Trecho Protágoras

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ESCOLA SESI DUQUE DE CAXIAS Professor Evando – Filosofia – EJA – 2º semestre/2014 PROTÁGORAS “Sócrates: Vou começar, Protágoras, pela finalidade da nossa visita. Hipócrates, aqui presente, deseja entrar para a tua escola e diz que gostaria de conhecer as vantagens que obteria com teu ensino. Eis tudo o que temos a dizer. Protágoras: Meu jovem, a vantagem que obterás com minhas lições é que, depois de passares um dia comigo, voltarás para casa melhor do que eras; no dia seguinte a mesma coisa, e assim, todos os dias farás progressos, sempre para melhor. Sócrates então pede que Protágoras seja mais preciso na sua resposta e este acrescenta: “Eu só ensino a meus discípulos a ciência que eles procuram; esta ciência é a prudência, que lhes ensinará, nos negócios domésticos, a melhor forma de administrar a própria casa, e nos negócios da cidade (pólis) os tornará melhores para agir e falar por ela”. Sócrates: Terei compreendido bem tua explicação? Referes-te então à arte política e dedicas-te a formar bons cidadãos? Protágoras: Isso mesmo, Sócrates; esta é a ciência à qual me dedico. Sócrates, então, passa a questionar Protágoras sobre a real possibilidade de se ensinar a virtude da mesma forma como se ensinam outras artes, como a da medicina, ou a de tocar flauta, e desafia Protágoras a demonstrar que ensinar a arte da política é, de fato, possível. Protágoras: Pois bem, Sócrates. Mas, o que preferes? Que faça a minha demonstração contando uma fábula, como um avô conta histórias aos netos, ou discutindo a questão, ponto por ponto? Como os presentes ao diálogo respondessem que Protágoras tratasse a questão como preferisse, Protágoras responde: “Parece que contar a fábula será mais agradável para todos”.

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Texto de Platão

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ESCOLA SESI DUQUE DE CAXIASProfessor Evando Filosofia EJA 2 semestre/2014PROTGORASScrates: Vou comear, Protgoras, pela finalidade da nossa visita. Hipcrates, aqui presente, deseja entrar para a tua escola e diz que gostaria de conhecer as vantagens que obteria com teu ensino. Eis tudo o que temos a dizer.Protgoras: Meu jovem, a vantagem que obters com minhas lies que, depois de passares um dia comigo, voltars para casa melhor do que eras; no dia seguinte a mesma coisa, e assim, todos os dias fars progressos, sempre para melhor. Scrates ento pede que Protgoras seja mais preciso na sua resposta e este acrescenta: Eu s ensino a meus discpulos a cincia que eles procuram; esta cincia a prudncia, que lhes ensinar, nos negcios domsticos, a melhor forma de administrar a prpria casa, e nos negcios da cidade (plis) os tornar melhores para agir e falar por ela.Scrates: Terei compreendido bem tua explicao? Referes-te ento arte poltica e dedicas-te a formar bons cidados?Protgoras: Isso mesmo, Scrates; esta a cincia qual me dedico.Scrates, ento, passa a questionar Protgoras sobre a real possibilidade de se ensinar a virtude da mesma forma como se ensinam outras artes, como a da medicina, ou a de tocar flauta, e desafia Protgoras a demonstrar que ensinar a arte da poltica , de fato, possvel.Protgoras: Pois bem, Scrates. Mas, o que preferes? Que faa a minha demonstrao contando uma fbula, como um av conta histrias aos netos, ou discutindo a questo, ponto por ponto?Como os presentes ao dilogo respondessem que Protgoras tratasse a questo como preferisse, Protgoras responde: Parece que contar a fbula ser mais agradvel para todos.E, assim, passa a contar o que se tornou clebre como o Mito de Protgoras.Eis um resumo da histria:[...]Os deuses haviam terminado a criao das vrias criaturas (animais) do mundo. Mas ainda tinham que dar-lhes vida. Para tanto, chamaram dois irmos Prometeu e Epimeteu para realizarem a seguinte tarefa: distribuir os dons para as diversas espcies, de maneira equitativa para que se garantisse que uma espcie no acabasse por destruir a outra. Epimeteu convence o irmo a deix-lo fazer a distribuio dos dons e depois chamar Prometeu para conferir a obra. Epimeteu fez a partilha, dando a uns a fora, e no a velocidade; a outros, a velocidade, mas no a fora; deu recursos a alguns, e no a outros, a quem doou outros meios de sobrevivncia. [...] Estes cuidados visavam evitar a extino de cada raa.Quando Prometeu veio examinar a distribuio dos recursos, viu as vrias criaturas bem providas de tudo, enquanto o homem encontrava-se nu, descalo, sem proteo ou armas. Sem saber o que fazer, roubou dos deuses o domnio do fogo e das artes e presenteou-o ao homem. Assim, o homem ficou com as tcnicas para se conservar vivo, mas sem a arte da poltica. Por estes favores aos homens, parece que Prometeu foi severamente punido mais tarde. Com o que tinha, o homem articulou a linguagem, construiu casas, inventou a agricultura. Mas, isolados, continuavam frgeis diante dos perigos da natureza. E, quando procuravam reunir-se em segurana, fundando cidades, faziam mal uns aos outros, pois no tinham os saberes da poltica, e assim, se dispersavam e acabavam por morrer.Ento, Zeus, temendo que a nossa espcie se extinguisse, encarregou Hermes de levar aos homens os dons do pudor e da justia como norma para a convivncia a ligar os homens pelos laos da civilidade. Depois de estabelecer que o pudor e o senso da justia fossem repartidos a todos os homens sem exceo, ordena que, em seu nome, todo homem incapaz de pudor e justia seja exterminado como se fosse uma peste na sociedade.E assim, a humanidade sobreviveu e progrediu.Em seguida, Protgoras apresenta seus argumentos, tratando a questo ponto por ponto. Afirma que, em relao s artes, concorda que os profissionais no admitam que amadores deem palpite. Mas, quando se delibera sobre poltica, que se apoia no senso da justia e na temperana, adequado admitir todo o tipo de gente a opinar. Pois necessrio que todos tenham parte na virtude da civilidade. Seno, no poderia existir a cidade.Depois, quanto possibilidade de se ensinar a virtude poltica, oferece outros argumentos:No ensino da virtude, a tarefa dos pais comea desde os primeiros anos e estende-se at a morte [...]. Cada ato, cada palavra serve de ocasio para uma lio: Isto justo, dizem-lhe, aquilo injusto; isto belo, aquilo vergonhoso; isto agrada aos deuses, aquilo desagrada; faa isto, no faa aquilo. [...] Depois, os pequenos so mandados escola [...]. Ali conhecem as muitas normas, muitas histrias de louvor aos heris antigos. que se espera que a criana os imite e busque se assemelhar a eles.Pelo fato de todos ensinarem a virtude, cada um na sua oportunidade, parece que ningum a ensina. o mesmo que se d ao procurar um professor especfico para ensinar a falar o grego (nossa lngua materna). No existe tal professor.Depois da exposio da fbula e dos argumentos, Scrates vira-se para o candidato a discpulo de Protgoras e exclama: Hipcrates, filho de Apolodoro, como agradeo me fazeres vir a este encontro! Por nada no mundo trocaria o prazer de ter ouvido este discurso de Protgoras.

PLATO. Protgoras. Traduo Luiza Christov. Disponvel em:. Acesso em: 13 nov. 2009.