Um filósofo totus politicus

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Um filósofo totus politicus 1. A unidade do pensamento de Nietzsche Denuncia e crítica da revolução como o fio condutor da leitura de Nietzsche; sem isso não seria possível salvar o filósofo em sua inteireza; As formas de ver Nietzsche: a) critico da ideologia, dos mitos do germanismo e antissemitismo; Teria que se desconsiderar as obras de juventude, temas teutômanos e judeófobos; b) espírito livre e reabilitação da carne em contraposição ao ascetismo do ocidente; Desprezariamos o discípulo de Schopenhauer com a recusa da mundanização, triste crepúsculo ateu, o lado melhor do cristianismo, o dos eremitas e dos santos; c) crítica ao niilismo; “Não ser é melhor do que ser” como explicar isso; e a crítica ao cristianismo mais do que o niilismo; d) crítica da razão e da ciência; Há em outros textos pathos iluminista e positivista, crítica a visões de mundo empenhadas em fantasias e visões; admirador da eugenista; e) celebração da arte; “A arte desempenha uma função de primeiro plano só na medida em que reforça a hierarquia”. f) vontade de verdade; g) interpretação em perspectiva psicológica;

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Um filósofo totus politicus

1. A unidade do pensamento de Nietzsche

Denuncia e crítica da revolução como o fio condutor da leitura de Nietzsche; sem isso não seria possível salvar o filósofo em sua inteireza;

As formas de ver Nietzsche:

a) critico da ideologia, dos mitos do germanismo e antissemitismo;

Teria que se desconsiderar as obras de juventude, temas teutômanos e judeófobos;

b) espírito livre e reabilitação da carne em contraposição ao ascetismo do ocidente;

Desprezariamos o discípulo de Schopenhauer com a recusa da mundanização, triste crepúsculo ateu, o lado melhor do cristianismo, o dos eremitas e dos santos;

c) crítica ao niilismo;

“Não ser é melhor do que ser” como explicar isso; e a crítica ao cristianismo mais do que o niilismo;

d) crítica da razão e da ciência;

Há em outros textos pathos iluminista e positivista, crítica a visões de mundo empenhadas em fantasias e visões; admirador da eugenista;

e) celebração da arte;

“A arte desempenha uma função de primeiro plano só na medida em que reforça a hierarquia”.

f) vontade de verdade;

g) interpretação em perspectiva psicológica;

Seria mutilação mais reducionismo, como se fosse estranho a nosso autor o tormento para abraçar e compreender a realidade na sua totalidade e a obsessão de intervir ativamente sobre ela;

Monocultura artística e psicológica; tudo revela a presença de uma alma e até de um corpo aristocráticos ou plebeus;

Na verdade, perpassam a crítica e denuncia militante da revolução e da modernidade é possível colher a unidade do pensamento do filósofo e sua coerência interna;

“O que marca a evolução do filósofo é o suceder-se de posições aparentemente muito diferentes entre elas, as quais, porém, a um olhar mais atento, se revelam como progressivos ajustamentos da mira para melhor atingir um alvo para sempre constituído pela modernidade e pela revolução” p.840.

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Filologia, arte, psicologia tem em Nietzsche significado político;

Lê a história em lutas de categorias e de classes; reduzida de uma maneira naturalista e não dialética histórica, na ideia de senhores e escravos; via também a luta de classe na moral, na religião, na ciência, no silogismo socrático; muito mais político do que Marx;

Choque entre senhores e escravos é eterno, sempre atual, nada está neutro a isso;

NIETZSCHE E OS HISTORIADORES

Empenho e rigor com que procurou reconstruir o milenar ciclo histórico que desembocou na Revolução Francesa e no emergir ameaçador do movimento socialista; história e historiadores tem papel central no discurso de Nietzsche;

O interesse histórico e de modo eminente um interesse político;

A questão da revolução e contrarrevolução sucitam particular interesse; além da questão da unificação alemã;

Democracia como herdeira do cristianismo; lê e aprova historiadores que se empenharam numa análise impiedosa da Revolução Francesa;

“Sobre o sentido político do encontro de Nietzsche com os grandes historiadores não pode haver dúvidas. Tocqueville e Taine, caros a Lee, são sumamente liquidados por Engels como autores ‘divinizados pelos filisteus’ (...)” p.847.

CONTINUIDADE E DESCONTINUIDADE: GÊNIO, ESPÍRITO LIVRE, HIERARQUIA E SUPER-HOMEM

No período de juventude, a celebração do gênio; república dos gênios em Schopenhauer; a história mergulharia a genialidade excepcional em uma massa anônima;

Como sinônimos de gênio, surgem gigante e espírito elevado; Espírito livre é do período iluminista; espíritos livres se opõem ao povo, à massa.

No período iluminista, os espíritos livres são os bons europeus, em oposição aos chauvinistas, bárbaro e asiático;

Espírito livre deve superar a superstição religiosa, democrática e ter visão do problema da hierarquia; o Estado está em contradição com o gênio; O super-homem está para o homem como este é para o macaco;

“Uma vez estabelecido que o elitismo é um traço fundamental e permanente do pensamento de Nietzsche, podemos distinguir as diversas fases da sua evolução: as duas primeiras segundo o princípio da celebração do gênio e do gênio artístico em particular, a terceira segundo o princípio da celebração do espírito livre e iluminado, a última segundo o princípio da celebração do super-homem e da hierarquia” p.849.

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Fio condutor do elitismo cultural e político; é a individualidade excepcional que dá sentido à comumente chamada “história universal”; a massa apenas como material bruto do qual se serviram essas individualidades para suas criações artísticas;

Arte contra o socialismo; quem determina o valor ou desvalor da vida é apenas a aparição do intelecto supremo; partir disso para ajuizar sobre ordenamentos políticos e ideologias;

4. CONTINUIDADE E DESCONTINUIDADE: O ‘ILUMINISMO’ DE PILATOS AO ANTIGO REGIME

“Portanto, nem sequer a fase ‘iluminista’ põe em discussão o elitismo cultural, que constitui em Nietzsche um traço constante, mas que, no decorrer do tempo, se exprime com categorias e palavras de ordem sempre mais diferentes” p.852.

Ao iluminismo de baixo, que pretende deslegitimar e contestar as classes dominantes, Nietzsche propõe um iluminismo do alto; iluminismo com traços de antiguidade;

Nietzsche se apropria de argumentos e faz eco à postura dos autores pagãos contra o cristianismo; pensa que o mesmo ocorrera na revolução francesa; Nietzsche como herdeiro do iluminismo pagão;

O confronto entre Pilatos que representa a ciência, as luzes e a tolerância x Jesus que representa a fé e o fanatismo; isso ligado às categorias sociais que pertencem; ciência x cristianismo; a valorização dos céticos ligado à descrença com o desenvolvimento e felicidade dos mais pobres;

Iluminismo que mostraria que às naturezas dominantes é permitido tudo o que não é consentido às naturezas gregárias;

A perspectiva sobre Lutero e suas subseqüentes alterações também são só compreensíveis a partir do fio elitista;

5. CONTINUIDADE E DESCONTINUIDADE: DA NEUTRALIZAÇÃO DA TEODICEIA DO SOFRIMENTO À CELEBRAÇÃO DA TEODICEIA DA FELICIDADE

Atitude assumida por Nietzsche em relação à questão social, felicidade por parte dos escravos;

Teodiceia do sofrimento cristã foi neutralizada; pois as diferenças se baseiam no mérito e sensibilidade à dor; tornando assim, a divisão do trabalho como algo justo e providencial; fornecendo os elementos necessários para a teodiceia da felicidade;

No último estágio, os mais nobres passam a duvidar do seu direito à felicidade;

O FILÓSOFO, O BRÂMANE E O ‘PARTIDO DA VIDA’

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Não apenas tinha objetivos políticos (grande política), mas pensava os meios: fundação do partido da vida;

Resolver o problema da moral como tarefa, missão, destino; transvaloração dos valores; atitude política; futuro, destino da humanidade em suas mãos;

“Para aqueles que quisessem colocar Nietzsche numa esfera afastada do conflito político e mais próxima da pura contemplação estética ou da pura investigação psicológica, se poderia responder com as palavras do próprio filósofo: ‘Fora dos grandes problemas da moral, nada há de importante’” p.861.

Nietzsche não procura ensinar, mas converter; por isso, recorre sempre ao plural; apelo à unificação da elite européia contra a ralé; alinhamento anti-humanista e anti-democrático; ‘Nietzsche aspira ser o brâmane do ‘partido da vida’” p.863.

“AUTODISCIPLINA LINGUÍSTICA” CONTRA “ANARQUIA” E “ACANALHAMENTO LINGUÍSTICO”

O estilo que desenvolve tem a ver com a persuasão e até conversão dos leitores; critica a falta de meditação na modernidade; antítese em relação à época do trabalho;

AFORISMO, ENSAIO E SISTEMA

“A esse gênero literário conduz também a rigorosa autodisciplina lingüística, presente desde o início e à qual, como vimos, Nietzsche atribui um significado filosófico, de desinteresse pela pressa jornalística e da imundície que caracteriza o moderno em todas as suas manifestações” p,868.

Aforismo se acentua quanto mais sente isolamento e inatualidade; preocupação pedagógico-política;

“Portanto, aqui já estão os pressupostos para desenvolver a reflexão sistemática que se impõe. Faz tempo que Nietzsche acalenta o plano de elaboração da obra definitiva, A vontade de potência, chamada a definir de modo organizado a plataforma teórica e política do ‘partido da vida’ e em cujo âmbito os aforismos deveriam conectar-se numa sequência fechada, para tomar a forma não diferente das proposições, dos corolários e dos escólios na Ética de Spinoza” p.870.