TRIBUTAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE RECEITAS: ANÁLISE...

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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ UNIVERSIDADE DE FORTALEZA – UNIFOR PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM DIREITO CONSTITUCIONAL TRIBUTAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE RECEITAS: ANÁLISE INTERPRETATIVA SOBRE A ÓTICA DA PROPORCIONALIDADE E DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 Dione de Moura Araújo Matr. 0724539/4 Fortaleza – CE Abril , 2010

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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ UNIVERSIDADE DE FORTALEZA – UNIFOR PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM DIREITO CONSTITUCIONAL

TRIBUTAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE RECEITAS: ANÁLISEINTERPRETATIVA SOBRE A ÓTICA DA

PROPORCIONALIDADE E DA CAPACIDADECONTRIBUTIVA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Dione de Moura AraújoMatr. 0724539/4

Fortaleza – CE Abril , 2010

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DIONE DE MOURA ARAÚJO

TRIBUTAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE RECEITAS: ANÁLISEINTERPRETATIVA SOBRE A ÓTICA DA

PROPORCIONALIDADE E DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVANA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Dissertação submetida ao Programa dePós-Graduação em Direito – Mestradoem Direito Constitucional - daUniversidade de Fortaleza comorequisito parcial para obtenção dograu de Mestre em DireitoConstitucional, sob a orientação daProfª. Maria Lírida Calou de Araújo eMendonça.

Fortaleza - Ceará2010

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____________________________________________________________________________ A663t Araújo, Dione de Moura. Tributação e distribuição de receitas : análise interpretativa sobre a ótica da proporcionalidade e da capacidade contributiva na constituição de 1988 / Dione de Moura Araújo. - 2010. 114 f.

Dissertação (mestrado) – Universidade de Fortaleza, 2010. “Orientação: Profa. Maria Lírida Calou de Araújo e Mendonça.”

1.Receita tributária. 2. Tributação. 3. Autonomia política. I. Título.

CDU 34:336.221.262 ___________________________________________________________________________

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DIONE DE MOURA ARAÚJO

TRIBUTAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE RECEITAS: ANÁLISEINTERPRETATIVA SOBRE A ÓTICA DA

PROPORCIONALIDADE E DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVANA CONSTITUIÇÃO DE 1988

BANCA EXAMINADORA

____________________________________

Profª. Drª. Maria Lírida Calou de Araújo e MendonçaUNIFOR

____________________________________

Prof. Dr.Rosendo de Freitas AmorimUNIFOR

____________________________________

Prof. Dr. Hugo de Brito Machado SegundoFACULDADE CHRISTUS

Dissertação aprovada em: 27 / 04 / 2010

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Dedico este estudo, com o qual dou continuidade àminha caminhada na vida acadêmica, ao meu pai,FRANCISCO HOLANDA LAVOR, sem o qual nãoteria conseguido realizar o presente sonho, à minhamãe, MONICA, pelo carinho, amor e atenção sempredados em demasia e aos amigos que acreditaram emminhas verdades.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus por ter-me iluminado e abençoado nos momentos cruciais de minha

jornada, por ter se feito presente em minha vida não somente nas horas difíceis.

Ao meu pai, Francisco Holanda Lavor, por ter um sonho e compartilhá-lo comigo,

acreditando e incentivando meu crescimento pessoal. Por ter possibilitado e me dado todo o apoio

que precisei para concluir essa caminhada.

À minha mãe, Mônica Maria Teixeira de Moura, mulher de fibra e trabalhadora, que me

deu o carinho e atenção que sempre precisei.

Ao meu irmão Diego, que apesar de ser meu irmão mais velho sempre fez assumir esta

posição me proporcionando amadurecimento. E pelas partidas de vídeo game em que ele sempre

saía perdedor. E para quem eu desejo todo o sucesso do mundo.

À minha vovó Neuza, que muito deixa saudade, exemplo de mulher e caráter.

A meus avós maternos Alcides e Eunice, que mesmo à distância torcem por mim e sempre

me recebem com muito amor.

À minha namorada Milena Montenegro Aguiar, pelo carinho, amor, ternura e por iluminar

a minha vida.

À Eliani Alves Nobre, Procuradora de Justiça, ilustre representante do Ministério Público

do Estado do Ceará, pessoa admirável e de grande coração.

Ao meu amigo Matheus Cintra Bezerra, extraordinária pessoa que tenho como irmão, a

quem sou muito grato pelo apoio dado todos os dias. Pela espiritualidade que me é transmitida.

Ao meu amigo Daniel Borges, por ser um cara bacana.

Ao Programa de Pós-Graduação e Pesquisa da Unifor e seus funcionários: Lanuce, Luiz

Carlos, Nádja e Ana Paula, pela atenção.

Ao Capes pela bolsa de estudos concedida.

À professora Núbia Garcia, pela colaboração técnica e por toda atenção.

À minha querida professora e orientadora Maria Lírida Calou de Araújo e Mendonça, pelo

apoio, carinho, atenção, incentivo, inspiração e palavras sábias.

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Ao professor Hugo de Brito Machado Segundo, por ser fonte de inspiração, por ter aceitado

fazer parte da banca examinadora deste trabalho e por sempre ter feito parte da minha vida

acadêmica.

Ao professor Rosendo Freitas Amorim, pelos conselhos e orientações que iluminaram

minhas reflexões.

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“Todo ponto de vista é um ponto. Ler significa reler ecompreender, interpretar. Cada um lê com os olhos quetêm. E interpreta a partir de onde os pés pisam. Paraentender como alguém lê, é necessário saber como sãoseus olhos e qual é sua visão de mundo. Isso faz daleitura sempre uma releitura”.

(Leonardo Boff)

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RESUMO

A presente dissertação tem como objetivo saber se cabe ou não a aplicação do princípio daproporcionalidade na repartição constitucional de receitas tributárias, no momento da criação dostributos pelo legislador e no momento de exigi-los e fazer uma análise das espécies de tributos,das duas vias da proporcionalidade constitucional tributária e da interpretação e aplicação dasregras e princípios. No decorrer do estudo a respeito das formas de se colocar em prática osprincípios constitucionais tributários é feita uma avaliação sobre repartição de receitas tributáriasentre os entes federados, tendo em vista que a Constituição da República Federativa do Brasilgarante tal participação, como também há inter-relação entre os mesmos em forma de percentuaisestabelecidos na Constituição. Tal estudo se faz necessário, pois a autonomia política estádiretamente relacionada à autonomia financeira, não sendo possível o exercício pleno de umasem que a outra seja observada. Estudar as espécies tributárias possibilita uma melhor reflexãosobre suas distinções. Apresentadas as diferenças entre as espécies tributárias, tem-se a análisepolítico-jurídica da finalidade das repartições das receitas tributárias, onde se objetiva determinaras espécies tributárias que se encontram no rol das fontes de receitas que são repassadas aosEstados e aos Municípios. Tem o trabalho como principais referencias teóricas Hans Kelsen,Heidegger, Leandro Pausen, José Afonso da Silva, Hugo de Brito Machado e Ivens Gandra. Ametodologia na pesquisa pode ser caracterizada do ponto de vista de sua natureza como aplicada,do ponto de vista da abordagem do problema como qualitativa, do ponto de vista de seusobjetivos como explicativa e do ponto de vista de seus procedimentos técnicos comobibliográfica.

Palavras-chave: Repartição tributária. Transferências. Fundo de participação. Autonomia política.Princípio da igualdade.

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ABSTRACT

This dissertation aims to whether or not it is the principle of proportionality in the constitutionaldistribution of tax revenues at time of creation of taxes by the legislature and at the time ofclaiming them and make a analyzes the kinds of taxes, for the two ways of constitutionalproportionality tax and for interpretation and enforcement of rules and principles. During thestudy about the ways of putting into practice the principles of constitutional tax is made anassessment on the distribution of tax revenues between federal entities, knowing that theConstitution of the Federative Republic of Brazil guarantee such participation, as with theinterrelation between them in the form of percentages established in the Constitution. Such astudy is necessary because the political autonomy is directly related to economic autonomy, beennot possible the full exercise of one without the observation of the other. To study the tributariesspecies allows a better reflection on their distinctions. Presented the differences betweentributaries species, has been analyzing the political-legal purpose of the allocations of taxrevenues, which aims to determine the species found in the tax roll revenue sources that arepassed to the states and municipalities. Work has as main theoretical references Hans Kelsen,Heidegger, Pausen Leandro, José Afonso da Silva, Hugo de Brito Machado and Ivens Gandra.The research methodology can be characterized in terms of its nature as applied, in terms ofaddressing the problem and a qualitative point of view of its objectives as explanatory and fromthe standpoint of their technical and bibliographic procedures.

Keywords: Distribution tax. Transfers. Fund participation. Political autonomy. Principle ofequality.

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1.................................................................................................................................... 69

TABELA 2.....................................................................................................................................69

TABELA 3.....................................................................................................................................70

TABELA 4.....................................................................................................................................71

TABELA 5.....................................................................................................................................72

TABELA 6.....................................................................................................................................73

TABELA 7.....................................................................................................................................74

TABELA 8.....................................................................................................................................75

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................................131 UM EMBASAMENTO TRIBUTÁRIO DA TEORIA CONSTITUCIONAL.........................17

1.1 A superação da teoria positiva das fontes pela Constituição..............................................20 1.2 A superação da regra pelo princípio...................................................................................21 1.3 Nova nterpretação...............................................................................................................221.4 Positivismo kelseniano e interpretação...............................................................................221.5 Uma nova concepção hermenêutica...................................................................................241.6 Princípios e a resolução de conflitos................................................................................. 311.7 Regra e antinomia jurídica..................................................................................................35

1.8 O estado subsidiário ..........................................................................................................37

2 TRIBUTOS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 E REPARTIÇÃO CONSTITUCIONAL

TRIBUTÁRIA DAS RECEITAS..................................................................................................402.1 Tributos em espécie............................................................................................................40

2.1.1 Imposto.....................................................................................................................402.1.2 Taxas.........................................................................................................................442.1.3 Contribuição de melhoria.........................................................................................472.1.4 Empréstimos compulsórios.......................................................................................482.1.5 Contribuições especiais............................................................................................51

2.1.5.1 Contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas......522.1.5.2 Contribuições sindicais................................................................................532.1.5.3 Contribuições corporativas para custeio de entidades de fiscalização do

exercício de profissões regulamentadas................................................................. 55

2.1.5.4 Contribuições de intervenção no domínio econômico.................................58 2.1.5.5 Contribuições sociais.................................................................................. 582.1.5.6 Contribuição de iluminação pública............................................................ 60

2.2 Repartição constitucional tributária das receitas............................................................... 632.2.1 Participação dos entes federados nos valores arrecadados............................................. 672.2.2 Regionalização da carga tributária disponível dos municípios....................................... 71

3 PRINCIPIOLOGIA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIA: PROPORCIONALIDADE E

CAPACIDADE CONTRIBUTIVA .............................................................................................773.1 Princípio da Capacidade Contributiva................................................................................883.2 Capacidade contributiva e capacidade econômica.............................................................893.3 Capacidade contributiva e pessoalidade.............................................................................903.4 Capacidade contributiva, seletividade e progressividade...................................................913.5 Os critérios para estabelecer e capacidade contributiva ....................................................953.6 O alcance da capacidade contributiva com relação às imunidades tributárias...................973.7 Princípio da vedação ao confisco.......................................................................................98

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CONCLUSÃO..............................................................................................................................10

1

REFERÊNCIAS ..........................................................................................................................108

ÍNDICE ONOMÁSTICO............................................................................................................115

ÍNDICE REMISSIVO.................................................................................................................116

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como finalidade a elaboração de uma análise acerca da

hermenêutica constitucional tributária através de um estudo das formas e métodos interpretativos,

bem como a superação de determinados conflitos entre regras e princípios. A hermenêutica é

atividade em transformação, em constante movimento, passando por modificações através do

tempo, e esta dissertação pretende demonstrar a passagem do Positivismo para a nova forma de

interpretação: a Interpretação Constitucional. Evidencia-se tal evolução na interpretação que

confere liberdade ao juiz com relação à letra jurídica. Este primeiro momento do trabalho está

dividido em três partes: a) defasagem da concepção interpretativa positivista – posição que

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predominou durante muito tempo na hermenêutica e que se postava incompatível com o sistema

Constitucional brasileiro, onde predomina a concepção de Estado Social; b) destaque para a

Escola da Exegese, do Positivismo, ressaltando a importância de Hans Kelsen e sua forma de

compreensão quanto à Teoria Pura do Direito; c) apreciação de uma nova concepção da

hermenêutica, na qual podem ser observadas singularidades que a distinguem da visão positivista

de Kelsen. A Constituição passa a ser centro irradiador de sentido interpretativo. Müller, com a

metódica estruturante, e Peter Harbele, com a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição

oferecem grande contribuição para o presente trabalho.

No primeiro capítulo intitulado “Um embasamento tributário da teoria constitucional”

buscarei tratar das teorias constitucionais e das escolas interpretativas que influenciaram a

maneira de aplicar as normas constitucionais tributárias e mesma a maneira de ver o direito em si,

além de fazer distinções entre as escolas farei uma abordagem de uma evolução da doutrina a

respeito do tema. Fazendo um contraponto entre regras e princípios e mostrando como do Direito

Tributário sofre a influência de tais, este capítulo se faz necessário para entender o que seja

interpretação e aplicação de normas constitucionais tributárias além de entender o ponto central

do trabalho que é saber se: “cabe ou não a aplicação do princípio da proporcionalidade na

repartição constitucional de receitas tributárias, no momento da criação dos tributos pelo

legislador e no momento de exigi-los?”. Este primeiro capítulo se faz necessário para entender as

regras e princípios que permeiam o direito tributário, além de facilitar a resposta da pergunta

central do trabalho que acima mencionada.

No segundo capitulo tratarei sobre as espécies tributárias e da repartição de receitas

tributárias em si, buscarei fazer uma análise de cada espécie de tributos para só então entender

como e quais deles fazem parte da sistemática constitucional tributária, onde pretendo provar que

os municípios têm uma participação irrisória nos valores arrecadados a títulos de receitas, isto

será apresentado através de gráficos retirados de estudos realizados a respeito, ou seja, que na

sistemática vigente não houve um respeito ao princípio da proporcionalidade, já que os

municípios em geral são os entes da federação que menos tem mecanismos para exercer suas

competências tributárias, já que a maioria não possuem estruturas fiscais para tanto. Esta é umas

das vias onde buscaremos provar a necessária aplicação do princípio da proporcionalidade.

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Já no terceiro e ultimo capítulo no qual intitulamos de “princípiologia constitucional

tributária: proporcionalidade e capacidade contributiva”, buscaremos tratar das vertentes dos

referentes princípios onde esta analise se fará necessária para um fechamento do raciocínio

quanto uma segunda via de aplicação da proporcionalidade tributária, ou seja, será demonstrado

que o referido princípio deve ser respeitado.

De forma mais detalhada, podemos dizer que serão abordados os tributos na Constituição

de 1988 de competência da União, dos Estados e dos Municípios, observando as peculiaridades

inerentes a cada tributo e ressaltando a importância da repartição de receitas entre os entes

federados para se exercer a autonomia política de forma plena, tendo em vista que se faz

necessária também a existência da autonomia financeira, que venha a repercutir diretamente na

liberdade do administrador (governadores e prefeitos) em planejar de maneira precisa suas

atividades voltadas ao interesse da população, seja através de obras públicas ou serviços. Por

conseguinte, será apresentada uma análise das espécies de tributos, mais especificamente dos

impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições. Os três

primeiros, presentes há mais tempo no nosso ordenamento jurídico, estão previstos no Código

Tributário Nacional. Os dois últimos passaram a fazer parte da nossa realidade a partir da

promulgação da Constituição de 1988. Uma diferença entre as

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espécies tributárias é apontada no intuito de facilitar o entendimento das características próprias

de cada uma delas.

Após o estudo dos tributos constitucionais, trataremos da repartição tributária de receitas,

pois se entende que não é possível dissociar tal análise de um conhecimento prévio de

determinados aspectos relevantes dos tributos inerentes a cada ente federado. É por esta vertente

que se desenvolve o presente trabalho. Dados estatísticos irão demonstrar a desigualdade

existente no montante dos valores arrecadados pelos entes federados. Será exposta a diferença

gerada pela concentração de instrumentos arrecadatórios nas mãos da União e dos Estados em

detrimento de Municípios que não possuem competência constitucional para um maior número

de tributos e muitas vezes não dispõem de aparato administrativo para cobrar os tributos de sua

competência, tornando-se, muitas vezes, reféns da repartição constitucional de receitas tributárias

para manter a logística e os serviços essenciais. Surge, neste ponto, a importância da análise da

repartição de receitas para o federalismo fiscal. É levada à baila a questão da relevância dos

tributos que carreiam recursos de forma vinculada para os Estados, Distrito Federal e Municípios.

Como determina de modo claro a Constituição, o número de impostos de competência da União é

muito superior à somatória de todos os impostos dos Estados ou Municípios. Para que haja um

equilíbrio maior entre os respectivos entes, a Constituição garantiu a repartição de receitas.

Uma relação entre tributos e repartição de receitas constitucionais tributárias pode ser

observada, tendo-se os tributos como ferramentas para o labor de carrear recursos ao Estado para

que este possa exercer sua função já predeterminada pela Constituição. Não haveria receita se não

houvesse tributação; é nesse sentido que a Teoria Constitucional Tributária encontra sua fonte

para se abeberar. Os fundos de participação dos Estados e dos Municípios serão estudados de

forma mais específica, sem se olvidar de que não existem apenas dois fundos que correspondem

às transferências indiretas de receitas tributárias, mas quatro, estando também incluídos neste rol

os fundos residuais e os de compensação das exportações.

Por fim, tem-se uma análise acerca de dois princípios constitucionais tributários: Princípio

da Proporcionalidade e da capacidade contributiva e suas vertentes, como é o caso da vedação do

confisco. Primeiramente serão abordados os aspectos históricos, remontado a Grécia Antiga e a

Idade Média, dentre outros momentos. Os dois princípios, foco central do nosso estudo, serão

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trabalhados isoladamente para uma posterior análise conjunta, sendo feita também uma

comparação entre capacidade contributiva e capacidade econômica. Em seguida, se faz

necessário observar se a mera obediência ao Princípio da Capacidade Contributiva pode, a partir

da pessoalidade, vir a promover a justiça social. Estes são alguns dos pontos que este trabalho

pretende abordar, não de forma superficial, mas na medida razoável para que se tenha uma boa

compreensão dos aspectos tributários envolvidos nas questões em análise.

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1 UM EMBASAMENTO TRIBUTÁRIO DA TEORIA

CONSTITUCIONAL

O Estado intitulado Democrático de Direito, que visa tratar os desiguais de acordo com

suas necessidades específicas, exige que nasça uma nova visão do Direito Tributário e da maneira

com que a Hermenêutica é aplicada. Pode-se observar que o Estado Democrático de Direito visa

à modificação da realidade, não mais se contentando com o papel de inerte observador das forças

sociais e econômicas que lhe cabia no Estado Liberal.

O Estado Social busca uma melhora das condições existentes, um salto qualitativo na

sociedade; relaciona-se, portanto, com a transformação da realidade. Já o Estado Democrático de

Direito está atrelado a melhoraria do já existente. Na prática, significa que o Estado Social está

contido no Estado Democrático de Direito, pois além de buscar e garantir uma vida digna ao

homem, também aspira uma participação dos indivíduos na construção da democracia, fazendo

com que os valores democráticos passem a influenciar também a ordem jurídica. É o que ocorre

com os princípios constitucionais tributários. Nesta nova concepção de Estado de Direito a escola

da Exegese e sua influência – evidente na recente criação da Súmula Vinculante – em nada

favorecem na sua efetivação. Não estou aqui a defender que a sumula vinculante seja da escola da

exegese, mas sim que é uma manifestação em tempos modernos de alguns preceitos

característicos daquela escola superada.

Uma nova maneira de interpretar é exigida, influenciada pelo artigo 3º da Constituição

Federal de 1988, que prioriza os princípios e as peculiaridades do caso concreto, passando a

interpretação a ocupar o lugar do estrito legalismo, que compreendia o Direito como um sistema

composto por regras, exclusivamente. Hans Kelsen (1985, p.181-182), preconizador maior do

Positivismo, afasta-se da realidade, não se preocupando com expressões como “caso concreto”.

Vale ressaltar que sua doutrina fora concebida em um momento histórico marcado pelo Estado

Liberal, distante do Estado Democrático de Direito que vivemos atualmente.

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19

A Constituição do Brasil de 1988 trouxe a preocupação em construir um Estado Social.

Constituições com características semelhantes à nossa receberam o nome de “dirigente” pelo

autor português Canotilho (2003, p. 39), significando este termo a própria superação do

Positivismo, pois uma materialidade é almejada através dos princípios ao aproximar as regras da

realidade. Segundo o autor:

Em princípio, não existe, pois, uma cláusula aberta para admissibilidade de deveresmaterialmente fundamentais. Todavia, também aqui se podem admitir deveresfundamentais (deveres de registro, dever de colaborar na administração da justiça). Noentanto, como na criação ex lege, de deveres fundamentais, implica, muitas vezes, umarestrição da esfera jurídica dos cidadãos, impõe-se um regime particularmente cautelososemelhante ao das leis restritivas de direitos, liberdades e garantias.

Nota-se aqui uma nova concepção da doutrina no que se refere a constitucionalismo. Os

princípios constitucionais tributários sofreram a mesma influencia quando na Constituição

passou-se a falar em princípios a serem aplicados num Constitucionalismo-Tributário. A simples

relação do conhecimento, sujeito-objeto, do Positivismo, chamada de circularidade virtuosa na

compreensão, não é mais suficiente; o Direito Tributário não está adstrito às regras contidas no

Código Tributário Nacional ou nas leis esparsas, mas antes daquelas devem ser aplicadas de

acordo com um fim maior, finalidade esta diretamente relacionada aos valores de um novo

constitucionalismo-tributário que surgiu a partir de 1988 e que vem sendo construído em nosso

ordenamento jurídico. Observa-se que houve uma evolução do Positivismo rumo a uma nova

postura interpretativa, como bem esclarece Lênio Luiz Streck (2005, p. 139):

Destarte, esse déficit de realidade produzido pelas posturas epistemológicas vem a serpreenchido pelas posturas interpretativas – especialmente as hermeneutico-ontológicas –que deixam de hipostasiar o método e o procedimento, colocando no modo-de-ser e nafaticidade o lócus da compreensão. Assim, salta-se do fundamentar para o compreender,em que este – o compreender – não é mais um agir do sujeito, mas um modo-de-ser quese dá em uma intersubjetividade.

Apesar dos novos rumos traçados pela Constituição Federal de 1988, no campo da

interpretação, o que ainda pode ser observado são os reflexos de um costume influenciado pelo

Positivismo e sua interpretação exegética, deflagrando-se pela imensa quantidade de processos

que abarrotam as estantes das varas judiciárias e dos tribunais de segunda instância, ou mesmo às

superiores. Ocorre que o judiciário brasileiro, alegando a necessidade de aperfeiçoar o andamento

de tais processos, sofreu, em verdade, um retrocesso do ponto de vista hermenêutico, com a

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criação da Súmula Vinculante, através da Emenda Constitucional 45, contrapondo-se à orientação

da Carta Magna de superar gradativamente a influência da escola positivista-exegética.

Com a Súmula Vinculante, o que se pretende é condensar, de forma abstrata, as mais

diversas situações, presumindo a existência de uma essência comum a vários casos

aparentemente semelhantes. Essência esta que, no campo do conhecimento, serviria como a

categoria da decisão, desconsiderando, desta forma, a indivisibilidade do caso concreto,

atribuindo caráter geral-abstrato às decisões que a ela se referem na fundamentação. Os efeitos da

decisão que dão origem à Súmula Vinculante seriam observados nas decisões futuras, separando-

se interpretação de aplicação, o que é inaceitável perante uma concepção concretista da

hermenêutica.

A Súmula Vinculante é uma figura normativa que, ao afastar a especialidade do caso

concreto, faz com que todos os casos sejam decididos de acordo com um entendimento firmado

por um tribunal, entendendo que o direito é mero conjunto de regras e fazendo com que o

decisionismo e a arbitrariedade se sobreponham à nova postura interpretativa. O que já estava

superado ressurge, evidenciando o retorno a um estado anterior da interpretação.

O Positivismo admite várias soluções normativas para o mesmo caso, já a nova concepção

hermenêutica, ao reverso disso, entende que há apenas uma solução adequada para cada caso

concreto, aproximando, deste modo, o caso concreto no momento da aplicação. Três são os

argumentos de maior força na busca de superar a resistência do Positivismo à importância da

Constituição e à jurisdição constitucional no Estado Democrático de Direito. De acordo com

Lenio Luiz Streck (2005, p. 142) em síntese, são eles:

[...] a teoria positivista das fontes vem ser superada pela Constituição; a velha teoria danorma dará lugar à superação da regra pelo princípio; e o velho modus interpretativosubsuntivo-dedutivo – fundado na relação epistemológica sujeito-objeto – vem a darlugar ao giro lingüístico-ontológico, fundado na intersubjetividade.

No Estado Liberal a metodologia utilizada na aplicação do Direito, representada esta

corrente pelo Positivismo, estava diretamente relacionada à doutrina liberalista que se seguiu na

pós-revolução burguesa, que buscava segurança jurídica até então inexistente. Tal objetivo só

pôde ser alcançado pela firmeza e solidificação das regras, que deviam ser aplicadas da forma

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como estavam inseridas no ordenamento jurídico, sem haver possibilidade, portanto, de

interpretação e flexibilização na norma contida no preceito normativo (corpo de texto).

Este entendimento é importante para observar o quanto os princípios passaram a

influenciar o ordenamento jurídico-tributário nacional, ao passo que as regras não perderam a sua

importância, mas apenas passaram a ser interpretadas segundo os princípios contidos no novo

constitucionalismo inserido pela Carta Magna de 1988.

São nesses três pontos onde se busca a base para um raciocínio coeso, que objetiva

demonstrar a superação do Positivismo através dessas concepções e constatações, analisando-os a

seguir.

1.1 A superação da teoria positivista das fontes pela constituição

A Teoria das Fontes, até pouco tempo, era o único sistema a ser trabalhado e não levava

em consideração aspectos principiológicos, tendo a Constituição como fonte formal de Direito. A

regra de conduta era o que predominava, sendo identificada geralmente entre leis ordinárias,

tornando a Constituição uma mera carta política.

Todo esse entendimento mudou, passando a Constituição a ter auto-aplicação. Um

exemplo disso é a norma constitucional aplicada em âmbito tributário em detrimento de regras. É

o que ocorre, por exemplo, quando o Supremo Tribunal Federal declara uma regra tributária

inconstitucional, aplicando-se princípios contidos em norma constitucional-tributária.

A Constituição de 1988 apresenta uma visão programática de seus enunciados, onde os

princípios incorporam e agregam sentido à Constituição e ao Direito. A Teoria das Fontes,

baseada apenas nas regras, encontra-se assim superada, pois é a Constituição que prescreve

condutas e, quando não a faz, seus princípios devem ser levados em consideração. A regra passou

a não ser mais a única fonte do Direito, porque os princípios constitucionais tomaram o papel de

fonte prioritária.

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1.2 A superação da regra pelo princípio

Um novo entendimento acerca do significado e da finalidade das regras e dos princípios

pode ser observado a partir da superação de um referencial que levava em conta apenas as regras

como fonte do Direito. Atualmente, os princípios fazem parte do rol das fontes do Direito

Tributário, influindo diretamente no trabalho hermenêutico e no resultado a ser obtido. Esta

postura afasta a antiga visão positivista acerca dos valores e princípios, não sendo, portanto, a

questão entre regras e princípios uma mera diferença de grau entre as referidas fontes. Importante

salientar que não é possível separar regras de princípios, mas apenas estabelecer uma

diferenciação entre ambos. A interpretação de uma regra deve levar em consideração o princípio

a partir do qual ela foi instituída. De acordo com Lenio Luiz Streck (2005, p.143), a respeito da

diferença entre regra e princípio, relacionado à teoria da norma:

Pela regra fazemos uma justificação de subsunção (portanto, um problemahermeneutico-filosófico), que no fundo é uma relação de dependência, de subjugação e,portanto, uma relação de objetivação (portanto, um problema exsurgente dapredominância do esquema sujeito-objeto); já por intermédio do princípio, não operamosmais a partir de dados ou quantidades objetiváveis, isto porque, ao trabalhar com osprincípios, o que está em jogo não é mais a comparação no mesmo nível de elementos,em que um elemento é causa e outro é efeito, mas sim, o que está em jogo é o acontecerdaquilo que resulta do princípio, que pressupõe uma espécie de ponto de partida, que éo processo compreensivo. Pode-se dizer que a regra – como tradicionalmente éentendida no campo jurídico – permanece no campo ôntico, objetivando, causalista-explicativa, enquanto o princípio se situa no acontecer de caráter ontológico (nãoclássico). (grifo original)

Isso se explica porque, do ponto de vista da hermenêutica, não é possível separar

interpretação e aplicação, É observando a antecipação de sentido que se torna viável a

compreensão do objeto interpretativo. Interpretar e aplicar são atividades que se dão no mesmo

instante, pois dissociar a regra do princípio é algo que fere a lógica da racionalidade, já que uma

regra é interpretada de acordo com o princípio instituidor. O fato é que não há regra que não

esteja relacionada a um princípio, ainda que, pela clareza e objetividade daquela, marcada pela

lógica dedutiva, muitas vezes o princípio instituidor fique encoberto, sem que se perceba

facilmente qual é o princípio instituidor.

Outra questão importante a ser tratada está relacionada ao ato de compreensão. A

atividade de compreender não é exercida apenas através de um comportamento do sujeito, mas

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também de algo na essência do ser humano em relação à realidade na qual está inserido, falando-

se aqui de pré-compreensão, da bagagem interpretativa que traz o intérprete dentro de si.

1.3 Nova interpretação

Um sentido interpretativo baseado apenas na relação sujeito-objeto passa a ceder lugar a

uma intersubjetividade. Ainda é possível identificar em alguns autores e mesmo em julgamentos

dos tribunais a importância de uma metodologia para se chegar à vontade e ao sentido que o

legislador quis atribuir à norma. A norma é o objeto a ser conhecido pelo sujeito (intérprete) que

busca esgotar o seu sentido, criando-se o conceito de círculo hermenêutico. O mundo prático

passa a ser observado no momento em que é feito o trabalho interpretativo, não mais a relação

sujeito-objeto. É neste ponto que se deve atentar para a circularidade hermenêutica. Nesse

sentido, Heidegger (2000, p. 207) considera que a interpretação se funda, essencialmente, numa:

[...] posição prévia, visão prévia e concepção prévia. A interpretação nunca é apreensãode um dado preliminar, isenta de pressuposições. Se a concreção da interpretação, nosentido da interpretação textual exata, se compraz em se basear nisso que ‘está’ no texto,aquilo que, de imediato, apresenta como estando no texto nada mais é do que a opiniãoprévia, indiscutida e supostamente evidente do intérprete.

Aqui se apresenta não mais uma mera relação sujeito-objeto, mas uma intersubjetividade

que mostra o entendimento do sujeito sobre o objeto antes mesmo de se estabelecer contato, pois

se parte do pressuposto de que o sujeito possui pré-compreensões a respeito do objeto a ser por

ele tratado.

1.4. Positivismo kelseniano e interpretação

Analisar o método interpretativo no modelo positivista é de grande valor para este

trabalho, pois é feita uma crítica desta frente a uma nova concepção da hermenêutica concretista

constitucional. Quanto aos chamados métodos de interpretação relacionados ao Direito Positivo,

baseado na Teoria Pura do Direito, não há um critério objetivo de interpretação que demonstre de

forma segura que determinada decisão encontrada é a correta, em detrimento de uma segunda

posição. O esclarecimento acerca da afirmativa acima pode ser observado, no que concerne ao

método na interpretação no Direito Positivo, na obra de Kelsen:

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Apesar de todos os esforços da jurisprudência tradicional, não se conseguiu até hojedecidir o conflito entre vontade e expressão a favor de uma ou outra, por uma formaobjetivamente válida. Todos os métodos de interpretação até o presente, elaboradosconduzem sempre a um resultado apenas possível, nunca a um resultado que seja o únicocorreto. (KELSEN, 1984, p. 468).

Na doutrina positivista, o ato interpretativo está diretamente ligado à aplicação, pois as

normas devem ter seus sentidos fixados pela interpretação na exata medida em que a aplicação

ocorre. Duas são as possibilidades de interpretação, chamadas pelo autor de autêntica e

“inautêntica”, estando a distinção no sujeito-intérprete. Na autêntica a interpretação do direito é

feita pelo órgão aplicador; na “inautêntica” é feita por pessoa privada. O intérprete identifica as

soluções possíveis no dispositivo e depois aplica a que escolher. São dois momentos: no primeiro

deles é observado um ato de conhecimento; em seguida, um ato de vontade. Neste modelo

proposto pode haver espaço para arbitrariedade e decisionismo, já que a discricionariedade

jurídica é para onde Kelsen (1984, p. 469) direciona a escolha da decisão a ser tomada dentre as

várias corretas encontradas.

É flagrante o alto grau de subjetividade e poder que incorpora a pessoa do intérprete no

momento de decidir. O Positivismo não admite que no momento de escolha das várias decisões

possíveis não seja possível identificar a decisão correta na Constituição. Essa posição de que não

se pode extrair da Constituição ou chegar através de uma interpretação à decisão correta se

contrapõe à teoria da concretização constitucional, através da qual a hermenêutica alcança a todo

o momento a resposta correta para determinado caso. É com esta finalidade que se faz referência

a Kelsen: chegar a um novo entendimento interpretativo que possa superar o Positivismo por ele

adotado. Kelsen, então, é a origem de toda a crítica para construção de um embasamento teórico.

Deve-se ter a compreensão de que o conceito de absoluto não coincide com o fim que se

propõe à hermenêutica. Portanto, as várias respostas propostas pelo Positivismo kelseniano, no

qual uma será escolhida de forma “absoluta”, vai de encontro à inexistência do absoluto em

hermenêutica. Podemos notar o contraste com a doutrina interpretativa atual em mais um escrito

de Kelsen (1984, p. 473):

Não se pretende negar que esta ficção da univocacidade das normas jurídicas, vista deuma certa posição política, pode justificar que se faça uso desta ficção numa exposiçãocientífica de um Direito positivo, proclamando como única correcta, de um ponto devista científico subjetivo, uma interpretação que, de um ponto de vista políticosubjectivo, é mais desejável do que uma outra, igualmente possível do ponto de vista

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lógico. Neste caso, com efeito, apresenta-se falsamente como uma verdade científicaaquilo que é tão-somente um juízo de valor político.

Positivismo afasta os princípios, admitindo como meio de decisão apenas as regras,

fazendo a distinção entre texto e sentido de texto. Para esta Escola, o Direito é um sistema de

regras e os fatos do mundo não teriam relevância a ele. O Positivismo interpretativo entende que

pode haver várias possibilidades de respostas, enquanto a hermenêutica moderna atenta para o

fato de que, aparentemente, pode haver mais de uma solução correta para o caso concreto, mas,

de fato, haverá uma única solução baseada em uma pré-compreensão legítima por parte do

intérprete. Na chamada tese da melhor resposta, ainda assim a discricionariedade é afastada,

tendo em vista que permaneceria o problema das várias respostas.

1.5 Uma nova concepção hermenêutica

A interpretação a que se refere o Positivismo deve ser entendida como ultrapassada para

que se possa compreender uma nova concepção de hermenêutica do Direito, que passa a ser

concretista. Segundo Rodolfo Viana Pereira: “a Hermenêutica no Direito torna-se concretização,

ou seja: processo de reconstrução do Direito aplicável ao caso, à luz do padrão constitucional e

através de um procedimento argumentativo e racionalmente controlável”.

O autor delimitou esta análise à jurisdição por questão metodológica. Outra restrição

feita por ele é que a concretização não corresponde apenas a momentos de dúvidas

interpretativas, fazendo-se necessário uma compreensão conceitual de norma, em uma relação

desta com o intérprete, na busca de uma concretização.

Para Friedrich Muller, segundo Rodolfo Viana (2007, P.166-167), a norma é um

processo de concretização do texto:

a) programa normativo: é o conjunto de domínios lingüísticos resultantes da aberturasemântica proporcionada pelo texto do preceito jurídico, ou seja, a diversidade desentidos semanticamente possíveis do comando lingüístico insculpido no texto; b)âmbito normativo: é o conjunto de domínios reais, fáticos, abrangidos em função doprograma normativo... c) norma jurídica: resultado do conjunto formado pelo programanormativo e o âmbito normativo e que de ser formulada de maneira genérica e abstrata;d) norma-decisão: resultado final do trabalho do jurista em função da individualizaçãoda norma jurídica geral na norma que irá decidir o caso.

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O que pode ser observado na análise dos conceitos trazidos por Muller é que a norma não

existe em abstrato; possui um sentido prévio à análise da concretude do caso e da relação deste

com o intérprete. Quanto à concretização da Constituição na metódica estruturante de Friedrich

Muller, escreve Márcio Augusto de Vasconcelos Diniz (1998, p. 253):

Na perspectiva de Muller, a interpretação é concretização da norma(Normkonkrestisienrung). A originalidade da metodologia por ele proposta reside noconceito mesmo de norma enquanto modelo de ordem determinado pela realidade fática(Sanchbestimmtes Ordnungsmodell), mas que não é totalmente absorvido por ela; emoutros termos, norma e realidade são termos de mútua implicação, pois o conteúdodaquela primeira é o resultado da concretização, processo no qual a segunda adquireuma especial relevância. A concretização das normas constitucionais deve ser orientadaa partir da realidade que estas devem disciplinar, justamente porque são modelos deordem. Normas e fatos não podem ser considerados, portanto, no processo deconcretização, como fenômenos isolados. A relação entre Direito e realidade não deveser abordada a partir de uma perspectiva de identificação/não identificação, mas emfunção dos problemas concretos que demandam uma solução.

É confirmada a tese de que a interpretação kelseniana está superada na afirmação de que

normas e fatos não podem ser considerados isoladamente no processo de concretização. No

Positivismo kelseniano, o “fato” não é considerado no trabalho interpretativo. A sistemática do

processo interpretativo-tributário relacionado à norma deve estar atrelada a um processo

argumentativo, de justificação e fundamentação, para que não haja arbitrariedade daquele que

procede ao trabalho hermenêutico, sendo a única forma de se garantir uma decisão isenta de pré-

compreensões ilegítimas.

Relacionando o processo argumentativo com a função judiciária, onde a segurança

jurídica deve se constituir numa meta a ser alcançada para que o Estado tenha condições de

regular as relações entre os indivíduos de forma coerente, nasce à questão de que as decisões

proferidas pelos juízes são motivadas, obrigatórias e validam processualmente a sentença,

evitando sua nulidade ou anulação. A motivação faz com que a sentença tenha a possibilidade de

ser reformada ou confirmada, superando argumentos contrários, demonstrando assim seu caráter

científico.

Outra modificação no entendimento acerca da hermenêutica está relacionada a quem e

quantos estão aptos a proceder ao trabalho interpretativo. Esta questão foi levantada por Peter

Härbele (1997, p.41), na sociedade aberta dos intérpretes da Constituição na qual se fundamenta

esta dissertação para apontar uma evolução que vem a superar a visão positivista já ultrapassada

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acerca da hermenêutica. No estudo elaborado pelo presente autor, foi observado que o número

daqueles que vinham procedendo à interpretação da Constituição estava, de certo modo, bastante

restrito. Reduzia-se, geralmente, a juízes constitucionais, que se limitavam por procedimentos

formais previamente estabelecidos. A conseqüência deste tipo de comportamento e aceitação é

que o entendimento acerca do sentido do texto constitucional se reduz à interpretação daqueles

formalmente aptos para tanto.

Não se pode mais compreender a interpretação da Constituição, ou mesmo de outros

textos normativos, como sendo uma função exclusiva dos juízes, sejam eles constitucionais ou

não, podendo o trabalho interpretativo ser exercido por todos aqueles atingidos pelo âmbito

normativo. Excluir é discriminar e subjugar muitos ao entendimento de poucos. Neste ponto do

trabalho se faz necessário trazer algumas palavras de Peter Härbele (1997, p. 41-42), de forma a

acrescentar a tese de uma superação de Positivismo:

As reflexões desenvolvidas levam a uma relativização da hermenêutica constitucionaljurídica. Essa relativização assenta-se nas seguintes razões: 1. O juiz constitucional jánão interpreta, no processo constitucional, de forma isolada: muitos são os participantesdo processo; as formas de participação ampliam-se acentuadamente; 2. Na posição queantecede a interpretação constitucional ‘jurídica’ dos juízes (Im Vorfeld juristischerVerfassungsinterpretation der Richter), são muitos os intérpretes, ou, melhor dizendo,todas as forças pluralistas públicas são, potencialmente, intérpretes da Constituição. Oconceito de “participante do processo constitucional” (am VerfassungsprozessBeteiligte) relativiza-se na medida que se amplia o círculo daqueles que, efetivamente,tomam parte na interpretação constitucional. A esfera pública pluralista (diepluralistische Öffentlichkeit) desenvolve força normatizadora (normierende Kraft).Posterioemente, a Corte Constitucional haverá de interpretar a Constituição emcorrespondência com a sua atualização pública; 3. Muitos problemas e diversas questõesreferentes à Constituição material não chegam à Corte Constitucional, seja por falta decompetência específica da Corte, seja pela falta de iniciativa de eventuais interessados.Assim, a Constituição material “subsiste” sem interpretação constitucional por parte dojuiz. Considerem-se as disposições dos regimentos parlamentares! Os participantes doprocesso de interpretação constitucional em sentido amplo e os intérpretes daConstituição desenvolvem, automaticamente, direito constitucional material. Vê-se, pois,que o processo constitucional formal não é a única via de acesso ao processo deinterpretação constitucional.

Portanto essa nova concepção hermenêutica a respeito de quem e quantos estão aptos a

interpretar, abrindo-se o espaço interpretativo para a comunidade democrática, é mais uma

modificação evidenciada na evolução do Positivismo estrito, que encontra claras objeções no

novo modo interpretativo de consideração do caso concreto, na necessidade de se fundir

momentos de aplicação e interpretação da norma, e numa sociedade mais aberta de intérpretes.

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Fazer a distinção entre valorar e avaliar é importante para que não haja dúvidas quanto às

terminologias e finalidades. Esta diferença pode ser notada nos escritos de Miguel Reale (1998, p.

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Valorar não é avaliar. Valorar é ver as coisas sob o prisma de valor. Quando se compraum quadro, não se valora, mas se avalia. Em tal caso, compara-se um objeto com outros.Valorar ao contrário, pode ser mera contemplação de algo, sem cotejos ou confrontos,em sua singularidade sob prisma de valor. O crítico de arte valora um quadro ou umaestátua, porque os compreende sob prisma valorativo, em seu ‘sentido’ ou ‘significado’.O negociante de arte ‘avalia’ o quadro depois de valorá-lo. Valorar e avaliar são,portanto palavras de sentidos distintos, embora complementares.

Não há ciência isenta de valores e de ideologias. O fato de alguns autores não atribuírem

um caráter valorativo ao conhecimento científico não significa que nas ciências não pode haver

valoração, que não haja uma ciência axiológica, tendo em vista que é inerente ao homem atribuir

valores àquilo que ele observa no mundo. A importância daquilo que se estuda, que se pesquisa e

aonde se quer chegar com uma metodologia é graduado pelo valor que o homem atribui a todas

as coisas.

Há uma distinção entre crença e valoração. Com relação à primeira, pode haver um

julgamento a respeito das suas veracidades ou falsidades e uma graduação dos níveis de verdade

ou mentira. Na valoração há uma distinção, não pode haver um julgamento objetivo nos padrões

científicos. Dizer que algo é justo, correto ou adequado, medindo-se o grau de intensidade desses

sentimentos, não pode ser feito. No momento em que uma pessoa manifesta sua opinião a

respeito de um determinado fato ou coisa, estará assim expressando suas crenças e somando-as às

suas valorações. Sobre valorações escreve Gunnar Myrdal (1965, p. 124), esclarecendo:

Valorações específicas são selecionadas para servirem como opiniões, formuladas empalavras e motivações por razões aceitáveis. Com a ajuda de certas crenças sobre arealidade, as valorações são colocadas como partes de um esquema geral de valores doqual se apresentam como se fossem inferências lógicas. Esta hierarquia de valores temuma estrutura simples ou elaborada, dependendo, principalmente, do nível cultural dapessoa. Mas, independente disto, a maior parte das pessoas deseja exibir aos seussemelhantes – e a si próprias – um conjunto bem aparado e polido de valorações, no qual

a honestidade, a lógica e a coerência sejam a regra..

O Direito, a Moral e os Valores estão interligados. O aplicador do direito, o juiz, o ser

humano, está a todo o momento fazendo juízo de valor, quando, por exemplo, permite um

acusado de responder o processo em liberdade, ele o faz por que acredita que o acusado não

coloca em risco a sociedade, o faz valorando, se utilizando de critérios pessoais.

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Quando se fala em interpretar a lei, agir dizendo o direito, se está nesse momento a agir

com valorações. Muito se comenta que o juiz deve ser imparcial, mas não poderá ser feita a

afirmativa de que ele deva ser neutro, ou seja, que seja proibido de valorar. A neutralidade em

nada se confunde com imparcialidade, pois esta se refere ao distanciamento do julgador com as

partes interessadas, quando há uma completa liberdade do magistrado para decidir a causa

conforme suas convicções do que seja certo ou errado.

A racionalização existente no critério de avaliação dos valores e crenças é claramente

oportunista .Quando se serve de uma motivação para uma ação ou omissão, as valorações e

crenças são selecionadas de acordo com a ocasião a que se presta. Os valores em uma sociedade

estão em constante modificação, assim como o Direito. Um exemplo que podemos observar é o

caso do crime de adultério, que no momento da publicação do Código Penal brasileiro da década

de 40, era considerado crime, mas hoje, com a modificação dos valores, deixou de ser ato delitivo

sancionado, apesar de ainda ser repugnado moralmente. Gunnar Myrdal (1965, p. 132) discorre

sobre a dinâmica da valoração:

Segundo o nosso ponto de vista, mudanças em valorações – do tipo conhecido comorevolução, mutação, ou explosão – hão de ocorrer, provavelmente, sem interrupção, nasociedade moderna. A estabilidade ou, melhor, a ausência de mudança, é o que exigeexplicação, quando se apresenta. Os indivíduos, numa sociedade moderna, se encontramna mesma condição de lábil equilíbrio que a molécula de explosivo. Suas valorações sãoinconsistentes, e eles estão sendo constantemente lembrados dessa inconsistência.Ocasionalmente, a personalidade moral do indivíduo explode, produzindo-se umamodificação e reorganização das valorações, com o que se atinge um equilíbrio maisestável.

Este fenômeno de explosão ocorre não só no indivíduo, mas também na sociedade, que

ao aderir ou modificar seus valores está buscando uma condição mais estável, confortável. Todo

esse processo tem conseqüências no Direito tanto para aqueles que elaboram as leis quanto para

os que às cumprem. A chamada opinião pública, que é o resultado da influência sobre todos os

indivíduos de uma sociedade, quanto a valores impostos, pode, muitas vezes, modificar as leis,

fazendo com que haja um surgimento de novas normas jurídicas para o Direito.

Um exemplo desta influência é o que se observa no seguinte caso que ocorreu na

sociedade cearense, mas que se tornou público e assim pode ser citado sem excessivas restrições.

Um crime contra a mulher fez com que uma lei de natureza penal viesse a ser aprovada para

aumentar as sanções nos crimes praticados contra este gênero, mais especificamente nos casos de

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violência doméstica, criando novos tipos delitivos e medidas processuais, como as medidas

protetivas, que tem o objetivo de evitar tais abusos. Houve, neste caso, grande influência social,

que modificou as valorações existentes pelas novas. O crime contra Maria da Penha foi a faísca

para que a pólvora existente viesse a explodir e um sistema de valores com relação à violência

doméstica se instalasse na sociedade brasileira.

Ora, por conta de uma modificação nos valores sociais vigentes, uma nova norma jurídica

foi criada, fazendo com que haja uma subordinação entre a norma e a conduta humana. É o que

afirma Hans Kelsen (1985, p. 181-182):

[...] a norma jurídica tem como objeto regulamentar a conduta dos indivíduos, tendo,pois, caráter prescritivo, desde que criada pela autoridade competente, revestida dopoder de prescrição. Assim sendo, a relação entre norma e comportamento humano é desubordinação.

Um fato local que teve repercussão internacional e modificou a realidade nacional devido

à mudança e à inserção de um novo sentimento de valores que, por sua vez, acarretou na criação

de novas normas jurídicas para regular um possível comportamento serve também como

prevenção e, por isso, tem a sanção. Sobre a dinâmica da valoração escreve Gunnar Myrdal

(1965, p. 133) explicando teoricamente a forma com que os valores se modificam:

Através de um cartases de opiniões – de um indivíduo ou de um grupo – estabelece-seum novo equilíbrio, temporário e lábil de valorações em conflito. A tendência de umprocesso normal e pacífica de educação popular é no sentido da decrescente incoerência.Já dissemos que, ordinariamente, no novo equilíbrio, as valorações mais gerais ganhammais peso. Mas a nossa conclusão se baseava no argumento de que havia um consensogeral quanto a serem tais valorações moralmente “mais elevadas” e no de receberem asuprema sanção social, acrescentando a restrição de que nossa conclusão presume quenão se difunda o cinismo moral.

O Valor, assim como o Direito, está no mundo do “dever ser”. Discorre Arnaldo

Vasconcelos (1986, p. 02), acerca do mundo do ser e do dever ser:

A diferença entre o mundo do ser e o mundo do dever ser é marcante, tanto por seusfundamentos, como por suas conseqüências. O mundo do dever ser se caracteriza e sedistingue, essencialmente, por ser o reino da liberdade, contemplando o homem em suasimensas potencialidades de ser que tende a superar-se a todo instante. O mundo do ser éobjeto do conhecimento, ao passo que o mundo do dever-ser é objeto da ação. Como é ohomem livre, o Direito não poderia exprimir-se senão como um dever-ser, comopossibilidade.

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Não se pode afastar a figura do valor da dimensão axiológica das ciências humanas (e

nesta se inclui o Direito), sociais ou culturais. É o que diz Arnaldo Vasconcelos (1986, p. 02), ao

fazer a distinção entre ciências naturais e humanas.

Expressar-se em norma significa ser normativo. Normatividade opõe-se à causalidade.Nas ciências sociais, culturais ou humanas, prevalece a dimensão axiológica; nasciências naturais, físicas ou matemáticas, domina a dimensão existencial. A ciêncianatural, neutra e causal, afirma o que é, colocando sob o signo da necessidade, enquantoa ciência social, axiológica e normativa, diz o que deve ser, situando-se no mundo daliberdade. Manifesta-se esta através das regras de fim, peculiarmente chamadas normas.

Arnaldo Vasconcelos (1986, p. 02) refere-se ainda à dimensão axiológica, valorativa,

como sendo o que distingue ciências humanas de ciências naturais, e tendo aquilo como o que

distingue é essência, portanto, é mais um argumento de que o valor está inserido na ciência do

Direito. Os valores, para a ciência do Direito, estão relacionados ao dever ser, não só quanto à

moral e ética, mas ao vislumbre de um mundo ideal em que o homem pretende ser, dentro do

objeto das ciências humanas. Portanto, quando se fala em uma ciência axiológica, na valoração,

não pode haver um desvirtuamento nem uma generalização para todos os ramos das ciências, mas

apenas referindo-se às ciências humanas. O Direito é uma ciência axiológica.

Orientação maior sobre o Direito e os valores é a escrita por Arnaldo Vasconcelos (2003,

p. 144) , em sua tese de Doutorado, quando observa:

Apesar de Kelsen haver afirmado, em tom de princípio programático, que a teoria pura,por ser positivista e realista, ‘recusa-se a valorar o Direito positivo’ (1974:161), admitefrancamente, no entanto, tenha a norma jurídica função axiológica. Está também dito naTeoria Pura do Direito, antes dessa sua primeira afirmativa, que ‘a norma consideradacomo objetivamente válida funciona como medida de valor relativamente à condutareal’(1974:38). Em seguida, explica-se Kelsen: (O valor, como dever-ser coloca-se emface da realidade, como ser; valor e realidade – tal como o dever-ser e o ser – pertencema duas esferas diferentes’ (1974:40). Mais incisiva é a sua asserção de que a ‘normafundamental hipotética é à base de todos os juízos jurídicos de valor possíveis naestrutura da Ordem jurídica de um Estado dado’ (1997:215). Portanto, a teoria puraenvolve o valor, que, como tal, perpassa toda a ordem jurídica.

A compreensão de círculo hermenêutico colocada por Heidegger (2000, p. 207),

demonstra a inexistência de uma Ciência do Direito compatível com a neutralidade, ou seja, que

não é influenciada pela política ou outros aspectos sociais. Não se deve observar o fato como

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sendo objetivo e o valor como sendo subjetivo, pois se assim for compreendido, haverá uma

fortalecimento da tese de uma ciência valorativa e de um círculo hermenêutico.

1.6 Princípios e a resolução de conflitos

Saber o significado, conceituar e entender o que seja princípio no âmbito da Ciência do

Direito Constitucional-Tributário é de real importância na compreensão do ordenamento jurídico,

na interpretação e aplicação das normas na sua essência, como explana Roque Antonio Carraza

(1996, p. 29), constitucionalista e tributarista amplamente reconhecido pela doutrina:

[...] ora, num edifício tudo tem importância: as portas, as janelas, as luminárias, asparedes, os alicerces etc. No entanto, não é preciso termos conhecimentos aprofundadosde Engenharia para sabermos que muito mais importante que as portas e janelas( facilmente substituíveis ) são os alicerces e as vigas-mestras. Tanto que, se de umedifício retirarmos ou destruirmos uma porta, uma janela ou até mesmo uma parede, elenão sofrerá nenhum abalo mais sério em sua estrutura, podendo ser reparado (ou atéembelezado). Já, se dele subtrairmos os alicerces, fatalmente cairá por terra. De nadavalerá que as portas, janelas, luminárias, paredes etc. estejam intactas e em seus devidoslugares. Com inevitável desabamento, não ficará pedra sobre pedra. Pois bem, tomadasas cautelas que as comparações impõem, estes ‘alicerces’ e vigas-mestras’ são osprincípios jurídicos, ora objeto de nossa atenção;

E sobre definição de princípio jurídico (1996, p. 29):

[...] princípio jurídico é um enunciado lógico, implícito ou explícito, que, por sua grandegeneralidade, ocupa posição de preeminência nos vastos quadrantes do Direito e, porisso mesmo, vincula, de modo inexorável, o entendimento e a aplicação das normasjurídicas que com ele se conectam. (CARRAZA, 1996, p. 29)

Já para Celso Antonio Bandeira de Mello (1980, p. 230):

[...] Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicercedele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes oespírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente pordefinir a lógica e racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhedá sentido harmônico.

Para a hoje Ministra do Supremo Tribunal Federal, Carmem Lúcia Antunes Rocha ( 1994,

p. 25):

[...] Os princípios constitucionais são os conteúdos primários diretores do sistemajurídico-normativo fundamental de um Estado. Dotados de originalidade e superioridadematerial sobre todos os conteúdos que formal o ordenamento constitucional, os valoresfirmados pela sociedade, sedimentam-se nas normas, tornando-se, então pilares queinformam e conformam o Direito que rege as relações jurídicos no Estado.

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Segundo Ruy Samuel Espínola (1999, p. 132):

[...] além de servirem como parâmetro para solução de problemas jurídicos que exijam asua aplicação normativa, ainda funcionam como critérios interpretativos para solução deoutros casos, que não lhe solicitem, diretamente, aplicação jurídica. Esses casos podemter em mira tanto normas jurídicas constitucionais quanto infraconstitucionais. Ou seja,os princípios constitucionais, além de desempenharem a função de normas comdiferentes graus de concretização, ainda funcionam como critério para interpretação deoutras normas, não importando o nível hierárquico-normativo destas.

O intérprete e aplicador do direito pode observar choque entre direitos fundamentais e

outros bens constitucionalmente tutelados. A doutrina entende esse fenômeno como sendo a

colisão de direitos fundamentais. O problema de se saber resolver tal colisão de acordo com

alguns critérios é um dos pontos do presente trabalho.

No caso dos princípios, o método a ser adotado quando o intérprete se deparar com um

“hard case” (caso difícil) é utilizar a lei de colisão. Caso haja dúvida entre dois princípios

possíveis de serem aplicados no caso concreto, este método indicará qual princípio deverá

prevalecer.

Não se pode fazer confusão entre o que seja regra e o significado de princípios, pois para

a hermenêutica, tais espécies do gênero norma jurídica se apresentam de forma distinta no

ordenamento jurídico, Canotilho (1999, p. 1088 – 1089) esclarece esta questão:

(1) os princípios são normas jurídicas impositivas de uma optimização, compatíveis comvários graus de concretização, consoante os condicionalismos fácticos e jurídicos; asregras são normas que prescrevem imperativamente uma exigência (impõem, permitemou proíbem) que é ou não é cumprida [...]; a convivência dos princípios é conflitual(ZAGREBELSKY); a convivência de regras é antinômica; os princípios coexistem; asregras antinómicas excluem-se; (2) conseqüentemente, os princípios, ao constituiremexigências de optimização, permitem o balanceamento de valores e interesses (nãoobedecem, como as regras, à ‘lógica do tudo ou nada’), consoante o seu peso e aponderação de outros princípios eventualmente conflitantes; as regras não deixamespaço para qualquer outra solução, pois se uma regra vale (tem validade) deve cumprir-se na exacta medida das suas prescrições, nem mais nem menos. (3) em caso de conflitoentre princípios, estes podem ser objecto de ponderação, de harmonização, pois elescontêm apenas ‘exigências’ ou ‘standards’ que, em ‘primeira linha (prima facie), devemser realizados; as regras contêm ‘fixações normativas’ definitivas, sendo insustentável avalidade simultânea da regras contraditórias. (4) os princípios suscitam problemas devalidade e peso (importância, ponderação valia); as regras colocam apenas questões devalidade (se elas não são correctas devem ser alteradas).

Muitas vezes, ao se utilizar do termo proporcionalidade de forma a se referir ao seu

sentido técnico-jurídico, faz-se confusão com a expressão razoabilidade, mas se tratam de termos

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jurídicos totalmente diferentes e o uso destas palavras como sinônimas poderá levar a erro na

aplicação do direito.

É pacífico, na doutrina, que o princípio da proporcionalidade seja de interpretação e

aplicação do direito, onde o objetivo é fazer com que nenhuma restrição a direitos fundamentais

tome dimensões desproporcionais. Com a lei de sopesamento (necessidade, adequação e

proporcionalidade em sentido estrito) são disponibilizadas ferramentas para um melhor

entendimento do tema ao se estabelecer três passos para atingir um resultado aceitável.

Primeiramente deve-se determinar o grau de restrição de um princípio; em seguida, avaliar a

importância em se realizar outro princípio e, por fim, deliberar se a importância em realizar o

segundo princípio justifica a restrição, ou seja, a não realização do primeiro princípio. Para

Robert Alexy (1999, p. 102), sopesar princípios significa estabelecer o “peso concreto” (a

relevância específica) de um princípio em relação a outro que lhe seja conflitante, levando em

consideração o “peso abstrato” de cada um deles, bem como as restrições a serem concretamente

impostas a cada um deles em caso de realização do outro.

Na nossa Corte Suprema, o Supremo Tribunal Federal solidifica a idéia de que a

proporcionalidade e a razoabilidade sejam sinônimas. Em várias de suas decisões, usando tais

expressões não de forma sistemática, mas meramente retórica, quando busca expurgar aplicações

de uma conduta por deveras abusiva, usa-se a seguinte frase, colocando tudo em um só bloco de

sentido, sem fazer nenhum tipo de distinção teleológica: “à luz do Princípio da Proporcionalidade

ou da razoabilidade, o deve ser considerado inconstitucional”. O Supremo, desta forma, se afasta

da discussão de fazer a seguinte distinção e aplica a seguinte fórmula em seus julgados:

A constituição consagra a regra da proporcionalidade → se o ato questionado não respeita

essa exigência → logo, o ato é inconstitucional.

Para compreender o que seja a regra de aplicação da proporcionalidade, se faz necessário

entender o sentido das três bases inseridas em seu conceito, no caso, a necessidade, a adequação e

a proporcionalidade em sentido estrito. A fuga a um destes elementos deixa claro que o ato

analisado é deveras desproporcional. Um bom aplicador do direito necessita saber e discernir a

utilização dessas ferramentas para poder proceder de forma equilibrada e segura em seus atos.

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A proporcionalidade é aplicável na teoria dos princípios por meio do balanceamento ou

ponderação e pressupõe o exame de outras três condições: adequação, necessidade e

proporcionalidade em sentido estrito. É relevante apontarmos a confusão terminológica que

envolve a noção de proporcionalidade. Diferentes autores a classificam ora como máxima,

princípio, regra, postulado normativo. Tal análise será objeto de estudo desta dissertação.

A proporcionalidade e a razoabilidade estão diretamente ligadas ao conceito e aplicação

da ponderação. O conceito de ponderação foi desenvolvido a partir da diferença qualitativa entre

normas e princípios. Robert Alexy (1999, p. 105) afirma que a ponderação resulta do

reconhecimento necessário da proporcionalidade, e diz que aceitar a proporcionalidade é aceitar

que princípios são mandatos de otimização, ou seja, determinadas normas poderão ser cumpridas

em maior ou menor grau, dependendo das possibilidades jurídicas e fáticas, devendo ser objeto

de uma ponderação quando colidirem com outros princípios.

O conceito de princípio, portanto, não decorre da abstração, generalidade ou mesmo da

fundamentalidade da norma, mas da sua forma de aplicação, que é oposta àquela das regras. Em

sentido oposto, Jürgen Habermas, fazendo uma crítica à teoria do sopesamento de Robert Alexy

(1999, p. 97), afirma que a ponderação não seria realizada de forma racional, pois a atribuição de

pesos aos direitos e às restrições poderia ocorrer de forma arbitrária e sem a devida reflexão,

trazendo, assim, enorme risco à segurança jurídica.

O conceito de princípio na teoria de Alexy nada diz sobre a fundamentalidade da norma.

Assim, um princípio pode ser um “mandamento nuclear do sistema”, mas também pode não o

ser, já que uma norma é um princípio apenas em razão de sua estrutura normativa e não de sua

fundamentalidade. Ensina Valmir Pontes Filho (2001, p. 77):

Vale retornar, ainda que a vôo de pássaro, ao tema da interpretação sistêmica do Direito:esta técnica necessariamente conduz o exegeta à reflexão de que nenhuma norma existeisoladamente, como se cada uma delas fosse compartimento estanque, algo bastante emsi: ao contrário, percebe ele que as regras de um dado sistema jurídico se encontram empermanente, continuo e inexorável conexão, sendo relevante notar que esse inter-relacionamento não se dá num plano só meramente normativo (é dizer, entre as simplesnormas), mas, muito especialmente, no plano dos princípios (ou das normasprincípiológicas), de tal modo a interpretação de uma norma (e em especial de umprincípio) influi na de outra; demais disso, às vezes é preciso equilibrar o sistemajurídico-constitucional, quando surgem os aparentes conflitos entre princípios, ocasiãoem que cabe ao intérprete, à luz da proporcionalidade, escolher aquele topicamente quese põe como mais importante. A rigor, como já anteriormente salientado, nem é

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adequado falar-se em ‘técnica sistemática de interpretação’ apartada das demais, postoque interpretar não-sistematicamente é não interpretar.

Numa análise do papel dos princípios na atividade interpretativa da Constituição, nos

ensina Luiz Roberto Barroso (1996, p. 150):

[...] Sem embargo dos particularismos inevitáveis, procurou-se delinear... um papelabrangente dos princípios constitucionais... Ao intérprete constitucional caberávisualizá-los em cada caso e seguir-lhe as prescrições. A generalidade, abstração ecapacidade de expansão dos princípios permitem ao intérprete, muitas vezes, superar olegalismo estrito e buscar no próprio sistema a solução mais justa... Mas são essesprincípios que funcionam como limites interpretativos máximos, neutralizando osubjetivismo voluntarista dos sentimentos pessoais e das conveniências políticas,reduzindo a discricionariedade do aplicador na norma e impondo-lhe o dever de motivarseu convencimento.

Pode-se afirmar que a ponderação é uma tentativa de restabelecer uma conexão entre

direito e justiça, reconhecendo valor normativo para todos os princípios e adequando sua

aplicação conforme as condições concretas e as possibilidades jurídicas; agindo de forma racional

para atingir uma correção na aplicação da lei fundamentalidade. Tal discussão será objeto de

estudo e aprofundamento no trabalho aqui proposto.

1.7 Regras e antinomia jurídica

Outro problema que pode surgir para o intérprete e aplicador da norma jurídica é o de

saber como proceder diante da identificação de um choque entre as regras, problema conhecido

como antinomia jurídica.

Pode-se entender antinomia como sendo a presença de duas normas que se apresentam

incompatíveis entre si num sistema jurídico. Se entendermos assim, em prol da justiça, pode-se

dizer que o Direito não aceita antinomias. A incompatibilidade pode ser verificada quando da

existência de três situações distintas: primeiramente, quando da existência do choque entre uma

norma que ordene alguém a fazer algo e uma segunda que proíba. Esta conjectura pode ser

denominada de contrariedade. Uma segunda situação de incompatibilidade é quando da

existência de uma norma que ordene alguém a fazer algo ou alguma coisa e uma segunda que não

permita que este algo ou esta coisa seja feita. O nome desta incompatibilidade é

contraditoriedade. A terceira e última hipótese é aquela em que uma norma proíba que algo ou

alguma coisa seja feita, mas, se contrapondo a esta, há outra norma que permita que este algo ou

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esta coisa seja feita. O nome desta incompatibilidade também é contraditoriedade. Nota-se que é

necessário entender um pouco de lógica no contexto em que estes conceitos são estudados.

Para que seja verificada a existência de antinomia jurídica, não é suficiente a percepção

das situações acima descritas, requer-se, ainda, que as normas em análise se encontrem inseridas

em um mesmo ordenamento. Não se pode falar em antinomia quando, por exemplo, uma norma

constitucional se apresenta de forma incompatível com uma norma ordinária, ou seja, de natureza

hierárquica inferior. Norberto Bobbio (1996, p. 88) ainda ressalta que a norma deve ter o mesmo

âmbito de validade espacial, pessoal, material e temporal para que esse tipo de análise seja feita.

Para explicar tais conceitos, o autor apresenta os seguintes exemplos:

a) validade temporal: ‘É proibido fumar das cinco às sete’ não é incompatível com ‘Épermitido fumar das sete às nove’;b) validade espacial: ‘É proibido fumar na sala de cinema’ não é incompatível com: ‘Épermitido fumar na sala de espera’;c) validade pessoal: ‘É proibido, aos menores de 18 anos, fumar’ não é incompatívelcom ‘É permitido aos adultos fumar’;d) validade material: ‘É proibido fumar charutos’ não é incompatível com ‘É permitidofumar cigarros’.

Para que haja um melhor entendimento do que seja antinomia jurídica, é interessante

estudar o conceito trazido por Tércio Sampaio Ferraz Junior (1994, p. 211), qual seja:

[...] a oposição que ocorre entre duas normas contraditórias (total ou parcialmente),emanadas de autoridades competentes num mesmo âmbito normativo, que colocam osujeito numa posição insustentável pela ausência ou inconsistência de critérios aptos apermitir-lhe uma saída nos quadros de um ordenamento dado.

Entendendo o que seja o conceito de antinomia jurídica, para prosseguir no estudo, é

necessário expor uma divisão acerca das espécies existentes de antinomias. Tratam-se das

antinomias reais (insolúveis) e aparentes (solúveis). Norberto Bobbio (1996, p. 92) conceitua as

antinomias reais como aquelas em que o intérprete é abandonado a si mesmo ou pela falta de um

critério, ou ainda por conflito de critérios dados. Esclarece e acrescenta Tércio Sampaio Ferraz

Junior:

O reconhecimento desta lacuna não exclui a possibilidade de uma solução efetiva, querpor meios ab-rogatórios (edita-se nova norma que opta por uma das normasantinômicas), quer por meio de interpretação equitativa, recurso ao costume, à doutrina,a princípios gerais do direito, entre outros. O fato, porém, de que estas antinomias ditasreais sejam solúveis desta forma não exclui a antinomia, mesmo porque qualquer dassoluções, ao nível da decisão judiciária, pode suprimi-la no caso concreto, mas nãosuprime a sua possibilidade no todo do ordenamento, inclusive no caso de edição de

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nova norma, que pode por pressuposição, eliminar uma antinomia e, ao mesmo tempodar origem a outras. O reconhecimento de que há antinomias reais indica, por fim, que odireito não tem o caráter de sistema lógico-matemático, pois sistema pressupõeconsistência, o que a presença da antinomia real exclui. (FERRAZ JUNIOR, 1994, p.211).

No caso dos princípios, não pode ser aplicado o critério da hierarquia como forma de

resolução de conflitos, pois não há hierarquia entre princípios, sofrendo este apenas juízo de

valoração. O critério da especialidade também não se aplica a princípios, assim como o da

cronologia.

Toda essa prévia análise da hermenêutica constitucional tributária se faz necessária para

apreender a aplicação dos preceitos constitucionais, que tem como previsão os tributos e os

princípios a eles relacionados. Entender os métodos de resolução de conflitos entre as regras, bem

como a ponderação de princípios no caso concreto, torna possível exigir uma aplicação coerente

do Princípio da Capacidade Contributiva no momento em que o contribuinte sofre a exação dos

tributos previstos nas regras constitucionais. Assim como torna viável a garantia da existência do

federalismo fiscal devido à repartição constitucional das receitas dos tributos, aspecto apreciado

no próximo capítulo.

1.8 Do estado subsidiário

Muito se falou no presente trabalho a respeito do Estado Social e do Estado Liberal, onde

este teria sido superado por aquele, o que realmente é verdade, em todas as concepções e

preceitos, houve uma mudança na compreensão da função do estado frente aos indivíduos. Não é

a tua que Paulo Bonavides escreveu um livro sobre explicado essas mudanças, intitulado “Do

Estado Liberal ao Estado Social”. Mas como já lembrava o professor Hugo de Brito Machado

Segundo, em uma conversa esclarecedora e sugestiva sobre o tema, aquilo que consta no livro do

catedrático professora da Universidade Federal Do Ceará foi escrito a quase 50 anos, e que

atualmente o que se defende é a existência de um estado subsidiário. Este é caracterizado por uma

nova concepção da relação Estado-Sociedade, na qual os indivíduos tem a liberdade de

resolverem seus conflitos, para só então, falhando esta oportunidade pode o estado de forma

subsidiária intervir nas relações privadas. O que pode-se observar é que no Estado Liberal, pós

revolução burguesa era marcado pelo estado mínimo, não intervencionista, já no Estado Social

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pós revolução socialista havia o estado máximo, intervencionista, já o Estado Subsidiário é o

meio termo. Bem escreve Moreira Neto (1999, p. 44):

Esses dois momentos, o da fundação e o do ressurgimento do Estado Liberal, têm seuscarismas próprios: a fundação se caracterizou pelo primado das manifestações deliberdade do indivíduo e pelo emprego do direito da fonte de direito estatal para lograr-se a proteção de certos interesses caracterizados como públicos, o que explicava a ênfasena construção do Estado de Direito, enquanto que o ressurgimento do Estado Liberal secaracteriza pelo primado das manifestações de liberdade da sociedade e pela acolhidadas fontes alternativas de direito por elas geradas para a proteção de novas configuraçõesde interesses, o que justifica a ênfase na construção do Estado Democrático.

Há, portanto, uma substituição após o surgimento do novo ordenamento jurídico

brasileiro em 1988, da compreensão de estado, sendo atualmente defendida a tese da existência

do Estado Subsidiário, por autores como Ricardo Lobo Torres (2005, p. 174-175) ao dizer que:

O Estado Democrático e Social de Direito vai se afirmando, cada vez mais, como EstadoSubsidiário. No Brasil essa característica fica muito clara a partir das reformasconstitucionais da década de 90. O Estado Subsidiário reflete um novo relacionamentoentre Estado e Sociedade, no qual a Sociedade tem a primazia na solução dos seusproblemas, só devendo recorrer ao Estado de forma subsidiária. Observou Klaus Tipkeque o Estado não possui dinheiro originariamente (Der Staat selbst hat kein Geld) e quesua missão se reduz a tirar parcimoniosamente recursos da camada mais rica dapopulação para repassá-los à mais pobre, observando os postulados da justiça. O EstadoSubsidiário vem substituir historicamente o Estado de Bem-estar Social, no qual havia apredominância do Estado sobre a Sociedade ou até uma certa simbiose entre ambos.Remotamente se estrema do Estado Liberal Clássico ou do Estado Guarda-Noturno, queprivilegiava a liberdade individual e no qual o indivíduo tinha a preeminência diante doorganismo estatal. (...) O Estado Subsidiário é o Estado da Sociedade de Risco, assimcomo o Estado de Bem-estar Social, na expressão de Forsthoff, foi o Estado daSociedade Industrial, que entrou em crise pela voracidade na extração de recursosfinanceiros da sociedade para financiar as políticas desenvolvimentistas e o plenoemprego. Não se cuida de um Estado Pós-moderno, que passe a se conduzir pelosmecanismos da deslegalização, da desregulamentação ou da autoregulação, mas de umEstado Pós-positivista, ainda no âmbito da modernidade, que procura pautar as suasações com base no princípio da transparência, para superar os riscos sociais. Asociedade de riscos se caracteriza por algumas notas relevantes: a ambivalência, ainsegurança e o redesenho do relacionamento entre as atribuições das instituições doEstado e da própria sociedade.(...) Da ambivalência e do caráter paradoxal da sociedadede risco decorre a modificação do próprio conceito de segurança. A idéia de segurançajurídica, prevalecente no Estado Liberal Clássico, que tinha por objetivo a proteção dosdireitos individuais do cidadão, começa a ser contrabalançada no Estado de Bem-estarSocial com a de segurança social (rectius: seguridade social) e culmina, no EstadoSubsidiário, com a de seguro social. Os riscos e a insegurança da sociedade hodierna nãopodem ser eliminados, mas devem ser aliviados por mecanismos de segurança social,econômica e ambiental. A solidariedade social e a solidariedade do grupo passam afundamentar as exações necessárias ao financiamento das garantias da segurança social.Habermas chega a falar em uma nova dimensão estatal, a do Estado de Segurança(Sicherheitsstaat), fundado no princípio da solidariedade. Uma outra característicamarcante da sociedade de risco é que nela as instituições políticas e as instituiçõessociais entram em novo relacionamento. O Ministério Público e o Judiciário passam a

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exercer papel mais ativo na defesa dos direitos difusos, em cooperação com asinstituições sociais, afastando-se da missão neutra que desempenhavam na sociedadeindustrial. A sociedade de riscos, com a pluralidade de interesses em jogo, énecessariamente uma sociedade litigiosa.

Nota-se na passagem acima citada que o estado subsidiário não é mínimo nem máximo,

mas intermediário quanto intervenção nas relações privadas, ele passa a intervir apenas no

momento em que os particulares não conseguem chegar a uma harmonia. Não há uma extinção

dos riscos sociais, mas apenas aliviados, esta função fica a cargo da iniciativa privada vigiada de

perto pelo estado.

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2 TRIBUTOS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Dúvida não pode haver no que diz respeito ao número de tributos existentes no

ordenamento jurídico brasileiro, e, já de pronto respondendo à presente indagação, pode-se dizer

que são cinco: impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e

contribuições.

2.1 Tributos em espécie

Apontar o quantitativo tributário é relevante pelo fato de que controvérsias existiam sobre

este número, pois doutrina já desautorizada dividia os tributos em apenas três: (teoria obsoleta,

denominada de Teoria Tripartite) os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria,

fundamentando-se tal doutrina no Código Tributário Nacional. Vale ressaltar, neste momento,

que a Constituição Federal de 1988 recepcionou, com roupagem de lei complementar, o Código

Tributário Nacional, que só poderá ser modificado por lei completar, requerendo, dessa forma,

um quorum qualificado de maioria absoluta, mesmo tendo sido criado por decreto-lei. Iniciar-se-á

o estudo, por razão meramente didática, falando-se a respeito dos impostos.

2.1.1 Impostos

Conceituar é delimitar, sabendo-se, no entanto, que jamais um conceito irá condizer de

forma perfeita à realidade; o conceito é fluido diante da realidade que lhe dá significado,

escapando quase sempre sua essência, por mais que se tente agarrá-la. Assim, conceituar imposto,

ou melhor, identificar uma conceituação para imposto dentre várias possíveis, é tarefa, no

mínimo, necessária. No entanto, deve-se dizer, primeiramente, que se pode encontrar uma

denominação expressa e clara no CTN (Código Tributário Nacional), em seu artigo 16, e, em

segundo lugar, que se trata de matéria já pacificada em vasta doutrina que, a despeito disso, não

deixa de merecer um maior exame. Diz o artigo 16 do CTN: “Imposto é tributo cuja obrigação

tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa

ao contribuinte”.

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O conceito acima descrito, apesar de doutrinariamente acatado, não deixa transparecer

importante aspecto do imposto: seu conceito está intrinsecamente relacionado à concepção

política de determinado Estado, como explanam as palavras de Bernardo Ribeiro de Moraes

1996, p. 397):

a) na fase primária da vida em sociedade, o imposto apresenta-se como uma prestaçãonão contratual, cujo fundamento variava consoante a vontade e a força de quemdispunha do poder político; b) do pagamento voluntário (benevolência), o impostopassou a ser um pagamento compulsório; c) da compensação pela atividade do chefe oimposto passou a ser uma contribuição à Fazenda Pública. O direito de tributar aparecefundamentado na função do Estado de satisfazer necessidades coletivas (a finalidade darealização do bem comum e não do direito próprio, da necessidade ou da vontade dodetentor do poder político); d) da compensação ocasional, o imposto passou a cobrir asnecessidades permanentes; e) da prestação a cargo de certos grupos de pessoas oimposto passou a ser uma obrigação geral; f) de uma prestação em espécie ou detrabalho o imposto passou a ser uma prestação em dinheiro; e g) da prestação paracobrir fins fiscais o imposto passou a ser prestação com fins fiscais e extrafiscais, frutodo alargamento das funções do Estado e de sua ação intervencionista, através doimposto, para fomentar a produção de riqueza ou repartir riquezas existentes.

Vê-se que o conceito de imposto, ainda que legalizado e legitimado pela Constituição

instituidora de um Estado Federado, não prescinde de seu aspecto político, pois que não

prescinde mesmo da coação Estatal necessária a seu cumprimento. Mas, desde já, faz-se a

ressalva de que em um Estado Democrático de Direito a discricionariedade estatal quanto às

espécies de impostos e suas respectivas competências não pode ser confundida com

arbitrariedade, ou seja, a escolha dos impostos e a repartição de receitas não devem e não podem

ferir o Princípio Constitucional da Igualdade, Independência e Autonomia dos entes federados,

pois que se tratam de cláusulas pétreas inseridas na Carta Magna de 1988.

A Constituição da República de 1988, no seu artigo 145, inciso I, faz menção à espécie

tributária, mas como é característica da nossa Constituição retratar normas jurídicas gerais e

abstratas, não faz referência específica quanto a qualquer aspecto material. Lê-se no presente

artigo: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes

tributos: Impostos”.

Diz-se que o imposto é uma espécie de tributo que não vincula qualquer contraprestação

do Estado ao contribuinte que se encontra no pólo passivo da relação tributária. Mais do que isso,

está relacionado a uma atividade mesma do particular, tendo este que incidir no fato gerador para

que haja o surgimento da obrigação tributária, ou seja, depende de um agir do indivíduo em sua

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seara privada para seu surgimento. Outro ponto importante que se deve observar é a cronologia

que seguem os tributos que, em geral, trazem alguma importância. Primeiramente, faz-se

necessária a existência da hipótese de incidência, que surge através de lei, respeitando-se o

Princípio da Legalidade inerente ao sistema constitucional tributário. Em seguida, deve o sujeito

passivo praticar o fato gerador, assim nascendo a obrigação tributária. A partir deste momento,

começa a correr o prazo para a decadência; e o somatório deste com o lançamento faz surgir o

crédito tributário; caso este não seja pago pelo sujeito passivo, o crédito poderá ser inscrito na

dívida ativa, iniciando-se o prazo da prescrição, e assim podendo ser cobrado judicialmente por

execução fiscal. Por fim, o prazo tanto para a decadência quanto para a prescrição é de 5 (cinco)

anos. Abaixo seguem alguns esclarecimentos de Eduardo de Moraes Sabbag (2008, p. 91) a

respeito da não-vinculação do imposto à obrigatória atividade estatal1:

Ademais, insta mencionar que o imposto é, concomitantemente exação não vinculada egravame de arrecadação não afetada. Com efeito, a receita dos impostos visa custear asdespesas públicas gerais ou universais, v.g, educação, segurança pública, limpezapública etc., não se atrelando a qualquer órgão, fundo ou despesa, consoante proibiçãoderivada do Princípio da não-afetação dos impostos.

Os serviços estatais que se ligam aos impostos hão de ser gerais, e não específicos, pois,

se diferente fosse, estaria retratando uma característica de taxa, servindo a presente exação para

carrear recursos aos cofres públicos, onde a contraprestação do Estado, que ocorre através de

serviços e outros meios, não estão vinculados ao valor pago a título de imposto, já que os valores

arrecadados, por exemplo, através do imposto territorial rural, poderão servir para construir um

hospital na zona urbana.

Quanto às espécies de impostos, no sistema constitucional tributário há a previsão dos

impostos federais, de competência da União, presentes em sua maioria no artigo 153 da

Constituição Federal e em dois incisos no artigo 154:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:I - importação de produtos estrangeiros;II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados;III - renda e proventos de qualquer natureza;IV - produtos industrializados;V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;VI - propriedade territorial rural;VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.

1 Ver também art. 167, IV, CF.

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Art. 154. A União poderá instituir:I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde quesejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dosdiscriminados nesta Constituição;II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidosou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente,cessadas as causas de sua criação.

Há que se dizer que a maioria destes impostos acima descritos na Constituição são

instituídos por meio de lei ordinária, ressalvadas duas hipóteses de impostos federais, que só

poderão ser instituídos por lei complementar: o imposto sobre grandes fortunas e o imposto

residual. Conseqüência inevitável deste fato é que estes não poderão ser instituídos por Medida

Provisória, como assim determina a própria Constituição.

Inseridos no artigo 155 da Constituição Federal de 1988 estão os impostos estaduais,

competência dos estados-membros e do distrito federal. Delimitar tais impostos e competências é

de grande importância para o presente trabalho, no entanto, tecer comentários acerca de forma

específica sobre cada um deles desviaria o objetivo maior deste trabalho, que é tratar da

importância da repartição tributária de receitas.

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redaçãodada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; (Redação dada pelaEmenda Constitucional nº 3, de 1993) II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços detransporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e asprestações se iniciem no exterior; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)III - propriedade de veículos automotores. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993). (Grifo nosso).

E, finalmente, os impostos municipais – competência dos Municípios e do Distrito

Federal – estão explicitados na Constituição Federal, no art. 156, ressaltando-se que o Distrito

Federal acumula as competências do artigo 155 e 156.

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:I - propriedade predial e territorial urbana;II - transmissão ‘inter vivos’, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, pornatureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bemcomo cessão de direitos a sua aquisição;III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em leicomplementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

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Por fim, vale salientar que a Emenda Constitucional de número 3 (três) de 1993

modificou os artigos 155, caput e incisos I, II e III, assim como o inciso III do artigo 156, tendo

se mantido até a presente data a redação acima citada.

2.1.2 Taxas

Diferente do que ocorre com os impostos, as taxas são tributos que estão vinculados a

uma atuação do Estado, ligando-se a um agir deste, e não do particular. A União, os Estados, os

Municípios e o Distrito Federal têm competência para instituir taxas quanto a serviços instituídos

por cada um dos referidos entes. Enquanto o imposto é exação unilateral, a taxa é bilateral. Tais

afirmações confirmam-se quando observado o artigo 145, inciso II, da Constituição Federal:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir osseguintes tributos:[...]II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva oupotencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte oupostos a sua disposição [...].

Dois podem ser os fatos gerados da taxa: o primeiro deles é o exercício regular do poder

de polícia; e o segundo, a utilização, efetiva ou potencial de serviço público específico e divisível

prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição, nascendo, assim, a divisão dos dois tipos de

taxas: a de polícia ou fiscalização, presente no artigo 78 do CTN:

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitandoou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção defato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aoscostumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicasdependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ouao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. (Redação dada pelo AtoComplementar nº 31, de 28.12.1966)

Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quandodesempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância doprocesso legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abusoou desvio de poder. (Grifo nosso).

E a de serviço ou utilização, inserida no artigo 79 do mesmo diploma:

Art. 79. Os serviços públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se:I - utilizados pelo contribuinte:a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título;

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b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à suadisposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento;II - específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção,de unidade, ou de necessidades públicas;III - divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada umdos seus usuários.

É Imprescindível salientar que não se pode confundir taxa com tarifa, apesar de haver

alguns aspectos em comum, como o fato de serem ambas contraprestacionais e dotadas de

referibilidade. É de se dizer, no entanto, que as diferenças são maiores do que as semelhanças: a

taxa é um tributo, a tarifa não; a taxa é prestação pecuniária compulsória, a tarifa é facultativa; na

taxa há autonomia na vontade, na tarifa não; a taxa decorre de lei, a tarifa decorre de contrato

administrativo; a taxa não admite rescisão, a tarifa admite; na taxa a obrigação é “ex-lege”, na

tarifa a obrigação é “ex-voluntate”; a taxa obedece aos princípios de direito tributário, a tarifa

apenas aos de direito administrativo; a taxa obedece ao regime jurídico de direito público, a tarifa

obedece ao regime jurídico de direito privado; a taxa é cobrada em razão do poder de polícia, a

tarifa não; existe taxa de uso potencial, enquanto só existe tarifa de uso efetivo de serviço; a taxa

pode ser exigida somente por pessoa jurídica de direito público, já a tarifa pode ser exigida por

pessoa jurídica de direito tanto público quanto privado; a taxa não precisa ter seu valor

proporcional ao uso do serviço, a tarifa deve ser cobrada de forma proporcional ao uso; e, por

fim, na taxa é observado o poder de império do Estado, na tarifa não. Hugo de Brito Machado

2005, p. 20) confirma este posicionamento:

Como se vê, diferentemente dos impostos, as taxas são devidas em face da ocorrência deum fato diretamente ligado, ou vinculado, a uma atuação estatal. Seu ‘fato gerador’ não éatividade realizada pelo contribuinte (auferir renda, comercializar mercadoria etc), massim algo relacionado a uma atuação do Poder Público (prestação de serviços ouexercício do poder de polícia). Note-se que a atuação estatal que justifica a cobrança da taxa deve ser especificada aocontribuinte. Por isso, quando se tratar de serviço público, este deve ser específico, edivisível, ou seja, deve ser possível determinar a qual contribuinte o serviço está sendoprestado, e quanto desse serviço está sendo aproveitado, utilizado ou posto à disposiçãodesse mesmo contribuinte, individualmente. Também em relação ao poder de polícia, énecessário que este esteja sendo efetivamente exercitado sobre o contribuinte, para que ataxa possa ser cobrada.

Estes são os esclarecimentos quanto às características que fazem com que as taxas não

possam ser confundidas com os impostos, e nem mesmo com as tarifas, tendo, no entanto, uma

maior semelhança com essa última, tal como fora acima explanado com clareza e em poucas

palavras pelo professor.

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Foi solicitada venia para apresentar julgado proferido pelo Supremo Tribunal Federal, da

lavra do Ministro Carlos Velloso, que compilou diversas orientações doutrinárias a respeito de

taxas:

A taxa, espécie de tributo vinculado, tendo em vista o critério jurídico do aspectomaterial do fato gerador, que Geraldo Ataliba denomina de hipóteses de incidência(Hipótese de Incidência Tributária, Ed. Rev. dos Tribs. 4ª ed., 1991, págs. 128 e ss.), oué de polícia, decorrente do exercício do poder de polícia, ou é de serviço, resultante dautilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestadosao contribuinte ou postos a sua disposição (CF, art. 145, II). A materialidade do fatogerador da taxa, ou de sua hipótese de incidência, é, ‘sempre e necessariamente um fatoproduzido pelo Estado, na esfera jurídica do próprio Estado, em referibilidade aoadministrado.’ (Geraldo Ataliba, Sistema Trib. na Constituição de 1988, Rev. de Dir.Trib., 51/140), ou ‘uma atuação estatal diretamente referida ao contribuinte’, que ‘podeconsistir ou num serviço público ou num ato de polícia.’ (Roque Antônio Carrazza,Curso de Dir. Const. Tributário, Ed. R.T., 2ª ed., 1991, pág. 243). [...] As taxas depolícia, conforme mencionamos, decorrem do exercício do poder de polícia, conceituadoeste no art. 78 do CTN, e as de serviço, de um serviço público prestado ao contribuinte,serviço público específico e divisível (CF, art. 145, II). Os serviços públicos, ensinaRoque Carrazza, ‘se dividem em gerais e específicos’, certo que os primeiros, ou gerais,‘são os prestados uti universi, isto é, indistintamente a todos os cidadãos’, alcançando ‘acomunidade, como um todo considerada, beneficiando número indeterminado (ou, pelomenos, indeterminável) de pessoas.’ (Ob. cit., pág. 243). Esses serviços não constituemfato gerador de taxa, não podem, portanto, ser custeados por meio de taxa, mas pelosimpostos. ‘Já os serviços específicos’, acrescenta Carrazza, ‘são os prestados ut singuli.Referem-se a uma pessoa ou a um número determinado (ou, pelo menos, determinável,de pessoas). São de utilização individual e mensurável. Gozam, portanto, dedivisibilidade, é dizer, da possibilidade de avaliar-se a utilização efetiva ou potencial,individualmente considerada. ’ (Ob. e loc. cits.). Noutras palavras, o serviço ‘éespecífico quando possa ser separado em unidades autônomas de intervenção daautoridade, ou de sua utilidade, ou de necessidade pública, que o justificou: p. ex., aexistência do corpo de bombeiros para o risco potencial de fogo’; e ‘é divisível quandopossa funcionar em condições tais que se apure a utilização individual pelo usuário: – aexpedição de certidões, a concessão de porte de armas, a aferição dos pesos e medidas,etc.’ (Aliomar Beleeiro, ‘Direito Trib. Brasileiro’, Forense, l0ª ed., págs. 353- 354). Oserviço público, pois, que dá ensejo ao nascimento da taxa, há de ser um serviçoespecífico e divisível. “A sua utilização, pelo contribuinte, ou é efetiva ou é potencial,vale dizer, ou o serviço público é prestado ao contribuinte ou e posto à disposiçãodeste.” (ADI 447, voto do Min. Carlos Velloso, julgamento em 5-6-91, DJ de 5-3-93).[...] Concedo que há serviços públicos que somente podem ser remunerados mediantetaxa. Do acórdão do RE n. 89.876-RJ, relatado pelo eminente Ministro Moreira Alves(RTJ 98/230) e da conferência que S. Exa. proferiu no ‘X Simpósio Nacional de DireitoTributário’ [...] penso que podemos extrair as seguintes conclusões, com pequenasalterações em relação ao pensamento do eminente Ministro Moreira Alves: os serviçospúblicos poderiam ser classificados assim: 1) serviços públicos propriamente estatais,em cuja prestação o Estado atue no exercício de sua soberania, visualizada esta sob oponto de vista interno e externo: esses serviços são indelegáveis, porque somente oEstado pode prestá-los. São remunerados, por isso mesmo, mediante taxa, mas oparticular pode, de regra, optar por sua utilização ou não. [...] 2) Serviços públicosessenciais ao interesse público: são serviços prestados no interesse da comunidade. Sãoremunerados mediante taxa. [...] 3) Serviços públicos não essenciais e que, nãoutilizados, disso não resulta dano ou prejuízo para a comunidade ou para o interessepúblico. Esses serviços são, de regra, delegáveis, vale dizer, podem ser concedidos e

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podem ser remunerados mediante preço público. Exemplo: o serviço postal, os serviçostelefônicos, telegráficos, de distribuição de energia elétrica, de gás, etc. (ADI 447, votodo Min. Carlos Velloso, julgamento em 5-6-91, DJ de 5-3-93).

Não se pode confundir preço público com taxa, tendo em vista que a própria

jurisprudência já foi pacificada no sentido de apresentar esta diferença que está contida na

Súmula 545 do Supremo Tribunal Federal ao dizer que: “Preços de serviços públicos e taxas não

se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança

condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu.”

2.1.3 Contribuição de melhoria

A contribuição de melhoria é uma espécie de tributo, sendo cobrada a partir da

valorização ocorrida em propriedades privadas em decorrência da construção de obras públicas,

como estradas, saneamento básico, dentre outros. Teve origem na Inglaterra como objetivo de

evitar o enriquecimento sem causa e a especulação imobiliária, que acarretaria prejuízos no

crescimento urbano. O legislador brasileiro inspirou-se no formato do tributo até então existente

nos Estados Unidos, onde se unificaram dois tributos existes naquele país. As palavras de

Cláudio Borba (2004, p. 24) ilustram a compreensão do referido tributo em território norte

americano:

Os americanos copiaram esta idéia e criaram os chamados ‘special assessment’, tributosespeciais, dos quais fazem parte o ‘cost assessment’ e o ‘benefit assessment’, amboscom a idéia do tributo inglês, sendo o primeiro cobrado para que a obra pública possa serrealizada e o segundo após a realização da obra que decorra valorização imobiliária.

Como pôde ser visto, primeiramente houve o surgimento da contribuição de melhoria na

Inglaterra. Em seguida, os Estados Unidos, inspirados na experiência inglesa, instituíram seus

dois tributos: um cobrado antes da execução da obra como forma de financiá-la e outro que tem

sua exação após a execução da obra, sendo observada a real valorização do imóvel. No Brasil

houve a unificação dos dois em um tributo apenas, que é cobrado após a execução da obra, sendo

observada a real valorização do imóvel, havendo cobrança uma única vez. O fato gerador é a

valorização imobiliária decorrente de obra pública, enquanto a base de cálculo é o quantitativo de

valorização experimentada pelo imóvel. Deve haver o respeito a dois limites no momento de o

fisco cobrar a contribuição de melhoria: o primeiro limite a ser obedecido é o individual, onde se

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deve ser cobrada a exação a partir do benefício individual de cada imóvel, ou seja, se o imóvel

valorizou 10 mil reais, é sobre este valor que será cobrada a contribuição de melhoria; o segundo

limite é o global, onde o tributo só poderá ser cobrado até o limite do valor gasto na obra. Tanto a

Constituição Federal no seu artigo 145, inciso III quanto o CTN, em seu artigo 81 trazem a

previsão do presente tributo:

CF / Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituiros seguintes tributos:III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.

CTN / Art. 81. A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, peloDistrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, éinstituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorizaçãoimobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual oacréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.

Há jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal que explica a diferença

existente entre a contribuição de melhoria e as demais espécies de tributos, envolvendo

principalmente suas características e pressupostos para cobrança.

Taxa de pavimentação asfáltica. […]. Tributo que tem por fato gerador benefícioresultante de obra pública, próprio de contribuição de melhoria, e não a utilização, pelocontribuinte, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou postoa sua disposição. Impossibilidade de sua cobrança como contribuição, por inobservânciadas formalidades legais que constituem o pressuposto do lançamento dessa espécietributária. (RE 140.779, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgamento em 2-8-95, DJ de 8-9-95).

Muitas foram e continuam sendo as tentativas legislativas de criar novos tributos, como

novos nomes, mas revestidos de características de tributos já existentes, o que acaba esbarrando

em vedação constitucional que sempre deve ser corrigida. No exemplo acima a correção foi

exercida pelo Supremo Tribunal Federal e não poderia ser diferente, pois havendo afronta à

norma ou à princípios constitucionais, aquela tem competência jurisdicional para atuar.

2.1.4 Empréstimo compulsório

O empréstimo compulsório veio a ter caráter de tributo com a Constituição de 1988. Esta

afirmação se corrobora quando é observada a Súmula 418 do Supremo Tribunal Federal, qual

seja: “O empréstimo compulsório não é tributo, e sua arrecadação não está sujeita à exigência

constitucional da prévia autorização orçamentária”, que data de período pretérito à nossa Vigente

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Carta Política. Zelmo Denari (2002, p. 129) aborda em seus escritos a historicidade da presente

exação no ordenamento jurídico brasileiro:

A Constituição de 1946 desconhecia o empréstimo compulsório. Como experiênciatributária, surgiu em 1951, quando o crédito nacional rastejava em virtude da vertiginosainflação que já na ocasião solapava as bases do país. Fruto de anomalia econômica, há de ser necessariamente, uma anomalia jurídica; umexcrescência, que deveria ser banida do sistema tributário pátrio. Quando, em 1951, a União instituiu o empréstimo compulsório, os Estados-membrosaplaudiram a iniciativa e passaram também a legislar sobre a matéria, nova e inexaurívelfonte de recursos para os cofres públicos. A Emenda Constitucional nº 18, de 1965, impôs o necessário corretivo, atribuindosomente à União competência para instituir e cobrar empréstimos compulsórios.

Não se pode negar o caráter tributário do empréstimo compulsório na atualidade, o qual é

conhecido também como empréstimo forçado, pois a referida espécie tributária adapta-se

perfeitamente ao conceito de tributo constante no artigo 3º, como também sua regulamentação

está expressa no artigo 15 do CTN. Em segundo lugar, e fortalecendo o argumento, sua

localização na Constituição no capítulo referente aos princípios gerais do Sistema Tributário

Nacional confirma a posição de que o empréstimo compulsório configura um tributo. Presente no

artigo 148, I e II, da Constituição Federal, o empréstimo compulsório tem a referida roupagem:

Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimoscompulsórios:I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerraexterna ou sua iminência;II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional,observado o disposto no art. 150, III, "b".Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório serávinculada à despesa que fundamentou sua instituição.

Superada a discussão a respeito da natureza jurídica da presente exação, devem evoluir os

questionamentos no sentido de haver ou não uma autonomia do presente tributo; sendo negativa a

resposta, não haveria outra solução, senão enquadrá-lo como uma espécie pré-existente, o que

não ocorre na realidade. Confirmando nosso posicionamento, apontando e ressaltando que o

empréstimo compulsório apresenta-se como uma modalidade autônoma de tributo, escreve

Sabbag (2008, p.110):

De nossa parte, estamos que o empréstimo compulsório é modalidade autônoma detributo, cuja diferença específica encontra a sua melhor representação na necessáriaprevisão legal da sua restituibilidade. Com efeito, o aspecto estrutural mais relevante dotributo é a restituibilidade. Pontes de Miranda chama-o, assim, de ‘tributo com cláusulade restituibilidade’. Há, pois, uma simultaneidade de deveres: um, para o contribuinte,

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no tocante ao dever de pagar; outro, para o Fisco, no concernente à devolução da quantiapaga – frise-se – na mesma espécie em que foi recolhido (Ver, no STF: RE 121.336 eRE 175.385). Para a instituição basta a finalidade e o compromisso de restituir. Assim,há direito subjetivo do contribuinte à restituição, sendo vedado que uma nova leisuprima esse direito, sob pena de ofensa ao art. 5, XXXVI, CF.

Além de se tratar de modalidade autônoma de tributo, a restituibilidade, como se pôde

observar no texto acima descrito, é um aspecto essencial do respectivo tributo, característica esta

que o distingue dos demais, pois que lhe é exclusiva, ressalvada ocasiões onde pode haver

pagamento a maior do tributo, hipótese esta onde o valor pago pode ser restituído

administrativamente ou judicialmente por ação específica denominada: “Ação de Restituição de

Indébito”. Então, a restituibilidade é essência do empréstimo compulsório, pois é característica

que nasce já com esta espécie tributária, não se tratando de mera restituição de pagamento a

maior. Seguindo a mesma linha de raciocínio, ressalta-se a via de mão dupla das obrigações que

circundam a presente exação: a primeira é o dever de pagar o tributo, não podendo o sujeito

passivo se negar, a despeito de qualquer pretexto, a pagá-lo; outra via, e esta é de salutar

importância, pois descaracteriza um possível aspecto confiscatório do tributo, é o dever de

devolver o valor compulsoriamente emprestado, frise-se, com as devidas correções monetárias,

tendo em vista a atualidade do valor real cedido. É evidente que se trata de um tributo federal,

situado na seara de competências da União, devendo ser instituído por lei complementar, o que,

claro, impossibilita sua inserção no mundo jurídico tributário através de Medida Provisória, nos

termos constantes do artigo 62, parágrafo I, inciso III, da Constituição Federal.

Os pressupostos constitucionais que autorizam a criação do empréstimo compulsório são

de extrema importância para se observar a legitimidade da interposição da referida exação, tendo

em vista o caráter excepcional da medida. Não observar tais pressupostos implica em vício de

legalidade e constitucionalidade gerado por tal desrespeito, devendo o Judiciário anular o ato de

sua criação. São quatro as circunstâncias que podem viabilizar o surgimento do empréstimo

compulsório; três deles encontram-se no inciso I do artigo 148 da Constituição Federal, e um no

inciso II do mesmo artigo:

1. Despesas Extraordinárias (inciso I);

2. Calamidade Pública (inciso I);

3. Guerra Externa (inciso I);

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4. Investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional (inciso II).

Por razões didáticas, faz-se necessária uma comparação entre os pressupostos

constitucionais que autorizam a instituição do empréstimo compulsório. As maiores diferenças

estão na própria divisão feita pelo constituinte entre os dois incisos: no inciso primeiro, o

empréstimo compulsório tem como finalidade atender a uma calamidade pública, ou a uma

guerra externa iminente ou deflagrada, ou a despesas extraordinárias de caráter emergencial, não

precisando, portanto, respeitar o princípio da anterioridade, sendo exceção a anterioridade anual e

nonagesimal (90 dias), ambas previstas no texto constitucional pela Emenda n. 42/2003; no inciso

segundo, o empréstimo compulsório passa a ter uma finalidade diversa do já mencionado inciso I,

onde deve suprir as exigências de um investimento público de caráter urgente e de relevante

interesse nacional. Isso significa que passa a ser uma mera antecipação de receita, onde aquilo

que seria entregue pelo sujeito passivo de uma relação tributária é antecipado como forma de

possibilitar a execução da obra. Tal justificativa remete a uma das formas de cobrança da

contribuição de melhoria nos Estados Unidos da América, fazendo assim referência ao que

anteriormente fora mencionado. Em síntese: enquanto este tem caráter urgente, mas precisa

respeitar o princípio da anterioridade, não sendo, portanto, exceção nem à anterioridade anual

nem à nonagesimal (90 dias), aqueles (referentes ao inciso I) constituem exceção às duas espécies

de anterioridade.

2.1.5 Contribuições especiais

Como esta análise tem viés Constitucional, observar o tratamento deferido pelo

Constituinte acerca da matéria estudada traz uma maior segurança e fidelidade à proposta do

presente trabalho. A citação abaixo corresponde ao artigo 149 da Constituição Federal:

Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, deintervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais oueconômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado odisposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º,relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.

Inseridas no artigo 149, caput, as contribuições podem ser dividas em três espécies, quais

sejam:

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1. Contribuições de Interesse das Categorias Profissionais ou Econômicas;

2. Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE);

3. Contribuições Sociais;

Tecer comentário acerca de cada uma delas se faz necessário, tendo em vista que um dos

pontos relevantes desta dissertação é a análise do sistema de repartição de receitas tributárias,

onde a CIDE-Combustível é uma das receitas que sofre o processo de repartição. A ordem acima

constitui apenas ferramenta didática.

2.1.5.1 Contribuições do interesse das categorias profissionais

As contribuições de interesse das categorias profissionais (dos empregados), ou

econômicas (dos empregadores), apresentam-se como contribuição anual e contribuição sindical.

A primeira tem como finalidade carrear recursos a entidades que fiscalizam as profissões, sendo o

caso da Ordem dos Advogados do Brasil, que se reveste de caráter de autarquia especial, pessoa

jurídica de direito público; a segunda, ou seja, a contribuição sindical, na visão do STF, é

contribuição parafiscal, não se confundindo com a contribuição confederativa. Com relação à

contribuição sindical, esta se encontra positivada no art. 8, IV, parte final, da Constituição

Federal, cumulado com o art. 578 da Consolidação das Leis Trabalhistas. É um tributo e, como

tal, compulsório, cuja obrigação decorre de lei, portanto, a lei é o instrumento jurídico de

exigibilidade do tributo, conseqüência disso é a necessidade de os princípios constitucionais

tributários serem respeitados. Outro aspecto relevante é que a contribuição sindical tem sua

exigibilidade ampla a todos os trabalhadores que se encontram em atividade na respectiva

atividade a qual o sindicato representa.

Já se referindo à contribuição confederativa, outro cenário nos é apresentado, sendo sua

positivação decorrente do art.8º, inciso IV da Constituição Federal, parte inicial, e não final,

como ocorre com a contribuição sindical. A contribuição confederativa não é tributo, é paga de

forma voluntária, portanto, sua obrigação decorre do livre arbítrio daquele que contribui. O

instrumento que faz com que a contribuição passe a ser exigível é o contrato, dependendo de uma

manifestação da assembléia geral que representa os trabalhadores, fazendo com que o tributo não

decorra de lei e, assim, não haja necessidade de se respeitar os princípios constitucionais

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tributários, passando a ter sua exigibilidade atrelada apenas aos trabalhos que se vinculam a um

sindicato co-respectivo àquela contribuição.

2.1.5.2 Contribuição sindical

No ordenamento jurídico constitucional há duas subespécies do gênero contribuições de

interesse das categorias profissionais ou econômicas – contribuições corporativas - uma delas é a

contribuição sindical. A outra são as contribuições corporativas para o custeio das entidades de

fiscalização do exercício de profissões regulamentadas, mas estas serão tratadas adiante.

Na Constituição Federal, mais especificamente no art. 8º, inciso IV, é prevista a criação

de duas contribuições sindicais. A primeira delas é a contribuição fixada pela assembléia geral

para o custeio do sistema confederativo do respectivo sindicato; e a outra é a contribuição fixada

em lei, cobrada de todos os trabalhadores.

É sumulado pelo Supremo Tribunal Federal, no enunciado nº 666 que: “A contribuição

confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição, só é exigível dos filiados do sindicato

respectivo”, após diversos precedentes, dentre eles, RE 198092, RE 170439, RE 193972, RE

178927, RE 189443, RE 181087, RE 161547, RE 199019, RE 242078, RE 194603.

Como pôde ser constatado, já está sedimentada na jurisprudência que a presente

contribuição somente é paga pelos trabalhadores que se encontram sindicalizados. Possuindo

caráter facultativo, o trabalhador tem o livre arbítrio de vir a se sindicalizar para só então ser

sujeito passivo da presente contribuição. Dois são os motivos que nos faz acreditar que a

“contribuição fixada pela assembléia geral para o custeio do sistema confederativo do respectivo

sindicato” não tem caráter nem natureza tributária. O primeiro deles é o fato já mencionado da

facultatividade, melhor dizendo, a não compulsoriedade; e o segundo motivo é o fato de a

respectiva contribuição não ser criada por lei, mais sim fixada pela assembléia geral do sindicato

dos trabalhadores de determinada classe. Um julgado do Supremo Tribunal Federal, que merece

ser inserido no presente trabalho, corrobora a tese da inexistência do caráter tributário da

contribuição sindical para o custeio do sistema confederativo do respectivo sindicato. É o

Recurso Extraordinário 173.869, da lavra do Ministro do Ilmar Galvão:

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Contribuição confederativa. Trata-se de encargo que, por despido de caráter tributário,não sujeita senão os filiados da entidade de representação profissional. Interpretação que,de resto, está em consonância com o princípio da liberdade sindical consagrado na Cartada República. ’ (RE 173.869, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgamento em 22-4-97, 1ª Turma,DJ de 19-9-97). No mesmo sentido: RE 189.443, Rel. in. Ilmar Galvão, julgamento em19-12-96, 1ª Turma, DJ de 11-4-97. (grifo nosso).

Há uma diferença primordial a ser estudada a respeito das duas modalidades de

contribuições sindicais previstas no art. 84, IV da Constituição Federal: é a que se refere ao

caráter tributário ou não de uma ou de outra. Como anteriormente fora dito e agora reforçado,

acredita-se na inexistência do caráter tributário na modalidade da contribuição para o custeio do

sistema confederativo do sindicato e na existência do caráter tributário na segunda exação, na

parte final do referido dispositivo, que é a contribuição fixada em lei, cobrada de todos os

trabalhadores. Neste mesmo sentido é o Recurso Extraordinário 198.092 da lavra do Ministro

Carlos Velloso:

A contribuição confederativa, instituída pela assembléia geral – CF, art. 8º, IV –distingue-se da contribuição sindical, instituída por lei, com caráter tributário – CF, art.149 – assim compulsória. A primeira é compulsória apenas para os filiados do sindicato.(RE 198.092, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 27-8-96, 2ª Turma, DJ de 11-10-96). No mesmo sentido: AI 692.369-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 30-6-09, 1ª Turma, DJE de 21-8-09. Vide: RE 199.019, Rel. Min. Octavio Gallotti,julgamento em 31-3-98, 1ª Turma, DJ de 16-10-98.

Este livre arbítrio de associar-se ou não a um sindicato está contido na Constituição

Federal como direito fundamental no art. 5º inciso XX, onde expressa que “ninguém poderá ser

compelido a associar-se ou a permanecer associado”. Já havendo precedente jurisprudencial no

que se refere à vedação de desconto de contribuição sindical de quem não se encontra associado,

é o constante de ADI 1.416, tendo como Ministro relator Gilmar Mendes, o hoje Presidente da

Suprema Corte, vejamos:

Estatuto da Polícia Civil do Estado do Piauí (Lei Complementar 01, de 26-6-90), art.151; Portaria 12.000-007/96, de 9-1- 1996, do Secretário de Segurança Pública doEstado do Piauí. Vedação de desconto de contribuição sindical. Violação ao art. 8º, IV,c/c o art. 37, VI, da Constituição. Reconhecimento de duas entidades representativas daPolícia Civil do Estado do Piauí. Transgressão ao art. 5º, inciso XX, tanto na suadimensão positiva, quanto na dimensão negativa (direito de não se associar). (ADI1.416, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 10-10-02, Plenário, DJ de 14-11-02).(grifo nosso).

Com relação à segunda subespécie de contribuição sindical prevista no art. 8º, inciso IV,

prevista em sua parte final, a contribuição fixada em lei, cobrada de todos os trabalhadores, trata-

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se de tributo, pois se enquadra em todos os elementos presentes do art. 3º do Código Tributário

Nacional, onde diz que “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor

nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada

mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. A mencionada contribuição foi

instituída por lei e, portanto, é compulsória para todos que participarem de categoria econômica

ou profissional ou de uma profissão liberal em favor do Sindicato representativo da mesma

categoria ou profissão, ou mesmo, inexistindo este, à Federação correspondente à mesma

categoria econômica ou profissional. Vejamos um julgamento do STF e corrobora o que já foi

dito:

Sindicato de servidores públicos: direito à contribuição sindical compulsória (CLT, art.578 ss.), recebida ela Constituição (art. 8º, IV, in fine), condicionado, porém, àsatisfação do requisito da unicidade. A Constituição de 1988, à vista do art. 8º, IV, infine, recebeu o instituto da contribuição sindical compulsória, exigível, nos termos dosarts. 578 ss. CLT, de todos os integrantes da categoria, independentemente de suafiliação ao sindicato (cf. ADIn 1.076, med. cautelar, Pertence, 15-6-94). Facultada aformação de sindicatos de servidores públicos (CF, art. 37, VI), não cabe excluí-los doregime da contribuição legal compulsória exigível dos membros da categoria (ADIn 962,11-11-93, Galvão). (RMS 21.758, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 20-9-94, 1ª Turma, DJ de 4-11-94).

2.1.5.3 Contribuições corporativas para o custeio das entidades de fiscalização do

exercício de profissões regulamentadas

Na Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, XIII, há uma garantia ao trabalhador de

que é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, desde que sejam atendidas as

qualificações profissionais que a lei estabelecer. Há aqui, portanto, uma norma constitucional de

eficácia contida, havendo a possibilidade de vir a ser criada uma lei, tendo em vista o interesse

público, que venha a restringir o exercício da liberdade contida na norma constitucional. Ensina

José Afonso da Silva (2004, p. 116) que:

Norma de eficácia contida, portanto, são aquelas em que o legislador constituinteregulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixoumargem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do Poder Público,nos termos que a lei estabelecer ou nos termos dos conceitos gerais nelas enunciados.

A liberdade de exercício profissional é plena até a criação legislativa que venha a

estabelecer os requisitos para seu regular exercício. Diversas são as profissões regulamentadas

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por lei, que por conseqüência exigem determinados requisitos para seu exercício, dentre elas

podemos citar como exemplo a Medicina, a Advocacia, Arquitetura, que são fiscalizadas

respectivamente pelo Conselho Regional de Medicina (CRE), Ordem dos Advogados do Brasil

(OAB) e Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA).

O ordenamento jurídico nacional, mais especificamente no Código Penal, no Título VIII

que trata “Dos crimes contra a incolumidade pública”, no Capítulo III “Dos crimes contra a saúde

pública” tipifica a conduta do exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica,

constante no art. 282 do Código Penal que diz “Exercer, ainda que a título gratuito, a profissão de

médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal ou excedendo-lhe os limites. Cominando

pena de detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos”. O que pode se observar é que o ordenamento

jurídico exige determinados requisitos para o exercício de certas profissões que considera de

interesse público; atribui à instituições como o Conselho Regional de Medicina (CRM), já

exemplificado anteriormente, o poder de fiscalizá-las, havendo sanções administrativas a cargo

dos conselhos, ou mesmo sanções penais, caso a profissão seja exercida em desacordo com as leis

que regulam cada uma delas.

Com a norma constitucional inserida no art. 5º, XIII, houve a criação de instituições

descentralizadas com a finalidade de fiscalizar o exercício de determinadas profissões e

atividades, tendo também, dentre outras atribuições, a de representar os interesses dos

profissionais de forma independente e incondicionada. A justificativa para a criação e instituição

de tributos (a serem cobrados destes profissionais) destinados às respectivas entidades

representativas é o argumento inserido na determinação legal de que as respectivas atividades

seriam de interesse público.

Não se poderia, portanto, deixar de observar a existência da parafiscalidade como

característica marcante desta espécie tributária. Chamar um tributo de parafiscal não é outra coisa

senão referir-se à sua finalidade, ou seja, para qual fim se presta a utilização de determinado

tributo pelo Estado. O Estado cria o tributo (contribuição corporativa) por lei e atribui o produto

da sua arrecadação a uma terceira pessoa (entidades de fiscalização do exercício de profissões

regulamentadas), tendo por fim o interesse público.

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Há uma discussão acerca da natureza jurídica tanto das entidades quanto das contribuições

por elas cobradas. Em saber se a Ordem dos Advogados do Brasil encontra-se ou não na mesma

categoria das demais instituições. A maior parte da doutrina tem entendido que não, pois haveria

uma distinção no tratamento especial dado a OAB, por não ser voltada apenas à defesa dos

interesses corporativos, conclui-se que a justificativa para a cobrança das respectivas

contribuições não seria por “interesses de categorias profissionais ou econômicas”.

Uma passagem pela lei 8906/1994, em seu art. 44, I e II, nos concede uma visão mais

clara da importância da Ordem dos Advogados do Brasil, que é autarquia especial de regime

especial, e da sua natureza jurídico-constitucional, ao tratar dos fins da instituição, havendo o

interesse corporativo da classe nos dizeres do inciso II, no que concerne “promover, com

exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a

República Federativa do Brasil.” Corroborando este entendimento, há um julgado do Supremo

Tribunal Federal da lavra do Ministro Eros Grau que diz:

A Lei Federal n. 8.906/94 atribui à OAB função tradicionalmente desempenhada pelossindicatos, ou seja, a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais dacategoria. A Ordem dos Advogados do Brasil ampara todos os inscritos, não apenas osempregados, como o fazem os sindicatos. Não há como traçar relação de igualdade entreos sindicatos de advogados e os demais. As funções que deveriam, em tese, ser por elesdesempenhadas foram atribuídas à Ordem dos Advogados. O texto hostilizado nãoconsubstancia violação da independência sindical, visto não ser expressivo deinterferência e/ou intervenção na organização dos sindicatos. Não se sustenta oargumento de que o preceito impugnado retira do sindicato sua fonte essencial decusteio. Deve ser afastada a afronta ao preceito da liberdade de associação. O textoatacado não obsta a liberdade dos advogados. (ADI 2.522, Rel. Min. Eros Grau,julgamento em 8-6-06, Plenário, DJ de 18-8-06).

Há ainda outro complementando o primeiro ao tratar do pagamento obrigatório da

contribuição, também do Ministro Eros Grau:

Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil. Contribuição anual àOAB. Isenção do pagamento obrigatório da contribuição sindical. Violação dos artigos5º, incisos I e XVII; 8º, incisos I e IV; 149; 150; § 6º; E 151 da Constituição do Brasil.Não ocorrência. (ADI 2.522, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 8-6-06, DJ de 18-8-06)

Além desta finalidade já mencionada, a OAB ainda tem outras, que são revestidas de

caráter constitucional, que é o de “defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado

democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis,

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pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições

jurídicas”.

Com todos os argumentos já expostos, é possível chegar à conclusão de que há uma nítida

distinção entre a Ordem dos Advogados do Brasil e as demais entidades de fiscalização das

profissões, como o CRM (Conselho Regional de Medicina). A OAB, de acordo com o caput do

art. 44 da lei 8906/1994 é serviço público dotado de personalidade jurídica e forma federativa.

Uma decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, em sede de embargos de

divergência (que é o recurso cabível quando uma turma, ao apreciar um recurso especial, divergir

do julgamento de outra, de uma seção ou da Corte Especial) reconheceu a Ordem dos Advogados

do Brasil como sendo uma autarquia especial, ou seja, com peculiaridades não presentes nas

demais, porém, não foi reconhecida a natureza tributária às contribuições requeridas pela

instituição:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL – EXECUÇÃOLEVADA A EFEITO PEÇA OAB PARA COBRANÇA DE ANUIDADES –APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – PRECEDENTES.

Diante da natureza intrínseca da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, autarquiadetentora de características diferentes das autarquias consideradas entesdescentralizados; denota-se que as contribuições recebidas pela entidade não temnatureza tributária. Nesse diapasão, esta egrégia Primeira Seção desta colenda CorteSuperior de Justiça, esposou, em recente julgado, entendimento segundo o qual ‘ ascontribuições cobradas pela OAB, como não têm natureza tributária, não têm naturezatributária, não seguem o rito estabelecido pela Lei n. 6830/1980’ (EREsp 463.258/SC,Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 29.03.2004). Embargos de divergência providos” (STJ, 1.ªSeção, EREsp 495.918/SC, Rel. Min. Franciulli Netto, j. 22.06.2005, DJ 01.08.2005, p.307).

2.1.5.4 Contribuições de intervenção no domínio econômico

As contribuições de intervenção no domínio econômico são mais comumente conhecidas

pela abreviatura CIDEs, as quais estão inseridas na seara de competência da União, tendo, via de

regra, roupagem de tributos federais, fisionomia extra fiscal e a finalidade de fazer uma

compensação e equilibrar o exercício de determinadas atividades econômicas, de forma

planejada, não servindo apenas como meio de arrecadação de recursos. Podem ser observadas

duas espécies de tributos, que representam o presente gênero: a Cide-Combustível e a Cide-

Royalties. Adiante é feita alusão às respectivas contribuições.

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Segue, abaixo, texto localizado constitucionalmente, artigo 145 caput, parágrafo 2º, inciso

I, II e III alinhas a e b:

Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervençãono domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, comoinstrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III,e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuiçõesa que alude o dispositivo.§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata ocaput deste artigo: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) II - incidirão também sobre a importação de produtos estrangeiros ou serviços; (Redaçãodada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) III - poderão ter alíquotas: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) a) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, nocaso de importação, o valor aduaneiro; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)b) específica, tendo por base a unidade de medida adotada. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) . (Grifo nosso).

A Cide – Combustível é a contribuição que mais interessa ao presente estudo, pois é a

única que se submete à repartição de receita, sendo um tributo da União, que terá uma

percentagem destinada aos Estados e Distrito Federal, os quais repassarão também um percentual

aos Municípios. Mais detidamente, a presente análise será feita ao tratar sobre a parte central do

trabalho, que é repartição de receita, tendo como objeto de incidência a importação e

comercialização de petróleo, gás natural, derivados e álcool. Há também a Cide – Royalties, que

segundo a lei 10.168/2000, é destinada a arrecadar recursos para o Programa de Estímulo à

Interação Universidade – Empresa para o Apoio à Inovação, tendo como fim o estímulo à

pesquisa.

2.1.5.5 Contribuições sociais

É destacado o volume de arrecadação decorrente dessas contribuições, havendo o cuidado

de estabelecer o Supremo Tribunal Federal uma diferenciação em um número de três

contribuições distintas. Segundo a Suprema Corte, há as contribuições sociais gerais, sendo

exemplo desta o salário educação presente na Constituição no artigo 212 parágrafo 5º. Outro

exemplo são as contribuições do sistema “S” presentes na Constituição no artigo 240. Uma

segunda espécie são as contribuições de seguridade social, constantes no artigo 195, inciso I à IV,

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também da carta política. A terceira e última espécie, que está no artigo 195, parágrafo 4º, são

denominadas de contribuições residuais.

2.1.5.6 Contribuição de Iluminação Pública

Ainda quando da criação do Código Tributário Nacional, entendia a doutrina e a

jurisprudência que havia apenas três espécies tributárias, ou seja, os tributos eram limitados em

uma tripartição. Após a Constituição de 1988, a doutrina e a jurisprudência passaram a entender

que os tributos eram cinco. Neste momento não havia o conhecimento da existência da

contribuição de iluminação pública, também conhecida como COSIP. Vejamos o inteiro teor do

artigo 149-A:

Art. 149-A: Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuições, na formadas respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, os ervado odispositivo no art. 150, I e III.Parágrafo único. è facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na faturade consumo de energia elétrica.

No Supremo Tribunal Federal, em sua jurisprudência, não há manifestação quanto à

natureza jurídica de tal exação, tornando mais simples classificá-la como uma contribuição

especial, já que há um leque de tributos com esta classificação. Acredita-se que seja esta a

posição a ser firmada pelo STF, ainda que o referido tribunal, até o momento, não tenha se

manifestado em seus julgados quanto tal natureza.

Há outras razões para que possa ser feito o raciocínio e isto se dá devido ao fato de o

Poder Constituinte Derivado, através de emenda constitucional número 39 de 2002, inseriu o

referido tributo na Constituição com a nomenclatura de art. 149-A, aproximando-o assim das

demais contribuições inseridas no art. 149 da Carta Política. Não se poderia imaginar que o

Constituinte Derivado iria colocar dois institutos lado a lado se não existissem semelhanças.

Está pacificado na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o serviço de

iluminação pública não se enquadra nos requisitos necessários para ser considerada uma espécie

tributária na modalidade taxa, pois não atenderia a dois dos seus requisitos básicos: a

divisibilidade e a especificidade; e o que fortalece ainda mais este nosso argumento é o conteúdo

da Súmula 670 do STF ao dizer que “o serviço de iluminação pública não poderia ser remunerado

por taxa”. Não poderia ser diferente, pois se trata de um serviço prestado a um número

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indeterminado de pessoas sob o caráter de serviço uti universi, pois não há como determinar

quem são as pessoas que estariam se beneficiando e utilizando o serviço.

A ferramenta utilizada para tornar possível a implementação de um tributo voltado a

custear a iluminação pública, como antes dito, foi a criação da Emenda Constitucional 39/2002,

porém, é formal e materialmente inconstitucional. Com relação à inconstitucionalidade material,

esta pode ser verificada devido ao fato de que o processo legislativo não foi respeitado. A

Constituição determina que para a aprovação de uma emenda constitucional é necessário o

respeito a algumas formalidades. Primeiramente, o projeto deve ser aprovado em dois turnos

tanto na Câmara dos Deputados como no Senado Federal. Isto ocorre para que seja possível uma

ampla discussão da matéria nas duas casas e uma maior participação da população no que se

concerne à pressão política. É por esta razão que o art. 362 do Regimento Interno do Senado

Federal prevê que o interstício mínimo para a votação no primeiro e segundo turno deve ser de

cinco dias úteis. Com a mesma finalidade, mas utilizando uma contagem temporal distinta, há o

art. 202, §6º do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, ao dizer que deve haver dois

turnos de votação com um lapso temporal de cinco sessões entre uma e outra.

Não foi o que ocorreu no processo legislativo da Emenda Constitucional nº 39/2002, pois

houve violação ao processo legislativo previsto na Constituição Federal. Tendo em vista o pouco

tempo que restava para o término do ano de 2002, surgiu o receio por parte dos Prefeitos, que

eram os mais interessados na criação da respectiva contribuição, de que em sendo aprovada

apenas em 2003, só poderia haver cobrança em 2004, devido a princípio constitucional da

anterioridade previsto no art. 150, III, b da Constituição Federal.

Tal fato ensejou um não cumprimento do processo legislativo previsto na Constituição

para a elaboração e aprovação de Emenda Constitucional. A Câmara dos Deputados, em

desrespeito inclusive ao seu Regimento Interno anteriormente já mencionado, realizou, no mesmo

dia, as duas votações (turnos) necessárias. Não houve respeito à Constituição e ao Regimento

Interno da Câmara dos Deputados, pois a votação dos dois turnos fora realizada na mesma sessão.

Aqui se mostra o vício formal na criação da Emenda Constitucional 39/2002. Já o vício material

pode ser constatado na ofensa ao direito constitucional garantido ao contribuinte de sofrer a

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incidente tributária de acordo com as diretrizes existentes no Sistema Tributário Nacional

previamente instituído.

Apesar das críticas aqui inseridas quanto à inconstitucionalidade formal e material da

Emenda Constitucional 39/2002, que criou a Contribuição de Iluminação Pública (COSIP), o

Supremo Tribunal Federal, se manifestando quanto ao vício formal acima descrito, entende que,

no que se refere aos Regimentos Internos de cada casa legislativa, é assunto que apenas diz

respeito à própria casa, não podendo haver interferência do judiciário, muito menos servir de

fundamento para declaração de inconstitucionalidade. Não havendo manifestação do Supremo

quanto à inconstitucionalidade material do art. 149-A da Constituição, prevalece a presunção de

constitucionalidade até que a Corte Suprema a declare expressamente. Segue abaixo uma análise

sintética de Ricardo Alexandre (2008, p. 84) da Contribuição de Iluminação Pública:

A competência constitucional, como pleiteado, foi deferida aos Municípios e ao DistritoFederal (por não ser dividido em Municípios), que podem exercê-la por intermédio de leiprópria, definindo co determinado grau de liberdade seu fato gerador, base de cálculo,alíquota e contribuintes.Como não se trata de imposto, não é necessária lei de caráter nacional para definir fatogerador, base de cálculo e contribuintes (CF, art. 146, III, a). Esse, aliás, é mais um dosproblemas advindos da EC 39/2002, pois abre espaço para despautérios ainda maioresque a própria Emenda.Na maioria dos casos a contribuição tem sido cobrada com base num valor fixo para osditos “consumidores residências” num outro para os ditos “consumidores comerciais”.O dispositivo constitucional deixa claro que a arrecadação da contribuição é vinculadaao custeio do serviço de iluminação pública, sendo, portanto, ilegítima qualquer espéciede tredestinação.

Fica evidente a grande carência de fontes para custeio de despesas e investimentos em

geral de parte significativa dos municípios. A intenção do Constituinte Derivado de possibilitar

um carreamento de recursos para os entes federados com menor participação na receita tributária

nacional foi boa. Caberia aqui uma crítica à forma encontrada para tal finalidade: não

acreditamos que em matéria constitucional tributária os fins justificariam os meios.

Interessante é o julgado da lavra do Ministro Ricardo Lewandowski, ao analisar a

contribuição de iluminação pública. Foi solicitada venia para transcrever o julgado:

Lei que restringe os contribuintes da COSIP aos consumidores de energia elétrica domunicípio não ofende o princípio da isonomia, ante a impossibilidade de se identificar etributar todos os beneficiários do serviço de iluminação pública. A progressividade daalíquota, que resulta do rateio do custo da iluminação pública entre os consumidores de

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energia elétrica, não afronta o Princípio da Capacidade Contributiva. Tributo de carátersui generis, que não se confunde com um imposto, porque sua receita se destina afinalidade específica, nem com uma taxa, por não exigir a contraprestaçãoindividualizada de um serviço ao contribuinte. Exação que, ademais, se amolda aosprincípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (RE 573.675, Rel. Min. RicardoLewandowski, julgamento em 25-3-09, Plenário, DJE de 22-5-09).

Um estudo acerca das espécies tributárias se fez necessário para que fosse possível

entender o mecanismo de repartição constitucional tributária das receitas, tendo em vista as

peculiaridades de alguns tributos de competência da União e dos Estados que sofrem a incidência

da regra de repartição contida na constituição, que tem como um dos objetivos a garantia do

federalismo fiscal com o intuito de reduzir as desigualdades político-administrativa entre os

entes. A seguir, é apresentado um estudo mais detalhado sobre o referido preceito constitucional.

2.2 Repartição constitucional tributária das receitas

Apresentados os conceitos das diversas espécies tributárias, dentre elas, impostos, taxas,

contribuições de melhorias, empréstimos compulsórios; este merecendo atenção às justificativas

que ensejam a instituição e cobrança do referido tributo; e, por último, e não menos importante

quanto ao volume da arrecadação, merecem especial atenção as contribuições, em suas sub-

espécies já anteriormente tratadas nesse trabalho. Passaremos a analisar a forma com que as

receitas de determinados tributos são repassados para outros entes, como instrumento a garantir a

autonomia econômica, a autonomia política e o pacto federativo.

A grande importância da repartição de receita está no fato de possibilitar uma organização

financeira e orçamentária, garantindo recursos para que possa haver um crescimento mais

igualitário e justo entre as regiões, e mesmo entre os entes que compõe o Estado brasileiro, seja

no caso dos Estados, Distrito Federal ou Municípios, este último merecendo alguns comentários

adicionais, posto que anteriormente à Constituição Federal do Brasil de 1988 os Municípios

tinham pequena participação nas receitas dos tributos federais ou estaduais. Com o surgimento

desta nova ordem jurídica, os Municípios passaram, sim, a possuir autonomia.

As desigualdades existentes do ponto de vista político devem ser mitigadas

gradativamente para que os municípios possam programar-se quanto às obras e serviços que

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pretendem ofertar aos seus habitantes, já que todas as pessoas vivem obrigatoriamente em

Municípios inseridos em Estados, os quais se encontram na União. Não deve haver dúvida quanto

à autonomia dos entes federados do Estado Brasileiro, salientando-se o fato de que a soberania de

nosso Estado refere-se à sua relação de Estado com outros Estados estrangeiros. Assim sendo,

soberania diz respeito a um Estado perante outro; mais claramente ainda: os entes federados não

possuem soberania porque se tratam de uma Federação, e não de uma Confederação. Sobre a

questão da autonomia dos municípios, escreve Carraza (2007, p. 165):

De fato, o Município não poderia ser havido por autônomo, se a ele não se consentisse agerir o seu, dispor do seu, contratar sobre o seu e reger sua vida e seus bens, observados,apenas, os limites constitucionais e legais.No Brasil, o governo e a administração de cada Município correspondem ao que seupovo, por seus representantes, estabelece nas leis e votadas pelas Câmaras. O Municípiopode governar-se e administra-se como bem lhe parecer, sem interferência de outrospoderes (estaduais, federais, nacionais e internacionais), contanto, naturalmente, que nãose afaste dos princípios cardeais da Constituição. Logo, exemplificando, toda lei tributária municipal válida é suprema sobre qualqueroutra da União, do Estado ou de outro Município com a qual conflite. Quando, porhipótese, uma lei municipal, e uma lei estadual regulem a mesmo matéria, e esta se achacompreendida na competência da Câmara Municipal, a lei estadual deve ceder, pois nãoé senão um simulacro de lei, isto é, uma tentativa malograda de exerce uma aptidãoestranha à legislatura dos Estados.Convém enfatizar, ainda, que, em nosso País, como decorrência da autonomia quepossuem, os Municípios são iguais entre si, sob o prisma jurídico. À semelhança do quesustentamos acerca da Federação, reconhece-se também a absoluta isonomia dosMunicípios Brasileiros. Um não pode ser impor ao outro (ou a outros). Todos buscamseu fundamento de validade na própria Constituição, sem qualquer ingerência deterceiros.

Como destacado no presente estudo, a União possui competência quanto a um número

maior de tributos, exatamente nove impostos, que superam, em muito, os tributos de competência

dos Estados, que são três apenas, e dos Municípios, que possuem o mesmo número. Portanto, a

Constituição de 1988 veio a organizar a forma de repartição de receita, tendo previsto que a

União repartiria a arrecadação de determinados tributos com os Estados, e este, por sua vez,

passaria a repartir o produto da arrecadação também de determinados tributos com os

Municípios.

Analisar as formas de repartição de receita de uma maneira esquematizada facilita o

entendimento e esclarece possíveis dúvidas quanto à complexa forma de transferir parte da

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arrecadação de determinados tributos da União para os Estados, Distrito Federal e Municípios,

assim como dos Estados para os Municípios. Trata-se de matéria de essência constitucional, isto

com fundamento no texto da própria Carta Política, que inicia a explanação de como a União

repassa percentagens aos Estados e Distrito Federal, por exemplo, do Imposto de Renda retido na

fonte, do IOF-Ouro, IPI (imposto sobre produto industrializado) das exportações, Imposto

Residual e CIDE-Combustível (contribuição de intervenção no domínio econômico sobre o

combustível).

Sucintamente, é assim que funciona, mas, de forma mais elaborada, poderíamos dizer que

a União transfere diretamente aos Estados e Distrito Federal 100 % do valor arrecadado do

imposto de renda retido na fonte pagadora, sobre rendimentos pagos a qualquer título pelos

mesmos, e suas autarquias e fundações instituídas e mantidas pelos mesmos. Isso significa que,

por exemplo, um determinado Estado paga, a título de remuneração, subsídio a um Juiz de

Direito (função de Estado) e retém esse valor; sendo a fonte pagadora, nesse caso, o próprio

Estado, não deve este nem o Município repassar à União o valor referente ao imposto de renda do

servidor público, permanecendo este valor nos cofres públicos do ente federal. Em caso contrário,

haveria um carrear de recursos excessivos para a União, ficando o Estado, que já paga a referente

remuneração, em situação comprometedora do ponto de vista financeiro; o mesmo argumento

servindo para os municípios no referente ao imposto de renda retido na fonte pago pelo mesmo.

Ainda sobre as transferências diretas feitas da União, merecem destaque os valores

referentes ao IOF-OURO, onde 30% do quantum arrecadado deste fica com o respectivo Estado

de onde o ouro foi extraído, quando o ouro tiver sua destinação vinculada como ativo financeiro e

cambial; o restante do percentual, ou seja, 70% é transferido para os municípios em que o ouro

tiver sido extraído, já que todo município está inserido dentro de um estado, o que nos faz

concluir que, no caso do Distrito Federal, este ficará com 100% do produto da arrecadação do

referido tributo, já que possui competência comum a Estados e Municípios. Assim sendo, incluir

o texto do artigo 153, parágrafo 5º, inciso I, da Constituição Federal, enriquece o presente

trabalho, confirmando a tese de que a repartição de receita é matéria essencialmente

constitucional:

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Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:§ 5º - O ouro, quando definido em lei como ativo financeiro ou instrumento cambial,sujeita-se exclusivamente à incidência do imposto de que trata o inciso V do "caput"deste artigo, devido na operação de origem; a alíquota mínima será de um por cento,assegurada a transferência do montante da arrecadação nos seguintes termos:I- trinta por cento para o Estado, o Distrito Federal ou o Território, conforme a origem;II - setenta por cento para o Município de origem.

Há o imposto residual, inserido na Constituição no artigo 154, inciso I, onde 20% deste é

destinado ao respectivo Estado. Outro tributo que sofre repartição, mas em condições e

percentual diferente, é o IPI (imposto sobre produto industrializado) sobre o quantum dos

produtos destinados à exportação, cujo percentual é de 10% destinado aos Estados, sendo que

25% do valor que vai para os Estados é destinado ao Município. Dois são os dispositivos

constitucionais que confirmam a presente repartição de receitas: o artigo 159, inciso II, no caso

dos Estados e o mesmo artigo 159, mas sendo o parágrafo 3º para os municípios.

Art. 159. A União entregará: II - do produto da arrecadação do imposto sobre produtos industrializados, dez porcento aos Estados e ao Distrito Federal, proporcionalmente ao valor das respectivasexportações de produtos industrializados. § 3º - Os Estados entregarão aos respectivos Municípios vinte e cinco por cento dosrecursos que receberem nos termos do inciso II, observados os critérios estabelecidos noart. 158, parágrafo único, I e II.

Outra exação tributária inclusa na Constituição no artigo 159, inciso II é a Contribuição

de Intervenção no Domínio sobre o Combustível (CIDE-COMBUSTÍVEL). Nesta hipótese há

uma transferência de 29% do valor arrecadado para o respectivo Estado e deste total é transferido

25% para o respectivo Município, ou seja, se a União arrecada 100, 29 é transferido para o

respectivo Estado, e, deste percentual, 7,25 irá para os municípios. É terminantemente vedada a

repartição de receitas quanto a qualquer outro tipo de contribuição que não seja a Cide-

Combustível, por se tratarem de gravames com seu fim determinado por lei.

Art. 159. A União entregará:III - do produto da arrecadação da contribuição de intervenção no domínio econômicoprevista no art. 177, § 4º, 29% (vinte e nove por cento) para os Estados e o DistritoFederal, distribuídos na forma da lei, observada a destinação a que se refere o inciso II,c, do referido parágrafo. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 44, de 2004)

Do restante das transferências diretas da União para os Municípios, pode-se destacar o

ITR (imposto sobre a propriedade territorial rural), que tem destinação de 50% do produto da

arrecadação da União direcionado ao Município, mas a Constituição ressalta a possibilidade de o

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município ficar com 100% do valor arrecadado, caso fiscalize e cobre. O dispositivo

constitucional que retrata tal previsão é o artigo 158, inciso II, inserido na Carta Política pela

Emenda Constitucional nº42/2003. O município fica também com 50%, do quantum arrecadado

pelos Estados do IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor), o qual é de

competência dos Estados, recebe este percentual quanto aos veículos que estivem licenciados em

seus territórios.

As formas de transferências mencionadas anteriormente tratam-se das chamadas

direitas. Há também as chamadas transferências indiretas, que são representadas pelos Fundos

Especiais, que se dividem em quatro tipos de fundos, se destinando a fazer repasses de

determinados percentuais de dois tributos específicos, no caso, o Imposto de Renda (ressalvados

os casos previsto no art. 157, I e 158, I da CF) e o Imposto sobre Produto Industrializado. De

forma sintética, Sabbag (2008, p.150-151), explica os quatro fundos:

Fundo de Compensação de Exportações (FPEx): constituído por 10% da arrecadaçãototal do IPI, é espécie de fundo compensatório para os Estados e Distrito Federal, emvirtude da imunidade de ICMS para as exportações, prevista no art. 155, §2º, X, “a”, CF.Sua distribuição aos Estados e Distrito Federal é proporcional ao valor das exportaçõesde produtos industrializados, sendo a participação individual de cada Estado limitada a20% do total do Fundo, no intuito de inibir favorecimento a Estados mais desenvolvidos.Cada Estado deve repassar 25% aos Municípios situados em seu território nos mesmomoldes estipulados no art. 158, parágrafo único, I e II, CF;

Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE): constituído por21,5% do produto da arrecadação do IR e do IPI. Sua distribuição se dá em função donúmero da população e de modo inversamente proporcional à renda per capita daunidade federativa;

Fundo de Participação dos Municípios (FPM): constituído por 22,5% do produto daarrecadação do IR e do IPI. Sua distribuição se dá em função do número da populaçãode cada Município, sendo que o patamar de 10% do Fundo é destinação às Capitais dosEstados;

Fundos Regionais: constituídos por 3% do produto da arrecadação do IR e do IPI. Suadistribuição se dá em programas de financiamento do setor produtivo das RegiõesNordeste (1,8%), Norte e Centro-Oeste (1,2%), por meio de suas instituições financeirasde caráter regional (art. 159, I, “c”, CF). Ademais, a metade (50%) dos recursos doFundo, que forem destinados à região Nordeste será assegurada ao semi-áridonordestino. (Grifo original)

Dentre as quatro espécies de fundos existentes, os mais conhecidos e comentados pela

doutrina se restringem ao fundo de participação dos Estados e Municípios. Como pôde ser

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demonstrado nesta última citação, dois são os impostos relacionados neste tipo de transferência

indireta de receitas aos mencionados entes, no caso, IPI e IR.

Entendendo todos esses mecanismos constitucionais tributários de repartição de receita, é

interessante fazer uma análise acerca dos valores, dos números repassados aos municípios, como

será demonstrado a seguir.

2.2.1 Participação dos entes federados nos valores arrecadados

Um estudo feito pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) nos mostra a

estimativa quanto aos números da arrecadação municipal e que a parcela da carga tributária

arrecadada pelo Estado, destinada à União, foi o maior de todos os tempos no ano de 2007,

mesmo constatando-se um crescimento nas transferências para os estados e municípios. Neste

referido ano (2007) foram pagos um total de R$: 947 (novecentos e quarenta e sete) bilhões em

impostos e contribuições pela sociedade como um todo. Este valor compreende arrecadações a

títulos de tributos, fruto da produção nacional e do trabalho de todo o povo, dos quais, como

poderá ser conferido na tabela logo abaixo, 58.14% (cinqüenta e oito vírgula quatorze por cento)

deste total permaneceram nas mãos da União, totalizando R$ 550.585.800.000,00 (quinhentos e

cinqüenta bilhões, quinhentos e oitenta cinco milhões e oitocentos milhões de reais), outros

25,27% (vinte e cinco vírgula vinte e sete por cento) do referido total, ou seja,

R$ 239.306.900.000,00 (duzentos e trinta e nove bilhões, trezentos e seis milhões e novecentos

mil reais) nas mãos dos Estados; e o restante ficou nas mãos dos municípios: um total de 16,59%,

que resulta em R$157.107.300.000,00 (cento e cinqüenta e sete bilhões, cento e sete milhões e

trezentos mil reais). De forma mais esquematizada é o que pode ser visto na tabela a seguir:

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Tabela 1 Carga Tributária Disponível, depois das transferências intergovernamentais (% do total)

Fonte: Estudos Fiscais da Confederação Nacional dos Municípios, 2008.

Como pôde ser observado, houve um aumento no percentual da parcela tributária

destinada à União ao longo dos últimos sete anos, ocorrendo uma redução maior na receita dos

Estados e uma redução pouco menor nas receitas dos Municípios. Nota-se que estes percentuais

são aqueles encontrados logo após as transferências intergovernamentais.

Na relação com o PIB (Produto Interno Bruto), que representa a soma (em valores

monetários) de todos os bens e serviços finais produzidos numa determinada região (quer sejam

países, estados, cidades) durante um período determinado (mês, trimestre, ano, etc). O PIB é um

dos indicadores mais utilizados na macroeconomia com o objetivo de mensurar a atividade

econômica de uma região. Em 2007, o valor R$ 947 bilhões de reais equivale ao montante de

37,01% do PIB nacional, sendo destes 25,64% cobrados pela União, 9,59% pelos estados e

1,78% dos municípios.

Tabela 2 Carga Tributária Arrecadada por esfera

Fonte: Estudos Fiscais da Confederação Nacional dos Municípios, 2008.

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A tabela 2 é um complemento da tabela 3, que traduz em porcentagem o que a segunda

diz em números; mais que isso, é demonstrado através destas duas tabelas um detalhamento de 08

(oito) anos do processo de arrecadação das três esferas, mas que, de forma mais expressiva, é a

evolução da arrecadação da União, que se sobressai às demais no que se refere a uma

equivalência do produto interno bruto brasileiro. A esfera federal acresceu sua arrecadação de

20,80% no ano 2000 para 25,64% no ano de 2007, uma evolução de 4,84%, sendo que, no

mesmo período, a arrecadação dos Estados passou de 8,41% para 9,59%, uma evolução de

1,18%. Já com relação aos municípios, a evolução da arrecadação de tributos tendo como

parâmetro o PIB nacional foi a menor, se comparada aos demais entes, tendo sido constatado no

ano de 2000 um percentual de 1,52% e em 2007 um percentual de 1,78%, ou seja, um aumento

de 0,26% em 7 (sete) anos, valor este considerado irrisório se comparado aos valores dos Estados

e da União.

A conclusão é de que a carga tributária em 7 (sete) anos aumentou de 30,74% para

37,01% do PIB nacional, ou seja, 6,27% se reverteu em quase sua totalidade em benefício do ente

Federal. O contribuinte tem passado, através dos anos, por um aumento significativo da carga

tributária, que se deve, em sua maioria, aos tributos de competência da União. A tabela abaixo

traduz este fenômeno, disponibilizando uma visão exata dos números referentes ao período

estudado.

Tabela 3 Carga Tributária Arrecada por esfera

Fonte: Estudos Fiscais da Confederação Nacional dos Municípios, 2008.

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Aspecto mais relevante ainda a ser observado é referente à análise da carga tributária

disponível depois das transferências legalmente exigidas por lei, mais especificamente, pela

Constituição Federal e pelo Código Tributário Nacional (transferências intergovernamentais).

A tabela seguinte demonstra o quantum dos valores arrecadados através da carga

tributária que fica disponível para os respectivos entes. Os valores são representados em milhões.

Mesmo após todas as transferências efetuadas, o ente Federal ainda permanece como detentor da

maior parte dos valores. A União fica com 58,14% do total arrecadado com carga tributária após

as transferências intergovernamentais, já os Municípios ficam com apenas 16,59%, após o

processo, que compreende as transferências da União para os Estados e Municípios, as

transferências entre Estados e Municípios, as participações do ICMS e do IPVA e aquelas

determinadas pelo Fundef/Fundeb.

Tabela 4 Carga Tributária Disponível, depois das transferências intergovernamentais

Fonte: Estudos Fiscais da Confederação Nacional dos Municípios, 2008.

2.2.2 Regionalização da carga tributária disponível dos municípios

Para compreender melhor como os valores são distribuídos entre os entres federados, é

preferível visualizar os números através de gráficos, pois proporciona ao leitor uma idéia

específica da existência ou não de uma concentração de receita nas mãos de algum ente federado.

A seguir, são apresentadas quatro tabelas que explicam o quantitativo destinado em valores reais

da carga tributária disponível dos municípios, das receitas próprias dos municípios, as

transferências da União para os municípios e as transferências dos estados para os municípios.

Vale ressaltar que estes dados foram retirados de estudos fiscais da Confederação Nacional dos

Municípios quanto às estimativas dos entes da federação no bolo tributário.

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Tabela 5 Carga Tributária Disponível dos Municípios

Fonte: Estudos Fiscais da Confederação Nacional dos Municípios, 2008.

A tabela 5 se refere à carga tributária disponível dos municípios e das regiões do país. Há

um demonstrativo do período compreendido entre os anos de 2002 a 2007 que acusa na média

nacional um aumento de 94,7% de crescimento na arrecadação durante este tempo transcorrido,

sendo o Piauí o estado onde os municípios menos obtiveram aumento na receita disponível

(73,2%, bem abaixo da média nacional) e Roraima o estado cujos municípios mais tiveram

acréscimo no repasse da arrecadação no período (149,4 %). Estes números refletem o nível de

desenvolvimento da máquina administrativo-tributária dos municípios brasileiros.

Em valores reais, o estado de São Paulo é o que contém municípios com maior repasse da

arrecadação. No ano de 2007 o saldo resultou em 45 bilhões de reais, o equivalente a um terço de

toda a arrecadação nacional. Os municípios do estado do Amazonas obtiveram o menor repasse

da arrecadação, com pouco mais de 355 milhões de reais.

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Tabela 6 Receitas Próprias dos Municípios

Fonte: Estudos Fiscais da Confederação Nacional dos Municípios, 2008.

A tabela 6 compreende as receitas próprias dos municípios e das regiões do país. Há uma

análise do período do ano de 2002 a 2007, tendo ocorrido um aumento na média nacional de

102,4% de crescimento na arrecadação deste período, sendo o Rio de Janeiro o estado onde os

municípios menos obtiveram crescimento em suas arrecadações próprias (68,1%, bem abaixo da

média nacional). O estado do Amapá foi onde os municípios mais tiveram um aumento de

arrecadação no período, ou seja, 192,5 %.

Em valores reais o estado de São Paulo é o que tem os municípios com maior

arrecadação: em 2007 o saldo foi superior a 18 bilhões de reais, o equivalente a um terço de toda

a arrecadação nacional. Já o estado de Roraima consta como tendo os municípios com menor

arrecadação, com um pouco mais de 48 milhões de reais.

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Tabela 7 Transferências da União para Municípios

Fonte: Estudos Fiscais da Confederação Nacional dos Municípios, 2008.

A tabela 7 corresponde às transferências da União para municípios e das regiões do país.

Há uma análise do período do ano de 2002 a 2007, tendo a média nacional um aumento de 98,7

% de crescimento nas transferências no período, sendo o Piauí o estado onde as transferências da

União para os municípios menos cresceram, (57,9%, bem abaixo da média nacional). O estado de

Roraima foi onde os municípios mais obtiveram aumento no repasse da arrecadação no período,

(157,5 %).

Em valores reais, o estado de São Paulo é o que tem os municípios com maior repasse de

receitas da União para os municípios. No ano de 2007 houve transferência de um pouco mais de

6,5 bilhões de reais, enquanto que o estado do Amapá foi apontado como tendo os municípios

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com menor repasse da arrecadação em valores reais, com um pouco mais de 219 milhões de

reais.

Tabela 8 Transferências dos Estados para Municípios

Fonte: Estudos Fiscais da Confederação Nacional dos Municípios, 2008.

A tabela 8 refere-se às transferências dos estados para municípios e das regiões do país.

Há uma análise do período do ano de 2002 a 2007, tendo a média nacional um aumento de 85,8%

de crescimento nas transferências ocorridas neste período, sendo o Ceará o estado onde as

transferências do estado para os municípios menos cresceram (57,0%, bem abaixo da média

nacional). O estado do Espírito Santo foi onde os municípios mais tiveram um aumento no

repasse da arrecadação no período (178,5 %).

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Em valores reais, o estado de São Paulo é o que tem os municípios com maior repasse de

receitas do estado para os municípios. No ano de 2007 houve uma transferência de um pouco

mais de 20 bilhões de reais, aparecendo o Estado do Roraima como tendo os municípios com

menor repasse da arrecadação, com um pouco mais de 65 milhões de reais.

O que se conclui é que há uma grande concentração de receita nas mãos da União e que os

municípios, por não possuírem máquina administrativo-tributária e competência constitucional

para um maior número de tributos, ficam à mercê das transferências da União e dos estados para

fazer funcionar sua máquina administrativa, economia e serviços. Defendemos neste trabalho

uma maior transferência das receitas dos demais entes federados para os municípios, que atenda

ao Princípio da Proporcionalidade, sendo esta a segunda via da proporcionalidade tributária que

aqui defendemos, pois estados com menor capacidade arrecadatória necessitam de uma maior

transferência da União.

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3 PRINCÍPIOLOGIA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIA:

PROPORCIONALIDADE E CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

O Estado tem como fim último, segundo uma concepção do Direito Social, atingir um

bem comum, estando este caracterizado como sendo uma prestação, que tem como via Estado →

Coletividade, ou contraprestacional, como preferem outros, com via Coletividade → Estado →

Coletividade. Estas classificações têm o objetivo de afirmar que o Estado obtém receita da

coletividade para só então, por meio de ações estatais diversas, “devolver” à coletividade, através

de “benefícios”, o que dela foi retirado. Ives Gandra da Silva Martins (2009, p. 01), ao falar da

imposição tributária, afirma de forma segura:

A imposição tributária, como decorrência das necessidades do Estado em gerar recursospara sua manutenção e a dos governos que o administram, é fenômeno que surge nocampo da Economia, sendo reavaliado na área de Finanças Públicas e normalizado pelaCiência do Direito. Impossível se faz o estudo da imposição tributária, em sua plenitude,se aquele que tiver que estudá-la, não dominar os princípios fundamentais que regem aEconomia (fato), as Finanças Públicas (valor) e o Direito (norma), uma vez quepretender conhecer bem uma das ciências, desconhecendo as demais, é correr o risco deum exame distorcido, insuficiente e de resultado, o mais das vezes incorreto.

A autora usa a trilogia fato, valor e norma, muito estudada pelos acadêmicos de Direito.

Como pode ser visto, há uma relação intrínseca entre Economia, Finanças Públicas e Ciência do

Direito, resultando em uma Ciência do Direito Constitucional-Tributário. Negligenciar estes

ramos do conhecimento é entender mal o Direito Constitucional Tributário.

O Estado é detentor de bens ou patrimônios, os quais podem ser de três espécies, quanto à

sua destinação:

a) bens de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças; art.99,

inciso I, do Código Civil de 2002;

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b) bens de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou

estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal,

inclusive os de suas autarquias; art.99, inciso II, do Código Civil de 2002;

c) bens dominiais, que constituem o patrimônio público como objeto de direito

pessoal ou real de cada uma dessas entidades. art.99, inciso III, do Código Civil de

2002.

Não há muita novidade nesta classificação, tendo o Código Civil nos apresentado a

distinção entre as três modalidades de bens públicos em seu art.99. Para presente estudo interessa

a análise da fruição dos bens dominiais, os quais são os aptos a gerar receitas patrimoniais. Como

exemplo: uma relação Estado-Particular, onde o Estado é o locador de um imóvel e o particular é

o locatário. Esta relação gera uma receita para o Estado, uma receita originária. Nesta relação, o

poder de império do Estado não se apresenta para influir na relação entre as partes.

A segunda modalidade a ser estudada e que mais interessa a este estudo é a análise das

receitas derivadas. De acordo com Ricardo Alexandre (2008, p. 30-31):

Na obtenção de receitas derivadas, o Estado, agindo como tal, utiliza-se das suasprerrogativas de direito público, edita uma lei obrigando o particular que pratiquedeterminados atos ou se ponha em certas situações a entregar valores aos cofrespúblicos, independentemente de sua vontade. Como por exemplo, aquele que auferiurendimento será devedor do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza(imposto de renda) independentemente de qualquer manifestação volitiva.Registre-se, por oportuno, que tanto nas receitas originárias quanto nas derivadasexistem hipóteses em que o sujeito passivo (devedor) também é ente estatal, sendo anota distintiva entre as espécies de receita ora estudadas o regime jurídico a que estãoessencialmente submetidas (direito público ou privado) e não os pólos da respectivarelação jurídica.

É através das receitas tributárias que o Estado exerce o seu poder de império para

arrecadar tributos, tendo como fonte o patrimônio dos particulares, onde o regime jurídico

exercido é o de direito público. As receitas originárias como fonte de obtenção de capital por

parte do Estado vem perdendo sua importância, podendo-se observar o surgimento de uma nova

concepção de Estado, onde se percebe um rareamento progressivo de sua atividade econômica,

que vem sendo delegada à iniciativa privada, que passa a exercer atividades essenciais através de

contratos administrativos, por meio de concessão ou permissão. Há também a autorização, mas

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não se enquadra na modalidade de contrato administrativo. Este processo torna a atividade de

arrecadação, como quase que prioritariamente e em sua totalidade, exercida através das receitas

derivadas. Tal assertiva pode ser vista na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

em seu art. 173, que diz: “Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta

de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessárias aos imperativos da

segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.”

Quanto a esse artigo da Constituição, o Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência

pacífica quanto ao tema:

Quer dizer, o artigo 173 da CF está cuidando da hipótese em que o Estado esteja nacondição de agente empresarial, isto é, esteja explorando, diretamente, atividadeeconômica em concorrência com a iniciativa privada. Os parágrafos, então, do citado art.173, aplicam-se com observância do comando constante do caput. Se não houverconcorrência — existindo monopólio, CF, art. 177 – não haverá aplicação do disposto no§ 1º do mencionado art. 173. (RE 407.099, voto do Min. Carlos Velloso, julgamento em22-6-04, DJ de 6-8-04)

E ainda:

O juízo de conveniência, quanto a permanecer o Estado na exploração de certa atividadeeconômica, com a utilização da forma da empresa pública ou da sociedade de economiamista, há de concretizar-se em cada tempo e à vista do relevante interesse coletivo ou deimperativos da segurança nacional. Não será, destarte, admissível, no sistema daConstituição Federal que norma de Constituição estadual proíba, no Estado-Membro,possa este reordenar, no âmbito da própria competência, sua posição na economia,transferindo à iniciativa privada atividades indevida ou, desnecessariamente, exploradaspelo setor público. (ADI 234, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 22- 6-95, DJ de15-9-95)

O que se observada na análise da norma Constitucional em comento é que o Estado deve

carrear recursos para a sua máquina administrativa, mas a fonte principal para atingir este fim

seja são receitas derivadas. O Estado na condição de agente empresarial, explorando diretamente

atividade econômica em concorrência com iniciativa privada é fato excepcional. Isso se deve,

como já antes dito, ao modelo de Estado mínimo comum nos sistemas capitalistas. A segunda

jurisprudência nos mostra bem isso, em acórdão da lavra do Ministro Néri da Silveira, como

relator, quando permite aos Estados-Membros, no âmbito da própria competência, transferir à

iniciativa privada, atividades “desnecessariamente exploradas pelo setor público”.

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Não se discute entre aqueles que estudam a influência da tributação na formação e na

manutenção do Estado que, para este conseguir obter recursos e, assim, atingir um fim último,

(bem-comum) é necessário tributar. Esta análise acaba sendo por demais simplificada e só atende

àqueles que buscam uma justificativa para a carga elevada de tributos que é paga pelos

contribuintes, que no Brasil excede o razoável. Para o presente estudo, é importante analisar um

período muito importante para o Direito Financeiro e Tributário, entre os séculos XVIII e XIX,

referente à instituição do Estado Liberal, onde a regra era a não intervenção do Estado na

economia.

O Positivismo foi implementado em um momento histórico marcado pela concepção do

Estado puramente mantenedor da economia privada, que não intervinha nas relações nem na

busca da igualdade material entre os indivíduos. Este contexto difere em muito da realidade da

Constituição que hoje temos no Brasil, do Estado Social com suas peculiaridades e solidariedade,

onde o sentimento de tratar os desiguais de acordo com suas necessidades distintas habita e

predomina na sociedade. Neste âmbito, os Princípios Constitucionais não se compatibilizam com

uma interpretação positivista kelseniana.

Durante este período de atuação do Estado Liberal prevaleceram as idéias de que o Estado

não deveria intervir na economia, pensamento que se mostrava coerente com o respectivo

momento histórico em que o mundo saía de um período absolutista após a Revolução Francesa.

Havendo a burguesia saído “vitoriosa” deste embate fora instituída uma sistemática que só a ela

privilegiava, onde o Estado tratava todos da mesma forma. Criou-se aqui uma ilusão de igualdade

que era o próprio conceito de desigualdade. Outra ilusão foi a doutrina baseada em Adam Smith

(2008, p. 211), ao gerar a figura abstrata “mão invisível do mercado”, que corrigiria naturalmente

os desvios, proporcionando assim um ótimo funcionamento da economia e uma

conseqüentemente melhoria das condições da vida em sociedade. O Estado Liberal, no entanto,

nada mais proporcionava do que um crescimento das desigualdades entre os indivíduos. Não

havia preocupação alguma com o social, ou mesmo com o coletivo.

O Estado Social, por sua vez, foi substituído pelo Estado intitulado Democrático de

Direito, que tem como prioridade a resolução dos problemas gerados pelas desigualdades sociais,

exige uma nova visão do Direito e da maneira como a Tributação é aplicada. Pode-se observar

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que o Estado Democrático de Direito visa a modificação da realidade, não mais se contentando

com o papel de inerte observador das forças sociais e econômicas que lhe cabia no Estado

Liberal. O Estado Social busca uma melhora das condições existentes, um pulo qualitativo na

sociedade. O primeiro, portanto, relaciona-se com a transformação da realidade e o segundo com

a melhoria do já existente. Na prática, isso significa que o Estado Social está contido no Estado

Democrático de Direito, pois busca garantir uma vida digna ao homem e aspira a uma

participação dos indivíduos na construção da democracia, fazendo com que os valores

democráticos passem a influenciar também a ordem jurídica.

A Constituição de 1988 trouxe a preocupação em se construir um Estado Subsidiário.

Constituições com características semelhantes à nossa receberam o nome de “dirigente” pelo

autor português Canotilho (2001, p. 37), significando este termo a própria superação do

Positivismo, pois uma materialidade é almejada através dos princípios, ao fazer com que as

regras se aproximem da realidade.

Dentre os princípios inseridos na Carta Política de 1988 está o Princípio da

Proporcionalidade, que possui diversas aplicações no ordenamento jurídico. Pela sua importância

direta na relação Estado arrecadador e sujeito contribuinte, a aplicação deste princípio ao Direito

Constitucional Tributário foi norteadora no desenvolvimento deste trabalho. Quando na pesquisa

doutrinária e jurisprudencial feita de forma específica para o presente estudo, pode-se perceber

que o conceito de proporcionalidade muitas vezes se confundia com o conceito de razoabilidade.

Isso quando não havia o tratamento como igualitários ou equivalentes. Havendo variação na

doutrina quanto aos conceitos, tal fato depende de qual escola o doutrinador veio a ser

influenciado. Dizem isto por que no direito anglo-saxão, o que conhecemos por

proporcionalidade recebe o nome de razoabilidade; no direito germânico, recebe a denominação

de proporcionalidade. Já em Portugal, o presente postulado recebe o nome de princípio da

proibição de excesso.

Vê-se, então, que nem sempre um mesmo instituto é tratado com igual denominação pela

doutrina e pela jurisprudência, mas nem por isso se justifica ignorar ou menosprezar sua

importância. Na verdade, pode-se afirmar que não há muito sentido em compreender os institutos

da razoabilidade e proporcionalidade como sinônimos. Para Humberto Ávila (2004, p. 94), existe

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uma relação de causalidade entre meio e fim no postulado da proporcionalidade. Exige-se dos

poderes públicos, para a realização de seus fins, a escolha dos meios adequados, necessários e

proporcionais, devendo o referido princípio ser respeitado no momento de cobrança do tributo de

cada indivíduo, de acordo com sua capacidade contributiva, exercendo assim a justiça social ao

caso concreto, e assim aplicando de forma subsidiária o princípio da igualdade.

Outro momento a ser observado no Princípio da Proporcionalidade no Direito

Constitucional Tributário (uma “segunda via” do referido princípio) é o momento em que o

Estado exerce a repartição de receitas tributárias entre os entes federados. Trata-se da observação

do princípio na destinação às receitas arrecadadas, visando a uma desconcentração das receitas

nas mãos da União para que cada vez mais os valores sejam destinados aos Municípios, que são

os mais desprovidos de fontes de receitas e de meios arrecadadores para efetuar políticas públicas

próximas do destinatário final, que é o contribuinte que recebe a contraprestação daquilo que

entrega ao Estado a título de tributo.

Fazendo a distinção entre razoabilidade e proporcionalidade Humberto Ávila (2004, p.

102- 111) afirma:

Dever de equidade: determinada que as circunstancias de fato sejam consideradas com apresunção de estarem dentro da normalidade, ou que a aplicabilidade da regra geraldependa do enquadramento do caso concreto (geral individual);Dever de congruência: impõe a harmonização das normas com suas condições externasde aplicação, ‘quer demandando um suporte empírico existente para a adoção de umamedida, que exigindo uma relação congruente entre o critério de diferenciação escolhidoe a medida adotada’ (norma e realidade regulada); Dever de equivalência: exige que amedida adotada seja equivalente ao critério que a dimensiona. Nesta hipótese, não háuma relação de causalidade, mas sim de correspondência entre duas grandezas (critério emedida).

Para que o Estado Social não entre em contradição com o Estado federal é necessário que

o Estado Social passe a influir de maneira decisiva no desenvolvimento do federalismo atual,

tendo-se como o federalismo cooperativo como o federalismo mais adequado ao Estado Social.

Explica bem o sentido de cooperação no federalismo Gilberto Bercovici (2004, p. 57):

Esta unidade de atuação não significa, necessariamente, centralização. Precisamos, antesde mais nada, diferenciar centralização de homogeneização. Com a centralização há aconcentração de poderes na esfera federal, debilitando os entes federados em favor dopoder central. Já a homogeneização (Unitarisierung, uniformização) é baseada nacooperação, pois se trata do processo de redução das desigualdades regionais em favorde uma progressiva igualação das condições sociais de vida em todo território nacional.

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A homogeneização não é imposta pela União, mas é resultado da vontade de todos osmembros da Federação.

É dever da União, nos regimes federais, de forma tradicional, buscar a redução das

desigualdades regionais. Na republica brasileira há uma manifestação estatal na economia, o que

faz com que o governo federal busque agir através da concessão de incentivos fiscais, quando

isso ocorre no âmbito federal não há conseqüências maiores, mas quando os estados-membros

tomam a iniciativa de conceder incentivos fiscais de forma unilateral pode vir a causar a chamada

guerra-fiscal.

Já quanto a outro aspecto constitucional-tributário, se procurarmos na Constituição

Federal de 1988, não encontraremos, de forma expressa, em seu texto, o Princípio da

Proporcionalidade. O referido princípio, no entanto, pode ser compreendido de forma dedutível

no estudo de outros postulados constitucionais. Acredita-se haver uma relação conexa entre

aquele e o sistema de direitos fundamentais. A escola germânica, em contrapartida, defende que a

proporcionalidade tem uma relação íntima com o “Estado de Direito”, encontrando-se inserido de

forma implícita no sistema constitucional. Já a escola norte-americana compreende o respectivo

princípio como sendo uma vertente do devido processo legal. No Brasil, o surgimento do

Princípio da Razoabilidade está quase sempre relacionado ao preceito anglo-saxão do devido

processo legal, sendo esta a postura do Supremo Tribunal Federal brasileiro. Pedimos vênia ao

leitor para acrescentar um julgamento da lavra do Ministro Celso de Mello na ADI 2.667 do

Distrito Federal:

STF- ADI(MC)2.667/DF, re Min. Celso de Mello ‘Todos os atos emanados do poderpúblico estão necessariamente sujeitos, para efeito da sua validade material, àindeclinável observância de padrões mínimos de razoabilidade. As normas legais devemobservar, no processo de sua formulação, critérios de razoabilidade que guardem estritaconsonância com os padrões fundados no Princípio da Proporcionalidade, pois todos osatos emanados do Poder Público devem ajustar-se a clausula que consagra, em suadimensão material, o princípio do ‘substantive due processo of law’. Lei Distrital que, nocaso, não observa padrões mínimos de razoabilidade. A exigência de razoabilidade – quevisa a inibir e a neutralizar eventuais abusos do Poder Público, notadamente nodesempenho de suas funções normativas – atua, enquanto categoria fundamental delimitação dos excessos emanados do Estado, como verdadeiro parâmetro de aferição daconstitucionalidade material dos atos estatais’.

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Diferente da razoabilidade, a proporcionalidade está relacionada à máxima de aplicação

dos princípios, uma potencialização dos preceitos princípiológicos ao caso concreto, atuando

como verdadeiro critério de aferição da legitimidade material de todos os atos praticados pelo

poder público, inclusive no que se refere a criação de tributos, nas sanções tributárias, no

aumento de alíquotas tributárias, dentre outros atos que interfiram na vida dos contribuintes.

Entendendo esta como uma primeira via da proporcionalidade tributária, deve haver também a

incidência do mencionado instituto em um segundo momento (que entendemos ser a segunda

via), que é aquele em que o estado exerce a contraprestação para a coletividade, mais

especificamente no momento em que a União aplica a repartição tributária de receitas para os

Estados e Municípios com a finalidade de tornar possível o equilíbrio federativo e o exercício de

atividades que visem o bem comum da população. Acredita-se também que o municípios devem

ter maior participação no que é arrecadado, tendo em vista que a administração municipal

encontra-se mais próxima da população e tem maiores condições de saber quais as maiores

necessidades de seus habitantes.

Há uma grande concentração de receita em poder do ente União Federal, devendo haver

uma aplicação do Princípio da Proporcionalidade no sentido de haver um maior carreamento de

recursos para os municípios, que na maioria dos casos vivem a mercê destas verbas repassadas.

Este tema será tratado novamente mais adiante, ao se discorrer sobre capacidade contributiva e de

repartição de receita tributária, tendo em vista que essas são duas vias em que o Princípio da

Proporcionalidade tributária deve ser aplicado.

Em um julgado do Supremo Tribunal Federal no agravo regimental em recursos

extraordinário também da lavra do ministro Celso de Mello, publicado no Diário da Justiça em

16.08.2002, o ministro defende a aplicação do Princípio da Proporcionalidade em material

tributária:

STF – RE (AgR) 200.844, rel. Min. Celso de Mello ( DJ 16.08.2002): O Estado nãopode legislar abusivamente, eis que todas as normas emanadas do Poder Público –Tratando-se ou não de matéria tributária - devem ajustar-se a cláusula que consagra, emsua dimensão material, o princípio do substantive due processo f Law ( CF, art. 5º LIV).O postulado da proporcionalidade qualifica-se como parâmetro de aferição da própriaconstitucionalidade material dos atos estatais. Hipótese em que a legislação tributáriareveste-se do necessário coeficiente de razoabilidade

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O que se pode observar é que o judiciário, através do controle exercido perante os atos

ilegais, aplica o Princípio da Proporcionalidade em suas decisões e orienta que esse preceito seja

respeitado pelo executivo, legislativo e judiciário, sob pena de ser exercido controle dos atos que

assim não procederem para que se adéqüem a determinado preceito. Há, na verdade, uma seara

de controles, existindo muita discussão quanto à possibilidade de controle dos atos do legislativo,

pois poderia haver afronta à separação dos poderes. O que não ocorre, pois, atualmente, na

organização interna de cada casa legislativa existem comissões de constituição e justiça que

analisam previamente a constitucionalidade dos projetos de leis. Este procedimento procura

evitar que projetos já convertidos em lei posteriormente sejam declarados inconstitucionais pelo

Poder Judiciário por meio do órgão competente.

São necessárias prudência e cautela no que tange à análise meritória de atos advindos

tanto do poder legislativo quanto do executivo e judiciário. Este cuidado, porém, não deve se

tornar um empecilho que venha a obstar o exercício de tal controle, pois o controle de

constitucionalidade de determinados atos devem ocorrer quando constatados abusos, excessos e

desrespeitos à Constituição.

Para poder se falar em proporcionalidade entre duas medidas, ou melhor, para que possa

haver ponderação, é necessário que haja uma análise sobre objetos de mesma espécie; e no

momento da escolha de qual caminho seguir, deve-se perguntar se o caminho escolhido atende às

máximas da adequação, da necessidade e da proporcionalidade e sentido estrito. Não existindo o

atendimento de tais máximas, se estará diante de uma inconstitucionalidade. No caso, o postulado

da necessidade e da adequação está relacionado a possibilidade fáticas, já a proporcionalidade,

em sentido estrito, tem relação com o postulado da ponderação.

Como dito anteriormente, e segundo a doutrina de Robert Alexy, “o postulado da

proporcionalidade exige a observância de três requisitos: adequação, necessidade e

proporcionalidade em sentido estrito” (1993, p. 111). Deve haver adequação entre meio e fins,

havendo também a exigência de que as medidas que vierem a ser adotadas tenham aptidão para

com os objetivos pretendidos. Já a necessidade que também é conhecida como exigibilidade ou

princípio da menor ingerência possível está relacionada à meta de se atingir um objetivo com a

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menor onerosidade possível. Com relação à proporcionalidade em sentido estrito pedimos vênia

para inserir o raciocínio exposto por Luiz Roberto Barroso (1996, p. 208-209), vejamos:

A proporcionalidade em sentido estrito está vinculada a verificação do custo-benefícioda medida, aferida por meio de uma ponderação entre os danos causados e os resultadosa serem obtidos. A interferência na esfera dos direitos dos cidadãos só será justificávelse o benefício alcançado for maior que o ônus imposto.

O que pode ser extraído do Princípio da Proporcionalidade em relação à esfera jurídica

dos particulares, mais especificamente quanto aos contribuintes, é que o mencionado instituto não

visa apenas evitar a interferência direta do Estado de forma coativa na seara de atuação privada,

mas visa a exigir uma contraprestação do Estado no sentido de ver respeitados os direitos

fundamentais. Há uma verdadeira obrigação do Estado em tutelar a segurança, a saúde, a

educação, dentre outros direitos essenciais do ser humano. Assim, podem-se observar as duas

vias da proporcionalidade constitucional tributária. O contribuinte deve sofrer a exação do Estado

de forma proporcional, na medida de sua capacidade contributiva. A segunda via da

proporcionalidade está no sentido de o Estado exercer a contraprestação à população, respeitando

os direitos fundamentais dos indivíduos em uma verdadeira obrigação de cumprir quando

disponibiliza serviços de saúde, ensino e segurança, por exemplo.

Após entendermos como os Estados se apresentam à luz da Constituição Federal de 1988

no que se refere a lidar com o resultado da arrecadação tributária, é importante analisar os freios

que este mesmo Estado deve observar no momento de exercer sua competência de cobrar esses

valores. Um norte para o entendimento desta dinâmica é saber o significado da expressão

“capacidade contributiva”, que limita o poder de arrecadação do Estado perante o contribuinte,

exigindo que haja um respeito ao Princípio da Proporcionalidade no que tange a interferência no

Estado.

A expressão capacidade contributiva é bastante antiga. Os filósofos Gregos já colocavam

em seus fundamentos as bases do princípio de que os indivíduos deveriam concorrer para as

necessidades da coletividade na medida (proporcionalidade) de sua capacidade econômica. A

Declaração dos Direitos Humanos do Homem e do Cidadão em seu art. 13 estabelece que “para a

manutenção da força pública e para as despesas da administração é indispensável uma

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contribuição comum”, onde esta deve ser repartida por igual entre todos os cidadãos, tendo em

conta as suas possibilidades.

O Princípio da Capacidade Contributiva está presente em várias Constituições, como, por

exemplo, na Francesa de 1848. Trata-se de um princípio que atualmente está inserido em quase

totalidade dos ordenamentos jurídicos mundiais. No Brasil, a primeira menção expressa

constitucionalmente ao Princípio da Capacidade Contributiva foi no texto constitucional da Carta

Magna de 1824, em seu art.179, XV:

Art. 179. a inviolabilidade dos direito civis e políticos dos cidadões brasileiros, que tempor base a liberdade, a segurança individual e a propriedade, é garantida pelaConstituição do Império pela maneira seguinte:.............................................................................................................................................XV – Ninguém será isento de contribuir para as despesas do Estado em proporção dosseus haveres.

Na Constituição de 1946 encontrou-se expresso integralmente no texto normativo, no seu

art. 202, que “Os tributos terão caráter pessoal sempre que isso for possível e serão graduados

conforme a capacidade econômica do contribuinte.”

O Princípio da Capacidade Contributiva foi suprimido na Constituição de 1967, no

entanto, alguns doutrinadores ainda defendiam a existência implícita deste princípio, numa

interpretação sistemática das normas constitucionais. A Carta Magna de 1967, de acordo com a

Emenda Constitucional nº1/1969, não versou especificamente sobe este tema, mas, para muitos

doutrinadores, o Princípio da Capacidade Contributiva continuava plenamente em validade, pois

no §36 do art. 153 enunciava:

Art. 153. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País ainviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade e à propriedade nos termosseguintes: .............................................................................................................................................§3º – A especificação dos direitos e garantias expressos nessa Constituição não excluioutros direitos e garantias decorrentes do regime e dos princípios que ela adota.

A Constituição de 1988 dispõe no §1º do art.145:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir osseguintes tributos:...........................................................................................................................................

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§1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundoa capacidade econômica do contribuinte, facultado a administração tributária,especialmente para conferir efetividade a esses objetivos identificar, respeitados osdireitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividadeseconômicas dos contribuintes.

O Princípio da Capacidade Contributiva tem diversos desdobramentos, merecendo uma

análise pormenorizada do primeiro momento de ação do Estado perante a coletividade, que é a

arrecadação, entender a limitação e como funciona esse sistema de grande importância para o

presente estudo, pois consiste em um de seus objetivos principais, dentre entender a forma como

o tributo é arrecadado e como esses valores são repartidos entre os demais entes federados para

que possam, então, serem revertidos para a população via Estados e Municípios. Passemos então

à análise dos desdobramentos do Princípio da Capacidade Contributiva.

3.1 Princípio da Capacidade Contributiva

Conforme foi colocado em nossa Carta Magna, a expressão “sempre que possível”

ressalta que é necessário levar em consideração a capacidade econômica do contribuinte. Instituir

impostos sem levar em consideração a situação financeira ou econômica do contribuinte pode

gerar uma situação caótica, pois, não sendo desta forma, a ressalva constitucional se aplica a

personalização, pois se assim não o for, o Princípio da Capacidade Contributiva ficaria anulado.

É importante observar, no entanto, que existem determinados casos em que é impossível observar

este princípio, daí a ressalva do texto constitucional. A capacidade econômica postulada pelo

legislador busca atingir objetivos como a personalização, a proporcionalidade, a progressividade

e a seletividade. A personalização é um dos objetivos observados pelo Princípio da Capacidade

Contributiva. Bernardo Ribeiro de Moraes (2008, p. 118) conceitua o termo como sendo o

princípio “pelo qual cada pessoa deve contribuir para as despesas da coletividade de acordo com

a sua aptidão econômica, ou capacidade contributiva, origina-se do ideal de justiça distributiva”.

O tributo, além de ser legal, deve ser justo, ou seja, adequado à capacidade econômica da

pessoa que vai pagá-lo. Bernardo Ribeiro de Moraes (2008, p. 118) questiona ao perguntar: “Por

que deve o legislador considerar as disparidades? Para nós, a juridicidade da capacidade

contributiva, resulta, como vimos do lado positivo do princípio da igualdade: o dever imposto ao

legislador dever distinguir disparidades”.

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O §1º do art. 145 da Constituição da República prevê que “sempre que possível, os

impostos terão caráter pessoal e serão graduados de acordo com a capacidade econômica do

contribuinte, facultado a administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses

objetivos e identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os

rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”.

Sobre o citado artigo da Constituição, Luciano Amaro (2001, p. 136) comenta o Princípio

da Capacidade Contributiva:

O Princípio da Capacidade Contributiva inspira-se na ordem natural das coisas: onde nãohouver riqueza é inútil instituir imposto, no mesmo modo que em terra seca não adiantaabrir poço à busca de água. Porém, na formulação jurídica do princípio, não se querapenas preservar a eficácia da lei de incidência (no sentido de que esta não caia no vazio,

por falta de riqueza que suporte o imposto).

Temos, por outro lado, o caso dos impostos reais, que não levam em conta a situação

individual e nem o Princípio da Capacidade Contributiva, pois na criação destes impostos não é

levada em consideração a capacidade econômica do contribuinte de fato, em razão de quem, nos

tributos indiretos, o princípio é ignorado.

3.2 Capacidade contributiva e capacidade econômica

O Princípio da Capacidade Contributiva deriva do princípio da isonomia e tem base no

postulado do Direito onde o mesmo “é o modo pelo qual se deve tratar os desiguais de modo

desigual, na medida de sua desigualdade”, devendo, assim, o tributo ser cobrado de acordo com

as possibilidades de cada um. Ressalta-se a visão de Ricardo Chimenti ( 2001, p. 16):

O princípio da igualdade é complementado pelos princípios da personalização e dacapacidade contributiva, previstos no art. 145 § 1.º, da Constituição. A expressãocapacidade contributiva pode ser vista sob dois ângulos – estrutural e funcional –,gerando conceitos distintos. Sob o ângulo estrutural, a capacidade contributiva pode serdefinida como a aptidão para suportar o ônus tributário; a capacidade de arcar com adespesa decorrente do pagamento de determinado tributo. Sob o ângulo funcional, oPrincípio da Capacidade Contributiva pode ser visto como critério destinado adiferenciar pessoas, de modo a fazer com que se possa identificar quem são os iguais,sob o aspecto do Direito Tributário, quem são os desiguais e em que medida se igualam,a fim de que se possa aplicar o princípio da igualdade com o justo tratamento a cada umdeles.

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Importante notar, com o mesmo autor Chimenti (2001, p.16), que, “A fim de dar eficácia

a este princípio, faculta-se à administração, respeitados os direitos individuais e os termos da lei,

identificar os rendimentos do contribuinte, seu patrimônio e suas atividades econômicas.”

Capacidade contributiva e capacidade econômica não se confundem, pois embora sejam

dimensões da capacidade do contribuinte de pagar tributos, têm conotações distintas.

Contributiva é a capacidade do contribuinte relacionada com a imposição específica ou global,

sendo, portanto, dimensão econômica particular de sua vinculação ao poder tributante, nos termos

da lei. Capacidade econômica é a exteriorização da potencialidade econômica de alguém,

independente de sua vinculação ao referido poder. Um cidadão que usufrui renda tem capacidade

contributiva perante o ente que daquele recebeu, desde que nos limites adequados e vinculados à

sua produção de renda, se a imposição for aquela do imposto sobre a renda. Um cidadão rico, de

passagem pelo país, tem capacidade econômica, mas não contributiva, para efeitos dos tributos

específicos exigidos de cidadãos e residentes no local onde ocorre o fato gerador. À luz de tal

distinção, percebe-se que o constituinte, no parágrafo 1º do artigo 145 e no artigo 150, inciso IV,

da CF, pretendeu, ao mencionar a capacidade do contribuinte, referir-se à sua capacidade

contributiva e não à sua capacidade econômica, nada obstante o núcleo comum de ambas, que

implica densidade econômica capaz de suportar a imposição.

3.3 Capacidade contributiva e pessoalidade

A personalização do imposto pode ser vista como uma das faces da capacidade

contributiva, à qual, sem dúvida, o imposto pessoal deve ser adequado. Esta personalização é

traduzida na adequação do gravame fiscal às condições pessoais de cada contribuinte. Portanto, a

seletividade (pessoalidade) apresenta-se como uma técnica de implementação da justiça fiscal.

Embora a Constituição Federal de 1988 apenas tenha se referido aos impostos, esta

capacidade contributiva também pode ser levada a outras espécies tributárias, em especial as

taxas, como forma de aplicação do Princípio da Capacidade Contributiva e da pessoalidade como

pressuposto do alcance da justiça fiscal e social. O Princípio da Proporcionalidade também se

relaciona à capacidade contributiva e à pessoalidade, visto que impõe que se aplique uma justiça

na incidência em cada situação isoladamente considerada, determinando a importância da

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aplicação destes institutos para que a justiça social esteja amplamente defendida e protegida no

direito tributário brasileiro. Baleeiro (2004, p. 695) interpreta o dispositivo:

O art. 145, §1º, fala em pessoalidade sempre que possível. A cláusula sempre quepossível não é permissiva, nem confere poder discricionário ao legislador. Ao contrário,o advérbio sempre acentua o grau da imperatividade e abrangência do dispositivo,deixando claro que, apenas sendo impossível, deixará o legislador de considerar apessoalidade para graduar os impostos de acordo com a capacidade econômica subjetivado contribuinte. E quando será impossível? A doutrina costuma apontar a hipótese dosimpostos que são suportados pelo consumidor final, como exemplo de tributação não-pessoal. É que nos impostos incidentes sobre a importação, a produção ou a circulação, osujeito passivo, que recolhe o tributo aos cofres públicos (o industrial ou o comerciante),transfere a um terceiro, o consumidor final, os encargos tributários incidentes. Tornar-se-ia muito difícil, senão impossível, graduar o imposto sobre produtos industrializados ousobre operação de circulação de mercadoria de acordo com a capacidade econômica dapessoa que adquire o produto ou a mercadoria para o consumo.

É realmente difícil fazer uma análise acerca do princípio da pessoalidade relacionado à

capacidade contributiva no que se refere aos impostos não cumulativos, como no caso do imposto

sobre produtos industrializados, que é um imposto federal, e o imposto sobre circulação de

mercadoria e serviços, pois o imposto pode ter ocorrido diversas vezes o fato gerador dos

referidos impostos, tendo havido, assim, a incidência da mesma forma da alíquota nas diversas

operações, até que o produto viesse às mãos do consumidor final.

Ora, medir a capacidade contributiva do indivíduo para só então observar se há um

excesso de exação é como buscar algo inalcançável, pois se deve procurar um lugar comum,

tendo como parâmetro critérios objetivos e não subjetivos, como, por exemplo, a renda per

capita, o produto interno bruto de determinadas localidades ou mesmo do país, estudos acerca de

inflação, carga tributária sobre produtos mais consumidos e necessários a subsistência; como é o

caso da cesta básica.

3.4 Capacidade contributiva, seletividade e progressividade

A justiça tributária tem seus pilares nos princípios constitucionais expressos e implícitos,

tais como a legalidade estrita para exigências de tributos, a propriedade, a igualdade ou isonomia,

garantindo tratamento igual a contribuintes que se encontrem em situação equivalente e liberdade

de circular livremente com seus bens em todo território nacional, amplamente assegurado pelo

princípio federativo. Dentre muitos princípios expressos na nossa Constituição Federal, encontra-

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se o Princípio da Capacidade Contributiva, critério base de uma tributação justa e equilibrada,

que contribui para que o nosso país atinja seus objetivos esculpidos no art.3º, em especial, o de

construir uma sociedade justa e equilibrada, reduzir as desigualdades sociais e regionais, garantir

o desenvolvimento nacional e promover o bem de todos. Alfredo Augusto Becker 1972, p. 447)

afirma que:

[...] o Princípio da Capacidade Contributiva constitui uma regra de direito natural sendocorolário do princípio da igualdade. Capacidade Contributiva é expressão equivalente àcapacidade econômica, representando a aptidão da pessoa para participar das despesaspúblicas, isto é, para pagar tributos.

Este princípio origina-se do ideal de justiça distributiva. Aqui o cidadão-contribuinte

participa nas despesas da coletividade de acordo com a sua aptidão econômica, ou capacidade

contributiva. O Princípio da Capacidade Contributiva sempre esteve ligado a problemas políticos

e econômicos do Estado, concretamente, (distribuição da carga tributária) e econômicos (caráter

regressivo dos impostos, tributos pessoais e direitos). No art.145, §1º da CF, esse parágrafo é um

comando, em especial, para os impostos, tributos que pressupõem uma carga mais onerosa ao

contribuinte do que as outras espécies tributárias. Fixa-se neste dispositivo constitucional um

objetivo a ser atendido pela administração tributária, como também ao judiciário e ao legislador,

que não se eximem de assegurá-lo, visando à equidade fiscal. A administração tributária e seus

agentes devem, portanto, conferir máxima efetividade.

O Princípio da Capacidade Contributiva deve observar e respeitar os direitos individuais e

a legalidade no que concerne à identificação e ao sigilo fiscal quanto ao seu patrimônio,

rendimentos e atividades econômicas, visto que as informações relativas ao contribuinte o

desnuda, expõe sua vida privada e o fragiliza diante de sua atividade produtiva. A justiça fiscal é

o sustentáculo de uma relação equilibrada entre o fisco e o contribuinte, que impõe obrigação da

administração em ser razoável e proporcional no que diz respeito à tributação sobre a iniciativa

privada, provedora dos recursos que movimentam a máquina estatal, sem que isto importe um

estrangulamento de sua atividade, tornando inviável a atividade objeto de tributação.

Tal como o fiel da balança, a carga tributária deve manter-se justa para que o Estado tenha

a legitimidade de cobrá-la, em sua prerrogativa unilateral, fornecendo os serviços gerais à

comunidade e distribuindo a parte da riqueza tributada que lhe cabe mediante lei às comunidades

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mais carentes de programas sociais, educação, saúde, infra-estrutura, dentre outros serviços. Cabe

ao contribuinte, mediante seu dever fundamental, em medida justa e proporcional, repassar parte

de seu patrimônio ou riquezas em prol da coletividade, representada pelo Estado promotor do

bem comum, recolhendo aos cofres públicos os recursos que serão empregados em benefício da

sociedade. Com relação à Capacidade Contributiva, contempla Leandro Paulsen ( 2004, p. 75):

A previsão da graduação dos impostos seguindo a capacidade econômica do contribuinteconstitui positivação do Princípio da Capacidade Contributiva, suscitando inúmerosquestionamentos, principalmente quanto a sua extensão. A maior parte da doutrina diztratar-se de um princípio de sobredireito ou metajurídico, que deve orientar o exercícioda tributação independentemente de constar expressamente na Constituição.Decorre deste princípio, basicamente que o Estado deve exigir que as pessoascontribuam para as despesas públicas na medida de sua capacidade para contribuir, demaneira que nada deve ser exigido de quem só tem para sua própria subsistência, a cargatributária deve variar segundo as demonstrações de riqueza e, independentemente disso,a tributação não pode implicar confisco para ninguém. Os extremos desta formulação(preservação do mínimo vital e vedação ao confisco) se aplicam a todas as espéciestributárias. Entretanto, a possibilidade de graduação do tributo (e.g.,alíquota maior parabase de cálculo maior) depende que se cuide de uma hipótese de incidência efetivamentereveladora de capacidade contributiva.

Por sua vez, a seletividade consiste em um instrumento para a observância do Princípio

da Capacidade Contributiva, que visa reduzir a tributação de bens cuja essencialidade seja

relevante à sociedade como um todo, podendo também aumentar a tributação de bens que sejam

considerados nocivos à sociedade ou à economia de um estado, dando um tratamento tributário

diferenciado em função da necessidade da sociedade e do Estado. Trata-se de uma proteção geral

a certo bem ou produto, tornando menos oneroso o produto benéfico ou mais oneroso o produto

prejudicial.

Anteriormente à Constituição Cidadã, este princípio somente se aplicava ao Imposto sobre

Produto Industrializado, agora estendido expressamente ao Imposto sobre Circulação de

Mercadoria e Serviços. Hugo de Brito Machado (1993, p. 54) afirma que este princípio está

juridicizado, no Brasil, apenas à espécie impostos, e não ao gênero tributo, comentando:

Assim, no Direito brasileiro, o Princípio da Capacidade Contributiva existe como umprincípio jurídico constitucional apenas para os impostos, e apenas em relação a estes,portanto, se impõe ao legislador, que não observando produzirá lei inconstitucional. Emrelação às taxas, como em relação a qualquer outro tributo que não se caracterize comoimposto, o legislador tem a liberdade de observar, ou não, o princípio em tela.

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O STF, entretanto, vem se dispondo a aplicar o Princípio da Capacidade Contributiva em

relação às taxas. RREE-177.835-PE-22/04/99- Informativo 146 STF diz o seguinte:

Concluído o julgamento de recursos extraordinários em que se discute aconstitucionalidade da taxa de fiscalização do mercado de títulos e valores mobiliários,instituída pela Lei 7.940/89 (v. Informativos 82, 112 e 119). O Tribunal, por maioria,mantendo as decisões recorridas, entendeu constitucional a referida taxa. Considerou-se:1) que o fato de a taxa variar em função do patrimônio líquido da empresa não significaque esse patrimônio líquido constitua sua base de cálculo - serve, apenas, de elementoinformativo do montante a ser pago, quando da aplicação da tabela prevista na lei; 2) queo critério adotado para a cobrança de taxa observa o Princípio da CapacidadeContributiva, que também pode ser aplicado a essa espécie de tributo, principalmentequando se tem como fato gerador o poder de polícia. (CF, art. 145, § 1º - ‘Sempre quepossível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidadeeconômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente paraconferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais enos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas docontribuinte. ’). Vencido o Min. Marco Aurélio, que declarava a inconstitucionalidadeda referida Lei.

A seletividade, juntamente com a progressividade, é instrumento de aplicação do

Princípio da Capacidade Contributiva e indispensável à efetivação da justiça fiscal e tributária, no

que concerne aos impostos reais, visto que nestes impostos o princípio fica cego à condição

pessoal do contribuinte, alheio ao verdadeiro status de riqueza. Conforme entendimento

pacificado na doutrina, a seletividade é uma vertente da capacidade contributiva, no qual o

gravame deve ser inversamente proporcional à essencialidade do bem. A seletividade, em tais

casos, pode, inclusive, dar isenção de um imposto real, observadas as condições peculiares e

pessoais do contribuinte. A exemplo da Prefeitura Municipal de Fortaleza – a viúva pobre, o ex-

combatente etc, transformando um imposto real justo que vislumbre a equidade tributária

constitucionalmente objetivada e positivada.

Por fim, resta esclarecer, com base na doutrina majoritária, que o Princípio da Capacidade

Contributiva não se confunde com o Princípio da Pessoalidade dos Impostos, embora possuam

relação intrínseca, uma vez que o aspecto pessoal do imposto imprime caráter de justiça

tributária, tal qual o da capacidade contributiva. O Princípio da Pessoalidade demonstra uma

preocupação com a situação individual do sujeito passivo, buscando atingir a sua real capacidade

contributiva, sendo o Princípio da Capacidade Contributiva mais genérico e amplo de uma

coletividade, dando margem a um tratamento isonômico geral, seja por falta de capacidade ou

excesso da mesma, ambos buscando a justa tributação.

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A progressividade é instrumento realizador da capacidade contributiva e distingue-se da

seletividade, pois é progressivo o imposto cuja alíquota é maior na medida em que aumenta a

base de cálculo tributada. A progressividade faz com que o imposto onere mais quem tem riqueza

maior. Neste sentido, concluímos que se torna um importante instrumento para justiça tributária,

porém, quando aplicado a impostos reais em produtos que são essenciais a vida como: alimentos

básicos, remédios, transporte, ensino, moradia e outros produtos consumidos pelas classes

trabalhadoras, termina por constituir uma tributação excessiva, pois fere o Princípio da

Capacidade Contributiva. Há, portanto, de se conjugar este instrumento com a seletividade nos

impostos reais.

3.5 Os critérios para estabelecer e capacidade contributiva

José Afonso da Silva (2007, p. 692) afirma o Princípio da Capacidade Contributiva

segundo o qual o ônus tributário deve ser distribuído na medida da capacidade econômica dos

contribuintes. Isto implica uma base impositiva que seja capaz de medir a capacidade para

suportar o encargo e alíquotas que igualem verdadeiramente esses ônus. A doutrina fixou alguns

critérios para isso, como o de “sacrifício igual”, o de “sacrifício proporcional”, o de “menor

sacrifício” e o de não “altere a desigualdade das rendas, pela tributação”. Mas o princípio tem o

importante significado, destacado por Victor Uckmar (1976, p. 54), na medida em que reafirma

“o princípio ou preceito da igualdade de posições dos cidadãos diante do dever tributário de

prover as necessidades da coletividade, implica distribuição equânime dos ônus tributários”.

Mizabel Derzi (1997, p. 690-93), nos seus comentários à obra de Baleeiro – limitações

constitucionais ao poder tributar, discorre com precisão: “[...] diferentes autores distinguem entre

capacidade econômica objetiva (absoluta) e subjetiva (ou relativa ou pessoal)”. Assim, para

determinar a capacidade contributiva do ponto de vista objetivo, deve-se partir de critérios, isto é,

o legislador ordinário deve eleger como hipóteses de incidência dos tributos aqueles fatos que

efetivamente sejam indícios de capacidade econômica. Daí inferir a aptidão abstrata e em tese

para concorrer aos gastos públicos da pessoa que realiza tais fatos indicadores de riqueza. Do

ponto de vista subjetivo, refere-se à concreta e real aptidão de determinada pessoa para o

pagamento de certo tributo. Esta capacidade de participar do financiamento estatal somente se

inicia após a dedução das despesas necessárias para a manutenção de uma existência digna ao

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contribuinte e sua família. A capacidade contributiva real (subjetiva) corresponde a um conceito

de renda ou patrimônio liquido pessoal, livremente disponível para o consumo e assim também

para o pagamento de tributos. Desta forma, se realizam os princípios constitucionais exigidos da

pessoalidade do imposto.

Em vista disto, Sacha Calmon Navarro Coêlho (2005, p.84) estabelece as duas

modalidades de capacidade contributiva, levando-se em conta o potencial econômico que o

contribuinte pode apresentar: a capacidade econômica objetiva e subjetiva. Neste diapasão, os

critérios para determinar o ônus fiscal que será suportado pelos contribuintes serão diferenciados

pelo fator gerador dos impostos que porventura incidirão. Caso seja um imposto em que o fato

imponível faça uma presunção de riqueza, nas palavras de Becker “signos presuntivos de

capacidade econômica” (ter uma casa, carro do ano), certamente incidirá uma aferição de uma

capacidade contributiva objetiva. Mas na situação dos impostos que advêm da renda e proventos,

tem-se uma medida econômica subjetiva, onde o contribuinte apresenta sua verdadeira aptidão e

capacidade para participar do financiamento estatal. Louvável seria se todos os impostos tivessem

seus fatos geradores baseados na capacidade econômica subjetiva, pois, assim, a justiça fiscal

seria então alcançada.

A doutrina fiscal discute se a capacidade contributiva eleita pela Constituição Federal tem

por base a capacidade econômica subjetiva ou objetiva. Roque Antonio Carrazza (2006, p. 89)

assevera seu pensamento:

A capacidade contributiva à qual alude a Constituição e que a pessoa política é obrigadaa levar em conta ao criar, legislativamente, os impostos de sua competência é objetiva, enão subjetiva. É objetiva porque se refere não as condições econômicas reais de cadacontribuinte, individualmente considerado, mas as manifestações objetivas de riqueza(ter um imóvel, possuir um automóvel, ser proprietário de jóias ou obras de arte, operarem Bolsa, praticar operações mercantis etc.) Assim, atenderá ao Princípio da CapacidadeContributiva a lei que, ao criar o imposto, colocar em sua hipótese de incidência fatosdeste tipo.

Já Sacha Calmon Navarro Coêlho (1990, p. 90) pensa de maneira oposta ao enunciado

acima: “[...] a capacidade contributiva à qual alude o art. 145, parágrafo primeiro, da CF é

subjetiva, devendo levar em conta, pois, a capacidade econômica real do contribuinte, isto é, sua

aptidão concreta e especifica de suportar a carga econômica do imposto.” A conclusão do

professor Sacha Calmon expressa mais consistência, haja vista que o texto constitucional requer o

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caráter pessoal dos impostos, mas é conhecido que em todos os impostos poderão medir

fielmente a capacidade contributiva, cabendo ao legislador a utilização de outros princípios

fiscais (seletividade, alíquotas progressivas, dentre outros) para tornar o exercício fiscal mais

justo e equânime aos destinatários das normas tributárias.

3.6 O alcance da capacidade contributiva com relação às imunidades

tributárias

A competência tributária é desenhada também por normas negativas, que veiculam o que

se convencionou em chamar de imunidades tributárias. São as hipóteses de não incidência

constitucionalmente qualificadas, que palavras de Hugo de Brito Machado (2006, p. 296):

Imunidade é o obstáculo decorrente de regra da Constituição à incidência de regrajurídica de tributação. O que é imune não pode ser tributado. A imunidade impede que alei defina como hipótese de incidência tributária aquilo que é imune. É limitação dacompetência tributária.

A doutrina mais tradicional classifica as imunidades em subjetivas, objetivas e mistas,

conforme alcancem pessoas, coisas ou ambas. Mas a imunidade é sempre subjetiva, já que

invariavelmente beneficia pessoas, quer por sua natureza jurídica, quer pela relação que guardam

com determinados fatos, bens ou situações. A imunidade descrita na Carta Magna tem sua razão

de ser pela falta de capacidade contributiva de certos entes imunes, como, por exemplo, os

partidos políticos, suas fundações, os sindicatos dos trabalhadores, as instituições de educação e

assistência social sem fins lucrativos, como também os entes federativos. Assim diz Misabel

Derzi ao atualizar a obra de Aliomar Baleeiro (2004, p. 125):

Outros juristas, no entanto, preferem fundamentar as imunidades dos entes estatais naausência de capacidade contributiva. De fato, esse é outro prisma pelo qual a questãotambém pode ser examinada, não se podendo reconhecer nas atividades estatais próprias,como instrumentalidades governamentais, a capacidade inerente às atividadeseconômicas de fins lucrativos. Nem seria razoável tributar, decepando a renda, aquelaatividade para cuja manutenção compulsoriamente deve contribuir os cidadãos.

Em relação aos partidos políticos, Sacha Calmon Navarro Coêlho (2005, p. 304) assevera:

“Ora, a democracia postula a existência de partidos sem os quais é impossível a sua mecânica, os

partidos são non-profit, não projetam signos presuntivos de capacidade contributiva”. Ruy

Barbosa Nogueira conclui:

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Na verdade e em razão da própria natureza das coisas, essas situações realizadas por taisentidades não tem qualquer conteúdo ou resultado econômico para serem tributadas, oucomo se diz na técnica da tributação, não existe física nem legalmente qualquer base decálculo que é a expressão econômica ou de grandeza do próprio cerne do fato gerador deimposto. É mesmo um princípio universal de justiça social em matéria de tributação aconsideração econômica, pela qual somente podem e devem ser escolhidas pelolegislador como assento ou base de cálculo do imposto, as relações fáticas de expressãoou conteúdo econômico e potencialmente contributiva. Onde nada existe, ate oimperador perdeu o seu direito ao imposto. (NOGUEIRA,1984, p.74-75).

Questão de importância relevante é saber o alcance da imunidade tributária está adstrito

apenas aos impostos ou a qualquer tributo. Hugo de Brito Machado (2006, p. 296) discorre:

Em edições anteriores afirmamos que a imunidade refere-se apenas aos impostos. Nãoaos demais tributos. Hoje, porem, já não pensamos assim. A imunidade, para ser efetiva,para cumprir suas finalidades deve ser abrangente. Nenhum tributo pode ficar fora deseu alcance.

Ora, é fácil chegar a este entendimento, tendo em vista que, se falta capacidade

contributiva para os impostos, cabalmente faltaria para os demais tributos, sendo os entes imunes

carentes de potencial econômico, não poderiam arcar com o ônus fiscal oriundos das outras

espécies tributárias. Por um simples raciocínio, quem não pode pagar imposto pela falta de

aptidão financeira para isto não pode pagar também outros tributos. Como diz Hugo de Brito

Machado (2006, p. 296), “a finalidade da imunidade deve abranger toda e qualquer espécie

tributária, sendo o contrario o espírito do instituto estará mitigado, algo que não é aceitável, haja

vista a interpretação dos preceitos imunizantes há de ser o quanto possível favorável ao

contribuinte.”

3.7 Princípio da vedação ao confisco

O confisco constitui a retirada compulsória da propriedade pelo Estado sem indenizar o

contribuinte. Não há duvidas de que o Brasil possui uma das mais altas cargas tributárias do

mundo, mesmo tendo o contribuinte, a seu favor, uma Carta Constitucional, que “teoricamente”

deveria protegê-lo dos excessos do fisco. Mesmo consagrado na forma de princípios, direitos e

garantias fundamentais que deveriam ser aplicados a todos, o que ocorre de fato em nosso país

não é a aplicação do princípio da vedação ao confisco, pois apesar desta elevada carga tributária,

não existe, de fato, um percentual que possa servir de parâmetro para que se defina o que seja um

tributo confiscatório. A atual Constituição Federal, no inciso IV do art. 150, dispõe que, “Sem

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prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao

Distrito Federal e aos Municípios: IV – Utilizar tributo com efeito de confisco.”

Isto quer dizer que o legislador não pode exigir um tributo em percentual superior ao

patrimônio da pessoa, pois isto implicaria na retirada pelo Estado da maior parte do que possui o

contribuinte. O estabelecimento deste percentual é bastante questionado, pois depende de muitos

outros fatores como, por exemplo, a necessidade do produto ou a desnecessidade. O governo taxa

produtos como cigarro e bebidas alcoólicas em um altíssimo percentual, pois o consumo destes

produtos é absolutamente desestimulado e a alta taxação é uma forma de desencorajar o

consumo.

No Brasil, a Constituição autoriza a União a instituir mais de um tributo sobre o mesmo

fato gerador, por exemplo: Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ), Contribuição Social

Sobre o Lucro Líquido (CSLL), Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) e contribuição

previdenciária. Para saber se nestes casos está havendo o confisco, é necessário fazer a soma dos

mesmos, pois não podem ser analisados isoladamente, uma vez que estão inseridos sobre o

mesmo fato. Sobre a extensão do conceito e a identificação do efeito confiscatório discorreu o

Ministro Celso de Mello nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº2010-2/DF, julgada

em setembro de 1999:

A proibição constitucional do confisco em matéria tributária nada mais representa se nãoa interdição, pela Carta Política, de qualquer pretensão governamental que possaconduzir, no campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no todo ou em parte, dopatrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes, comprometendo-lhes, pelainsuportabilidade da carga tributária, o exercício do direito a uma existência digna, ou aprática de atividade profissional lícita ou, ainda, a regular satisfação de suasnecessidades vitais (educação, saúde e habitação, por exemplo). A identificação doefeito confiscatório deve ser feito em função da totalidade da carga tributária, medianteverificação da capacidade de que dispõe o contribuinte – considerado o montante de suariqueza (renda e capital) – para suportar e sofrer a incidência de todos os tributos que eledeverá pagar, dentro de determinado período, à mesma pessoa política que os houverinstituído (a União Federal, no caso) condicionando-se, ainda, a aferição do grau deinsuportabilidade econômico-financeira, à observância pelo legislador, de padrões derazoabilidade destinados a neutralizar excessos de ordem fiscal eventualmente praticadospelo Poder Público. Resulta configurado o caráter confiscatório de determinado tributo,sempre que o efeito cumulativo- resultante das múltiplas incidências tributáriasestabelecidas pela mesma entidade estatal- afetar, substancialmente, de maneirairrazoável, o patrimônio e/ou os rendimentos do contribuinte. - O Poder Público,especialmente em sedes de tributações (as contribuições da seguridade social revestem-se de caráter tributário), não pode agir imoderadamente, pois a atividade estatal acha-seessencialmente condicionada pelo princípio da razoabilidade.

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O princípio do não-confisco é recente em nosso ordenamento jurídico, pois ele só

apareceu em nossa Carta Magna de 1988, em função do direito de propriedade e da proteção à

livre iniciativa. A Constituição de 1988 foi explícita quando proibiu a utilização do tributo com

efeito de confisco (art. 150, IV). No entanto parece que pode ainda ser difícil determinar, de

forma prévia, quando um tributo é confiscatório e quando não o é. Segundo Hugo de Brito

Machado (2003, p. 168):

A carga tributária há de ser, portanto, proporcional aos serviços, sem sentido amplo, queo Estado presta à população. Um Estado que tributa pesadamente e não presta osserviços públicos a que está obrigado pode estar praticando tributação confiscatória. Jáum Estado que tributa pesadamente, mas presta à população todos os serviços públicosde que necessita não estará utilizando o tributo com efeito de confisco, mas como fontede recursos para o financiamento dos serviços que efetivamente presta.

Assim, na avaliação que se deva entender por tributo com efeito de confisco temos delevar em consideração a quantidade e a qualidade dos serviços públicos efetivamenteprestados à população. A definição, em cada caso, do efeito confiscatório do tributo ficaa depender da equivalência entre os serviços prestados pelos Estados e os tributos poreste arrecadados.

Cabe ao poder judiciário a decisão de, em caso concreto, decidir se o tributo é

confiscatório, e, desta maneira, fazer com que seja considerado inconstitucional. Para que se

possa avaliar se um tributo está sendo usado de forma confiscatória, seu “ônus” precisa ser

considerado em conjunto com todos os demais tributos que oneram o mesmo fato.

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CONCLUSÃO

O Positivismo foi implementado em um momento histórico marcado pelo liberalismo

econômico, onde o Estado era apenas garantidor das relações privadas, não intervindo nas

relações entre particulares para que uma igualdade material entre os indivíduos fosse alcançada.

É diferente da realidade que hoje vivemos e da Constituição que hoje temos no Brasil, que tem

traços do Estado Social com suas peculiaridades dentre elas a solidariedade e o sentimento de

“tratar os desiguais desigualmente na medida exata de suas desigualdades”. Outro ponto marcante

do ordenamento jurídico implementado pela Constituição de 1988 foi a instituição das chamadas

normas programáticas, que possuem uma roupagem predominantemente social. Nota-se, com

toda esta mudança instituída pela nova ordem, que os princípios constitucionais não se

compatibilizam com uma interpretação positivista kelseniana. Um Positivismo exegético

encontra-se ultrapassado, mesmo ainda que remanescente em momentos interpretativos. A

tendência atual é que os intérpretes, na busca de soluções mais justas para o caso concreto,

afastem-se do Positivismo.

A abstração deu lugar a uma concretização. Passou-se a interpretar de acordo com os

princípios inseridos na Constituição e na sociedade; o caso concreto passou a ser analisado com

suas peculiaridades e a rigidez interpretativa foi ultrapassada por uma relativização. Toda a

sociedade está apta a proceder ao trabalho interpretativo, não mais apenas juízes ou aqueles

formalmente incumbidos para tanto. Esta é uma característica de um Estado Democrático de

Direito, que se afasta de regimes ditatoriais recentes na história da humanidade, como a

Alemanha Nazista, onde a norma, independentemente de ser justa ou injusta, deveria ser

obedecida em nome de um Estado simplesmente de Direito, legalizando-se, e não se legitimando,

todo tipo de atrocidade e arbitrariedade. A realidade exige atenção e pensamento aberto por parte

do intérprete, que guarda, no momento de aplicação e interpretação da norma, essa memória

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103

recente, afastando-se, assim, de qualquer tipo de discricionariedade, fazendo da nova

hermenêutica ato coletivo rumo a uma sociedade mais justa.

Ao entender a forma com que a norma jurídica se apresenta para o intérprete, o momento

no qual este se depara com um caso concreto, que carece de uma decisão adequada para que este

venha a fazer o trabalho hermenêutico-tributário, divide-se a norma jurídica em regras e

princípios. Esta divisão é feita para que haja um trabalho coerente do intérprete. A forma com

que se interpretam as regras e princípios é diferente; as ferramentas e o método a ser utilizado

também se apresentam de forma distinta. No caso dos princípios, o método a ser utilizado é a

colisão de princípios, onde uma ponderação feita, ao se colocar dois princípios em colisão fará

com que a decisão que será tomada acerca do caso concreto em análise se aproxime da justiça e

da certeza. Analisando se o princípio é adequado, necessário e respeita a proporcionalidade, fará

com que o juízo de valoração do intérprete se incline em uma determinada direção no sentido de

resolver o conflito. Para as regras ocorre de outra maneira: o método é diferente, não há um juízo

valorativo neste caso e o trabalho axiológico é afastado. O método para a resolução do conflito

entre regras é o da antinomia jurídica, onde os critérios da especialidade, hierarquia e cronologia

irão guiar o intérprete para uma decisão próxima da exigida. No caso das regras, elas devem ser

aplicadas da maneira que se apresentam no mundo jurídico, diferente dos princípios, que devem

ser aplicados da melhor maneira possível, constituindo-se em mandados de otimização.

Quando se fala em conflito entre direitos fundamentais, colisão, sopesamento e

ponderação, é quase certo que o texto se refere à figura normativa “princípio”. O mesmo ocorre

com as regras ao se tratar de antinomia jurídica: relacionam-se sempre os dois conceitos sem o

devido critério. A resolução de conflitos entre normas jurídicas, seja qual for sua espécie, é o fim

último do intérprete do direito tributário. O que muitos não observam é que cada modelo

interpretativo acima relacionado apresenta suas peculiaridades, sendo o conceito mais amplo o de

colisão de direitos do que o de antinomia jurídica. Tais distinções existentes, se não observadas

com o devido critério, pode resultar em um desvirtuamento do instituto e num erro quanto ao

resultado obtido. Há uma relação entre colisão de direitos fundamentais e o instituto da antinomia

jurídica, onde o primeiro não pode ser solucionado sem que haja um contraponto com o segundo.

A antinomia jurídica é o instituto que se apresenta quase de forma inevitável diante de uma

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realidade atual, onde o poder legislativo, a cada dia, vem aumentando de forma exponencial a

atividade legislativa. Para não se chegar a um falso entendimento de que a frenética atividade do

poder legislativo cria um incontestável número de textos soltos sem relação nenhuma entre si,

devem-se observar tais textos como um todo – unido, coerente e completo.

Para a resolução de antinomias jurídicas é necessária a observância de três critérios: o

critério cronológico postula que a norma posterior prevalece sobre a norma precedente (lex

posterior derrogat priori); já o critério da especialidade se apresenta de forma diferente, onde a

norma especial ou específica prevalece sobre a norma geral (lex specialies obrigat generali); e,

por fim, também distinto, acrescenta-se o critério hierárquico, onde a norma de grau superior

prevalece sobre aquela de grau inferior (lex superior obrigat inferior).

Nota-se também a diferença entre regras e princípios pela forma com que devem ser

interpretadas, observando-se critério e peculiaridades inerentes a cada uma das espécies de norma

jurídica. Mais que isso, deve-se tratar da norma jurídica tributária e das duas vias da

proporcionalidade tributária trabalhando o aspecto em que o contribuinte não sofra o excesso de

exação de forma desproporcional, assim como na contraprestação e na repartição de receitas

constitucionais tributárias. Ambos devem seguir o Princípio da Proporcionalidade para que haja

uma correção nos níveis sociais. Não há aqui a pregação de um socialismo frente a um

capitalismo, mas sim um repúdio à disparidade social. Deve-se considerar a carga tributária com

sendo alta se a contra-prestação é desproporcionalmente irrisória à exação sofrida.

Respondendo a pergunta central do trabalho, que relembrando é a seguinte: “cabe ou não

a aplicação do princípio da proporcionalidade na repartição constitucional de receitas tributárias,

no momento da criação dos tributos pelo legislador e no momento de exigi-los?” .

Como bem ensinou o professor Arnaldo Vasconcelos em suas aulas de epistemologia

jurídica, existe o mundo do “ser” e do “dever ser”, e no presente caso, estamos criticando o “ser”,

onde não há um respeito ao princípio da proporcionalidade nas normas constitucionais que

determinam a repartição de receitas tributárias onde os municípios ficaram relegados, ao ser

previsto na constituição uma sistemática que os coloca em desigualdade financeira e por

conseqüência política por estarem em sua maioria sempre com o “pires na mão”. Mas para eu

isso seja possível se faz necessário modificar a sistema constitucional-tributária no que se refere a

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repartição de receitas, através de emenda à constituição no sentido de ser destinado uma maior

fração da receita para os municípios, respeitando assim a proporcionalidade. Este critério serve

também como parâmetro para o legislador no momento da criação, extinção, majoração ou

redução de tributos.

O tributo é exigível por lei, devendo esta respeitar os princípios constitucionais, dentre

eles o da capacidade contributiva e da proporcionalidade, apresentando esta como uma das vias

de aplicação do referido princípio, ou seja, tanto de ser cobrado, que é o momento em que o

contribuinte sofre a exação tributária, quanto no momento de receber a contraprestação daquilo

que lhe foi retirado deve haver o respeito à proporcionalidade. Não defendo aqui uma vinculação

de todos tributos à uma contraprestação, assim como nas taxas, mas apenas afirmando de forma

categórica que para não haver “confisco travestido de tributo” e para que possa ser auferido se há

ou não uma alta carga tributária, é necessário saber se há ou não uma contraprestação equivalente

por parte do estado, no âmbito da saúde, segurança, ensino, dentre outros serviços. A

proporcionalidade é sim meio apto à tanto.

É de se ressaltar a importância da tributação para a sustentabilidade do Estado e a

modificação no entendimento da doutrina, que passou a reconhecer a existência de cinco espécies

de tributos com o advento da Constituição Federal de 1988, quando, anteriormente, o

entendimento mais aceito era o constante no Código Tributário Nacional, que mencionava apenas

três espécies tributárias. O fato é que retratar as cinco espécies de tributos se faz necessário por

antecipar conceitos, demonstrando a forma com que cada tributo se apresenta inserido na Teoria

Constitucional Tributária para se poder adentrar na repartição de receita tributária, que é a

ferramenta para se chegar a uma autonomia política através da autonomia financeira.

Os Municípios, após a publicação da Constituição Federal de 1988, passaram a gozar de

uma autonomia até então desconhecida no ordenamento jurídico brasileiro, por motivos não

outros senão pela sistemática de transferências de recursos, produto da arrecadação de

determinados tributos específicos, como a totalidade do valor arrecado a título de Imposto de

Renda, imposto federal, pago pelos municípios a seus funcionários, ou de autarquias e fundações

instituídas e mantidas pelos mesmos. Recebem também metade ou a totalidade do ITR (Imposto

sobre a propriedade Territorial Rural) no segundo caso, desde que arrecade e cobre o imposto, o

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qual é de competência da União. Ainda deste recebe 7,25 % do IPI proporcional ao valor das

exportações. Chega-se a este valor porque a lei fala em 25% dos 10% do total arrecadado pela

União, portanto, matemática e facilmente chega-se a 7,25%. Fica também com 70% do IOF-Ouro

e 25% dos 29% entregue ao Estado pela União a título de CIDE- Combustível. Mais importante

do que especificar e detalhar as fontes de recursos que passaram a fazer parte das finanças dos

Municípios é fazer um relato acerca das conseqüências geradas pelo novo sistema tributário

nacional, que é a independência financeira e, por conseqüência, política. Passou o Município a

não depender da “boa vontade” de determinados políticos para obter meios de suprir as

necessidades da população, o chamado “Assédio Moral”. A lei de Responsabilidade Fiscal veio,

então, para punir as autoridades que gerenciam mal tais verbas decorrentes do repasse. Muitas

vezes tais transferências ficam condicionadas à aprovação dos valores gastos pelos Tribunais de

Contas, órgão responsável para fazer o controle externo.

Os tributos acabam sendo importantes por possibilitar a manutenção da estrutura logística

do Estado, podendo este vir a proporcionar, teoricamente, serviços essenciais a toda a população,

como educação, saúde, escola, dentre outros. A repartição destas receitas possibilita, na prática,

uma efetivação do Princípio da Igualdade entre Estados, onde todos os estados podem exercer sua

autonomia (e não soberania) perante a União e perante outros entes. O mesmo ocorre com os

Municípios que passam a ter meios de exercer sua autonomia, tendo em vista que possuem

receitas garantidas constitucionalmente.

Para entender a proporcionalidade constitucional tributária é importante entender o

princípio da não confiscatoriedade, expresso no art.150, IV da CF, de 1988, que se deriva do

Princípio da Capacidade Contributiva, pois o legislador, ao criar as leis que instituem ou majoram

impostos precisam, necessariamente, levar em consideração a capacidade econômica do

contribuinte, não podendo obrigá-lo a saldar uma parcela que esteja além de suas possibilidades.

O princípio da não confiscatoriedade impõe limite aos entes políticos de expropriar os bens

privados, ou seja, a norma constitucional impede que os tributos sejam utilizados “com efeito de

confisco”, cria limites e reforça o direito de propriedade. O princípio da não confiscatoriedade

impõe ao legislador uma conduta equilibrada, moderada e justa. Já o velho Princípio da

Capacidade Contributiva nos mostra a necessária correlação entre os impostos e a verdadeira

capacidade econômica do contribuinte, que permite que os cidadãos cumpram perante toda a

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coletividade com seus deveres de forma justa. Com isso espera-se que o estado cumpra com o seu

papel social, reduzindo as desigualdades e melhorando a qualidade de vida da população.

O Princípio da Capacidade Contributiva apresenta-se como um grande instrumento de

justiça social, pois nada mais justo do que impor ao contribuinte um tributo que esteja de acordo

com a sua capacidade econômica, pois se não fosse desta forma, estaria o estado intervindo de

forma ilegal e injusta no direito de propriedade, inviabilizando a atividade econômica no país e

sacrificando a sociedade. O Princípio da Capacidade Contributiva, assim como o não confisco,

vieram para balizar e impor limites ao legislador em nossa Constituição Federal, fazendo com

que um tributo não seja excessivamente oneroso ao contribuinte. O Princípio da Capacidade

Contributiva é um dos pilares fundamentais do Estado Democrático de Direito, mostra-se

imprescindível para o exercício da igualdade no direito tributário em nosso país. É uma

concretização do Princípio Geral da Igualdade no âmbito da tributação nacional, impondo ao

legislador uma direta observância da referida orientação, e, ao poder judiciário, o dever de

controlar as práticas abusivas dos Entes Federados em suas esferas de competência para instituir

tributos por ser o poder de controle de constitucionalidade das leis e da legalidade dos atos

administrativos. Cabe, portanto, ao Poder Judiciário, com base no princípio da inafastabilidade do

controle jurisdicional, teor do que dispõem o art.5º XXXV, da CF/88, impedir a aplicação de

norma legal que tenha efeito confiscatório, sem que, com isso, haja qualquer afronta à tripartição

de poderes.

Vertentes do Princípio da Proporcionalidade Constitucional Tributária, o Princípio da

Capacidade Contributiva e da não confiscatoriedade apresentam-se não somente como um eficaz

instrumento de justiça social e fiscal, mas principalmente como um corolário do Princípio da

Igualdade, essencial em qualquer regime democrático de direito. Sua observância é imperativa

para que os contribuintes não se sintam incomodados com a cota que lhes cabe pagar, pois o ônus

tributário deve levar em consideração as particularidades dos contribuintes.

Diferente da razoabilidade, a proporcionalidade está relacionada à máxima de aplicação

dos princípios, uma potencialização dos preceitos principiológicos ao caso concreto, tendo

atuação como verdadeiro critério de aferição da legitimidade material de todos os atos praticados

pelo poder público, inclusive no que se refere à criação de tributos, nas sanções tributárias, no

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aumento de alíquotas tributárias, dentre outros atos que venham interferir na vida dos

contribuintes. Entendendo esta como uma primeira via da proporcionalidade tributária, deve

haver também a incidência do mencionado instituto em um segundo momento. Entendemos essa

como a segunda via, que é aquela em que o Estado exerce a contraprestação para a coletividade,

mais especificamente no momento em que a União aplica a repartição tributária de receitas para

os estados e Municípios com o fim único de viabilizar o exercício de atividades que visem o bem

comum da população. Acredita-se, ainda, que os municípios devem ter maior participação em

tudo o que é arrecadado, tendo em vista que a administração municipal encontra-se mais próxima

da população e possuem melhores condições de saber quais as maiores necessidades de seus

habitantes. Há, na verdade, uma grande concentração de receita em poder do ente União Federal,

devendo existir uma aplicação do Princípio da Proporcionalidade no sentido de haver um maior

carreamento de recursos para os municípios que muitas vezes vivem à mercê dessas verbas

repassadas.

O que pode ser extraído do Princípio da Proporcionalidade em relação à esfera jurídica

dos particulares, mais especificamente quanto aos contribuintes, é que o mencionado instituto não

visa apenas evitar a interferência direta do Estado de forma coativa na seara de atuação privada,

mas visa, da mesma forma, exigir uma contraprestação do Estado no sentido de se ver respeitados

os direitos fundamentais. Há uma verdadeira obrigação do Estado de tutelar a segurança, a saúde,

a educação, dentre outros direitos essenciais ao ser humano. Assim, de forma clara, podem-se

observar as duas vias da proporcionalidade constitucional tributária. O contribuinte deve sofrer a

exação do Estado de forma proporcional, na medida de sua capacidade contributiva; e uma

segunda via da proporcionalidade é no sentido de o Estado exercer a contraprestação à população,

respeitando os direitos fundamentais dos indivíduos em uma verdadeira obrigação de não fazer, e

em uma obrigação de fazer quando disponibiliza serviços de saúde, ensino e segurança, por

exemplo. O Princípio da Proporcionalidade no Direito Constitucional Tributário tem uma

“segunda via”; é o momento em que o Estado exerce a repartição de receitas tributárias entre os

entes federados. É a observação do princípio na destinação das receitas arrecadadas, visando uma

desconcentração das receitas nas mãos da União para que cada vez mais os valores sejam

destinados aos municípios, que se mostram como os mais desprovidos de fontes de receitas e de

meios arrecadadores para efetivar políticas públicas de forma mais próxima ao destinatário final,

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que é o contribuinte que recebe a contraprestação daquilo que entrega ao Estado a título de

tributo.

Para tornar possível uma divisão de receitas de forma a favorecer os entes mais

desprivilegiados, que é o caso dos municípios, se faz necessária a aprovação de uma emenda

constitucional onde o projeto atenda ao Princípio da Proporcionalidade e, assim, buscar reduzir as

desigualdades geradas pela disparidade quanto aos valores destinados aos entes. A emenda se faz

indispensável para reorganizar a sistemática constitucional de repartição de receitas. Somente

desta forma uma maior autonomia política por parte dos municípios será estabelecida.

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ÍNDICE ONOMÁSTICO

A

Adam Smith, 77Alfredo Augusto Becker, 88Aliomar Baleeiro, 94Arnaldo Vasconcelos, 28, 29

B

Bernardo Ribeiro de Moraes, 38, 85

C

Carmem Lúcia Antunes Rocha, 30Cláudio Borba, 44

E

Eduardo de Moraes Sabbag, 39

G

Giberto Bercovici, 79Gunnar Myrdal, 26, 27, 28

H

Hans Kelsen, 13, 16, 28Hugo de Brito Machado, 2, 6, 42, 90, 93, 94,

95, 96

I

Ives Gandra da Silva Martins, 74

J

José Afonso da Silva, 52, 91Jürgen Habermas, 33

L

Lenio Luiz Streck, 18, 20Luciano Amaro, 85

M

Miguel Reale, 26

P

Peter Härbele, 24, 25

R

Ricardo Alexandre, 59, 75Robert Alexy, 32, 33, 82Rodolfo Viana Pereira, 23Roque Antonio Carrazza, 93Ruy Barbosa Nogueira, 94

S

Sacha Calmon Navarro Coêlho, 92, 93, 94

V

Valmir Pontes Filho, 33Victor Uckmar, 91

Z

Zelmo Denari, 46

Page 117: TRIBUTAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE RECEITAS: ANÁLISE …dominiopublico.mec.gov.br/download/teste/arqs/cp127684.pdf · 2013. 1. 30. · Tributação e distribuição de receitas : análise

ÍNDICE REMISSIVO

A

Câmara dos Deputados..............................62Capacidade Contributiva...12, 17, 38, 64, 88,

89, 90, 91, 93, 94, 95, 96, 97, 106, 107Código Tributário Nacional.. . .15, 19, 41, 56,

61, 72, 105, 114Constitucional....2, 13, 16, 20, 27, 32, 42, 44,

45, 50, 52, 60, 62, 63, 67, 68, 78, 80, 82,83, 88, 99, 105, 107, 108

Constitucionalismo....................................19Constituição.9, 12, 14, 15, 16, 18, 19, 20, 21,

24, 26, 27, 36, 41, 42, 43, 44, 45, 47, 49,50, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 58, 60, 61, 62,63, 64, 65, 66, 67, 72, 80, 81, 82, 84, 86,87, 88, 90, 91, 92, 94, 97, 98, 99, 100,101, 102, 105, 107, 111, 112, 113, 114

Contribuição....12, 48, 54, 55, 58, 61, 63, 67,100

Democrático.............18, 20, 42, 81, 102, 107Direito....2, 14, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25,

26, 28, 29, 30, 31, 32, 35, 36, 42, 47, 66,78, 81, 82, 83, 84, 90, 94, 102, 107, 108,110, 111, 112, 113, 114

Emenda 20, 44, 45, 50, 52, 60, 62, 63, 67, 68,88

Estado. .14, 16, 18, 19, 20, 26, 31, 32, 42, 43,45, 46, 47, 55, 57, 58, 64, 65, 66, 67, 68,69, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 87,88, 89, 93, 94, 99, 100, 101, 102, 105,106, 107, 108

Exação......................................................64Fiscal.......................................................106Hermenêutica.......................18, 25, 113, 114Imposto..............12, 41, 66, 68, 94, 100, 105

Inconstitucionalidade...............................100Interpretação................................13, 55, 111Legalidade.................................................43Lei................................55, 58, 59, 63, 84, 95Liberal.....................................18, 20, 81, 82Ministro..........47, 54, 55, 58, 63, 80, 84, 100Moral...........................................28, 29, 106Município........................65, 66, 67, 68, 106Norma.......................................................56Participação...................................12, 68, 69Positivismo 12, 13, 18, 19, 20, 21, 23, 24, 25,

26, 27, 81, 82, 102Princípio 9, 12, 16, 32, 34, 38, 42, 43, 64, 77,

82, 83, 84, 85, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 93,94, 95, 96, 97, 99, 104, 106, 107, 108, 109

Proporcionalidade..16, 34, 77, 82, 83, 84, 85,86, 87, 91, 104, 107, 108, 109

Regra.........................................................12Repartição.......................................9, 12, 64Senado Federal..................................62, 111Social............14, 18, 19, 78, 81, 82, 100, 102STF........................51, 53, 56, 61, 84, 85, 95Súmula...............................18, 20, 48, 49, 61Taxa..........................................................49Teoria. .14, 16, 21, 23, 31, 41, 105, 110, 111,

113, 115Tributação.................................................81Tributo................................................49, 64União.. .15, 16, 42, 43, 44, 45, 49, 50, 51, 52,

59, 60, 64, 65, 66, 67, 69, 70, 71, 72, 75,77, 83, 85, 88, 100, 106, 108

Valor.........................................................30Vinculante...........................................18, 20