TSE Eleicoes No Brasil Uma Historia de 500 Anos 2014

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História das eleições no Brasil.

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  • 2 0 1 4

  • 2014 Tribunal Superior Eleitoral proibida a reproduo total ou parcial desta obra sem a autorizao expressa dos autores.

    Secretaria de Gesto da InformaoSetor de Administrao Federal Sul (SAFS), Quadra 7, Lotes 1/2, 1 andar70070-600 Braslia/DFTelefone: (61) 3030-9225

    Secretria-Geral da Presidncia: Claudia Dantas Ferreira da Silva

    Diretor-Geral da Secretaria: Athayde Fontoura Filho

    Secretria de Gesto da Informao: Bianca do Prado Pagotto

    Concepo do projeto: Ane Ferrari Ramos Cajado (Seo de Acervos Especiais)

    Pesquisa histrica e elaborao de textos: Ane Ferrari Ramos Cajado Thiago Dornelles Amanda Camylla Pereira

    Reviso de contedo histrico: Ministro Costa Porto

    Editorao e reviso editorial: Coordenadoria de Editorao e Publicaes (Cedip/SGI)

    Editorao: Seo de Editorao e Programao Visual (Seprov/Cedip/SGI)

    Capa e projeto grfico: Clinton Anderson

    Reviso editorial: Seo de Preparao e Reviso de Originais (Seprev/Cedip/SGI)

    Reviso e padronizao: Emanuelly Arajo

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    (Tribunal Superior Eleitoral Biblioteca Professor Alysson Darowish Mitraud)

    B823 Brasil. Tribunal Superior Eleitoral.

    Eleies no Brasil : uma histria de 500 anos / Ane Ferrari Ramos Cajado, Thiago Dornelles, Amanda Camylla Pereira. Braslia : Tribunal Superior Eleitoral, 2014. 100 p. ; il.

    1. Eleies - histria. 2. Imprio (1822-1989). 3. Repblica (1989-). 4. Quinta Repblica. 5. Democratizao. I. Cajado, Ane Ferrari Ramos. II. Dornelles, Thiago. III. Pereira, Amanda Camylla. IV. Ttulo.

    CDD 324.981

  • TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

    Presidente

    Ministro Marco Aurlio

    Vice-Presidente

    Ministro Dias Toffoli

    Ministros

    Ministro Gilmar Mendes

    Ministra Laurita Vaz

    Ministro Joo Otvio de Noronha

    Ministro Henrique Neves

    Ministra Luciana Lssio

    Procurador-Geral Eleitoral

    Rodrigo Janot Monteiro de Barros

  • SECRETARIA DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

    Diretor-Geral

    Athayde Fontoura Filho

    Secretria de Administrao

    Adriana Novais Teixeira

    Secretria de Controle Interno e Auditoria

    Mrcia Giselle dos Santos Oliveira

    Secretria de Gesto da Informao

    Bianca do Prado Pagotto

    Secretria de Gesto de Pessoas

    Zlia Oliveira de Miranda

    Secretrio de Planejamento, Oramento,

    Finanas e Contabilidade

    Eduardo Demtrio Bechara

    Secretrio de Tecnologia da Informao

    Giuseppe Dutra Janino

    Secretrio Judicirio

    Marcio Fernando dos Santos Valado

  • ApresentAo

    Eis o mvel desta obra: quase cinco sculos de eleies, desde 1532. Em quinhentos anos de histria, houve disputas, conquistas de direitos, momentos de autoritarismo e de gritos por liberdade.

    Foram muitos os obstculos e os sujeitos atuantes nos processos eleitorais desenvolvidos no decorrer desse perodo. O ato de votar j foi visto como indcio de superioridade e instrumento do controle exercido pelos poderosos. Noutros tempos, nobreza, renda, gnero e letramento foram alguns dos critrios de excluso do seleto grupo de eleitores de outrora.

    Com o advento da Constituio Federal de 1988, o direito ao voto ampliou-se, revelando-se como poder soberano, esteio da comunidade poltica e o maior indicativo de estgio democrtico vivenciado por uma nao.

    O voto no surge apenas como direito estabelecido pela Lei Maior, mas instrumento de manifestao do povo, genuinamente livre, decorrente de convices e expectativas sobre o futuro do pas.

    Justia Eleitoral atribui-se papel da maior importncia: garantir ao eleitor o exerccio amplo e irrestrito dos ideais democrticos. No se limita a viabilizar as eleies, a realizar a contagem de votos e a proclamar o vencedor. Mantm-se atenta aos desvios de conduta de candidatos e ocupantes de cargos pblicos eletivos, trabalhando ininterruptamente, e no apenas no perodo das eleies. Incumbe-lhe, a partir do Direito posto, zelar pela correo dos procedimentos anteriores disputa e afastar os que, mesmo tendo obtido o mandato, transgrediram a ordem jurdica.

    Avanando-se na leitura do texto, notar-se- que a democracia no nasceu pronta e acabada, mas foi construda

  • a partir dos clamores por justia. Novos contedos foram-lhe acrescidos a cada gerao. A Justia Eleitoral contribui aprimorando, continuadamente, os instrumentos para garantir eleies transparentes, seguras e rpidas. Ao eleitor, figura central do processo de escolha, cabe aperfeioar a democracia por meio de prtica cidad, aprovando ou rejeitando a atuao do parlamentar ou do administrador anteriormente eleito. Compete-lhe sinalizar ao poltico o necessrio agir com fidelidade de propsito.

    Este livro materializa o esforo da Justia Eleitoral direcionado ao resgate da memria. A equipe responsvel pelo Museu do Tribunal Superior Eleitoral, ao realizar este trabalho, reconstri parte importante da histria eleitoral brasileira, reforando a vocao desta Justia Especializada de estar a servio dos cidados brasileiros.

    Ministro MARCO AURLIOPresidente

  • 7prefcio

    Durante nossa histria, o direito de votar e de ser votado foi garantido e vetado, ampliado e restringido, alm de ter sido instrumento de exerccio da cidadania e meio de coero de alguns setores sociais sobre camadas da populao. A mudana de Colnia para Imprio e depois de Imprio para Repblica no necessariamente representou um avano no exerccio pleno dos direitos polticos. Somente com a criao da Justia Eleitoral, em 1932, iniciou-se a construo das bases para o exerccio pleno desses direitos.

    Nas ltimas dcadas, a urna eletrnica tornou-se smbolo de democracia e transparncia. A informatizao do voto o coroamento do esforo histrico da Justia Eleitoral de possibilitar ao cidado os meios necessrios plena manifestao da vontade popular, conferindo segurana, celeridade e confiabilidade ao processo eleitoral.

    A urna, o ttulo e a cdula so cones da prtica do voto que, no Brasil, tem quase 500 anos. Voc poder conhecer melhor a trajetria histrica desses objetos e das eleies no Brasil nas pginas seguintes. Percorreremos os caminhos do voto atravs do Brasil Colnia, do Imprio, passando pelos primeiros anos da Repblica at chegar aos dias de hoje. No deixe de conferir as Informaes adicionais ao final de cada texto das sees Colnia, Imprio e Repblica. Esperamos que aprecie essa jornada!

    Ane Ferrari Ramos Cajado

    Thiago Dornelles

    Amanda Camylla Pereira

  • 9sumrio

    Marcos Histricos ...................................................................................................................................................................11

    Colnia ................................................................................................................ 11

    Eleies das vilas ....................................................................................................................................11

    Primeiras eleies gerais do Brasil ..................................................................................................15

    Imprio ............................................................................................................... 17

    O voto nos tempos do imperador .................................................................................................17

    Repblica ........................................................................................................... 27

    Vrias repblicas .....................................................................................................................................27

    Primeira Repblica (1889-1930) ......................................................................................................27

    Refundao da Repblica (1930-1937) ........................................................................................35

    A Repblica democrtica (1945-1964) .........................................................................................43

    Regime Militar (1964-1985) ...............................................................................................................49

    Nova Repblica (1985 at os dias atuais) ....................................................................................59

    Texto complementar: Voto das mulheres ...................................................................................71

    Referncias ............................................................................................................................................................................77

    Stios eletrnicos ............................................................................................... 77

    Livros e artigos .................................................................................................. 79

    Anexos ................................................................................................................................................................................... 83

    Urnas ................................................................................................................... 83

    Ttulos ................................................................................................................. 87

    Cdulas ............................................................................................................... 93

  • 11

    mArcos Histricos

    Colnia

    Eleies das vilas

    Uma tradio portuguesa...

    Os colonizadores portugueses mal pisavam o territrio americano, logo

    realizavam votaes para eleger os que iriam governar as vilas e cidades que fundavam,

    obedecendo tradio portuguesa de escolher os administradores de seus povoados.

    Vrios cargos eram preenchidos nestes pleitos, dentre eles: vereador, juiz ordinrio,

    procurador e outros oficiais.

    A primeira eleio de que se tem notcia definiu os membros do Conselho

    Municipal da Vila de So Vicente1 atual So Paulo em 1532 e ocorreu conforme

    as determinaes das Ordenaes do Reino(A).

    Quem podia votar?

    S os homens bons tinham o direito de poder escolher os administradores das

    vilas. Na poca do Brasil Colnia, eram homens bons os nobres de linhagem, os senhores

    de engenho, e os membros da alta burocracia militar, a esses se acrescentando os

    homens novos, burgueses enriquecidos pelo comrcio.

    1 Para mais informaes sobre a histria da Vila de So Vicente, acesse o stio: http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=355100.

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    O pelouro(B) guarda os resultados da eleio.

    Os homens bons escolhiam, indiretamente, os nomes que exerceriam os cargos

    das vilas nos trs anos seguintes. O processo era cheio de detalhes e obedecia s

    seguintes etapas:

    Homens bons e povo diziam 6 nomes ao p do ouvido do escrivo.

    Os 6 mais votados seriam os eleitores.

    O juiz mais velho da comarca dividia os 6 eleitores em 3 duplas.

    Nessa formao, procurava-se separar os parentes e era proibida a comunicao entre as duplas.

    Cada dupla elaborava 3 listas contendo: nomes dos vereadores, dos procuradores e dos juzes.

    ESCOLHA DOS ELE ITORES

    FORMAO DAS DUPLAS

    ELABOR AO DE 9 L ISTAS

  • 13

    REDUO DE 9 L ISTAS A 3

    PELOUR OS

    O juiz mais velho rearranjava as 9 listas de forma a definir as composies da Cmara para cada um dos 3 anos subsequentes.

    Eram formadas 3 listas contendo em cada uma os nomes dos vereadores, procuradores e juzes que exerceriam os cargos durante um ano.

    O juiz mais velho inseria em cada um dos pelouros uma lista contendo o nome daqueles que exerceriam os cargos da Cmara em um ano.

    Uma sacola com 4 compartimentos acondicionava os 3 pelouros e a lista contendo o nome de todos os eleitos.

    A sacola era guardada em uma arca com 3 fechaduras, cada chave ficava sob a guarda de um vereador que exercia o cargo naquele ano.

    SOR TE IO

    No incio do ano, numa reunio chamada Janeirinha, a arca era aberta pelos vereadores e um menino de at sete anos sorteava o pelouro que continha o nome dos oficiais que iriam exercer as atividades na Cmara naquele ano.

    Col

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    Informaes adicionais

    (A) Ordenaes do Reino: refere-se compilao de leis em Portugal durante o

    perodo de algum rei. Assim, afonsinas, em funo de Dom Afonso V (1448-1481);

    manuelinas, sob o reinado de Dom Manuel I (1495-1521); filipinas, na poca de Dom

    Felipe I (1581-1598).

    No Brasil, as Ordenaes Filipinas foram paulatinamente derrogadas medida em que se

    elaboravam leis brasileiras. S em 1917 foram excludas inteiramente do ordenamento

    jurdico nacional, quando entrou em vigor o primeiro Cdigo Civil.

    (B) Pelouro: bola destinada a guardar a lista dos candidatos escolhidos nas eleies

    das vilas.

  • 15

    Primeiras eleies gerais do Brasil

    Portugal para os portugueses

    Como resultado da transferncia da famlia real para o Rio de Janeiro, em 1808,

    em funo da invaso francesa a Portugal, o Brasil foi elevado, em 1815, de colnia a

    Reino do Imprio Portugus, oficialmente denominado de Reino Unido de Portugal,

    Brasil e Algarves. Com a libertao de Portugal da ocupao napolenica, em 1815,

    iniciou-se um movimento que culminou com a Revoluo Liberal do Porto, em 1820.

    Entre as reivindicaes do movimento estavam: a convocao das cortes para elaborar

    uma constituio para o pas, o imediato retorno da Corte para Portugal e a restaurao

    do monoplio comercial com o Brasil.

    As eleies para as cortes no Brasil

    D. Joo VI(A), ainda no Brasil, decretou, em 1821, a convocao dos brasileiros

    para escolha dos deputados s cortes de Lisboa. A Constituio espanhola de 1812

    adotada para o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves determinou a realizao

    do pleito em quatro graus:

    Cidados das freguesias nomeavam compromissrios

    Compromissrios escolhiameleitores de parquia

    1 GRAU

    2 GRAU

    4 GRAUEleitores de comarca elegiam os deputados

    Eleitores de parquia designavam os eleitores de comarca3 GRAU

    Col

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    Font

    e: W

    ikip

    ediaInformaes adicionais

    (A) D. Joo VI: Joo Maria Jos Francisco Xavier de Paula Lus Antnio Domingos Rafael nasceu em 13 de maio de 1767. Chegou ao Brasil em janeiro de 1808, em decorrncia da invaso de Portugal por tropas francesas. Em 1815, elevou o Brasil condio de Reino. A Revoluo do Porto, movimento constitucionalista, obrigou-o a voltar para Portugal. Deixou o Brasil em abril de 1821. Em 1825, reconheceu a independncia do Brasil. Faleceu em 10 de maro de 1826.

    D. Joo VI

  • 17

    Imprio

    O voto nos tempos do imperador

    Uma Constituio para o Brasil independente

    Aps a declarao de independncia, em 1822,

    D. Pedro I(A) convocou eleies para a Assembleia

    Geral Constituinte e Legislativa. O sistema utilizado

    foi o de dois graus: no votavam em primeiro grau

    os que recebessem salrios e soldos; para a eleio

    de segundo grau, exigia-se decente subsistncia por

    emprego, indstria ou bens. O clculo do nmero

    de eleitores era feito a partir do nmero de fogos(B) da freguesia.

    Para votar e ser votado no Imprio

    Durante quase todo o perodo imperial, as eleies eram indiretas, ou seja, os cidados

    escolhiam os eleitores dos deputados e senadores. Nessas eleies, podiam votar homens

    com mais de 25 anos(C) que atendessem aos critrios censitrios legalmente definidos.

    O analfabeto pde votar quase que livremente

    nesse perodo. Ocorreu apenas alguma limitao quando

    foi instituda a obrigatoriedade de assinatura da cdula

    eleitoral(D). S com a Lei Saraiva, em 1881, que foi

    proibido o voto daqueles que no soubessem ler nem

    escrever, inaugurando o chamado censo literrio,

    responsvel pelo decrscimo no eleitorado poca(E).

    Tendo em vista a concepo restritiva de cidadania

    (s era cidado quem tivesse certos atributos econmicos

    e morais), os critrios estabelecidos para exerccio dos

    direitos polticos foram objeto de grande detalhamento

    por parte dos textos legais.

    Primeira bandeira do Imprio

    O parmetro censitrio definia o eleitorado durante o perodo do Brasil Imperial. Este um exemplo de cdula monetria poca do Imprio.

    Font

    e: W

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    Para conhecer esses critrios, explore o infogrfico a seguir, que condensa,

    informalmente, alguns personagens envolvidos nas eleies imperiais.

    Personagem 1: (eleitor 1 grau)

    A grande massa que constitua os eleitores de primeiro

    grau, ou votantes, era formada pelos cidados brasileiros do sexo

    masculino que tivessem mais de vinte e cinco anos e uma renda

    anual de cem mil ris. Em rigor, esse limite de renda no era to alto

    poca, o que possibilitava o direito de votar a considervel parcela

    da populao livre.

  • 19

    Personagem 2: (eleitor 1 grau liberto)

    Os libertos, ex-escravos que adquiriram a liberdade, podiam

    votar apenas como eleitores de primeiro grau. A situao dos libertos

    e dos ingnuos os nascidos do ventre livre da me escrava era

    controversa e fez correr muita tinta nas discusses da poca.

    Como a Constituio de 1824 restringiu apenas o direito de

    voto dos libertos nada mencionando sobre os ingnuos , seria

    possvel entender que os ingnuos no estavam excludos do rol

    dos eleitores de segundo grau, tampouco proibidos de serem

    eleitos. Essa interpretao no era unnime, razo pela qual muitas

    discusses ocorreram sobre a situao tanto de uns quanto de

    outros, principalmente com a proximidade da promulgao da

    Lei do Ventre Livre(F), em 1871.

    Se a legislao permitia mltiplas interpretaes, a realidade

    era ainda mais complexa, ocorrendo situaes inusitadas, como

    a do fazendeiro Joo Jos da Costa, juiz de paz da freguesia de

    Jurujuba, que teve sua eleio contestada sob suspeita de ser

    um liberto.

    Personagem 3: (eleitor 1 grau criminoso)

    Aqueles que tivessem sido pronunciados em querela

    ou devassa, ou seja, os que estivessem passando por uma

    disputa na justia ou estivessem sendo investigados, definidos

    como criminosos pela Constituio de 1824, teriam o poder

    de voto na primeira instncia das eleies. J a primeira

    lei eleitoral elaborada pelo Legislativo, em 1846, deixa de

    qualificar esses indivduos como criminosos, definindo-os

    como Os pronunciados em queixa, denuncia, ou summario,

    estando a pronuncia competentemente sustentada.

    (Decreto n 387, de 19 de agosto de1846, art. 53, 3).

    Imp

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  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

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    Personagem 4: (eleitor 1 e 2 graus estrangeiro)

    De acordo com a Constituio de 1824, os estrangeiros que fossem

    naturalizados, independentemente de sua religio, podiam votar na

    primeira e na segunda instncia das eleies, mas no podiam ser eleitos

    deputados e senadores, alm de no poderem succeder na Cora do

    Imperio do Brazil (Constituio de 1824, art. 119).

    Personagem 5: (eleitor 2 grau)

    A Constituio de 1824 estabelecia a renda mnima de 200 mil

    ris para se ser qualificado como eleitor de segundo grau, devendo

    cumprir tambm as exigncias para ser votante. O mesmo texto legal

    exclua libertos e criminosos do rol de eleitores de segundo grau.

    Personagem 6: (condio para ser deputado)

    Alm de estar habilitado para ser eleitor de segundo grau

    e ter renda mnima de 400 mil ris, outro requisito era imposto a

    quem quisesse ser deputado: professar a religio do Estado, ou

    seja, ser catlico.

    Personagem 7: (condio para ser senador)

    Para poder ser senador, de acordo com a Constituio de 1824,

    era necessrio preencher alguns requisitos: ter renda mnima de 800

    mil ris anuais, ser cidado brasileiro, ter 40 anos de idade ou mais

    (com exceo para os prncipes da Casa Imperial, que ganhavam

    assento no Senado aos 25 anos). Tambm deveria ser pessoa de

    saber, capacidade e virtudes, com preferencia os que tiverem feito

    servios Patria (Constituio de 1824, art. 45, III).

  • 21

    De todo o modo, o texto da Constituio no exigia, expressamente,

    que o senador professasse a religio do Estado, o que diferia dos

    requisitos para ser deputado, mas restava a condio de, ao tomar

    posse, prestar juramento de manter a religio catlica apostlica romana.

    A escolha dos senadores era feita de um modo particular. Os

    eleitores votavam em trs vezes a quantidade de cargos de senadores

    disponveis para a respectiva provncia, e, ento, o imperador

    designava o tero dessa lista que tomaria posse do cargo vitalcio.

    Inovaes importantes

    Durante o Imprio, foram muitas as alteraes na legislao que regulamentava

    as eleies, ocorridas, dentre outros motivos, para garantir maioria ao partido que estava

    no poder. Somente em relao aos sistemas eleitorais, tivemos sistemas majoritrios de

    listas completas por provncias, voto distrital com um deputado por provncia, com trs

    deputados por provncia e voto limitado ou de lista incompleta.1

    Outras modificaes importantes foram

    introduzidas com a Lei Saraiva: as eleies

    passaram a ser diretas, as juntas paroquiais de

    qualificao foram extintas, o alistamento foi

    entregue magistratura, o ttulo de eleitor foi

    institudo, substituindo o ttulo de qualificao

    criado em 1875, e o analfabeto foi proibido

    de votar.(G)

    1 Para a definio desses sistemas, consulte o glossrio eleitoral no Portal TSE.

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    Conselheiro Saraiva

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

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    A seguir, quadro ilustra como o sistema eleitoral foi modificado, em relao s

    eleies para deputados:

    1855 Lei dos Crculos

    1822 Deciso n 57A Deciso n 57, de 19 de junho de 1822, regulamentou

    a eleio para a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa,

    a ser realizada em dois graus: os cidados de cada freguesia

    escolhiam os eleitores de parquia, que por sua vez escolhiam

    os deputados. A eleio indireta seria a regra durante quase

    todo o perodo imperial, s sendo introduzido o voto direto

    em 1881, por meio da Lei Saraiva.

    O sistema eleitoral utilizado era o majoritrio(H), mas

    com especificidades para cada um dos graus. Os cidados da

    freguesia votavam em listas de eleitores, sendo eleitos aqueles

    que figurassem na lista que obtivesse a maioria simples dos

    votos. Os eleitores, por sua vez, votavam nos deputados por

    meio de cdulas que eram repetidas tantas vezes quantos

    fossem os deputados a serem eleitos.

    O Decreto n 842, conhecido como a Lei dos Crculos,

    inaugurou no Brasil o voto distrital(I). Por meio de decretos, as

    provncias(J) foram divididas em crculos (distritos), devendo

    ser eleito um deputado por cada distrito. O deputado que

    obtivesse a maioria absoluta de votos no distrito era eleito,

    sendo possvel se eleger por mais de um distrito, caso em que

    escolheria o distrito que queria representar.

    O Decreto n 1.082, tambm conhecido como a Segunda

    Lei dos Crculos, manteve basicamente todas as disposies da

    lei anterior, realizando duas importantes alteraes: ampliao

    do nmero de deputados por crculo, que passou a ser trs;

    1860 2 Lei dos Crculos

  • 23

    exigncia de desincompatibilizao das autoridades de seus

    cargos seis meses antes dos pleitos.

    A Segunda Lei dos Crculos foi substituda pela Lei do Tero

    (Decreto n 2.675), que aboliu o voto por crculos, determinando

    que as eleies fossem realizadas por provncias. A finalidade

    dessa lei foi a de possibilitar maior representatividade das

    minorias, tema recorrente nos debates parlamentares. A soluo

    encontrada foi limitar o voto(K) de cada eleitor a dois teros do

    nmero total de cadeiras em disputa.

    Outra mudana importante trazida pela Lei do Tero foi

    a criao do ttulo de qualificao do eleitor e a participao da

    justia comum no processo eleitoral.

    A Lei Saraiva(L) (Decreto n 3.029), publicada em 9 de

    janeiro de 1881, decorreu dos anseios da sociedade brasileira

    por mudanas na legislao eleitoral. Um dos principais pontos

    de inovao foi a introduo do voto direto, reivindicao

    constante nos jornais, nas ruas e nos debates parlamentares.

    Alm do voto direto, a Lei Saraiva estabeleceu o voto

    secreto, confiou o alistamento magistratura e instituiu o

    ttulo de eleitor, em substituio ao ttulo de qualificao

    criado em 1875.

    Imp

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    1875 Lei do Tero

    1881 Lei Saraiva

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

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    Informaes adicionais

    (A) D. Pedro I: Pedro de Alcntara Francisco Antnio Joo Carlos Xavier

    de Paula Miguel Rafael Joaquim Jos Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de

    Bragana e Bourbon nasceu em 12 de outubro de 1798. Em 26 de abril de 1821,

    assumiu a regncia do Reino do Brasil. Em 7 de setembro de 1822, proclamou a

    independncia. Em 12 de outubro de 1822, foi aclamado imperador e abdicou

    em 7 de abril de 1831. Faleceu em 24 de setembro de 1834.

    (B) Fogos: o Decreto n 1571, de 4 de maio de 1842, em seu art. 6, assim

    definia fogo: Por fogo entende-se a casa, ou parte dela, em que habita

    independentemente uma pessoa ou famlia; de maneira que um mesmo edifcio

    pode ter dois ou mais fogos.

    (C) 25 anos: podiam votar tambm homens com mais de 21 anos, se fossem

    casados ou oficiais militares e, independentemente da idade, clrigos ou

    bacharis.

    (D) Cdula eleitoral: em rigor, no havia cdula eleitoral. No dia da votao,

    os eleitores traziam os nomes escolhidos em uma relao que era assinada e

    depositada na urna.

    1 Para acessar o inteiro teor desse decreto e dos demais decretos, leis e cdigos eleitorais que aparecerem ao longo do texto, entre no stio do TSE: http://www.tse.jus.br/internet/legislacao/eleitoral_blank.htm.

    importante ressaltar que a lei no aboliu o voto censitrio, ao

    contrrio, estipulou rgidos critrios para a comprovao da renda e

    instituiu a vedao ao voto do analfabeto.

  • 25

    (E) Decrscimo no eleitorado poca: a vedao imposta em 1881, que

    s foi extinta em 1985, teve grande impacto no exerccio da cidadania poltica

    no Brasil. Para se ter uma ideia do contingente atingido por essa vedao, em

    1880, na parquia de Iraj, provncia do Rio de Janeiro, 44% dos votantes eram

    analfabetos. de Jos Murilo de Carvalho a informao de que Em 1872 havia

    mais de um milho de votantes, correspondentes a 13% da populao livre.

    Em 1886, votaram nas eleies parlamentares pouco mais de 100 mil eleitores,

    ou 0,8% da populao total. (CARVALHO, 2007, p.39).

    (F) Lei do Ventre Livre: lei publicada em 28 de setembro de 1871, que

    declarou, a partir daquela data, ingnuos e livres os filhos das mulheres

    escravizadas.

    (G) Vedao ao voto do analfabeto: a Constituio de 1824 no proibiu o

    voto do analfabeto que foi, no mximo, dificultado durante um breve perodo,

    quando o eleitor era obrigado a assinar as listas de seus candidatos. A Lei

    Saraiva foi o que realmente imps vedao expressa ao voto do analfabeto,

    inaugurando o chamado censo literrio, responsvel pelo decrscimo no

    eleitorado.

    (H) Voto majoritrio: aquele no qual se considera eleito o candidato que

    receber, na respectiva circunscrio pas, estado, municpio , a maioria

    absoluta ou relativa, conforme o caso, dos votos vlidos (descontados os nulos

    e os em branco). Fonte: glossrio eleitoral, disponvel no Portal TSE.

    (I) Voto distrital: no voto distrital cada partido poltico apresenta um

    candidato por circunscrio eleitoral e o mais votado o eleito. Fonte: glossrio

    eleitoral, disponvel no Portal TSE.

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    26

    (J) Provncias: no perodo imperial, era essa a denominao dada a cada

    uma das divises administrativas que compunham o Imprio, as quais, com

    a Repblica, passaram a ser denominadas estados.

    (K) Voto limitado: quando o eleitor, em uma escolha plurinominal, no tem

    o direito de votar na totalidade das cadeiras a preencher. Fonte: glossrio

    eleitoral, disponvel no Portal TSE.

    (L) Lei Saraiva: o Conselheiro Jos Antnio Saraiva foi o responsvel pela

    reforma eleitoral que se materializou na Lei Saraiva, mas a redao coube a

    Ruy Barbosa.

  • 27

    Repblica

    Vrias repblicas

    O perodo que vai de 1889 at os dias atuais foi marcado por inmeros contextos

    polticos, sociais e econmicos. Nesse perodo, democracias alternaram-se com

    ditaduras, o que contribuiu para que o direito de votar e ser votado fosse garantido

    em alguns momentos e vetado em outros.

    Primeira Repblica (1889-1930)

    Formao e consolidao da Repblica

    Os primeiros anos que se seguiram

    Proclamao da Repblica foram de grandes

    incertezas quanto aos trilhos que a nova forma de

    governo deveria seguir. Numa rpida olhada, se

    identificam dois grupos que defendiam diferentes

    formas de se exercer o poder da Repblica: os

    civis e os militares. Os civis, representados pelas

    elites das principais provncias So Paulo, Rio

    de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul ,

    queriam uma Repblica Federativa que desse muita autonomia s unidades regionais. Os

    militares, por outro lado, defendiam um Poder Executivo forte e se opunham autonomia

    buscada pelos civis. Isso sem mencionar as acirradas disputas internas de cada grupo.

    Esse era um quadro que demonstrava a grande instabilidade sentida pelos cidados que

    viveram naqueles anos. Mas havia cidados?

    Formalmente, a Constituio de 1891 definia como cidados os brasileiros

    natos e, em regra, os naturalizados. Podiam votar os cidados maiores de 21 anos que

    tivessem se alistado conforme determinao legal. Mas o que, exatamente, significava

    isso? Em 1894, na primeira eleio para presidente da Repblica, votaram 2,2% da

    Primeira bandeira republicana, criada por Ruy Barbosa, usada entre 15 e 19 de novembro de 1889.

    Rep

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    Font

    e: W

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    edia

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    mon

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  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    28

    populao. Tudo indica que, apesar de a Repblica ter abolido o critrio censitrio e

    adotado o voto direto, a participao popular continuou sendo muito baixa em virtude,

    principalmente, da proibio do voto do analfabeto e das mulheres.

    No que se refere legislao eleitoral, alguns instrumentos legais vieram a pblico,

    mas nenhum deles alterou profundamente o processo eleitoral da poca. As principais

    alteraes promovidas foram o fim do voto censitrio e a continuidade do voto direto.

    Essas modificaes, embora importantes, tiveram pouca repercusso prtica, j que o

    voto ainda era restrito analfabetos e mulheres(A) no votavam e o processo eleitoral

    continuava permeado por toda sorte de fraudes.

    Para conhecer mais detalhes dessa legislao, explore o infogrfico seguinte.

    O Decreto n 200-A promulgou o regulamento para

    a eleio do Congresso Nacional Constituinte, manteve o

    voto direto e determinou a incluso de todos os eleitores j

    qualificados pela Lei Saraiva.

    A qualificao de outros eleitores, ao contrrio do que

    previa a Lei Saraiva, no era feita pelas autoridades judicirias,

    ficando sob a responsabilidade de comisses distritais, que

    iniciavam a elaborao das listas de eleitores, e de comisses

    municipais, que finalizavam a qualificao. As comisses

    distritais eram formadas por um juiz de paz, um eleitor e

    o subdelegado da parquia; as municipais, por um juiz

    municipal, o presidente da cmara de vereadores e o delegado

    de polcia. O eleitor insatisfeito com as decises tomadas por

    essa comisso podia recorrer ao juiz de direito da comarca.

    Todos os que eram qualificados recebiam ttulo de eleitor.

    V-se que a estrutura concebida dificultava a realizao

    de eleies transparentes, posto que o processo de alistamento

    e qualificao de eleitores era de total responsabilidade das

    autoridades locais.

    1890 Decreton 200-A

  • 29

    O Decreto n 511, de 23 de junho de 1890, conhecido

    como Regulamento Alvim, regulamentou a eleio para o

    Congresso Nacional Constituinte. Assim, foram definidas

    as seguintes condies de elegibilidade: para o cargo de

    deputado, a condio de ter mais de sete anos de cidadania

    brasileira; para o de senador, ter mais de nove anos de cidadania

    brasileira e ter mais de 35 anos de idade. As imposies

    referentes a tempo de nacionalidade justificam-se em razo

    da Grande Naturalizao, ocorrida em 1889, quando todos os

    estrangeiros que residiam no Brasil foram naturalizados, a no

    ser que se recusassem oficialmente.

    Alm disso, revogou o voto distrital e restabeleceu o voto

    de lista completa por estado, sendo eleito quem obtivesse a

    maioria relativa de votos.

    Se pelo Decreto n 200-A a qualificao dos eleitores era

    feita pelas autoridades locais, o Regulamento Alvim conferiu

    mais dispositivos para o controle dos resultados eleitorais: as

    mesas eleitorais ficaram responsveis por receber e apurar os

    votos, alm de lavrar as atas.

    Sem surpresas, o Governo Provisrio garantiu maioria

    no Congresso Nacional, que elaborou a primeira constituio

    republicana.

    1890 Regulamento Alvim

    Rep

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  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    30

    A primeira constituio republicana criou o sistema

    presidencialista, em que o presidente e o vice-presidente

    deveriam ser eleitos pelo sufrgio direto da nao, por maioria

    absoluta de votos.

    Alm disso, atribuiu ao Congresso Nacional a

    competncia de legislar sobre o processo eleitoral para

    os cargos federais em todo o pas, deixando aos estados a

    responsabilidade para regulamentar as eleies estaduais e

    municipais. Em decorrncia dessa autonomia, houve variao nas regras eleitorais entre os estados, consolidando-se, assim,

    a descentralizao da dinmica eleitoral.

    A Lei n 35, de 26 de janeiro de 1892, foi a primeira Lei Eleitoral da Repblica e estabeleceu o processo para as

    eleies federais.

    Ela instituiu o voto limitado e o voto distrital de trs

    deputados por distrito. A justificativa, ao estabelecer o voto

    limitado, era a mesma desde os tempos do Imprio: garantir

    representao s minorias. Pelos instrumentos legais anteriores,

    v-se que a efetividade dessa medida era no mnimo duvidosa,

    tendo em vista os procedimentos eleitorais que asseguravam a

    vitria dos candidatos do governo.

    Foi a primeira lei que estabeleceu as condies de

    elegibilidade para o cargo de presidente, quais sejam: ser

    brasileiro nato com mais de 35 anos de idade e estar na posse

    dos direitos polticos.

    1891

    1892

    Constituio

    Lei n 35

  • 31

    O alistamento continuava sendo feito em duas etapas:

    as comisses secionais preparavam a lista que era finalizada

    por uma comisso municipal. Os integrantes das comisses

    secionais eram eleitos pelos membros do governo municipal,

    sendo a comisso municipal formada pelo presidente do

    governo municipal e um representante de cada uma das

    comisses secionais.

    A Lei n 426, de 7 de dezembro de 1896, introduziu a possibilidade do voto a descoberto. O interessante que essa

    lei (formalmente) no eliminou o voto secreto, mas permitia,

    caso o eleitor quisesse, votar a descoberto. Alm de declarar seu

    voto em pblico, a lei previa um dispositivo pelo qual o eleitor

    recebia uma segunda via do voto devidamente certificada

    pela mesa atestando em quem o eleitor tinha votado. Vale a

    pena ler o trecho da lei:

    Art. 8 Ser licito a qualquer eleitor votar por voto

    descoberto, no podendo a Mesa recusar-se a acceital-o.

    Paragrapho unico. O voto descoberto ser dado,

    apresentando o eleitor duas cedulas, que assignar perante

    a Mesa, uma das quaes ser depositada na urna e a outra

    lhe ser restituida depois de datada e rubricada pela Mesa e

    pelos fiscaes.

    Essa alterao funcionou como uma estratgia legal

    para facilitar a articulao do que ficou conhecido como voto

    de cabresto, j que o voto a descoberto abria espao para o

    exerccio de prticas polticas de controle eleitoral.

    1896 Lei n 426

    Rep

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  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    32

    A Lei n 1.269, de 15 de novembro de 1904, conhecida

    como Lei Rosa e Silva, reformou a legislao eleitoral,

    revogando toda a anterior. Manteve o voto limitado e o

    distrital agora com cinco deputados por distrito , alm de

    introduzir o voto cumulativo(B).

    Embora a influncia poltica no tenha sido mitigada,

    a lei mudou a composio das comisses de alistamento

    que passaram a ser assim formadas: juiz de direito, dois dos

    maiores contribuintes de imposto predial, dois dos maiores

    contribuintes sobre a propriedade rural e trs cidados eleitos

    pelo governo municipal. Para ser eleito, o cidado deveria

    saber escrever e ler, fazendo prova disso apondo em livro

    especial as seguintes informaes pessoais: nome, filiao,

    idade, profisso e residncia.

    O voto continuava secreto moda da Lei n 426, de 1896,

    ou seja, era possvel tambm o voto a descoberto nos mesmos

    termos daquela lei.

    A Lei n 3.139, de 2 de agosto de 1916, confiou o alistamento

    dos eleitores exclusivamente ao Poder Judicirio. Alm disso,

    aumentou o rigor quanto comprovao da documentao

    exigida para a qualificao, devendo o eleitor provar: idade,

    capacidade de assegurar sua subsistncia, residncia por mais de

    dois meses no municpio e demonstrao de saber ler e escrever.

    1904

    1916

    Lei Rosa e Silva

    Lei n 3.139

  • 33

    Memria sobre as eleies na Primeira Repblica

    A memria de um acontecimento passado sempre construda a partir da

    nossa situao no presente. possvel que lembremos um fato de uma forma hoje e

    de outra dez anos depois. Com a histria parecido. A memria construda sobre as

    eleies na Primeira Repblica foi muito marcada pelo projeto de homens e mulheres

    engajados no movimento conhecido como Revoluo de 1930. Vejamos.

    Essa imagem do voto como instrumento de controle dos coronis deve-se, em

    parte, memria que se construiu sobre a Primeira Repblica a partir da Revoluo de

    1930, nos fazendo enxergar somente uma parte da histria da poca. Assim, as eleies,

    os parlamentos, os partidos polticos e os variados tipos de associativismo desse perodo

    foram quase sempre desqualificados ou considerados ineficientes e desnecessrios. Dessa

    forma, a Revoluo de 1930 tornava-se o smbolo da modernizao em contraposio a

    uma Repblica atrasada e dominada pelas oligarquias.

    Assim, durante muito tempo, esse perodo foi visto como uma espcie de idade

    das trevas eleitoral. As eleies eram consideradas nada mais do que mera legitimao,

    por meio de artifcios fraudulentos, do poder de elites tradicionais. A expresso voto

    de cabresto, com suas inmeras ilustraes, recorrente ainda hoje para explicar o

    perodo. Entretanto, bom lembrar que essa imagem eleitores conduzidos fora

    s sees eleitorais pelos jagunos de poderosos coronis no pode ser vista como

    uma fotografia da experincia eleitoral do perodo. claro que fraudes e violncia

    eram elementos recorrentes, mas as eleies no se reduziam a isso. Elas tinham um

    papel estratgico, permitindo uma relativa circulao de elites, estabelecendo um

    mnimo de competio e renovao no mundo poltico. Elas tambm eram capazes

    de mobilizar mesmo que de forma incipiente os eleitores, fundamentando um

    aprendizado poltico.

    Alm disso, preciso reconhecer que a atuao poltica maior do que a

    experincia eleitoral. E o perodo conhecido como Primeira Repblica foi palco de

    diversas manifestaes de atuao popular, dentre as quais: Revolta da Chibata,

    Revolta da Vacina, Guerra de Canudos, Contestado, Greve de 1917, para citar algumas.

    Rep

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  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    34

    Informaes adicionais

    (A) Mulheres: o exerccio do voto foi associado aos papis sociais atribudos s

    mulheres. Isso significa que, durante boa parte de nossa histria, as mulheres

    no puderam votar, conquistando esse direito somente a partir de 1932. Antes,

    contudo pelo menos desde 1890 , j se discutia sobre a extenso desse direito

    s mulheres, e durante as prvias da primeira constituio republicana muita tinta

    correu sobre o assunto. As primeiras eleitoras a se alistarem no Brasil eram mulheres

    do Estado do Rio Grande do Norte, que, aps processo judicial, conseguiram realizar

    o registro para a eleio que ocorreria em 1928. Ainda que os votos delas tenham

    sido descontados por inapurveis, eles marcam a maior movimentao que essas

    questes causavam na sociedade. Para saber mais sobre o voto da mulher, leia o

    texto complementar Voto das mulheres.

    (B) Voto cumulativo: aquele em que o eleitor ou votante dispe de mais de um

    voto, podendo dar ao mesmo candidato o nmero de votos que lhe possam ser

    atribudos, nele cumulando os votos que poderiam ser distribudos entre vrios

    candidatos. Fonte: glossrio eleitoral, disponvel no Portal TSE.

  • 35

    Refundao da Repblica (1930-1937)

    O fim dos anos 1920 representou uma ruptura institucional, com grandes

    consequncias para a vida nacional, cujos marcos orientadores foram: maior

    participao de novos atores sociais no jogo poltico e modernizao do pas por

    meio do desenvolvimento industrial. No que interessa histria da Justia Eleitoral, a

    principal bandeira levantada pelo movimento de 1930 foi a moralizao das eleies.

    Foi nesse contexto que nasceu a Justia Eleitoral.

    Nascimento da Justia Eleitoral

    A ideia de criar um rgo independente para cuidar exclusivamente das eleies

    bem razovel, especialmente quando se tem como tradio a prtica de fraudes eleitorais

    desde o Imprio. Mas que razes levaram criao de um ramo especializado dentro do

    Poder Judicirio para administrar as eleies e julgar questes relativas matria eleitoral?

    Mesmo antes da criao da Justia

    Eleitoral, havia a sinalizao de que a moralizao

    das eleies passava pela perda de ingerncia do

    Executivo e do Legislativo e pelo aumento das

    atribuies do Judicirio no processo eleitoral.

    Tanto isso verdade que, em 1916, o Presidente

    Wenceslau Brs, preocupado com a seriedade

    do processo eleitoral, sancionou a Lei n 3.139,

    que entregou ao Poder Judicirio o preparo do

    alistamento eleitoral.

    Em 1932 concretizada a ideia

    de centralizar no Poder Judicirio(A)

    o gerenciamento das eleies. A partir dessa data, a Justia Eleitoral tornou-se

    responsvel por todos os trabalhos eleitorais: alistamento, organizao das mesas de

    votao, apurao dos votos, reconhecimento e proclamao dos eleitos, bem como

    o julgamento de questes que envolviam matria eleitoral.

    Primeiro prdio a sediar as sesses do Tribunal Superior de Justia Eleitoral.

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    O primeiro Cdigo Eleitoral

    A demanda social por eleies limpas e confiveis era tamanha que um dos

    primeiros atos do Governo Provisrio foi a criao de uma comisso de reforma da

    legislao eleitoral, cujo trabalho resultou na elaborao do primeiro Cdigo Eleitoral

    do Brasil.

    As principais inovaes trazidas pelo cdigo foram o voto feminino facultativo,

    a fixao definitiva do voto secreto(B), a instituio do sistema representativo

    proporcional(C) e a regulao em todo pas das eleies federais, estaduais e municipais.

    Apesar de continuar sendo possvel a eleio de candidatos sem partido, pela primeira

    vez os partidos polticos foram mencionados em legislao eleitoral, sendo obrigatrio

    o registro prvio de todas as candidaturas. O Cdigo de 1932 no ficou isento de crticas,

    especialmente no que se refere ao processo de qualificao(D). Alm disso, vale

    ressaltar que permaneciam restries ao pleno exerccio da cidadania, dentre as quais

    a impossibilidade de votarem os analfabetos, mendigos e praas de pr.

    Cdigo Eleitoral de 1932 Foto: Carlos Humberto

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  • 37

    A Lei n 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, criou a

    Justia Eleitoral para que ela fosse a nica responsvel por

    todo o processo eleitoral: do alistamento proclamao

    dos eleitos.

    Alm disso, o cdigo possibilitou, pela primeira vez

    no pas, s mulheres o direito a votar, mas, por outro lado,

    manteve grave obstculo universalizao do voto ao

    continuar proibindo o voto do analfabeto.

    Um aspecto interessante do cdigo diz respeito

    qualificao eleitoral, que podia ocorrer por iniciativa do

    eleitor ou de ofcio.

    Apesar de ainda ser possvel a candidatura avulsa, o

    cdigo j mencionava a possibilidade de os partidos polticos

    registrarem seus candidatos para concorrerem ao pleito. Em

    todo caso, era sempre obrigatrio o registro prvio de quem

    desejava concorrer a cargos eletivos.

    O Decreto n 22.621, de 5 de abril de 1933,

    convocou a populao a votar em seus representantes

    para a Assembleia Nacional Constituinte e fixou o nmero

    de deputados em 251, que deveriam ser eleitos de forma

    mista: 214 segundo as normas do Cdigo Eleitoral e 40

    representantes de categorias profissionais, o que ficou

    conhecido como representao classista(E).

    Explore o infogrfico para conhecer mais sobre a legislao eleitoral do perodo.

    1932

    1933

    Cdigo Eleitoral

    Decreto n 22.621

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    A Constituio de 1934, de 16 de julho, manteve a Justia

    Eleitoral e estabeleceu o voto secreto e universal, embora a

    vedao ao voto do analfabeto fosse mantida.

    A Lei n 48, de 4 de maio de 1935, reformou o Cdigo

    Eleitoral de 1932. As principais alteraes foram: reduo da

    idade mnima para votar de 21 para 18 anos; obrigatoriedade

    de voto das mulheres que exerciam funo pblica remunerada

    e a limitao candidatura avulsa: s podia se candidatar sem

    partido poltico quem registrasse sua candidatura mediante

    requerimento de um nmero mnimo de eleitores.

    Esse Cdigo Eleitoral nunca foi aplicado, em funo da

    interrupo da ordem democrtica, em 1937, com o golpe

    do Estado Novo.

    1934

    1935

    Constituio

    Cdigo Eleitoral

  • 39

    Extino e recriao da Justia Eleitoral

    Em 10 de novembro de 1937, sustentado por setores

    sociais conservadores, Getlio Vargas anuncia, pelo rdio, a

    Nova Ordem do pas. Outorgada nesse mesmo dia, a polaca,

    como ficou conhecida a Constituio de 1937, extinguiu

    a Justia Eleitoral, aboliu os partidos polticos existentes,

    suspendeu as eleies livres e estabeleceu eleio indireta

    para presidente da Repblica, com mandato de seis anos.

    Durante o perodo de 1937 a 1945, conhecido como Estado

    Novo, no houve eleies no Brasil. As casas legislativas

    foram dissolvidas e a ditadura governou com interventores

    nos estados.

    A exacerbao da contradio vivenciada pelo regime varguista que

    impunha, internamente, uma ditadura aos brasileiros, mas, externamente, apoiava

    as democracias ocidentais na luta contra o nazifascismo na Segunda Guerra Mundial

    gerou manifestaes de descontentamento com o regime.

    Sem conseguir prolongar a ditadura, em 1945, Getlio anuncia eleies gerais e

    lana como seu candidato Eurico Gaspar Dutra, ministro da Guerra. Desconfiados das

    reais intenes de Vargas, oposio e cpula militar se articulam e do o golpe, em 29

    de outubro de 1945, destituindo Getlio. Como na Constituio de 1937 no havia a

    figura do vice-presidente, a Presidncia da Repblica foi ocupada pelo ento presidente

    do Supremo Tribunal Federal1, Jos Linhares, at eleio e posse do novo presidente da

    Repblica, que viria a ser o general Dutra, em janeiro de 1946. Era o fim do Estado Novo.

    1 http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=sobreStfConhecaStfInstitucional.

    Jos Linhares. Em maio de 1945 passou a presidir o Tribunal Su-perior Eleitoral. Providenciou a instalao desse Tribunal no an-tigo Palcio Monroe, no Rio de Janeiro, em 1 de junho de 1945.

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    A volta da Justia Eleitoral

    Foi nesse cenrio poltico que

    a Justia Eleitoral foi reinstalada

    definitivamente. O Cdigo Eleitoral

    de 1945, conhecido como Lei

    Agamenon, restabeleceu a Justia

    Eleitoral, regulando em todo o

    pas o alistamento eleitoral e as

    eleies. Sua principal novidade foi

    a obrigatoriedade de os candidatos

    estarem vinculados a partidos polticos.

    Esse cdigo orientou a eleio para a Assembleia Nacional Constituinte de 1945 e as

    eleies diretas para todos os cargos nos trs nveis de governo.

    O trabalho que vinha pela frente era grande. Afinal, da data em que foi publicado

    o Cdigo Eleitoral (28.5.1945) at o dia do pleito para cargos federais (2.12.1945) eram

    menos de 200 dias, pouco mais de seis meses. Alm disso, a Resoluo-TSE n 1 fixava

    o dia 2.7.1945 como incio do alistamento dos eleitores, para o que recomendava que

    todos os tribunais regionais estivessem instalados at o dia 16.6.1945. Essa ordem

    comeou a ser cumprida e os tribunais regionais comearam a ser instalados: em

    So Paulo, em 6.6.1945; na Bahia, em 8.6.1945; no Par, em 6.6.1945; e no Rio Grande

    do Sul, em 8.6.1945.

    Promulgada a Constituio, em 18 de setembro de 1946, a Cmara dos

    Deputados e o Senado Federal passaram a funcionar como Poder Legislativo ordinrio.

    A Constituio, a exemplo da de 1934, consagrou a Justia Eleitoral entre os rgos do

    Poder Judicirio e proibiu a inscrio de um mesmo candidato por mais de um estado.

    O Palcio Monroe foi a primeira sede do Tribunal Superior Elei-toral aps a reinstalao da Justia Eleitoral em 1945.

    Font

    e: a

    cerv

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    Arq

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    Sena

    do F

    eder

    al

  • 41

    Informaes adicionais

    (A) Poder Judicirio: voc sabia que o Brasil no foi o primeiro pas a confiar

    as eleies ao Poder Judicirio? As eleies estavam relacionadas ao Judicirio

    tambm em outros pases, como Inglaterra (desde 1868), Portugal (por lei de

    1896), Alemanha, Prssia, ustria, Grcia, Polnia, Tchecoslovquia, Uruguai

    e Argentina. Exemplos internacionais foram lembrados inclusive durante as

    discusses para elaborao do Cdigo Eleitoral, como inspirao para o modelo

    a ser adotado no Brasil.

    (B) Voto secreto: os anos 1920 foram marcados no Brasil pela tentativa de

    disciplinarizao da vida urbana, com nfase na investigao e higienizao

    dos corpos. Foi a poca da destruio das moradias coletivas (cortios) por

    serem consideradas locais sujos, focos de proliferao de doenas fsicas e de

    comportamentos moralmente inadequados. O Estado tinha o objetivo de formar um

    homem novo: saudvel, trabalhador, cumpridor dos seus compromissos como chefe

    de famlia e como cidado virtuoso. A nova tica eleitoral inaugurada pelo Cdigo

    de 1932 concorria para formar esse novo homem. Um exemplo disso foi o novo

    carter do voto secreto, formado a partir de duas estratgias: o envelope uniforme

    oficial, que no poderia ter marcas que o identificasse, dentro do qual seria inserida

    a cdula; e o gabinete indevassvel, uma cabine que isolaria o cidado no momento

    do envelopamento da cdula. Tais estratgias foram responsveis pela construo

    de um simbolismo em torno do individualismo do voto.

    O eleitor de massa, sem vontade prpria, que servia apenas aos interesses

    dos poderosos da Primeira Repblica, passa a ser um cidado que deveria ser

    protegido de qualquer investida externa que maculasse o exerccio de expresso

    da sua vontade. Alm do gabinete indevassvel e dos envelopes oficiais, a

    previso no Cdigo de 1932 do uso da mquina de votar aparece como o pice

    desse processo de modelao do cidado eleitor.

    Rep

    blic

    a

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    42

    (C) Sistema representativo proporcional: o sistema eleitoral proporcional,

    segundo a Constituio, utilizado para a composio do Poder Legislativo,

    com exceo do Senado Federal. Assim, as vagas nas cmaras de vereadores,

    assembleias legislativas dos estados, Cmara Legislativa do Distrito Federal e na

    Cmara dos Deputados sero distribudas em proporo aos votos obtidos pelos

    partidos ou coligaes partidrias.

    A partir dos votos apurados para determinada legenda, as vagas nas casas legislativas

    sero preenchidas pelos candidatos mais votados da lista do partido ou coligao, at

    o limite das vagas obtidas, segundo o clculo do quociente partidrio e distribuio

    das sobras. Fonte: glossrio eleitoral, disponvel no Portal TSE.

    (D) Qualificao: a qualificao dos eleitores podia ocorrer de duas formas:

    por iniciativa do prprio eleitor ou ex officio, por iniciativa dos rgos pblicos.

    A segunda forma podia ocorrer sempre que os eleitores fossem magistrados,

    militares ou servidores pblicos civis. A justificativa utilizada para esse modelo de

    qualificao era a necessidade de ampliao do eleitorado brasileiro. Na ltima

    eleio da Primeira Repblica, o eleitorado correspondia a 5,6 % da populao

    brasileira. (CARVALHO, 2007, p. 40). Por outro lado, a crtica qualificao ex officio

    se baseava na desconfiana de que os rgos pudessem exercer influncia sobre a

    vontade dos eleitores. Para corrigir essa falha, dentre outras, que foi promulgada

    a Lei n 48, de 4 de maio de 1935, o segundo Cdigo Eleitoral brasileiro, que

    manteve as vrias conquistas do Cdigo de 1932.

    (E) Representao classista: voc sabia que a Constituio de 1934 foi

    elaborada por representantes de diversas classes sociais? Atendendo s

    presses de diversos segmentos sociais, o Governo Provisrio, por meio do

    Decreto n 22.621/1933, disps sobre a convocao da Assembleia Nacional

    Constituinte que, alm de elaborar a nova Constituio, teria poderes para

    aprovar os atos do Governo Provisrio e eleger o presidente da Repblica.

    A eleio dos constituintes era hbrida: dos 254 deputados que deveriam

    ser eleitos, 214 seriam escolhidos de acordo com o que determinava

    o Cdigo Eleitoral e 40 seriam eleitos pelos sindicatos legalmente

    reconhecidos, pelas associaes de profissionais liberais e de funcionrios

    pblicos. Inaugurava-se a chamada representao classista.

  • 43

    A Repblica democrtica (1945-1964)

    Era das campanhas eleitorais

    Entre o fim do Estado Novo, em 1945, e o golpe militar, em 1964, o Brasil teve

    nove presidentes entre titulares, interinos e vices que sucederam a presidentes

    e passou por alguns episdios que poderiam desembocar em interrupo da

    ordem democrtica. De forma bem simples, pode-se dizer que o movimento que

    conduziu ao golpe de estado ocorrido em 1964 foi tentado antes em 1951(A),

    1954(B), 1956(C) e 1961(D). Durante esse perodo, a legislao eleitoral continuou

    a trazer novos elementos cena poltica.

    A exclusividade dos partidos polticos na apresentao das candidaturas,

    somada obrigatoriedade do voto(E) em sufrgio universal, levou ao

    estabelecimento de novas relaes entre candidatos e eleitores. Antes limitada ao

    convencimento de uma restrita parcela da populao que detinha direito ao voto, as

    campanhas passaram a ganhar, nesse perodo, cada vez mais importncia. Isso ocorreu

    num cenrio em que, por um lado, o eleitorado se ampliava(F) para incluir novos

    atores sociais e, por outro, os partidos polticos(G) se defrontavam com a necessidade

    de convencer os eleitores.

    Abriu-se ento um leque de novas prticas relacionadas a essas necessidades.

    Por exemplo, os panfletos de manifestos polticos passaram a ser panfletos de

    propaganda, os comcios microfonados se tornaram parte do cenrio urbano, os

    candidatos comearam a distribuir apertos de mo e sorrisos. Nesse aspecto, nota-se

    uma preocupao cada vez maior dos candidatos com suas imagens.

    O cidado-eleitor

    A obrigatoriedade do voto, nesse perodo, fez parte da tentativa de engajar uma

    populao ainda muito distanciada das estruturas e identidades nacionais a um

    projeto de nao. Mas como convencer tal populao de que ela deveria integrar um

    Rep

    blic

    a

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    44

    todo maior, uma comunidade imaginria, ou seja, um Estado nacional? Para isso, seria

    necessrio persuadi-la sobre a ideia de que, na qualidade de cidados e cidads, todos

    precisavam participar do jogo poltico necessrio construo de um pas democrtico.

    Ser cidado, nessa poca, era o poder-dever de escolher seus representantes. A

    superposio desses dois personagens o eleitor e o cidado num nico indivduo

    acarretou a disciplinarizao das expresses polticas em torno do calendrio eleitoral.

    Em outras palavras, buscava-se direcionar as expresses polticas para os aparatos

    eleitorais, tornando cada vez mais distante do iderio do Estado daquela poca a

    possibilidade de entender como cidads outras prticas polticas (grandes comoes

    populares, barricadas) que no aquelas abrigadas pelo sistema eleitoral oficial.

    Explore o infogrfico a seguir para conhecer mais sobre a legislao do perodo.

    O Cdigo de 1945, tambm conhecido como Lei

    Agamenon, mantinha a possibilidade de qualificao e

    inscrio do eleitor ex officio, ou seja, estavam autorizados

    a realiz-las os chefes de reparties pblicas mesmo de

    entidades autrquicas, paraestatais ou de economia mista

    e os titulares das sees da Ordem dos Advogados e dos

    conselhos regionais de engenharia e arquitetura.

    Alm disso, o Cdigo de 1945 trouxe disposies

    especficas que visavam garantir o sigilo do voto, dentre as

    quais est o emprego de sobrecartas oficiais, uniformes e

    opacas. No mesmo sentido de moralizar os pleitos, o cdigo

    determinava que o cidado, caso se inscrevesse mais de uma

    vez com vistas a burlar o processo eleitoral, seria submetido

    pena de deteno de trs meses a um ano; se tentasse votar

    mais de uma vez ou votar no lugar de outro eleitor, a pena

    seria de deteno de seis meses a um ano.

    1945 Decreto-Lei n 7.586

  • 45

    No que se refere aos partidos polticos, o cdigo trouxe

    duas inovaes importantes: a exclusividade da candidatura por

    meio dos partidos polticos (foi proibida a candidatura avulsa) e a

    exigncia de que os partidos tivessem carter nacional.

    Na dcada de 1950, algumas inovaes legais foram

    introduzidas. O Cdigo de 1950 inseriu critrios para a

    padronizao de cdulas e acabou com o alistamento ex officio.

    Em 1955, a Lei n 2.250 criou a folha individual de votao,

    que fixou o eleitor na mesma seo eleitoral e aboliu, entre outras,

    a fraude do uso de ttulo falso ou de segunda via obtida de modo

    doloso. No mesmo ano, a Lei n 2.582 criou a cdula de votao

    oficial, embora fosse facultado aos partidos polticos fabricar e

    distribuir cdulas de acordo com o modelo enunciado pela lei.

    A cdula oficial guardou a liberdade e o sigilo do voto, facilitou a

    apurao dos pleitos e contribuiu para combater a influncia do

    poder econmico, liberando os candidatos de vultosos gastos

    com a impresso e a distribuio de cdulas.

    1950

    1955

    Lei n 1.164

    Lei n 2.250

    Informaes adicionais

    (A) 1951: em 1950, aps a proclamao da vitria de Vargas, seus adversrios

    tentaram impedir a sua posse utilizando-se do argumento de que ele no

    arregimentara metade mais um dos votos o que, alis, a Constituio em vigor

    no estabelecera.

    (B) 1954: no final de agosto de 1954, oficiais da Aeronutica exigiram, por

    meio de um manifesto, a sada do Presidente Vargas. Logo depois, seria a vez

    do Exrcito. Sem sustentao poltica e progressivamente isolado, Vargas no

    admitiria renunciar, optando pelo suicdio no dia 24 daquele ms.

    Rep

    blic

    a

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    46

    (C) 1956: com a vitria de Juscelino Kubitschek e Joo Goulart, foi iniciada uma

    campanha para impedir-lhes a posse. Com o intuito de garantir a posse dos eleitos,

    foi organizado o Movimento de 11 de Novembro, no qual se destacou o General

    Henrique Teixeira Lott, ministro da Guerra, que se posicionou a favor da legalidade,

    ou seja, pela posse dos eleitos. Em janeiro de 1956, a chapa vitoriosa foi empossada.

    (D) 1961: em 1961, com a renncia de Jnio Quadros Presidncia, Joo Goulart,

    vice-presidente eleito, deveria assumi-la, porm os militares iniciaram um

    movimento para impedir sua posse. Apesar de terem perdido a batalha, pois Jango

    assumiu a Presidncia em 7 de setembro de 1961, os militares garantiram que o

    presidente governaria com poderes reduzidos, em virtude de o sistema de governo

    ter passado de presidencialista a parlamentarista, tendo assim permanecido at

    1963, quando, aps plebiscito, retornou ao sistema presidencialista. Seu governo

    foi marcado pela abertura s organizaes sociais, o que levou grande parte da

    sociedade brasileira desconfiando que pudesse estar presenciando o incio da

    instalao de um estado socialista no Brasil a apoiar a movimentao militar que

    redundaria no Golpe de 1964.

    (E) Exclusividade dos partidos e obrigatoriedade de voto: a exclusividade

    dos partidos polticos inovao do Cdigo Eleitoral de 1945, j a obrigatoriedade

    do voto consta desde 1935. Nenhuma eleio, porm, ocorreu sob a vigncia

    do Cdigo de 1935. Em 1945, a obrigatoriedade foi resgatada no texto da Lei

    n 7.586. Doravante, todos os que fossem aptos para o exerccio do voto seriam

    obrigados a exercer esse direito, fossem homens ou mulheres (a menos que

    fossem mendigos, alguns tipos especficos de militares, invlidos, maiores de

    65 anos, magistrados, funcionrios pblicos que estivessem viajando de frias

    ou mulheres que no possussem profisso lucrativa art. 4).

    (F) Ampliao do eleitorado: a ampliao do eleitorado se deveu, principalmente,

    reduo da idade mnima para votar, de 21 para 18 anos, e imposio da

    obrigatoriedade do voto. Apesar disso, o eleitorado que compareceu s urnas em

    1945 para escolher o presidente da Repblica ainda era pequeno (apenas 15 %

    da populao total), o que talvez fosse explicado pela manuteno da vedao ao

    voto do analfabeto1.

    1 Para mais informaes sobre a estatstica do eleitorado entre 1910 e 1986, acesse: http://seculoxx.ibge.gov.br.

  • 47

    (G) Partidos polticos: nessas novas circunstncias, nas quais os meios de

    comunicao de massa sobressaem na articulao do relacionamento entre

    candidato e eleitor, importante falar do papel dos partidos polticos, que

    tambm se modifica em razo das novas regras. Assim, os partidos passam a

    adquirir progressivamente uma maior participao nas mobilizaes poltico-

    eleitorais, tendo em vista que as campanhas trouxeram as questes do momento

    para serem discutidas pela sociedade. Alm disso, em razo da exclusividade

    partidria, seriam os partidos aqueles a promover a aglutinao da movimentao

    poltica em funo das plataformas e projetos de cada grupo. Algo interessante

    decorreu a partir da. Essa aglutinao de parcelas da populao formou um

    verdadeiro universo de identidades sociais, relacionadas s associaes poltico-

    partidrias e seus smbolos. Quer dizer, com base nessa formao de identidades

    que possvel, nos tempos mais recentes, pessoas se declararem petistas,

    peemedebistas, tucanas, entre outras coisas, e que elas se movam dentro dessas

    significaes compartilhadas, adotando posturas e prticas de acordo com o seu

    alinhamento poltico-partidrio.

    Rep

    blic

    a

  • 49

    Regime Militar (1964-1985)

    O perodo que vai de 1964 a 1985 foi marcado, no Brasil, por uma combinao

    entre expanso dos direitos sociais(A), reduo drstica dos direitos civis(B) e

    restries aos direitos polticos(C). Embora os direitos sociais tenham sido tratados

    como concesses por parte do governo, na prtica, tais direitos tinham sido resultado

    de reivindicaes populares.

    DireitosSociais

    Direitos Civis

    Direitos Polticos

    Voto no laboratrio: as eleies no Regime Militar

    Durante o Regime Militar foram realizadas, para todos os cargos, eleies

    diretas e indiretas, conforme as hipteses legais(D). A existncia de eleies durante

    esse perodo especialmente para o Congresso Nacional tinha uma dupla funo:

    legitimar as decises do governo, j que, pelo menos formalmente, existia oposio;

    e servir como uma espcie de laboratrio eleitoral(E), no qual a populao podia

    exercer controladamente o direito de votar.

    Rep

    blic

    a

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    50

    Vale ressaltar, no entanto,

    que a tentativa do Regime

    em dar legitimidade s suas

    decises por meio da ampliao

    do eleitorado esbarrou no alto

    nmero de abstenes, votos

    nulos e brancos(G). Isso pode ter

    significado, de algum modo, certo

    descrdito por parte dos eleitores

    em relao utilidade prtica de

    seu voto. Esse comportamento

    eleitoral seria um reflexo do papel

    imposto ao parlamento poca? Qual era esse papel?

    O Congresso Nacional deveria, por um lado, legitimar as decises tomadas

    pelo governo e, por outro, ser um espao onde alguns direitos polticos podiam

    ser exercitados, mas sempre dentro dos limites definidos previamente. Para

    sustentar esse experimento, um instrumento polt ico foi fabricado:

    o bipartidarismo. Por meio dele, o Movimento Democrtico Brasileiro (MDB) (H), a quem

    cabia exercer uma oposio controlada, se opunha Aliana Renovadora Nacional (Arena),

    cujo papel era o de referendar as decises tomadas pela cpula militar.

    Tentaremos explicar o experimento eleitoral de que falamos h pouco por meio

    da anlise de dois ingredientes: a ampliao do eleitorado e o papel desempenhado

    pelo Congresso Nacional.

    Entre os anos de 1966 e 1982, o eleitorado brasileiro aumentou 163%, o

    que no pode ser bem compreendido apenas luz das sanes impostas a quem

    no se alistasse, tampouco tendo como referncia o crescimento vegetativo da

    populao(F). Esse aumento, aliado s restries dos direitos polticos no perodo,

    pode ser entendido como uma estratgia de criao de um ambiente onde o ato de

    votar pudesse ser exercido de forma controlada.

    Quarta sede do TSE. Esplanada dos Ministrios, de 1960 a 1971.

    Font

    e: a

    cerv

    o do

    Mus

    eu d

    o TS

    E

  • 51

    Sesso ordinria da Cmara dos Deputados que apro-vou o AI-1.

    Font

    e: C

    mar

    a do

    s D

    eput

    ados

    Processo encaminhado pelo TRE da Guanabara ao TSE em 1968, com sugestes relativas mquina Puntel de votao. Ver mquina de votar ao final do livro (Anexos).

    Font

    e: a

    cerv

    o do

    Mus

    eu d

    o TS

    E

    Explore o infogrfico abaixo para conhecer mais sobre a legislao eleitoral no

    perodo.

    1964 AI-1O Ato Institucional n 1, de 9 de abril de 1964, instituiu

    alteraes Constituio de 1946. Estabeleceu a eleio

    indireta para presidente da Repblica pelo Congresso Nacional.

    Determinou a aprovao de projetos por decurso de prazo:

    projeto de lei enviado pelo presidente ao Congresso deveria ser

    aprovado em 60 dias (30 dias na Cmara e 30 dias no Senado),

    caso contrrio seria considerado aprovado tacitamente. Fixou

    a suspenso de garantias de vitaliciedade dos magistrados e

    estabilidade dos servidores pblicos por seis meses. Tambm

    A efetiva realizao de oposio era, entretanto, muito dificultada pelas

    constantes alteraes na legislao, especialmente relativa matria eleitoral.

    Rep

    blic

    a

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    52

    1965

    1966 AI-3

    AI-2

    autorizou o Comando Supremo da Revoluo a cassar mandatos

    em qualquer nvel e suspender direitos polticos pelo prazo de dez

    anos, vedada a apreciao judicial. O AI n 1 teve vigncia at 31

    de janeiro de 1966.

    O Ato Institucional n 2, de 17 de outubro de 1965,

    disciplinou as formas de emenda Constituio. Manteve

    a aprovao por decurso de prazo, dilatando para 45 dias

    os prazos para os projetos serem aprovados na Cmara e

    Senado. Estabeleceu definitivamente a eleio indireta para

    presidente e vice-presidente da Repblica, que deveria ocorrer

    em votao nominal. Tambm estabeleceu a extino dos

    partidos polticos existentes e o cancelamento dos respectivos

    registros para a organizao de novos partidos, devendo ser

    obedecidas as determinaes da Lei n 4.740/1965. Permitiu

    decretar recesso parlamentar (em todos os nveis) em estado

    de stio ou fora dele, ficando o Poder Executivo responsvel

    por legislar sobre todas as matrias previstas na Constituio

    ou nas leis orgnicas durante o tempo que durasse o recesso.

    O AI n 2 teve vigncia at 15 de maro de 1967.

    O Ato Institucional n 3, de 5 de fevereiro de 1966,

    estabeleceu que os governadores fossem eleitos indiretamente

    pelas assembleias legislativas estaduais e que eles nomeassem os

    prefeitos das capitais, aps aprovao das respectivas assembleias

    legislativas. Sendo assim, apenas nas cidades que no fossem

    capitais os prefeitos seriam eleitos diretamente. No determinou

    limite de vigncia como os atos institucionais anteriores.

  • 53

    O Ato Institucional n 4, de 7 de dezembro de 1966,

    determinou a convocao do Congresso Nacional, que havia

    sido fechado, para votar e promulgar a nova Constituio.

    Embora o 1 do primeiro artigo fale em discusso, votao

    e promulgao, a inteno era mesmo aprovar a Constituio

    sem muitas discusses. o que dispe o art. 8 ao afirmar

    que a Constituio ser promulgada em 24 de janeiro, tendo

    sido apresentadas e aprovadas emendas ou tendo sido

    apresentadas e reprovadas ou se no tiver sido encerrada a

    votao at dia 21 de janeiro.

    O Ato Institucional n 5, de 13 de dezembro de 1968,

    significou o ponto alto da severidade no Regime Militar.

    Determinou a possibilidade de o presidente da Repblica decretar

    o recesso parlamentar, s voltando o Congresso a funcionar

    quando convocado pelo prprio presidente da Repblica.

    Manteve a possibilidade da cassao de direitos polticos e

    de mandatos por at 10 anos. Quem tivesse sido alvo dessas

    cassaes, alm de no exercer seus direitos polticos, poderia

    ter liberdade vigiada, ser proibido de frequentar determinados

    lugares, e possuir domiclio determinado. Suspendeu a garantia

    do habeas corpus para os acusados de crimes contra a segurana

    nacional e das infraes contra a ordem econmica e a economia

    popular. Alm disso, excluiu a apreciao judicial de todos os

    atos praticados de acordo com este Ato institucional e seus atos

    complementares, bem como os respectivos efeitos.

    1966

    1968

    AI-4

    AI-5

    Rep

    blic

    a

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    54

    O Ato Institucional n 14, de 5 de setembro de 1969,

    alterou a Constituio de 1967 para possibilitar a pena de

    morte para os casos de guerra externa, psicolgica adversa ou

    revolucionria ou subversiva.

    A Lei n 4.740, de 15 de julho de 1965, tambm

    conhecida como Lei Orgnica dos Partidos Polticos,

    regulamentou diversos aspectos relativos ao registro e

    funcionamento dos partidos polticos. A personalidade jurdica

    do partido era de direito pblico interno, a ser adquirida por

    meio de registro junto ao Tribunal Superior Eleitoral, ficando

    vedada a existncia de qualquer entidade com fim poltico

    ou eleitoral que no fosse um partido registrado. Limitou a

    participao nos quadros dos partidos aos brasileiros que

    estivessem no exerccio de seus direitos polticos. A ingerncia

    nas atividades partidrias era tamanha que a lei normatizava

    a estrutura dos rgos internos, as condies para a expulso

    dos filiados e, inclusive, a forma de eleio dos diretrios (voto

    direto e secreto).

    Quinta sede do TSE. Praa dos Tribunais Superiores, de 1971 a 2012.

    Foto

    : Nel

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    Jr. F

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    cs/T

    SE

    1969

    1965

    AI-14

    Lei Orgnica dos Partidos Polticos

  • 55

    Abertura lenta e gradual

    Os militares no eram um grupo homogneo, havendo tendncias diferentes

    dentro da corporao. Com a posse do Presidente Geisel, em 1974, foi iniciada a

    distenso poltica definida como lenta, gradual e segura. Esse processo de abertura

    foi cheio de idas e vindas.

    Havia um embate entre os segmentos sociais de oposio, que vinham se

    unificando na luta contra as arbitrariedades do regime, e a linha dura dos militares que

    no queriam a abertura. A meio caminho estava o Presidente Geisel que planejava a

    distenso poltica, sem a imediata tomada do poder pela oposio.

    Para atingir essa abertura gradual, foram tomadas algumas medidas:

    Fim do AI-5

    Fim da censura prvia

    Restabelecimento do habeas corpus para crimes polticos

    Atenuao da Lei de Segurana Nacional

    Permisso da volta de 120 exilados polticos

    Essas medidas de abertura, aliadas vitria da oposio nas eleies para

    governador em 1982 e ao prprio esgotamento do Regime Militar culminaram na

    eleio, em 1985, do primeiro presidente civil desde 1964. O prximo texto conta

    como ocorreu o processo de transio para a democracia. Antes de chegarmos a ele,

    explore as leis do perodo por meio do infogrfico a seguir.

    A Lei n 6.339, de 1 de julho de 1976, barrou o acesso

    dos candidatos ao rdio e televiso. Os partidos s poderiam

    apresentar o nome, nmero, currculo dos candidatos e uma

    fotografia, no caso da TV.

    1976 LeiFalco

    Rep

    blic

    a

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    56

    A Emenda Constitucional n 11, de 13 de outubro de

    1978, foi responsvel pela revogao do AI-5, ficando proibido o

    Executivo de determinar recesso parlamentar, cassar mandatos,

    demitir servidores pblicos e privar os cidados dos direitos

    polticos. Restaurou em sua plenitude o direito a manejar habeas

    corpus e representou um abrandamento das restries impostas

    pelo regime. Apesar disso, criou a figura das salvaguardas, pelas

    quais o Poder Executivo poderia decretar estado de emergncia

    e tomar medidas para restabelecer a paz e a ordem em locais

    atingidos por calamidades e fortes perturbaes.

    O pacote foi um conjunto de medidas baixadas em abril

    de 1977 depois de Geisel ter fechado o Congresso por no

    ter conseguido aprovar algumas alteraes constitucionais.

    Dentre elas, estava a criao do senador binico com objetivo

    de impedir que o MDB conseguisse ter maioria no Senado.

    Os senadores binicos foram eleitos indiretamente por um

    colgio eleitoral composto de forma a dificultar a vitria da

    oposio. Alm disso, o critrio de representao foi alterado,

    fazendo com que os estados do nordeste elegessem maior

    nmero de deputados do que os do centro-sul. Tambm

    estendeu as restries da Lei Falco s eleies para os

    legislativos Municipal e Estadual, alterando o mandato do

    presidente de cinco para seis anos.

    1978

    1977

    Emenda Constitucional n 11

    Pacote de Abril

  • 57

    A Lei n 6.767, de 20 de dezembro de 1979, modificou

    a LOPP anterior (Lei n 5.682 de 21.7.1971). Extinguiu o MDB

    e a Arena, e permitiu o surgimento de novos partidos, que

    deveriam incluir a palavra partido em suas denominaes. A

    designao de partido no poderia ser utilizada com base em

    crenas religiosas ou sentimentos de raa ou classe. Tambm

    prescreveu os requisitos para a formao desses partidos,

    bem como regulou as estruturas internas de funcionamento.

    1979 Lei Orgnica dos Partidos Polticos

    Rep

    blic

    a

    Informaes adicionais

    (A) Direitos sociais: os militares foram responsveis pela universalizao da

    previdncia social por meio da criao, em 1971, do Fundo de Assistncia Rural

    (Funrural). A partir dessa data, os trabalhadores rurais passaram a ter direito

    a aposentadoria, penso e assistncia mdica. Embora os valores pagos pela

    previdncia no fossem altos, eram iguais ou maiores aos recebidos pelo trabalho

    no campo. Alm disso, foram incorporadas duas categorias profissionais

    previdncia: empregadas domsticas e trabalhadores autnomos. Sem dvida,

    a universalizao da previdncia representou importante avano para incluso

    social de grupos que, at ento, no recebiam ateno do Estado. Por outro

    lado, registram-se limitaes a alguns direitos, como a proibio de greves e a

    possibilidade de interveno nos sindicatos.

    (B) Direitos civis: por meio de uma ordem jurdica instalada durante todo o

    perodo do Regime Militar os atos do governo foram revestidos de aspecto legal,

    por meio dos atos institucionais , muitas garantias civis foram violadas, dentre

    as quais: liberdade de expresso, limitao ao direito de ir e vir, e direito ampla

    defesa e ao contraditrio.

    (C) Direitos polticos: a realizao de eleies como mtodo para escolha dos

    governantes e representantes no exclusividade da democracia, tendo ocorrido

    em regimes autoritrios. Sendo assim, as eleies ocorridas durante o Regime

    Militar no devem significar o pleno exerccio dos direitos polticos, j que muitos

    deles foram cerceados, dentre os quais o de votar e ser votado; o de reunir-se;

    o de manifestar livremente o pensamento; e o de organizar partidos polticos.

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    58

    (D) Hipteses legais: no perodo do Regime Militar, conviveram eleies diretas

    e indiretas. A escolha do presidente da Repblica e governadores dos estados era

    realizada pelos membros do Congresso Nacional e das Assembleias Legislativas, com

    votao aberta. Eram diretas as eleies para o Legislativo Federal, Estadual e Municipal.

    As eleies tambm eram diretas para a escolha dos prefeitos, exceto na capital dos

    estados e nas cidades consideradas de segurana nacional. Para conhecer a cronologia

    eleitoral no perodo, acesse http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores e clique

    em Cronologia das eleies.

    (E) Laboratrio eleitoral: essa noo de laboratrio eleitoral reflete uma ideia, h

    muito presente no pensamento poltico brasileiro, segundo a qual a cidadania algo

    a ser ensinado a uma populao ainda despreparada que s poder exerc-la ao final

    da sua jornada de alfabetizao cidad. Com isso no se quer afirmar que o objetivo

    final dos militares tenha sido o de preparar a populao para a democracia, mas sim

    que o perodo entre 1964 e 1985 foi marcado pela ideologia de que o povo no estaria

    preparado para o pleno exerccio dos direitos polticos, como se a aprendizagem da

    cidadania pudesse, de fato, ocorrer sem prtica democrtica.

    (F) Crescimento da populao: o incremento populacional no acompanhou o

    aumento do contingente eleitoral. Segundo o IBGE, entre as dcadas de 1960 e 1970

    a taxa mdia geomtrica de incremento anual da populao foi de 2,89% e entre

    1970 e 1980 o patamar foi de 2,49%. Ver http://seculoxx.ibge.gov.br/images/seculoxx/

    arquivos_download/populacao/1981/populacao_m_1981aeb_037.xls.

    (G) Absteno: nas eleies para o Congresso Nacional a absteno foi 21% de votos

    nulos/brancos em 1966 e 30% em 1970.

    (H) MDB: impunha-se um dilema ao MDB: atuar politicamente ou retirar-se da cena

    poltica. Ao escolher existir, ocuparia o nico espao de oposio permitida pela ordem

    jurdica instituda, mas teria o inconveniente de legitimar as decises governamentais,

    reforando o discurso oficial de que no existiam imposies. Se, ao contrrio, optasse

    por se retirar do jogo poltico, poderia desmantelar a legitimao do governo, mas

    retiraria qualquer obstculo s decises militares. Enfrentando o dilema, o MDB optou

    por permanecer na cena poltica, atuando no espao a ele destinado para oferecer

    alguma oposio ao regime.

  • 59

    Nova Repblica (1985 at os dias atuais)

    Diretas j!

    O processo da transio democrtica no fim do Regime Militar envolveu a

    abertura gradual idealizada pelas elites polticas autoritrias. A transio se tornava

    inevitvel medida que engrossava o nmero daqueles que pressionavam e ansiavam

    pela mudana. Trs foras atuavam nesse momento: a crise no reconhecimento

    da legitimidade do regime (em decorrncia da crise econmica); a eleio de

    governadores oposicionistas em 1982; e a maior manifestao de massas no Brasil:

    as campanhas pelas Diretas.

    Diretas J! foi um movimento em favor de eleio direta para o cargo de

    presidente. Foram feitas manifestaes pblicas (comcios e passeatas) em vrias

    cidades brasileiras ao longo do ano de 1983 e 1984, que mobilizaram mais de 5

    milhes de pessoas.

    Um dos objetivos pontuais era pressionar a aprovao da Emenda Dante de

    Oliveira pelo Congresso. A emenda acabou sendo refutada em abril de 1984, mas o

    impacto se fez sentir. Em 1985 Tancredo Neves, candidato do partido de oposio

    ao governo, foi eleito com a ajuda de desertores do partido governista. Isso acabou

    ocasionando um processo de denncia de infidelidade partidria(A) junto ao TSE,

    que a julgou improcedente.

    A situao poltica era tensa e Tancredo escondia estar doente. Temia que

    oportunistas e militares linhas-duras no passassem o poder ao vice que havia sido

    eleito. Na vspera da posse, a doena se torna insuportvel e Tancredo internado.

    Isso gerou a primeira crise constitucional aps o Regime Militar: estando o presidente

    eleito, mas no empossado, quem o substituiria? O vice, Jos Sarney, ou o presidente

    da Cmara, Ulysses Guimares?

    A soluo foi encontrada em Sarney, que era dissidente do partido governista,

    e assumiu a Presidncia no momento da transio democrtica.

    Rep

    blic

    a

  • Tr ibunal Super ior E le i tora l

    60

    Durao do mandato presidencial

    A durao do mandato presidencial j passou por muitas variaes desde que

    o cargo foi criado. Considerando somente o perodo mais recente, ele foi definido

    em quatro anos na Constituio de 1967 (Art. 77, 3). Essa durao se manteve at

    1977, quando a Emenda Constitucional n 8 (de 14.4.1977) alterou para seis anos o

    tempo de permanncia do presidente no cargo.

    Sarney foi eleito em 1985 e durante seu mandato foi promulgada a nova

    Constituio, que estabeleceu o perodo de cinco anos para os prximos mandatos.1

    Entretanto, apenas o governo de Collor-Itamar durou cinco anos, pois em 1994 a

    Emenda Constitucional de Reviso n 5 alterou para quatro anos a durao do mandato

    presidencial, tendo sido autorizada a reeleio em 1997 pela Emenda Constitucional

    n 16. De modo que o governo dos presidentes posteriores (FHC e Lula) durou oito

    anos cada, devido reeleio de ambos.

    Constituinte de 1988

    Uma constituio o documento fundador de uma comunidade poltica

    dentro do Estado de direito. O seu texto abrange a regulao da autoridade pblica,

    a proposio de instituies com a finalidade de bem organizar a sociedade e tudo

    o mais que for considerado relevante constar nesse documento. Nesse sentido, a

    Constituio desponta como um projeto poltico da sociedade e reflete o conflito de

    valores e poderes que caracteriza esta.

    Foi para formular uma nova espinha dorsal para a Repblica Federativa do Brasil

    que a Assembleia Nacional Constituinte comeou a se reunir em 1 de fevereiro de

    1987. O Brasil vivia, sob a Presidncia de Sarney, um perodo de transio formal para

    um Estado democrtico que no se sabia como seria.

    1 De fato, o mandato de Sarney durou 6 anos conforme previa o art. 4 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias.

  • 61

    Ela ficou conhecida como a Constituio Cidad, pelo fato de ampliar o rol dos

    direitos sociais e polticos. Assegurou a liberdade de expresso, de reunio, garantiu

    o direito privacidade, inviolabilidade do domiclio e da correspondncia, proibiu a

    priso sem deciso judicial: tudo isso em contraponto a prticas do regime anterior,

    das quais se buscava o distanciamento.

    Entre as alteraes que a Constituio trouxe figuram o reconhecimento da existncia

    de direitos e deveres coletivos, alm dos individuais; a equiparao dos filhos, vedada

    qualquer discriminao; a diminuio da idade para a faculdade do voto; a permisso de

    voto ao analfabeto; a reduo da jornada de trabalho e a afirmao de muitos outros direitos

    trabalhistas.

    Promulgada em 5 de outubro de 1988, ela previu um plebiscito para a definio da

    forma e sistema de governo. A populao foi consultada em 21 de abril de 1993 para decidir

    entre Repblica e Monarquia, e entre presidencialismo e parlamentarismo. O resultado fixou