCC para a execução dos
recursos incentivados. Não que a aplicação de um Regulamento para definir os
procedimentos de compras e contratações, elaborado tendo como base os princípios
da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da economicidade,
da razoabilidade e da eficiência, e previamente aprovado pelo Poder Público seja
impedido, contudo, simplesmente não é exigido pelos órgãos reguladores.
7.1 Aprofundando a questão: algumas reflexões importantes
Ilustramos na seção anterior que a execução financeira nos Termos de
Parceria, independente de possuir ou não recursos incentivados, segue uma lógica
integralmente vinculada aos preceitos do RCC. Em que pese o pressuposto de que
este regulamento é um documento institucional da OSCIP, em que os associados
desta, tendo em vista a autonomia gerencial conferida a estes, deliberam as
melhores práticas no contexto da execução dos recursos necessários à
consecução dos objetivos estatutários da entidade, temos, na verdade, uma
interferência do Poder Público, notadamente quando se verifica que este deve,
necessariamente, aprovar as disposições do RCC, tendo como subsídio um
Manual desenvolvido pela SEPLAG.
O Manual de Construção do RCC traz uma série de disposições e
requisitos mínimos que acabam por, praticamente, moldar o conteúdo do
Regulamento, ficando apenas algumas características bastante peculiares fora do
escopo daquele, conforme já afirmado. Esta lógica foi implementada pela SEPLAG
para garantir uniformidade nos procedimentos utilizados nos Termos, fazendo com
que não tivéssemos muitas variações e peculiaridades que dificultassem o
acompanhamento e controle do uso dos recursos públicos repassados às OSCIPs.
Neste ponto, entende-se que a lógica utilizada pela SEPLAG foi interessante e
razoável já que, passados mais de dez anos de implementação do modelo, a
padronização dos procedimentos trouxe um controle de resultados e dos processos.
21
Impende destacar que, conforme discutido neste artigo, os recursos
incentivados possuem regulamentações que estabelecem uma lógica menos rígida
na execução das receitas utilizadas quando comparado ao modelo mineiro,
privilegiando muito mais a agilidade nos processos. Para os órgãos reguladores dos
mecanismos de incentivo e fomento à cultura o fundamental é o alinhamento e
consistência entre a execução financeira e o planejamento financeiro, e não
necessariamente a aplicação de um RCC contendo os requisitos mínimos dos
processos e procedimentos. Pela própria característica das políticas públicas da
área cultural, em que existem diversas peculiaridades e demandas específicas na
contratação dos serviços e na compra de equipamentos, os órgãos reguladores
estabeleceram regras que buscam privilegiar, nos processos, a agilidade,
flexibilidade e autonomia gerencial.
Quando se analisa os Termos em que existem as disposições tanto da
legislação mineira de parcerias com OSCIPs como as regulamentações dos
mecanismos de incentivos e fomento à cultura, verificamos a predominância da
primeira sobre a segunda. Ou seja, a legislação estadual de parcerias com OSCIPs
estabelece e impõe procedimentos não exigidos pelo Ministério da Cultura e pela
Secretaria de Cultura de Minas Gerais. Não que a inserção dos requisitos
estabelecidos no Manual de Construção do RCC, elaborado pela SEPLAG, seja
menos importante ou mesmo impedida, contudo, é desnecessária para a execução
dos recursos incentivados.
Quando analisamos que uma das grandes vantagens do modelo mineiro
de parcerias com OSCIPs notadamente na área cultural, é a possibilidade de
utilização de receitas que não sejam oriundas do Tesouro Estadual como recursos
complementares aos recursos públicos, contribuindo para a sustentabilidade das
parcerias, verificamos que a sobreposição de uma legislação ampla e genérica na
execução dos recursos, independente da fonte destes – se advinda do repasse do
OEP ou dos mecanismos de incentivo e fomento à cultura – pode enrijecer os
procedimentos ao ponto de minimizar o interesse das entidades parceiras em
potencializar a captação de recursos.
22
Neste ponto, cabe refletir em que medida o modelo mineiro de parcerias
não poderia segmentar a lógica de execução dos recursos. Assim sendo, seriam
verificados procedimentos específicos para as receitas advindas do repasse do
Poder Público e demais recursos captados pela OSCIP. Para as receitas captadas
que possuam algum tipo de regulamentação, como no caso dos recursos
incentivados, seria permitida a execução dos recursos conforme determinada em
cada legislação. Ainda que segmentada a lógica de execução dos recursos, seria
obrigatória a construção de um RCC, contudo este Regulamento não seria uma
peça ampla e genérica, construída totalmente sob os requisitos determinados no
Manual da SEPLAG. Ele permitiria customizações e adaptações tendo em vista a
natureza de cada atividade desenvolvida, no caso específico deste trabalho,
abrangendo a especificidade das políticas públicas culturais.
Em suma, a reflexão proposta neste trabalho é que cada recurso seja
executado conforme a regulamentação própria definida pelo órgão gestor. Para o
repasse do Poder Público Estadual para as OSCIPs, faz sentido que a SEPLAG
determine os procedimentos de execução das receitas, sob a égide de um Manual
amplo e genérico. Contudo, para as receitas captadas, previstas no Termo de
Parceria, que possuam regulamentação própria quanto à sua utilização, é razoável
supor que sigam as determinações do órgão regulador.
O que se advoga não seria meramente a flexibilização de normas de
utilização dos recursos do Termo de Parceria, mas tão somente a execução das
receitas conforme cada tipo de regulamentação. Acredita-se que, assim, além da
coerência com as diferentes normas e regulamentações próprias para execução das
receitas, existiria observância das especificidades concretas da área cultural. De
forma complementar as entidades teriam mais estímulos à maximizar a entrada das
receitas captadas. Segmentando a execução das receitas conforme as
regulamentações já pacificadas, existiria, em tese, um incentivo a mais para
contribuir com a sustentabilidade dos Termos de Parceria.
23
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho analisou o formato da execução financeira nos
Termos de Parceria que utilizam recursos públicos repassados às OSCIPs e receitas
arrecadadas advindas dos mecanismos de incentivo e fomento à cultura. A questão
principal refere-se à sobreposição da legislação mais restritiva no trato da execução
dos recursos sob a posse das OSCIPs parceiras.
Como se viu, as OSCIPs com Termo de Parceria vigente que possuem
recursos incentivados devem, necessariamente, ter a execução financeira
totalmente vinculada às disposições do RCC. Desta feita, a despeito do regulamento
ser um documento de caráter institucional, em que a entidade deveria dispor sobre
os melhores processos, dada a natureza e peculiaridade das atividades
desenvolvidas, verifica-se que aquele replica, em larga escala, os procedimentos
considerados adequados pelo Poder Público, e em escala ínfima as especificidades
de cada política pública executada. Isso faz com que, apesar de os órgãos
reguladores dos mecanismos de incentivo e fomento à cultura não exigirem a
utilização de um RCC pela legislação mineira de parcerias com OSCIPs, as
entidades são obrigadas a seguir as disposições do regulamento. Neste ponto,
verificamos que a sobreposição de uma legislação ampla e genérica na execução
dos recursos, independente da fonte destes, pode enrijecer os procedimentos ao
ponto de minimizar o interesse das entidades parceiras em viabilizar a captação de
recursos e, assim, contribuir para a sustentabilidade financeira das parcerias.
Uma reflexão importante é a segmentação da lógica de execução dos
recursos, respeitada cada regulamentação existente, tornando o RCC um
documento que traduz de forma mais clara as especificidades institucionais e
relativas à natureza das atividades desenvolvidas pelas entidades e não apenas os
anseios do Poder Público Estadual. Entende-se que, assim, seria coerente com as
diferentes regulamentações existentes, observaria as especificidades da área
cultural e, de forma complementar, existiria um incentivo a impulsionar a própria
captação de recursos incentivados.
24
9 REFERÊNCIAS
BRASIL. Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL E REFORMA DO ESTADO. Brasília: Presidência da República, Imprensa Nacional, 1995.
BERNARDO, Renata e MARTINS, Humberto (2013). "Some critical issues on collaborative governance in Brazil", apresentado no XVIII Congresso Internacional do CLAD, Montevideo - Uruguai, 29 de outubro a 1 de novembro de 2013.
SARAVIA, Henrique (2005), “Contratos de gestão como forma inovadora de controle das organizações estatais”. X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005.
PROSDOCIMI, Eduardo Campos. RELAÇÃO ESTADO E OSCIPs: estudo do caso de Minas Gerais. Belo Horizonte. Fundação João Pinheiro, 2012.
ROMERO, Gerlainne Cristine Diniz. PROSDOCIMI, Eduardo Campos. Modelo de parcerias com OSCIPs do Estado de Minas Gerais: uma análise das ferramentas gerenciais estruturadas In: V CONGRESSO DE CONSAD DE GESTÃO PÚBLICA, 1. Anais... Brasília, junho 2012
PONTE, Elizabeth. Por uma cultura pública: organizações sociais, Oscips e a gestão pública não estatal na área da cultura / organização da coleção Lia Calabre. – São Paulo: Itaú Cultural: Iluminuras, 2012.
MINAS GERAIS. Decreto nº 46.020, de 09 de agosto de 2012 (versão atualizada). Regulamenta a Lei nº 14.870, de 16 de dezembro de 2003, que dispõe sobre a qualificação de pessoa jurídica de direito privado como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP, institui e disciplina o Termo de Parceria e dá outras providências. Disponível em: <http://www.almg.gov.br> acesso em: 11 fev. 2014.
MINAS GERAIS. Lei n. 14.870, de 1º de julho de 2008. Dispõe sobre a qualificação de pessoa jurídica de direito privado como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público - OSCIP - e dá outras providências. Disponível em: <http://www.almg.gov.br> acesso em: 10 fev. 2014.
COUTINHO, Frederico M. A.; BERNARDO, Renata A.; SILVA, Felipe, A. R. Contratualização de resultados com o terceiro setor (Oscip), desafios e potencialidades: a experiência de Minas Gerais. In: CONGRESSO DE CONSAD DE GESTÃO PÚBLICA, 1. Anais... Brasília, maio 2008.
COUTINHO, Frederico M. A.; Romero, Gerlainne, Melo, Íria. Os desafios do controle de resultados nas Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP): um estudo do caso de Minas Gerais. In: III CONGRESSO DE CONSAD DE GESTÃO PÚBLICA, 1. Anais... Brasília, maio 2009.
25
___________________________________________________________________
AUTORIA
Eduardo Prosdocimi – Especialista em Gestão Estratégica pela Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro – Belo Horizonte/Minas Gerais (2012), Graduado em Administração Pública pela Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro – Belo Horizonte/Minas Gerais (2008). É servidor efetivo da carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Estado de Minas Gerais, atualmente é coordenador no Núcleo Central de Parcerias com Oscips da SEPLAG.
Endereço eletrônico: [email protected]
Gerlainne Romero – Graduada em Administração Pública pela Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro – Belo Horizonte/Minas Gerais (2008), em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais – Belo Horizonte/Minas Gerais (2010), e é Pós Graduada em Gestão de Negócios pelo Ibmec – Belo Horizonte/Minas Gerais (2013). É servidora da carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Estado de Minas Gerais, atualmente é assessora da Diretoria Geral do Departamento de Obras Públicas.
Endereço eletrônico: [email protected]
Renata Bernardo – Mestre em Políticas Públicas e Administração pela London School of Economics and Political Science, graduada em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro e em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais. É servidora efetiva da carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do estado de Minas Gerais há sete anos, tendo atuado como Gerente Adjunta do Projeto Estruturador TRAVESSIA da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e como Gestora do Núcleo Central de Parcerias com OSCIPs da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão, atualmente é Chefe de Gabinete da Fundação Clóvis Salgado. Endereço eletrônico: [email protected]