Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de...

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Um olhar histórico e afetivo M Ã E C O R U J A PE R N A M B U C A N A VOLUME 1

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Um olhar histórico e afetivo

MÃE

C

ORUJA PERNAMBUCAN

A

VOLUME 1

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Um olhar histórico e afetivo

VOLUME 1

MÃE

CO

RUJA PERNAMBUCAN

A

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Programa Mãe Coruja Pernambucana

Paulo Henrique Saraiva CâmaraGovernador do Estado de Pernambuco

João Henrique de Andrade Lima CamposGabinete do Governador

Renato hièbautChefe de Gabinete de Projetos Estratégicos

Ana Elizabeth de Andrade LimaCoordenadora do Programa Mãe Coruja Pernambucana e

Diretora de Políticas Estratégicas do Programa Mãe Coruja Pernambucana

SECRETARIAS

José Iran Costa JúniorSecretário de Saúde

Frederico AmâncioSecretário de Educação

Roberto Franca FilhoSecretário de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude

Alexandre ValençaSecretário de Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação

Márcio Stefanni Secretário de Planejamento e Gestão

Sílvia CordeiroSecretária da Mulher

Nilton MotaSecretário de Agricultura e Reforma Agrária

Marcelino GranjaSecretário de Cultura

Felipe CarrerasSecretário de Turismo, Esportes e Lazer

P452m Pernambuco. Governo do Estado Mãe coruja pernambucana : um olhar histórico e afetivo / Governo do Estado ; Fundação Maria Cecília Souto Vidigal ; prefácio Paulo Câmara ; apresentação Eduardo de C. Queiroz. – Recife : Cepe, 2017. v. 1. : il.

Inclui referências.

1. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAMBUCANA. 2. ASSISTÊNCIA À MATERNIDADE E À INFÂNCIA. 3. ASSITÊNCIA PRÉ-NATAL. 4. CRIANÇAS – DESENVOLVIMENTO – ASSISTÊNCIA SOCIAL. 5. GRAVIDEZ NA ADOLES- CÊNCIA – ASSISTÊNCIA SOCIAL. 6. MÃES – PERNAMBUCO – ASPECTOS SOCIAIS. 7. MÃES – PERNAMBUCO – CONDIÇÕES SOCIAIS. 8. BEM-ESTAR SOCIAL – PERNAMBUCO. 9. FUNDAÇÕES E INSTITUIÇÕES BENEFICENTES – PERNAMBUCO. 10. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAMBUCANA – HIS- TÓRIA. I. Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. II. Câmara, Paulo. III. Queiroz, Eduardo de C. IV. Título. CDU 364.4 CDD 362.198

PeR – BPE 17-234

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Prefácio ..................................................................................................... 9

Apresentação ............................................................................................13

Parte 1 - Um olhar histórico ...................................................................17

O grande desafio ......................................................................................19

Capítulo 1 – A construção de uma ideia .................................................21

Capítulo 2 – Inaugurando vida nas vidas das pessoas ..........................37

Capítulo 3 – Um dia após o outro .......................................................... 49

Uma vida menos severina ...................................................................... 65

Parte 2 - Um olhar afetivo ..................................................................... 67

Um caminho cheio de vida e esperança ............................................... 68

Quando o amor vence a dor .................................................................. 74

Paciência que nasce do amor ao filho ................................................... 82

Enfeites para dar ânimo e renda ............................................................90

Sumário

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Superação à base de doces e salgados ................................................... 98

Círculos contra a depressão ................................................................. 108

Uma valente na paisagem sertaneja ..................................................... 116

Artesanato para enfeitar o futuro .........................................................126

Nasce uma bem-sucedida manicure ...................................................134

Sonhos possíveis da miúda e vaidosa Cleide .......................................142

Comércio de doces em comunidade quilombola ............................... 150

Primeiro o susto, depois a vitória ........................................................ 160

Cinco encontros afetivos .......................................................................170

A felicidade entre sonhos e festas ........................................................178

A arte de superar obstáculos e a cultura de ser feliz ........................... 184

Uma história de amor e superação .......................................................192

Documentos consultados ..................................................................... 203

Autores: Sérgio Miguel Buarquee Benira Maia

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Às crianças pernambucanas

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OPrograma Mãe Coruja Pernambucana, resultado

da inspiração e trabalho de muita gente e uma

das estratégias mais bem-sucedidas do Governo

Eduardo Campos, trouxe vida e esperança para

milhares de mães e crianças do nosso Estado. Ao longo

de quase uma década, o programa apresentou resultados

expressivos, cresceu de forma sustentável e consistente,

ganhou reconhecimento internacional e se consolidou

como uma política de Estado. O Mãe Coruja é, hoje, um

programa perene.

Falo isso com muita segurança porque acompanho

e conheço detalhadamente o Mãe Coruja desde o seu

início em 2007 - primeiro como Secretário de Estado

(em três pastas diferentes) e depois como Governador -

e desde cedo já estava muito claro que o programa seria

algo capaz de ir além do alcance de cada um de nós,

com respaldo político e reconhecimento social capaz de

ultrapassar mandatos.

Como não poderia deixar de ser, as prioridades do

Mãe Coruja são prioridades do meu Governo. E como

costumo dizer, prioridade não é conversa, é orçamento.

Só tem prioridade aquilo que tem recursos garantidos.

Por isso, ainda em 2016, enviei à Assembleia Legislativa

um projeto de lei para tornar impositivo os recursos

do Mãe Coruja Pernambucana. Em outras palavras, as

rubricas destinadas ao programa serão protegidas por

Lei. Também ampliamos o atendimento à primeira

infância (crianças até seis anos), através de um plano de

desenvolvimento infantil.

O Mãe Coruja é um exemplo para o Brasil e para o

mundo. Por isso, vejo com muita satisfação essa história

exitosa ser contada, com objetividade, profundidade

e sensibilidade em livro. É mais uma forma de

continuarmos levando ‘vida’ para a vida das pessoas.

Paulo Câmara

Governador de Pernambuco

Governador Paulo

Câmara fala

sobre o Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

durante o VI

Simpósio de

Desenvolvimento da

Primeira Infância

Foto: Aluisio Moreira/SEI

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Desde 2005, a Fundação Maria Cecilia dedica-se a gerar e disse-

minar conhecimento para o pleno desenvolvimento da criança

na primeira infância, período que vai do nascimento aos seis

anos de idade.

Dentre as diversas formas de alcançar nossa missão, está o fomen-

to à sistematização e a avaliação das práticas, programas e políticas de

primeira infância existentes como um processo de aprofundamento,

reflexão, qualificação e registro de tais experiências. Nesse contexto se

insere a atuação conjunta com o Governo do Estado de Pernambuco,

na avaliação e sistematização do Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na, que está há quase uma década em execução.

Conhecer essa história, sua metodologia, as fortalezas, os desa-

fios e seus resultados traz relevantes aprendizados que podem ser

inspiradores para os diversos gestores que hoje desejam priorizar,

em suas políticas, essa importante etapa da vida.

Entendemos que o produto dessa sistematização pode contribuir

para o aprimoramento das políticas públicas voltadas para a primei-

ra infância. Governos que investem esforços em olhar para a efetivi-

dade de suas políticas identificando as ações que deram certo, bem

como reconhecendo as que não obtiveram os resultados esperados,

têm melhores condições de aprimorar seus programas e gerar im-

pactos significativos à sua população.

O material apresentado aqui é fruto de um extenso trabalho de

pesquisa de campo e documental sobre o programa, consolidado em

quatro publicações para abordar a complexidade que o tema primei-

ra infância exige, trazendo aos gestores informações valiosas sobre a

experiência pernambucana.

Parabenizamos o Governo do Estado pela priorização da criança

e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema-

tizar sua política de primeira infância e constante preocupação em

qualificá-la.

“Se mudarmos o começo da história, mudamos a história toda.”

– frase do documentário O Começo da Vida

Eduardo de C. Queiroz

Diretor Presidente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal

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Amotivação inicial para a produção deste esforço

de análise, sistematização e registro histórico foi

a aproximação da data – 4 de outubro de 2017 –

em que o Programa Mãe Coruja Pernambucana

completa dez anos de contribuição ao bem-estar de

gestantes e crianças na primeira infância. De repente,

ficou claro que era necessário contar a história do

programa, uma política pública que, ao longo de

três mandatos governamentais consecutivos, não

apenas foi preservada como ganhou abrangência e

blindagem institucional. Implantado inicialmente

em uma das 12 microrregiões do estado, agora está

presente na maior parte do território pernambucano

e protegido por legislação específica que o enquadra

como política de Estado, tendo inclusive execução

orçamentária impositiva por força de decreto

assinado pelo governador Paulo Câmara.

Nestes quatro volumes, são apresentados registros

captados a partir de diferentes olhares sobre o Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana. Há, em primeiro

lugar, um olhar rememorativo, que desvela a crônica

dos fatos que marcaram a trajetória do programa. E

também um olhar afetivo – a visão das usuárias desde

os anos iniciais. Há um olhar metodológico, que de-

talha os procedimentos utilizados em Pernambuco e

que podem ser reproduzidos em outros lugares, caso

se queira implementar programa semelhante. E há,

por fim, o olhar externo, a mirada dos especialistas

que documentaram e analisaram as percepções dos

diferentes atores envolvidos no programa por meio

de uma leitura qualitativa enquanto outros utilizaram

recursos de mensuração para avaliar a eficácia do pro-

grama e propor aperfeiçoamentos.

Todo este esforço para estruturar uma narrativa

sobre o passado, o presente e o futuro do Programa

Mãe Coruja Pernambucana se tornou possível gra-

ças a uma parceria do Governo de Pernambuco com

Reconhecimento

internacional:

Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

recebe prêmio

da ONU na

Coreia do Sul

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a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. Ao governo interessava conectar a

experiência vivida na construção e manutenção do Programa Mãe Coruja

Pernambucana com a expertise de uma instituição que há 50 anos constrói

articulações para lançar luz sobre projetos e disseminar boas práticas em

favor da infância. Já a fundação identificou a chance de ver de perto uma

experiência como a grande concertação de atores sociais – governos nas di-

ferentes esferas e instituições da sociedade civil – que dá forma e sentido ao

Programa Mãe Coruja Pernambucana.

O retrato que se desenha é complexo, multifacetado. O relato que se mate-

rializa, é polifônico, combinando as vozes de brasileiras que vivem em peri-

ferias e zonas rurais de municípios sertanejos em situação de vulnerabilidade

com as leituras realizadas por estudiosos como Ricardo Paes de Barros e Tânia

Bacelar, responsáveis pelas avaliações quantitativa e qualitativa, e Oswaldo

Yoshimi Tanaka, que se encarregou de manualizar a metodologia.

A avaliação qualitativa mostrou que o programa tem pontos fortes como a

efetividade na difusão de informação qualificada e no fortalecimento dos vín-

Equipe do

Programa

Mãe Coruja

Pernambucana na

Coreia (esquerda)

e o Governador

Eduardo Campos

cumprimentando

participantes do

programa

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culos familiares, além da matriz intersetorial de sua atuação – e também al-

guns pontos fracos, sendo os mais evidentes a dificuldade na articulação com

as instituições envolvidas e a carência de suporte que poderia ser suprida por

novos parceiros a serem conquistados.

Já a avaliação quantitativa demonstrou, por exemplo, que o Programa Mãe

Coruja Pernambucana ajudou a reduzir a incidência de gravidezes de ado-

lescentes e impactou positivamente o aleitamento materno. Não foi possível,

porém, detectar impacto na redução do principal indicador de resultado do

programa, a mortalidade infantil, numa perspectiva nacional.

Pelos dois métodos, chegou-se à mesma conclusão: que o Programa Mãe

Coruja Pernambucana tem como principal limitador dos seus resultados as

fragilidades da rede de assistência às gestantes, principalmente das materni-

dades municipais.

As leituras aqui reunidas deixam patente, em suma, que a experiência do

Programa Mãe Coruja Pernambucana fornece lições importantes para a con-

cepção e a implementação de iniciativas voltadas à primeira infância.

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Parte 1

Um olhar histórico

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“Quando os problemas se tornam absurdos, os desafios se tornam apaixonantes”

Dom Hélder Câmara

O grande desafio S

erra da Ladeira, chapada do

Araripe, abril de 2007. Uma

equipe de atendimento à atenção

primária da Secretaria de Saúde

de Pernambuco, que percorria o

Estado colhendo dados para o que

no futuro seria o Programa Mãe

Coruja Pernambucana, chega ao

aglomerado de cerca de vinte casas

dispersas, localizado na zona rural

de Ipubi, a 685 km do Recife. Depois

de deixar o asfalto no distrito de

Serrolândia e percorrer mais de 4 km

por uma estreita estrada de barro, o

grupo se depara com uma imagem

chocante. No quintal de umas das

casas da comunidade, cinco cruzes

assinalavam as covas em que estavam

enterrados cinco “anjinhos”, como

os moradores da região chamam as

crianças que morrem ainda bebês.

Para dar mais dramaticidade à

cena, outras crianças brincavam em

torno do cemitério clandestino. Todos

da localidade, adultos e crianças,

demonstravam total naturalidade com

a situação. A cena na Serra da Ladeira

era o retrato triste e fiel da banalização

da morte e do pouco valor da vida. Era

o símbolo de uma situação grave e que

precisava ser combatida com todas as

forças: a elevada taxa de mortalidade

infantil em Pernambuco.

Abril de 2007:

cemitério

clandestino na

Serra da Ladeira,

em Ipubi

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Capítulo 1

A construção deuma ideia

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“Não existem sonhos impossíveis para aqueles que

realmente acreditam que o poder realizador reside no

interior de cada ser humano, sempre que alguém descobre

esse poder, algo antes considerado impossível se

torna realidade”

Albert Einstein

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Esta é a história de como uma boa ideia, quando bem planejada e eficientemen-

te executada, pode mudar o dia a dia de milhares de pessoas e de como, ao ser

transformada em políticas públicas, pode salvar vidas. Como acontece com a

maior parte das grandes ideias, a que deu origem ao Programa Mãe Coruja Per-

nambucana precisou de uma conjunção de fatores para se tornar realidade.

Uma história que começa, de forma efetiva, no ano de 2007, quando as pes-

soas certas – com pensamentos convergentes e com capacidade técnica diversas e

complementares – cruzaram seus caminhos em um momento histórico propício

e em um ambiente político favorável. O Programa Mãe Coruja Pernambucana é

a construção complexa de uma concepção simples para solucionar um problema

profundo: salvar a vida de milhares de mulheres e crianças em Pernambuco. Para

entender todo esse processo de forma completa será preciso refazer, passo a passo,

todo o caminho percorrido. Será preciso voltar alguns anos no tempo.

Conhecendo o problema

A imagem do cemitério clandestino no povoado da Serra da Ladeira, na zona rural

de Ipubi, na época uma região com os piores indicadores socioeconômicos do Es-

tado, era a face visível de um perturbador e alarmante dado estatístico: em 2007,

de cada mil crianças que nasciam em Pernambuco, cerca de 22 morriam antes

de completar um ano, segundo dados do Sistema de Informação Mãe Coruja Per-

nambucana. Isso, mesmo com avanços legais significativos, como o reconheci-

mento dos direitos sexuais e reprodutivos e a promulgação do Estatuto da Criança

e do Adolescente, além de uma série de bem-sucedidos programas sociais.

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O número, em uma proporção bem acima do parâmetro mínimo aceito

pela Organização Mundial de Saúde, que é de até 10 óbitos por mil nascidos

vivos, era a face mais cruel da enorme desigualdade que afligia e separava os

pernambucanos desde o Brasil colônia.

No mesmo período, outro indicador tornava a situação ainda mais dramáti-

ca no Estado. A quantidade de mortes de mães em relação ao número de nas-

cimentos era muito elevada. A exemplo da mortalidade infantil, a mortalidade

materna era assustadoramente superior ao mínimo estabelecido pela Organi-

zação Mundial da Saúde (OMS). Em 2007, Pernambuco apresentava uma Ra-

zão de Morte Materna (RMM) de 71,73 para cada 100 mil nascimentos. Uma

realidade bem distante da pactuada nas Metas do Milênio, que fixava uma taxa

máxima de 35 mortes para cada 100 mil nascimentos até 2015.

Assim, no Pernambuco extremamente desigual de 2007, a vulnerabilida-

de das crianças e mulheres em sua trajetória de maternidade acentuava-se

no interior das comunidades quilombolas, das aldeias indígenas, dos assen-

tamentos e dos inúmeros bolsões de miséria urbanos e rurais. Naquele ano,

os coeficientes de mortalidade infantil de Pernambuco refletiam cenários do

abismo social existente no Estado. A desigualdade entre as pessoas era repli-

cada também do ponto de vista geográfico.

Enquanto, na capital, ocorriam 12,7 óbitos por mil crianças nascidas vi-

vas, no sertão, esse coeficiente subia para 25,8 óbitos por mil nascidos vivos,

Encontro de

sensibilização em

Bodocó

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segundo dados do Ministério da Saúde (mais atualizados em 2006), indican-

do que crianças nascidas na capital tinham maior chance de viver que as do

interior pernambucano. No que tange à mortalidade materna, no sertão de

Pernambuco os coeficientes registrados chegavam a 115 óbitos por 100 mil

nascimentos e, na capital, 68 óbitos por 100 mil nascimentos, também com

os dados mais atualizados do Ministério da Saúde em 2006.

Os primeiros dados levantados pelas equipes da Secretaria de Saúde, que

se transformariam em um detalhado diagnóstico e que embasariam a cria-

ção do Programa Mãe Coruja Pernambucana, já sinalizavam para um ou-

tro problema. Nesse cenário, acrescentava-se a presença de altos índices de

gravidez na adolescência, em média 23% nas áreas menos favorecidas e na

população em situação de vulnerabilidade, configurando-se como uma si-

tuação de risco (aqui não se trata de risco biológico e sim social), não só para

adolescentes, mas também para as crianças frutos dessa geração, uma vez

que a condição de imaturidade das futuras mães estava associada à baixa

renda, a níveis de escolaridade precários e a situações de desigualdades no

acesso às políticas públicas.

Por conta dos aspectos culturais específicos da Região Nordeste brasileira,

a situação de vulnerabilidade da mulher era potencializada, à época, particu-

larmente no interior do Estado, pela privação da condição de cidadã, ou seja,

privação de direitos civis, políticos e sociais e pela ausência de políticas públi-

cas voltadas ao gênero em Pernambuco. Essa privação da condição de cidadã se

refletia principalmente nos índices de mortalidade materna e infantil.

Quando analisamos as grandes regiões do Brasil, as disparidades aumen-

tam com o passar do tempo e, na Região Nordeste, verifica-se a maior vul-

nerabilidade do país quanto a esse indicador. Sua taxa equivale a mais que

o dobro das taxas verificadas nas Regiões Sul (17,9 óbitos por 100 mil nasci-

mentos), Sudeste (20 óbitos por 100 mil nascimentos) e Centro-Oeste (20,4

óbitos por 100 mil nascimentos).

Um dado do Ministério da Saúde deixava a situação em Pernambuco ain-

da mais desconfortável. Cerca de 92% dos óbitos maternos eram evitáveis, e

a atenção integral à mulher poderia ajudar a diminuir consideravelmente o

risco de vida das crianças e das mães. A conclusão é que o nível tão elevado

de mortalidade materna refletia, além das condições de saúde e de vida da

população, a ineficiente organização e atuação do sistema de saúde.

Os indicadores levantados em 2007 apontavam para uma situação injusta,

indigna, cruel, desumana e inaceitável. Algo precisava ser feito.

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A decisão política

O ano de 2007 também começava com uma mudança significativa, tanto do

ponto de vista político quanto histórico, no governo de Pernambuco. Após ga-

nhar as eleições estaduais em 2006, Eduardo Campos (PSB) assumia o Estado

com a decisão política de enfrentar a mortalidade infantil. Logo nos primeiros

dias do ano, por iniciativa do Governo do Estado, estiveram reunidos técnicos

e gestores das Secretarias Estaduais de Desenvolvimento Social e Direitos Hu-

manos; Saúde; Educação; Juventude e Emprego; Agricultura; Mulher e Plane-

jamento, construindo e consolidando um documento que conseguisse tradu-

zir todas as diretrizes e interfaces institucionais na perspectiva da garantia de

direitos para mulheres gestantes e crianças de 0 a 5 anos.

Publicamente, o governo do Estado de Pernambuco assumiu o compromisso de

concentrar esforços para, de um lado, fazer convergir os indicadores sociais das vá-

rias regiões do Estado em direção a um patamar médio mais equitativo. E, de outro,

desenvolver ações para elevar os referidos indicadores em direção à aproximação e,

mais adiante, à superação das médias nacionais prevalentes nos mesmos.

Os registros daqueles primeiros dias de 2007 mostram que o novo governo

chegava ao Palácio do Campo das Princesas decidido a implementar uma polí-

tica pública centrada nos principais desafios e voltada para desenvolver ações

que tivessem foco permanente em estratos mais vulneráveis da população e

também nas áreas do território estadual em condições mais desfavoráveis.

Café da manhã

do governador

com prefeitos e

primeiras-damas

envolvidos

no Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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O compromisso era de reconhecer os desníveis e diferenças econômicas,

sociais, culturais e espaciais existentes e intervir para reduzir as diferenças

entre os cidadãos pernambucanos. Essa proposição de caráter geral visava a

promover um estilo de desenvolvimento equilibrado em Pernambuco, o que

só seria possível com uma intervenção integradora do território estadual, ou

seja, tratava-se de “integrar para desenvolver”.

Como se veria alguns meses mais tarde, esses seriam os princípios nortea-

dores para a concepção do Programa Mãe Coruja Pernambucana, que sempre

teve como foco de atenção a mulher e a criança em seu contexto familiar e, as-

sim, enfrentar os indicadores alarmantes relacionados à mortalidade materna

e infantil, e sua correlação com a exclusão social no Estado.

Os primeiros passos

Entre a decisão política tomada pelo governo do Estado de enfrentar o proble-

ma da mortalidade materno-infantil e o lançamento do Programa Mãe Coru-

ja Pernambucana houve um curto e intenso caminho a ser percorrido. Foram

nove meses de construção, o tempo de uma gestação. O primeiro passo dado

nessa direção foi o fortalecimento da atenção primária de saúde. Como o nome

sugere, esse é o primeiro nível de atenção do Sistema Único de Saúde (SUS) e

caracteriza-se por um conjunto de ações nos âmbitos individual e coletivo que

abrange a promoção e proteção à saúde, a prevenção dos agravos, o diagnós-

tico, o tratamento e a reabilitação, sempre visando à manutenção da saúde.

Vale lembrar que, até então, a política pública, fragmentada e sem foco es-

tratégico, não considerava também que os direitos da mulher e da criança se

reforçavam reciprocamente, não entendendo que investir nos direitos da mu-

lher favorecia a sobrevivência e o desenvolvimento da criança. Não existiam

iniciativas de uma atuação multidisciplinar do Estado no sentido de cuidar de

forma ampla da mulher e das crianças, de promover gestação saudável e de

garantir às crianças nascidas em Pernambuco o direito a um nascimento e de-

senvolvimento saudável e harmonioso.

Para enfrentar esses desafios, o governo do Estado definiu, por meio da Se-

cretaria de Saúde, a Política Estadual de Fortalecimento da Atenção Primária

em Saúde como prioridade de governo, trabalhando os eixos transversais da

universalidade, acessibilidade, linha de cuidado, vínculo, longitudinalidade,

responsabilidade sanitária, humanização e equidade em um contexto de des-

centralização e controle social da gestão.

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Na prática, a nova política significava uma mudança importante na forma

como a saúde era conduzida pelo Estado. Em alguns pontos, chegava a haver

uma inversão de valores. Antes, de maneira geral, o foco estava em tratar as

doenças. Com a nova filosofia, o foco passou a ser a promoção da saúde. Uma

das consequências diretas dessa “inversão” foi a mudança na lógica do aces-

so ao serviço de saúde. Se antes só funcionava se o paciente fosse até o posto

de saúde ou hospital, depois, as equipes intensificaram o trabalho preventivo,

indo até aonde as pessoas estavam.

Um detalhe importante precisa ser lembrado. Paralelo ao trabalho de aten-

ção básica, as equipes da Secretaria de Saúde percorriam o Estado colhendo

dados para a construção de um diagnóstico detalhado que serviria de base

para o que viria a ser, mais tarde, o Programa Mãe Coruja Pernambucana.

A política foi instituída oficialmente em 12 de abril de 2007, pelo Decreto

nº 30.353, assinado pelo governador Eduardo Campos, com o objetivo de for-

talecer e qualificar a Atenção Primária no Estado, induzindo a ampliação da

cobertura e qualificando os serviços. É importante destacar que tratava-se de

uma política com financiamento (o Governo de Pernambuco foi cofinancia-

dor) e com controle social, pois as certificações eram também validadas pelo

Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (Cosems).

Em seguida, a Secretaria de Saúde instituiu as normas e procedimentos de

adesão a essa política, por meio da Portaria nº 720, de 12 de agosto de 2007.

Essa portaria delimitou as áreas programáticas a terem prioridade e detalhou

os componentes do decreto:

• Atenção integral à saúde da criança;

• Redução da mortalidade infantil e materna;

• Atendimento ambulatorial à gravidez e ao puerpério;

• Atenção às doenças prevalentes na infância;

• Assistência às carências nutricionais;

• Eliminação da desnutrição infantil;

• Eliminação da hanseníase;

• Controle da hipertensão arterial e diabetes;

• Saúde do idoso;

• Saúde bucal;

• Promoção à saúde;

• Atenção às populações rurais, assentamentos e reforma agrária, aldeias indí-

genas e quilombolas.

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Um olhar histórico e afetivo | 29

Com base nos cenários e índices de mortalidade infantil apresentados à época,

atrelados à necessidade de ampliação de ações desenvolvidas dentro da Política

Estadual de Fortalecimento da Atenção Primária, ficou clara a necessidade de de-

senvolvimento de um programa para cuidar de forma ampla e integral da mulher

gestante e de suas crianças, fortalecendo os vínculos afetivos. Assim, em outubro

de 2007, por meio do Decreto nº 30.859, foi criado pelo governo do Estado de Per-

nambuco o Programa Mãe Coruja Pernambucana.

As inspirações

Para estruturar o Programa Mãe Coruja Pernambucana, além do detalhado diag-

nóstico feito em Pernambuco, a equipe técnica que estava coordenando o projeto

conheceu e estudou outros programas similares pelo Brasil e pelo mundo. Nessa

busca, muita coisa boa foi encontrada.

Dessa forma, importantes referenciais teóricos passaram a fazer parte da his-

tória do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Algumas das experiências visitadas

merecem menção, a exemplo do Programa Mãe Curitibana (Paraná), do Primeira

Infância Melhor (PIM), do Rio Grande do Sul, ou mesmo do cubano Educa tu Hijo.

As visitas técnicas mostraram que a construção dos programas se dava à parte

da estrutura de governo, geralmente em parcerias com organizações internacio-

nais. Surge, então, um detalhe que foi fundamental para o sucesso do Programa

Mãe Coruja Pernambucana e que também diferenciou o modelo pernambucano

Mandala dos

desejos: uma

das ferramentas

usadas pelo

Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

para ouvir a

população

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| Mãe Coruja Pernambucana30

das demais iniciativas semelhantes em outros locais do Brasil e do mundo: o então

governador Eduardo Campos tomou a decisão política de construir o programa a

partir do Estado, tendo os municípios como parceiros.

Pernambuco também adotou a estratégia de implantar um programa que não

fosse um piloto, mas que pudesse atender à necessidade do Estado, integrando, arti-

culando e fortalecendo políticas. Um programa que pudesse ser construído em con-

junto pela sociedade civil, municípios e organizações governamentais. Um desafio

que entendeu a importância do desenvolvimento social para melhorar os indicado-

res inaceitáveis da desigualdade ainda existente no Estado em 2007.

O conceito

No final de 2015, a Coordenação do Comitê Executivo do Mãe Coruja produziu

um Relatório de Gestão no qual o conceito que fundamenta o programa está

descrito de forma clara e objetiva. Segundo o documento, o Programa Mãe

Coruja Pernambucana insere-se na perspectiva de garantir os direitos repro-

dutivos das mulheres e o direito à infância desde o primeiro ano de vida, de

forma a contribuir diretamente para a redução da mortalidade, tanto materna

quanto infantil, persistentes no Estado de Pernambuco. O Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana alicerça-se em dois pilares:

I. No reconhecimento dos direitos das mulheres, visto que são elas que en-

gravidam e, quando não acompanhadas de forma sistemática e plena pelo Esta-

do, pela sociedade e pela família, são as que mais sofrem consequências, muitas

vezes, irreversíveis.

II. No entendimento da infância como um dos universos etários prioritários na

formulação de políticas sociais conforme prega o Estatuto da Criança e do Adoles-

cente e na Constituição Federal de 1988.

A garantia dos direitos reprodutivos liga-se diretamente ao campo da saúde e se

faz mediante a efetivação de políticas públicas que permitam às mulheres desen-

volver uma gravidez e realizar um parto assistido; e, às crianças, um nascimento e

desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.

O horizonte ético de uma proposta voltada para a redução da mortalidade ma-

terno-infantil é o próprio compromisso de promoção da saúde e do desenvolvi-

mento de mulheres gestantes e de crianças de 0 a 5 anos. Esse compromisso toma

forma de ação governamental efetiva por meio da identificação e articulação de

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Um olhar histórico e afetivo | 31

eixos estratégicos, assim como dos objetivos e competências institucionais espe-

cíficas. Esse processo se estabelece a partir da confirmação da gravidez pela rede

de saúde; seguida do acompanhamento do pré-natal, com estímulos ao fortaleci-

mento das relações familiares e esforços para a vinculação à maternidade; o parto

humanizado; segurança alimentar e nutricional sustentável de mãe e filho; até o

estímulo à autonomia socioeconômica por meio do direito à documentação, além

da oferta de formação e profissionalização para as mulheres atendidas.

É no entrelaçamento dessa teia social que o Programa Mãe Coruja Pernambucana

se apresenta. Na conjunção de objetivos, eixos estratégicos, justificativas e metodolo-

gias; na garantia dos direitos das mulheres e de suas famílias.

O modelo

O programa tem um modelo de gestão intersetorial e descentralizado com uma

construção integrada desde o planejamento, execução, acompanhamento, moni-

toramento e avaliação. Integram o programa: Gabinete do Governador; Gabinete

de Projetos Estratégicos; Secretaria de Saúde; Secretaria de Educação; Secretaria de

Desenvolvimento Social, Criança e Juventude; Secretaria da Mulher; Secretaria de

Planejamento e Gestão; Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária; Secretaria de

Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação; Secretaria de Cultura; Secreta-

ria de Turismo, Esporte e Lazer; além da Assessoria Especial do Governador.

Enfrentar as questões intersetoriais exige das autoridades, gestores e técnicos

conhecer a realidade, focalizar as políticas públicas com planejamento e decisões

racionais para priorizar esse ou aquele tipo de ação, e conseguir a maior efetividade

e eficiência no uso dos escassos recursos para a promoção de políticas sociais.

O Programa Mãe Coruja Pernambucana está inserido no modelo de gestão es-

tadual com foco em resultado. Agrega instrumentos como o mapa da estratégia

do Estado e do programa, sala de situação em todos os Cantos Mãe Coruja e o mo-

nitoramento permanente de todas as ações entre as quais a vigilância dos óbitos

infantis e maternos. É meta prioritária de governo, sendo monitorado pelo gover-

nador do Estado mensalmente.

A gestão e o monitoramento do programa são descentralizados e ascendentes,

percorrendo os níveis local, regional, estadual, e sua coordenação central, da qual

participam as secretarias que fazem parte do programa e o próprio governador.

Um outro ponto importante e que pode ser considerado um diferencial do pro-

grama é que a inclusão social da mulher e de sua família saem do paradigma bio-

lógico para o da promoção social, criando uma “Rede de Cuidado” intersetorial.

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| Mãe Coruja Pernambucana32

Nesse contexto, são realizadas ações de fortalecimento e empoderamen-

to das mulheres, como círculos de educação e cultura, cursos de qualificação

profissional, oficinas de segurança alimentar e nutricional, inclusão em progra-

mas sociais nos Centros Regionais de Assistência Social, fornecimento de kits

do bebê para as gestantes, fortalecimento da atenção ao pré-natal com sete ou

mais consultas realizadas, parto e puerpério e reorganização da rede de atenção

ao parto. As crianças cadastradas no programa são acompanhadas por ações de

incentivo ao aleitamento materno, à imunização, ao acesso ao registro de nasci-

mento, e ao acompanhamento de seu crescimento e seu desenvolvimento.

Em resumo, o Programa Mãe Coruja estruturou-se a partir de um mode-

lo de gestão por resultado, utilizando o trabalho intersetorial e o monitora-

mento integrado baseados na leitura sistemática do território e ferramentas

de planejamento, como a criação de um sistema de informações próprio do

programa – o SIS Mãe Coruja.

A escolha do nome

Olhando agora, com praticamente uma década de caminhada, fica difícil ima-

ginar uma outra maneira de nomear o programa. Isso porque existe uma iden-

tificação muito forte entre o nome, o conceito e a essência do projeto. Chega a

ser até autoexplicativo.

Em 2007, no documento que continha as diretrizes para o lançamento do

Programa Mãe Coruja Pernambucana, constava a seguinte explicação para o

seu nome:

Festa de

lançamento

do Programa

Mãe Coruja

Pernambucana,

em Ouricuri,

contou com a

participação da

população

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Um olhar histórico e afetivo | 33

“A escolha do nome Mãe Coruja Pernambucana deve-se a uma reflexão so-

bre o desejo de realizar um programa de cuidasse de forma ampla da mulher

gestante e de seus filhos, que fortalecesse os vínculos afetivos, que promovesse

uma gestação saudável e que garantisse às crianças nascidas no território per-

nambucano o direito a um nascimento e um desenvolvimento harmonioso.”

“A expressão ‘mãe coruja’ faz parte da cultura popular e diz respeito às

mães que cuidam e se orgulham de seus filhos. Conta a fábula, de origem in-

certa e atribuída a vários autores, de La Fontaine a Monteiro Lobato, que uma

coruja teve seus filhotes devorados por uma águia, pois, ao referir-se a eles, só

ressaltava suas qualidades.”

“A coruja também é o símbolo clássico da filosofia. Pode movimentar-se

em 360º, olhar em todos os ângulos. Une as partes e compreende o todo. Tem

intuição e sabedoria. Possui boa visão durante o dia, apesar de muitos pensa-

rem o contrário, tem a capacidade de ampliar seu campo de visão durante a

noite, dilatando suas pupilas para aproveitar o máximo da claridade.”

“Na tradição Guarani, o Grande Espírito manifestou-se em forma de colibri

e de uma coruja.”

“O Programa Mãe Coruja Pernambucana enxerga o todo, compreende e ar-

ticula as partes e age de forma integrada com as diversas secretarias, tendo

como objetivo principal combater a mortalidade infantil e materna nas regiões

e comunidades mais vulneráveis do Estado de Pernambuco.”

As histórias fundadoras

O Programa Mãe Coruja Pernambucana tem, sobretudo, uma forma diferen-

ciada de olhar, enfrentar e resolver os problemas encontrados nessa exitosa

caminhada. O traço de afetividade, outra marca registrada, tem muito a ver

com duas histórias que surgiram bem no início do programa e que marcaram

profundamente as pessoas envolvidas e, por incrível que pareça, de muitos

que entraram nos anos seguintes.

A primeira delas é de perda e dor.

No início de 2007, no Hospital de Ouricuri, uma equipe da Secretaria de

Saúde comandada pela médica Ana Elizabeth de Andrade Lima, que, mais

tarde iria coordenar o Programa Mãe Coruja Pernambucana, encontrou uma

criança no corredor do hospital desfalecendo nos braços da mãe. A criança ti-

nha cerca de três meses e estava desnutrida. Estava “largada” porque nenhum

profissional havia conseguido “pegar sua veia”. Ao ver a situação, chocada,

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| Mãe Coruja Pernambucana34

Bebeth, como é conhecida Ana Elizabeth, atuou e fez com que Vágner, esse

era o nome do bebê, recebesse o atendimento. Com o quadro de saúde grave,

o menino teve de ser transferido para o Recife, mas não resistiu. Foi um caso

que mexeu muito com a equipe.

Após o ocorrido, a mesma equipe foi investigar a história dos poucos meses de

vida de Vágner. No posto de saúde de Videu (distrito de Ouricuri), onde a criança

havia recebido os primeiros atendimentos, um bilhete escrito na ficha médica do

recém-nascido dava a dimensão do drama e da precariedade do atendimento de

saúde naquele ano de 2007. Na ficha, o agente de saúde pedia para que quem vies-

se a atender Vágner tivesse uma atenção especial com a criança, que estava muito

mal, pois ela seria o terceiro filho que aquela mãe iria perder.

Ainda impactados pelo triste conteúdo do bilhete, o passo seguinte foi ir à casa

da família de Vágner, na Zona Rural de Ipubi, município vizinho a Ouricuri. Ao

chegar lá, além de toda falta de estrutura, a equipe encontrou, no terreno atrás da

residência, a cova em que o “anjinho” estava enterrado. Aquela cruz de madeira

improvisada no quintal era o desfecho e o símbolo de uma história que não poderia

mais se repetir.

A segunda história “fundadora” do Programa Mãe Coruja Pernambucana acon-

teceu alguns meses depois da de Vágner, em novembro de 2007. Dessa vez, porém,

teve um final feliz.

Na reta final de implantação do programa no município de Exu, toda equipe

do Programa Mãe Coruja Pernambucana tinha ido do Recife e estava reunido na

cidade para um Encontro de Sensibilização. No meio da reunião, chegou a notícia

de que a primeira criança do programa estava para nascer. A informação era que a

bolsa havia rompido antes do tempo e a futura mamãe, uma sertaneja forte cha-

mada Janimeire, estava tendo problemas com o trabalho de parto e não poderia

ser atendida na maternidade da cidade, já tendo sido transferida para Salgueiro,

distante cerca de 100 km dali.

Começou, então, a mobilização. Várias pessoas envolvidas, agindo de forma

coordenada e fazendo acontecer. Foi o primeiro exercício de cuidado com mui-

tas articulações. Com o empenho do pessoal do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana, Janimeire foi transferida para o Instituto de Medicina Integral Professor

Fernando Figueira (Imip), no Recife. No dia 30 de novembro de 2007 nascia Ga-

briele Vitória. O Programa Mãe Coruja Pernambucana deixava de ser uma ideia e

ganhava vida.

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Um olhar histórico e afetivo | 35

Gabriele ao lado

da mãe, Janimeire,

e do pai, Paulo

Henrique

Posto de Saúde

da Família do

distrito do Videu,

em Ouricuri, que

acompanhou o

caso Vágner

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| Mãe Coruja Pernambucana36

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Um olhar histórico e afetivo | 37

Capítulo 2

Inaugurando vida nas vidas das pessoas

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| Mãe Coruja Pernambucana38

“Assumimos a tarefa de escrever, com serenidade e

determinação, uma história diferente, que inaugure um

novo tempo para Pernambuco”

Eduardo Campos, em seu

discurso de posse como

governador de Pernambuco

em 1º de janeiro de 2007

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Um olhar histórico e afetivo | 39

Depois de abril de 2007, quando a Política Estadual de Fortalecimento da

Atenção Primaria em Saúde foi instituída oficialmente pelo Governo do

Estado, as viagens por todas as regiões de Pernambuco feitas pela equipe

que se tornaria o núcleo inicial do Programa Mãe Coruja Pernambucana

começaram a se intensificar. Concluída a fase de diagnóstico de campo e de

acúmulo de conhecimento, tanto prático quanto teórico, chegava a hora de co-

locar o programa para funcionar.

Em outubro, o Programa Mãe Coruja Pernambucana era implantado, sendo

posteriormente oficializado pelo Decreto nº 30.353. Na letra da lei, estavam

traçados formalmente os objetivos construídos, durante os meses anteriores,

sobre o sólido alicerce do contato permanente com a realidade: reduzir a mor-

talidade materna e infantil, por meio de ações estratégicas articuladas e in-

tersetoriais dos eixos de saúde, educação e desenvolvimento social, cuidando

de forma ampla da mulher e das crianças; fortalecendo os vínculos afetivos;

promovendo uma gestação saudável; e garantindo às crianças nascidas no ter-

ritório pernambucano o direito a um nascimento e um desenvolvimento sau-

dável e harmonioso.

A escolha da região e dos municípios por onde o programa começaria a

ser implantado obedeceu a critérios técnico e lógico, levando em considera-

ção as onze Gerências Regionais de Saúde (Geres) do Estado, nas quais havia

185 municípios nas seguintes condições:

a) taxa de mortalidade infantil igual ou maior que 25 óbitos por mil nas-

cidos vivos;

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| Mãe Coruja Pernambucana40

b) Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e índice de desenvolvimento

infantil (IDI) baixos;

c) nos casos em que 50% dos municípios situados na área adscrita à Geres

apresentassem taxa de mortalidade infantil maior que 25 óbitos por mil nas-

cidos vivos, o programa seria implantado em todos os municípios da Geres.

Da análise das estatísticas de mortalidade infantil e materna, junto de ou-

tros indicadores não menos importantes, foi definida a implantação do pro-

grama, inicialmente no Sertão do Araripe (IX Geres) e, em seguida, no Sertão

do Moxotó (VI Geres), que detinham os piores indicadores de mortalidade in-

fantil do Estado. Assim, 24 municípios passaram a ser beneficiados naquele

primeiro momento.

Em um Estado desigual como Pernambuco, a região do Sertão do Araripe

situava-se no extremo mais pobre do espectro social. Se, em 2007, o Coefi-

ciente de Mortalidade Infantil (CMI) no Estado já era assustador, ficando em

torno de 22 por mil nascidos vivos, nos 11 municípios do Araripe, a média era

de inacreditáveis 33,3 por mil nascidos vivos. Em Araripina e Ouricuri, o CMI

chegava, naquele ano, a 34,8 óbitos por mil nascidos vivos e 32,8 óbitos por

mil nascidos vivos, respectivamente.

A economia da região é caracterizada pela exploração da gipsita no cha-

mado Polo Gesseiro (concentra 40% das reservas de gipsita do mundo), pelas

culturas de subsistência nas áreas de sequeiro e pela pecuária extensiva (ex-

ploração da bovino/caprinocultura) e pela agricultura diversificada na Cha-

pada do Araripe (principalmente da mandioca). Mesmo assim, os municípios

do Sertão do Araripe, além da elevada taxa de mortalidade infantil, também

registravam grandes carências nas condições de vida de sua população, nota-

damente nas áreas de renda, esgotamento sanitário, abastecimento de água e

educação básica.

Foi essa região, considerada longínqua e esquecida, que não fazia parte da

agenda de políticas públicas, o local escolhido para iniciar a implantação do

Programa Mãe Coruja Pernambucana, que sonhava mudar a realidade e trans-

formar vidas.

Ouricuri

Para contar a história do Programa Mãe Coruja Pernambucana é preciso falar

de Ouricuri. Isso porque a cidade, distante 623 quilômetros do Recife, foi a es-

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Um olhar histórico e afetivo | 41

colhida para o lançamento estadual do programa, no dia 4 de outubro de 2007.

A festa aconteceu no pátio em que funciona a feira, uma grande área central

onde pulsa a vida do munícipio, e foi um sucesso sob todos os aspectos: políti-

co, cultural, estratégico e operacional. No evento, estavam presentes represen-

tantes dos onze municípios que integram a IX Geres. Lá, puderam apresentar

sua cultura e também participar de reuniões de sensibilização. De certa forma,

era uma espécie de “batismo” no Programa Mãe Coruja Pernambucana.

A festa contou com a presença do então governador do Estado, Eduardo

Campos, de várias autoridades, das mais variadas atrações artísticas e, prin-

cipalmente, com intensa participação da população. Foi a culminância de um

processo de construção coletiva, solidária, democrática e muito organizada do

Programa Mãe Coruja Pernambucana. A maneira como o evento foi colocado

em prática mostrava, logo de partida, que algo diferente de tudo que já havia

sido feito em termos de políticas públicas estava acontecendo. Ali estavam a

semente e a essência do que o programa se tornaria: a síntese entre uma estru-

tura extremamente organizada - focada em resultados, monitorada nos deta-

lhes - e um ambiente afetivo, acolhedor e inclusivo.

Nesses primeiros dias de trabalho, já ficava claro o envolvimento profundo

das pessoas que faziam parte do programa, característica que faz parte da cul-

tura e do DNA do Programa Mãe Coruja Pernambucana. As pessoas vestiam e

suavam a camisa de verdade. Ninguém se contentava em ficar apenas “dentro

da sua caixinha” no organograma. Motoristas montavam barracas junto com

o pessoal de saúde ou com quem tivesse livre na hora e também falavam em

encontros de sensibilização. Jornalistas carregavam caixas, pregavam cartazes

Renata e

Eduardo Campos:

personagens

centrais na história

do Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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| Mãe Coruja Pernambucana42

distribuíam panfletos nas ruas. Faziam um trabalho de “formiguinha” e fala-

vam sempre “nós”.

Outro traço marcante, que já estava ali em Ouricuri nos momentos ini-

ciais, era a maneira afetiva com que a equipe interagia com qualquer um que

cruzasse o caminho do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Daí a sensação

muito clara de pertencimento que as pessoas demonstravam sentir em rela-

ção ao programa.

Uma característica importante do Programa Mãe Coruja Pernambucana,

presente desde a sua estruturação em Ouricuri, foi a capacidade de diálogo.

A predisposição para ouvir começava desde as primeiras abordagens, ain-

da nos escalões superiores. Até mesmo o governador estava envolvido nesse

processo já que, geralmente, o primeiro contato era entre o chefe do execu-

tivo estadual e o prefeito.

Para isso, Eduardo Campos desenvolveu um verdadeiro processo de con-

vencimento que iniciava com um convite para o prefeito tomar um café da

manhã com o governador e a primeira-dama. Lá, ele era apresentado ao pro-

grama e, via de regra, saía do encontro convencido e entusiasmado. Tanto em-

penho por parte de Eduardo Campos nasceu do fato de ele ter, desde que o

Programa Mãe Coruja Pernambucana começou a ser concebido, a percepção

da importância de o Estado desenvolver parcerias com os municípios. Para o

governador, esse era um ponto-chave para o sucesso da iniciativa.

Depois do primeiro contato do governador com o prefeito, a “bola era pas-

sada” para as equipes técnicas, que tratavam das questões operacionais. Claro

que o Programa Mãe Coruja Pernambucana tinha seu escopo montado, tinha

objetivos, metas e processos, mas as conversas com as equipes aconteciam de

forma aberta, horizontal e existia uma verdadeira predisposição para ouvir.

Esse comportamento, entre outras coisas, estimulava um maior engajamento

de todos os envolvidos. O diálogo permanente também permitia uma melhor

adaptação às especificidades locais.

Essa maneira de agir, claro, chamou a atenção das pessoas positivamente.

Nos vários depoimentos gravados durante as diversas atividades que precede-

ram o lançamento do programa, era recorrente a referência de como o projeto

não veio pronto, de cima para baixo. Todos estavam felizes e até mesmo sur-

presos de serem ouvidos. Era uma novidade. “Nem parecia coisa do governo”.

Dentre os depoimentos dados naqueles primeiros dias, um parecia proféti-

co. Na época, atuando como agente de saúde, Rita Cláudia Oliveira participou

do encontro de sensibilização em Ouricuri. Ao tomar conhecimento de como

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Um olhar histórico e afetivo | 43

funcionaria o programa, que ela achou muito ousado, ficou encantada. Diante

da câmera, ela falou algo que parecia um pouco exagerado para um projeto que

começava a sair do papel: “Em dez anos, o Mãe Coruja será referência nacio-

nal”. O tempo mostrou que ela estava certa.

A consolidação

O segundo passo do Programa Mãe Coruja Pernambucana foi dado seis meses

depois do lançamento em Ouricuri. Em maio de 2008, o programa chegava ao

Sertão do Moxotó (VI Geres), composto por 13 municípios e onde a mortali-

dade infantil e os demais indicadores sociais também, a exemplo do Sertão do

Araripe, eram alarmantes.

A festa de lançamento aconteceu em Arcoverde, seguindo o mesmo mode-

lo e a mesma dinâmica da que havia acontecido em Ouricuri. Os preparativos

também foram feitos na mesma linha que marcou a implantação do Programa

Mãe Coruja Pernambucana nas demais regiões de Pernambuco. A diferença

era que o programa não era mais uma promessa. Com seis meses de estrada,

já tinha resultados positivos para mostrar, exemplos concretos para dar. Além

Programa

Mãe Coruja

Pernambucana foi

lançado com festa

e apresentações

culturais em

Ouricuri

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| Mãe Coruja Pernambucana44

disso, as equipes estavam mais estruturadas e as Secretarias de Estado envol-

vidas funcionavam de forma mais articulada.

Podia-se afirmar, sem medo, que o Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na estava consolidado. Se, em Ouricuri, as pessoas falavam com entusiasmo

das possibilidades que se abriam, em Arcoverde, o tom era de “agora vamos

crescer e alcançar todo Pernambuco”. Em seu discurso, o governador Eduardo

Campos fez questão de enfatizar que aquele era um “programa de Estado e não

de um governo”.

A alma do programa

A percepção do Programa Mãe Coruja Pernambucana pela população era di-

ferente porque o programa já começou essencialmente diferente. Um ponto

fundamental para isso era a sua característica multidisciplinar, que fugia total-

mente ao padrão usual. Chamava a atenção um programa de combate à mor-

talidade materno-infantil não ser formado apenas por profissionais da área

de saúde e também a forma “simples e de fácil compreensão” com que esses

profissionais se comunicavam. Um símbolo desse “modo de ser” diferente es-

tava no Grupo Alma.

Em um documento produzido pela Coordenação de Comunicação e Arte do

Mãe Coruja, em 2015, consta uma definição que resume o trabalho e o signifi-

cado do grupo para o programa. “O grupo Alma (Amor, Literatura, Movimento

Grupo Alma

comandava

as reuniões de

sensibilização

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Um olhar histórico e afetivo | 45

e Arte), pensado pela Diretoria de Gestão do Programa, era composto por artis-

tas plásticos, músico, jornalista, agente de saúde e lideranças populares. Eram

as pessoas que mais chamavam a atenção da população quando chegavam em

uma cidade onde o programa começava a ser implantado. Curiosamente, na

maioria das vezes, eram também os primeiros a criar (e manter) vínculos com

as pessoas do lugar. Foi o primeiro movimento que viabilizou o que é hoje a

Coordenação de Comunicação e Arte.

A contribuição do Alma para o Programa Mãe Coruja Pernambucana era tão

diversa quanto eram diversos seus integrantes. Incorporavam uma outra carac-

terística marcante nas pessoas envolvidas com o programa: eram “pau para toda

obra”; já em 2007, o grupo contribuiu nos fóruns e seminários para a construção

da política da Pessoa com Deficiência, do Homem, do Idoso e da Saúde do Tra-

balhador, com atividades que ajudavam na reflexão para a necessidade dessas

políticas e também no I Encontro da Atenção Primária, no qual o governo do

Estado firmava recursos para o incentivo ao fortalecimento da atenção primária.

Canto Mãe Coruja

Em Ouricuri também passou a funcionar o primeiro Canto Mãe Coruja, um

espaço de acolhimento, no qual ocorre o cadastramento das gestantes, fun-

cionando como ponto de apoio para os profissionais selecionados pelo Estado

para atuarem nos municípios como articuladores do programa no âmbito lo-

Em Ouricuri,

nasceu o primeiro

Canto Mãe Coruja

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| Mãe Coruja Pernambucana46

cal. Fazendo uma analogia com o corpo humano, os Cantos Mãe Coruja seriam

as células, unidades com forma e funções definidas, que, juntas, formam todo

o organismo.

O Canto Mãe Coruja monitora a gestante desde o momento em que a gravidez

é diagnosticada. Esse acompanhamento é feito por meio de cadastramento mo-

nitoramento do pré-natal, parto e pós-parto. A criança é acompanhada desde o

nascimento até os 5 anos de idade, assim como seus familiares.

Os profissionais contratados pelo Estado para atuarem nos cantos devem

realizar o cadastramento das gestantes nesse local ou, em caso de dificuldade

de deslocamento das gestantes, devem criar alternativas para o atendimento

das mesmas junto aos postos de Programa de Saúde da Família (PSF), Centros

de Referência de Assistência Social (Cras) e Instituto Agronômico de Pernam-

buco (IPA).

O Canto Mãe Coruja é mais que um espaço físico. Ele é, sobretudo, as pes-

soas que trabalham lá. Os profissionais do Canto são selecionados e contra-

tados pelo Estado para atuarem nos municípios beneficiados pelo programa.

Seu trabalho consiste em cadastrar e monitorar as gestantes identificadas por

eles mesmos ou pelo PSF, articulando, no território do município, as ações das

diversas secretarias estaduais e municipais que participam do programa, po-

tencializando os diversos instrumentos governamentais e da sociedade orga-

nizada que trabalham na promoção da melhoria das condições de vida das

gestantes, crianças e seus familiares.

Logo os Cantos se

espalharam por

outras cidades

pernambucanas

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Um olhar histórico e afetivo | 47

Uma importante estratégia de disseminação do conhecimento e de for-

talecimento dos laços afetivos entre as equipes dos Cantos Mãe Coruja, as

participantes do programa e suas famílias são os Círculos de Educação e

Cultura. Nos Círculos, através de um processo interativo, são realizadas

ações de fortalecimento e empoderamento das mulheres, com a finalidade

de construir um conhecimento sobre o mundo que circunda os indivíduos

e suas relações.

Todo esse trabalho educativo leva ao fortalecimento dos laços familiares,

proporcionando às crianças nascidas das gestantes atendidas pelo programa

um lar mais acolhedor. No final da participação nos Círculos de Educação e

Cultura, cada participante recebe um certificado contendo a carga horária vi-

venciada e os conteúdos abordados.

Parcerias

Existe uma lógica própria na organização do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana que é descentralizada e com capilaridade, formando uma rede interse-

torial e integrada. Cada Canto estabelece parcerias ou encontra soluções para

os problemas de acordo com as necessidades e com as peculiaridades dos mu-

nicípios. Para isso, existem modelos e fluxos de informações que estimulam a

troca de experiências, mas não há fórmulas prontas.

A gestão integrada é um espaço de pactuação e monitoramento entre todos

os gestores envolvidos na gestão do programa. É constituído por:

I. Um Conselho Consultivo, formado pelos secretários e coordenado

pela pessoa designada por ato do governador;

II. Um Comitê Executivo, formado pelos representantes das secretarias

que compõem o programa, coordenado pela Secretaria de Saúde;

III. Um Comitê de Assessoramento;

IV. Onze Comitês Regionais;

V. Doze Cooodenações Regionais localizadas nas Geres e coordenadas

pelos coordenadores regionais do programa com a participação de represen-

tantes municipais da região;

VI. Cento e três Cantos Mãe Coruja localizados nos municípios do pro-

grama com dois profissionais de monitoramento e gestão do Estado, em cada

Canto trabalhando em parceria com municípios, sociedade civil, universida-

des e organizações não governamentais.

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| Mãe Coruja Pernambucana48

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Um olhar histórico e afetivo | 49

Capítulo 3

Um dia apóso outro

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| Mãe Coruja Pernambucana50

“O que vale na vida não é o ponto de partida, e sim a

caminhada. Caminhando e semeando, no fim

terás o que colher”

Cora Coralina

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Um olhar histórico e afetivo | 51

Aos poucos, o Programa Mãe Coruja Pernambucana foi ganhando o Esta-

do, em um processo de crescimento planejado, contínuo e sustentável.

Seguindo critérios técnicos, a implantação ocorreu em períodos diferen-

ciados nas 12 Geres. O primeiro a ser contemplado foi o Sertão do Araripe,

depois, o Sertão do Moxotó, em 2007 e 2008, respectivamente. Os municípios

das V e VII Geres foram atendidos em 2009; os das VI, X, XI em 2010 e os

das I, II, III,IV e XII em 2011. Dessa forma, em 2016 o Programa Mãe Coruja

Pernambucana já atuava em 103 municípios no Estado. Para contar a história

desse longo caminho, construído cotidianamente, será preciso voltar a 2007.

Logo após o lançamento em Ouricuri, com o objetivo de garantir a efetivi-

dade do Programa Mãe Coruja Pernambucana já nos primeiros meses de im-

plantação, suas ações foram operacionalizadas nos 26 municípios do Estado

que apresentavam taxas de mortalidade infantil superiores a 25 óbitos por mil

nascidos vivos. Por conta desse critério, a região do Sertão do Araripe, onde

Ouricuri está localizada, foi a primeira área contemplada.

Paralelo a isso, ainda em 2007, intensificou-se o trabalho de instituciona-

lização do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Nesse período, foram estru-

turados grupos de trabalho para desenvolver manuais e definir metodologia

de monitoramento. Também foi publicado um decreto que legalizou a forma

de adesão dos municípios ao programa, detalhando informações do cadastra-

mento das gestantes e determinando as atribuições das secretarias estaduais.

Ainda nesse período, o programa foi incorporado ao Mapa da Estratégia do

Governo, estando vinculado ao Objetivo Estratégico relativo à promoção da

cidadania. Do ponto de vista prático, isso possibilitou que outros programas já

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| Mãe Coruja Pernambucana52

em curso no Estado passassem a ter ações atreladas ao Programa Mãe Coruja

Pernambucana, tais como os Programas Leite de Todos, Nenhuma Pernambu-

cana sem Documentos e Minha Certidão.

Além de crescer internamente, o Programa Mãe Coruja Pernambucana co-

meçava a desenvolver uma de suas mais importantes características: o trabalho

em parceria. No início de 2008, objetivando solidificar e ampliar a estratégia da

construção da rede de solidariedade junto aos municípios, entidades não go-

vernamentais, instituições privadas e governo federal, foram firmados, entre o

Programa Mãe Coruja Pernambucana e essas organizações, diversos termos de

cooperação e convênios. E, para possibilitar o repasse, aos entes municipais, de

recursos estaduais voltados ao enfrentamento da mortalidade infantil, foi pro-

mulgado decreto que normatizou as transferências do Fundo Estadual de Saúde

para os Fundos Municipais criados especificamente para esse fim.

Aqui, destaca-se outro ponto muito importante e que tem um grande peso no

êxito do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Em 2008, foi iniciada a sistemáti-

ca de monitoramento regular do programa, envolvendo os coordenadores regio-

nais em reuniões realizadas nos Cantos Mãe Coruja. Desde então, são analisados,

nesses encontros mensais, a mortalidade infantil, sempre com o foco na redução

desse indicador, e o andamento das ações programadas em cada região.

Com resultados cada vez mais sólidos e ampliados e visando a tornar a polí-

tica pública de atenção às gestantes uma ação permanente no Estado, ao final de

2009, o Programa Mãe Coruja Pernambucana passou a ser regulamentado por

uma lei estadual, revogando-se o decreto de sua criação promulgado em 2007.

Em 2011, em outro passo importante dessa caminhada, foram estabelecidos

os indicadores específicos do programa, voltados para a avaliação dos resulta-

dos e andamento dos processos. Junto com isso também foi elaborado o Mapa

da Estratégia do Programa. As duas ações melhoraram significativamente a

qualidade da gestão do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Uma questão importante diz respeito aos dados dos beneficiários do pro-

grama. Inicialmente, o processo de cadastramento dos atendidos pelo Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana e o acompanhamento das ações realizadas

junto às várias instituições envolvidas eram feitos por meio de fichas, plani-

lhas eletrônicas e sistemas específicos da Secretaria de Saúde. A partir de 2011,

foi desenvolvido um sistema informatizado específico para o programa, capaz

de conferir automação às ferramentas de controle e monitoramento. Em 2012

esse sistema, chamado SIS Mãe Coruja, foi posto em operação, integrando da-

dos e todas as áreas envolvidas, substituindo as planilhas, fichas de cadastro

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Um olhar histórico e afetivo | 53

e diversos relatórios produzidos em papel. Atualmente, o sistema encontra-se

em sua segunda versão, permitindo aos gestores e coordenadores seu monito-

ramento e gestão.

No ano de 2012, o Programa Mãe Coruja Pernambucana passou a ter orça-

mento próprio. Além do simbolismo que isso representava, a medida trazia

mais autonomia e agilidade nos processos. Também, de certa forma, comple-

tava o processo de institucionalização do programa.

Atualmente presente em 103 municípios de Pernambuco, o Programa Mãe

Coruja Pernambucana envolve 206 profissionais atuando diretamente junto às

gestantes, seus filhos e familiares. Esses profissionais interagem, em tempo

real, via web, com os gestores e coordenadores regionais e estaduais, que mo-

nitoram e avaliam o andamento do programa e seus resultados. Além disso,

em 2 municípios (Recife e Ipojuca), o programa tem gestão municipal e apoio

e cooperação técnica do Estado.

Evolução da estrutura

Com a criação do programa, em 2007, parte do grupo de trabalho inicialmente

montado para a realização dos estudos, composto por servidores das secretarias

participantes, com diversas formações profissionais; entre elas: médicos, enfer-

meiros, assistentes sociais, psicólogos, nutricionistas e administradores; passou

a compor os comitês e a equipe técnica. Essa equipe, composta por 33 profissio-

Reuniões de

monitoramento

estão na essência

do programa

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| Mãe Coruja Pernambucana54

nais, dentre eles, a então primeira-dama do Estado, Renata Campos, que as-

sumiu a Coordenação Geral do Programa; passaram a se reunir semanalmente,

atuando nas demandas voltadas ao desenvolvimento das ações e à articulação

dos atores envolvidos. Ao final de 2007, com a implementação das primeiras

ações, foram agregados às equipes dez técnicos da Secretaria de Saúde.

Para atuar nos Cantos Mãe Coruja e coordenadorias regionais, foi realizada,

em 2010, uma seleção pública simplificada para contratar profissionais de ní-

vel superior nas áreas de saúde, educação e ciências sociais, com capacidade

de articulação e monitoramento das gestantes e conhecimentos em informá-

tica. No perfil dos profissionais selecionados, pode-se perceber claramente

o caráter multidisciplinar do programa. Inicialmente, 52 profissionais foram

contratados, para atender os 26 municípios prioritários.

No que tange aos recursos técnicos e materiais, o programa tem sede no

Centro de Convenções de Pernambuco. Nos municípios, o Canto Mãe Coruja é

instalado em espaços cedidos pelas Prefeituras ou pelo Instituto Agronômico

de Pernambuco, para os quais o mobiliário e equipamentos foram adquiridos

com recursos próprios do programa. Como já mencionado, seu sistema infor-

matizado específico interliga todas as áreas.

Resultados

Embora os municípios beneficiados pelo Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana tenham apresentado uma redução em suas taxas de mortalidade infan-

til mais acentuada que os demais municípios do Estado entre 2008 e 2014,

verificou-se, na avaliação de impacto, que tal redução não se deve a um efei-

to isolado do programa. Para mais detalhes sobre a avaliação de impacto, ler

a publicação específica.

Da mesma forma, a taxa de mortalidade materna foi reduzida, em média,

no mesmo período, em 14% nos municípios de aplicação do Programa Mãe

Coruja Pernambucana e em 5% em todo o Estado, de acordo com dados do

Comitê Estadual de Morte Materna. Essa redução pode indicar um possível re-

sultado do programa, porém esse indicador não foi analisado na avaliação de

impacto, sendo necessária uma avaliação mais detalhada para comprovar o

efeito isolado do programa.

A partir da implantação do programa, outros ganhos mensuráveis foram

observados: de acordo com dados da Câmara Intersetorial de Segurança Ali-

mentar e Nutricional de Pernambuco, houve redução de 34%; 14% e 26%, res-

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Um olhar histórico e afetivo | 55

pectivamente, nos percentuais de mulheres gestantes, nutrizes e crianças de

seis meses a um ano em situação de insegurança alimentar leve, moderada ou

grave. Registrou-se, também, o aumento do percentual de gestantes que são

atendidas pela rede estadual de atenção à saúde com sete ou mais consultas de

pré-natal: o quantitativo cresceu em 17%, passando para 48% das gestantes

assistidas pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana, mesmo considerando a

expansão territorial do programa.

Outro importante resultado é a ampliação da inclusão das famílias em po-

líticas sociais integrantes do programa, de acordo com a sua necessidade, que

desde 2008 vem apresentando um crescimento médio de 132%, passando para

um patamar de mais de 100 mil mulheres atendidas e mais de 50 mil crianças

acompanhadas. Esse resultado tem sido alcançado por meio do trabalho ma-

tricial e indutivo dos Cantos Mãe Coruja que, concomitantemente, identificam

e inserem as famílias ao programa, realizam o diagnóstico da situação e fazem

os encaminhamentos necessários para as secretarias envolvidas.

O fortalecimento da política de atenção primária, alavancada pela atuação

integral, intersetorial e coparticipativa do programa é outro resultado de desta-

que. A partir do Programa Mãe Coruja Pernambucana, foi firmado um número

maior de convênios com várias entidades, o que possibilitou a realização de

novos investimentos financeiros em equipamentos, estrutura física e leitos da

rede materno-infantil dos territórios atendidos.

Mais de 50 mil

crianças já foram

acompanhadas

pelo programa

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| Mãe Coruja Pernambucana56

Monitoramento

Desde a sua implantação, em outubro de 2007, as ações do Programa Mãe

Coruja Pernambucana são permanentemente acompanhadas pelo Conselho

Consultivo do Programa e pelos profissionais locais dos municípios.

Com a inclusão do programa, no início de 2008, no Mapa da Estratégia do

Estado, o Mãe Coruja passou a ser também monitorado pelo governo do Esta-

do, no escopo do Modelo Todos por Pernambuco. Nesse processo, que culmina

com reuniões semanais presididas pelo governador e organizadas em torno de

cada objetivo estratégico, a ação estratégica, chamada de Meta Prioritária, é

acompanhada, na sua realização física e financeira, por meio de indicadores

de processo.

A metodologia de monitoramento utilizada no Modelo Todos por Pernam-

buco foi agregada, no início de 2008, à sistemática de monitoramento regular

do programa, envolvendo os coordenadores regionais em reuniões mensais de

acompanhamento realizadas nos Cantos Mãe Coruja (nas diversas regionais

de saúde), envolvendo o Conselho Consultivo; os coordenadores estaduais

(membros do Comitê de Assessoramento do programa) e coordenadores re-

gionais, em nível estadual; e os profissionais dos Cantos Mãe Coruja, articula-

dores municipais e secretarias municipais, em nível regional.

Em 2011, com a oficialização de indicadores específicos do programa, as re-

uniões de monitoramento realizadas pelo Conselho Consultivo tomaram nova

dinâmica deliberativa, passando a focar também a avaliação dos resultados das

ações realizadas e utilizando a ferramenta “Sala de Situação”, que acompanha

os indicadores de forma gerencial. Também é feita a análise final da vigilância

do óbito, à luz da evitabilidade.

Os obstáculos

Uma das dificuldades na implantação do Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na foi a desigualdade observada nas diversas regiões de atuação do programa,

cada uma com problemas e especificidades que influenciavam de maneira

particular as causas da mortalidade infantil e as condições das famílias obser-

vadas, inviabilizando a construção de uma solução única, aplicável a qualquer

território. Foi preciso estudar essas regiões, uma a uma, e definir abordagens

diferentes para o combate à mortalidade e outras ações de qualidade de vida,

customizando-as para cada região.

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Um olhar histórico e afetivo | 57

Um obstáculo importante residiu nas diferenças de estruturas básicas de

atenção primária existentes nos diversos municípios. Para superar esse pro-

blema, buscou-se, por meio das parcerias com municípios, promover o com-

partilhamento dos equipamentos disponíveis em cada território, bem como

realizar convênios com organizações não governamentais e entidades de fo-

mento para alocação de recursos destinados à aquisição de equipamentos.

A escassez de profissionais locais com conhecimentos e qualificações de-

sejadas para os postos de trabalho municipais foi outro obstáculo apresentado.

A solução encontrada para esse caso foi o desenvolvimento de formação con-

tinuada, com a realização de treinamentos que foram ministrados pela coor-

denação do programa.

Por se tratar da aplicação de um programa com ações interinstitucionais

executadas de forma integrada por órgãos estaduais, municipais e instituições

não governamentais, outro obstáculo enfrentado foi a articulação dos diver-

sos atores envolvidos. Em alguns casos, por dificuldades nessa articulação, foi

necessário modificar planos de atuação para que o programa não sofresse im-

pacto na sua condução e na consecução do seu objetivo. Para minimizar esse

problema, a Coordenação Geral do programa promoveu reuniões, oficinas e

capacitações com todos os envolvidos, visando a esclarecer papéis, mobilizar,

sensibilizar e comprometer os diversos atores.

Por fim, ao ser implantado o sistema informatizado específico para o progra-

ma, observou-se que nem todos os municípios possuíam cobertura de internet

satisfatória, o que comprometia a comunicação de alguns Cantos Mãe Coruja

O programa

implementou

iniciativas

eficazes, como a

distribuição de

enxovais de bebês

para mães com,

pelo menos, sete

exames pré-natal

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| Mãe Coruja Pernambucana58

com sua coordenação. Foi preciso realizar investimentos para ampliação da in-

ternet local nos municípios em que essa comunicação era mais precária.

Conquista da cidadania

A implantação do Programa Mãe Coruja Pernambucana dá oportunidade

às mulheres gestantes submetidas a condições de vulnerabilidade e às suas

crianças o resgate do direito à cidadania, uma vez que, enquanto política pú-

blica intersetorial, levou serviços públicos a áreas até então pouco assistidas

pelo Estado, na forma de ações integradas voltadas à assistência à saúde, ao

fortalecimento das relações familiares e à segurança alimentar e nutricional

sustentável de mãe e filho. Além disso, leva o estímulo à autonomia socioe-

conômica dessas mulheres por meio do direito à documentação e da oferta de

formação e profissionalização.

O Programa Mãe Coruja Pernambucana, por meio das ações na área da

educação e na área social, possibilitou também um impacto direto na contri-

buição para a promoção da inclusão produtiva e para consolidar os direitos de

cidadania e alfabetização das gestantes e familiares. Desde 2009, foram reali-

zados mais de 500 Círculos de Educação e Cultura, consolidando processos de

alfabetização, letramento e elevação de escolaridade.

Ainda dentro desse contexto, no que tange a ações focadas em promover

a inclusão das gestantes e respectivas famílias em programas de qualificação

profissional, mais de 22 mil mulheres concluíram cursos profissionalizantes

ofertados pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana, possibilitando sua maior

inserção no mercado de trabalho. No escopo do programa, outro importante

benefício foi a emissão de registros civis para os recém-nascidos. Os registros

civis passaram a ser emitidos, a partir de 2012, por um sistema informatizado

que interligou 201 cartórios a 197 maternidades públicas em todo o Estado, de

maneira que nenhuma criança atendida pelo Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana deixou a maternidade sem a certidão de nascimento.

Iniciativas simples, mas eficazes, tais como a distribuição de mais de 100

mil enxovais de bebês, a partir da confirmação da realização de, pelo menos,

sete exames pré-natal pela gestante cadastrada, ajudaram a atrair cada vez

mais beneficiárias para o programa, ampliando seu alcance. De 2007 a 2016,

150.615 mulheres cadastradas e 101.722 crianças foram acompanhadas. Além

desse aumento da capilaridade e da expansão do número de pessoas atendi-

das, o Programa Mãe Coruja Pernambucana tem sido efetivo enquanto política

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Um olhar histórico e afetivo | 59

pública ao preparar os Cantos Mãe Coruja de modo a funcionarem como espa-

ços de acolhimento e convivência voltados para o fortalecimento dos vínculos

afetivos entre gestantes, seus filhos e sua família, ali ofertando atividades e

serviços voltados ao desenvolvimento biopsicossocial das crianças e à inclu-

são socioprodutiva dos adultos.

O aprendizado

A experiência acumulada com o sucesso na implantação e operacionalização

de um programa dessa magnitude, de tamanha cobertura geográfica, direcio-

nado a um público com tantas carências, e com um propósito tão desafiador

possibilitou algumas oportunidades de aprendizado.

Inicialmente, destaca-se a crença de todos os envolvidos no programa que

a mortalidade materna e infantil não são apenas problemas de saúde públi-

ca, para os quais soluções devam ser encontradas nos ramos da medicina, da

assistência básica ou da nutrição. Desde a sua concepção, o Programa Mãe

Coruja Pernambucana parte do princípio que existem componentes sociais,

educacionais, políticos, econômicos e até emocionais que afetam igualmente

a realidade, devendo ser igualmente considerados na formulação da política

pública, e por ela trabalhados a partir de ações concretas.

Em segundo lugar, vê ser de fundamental importância para o sucesso da

melhora da qualidade de vida, a integração de políticas públicas que estejam

sendo executadas por atores interessados na transformação da realidade, se-

O diálogo sempre

foi uma marca na

história do Mãe

Coruja

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| Mãe Coruja Pernambucana60

jam eles públicos ou não. A estratégia adotada pelo Programa Mãe Coruja Per-

nambucana, focada na articulação com esses entes e voltada para a montagem

de uma rede de solidariedade entre os programas e ações desenvolvidos por

esses atores, viabilizando a realização de convênios e alianças com municí-

pios, com organizações não governamentais, com o setor privado e com a so-

ciedade civil, possibilitou ganhos e resultados positivos no cumprimento das

metas estabelecidas.

A decisão de envolver, de forma direta, oito diferentes Secretarias de Esta-

do em todas as fases do ciclo de gestão dessa política pública (formulação do

programa, implementação de ações, monitoramento do processo e avaliação

dos resultados) mostrou-se fundamental para o êxito do Programa Mãe Coruja

Pernambucana. Essa abordagem possibilitou que fossem priorizadas também,

no escopo do programa, ações nas áreas de educação, desenvolvimento social,

direitos humanos, agricultura, trabalho e empreendedorismo, o que contri-

buiu decisivamente para o alcance dos resultados.

O programa também tem como conceito que, para gerenciar um programa

com tal amplitude, é essencial automatizar suas práticas, controles e ativida-

des por meio de uma solução de tecnologia da informação primordialmente

voltada para a disseminação, em tempo real, de informações sempre atualiza-

das entre executantes e gestores, visando a remover eventuais obstáculos na

execução das ações.

A recomendação que o Programa Mãe Coruja Pernambucana guarda para

o futuro e que compartilha com as demais entidades do Poder Público é a de

que é preciso continuar priorizando o desenvolvimento contínuo dos pro-

cessos e práticas da gestão por resultados. Essa abordagem, utilizada desde a

sua concepção, possibilita aos entes públicos a consolidação de uma cultura

de intersetorialidade, a formulação estratégica de planos de ação, a defi-

nição clara de metas e recursos para cada um dos segmentos envolvidos, a

rápida identificação de gargalos e de busca de soluções para eventuais pro-

blemas e, principalmente, a geração de valor à população com a prestação

dos serviços públicos.

O reconhecimento

Junto com os resultados veio o reconhecimento. O Programa Mãe Coruja Per-

nambucana já recebeu várias honrarias. Dois desses prêmios, em especial,

ajudam a dar a dimensão que o programa conquistou dentro e fora do Brasil.

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Um olhar histórico e afetivo | 61

O primeiro deles foi o Prêmio das Nações Unidas para o Serviço Público

(UNPSA) 2014, um dos mais prestigiados reconhecimentos internacionais

por excelência no serviço público, que reúne ações de organizações públicas

e agências de todo o mundo, em níveis nacional, estadual e municipal. Na

saudação do subsecretário-geral da ONU para Assuntos Econômicos e So-

ciais, Wu Hongbo, fica clara a importância da premiação. “Essas instituições

vencedoras demonstram os princípios que apoiam uma governança transpa-

rente, responsável e colaborativa. Elas têm explorado novos caminhos para

melhorar o papel da governança participativa e responsável para o desenvol-

vimento sustentável.”

O outro reconhecimento internacional que precisa ser destacado foi o Prê-

mio Interamericano de Inovação para a Gestão Pública Efetiva – na catego-

ria Qualidade de Políticas Públicas, concedido pela Organização dos Estados

Americanos (OEA), em 2015. O prêmio da OEA tem como objetivo identificar

iniciativas inovadoras em gestão pública, realizadas por diversas instituições

públicas da América Latina, que sejam identificadas como iniciativas úteis e

que possam ser replicadas em outros lugares.

Na oportunidade, o Programa Mãe Coruja Pernambucana foi avaliado pe-

los critérios de originalidade; impacto ao cidadão; replicabilidade; eficácia;

O governador

Paulo Câmara

recebeu o Prêmio

Interamericano

de Inovação

para a Gestão

Pública Efetiva

conquistado

pelo Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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| Mãe Coruja Pernambucana62

eficiência; complexibilidade da solução de problemas; sustentabilidade da

experiência; e perspectiva de gênero. Ao todo, foram 74 candidaturas, repre-

sentando instituições públicas de todos os níveis administrativos de 13 países

membros da OEA.

O Prêmio Zilda Arns, concedido pela Pastoral da Criança em Pernambuco

ao Programa Mãe Coruja Pernambucana, também merece destaque. O prêmio,

entregue em abril de 2011, reconheceu o trabalho realizado por entidades, pro-

gramas ou ações que se destacaram em favor da vida, do cuidado com crian-

ças, jovens e adultos, que se preocupam com a cidadania - mesma missão da

Pastoral da Criança, criada pela médica e sanitarista Zilda Arns.

Um olhar para o futuro

Em um país onde é comum novos governos abandonarem projetos criados pe-

los antecessores, a perenidade do Programa Mãe Coruja Pernambucana come-

çou a ser garantida em 15 de dezembro de 2009, quando o então governador

de Pernambuco, Eduardo Campos, sancionou a Lei nº 13.959. A medida, na

prática, fez com que o Programa Mãe Coruja Pernambucana deixasse de ser

um programa de uma gestão para se transformar em política de Estado.

O governador

Paulo Câmara

considera o

Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

como uma das

prioridades da

sua gestão

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Um olhar histórico e afetivo | 63

Reforçando esse conceito, o governador Paulo Câmara, que assumiu o go-

verno de Pernambuco em janeiro de 2015, assegurou uma rubrica orçamentá-

ria em cada uma das secretarias estaduais com participação no Programa Mãe

Coruja Pernambucana. Além disso, em 2016, Paulo Câmara implementou o

orçamento impositivo, assegurando as ações do programa em Pernambuco,

mesmo em um momento de grave crise socioeconômica que assolava o país.

Dessa forma, o governo do Estado reafirmou seu compromisso de tratar com

prioridade as crianças, como assegura a Constituição Federal de 1988. Na ver-

dade, quem acompanha desde o começo e conhece a fundo o Programa Mãe

Coruja Pernambucana costuma falar que ele vive um “eterno recomeço”. Em

outras palavras, o programa está em permanente círculo virtuoso de avaliação,

reflexão, aprendizado e aperfeiçoamento. Por isso, os próximos passos já vêm

sendo planejados.

Em quase uma década de existência, o programa começou focado na mu-

lher grávida. Depois, passou a atender a mulher como um todo e, agora, o de-

safio será cuidar da família como um todo. O próximo passo, que já está sendo

preparado, será acompanhar a criança e a família, respeitando a sua cultura

(no sentido antropológico). Nesse sentido, além dos três eixos iniciais (saúde,

educação e desenvolvimento social), o programa também irá focar na cultura,

no esporte e no lazer.

Um ponto forte do Programa Mãe Coruja Pernambucana sempre foi o efi-

ciente monitoramento de suas ações e processos. Por isso, os indicadores

têm grande importância. Desde o início, ainda mesmo na sua fase de diag-

nóstico de planejamento, foram usados os indicadores básicos (mais de 20

indicadores dentro dos eixos de saúde, educação e desenvolvimento social).

Agora, com as novas etapas e objetivos que se desenham, o programa tam-

bém começa a trabalhar na elaboração de seus próprios indicadores. No caso,

seriam construídos indicadores que ajudem no monitoramento, controle e

aperfeiçoamento de aspectos muito peculiares e originais do programa. Tra-

ta-se, como tem sido uma de suas marcas, de uma ideia ousada. Trata-se

de um indicador para medir, por exemplo, “grandezas” como o sentimento

de pertencimento das pessoas em relação ao programa. Apesar da aparente

subjetividade, a elaboração desse indicador de processos e grandezas está

sendo tratada de forma científica.

Os desafios que se apresentam para o Programa Mãe Coruja Pernambucana

são grandes. Assim, ele segue na constante busca pelo aperfeiçoamento, so-

nhando com o dia em que não precise mais existir.

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| Mãe Coruja Pernambucana64

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Um olhar histórico e afetivo | 65

“... E não há melhor resposta que o espetáculo da vida”

João Cabral de Melo NetoMorte e Vida Severina

Uma vida menosseverina

Serra da Ladeira, chapada do

Araripe, julho de 2016. Quase

dez anos depois da primeira

visita, uma equipe do Programa

Mãe Coruja Pernambucana chega

ao aglomerado de cerca de 20

casas dispersas, localizado na zona

rural de Ipubi, a 685 km do Recife.

No quintal onde antes havia um

cemitério clandestino, agora, existe

uma roça que ajuda na subsistência

dos moradores do local. Desde

que aquela foto com as covas dos

“anjinhos” foi tirada, no já distante

ano de 2007, muita coisa mudou por

lá. O mais importante é que mais

nenhum bebê morreu.

As crianças que, na foto, brincavam

em torno das sepulturas cresceram

e, uma delas, Cláudia, acaba de

ter um filhinho. Sua gravidez foi

acompanhada pela equipe do

Programa Mãe Coruja Pernambucana.

A outra, Jaqueline, que, na época,

estava com 9 anos, ganhou mais dois

irmãos: Janiele, hoje com 6 anos, e

João Miguel, com 2 anos. Junto com

a mãe, Maria Cleonice, as crianças

foram assistidas de perto pelo

programa. Já no fim da visita, Maria

Cleonice recebeu de presente a foto

com Jaqueline ainda pequena. Sorriu,

surpresa, agradeceu com educação e

guardou aquela inesperada lembrança

de um tempo difícil, que ela espera

que não volte mais.

Julho de 2016: a

esperança tomou o

lugar do cemitério

clandestino na

Serra da Ladeira

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| Mãe Coruja Pernambucana66

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Parte 2

Um olhar afetivo

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| Mãe Coruja Pernambucana68

Janimeire

“É o sonho de consumo de toda mãe chegar em uma maternidade e ter seu filho com dignidade, sendo bem atendida. Por isso, acredito muito no Mãe Coruja”.

Um caminho cheio de vida e esperança

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Foto: Leônia Carvalho

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| Mãe Coruja Pernambucana70

Onome do lugar não poderia ser mais apropriado. Quis o acaso que, na peque-

na comunidade de Boa Esperança, situada às margens da PE-585, no meio

do caminho entre Exu (PE) e Crato (CE), começasse efetivamente a exitosa

caminhada do projeto que ajudou a melhorar a vida de milhares de pessoas

em Pernambuco. No isolado e pacato aglomerado de casas, a 36 km da sede do

munícipio, morava (e ainda mora) Janimeire Bacurau. No dia 30 de novembro de

2007, ela deu à luz Gabriele Vitória, tornando-se a primeira das mais de 150 mil

mães atendidas até hoje pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana.

A “relação”, que já dura quase dez anos, começou por acaso. A primeira vez

que Janemeire, uma sertaneja nascida e criada no coração da Chapada do Ara-

ripe, ouviu falar do Programa Mãe Coruja Pernambucana nem sabia que estava

grávida. Como era presidente da Associação de Moradores da Comunidade da Boa

Esperança, ela foi convidada para participar de um seminário sobre o programa,

que começava a ser desenhado naqueles primeiros meses de 2007. Gostou do

Comunidade da

Boa Esperança,

em Exú

Foto: Leônia Carvalho

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Um olhar histórico e afetivo | 71

que ouviu, achou tudo muito interessante

e torceu para que todas aquelas ideias vi-

rassem realidade. Nem de longe imaginava

que teria um papel importante na história

que começava a ser construída.

Dois meses depois, já com a barriga co-

meçando a aparecer, um encontro casual

a aproximou definitivamente do progra-

ma. Anoitecia quando dois participantes

da equipe do programa, que aproveitavam

o momento de folga para uma longa ca-

minhada de Exu ao Crato, cruzaram com

Janimeire. Conversa vai, conversa vem,

hospitaleira, ela convidou os dois para per-

noitarem em sua casa. Foi a segunda vez

que ouviu falar do projeto que estava sendo construído com o objetivo de acabar

com a mortalidade materno-infantil em Pernambuco. A essa altura, já estava en-

cantada com a ideia.

Na terceira vez que ouviu falar do Programa Mãe Coruja Pernambucana, cerca

de 15 dias depois, já foi para se cadastrar e ter sua gravidez acompanhada de per-

to. Fez os exames pré-natais necessários, participou das atividades promovidas.

Como já tinha uma filha, na época Jordana estava com 8 anos, pôde comparar

como é uma gestação assistida com uma não assistida. “A diferença é grande, me

senti muito mais segura.”

No final de novembro de 2007, a vida de Janimeire seguia seu curso normal.

Aos 33 anos de idade, a professora dedicada dava aulas na escola Henrique Por-

fírio, cuidava da filha Jordana (na época com 9 anos), do marido Paulo Henri-

que e da roça que mantinha em Boa Esperança. Ainda preparava o enxoval para

Gabriele, que deveria nascer em janeiro de 2008, quando um imprevisto e uma

coincidência aceleraram as coisas e mudaram seu destino.

O imprevisto aconteceu no dia 29 de novembro. Sem mais nem menos, sua

bolsa rompeu e Janimeire foi imediatamente para Exu. Ao chegar à maternidade,

soube que não tinha como ser atendida por lá. Não teve dúvidas e correu para

Salgueiro, que fica a cerca de 100 km de distância. O caso era mais complicado do

que se pensava. Foi aí que veio a coincidência.

Na reta final de implantação em Exu, todo o estafe do Programa Mãe Coruja

Pernambucana tinha ido do Recife e estava reunido na cidade para um Encontro

Gabriele continuou sendo atendida pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana até os 6 anos de idade

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| Mãe Coruja Pernambucana72

de Sensibilização. No meio da reunião, ficaram sabendo do caso de Janimeire e

começou, então, a mobilização. Várias pessoas envolvidas, agindo de forma co-

ordenada e fazendo acontecer. Foi o primeiro exercício de cuidado com muitas

articulações. Sem saber, estavam inaugurando o espírito que permearia o progra-

ma nos anos seguintes.

Com a articulação do Programa Mãe Coruja Pernambucana, Janimeire foi

transferida para o Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira

(Imip), no Recife. No dia 30 de novembro de 2007, nascia Gabriele Vitória, o pri-

meiro bebê nascido com o acompanhamento do programa. “Se não fosse o Mãe

Coruja, teria morrido mãe e filha”, lembra ela emocionada.

Janimeire faz questão de contar como foi bem atendida no Imip. “É o sonho de

consumo de toda mãe chegar em uma maternidade e ter seu filho com dignidade,

sendo bem atendida. Por isso, acredito muito no Mãe Coruja.”

Gabriele continuou sendo acompanhada pelo programa até os 6 anos de idade.

Isso, formalmente, porque, segundo a mãe, informalmente, continua até hoje. “O

nosso vínculo com o Mãe Coruja ficou para sempre.”

Janimeire, ao lado

da filha, teve todo

o apoio do marido,

Paulo Henrique,

durante a gravidez

Janimeire ao lado

das filhas: uma

família feliz

Foto: Leônia Carvalho

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Foto: Leônia Carvalho

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Gerci

“No Canto, a mãe pode contar com qualquer outra mãe. Uma vai ajudando a outra, contando suas histórias”

Quando o amor vence a dor

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| Mãe Coruja Pernambucana76

Um rio, uma tragédia agosteira, uma

dor infinita e um acolhimento com

jeito de “colo de mãe”. Juntos, es-

ses elementos sintetizam a história

de superação da alagoana Gerci Gomes

da Silva, hoje com35 anos, moradora de

Xexéu, município pobre da região deno-

minada Mata Sul de Pernambuco, na di-

visa com Alagoas. O local tem o pior IDH

da região, de apenas 0,552.

O rio, grande divisor de águas e, nesse

caso, da vida de Gerci, é o também ala-

goano Jacuípe, que alcança dois muni-

cípios de Pernambuco e, em 2006, pas-

sava ao lado do quintal da casa em que

Gerci morava, na parte baixa do distrito

de Campos Frios, a 15 km do Canto Mãe

Coruja de Xexéu. Era mês de agosto, no

domingo em que comemorava o Dia dos

Pais, quando ela viveu a maior tragédia

da sua vida. Gean, então com 3 anos de

idade, caçula de três filhos, brincava com

mais um menino e duas meninas quan-

do “saiu pra trás do quintal” nas palavras

da mãe. De lá, só voltou carregado por

Gerci, já morto. O menino havia se afo-

gado naquelas águas, que eram fundas.

O corpo foi achado pela irmã mais velha,

Jéssica, então com 8 anos, que saíra à procura do garoto junto com a mãe. “Ele

ainda deu o último suspiro”, recorda a garota, hoje com 18 anos.

Naquele domingo, também ficava para trás uma Gerci sorridente e surgia

uma mãe incompleta, extremamente triste e com uma ferida “que nunca ci-

catriza”. “Foi o mesmo que arrancar uma parte de mim. Pensava em parar e

desistir.” No mesmo dia, chegou a colocar veneno contra rato na boca, mas

cuspiu depois que veio à mente a lembrança dos outros dois filhos. Desnortea-

da, no dia seguinte, pulou o muro do cemitério em que o filho estava enterrado,

pois queria “dar de mamar” ao garoto.

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A perda do filho, acredita, havia sido vislumbrada em sonho. Ela recorda

que, tempos antes do afogamento, teve um sonho em que tirava o filho de den-

tro do rio. Gerci acredita mesmo em revelações durante o sonho; tanto que,

cincos meses após a morte do filho, foi a um ginecologista acreditando estar

grávida porque sonhara com Gean avisando que ela estava esperando outra

criança. O médico refutou a ideia porque, lembra, estava menstruada, mas a

certeza era tanta que o marido, Geovani, o Galego, como o chama, “tirou o di-

nheiro da feira” para que pudesse realizar uma ultrassonografia. Sim, estava

grávida e, sete meses mais tarde, nascia João Gabriel, hoje com 7 anos.

Rio Jacuípe, que

mudou a vida de

Gerci e sua família

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O nascimento do quarto filho não reanimou Gerci. Além do pequeno Gean,

perdera uma grande amiga e o próprio pai. Sua vida não tinha sido fácil até

ali. Segunda de oito filhos de uma família de baixa renda, se mudou de Mu-

rici, em Alagoas, para Xexéu no início da adolescência. Assim como mais de

32% da população xexeuense, era analfabeta e, em um ato de rebeldia, fugiu de

casa aos 16 anos com o namorado que conhecera havia apenas um mês e que

era cortador de cana, a principal atividade econômica da região. Teve Jessica e

Edinaldo Luiz e precisou trabalhar como empregada doméstica. Separou-se,

casou com Galego e veio a tragédia.

“Pensava em desistir...”, repete, “de tudo. De marido, de filhos, da vida”. O

marido tentou, por inúmeras vezes, convencê-la a ir a um médico, buscar tra-

tamento contra depressão. Mas ela retrucava, com o desânimo instalado: “Por

que procurar um remédio se quero morrer?”

O rio que levou o filho voltou a entrar na vida da família de Gerci de forma

também devastadora. Na cheia que se abateu sobre a região da Mata Sul, em

2010, o local em que morava, na parte baixa de Campos Frios, distrito rural do

município onde se concentra quase 35% da população de pouco mais de 14 mil

moradores, foi atingido. A água chegou a mais de meio metro dentro do vão,

uma espécie de garagem nos fundos do imóvel.

Em meio a esse cenário e à dor infinita, Gerci engravidou pela quinta vez.

Aos quatro meses de gestação, resolveu aceitar o convite de uma amiga que

tinha filho e ir visitar o Canto Mãe Coruja instalado na subprefeitura do distri-

to rural, na parte baixa de Campos Frios. Define o convite como algo divino:

“Foi uma coisa de Deus”. A crença não é à toa: “Tava em tempo de querer me

matar”, recorda.

Ela não sabe precisar quantas foram as idas ao espaço, mas sabe que, lá,

encontrou acolhimento. Não define com essa palavra; prefere outra: Paz. “Foi

aí que encontrei um pouco de paz”, conta. No Canto Mãe Coruja, ela costumava

desabafar junto às coordenadoras do espaço: “Elas não são psicólogas, mas era

como se fossem. Eu desabafava, conversava”.

De mais particular, a conversa foi se ampliando. Passou a participar dos

chamados Círculos de Educação e Cultura, nos quais as mães trocam experi-

ências entre si, contam suas histórias e, principalmente, recebem orientações.

No Canto Mãe Coruja de Campos Frios, há círculos regularmente. Ao todo, no

município, há mais de 900 mães cadastradas. Xexéu integra uma Regional de

Saúde do Estado, a terceira, que congrega 22 municípios da Mata Sul e contabi-

liza mais de 12 mil participantes do programa.

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Um olhar histórico e afetivo | 79

Foi participando do programa que Gerci, aos poucos, superou sua tragédia pessoal

À entrada do Canto Mãe Coruja, no

bairro de Nova Xexéu, a frase da escri-

tora francesa Simone de Beauvoir é um

chamamento. Pintada com cuidado na

parede, diz: “Não se nasce mulher; tor-

na-se mulher”. Gerci acredita. “Lá, en-

contrei tudo o que não encontrei na mi-

nha família”, desabafa, explicando que

as participantes do projeto, o qual cha-

ma de “Mamãe” Coruja, a ajudaram a se

manter erguida e, principalmente, viva.

“As pessoas de lá me tiraram do fundo

do poço”, sintetiza. “No Canto, a mãe pode contar com qualquer uma outra

mãe; uma vai ajudando a outra, contando suas histórias”, reforça Elizângela

Batista, de 38 anos, uma das coordenadoras do Canto.

O trabalho do Canto Mãe Coruja é o de fazer um apelo diário pelas ruas de

Xexéu, nem sempre pavimentadas. “As coordenadoras saem chamando, res-

gatando as mães de suas casas. São reuniões, atividades, festas de crianças”,

conta Gerci. Em Campos Frios, essas convocações contam com a ajuda dos

agentes de saúde – inicialmente, Pedro e, depois, Vânia.

Sara nasceu em

2012 e mudou a

vida de Gerci

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Foi conversando e participando das atividades que Gerci, aos

poucos, semana a semana, ano a ano, escalou o tal poço e, mais

tranquila, teve Sara, em 2012. A saudável e bonita menina, hoje

com 4 anos, só se alimenta do leite da mãe.

“Ela não veio para substituir Gean, mas para preencher um va-

zio”, afirma. Durante toda a gestação, Gerci não deixou de com-

parecer ao Canto, tampouco ao ginecologista. Como define o pro-

grama, com as sete visitas confirmadas ao médico, ganhou o kit do

bebê. Chegaram a ser entregues 71 kits em Xexéu.

Na casa onde hoje mora a família, na parte alta do distrito, rece-

bida após a devastação das águas do rio Jacuípe, a foto de Gean está

em uma das paredes da sala. Na parede vizinha, outras imagens

formam um painel com registros de todos os filhos e de sorrisos

estampados nos rostos. Nas portas que dão acesso aos dois quartos

e ao banheiro, há enfeites de flores e palhaços feitos pelas mãos

maternas. O artesanato foi fruto de um curso realizado no Canto

Mãe Coruja. Além disso, ela fez curso de ornamentação de festas

e, em 2015, realizou mais um voltado para o empreendedorismo.

“Aprendi mais sobre lucro, comissão”, conta.

Hoje, mais sorridente, Gerci faz planos e sonha também acor-

dada. Um sonho mais alicerçado após as aulas de empreendedo-

rismo. Deseja revender roupas. “Quero ter condições de trabalho

para sustentar os quatro filhos e não depender de ninguém”, afir-

ma, confiante. O dinheiro almejado viria a ajudar o pouco que o

marido recebe atualmente vendendo botijões de gás. Galego ga-

nha cerca de 150 reais por semana e engorda a triste estatística de

Xexéu que aponta que mais de 30% da população recebe só, men-

salmente, até um quarto de salário mínimo.

Gerci espera reverter esse quadro financeiro familiar, sim,

mas já se sente mais feliz. “O que importa não é dinheiro, car-

ro. É a paz, a alegria. Ter paz e alegria para passar pros outros”,

ensina. Uma paz anunciada já na entrada da pequena casa, no

árido conjunto no topo do distrito: um pé de capim-santo coloca

um pouco de verde na paisagem. Nesse cenário idealizado por

ela, a evangélica da Assembleia Ministérios de Madureira costu-

ma entoar louvores durante o dia enquanto arruma a casa e cuida

dos filhos. Tem por hábito louvar junto com Sara, que já aprendeu

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algumas letras. Quando vai ao “Mamãe Coruja”, também leva a menina, que

brinca de desenhar e pintar.

A mudança no semblante da alagoana é observada e sentida por toda a

família. “Antes de ela ir ao Canto, ela gritava muito em casa”, lembra, sorrin-

do, a primogênita Jessica. Apesar de, até a entrevista para este texto, nunca

haver acompanhado a esposa ao espaço, Galego é só incentivo. Com poucas

palavras, resume: “Ela ficou melhor, mais calma. Gostei”. E, principalmente,

Gerci tem gostado. Tanto que o principal sonho dela é transmitir sua história

de superação para que possa ajudar outras pessoas que, como ela, tiveram à

frente apenas um “fundo do poço”. Pronto, Gerci, sonho realizado. Seu de-

poimento está aqui. Gravado.

Gerci com as

filhas, Sara e

Jessica, e o marido,

Galego

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Marluce

“O Mãe Coruja foi meu pé e minha mão. Ajudou a procurar os vários médicos; conversou comigo, orientou...”

Paciência quenasce do amorao filho

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| Mãe Coruja Pernambucana84

“Meu filho me ensinou a ter paciência”. Muitas mães devem pensar

como a pernambucana Marluce Maria da Silva. A agitada more-

na magrinha que hoje prega paciência parece exalar vigor a cada

gesto e, em seus 34 anos de vida, não imaginou que teria, sim, que

imprimir mais calma à sua vida por causa de Ênio. Hoje com 5 anos, o me-

nino foi diagnosticado com autismo aos 3 e, desde então, Marluce deixou o

trabalho de vendedora ambulante de DVDs para se dedicar exclusivamente

ao “ofício” de mãe, na cidade de Macaparana, na zona da Mata Norte de Per-

nambuco, distante 84 km da capital do Estado.

O novo ofício de Marluce, que estudou até o segundo ano do ensino médio,

é praticamente sem trégua. Marluce fica atenta o tempo todo ao filho quando

ele está em casa – pela manhã o garoto vai à escola. “É preciso ficar mais alerta;

fazendo uma coisa e de ouvido atento a ele”, conta ela, emendando: “Quando o

filho é sem problema, a gente relaxa mais”. O transtorno de desenvolvimento,

Marluce mora

com a família

no município de

Macaparana

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que se apresenta principalmente

com a dificuldade de socialização

e de linguagem, exige mais dela e,

principalmente, imprimiu ainda

mais o amor materno.

Marluce é toda amor quando

fala do filho: “Quando me per-

guntam se o autismo mudou o

que sinto por ele, respondo que

sim; meu amor por ele aumentou

mais”, afirma, categórica, sempre

gesticulando e passando a mão

pelo cabelo preso em um rabo de

cavalo. “Ele é tudo na minha vida;

amo com todo o coração.” E, de

amor, ela parece entender. Apai-

xonada e grávida após quatro me-

ses de namoro com o Ênio “pai”,

saiu de Itambé, também na zona

norte, para se casar e viver com

ele em Macaparana.

Em Macaparana, já grávida

de Ênio, Marluce vendia DVDs

de filme e música na calçada diante da oficina do sogro, seu Zé Pequeno,

onde o marido trabalha com o pai, no centro da cidade. Começou atuando

como camelô apenas aos sábados, depois, passou a vender de segunda a

sábado, 12 horas diárias, das 5h às 17h. Com o bebê recém-nascido, parou

com as vendas até o menino ter um ano; depois, retornou. Mas precisou

parar de vez para se dedicar ao filho. Ágil, gostava – e até tem saudade – do

comércio na cidade, que tem a economia fincada principalmente nos pés de

cana-de-açúcar e de banana.

Também no centro macaparense, não tardou a bater na porta do Canto

Mãe Coruja, uma simpática casa de largas janelas e pisos de ladrilhos colo-

ridos localizada em uma das avenidas principais, para acompanhamento e

orientação na gestação. Mensalmente, ia ao médico e ao Canto, onde ganhou

o kit dado às mulheres que comparecem pelo menos a sete visitas ao gineco-

logista durante a gestação.

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Marluce conta que a gravidez foi tranquila, mas, quando lembra do parto,

não pode dizer o mesmo. Começou a ter contração na madrugada da Quar-

ta-feira de Cinzas, em 2011, e precisou se dirigir a Goiana, município polo

da Mata Norte e sede da XII Geres, que compreende dez municípios e uma

população de mais de 311 mil habitantes. Sem a dilatação necessária, só teve

a criança no fim da tarde do dia seguinte em uma cesariana.

De início, Marluce não lembra de haver notado nada de diferente no fi-

lho, primeiro e único. “Ele andava, brincava, falava e comia de tudo”, afir-

ma, resumindo: “Tranquilo como toda criança”. Ela reparou os primeiros

sinais do transtorno quando ele estava com 2 anos: “Ele foi parando de falar,

se afastando da gente”. Viu o filho mudar o comportamento, mas pensou

ser apenas uma fase, até que a cunhada, Vivaldina, vizinha de casa, leu, por

acaso, na carteira de vacinas do menino, anotadas características do autis-

mo e mostrou para Marluce. “Não sabia desse problema”, diz, recordan-

do o dia em que percebeu, entre as letras, sinais que viraram tão próprios

do filho, a única criança até hoje no Programa Mãe Coruja Pernambucana

de Macaparana diagnosticada com o transtorno. Ano passado, o programa

acompanhou 335 gestações no município de quase 24 mil moradores.

Preocupada, Marluce procurou o Núcleo de Apoio à Saúde da Família

(Nasf) e se voltou ainda mais para o Canto Mãe Coruja, que a direcionou

para todos os profissionais da área de saúde necessários para o diagnós-

tico do autismo (foi ao pediatra, psicólogo, fonoaudiólogo e neurologis-

ta). “O Mãe Coruja foi meu pé e minha mão. Ajudou a procurar os vários

médicos; conversou comigo, orientou... Queria saber como lidar com essa

nova situação”, afirma Marluce, que,

a partir dali, parou com o trabalho de

vendedora ambulante. E Ênio, aos 3

anos, teve o diagnóstico finalizado:

sim, possui autismo. Além da difi-

culdade em se socializar e se comu-

nicar, o autista costuma ter alto grau

de irritabilidade, déficit cognitivo,

dificuldade de concentração e baixa

tolerância à frustração. O menino tem

muitas dessas características, além de

um problema intestinal que também é

comum em pessoas autistas.

O Canto Mãe Coruja a direcionou para os profissionais necessários ao diagnóstico do autismo

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Marluce conta que a brincadeira predileta de Ênio é organizar objetos, po-

dem ser carrinhos de brinquedo, frascos de desodorante ou de perfume – cos-

tuma fazer filas com esses itens. “Deixar tudo em ordem”, define a mãe. Tam-

bém gosta de assistir a DVDs de música. Se gosta de uma cena, para o disco e

volta para revê-la várias vezes. Marluce e “Mô”, como chama o marido, não

poupam esforços para fazer o filho feliz. Na casa em que moram, no topo de

uma ladeira alta e íngreme de Macaparana, podem ser vistas capas de DVDs

espalhadas pelo sofá, pelo rack, pelo chão da sala e do quarto onde Ênio dorme

com os pais. O menino tem seu próprio quarto, mas a mãe, por causa da “rata-

ria” que circula por um terreno baldio próximo, preferiu, por segurança, deixar

o filho junto de si. Os planos são de uma nova casa, que será alugada em breve.

A família também possui notebook “com gavetinha” onde Ênio coloca e tira os

DVDs que deseja ver.

Marluce e Ênio

Júnior continuam

recebendo todo o

apoio do programa

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A chegada de Ênio

Júnior uniu ainda

mais a família

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Ênio também gosta de dançar e costuma “quando quer, chamar a mãe para

bailar”. Com “painho”, como o chama, a brincadeira é ficar sobre suas costas,

na cama, pulando “de cavalinho”. Mas nem sempre o menino está tranquilo;

por vezes, há crises de choro que levam Marluce a buscar entendimento e ajuda

de psicólogos – no dia da entrevista, por exemplo, ela havia ido ao Canto relatar

e procurar conselho da psicóloga Mariza Coutinho de Farias, uma das técnicas

de monitoramento do programa no município.

O autismo, porém, não afastou Ênio da escola. No recreio, costuma se di-

vertir – sorrindo sozinho – ao observar os coleguinhas brincando. No ano de

2016, ele completa a alfabetização no Centro Educacional Mariano Cavalcanti,

uma pequena escola particular onde estuda pela manhã e cuja mensalidade

é paga pelos pais. “No Canto, me ensinaram como conseguir os benefícios a

que Ênio tem direito”, explica Marluce, cuja rotina de médicos com o filho é

intensa. A cada 15 dias, vai com ele a um especialista — psicólogo, psiquiatra,

fonoaudiólogo ou gastroenterologista.

A ex-camelô vai costumeiramente ao Canto Mãe Coruja, onde também re-

cebe ajuda prática – outra técnica do Canto, a economista doméstica Amanda

Cavalcanti, por exemplo, é quem costuma trazer do Recife o remédio mani-

pulado que Ênio usa para o problema no intestino, a pedido de Marluce –e,

claro, acolhimento para o cotidiano desafiador. Um desses desafios foi a festa

de aniversário de 5 anos do filho. De início insegura, Marluce foi em frente e, na

calçada lateral da residência, espalhou mesas enfeitadas com motivos automo-

bilísticos e comemorou os 5 anos de Ênio junto a cerca de 30 convidados, entre

parentes, amigos da família, colegas da escola e a professora, Franciele. Sim,

porque outra paixão do menino são os carros. Na escola, a garotada já sabe:

quando alguém leva um carrinho já entrega para Ênio. E, em casa, ele não se

furta a um passeio de automóvel – muitas vezes, o pai o leva no carro do avô

pelas ladeiras da cidade.

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Cida

“Minha mãe sempre dava conselho dizendo: ‘Filha, é bom trabalhar para você’. Por isso, quero trabalhar e renovar mais. Fazer cursos para aprender mais”

Enfeites para dar ânimo e renda

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Vende-se picolé. A placa, afixada no gradil do terraço, já mostra aos tran-

seuntes que, naquela casa laranja claro, no alto de uma ladeira e em frente

a um bananal, é mais que uma simples residência. Informal, o comércio

impera no imóvel, que também abriga a produção da pernambucana Cida

Marques. Aos 32 anos, a mãe de Leonardo, 11 anos, e Lauany, 4, desde 2015 cria

e comercializa enfeites de festa feitos com emborrachado (EVA), na cidade de

Macaparana, município da zona da Mata Norte de Pernambuco.

A força empreendedora tem genética e endereço certos. A genética veio da

mãe, Maria Dolores Ferreira, de 67 anos, a dona da casa que, desde os 9 anos,

começou a trabalhar. Foi canavieira e também teve banca na feira da cidade, a

84 km do Recife. Precisou criar a filha, Cida, sozinha. O marido, como conta,

foi embora quando a menina tinha 9 anos. Hoje aposentada, Maria Dolores faz

da casa uma espécie de loja de guloseimas – na sala, estão expostos para venda

pipoca, chiclete, doce de leite e paçoca.

Cida com a filha

Lauany

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“Minha mãe sempre dava conselho dizendo ‘Filha, é bom tra-

balhar para você’”, atesta Cida, que se viu dando os primeiros pas-

sos do empreendedorismo a partir do Canto Mãe Coruja, localizado

no centro de Macaparana, o tal endereço já citado. Cida começou a

frequentar o Canto quando engravidou de Lauany: “Ia sempre que

podia”. A gestação foi tranquila, assim como o parto, que foi nor-

mal. Como o programa acompanha mães e filhos até os 5 anos, Cida

seguiu frequentando o espaço, que também incentiva a educação e

a geração de renda, visando a melhorar a qualidade de vida da fa-

mília. Logo ela tratou de aprender a ler e a escrever, no programa de

Educação de Jovens e Adultos. Depois, passou a frequentar os cursos

promovidos no Canto Mãe Coruja. Participou de todos os cursos pro-

movidos no espaço desde 2010. As aulas, oferecidas pela Secretaria

de Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação, são profissio-

nalizantes para as mulheres do município, que têm, nas plantações

de cana-de-açúcar e de banana, sua principal fonte de renda.

Um dos cursos realizados por Cida foi o Cozinha Brasil, que reu-

niu 86 mulheres em 2014. O curso tem como proposta a alimenta-

ção saudável por meio do reaproveitamento de alimentos e da utili-

zação de produtos da terra, de baixo custo, para promover também a

geração de renda. “Foi muito bom, viu?!”, lembra, com uma expres-

são bem típica dos moradores da região e que costuma repetir. Mas

foi a Oficina de Construção de Brinquedos com Material Reciclável,

dada em 2015, que fez emergir a arte e a força de empreendedo-

ra daquela Cida que, quando criança e

adolescente, brincava de fazer patinhos

com o barro comprado na feira da vi-

zinha Timbaúba. Com emborrachados

à mão, transformou, junto com as 18

colegas do curso, latinhas de cerveja

em bonecos com bracinhos, e caixas

de sapato em vaquinhas. “Senti que ali

era a minha praia, meu foco”, lembra a

expansiva Cida. As aulas, que duraram

60 horas distribuídas em cerca de dois

meses, aconteciam no Canto três dias

na semana, à tarde, das 13h às 16h.

Aos 32 anos, a mãe de Leonardo e Lauany cria e comercializa enfeites festivos

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O curso foi o estopim para que a Cida, sempre sorridente e expansiva, to-

masse a frente para ganhar o próprio dinheiro. Não que ela nunca tivesse tra-

balhado – foi empregada doméstica por um cerca de um ano e meio. Depois

das aulas, ficou para trás uma Cida que se definia como uma “pessoa desligada,

que ficava só em casa...”. Agora, sente-se renovada e estimulada. “O curso foi

uma atitude em minha vida. Tinha vontade de fazer as coisas, mas não tinha

ânimo”. O ânimo realmente chegou para ela: depois da oficina de brinquedos,

participou também de cursos sobre empreendedorismo, controle financeiro e

Cida mostra o

que aprendeu nos

cursos promovidos

pelo Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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vendas. “Lá, eles ensinam a administrar o dinheiro, gastar certo, guardar uma

reserva, o que antes eu não fazia”, conta. E enumera as qualidades: “Mostram

como fazer os produtos bons, limpinhos. Tudo mais organizado”. Ela realmente

se empolga ao falar das aulas: “O curso é muito bom. Os professores têm paci-

ência para ensinar”.

Cida aprendeu, aprimorou e tratou de colocar em prática tudo o que absor-

veu nas aulas. Começou a fazer enfeites para festas de aniversário e batizados.

A encomenda pode ser feita diretamente a ela, mas expandiu os horizontes co-

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merciais para além do bananal que um fazendeiro mantém no terreno do outro

lado da rua e montou um perfil em uma rede social com fotos dos produtos. É

via internet que ela recebe a maior parte dos pedidos, feitos, em sua maioria,

por mulheres, que pedem enfeites inspirados em desenhos animados. Os lu-

cros até agora não são muitos, mas são um estímulo. “Lucro 18, 20, 25 reais.

Preciso de um xampu e não vou mais pedir ao meu marido, né? Ganhar o seu

dinheirinho, mesmo pouco, é bom”, atesta, sorrindo, orgulhosa.

A casa já sente a mudança de atitude da filha de dona Dolores. Se, na sala,

a mãe expõe os produtos que vende pendurados na estante de madeira escura

Dona Dolores

é um modelo

para a filha

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e nas paredes verdes, dividindo espaço com dez fotos de santos e

mais de dez esculturas religiosas, além de um pé de alho (“Para

cortar a inveja”), Cida não faz muito diferente na residência em

que mora com os filhos e o marido. As produções de Cida também

ocupam espaço na sala apertada da casa, erguida no mesmo ter-

reno e logo atrás da casa de dona Dolores. Sobre a pequena mesa

quadrada de mármore, estão o notebook, para divulgar os trabalhos;

tintas; tesouras; cola com glitter; estilete; emborrachados e pisto-

la de cola quente. A produção é feita à noite, depois que a filha,

Lauany, dorme. “Prefiro o silêncio. Com ela dormindo, é o melhor

período para trabalhar”, explica.

Envolvida cada vez mais na produção manual, Cida mal lembra

que, quando criança, desejou ser professora. Hoje, quer aprender

cada vez mais e trabalhar para si mesma, produzindo os enfeites,

“porque é isso que gosto de fazer”. “Quero trabalhar e renovar

mais. Fazer cursos para aprender mais.” Ouvir Cida falar é empol-

gante. Maquiada e de sandália de salto alto para as fotos que ilus-

tram este texto, ela sorri o tempo todo. “Me sinto bem fazendo os

enfeites; é uma terapia”, garante a artesã. Questionada sobre qual

conselho daria a quem quer apreender, ela afirma: “Aconselho. É

tão bom a gente ser independente!”.

A artesã culpa a crise econômica pela qual o Brasil passa para

a baixa nas encomendas. “As pessoas não encomendam mais por

causa da crise; muita gente desempregada”, diz. Apesar do aperto

financeiro, no entanto, Cida segue com os investimentos. Sempre

com o incentivo da mãe e o apoio do marido, Everaldo, que traba-

lha fazendo bicos em serviços gerais. Quando vê um produto fi-

nalizado, ele costuma elogiar dizendo, orgulhoso: “Amor, gostei.

Faça mais”. Cida Marques faz e quer mais. Sempre confiante e ani-

mada, vislumbra um futuro melhor. “Tenho esperança que o Brasil

vai melhorar”, diz. E avisa: “Porque só tô começando”.

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Angerleide

“Eu me sinto bem cozinhando. Tira a tristeza da minha mente; me concentro ali, no que estou fazendo”

Superação à base de doces e salgados

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No caminho da coxinha, há uma estreita estrada de barro cheia de poças.

No caminho do churro, há um riacho ao lado e mais de uma dezena de

fruteiras. No caminho do salgadinho de queijo, há cachorros, galinhas e

um casal de patos. Convivendo entre o bucólico e o moderno, o espírito

empreendedor de Maria Angerleide da Silva percorreu e estabeleceu todos es-

ses caminhos depois de entrar pela porta do Canto Mãe Coruja de Palmares, na

zona da Mata Sul de Pernambuco.

A história da mulher de 32 anos residente na zona rural de Palmares mis-

tura paixão, morte, dor, família, natureza, empreendedorismo, dom e muito

amor. Mãe de Allana Beatriz, hoje com 3 anos e meio, Gê, como é conhecida,

se voltou com afinco para os salgadinhos e docinhos depois que o marido foi

assassinado quando a filha tinha 1 ano e 5 meses de idade. Era uma noite de

sexta-feira quando Alexandre Santana, então com 22 anos, foi executado jun-

Angerleide mora na

tranquila zona rural

de Palmares

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to com um cunhado, quando voltavam de um jogo no bairro do Quilombo 2,

e entrando para a cruel estatística de 3.434 homicídios naquele ano de 2014,

em Pernambuco, segundo números do programa Pacto Pela Vida. O rapaz, que

teria envolvimento com drogas, recebeu “de quatro a cinco tiros” segundo Gê.

Depois da tragédia, a tristeza a envolveu.

A dor era visível em Gê. Além do semblante triste, emagreceu: passou de

53 para 48 quilos. O sofrimento não passou despercebido pelas profissionais

do Canto Mãe Coruja do município, localizado a 128 km do Recife. A palma-

rense havia começado a frequentar o espaço, um imóvel pequeno localizado

em frente ao Mercado da Sulanca, no bairro Modelo, a partir dos três meses

de gestação de Allana. No início, não achara que estava grávida e só aos três

meses, após ultrassom, ficou ciente da gestação. A partir daí, foi mensalmente

ao Canto, assim como centenas de outras mães e gestantes – só nos quatro pri-

meiros meses do ano de 2016, o programa atendeu 1.953 mulheres de segunda

a sexta-feira, das 7h às 17h. “Ela ganhou tudo de lá; foi enxoval, banheira”,

lembra a mãe de Gê, Maria Auxiliadora, conhecida como Dora.

Mais magra e em meio às lágrimas constantes depois da morte do marido,

Angerleide recebeu apoio e orientação no Canto para participar dos cursos pro-

fissionalizantes oferecidos pelo programa em parceria com a Secretaria de Micro

e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação. Nada mau para a jovem mulher

que, desde a adolescência, gostava de fazer salgadinhos para as festas da família.

Na época, ela também enfrentava, além da própria dor, o sofrimento de dona

Dora, que estava depressiva por causa

de problemas conjugais, hoje supera-

dos. O curso de lancheteria ministrado

pelo Serviço Nacional de Aprendiza-

gem Industrial (Senai) caiu como uma

luva para Gê. Três vezes na semana, das

13h às 17h, entre outubro e novembro

de 2013, ela foi às aulas, que aprimora-

ram o sabor e a textura de seus salgadi-

nhos. “Aprendi dica de como unir mais

a massa do pastel de forno”, exemplifica

Gê, uma das 14 mães que participaram

das aulas dadas na carreta do Senai es-

tacionada no Mercado da Sulanca, bem

diante do Canto Mãe Coruja.

Só nos quatro primeiros meses de 2016, o programa atendeu 1.953 mulheres de Palmares

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“Os cursos profissionalizantes são uma possi-

bilidade de as mulheres atendidas no Mãe Coruja

poderem aprender uma atividade prazerosa e que

proporcione, ao mesmo tempo, a geração de em-

prego e renda, garantindo assim mais autoestima e

sentimento de produtividade”, observam as técni-

cas do Canto Mãe Coruja de Palmares, Luzia Félix e

Lucinery de Holanda.

O pastel do forno é apenas um dos muitos pro-

dutos que a mãe de Allana hoje faz e comercializa na

casa em que mora com parte da família, nas terras

do Engenho Santa Fé, localizado a cerca de 6 km do

centro de Palmares. Na residência cercada de verde

há pés de carambola, caju, azeitona, acerola, coco,

manga, jambo, goiaba, banana, atemoia, macaxei-

ra..., a família cria galinhas e um casal de patos, que

vivem soltos pelo quintal de terra batida onde antes

funcionava a casa de farinha do engenho. No local,

ainda existem parte do maquinário e as marcas no

chão da grande roda. O lugar é tão emblemático entre

os moradores da terra – quase 75 famílias – que o avô

de Gê, o guarda-chaves do trem, Severino Bezerra da

Silva, é até hoje conhecido como Biu da Farinha.

Na cozinha onde convivem em harmonia micro-

-ondas e uma grande jarra de barro para armazenar

a água, Gê frita bolinhos de queijo coalho e churros;

assa pastelões, minitortas, biscoitos, enroladinhos,

bolos de rolo e queijadinhas. Tudo sob a supervisão de dona Dora: “Eu reco-

mendo que ela não bagunce muito”; e da pequena Allana.

Os salgadinhos e docinhos já ajudam na economia da casa, onde vivem Gê,

Allana, seu Biu da Farinha, dona Dora e mais uma nora e um neto dela de 8 anos.

O entra e sai é constante na residência, que tem os quatro quartos e o corredor di-

vididos por leves cortinas de pano. São parentes vindo conversar, ajudar no trato

com seu Biu, que, aos 91 anos, já não anda nem enxerga – e também vizinhos

e clientes de Gê. Depois do curso, ela se especializou mais na culinária e passou

a vender com constância os pratos. As vendas são para os vizinhos das terras, a

que se tem acesso por um pequeno caminho de barro, geralmente empoçado

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por causa das chuvas. São também para encomendas na cidade de Palmares e na

vizinha Joaquim Nabuco – lá, Angerleide preparou os salgadinhos da festa dos

professores do colégio municipal em que estudou.

Para a vizinhança, Gê, que terminou o ensino médio, costuma vender sal-

gadinhos todos os finais de semana. Na sala, em um móvel ao lado da estante

da TV, ela expõe os quitutes em uma estufa, adquirida recentemente com o di-

nheiro do comércio. Costuma colocar à venda coxinhas, salgadinhos de quei-

jo e cachorros-quentes. Em dias de jogos, nas tardes de domingo, oferece os

salgadinhos no campo de futebol que tem próximo à casa, do outro lado da BR

101. Vai com a filha e uma prima, levando os alimentos em uma embalagem de

Angerleide

descobriu uma

nova profissão

graças ao

Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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plástico transparente com tampa branca. Lá, fica em um banco improvisado

sob uma frondosa amendoeira.

Além do lucro financeiro em torno de 120% sobre os produtos, os salgados e

doces trouxeram mais paz e felicidade à viúva Gê. “Eu me sinto bem cozinhando.

Tira a tristeza da minha mente; me concentro ali, no que estou fazendo”, diz a

cozinheira, de touca branca na cabeça. As técnicas do Canto Mãe Coruja também

atestam a mudança, lembrando como ela havia chegado desmotivada, desacre-

ditada de si e do mundo e amedrontada diante da vida após a morte do marido.

“Ela cresceu como pessoa e como profissional; e aprendeu que não está só e que,

apesar dos problemas, a vida não é estática e, sim, dinâmica; que aquilo que não

tem solução hoje, amanhã terá. E que só depende de nós para mudar a realida-

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de”, observam Luzia e Lucinery, do Canto Mãe Coruja, que a impulsionaram a

persistir. “Ela encarou sem medo o desafio e foi em frente.”

Nessa caminhada, Angerleide agora planeja também se dedicar ao artesanato.

Ela até já enveredou por essa trilha: mesmo não tendo feito o curso ainda, enfeita

chinelos de plástico com miçangas e faz abajures e vasos tendo como base co-

lheres de plástico que, em vídeo na internet, aprendeu a cortar da forma correta.

Sim, porque a tecnologia chegou à casa de seu Biu da Farinha. Ao lado da linha

férrea desativada e do riacho que corre por ali, chegam os dados nos celulares

de Gê e dos parentes. Só há um detalhe: dentro de casa, o sinal só pega junto à

parede da frente – problema nenhum para uma família que vive unida e que tem

a natureza como companheira.

Três gerações da

família da pequena

Allana

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Silvana, Simone e Luclécia

“Contar alivia; colocava para fora o que estava sentindo... Era a que mais iaao Canto. Hoje estou outra pessoa”

Simone Maria da Silva

Círculos contra a depressão

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Depressão puerperal: os sintomas são semelhantes aos da melancolia, po-

rém mais acentuados e incluem: choro e irritabilidade, distúrbios no sono

e do apetite, sentimentos de tristeza, de desesperança e de impotência que

persistem. Dificuldade de criar vínculos com o bebê, incapacidade (ou fal-

ta de vontade) de tomar conta de si mesma e do bebê; esquecimento. Aversão e

raiva da criança, que pode ser acompanhada por impulsos de tentar machucar

ou até matar a criança.*

A definição da depressão pós-parto está em várias publicações médicas,

mas as pernambucanas Silvana, Simone e Luclécia não precisaram recorrer aos

livros para tomar conhecimento desse transtorno psíquico. Elas o sentiram na

pele e, por algum tempo, rejeitaram seus filhos. O problema psicológico não é

o único elo entre as três: todas são moradoras do Agreste de Pernambuco, de-

ram à luz em 2014, se apoiaram mutuamente, compartilharam experiências e

foram atendidas – ainda o são — pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana no

município de Casinhas, a 131 km do Recife, na divisa com a Paraíba, e um dos

vinte que integram a II Geres.

As histórias dessas casinhenses ainda têm mais em comum. Assim como a

maioria dos 13.766 moradores do município, elas moram na zona rural de Casi-

nhas, que tem sua economia calcada na agropecuária e que foi desmembrada há

apenas 21 anos de Surubim, localizado a 15 km e 64 lombadas de distância. Todas

vêm de famílias de pequenos agricultores – 87% da população mora no campo,

espalhada em 35 distritos (ou sítios, como chamam). Silvana, Simone e Luclécia

viviam em sítios próximos e, grávidas, conheceram o Programa Mãe Coruja Per-

nambucana por meio do Círculo de Educação e Cultura atuante no sítio de Vila

Nova. Lá, o Círculo funciona na sede do Programa Saúde da Família e, para reunir

as mães e seus filhos, as coordenadoras precisam sair pelas estradas íngremes de

barro que formam a paisagem e interligam os sítios. “Se a gente ficar no Canto

[Canto Mãe Coruja] o dia todo, não consegue captar mãe nenhuma”, afirma a psi-

copedagoga Claudenice Lourenço, uma das coordenadoras do programa em Ca-

sinhas junto com a pedagoga Carmen Lúcia Valença, que corrobora: “A realidade

aqui é muito diferente: a maioria mora na zona rural e não tem feira, por exemplo,

para congregar os moradores”. Em 2015, o programa atendeu 173 mães gestantes

no município. Foram a chamada “busca ativa”, a consciência de uma boa gesta-

ção e a amizade que levaram as três mães ao Canto Mãe Coruja.

Primeiro veio Simone Maria da Silva, em 2013. Hoje com 28 anos, a moradora

do sítio Bengalas chegou ao programa no início da segunda gravidez. Uma ges-

tação planejada pela dona de casa e pelo vigilante, Gilson Gomes, que já eram

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pais de Emannuela Mayara, na época, com 8 anos de idade. Apesar de desejar

muito ser mãe novamente, a dona de casa entrou em depressão duas semanas

depois do nascimento de Jhonatan Miguel, em março de 2014. A sensação era

de desamparo e solidão. “Chorava dia e noite sem parar”, conta. Para completar:

“Amamentava e sentia medo de estar só”. Recordar faz os verdes olhos de Simo-

ne se encherem de lágrimas: “Lembrar dói”, resume.

Acompanhada

pelo Programa

Mãe Coruja

Pernambucana,

Luclécia é feliz ao

lado do marido

Maurício e da

filha Emily

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Como já havia dado à luz antes, Simone sabia que não estava bem. Assim

como ela, que estudara até a oitava série, o Programa Mãe Coruja Pernambucana

também observou a mudança e tratou de encaminhá-la ao psicólogo e a estimu-

lá-la a desabafar. Simone recebeu, em casa, visitas de profissionais do Círculo de

Educação e Cultura de Vila Nova duas a três vezes ao mês. A tristeza era tamanha

que chegou a se mudar de casa, em busca de mais pessoas por perto. “Contar

alivia; colocava para fora o que estava sentindo...”, relembra. O apoio e as con-

versas eram mesmo um estímulo. “Eu era a que mais vinha ao Canto. Até para

sair, conversar”, explica Simone. Ela calcula que a depressão pós-parto durou

cerca de um ano. Hoje, tomando antidepressivo e tendo retornado à antiga casa,

afirma, feliz: “Hoje estou outra pessoa”.

As conversas de Simone mostraram à colega do Círculo de Educação e Cultu-

ra, Silvana Alves Pinheiro, 31 anos, que ela não estava sozinha. Moradora do sítio

São Domingos, a também dona de casa passara por depressão profunda depois de

ter o primeiro filho, Jamilson Júnior, em 2009. Naquela época, mal engravidara e

o marido, Jamilson Antônio do Nascimento, 32 anos, se mudara para São Paulo

à procura de trabalho como motorista. Desconhece o que a levou ao transtorno,

Silvana caminha

com os filhos

Jamilson e Maria

Gabrielly

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mas, assim como Simone, ela se sentia só. E mais: sofrera bastante até a criança

nascer, de cesariana. Como seu caso era complicado, foram quatro dias entre ma-

ternidades de Casinhas, Surubim, Caruaru – onde foi internada com eclampsia

– e Recife, onde, enfim, foi operada. Durante todo esse difícil processo, ela contou

com o apoio do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Mal o bebê veio ao mundo, nasceu a depressão em Silvana, ainda na sala de

parto da Maternidade Barros Lima, no bairro da Encruzilhada, na capital pernam-

bucana. “Quando vieram mostrar a criança, mandei tirar. Não queria saber dele”,

diz, com sinceridade. Ela recorda que, no quarto em que ficava com outras mães,

suas companheiras a orientavam a cuidar do bebê, mas as frases “entravam por

um ouvido e saíam pelo outro”. “Deixava chorando; não dava de mamar.”

Silvana deixou a maternidade levando o propósito de dar o menino a alguém.

Não deu. Chorava muito e se imaginava matando a criança: “Imaginava ele pen-

durado no mosquiteiro ou a avó espremendo ele com o cotovelo”. A família te-

meu que o pior acontecesse e se revezava na casa, fazendo companhia. Durante

o dia, ora era a irmã, Sílvia, ora a avó, Severina. À noite, um dos primos dormia

com Simone. A médica que a atendeu encaminhou-a ao psicólogo e começou o

tratamento. Sem rodeios, diz que levou “quase um ano para gostar do menino”.

Chegou a ir a São Paulo para que o pai conhecesse Júnior e passou sete meses por

lá. Voltou, assim como o marido.

Uma vez o casal novamente em Casinhas, Silvana engravidou. Dessa vez,

procurou o Programa Mãe Coruja Pernambucana – à época da primeira ges-

tação, ainda não havia o programa no município. Foi uma fiel frequentadora

das reuniões no posto do PSF de Vila Nova, que fica a cerca de 7 km da sede

do município e para onde ia, animada, duas vezes por semana, caminhando

quase um quilômetro entre subidas e descidas de barro e onde foi acompanha-

da durante todo o pré-natal de Maria Gabrielly, nascida em setembro de 2014.

Com o acompanhamento próximo de profissionais da saúde e contando com

as conversas semanais com as colegas do Canto Mãe Coruja, ela conseguiu não

passar pelo transtorno de novo. E, se durante a gestação do filho se sentia sozi-

nha, hoje, comemora a presença do pequeno Júnior em casa. “Faz companhia;

é o homem da casa”, define ela, cujo marido só vê nos fins de semana porque,

nos outros dias, ele trabalha na capital pernambucana.

Júnior foi e é figura constante nos Círculos de Educação e Cultura de Vila

Nova, onde se reúnem cerca de dez mulheres regularmente. O garoto, quando

não está na escola, acompanha Simone. Lá, brinca com outras crianças que

também são levadas pelas mães.

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| Mãe Coruja Pernambucana114

Além do filho e de Maria Gabrielly,

Simone levou ao Círculo a então vizi-

nha, Luclécia Maria Ferreira da Silva,

assim que a garota, então com 17 anos,

engravidou. Vaidosa como geralmente

são as adolescentes, Luclécia engravi-

dou após três anos de casamento com

o motorista Maurício, sete anos mais

velho. A gestação não foi planejada,

“mas seja o que Deus quiser”, pensou

na época em que se viu grávida.

Filha e neta de agricultores – plantam

feijão e milho –, a mais velha de qua-

tro filhos de Maria de Fátima e Edmil-

son lembra que a gestação, acompanhada durante os nove meses pelo Programa

Mãe Coruja Pernambucana, foi “ótima”. Ia animada aos círculos junto com ou-

tras cinco grávidas: “Vinha de barrigão andando quase uma hora e meia”, conta,

sorrindo. Se a gestação foi tranquila, o mesmo ela não diz do parto. Com batom

vermelho claro nos lábios para as fotos deste livro e um sorriso tímido, Luclécia

fala da dificuldade do nascimento da filha. A exemplo da amiga Simone, Luclécia

passou por atendimentos hospitalares em quatro municípios entre Pernambuco e

Paraíba até chegar a Caruaru, onde teve Emily em uma cesariana.

Vítima de infecção intestinal, a bebê ficou hospitalizada por cerca de dez dias.

Começou ali um tormento para a mãe que, quando criança, não gostava muito

de brincar de boneca. Luclécia enumera as angústias: “As dores que senti; o peito

inflamado, muito tempo no hospital”. “Não aguentava dar de mamar”, lembra.

Costumava também chorar muito e, entre lágrimas, ameaçava saltar da janela do

quarto, no primeiro andar do hospital. Não era raro dizer: “Mainha, eu vou pular”.

A partir de visita puerperal de técnicas do Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na, não tardou o diagnóstico: depressão. A adolescente, então, recebeu o acompa-

nhamento de profissionais e, nove dias após o retorno à casa em que morava com

a avó, a agricultora Josefa, conhecida como Rita ou Ritinha, aceitou tomar a filha

pela primeira vez nos braços. Profissionais do Canto Mãe Coruja estavam no dia e

registraram o encontro, que fez marejar os olhos da coordenação. Meses depois,

tirou foto com a filha, sorridente. “Mas era uma risada falsa”, confessa.

Passado um ano e meio do nascimento de Emily, Luclécia conta que, com

o passar dos meses, aprendeu a amar a filha. O apoio da mãe foi também fun-

A partir da visita de técnicas do programa, a adolescente recebeu o acompanhamento de profissionais

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damental para a garota. Dela, ouviu a frase que nunca esqueceu: “A sua filha é

tudo para você; é sua família”. Hoje, Luclécia veste a filha com roupas iguais às

dela. No dia destas novas fotos, estava de short jeans e uma blusa de alças com

estampa de oncinha, mesma padronagem da blusinha da filha. A adolescente

já havia, inclusive, comprado um outro tecido, azul de bolinhas brancas, para

um “macaquito” para si e outro para a filha. Também exibiu sorrisos, que clas-

sificou como verdadeiros.

Morando em uma casa erguida no terreno dos sogros, em Matinadas, dis-

trito da vizinha cidade de Orobó, Luclécia está mais distante dos Círculos de

Educação e Cultura de Vila Nova, localizada a vinte minutos de carro e quase

dez reais de passagem, porém ainda vai ao local, mesmo sem tanta frequência.

Quando questionada sobre a possibilidade de ter mais filhos, não titubeia: “Só

daqui a dez anos; Emily vale por dez”, diz, sorrindo. Agora pretende terminar

os estudos, para os quais retornou, aos 19 anos, na oitava série. E espera um

futuro diferente para a filha: “Gostaria que ela estudasse, trabalhasse, viajasse”.

Nos planos de viagem, sonha voos maiores – e conjuntos: “Que ela viajasse e

me ligasse dizendo ‘Tô aqui e vou pegar você para passear’”.

* Trechos retirados das publicações O que esperar quando você está esperando e Psi-

quiatria básica

Três amigas unidas

pelo Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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Márcia

“O Mãe Coruja foi muito importante, ajudou com o kit do bebê, com aspalestras...Agora, quero trabalhar, arrumar um meio de vida”

Uma valente na paisagem sertaneja

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| Mãe Coruja Pernambucana118

“Óque estrada mais comprida, ó que légua tão tirana...” O trecho da música

de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira bem poderia definir os muitos ca-

minhos que compõem Carnaíba, cidade sertaneja do também compositor

Zé Dantas, um dos principais parceiros de seu Lua. Localizada no chamado

Alto Sertão do Pajeú pernambucano e distante 417 km do Recife, Carnaíba se espa-

lha por mais de 427 km2 compostos principalmente de vegetação do semiárido e de

chão de terra batida marrom, onde vivem menos de 20 mil pessoas, uma densidade

populacional de fazer inveja à capital do Estado, somente 43,42 habitantes/km² –

Recife tem mais de 7 mil habitantes/km² em uma área que é metade do município

sertanejo. E é percorrendo 17 km em uma dessas estradas de barro praticamente de-

sertas que se chega a Márcia Muniz, uma aguerrida mãe, desempregada, agricultora

e presidente da Associação dos Agricultores do Sítio Lagoa Caroá.

Não, Márcia Muniz não é sertaneja, apesar de todo o cenário descrito. Nem

tampouco pernambucana. Afinal, não precisa ter nascido e se criado em um

dos muitos sertões brasileiros para ser valente. “A gente tem que se virar nos

trinta”, resume a paulista Márcia, ainda com o sotaque que evidencia seu êxodo

incomum de sair do centro econômico do País para se embrenhar pelo sertão

que faz a divisa entre Pernambuco e Paraíba. E para uma das cidades cujo IDH

é de 0,583, considerado muito baixo, enquanto o município em que nasceu e

viveu por muitos anos, Osasco, ostenta um índice alto, de 0,776.

A mudança não parece haver causado estranheza à paulista Márcia. Com o

ensino médio completo, trabalhava como assistente administrativa quando, jun-

to com o marido, um carnaibano do povoado de Lagoa do Caroá, decidiu tomar

o rumo para o sertão, em 2008. Nessa época, o casal já tinha Larissa, nascida

em 2002 – hoje a garota tem 14 anos e, com um leve retardo mental, estudou

somente até a sétima série e ajuda a mãe em casa. Sempre corajosa, Márcia per-

maneceu na comunidade quando o casamento chegou ao fim e, como costuma

dizer, se “virou nos trinta”. Trabalhou em uma fábrica de polpa de fruta – hoje

fechada –, casou-se novamente, virou agricultora e foi escolhida presidente da

Associação dos Agricultores de Sítio Lagoa do Caroá.

Todos os rumos de Márcia frutificaram. Do segundo casamento, nasceu Mi-

chelly, em novembro de 2015. A gestação foi uma surpresa para ela e até para

o médico que a acompanhava. Quando a menstruação atrasou, ouviu simples-

mente do profissional que era a “menopausa”, que teria chegado já aos 41 anos.

Mas, com cinco meses, a gestação foi, enfim, confirmada. A partir daí, a mu-

lher magra de ar dinâmico passou a frequentar o Canto Mãe Coruja localizado

na Secretaria de Saúde de Carnaíba, no centro da cidade.

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Márcia Muniz

trocou São Paulo

pelo sertão

pernambucano

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O município é um dos cinco atendidos pelo Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana no Alto Pajeú – os outros são Iguaracy, Itapetim, Santa Terezinha e

Solidão. Todos coordenados pela X Geres, que compreende mais sete muni-

cípios. “O critério de escolha foi epidemiológico. Além disso, esses eram os

municípios onde, de acordo com estudo regional feito pela Secretaria de Saú-

de, havia maior taxa de mortalidade infantil, igual ou superior a 25 óbitos por

mil crianças nascidas vivas por ano”, explica Wilson Rodrigues, coordenador

do programa na X Geres. Desde que o programa chegou à

região, em 2010, a taxa de mortalidade caiu, em alguns mu-

nicípios, como Itapetim e Iguaracy, para menos de 14 óbitos

por mil crianças nascidas vivas por anode acordo com nú-

meros de 2011, e foram assistidas 3.803 mulheres e 3.660

crianças. “O Mãe Coruja foi muito importante, ajudou com

o kit do bebê, com as palestras... afinal, depois de treze anos,

a gente ‘estranha’ a gravidez”, diz, bem-humorada, Márcia,

que, durante a gestação, recebeu orientações sobre gesta-

ção, amamentação e cuidados com a criança, entre outros

temas tratados pelo Canto Mãe Coruja, tanto em palestras

com várias mães quanto em conversas individuais com as

técnicas do programa.

Natural do município vizinho de Afogados da Ingazeira,

onde fica a sede da X Geres, Michelly foi um dos 152 bebês

nascidos em 2016 e assistidos pelo programa. Com perí-

metro encefálico de 31 cm, a recém-nascida entrou na lista

de casos suspeitos de microcefalia notificados pelo Estado

de Pernambuco. A notificação segue o parâmetro utilizado

pelo Ministério de Saúde, desde março de 2016, que colo-

ca o perímetro encefálico inferior ou igual a 31,5 cm para

meninas como de risco. Aos 6 meses de idade, no entanto,

a bebê, cuja aparência não aponta para a microcefalia, não

tinha ainda passado por todos os protocolos necessários

para entrar na lista de suspeita descartada. A demora nos

exames deixou a mãe irritada. Além da incerteza sobre a

saúde da filha, Márcia reclamou dos gastos com o trans-

porte. Morando distante, cada viagem para consulta em

Serra Talhada lhe sai caro – nas últimas semanas, ela cal-

cula haver gastado cerca de 400 reais com viagens.

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A articulação com os setores da saúde e as várias secretarias é um dos desa-

fios do Canto Mãe Coruja. “A gente busca que as políticas públicas aconteçam

porque, às vezes, não acontecem”, desabafa a psicóloga Emanuella Genésio,

uma das técnicas de monitoramento e avaliação do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana em Carnaíba, e que tem mais da metade das mais de 1.200 mulhe-

res cadastradas desde 2010 morando na extensa zona rural do município – são

mais quatro povoados (ou sítios) afora Lagoa do Caroá.

Maria Clara e

Maria Débora

também são

acompanhadas

pelo Mãe Coruja

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Outro fruto germinado por Márcia Muniz foi sua atu-

ação como agricultora e sua força para lutar pela vila

onde mora, que reúne mais de cem famílias. O cami-

nho até o local é uma estrada de barro na qual pouco se

vê movimento, ladeada de plantações que, no mês de

maio de 2016, se encontravam verdes, apesar do baixo

índice pluviométrico da região. Na principal rua do sí-

tio, onde ainda se pode encontrar um carro de boi cir-

culando, senhoras e senhores debulham o feijão verde

no mormaço da tarde.

Em uma das extremidades da rua, no alto, fica a ca-

sinha modesta de Márcia, em um terreno de 1,2 hec-

tare. Na frente, uma varanda de cimento batido onde

repousa uma das seis enxadas da família. Sob a sombra

de uma catanduva, encontramos a agricultora sentada

conversando com a vizinha de sítio Rejane de Souza.

Em cadeiras de balanço de ferro com tiras de plásti-

co, elas compõem uma paisagem familiar, rodeadas

pelas meninas (as duas da paulista: Larissa, 14 anos e

Michelly, 6 meses; e as três da pernambucana: Maria

Clara, 4 anos; Maria Débora, 2; e Maria Cecília, de 9

meses). Ao lado delas, galinhas e os cinco vira-latas

que Márcia cria, todos devidamente com nome: Tata-

co, Tião, Titica, Sereia e Rebeca.

À frente da Associação de Agricultores da Lagoa

Caroá desde 2012, Márcia leva as demandas da comu-

nidade junto ao IPA. As reuniões da associação acon-

tecem sempre nas tardes de domingo, das 14h às 16h,

na Escola Martiniano Martins, na vila. Nessas horas,

Márcia busca a calma. “Lidar com o ser humano é pre-

ciso paciência”, ensina ela, contando que, nesse tem-

po, as maiores conquistas foram cisternas instaladas

no vilarejo, favorecendo muitas famílias. Agora sua

principal reivindicação é a construção de um poço.

Afirma presidir a associação porque não tem ninguém

para fazê-lo, mas que planeja permanecer no cargo

somente até março de 2017.

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A paulista tem muito para fazer em sua vida pessoal: precisa cuidar das fi-

lhas e das plantações de feijão e de milho que possui ao lado da casa, tarefas em

que conta com a ajuda do pai de Michelly, de quem se separou. Também quer

levar adiante a ampliação da cozinha e a construção de um quarto para as me-

ninas – a obra já começou e acontece ao lado da residência. Vivendo com re-

cursos do Bolsa Família, quer ir além do plantio e dos afazeres de casa. “Quero

trabalhar, arrumar um meio de vida”, se determina. Afinal, “tem que se virar

nos trinta”.

Márcia com as

filhas Larissa e

Michelly

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Missileide, Carla e Vânia

“Se não fossem as meninas (do Programa Mãe Coruja Pernambucana) aqui, não tinha futuro”

Geissa Carla

Artesanato para enfeitar o futuro

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O que pode uma boneca de pano, um par de chinelos com strass, ou

mesmo um tic-tac com laços? São com objetos assim, de ingênua

beleza, que três mães sertanejas se tornaram empreendedoras.

Moradoras do Alto Pajeú, no Sertão de Pernambuco, Missileide,

Geissa Carla e Vânia têm a mesma faixa etária – entre 25 e 30 anos – e,

diferente de muitas mulheres da região, começaram a, literalmente,

“enfeitar” o presente com trabalhos artesanais em busca de um futuro

mais abundante. Com bonecas de pano, chinelos de borracha custo-

mizados e enfeites para cabelo e para a casa, esse trio quer ganhar di-

nheiro e melhorar economicamente a vida de suas famílias, morado-

ras das cidades de Itapetim e de Iguaracy. A distância de quase 100 km

entre os dois municípios tem como elo entre as mulheres o Programa

Mãe Coruja Pernambucana, que atua na região e no qual as sertanejas

alinhavam os pontos do empreendedorismo. Foi em cursos promovi-

dos pelo programa que elas começaram a fazer trabalhos manuais e, a

partir daí, a vender seus produtos.

“O curso é muito importante porque elas podem se profissionali-

zar”, afirma a professora Genézia Dayanna, uma das técnicas de mo-

nitoramento do Canto Mãe Coruja de Itapetim, município distante 423

km da capital de Pernambuco, cuja economia é baseada principal-

mente na agricultura e pecuária e onde não há uma agência de traba-

lho. No Canto Mãe Coruja, que chegou ao município em 2010 e hoje

ocupa um simpático imóvel com vitral colorido na parede da frente,

no centro da cidade, 33 mães participaram dos cursos de bonecas e de

brinquedos reciclados ministrados pelo Serviço Social do Transporte e Serviço

Nacional de Aprendizagem do Transporte (Sest/Senat) ano passado.

Mãe de Isabela, 11 anos; Mariana, 10; e Letícia, 5, e grávida de Noemi, Mis-

sileide Limeira da Silva, 28 anos, foi das 20 que foram às aulas para confecção

de bonecas de pano ainda em 2014. A partir do curso, ministrado nas tardes de

maio e junho, a filha de agricultores que nunca havia tido remuneração, come-

çou a ganhar dinheiro.

“Eu só sabia fazer crochê. Mas, com o incentivo do curso, aprendi a fazer

boneca e comecei a vender”, fala a sorridente Missileide, que, até então, tinha a

família totalmente sustentada pelo marido, o entregador Eudivan de Almeida,

30 anos. As primeiras bonecas, no entanto, foram para deleite da família: grá-

vida, fez as três primeiras, que medem em torno de 30 centímetros de compri-

mento, para enfeitar a parede do quarto da pequena Noemi. “Achei fácil; é feito

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tudo na mão”, resume ela. Depois de decorar o quarto, tratou de produzir para

fora. Levou as bonecas seguintes na loja de calçados de uma prima para vender

e começou a receber os primeiros reais de lucro.

A produção de Missileide é realizada à tarde, na ampla cozinha da casa locali-

zada na Vila Miguel Arraes, na entrada de Itapetim. O horário é o mais tranquilo

do dia, depois que as quatro meninas almoçam e se dedicam às tarefas escolares.

Sim, porque Missileide é uma danada na organização: criou um cronograma de

tarefas para as filhas, que pregou na parede da cozinha, e um “Canto da Tarefa”

– com esse nome mesmo fixado sobre um pano colorido –, no qual as meninas

estudam. Com o lucro das bonecas, ela já realizou compras. “É bom ganhar o

próprio dinheiro; não ficar só dependendo do marido. Porque, por exemplo, o

marido dá um dinheiro e, se for dar um presente pra ele, é ele pagando, né?”,

Bonecas de

pano, feitas por

Missileide, já

fazem sucesso em

Itapetim

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raciocina. Por falar em presentes, a ar-

tesã comprou, com seu próprio dinhei-

ro, calçados novos para toda a família no

fim de 2015. Missileide, que comemora

também a aquisição da pistola de cola

quente para a feitura dos objetos, so-

nha agora abrir um armarinho com suas

próprias produções.

Separadas por 91 km de Missileide,

Vania Alexandre da Silva, de 26 anos,

e a amiga Geissa Carla da Silva Xavier,

27, têm praticamente o mesmo sonho.

Amigas, nascidas e criadas na pouco

povoada Iguaracy – população estimada

em pouco mais de 12 mil habitantes em

uma área que chega a mais de 838 km2 –, Vânia e Carla, como é mais conhecida,

buscam no artesanato um futuro com mais recursos. A construção desse desejo

veio a partir das idas aos Círculos de Educação e Cultura realizados no Canto Mãe

Coruja instalado em uma rua tranquila atrás da Igreja Matriz do município. Ca-

sadas, mães de filhos únicos e fazendo “bicos” como babá e faxineira, as amigas

começaram a frequentar o espaço a partir da gravidez. Primeiro foi Carla, que

teve o simpático Gabriel em 2012. Depois, veio Vania, grávida de Anny Eyloá,

nascida no ano seguinte.

Durante as gestações e, principalmente depois, elas fizeram do Canto Mãe

Coruja um espaço frequente de aprendizado. “Todo dia a gente se encontra

aqui”, diz, sorrindo, Carla. O local também tem uma parceria forte com o IPA,

que garante frutos para os lanches diários das mães e crianças que frequentam os

Círculos de Educação e Cultura. A comida é farta no local. No dia da nossa con-

versa, havia quilos de polpa de fruta, inhame, melão, macaxeira, batata-doce,

melancia e verduras.

“O Círculo é uma forma de empoderar a família”, atesta Wilson Rodrigues,

coordenador regional do Programa Mãe Coruja Pernambucana no Alto Pajeú.

As palavras dele são alicerçadas: afora as orientações, uma vez por semana, são

ministradas aulas de artesanato para as mães. “Além da aprendizagem e do co-

nhecimento, elas podem criar uma renda”, observa a educadora do Canto Mãe

Coruja de Iguaracy, Elânia Santino da Silva que, prendada, tomou para si o en-

sino do artesanato às mães cadastradas no programa. Já ensinou a transformar

Durante as gestações e, principalmente depois, elas fizeram do Canto Mãe Coruja umespaço frequente de aprendizado

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Arte de fazer

bonecas de pano

transformou a vida

de Vânia

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embalagens de leite em bolsas; vidros de azeite e copos de

extrato de tomate em vasos; garrafas PET em porta-bijute-

rias... “Tudo o que aprendo na internet ensino aqui; fazer

artesanato é uma terapia.”

Repassar o conhecimento parece ser mesmo o lema do

Canto Mãe Coruja de Iguaracy. “Eu gosto de tudo, desde o

momento que a gente senta e faz nossas atividades. Pas-

sando conhecimento uma para outra. Porque não adianta

aprender e o conhecimento ficar parado”, atesta Carla, que

praticamente vai todos os dias ao Canto. Lá, ela fez tam-

bém curso, dado pelo Sest/Senat, de reaproveitamento de

alimentos e de customização de chinelos e de roupas. Um

ponto ressaltado pela mãe sobre o curso é a gratuidade: “Só

aprender sem ter que gastar já é uma maravilha!”.

Morando a cinco casas do Canto, Vânia vai quase toda

semana até lá. “Só não venho quando tenho preguiça”, ad-

mite, mas completa: “Gosto das jornadas porque aprendo

mais e mais”. Com o programa, realizou o curso de custo-

mização de chinelos, que define como seu “novo amor”.

Tomou tanto gosto pelo ofício que chegou a ministrar aula

para as mães do programa Leite de Todos, da prefeitura do

município. “Fiquei feliz por passar essa experiência para as

mães, que fizeram pros seus filhos.”

Ainda produziu e vendeu alguns pares, porém não foi

adiante porque não teve mais recurso para adquirir o ma-

terial necessário: “Aqui as coisas são mais caras”, reclama.

Apesar das dificuldades financeiras, Vânia sonha em

montar um negócio próprio para comercializar os chinelos

– até lá, expõe no seu perfil em rede social. Carla também

quer o mesmo, tanto que, quando faz um produto, tira a

foto e põe o produto à venda na internet, no seu perfil na

rede social. “Se não fossem as meninas [do Programa Mãe

Coruja Pernambucana], aqui não tinha futuro”, diz Carla,

humildemente. “A aula de artesanato é um diferencial e

um incentivo como fonte de renda porque não há muito

emprego no interior”, observa a enfermeira Bruna Almei-

da, uma das técnicas do Canto Mãe Coruja.

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Vânia com a filha

Anny Eyloá

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Mazé

“Os cursos proporcionam às mães não ficarem dependentes financeiramente. Se não fosse o Mãe Coruja aqui...”

Nasce uma bem-sucedida manicure

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| Mãe Coruja Pernambucana136

Primeiro, vieram, na infância, os desenhos de florezinhas e casinhas nos

cadernos escolares; na adolescência, o desejo de cursar arquitetura; de-

pois, as pinturas de ursinhos e de crianças nos panos e toalhinhas da filha.

Desses traços, da noção de estética e de um curso organizado pelo Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana, nasceu a empreendedora Mazé, apelido da

sertaneja Maria José Rodrigues, moradora da pequena e tranquila cidade de

Dormentes, localizada a 649 km de Recife, no extremo oeste de Pernambuco,

limite com o Estado do Piauí. Aos 27 anos e mãe de Heloíse, de 5 anos, tornou-

se uma bem-sucedida manicure e hoje é dona de equipado salão de beleza de-

dicado principalmente aos cuidados e à pintura das unhas dos pés e das mãos.

O ofício de manicure foi sendo construído cliente a cliente, plano a plano,

depois que Mazé, no fim de 2011, realizou o curso de manicure promovido pelo

Canto Mãe Coruja de Dormentes. Com as aulas, ministradas em um salão de

beleza no chamado centro velho, Mazé vislumbrou uma profissão. “Eu vi que

eu tinha o dom [de manicure]”, afirma. Na época, Heloíse tinha 1 ano e, para

ir ao curso, Mazé deixava a filha com a mãe, a agricultora Maria do Socorro, 47

anos, que mora com ela, na residência também localizada no centro novo.

O curso no salão de beleza foi o quarto feito por Mazé desde que se cadastrou

no Programa Mãe Coruja Pernambucana, que tem seu Canto Mãe Coruja ins-

talado a apenas um quarteirão da casa dela. Mazé procurou o programa logo no

primeiro mês de uma gestação planejada por ela e pelo marido, o agente de en-

demias Alfredo Novais da Silva, 38 anos. Ainda grávida, participou de aulas de

torta e de decoração de bolo no próprio Canto Mãe Coruja. Com Heloíse ainda

bebê, realizou mais um curso e aprendeu a fazer fuxico. “Eu ficava procurando

se tinha uma identificação com uma dessas ocupações”, recorda. Essa identi-

ficação aconteceu quando passou a cuidar e pintar unhas. Não que ela já não

fizesse isso, mas só para as primas e parentes. Também lembra de, na infância,

já brincar com o esmalte da mãe, quando ainda morava no sítio Maxixeiro, a

cerca de 9 km da residência na cidade e onde os pais plantavam milho e feijão

e criavam ovelha e galinha. Mudou-se para a área urbana com a mãe aos 10

anos, depois que o pai, Venâncio Miguel, morreu vítima de câncer aos 38 anos.

Filha única e com a mãe vivendo da pensão e da roça, Mazé sempre almejou

uma profissão. Completou o ensino médio e sonhava ser arquiteta. “Mas nem

em Petrolina tem arquitetura...”, lamenta, referindo-se à cidade polo da região,

que congrega uma população estimada de mais de 330 mil habitantes e que fica

a cerca de 150 km de distância de Dormentes. O desejo de projetar e desenhar

imóveis e ambientes foi adaptado à realidade e, aos poucos, ela começou a de-

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Um olhar histórico e afetivo |137

senhar sua nova realidade. Durante a gravidez, desenhou e pintou os panos do

berço e as toalhas de Heloíse, que receberam também bico feito pela avó, em

um trabalho a quatro mãos. Sentindo-se segura com as aulas de manicure, co-

meçou a atender clientes em um canto da sala da casa.

Era início de 2012 e, naquela época, calcula haver investido cerca de 250

reais na aquisição dos primeiros materiais para o trabalho: comprou alicate,

espátula, esmaltes, cadeira e uma caixa para colocar os esmaltes. No início,

atendia cerca de cinco clientes por semana. Organizada e focada em prospe-

rar, Mazé foi, pouco a pouco, estruturando o salão que ergueu no canto es-

Por intermédio

do Programa

Mãe Coruja

Pernambucana,

Mazé encontrou

sua vocação

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Mazé, em seu

salão, onde as

fotos da filha

Heloíse ganham

lugar de destaque

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Um olhar histórico e afetivo |139

querdo do jardim da casa, com porta de

vidro transparente para a calçada. Para

ampliar o negócio, pegou parte de um

empréstimo tomado pelo sítio da mãe e

começou a obra. Passados quatro anos,

o espaço, que tem ar-condicionado,

oferece até wi-fi gratuitamente para a

clientela. E se, no início, no canto da

sala, atendia cerca de cinco pessoas

por semana, hoje, a média é em torno

de vinte. Todas devidamente agenda-

das. O horário é marcado muitas vezes

por aplicativo de mensagens do celular,

mas ela também mantém páginas em redes sociais.

Com o salão, que está prestes a ganhar a placa de Belíssima Designer, Mazé

praticamente não tem mais tempo para aulas. “Recebi convites para mais cursos

no Canto Mãe Coruja, mas não tinha mais tempo”, diz. Ela, no entanto, avalia

que as aulas foram importantes. “Se não fosse o Mãe Coruja aqui [em Dormen-

tes], não tinha como fazer em Petrolina porque seria muita despesa”, admite

ela. Dona Socorro é só elogios à iniciativa da filha: “Foi bom; ela não tinha outro

trabalho”, diz, comentando que a filha hoje contribui nas finanças da casa. Ob-

servação parecida é feita pela enfermeira Karla Sá, técnica do Canto Mãe Coruja

e uma das clientes de Mazé. “Os cursos proporcionam às mães não ficar depen-

dente financeiramente”, diz. Ela chama também a atenção pelo orgulho das par-

ticipantes: “A gente vê a satisfação delas fazendo os trabalhos”.

A satisfação e o orgulho de Mazé são notórios com o salão: na camiseta polo

que vestia, trazia estampada no peito a logomarca do salão. O espaço, porém, não

se resume só ao serviço de manicure: ela também lava, hidrata e seca cabelos. E

mais: uma vez por mês, o salão recebe uma especialista em design de sobrancelha

e uma cabeleireira. O movimento, claro, é maior próximo ao fim de semana e

em vésperas de grandes festas na cidade, que tem uma população estimada de

pouco mais de 18 mil habitantes. Para o Caprino Show, exposição de caprinos e

ovinos no pátio de eventos da cidade, com shows gratuitos de estrelas da música

nacional, em maio de 2016, ela não teve direito ao descanso dominical como de

costume: começou a atender no sábado anterior, trabalhou no domingo e seguiu

assim, das 6h até quase 21h, até o sábado do evento. Ela, porém, não lamenta o

serviço maior em épocas festivas nem tampouco deixa de se divertir: “Só vou

Durante a gravidez, Mazé desenhou e pintou os panos doberço e as toalhas de Heloíse

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cansada”. Afinal, é o sucesso do empreendi-

mento que está garantindo um faturamento

mensal bem satisfatório. “Graças a Deus, o

salão tem dado muito certo”, festeja o ma-

rido, responsável por apanhar a filha na es-

cola na maioria dos dias enquanto a esposa

está fazendo unhas.

Apesar da falta de tempo, Mazé quer

ampliar sua atuação e pretende frequentar

cursos de cabeleireiro, sobrancelha e lim-

peza de pele. “Pretendo viver de estética”,

diz a dormentense de olhos cor de mel. En-

quanto não participa de novas aulas, trata

de enveredar ainda mais pelas unhas. Ela

mesma pinta desenhos em películas para

adornar as unhas das clientes. São flores

brancas, amarelas, rosinhas, borboletas,

lacinhos, corações... Desenhos que ela

também fazia quando criança e que lem-

bram os que pintou para os lençóis da filha.

Heloíse parece seguir os passos da mãe e

gosta de desenhar, além, claro, de passear

na bicicleta cor-de-rosa na calçada da qua-

dra poliesportiva perto da casa e de brincar

com a poodle Belinha. Também curte o sa-

lão da mãe. “Gosto de ver pintando a unha,

quero aprender”, afirma. Para logo avisar:

“Mas quando crescer quero ser veteriná-

ria!”. E sai correndo.

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Com o apoio da

família e do Mãe

Coruja, Mazé vem

transformando

sonhos em

realidade

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Cezicleide

“A gente se sente bem lá (no Programa Mãe Coruja Pernambucana); aprende coisa que não sabe sobre a gravidez, sobre doença que a gente não sabe”

Sonhos que nascem com os filhos

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Sonhos megalomaníacos não pertencem à miúda Cezicleide, mas projetos

possíveis integram os desejos cotidianos da sertaneja de Cabrobó, a 531 km

da capital pernambucana. Com uma deficiência física que a deixou com ape-

nas 1,30 m de altura, a mãe de Jhennyffer Gleicyele, de 3 anos, sonha seguir

morando junto à menina e à mãe na cidade sertaneja vizinha à Bahia, “trabalhar

em casa de família” e acompanhar a educação e o futuro da filha. Às vésperas de

completar trinta anos, Cezicleide também espera retomar os estudos, interrom-

pidos há quase uma década.

Mas falar de sonhos com a tímida Cezicleide não é fácil. Inicialmente, ela se

resigna em dizer que os seus sonhos se resumem a cuidar e dar estudo à filha:

“Meu futuro quero ver nela. Porque acho que já não tenho mais futuro porque

parei de estudar”. Impactante, a frase não passa despercebida pelo Programa Mãe

Coruja Pernambucana. O programa tem incentivado constantemente a sertaneja

a participar do projeto Educação de Jovens e Adultos. “Já estou vendo a matrícula

dela e de outras mães”, conta a pedagoga Maria Zuleide da Silva, uma das pro-

fessoras dos Círculos de Educação e Cultura do Canto Mãe Coruja. No município

desde 2009, o programa funciona em uma ampla casa de esquina em uma das

vias principais da cidade, a 11 de Setembro.

Os círculos têm sido um ponto de convivência e de aprendizagem para Ce-

zicleide, que só chegou ao Canto Mãe Coruja no oitavo mês de gestação. A

partir dos três meses do nascimento de Jhennyffer Gleicyele, ela passou a fre-

quentar os encontros com assiduidade. Nas tardes das segundas e quartas-fei-

ras, Cezicleide deixa a filha na creche e vai ao Círculo de Educação e Cultura,

que funciona das 13h às 18h no Cras localizado na rua paralela à casa em que

mora na Vila Projetada do bairro da Subestação. Lá, recebe orientações sobre

assuntos da maternidade, da mulher e de assistência social. “A gente se sente

bem lá; aprende coisa que não sabe, sobre a gravidez, sobre doença que a gen-

te não sabe”, diz. A professora Zuleide atesta sua participação: “Ela é bastante

participativa; não é faltosa”.

No Programa Mãe Coruja Pernambucana, Cezicleide seguiu além das pales-

tras. Participou de cursos de empreendedorismo de bonecas de pano, enfeites de

emborrachados e preparação de sucos. Os enfeites podem ser vistos espalhados

pelo quarto dela e da filha e também na sala, na estante da TV junto a uma es-

cultura dos santos Cosme e Damião. São bonecas, um pintinho e um aparador de

porta em forma de caracol. Em um vaso de vidro branco, está um buquê de flores

emborrachadas, confeccionado durante as aulas. Não se arriscou a produzir mais

após a aula: “A fôrma é muito cara”, justifica.

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Dentre os cursos realizados, o de preferência dela foi o de preparação de su-

cos. Das aulas, faz, para os almoços da família, suco de couve, limão e cenoura.

Ajudando a mãe, a agricultora Leoniza Alves, 54 anos, com o trabalho de casa,

Cezicleide diz curtir as tarefas domésticas, seja na arrumação ou na cozinha, e

conta fazer muito bem peixe torrado e baião de dois. Nessa hora, ela deixa esca-

par o sonho de ser empregada doméstica. “Queria trabalhar em casa de família

porque gosto de arrumar casa e de cozinhar”, diz ela, que, por causa do problema

no corpo, recebe há cerca de uma década o Benefício de Prestação Continuada de

Assistência Social (BPC), do Governo Federal.

A deficiência física – cifose acentuada da coluna vertebral – Cezicleide encara

com naturalidade. “Sempre encarei de frente. Se foi uma coisa que Deus deu, é

porque quis”, afirma, contando que nunca fizeram brincadeiras com ela na escola

Além de cuidar da

filha, Cleide adora

cozinhar

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A família e

o Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

ajudaram Cleide

a ser uma mãe

melhor

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Um olhar histórico e afetivo |147

ou na rua. A deficiência de Cezicleide é

única na família formada por Leoniza e

pelo também agricultor José Givaldo da

Silva, 67 anos. Dona Leoniza, que costu-

ma ainda ir para a roça de cebola e fei-

jão onde ganha por diária, conta que a

gestação foi sem intercorrência e o parto

normal, e que a caçula das filhas mulhe-

res começou a apresentar a deformidade

por volta dos 6 anos. “Mamãe conta que

eu, bebezinha, tinha caído da cama”,

arrisca Cezicleide, a “Cleide”. Sim, por-

que ela integra uma família de “Cezis”:

“Coisa do pai”, conta, rindo, a mãe, que

ainda hoje se confunde com os nomes dos oito filhos, todos nascidos de parto

normal. Afora Genivaldo e Cenilton, que fogem à regra, os demais são “Cezi”: Ce-

zivaldo, Cezinaldo, Cezimar, Cezineide e Cezinildo, além de Cezicleide.

Mesmo tímida, Cleide é a vaidade em pessoa. Para qualquer saída de casa,

seja para deixar a filha na creche ou participar dos Círculos de Educação e Cul-

tura, só vai maquiada. O estojo de maquiagem é trocado a cada três meses. Para

o dia, delineador nos olhos, sombra e batom claro ou gloss nos lábios. “Blush só

para a noite porque, de dia, o calor atrapalha”, ensina. Também tem os longos

cabelos pretos na chapinha, que faz todo dia, principalmente na franja, que co-

loca para o lado esquerdo. A vaidade é tanta que até já rendeu uma piada entre

os familiares: “Ela vai morrer maquiada” (risos).

A pintura no rosto, claro, fica mais caprichada em dias de festa ou even-

tos à noite. Nessas ocasiões, Cleide também maquia as amigas. Animada,

Cleide confessa: “Gosto de sair. E muito”. A mãe dela é sabedoura disso.

Tanto que, apesar de preferir morar na roça, mantém a residência na peque-

na rua de casas simples porque a filha prefere a cidade: “Gosto mais daqui

porque tem pra onde sair”, justifica Cleide. Um dos programas da jovem

mulher foi ver o revezamento da Tocha Olímpica, que passou por Cabrobó e

foi carregada por 18 participantes, no final da manhã de 27 de maio. Quan-

do não tem muito passeio, a opção é ficar sentada com as amigas da rua em

frente à casa pintada de um azul pálido. Em cadeiras de plástico sob um fí-

cus, Cleide e as amigas conversam e observam o movimento da rua de terra

onde as filhas brincam livremente.

Cezicleide participou de cursos de bonecas de pano, enfeites de emborrachados e preparação de sucos

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Quando tem tempo, Cleide também navega pela rede social. “Mais à tar-

de, quando não vou ao Círculo e Jhennyffer está na creche”, comenta, sob o

olhar reprovador da mãe. “Tem hora que me falta paciência para isso!”, desa-

bafa dona Leoniza. Cleide nem liga para a reclamação materna, mas ela, sim,

anda impaciente com a Justiça, onde move processo de reconhecimento de pa-

ternidade da sua filha junto a Wilson Lima Gomes. Ela conta haver namorado

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dois meses com ele, que é de Juazeiro do Norte (CE) e que, como vendedor de

crediário, trabalhava em Cabrobó. Quando engravidou, ela diz que o namorado

aceitou a gestação, porém foi se afastando aos poucos. Em fevereiro de 2013,

Jhenyffer veio ao mundo, em uma cesariana, no Hospital Dom Malan, em Pe-

trolina, distante quase 200 km de sua cidade. Saudável, a filha recebeu leite do

peito da mãe até os 3 anos.

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Regivânia

“O Cozinha Brasil foi o meu preferido porque foi o começo de tudo. Agora, quero outros cursos, de confeitaria e de salgados”

Comércio doce em comunidade quilombola

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| Mãe Coruja Pernambucana152

Regivânia Torquato dos Santos integra várias estatísticas so-

ciais brasileiras. Sertaneja, mãe adolescente, quilombola.

Mãe coruja. A jovem moradora do município de Santa Maria

da Boa Vista, na região do Sertão do São Francisco, perto da

divisa com a Bahia, abre um sorriso largo junto à animada famí-

lia da Comunidade Quilombola Inhanhum e declara que, apesar

de não haver planejado a gravidez, foi a pequena Sofia, hoje com

menos de 2 anos, que lhe abriu os caminhos das receitas, panelas,

doces e empreendedorismo. “Sem ela, não teria conhecido nada”,

afirma, categórica, a iniciante no empreendedorismo que a des-

viou da trilha do trabalho na roça da família.

A roça na família Torquato vem de séculos e remonta à misci-

genação de escravos, índios e brancos no sertão pernambucano

cortado pelo Rio São Francisco. No chão de cascalho do imenso

município da Boa Vista, como os moradores Santa Maria da Boa

Vista chamam a cidade, ou nas ilhas do grande rio, há plantações

variadas, seja de legumes, verduras ou frutas. Regivânia tem pais,

irmãos e marido trabalhando nos roçados. Até hoje, Luzinete, 52

anos, e Raimundo, 56, pais dela, vão plantar e colher. Seja “em

Pernambuco” – como definem o local que fica no solo do conti-

nente –, seja “na ilha”. No caso, a ilha é Missão Velha, localizada

a cerca de 200 m da casa dos pais de Regivânia. Para chegar lá, o

caminho entre a residência simples na Comunidade Quilombola

Inannhum é abrindo porteiras de outros produtores, adentrando

um alto bananal entremeado por pés de graviola e laranja, até al-

cançar os dois botes estacionados à beira do rio, sob a sombra de

uma frondosa ingazeira. Mais 100 m rio adentro, e se chega a mais plantações

de banana, arroz, feijão, melão, cebola, batata e coentro.

Nesse cenário bucólico, Regivânia participou do processo casa-escola-ro-

çado também vendendo, pelas ruas de Boa Vista, de porta em porta, o coentro

colhido pela família. Para fincar ainda mais os pés na terra, começou a namo-

rar um agricultor. Engravidou de Maria Sofia no relacionamento com Romário

Carvalho Mateus, quatro anos mais velho e morador da também boa-vistense

Cupira, uma das 42 outras comunidades quilombolas do sertão pernambuca-

no. Como tantas outras jovens que integram o percentual de 12% das brasileiras

que se tornaram mães entre 15 de 19 anos, ela parou os estudos – cursou até

meados do ensino médio.

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Começou, então, a trilhar outros caminhos, a partir da gestação. Pegava o

caminho de altos e baixos de cascalhos ladeado por plantações, bodes e até

porquinhos no meio da estrada para chegar a Boa Vista, onde, no centro, com-

parecia mensalmente ao Canto Mãe Coruja. Lá, recebeu orientações sobre a

gravidez, prevenção e “muitos papeizinhos e livros” sobre assuntos relativos à

saúde, família e maternidade.

Depois do nascimento de Sofia, que veio ao mundo em um parto normal, Re-

givânia seguiu frequentando o Canto e passou a participar de todos os cursos ofe-

recidos pelo espaço. O primeiro foi o Cozinha Brasil: “Foi o meu preferido porque

foi o começo de tudo”, conta animada. Depois, vieram uma oficina de prepara-

Regivânia, uma

cozinheira de

“mão cheia”

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Família

Torquato vem da

miscigenação

de escravos, índios

e brancos no sertão

pernambucano

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ção de sucos e uma de doces artesanais – todos devidamente certificados.

Nas aulas de doces, aprendeu a fazer trufas de chocolate em aula dada pela

colega Nice. “Ela foi fazendo e eu observando…” Da observação, nasceram,

das suas mãos, várias trufas que começou a fabricar em 2015 e a vender

pela comunidade quilombola. Todas de chocolate, mas com recheios va-

riados: coco, brigadeiro, maracujá… Já chegou a vender 80 unidades em um

mês, a preços que variam de 1,25 a 2 reais, dependendo do tamanho do

bombom. Comercializa na escola da comunidade – fez propaganda entre

os alunos – e na vizinhança, formada por cerca de 50 famílias. O dinheiro

é usado para comprar novamente o material e tem um lucro de 40%. Como

precisa da geladeira para endurecer o doce, prefere fazê-lo na casa dos pais.

“A geladeira lá de casa não tá muito bem”, diz ela, que se divide entre a casa

dos Torquato e a casinha com o marido, em Cupira.

“Os cursos são uma forma de desenvolver habilidades para as mães, e

elas perceberem que têm potencial e que são capazes de fazer o mesmo

que outras que já sabem. É também uma forma de ingresso no mercado e

de não ficar na dependência”, observa a professora e psicopedagoga Sil-

vana de Alencar Cruz, técnica do Canto Mãe Coruja de Santa Maria da Boa

Vista. Lizete, a mãe de Regivânia, é só orgulho da filha, a penúltima de

sete. “Era o que mais desejava para ela: que participasse dos cursos”, afir-

ma a mãe, que já recebeu na comunidade aulas de bordado; tanto que um

pano com flores vermelhas adorna o som instalado na sala. Dona Lizete

também vende cocada, pipoca e bombons entre os vizinhos enquanto se

reveza com os afazeres da casa e da roça. O apurado das vendas – tan-

to da mãe quanto da filha – fica em um pequeno vasilhame sobre uma

das geladeiras da residência. Apesar de a cozinha ser espaçosa, a cocada

é feita no quintal, ao fundo, em um grande fogão a lenha, pegada por seu

Raimundo nos matos perto. Lá também é cozido o feijão: “Para maneirar

com o bujão”, explica seu Raimundo.

As trufas de Regivânia são feitas preferencialmente à noite, quando ela já

colocou a filha para dormir. Trabalhar com o doce, diz, permite um cuidado

maior com a filha, que com 1 ano e 9 meses, ainda mama. “Vou parar a ama-

mentação quando ela fizer 2 anos”, avisa a mãe, sorrindo. “Em casa, a gente

vê o que o filho tá fazendo, pode cuidar mais”, observa ela, que costumava

levar a criança ainda bebê para a roça. Enquanto aguava a plantação, deixava

a filha sentada sobre as palhas da bananeira. “Ela ficava tirando todas as flo-

res”, conta, sorrindo.

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Sem planos próximos de futuros filhos: “Deus me livre!”, Regivânia exclama

rápido quando questionada sobre essa possibilidade, para emendar com: “Só

quando essa aqui crescer”, referindo-se a Sofia em seu colo. Regivânia quer,

sim, mais aulas: “Queria outros cursos, de confeitaria e de salgados”, afirma,

sonhando com o dia em que poderá usar as fôrmas já compradas para assar

“rabinho de tatu”, como o salgadinho canudinho é conhecido na região.

Os Torquatos

mantêm uma roça

na ilha Missão

Velha, no meio do

Rio São Francisco

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Maria Auxiliadora

“A esperança reacendeu quando procurei o Mãe Coruja em Boa Vista porque escutei que lá ajudavam no encaminhamento médico... Hoje estou feliz demais”

Primeiro, o susto, depois, a vitória

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Auxiliadora nunca tinha ouvido a palavra, tampouco sabia seu significado.

Que dirá, então, das consequências? Mas, desde julho de 2015, quando

realizou uma ultrassonografia morfológica, o termo “hidrocefalia” entrou

na sua vida e ganhou forma, olhos, sorriso e muito amor com o nasci-

mento de Ítalo Bernardo dois meses depois. Hoje, a expressão virou corriqueira

na vida da agricultora Maria Auxiliadora Adriano Barros, 34 anos, e de toda a

família dela, residente em uma das 47 agrovilas do Projeto Fulgêncio, erguido

nos confins da extensa zona rural do município de Santa Maria da Boa vista, no

sertão pernambucano do São Francisco, vizinho ao Estado da Bahia. Do total

desconhecimento sobre a doença à dor e ao desespero da ameaça de uma gra-

videz interrompida e do risco de morte do filho, ela comemora os 8 meses do

menino, que pouco se mexe e passa grande parte do tempo nos braços da mãe.

Uma vitória da vida para quem recebeu um prognóstico de quem “não teria

noção nem de respirar nem de comer”.

“Hoje estou feliz demais. Muito feliz”, festeja Auxiliadora. A gestação foi

toda de sobressaltos para a pernambucana que foi para Boa Vista com os pais

e irmãos na década de 1980, da cidade vizinha de Belém de São Francisco. A

mudança para a agrovila de número 42 aconteceu depois que o roçado onde

moravam foi desapropriado para a construção da barragem de Itaparica, for-

çando o deslocamento de quase 45 mil pessoas de sete municípios de Pernam-

buco e Bahia. Casada com o também agricultor Francisco Barros, o Tico, e com

já três filhos, Auxi, como é chamada, confessa que a gravidez pegou a todos de

surpresa. “Pobre é difícil planejar”, justifica.

A gestação foi confirmada na 21ª semana, em ultrassonografia realizada

após ela ir ao posto do PSF do projeto agrícola e ser encaminhada para exame

na sede de Santa Maria da Boa Vista, queixando-se de atraso na menstruação e

dor “no pé da barriga”. Mais espanto ainda ela teve quando, ao ser constatada a

gravidez, foi solicitada uma nova ultrassonografia mais detalhada, a morfológi-

ca. Realizado em Petrolina, o exame constatou o problema no feto: hidrocefalia.

“Não sabia o que era; nunca tinha ouvido falar”, lembra. Perguntou, então, se

era algo grave e ouviu um “muito grave” como resposta. Veio na lotação cho-

rando os quase 60 km do caminho de volta.

O assombro diante do termo médico para designar o acúmulo excessivo de

líquido dentro do crânio, causando aumento da pressão no cérebro, só fez au-

mentar em nova visita ao posto do PSF localizado na agrovila 43. Lá, ouviu que

o filho não resistiria: “Ele não vai ter noção de respirar, nem de comer. O caso é

muito grave e ele não vai sobreviver”, lembra a mãe. No PSF mesmo, foi orien-

Os apoios da

família e do

Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

têm sido

fundamentais para

Auxiliadora

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tada a interromper a gravidez, que estava na 22ª semana, e recebeu o enca-

minhamento para o procedimento, que seria em Petrolina. Retornou “sem

chão” à casa de dois quartos onde mora com o marido e filhos. “A notícia

de um aborto tirou todas as esperanças”, recorda. Chorou bastante e che-

gou a sonhar com várias crianças deficientes e se perguntava: “Qual tipo de

deficiência meu filho tem?”. Nesse período, começou um novo processo,

de desapego – se antes toda a família alisava a barriga, a ordem ali era se

distanciar, para não sofrer – e também não fez o pré-natal nem tomou as

vitaminas necessárias.

Já em Petrolina, a esperança reacendeu quando o obstetra solicitou a

opinião de um segundo médico. Nesse momento, Auxiliadora procurou o

Programa Mãe Coruja Pernambucana em Boa Vista porque escutara que

“elas ajudavam no encaminhamento médico”. E ajudaram. Em nova con-

sulta, ouviu, na cidade polo econômico da região, que o filho teria chan-

ce de sobreviver e que havia tratamento para a hidrocefalia, com cirurgia

para implantação de válvulas na cabeça para escoar o excesso de líquido.

Saiu da consulta com uma cesariana programada para a 38ª semana. “Foi

um alívio ouvir tudo aquilo!”, lembra, emocionada. Nesse momento, tra-

tou de comprar umas mudas de roupa para o filho, uma toalhinha... afinal,

já estava com quase 34 semanas. Nessa contagem regressiva para o parto,

voltou ao PSF da agrovila e, novamente, ouviu do médico que, sim, a in-

terrupção da gravidez seria necessária. Na 35ª semana, voltou ao Hospital

Dom Malan, em Petrolina, e, após algumas horas de indecisão, foi feito o

parto. Ítalo Bernardo nasceu com 3,04 kg de peso, 45 cm de altura e perí-

metro cefálico de 42,5 cm. Não só respirou como se alimentou, mamando.

Ficou na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) por 24 dias, quando pas-

sou pela primeira cirurgia, para a colocação de um dreno visando a escoar

o excesso de líquido, que é eliminado pela bexiga.

De lá para cá, foram realizadas mais duas cirurgias em Bernardo, todas

envolvendo as válvulas, colocadas internamente na cabeça e com um lon-

go “cano” que passa pelo abdome até a bexiga. Recém-nascido, ele ma-

mou até os 2 meses (apesar de todos os esforços) e hoje se alimenta, entre

outras coisas, de banana e verduras machucadas e de uma mistura de leite

e cereal próprios para bebês, na mamadeira. O bebê é assistido por fisio-

terapeuta e nutricionista em Boa Vista e por neurocirurgião e pediatra em

Petrolina. Cada ida a um dos profissionais é um verdadeiro périplo. Afinal,

Auxiliadora tem

outros três filhos:

Fernanda, Gustavo

e Hilary

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de onde mora até Boa Vista são 60 km, e boa parte deles em estrada

de barro; para Petrolina, são mais 120 km – o que implica em sair às

4h da manhã com o marido levando-os de motocicleta em estrada de

barro até o povoado de Caraíbas, onde pegam a lotação. Um problema

vivido por muitas das mães corujas da região: quase 70% delas vivem

na zona rural de Santa Maria da Boa Vista. Desses trajetos, Auxi volta

extenuada porque, na moto, leva o filho suspenso, além de sacola e

da sombrinha para proteger do sol nas ruas até o hospital. Para ajudar

nos gastos, principalmente com fraldas, desde os 7 meses de idade

Bernardo recebe benefício do Governo Federal.

Para a retirada do benefício e os encaminhamentos médicos,

Auxi contou com ajuda e orientação do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana. Com os cuidados intenso com o caçula, hoje, raramen-

te visita o programa: “É muito difícil sair”. Ela divide os afazeres

domésticos com a filha mais velha, Fernanda, 15 anos. Pela manhã,

Auxiliadora e Fernanda se revezam entre os cuidados com Bernardo

e o serviço da casa, à tarde, Fernanda vai para a escola onde estuda

o segundo ano do ensino médio e tem planos de cursar faculdade

de Ciências Contábeis. Os outros dois filhos – Gustavo, 9; e Hilary

(achou o nome de Hillary Clinton bonito), 7 – estudam pela manhã,

respectivamente, na quinta e segunda séries do ensino fundamen-

tal. Quando retornam da escola, correm para junto do irmão, que

observa tudo movendo os olhos sem mexer a cabeça e fica sonolen-

to grande parte do tempo, uma das características da doença.

Apesar da familiaridade já adquirida com a hidrocefalia, os ir-

mãos gostariam de conhecer outras pessoas com a doença, desejo-

sos de que Bernardo “corra logo”, como conta a mãe. Entre as quase

8 mil crianças cadastradas no Programa Mãe Coruja Pernambucana

atendidas pela VIII Geres, na qual Boa Vista está inserida, há o registro de

uma outra criança com o problema. O menino vive no povoado quilombola

de Serrote, a cerca de 80 km da agrovila 42, já está com 6 anos e mostrou uma

boa evolução, convivendo com o dreno e frequentando a escola regular.

Muitas vezes, Auxiliadora, que cursou o ensino médio e também trabalha-

va na roça com o marido, fica com Bernardo no alpendre diante da casa, co-

berto com palha de coqueiro. Lá, conversa com as cunhadas e vê a movimen-

tação no amplo quintal onde há pés de manga, limão, acerola, pinha, laranja

e goiaba. No espaço, podem ser vistos também galinhas, um porco, a cabra

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Carol e o burro Canário, responsável por puxar a carroça que leva Tico para o

roçado de meio hectare onde ele hoje planta banana pacovan. Uma montanha

de tijolos também ocupa uma parte do quintal. A meta é fazer uma outra casa,

que não seja tão perto da estrada que dá acesso à agrovila para que não suba

tanta poeira e prejudique o pequeno Ítalo Bernardo. Vindo para almoçar em

casa entre os dois turnos na plantação, o pai é amoroso com o filho. “Ele dá

muita risada”, conta, orgulhoso, ele, que é responsável por, durante a noite,

quando os demais filhos dormem, preparar a mamadeira para o caçula: “Oxi,

tem que ajeitar!”.

Auxiliadora e toda

a família

reside em uma das

47 agrovilas do

Projeto Fulgêncio

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Inês

“Se não fosse esse suporte... Sei não... Talvez eu não tivesse hoje o sorriso dela”

Cinco encontros afetivos

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Nos últimos oito anos, a história da, hoje, pedagoga Inês Maria dos Santos,

nascida e criada em Parnamirim, no sertão central de Pernambuco, con-

funde-se com a do Programa Mãe Coruja Pernambucana no município.

Nesse período, a vida de Inês sofreu profundas transformações, alternan-

do momentos tristes e felizes. Mas, toda vez que o caminho dela parecia ficar

mais difícil, ela cruzava com o programa. Foram cinco encontros que ajudaram

a tornar os momentos bons maiores do que os mais complicados.

O primeiro encontro com o Programa Mãe Coruja Pernambucana aconte-

ceu, muito provavelmente, no momento mais difícil para Inês, quando ela per-

deu Maria Rita, a primeira filha, que morreu poucos dias depois de nascer. Os

impactos do episódio foram tão profundos que ela tem dificuldades de lembrar

dos detalhes. “Apagou muita coisa da memória.”

Inês nasceu e

foi criada em

Parnamirim,

sertão de

Pernambuco

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Era o ano de 2008, o Programa Mãe Coruja Pernambucana ainda estava em

fase de implantação em Parnamirim, quando Inês teve uma pré-eclâmpsia.

Chegou a ser internada no Instituto de Medicina Integral Professor Fernando

Figueira (IMIP), no Recife. Mas os cuidados não foram suficientes e a criança

acabou morrendo.

A volta para casa não foi fácil. Destroçada por dentro, Inês acabou entran-

do em depressão. “Era muito triste ver o quarto dela todo arrumado e vazio.”

Sentia que havia entrado em um beco sem saída quando foi procurada pela

equipe do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Mesmo sem estar grávida ou

ter filhos, Inês foi convidada e aceitou participar dos cursos que passaram a ser

ministrados pelo programa no município.

Além do conteúdo ministrado nos cursos, foram as conversas, a troca de ex-

periências e a afetividade que encontrou no ambiente

do Canto Mãe Coruja que atraíram Inês. Sentindo-se

acolhida, ela foi ficando e curando as feridas. Novos

caminhos começavam a se abrir. Ela estava preparada

para o segundo encontro com o Programa Mãe Coruja

Pernambucana.

Foi quando, em 2009, engravidou novamente. Mais

uma vez de uma menina. Dessa vez, porém, a gesta-

ção teve o acompanhamento do Programa Mãe Coruja

Pernambucana. “Tive todo o apoio e deu tudo certo.”

Maria Clara nasceu saudável, cercada de cuidados e

amor. E assim continuou, com mãe e filha sendo as-

sistidas pelo programa.

Em 2010, ela teve seu terceiro encontro com o

Programa Mãe Coruja Pernambucana. Mais uma vez,

quando ela precisava. Só que, dessa vez, Inês não es-

tava grávida. A mãe de Maria Clara foi contratada para

ensinar nos Ciclos de Educação e Cultura. Uma expe-

riência rica, tanto do ponto de vista profissional quan-

to pessoal, que a levou por outros caminhos. Assim,

motivada com o novo trabalho, Inês voltou a estudar,

entrou e concluiu o curso de Pedagogia.

A experiência como professora dos Círculos de Edu-

cação e Cultura durou seis anos (que é o tempo permi-

tido pela legislação para esse tipo de vínculo profissio-

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O Canto Mãe

Coruja é como

uma segunda casa

para Inês

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nal). Mas foi tempo suficiente para

marcar profundamente a vida de Inês.

“Com as alunas, o acolhimento foi tão

profundo que viramos uma família”,

explica ao afirmar que a maioria dos

vínculos construídos no período ainda

são mantidos até hoje.

O quarto encontro de Inês com o

Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na aconteceu em 2013 e tem nome:

Maria Paula. A gestação também foi

acompanhada desde o início pelo

programa. O curioso é que, dessa vez,

Inês experimentou os dois lados do

processo, como mãe e como parte da equipe. O parto, em Ouricuri, foi tran-

quilo e, até hoje, Maria Paula segue sendo cuidada pelo programa.

Já no final de novembro de 2015, uma “simples” catapora em Maria Clara,

a filha mais velha, quase causa uma nova tragédia na vida da família de Inês.

Por conta da doença, a menina teve infecções causadas por uma bactéria resis-

tente, que chegou a paralisar seus rins, com o quadro evoluindo para o coma.

Precisou ser atendida no hospital de Ouricuri, cidade que fica a cerca de 60 km

de Parnamirim.

Mesmo em Ouricuri, a coisa não caminhava bem. Foi quando entrou no cir-

cuito a equipe do Programa Mãe Coruja Pernambucana para auxiliar nos enca-

minhamentos, na articulação entre as instituições de saúde, na organização do

transporte para levar ao hospital mais adequado para receber o caso de Maria

Clara e, não menos importante, no apoio afetivo.

Mesmo assim, a batalha foi dura. Maria Clara foi transferida para Caruaru.

Passou Natal e Ano Novo internada. Ficou 22 dias na UTI, depois mais 14 dias

na pediatria (ainda em Caruaru) e outros 10 dias já de volta no hospital de Ou-

ricuri. Hoje, ainda faz acompanhamento mensal no Hospital Barão de Lucena,

no Recife, também com o apoio do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Na opinião de Inês, a atuação do programa foi fundamental para salvar a

vida da filha. “Se não fosse esse suporte... Sei não... Talvez eu não tivesse hoje o

sorriso dela.” Inês também faz questão de ressaltar o apoio que teve da família.

A mãe, por exemplo, ficou com Maria Paula, a filha caçula, durante todo esse

tempo difícil.

A experiência como professora dos Círculos de Educação e Cultura marcou profundamente a vida de Inês

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Maria Clara é uma

aluna dedicada

O episódio com Maria Clara serviu para aproximar ainda mais Inês do ma-

rido, que, na época, também passava por um momento pessoal complicado, já

que estava desempregado. “A gente conhece as pessoas nos momentos difíceis.

E ele foi companheiro. Enquanto pai, foi excelente”, relembra.

Hoje, com as filhas bem de saúde e o marido empregado (trabalha nas obras de

transposição do Rio São Francisco), Inês agradece o fato de o Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana ter surgido na sua vida. “Para mim, isso aqui é uma família.”

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Maria de Lurdes

“Eu faço qualquer coisa para não deixar que falte nada para meus filhos. No futuro, eu vou ensinar o que aprendi no Mãe Coruja para a minha filha”

A felicidade entre sonhos e festas

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Oaniversário de 5 anos de Gustavo Araújo Lima fez o maior sucesso entre

os amigos e familiares que moram em Trindade, no Sertão do Araripe,

em Pernambuco. Os convidados ficaram impressionados com a qualida-

de dos enfeites, o capricho na decoração, o sabor dos docinhos e, prin-

cipalmente, o sabor do bolo. A alegria do aniversariante só não era maior do

que a da mãe, Maria de Lurdes. Afinal, foi ela quem preparou tudo com as

próprias mãos.

Maria de Lurdes descobriu o talento para organizar festas infantis há pouco

tempo. Tudo começou justamente quando engravidou de Gustavo. Isso porque,

durante a gestação, ela se cadastrou no Programa Mãe Coruja Pernambucana e

passou a ser acompanhada pelas “meninas”, como chama carinhosamente as

técnicas que trabalham no programa.

O carinho com as “meninas” do Canto Mãe Coruja se justifica. Embora te-

nha se cadastrado apenas na gravidez, Lurdes já trabalhava há dois anos no

programa, cedida pela Secretaria de Saúde do município, à qual era vinculada.

Começou como auxiliar de serviços gerais e continua hoje como recepcionista.

Curiosa e dedicada, Maria de Lurdes entrou em todos os cursos profissio-

nalizantes oferecidos regularmente pelo programa na cidade. Aprendeu, entre

outras coisas, a trabalhar com bijuterias, customização de roupas e a fazer arte

com feltro e emborrachado.

As novas habilidades vieram em boa hora. Aos 38 anos, com dois filhos

(além de Gustavo, ela é mãe de Tayná, de 10 anos) e com o marido, Márcio

José, desempregado, Lurdes teve que assumir mais efetivamente as despesas

da casa. A renda extra, fundamental para complementar o orçamento domés-

tico, veio das encomendas para as festas infantis.

Além da decoração, Lurdes faz os docinhos. Habilidosa nos trabalhos ma-

nuais, ela também tem se mostrado competente nos “negócios”. Assim, os pe-

didos têm crescido e ela já anda até se queixando que tem faltado tempo para

dar conta das encomendas. A reclamação sobre a quantidade de trabalho, po-

rém, é feita com um visível tom de orgulho. “Eu faço qualquer coisa para não

deixar que falte nada para meus filhos. No futuro, eu vou ensinar o que aprendi

no Mãe Coruja para a minha filha”, complementa.

Mas a importância no Programa Mãe Coruja Pernambucana na vida de

Maria de Lurdes não foi apenas material. O programa também teve papel fun-

damental no lado afetivo, psicológico e, até mesmo, cidadão da jovem mãe.

A certeza disso vem quando ela compara as suas duas gestações. Entre a pri-

meira, há cerca de dez anos, quando nasceu Tayná, e essa última de Gusta-

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Lurdes

trabalhando em

casa, e ao lado

das “meninas” do

Canto Mãe Coruja

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vo, muita coisa mudou. Para melhor, segundo ela. “Na

primeira, tinha muitas dúvidas. Na segunda, recebi

toda a orientação.”

Lurdes conta que as orientações se estendiam até o

plano pessoal, quando necessário. “As meninas per-

guntam como está a vida em casa, a relação com o ma-

rido, essas coisas. No meu caso, elas chegaram até a

chamar Márcio, com quem estou casada há oito anos,

para conversar e orientar. Elas explicaram que a mulher

fica mais sensível quando está grávida.”

Depois da conversa no Canto Mãe Coruja, Lurdes ga-

rante que a relação conjugal ficou muito melhor. “Már-

cio passou a ser mais atencioso, a dar mais carinho. Ele

passou a entender melhor como a gravidez funciona e

interfere na sensibilidade das mulheres.”

Para ela, a ajuda do programa foi marcante até na

hora de buscar os seus direitos e informações básicas,

ainda que mesmo em uma simples consulta médica.

“Antes [do Programa Mãe Coruja Pernambucana] era

como se a gente não enxergasse direito. Eu não tinha

coragem de fazer perguntas. As enfermeiras também

não explicavam. As meninas [técnicas do Canto Mãe

Coruja] orientaram, disseram quais perguntas eu de-

veria fazer.”

Agora com 5 anos, Gustavo está chegando na idade

limite para continuar cadastrado no programa e Lur-

des diz que já está começando a sentir saudades. Mas

a experiência de participar do Programa Mãe Coruja

Pernambucana, tanto como mãe quanto como profis-

sional, também ajudou Lurdes a se conhecer melhor e

a traçar novos objetivos na vida. Na verdade, uma coisa

está relacionada com a outra.

Lurdes já fala no futuro: “Descobri que tenho um

dom, que é ajudar as pessoas”. Por isso, ela traçou um

plano muito claro para a sua vida: “Vou ser assistente

social. Assim que Márcio arrumar um emprego, entro

na faculdade”.

Para Lurdes, a

ajuda do Programa

Mãe Coruja

Pernambucana foi

marcante

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Maria Givaneide

“Através da cultura, as crianças vão crescer com um pensamento mais rico e longe dos problemas”

A arte de superar obstáculos

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Quem vê Maria Givaneide sorrindo, cantando e dançando coco não imagi-

na os percalços que passou na vida. Essa arcoverdense de 34 anos poderia

ser uma mulher triste e amarga. Mas, contrariando as adversidades, ela

escolheu a alegria representada na música e na cultura de seus ancestrais.

Dessa forma, vive de bem com o marido, Anderson, e as filhas, Maysa Rhaian-

na e Ana Lílian, cercada de amigos e satisfeita com o que faz.

Só que nem sempre foi assim. “Vivia chorando pelos cantos”, lembra com

ar pesaroso, para depois soltar uma bela risada. Dois fatores foram decisivos

para transformar aquela Givaneide triste, “estressada com a vida”, como cos-

tuma dizer, na mãe e esposa alegre. Um foi o encontro, ainda adolescente,

com o samba de coco. O outro foi a descoberta, anos depois, quando estava

grávida, do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Por sorte, as duas coisas surgiram quando ela mais precisava. Coco e Mãe

Coruja complementaram-se. Um potencializou o outro e, juntos, mudaram a

vida de Givaneide e das pessoas que a cercam. Mas, antes de contar essa me-

tamorfose, é preciso conhecer o início da história.

Givaneide nasceu em uma família de pequenos agricultores em Arcoverde,

sertão pernambucano. Na infância, compartilhou com sete irmãos uma vida

de privações, um pai pouco afetivo, violento até, e uma mãe batalhadora e

dedicada aos filhos. Se quase não cita o pai, da mãe fala o tempo todo, e com

orgulho. De dona Terezinha dos Anjos herdou o amor pelo samba de coco, a

garra para superar obstáculos e um boa dose de bom humor.

O primeiro grande obstáculo surgiu quando ainda tinha 4 anos de idade.

Em uma simples brincadeira de roda na escola, ao lado da irmã, caiu e teve o

braço esquerdo deslocado. Como não teve atendimento médico imediato (só

foi atendida dias depois, quando a família percebeu que a coisa era mais grave

do que imaginavam), acabou ficando, de forma definitiva, com os movimen-

tos seriamente limitados.

Pouco depois disso, mais um desafio. Por volta dos 6 anos de idade, en-

quanto os irmãos e vizinhos brincavam correndo de um lado para o outro, a

menina, que ainda se adaptava à limitação dos movimentos do braço, teve

que passar cerca de três anos dentro de casa, sem poder andar, por conta de

uma febre reumática.

Com o tempo, recuperou a mobilidade das pernas, mas não a sorte. Aos 10

anos, novamente na escola, foi atingida por uma “pedra” de giz arremessada

por um colega. O objeto a acertou bem no olho e, em consequência disso,

Givaneide perdeu a visão esquerda. Assim, a menina triste começou a se re-

Givaneide com a

filha caçula, Ana

Lílian

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trair mais ainda na sua timidez. Aos 16 anos, caminhava para uma depressão

quando, seguindo os passos da mãe, passou a fazer parte do centenário grupo

Samba de Coco das Irmãs Lopes.

A partir desse momento, um novo mundo se abriu. À medida que “se solta-

va”, Givaneide espantava a tristeza e descobria um sentido para a vida. Passou

a ter convivência social e, mais segura e desinibida, conheceu Anderson da

Silva Monteiro, primeiro namorado e atual marido. As coisas estavam, eviden-

temente, melhores para Givaneide. Mas uma agitação interna, algo que ela não

Sede do centenário

grupo Samba de

Coco das Irmãs

Lopes

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sabe explicar direito e define com “es-

tresse com a vida”, ainda a incomodava.

Foi quando, há sete anos, Givaneide

engravidou. Ao fazer o pré-natal, conhe-

ceu o Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana e, de cara, foi participar do Círculo

de Cultura e Educação. Foi outro salto

de qualidade na vida da nova mamãe.

Quando Maysa nasceu, encontrou uma

mãe bem mais preparada para o desafio

que se apresentava.

Cerca de três anos depois, uma nova

gravidez. Só que, dessa vez, as coisas fo-

ram mais complicadas. Durante a gesta-

ção de Ana Lílian, veio a notícia devas-

tadora da morte de dona Terezinha. A

pancada foi grande. Grávida, com o ma-

rido desempregado e sem a mãe, Giva-

neide não resistiu e acabou entrando em

depressão.

A força para “sair do fundo do poço”

Givaneide encontrou no Programa Mãe

Coruja Pernambucana e nos laços afe-

tivos construídos com as profissionais e

com as outras participantes. Além do Ci-

clo de Cultura e Educação, ela participou

dos cursos profissionalizantes ofereci-

dos pelo programa. Descobriu algumas

habilidades que nem sabia que possuía.

Aprendeu a fazer velas, bolos e a usar esses conhecimentos para melhorar sua

vida familiar. Aos poucos, voltou a sorrir.

No embalo da recuperação, ganhou ânimo para estudar. Concluiu o Magis-

tério e já está inscrita no Enem. Quer cursar Pedagogia para exercitar o que ela

acredita que é um dom seu: “trabalhar com crianças”. Enquanto as aulas na

faculdade não vêm, ela vai exercitando sua habilidade com as crianças como

pode. Um exemplo disso foi quando ela juntou duas de suas paixões e organi-

zou a Ciranda do Mãe Coruja com os filhos das participantes do programa.

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Com a Ciranda Mãe Coruja, Givaneide teve oportunidade de

dividir com outras pessoas a experiência positiva que teve ao

unir a afetividade do programa com as tradições culturais. Ela

acredita que: “Através da cultura, as crianças vão crescer com

um pensamento mais rico e longe dos problemas”.

Um exemplo de como a cultura tem uma importância

central para a vida de Givaneide está no local em que ela

passa grande parte do tempo. No Samba de Coco Irmã Lopes

ela se sente realizada e, como também acontece no Canto

Mãe Coruja, acolhida. Tem uma relação de mãe e filha com

a Mestra Severina, responsável pelo grupo. Graças às muitas

apresentações, feitas principalmente nos períodos juninos

e natalinos, conheceu o Recife e outras tantas cidades pelo

Nordeste. Já participou até da gravação de um CD, o Anda a

roda, lançado em 2014.

No mesmo local em que fica a sede do Samba de Coco Irmã

Lopes funciona também o Museu Ivo Lopes. A instituição,

mantida com muita dedicação por Mestra Severina, preserva

a centenária história da dança de coco em Arcoverde, levada à

cidade pela família Lopes. Mas também existe uma outra histó-

ria escondida ali. Muito dos elementos que ajudaram Givaneide

a formar sua personalidade estão nas paredes do museu; são as

dezenas de objetos, instrumentos e imagens – inclusive fotos

de sua mãe, Terezinha, que mostra com orgulho. Por isso, é fá-

cil entender quando ela diz que pertence àquele lugar.

O samba de coco fez Givaneide se descobrir socialmente,

entender sua história e a que mundo pertence, trazendo ale-

gria e abrindo horizontes. O Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana, por sua vez, a fez se descobrir como mulher, comparti-

lhar suas histórias e a olhar para dentro, para a família. Trouxe

paz à alegria.

A melhora na qualidade de vida de Givaneide e da família,

claro, foi notada e comemorada pelo marido, Anderson, que,

segundo ela faz questão de destacar, foi um grande compa-

nheiro nos momentos difíceis. Ele ficou tão satisfeito com o

Programa Mãe Coruja Pernambucana que até defende a criação

do “Pai Coruja”. Mas, para ele, “a patroa feliz é o que importa”.

No Samba de

Coco Irmã Lopes,

Gilvaneide se sente

realizada

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| Mãe Coruja Pernambucana192

Elis

“A mãe tem que ser fonoaudióloga, fisioterapeuta. Tem que estar presente o tempo todo”

Uma história de amor e dedicação

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Um olhar histórico e afetivo |193

Foto: Leônia Carvalho

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| Mãe Coruja Pernambucana194

Quem chega na casa de Antônia Elislândia para visitar a pequena Elaine,

na sertaneja cidade de Parnamirim, irá encontrar uma típica mamãe co-

ruja. O tratamento de “princesinha”, o capricho nas roupas e enfeites e,

principalmente, o brilho nos olhos ao falar da filhinha de 7 meses mos-

tram o quanto aquele bebê é querido. No celular, dezenas de fotos (a maioria

ao lado do carinhoso papai Osvaldo) e vídeos com as pequenas conquistas

diárias – como uma virada na cama ou o esboço de um sorriso – são mostra-

das aos visitantes com orgulho.

Tanto orgulho dos pais por coisas aparentemente triviais para qualquer bebê

tem explicação. Elaine foi a primeira criança nascida em Parnamirim diagnos-

ticada com microcefalia relacionada à infecção da mãe pelo zika vírus. Assim,

cada uma dessas pequenas conquistas vem acompanhada de muito esforço, de-

dicação e, claro, amor da família.

A rotina de Elaine é puxada. Ela faz fisioterapia (semanalmente com um

profissional e, diariamente, com a mãe), fonoaudiologia e consultas a cada dois

meses em Petrolina, que fica a 185 km de distância. Isso fora os tantos outros

cuidados comuns a todos os bebês. Embora ainda mame, o que é muito bom,

ela já complementa a alimentação com frutas e papinhas. Geralmente acorda

durante a madrugada e, na maioria das vezes, chorando muito. Não é incomum

trocar o dia pela noite.

Para dar conta de um dia a dia tão puxado, Elis, como Antônia Elislândia

é chamada pelos mais próximos, parou de trabalhar. Formada em Letras, ela

dava aula até engravidar. “A mãe tem que ser fonoaudióloga, fisioterapeuta.

Tem que estar presente o tempo todo.” Agora, as despesas da casa, que por

sinal aumentaram, ficam por conta apenas de Osvaldo. Muito provavelmente

Elaine terá direito a um benefício por conta da sua condição, e o orçamento

doméstico voltará a se equilibrar.

Nesse vai e vem de salas de espera e consultas médicas, de informações que

precisam ser buscadas e decisões a serem tomadas surgem muitas dúvidas e,

em alguns momentos, bate certa insegurança. É aí que entra outro personagem

importante na história de Elaine, Elis e Osvaldo: o Programa Mãe Coruja Per-

nambucana. “É um apoio muito importante. Sempre que tenho uma dúvida, ligo

para elas. Me sinto mais segura”, fala Elis, referindo-se à equipe do Canto Mãe

Coruja de Parnamirim.

O programa também ajuda na busca por profissionais e especialistas adequa-

dos para o caso de Elaine, ou para a própria Elis. “As meninas [equipe do Canto

Mãe Coruja] já me perguntaram se eu queria um psicólogo. Eu disse que não pre-

Cada pequena

conquista vem

acompanhada

de muito esforço,

dedicação e amor

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Um olhar histórico e afetivo |195

Foto: Leônia Carvalho

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| Mãe Coruja Pernambucana196

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Um olhar histórico e afetivo |197

cisava. Eu estou bem. Não preciso de psicólogo.

Na época, eu disse a elas que queria mesmo era

um fisioterapeuta para Elaine”, lembra.

A participação de Osvaldo, como marido e

como pai, tem sido muito importante desde o

início do processo. Elaine nasceu no dia 29 de

novembro de 2015 e confirmou o diagnóstico,

já esperado desde os cinco meses de gestação

após um dos exames do pré-natal. Apesar de,

naquele momento, ainda haver alguma dúvida

sobre a possibilidade da microcefalia, a notí-

cia acabou sendo um baque para Elis. “Chorei

muito. Mas Osvaldo sempre se manteve tran-

quilo, dando força.”

Foi a primeira vez que Elis ouviu falar em mi-

crocefalia. O assunto estava começando a entrar

em evidência no Brasil e ela mergulhou na inter-

net em busca de informações. A relação com o

vírus da zika, doença que ela teve entre os três

e quatro meses de gestação, veio depois. “Só fui

ouvir falar de zika perto do parto.”

À medida que os exames iam confirmando as

suspeitas iniciais, Elis e Osvaldo passavam a en-

tender melhor o desafio que teriam pela frente. O

tempo preparava e fortalecia o casal.

Fora o fato de ter tido zika, a gestação seguiu

sem outras complicações. Elaine nasceu de parto

normal na Maternidade Mãe Coruja, que fica na

vizinha cidade de Ouricuri. “Chegamos às 4h30.

Às 5h ela nasceu”, lembra com emoção, do dia

que mudou completamente sua vida.

Sete meses depois, Elis fala e se porta como

uma mulher forte, bem resolvida com a vida.

Basta um primeiro encontro com ela, seguido de

alguns minutos de conversa, para perceber que

Elaine tornou a mãe e o pai, além de corujas,

pessoas ainda melhores.

Osvaldo, como

marido e como

pai, tem sido muito

importante desde o

início do processo

Foto: Leônia Carvalho

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| Mãe Coruja Pernambucana198

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Um olhar histórico e afetivo |199

COMITÊ DE ASSESSORAMENTO

Ana Elizabeth de Andrade LimaCoordenadora do Programa Mãe Coruja

Pernambucana e Diretora de Políticas Estratégicas do

Programa Mãe Coruja Pernambucana Secretaria de Saúde

Alessandra Debone de SousaSecretaria de Saúde

Ana Maria de Lima OliveiraSecretaria de Saúde

Cristina Pinheiro RodriguesSecretaria de Saúde

Eveline D’Andrada CruzSecretaria de Saúde

Keduly Vieira GadelhaSecretaria de Saúde

Lusanira Maria da Fonseca de Santa Cruz

Secretaria de Saúde

Maria da Conceição Silva CardozoSecretaria de Saúde

Marta Cristina Santos WanderleySecretaria de Saúde

Tânia Maria de Andrade LimaSecretaria de Saúde

Virgínia Maria Holanda de MouraSecretaria de Saúde

Rita de Kássia Pontes SilvaSecretaria de Educação

Bernadeth de L. GondimSecretaria de Desenvolvimento Social,

Criança e Juventude

Maria Adélia GonçalvesSecretaria de Desenvolvimento Social,

Criança e Juventude

Wedja Santana da SilvaSuperintendência de Segurança Alimentar

e NutricionalSecretaria de Desenvolvimento Social,

Criança e Juventude

Lúcia Helena Dias F. da CostaSecretaria de Micro e Pequena Empresa,

Trabalho e Qualificação

Hélida Campos Pereira LimaSecretaria de Planejamento e Gestão

Maria Cecília CabralSecretaria de Planejamento e Gestão

Lia VerasSecretaria da Mulher

Daniel Saboya Paes BarretoInstituto Agronômico de Pernambuco

Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária

Edivânia VidalPrograma do Leite

Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária

Danièlle de Belli ClaudinoGabinete do Governador

GERÊNCIA DE MONITORAMENTO DO PROGRAMA MÃE CORUJA

Virgínia Maria Holanda de MouraGerente de Monitoramento do Programa

Mãe Coruja Pernambucana

Alessandra Debone de SousaCoordenadora de Acompanhamento do Programa Mãe Coruja Pernambucana

Ana Maria de Lima OliveiraCoordenadora de Acompanhamento do Programa Mãe Coruja Pernambucana

Eveline D’Andrada CruzCoordenadora Técnica do Programa Mãe

Coruja Pernambucana das Geres

Keduly Vieira GadelhaCoordenadora de Ações Intersetoriais

COORDENAÇÕES TÉCNICAS DE SAÚDE DAS REGIÕES DE SAÚDE -

Geres

Keduly Vieira GadelhaCoordenadora de Ações Intersetoriais

I Regional de Saúde – Geres

Valmir Correia de MeloCoordenador Técnico de Saúde do Programa

Mãe Coruja Pernambucana das Geres II e XII Regional de Saúde – Geres

Jozelma Maria Araújo SilvaCoordenadora Técnica do Programa Mãe

Coruja Pernambucana das Geres III Regional de Saúde- Geres

Catarina Souza AlmeidaCoordenadora Técnica do Programa Mãe

Coruja Pernambucana das Geres IV Regional de Saúde- Geres

Izeni Teixeira PimentelCoordenadora Técnica do Programa Mãe

Coruja Pernambucana das Geres V Regional de Saúde- Geres

Raquel Neposiano da Silva Lima Coordenadora Técnica do Programa Mãe

Coruja Pernambucana das Geres VI Regional de Saúde- Geres

Maria Helena de Sousa LeiteCoordenadora Técnica do Programa Mãe

Coruja Pernambucana das Geres VII Regional de Saúde- Geres

Angélica Mayumi EguchiCoordenadora Técnica do Programa Mãe

Coruja Pernambucana das Geres VIII Regional de Saúde- Geres

Leônia Carvalho de MouraCoordenadora Técnica de Saúde das Geres

IX Regional de Saúde- Geres

Wilson Rodrigues da SilvaCoordenador Técnico do Programa Mãe

Coruja Pernambucana das Geres X Regional de Saúde- Geres

Ana Cristina de Freitas AlencarCoordenadora Técnica do Programa Mãe

Coruja Pernambucana das Geres XI Regional de Saúde- Geres

GERÊNCIA DE ARTICULAÇÃO INTERSETORIAL

Marta Cristina Santos Wanderley Gerente de Articulação Intersetorial

Alissandra Regina Siqueira Oliveira Marciano

Coordenadora de Acompanhamento do Programa Mãe Coruja Pernambucana

Edna Maia de SouzaCoordenadora de

Recursos Humanos

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| Mãe Coruja Pernambucana200

Daniel Saboya Paes BarretoAdministrador do Sistema Mãe Coruja

Marta de Melo MacedoAssistente Administrativo

Nadjane Cavalcante da Silva

BurkhardtAssistente em Saúde

Noêmia Siqueira GarciaAssistente Administrativo

Reginaldo Manoel de Sales JúniorAssistente AdministrativoVolmer Souza de Sá

Assistente Administrativo

COORDENAÇÃO DE COMUNICAÇÃO E ARTE

Gustavo BurkhardtCoordenador de Ações

Intersetoriais

Iramaraí José Vilela de FreitasCoordenador de Ações

Intersetoriais

GERÊNCIA TÉCNICA DE PESQUISA

Ana Elizabeth de Andrade LimaMestra em Saúde Pública

Especialista em Medicina de Família e Comunidade

Lusanira Maria da Fonseca de Santa Cruz

Gerente Técnica de Pesquisa do Programa Mãe Coruja Pernambucana

Cristina Pinheiro RodriguesMédica Sanitarista

Maria da Conceição Silva CardozoCoordenadora Técnica de Pesquisa do Programa Mãe Coruja Pernambucana

Tânia Maria de Andrade Lima

Médica e Professora da Universidade Federal de Pernambuco

PROFISSIONAIS DOS CANTOS MÃE CORUJA PERNAMBUCANA

Técnicos de Nível Superior

CANTOS MÃE CORUJA – I Geres

Fabiana Amorim TorresJoulianne Barbosa Pereira

Município de Araçoiaba

CANTOS MÃE CORUJA – II Geres

Carmem Iumatti ValençaClaudenice Lourenço da Silva

Município de Casinhas

Izabella Cristina de Arruda MouraMarta Valéria da Silva

Município de Cumaru

Claudecyta Maria Carvalho da HoraLúcia Laurinda de Souza

Município de Salgadinho

CANTOS MÃE CORUJA – III Geres

Daniella Maria Pereira de LimaErika Fernanda Montenegro de

OliveiraMunicípio de Amaraji

Claudia Alves de FreitasVasti Maria Barbosa Gomes de

SouzaMunicípio de Catende

Helba Patrícia Pires de CarvalhoMargarida Cecília de Barros Barbosa

Município de Cortês

Ana Paula Barbosa da SilvaCarla Cardinalle Bezerra da Silva

Município de Jaqueira

Eliane Dias da SilvaShirley Uchôa Paes Martins

Município de Joaquim Nabuco

Alexiana Inácia de Carvalho Sales Santos

Wlademir Bernardo de SouzaMunicípio de Lagoa dos Gatos

Maria Quitéria Freitas da Silva Moraes

Rômulo Patrício Silva BezerraMunicípio de Maraial

Lucinery Silva de Holanda Vasconcelos

Luzia Félix dos Santos SilvaMunicípio de Palmares

Diana Maria da SilvaEdvanilda Marinho Pereira

Município de Quipapá

José Ricardo PereiraRivane de Vasconcelos Costa

Município de Rio Formoso

Antônio Carlos Ferreira CavalcanteCláudia de Fátima dos Santos

Município de Xexéu

CANTOS MÃE CORUJA – IV Geres

Lucia Karlla Borba de Sousa Monteiro

Maria Aparecida de Vasconcelos Queiroz

Município de Agrestina

Ana Karla Gouveia Regis FragaPriscilla de Melo Macedo

Município de Belo Jardim

Michelle Regina Albuquerque Silva Monica Alves Correia de Aquino

Município de Bonito

Alice Azevedo e SouzaMaria Goretti Monteiro

Município de Camocim de São Félix

Daniely de Almeida Pontes SenaTaiza Maria de Almeida Andrade

Município de Ibirajuba

Alexandra Vivieane BatistaGlaucy Naiany Cordeiro de Barros

Arruda Município de Jataúba

Gabriela Arruda Reinaux PontesJosefa Verônica de Oliveira Silva

Município de JuremaÉrica Daniely Mariano Monteiro

Silvânia de Lima CristóvãoMunicípio de Panelas

Miriam Pessoa Souto MaiorPatrícia Carneiro Araújo dos Santos

Município de Riacho das Almas

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Um olhar histórico e afetivo |201

Ana Cláudia de Castro Nunes Soares Fabiana Waléria dos Santos Silva

Município de Sairé

Esmeralda das Dores Santos Santana

Wilitiusa Abreu SpinolaMunicípio de Sanharó

Ângela Soares Silva de VasconcelosJanaina Barbosa Ferreira Santana

Município de São Caetano

Verônica Myriam Gonçalves LeitãoViviane Mota dos Santos

Município de Tacaimbó

Dicla Bezerra de AlmeidaMunicípio de Vertentes

CANTOS MÃE CORUJA – V Geres

Elianne de Oliveira AraújoWdlândia Karoline da Silva Araújo

Município de Águas Belas

Alecsandra Brandão CardosoClaudia Alves da Cruz Melo

Município de Angelim

Irabele Guedes de OliveiraKarla Oliveira Ramos de Souza

Município de Bom Conselho

Célia de Oliveira LimaMichelle Karine Lima

Município de BrejãoGraziela Maria Gonçaves Metódio

Maria Teresa Fernandes CintraMunicípio de Caetés

Claudia Regina de FreitasJanaina Tércia da Silva

Município de Calçado

Aline Cordeiro CavalcanteSimone de Morais Simões

Município de Canhotinho

Amanda Pimentel PontesVânia Gisele Gomes da Silva

Município de Capoeiras

Carla Calado de VasconcelosNatálye Fernanda Leão da Silva

Município de Correntes

Erika Kataline Albuquerque LimaKátia da Silva Araújo Notaro

Município de Garanhuns

Aricherlla Ramos Lucena AraújoRoberta Cassandra Vasquez de

FreitasMunicípio de Iati

Edvaneide Silvério MartinsRenata Juliano dos Santos

Município de Itaíba

Maria Tereza da Costa Bezerra Ferreira

Silmara Vieira dos SantosMunicípio de Jucati

Angélica Sabrina dos Santos Azevedo

Edjane Maria da SilvaMunicípio de Jupi

Isabel Cristina de Melo AlmeidaPollyana Jorge Novaes Bantim

Município de Lagoa do Ouro

Natalywood Inácio da SilvaPrycilla Inácio da Silva Diniz

Município de Lajedo

Maria Ester de Souza MoraesMaria Sueli Pimentel de Santana

Município de Palmeirina

Maria Celia Almeida de LimaMaria Cícera Carvalho Gomes

Município de Paranatama

Alex Diniz SilvaMunicípio de Saloá

Jailma Dantas de SouzaJoselma Gomes Calado

Município de São JoãoElizabeth Costa Ferreira de Sousa

Mirella Godoy SilvestreMunicípio de Terezinha

CANTOS MÃE CORUJA – VI Geres

Djane Patrícia de AraújoTarcísio Albuquerque Moraes

Município de Arcoverde

Karine da Silva MonteiroSandra Valéria do Amaral Lira

Município de Buíque

Débora Bandeira do Nascimento Rocha

Marília Pereira LopesMunicípio de Custódia

Jannine Gomes OliveiraJosevânia Maria Andrade Oliveira

Município de Ibimirim

Ana Paula Batista CardosoMariana Ferraz N. Gomes de Lima

Município de Inajá

Alexsandro da Silva SantosCarla Samara Silva Santos

Município de Jatobá

Janice Cordeiro Rodrigues BezerraWaléria Sayão Maia de Melo

Município de Manari

Dayse Albuquerque CavalcanteFernanda Braz Macedo Brederodes

Município de Pedra

Lívia Carolline Gomes de Lima Lisboa

Maria Roseli OliveiraMunicípio de Petrolândia

Alessandra Inojosa LeandroAnamim Leite da Silva

Município de Sertânia

Soraia Leal TorresMunicípio de Tacaratu

Virgínia Freire da RochaMunicípio de Tupanatinga

Katiúcia Dantas CavalcanteMilane Monteiro da Silva

Município de Venturosa

CANTOS MÃE CORUJA – VII Geres

Cássia Simone Gondim Sales Magalhães

Emanuella Nunes da ValõesMunicípio de Mirandiba

Adriana Carvalho de Sá BezerraMarlene Gonçalves Torres de

AndradeMunicípio de Terra Nova

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| Mãe Coruja Pernambucana202

CANTOS MÃE CORUJA – VIII Geres

Gicélia Maria dos SantosRaimunda dos Humildes Rodrigues

de MacedoMunicípio de Afrânio

Sara Carvalho de Araújo GonçalvesMunicípio de Cabrobó

Karla Tatiana Carvalho e Sá Alves da Cruz

Marcos Kleber Alves da CruzMunicípio de Dormentes

Fabíola Bezerra de SáMailza Alves Damasceno Valgueiro

Município de Lagoa Grande

Ana Maria de Araújo SantosMauri Célio Alves Santana

Município de Orocó

Claudia Regina Pereira de SouzaCybelle Roriz Leite Ferraz

Município de Petrolina

Girlândia César dos SantosSilvana de Alencar Santos

Município de Santa Maria da Boa Vista

CANTOS MÃE CORUJA – IX Geres

Ediane Alencar De MirandaJoyce Caetano Laurentino

Município de Araripina

Elainne Guimarães CoriolanoSâmia Pedroza De Holanda

Município de Bodocó

Ana Cristina Moreira dos SantosEdna Maria Lôbo Cruz

Município de Exú

Maria Selma de CaldasMarline Sandinara

Cavalcante NeloMunicípio de Granito

Jasiana Pereira da SilvaRebeca Manuelli Alves Gonçalves

Município de Ipubi

Lucely Galiza de Alencar BentoMaria Gildene dos Santos

Município de Moreilândia

Ângela Valéria Xavier de FrançaFabiana Carvalho de Souza

Município de Ouricuri

Fabiana Teles RamosRenailda Silva de Oliveira

Município de Parnamirim

Newilton Gois de AraújoTânia Maria Coelho Lins

Município de Santa Cruz

Isabel Mª Saraiva do AmaralMaria do Socorro Duarte da Silva

Município de Santa Filomena

Erilene Luna TelesMércia Celiana Barros Delmondes

Município de Trindade

CANTOS MÃE CORUJA – X Geres

Emmanuela Alves GenésioGeovanna Acioly de Moura

Município de Carnaíba

Bruna Caroline Xavier de Almeida Maria Aparecida de Lima Silva

Município de Iguaraci

Genésia Dayana Pires Leite de SouzaLucrécia Moreira da Silva

Município de Itapetim

Allyne Leite Nunes BritoJuliana Araújo do Nascimento

Município de Santa Terezinha

Johanna Paulla Malaquias Guimarães

Roberta Jeanne Santos da SilvaMunicípio de Solidão

CANTOS MÃE CORUJA – XI Geres

Aline Araújo da Silva SáAuricléa de Moura Souza

Município de Betânia

Maria Edileuza Seraim De LimaMaria Rita Duarte Rodrigues de

LimaMunicípio de Calumbi

Joseilma Maria Araújo da Silva Novaes

Nadice Pereira dos Santos CorreiaMunicípio de Carnaubeira da Penha

Daniely Cristina Terto CarvalhoPriscila de Lima Vargas Carneiro

Município de Flores

Pedro Roldão de Almeida SáMunicípio de Floresta

Maria das Neves SilvaMaria de Fátima Sá Campos

Município de Itacuruba

Mayanna Sobreira Tavares Rodrigues

Renata Socorro Pereira de Figueiredo

Município de Santa Cruz da Baixa Verde

Maria Cecília Andrade MedeirosSimone Cecília Da Silva LimaMunicípio de São José do Belmonte

Juslayne Crystiane Nogueira SilvaMaria do Socorro Alencar

Município de Serra Talhada

Kally Patrícia de S. FerreiraMaria Gomes de Pádua Bezerra

Município de Triunfo

CANTOS MÃE CORUJA – XII Geres

Flora Luiza Pereira do Nascimento Freire

Maria Betânha GuimarãesMunicípio de Aliança

Josoilma Lino de CarvalhoNilcilene de Fátima Santos da

SilveiraMunicípio de Condado

Eriberto José Pereira da SilvaJailde Rosa dos Santos

Município de Ferreiros

Amanda da Fonseca Cavalcante Mariza Coutinho de Farias

Município de Macaparana

Gerard José da SilvaSandra Karla Braz de Freitas

CavalcantiMunicípio de São Vicente Férrer

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Um olhar histórico e afetivo |203

Documentos consultados

Para a realização deste livro, além das entrevistas e pesquisa de campo,

foram consultados vários documentos, apresentações e trabalhos técnicos

produzidos ao longo dos anos pela equipe do Programa Mãe Coruja

Pernambucana. De alguns foram extraídos dados, de outros, declarações ou,

devido a precisão e relevância, até mesmo trechos completos. O certo é que

sem eles essa obra não seria possível.

1) Monitoramento - Programa Mãe Coruja Pernambucana/ dezembro 2015

2) Relatório de Gestão do Programa Mãe Coruja Pernambucana/ 2015

3) Relatório de Gestão do Programa Mãe Coruja Pernambucana/ 2015 /

Coordenação de Comunicação e Arte

4) Relatório de Gestão do Programa Mãe Coruja Pernambucana/ 2015 / IX

Região de Saúde – Ouricuri

5) Normas legais do Programa Mãe Coruja Pernambucana

6) Manual do Programa Mãe Coruja Pernambucana

7) Protocolo Operacional do Programa Mãe Coruja Pernambucana

8) Documento de candidatura do Programa Mãe Coruja Pernambucana ao

Prêmio da ONU 2014

9) Diagnóstico IX Geres 2008

10) Manual de Implantação do Programa Mãe Coruja – IX Geres

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O texto deste livro foi composto em Velino Text, Steelfish e Futura.

O papel utilizado para o miolo é Couché fosco 115g/m2 e para a capa é Supremo 250g/m2.

Companhia Editora de Pernambuco – junho de 2017.

Supervisão Geral: Evaldo Costa e Anelise TimmEdição: Sérgio Miguel Buarque

Projeto Gráico: Luiz ArraisFotos: Iramaraí José Vilela de Freitas

Revisão: Ab Aeterno Produção EditorialDiagramação: Luiz Arrais / Sebastião Corrêa

Tratamento de imagem: Sebastião Corrêa

CANAL YOUTUBE

https://www.youtube.com/channel/UCNAB42pELwdzIIi5U891o1Q

BLOG

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Uma revolução silenciosa vem ajudando a mudar a

realidade de milhares de pessoas em Pernambuco. Em

uma década, o Programa Mãe Coruja Pernambucana

tem contribuindo efetivamente para o bem-estar de

gestantes e crianças na primeira infância, estimulando

o fortalecimento dos vínculos afetivos entre mãe, filho e

família. O sucesso do programa criado em 2007 deve-se a

uma concepção inteligente, a um processo de implantação

bem feito, a uma gestão eficiente e, sobretudo, a uma

forma diferenciada de olhar, enfrentar e resolver os

problemas encontrados nessa exitosa caminhada. Agora,

chegou a hora dessas histórias serem contadas e desse

conhecimento acumulado ser compartilhado. Além de

servir como instrumento de divulgação e documentação

do programa, este livro também cumpre a função de ser

uma importante ferramenta de consulta.

9 788578 585068

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Um olhar analítico

MÃE

C

ORUJA PERNAMBUCAN

A

VOLUME 2

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VOLUME 2

Um olhar analítico

MÃE

CO

RUJA PERNAMBUCAN

A

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Programa Mãe Coruja Pernambucana

Paulo Henrique Saraiva CâmaraGovernador do Estado de Pernambuco

João Henrique de Andrade Lima CamposGabinete do Governador

Renato hièbautChefe de Gabinete de Projetos Estratégicos

Ana Elizabeth de Andrade LimaCoordenadora do Programa Mãe Coruja Pernambucana e

Diretora de Políticas Estratégicas do Programa Mãe Coruja Pernambucana

SECRETARIAS

José Iran Costa JúniorSecretário de Saúde

Frederico AmâncioSecretário de Educação

Roberto Franca FilhoSecretário de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude

Alexandre ValençaSecretário de Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação

Márcio Stefanni Secretário de Planejamento e Gestão

Sílvia CordeiroSecretária da Mulher

Nilton MotaSecretário de Agricultura e Reforma Agrária

Marcelino GranjaSecretário de Cultura

Felipe CarrerasSecretário de Turismo, Esportes e Lazer

P452m Pernambuco. Governo do Estado Mãe coruja pernambucana : um olhar analítico / Governo do Estado ; Fundação Maria Cecília Souto Vidigal ; prefácio Paulo Câmara ; apresen- tação Eduardo de C. Queiroz. – Recife : Cepe, 2017. v. 2 : il.

Inclui apêndices.

1. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAMBUCANA – AVALIA- ÇÃO. 2. ASSISTÊNCIA À MATERNIDADE E À INFÂNCIA – AVA- LIAÇÃO. 3. GRÁVIDAS – ASSISTÊNCIA SOCIAL. 4. CRIANÇAS – ASSISTÊNCIA SOCIAL. 5. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAM- BUCANA – ENTREVISTAS. I. Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. II. Câmara, Paulo. III. Queiroz, Eduardo de C. IV. Título.

CDU 364.4 CDD 362.198

PeR – BPE 17-235

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Prefácio ............................................................................................... 7

Apresentação ........................................................................................... 11

Capítulo 1 – Avaliação qualitativa:

bases conceituais e metodológicas ........................................................15

1.1 Caracterizando a avaliação qualitativa .....................................17

1.2 O processo avaliativo: fases vivenciadas

e procedimentos metodológicos adotados ...................................21

Capítulo 2 – Programa Mãe Coruja Pernambucana:

motivações iniciais, concepções norteadoras,

gênese, evolução e funcionamento ....................................................... 29

2.1 Visão a partir do manual do programa

e da análise documental ................................................................31

2.2 Visão a partir da fala dos entrevistados .................................. 34

Capítulo 3 – Visão de especialistas: percepção de atores internos e

externos ao Programa Mãe Coruja Pernambucana .............................. 49

3.1 Visão dos atores internos ......................................................... 52

3.2 Visão dos atores externos ........................................................ 65

Capítulo 4 – Avaliação a partir da visão das usuárias,

técnicas dos Cantos Mãe Coruja e parceiros locais ............................... 79

4.1 Breve descrição dos contextos: municípios

selecionados e Cantos Mãe Coruja ............................................... 82

4.2 Cantos Mãe Coruja e o acompanhamento

das gestantes e crianças ................................................................. 92

4.3 Impactos do programa

nas trajetórias de vida das usuárias ............................................. 98

Sumário

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EQUIPE TÉCNICA

Coordenação Geral: Tania Bacelar de Araújo

Coordenação Técnica: Rayane Andrade

Consultor Sênior: Francisco Jatobá

Consultor Sênior: Jorge Jatobá

Assistente da Coordenação: Raquel Aquino da Silva

Consultora Junior: Laís Veloso

Pesquisadora: Marília Gomes do Nascimento

Pesquisadora: Danielle Gomes da Costa

Pesquisadora: Eloah Maria Martins Vieira

Pesquisadora: Pollyanna Mendes Alves

Estagiária: Carolina Queiroga Jucá

Capítulo 5 – Síntese e conclusões ........................................................ 117

5.1 Alguns pontos para discussão ................................................ 119

5.2 Considerações finais e sugestões dos avaliadores ................138

Apêndice 1 – Lista de especialistas internos ........................................147

Apêndice 2 – Lista de especialistas externos .......................................149

Apêndice 3 – Metodologia dos grupos focais ..................................... 150

Apêndice 4 – Roteiro de entrevistas .....................................................153

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Um olhar analítico | 7

OPrograma Mãe Coruja Pernambucana, resultado

da inspiração e trabalho de muita gente e uma

das estratégias mais bem-sucedidas do Governo

Eduardo Campos, trouxe vida e esperança para

milhares de mães e crianças do nosso Estado. Ao longo

de quase uma década, o programa apresentou resultados

expressivos, cresceu de forma sustentável e consistente,

ganhou reconhecimento internacional e se consolidou

como uma política de Estado. O Mãe Coruja é, hoje, um

programa perene.

Falo isso com muita segurança porque acompanho

e conheço detalhadamente o Mãe Coruja desde o seu

início em 2007 - primeiro como Secretário de Estado

(em três pastas diferentes) e depois como Governador -

e desde cedo já estava muito claro que o programa seria

algo capaz de ir além do alcance de cada um de nós,

com respaldo político e reconhecimento social capaz de

ultrapassar mandatos.

Como não poderia deixar de ser, as prioridades do

Mãe Coruja são prioridades do meu Governo. E como

costumo dizer, prioridade não é conversa, é orçamento.

Só tem prioridade aquilo que tem recursos garantidos.

Por isso, ainda em 2016, enviei à Assembleia Legislativa

um projeto de lei para tornar impositivos os recursos

do Mãe Coruja Pernambucana. Em outras palavras, as

rubricas destinadas ao programa serão protegidas por

Lei. Também ampliamos o atendimento à primeira

infância (crianças até seis anos), através de um plano de

desenvolvimento infantil.

O Mãe Coruja é um exemplo para o Brasil e para o

mundo. Por isso, vejo com muita satisfação essa história

exitosa ser contada, com objetividade, profundidade

e sensibilidade em livro. É mais uma forma de

continuarmos levando ‘vida’ para a vida das pessoas.

Paulo Câmara

Governador de Pernambuco

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| Mãe Coruja Pernambucana8

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Um olhar analítico | 9

Desde 2005, a Fundação Maria Cecilia dedica-se a gerar e dis-

seminar conhecimento para o pleno desenvolvimento da

criança na primeira infância, período que vai do nascimento

aos seis anos de idade.

Dentre as diversas formas de alcançar nossa missão, está o fomen-

to à sistematização e a avaliação das práticas, programas e políticas de

primeira infância existentes como um processo de aprofundamento,

reflexão, qualificação e registro de tais experiências. Nesse contexto se

insere a atuação conjunta com o Governo do Estado de Pernambuco,

na avaliação e sistematização do Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na, que está há quase uma década em execução.

Conhecer essa história, sua metodologia, as fortalezas, os desa-

fios e seus resultados traz relevantes aprendizados que podem ser

inspiradores para os diversos gestores que hoje desejam priorizar,

em suas políticas, essa importante etapa da vida.

Entendemos que o produto dessa sistematização pode contribuir

para o aprimoramento das políticas públicas voltadas para a primei-

ra infância. Governos que investem esforços em olhar para a efetivi-

dade de suas políticas identificando as ações que deram certo, bem

como reconhecendo as que não obtiveram os resultados esperados,

têm melhores condições de aprimorar seus programas e gerar im-

pactos significativos à sua população.

O material apresentado aqui é fruto de um extenso trabalho de

pesquisa de campo e documental sobre o programa, consolidado em

quatro publicações para abordar a complexidade que o tema primei-

ra infância exige, trazendo aos gestores informações valiosas sobre a

experiência pernambucana.

Parabenizamos o Governo do Estado pela priorização da criança

e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema-

tizar sua política de primeira infância e constante preocupação em

qualificá-la.

“Se mudarmos o começo da história, mudamos a história toda.”

– frase do documentário O Começo da Vida

Eduardo de C. Queiroz

Diretor Presidente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal

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Um olhar analítico | 11

Esta avaliação foi feita com base na captura e interpretação da experiência

dos diversos atores envolvidos direta ou indiretamente no Programa Mãe

Coruja Pernambucana, em especial seus coordenadores, especialistas em

saúde, em educação e em desenvolvimento social, técnicos das secretarias

estaduais e municipais, profissionais dos Cantos Mãe Coruja1, estudiosos de

políticas sociais e sobremodo das usuárias do programa.

O relatório está dividido em cinco capítulos. O primeiro aborda a natureza

da pesquisa qualitativa e sua aplicação à avaliação do Programa Mãe Coru-

ja Pernambucana aqui desenvolvida, detalhando as suas características e os

procedimentos adotados. O segundo trata do objeto do estudo, descrevendo a

gênese, as concepções norteadoras e o funcionamento do programa. No capí-

tulo 3, inicia-se a avaliação do programa por meio da interpretação da escu-

ta e da sistematização de conteúdo fornecido pelos olhares interno e externo

dos diversos agentes envolvidos, especialistas conhecedores do programa. O

capítulo 4 analisa os resultados do trabalho de campo que focou as usuárias,

buscando identificar as suas percepções acerca dos impactos do programa em

suas trajetórias de vida. O último capítulo contém as observações mais rele-

vantes da equipe que conduziu esta avaliação qualitativa.

No primeiro capítulo ressalta-se que a avaliação se desenvolveu mediante

o emprego de métodos e técnicas da pesquisa social qualitativa, nos quais se

privilegiou, ao lado da análise documental, o uso de três técnicas distintas para

a coleta dos dados: entrevistas (semiestruturadas e em profundidade), grupos

1 Canto Mãe Coruja é o espaço de acolhimento no qual ocorre o cadastramento das gestantes, funcionando como ponto de apoio para os profissionais selecionados pelo Estado para atuar nos municípios como articuladores do programa no âmbito local.

Apresentação

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| Mãe Coruja Pernambucana12

focais e observação sistemática em campo com foco nas usuárias. Buscou-se,

a partir das perspectivas dos indivíduos envolvidos, avaliar o programa em

termos de concepção, execução e resultados. O emprego articulado desses três

instrumentais procurou captar as formas de enquadramento que fundamen-

tam o programa avaliado, as dinâmicas assentadas em sua cultura organiza-

cional e a percepção das repercussões desse programa sobre a vida das usuá-

rias e de seus filhos.

A gênese, as concepções norteadoras e o funcionamento do Programa Mãe

Coruja Pernambucana estão contidos no capítulo 2. A iniciativa partiu da cons-

tatação de que os pernambucanos estavam perdendo anos potenciais de vida

por conta da ainda alta, e resistente à queda, mortalidade infantil e das mortes

violentas entre os jovens. O governo de Eduardo Campos, ao assumir a gestão

do Estado de Pernambuco, promoveu a criação de dois programas com o obje-

tivo de enfrentar essa questão central: o Programa Mãe Coruja Pernambucana,

com foco na mortalidade infantil; e o Pacto pela Vida, com foco na violência

urbana, no qual se destaca a mortalidade juvenil.

Concebeu-se o Programa Mãe Coruja Pernambucana a partir da constata-

ção de que a mortalidade infantil é um fenômeno multicausal. Sendo assim,

seu combate exige transversalidade, integração e intersetorialidade entre os

agentes e instituições de diferentes níveis de governo, tendo ainda sua cen-

tralidade definida pela ideia de cuidado com a mãe, gestante ou não, e com

a criança até os primeiros cinco anos de vida. O funcionamento do programa

está fundado em uma perspectiva interdisciplinar de integração e colabora-

ção entre as diversas secretarias e diferentes atores nele envolvidos direta ou

indiretamente. O modelo de gestão do programa reflete a perspectiva da in-

tersetorialidade, por meio da adoção de instâncias deliberativas, consultivas e

executivas, nas quais o monitoramento é um ponto central.

O capítulo 3 dedica-se à avaliação propriamente dita do Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana, consistindo essencialmente da escuta ao público interno

(coordenadores estaduais e regionais do programa e técnicos dele participan-

tes) e aos especialistas externos de diversas áreas do conhecimento relaciona-

das aos objetivos e ações do programa, bem como aos profissionais atuantes

na seara da primeira infância ou temas correlatos e que, em algum momento,

conheceram ou atuaram junto ao programa. O objetivo, aqui, foi levantar as

principais forças e fraquezas do programa a partir dos olhares interno e ex-

terno. Além disso, buscou-se identificar os principais desafios para o futuro,

assim como possíveis sugestões para o seu funcionamento.

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Um olhar analítico | 13

No capítulo 4, a avaliação continua, agora com os resultados da observação

em campo, que focou nas usuárias que foram objeto de visitas e de entrevis-

tas. O foco, foi captar a visão das usuárias do programa e dos profissionais que

atuam diretamente nos municípios – profissionais dos Cantos Mãe Coruja e das

administrações municipais parceiras, além de técnicos do governo estadual

atuantes nos municípios visitados.

Quatro municípios foram visitados pela equipe de campo, formada por

pesquisadoras qualificadas, com experiência em áreas temáticas correlatas ao

programa e organizadas em duplas.

Os critérios para a escolha dos municípios foram os seguintes: a) localiza-

ção em distintas regiões do interior do Estado (Sertão, Agreste e Mata); b) tra-

jetórias que obtiveram mais êxito na implementação do programa e trajetórias

com menos êxitos; c) tempo de existência dos Cantos Mãe Coruja nos municí-

pios (mais antigos e mais recentes). Os municípios selecionados foram: Ouri-

curi, Exu, Iguaracy e Condado. Os Cantos Mãe Coruja nesses municípios foram

visitados e, a partir deles, deflagraram-se as atividades das pesquisadoras.

O capítulo 5 registra, sob a forma de síntese e conclusões, as observações

da equipe avaliadora, destacando as principais características, os resultados

tangíveis e intangíveis mais relevantes e as dificuldades e desafios mais signi-

ficativos que o Programa Mãe Coruja Pernambucana apresenta atualmente e

para o futuro.

Ressalta-se, aqui, que o registro histórico dessa experiência fica agora mais

enriquecido como resultado desse esforço coletivo de avaliação que deverá ser

difundido até mesmo para que o programa seja universalizado em Pernambu-

co e estendido a outras regiões e países.

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| Mãe Coruja Pernambucana14

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Um olhar analítico | 15

Capítulo 1

Avaliação qualitativa: bases conceituais e metodológicas

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| Mãe Coruja Pernambucana16

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Um olhar analítico | 17

1.1 Caracterizando a avaliação qualitativa

Este capítulo apresenta o trabalho avaliativo realizado, caracterizando-o e

explicitando os procedimentos metodológicos adotados. A presente in-

vestigação desenvolveu-se mediante o emprego de métodos e técnicas da

pesquisa social qualitativa, portanto, de forma bastante breve, cabe aqui

pontuar alguns dos fundamentos que embasaram o seu desenvolvimento, es-

pecialmente no que concerne aos seus aspectos metodológicos.

De maneira geral, as pesquisas sociais buscam descobrir respostas para

problemas sociais diversos mediante o emprego de procedimentos científicos

– a metodologia científica – e, assim, permitem a obtenção de novos conhe-

cimentos no campo da realidade social2. Essa realidade, por sua vez, envolve

tanto os aspectos relativos ao indivíduo e suas interações com outros indiví-

duos, quanto aqueles relativos às instituições sociais e suas dinâmicas. Assim,

as pesquisas procuram explorar, descrever ou explicar os fenômenos sociais a

partir de observação, registro e análise de práticas sociais diversas. Estas últi-

mas, por sua vez, associam-se a dinâmicas de caráter mais formal (como leis

e regras institucionalizadas) ou menos formal (costumes, comportamentos,

etiquetas e normas não escritas), ambas, porém, igualmente importantes para

a compreensão de tais fenômenos.

O presente trabalho teve como objetivo avaliar um programa social espe-

cífico – o Programa Mãe Coruja Pernambucana – que, por sua vez, propõe-se

2 GIL, Antônio C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo, Atlas, 1999.

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| Mãe Coruja Pernambucana18

a intervir em uma dada realidade social, alterando, assim, as dinâmicas so-

ciais de um dado contexto – seja no âmbito institucional, seja no âmbito

sociocultural. Cabe pontuar, ainda, que a pesquisa avaliativa se caracteriza

como um tipo particular de investigação, voltada também para o exame de

políticas, programas ou ações – suas forças, fraquezas, desafios e possíveis

resultados alcançados.

Cabe pontuar, ainda, que as pesquisas podem ser desenvolvidas segundo

abordagens distintas, ou seja, seguindo uma classificação mais ampla. Pode-

se dizer que é possível adotar que há dois grandes métodos: o quantitativo e o

qualitativo. Tais métodos se diferenciam não só pela sistemática pertinente a

cada um deles, mas sobretudo pela forma de abordagem do problema. A es-

colha da abordagem ou metodologia a ser aplicada relaciona-se, em grande

medida, com a natureza do problema que se pretende analisar e as respostas

que se busca obter. Sem alongar demasiado o debate, em linhas gerais, tem-se

que a pesquisa qualitativa se preocupa com um nível de realidade difícil de ser

quantificado, trabalhando com o universo de significados, motivos, crenças,

valores e atitudes, alcançando, pois, uma dimensão mais profunda das rela-

ções, processos e fenômenos que não devem ou não podem ser reduzidos à

operacionalização de variáveis. Em suma, enquanto a perspectiva quantita-

tiva, fazendo uso da estatística, consegue apreender aspectos “visíveis, mor-

fológicos e concretos” dos fenômenos de forma objetiva, a perspectiva quali-

tativa adentra no mundo dos significados das ações e relações humanas, uma

Reunião de

monitoramento

do programa com

a presença do

então governador

Eduardo Campos e

a primeira-dama

Renata Campos

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Um olhar analítico | 19

seara não captável por equações e estatísticas3. As duas abordagens, porém,

longe de se contraporem, se complementam, uma vez que as dimensões pro-

blematizadas por elas interagem dinamicamente.

A adoção de uma abordagem qualitativa para a realização da pesquisa ava-

liativa visa a ir além do levantamento de indicadores objetivos (mensuráveis e

parametrizados), típicos das pesquisas de delineamento quantitativo, que, se

por um lado carregam a precisão inerente aos procedimentos estatísticos, por

outro, perdem em profundidade e detalhamento, por causa da própria natu-

reza de suas técnicas e métodos. Frente ao próprio caráter do programa que

se pretende avaliar, que tem como objetivo tratar de um problema multicau-

sal – a mortalidade materno-infantil – por meio de uma perspectiva holística,

ancorado em concepções subjetivas como cuidado, e atuando nas trajetórias de

vida dos indivíduos, adotar uma abordagem qualitativa parece ser um cami-

nho bastante profícuo. Assim, buscou-se avaliar o programa a partir da com-

preensão das dinâmicas sociais envolvidas, entendendo as estruturas e insti-

tuições como resultados da ação humana objetivada.

Aqui, busca-se a compreensão dos diversos fenômenos e problemas so-

ciais a partir das perspectivas dos indivíduos neles envolvidos, direta ou indi-

retamente, e sua interpretação da realidade em que estão inseridos. A descri-

ção e análise dos contextos sociais também são de fundamental importância,

uma vez que dão significado às vivências dos sujeitos, permitindo uma maior

compreensão de comportamentos, valores, crenças e atitudes. Do ponto de

vista avaliativo, a interpretação dos processos intersubjetivos, subjacentes às

dinâmicas que envolvem tais elementos, tende a desempenhar um importante

papel na caracterização de uma cultura institucional, por exemplo.

Por sua vez, a pesquisa qualitativa engloba diferentes desenhos e orien-

tações, comportando diversos instrumentos de coleta e análise passíveis de

serem utilizados. Frequentemente as pesquisas de delineamento qualitativo

empregam uma abordagem “multitécnica”, com a combinação de diferentes

técnicas de coleta e análise – como o uso combinado de análise documental,

entrevistas e observações, por exemplo. Vale salientar que essa abordagem

preza por maior flexibilidade nos instrumentos de coleta, ou seja, há uma

preferência por instrumentos pouco estruturados a fim de evitar, tanto quan-

to possível, a condução das opiniões e aumentar as chances de conseguir

uma resposta genuína. Além disso, os instrumentos de pesquisa utilizados

3 MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 18 ed. Petró-polis: Vozes, 2001.

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| Mãe Coruja Pernambucana20

tentam captar a natureza dinâmica e processual dos fenômenos, priorizan-

do a descrição detalhada das situações diversas. Assim, diferentemente das

pesquisas quantitativas, que geralmente partem de categorias ou respostas

pré-estruturadas para fins de mensuração e análise estatística, a constru-

ção dos dados qualitativos, ou corpus, é profundamente intersubjetiva, isto é,

centrada na interação pesquisador-pesquisado, alcançando uma profundi-

dade e riqueza de significados dos conceitos que as abordagens quantitativas

via de regra não conseguem.

A construção do corpus é funcionalmente equivalente à amostra represen-

tativa, mas com o objetivo diverso de maximizar a variedade de represen-

tações desconhecidas. O corpus tipifica atributos desconhecidos, enquanto

que a amostragem estatística aleatória descreve a distribuição de atributos já

conhecidos no espaço social. Isso porque, em geral, na pesquisa qualitativa,

os pesquisadores querem mapear as representações de uma população em

vez de medir sua distribuição relativa na população. Além disso, utiliza uma

forma não probabilística de amostragem, na qual o pesquisador não busca

capacidade de generalização, mas tem como objetivo selecionar os casos de

maneira estratégica, de acordo com os objetivos da pesquisa. Em outras pa-

lavras, o pesquisador seleciona casos típicos no que se refere à sua dimensão

de interesse, a fim de que seja capaz de fornecer a informação no nível de

aprofundamento desejado.

Em resumo, a pesquisa qualitativa tem como pilares principais:

• Perspectiva interpretativista: focada na compreensão do mundo so-

cial por meio da interpretação que os indivíduos dele fazem.

• Foco na “alteridade”: comprometendo-se a ver os eventos a partir do

olhar das pessoas estudadas.

• Ênfase no contexto: uma vez que não é possível entender um fenôme-

no social sem entender o contexto em que ele se desenvolve.

• Flexibilidade dos instrumentos de coleta: ou seja, recorrendo a

conjuntos de instrumentos de coleta minimamente estruturados a fim de

evitar a condução de respostas e ampliar as possibilidades de captar infor-

mações genuínas.

Para o desenvolvimento desta pesquisa, lançou-se mão da utilização de

instrumentos considerados mais adequados à captação de dinâmicas infor-

mais, a saber: a) entrevistas em profundidade; b) grupos focais; e c) obser-

vação sistemática, além da análise documental. O emprego articulado desses

instrumentais, bastante típicos da abordagem qualitativa, visa a captar desde

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Um olhar analítico | 21

as formas de enquadramento que fundamentam o programa social aqui ava-

liado e as dinâmicas assentadas em sua cultura organizacional até a percepção

das repercussões desse programa na vida dos sujeitos-alvo da ação governa-

mental, por exemplo. Considerando os interesses desta investigação, as técni-

cas citadas demonstram-se, a priori, adequadas ao processo de pesquisa e em

consonância com os objetivos previamente estabelecidos.

No próximo tópico serão apresentadas de forma mais detalhada, cada uma

dessas técnicas utilizadas, bem como serão descritos os procedimentos adota-

dos no decorrer da presente avaliação.

1.2 O processo avaliativo: fases vivenciadas e procedimentos metodológicos adotados

O processo de avaliação qualitativa aqui apresentado foi realizado em fases

que se sucederam alimentando cada uma os momentos seguintes. Ao longo de

três meses de trabalho, foi sendo gerada uma análise do Programa Mãe Coruja

Pernambucana em seus aspectos principais. Foram vivenciadas nesse proces-

so analítico quatro grandes fases, a seguir detalhadas.

Os trabalhos realizados na Fase exploratória (fase 1) compreenderam o

levantamento de documentação sobre o programa, seguido de análise docu-

mental e, em paralelo, a realização de entrevistas com a equipe de coorde-

nação do Programa Mãe Coruja Pernambucana e com integrantes da equipe

técnica que está atualmente participando dessa iniciativa, além de secretários

de Estado e gestores de diversas secretarias. Foram ouvidas também a Dra. Re-

nata Campos, que liderou a primeira etapa dos trabalhos, e a Dra. Ana Luiza

Câmara, que lidera o momento atual. Além dessas pessoas, foram entrevista-

dos os integrantes da coordenação do programa, assim como representantes

de várias secretarias de Estado.

O objetivo inicial foi o de compreender a concepção do programa, seus

eixos prioritários e sua estrutura de funcionamento, compreender os ob-

jetivos perseguidos e os resultados alcançados na visão das pessoas que

o conceberam e o implementam, além de mapear sua institucionalidade,

suas ações e as incumbências das secretarias envolvidas e dos demais par-

ceiros. A leitura crítica da equipe sobre o programa também foi levantada

nessa ocasião.

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| Mãe Coruja Pernambucana22

Nesse momento, foram identificados, ainda, nomes de atores-chaves

para integrar um grupo focal ou serem entrevistados na fase 2: A visão de

especialistas. Ao mesmo tempo, nas entrevistas, foram identificados crité-

rios de escolha dos municípios a serem objeto do trabalho de campo a ser

realizado na fase 3: Visão das usuárias e de executores locais do Programa

Mãe Coruja Pernambucana.

A démarche metodológica proposta sinalizou para uma segunda fase (Visão

de especialistas), realizada com base na consulta a especialistas que, estando

dentro e fora do governo estadual, em situações diversas, conheciam o Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana.

Os trabalhos realizados nesse momento da avaliação compreenderam es-

sencialmente a escuta a especialistas de diversas áreas do conhecimento re-

lacionadas aos objetivos e às ações do programa, bem como a profissionais

atuantes na seara da primeira infância ou temas correlatos, que, em algum

momento, conheceram ou atuaram junto ao Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana. O objetivo, aqui, foi levantar as principais forças e fraquezas do progra-

ma a partir de uma visão especializada, priorizando atores que o conhecem,

integrando ou não seus quadros técnicos. Além disso, buscou-se identificar

os principais desafios para o futuro, assim como possíveis sugestões para seu

funcionamento e para a implementação de ações futuras.

A metodologia utilizada privilegiou o uso de duas técnicas distintas para a

coleta dos dados: entrevistas semiestruturadas e grupos focais. Quanto a estes

últimos, trata-se de técnica de pesquisa qualitativa que objetiva levantar in-

formações e análises qualificadas sobre uma temática selecionada (no caso,

o Programa Mãe Coruja Pernambucana e seus resultados), reunindo, em um

mesmo ambiente, convidados previamente selecionados que tenham condi-

ção de tratar do assunto proposto.

A utilização dos grupos focais, de forma isolada ou combinada com outras

técnicas de coleta de dados, como entrevistas, tem se revelado especialmen-

te útil na pesquisa avaliativa, sobretudo no que se refere à sua capacidade de

confrontar diferentes pontos de vista sobre uma determinada questão. Nesse

sentido, a interação entre os participantes proporciona uma maior exploração

de argumentos e opiniões, possibilitando a observação de processos de diver-

gência e convergência acerca da temática analisada. A metodologia utilizada

para a realização dos grupos focais se encontra anexa.

Vale destacar que foram realizados dois grupos focais: um com os atuais

coordenadores regionais do Programa Mãe Coruja Pernambucana, e outro com

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Um olhar analítico | 23

especialistas que não atuam no programa atualmente, mas tiveram vivência

com ele em algum momento de sua implementação.

No que se refere às entrevistas semiestruturadas, elas foram realizadas a

fim de contemplar a participação daqueles atores que não puderam partici-

par do grupo focal e dos especialistas residentes fora do Estado ou do país.

Para as entrevistas, foi utilizado um roteiro semiestruturado que também

se encontra anexo.

A coleta dessas informações nesse momento foi importante no sentido de

fornecer insumos para a etapa posterior a ser realizada diretamente nos mu-

nicípios, por meio da escuta das profissionais dos Cantos Mãe Coruja, técnicos

estaduais e municipais que atuam no programa e, em especial, suas usuárias.

A terceira fase compreendeu a realização de visitas a campo, em muni-

cípios selecionados, objetos de atuação do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana. A escolha dos municípios a serem visitados teve como base os se-

guintes critérios:

• Trajetóriasquetiverammaisêxitoemenosêxitonaexecuçãodopro-

grama: buscou-se identificar, com base nas percepções dos gestores e coor-

denadores entrevistados, os municípios que apresentaram uma trajetória de

sucesso na implementação do Programa Mãe Coruja Pernambucana, assim

como municípios que ainda apresentam dificuldades na sua execução.

Exu foi um dos

municípios

selecionados para

fazer parte da

pesquisa de campo

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| Mãe Coruja Pernambucana24

• TempodeexistênciadoCantoMãeCorujanomunicípio:selecionando

municípios pioneiros, isto é, aqueles que foram os primeiros a receber o Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana, bem como aqueles que têm uma experiên-

cia mais recente com o programa.

• LocalizaçãoemdistintasregiõesdoEstado:aimdecaptarrealidades

e contextos distintos.

Os municípios selecionados foram os seguintes:

Tempo RegiãoTrajetória de implantação

Mais êxito Menos êxito

Antigos Sertão do Araripe (GERES IX) Ouricuri Exú

RecentesPajeú (GERES X) Iguaracy -

Mata Norte (GERES XII) - Condado

*Geres – Gerência Regional de Saúde

O objetivo principal do trabalho de campo foi captar a visão das usuárias

do programa e dos profissionais que atuam diretamente nos municípios – pro-

fissionais dos Cantos Mãe Coruja e das administrações municipais; tais como

profissionais do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), do Progra-

ma de Saúde da Família (PSF) e da Secretaria da Educação.

A finalidade foi identificar, especialmente, possíveis impactos do programa

na vida das usuárias, bem como a visão que elas têm dele, seus pontos positi-

vos e negativos. Em paralelo, a consulta aos profissionais que atuam na linha

de frente do programa teve como propósito identificar forças e fraquezas do

processo de implementação e operacionalização do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana na ponta, além de identificar sugestões para seu aperfeiçoamento.

As técnicas de coleta de dados utilizadas nessa etapa foram: a) entrevistas em

profundidade gravadas e sistematizadas em seus resultados e b) observação sis-

temática da realidade, gerando um diário de campo. Para as entrevistas em pro-

fundidade, foi utilizado um tópico-guia com pontos e/ou questões importantes

a serem levantadas ao longo da escuta, de forma que o roteiro não fosse rígido,

permitindo explorar em profundidade as percepções e vivências das pessoas

entrevistadas. Nesse sentido, foram produzidos três roteiros distintos: um para

as usuárias do programa, um para os profissionais dos Cantos Mãe Coruja e outro

voltado para profissionais de instituições parceiras e que atuam no atendimento

às mães e crianças, com vistas a contemplar as especificidades de cada perfil.

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Um olhar analítico | 25

No que diz respeito à observação sistemática, esta se constitui como uma

importante técnica de coleta de dados, uma vez que possibilita ao pesquisador

captar informações valiosas que não se expressam nos discursos, tais como

comportamentos e atitudes, com riqueza de detalhes. Idealmente, a observa-

ção requer a imersão do pesquisador na realidade social investigada, no en-

tanto, por questões de tempo, foi realizada a observação sistemática dentro dos

Cantos Mãe Coruja e, quando possível, nas residências das usuárias.

Nessa modalidade de levantamento de informações, há um planejamento

prévio do que se deseja analisar, com a construção de uma espécie de ro-

teiro, no qual se listam pontos importantes a serem observados de maneira

detalhada no campo. As pesquisadoras foram orientadas a reservar momen-

tos para observar a forma como se desenvolve o dia a dia das atividades nos

Cantos Mãe Coruja, tais como, o acolhimento das mulheres que ali chegam,

as orientações compartilhadas, o relacionamento entre profissionais-bene-

ficiárias, entre outros aspectos. Nas casas das usuárias, observou-se, em es-

pecial, o relacionamento entre os familiares presentes, a estrutura domiciliar

e a quantidade de crianças, entre outros aspectos. Para isso, foram utilizados

diários de campo, que se constituem como relatos detalhados e descrições em

profundidade da realidade observada.

Considerando as técnicas a serem adotadas, a seleção da equipe de pes-

quisadores foi feita com o objetivo de contemplar, tanto quanto possível, as

especificidades do campo e dos sujeitos a serem entrevistados, buscando pro-

fissionais com formação em áreas/temáticas que possuíssem interface com os

objetivos e concepções norteadoras do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Assim, foi priorizada a contratação de pesquisadoras, todas com experiência

em pesquisas qualitativas e estudos nas áreas de gênero, maternagem, cuidado

(estudos do care) e afins.

A pesquisa de campo foi iniciada no dia 15 de agosto de 2016 e terminou no

dia 28 de agosto de 2016, com duração de 15 dias no total. A equipe foi dividida

em duplas – cada uma delas responsável por visitar dois municípios – a fim de

possibilitar a observação e a tomada de notas no curso das entrevistas.

Ao chegar nos municípios, o primeiro contato foi feito com as profissionais

dos Cantos Mãe Coruja, que tinham sido previamente informadas sobre a pes-

quisa e estavam disponíveis para a realização das entrevistas e o fornecimento

das informações necessárias para o desenvolvimento do campo. O segundo

passo foi, juntamente com essas profissionais, realizar o levantamento das

usuárias cadastradas no programa e, a partir desse cadastro, selecionar pelo

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| Mãe Coruja Pernambucana26

menos quatro mulheres a serem entrevistadas em cada município, levando em

consideração os seguintes critérios:

• Tempodeentradanoprograma:umamaisantigaeumamaisrecente.

• Territórioonderesidenomunicípio:meioruralemeiourbano.

• Mãeadolescente.

• Número de ilhos: preferencialmente mães com um ilho que foi

acompanhado pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana e um que não foi.

No que se refere ao terceiro perfil de pessoas a entrevistar, priorizou-se

a escuta de profissionais das administrações municipais que trabalham em

parceria com o programa, em especial os que trabalham no Cras e no PSF.

Dentre os funcionários estaduais, priorizou-se as responsáveis pela realiza-

ção dos Círculos de Educação e Cultura (educadores ou coordenadores), visto

que a educação é o terceiro eixo prioritário do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana. Finalmente, buscou-se ouvir outros atores que apareceram nos dis-

cursos de entrevistados ou que foram indicados como figuras de referência

no cenário local e atuando junto ao programa (como membros da Pastoral da

Criança, por exemplo).

As pesquisadoras foram orientadas a explorar as situações para além do

roteiro preestabelecido, dando importância especial à observação sistemáti-

ca. Um cuidado especial foi dado ao uso de fotografias, que funcionou como

um registro para ilustrar os contextos visitados e a realidade social pesquisada.

Mulheres

beneficiadas pelo

programa também

foram ouvidas

durante o processo

de avaliação

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Um olhar analítico | 27

Nessa fase dos trabalhos, foram realizadas 55 entrevistas, assim distribuídas:

Perfis de entrevistados por municípios

OURICURI - 13 entrevistas, das quais:

2 Profissionais do Canto Mãe Coruja

1 Profissional da Saúde

2 Profissionais da Educação

1 Profissional do CRAS

5 Beneficiárias

1 Profissional do NASF

1 Profissional Voluntário

EXU - 12 entrevistas, das quais:

2 Profissionais do Canto Mãe Coruja

1 Profissional da Saúde

2 Profissionais da Educação

1 Profissional do CRAS

4 Beneficiárias

1 Profissional do IPA

1 Profissional da Pastoral da Criança

CONDADO - 17 entrevistas, das quais:

2 Profissionais do Canto Mãe Coruja

2 Profissionais da Saúde

2 Profissionais da Educação

1 Profissional do CRAS

9 Beneficiárias

1 Profissional da Secretaria de Políticas para

Mulheres

EXU - 13 entrevistas, das quais:

2 Profissionais do Canto Mãe Coruja

2 Profissionais da Saúde

1 Profissionail da Educação

1 Profissional do CRAS

5 Beneficiárias

1 Pai

1 Profissional do IPA

*IPA – Instituto Agronômico de Pernambuco

A partir das anotações de campo e dos relatos ouvidos, as pesquisadoras

priorizaram, na sistematização dos resultados, a explicitação de: a) pontos for-

tes do Programa Mãe Coruja Pernambucana; b) pontos fracos/dificuldades en-

frentadas; c) principais percepções sobre os impactos do programa nas vidas

das usuárias e de seus filhos; e d) sugestões para a melhoria do programa.

No momento final da démarche analítica (fase 4) foi realizada uma sistemati-

zação de todo o material recolhido ao longo do trabalho, buscando identificar

os principais achados e explicitar as ideias-força que se destacaram ao longo

das várias leituras e escutas realizadas.

Trata-se de um momento de síntese que implicou em trabalho em grupo

com a participação de toda a equipe envolvida nas diversas fases do estudo.

Um roteiro geral capaz de guiar a apresentação dos resultados foi construído

coletivamente e o trabalho foi repartido entre membros da equipe sênior. Nes-

se momento, foram identificadas as principais conclusões obtidas no processo

de análise, material destinado a compor o capítulo final da avaliação.

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| Mãe Coruja Pernambucana28

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Um olhar analítico | 29

Capítulo 2

Programa Mãe Coruja Pernambucana: motivações iniciais,

concepções norteadoras, gênese, evolução e funcionamento

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| Mãe Coruja Pernambucana30

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Um olhar analítico | 31

O Programa Mãe Coruja Pernambucana foi criado em 2007, por meio do

Decreto de n° 30.859, de 4 de outubro de 2007, frente à necessidade de

garantir os direitos reprodutivos das mulheres e o direito à infância desde

o primeiro ano de vida, com vistas a melhorar os indicadores materno-in-

fantis no Estado de Pernambuco, em especial a mortalidade infantil. Em 2009,

o então governador Eduardo Campos transformou o programa em projeto de

lei, aprovado pela Assembleia Legislativa (Lei n° 13.959, de 15 de dezembro de

2009), que define seus objetivos, ações, critérios de inclusão dos municípios e

atribuições das secretarias.

A seguir, busca-se explicitar as concepções que nortearam a criação do refe-

rido programa, seus objetivos, eixos prioritários e a forma como foi pensado o seu

funcionamento, por meio de análise dos documentos institucionais – em espe-

cial, do Manual do Programa Mãe Coruja Pernambucana – e dos relatos coletados na eta-

pa de entrevistas com seus idealizadores e com a equipe coordenadora. A apre-

sentação do programa será aqui dividida em dois momentos: o primeiro, mais

focado na análise do manual, e o segundo na análise das entrevistas realizadas.

2.1 Visão a partir do manual do programa e da análise documental

O Manual do Programa Mãe Coruja Pernambucana, definido como um instrumen-

to de orientação para todos que irão se envolver, direta ou indiretamente, no

processo de implantação, desenvolvimento, monitoramento e avaliação das

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| Mãe Coruja Pernambucana32

ações do programa, traz importantes informações acerca das concepções que

nortearam sua criação, além de esclarecimentos sobre seus objetivos, eixos de

atuação e funcionamento.

A discussão contida no documento parte da compreensão de que, a des-

peito dos avanços alcançados, ainda há um longo caminho a seguir para su-

perar a exclusão em suas diversas formas, ainda existentes no país e no Esta-

do, mais especificamente.

Nesse cenário, determinados setores da população tendem a sofrer os

efeitos dessa desigualdade de forma mais acentuada, constituindo o que se

costuma chamar de “pessoas em situação de vulnerabilidade social”. Essa

denominação diz respeito, justamente, àqueles indivíduos que, por moti-

vação diversa, têm sua oportunidade igualitária de acesso a bens e servi-

ços universais dificultada ou, no extremo, vetada, ficando mais suscetíveis

à violação dos seus direitos como cidadãos e sofrendo, pois, os efeitos per-

versos da exclusão. Nesse grupo de pessoas em situação de vulnerabilidade,

encontram-se as mulheres, as crianças e os adolescentes, grupos fortemente

afetados pelos problemas sociais diversos existentes em nosso o país e que

colocam seu bem-estar e sua cidadania em risco.

O Programa Mãe Coruja Pernambucana surge, portanto, nesse cenário de

iniquidade social, com vistas a tentar sanar alguns dos problemas encontra-

dos no Estado de Pernambuco, tendo como foco as crianças e as mulheres.

Em 2007, ano da sua criação, a capital do Estado, Recife, apresentou indica-

dores de mortalidade infantil de 12,7 óbitos para cada mil crianças nascidas

vivas, enquanto no sertão pernambucano esse índice foi de 25,8 óbitos por

mil nascidos vivos, de acordo com os dados do Sistema de Informações sobre

Mortalidade (SIM/Datasus) do Ministério da Saúde. Essa distorção encontra-

da entre os coeficientes da capital e do interior reflete a existência de realida-

des distintas dentro do Estado, onde crianças nascidas no sertão apresentam

menos chance de viver do que as da capital, sendo, portanto, mais vulnerá-

veis. Levando isso em consideração, o programa é orientado pelo desafio de

enfrentar a mortalidade infantil no Estado, por meio do cuidado integral das

gestantes e crianças de 0 a 5 anos.

No caso de Pernambuco, a vulnerabilidade das crianças e mulheres em sua trajetória

de maternidade acentua-se no interior das comunidades quilombolas, das aldeias

indígenas, dos assentamentos e dos inúmeros bolsões de miséria urbanos e rurais.

Considerando a divisão geofísica, a zona semiárida pernambucana, assim como

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Um olhar analítico | 33

acontece em todo semiárido brasileiro, apresenta os piores indicadores de mortali-

dade materna e infantil. (Manual do Programa Mãe Coruja Pernambucana, 2011 p.7)

Reconhecer essa diferença e colocar essas áreas como foco de atuação do

programa, saindo do eixo capital-região metropolitana, coloca-o um passo à

frente dos demais, uma vez que não se furta a situar-se no centro do problema

e a combatê-lo de frente.

Já no que diz respeito à mulher, parte-se da ideia de que, historicamente,

sempre coube a ela o papel do cuidado. Isto é, ao ficar restrita ao ambiente

do lar, a ela foi imposto o lugar de cuidadora – do marido, dos filhos, e da fa-

mília como um todo. A partir de um processo de mudança ocorrido ao longo

dos anos, a mulher viu crescer seu escopo de responsabilidades: pesquisas re-

centes mostram que vem crescendo o número de mulheres chefes de família,

acumulando, portanto, os papéis de cuidadora e provedora, este último um

papel historicamente associado ao homem em muitas culturas. Apesar disso,

em contrapartida, esse crescimento não foi acompanhado de uma maior par-

ticipação dos homens no exercício das atividades da vida privada – de cuidado

da família e manutenção do lar — de forma proporcional.

Vê-se, portanto, que a mulher, ao passo que assume a responsabilidade da família,

enquanto pessoa de referência, reforça a sua função de “cuidadora”, desencadean-

do a questão: se ela cuida de todos, quem cuida da mulher? (Manual do Programa

Mãe Coruja Pernambucana, 2011, p.8)

Assim, o programa visa a promover, também, o cuidado às mulheres ges-

tantes, por meio do reconhecimento dos seus direitos e do estímulo ao pleno

exercício da cidadania. De acordo com seu manual, o programa se alicerça em

três pilares, a saber:

• Noreconhecimentodosdireitosdasmulheres,vistoquesãoelasque

engravidam e, quando não acompanhadas de forma sistemática e plena pelo

Estado, pela sociedade e pela família, são as que mais sofrem consequências,

muitas vezes, irreversíveis.

• Noreconhecimentodainfânciacomoumdosuniversosetáriosprio-

ritários na formulação de políticas sociais conforme o Estatuto da Criança e do

Adolescente.

• Noreconhecimentoedeiniçãocomopolíticaprioritáriaeestratégica

para o Estado de Pernambuco no enfrentamento das desigualdades sociais.

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| Mãe Coruja Pernambucana34

Por meio da análise do Manual do Programa Mãe Coruja Pernambucana é pos-

sível perceber que o referido programa se insere em um cenário de entre-

laçamento de problemas sociais distintos, porém relacionados, tais como

a desigualdade social, as vulnerabilidades sociais que vitimam mulheres e

crianças, a fragilidade da rede assistencial e o acesso desigual à cidadania,

entre outros. Tudo isso puxado pela grande questão e preocupação principal

do programa que é a mortalidade infantil e materna. Ou seja, ao resolver li-

dar com o problema específico dos altos índices de mortalidade infantil no

Estado, o Programa Mãe Coruja Pernambucana se depara com uma varie-

dade de problemas outros que estão relacionados – direta ou indiretamente

– com os altos coeficientes encontrados para esse indicador. Frente a isso, o

programa tem como objetivo principal reduzir esses índices, olhando, tan-

to quanto possível, para os demais indicadores sociais correlacionados, que

acabam por influenciar os resultados que se pretende alcançar. Essa pers-

pectiva fica clara no delineamento do objetivo geral do Programa Mãe Coruja

Pernambucana, conforme pode-se ver a seguir:

Garantir atenção integral às gestantes usuárias do sistema público de saúde, bem

como aos seus filhos e famílias, incentivando o fortalecimento dos vínculos afetivos

e criando uma rede solidária para redução da mortalidade infantil e materna, além

da melhoria de outros indicadores sociais, através de ações articuladas nos eixos da

saúde, educação, desenvolvimento e assistência social. (Manual do Programa Mãe

Coruja Pernambucana,2011, p. 11)

2.2 Visão a partir da fala dos entrevistados

Para além da análise dos documentos institucionais, na fase exploratória,

foi realizada uma série de entrevistas com o objetivo de melhor compreender

a essência do Programa Mãe Coruja Pernambucana: as motivações iniciais que

levaram ao seu surgimento, suas características basilares, as concepções que

nortearam sua construção, seu processo de implementação e desenvolvimento.

Tomando como base os relatos coletados nessas entrevistas, foi possível

identificar alguns eixos centrais para o entendimento e a avaliação das diretri-

zes do programa, que serão discutidos a seguir.

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Um olhar analítico | 35

a) Gênese

Por meio das entrevistas, foi possível observar que o processo de surgimen-

to e construção do programa passou pelo levantamento e identificação de al-

guns indicadores que evidenciaram a existência de problemas sociais sérios

no Estado de Pernambuco. Um desses indicadores foi o de Anos Potenciais de

Vida Perdidos (APVP), que diz respeito à diferença entre a expectativa de anos

de vida em um dado momento e a idade em que o indivíduo morreu4. Segundo

os relatos, na época da campanha eleitoral, em 2006, foi feito um diagnóstico

sobre a situação do Estado, no qual foi encontrada uma série de indicadores

negativos – entre eles, um número alto de “anos perdidos” que, em Pernam-

buco, era fortemente afetado por uma taxa altíssima de mortalidade infantil e

de assassinatos de jovens.

Tais coeficientes forneceram o embrião para a formulação do Programa

Mãe Coruja Pernambucana, e a taxa de mortalidade infantil foi tomada como

o marco principal a partir do qual era preciso pensar em saídas e soluções

para a sua redução. A primeira convicção nesse sentido foi sobre a neces-

sidade de fortalecer a atenção primária no Estado, o que foi feito por meio

da Política de Fortalecimento da Atenção Primária do Estado, instituída pelo

Decreto Estadual n° 30.353, de 12 de abril de 2007, com vistas à valorização

e à melhoria da cobertura e qualidade da atenção primária ofertada pelas

Secretarias Municipais de Saúde, e que faz parte do Marco Legal do Programa

Mãe Coruja Pernambucana:

Paralelo a isso a gente foi construindo a política de fortalecimento da atenção pri-

mária. Então, antes de nascer, o Mãe Coruja teve todo um movimento que surgiu a

partir daí, né, pra nascer a política de fortalecimento, a gente criou os indicadores,

criou os critérios, e as certificações das equipes de saúde [...] a política de forta-

lecimento da atenção primária, que é aquele primeiro decreto que a gente tem no

nosso marco legal, foi em abril de 2007, foi a primeira política que Eduardo assi-

nou. (Ana Elizabeth de Andrade Lima – Médica, diretora de Políticas Estratégicas

do Programa Mãe Coruja Pernambucana e coordenadora do Conselho Consultivo

do Programa Mãe Coruja Pernambucana)

4 Assim, um determinado indivíduo que morreu com 30 anos, considerando a expectativa de vida de 70 anos, perdeu 40 anos potenciais de vida.

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| Mãe Coruja Pernambucana36

Outro ponto colocado em algumas das entrevistas refere-se à influên-

cia do Projeto Caminhar, implementado no final dos anos 1980 pelo governo

de Miguel Arraes. Esse projeto tinha como um dos seus objetivos diminuir a

mortalidade infantil mobilizando, capacitando os agentes e transferindo o co-

nhecimento à população por meio da cultura popular, mais especificamente,

utilizando o mamulengo5. O projeto Caminhar é apontado como uma inspi-

ração para a criação do Programa Mãe Coruja Pernambucana e, em especial,

para a implementação dos Círculos de Educação e Cultura como um dos ins-

trumentos do programa.

Era uma coisa que a gente resgatou do governo Arraes e trouxe do Caminhar,

tanto é que o nome é muito simbólico, Projeto Caminhar, e a gente continua ca-

minhando... se você olhar na estruturação, na linha do tempo, é o Caminhar, a

Política de Fortalecimento da Atenção Primária [...], o Mãe Coruja. (Ana Eliza-

beth de Andrade Lima – Médica, diretora de Políticas Estratégicas do Programa

Mãe Coruja Pernambucana e coordenadora do Conselho Consultivo do Programa

Mãe Coruja Pernambucana)

Assim, começou-se a pensar em como resolver o problema específico da

mortalidade infantil, cujos indicadores eram bastante elevados e se encontra-

vam de forma desigual por todo o Estado. Para isso, várias secretarias estaduais

foram mobilizadas para pensar de forma integrada em um conjunto de medi-

das necessárias para reduzir os indicadores e como cada uma dessas secreta-

rias poderia atuar a fim de atingir o objetivo desejado.

Dessa forma, dois grandes programas foram criados pelo governo Eduardo

Campos, partindo do conhecimento acerca do indicador de anos potenciais de

vida perdidos: o Pacto Pela Vida, que surge para enfrentar a questão dos crimes

violentos letais intencionais – que tem os jovens como vítimas preferenciais –,

e o Programa Mãe Coruja Pernambucana, que vem com o objetivo de reduzir

os altos índices de mortalidade infantil.

Observa-se que, na gênese, há uma ponte entre o Pacto Pela Vida e o Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana, que partem, inclusive, de modelos de

gestão semelhantes no que diz respeito à perspectiva de transversalidade, in-

tegração e intersetorialidade, características que se constituem como um dife-

rencial desses dois programas.

5 O mamulengo é uma manifestação popular, tipicamente pernambucana, que consiste em uma forma de teatro de bonecos praticada por artistas populares.

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Um olhar analítico | 37

Outro elemento muito presente tanto nas falas dos entrevistados quanto

nos documentos analisados é a questão das mortes por “causas evitáveis”. As

causas evitáveis são aquelas passíveis de serem prevenidas – total ou parcial-

mente – por ações efetivas dos serviços de saúde disponíveis em dada épo-

ca. Sendo assim, os óbitos por causas evitáveis são aqueles que não deveriam

ocorrer e que, uma vez que acontecem, têm sua ocorrência ligada à qualida-

de ou à efetividade do sistema de saúde de uma determinada localidade. Ou

seja, com o aprofundamento na problemática da mortalidade infantil no Esta-

do, começou-se a perceber que uma grande parcela dessas mortes poderia ter

sido evitada com ações simples do serviço de saúde, como um maior acompa-

nhamento e cuidado com as crianças e gestantes.

[...] a gente começou todo um diagnóstico, aí a gente viu que a mortalidade era alta,

muitas vezes, por causas evitáveis, era uma infecção urinária, era uma sífilis, era

um acompanhamento que não teve na gestação... (Renata Campos - Ex-primeira-

dama do Estado de Pernambuco e líder da primeira fase do Programa Mãe Coruja

Pernambucana)

Tendo essas questões como referência, partiu-se em busca de experiências

bem-sucedidas no trato com o problema da mortalidade infantil e no cuidado

com a primeira infância, tanto no Brasil quanto fora dele. Alguns programas

que inspiraram a construção do Programa Mãe Coruja Pernambucana, segun-

do as entrevistas feitas, foram o Primeira Infância Melhor (PIM), do Rio Gran-

de do Sul, e o Mãe Curitibana, no Paraná. O contato com essas experiências,

segundo os relatos, foi muito rico no sentido de trazer importantes insights para

a forma de pensar e formular o programa, que se inspirou em várias dessas

perspectivas encontradas e buscou se adaptar à realidade de Pernambuco, le-

vando em conta as suas particularidades. Um ponto importante que se cons-

titui como central na gênese do Programa Mãe Coruja Pernambucana é a im-

portância de se voltar o olhar para o cuidado na primeira infância, como etapa

crucial para o desenvolvimento humano.

Além disso, o programa parte do pressuposto de que o cuidado com a in-

fância começa já na gestação, por meio de acompanhamento e atenção à ges-

tante durante toda a gravidez.

Essas questões, colocadas aqui de maneira breve, constituem o cerne do

processo por meio do qual o Programa Mãe Coruja Pernambucana foi gera-

do, bem como fornecem pistas importantes acerca das concepções que vão

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| Mãe Coruja Pernambucana38

nortear todo o programa: desde a sua criação, perpassando todo o seu funcio-

namento e a execução na ponta, como se verá a seguir.

b) Concepções norteadoras

Ainda no processo de investigação realizado na primeira etapa deste es-

tudo, foi possível identificar alguns dos eixos e preocupações centrais que

orientaram a criação do Programa Mãe Coruja Pernambucana, bem como a

dinâmica de sua implantação e funcionamento. Cabe salientar que esse se

constituiu como um primeiro olhar sobre o programa, seus fundamentos e

possíveis repercussões.

b.1) Mortalidade infantil como fenômeno multicausal

O que é que interfere na mortalidade infantil? O que é que faz uma geração ser

mais bem cuidada? Então, a gente viu que não era uma questão só de saúde [...] era

uma coisa que a gente se deparava muito. Normalmente os programas de combate

à mortalidade infantil são da saúde, e a gente via que a mortalidade infantil não

é só uma questão de saúde, é uma questão de saúde, de educação, de assistência

social, de todo um cuidado [...]. E, aí, a gente começou a ver dentro do Estado o

que é que a gente poderia fazer pra construir esse programa. Aí foi uma verdadeira

gestação, de juntar as secretarias, de ver [...] e, aí, começou, a Secretaria de Saúde,

a Secretaria da Educação, a Secretaria da Mulher [...] (Renata Campos - Ex-pri-

meira-dama do Estado de Pernambuco e líder da primeira fase do Programa Mãe

Coruja Pernambucana)

De acordo com os diversos relatos coletados, tornou-se possível per-

ceber como, desde o início, buscou-se tratar da mortalidade infantil por

meio do entendimento de que esse é um fenômeno complexo e múltiplo

em sua causalidade. Esse fenômeno, captado e mensurado como indicador

específico, acaba por despontar como um dos elementos norteadores para

a construção do programa, uma vez que suas causas e efeitos – profun-

damente transversais – demandariam uma perspectiva multissetorial de

ações e políticas convergentes.

Sendo assim, para lidar com essa questão, seria necessário um olhar ho-

lístico e um esforço combinado entre várias dimensões que, juntas, poderiam

ser capazes de sanar o problema. A ideia de não reduzir a mortalidade infantil

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Um olhar analítico | 39

em uma única causa fica clara em vários momentos na fala de vários dos atores

entrevistados, por meio da noção de que é preciso cuidar não apenas da crian-

ça, mas também da mãe e da família como um todo.

Dessa forma, a mortalidade infantil e seu enfrentamento não se resu-

mem a uma questão de saúde apenas, tendo a dimensão social um papel

fundamental, o que se traduz na própria definição dos eixos prioritários do

Programa Mãe Coruja Pernambucana, quais sejam: a saúde, a educação/

cultura e o desenvolvimento e assistência social. Assim, as ações do pro-

grama não estão apenas voltadas para questões diretamente vinculadas ao

âmbito da saúde, mas também prezam pelo fortalecimento dos vínculos

afetivos familiares, pelo estímulo à autonomia das mães mediante a conso-

lidação de processos de alfabetização, letramento e capacitação profissio-

nal, pela promoção da inclusão social e direito à cidadania, entre outros. É

essa ideia que, na gênese, deu fruto à perspectiva tão citada e presente de

integração e transversalidade nas ações.

b.2) Transversalidade, integração e intersetorialida-de como diretrizes centrais de atuação

Outro aspecto fundamental para compreender o Programa Mãe Coruja

Pernambucana diz respeito à noção de transversalidade e integração. Frente ao

entendimento de que o problema da mortalidade infantil é multicausal, tratá-lo

a partir de uma ótica multidisciplinar acaba por ser uma consequência natural e

profícua, que se observa desde a sua origem, por intermédio do diálogo com as

várias secretarias e a construção coletiva de suas diretrizes e ações.

A gente fez uma opção de agir no programa de forma integrada, de forma integrada

dentro do Estado e pra dentro do município, trabalhar de forma integrada o Estado

e o município. E buscar dentro do município que ele também se organizasse de for-

ma integrada. Essa integração, eu acho que é uma coisa muito forte do programa, é

trabalhar de forma integrada, né, ele é intersetorial e integral e, aí, essa integração

que a gente fez no Estado a gente levou para que os municípios também passassem

a trabalhar de forma integrada. (Renata Campos - Ex-primeira-dama do Estado

de Pernambuco e líder da primeira fase do Programa Mãe Coruja Pernambucana)

Essa transversalidade se reflete no próprio modelo de gestão e governança

do programa, que busca construir uma dinâmica articulatória entre as várias

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| Mãe Coruja Pernambucana40

secretarias participantes, de modo a que todas elas tenham responsabilidades

compartilhadas no tratamento da questão, privilegiando um desenho eminen-

temente intersetorial. Por sua vez, o Programa Mãe Coruja Pernambucana busca

levar essa perspectiva intersetorial também para o âmbito dos municípios onde

chega por meio do estímulo à integração das atividades e cooperação entre os

diferentes atores e profissionais atuantes no município.

É recorrente, nos discursos dos entrevistados, a ênfase dada a essa transver-

salidade, vista como característica basilar do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana, à qual creditam boa parte dos resultados positivos alcançados.

Por outro lado, apesar dessa integração ser vista como um ponto forte, muitas

das falas a encaram também como sendo um desafio constante, uma vez que re-

quer a sensibilização continuada dos atores envolvidos nos diversos níveis, bem

como a repactuação institucional das várias secretarias estaduais envolvidas.

b.3) Centralidade da ideia de cuidado

A perspectiva do cuidado é central no discurso de todos os entrevistados, que

identificam como um dos objetivos principais do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana cuidar das crianças e de suas famílias. Segundo muitos deles, o en-

frentamento de um problema tão sério quanto o da mortalidade infantil passa

diretamente pela necessidade de fortalecimento dos vínculos familiares, espe-

cialmente o vínculo mãe-bebê, e a atuação do programa nesse sentido é feita

por meio de um trabalho multidisciplinar com o objetivo de operar nas várias

vertentes que compõem a esfera do cuidado.

Na verdade, a gente via a necessidade, lá na campanha, uma coisa aí pra trás mes-

mo, de criar, de ter um programa, de ter uma coisa que cuidasse da vida desde o

início [...]. Nasceu da gente perceber que era importante a gente ter alguma coisa

que cuidasse da vida, e que cuidasse da vida desde o início. [...] A gente percebia que

cuidar dos vínculos afetivos era uma coisa muito importante. (Renata Campos - Ex

-primeira-dama do Estado de Pernambuco e líder da primeira fase do Programa Mãe

Coruja Pernambucana)

Sendo assim, observa-se a compreensão do cuidado para além da visão bio-

lógica – situada no campo mais específico da saúde, de modo a levar em con-

ta a multiplicidade de aspectos aí inclusos e, dessa forma, tratar o ser humano

em sua complexidade e subjetividade. De forma prática, esse entendimento é

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Um olhar analítico | 41

operacionalizado pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana no próprio desen-

volvimento de suas ações, que buscam articular diversos âmbitos, tais como o

da saúde, da educação e da assistência social, para alcançar uma perspectiva de

cuidado global que leve em conta as múltiplas dimensões do ser humano.

O fortalecimento dos vínculos afetivos e familiares é visto como um ponto

fulcral a ser estimulado pelo programa, por meio de reuniões, oficinas, sensi-

bilizações e da instrumentalização de toda uma cadeia de recursos simbólicos

ligados à própria ideia de maternidade. Um exemplo disso é a utilização do

Álbum do Bebê, recorrentemente citado como um instrumento de construção

de memória, resgate e consolidação dos vínculos afetivos no âmbito familiar

– nuclear ou ampliado.

Vale salientar que as emoções constituem uma dimensão fundamental dentro

do trabalho do cuidado e, por esse motivo, a capacitação dos profissionais que

lidam com as gestantes e suas famílias é vista como um fator fundamental para

o bom desenvolvimento do programa. O trabalho direto com as famílias requer

a sensibilidade e o envolvimento desses profissionais para compreender as rea-

lidades e necessidades distintas de cada uma dessas famílias. A seleção de um

perfil de profissional que se coadune com essa visão é, pois, de suma importân-

cia, uma vez que é ele que vai tratar com essas famílias diretamente na ponta.

c) Evolução do programa

Com base nos indicadores de mortalidade infantil coletados, foi cons-

truído um critério para selecionar os municípios que seriam alvo de atua-

ção do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Assim, o critério adotado foi

o de 25 óbitos por mil nascidos vivos, ou seja, os municípios onde a taxa

de mortalidade infantil era igual ou superior a 25 óbitos por mil nasci-

dos vivos eram considerados prioritários para a implantação do programa.

Aliado a isso, também foram levados em consideração para a definição das

áreas prioritárias o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o Índice

de Desenvolvimento Infantil (IDI).

A divisão territorial adotada foi a mesma adotada pela área da saú-

de, que divide o território do Estado em 12 Gerências Regionais de Saúde

(Geres). Cada uma dessas Geres é responsável por um conjunto de muni-

cípios e atua, de forma mais localizada, na atenção básica, na reestrutu-

ração da rede hospitalar, nas ações municipais e nas diversas endemias,

e, portanto, no enfrentamento à mortalidade infantil. Dessa forma, nos

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| Mãe Coruja Pernambucana42

casos em que pelo menos 50% dos municípios situados em uma deter-

minada Geres apresentassem taxa de mortalidade infantil igual ou su-

perior a 25 óbitos por mil nascidos vivos, o Programa Mãe Coruja Per-

nambucana seria implantado na área como um todo, isto é, em todos os

municípios daquela Geres.

A princípio, no ano de 2007, a área que se apresentou mais crítica foi

o Sertão do Araripe, onde estavam os piores indicadores de Pernambuco.

Essa região foi, portanto, o local escolhido para iniciar a implantação do

Programa Mãe Coruja Pernambucana. De acordo com os documentos ins-

titucionais analisados, em 2008, foi definida a implantação do programa

nos 11 municípios da IX Geres – Araripina, Bodocó, Exu, Granito, Ipubi,

Moreilândia, Ouricuri, Parnamirim, Santa Cruz, Santa Filomena e Trindade

– e nos 13 municípios da VI Geres – Arcoverde, Buíque, Custódia, Ibimirim,

Inajá, Jatobá, Manari, Pedra, Petrolândia, Sertânia, Tacaratu, Tupanatinga e

Venturosa –, totalizando 24 municípios beneficiados.

Atualmente, o Programa Mãe Coruja Pernambucana está presente nas

12 Geres, em 105 municípios, 103 deles sob a gestão estadual, são eles6:

• I Geres – Araçoiaba.

• II Geres – Casinhas, Cumaru, Salgadinho.

• III Geres – Amaraji, Catende, Cortês, Jaqueira, Joaquim Nabuco, Lagoa

dos Gatos, Maraial, Palmares, Quipapá, Rio Formoso e Xexéu.

• IV Geres – Agrestina, Belo Jardim, Bonito, Camocim de São Félix, Ibi-

rajuba, Jataúba, Jurema, Panelas, Riacho das Almas, Sairé, Sanharó, São Cae-

tano, Tacaimbó e Vertentes.

• V Geres – Águas Belas, Angelim, Bom Conselho, Brejão, Caetés, Cal-

çado, Canhotinho, Capoeiras, Correntes, Garanhuns, Iati, Itaíba, Jucati, Jupi,

Lagoa do Ouro, Lajedo, Palmeirina, Paranatama, Saloá, São João e Terezinha.

• VI Geres – Arcoverde, Buíque, Custódia, Ibimirim, Inajá, Jatobá, Ma-

nari, Pedra, Petrolândia, Sertânia, Tacaratu, Tupanatinga e Venturosa.

• VII Geres – Mirandiba e Terra Nova.

• VIII Geres – Afrânio, Cabrobó, Dormentes, Lagoa Grande, Orocó, Pe-

trolina e Santa Maria da Boa Vista.

• IX Geres – Araripina, Bodocó, Exu, Granito, Ipubi, Moreilandia, Ouri-

curi, Parnamirim, Santa Cruz, Santa Filomena e Trindade.

6 Versão atualizada de acordo com as informações contidas no site Programa Mãe Coruja Per-nambucana. Disponível em: http://www.maecoruja.pe.gov.br/cantos-mae-coruja/. Acesso em: 31 jan. 2017.

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Um olhar analítico | 43

• X Geres – Carnaíba, Iguaracy, Itapetim, Santa Terezinha e Solidão.

• XI Geres – Betânia, Calumbi, Carnaubeira da Penha, Flores, Floresta, Ita-

curuba, Santa Cruz da Baixa Verde, São José do Belmonte, Serra Talhada e Triunfo.

• XII Geres – Aliança, Condado, Ferreiros, Macaparana e São Vicente Férrer

Os municípios de Recife e Ipojuca possuem um programa similar, implan-

tado sob a gestão municipal com cooperação técnica estadual.

d) Funcionamento do programa

De acordo com os documentos institucionais analisados e por meio dos re-

latos coletados, é possível entender como se dá o funcionamento do Programa

Mãe Coruja Pernambucana, fundado em uma perspectiva interdisciplinar de

integração e colaboração entre diversas Secretarias de Estado e diferentes ato-

res nele envolvidos, direta ou indiretamente.

O próprio modelo de gestão do programa reflete a perspectiva da interseto-

rialidade, por meio da adoção de instâncias deliberativas, consultivas e execu-

tivas, como se pode ver no organograma a seguir, retirado das apresentações

oficiais do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Figura 1 – Organograma da gestão do Programa Mãe Coruja Pernambucana

Fonte: Elaboração própria a partir de dados contidos no Manual do Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na, 2011. Disponível em: <http://pt.slideshare.net/maecoruja/manual-do-programa-me-coru-

ja>. Acesso em: 31 jan. 2017.

Como é possível notar, cada um dos comitês mencionados no organogra-

ma tem uma formação interdisciplinar e atua de forma conjunta realizando

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| Mãe Coruja Pernambucana44

a definição, o acompanhamento e o monitoramento das ações. Outro ponto

importante no que se refere ao funcionamento do programa é o que diz res-

peito ao monitoramento sempre permanente das ações, que perpassa seus

diferentes âmbitos.

No âmbito local, encontra-se o que é chamado de Canto Mãe Coruja, que

se constitui como um espaço de acolhimento das gestantes, crianças e famí-

lias, funcionando como o ponto de apoio para os profissionais atuarem como

articuladores do programa na esfera municipal. É nesse espaço que ocorrem o

cadastramento das gestantes e o monitoramento do pré-natal, parto, pós-par-

to e desenvolvimento da criança até os 5 anos de idade.

É também por meio dos Cantos Mãe Coruja que as gestantes são encaminhadas

para outros programas, políticas ou equipamentos que possuam ações contidas

no escopo do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Em cada um desses Cantos

atuam dois profissionais, cujo trabalho consiste em cadastrar e monitorar as ges-

tantes, articulando no território dos municípios as ações das diversas secretarias

– tanto estaduais quanto municipais – que participam do programa, com o ob-

jetivo de potencializar os diversos instrumentos disponíveis para a promoção da

melhoria das condições de vida de gestantes, crianças e suas famílias.

As entrevistas feitas ressaltam o fato de que o Programa Mãe Coruja Per-

nambucana, quando chega no município, não traz nenhuma ação necessaria-

mente nova, atuando muito mais como um catalisador das ações já existentes,

buscando apoiar e articular os atores locais – governamentais e da sociedade

organizada – por meio do estímulo ao trabalho integrado com vistas a atender

às demandas das gestantes e de suas famílias.

Ele tem como porta de entrada sim os cuidados pré-natais e a mulher grávida, mas

ele é um grande indutor de políticas públicas do estado, né? Então é um programa

que permite, por exemplo, a escolarização das mães e das famílias que integram o

programa, a questão da documentação, das certidões, do empreendedorismo que

chega, dos cursos de cultura e de educação, né, então o programa, na verdade, é

muito maior, muito mais amplo. (Ana Luíza Câmara – Coordenação de Articula-

ção do Programa Mãe Coruja Pernambucana)

Nesse sentido, em cada município no qual o Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana se insere são feitos o mapeamento e o reconhecimento do local e das

instâncias que podem atuar de forma conjunta com o programa. A partir daí,

são realizadas sensibilizações com os prefeitos, secretários, agentes de saúde,

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Um olhar analítico | 45

profissionais do Cras, entre outros atores que podem auxiliar no trato com a

questão no âmbito local. O Canto Mãe Coruja se torna, portanto, um equipa-

mento de triagem e encaminhamento para outras políticas públicas, funcio-

nando como uma estratégia de articulação e fortalecimento das ações e polí-

ticas já existentes.

Há, também, um grande investimento na capacitação e na formação dessas

equipes que vão lidar diretamente com as famílias, com as quais são trabalha-

das questões ligadas à maternidade, desenvolvimento na primeira infância e

cidadania. A intenção é que esses profissionais possam atuar como multiplica-

dores desse conhecimento, levando as informações às mães por meio de uma

perspectiva de empoderamento por meio do conhecimento.

Toda reunião da gente tem uma parte formativa. Então, a gente traz para as

reuniões, se a gente vai trabalhar desenvolvimento infantil, tem a equipe de

comunicação e arte que vai lá pesquisar vídeos, coisas que a gente possa dia-

logar [...]. A gente faz isso a nível central, o que é treinado e capacitado e for-

matado aqui, vai para o comitê regional, vai para o local. Então, a gente tem

essas instâncias de formação e empoderamento, em todas as instâncias, para

que o profissional que está lá na ponta, ele tenha argumentos e capacidade

de dialogar e fazer isso junto à família, junto à mulher [...] essa coisa de a

gente trabalhar o empoderamento através do conhecimento. (Ana Elizabeth de

Andrade Lima – Médica, diretora de Políticas Estratégicas do Programa Mãe

Coruja Pernambucana e coordenadora do Conselho Consultivo do Programa

Mãe Coruja Pernambucana)

e) Monitoramento Dada a maneira como o Programa Mãe Coruja Pernambucana foi con-

cebido e é implementado, tendo-se optado por montar uma estrutura es-

pecial para definir e, sobretudo, articular ações de vários atores, dentro e

fora do governo estadual, o processo de monitoramento assume papel es-

tratégico. Um organograma complexo, com várias instâncias, com agentes

atuando em várias escalas de poder e de implementação, requer um mo-

delo de gestão no qual o sistema de monitoramento é peça fundamental.

O essencial dos agentes do programa é “fazer fazerem”. Articular para que

aconteça. Não é executar diretamente. Portanto, a tarefa de acompanhar as

iniciativas em curso se torna vital.

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| Mãe Coruja Pernambucana46

Cabe destacar que a concepção e o funcionamento do modelo de monitora-

mento do programa foram facilitados pela existência de um modelo de gestão

estadual que valoriza o planejamento e o monitoramento, adotados desde o

início da gestão de Eduardo Campos e liderados pela Secretaria de Planeja-

mento e Gestão.

O processo de monitoramento adotado pelo programa é descentralizado,

sendo realizado em múltiplas escalas, desde a estadual até a local.

Na sede do Programa Mãe Coruja Pernambucana há uma Gerência de Moni-

toramento que dialoga diariamente (trabalhando no mesmo espaço físico) com

quatro coordenações estaduais. Sob a responsabilidade dessas coordenações es-

taduais, estão 12 coordenações regionais. Essas coordenações são organizadas

por regiões do Estado (mesma lógica das Geres).

Nesse ambiente institucional, o monitoramento do Programa Mãe Coruja

Pernambucanaestáassimorganizado:GerênciadeMonitoramento•4Coorde-

naçõesEstaduais•12CoordenaçõesRegionais,aseguirelencadas:

• 1ªCoordenaçãoEstadual:IGeres7 (Araçoiaba + Recife e Ipojuca - coope-

ração técnica), II Geres (Limoeiro), III Geres (Palmares) e XII Geres8 (Goiana).

• 2ªCoordenaçãoEstadual:IVGeres(Caruaru)eVGeres(Garanhuns).

• 3ªCoordenaçãoEstadual:VIGeres(Arcoverde),VIIGeres(Salgueiro)e

X Geres (Afogados da Ingazeira).

• 4ªCoordenaçãoEstadual:VIIIGeres(Petrolina),IXGeres(Ouricuri)eXI

Geres (Serra Talhada).

Na escala estadual, duas atividades de monitoramento ocorrem mensal-

mente: a) a reunião do Ciclo de Monitoramento da Cidadania Ativa9, coorde-

nada pelo governador do Estado, e b) a reunião do Ciclo Interno de Monito-

ramento, coordenada pelo secretário de Projetos Especiais, a quem hoje se

vincula o programa, que mobiliza a gerência de monitoramento, coordenações

estaduais e regionais, outras gerências e coordenações de outras secretarias

(mobiliza cerca de 40 pessoas).

7 Na I Geres só há um município que participa do programa, por isso, o coordenador estadual faz o papel do coordenador regional. 8 Quando o programa foi implantado, alguns municípios da XII Geres estavam lotados na II Geres, dessa forma, ainda hoje há apenas um coordenador regional para as duas Geres.9 Dentro do Mapa da Estratégia 2015-2018 do governo do Estado de Pernambuco, o Programa Mãe Coruja Pernambucana está inserido na perspectiva “Desenvolvimento Social e Direitos Hu-manos – Pernambuco Humano e Solidário” e no objetivo estratégico “Cidadania Ativa – Ampliar a eficácia da rede de proteção e de assistência social, e a inclusão de grupos em situação de risco nas políticas públicas”.

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Um olhar analítico | 47

Na reunião com o governador, são monitorados indicadores gerais, que

foram sendo aperfeiçoados ao longo dos últimos anos. Os 43 indicadores ini-

cialmente trabalhados foram sendo criticados e aperfeiçoados, chegando-se

hoje a 11 indicadores informacionais10 cuja responsabilidade de acompanha-

mento está dividida entre as diversas secretarias que participam do progra-

ma. Os atuais indicadores-síntese objeto de discussão e acompanhamento

são: a) mortalidade infantil; b) gestações acompanhadas; c) gestações cadas-

tradas; d) mães com sete ou mais consultas de pré-natal realizadas; e) crian-

ças acompanhadas; f) mortalidade materna; g) mulheres que concluíram os

módulos de Educação e Cultura; h) crianças com registro civil de nascimen-

to; e i) pessoas que concluíram os cursos de qualificação profissional.

Na reunião com o secretário, a cada mês, é apresentado o monitoramento

geral, com as informações dos 103 municípios e regionais. Duas ou três coor-

denações regionais apresentam e discutem os indicadores de suas regiões,

sempre comparando os resultados à média estadual, comentando avanços

alcançados e dificuldades enfrentadas. Como as demais coordenações regio-

nais estão presentes, debatem-se desafios, conquistas comuns e especifici-

dades regionais. Na ocasião, é feito o balanço dos retornos de iniciativas de

encaminhamento de problemas propostas na reunião anterior. Também par-

ticipam dessa reunião, representantes das secretarias estaduais que atuam no

Programa Mãe Coruja Pernambucana, membros de assessorias e convidados

especiais (em torno de 40 pessoas). Após a reunião de monitoramento, apro-

veitando sua presença no Recife, as coordenações regionais se reúnem com

a equipe de coordenação do programa e assessores das secretarias estaduais

para alinhar a agenda do mês seguinte e nivelar procedimentos.

Além dessas reuniões mensais, semanalmente (toda segunda-feira) acon-

tece uma reunião de diretoria (nível central), com a participação das outras

gerências, coordenações e do secretário de Projetos Estratégicos. E quinze-

nalmente (quintas-feiras), realiza-se a reunião do Comitê de Assessoramento

(composto pela diretoria do programa e representantes das secretarias).

Na escala regional, ocorre uma reunião mensal com o coordenador re-

gional e os profissionais dos Cantos Mãe Coruja, o coordenador pedagógico

da educação, o extensionista rural e, quando possível, os profissionais dos

Cras. Nessa reunião, são analisados e discutidos os 11 indicadores já citados,

por município.

10 Elaborados pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana em conjunto com a Secretaria de Plane-jamento e Gestão, a Vigilância Epidemiológica e a Atenção Básica de Saúde.

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Na escala local, o coordenador regional faz o monitoramento da atuação de

todos os Cantos Mãe Coruja dos municípios de cada Geres (monitoramento das

ações e do processo de trabalho, além da avaliação do profissional do Canto).

Ele é o elo com a coordenação estadual e a gerência de monitoramento. Para um

melhor monitoramento local, há uma sala de situação fixada em cada Canto Mãe

Coruja, na qual qualquer pessoa (usuárias do programa, profissionais da Unida-

de de Saúde da Família, do Cras, gestores, etc.) pode ter acesso a informações.

Atualmente, a sala de situação está passando por um processo de reformulação,

visto que foi pensada com base nos 43 indicadores anteriormente utilizados.

Esse monitoramento embasa o profissional do Canto para interagir com o pre-

feito ou secretários municipais.

Para que todo o processo de monitoramento aconteça, o Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana utiliza o QlikView (ferramenta que processa as informações

da base de dados do sistema de informação do programa). Mensalmente, os in-

dicadores discutidos e pactuados são analisados por intermédio do QlikView. Os

dados do sistema de informação são extraídos e as análises são realizadas nos

níveis municipal (municípios onde o programa atua), regional e estadual. To-

dos os meses, a gerência de monitoramento faz a análise dos 103 municípios; de

igual forma, as gerências regionais fazem a análise das suas regionais (analisan-

do os 11 indicadores e detalhando por município).

Os coordenadores estaduais enviam para os coordenadores regionais e estes,

para os profissionais dos Cantos Mãe Coruja, os relatórios das análises retirados

do QlikView (por questão financeira, há um acesso limitado à ferramenta, caben-

do aos coordenadores estaduais o repasse dos relatórios aos coordenadores re-

gionais). Esse sistema de informação funciona online, alimentado diariamente

por cada profissional dos Cantos Mãe Coruja com informações sobre quem foi

cadastrado, o número de gestantes acompanhadas, a realização das oficinas de

segurança alimentar, do curso de qualificação e do círculo de educação etc. Os

profissionais dos Cantos Mãe Coruja, o coordenador regional, o coordenador es-

tadual e a Gerência de Monitoramento podem acessar essas informações, mas o

acesso é limitado por perfil do usuário.

Como se vê, o monitoramento envolve sistemática ampla e complexa, dado

seu papel estratégico.

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Um olhar analítico | 49

Capítulo 3

A visão de especialistas: percepção de atores internos e externos

ao Programa Mãe Coruja Pernambucana

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Um olhar analítico | 51

No presente capítulo será apresentada uma síntese das avaliações acer-

ca do Programa Mãe Coruja Pernambucana, a partir das percepções de

diferentes especialistas consultados, no que se refere aos seus méritos,

fragilidades e desafios a serem enfrentados. Tais atores, por sua vez, po-

dem ser divididos em dois grandes grupos: internos e externos ao programa.

O primeiro grupo é composto, basicamente, pela equipe de coordenação do

programa, por integrantes da equipe técnica e por membros da gestão pública

mais diretamente relacionados à organização e funcionamento do Programa

Mãe Coruja Pernambucana. O segundo, por sua vez, é formado por indivíduos

conhecedores dos objetivos e estruturação do programa, todos especialistas

em áreas de atuação correlatas (saúde, assistência social, educação, entre ou-

tras), muitos dos quais, em algum momento, atuaram no programa.

Para a captação dessas percepções, opiniões e olhares foram realizados

dois grupos focais, sendo um com as coordenações regionais do Programa

Mãe Coruja Pernambucana e, portanto, internas ao programa, atores inter-

nos, seguido de uma mesma dinâmica aplicada aos especialistas de fora do

programa – atores externos. De forma complementar, também foram rea-

lizadas entrevistas semiestruturadas com os dois grupos, cujas respostas

foram sistematizadas, devidamente analisadas e inseridas no conjunto das

sínteses aqui apresentadas.

A metodologia adotada para a realização dos grupos focais buscou priorizar

o levantamento e a discussão de pontos fortes, pontos fracos e desafios para o

futuro do Programa Mãe Coruja Pernambucana, partindo de quatro dimen-

sões específicas: a) concepção; b) implementação/modo de funcionamento;

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| Mãe Coruja Pernambucana52

c) estrutura organizacional; e d) resultados alcançados. Dessa forma, os par-

ticipantes foram orientados a elencar dois pontos fortes, dois pontos fracos

e dois desaios, de acordo com essas dimensionalidades, baseados em suas

experiências e percepções.

Um ponto importante a ressaltar acerca da metodologia e do levantamento

de informações de caráter qualitativo – mais especialmente – é que, de ma-

neira geral, a construção dos dados ou corpus é profundamente intersubjetiva,

isto é, centrada na interação pesquisador-pesquisado. Em outras palavras, por

não partir de categorias ou respostas pré-estruturadas, a exemplo das aborda-

gens quantitativas de levantamento (survey), a construção das respostas e sua

alocação em dimensões específicas (concepção, implementação, estrutura or-

ganizacional e resultados alcançados) nem sempre são exclusivas. Isto é, por

vezes, a alocação de um determinado ponto (forte, fraco ou desafio elencado)

pode, para um ator específico, estar situado na concepção do programa, en-

quanto, para outro, esse mesmo aspecto – ou similar – localiza-se na dimen-

são da implementação, por exemplo. Nesse sentido, algumas das categorias

sistematizadas a partir das percepções dos entrevistados podem apresentar

intercessões entre as dimensões, não significando uma ausência de valida-

ção das respostas, mas traduzindo a própria dinâmica imanente das pesquisas

qualitativas: seu paradigma interpretativista.

Ademais, a divisão entre grupos de indivíduos externos e internos ao

Programa Mãe Coruja Pernambucana foi uma decisão metodológica tomada

com o fim de contrastar as perspectivas, evidenciando, a partir dos diferen-

tes olhares e experiências dos envolvidos, possíveis convergências e diver-

gências acerca do programa. Dessa forma, a estruturação do capítulo está

construída da seguinte maneira: I) a visão dos atores internos ao programa;

e II) visão dos atores externos ao programa. Para cada um desses grupos,

foram sumarizados os respectivos pontos fortes, fracos e desafios, de acordo

com as percepções dos pesquisados, englobando, em ambos os casos, tanto

os resultados das entrevistas, quanto dos grupos focais, identificando as con-

vergências e possíveis divergências.

3.1 Visão dos atores internosConforme já citado, para a escuta dos atores internos ao Programa Mãe

Coruja Pernambucana foram utilizados dois instrumentais distintos, a en-

trevista e o grupo focal. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com a

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Um olhar analítico | 53

equipe de coordenação do programa e com membros da gestão pública mais

diretamente relacionados à sua organização e funcionamento11, totalizando

22 atores ouvidos.

Já no que diz respeito ao grupo focal, no dia 11 de agosto de 2016, reuni-

ram-se na sede do Programa Mãe Coruja Pernambucana, no Centro de Con-

venções de Olinda, nove coordenadoras regionais do programa, juntamente

com a equipe da CeplanMulti, para a realização de um grupo focal acerca do

programa. Nesse encontro, estavam presentes as coordenações do programa

lotadas nas seguintes Geres do Estado: III, IV, V, VI, VII, VIII, X e XI12.

As principais questões levantadas – tanto nas entrevistas, quanto no grupo

focal – são discutidas a seguir, de forma comparada.

3.1.1. Pontos fortes

No que diz respeito aos pontos fortes do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana, de acordo com as percepções das coordenações regionais participantes

do grupo focal, todas as dimensões foram contempladas como detentoras de

méritos específicos. Entretanto, cabe pontuar que algumas dessas dimensio-

nalidades possuíram uma ampla convergência acerca de aspectos específicos

considerados como fortalezas do programa, a exemplo das dimensões de con-

cepção (5 indicações); estrutura organizacional (5 indicações); e resultados alcança-

dos (4 indicações). Em outras dimensões, todavia, houve uma quantidade um

pouco menor de pontos de força do programa, como é o caso da implementação/

modo de funcionamento (2 indicações).

Entre os entrevistados, houve, também, convergência no que diz respeito

aos pontos levantados, corroborando, inclusive, as visões observadas no grupo

focal, embora algumas vezes guardem diferenças sutis, conforme poderá ser

visto a seguir.

a) Paradigma da intersetorialidade

Possivelmente, o ponto mais convergente acerca das forças do Programa

Mãe Coruja Pernambucana é o seu caráter intersetorial. Pela forma e elabo-

ração dos discursos, esse é um dos grandes pontos fortes do programa, alo-

cado, mais especialmente, em sua dimensão conceitual, e também presente

11 Lista anexa.12 Não participaram da atividade as Geres: I, II e IX e XII.

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| Mãe Coruja Pernambucana54

na esfera da implementação/modo de funcionamento. Do ponto de vista da

concepção, a percepção das coordenações regionais é de que o programa parte

de uma lógica extremamente profícua de compreensão da dinâmica multidi-

mensional no que tange à mortalidade materno-infantil. Essa mesma percep-

ção também é reforçada nas entrevistas com as equipes de coordenação e os

gestores estaduais.

Consequentemente, a forma como o Programa Mãe Coruja Pernambucana

é implementado e se desenvolve em termos funcionais, ou seja, com o envol-

vimento das diferentes secretarias estaduais (Saúde, Educação, Desenvolvi-

mento Social, Mulheres, entre outras), de órgãos municipais, órgãos e atores

sociais relevantes, típicos da estruturação do programa, parte da ideia inicial

da transversalidade do fenômeno que se busca combater (mortalidade infan-

til) e, portanto, da necessidade da ação intersetorial.

Nesse contexto, a valorização de profissionais de diferentes áreas, a articula-

ção com a rede de saúde materno-infantil e a problematização acerca das dinâ-

micas multicausais subjacentes ao fenômeno da mortalidade materno-infantil

surgem como méritos importantes do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

No mesmo sentido, o programa é percebido como um parceiro de outros

órgãos e equipamentos, estimulador de políticas, e não fiscalizador, o que o

permite, de certa forma, agir de maneira transversal sem tantas tensões ins-

titucionais – apesar de elas surgirem em certos momentos e contextos –,

ampliando o olhar de sua ação não apenas para uma situação isolada, mas

desenvolvendo uma compreensão mais holística das dinâmicas em curso, en-

volvendo a mãe, a criança e a família. Isso posto, pode-se dizer que o paradig-

ma da intersetorialidade é profundamente valorizado, visto que parte de uma

concepção diferenciada e se implementa nessa lógica.

b) Critérios para implantação e prática de monitoramento sistemático

Entre os pontos considerados como forças do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana, outra convergência frequente nos discursos e apontamentos das

coordenações regionais diz respeito aos critérios de implantação do progra-

ma. Construído mais amplamente a partir de um parâmetro de mortalidade

infantil13 em regiões onde tal indicador fosse superior a uma taxa de 25 óbitos

13 Indicadores de morbidade e mortalidade materna também foram referenciados na construção e desenvolvimento do programa, entretanto, a centralidade da política acaba residindo na morta-

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Um olhar analítico | 55

por mil nascidos vivos, o desenvolvimento do programa a partir de tais bases

permitiu um delineamento mais nítido de seus objetivos operacionais e de sua

forma de estruturação. A escolha da mortalidade infantil como o principal foco

de ação, de acordo com os argumentos mobilizados no grupo, estimulou uma

forma de abordar o fenômeno por uma perspectiva holística e multifacetada –

fundamentando, assim, o paradigma da intersetorialidade –, isto é, pensando

o combate à mortalidade infantil em ações que partiam desde a gestação e dos

cuidados com a mulher gestante até uma promoção da cultura do cuidado.

Ainda no âmbito dos méritos relacionados aos critérios de implantação, um

dos desdobramentos objetivos e, consequentemente, também um ponto forte

no que tange ao Programa Mãe Coruja Pernambucana, reside em seu modelo

de monitoramento das ações. De acordo com as perspectivas das coordena-

ções, o modelo de monitoramento do programa é uma força, uma vez que seus

efeitos vêm sendo avaliados e sentidos positivamente em suas respectivas ter-

ritorialidades. Um exemplo, segundo indicado no grupo focal, o fim (ou forte

redução) dos cemitérios clandestinos de crianças que “não vingaram” ou “ an-

jinhos”, como diz o jargão popular.

Dessa maneira, o acompanhamento próximo à mãe usuária do programa,

cujos registros são feitos em planilhas de monitoramento, permite avaliações

frequentes acerca da situação e do desenvolvimento da mulher, mais espe-

cialmente a gestante. Vale pontuar aqui que, de acordo com os relatos coleta-

dos, os registros de perfil das usuárias gerenciados pelo Programa Mãe Coruja

Pernambucana desempenharam papel relevante para o monitoramento dos

casos de microcefalia e zika em Pernambuco, visto que os Cantos Mãe Coruja

se tornaram espaços de referência, tanto para as mães que buscavam informa-

ções sobre suas situações e os riscos em questão, quanto para a rede de saúde

estadual e municipal, por possuírem dados consistentes de acompanhamento

das gestantes. Logo, os relatos dão conta que a atuação do Programa Mãe Coru-

ja Pernambucana foi muito importante para intermediar e marcar as consultas

para diagnóstico de microcefalia em gestantes, da mesma forma que, quando

estas eram mães inscritas no programa, todos os procedimentos de acompa-

nhamento eram mais rápidos.

Frente a tudo isso, conforme apresentado no grupo focal, o Programa Mãe

Coruja Pernambucana, via de regra, passou a gozar de profunda credibilidade

lidade infantil propriamente dita, mesmo que pensada enquanto um fenômeno multidimensio-nal, intersetorial e dinâmico, conforme indicado em entrevistas componentes do Produto 1 desta investigação.

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| Mãe Coruja Pernambucana56

nas municipalidades, tornando-se um ator sociopolítico relevante, sendo per-

cebido como detentor de grande capacidade de resolução de problemas e pró-

ximo ao governo do Estado.

c) Efeitos na mortalidade infantil e no empoderamento feminino

A percepção do grupo focal em relação aos resultados do programa é for-

temente convergente no sentido do declínio da mortalidade infantil. Dessa

forma, de acordo com as percepções e discursos das coordenações, os efeitos

do programa são bastante consistentes na redução dos óbitos fetais, mater-

nos e infantis, com destaque, especialmente, para o aumento significativo

das consultas pré-natais – em uma das regionais, esse aumento foi estimado

em torno de 90%.

Para compreender melhor esse fenômeno narrado pelas coordenações,

é preciso entender que os movimentos de redução da mortalidade podem

estar associados, de maneira bem-sucedida, ao paradigma da intersetoriali-

dade. Logo, não se trata exclusivamente do efeito do pré-natal per si, mas das

Rodas de conversa

estreitavam as

relações com as

comunidades

locais

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Um olhar analítico | 57

dinâmicas paralelas e subjacentes que convergem, também, nesses exames

regulares. Entre tais dinâmicas, destacam-se não apenas o acompanhamento

e a busca ativa das técnicas dos Cantos Mãe Coruja, por exemplo, mas tam-

bém o papel dos Círculos de Educação e Cultura como espaços educativos, de

interação e, principalmente, de empoderamento dessas mulheres.

A ideia de empoderamento, no sentido empregado pelas coordenadoras,

está muito associado à perspectiva de promoção de autonomia pelo conheci-

mento – seja em um sentido educacional mais estrito, como a própria leitura,

seja por meio da divulgação de direitos. Nesse sentido, o empoderamento

dessas mulheres propiciou, por exemplo, segundo os relatos, o tensiona-

mento em torno do atendimento aos protocolos e procedimentos obrigató-

rios que devem ser realizados em um pré-natal adequado (isto é, um meca-

nismo de controle social).

Outro aspecto também indicado e que merece ser apontado foi, segun-

do os relatos de membros do grupo focal, o aumento do número de crian-

ças acompanhadas – mesmo que esse aspecto venha a ser problematizado

posteriormente.

d) A adoção dos Círculos de Educação e Cultura como instrumentos para transmitir conhecimento e mobilizar pessoas

Uma das inspirações do programa foi o projeto Caminhar, implementado

no final dos anos 1980 pelo governo de Miguel Arraes, que usou o mamulengo

para mobilizar e transferir conhecimento à população. O Programa Mãe Coruja

Pernambucana, desde o seu nascedouro, também valorizou, na formação de

sua equipe e na definição de suas ações, o grupo Amor, Literatura, Movimento

e Arte (Alma). Além disso, na relação com as comunidades locais adotava as

Rodas de Conversa, tendo como lastro conceitual o método Paulo Freire. A im-

portância desse instrumento foi amplamente ressaltada ao longo das escutas

realizadas nesta avaliação.

e) Canto Mãe Coruja

A existência dos Cantos Mãe Coruja aparece como um aspecto positivo do

Programa Mãe Coruja Pernambucana, especialmente no sentido de propiciar

um espaço físico para o desenvolvimento das atividades previstas a serem

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| Mãe Coruja Pernambucana58

realizadas no escopo do programa. Nesse sentido, a existência de um local es-

pecífico – especialmente quando o Canto possui uma sede exclusiva para o

desempenho de suas funções – também foi compreendida com um elemento

importante não apenas para a realização das atividades rotineiras, mas tam-

bém para o fortalecimento da identidade do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana, associando-o a um local e a uma equipe de referência.

Segundo os atores entrevistados, a coordenação das ações executadas em

bases territoriais permite tratar das especificidades da realidade de cada mu-

nicípio, abrindo oportunidade para praticar arranjos institucionais diversos

dialogando com a realidade local. A implantação do Cantos Mãe Coruja deu,

portanto, capilaridade ao programa e criou, nos municípios onde foram im-

plantados, um espaço de referência para a sociedade local e seu entorno, sen-

do apontada como iniciativa relevante.

f) Valorização do cuidado

A valorização do conceito de “cuidado” para atuar junto às crianças e suas

famílias, com vistas a alcançar o objetivo central de redução da mortalidade

infantil, é vista pelos atores entrevistados como uma força do programa. Alia-

das a isso, a ênfase no fortalecimento do vínculo afetivo entre os integrantes da

O programa

colabora para o

fortalecimento do

vínculo afetivo na

família do bebê

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Um olhar analítico | 59

família do bebê e a importância crescente do afeto vêm alicerçadas no conhe-

cimento aportado pela neurociência, despontando como um caráter inovador

do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

3.1.2 Pontos fracos

Do ponto de vista dos pontos fracos do Programa Mãe Coruja Pernambucana,

vale apontar que a dimensão que mais agregou aspectos negativos foi a de im-

plementação/modo de funcionamento (de um total de 14 pontos fracos elenca-

dos, 8 foram atribuídos a esse âmbito). Por outro lado, a que menos comportou

aspectos negativos foi a dimensão da concepção, com apenas um apontamento.

As dimensionalidades relativas à estrutura organizacional e aos resultados al-

cançados receberam, respectivamente, três e dois apontamentos.

a) Diiculdades nas articulações com municípios e secretarias

A falta de apoio de gestores municipais e, consequentemente, as dificul-

dades advindas dessa ausência – como a pouca articulação com os órgãos,

serviços e espaços da municipalidade –, foram rapidamente apontadas pelas

coordenações e diversos atores entrevistados. No mesmo sentido, apesar de

o desenho do Programa Mãe Coruja Pernambucana assentar-se em uma es-

trutura transversal de secretarias estaduais, um baixo envolvimento dessas

secretarias também foi criticado. É possível, pois, distinguir essa dificuldade

de articulação em dois níveis – municipal e estadual – discutidos mais deta-

lhadamente a seguir.

a.1) O município – Em nível municipal, o Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana, apesar de basear-se em um princípio de parceria, estímulo e encaminha-

mento para políticas já existentes (funcionando em paralelo a elas), por vezes,

acaba sendo percebido como um agente de “fiscalização” das atividades dos

atores e órgãos responsáveis pelas políticas previamente estabelecidas. Por de-

senvolver suas atividades no já referido princípio de estímulo, a intermediação

do programa suscita tensões, uma vez que interfere nas lógicas institucionais

estabelecidas. Assim, de acordo com os relatos, algumas prefeituras optam por

desenvolver iniciativas com objetivos semelhantes, mas adotando um prisma

compreendido como mais “assistencialista”.

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| Mãe Coruja Pernambucana60

a.2) O Estado – No aspecto estadual, a fraqueza mais convergente refere-se ao

pouco envolvimento dos diversos atores (em diferentes níveis da gestão) das se-

cretarias estaduais, os quais, segundo os discursos, parecem não se harmonizar

ao programa, dificultando o funcionamento das engrenagens da transversalidade

das ações. De acordo com a percepção dos participantes, parece que esses atores

institucionais não foram devidamente “seduzidos” pelo Programa Mãe Coruja Per-

nambucana, não se identificando com seus princípios de concepção, organização

e funcionamento e, dessa forma, implicando em dificuldades de articulação. Uma

breve reflexão que pode ser indicada aqui é a de que parece estar em curso um

conflito de paradigmas (tanto em nível estadual quanto municipal), uma vez que a

concepção do programa, sua estruturação e funcionamento se baseiam na lógica

da intersetorialidade. Por outro lado, tanto a compreensão dos atores das distin-

tas secretarias e órgãos diversos, quanto os seus respectivos modelos de estrutura e

gestão respaldam-se em uma perspectiva mais intrassetorial.

Para além dos aspectos positivos, frequentemente referenciados, da transversali-

dade e intersetorialidade, basilares ao programa, há a percepção entre os entre-

vistados de que a harmonização das ações entre as secretarias requer pactuações

frequentes e constante “azeitamento” das estruturas e dinâmicas operacionais

demandadas pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana. Isso posto, a cooperação

institucional é vista como um desafio sempre presente, tanto no sentido operacional

mais estrito – políticas e ações específicas sob responsabilidade daquele órgão e

intrínsecas aos objetivos do programa –, quanto na própria compreensão acerca de

seus objetivos e funcionamento por parte de agentes da estrutura de gestão.

b) Possibilidade de descaracterização dos Círculos de Educação e Cultura

Concretamente, uma das repercussões dessa dificuldade de articulação

entre atores e esferas retratada no tópico anterior, converge em um aponta-

do “engessamento” dos Círculos de Educação e Cultura, isto é, na possibilida-

de de perda de sua característica original no que concerne à forma dinâmica

de educação transversal e que vai além da lógica estritamente disciplinar. De

acordo com as coordenações regionais, os círculos vêm se descaracterizando

e apresentando movimentos de reforço das setorialidades, ou seja, as ativida-

des têm se desenvolvido a partir de perspectivas mais estreitas e segmentadas

(atividades da educação distintas das atividades da saúde, por exemplo), des-

toando da lógica integrativa original desse instrumento, que tem como base a

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Um olhar analítico | 61

educação por meio da realidade social e das práticas cotidianas das usuárias.

Esse distanciamento da dinâmica conceitual, conforme apontado no grupo fo-

cal, termina culminando no afastamento das usuárias. Ao mesmo tempo, os

círculos também vêm sentindo os efeitos da ampla contenção de recursos que

afeta as diversas secretarias estaduais e as dificuldades de cooperação técnica

e financeira com as secretarias municipais.

c) Vínculo contratual e seleção dos proissionais do programa

Percebidas enquanto fraquezas relativas à estrutura organizacional do Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana, os processos de seleção e o tipo de vínculo

dos profissionais do programa também foram indicados como fragilidades pe-

los entrevistados e participantes do grupo focal.

Do ponto de vista da seleção profissional, de acordo com as críticas for-

muladas pelas coordenações regionais, a crítica concentra-se na última sele-

ção realizada, pelo fato de ela ser realizada pelo modelo simplificado – apenas

via análise de currículo –, o que resulta na contratação de profissionais sem o

perfil compreendido por esses atores como o mais profícuo para o programa.

O perfil necessário preza por habilidades interpessoais muito específicas e di-

ficilmente mensuráveis em ações desse tipo. As coordenações reforçam tam-

bém a importância de se realizar entrevistas com os candidatos.

No tocante ao aspecto dos vínculos empregatícios, o modelo adotado de

contratação temporária foi compreendido como uma fraqueza, uma vez que

implica em um eventual desligamento do profissional do programa, uma vez

que sua vinculação empregatícia tem período limitado por lei. As repercussões

desse afastamento são bastante impactantes à perenidade do programa, uma

vez que seus profissionais passam por uma trajetória de qualificação bastan-

te específica, uma vez que as dinâmicas interpessoais ligadas ao exercício do

cuidado – eixo central do programa – não se desenvolvem rapidamente.

d) Diiculdades no acompanhamento da mãe e da criança

Outro aspecto compreendido como fragilidade do Programa Mãe Coruja

Pernambucana, tanto pelas coordenações regionais quanto por outros atores

entrevistados, diz respeito às dificuldades de acompanhamento da criança

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| Mãe Coruja Pernambucana62

após o nascimento, mais especialmente depois do primeiro ano de vida. Essa

crítica se constrói tanto na dimensão do modo de funcionamento quanto dos

resultados alcançados pelo programa, uma vez que há a definição em seu mar-

co legal para o acompanhamento das crianças até os 5 anos de idade.

A reflexão desenvolvida em torno dessa fragilidade pelos participantes do

grupo focal apontou a necessidade de se estimular o retorno da mãe ao progra-

ma, especialmente aquelas cujos filhos não apresentam nenhuma condição

mais delicada a priori.

Já para os entrevistados, o movimento de construir as estratégias em tor-

no da mãe gestante, apesar de lograr êxito em vários sentidos, acaba por dei-

xar transparecer as lacunas no que se refere às estratégias para a promoção

da primeira infância que se voltem, mais especificamente, para a criança,

indo além da mãe.

e) Número de equipes por território

Outro dos pontos fracos do Programa Mãe Coruja Pernambucana, de acor-

do com as coordenações regionais, relaciona-se à ausência de parâmetros

ou proporcionalidades entre território, população e quantidades de equipes

alocadas. Na percepção das participantes, essa é uma fraqueza de caráter

conceitual (a única apontada para essa dimensionalidade). Nesse sentido,

as coordenações indicam que, em função da quantidade de profissionais ser

a mesma para territorialidades muito diferentes (em extensão, sobretudo

das áreas rurais, e no contingente populacional), tanto o desempenho das

atividades regulares quanto os possíveis resultados alcançados podem apre-

sentar grande variação. Equipes do programa em municípios de maior porte

ou com grande extensão rural, por exemplo, dificilmente conseguirão que

seus dois técnicos realizem quantidades semelhantes de acompanhamento

e busca ativa que aquelas equipes lotadas em municípios de menor porte ou

mais urbanizados.

f) Timidez das parcerias institucionais

Não obstante convênios e articulações com o Fundo das Ações Unidas para

a Infância (Unicef), a Universidade de Pernambuco e a Fundação Maria Cecília

Souto Vidigal, entre outros, sejam relatados no conjunto de parcerias já estabe-

lecidas, a ausência de um leque maior de instituições que pudessem se alinhar

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Um olhar analítico | 63

ao Programa Mãe Coruja Pernambucana surge como um ponto nevrálgico às

estratégias de continuidade do programa para além do escopo mais estreito da

esfera pública (estadual e municipal).

A pouca presença das universidades, especialmente a Universidade Federal

de Pernambuco, a Universidade Federal Rural de Pernambuco, a Universidade

Federal do Vale do São Francisco e a Universidade Católica de Pernambuco na

rede de parceiros é marcante, tendo apenas a Universidade de Pernambuco

aparecido como uma parceria já formalizada. A Pastoral da Criança também

desponta como um ator importante, especialmente na aproximação com os

municípios, mas sua atuação é ainda bastante limitada.

No que toca à gestão e contribuição de recursos econômicos e humanos,

a participação dessas parcerias já firmadas, precisamente por suas limita-

ções de alcance e envolvimento institucional, não é suficiente para confe-

rir maior autonomia ao programa, seja no sentido de repasse de recursos,

estruturas de acolhimento e operacionalização ou um possível comparti-

lhamento na gestão administrativa do programa – especialmente entre os

profissionais da ponta.

3.1.3 Desafios

Os desafios destacados pelas coordenações regionais centralizaram-se em

duas categorias: implementação/modo de funcionamento e estrutura organi-

zacional; ambos com sete indicações por parte dos atores internos. A concep-

ção e os resultados alcançados não foram referenciados para os desafios pen-

sados pelos participantes. Entre os entrevistados, foi recorrente o olhar para a

primeira infância e a universalização do programa.

a) Apoio da gestão municipal

O apoio da gestão municipal foi indicado como um dos principais desafios

do Programa Mãe Coruja Pernambucana, tendo uma ampla convergência por

parte das coordenações. Em função de sua estrutura descentralizada, as ex-

periências têm demonstrado que o apoio das prefeituras desempenha papel

muito importante – desde a cessão de espaços adequados para os Cantos Mãe

Coruja, até a efetiva articulação com a rede de saúde municipal – para o de-

sempenho das atividades e, fundamentalmente, na consecução dos objetivos

de redução dos indicadores de mortalidade infantil.

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| Mãe Coruja Pernambucana64

b) Fortalecimento dos Círculos de Educação e Cultura

Fortalecer o funcionamento dos Círculos de Educação e Cultura, enquan-

to atividade pedagógica de promoção de conhecimento e autonomia das

usuárias, levando em consideração suas realidades e práticas sociais, é um

desafio a ser enfrentado permanentemente. Assim, trata-se de um resgate à

inspiração em Paulo Freire, rompendo com a perspectiva engessada e pouco

atrativa de uma atividade pedagógica mais disciplinar, atraindo e cativan-

do as usuárias. Por sua vez, os profissionais responsáveis devem encarar os

círculos como uma ferramenta que gera conhecimento e mudança. Nesse

sentido, uma coordenação regional exclusiva para os Círculos de Educação e

Cultura que possua um perfil que se coadune com os princípios do programa

é vista como fundamental.

c) Acompanhamento da criança e a primeira infância

Um dos desafios prementes é o acompanhamento das crianças até 5 anos,

desafio que também está relacionado ao retorno da mãe para o Canto Mãe

Coruja. É possível compreendê-lo, todavia, junto a outro também citado pe-

las participantes: o envolvimento e a responsabilização da atenção integral à

criança com a implementação do plano pela primeira infância. Aliado a isso,

outro desafio diz respeito ao tratamento especial de crianças com microcefalia,

síndrome de Down e autismo.

d) Universalização do programa e ampliação da quantidade de Cantos Mãe Coruja

Um dos desafios principais apontados pelos atores entrevistados é o que

diz respeito à universalização do Programa Mãe Coruja Pernambucana, com

vistas a atingir 100% dos municípios de Pernambuco. Além disso, propôs-se

a ampliação da quantidade de Cantos Mãe Coruja e, consequentemente, de

equipes, seguindo uma proporcionalidade populacional da área. No programa

Todos por Pernambuco realizado pela nova administração estadual, e instru-

mento de diálogo do governo estadual com a população, os municípios que

não tinham um Canto Mãe Coruja colocaram-no entre suas prioridades.

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Um olhar analítico | 65

e) Fortalecimento da rede de saúde e de assistência materno-infantil

A melhoria da rede de saúde é um grande dos grandes desafios apontados

pelos atores ouvidos, tanto no grupo focal, quanto nas entrevistas. Embora não

seja uma questão do programa em si, tem rebatimento direto no desenvolvi-

mento das suas atividades e no alcance dos resultados esperados, motivo pelo

qual seu enfretamento é fundamental.

Na percepção das coordenações, a rede de saúde materno-infantil é insu-

ficiente para absorver a demanda estabelecida de forma eficaz pelo Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana. No âmbito desse encaminhamento, podem

ser agregadas as melhorias nas seguintes áreas, também apontadas durante o

debate:

• Assistênciaaopartonaturalepuerpério.

• Melhorianosexamespré-natalcomaidentiicaçãodaclassiicaçãode

risco da gestante.

• Fortalecimentodosmecanismosdereferênciaecontrarreferênciada

rede de saúde materno-infantil.

• Melhorianaassistênciaàgestantenahoradoparto.

3.2 Visão dos atores externos

Conforme já citado, nesta etapa da avaliação, foi prevista, além dos grupos

focais, a realização de entrevistas individuais com especialistas de diversas

áreas do conhecimento relacionadas aos objetivos e ações do Programa Mãe

Coruja Pernambucana, bem como com profissionais atuantes na área da pri-

meira infância ou temas correlatos e que, em algum momento, conheceram

ou atuaram junto ao programa. A indicação dos atores entrevistados partiu

de consulta ao comitê gestor criado para acompanhar o estudo, levando em

consideração o perfil proposto. Para as entrevistas, foram privilegiados, ainda,

especialistas de fora do Estado/país, dada a impossibilidade de estes participa-

rem do grupo focal. Além disso, foram incluídos neste rol especialistas locais,

que foram convidados a participar do grupo focal, mas que, por um motivo ou

outro, não puderam comparecer. Sendo assim, entre especialistas de fora do

Estado e aqueles que não puderam comparecer aos grupos focais, foram en-

trevistados nove especialistas14.

14 Lista anexa.

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| Mãe Coruja Pernambucana66

O grupo focal foi realizado no dia 12 de agosto de 2016, na Sala de Monitora-

mento da Secretaria de Planejamento e Gestão do Estado de Pernambuco, com

um conjunto de profissionais especializados em diferentes áreas de atuação

e com amplo conhecimento acerca da implantação e do desenvolvimento do

Programa Mãe Coruja Pernambucana. Participaram do grupo focal, na quali-

dade de especialistas, as seguintes pessoas: Polyanna Magalhães (Educação);

Anna Lúcia Miranda (Educação); Claudio Fonseca (Saúde); Alessandra Fam

(Saúde); Ana Paula Silva (Agricultura/IPA); e André Luis Santos (IPA).

Vale fazer a ressalva de que a previsão para a composição original do grupo

focal foi de 12 participantes, no intuito de abranger maior quantidade de es-

pecialidades, áreas e olhares. Todavia, em função da impossibilidade do com-

parecimento dos demais convidados, a decisão metodológica tomada foi a de

incluir ao menos parte dos ausentes na lista de entrevistas individuais.

As principais questões levantadas – tanto nas entrevistas, quanto no grupo

focal – são discutidas a seguir, de forma comparada.

3.2.1 Pontos fortes

As quatro dimensões propostas para a alocação do Programa Mãe Coruja

Pernambucana são: a) Concepção; b) Implementação/Modo de funciona-

mento; c) Estrutura organizacional e d) Resultados alcançados. De um total

No Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

o enfrentamento

à mortalidade

infantil é feito de

forma integrada

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Um olhar analítico | 67

de 11 pontos fortes indicados para essas dimensões, a primeira agregou 5

pontos, a segunda 4 pontos, enquanto as últimas duas receberam um ponto

em cada. Por esse movimento, é possível observar que, na percepção dos

especialistas consultados no grupo focal, os pontos fortes do Programa Mãe

Coruja Pernambucana se concentram em sua concepção e implementação/

modo de funcionamento.

Entre os entrevistados, foram levantados alguns pontos em comum com o

que foi observado no grupo focal, e trazidas novas questões ao debate, confor-

me poderá ser visto a seguir.

a) Intersetorialidade

a.1) Na concepção – Uma das principais fortalezas do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana, de acordo com a perspectiva dos especialistas participantes do grupo

focal, está na dimensão conceitual do programa, sendo esta, especificamente, a

perspectiva intersetorial que fundamenta a ideia de ação integrada entre as diferentes

secretarias estaduais, com vistas a combater um fenômeno complexo e multifacetado

que é a mortalidade infantil. Nesse sentido, a força conceitual do programa se assenta

em uma visão integrada da criança e de seus direitos, atribuindo-lhe um status de

prioridade política. Isto posto, o Programa Mãe Coruja Pernambucana é compreen-

dido como uma forma de inovação, uma vez que se propõe a pensar tanto a mãe,

quanto a criança, desde sua concepção até os 5 anos de vida, considerando todas

as nuances do “cuidado”. O pensamento intersetorial na concepção do programa,

segundo os especialistas, conclama as diferentes secretarias estaduais para pensar

uma questão que, apesar de seminalmente ligada à área de saúde, não reside apenas

no âmbito dessa área. Dessa maneira, o programa busca envolver uma série de pro-

fissionais que, em um primeiro olhar, não teriam aproximação direta com a temática

da mortalidade infantil, sensibilizando-os para esse envolvimento – a exemplo dos

extensionistas do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA).

No que se refere aos especialistas ouvidos, os discursos analisados se coadunam,

em grande medida, com o que foi levantado pelas coordenações regionais e es-

pecialistas nos grupos focais. Assim, o grande ponto forte que foi recorrente nas

falas dos entrevistados diz respeito à intersetorialidade como concepção

norteadora do programa. A tentativa de enfrentar o problema da mortalidade

infantil de forma integrada, por meio de uma visão holística e interdisciplinar que

busca a atuação conjunta de diversas secretarias estaduais, é tida como inovadora

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| Mãe Coruja Pernambucana68

e fortaleza principal do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Ligado a isso, foi

apontado também como ponto forte a interface que o programa busca ter com os

municípios, a fim de promover essa mesma intersetorialidade no âmbito munici-

pal, fortalecendo a relação estado-município.

a.2) Na implementação – Fundamentado na concepção da intersetorialidade,

ao se iniciar o processo de implementação do Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na, de acordo com os especialistas ouvidos no grupo focal, pensou-se no que seria

necessário para cuidar da criança de forma mais ampla. Dessa forma, iniciou-se

um movimento para convocar as secretarias consideradas como necessárias para

abordar os problemas relacionados às dinâmicas da mortalidade infantil (como

a saúde da mulher, a assistência social e mesmo a geração de renda por meio do

empreendedorismo dos pais), tentando fazer com que cada uma das instituições

envolvidas conseguisse identificar, no conjunto concatenado de ideias do processo,

sua ação enquanto provedora de cuidado.

a.3) Na estrutura organizacional – A ideia da intersetorialidade penetra na

estrutura organizacional do Programa Mãe Coruja Pernambucana, visto que en-

volve um amplo conjunto de atores em seu arranjo interinstitucional. Agregam-

se atores de diversas esferas: prefeituras, secretarias estaduais, organizações não

governamentais e igrejas. De acordo com os especialistas, envolvem-se do gestor

ao coveiro (este último sendo um parceiro importante para notificar sepultamentos

não notificados de crianças).

b) Fortalecimento dos vínculos familiares e importância do cuidado para a redução da mortalidade infantil

De acordo com os participantes do grupo focal, um dos apontamentos tido

como força do Programa Mãe Coruja Pernambucana, mais especificamente

em seus resultados, diz respeito à união promovida pelo programa, uma vez

que este, segundo os especialistas, consegue estimular, em um movimento

conjunto de grupos, líderes, vizinhos e outros atores, esforços agregados em

prol de seus objetivos. De acordo com os relatos, o Programa Mãe Coruja Per-

nambucana é um relevante promotor da união, especialmente a familiar, ten-

do como um de seus elementos norteadores a promoção do cuidado e o forta-

lecimento dos vínculos familiares.

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Um olhar analítico | 69

Já os especialistas entrevistados destacam a importância do cuidado e suas

repercussões na redução dos indicadores de mortalidade infantil, extrapolan-

do as causas do fenômeno para uma percepção mais holística. Uma ideia de

cuidado integral, que se descola da assistência mais estreita e aproxima-se do

empoderamento, do fortalecimento dos vínculos familiares, até a geração de

renda e as especificidades da mãe.

c) A descentralização do programa

De acordo com as percepções dos especialistas externos que participaram

das entrevistas, a descentralização do Programa Mãe Coruja Pernambucana,

indo além da esfera do Estado, surge como uma de suas forças. A preocupação

do diálogo com os municípios, aproximando-se do território e envolvendo a

gestão municipal no desenho e na estruturação do programa surge como um

aspecto importante para os resultados positivos por ele alcançados. Existe a

compreensão de que a articulação com os municípios é fundamental para que

haja uma boa interlocução com a rede de saúde básica do território, por exem-

plo, cujo envolvimento é estratégico para a realização das consultas pré-natal

e na atenção materno-infantil.

d) Critérios de implantação do programa

Outra convergência presente nos discursos dos especialistas entrevistados

diz respeito aos critérios de implantação do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana, construído a partir de um parâmetro de mortalidade infantil em regiões

em que tal indicador fosse superior a uma taxa de 25 óbitos por mil nascidos

vivos. Assim, o desenvolvimento do programa a partir desse indicador objeti-

vo possibilitou o delineamento mais nítido de seus objetivos operacionais e de

sua forma de estruturação, estimulando uma forma de abordar o fenômeno a

partir de uma perspectiva multidimensional.

e) Governabilidade e monitoramento

Na percepção dos atores externos ao Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana, o sistema de monitoramento por ele empregado e estabelecido desde

a sua concepção e estruturação surge como um importante aspecto de força,

juntamente com sua governabilidade. O desenvolvimento do monitoramento

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| Mãe Coruja Pernambucana70

do Programa Mãe Coruja Pernambucana, alinhado, desde a sua concepção,

ao modelo de governança do governo do Estado, desponta, na percepção dos

especialistas entrevistados, como bastante profícuo e bem-sucedido no levan-

tamento de insumos para uma avaliação constante acerca dos andamentos e

objetivos do programa. No que toca especificamente à governabilidade do pro-

grama, o mérito reside, segundo os especialistas, na concepção de seu modelo

de gestão – que compreende diferentes instâncias de coordenação, delibera-

ção, consultivas, entre outras.

f) Apoio político da alta gestão

O fato de a construção e o gerenciamento do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana remeterem, mais diretamente, ao governador e à primeira-dama,

atribuiu ao programa um status político de prioridade que o fortaleceu em seu

processo de implantação, uma vez que contava com amplo apoio da instância

mais elevada do executivo estadual. Esse apoio, por sua vez, é compreendido

como uma força decisiva no processo de desenvolvimento do programa, espe-

cialmente nas articulações entre as secretarias e junto aos municípios. Via de

regra, essa é uma compreensão que perpassa tanto os atores internos quanto

os externos ao programa.

g) Empoderamento

Do ponto de vista externo ao Programa Mãe Coruja Pernambucana – mas

convergente com a visão dos atores internos –, a percepção do empoderamen-

to das mulheres é recorrente. Apesar de ser um efeito de caráter intangível,

existe uma compreensão bastante consistente acerca de um crescente empo-

deramento das mulheres usuárias do programa. Como dito anteriormente, a

concepção desse conceito está muito associada à promoção de autonomia pelo

conhecimento e na divulgação de direitos, e também está relacionada ao res-

gate da autoestima e da garantia dos direitos das crianças, desde a sua gesta-

ção, por meio do fortalecimento das mães.

3.2.2 Pontos fracos

No elenco das fragilidades do Programa Mãe Coruja Pernambucana le-

vantadas no grupo focal, as dimensões referentes a implementação/modo de

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Um olhar analítico | 71

funcionamento e estrutura organizacional acumularam quatro indicações cada,

restando uma indicação para concepção e uma para resultados alcançados.

Entre os especialistas entrevistados, assim como aconteceu nos pontos

fortes, foram levantados alguns aspectos em comum com o que foi obser-

vado no grupo focal e trazidas novas questões ao debate, conforme poderá

ser visto adiante.

a) Forma fragmentada de pensar a educação

Na percepção dos participantes do grupo focal, a forma de se pensar a edu-

cação é, ainda, muito fragilizada e fragmentada. As Secretarias de Educação

dos municípios não se envolvem com as iniciativas, em especial, com os Cír-

culos de Educação e Cultura.

Esse baixo envolvimento das Secretarias Municipais de Educação, funda-

mentados em um paradigma intrassetorial e descoordenado com a estratégia

do Estado, resulta no reforço da lógica escolar tradicional – discrepante do

modelo concebido para os círculos –, culminando no afastamento das usuá-

rias e no isolamento das representantes do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana junto aos órgãos municipais de educação.

b) Diiculdades na articulação entre as diferentes instituições

No âmbito da implementação e funcionamento, de acordo com as opiniões

dos especialistas consultados no grupo focal, um dos pontos de fraqueza do

Programa Mãe Coruja Pernambucana reside na falta de integração, tanto em

nível comunicacional quanto de ação entre os responsáveis pelo programa si-

tuados em uma mesma secretaria estadual específica. Por vezes, segundo as

percepções narradas, os responsáveis pelo programa não se articulam bem

internamente, ou seja, junto a outros setores da mesma secretaria a que per-

tencem. Essa falha de integração evidencia, segundo eles, a falta de autonomia

de alguns atores-chaves para o Programa Mãe Coruja Pernambucana frente às

secretarias estaduais.

Já no que diz respeito à relação entre as diferentes secretarias, outra fragili-

dade seria a centralização dos fluxos comunicacionais e de ação em pessoas e

não em prerrogativas institucionais, apontando para uma dinâmica de perso-

nalização dos processos.

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| Mãe Coruja Pernambucana72

Entre os especialistas entrevistados, foi apontada como outra fragilidade do

programa a diiculdade em articular e mobilizar as diversas secretarias para atua-

ção de forma integrada. A falta de apoio dos gestores municipais e, consequente-

mente, as dificuldades advindas dessa ausência – como a pouca articulação com

os órgãos, serviços e espaços da municipalidade – esteve também presente nos

relatos. Trazendo mais especialmente à realidade dos municípios, de acordo com

a percepção externa, as estruturas municipais são muito frágeis no concernente

aos quadros técnicos. Essas dificuldades tornam-se mais nevrálgicas ao Programa

Mãe Coruja Pernambucana justamente nas relações com a rede básica de saúde e

com as secretarias municipais de educação, por exemplo.

c) Fragilidade na forma de contratação e rotatividade da equipe técnica

Outro elemento recorrente entre as fragilidades apontadas pelos atores exter-

nos, tanto no grupo focal, quanto nas entrevistas, refere-se à fragilidade na forma

de contratação da equipe técnica, que, por sua vez, acaba por proporcionar uma

alta rotatividade de técnicos e consequente perda de profissionais já capacitados

para atuar naquela seara específica, já que o modelo vigente de contratação, por

seleção simplificada (de caráter temporário), implica em um eventual desliga-

mento do profissional do programa. As repercussões desse afastamento são bas-

tante impactantes ao desenvolvimento do programa, uma vez que, entre outras

coisas, estabelece a ruptura dos vínculos de cuidado, fundamentais para seu de-

senvolvimento. Com base na percepção dos especialistas, o fato de não serem ser-

vidores concursados do Estado é uma fraqueza, o que acaba fragilizando o proces-

so de institucionalização e perenidade do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

A alta rotatividade e a ausência de uma equipe fixa também repercutem na perda

da memória do programa.

d) Instabilidade na cessão dos locais que sediam os Cantos Mãe Coruja

Convergindo com a perspectiva da institucionalização do Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana, outro ponto relevante indicado no grupo focal foram as di-

ficuldades relacionadas aos Cantos Mãe Coruja. Por estar muitas vezes sujeito às

articulações municipais, o espaço físico pode receber repercussões advindas das

mudanças de gestão ou do cenário político, de maneira geral. De acordo com os

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Um olhar analítico | 73

especialistas consultados, a cessão do espaço municipal pode ser retirada em fun-

ção de intempéries político-administrativas, rompendo os processos de continui-

dade. No mesmo sentido, o compartilhamento dos espaços com outros órgãos es-

taduais, a exemplo do IPA, também não se apresenta adequado para a realização

das atividades.

e) Estrutura “paralela” e metodologia de integração pouco formalizada

Um dos aspectos de fragilidade indicado pelos especialistas ouvidos no grupo

focal refere-se à baixa formalização de metodologias que orientem a prática de

intersetorialidade na gestão. Por mais que o Programa Mãe Coruja Pernambucana

se proponha, especialmente em sua concepção, a ser um catalisador para diferen-

tes políticas e serviços públicos, o “como fazer” não foi devidamente sistematiza-

do em protocolos e procedimentos. Especialmente entre as secretarias estaduais,

o programa, de acordo com os participantes, não propõe nem desafia que estas

pensem a integralidade de maneira procedimental. Nesse mesmo sentido, ao

criar-se uma esfera que as secretarias consideram “paralela” à uma previamente

operante – baseada na perspectiva da intrassetorialidade – formou-se, segundo

os relatos, um contexto de disputa (“ciúmes” foi a palavra utilizada) entre aquelas

estruturas já consolidadas e o Programa Mãe Coruja Pernambucana.

f) Escassez de registros e pouca divulgação do programa

Outro elemento a despontar nas fragilidades citadas pelos especialistas entre-

vistados diz respeito à pouca divulgação do Programa Mãe Coruja Pernambucana,

juntamente com a escassez de registros que possam construir uma “memória” do

programa. Essa baixa divulgação dificulta a sensibilização de parceiros externos, da

mesma forma que não propicia o envolvimento de atores-chaves dentro da gestão

pública. Dessa forma, os conhecimentos construídos e a prática instituída no pro-

grama, responsáveis pelos resultados positivos, são pouco compartilhados.

g) Apoio político enquanto tensão

Se em um primeiro momento o apoio político surge como ponto forte,

ele também desponta como uma fragilidade, de acordo com a percepção dos

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entrevistados. A avaliação colocada foi a de que a centralidade do apoio polí-

tico enquanto recurso estratégico-chave, não apenas para a implantação, mas

também (e principalmente) para o funcionamento do Programa Mãe Coruja

Pernambucana, pode acabar tornando-se uma fragilidade para a sua conti-

nuidade, visto que uma mudança de gestão que não ofereça o mesmo nível de

apoio político pode acarretar na desestabilização do programa.

h) Mulher como coadjuvante

Uma das fragilidades apontadas pelos atores externos está relacionada ao

fato de o Programa Mãe Coruja Pernambucana estar mais amplamente foca-

do na criança, voltando seu olhar para a mulher como um meio de promover

a proteção da criança. Nesse sentido, a mortalidade materna foi colocada de

lado em detrimento da mortalidade infantil, tornando a mulher uma coadju-

vante do programa. De acordo com essa perspectiva, o programa também se

fragiliza ao atribuir grande prioridade à assistência básica (pré-natal) e não

buscar um modelo de assistência ao parto de qualidade – compreendido como

muito importante para a redução da mortalidade materna. Ainda nesse con-

texto, além de lateralizar as mulheres que não são mães, entre aquelas que são,

o foco é prioritariamente o período da gestação.

3.2.3 Desafios

Na etapa dos desafios do Programa Mãe Coruja Pernambucana, a maior

convergência das indicações foi em torno da dimensão dos resultados (4 indi-

cações), seguida da dimensão de implementação/modo de funcionamento (3

indicações), concepção (2 indicações) e estrutura organizacional (1 indicação).

Também foram encontradas algumas convergências em relação aos desafios

propostos pelos especialistas entrevistados, devidamente aqui sistematizados.

a) Concepção original de educação e os Círculos de Educação e Cultura

Do ponto de vista da concepção, um dos desafios apresentados pelos es-

pecialistas participantes do grupo focal refere-se ao fortalecimento da pers-

pectiva original de educação que foi concebida para o programa (a partir das

práticas cotidianas e da realidade social das usuárias). Dessa forma, o desafio

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Um olhar analítico | 75

reside em manter a concepção dos Círculos de Educação e Cultura, não per-

mitindo que sua formatação se torne cartesiana e escolar. No mesmo sentido,

também é proposto como desafio, ainda no âmbito educacional que o Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana operacionaliza, garantir o direito à educação

não apenas para gestantes, mas também para seus parceiros.

b) Capacidade de atração da comunidade

Um desafio apresentado é o de conseguir atrair a população da área rural

para os Cantos Mãe Coruja, localizados em ambientes mais urbanos. Em re-

ferência às experiências anteriores, os especialistas indicam que é necessá-

rio convencer e provar aos grupos mais afastados do perímetro urbano que o

programa foi elaborado para cuidar das pessoas, das mulheres, das crianças e

também dos homens (a família).

c) Universalização do programa e foco na primeira infância

A universalização para todos os municípios, juntamente com o aumento

da cobertura do número de mulheres usuárias do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana surgem como desafios para os especialistas ouvidos. No mesmo

sentido, a percepção que se desenha acerca do programa é a de que ele segue

uma dinâmica de progressão de ações, desenvolvendo-se, entre outras coi-

sas, por meio das necessidades que se estabelecem no curso de sua atuação

ao longo dos anos. Assim, de acordo com as entrevistas, se um dos desafios

já em andamento é o delineamento do programa de forma mais consistente

em torno da primeira infância (especialmente no que tange ao acompanha-

mento das crianças depois do nascimento), um desafio já antecipado é ir além

desta, acompanhando a criança depois desse momento, dando mais ênfase à

educação. Ainda nesse contexto, um outro desafio proposto seria uma maior

aproximação com a Rede Nacional da Primeira Infância.

d) Integração e articulação fortalecidas

De acordo com os participantes do grupo focal, um desafio a ser enfrenta-

do é o de garantir maior articulação e integração mais forte entre as equipes

dos Cantos Mãe Coruja e as da atenção básica de saúde, especialmente no que

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| Mãe Coruja Pernambucana76

tange à execução das ações. Os entraves relativos à consecução dos objetivos e

atividades do Programa Mãe Coruja Pernambucana junto à rede de saúde ma-

terno-infantil são constantes e convergentes. No mesmo sentido, para além da

área mais específica da saúde, outros desafios para os resultados do programa

residem em maior aproximação com as creches – estimulando um possível

aumento no acesso a esse serviço –, e no desenvolvimento de um fluxo mais

alinhado de trabalho entre as diferentes secretarias estaduais e os municípios.

Já no que concerne à percepção dos entrevistados, a articulação dentro

do Estado e entre os municípios também é um ponto nevrálgico que precisa

ser enfrentado. Na percepção desse grupo, entretanto, a descentralização da

administração do programa para os municípios é vista como importante para

sua institucionalização, entretanto, existe a compreensão do grande desafio

que isso representa.

e) Quadro técnico e qualiicação das equipes

A implementação de quadro técnico via concurso público, de acordo com

os especialistas, é um dos desafios a ser enfrentado, mais especialmente no

que concerne à estrutura organizacional do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana. Já no que se refere aos Cantos Mãe Coruja, o desafio reside na sua fixação

em espaços próprios adequados, ou em espaços estaduais previamente desti-

nados ao programa.

A qualificação continuada das equipes também surge como um desafio, não

apenas no sentido de que o corpo técnico do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana domine e transmita informações corretas e adequadas sobre a saúde da

mulher e da criança, mas também possa promover maior protagonismo das

competências familiares por meio do empoderamento feminino. A qualifica-

ção constante das equipes deve passar por questões que vão de aleitamento,

processos gestacionais, exames preventivos e prática do cuidado, ao planeja-

mento familiar, questões de gênero e papel da família como um todo.

f) Construção e divulgação de indicadores e resultados

Outro desafio apontado pelos especialistas externos ao Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana refere-se ao desenvolvimento de indicadores mensuráveis

que permitam acompanhamentos mais precisos de seus resultados e efeitos.

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Um olhar analítico | 77

No mesmo sentido, a divulgação desses resultados, das práticas e dos proce-

dimentos adotados no programa precisam ser mais amplamente divulgados.

g) Maior foco na mulher, na assistência ao parto e nas discussões de gênero

Uma das fragilidades indicadas no olhar externo foi a lateralidade da mu-

lher em detrimento da criança no desenvolvimento do Programa Mãe Coruja

Pernambucana. Assim, um dos desafios apresentados é o maior foco na mu-

lher e na mortalidade materna, o que, em um primeiro momento, poderia

ser realizado por meio do fortalecimento da assistência ao parto (evitando as

peregrinações na rede de saúde), do estímulo ao parto normal humanizado

e do acompanhamento pós-parto. Nesse mesmo sentido, para além da mãe

gestante, um outro desafio seria incorporar discussões de gênero (relações de

poder, violência contra a mulher, desigualdade, direitos da mulher, entre ou-

tras questões) a fim de alcançar um grupo maior de mulheres, especialmente

as mais vulneráveis.

h) Continuidade do programa

Um dos elementos a despontar como desafio, de acordo com a visão ex-

terna, refere-se à sustentabilidade do Programa Mãe Coruja Pernambucana,

especialmente no que concerne à obtenção de recursos em momentos de crise

– como a atualmente vivida no Brasil. Nesse mesmo contexto, a permanência

mais prolongada de coordenadores, supervisores e técnicos também é consi-

derada como estratégica para o sucesso e continuidade do programa.

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Um olhar analítico | 79

Capítulo 4

Uma avaliação a partir da visão das usuárias, técnicas do

Canto Mãe Coruja e parceiros locais15

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| Mãe Coruja Pernambucana80

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Um olhar analítico | 81

Capítulo 4 – Avaliação a partir da visão das usuárias, técnicas dos Cantos Mãe Coruja e parceiros locais15

O presente capítulo se ocupará da sistematização e análise dos resultados da

pesquisa de campo, realizadas com o objetivo de captar a visão das usuárias

do Programa Mãe Coruja Pernambucana e dos profissionais que atuam di-

retamente nos municípios – técnicas dos Cantos Mãe Coruja e profissionais

das administrações municipais que trabalham em parceria com o programa,

com especial ênfase nos que são ligados aos seus três eixos prioritários, a saber:

saúde, desenvolvimento e assistência social e educação.

A ideia, aqui, foi proporcionar uma avaliação a partir da perspectiva daquelas

pessoas que acessam o programa diretamente, buscando identificar possíveis

impactos deste em suas vidas, bem como a visão que elas têm dele, seus pontos

positivos e negativos. Em paralelo, a consulta aos profissionais que atuam na li-

nha de frente teve como finalidade identificar forças e fraquezas do processo de

implementação e operacionalização do programa na ponta, além de identificar

sugestões para seu aperfeiçoamento.

Dessa forma, na etapa do campo, trabalhou-se com três perfis distintos

de sujeitos: usuárias do programa, técnicas dos Cantos Mãe Coruja e pro-

fissionais das administrações estaduais e municipais; em quatro municípios

distintos, previamente selecionados. Para a realização desta etapa foram uti-

lizadas duas técnicas de coleta de dados diversas, porém complementares

– entrevista em profundidade e observação sistemática – que, por sua vez,

deram fruto às transcrições das entrevistas, aos diários de campo e aos guias

15 Aqui, compreende-se como “parceiros locais” os profissionais das administrações estaduais e municipais, além de representantes de entidades que atuam em parceria com o Programa Mãe Coruja Pernambucana no âmbito municipal.

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| Mãe Coruja Pernambucana82

de observação, que aqui serão analisados e interpretados à luz dos insumos

coletados nas etapas anteriores. Sendo assim, os tópicos a seguir tratarão de

uma breve descrição dos contextos analisados, seguida das análises feitas a

partir das perspectivas desses três perfis de atores consultados. Serão abor-

dadas, dessa forma, as atividades realizadas nos Cantos Mãe Coruja, as per-

cepções das usuárias acerca dos impactos do programa em suas vidas, bem

como a discussão de questões importantes que emergiram nos discursos dos

três perfis de atores escutados.

4.1 Breve descrição dos contextos: municípios selecionados e Cantos Mãe Coruja

Conforme já explicitado no capítulo 1, a seleção dos municípios a serem in-

vestigados foi feita levando-se em consideração os seguintes critérios:

• Trajetóriascommaisêxitoecommenosêxitonaexecuçãodoprogra-

ma: buscou-se identificar, com base nas percepções dos gestores e coordenado-

res entrevistados, os municípios que apresentaram uma trajetória de sucesso na

implementação do Programa Mãe Coruja Pernambucana, assim como municí-

pios que ainda apresentam dificuldades na sua execução.

• TempodeexistênciadoProgramaMãeCorujaPernambucananomuni-

cípio: municípios pioneiros, isto é, aqueles que foram os primeiros a receber o

programa, bem como aqueles que têm uma experiência mais recente com ele.

• LocalizaçãoemdistintasregiõesdoEstado:comvistasacaptarrealida-

des e contextos distintos.

Com base nisso, foram selecionados os municípios de Ouricuri, Exu, Conda-

do e Iguaracy.

Ouricuri e Exu localizam-se no Sertão do Araripe e são pioneiros no que

se refere à implantação do Programa Mãe Coruja Pernambucana: tanto um

como o outro fazem parte da IX Geres que, na época da implantação do pro-

grama, apresentava taxa de mortalidade infantil igual ou superior a 25 óbitos

por mil nascidos vivos em pelo menos metade dos municípios nela situados,

motivo pelo qual, em 2008, o programa foi implantado em todos os municí-

pios dessa Geres.

Na época, o Sertão do Araripe foi a região que apresentou os piores índices

de mortalidade infantil do Estado de Pernambuco. Em 2007, o município de

Ouricuri possuía uma taxa de mortalidade infantil de 28,5 óbitos por mil nas-

cidos vivos, tendo caído para 17,1 óbitos por mil nascidos vivos em 2014, o que

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Um olhar analítico | 83

representa uma redução absoluta de 11,4 pontos no índice de mortalidade. Já

Exu apresentou, no ano de 2007, uma taxa de 18 óbitos por mil nascidos vivos,

passando para 31,6 óbitos por mil nascidos vivos no ano de 2014, o que evi-

dencia uma ascensão de 13,24 pontos16, em termos absolutos, ou de 72%, em

termos relativos.

Dessa forma, Ouricuri apresentou redução nos índices de mortalidade in-

fantil, enquanto Exu apresentou ascensão, constituindo-se, assim, como dois

municípios pioneiros na implantação do programa, com resultados distintos

entre si. Os dados reiteram os discursos coletados nas etapas anteriores, que

apontaram esses municípios como sendo uma experiência de sucesso, no caso

de Ouricuri, e uma de município que encontrou algumas dificuldades em sua

trajetória de implantação e funcionamento, caso de Exu.

Na outra ponta, tanto Condado quanto Iguaracy são municípios que re-

ceberam o Programa Mãe Coruja Pernambucana mais recentemente, no ano

de 2012. Nesse ano, segundo os dados disponíveis no Departamento de In-

formática do Sistema Único de Saúde (Datasus), Iguaracy apresentou um

índice de mortalidade infantil de 19,4 óbitos por mil nascidos vivos, ten-

do caído para 6,1 óbitos por mil nascidos vivos em 2014, o que representa

uma queda de 13,3 pontos no referido índice. Já Condado possuía uma taxa

de 14,2 óbitos por mil nascidos vivos em 2012, passando para 24,1 óbitos

por mil nascidos vivos em 2014, uma ascensão de 9,8 pontos. Dessa forma,

Iguaracy apresentou redução nos índices de mortalidade, enquanto Con-

dado apresentou ascensão, constituindo-se, assim, como dois municípios

nos quais o Programa Mãe Coruja Pernambucana foi implantado mais re-

centemente, mas que apresentaram trajetórias distintas no que diz respeito

à sua execução. Da mesma forma, os dados confirmam as percepções dos

entrevistados nas etapas anteriores, que apontaram esses municípios como

apresentando experiências distintas no que se refere à performance na im-

plantação e funcionamento.

Vale salientar, no entanto, que as séries históricas disponibilizadas pelo

Datasus devem ser analisadas com cautela, posto que apresentam alta va-

riabilidade nos dados, levando a questionamentos no que diz respeito à con-

fiabilidade desses indicadores. Isso porque os registros são irregulares, apre-

sentando relevante subnotificação e, ademais, possuem uma inércia entre o

evento e o seu registro.

16 De acordo com a série histórica disponibilizada pelo Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde – SIM/Datasus.

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Dito isso, nesta seção, será feita uma pequena introdução sociodemográfi-

ca de cada um dos municípios selecionados, destacando-se algumas de suas

principais características de composição populacional e indicadores de pobre-

za e desigualdade social, com o objetivo de caracterizá-los minimamente. Em

seguida, será feita uma breve descrição da situação dos Cantos Mãe Coruja em

cada um dos municípios, com base nos diários de campo e guias de observa-

ção sistemática produzidos pelas pesquisadoras.

a) Ouricuri

O município de Ouricuri está localizado no Sertão do Araripe, possuindo

área de aproximadamente 2.379,385 km² e população de 64.358 habitantes,

o que corresponde a uma densidade demográfica de 26,56 habitantes por

km², de acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísti-

ca (IBGE). Ainda de acordo com o IBGE, observa-se que as mulheres corres-

pondem a 50,75% da população, enquanto, dentre as pessoas residentes no

município, 50,65% residem em áreas urbanas. O Índice de Desenvolvimento

Humano Municipal (IDHM) de Ouricuri foi de 0,572 em 2010, o que o situa na

faixa de baixo IDH17.

No que se refere à questão da pobreza e da desigualdade social, Ouricuri

apresentou, em 2010, um percentual de concentração de renda18 de 62,57%,

com um percentual de pobres19 de 43,46% e uma proporção de 69,10% indiví-

duos vulneráveis à pobreza20.

• Canto Mãe Coruja

Partindo para a descrição do Canto Mãe Coruja, em Ouricuri, o Canto fica

localizado no centro, em frente a uma praça bem movimentada, próximo a um

pequeno comércio local composto de feira, lojas, bancos e restaurantes. A casa

onde o Canto funciona é espaçosa e de boa estrutura, possuindo copa (com ge-

ladeira, mesa, bebedouro), banheiro, uma sala com computador, impressora

e muitos documentos arquivados em pastas (há mais documentos arquivados

17 Entre 0,500 e 0,599 (Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Disponível em: <http://www.atlas-brasil.org.br/2013/pt/>).18 Esse indicador nos informa em qual porcentagem a renda está concentrada nas mãos dos 20% mais ricos.19 Proporção dos indivíduos com renda domiciliar per capita igual ou inferior a 140 reais mensais, de agosto de 2010, de acordo com o Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil (Disponível em: <http://www.atlasbrasil.org.br/2013/pt/>). 20 Proporção dos indivíduos com renda domiciliar per capita igual ou inferior a 255 reais mensais, de agosto de 2010, equivalente a meio salário-mínimo naquela data. O universo de indivíduos é limitado àqueles que vivem em domicílios particulares permanentes. (Atlas do Desenvolvimento Hu-mano no Brasil. Disponível em: <http://www.atlasbrasil.org.br/2013/pt/>).

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Um olhar analítico | 85

em um banheiro desativado conectado com essa sala), e uma sala de recepção

com cadeiras, cartazes informativos e bebedouro.

Nessa mesma casa funciona, também, um laboratório de análises clínicas

onde é feito, além de outros exames, o teste do pezinho. Algumas vezes, as

profissionais do Programa Mãe Coruja Pernambucana também utilizam a sala

da coordenação do laboratório, quando ela está desocupada.

• Composição da equipe e funcionamento do Canto

O horário de funcionamento do Canto Mãe Coruja de Ouricuri é das 8h às

14h, ficando fechado durante o resto da tarde. As duas profissionais que ali

trabalham, ficam juntas nesse horário porque, segundo elas, há maior mo-

vimento no período da manhã. Ainda segundo as funcionárias, havia o reve-

zamento dos turnos, mas, passado algum tempo, avaliaram que seria melhor

as duas trabalharem no mesmo horário, a fim de lidar com a demanda. Além

disso, esse horário propicia o revezamento das profissionais na realização da

Canto Mãe Coruja

em Ouricuri conta

com boa estrutura

física

Fonte: Equipe CeplanMulti

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busca ativa sem que, para isso, seja preciso fechar o Canto. O Canto Mãe Co-

ruja de Ouricuri conta, ainda, com uma recepcionista cedida pela prefeitura.

Segundo as profissionais, a quinta-feira é o dia da semana mais movimentado

no Canto porque muitas pessoas vão de sítios da área rural para a feira que

acontece na cidade e, assim, aproveitam para ir à sede do Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana.

O Canto não funciona às sextas-feiras pois, via de regra, é o dia reservado

para reunião de planejamento das atividades. Na terceira quinta-feira do mês

acontece a reunião regional, na qual as técnicas dos demais municípios se en-

contram – nesse dia, o Canto Mãe Coruja também não tem expediente.

• Círculos de Educação e Cultura

Em Ouricuri, atualmente, existem quatro turmas do Círculo de Educação e

Cultura:

i. Na creche do distrito de Santa Rita (área rural), com 25 mulheres

inscritas.

ii. No Cras do bairro de Nossa Senhora do Carmo, com 21 mulheres inscritas.

iii. No Cras do bairro Capela de São Braz, com 13 mulheres inscritas.

iv. No PSF do bairro de Santa Maria, com 11 mulheres inscritas.

A coordenadora pedagógica dos círculos relatou que as professoras rece-

bem os temas que podem ser trabalhados em cada eixo, mas não recebem

materiais nem metodologia para orientar e auxiliar o trabalho. Assim, grande

parte dos materiais são custeados pelas próprias professoras, e a metodologia é

desenvolvida por elas em conjunto com as educadoras. Uma técnica do Canto

Mãe Coruja vai uma vez por mês aos Círculos de Educação e Cultura para fazer

atualização do cadastro das usuárias. Toda sexta-feira, se reúnem a coorde-

nadora pedagógica, as professoras dos círculos e uma técnica do Canto para

fazerem a ficha de planejamento.

b) Exu

O município de Exu está localizado no Sertão do Araripe, possuindo área

de aproximadamente 1.337,495 km² e população de 31.636 habitantes, o que

corresponde a uma densidade demográfica de 23,65 habitantes por km², de

acordo com os dados do último censo, realizado em 2010. Observa-se, ainda,

que as mulheres correspondem a 51,05% da população, enquanto, entre as

pessoas residentes no município, 51,53% residem em áreas urbanas. O IDHM

de Exu foi de 0,576, em 2010, o que o situa na faixa de baixo IDH.

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Um olhar analítico | 87

No que se refere à questão da pobreza e da desigualdade social, em Exu, no

ano de 2010, encontrou-se 59,95% da renda concentrada entre os 20% mais

ricos da população. Além disso, o município contou com um percentual de

pobres de 52,25% e uma proporção de 74,87% indivíduos vulneráveis à pobre-

za – a maior dentre os municípios analisados.

• Canto Mãe Coruja

Em Exu, o Canto Mãe Coruja fica localizado próximo ao centro da cidade,

em uma rua asfaltada, em uma área prioritariamente residencial. Próximos

a ele, ficam um PSF, o Conselho Tutelar e o IPA. No período em que foram

realizadas as visitas à campo, a placa de identificação do Canto estava caída,

dificultando o reconhecimento do local para os que circulavam pela rua.

A casa onde o Canto Mãe Coruja funciona possui quatro salas: uma uti-

lizada como estoque; uma onde ficam guardados alguns materiais e são

arquivados alguns documentos, sua parede é cheia de fotos das famílias e

das atividades realizadas; outra sala possui um berço e alguns brinquedos

Casa onde

funciona o Canto

Mãe Curuja, no

município de Exu

Fonte: Equipe CeplanMulti

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para as crianças brincarem enquanto as mães são atendidas; e, por fim,

uma sala para atendimento. A casa possui, ainda, dois banheiros: no pri-

meiro há um trocador, voltado para as usuárias com seus bebês, e o outro

fica na cozinha e é utilizado pelas profissionais do Canto. A recepção é

equipada com uma televisão, um computador e cadeiras para as mulheres

que aguardam atendimento.

• Composição da equipe e funcionamento do Canto

O Canto Mãe Coruja de Exu funciona de segunda-feira a quinta-feira,

das 8h às 14h, para o atendimento das gestantes. Nas sextas-feiras é quan-

do acontece a busca ativa e, por isso, não há atendimento no Canto. Assim

como em Ouricuri, toda terceira quinta-feira do mês não tem expediente

por causa da reunião de monitoramento que acontece com todos os muni-

cípios da regional de que fazem parte.

Fora as duas técnicas, também fazem parte da equipe do Canto Mãe Co-

ruja de Exu uma recepcionista e uma auxiliar de serviços gerais, ambas

cedidas pela prefeitura. A função da recepcionista, segundo as técnicas, é

buscar as fichas das mulheres que chegam para ser atendidas, conferin-

do maior agilidade ao atendimento, muito embora, tenha sido observado

que há uma flexibilização das tarefas e atribuições entre os membros da

equipe.

• Círculos de Educação e Cultura

Em Exu, atualmente, funcionam seis turmas do Círculo de Educação e

Cultura, sendo quatro na zona urbana e duas na zona rural:

i. No Programa de Educação para o Trabalho (PET) no distrito de Ta-

bocas (zona rural).

ii. No Posto de Saúde no bairro de Wilson Moreira Saraiva (zona

urbana).

iii. Em uma escola municipal no distrito da Viração (zona rural).

iv. Na Coordenadoria da Mulher no centro da cidade (zona urbana).

v. No Posto de Saúde Nossa Senhora Aparecida (zona urbana).

vi. Na creche do bairro do Gonzagão (zona urbana).

Segundo as técnicas do Canto, os Círculos de Educação e Cultura só co-

meçaram a ser implantados no meio rural no ano de 2016, anteriormente,

funcionavam apenas na área urbana. Para contemplar toda a área do Exu fal-

ta, ainda, implantar os círculos em mais dois distritos da zona rural. Para rea-

lizar os seis círculos, trabalham três professoras e uma coordenadora peda-

gógica, que se reúnem às sextas-feiras para planejar as atividades semanais.

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Um olhar analítico | 89

c) Iguaracy

O município de Iguaracy está localizado no Pajeú, possuindo área de apro-

ximadamente 838,132 km² e população de 11.779 habitantes, o que correspon-

de a uma densidade demográfica de 14,05 habitantes por km², de acordo com

os dados do IBGE. Ainda de acordo com o IBGE, as mulheres correspondem a

49,78% da população, enquanto, dentre as pessoas residentes no município,

51,87% residem em áreas urbanas. O IDHM de Iguaracy foi de 0,598 em 2010,

o que o situa na faixa de baixo IDH.

No que se refere à questão da pobreza e da desigualdade social, no ano de

2010, em Iguaracy, encontrou-se um percentual de 57,65% da renda concen-

trada nas mãos da parcela mais rica da população. Além disso, o município

contou com um percentual de pobres de 43,66% e uma proporção de 64,30%

de indivíduos vulneráveis à pobreza.

• Canto Mãe Coruja

O Canto Mãe Coruja foi implementado em Iguaracy em 2012 e fica locali-

zado no centro do município, em uma rua asfaltada e de fácil acesso. A casa,

cedida pela prefeitura, é ampla, limpa e bem organizada, possuindo dois quar-

tos – um que funciona como escritório e outro como berçário (que, no caso, se

constitui de um único berço) –, duas salas (uma que serve como brinquedo-

teca e outra para os círculos), uma cozinha e um banheiro. A casa é um pouco

abafada e o espaço da brinquedoteca é relativamente grande.

Casa onde

funciona o Canto

Mãe Curuja, no

município de

Iguaracy

Fonte

: E

quip

e C

epla

nM

ult

i

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| Mãe Coruja Pernambucana90

• Composição da equipe e funcionamento do Canto

O Canto Mãe Coruja de Iguaracy funciona de segunda-feira a sexta-feira, das

8h às 17h, para atendimento das gestantes. A equipe é composta de duas técni-

cas que intercalam o horário de trabalho, ficando uma no período da manhã e

outra no período da tarde. Contudo, quando há uma agenda externa nas comu-

nidades rurais, as técnicas geralmente vão juntas. Apesar disso, nessas ocasiões,

o Canto não fecha, visto que, além das profissionais que ali trabalham, há uma

funcionária extra cedida pela prefeitura cuja função é a de recepcionista.

Cada profissional do Canto segue um cronograma de atividades, que é

elaborado com o objetivo de priorizar o atendimento as gestantes de risco. O

município tem, ainda, um grupo de trabalho composto por um médico, uma

enfermeira e uma das técnicas do Canto, com o objetivo de avaliar os casos de

óbitos materno-infantis e se eles aconteceram por causas evitáveis.

• Círculos de Educação e Cultura

Em Iguaracy funcionam quatro turmas do Círculo de Educação e Cultura:

i. Dois círculos acontecem no próprio Canto Mãe Coruja, nos

períodos da manhã e da noite.

ii. Na Unidade Básica de Saúde (UBS) no bairro de Santa Ana, no perío

do da noite.

iii. Na Unidade Básica de Saúde no distrito de Irajaí, no período

da manhã.

Toda segunda-feira, as educadoras se reúnem para fazer um planejamen-

to semanal dos conteúdos que serão abordados e das atividades que serão

realizadas.

d) Condado

O município de Condado está localizado na Mata Setentrional Pernambu-

cana, possuindo área de aproximadamente 89,645 km² e população de 24.282

habitantes, o que corresponde a uma densidade demográfica de 270,87 habi-

tantes por km², de acordo com os dados do último censo, realizado em 2010.

Observa-se que as mulheres correspondem a 51,22% da população, e que o

município possui uma taxa de urbanização de 93,23%. O IDHM de Condado é

de 0,602, o que o situa na faixa de médio IDH21.

No que se refere à questão da pobreza e da desigualdade social, no ano de

2010, em Condado, encontrou-se um percentual de concentração de renda de

21 Entre 0,600 e 0,699.

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Um olhar analítico | 91

56,41%. Além disso, o município apresentou um percentual de 36,09% indi-

víduos pobres – ou seja, com renda domiciliar per capita igual ou inferior a 140

reais, de agosto de 2010 –, e uma proporção de 66,26% de indivíduos vulne-

ráveis à pobreza.

• Canto Mãe Coruja

O Canto Mãe Coruja foi implementado em Condado em 2012 e fica loca-

lizado no centro da cidade, próximo à feira local e ao equipamento do Bolsa

Família, em uma localização de fácil acesso. A casa, cedida pela prefeitura,

tem quatro salas: uma serve de escritório; a outra para guardar os materiais

produzidos pelas mulheres nas oficinas; uma sala grande onde funcionam os

Círculos de Educação e Cultura, e uma sala que funciona como brinquedoteca.

Além dessas, a casa possui ainda uma cozinha pequena e um banheiro. A casa

é bastante quente, sobretudo na parte da tarde, e o espaço para a brinquedote-

ca é muito pequeno. O Canto possui um único berço para acomodar os bebês

que ali chegam.

• Composição da equipe e funcionamento do Canto

A equipe de trabalho do Canto Mãe Coruja de Condado é formada pelas duas

profissionais do Canto e uma funcionária extra, cedida pela prefeitura. O Canto

Casa onde

funciona o Canto

Mãe Curuja, no

município de

Condado

Fonte

: E

quip

e C

epla

nM

ult

i

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| Mãe Coruja Pernambucana92

funciona de segunda-feira a sexta-feira, em horários distintos: às segundas-fei-

ras e às sextas-feiras, as duas técnicas ficam das 8h às 14h; nas terças-feiras,

quartas-feiras e quintas-feiras elas revezam, uma trabalha no período da ma-

nhã e outra no período da tarde. Cada profissional do Canto segue um cronogra-

ma de atividades que é elaborado toda sexta-feira.

• Círculos de Educação e Cultura

Em Condado funcionam seis turmas do Círculo de Educação e Cultura:

i. No próprio Canto Mãe Coruja.

ii. Na escola municipal do loteamento Timbó.

iii. Dois na escola municipal na Vila Diogo.

iv. Dois na igreja evangélica na comunidade Novo Tempo.

4.2 Cantos Mãe Coruja e o acompanhamento das gestantes e crianças

Nesta seção, será abordada a visão das profissionais dos Cantos Mãe Co-

ruja localizados nos municípios selecionados, com vistas a levantar as suas

percepções no que diz respeito ao desempenho das atividades nos Cantos, o

acompanhamento das gestantes e crianças, as dificuldades encontradas no dia

a dia de suas funções, bem como as possíveis sugestões de aperfeiçoamento.

Em cada município, foram entrevistadas as duas profissionais do Canto, com

exceção do município de Exu, onde só foi realizada entrevista com uma delas,

visto que a outra encontrava-se em licença-maternidade.

Segundo as profissionais dos Cantos Mãe Coruja, seu trabalho consiste

em cadastrar as mulheres grávidas, acompanhar a gestação até os 9 meses,

acompanhar a criança até os 5 anos de idade, promover eventos comemora-

tivos e organizar cursos, palestras e oficinas para as gestantes. Nesse sentido,

ressaltam a importância da articulação com as Secretarias de Saúde Muni-

cipais, sobretudo com os profissionais do PSF, uma vez que este se constitui

como a principal forma de identificação e cadastramento das gestantes, que

são encaminhadas para o Programa Mãe Coruja Pernambucana pelos agentes

de saúde no momento do pré-natal.

A nossa atividade começa na ida das mulheres ao PSF, quando elas descobrem

que estão gravidas, elas vão para a primeira consulta. Então, quando elas estão

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Um olhar analítico | 93

na primeira consulta, elas são encaminhadas ou não, né? Pelas enfermeiras. Elas

vêm até aqui no Canto do Mãe Coruja fazer o cadastro no programa. Então esse

cadastro é realizado, onde nós colocamos as informações que são dadas ao PSF.

Nós transcrevemos o que vem no cartão da gestante para nosso sistema aqui do

Mãe Coruja. (Profissional do Canto Mãe Coruja)

A chegada das mulheres ao Programa Mãe Coruja Pernambucana, segun-

do as profissionais dos Cantos Mãe Coruja, pode acontecer de três formas: a)

por intermédio do PSF, b) de forma espontânea – nesse caso, geralmente, são

mulheres que já tiveram uma experiência anterior com o programa e estão na

sua segunda ou terceira gestação, ou ainda que ouvem falar do programa por

amigas/familiares, ou c) por meio da busca ativa. A busca ativa, via de regra,

acontece quando as técnicas recebem informação de alguma gestante ainda

não cadastrada, ou quando a gestante, apesar de cadastrada, não volta ao Can-

to para o acompanhamento e atualização das suas informações. Além disso,

elas relatam que é comum realizar busca ativa nas áreas rurais, uma vez que,

por conta da distância, as gestantes e mães residentes nessas áreas encontram

mais dificuldades para ir ao Canto. A busca ativa também acontece nos postos

e UBS, tanto para novos cadastramentos, quanto para atualização de informa-

ções das gestantes, como podemos ver nas falas transcritas a seguir:

A busca ativa se dá quando elas não vêm, porque, normalmente, tem mãezi-

nhas que infelizmente vêm, faz todo o acompanhamento da gente, aí pega o kit

e desaparece. Não vem informar o parto, não vem fazer o acompanhamento da

criança. Aí a gente tem que ir, a gente procura. Eu, minha busca ativa começa

primeiro no postinho, eu vou, vejo com a enfermeira e com os agentes de saúde,

que é quem conhece melhor a área. Aí agendo com a enfermeira, deixo lá a rela-

ção daquelas que eu preciso (...). Deixo agendado um dia pra ir lá. Aí os agentes

convocam pro postinho essas mães que ficam mais próximas. Principalmente

quando é área rural. (...) Geralmente de 70% a 80% vão, aí ficam duas ou três que

eu tenho que ir buscar, ir visitar os sítios...” (Profissional do Canto Mãe Coruja)

Geralmente as mulheres chegam de forma espontânea ou através de busca ati-

va. Essa busca ativa, a gente faz um cronograma de atividade mensal onde a

cada 8 dias eu tô dentro das UBS para o pré-natal. É quando a gente chega e

faz esse levantamento de gestantes, e muitas vezes elas vêm. (Profissional do

Canto Mãe Coruja)

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| Mãe Coruja Pernambucana94

Além dessas atribuições, algumas técnicas relataram que acompanham a

realização dos Círculos de Educação e Cultura, espaço em que também apro-

veitam para atualizar o cadastro das mulheres que dele participam. A articu-

lação com outras secretarias e o encaminhamento das gestantes para outras

políticas e serviços de que necessitem é, também, tarefa das técnicas dos

Cantos. O objetivo dessa articulação é promover a garantia de direitos essen-

ciais e o cuidado mais amplo com a gestante.

O acompanhamento das gestantes é feito por meio do monitoramento

das consultas de pré-natal. Uma vez realizado o parto, passa-se a acom-

panhar a criança. No que diz respeito ao monitoramento da criança, é feita

uma visita puerperal nos primeiros 15 dias, durante a qual a criança deve

ser cadastrada e são repassadas algumas orientações para as mães, tais

como a importância do aleitamento materno e da vacinação. A partir daí,

o acompanhamento da criança deve ser mensal no primeiro ano de vida,

trimestral no segundo ano de vida e anual a partir do terceiro ano de vida.

É por meio desse monitoramento que as técnicas devem levantar informa-

ções sobre peso, vacinas, avanços da criança e eventuais internações, além

de verificar se há a necessidade de encaminhamento para outros serviços

da rede de saúde. No entanto, cabe destacar que esse acompanhamento da

criança é feito apenas via documentação, mais especificamente por meio

da checagem dos cartões de vacina.

Após a puericultura deles, elas retornam com o cartão de vacina pra gente ver

como foi a puericultura daquele mês, questão do peso, se tá tendo desnutrição, se

não tá... Perímetro encefálico, se tá aumentando, se foi vacinado. Se não foi, por

que não foi vacinado, se a unidade que não tinha vacina, se é porque tava doente

(...). Ver se mãe tá fazendo realmente a puericultura ou não, porque há umas que

acham que não tem importância nenhuma, a puericultura, e não vai ao postinho.

Aí a gente começa a cobrar, explicar, cobrando da forma, explicando que há a

necessidade, que não é uma coisa qualquer. (Profissional do Canto Mãe Coruja)

O acompanhamento, na verdade, a gente pega o cartão de vacina delas, né, que

quem faz é lá no PSF. Checa só documentação. Muitas estão acompanhando em

algum círculo, que as professoras do círculo faz a questão do desenvolvimento

delas. E a gente acompanha peso, vacina e altura. A gente consegue identificar

que tem mães que não leva todo mês, que não são frequentes. Aí a gente dá um

puxão de orelha, tá perguntando se tá na escola, se tá no aleitamento materno,

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Um olhar analítico | 95

que tipo de alimentação, isso é mais uma conversa, a gente não acompanha exa-

tamente a criança especificamente, mas a gente acompanha pelo cartão e pela

conversa com a mãe. (Profissional do Canto Mãe Coruja)

O fato de o acompanhamento das crianças se limitar à verificação da do-

cumentação surge como um entrave do programa, frente à necessidade de

mais ações voltadas para a primeira infância que extrapolem a mera che-

cagem de documentos. Isso é indicado pelas profissionais dos Cantos, que

reclamam da falta de atividades voltadas para as crianças. Segundo elas, isso

acaba por dificultar a realização dos círculos, visto que tanto as mães quanto

as educadoras precisam dar conta de entreter e cuidar das crianças, ao mes-

mo tempo que realizam as atividades pedagógicas. A falta de estrutura para

receber as crianças nos Cantos também é apontada, sugerindo a possibilida-

de da existência de uma pessoa para se dedicar apenas ao desenvolvimento

infantil. Essa questão também aparecerá nas falas das usuárias, e será discu-

tido de forma mais detalhada mais adiante.

Acredito que [precisa de] algo voltado para a criança. Aqui nos círculos a profes-

sora tem que se desdobrar em dois, mãe e filho, e às vezes fico pensando se tivesse

uma pessoa só que fizesse uma atividade com as crianças, pra trabalhar o desen-

volvimento infantil de uma forma diferenciada. Eu acho que falta isso também.

Falta um olhar diferenciando dentro dos Círculos para a criança. Poderia ter um

educador para essas crianças, um cronograma para essas crianças. (Profissional

do Canto Mãe Coruja)

Na percepção das técnicas entrevistadas, as ações mais importantes para

a redução da mortalidade infantil são o acompanhamento da gestação e o

compartilhamento de informação em saúde. O acompanhamento das ges-

tantes, junto ao PSF, para que realizem todas as consultas previstas no pré-

natal – sobretudo para os casos de risco –, aliado às informações que são

compartilhadas com as gestantes nos círculos funcionariam como medidas

complementares para prevenir os óbitos infantis.

Eu acredito que [o que é mais importante] é justamente esse acompanhamento

da mulher. E o caso da microcefalia agora, a gente tem uma tabela específica e

que toda semana a gente consegue saber a rede dessa gestante. O acompanha-

mento e a informação. Hoje a contribuição do programa é acompanhar essa

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| Mãe Coruja Pernambucana96

gestante pra ver se ela tá bem acompanhada, se os exames foram solicitados,

se tá tudo ok com o bebê. Então tem como a gente ter um acompanhamento e

evitar lá na frente. E caso aconteça alguma coisa a gente encaminha, enquanto

programa, a gente é de monitorar, a gente não executa. (Profissional do Canto

Mãe Coruja)

Educação mesmo em saúde. A parte de educação, de orientação mesmo, de tá

junto mesmo. De tá ali orientando. Educação e saúde (...). Nos atendimentos, nas

orientações em si, nas palestras, nos círculos. É tá junto mesmo, informando,

passando informações. Tá monitorando os acompanhamentos pra ver se precisa

agir. (Profissional do Canto Mãe Coruja)

Quando questionadas sobre as principais dificuldades encontradas para

a realização das atividades do dia a dia, algumas das profissionais entre-

vistadas falaram sobre a necessidade de transporte para cobrir a área rural

e realizar a busca ativa, além da pouca quantidade de funcionários para

cobrir toda a demanda dos municípios. Segundo elas, duas pessoas não são

suficientes para lidar com todas as famílias cadastradas. A forma de con-

tratação, com vínculo temporário, também foi citada como sendo algo que

deveria mudar.

Uma delas é o transporte, se a gente tivesse um transporte a nossa disposição a

gente podia cobrir a área rural melhor. E outra dificuldade é em investir mais

nessas mães. A gente vê que ela tem habilidade, que elas têm talento, mas muitas

vezes elas não têm condição econômica de comprar o material e produzir. (Pro-

fissional do Canto Mãe Coruja)

A demanda mesmo. Porque olhe só, o programa quando iniciou era uma coisa,

a gente começou a cadastrar, foi começando com cem mães, com duzentas, com

trezentas. Eram duas técnicas. Hoje, eu não sei como é em (...), porque aqui a

gente tem 3600 famílias, e continua com duas técnicas, com um computador. Se

tivesse, pelo menos, outro computador, ou sei lá. Eu acho que tem municípios que

tinha que ser revisto o número de técnicas. (Profissional do Canto Mãe Coruja)

Outra queixa recorrente é a que se refere à falta de recurso para a realiza-

ção de eventos nos Cantos. Assim, segundo as técnicas, entre as suas ativi-

dades está prevista a organização de alguns eventos para as usuárias e suas

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Um olhar analítico | 97

famílias, como as comemorações do Dia das Mães e Dia dos Pais, a realização

de palestra e a organização de feiras para a exposição e a venda do material

produzido pelas usuárias nas oficinas. Apesar das cobranças, no entanto, não

há o envio de qualquer auxílio para a realização das atividades e as profis-

sionais acabam tendo de arcar com todos os custos, como é possível ver na

fala a seguir:

Eu acredito que o que falta pra gente é mais subsídio de trabalho, que poderia

melhorar. A questão do transporte, de eventos. Muitas vezes a gente trabalha com

cotinhas pra fazer esse evento pra as mães, quando poderia vim um recurso para

eventos. (Profissional do Canto Mãe Coruja)

Além disso, várias delas destacaram como maior entrave ao programa a

hora do parto, sujeita às fragilidades da rede hospitalar, como a falta de es-

trutura e a falta de obstetras. Pontuaram também a dificuldade em fazer as

mulheres voltarem aos Cantos após o parto, para dar continuidade ao acom-

panhamento do bebê, bem como a dificuldade em trazer os pais para parti-

cipar das atividades.

Dificuldade de tá trazendo essas mulheres pra fazer com que elas retornem ao

Canto em tempo hábil da gente tá pegando essas informações se ela tá bem, se

não tá, se tão precisando de alguma assistência da gente. [Retornarem] depois do

pré-natal e depois do parto. A maioria dessas de 2015 [que não retornou] fala-

ram que foi por falta de informação, que não entendeu bem qual era a proposta

do programa. Aí a gente tá tentando melhorar as informações no momento de

cadastro e no momento de atualização do cadastro pra que elas retornem. (Pro-

fissional do Canto Mãe Coruja)

Bom o que a gente poderia fazer, mas não faz e poderia fazer, mas não tem es-

trutura. É a questão do parto, porque a gente faz todo o trabalho de acompanha-

mento do pré-natal junto com o posto. Mas quando chega na parte final, que é o

parto -no momento do parto-, a gente perde esse controle. (Profissional do Canto

Mãe Coruja)

Essas questões também foram muito presentes nos discursos das usuárias

e dos profissionais parceiros, motivo pelo qual merecerão tópicos específicos

para uma discussão mais detalhada, adiante.

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| Mãe Coruja Pernambucana98

4.3 Impactos do programa nas trajetórias de vida das usuárias

Esta etapa da avaliação teve como objetivo captar as percepções das usuá-

rias acerca da importância do Programa Mãe Coruja Pernambucana em suas

vidas, bem como dos impactos deste em suas trajetórias. A fim de alcançar

maior diversidade de pontos de vista e representações, buscou-se selecionar

diferentes perfis de usuárias, com base nas seguintes características:

• Tempode entradanoprograma, buscandousuáriasmais antigas e

outras mais recentes.

• Regiãoemqueresidenomunicípio(urbanaourural).

• Usuáriascommaisdeumilho,parapodertraçarumparaleloentre

gestações acompanhadas e não acompanhadas pelo programa.

• Mãesadolescentes.

Compreende-se que as vivências e percepções dos sujeitos podem variar

de acordo com suas experiências (backgrounds) e com os contextos em que

estão inseridos, resultando em necessidades distintas, diferentes formas de

acessar o programa e de participar de suas ações. Nesse sentido, em todos os

municípios foi possível contemplar os diferentes perfis citados, resultando

em um total de 23 usuárias entrevistadas, sendo 5 em Ouricuri, 4 em Exu, 9

em Condado e 5 em Iguaracy.

Para a coleta das informações, o instrumento utilizado foi a entrevista em

profundidade, a fim de obter relatos com maior riqueza de detalhes e evitar,

tanto quanto possível, conduções e vieses nas respostas. O fio condutor das

entrevistas foi o questionamento acerca do impacto do Programa Mãe Coruja

Pernambucana em suas vidas e nas vidas dos seus filhos e, para isso, foram

feitas perguntas tais como: “Como foi/é sua experiência no Programa Mãe

Coruja Pernambucana?”; “Qual é a importância do Programa Mãe Coruja

Pernambucana na sua vida?”; “Algo mudou na sua vida após conhecer o Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana?”; “Você considera que o Programa Mãe

Coruja Pernambucana melhorou a vida do seu filho? Como?”; “O que acha

mais importante no Programa Mãe Coruja Pernambucana?”, entre outras22.

Os relatos coletados retratam as vivências dessas mulheres no programa, as

formas como elas o enxergam e suas percepções acerca de sua importância e

eficácia. Vale destacar que os relatos coletados trazem bastante convergência

22 Roteiro anexo.

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Um olhar analítico | 99

de percepções entre os diferentes municípios visitados, conforme poderá ser

percebido por meio das falas transcritas adiante. As questões levantadas se-

rão, assim, discutidas com maior detalhamento em tópicos específicos.

Antes, cabe aqui fazer uma consideração acerca das adolescentes entre-

vistadas. Nos quatro municípios visitados, foi possível realizar entrevistas

com usuárias adolescentes. Em comum, elas relataram pouca participação

nas atividades promovidas pelo programa e pouco impacto deste em suas vi-

das. Via de regra foram entrevistas rápidas, com respostas curtas, revelando

pouco conhecimento das atividades e ações relacionadas ao Programa Mãe

Coruja Pernambucana. A falta de informações, no entanto, acabou por reve-

lar uma dinâmica comum entre essas usuárias, confirmada depois pelas pro-

fissionais dos Cantos. Assim, por conta de sua idade e perfil, as adolescen-

tes acabam tendo pouca penetração no programa, com pouca participação

nos círculos e nas demais atividades, seja por causa do horário escolar, seja

por simples falta de interesse por parte das garotas. Esse cenário encontrado

aponta para a necessidade de o programa pensar ações próprias para esse

perfil específico de usuária, com o fim, inclusive, de evitar a reincidência de

gravidez ainda no período da adolescência.

a) Acesso à informação e ao conhecimento

Via de regra, as usuárias relataram que o Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana trouxe impactos positivos para as suas vidas, sobretudo no que se re-

fere ao maior acesso à informação qualificada sobre a gravidez e o pré-natal

e sobre os cuidados com o bebê, tais como a importância do aleitamento, da

vacinação e da alimentação, por exemplo. Segundo elas, o acompanhamento

proporcionado pelo programa e as informações obtidas nas reuniões dos Cír-

culos de Educação e Cultura foram diferenciais para desmistificar crendices

e possibilitar uma gestação mais saudável e tranquila, sobretudo quando em

comparação com gestações anteriores que não foram acompanhadas pelo

Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Assim, pra mim, ofereceu informação nova, mais atenção nessa gravidez. Eu

aprendi mais nessa gravidez do que com as outras. Por exemplo, eu não sabia

muita coisa do aleitamento materno, antes eu não sabia a hora que a menina

tava com fome, eu tinha medo de dar comida pra ela. Eu nunca tinha feito uma

cesariana e eu fiquei com medo, mas elas explicaram direito e me acalmou mais.

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| Mãe Coruja Pernambucana100

Fiquei mais informada, que eu não era. Sobre minha filha, sobre mim.... Deu mais

segurança, mais tranquilidade. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana de Iguaracy)

Eu acho que eu não tinha aprendido as informações que eu sei, se eu não tivesse

participando [do Programa]. Eu achei muito importante participar. Se eu não

participasse, eu não sabia as informações que eu sei hoje, participando do Cír-

culo (...) Acrescentou mais coisa né? Que eu não sabia. Eu não sabia nem como

era que dava banho. Quem deu banho foi mãe, que eu tinha medo de derrubar na

banheira. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Ouricuri)

Além disso, por meio dos discursos é possível perceber que as usuárias

acabam disseminando o conhecimento apreendido com seus companheiros

e familiares mais próximos, gerando impactos também na família. Outras re-

latam, ainda, que compartilham as informações recebidas no programa não

só com a família, mas também com outras mulheres que, por um motivo ou

outro, não puderam acessar o programa.

Mudou [a vida] porque as experiências que eu tenho, que eu já tive e tô tendo,

eu repasso pra minha cunhada também, que não teve como ir. Quando ela

Capacitação

continuada é uma

demanda existente

no Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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Um olhar analítico |101

descobriu já tava com quatro meses, aí já não pôde ir pro Mãe Coruja. E mui-

tas vezes eu converso com ela, converso com uma colega minha(...)E minhas

experiências que eu tive com as meninas, eu repasso. Eu não fico só pra mim,

passo pro meu esposo também. A questão de alimentação pro bebê, dar de

mamar (...) aí o povo sempre diz: cuidado pra o bebê não arrotar no teu peito.

E eu digo: por que isso? ‘Não, porque teu peito pedra’. E num tem nada a ver,

a minha arrotou, graças a Deus. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana de Exu)

(...)às vezes minha irmã pergunta as coisas, minha mãe. Aí o que eu aprendo aqui,

eu ensino em casa. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Ouricuri)

Outro impacto positivo, de acordo com a percepção das usuárias, foi a

participação em cursos de capacitação e oficinas, visto que isso possibilitaria

a venda dos itens produzidos, proporcionando a complementação da renda e

estimulando o empreendedorismo e a autonomia econômica.

Assim, porque os cursos eles tão dando uma renda. Você faz os cursos, a pessoa tá

aprendendo ali. Você vai praticando e vai gerando renda (...). As que fizeram esse

último curso tão tudo praticando. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana de Exu)

Depois que eu entrei mudou. Assim, porque esses trabalhos que a gente faz aqui, a

gente aprende muito aqui, né, e a gente ganha, faz sofázinho, a gente vende. Teve

uns fantoches que eu fiz, pequenininho, pra aniversário, então já é uma ajuda, né?

Dá liberdade, porque antes eu dependia muito de marido, eu dependia dele, mas

não vou depender mais de homem não. (Usuária do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana de Condado)

Pronto, esse curso de empreendedorismo mesmo, me ajudou muito. Até pra cus-

tomizar meus panos, pra eu sair para vender. (Usuária do Programa Mãe Coruja

Pernambucana de Condado)

A questão do acesso à informação é um dos pontos mais recorrentes – se

não o principal – nas percepções das entrevistadas sobre os impactos e bene-

fícios que a participação no Programa Mãe Coruja Pernambucana trouxe para

as suas vidas, aparecendo em vários momentos no decorrer das entrevistas,

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| Mãe Coruja Pernambucana102

seja quando questionadas sobre o que julgam mais importante no programa,

seja quando falam sobre as mudanças que ocorreram nas suas vidas depois

dele, ou ainda quando relatam suas experiências, revelando, assim, o poten-

cial transformador do conhecimento e da educação na vida dessas mulheres.

b) O acompanhamento das crianças e a primeira infância

Quando questionadas sobre o que consideram mais importante no Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana, algumas usuárias destacaram o acompa-

nhamento das crianças que é feito pelas técnicas dos Cantos Mãe Coruja. Na

percepção delas, esse monitoramento funciona como um incentivo para o

comparecimento nas consultas e para a vacinação das crianças no tempo cor-

reto. Além disso, acentuam as orientações que são dadas pelas técnicas sobre

alimentação, crescimento e desenvolvimento das crianças.

O acompanhamento com as crianças. Ela vai, a gente leva o cartão da vacina e

orienta a alimentação da criança. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana de Ouricuri)

É como eu já falei, é por causa do acompanhamento que tem. Tem o acompanha-

mento, às vezes elas marcam consulta pra outro médico se precisar. (Usuária do

Programa Mãe Coruja Pernambucana de Exu)

É importante a vacinação em dia, né, o peso, saber como é que a criança, o cres-

cimento da criança (...). Porque se for só depender do agente de saúde tá passando

nas portas pra ver essas coisas (...) eles passam só de mês em mês. (Usuária do

Programa Mãe Coruja Pernambucana de Iguaracy)

Vale ressaltar que, conforme observado nos relatos das profissionais dos

Cantos, esse acompanhamento é feito por meio das informações contidas no

cartão de vacinação, limitando-se, assim, à checagem de documentação. Nas

falas das usuárias entrevistadas, fica clara a necessidade de uma maior atua-

ção do Programa Mãe Coruja Pernambucana na atenção e no cuidado com a

primeira infância, promovendo atividades voltadas para as crianças e equi-

pando os Cantos para atuarem como um espaço de acolhimento, com brin-

quedos educativos e berçários.

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Um olhar analítico |103

De acordo com a observação sistemática realizada, foi possível perceber o des-

preparo que ainda há nesse sentido, seja pela falta de uma estrutura adequada para

as crianças – visto que apenas alguns Cantos possuem brinquedoteca e, quando

possuem, com poucos brinquedos; faltam também berçários adequados para rece-

ber os bebês, em Condado, por exemplo, o berçário se constitui de apenas um ber-

ço –, seja pela falta de pessoal capacitado para lidar especificamente com a questão

do desenvolvimento infantil. O campo revelou, portanto, a demanda existente no

sentido de uma evolução do programa para uma nova etapa de acompanhamento

das crianças, com a promoção de espaços de convivência e estímulo ao brincar.

c) Construção da autoconiança e resgate da autoestima

Na percepção das mulheres, o Programa Mãe Coruja Pernambucana possibi-

lita o resgate da autoestima e a construção da autoconfiança, fazendo com que

elas se sintam mais valorizadas. Relatos de várias entrevistadas revelam impac-

tos de caráter fortemente subjetivo, uma vez que destacam mudanças na forma

de agir e se comportar que atribuem à participação no programa, mais especial-

mente aos Círculos de Educação e Cultura. De acordo com as falas coletadas e

com as observações realizadas em campo, pode-se notar que os círculos fun-

cionam como um espaço importante para a difusão de informações e interação

social para essas mulheres que, de outro modo, não teriam outros espaços para

interagir e se informar.

A vivência dos Círculos de Educação e Cultura, aliada ao compartilhamento

de experiências com as educadoras e umas com as outras acaba por propor-

cionar, segundo elas, um aumento da autoconfiança e da capacidade de se ex-

pressar e de se relacionar com o mundo, fazendo com que sintam que “agora,

possuem voz”. Além disso, os encontros promovidos pelos círculos propiciam

a criação de uma rede de apoio mútuo, muito frequente nos discursos das mu-

lheres entrevistadas.

Eu era uma mulher que vivia dentro de casa, bem dizer trancada 24 horas só em

serviço, não tinha capacidade de sair, né, conversar com as meninas, nada. (Usu-

ária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Condado)

Mudou, mudou [depois do PMC]. Eu tinha um problema, assim, nervosismo. Pron-

to, aqui mesmo, eu, antes do Mãe Coruja, não estaria aqui não, porque ficava ner-

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| Mãe Coruja Pernambucana104

vosa (...) eu não estaria aqui não, antes do programa. Hoje eu já me enturmo com

as pessoas. [Antes] eu chegava e ficava na minha, quieta. Hoje não, eu chego e dou

boa tarde, já converso tudinho. Antes, eu não faria isso não. (Usuária do Programa

Mãe Coruja Pernambucana de Condado)

Mudou[a vida, depois do PMC]. Como eu já disse, nunca tinha visto essas coisas

aqui, nunca tive. Aí agora apareceu. Principalmente pras mães carentes também,

né. Me senti valorizada, que antes ninguém olhava, principalmente pras mães.

(Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Iguaracy)

A participação nas atividades do programa pode, assim, trazer impactos

socioculturais e de bem-estar individual muito importantes para essas mu-

lheres, uma vez que possibilita maior acesso a espaços sociais e à participação

em grupos extrafamiliares, pois muitas delas viviam restritas ao espaço do lar,

relatando que, antes de se cadastrarem, raramente saíam de casa. É, pois, um

efeito intangível, mas muito valorizado pelas mulheres entrevistadas, que se

percebem, assim, mais confiantes e valorizadas.

d) Papel dos Círculos de Educação e Cultura na promoção do cuidado

Inspirado no método Paulo Freire e tendo como concepção de suas ativi-

dades as realidades sociais e práticas do cotidiano das usuárias, os Círculos de

Educação e Cultura surgem como uma das peças mais impactantes do Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana.

Entre os conceitos basilares do programa estão a prática da cultura do cui-

dado e o fortalecimento de vínculos afetivos e familiares, assim, é precisa-

mente nesse sentido que os círculos desempenham papel importante na vida

das usuárias. Frequentemente apontados pelas usuárias como um dos ele-

mentos mais importantes do programa, os círculos se estabelecem enquanto

iniciativas de destaque não apenas para a atividade educacional, mas também

apresentam-se como um espaço de socialização continuada, com formação de

redes e construção de vínculos – dos mais fracos aos mais fortes. Ao comen-

tar a importância do Programa Mãe Coruja Pernambucana e dos Círculos de

Educação e Cultura, a usuária dá o seguinte depoimento sobre as estruturas de

apoio que se estabelecem a partir dos círculos:

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Um olhar analítico |105

Assim, a amizade e o amor, né. Que a gente chega aqui é amigo, é tudo amigo. O

carinho, o amor aqui é muito, muita energia boa. (risos) (Usuária do Programa

Mãe Coruja Pernambucana de Condado)

Conforme pode se observar no comentário a seguir, ao ser indagada acerca

das possíveis influências dos círculos nos vínculos familiares, uma outra en-

trevistada diz que:

Influenciou [os vínculos familiares] sim. Porque muitas vezes a gente chega aqui

triste, e aí a professora chama a gente de canto, pergunta o que é que tá acontecen-

do. Muitas vezes a gente fala dos problemas. E assim, ela vai lá, fala com a família

da gente. Se a gente tiver passando por alguma coisa, ela vai lá, conversa. (Usuária

do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Ouricuri)

Ilustrando de maneira mais evidente os efeitos dos círculos, uma terceira

usuária faz a seguinte reflexão acerca do Programa Mãe Coruja Pernambucana,

dos Círculos de Educação e Cultura e da promoção da prática do cuidado:

Ela [profissional do Círculo] leva as palestras, a gente sempre tá lá, a gente vê as

palestras da família; que família não é aquela que só que tem a mãe, que tem o pai

e tem a filha, mas sim que tem quer ter o vínculo familiar tanto da mãe quanto do

pai, pra criança; se eu tenho minhas responsabilidade, o pai também tem que ter,

mas não é só aquela responsabilidade de colocar o arroz e o feijão dentro de casa,

não. Mas sim de educar sempre a criança. (Usuária do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana de Exu).

Por outro lado, uma das fragilidades do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana vem à tona também nos círculos. Trata-se, mais especificamente, da

lateralidade da mulher não gestante no planejamento e desenvolvimento das

atividades. Em uma das entrevistas realizadas na pesquisa de campo, uma das

usuárias expressa sentir falta de algo voltado para a mulher de maneira geral,

cobrando mais palestras e atividades com especialistas nessa temática. O de-

poimento contundente, proferido pela usuária, coaduna-se com a perspectiva

crítica acerca do papel coadjuvante da mulher em detrimento da criança na

concepção e desenvolvimento do Programa Mãe Coruja Pernambucana:

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| Mãe Coruja Pernambucana106

Por exemplo, a saúde da mulher, porque a gente debate tanto das crianças da gente.

Às vezes a gente tá num assunto e foge pro outro. Então, acho que a questão da mulher

mesmo, de doenças. Prevenção, por exemplo. (...) Prevenção, muita mulher aqui não

faz, com medo. Eu mesmo nunca fiz uma prevenção. (...) No módulo mulher a gente

conversava, mas seria mais bom com o profissional mesmo, da área pra explicar. (...)

Porque muita gente não sabe nem o que é prevenção. (...) A criança a gente aprende

aqui, aprende no postinho, todo mundo sabe, agora a questão da mulher é mais esque-

cida. A questão da gente é mais esquecida. Pelas coisas que a gente tem em casa, a gente

vive mais pros filhos do que pra gente. Eu acho que seria muito interessante a questão

da mulher, da saúde da mulher. Porque no postinho eles dá palestra sobre aleitamento

materno, parto, essas coisas, mas esquece mais um pouco da gente. Até a gente mesmo

acaba esquecendo. No dia a dia da gente, a agente acaba esquecendo da gente (Usuária

do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Ouricuri).

De acordo com os relatos coletados e as observações realizadas, os Círculos

de Educação e Cultura despontam como possuindo um papel central para o

Programa Mãe Coruja Pernambucana, com amplo reconhecimento das usuá-

rias, atuando, inclusive, no âmbito subjetivo, de fortalecimento de vínculos

e construção da autoestima, revelando seu papel crucial em suas trajetórias

de vida. Frente a esse papel crucial que os círculos desempenham, o campo

revelou, também, a necessidade de ampliação do seu escopo, trazendo outros

temas relevantes além dos cuidados com a gestação. Foi citada, também, a de-

manda de aumento do número de círculos, com vistas a cobrir mais áreas e,

assim, melhor atender a população.

e) Fortalecimento dos vínculos familiares e o papel do pai

Além da questão da autoconfiança e da autoestima, as usuárias relatam,

ainda, a importância do programa para o fortalecimento dos vínculos familia-

res, seja delas com os seus filhos e maridos ou, ainda, com outros parentes. De

acordo com a percepção de uma usuária adolescente, a participação no pro-

grama e as conversas sobre maternidade acabaram por influenciar na relação

dela com a mãe. Outra entrevistada relata que, a partir das palestras, aprendeu

a dialogar mais e, assim, melhorou a relação com seu pai; enquanto uma ter-

ceira apontou que a participação nos círculos e as orientações para a prática do

cuidado fortaleceu sua relação com suas filhas, sobretudo com a mais velha,

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Um olhar analítico |107

com quem a relação era mais distante, pois ela estava estudando na época do

nascimento da menina.

Mudou muito meu jeito com mainha, depois que elas disseram o que é que era ser

mãe. Mudou meu jeito com minha mãe (…) Eu era muito ignorante, até hoje eu sou,

mas melhorou. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Ouricuri)

Assim, me ajudou. Eu tinha uma dificuldade na relação com meu pai. Então assim,

eu indo para as palestras, eu me juntando com as meninas lá, dialogando, eu já

chegava em casa uma nova pessoa. Isso foi me ajudando a dialogar mais com

meu pai, que eu não tinha muito diálogo com meu pai. (Usuária do Programa Mãe

Coruja Pernambucana de Condado)

Mudou, mudou bastante. Porque assim, eu não tinha muita relação com elas [as

filhas]. Depois do programa foi que eu fui me chegando mais com a mais velha.

Até hoje com a mais velha ela tem hora que ela estranha, tem hora que ela diz “Oxe

mãe, tá me adulando muito”, mas é porque eu fui aprendendo muitas brincadeiras

que elas sentem que a gente gosta delas. (Usuária do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana de Exu)

O kit enxoval é

um importante

incentivo para

a entrada no

Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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| Mãe Coruja Pernambucana108

Segundo elas, o programa, por meio dos Círculos de Educação e Cultura,

proporciona momentos de integração com os filhos, nos quais podem desfru-

tar da companhia um do outro longe das preocupações do cotidiano e das ati-

vidades do lar.

Faz, faz muita diferença, porque às vezes a gente tá em casa, lavando uma roupa,

tá cuidando de uma comida, a gente não tem aquela atenção só pra criança (...).

Aqui, a gente junta as crianças e tem um tempo só pra gente, as crianças e a pro-

fessora. A gente fica conversando tudo, a gente sabe que não tem outra coisa pra

fazer ali no momento. A gente tá ali curtindo o momento com os filhos da gente.

(Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Ouricuri)

Quanto aos pais das crianças, os discursos das usuárias convergem com o

que foi relatado pelas profissionais dos Cantos, no sentido da pouca participa-

ção deles nas atividades promovidas pelo programa. As observações realizadas

Atividades

educacionais

e produtivas

funcionam como

recurso importante

para a autonomia

econômica da

mulher

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Um olhar analítico |109

nos Cantos também corroboram os discursos, visto que, durante o campo,

pouquíssimos pais foram vistos participando das atividades ou simplesmente

acompanhando as mulheres até o Canto, por exemplo. Dentre as entrevista-

das, apenas uma relatou que o marido participou de alguns círculos junto com

ela. Na percepção da maioria delas, os pais não participam por vergonha, e por

não se identificarem com as atividades do programa. O próprio nome do pro-

grama, o formato dos círculos e os temas trabalhados acabam por não atrair os

pais e companheiros a participar junto com suas esposas. A criação de ativida-

des voltadas para os pais, em horário conciliável com o trabalho, surge como

uma alternativa para tentar torná-los mais participativos.

Geralmente os pais não quer vir, eles tem vergonha. Inclusive tem uma menina

aqui que ela convida o marido e ele diz ‘Eu não vou não, lá só tem mulher’. É os

pais mesmo que são meio, eles não gosta. Não é que não gosta, eles têm vergonha.

Eu acho que seria interessante [fazer uma atividade para os pais] porque quando

fala ‘Mãe Coruja’ aí ele já fica ‘só mulher, só mulher, eu não vou não’. Acho que

se fosse só os pais, acho que eles viria sim. (Usuária do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana de Ouricuri)

Elas [as professoras] manda chamar [os pais]. Mas eu nunca levei ele não (…). Ele

é muito fechado pra essas coisas. - Pergunta: Se tivesse uma atividade só

para os pais seria interessante? Seria, muito. Eu digo que ele iria. - Per-

gunta: O que era bom de trabalhar com os pais?O jeito de lidar com

criança, de pegar, de tudo, de tratar a criança. Que hoje em dia, não é todos, mas

a maioria trata mal, trata ruim as mulher, as criança(…). Eu digo que seria bom se

tivesse. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Exu)

Os pais lá? Não, vão não [para os círculos]. Nenhum pai vai. É porque tem vergo-

nha, fica com vergonha de ir. Não vão não. (…) Só porque tem mulher. (Usuária do

Programa Mãe Coruja Pernambucana de Ouricuri)

Apesar de os maridos não participarem ativamente do programa, algumas

usuárias relatam que recebem o apoio deles para que elas possam participar

das atividades, eles se oferecem para ficar com os filhos para que elas possam

ir aos cursos e palestras. Há, também, entre algumas delas, a percepção de que

a participação no Programa Mãe Coruja Pernambucana trouxe impactos posi-

tivos na relação com seus maridos, no sentido de fortalecê-la.

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| Mãe Coruja Pernambucana110

Influencia [na relação com os pais da criança] porque tem muitos que até fica com

a criança pra mãe vir. Quando elas vêm, fica com a criança, porque muitas vezes

tem o bebezinho, o sol tá quente, aí eles: ‘não, pode ir que eu fico com a criança’.

Muitas aqui, quem fica é o pai. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana

de Ouricuri)

Eu converso [com o marido, sobre o conteúdo dos Círculos]. Eu digo que esse mo-

mento é nosso, e é deles. A gente passa pro pai também. E ele gosta. Às vezes [a edu-

cadora] vem aqui (...). Minha segunda gravidez tá sendo de risco e elas falaram que

num é tanto o meu esforço, mas o esforço dele também ia me ajudar muito. Tipo,

nessa questão, tem muitos casais que brigam muito e, hoje, graças a Deus tamo

um casal ideal. Eu digo: ‘meu Deus, era o que eu tava pedindo a Deus’. (Usuária do

Programa Mãe Coruja Pernambucana de Exu)

No município de Iguaracy, em uma das visitas à UBS, foi possível entre-

vistar um pai que acompanhava sua esposa na consulta da filha deles, de 2

meses de idade. Na sua percepção, o Programa Mãe Coruja Pernambucana tem

sido muito importante para o casal, por trazer informações sobre o cuidado

com o bebê, que antes não tinham. Disse, ainda, que sempre acompanhou sua

Articulação entre

o programa e

as equipes de

saúde resulta

em um melhor

atendimento às

gestantes

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Um olhar analítico |111

esposa no pré-natal e a levava ao Canto Mãe Coruja, mas que observou que a

maioria das mulheres chegava só, e que sabe que a maioria dos maridos não

quer ir. Quando perguntado se gostaria que houvesse atividades para os pais e

se participaria, respondeu:

Com certeza, todo momento que me chamar. Depende do, do horário, se eu tiver

muito ocupado, eu poderia dar um pulo lá. Eu não poderia ficar o tempo todo com

ela, mas um tempozinho, se eu achava que era de necessidade, eu ficava. (Marido

de usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Iguaracy)

Assim, visto que o Programa Mãe Coruja Pernambucana tem como um de

seus objetivos fortalecer os vínculos familiares, promovendo a integração da

família no cuidado com o bebê, sugere-se a criação de ações que busquem, de

fato, contemplar a família como um todo – e não só a mãe – com foco especial

nos pais das crianças.

f) Kit do bebê

O kit com um enxoval23 é considerado um importante incentivo para a en-

trada no Programa Mãe Coruja Pernambucana e é distribuído para as gestan-

tes acompanhadas pelo programa que compareceram a sete ou mais consultas

pré-natais. A compreensão de sua importância para as usuárias do programa

– muitas em condição de extrema vulnerabilidade – é bastante sólida, bem

como a percepção de que o Programa Mãe Coruja Pernambucana segue, de

forma muito consistente, muito além da entrega do kit.

Aí assim pra elas tirar da mente que o kit não é o final, é o meio. O trabalho con-

tinua. O kit é muito importante, assim, é...eu vejo esse kit como sendo assim a

chama, a chama pra elas participar. Aí depois que elas entram no programa, aí

começa a estudar os temas e ver que é além, vai muito além, o kit serviu de atrativo.

(Profissional da área de educação).

De acordo tanto com as profissionais dos Cantos Mãe Coruja, quanto com

a percepção dos outros atores envolvidos, a proposta de entrega do kit enxoval

23 Os itens componentes do kit são: 2 pacotes de fraldas descartáveis; 2 pacotes de fraldas de pano; 3 pacotes de lençóis; 1 sabonete; 1 tubo de pomada para assaduras; 1 calça enxuta; 1 banheira; 1 bolsa branca (para transporte do material). Disponível em: <http://maecorujape.blogspot.com.br/2009_01_01_archive.html>. Acesso em: 18 set 2016.

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| Mãe Coruja Pernambucana112

goza de ampla legitimidade, não podendo ser reduzida a uma possível prática

assistencialista. As condicionalidades para a entrega do kit, juntamente com

os esforços e ações para a continuidade da usuária no Programa Mãe Coruja

Pernambucana, indicam que se trata de uma estratégia de incentivo inicial, e

não com função finalística. No mesmo sentido, trata-se de uma ação impor-

tante na promoção da cidadania e da dignidade das mães e crianças, segundo

as escutas realizadas.

Não, não acho que é assistencialista porque é realmente necessário. A entrega do

kit, ele vem, quando eu sei que tem uma mãe que mora na casa de taipa, um kit

é muito bem-vindo. Eu tive mãe que dava banho em panela, em bacia de lavar

roupa. Pra um bebê, uma banheira é fundamental. Eu tenho mãe que ainda tem

banheira do primeiro filho e guarda. A qualidade do produto também é boa. (Pro-

fissional do Canto Mãe Coruja)

No que toca à repercussão do kit na vida das usuárias do programa, esse

enxoval apresenta um impacto extremamente relevante em termos de autoes-

tima das mães e na promoção do cuidado, segundo os depoimentos colhidos.

Assim, o que mudou, eu acho que mudou tudo porque eu ganhei o que precisava e

graças a Deus, eu tô com as coisinhas até hoje, eu tô usando, que, assim, tem gente

aqui que fala muita coisa, fala que a fraldinha não presta. Só que pra mim presta

muito, dou banho na banheiro do meu filho, na banheirinha do Mamãe Coruja,

tô usando a pomadinha de assadura que eles dão, eles dão de tudo, a toalhinha

também eu tô usando, tô usando tudo graças a Deus. (Usuária do Programa Mãe

Coruja Pernambucana de Iguaracy).

Recebi[o kit], recebi das duas [gestações]. Gostei, até hoje eu tenho. Ajuda bastante.

(...) Porque não é toda pessoa que tem condições de comprar tudo. (Usuária do

Programa Mãe Coruja Pernambucana de Exu)

Em grande parte dos casos, a situação de vulnerabilidade é tamanha que o

kit vem a suprir uma carência bastante acentuada, conforme pode ser obser-

vado na fala de uma usuária ao ser consultada sobre a importância do Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana em sua vida:

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Um olhar analítico |113

Assim, a importância, eu pensei que eu não ia ganhar, eu não ia ter nada assim,

sabe, pro meu filho. Mas, só que uma mãe coruja me ajudou, foi o primeiro kit, a

primeira coisinha que eu ganhei pro meu filho. (Usuária do Programa Mãe Coruja

Pernambucana de Iguaracy)

Para além da extrema vulnerabilidade e carência, o kit também permite que

aquelas mães cuja situação financeira é um pouco menos dramática possam

investir em outras necessidades, tanto suas quanto da criança.

É bom, eu usei tudo, usei bolsa, usei fralda, ganhei muita fralda. A banheira até

hoje eu tenho. A pomada é boa, é uma das melhores que tem (…). Ajuda a gente.

Foi importante porque na época eu tava com meu marido, ele tava desempregado e

aí a renda já ficou pouca. Aí esse kit já ajudou, eu não precisei comprar bolsa, não

precisei comprar banheira (...). Não precisei comprar, então ajudou muito. E muita

mãe aqui não tem renda fixa. E esse kit ajuda muito, porque já diminui o dinheiro.

O dinheiro de você ter que comprar a banheira, a bolsa, você já compra outra coisa.

(Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Ouricuri)

Uma das críticas atuais acerca do kit é de caráter bastante prático: os cons-

tantes atrasos na entrega do material para as mães. Em função do amplo con-

tingenciamento de recursos, agregado a outros trâmites burocráticos e institu-

cionais, a distribuição do material vem sofrendo com atrasos e escassez.

Discutidos, aqui, os principais achados da pesquisa de campo; no próximo

capítulo, serão registradas, sob a forma de síntese e conclusões, as observa-

ções da equipe avaliadora acerca das principais características do Programa

Mãe Coruja Pernambucana, seus resultados mais relevantes e desafios mais

significativos, atualmente e para o futuro.

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| Mãe Coruja Pernambucana114

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| Mãe Coruja Pernambucana116

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Um olhar analítico |117

Capítulo 5

Síntese e conclusões

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| Mãe Coruja Pernambucana118

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Um olhar analítico |119

O presente capítulo tem como intento retomar os principais achados da pes-

quisa em todas as suas etapas, discutindo e problematizando as questões

mais relevantes, identificando os desafios centrais, e apresentando su-

gestões para o futuro do Programa Mãe Coruja Pernambucana, a partir do

ponto de vista da equipe que conduziu a presente avaliação. Ao final, busca-se

explicitar a visão dos avaliadores sobre o programa.

5.1 Alguns pontos para discussão

Nesta seção, serão abordadas algumas questões que surgiram ao longo do

desenvolvimento da pesquisa de campo, de maneira transversal, nos discur-

sos dos distintos sujeitos entrevistados. Serão discutidas, aqui, algumas refle-

xões acerca de aspectos como o empoderamento das mulheres, as dinâmicas

de articulação do Programa Mãe Coruja Pernambucana frente aos municípios,

a assistência materno-infantil e o parto humanizado e, por fim, a qualificação

das equipes do programa.

a) Articulação do programa nos municípios

Neste tópico, será abordada a questão da articulação do Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana junto aos municípios previamente especificados. As uni-

dades de observação foram, mais especificamente, as profissionais dos Can-

tos Mãe Coruja e profissionais das áreas estratégicas associadas ao programa,

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| Mãe Coruja Pernambucana120

sendo: saúde, assistência social e educação. De maneira complementar, tam-

bém foram entrevistados atores parceiros identificados como relevantes nas

regiões, a exemplo da Ação Pastoral, do Núcleo de Saúde da Família e do Con-

selho Tutelar.

Apesar dos critérios metodológicos propostos para diferenciar os municí-

pios indicarem, em termos de indicadores de mortalidade infantil, possíveis

experiências mais bem-sucedidas (com maior queda na taxa de óbitos por

grupos de mil nascidos vivos), do ponto de vista dos elementos encontrados

na investigação qualitativa, essa distinção não pode ser categoricamente con-

firmada. Em outras palavras, as dinâmicas encontradas nos quatro municípios

analisados apresentam características semelhantes e, portanto, dificilmente

poderiam ser utilizadas como elementos explicativos para as diferenças nos

indicadores de mortalidade infantil.

• Articulações no Estado e nos municípios

Conforme indicado pelas profissionais dos Cantos Mãe Coruja, as articu-

lações com as secretarias estaduais são realizadas por meio das coordenações

regionais. Por outro lado, com as secretarias municipais essa aproximação é

mais estreita entre os Cantos e os gestores, sendo estes últimos muitas vezes

acessados diretamente pelo corpo técnico. De acordo com as dinâmicas obser-

vadas na pesquisa de campo, algumas coordenações desempenham um papel

bastante proativo nos processos de cooperação institucional, arregimentando

atores, planejando e monitorando as ações do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana no território, bem como articulando de forma mais intensa com o Es-

tado e os municípios. Quando o papel da coordenação regional é mais intenso,

os processos tendem a ser mais sinérgicos.

As parcerias com as prefeituras, de forma geral, tendem a ser muito restri-

tas à cessão de espaço e pessoal de apoio aos Cantos – recepcionistas e equipes

de manutenção – e o custeamento de despesas de água e luz. De acordo as

informações levantadas, entretanto, esse tipo de parceria nem sempre é ex-

clusiva ao programa ou mesmo adequada para o desempenho das atividades

previstas, tendo como problemas: casas pequenas e/ou compartilhadas; espa-

ços quentes e insalubres para mães e bebês; berçários inexistentes ou insufi-

cientes; pessoal de apoio com dupla função; entre outras questões.

A relação de articulação com o município se desenvolve de forma mais fre-

quente na relação com as secretarias municipais, especialmente aquelas li-

gadas às áreas de saúde, assistência social e educação. Conforme os relatos

coletados, via de regra, a relação com as áreas de saúde e assistência social

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Um olhar analítico |121

tendem a ser mais presentes e cooperativas; por outro lado, os órgãos locais

de educação tendem a ser referenciados de forma negativa, com pouco en-

volvimento e apoio ao Programa Mãe Coruja Pernambucana. Não obstante es-

sas fragilidades em nível municipal, na esfera administrativa estadual o apoio

tende a ser reconhecido, especialmente no que tange à Secretaria Estadual de

Educação que, dentro dos limites de recursos e possibilidades legais, contribui

com apoio técnico e material.

• Articulação com a saúde

As parcerias estabelecidas com a rede de saúde materno-infantil, mais

especialmente as unidades do PSF ou UBS, indicaram, de acordo com as en-

trevistas e observações, dinâmicas colaborativas entre as equipes. De ma-

neira geral, as opiniões proferidas entre vários dos profissionais ouvidos é a

de que a relação entre o Programa Mãe Coruja Pernambucana e as equipes

de saúde tende a ser potencialmente boa e profícua, visto que o programa

tende a desempenhar um papel de reforço e cobertura de visitas e encami-

nhamentos de mães vulneráveis, especialmente nas áreas rurais ou distritos

mais afastados do perímetro urbano – por vezes sem alcance de agentes co-

munitários de saúde.

Entre as percepções positivas acerca da articulação, foram citados, de

forma pontual, o movimento de troca de informações entre o Programa Mãe

Coruja Pernambucana e as equipes de saúde, a exemplo do compartilha-

mento dos dados das gestantes – como endereços cedidos pelo programa

ao PSF para a realização da busca ativa. Há, também, o deslocamento das

técnicas do programa aos equipamentos da rede de saúde em busca de in-

formações sobre aquelas mães que estão sob seu acompanhamento. Em

contrapartida, entre os bons exemplos de parceria, as profissionais de saú-

de informam às gestantes acerca do Programa Mãe Coruja Pernambucana,

desde a primeira consulta pré-natal, estabelecendo uma dinâmica de en-

caminhamento que permite às usuárias já chegarem aos Cantos Mãe Coruja

tendo conhecimento do programa.

Por outro lado, uma das fragilidades mais citadas nesse processo de arti-

culação refere-se ao fato de que muitos dos profissionais da rede de saúde – e

possivelmente a rede de saúde, de maneira geral –, não conhecem em pro-

fundidade o Programa Mãe Coruja Pernambucana. O exemplo que ilustra esse

tipo de dificuldade refere-se a um relatado desconhecimento, por parte das

equipes de saúde, acerca dos objetivos, protocolos, organização, ações, bem

como agendas de atividade do programa.

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| Mãe Coruja Pernambucana122

De acordo com as entrevistas realizadas na pesquisa de campo, as equipes

de saúde se queixam de não saber ao certo quais as atribuições das profissionais

dos Cantos, dificultando a articulação com o programa. Assim, falta comunica-

ção e informação sobre as atividades do Programa Mãe Coruja Pernambucana,

o que acaba por dificultar/inviabilizar o estímulo de uma forma conjunta de

atuação.

Isso posto, um dos aspectos observados acerca das dificuldades de articula-

ção diz respeito à formação de uma agenda conjunta entre as equipes de saúde

e do Programa Mãe Coruja Pernambucana, com especificações de protocolos,

procedimentos e responsabilidades compartilhadas. Um dos exemplos que

pode ser utilizado para ilustrar essa questão reside na expectativa dos profissio-

nais do PSF em obter informações sobre as atividades em curso no Programa

Mãe Coruja Pernambucana para, possivelmente, pensarem em atividades con-

catenadas, conforme indica a fala abaixo:

Eu não sei, porque assim, a gente sabe que elas fazem esses cuidados, que ela tem esse

acompanhamento, mas até então a gente não tem um cronograma das ações, que são desen-

volvidas lá. Por exemplo: Eu posso tá fazendo uma atividade educativa aqui com as minhas

gestantes, que pode tá sendo feito lá também e termina que a paciente não vai para os dois. E a

gente poderia se articular. (Profissional de saúde)

A articulação no tocante ao encaminhamento da gestante também surge

como um aspecto sob questionamento, uma vez que os processos de comuni-

cação não são vistos como bem estabelecidos. Dessa forma, quando questiona-

da se as usuárias encaminhadas pelo PSF realmente vão aos Cantos Mãe Coruja,

a profissional de saúde lança a seguinte questão:

Algumas a gente sabe que não vão, mas como tem a questão da busca ativa, pelas meninas

do Canto, aí acho que elas acabam indo. Mas o que eu sinto falta é que no cartão do pré-natal,

eu não tenho esse feedback, se elas estão realmente indo. (Profissional de saúde)

Para além do encaminhamento e da busca ativa – realizados pela área de

saúde e pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana –, uma demanda que des-

ponta frente a esses processos é um procedimento semelhante à referência e

contrarreferência. Tal movimento se define, na área de saúde, enquanto a arti-

culação entre os níveis primário, secundário e terciário caracteriza os fluxos de

encaminhamento dos usuários através dos diferentes níveis de complexidade.

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Um olhar analítico |123

No caso específico da relação entre o Programa Mãe Coruja Pernambucana e

a rede de saúde, não apenas a identificação da frequência e movimentação da

gestante ao longo do trânsito entre os equipamentos, mas também (e princi-

palmente) as notificações dos casos de gestações de risco – frequentemente

subnotificados.

É possível concluir, de acordo com as análises das entrevistas e das observa-

ções realizadas no campo, que um dos aspectos importantes para a construção

de um processo de articulação mais consistente está associado à aproximação

mais frequente (reuniões, atividades e alinhamento de agendas) e regular dos

planejamentos e a construção de um cronograma conjunto para as equipes.

• Articulação com a assistência social

No concernente à articulação com a área de assistência social, mais especi-

ficamente nos equipamentos dos Cras e Centro Especial de Referência em As-

sistência Social (Creas), esta surge de forma bastante regular.

Como é conhecido, o papel das equipes do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana desenvolve-se em uma estrutura especial, em uma área limítrofe entre

a saúde, a assistência social e a educação, por exemplo. Em função dessa ca-

racterística transversal, os mecanismos de articulação aplicados junto às áreas

previamente existentes e institucionalizadas podem convergir em uma pers-

pectiva mais consonante ou dissonante no que tange às práticas institucionais

já consolidadas. No caso específico da assistência social, os Cantos Mãe Coruja

são percebidos, de forma geral, enquanto pontos de apoio aos Cras e Creas. De

acordo com o que informou uma das entrevistadas, tanto as técnicas dos Can-

tos Mãe Coruja recorrem ao Cras, quanto o Cras recorre às técnicas, ilustrando

uma dinâmica de cooperação entre os equipamentos.

Porque a gente sabe que a equipe é pequena, não tem como um não dar a mão ao outro, né?

Trabalha em rede. Então, assim facilitou muito, né? (Profissional)

No mesmo sentido, essa perspectiva é corroborada pela fala de uma técnica

do Programa Mãe Coruja Pernambucana:

“É um trabalho de rede. Então nós temos o CRAS, por exemplo, eles têm um trabalho itineran-

te que eles realizam nas comunidades. Então, nesse trabalho é envolvido todo mundo. Todas as

secretarias, todas as ações o Mãe Coruja sempre está presente. Quando vêm ações para o CRAS,

eles sempre disponibilizam vagas para as mulheres do Mãe Coruja . E nas festas a gente sempre

tá se juntando para que haja esse vínculo na comunidade (Profissional do Canto Mãe Coruja)

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| Mãe Coruja Pernambucana124

Nesse processo de cooperação, a estrutura de deslocamento dos Cras se

apresenta como um recurso estratégico para as técnicas do Programa Mãe

Coruja Pernambucana. A indisponibilidade de um carro exclusivo para o

programa é recorrentemente vista como uma grande fragilidade, uma vez

que as equipes encontram grande dificuldade de transporte para áreas rurais

e distritos mais afastados do perímetro urbano, reduzindo significativamen-

te sua capacidade de acompanhamento e a amplitude das visitas técnicas.

Nesse sentido, conforme observado em campo, a articulação com o Cras

permite que as técnicas do Programa Mãe Coruja Pernambucana compar-

tilhem o veículo da assistência social, ficando, entretanto, sujeitas à agenda

do outro órgão.

Também surgiram outros aspectos críticos no que se refere à cooperação

entre o programa e a assistência social. Ao que foi relatado em entrevistas, em

algumas localidades, parece estar ocorrendo uma fragilização das relações

entre o Programa Mãe Coruja Pernambucana e o Cras, o que se traduz em

um afastamento paulatino entre o programa e a assistência social. De acordo

com as informações coletadas, as mudanças nas equipes do programa aca-

baram contribuindo para um crescente afastamento dos equipamentos, visto

que os novos profissionais não apresentavam o mesmo grau de envolvimento

na interlocução entre o Cras/Creas e os Cantos Mãe Coruja.

• Articulação com a educação

De maneira geral, as Secretarias de Saúde e de Assistência Social dos mu-

nicípios investigados apresentaram-se bastante presentes e cooperativas

com o Programa Mãe Coruja Pernambucana. Por outro lado, as Secretarias de

Educação dos municípios despontam como ponto convergente no que tan-

ge às dificuldades de articulação e cooperação. De acordo com as entrevis-

tas e observações realizadas na pesquisa de campo, o apoio das Secretarias

Municipais de Educação é baixo, com pouco alinhamento aos objetivos do

Programa Mãe Coruja Pernambucana, escassez de material de apoio didático

(cartilhas, apostilas, livros, por exemplo) e estrutura de apoio aos Círculos

de Educação e Cultura. Entre os quatro municípios pesquisados, apenas um,

por meio da Secretaria de Educação, disponibiliza, ao mesmo tempo, espa-

ço físico, material pedagógico e lanches para as usuárias. Este último ponto

surge como um elemento muito importante, visto que se torna muito des-

gastante para as usuárias do programa permanecerem por mais de quatro

ou cinco horas em uma atividade pedagógica sem alimentação – e, muitas

vezes, acompanhadas por seus filhos.

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Um olhar analítico |125

As meninas dizem que eu tenho a língua grande. É porque é saúde, educação e

assistência social, as que mais ajudam. Só que como a nossa [atividade] é edu-

cação, a gente poderia ter uma ajuda maior da Secretaria de Educação. E nossa

ajuda não é da Secretaria de Educação, é de saúde. A saúde [dá] tudo que a gente

precisa, se a gente precisar de um birô, de uma cadeira, de transporte pra ir pras

reuniões (...), dos eventos. Tudo que a gente precisa, só quem auxilia a gente é a

saúde. Pouquíssimo a educação. (Profissional de educação atuante no Círculo de

Educação e Cultura)

Conforme pode ser visto na fala anterior, não é incomum que a os apoios

venham mais amplamente das Secretarias de Saúde dos municípios do que

daquelas da área de educação. Entre outras coisas, esse exemplo também

serve para ilustrar uma percepção bastante difundida entre diferentes esfe-

ras da administração pública de que o Programa Mãe Coruja Pernambucana

é um programa da saúde. Nesse sentido, se a aproximação com os protocolos

e atividades da assistência social é mais estreita, com a área mais específica

da educação isso parece não ocorrer da mesma maneira.

Com a saúde eles dão total apoio, a gente consegue trabalhar muito em parce-

ria. Assistência social também, a gente tem uma boa comunicação, com o bolsa

família com o CRAS e com a própria assistência (...) Eu acho que nossa parceria

deveria se fortalecer mais com a secretaria de educação, a gente tem um pouco de

entrave de trabalhar junto com a educação. A gente ainda precisa quebrar mais

algumas barreiras. (Profissional do Canto Mãe Coruja)

Ao ser questionada sobre os motivos dessas barreiras, a entrevistada

responde:

Eu não sei dizer bem o motivo. Mas não consegue ter um diálogo, agora assim…

eu não vejo nenhum motivo específico pra isso.

De forma complementar à entrevista citada, utilizando as palavras de uma

outra entrevistada, de uma região distinta da primeira, ao ser indagada acer-

ca da articulação com a Secretaria Municipal de Educação de sua localidade:

Não houve [articulação] e eu falei diretamente com a secretaria [de educa-

ção]. Foi uma coisa mínima em que eu fui pedir e ele disse que não tava tendo

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| Mãe Coruja Pernambucana126

verba pra fazer a solicitação. (…) E eu fui a secretaria de saúde e ela só me deu

a notinha e eu fui atrás. Que era justamente para a gente fazer a festa de Dia

das Mães. (…)

Eu pedi três bolos só ao secretário (de educação) e ele disse que não podia. Aí

eu também não fui mais atrás porque E. (coordenadora pedagógica) disse ‘Não

é a primeira vez. Toda vez que a gente vai atrás pra ver alguma coisa, se eles

disponibilizam de material, alguma coisa que seja, a gente nunca consegue. Eles

sempre dizem que não podem’. Aí, a gente não foi mais. Enfiou a cara e fez o que

pôde. E o que a secretária (de saúde) deu a gente. (…) foi em maio.

De lá pra cá a gente não teve mais nada que fosse atrás dele (secretário de edu-

cação). Mas eu tinha até falado pra ver se não conseguia cadernos, essas ma-

teriais assim, lápis porque é coisa que vem pro município. Mas o menino disse

´Eu vou ver o que eu consigo, e eu te dou um retorno’. E o retorno… (…) E eu tô

aguardando três meses praticamente e nada. (Profissional do Canto Mãe Coruja)

Ainda recorrendo aos relatos do campo, a aquisição de materiais e equi-

pamentos para as atividades dos Círculos de Educação e Cultura, quando

não promovida por outras secretarias municipais como Saúde e Assistência

Social, ocorre com o apoio da Secretaria Estadual de Educação ou, como fre-

quentemente indicado nas entrevistas, pela compra com recursos das pró-

prias profissionais, o que, corretamente, é criticado.

É um programa muito bom, mas assim que. Eu acho que a gente precisava mais

de reforço, a gente precisa porque muita coisa a gente trabalha, compra, tira do

bolso, né. E assim são famílias carentes que precisam de ajuda. (Profissional da

educação atuante no Círculo de Educação e Cultura)

Quando a gente compra [lanche] é do nosso bolso (…). Quando tem um chá de

fraldas, a gente tem que fazer um agrado a elas, também para cativar. Aí a gen-

te faz um bolo tudo por nossa conta, e leva pra elas e também lembrancinhas.

(Profissional da educação atuante no Círculo de Educação e Cultura)

Esses depoimentos revelam, pois, essa fragilidade, que é fruto tanto da

pouca articulação, quanto da falta de insumos e de estrutura adequada para

a realização das atividades dos Círculos de Educação e Cultura, corroborando

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Um olhar analítico |127

as falas das profissionais dos Cantos Mãe Coruja acerca das dificuldades que

encontram para a execução das atividades do dia a dia.

• Outros parceiros e o envolvimento da comunidade

Também foram entrevistados representantes de entidades e órgãos par-

ceiros, tais como a Pastoral da Criança (Exu), o Conselho Tutelar (Exu), o

Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Ouricuri), Organismos de Políticas para

Mulheres (OPM – Condado) e IPA (Iguaracy). No caso da Pastoral, a arti-

culação surge como consistente e positiva, especialmente no que concerne

aos cuidados com a questão nutricional, pesagem e estímulo no acompanha-

mento das palestras sobre o cuidado. Já a articulação com o Conselho Tutelar,

por exemplo, foi avaliada como praticamente inexistente, restrita a poucas

palestras. No caso do OPM consultado, a aproximação foi considerada exis-

tente e colaborativa sempre que necessária, mas sua qualificação foi pouco

desenvolvida pela entrevistada.

O IPA, por sua vez, possui uma trajetória mais consolidada junto ao Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana, pois constroem cronogramas e desenvolvem

atividades em conjunto. Entre as ações compartilhadas, foram citados o Pro-

grama de Aquisição de Alimentos (PAA), que compra alimentos dos agriculto-

res e faz doação para diversas entidades, também beneficiando as usuárias do

Programa Mãe Coruja Pernambucana e ações voltadas à questão da segurança

alimentar e nutricional.

O envolvimento da comunidade é apontado especialmente na realização

de festas e eventos, por exemplo, como é o caso da participação dos comer-

ciantes na festa de São João. Ainda no tocante às articulações com entidades ou

grupos específicos, existe a referência de cessão de espaços por igrejas para a

realização dos Círculos de Educação e Cultura, bem como a aproximação com

associações de moradores. De maneira geral, também foi apontado que existe

certo desconhecimento acerca do Programa Mãe Coruja Pernambucana por

parte da comunidade, em alguns municípios, e por potenciais parceiros.

b) Empoderamento das mulheres

Uma das questões levantadas como ponto forte do Programa Mãe Coruja

Pernambucana – tanto por atores entrevistados (coordenação do programa,

coordenadoras regionais, entre outros), quanto pelas profissionais dos Can-

tos Mãe Coruja – é o que diz respeito ao empoderamento das mulheres por

meio das ações do programa. Aliado a isso, o programa tem como um dos seus

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| Mãe Coruja Pernambucana128

pilares o reconhecimento dos direitos das mulheres, buscando, entre outras

coisas, estimular o pleno exercício de sua cidadania por meio da consolidação

dos seus direitos sociais. Por esses motivos, faz-se necessária uma discussão

mais cuidadosa acerca do que significa a ideia de “empoderamento”, assim

como uma análise de como essa categoria pode ser aplicada nesses contextos

específicos.

A noção de “empoderamento” (empowerment) relaciona-se à ideia de trans-

formação de um sujeito em agente ativo, por meio de processos diversos que

podem variar conforme os contextos em que estão inseridos. De acordo com a

Organização Mundial da Saúde24, o conceito de “empoderamento” é definido

como um processo social, cultural, psicológico ou político por meio do qual in-

divíduos e grupos sociais tornam-se capazes de expressar suas necessidades,

explicitar suas preocupações, desenvolver estratégias para o envolvimento em

tomadas de decisões, bem como atuar política, social e culturalmente com

vistas a satisfazer suas necessidades, acarretando em um maior controle sobre

suas vidas. Outras definições relacionam o empoderamento com a questão da

equidade, uma vez que, por intermédio dele, é possível chegar a um equilíbrio

no que se refere às relações de poder em favor dos que possuem menos recur-

sos, ou, ainda, com processos de resgate da autoconfiança e autoafirmação,

tendo como foco a melhoria das condições de vida.25

Quando partimos para a questão específica do empoderamento de mulhe-

res, tem-se, em linhas gerais, o fortalecimento dos atores sociais levando-se

em conta as desigualdades de gênero, partindo-se da compreensão de que es-

sas desigualdades não se restringem à precariedade de recursos, mas também

englobam a falta de oportunidades sociais, políticas e econômicas, exigindo

a expansão das capacidades humanas e das liberdades reais.26 O processo de

empoderamento das mulheres passa, portanto, não só pelo maior acesso a re-

cursos, mas também pela garantia da autonomia em seus vários níveis, isto é,

autonomia econômica, autonomia frente aos processos de tomada de decisão

em várias esferas – inclusive a familiar, autonomia sobre seu próprio corpo e

sobre sua sexualidade, entre outros.

24 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Glossary of health promotion terms. Geneva: World Health Organization/Division of Health Promotion, Educations and Communications/Health Education and Health Promotion Unit, 1998.25 MOREIRA, Nathalia Carvalho et al. Empoderamento das mulheres beneficiárias do Programa Bolsa Família na percepção dos agentes dos Centros de Referência de Assistência Social. Rev. Adm. Pública. Rio de Janeiro, v. 46, n. 2, p. 403-423, 2012.26 MAGESTE, G. S. et al. Empoderamento de Mulheres: uma proposta de análise para organiza-ções. In: V Encontro de Estudos Organizacionais da Associação Nacional de Pós-Graduação em Administração. Anais... Belo Horizonte, 2008.

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Um olhar analítico |129

Desse modo, frente a essa breve discussão acerca do termo, compreen-

de-se que o conceito de empoderamento aplicado à realidade ora investi-

gada deve ser visto de forma cuidadosa. É importante destacar que, episte-

mologicamente, o conceito formal é um tipo ideal e, portanto, se aplica de

diferentes maneiras, de acordo com as diferentes realidades. Sendo assim,

considera-se que a pesquisa de campo detectou, especialmente por meio dos

Círculos de Educação e Cultura, movimentos que promovem autonomia e

acesso ao conhecimento, assim como propiciam a criação de redes de intera-

ção e vínculos entre usuárias. Esses movimentos podem ser compreendidos

como espaços de socialização continuada constituindo, pois, requisitos cen-

trais do processo de empoderamento.

Se compreendermos o fenômeno de forma não necessariamente linear ou

rígida, é possível que processos distintos de empoderamento estejam em cur-

so; processos que precisam ser analisados à luz de suas especificidades, situa-

ções e contextos. Assim, o maior acesso à informação propiciado a essas mu-

lheres, aliado ao simples fato de elas terem suas vozes ouvidas e valorizadas

pode, em certa medida, proporcionar-lhes um sentimento de empoderamen-

to. As formas de vida, as práticas de transmissão de conhecimento tradicional

e de se relacionar dessas mulheres, localizadas em contextos de profunda vul-

nerabilidade social (sobretudo no meio rural), implicam na necessidade de um

olhar mais flexível sobre como se adquire autonomia.

Os discursos coletados e explicitados vão nesse sentido, mostrando que as

próprias usuárias identificam que o Programa Mãe Coruja Pernambucana im-

pactou positivamente suas vidas, destacando como principais efeitos o acesso

a novas informações, o aprendizado em diferentes searas, a criação e o forta-

lecimento de vínculos interpessoais em diferentes esferas, a participação em

grupos extrafamiliares, bem como o resgate da autoestima e construção da

autoconfiança, além da maior compreensão acerca dos seus direitos. Tais fato-

res caracterizam-se, pois, como aspectos de processos de empoderamento de

diferentes níveis ou dimensões, como o individual/psicológico, o sociocultural

e o familiar/interpessoal.

Os relatos coletados nas entrevistas trazem vários elementos relacionados

ao bem-estar psicológico dessas mulheres. Assim, na percepção de algumas

delas, o Programa Mãe Coruja Pernambucana e, sobretudo, a participação nos

Círculos de Educação e Cultura, proporcionou-lhes conhecimento, satisfação,

valorização e autoconfiança, acarretando em mudanças em suas vidas, con-

forme pode ser observado em alguns trechos transcritos a seguir.

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| Mãe Coruja Pernambucana130

É, eu era uma mulher que vivia dentro de casa, bem dizer trancada 24 horas só em

serviço, não tinha capacidade de sair, né, conversar com as meninas nada. (Usuária

do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Condado)

Mudou. Como eu já disse, nunca tinha visto essas coisas aqui, nunca tive. Aí agora

apareceu. Principalmente pras mães carentes também, né? Me senti valorizada, que

antes ninguém olhava, principalmente pras mães. (Usuária do Programa Mãe Coruja

Pernambucana de Iguaracy)

Mudou, mudou bastante que eu era mais vergonhosa, só vivia pelos cantos, aí tem

hora que a professora chama a gente pra frente, aí a gente vai se soltando. (Usuária do

Programa Mãe Coruja Pernambucana de Exu)

Assim, o que ele [o Programa Mãe Coruja Pernambucana] trouxe de bom foi através

desse estudo pra ensinar a gente, porque eu quero aprender mais...a gente estudando

tem que ter um futuro melhor pra frente, né? (Usuária do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana de Condado)

A partir dessas falas, é possível perceber os efeitos não materiais advindos

da participação no Programa Mãe Coruja Pernambucana. Mesmo que seu de-

senvolvimento, em um primeiro momento e nesses contextos específicos, não

esteja pari passu com o tipo ideal, dinâmicas de empoderamento real podem ser

observadas na vida das usuárias, ainda que em um nível mais embrionário e não

atingindo todas as dimensões necessárias. A articulação com outras atividades

educacionais e produtivas que gerem oportunidades de emprego formal e não

apenas os chamados “bicos”, pode funcionar como um recurso importante para

o alcance da autonomia econômica por parte delas, consolidando ainda mais

esse processo.

Depois que eu entrei mudou. Assim, porque esses trabalhos que a gente faz aqui, a gente

aprende muito aqui, né, e a gente ganha, faz sofázinho, a gente vende. Teve uns fanto-

ches que eu fiz, pequenininho, pra aniversário, então já é uma ajuda, né? Dá liberdade,

porque antes eu dependia muito de marido, eu dependia dele, mas não vou depender

mais de homem não. (Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Condado)

Cabe salientar que, de forma convergente com as críticas lançadas pelos

especialistas externos entrevistados, acerca do papel lateral da mulher no

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Um olhar analítico |131

Programa Mãe Coruja Pernambucana, é possível que, uma vez que seja dada

maior ênfase às questões de gênero, trazendo para a discussão temas rele-

vantes para as mulheres, além dos cuidados com a gestação, essa dinâmica

de empoderamento seja fortalecida e se aproxime mais da estrutura concei-

tual formal proposta pelos estudos feministas. De acordo com a percepção de

algumas usuárias, o programa foca no bebê e acaba deixando-as um pouco

de lado, resultando em um sentimento de “esquecimento” da mulher, con-

forme pode ser visto na fala a seguir, na qual uma usuária expressa sentir

falta de algo voltado para a mulher de maneira geral, cobrando mais palestras

e atividades com especialistas nesse tema.

Por exemplo, a saúde da mulher, porque a gente debate tanto das crianças da

gente. Às vezes a gente tá num assunto e foge pro outro. Então, acho que a ques-

tão da mulher mesmo, de doenças. Prevenção, por exemplo. (...) Prevenção, mui-

ta mulher aqui não faz, com medo. Eu mesmo nunca fiz uma prevenção. (...)

No módulo mulher a gente conversava, mas seria mais bom com o profissional

mesmo, da área pra explicar. (...) Porque muita gente não sabe nem o que é pre-

venção. (...) A criança a gente aprende aqui, aprende no postinho, todo mundo

sabe, agora a questão da mulher é mais esquecida. A questão da gente é mais

esquecida. Pelas coisas que a gente tem em casa, a gente vive mais pros filhos

do que pra gente. Eu acho que seria muito interessante a questão da mulher, da

saúde da mulher. Porque no postinho eles dá palestra sobre aleitamento materno,

parto, essas coisas, mas esquece mais um pouco da gente. Até a gente mesmo

acaba esquecendo. No dia a dia da gente, a agente acaba esquecendo da gente.

(Usuária do Programa Mãe Coruja Pernambucana de Ouricuri)

A partir das visitas aos Cantos Mãe Coruja, pôde ser observado que, após

o nascimento, as informações coletadas pelas profissionais são apenas em

relação à criança. Não há, por exemplo, um formulário sobre a saúde da mu-

lher a ser preenchido após o parto, mas apenas o formulário de gestante e o

do bebê, corroborando a percepção da usuária. Essa dinâmica pode se revelar

problemática, uma vez que deixa a mulher em segundo plano e compromete

a consolidação dos processos de empoderamento em curso. Além disso, o

cuidado com a saúde da mulher antes, durante, e após o parto27 é essencial,

inclusive porque, muitas vezes, cabe a ela o lugar de “cuidadora” da família,

em detrimento da sua própria saúde.

27 Inclusive para prevenir e tratar casos de depressão pós-parto.

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| Mãe Coruja Pernambucana132

Os processos de empoderamento, na perspectiva de gênero, emergem

como um tema de extrema importância no campo das políticas públicas, com

vistas a superar dinâmicas de desigualdade fortemente estabelecidas e modi-

ficar as condições de vida das mulheres. Sendo assim, o Programa Mãe Coruja

Pernambucana, tendo a mulher como usuária e como um de seus objetivos o

reconhecimento e promoção dos seus direitos, deve atentar para a necessidade

de atuar de forma mais contundente no sentido de promover o alcance pleno

desse processo, superando, inclusive, a visão preestabelecida que essencializa

a maternidade como papel central das mulheres pobres, restringindo, assim,

suas potencialidades e capacidades de atuação.

Rede de assistência materno-infantil e humanização do parto

Presente de maneira transversal nos discursos dos diferentes perfis de

atores entrevistados está a precariedade da rede hospitalar e da assistência

ao parto, constituindo um entrave fulcral para a efetividade das ações do

Programa Mãe Coruja Pernambucana e para o alcance dos seus objetivos.

Dentre as ações do Programa Mãe Coruja Pernambucana, prevista na

Lei 13.959, de 15 de dezembro de 2009, está a realização do parto humani-

zado entre as mulheres cadastradas. No entanto, a partir das escutas reali-

zadas com diferentes atores ligados ao programa, observou-se que não há

um consenso sobre o que seria, de fato, esse parto humanizado que o PMC

se propõe a promover, o que coloca o questionamento sobre o cumpri-

mento dessa ação. Além disso, entre as usuárias entrevistadas, nenhuma

demonstrou familiaridade com o termo, tampouco relatou ter vivenciado

esse tipo de parto. Dessa forma, cabe, aqui, fazer uma discussão mais de-

talhada acerca desse ponto em específico.

A humanização na assistência ao parto ou o parto humanizado é um ter-

mo que encontra diferentes versões e interpretações, sendo utilizado há

muitas décadas com sentidos os mais diversos, que vão desde a perspec-

tiva do alívio das dores do parto por meio de analgesia e outras tecnolo-

gias, passando pelas propostas de humanização de hospitais e da relação

médico-parturiente, chegando até à associação ao parto natural, livre de

intervenções.28

28 DINIZ, Carmen Simone Grilo. Humanização da assistência ao parto no Brasil: os muitos sen-tidos de um movimento. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 10, n. 3, p. 627-637, set. 2005.

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Um olhar analítico |133

Atualmente, o movimento pela humanização do parto e do nascimento

caminha no sentido de garantir à mulher o direito de atuar como protago-

nista de sua experiência de parturição, podendo decidir sobre a forma como

irá dar à luz, a posição que julga mais adequada, o uso de analgesia, o local e

a presença de acompanhante, por exemplo. Mais que se relacionar com um

tipo de parto específico, a humanização da assistência ao parto refere-se

ao tratamento individualizado das mulheres, estabelecendo relações me-

nos desiguais e autoritárias entre os profissionais de saúde e as parturientes,

evitando intervenções desnecessárias e preservando a privacidade e a auto-

nomia das mulheres.

Assim, o movimento pela humanização do parto propõe uma nova forma

de assistência, baseada na transmissão horizontal do conhecimento, para que

a paciente deixe de ser vista como um sujeito passivo por não compartilhar

do conhecimento especializado. Nesse sentido, as informações sobre pré-na-

tal, parto e puerpério tornam-se de fundamental importância, uma vez que

possibilitam às mulheres o conhecimento sobre seu corpo para, assim, assu-

mirem o papel de protagonistas desse momento.

De acordo com alguns relatos das profissionais dos Cantos Mãe Coruja,

a difusão de informações por parte do Programa Mãe Coruja Pernambucana

ajudaria a desempenhar esse papel, visto que as mune de informações para

agirem como sujeitos ativos nessa relação médico-paciente, de forma a mini-

mizar as assimetrias e a sujeição da parturiente em relação à figura do obste-

tra. No entanto, a partir das visitas a campo, pode-se perceber que, se por um

lado existe o compartilhamento de informações com as usuárias, por outro,

elas esbarram nas fragilidades da rede de saúde materno-infantil, que não

consegue garantir a autonomia de decisão para essas mulheres, comprome-

tendo, assim, o processo de humanização.

[O parto] humanizado assim, na concepção, é tanto o cesáreo como o normal. É

a escolha da mulher do tipo de parto e como ela quer ter seu filho. Então, assim,

elas têm aqui normal, se quiser ter normal. E algumas de alto risco vão ter que ser

encaminhadas pro Recife. Mas eu acho que não existe uma escolha muito grande

não. Por mais que a gente fale, não depende só da gente, depende dos órgãos de

saúde. Não tem muita escolha pra elas não, a não ser que elas queiram ter normal

e ter no município, aí consegue ter essa liberdade, mas quando é por cesáreo, elas

não têm, porque aí vão chocar com os hospitais de grande porte, acompanhante,

não ser na própria cidade. (Profissional do Canto Mãe Coruja)

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| Mãe Coruja Pernambucana134

Na realidade o parto em si é uma questão que preocupa a gente, porque assim,

a mãe faz o pré-natal certinho, mas vem aquela insegurança do parto. A gente

teve dois casos aqui que a mulher teve no trânsito. Vai pro regional...quan-

do chega no regional não tem quem atender, aí essa mulher já tá com alguns

centímetros de dilatação, aí onde tiver vaga a mulher vai e pare. A rede, em si,

não dá uma segurança ao parto humanizado. Hoje a mulher em si, a partir da

UBS e do Mãe Coruja, a gente empodera essa mulher dos conhecimentos e da

informação, só que a gente sabe que a questão do parto e da assistência, a gente

precisa melhorar e muito. (Profissional de Canto Mãe Coruja)

As fragilidades da rede de saúde materno-infantil têm um amplo reba-

timento nas atividades do Programa Mãe Coruja Pernambucana, e consti-

tuem-se como um forte entrave para o desenvolvimento de suas ações e o

alcance de suas metas, visto que não há garantias acerca da qualidade do

atendimento e de uma assistência ao parto humanizada e satisfatória, o que

acarreta, muitas vezes, na peregrinação dessas mulheres em vários hospi-

tais no momento de parir. Em conversa com as usuárias participantes de um

dos Círculos de Educação e Cultura, várias delas relataram as dificuldades e

complicações na hora do parto, como a peregrinação nos hospitais, a falta de

leitos, a demora e a má qualidade no atendimento – com relatos, inclusive,

de humilhações sofridas por parte de médicos. Assim, algumas delas dizem

que decidem, quando podem e conseguem ajuda, pagar pela cesariana com

medo das dificuldades e intercorrências.

Outro ponto importante é o que se refere à questão da mortalidade ma-

terna, que segue pouco problematizada. A inconsistência dos indicadores,

aliada à precariedade da rede e à falta de uma assistência de qualidade ao

parto, torna essa uma questão que permanece não solucionada. A saída

apontada, aqui, seria um foco maior na atenção ao parto como desdobra-

mento das atividades do Programa Mãe Coruja Pernambucana, uma vez que

o acompanhamento apenas do pré-natal não é suficiente para prevenir e

evitar os óbitos maternos. O diálogo e a articulação com a Rede Cegonha

poderiam, nesse sentido, serem iniciativas profícuas.

A humanização do parto caminha, também, no sentido de modificar o

modelo atual de assistência, buscando, cada vez mais, romper com a lógica

do atendimento em série, repleto de intervenções desnecessárias e casos de

violência obstétrica e institucional, tendo um impacto direto nos índices de

mortalidade materna. Nesse sentido, o fortalecimento dos espaços de troca

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Um olhar analítico |135

e disseminação de informações sobre a fisiologia do parto, os riscos envol-

vidos, as intervenções necessárias e os cuidados com a parturiente são de

fundamental importância, por isso sugere-se a capacitação continuada das

profissionais dos Cantos Mãe Coruja e das educadoras dos Círculos de Edu-

cação e Cultura acerca dessas temáticas específicas.

c) Qualiicação continuada das técnicas e educadoras

Um dos pontos que merece certo destaque, entre os achados da pesquisa

de campo, diz respeito à demanda por um processo de capacitação conti-

nuada, tanto para as técnicas dos Cantos Mãe Coruja, quanto para as educa-

doras dos Círculos de Educação e Cultura. Esse movimento de qualificação

das profissionais parte desde o domínio de informações mais gerais acerca

dos objetivos e procedimentos do Programa Mãe Coruja Pernambucana, até

conhecimentos, técnicas e práticas mais específicas das áreas de saúde, edu-

cação e assistência social.

De acordo com as verificações feitas ao longo da observação sistemáti-

ca, foi percebido que existem fragilidades nos procedimentos desenvolvi-

dos pelas técnicas do Programa Mãe Coruja Pernambucana que poderiam

ser revertidas por meio de processos de qualificação e protocolos, a exemplo

do preenchimento de formulários de acompanhamento das gestantes. Con-

forme observado e averiguado na investigação, é relativamente comum que

a técnica mais antiga ensine a mais nova sobre os formulários, indicando a

forma “padronizada” de preencher determinados campos – com vários ter-

mos específicos da área de saúde –, mas sem o amparo de protocolos ou qua-

lificações consistentes.

No mesmo sentido, a fragilidade nos processos de formação e qualificação

continuada das equipes também converge no âmbito das articulações, dado

que existe uma ampla crítica acerca do desconhecimento dos objetivos, pro-

cedimentos e atuação do Programa Mãe Coruja Pernambucana (em diferen-

tes níveis de gestão, esferas administrativas e na população), transparecen-

do, assim, a pouca divulgação das diretrizes do programa por parte da equipe

técnica. Apesar dos esforços da gestão estadual nesse sentido, a demanda

– direta ou indiretamente – por qualificação continuada se destaca.

Desdobrando essa questão para um nível maior de detalhamento, à luz

do contexto atual e do conjunto de demandas que se apresentam em nível

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| Mãe Coruja Pernambucana136

estadual, uma solicitação que se destaca é aquela voltada para qualificações

específicas em assuntos como: crianças com deficiência, autismo, síndrome

de Down e microcefalia. De acordo com a investigação, especialmente as téc-

nicas que não são da área de saúde sentem necessidade de maiores informa-

ções acerca dessas questões, bem como, de forma mais geral, existe demanda

pela realização de cursos como o de Atenção Integrada às Doenças Prevalentes

na Infância para as profissionais dos Cantos Mãe Coruja. Na fala a seguir, ao ser

questionada sobre o que o Programa Mãe Coruja Pernambucana poderia fazer

melhor, a profissional responde:

Tá trazendo mais cursos mais coisas pra gente, (…) técnicas. (…) Pra gente tá ven-

do questão de autismo, a síndrome de down, pra tá fazendo inclusão, essas coisas

assim. A microcefalia também. Chegou de repente e a gente foi tendo que lidar

com essa situação, e foi pra todo mundo uma surpresa. Mas essa questão de tá

trazendo mais informação pra gente. (…) Porque não são todos os técnicos [que

são] da área da saúde, como eu, sou professora e entrei na saúde. (Profissional

do Canto Mãe Coruja)

Entre as educadoras dos Círculos de Educação e Cultura, a questão da quali-

ficação também desponta como um ponto sensível. Muitas foram as problema-

tizações e os conflitos advindos da dissonância entre a concepção pedagógica

original pensada para os círculos e as práticas educacionais adotadas por parte

das profissionais responsáveis por sua realização.

As entrevistas realizadas na pesquisa de campo relataram que parte das

profissionais dos Círculos de Educação e Cultura pensavam as atividades como

“aulas normais” de matemática e português, em uma dinâmica de alfabetiza-

ção. Contudo, ao ingressarem no Programa Mãe Coruja Pernambucana, perce-

beram que as práticas pedagógicas incluíam o desenvolvimento social, a saúde

da mulher e da criança. Não obstante tais dificuldades iniciais, também foram

relatadas práticas educativas derivadas de elementos do cotidiano da usuária,

como o letramento a partir da certidão de nascimento e a matemática com base

nas datas de nascimento dos familiares. Na fala a seguir, é possível observar

que as dinâmicas educacionais precisam ser mais flexíveis e menos escolar/

disciplinar, dadas a concepção dos círculos e a realidade social das usuárias:

Então, assim, pra mim foi bem assim é...desafiador. Que eu tive que trabalhar

aqueles temas, também trabalhar a parte do letramento, que elas a maioria, e

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Um olhar analítico |137

já por conta disso mesmo, abandonaram a escola depois que engravidaram,

elas tinham muita dificuldade em ler um texto, interpretar. Aí assim, eu tive

que trabalhar aquele tema, deixar alguma mensagem pra elas, uma mensagem

que fosse edificante, que mudasse a sua vida e, ao mesmo tempo, trabalhar a

questão do letramento mesmo, da alfabetização. (Profissional de educação de

Círculo de Educação e Cultura)

De maneira complementar a essa fala, outra profissional, ao ser questio-

nada se ela e outras envolvidas nos Círculos de Educação e Cultura haviam

passado por algum tipo de qualificação com uma abordagem mais específi-

ca para as usuárias do Programa Mãe Coruja Pernambucana responde:

Não. A gente busca as informações. (…) Seria interessante. (…) Tanto que uma

das nossas colegas colocou para Alessandra que era bom se tivesse um encon-

tro pra gente pra questão da gente tá incluindo essas crianças, na questão so-

cial das crianças com síndrome de down, as crianças especiais pra tá fazendo

a inclusão delas no nosso meio social, pra gente poder entender mais o que a

gente fazer, como a gente trabalhar. (…) Aí ela pediu que tivesse um encontro

da gente lá em Recife, que seria bom. (Profissional de educação de Círculo de

Educação e Cultura)

Aliada a isso, desponta a necessidade de ampliar o leque de temas a

serem abordados nos círculos. Os relatos das usuárias entrevistadas e a

observação sistemática realizada indicam a necessidade de discutir temas

relacionados às realidades e vivências das usuárias do programa, como

questões de gênero, tais como violência doméstica e outras violências

contra a mulher; questões de raça/cor – uma usuária relatou, por exem-

plo, que a filha era vítima de racismo, por conta de seu cabelo –; discus-

sões sobre a prevenção e o combate às drogas; sobre economia doméstica,

entre outros.

Considerando que os Círculos de Educação e Cultura se revelaram como

tendo um impacto central na vida das usuárias, funcionando, inclusive,

como uma ferramenta significativa para o seu empoderamento, abordar

questões como essas é de fundamental importância para a consolidação

desse processo. Nesse sentido, ressalta-se a necessidade de qualificação

continuada das educadoras dos círculos e profissionais dos Cantos para tra-

balhar com temas dessa relevância.

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| Mãe Coruja Pernambucana138

5.2 Considerações finais e sugestões dos avaliadores

a) Sobre o contexto e as principais características do programa

Desde 2007 até 2013, e com menos intensidade em 2014, Pernambuco e

o Brasil, a despeito dos efeitos da crise global de 2008, experimentaram um

período em que conviveram crescimento econômico e prosperidade social.

Particularmente em Pernambuco, o dinamismo da economia permitiu fortes

ganhos de arrecadação ao governo, que financiou novos programas de desen-

volvimento e inclusão social, entre os quais se situa o Programa Mãe Coruja

Pernambucana. O ambiente econômico nacional e estadual, no entanto, mu-

dou muito após 2015. A desaceleração rápida da economia e a queda da receita

pública em ritmo superior ao do Produto Interno Bruto (PIB) criou um novo

contexto no qual manter ou ampliar a prioridade a políticas sociais como o

Programa Mãe Coruja Pernambucana se torna mais desafiador.

Cabe destacar que, em Pernambuco, tal prioridade foi mantida em meio a

iniciativas de ajuste dos gastos públicos. Assim é que, em 2016, foram desti-

nados ao programa, na programação financeira do Estado, 24.540.945,50 de

reais; e foram efetivamente liquidados 22.754.367,30 de reais, ou seja, 93% do

previsto, o que manteve as prioridades principais do programa, que atendeu,

naquele ano, 20.990 gestantes e 88.258 crianças (de 0 a 5 anos).

No contexto no qual o Programa Mãe Coruja Pernambucana foi concebi-

do, o IDH construído com base nos dados dos Censos de 2000 e 2010, tanto

no país quanto em Pernambuco, indicavam avanços que se estabilizaram em

patamares elevados na componente longevidade – vinculado aos ganhos em

saúde – e ganhos rápidos, mas ainda insatisfatórios na componente educação.

O aumento da expectativa de vida capturado pela componente longevidade

do IDH, todavia, não foi ainda mais significativo porque enfrentava perdas de

anos de vida, tanto entre as crianças com até 5 anos de idade, quanto entre os

jovens de 15 a 29 anos. Os indicadores de mortalidade infantil, de um lado,

e os de mortalidade por causas violentas entre os jovens, pelo outro, ense-

jou a concepção de dois programas que teriam de se defrontar com proble-

mas gerados por causas múltiplas e complexas. Um foi o Programa Mãe Coruja

Pernambucana, objeto desta avaliação qualitativa, e o outro, o Pacto pela Vida

(PPV). A consciência de que se estava lidando com problemas plurais na sua

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Um olhar analítico |139

origem conduziu a concepção norteadora dos dois programas. Sendo proble-

mas de origens múltiplas, foram abordados como tais a partir de uma concep-

ção holística, multissetorial e integradora das ações implementadas.

A concepção do Programa Mãe Coruja Pernambucana foi convergente com

um período fértil em termos de estruturação e consolidação de outros progra-

mas nacionais e locais voltados para a saúde, assistência e desenvolvimento

social e educação. Essa convergência contribuiu para nutrir sua concepção e

permitiu que o programa se estruturasse em nível estadual, mas com uma cla-

ra prioridade definida para os municípios mais vulneráveis de atenção mater-

no-infantil do interior do território pernambucano. Assim, foi natural que a

avaliação qualitativa do programa se centrasse no interior do Estado.

Uma característica comum ao Programa Mãe Coruja Pernambucana e ao

PPV é que foram concebidos e implementados logo no início do primeiro go-

verno de Eduardo Campos. O Programa Mãe Coruja Pernambucana, em par-

ticular, além de sua visão holística e intersetorial, foi desenhado como uma

estratégia de articulação e de estímulo a integralidade das políticas públicas.

Assim, o monitoramento é, de fato, um dos traços mais fortes e um dos ele-

mentos mais estratégicos do programa, pois permite que se acompanhe quem

está executando diretamente suas ações. O programa não prioriza agir direta-

mente, mas busca tornar possível os outros fazerem e serem acompanhados

no que fazem. Nesse sentido, é um laboratório importante para outras inicia-

tivas governamentais no tratamento de problemas complexos que requerem

ações múltiplas e integradas.

A articulação em vários níveis e em bases territoriais claras (do local ao

estadual) aparece também como um dos pontos a valorizar na implementação

de políticas públicas no país, em particular em políticas sociais. O Brasil é um

país continental e muito diferenciado na sua realidade ambiental, econômica

e sociocultural, o que torna difícil tratar uniformemente e de maneira centra-

lizada os desafios complexos como são, em geral, os problemas sociais.

A intersetorialidade, por sua vez, é necessária para tratar um problema

essencialmente multicausal na sua gênese, mas é também fonte de tensão

permanente na sua implementação. A gestão da execução de programas

multissetoriais, como o Programa Mãe Coruja Pernambucana, exige uma

coordenação tanto vertical quanto horizontal, ou seja, requer coordenação

e articulação com as secretarias estaduais e com as secretarias municipais

para sua bem-sucedida execução. E isso é de difícil consecução nas estrutu-

ras compartimentadas e autóctones do serviço público nacional, estadual e

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| Mãe Coruja Pernambucana140

municipal. Por essa razão, desde a sua origem o Programa Mãe Coruja Per-

nambucana está ancorado na Secretaria de Saúde, sob a Coordenação consul-

tiva da Primeira Dama, que o apoiam integralmente. Isso minimiza a tensão

decorrente da intersetorialidade, fazendo o programa funcionar, a despeito

das dificuldades, de forma articulada, para ser efetivo. Assim, desenvolve-se

uma estrutura especial, cuja atuação visa a estimular aquelas previamente

existentes a funcionarem da forma mais coordenada e harmônica possível.

É como se o Programa Mãe Coruja Pernambucana conduzisse uma orquestra

heterogênea na composição e origem de seus membros. O desafio de manter

a intersetorialidade, na prática, não pode ser minimizado, nem deixar de ser

objeto de intervenção permanente.

A avaliação qualitativa permitiu distinguir outras características impor-

tantes do programa, concluindo que ele: i) gera accountability nos diversos par-

ceiros responsáveis por seus diferentes componentes; ii) tem foco no cuidado

com a criança, sobretudo até o primeiro ano de vida; e iii) valoriza o cuidado

com a mãe gestante.

A qualidade da informação sobre o momento atual da criança e seu fu-

turo tem se inspirado em avanços recentes da neurociência, tornando o

programa, na sua concepção, convergente com conquistas recentes dessa

área do conhecimento.

b) Instrumentos e estruturas a serem fortalecidos

Entre os instrumentos do Programa Mãe Coruja Pernambucana, mere-

ce referência especial o Círculo de Educação e Cultura, que se constitui em

veículo de informação qualificada para as mães. Os círculos oportunizam

momentos de diálogo com as usuárias, sendo o local no qual se exercita a

cidadania e no qual se dão, em certa medida, as bases do empoderamento da

mulher. Esses círculos, todavia, poderiam focar não apenas na mãe gestan-

te – como tem feito o programa – mas na mãe como mulher, abordando e

discutindo temas para além do cuidado com o bebê, de forma a consolidar

o processo de empoderamento em curso e promover a melhoria nas con-

dições de vida das famílias atendidas. Sugere-se, aqui, a abordagem de te-

máticas relacionadas a questões de gênero e raça/cor, temas como: violência

doméstica, violência contra a mulher, relações de poder, direitos da mulher,

cidadania, racismo e discriminação, desigualdade, saúde da mulher, econo-

mia doméstica, entre outros.

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Um olhar analítico |141

Ainda com relação aos Círculos de Educação e Cultura, fortalecer o seu

funcionamento enquanto uma atividade pedagógica de promoção de conhe-

cimento e autonomia das usuárias, levando em consideração suas realidades

e práticas sociais, é um desaio permanente a ser enfrentado. Assim, trata-se

de um resgate à inspiração em Paulo Freire, rompendo com a perspectiva en-

gessada e pouco atrativa de uma atividade pedagógica mais disciplinar, atrain-

do e cativando, assim, as usuárias. Por sua vez, os profissionais responsáveis

devem encarar o círculo como uma ferramenta que gera conhecimento e mu-

dança. Nesse sentido, enfatiza-se a importância de capacitar continuamen-

te as educadoras acerca dos princípios da educação popular para que possam

desenvolver as atividades levando em consideração as especificidades da rea-

lidade social em que estão inseridas.

Com relação à mortalidade materna, há dificuldades de se obter informa-

ções confiáveis que permitam identificar tendências temporais inequívocas

na taxa de mortalidade29. Percebe-se, todavia, que há obstáculos na rede de

assistência básica à mulher antes, durante e após o parto, que necessitam ser

melhorados para evitar perdas de vidas. Nesse sentido, maiores investimen-

tos na rede de assistência básica (estrutura estratégica ao longo da gestação

e, especialmente, na hora do nascimento da criança) aliados a uma maior

articulação no sentido de garantir assistência ao parto de qualidade e, de

fato, humanizado, para as mulheres usuárias tornam-se fundamentais, so-

bretudo para que se consiga reduzir os altos índices de mortalidade materna

ainda existentes. A articulação e o diálogo do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana com a Rede Cegonha podem, dessa forma, se apresentar como

iniciativas profícuas.

Por sua vez, atenção especial merece o fortalecimento dos espaços de troca

e disseminação de informações sobre a isiologia do parto, os riscos envolvi-

dos, as intervenções necessárias e os cuidados com a parturiente. Para isso,

recomenda-se a capacitação das proissionais dos Cantos Mãe Coruja e das

educadoras dos Círculos de Educação e Cultura sobre isiologia do parto, para

que, assim, possam orientar de forma qualificada as gestantes sobre os está-

gios da gestação e do parto, sobre sintomas, características e cuidados, entre

outras informações, de modo a evitar a disseminação de ideias equivocadas.

29 Essa dificuldade é uma característica nacional, e não exclusiva do Estado de Pernambuco. As taxas de mortalidade materna, por exemplo, bem como outros indicadores sociais, frequente-mente apresentam fragilidades em sua composição, tornando sua análise sistemática pouco con-sistente. As razões são as mais variadas, partindo da subnotificação do fenômeno, inconsistências de levantamento, baixa regularidade dos registros ou metodologias de mensuração dissonantes.

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| Mãe Coruja Pernambucana142

c) Resultados intangíveis a serem valorizados

Há resultados que são intangíveis e nem por isso menos importantes.

Destacam-se os seguintes: i) difusão e absorção da informação qualificada

por meio dos Círculos de Educação e Cultura; ii) fortalecimento dos vínculos

familiares; iii) avanços sobre a consciência dos direitos e deveres do Estado

para com as mulheres gestantes e as crianças nos primeiros anos de vida; e

iv) ganhos decorrentes da ênfase do programa sobre o cuidado e o afeto com

a criança, que se coloca além da relação mãe-bebê.

d) Diiculdades e limitações a serem superadas

O programa tem encontrado obstáculos para estender sua ação à primeira

infância, enfrentando dificuldades ainda no primeiro ano de vida. Superar

essas dificuldades de modo a proteger a criança até os 5 ou 6 anos de idade

coloca-se como desafio permanente e estratégico, visto que essa proteção

está vinculada ao objeto central do programa, razão de ser de sua criação e

existência. Nesse sentido, sugere-se: i) o reforço no acompanhamento efe-

tivo das crianças. Para isso, torna-se necessária a existência, na equipe, de

um proissional qualiicado destinado apenas a lidar com as crianças e com

as questões relacionadas ao desenvolvimento infantil; ii) desenvolvimento

de atividades voltadas paras as crianças, como brincadeiras, contação de

histórias, entre outras; iii) implementação de berçários e brinquedotecas

equipadas em todos os Cantos Mãe Coruja, de modo que as crianças te-

nham um espaço destinado ao seu acompanhamento, facilitando, inclu-

sive, a participação das mães nas atividades desenvolvidas pelo Programa

Mãe Coruja Pernambucana.

Além disso, o trabalho de campo revelou a pouca participação dos pais

e demais familiares nas atividades do programa. Frente a isso, o desenvol-

vimento de ações voltadas para os pais e demais familiares pode ser uma

iniciativa importante, sobretudo no sentido de conscientizar os pais para

a importância da participação no desenvolvimento dos seus ilhos, bem

como integrar a família no cuidado com a criança e, assim, não essencia-

lizar na mulher toda a responsabilidade do cuidado com o bebê, estimu-

lando o cuidado compartilhado e o fortalecimento dos vínculos familiares.

Outro desafio, dificultado no momento pela conjuntura de crise eco-

nômica que atinge o país e o Estado, é o de estender o programa para os

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Um olhar analítico |143

municípios ainda não beneficiários de sua ação, universalizando sua atua-

ção em todo o território pernambucano.

É também crucial para o sucesso do Programa Mãe Coruja Pernambucana

que haja pessoal qualificado e treinado para as ações que, como mencionado

anteriormente, têm mais a ver com o “fazer fazerem” do que com a atuação

direta. Estabilizar o emprego e a relações de trabalho das equipes do pro-

grama se constitui como principal desaio dentre as atividades-meio de sua

atuação. Além disso, faz-se necessário que haja, em cada um dos municípios,

um espaço próprio para os Cantos Mãe Coruja, garantindo, assim, a autono-

mia necessária para o desenvolvimento de suas atividades.

Outro ponto importante ponto refere-se à ausência de parâmetros ou pro-

porcionalidades do tamanho das equipes em relação à população atendida e

à extensão dos territórios. Desta feita, sugere-se que a quantidade de prois-

sionais seja revista levando-se em conta essas variáveis, visto que equipes do

programa em municípios de maior porte, ou com grande extensão rural, por

exemplo, diicilmente conseguirão que suas duas técnicas realizem o mesmo

acompanhamento e busca ativa que aquelas equipes lotadas em municípios

de menor porte ou mais urbanizados.

No que se refere à prática da intersetorialidade – característica central do

programa e condição para o seu funcionamento – sugere-se a criação de um

“protocolo de atividades para a prática da intersetorialidade”, com infor-

mações para os proissionais e técnicos sobre as atividades do programa e

responsabilidades de cada instância/secretaria. Também é importante que

existam orientações para esses agentes sobre como proceder de maneira ar-

ticulada e com vistas a alcançar a integralidade das ações (sobretudo no âm-

bito municipal) e, assim, atingir os objetivos do programa.

Recomenda-se, também, a realização de parcerias com um leque maior

de instituições para além da instância governamental. A pouca presença das

universidades; especialmente UFPE, UFRPE, UNIVASF, UNICAP-PE; na rede

de parceiros é uma ausência marcante e que deve ser revertida.

Outro elemento importante e que merece atenção diz respeito à pouca di-

vulgação do Programa Mãe Coruja Pernambucana, juntamente com a escas-

sez de registros que possam construir uma “memória” do programa, o que

diiculta a sensibilização de parceiros externos, da mesma forma que não

propicia o envolvimento de atores-chaves dentro da gestão pública. Suge-

re-se, pois, uma maior divulgação do programa, de seus objetivos e ativida-

des, por meio de folhetos e cartilhas informativas esclarecendo os principais

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| Mãe Coruja Pernambucana144

pontos do Programa Mãe Coruja Pernambucana: o que é, objetivo, a quem se

destina, como acessar, atividades realizadas etc.

e) A título de conclusão

Como descrito no início deste documento, os municípios selecionados para

esta avaliação apresentaram desempenhos distintos no que tange ao maior ou

menor êxito na implementação do Programa Mãe Coruja Pernambucana, ten-

do os municípios de Iguaracy e Ouricuri apresentado trajetórias mais bem-

sucedidas, quando comparados a Exu e Condado. De acordo com as informa-

ções da pesquisa de campo, no caso dos dois primeiros municípios, possíveis

diferenças de desempenho podem estar assentadas em uma dinâmica mais

harmônica do tripé: i) boa articulação interinstitucional; ii) bom atendimento

à gestante; e iii) proatividade das equipes locais. Longe de ser determinante ou

permitir qualquer tipo de inferência estatística, a sinergia entre esses três ele-

mentos apresentava-se mais evidente entre os dois municípios com trajetórias

de mais êxito, em comparação com os outros dois. Estimular esses elementos

nas experiências em curso e nas novas, amplia, certamente, as possibilidades

de alcance de melhores resultados no Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Como se verifica pelos resultados da avaliação aqui apresentados, a expe-

riência do Programa Mãe Coruja Pernambucana guarda aprendizados impor-

tantes para a concepção e a implementação de iniciativas voltadas à primeira

infância.

Este estudo de natureza qualitativa é um registro importante, um dos pou-

cos que têm acolhido, analisado e divulgado a concepção, execução e resulta-

dos do programa. Pela sua concepção norteadora e forma de operar na aborda-

gem de desafio multicausal, o Programa Mãe Coruja Pernambucana merece

ampla difusão, replicação e respeito.

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Um olhar analítico |145

Anexos

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| Mãe Coruja Pernambucana146

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Um olhar analítico |147

Apêndice 1 – Lista de especialistas internos

A) Entrevistados 1. Alessandra Debone – Administradora pública, coordenadora de acompa-

nhamento do Programa Mãe Coruja Pernambucana

2. Ana Elizabeth de Andrade Lima – Médica, diretora de Políticas Estratégi-

cas do Programa Mãe Coruja Pernambucana e coordenadora do Conselho

Consultivo do Programa Mãe Coruja Pernambucana

3. Ana Luiza Câmara – Atual primeira–dama do Estado de Pernambuco e lí-

der da fase atual do Programa Mãe Coruja Pernambucana

4. Ana Maria de Lima Oliveira – Enfermeira, coordenadora de acompanha-

mento do Programa Mãe Coruja Pernambucana

5. Ana Selva – Secretária executiva de Educação

6. Carolina Romeira – Advogada, Gestora de ações intersetoriais do Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana

7. Danièlle de Belli Claudino – Socióloga, gestora de apoio às relações insti-

tucionais do gabinete do governador do Estado de Pernambuco e membro

do comitê de assessoramento do Programa Mãe Coruja Pernambucana

8. Edna Maia – Psicóloga, coordenadora de recursos humanos do Programa

Mãe Coruja Pernambucana

9. Frederico Amâncio – Secretário de Educação do Estado de Pernambuco

10. Gustavo Burkhardt – Licenciado em artes plásticas; coordenador de co-

municação e arte do Programa Mãe Coruja Pernambucana

11. Hélida C. P Lima – Secretária executiva de Gestão Estratégica na Secretaria

de Planejamento e Gestão de Pernambuco

12. Iramarai V. de Freitas – Artista plástico, coordenador de comunicação e

arte do Programa Mãe Coruja Pernambucana

13. João Suassuna – Secretário executivo da Criança e Juventude da Secretaria

de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude de Pernambuco

14. Laura Gomes – Secretária executiva de Direitos Humanos da Secretaria de

Desenvolvimento Social, Criança e Juventude de Pernambuco

15. Mariana Suassuna – Assistente social, superintendente de segurança ali-

mentar e nutricional da Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e

Juventude de Pernambuco

16. Marta Cristina Santos Wanderley – Assistente social, gerente de Ações Es-

tratégicas do Programa Mãe Coruja Pernambucana

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| Mãe Coruja Pernambucana148

17. Nadjane Burkhardt – Licenciada em artes plásticas, Assistente Administra-

tiva do Programa Mãe Coruja Pernambucana

18. Renata Campos – Ex-primeira-dama do Estado de Pernambuco e líder da

primeira fase do Programa Mãe Coruja Pernambucana

19. Silvia Cordeiro – Secretária da Mulher de Pernambuco

20. Tania Andrade Lima – Médica, coordenadora do grupo de pesquisa do

Programa Mãe Coruja Pernambucana

21. Vera Garbi – Psicóloga, coordenadora de acompanhamento do Programa

Mãe Coruja Pernambucana

22. Virgínia Maria Holanda de Moura – Enfermeira, gerente de monitoramento

do Programa Mãe Coruja Pernambucana

23. Volmer Souza de Sá – Tecnólogo em redes de computadores, assistente ad-

ministrativo do Programa Mãe Coruja Pernambucana

B) Integrantes do grupo focal1. Ana Cristina Alencar – Enfermeira, XI Geres

2. Angélica Mayumi Eguchi – Enfermeira, VIII Geres

3. Izeni Teixeira Pimentel – Administradora, V Geres

4. Jozelma Maria da Silva – Assistente social, III Geres

5. Lúcia Karlla – Enfermeira, IV Geres

6. Maria Helena de Souza Leite – Enfermeira, VII Geres

7. Rebeca Rodrigues Gomes – Terapeuta ocupacional, VI Geres

8. Wilson Rodrigues da Silva – Biólogo sanitarista, X Geres

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Um olhar analítico |149

Apêndice 2 – Lista de especialistas externos

A) Entrevistados1. Carolina Drugg – Representante do Primeira Infância Melhor (PIM)

2. Cleuza Pereira – Deputada federal pelo Partido Socialista Brasileiro

3. Jane Santos – Representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância

(Unicef) em Pernambuco

4. Leonardo Yanez – Presidente da Fundação Van Leer

5. Liliane Penello – Coordenadora Técnica da Estratégia Brasileirinhos e Bra-

sileirinhas Saudáveis

6. Luzia Laffite – Superintendente Executiva do Instituto da Infância (Ifan)

do Ceará

7. Rosa Barros – Representante do Conselho Estadual dos Direitos da Criança

e do Adolescente (CEDCA)

8. Sandra Valongueiro – Professora da Universidade Federal de Pernambuco

(UFPE)

9. Simone Santana – Médica pediatra e deputada estadual pelo Partido So-

cialista Brasileiro

B) Integrantes do grupo focal1. Alessandra Fam – Médica, Gerente da Gerência de Saúde da Criança e do

Adolescente de Pernambuco

2. Ana Lucia Miranda – Professora da Universidade de Pernambuco (UPE)

(participação no Círculo de Educação e Cultura)

3. Ana Paula – Extensionista do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA)

4. André Feitosa – Prestador de servições do Instituto Agronômico de Per-

nambuco (IPA)

5. Claudio Duarte – Médico, assessor do Ministério do Desenvolvimento So-

cial e Agrário(MDSA).

6. Polyana Magalhães – Assistente social da Secretaria Especial de Bem-Estar

Social (Sebes) em Ipojuca

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| Mãe Coruja Pernambucana150

Apêndice 3 – Metodologia dos grupos focais

Dinâmica da reunião do grupo focal e uso do tempo

A reunião do grupo focal será coordenada por um moderador (da Ceplan)

auxiliado por pelo menos um assessor, que apoiará na sistematização dos

resultados.

A reunião terá duração prevista de 4 horas.

Os trabalhos se realizarão em quatro momentos. No primeiro, serão feitas

a abertura e as apresentações dos participantes, quando cada um explicitará

como interagiu com o Programa Mãe Coruja Pernambucana (30 minutos); no

segundo, os trabalhos terão como foco a análise dos pontos fortes (1 hora) e,

no terceiro, a análise dos pontos fracos (1 hora). Haverá 15 minutos para o coffee

break, enquanto a equipe Ceplan organiza a sistematização dos resultados da

primeira parte dos trabalhos. No quarto momento, serão apresentados os de-

safios (1 hora) e será feito o encerramento (15 minutos).

• Momento Inicial: Abertura e apresentações (30 minutos)

o A reunião será aberta por dirigente do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana, que dará as boas-vindas aos participantes (5 minutos).

o Em seguida, o moderador da Ceplan apresentará a dinâmica dos tra-

balhos (10 minutos).

OBS: Os participantes receberão ichas de três cores diferentes para usar

nas suas intervenções.

Segue-se uma rodada de apresentação dos participantes (nome, profissão,

instituição em que atua e indicação de como interagiu com o Programa Mãe

Coruja Pernambucana).

• Dinâmica da Primeira Parte: pontos fortes do Programa Mãe Coruja

Pernambucana (1 hora), que serão trabalhados em dois momentos:

o Trabalho individual durante 10 minutos: cada participante, usando

as fichas que lhes foram entregues, resume os dois mais importantes pontos

fortes do programa. Usará, portanto, duas fichas de cores distintas, sendo:

Branca para concepção.

Rosa para implementação e modo de funcionamento.

Azul para estrutura organizacional.

Amarelo para resultados alcançados.

Após preencher as fichas, deverá colá-las em um local montado pela

coordenação.

o Apresentação de análise pelos participantes durante 50 minutos:

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Um olhar analítico |151

momento no qual, um por um, os convidados vão dando sua visão dos as-

pectos positivos que escolheram, antes colocando a ficha no local indicado na

parede (média de 5 minutos por participante). A coordenação atuará para que

os prazos sejam respeitados.

• Dinâmica da Segunda Parte: pontos fracos do Programa Mãe Coruja

Pernambucana (1 hora), que serão trabalhados em dois momentos:

o Trabalho individual durante 10 minutos: cada participante, usando

as fichas que lhes foram entregues, resume os dois mais importantes pontos

fracos do programa. Usará, portanto, duas fichas de cores distintas, sendo:

Branca para concepção.

Rosa para implementação e modo de funcionamento.

Azul para estrutura organizacional.

Amarelo para resultados alcançados.

Após preencher as fichas, deverá colá-las em um local montado pela

coordenação.

• Apresentação de análise pelos participantes durante 50 minutos: mo-

mento no qual, um por um, os convidados vão dando sua visão das fragilida-

des que escolheram, antes colocando a ficha no local indicado na parede (mé-

dia de 5 minutos por participante). A coordenação atuará para que os prazos

sejam respeitados.

Coffee break (15 minutos) e, em paralelo, a Ceplan fecha sistematização dos

trabalhos iniciais.

• Dinâmica da Terceira Parte: principais desafios do Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana (1 hora) também trabalhada em dois momentos:

o Trabalho individual durante 10 minutos: cada participante, usando as

fichas que lhes foram entregues, formula os dois mais importantes desaios do

Programa Mãe Coruja Pernambucana para os próximos anos. Usará, para isso,

duas fichas de cores distintas, a sua escolha.

• Apresentação das sugestões de iniciativas pelos participantes (50 mi-

nutos): um por um, os convidados vão justificando as sugestões de desafios

que propuseram, antes colocando a ficha no local indicado na parede (média

de 5 minutos por participante).

• Encerramento (15 minutos) comportando:

Observações inais dos participantes – espaço para complementações

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| Mãe Coruja Pernambucana152

com inscrição inicial pelo moderador, quando se pode avaliar os trabalhos e

fazer adendos.

Palavra de agradecimento por representante do Programa Mãe Coruja

Pernambucana.

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Um olhar analítico |153

Apêndice 4 – Roteiro de entrevistas

Entrevistas com especialistas (duração prevista de 50 a 60 minutos)

1. Em quais circunstâncias você conheceu o Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana? Fale-nos um pouco sobre a sua experiência com o programa.

2. Na sua percepção, quais as principais forças (pontos fortes) do programa?

3. Quais as suas principais fragilidades (pontos fracos)?

4. Na sua opinião, dentre as ações que o Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na implementa, quais são as mais importantes para combater a mortalida-

de materno-infantil no Estado? Cite apenas duas ações.

5. O que o Programa Mãe Coruja Pernambucana deveria fazer, mas não faz?

6. E o que poderia fazer melhor?

7. Na sua percepção, quais são as maiores dificuldades que o programa en-

contra para:

7a. combater a mortalidade infantil

7b. combater a mortalidade materna

8. Quais você acha que são os principais desafios a serem enfrentados pelo

Programa Mãe Coruja Pernambucana nos próximos anos ?

9. [Pergunte se a pessoa tem algo a acrescentar. Caso não tenha, agradeça e

encerre a entrevista]

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O texto deste livro foi composto em Velino Text, Steelfish e Futura.

O papel utilizado para o miolo é Couché fosco 115g/m2 e para a capa é Supremo 250g/m2.

Companhia Editora de Pernambuco – junho de 2017.

Supervisão Geral: Evaldo Costa e Anelise TimmEdição: Sérgio Miguel Buarque

Projeto Gráico: Luiz ArraisFotos: Iramaraí José Vilela de Freitas

Revisão: Ab Aeterno Produção EditorialDiagramação: Sebastião Corrêa

CANAL YOUTUBE

https://www.youtube.com/channel/UCNAB42pELwdzIIi5U891o1Q

BLOG

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Uma revolução silenciosa vem ajudando a mudar a

realidade de milhares de pessoas em Pernambuco. Em

uma década, o Programa Mãe Coruja Pernambucana

tem contribuindo efetivamente para o bem-estar de

gestantes e crianças na primeira infância, estimulando

o fortalecimento dos vínculos afetivos entre mãe, filho e

família. O sucesso do programa criado em 2007 deve-se a

uma concepção inteligente, a um processo de implantação

bem feito, a uma gestão eficiente e, sobretudo, a uma

forma diferenciada de olhar, enfrentar e resolver os

problemas encontrados nessa exitosa caminhada. Agora,

chegou a hora dessas histórias serem contadas e desse

conhecimento acumulado ser compartilhado. Além de

servir como instrumento de divulgação e documentação

do programa, este livro também cumpre a função de ser

uma importante ferramenta de consulta.

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Um olhar sobre os números

MÃE

C

ORUJA PERNAMBUCAN

A

VOLUME 3

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VOLUME 3

Um olhar sobre os números

MÃE

CO

RUJA PERNAMBUCAN

A

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Programa Mãe Coruja Pernambucana

Paulo Henrique Saraiva CâmaraGovernador do Estado de Pernambuco

João Henrique de Andrade Lima CamposGabinete do Governador

Renato hièbautChefe de Gabinete de Projetos Estratégicos

Ana Elizabeth de Andrade LimaCoordenadora do Programa Mãe Coruja Pernambucana e

Diretora de Políticas Estratégicas do Programa Mãe Coruja Pernambucana

SECRETARIAS

José Iran Costa JúniorSecretário de Saúde

Frederico AmâncioSecretário de Educação

Roberto Franca FilhoSecretário de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude

Alexandre ValençaSecretário de Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação

Márcio Stefanni Secretário de Planejamento e Gestão

Sílvia CordeiroSecretária da Mulher

Nilton MotaSecretário de Agricultura e Reforma Agrária

Marcelino GranjaSecretário de Cultura

Felipe CarrerasSecretário de Turismo, Esportes e Lazer

P452m Pernambuco. Governo do Estado Mãe coruja pernambucana : um olhar sobre os números / Governo do Estado ; Fundação Maria Cecília Souto Vidigal ; prefácio Paulo Câmara ; apresentação Eduardo de C. Queiroz. – Recife : Cepe, 2017. v. 3. : il.

Inclui referências. Inclui apêndices.

1. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAMBUCANA. 2. ASSISTÊNCIA À MA- TERNIDADE E À INFÂNCIA – PERNAMBUCO – ESTATÍSTICA. 3. SERVIÇOS DE SAÚDE À MATERNIDADE – PERNAMBUCO – AVALIAÇÃO. 4. SERVIÇOS DE SAÚDE INFANTIL – PERNAMBUCO – AVALIAÇÃO. 5. GRÁVIDAS – PER- NAMBUCO – ASPECTOS SOCIAIS. 6. SERVIÇOS DE SAÚDE – PERNAMBUCO – ADMINISTRAÇÃO. 7. MUNÍCIPIOS – PERNAMBUCO – ANÁLISE. 8. HUMA- NIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE – PERNAMBUCO. 9. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAMBUCANA – ESTATÍSTICA. I. Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. II. Câmara, Paulo. III. Queiroz, Eduardo de C. IV. Título.

CDU 364.4 CDD 362.198

PeR – BPE 17-236

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Prefácio ............................................................................................... 7

Apresentação ............................................................................................ 9

Sumário Executivo ................................................................................... 11

1 Introdução ............................................................................................. 27

2 Objetivo e Desafios ................................................................................37

2.1 Munícipios como unidades de análise .................................... 40

2.2 Programa atua de forma complementar ..................................41

2.3 Impacto sobre eventos raros .................................................... 42

2.4 Processo de seleção dos municípios

beneficiados pelo programa .......................................................... 42

3 Metodologia .......................................................................................... 45

3.1 Indicadores escolhidos ............................................................. 47

3.2 Evolução dos indicadores

em Pernambuco, no Nordeste e no Brasil .................................... 49

3.3 Modelo simples de Diferenças em Diferenças ........................ 50

3.4 Modelo de Diferenças em Diferenças

com correção para condição inicial .............................................. 52

3.4.1 Processo de expansão e seleção ................................ 53

3.4.2 Diferenças nas condições iniciais ............................. 63

3.4.3 Correção para condição inicial .................................. 66

4 Resultados ............................................................................................ 69

4.1 Acesso a serviços de saúde materno-infantil ..........................71

4.1.1 Cobertura de pré-natal ................................................71

4.1.2 Cobertura vacinal ........................................................73

4.2 Período gestacional, parto e puerpério ....................................75

4.2.1 Gravidez na adolescência ...........................................75

4.2.2 Partos cesáreos ............................................................77

4.2.3 Aleitamento materno exclusivo ................................ 79

Sumário

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4.3 Saúde infantil no parto ............................................................. 82

4.3.1 Índice de Apgar .......................................................... 82

4.3.2 Peso ao nascer ............................................................ 86

4.4 Indicadores de mortalidade ..................................................... 88

5 Análises de robustez e validade........................................................... 93

5.1 Validade da metodologia .......................................................... 96

5.2 Robustez dos resultados ........................................................... 97

6 Conclusões ..........................................................................................101

7 Referências ...........................................................................................111

Apêndice 1: Metodologia de cálculo

dos indicadores de saúde materno-infantil ......................................... 116

Apêndice 2: Modelo de Diferenças

em Diferenças com correção para condição inicial ............................. 118

Definindo impacto ........................................................................ 118

Processo de seleção dos beneficiários ......................................... 119

Estimando o impacto .................................................................... 119

Apêndice 3: Participação dos municípios no Programa Mãe

Coruja Pernambucana ao longo do período de 2007 a 2014 ................122

Apêndice 4: Taxas de mortalidade infantil dos municípios

não participantes do Programa Mãe Coruja Pernambucana ...............126

Apêndice 5: Evolução dos indicadores de saúde materno-infantil

em Pernambuco e no restante do Nordeste e do Brasil. .......................128

Apêndice 6: Impacto sobre indicadores

de saúde materno-infantil (2014) .........................................................129

Equipe Insper:

Amiris de Paula Serdeira

Beatriz Silva Garcia

Camila Mata Machado Soares

Diana Coutinho

Marina de Cuffa

Ricardo Paes de Barros

Rosane Mendonça

Produção Estatística - OPE Sociais:

Bárbara Lerbach

Danielle Nascimento

Grazielly Rocha

Samuel Franco

Suiani Febroni

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Um olhar sobre os números | 7

OPrograma Mãe Coruja Pernambucana, resultado

da inspiração e trabalho de muita gente e uma

das estratégias mais bem-sucedidas do Governo

Eduardo Campos, trouxe vida e esperança para

milhares de mães e crianças do nosso Estado. Ao longo

de quase uma década, o programa apresentou resultados

expressivos, cresceu de forma sustentável e consistente,

ganhou reconhecimento internacional e se consolidou

como uma política de Estado. O Mãe Coruja é, hoje, um

programa perene.

Falo isso com muita segurança porque acompanho

e conheço detalhadamente o Mãe Coruja desde o seu

início em 2007 - primeiro como Secretário de Estado

(em três pastas diferentes) e depois como Governador -

e desde cedo já estava muito claro que o programa seria

algo capaz de ir além do alcance de cada um de nós,

com respaldo político e reconhecimento social capaz de

ultrapassar mandatos.

Como não poderia deixar de ser, as prioridades do

Mãe Coruja são prioridades do meu Governo. E como

costumo dizer, prioridade não é conversa, é orçamento.

Só tem prioridade aquilo que tem recursos garantidos.

Por isso, ainda em 2016, enviei à Assembleia Legislativa

um projeto de lei para tornar impositivo os recursos

do Mãe Coruja Pernambucana. Em outras palavras, as

rubricas destinadas ao programa serão protegidas por

Lei. Também ampliamos o atendimento à primeira

infância (crianças até seis anos), através de um plano de

desenvolvimento infantil.

O Mãe Coruja é um exemplo para o Brasil e para o

Mundo. Por isso, vejo com muita satisfação essa história

exitosa ser contada, com objetividade, profundidade

e sensibilidade em livro. É mais uma forma de

continuarmos levando ‘vida’ para a vida das pessoas.

Paulo Câmara

Governador de Pernamnbuco

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| Mãe Coruja Pernambucana8

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Um olhar sobre os números | 9

Desde 2005, a Fundação Maria Cecilia dedica-se a gerar e disse-

minar conhecimento para o pleno desenvolvimento da criança

na primeira infância, período que vai do nascimento aos seis

anos de idade.

Dentre as diversas formas de alcançar nossa missão, está o fomen-

to à sistematização e a avaliação das práticas, programas e políticas de

primeira infância existentes como um processo de aprofundamento,

reflexão, qualificação e registro de tais experiências. Nesse contexto se

insere a atuação conjunta com o Governo do Estado de Pernambuco,

na avaliação e sistematização do Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na, que está há quase uma década em execução.

Conhecer essa história, sua metodologia, as fortalezas, os desa-

fios e seus resultados traz relevantes aprendizados que podem ser

inspiradores para os diversos gestores que hoje desejam priorizar,

em suas políticas, essa importante etapa da vida.

Entendemos que o produto dessa sistematização pode contribuir

para o aprimoramento das políticas públicas voltadas para a primei-

ra infância. Governos que investem esforços em olhar para a efetivi-

dade de suas políticas identificando as ações que deram certo, bem

como reconhecendo as que não obtiveram os resultados esperados,

têm melhores condições de aprimorar seus programas e gerar im-

pactos significativos à sua população.

O material apresentado aqui é fruto de um extenso trabalho de

pesquisa de campo e documental sobre o programa, consolidado em

quatro publicações para abordar a complexidade que o tema primei-

ra infância exige, trazendo aos gestores informações valiosas sobre a

experiência pernambucana.

Parabenizamos o Governo do Estado pela priorização da criança

e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema-

tizar sua política de primeira infância e constante preocupação em

qualificá-la.

“Se mudarmos o começo da história, mudamos a história toda.”

– frase do documentário O Começo da Vida

Eduardo de C. Queiroz

Diretor Presidente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal

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| Mãe Coruja Pernambucana10

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Um olhar sobre os números | 11

Avaliação de impacto do Programa Mãe Coruja Pernambucana

Sumário Executivo

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| Mãe Coruja Pernambucana12

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Desde o início da gestação e ao longo dos primeiros anos de vida de uma

criança, os cuidados básicos com a saúde, tanto sua quanto de sua mãe,

são fundamentais para promover seu desenvolvimento integral. A au-

sência de cuidados como o acompanhamento pré-natal, o aleitamento

materno e a vacinação pode acarretar riscos para o desenvolvimento infantil,

fazendo com que haja dificuldades para a criança atingir seu potencial pleno.

De fato, diversos estudos nas mais variadas áreas da ciência têm repetida-

mente demonstrado que a promoção da atenção materno-infantil integral

e de qualidade é uma das áreas de atuação das políticas públicas com maior

potencial para gerar desenvolvimento humano, inclusão social e redução

de todas as formas de desigualdade. Segundo o Comitê Científico do Núcleo

Ciência Pela Infância (2014, p. 9)1:

No Brasil, estudos prévios mostraram que baixo peso ao nascer, prematuridade, retardo no

crescimento infantil nos primeiros anos de vida, baixa estatura e ocorrência de infecções

nos dois primeiros anos de vida, por exemplo, estão associadas com desempenho cognitivo

inadequado em idade escolar, mau aproveitamento no ensino fundamental e maior taxa

de abandono escolar.

Ou seja, é de amplo conhecimento que o desenvolvimento humano res-

ponde de forma intensa, rápida e duradoura à disponibilidade, à qualidade e à

integralidade da atenção materno-infantil.

1 Comitê Científico Núcleo Ciência Pela Infância. O impacto do desenvolvimento na primeira infância sobre a aprendizagem. Estudo I, 2014.

Importância da saúdematerno-infantil

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| Mãe Coruja Pernambucana14

Um reflexo da importância da saúde materno-infantil são os Objetivos

de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Lançada em setembro de 2015, du-

rante a Cúpula de Desenvolvimento Sustentável, essa agenda, composta por

17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e 169 metas, dá continuidade

aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio que não foram alcançados até

2015. Dentre os objetivos e metas a serem alcançados nos próximos 15 anos

em áreas de importância crucial para a humanidade e para o planeta, encon-

tra-se o Objetivo 3: “Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar

para todos, em todas as idades”. Três das nove metas contidas nesse objetivo

dizem respeito à saúde materno-infantil2:

• Meta 3.1: até 2030, reduzir a taxa de mortalidade materna global para

menos de 70 óbitos por 100 mil nascidos vivos.

• Meta 3.2: até 2030, acabar com as mortes evitáveis de recém-nascidos

e crianças menores de 5 anos, com todos os países objetivando reduzir

a mortalidade neonatal para, pelo menos, 12 óbitos por mil nascidos

vivos e a mortalidade de crianças menores de 5 anos para, pelo me-

nos, 25 óbitos por mil nascidos vivos;

• Meta 3.7: até 2030, assegurar o acesso universal aos serviços de saúde

sexual e reprodutiva, incluindo planejamento familiar, informação e

educação, bem como integração da saúde reprodutiva em estratégias

e programas nacionais.

O Programa Mãe Coruja PernambucanaConscientes da importância da atenção materno-infantil, o Governo do

Estado de Pernambuco, em coordenação com os governos municipais, dese-

nhou e implantou o Programa Mãe Coruja Pernambucana, com vistas a ace-

lerar o progresso na saúde materno-infantil no Estado e a eliminar o déficit

existente.

Criado em outubro de 2007, a partir do Decreto 30.859, e transforma-

do em política pública do Estado de Pernambuco pela Lei 13.959, de 2009,

o Programa Mãe Coruja Pernambucana surgiu como uma estratégia do go-

verno pernambucano para garantir atenção integral às gestantes usuárias do

Sistema Único de Saúde (SUS) e seus filhos de até 5 anos de idade, criando

uma rede solidária para reduzir a mortalidade materna e infantil.

2 Veja: https://nacoesunidas.org/pos2015/ods3/.

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Um olhar sobre os números | 15

Desde a sua criação, o Programa Mãe Coruja Pernambucana se estabe-

leceu como uma política pública de saúde materno-infantil baseada na ar-

ticulação de diferentes entes, incluindo secretarias, municípios e o Estado.

Essa característica do programa é essencial para compreender sua forma de

atuação: ao ser implementado em um município, o Programa Mãe Coruja

Pernambucana estabelece o Canto Mãe Coruja, nome dado ao local físico em

que o programa se instala. Os Cantos Mãe Coruja contam com dois profissio-

nais responsáveis por coordenar os cuidados com as gestantes e as crianças

beneficiadas, juntamente com os diferentes entes municipais e estaduais. O

Programa Mãe Coruja Pernambucana atua, portanto, como articulador de

uma rede de apoio às gestantes beneficiadas. Cabe destacar que esse apoio

não se limita ao universo da saúde materno-infantil, conforme fica claro na

portaria que instituiu o programa. Um exemplo disso é a organização de cur-

sos profissionalizantes promovidos pelos Cantos, em parceria com outros

entes governamentais.

A partir de seu cadastramento no programa, as gestantes são monitoradas

durante o pré-natal, o parto e o pós-parto; posteriormente, também o de-

senvolvimento das crianças é acompanhado até os 5 anos de idade. Durante

todo esse período, os Cantos coordenam os cuidados com as gestantes be-

neficiadas e suas crianças, acionando os diferentes entes municipais e esta-

duais de acordo com a necessidade. Além disso, as mulheres beneficiadas e

suas famílias são convidadas a participar dos Círculos de Educação e Cultura

— momentos de troca de experiências e de orientação que acontecem sema-

nalmente. Por fim, as gestantes que comparecem a pelo menos sete consul-

tas pré-natais recebem um kit contendo um enxoval para o bebê.

Desde sua implantação, em 2008, em 24 dos municípios mais vulneráveis

do Estado, o programa expandiu-se rapidamente, chegando a atender, em

2010, 105 municípios pernambucanos (57% do total).

Comparando a situação materno-infantil em Pernambuco e no Brasil

Neste estudo, utilizamos 17 indicadores que são coletados pelo Departa-

mento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus), principal base

de dados de indicadores de saúde no Brasil. Foram escolhidos os indicadores,

dentre os já calculados pelo Datasus, que cobrissem todos os aspectos da saúde

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| Mãe Coruja Pernambucana16

materno-infantil, ou seja, que possibilitassem o monitoramento das diferentes

fases do ciclo gravídico-puerperal, tanto das gestantes quanto dos fetos, além

de indicadores que cobrissem também as condições de saúde do primeiro ano

de vida da criança (veja a tabela 1).

A tabela 1 apresenta a média de cada indicador para o Brasil e Pernambuco,

em 2008 e 2014. Conforme é possível observar, Pernambuco experimentou

grande progresso em saúde materno-infantil nesse período. Em mortalidade

infantil, por exemplo, o declínio foi de 15 óbitos por mil nascidos vivos e a

porcentagem de nascimentos cujas mães tiveram ao menos sete consultas de

pré-natal cresceu 14 pontos percentuais. Esses resultados parecem evidenciar

que as políticas implementadas para acelerar o progresso na saúde materno-

-infantil no Estado e eliminar o déficit existente em relação ao Brasil se mos-

traram extremamente eficazes.

Brasil Pernambuco

Hiato de PE

em relação ao

Brasil

Brasil Pernambuco

Hiato de PE

em relação ao

Brasil

1. Proporção de nascidos vivos com sete ou mais

consultas de pré-natal56,79 41,98 0,26 67,47 55,62 0,18

2. Cobertura vacinal (idade-alvo como menores de 2 anos

de idade)78,21 65,70 0,16 94,18 83,87 0,11

3. Taxa de internação hospitalar por causas sensíveis à

atenção básica 37,53 38,82 0,03 33,25 35,20 0,06

4. Proporção de partos cesários 46,78 39,08 -0,16 58,54 47,76 -0,18

5. Proporção de partos de mães adolescentes (menor ou

igual a 19 anos de idade)22,72 23,65 0,04 21,23 22,82 0,07

6. Prevalência de aleitamento materno exclusivo (crianças

com até 6 meses de idade)74,71 64,71 0,13 74,61 64,74 0,13

7. Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar

maior ou igual a 6 no 1º minuto de vida1 90,20 92,60 -0,03 92,99 93,73 -0,01

8. Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar

maior ou igual a 6 no 5º minuto de vida1 92,74 92,74 -0,03 95,55 96,56 -0,01

9. Proporção de nascidos vivos com baixo peso ao nascer

(abaixo de 2.500 g)7,81 6,89 -0,12 8,00 7,08 -0,11

10. Taxa de natimortalidade (nascidos mortos de 22

semanas ou mais de gestação)15,04 15,11 0,00 14,40 12,68 -0,12

11. Taxa de mortalidade neonatal precoce (0 a 6 dias de

idade)15,93 16,07 0,01 12,97 9,14 -0,29

12. Taxa de mortalidade perinatal (agrupa os dois grupos

considerados nas taxas de mortalidade acima)25,83 28,94 0,12 24,53 20,11 -0,18

13. Taxa de mortalidade neonatal (0 a 27 dias de idade) 19,29 12,51 -0,35 15,17 10,95 -0,28

14. Taxa de mortalidade neonatal tardia (7 a 27 dias de

idade)8,91 3,65 -0,59 6,41 3,74 -0,42

15. Mortalidade infantil pós-neonatal (28 a 364 dias de

idade)10,64 13,98 0,31 8,88 6,27 -0,29

16. Taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano de

idade)24,90 30,15 0,21 19,76 15,08 -0,24

17. Taxa de mortalidade na infância (menores de 5 anos

de idade)28,32 43,70 0,54 22,52 17,45 -0,22

Tabela 1: Indicadores de saúde materno-infantil - Pernambuco e Brasil, 2008 e 2014

2008 2014

Indicador

Acesso a serviços de saúde materno-infantil

Período gestacional, parto e puerpério

Saúde infantil no parto

Indicadores de mortalidade

Fonte: Elaboração própria a parir de informações do Datasus.

Nota: 1. "A Escala ou Índice de Apgar é um teste que consiste na avaliação de cinco sinais objetivos do recém-nascido no 1º e no 5º minuto após o

nascimento, atribuindo-se a cada um dos sinais uma pontuação de 0 a 2, sendo utilizado para avaliar as condições dos recém-nascidos. Os sinais

avaliados são: frequência cardíaca, respiração, tônus muscular, irritabilidade reflexa e cor da pele. O somatório da pontuação (no mínimo zero e no

máximo dez) resultará no Índice de Apgar e o recém-nascido será classificado como sem asfixia (Apgar 8 a 10), com asfixia leve (Apgar 5 a 7), com

asfixia moderada (Apgar 3 a 4) e com asfixia grave: Apgar 0 a 2." Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Escala_de_Apgar. Acesso em: 13 fev

2017.

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Um olhar sobre os números | 17

Para cada indicador, estimou-se a que distância a média de Pernambuco

está da média brasileira. Para isso, obteve-se a razão entre: i) a diferença entre

a média do Brasil e de Pernambuco, e ii) a média do Brasil. Os resultados apre-

sentados na coluna “Hiato de PE em relação ao Brasil” foram calculados para

os anos de 2008 e 2014. Assim, é possível conhecer se o hiato de Pernambuco

em relação ao Brasil diminuiu, aumentou ou permaneceu estável.

O gráfico 1 sintetiza as informações apresentadas na tabela 1. As linhas pa-

ralelas aos eixos indicam a marca “zero”; isto é, pontos à direita desta linha,

no eixo X (2008), são positivos, e à esquerda, negativos. Pontos sobre a reta de

45° revelam que o indicador em Pernambuco permaneceu a uma mesma dis-

tância em relação à média do Brasil, tanto em 2008 quanto em 2014. Ou seja,

sua posição relativa não se modificou nesse período.

Assim, no caso do primeiro indicador – “Proporção de nascidos vivos com

7 ou mais consultas de pré-natal” –, o hiato em 2008 era de 0,26 (3ª coluna

da tabela), sendo, então, a média desse indicador em Pernambuco 26% me-

nor que a média brasileira. Em 2014, o hiato declinou para 0,18 (a média de

Pernambuco passou a ser 18% inferior à média do Brasil), o que significa que

Pernambuco, apesar de continuar abaixo da média brasileira com respeito a

este indicador, conseguiu reduzir esse hiato. Em outras palavras, a magnitude

do atraso em relação à média brasileira foi, em 2014, inferior à de 2008. Indi-

cadores com esse padrão de comportamento estão representados na região I

do gráfico 1 e revelam o progresso de Pernambuco3.

Na região II do gráfico, encontram-se aqueles indicadores cujo progresso no

Estado foi ainda melhor. Por exemplo, a taxa de mortalidade na infância (me-

nores de 5 anos de idade) — indicador 17 —, em 2008, era 43,7 em Pernambuco

e 28,3 no Brasil, hiato de 0,54, conforme mostra a tabela 1. Isso significa que a

média desse indicador em Pernambuco era 54% superior à média brasileira.

Em 2014, essa razão foi -0,22, o que significa que a média do indicador em

Pernambuco passou a ser 22% inferior à média brasileira. Ou seja, o progresso

em Pernambuco fez com que o Estado ultrapassasse o Brasil em termos desse

indicador. Indicadores com esse comportamento estão representados na re-

3 Quando se compara as médias para o Brasil e Pernambuco nos dois anos, é claro que a inter-pretação vai depender se o indicador é “bom” ou “ruim”. Assim, por exemplo, no caso dos indi-cadores de mortalidade, a média de Pernambuco ser menor que a média brasileira significa que Pernambuco está melhor em relação ao Brasil. Porém, no caso da “Proporção de nascidos vivos com sete ou mais consultas de pré-natal”, a média ser menor em Pernambuco indica uma posi-ção pior do Estado em relação ao Brasil. Quanto à interpretação do hiato essa preocupação de se o indicador é “bom” ou “ruim” não existe, uma vez que, no seu cálculo, esse aspecto já foi consi-derado. Assim, quando o indicador é “bom”, o numerador é a média do Brasil menos a média de Pernambuco; quando o indicador é “ruim” inverte-se Brasil com Pernambuco.

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| Mãe Coruja Pernambucana18

gião II e revelam uma situação em que o estado se encontrava atrasado em

relação à média brasileira, em 2008, mas ultrapassou o Brasil em função de um

progresso mais acelerado, em 2014.

Importante destacar que a maioria dos indicadores se encontra abaixo da

reta de 45°, área que abrange os indicadores em que se observou progresso do

Estado em relação à situação inicial. Destarte, na maioria dos indicadores de

saúde materno-infantil analisados, Pernambuco progrediu mais que o Brasil.

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Um olhar sobre os números | 19

Entretanto, cabe destacar que o Brasil não se encontra, ainda hoje, em

uma posição confortável com relação ao nível e à evolução desses indicado-

res quando comparado aos demais países com renda per capita similar, como é

possível observar nos gráficos 2a–c. O nível de alguns indicadores importantes

de mortalidade infantil no Brasil encontra-se aquém do que seria esperado

para um país com a sua renda per capita.

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| Mãe Coruja Pernambucana20

Em suma, apesar do inegável avanço dos indicadores da situação mater-

no-infantil nos últimos anos, seja no Brasil, seja em Pernambuco, é evidente

que esse é um tema que ainda precisa ser priorizado no país. É preciso que os

entes públicos continuem a trabalhar em políticas públicas que tenham espe-

cial foco nas mulheres grávidas e crianças e que consigam, de forma efetiva,

reduzir a mortalidade desses grupos.

Objetivo deste estudo Apesar do inegável avanço dos indicadores da situação materno-infantil

nas últimas duas décadas, o objetivo deste estudo é um pouco mais “egoísta”:

pretende-se avaliar a real contribuição do Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na para o progresso observado no Estado nessa área, afinal, ele foi desenhado

e implantado com esse propósito. Em outras palavras, buscou-se isolar o im-

pacto do programa e estimar a sua magnitude sobre esses 17 indicadores de

saúde materno-infantil. Assim, este relatório tentou responder, com precisão,

a difícil questão sobre em que medida o desempenho do Estado em saúde ma-

terno-infantil teria sido pior caso o Programa Mãe Coruja Pernambucana não

tivesse sido implantado.

Optou-se por investigar o impacto do programa sobre indicadores muni-

cipais de saúde materno-infantil nos municípios em que foi implementado.

Tal opção é consistente com sua natureza municipal e com seus objetivos

ousados, que incluem transformar a situação da saúde materno-infantil

dos municípios e regiões em que atua, além de modificar essa situação no

Estado como um todo.

Avaliando a contribuição do Programa Mãe Coruja Pernambucana para reduzir o déficit em relação ao Brasil

Isolar a contribuição do Programa Mãe Coruja Pernambucana, o que usual-

mente denominamos de “avaliação de impacto”, requer comparar os resulta-

dos fantásticos observados no Estado com o que teria acontecido na ausência

do programa. Para isso, caso houvesse uma seleção aleatória do grupo de tra-

tamento (beneficiários do programa), esse grupo e o grupo de controle (não

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Um olhar sobre os números | 21

beneficiários) iriam diferir apenas em termos de terem ou não recebido o

programa e, portanto, não possuiriam diferenças em termos de variáveis não

observadas. Com isso, seria possível isolar o impacto do programa a partir da

simples comparação da evolução do indicador no grupo de tratamento, antes

e depois de beneficiados pelo programa, com a evolução desse mesmo indica-

dor para o mesmo período no grupo de controle, conforme ilustra o gráfico 3.

Sa

úd

e m

ate

rno

-in

fan

il

Antes da implantação

Gráfico 3: Evolução de um indicador de Saúde Materno-Infanil

Após a implantação

Grupo de

tratamento

Grupo de

tratamento na

ausência do

programa

Melhora do

grupo de

tratamento

Impacto do

programa

Melhora que teria ocorrido no

grupo de tratamento caso não

ivessem ido acesso ao

programa.

Essa tarefa é sempre difícil, dado que, no fundo, é preciso descobrir o que

teria acontecido com Pernambuco se o Programa Mãe Coruja Pernambucana

não tivesse sido implantado. O ideal para uma avaliação de impacto é que esta

seja sempre planejada de antemão e acomodada na própria implantação do

programa. Mas, mesmo quando planejada e implementada junto com o pro-

grama, a avaliação permanece sendo uma tarefa difícil, ainda que seja possível

obter uma linha de base e construir os grupos de controle e de tratamento.

A avaliação do Programa Mãe Coruja Pernambucana, cujos resultados são

apresentados neste relatório, não foi planejada originalmente e, portanto, não

foi possível construir um grupo de controle desde o início da implantação e

tampouco criar um sistema de monitoramento dos não beneficiados. A ava-

liação foi inteiramente concebida após o programa ter sido implantado e estar

em operação por quase uma década. Dessa forma, ficaram restritas as infor-

mações que foram coletadas com outras finalidades. Ou seja, a avaliação rea-

lizada não se baseia em informações presentes em pesquisas de linha de base

e seguimento especificamente desenhadas e coletadas para responder às suas

necessidades de investigação.

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| Mãe Coruja Pernambucana22

O desenho dessa avaliação de impacto, desconectado da implantação do

programa, leva a quatro grandes desafios que precisam ser enfrentados. Em

primeiro lugar, embora o público-alvo do programa sejam mulheres, crian-

ças e famílias, a informação utilizada está no nível municipal. Como o pro-

grama efetivamente atende a apenas uma parcela da população-alvo em

cada município, o impacto sobre os indicadores municipais dá, naturalmen-

te, uma visão diluída do impacto que o programa tem sobre as famílias efe-

tivamente atendidas. Caso, por exemplo, apenas metade da população-alvo

do município fosse atendida pelo programa e o impacto dele sobre as não

atendidas fosse nulo (isto é, se o programa não tivesse efeito sobre a popula-

ção que não atende diretamente), então, esse impacto sobre os indicadores

municipais seria equivalente à metade do impacto do programa sobre as fa-

mílias efetivamente atendidas.

Em segundo lugar, deve-se ter em conta que o programa avaliado tem natu-

reza complementar, já que opera em um ambiente em que já existem diversas

outras ações voltadas à promoção da saúde materno-infantil. Sua função é pro-

mover o acesso a esses programas preexistentes, além de contribuir para que

tenham maior eficácia. Sua contribuição e, portanto, seu impacto é necessaria-

mente restrito a situações em que o acesso e a eficácia das ações já existentes

podem ser aperfeiçoados. Assim, quanto maior e mais eficaz a cobertura inicial

de ações prexistentes, como o Programa Saúde da Família, menores as possibi-

lidades de contribuição do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Além disso, boa parte dos objetivos da saúde materno-infantil se refere à

redução na prevalência de eventos raros (como a mortalidade infantil), cuja

ocorrência pode apenas em parte ser influenciada por ações públicas. A ava-

liação de impacto sobre esse tipo de indicador é difícil por duas razões. Por

um lado, por serem eventos raros, sua prevalência em municípios pequenos é

muito volátil. Basta uma morte a mais ou a menos em um dado ano para que a

taxa de mortalidade neonatal, por exemplo, varie substancialmente. A elevada

volatilidade dificulta a tarefa estatística de isolar o impacto do Programa Mãe

Coruja Pernambucana. Por outro lado, apenas uma parcela das causas desses

eventos poderia ser controlada ou evitada pelo atendimento dado pelo pro-

grama e, mesmo nesse caso, como a cobertura nos municípios atendidos não

é universal, apenas parte desses eventos pode efetivamente ser evitada. Em

síntese, o programa atende somente uma parcela da população e atua apenas

sobre uma parcela das causas de determinados eventos raros; esses são certa-

mente desafios à detecção de seu impacto.

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Um olhar sobre os números | 23

Por fim, isolar o impacto de um programa dos demais determinantes so-

bre os resultados de interesse (saúde materno-infantil, neste caso) requer

um conhecimento perfeito do processo de seleção de beneficiários e, prefe-

rencialmente, requer que esse processo tenha seguido regras bem definidas

e relativamente simples, de forma que seja reproduzível. O processo utili-

zado no Programa Mãe Coruja Pernambucana é relativamente complexo, o

que torna difícil (ou mesmo impossível) o seu perfeito conhecimento e a sua

reprodução. Esse desconhecimento torna as estimativas de impacto obtidas

dependentes de uma série de ajustes que, por sua vez, dependem da validade

de hipóteses não testáveis.

Conforme já ressaltado, a magnitude do impacto de um programa é a di-

ferença entre o que ocorreu com os municípios beneficiados e o que teria

ocorrido com esses municípios caso o programa não tivesse sido implantado.

Para simular qual teria sido a trajetória dos municípios beneficiados pelo Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana, caso eles não tivessem sido beneficiados,

foi criado um grupo de comparação, composto por municípios do Estado de

Pernambuco que não tiveram acesso ao programa. No entanto, a simples di-

ferença entre o progresso alcançado nos dois grupos não é necessariamente

uma medida do impacto do programa. Isso acontece porque os municípios que

compõem cada grupo partem de condições iniciais distintas e é de se esperar

que diferenças nas condições de partida muito provavelmente influenciem o

progresso de indicadores de saúde materno-infantil, mesmo na ausência do

programa. Com isso, a situação de municípios não beneficiados após a im-

plantação do Programa Mãe Coruja Pernambucana possivelmente não seria

uma boa medida para o que teria acontecido com os municípios beneficiados

na sua ausência. Entretanto, como tal medida é essencial na estimação do im-

pacto do programa, foram realizadas correções na situação dos municípios não

beneficiados após a implementação do programa, de modo a eliminar o efeito

das diferenças existentes nas condições iniciais.

Foram realizadas dois tipos de correções: um ajuste para a condição inicial

em termos da saúde materno-infantil e outro para diferenças iniciais em ter-

mos da vulnerabilidade socioeconômica4. A interpretação é simples: calculou-

se como uma diferença nas condições iniciais, seja em termos da saúde ma-

terno-infantil, seja em termos da vulnerabilidade socioeconômica, influencia

4 A metodologia detalhada de como esses ajustes foram realizados encontra-se no apêndice 2 do relatório Avaliando o impacto do Programa Mãe Coruja Pernambucana sobre a saúde materno-in-fantil.

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| Mãe Coruja Pernambucana24

os resultados futuros em cada indicador analisado. Com isso, a magnitude de

cada ajuste indica o quanto as diferenças em condições iniciais entre os muni-

cípios beneficiados e os não beneficiados afetam a evolução final para cada in-

dicador. Sendo assim, a soma dos ajustes representa a correção total que deve

ser aplicada ao impacto estimado e, então, ao subtrair do impacto do programa

a soma dos ajustes, encontra-se o impacto corrigido.

Resultados e reflexões para a política de atenção materno-infantil em Pernambuco

Os resultados obtidos apontam para um impacto significativo sobre o efe-

tivo acesso aos diversos serviços de saúde materno-infantil. Em particular,

sobre o acesso ao pré-natal e a parto cesáreo (este último na contramão do

que seria desejável), embora não indiquem impacto sobre a cobertura vaci-

nal. Também foram encontrados impactos marginalmente significativos sobre

comportamentos relacionados à melhoria na saúde materno-infantil, como

redução da gravidez na adolescência e expansão na prevalência do aleitamen-

to materno exclusivo.

Tanto nos resultados últimos da saúde materno-infantil, como na taxa de

mortalidade infantil foram encontrados progressos muito mais acentuados

nos municípios beneficiados pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana do

que naqueles não beneficiados. Essa diferença de progresso, contudo, parece

estar integralmente associada à maior vulnerabilidade inicial dos municípios

beneficiados, já que não foi encontrada qualquer diferença ao comparar o pro-

gresso, nesses indicadores, em municípios beneficiados e em não beneficiados

com situações iniciais similares.

No entanto, é preciso relativizar esses resultados. Se, de um lado, compa-

rando municípios com a mesma situação inicial em termos do indicador ana-

lisado não se encontra impacto, de outro, ao se comparar a evolução de mu-

nicípios que partem da mesma situação socioeconômica, encontra-se que a

mortalidade infantil declinou de forma significativamente mais intensa entre

os beneficiários do que entre os não beneficiários. Qual das duas formas de

ajuste é mais correta (ou, ainda, seria outra não adotada)? Responder a essa

pergunta com precisão depende do pleno conhecimento do processo de se-

leção dos municípios beneficiários, o que não foi possível decifrar de forma

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Um olhar sobre os números | 25

plenamente adequada. Pelo que pode ser desvendado, o processo se baseou na

situação inicial de mortalidade infantil, indicando que o ajuste pela situação

inicial seja o procedimento mais adequado no caso do impacto sobre a morta-

lidade infantil.

Além disso, um conjunto de simulações realizadas aponta que, de fato,

municípios com piores condições iniciais tenderam a progredir mais do que

aqueles com melhores condições. Em outras palavras, comparar municípios

beneficiados e não beneficiados que partiram de situações iniciais diferentes

pode levar a vieses na estimação do impacto do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana. No entanto, apesar de existir evidência a favor da utilização da

metodologia baseada na comparação de municípios com idêntica situação ini-

cial (que não aponta impacto significativo sobre a mortalidade infantil), essa

evidência não é definitiva. Existe a possibilidade de a melhor opção metodo-

lógica ser aquela que compara municípios com as mesmas condições socioe-

conômicas, caso em que o Programa Mãe Coruja Pernambucana teria tido im-

pacto significativo sobre a mortalidade infantil.

Em suma, por não ter sido capaz de explicitar completamente o processo

de seleção dos beneficiários, sejam eles municípios, sejam famílias nos mu-

nicípios atendidos, o estudo utilizou um grupo de comparação, cuja valida-

de depende de hipóteses não verificáveis. Ademais, por não ter sido levada

em consideração a efetiva cobertura do programa nos municípios atendidos,

subestima-se o real impacto sobre as famílias atendidas. Por essas razões, os

resultados obtidos devem ser considerados preliminares.

A despeito de todas as limitações desta avaliação, os resultados encontrados

parecem identificar aspectos importantes do Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana e sugerir algumas modificações. Duas implicações para o aperfeiçoamen-

to do programa merecem destaque. Primeiramente, o fato de que as estimati-

vas apontam para um grande impacto do programa sobre o acesso, mas não

sobre os resultados últimos pode estar revelando que o programa está sendo

muito mais efetivo em promover o acesso a serviços do que em promover me-

lhorias na qualidade dos serviços oferecidos. Dessa forma, dada a expansão

da cobertura municipal de serviços básicos de saúde, via Programa Saúde da

Família e programas correlatos, o Programa Mãe Coruja Pernambucana talvez

devesse fortalecer seu foco na assistência técnica e na supervisão às secretarias

municipais, com vistas a promover melhorias na qualidade dos serviços (aten-

dimento indireto à população local), retirando eventualmente parte de seu foco

na expansão da cobertura e no atendimento direto à população.

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| Mãe Coruja Pernambucana26

Em segundo lugar, o fato de não ter sido encontrado impacto significati-

vo do Programa Mãe Coruja Pernambucana sobre importantes resultados com

baixa prevalência (como a mortalidade neonatal) pode indicar que o estilo e o

protocolo de atendimento utilizados pelo programa estejam mais adequados à

promoção de uma atenção básica geral e muito menos adequados à identifica-

ção de casos de alta vulnerabilidade e alto risco (ou a limitações na capacidade

de encaminhamento ou resolutividade desses casos). Assim, se o Programa

Mãe Coruja Pernambucana tem a pretensão de ser mais efetivo na redução

da prevalência de eventos cada vez mais raros (como a mortalidade infantil),

talvez precise dar maior ênfase à identificação dos casos de alto risco e vulne-

rabilidade e, eventualmente, até desenvolver protocolos ainda mais eficazes

para identificá-los e aprimorar os mecanismos de encaminhamento, promo-

vendo maior resolutividade.

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Um olhar sobre os números | 27

IntroduçãoCapítulo 1

Introdução

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| Mãe Coruja Pernambucana28

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Em 2015, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca

de 300 mil mulheres morreram1 por complicações na gravidez e no parto;

foram, então, cerca de 830 óbitos maternos por dia naquele ano2. No Brasil,

nesse mesmo ano, o total de óbitos maternos foi cerca de 1.3003.

Entretanto, a análise da trajetória da taxa de mortalidade materna indica o

seu declínio4. Entre 1990 e 2015, esse indicador registrou uma redução de 44%,

em todo o mundo – uma redução de 2,3% ao ano5. Infelizmente, esse declínio

estava abaixo do necessário para se alcançar a meta A do quinto Objetivo de

Desenvolvimento do Milênio6, de redução de 75% da taxa de mortalidade ma-

terna em todo o mundo, entre 1990 e 2015.

A trajetória desse indicador é similar no Brasil: apesar de ter caído pela me-

tade entre 1990 e 2010, fundamentalmente por uma redução dos óbitos por

causas diretas7, a taxa de mortalidade brasileira ainda é superior ao considera-

1 Ficha de Informação sobre Mortalidade Materna da Organização Mundial da Saúde. Disponível em http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs348/en/. Acesso em 24 jan. 2016.2 Ibidem.3 Dado retirado do Global Health Observatory data repositor da Organização Mundial de Saúde. Disponível em http://apps.who.int/gho/data/view.main.1390?lang=en. Acesso em 24 jan. 2016.4 “Estima a frequência de óbitos femininos, ocorridos até 42 dias após o término da gravidez, atri-buídos a causas ligadas à gravidez, ao parto e ao puerpério, em relação ao total de nascidos vivos. O número de nascidos vivos é adotado como uma aproximação do total de mulheres grávidas.” (REDE..., 2008).5 Ficha de Informação sobre Mortalidade Materna da Organização Mundial da Saúde. Disponível em http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs348/en/. Acesso em 24 jan. 2016.6 “O quinto Objetivo de Desenvolvimento do Milênio (ODM 5) é melhorar a saúde materna. São duas metas globais a serem atingidas até 2015: A) reduzir a mortalidade materna a três quartos do nível observado em 1990; e B) universalizar o acesso à saúde sexual e reprodutiva” (INSTITUTO..., 2014, p. 78).7 “Entre as causas de morte materna no Brasil predominam as causas obstétricas diretas (67%), principalmente as hipertensivas e as síndromes hemorrágicas, que têm se mantido como as duas

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| Mãe Coruja Pernambucana30

do aceitável pela OMS – 10 a 20 óbitos para cada 100 mil nascimentos (COSTA

et al., 2002). Não é surpreendente, assim, que o país também não tenha, até

2015, alcançado a meta A do quinto Objetivo de Desenvolvimento do Milênio

(Instituto de Pesquisa Econômica, 2014).

Podem-se realizar análises similares com o indicador de mortalida-

de infantil8: ainda morrem, todos dias, e em todo o mundo, 16 mil crianças

menores de 5 anos de idade, de acordo com a OMS9; em 2015, 5,9 milhões

de crianças de até 5 anos morreram, das quais 75% com menos de 1 ano de

vida10. No Brasil, nesse mesmo ano, morreram mais de 31 mil crianças me-

nores de 1 ano (IBGE, 2015).

A mortalidade infantil também tem apresentado uma trajetória de declínio

um pouco mais acentuada que a taxa de mortalidade materna, no Brasil e no

mundo, desde a década de 1990. De acordo com a OMS, a taxa de mortalidade

infantil11 alcançou o patamar de 32 óbitos por mil nascidos vivos, um avan-

ço em relação a 1990, quando essa taxa alcançava 63 óbitos por mil nascidos

vivos12 No Brasil, esse indicador apresentou melhora mais significativa nesse

período: de 47,1 óbitos por mil nascidos vivos em 1990 para 13,8 óbitos por mil

nascidos vivos em 2016 (IBGE, 2016). Com isso, o Brasil, ao contrário de gran-

de parte do restante do mundo, conseguiu atingir a meta B do quarto Objetivo

de Desenvolvimento do Milênio13, já em 2011.

Assim, apesar de serem inegáveis os avanços das últimas duas décadas, fica

evidente que as reduções das taxas de mortalidade materna e infantil devem

ser tratadas como temas centrais para o Brasil. É preciso que os entes públi-

cos continuem a trabalhar em políticas públicas que tenham especial foco nas

mulheres grávidas e crianças e que consigam, de forma efetiva, reduzir a mor-

talidade desses grupos.

principais causas de mortalidade materna ao longo das últimas décadas. Estas são também as cau-sas mais frequentes na América Latina. “ (BRASIL, 2011b).8 Calcula-se a taxa de mortalidade infantil, de forma direta, a partir da seguinte fórmula: Número de óbitos de residentes com menos de um ano de idade/Número de nascidos vivos de mães resi-dentes x 1000 (REDE ..., 2008).9 Ficha de Informação sobre Mortalidade na Infância da Organização Mundial da Saúde. Disponí-vel em http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs178/en/. Acesso em 24 jan. 2016.10 Ibidem.11 A taxa de mortalidade infantil é calculada a partir da divisão do número de óbitos de crianças menores de um ano em uma dada localidade pelo número de crianças nascidas nessa mesma localidade.12 http://www.who.int/gho/child_health/mortality/neonatal_infant_text/en/.13 “O quarto Objetivo de Desenvolvimento do Milênio (ODM 4), de reduzir a mortalidade na in-fância, leva em conta três indicadores: a taxa de mortalidade na infância (menores de 5 anos), a taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano) e a proporção de crianças de até 1 ano vacinadas contra o sarampo. [...] À frente de muitos países, o Brasil já alcançou a meta de redução da morta-lidade na infância. A taxa passou de 53,7 em 1990 para 17,7 óbitos por mil nascidos vivos em 2011” (INSTITUTO..., 2014, p. 66).

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Um olhar sobre os números | 31

Ações de saúde pública focadas na saúde materno-infantil existem desde o

início do século XX, com a implantação de diversos programas e um objetivo

em comum: reduzir as taxas de morbimortalidade materna e infantil. Tais ações,

evidentemente, contribuíram para a redução significativa nessas taxas, confor-

me visto anteriormente.

O primeiro programa de defesa à saúde materno-infantil foi implantado du-

rante o governo de Getúlio Vargas14. Posteriormente, a intensificação dos mo-

vimentos sociais a partir da década de 1980 deu origem à formulação de no-

vas políticas e programas de saúde pública voltados para promover avanços no

atendimento à mulher em fase de gestação e à criança.

A primeira dessas novas políticas públicas foi o Programa de Assistência

Integral à Saúde da Mulher (PAISM), implantado em 1984. Esse programa

representou um marco ao definir suas ações prioritárias a partir das necessidades

das mulheres, rompendo com o modelo vigente de atenção materno-infantil15.

O PAISM foi o primeiro programa lançado pelo governo federal que destacou a

importância do planejamento familiar no Brasil, incluindo atividades educativas,

de prevenção à gravidez indesejada e doenças sexualmente transmissíveis, de

diagnóstico e tratamento (BRASIL, 2011b). Ademais, esse programa considerava

a necessidade de articulação das ações de pré-natal, assistência ao parto e

puerpério, prevenção do câncer e de doenças sexualmente transmissíveis,

assistência à adolescente, à menopausa e à anticoncepção (ALMEIDA, 2005).

As ações do programa foram apontadas como uma das causas da redução

substancial da taxa de mortalidade materna: de 69 óbitos para cada 100 mil

nascimentos, em 1980, para 44 óbitos por 100 mil nascimentos em 1996 (BRASIL,

2004a). No entanto, ainda em 1996, essa taxa era extremamente elevada para

os padrões da OMS e também quando comparada com as taxas observadas em

países desenvolvidos, nos quais ocorriam menos de 10 óbitos para cada 100

mil nascidos vivos. Ou seja, mesmo após décadas de implantação do PAISM,

persistiam altos índices de morbimortalidade materna.

A Constituição Federal de 1988 contribuiu para proteger a saúde da mulher

e da criança, assegurando a proteção à maternidade e à infância; a licença à

gestante sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de 120 dias; a

licença-paternidade nos termos fixados em lei; a assistência gratuita aos filhos

14 Para uma análise mais detalhada da evolução da atenção à saúde materno-infantil no Brasil desde o Estado Novo até os dias atuais, ver Cassiano et al. (2014).15 Segundo Cassiano et al. (2004), esse programa “foi uma das maiores conquistas do movimento feminista, resultante da mobilização das mulheres brasileiras em busca da cidadania, dos direitos e do acesso ao espaço público”.

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| Mãe Coruja Pernambucana32

e dependentes, desde o nascimento até 6 anos de idade em creches e pré-es-

colas; e a proteção especialmente à gestante e ao planejamento familiar, entre

outros (BRASIL, 1988).

Alguns anos após a promulgação da Constituição Brasileira, em 1994, foi cria-

do o Programa Saúde da Família (PSF). O PSF é um programa de atenção básica à

saúde, com foco na prevenção e na detecção rápida de doenças, com o acompa-

nhamento constante da população usuária. Implementado em nível municipal,

seu objetivo é reorganizar a atenção básica no país, estabelecendo um vínculo en-

tre equipes multiprofissionais de saúde e a população. Cada equipe funciona com

um médico, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e seis agentes comuni-

tários de saúde e deve ser responsável por, no máximo, 4 mil pessoas. Atenção

especial é dada à saúde infantil e, consequentemente, ao acompanhamento de

mulheres grávidas. De fato, conforme mostrado em Rocha e Soares (2008), o pro-

grama contribuiu para a redução da taxa de mortalidade infantil nos municípios

que receberam o programa. O estudo revela que o efeito foi maior nos municípios

que apresentavam piores condições em termos de taxa de mortalidade, nos mu-

nicípios do Norte e Nordeste do país, e também nas causas de morte que depen-

dem mais de atenção básica.

Em junho de 2000, foi lançado o Programa de Humanização no Pré-natal e

Nascimento (PHPN) cujo principal objetivo era reduzir as altas taxas de mor-

bimortalidade materna, perinatal e neonatal no país (CASSIANO et al., 2014).

Esse programa visava a aumentar a qualidade do atendimento à mulher, ten-

do a humanização como princípio norteador. Mais especificamente as gestan-

tes passaram a ter o direito de saber em qual maternidade teriam seus bebês; a

poder ter um acompanhante durante o pré-parto, parto e puerpério imediato;

e também a ter acesso ao alojamento conjunto16. Contudo, por conta de uma

série de problemas como dificuldades no acesso aos serviços de saúde, falta de

leitos, carência de recursos humanos, financeiros e materiais, o programa aca-

bou não tendo o impacto desejado (CASSIANO et al., 2014). Persistia a incerteza,

por parte das mães, sobre vagas nos hospitais e a peregrinação entre os serviços

hospitalares. Ademais, o programa não alcançou a abrangência esperada, com

a humanização ficando restrita aos grandes centros urbanos e, com isso, atingiu

metas inferiores às estabelecidas (CASSIANO et al., 2014).

Com os resultados obtidos e a redução da mortalidade materna permane-

cendo ainda em níveis inaceitáveis, em 2004, foi lançado pelo governo o Pac-

16 Quando o bebê nasce em boas condições de saúde, pode permanecer com a mãe durante todo o tempo de internação e não apenas durante a amamentação.

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Um olhar sobre os números | 33

to Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, cujo objetivo era

atingir uma redução anual de 5% nesses óbitos (BRASIL, 2004a). As altas taxas

de partos cesáreos eram uma preocupação clara: o procedimento implica o do-

bro da permanência no hospital, além de ser um possível motivo de complica-

ção no parto. Atualmente, o Brasil ocupa posição de destaque no cenário inter-

nacional, com 57% das mulheres recorrendo a esse procedimento, muito acima

da recomendação de 15% da OMS (BRASIL, 2004b).

Após mais de uma década, o governo voltou a mobilizar esforços na busca pela

melhoria da assistência materno-infantil e lançou, em 2011, o Programa Rede Ce-

gonha, que tem como objetivos:

I - Fomentar a implementação de novo modelo de atenção à saúde da mulher e à saúde da

criança com foco na atenção ao parto, ao nascimento, ao crescimento e ao desenvolvimento da

criança de 0 aos 24 meses.

II - Organizar a Rede de Atenção à Saúde Materna e Infantil para que esta garanta acesso,

acolhimento e resolutividade.

III - Reduzir a mortalidade materna e infantil com ênfase no componente neonatal.

(BRASIL, 2011a: Art. 3º)

As mulheres são acompanhadas durante todas as fases da gravidez desde a

sua confirmação, pré-natal, parto e 28 dias após o parto, e as consultas de pré-

natal incluem exames laboratoriais e de ultrassonografia, além de testes rápidos

para diagnóstico de algumas doenças (como o teste do pezinho). A Rede Cego-

nha prevê, ainda, visitas domiciliares às gestantes e puérperas, principalmente

no último mês de gestação e na primeira semana após o parto. O objetivo dessas

visitas é monitorar tanto a mulher quanto a criança, passar orientações e iden-

tificar possíveis fatores de risco, realizando os encaminhamentos necessários.

Segundo Cassiano et al. (2014):

A Rede Cegonha é, até então, o programa mais completo já elaborado pelo Governo Federal.

Suas ações são voltadas para todas as etapas da vida da mulher e abrangem estratégias que

vão desde orientação em relação ao cuidado com o corpo, com o uso de métodos contracepti-

vos, atendimento da gestante, puérpera e recém-nascido, até ações voltadas ao atendimento

da criança de até dois anos de idade.

Por fim, em 2015, com vistas a intensificar e alinhar as ações e recursos nas

três esferas de governo – federal, estadual e municipal –, instituiu-se a Política

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| Mãe Coruja Pernambucana34

Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC), cujo objetivo seria

o de consolidar e ampliar conquistas como a redução da mortalidade infantil e

materna e a queda da desnutrição17. A política promove o aleitamento materno

e atenção à criança da gestação aos 9 anos de idade, com especial ênfase na pri-

meira infância (0 a 72 meses) e em populações de maior vulnerabilidade, como

crianças com deficiência, indígenas, quilombolas, ribeirinhas e em situação de

rua. São sete os eixos estratégicos: i) atenção humanizada e qualificada à ges-

tação, parto, nascimento e recém-nascido; ii) aleitamento materno e alimenta-

ção complementar saudável; iii) promoção e acompanhamento do crescimento

e desenvolvimento integral; iv) atenção a crianças com agravos prevalentes na

infância e com doenças crônicas; v) atenção à criança em situação de violências,

prevenção de acidentes e promoção da cultura de paz; vi) atenção à saúde de

crianças com deficiência ou em situações específicas e de vulnerabilidade; e vii)

vigilância e prevenção do óbito infantil, fetal e materno18.

Dado esse cenário, em que diversos programas com foco na saúde materno

-infantil foram implementados desde o século XX, observou-se, de fato, resul-

tados bastante positivos em termos de redução das taxas de morbimortalidade

materna e infantil19. Contudo, mesmo com todo o progresso observado no país

em termos de redução dessas taxas, ainda há muito que fazer, principalmente

no que diz respeito a aumentar a qualidade dos serviços prestados e a garantir

maior equidade em todo o país.

O Programa Mãe Coruja Pernambucana, foco deste estudo, se insere nesse

contexto de políticas públicas voltadas para a saúde materno-infantil e para a re-

dução dos índices de mortalidade materno-infantil. Criado em outubro de 2007,

a partir do Decreto 30.859, e transformado em política pública do Estado de Per-

nambuco pela Lei 13.959, de 2009, o Programa Mãe Coruja Pernambucana surgiu

como estratégia do governo pernambucano para garantir atenção integral às ges-

tantes usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS) e seus filhos com até 5 anos de

idade, criando uma rede solidária para reduzir a mortalidade materna e infantil20.

17 Ministério da Saúde, portaria nº 1.130, de 5 de agosto de 2015. Ver também http://www.brasil.gov.br/saude/2015/08/politica-vai-fortalecer-acoes-de-promocao-da-saude-da-crianca-brasileira.18 Portaria nº 1.130, de 5 de agosto de 2015.19 Evidentemente, nem todas as ações produziram resultados positivos, como é o caso do aumen-to dos partos cesáreos. 20 São 11 os objetivos do Programa Mãe Coruja Pernambucana, conforme Portaria nº 1.130, de 5 de agosto de 2015: I - articular, formular, executar e monitorar ações que promovam a redução da morbimortalidade materna e infantil no Estado de Pernambuco; II - garantir atenção integral e humanizada à mulher durante o ciclo gravídico-puerperal; III - garantir atenção integral e hu-manizada às crianças de 0 a 5 anos; IV - fortalecer os Comitês de Estudos da Mortalidade Materna e Comitês de Prevenção e Redução da Mortalidade Infantil em todo o Estado; V - consolidar os

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Um olhar sobre os números | 35

Como consta em manual disponibilizado pelo governo do Estado de Pernambuco

(2007), o objetivo do programa é:

Garantir atenção integral às gestantes usuárias do sistema público de saúde, bem como aos

seus filhos e famílias, incentivando o fortalecimento dos vínculos afetivos e criando uma

rede solidária para redução da mortalidade infantil e materna, além da melhoria de outros

indicadores sociais, através de ações articuladas nos eixos da saúde, educação, desenvol-

vimento e assistência social. (PERNAMBUCO, 2007)

Desde a sua criação, o Programa Mãe Coruja Pernambucana se estabeleceu

como uma política pública de saúde materno-infantil baseada na articulação

direitos de cidadania pela garantia de acesso à documentação; VI - fortalecer vínculos familia-res por meio da proteção social básica; VII - melhorar a regularidade, quantidade e qualidade da alimentação das crianças, gestantes e nutrizes com vistas à segurança alimentar e nutricional sustentável; VIII - promover ações de inclusão produtiva por meio de políticas emancipatórias sustentáveis; IX - consolidar a alfabetização das famílias acompanhadas; X - propiciar espaços de informação e qualificação profissional das famílias beneficiárias; XI - promover ações articuladas, constituindo uma rede de solidariedade entre as Secretarias Estaduais de Saúde, de Educação, de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos, de Agricultura e Reforma Agrária, de Planejamento e Gestão, de Juventude e Emprego e da Mulher.

No Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

as mulheres

continuam sendo

acompanhadas

depois do

nascimento

do bebê

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| Mãe Coruja Pernambucana36

de diferentes entes, incluindo secretarias, municípios e Estado. Essa caracte-

rística do programa é essencial para compreender sua forma de atuação: ao

ser implementado em um município, o Programa Mãe Coruja Pernambucana

estabelece o Canto Mãe Coruja, como é chamado o local físico em que o pro-

grama se instala. Os Cantos Mãe Coruja contam com dois profissionais respon-

sáveis por coordenar os cuidados com as gestantes e as crianças beneficiadas,

juntamente com os diferentes entes municipais e estaduais. O Programa Mãe

Coruja Pernambucana atua, portanto, como articulador de uma rede de apoio

às gestantes beneficiadas. Cabe destacar que esse apoio não se limita ao uni-

verso da saúde materno-infantil, conforme fica claro da portaria que instituiu

o programa. Um exemplo disso é a organização de cursos profissionalizantes

promovidos pelos Cantos, em parceria com outros entes governamentais.

A partir de seu cadastramento no programa, as gestantes são monitoradas

durante o pré-natal, o parto e o pós-parto; posteriormente, também o desen-

volvimento das crianças é acompanhado até os 5 anos de idade. Durante todo

esse período, os Cantos coordenam os cuidados com as gestantes beneficiadas

e suas crianças, acionando os diferentes entes municipais e estaduais de acor-

do com a necessidade. Além disso, as mulheres beneficiadas e suas famílias

são convidadas a participar dos Círculos de Educação e Cultura — momentos

de troca de experiências e de orientação que acontecem semanalmente. Por

fim, as gestantes que comparecem pelo menos a sete consultas pré-natais re-

cebem um kit com enxoval para o bebê.

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Um olhar sobre os números | 37

Capítulo 2

Objetivos e desafios

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| Mãe Coruja Pernambucana38

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O presente relatório apresenta os resultados da avaliação de impacto

do Programa Mãe Coruja Pernambucana sobre indicadores de saúde

materno-infantil. Optou-se por investigar o impacto do programa sobre

indicadores municipais de saúde materno-infantil nos municípios em que

ele foi implementado. Tal opção é consistente com a natureza municipal do

programa e com seus ousados objetivos, que incluem transformar a situação

da saúde materno-infantil dos municípios e regiões em que atua, além de

também modificar essa situação em nível estadual.

Assim, considerando o processo de expansão do Programa Mãe Coruja

Pernambucana entre 2008 e 2014, uma série de modelos estatísticos foi utilizada

para isolar, da forma mais robusta possível, o impacto do programa sobre

indicadores municipais de saúde materno-infantil. Para tal, foram utilizados

dados secundários, retirados do Departamento de Informática do Sistema Único

de Saúde Datasus, em nível municipal. Entretanto, a estimação do impacto do

programa enfrentou diversos desafios, que serão detalhados na próxima subseção.

A metodologia, apresentada no capítulo 3, foi construída de modo a lidar

com todos esses desafios e conseguir isolar o impacto do Programa Mãe Coruja

Pernambucana. Nesse capítulo, serão discutidos os desafios enfrentados pela

avalição decorrentes da agregação dos dados que se consegue observar, forma

de atuação do programa e seu processo de expansão. As subseções seguintes

são destinadas à descrição metodológica de nossa avaliação com uma breve

explanação dos modelos utilizados para lidar com os desafios mencionados

aqui. No capítulo 4, são apresentados os resultados encontrados para cada in-

dicador de interesse e a análise sobre a validade da metodologia adotada. A

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| Mãe Coruja Pernambucana40

robustez desses resultados é avaliada no capítulo 5. Por fim, o capítulo 6 traz

as principais conclusões desta avaliação.

2.1 Munícipios como unidades de análise

Como já explicitado nesta avaliação, o impacto do Programa Mãe Coruja

Pernambucana é medido sobre o total da população de mães e crianças dos

municípios beneficiados, uma vez que foram analisados indicadores munici-

pais de saúde materno-infantil. Entretanto, o programa atende apenas parte

dessa população: são apenas dois funcionários nos Cantos Mãe Coruja cadas-

trando e atendendo mães e crianças, em cada município beneficiado. Assim,

é preciso justificar essa dissonância entre população atendida pelo programa e

população sobre a qual o impacto foi medido.

Em termos substantivos, é importante ressaltar que o desenho do pro-

grama foi pensado para que, a partir da atuação sobre alguns, seja possível

transformar todos. Ou seja, entende-se que o objetivo do Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana é não apenas transformar a vida dos que participam di-

retamente dele, mas também causar efeitos benéficos em todo o Estado. Por

isso, analisar o impacto sobre indicadores municipais de saúde é consoante

com seus objetivos.

Em segundo lugar, cabe ressaltar que, como poucas famílias concentram a

maior parte das carências, o atendimento a elas pode ter um impacto de gran-

de magnitude sobre os indicadores municipais. Para tal, é importante que o

programa tenha capacidade de rastrear e identificar os casos de alta vulnerabi-

lidade; mas não é necessário que ele tenha um atendimento massivo. Ou seja,

a informação e a inteligência na focalização do atendimento são mais impor-

tantes do que a escala.

Com isso, entende-se que a mensuração do impacto do Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana sobre o conjunto das famílias de um município é consis-

tente com seus objetivos. Entretanto, a despeito da adequação de uma avalia-

ção de impacto sobre o resultado agregado a esses objetivos, seria de grande

utilidade também contar com uma avaliação do impacto do programa sobre

as famílias diretamente atendidas. Assim como em grande parte do país, o

desafio da disponibilidade de informações individualizadas e de qualidade,

tanto para as famílias atendidas, quanto para as não atendidas pelo programa,

impossibilita que uma avaliação dessa natureza seja conduzida. Também essa

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Um olhar sobre os números | 41

limitação prática fez com que esta avaliação se concentrasse no impacto do

programa apenas sobre indicadores agregados em nível municipal.

2.2 Programa atua de forma complementar

Outro desafio enfrentado pela avaliação é consequência de uma caracterís-

tica intrínseca do Programa Mãe Coruja Pernambucana: ele é complementar e

não atua em um vácuo de ações voltadas à promoção da saúde materno-infan-

til. Como já mencionado, a promoção da saúde materno-infantil é talvez a maior

das prioridades das políticas de saúde nacional, contando com uma variedade de

programas com alta cobertura, incluindo o Programa Saúde da Família e o Rede

Cegonha. Com isso, o papel do Programa Mãe Coruja Pernambucana reside mais

em garantir que os programas e serviços já existentes alcancem e sejam acessados

por todos, em particular pelas famílias mais vulneráveis, do que propriamente

oferecer um atendimento adicional direto.

O Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

é um articulador

de diversos

programas e ações

preexistentes

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| Mãe Coruja Pernambucana42

Essa característica coloca desafios para a avaliação de impacto. Por ope-

rar como um galvanizador, articulador e promotor de uma série de programas

e ações de promoção da saúde materno-infantil preexistentes, o impacto do

Programa Mãe Coruja Pernambucana é necessariamente complementar. As-

sim, em um município em que os outros programas e serviços voltados para a

saúde materno-infantil funcionem bem e sejam de fácil acesso, o impacto do

programa será pequeno.

2.3 Impacto sobre eventos rarosUm terceiro desafio está relacionado à natureza dos indicadores analisa-

dos. Muitos dos eventos que o Programa Mãe Coruja Pernambucana busca evi-

tar que ocorram e, portanto, muitos dos indicadores analisados referem-se a

eventos relativamente raros e pouco sensíveis às intervenções. A mortalidade

infantil é um exemplo característico: mesmo nos municípios pernambucanos

em que a mortalidade infantil é mais elevada, ela não supera 5%. Embora vá-

rias medidas possam ser tomadas para evitar que essas mortes ocorram, não

há suficiente conhecimento médico para identificar, com absoluta precisão, as

crianças em maior risco e evitar sua morte.

Assim, como o Programa Mãe Coruja Pernambucana se propôs a reduzir

eventos relativamente raros e sobre os quais tem capacidade reconhecida-

mente limitada de influenciar, a saber, os indicadores de mortalidade in-

fantil, a avaliação de impacto do programa enfrenta mais um desafio. Entre-

tanto, se é um grande desafio (e de fato é) encontrar impactos significativos

nesses indicadores, por outro lado, é o desafio que o próprio programa se

propôs a enfrentar.

2.4 Processo de seleção dos municípios beneficiados pelo programa

Por fim, estimar o que teria acontecido com a saúde materno-infantil nos

municípios beneficiados, caso esses benefícios não tivessem acontecido, é ou-

tro grande desafio da avaliação de impacto. Invariavelmente, estima-se o que

teria acontecido a partir do que aconteceu com a saúde materno-infantil nos

municípios não beneficiados. Evidentemente, essa estratégia não irá funcio-

nar muito bem se os municípios não beneficiados forem de natureza distinta

dos beneficiados, por serem, por exemplo, socioeconomicamente menos vul-

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Um olhar sobre os números | 43

neráveis ou por terem historicamente melhores condições de saúde materno

-infantil. Para que essa estratégia funcione, é necessário encontrar municípios

não beneficiados similares aos beneficiados, de modo a formar o que se deno-

mina de “grupo de controle”.

O processo seletivo dos participantes é um ponto-chave para a construção

de um grupo de controle. Quando a seleção dos participantes é feita ao aca-

so (por exemplo, por sorteio), os não beneficiados formam naturalmente um

grupo de controle. Quando o processo de seleção segue outros procedimentos,

como ocorreu no Programa Mãe Coruja Pernambucana21, não é possível obter

um grupo de controle exato. Trabalha-se, então, com um grupo aproximado,

denominado “grupo de comparação”. O processo de construção do grupo de

comparação é necessariamente mais elaborado: é preciso realizar ajustes para

formar esse grupo. Pode-se, por exemplo, utilizar todos os não beneficiados

como grupo de comparação e ajustar para as diferenças preexistentes entre

municípios beneficiados e não beneficiados.

Importante ressaltar que, na falta de um processo de seleção ao acaso, os

procedimentos para seleção do grupo de comparação e para ajustes necessários

para corrigir as diferenças preexistentes serão necessariamente mais comple-

xos. Para além disso, esses procedimentos serão mais incertos, já que não será

possível verificar se os ajustes realizados são de fato os que deveriam ter sidos

feitos. Nesse caso, a estimação do impacto de um programa passa inexoravel-

mente a depender de hipóteses não testáveis. Entretanto, dado o processo de

seleção de beneficiários utilizado pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana,

descrito em detalhes posteriormente na seção 3.4.1 deste documento, essa foi

a estratégia de avaliação que precisou ser adotada e, portanto, foi mais um de-

safio enfrentado por esta avaliação.

21 Será explorado em detalhes na seção 3.4.1.

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| Mãe Coruja Pernambucana44

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Um olhar sobre os números | 45

Capítulo 3

Metodologia

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| Mãe Coruja Pernambucana46

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3.1 Indicadores escolhidos

Vinte indicadores de saúde materno-infantil foram inicialmente selecio-

nados para serem analisados nesta avaliação. A metodologia de cálculo

desses indicadores, sua unidade de medida e a fonte de informação utili-

zada podem ser encontradas no apêndice 1.

Optou-se por trabalhar, nesta avaliação, apenas com indicadores que são

coletados pelo Datasus, principal base de dados de indicadores de saúde no

Brasil. Assim, foram escolhidos os indicadores, dentre os já calculados pelo

Datasus, que cobrissem todos os aspectos da saúde materno-infantil, ou seja,

que possibilitassem o monitoramento das diferentes fases do ciclo gravídi-

co-puerperal, tanto das gestantes quanto dos fetos, além de indicadores que

cobrissem também as condições de saúde do primeiro ano de vida da criança.

Com isso, definiu-se um conjunto de indicadores que pode ser dividido nas

seguintes categorias:

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| Mãe Coruja Pernambucana48

Tabela 1: Grupos dos indicadores de saúde materno-infantil

Fonte: Elaboração própria.

Ressalta-se que alguns dos indicadores listados na tabela 1 possuem diver-

sos problemas metodológicos que prejudicam a análise dos resultados. Optou-

se, então, por excluir tais indicadores, a saber: a taxa de mortalidade materna

e a taxa de prematuridade22. Já o indicador de razão de óbitos infantis também

foi excluído das análises a seguir por ser de difícil interpretação. Com isso, se-

rão apresentados resultados para um conjunto de 17 indicadores de saúde ma-

terno-infantil.

22 Ambos os indicadores são subnotificados. De acordo com Volochko (2003), em relação à mor-talidade materna, há uma subnotificação frequente de óbitos maternos “(...) atribuída ao desco-nhecimento das regras de preenchimento da Declaração de Óbito e de sua importância nas esta-tísticas vitais, e também ao ocultamento da causa real das mortes maternas por possibilidade de associação à negligência, imperícia ou a possível ato ilegal”. Já quanto à taxa de prematuridade, também “(...) há fortes evidências de que os dados oficiais do Sistema de Informações sobre Nas-cidos Vivos (Sinasc) subestimam a prevalência de nascimentos pré-termo no país” (MATIJASE-VICH, 2013).

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Um olhar sobre os números | 49

3.2 Evolução dos indicadores em Pernambuco, no Nordeste e no Brasil

Comparar a evolução no período de 2008 a 2014 dos indicadores selecionados

em Pernambuco com a evolução tanto no restante do Nordeste quanto no restante

do Brasil pode apresentar uma primeira evidência do impacto do Programa Mãe

Coruja Pernambucana. Afinal, caso a taxa de melhoria de um dado indicador seja

mais acentuada em Pernambuco que no restante do Nordeste e do Brasil, após

a implementação do programa, é possível interpretar essa diferença como um

indicativo de que o programa possui impacto sobre esse indicador.

Optou-se, assim, por iniciar este estudo com uma análise desse gênero. Impor-

tante destacar que esta é uma análise descritiva e que não se pretende, neste mo-

mento, isolar o impacto do Programa Mãe Coruja Pernambucana sobre quaisquer

indicadores. O objetivo desta análise é, portanto, coletar uma primeira indicação

de impacto e também descrever a evolução desse conjunto de indicadores no pe-

ríodo analisado.

Para cada um dos indicadores, foi estimado o modelo (1) , apresentado a seguir,

considerando o período de 2008 a 2014:

(1)

onde é o indicador de interesse no ano no município e a dummy

indica se o município pertence ao Estado de Pernambuco. O coeficiente re-

presenta o crescimento do indicador analisado entre 2008 e 2014 no Brasil, ex-

cluindo-se o Estado de Pernambuco. Já a soma desse coeficiente com o coeficiente

da interação entre e , , representa o crescimento desse indicador

no Estado de Pernambuco. Analisando a precisão do coeficiente dessa interação,

pode-se, então, concluir se há uma diferença estatisticamente significante entre a

evolução de um determinado indicador em Pernambuco e no restante do Brasil. A

variável inclui os erros de estimação decorrentes de fatores não observados e

possíveis erros de medida.

O modelo (1) também foi estimado para cada um dos indicadores selecionados,

considerando apenas municípios da região Nordeste. Nesse caso, a interpretação

dos coeficientes modifica-se: o coeficiente indica o crescimento de um dado

indicador ao longo do tempo na região Nordeste, excluindo-se o Estado de Per-

nambuco, e o coeficiente da interação, , representa a diferença entre o cresci-

mento desse indicador no Nordeste e em Pernambuco. A análise da significância

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| Mãe Coruja Pernambucana50

estatística desse coeficiente possibilita concluir se há uma diferença significativa

entre o crescimento de Pernambuco e o do restante do Nordeste em relação a um

dado indicador23.

Além da análise comparada da evolução dos indicadores selecionados

no período de 2008 a 2014, pode-se também analisar a evolução da taxa de

progresso antes e após a implementação do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana, considerando apenas o Estado de Pernambuco. Uma aceleração na

taxa de progresso de um dado indicador após a implementação do programa

também pode ser interpretada como um indicativo de que ele pode ter im-

pacto nesse indicador.

O modelo (2), apresentado a seguir, foi utilizado para realizar essa análise e foi

estimado para todos os indicadores selecionados.

(2)

onde representa novamente um indicador de interesse no ano no muni-

cípio e a dummy indica a existência do Programa Mãe Coruja Pernambucana

e assume o valor 1 após 2008 e 0, antes. A variável representa aqui o erro de

estimação do modelo decorrente de possíveis erros de medida e existência de fa-

tores não observados.

A interpretação desse modelo é simples: o coeficiente representa a diferença

da evolução da taxa de progresso de um dado indicador entre os municípios benefi-

ciados e não beneficiados pelo programa. Caso esse coeficiente seja estatisticamen-

te significativo, pode-se, então, afirmar que há evidências de que a implementação

do programa tenha impactado de alguma forma o progresso desse indicador24.

3.3 Modelo simples de Diferenças em Diferenças

Uma evidência um pouco mais robusta do impacto do Programa Mãe Coruja

Pernambucana pode ser encontrada a partir da estimação de um modelo de Dife-

renças em Diferenças. Modelos desse gênero são usualmente utilizados em avalia-

ções de impacto de programas e baseiam-se em um princípio simples: caso haja

uma seleção aleatória do grupo de tratamento, esse grupo e o grupo de controle

23 Os resultados para essas duas análises da evolução dos indicadores são apresentados no capí-tulo 4 separadamente para cada indicador de interesse.24 Os resultados da análise dessa evolução também serão apresentados no capítulo 4 separada-mente para cada indicador de interesse.

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Um olhar sobre os números | 51

irão diferir apenas em termos do tratamento recebido e, portanto, não possuirão

diferenças em termos de variáveis não observadas. Com isso, é possível isolar o

impacto do tratamento a partir da simples comparação da evolução do indicador

no grupo de tratamento antes e depois de tratados com a evolução desse mesmo

indicador para o mesmo período no grupo de controle. Ou seja, a estimação pon-

tual do impacto ( ) do tratamento pode ser dada por:

(3)

onde e são as médias do indicador de interesse antes do progra-

ma nos grupos de tratamento e de controle, respectivamente, e e

são as médias após o período de implementação do programa também nos grupos

de tratamento e controle, respectivamente. A significância estatística da estimativa

pode ser encontrada a partir do Teste-t de diferenças. Para melhor ilustrar esse

modelo, foi elaborado o gráfico 1.

Nesse gráfico, a estimação pontual do impacto do programa, , é represen-

tada pela seta azul e pode ser encontrada ao subtrair a seta cinza [a melhora do

grupo de controle no período analisado, representada por

da seta vermelha [a melhora do grupo de tratamento no período analisado,

. Cabe observar que, no gráfico 1, tanto o grupo de tratamento

(vermelho) quanto o grupo de controle (cinza) partem da mesma condição ini-

cial antes da intervenção do Programa Mãe Coruja Pernambucana em relação ao

indicador de interesse, o que é uma consequência da seleção aleatória dos trata-

dos, hipótese central desse modelo.

Gráfico 1: Ilustração de um modelo de Diferenças em Diferenças

Fonte: Elaboração própria.

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| Mãe Coruja Pernambucana52

O modelo de Diferenças em Diferenças, apresentado em (3), foi estimado

para todos os indicadores selecionados. Importante destacar que o grupo de

tratamento é composto por todos os municípios beneficiados pelo programa

e o grupo de comparação25, por todos os municípios não beneficiados. Assim,

no modelo (3), representa a média de um dado indicador no grupo e no

período , em que é o grupo de comparação ( ) ou o tratamento ( ) e

é o período 1 (antes da implementação do programa) ou o período 2 (após a

implementação do programa). Com isso, a diferença entre as duas diferenças

representa a estimação pontual do impacto do Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana para um dado indicador26.

3.4 Modelo de Diferenças em Diferenças com correção para condição inicial

Como já explicitado anteriormente, caso haja seleção aleatória do grupo de

tratamento, a estimação de um modelo de Diferenças em Diferenças é uma

estimação robusta de impacto do programa. Entretanto, essa hipótese não se

aplica ao Programa Mãe Coruja Pernambucana, uma vez que a seleção e a ex-

pansão do programa foram realizadas de forma focada, buscando primeiro

atender os municípios mais vulneráveis. Na próxima subseção, esse processo

de expansão será analisado em maior profundidade.

Por conta da seleção não aleatória do grupo de tratamento, o modelo de

Diferenças em Diferenças apresentado na seção 3.3 não é capaz de isolar o

impacto do Programa Mãe Coruja Pernambucana. O grupo de tratamento e o

de comparação27 diferem tanto em relação à condição inicial dos indicadores

selecionados quanto em relação a uma série de outros indicadores de vulne-

rabilidade, como será discutido na subseção 3.4.2. Para estimar o impacto do

programa de forma robusta, foi preciso realizar dois tipos de ajustes ao im-

pacto estimado pelo modelo de Diferenças em Diferenças: um ajuste para a

diferença em termos da condição inicial do indicador analisado e outro para a

diferença em termos da vulnerabilidade socioeconômica dos municípios be-

neficiados. A seção 3.4.3 apresentará a metodologia utilizada para realizar tais

ajustes e para calcular o impacto ajustado.

25 Como o Programa Mãe Coruja Pernambucana não teve um processo de seleção aleatório, este grupo não pode ser denominado “grupo de controle”.26 Os resultados dessa estimação podem ser encontrados nas tabelas apresentadas para cada in-dicador de interesse no capítulo 4.27 Como os beneficiários não foram definidos de forma aleatória, esta avaliação trabalha com um grupo de comparação e não de controle.

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Um olhar sobre os números | 53

3.4.1 Processo de expansão e seleção

A seleção dos municípios pernambucanos que seriam incluídos no Programa

Mãe Coruja Pernambucana considerou a divisão já estabelecida das Gerências

Regionais de Saúde do Estado28 (Geres). Os critérios de seleção dos municípios

foram: possuir taxas de mortalidade infantil maior ou igual a 25 óbitos por mil

nascidos vivos; possuir Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e Índice de

Desenvolvimento Infantil (IDI) baixos29; e, no caso em que 50% dos municípios

situados na área adstrita à Geres apresentassem taxa de mortalidade infantil

maior que 25 óbitos por mil nascidos vivos, o programa seria então implementado

em todos os municípios da Geres (PERNAMBUCO, 2016).

A implementação do programa foi iniciada em 200830 com a priorização dos

municípios pertencentes às VI e IX Geres por apresentarem os piores indicadores

de mortalidade infantil de Pernambuco, conforme o Manual do Programa Mãe Coruja

Pernambucana (PERNAMBUCO,2016). Assim, os primeiros municípios a contarem

com o programa foram aqueles pertencentes ao Sertão de Moxotó31, ao Sertão do

Araripe32, além de Parnamirim, um município do Sertão Central.

No ano seguinte, foram incorporados ao programa mais 67 munícipios a partir

do mesmo critério, distribuídos da seguinte forma pelo Estado: 1 município da I

Geres (Araçoiaba); 2 municípios da II Geres (Casinhas e Cumaru); 10 municípios

da III Geres (Amaraji, Catende, Cortês, Jaqueira, Joaquim Nabuco, Lagoa dos Gatos,

Maraial, Palmares, Quipapá e Xexéu); 13 municípios da IV Geres (Agrestina, Belo

Jardim, Camocim de São Félix, Ibirajuba, Jataúba, Jurema, Panelas, Riacho das

Almas, Sairé, Sanharó, São Caetano, Tacaimbóe Vertentes); todos os municípios

das V, VIII e XI Geres (o que corresponde respectivamente a 21, 7 e 10 municípios);

e 3 municípios da XII Geres (Aliança, Condado e Ferreiros).

Em 2010, com sua última expansão, o Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana alcançou mais 12 municípios, atingindo então todas as Geres do Esta-

28 A Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco dividiu o Estado em Gerências Regionais de Saúde (Geres), responsáveis por um conjunto de municípios. No total, são 12 Geres que cobrem os 185 municípios pernambucanos. 29 O documento que define os critérios de seleção não indica quais seriam esses níveis. Entretan-to, no Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é definido como baixo quando está abaixo de 0,600 (encontrado online em: http://www.atlasbrasil.org.br/2013/pt/o_atlas/idhm/. Acesso em: 27 jan. 2017). Já o Índice de Desenvolvi-mento Infantil é definido como baixo, pela Unicef, quando é inferior a 0,500 (encontrado online em: https://www.unicef.org/brazil/pt/SIB3.pdf. Acesso em: 27 jan. 2017). 30 O Programa Mãe Coruja Pernambucana foi criado via Decreto 30.859, de 4 de outubro de 2007, mas iniciou sua implementação em 2008 e tornou-se lei em 2009 (Lei 13.959).31 Arcoverde, Betânia, Custódia, Ibimirim, Inajá, Manari e Sertânia.32 Araripina, Bodocó, Exu, Granito, Ipubi, Moreilândia, Ouricuri, Santa Cruz, Santa Filomena e Trindade.

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| Mãe Coruja Pernambucana54

do. Foram acrescentados um município da II Geres (Salgadinho), um da III

Geres (Rio Formoso), um da IV Geres (Bonito), dois municípios da VII Geres

(Mirandiba e Terra Nova), cinco municípios da X Geres (Carnaíba, Itapetim,

Iguaracy, Santa Terezinha e Solidão) e dois municípios da XII Geres (Maca-

parana e São Vicente Férrer).

Hoje, o Programa Mãe Coruja Pernambucana totaliza 103 municípios aten-

didos. Para além desses, os municípios de Ipojuca e Recife, ambos pertencen-

tes à I Geres, optaram por adotar o programa em seus municípios a partir de

2013 e 2014, respectivamente, com cooperação técnica estadual.

A tabela 2 apresenta um resumo dessa expansão33 e a figura 1 ilustra a co-

bertura do programa nos municípios pernambucanos em 2015.

Tabela 2: Lista de municípios atendidos pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana e ano de implementação

Ano de

implementaçãoMunicípios

2008 VI Geres: Arcoverde, Buíque, Custódia, Ibimirim, Inajá, Jatobá, Manari, Pedra, Petrolândia,

Sertânia, Tacaratu, Tupanai ga e Venturosa.

IX Geres: Araripina, Bodocó, Exu, Granito, Ipubi, Moreilândia, Ouricuri, Parnamirim, Santa

Cruz, Santa Filomena e Trindade.

2009 I Geres: Araçoiaba.

II Geres: Casinhas e Cumaru.

III Geres: Amaraji, Catende, Cortês, Jaqueira, Joaquim Nabuco, Lagoa dos Gatos, Maraial,

Palmares, Quipapá e Xexéu.

IV Geres: Agresi a, Belo Jardim, Camocim de São Félix, Ibirajuba, Jataúba, Jurema, Panelas,

Riacho das Almas, Sairé, Sanharó, São Caitano, Tacaimbó e Vertentes.

V Geres: Águas Belas, A gelim, Bom Conselho, Brejão, Caetés, Calçado, Ca hoi ho,

Capoeiras, Correntes, Garanhuns, Iai, Itaíba, Jucai, Jupi, Lagoa do Ouro, Lajedo,

Palmeirina, Paranatama, Saloá, São João e Terezinha.

VIII Geres: Afrânio, Cabrobó, Dormentes, Lagoa Grande, Orocó, Petrolina e Santa Maria da

Boa Vista.

XI Geres: Betânia, Calumbi, Carnaubeira da Penha, Flores, Floresta, Itacuruba, Santa Cruz

da Baixa Verde, São José do Belmonte, Serra Talhada e Triunfo.

XII Geres: Aliança, Condado e Ferreiros.

2010 II Geres: Salgadinho.

III Geres: Rio Formoso.

IV Geres: Bonito.

VII Geres: Mirandiba e Terra Nova.

X Geres: Car aíba, Iguaracy, Itapei , Sa ta Terezinha e Solidão.

XII Geres: Macaparana e São Vicente Férrer.

2013 Ipojuca (apenas cooperação técnica estadual)

2014 Recife (apenas cooperação técnica estadual)

Fonte: Elaboração própria.

33 O Apêndice 3 apresenta uma tabela com a participação de todos os municípios pernambucanos no Programa Mãe Coruja Pernambucana entre 2008 e 2014.

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Um olhar sobre os números | 55

Figura 1: Mapa dos Cantos Mãe Coruja e municípios participantes do programa, 2015

Fonte: PERNAMBUCO, 2015.

Entretanto, todo esse processo de expansão detalhado nos parágrafos ante-

riores não seguiu de forma clara e direta os critérios estabelecidos pelo próprio

Programa Mãe Coruja Pernambucana e explicitados no primeiro parágrafo

desta seção. A seguir, o processo de expansão do programa é analisado em

detalhes, evidenciando esta conclusão.

A seleção dos municípios que participariam do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana foi realizada a partir da análise dos indicadores de mortalidade in-

fantil de 2000 a 2007 e a taxa média para esse período. Considerando a divisão

dos municípios pelas Geres, as taxas médias de cada região obtidas após esse

ajuste podem ser encontradas na tabela 3.

Tabela 3: Taxa média ajustada de mortalidade infantil por Geres (por mil nascidos vivos)

Geres 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Média

I 29,96 19,75 19,85 20,40 15,11 14,53 14,16 14,94 18,59

II 32,50 25,64 20,23 25,62 22,43 20,41 15,18 15,78 22,22

III 52,19 39,01 36,20 36,82 24,46 25,79 19,86 21,47 31,98

IV 43,77 33,46 31,80 33,13 30,37 24,54 21,10 22,21 30,05

V 41,94 28,34 33,58 34,92 32,65 28,39 21,30 23,48 30,57

VI 35,86 42,74 40,64 39,52 39,06 32,69 28,73 29,10 36,04

VII 27,75 28,85 22,71 23,87 21,05 18,18 18,47 20,89 22,72

VIII 34,33 23,88 29,73 33,64 27,71 29,29 26,59 20,96 28,27

IX 24,10 32,82 28,20 35,05 29,35 31,95 27,79 29,69 29,87

X 36,90 25,55 37,64 25,41 27,38 20,29 22,51 25,36 27,63

XI 27,66 24,85 34,43 28,66 24,86 27,54 21,42 28,58 27,25

XII 39,85 32,81 25,57 26,92 25,87 25,18 19,18 18,23 26,70

Total 37,66 30,02 30,05 30,79 26,56 24,53 20,52 21,98 27,77

Fonte: Elaboração própria com dados fornecidos pela gestão do programa.

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| Mãe Coruja Pernambucana56

O processo de implementação do Programa Mãe Coruja Pernambucana

iniciou-se em 2008, estendendo-se até 2010. Priorizou-se, no primeiro ano

de implementação, as VI e IX Geres, por possuírem elevadas taxas de morta-

lidade infantil dos municípios. A tabela 4 apresenta as taxas dos municípios

pertencentes a essas regiões para o período de 2000 a 2007.

Tabela 4: Taxa de mortalidade infantil anual dos municípios incluídos em 2008 (por mil nascidos vivos)

Município 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Média

Arcoverde 27,89 35,64 30,02 40,03 31,64 38,37 22,66 26,59 31,60

Buíque 34,90 42,93 34,02 53,40 30,03 27,69 34,04 25,51 35,31

Custódia 22,58 34,69 44,55 37,04 22,97 18,36 19,33 27,87 28,42

Ibimirim 38,46 31,52 44,63 35,71 29,57 23,92 36,48 33,04 34,17

Inajá 96,43 47,87 52,81 81,33 28,17 39,37 11,56 26,55 48,01

Jatobá 36,63 32,47 61,43 16,19 16,06 40,74 29,96 33,21 33,34

Manari 57,40 91,40 54,31 59,81 61,36 58,82 36,06 30,66 56,23

Pedra 16,36 30,95 24,24 33,80 53,36 40,40 26,67 23,45 31,16

Petrolândia 23,89 18,40 22,99 22,84 25,40 16,33 17,93 31,29 22,39

Sertânia 23,64 40,27 35,66 28,78 23,49 31,63 34,90 28,85 30,90

Tacaratu 39,27 77,10 51,87 28,72 82,24 37,04 29,33 20,11 45,71

Tupanatinga 20,00 44,80 47,10 40,15 47,29 34,14 31,94 36,40 37,73

Venturosa 28,78 27,59 24,69 35,93 56,25 18,13 42,64 34,81 33,60

Araripina 26,57 43,07 26,58 43,45 33,95 28,73 25,61 30,91 32,36

Bodocó 24,68 42,38 53,62 41,73 34,29 30,97 39,93 30,40 37,25

Exu 23,00 24,29 21,21 35,59 24,79 34,09 26,60 18,38 25,99

Granito 10,99 - 6,76 8,33 15,63 28,04 19,61 26,67 16,57

Ipubi 30,77 47,55 25,40 42,98 28,19 29,99 36,21 31,83 34,11

Moreilândia 15,31 16,76 27,78 30,53 14,18 35,09 24,39 34,09 24,77

Ouricuri 23,73 22,55 24,13 38,00 35,36 27,37 23,69 28,51 27,92

Parnamirim 12,37 29,30 31,91 16,13 37,30 31,53 10,23 19,51 23,54

Santa Cruz 40,59 48,39 38,46 59,80 32,93 43,61 29,51 43,08 42,05

Santa Filomena 19,35 25,72 7,38 24,54 32,37 27,87 36,89 30,04 25,52

Trindade 37,69 28,21 46,93 44,44 33,81 34,19 33,03 33,16 36,43

VI Geres

IX Geres

Fonte: Elaboração própria com dados fornecidos pela gestão do programa.

Como grande parte dos municípios pertencentes às VI e IX Geres apre-

sentavam taxas de mortalidade infantil médias superiores a 25 óbitos por mil

nascidos vivos para o período entre 2000 e 2007, o programa foi implementa-

do em todos os municípios dessas regiões, conforme os critérios de seleção já

apresentados anteriormente.

Apenas o município de Granito, pertencente à IX Geres, apresentou taxa

média inferior a esse patamar: 16,57 óbitos por mil nascidos vivos. No entanto,

observa-se que este último pode se tratar de um município com problema de

sub-registro, uma vez que, em todo o período, o número de óbitos registrados

manteve-se inferior a 3 a cada ano.

A lista de municípios incluídos em 2009 por Geres e suas taxas de mor-

talidade infantil, ajustadas ao efeito de pequenos números, encontram-se

na tabela 5.

.

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Um olhar sobre os números | 57

Reunião de

monitoramento

da IX regional -

Ouricuri, onde

o Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

começou a ser

implantado

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| Mãe Coruja Pernambucana58

Tabela 5: Taxa de mortalidade infantil dos municípios incluídos em 2009 (por mil nascidos vivos)

Município 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Média

Araçoiaba 33,64 5,85 36,92 41,24 30,58 30,53 16,13 23,46 27,29

Casinhas 27,47 24,19 4,42 21,28 15,81 10,53 20,83 25,25 18,72

Cumaru 20,92 23,89 14,02 38,14 12,71 49,69 4,08 16,19 22,46

Amaraji 30,30 62,07 20,64 25,07 12,35 35,29 29,63 33,80 31,14

Catende 40,52 30,81 31,21 39,72 32,09 39,11 17,65 19,97 31,38

Cortês 45,20 33,51 26,87 32,57 25,89 26,52 27,78 14,93 29,16

Jaqueira 51,06 47,10 46,15 40,89 55,81 21,43 12,50 35,16 38,76

Joaquim Nabuco 53,63 38,07 63,58 26,47 20,41 33,03 21,15 32,89 36,15

Lagoa dos Gatos 51,28 54,74 46,15 40,00 41,15 33,46 24,14 23,44 39,30

Maraial 88,34 37,74 64,39 38,33 50,21 30,77 39,22 22,64 46,45

Palmares 42,19 38,17 39,30 28,80 19,73 27,73 18,23 22,17 29,54

Quipapá 60,22 48,48 49,28 43,29 21,14 45,65 13,67 31,25 39,12

Xexéu 85,94 86,64 42,35 69,23 21,58 34,78 17,95 18,87 47,17

Agrestina 38,67 22,73 50,23 40,67 33,98 33,77 11,33 28,57 32,49

Belo Jardim 44,89 40,11 26,33 41,95 29,04 29,46 22,22 17,31 31,41

Camocim de São Félix 74,18 27,68 55,02 30,04 25,55 44,67 22,90 18,10 37,27

Ibirajuba 8,00 12,12 14,29 31,01 28,37 41,32 19,05 - 22,02

Jataúba 32,54 33,61 46,38 37,74 27,45 25,72 22,15 40,13 33,22

Jurema 81,34 53,29 40,70 38,46 36,90 39,86 37,19 32,14 44,98

Panelas 57,49 39,25 39,14 44,78 16,74 26,80 21,74 19,44 33,17

Riacho das Almas 35,42 40,00 28,25 14,98 14,71 10,27 30,82 16,89 23,92

Sairé 22,32 37,74 30,00 34,31 26,18 27,03 12,66 35,09 28,17

Sanharó 57,93 26,60 31,65 29,50 32,84 34,19 29,90 23,74 33,29

São Caitano 36,23 29,22 25,50 50,37 36,79 29,78 15,63 28,24 31,47

Tacaimbó 102,94 80,81 18,78 37,56 78,13 41,47 10,36 31,09 50,14

Vertentes 27,03 27,36 42,90 24,82 46,58 28,04 13,56 28,04 29,79

Águas Belas 38,79 22,77 16,47 28,41 22,22 25,40 19,73 21,12 24,36

Angelim 30,70 52,08 35,90 27,40 11,90 28,25 26,32 11,43 28,00

Bom Conselho 44,63 33,33 39,36 49,26 36,20 30,12 28,29 11,85 34,13

Brejão 74,80 19,23 25,32 35,71 9,13 28,23 19,51 32,79 30,59

Caetés 55,89 26,83 26,21 41,10 45,93 23,17 20,09 15,56 31,85

Calçado 50,85 5,03 33,02 18,18 36,59 38,46 16,13 19,35 27,20

Canhotinho 36,36 29,29 21,60 45,65 42,22 38,03 28,30 4,99 30,81

Capoeiras 15,75 39,22 28,17 25,21 38,01 21,28 16,53 26,79 26,37

Correntes 69,91 35,83 31,95 32,61 31,14 16,78 17,12 26,52 32,73

Garanhuns 41,07 31,10 39,57 28,84 24,00 23,12 19,83 16,22 27,97

Iati 9,37 20,64 7,86 41,59 40,43 35,16 28,92 25,00 26,12

Itaíba 8,24 9,49 12,44 23,45 14,08 17,45 14,93 28,02 16,01

Jucati 59,88 41,18 59,14 44,78 48,31 30,70 48,13 17,32 43,68

Jupi 44,07 19,05 37,27 36,14 62,50 31,80 34,84 23,53 36,15

Lagoa do Ouro 58,82 10,99 27,97 17,54 22,39 27,68 11,90 24,39 25,21

Lajedo 59,68 36,46 34,08 19,32 27,10 20,41 17,83 23,44 29,79

Palmeirina 39,47 35,40 51,81 65,87 59,17 52,63 6,33 32,26 42,87

Paranatama 25,27 53,81 18,69 65,31 37,82 7,60 25,64 19,53 31,71

Saloá 48,95 37,16 40,13 51,83 24,39 50,00 17,48 27,21 37,14

São João 43,38 28,63 38,55 24,72 32,35 25,84 20,05 26,89 30,05

Terezinha 24,79 7,63 79,65 10,31 19,80 24,00 9,35 58,82 29,29

I Geres

II Geres

III Geres

IV Geres

V Geres

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Um olhar sobre os números | 59

Município 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Média

Afrânio 52,17 26,83 24,66 36,55 34,12 26,57 24,19 10,70 29,47

Cabrobó 33,85 21,13 20,25 24,62 25,42 32,35 26,77 13,98 24,80

Dormentes 35,71 18,69 29,67 26,85 26,06 28,66 43,86 13,61 27,89

Lagoa Grande 28,82 40,46 53,15 50,63 30,46 29,11 27,96 28,24 36,10

Orocó 32,03 19,87 35,29 33,83 29,61 41,94 22,14 44,12 32,35

Petrolina 29,61 22,06 28,83 31,16 31,06 25,59 25,28 22,17 26,97

Santa Maria da Boa Vista 28,10 18,09 16,27 31,85 17,24 20,79 15,91 13,95 20,27

Betânia 58,04 37,59 20,41 18,52 22,56 55,34 27,78 37,31 34,69

Calumbi 10,64 19,48 45,05 44,12 50,36 13,07 19,80 17,39 27,49

Carnaubeira da Penha 22,92 47,62 40,50 29,07 18,87 17,09 22,92 22,47 27,68

Flores 24,24 18,14 43,59 27,30 15,50 27,50 17,65 27,44 25,17

Floresta 14,02 29,11 33,60 26,74 23,99 35,43 17,57 42,55 27,88

Itacuruba 22,47 12,99 38,46 11,24 0,00 20,20 0,00 - 15,05

Santa Cruz da Baixa Verde 22,22 25,32 25,51 31,67 13,89 33,98 37,50 37,34 28,43

São José do Belmonte 20,03 18,66 23,85 26,77 51,81 19,93 28,76 11,22 25,13

Serra Talhada 35,26 32,04 31,86 32,16 41,35 28,88 28,64 33,63 32,98

Triunfo 46,81 7,52 41,51 39,06 10,26 24,00 13,57 27,91 26,33

Aliança 26,03 39,67 34,74 23,64 39,84 29,81 12,84 23,03 28,70

Condado 45,58 28,78 41,56 44,62 19,95 18,47 26,89 26,09 31,49

Ferreiros 43,21 40,40 25,32 15,79 14,85 34,93 12,99 - 26,78

XI Geres

XII Geres

VIII Geres

Fonte: Elaboração própria com dados fornecidos pela gestão do programa.

O município pertencente à I Geres incluído no programa, Araçoiaba, apre-

sentou uma taxa média de 27,29 óbitos por mil nascidos vivos, a maior den-

tre os municípios de sua Geres. Quanto aos municípios da II Geres, Casinhas

e Cumaru, apresentaram, nesse período, uma média de 18,72 óbitos por mil

nascidos vivos e 22,46 óbitos por mil nascidos vivos. Não ficou claro o cri-

tério utilizado para a escolha desses municípios no programa, uma vez que

essas não eram as maiores taxas apresentadas nesse grupo. Ainda que não seja

um critério especificado, vale ressaltar que esses municípios também podem

apresentar problemas de sub-registro, uma vez que, durante esse período, fo-

ram registrados, em média, 5 óbitos ao ano.

Da III Geres, foram incluídos 10 dos 22 municípios da região, todos respei-

tando o critério de uma taxa média para o período superior a 25 óbitos por mil

nascidos vivos. No entanto, ainda assim, a seleção não ficou inteiramente cla-

ra, pois 4 municípios que atendiam a esse critério não foram incluídos no pro-

grama: Gameleira (34,25 óbitos por mil nascidos vivos), Ribeirão (32,56 óbitos

por mil nascidos vivos), Rio Formoso (29,52 óbitos por mil nascidos vivos),

São Benedito do Sul (27,36 óbitos por mil nascidos vivos) e Tamandaré (29,32

óbitos por mil nascidos vivos).

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| Mãe Coruja Pernambucana60

Quanto à IV Geres, o programa foi implementado, no ano de 2009, em 13

dos 32 municípios, ainda que apenas 9 municípios da região apresentassem

uma taxa média para o período inferior a 25 óbitos por mil nascidos vivos, o

que é um critério para que toda a região seja atendida. Dos municípios que

não foram incluídos no programa, 12 deles apresentaram taxas médias entre

25 óbitos mil nascidos vivos e 48 óbitos por mil nascidos vivos, atendendo ao

critério de seleção. Observou-se ainda 2 municípios dentre os selecionados

que apresentaram taxas médias inferiores a 25 óbitos por mil nascidos vivos,

porém, com possibilidade de sub-registro, já que o número de óbitos registra-

dos muitas vezes não chegava a cinco.

Nas V, VIII e XI Geres, todos os municípios pertencentes foram selecionados,

uma vez que mais da metade de cada região apresentou uma taxa de mortalidade

infantil superior ao critério do programa. Na V Geres, apenas 2 dos 21 municípios

apresentaram uma taxa média inferior ao estabelecido pelo critério de seleção

(Águas Belas e Itaíba). Na VIII Geres, também apenas 2 dos 7 municípios apre-

Afrânio, na

VIII Geres,

apresentava taxa

de mortalidade

infantil superior

ao critério do

programa, entre

2000 e 2007

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Um olhar sobre os números | 61

sentaram taxas inferiores a 25 óbitos por mil nascidos vivos (Cabrobó e Santa

Maria da Boa Vista) e, na XI Geres, apenas Itacuruba registrou uma taxa média

baixa para esse período, porém com a possibilidade de se tratar de um caso de

sub-registro, uma vez que foram registrados apenas 4 óbitos durante todo o pe-

ríodo de 2000 a 2007.

Ainda em 2009, o Programa Mãe Coruja Pernambucana foi implementado

em três municípios da XII Geres (Aliança, Condado e Ferreiros), também sem

um critério claro. Observou-se mais da metade dos municípios dessa região

com taxas médias superiores a 25 óbitos por mil nascidos vivos, sendo assim,

toda a região deveria ser incluída no programa, o que não ocorreu. Além disso,

3 municípios que atendiam ao critério de seleção ficaram fora do programa.

Em 2010, último ano de implementação do programa, foram selecionados

mais 12 municípios. Salgadinho, pertencente à II Geres, possuía uma taxa mé-

dia de mortalidade infantil de 44,04 óbitos por mil nascidos vivos para o pe-

ríodo de 2000 a 2007. Da III Geres, incluiu-se Rio Formoso com uma taxa de

29,52 óbitos por mil nascidos vivos.

Dentre os municípios atendidos na IV Geres, acrescentou-se também

Bonito, que apresentava uma taxa média de mortalidade infantil de 26,95 óbitos

por mil nascidos vivos de 2000 a 2007. A VII Geres, até então não atendida pelo

programa, teve os municípios Mirandiba e Terra Nova incluídos – Mirandiba

apresentava uma taxa média de mortalidade de 25,26 óbitos por mil nascidos

vivos, e Terra Nova, com 28,64 óbitos por mil nascidos vivos. Nessa região, o

município de Salgueiro, apesar de ter apresentado uma taxa média de 27,58

óbitos por mil nascidos vivos, continuou sem participar do programa.

A X Geres teve seus primeiros municípios incluídos no Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana também em 2010 com a seleção de 5 dos seus 12 municí-

pios. Dentre eles, apenas Iguaracy e Itapetim não apresentaram uma taxa mé-

dia superior a 25 óbitos por mil nascidos vivos. Vale ressaltar que, ainda que

não seja um critério estabelecido, há a possibilidade de sub-registro nesses

municípios, uma vez que o número de óbitos registrados se manteve abaixo de

5 em diversos anos. Nessa região, os municípios de Solidão, Tabira e Tupare-

tama não foram selecionados, apesar de satisfazerem o critério de taxa média

superior a 25 óbitos por mil nascidos vivos. Por fim, os municípios Macapa-

rana e São Vicente Férrer foram incluídos, ambos da XII Geres e com taxas de

mortalidade superiores ao estabelecido pelo critério de seleção.

A lista dos municípios incorporados ao Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana em 2010 e suas taxas de mortalidade infantil encontram-se na tabela 6.

Page 431: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

| Mãe Coruja Pernambucana62

Tabela 6: Taxa de mortalidade infantil dos municípios incluídos em 2010 (por mil nascidos vivos)

Município 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Média

Salgadinho 40,00 46,88 - 32,79 86,96 59,41 19,80 22,47 44,04

Rio Formoso 45,91 32,79 41,30 44,53 10,44 34,09 17,90 9,24 29,52

Bonito 22,09 31,69 31,73 27,50 25,54 25,55 26,03 25,45 26,95

Mirandiba 18,77 31,85 19,02 36,42 20,20 18,67 27,03 30,10 25,26

Terra Nova 59,88 37,04 30,93 21,05 31,25 20,94 11,56 16,48 28,64

Carnaíba 30,30 21,51 27,25 38,67 34,48 27,86 9,15 34,48 27,96

Iguaracy 52,94 19,51 35,50 21,86 - 5,75 - 20,62 26,03

Itapetim 23,35 - 47,62 11,86 25,42 31,11 16,60 23,15 25,59

Santa Terezinha 71,43 23,47 40,00 36,46 14,78 29,27 30,61 29,85 34,48

Solidão 71,43 17,54 72,16 24,79 39,06 35,40 25,32 25,00 38,84

Macaparana 48,47 34,61 35,58 40,24 24,21 31,82 8,71 12,53 29,52

São Vicente Ferrer 35,71 32,35 15,97 22,22 18,32 24,24 37,97 13,75 25,07

XII Geres

II Geres

III Geres

IV Geres

VII Geres

X Geres

Fonte: Elaboração própria com dados fornecidos pela gestão do programa.

Vale lembrar que Ipojuca e Recife também participam do Programa Mãe

Coruja Pernambucana, porém, suas gestões são municipais e apenas contam

com a cooperação técnica estadual, diferentemente dos demais municípios.

Ambos apresentavam taxas médias de mortalidade infantil abaixo da média

estadual para o período.

Assim, podem ser encontrados 28 municípios, dentre os municípios que

não recebem o programa, que apresentavam níveis médios de taxa de mor-

talidade infantil superiores a 25 óbitos por mil nascidos vivos no período de

2000 a 2007. A lista desses municípios e suas taxas podem ser encontradas

no apêndice 4.

Toda esta análise comprova que a escolha dos municípios participantes do

Programa Mãe Coruja Pernambucana não se deu ao acaso. A prioridade de in-

clusão foi sempre dada àqueles com maior vulnerabilidade, em particular, no

que se refere à situação da saúde materno-infantil, mas também com relação

às condições socioeconômicas, afinal, a taxa de mortalidade infantil e o IDH

foram critérios determinantes de entrada no programa. Mas esta análise tam-

bém indica que o critério de seleção, explicitado no início desta seção, não foi

seguido à risca: municípios com taxas de mortalidade inferiores e outros com

taxas superiores a ele não foram incluídos no programa.

Page 432: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

Um olhar sobre os números | 63

3.4.2 Diferenças nas condições iniciais

Nesta seção, serão analisadas as diferenças entre municípios beneficiados

e não beneficiados, antes da implementação do programa, tanto em relação

a indicadores de saúde materno-infantil, quanto em relação a indicadores de

vulnerabilidade socioeconômica. Na tabela 7, são apresentadas as médias para

2005 a 2008 dos indicadores de saúde materno-infantil selecionados, a di-

ferença entre essas médias e um teste estatístico que analisa a significância

estatística dessas diferenças.

Itapetim, no

Alto Pajeú, é um

dos municípios

beneficiados

pelo Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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| Mãe Coruja Pernambucana64

Tabela 7: Teste T de diferença das médias do grupo de municípios beneficiados e não beneficiados na condição inicial: Programa Mãe Coruja Pernambucana

(Indicadores de saúde, média para os anos de 2005 a 2008)

Indicador

Média Desvio

padrão

Número de

observações

Média Desvio

padrão

Número de

observações

Diferença entre

grupo de

tratamento e

comparação

Estatística Significância

estatística(2)

Proporção de nascidos vivos com sete ou mais

consultas de pré-natal

34,71 12,35 103 41,56 10,72 77 -6,86 -3,89

Cobertura vacinal (idade-alvo como menores de 2 anos

de idade)

64,20 8,40 103 64,85 9,70 77 -0,65 -0,48

Taxa de internação hospitalar por causas sensíveis à

atenção básica

39,58 9,40 103 38,11 10,37 77 1,47 1,00

Proporção de cesarianas 28,54 7,44 103 39,09 9,68 77 -10,55 -8,27

Proporção de partos de mães adolescentes (menor ou

igual a 19 anos de idade)

24,06 3,17 103 24,61 3,34 77 -0,54 -1,11

Prevalência de aleitamento materno exclusivo

(crianças com até 6 meses de idade)

63,63 8,76 103 61,92 7,49 77 1,71 1,38

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar

maior ou igual a 6 no 1º minuto de vida

87,82 15,20 103 93,93 7,23 77 -6,11 -3,26

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar

maior ou igual a 6 no 5º minuto de vida

91,17 15,29 103 98,39 1,22 77 -7,23 -4,13

Proporção de nascidos vivos com baixo peso ao nascer

(abaixo de 2.500g)

6,74 1,21 103 6,74 1,19 77 -0,01 -0,04

Taxa de natimortalidade (nascidos mortos de 22

semanas ou mais de gestação)

14,08 3,37 94 11,19 4,02 70 2,89 5,01

Taxa de mortalidade neonatal precoce (0 a 6 dias de

idade)

13,10 3,49 88 9,38 3,28 66 3,71 6,70

Taxa de mortalidade perinatal (agrupa os dois grupos

considerados nas taxas de mortalidade acima)

27,59 5,64 83 20,95 6,04 64 6,65 6,87

Taxa de mortalidade neonatal (0 a 27 dias de idade) 15,70 3,63 88 11,59 3,44 71 4,11 7,27

Taxa de mortalidade neonatal tardia (7 a 27 dias de

idade)

10,62 3,36 71 6,94 3,05 58 3,67 6,43

Mortalidade infantil pós-neonatal (28 a 364 dias de

idade)

3,73 1,70 45 3,55 2,17 42 0,18 0,44

Taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano de

idade)

25,07 5,23 95 17,66 4,46 73 7,41 9,70

Taxa de mortalidade na infância (menores de 5 anos de

idade)

28,67 5,87 95 20,66 4,81 73 8,01 9,47

Grupo de Tratamento(1) Grupo de Comparação Médias

Acesso a serviços de saúde materno-infantil

Período gestacional, parto e puerpério

Saúde infantil no parto

Indicadores de mortalidade

(1) Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(2) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 1%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

Analisando o conjunto de indicadores, apresentados na tabela 7, conclui-se

que a situação da saúde materno-infantil inicial era significativamente pior

nos municípios selecionados. As taxas de mortalidade na infância, para

todas as faixas etárias, eram maiores nos municípios beneficiados34. Já o

acesso a consultas de pré-natal, medido pela proporção de nascidos vivos

34 A única exceção foi a taxa de mortalidade infantil pós-neonatal (28 a 364 dias de idade): não foram encontradas diferenças significativas entre os municípios selecionados e os não selecionados.

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Um olhar sobre os números | 65

com sete ou mais consultas de pré-natal, assim como a condição de saúde

da criança ao nascer, medida pela proporção de nascidos vivos com índice

de Apgar35 superior a seis, tanto no 1º quanto no 5º minuto de vida, eram

inferiores nos municípios beneficiados. Para um conjunto menor de cinco

indicadores36, não foram encontradas diferenças iniciais significativas entre

os municípios beneficiados e os não beneficiados. Por fim, cabe destacar que

a prevalência de partos cesáreos era inferior nos municípios beneficiados

antes da implantação do programa.

Para além de uma diferença significativa em termos das condições iniciais

de saúde materno-infantil, os municípios selecionados e os não seleciona-

dos também diferem quanto a sua situação socioeconômica, como pode-se

concluir com base na tabela 8, elaborada a partir de dados do Censo Demo-

gráfico de 2010. Os indicadores destacados na tabela são aqueles que apre-

sentam uma diferença significativa entre os grupos de municípios beneficia-

dos e não beneficiados pelo programa. Os municípios beneficiados possuem

nível educacional da população adulta mais baixo, apontado por uma taxa de

analfabetismo mais elevada; e uma distribuição de renda nitidamente pior,

apontada por uma menor renda per capita e graus mais elevados de pobreza

e desigualdade. Com isso, esses municípios possuem um IDH mais baixo.

Surpreendentemente, no entanto, os municípios beneficiados pelo programa

não apresentam piores condições de saneamento: não foram encontradas di-

ferenças significativas quanto a esse indicador.

Essas duas análises permitem concluir que as condições iniciais dos muni-

cípios beneficiados pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana e os não bene-

ficiados eram bem distintas. A evidência aponta para uma maior vulnerabili-

dade inicial dos municípios beneficiados – tanto em relação a indicadores de

saúde materno-infantil, que o programa pretende modificar, como também

em relação às condições socioeconômicas que, por sua vez, também influen-

ciam a evolução desses indicadores.

35 O índice de Apgar mede a vitalidade do recém-nascido e varia entre 0 e 10, a partir da ava-liação de cinco sintomas objetivos: frequência cardíaca (ausente: 0; < 100/min: 1; > 100/min: 2); respiração (ausente: 0; fraca/irregular: 1; forte/choro: 2); irritabilidade reflexa (ausente: 0; algum movimento: 1; espirros/choro: 2); tônus muscular (flácido: 0; flexão de pernas e braços: 1; movi-mento ativo/boa flexão: 2) e cor (cianótico/pálido: 0; cianose de extremidades: 1; rosado: 2) (AP-GAR, 1953).36 Proporção de partos de mães adolescentes, proporção de nascidos vivos com baixo peso ao nascer, cobertura vacinal, taxa de internação hospitalar por causas sensíveis à atenção básica e prevalência de aleitamento materno exclusivo.

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| Mãe Coruja Pernambucana66

Tabela 8: Teste T de diferença das médias do grupo de municípios beneficiados e não beneficiados na condição inicial: Programa Mãe Coruja

Pernambucana (Indicadores demográficos e de vulnerabilidade, 2010)

Indicador

Média Desvio padrão Número de

observações

Média Desvio padrão Número de

observações

Diferença entre

grupo de

tratamento e

controle

Estatística Significância

estatística (2)

Proporção da população de 0 a 14 anos 0,29 0,02 103 0,27 0,02 77 0,02 6,71

População total (em Ln) 9,90 0,67 103 10,20 0,84 77 -0,30 -2,68

Analfabetismo da população de 15 anos ou

mais

29,72 6,14 103 24,89 6,48 77 4,83 5,10

Índice de desenvolvimento humano 0,58 0,04 103 0,61 0,04 77 -0,03 -5,80

Saneamento adequado 19,76 12,01 103 17,35 11,51 77 2,42 1,36

Porcentagem de pobres 68,20 7,05 103 61,16 10,97 77 7,03 5,22

Renda domiciliar per capita 265,17 67,20 103 321,01 108,16 77 -55,84 -4,26

Grupo de Tratamento (1) Grupo de Comparação Médias

(1) Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(2) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 1%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Censo Demográfico de 2010.

3.4.3 Correção para condição inicial

Como resultado da diferenciação entre municípios beneficiados e não be-

neficiados, detalhada na seção anterior, a simples diferença entre o progresso

alcançado nos dois grupos não é necessariamente uma medida do impacto do

Programa Mãe Coruja Pernambucana. Foi preciso realizar ajustes para as dife-

renças nas condições preexistentes. Afinal, essas diferenças muito provavel-

mente influenciariam o progresso de indicadores de saúde materno-infantil,

mesmo na ausência do programa. Consequentemente, a situação de municí-

pios não beneficiados após a implementação do programa possivelmente não

seria uma boa medida para o que teria acontecido com os municípios benefi-

ciados na sua ausência. Entretanto, como tal medida é essencial na estimação

de seu impacto, foram realizadas correções na situação dos municípios não

beneficiados após a implementação do programa, de modo a eliminar o efeito

das diferenças existentes nas condições iniciais.

Foram dois os tipos de correções realizadas: um ajuste para a condição inicial

em termos da saúde materno-infantil e outro para diferenças iniciais em termos

da vulnerabilidade socioeconômica. A metodologia de cálculo desses ajustes é

detalhada no apêndice 2, mas sua interpretação é simples: calculou-se como

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Um olhar sobre os números | 67

uma diferença nas condições iniciais – seja em termos da saúde materno-in-

fantil, seja em termos da vulnerabilidade socioeconômica – influencia os re-

sultados futuros em cada indicador analisado. Com isso, a magnitude de cada

ajuste indica o quanto as diferenças em condições iniciais entre os municípios

beneficiados e os não beneficiados afetam a evolução final para cada indicador.

Sendo assim, a soma dos ajustes representa a correção total que será aplicada ao

impacto estimado via modelo de Diferenças em Diferenças37. Ou seja, ao sub-

trair do impacto do programa, calculado via Diferenças em Diferenças, a soma

dos ajustes, encontra-se o impacto corrigido.

A tabela 9 apresenta, para cada um dos 17 indicadores analisados, a melho-

ria que os grupos de tratamento e de comparação obtiveram em seus níveis, a

diferença calculada entre esses grupos e os ajustes necessários para a correção

das condições iniciais. As duas últimas colunas da tabela apresentam, então,

qual seria o impacto ajustado e indicam a significância estatística de cada esti-

mativa. Os resultados apresentados nessa tabela serão analisados no capítulo 4

separadamente para cada indicador de interesse.

Cabe aqui uma importante observação sobre a metodologia desta avaliação: ao

realizar essa correção, são controladas as diferenças nas condições iniciais de ape-

nas um pequeno conjunto de indicadores relacionados à saúde materno-infantil e

à vulnerabilidade socioeconômica. Há uma variedade de outros indicadores que

são observados e poderiam ter sido incluídos na definição da situação inicial e há

uma variedade ainda maior de indicadores para os quais não existem informa-

ções coletadas. Caso esses indicadores fossem incluídos, a magnitude dos ajustes

poderia ser modificada em qualquer direção e, consequentemente, as estimativas

de impacto poderiam ser menores ou maiores em magnitude. Os resultados apre-

sentados neste relatório como estimativa de impacto foram calculados a partir da

hipótese de que a magnitude dos ajustes adicionais é desprezível38.

37 Detalhes sobre as hipóteses utilizadas para alcançar esse resultado são encontradas no apêndice 2.38 Vale ressaltar que a validade dessa hipótese, infelizmente, não pôde ser verificada.

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| Mãe Coruja Pernambucana68

Tabela 9: Impacto do Programa Mãe Coruja Pernambucana sobre indicadores de saúde (2014)

Indicador Melhora no

tratamento(1)

Melhora na

comparação

Impacto estimado

por Diferenças em

Diferenças

Ajuste 1: Saúde

materno-infantil

Ajuste 2:

vulnerabilidade

socioeconômica

Impacto

ajustado

Significância

estatística(2)

Proporção de nascidos vivos com sete ou mais consultas

de pré-natal

37,38 21,90 15,48 7,46 -0,63 8,65

Cobertura vacinal (idade-alvo como menores de 2 anos

de idade)

26,48 30,28 -3,80 0,32 -1,54 -2,58

Taxa de internação hospitalar por causas sensíveis à

atenção básica

-7,51 -9,19 1,69 -0,80 0,79 1,69

Proporção de cesarianas 20,68 16,32 4,36 3,12 -2,07 3,32

Proporção de partos de mães adolescentes (menor ou

igual a 19 anos de idade)

-0,67 -1,47 0,80 0,25 1,28 -0,73

Prevalência de aleitamento materno exclusivo (crianças

com até 6 meses de idade)

1,56 -0,14 1,70 -0,53 0,58 1,64

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar

maior ou igual a 6 no 1º minuto de vida

7,54 2,15 5,39 5,17 0,39 -0,17

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar

maior ou igual a 6 no 5º minuto de vida

6,66 0,28 6,38 5,89 0,42 0,07

Proporção de nascidos vivos com baixo peso ao nascer

(abaixo de 2.500g)

0,31 0,22 0,09 0,01 -0,13 0,22

Taxa de natimortalidade (nascidos mortos de 22

semanas ou mais de gestação)

-2,72 -0,01 -2,72 -2,76 0,71 -0,67

Taxa de mortalidade neonatal precoce (0 a 6 dias de

idade)

-4,07 -1,78 -2,29 -3,55 1,05 0,21

Taxa de mortalidade perinatal (agrupa os dois grupos

considerados nas taxas de mortalidade acima)

-7,12 -1,16 -5,97 -7,19 2,40 -1,17

Taxa de mortalidade neonatal (0 a 27 dias de idade) -4,59 -2,27 -2,32 -3,74 1,09 0,33

Taxa de mortalidade neonatal tardia (7 a 27 dias de

idade)

0,16 -0,09 0,25 -0,15 0,58 -0,18

Mortalidade infantil pós-neonatal (28 a 364 dias de

idade)

-3,92 -1,98 -1,94 -3,15 0,69 0,52

Taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano de idade) -9,76 -4,64 -5,12 -6,26 1,33 -0,18

Taxa de mortalidade na infância (menores de 5 anos de

idade)

-10,96 -5,78 -5,18 -5,99 1,43 -0,62

Acesso a serviços de saúde materno-infantil

Período gestacional, parto e puerpério

Saúde infantil no parto

Indicadores de mortalidade

(1) Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(2) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 15%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

Page 438: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

Um olhar sobre os números | 69

Capítulo 4

Resultados

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| Mãe Coruja Pernambucana70

Page 440: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

A seguir, serão apresentados e interpretados os resultados das estimati-

vas de impacto, cuja metodologia foi apresentada no capítulo anterior.

Esses resultados são discutidos separadamente para cada um dos quatro

grupos de indicadores apresentados anteriormente. Como foi descrito na

seção metodológica, as análises de evolução dos indicadores são apresenta-

das apenas como evidências da possibilidade de um efeito do Programa Mãe

Coruja Pernambucana sobre os indicadores de saúde. No entanto, o impacto é

identificado pelo modelo de Diferenças em Diferenças ajustado, exposto deta-

lhadamente no apêndice 2.

Além das tabelas apresentadas a seguir, os resultados sobre a evolução dos

indicadores de saúde materno-infantil e sobre impacto do programa podem

ser consultados em detalhes nas tabelas dos apêndices 5 e 6, respectivamente.

4.1 Acesso a serviços de saúde materno-infantil

4.1.1 Cobertura de pré-natalEm Pernambuco, a cobertura de pré-natal, medida pela proporção de

nascidos vivos com sete ou mais consultas de pré-natal, cresceu, entre 2008

e 2014, em média, 4,41 pontos percentuais ao ano. Já no restante da região

Nordeste, esse indicador cresceu, em média, 2,87 pontos percentuais ao ano.

Também no Brasil, excluindo-se Pernambuco, o crescimento da cobertura de

pré-natal foi inferior: 1,66 pontos percentuais ao ano, em média.

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| Mãe Coruja Pernambucana72

Para além de um crescimento mais acentuado que o Nordeste e que o res-

tante do país, durante o período de implementação do Programa Mãe Coruja

Pernambucana, Pernambuco também apresentou uma aceleração estatistica-

mente significante da cobertura de pré-natal após o início do programa: ob-

serva-se um crescimento de 1,92 pontos percentuais ao ano após 2008. Em

2005, Pernambuco possuía um indicador de magnitude similar ao do restante

da região Nordeste e bem inferior à média do restante do país. Porém, em 2014,

por conta da aceleração no crescimento desse indicador, a cobertura de pré-

natal tornou-se superior ao restante da região Nordeste. É possível interpretar

a aceleração inusitada do progresso desse indicador, em Pernambuco, coinci-

dente com a implantação do programa, como uma forte indicação de que ele

teve impacto sobre a cobertura de pré-natal.

Essa evidência é adicionalmente corroborada pelo resultado do modelo de

Diferenças em Diferenças, apresentado na tabela 10, que aponta para um im-

pacto estatisticamente significativo de 15,48 pontos percentuais do Programa

Mãe Coruja Pernambucana. Ou seja, nos municípios beneficiados, a cobertura

de pré-natal aumentou 15,48 pontos percentuais em relação aos municípios

não beneficiados. Essa diferença, estatisticamente significativa, é outro forte

indício de que o programa teve importante impacto sobre o acesso à cobertura

de pré-natal.

Entretanto, como já discutido, é necessário realizar ajustes adicionais a esse

impacto estimado. O impacto ajustado foi encontrado a partir do modelo de

Diferenças em Diferenças com correção de condições iniciais, também en-

contrado na tabela 10.

Percebe-se que, caso os municípios não beneficiados tivessem as mesmas

condições iniciais, seja em termos dos indicadores de saúde, seja em termos

de vulnerabilidade dos municípios beneficiados, seu progresso teria sido 6,8

pontos percentuais mais elevado. Importante destacar que o ajuste por dife-

renças em termos de vulnerabilidade foi negativo e pequeno, -0,63; enquanto

o ajuste por diferenças na condição inicial foi positivo e grande, 7,46. Após

todos os ajustes, conclui-se que o impacto estimado é de 8,65 pontos percen-

tuais (15,48–6,83) e estatisticamente significativo, indicando que o programa

possui impacto sobre a cobertura de pré-natal.

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Um olhar sobre os números | 73

Tabela 10: Resultados encontrados sobre a proporção de nascidos vivos com sete ou mais consultas de pré-natal

Proporção de nascidos vivos com sete ou mais consultas de pré-natal Coeficiente Significância

estatística(1)

Crescimento do indicador no Brasil, exceto Pernambuco 1,66

Diferença entre Pernambuco e o resto do Brasil 2,76

Crescimento do indicador no Nordeste, exceto Pernambuco 2,87

Diferença entre Pernambuco e o resto do Nordeste 1,54

Crescimento do indicador dentre os municípios não participantes do

programa

2,46

Diferença entre municípios participantes e não participantes 1,92

Melhora no tratamento 37,38 -

Melhora no controle 21,90 -

Impacto estimado com Diferenças em Diferenças 15,48

Ajuste 1: Condição inicial 7,46 -

Ajuste 2: Vulnerabilidade -0,63 -

Impacto ajustado 8,65

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Brasil

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Nordeste

Evolução do indicador nos municípios beneficiados e não beneficiados de Pernambuco

Diferenças em Diferenças sem e com ajuste das condições iniciais

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) Estimativas estatisticamente significantes em, no máximo, 1%.Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e

do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

4.1.2 Cobertura vacinal

Em Pernambuco, entre 2008 e 2014, a cobertura vacinal cresceu, em mé-

dia, 3,93 pontos percentuais ao ano. Durante esse mesmo período, o restante

da região Nordeste apresentou um crescimento de, em média, 1,93 pontos per-

centuais ao ano, inferior à evolução encontrada para esse indicador no Brasil39,

de 2,70 pontos percentuais por ano em média. Além de crescer estatistica-

mente mais que o restante do país durante o período de implementação do

39 Excluindo-se Pernambuco.

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| Mãe Coruja Pernambucana74

Programa Mãe Coruja Pernambucana, Pernambuco experimentou uma ace-

leração no crescimento da cobertura vacinal após a implementação do pro-

grama, como pode ser constatado na tabela 11 com a análise sobre a evolução

entre os municípios de Pernambuco: após 2008, o indicador passou a crescer

3,35 pontos percentuais ao ano. O crescimento mais acelerado da cobertura

vacinal, em Pernambuco, após a implementação do programa, representa

uma forte evidência de seu impacto.

Tabela 11: Resultados encontrados sobre a cobertura vacinal

Cobertura vacinal (idade-alvo como menores de 2 anos de idade) Coeficiente Significância

estatística(1)

Crescimento do indicador no Brasil, exceto Pernambuco 2,70

Diferença entre Pernambuco e o resto do Brasil 1,23

Crescimento do indicador no Nordeste, exceto Pernambuco 1,93

Diferença entre Pernambuco e o resto do Nordeste 2,00

Crescimento do indicador dentre os municípios não participantes do

programa

0,43

Diferença entre municípios participantes e não participantes 3,35

Melhora no tratamento 26,48 -

Melhora no controle 30,28 -

Impacto estimado com Diferenças em Diferenças -3,80

Ajuste 1: Condição inicial 0,32 -

Ajuste 2: Vulnerabilidade -1,54 -

Impacto ajustado -2,58

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Brasil

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Nordeste

Evolução do indicador nos municípios beneficiados e não beneficiados de Pernambuco

Diferenças em Diferenças sem e com ajuste das condições iniciais

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) Estimativas estatisticamente significantes em, no máximo, 15%.Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e

do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

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Um olhar sobre os números | 75

Entretanto, o modelo de Diferenças em Diferenças não corrobora forte-

mente essa análise: foram encontradas diferenças marginalmente significa-

tivas entre o crescimento da cobertura vacinal nos municípios beneficiados e

nos municípios não beneficiados pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana.40

Assim, a análise de Diferenças em Diferenças simples não aponta fortemente

para um impacto estatisticamente significativo do programa sobre esse aspec-

to da saúde materno-infantil.

Já o modelo de Diferenças em Diferenças com ajustes corrobora essa análi-

se. Estima-se que, caso tivessem as mesmas condições iniciais que os benefi-

ciados, o progresso dos municípios não beneficiados seria 1,22 pontos menor

e, com isso, esses municípios alcançariam 29,06 pontos percentuais, em vez

dos 30,28 pontos percentuais. Tal diferença foi resultado de um ajuste de 0,32

por diferenças nas condições iniciais e de -1,54 por diferenças em vulnera-

bilidade socioeconômica. Como o progresso entre os municípios beneficia-

dos foi de 26,48 pontos percentuais, encontra-se uma estimativa de impacto

negativa, de magnitude 2,58, que, no entanto, não se mostra estatisticamente

significativa. Com isso, não encontramos grandes evidências de impacto do

Programa Mãe Coruja Pernambucana sobre a cobertura vacinal já no modelo

de Diferenças em Diferenças simples, o que é reforçado no modelo com corre-

ções para as diferenças de condições iniciais.

4.2 Período gestacional, parto e puerpério

4.2.1 Gravidez na adolescência

Importante indicador de saúde materno-infantil, a porcentagem de partos

de mães adolescentes, entre 2008 e 2014, declinou 0,24 pontos percentuais

por ano no Brasil41 e 0,10 pontos percentuais no Nordeste42. Em Pernambuco,

essa porcentagem permaneceu praticamente estável desde a implementação

do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Essa simples análise comparativa

aponta para a não existência de impacto do programa sobre a gravidez na ado-

lescência.

40 O p-valor estimado foi de 11%.41 Excluindo-se Pernambuco.42 Excluindo-se Pernambuco.

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| Mãe Coruja Pernambucana76

A estimação do modelo de Diferenças em Diferenças corrobora a aná-

lise comparativa do parágrafo anterior: enquanto os municípios não be-

neficiados reduziram a porcentagem de partos de mães adolescentes em

1,47 pontos percentuais, os municípios beneficiados reduziram em apenas

0,67 pontos percentuais. A diferença de 0,80 pontos percentuais entre es-

sas duas diferenças é significativa43. Assim, a evidência preliminar indica

que o Programa Mãe Coruja Pernambucana não contribui para a redução da

gravidez na adolescência.

Por fim, para confirmar esta análise, foram calculados os ajustes para di-

ferenças em termos de condições iniciais dos municípios beneficiados e dos

não beneficiados. Encontra-se que, caso os municípios não beneficiados ti-

vessem as mesmas condições iniciais dos municípios beneficiados, eles ha-

veriam aumentado a porcentagem de partos de mães adolescentes em 1,53

pontos percentuais – 0,25 pontos por conta das condições iniciais de saúde

materno-infantil e 1,28 por conta de diferenças iniciais em termos de vulne-

rabilidade socioeconômica.

Como foi encontrada uma evolução negativa de 1,47 pontos percentuais

nos municípios não beneficiados entre 2008 e 2014, estima-se que, caso esses

municípios possuíssem as mesmas condições dos beneficiados, esse indica-

dor teria permanecido praticamente estável nesse período (1,47–1,53). Como a

porcentagem de partos de mães adolescentes declinou 0,63 ponto percentual

entre os beneficiados pelo programa, estima-se que o impacto do Programa

Mãe Coruja Pernambucana sobre a gravidez na adolescência seja uma queda

de 0,73 ponto percentual. Importante dizer que esse impacto, embora de mag-

nitude limitada, é marginal e estatisticamente significativo44.

Todos esses resultados podem ser encontrados na tabela 12, a seguir.

43 O p-valor estimado foi de 9%.44 O p-valor estimado foi de 12%.

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Um olhar sobre os números | 77

Tabela 12: Resultados encontrados sobre a proporção de partos de mães adolescentes

Proporção de partos de mães adolescentes (menor ou igual a 19 anos de

idade)

Coeficiente Significância

estatística(1)

Crescimento do indicador no Brasil, exceto Pernambuco -0,24

Diferença entre Pernambuco e o resto do Brasil 0,18

Crescimento do indicador no Nordeste, exceto Pernambuco -0,10

Diferença entre Pernambuco e o resto do Nordeste 0,03

Crescimento do indicador dentre os municípios não participantes do

programa

-0,46

Diferença entre municípios participantes e não participantes 0,37

Melhora no tratamento -0,67 -

Melhora no controle -1,47 -

Impacto estimado com Diferenças em Diferenças 0,80

Ajuste 1: Condição inicial 0,25 -

Ajuste 2: Vulnerabilidade 1,28 -

Impacto ajustado -0,73

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Brasil

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Nordeste

Evolução do indicador nos municípios beneficiados e não beneficiados de Pernambuco

Diferenças em Diferenças sem e com ajuste das condições iniciais

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 15%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

4.2.2 Partos cesáreos

A evolução da porcentagem de partos cesáreos entre 2008 e 2014 é preo-

cupante em todas as regiões analisadas, seja em Pernambuco, seja no res-

tante do Nordeste ou do Brasil: há um aumento de 2,07 pontos percentuais

por ano no Brasil45, 2,41 pontos percentuais no Nordeste46 e 2,16 pontos per-

centuais em Pernambuco. Não há diferenças estatisticamente significativas

45 Excluindo-se Pernambuco.46 Excluindo-se Pernambuco.

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| Mãe Coruja Pernambucana78

entre essas três taxas e, com isso, essa primeira análise não indica que o

Programa Mãe Coruja Pernambucana tenha impacto sobre a porcentagem

de partos cesáreos.

Entretanto, após a implantação do programa em Pernambuco, em 2008,

a velocidade de crescimento da porcentagem de partos cesáreos declinou

1,63 pontos percentuais por ano. Essa análise indica um possível impacto do

programa sobre esse indicador.

No entanto, a estimação do modelo de Diferenças em Diferenças, apresen-

tada na tabela 13, não comprova essa conclusão: a incidência de partos cesá-

reos cresceu mais intensamente nos municípios beneficiados (20,68 pontos

percentuais) pelo programa que naqueles não beneficiados (16,32 pontos per-

centuais). Assim, esta análise não apresenta qualquer indício de que o Pro-

grama Mãe Coruja Pernambucana tenha sido efetivo em reduzir a incidência

de partos cesáreos nos municípios em que atua; ao contrário, encontra-se um

impacto estatisticamente significativo de 4,36 pontos percentuais47.

A análise do modelo de Diferenças em Diferenças ajustado para as diferenças

nas condições iniciais dos municípios beneficiados e não beneficiados aponta

nessa mesma direção: estima-se que o Programa Mãe Coruja Pernambucana

tenha provocado um aumento estatisticamente significativo de 3,32 pontos

percentuais48. Encontrou-se tal resultado após a realização dos ajustes de 3,12

pontos percentuais por diferenças em termos das condições iniciais de saúde

materno-infantil e de -2,07 por diferenças em termos de vulnerabilidade.

Com isso, conclui-se que, caso os municípios não beneficiados tivessem as

mesmas condições iniciais que os beneficiados, o crescimento da porcentagem

de partos cesáreos seria superior em um ponto percentual.

47 O p-valor estimado foi de 0,1%.48 O p-valor estimado foi de 3%.

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Um olhar sobre os números | 79

Tabela 13: Resultados encontrados sobre a proporção de partos cesáreos

Proporção de cesarianas Coeficiente Significância

estatística(1)

Crescimento do indicador no Brasil, exceto Pernambuco 2,07

Diferença entre Pernambuco e o resto do Brasil 0,09

Crescimento do indicador no Nordeste, exceto Pernambuco 2,41

Diferença entre Pernambuco e o resto do Nordeste -0,25

Crescimento do indicador dentre os municípios não participantes do

programa

3,90

Diferença entre municípios participantes e não participantes -1,63

Melhora no tratamento 20,68 -

Melhora no controle 16,32 -

Impacto estimado com Diferenças em Diferenças 4,36

Ajuste 1: Condição inicial 3,12 -

Ajuste 2: Vulnerabilidade -2,07 -

Impacto ajustado 3,32

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Brasil

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Nordeste

Evolução do indicador nos municípios beneficiados e não beneficiados de Pernambuco

Diferenças em Diferenças sem e com ajuste das condições iniciais

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 10%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

4.2.3 Aleitamento materno exclusivoEntre 2008 e 2014, a prevalência de aleitamento materno exclusivo até os 6

meses de idade permaneceu constante no Brasil49, não apresentando variação

significativa. No Nordeste50, esse indicador obteve um pequeno crescimento,

de 0,14 ponto percentual por ano, nesse mesmo período. Em Pernambuco, a

prevalência de aleitamento materno apresentou uma pequena redução nesse

49 Excluindo-se Pernambuco.50 Excluindo-se Pernambuco.

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| Mãe Coruja Pernambucana80

período, de 0,17 ponto percentual ao ano51, estatisticamente diferente da

taxa apresentada pela região Nordeste. Após a implantação do Programa Mãe

Coruja Pernambucana em Pernambuco, houve uma aceleração de 1,23 pontos

percentuais por ano na redução da prevalência de aleitamento materno. Assim,

essas duas primeiras análises indicam que existe alguma evidência de impacto

negativo do programa sobre o aleitamento materno.

Entretanto, o modelo de Diferenças em Diferenças, apresentado na tabela

14, e estimado via esse mesmo modelo, não corrobora esta conclusão: a preva-

lência de aleitamento materno cresceu 1,56 ponto percentual nos municípios

beneficiados pelo programa e reduziu 0,14 ponto percentual nos municípios

não beneficiados. Encontra-se, então, um impacto positivo e significativo52 de

1,70 ponto percentual.

O modelo de Diferenças em Diferenças ajustado para as diferenças nas con-

dições iniciais dos municípios beneficiados e não beneficiados aponta na mes-

ma direção. Estima-se que o Programa Mãe Coruja Pernambucana tenha provo-

cado um aumento de 1,64 ponto percentual no aleitamento materno, aumento

este que é marginalmente significativo53. Para encontrar esse resultado, foi rea-

lizado um ajuste de 0,06, consequência de um ajuste por condição inicial da

saúde materno-infantil de -0,53 e um ajuste por vulnerabilidade de 0,58.

51 O p-valor estimado foi de 4%.52 O p-valor estimado foi de 8%.53 O p-valor estimado foi de 11%.

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Um olhar sobre os números | 81

Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

provocou um

aumento de 1,64

ponto percentual

no aleitamento

materno

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| Mãe Coruja Pernambucana82

Tabela 14: Resultados encontrados sobre a prevalência de aleitamento materno exclusivo

Prevalência de aleitamento materno exclusivo (crianças com até 6 meses

de idade)

Coeficiente Significância

estatística(1)

Crescimento do indicador no Brasil, exceto Pernambuco -0,03

Diferença entre Pernambuco e o resto do Brasil -0,14

Crescimento do indicador no Nordeste, exceto Pernambuco 0,14

Diferença entre Pernambuco e o resto do Nordeste -0,31

Crescimento do indicador dentre os municípios não participantes do

programa

1,07

Diferença entre municípios participantes e não participantes -1,23

Melhora no tratamento 1,56 -

Melhora no controle -0,14 -

Impacto estimado com Diferenças em Diferenças 1,70

Ajuste 1: Condição inicial -0,53 -

Ajuste 2: Vulnerabilidade 0,58 -

Impacto ajustado 1,64

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Brasil

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Nordeste

Evolução do indicador nos municípios beneficiados e não beneficiados de Pernambuco

Diferenças em Diferenças sem e com ajuste das condições iniciais

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 15%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

4.3 Saúde infantil no parto

4.3.1 Índice de Apgar

Com base no índice de Apgar, foram construídos dois indicadores das

condições de saúde da criança ao nascer: a porcentagem de crianças com

índice de Apgar de pelo menos seis no primeiro e no quinto minutos de vida

e que estão demonstrados nas tabelas 15 e 16, respectivamente. Entre 2008

e 2014, ambos os indicadores cresceram, em média, 0,4 ponto percentual

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Um olhar sobre os números | 83

por ano no Brasil54. Não foram encontradas diferenças significativas entre o

crescimento desses indicadores em Pernambuco e no restante do Brasil. Para a

região Nordeste, excluindo-se o Estado de Pernambuco, o primeiro indicador

cresceu 0,81 ponto percentual ao ano, em média; e o segundo, 0,91 ponto

percentual. Não foram encontradas diferenças significativas para Pernambuco

quanto ao primeiro indicador, mas, em relação ao indicador que analisa

o índice de Apgar no quinto minuto de vida, o progresso de Pernambuco

foi -0,54 inferior ao progresso no restante da região Nordeste55. Assim, essa

primeira análise encontra apenas uma pequena evidência de impacto negativo

do programa sobre as condições de saúde da criança ao nascer.

Após a implementação do programa, há uma aceleração do declínio de

ambos os indicadores, de -1,10 e -0,69 ponto percentual, respectivamente.

Esta análise sobre a evolução dos indicadores nos municípios de Pernambuco

aponta para um impacto negativo do programa sobre esses indicadores.

Entretanto, a estimação do modelo de Diferenças em Diferenças não cor-

robora as análises iniciais, ao encontrar uma diferença significativa entre a

evolução dos municípios beneficiados versus a evolução dos demais muni-

cípios pernambucanos. Os resultados desse modelo revelam que, desde o

começo da implantação do Programa Mãe Coruja Pernambucana, a porcen-

tagem de crianças nascidas com índice de Apgar de pelo menos seis no pri-

meiro e no quinto minutos de vida cresceu 7,54 e 6,66 pontos percentuais,

respectivamente, entre os municípios beneficiados; e 2,15 e 0,28 pontos per-

centuais, respectivamente, entre os municípios não beneficiados pelo pro-

grama. Com isso, encontram-se impactos estatisticamente significativos de

5,39, para o indicador no primeiro minuto de vida, e 6,38, para o indicador

no quinto minuto de vida56.

A inclusão de ajustes para as diferenças iniciais, porém, tornam as estima-

tivas de impacto nulas. Calcula-se um ajuste por vulnerabilidade de aproxima-

damente 0,4 em ambos os indicadores e um ajuste por diferenças em condições

iniciais de saúde materno-infantil de 5,17 para o primeiro indicador e 5,8 para o

segundo. Com isso, o progresso dos não beneficiados, ajustado pelas diferenças

nas condições iniciais, é de 5,56 e 6,31 pontos percentuais, levando-se em conta

que a estimativa estatisticamente insignificante de impacto do programa sobre o

acesso ao pré-natal seja de -0,17 e 0,07 ponto percentual57.

54 Excluindo-se Pernambuco. 55 O p-valor estimado é de 6%.56 O p-valor estimado é de 0,2% e 0,005% para o Apgar no 1º e no 5º minutos, respectivamente.57 O p-valor estimado é de 81% e 90% para o Apgar no 1º e no 5º minutos, respectivamente.

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| Mãe Coruja Pernambucana84

Tabela 15: Resultados encontrados sobre a porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar maior ou igual a 6 no 1º minuto de vida

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar maior ou igual a 6 no

1º minuto de vida

Coeficiente Significância

estatística(1)

Crescimento do indicador no Brasil, exceto Pernambuco 0,43

Diferença entre Pernambuco e o resto do Brasil -0,01

Crescimento do indicador no Nordeste, exceto Pernambuco 0,81

Diferença entre Pernambuco e o resto do Nordeste -0,39

Crescimento do indicador dentre os municípios não participantes do

programa

1,51

Diferença entre municípios participantes e não participantes -1,10

Melhora no tratamento 7,54 -

Melhora no controle 2,15 -

Impacto estimado com Diferenças em Diferenças 5,39

Ajuste 1: Condição inicial 5,17 -

Ajuste 2: Vulnerabilidade 0,39 -

Impacto ajustado -0,17

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Brasil

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Nordeste

Evolução do indicador nos municípios beneficiados e não beneficiados de Pernambuco

Diferenças em Diferenças sem e com ajuste das condições iniciais

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 1%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

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Um olhar sobre os números | 85

Tabela 16: Resultados encontrados sobre a porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar maior ou igual a 6 no 5º minuto de vida

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar maior ou igual a 6 no

5º minuto de vida

Coeficiente Significância

estatística(1)

Crescimento do indicador no Brasil, exceto Pernambuco 0,44

Diferença entre Pernambuco e o resto do Brasil -0,08

Crescimento do indicador no Nordeste, exceto Pernambuco 0,91

Diferença entre Pernambuco e o resto do Nordeste -0,54

Crescimento do indicador dentre os municípios não participantes do

programa

1,03

Diferença entre municípios participantes e não participantes -0,69

Melhora no tratamento 6,66 -

Melhora no controle 0,28 -

Impacto estimado com Diferenças em Diferenças 6,38

Ajuste 1: Condição inicial 5,89 -

Ajuste 2: Vulnerabilidade 0,42 -

Impacto ajustado 0,07

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Brasil

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Nordeste

Evolução do indicador nos municípios beneficiados e não beneficiados de Pernambuco

Diferenças em Diferenças sem e com ajuste das condições iniciais

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 10%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

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| Mãe Coruja Pernambucana86

4.3.2 Peso ao nascer

Entre 2008 e 2014, o peso ao nascer evoluiu no Brasil58 em uma direção

contrária ao que seria desejável: a porcentagem de crianças que nascem com

baixo peso cresceu em média 0,02 ponto percentual ao ano. O progresso obti-

do em Pernambuco não foi significativamente diferente do encontrado no res-

tante do Brasil e da região Nordeste, como pode ser visto na tabela 17. Também

não foi encontrada nenhuma evidência de aceleração no crescimento desse

indicador após a implementação do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Ademais, a estimação de um modelo de Diferenças em Diferenças não in-

dica nenhuma evidência de impacto do programa sobre o indicador de bai-

xo peso ao nascer. O retrocesso alcançado pelos municípios participantes do

programa é muito similar e estatisticamente equivalente59 ao alcançado pelos

demais municípios pernambucanos não participantes.

A correção do impacto estimado via modelo de Diferenças em Diferenças

ajustado corrobora essa análise: encontra-se um impacto muito próximo a

zero e estatisticamente insignificante60. Esse resultado foi encontrado após a

realização de dois ajustes, 0,01 para as diferenças nas condições iniciais de

saúde materno-infantil e de -0,13 para as diferenças em termos de vulnerabi-

lidade socioeconômica. Importante destacar que o primeiro ajuste encontrado

indica que a tendência ao declínio desse indicador é bastante independente

das condições iniciais.

58 Excluindo-se Pernambuco.59 O p-valor estimado foi de 75%.60 O p-valor estimado foi de 47%.

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Um olhar sobre os números | 87

Tabela 17: Resultados encontrados sobre a proporção de nascidos vivos com baixo peso ao nascer

Proporção de nascidos vivos com baixo peso ao nascer (abaixo de 2.500g) Coeficiente Significância

estatística(1)

Crescimento do indicador no Brasil, exceto Pernambuco 0,02

Diferença entre Pernambuco e o resto do Brasil 0,03

Crescimento do indicador no Nordeste, exceto Pernambuco 0,05

Diferença entre Pernambuco e o resto do Nordeste 0,00

Crescimento do indicador dentre os municípios não participantes do

programa

0,04

Diferença entre municípios participantes e não participantes 0,02

Melhora no tratamento 0,31 -

Melhora no controle 0,22 -

Impacto estimado com Diferenças em Diferenças 0,09

Ajuste 1: Condição inicial 0,01 -

Ajuste 2: Vulnerabilidade -0,13 -

Impacto ajustado 0,22

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Brasil

Evolução do indicador em Pernambuco e no resto do Nordeste

Evolução do indicador nos municípios beneficiados e não beneficiados de Pernambuco

Diferenças em Diferenças sem e com ajuste das condições iniciais

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 5%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

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| Mãe Coruja Pernambucana88

4.4 Indicadores de mortalidadeNesta seção, foi analisada a evidência existente sobre a evolução diferen-

ciada da mortalidade infantil, mortalidade na infância e em outras idades

mais específicas (como a neonatal, perinatal etc.) nos municípios pernam-

bucanos atendidos pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana em compa-

ração com os não atendidos e também com as médias nacional e da região

Nordeste. As taxas de mortalidade consideradas nesta avaliação foram: i)

mortalidade na infância, menores de 5 anos de idade; ii) mortalidade infan-

til, menores de 1 ano de idade; iii) mortalidade infantil pós-neonatal, com 28

a 364 dias de vida; iv) mortalidade neonatal, com 0 a 27 dias de vida; v) mor-

talidade neonatal tardia, com 7 a 27 dias de vida; vi) mortalidade neonatal

precoce, de 0 a 6 dias completos de vida; vii) mortalidade perinatal, nascidos

mortos após, no mínimo, 22 semanas de gestação ou óbitos de crianças com

0 a 6 dias completos de vida; e viii) natimortalidade, nascidos mortos após,

no mínimo, 22 semanas de gestação. A evolução dessas taxas está demons-

trada na tabela 18.

Em todo o Brasil, assim como na região Nordeste e em Pernambuco, todas

essas taxas de mortalidade declinaram entre 2008 e 2014. Não existe evi-

dência, no entanto, de que a queda nesses indicadores seja mais acentuada

em Pernambuco que no restante do Brasil. No entanto, o progresso desses

indicadores foi superior em Pernambuco quando comparado ao restante da

região Nordeste. Há ainda evidência de que a queda nos indicadores de mor-

talidade analisados seja significativamente maior nos municípios beneficia-

dos do que nos demais municípios pernambucanos, com exceção da taxa de

mortalidade neonatal tardia.

No que se refere à taxa de mortalidade na infância, observou-se, entre

2008 e 2014, no grupo de municípios beneficiados, uma queda de 10,96

óbitos por mil nascidos vivos, enquanto entre os não beneficiados a taxa de

mortalidade na infância reduziu apenas 5,78 óbitos por mil nascidos vivos.

Encontra-se, então, um impacto estatisticamente significativo61 de 5,18 óbi-

tos por mil nascidos vivos. Assim, há nesse sentido alguma evidência que

aponta para um impacto do Programa Mãe Coruja Pernambucana na redução

da mortalidade na infância.

61 O p-valor estimado foi de 0,004%.

Page 458: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

Um olhar sobre os números | 89

Tabela 18: Resultados encontrados sobre a evolução das taxas de mortalidade

Coef. Significância

estatística(1)

Coef. Significância

estatística(1)

Coef. Significância

estatística(1)

Coef. Significância

estatística(1)

Coef. Significância

estatística(1)

Coef. Significância

estatística(1)

Taxa de natimortalidade

(nascidos mortos de 22 semanas ou

mais de gestação)

-0,71 0,43 -0,25 -0,03 -0,35 0,05

Taxa de mortalidade neonatal precoce

(0 a 6 dias de idade)

-1,24 0,86 -0,24 -0,15 -0,56 0,16

Taxa de mortalidade perinatal

(agrupa os dois grupos considerados

nas taxas de mortalidade acima)

-0,96 0,39 -0,41 -0,17 -0,92 0,33

Taxa de mortalidade neonatal

(0 a 27 dias de idade)

-1,41 0,99 -0,20 -0,22 -0,60 0,15

Taxa de mortalidade neonatal tardia

(7 a 27 dias de idade)

-0,84 0,69 -0,24 0,09 0,02 -0,15

Mortalidade infantil pós-neonatal

(28 a 364 dias de idade)

-0,76 0,42 -0,34 0,00 -0,81 0,47

Taxa de mortalidade infantil

(menores de 1 ano de idade)

-1,60 0,85 -0,27 -0,48 -1,75 0,97

Taxa de mortalidade na infância

(menores de 5 anos de idade)

-1,72 0,83 -0,36 -0,53 -2,03 1,10

Diferença entre

municípios

beneficiados e não

beneficiadosIndicadores de mortalidade - Evolução

dos indicadores

Crescimento do

indicador no Brasil,

exceto

Pernambuco

Diferença entre

Pernambuco e o

resto do Brasil

Crescimento do

indicador no

Nordeste, exceto

Pernambuco

Diferença entre

Pernambuco e o

resto do Nordeste

Crescimento

dentre os

municípios não

beneficiados

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 15%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

Observou-se também evidências de que o declínio mais acentuado da taxa

de mortalidade infantil em Pernambuco vem ocorrendo de forma duas vezes

mais acentuada nos municípios beneficiados pelo programa do que nos mu-

nicípios não beneficiados. Enquanto esse primeiro grupo obteve um declínio

de 9,76 óbitos por mil nascidos vivos, o grupo dos não beneficiados obteve um

declínio de apenas 4,64 óbitos por mil nascidos vivos. Estimou-se, via modelo

de Diferenças em Diferenças, um impacto de 5,1262 do programa sobre a redu-

ção desse indicador.

Da mesma forma, observa-se um impacto aparente também sobre as taxas

de mortalidade neonatal, neonatal precoce, natimortalidade e mortalidade in-

fantil pós-neonatal, com uma diferença de 2 a 3 óbitos por mil nascidos vivos

na redução desses indicadores entre os municípios beneficiados e os não be-

neficiados pelo programa.

Já a comparação da taxa de mortalidade perinatal entre o grupo de municí-

pios beneficiados e não beneficiados revela um contraste ainda maior: os mu-

nicípios beneficiados reduziram em 7,12 óbitos por mil nascidos vivos essa taxa,

enquanto os não beneficiados reduziram apenas 1,16 por mil nascidos vivos.

62 O p-valor estimado foi de 0,004%.

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| Mãe Coruja Pernambucana90

A taxa de mortalidade neonatal tardia, por sua vez, foi a única que não

apresentou diferença significante entre os grupos de municípios participantes

e não participantes.63 Os contrastes obtidos expostos em cada um dos indica-

dores, assim como sua significância, podem ser verificados na tabela 19.

63 O p-valor estimado foi de 62%.

Redução das taxas

de mortalidade

foi superior em

Pernambuco

quando

comparado ao

restante da região

Nordeste

Page 460: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

Um olhar sobre os números | 91

Tabela 19: Resultados encontrados sobre o impacto nas taxas de mortalidade

Coef. Significância

estatística(2)

Coef. Significância

estatística(2)

Taxa de natimortalidade

(nascidos mortos de 22 semanas ou

mais de gestação)

-2,72 -0,01 -2,72 -2,76 0,71 -0,67

Taxa de mortalidade neonatal precoce

(0 a 6 dias de idade)

-4,07 -1,78 -2,29 -3,55 1,05 0,21

Taxa de mortalidade perinatal

(agrupa os dois grupos considerados

nas taxas de mortalidade acima)

-7,12 -1,16 -5,97 -7,19 2,40 -1,17

Taxa de mortalidade neonatal

(0 a 27 dias de idade)

-4,59 -2,27 -2,32 -3,74 1,09 0,33

Taxa de mortalidade neonatal tardia

(7 a 27 dias de idade)

0,16 -0,09 0,25 -0,15 0,58 -0,18

Mortalidade infantil pós-neonatal

(28 a 364 dias de idade)

-3,92 -1,98 -1,94 -3,15 0,69 0,52

Taxa de mortalidade infantil

(menores de 1 ano de idade)

-9,76 -4,64 -5,12 -6,26 1,33 -0,18

Taxa de mortalidade na infância

(menores de 5 anos de idade)

-10,96 -5,78 -5,18 -5,99 1,43 -0,62

Indicadores de mortalidade - Evolução

dos indicadores

Impacto estimado com

Diferenças em Diferenças

Impacto ajustado

Melhora no

controle

Melhora no

tratamento

Ajuste 1:

Condição inicial

Ajuste 2:

Vulnerabilidade

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 5%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

No entanto, é preciso ajustar os impactos descritos nos parágrafos anteriores

por conta das diferenças iniciais tanto em saúde materno-infantil quanto em

vulnerabilidade socioeconômica. Para as diferenças em termos das condições

iniciais de saúde materno-infantil, encontram-se ajustes com magnitudes va-

riando entre -2,76 e -7,1964, a depender do indicador de mortalidade analisa-

do. Já os ajustes estimados por conta de diferenças de vulnerabilidade entre

os municípios beneficiados e não beneficiados variaram entre os indicadores

analisados, mas, de forma geral, tiveram magnitude de um ponto percentual

positivo. Com isso, os ajustes totais alcançaram valores entre 2 a 5 óbitos por

mil nascidos vivos, a depender do indicador de mortalidade analisado65.

Conclui-se que, caso os municípios não beneficiados tivessem as mesmas

condições iniciais dos beneficiados, o declínio dos indicadores nesse gru-

po seria maior do que o efetivamente observado, aproximando-se, com isso,

da redução obtida no grupo de municípios beneficiados. A estimativa desses

64 Novamente, a taxa de mortalidade neonatal tardia foi uma exceção, apresentando um ajuste de apenas -0,15.65 A taxa de mortalidade neonatal tardia foi uma exceção, apresentando ajustes pequenos, que somados, alcançavam 0,43.

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| Mãe Coruja Pernambucana92

impactos, após a correção pela diferença entre os grupos na condição inicial,

torna-se, então, de magnitude pouco expressiva66 e estatisticamente não sig-

nificativa para todos os indicadores de mortalidade analisados.

66 A única exceção seja talvez a taxa de mortalidade perinatal: o impacto estimado sobre esse indicador tem magnitude expressiva, 1,17, mas, assim como os outros indicadores de mortalidade, não é estatisticamente significativo.

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Um olhar sobre os números | 93

Capítulo 5

Análises de robustez e validade

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| Mãe Coruja Pernambucana94

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O Programa Mãe Coruja Pernambucana, em seu processo de seleção de be-

neficiários, por merecidas razões, privilegiou municípios com indicado-

res de saúde materno-infantil mais precários e com grau de vulnerabi-

lidade socioeconômica maior – a seção 3.4.2 deste relatório apresentou,

em detalhes, as diferenças encontradas em termos das condições iniciais dos

municípios beneficiados e dos não beneficiados. Como resultado dessa desi-

gualdade de partida, a simples diferença entre o progresso alcançado nos dois

grupos não é necessariamente uma medida do impacto do programa. Por isso,

foi preciso realizar ajustes para as diferenças nas condições preexistentes para

estimar esse impacto.

No entanto, as correções realizadas mostraram-se bastante acentuadas em

muitos casos e, em particular, no caso das taxas de mortalidade analisadas: o

ajuste a ser realizado foi da magnitude da diferença de progresso entre mu-

nicípios beneficiados e não beneficiados. Com isso, apesar de o progresso ter

sido mais intenso nos municípios beneficiados do que nos municípios não be-

neficiados, a explicação encontrada não parece estar associada à presença do

Programa Mãe Coruja Pernambucana, mas, sim, às diferenças iniciais. Seriam

essas diferenças o que causa a disparidade observada no progresso dos dois

grupos, mesmo na ausência do programa.

Frente à necessidade de ajustes de tamanha magnitude, como os apresen-

tados nas tabelas de resultados do capítulo 4 (tabelas 10 a 19), é inevitável que

se questione a validade do procedimento utilizado para obtê-los. Apesar de

ser impossível, em última instância, testar as hipóteses subjacentes à meto-

dologia utilizada, é possível apresentar algumas evidências da plausibilidade

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| Mãe Coruja Pernambucana96

das hipóteses formuladas e da metodologia em si. Portanto, neste capítulo,

são apresentadas duas formas de validação da metodologia utilizada e de uma

análise da robustez dessas estimações.

5.1 Validade da metodologiaComo primeira validação, foi feita uma simulação, estimando o modelo

de Diferenças em Diferenças, apenas para municípios não beneficiados de

Pernambuco e apenas para o indicador de mortalidade infantil67. Para tal,

comparou-se o progresso dos municípios não beneficiados com mais alta

taxa de mortalidade infantil (acima de 20 óbitos por mil nascidos vivos no

período de 2005 a 2008) com o progresso daqueles municípios também não

beneficiados, mas com mais baixa taxa de mortalidade infantil (abaixo de 20

óbitos por mil nascidos vivos no período de 2005 a 2008). Se é esperado que

condições iniciais afetem o progresso nos municípios, dever-se-ia encontrar

diferenças significativas nos resultados alcançados pelos grupos de compa-

ração usados neste exercício. Como esperado, o primeiro grupo, entre 2008

e 2014, reduziu a taxa de mortalidade infantil em 9,7 óbitos por mil nascidos

vivos; já o segundo grupo apresentou uma redução de apenas 4,3 óbitos por

mil nascidos vivos.

A comparação dos progressos apresentados por cada grupo corrobora in-

tegralmente a proposta de ajuste deste relatório: municípios não beneficiados

com altas taxas de mortalidade reduziram a mortalidade infantil, em média,

em 5,4 óbitos por mil nascidos vivos a mais que municípios não beneficiados

com baixas taxas de mortalidade. Ou seja, na total ausência do Programa Mãe

Coruja Pernambucana, municípios com altas taxas de mortalidade apresen-

tam um progresso superior ao observado para os municípios com baixas taxas

de mortalidade. Com isso, o ajuste proposto, de 4,9 óbitos por mil nascidos

vivos, apresentado na tabela 19, está, em boa medida, validado. Afinal, esse

ajuste representa o quanto a mortalidade infantil seria maior entre os municí-

pios beneficiados do que entre os não beneficiados na ausência do programa,

em virtude apenas de diferenças na situação inicial de municípios beneficia-

dos e não beneficiados e, portanto, deveria ser bem similar ao impacto esti-

mado nesta seção, apenas para municípios não beneficiados.

A segunda forma de validação da metodologia utilizada neste relatório

consistiu em reproduzir o processo de seleção adotado pelo programa em Per-

67 Importante agradecer ao prof. Sérgio Firpo (Insper) por sugerir realizar tal análise.

Page 466: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

Um olhar sobre os números | 97

nambuco nos demais Estados da região Nordeste, considerando todos os indi-

cadores de saúde materno-infantil68. Foi definido, então, um grupo de muni-

cípios que seria beneficiado caso o Programa Mãe Coruja Pernambucana fosse

uma política de toda a região Nordeste. Posteriormente, foi calculada a dife-

rença de progresso na redução da taxa de mortalidade infantil entre os muni-

cípios que seriam beneficiados e os municípios que não seriam beneficiados.

Novamente, se a hipótese de que as condições iniciais afetam o progresso for

verdadeira, então, a diferença encontrada nos resultados entre os grupos con-

siderados é uma medida do ajuste necessário para corrigir as diferenças de

condições iniciais em saúde materno-infantil entre municípios beneficiados e

não beneficiados em Pernambuco.

No caso da taxa de mortalidade infantil, a diferença encontrada foi de 6,0

óbitos por mil nascidos vivos – ou seja, os municípios que seriam (mas eviden-

temente não foram) beneficiados pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana

reduziram, desde a sua implementação até 2014, a taxa de mortalidade infantil

em 6,0 óbitos por mil nascidos vivos a mais que os municípios nordestinos não

selecionados para participar. Novamente, esse resultado corrobora a magnitu-

de do ajuste estimado para correção do impacto, de 4,9 óbitos por mil nascidos

vivos. Importante destacar que, caso o ajuste adotado fosse de 6,0 óbitos por

mil nascidos vivos, o impacto estimado do programa sobre a taxa de mortali-

dade infantil seria ainda menor.

5.2 Robustez dos resultadosNesta seção, serão detalhadas duas análises da robustez dos resultados.

O objetivo destas análises foi verificar se os resultados não são afetados por

variações pequenas relacionadas às hipóteses do modelo aplicado. Duas va-

riações foram testadas: a expansão do grupo de controle e a modificação da

variável de exposição ao programa.

Dado o número relativamente pequeno de municípios pernambucanos não

beneficiados pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana69, uma análise impor-

tante da robustez dos resultados apresentados neste relatório é a estimação

desses municípios, considerando um conjunto de municípios da região Nor-

deste como grupo de comparação em vez dos municípios não beneficiados de

68 Não foram utilizados indicadores socioeconômicos nesta reprodução do processo de seleção.69 Apenas 76 municípios, de um total de 185, não são hoje beneficiados pelo programa.

Page 467: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

| Mãe Coruja Pernambucana98

Pernambuco70,71. Para tal, estimou-se o efeito que as diferenças iniciais, tanto

em termos de saúde materno-infantil quanto de vulnerabilidade econômica,

teriam sobre o progresso dos diferentes indicadores, considerando esse gru-

po de controle expandido. Esse efeito é, então, aplicado às diferenças iniciais

existentes apenas entre os municípios pernambucanos, beneficiados e não

beneficiados, para se calcular o ajuste.

Os resultados encontrados corroboram o ajuste apresentado neste relatório:

encontra-se uma diferença de 4,1 óbitos por mil nascidos vivos no caso da

mortalidade infantil. Ou seja, a experiência de toda a região demonstra que

a queda na taxa de mortalidade infantil entre municípios beneficiados pelo

Programa Mãe Coruja Pernambucana deveria ser ao menos 4,1 óbitos por mil

nascidos vivos maior do que nos municípios pernambucanos não beneficia-

dos pelo programa. Assim, o declínio de apenas 1 óbito por mil nascidos vivos72

poderia ser atribuído à presença do programa nos municípios beneficiados –

uma queda substantiva e estatisticamente insignificante.

Esse mesmo procedimento foi também utilizado para estimar o impacto do

Programa Mãe Coruja Pernambucana sobre todos os 17 indicadores de saúde

materno-infantil. Em todos os casos, os resultados encontrados são muito si-

milares aos encontrados quando o ajuste foi estimado considerando apenas

os municípios pernambucanos não beneficiados como grupo de comparação

para o cálculo do efeito das diferenças iniciais. Conclui-se, então, que os re-

sultados estimados são robustos, afinal, eles não se modificam com a expansão

do grupo de comparação.

Outra análise da robustez dos resultados encontrados é o refinamento da

variável de exposição. Neste estudo, o acesso ao Programa Mãe Coruja Per-

nambucana foi tratado como dicotômico: os municípios que ingressaram no

programa entre 2008 e 2014 foram denominados “beneficiados”, já os que não

tiveram acesso foram denominados “não beneficiados”. Por conta dessa esco-

lha metodológica, a heterogeneidade na exposição ao programa entre os be-

neficiados não foi considerada. Potencialmente, um refinamento da variável

de exposição que considerasse essa heterogeneidade poderia afetar o impacto

estimado do programa. Assim, novas estimativas foram obtidas, consideran-

do-se, como medida de exposição, o número de anos no programa até 2014.

70 O procedimento foi realizado para todos os Estados da região Nordeste, à exceção de Maranhão e Piauí.71 Importante agradecer ao prof. Jorge Jatobá (Ceplan Consultoria Econômica) pela sugestão de utilizar toda a região Nordeste como grupo de comparação.72 Esse impacto foi estimado a partir da subtração do ajuste, 4,1, da diferença entre o grupo de tratamento e o grupo de comparação; 5,1, já encontrada no modelo de Diferenças em Diferenças.

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Um olhar sobre os números | 99

As estimativas obtidas são apresentadas na tabela 20; caso o coeficiente

“estimativa do impacto” seja multiplicado por 5,1 anos (que corresponde à ex-

posição média dos municípios beneficiados até 2014), serão encontrados im-

pactos essencialmente idênticos aos estimados no restante do trabalho, quan-

do essa forma de heterogeneidade é ignorada. Assim, pode-se concluir que os

resultados estimados nessa avaliação são robustos, já que se mantêm, mesmo

quando a heterogeneidade na exposição do programa é considerada.

Tal resultado não é surpreendente: a diferença de exposição entre os muni-

cípios é pequena, de no máximo dois anos. Como visto na seção 3.4.1, todos os

municípios beneficiados e considerados nesta análise73 aderiram ao programa

no biênio 2008-2010.

73 Ipojuca e Recife aderiram posteriormente, mas não foram considerados na análise aqui apre-sentada.

Em maio de

2008, o Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

foi implantado em

Arcoverde

Page 469: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

| Mãe Coruja Pernambucana100

Tabela 20: Impacto de anos de exposição ao Programa Mãe Coruja Pernambucana sobre indicadores de saúde (2014)

Indicador Impacto Significância

estatística(1)

Média Número de

observações

Proporção de nascidos vivos com sete ou mais consultas de pré-natal 1,71 2,93 180

Cobertura vacinal (idade-alvo como menores de 2 anos de idade) -0,55 2,93 180

Taxa de internação hospitalar por causas sensíveis à atenção básica 0,44 2,93 180

Proporção de partos cesáreos 0,58 2,93 180

Proporção de partos de mães adolescentes (menor ou igual a 19 anos de

idade)

-0,13 2,93 180

Prevalência de aleitamento materno exclusivo (crianças com até 6 meses de

idade)

0,37 2,93 180

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar maior ou igual a 6 no 1º

minuto de vida

-0,01 2,93 180

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar maior ou igual a 6 no 5º

minuto de vida

0,05 2,93 180

Proporção de nascidos vivos com baixo peso ao nascer (abaixo de 2.500g) 0,05 2,93 180

Taxa de natimortalidade (nascidos mortos de 22 semanas ou mais de

gestação)

-0,12 2,94 164

Taxa de mortalidade neonatal precoce (0 a 6 dias de idade) 0,07 2,95 154

Taxa de mortalidade perinatal (agrupa os dois grupos considerados nas taxas

de mortalidade acima)

-0,15 2,93 147

Taxa de mortalidade neonatal (0 a 27 dias de idade) 0,09 2,86 159

Taxa de mortalidade neonatal tardia (7 a 27 dias de idade) -0,06 2,71 87

Mortalidade infantil pós-neonatal (28 a 364 dias de idade) 0,11 2,84 129

Taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano de idade) 0,00 2,90 168

Taxa de mortalidade na infância (menores de 5 anos de idade) -0,07 2,90 168

Acesso a serviços de saúde materno-infantil

Período gestacional, parto e puerpério

Saúde infantil no parto

Indicadores de mortalidade

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

(1) As estimativas identificadas na última coluna como estatisticamente significantes atingem significância de, no máximo, 10%.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

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Um olhar sobre os números |101

Capítulo 6

Conclusões

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| Mãe Coruja Pernambucana102

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Diversos estudos, nas mais variadas áreas da ciência, têm, repetidamente,

demonstrado que a promoção de atenção materno-infantil integral e de

qualidade é uma das áreas de atuação das políticas públicas com maior

potencial para gerar desenvolvimento humano, inclusão social e reduzir

todas as formas de desigualdade. Ou seja, é de amplo conhecimento que o de-

senvolvimento humano responde de forma intensa, rápida e duradoura à dis-

ponibilidade, qualidade e integralidade da atenção materno-infantil.

Conscientes da importância da atenção materno-infantil e do atraso de

Pernambuco em relação aos padrões já alcançados e desejados nos níveis na-

cional e internacional, o governo estadual, em coordenação com os governos

municipais, desenhou e implantou o Programa Mãe Coruja Pernambucana,

com vistas a acelerar o progresso na saúde materno-infantil no Estado e a eli-

minar o déficit existente. Implantado em 2008, em 24 municípios dos mais

vulneráveis do Estado, o programa expandiu-se rapidamente, chegando a

atender, já em 2010, 57% dos municípios pernambucanos.

Como documentado neste estudo, ao longo da última década, Pernambuco

experimentou grande progresso em saúde materno-infantil. A taxa de

mortalidade infantil declinou em 15,07 óbitos por mil nascidos vivos, e a

porcentagem de nascidos vivos cujas mães tiveram ao menos sete consultas

de pré-natal cresceu 13,64 pontos percentuais. Buscou-se, com o presente

estudo, avaliar a contribuição do Programa Mãe Coruja Pernambucana para

esse sucesso, afinal, ele foi desenhado e implantado com esse propósito. Em

outras palavras, buscou-se isolar o impacto do programa e estimar a sua

magnitude sobre um amplo leque de indicadores de saúde materno-infantil.

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| Mãe Coruja Pernambucana104

Assim, este relatório tentou responder, com precisão, a difícil questão sobre

em que medida o desempenho do Estado em saúde materno-infantil teria sido

pior caso o Programa Mãe Coruja Pernambucana não tivesse sido implantado.

Para se avaliar o impacto de um programa, o ideal é que a avaliação seja

sempre planejada de antemão e acomodada em sua própria implantação. Esse,

infelizmente, não foi o caso do Programa Mãe Coruja Pernambucana. A avalia-

ção apresentada neste estudo precisou, portanto, ser inteiramente concebida

após o programa ter sido implantado e estar em operação por quase uma déca-

da; ficou restrita, dessa forma, a informações que foram coletadas com outras

finalidades. Ou seja, esta avaliação não se baseia em informações presentes

em pesquisas de linha de base e seguimento especificamente desenhadas e

coletadas para atender às suas necessidades.

O desenho da avaliação de impacto, desconectado da implantação do

programa, leva a quatro grandes desafios que precisam ser enfrentados.

Em primeiro lugar, embora o público-alvo do programa sejam mulheres,

crianças e famílias, a informação utilizada está no nível municipal. Como

o programa efetivamente atende a apenas uma parcela da população-al-

vo em cada município, o impacto sobre os indicadores municipais nos dá,

naturalmente, uma visão diluída do impacto que o programa tem sobre as

famílias efetivamente atendidas. De fato, se apenas metade da população

-alvo do município é atendida pelo programa e o impacto sobre a popula-

ção não atendida é nulo, então, o impacto do programa sobre os indicado-

res municipais será equivalente à metade do seu impacto sobre as famílias

efetivamente atendidas.

Em segundo lugar, deve-se ter em conta que está se avaliando o impacto

de um programa complementar, que opera em um ambiente em que já exis-

tem diversas outras ações voltadas à promoção da saúde materno-infantil. Sua

função é promover o acesso e uma maior eficácia desses programas preexis-

tentes. Sua contribuição e, portanto, seu impacto é necessariamente restri-

to a situações em que o acesso e a eficácia das ações já existentes podem ser

aperfeiçoados. Assim, quanto maior e mais eficaz a cobertura inicial de ações

preexistentes, como o Programa Saúde da Família, menores as possibilidades

de contribuição do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Além disso, boa parte dos objetivos da saúde materno-infantil se referem

à redução na prevalência de eventos raros (como a mortalidade infantil), cuja

ocorrência pode apenas em parte ser influenciada por ações públicas. A ava-

liação de impacto sobre esse tipo de indicador é difícil por duas razões. Por

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Um olhar sobre os números |105

um lado, por serem eventos raros, a sua prevalência em municípios pequenos

é muito volátil. Basta uma morte a mais ou a menos em um dado ano para

que a taxa de mortalidade neonatal, por exemplo, varie substancialmente. A

elevada volatilidade dificulta a tarefa estatística de isolar o impacto do Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana. Por outro lado, apenas uma parcela das causas

desses eventos poderia ser controlada ou evitada pelo atendimento dado pelo

programa e, mesmo nesse caso, como a cobertura nos municípios atendidos

não é universal, apenas parte desses eventos poderá ser evitada. Em síntese, o

programa atende apenas uma parcela da população e atua apenas sobre uma

parcela das causas de determinados eventos raros. Certamente um desafio à

detecção de seu impacto.

Por fim, isolar o impacto de um programa dos demais determinantes sobre

os resultados de interesse (saúde materno-infantil, neste caso) requer um co-

nhecimento perfeito do processo de seleção de beneficiários e, de preferência,

que esse processo tenha seguido regras bem definidas e relativamente simples,

de maneira que possa ser reproduzido. O processo utilizado no Programa Mãe

Coruja Pernambucana é relativamente complexo, o que torna difícil (ou mes-

mo impossível) o seu perfeito conhecimento e a sua reprodução. Esse desco-

nhecimento torna as estimativas de impacto obtidas dependentes da validade

de hipóteses não testáveis.

Conforme já ressaltado, a magnitude do impacto de um programa é a

diferença entre o que ocorreu com os resultados de interesse e o que teria

ocorrido com esses resultados caso o ele não tivesse sido implantado. Neste

estudo, para avaliar o que teria ocorrido caso o programa não tivesse sido

implantado, analisa-se o que efetivamente ocorreu com os municípios per-

nambucanos não participantes que apresentavam as mesmas condições de

saúde materno-infantil antes de sua implantação e que tinham o mesmo ní-

vel socioeconômico dos que participaram.

Os resultados obtidos apontam para um impacto significativo sobre o efeti-

vo acesso aos diversos serviços de saúde materno-infantil. Em particular, so-

bre o acesso ao pré-natal e a partos cesáreos74, embora não indiquem impacto

sobre a cobertura vacinal. Também foram encontrados impactos marginal-

mente significativos sobre comportamentos relacionados à melhoria na saúde

materno-infantil, como redução da gravidez na adolescência e expansão na

prevalência do aleitamento materno exclusivo.

74 Cabe registrar que nos últimos anos tem-se realizado um esforço nacional para a redução de partos cesáreos, restringindo-os somente aos casos necessários.

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| Mãe Coruja Pernambucana106

Quanto aos resultados últimos da saúde materno-infantil, assim como a

taxa de mortalidade infantil, foram encontrados progressos muito mais acen-

tuados nos municípios beneficiados pelo Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana do que naqueles não beneficiados. Essa diferença de progresso, contu-

do, parece estar integralmente associada à maior vulnerabilidade inicial dos

municípios beneficiados. De fato, quando foi comparado o progresso nesses

indicadores em municípios beneficiados e não beneficiados, com situações

iniciais similares, não foi encontrada qualquer diferença em progresso. Vale

dizer que não foram encontrados quaisquer impactos significativos do Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana sobre os indicadores de resultados últimos da

saúde materno-infantil, como a taxa de mortalidade infantil geral ou as espe-

cíficas a diversos grupos etários.

No entanto, é preciso relativizar a conclusão anteriormente formulada. Se

de um lado, comparando municípios com a mesma situação inicial em ter-

mos do indicador analisado não se encontra impacto; de outro, ao se compa-

rar a evolução de municípios que partem da mesma situação socioeconômica,

encontra-se que a mortalidade infantil declinou de forma significativamente

mais intensa entre os beneficiários do que entre os não beneficiários. Qual das

duas formas de ajuste é mais correta (ou, ainda, seria uma outra não adotada)?

Responder a essa pergunta com precisão depende do pleno conhecimento do

processo de seleção dos municípios beneficiários, o que não conseguimos de-

cifrar de forma plenamente adequada. Pelo que pôde ser desvendado, o pro-

cesso baseou-se na situação inicial de mortalidade infantil, indicando que o

ajuste pela situação inicial seja o procedimento mais adequado no caso do im-

pacto sobre a mortalidade infantil.

Além disso, um conjunto de simulações realizadas aponta que, de fato,

municípios com piores condições iniciais tenderam a progredir mais do que

aqueles com melhores condições. Em outras palavras, comparar municípios

beneficiados e não beneficiados que partiram de situações iniciais diferentes

pode levar a vieses na estimação do impacto do Programa Mãe Coruja Per-

nambucana. No entanto, apesar de existir evidência a favor da utilização da

metodologia baseada na comparação de municípios com idêntica situação ini-

cial (que não aponta impacto significativo sobre a mortalidade infantil), essa

evidência não é definitiva. Existe a possibilidade de a melhor opção metodo-

lógica ser aquela que compara municípios com as mesmas condições socioe-

conômicas, caso em que o Programa Mãe Coruja Pernambucana teria tido im-

pacto significativo sobre a mortalidade infantil.

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Um olhar sobre os números |107

Em suma, por não ter sido capaz de explicitar completamente o processo

de seleção dos beneficiários, sejam eles municípios, sejam famílias nos mu-

nicípios atendidos, o estudo utilizou um grupo de comparação, cuja valida-

de depende de hipóteses não verificáveis. Ademais, por não ter sido levada

em consideração a efetiva cobertura do programa nos municípios atendidos,

subestima-se o real impacto sobre as famílias atendidas. Por essas razões, os

resultados deste estudo devem ser considerados preliminares.

A despeito de todas as limitações desta avaliação, os resultados encon-

trados parecem identificar aspectos importantes do Programa Mãe Coruja

Pernambucana e sugerir algumas modificações. Duas implicações para o

aperfeiçoamento do programa merecem destaque. Primeiramente, o fato de

que as estimativas apontam para um grande impacto do programa sobre o

acesso, mas não sobre os resultados últimos pode estar revelando que o pro-

grama está sendo muito mais efetivo em promover o acesso a serviços do que

em promover melhorias na qualidade dos serviços oferecidos. Dessa forma,

dada a expansão da cobertura municipal de serviços básicos de saúde, via

Programa Saúde da Família e programas correlatos, o Programa Mãe Coruja

Pernambucana talvez devesse fortalecer seu foco na assistência técnica e na

supervisão às secretarias municipais, com vistas a promover melhorias na

qualidade dos serviços (atendimento indireto à população local), retirando

eventualmente parte de seu foco na expansão da cobertura e no atendimento

direto à população.

Em segundo lugar, o fato de não ter sido encontrado impacto significati-

vo do Programa Mãe Coruja Pernambucana sobre importantes resultados com

baixa prevalência (como a mortalidade neonatal) pode indicar que o estilo e o

protocolo de atendimento utilizados pelo programa estejam mais adequados à

promoção de uma atenção básica geral e muito menos adequados à identifica-

ção de casos de alta vulnerabilidade e alto risco (ou a limitações na capacidade

de encaminhamento ou resolutividade desses casos). Assim, se o Programa

Mãe Coruja Pernambucana tem a pretensão de ser mais efetivo na redução

da prevalência de eventos cada vez mais raros (como a mortalidade infantil),

talvez precise dar maior ênfase à identificação dos casos de alto risco e vulne-

rabilidade e, eventualmente, até desenvolver protocolos ainda mais eficazes

para identificar esses casos e aprimorar os mecanismos de encaminhamento,

promovendo maior resolutividade.

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| Mãe Coruja Pernambucana108

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Um olhar sobre os números |109

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| Mãe Coruja Pernambucana110

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Um olhar sobre os números |111

Referências

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| Mãe Coruja Pernambucana112

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| Mãe Coruja Pernambucana114

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Um olhar sobre os números |115

Apêndices

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| Mãe Coruja Pernambucana116

Apêndice 1: Metodologia de cálculo dos indicadores de saúde materno-infantil

Indicador Unidade Fonte Construção

Proporção de nascidos vivos com sete ou mais

consultas de pré-natal

% DATASUS Número de nascidos vivos com 7 ou mais consultas de

pré-natal por nascidos vivos em termos percentuais.

Cobertura vacinal (idade-alvo como menores de

2 anos de idade)

% DATASUS Número de crianças com esquema básico completo na

idade-alvo para determinado tipo de vacina por

crianças na idade-alvo em termos percentuais.

Considera-se idade alvo como menores de 2 anos de

idade e as seguintes vacinas: BCG, Hepatite B em

menores de 1 mês, Rotavírus Humano, Meningococo C,

Penta, Pneumocócica, Poliomielite, Febre Amarela,

Hepatite A, Pneumocócica (1º ref.), Meningococo C (1º

ref.), Poliomielite (1º ref.), Tríplice Viral D1 e Tetra Viral

(SRC+VZ).

Taxa de internação hospitalar por causas

sensíveis à atenção básica

% DATASUS Número de internações por causas selecionadas

sensíveis à atenção básica pelo total de internações

clínicas em termos percentuais.

Proporção de partos cesáreos % DATASUS Número de nascidos vivos de partos cesáreos por

nascidos vivos em termos percentuais. Excluem-se as

ocorrências sem informação sobre o tipo e local de

parto.

Taxa de prematuridade % DATASUS Número de nascidos vivos prematuros (abaixo de 37

semanas de gestação) por nascidos (vivos ou mortos)

em termos percentuais. Consideram-se apenas partos

hospitalares.

Taxa de mortalidade materna por 100 mil DATASUS Número de óbitos femininos por causas maternas, por

100 mil nascidos vivos. Considera-se morte materna a

morte de uma mulher durante a gestação ou até 42

dias após o término da gestação, independente da

duração ou da localização da gravidez, devida a

qualquer causa relacionada com ou agravada pela

gravidez ou por medidas em relação a ela.

Proporção de partos de mães adolescentes

(menor ou igual a 19 anos de idade)

% DATASUS Número de nascidos vivos de mães residentes

pertencentes ao grupo etário por nascidos vivos de

mães residentes em termos percentuais.

Prevalência de aleitamento materno exclusivo

(crianças com até 6 meses de idade)

% SISVAN (DAB) Número de crianças de 0 a 6 meses de idade que se

alimentam exclusivamente de leite materno por

crianças residentes de 0 a 6 meses em termos

percentuais. Considera-se a declaração do responsável

no momento do atendimento.

Acesso a serviços de saúde materno-infantil: indicadores que representam o acesso e a qualidade da atenção primária a gestantes e

às crianças em seus primeiros anos de vida.

Período gestacional, parto e puerpério: indicadores que caracterizam o período gestacional, o momento do parto e os meses

seguintes, o puerpério.

Fonte: Elaboração própria.

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Um olhar sobre os números |117

Indicador Unidade Fonte Construção

Porcentagem de nascidos vivos com índice de

Apgar maior ou igual a 6 no 1º minuto de vida

% DATASUS Número de nascidos vivos de mães residentes que

receberam nota de 6 até 10 na escala Apgar, no 1º

minuto de vida, com relação ao total de nascidos vivos

residentes em determinado espaço geográfico, no ano

considerado.

Porcentagem de nascidos vivos com índice de

Apgar maior ou igual a 6 no 5º minuto de vida

% DATASUS Número de nascidos vivos de mães residentes que

receberam nota de 6 até 10 na escala Apgar, no 5º

minuto de vida, com relação ao total de nascidos vivos

residentes em determinado espaço geográfico, no ano

considerado.

Proporção de nascidos vivos com baixo peso ao

nascer (abaixo de 2.500g)

% DATASUS Número de nascidos vivos com peso < 2500g por

nascidos vivos em termos percentuais.

Taxa de natimortalidade (nascidos mortos de 22

semanas ou mais de gestação)

por mil DATASUS Número de natimortos (nascidos mortos de 22

semanas de gestação ou mais; ou, equivalentemente,

pesando mais de 500g) por mil nascidos (vivos ou

mortos).

Taxa de mortalidade neonatal precoce (0 a 6

dias de idade)

por mil DATASUS Número de óbitos de 0 a 6 dias por mil número de

nascidos vivos.

Taxa de mortalidade perinatal (agrupa os dois

grupos considerados nas taxas de mortalidade

acima)

por mil DATASUS Número de óbitos fetais (nascidos mortos de 22

semanas de gestação ou mais) e óbitos de 0 a 6 dias

completos de vida por nascidos (vivos ou mortos) em

termos percentuais.

Taxa de mortalidade neonatal (0 a 27 dias de

idade)

por mil DATASUS Número de óbitos infantis do período neonatal (< 28

dias de idade) por mil nascidos vivos.

Taxa de mortalidade neonatal tardia (7 a 27 dias

de idade)

por mil DATASUS Número de óbitos infantis no período neonatal tardio

(7 a 27 dias de idade) por mil nascidos vivos.

Mortalidade infantil pós-neonatal (28 a 364 dias

de idade)

por mil DATASUS Número de óbitos de 28 a 364 dias por mil nascidos

vivos.

Razão de óbitos infantis por causas evitáveis

(menores de 1 ano de idade)

% DATASUS Número de óbitos infantis por causas evitáveis por

nascidos vivos de mães residentes em termos

percentuais. São considerados óbitos evitáveis,

aqueles que, pelo menos teoricamente, poderiam ser

reduzidos ou evitados por ações efetivas dos serviços

de saúde ofertados para uma população em

determinados ano e local.

Taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano

de idade)

por mil DATASUS Número de óbitos de menores de 1 ano por mil

nascidos vivos.

Taxa de mortalidade na infância (menores de 5

anos de idade)

por mil DATASUS Número de óbitos com menos de 5 anos de idade por

mil nascidos vivos.

Saúde infantil no parto: indicadores que caracterizam às condições de saúde dos recém-nascidos.

Indicadores de mortalidade: taxas de mortalidade que podem ser calculadas para crianças em seus primeiros cinco anos de vida.

*Sisvan – Sistema de Vigilância Alimentar Nutricional**DAB – Departamento de Atenção Básica

Fonte: Elaboração própria.

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| Mãe Coruja Pernambucana118

Apêndice 2: Modelo de Diferenças em Diferenças com correção para condição inicial

Definindo impacto

Vamos denotar o universo de municípios de Pernambuco onde o Progra-

ma Mãe Coruja Pernambucana poderia ser implantado75 por e por um

município nesse universo, . Denotamos por , um indicador de se

o município foi ou não selecionado para participar do programa, com

se o município foi selecionado e caso não tenha sido se-

lecionado. Adicionalmente, para cada município , vamos denotar por

e um vetor de resultados indicativos da situação da saúde ma-

terno-infantil nesse município, posterior à implantação do Programa Mãe

Coruja Pernambucana no Estado, caso esse município se beneficie ou não

se beneficie do programa. De forma similar, denotamos por o corres-

pondente vetor de resultados indicativos da situação da saúde materno-in-

fantil nesse município anterior à implantação do Programa Mãe Coruja

Pernambucana no Estado. Por fim, denotamos por um vetor de indi-

cadores que caracterizam a vulnerabilidade socioeconômica do município

no momento em que os municípios a serem selecionados para participar do

programa foram selecionados.

Daí segue que, como o impacto do programa sobre as condições de saú-

de materno-infantil no município , é dado pela diferença entre o que

aconteceria com as condições de saúde materno-infantil nesse município

caso ele participe do programa, , e a condição que prevaleceria caso não

participe, . Temos que . Assim, o impacto mé-

dio, , do programa sobre os municípios participantes, , é dado por:

Note que também é verdadeiro que:

Em outras palavras, o impacto pode ser definido tanto em termos do

contraste da situação da saúde materno-infantil posterior à implantação do

programa como do contraste entre o progresso na situação da saúde mater-

no-infantil.

75 Isso exclui os x municípios de grande porte do Estado: Recife, Olinda etc.

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Um olhar sobre os números |119

Como para todo município participante, , e são

observáveis, a média pode facilmente ser estimada. A dificul-

dade é a segunda média na expressão para o impacto, , uma vez

que, para os municípios beneficiados, , não é observável,

uma vez que se refere às condições que esse município teria posteriormente

a implantação do Programa Mãe Coruja Pernambucana, caso ele não tivesse

sido um dos municípios selecionados para participar.

Processo de seleção dos beneficiários

Todo método de estimação do impacto de um programa deve necessaria-

mente se basear no conhecimento do processo de seleção dos beneficiários. O

método utilizado neste estudo pressupõe, com base na seção 3.4.1, que des-

creveu o processo de seleção dos municípios beneficiados, que esse proces-

so pode ser muito bem aproximado por uma seleção baseada integralmente

nas condições de saúde materno-infantil, , e no grau de vulnerabilidade, ,

preexistentes, no sentido de que existe uma função e um componente (sorte)

aleatório, isto é, estatisticamente independente de todas as demais variáveis

envolvidas na seleção e das condições de saúde que iriam prevalecer em um

momento posterior ao da implantação do programa, caso o programa não fos-

se implantado, . Isto é, assumimos que:

Nesse caso, se denota a sorte do município , então, teremos que

esse município será selecionado, , se e somente se:

E o município não será selecionado, , se e somente se teve pou-

ca sorte, no sentido de que:

Essa hipótese para o processo de seleção é comumente denominada de se-

leção nos observáveis.

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| Mãe Coruja Pernambucana120

Estimando o impacto

Conforme já demonstrado, o impacto médio do programa é dado pela di-

ferença:

onde o primeiro valor esperado, , pode facilmente ser es-

timado, uma vez que para todo município participante, , e

são observáveis. A dificuldade é o segundo valor esperado na expressão

para o impacto, , uma vez que, para os municípios benefi-

ciados, não é observável, já que se refere às condições que

esse município teria, no momento posterior à implementação do Programa

Mãe Coruja Pernambucana, caso não tivesse sido um dos municípios selecio-

nados para participar.

No entanto, uma vez que a sorte de seleção, , é independente de todas as

demais variáveis envolvidas na seleção e das condições de saúde que iriam

prevalecer em um momento posterior ao da implantação do programa, caso

ele não tivesse sido implantado, , temos que:

onde a terceira e quarta igualdades decorrem da independência entre e

. Como o impacto médio sobre os municípios beneficiados pode ser

alternativamente expresso via:

Segue que:

Assim, para se obter uma estimativa do impacto basta obter estimativas para:

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Um olhar sobre os números |121

e:

que representam regressões observacionalmente factíveis, uma vez que a

primeira envolve apenas indicadores observáveis para os municípios benefi-

ciados, e a segunda, apenas indicadores observáveis para os municípios não

beneficiados.

Neste estudo, com vistas a simplificar a estimação, consideramos uma

aproximação linear para as duas regressões anteriores. Em outras palavras, as-

sumimos que:

e que:

Com vistas a facilitar ainda mais a estimação, assumimos paralelismo no

sentido de que e . Nesse caso, se denotarmos por

as condições de saúde materno-infantil observáveis em um momento poste-

rior à implantação do programa, teremos que:

do que segue que:

onde . Essa é uma regressão observacionalmente factível, uma

vez que envolve regredir, no universo de municípios pernambucanos em que o

programa poderia ser implantado, , o progresso nas condições de saúde mater-

no-infantil, , em um indicador de acesso ao programa, , e nas condições

de saúde e no grau de vulnerabilidade socioeconômica , em um momento

anterior a implantação do Programa Mãe Coruja Pernambucana no Estado.

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| Mãe Coruja Pernambucana122

Com base nessa notação, temos que:

Dessa forma, o impacto do programa pode ser estimado como o coefi-

ciente do indicador de acesso ao programa, , em uma regressão do progres-

so nas condições de saúde, , que inclui, como variáveis explicativas,

além do indicador de acesso ao programa, , as condições de saúde, , e o

grau de vulnerabilidade, anteriores à implantação do Programa Mãe Coruja

Pernambucana.

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Um olhar sobre os números |123

Município 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Abreu e Lima

Afogados da Ingazeira

Afrânio

Agrestina

Água Preta

Águas Belas

Alagoinha

Aliança

Altinho

Amaraji

Angelim

Araçoiaba

Araripina

Arcoverde

Barra de Guabiraba

Barreiros

Belém de Maria

Belém de São Francisco

Belo Jardim

Betânia

Bezerros

Bodocó

Bom Conselho

Bom Jardim

Bonito

Brejão

Brejinho

Brejo da Madre de Deus

Buenos Aires

Buíque

Cabo de Santo Agostinho

Cabrobó

Cachoeirinha

Caetés

Calçado

Calumbi

Camaragibe

Camocim de São Félix

Camutanga

Canhotinho

Capoeiras

Carnaíba

Carnaubeira da Penha

Carpina

Caruaru

Casinhas

Catende

Apêndice 3: Participação dos municípios no Programa Mãe Coruja Pernambucana ao longo do período de 2007 a 2014

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| Mãe Coruja Pernambucana124

Município 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Cedro

Chã de Alegria

Chã Grande

Condado

Correntes

Cortês

Cumaru

Cupira

Custódia

Dormentes

Escada

Exu

Feira Nova

Fernando de Noronha

Ferreiros

Flores

Floresta

Frei Miguelinho

Gameleira

Garanhuns

Glória do Goitá

Goiana

Granito

Gravatá

Iati

Ibimirim

Ibirajuba

Igarassu

Iguaracy

Ilha de Itamaracá

Inajá

Ingazeira

Ipojuca

Ipubi

Itacuruba

Itaíba

Itambé

Itapetim

Itapissuma

Itaquitinga

Jaboatão dos Guararapes

Jaqueira

Jataúba

Jatobá

João Alfredo

Joaquim Nabuco

Jucati

Jupi

Jurema

Lagoa do Carro

Lagoa do Itaenga

Page 494: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

Um olhar sobre os números |125

Município 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Lagoa do Ouro

Lagoa dos Gatos

Lagoa Grande

Lajedo

Limoeiro

Macaparana

Machados

Manari

Maraial

Mirandiba

Moreilândia

Moreno

Nazaré da Mata

Olinda

Orobó

Orocó

Ouricuri

Palmares

Palmeirina

Panelas

Paranatama

Parnamirim

Passira

Paudalho

Paulista

Pedra

Pesqueira

Petrolândia

Petrolina

Poção

Pombos

Primavera

Quipapá

Quixaba

Recife

Riacho das Almas

Ribeirão

Rio Formoso

Sairé

Salgadinho

Salgueiro

Saloá

Sanharó

Santa Cruz

Santa Cruz da Baixa Verde

Santa Cruz do Capibaribe

Santa Filomena

Santa Maria da Boa Vista

Santa Maria do Cambucá

Santa Terezinha

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| Mãe Coruja Pernambucana126

Fonte: Elaboração própria com dados fornecidos pela gestão do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Município 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

São Benedito do Sul

São Bento do Una

São Caetano

São João

São Joaquim do Monte

São José da Coroa Grande

São José do Belmonte

São José do Egito

São Lourenço da Mata

São Vicente Férrer

Serra Talhada

Serrita

Sertânia

Sirinhaém

Solidão

Surubim

Tabira

Tacaimbó

Tacaratu

Tamandaré

Taquaritinga do Norte

Terezinha

Terra Nova

Timbaúba

Toritama

Tracunhaém

Trindade

Triunfo

Tupanatinga

Tuparetama

Venturosa

Verdejante

Vertente do Lério

Vertentes

Vicência

Vitória de Santo Antão

Xexéu

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Um olhar sobre os números |127

Apêndice 4: Taxas de mortalidade infantil dos municípios não participantes do Programa Mãe Coruja PernambucanaMunicípio 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Média

Abreu E Lima 23,54 21,77 16,54 14,62 13,67 16,91 12,46 13,72 16,65

Cabo de Santo Agostinho 26,12 21,13 16,68 16,97 12,59 15,90 13,19 15,86 17,30

Camaragibe 14,65 15,68 18,43 12,21 10,06 15,09 12,85 13,62 14,07

Chã de Alegria 49,18 19,48 19,32 25,38 16,67 5,18 21,55 23,70 22,56

Chã Grande 65,67 24,39 3,16 11,05 6,12 11,87 17,70 3,10 17,88

Fernando de Noronha 55,56 - 45,45 50,00 - - - - 50,34

Glória do Goitá 39,92 21,13 36,65 41,98 16,20 17,35 17,70 25,38 27,04

Igarassu 19,55 21,71 15,46 6,71 16,94 13,34 10,23 13,82 14,72

Ilha de Itamaracá 27,44 11,73 9,35 17,19 23,65 8,96 6,60 20,41 15,66

Itapissuma 31,67 19,83 11,11 32,11 11,74 7,41 28,85 11,27 19,25

Jaboatão dos Guararapes 24,03 22,64 21,43 24,28 18,28 17,10 16,56 15,16 19,94

Moreno 24,08 29,41 23,11 20,62 17,70 20,36 18,52 15,31 21,14

Olinda 21,60 21,10 20,69 18,37 16,71 18,86 18,61 20,48 19,55

Paulista 22,36 18,32 17,84 16,65 13,64 12,61 16,96 15,95 16,79

Pombos 29,56 27,03 9,01 17,24 20,59 12,20 17,99 13,16 18,35

São Lourenço da Mata 29,65 18,80 19,60 16,73 11,31 13,37 12,21 17,08 17,34

Vitória de Santo Antão 28,17 23,90 30,61 19,29 12,72 15,63 9,98 12,20 19,06

Bom Jardim 17,19 27,26 13,23 37,35 24,39 23,73 16,42 10,87 21,31

Buenos Aires 28,85 14,42 4,08 22,32 24,39 17,39 13,70 10,05 16,90

Carpina 39,52 27,22 25,21 23,04 15,63 15,22 18,98 16,83 22,71

Feira Nova 25,07 7,44 39,00 12,99 15,83 19,18 8,96 21,28 18,72

João Alfredo 39,87 32,57 37,34 37,19 26,10 23,50 10,37 13,67 27,58

Lagoa do Carro 28,69 51,02 15,87 15,50 24,63 20,24 17,70 3,80 22,18

Lagoa do Itaenga 38,15 21,69 15,59 20,88 25,40 19,40 8,71 25,13 21,87

Limoeiro 23,83 22,14 26,34 16,86 22,11 17,19 13,48 11,92 19,23

Machados 45,27 26,32 29,85 49,77 15,08 23,58 5,43 4,39 24,96

Nazaré da Mata 22,00 23,30 21,96 14,03 19,74 23,61 19,49 19,52 20,45

Orobó 21,18 25,45 17,46 10,81 9,93 2,94 10,84 6,25 13,11

Passira 13,18 8,88 22,27 22,96 19,08 20,99 14,49 10,08 16,49

Paudalho 20,07 54,45 16,49 31,75 25,89 17,34 18,50 11,76 24,53

Surubim 55,79 22,60 20,29 23,58 15,44 22,30 26,84 21,58 26,05

Tracunhaém 50,28 29,76 15,23 35,71 18,02 12,82 9,52 8,30 22,46

Vertente do Lério 43,10 5,81 7,09 6,37 11,49 12,90 24,54 27,40 17,34

Vicência 25,56 28,25 23,16 22,94 31,94 14,55 11,99 11,26 21,21

Água Preta 61,01 39,58 30,93 27,07 16,11 20,00 16,84 14,41 28,24

Barreiros 23,54 34,93 28,32 29,69 15,01 21,11 12,64 16,15 22,68

Belém de Maria 136,36 20,58 27,65 46,51 21,62 17,14 19,90 21,05 38,85

Escada 31,98 30,13 28,28 20,32 14,01 18,59 17,47 18,47 22,41

Gameleira 60,42 47,71 42,00 41,76 20,53 15,22 16,79 29,56 34,25

Primavera 51,40 17,86 4,98 35,09 23,15 13,95 39,41 4,37 23,77

Ribeirão 45,56 30,11 32,01 50,25 31,77 26,92 22,34 21,52 32,56

São Benedito do Sul 48,65 26,82 50,69 27,27 32,41 15,79 5,65 11,63 27,36

São José da Coroa Grande 26,85 29,89 29,41 39,00 13,70 12,59 20,67 25,00 24,64

Sirinhaém 19,25 33,06 20,98 25,16 15,57 25,03 12,15 22,34 21,69

Tamandaré 48,54 37,50 29,95 39,02 23,53 19,18 13,26 23,56 29,32

Alagoinha 45,80 33,76 18,35 18,18 47,39 19,01 33,02 13,22 28,59

Altinho 48,17 31,40 37,33 23,81 24,13 18,32 31,06 35,34 31,19

Barra de Guabiraba 29,29 36,00 33,78 37,21 28,46 17,32 25,00 44,44 31,44

Bezerros 34,35 34,72 32,75 26,98 22,60 17,89 15,01 19,37 25,46

Brejo da Madre de Deus 40,18 33,80 32,37 29,92 35,32 13,73 22,56 16,82 28,09

Cachoeirinha 61,83 52,49 15,20 34,29 35,37 26,55 14,23 23,18 32,89

I GERES

II GERES

III GERES

IV GERES

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| Mãe Coruja Pernambucana128

Município 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Média

Caruaru 24,97 23,41 19,63 23,07 20,90 18,15 15,18 13,90 19,90

Cupira 34,82 35,01 34,07 28,72 24,73 13,97 10,99 5,51 23,48

Frei Miguelinho 10,26 21,16 14,49 17,34 30,49 14,93 6,17 17,44 16,54

Gravatá 37,52 24,63 23,12 19,48 23,26 16,10 10,43 11,37 20,74

Pesqueira 43,95 41,36 33,72 46,82 33,47 17,39 33,93 20,60 33,91

Poção 98,13 34,01 54,69 81,55 28,00 22,90 43,90 18,18 47,67

Santa Cruz do Capibaribe 34,05 26,19 24,09 28,85 28,40 22,51 17,74 12,97 24,35

Santa Maria do Cambucá 64,68 4,08 37,17 29,91 18,26 22,73 21,37 24,51 27,84

São Bento do Una 29,92 30,25 44,30 41,93 40,00 21,40 13,27 16,36 29,68

São Joaquim do Monte 63,38 31,39 34,78 46,23 39,26 27,78 16,83 16,57 34,53

Taquaritinga do Norte 33,02 44,44 17,86 20,93 11,60 15,08 34,06 19,75 24,59

Toritama 25,35 30,56 29,01 21,20 21,43 21,45 14,95 14,87 22,35

Belém de São Francisco 27,42 12,20 16,67 21,78 24,95 22,42 14,68 16,47 19,57

Cedro 19,80 5,38 4,33 22,22 19,70 15,00 18,18 25,25 16,23

Salgueiro 31,25 37,92 29,84 30,08 25,34 24,39 22,45 19,38 27,58

Serrita 19,48 36,78 21,33 19,66 16,17 12,99 24,52 23,32 21,78

Verdejante 17,62 40,82 36,89 15,87 9,71 12,82 10,87 15,23 19,98

Afogados da Ingazeira 16,18 29,90 13,98 11,57 16,26 15,24 20,03 27,82 18,87

Brejinho 13,33 26,79 55,56 7,46 35,09 - 18,99 7,94 23,59

Ingazeira 15,87 17,24 15,63 12,99 - 13,33 16,95 33,33 17,91

Quixaba 9,35 8,70 30,93 10,42 8,13 18,02 21,28 43,48 18,79

São José Do Egito 50,10 43,75 32,37 41,32 40,25 24,23 29,91 24,95 35,86

Tabira 37,76 35,90 36,85 37,88 26,72 23,90 22,52 18,56 30,01

Tuparetama 50,72 36,76 43,80 49,65 33,56 19,35 36,23 15,15 35,65

Camutanga 44,59 41,18 13,79 11,76 50,72 23,95 14,93 17,09 27,25

Goiana 17,39 24,70 20,31 25,14 17,17 19,78 20,27 14,52 19,91

Itambé 45,86 25,64 23,81 23,85 15,85 17,80 25,32 16,45 24,32

Itaquitinga 56,52 37,54 9,52 26,23 23,03 25,81 16,95 14,34 26,24

Timbaúba 35,16 23,22 35,09 35,75 34,76 25,19 14,89 26,24 28,79

X GERES

XII GERES

IV GERES

VII GERES

Fonte: Elaboração própria com dados fornecidos pela gestão do Programa Mãe Coruja Pernambucana.

Page 498: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

Um olhar sobre os números |129

Apêndice 5: Evolução dos indicadores de saúde materno-infantil em Pernambuco e no restante do Nordeste e do Brasil

Estimativa P-valor (%) Estimativa P-valor (%) Estimativa P-valor (%) Estimativa P-valor (%) Estimativa P-valor (%) Estimativa P-valor (%)

Proporção de nascidos vivos com sete

ou mais consultas de pré-natal

1,66 0,00 2,76 0,00 2,87 0,00 1,54 0,00 2,46 0,00 1,92 0,00

Cobertura vacinal (idade-alvo como

menores de 2 anos de idade)

2,70 0,00 1,23 0,10 1,93 0,00 2,00 0,00 0,43 23,52 3,35 0,00

Taxa de internação hospitalar por

causas sensíveis à atenção básica

-0,73 0,00 -0,62 0,07 -0,99 0,00 -0,36 7,05 0,33 21,64 -1,65 0,00

Proporção de cesarianas 2,07 0,00 0,09 72,52 2,41 0,00 -0,25 23,39 3,90 0,00 -1,63 0,01

Proporção de partos de mães

adolescentes (menor ou igual a 19 anos

de idade)

-0,24 0,00 0,18 6,48 -0,10 0,02 0,03 67,41 -0,46 0,00 0,37 1,01

Prevalência de aleitamento materno

exclusivo (crianças com até 6 meses de

idade)

-0,03 32,92 -0,14 45,37 0,14 0,37 -0,31 3,90 1,07 0,00 -1,23 0,01

Porcentagem de nascidos vivos com

índice de Apgar maior ou igual a 6 no 1º

minuto de vida

0,43 0,00 -0,01 94,87 0,81 0,00 -0,39 15,50 1,51 0,00 -1,10 0,29

Porcentagem de nascidos vivos com

índice de Apgar maior ou igual a 6 no 5º

minuto de vida

0,44 0,00 -0,08 69,70 0,91 0,00 -0,54 5,54 1,03 0,01 -0,69 4,83

Proporção de nascidos vivos com baixo

peso ao nascer (abaixo de 2.500g)

0,02 1,85 0,03 65,12 0,05 0,00 0,00 99,43 0,04 38,77 0,02 77,00

Taxa de natimortalidade (nascidos

mortos de 22 semanas ou mais de

gestação)

-0,71 0,00 0,43 31,98 -0,25 0,00 -0,03 80,14 -0,35 4,21 0,05 83,18

Taxa de mortalidade neonatal precoce

(0 a 6 dias de idade)

-1,24 0,00 0,86 48,76 -0,24 0,00 -0,15 30,60 -0,56 0,13 0,16 48,35

Taxa de mortalidade perinatal (agrupa

os dois grupos considerados nas taxas

de mortalidade acima)

-0,96 0,00 0,39 56,85 -0,41 0,00 -0,17 42,98 -0,92 0,03 0,33 33,18

Taxa de mortalidade neonatal (0 a 27

dias de idade)

-1,41 0,00 0,99 50,67 -0,20 0,01 -0,22 14,12 -0,60 0,17 0,15 54,41

Taxa de mortalidade neonatal tardia (7

a 27 dias de idade)

-0,84 0,00 0,69 22,13 -0,24 0,00 0,09 38,80 0,02 85,69 -0,15 23,89

Mortalidade infantil pós-neonatal (28 a

364 dias de idade)

-0,76 0,00 0,42 40,84 -0,34 0,00 0,00 99,55 -0,81 0,00 0,47 0,91

Taxa de mortalidade infantil (menores

de 1 ano de idade)

-1,60 0,00 0,85 62,21 -0,27 0,00 -0,48 0,45 -1,75 0,00 0,97 0,21

Taxa de mortalidade na infância

(menores de 5 anos de idade)

-1,72 0,00 0,83 66,12 -0,36 0,00 -0,53 0,42 -2,03 0,00 1,10 0,12

Diferença entre

municípios beneficiados

e não beneficiados

Acesso a serviços de saúde materno-infantil

Período gestacional, parto e puerpério

Saúde infantil no parto

Indicadores de mortalidade

Indicadores

Crescimento do

indicador no Brasil,

exceto Pernambuco

Diferença entre

Pernambuco e o resto

do Brasil

Crescimento do

indicador no Nordeste,

exceto Pernambuco

Diferença entre

Pernambuco e o resto

do Nordeste

Crescimento dentre os

municípios não

beneficiados

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

Page 499: Um olhar histórico e afetivo - munganga.ag · e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema - tizar sua política de primeira infância e constante preocupação

| Mãe Coruja Pernambucana130

Apêndice 6: Impacto sobre indicadores de saúde materno-infantil (2014)

EstimativaP-valor

(%)Estimativa

P-valor

(%)

Proporção de nascidos vivos com sete ou mais consultas

de pré-natal

37,38 21,90 15,48 0,00 7,46 -0,63 8,65 0,00

Cobertura vacinal (idade-alvo como menores de 2 anos

de idade)

26,48 30,28 -3,80 10,98 0,32 -1,54 -2,58 32,09

Taxa de internação hospitalar por causas sensíveis à

atenção básica

-7,51 -9,19 1,69 21,57 -0,80 0,79 1,69 17,92

Proporção de cesarianas 20,68 16,32 4,36 0,12 3,12 -2,07 3,32 3,19

Proporção de partos de mães adolescentes (menor ou

igual a 19 anos de idade)

-0,67 -1,47 0,80 8,88 0,25 1,28 -0,73 11,83

Prevalência de aleitamento materno exclusivo (crianças

com até 6 meses de idade)

1,56 -0,14 1,70 7,55 -0,53 0,58 1,64 10,81

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar

maior ou igual a 6 no 1º minuto de vida

7,54 2,15 5,39 0,18 5,17 0,39 -0,17 80,73

Porcentagem de nascidos vivos com índice de Apgar

maior ou igual a 6 no 5º minuto de vida

6,66 0,28 6,38 0,00 5,89 0,42 0,07 89,74

Proporção de nascidos vivos com baixo peso ao nascer

(abaixo de 2.500g)

0,31 0,22 0,09 75,25 0,01 -0,13 0,22 47,03

Taxa de natimortalidade (nascidos mortos de 22

semanas ou mais de gestação)

-2,72 -0,01 -2,72 0,90 -2,76 0,71 -0,67 50,94

Taxa de mortalidade neonatal precoce (0 a 6 dias de

idade)

-4,07 -1,78 -2,29 1,41 -3,55 1,05 0,21 82,91

Taxa de mortalidade perinatal (agrupa os dois grupos

considerados nas taxas de mortalidade acima)

-7,12 -1,16 -5,97 0,01 -7,19 2,40 -1,17 42,46

Taxa de mortalidade neonatal (0 a 27 dias de idade) -4,59 -2,27 -2,32 2,20 -3,74 1,09 0,33 77,58

Taxa de mortalidade neonatal tardia (7 a 27 dias de

idade)

0,16 -0,09 0,25 61,96 -0,15 0,58 -0,18 73,69

Mortalidade infantil pós-neonatal (28 a 364 dias de

idade)

-3,92 -1,98 -1,94 1,22 -3,15 0,69 0,52 50,12

Taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano de idade) -9,76 -4,64 -5,12 0,00 -6,26 1,33 -0,18 89,67

Taxa de mortalidade na infância (menores de 5 anos de

idade)

-10,96 -5,78 -5,18 0,00 -5,99 1,43 -0,62 66,04

Impacto

ajustado

Acesso a serviços de saúde materno-infantil

Período gestacional, parto e puerpério

Saúde infantil no parto

Indicadores de mortalidade

Fonte: Elaboração própria a parir de informações do DATASUS e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

IndicadorMelhora no

tratamento(1)

Melhora na

comparação

Impacto estimado

por Diferenças em

DiferençasAjuste 1: Saúde

materno-infantil

Ajuste 2:

vulnerabilidade

socioeconômica

Nota: Não estão sendo considerados os municípios de Ipojuca e Recife, que passaram a receber o Programa Mãe Coruja Pernambucana apenas em 2013 e 2014, respectivamente.

Fonte: Elaboração própria a partir de informações do Datasus e do Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil.

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O texto deste livro foi composto em Velino Text, Steelfish e Futura.

O papel utilizado para o miolo é Couché fosco 115g/m2 e para a capa é Supremo 250g/m2.

Companhia Editora de Pernambuco – junho de 2017.

Supervisão Geral: Evaldo Costa e Anelise TimmEdição: Sérgio Miguel Buarque

Projeto Gráico: Luiz ArraisFotos: Iramaraí José Vilela de Freitas

Revisão: Ab Aeterno Produção EditorialDiagramação: Sebastião Corrêa

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Uma revolução silenciosa vem ajudando a mudar a

realidade de milhares de pessoas em Pernambuco. Em

uma década, o Programa Mãe Coruja Pernambucana

tem contribuindo efetivamente para o bem-estar de

gestantes e crianças na primeira infância, estimulando

o fortalecimento dos vínculos afetivos entre mãe, filho e

família. O sucesso do programa criado em 2007 deve-se a

uma concepção inteligente, a um processo de implantação

bem feito, a uma gestão eficiente e, sobretudo, a uma

forma diferenciada de olhar, enfrentar e resolver os

problemas encontrados nessa exitosa caminhada. Agora,

chegou a hora dessas histórias serem contadas e desse

conhecimento acumulado ser compartilhado. Além de

servir como instrumento de divulgação e documentação

do programa, este livro também cumpre a função de ser

uma importante ferramenta de consulta.

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Um olhar metodológico

MÃE

C

ORUJA PERNAMBUCAN

A

VOLUME 4

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VOLUME 4

Um olhar metodológico

MÃE

CO

RUJA PERNAMBUCAN

A

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Programa Mãe Coruja Pernambucana

Paulo Henrique Saraiva CâmaraGovernador do Estado de Pernambuco

João Henrique de Andrade Lima CamposGabinete do Governador

Renato hièbautChefe de Gabinete de Projetos Estratégicos

Ana Elizabeth de Andrade LimaCoordenadora do Programa Mãe Coruja Pernambucana e

Diretora de Políticas Estratégicas do Programa Mãe Coruja Pernambucana

SECRETARIAS

José Iran Costa JúniorSecretário de Saúde

Frederico AmâncioSecretário de Educação

Roberto Franca FilhoSecretário de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude

Alexandre ValençaSecretário de Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação

Márcio Stefanni Secretário de Planejamento e Gestão

Sílvia CordeiroSecretária da Mulher

Nilton MotaSecretário de Agricultura e Reforma Agrária

Marcelino GranjaSecretário de Cultura

Felipe CarrerasSecretário de Turismo, Esportes e Lazer

P452m Pernambuco. Governo do Estado Mãe coruja pernambucana : um olhar metodológico / Governo do Estado ; Fundação Maria Cecília Souto Vidigal ; texto: Oswaldo Yoshimi Tanaka e Cristiane Andrea Locatelli de Almeida ; prefácio Paulo Câmara ; apresentação Eduardo de C. Queiroz. – Recife : Cepe, 2017. v. 4. : il.

1. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAMBUCANA. 2. ASSISTÊNCIA À MATERNIDADE E À INFÂNCIA – PERNAMBUCO – PLANEJAMENTO. 3. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAMBUCANA – METODOLOGIA. 4. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAMBUCANA – ORGANIZAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO. 5. POLÍTICAS PÚBLICAS. 6. PROGRAMA MÃE CORUJA PERNAMBUCANA –ASPECTOS SOCIAIS. I. Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. II. Tanaka, Oswaldo Yoshimi. III. Almeida, Cristiane Andrea Locatelli de. IV. Câmara, Paulo. V. Queiroz, Eduardo de C. VI. Título.

CDU 364.4 CDD 362.198

PeR – BPE 17-258

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Prefácio ............................................................................................... 7

Apresentação ...........................................................................................13

Logo no início... .....................................................................................15

A implementação do Mãe Coruja Pernambucana ..................................17

Canto Mãe Coruja .................................................................................... 20

Eixos estratégicos .................................................................................... 23

Dimensões estratégicas .......................................................................... 29

Articulação intersetorial ................................................................ 29

Passos para a implementação do Programa Mãe Coruja .......................37

Sumário

Agradecemos a toda a equipe, colaboradores e pais do

Programa Mãe Coruja Pernambucana que, participando das

entrevistas e grupos, possibilitaram a elaboração deste volume.

Autores: Oswaldo Yoshimi Tanaka e Cristiane Andrea Locatelli de Almeida

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Um olhar metodológico | 7

OPrograma Mãe Coruja Pernambucana, resultado

da inspiração e trabalho de muita gente e uma

das estratégias mais bem-sucedidas do Governo

Eduardo Campos, trouxe vida e esperança para

milhares de mães e crianças do nosso Estado. Ao longo

de quase uma década, o programa apresentou resultados

expressivos, cresceu de forma sustentável e consistente,

ganhou reconhecimento internacional e se consolidou

como uma política de Estado. O Mãe Coruja é, hoje, um

programa perene.

Falo isso com muita segurança porque acompanho

e conheço detalhadamente o Mãe Coruja desde o seu

início em 2007 - primeiro como Secretário de Estado

(em três pastas diferentes) e depois como Governador -

e desde cedo já estava muito claro que o programa seria

algo capaz de ir além do alcance de cada um de nós,

com respaldo político e reconhecimento social capaz de

ultrapassar mandatos.

Como não poderia deixar de ser, as prioridades do

Mãe Coruja são prioridades do meu Governo. E como

costumo dizer, prioridade não é conversa, é orçamento.

Só tem prioridade aquilo que tem recursos garantidos.

Por isso, ainda em 2016, enviei à Assembleia Legislativa

um projeto de lei para tornar impositivos os recursos

do Mãe Coruja Pernambucana. Em outras palavras, as

rubricas destinadas ao programa serão protegidas por

Lei. Também ampliamos o atendimento à primeira

infância (crianças até seis anos), através de um plano de

desenvolvimento infantil.

O Mãe Coruja é um exemplo para o Brasil e para o

mundo. Por isso, vejo com muita satisfação essa história

exitosa ser contada, com objetividade, profundidade

e sensibilidade em livro. É mais uma forma de

continuarmos levando ‘vida’ para a vida das pessoas.

Paulo Câmara

Governador de Pernambuco

Governador Paulo

Câmara fala

sobre o Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

durante o VI

Simpósio de

Desenvolvimento da

Primeira Infância

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| Mãe Coruja Pernambucana8

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Um olhar metodológico | 9

Desde 2005, a Fundação Maria Cecilia dedica-se a gerar e disse-

minar conhecimento para o pleno desenvolvimento da criança

na primeira infância, período que vai do nascimento aos seis

anos de idade.

Dentre as diversas formas de alcançar nossa missão, está o fomen-

to à sistematização e a avaliação das práticas, programas e políticas de

primeira infância existentes como um processo de aprofundamento,

reflexão, qualificação e registro de tais experiências. Nesse contexto se

insere a atuação conjunta com o Governo do Estado de Pernambuco,

na avaliação e sistematização do Programa Mãe Coruja Pernambuca-

na, que está há quase uma década em execução.

Conhecer essa história, sua metodologia, as fortalezas, os desa-

fios e seus resultados traz relevantes aprendizados que podem ser

inspiradores para os diversos gestores que hoje desejam priorizar,

em suas políticas, essa importante etapa da vida.

Entendemos que o produto dessa sistematização pode contribuir

para o aprimoramento das políticas públicas voltadas para a primei-

ra infância. Governos que investem esforços em olhar para a efetivi-

dade de suas políticas identificando as ações que deram certo, bem

como reconhecendo as que não obtiveram os resultados esperados,

têm melhores condições de aprimorar seus programas e gerar im-

pactos significativos à sua população.

O material apresentado aqui é fruto de um extenso trabalho de

pesquisa de campo e documental sobre o programa, consolidado em

quatro publicações para abordar a complexidade que o tema primei-

ra infância exige, trazendo aos gestores informações valiosas sobre a

experiência pernambucana.

Parabenizamos o Governo do Estado pela priorização da criança

e de seus adultos de referência, pela iniciativa de avaliar e sistema-

tizar sua política de primeira infância e constante preocupação em

qualificá-la.

“Se mudarmos o começo da história, mudamos a história toda.”

– frase do documentário O Começo da Vida

Eduardo de C. Queiroz

Diretor Presidente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal

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| Mãe Coruja Pernambucana10

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Um olhar metodológico | 11

Sistematização da metodologia do Programa Mãe Coruja Pernambucana

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Um olhar metodológico | 13

Você vai encontrar, nesta publicação, elementos que irão ajudá-lo a en-

tender como o Programa Mãe Coruja Pernambucana vem funcionado no

Estado de Pernambuco desde 2007.1

Começamos com o foco de ação do programa: muitas crianças e mães

ainda morrem no Brasil pela falta de eficácia na utilização de tecnologias que

estão disponíveis há muito tempo. A despeito de quaisquer outras considera-

ções, esse é um problema que exige providências imediatas.

A agenda defendida pelo Programa Mãe Coruja Pernambucana é a de intro-

dução de novas estratégias, capazes de induzir políticas públicas a desempe-

nhar o papel que lhes cabe.

O modo como o governo do Estado de Pernambuco se organizou para

concretizar o programa, por meio da criação de uma estrutura de governan-

ça e mobilização de capacidade técnica, será aqui descrito em alguns de seus

elementos-chave.

Quatro dimensões foram consideradas estratégicas para essa construção: a

articulação intersetorial e a articulação interfederativa dos agentes que ofere-

cem o cuidado, tendo como base a compreensão multicausal dos problemas

que afetam mães e filhos; o monitoramento preciso do atendimento às pessoas

envolvidas, pautado no respeito a seus direitos sociais; e a consideração à sua

singularidade, condição para a efetividade do cuidado.

Destacamos também passos importantes para trazer essas dimensões à

1 As informações apresentadas neste volume foram coletadas em entrevistas com profissionais das equipes do programa e dos municípios onde ele é desenvolvido, além de em materiais sobre o Programa Mãe Coruja Pernambucana disponibilizados na internet.

Apresentação

Pioneiros: equipe

que implantou, em

2007, o Programa

Mãe Coruja

Pernambucana em

Ouricuri

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| Mãe Coruja Pernambucana14

prática, lembrando, entretanto, que as ações priorizadas devem ser modeladas

pelos atores locais, conhecedores de sua própria realidade.

Todo o tempo, o investimento feito no capital humano do programa é real-

çado – a escolha de sua equipe, a sensibilização dos agentes de cuidado, a ca-

pacitação permanente, o monitoramento de mulheres e crianças feito de for-

ma individualizada – com a clareza de que esta é a essência do Programa Mãe

Coruja Pernambucana: criar e fortalecer vínculos afetivos para bem acolher e

cuidar das mulheres, das famílias e dos que estão chegando.

Capacitação

permanente

da equipe é

um diferencial

do Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

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Um olhar metodológico | 15

Logo no início...

Pernambuco, 2006: elaborava-se o plano de governo da primeira adminis-

tração estadual de Eduardo Campos. Resultados bastante elevados nos in-

dicadores de mortalidade materno-infantil e óbitos distribuídos de forma

desigual pelas diversas regiões do Estado ganhavam lugar de destaque.

Enfrentar o desafio de reduzi-los foi considerada uma ação prioritária e estra-

tégica pelo governador e sua equipe.

Os primeiros trabalhos para construir essa ação foram liderados pela então

primeira-dama, Renata Campos. Técnicos com reconhecida experiência na

área foram reunidos e se concentraram em dois eixos principais: diagnóstico

preciso dos indicadores de saúde materno-infantil de cada um dos municí-

pios; e identificação, detalhamento e análise de fatores, de diversas ordens,

que incidiam sobre a realidade que se desejava mudar. Compreendia-se a

mortalidade materno-infantil como um problema multicausal que reflete as

condições sociais da família, seu nível de escolaridade e renda e as reconhe-

cidas dificuldades no acesso a serviços de saúde. Já se tinha clareza da neces-

sidade de um olhar intersetorial sobre o tema, compreensão que foi reforçada

pelas visitas realizadas a programas similares que vinham sendo desenvolvi-

dos no Brasil2 e em outros países3.

O esboço do Programa Mãe Coruja Pernambucana foi discutido com as di-

versas secretarias de governo para identificação, dentro de sua especificidade,

de ações estratégicas factíveis para o enfrentamento da questão. Delimitadas as

responsabilidades de cada uma delas, a implantação do programa teve início.

2 Programa Primeira Infância Melhor (PIM – RS) e Mãe Curitibana (PR).3 Educa a tu Hijo – Cuba e CENDI (Centro de Desarrollo Infantil) – México.

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| Mãe Coruja Pernambucana16

O diagnóstico prévio dos índices de mortalidade e as visitas realizadas a

outros programas permitiram que já fosse concebido como uma política públi-

ca, construída a partir da ampla discussão com a sociedade civil e os diversos

setores. Optou-se por levar o Programa Mãe Coruja Pernambucana a muni-

cípios em que a mortalidade infantil estivesse mais alta4 e onde as condições

de desenvolvimento infantil e humano fossem piores, sinalizando a urgência

da intervenção. A região do Sertão do Araripe, oeste pernambucano, foi iden-

tificada como aquela de maior concentração de municípios nesse patamar e

recebeu a primeira equipe do programa.

Seus prefeitos foram convidados a uma reunião com o governador do Es-

tado, juntamente com a primeira-dama e demais atores-chave de governo,

estratégia assumida por eles para mobilizar e pautar a problemática para os

gestores, apresentando-a como responsabilidade de todos.

Firmados os termos de cooperação técnica e institucional entre Estado e

municípios, e estabelecido um compromisso com a implementação do pro-

grama, formou-se uma equipe que planejou e executou uma sensibilização

com todos os atores envolvidos em ações voltadas à mulher e à primeira infân-

cia nos territórios escolhidos.

Houve muito cuidado na composição desse time que levaria o Programa

Mãe Coruja Pernambucana aos municípios. Ele contou com representantes

das várias secretarias, em uma opção claramente multiprofissional. Buscou-

se reunir pessoas que julgavam importante conversar de igual para igual com

os profissionais, tocá-los com o significado de mortes de mães e de crianças

que poderiam ser evitadas, alcançando não apenas uma adesão formal, mas

um engajamento real. A importância de adotar uma visão integral e interdis-

ciplinar do problema da mortalidade materno-infantil esteve realçada todo

o tempo.

Essa equipe desenvolvia concomitantemente um projeto de construção da

imagem do programa, atentando a todos os detalhes de comunicação interna e

publicidade utilizada. A valorização da arte e da cultura esteve representada no

Programa Mãe Coruja Pernambucana desde a logomarca, concebida e elabo-

rada pelo artista plástico Romero de Andrade Lima. O zelo com as imagens pu-

blicadas, com os dizeres dos representantes, retratava a clareza da mensagem

4 Para a escolha dos municípios onde o programa seria inicialmente implantado, considerou-se a taxa de mortalidade infantil igual ou acima de 25 por mil nascidos vivos. Considerou-se também os baixos valores no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e no Índice de Desenvolvimento Infantil (IDI); e o critério de, no caso de 50% dos municípios de uma Gerência Regional de Saúde (Geres) apresentarem taxa de mortalidade infantil maior que 25 por mil nascidos vivos, todos os municípios da Geres receberiam o programa (Governo do Estado de Pernambuco, 2016).

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Um olhar metodológico | 17

que se queria disseminar e que estaria presente em todas as referências oficiais

ao programa.

É visível o encantamento dos vários participantes do Programa Mãe Coruja

Pernambucana pelo programa. Muitos compartilham de uma longa trajetória

de trabalho nos serviços públicos e vibram com a possibilidade real de inte-

gração de políticas tradicionalmente fragmentadas. Outros se veem como par-

te de um mecanismo que incide na detecção e resolução de entraves ao cui-

dado efetivo das mulheres, crianças e suas famílias e, por isso, se mobilizam.

Convidamos você a compartilhar dessa experiência e verificar como utili-

zá-la em suas próprias ações.

A implementação do Programa Mãe Coruja Pernambucana

Pernambuco é um Estado que se localiza no nordeste brasileiro. Possui 184

municípios e o território de Fernando de Noronha (figura 1).

Hoje, o Programa Mãe Coruja Pernambucana está presente em 103 muni-

cípios como um programa de gestão estadual que realiza ações descentrali-

zadas. Em dois municípios, Ipojuca e Recife, ele foi replicado e já se desen-

volve sob gestão municipal – Programa Mãe Coruja do Ipojuca e Programa

Mãe Coruja Recife.

Diminuir a mortalidade infantil em uma região é uma tarefa difícil e de-

pende de vontade política. Há diversos fatores passíveis de serem controla-

dos que concorrem para esse desfecho. Trabalhando nesse sentido, uma das

primeiras necessidades identificadas pelos formuladores do Programa Mãe

Coruja Pernambucana foi a de acompanhamento e controle de todos os aten-

dimentos realizados para a mulher durante a gestação e para a criança até 5

anos de idade.

Localização

do Estado de

Pernambuco no

Brasil (à esquerda)

e seus municípios

(à direita).

Fonte: Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/palestras/humanizacao/brasileirinhos_apresentacao_mae_coruja.pdf>. Acesso em: 09 de maio de 2017.

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| Mãe Coruja Pernambucana18

Atualmente, esses e outros dados são inseridos pelos técnicos locais do

programa no Sistema de Informações Mãe Coruja (SIS Mãe Coruja), figura 2,

que foi desenvolvido por profissionais de tecnologia da informação em con-

junto com a equipe técnica do programa, visando a atender às especificidades

do Mãe Coruja Pernambucana.

Profissionais foram

capacitados para

utilizar a nova

versão do SIS

Fonte: http://maecorujape.blogspot.com.br/2012/11/sistema-de-informacao-do-programa-mae.html

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Um olhar metodológico | 19

O sistema permite que os profissionais acompanhem o atendimento aos

direitos de mãe e filho, tais como: inserção em programas sociais, consultas

de pré-natal, vacinação, atenção a uma gestação de alto risco, entre outros.

Caso não tenham sido atendidos, o sistema emite um alerta que desencadeia,

para os diversos profissionais e especialmente para os técnicos do Programa

Mãe Coruja Pernambucana, um mecanismo de busca ativa das famílias, vi-

sando à sua localização e regularização do atendimento. Além disso, por meio

do monitoramento das mulheres e crianças, o sistema possibilita a detecção de

situações inusitadas – como o aumento do número de casos de microcefalia

ocorrido nos anos de 2015/16.

A coordenação do programa, em seus diferentes níveis, acompanha os re-

sultados e toma as decisões necessárias para ajustes e melhorias, tendo como

base uma informação confiável.

Para além do uso específico do programa, as informações disponibilizadas

pelo sistema – que é constantemente alimentado em função de sua utilização

rotineira pelos diversos profissionais – podem ser utilizadas para subsidiar no-

vas ações, programas e políticas públicas.

Os demais sistemas de informação utilizados pelo município também são

beneficiados por essa busca constante da informação atualizada, a exemplo

do Sistema de Monitoramento e Avaliação do Pré-Natal, Puerpério e Criança

(Sisprenatal WEB) e do e-SUS.

O sistema do Programa Mãe Coruja Pernambucana tem a particularidade

de incluir dados individuais das mulheres – nome, endereço, número de ca-

dastramento no Sistema Único de Saúde (SUS) e no Bolsa Família, dentre ou-

tros – o que pode ajudar serviços como o Centro de Referência de Assistência

Social (Cras), o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf), e a Vigilância Epi-

demiológica, na localização de famílias vulneráveis.

Todos os óbitos materno-infantis de residentes no município, entre os ca-

dastrados no programa, têm inserção obrigatória nesse sistema, e o profissio-

nal do Canto Mãe Coruja (quadro 1) deve participar ativamente das Comissões

de Investigação de Óbitos, contribuindo com informações atualizadas e com-

plementares para que as análises sejam finalizadas a contento.

Como os coordenadores regionais do Programa Mãe Coruja Pernambucana

participam das Comissões Intergestores Regionais – que reúnem represen-

tantes da área da saúde do Estado e municípios –, torna-se possível articu-

lar ações/visão do programa e das secretarias, trazendo efetivas contribuições

para a organização da rede materno-infantil na região de saúde.

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| Mãe Coruja Pernambucana20

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Um olhar metodológico | 21

O Canto Mãe Coruja é o espaço

de referência para as famílias,

o principal lugar onde o técni-

co do programa pode escutar

e acolher as necessidades das

usuárias do programa.

Esse profissional busca ar-

ticular ações desenvolvidas

pelas diversas secretarias de

governo municipal e estadual

e organizações da sociedade

civil, criando uma rede solidá-

ria para o cuidado integral da

gestante, filho e família. Está

constantemente em contato

com os integrantes dessa rede

e, quando necessário, realiza

encaminhamentos.

O Canto é também o local onde

o técnico do Mãe Coruja vai

trabalhar no monitoramento

de suas ações, inserindo e or-

ganizando informações no SIS

Mãe Coruja.

Secretaria de Planejamento e

Gestão

Gabinete do Governador

Gabinete de Projetos

Estratégicos

Secretaria de Turismo, Esporte e

Lazer

Secretaria de Cultura

Secretaria de Saúde

Canto Mãe CorujaSecretaria da

Mulher

Secretaria deEducação

Secretaria de Agricultura e

Reforma AgráriaIPA

Secretaria de Micro e Pequena

Empresa, Trabalhoe Qualificação

Secretaria de Desenvolvimeno Social, Criança e

Juventude

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| Mãe Coruja Pernambucana22

Atualmente, tem funcionado em locais disponibilizados pelo município ou

junto a equipamentos do Estado, a depender do que é pactuado nos termos

de cooperação técnica ou da negociação entre as partes. No primeiro caso, o

governo estadual se responsabiliza pela contratação e pelos salários dos dois

técnicos, mobiliário e equipamentos do Canto, sistema de informação, ma-

terial didático, de escritório e divulgação, e o município, pela manutenção e

conservação do espaço físico.

Alguns Cantos têm funcionado junto ao escritório do Instituto Pernambuca-

no de Agricultura (IPA), outros em Centros Municipais de Atenção à Mulher ou

outros espaços dos municípios. É comum que seja disponibilizada uma sala na

Unidade de Saúde da Família para contato dos técnicos com as mães quando do

acompanhamento do pré-natal ou de puericultura, mas o programa precisa de

outro local adequado para grupos e para receber as crianças, que, quase sempre,

acompanham suas mães.

Sala de situação:

presente em todos

os Cantos Mãe

Coruja do Estado

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Um olhar metodológico | 23

Eixos estratégicos

O Programa Mãe Coruja Pernambucana trabalha a partir de três eixos estra-

tégicos, saúde, educação e desenvolvimento social. Na figura 4, a seguir,

estão relacionadas ações cuja responsabilidade cabe a essas áreas.

O profissional do Programa Mãe Coruja Pernambucana terá como res-

ponsabilidade trabalhar para a articulação dessas ações, intervindo de forma a

facilitar o alcance conjunto dos objetivos das políticas públicas desses setores.

Algumas das ações específicas estão detalhadas a seguir.

Ações das distintas áreasSaúde. Implantar a Política de Direitos Reprodutivos

. Garantir atenção ao pré-natal com qualidade

. Garantir acesso ao parto/nascimento humanizado

. Assegurar acompanhamento do puerpério e puericultura

. Garantir atenção integral e humanizada à mulher e à criança nas intercorrên-

cias da gestação, parto, nascimento, puerpério

. Reduzir o número de internações de crianças de 0 a 5 anos por doenças diar-

réicas, respiratórias e por acidentes

. Promover ações para reduzir os índices de desnutrição infantil e materna

. Mobilizar agentes sociais em defesa dos direitos de crianças e mulheres

. Realizar vigilância ao óbito

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| Mãe Coruja Pernambucana24

Ações das áreas

que compõem

o Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

Educação. Reduzir a vulnerabilidade de mulheres cadastradas no Programa Mãe Coruja

Pernambucana, mediante a realização de estratégias pedagógicas que favore-

çam o empoderamento pessoal e social, fortalecendo o processo de alfabeti-

zação e estimulando a continuidade da escolarização dessas mulheres. Para

isso, a secretaria coordena, formata, implanta e avalia os Círculos de Educação

e Cultura, fornecendo material didático e pedagógico e promovendo, paralela-

mente, a formação continuada dos profissionais envolvidos na atividade

Desenvolvimento Social. Identificar gestantes, crianças e seus familiares em situação de vulnerabili-

dade social, articulando ações sociais, de segurança alimentar e de cidadania

. Através do programa Minha Certidão, garantir a universalização do acesso ao

registro civil de nascimento

. Realizar oficinas de Educação Alimentar e Nutricional e de Alimentação

Complementar Saudável

. Fornecer o Kit do Bebê para todas as gestantes com sete ou mais consultas de

pré-natal realizadas

. Incentivar a autonomia sociopolítica e econômica da população feminina,

por meio do Programa Nenhuma Pernambucana sem Documento

Círculo de Educação e Cultura (CEC)

Os Círculos de Educação e Cultura são voltados ao empoderamento das

mulheres cadastradas no programa. Foram concebidos com base na meto-

dologia de Paulo Freire e se oferecem como um espaço democrático e afetivo

onde a voz de cada participante é valorizada.

Equipes formadas por coordenadores pedagógicos e professores se res-

ponsabilizam por essa formação. Eles estão alocados na Gerência Regional de

Educação, parte da Gerência de Educação de Jovens, Adultos e Idosos.

Os grupos se reúnem em dois períodos durante a semana, para o desen-

volvimento de atividades que objetivam seu fortalecimento pessoal e a ele-

vação de escolaridade.

O Círculo de Educação e Cultura não tem como foco específico o processo

de alfabetização das mulheres. Há entre elas níveis de escolaridade diversos e

o que, especialmente, as mobiliza a frequentar o Círculo é a troca de aprendi-

zados de vida, o fortalecimento de sua autoestima e o conhecimento de seus

direitos, em um espaço no qual podem levar também os seus filhos.

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Um olhar metodológico | 25

São oferecidos às mulheres quatro módulos formativos: Mulher, Criança,

Família e Território. Para trabalhá-los, é utilizada, principalmente, a técnica

das rodas de conversa, buscando sintonia com suas próprias questões e vivên-

cias. Toda a experiência é registrada, e esse material é utilizado como insumo

para modificações a serem sugeridas nas revisões anuais do currículo.

Importante ressaltar que as mulheres não precisam cursar os quatro módu-

los em ordem sequencial. A depender de seu momento, interesse e disponibi-

lidade, podem interromper momentaneamente sua participação e retomá-la

em módulos seguintes.

O retorno à rede formal de ensino – nível básico, médio ou superior – é

compreendido como um sinal do empoderamento dessas mulheres e sempre

estimulado.

O Círculo de

Educação e Cultura

de Lagoa do Ouro

com participação

das técnicas

do programa e

Coordenadoria da

Mulher

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| Mãe Coruja Pernambucana26

Cursos de qualiicação proissional

Uma das frentes de ação do programa é o oferecimento de cursos de qua-

lificação profissional aos participantes, cuja execução é de responsabilidade

da Secretaria Estadual de Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação.

A escolha de quais cursos disponibilizar se dá a partir do levantamento de in-

teresses das famílias nas diversas regiões do Estado. Administre o seu dinheiro;

Cozinha Brasil; Doces finos e lancheteria; Oficinas de reciclagem e meio am-

biente; Artesanato em tecido; Decoração de festas e eventos; Montagem de biju-

terias; e Preparação de bolos e tortas foram alguns dos cursos oferecidos.

Oicinas

Diversos parceiros locais são convidados a realizar oficinas com os parti-

cipantes do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Os temas de segurança ali-

mentar e nutricional, segurança doméstica e desenvolvimento sustentável,

por exemplo, já foram abordados por profissionais dos Nasf, Conselho Regio-

nal de Engenharia e Agronomia (Crea) e IPA.

A parceria com o IPA tem sido bastante importante para o Programa Mãe Coruja

Pernambucana em vários aspectos. O técnico agropecuário está capacitado a rea-

lizar palestras sobre temas ligados a agricultura, saúde, meio ambiente e educação

e pode trabalhar em conjunto com o programa na capacitação das famílias. Além

disso, contar com o apoio do extensionista rural no acesso às famílias rurais – com

seu conhecimento dos caminhos para chegar até elas – facilita bastante o trabalho

dos profissionais do programa. Cabe lembrar que, em diversos municípios, o IPA

é o responsável pelo gerenciamento do Programa de Aquisição de Alimentos da

Agricultura Familiar do governo federal, e pode tanto inserir nele as famílias do

Programa Mãe Coruja Pernambucana, como fornecer alimentos prontos (lanches)

para atividades do programa.

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Um olhar metodológico | 27

Outras iniciativas

O Programa Mãe Coruja Pernambucana dispõe de uma série de elementos

concebidos para fortalecer a mensagem que deseja transmitir: importância

do cuidado integral à mulher e à criança pequena e fortalecimento de vín-

culos afetivos.

Ao completar sete consultas de pré-natal, a gestante cadastrada no progra-

ma adquire o direito ao kit do bebê, concebido como um estímulo importante

para a captação precoce da gestante ao pré-natal e também para que ela co-

nheça seu direito a esse tipo de atendimento e se esforce por obtê-lo.

Um dos instrumentos de trabalho do Programa Mãe Coruja Pernambucana

é o Almanaque da Família Brasileira, publicado e distribuído com o apoio do

Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), cujo conteúdo versa sobre

direitos, importância do apoio da família e da comunidade e elementos neces-

sários para o bom desenvolvimento das crianças.

O Álbum do bebê é entregue à gestante no momento de seu cadastramento.

Tem a intenção de potencializar a construção da história da criança com regis-

tros fotográficos e de reunir informações que favoreçam o fortalecimento dos

vínculos afetivos e o desenvolvimento infantil.

Junto às comunidades, o Programa Mãe Coruja Pernambucana, orientado

por uma política estadual, promove sistematicamente a Semana da Criança,

com o objetivo de promover discussões e divulgar conteúdos considerados

importantes para a orientação das famílias em seus cuidados com as gestan-

tes e as crianças.

Para a transmissão de sua visão, o programa produziu, e divulga também,

diversos vídeos de referência, além de promover encontros voltados à forma-

ção profissional.

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| Mãe Coruja Pernambucana28

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Um olhar metodológico | 29

Dimensões estratégicas

Articulação intersetorial

O Programa Mãe Coruja Pernambucana está inserido nas estratégias priori-

tárias do governo do Estado, que adota o modelo de gestão por resultados

com o estabelecimento de metas pactuadas e monitoramento constante

das ações.

Objetivos estratégicos orientam a ação de todo o governo e partem da com-

preensão de que melhorias, em cada uma das áreas, “só podem ser obtidas

com a atuação coordenada, sinérgica e complementar das várias Secretarias

de Estado”.

O Programa Mãe Coruja Pernambucana é atualmente coordenado pelo

chefe do Gabinete de Projetos Estratégicos do governo do Estado de Pernam-

buco. Onze secretarias de governo são responsáveis por sua execução: Secre-

taria de Planejamento e Gestão; Gabinete do Governador; Gabinete de Projetos

Estratégicos; Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária; Secretaria da Micro

e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação; Secretaria de Educação; Secre-

taria da Mulher; Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude;

Secretaria de Saúde; Secretaria de Turismo, Esporte e Lazer e Secretaria de

Cultura. Em cada município, busca-se identificar como as secretarias podem

atuar, visando a aproveitar ao máximo o que podem oferecer em uma compo-

sição de esforços.

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| Mãe Coruja Pernambucana30

Organograma

do Programa

Mãe Coruja

Pernambucana

Coordenação GeralGabinete de Projetos Estratégicos

Comitê ExecutivoCoordenação: Gabinete de Projetos Estratégicos

Coordenação ConsultivaDiretoria de Políticas Estratégicas

do Programa Mãe Coruja Pernambucana

Comitês RegionaisCoordenação: Coordenadores das Regionais do

Programa Mãe Coruja Pernambucana

103 Cantos Mãe CorujaEquipes multidisciplinares

Comitê AssessoramentoCoordenação: Diretoria de Políticas Estratégicas do

Programa Mãe Coruja Pernambucana

Estrutura Organizacional

Membros: Secretários Estaduais: Saúde; Educação; Desenvolvimento Social, Criança e Juventude; Agri-cultura e Reforma Agrária; Assessoria Especial do Governador; Gabinete do Governador; Mulher; Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação; Cultura, Turismo, Esporte e Lazer.

Representantes das Secretarias de Estado: Saúde; Educação; Desenvolvimento Social, Criança e Juven-tude; Agricultura e Reforma Agrária; Mulher; Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação; Assesso-ria Especial do Governador; Gabinete do Governador; Cultura; Turismo, Esporte e Lazer.

Membros: Articuladores Municipais e Profissionais dos Cantos Mãe Coruja

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Um olhar metodológico | 31

A Lei 13.959, de 2009, que dispõe sobre o Programa Mãe Coruja Pernambucana,

prevê a criação de uma Unidade Orçamentaria própria nas Secretarias de Estado

participantes, o que facilita muito a gestão de prioridades do programa.

Do nível local ao central, são previstas diversas instâncias integradoras

de gestão, que visam a promover um fluxo contínuo de cuidados à mulher

e à criança, buscando identificar e solucionar continuamente entraves que

possam obstruir o programa.

Dois técnicos são os gestores do programa no município. São selecionados

a partir da análise curricular de profissionais de nível superior das áreas de

saúde, educação, ciências humanas e sociais, dentre outras; e de sua expe-

riência profissional em gestão e/ou pós-graduação. Suas atividades envol-

vem o acolhimento e o cadastramento da gestante, o acompanhamento de

mulheres e crianças de 0 a 5 anos de idade, o mapeamento do território e a

articulação entre a ação governamental e a sociedade civil organizada.

Para atuar em cada um dos pontos da rede de assistência, é necessário

que o profissional tenha habilidade política e reconhecimento técnico para

trabalhar a articulação entre os distintos atores envolvidos.

Além disso, esse profissional é o responsável pela alimentação dos dados

sobre mulher e criança no sistema de informações do programa e assume,

portanto, a função de trabalhar, junto aos parceiros responsáveis, a necessá-

ria completude do cuidado a cada pessoa cadastrada.

Conta com o apoio dos Comitês Regionais e das Coordenações Regionais

do programa, alocadas atualmente nas Gerências Regionais de Saúde (Geres)

e organizadas no Estado a partir dessa divisão.

Os Comitês Regionais são formados pelos articuladores municipais e

pelos profissionais dos Cantos Mães Coruja e têm como propósito alinhar a

compreensão da dinâmica do município, as ações que serão executadas e os

princípios e diretrizes do Programa Mãe Coruja Pernambucana. Os comitês

são liderados pela instância de Coordenação Regional, que, por sua vez, é

responsável pela formação contínua e pelo suporte desses profissionais no

nível local, desde o momento de sua admissão. Promove uma reunião men-

sal com profissionais e articuladores dos municípios, realiza visitas regulares

aos municípios e pode ser acionada em caso de necessidade dos atores locais.

Nessa reunião sistemática, promove-se um espaço no qual os técnicos apre-

sentam os resultados atingidos pelo município no painel de monitoramento e

trocam experiências com seus pares em outras localidades, compartilhando

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estratégias de abordagem das famílias e, principalmente, de articulação en-

tre parceiros.

Os coordenadores regionais são selecionados pelo Comitê Executivo do pro-

grama a partir de seu perfil profissional e experiência em gestão e monitoramento.

Buscam-se pessoas que possuam respeitabilidade entre os colegas, características

de liderança, facilidade de articulação entre os diversos profissionais, bom trân-

sito nas secretarias (municipais e estaduais), além de competência geral na área.

As Coordenações Regionais são reunidas em quatro Coordenações Esta-

duais, de acordo com sua localização: Região Metropolitana do Recife e Zona

da Mata; Agreste; Sertão do Moxotó e Pajeú; e Sertão do Araripe e São Francis-

co. No organograma, localizam-se na Gerência de Monitoramento, parte da

coordenação central do programa. Esses quatro coordenadores e também os

representantes de todas as secretarias participantes compõem o Comitê de As-

sessoramento, instância que discute e delibera todas as questões do programa,

e cuja coordenação está a cargo do Chefe de Gabinete de Projetos Estratégicos.

No âmbito de ação de sua secretaria, os representantes procuram plane-

jar ações e lidar com dificuldades encontradas no território, com limitações

técnicas ou com entraves burocráticos que cerceiam o bom andamento das

proposições do programa.

Esses atores não atuam exclusivamente no Programa Mãe Coruja Pernam-

bucana, mas também em outras gerências de suas secretarias de origem. Essa

posição é importante, pois dominam o funcionamento dessas secretarias e po-

dem agilizar decisões. Além disso, ajustes realizados com base nos parâmetros

do programa podem ser estendidos a municípios que em que ele não está pre-

sente, o que permite impulsioná-lo para todo o Estado.

Caso os membros do Comitê de Assessoramento não possuam autono-

mia para resolver determinadas questões em suas secretarias, podem acio-

nar o Comitê Executivo para apoio. Esse comitê é composto pelos secretários

estaduais envolvidos com o Programa Mãe Coruja Pernambucana. Ele não se

reúne regularmente para atividades do programa, sendo apenas acionado, em

caso de necessidade, pelo coordenador do Comitê de Assessoramento ou por

seus representantes no mesmo comitê.

Como é possível observar no organograma (figura 6), o Programa Mãe Co-

ruja Pernambucana conta com uma Coordenação Consultiva dirigida pela Di-

retoria de Políticas Estratégicas. Seu papel é o de gestão interna, central, do

programa e compreende três gerências: Monitoramento, Articulação Interse-

torial e Ações Estratégicas.

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Um olhar metodológico | 33

A Gerência de Monitoramento inclui as quatro Coordenações Estaduais do

programa, às quais se vinculam as 12 Coordenadorias Regionais.

A Gerência de Articulação Intersetorial é composta pela Coordenação de

Ações Administrativas e Orçamentárias, Coordenação de Recursos Humanos

e Coordenação do sistema de informações.

Na Gerência de Ações Estratégicas, estão a Coordenação de Comunicação e

Arte e a Coordenação de Ensino e Pesquisa.

Articulação interfederativa

O diálogo entre as distintas instâncias de governo que gerenciam os servi-

ços responsáveis pelo cuidado à mulher e à criança é ainda limitado no Brasil,

o que gera entraves para o alcance de sua efetividade.

A responsabilização dos três entes – municipal, estadual e federal – deve se

dar a partir da clareza de seu papel no desenvolvimento das ações e dentro de

suas especificidades.

A qualificação dos sistemas de regulação entre serviços dos níveis de gestão

estadual e municipal é uma das principais frentes de ação do Programa Mãe

Coruja Pernambucana. O processo de corresponsabilização institucional, esti-

mulado pelo profissional do Canto, tem o potencial de viabilizar fluxos e abrir

caminhos.

Um dos principais desafios dos serviços continua sendo a regulação e a assis-

tência ao parto: o tempo perdido em busca por vaga nas maternidades de uma

região é, por diversas vezes, o responsável por complicações que colocam em

risco mãe e bebê.

A ação dos profissionais do Programa Mãe Coruja, baseada no monitoramento de

uma a uma das gestantes cadastradas, fortalece a busca por suplantar entraves

burocráticos e administrativos, facilitando a necessária integração entre o cuidado

pré-natal e a assistência ao parto a toda a rede materno-infantil.

Um município de pequeno ou mesmo médio porte populacional dificilmen-

te contará em seu território com recursos para a realização de um pré-natal e

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| Mãe Coruja Pernambucana34

parto de alto risco, ou mesmo de um ultrassom morfológico. Acompanhando

as gestantes individualmente e buscando a articulação entre os distintos ges-

tores com vistas à integralidade do atendimento e, ao mesmo tempo, atuando

sobre pactuações e responsabilidades dos diferentes entes, o programa contri-

bui para torná-los mais funcionais.

A necessária cooperação técnica entre Estado e município, da qual o Pro-

grama Mãe Coruja é um veículo, implica em disponibilizar todo tipo de infor-

mação captada e todo processo de transmissão de capacidade tecnológica e

administrativa para utilização nas ações a serem desenvolvidas.

Monitoramento e capilaridade da informação

Um dos pontos mais fortes da estrutura do Programa Mãe Coruja é o plane-

jamento e o desenvolvimento de ações tendo por base informações advindas

do sistema de monitoramento implementado.

No SIS Mãe Coruja, a gestante é cadastrada até o quinto mês de gestação.

Caso a gestação esteja em momento mais avançado, ela poderá ser incluída

no programa mediante a comprovação da realização de, pelo menos, quatro

consultas de pré-natal além da análise dos profissionais do Canto Mãe Coruja

em conjunto com os profissionais de saúde. Essa condição se deve ao fato de

que o programa objetiva a formação de um vínculo com a mulher, que lhe

permita dizer que a gestação está realmente sendo acompanhada, sem o qual

o cadastro perde seu sentido.

Apenas os dois técnicos do Canto Mãe Coruja alimentam o sistema, com

informações colhidas pessoalmente no contato com as mães ou por meio dos

registros no cartão da gestante e da criança.

Esse procedimento, aliado a um processo contínuo de qualificação da in-

formação empreendido pela Gerência de Monitoramento, permite bastante

confiabilidade ao sistema, o que vem sendo reconhecido pelos governos mu-

nicipais e governo do estado. Nota-se que essas instâncias de poder já utilizam

dados do programa em diversas esferas de planejamento.

Resultados em dez indicadores previamente selecionados são regularmen-

te apresentados aos gestores: mortalidade infantil; mortalidade fetal; gestações

acompanhadas; gestações cadastradas; mães com sete consultas, ou mais, de

pré-natal realizadas; crianças acompanhadas; mortalidade materna; crianças

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Um olhar metodológico | 35

com registro civil de nascimento; mulheres que retornaram ao ensino regular

e pessoas que concluíram os cursos de qualificação profissional. Além desses,

pode-se ter acesso a outros dados referentes a diversas áreas de proteção às

mulheres e primeira infância no sistema.

Os profissionais do Canto Mãe Coruja são avaliados a cada dois meses com

base nos resultados indicados pelo monitoramento. Caso as metas pactuadas

entre as diversas instâncias de gerenciamento do programa não sejam atin-

gidas, o coordenador regional buscará identificar suas causas – por exemplo,

problemas específicos com a gestão municipal ou dificuldades de articulação

em decorrência do perfil do técnico – e intensificar seu apoio.

Alicerce na realidade local, customização do Programa Mãe Coruja

Embora os recursos e a qualificação dos profissionais devam ser equitativos

para os diversos municípios onde o Programa Mãe Coruja é desenvolvido, sa-

be-se que é fundamental que as características físicas dos territórios, a cultura

das comunidades e os desafios diários enfrentados pelos profissionais para a

organização dos serviços sejam levados em conta na tomada de decisões sobre

sua implantação e implementação.

Guardando as diretrizes técnicas do programa, os profissionais desenvol-

vem suas atividades considerando a realidade no Sertão, na Zona da Mata, no

Agreste e na Região Metropolitana do Recife.

Citando um exemplo, o acesso a serviços complexos ainda é difícil no Ser-

tão. Em diversos de seus municípios, a desassistência é mais alta e o nível de

escolaridade mais baixo. Talvez, em reação a isso, a capacidade de articu-

lação entre serviços é bastante desenvolvida, muitas dificuldades são assim

equacionadas.

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Um olhar metodológico | 37

Passos para a implementação do Programa Mãe Coruja Pernambucana

A implementação do programa nos municípios pernambucanos foi rea-

lizada a partir de uma série de proposições, sustentadas pelo conheci-

mento técnico e poder político, para o envolvimento dos interessados

em seus objetivos. Os itens a seguir procuram realçar algumas delas,

ocorridas não necessariamente nesta ordem, como diretrizes essenciais para

aqueles que se proponham a utilizar essa experiência para a organização de

programas voltados aos cuidados à mulher e à criança em seu Estado, região

ou município.

1. Construir sustentação política e deinir a estrutura de gestão

Uma das propostas-chave do Programa Mãe Coruja é a articulação de ações

desenvolvidas pelo município, Estado ou demais parceiros, nas diversas áreas.

Sua direção é a indução das políticas existentes para que sejam realmente im-

plementadas e efetivadas.

Nesse sentido, depende de uma decisão política, da compreensão do ges-

tor de que a qualificação do cuidado à mulher e à criança é uma proposição

essencial e estratégica em seu plano de governo. Tanto ele como pessoas que

tenham influência sobre esse plano devem ter pleno conhecimento das razões

que levaram à concepção do programa, de seus objetivos e dos eixos estraté-

gicos – daquilo que lhes permitirá replicá-lo de forma adequada à realidade

local, sem colocar em risco a sua essência.

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O diagnóstico da situação de saúde e social envolvendo a mortalidade ma-

terna e infantil nos municípios de interesse é um fator primordial para a deci-

são política de compromisso com o programa e se constitui em uma ferramen-

ta potente para o envolvimento dos interessados na implantação.

Ação fundamental e simbólica desse compromisso é a definição clara de

uma estrutura de gestão que localize o programa como uma prioridade de

governo.

2. Promover ampla sensibilização dos proissionais envolvidos no atendimento às mulheres e às crianças quando da implantação do programa

Não é suficiente oferecer palestras para os diversos profissionais com o ob-

jetivo de que se tornem parceiros na implementação do Programa Mãe Coruja.

É preciso que tenham compreensão de que é possível evitar a morte de mães e

crianças a partir do estímulo para que políticas públicas sejam concretizadas e

as ações sejam monitoradas e constantemente aprimoradas.

Lançar mão de recursos como apresentação de vídeos, criação de ambien-

tes e confecção de elementos gráficos e artísticos, uso de dinâmicas de grupo e

teatro facilita e potencializa esse trabalho.

Sentir-se realmente participante e corresponsável pelas ações empreendi-

das favorecerá o envolvimento e a disponibilidade dos atores sociais – técni-

cos, governamentais e não governamentais, sindicatos e associações – para a

transformação de suas próprias práticas em busca de uma melhoria nos resul-

tados alcançados.

3. Dialogar com o território, com as redes de saúde, educação e desenvolvimento social

Será bastante importante elaborar, de forma conjunta – buscando congre-

gar os profissionais do Programa Mãe Coruja e aqueles que já atuam na rede

de serviços –, uma visão ampla dos recursos com que contam mães e crianças

na região, bem como obter dados organizados acerca dos serviços oferecidos

e dos resultados obtidos até então, construindo uma base sólida para o desen-

volvimento do programa.

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Tanto a pesquisa em campo como a utilização de diagnósticos já elaborados

por outros grupos, nas diferentes áreas, podem, inclusive, favorecer a integra-

ção dos profissionais que irão compor, cada qual em sua especificidade, a rede

de apoio ao programa.

O programa tem objetivos e metodologia específicos, mas é essencial con-

siderar que os recursos que serão mobilizados e as parcerias que serão forma-

das para enfrentar os desafios advindos das diferentes realidades serão pró-

prios a cada município e deverão partir desse diagnóstico inicial.

4. Articular agentes de cuidado no município

É de fundamental importância o alinhamento entre Estado e município

para a sustentabilidade do programa e a criação de uma parceria que se dis-

tancie de propósitos de fiscalização. A tecnologia do Programa Mãe Coruja é

de execução local, mas, por sua vez, o Estado tem uma função articuladora,

fomentadora e de monitoramento regional da política pública.

A mensagem da valorização de um trabalho solidário e não competitivo

deve ser transmitida entre as secretarias municipais e, da mesma forma, às

organizações parceiras da sociedade civil, à comunidade e às famílias, em um

esforço para que todos, em sua especificidade, se responsabilizem pelo apri-

moramento do cuidado à mulher e à criança.

Será também importante que seja designado pelo prefeito um profissional

do município para atuar como articulador municipal responsável pelas neces-

sárias conexões entre o programa, a administração municipal e as secretarias,

de modo a facilitar a comunicação entre essas instâncias.

5. Disponibilizar um sistema de informações para monitoramento e avaliação do programa

O monitoramento dos atendimentos, a partir de um sistema que propicie a

entrada de dados pessoais da mãe e da criança, é uma das bases do Programa

Mãe Coruja. Essa inserção permite a viabilização do acesso aos direitos. A pre-

sença no sistema de informações essenciais – por exemplo, quanto à realiza-

ção de exames, controle de uma situação de insegurança nutricional diagnos-

ticada ou mesmo quanto à documentação da mulher – é uma das estratégias

que agiliza e faz acontecer as ações priorizadas pelo programa.

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Um sistema de informações construído para o Programa Mãe Coruja, que

contemple suas necessidades específicas, é uma ferramenta essencial para o

monitoramento e a avaliação do programa – dispositivos que devem operar

continuamente.

6. Deinir a localização do Canto Mãe Coruja e lançar oicialmente o programa

A definição de um local para o Canto Mãe Coruja pode representar um mar-

co no lançamento do programa no município. A organização de um evento

comunitário para dar início às ações, com a presença de representantes do

quadro político estadual e regional, lideranças da sociedade civil organizada

e entidades parceiras, aberto à participação da comunidade local, contribui-

rá imensamente com a proposta, uma vez que demonstrará, principalmente

àqueles municípios de pequeno porte, o apoio recebido pelo programa e a im-

portância de suas ações no cuidado à mulher e à criança.

7. Capacitar proissionais, iniciar o cadastramento das gestantes e implementar as diversas ações do programa

O investimento na formação dos profissionais acompanhará o Programa

Mãe Coruja em toda a sua construção e desenvolvimento. O constante fluxo

de conhecimento entre as instâncias de coordenação central do programa e

seus agentes locais é a garantia de permanente renovação e aprimoramento

das práticas, do resgate de seu significado e força.

Sensibilizados os parceiros e a comunidade, capacitados os profissionais, o

cadastramento das gestantes e as diversas ações do programa encontrarão um

solo fértil para a implementação.

8. Sempre renovar objetivos e estratégias

A equipe do Programa Mãe Coruja se vê continuamente rumo à criação de

novas ações e estratégias, seja respondendo a solicitações dos parceiros ou a

demandas da população-alvo. O programa trabalha com pessoas reais e não

com números. Os envolvidos precisam compartilhar essa realidade dinâmica

e em constante mutação.

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Um olhar metodológico | 41

9. Estimular o trabalho conjunto para tecer a rede

Determinadas ações são fundamentais para o desencadeamento e fortale-

cimento de ações conjuntas, permitindo uma integração real dos atores en-

volvidos: a presença do Programa Mãe Coruja e seu estímulo à articulação

permanente contribui para a construção da Rede Materno-Infantil na região,

assim como sua participação na elaboração do Plano Municipal para a Primei-

ra Infância ou na conquista do Selo Unicef favorece a mobilização social em

prol da infância para o município.

10. Construir sustentabilidade

A equipe do Programa Mãe Coruja Pernambucana vem insistindo ao longo

dos anos em uma mensagem trazida por Eduardo Campos: “trabalhamos com

aquilo que nos une, e não com o que nos separa”. A união de todos na busca

por um objetivo comum está no ideário do programa e também em sua prática.

Isso é importante quando se trata de induzir políticas dos diversos níveis fede-

rativos, transcendendo opções político/partidárias.

O critério de escolha dos municípios que recebem o Programa Mãe Coruja

Pernambucana é a taxa de mortalidade infantil e os indicadores sociais do lo-

cal, e não o partido político que os administra à época. Há sempre uma orienta-

ção à equipe de que o trabalho se baseie na parceria entre Estado e município,

independentemente de sua opção política, e de que, em processos eleitorais,

deve-se garantir a neutralidade do programa. Não são aceitas quaisquer indi-

cações ou solicitações de contratação de técnicos e professores por outra via

que não a seleção pública.

A efetividade das ações do Programa Mãe Coruja Pernambucana no acom-

panhamento e monitoramento de seu público e a publicação constante desses

resultados são os principais fatores que impulsionam a continuidade do pro-

grama ao longo das administrações do Estado de Pernambuco. A promulgação,

em 2009, da Lei 13.959, que dispõe sobre o Programa Mãe Coruja Pernambu-

cana, veio a fortalecer a indicação de que essa luta não pode ser interrompida.

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Para implantar o Mãe Coruja em seu municípioConstruir sustentação política e definir a estrutura de gestão

Promover ampla sensibilização dos profissionais na implantaçãoDialogar com o

território, com as redes de saúde, educação e desenvolvimento social Articular agentes de

cuidado no município, valorizando o trabalho solidárioDisponibilizar

um sistema de informações voltado às necessidades do programa

Definir localização do Canto Mãe Coruja e lançar oficialmente o programa

Capacitar os profissionais, iniciar o cadastramento das gestantes e mplementar as diversas ações do programa

Sempre renovar objetivos e estratégias

Estimular o trabalho conjunto para tecer a rede

Construir sustentabilidade

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Um olhar metodológico | 43

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O texto deste livro foi composto em Velino Text, Steelfish e Futura.

O papel utilizado para o miolo é Couché fosco 115g/m2 e para a capa é Supremo 250g/m2.

Companhia Editora de Pernambuco – junho de 2017.

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MÃECORUJAPE

Supervisão Geral: Evaldo Costa e Anelise TimmEdição: Sérgio Miguel Buarque

Projeto Gráico: Luiz ArraisFotos: Iramaraí José Vilela de Freitas

Revisão: Ab Aeterno Produção EditorialDiagramação: Sebastião Corrêa

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Uma revolução silenciosa vem ajudando a mudar a

realidade de milhares de pessoas em Pernambuco. Em

uma década, o Programa Mãe Coruja Pernambucana

tem contribuindo efetivamente para o bem-estar de

gestantes e crianças na primeira infância, estimulando

o fortalecimento dos vínculos afetivos entre mãe, filho e

família. O sucesso do programa criado em 2007 deve-se a

uma concepção inteligente, a um processo de implantação

bem feito, a uma gestão eficiente e, sobretudo, a uma

forma diferenciada de olhar, enfrentar e resolver os

problemas encontrados nessa exitosa caminhada. Agora,

chegou a hora dessas histórias serem contadas e desse

conhecimento acumulado ser compartilhado. Além de

servir como instrumento de divulgação e documentação

do programa, este livro também cumpre a função de ser

uma importante ferramenta de consulta.